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NILZA FONSECA PINTO 4º ANO DE DIREITO SEGUNDO SEMESTRE. DIP. DOCENTE, Dr. HERMES. ANO LETIVO 2020/2021.

UNIVERSIDADE DO MINDELO.
Por fonte de direito entende-se as “causas de ordem social determinantes da
necessidade da norma (fontes materiais, fontes criadoras, fontes reais ou
profundas), ou de modos de processos de formulação, exteriorização ou
afirmação das normas na vida social (fontes formais).

As fontes materiais, são as fontes criadoras que a doutrina considera a


verdadeira fonte de direito.

As fontes formais, que, do ponto de vista técnico-jurídico, são as mais


importantes, não criam o direito, limitando-se a exteriorizar as normas.

Classificação das fontes do direito internacional:

Estudo do artigo 38º do estatuto do tribunal internacional de justiça – para


se saber quais são as fontes de direito internacional terá, antes de mais, de
averiguar se a ordem jurídica internacional estabelece ou não o elenco das
fontes. Vários textos de direito internacional enumeram as diversas fontes
Direito 4º Ano do direito, e precisamente porque é generalizada a aceitação desses textos,
estes podem servir de base à elaboração do elenco das fontes. De entre esses
textos encontramos o Estatuto do Tribunal Internacional de justiça no seu
artigo 38º. Assim, e nos termos do citado artigo 38º que reproduz o que o
Estatuto do tribunal permanente de justiça internacional, consagra nesta
matéria as fontes do direito internacional: as convenções ou tratados; o
costume; os princípios gerais de direito; a jurisprudência e a doutrina e a
equidade.
Este Documento Pertence ao Estudante: No artigo 38º do ETIJ avança uma ordem ou sequência lógica de
consideração das diferentes fontes de direito por parte dos juízes chamados
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a resolver um conflito internacional. A primeira coisa que um juiz faz,
quando confrontando com uma determinada disputa internacional, é
procurar uma norma escrita, num tratado internacional. Se não for esse o
caso, o mesmo deve procurar uma norma não escrita, a partir da
consideração do direito consuetudinário, fonte de grande relevo na ordem
jurídica internacional.
FONTES DO DIREITO
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Se depois disso continuar sem uma solução adequada, compete-lhe indagar Os princípios permitem a construção de normas para o caso concreto e a
dos princípios de direito internacional, para procurar construir, a partir integração das lacunas do ordenamento jurídico internacional. Subjacente à
dessa base, uma retórica argumentativa que lhe permita extrair e justificar compreensão dos princípios gerais do direito está uma distinção, operada
uma regra para o caso sub Júdice. Em todo este procedimento, o juiz deve pela doutrina, entre valores, princípios e regras, de acordo com o respectivo
apoiar-se nas fontes auxiliares de direito internacional, a saber, a nível de generalidade. Os valores traduzem opções axiológicas éticas
jurisprudência e a doutrina internacional. Fica sempre aberta a possibilidade fundamentais dotadas de um elevadíssimo grau de abstracção.
de decisões ex aequo et bono, se as partes no litígio consentirem nesse Nomeadamente, com os valores da dignidade humana, da liberdade, da
sentido. Faz-se notar que esta enumeração não é taxativa pois pode haver, e democracia, da justiça, da paz, da segurança, da estabilidade, etc.
há, outras fontes formais de natureza diversa das enumeradas no artigo 38º Os princípios surgem como normas optimizáveis, dotadas de um elevado
do ETIJ. grau de generalidade e abstracção, compatível com diferentes graus e
formas de concretização, as regras são suficientemente densas e concretas
Assim, por exemplo, os actos unilaterais que, abrangem o protesto, a para permitirem a sua aplicação em termos de ou tudo ou nada. Os
notificação, o reconhecimento, as resoluções das organizações princípios e as regras podem ter como fundamento material certos valores
internacionais. Por outro lado, não estabelece uma hierarquia das fontes, (justiça, paz, liberdade, soberania). Isto é, desses valores podem deduzir-se
limitando-se a enumerar exemplificadamente as fontes. O artigo 38º do princípios dotados um grau razoavelmente elevado de generalidade e
ETIJ, para além de não resolver o problema da hierarquia das fontes abstracção (equidade, segurança, justiça e protecção da confiança,
encontra-se, hoje, de certo modo, desajustado da realidade internacional, imunidade soberana) e regras determinadas (direito de passagem inofensiva,
que de ponto de vista jurídico sofreu uma forte evolução. Na verdade, a legitimidade processual activa das organizações). Há casos em que os
referência aos princípios gerais do direito reconhecidos pelas noções princípios são deduzidos a partir de princípios gerais do direito interno (boa
civilizadas. fé, proporcionalidade). Por vezes os princípios gerais do direito podem ter
Natureza do costume – de acordo com a doutrina jusnaturalista o costume uma natureza processual (caso julgado, admissibilidade de medidas
internacional forma-se independentemente do consentimento dos sujeitos do cautelares).
direito internacional. A sua origem é inconsciente e involuntária e o seu Natureza jurídica – Para a tese jusnaturalista, os princípios constituem
valor deriva não do facto de ter havido intenção de o criar, mas da expressão do direito natural. Segundo o professor Jonatas Machado,
convicção da sua obrigatoriedade. Para outra corrente doutrinária – a afigura-se inegável que pela via dos princípios gerais do direito é
voluntarista e positivista – o costume tem na sua base um acordo tácito incorporado no direito internacional contemporâneo um amplo lastro de
entre os sujeitos do direito internacional – maxime, os estados -, pelo que princípios sedimentados no quadro da milenar de direito natural. Hoje é
em nada difere dos tratados ou, melhor, só é diferente deste sob o ponto de opinião generalizada que tais princípios são princípios do Direito Positivo e
vista formal – por não ser escrito. fazem parte da ordem jurídica positiva. Assim sendo, nos princípios gerais
Princípios gerais do direito internacional – artigo 38º, número 1, alínea do direito incluem-se todos os princípios comuns à ordem jurídica interna e
c) do ETIJ: Caracterização – internacional. Por outro lado, tanto podem ser princípios gerais do direito
privado, como princípios gerais do direito público. Devem considerar-se
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ainda princípios gerais de direito certos princípios inerentes à própria relaciona-se com a obrigatoriedade, permissividade ou inadmissibilidade de
estrutura da sociedade internacional e que formam como que uma uma conduta, sendo que em todos os casos se exige uma convicção
constituição da mesma sociedade. juridicamente relevante. Fundamento da obrigatoriedade, em que só se
pode considerar existente um costume internacional, e este só pode ser
Costume internacional é uma norma não escrita. Portanto, o costume juridicamente relevante quando os sujeitos do direito internacional estejam
internacional é uma forma de proceder uniforme e constante (uso) adoptado convencidos da sua obrigatoriedade. Sem esse consentimento não será do
pelos membros da sociedade internacional nas suas relações mútuas, com a que uma mera praxe internacional, ou conjunto de actos de cortesia. Assim,
convicção de que é conforme a uma norma jurídica, isto é corresponde ao o costume só se torna obrigatório quando é continuo e geral, e quando há
cumprimento de uma obrigação ou ao exercício de uma faculdade jurídica. convicção da sua obrigatoriedade.
Por outras palavras, o costume aparece-nos naquela disposição legal como
uma prática reiterada aceite como conforme ao direito, assim disposto Funções dos princípios de direito internacional:
no número 1, aliena b) do artigo 38º do Estatuto do Tribunal Internacional a) Cabe-lhes exprimir e densificar normativamente a ordem de valores
de Justiça. jurídico-internacional. Desse modo os mesmos enquadram e estruturam,
substantiva e procedi mentalmente, a interacção entre os vários sujeitos
Elemento Fáctico – é a existência de uma prática constante e uniforme. de direito internacional, mesmo quando a mesma não se concretiza na
Este elemento tanto pode consistir na prática de actos ou na abstenção ou adopção de certos normativos;
omissão dessa prática. Em qualquer dos casos, contudo, tal prática terá de b) Compete-lhes assegurar a coesão do direito internacional, ou seja, a sua
consistir numa série uniforme de comportamentos imutáveis aos estados ou coerência axiológica e normativa;
outros sujeitos activos do direito internacional. Terá ainda de ser constituído c) Alguma doutrina sublinha igualmente o relevo dos princípios na
por comportamentos reiterados, ou contínuos e generalizados. Deverá classificação daquilo que seja o núcleo essencial do jus cogens; Aos
portanto, traduzir-se numa prática cuja aplicação no tempo seja contínua e mesmos cabe igualmente o estabelecimento dos limites do diálogo
constantemente aceite pelos estados que se encontram na situação de o ter interpretativo jurídico-internacional; Os princípios asseguram a unidade
de aplicar. Presentemente tende a aceitar-se que não é necessária uma substancial entre o direito interno e o direito internacional.
grande duração, e muito menos uma duração imemorial, para que se possa
falar num costume jurídico, internacionalmente relevante. JURISPRUDÊNCIA INTERNACIONAL – artigo 38º, número 1, alínea
d) do ETIJ - A jurisprudência são as decisões dos tribunais ou, melhor, o
Elemento psicológico – é a convicção juridicamente relevante sobre a conjunto das decisões jurisdicionais ou arbitrais, quer nacionais quer
obrigatoriedade dessa prática, portanto permissividade ou a jurisdição de internacionais. O alcance da jurisprudência internacional há-de encontrar-se
uma certa conduta. É com base na falta do elemento psicológico que se por referência aos princípios tipos de decisões das instâncias internacionais.
distingue do costume o mero uso ou a cortesia. Em torno do elemento Merecem particular relevo, neste contexto, as decisões do TIJ. As mesmas
psicológico do costume, a doutrina contemporânea alerta para a necessidade têm força de caso julgado, estando os seus efeitos circunscritos ao caso
de algum cuidado. Pois, este elemento psicológico cria dificuldade sob o concreto. A doutrina tende a reconhecer-lhes uma força tendencial de
ponto de vista da apreciação da sua existência, dado que é grande a latitude precedente, ainda que distinta da tradição de anglo-saxónico do common
que os juízes têm para apreciar a sua existência. O elemento psicológico
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law, embora a sua maior utilidade se prenda com a densificação e de vontade dos sujeitos do Direito Internacional, que se destina a produzir
concretização dos princípios e das normas institucionais. entre as partes efeitos de direito, e ainda que o Tratado é um acto jurídico
único, dado que tem uma natureza jurídica unitária, mesmo quando seja
A DOUTRINA artigo 38º, número 1, alínea d) do ETIJ - Por doutrina constituída por diversos documentos a ele anexados. Quanto à natureza, o
entende-se a posição dos autores sobre questões jurídicas, que são, em Tratado constitui uma espécie de legislação substantiva de estados. Trata-se
última análise, opiniões dos juristas sobre questões teóricas ou práticas do de um instrumento normativo de natureza jurídico-institucional atenta no
direito. Historicamente, a doutrina exerceu uma grande influência sobre o consentimento voluntários dos Estados.
direito internacional clássico, cuja elaboração foi grandemente feita por ela.
Daí que a doutrina tenha grande importância na revelação e na própria Classificação dos tratados: Ponto de vista material:
formação do direito consuetudinário. Actualmente a doutrina perdeu a
importância histórica que tinha e o seu forte impacte na produção e na a) Tratados normativos ou Tratados leis – são aqueles que estabelecem
uma regra de direito aplicável a uma generalidade de casos. Estes
revelação das normas do direito internacional. Tratados têm assim por objecto a enunciação de uma regra de direito
objectivamente válida;
ACTOS UNILATERAIS - Por acto unilateral entende-se o acto praticado e
b) Tratados Contratos – “são acordos por meio dos quais se realiza uma
imputado a um só sujeito do direito internacional, ou vários conjuntamente, operação jurídica concreta, esgotando-se imediatamente os seus
desde que neste ultimo caso, o conteúdo do acto seja o mesmo. efeitos”. Estes Tratados são, portanto, actos jurídicos de natureza
subjectiva geradores de prestações recíprocas entre as Partes, de
TRATADOS conteúdo ou de natureza diversa. Assim, por exemplo, certos Tratados
de Comércio;
Críticas à convenção de Viena: Esta convenção, que pela sua natureza e
c) Tratados–quadro – são aqueles que estabelecem as regras gerais de
importância deveria ter uma vocação universal, acaba por se auto limitar, enquadramento de certas relações. Estes Tratados contêm normalmente
restringindo a sua própria vocação universalista – artigo 81º da CVDT. directivas materiais, abstractas e gerais, que terão de ser
Acresce por outro lado, que a Convenção não resolve certos problemas do regulamentadas, desenvolvidas e concretizadas;
direito dos Tratados. Desde logo porque tal Convenção só regula os d) Tratados Institucionais – são os que criam instituições ou organizações,
Tratados celebrados entre Estados, sob a forma escrita, ficando de fora fazendo nascer um novo sujeito do Direito Internacional e estabelecendo
todos os Tratados celebrados em “forma não escrita” e aqueles outros entre as regras de governo e organização desses sujeitos;
e) Tratados que criam situações objectivas – impõe-se objectivamente e
os Estados e Organizações e entre estas e finalmente, porque a Convenção
independentemente do consentimento dos sujeitos do Direito
atribui, na maior parte das vezes, natureza supletiva às regras gerais nelas Internacional as situações jurídicas que criam.
contidas.

Definição de tratados: Segundo a Doutrina, o Tratado deve ser definido


como um acto jurídico internacional bilateral ou plurilateral praticado
por sujeitos de direito internacional pelo qual estabelecem direitos e
obrigações recíprocas. Com esta definição, o Tratado é uma manifestação
Classificação dos tratados: Ponto de vista formal:
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a) Tratados bilaterais – aqueles em que participam apenas dois sujeitos de ordem internacional e neste caso os vícios que a convenção sanciona
Direito Internacional; com a nulidade é a coação;
b) Tratados mutilarias ou colectivos - aqueles em que participam mais de b) A anulabilidade ou nulidade relativa como direito civil visa situações
dois sujeitos de Direito Internacional. Estes podem ser gerais, isto é, menos graves mais de legalidade, regras jurídicas, protecção de
abertos à participação de qualquer Estado, ou restritos (ou fechados) interesses particulares e não de interesses gerais das partes contratantes,
que são aqueles em que só os estados partes podem neles participar. é o caso do dolo, do erro, da corrupção, do excesso de poder e das
c) Tratados solenes – são aqueles cujo processo de elaboração e de ratificações imperfeitas. Quem tem legitimidade para arguir essas
conclusão é complexo; anulabilidades não pode ser avaliados pelos juízes sobre ex ofice por
d) Acordos em forma simplificada – são as convenções cujo processo de poder de ofício, mesmo que ele absteve num processo que há esse vício,
elaboração é simples e que a partir da assinatura ficam perfeitos e aptos ele não pode tomar posição sobre esse vício sem ter alegado pelas
a entrar em vigor, não sendo, portanto, necessária a ratificação. partes. Só quando as partes invocam esse vício é que o juiz pode tomar
posição em relação sobre esse vício. E só os sujeitos que foram
directamente afectados pelos vícios é que podem invocar esse vício. Em
ÓRGÃOS COMPETENTES PARA A CONCLUSÃO DE TRATADOS- Para este relação a nulidade acontece o mesmo processo que na anulabilidade.
efeito é efectivamente o direito interno dos Estados que vai determinar Artigo 69º.
quais são os órgãos competentes para a elaboração do Tratado, e, regra
FASES DO PROCESSO DE ELABORAÇÃO DOS TRATADOS - A Fase
geral, essa tarefa cabe ao direito constitucional de cada Estado.
da Negociação: A negociação dos Tratados consiste na discussão e fixação
Normalmente tal competência pertence ao Chefe do Estado. É o órgão
do conteúdo do Tratado ou, melhor, do “conteúdo das estipulações que
constitucionalmente competente para celebrar Tratados que tem constituem o Tratado”, e pode assumir distintas formas, conforme se trate
competência para designar os plenipotenciários e para lhes conceder os de um Tratado bilateral ou multilateral. Nos Tratados bilaterais as
plenos poderes para negociarem o Tratado. Regra Geral, cabe ao Executivo negociações são conduzidas, normalmente, pelo Ministro dos Negócios
(Governo) através do Ministro de Negócio Estrangeiro essa competência – Estrangeiros de um Estado e o agente diplomático do outro, ou pelos
artigo 202º, numero 1, alíneas j) e k), 203º, numero 2, alínea d) da Ministros dos Negócios Estrangeiros dos Estados Partes, podendo ambos
constituição da República de Cabo Verde. Artigo 174º alínea h) por parte a ser assistidos por peritos e técnicos. Nos Tratados multilaterais as
Assembleia Nacional; artigo 135º, alínea a) da CRCV por parte do negociações decorrem normalmente em Congressos ou Conferencias onde
Presidente da República. cada parte se faz representar por negociadores, que formam as delegações
dos respectivos Estados. Assinatura – redigido o texto, este é assinada por
Consequências dos vícios estipulados na convenção de Viena sobre o todos os plenipotenciários. A assinatura é um procedimento formal de
direito dos tratados Assim como no direito interno temos a nulidade autenticação desse texto como aliás resulta do corpo do artigo 10º da
absoluta e a nulidade relativa (anulabilidade), também no direito CVDT. De acordo com a alínea b) do citado artigo a assinatura pode
internacional todos esses vícios não têm a mesma consequência. revestir a forma de: Rubrica – que consiste na aposição das iniciais do
representante do Estado no texto do Tratado. Assinatura ad referendum –
a) A nulidade absoluta sanciona os vícios mais graves que põem em causa
o interesse geral da comunidade internacional, neste caso, a própria que é feita pelo representante do Estado que não tem poderes. Por isso a
autenticação do texto fica sujeita a confirmação posterior que será feita
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quando lhe for concedido os necessários poderes. Assinatura propriamente não sob a forma de carta de ratificação, é claro, mas sim de Decreto
dita – é a forma normal e tradicional de autenticação do texto de um Presidencial, que reproduz o texto integral do Tratado e no qual se assume o
Tratado. Estrutura do texto do Tratado: Preambulo – neste, regra geral, são compromisso de o fazer executar internamente.
indicadas as partes contratantes e uma exposição sucinta dos motivos que
levaram à conclusão do Tratado. O corpo normativo – este é redigido sob A troca de ratificações é, regra geral, usada nos Tratados bilateral e através
forma articulada (de artigos), pode ter um ou vários anexos destinados a dela “os Ministros dos Negócios Estrangeiros dão-se conhecimento
regular a forma pormenorizada certos aspectos técnicos, e é nele que estão recíproco de que a ratificação teve lugar e a sua data”.
consagrados os direitos e as obrigações conferidos e impostas às partes e Depósito de Ratificação, que é reservado, normalmente, para os Tratados
que estes aceitam respeitar. Trata-se, portanto, do conjunto de regras multilaterais, mas não é do que a participação das ratificações ao Ministério
jurídicas que se destinam a regular as relações entre as partes. Cláusulas dos Negócios Estrangeiros, “para esse efeito previamente escolhido, ou ao
finais – são sob o ponto de vista material, textos normativos e sob o ponto secretariado de uma organização internacional, os quais se encarregam de
de vista formal, um acto. Anexos – normalmente contem disposições dar conhecimento a todos os signatários do tratado das ratificações
técnicas ou que complementam certos artigos do Tratado. efectuados”.
As Fases do processo de elaboração dos Tratados A Fase da ratificação: Efeitos de ratificação: A ratificação imperfeita é, “aquela que não
O texto do Tratado após a assinatura não é ainda obrigatório nem vinculante obedece aos trâmites definidos pelo Direito interno dos Estados
para os Estados contratantes. Após a assinatura, o texto é apenas um ratificantes”. Esta situação levanta a questão de saber quais são os efeitos
projecto de Tratado com o qual, normalmente, se concluem as de um Tratado irregularmente ratificado, o que levou a Doutrina a defender
negociações e que deve ser aceite ou recusado pelos Estados nos seus três posições deferentes: A Doutrina defendia que em virtude da primazia do
exactos termos, isto é, sem nele introduzir modificações. Torna-se assim Direito Internacional sobre o Direito Interno e por motivos de segurança e
necessário ratificá-lo para que o projecto se transforme em Tratado e este certeza nas relações internacionais, o Tratado irregularmente ratificado era
passe a ser obrigatório para o Estado ou os Estados que o aprovaram, internacionalmente válido. Com esta tese pretendiam os seus defensores
ratificando-o, tarefa que compete exclusivamente aos órgãos internos dos evitar intromissões abusivas no direito interno do Estados ou na ordem
Estados constitucionalmente competentes para o efeito. Portanto a jurídico-política destes;
Ratificação é a aprovação solene do Tratado pelo órgão Estatal
(interno) constitucionalmente competente para obrigar Advoga que o Estado ratificante incorre, no caso da ratificação ser
internacionalmente o Estado – artigos 2º, número 1, alínea b); 11º e 14º da irregular, em responsabilidade internacional e não pode invocar a seu
CVDT. favor a nulidade deste acto ilícito; É dominante e que tem sido seguida pela
prática internacional, advoga a invalidade ou a inexistência ou, mais
Forma de ratificação: A ratificação, na prática, assume a forma de carta genericamente, a nulidade de um Tratado irregularmente ratificado, com
de ratificação, sendo esta um documento destinado a troca ou depósito, fundamento em argumentos técnico-jurídicos assentes na teoria da
conforme o caso, e que é em parte reproduzido (por publicação) no Jornal competência.
Oficial do Estado ratificante – no caso de Cabo Verde, no Boletim Oficial –
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A estas três soluções, a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados assinatura do Presidente da Conferencia, é enviados aos estados para estes
vem acrescentar uma outra no seu artigo 46º. Com esta norma procura a submeterem à aprovação dos respectivos parlamentos. O acordo dos
Convenção adoptar uma posição eclética com a qual procura garantir a Estados é, deste modo, corroborado, pelos Parlamentos.
estabilidade e a certeza nas relações internacionais, ao mesmo tempo que
se esforça por evitar a interferência abusiva na ordem interna dos Estados, Outras Formas de Vinculação dos Estados pelos Tratados A adesão ou
ecletismo esse que “não deixa, porém, de suscitar críticas, a principal das acessão (artigo 15º da CVDT); Assinatura (artigo 12º da CVDT);
quais é a de que nem sempre o carácter manifesto ou notório de violação Aprovação ou aceitação (artigo 14º da CVDT).
de Direito Estadual Interno poder cabalmente comprovado deixando, Reserva - A reserva é um acto formal unilateral praticado por um Estado
portanto, aberto o caminho ao arbítrio dos Estados para se libertaresm das parte num Tratado no momento em que exprime o seu consentimento, em
obrigações que hajam assumido por via convencional”. que declara que exclui ou modifica o efeito jurídico de certas disposições do
Conclusão de Tratados no seio das Conferencias e das Organizações Tratado – artigo 2º, número 1, alínea b) e artigo 19º e seguintes da CVDT. É
Internacionais – Conferencias: Os Tratados concluídos no âmbito das uma forma unilateral de limitar os efeitos de um Tratado e nessa medida, a
Conferencias Internacionais são directamente negociados pelos Estados, reserva tem a natureza jurídica de um incidente no processo de elaboração
pelo menos na fase final das negociações, não sendo necessária a de um Tratado. A essência da reserva é a de pôr uma condição, visto que o
unanimidade de consentimento para a adopção do texto do Tratado. Basta Estado só se vincula com a condição de que certos efeitos jurídicos do
que este seja aprovado por uma maioria de dois terços do Estados presentes Tratado lhe não sejam aplicáveis quer seja por exclusão, por modificação,
e com direito a voto – número 2, do artigo 9º da CVDT –, o que tem em por interpretação ou por aplicação de uma regra.
vista evitar o bloqueamento da aprovação do Tratado. Organizações Momento em que deve ser feita a Reserva - Sobre este aspecto, podemos
internacionais: Aqui, os Tratados são totalmente preparados pela própria dizer que a reserva pode ser feita nos seguintes momentos:
organização, o que significa que o processo é institucionalizado. Não cabe,
portanto, aos Estados-Membros a direcção de tal processo. Assim por a) No da assinatura – é reserva na assinatura – que é feita no momento em
exemplo, no seio da ONU, a partir de uma resolução da Assembleia Geral que o texto do Tratado é assinado e fica a fazer parte do texto do
definidora dos princípios que devem reger o Tratado, um comité restrito Tratado é assinado e fica a fazer parte do texto do Tratado. Tem
vantagem de ser de imediato conhecida pelos Estados contratantes no
formado por representantes dos Estados membros, ou uma comissão exacto momento em que o Tratado é concluído, o que evita surpresas
técnica, formada por pessoas independentes dos Estados – especialistas – posteriores,
preparam um texto, que é o projecto do tratado, que é enviado para estudo
aos estados. Estes, por sua vez, reenviam-no com as suas críticas e b) No da ratificação – é a reserva na ratificação – esta faz-se no momento
propostas ao comité, que elabora o texto final e leva-o à Assembleia Geral do depósito dos instrumentos de ratificação. Ela aparece, assim, num
para ser votado, ficando se colher o voto de uma maioria de dois terços. momento já avançado ou tardio, tendo com efeito o de os outros Estados
contratantes não poderem, de imediato, aceitá-la ou rejeitá-la em bloco;
Outro exemplo, é o adoptado na OIT, aqui, a Assembleia Geral constitui-se
em Conferencia Geral e adopta um projecto de convenção pela maioria de
dois terços dos membros. Este projecto, depois de autenticado pela
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c) No da adesão – é a reserva na adesão – que aparece quando o Tratado já 2. Aceitação Expressa – está consagrada como regra no numero 2, do
é definitivo para todos os Estados contratantes (originariamente), o que artigo 20º, quando se impõe a aceitação expressa da reserva pelos
tem gravíssimos inconvenientes. Estados contratantes sempre que, pelo pequeno número ou pelo objecto
ou fim do Tratado, a aplicação integral deste entre todos os contratantes
Regime das Reservas - Se um conjunto dos Estados contraentes que fazem seja uma condição essencial para o consentimento de cada um. Para
parte do tratado aceitarem uma reserva, esta mesma reserva torna-se lícita, e alem desta, a aceitação deve ainda ser expressa sempre que o Tratado
portanto essa reserva aplica-se a todos os Estados; e se um conjunto de seja acto constitutivo de uma organização Internacional, salvo se no
Estados que não aceita uma reserva, há três posições doutrinais sobre essa próprio Tratado se estabelecer outra regra.
questão: Se o conjunto dos Estados não aceita a reserva, o Estado que fez a
reserva não é parte da convenção do Tratado; A reserva é válida nas Registo e publicação dos tratados: A convenção de Viena, tendo em conta
relações entre os Estados que a formula e os estados que a aceitam a nível as necessidades de maior segurança e certeza nas relações internacionais,
dos compromissos que ela determina; Para se tornar parte de um tratado veio consagrar um sistema de registo e de publicação dos tratados.
basta que um estado aceitar a reserva.
O registo- passou a ser obrigatório a todo e qualquer tratado (artigo 80º,
Objecções à reserva pelos Estados Contratantes - Quanto à objecção ou numero 1 da convenção de Viena sobre o direito dos tratados). No entanto
oposição à reserva, ela deve ser formulada por escrito e notificada aos apesar de a publicação ter tornado obrigatório, o registo dos tratados não
Estados contratantes e aos outros Estados que tenham o direito de se estipula as consequências jurídicas para a falta de registo. Quem vem fazer
tornarem parte do Tratado (artigo 23º, numero 1, da CVDT) no prazo de referência a esta situação é a carta das nações unidas que estabelece como
doze meses seguintes ao da data da recepção da notificação da reserva consequência a simples oponibilidade, ou seja, um tratado que não está
(artigo 20º, da CVDT). registado, nenhuma das partes desde tratado pode invocar disposições de
um tratado que não esteja registado perante qualquer instituição da ONU,
Condições de Validade de Reserva logo também, não pode invocar perante o Tribunal Internacional de justiça.
O artigo 80º, também diz que torna-se necessária a publicação nas colecções
a) Requisito Formal- A reserva deve ser sempre expressa, formulada por de tratados. Também os tratados tem que ser publicados nos países que
escrito e consignada num documento diplomático especial. fazem parte do tratado, como o nosso caso, que tem que ser pedidas as
imposições do direito interno que tem que ser publicados no boletim oficial.
b) Requisito Material: aceitação da Reserva pelos Estados Contratantes: E se não são publicados, em princípio, os tribunais internos não poderiam
aplicar direito internacional sem estar publicados, mas já há casos em que
1. Aceitação Tácita – desde que os outros contratantes assinassem ou houve aplicação pelos tribunais internos de tratados que não foram
ratificassem sem objecções o acto do depósito das ratificações em que publicados. Em ralação à entrada em vigor dos tratados, normalmente os
estivesse consignada a reserva, este era tacitamente aceite. tratados na parte dos anexos, vem sempre a referência da data de entrada em
vigor e em que termo. Minuciosamente, costuma ver num tratado a
disposição dessa matéria, estão escritos ao pormenor a maneira que o
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tratado entra em vigor. De qualquer maneira, tem regras supletivas na dizer, uma coisa exige outra. Quanto ao erro de vontade, a pessoa
convenção de Viena estipuladas no artigo 34º.Em relação à aplicação dos engana mesmo na sua vontade, quer uma coisa e diz que quer outra), o
tratados, tendo em conta a sua entrada em vigor, não há retroactividade dos erro está previsto no artigo 48º;
II. O vício da coação- (estipulado nos artigos 51º e 52º. A coação pode
tratados (artigo 28º).
ser física – é quando alguém obriga pela força física outra pessoa a
adoptar um determinado comportamento; ou coação moral – acontece
através das chantagens emocionais, procura o nosso ponto franco como
Condições de validade dos tratados
forma de no fazer adoptar um determinado comportamento,
As Condições de validade dos Tratado são: Capacidade das Partes; Licitude III. O vício do dolo - (o dolo é um erro provocado à uma conduta
fraudulenta de alguém que nos induz a erro). O dolo está estipulado no
do Objecto e regularidade do consentimento.
artigo 49º;.
a) Capacidades das partes – são os sujeitos de direito internacional é que IV. O vício da corrupção - (previsto no artigo 50º, abrange somente actos
podem celebrar tratados. No entanto, cabe aos estados e organizações praticados pelo corruptor. Pela sua importância têm pesado na vontade
internacionais ter a competência ou capacidades para celebrar tratados. do representante do Estado, têm de ser praticado pelo Estado que
Se um tratado for celebrado por um sujeito que não tem capacidade participa na negociação sobre o representante do outro Estado. o próprio
internacional, será um tratado inexistente. (artigo 5º - estados - e 6º - tipo de corrupção de um Estado fica claro que é sobre o representante de
organizações internacionais) um Estado.
b) Regularidade do consentimento – o consentimento de um sujeito do
direito internacional face num tratado deve ser dado livremente e sem AS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS:
nenhum vicio.
Evolução histórica:
Os Vícios que podem afectar a declaração ou o consentimento de um
estado: a doutrina costuma dividir esses vícios, em vícios formais e vícios
a) Período anterior a 1914 – a necessidade de construir uma Organização
substanciais materiais.
capaz de garantir a paz, surgem, no continente americano, a União Pan-
a) Os Vícios Formais, São vícios que são regulados pelo direito interno americana, e na Europa, as Comissões Fluviais Internacionais, criadas na
dos estados. Aqui têm as ratificações imperfeitas (são ratificações que sequência dos Tratados de Paris, de 1814, e de Viana, de 1815, que
não cumpram nas formalidades do direito constitucional interno dos tinham como objectivo garantir a livre navegação nos rios internacionais.
Estado, para que estes estado possa estar vinculado internacionalmente Ainda nessa mesma face foram criadas diversas Uniões Administrativas,
que está estipulado no artigo 46º, numero 1 e é sancionado com a
encarregadas de estabelecer a cooperação nos domínios técnicos,
nulidade), e excesso do poder do representante do Estado (é uma
situação que acontece quando o Estado restringe de forma pouco usual artísticos, científicos e de comunicações. De entre essas Uniões há
na prática internacional os poderes do seu representante, previsto no salientar a União para a Protecção das Obras Literárias e Artísticas;
artigo 47º).
b) Período entre 1919 a 1945 – os efeitos da Primeira Guerra Mundial e o
b) Os Vícios substanciais ou materiais, podem ser: profundo traumatismo causado pela morte de milhares de pessoas e pelas
I. O vício do erro - (existe erro de vontade e o erro de declaração, ou
seja, o erro de declaração – a pessoa engana a declarar a um lato, quer
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destruições vão gerar a consciência de necessidade de uma organização tratado, o que significa que não possa assumir outras formas jurídicas como,
universal mais eficaz; por exemplo, a de resolução, como aconteceu com a criação do
COMECOM, ou a de actos jurídicos unilaterais. Tal iniciativa tanto pode
c) Período posterior a 1945 – terminada a Segunda Guerra Mundial e partir de um conjunto de Estados, ou de um só Estado, como de uma
falhada a experiencia das sociedades das nações, a consciência da Organização Internacional, que podem convocar uma conferência com o
necessidade de se criar uma Organização apta a reforçar a cooperação objectivo de criar a Organização Internacional, por consenso ou por
internacional e de evitar novos conflitos armados à escala mundial, unanimidade.
através da adopção de mecanismos capazes de permitirem a resolução
pacífica dos litígios internacionais, levou à criação da Organização da Natureza jurídica do Acto Constitutivo - É corrente na doutrina dizer-se
Nações Unidas, em 26 de Junho de 1945. que o acto constitutivo é a constituição da Organização Internacional.
Contudo, tal expressão deve ser entendida somente como norma
Conceito de Organização Internacional - A Organização Internacional é fundamental hierarquicamente superior a todas as outras que a Organização
uma entidade autónoma e permanente, com personalidade e capacidade Internacional pode produzir.
jurídica internacional, constituída por associação voluntária de sujeitos do
Constituição do acto constitutivo das organizações internacionais - Este
Direito Internacional por acto jurídico internacional, dotada de regulamento
Ordenamento constitui um sistema, uma ordem particular, é constituído
interno próprio e de órgãos permanentes encarregados de prosseguir os
pelo Tratado constitutivo da Organização Internacional e pelas normas
objectivos definidos no acto constitutivo. Com esse conceito procura-se
jurídicas produzidas com base naquele tratado. No quadro desse
recobrir os diversos tipos de Organizações Internacionais precisamente
ordenamento, o tratado constitutivo tem funções equivalentes às que as
porque nele estão presentes os aspectos essenciais.
Constituições têm no direito interno dos Estados e reúne as características
próprias da super legalidade constitucional do direito interno. O direito
Quanto à natureza internacional das Organizações Internacionais,
fundamental das Organizações Internacionais está subordinado a regras
Ela reside no facto de as Organizações Internacionais serem criadas por
fundamentais do direito dos Tratados e a outras Regras do Direito
sujeitos do direito internacional e por um acto jurídico internacional que
Internacional. O tratado constitutivo não pode violar as normas do ius
assume, a maior parte das vezes, a forma convencional.
cogens, sob pena de nulidade – artigo 53º da Convenção de Viena de 1969 –
No que se refere à natureza institucional, - esta traduz-se na existência de
nem pode ser incompatível com as normas e princípios da carta da ONU,
um complexo coerente de órgãos permanentes e autónomos encarregados de
pois nesse caso prevalecerão as obrigações previstas naquela carta – artigo
prosseguir de forma continuada os interesses da Organização Internacional.
103º da carta.
Criação das organizações internacionais - As organizações internacionais Características do ordenamento jurídico das organizações internacionais:
são entidade voluntariamente criadas pelos sujeitos de direito internacional - O ordenamento jurídico das organizações internacionais, tem como
máxime os Estados, tornando assim necessário criar um acordo de vontade características principais a coerência, a homogeneidade e a unidade
entre os sujeitos, logo por regras, são constituídos e criados por um tratado interna, que lhes permitem apresentar-se como um sistema unitário de
internacional multilateral. Normalmente tal acordo assume a forma de um normas hierarquicamente estruturado, constituído pelo Tratado Constitutivo
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e por todos os actos jurídicos. Devido precisamente àquelas características unanimidade, depois de consulta à Comissão e de parecer favorável do
tal ordenamento jurídico é muito mais perfeito e coerente do que a ordem parlamento Europeu adoptado por maioria absoluta dos seus membros;
jurídica internacional geral e convencional e encontra-se dotado de noutras organizações internacionais, mais complexas os requisitos e o
processo de admissão, visto que esta tem de ser precedida de um convite
mecanismos de controlo da legalidade e da validade dos actos muito
unanimemente feito por todos os membros originários.
mais evoluídos e eficazes dos que existem no Direito Internacional; Por Portanto a admissão tanto pode decorrer de um acto unilateral do
outro lado, tal ordenamento goza de autonomia relativamente à ordem candidato, como de um convite prévio feito pelos membros originários.
jurídica internacional, o que permite às organizações Internacionais Em ambos os casos, regra geral, é pela adesão ao tratado constitutivo
regerem-se pelo seu próprio direito. Contudo, relativamente ao Direito que se dá a admissão na organização internacional.
Internacional Geral ou Convencional, tal autonomia não é absoluta, mas sim
relativa. O direito derivado das organizações internacionais
As organizações internacionais produzem as suas normas, que se revestem
Aquisição da qualidade de membro de uma organização internacional :Só de formas variadas conforme a sua natureza jurídica. Tais normas
adquire a qualidade de membro de uma organização internacional o sujeito constituem o direito derivado das Organizações Internacionais
de direito internacional que tenha originariamente participado na sua precisamente por serem actos cuja produção está prevista e regulada no
criação ou que, posteriormente à criação da organização, nela venha a ser tratado constitutivo. Contudo,
admitido. De acordo com o momento em que se inicia a participação na os actos das Organizações Internacionais assumem as seguintes formas:
organização e a forma como se adquire o estatuto de membro, estes podem
ser classificados em duas categorias: membros originários e membros a) Regulamentos, que são normas gerais e abstractas, obrigatórias para
admitidos. todos os membros da organização internacional. Na generalidade das
organizações Internacionais os regulamentos só produzem efeito no
Membros originários: são membros originários os Estados que inicialmente interior das organizações internacionais, não sendo aplicáveis
negociaram e concluíram o Tratado Constitutivo da Organização e que directamente nos territórios dos Estados membros. Trata-se de
tornaram membros com ratificação desse tratado. Tais membros, pelo facto regulamentos de execução que contêm normas de natureza técnica.
de terem criado a organização internacional, não tem direitos ou Tais regulamentos versam normalmente matérias relativas à organização
privilégios especiais, nem tal facto, regra geral, afecta o princípio da administrativa da organização internacional, ao estatuto dos
igualdade dos membros. funcionários, ao orçamento, etc.

Membros admitidos: são membros admitidos todos aqueles que entrem na b) Decisões, são actos que impõem obrigatoriamente um comportamento
organização através de um processo de admissão estabelecido no próprio aos membros da organização internacional. Com excepção da união
acto constitutivo. Normalmente, os candidatos têm de preencher todos os europeia, onde a decisão assume um carácter individual, é obrigatória
requisitos de admissão exigidos pelo acto constitutivo da organização. para o seu destinatário, que tanto pode ser um estado membro, como
Assim por exemplo: Na ONU os requisitos e o processo de admissão vêm uma pessoa singular ou colectiva.
regulados no artigo 4º, e é efectuado por decisão da Assembleia Geral
mediante recomendação do conselho de segurança; Na EU a admissão é c) Recomendações, são actos através dos quais a organização internacional
também precedida de um pedido formulado pelo Estado que pretende nela formula, solenemente, aos seus membros, a terceiros Estados ou outras
participar – um acto unilateral – cabendo ao Conselho pronunciar-se por organizações, ou um órgão seu, um convite para adoptar certo
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comportamento. As recomendações não são obrigatórias, podendo ou 1. Geral – quando tem por objecto a solução pacífica de todos os conflitos
não ser adoptadas pelos Estados ou Organizações a que se destinam. internacionais, isto é, quando se ocupam de todas as questões vitais para
Apesar de a recomendação não ter, regra geral, força vinculativa, em a sociedade internacional;
certas circunstâncias ela não deixa de ser obrigatória. 2. Especiais – são aqueles que têm uma actividade especializada, isto é, a
cooperação em assuntos especiais. Estas organizações internacionais
Saída voluntária de membros de uma organização internacional - O podem ser de natureza económica, social e humanitária, técnica,
abandono voluntário de uma organização internacional por qualquer dos científica e cultural, e por fim militar.
seus membros é um acto unilateral praticado voluntariamente pelo
Quanto à estrutura jurídica:
membro que, por qualquer razão válida, entende deixar de participar na
organização internacional. Contudo, para se saber se é ou não legítimo a 1. Inter-governamental;
qualquer membro de uma organização internacional sair desta, importa em 2. Não governamental;
primeira linha ver se o tratado constitutivo admite ou não tal prática: 3. Supra-nacional – ex: União Europeia;

Saída prevista e admitida no Tratado: se a saída voluntária for admitida no Quanto ao âmbito territorial de acção:
tratado Constitutivo, então basta respeitar as condições nele estabelecida 1. Organizações de vocação universal, quando estão abertas a todos os
para que um membro possa, sem quaisquer problemas, deixar a organização Estados. Caso da ONU;
internacional. 2. Organizações regionais, quando só são admitidos no seu seio sujeitos
ligados por laços de natureza geográfica, religiosa, ideológica, política…
Saída não prevista no tratado: o problema mais delicado surge quando o
tratado nada diz sobre a saída dos membros. Deve-se, em primeiro lugar, Competências das organizações internacionais –
analisar o pacto constitutivo para se ver se implicitamente as partes Conceito de competência - é o complexo de poderes funcionais conferidos
admitem ou não como legitima o abandono voluntário por um membro da por lei aos órgãos de uma pessoa colectiva com vista ao exercício das
organização internacional. Nada resultando daqueles trabalhos, dever-se-á atribuições desta.
recorrer às regras gerais do direito dos Tratados, consagrada nos artigos 54º
e 56º da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 1969. 1. Competência exclusiva estes poderes podem ser atribuídos a um só
órgão e, neste caso, só ele os pode exercer.
2. Competência conjunta- estes poderes podem ser atribuídos a dois ou
mais órgãos conjuntamente
Classificação das Organizações Internacionais A teoria da competência implícita: Se o princípio da especialidade tem
Quanto ao objecto ou finalidade: como resultado prático a limitação das competências das organizações
internacionais, o que implica uma interpretação restritiva das normas
relativas à competência, a doutrina da competência implícita tem como
efeito o alargamento das competências e uma interpretação extensiva
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daquelas normas. Esta doutrina da competência implícita foi definida pelo As competências das organizações internacionais são limitadas. Estes
TIJ no caso “Reparação de prejuízos sofridos ao serviço das nações unidas”. limites decorrem não só do princípio da especialidade, como ainda, do
domínio reservado dos Estados. O domínio reservado dos Estados, a
Teoria das competências das organizações internacionais : organização internacional está proibida de intervir em questões em que a
O princípio da especialidade – nas organizações internacionais as competência dos Estados não esteja abrangida pelo direito internacional.
competências são definidas pelo Tratado Constitutivo, que atribui a cada um Conteúdo das competências:
dos órgãos um conjunto, mais ou menos amplos, de poderes funcionais para
prosseguirem as atribuições da organização internacional. Tais competências a) Competências normativas, com base nas quais as organizações
têm na sua base o princípio da especialidade, segundo o qual os poderes internacionais produzem normas, querem internas, quer externas.
atribuídos aos órgãos apenas podem ser exercidos para a prossecução das I. Internamente, esta função normativa visa, essencialmente, a
atribuições da organização internacional, precisamente porque tais poderes produção de normas internas de carácter gerais ou individuais
só se justificam pelos objectivos que a organização internacional tem de necessárias ao funcionamento da própria organização internacional.
prosseguir. Significa tudo isto que a competência de cada organização II. Externamente, as organizações internacionais produzem normas de
carácter convencional, celebrando tratados com outras
internacional é limitada necessariamente pelos fins para que foi criada e que
organizações ou com Estados terceiros.
só devem ser reconhecidas à organização internacional as competências
indispensáveis e necessárias ao exercício das suas funções. b) Competência operacional, - traduz-se nos poderes conferidos à
organização internacional para a prática directa e imediata de operações
O carácter funcional das competências das organizações internacionais –
materiais necessárias à execução das normas ou decisões por ela
as organizações internacionais são sujeitos derivados do direito internacional produzidas. Como por exemplos: a criação de missões técnicas, o envio
cuja criação tem como objectivo a realização de certos e determinados de legações diplomáticas, etc.
interesses ou fins, pelo que não dispõe de poderes soberanos e ilimitados.
Por essa razão, os seus órgãos só dispõem dos poderes indispensáveis à c) Competências de controlo, as organizações internacionais - têm
prossecução das atribuições da organização internacional. Pode, portanto, poderes para controlar os actos praticados pelos seus órgãos ou agentes.
dizer-se que é a partir dos fins para que foi criada a organização Assim sendo, normalmente esta competência é atribuída aos :
internacional que se determina as funções de cada um e do conjunto dos
seus órgãos e, em conformidade com estas, os poderes necessários que I. órgão supremo das organizações internacionais, como acontece na
devem ser atribuídos a cada órgão para a realização das suas funções e, UA com a conferência dos chefes de estado (artigo 9º da carta).
consequentemente, para a prossecução dos fins da organização internacional.
II. órgãos intergovernamentais -naquelas organizações internacionais em
que não existe um órgão supremo, o controlo tanto pode ser feito através
de– caso FMI.
Limites da competência das organizações internacionais
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III. órgãos jurisdicionais, aos quais poderão recorrer em caso de soberana ordem pode manter relações diplomáticas com os estados,
interpretação divergente das normas de competência. enviando e reconhecendo embaixadores, bem como celebrar tratados que lhe
permitem desenvolver a sua actividade assistencial e religiosa no território
d) Competência para a composição de litígios – com base na qual todas dos estados. A Itália reconhece o Grão-mestre como um chefe de estado e
as organizações internacionais têm poderes para solucionar os litígios concede imunidade diplomática à sede da ordem. São estas prerrogativas que
entre os estados membros ou entre estes e a organização internacional. levam certos autores a atribuir à ordem a qualidade de sujeito do direito
Internacional, enquanto outros não lhe reconhecem a subjectividade jurídica,
Esta competência tanto pode ser exercida pela:
por considerarem que as mencionadas prerrogativas não derivam do direito
1. Via jurisdicional – caso TIJ, TJCE – quer pela internacional, mas sim da comitas gentiun.
2. Via política, como acontece na UA e na OEA.
2) O binómio santa sé / cidade do Vaticano
Outros sujeitos especiais do direito internacional
Em torno da Santa sé e da Cidade de Vaticano surgiu aquela que é,
1) A soberana ordem de malta certamente, uma das maiores e mais bem sucedidas ficções do direito
A subjectividade jurídica da Soberana ordem de Malta é bastante discutida internacional contemporâneo. O problema prende-se com a resposta que
na doutrina. Na verdade, a ordem era originariamente uma organização de tem sido dada à natureza jurídica desse tão controvertido binómio. O
problema tem um relevo especial a propósito da celebração de concordatas
carácter religioso e militar conhecida por Ordem de São João de Jerusalém,
entre os estados e a santa sé, especialmente quando as mesmas pretendem
que foi criada inicialmente, no século XI, em Jerusalém, para fins assegurar um estatuto jurídico internacional privilegiado para a igreja
hospitalares, assumindo mais tarde funções militares. Posteriormente, em católica no seio desses estados, violando princípios constitucionais e
1310, a Ordem ocupa a ilha de Rodes onde instala a sua sede, até 1529, jurídico-internacionais de garantias de uma igual liberdade religiosa a todos
tendo o Papa Nicolau V, por bula de 1446, reconhecido o seu Grão-mestre os cidadãos e confissões religiosas. Essas passam pela afirmação da
como príncipe soberano dessa Ilha. A partir de 1530 a Ordem passa a ter a natureza estadual da cidade de Vaticano, concebendo a santa sé como
entidade soberana sobre a cidade de Vaticano. Com base nos argumentos do
sua sede na Ilha de Malta, onde fica até 1798, ano em que essa ilha foi
reconhecimento de outros estados, de estabelecimento de relações
ocupada por Napoleão, tendo a Ordem dela sido expulsa. Perdeu assim a diplomáticas com outros estados, da pertença a organizações internacionais
ordem o “seu território”. Hoje a ordem tem a sua sede em Roma e dedica-se do reconhecimento como estado não membro observador permanente da
a actividades religiosa de beneficência. A soberana ordem de malta não tem, ONU e do exercício de prerrogativas de soberania interna e externa
portanto, território. Contudo, ela tem um ordenamento jurídico próprio, (emissão de moeda e de passaportes). Diferentemente, e esta é a posição
constituído por uma carta Constitucional e um código, para além das leis que prevalece na maioria dos manuais do direito internacional, as teses não
editadas pelo sumo pontífice, e um governo próprio dirigido pelo Grão- Estadualistas sublinham que se está perante uma entidade sui generis, ou,
materialmente, perante uma organização. Isto, porque não se verifica a
mestre, que é assistido por um conselho soberano. Se é certo que a Soberana
presença dos elementos clássicos de um estado. Não existe um povo ou uma
Ordem, enquanto ordem religiosa, depende da santa sé e encontra-se nacionalidade Vaticana, verificando-se que a cidadania Vaticano tem um
submetida às leis canónicas, não é menos certo que a igreja lhe reconhece carácter funcional e temporário. Ora, não existe estado sem povo, devendo
certas prerrogativas próprias dos sujeitos do direito internacional. Assim, a entender-se que se trata aqui de um elemento essencial constitutivo. Alem
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disso, o território do Vaticano, é territorialmente insignificante profissionais, técnico, cientifico, académico, desportivo, etc. Assim sucede,
apresentando-se encravado na cidade de Roma, sendo maioritariamente nomeadamente, com a Internacional Air Transportation Association
constituído por jardins e pavimento. As teses dominantes neste domínio (IATA), que tem carácter Professional, ou com as organizações desportivas,
inclinam-se para a natureza meramente declarativa (ou não constitutiva) do
devendo destacar-se o Comité Olímpico internacional, a FIFA, UEFA, a
reconhecimento, sendo que, para alguns, não se satisfazem no Vaticano,
além do mais, as modernas exigências de reconhecimento, no tocante à FIA, a FOCA, etc. Embora com contornos ainda não totalmente definidos.
democracia e ao respeito pelos direitos fundamentais. As teses não Esse seu relevo tem sido reconhecido pelas mais altas instâncias
Estadualistas assinalam a dependência relativamente ao estado italiano para internacionais, incluindo o CS da ONU.
a prestação dos serviços mais básicos (água, electricidade, gás, telefone).
Mas, mais importante que tudo, é a natureza especificamente religiosa da b) Capacidade jurídica internacional das organizações não governamentais
missão essencial da santa sé, sem a qual ela perde a sua razão de ser. A – o estatuto jurídico internacional das organizações não governamentais
santa sé existe unicamente para promover uma confissão e uma doutrina
afirma-se pela sua actividade na organização de conferências internacionais,
religiosa e não os interesses dos cidadãos do Vaticano. Ela actua como uma
confissão religiosa e não como um estado. na sua essência, a santa sé é uma pela promoção de iniciativas normativas de alcance geral, através da
entidade religiosa ao serviço de uma missão religiosa, sem a qual ela deixa apresentação de propostas de convenção e da participação na sua
de ter sentido útil. negociação. A sua influência nos procedimentos normativos internacionais
efectiva-se também pela sua integração nas delegações governamentais a
conferências internacionais, bem como através da sua acreditação. Deste
Organizações Não Governamentais
modo, alguma doutrina chama a atenção para o facto de que o papel das
a) Caracterização, escopo e natureza jurídica – apesar de terem a sua origem organizações não governamentais deve ser considerado quando se trata de
de direito interno, elas caracterizam-se pelo alcance internacional da sua indagar da existência e do conteúdo do direito consuetudinário
actividade e pela ausência de escopo lucrativo. Essas características surgem internacional.
dotadas de um estatuto internacional parcial, que pode passar, entre outras
coisas, pela obtenção da qualidade de observador numa organização c) Tipos de organizações não governamentais
internacional pelo exercício de direitos de participação e de poderes a) Cruz vermelha – a cruz vermelha internacional é fruto das iniciativas laicas
normativos internacionalmente reconhecidos. A expressão organização de prestação de serviços de natureza assistencial, que começam a surgir a
surge associada a organizações de natureza confessional, humanitária, partir do século XIX, momento em que tais actividades deixam de ter uma
sindical, que se destacam pelo seu activismo em favor dos direitos natureza exclusiva religiosa. Inicialmente, a socorrer os feridos de guerra e,
humanos, dos direitos de mulheres e crianças, de trabalhadores e posteriormente, a diversas outras tarefas, a maioria das quais relacionadas
consumidores, da paz, do desarmamento, do desenvolvimento económico e com a protecção e o auxilio a vitimas da guerra. Tinha uma estrutura
social sustentado, da protecção do ambiente, etc. Nestes domínios elas constituída por sociedades nacionais e por um comité internacional. Têm
constituem importantes instrumentos de participação organizada dos também o seu estatuto próprio, que estão subordinados ao estatuto da cruz
indivíduos no debate e resolução dos problemas internacionais. No entanto, vermelha internacional. No que se refere à personalidade jurídica da cruz
as mesmas podem desenvolver actividades importantes nos domínios vermelha, a questão é debatida pela doutrina. De facto, enquanto certos
autores, tendo em conta que a cruz vermelha pode participar – e tem
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participado – em tratados internacionais, através do seu comité, autoridades estabelecidas que, na verdade, não se pode dizer que estas
reconhecem-lhe personalidade jurídica internacional, considerando-o, mantêm a legitimidade da representação do estado, pois é esta legitimidade
portanto, um sujeito do direito internacional. Na verdade, a cruz vermelha que os rebeldes põem em causa com a insurreição, pelo que o governo deixa
de representar toda a nação. De qualquer forma o prolongamento da
mantém relações com os estados e as organizações internacionais, que lhes
insurreição e a sua transformação numa situação de beligerância acaba
solicitem diversos serviços de natureza internacional e, para o efeito, com sempre por levar os terceiros estados a terem de adoptar uma posição face
ela celebram convenções, o que por si só pode não ser suficiente para lhe às partes em conflito. Ora, havendo reconhecimento – é sempre de natureza
atribuir subjectividade internacional. Diversas normas do direito das gentes constitutiva – que tanto pode ser por parte do governo e do estado atacados
atribuem direitos e impõe obrigações a esta organização, e, ainda, que ela como de terceiros estados, os revoltosos passam a ser considerados, sob o
participa directamente na formação dessas normas, quando celebra, em ponto de vista internacional, como uma comunidade organizada de
nome próprio, tratados ou convenções internacionais. beligerantes, com um estatuto próprio, destinatária de certas normas de
direito internacional.
b) Insurrectos – no que se referes aos insurrectos, não é correcto atribuir-
lhes o estatuto de sujeitos de direito internacional, visto que trata-se de
Desse reconhecimento resulta fundamentalmente as seguintes efeitos:
uma situação efémera tendente a transformar-se em situações de
- Aplicação aos partidos em luta do direito internacional da guerra; isenção
beligerância, caso consigam o controlo de parte do território e da
do estado de responsabilidade pelos danos causados pelos revoltosos;
população, ou a desaparecer, quando são vencidos, deixando o território
neutralidade, perante a luta, dos estados que reconhecem a beligerância. –
do estado para se refugiarem noutro estado.
- Quanto aos rebeldes, do reconhecimento deles resulta essencialmente que
Os Beligerantes e os insurrectos os seus actos não podem ser considerados como actos de pilhagem ou de
pirataria.
Beligerantes: a sublevação de certos grupos sociais organizados contra o - Os terceiros estados, para evitar o reconhecimento prematuro de uma
governo de um estado pode levar a que os rebeldes acabem por controlar, de situação de beligerância, devem esperar que se reúnem todos os requisitos
forma organizada, uma parte do território e da população do estado; necessários para se qualificar a situação como uma real situação de
beligerância, ou seja, que os revoltosos se encontrem dotados de uma
Insurrectos: ou que se limitem a controlar pequenas áreas territoriais, organização, que controlem uma parte do território e da população do
barcos de guerra ou civis. estado e que se afirmem pela luta como um movimento contra o governo
estabelecido.
Beligerância – uma situação de beligerância pode ter na sua origem uma
rebelião ou insurreição. Daí que a doutrina discuta a questão de saber qual o Relativamente à personalidade jurídica dos beligerantes e dos rebeldes,
estatuto internacional que dever ser atribuído aos rebeldes antes de serem estes enquanto destinatários de direito e de obrigações directamente
reconhecidos como verdadeiros beligerantes. Para certos autores, defensores emanados da ordem jurídica internacional são sujeitos do direito
da teoria da legalidade da ajuda às autoridades estabelecidas, os terceiros internacional. É claro que, os beligerantes são sujeitos transitórios ou
estados têm o dever de auxiliar estas autoridades. Para outros, os terceiros provisórios na medida em que a situação de facto em que se funda a sua
estados devem manter-se neutrais, posto que o auxílio a qualquer das partes subjectividade está naturalmente vocacionada a desaparecer, pois ou
traduzir-se-á necessariamente em ingerência nos assuntos internos. vencem a guerra e constituem-se em governo do estado ou perdem-na e
Entendem estes autores, defensores da teoria da ilegalidade do auxílio às
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desaparecem enquanto movimento real contra o governo. Em qualquer dos deveres aos indivíduos. De facto, encontramos quer no direito internacional
casos o reconhecimento cessa ou caduca necessariamente. costumeiro, quer no direito internacional convencional. No que se refere à
defesa dos direitos, a atribuição ao individuo de meios para, por si só e sem
qualquer mediação estatal, assegurar a protecção jurídico-internacional dos
O Indivíduo
seus direitos, ainda não se encontra suficientemente garantida, precisamente
Introdução porque a pratica internacional dominante é a de atribuir ao estado a tutela
dos direitos conferidos aos indivíduos. Com efeito, a estes ainda não é
A atribuição ao indivíduo da qualidade de sujeito do direito internacional permitido, na generalidade dos casos, o recurso directo às instâncias
tem gerado uma acesa polémica doutrinal. Para aqueles autores que internacionais. Sob o ponto de vista dos deveres, o indivíduo surge aqui
entendem que a sociedade internacional é uma sociedade de estados regida directamente como um sujeito passivo das normas internacionais e, nessa
por normas do direito internacional que regulam directamente as relações medida, como destinatário directo das sanções internacionais. Sob esse
interestaduais, o indivíduo não é destinatário directo dessas normas. Para ponto de vista, portanto, o indivíduo aparece como responsável directo da
outro sector da doutrina que entende que a sociedade internacional é uma violação de deveres internacionais e, nessa medida, pode ser directamente
sociedade de indivíduos, estes são destinatários directos das normas do punido pelos actos ilícitos por ele praticados, podendo dizer-se que é sujeito
direito das gentes, pelo que são verdadeiros sujeitos do direito internacional. imediato e directo do direito internacional sancionador.
Face a essas posições radicais, a doutrina mais recente tem procurado
encontrar uma posição de equilíbrio capaz de reflectir a verdadeira situação O duplo estatuto do individuo no plano internacional
do indivíduo no quadro da teoria dos sujeitos do direito internacional, em
À defesa dos seus direitos, o individuo é um sujeito menor, isto é, um
que o principio segundo o qual os estados são sujeitos de direitos e de
sujeito a quem não se reconhece, na maior parte dos casos, capacidade de
obrigações internacionais comporta importantes excepções, por diversas agir em defesa dos seus direitos. Aos deveres, já goza de um estatuto de
normas desse direito regerem directamente a conduta do indivíduo. plena capacidade nos termos do qual pode ser directamente
responsabilizado pelos seus actos ilícitos. Estes mecanismos não estão ainda
Desta forma, os indivíduos são verdadeiros destinatários dessas mesmas generalizados, mas apesar disso, a sua institucionalização progressiva, em
normas. Deste modo, a doutrina mais recente só por excepção aceita o especial no sério das organizações internacionais, constitui um importante
individuo como sujeito do direito internacional. passo na defesa dos direitos do homem.

Relativamente aos outros sujeitos – estados e organizações internacionais –


que os impede de participar na elaboração de normas e só lhes O indivíduo como sujeito de deveres internacionais e a sua
reconhecendo certos direitos ou certas obrigações, o que faz do individuo responsabilidade penal internacional
um sujeito parcial e passivo do direito internacional. O direito atribui ou não
A atribuição da qualidade de sujeito do direito internacional ao indivíduo
direitos, impõe ou não deveres aos indivíduos e se lhes assegura os meios
começou precisamente pela edição de normas jurídico-internacionais que
indispensáveis para, sem mediação estatal, exercerem e fazerem respeitar os lhes impunham deveres e que estabeleciam sanções directamente aplicáveis
seus direitos e para cumprirem as suas obrigações. Ninguém dúvida da àqueles que violavam tais deveres.
existência de normas jurídicas internacionais que atribuem direitos e impõe
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Essas regras jurídicas, embora fragmentárias e, de certo modo, empíricas, encontra-se provido de capacidade de gozo do direitos ou de capacidade
criam uma verdadeira responsabilidade penal do indivíduo, quando jurídica.
classificam com infracção certos factos – como a pirataria no alto mar e o
tráfico de escravos – por estes praticados e estabelecem as sanções a aplicar.
Personalidade jurídica internacional - A personalidade jurídica tem
O indivíduo aparece como destinatário directo de regras jurídico-
internacionais sancionatórias consuetudinariamente estabelecidas. Esse necessariamente de ser aferida sob o ponto de vista das ordens jurídicas
movimento gerador de um direito internacional penal que responsabiliza e nacionais e da ordem jurídica internacional, precisamente porque ela
sanciona directamente o individuo pela prática de actos ilícitos vai sofrer encontra-se sempre em relação com estas duas ordens jurídicas. Portanto, as
evolução acelerada depois da segunda guerra mundial. ordens jurídicas nacionais e a ordem jurídica internacional terão de averiguar
Na verdade, inicialmente, o direito internacional em vista essencialmente a se, no caso dos Estados, existe ou não uma organização soberana de uma
responsabilização das pessoas que praticavam a titulo privado certos factos comunidade territorial, dotada de requisito da perspectiva de permanência,
considerados como ilícitos internacionais e a punição a titulo particular, dos
ou se, no caso dos outros sujeitos, estão ou não reunidos os requisitos
autores dessas infracções. Posteriormente, o sistema evoluiu no sentido de
responsabilizar e de punir o indivíduo enquanto autor de factos ilícitos por jurídico-internacionalmente reputados de necessários e suficientes para que
ele praticados na qualidade de agente de um estado. Esta evolução gera um possam ser aceites como sujeitos do direito internacional. Tais condições ou
alargamento dos factos classificados como infracções internacionais. requisitos são, o território, a população, e o poder político, ou mais
A partir do século XX, ao mesmo tempo que se alarga o número de factos resumidamente, a independência política, que é o único requisito necessário
classificados como infracções internacionais, cuja prática gera a à aquisição da personalidade.
responsabilidade individual do agente, como acontece com o tráfico de
estupefacientes, as várias modalidades de prática aérea e o terrorismo.
A personalidade jurídica do Estado: No que diz respeito às organizações
Agora considerado e punido como um agente público, que os pratica em
nome e ao interesse de um estado. Assim acontece com os crimes contra internacionais, a personalidade desses entes de um reconhecimento
paz, os crimes de genocídio, crimes contra a humanidade, etc. constitutivo por parte dos Estado fundado nessas organizações, o qual
decorre do próprio acto constitutivo. Na verdade, com a celebração do
A TEORIA DOS SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL acordo constitutivo da organização, os Estados que a criam reconhecem,
colectivamente, tácita ou expressamente, não interessa, a personalidade do
A PERSONALIDADE E A CAPACIDADE JURÍDICA –
substrato, que desta forma adquire unidade e autonomia jurídica. Quanto aos
A personalidade jurídica, é precisamente a qualidade de pessoa ou sujeito
indivíduos, a sua personalidade jurídico-internacional não precisa também de
de direito, qualidade que se traduz na aptidão para ser titular autónomo de
ser reconhecida, pois para ser uma pessoa jurídica internacional, com
relações jurídicas ou, na susceptibilidade de ser sujeito de direitos e
personalidade, basta que o seja sob o ponto de vista do direito interno do seu
obrigações.
Estado de origem.
A Capacidade de direito ou de gozo, que mede a susceptibilidade de ser
No que aos outros sujeitos se refere – beligerantes, insurrectos, movimentos
titular de situações jurídicas.
de libertação nacionais, etc. -, a personalidade jurídica desses sujeitos
A Capacidade de agir ou de exercício , que mede a susceptibilidade de
dependo do reconhecimento, pois é esse acto que lhes atribui a qualidade de
alguém praticar, por si e livremente, actos jurídicos. Pode dizer-se, portanto,
sujeitos do direito internacional, sempre com um carácter transitório.
que todo o sujeito de direito ou todo o ente com personalidade jurídica
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Critérios gerais da personalidade jurídica internacional: Surge uma acto do reconhecimento, que mais não é do que uma constatação de uma
comunidade politicamente organizada e com autonomia relativamente a realidade já existente, da qual não resulta a atribuição de qualquer
todos os outros já existentes, desde que a sua organização e autonomia não qualidade jurídica ao novo Estado. a tese declarativa tem na sua base a
dependem da vontade de qualquer outra entidade soberana; As comunidades ideia segundo a qual o direito internacional regula minuciosamente e
organizadas e com autonomia, cuja organização e autonomia dependam da que juridicamente este surge automaticamente: decorre directamente do
vontade de outras comunidades que tenham uma natureza transitória, bem direito internacional, sem ser necessário qualquer acto posterior dos
como aquelas a que faltem algum ou alguns elementos para completar o seu restantes estados.
substrato, só ascendem à categoria de sujeitos e adquirem personalidade
jurídica depois de serem reconhecidas por outras comunidades soberanas já 3. Teoria mista ou eclética , em que entende que o reconhecimento tem
existentes. simultaneamente um carácter declarativo e constitutivo. É declarativo
num primeiro momento, ou seja, quando os sujeitos já existentes do
A TEORIA DO RECONHECIMENTO - Conceito: o reconhecimento é o direito internacional comprovam ou constata a existência de um novo
acto pelo qual um Estado, constatando uma situação de facto ou de direito, estado. é constitutivo num segundo momento, ou seja, quando se
aceita que esta lhe é oponível. O reconhecimento é, portanto, um acto estabelece relações oficiais com o novo sujeito.
jurídico unilateral formal e materialmente internacional que tem por objecto
qualquer modificação ou transformação na ordem jurídica internacional. 4. Teoria SANTI ROMANO, segundo a qual o reconhecimento não tem
nem carácter declarativo, nem constitutivo, mas tem por função
As teorias do reconhecimento: completar a capacidade internacional.

1. A teoria constitutiva do reconhecimento, segundo a qual a


personalidade e a plena capacidade jurídica do Estados só aparecem Análise crítica das teorias do reconhecimento
com o acto de reconhecimento por parte dos outros sujeitos, leia-se, a) No que refere à teoria declarativa é a única que não entra em conflito
Estados. O reconhecimento surge, assim, ao lado da população, do com princípios fundamentais do direito internacional, nomeadamente
território e do poder político, como espécie de quarto elemento com o da autodeterminação dos povos e da igualdade dos Estados. De
constitutivo do Estado e, em consequência, como o acto através do qual facto, a defesa da natureza declarativa do reconhecimento é feita pelo
é outorgado ao novo sujeito do direito internacional personalidade artigo 3º da convenção Inter-Americana dos Direitos e deveres dos
Estados, conhecida por convenção de Montevideu.
jurídica.
b) A teoria constitutiva não ós obriga com estes princípios, como ainda
2. Teoria declarativa do reconhecimento, que advoga que o conduz a uma certeza a uma certa arbitrariedade, por fazer depender a
reconhecimento tem um alcance meramente declarativo, dado que o existência de um Estado da vontade dos que já existem. Essa teoria
Estado, a partir do momento do seu nascimento é uma pessoa jurídico- conduz a que um Estado reconhecido só por alguns estados passe,
internacional titular de direitos e de obrigações internacionais. A simultaneamente, a existir e a não existir juridicamente, isto é, existe
personalidade jurídica do Estado não depende, portanto, de qualquer
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para aqueles estados que o reconhecem, mas já não tem existência reconhecimento produzem-se simplesmente na capacidade de agir
jurídica para aqueles outros que o não reconheceram. dessas organizações.

2. Organizações não criadas por pactos ou Tratados internacionais e


c) Quanto a teoria eclética ela não consegue explicar devidamente aqueles organizações não governamentais – estas organizações não são sujeitos
casos em que, simultaneamente, no acto de reconhecimento não só se do direito internacional, pelo que não têm personalidade jurídica
declara a existência do novo Estado, como ainda estabelece com estas internacional nem capacidade de agir internacional. A personalidade
relações oficiais. O segundo momento é já uma consequência do jurídica e a capacidade de agir dessas organizações depende da lei
reconhecimento – ou do primeiro momento -, pois o estabelecimento da interna do estado onde foram constituídas e onde desenvolvem a sua
relações oficiais implica o prévio reconhecimento do Estado. actividade. Isto não significa que estas organizações não exerçam um
importante papel na cena internacional e que, por vezes, pela
Reconhecimento dos Estados: O reconhecimento em que os estados se importância da actividade que desempenham não lhes seja reconhecida
referes, tem uma natureza declarativa e os seus efeitos não incidem sobre a um estatuto internacional que as coloca na situação de parceiros de
personalidade, mas sim sobre a capacidade de agir do Estado. o Estado sujeitos do direito internacional, nomeadamente dos Estados e de outras
organizações internacionais.
existe como pessoa jurídica e, consequentemente, como sujeito do direito
internacional com personalidade jurídica independentemente de ter ou não
sido reconhecido e, por essa razão, goza de todos os direitos e obrigações Reconhecimento dos Beligerantes, insurrectos e movimentos de libertação
inerentes aos sujeitos de direito internacional. O estado existe juridicamente - O reconhecimento aparece como elemento de direito atributivo da
a partir do momento em que existe em que existe de facto e o personalidade jurídica, no caso das organizações internacionais, movimentos
reconhecimento não modifica essa situação objectiva. O reconhecimento de libertação, insurrectos e beligerantes e, consequentemente, também da
modifica é a situação subjectiva do estado reconhecido, dado que de uma capacidade de agir destes sujeitos mas, neste ultimo caso, de uma capacidade
existência introvertida passa, com o seu reconhecimento a uma situação sempre limitada pelos fins que estes entes prosseguem.
extrovertida, o que larga o círculo das suas relações jurídico-políticas
internacionais. O reconhecimento dos estados é um acto que tem a ver, não Modalidades de reconhecimento:
com a personalidade deste, mas com a sua capacidade de agir.
1. - Expresso – quando se traduz numa declaração solene feita pelo Estado
Reconhecimento das organizações internacionais –
recognoscente através da qual manifesta inequivocamente a sua vontade
1. Organizações criadas por pactos ou tratados internacionais – o de reconhecer o novo sujeito do direito internacional. Esta declaração é
reconhecimento destas organizações têm um efeito constitutivo que transmitida directamente a este novo sujeito e adopta a forma de acto
decorre do próprio acto de pactuar dos Estados fundadores da jurídico unilateral – quando é feita através de telegrama, nota
organização, o que significa que são esses estados que atribuem diplomática, declaração pública etc. - Ou a de um acto jurídico
personalidade jurídica e capacidade de agir à organização no exacto
bilateral, quando é feita através de uma convenção, ou de acto
momento em que outorgam o pacto constitutivo. Posteriormente, ao
serem reconhecidas pelos demais estados, os efeitos desse concertado mas sem natureza convencional – caso de declarações ou
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comunicados conjuntos, comunicado ou acta final de uma conferencia – o reconhecido deste último pela organização não implica que cada
etc. Estado membro, mesmo que tenha votado favoravelmente, fique
2. Implícito – quando, apesar de inexistir qualquer manifestação expressa e impedido ou perca o seu direito de reconhecer individualmente o novo
inequívoca da vontade de reconhecer, esta vontade está, contudo, sujeito, mesmo que este passe, em virtude do reconhecimento, a ser
subentendida implicitamente em certas condutas ou em certos factos membro da organização.
praticados por um sujeito já existente relativamente ao ente reconhecido.
Esta forma de reconhecimento levanta o problema da necessidade de
prova, o que se compreende, dado que ela exige uma tarefa de Para além das modalidades indicadas existe uma outra que se traduz na
interpretação da conduta ou dos factos tendente a averiguar se há ou não distinção entre reconhecimento de direito e reconhecimento de facto:
a intenção de reconhecer. A doutrina, contudo, tem vindo a aceitar
unanimemente que, apesar de não ser possível estabelecer uma regra a) Reconhecimento de direito é um reconhecimento definitivo e
geral sobre esta questão é que só uma análise casuística pode permitir a irrevogável que produz, sem quaisquer limitações, todos os efeitos do
determinação das verdadeiras intenções dos Estados, certas condutas não direito. O reconhecimento de direito é a forma classicamente adoptada
podem deixar de ser entendidas como uma tácita ou implícita na prática internacional e, regra geral, é expresso.
manifestação de vontade de reconhecer. Assim, por exemplo: a
celebração de tratados, entre o sujeito recognoscente e o reconhecimento. b) Reconhecimento de facto é o reconhecimento provisório, revogável e
com efeitos limitados. Esta forma de reconhecimento é normalmente
3. Individual – quando cada sujeito reconhece o novo sujeito através de um utilizada, quando um Estado prefere não reconhecer de forma
acto jurídico individual que só a ele, ente recognoscente, vincula. definitivamente a entidade que se intitula Estado ou Governo – por a
situação não ser clara ou por motivos políticos – mas, ao mesmo tempo,
4. Colectivo – quando um grupo mais ou menos amplo de Estados considera desejável manter determinados contactos oficiais.
conjuntamente acordam em reconhecer um novo sujeito. Estes estados
podem ou não tomar essa iniciativa no quadro de uma organização O carácter discricionário do reconhecimento
internacional a que todos pertencem. Os estados que colectivamente É entendimento unânime que o Direito Internacional não impõe aos estados
reconhecem um novo sujeito ficam individualmente vinculados ao acto o dever de reconhecer um novo sujeito, mesmo que estes tenham
que conjuntamente praticaram, não podendo, portanto, subordinar os preenchido todos os requisitos internacionalmente reputados de necessários
efeitos do reconhecimento a um acto posterior de reconhecimento para ascenderem à categoria de sujeitos. O reconhecimento surge no direito
internacional como carácter discricionário, posto que, regra geral, não existe
individual. Hoje em dia o reconhecimento colectivo é, normalmente,
nem uma obrigação de reconhecer, nem um dever de não reconhecer.
praticado por decisão de organizações internacionais, o que levanta o Significa tudo isso que o reconhecimento é um acto jurídico discricionário,
problema de saber se o reconhecimento pela organização implica o mas não arbítrio, que deverá respeitar sempre certas regras por forma a
reconhecimento pelos Estados membros, por cada um desses estados evitar reconhecimentos que violam regras fundamentais do direito
individualmente considerados. A doutrina dominante é no sentido de que internacional, nomeadamente as que proíbem o recurso à força para criar ou
nas relações internacionais – entre os Estados membros e o novo sujeito impor certas situações internacionais.
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As generalidades dos estados utilizam o reconhecimento como uma arma transitório, como acontece com o reconhecimento dos beligerantes,
política de que se servem de acordo com os seus interesses. insurrectos e movimentos de libertação, ou nos casos em que se verifica o
desaparecimento de um sujeito. Nesses caos, o ente recognoscente não
a) Dá-se o reconhecimento prematuro quando numa dada situação – ou
necessita de praticar qualquer acto declarativo da caducidade.
um ente – é reconhecido sem que o processo da sua formação esteja
completo. Essa forma de reconhecimento pode criar situações
internacionais embaraçosas; RELAÇÃO ENTRE DIREITO INTERNACIONAL E DIREITO INTERNO

b) O reconhecimento tardio é aquele que, contra todas as evidencias O problema das relações entre o direito internacional e o direito interno
relativamente à existência de uma dada situação só é dado muito depois coloca-se inevitavelmente à doutrina e à jurisprudência, tanto no plano
de se verificar tal situação.
nacional como no internacional. A doutrina tende a tematizar questão em
c) O reconhecimento condicional é o praticado sob condição, ou seja, termos teoréticos, interrogando-se sobre se o direito internacional e o direito
trata-se de um reconhecimento subordinado à realização de um interno são uma só realidade ou grandezas autónomas.
acontecimento futuro e consequentemente incerto.
Doutrina tradicional – a doutrina quando não se limita ao expor e a
Efeitos do reconhecimento: sistematizar os dados normativos e fácticos pertinentes, pretende clarificar
- Relativamente aos Estados, resumidamente, poderemos dizer que o que se suscitam no direito internacional e avançar com respostas. Só nessa
reconhecimento produz efeitos sobre a capacidade de agir dos estados, medida é que a referência às discussões doutrinária será relevante. No
efeito que é meramente declarativo. entendimento tradicional tem vindo a qualificar este problema como uma
- No que se refere às organizações internacionais, ao beligerante e aos questão da hierarquia entre as fontes de direito. O debate tem-se
insurretos tais efeitos são constitutivos da personalidade e da capacidade desenvolvido ao longo de duas linhas doutrinárias básicas, reconduzida às
jurídico-internacional desses sujeitos. expressões dualismo e monismo.
- Quanto às nações, os efeitos são meramente declarativos da
Monismo – as posições monistas procuram uma espécie de teoria total do
personalidade.
direito, um ponto arquimediano ou princípio fundamental que possibilite a
unificação do direito interno e do direito internacional num único sistema
Revogabilidade e caducidade do reconhecimento:
jurídico. O Monismo, a partir de um princípio de natureza substantiva,
como a ideia de direito, uma noção de solidariedade social ou valor da
- Revogabilidade são a destruição ou a cessação dos efeitos dele através de
dignidade da pessoa humana, como tendo por base um ponto de apoio de
um outro acto jurídico unilateral praticado pela mesma entidade autor do
natureza formal, como o princípio pacta sunt servanda. A primeira
acto de reconhecimento.
orientação tem um sólido pedigree na doutrina do direito internacional. De
A Caducidade consistiria na cessação dos efeitos do acto de
acordo com esta concepção os mesmos princípios de direito natural
reconhecimento por ter decorrido o tempo previsto para a sua duração ou
permeiam, tanto no direito internacional como no direito interno. Já a
por terem desaparecido os pressupostos que o justificaram. Assim sendo a
segunda orientação formalista, preconizada na primeira metade do Século
caducidade só é possível naqueles casos de reconhecimento provisório ou
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XX pelo judeu austríaco Hans kelsen, parece assentar num propósito de caracteriza-se por ter a sua origem na vontade de um estado enquanto que o
combinar elementos básicos da posição jusnaturalista e contratualista. Do direito internacional constitui uma emanação da vontade de vários estados,
modo geral o monismo postula a existência de um único sistema jurídico assim, na perspectiva de cada estado existiriam, dois ordenamentos
dentro do qual, não podem existir normas incompatíveis. As jurídicos distintos, interno e internacional, sendo possível discernir
incompatibilidades seriam resolvidas dentro do sistema com o recurso à situações em que uma norma é válida num deles e inválida no outro.
meta-regras identificadoras das normas superiores do sistema jurídico. Para Alguma doutrina dualista sustenta a superioridade do direito internacional
uma variante da doutrina monista, a superioridade cabe, em uma análise do relativamente as normas estaduais ao menos diante dos tribunais
direito interno, considerando-se que o estado se encontra na origem de todo internacionais tende-se caminhado, a partir daí, para a defesa da
o direito, pelo que o direito internacional é um direito criado pelos estados e superioridade do direito internacional relativamente às normas de todos os
dependente, em última análise deles. Está-se aqui perante uma linha de outros sujeitos de direito internacional.
pensamento tipicamente Estadualistas, voluntarista e positivista, que vê o
direito internacional como simples direito estadual externo. Para outra O Estado
posição doutrinal o monismo assenta na superioridade do direito POVO - Em muitos casos são utilizadas as designações povo e nação como
internacional, a partir de premissas fundamentais de conteúdo politico- sinónimos. Os vínculos étnicos, linguísticos, históricos e culturais
moral. A verdadeira soberania em última analise no direito internacional, apresentam-se hoje substancialmente relativizados, sobressaindo o chamado
que serve de base para a construção do estado, da soberania estadual e do conceito político-constitucional de povo. Um povo no sentido étnico,
direito interno e a quem cabe delimitar o domínio da validade das ordens cultural e linguístico pode estar dividido por diferentes estados (povo
jurídicas nacionais. germânico na Áustria, Alemanha e suíça alemã, e o povo árabe nos Estados
Dualismo – as teses dualistas sugerem a existência de uma distinção árabes), ao passo que um estado pode conter diferentes povos, na mesma
estrutural e o direito interno e o direito internacional. As suas premissas acepção (reino unido, Espanha, índia, Afeganistão). Do mesmo modo, pode
fundamentais adequam-se ao modelo de vest falia dos estados soberanos, haver povos sem estado (curdos, palestinianos), bem como estados que
cada um com a sua própria ordem de valores, embora revistam uma incluam indivíduos das mais variadas etnias, acomodadas no seio de uma
natureza positiva e Estadualistas. O direito internacional perspectivada cultura aberta mais ou menos comum (estados unidos, Brasil). Do ponto de
como uma grandeza distinta do direito interno, sendo a ênfase colocado no vista do direito internacional, a categoria povo assume o maior relevo, na
consentimento efectivo daqueles como fonte de direito internacional. O medida em que refere aos titulares e destinatários do exercício da soberania.
dualismo intensificou-se com o positivismo estadista, para quem o centro de
gravidade do direito internacional é o estado e a sua vontade, o que resulta Nacionalidade dos indivíduos – a nacionalidade dos indivíduos é
na dificuldade de justificar normas existentes sem o consentimento dos normalmente obtida pela via da aquisição originária, a qual se processa com
estados e para além dele. Para C.H. Triepel, o direito interno e o direito base numa combinação, que varia do Estado para Estado, dos critérios do jus
internacional resultam da existência de dois planos separados, sendo um o soli e jus sanguinis. Para além disso, generalidade dos estados prevê a
das relações internas (cidadãos e estado) e outro o das relações possibilidade de aquisição derivada da nacionalidade através de outros
internacionais (estados). Na doutrina germânica, o direito interno
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mecanismos, como a naturalização, a opção de vontade, a recuperação, a 2. O arrendamento (verifica-se idêntica transferência da supremacia
adopção e o matrimónio. territorial, mas agora mediante o pagamento de uma renda);

TERRITÓRIO - é o marco físico em que opera o ordenamento jurídico de 3. O protetorado, exprime uma relação entre dois Estados, o protector e o
um Estado, constituindo o objecto da plenitude e da exclusividade da protegido;
soberania.
1. O princípio da efectividade, segundo o qual é do exercício efectivo dos 4. O condomínio, em que dois ou mais estados exercem sobre um dado
poderes e/ou das funções estatais num dado território que nasce a território;
soberania territorial.
2. O princípio da relatividade da efectividade, em que a intensidade e as 5. A ocupação militar, consiste na presença de forças estrangeiras sobre a
características do exercício das competências estais num dado território totalidade ou parte do território de um outro estado.
devem ser apreciadas de acordo com as circunstâncias histórica,
DOMINIO FLUVIAL - o domínio fluvial é constituídos por todos os
sociológicas e políticas concretas, ou, de cada caso concreto.
cursos de água ou pela parte dos menos que correm no território de um
3. O princípio uti possidetis, em que os estados devem respeitar e manter
estado e pela parte dos cursos de água que o separam de outro ou outros
as fronteiras coloniais herdadas no momento da independência, de
estados e sobre a qual exercem soberania. Se os rios nascem e desaguam no
respeitar os títulos da época colonial, desempenhando aqui a
território nacional, chamam-se nacionais. Normalmente não causam
efectividade um papel subsidiário.
problemas de carácter internacional, pois constituem domínio público de
cada estado.
Modos de aquisição do território:
a) A aquisição originária – da soberania territorial verifica-se quando o Quanto à navegação, pesca e aproveitamento industrial e agrícola, a sua
território sobre o qual de estabelece a soberania territorial não se regulamentação é da exclusiva competência do respectivo estado. De facto,
encontra, no momento da imposição dessa soberania submetido à a própria natureza de tais cursos de água levanta problemas que não surgem
soberania territorial de nenhum outro estado. nos rios nacionais. Uma fábrica instalada junto à nascente ou à foz daqueles
b) A aquisição derivada – é modo de aquisição que resulta do exercício de rios pode ser o suficiente para liquidar a possibilidade de pesca por qualquer
competências sobre territórios que já se encontram submetidos à dos estados ribeirinhos; uma barragem que desvie um curso de água pode
soberania do outro estado no momento em que se inicia aquele exercício ser fatal para a agricultura do estado que dela se não pode aproveitar; a
de competências. impossibilidade de os barcos do país da nascente descerem até ao mar pode
Este modo de aquisição pode assumir as seguintes formas: causar despesas e complicações apreciáveis.

1. A cessão que pode ser administração (que dá-se a transferência Uma central nuclear pode poluir e aumentar sensivelmente a temperatura
temporária dos poderes de um estado sobre o território para outro dum curso de água, tornando impossível o seu aproveitamento e liquidando
estado). a existência a certas espécies piscícolas. E os exemplos podiam repetir-se.
Cada estado só pode navegar na parte sobre a qual exerce soberania, salvo
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acordo estabelecendo a liberdade de navegação. Mas mesmo quando esta específico, não falta quem recorra ao direito de vizinhança e às suas
existe, vigora normalmente o princípio da permissão da cabotagem só a implicações. Com base numa interpretação lata deste princípio, entende-se
barcos nacionais e o da restrição à entrada de navios de guerra estrangeiros. que os efeitos prejudiciais da acção (poluição) tolerada num estado se
A liberdade de navegação nos rios internacionais não constitui, pois, uma podem sentir no território de outro estado sem que, para o efeito, tenha de
regra de direito consuetudinário aplicável a tais rios. existir contiguamente geográfica.

A pesca só é permitida a cada estado na parte do rio que se encontra sob o Águas interiores - são águas situadas entre a linha normal da maré-baixa e
seu domínio. Não pode prejudicar igual direito dos outros estados o território terrestre, ou seja, as águas dos portos, dos golfos, das baías e dos
ribeirinhos; todo o aproveitamento que um estado faça das águas dum rio estuários e bem assim as dos mares internos, dos estreitos, e dos canais. As
internacional deve ser previamente comunicado aos estados interessados. águas interiores constituem território estadual, sendo, pois, completa a
Em caso algum se devem fazer obras que prejudiquem a navegabilidade. O soberania que sobre elas exerce, nem sequer se encontra aqui o limite à
problema mais grave da actualidade referente ao aproveitamento dos rios soberania sobre o mar territorial – o direito de passagem inocente ou
internacionais é o levantado pela poluição das águas devida ao inofensiva. A regra da competência do estado ribeirinho sofre algumas
desenvolvimento da indústria química, petrolífera, do papel e, mais excepções. Antes de mais, não se aplica aos navios de guerra. Como estes
recentemente, pela produção de matérias ou resíduos radioactivos. gozam de imunidade de jurisdição, não podem as autoridades locais: Entrar
em tais navios ou praticar a bordo qualquer acto sem autorização do
A este propósito acaba por vir à baila as teses geralmente postas em campo respectivo capitão ou qualquer autoridade competente do estado do
quando se discute a questão do aproveitamento das águas fluviais pavilhão; Julgar ou punir membros da tripulação por actos praticados a
internacionais. Uns sustentam a ultrapassada tese da soberania nacional bordo; Julgar ou punir membros da tripulação por actos praticados em terra,
absoluta: qualquer estado pode dispor como bem entender das suas águas, desde que, ao praticá-los, se encontrem de uniforme e em serviço oficial.
sem se pronunciar com as repercussões que a sua atitude possa vir a ter nos Dada, a sua qualidade de instrumentos de guerra, só podem entrar nas águas
estados vizinhos. interiores mediante permissão das autoridades do estado ribeirinho.
Outros defendem a pouco menos irrealista doutrina da integridade Zona contígua – no século XVIII, a Inglaterra reconheceu aos seus navios
territorial absoluta: nenhum estado pode fazer uso das águas que passam no o direito de fiscalizarem os navios estrangeiros que vogassem no alto-mar, a
seu território se os outros actos podem prejudicar outros estados. Não é fácil fim de procederem ao controlo aduaneiro do chá e da aguardente. Outros
encontrar um meio-termo. estados costeiros foram reivindicados jurisdição sobre uma faixa marítima
Como deverá ou poderá reagir um estado inferior, se o estado mais adjacente ao mar territorial, a qual veio a ser baptizado de zona contígua. Os
próximo da nascente polui do rio que os atravessa a ambos? direitos reivindicados não se traduziriam numa soberania completa: os
interesses em causa ficariam satisfeitos com o reconhecimento de direitos
Parece que a solução mais fácil é proibir toda a poluição fluvial. Assim limitados. A questão estava na matéria sobre que deveriam incidir.
acontece, por exemplo, quanto ao rio Danúbio no qual é proibido despejar
produtos petrolíferos ou respectivos resíduos. Na falta de um princípio
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Conceito da zona contígua: trata-se de um alargamento da jurisdição origem consuetudinária e que não deixou de ser codificada, em 1958, em
estadual para fora do mar territorial com objectivo apenas de satisfazer genebra, isto é, o direito de passagem inofensiva. Há grande controvérsia
interesses de segurança e de preservação e exploração dos princípios. quanto ao problema de saber quais os navios que devem gozar do direito de
passagem inofensiva. Alguns autores entendem que só não gozam de tal
A convenção consagrou-se, portanto, uma zona contígua apenas em matéria prerrogativa os navios de pesca; outros julgam ser mais coerente que nem
aduaneira, fiscal, sanitária e de emigração, a qual, para todos os outros aos navios de pesca nem aos navios de guerra sejam atribuído o direito da
efeitos, conserva o carácter de parte do alto mar, ou seja, o princípio da passagem inofensiva. Importa ter presente o modo como são determinados
navegação no alto mar é a da liberdade navegação. O alto mar é os limites do mar territorial.
considerado o património da humanidade e ninguém detêm de soberania no Nos termos da CDM – artigo 3º e seguintes -, os estados têm o direito de
alto mar. Portanto todos têm liberdade de navegar no alto mar. fixar a largura do seu mar territorial até um limite que não ultrapasse 12
A zona contígua está prevista na secção IV, artigo 33º e seguintes da CDM. milhas marítimos. Segundo o artigo 18º da CDM, entende-se por passagem
Neste artigo dispõe que a zona contígua não pode estender-se além de 24 o facto de se navegar no mar territorial, quer para o atravessar sem entrar
milhas marítimas, contadas a partir das linhas de base que servem para nas águas interiores, quer para entrar nas mesmas águas, quer ainda para
medir a largura do mar territorial. Diferentemente do que sucede fazer ao largo, vido delas.
relativamente ao mar territorial, a zona contígua deve ser expressamente A Passagem deverá ser contínua e rápida, embora compreenda o parar e o
reclamada. Portanto a zona contígua deve ser contada a partir das linhas de fundear, na medida em que os mesmos constituem incidentes comuns da
base que servem para medir a largura do mar territorial. Logo a zona navegação ou sejam impostos por motivos de força maior, por dificuldade
contígua são as 12 milhas da zona contígua mais as 12 milhas para além da grave ou pela intenção de prestar auxilio a pessoas, navios ou aeronaves em
zona territorial, esse 24 milha denomina de zona contígua. No direito perigo ou em dificuldade grave. A convenção parece ter optado por permitir
internacional, qualquer reivindicação de mar territorial para além das doze a todos os navios a passagem inofensiva, sejam eles públicos ou privados.
milhas é ilegítima. Também vigora o direito de perseguição na zona Assim, a secção III da convenção intitula-se “direito de passagem
contígua – artigo 111º da CDM. inofensiva” e a subsecção A, que trata de atribuição deste direito, encontra-
se sob a epígrafe “regras aplicáveis a todos os navios”, expressão em que
O mar territorial – o mar territorial é a faixa marítima adjacente às costas cabem necessariamente os navios de guerra e os navios mercantes – artigo
da superfície terrestre do estado, que vai desde a linha normal da maré- 17º da CDM.
baixa até a uma distância sobre a qual não há unanimidade de pontos de A passagem é inofensiva desde que não seja prejudicial à paz, à boa ordem
vista. Antes de mais, deve dizer-se que a delimitação do mar territorial é ou à segurança do estado costeiro, o que, de acordo com o artigo 19º/2 da
feita unilateralmente pelos estados. Actualmente o critério geralmente CDM, não se verifica num conjunto tipificado de situações. Jurisdição penal
válido é o das doze milhas marítimas a parir do ponto mais baixo da baixar- a bordo de navio estrangeiro – artigo 27º da CDM; jurisdição civil em
mar, devidamente reconhecido pelo estado costeiro. A soberania do estado relação a navios estrangeiros – artigo 28º.
costeiro sobre esta parte do seu território é quase completa. Aquele goza de
direitos exclusivos de pesca, de polícia, de regulamentação da navegação, Segundo o professor Jonatas Machado, defende que todos navios gozam o
da regulamentação alfandegária e sanitária, etc. Sofre uma limitação de direito de passagem inofensivo, sem excepção, inclusivos os navios de
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pesca e de guerra – argumentos: A secção III da convenção intitula-se territorial o critério do alcance de um tiro de canhão, enquanto marca visível
“direito de passagem inofensiva” e a subsecção A, que trata de atribuição do exercício da soberania. A precariedade deste critério é visível se pensar
deste direito, encontra-se sob a epígrafe “regras aplicáveis a todos os nos estados que antigamente não dispunham de canhões e nos estados que
navios”, expressão em que cabem necessariamente os navios de guerra e os hoje possuem mísseis internacionais.
navios mercantes; A passagem dos navios de pesca só deixa de ser Daí que se tenha abandonado este critério e adoptado um outro, das três
inofensiva se não forem observadas as leis e regulamentos que o estado milhas. Actualmente o critério geralmente válido é o das doze milhas
ribeirinho tenha editado para proibir a pesca no mar territorial; Os marítimas a parir do ponto mais baixo da baixar-mar, devidamente
submarinos são obrigados a navegar à superfície e a arvorar o respectivo reconhecido pelo estado costeiro. Também a convenção consagra aos
pavilhão. Esta obrigação só se compreende pelo facto de os submarinos estados o direito de perseguição dentro mar territorial. Portanto os estados
serem barcos de guerra submersíveis. têm o direito de perseguir os navios estrangeiros que estejam no seu mar
Daqui se pode inferir que qualquer barco goza do direito de passagem territorial e que estejam a infringir quaisquer leis deste estado – artigo 111º
inofensiva no mar territorial de outro estado. Quando as costas de dois da CDM. Quando cessa a perseguição – artigo 111º/3; quem tem pode fazer
estados são opostas ou limítrofes, o mar territorial de cada estado não a perseguição – artigo 111º/4;
ultrapassa a linha mediana da superfície marítima em causa, a não ser que
vigoram outros critérios: títulos históricos ou outras circunstâncias especiais A plataforma continental – a plataforma continental está prevista no artigo
– artigo 15º da CDM. Todo o estado ribeirinho pode suspender 76º e seguintes da CDM. A plataforma continental inclui o leito do mar e o
temporariamente a passagem inofensiva de navios estrangeiros, em certas subsolo marítimo. O valor económico de aproveitamento de recursos
zonas do seu mar territorial, desde que tal suspensão se torne necessária naturais, especialmente minerais levou a que os estados reivindicassem a
para protecção da sua segurança devidamente anunciada. soberania sobre essa parte do território. O marco decisivo para a formação
Quanto à largura do mar territorial, cada estado pretende obter a extensão de dum costume internacional geral que reconhece os direitos dos estados
mar territorial que mais benefício lhe trouxer. Portanto, se é um pequeno ribeirinhos sobre a plataforma continental foi a proclamação do presidente
estado, teme as frotas pesqueiras dos estados economicamente norte-americano em 1945 que considerava pertença dos EUA e debaixo da
desenvolvidos, munidas de radar, de navios-frigorificos e de navios- sua jurisdição e fiscalização os recursos naturais correspondente ao alto mar
fábricas, o que lhes permite pescar com eficiência, durante largas épocas, a adjacente às coisas dos Estados Unidos.
distâncias consideráveis dos seus portos. Alem disso, o pequeno estado Os restantes Estados seguiram o exemplo, declarando-se com direitos
teme a acção psicológica que, em caso de conflito interno, pode exercer a exclusivos à apropriação dos recursos mortos do leito e do subsolo do mar e
presença da esquadra duma grande potência a pouca milhas da costa. dos organismos vivos sedentários ou que só se podem locomover em
Por sua vez, as grandes potencias procuram a maior liberdade possível para constante contacto com o solo. Em 1958, concluiu-se em Genebra, uma
os movimentos da sua marinha de guerra e todos os estados com grande convenção sobre a plataforma em que encontra definida nesta mesma
tráfego aéreo temem o alargamento do mar territorial, dado o direito convenção – artigo 76º e seguintes da CDM.
internacional não permitir a passagem inofensiva aos aviões que sobrevoam Nesta área o estado costeiro pode, portanto, explorar e proceder à extracção
o espaço aéreo supra jacente ao mar territorial, a não se mediante acordo dos recursos minerais e outros recursos não vivos do leito do mar e do
dos estados interessados. Tradicionalmente, adoptou-se como limite do mar subsolo, bem como dos organismos vivos pertencentes às espécies
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sedentárias. Para tanto, pode construir e manter ou fazer funcionar sobre a Os mares internos – também os mares internos fazem parte do domínio
plataforma continental todas as instalações ou dispositivos necessários, marítimo dos estados. São vastas porções de água salgada cercadas de terra,
podendo estabelecer, em redor, zonas de segurança de 500 metros, que que podem ter ou não comunicação com o mar livre, assim se subdividindo
todos os navios estrangeiros devem respeitar. Tais instalações e dispositivos em mares abertos e mares fechados (estes designados frequentemente por
não têm o estatuto de ilhas, apesar de estarem submetidos à jurisdição do mares encravados. É o que se verifica relativamente ao Mar Aral, que,
estado ribeirinho e não têm, portanto, mar territorial próprio, não influindo a encravado no território da URSS, pertence unicamente a este Estado, que
sua presença na delimitação do mar territorial do estado costeiro. sobre ele pode exercer os mesmos direitos que exerce em relação a qualquer
As águas supra jacentes á plataforma continental conservam o carácter de outra parte do território nacional. Tratando-se de uma bar aberto, pertencerá
alto mar, havendo, pois, liberdade de navegação e de sobrevoo; na a um só estado, se tanto esse mar como o canal que o liga ao mar livre se
superfície da plataforma continental, todos os estados podem proceder a situarem dentro do território daquele estado. se o mar aberto se situa no
colocação de oleodutos e de cabos submarinos. território de um estado e o canal no território de outro, ou se tanto o mar
Quando a plataforma continental é adjacente ao território de dois estados como o canal pertencem a mais que um estado, o mar é livre.
cujas costas são opostas, o limite de cada plataforma será determinado por
acordo ou, na falta dele, pela linha mediana em relação à linha de base do Os estreitos e canais – tanto os estreitos como os canais são vias de
mar territorial. Os direitos do estado costeiro sobre a plataforma continental comunicação entre dois mares. Enquanto os primeiros são obra da natureza,
abrangem a exploração e extracção de recursos naturais – minerais ou os canais são o resultado de transformações operadas pela iniciativa
organismos vivos sedentários – e a autorização de perfurações humana, quer dizer, dão artificiais. Se um estreito está sujeito à soberania de
independentemente do fim, constituindo direitos soberanos, exclusivos e um único estado e faz a ligação com um mar fechado. Se um estreito pode
inerentes ao estado costeiro – artigo 77º da CDM. ser utilizado pela navegação internacional e estabelece a comunicação entre
Os mesmos não dependem de ocupação efectiva ou fictícia, nem afectam o duas zonas de alto mar ou entre um mar livre e um mar territorial de um
estatuto jurídico-internacional das águas supra jacentes ou do espaço aéreo estado estrangeiro, estamos perante um estreito internacional, no qual todos
sobre essas águas. A liberdade de navegação e sobrevoo não podem ser os navios gozam do direito de passagem inofensiva. É o que se verifica com
postas em causa – artigo 78º da CDM. Do mesmo modo, a exploração o estreito de Gibratar.
razoável e ambientalmente adequada da plataforma continental não pode
O alto mar – o alto-mar é formado por todas as partes do mar que não
pôr em causa o direito dos estados de colocar cabos e ductos submarinos –
pertençam ao mar territorial ou às águas interiores dum estado. é aberto a
artigo 79º da CDM.
todas as nações, e sem que nenhum estado possa legitimamente pretender
A plataforma continental de estados costeiros adjacentes ou situados frente
submeter qualquer parte dele à sua soberania. Quer-se com isto significar
a frente deve ser equitativamente definida por acordo, de conformidade com
que impera, neste domínio, o principio da liberdade do alto-mar, com os
as fontes de direito internacional referidas no artigo 38º do estatuto do TIJ,
seus corolários de liberdade de navegação, liberdade de pesca, liberdade de
ou, na falta de acordo, através dos mecanismos de solução de controvérsias
colocação de oleodutos e cabos submarinos e liberdade de sobrevoo.
previstos na parte XV da convenção – artigo 83º da CDM.
Zona económica exclusiva (ZEE) – nos termos da CDM – artigo 55º - a
ZEE é uma zona situada além do mar territorial e a este adjacente, tem uma
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largura de 200 milhas, sujeita ao regime jurídico específico por ela princípios de justiça e humanidade, quanto aos fins e quanto aos meios,
determinado. Nela, o estado costeiro tem direitos de soberania para fins de remota à antiguidade pré-cristã.
exploração e aproveitamento, conservação e gestão dos recursos naturais,
vivos ou não vivos, das águas sobrejacentes ao leito do mar e o seu subsolo. A defesa da utilização incondicional da força armada sempre coexistiu com a
Alem disso, o estado costeiro dispõe, nomeadamente, de jurisdição no que tentativa de proceder à sua limitação. Na idade média, Tomás de Aquino
se refere à colocação e utilização de ilhas artificiais, instalações e estruturas, sustentou que, para ser justa, a guerra devia ser combatida sob a autoridade
à investigação científica marinha, à protecção e preservação do meu do soberano, tendo como fim resolver um mal muito grave e sempre sob
marinho. uma recta intenção. Por seu lado, Hugo Grócio parte da premissa de que o
direito deve vincular a comunidade internacional, tanto na guerra como na
No exercício dos seus direitos e deveres na ZEE, o estado costeiro deve ter paz, não podendo existir zonas livres de direito nas relações entre os estados.
na devida conta os direitos e deveres dos outros estados nos termos do Esta noção esteve na base do desenvolvimento do chamado direito da guerra,
tratado em presença. Os direitos de jurisdição na ZEE são limitados e integrando o direito a declarar a guerra e o direito na guerra, de acordo com
específicos, a exercer nos precisos termos da CDM – artigo 56º. O regime o princípio fundamental de que a guerra só é legítima quando é justa.
jurídico da ZEE pretende ponderar os interesses de outros estados,
estabelecendo um sistema complexo de direitos e deveres. Ainda assim, o problema de saber quando é que uma guerra pode ser
considerada justa e quem tem competência para o decidir revelou-se
Na ZEE todos os estados, quer costeiros quer sem litoral, gozam das impossível de determinar em termos incontroversos. Se a escola peninsular
liberdade de navegação e sobrevoo e de colocação de cabos e ductos tendia a favorecer as competências do Papa e dos monarcas católicos neste
submarinos, bem como de outros usos do mar internacional lícitos, domínio, já Hugo Grácio utilizava critérios universais de direito natural. Para
relacionados com as referidas liberdades, tais como ligados à operação de ele, a guerra só seria admissível se, quando e na medida necessária para
navios, aeronaves, cabos e ductos submarinos – artigo 58º da CDM. O defesa da nação e para garantir a efectividade do direito, devendo ser levada
artigo 57º da CDM fala do da largura da ZEE. Artigo 59º da CDM; artigo a cabo com não menos escrúpulos do que os devidos num processo judicial.
70º da CDM; artigo 71º da CDM; artigo 79º da CDM; artigo 73º da CDM;
artigo 74º da CDM; No século XVII, Vattel sustenta que o soberano pode recorrer à guerra
defensiva e ofensiva para combater e punir a injustiça e obter a realização de
O USO DA FORÇA NO DIREITO INTERNACIONAL justiça, em virtude de não existirem mecanismos alternativos para este
efeito. No auge do positivismo estatista, a guerra era legitimada, em termos
Nota histórica - Tradicionalmente o recurso á força era visto como um mero darwinianos, como um instrumento natural e biologicamente justo para o
facto, no direito internacional. Entendia-se que o uso da força no direito triunfo das raças mais favorecidas na luta pela vida. Com a criação da ONU
internacional constituía uma prerrogativa natural da soberania dos estados, e a aprovação da DUDH, foi-se tornando claro que a melhor solução
pelo que, na prática, a mesma operava em benefício exclusivo dos consistia em te matizar o recurso à força a partir dos direitos humanos.
poderosos, verificando-se uma total ausência de garantias para os mais
fracos. A noção de que os conflitos armados se devem subordinar a
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O uso da força e a carta da ONU – um sistema de segurança colectiva: o um estado e, em termos mais gerais, contra os fins da carta. A existência, ou
monopólio da coação legítima da ONU - As Nações Unidas encontram-se não, de uma declaração formal de guerra é irrelevante, tanto mais quanto se
edificadas sobre os princípios da proibição de recurso à força por parte dos verifica que, na prática, a mesma é cada vez menos utilizada.
Estados e da Obrigação de resolução pacífica dos conflitos. A efectivação
do princípio da proibição de recurso à força no direito internacional O capítulo VII da carta da ONU - O sistema da manutenção de paz e da
encontra-se fortemente dependente da generalização e credibilização dos estabilidade internacional das Nações Unidas assenta na responsabilidade
meios de resolução pacífica de conflitos. Se o recurso aos meios de primordial do conselho de segurança. É a este órgão que compete a
resolução pacífica de conflitos falhar, as partes dever remeter qualquer determinação da existência de uma ameaça à paz ou de uma rotura da paz e
disputa que constitua uma ameaça à paz e à seguranças internacionais ao a recomendação ou decisão do recurso à força, nos termos dos artigos 41º e
conselho de segurança. 42º da carta, operando com autonomia relativamente à Assembleia-Geral da
ONU. Só as suas decisões revestem carácter obrigatório para os estados.
Nalguns casos o recurso à força, sendo sempre dramático e indesejável, é Normalmente entende-se que a proibição do recurso à força vale no
infelizmente inevitável e mesmo necessário e justificado. Existem contexto das relações entre estados, com exclusão de conflitos de direito
princípios e regras de direito internacional que devem ser observados em interno. No entanto, casos que conflitos internos podem assumir um relevo
caso de conflito armado. O sistema da ONU tem como premissa jurídico internacional.
fundamental a detenção por esta de monopólio da coação legítima no plano Não existe um sistema de controlo jurisdicional das decisões da conselho de
internacional. Talvez seja este aspecto o que mais se aproxima de uma segurança. A regra geral é a da proibição do recurso à força, uma norma
transferência de soberania dos estados para a ONU. Todavia, isso não é imperativa de direito internacional. No entanto, existe a possibilidade de o
correcto, nem na teoria nem na prática. O recurso à força para cometer uma Conselho de segurança recomendar ou decidir o recurso à força. A
agressão contra um estado é hoje considerado um crime internacional. operacionalização do capitulo VII encontra-se formalmente assente na
Conduz hoje à responsabilidade criminal individual internacional por celebração de acordos especiais, oportunamente negociados, mediante os
genocídio, agressão, crimes de guerra e crimes contra a humanidade. Não quais os estados comprometem a proporcionar ao conselho de segurança
obstante, a comunidade internacional ainda não conseguiu chegar a uma forças armadas, assistência e facilidade necessários à manutenção da paz.
definição consensual de agressão e de rotura da paz internacional.
Legítima defesa - O direito da legítima defesa constitui uma excepção ao
A própria definição de guerra é controvertida da doutrina. Alguns utilizam o princípio da proibição do recurso à força. Desde há muito que se entende,
termo em sentido restrito, reservando-o, dentro da categoria genérica dos no direito internacional, que os estados têm o direito e o dever de auto-
conflitos armados, àqueles que se travam entre estados, precedidos de uma preservação e de defesa dos seus membros.
declaração formal de guerra. Outros preferem uma acepção mais ampla,
compreendendo todas as hostilidades armadas entre estados e mesmo entre A legítima defesa tem algumas características:
grupos dentro de um estado que não tenham um carácter esporádico ou
- é o que sucede com a provisoriedade da defesa, até que o conselho de
isolado. A carta da ONU aponta inequivocamente para a proibição de
segurança tome as medidas necessárias, e com a sua subsidiariedade, já que
recurso à força militar contra a integridade territorial e a independência de
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a defesa só é legítima se não existir uma alternativa viável sob a égide da dirigentes e dirigidos, detentores e destinatários do poder. O poder acabar
ONU. sempre por se materializar em instituições através das quais se organiza, e
exprime-se, assim, oficialmente uma desigualdade.
- Igualmente importante é o dever de notificação das medidas tomadas ao
conselho de segurança da ONU. Para além disso, a legitima defesa está No direito internacional o poder político é um elemento do estado, que só
sujeita ao princípio da proporcionalidade em sentido amplo, desde sempre tem relevância jurídico-internacional enquanto organização institucional,
associado à ideia de guerra justa. Valem aqui as exigências do princípio da que efectivamente exerce o domínio sobre a população e o território, e
proporcionalidade em sentido amplo, de legitimidade do meio, em face das defende os interesses do estado no exterior. O poder só interessa portanto ao
normas imperativas de direito internacional, de adequação do meio ao fim, direito internacional como um conjunto de órgãos, instituições e
de necessidade do meio em ralação ao fim. autoridades que exprimem a soberania politico-juridica do estado e
garantem o cumprimento das obrigações internacionais.
Legitima defesa preventiva ou antecipatória
Segundo o Jonatas Machado, o conceito moderno de soberania é
A questão, respeitante à legítima defesa preventiva, ou antecipatória, alguns geralmente caracterizado pelas notas típicas de estadualidade, publicidade,
entendem que existem situações em que a necessidade, por parte de um
estado que se sente ameaçado, de levar a cabo um ataque preventivo, com independência, autodeterminação, auto normação, centralização, hierarquia,
base na ideia de que a melhor defesa é o ataque, constitui uma justificação jurisdição, indulto e autoridade coerciva, monetária, tributária, penal e
aceitável para o recurso à força. militar. No presente momento do conceito, ainda de contornos imprecisos, é
A maioria dos autores, porém, chama a atenção para o que há de arbitrário e referido com expressões como pós-soberania, soberania limitada, soberania
manipulável numa tal concepção, susceptível de abrir as portas a uma partilhada, soberania globalizada, soberania imperial, ou simplesmente
abusiva invocação da existência de uma ameaça. Isto, para além dos riscos soberania avançada. Deste conceito, ao mesmo tempo que explicita algumas
militares inerentes às acções preventivas, que a doutrina descreveu como
das suas notas tradicionais, pretende da conta de alguns desses factores de
uma forma de suicídio por meio da morte. Para este entendimento, a ameaça
deve ser eminente, Seia e intensa, não se confundindo, por exemplo, com a transição. Diferentemente, afasta-se hoje o entendimento de que os estados
mera pose de armas convencionais, químicas, bacteriológicas ou nucleares são pessoas morais e realça-se o facto de que os mesmos são apenas
por parte do estado alegadamente ameaçador, nem com a simples realização recursos institucionais ao serviço dos cidadãos. É nestas premissas que
de exercícios militares pelo mesmo. Daí que resulta a luta contra o radica a noção de soberania como responsabilidade. Potencialmente
terrorismo tenha obrigado á consideração da admissibilidade de um novo ilimitada no plano interno, a soberania estadual encontra-se, na realidade,
tipo de legítima defesa preventiva, em situações em que se trata de subordinada ao direito internacional e aos valores transnacionais de respeito
neutralizar ameaças extraordinárias, geradoras de uma situação global de
pela dignidade da pessoa humana e pelos seus direitos básicos. Entende-se
perigo, desde que causada por actores não estaduais, revestindo contornos
ocultos, difusos e indeterminados. que hoje que o estado não pode dispor livremente dos seus próprios
cidadãos. À soberania estadual anda associada a responsabilidade de
A SOBERANIA OU PODER POLÍTICO proteger os direitos fundamentais dos cidadãos e de promover o seu bem-
estar económico e social, proporcionando um quadro institucional e
Conceito – segundo o Vlademir Brito, o poder político é um fenómeno normativo de auto governo democrático e subordinação ao direito. A
relacional entre grupos antagónicos ou, pelo menos, contraditórios,
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soberania como responsabilidade aponta para a consideração do estado de especialmente as do ius cogens que impõe certos deveres que o estado
direito democrático, é de promover, não a soberania do estado mas sim a terá que cumprir;
soberania dos cidadãos.
c) a plenitude de competências significa que, no interior do seu território,
Atributos fundamentais – a soberania consiste na ausência de qualquer a competência do estado é ilimitada, no sentido de que este pode
dependência orgânica relativamente a qualquer outra entidade dentro do livremente determinar a extensão da sua competência material. Disto
decorre que a competência estatal é plena e tem como única limitação as
respectivo marco territorial. A soberania traduz-se na capacidade de
obrigações por ele assumidas internacionalmente, cuja violação pode
estabelecer relações com outros estados em condições de igualdade e fazer com que ele incorra em responsabilidade internacional.
simetria de reconhecimento. A estas duas dimensões acrescenta-se a O princípio da igualdade: os estados são, sob ponto de vista do direito
capacidade de estruturar normativamente a vida dentro das suas fronteiras, internacional, juridicamente iguais, o que significa que todos os estados,
sem interferência de terceiros estados. independentemente da extensão do seu território, do número de habitantes,
do seu poder económico, politico ou militar, têm os mesmos direitos e
Características da soberania –
obrigações;
a) exclusividade de competências que significa que no interior do seu
território, o estado, e só ele, pode exercer os poderes ou as competências Os direitos fundamentais do estado: tradicionalmente existem os
decorrentes da soberania, quer sobre o território, quer sobre as pessoas seguintes direitos fundamentais dos estados:
que nele habitam. A exclusividade da competência significa, portanto,
que o estado monopoliza, no interior do seu território o exercício do o direito à independência, o direito à autoconservação, o direito à
poder legislativo, administrativo, o poder jurisdicional e o poder igualdade, o direito á honra, o direito aos signos e símbolos nacionais e o
coercivo e essa exclusividade só é absoluta no que se refere ao exercício direito ao comércio.
do poder coercivo. Nesta perspectiva, a exclusividade de competências é
relativa naqueles domínios em que o estado pode partilhar as suas Entende que só são direitos fundamentais dos estados os seguintes: o
competências com a comunidade internacional, permitindo que esta a direito á independência, o direito á supremacia territorial e o direito à honra.
traves de normas jurídico-internacionais, exerça certas competências no A estes direitos correspondem os deveres de não ingerência nos assuntos
interior do território estatal; internos dos estados, de respeito pela integridade territorial e pela honra dos
estados.
b) autonomia das competências significa que o estado, no interior do seu
território, pode e deve agir com independência, isto é, sem estar O direito à independência consiste no direito que os estados têm de, no
dependente de ordens ou instruções de outros estados. De acordo com
interior do seu território, e com respeito pelo direito internacional, decidir
este princípio cada estado pode e deve decidir com plena liberdade
sobre a sua organização político-constitucional não estando obrigado a com plena autonomia a sua politica interna e externa e de ver respeitadas as
ter de se sujeitar a comandos, directos ou indirectos, de outros estados. suas decisões. Como corolário desse direito há o direito à imunidade dos
Aqui, também, não pode atribuir um sentido absoluto à autonomia, visto estados, precisamente por que o respeito pela independência implica que
que se a regra é, com efeito, a da discricionariedade de competência, nenhum estado deva ser submetido à jurisdição ou ao ordenamento jurídico
não é menos certo que em determinadas matérias pode a competência de outro. A este direito corresponde o dever de não ingerência nos assuntos
estatal estar limitada e condicionada por normas jurídico-internacional,
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internos, que se traduz no respeito recíproco pela independência política e Existem poderes do estado sobre o território em que é exercido as
organização jurídico-constitucional interna de cada estado; características da exclusividade, da autonomia e da plenitude de
competências, que já forem aferidas. Também há poderes exercidas fora
O direito à supremacia territorial é a faculdade que o estado tem de do território com base na soberania territorial que refere aos navios ou
decidir autorizar ou não, mo interior do seu território, a prática, por outros aeronaves militares, aos navios públicos ou aeronaves civis e aos navios e
estados, de actos de carácter oficial. A este direito corresponde o dever de aeronaves privados.
não ingerência na supremacia territorial dos estados, que aqui deve ser
entendido como um dever imposto a cada estado de não praticar actos que Competência do estado sobre pessoas: nacionais e estrangeiros – o estado
denunciem o exercício de poderes públicos no território do outro, sem o pode, assim, exercer um conjunto, mais ou menos amplo, de competências
consentimento deste; não só sobre os seus nacionais, quer estes habitam o território estatal, quer
se encontrem no estrangeiro, como, ainda, sobre os estrangeiros que
O direito à honra é o direito que cada estado tem de fazer respeitar a sua residem nos seu território ou aí se encontrem.
honra, isto é, o seu bom nome, a sua dignidade e a consideração de que
goza na sociedade internacional. Nenhum estado está obrigado a tolerar as A questão da nacionalidade é essencial para a demarcação da competência
ofensas à sua honra, que podem consistir na prática de actos que atentem pessoal dos estados, dado que esta é exercida de forma diferente conforme
contra os seus símbolos nacionais ou contra os seus órgãos de soberania. A se trate ou não de seus nacionais; o ponto que interessa agora averiguar é o
este direito corresponde o dever de os estados garantirem o respeito pela de saber, sob o ponto de vista do direito internacional, quem pode atribuir a
honra dos outros estados. Esta garantia consiste na adopção de medidas de nacionalidade. Parece estar fora de dúvidas que o direito internacional
natureza penal e administrativa que permitem ao estado punir as pessoas – confia à ordem jurídica interna de cada estado a regulamentação da
nacionais ou estrangeiras – que, no seu território, ofendam a honra de atribuição, da conservação e da perda da nacionalidade, embora não deixe
terceiros estados. de apor certas limitações ao direito interno. Os critérios de conexão
reconhecidos como geralmente válidos pela ordem jurídica internacional,
Os poderes do estado sobre o território e as pessoas – o estado pode entre os quais são o do ius sanguinis e o do ius solis, comumente aceitem
exercer os seus poderes quer sobre o seu território, quer sobre as pessoas – como critérios tipo.
nacionais e estrangeiras – que nele vivem. Esses tais poderes reconhecem a
todos os estado de legislar para todo o território, de exercer a competência De acordo com o ius sanguinis, a atribuição da nacionalidade é feita com
jurisdicional e de monopolizar o poder coactivo. É claro que todos estes base em laços de sangue, enquanto é o local de nascimento que está na base
poderes são limitados, em maior ou menor grau, pelo direito internacional. do ius solis; em matéria da regulamentação da nacionalidade o direito
Das competências territoriais do estado existem competências internacional impõe aos estados limites que estes devem respeitar, embora a
discricionárias e competências vinculadas. As competências discricionárias doutrina não só admita unanimemente que com fundamento no direito
visam proteger a soberania estatal e estão ligadas à ideia do domínio internacional geral o único limite inequivocamente aceitável é o de que os
reservado dos estados, isto é, àquele conjunto de actividade jurídicas que o estados devem abster-se de determinar quem são os nacionais de outros
estado pode exercer sem qualquer submissão ao direito internacional, por estados e é o de que a determinação da nacionalidade deve assentar numa
serem essenciais à sua própria vida. relação efectiva e estrita entre a pessoa e o estado, qualquer que seja o
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critério utilizado para o efeito – ius sanguinis ou ius solis – ou qualquer
outro.

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