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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS


Curso de Graduação em Direito

Douglas Eustaquio Oliveira Malaquias

ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO CRIME DE ESTUPRO:


Cometido por adolescente: Caso Champinha

CONTAGEM
2020
2

Douglas Eustaquio Oliveira Malaquias

ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO CRIME DE ESTUPRO:


Cometido por adolescente: Caso Champinha

Monografia apresentada ao Curso de Direito da


Pontifícia Universidade Católica de Minas
Gerais, como requisito parcial para obtenção
do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Cristiano de Oliveira Ferreira

CONTAGEM
2020
3

Douglas Eustaquio Oliveira Malaquias

ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO CRIME DE ESTUPRO:


Cometido por adolescente: Caso Champinha

Monografia apresentada ao Curso de Direito da


Pontifícia Universidade Católica de Minas
Gerais, como requisito parcial para obtenção
do título de Bacharel em Direito.

______________________________________________________________
Prof. Cristiano de Oliveira Ferreira – PUC Minas (Orientador)

______________________________________________________________
Prof. – PUC Minas (Banca Examinadora)

______________________________________________________________
Prof. – PUC Minas (Banca examinadora)

Contagem, ____ de _____________ de 2020.


4

AGRADECIMENTOS

Agradeço pela finalização deste trabalho, fruto de muito esforço e dedicação,


primeiramente a Deus, pela sabedoria concedida e por me iluminar nesta árdua
caminhada.
Agradeço a minha esposa Maria pelo apoio, compreensão nos momentos de
angústia e nervosismo, e que nunca poupou esforços e palavras de incentivos que
me deram forças para que eu chegasse até esta etapa.
Agradeço ao professor Cristiano meu orientador, pela confiança, amizade,
estímulo, conselhos, dicas e apoio para que o presente trabalho fosse realizado.
Agradeço também aos meus pais e toda minha família, que através da
educação e caráter, permitiram que eu construísse este caminho.
Agradeço a todos os mestres e companheiros da PUC, pela troca de
conhecimento e experiências.
Obrigado a todos!
5

RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo, analisar o ato infracional análogo ao crime
de estupro quando praticado por adolescente, bem como, demonstrar porque o
adolescente é tratado de maneira diferenciada desde a apuração do fato até as
medidas socioeducativas. Houve o entendimento da intenção do legislador quando
revogou o Código de Menores, cuja doutrina tratava apenas do menor quando em
situação irregular, trazendo para o Estatuto da Criança e do Adolescente a doutrina
da proteção integral num escopo preventivo e também punitivo. Conceituou o ato
infracional que compreende a conduta de crime ou contravenção, o intuito foi
demonstrar o cuidado da legislação para que os procedimentos não sejam os
mesmos aplicados aos adultos. Demonstrou a aplicação da medida de proteção
destinadas às crianças e adolescentes com a finalidade de fortalecer o vínculo
familiar e bem como as medidas socioeducativas, que devem ser cumpridas pelos
adolescentes com a finalidade de reparar e ressocializa-los. A criança e o
adolescente não cometem crime, praticam ato infracional análogo à um crime
tipificado em lei, o conceito de analogia interpreta qual ato ilícito está assemelhado e
qual a gravidade da sua conduta. Estudou-se o crime previsto no artigo 213 do
Código Penal, com a finalidade de entender o que a lei comina ao autor de estupro,
bem como, a distinção de extrema importância quando praticado através da
conjunção carnal e do ato libidinoso.

Palavras-chave: Estatuto da Criança e do Adolescente. Imputabilidade. Ato


Infracional. Medida Socioeducativa. Estupro.
6

ABSTRACT

The objective of this study is to analyze the infraction act analogous to the crime of
rape when practiced by adolescents, as well as to demonstrate why the adolescent is
treated in a differentiated way from the investigation of the fact to the socioeducative
measures. There was an understanding of the intention of the legislature when he
revoked the Code of Minors, whose doctrine treated only the minor when in an
irregular situation, bringing to the Statute of the Child and Adolescent the doctrine of
integral protection in a preventive and also punitive scope. Conceptualized the
infraction that includes the conduct of crime or contravention, the purpose was to
demonstrate the care of the legislation so that the procedures are not the same
applied to adults. It was demonstrated the protection measure application aimed at
children and adolescents with the purpose of strengthening the family bond and
socio-educational measures that must be carried out by adolescents for the purpose
of repairing and resocializing them. The child and the adolescent do not commit
crime, they practice an infraction act analogous to a crime typified by law, the
concept of analogy interprets which illicit act is similar and how serious their conduct.
The crime foreseen in article 213 of the Criminal Code was studied in order to
understand what the law commits to the author of rape, as well as the distinction of
extreme importance when practiced through the carnal conjunction and libidinous
act.

Keywords: Statute of the Child and Adolescent. Imputability. Infringement Act. Socio-
educational Measure. Rape.
7

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 8
2 ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ................................................. 9
3 PRINCÍPIOS NORTEADORES DA TUTELA DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE ....................................................................................................... 10
3.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana ................................................... 11
3.2 Princípio da Proteção Integral ......................................................................... 12
3.3 Princípio da Prioridade Absoluta .................................................................... 13
3.4 Princípio da Condição Peculiar da Pessoa em Desenvolvimento ................ 14
4 A IMPUTABILIDADE DA CRINAÇA E DO ADOLESCENTE ................................ 14
5 DO ATO INFRACIONAL ........................................................................................ 16
5.1 Crime e Contravenção Penal ................................... Erro! Indicador não definido.
5.2 Apuração do Ato Infracional ............................................................................ 20
6 DOS DIREITOS INDIVIDUAIS ............................................................................... 21
6.1 Das Garantias Processuais .............................................................................. 23
6.2 MEDIDAS DE PROTEÇÃO ................................................................................ 24
7 ESTUPRO COMETIDO POR ADOLESCENTE ..................................................... 27
8 MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS ........................................................................... 33
8.1 Advertência ....................................................................................................... 35
8.1.1 Obrigação de Reparar o Dano .......................................................................... 35
8.1.2 Da Prestação de Serviços à Comunidade ........................................................ 36
8.1.3 Da Liberdade Assistida ..................................................................................... 37
8.1.4 Do Regime de Semiliberdade ........................................................................... 38
8.1.5 Da Internação ................................................................................................... 39
9 ANALOGIA AO CRIME DE ESTUPRO ................................................................. 42
9.1 Analogia Jurídica............................................................................................... 42
10 DO CRIME DE ESTUPRO ................................................................................... 43
10.1 Da Conjunção Carnal e do Ato Libidinoso .................................................... 49
11 ESTUDO DE CASO CHAMPINHA ...................................................................... 50
12 CONCLUSÃO ...................................................................................................... 54
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 56
8

1 INTRODUÇÃO

São cada vez mais constantes, os relatos de crimes praticados por crianças e
adolescentes, constituindo muitas vezes danos irreparáveis para as vítimas, e estes
não são punidos com as mesmas consequências penais cabíveis aos adultos. Nesta
linha, será analisado a analogia ao crime de estupro previsto no artigo 213 e artigo
217- A do Código Penal Brasileiro, que será demostrado no caso Champinha,
descrevendo as penas de quem pratica o ato ilícito com alguém que, por
enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a
prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.
Embora a conduta seja delituosa, ao adolescente com idade entre doze e
dezoito anos de idade não será imposta a mesma sanção aplicada para o adulto,
apenas equipara-se na ilicitude do ato de estuprar alguém, não sendo imputada tal
responsabilidade, são penalmente inimputáveis conforme prevê a Constituição
Federal de 1988 no artigo 228 e artigo 27 do Código Penal, presumindo-se que o
menor não tem a consciência acerca do caráter ilícito da sua conduta, está em
peculiar desenvolvimento de maturidade psicológica e social.
Serão impostas medidas protetivas para crianças de zero a doze anos
incompletos, e medidas socioeducativas e protetivas aos adolescentes entre doze a
dezoito anos sob a égide da Lei 8.069/1990 do Estatuto da Criança e do
Adolescente.
Assim, ato infracional será toda a conduta da criança ou adolescente descrita
como crime ou contravenção penal, mesmo com o seu desenvolvimento incompleto
pratica ato reprovável com violência.
Será abordado o conceito da inimputabilidade do menor, compreenderemos
melhor a ideia do legislador quando estabeleceu a idade para imputação da pena,
bem como, todo o procedimento da apuração do ato infracional das medidas
socioeducativas estabelecidas em legislação especial.
Ao final será apresentado uma reflexão conclusiva à respeito da conduta do
crime de estupro praticado pelo adolescente, analisando se realmente às medidas
socioeducativas são aplicáveis ao caso concreto em tratando-se de um crime
hediondo.
9

2 ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que dispõe sobre a proteção


integral à criança e ao adolescente, sendo criado por meio da Lei 8.069/1990
revogando a Lei 6.697/1979 do Código de Menores, na qual, sua principal finalidade
era a aplicação de regras protetivas aos menores em situação irregular ou de risco.
Neste sentido, João Batista Saraiva descreve a situação irregular:

[...] os menores passam a ser objeto da norma quando se encontrarem em


estado de patologia social [...], muitas vezes misturavam-se infratores e
abandonados, vitimizados por abandono e maus-tratos com autores de
conduta infracional, partindo do pressuposto de que todos estariam na
mesma condição, estariam em “situação irregular. (SARAIVA 2003, p. 14).

Os menores eram vistos como meros objetos do Estado e uma doença social,
jamais como sujeitos de direitos e garantias especiais, os abrangidos em situação de
risco eram encaminhados para o mesmo local e tratamento dos menores autores de
atos infracionais, não sendo analisada a particularidade de cada problema.
A lei preocupava-se apenas na solução do menor quando configurada a
situação irregular ou de risco. Com sua revogação, o ECA adotou uma doutrina
totalmente diversa: O Estatuto tem por escopo a proteção integral da criança e do
adolescente, de forma que cada brasileiro possa ter assegurado seu pleno
desenvolvimento.
João Batista Saraiva explica claramente a mudança desse paradigma:

[...] o ECA trouxe uma completa transformação ao tratamento legal da


matéria. Em todos os aspectos, com a adoção da Doutrina da Proteção
Integral, em detrimento dos vetustos primados da arcaica Doutrina da
Situação Irregular [...], especialmente no plano do trato da questão
infracional. (SARAIVA, 2003, p. 13).

A expressão menor foi substituída do texto legal: “em prejuízo da antiga


terminologia ‘menor’. Esta servia para conceituar aqueles em ‘situação irregular’”
(grifo do autor) (SARAIVA, 2003, p.13) e, criou-se uma nova nomenclatura conforme
o artigo 2º do Estatuto: “Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa
até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito
anos de idade. ” (BRASIL, ECA, 1990), estendeu a condição irregular da criança e
10

adolescente para qualquer situação de perigo ou lesão ao seu direito, rompendo


definitivamente a doutrina da situação irregular desenvolvendo um novo modelo
baseado no princípio da proteção integral, com caráter preventivo e repressivo em
último caso.
Atribuiu ao Estado, família e sociedade a responsabilidade da proteção e
garantia dos direitos da criança e do adolescente conforme descrito no artigo 227 da
Constituição Federal: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à
criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade [...].” (BRASIL, CF,
1988), e reprisado no artigo 4º do Estatuto: “É dever da família, da comunidade, da
sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade [...].”
(BRASIL, ECA, 1990).
Conforme dispõe o art. 227 da Constituição Federal:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança,


ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura,
à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL, CF, 1988).

Ou seja, é um dever a garantia de proteção à criança e ao adolescente


independente da sua situação, havendo necessidade de atenção e cuidados
especiais para pessoas em condições de desenvolvimento e formação, visto que,
não possuem a maturidade de um adulto. De tal modo, a criança e o adolescente
são concebidos como pessoas em desenvolvimento, sujeitos de direitos e
destinatários de proteção integral.
Devido sua vulnerabilidade necessitam de amparo legal e direitos garantidos
em legislação própria, o ECA quando entrou em vigor foi um marco em todos os
aspectos, com direitos e deveres condizentes com a formação psicológica, física e
mental da criança e do adolescente.

3 PRINCÍPIOS NORTEADORES DA TUTELA DA CRIANÇA E DO

ADOLESCENTE

Os princípios norteadores da Constituição Federal em consonância com o


Estatuto da Criança e do Adolescente são necessários para assegurar o tratamento
diferenciado da legislação especial.
11

Para Tercio Sampaio princípios: “não são elementos do repertório do sistema,


mas fazem parte de suas regras estruturais, dizem respeito à relação entre as
normas no sistema, ao qual conferem coesão” (SAMPAIO, 2001).
Vejamos os princípios mais importantes que regulam o ECA, ajudando-o a
aplicabilidade e interpretação da norma, visando garantir sua eficácia.

3.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

O princípio fundamental da dignidade da pessoa humana está expresso no


artigo 1º, inciso III da Constituição Federal de 1988, é um princípio basilar de um
Estado Democrático de Direito.
Conforme dispõe o art. 1º, III da Constituição Federal:

A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos


Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado
Democrático de Direito e tem como fundamentos:
III – a dignidade da pessoa humana. (BRASIL, CF, 1988).

Este princípio demonstra a concretização do objetivo de se criar uma


Constituição que visasse mais os direitos fundamentais das pessoas, além de
garantir o bem-estar social, para que as pessoas passassem a viver em harmonia
entre si e com o Estado.
Segundo José Afonso da Silva:

A dignidade da pessoa humana é um valor humano que dá alicerce a todos


os direitos fundamentais do homem desde o direito à vida. Ainda segundo o
referido autor, não se pode reduzir o sentido de dignidade à defesa dos
direitos pessoais, mas lembrar dos direitos sociais, que garantem a todos a
existência digna, a justiça social, a educação, o desenvolvimento da pessoa
[...] (SILVA, 2014, p. 107).

Por outras palavras, o Princípio da Dignidade Humana é a base de todos os


outros direitos fundamentais, é uma forma de conceder à pessoa o mínimo que se
deve ao ser humano: direito à integridade, além do respeito por parte de seus iguais
e do Estado.
Faz notar Alexandre de Moraes:
12

A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se


manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da
própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das
demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto
jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam
ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre
sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas
enquanto seres humanos e a busca ao Direito à Felicidade. (MORAES,
2016, p. 35).

O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, nesse sentido, seria uma


espécie de proteção no que tange a criação de punições às pessoas no calor do
momento, impedindo um tipo de vingança contra um determinado sujeito.

3.2 Princípio da Proteção Integral

Encontra-se estabelecido na Constituição Federal de 1988 e posteriormente


foi concentrado no Estatuto da Criança e do Adolescente, tem como principal
finalidade a proteção integral da criança e adolescente.
O propósito é a proteção de um dever Estatal, social e familiar, serve como
base para compreensão e aplicabilidade das normas, garantindo ao menor um
tratamento especial e diferenciando.
O princípio da proteção integral, está explícito na Constituição Federal e no
Estatuto da Criança e do Adolescente:

Artigo 227 - É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à


criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à
vida, à saúde, à alimentação, à educação, a o lazer, à profissionalização, à
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e com
unitária, além de coloca-los a salvo de toda forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL, CF,
1988).

Artigo 1º - Esta lei dispõe sobre a proteção integral à criança ao


adolescente. (BRASIL, ECA, 1990).

O artigo 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente faz referência aos


direitos fundamentais da pessoa humana em harmonia com a proteção integral:

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais


inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata
esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as
13

oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico,


mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
(BRASIL, ECA, 1990).

Com a revogação do Código de Menores o ECA substituiu a doutrina da


situação irregular para a doutrina da proteção integral, com meios de assegurar a
eficaz aplicabilidade do Estatuto.
Assim, para Wilson Donizeti Liberati:

A garantia e a proteção desses direitos deverão ser exercidas, assegurando


aos seus beneficiários, quer pela lei ou por qualquer outro meio, todas as
facilidades para o desenvolvimento físico, moral, mental, espiritual e social,
com dignidade e liberdade. (LIBERATI (1993, p. 16).

É o princípio mais importante da Lei 8.069/1990, buscou um novo modelo de


lei e, deixou para trás a ideia da necessidade de intervenção somente quando
configurada a situação irregular do menor, protegendo e garantindo o tratamento
diferenciado aos menores independente da sua situação.

3.3 Princípio da Prioridade Absoluta

Reprisa praticamente o artigo 227 da Constituição Federal, é um


complemento do princípio da proteção integral que reconhece a criança, adolescente
e o jovem como detentores de direitos com necessidades específicas, são pessoas
hipossuficientes com prioridade no acesso aos seus direitos e garantias.
Este princípio tem previsão no artigo 4º do Estatuto da Criança e do
Adolescente:
Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do
poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos
referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer,
à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária. (BRASIL, ECA,1990).

A despeito disso Wilson Donizeti Liberati afirma que: “Por absoluta


prioridade devemos entender que a criança e o adolescente deverão estar em
primeiro lugar na escala de preocupação”. (grifos do autor) (LIBERATI, 1993, p.16).
Compreende-se como um meio de garantir a prioridade absoluta dos direitos e
garantias da criança e do adolescente em todos âmbitos, para que alcancem um
futuro e melhor qualidade de vida.
14

3.4 Princípio da Condição Peculiar da Pessoa em Desenvolvimento

Este princípio prega que crianças e adolescentes além de detentoras de todos


os direitos conferidos aos adultos, gozam de uma atenção especial e direito maior,
estendendo-se a qualquer bem jurídico tutelado devido à sua condição peculiar de
pessoa em desenvolvimento.
A condição peculiar encontra respaldo nos seguintes artigos do ECA:

Art. 6º Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que


ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais
e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como
pessoas em desenvolvimento.
Art. 69. O adolescente tem direito à profissionalização e à proteção no
trabalho, observados os seguintes aspectos, entre outros:
I - respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento;
Art. 71. A criança e o adolescente têm direito a informação, cultura, lazer,
esportes, diversões, espetáculos e produtos e serviços que respeitem sua
condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.
Art. 121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos
princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de
pessoa em desenvolvimento. (BRASIL, ECA, 1990).

À respeito da condição peculiar Liberati:

[...] na interpretação do texto legal, o que deve observar é a proteção dos


interesses da criança e do adolescente, que deverão sobrepor-se a
qualquer outro bem ou interesse juridicamente tutelado, levando em conta a
destinação social da lei e o respeito à condição peculiar da criança e do
adolescente como pessoas em desenvolvimento. (LIBERATI, 1993. p.18).

O legislador preocupou-se com a fase de desenvolvimento físico, mental,


social e psicológico, conferindo-lhes uma ampla proteção, assim, para os autores de
atos infracionais, jamais será aplicada qualquer sanção como se adulto fosse, deve
existir a proporcionalidade de acordo com a sua idade e entendimento.

4 A IMPUTABILIDADE DA CRINAÇA E DO ADOLESCENTE

A inimputabilidade tem como condição que para a prática de conduta


criminosa, o agente não deve ser capaz de entender o caráter ilícito de seu ato.
Significa que para a criança e adolescente não será imputada culpa pela sua
15

conduta, nem tampouco, atribuída sanção penal prevista em legislação comum, todo
e qualquer ato será estabelecido de acordo com legislação especial vigente.
A inimputabilidade está inserida nos seguintes artigos:

Art. 288 CF/1988: São penalmente inimputáveis os menores de dezoito


anos, sujeitos às normas da legislação especial. (BRASIL, CF, 1988).

Art. 27 CP/1941: Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente


inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação
especial. (BRASIL, CP, 1940).

Art. 104 ECA/1990: São penalmente inimputáveis os menores de dezoito


anos, sujeitos às medidas previstas nesta Lei. (BRASIL, ECA, 1990).

À respeito, o doutrinador Fernando Capez define:

É a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de


acordo com esse entendimento. O agente deve ter condições físicas,
psicológicas, morais e mentais de saber que está realizando um ilícito
penal. (CAPEZ, 2017, p. 411).

Não podemos associar inimputabilidade com impunidade, crianças e


adolescentes autores de atos infracionais não estarão impunes, existem medidas
sancionatórias desde a mais leve até a mais rigorosa privando-o de sua liberdade,
em unidade educacional apropriado.
Seguindo o mesmo pensamento João Batista Saraiva: “Inimputabilidade, toda
via, não implica impunidade, vez que estabelece medidas de responsabilização
compatíveis com a condição de peculiar pessoa em desenvolvimento destes
agentes. ” (SARAIVA, 2005, p. 20).
Completa o raciocínio Saraiva:

[...] o sistema legal implantado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente


faz estes jovens, entre 12 e 18 anos, sujeitos de direitos e de
responsabilidades e, em caso de infração, prevê medidas socioeducativas,
inclusive com privação de liberdade, com natureza sancionatória e
prevalente conteúdo pedagógico. (SARAIVA, 2005, p. 22).

O ECA definiu uma faixa etária de doze a dezoito para a aplicação das
medidas sancionatórias: “Os que estejam na faixa de doze a dezoito anos podem
ser submetidos a processo especial perante o juiz de menores, os de idade inferior a
doze anos estão excluídos daquele processo. ” (TOLEDO, 1994, p. 320).
Sobre a inimputabilidade definida no Estatuto, Marcos Bandeira:
16

É de se notar que o próprio ECA se encarregou de configurar, no âmbito de


seus lindes estatutários, os “inimputáveis”, bem como estabeleceu a
responsabilização juvenil infracional a partir dos doze anos completos.
(BANDEIRA, 2006, p. 25).

O inimputável não responde pelo delito, responde por ato infracional, conduta
assemelhada aos crimes com previsão no código penal, a inimputabilidade, é uma
presunção absoluta. Ainda que o adolescente seja emancipado, ele continuará sob a
proteção da legislação especial até o primeiro minuto que completar a maioridade,
quando passará a ser submetido a todas as regras previstas no código penal.
Certo que existe uma sensação de impunidade na sociedade, o adolescente
está cada vez mais precocemente inserido em ações criminosas e, muitas vezes
com maior violência de quando praticado por um adulto. Por serem pessoas
inimputáveis, não estão sujeitos às normas estabelecidas no Código Penal.

5 DO ATO INFRACIONAL

O assunto é tratado no artigo 103 do Estatuto da Criança e do Adolescente:


“Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal.
” (BRASIL, ECA, 1990), são condutas tipificadas praticadas por criança e
adolescente.
Todas as consequências do ato infracional são regulamentadas pelo
Estatuto, embora sua conduta seja coberta por ato típico, antijurídico e culpável, com
cominação de penas previstas no código penal, ao adolescente será imposta medida
protetiva ou socioeducativa.
Segundo Marcos Bandeira:

[...] sendo praticada por um imputável penalmente, ele estará cometendo


um crime ou contravenção e poderá sofrer uma pena, enquanto se esse
mesmo ato estiver sendo cometido por um adolescente configurar-se-á ato
infracional e estará ele sujeito à imposição de uma medida socioeducativa
e/ou protetiva. (BANDEIRA, 2006, p. 29).

São condutas análogas aos crimes previstos na legislação penal, praticados


por pessoas em fase de desenvolvimento, ficando ao encargo do Estado executar
políticas relacionadas às medidas protetivas e socioeducativas.
17

Continua Bandeira:

[...] toda conduta praticada por criança ou adolescente que se amolde à


figura típica de um crime previsto no Código Penal ou em leis
extravagantes, ou a uma contravenção penal, configura-se como ato
infracional. (BANDEIRA, 2006, p. 26).

Segundo à prática de crime Válter Ishida ensina:

A criança e o adolescente podem vir a cometer crime, mas não preenchem


o requisito culpabilidade (imputabilidade), pressuposto de aplicação de
pena. Aplica-se ao mesmo, a presunção absoluta da incapacidade de
entender e determinar-se. (ISHIDA, 2015, p. 254).

A criança que praticar o ato de estupro, será encaminhada para medidas


protetivas e o adolescente sujeito às medidas socioeducativas, vez que estes não
cometem crime ou contravenção, apenas equiparam-se na ilicitude do fato. Sua
responsabilização somente se iniciará aos dezoito anos de idade quando seu
desenvolvimento estiver completo para responder por seus atos.
A idade do adolescente será considerada ao tempo ou data do ato praticado,
podendo em casos excepcionais chegar até vinte e um anos de idade, conforme
explica Nucci: “a viabilidade de se aplicar qualquer medida socioeducativa a maiores
de 18 anos, desde que o fato cometido tenha sido efetivado antes de o jovem
completar a maioridade. ” (NUCCI, 2014, p. 316). O objetivo principal é preparar e
reincluir o menor na sociedade, através de programas pedagógicos, psicológicos e
sociais.
É matéria já discutida nos tribunais:

APELAÇÃO CÍVEL. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE.


ATO INFRACIONAL EQUIPARADO A ESTUPRO DE VULNERÁVEL.
MAIORIDADE AOS 18 ANOS. IRRELEVÂNCIA. EVIDENTE INTERESSE
DO ESTADO EM RESPONSABILIZÁR O ADOLESCENTE PELO FATO
ATE OS 21 ANOS DE IDADE. PROVA ESCORREITA DA
RESPONSABILIDADE DO ADOLESCENTE NO ATO SEXUAL
PERPETRADO CONTRA MENINO DE 10 ANOS DE IDADE. GRAVIDADE
DO ATO. PLEITO DE APLICAÇÃO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE
INTERNAÇÃO. SITUAÇÃO QUE JUSTIFICA APLICAÇÃO DE MEDIDA
GRAVOSA. APELAÇÃO MINISTERIAL PROVIDA. (Apelação Cível Nº
70077612281, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Jorge Luís Dall'Agnol, Julgado em 20/06/2018).

(TJ-RS - AC: 70077612281 RS, Relator: Jorge Luís Dall'Agnol, Data de


Julgamento: 20/06/2018, Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário
da Justiça do dia 22/06/2018).
18

Serão analisados nos itens a seguir o conceito e a diferença entre crime e


contravenção penal, as garantias e direitos juvenis quando da apuração do ato
infracional, bem como, diferenciar a apuração do ato infracional cometido por
criança, e cometida por adolescente pela conduta de estupro, para depois delinear
as medidas socioeducativas aplicadas ao adolescente que praticar ato infracional
análogo ao crime de estupro.

5.1 Crime e Contravenção penal

Crime e contravenção em relação ao ato infracional serão equiparados aos


crimes cuja pena é cominada aos adultos, neste sentido, explica Marcos Bandeira:
“toda conduta praticada por criança ou adolescente que se amolde à figura típica de
um crime previsto no Código Penal ou em leis extravagantes, ou a uma
contravenção penal, configura-se como ato infracional” (BANDEIRA, 2006, p. 25).
O crime e a contravenção penal são espécies de gêneros que comportam
infração penal, a diferença está na importância ou no grau que o legislador fez o seu
juízo de valor. Rogério Greco dispõe acerca da infração penal: “infração penal é
gênero, do qual são duas espécies os crimes e as contravenções. ” (GRECO, 2017,
p. 235). O artigo 1º da Lei de Introdução do Código Penal dispõe sobre o crime e a
contravenção penal:

Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou


de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a
pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina,
isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou
cumulativamente. (BRASIL, LICP, 1941).

Existe a necessidade de observar qual a sanção penal que está sendo


cominada, para classificarmos se a conduta resulta de crime ou contravenção penal.
O Código Penal expressa quanto ao crime:

Art. 4º - Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão,


ainda que outro seja o momento do resultado.
Art. 5º - Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e
regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional.
Art. 14 - Diz-se o crime:
19

Parágrafo Único - Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a


pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços.
Art. 33 - A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-
aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo
necessidade de transferência a regime fechado.
Art. 75. O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não
pode ser superior a 40 (quarenta) anos.
Art. 100 - A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a
declara privativa do ofendido. (BRASIL, CP, 1940).

Desta forma, os crimes sujeitam seus autores a penas de reclusão ou


detenção, sendo que os crimes são condutas mais gravosas, com penas de reclusão
ou detenção que podem durar até 40 anos, admite-se a extraterritorialidade e pune a
tentativa, admite todas as formas de ação penal condicionada ou incondicionada,
sendo de competência Federal ou Estadual, pode-se por fim definir crime como ação
ou omissão típica, antijurídica e culpável, com pena de reclusão ou detenção.
Quanto as contravenções, segundo o professor Guilherme Nucci, delimita: “As
contravenções, no máximo, implicam em prisão simples. ” (NUCCI, 2015, p.124).
A Lei das Contravenções Penais estatui nos artigos:

Art. 1º Aplicam-se as contravenções às regras gerais do Código Penal,


sempre que a presente lei não disponha de modo diverso.
Art. 2º A lei brasileira só é aplicável à contravenção praticada no território
nacional.
Art. 3º Para a existência da contravenção, basta a ação ou omissão
voluntária. Deve-se, todavia, ter em conta o dolo ou a culpa, se a lei faz
depender, de um ou de outra, qualquer efeito jurídico.
Art. 4º Não é punível a tentativa de contravenção.
Art. 5º As penas principais são:
I – prisão simples.
II – multa.
Art. 6º A pena de prisão simples deve ser cumprida, sem rigor penitenciário,
em estabelecimento especial ou seção especial de prisão comum, em
regime semi-aberto ou aberto.
Art. 10. A duração da pena de prisão simples não pode, em caso algum, ser
superior a cinco anos, nem a importância das multas ultrapassar cinquenta
contos.
Art. 17. A ação penal é pública, devendo a autoridade proceder de ofício.
(BRASIL, LCP, 1941).

São infrações penais de menor dimensão, não exige o mesmo rigor


penitenciário da prática de crime, a pena prevista para contravenção penal só admite
pena de prisão simples ou multa que vão até cinco anos, não admite
extraterritorialidade e não pune a tentativa, ação penal apenas incondicionada.
Cezar Roberto Bittencourt, esclarece de forma simples e significativa: “As
contravenções, que por vezes são chamadas de crimes-anões, são condutas que
20

apresentam menor gravidade em relação aos crimes, por isso sofrem sanções mais
brandas. ” (BITENCOURT, 2007, p. 212).
O ECA classificou como ato infracional as infrações de autoria da criança e
adolescente, afastando a ideia de crime ou contravenção e seus respectivos efeitos
penais e processuais.

5.2 Apuração do Ato Infracional

A apuração do ato infracional possui procedimentos próprios estabelecidos


nos artigos 171 a 190 do ECA, garantidos através dos princípios da proteção
integral, prioridade absoluta e condição peculiar da pessoa em desenvolvimento, em
nenhum momento terá caráter punitivo.
Já vimos que a idade para responsabilização do ato infracional inicia-se aos
doze anos de idade, quando o adolescente estará sujeito as medidas
socioeducativas, reforça a doutrina neste sentido: “a partir da entrada em vigor do
ECA, em 1990, a legislação brasileira fixou responsabilidade penal juvenil aos 12
(doze) anos. ” (SPOSATO, 2013, 42).
Existe um tratamento diferenciado para a criança e adolescente autores do
mesmo ato infracional: “às crianças será possível a aplicação única e
exclusivamente de medida de proteção. De outro lado, aos adolescentes será
possível a aplicação de medidas socioeducativas e/ou medidas protetivas.
(ROSSATO; LÉPORE; CUNHA, 2015, p. 297).
Bandeira explana sua ideia:

Nesse diapasão, pode-se afirmar que a criança não está sujeita à imposição
de qualquer medida socioeducativa, em face de sua condição peculiar de
ser em formação, sem aptidão suficiente para entender o caráter ilícito do
ato infracional praticado ou de determinar-se de acordo com tal
entendimento. (BANDEIRA, 2006, p. 25).

Assim, caso a criança venha praticar o crime de estupro, poderão ser


aplicadas apenas medidas protetivas elencadas no artigo 101 do Estatuto, não
haverá nenhum procedimento para a apuração do ato infracional.
21

6 DOS DIREITOS INDIVIDUAIS

O ECA delimitou no seu capítulo II, os direitos individuais dos adolescentes


sujeitos à apuração de ato infracional, para que em nenhum momento se confunda
com o processo penal para apuração de crimes praticados por adultos, devendo o
tratamento ao adolescente ser diferenciado.
Os direitos individuais encontram respaldo nos seguintes artigos:

Art. 106. Nenhum adolescente será privado de sua liberdade senão em


flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da
autoridade judiciária competente. Parágrafo único. O adolescente tem direito
à identificação dos responsáveis pela sua apreensão, devendo ser
informado acerca de seus direitos.
Art. 107. A apreensão de qualquer adolescente e o local onde se encontra
recolhido serão incontinenti comunicados à autoridade judiciária competente
e à família do apreendido ou à pessoa por ele indicada.
Parágrafo único. Examinar-se-á, desde logo e sob pena de
responsabilidade, a possibilidade de liberação imediata.
Art. 108. A internação, antes da sentença, pode ser determinada pelo prazo
máximo de quarenta e cinco dias.
Parágrafo único. A decisão deverá ser fundamentada e basear-se em
indícios suficientes de autoria e materialidade, demonstrada a necessidade
imperiosa da medida.
Art. 109. O adolescente civilmente identificado não será submetido a
identificação compulsória pelos órgãos policiais, de proteção e judiciais,
salvo para efeito de confrontação, havendo dúvida fundada. (BRASIL, ECA,
1990).

Em regra, o adolescente não pode ser privado da sua liberdade, existe


previsão para casos de flagrante, sendo através de ordem judicial escrita e jamais
será preso preventivamente para averiguações como no processo penal.
As características de flagrância seguem o mesmo conceito do Código de
Processo Penal, entende-se por flagrante próprio quando o adolescente está
cometendo o ato infracional, quando acaba de cometê-lo, flagrante impróprio ou
presumido ao ser perseguido após o cometimento do ato infracional, pela
autoridade, ofendido ou outra pessoa, em situações que presume ser ele o autor da
infração, ou encontrado logo após com os objetos do ato que façam presumir ser ele
o autor da infração.
Excluída a hipótese de flagrância, poderá haver apreensão do adolescente
que deverá ocorrer por meio de ordem do juiz da Vara da Infância e da Juventude,
visto que é a autoridade competente para demandar a ordem, caso seja
22

descumprimento os preceitos do referido artigo, poderá incorrer crime do artigo 230


do ECA:
Art. 230. Privar a criança ou o adolescente de sua liberdade, procedendo à
sua apreensão sem estar em flagrante de ato infracional ou inexistindo
ordem escrita da autoridade judiciária competente:
Pena - detenção de seis meses a dois anos.
Parágrafo único. Incide na mesma pena aquele que procede à apreensão
sem observância das formalidades legais. (BRASIL, ECA, 1990).

O adolescente no momento da sua apreensão será informado de todos os


seus direitos, bem como, a identificação dos agentes, para evitar abuso de
autoridade, são preceitos estabelecidos na Constituição Federal no artigo 5º, incisos
LXIII e LXIV, reprisados na legislação especial.
Ao ser apreendido deverá ocorrer a imediata comunicação à autoridade
judiciária, num prazo de até vinte e quatro horas aos pais, responsáveis ou pessoa
por ele indicado, Murílo e Ildeara explicam que: “a expressão ‘incontinenti’, ao invés
da palavra “imediatamente”, para enfatizar a necessidade de a comunicação ser
efetuada logo após o ingresso do adolescente na repartição policial.” (grifos do
autor) (DIGIÁCOMO, M, DIGIÁCOMO I, 2020. p. 222), quando da apreensão em
flagrante, todas as formalidades estabelecidas no Estatuto deverão ser respeitadas,
observando as hipóteses de liberação, não restando outra alternativa, caberá ao
magistrado a determinação de apreensão. (NUCCI, 2015).
O ECA prevê a possibilidade de internação provisória, desde que,
configurados indícios de autoria e materialidade, num prazo improrrogável de
quarenta e cinco dias.
Para os promotores Murílo e Ildeara:

Em que pese a reprovabilidade do ato infracional praticado, não pode o Juiz


se afastar da norma contida no art. 108 do Estatuto da Criança e do
Adolescente, que dispõe expressamente que a medida de internação
anterior a sentença não pode extrapolar o prazo de 45 dias. (DIGIÁCOMO,
M, DIGIÁCOMO I, 2020. p.224).

Por fim, jamais o adolescente será submetido a constrangimento de


identificação, como colheita de foto e impressão digital, somente se houver dúvidas
quanto a sua identidade, está em tratamento diferenciado e não poderá ser tratado
como investigado comum. (DIGIÁCOMO, DIGIÁCOMO, 2020).
23

São direitos do adolescente que devem ser respeitos e garantidos no


momento da sua apreensão para apuração do ato infracional, o descumprimento das
regras do Estatuto poderá incidir em crime.

6.1 Das Garantias Processuais

São princípios constitucionais que foram recepcionados pelo Estatuto da


Criança e do Adolescente, garantias do devido processo legal, contraditório e ampla
defesa ao adolescente na apuração de Ato Infracional. Estão consolidados para
qualquer pessoa no artigo 5º da Constituição Federal, no inciso LIV dispomos do
devido processo: “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido
processo legal”, e no inciso LV encontramos o direito ao contraditório e ampla
defesa: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em
geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a
ela inerentes. ” (BRASIL, CF, 1988).
O Capítulo III do ECA dispõe:

Art. 110. Nenhum adolescente será privado de sua liberdade sem o devido
processo legal.
Art. 111. São asseguradas ao adolescente, entre outras, as seguintes
garantias:
I - pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, mediante
citação ou meio equivalente;
II - igualdade na relação processual, podendo confrontar-se com vítimas e
testemunhas e produzir todas as provas necessárias à sua defesa;
III - defesa técnica por advogado;
IV - assistência judiciária gratuita e integral aos necessitados, na forma da
lei;
V - direito de ser ouvido pessoalmente pela autoridade competente;
VI - direito de solicitar a presença de seus pais ou responsável em qualquer
fase do procedimento. (BRASIL, ECA, 1990).

Segundo Nagib Slaibi Filho, o princípio do devido processo formal e material, é


indispensável para qualquer processo, judicial ou administrativo, até mesmo para aqueles
referentes a atos infracionais praticados por menor. (FILHO, 2009).
Já foi tema de discussão nos tribunais, em que o descumprimento da norma
incidirá na suspensão de processo, sendo obrigatório o refazimento de todos os atos
processuais:
24

Apelação – Sentença que concedeu ao adolescente a remissão judicial,


como forma de suspensão do processo, cumulada com medida
socioeducativa de liberdade assistida, sem prévias oitivas do adolescente
e de seu defensor técnico – Nulidade absoluta – Cerceamento de defesa –
Ofensa aos princípios do devido processo legal, do contraditório, da ampla
defesa e da igualdade processual – Apelação parcialmente provida, para
declarar nula a r. sentença e determinar o refazimento dos atos
processuais.
(TJ-SP - APL: 00032586320158260302 SP 0003258-63.2015.8.26.0302,
Relator: Renato Genzani Filho, Data de Julgamento: 24/10/2016, Câmara
Especial, Data de Publicação: 26/10/2016).

Em suma, deve-se obedecer ao princípio do devido processo legal como


uma proteção jurídica, conforme explica Saraiva: “A citação, mais do que uma
garantia processual, se constitui em uma garantia constitucional, na medida em que
ninguém poderá ser processado sem ser ouvido a propósito da imputação que
contra si é feita. ” (SARAIVA, 2005, p. 68), bem como, obedecidos os princípios do
contraditório e ampla defesa, também fundamentadas no artigo 227 da
Constituição incisos IV:

[...] garantia de pleno e formal conhecimento da atribuição de ato


infracional, igualdade na relação processual e defesa técnica por
profissional habilitado, segundo dispuser a legislação tutelar específica.
(BRASIL, CF, 1988).

Continua Saraiva em obra:

A imprescindibilidade do advogado à administração da justiça se constitui


em primado de ordem constitucional (art. 133 da CF). Ora, se o adolescente
está sujeito ao devido processo legal, faz- se indiscutível seu direito à
defesa técnica por advogado. Tal, aliás, vem expresso no art. 227, § 3º, inc.
IV, da Magna Carta, e repetido no ECA em seu art. 207, que impõe a defesa
do adolescente por advogado sempre que lhe for atribuída a autoria de ato
infracional em procedimento judicial. (SARAIVA, 2005, p. 69/70).

Assim, conforme ressaltado nos artigos supracitados, ao iniciar a apuração


pela suposta prática do ato infracional, está reservado ao adolescente todas as
garantias processuais do Estatuto da Criança e do Adolescente.

6.2 MEDIDAS DE PROTEÇÃO

Dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente no artigo 98:


25

Art. 98. As medidas à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que


os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçado ou violados”
I – por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;
II – por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável;
III - em razão da sua conduta, podendo as medidas ser aplicadas isolada ou
cumulativamente, e substituída a medida quando necessário (BRASIL, ECA,
1990).

Bem como o Artigo 99 da mesma Lei: “As medidas previstas neste Capítulo
poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente, bem como substituídas a
qualquer tempo” (BRASIL, ECA,1990).
As medidas protetivas são norteadas pelos princípios estabelecidos no
parágrafo único do artigo 100 do ECA:

Art. 100. Na aplicação das medidas levar-se-ão em conta as necessidades


pedagógicas, preferindo-se aquelas que visem ao fortalecimento dos
vínculos familiares e comunitários. Parágrafo único. São também princípios
que regem a aplicação das medidas:
I - condição da criança e do adolescente como sujeitos de direitos: crianças
e adolescentes são os titulares dos direitos previstos nesta e em outras
Leis, bem como na Constituição Federal;
II - proteção integral e prioritária: a interpretação e aplicação de toda e
qualquer norma contida nesta Lei deve ser voltada à proteção integral e
prioritária dos direitos de que crianças e adolescentes são titulares;
III - responsabilidade primária e solidária do poder público: a plena
efetivação dos direitos assegurados a crianças e a adolescentes por esta
Lei e pela Constituição Federal, salvo nos casos por esta expressamente
ressalvados, é de responsabilidade primária e solidária das 3 (três) esferas
de governo, sem prejuízo da municipalização do atendimento e da
possibilidade da execução de programas por entidades não
governamentais;
IV - interesse superior da criança e do adolescente: a intervenção deve
atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do
adolescente, sem prejuízo da consideração que for devida a outros
interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no
caso concreto;
V - privacidade: a promoção dos direitos e proteção da criança e do
adolescente deve ser efetuada no respeito pela intimidade, direito à imagem
e reserva da sua vida privada;
VI - intervenção precoce: a intervenção das autoridades competentes deve
ser efetuada logo que a situação de perigo seja conhecida.
VII - intervenção mínima: a intervenção deve ser exercida exclusivamente
pelas autoridades e instituições cuja ação seja indispensável à efetiva
promoção dos direitos e à proteção da criança e do adolescente;
VIII - proporcionalidade e atualidade: a intervenção deve ser a necessária e
adequada à situação de perigo em que a criança ou o adolescente se
encontram no momento em que a decisão é tomada;
IX - responsabilidade parental: a intervenção deve ser efetuada de modo
que os pais assumam os seus deveres para com a criança e o adolescente;
X - prevalência da família: na promoção de direitos e na proteção da criança
e do adolescente deve ser dada prevalência às medidas que os mantenham
ou reintegrem na sua família natural ou extensa ou, se isso não for possível,
que promovam a sua integração em família adotiva;
XI - obrigatoriedade da informação: a criança e o adolescente, respeitado
seu estágio de desenvolvimento e capacidade de compreensão, seus pais
26

ou responsável devem ser informados dos seus direitos, dos motivos que
determinaram a intervenção e da forma como esta se processa;
XII - oitiva obrigatória e participação: a criança e o adolescente, em
separado ou na companhia dos pais, de responsável ou de pessoa por si
indicada, bem como os seus pais ou responsável, têm direito a ser ouvidos
e a participar nos atos e na definição da medida de promoção dos direitos e
de proteção, sendo sua opinião devidamente considerada pela autoridade
judiciária competente, observado o disposto nos §§ 1o e 2o do art. 28 desta
Lei (BRASIL, ECA, 1990).

São princípios gerais que devem ser respeitados para garantir a proteção das
crianças e adolescentes.
Estão elencadas as medidas de proteção destinadas às crianças e aos
adolescentes no artigo 101 do ECA:

Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no artigo 98, a


autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes
medidas:
I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de
responsabilidade;
II - orientação, apoio e acompanhamento temporários;
III - matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino
fundamental;
IV - inclusão em serviços e programas oficiais ou comunitários de proteção,
apoio e promoção da família, da criança e do adolescente;
V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime
hospitalar ou ambulatorial;
VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e
tratamento a alcoólatras e toxicômanos;
VII - acolhimento institucional;
VIII - inclusão em programa de acolhimento familiar;
IX - colocação em família substituta. (BRASIL, ECA, 1990).

Cumpre observar que até o inciso VI, a competência é do juiz ou Conselho


Tutelar e, os incisos VII, VIII e IX somente poderão ser aplicadas pela autoridade
judiciária “[...] as medidas protetivas de acolhimento institucional e familiar somente
poderão ser determinadas pela autoridade judiciária [...]” (ROSSATO, LÉPORE,
CUNHA, 2015, p. 298). O rol das medidas é de caráter exemplificativo, existe a
possibilidade de medidas alternativas, além das previstas neste artigo (NUCCI,
2014).
Sempre que necessária a aplicação das medidas de proteção, é obrigatório
que a criança e o adolescente estejam acompanhadas da certidão de nascimento
conforme preconiza o artigo 102 do ECA: “As medidas de proteção de que trata este
Capítulo serão acompanhadas da regularização do registro civil. ” (BRASIL, ECA,
1990), caso inexista o registro, o juiz deve determinar a sua lavratura de forma não
27

onerosa; se desconhecida a paternidade em registro, a genitora será ouvida para


que apresente dados para localização do suposto pai, não sendo possível
determinar a paternidade será aberto o procedimento para investigação de
paternidade, esta, será dispensada se houver adoção da criança e do adolescente.
(NUCCI, 2014).
As medidas de proteção poderão ser aplicadas para criança e adolescente,
sua finalidade de fortalecer o vínculo familiar. O objeto do presente trabalho é o ato
infracional análogo ao crime de estupro, nos interessa é a conduta do menor com
idade de doze à dezoito anos praticado com violência ou grave ameaça,
comportarão medidas protetivas para crianças e, para os adolescentes medida de
proteção ou socioeducativa, sendo o crime de estupro considerado hediondo
dificilmente um adolescente estará sujeito à medida protetiva, concorda NUCCI: “As
medidas previstas neste artigo são insuficientes para determinados atos infracionais,
como os cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa.” (NUCCI, 2014, p.
276).

7 Estupro Cometido por Adolescente

Compreende por adolescente aquele entre doze e dezoito de idade, devido


sua inimputabilidade se autor de ato infracional estará passível à aplicação das
medidas protetivas e socioeducativas previstas no Estatuto da Criança e do
Adolescente.
No momento da apuração, deverá ser observada a idade do adolescente à
data do fato, prevalecendo a presunção absoluta, não admitindo prova em contrário
e para aferir a imputabilidade, considera-se a idade no momento da conduta
comissiva ou omissiva. Sabemos que estão protegidos pelo ECA a pessoa até os
dezoito anos de idade, excepcionalmente esta proteção poderá ser estendida até os
vinte e um anos de idade, como exemplo, uma conduta descrita como crime ou
contravenção penal, se praticada por adolescente aos 17 e 11 meses de idade,
excepcionalmente estará sujeito às medidas previstas no Estatuto até os vinte e um
anos de idade, “Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este
Estatuto às pessoas entre dezoito e vinte um anos de idade.” (BRASIL, ECA, 1990).
28

Ao completar vinte e um anos de idade, o Estado imediatamente o incluirá


novamente na sociedade, “A liberação será compulsória aos vinte e um anos de
idade. ” (BRASIL, ECA, 1990).
Vejamos a decisão do tribunal:

PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO


ESPECIAL. MENOR INFRATOR QUE COMPLETA 21 ANOS DE IDADE.
LIBERAÇÃO COMPULSÓRIA. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO.
AGRAVO REGIMENTAL PROVIDO. RECURSO ESPECIAL DA
ACUSAÇÃO PREJUDICADO. 1. Nos termos do art. 121, § 5º, do Estatuto
da Criança e do Adolescente, o advento de 21 anos acarreta a liberação
compulsória do adolescente, de modo que não mais subsiste utilidade na
pretensão recursal do Ministério Público em restabelecer a sentença que
impôs medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade. 2.
Agravo regimental provido para julgar prejudicado o recurso especial.
(STJ - AgRg no REsp: 1687455 ES 2017/0186854-8, Relator: Ministro
NEFI CORDEIRO, Data de Julgamento: 10/04/2018, T6 - SEXTA TURMA,
Data de Publicação: DJe 23/04/2018).

O adolescente apreendido por ordem judicial ou flagrante delito, deverá ser


respeitado todos os direitos e garantias processuais já delimitados anteriormente.
Cumpre observar a diferença de ordem judicial e flagrante delito.
Segundo Nucci, ”(...) continua sendo a principal das atenuantes, por tradição,
entendendo-se que o menor, nessa idade, ainda não se encontra totalmente
amadurecido, merecendo a benevolência do juiz no momento da fixação da pena.
Para a maioria da doutrina e da jurisprudência, deve ela sobrepor-se a qualquer
agravante, inclusive a reincidência. A prova da menoridade se faz por qualquer
documento hábil, como preceitua a Súmula 74 do Superior Tribunal de Justiça. ”
(NUCCI, 2019, p. 461).
O artigo 171 trata da apreensão por ordem do magistrado: “O adolescente
apreendido por força de ordem judicial será desde logo, encaminhado à autoridade
judiciária. ” (BRASIL, ECA, 1990).
Neste sentido, diga-se que apreensão do adolescente por judicial somente é
devida quando houver indícios de autoria e materialidade, podendo ocorrer também,
no caso em que o adolescente descumpra por exemplo a medida de semiliberdade,
não retornando para a unidade educacional quando deveria.
Outra espécie de apreensão, é por flagrante de ato infracional, conforme
dispõe o artigo 172 do ECA:
Art. 172. O adolescente apreendido em flagrante de ato infracional será,
desde logo, encaminhado à autoridade policial competente.
29

Parágrafo único. Havendo repartição policial especializada para


atendimento de adolescente e em se tratando de ato infracional praticado
em co-autoria com maior, prevalecerá a atribuição da repartição
especializada, que, após as providências necessárias e conforme o caso,
encaminhará o adulto à repartição policial própria. (BRASIL, ECA, 1990).

Quando configurada a situação de flagrância, o adolescente será


encaminhado para delegacia, aonde formalizará a sua apreensão pela conduta, se
estiver acompanhado de uma pessoa de idade maior, este adolescente ficará na
delegacia especializada e o outro adulto seguirá para uma outra delegacia. Para
tanto, existem delegacias especializadas para prática de ato infracional, por ventura,
se a região não dispuser de instalação, poderá o adolescente infrator ser
encaminhado para delegacia comum, todavia, jamais deverá ser colocado com
adultos na mesma cela.
De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, a formalização
ocorrerá para a conduta cometida com violência ou grave ameaça, utilizaremos a
conduta análoga ao crime de estupro, ou seja, tema do presente trabalho.

Art. 173. Em caso de flagrante de ato infracional cometido mediante


violência ou grave ameaça a pessoa, a autoridade policial, sem prejuízo do
disposto nos arts. 106, parágrafo único, e 107, deverá:
I - lavrar auto de apreensão, ouvidos as testemunhas e o adolescente;
II - apreender o produto e os instrumentos da infração;
III - requisitar os exames ou perícias necessários à comprovação da
materialidade e autoria da infração.
Parágrafo único. Nas demais hipóteses de flagrante, a lavratura do auto
poderá ser substituída por boletim de ocorrência circunstanciada. (BRASIL,
ECA, 1990).

A finalidade da condução do apreendido para a delegacia somente em casos


de violência ou grave ameaça, é de preservar o máximo a integridade do
adolescente, ou seja, o objetivo é diminuir ao máximo sua presença na repartição
policial, ficando o menor tempo possível nesse local.
A regra para apreensão em flagrante é a imediata liberação após o
comparecimento dos pais ou responsável, após será levado ao delegado de polícia
e então será lavrado o auto de apreensão ou boletim de ocorrência circunstanciada
e, posteriormente apresentado ao membro do Ministério Público. Se não ocorrer a
liberação e o ato infracional for grave seguido de grande repercussão social, este,
ficará detido através de ordem judicial, que decidirá em manter ou não o adolescente
em internação provisória.
30

O caso Champinha é exemplo de grande repercussão social, o adolescente


manteve Liane e Felipe em cativeiro. Liane ficou em seu poder durante 5 dias sendo
estuprada e foi morta com quinze facadas, o caso em 2003 causou revolta social e
perigo para a integridade física do autor do ato infracional.
O artigo 174 do ECA preconiza:

Art. 174. Comparecendo qualquer dos pais ou responsável, o adolescente


será prontamente liberado pela autoridade policial, sob termo de
compromisso e responsabilidade de sua apresentação ao representante do
Ministério Público, no mesmo dia ou, sendo impossível, no primeiro dia útil
imediato, exceto quando, pela gravidade do ato infracional e sua
repercussão social, deva o adolescente permanecer sob internação para
garantia de sua segurança pessoal ou manutenção da ordem pública.
(BRASIL, ECA, 1990).

Válter Ishida, explica os procedimentos:

Delitos de menor gravidade: a autoridade policial elabora o termo


circunstanciado e, mediante o comparecimento dos pais ou responsável
legal, libera o menor com o compromisso de apresentação ao membro do
MP para oitiva informal. Delitos graves e de grande repercussão: mantém o
adolescente internado, desde que constatada a necessidade de segurança
pessoal do menor ou manutenção da ordem pública. (ISHIDA, 2015, p 447).

O artigo 175 do Estatuto, trata da não liberação policial, conforme explica


Guilherme Nucci:
Há duas alternativas para a não liberação do adolescente, com o seu
encaminhamento ao Parquet: a) trata-se de ato infracional grave,
preenchendo os requisitos para a internação provisória; b) embora pudesse
ser liberado, não comparece à delegacia nenhum responsável legal pelo
jovem. Diante disso, o menor deve ser levado à presença do promotor em,
no máximo 24 horas. (NUCCI, 2015, p. 473).

Os parágrafos 1 e 2 do artigo em epígrafe, prevê a impossibilidade de


apresentação imediata ao Ministério Público, conforme explica Ishida:

No caso de não liberação, deve a autoridade policial encaminhar o


adolescente ao membro do MP. Havendo impossibilidade, deve enviá-lo à
entidade de atendimento, que incumbirá da apresentação. No caso de
inexistência de entidade, a apresentação deverá ser feita pela própria
autoridade policial, que deverá custodiar o adolescente em compartimento
separado. (ISHIDA, 2015, p. 449).

Conforme o artigo 176 do ECA, o delegado de polícia encaminhará o


adolescente até o promotor do Ministério Público que o representará ao Juiz da Vara
da Infância e Juventude, que poderá optar pela internação provisória ou dispensa.
Se a liberação do adolescente for permitida, a autoridade policial remeterá de
31

imediato cópia do auto de apreensão ou boletim de ocorrência (ISHIDA, 2015).


Nucci completa que: “Em tese, nessas peças já existirão elementos suficientes para
a formação do seu convencimento, decidindo o que fazer.” (NUCCI, 2014, p. 473).
Preenchidas todas as formalidades para apuração do ato infracional e, sendo
o adolescente levado apresentado ao Ministério Público fará sua oitiva informal
conforme o artigo 179 do ECA:

Art. 179. Apresentado o adolescente, o representante do Ministério Público,


no mesmo dia e à vista do auto de apreensão, boletim de ocorrência ou
relatório policial, devidamente autuados pelo cartório judicial e com
informação sobre os antecedentes do adolescente, procederá imediata e
informalmente à sua oitiva e, em sendo possível, de seus pais ou
responsável, vítima e testemunhas.
Parágrafo único. Em caso de não apresentação, o representante do
Ministério Público notificará os pais ou responsável para apresentação do
adolescente, podendo requisitar o concurso das polícias civil e militar.
(BRASIL, ECA, 1990).

Neste contexto, Guilherme Nucci explana: “Este dispositivo permite que o


promotor estabeleça, em seu gabinete, embora informalmente, uma audiência
concentrada, na qual ouvirá, pelo menos, o adolescente. ” (grifos do autor) (NUCCI,
2014. p.477).
Percebe-se que o Ministério Público é a autoridade competente para a
representação, detendo também o poder de arquivar os autos, conceder remissão
homologada pelo Juiz e representação para medida socioeducativa, excluindo o
regime de semiliberdade e a internação nos moldes do artigo 127:

Art. 127. A remissão não implica necessariamente o reconhecimento ou


comprovação da responsabilidade, nem prevalece para efeito de
antecedentes, podendo incluir eventualmente a aplicação de qualquer das
medidas previstas em lei, exceto a colocação em regime de semi-liberdade
e a internação. (BRASIL, ECA, 1990).

Vejamos a jurisprudência abaixo, onde o Ministério Público concedeu a remissão.

APELAÇÃO. ECA. ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO TRÁFICO DE


DROGAS. CONCESSÃO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DE REMISSÃO
CUMULADA COM MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE ADVERTÊNCIA.
REMISSÃO HOMOLOGADA PELO JUIZ. ALEGAÇÃO DE QUE A MEDIDA
SOCIOEDUCATIVA FOI APLICADA SEM A AQUIESCÊNCIA DA DEFESA
TÉCNICA. VIOLAÇÃO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL NÃO
VERIFICADA PROCEDIMENTO EXTRAJUDICIAL PREVISTO NO ART.
179 DO ECA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. A audiência
de oitiva informal prevista no art. 179 do ECA, tem natureza de
procedimento administrativo, que antecede a fase judicial, oportunidade
32

em que o membro do Ministério Público, diante da notícia da prática de um


ato infracional pelo menor, reunirá elementos de convicção suficientes
para decidir acerca da conveniência da representação, do oferecimento da
proposta de remissão ou do pedido de arquivamento extrajudicial. 2. Não
há constrangimento ilegal quando a remissão é cumulada com medida de
liberdade assistida ou advertência, pois esse instituto pode ser aplicado
com outras medidas que não impliquem restrição da liberdade do menor,
nos exatos termos do art. 127 do ECA. (Classe: Apelação,Número do
Processo: 0524712-52.2018.8.05.0001, Relator (a): Nágila Maria Sales
Brito, Segunda Câmara Criminal - Segunda Turma, Publicado em:
13/09/2018 )
(TJ-BA - APL: 05247125220188050001, Relator: Nágila Maria Sales Brito,
Segunda Camara Criminal - Segunda Turma, Data de Publicação:
13/09/2018)

As atribuições do Ministério Público estão previstas nos artigos 180 a 182 do


Estatuto da Criança e do Adolescente:
Art. 180. Adotadas as providências a que alude o artigo anterior, o
representante do Ministério Público poderá:
I – promover o arquivamento dos autos;
II – conceder a remissão;
III – representar à autoridade judiciária para aplicação de medida
socioeducativa
Art. 181. Promovido o arquivamento dos autos ou concedida a remissão
pelo representante do Ministério Público, mediante termo fundamentado,
que conterá o resumo dos fatos, os autos serão conclusos à autoridade
judiciária para homologação.
§ 1.º Homologado o arquivamento ou a remissão, a autoridade judiciária
determinará, conforme o caso, o cumprimento da medida.
§ 2.º Discordando, a autoridade judiciária fará remessa dos autos ao
Procurador-Geral de Justiça, mediante despacho fundamentado, e este
oferecerá representação, designará outro membro do Ministério Público
para apresentá-la, ou ratificará o arquivamento ou a remissão, que só então
estará a autoridade judiciária obrigada a homologar.
Art. 182. Se, por qualquer razão, o representante do Ministério Público não
promover o arquivamento ou conceder a remissão, oferecerá representação
à autoridade judiciária, propondo a instauração de procedimento para
aplicação da medida socioeducativa que se afigurar a mais adequada.
§ 1.º A representação será oferecida por petição, que conterá o breve
resumo dos fatos e a classificação do ato infracional e, quando necessário,
o rol de testemunhas, podendo ser deduzida oralmente, em sessão diária
instalada pela autoridade judiciária.
§ 2.º A representação independe de prova pré-constituída da autoria e
materialidade. (BRASIL, ECA, 1990).

Cumpre esclarecer a diferença entre o arquivamento e a remissão. Ensina


Guilherme de Souza Nucci:

[...] inexistindo provas a sustentar a justa causa para a representação,


tampouco seja o caso de remissão, cabe o promotor requerer o
arquivamento dos autos. [...] a remissão é um perdão extrajudicial
embasado na lei. (NUCCI, 2015, p.482).
33

Excluindo a possibilidade do arquivamento ou remissão, o Ministério Público


oferecerá a representação do adolescente para a autoridade judiciária, inicia-se
então o processo judicial, salienta-se que somente o MP tem legitimidade para a
propositura da ação, conforme norma contida no artigo 201 do ECA: “Compete ao
Ministério Público”: no inciso II: “promover e acompanhar os procedimentos relativos
às atribuições atribuídas a adolescente. ” (BRASIL, ECA, 1998).
Neste contexto, ao adolescente serão assegurados os direitos individuais e
garantias processuais durante a apuração do ato infracional, o ECA reprisa no artigo
183, o prazo máximo e improrrogável de 45 dias estando o adolescente preso, a
apuração do ato infracional deverá ser concluída, nesta fase serão garantidos o
direito ao devido processo legal, contraditório e ampla defesa.
Feita a representação, o juiz decidirá se acatará ou não a denúncia, em caso
de internação o adolescente jamais poderá cumprir a ordem em estabelecimento
prisional, devendo este ser encaminhado para uma unidade educacional, se não
houver em território, seguirá para a unidade maia próxima. (NUCCI, 2014).
Observamos que existe todo um procedimento e garantias a serem
respeitadas ao adolescente autor de auto infracional, para o crime o de estupro
considerado penalmente como hediondo, o adolescente poderá ser posto em
liberdade sem os trâmites aplicados aos adultos.

8 MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS

As medidas socioeducativas são aplicadas aos adolescentes autores de ato


infracional, cabe reprisar que jamais serão aplicadas para crianças. Esta medida tem
cunho educativo e ressocializador, com o objetivo de reabilitar o adolescente para o
convívio em sociedade. Essas medidas estão elencadas taxativamente no artigo 112
do Estatuto da Criança e do Adolescente:

Art. 112.Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente


poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:
I – advertência;
II – obrigação de reparar o dano;
III – prestação de serviços à comunidade;
IV – liberdade assistida;
V – inserção em regime de semiliberdade;
VI – internação em estabelecimento educacional;
VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.
34

§1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de


cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração;
§2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de
trabalho forçado. (BRASIL, ECA, 1990).

De tal modo, o fato típico previsto no artigo 213 do Código Penal Brasileiro:

Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter


conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato
libidinoso:
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.
§ 1o Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima
é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos:
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos.
§ 2o Se da conduta resulta morte:
Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.
(BRASIL, CP, 1940).

Para o adolescente que praticar este ato, não será aplicada a penalidade do
aludido artigo, qual seja pena mínima cominada de 6 e máxima cominada de 10
anos de reclusão, que configurada a conduta descrita, ao adolescente será aplicada
a melhor medida socioeducativa conforme entendimento do Juiz.
Portanto, a finalidade e objetivo das medidas socioeducativas é a reeducação
e adequação social, para uma efetiva reinserção na sociedade, conforme demonstra
Marcos Bandeira:

As medidas socioeducativas, portanto, devem pautar-se fundamentalmente,


na adoção pedagógica de mecanismos de inclusão social, que seja capaz
de introjetar, no jovem ainda em formação, valores que penetrem na sua
centelha divina, aumentando a sua autoestima, ampliando os seus
horizontes e a sua condição de sonhar com a grande possibilidade que é a
vida. (BANDEIRA, 2006. p. 133).

Ressalta-se que as medidas socioeducativas têm cunho reparador,


ressocializador e educativo, para que o adolescente não venha cometer novamente
o ato de estupro, tornando-se uma pessoa de bem.
Pode-se compreender que as medidas de semiliberdade e internação
possuem cunho punitivo, embora o tempo de permanência não seja o adequado
para a conduta, demonstra também para a sociedade que o adolescente não está
impune do ato seu reprovável, transmite ao infrator o real motivo de estar sob aquele
regime, que cometeu uma conduta grave e por este motivo está privado de
liberdade, seu comportamento é reprovável ao praticar ato sexual sem o
35

consentimento de outra pessoa, ou qualquer ato libidinoso para satisfazer sua


lascívia, conforme veremos em capítulo específico do crime de estupro.
Assim, serão analisadas nos itens a seguir, as medidas Sócio-Educativas
impostas pelo ECA.

8.1 Advertência

A primeira medida socioeducativa é a advertência, que dispõe o artigo 115 do


ECA: “A advertência consistirá na admoestação verbal, que será reduzida a termo e
assinada.” (BRASIL, ECA, 1990). Essa medida é a mais branda, devendo ser
aplicada quando o ato infracional for de natureza leve, ou seja, de menor potencial
ofensivo e que não gera tanta reprovação social, podemos classificar a conduta do
adolescente resultante de uma contravenção penal.
A repreensão é feita pelo Juiz da Vara da Infância e Juventude, serve de
alerta para que o menor não venha cometer novas infrações. Para que essa medida
seja aplicada, existe a necessidade de autoria e materialidade suficientes da autoria.
É a medida menos rigorosa e será aplicada de acordo com a conduta do
adolescente, a censura é feita pelo Juiz como uma maneira de alerta e prevenção
para que o menor não venha cometer novas infrações.

8.1.1 Obrigação de Reparar o Dano

Trata-se de medida com a finalidade de reparação do dano patrimonial


causado pela sua conduta, e consequentemente para que a vítima tenha o seu
prejuízo compensado. Jamais a reparação do dano seguirá os trâmites de título
executivo conforme o Código Civil.

O artigo 116 do ECA estabelece que:

Art. 116. Em se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a


autoridade poderá determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a
coisa, promova o ressarcimento do dano ou, por outra forma, compense o
prejuízo da vítima. (BRASIL, ECA, 1990).
36

De acordo com os promotores Murílo e Ildeara:

As medidas socioeducativas são destinadas apenas a adolescentes


acusados da prática de atos infracionais, devendo por força do art. 104, par
único do ECA ser considerada a idade do agente à data do fato (a criança
está sujeita APENAS a medidas de proteção - arts. 105 c/c 101 do ECA) e,
embora pertençam ao gênero "sanção estatal" (decorrentes da não
conformidade da conduta do adolescente a uma norma penal proibitiva ou
impositiva), não podem ser confundidas ou encaradas como “penas”, pois
têm natureza jurídica e finalidade diversas. (DIGIÁCOMO, M, DIGIÁCOMO
I, 2020. p.230).

Atende que a medida visa indenizar a vítima, mediante a devolução do bem,


reembolso ou outras formas, com os seguintes requisitos: a) provar a autoria e
materialidade do crime; b) gestão pelo próprio judiciário; e c) a reparação do dano
extingue a medida.
Guilherme Nucci elenca as possibilidades de reparação do dano:

Enumera este dispositivo as três formas pelas quais o adolescente pode


cumprir a medida: a) restituição da coisa; b) ressarcimento do dano e c)
compensar o prejuízo de qualquer forma. Essa medida é fazer com que o
adolescente autor de ato infracional se sinta responsável pelo ato que
cometeu e intensifique os cuidados necessários para não causar prejuízo a
outrem. (NUCCI, 2014, p. 344).

A medida deverá ser cumprida exclusivamente pelo adolescente que cometeu


a conduta, na impossibilidade de reparação deverá a medida ser modificada para
outra, desde que, não seja privativa de liberdade conforme parágrafo único do artigo
166: “Havendo manifesta impossibilidade, a medida poderá ser substituída por
adequada”. (BRASIL, ECA, 1990). O adolescente jamais poderá cumprir medida
além das suas condições.

8.1.2 Da Prestação de Serviços à Comunidade

Sua finalidade é a repreensão ao adolescente de modo que ele cumpra a


medida ajudando a sociedade.
A medida está prevista no artigo 117 do Estatuto da Criança e do
Adolescente:
37

Art. 117. A prestação de serviços comunitários consiste na realização de


tarefas gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis
meses, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros
estabelecimentos congêneres, bem como em programas comunitários ou
governamentais.
Parágrafo único. As tarefas serão atribuídas conforme as aptidões do
adolescente, devendo ser cumpridas durante jornada máxima de oito horas
semanais, aos sábados, domingos e feriados ou em dias úteis, de modo a
não prejudicar a freqüência à escola ou à jornada normal de trabalho.
(BRASIL, ECA, 1990).

Podemos até subentender que está medida compara-se com as penas


alternativas previstas no Código Penal, bem como, classifica-la como uma
contravenção penal, assim explica Liberati:

Pode-se dizer que, a exemplo da proposta do Código Penal, a medida em


análise figura como uma alternativa para a privação da liberdade, permitindo
que o infrator cumpra, junto à sala família, no emprego e na comunidade,
trabalhos gratuitos em benefício dos mais necessitados. (LIBERATI, 1993,
p.107/108).

O cumprimento deverá ser em entidades devidamente conveniadas com a


Vara da Infância e Juventude e governo, é uma medida em que visa trazer o jovem
para perto da sociedade e, demonstrar a realidade social com a prestação e serviços
em hospitais e abrigos, vivenciando a real situação de adolescentes que poderiam
estar junto de famílias e encontram-se em outra realidade, também é uma forma de
manter o infrator junto de sua família. Deverão ser levadas em consideradas as
aptidões do adolescente, até mesmo, para um reflexo na vida profissional.

8.1.3 Da Liberdade Assistida

Aplica-se aos atos infracionais de natureza leve, pode-se dizer que está
medida é assemelhada com a suspensão condicional da pena prevista no Código
Penal.
Dispõe o artigo 118 do Estatuto da Criança e do Adolescente:

Art. 118. A liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a


medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o
adolescente.
38

§ 1º A autoridade designará pessoa capacitada para acompanhar o caso, a


qual poderá ser recomendada por entidade ou programa de atendimento.
§ 2º A liberdade assistida será fixada pelo prazo mínimo de seis meses,
podendo a qualquer tempo ser prorrogada, revogada ou substituída por
outra medida, ouvido o orientador, o Ministério Público e o defenso.
(BRASIL, ECA, 1990).

A liberdade assistida será acompanhada por um orientador em todas as


atividades que envolver o adolescente, atinge a sua real finalidade de reeducação
conforme o artigo 119 do ECA:

Art. 119. Incumbe ao orientador, com o apoio e a supervisão da autoridade


competente, a realização dos seguintes encargos, entre outros:
I - promover socialmente o adolescente e sua família, fornecendo-lhes
orientação e inserindo-os, se necessário, em programa oficial ou
comunitário de auxílio e assistência social;
II - supervisionar a frequência e o aproveitamento escolar do adolescente,
promovendo, inclusive, sua matrícula;
III - diligenciar no sentido da profissionalização do adolescente e de sua
inserção no mercado de trabalho;
IV – apresentar relatório do caso. (BRASIL, ECA, 1990).

Diferente da obrigação de reparar o dano, esta medida tem prazo


estabelecido de no mínimo de seis podendo ser prorrogada e será acompanhada da
presença de um orientador judiciário, cujo o seu papel fundamental será orientar o
adolescente e sua família, promovendo inserção social e no mercado de trabalho,
com acompanhamento diário e supervisão do desempenho, bem como, a frequência
escolar, informando o Juiz da Vara da Infância e Juventude sua orientação mediante
relatório.

8.1.4 Do Regime de Semiliberdade

O regime de semiliberdade está disciplinado no artigo 120 do Estatuto da


Criança e do Adolescente:

Art. 120. O regime de semi-liberdade pode ser determinado desde o início,


ou como forma de transição para o meio aberto, possibilitada a realização
de atividades externas, independentemente de autorização judicial.
(BRASIL, ECA,1990).

Ensina Nucci sobre esta medida: “Inclui-se o adolescente em unidade


específica para recebe-los durante a noite, permitindo-se que ele estude e trabalhe
39

fora. Encontra equivalente, no sistema penal, regime aberto. (NUCCI, 2014,


p.351/352). Diferente da liberdade assistida, não existe a necessidade de
acompanhamento de orientador para realização das atividades externas, como
regra, existe o cumprimento de horário para o recolhimento na unidade educacional
para pernoitar, sua segregação surge pelo cometimento de atos infracionais de
natureza grave, ou quando as medidas anteriores mostrarem infrutíferas.
Exige a obrigatoriedade da frequência escolar ou trabalho para que a medida
seja cumprida, conforme preconiza o § 1º do artigo 120 do ECA: “São obrigatórias a
escolarização e a profissionalização, devendo, sempre que possível, ser utilizados
os recursos existentes na comunidade. ”. (BRASIL, ECA, 1990).
E tem como objetivo de ressocializar, quando exige seu retorno em horário
estabelecido para a unidade educacional, e educativo ao adolescente no convívio
familiar e social, oportunizando seu direito de locomoção.
Esta medida não compreende prazo pré-determinado, sua aplicação deve ser
subsidiária as disposições da medida de internação, assim diz o §2º do artigo 120 do
Estatuto: “A medida não comporta prazo determinado, aplicando-se, no que couber,
as disposições relativas à internação” (BRASIL, ECA, 1990). Veremos na medida de
internação, que não poderá ultrapassar três anos, com reavaliações a cada seis
meses e liberação compulsória aos 21 anos completos.
Poderá ser aplicada como medida inicial ou de transição da aplicação de
internação para a semiliberdade, assim como no Código de Processo Penal para
progressão de pena, todavia, este com o intuito de inclusão social, através de
atividades diárias, convívio familiar, estudo e profissionalização.

8.1.5 Da Internação

Trata-se de uma medida excepcional e a mais severa das medidas anteriores,


é destinada ao adolescente autor de ato infracional mediante violência ou grave
ameaça, quando este estará totalmente privado da sua liberdade.
Assim dispõe a medida:

Art. 121 – A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos


princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de
pessoa em desenvolvimento.
40

§ 1º - Será permitida a realização de atividades externas, a critério da


equipe técnica da entidade, salvo expressa determinação judicial em
contrário.
§ 2º - A medida não comporta prazo determinado, devendo sua manutenção
ser reavaliada, mediante decisão fundamentada, no máximo a cada seis
meses.
§ 3º - Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a
três anos.
§ 4º - Atingido o limite estabelecido no parágrafo anterior, o adolescente
deverá ser liberado, colocado em regime de semiliberdade ou de liberdade
assistida.
§ 5º - A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade.
§ 6º - Em qualquer hipótese a desinternação será precedida de autorização
judicial, ouvido o Ministério Público. (BRASIL, ECA, 1990).

Observa-se que o parágrafo 1º do artigo trata da possibilidade de atividades


externas, salvo quando o juiz não autorizar tal medidas aos técnicos da unidade
educacional, privando-o totalmente do convívio social por estar incompatível para a
vida em sociedade.
Destaca-se que a referida medida somente será aplicada, quando as demais
medidas restarem inócuas e, por fim está mais adequada para o caso concreto,
devendo sua duração limitar-se apenas no período necessário, observado o
princípio da condição peculiar da pessoa em desenvolvimento, respeitando o
princípio da brevidade que exige a internação por um curto período.
Quanto à medida de internação Ishida (2015, p. 307): “o compromisso do
Estatuto da Criança e do Adolescente é com o resgate da cidadania, o que só é
possibilitado com a educação em sentido amplo, voltada à socialização e à formação
do caráter. ”
Diferente do Código Penal que comina pena mínima, o ECA não estabelece
um período pré-fixado para a aplicação da medida, todavia, deverá ser respeitado o
princípio da brevidade, e estabelece prazo de internação máxima de improrrogáveis
três anos, neste período o adolescente será reavaliado num prazo de máximo a
cada seis, observando se a medida será mantida, substituída ou revogada, o intuito
é a inserção o mais prevê possível ao convívio familiar e social.
Excepcionalmente o adolescente poderá cumprir a medida até completar vinte
e um anos de idade, quando sua liberdade será compulsória, devendo de imediato o
autor da infração ser inserido na sociedade conforme o artigo 121, §5º do ECA: “A
liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade. ”
Conforme o aludido artigo, a medida de internação exige que a conduta do
adolescente seja praticada com violência ou grave ameaça:
41

Art. 122. A medida de internação só poderá ser aplicada quando:


I - tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência
a pessoa;
II - por reiteração no cometimento de outras infrações graves;
III - por descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente
imposta.
§ 1º. O prazo de internação na hipótese do inciso III deste artigo não poderá
ser superior a 3 (três) meses, devendo ser decretada judicialmente após o
devido processo legal.
§ 2º.Em nenhuma hipótese será aplicada a internação, havendo outra
medida adequada. (BRASIL, ECA, 1990).
.

À respeito das entidades para internações, destaca-se os artigos 94, IX, 123 e
124, V, XI, XII do ECA:

Art. 94 – As entidades que desenvolvem programas de internação têm as


seguintes obrigações, entre outras:
IX – oferecer cuidados médicos, psicológicos, odontológicos e
farmacêuticos.
Art. 123 - A internação deverá ser cumprida em entidade exclusiva para
adolescentes, em local distinto daquele destinado ao abrigo, obedecida
rigorosa separação por critérios de idade, compleição física e gravidade da
infração.
Parágrafo único: Durante o período de internação, inclusive provisória,
serão obrigatórias atividades pedagógicas.
Art. 124 – São direitos do adolescente privado de liberdade, entre outros, os
seguintes:
V – ser tratado com respeito e dignidade;
XI – receber escolarização e profissionalização;
XII – realizar atividades culturais, esportivas e de lazer. (BRASIL, ECA,
1990)

Analisou-se que a medida socioeducativa de internação pode ser comparada


com o tipo de regime fechado previsto do Código Penal, entretanto, o tempo de pena
cominada não será o mesmo para o crime tipificado. Esta medida ao mesmo tempo
tem caráter ressocializador e integrador, com característica punitiva privando o
adolescente totalmente de sua liberdade, é também a medida que demonstra mais
segurança para a sociedade, como por exemplo, o adolescente Champinha
enquanto esteve internado na unidade, trouxe para a sociedade a sensação de
proteção e punidade, já que o autor da infração foi retirado do âmbito social por sua
conduta violenta. O objetivo desta medida é educar o jovem e prepara-lo para o
convívio social através de programas e atividades pedagógicas/psicológicas,
devendo estas, serem efetivas para a garantia de resultado e comprometimento de
desenvolvimento do jovem que está em condição peculiar.
42

9 ANALOGIA AO CRIME DE ESTUPRO

Sabe-se que a conduta da criança e do adolescente descrita como crime ou


contravenção configura-se como ato infracional, são regidos sob a égide do Estatuto
da Criança e do Adolescente, as condutas ilícitas estão previstas aos imputáveis no
Código Penal Brasileiro com penas cominadas para cada fato típico. Com base no
tema do presente trabalho, ao adolescente autor de ato infracional de estupro, estão
sujeitos às regras e medidas socioeducativas em legislação especial, existirá apenas
uma semelhança ao crime previsto no Código Penal, vez que esta conduta não está
regulamentada em lei.

9.1 Analogia Jurídica

É a aplicação de uma lei prevista no ordenamento jurídico, em um caso


concreto semelhante, não previsto em lei. Considera um método de interpretação
jurídica, usado perante ausência de previsão especifica em lei, quando aplica-se
uma disposição legal que regula casos idênticos, semelhantes, ao da controvérsia.
O aludido conceito tem previsão legal no Artigo 4º da Lei 4657/42, Lei de
Introdução às normas do Direito Brasileiro: “Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o
caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito. ”
(BRASIL, LICC, 1942).
Entende-se então, que a analogia serve para preencher uma lacuna, o
Estatuto não dispõe de fatos típicos para as medidas socioeducativas a serem
aplicadas ao caso concreto, portanto, utiliza-se a conduta prevista no Código Penal
Brasileiro de forma subsidiária para aplicar a melhor medida ao adolescente,
levando em conta a gravidade da conduta, o crime de estupro previsto no artigo 213
do CP, é conduta típica e antijurídica praticada com violência e grave ameaça,
dentre as medidas socioeducativas elencadas no ECA, a melhor medida à ser
aplicada será a medida de internação imposta ao adolescente.
43

10 DO CRIME DE ESTUPRO

O Título IV – Capítulo I do Código Penal, antes denominado como “Crimes


contra os costumes”, previsto no artigo 213, o crime de estupro trazia a seguinte
redação: “Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave
ameaça. ” (grifo nosso) (BRASIL, CP, 1940). Percebe-se que o bem jurídico tratava
apenas da liberdade sexual da mulher como único sujeito passivo e sujeito ativo o
homem.
Esclarece Nelson Húngria: Fixado o sentido restrito da expressão legal
“conjunção carnal”, é óbvio que, em matéria de estupro, somente o homem pode ser
executor, do mesmo modo que só a mulher pode ser paciente. ” (HÚNGRIA, 1981,
p. 113).
Oportuna a manifestação de Rogério Greco:

A lei tutela o direito de liberdade que a mulher tem de dispor sobre o próprio
corpo no que diz respeito aos atos sexuais. O estupro, atingindo a liberdade
sexual, agride, simultaneamente, a dignidade da mulher, que se vê
humilhada com o ato sexual. (GRECO, 2007, p.467).

O Código Penal previa no artigo 214 o crime de atentado violento ao pudor,


não importando se sexo feminino ou masculino, cuja finalidade é diversa da
conjunção carnal, praticado através de ato libidinoso, conforme o caput do artigo:
“Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir
que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal. ” (BRASIL, CP,
1940), para este crime, como exemplo temos o sujeito passivo homem e sujeito ativo
homem, o artigo aplicado não seria o 213 de estupro, mas sim, o de atentado
violento ao pudor.
Neste caso, o Título VI foi modificado com o advento da Lei 12.015/2009 para
“Dos Crimes Contra a Dignidade Sexual”, alterando o tipo penal do artigo 213 e
fazendo uma junção do crime de atentado violento ao pudor revogando o artigo 214.
De tal modo, o crime de estupro, está previsto no Capítulo I, Dos Crimes
Contra a Liberdade Sexual no artigo 213, que passou a conceituar:

Art. 213 Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter


conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato
libidinoso:
44

Pena – reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.


§ 1º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é
menor de 18 (dezoito) anos ou maior de 14 (catorze) anos:
Pena – reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos.
§ 2º Se da conduta resulta morte:
Pena – reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos. (BRASIL, CP, 1940).

Damásio de Jesus explica que: “tal dispositivo protege a liberdade sexual das
pessoas, o seu direito de dispor do próprio corpo, a sua liberdade de escolha na
prática da conjunção carnal ou outro ato libidinoso.” (JESUS, 2010, p. 127), observa-
se que a conduta do artigo 214 continua sendo punida, todavia, agora classificada
como estupro e não mais atentado violento ao pudor, nem tampouco a extinção da
punibilidade, as penas previstas continuam as mesmas de seis a dez anos de
reclusão.
A alteração significativa deu-se na substituição da palavra mulher por alguém,
que permite sujeito passivo qualquer pessoa ser vítima de um crime sexual, o
homem também passa a ser sujeito passivo do delito, antes o homem era o único
réu para o crime de estupro, hoje a mulher também poderá configurar como sujeito
ativo nesta pratica.
Sobre o sujeito ativo e passivo da conduta Bitencourt: “[...] a mulher; a partir
de agora, também pode ser autora do crime de estupro” (BITENCOURT, 2012, p.
94/97), continua: “o crime de estupro pode ocorrer em relação hetero ou
homossexual. ” (BITENCOURT, 2012, p. 97).
O bem jurídico tutelado é a liberdade sexual da pessoa, quando se retira do
homem ou da mulher o direito de não praticar o ato sexual.
Segundo André Estefam: “O legislador, por meio da incriminação contida no
art. 213 do CP, visa à salvaguarda da dignidade das pessoas protegendo sua
liberdade de autodeterminação em matéria sexual. ” (ESTEFAM, 2018, p. 636).
Antes do advento da Lei 12.015/2009 somente o homem figurava o polo ativo
da conduta, vez que o estupro era configurado com a penetração do pênis na
cavidade vaginal.
Com a introdução da referida Lei, explica André Estefam:

Qualquer pessoa pode ser sujeito passivo do estupro, desde a mudança


introduzida pela Lei nº 12.015/2009. É possível, destarte, que se cometa
estupro entre dois homens, entre duas mulheres, o entre pessoas (autor e
vítima) de sexos opostos. (ESTEFAM, 2018. p.645).
45

Assim, o estupro pode ser praticado por qualquer pessoa homem ou mulher,
o homem quando violentado por meio de ato libidinoso também é vítima do crime
tipificado no artigo 213 do Código Penal, não mais no artigo 214 revogado, de
atentado violento ao pudor.
O núcleo do tipo do crime de estupro é o verbo constranger, pune-se a
pessoa que obriga outra fazer algo contra o seu desejo e vontade.
Neste sentido, não se faz necessária que a força empregada seja irresistível,
bastando para consumação do delito a simples coação. Sendo que a grave ameaça
constitui forma típica de violência moral, que exerce uma força intimidativa, inibitória,
anulando ou minando a vontade e o querer do ofendido.
André Estefam, descreve a melhor definição dos verbos presentes no artigo:

O constrangimento deve ser dirigido a obrigar alguém a praticar ou permitir


que com este se pratique algum ato libidinoso. As elementares “praticar” e
“permitir que com este se pratique” não se confundem com o núcleo da
disposição. Não se trata de verbos nucleares, mas de comportamentos
(ativos ou passivos) aos quais a vítima é sujeita manu militari pelo agente
(este constrange e aquela pratica ou permite a prática...). (ESTEFAM, 2018,
p. 639).

O crime consuma-se com a penetração do pênis na cavidade vaginal, mesmo


que de maneira incompleta, consuma-se também quando o agente pretende
satisfazer a sua lascívia, seja na parte externa da vagina ou outro membro do corpo,
o elementar ato libidinoso haverá a consumação do delito.
Explica André Estefam que: “Quando consiste na introdução do órgão viril na
vagina da mulher, não é necessário que se dê a total penetração do membro. ”
(ESTEFAM, 2018, p. 645).
Acerca do crime de estupro, admite-se a tentativa, quando na execução por
razões alheias à sua vontade, é impedido de consumar o delito.
Segundo manifesta Nelson Húngria:

Assim, deve responder por estupro tentado o indivíduo que, depois de


empolgar a vítima, joga-a ao chão ou para cima do leito, levantando-lhe as
vestes, arrancando ou rasgando-lhe as calças, e retira o membro em
ereção, procurando aproximá-lo do pudendum da vítima, mas vindo a ser
impedido de prosseguir por circunstâncias independentes de sua vontade.
(grifos do autor) (HÚNGRIA, 1981, p. 116).
46

No mesmo tocante André Estefam: É admissível, posto que alguém pode dar
início à execução do crime e ver frustrada sua intenção por fins alheios à sua
vontade. (ESTEFAM, 2018, p 645).
Portanto, ocorrerá a tentativa quando na execução, por razões alheias à sua
vontade, é impedido de consumar a sua finalidade de violar a liberdade sexual da
pessoa, seja através da conjunção ou ato libidinoso, estará configurado estupro na
forma tentada. O descrito no artigo 213, estabelece que a conduta será punida
quando houver o constrangimento através de violência ou grave ameaça, em manter
com a vítima a conjunção carnal ou permitir ou que com ele se pratique ato
libidinoso.
Estefam define a objetividade: “Os meios executórios previstos na disposição
legal são a violência física e a grave ameaça. ” (ESTEFAM, 2018, p. 639). Entende-
se que o termo violência significa a força física, vencendo a resistência da vítima.
Bitencourt ensina que:

“Mediante grave ameaça” constitui forma típica da “violência moral”; é a vis


compulsiva, que exerce força intimidativa, inibitória, anulando ou minando a
vontade e o querer do ofendido, procurando, assim, inviabilizar eventual
resistência da vítima” (BITENCOURT, 2012, p. 233).

Neste sentido, a Lei nº 12.015/2009 também trouxe mudanças significativas


no Codigo Penal, pincipalmente originando o artigo 217-A, que representa o tipo
penal autônomo, denominado estupro de vulnerável. Agora não há que se falar mais
em violência presumida do art. 224, revogado pela aludida lei, logo, na incidência da
causa de aumento de pena do art. 9º da Lei nº 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos).

Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor
de 14 (catorze) anos:
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.
§ 1º Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com
alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário
discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não
pode oferecer resistência.
§ 3º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave:
Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos.
§ 4º Se da conduta resulta morte:
Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.
§ 5º As penas previstas no caput e nos §§ 1º, 3º e 4º deste artigo aplicam-
se independentemente do consentimento da vítima ou do fato de ela ter
mantido relações sexuais anteriormente ao crime.
47

Observa-se que o caput do artigo 217-A, tem como objetivo a proteção das
crianças e adolescentes até 14 anos de idade. O parágrafo § 1º protege as pessoas
em situação de vulnerabilidade tanto psicológica quanto em razão de alguma droga
ou vulnerabilidade, esta não presumida, devendo ser comprovada.
Vale frisar que este conceito não pode ser confundido com o de criança e
adolescente prescrito no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que prevê em
seu art. 2º: ” Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos
de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade”
(ECA, 1990). Assim, o referido dispositivo delimita a definição para os efeitos do
ECA, ou seja, não abrange o significado de vulnerável disciplinada no Código Penal.
O crime de estupro tem a sua forma qualificada se a conduta resultar lesão
corporal de natureza grave e vítima menor de 18 ou maior de 14 anos, ou se resulta
morte, para a primeira hipótese a pena será de oito a doze anos de reclusão e, na
segunda hipótese a pena será de doze a trinta anos de reclusão.
Também se aplicam causas de aumento de pena conforme os artigos 226 e
234-A do Código Penal:

Art. 226. A pena é aumentada:


I – de quarta parte, se o crime é cometido com o concurso de 2 (duas) ou
mais pessoas;
II – de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão,
cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou
por qualquer outro título tiver autoridade sobre ela;
IV – de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado:
Estupro coletivo
a) Mediante concurso de 2 (dois) ou mais agentes;
Estupro corretivo
b) Para controlar o comportamento social ou sexual da vítima.
Art. 234-A. Nos crimes previstos neste Título a pena é aumentada:
III – de metade a 2/3 (dois terços), se do crime resulta gravidez;
IV – de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o agente transmite à vítima
doença sexualmente transmissível de que sabe ou deveria saber se
portador, ou se a vítima é idosa ou pessoa com deficiência. (BRASIL, CP,
1940).

A Lei 13.718/2018 incluiu no bojo do artigo 226 do Código Penal o aumento


para a pena de estupro coletivo e estupro corretivo, com finalidade de majorar a
pena para o crime de estupro.
Assim trata a referida Lei:

Art. 1º Esta Lei tipifica os crimes de importunação sexual e de divulgação de


cena de estupro, torna pública incondicionada a natureza da ação penal dos
48

crimes contra a liberdade sexual e dos crimes sexuais contra vulnerável,


estabelece causas de aumento de pena para esses crimes e define como
causas de aumento de pena o estupro coletivo e o estupro corretivo
(BRASIL, LEI 13.718, 2018).

A pena do crime de estupro será aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois
terços), se o estupro for praticado por duas ou mais pessoas tanto na conjunção
carnal como no ato libidinoso.
Já o estupro corretivo trata de homossexuais, bissexuais ou transexuais, afim
de controlar seu comportamento, podemos citar o modo de vestir ou para que
mantenham uma relação sexual com o sexo oposto, ou seja homem e mulher.
O crime de estupro é considerado um crime hediondo, conforme a Lei
8.072/90:
Artigo 1º São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados
no Decreto Lei nº 2.848 de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal,
consumados ou tentados:
V – estupro (art. 213, caput e §§ 1º e 2º). (BRASIL, LCH, 1990).

Um Ponto relevante a ser considerado é que a ação penal é pública


condicionada à representação da vítima, e se resultar lesão corporal grave ou morte,
contudo, será pública incondicionada.
O artigo mencionado quando cometido por adolescente que é o que nos
interessa, ao adolescente autor de ato infracional, não serão impostas as penas
cominadas do Código Penal quais sejam, mínima de 6 anos e máxima de 10 anos,
bem como as formas qualificadas, nem tampouco a majoração, estarão sujeitos às
medidas socioeducativas do Estatuto da Criança e Adolescente.
Sendo o estupro uma conduta praticada com violência, grave ameaça e crime
hediondo, existe grande previsibilidade de aplicação da medida de internação ao
adolescente infrator, temos como concreto o caso Champinha, na época menor com
dezesseis anos de idade, estuprou a jovem Liana também com dezesseis anos de
idade, acompanhado de dois comparsas maiores de idade e tiveram os
procedimentos e penas cominadas totalmente diferentes, entenderemos melhor no
estudo de caso e compreenderemos as medidas aplicadas aos autores do estupro.
Através da análise do referido artigo, a conduta prevista é o constrangimento
de qualquer pessoa, mediante violência ou grave ameaça a praticar conjunção ou
ato libidinoso, observe que existem duas espécies de estupro seja pela conjunção
49

carnal ou prática de outro ato libidinoso, que serão analisados de forma apartadas a
seguir.

10.1 Da Conjunção Carnal e do Ato Libidinoso

O crime de estupro se dá através da conjunção carnal ou ato libidinoso, se faz


mister sua diferenciação.
A conjunção carnal tem conotação sexual que caracteriza com a introdução
do pênis na cópula vaginica, portanto, somente mulheres estão sujeitas à conjunção
carnal.
Para Nelson Húngria:

Por conjunção carnal, em face do Código, entende-se a conjunção sexual,


isto é, a cópula secundum naturam, o ajuntamento do órgão genital do
homem com o da mulher, a intromissão do pênis na cavidade vaginal. Não
se compreendem, portanto, na expressão legal, o coito anal e a fellatio in
ore, pois o ânus e a boca não são órgãos genitais. (HÚNGRIA, 1981, p
105/106).

Ato libidinoso é amplo para fins de estupro, deve ser de gravidade equiparada
ao estupro ou semelhante como por exemplo sexo anal, oral, introdução e
penetração do dedo ou objetos na vítima.
Entendia Nelson Húngria: “O ato libidinoso tem de ser praticado pela, com ou
sobre a vítima coagida.” (HÚNGRIA, 1981, p. 125).
Existe uma grande discussão à respeito do beijo dado de forma forçada para
satisfazer a lascívia, se este configura estupro devendo ser comidas as penas do
artigo 213 do Código Penal.
Vejamos que a jurisprudência aplica o disposto neste sentido:

PENAL E PROCESSO PENAL - APELAÇÃO CRIMINAL - ESTUPRO


TENTADO - BEIJO LASCIVO - CONFIGURAÇÃO DO DELITO. 1) Os atos
libidinosos comportam diferentes níveis de configuração, que podem
englobar toques, contatos íntimos ou mesmo beijos lascivos. Assim,
correta é a decisão monocrática que condena o réu pela prática de
tentativa de estupro quando evidenciado, pelo conjunto probatório, que o
agente tentou, fazendo uso de violência, beijar lascivamente a vítima. 2)
Apelo não provido.
(TJ-AP - APL: 00019185820128030002 AP, Relator: Juiz Conv. JOAO
GUILHERME LAGES MENDES, Data de Julgamento: 05/08/2014,
Tribunal).
50

Bem como já houve decisão que desclassificou a tentativa do crime de


estupro tendo em vista a ausência dos requisitos violência e grave ameaça:

APELAÇÃO CRIMINAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL. TENTATIVA


DE ESTUPRO. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. MATERIALIDADE E
AUTORIA COMPROVADAS. TENTATIVA DE BEIJO À FORÇA.
DESCLASSIFICAÇÃO PARA IMPORTUNAÇÃO OFENSIVA AO PUDOR.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Quando o
conjunto probatório confirma a autoria e a materialidade da conduta do
apelante - notadamente o auto de prisão em flagrante, a ocorrência policial
e a prova oral colhida durante a persecução penal, incabível a absolvição
por insuficiência de provas. 2. Se se tem que a conduta não passou de
segurar a vítima pelos braços com intuito de roubar-lhe um beijo, melhor
adequação típica se dá em relação ao tipo da contravenção penal da
importunação ofensiva ao pudor. 3. Recurso conhecido e parcialmente
provido.
(TJ-DF 20161210054372 - Segredo de Justiça 0005312-
90.2016.8.07.0012, Relator: MARIA IVATÔNIA, Data de Julgamento:
13/09/2018, 2ª TURMA CRIMINAL, Data de Publicação: Publicado no DJE
: 18/09/2018 . Pág.: 111/122).

Ao contrário do que vem sendo julgado nos tribunais, o doutrinador André


Estefan não possui o mesmo entendimento: “Afigura-se arrematado exagero, em
nosso sentir, considerar que o ato de tomar à força um beijo na boca de outrem
possa ser considerado crime hediondo, punido com reclusão, de 6 a 10 anos. ”
(ESTEFAM, 2018, p. 640).
Por fim, em tratando-se de estupro por conjunção carnal e ato libidinoso em
um único momento, estamos diante de um crime alternativo e único, o agente
responderá de uma única vez (ESTEFAM, 2018. p. 615).

11 ESTUDO DE CASO CHAMPINHA

No dia 31 de outubro de 2003 o casal de namorados Liana Friedenbach de


dezesseis e Felipe Silva Caffé de dezesseis anos, resolveram acampar em um sítio
abandonado localizado a 25km de Embu-Guaçu, sem aviso prévio aos pais de que
estariam juntos naquela viagem.
51

A família só percebeu o desaparecimento quando a jovem não retornou para


casa no domingo do dia 08 de novembro de 2003, vez que, para os pais disse que
iria viajar com jovens da comunidade Israelita.1
Após buscas incessantes, no dia 10 de novembro do mesmo ano, foram
encontrados os corpos do casal de adolescentes. Felipe Silva Caffé foi encontrado a
4 km do local que estavam acampados com um tiro na nuca, já Liane Friedenbach
foi encontrada com diversos golpes de facada.2
Após investigações a polícia chegou até o menor Roberto Aparecido Alves
Cardos, vulgo Champinha, em depoimento, disse que no dia 01 de novembro, ele e
Paulo César da Silva Alves, vulgo Pernambuco, saíram para pescar na região, foi
então que avistaram o casal e decidiram assaltar os estudantes. Ao efetuar a
abordagem, não encontram dinheiro nem objetos de valores, foi então que decidiram
sequestrar Liane e Felipe para a casa de um amigo na mesma região Antônio
Caetano Silva.
À noite quando estavam reunidos no cativeiro Pernambuco estuprou Liana,
enquanto o namorado permaneceu em outro quarto, neste mesmo dia Champinha
que mataria Felipe.
Champinha e Pernambuco seguiram pela mata com o casal, em determinado
momento Pernambuco seguiu por uma trilha com Felipe enquanto Liana
permaneceu com Champinha na mata. Felipe foi assassinado com um tiro na nuca,
ao retornar para a mata Liana perguntou pelo namorado e Pernambuco respondeu
que havia liberado o adolescente. Pernambuco não retornou com Champinha e
Liana para o cativeiro, resolveu fugir após matar Felipe.
Champinha permaneceu com Liana com no cativeiro até que o dono da casa
Antônio Caetano Silva amigo de Champinha chegou acompanhado do amigo
Agnaldo Pires, neste momento Liane é apresentada como namorada e oferecida a
Antônio que a estuprou.
Champinha, Antônio e Agnaldo resolveram levar Liane para outro cativeiro,
seria a casa de outro amigo Antonio Matias de Barros, onde foi novamente
estuprada pelo grupo.

1
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff0611200314.htm
2
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1111200301.htm
52

Neste mesmo dia, o irmão de Champinha saiu a sua procura pois sua mãe
estava preocupada, e que havia muitos policiais na região, Liane foi novamente
apresentada como sua namorada.
Tendo em vista a presença de policiais na redondeza, Champinha decide
assassinar Liane com 15 golpes de facadas.3
Percebe-se que o adolescente sempre esteve à frente de todas as decisões
do grupo, em depoimento confessa que também estuprou Liana e a matou porque
sentiu vontade.
Concluído o inquérito, ao menor Champinha foi aplicada a medida
socioeducativa de internação na Fundação Casa, Aguinaldo Pires foi sentenciado a
47 anos e três meses de reclusão por estupro, Antônio Caetano da Silva
sentenciado a 124 anos de prisão por vários estupros, Antônio Matias sentenciado a
seis anos de reclusão e um ano, nove meses e 15 dias de detenção por cárcere
privado, favorecimento pessoal e ocultamento da arma do crime, por último Paulo
César da Silva Marques vulgo Permambuco, foi condenado a 110 anos e 18 dias de
prisão em regime fechado pelo homicídio qualificado de Felipe, sequestro, estupro e
cárcere privado.
Champinha cumpriu o prazo determinado de três anos no estabelecimento
educacional, após este período, conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente, o
adolescente deveria ser posto em liberdade, porém, através de um laudo psicológico
que legou uma condição psicológica irreversível, o Estado interditou civilmente o
adolescente, onde permaneceu por mais um período na unidade educacional,
contrariando as regras da legislação especial.
Hoje, ele tem 34 anos e vive com outros quatro internos na unidade
experimental de saúde localizada no bairro de Vila Maria. Ele é mantido sob custódia
do estado desde quando completou 21 anos e teve que deixar a Fundação Casa,
onde ficou internado após confessar a autoria do crime ocorrido em 2003. A Unidade
Experimental de Saúde, que já foi vinculada à Fundação Casa, hoje é administrada
pela Secretaria Estadual da Saúde. O local é uma espécie de hospital psiquiátrico e
a segurança é realizada por agentes da Secretaria da Administração Penitenciária
(SAP).4

3
https://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u134910.shtml
4
https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2019/09/04/champinha-lidera-rebeliao-com-refem-na-unidade-
experimental-de-saude-na-zona-norte-de-sp.ghtml
53

O objetivo do caso Champinha, é trazer o caso concreto da medida aplicada


ao adolescente e ao adulto para o cometimento do mesmo ato tipificado em lei, cujo
foi tema discutido no presente trabalho. Embora o adolescente tenha agido como o
“cabeça” do grupo, tomando todas as decisões quanto ao destino de Liana e Felipe,
seu comportamento e conduta foi a mais gravosa dos demais, toda via,
independentemente de ainda estar privado de sua liberdade, encontra-se em local
totalmente diverso dos demais, que ainda respondem em sistema penitenciário pelo
crime ocorrido em 2003.
Sobre a atual situação de Champinha não cabe no momento a discussão se o
tratamento é o adequado ou se contraria todas as normas estabelecidas no Estatuto,
nem tampouco, questionar o Estado sobre o que fazer com essa situação, seria
necessário um aprofundamento maior sobre o tema, vez que o objetivo é o ato
infracional análogo ao crime de estupro quando cometido por adolescente, buscando
compreender as medidas socioeducativas aplicadas aos infratores com idade entre
doze a dezoito anos de idade.
54

12 CONCLUSÃO

O presente trabalho compreendeu como estudo principal, a análise do ato


infracional análogo ao crime de estupro quando praticado por adolescente, visando,
demonstrar o motivo pelo qual os adolescentes são tratados de maneira diferenciada
a contar da apuração do fato até aplicação das medidas socioeducativas.
Corroboro com o entendimento de que estes encontram-se em plena fase de
desenvolvimento intelectual, estando a sua mente em um estado de formação,
entretanto, os adolescentes da contemporaneidade compreendem a extensão da
ilicitude das suas condutas, estando munidos de conhecimentos e informações,
providos com acesso à recursos que antigamente não existiam.
O Estatuo da Criança e do Adolescente foi promulgado em 1990, a todo
tempo a sociedade evolui e as lei precisam acompanhar esta evolução. Ao estuprar
homem ou mulher tem consciência que aquele ato é ilícito e reprovável, mesmo
assim, mediante violência e grave ameaça retiram a liberdade sexual de quem está
sendo violentado.
No que concerne às medidas socioeducativas aplicáveis à indivíduos com
idade entre doze a dezoito anos, defendo a tese de que são brandas, especialmente
quando comparadas as aplicáveis aos crimes hediondos, devendo o Estado atentar-
se para que referidas medidas socioeducativas cumpram o seu objetivo de fazer
com que o adolescente reflita antes de cometer um estupro ou qualquer outro crime.
Os adolescentes por muitas vezes não se preocupam com os seus atos,
sabendo que no máximo ficarão internados num prazo de três anos e, com
possibilidade de ser posto em sociedade antes deste período, o que torna o índice
de atos infracionais cada vez mais alarmantes.
De outro modo, não há de falar em colocar o adolescente na mesma cela de
um adulto, na qual estão reunidas pessoas que praticaram diversos tipos de crimes
e, que certamente propagaria um desenvolvimento ruim aos adolescentes, com
grandes chances de quando posto em liberdade, ter desenvolvido um pensamento e
comportamento voltado para o crime, vez que não acredito na efetividade do sistema
carcerário.
55

Por estarem em um estado de desenvolvimento mental e psicológico, podem


ser recuperados através de um programa efetivo desenvolvido para coibir a
reincidência e promover a ressocialização.
A sociedade clama por providências por parte do Estado para que as medidas
aplicadas aos adolescentes sejam endurecidas. Através da pesquisa proposta pude
concluir que as medidas socioeducativas para o cometimento de crimes hediondos
realmente são brandas, devendo o adolescente ser repreendido por seus atos,
quando este comete o ato infracional de estupro, tem a ciência da gravidade de sua
conduta, mas a faz para satisfazer o seu prazer, como se o corpo da outra pessoa
fosse seu objeto de uso pessoal podendo usá-la da maneira como quiser.
O presente estudo demostrou também ser um dever Estatal a proteção e
garantia dos direitos, compreende-se também a medida preventiva deveria ser
proposta com a finalidade de evitar a criminalidade entre os adolescentes, como por
exemplo, para crime hediondos a regra seria o cumprimento da medida
socioeducativa de internação, sem possibilidade de aplicação de qualquer outra
medida e com a mesma pena prevista no Código Penal, todavia, em ambiente
adequado para a sua ressocialização e finalmente reinseridos à sociedade.
56

REFERÊNCIAS

BANDEIRA, MARCOS. Atos Infracionais e Medidas Socioeducativas: Uma leitura


dogmática, crítica e constitucional. 1ª ed. Ilhéus: UESC, 2006.

BITENCOURT, Cesar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte especial 4 – dos


crimes contra a diginidade sexual até os crimes contra a fé pública. 06ª ed. São
Paulo: Saraiva, 2012.

BITENCOURT, Cesar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral. 11ª ed. São
Paulo: Saraiva, 2007.

BRASIL. [Constituição (1988)] Constituição da República Federativa do Brasil de


1988. Brasília, DF: Presidência da República, [2019]. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 10
mar. 2020.

BRASIL. [CP (1940)] Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Institui o


Código Penal. Rio de Janeiro: Presidência da República, [1940]. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm. Acesso em:
09 mar. 2020.

BRASIL. [CH (1990)] Lei no 8.072, de 10 de julho de 1990. Dispõe sobre os crimes
hediondos, nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, e determina
outras providências. Brasília, DF: Presidência da República, [1990]. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8072.htm. Acesso em: 24 ago. 2020.

BRASIL. [ECA (1990)] Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o


Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Brasília, DF:
Presidência da República, [1990]. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 24 mar. 2020.

BRASIL. Lei nº 13.718/2018, Presidente do Supremo Tribunal Federal, Decreto-Lei


nº 13.718, de 24 de setembro de [2018]. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/L13718.htm. Acesso em:
20 set. 2020.

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