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semelhantes àquelas recebidas pela teoria das representações sociais, formulação teórica
Valencia, Páez, Basabe e Gonzales (1998) acreditam que com grande frequência
os termos memória coletiva e memória social são confundidos. Para esses autores, a
conceber como a influência que certos fatores sociais têm sobre a memória individual.
Porém, a maioria dos autores que utilizam o termo memória social está na verdade
Sá e Vala (2000) ao sugerirem que o conceito de memória coletiva esteja passando pelo
mesmo processo que aquele empregado pelo psicólogo francês Serge Moscovici (1984)
coletiva” (p. 34). Um dos primeiros exemplos dessa aproximação conceitual entre
Vergara (1992) que, ao estudar o fenômeno da Aids, concluem que “as representações
(p.263).
grupo através das interações dos seus membros" (p.24). Na mesma direção, Emelyanova
(2002) defende que “a memória coletiva pode ser concebida tanto como um processo de
maior é o numero das elites competindo para dominá-la; logo, mais o passado torna-se o
interesses dominantes.
pelo filósofo francês Henri Bergson (1859-1941), que propunha uma abordagem da
memória como fenômeno individual, salientando seus aspectos subjetivos. Para Bergson
memória são pólos opostos, embora complementares. Tornou-se ainda clássica a divisão
memória-hábito seria a internalização que ocorre nas pessoas com os passos necessários
acelerador, muda-se as machas, nem sempre com a atenção voltada para o movimento.
motivo, segundo Bérgson, de muitas vezes não guardarmos na memória um fato inteiro
suas obras Les cadres sociaux de la mémoire, de 1925 e La mémoire collective, obra
realizou uma verdadeira síntese dos pontos de vista opostos de Durkheim e de Tarde,
social, mas como um processo de apropriação pelos grupos sociais da sua própria
existência. Por esta razão, a socialização supõe a presença da memória e isto suscita a
passado compartilhado que são mantidas pelos membros de um mesmo grupo, classe ou
que ela produz, sua eficácia social, é realizado pela introdução de um nível simbólico no
discurso sobre o passado e pela legitimação deste discurso pelas instâncias externas ao
conjuntamente. Ou seja, toda memória individual na sua gênese é social, pois para
lembrar de seu passado todo indivíduo ancora-se nas reminiscências e nas figuras dos
sociais, entre outros. Até o tempo é visto aqui, em primeiro lugar, como “um quadro
social que permite aos indivíduos e aos grupos sociais constituírem sua memória”
(Viaud, 2002, p.24). Nessa mesma linha, Bosi (1995) afirma que:
Halbwachs não vai estudar a memória, como tal, mas os “quadros sociais da
memória”. Nessa linha de pesquisa, as relações a serem determinadas já não
ficarão adstritas ao mundo da pessoa, mas perseguirão a realidade
interpessoal das instituições sociais. A memória do indivíduo depende do
seu relacionamento com a família, com a classe social, com a escola, com a
igreja, com a profissão; enfim com os grupos de convívio e os grupos de
referência peculiares a esse indivíduo. (p.54)
c) Em terceiro lugar, a memória é social ou intersubjetiva porque se baseia,
Halbwachs tinha por certo razão ao afirmar que os grupos sociais constróem
as suas próprias imagens do mundo estabelecendo uma versão acordada do
passado e ao sublinhar que estas versões se estabelecem graças à
comunicação, não por via das recordações pessoais. (p. 8).
Halbwachs via o funcionamento da memória dentro de um modelo bi-
dimensional, composto por uma função global e por uma função grupal. A principal
as gerações quando exercem a atividade de “olhar para trás” e achar que antes era tudo
melhor, mais tranqüilo e mais fácil. É a chamada “idade de ouro”, quando as famílias
eram mais unidas e a vida social menos violenta (Bellelli e Amatulli, 1998; Laurens,
dos grupos. A memória coletiva atuaria como uma reconstrução do passado, adaptando
Middleton e Edwards, 1990b). Ela também serviria para estabelecer a identidade grupal,
pela extinção do grupo (morte ou dispersão dos indivíduos) que existia como suporte,
tornando-se necessário preservar este conhecimento institucionalmente através de uma
narrativa escrita. De fato, segundo Halbwachs (1990), “em geral, a história não começa
até que termina a tradição, que é quando a memória social desaparece e se decompõe”
Halbwachs (1990) nos seguintes pontos: (a) a memória coletiva é uma corrente de
histórica existe fora dele; (c) os limites da memória coletiva são flexíveis, enquanto que
podem coexistir várias memórias coletivas; (e) a memória coletiva se sustenta sobre
grupo visto de dentro, enquanto que a histórica é exatamente o grupo visto de fora.
historiador francês Pierre Nora (1992; 1993). Para o autor, os lugares de memória são
instâncias nas quais “a memória é seletivamente encarnada, e que, pela vontade dos
formação rochosa presente em Israel, foi por séculos o palco quase mitológico de um
recrutas do exército eram obrigados a fazer seu juramento de defender Israel de todos os
seus inimigos e se preciso dar a vida em troca desse ideal, como o fizeram seus
aqueles que não os viveram (Quinault, 1998; Sá e Oliveira, 2002; Sá, Oliveira e Prado,
2003; Naiff, Sá e Möller, 2003; Möller, Sá e Bezerra, 2003). Nora (1993) salienta o fato
e Ranger (1984), que através do estudo das tradições nas sociedades ocidentais,
XIX, como uma forma de manipulação, através das elites, das imagens do passado até à
lembrança humana. Para tentar compensar esta lacuna, acompanharemos agora o resgate
que tem sido feito das idéias seminais sobre o caráter social da memória humana
cérebro, mas apenas traços deixados pela experiência (esquemas) que se transformariam
toda vez que fossem ativados para produzir uma atividade concreta no curso de uma
ação em marcha. Desta forma, as memórias não seriam fixas, mas sim recriações do
uma entidade com passado e com futuro (Rosa, Bellelli e Bakhurst, 2000). Logo, o
processo de recordar algo implica ter acesso a informações disponíveis como resultado
pessoais e históricos.
Uma das características do enfoque de Bartlett era sua ênfase no valor afetivo,
Bakhust, 2000). Estes efeitos possuiriam uma importância de primeira ordem nas
sejam estas narrações verbais ou tenham uma natureza imagética, sejam frutos da
sentimento.
cultural ou um de seus elementos (um texto, uma imagem, uma idéia) é transformado
quando ele é transferido de um grupo para o outro, até tomar uma forma distinta, estável
permitir que o recordado seja coerente com os estereótipos e com os valores locais
existentes.
forma central da representação do objeto – e que não são mais importantes por sua
como novo elemento cultural, mas também torna-se elemento constitutivo do esquema
social do grupo, no qual adquire uma nova forma que lhe permite integrar novos
elementos.
apresenta uma certa analogia com a sociogênese das representações sociais evidenciada
por Serge Moscovici na sua obra seminal A representação social da psicanálise: sua
foi resgatada na psicologia social moderna através das duas reedições de sua obra
Johnson (2001), pode-se identificar pelo menos três períodos no resgate das idéias
originais de Bartlett: (a) entre a década de 1940 e 1950, período dedicado à replicação
presentes em Remebering; (b) uma segunda onda iniciada pela obra do psicólogo
americano Ulric Neisser (1982), caracterizada pela ênfase cognitiva no campo de estudo
onda, que ainda estaria em curso, representada pelos artigos publicados nos últimos 10
ênfase vygotskiana nos aspectos culturais e sociais da cognição, facilitada pela explosão
das idéias de Vygotsky no Ocidente na década de 1980 (Van der Veer, 2001).
nas suas teorizações e experimentos, integrar numa mesma perspectiva o homem como
corpo e mente, ser biológico e ser social e enquanto membro da espécie humana e
em três grandes postulados, como sintetizado por Van der Verr e Valsiner (1996):
cerebral;
c) A relação do homem com o mundo a sua volta é basicamente uma relação mediada
por símbolos.
supracitado,
mesmo nos estágios mais primitivos do desenvolvimento social, ela poderia ser dividida
haveria uma resposta Y e se bem sucedida, esta informação poderia vir a ser utilizada
em povos iletrados. Entretanto, mesmo nesses povos que não dominavam a escrita,
Vygotsky também observou que a memória natural não era a única encontrada.
1
Grifo do autor.
madeira ou nós, mostraram ao autor que “mesmo nos estágios mais primitivos do
desenvolvimento histórico os seres humanos foram além dos limites das funções
envolvidas no ato de lembrar para além das dimensões biológicas do sistema nervoso
mediação.
principal essência da memória humana é que os homens ativam suas lembranças com a
ajuda de signos” (apud Barkhurst, 1990, p. 210). Estes elementos mediadores surgem
a espécie humana.
psicológica essencialmente social nas suas origens; (b) em segundo lugar, as memórias
são estados constituídos socialmente; e (c) em terceiro lugar, certas formas de atividades
simbólicos que são fenômenos culturais. A criança humana apenas adquire as funções
pela qual introduziu uma concepção das bases sociais da memória, na qual possuir uma
"memória lógica" envolveria muito mais uma sensitividade para o uso instrumental de
mostraria, como observa Bakhurst (1990), que nenhuma forma de memória adulta pode
comunidade e cultura.
lembram de alguma coisa, fato este que ilustraria o caráter ativo da memória mediada.
defendem que o ser humano cria lugares específicos (museus, monumentos) para que a
memória seja mantida, “os lugares de memória” (Nora, 1992), Vygotsky (1984)
escreve:
A verdadeira essência da memória humana está no fato de os seres humanos
serem capazes de lembrar ativamente com a ajuda de signos. Poder-se-ia
dizer que a característica básica do comportamento humano em geral é que
os próprios homens influenciam sua relação com o ambiente e, através desse
ambiente, pessoalmente modificam seu comportamento, colocando-o sob
seu controle. Tem sido dito que a verdadeira essência da civilização consiste
na construção propositada de monumentos de forma a não esquecer fatos
históricos. Em ambos os casos, do nó e do monumento, temos manifestações
do aspecto mais fundamental e característico que distingue a memória
humana da memória dos animais. (p.68).
4- ALGUMAS ABORDAGENS CONTEMPORÂNEAS NO
principais estudos a respeito da memória social têm se concentrado nas seguintes linhas
principais:
c) Analisar quais são os fatores que fazem com que acontecimentos coletivos
traumáticos, que não são comemorados, algumas vezes até negados institucionalmente,
memória social (Conway, 1998; Schuman, Belli e Bischoping, 1998), porém entender
este processo requer uma análise mais cuidadosa do próprio conceito de geração,
gerações não como períodos objetivos, mas como coortes definidas subjetivamente.
Na sua obra clássica de 1952, “O problema sociológico das gerações”,
afirmando que:
Desta forma, Mannheim afirma que o fenômeno social das gerações não
processo cultural estão surgindo, enquanto antigos participantes daquele processo estão
desaparecendo; (b) os membros de qualquer uma das gerações apenas podem participar
maneira pela qual Mannheim considera que a experiência passada pode ser incorporada
amoldam suas condutas. Como exemplo, o autor cita a influência que a Revolução
Francesa teve sobre a maioria dos modelos revolucionários subsequentes, que tentaram
(1993). Mannheim também acredita que a memória pode ser subdividida em: (a)
vividas pelo indivíduo; e (b) memórias apropriadas, fruto da transmissão cultural entre
os indivíduos.
“similaridade de situação”; o que realmente cria esta situação comum são eles estarem
“não é difícil perceber porque a mera contemporaneidade cronológica não pode, por si
realidade”, que envolveria uma dimensão a mais que a mera existência numa localidade
marcada histórica e socialmente, e que seria a "participação no destino comum" dessa
histórica; e um mais particular, a localidade física. Se era verdade que os jovens alemães
também era verdade que havia enormes diferenças entre os jovens alemães urbanos e os
jovens alemães camponeses. Em outras palavras, esses dois últimos grupos, por não
compartilharem entre eles a mesma participação no destino comum, não podiam ser
situação social que as caracteriza como únicas. Esta situação social surgiria das
experiências compartilhadas pelos seus membros. Os eventos públicos que afetam uma
são todos experiências sociais que dão forma a gerações particulares (Fields, 1994).
Neste raciocínio, os dados mentais são de importância sociológica, não somente pelos
seus conteúdos reais, mas também porque eles fazem com que os indivíduos os
compartilhem para formar um grupo, tendo assim uma função socializadora. As pessoas
estrutura social e cultural, mas por causa das similaridades resultantes na memória
(1998):
determinado fato o que falam seus pais e avós. Neste contexto, o conhecimento dos
anos de vida adulta proporcionariam uma abertura especial aos fatos mais importantes,
sendo que aqueles sujeitos que já tivessem passado esta fase quando um fato
acontecesse teriam uma menor lembrança deste fato do que aqueles que eram jovens
como crucial, é pouco provável que se possa aplicar algo tão preciso na atualidade. O
traumáticos, por exemplo, podem ter maior impacto em idades mais jovens do que
similares entre eles; “os tipos de experiências compartilhadas e uma ênfase em certas
unidade geracional” (Conway, 1998, p.60). São estas metas e planos comuns que
político, um clima de censura no ar, etc, deixam numa população sempre serão alvos de
capacidade de renascer sempre que o sujeito acessa seu passado no presente, entender os
efeitos e funções no nível social. Assim, podemos afirmar que as memórias sociais de
1998).
Entre as primeiras contribuições ao estudo dos fatos traumáticos no moderno
campo da memória social, estão as daqueles que procuram analisar o fenômeno das
ocorre quando o sujeito é submetido a eventos com forte impacto emocional. Este
momento na memória dos sujeitos como uma imagem fotográfica, o que permitiria
Harbor, etc. Enquanto ilustração, este autor lembra-se claramente o que estava fazendo
quando Ayrton Senna, piloto de fórmula 1 e grande ídolo esportivo brasileiro, morreu
acidentado na Itália.
atribuída aos seus conteúdos, propondo que é muito mais a elaboração sucessiva de um
evento e, em particular, sua repetição o que explicaria a formação das memórias “flash”,
característico das memórias “flash” seria sua função de ligação de pontos de referência
O caráter social das memórias flash é defendido por Finkenauer, Gisle e Luminet
Edwards, 1990c).
Existem evidências empíricas que mostram que, quando os indivíduos vivem uma forte
redor. Este falar repetidamente sobre um assunto dramático teria a função não apenas de
que permita uma resolução cultural do trauma emocional, que na falta de mudanças
começo da vida adulta. Como exemplo, podemos citar as pesquisas que, estudando o
impacto que fatos traumáticos ocorridos no século passado tiveram na população dos
1997; Pennebaker & Crow, 2000). Tentando entender melhor este fenômeno, três
históricos que impactaram a história americana no século passado são recordados pelos
primeiros anos de vida adulta são mais fácil e intensamente evocados do que aqueles
70 anos. Nesses estudos, pedia-se aos sujeitos para relatarem uma série de memórias
como resposta a vários fatos indicados. As respostas mostraram que em primeiro lugar
anos e, em segundo lugar, as que haviam se originado quando eles tinham entre 21 e 30
anos de idade.
da identidade social e das primeiras relações intimas, além de ser um tempo de grandes
variações emocionais e fisiológicas, sendo cada uma dessas dimensões importantes para
é destacada por Erik Erikson (1976), que defendia que entre as idades de 12 a 19 anos a
estabelecer relações íntimas com os outros. Para Erikson, após esse período de vida, a
para fazê-lo. Se a hipótese do período crítico está correta, as pessoas que possivelmente
ocorrência do evento, este grupo não possui a influência econômica ou política para
geracional afetada tem em média 40 anos, é que possuiria os recursos para finalmente
Este fenômeno ajudaria a entender o porquê das pessoas que viveram situações
traumáticas evitarem a construção de monumentos, pois a sua existência acabaria
traumático.
Gonzales (2000) defendem que uma repressão sociopolítica costuma deixar de atuar
depois de um período entre 20 e 30 anos. Ao fim deste período a grande maioria dos
responsáveis diretos pela repressão, guerra, etc, em outras palavras, pelo aparato de
antiga Alemanha Oriental, Ehlers, Maercker e Boss (2000) concluem que a PTSD é uma
Incescu e Sarimurat (1996), que estudaram quais as seqüelas psicológicas que repetidas
que afirmavam não terem sofrido agressões físicas na prisão. Com o auxílio da técnica
haviam sido submetidos às torturas apresentavam escores de PTSD maiores que o grupo
dos não torturados. Mostrando relação intrínseca com a identidade social dos sujeitos,
como ativistas políticos possuíam escores menores de PTSD, e do total dos aprisionados
que se declaravam como tendo atividade política, os torturados possuíam uma avaliação
mais positiva deles próprios como ativistas políticos do que aqueles que não haviam
sido torturados.
memória da experiência traumática. Mesmo não vivendo como seus pais os horrores do
trauma. Algumas ilações podem ser retiradas dos trabalhos acima para tentar entender o
manifesta-se como uma entidade única nos seus descendentes. Esta traumatização de
aos seus filhos através de duas estratégias comunicacionais: (a) uma tentativa de
naturalizar o assunto, falando sobre o holocausto, seus horrores, suas perdas de amigos,
acordo implícito pelo qual o tema do holocausto torna-se um “tabu”, com proibições
através da transferência da instabilidade emocional dos pais aos seus filhos. Por esta