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O câncer de esôfago: uma revisão

Elton Carlos de OLIVEIRA-BORGES1


Adriana Fernandes SILVA2
Amanda Monteiro das GRAÇAS3
Fabiano Freire Santos MELO4
Adler Andrade BARCELOS5
Seiji MYIATA6

1
Graduando em Medicina pela UninCor, eltonborges@hotmail.com
2
Graduanda em Medicina pela UninCor, drifernandesmg@gmail.com
3
Graduanda em Medicina pela UninCor, amandamontegra@hotmail.com
4
Graduando em Medicina pela UninCor, incisivocity@hotmail.com
5
Graduando em Medicina pela UninCor, adler@dr.com
6
Cirurgião-Oncologista, professor da disciplina de Clínica Cirúrgica na UninCor, seijisilvana@terra.com.br

Recebido em: 03/05/2015 - Aprovado em: 14/07/2015 - Disponibilizado em: 15/07/2015

RESUMO
O câncer de esôfago é um câncer relativamente incomum, mas de prognóstico desfavorável, associado ao alcoolismo,
tabagismo e chá mate, em populações com menor nível socioeconômico. OBJETIVO: elaborar uma revisão
bibliográfica sobre o câncer de esôfago, dividida nos seguintes tópicos: histórico; sintomatologia; classificação,
prognóstico e estadiamento; epidemiologia, distribuição geográfica e fatores de risco; formas de diagnóstico; e
tratamento. METODOLOGIA: foram revisados 23 artigos, publicados, entre os anos de 2005 a 2015, por centros de
pesquisa brasileiros de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, bem como internacionais.
RESULTADO: o câncer no esôfago reúne, sob o mesmo nome, 20 diferentes histologias tumorais, marcadas pelo
estabelecimento de sintomas como disfagia, odinofagia e perda de peso. Três classificações foram usadas para a sua
distinção e avaliação do estadiamento, entre as quais, a Classificação Macroscópica, o Consenso de Paris, e a
Classificação de Vienna p-TNM, de maior complexidade e referência. Alguns estudos sugeriram a associação de
adenocarcinomas ao esôfago de Barrett e à doença do refluxo gastro-esofágico, assim como à neutralização
medicamentosa do pH gástrico. Não foi relatada associação entre esôfago de Barret e carcinoma epidermóide. A
sobrevivência após 5 anos é desapontadora, variando conforme o tipo histológico e o estágio do tumor. O sítio mais
frequente é o terço médio. A endoscopia digestiva alta com biópsia é o exame diagnóstico mais indicado. A terapêutica
mais utilizada é a neoadjuvante, com combinação entre quimio e radioterapia para redução tumoral, e melhor resultado
na ressecção cirúrgica.
Palavras-chave: Câncer de Esôfago. Adenocarcinoma. Carcinoma Epidermóide. Esôfago de Barret. Disfagia.

ABSTRACT
Esophageal cancer is a relatively uncommon cancer, but the poor prognosis, associated with alcoholism, smoking and
mate tea in populations with lower socioeconomic status. OBJECTIVE: To develop a literature review on esophageal
cancer, divided into the following topics: history; symptoms; classification, prognosis and staging; epidemiology,
geographical distribution and risk factors; forms of diagnosis; and treatment. METHODS: we reviewed 23 articles
published between the years 2005 to 2015, by Brazilian research centers of Sao Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais and
Rio Grande do Sul, as well as international. RESULT: cancer of the esophagus brings together, under the same name,
20 different tumor histologies, marked by the establishment of symptoms such as dysphagia, odynophagia and weight
loss. Three classifications were used for their distinction and evaluation of staging, including the Macroscopic
Classification, the Consensus of Paris, and Vienna Classification p-TNM, more complex and reference. Some studies
have suggested the association adenocarcinomas of the Barrett’s esophagus and gastro-esophageal reflux, as well as to
drug neutralization of gastric pH. It was reported association between Barrett's esophagus and squamous cell carcinoma.
The survival after five years is disappointing, varying according to the histological type and tumor stage. The most
frequent site is the middle third. Upper endoscopy with biopsy is the preferred diagnostic test. The most widely used
therapy is neoadjuvant with combination chemotherapy and radiation therapy for tumor reduction, and better results of
surgical resection.
Keywords: Esophageal cancer. Adenocarcinoma. Carcinoma Epidermóide. Barrett's esophagus. Squamous cell
carcinoma. Dysphagia.

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INTRODUÇÃO encontradas referências históricas sobre o
câncer no esôfago, com exceção da citação de
O câncer no esôfago apresenta 20
Garbino (2005) sobre o primeiro caso de
diferentes tipos histológicos, dos quais o
carcinoma de esôfago tipo células pequenas,
adenocarcinoma é o mais frequente (75%);
publicado por Kelsen e colaboradores, em
todos, no entanto, estão associados à disfagia
1980.
e à perda de peso. A porcentagem de
pacientes que sobrevivem após cinco anos é
desapontadora, mas varia conforme a
Sintomatologia
classificação do tumor: 10% no carcinoma
epidermóide tipo basalóide e 25% no sarcoma
Em relação aos sintomas, os exemplos
sinovial, pode chegar, entretanto, a 95% no
mais detalhados foram dados pelos trabalhos
carcinoma de células escamosas em estágio
de Ximenes Netto et al. (2011) e (2012),
inicial.
Alencar et al. (2012), e Cambruzzi et al.
Este artigo tem como objetivo reunir
(2013), sobre a manifestação de odinofagia
uma síntese sobre tamanho mal, a partir de
(dor durante a deglutição), disfagia
artigos publicados entre os anos de 2005 a
(dificuldade para deglutição), perda de peso,
2015, contemplando os seguintes tópicos: (1)
dor torácica, febre, fadiga, desidratação e
Histórico, (2) Sintomatologia, (3)
alteração no timbre da voz; a disfagia foi
Classificação, Prognóstico e Estadiamento,
progressiva com necessária ingestão de
(4) Epidemiologia, Distribuição Geográfica e
líquidos durante a deglutição; os vômitos pós-
Fatores de Risco, (5) Formas de Diagnóstico,
prandiais de alimentos pouco digeridos
e (6) Tratamento. Foram analisadas
ocorreram após 30’ em média, e o
publicações nos idiomas português e
emagrecimento chegou a 10 kg em 4 meses
espanhol, produzidas por universidades e
No carcinoma epidermóide tipo basalóide, os
centros de pesquisa brasileiros, sediados nos
sintomas mais comuns foram a disfagia e a
Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas
perda de peso, havendo, em mais da metade
Gerais e Rio Grande do Sul, além de centros
dos casos, envolvimento linfonodal já no
de pesquisa de referência localizados em
diagnóstico. O mesmo pode crescer e atingir
outras partes do mundo.
grandes proporções sem qualquer sintoma ou
cursar com lesão cáustica, acalasia, doença
Histórico
diverticular ou do refluxo, além de tosse e
hematêmese. (XIMENES NETTO et al.
Na literatura analisada, não foram

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(2011) e (2012); CAMBRUZZI et al., 2013; microscópicos. (OMS citado por XIMENES
ALENCAR et al, 2012). NETTO et al., 2011).
Queiroga e Pernambuco (2006), Veas
Classificações histológicas, Estadiamento e e Flisfisch (2011) afirmam que o sítio mais
Prognóstico frequente do câncer no esôfago é o terço
médio, sendo os terços superior e inferior,
Quanto às referências sobre entre si, de percentual semelhante, mas com
classificações histológicas, estadiamento e tendência de aumento no terço inferior em
prognóstico, as melhores foram encontradas função da crescente incidência de refluxo
em Queiroga e Pernambuco (2006), Seineldin gastresofágico crônico e Esôfago de Barret
e Seineldin (2007), Garrido (2011), Veas e (EB). Seineldin e Seineldin (2007), por outro
Flisfisch (2011), Ximenes Netto et al. (2011), lado, defendem valores diferenciados de
Arantes (2012), Lacerda (2013) e Cambruzzi frequência de localização, sendo 50 % no
et al. (2013). terço médio; 30% a 35% no terço inferior e,
Segundo a Organização Mundial da apenas, 1% no terço superior. Para Cambruzzi
Saúde, os tumores malignos que acometem o et al. (2013), o sítio mais comum é o terço
esôfago subdividem-se em 20 tipos, quais inferior do esôfago, podendo o carcinoma de
sejam, (1) carcinoma epidermóide tipo usual; células escamosas ocorrer em qualquer parte,
(2) carcinoma epidermóide com variantes; (3) mas, especialmente, no terço médio e o
carcinoma basalóide; (4) carcinosarcoma; (5) inferior.
carcinoma verrucoso; (6) carcinoma tipo Cambruzzi et al. (2013) ressaltou que
linfoepitelial; (7) adenocarcinoma associado o esôfago é um dos locais mais comuns de
a esôfago de Barrett; (8) carcinoma adenóide tumores de células granulares (tumor de
cístico; (9) carcinoma misto Abrikossoff) no trato gastrointestinal, sendo
epidermóide/glandular e tumores compostos; solitários, incidentais, de pequena lesão e
(10) carcinoma adenoescamoso; (11) crescimento lento. Tumores múltiplos são
carcinoma mucoepidermóide; (12) carcinoma encontrados em cerca de 10% dos casos, e
de célula pequena; (13) coriocarcinoma; (14) podem levar à obstrução.
tumores não epiteliais; (15) leiomiosarcoma; Queiroga e Pernambuco (2006)
(16) rabdomiosarcoma; (17) sarcoma de classificaram histologicamente tais tumores
Kaposi; (18) melanoma maligno; (19) em (1) carcinoma epidermóide ou escamoso e
tumores secundários; e (20) carcinoma (2) adenocarcinoma; o primeiro derivado do
epidermóide invasivo com achados macro e epitélio estratificado não queratinizado,
característico da mucosa normal do esôfago,

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tem como variantes o (1.1) carcinoma superior), SM2 (terço médio) e SM3 (terço
verrucoso, o (1.2) carcinoma epidermóide tipo inferior). (ARANTES, 2012).
basilóide e o (1.3) carcinoma epidermóide Em relação à denominação
sarcomatóide. Já o (2) adenocarcinoma no histopatológica das neoplasias superficiais, a
interior do epitélio colunar displásico, recomendação atual é que seja adotada a
principalmente, na junção esôfago- normatização de terminologia proposta pela
gástrica/cárdia, com refluxo gástrico crônico e Classificação de Vienna / p-TNM (“p” de
metaplasia gástrica do epitélio, além de patologia). Na ausência de invasão da lâmina
aneuploidias e mutações do p53, mesmo antes própria, a lesão é denominada neoplasia
da neoplasia se tornar detectável. Suas intraepitelial de baixo ou alto grau, além de in
variantes raras incluem o (2.1) carcinoma situ (pTis). Ocorrendo a invasão da lâmina
mucoepidermóide e o (2.2) carcinoma própria a neoplasia esofagiana é denominada
adenóide-cístico. carcinoma intramucoso ou microinvasivo
De acordo com o Consenso de Paris (pT1m). Em caso de infiltração da camada
citado por Arantes (2012), as lesões submucosa, a neoplasia é considerada
superficiais no esôfago apresentam 3 invasora (pT1sm). Deve-se destacar que o
subtipos: (1) protuso (tipo 0-I), (2) plano (tipo risco de metástase linfonodal em neoplasias
0-II) e (3) escavado (tipo 0-III). As lesões superficiais é determinado pela profundidade
protusas são subclassificadas em (1.1) de invasão da lesão na parede do órgão,
pediculada (0-Ip), (1.2) subpediculada (0-Isp) critério este que define a necessidade do
e (1.3) séssil (0-Is). No esôfago são mais tratamento endoscópico com fins curativos:
frequentes as neoplasias superficiais planas, (1) se o acometimento é limitado ao epitélio
subdivididas em (2.1) superficialmente (M1) e à lâmina própria do esôfago (M2), o
elevadas em relação à mucosa adjacente risco de disseminação linfonodal é próximo a
(IIA), (2.2) planas (IIB) e (2.3) deprimidas zero, sendo a excisão local completa
(IIC), sendo raras as formas (1) protusa e (3) suficiente para a cura; (2) se a lesão invade a
escavada. Tais neoplasias podem, ainda, ser musculares mucosa (M3) e a porção superior
subdivididas segundo o grau de penetração da submucosa até a profundidade de 200ì
transmural: M1 corresponde ao epitélio e (SM1), o risco é de 9% a 19%; (3) se o tumor
camada basal; M2 à lâmina própria ou córion; atinge focalmente as camadas M3/SM1, com
e M3 à muscular da mucosa. O tamanho da lesão menor que 3cm, inexiste
comprometimento da submucosa também invasão linfovascular e o acometimento da
pode ser subdividido em SM1 (terço lâmina musculares mucosa tem largura
inferior a 3mm, o risco de metástase

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linfonodal é muito baixo (1,5%); (4) em caso margens; na superfície, nos focos
de infiltração acentuada da submucosa (SM2 de necrose são originadas crateras
e SM3), metástases linfonodais ocorrem em de diferentes extensões e
40% dos casos. (ARANTES et al., 2012). profundidade;
Cambruzzi et al. (2013), por sua vez, (2) ulcerados: os mamelões
focalizaram uma classificação na qual os neoplásicos apresentam menor
tumores primários do esôfago, com nódulo extensão que os vegetantes, e
mal circunscrito, firme e amarelo-pálido, na forma de úlcera com bordas
submucosa, são definidos segundo sua origem grossas, evertidas e irregulares,
celular em epiteliais e não epiteliais, benignos sobre fundo da cratera
e malignos. Afirmaram, ainda, que quase hemorrágico e escarpado; toda a
todos os cânceres de esôfago são carcinomas, espessura de sua parede pode ser
sendo raros os sarcomas; já os tumores não atravessada por crescimento
epiteliais são de maioria benigna, sobre tecido tumoral e o diâmetro maior é
de estroma mesenquimal; os tumores orientado para o eixo longitudinal
compostos são, por sua vez, tumores do esôfago;
originados de forma separada, em locais (3) infiltrantes: os mamelões
adjacentes, que se fundem, à medida que caracterizam-se por abundante
crescem, invadindo um ao outro. estroma fibroso, infiltrado em
Em relação à extensão e classificação toda espessura da parede ou como
macroscópica, Seineldin e Seineldin (2007) ilhotas descontínuas,
afirmaram que os cânceres de esôfago circunferenciais, pouco
apresentam, no diagnóstico, tamanho entre 4 e estendidas, com calibre exterior
5 cm, assim como três possíveis tipos pouco alterado, de menor
macroscópicos de lesões: elasticidade, e com finas
(1) vegetantes: os mamelões verrucosidades; a estenose é
neoplásicos (montículos) consequência do engrossamento
proliferam-se para o interior da parietal e da retração do tecido
luz, alcançando considerável tumoral. Embora possuam aspecto
tamanho, sobre ampla base e de fibroso, esses tumores costumam
bordas definidas; a apresentação ser de desfavorável evolução.
pedicular é improvável, apesar de Seineldin e Seineldin (2007),
serem comuns pequenas ressaltaram que em função da origem
excrescências polipóides nas embrionária esofágica ser ectodérmica com

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produção de epitélio pavimentoso mundial. Sem uma etiologia identificada, as
estratificado, a variedade cancerígena mais infecções pelos vírus HIV e Epstein-Barr
frequente é a epidermóide (escamosa), foram relatadas como os seus fatores de risco
incidente entre 93,7% e 78,5% dos casos, por (XIMENES, 2008), e afirmadas como item no
implantação nas paredes esofágicas ou diagnóstico diferencial de HIV-AIDS, uma
infiltração cefálica de tumor gástrico. vez que pacientes HIV+ apresentam 104
Queiroga e Pernambuco (2006), Veas e vezes mais risco de linfoma de esôfago.
Flisfisch (2011) confirmaram o carcinoma Tido por grande parte dos autores
epidermóide escamoso como o tipo mais como o tipo mais frequente, o carcinoma
frequente (75%), exofítico, ulcerado, epidermóide, segundo Seineldin e Seineldin
infiltrante, de precoce invasão local e (2007), é bem diferenciado, com
metástase à distância; sendo o segundo tipo o queratinização central e certa organização
adenocarcinoma, no terço médio inferior, celular, podendo ser moderadamente
mais associado ao Esôfago de Barret (EB), diferenciado; os pobremente diferenciados
com rápida disseminação linfonodal e apresentam polimorfismo celular,
acentuada incidência em obesos; carcinomas hipercromatismo nuclear e elevado número de
adenoescamosos, melanomas ou sarcomas são mitoses, não sendo possível definir seu caráter
infrequentes, representando menos de 1% dos epidermóide. No tipo pseudosarcomatoso ou
casos. Já Ximenes Netto et al., em revisão de fusiforme, variante do epidermóide, são
2011, assumiram como tipo mais frequente observadas células com aspecto de fuso
(75%) o adenocarcinoma, ao invés do semelhante aos sarcomas de outros sítios.
carcinoma escamoso. Garrido (2011) De acordo com Seineldin e Seineldin
esclareceu que o carcinoma de células (2007), o adenocarcinoma tem, por seu
escamosas ocorre mais no nível do terço tempo, origem associada a áreas de
superior e médio, enquanto que, no terço metaplasia intestinal ou ilhotas ectópicas de
inferior, há predomínio de adenocarcinoma. mucosa gástrica, com variantes
Para aumentar o dissenso, Cambruzzi et al. mucoepidermóide e adenocística. Já os
(2013), atribuíram ao carcinoma espinocelular carcinomas precoces são raramente
o tipo mais comum dos tumores malignos do reconhecidos nos primeiros estágios, sendo as
esôfago, nos homens, aos 60 anos de idade. lesões iniciais pequenas, com erosão
Ximenes Netto et al. (2011), por sua inespecífica, placa queratótica e imagem
vez, assumiram o linfoma primário do polipóide; o tipo papilar é menos frequente,
esôfago, como o tipo mais raro, apresentando mas comprometer a camada muscular.
menos de 30 casos relatados na literatura Garbino et al. (2005) caracterizaram o

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carcinoma de esôfago por pequenas células, frequente o leiomioma, e o menos, o fibroma,
redondas, ovais, poligonais, com núcleo o lipoma, o hemangioma, o neurofibroma e o
hipercromático e escasso citoplasma, tumor mesenquimatoso benigno. (GARRIDO,
dispostas em colunas e lâminas ou rosetas, 2011; CAMBRUZZI et al, 2013).
com grânulos neurosecretantes O fator prognóstico mais importante é
citoplasmáticos. No esôfago são menos o estadiamento baseado no sistema TNM,
frequentes o carcinoma verrucoso, o destacado na Tabela I a seguir. Nos pacientes
carcinoma epidermóide basalóide e as em que o tumor não vai além da submucosa,
neoplasias não epiteliais como o tumor a sobrevida pode chegar a 70%, comparado à
estromal gastrointestinal (GIST) e o sobrevivência de, apenas, 30% a 50% dos
melanoma maligno. (LACERDA, 2013). pacientes nos quais há invasão da musculares
De outro modo, os tumores de caráter própria e adventícia. (XIMENES NETTO et
benigno são raros e, grande parte das vezes, al., 2011).
assintomáticos, com incidência maior entre os
30 e 59 anos de idade, sendo o tumor mais

Tabela I: Sistema TNM na classificação dos tumores malignos do esôfago


Linfonodos regionais Estadiamento por
Tumor primário (T) Metástases distantes
(N) Grupos
TX tumor primário não NX linfonodos regionais MX metástases não Estágio 0 Tis N0 M0
pode ser acessado não podem ser acessados podem ser acessadas
T0 Sem evidência do N0 linfonodos regionais M0 sem metástases Estágio I T1 N0 M0
tumor primário não envolvidos distantes
Tis Carcinoma in N1 linfonodos regionais M1 metástases distantes Estágio IIA T2-T3
situ/displasia de alto grau envolvidos N0 MO
T1 Tumor que invade a N1a – 1-3 linfonodos Para os tumores do Estágio IIB T1-T2
lâmina própria ou envolvidos esôfago torácico inferior N1 M0
submucosa
T1a Tumor invade a N1b -4-7 linfonodos M1 a – metástases no Estágio III T3 N1
lâmina própria envolvidos tronco celíaco M0
T1b Tumor invade a N1c - > 7 linfonodos M1 b - outros locais de T4 Qualquer N M0
submucosa envolvidos metástases
T2 Tumor invade a Para os tumores do Estágio IV Qualquer
musculares própria esôfago torácico superior T Qualquer M M1
T3 Tumor invade a M1a – Metástases nos Estágio IV A
adventícia linfonodos cervicais Qualquer T
Qualquer N M1a
T4 Tumor invade M1b - 0utras metástases Estágio IV B
estruturas adjacentes distantes Qualquer T
Qualquer N M1b
Para os tumores do
esôfago médio
M1a – não se aplica
M1b - Sem linfonodos
regionais ou metástases
distantes
Fonte: American Joint Committee on Cancer (2002) citado por Ximenes Netto et al. (2011).

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A sobrevivência de um paciente após muito mais comum em negros do que em
5 anos, em caso de carcinoma epidermóide brancos. Uma característica interessante é a
tipo basalóide é de 10% a 15% (XIMENES sua rara ocorrência antes dos 30 anos.
NETTO et al., 2011); de sarcoma sinovial, de (QUEIROGA e PERNAMBUCO, 2006;
25% a 65% (ARANTES et al., 2012) ou WÜNSCH FILHO et al., 2010; MELO et al.,
incerta (ALENCAR et al., 2012); de 2012).
carcinoma epidermóide escamoso, de 30% a O câncer de esôfago é o oitavo tipo de
40% (XIMENES NETTO et al., 2011), e, no câncer mais incidente na população no
carcinoma de células escamosas, em estágio mundo. (TERCIOTI JUNIOR et al., 2011). A
inicial, de até 95%. epidemiologia do câncer de esôfago,
Entretanto, apesar do progresso nos especialmente do adenocarcinoma,
últimos anos com o tratamento cirúrgico e responsável por 75% de todos os casos
ressecção completa, Tercioti Junior et al. esofágicos, apresenta maior incidência no
(2011) afirmaram que a sobrevida a longo Ocidente, especialmente nos países mais
prazo é bastante desapontadora. Para Arantes desenvolvidos, com fatores de risco
et al. (2012), o prognóstico é reservado, com relacionados a estilo de vida, assim como
taxa de sobrevida em 5 anos de apenas 15% e práticas culturais e médicas, incluindo maior
taxa de recidiva local de até 70% das vezes, aporte de novos métodos de diagnóstico e
com metástases para o pulmão, linfonodos e tratamento. O segundo tipo mais frequente, o
medula óssea. Cambruzzi et al. (2013) carcinoma epidermóide, está mais associado a
destacaram uma sobrevida uniformemente pessoas de baixa classe social, e passado de
baixa, com taxa em 5 anos inferior a 10%. álcool e fumo, na parte sul do mar Cáspio,
Turquia, Rússia e nordeste da China; na Índia,
Epidemiologia, Distribuição Geográfica e Sri Lanka, Sudeste da África, e nordeste da
Fatores de Risco França varia entre 10 e 50 por 100,000
pessoas; no Brasil a maior prevalência se
O câncer de esôfago é uma neoplasia encontra no Rio Grande do Sul, em função do
maligna relativamente incomum e uso de chá quente. (XIMENES NETTO et al.,
extremamente letal. Acomete mais homens do 2011).
que mulheres, depois dos 50 anos de idade, O tabagismo e o alcoolismo atuam de
sendo maior a incidência aos 65 anos, e níveis forma sinérgica, especialmente no tipo
socioeconômicos mais baixos. Na América do epidermóide, aumentando o risco em 5-10
Norte e na Europa Ocidental, a doença é vezes comparado a não fumantes. As

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inúmeras substâncias químicas existentes no metacrônica de esôfago. (ARANTES et al.,
tabaco levam a mutações no gene p53 que 2012).
induzem a carcinogênese mais cedo no tipo O câncer de esôfago constitui a
epidermóide do que no tipo terceira causa de morte por câncer no sistema
adenocarcinomóide. O alcoolismo associado digestivo. No Brasil, em 2012, surgiram quase
ao tabagismo aumenta em 100 vezes o risco 10.500 novos casos de câncer de esôfago,
do tipo epidermóide, o mesmo não sendo 7770 em homens e 2650 em mulheres. O
verdade para o adenocarcinoma, no qual carcinoma de células escamosas (CCE) de
parece reduzir com o uso moderado do vinho. esôfago predomina nos homens (3,6:1), entre
(XIMENES NETTO et al., 2011). os 50 e 70 anos de vida; com taxa de
Entre as doenças associadas, as mais mortalidade, no sul do Brasil, de 14,3 homens
citadas são a (1) tilose (síndrome de Howel- e de 4,2 mulheres para cada 100.000
Evans, hiperceratose da palma das mãos e habitante.
planta dos pés) com 100% de risco; (2) O carcinoma epidermóide tipo
acalasia e síndrome de Plummer-Vinson- basalóide é altamente agressivo, com
Patterson-Kelly (disfagia pós-cricóide e prognóstico igual ou pior ao da variante
deficiência de ferro), todas associadas à lesão epidermóide. O carcinoma epidermóide tipo
inflamatória crônica; (3) ingestão de soda verrucoso é extremamente raro e afeta
cáustica, (4) bandas esofagianas e estenoses principalmente os homens em idade adulta
induzidas por irradiação, (5) câncer de cabeça (36 a 75 anos). O carcinosarcoma representa
e pescoço, e, (6) infecção por HPV - 2% dos tumores malignos do esôfago, e
Papiloma Vírus Humano. (QUEIROGA e acomete predominantemente homens adultos
PERNAMBUCO, 2006; XIMENES NETTO jovens. (XIMENES NETTO et al., 2011).
et al., 2011). Além dos fatores anteriores, Ximenes Netto et al. (2011)
Cambruzzi et al. (2013), também destacaram assinalaram que mais de 95% dos tumores
como possíveis fatores etiológicos a tipo adenocarcinoma estão associados ao
deficiência alimentar, a contaminação fúngica esôfago de Barrett e à doença do refluxo
dos alimentos, acalasia, divertículo esofágico, gastro-esofágico. O chamado esôfago de
e doença celíaca, além de esofagite crônica Barrett (EB) é tido como precursor em até
(CAMBRUZZI et al., 2013). Dentre todos 70% dos casos ressecados de câncer da junção
estes fatores, a história de carcinoma de esofagogástrica e esôfago, incidência descrita
células escamosas de vias aerodigestivas em 1% da população assintomática, e em 10%
superiores (VADS) é o que guarda relação daquela com refluxo gastresofagiano,
mais consistente com neoplasia sincrônica ou predominantemente em homens adultos

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jovens, brancos e obesos (IMC >30 Kg/m2). citologia esfoliativa, a tomografia
Não foi relatada associação entre EB e câncer computadorizada do tórax, o PET-Scan com
epidermóide. Alguns estudos demonstraram 18-fluorodeoxiglicose (Positron Emission
que o efeito da DRGE na gênese do Tomography), a ultrassonografia endoscópica
adenocarcinoma é independente de outras (USE), a toracoscopia e a laparoscopia. No
variáveis, tais como, idade, índice de massa entanto, de acordo com Ximenes Netto et al.
corporal e tabagismo. Antagonistas de (2011), a melhor estratégia para o diagnóstico
receptores H2 e inibidores da bomba de e subsequente tratamento do câncer de
prótons tem de forma significativa alterado o esôfago ainda não foi determinada porque a
tratamento da úlcera péptica e da DRGE, utilização de todas as técnicas disponíveis não
abordagem que altera e promove a é possível tendo em vista a escassez de
proliferação bacteriana com a neutralização recursos, tanto do ponto de vista financeiro
do pH gástrico, o que pode estar por trás do como humano.
aumento da incidência de adenocarcinoma. O exame indicado inicialmente é a
O uso de ácido acetil salicílico (AAS) endoscopia digestiva alta com biópsia,
e drogas anti-inflamatórias não-esteroidais considerada sua capacidade de avaliar a
(DAINE) pode exercer um efeito protetor localização, extensão e natureza pedunculada
contra o desenvolvimento do adenocarcinoma do tumor, elementos essenciais para a
do esôfago pela inibição de ciclo-oxigenases e definição etiologia e o planejamento
prostaglandinas com a consequente alteração cirúrgico. (XIMENES NETTO et al., 2011).
dos fatores de crescimento tumoral e aumento Um esofagograma com contraste, por sua vez,
imunitário. (XIMENES NETTO et al., 2011). possibilita a obtenção de imagens de estenose
Uma provável associação entre a ou ulcerações no esôfago, enquanto uma
colecistectomia e risco elevado de fibroendoscopia alta pode revelar massa
adenocarcinoma do esôfago, possivelmente friáveis ou ulceradas. (AYALA et al. 2007,
por uma toxicidade do refluxo duodenal na PLAZAS, 2015).
mucosa esofagiana também foi destacada. A tomografia computadorizada (TC)
(QUEIROGA e PERNAMBUCO, 2006). de tórax, abdômen e pelve com contraste
intravenoso (flúor-desoxiglicose F18) é a
Formas de Diagnóstico melhor tecnologia para avaliação de
metástases distantes, especialmente, em
Muitas são as formas de diagnóstico linfonodos celíacos, fígado, pulmões e ossos,
do câncer no esôfago, encontrando-se, entre além de estruturas vizinhas, tais como aorta,
as quais, o exame endoscópico com biópsia e traqueia e coluna torácica. (AYALA et al.

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2007, XIMENES NETTO et al., 2011; Ayala et al. (2007), Solari (2010), Arantes
PLAZAS, 2015). (2012), Henriques et al. (2012), Tortosa
A ultrassonografia endoscópica (USE) (2012), Lacerda (2013), Petropoulos et al.
pode predizer o estágio do tumor em 80-90% (2015), e Plazas (2015), além de Rubenstein e
dos pacientes, além da extensão metastática Shaheen (2015).
até os nódulos linfáticos em 70-80 % dos A maioria dos casos de câncer de
pacientes. A habilidade para detectar a esôfago apresenta-se avançado localmente,
invasão do nódulo linfóide regional tem estando a metade dos doentes com
aumentado com a realização da punção- micrometástases distantes, não sendo,
aspiração com agulha fina (PAAF) guiada por portanto, passível de cura. Outros pacientes
ultrassonografia endoscópica. É o método são inoperáveis, não podendo ser levados à
mais utilizado para a determinação do estágio cirurgia. De outro modo, nos pacientes com
correto (prognóstico) e para identificar, de indicação cirúrgica, os tumores e linfonodos
forma adequada, lesões superficiais, as quais são ressecáveis e a reconstrução do trânsito
requerem somente tratamento cirúrgico. esofágico, possível. (QUEIROGA e
(AYALA et al. 2007, PLAZAS, 2015). PERNAMBUCO, 2006).
A melhor alternativa, no momento, é o Uma possibilidade de tratamento é a
uso combinado da TC-USE, seguido de monoterapia, mas a maioria exige conduta
biópsia por agulha fina, se a TC for negativa multidisciplinar. (PLAZAS, 2015). Os
para metástases distantes. (XIMENES resultados obtidos com o uso único da
NETTO et al., 2011). radioterapia contra o câncer de esôfago têm
sido ruins. A sobrevida global em cinco anos
de pacientes tratados pela radioterapia apenas
Tratamento tem variado entre 0% e 10%, mas estes
estudos incluem pacientes com estado geral
Em relação à terapêutica contra o comprometido, o que , provavelmente, inclui
câncer no esôfago, a conduta mais utilizada pessoas com doença sistêmica. Os melhores
tem sido a neoadjuvante combinando quimio resultados foram obtidos nos portadores de
e radioterapia, seguida por cirurgia. Neste tumores do tipo histológico epidermóide (≤ 5
tópico, a maior parte das referências foi cm) que podem atingir 5 anos de sobrevida,
afirmada por Mata, Llach e Bordas (2007), em até 17% dos casos. Porém, a maioria dos
Merino (2010), Tercioti Junior (2011) e relatos incluem sobrevida menor do que 10%
Ximenes Netto et al., (2011), sendo o restante com tal modalidade de tratamento. A
afirmado por Queiroga e Pernambuco (2006), radioterapia exclusiva deve ser reservada aos

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pacientes intolerantes a outras formas de antes da cirurgia. (TERCIOTI JUNIOR,
terapia. (XIMENES NETTO et al., 2011). 2011).
Da mesma forma, a quimioterapia Terciotti Junior (2011), Rubenstein e
como forma exclusiva de tratamento do Shaheen (2015), Petropoulos et al. (2015)
câncer de esôfago tem apresentado resultado defendem o tratamento neoadjuvante contra o
limitado, embora boa resposta radiográfica câncer metastatizado, mas afirmam que,
seja verificada em até metade dos pacientes, apesar dos recentes avanços, o aumento
após dois ou três ciclos de quimioterapia, global das taxas de sobrevivência não foi
inclusive com melhora da disfagia. Os novos considerável, ficando entre 5 a 15%, apenas.
medicamentos incluem a cisplatina, o 5- Em relação às desvantagens da terapia
fluorouracil, e, ainda mais recentemente, neoadjuvante, devem ser destacados o retardo
paclitaxel, taxotere e bleomicina. (XIMENES do procedimento cirúrgico; edema e fibrose
NETTO et al., 2011). mediastinais dificultadores da operação;
Diante de sintomas de obstrução, são acúmulo de secreções pulmonares no pré-
elevadas as possiblidades de que o câncer operatório com deterioração da ventilação
tenha invadido a camada muscular e haja pulmonar; anemia e leucopenia. O surgimento
metastatizado regionalmente, ou à distância. de fístula esôfago-brônquica é de baixa
(MERINO, 2010). Assim, o tratamento deve frequência. (TERCIOTI JUNIOR, 2009).
melhorar não só o controle local, mas, A cirurgia tem sido o mais sólido pilar
também, distante do tumor por meio de no tratamento. A esofagectomia requer
tratamento neoadjuvante entre quimio / laparotomia, associada ou não à toracotomia.
radioterapia ou combinado, antes da Realiza-se também linfadenectomia regional.
abordagem cirúrgica. As vantagens da (AYALA et al., 2007; TORTOSA, 2012).
neoadjuvância são a (1) melhora da Devido ao estreitamento infranqueável do
ressectabilidade pela diminuição do tumor; esôfago, pode ser necessária a realização de
(2) aumento da eficiência quimioterápica, gastrostomia por via endoscópica ou
antes do rompimento do suprimento cirúrgica. (PLAZAS, 2015). A ressecção mais
sanguíneo tumoral / linfonodal; (3) melhora utilizada é a via transtorácica direita ou
do tratamento sistêmico antes da cirurgia; (4) transhiatal. Não existem estudos
aumento da sensibilização das células retrospectivos nem prospectivos, que tendam
tumorais pós-quimioterápicos. (XIMENES para um dos dois procedimentos quanto à
NETTO et al., 2011). A terapia neoadjuvante sobrevida, mortalidade e morbidade.
deve ser finalizada entre três a quatro semanas (SOLARI, 2010).
O tratamento endoscópico de

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neoplasia superficial está indicado em caso de utilizadas nos estágios iniciais do carcinoma
comprometimento em profundidade restrito às esofágico para melhorar os resultados pós-
camadas M1 e M2 (epitélio e lâmina própria); operatórios em casos de alta morbidade e
extensão longitudinal máxima de 3cm, assim mortalidade. (PETROPOULOS et al., 2015).
como extensão lateral inferior a 3/4 da A radioterapia tem como maior meta o
circunferência; limite de quatro lesões. As controle locorregional da doença, na tentativa
técnicas de ressecção são a mucosectomia ou de preservar os órgãos durante a ressecção, a
dissecção endoscópica de submucosa- DES, laringe no câncer do esôfago cervical ou o
além de ablação por terapia fotodinâmica, estômago no câncer do esôfago distal.
plasma de argônio, YAG-laser ou (TERCIOTI JUNIOR, 2011). Na radioterapia
radiofrequência. As modalidades ablativas radical exclusiva são utilizadas doses elevadas
não permitem análise histopatológica da lesão de 60-70 Gy, fracionadas em sessões de 1,8-2
neoplásica erradicada, necessária para Gy; na radioterapia radical associada à
avaliação da suficiência da intervenção quimioterapia concomitante, as doses de
endoscópica. Logo, os métodos ablativos não radioterapia são menores, entre 54-60 Gy,
são indicados para o tratamento endoscópico utilizando-se Cisplatina, 5- Fluorouracil e o
do carcinoma de células escamosas do Paclitaxel; na radioterapia neoadjuvante com
esôfago. (ARANTES, 2012). ou sem quimioterapia concomitante, as doses
A esofagectomia transhiatal é oscilam entre 39,6-43,2 Gy, em frações de 1,8
realizada por meio das vias de acesso Gy, podendo-se elevar essa dose em caso da
abdominal e cervical. O tempo abdominal é não realização de quimioterapia simultânea.
realizado por laparotomia, no qual o estômago (MERINO, 2010).
é preparado e tubulizado, faz-se a transecção Em relação à quimioterapia, Merino
mediana do diafragma e o esôfago médio- (2010) defende a combinação de vários
distal é dissecado. Procede-se o tempo fármacos, entre os quais, a Cisplatina e o 5-
cervical por meio de incisão paralela à borda Fluorouracil; os Taxanos também têm futuro
anterior do músculo esternocleidomastoideo. promissor. (MERINO, 2010).
Faz-se a esternotomia em sentido O tratamento químico da disfagia
longitudinal, desde a fúrcula até ultrapassar o maligna ocorre a partir da administração de
manúbrio e, por conseguinte, a secção óssea etanol ou polidocanol intratumoral,
toma sentido transversal para a direita, produzindo necrose tumoral. As experiências
culminando em esternotomia com forma da clínicas que avaliam esse procedimento são
letra L invertido. (HENRIQUES et al., 2012). limitadas, sendo necessário retratamento em
Técnicas minimamente invasivas têm sido

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intervalos de 4 a 5 semanas. (MATA, LLACH gastrostomia endoscópica (PEG) também é
e BORDAS, 2007). recomendada.
Outra possibilidade de tratamento é a No caso de fracasso da terapia
terapia com alvo molecular específico, na paliativa ou de pacientes em que tal técnica
qual o receptor transmembrana de fator de não for factível, a manutenção de suporte
crescimento, do tipo tirosina-quinase, nutricional por sonda nasoentérica é a saída
codificado pelo oncogene HER-2, é o alvo. para adequada ingesta calórica. (MATA,
Encontrou-se sua superexpressão entre 30% e LLACH e BORDAS, 2007).
90% dos tumores esofágicos, associando-se
ao aumento da invasão tumoral e pior CONSIDERAÇÕES FINAIS
prognóstico. Utiliza-se o anti-HER com
anticorpos monoclonais (cetuximabe e Dos tópicos apresentados, o que
panitumumabe) ou inibidores de receptor de reuniu maior número de referências foi o
tirosina-quinase (gefitinibe e erlotinibe). O Tratamento, destacado de forma distinta ou
anticorpo anti-HER-2 (trastuzumabe), complementar por 14 dos 23 artigos. Em
combinado à quimioterapia (cisplatina / 5- contrapartida, o de menor número foi
furacil), pode ser alternativa para pacientes Histórico, descrito, de maneira limitada, por
com neoplasias da trato esofágico-gástrico apenas 1 referência. Entre os periódicos, o
(TEG), possibilitando aos doentes com mais utilizado foi a Revista Colégio Brasileiro
surperexpressão de HER-2, maior sobrevida. de Cirurgiões, do Rio de Janeiro, com 6
(LACERDA, 2013). referências, não tendo sido encontrado mais
Finalmente, Mata, Llach e Bordas de um artigo em outra revista de mesmo
(2007) apontam como escolha mais realista o título.
tratamento paliativo para melhora da disfagia Como síntese, pode-se afirmar que o
contra casos de câncer avançado, sem câncer no esôfago reúne, sob o mesmo nome,
possibilidade de cura ou diante de 20 diferentes possibilidades histológicas,
comorbidades muito forte, destacando para todas associadas ao desenvolvimento de
tanto, a radioterapia externa e endoluminal lesões tumorais, mais ou menos agressivas,
(braquiterapia), a quimiorradioterapia, a mas marcadas pela disfagia, odinofagia e
dilatação esofágica, a colocação de stent, a perda de peso, sobre as quais foram
cirurgia endoluminal, além do tratamento com registradas, contudo, poucas referências
laser e terapia fotodinâmica. Com o objetivo históricas.
de alimentação e descompressão estomacal, a Nos artigos analisados foram encontradas três
classificações usadas para a a distinção e

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avaliação do estadiamento tumoral, entre as bomba de prótons, ao promoverem a
quais, a preconizada pelo (1) Consenso de proliferação bacteriana sob neutralização do
Paris, que diferencia as lesões segundo seu pH gástrico, poderiam aumentar a incidência
aspecto protuso, plano ou escavado, e as de adenocarcinoma. O uso de ácido acetil
subclassifica em pediculada, subpediculada e salicílico (AAS) e drogas anti-inflamatórias
séssil; a (2) Classificação Macroscópica que não-esteroidais, por seu modo, poderiam
as divide em vegetante, ulcerada ou proteger do adenocarcinoma ao inibirem as
infiltrante; e a (3) Classificação de Vienna p- ciclo-oxigenases, prostaglandinas e fatores de
TNM, de maior complexidade e referência, crescimento tumoral. Do contrário, não foi
que avalia a profundidade do tumor. Nos relatada associação entre esôfago de Barret e
pacientes em que o tumor não vai além da câncer epidermóide.
submucosa, a sobrevida pode chegar a 70%, Quanto ao prognóstico, a
comparado à sobrevivência de, apenas, 30% a sobrevivência após 5 anos é desapontadora,
50% dos pacientes nos quais há invasão da variando conforme o tipo histológico e o
musculares própria e adventícia. estágio do tumor. Em uma classificação
Epidemiologicamente, o câncer de crescente de 4 diferentes tipos, a sobrevida é
esôfago é uma neoplasia maligna de 10% a 65%; destacando o carcinoma
relativamente incomum, mas de prognóstico epidermóide tipo basalóide, como a menor, o
limitado, que acomete mais homens, negros, sarcoma sinovial e o carcinoma epidermóide
acima dos 50 anos de idade, e em piores escamoso como intermediárias, e o carcinoma
níveis socioeconômicos. No Brasil, a maior de células escamosas como a maior.
prevalência é observada no Rio Grande do O sítio mais frequente é o terço médio,
Sul, em função do arriscado consumo de chá apresentando os terços superior e inferior,
quente. O tabagismo e o alcoolismo são entre si, percentual semelhante, mas com
outros fatores predisponentes, assim como tendência de aumento no terço inferior em
doenças como a tilose e a hiperceratose. função da crescente incidência de refluxo
Alguns estudos sugeriram a associação de gastresofágico crônico e Esôfago de Barret
95% dos adenocarcinomas ao esôfago de (EB). Outros autores defendem o terço médio
Barrett e à doença do refluxo gastro- com 50 % da frequência, o terço inferior com
esofágico, sendo o esôfago de Barrett (EB) 30% a 35% e o terço superior com, apenas
mais observado em homens adultos jovens, 1%.
2
brancos e obesos (IMC >30 Kg/m ). A maior parte dos autores confirma o
Assinalaram, também, a possibilidade de que tipo epidermóide ou escamoso como o mais
antagonistas de receptores H2 e inibidores da incidente, seguido pelo adenocarcinoma;

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outros invertem a mencionada ordem, toracoscopia e a laparoscopia, destacando-se a
apontando o adenocarcinoma como o mais endoscopia digestiva alta com biópsia como o
frequente, seguido pelo carcinoma mais indicado inicialmente.
epidermóide ou escamoso; o linfoma primário Para finalizar, não se pode deixar de
é o mais raro. ressaltar a terapêutica contra o câncer no
Entre as muitas formas de diagnóstico esôfago, a respeito da qual existe ampla
do câncer no esôfago encontram-se o exame variedade de referências, mas cuja conduta
endoscópico com biópsia e citologia mais utilizada é a neoadjuvante, que combina
esfoliativa, a tomografia computadorizada do quimio e radioterapia em busca da redução
tórax, o PET-Scan com 18-fluorodeoxiglicose tumoral para melhor e mais eficiente
(Positron Emission Tomography), a ressecção cirúrgica.
ultrassonografia endoscópica (USE), a

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