O que se pode concluir acerca de manifestações sociais e a responsabilidade por
elas gerada em relação ao futuro eleito pela sociedade. Há responsabilidade social pelo futuro? A escolha de um futuro social por meio da sociedade necessitaria de consciência acerca da decisão e do momento vivenciado na oportunidade da decisão. Imagine-se uma sociedade onde os meios de informação de massa não são confiáveis, as notícias não são disponibilizadas ao conhecimento daqueles que se disponibilizam a se responsabilizar pelos rumos sociais. Poder-se-ia dizer que há autonomia e consequente responsabilidade do povo que decide diante da ausência ou da falsa informação? Haveria, verdadeiramente, uma decisão social quanto ao futuro? Para que de fato se possa falar em escolha é necessário que se tenham opções reais quanto aos fatos, de presente e de futuro. Mas o que seria essa realidade dos fatos (?), se a consciência de uma situação perpassa, necessariamente, pela interpretação daquele que o avalia, o qual, como agente, encontra-se incluso no processo de realidade, que já é consequencia de "escolhas" passadas, quando, como agora, o agente inseria-se no processo de mudança, vendo os fatos de dentro do redemoinho. É possível falar-se em interpretação de fatos e posterior escolha quando o sujeito se localiza dentro do processo de mudança, como agente e massa do complexo redemoinho social? Ainda que se imagine a possibilidade de um agente que exija de si mesmo uma análise mais sóbria do contexto, colocando-se fora do ato e refletindo-o a partir de elementos externos, seria certo que a interpretação dirigida aos elementos avaliados não se impregnasse de valores preconcebidos tornando a realidade vista uma fantasia fundada? Até mesmo a escolha dos elementos aos quais se dedicaria a atenção pode ser questionada, afinal, trata-se de um agente que se insere no contexto de mudanças, que possui valores a serem resguardados por eventual alteração de situação social. Assim, é possível imaginar que, para que se tenha uma análise de contexto social livre de influências valorativas, o intérprete deve ser alheio ao contexto investigado, pois, mesmo quando esteja incluso no contexto e se afaste para conferir maior 1 Texto produzido para a matéria Leitura e Redação de Texto Filosófico, Prof. Rafael Azize. 20016.1. legitimidade à investigação, a escolha dos fatos compromete o resultado, pois na própria eleição é possível que se atribua uma carga de valores capaz de desconsiderar atos viáveis à alteração do resultado final. Isso tudo, partindo-se do pressuposto de impossibilidade histórica de se ponderar racionalmente a integralidade dos elementos sociais de que se dispõe, sendo necessária a eleição de um número de fatores mais relevantes. Então, duas ordens de fatores à investigação se destacam: a inviabilidade do agente realizar uma análise afastado de diretivas impostas por valores, e, num intento de distanciamento, eleger atos e fatos que considera importante a partir de uma interpretação que não pode ser destacada dos valores pessoais de que possui. No contexto apresentado, poder-se-ia dizer que a responsabilidade da escolha justifica-se com a eleição de valores sociais que guiam a interpretação. A questão, então se voltaria para a existência de liberdade na eleição de valores. É possível que entes destacados de uma mesma sociedade apresentem grau de liberdade e independência intelectiva que o eximam das influências do contexto em que se enquadram? E, caso exista essa possibilidade, o que, então, definiria o indivíduo como integrante daquela sociedade(?), se os elementos valorativos de que dispõe são deveras destacáveis ao ponto de excluir-lhe eventual contaminação interpretativa do contexto. Nesse caso, a sociedade poderia ser formada de integrantes que não compartilhem uma moral? Imaginando-se a impossibilidade da formação social ultima, sem compartilhamento de valores, que os una e os auto identifique como um grupo? Partindo-se do pressuposto de que essa possibilidade é a negativa do que é sociedade, tem-se que o destacamento distintivo de valores, nos moldes apontados, não é possível para o integrante de uma sociedade, conclui-se pela impositiva pré-valoração dos resultados investigativos, seja decorrente da eleição de fatos ou mesmo da interpretação deles. Ora, mas se esse for o resultado, em que consistiriam a autonomia social e a decorrente responsabilidade? Seria possível alegar-se a inexistência de autonomia social, seria essa autonomia contrária ao próprio conceito de sociedade? Ou, por autonomia não se pressupõe independência de interpretação, mas apenas consciência de resultados? E, nesse caso, é possível que se tenha consciência de resultados desconhecendo os reais antecedentes fáticos? Concluindo-se pelo elemento de valor como necessário ao pertencimento de um indivíduo a uma sociedade, a eleição de qualquer fato social estará sempre, em maior ou menor grau, tocado por eles. De modo que, a responsabilidade social pela sua própria condução deve extrair-se de outro elemento que não o afastamento de valores. A defesa da inexistência de uma evolução hegeliana (George W. F. Hegel) impõe uma resposta coerente a esta indagação. O que atribui à sociedade a responsabilidade por seus atos? Se num contexto amplo, os indivíduos não possuem total informação sobre os fatos sociais que os movimenta à busca de soluções, e se os detêm, interpreta-os de modo a impregnar-los de elementos valorativos tais que lhes subtraem racionalidade. Em que consistiria a responsabilidade social? Existiria uma autonomia social? Poder-se-ia conceber que a responsabilidade social estaria no intento coletivo de se realizar atos em prol do bem comum. A finalidade da ação que definiria a autonomia e conceberia responsabilidade social para as escolhas coletivamente realizadas. Conquanto, nesse caso, parece que o próprio paradigma de autonomia se esvazia, e imediatamente, parece tomar corpo a sociedade inconsciente de Gadamer (Hans-Georg Gadamer), o que não se deseja e não se acredita, pois não se deseja acreditar que a utilidade humana se limita à sua própria existência. No que então consiste a autonomia social? Ou somos todos irresponsáveis pelas atrocidades e raras belezas que proporcionamos?