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Nunca a Ciência evoluiu tanto e tão rápido quanto no século XX. O conhecimento
teve uma propulsão em inúmeras áreas diferentes. Na Física, a Relatividade deixou
de ser uma teoria de um cientista brilhante e hoje está comprovada. A Física
Quântica fez a Física Clássica Newtoniana perder sua hegemonia, a partir do
descobrimento dos fenômenos físicos do mundo atômico. A Medicina evoluiu de tal
maneira, que em meados da década de 70 conseguiu fazer o primeiro transplante de
coração, dando esperança de sobrevida a milhões de pessoas. A Informática ainda
está revolucionando o Mundo com seus chips cada vez menores e mais potentes. A
Indústria da Guerra transformou as guerras em algo muito parecido aos videogames,
com sua altíssima tecnologia bélica empregada. A Internet encurtou o globo em um
local acessível a qualquer um que tenha um computador conectado à rede. A
Imprensa traz o mundo inteiro on-line para dentro da casa de todas as pessoas.
Enfim, a recente Engenharia Genética também vem obtendo avanços fabulosos nas
mais diversas áreas da Biologia.
Agora no século XXI não será diferente. Os avanços são tão rápidos que nem
sempre é possível discutir sobre eles. Muitas coisas são inventadas e criadas, mas
sem uma séria discussão sobre os seus usos e conseqüências. Esse é o caso, por
exemplo, da clonagem. Já há tecnologia disponível para fazê-la em seres humanos
e enquanto a discussão é colocada à mesa, cientistas estão fazendo seus
experimentos nos laboratórios e nós não sabemos o que pode vir pela frente. O
assunto não é para o futuro, é para agora.
Diante disso, as igrejas ficam atônitas e sem respostas convincentes para seus fiéis.
Quando algumas vozes surgem na discussão, geralmente, o que se vê é um
amontoado de bobagens, embasadas em textos bíblicos totalmente fora de seus
contextos, repletos de ignorância e fanatismo religioso. Felizmente, os cristãos do
novo século não estão (alguns, pelo menos) mais aceitando essa postura
irresponsável de seus líderes. Queremos respostas sérias e embasadas, resultando
no melhor entre o conhecimento bíblico e a mais recente pesquisa científica,
independente do assunto. É tarefa obrigatória da liderança cristã, estar bem
informada e ter uma opinião clara, definida e coerente frente às questões atuais.
Definições do tema
Há tantos usos para a palavra clone, que é preciso explicar sobre qual significado a
obra irá se referir. Não tem relação com os clones das Ciências da Computação e
dos Games para entretenimento, nem tampouco com os candidatos políticos que
imitam uma outra personalidade famosa, mas sim tem a ver com a clonagem
biológica, que reproduz seres vivos a partir de um ser vivo já adulto.
Como é definida a clonagem?
“É definida como uma produção deliberada de indivíduos geneticamente
idênticos. Cada novo indivíduo produzido é um clone do original. Clones
contêm idêntico material genético no núcleo de todas as células de seus
corpos ” 1.
A palavra “clonagem” vem do grego klon que quer dizer estaca. Poucos sabem, mas
a prática de enxerto em flores e frutos é uma clonagem. Um clone é sempre uma
cópia idêntica do progenitor, em termos de patrimônio genético. Há diversos tipos de
clonagem. Na natureza, por exemplo, alguns microorganismos e plantas se
reproduzem por clonagem natural, ou seja, pela reduplicação de uma ou mais
células que originam diferentes indivíduos. Há também a clonagem de animais por
que não de homens?
Delimitações do tema
Desenvolvimento
História
1
Scientific and Medical Aspects of Human Reproductive Cloning (2002), p. 24.
Em meados da década de 70, os cientistas aperfeiçoaram a chamada clonagem
molecular pela qual se produzem clones celulares. Isso possibilitou avanços nas
pesquisas sobre o DNA. Desde então, clones são produzidos a partir de organismos
unicelulares e de células somáticas pertencentes a um ser adulto.
Em animais, induz-se a separação dos blastômeros2 para realizar uma clonagem
induzida. Esse é um procedimento comum à zootecnia. Cada célula-blastômero está
apta a originar um indivíduo distinto, pois ainda não está diferenciada em células
ósseas, sanguíneas, etc. Os gêmeos univitelinos são exemplos de uma clonagem
embrionária natural, pois têm sua origem na partição do óvulo fecundado.
Em 1997, porém, cientistas do Instituto Roslin de Edimburgo, Escócia, deixaram o
mundo atônito com a notícia da clonagem nuclear de um mamífero. Houve muito
destaque para a notícia e o assunto repercutiu nas mais diversas esferas da
sociedade. Muitos ficaram curiosos e entusiasmados, mas outros, com razão,
apreensivos e preocupados com as possibilidades da reprodução humana. Muitos
jornalistas foram à busca de cientistas e eticistas. Políticos questionaram se a
legislação vigente era rígida o bastante para evitar abusos, ou se novas bases
jurídicas seriam necessárias para delimitar o uso da clonagem em seres humanos.
Figura 01: capa da revista Nature onde apareceu o artigo sobre a clonagem d emamíferos
Aspectos Científicos
2
Células de um embrião nos primeiros estágios de evolução nos quais elas ainda são totipotentes, isto é,
diferenciadas.
O grande feito na clonagem de Dolly, a ovelha que causou toda a celeuma, foi o
sucesso em se reproduzir um mamífero assexuadamente, não por meio de divisão
de células embrionárias indiferenciadas e totipotentes, o que já é feito no gado, por
exemplo, mas a partir de células diferenciadas adultas. Esse tipo de reprodução já
era feita, mas apenas em rãs. A novidade está no fato de transpô-la para mamíferos.
O que é feito, na verdade, “é a transferência do núcleo de célula adulta com o
respectivo material genético para o citoplasma de célula germinal feminina
previamente desnucleada”. 3
Trata-se de algo feito dessa maneira: o óvulo da ovelha “A” teve seu núcleo retirado.
Depois, em uma ovelha “B” tirou-se o núcleo de uma célula mamária, e substituiu-se
pelo tirado de “A”. Esse novo conjunto celular foi implantado no útero de uma ovelha
“C”. Dolly, então, nasceu idêntica à ovelha “B”, pois essa forneceu o núcleo e o
respectivo material genético 5.
Interessante saber que isso não ocorreu facilmente. Foram 277 óvulos fecundados e
apenas um sucesso, o que mostra a imperfeição do método. Isso sem falar que a
glândula mamária tirada de “B” pertenceu a uma ovelha gestante, ou seja, esse fato
foi ou não determinante? Ainda não se sabe.
3
Bioética – perspectivas e desafios, p. 252
4
Retirado de http://en.wikipedia.org/wiki/Dolly_the_sheep
5
Só por curiosidade, Dolly morreu em 14 de fevereiro de 2003, de uma doença comum em ovelhas.
Nesse tipo de clonagem é produzido um clone do núcleo original, ao mesmo tempo
em que a bagagem citoplasmática vem do óvulo. É certo que o citoplasma também
contém informações genéticas peculiares ao nível dos mitocôndrios, mas isso ainda
não é bem conhecido. Na verdade, isso mostra que o clone não será idêntico ao ser
adulto que forneceu o núcleo, pois há interação com o citoplasma de quem forneceu
o óvulo.
A grande inovação científica é o fato de os cientistas escoceses terem conseguido
“induzir uma célula somática adulta a voltar ao estado de indiferenciação para assim
gerar um novo ser”. 6
Até então, clonar indivíduos a partir de células adultas parecia remoto, mas Dolly
7
superou esse fato. Todas as células do organismo adulto têm o mesmo patrimônio
genético, mesmo elas sendo diferenciadas entre si.
Argumentação
Clonagem humana
6
Bioética – perspectivas e desafios, p. 254
7
Vale a pena conferir o artigo: I. WILMUT; A.E. SCHNIEKE; A.J. KIND; K.H.S. CAMPBELL, Viable
offspring derived from fetal and adult mammalian cells, Nature 385, 27 de fevereiro de 1997, 810-813.
Antes de Dolly8, a opinião pública pouco se interessava pelo assunto. Entretanto,
com a possibilidade de reprodução de um mamífero por clonagem nuclear, surgiu a
notícia de que o mesmo poderia ser feito com seres humanos. Assim, abriu-se um
interessante debate ético e jurídico. A clonagem estaria restrita ao tratamento da
infertilidade ou mentes cruéis poderiam criar verdadeiros exércitos de ciborgs?
Mulheres homossexuais poderiam gerar filhos sem a participação de homens e
pessoas necessitadas poderiam criar clones9 para fornecerem medulas
compatíveis? São questões a serem debatidas.
8
Não confundir com o refrigerante de gosto duvidoso disponível em qualquer supermercado.
9
O filme A Ilha (The Island – dirigido por Michael Bay) retrata exatamente essa questão.
Sinopse do filme para os interessados: Lincoln Six-Echo (EWAN MCGREGOR) é um morador de um utópico,
porém rigorosamente controlado complexo em meados do século 21. Assim como todos os habitantes deste
ambiente cuidadosamente controlado, Lincoln sonha em ser escolhido para ir para "A Ilha" – dita o único lugar
descontaminado no planeta. Mas Lincoln logo descobre que tudo sobre sua existência é uma mentira. Ele e todos
os outros habitantes do complexo são na verdade clones cujo único propósito é fornecer “partes sobressalentes”
para seus humanos originais. Percebendo que é uma questão de tempo antes que seja “usado”, Lincoln faz uma
fuga ousada com uma linda colega chamada Jordan Two-Delta (Scarlett Johansson). Perseguidos sem trégua
pelas forças da sinistra instituição que uma vez os abrigou, Lincoln e Jordan entram em uma corrida por suas
vidas e para literalmente conhecer seus criadores.
10
De 400 denominações, quantas há que são clones umas das outras? Por que essa clonagem é permitida?
Esses argumentos podem facilmente ser rebatidos:
Casais de lesbianas poderia ter filhos (as) com material genético do “casal”: quando
esses casais optaram pela preferência sexual, abriram mão do relacionamento
intersexual, fundamental à geração de filhos. De qualquer forma, não é um
argumento científico e poderá ser utilizado sem nenhum aparente problema
biológico. Isso dá assunto a um outro questionamento ético: casais homossexuais
devem ter filhos?
Repor filhos perdidos por doença fatal ou tragédia acidental: por mais profunda que
seja a dor de um casal, não é possível imaginar que creiam em alguém que possa
substituir o filho perdido. Nesse caso, só será um outro filho, geneticamente copiado,
nada mais. A dor pode ser maior ainda, pois a imagem (literalmente) do filho perdido
nunca dará tréguas. Mesmo assim, creio que alguns desejariam passar por isso.
A Perspectiva Ética
Pessoas que trabalham com ciências biológicas tendem a encarar a clonagem como
algo normal, visto que gêmeos, por exemplo, reproduzem-se por clonagem
embrionária. Então, qual o problema de se induzir a clonagem em laboratório?
A resposta dessa pergunta é complexa. Cientistas tendem a ver no homem apenas
um ser biológico, como qualquer outro animal, esquecendo de sua realidade
11
espiritual. É claro que a ciência sempre optará pela realidade material e sensível,
mas ignorar outras realidades não sensíveis certamente é equivocado. Geralmente,
a ciência sempre sofistica os meios e quase nunca se importa com os fins. As novas
descobertas nem sempre vêm acompanhadas de discussões éticas sérias. Veja, por
exemplo, a exaltação sobre o tema da clonagem humana em um artigo científico:
13
Bioética – perspectivas e desafios, p. 262
14
Almeida Fiel e Corrigida
em detrimento de gênios como Stephen Hawking. Isso sem falar nos fanáticos
religiosos que tentariam clonar Maomé, Jesus, Buda, Dalai Lama, etc. Muito bem
pontuou Álvaro Valls:
Poderíamos discutir, entrando nas questões do dia, se seria melhor termos,
disponível para a reprodução, um banco de doadores composto de prêmios
Nobel, de grandes esportistas e de artistas lindas, ou se deveríamos
assegurar uma humanidade mais pacífica, mais são e mais santa estocando
material genético de pessoas como Madre Teresa de Calcutá. p.150 Do
aconselha..
A dignidade humana deve ser defendida: o Biodireito é um novo ramo, ainda sem
leis específicas. Na expressão de FERRAZ:
15
FERRAZ, Sérgio. Manipulações biológicas e princípios constitucionais: uma introdução, Porto Alegre,
Sérgio Fabris editor, 1991, p.20.
16
Bioética: uma aproximação, p.46.
Para resguardar os direitos da humanidade, o Direito deve reprimir abusos; coibir os
experimentos científicos que usem o homem como meio, não como fim; e garantir a
perenidade humana, vegetal e animal na Terra.
A Perspectiva Teológica
Conclusão
Bibliografia