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As máscaras do liberalismo em sua realização histórica no Regime Civil Militar (64-85)

Adriel Torres de Queiroz Ferreira - 164974

No Brasil no qual a modernização também tem um caráter de manutenção da ordem


anterior, sendo isso estrutural segundo autores como Florestan Fernandes (1975), Celso
Furtado (1959), Caio Prado Júnior (1942), Silva (1996) e Cardoso de Mello (1975), a
aliança entre conservadorismo e liberalismo se repete historicamente. Durante o regime
civil-militar (1964-1985) esse aliança se impôs novamente, pela via autoritária, e sob a égide
do discurso privatizante e eficientista. Porém se realizou como uma reestruturação do forte
intervencionismo estatal que tornou o Estado Desenvolvimentista mais restritivo e
excludente. Tavares e Assis (1985) recapitulam esses vinte e um anos de políticas
econômicas produzindo um sentido de degeneração do sistema financeiro público sob
máscaras liberais. Assim como esses autores afirmam no prefácio, creio que entender tal
trilha histórica de degeneração e seus usos do imaginário liberal é o princípio para
superá-la.
No início do século XX uma classe emergente passa a buscar seu espaço na política
brasileira decorrente do início de sua vivência agora próxima aos centros urbanos. A greve
geral de 1917 da mão de obra fabril apresenta bem essa a emergência dessa classe que
acompanha a industrialização do capitalismo. Na efervescência da disputa por ela, surge a
política populista como forma de representá-los politicamente e atender interesses
econômicos do antigos detentores do poder político. Dessa forma a luta de classes passou
a ser mediada pelo Estado e sua política econômica do Desenvolvimentismo. A tomada do
poder político pelos militares em 64 pode ser observada, então, como uma retomada do
poder político pelos detentores anteriores ao avanço populista. O texto de Tavares e Assis
demonstra esse movimento refletido nas políticas econômicas que mascarados com a
crítica ao intervencionismo estatal efetuaram um centralismo excludente que deslocou a
pata forte da economia do capital industrial de volta para o capital agrário.
Para expor o processo tal degeneração da economia e sua apropriação do discurso
liberal como exposto por Tavares e Assis me valherei da mesma divisão temporal do
período histórico. Os períodos em suma acompanham mudança dos presidentes, eleitos
indiretamente durante o regime, e dos ministros. Os quatro períodos são: as reformas
institucionais de Bulhões e Campos, o milagre econômico com Delfim, sonho da grande
potência de Simonsen e reconhecimento do caos com o retorno de Delfim.
Bulhões e Campos eram professores e economistas ortodoxos da política
anti-inflacionária da FGV, sendo a imagem técnica do regime iniciaram com a estabilização
dos preços das empresas privadas e tentativa de controle inflacionári e atração de capital
externo para uma economia. Estas mudanças foram marcadas pela grande intervenção
estatal em nome de um liberalismo econômico que se realizava nos “preços reais” das
empresas nacionais, que colaboraram para compra de controle por empresas estrangeiras
das empresas nacionais privadas debilitadas e com potencial de crescimento. A alta
intervenção estatal também se expressou no campo capital trabalho com a imposição de
uma política de arrochos salariais. O cenário que se observou nesse primeiro momento foi
um conflito entre a liberdade econômica prática e a estabilização de preços tida como
prioridade da gestão em questão.
Uma estrutura interna enviesada foi tomando nosso sistema financeiro no qual era
mais vantajoso assumir crédito do que abrir o capital da empresa. Cenário propício ao
investimento financeiro estrangeiro por meio da abertura das empresas nacionais ao crédito
internacional que contribuiu para estatização das empresas de serviços levando o capital
estrangeiro para setores mais vantajosos como infraestrutura. Essas mudanças e o
desenrolar do movimento econômico privilegiou o crédito ao capital de risco. Tal situação
levou empresas à extroversão e ao endividamento.
Considerado um fracasso, a administração econômica ortodoxa de Bulhões e
Campos abriu espaço para a heterodoxia de Delfim. A política cambial se manteve
altamente estimulante à entrada capitais externo de empréstimo e esse sistema de crédito
foi a sustentação do milagre econômico em conjunto com uma política tributária regressiva.
Houve o controle da taxa de juros interna, do preço dos setores oligopolizados e o dos
preços dos produtos básicos. O resultado inflacionário foi uma redução considerável da
inflação em consideração a administração anterior. Entretanto o milagre econômico se
constituiu como um “castelo de cartas” dependente da financeirização. Segundo Tavares e
Assis, a internacionalização do mercado; a concentração de capital e do crédito; a
extroversão financeira foram o tripé econômico do milagre econômico.
Já Simonsen foi visto como uma solução entre o pragmatismo de Delfim e a
ortodoxia de Bulhões. Entretanto a política econômica de Simonsen revelou, sob a máscara
da ortodoxia que contornava a política monetária, uma crescente acomodação do arsenal
heterodoxo legado por Delfim, e logo ampliado (Ibid., p. 59). A especulação financeira sem
limites do momento de Delfim continuou mas devido a volatilidade maior do mercado
externo os conglomerados que se formaram de forma milagrosa no período anterior
começaram a entrar liquidação, ou seja, suas dívidas financeiras não tinham mais
expectativas de serem sanadas ou administradas a curto prazo. Para “resguardar o
mercado” o governo intervinha liquidando a dívida e patrocinando a transferência do ativo
para um conglomerado saudável que recebia generosos financiamentos subsidiados. Essa
se tornou uma das principais funções do Banco Central para o qual foi formada até um
departamento interno, o departamento de Operações Especiais. Além disso o segundo PND
foi instrumento de mascarar os empréstimos estrangeiros na forma de investimentos em
projetos específicos. Assim se acumulava uma dívida em dólares e se investia em cruzeiros
(Ibidem).
Com a realização do Caos quando a política de salvamento não podia mais ser
sustentada pelo BC e o mercado de consumo interno efetivou desaceleração do consumo
observada no horizonte da escolha inicial do congelamento das médias salariais a
estratégia de abertura começa a se desenhar em Geysel e se realizar em Fiqueiredo. O
retorno do Delfim se deu acelerando o caos com uma desvalorização monetária que estoura
a inflação de 50% no primeiro ano para 100% nos anos seguintes. Contra isso, Delfim,
organizou uma nova política econômica de restrições monetárias e de crédito, aumento da
taxa de juros e incentivos às exportações. Em 1981 tal política não evitou a redução do PIB,
nem o aumento do desemprego. A política econômica restante era a demagógica proposta
de redução de gasto da máquina pública. Com a consolidação do caos esse regime
demonstrou seus verdadeiros sentidos em suas heranças, a dependência do mercado
financeiro que é demonstrada pela busca final da salvação no FMI e a perseguição aos
gasto públicos.
O autoritarismo sob o discurso da ortodoxia econômica, se efetivou na verdade
como uma administração econômica estatal intervencionista mas com diferentes sentidos
para cada parcela sociedade brasileira. Enquanto para a classe trabalhadora a intervenção
ocorria no contingenciamento da média salarial e estrangulamento do conflito
capital-trabalho; para as classes financistas a intervenção estatal se materializou na limpeza
dos passivos de ativos em liquidação. E essa política econômica gerou heranças para além
das dívidas, externa, interna e social, uma cristalização na forma de enfrentar recessões a
partir do corte de gastos públicos que primeiro se observa nos programas redistributivos de
renda. Como o prólogo do texto já afirma “Na realidade, a dívida externa foi repassada à
atual administração como um problema de política econômica, quando de fato é o vínculo
material mais ostensivo para subordinar a Nova República aos princípios de economia
política que prevaleceram sob o autoritarismo.” (M.C.T. e J.C.A., p. 9). Entender essa
realização estrutural em tal conjuntura é de suma importância quando a conjuntura do
presente parece repetir as máscaras liberais em um avanço autoritário.
Dúvida:
como se deu intervenção no conglomerado Halles, e como era feita a maquiagem
(ou a fraude) do balanço deficitário se tornar superavitário no mercado financeiro? (página
53, segundo e terceiro parágrafo)

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