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Responsabilidade social e autonomia.

Carliane De Oliveira Carvalho1

O que se pode concluir acerca de manifestações sociais e a responsabilidade por


elas gerada em relação ao futuro eleito pela sociedade. Há responsabilidade social pelo
futuro?
A escolha de um futuro social por meio da sociedade necessitaria de consciência
acerca da decisão e do momento vivenciado na oportunidade da decisão.
Imagine-se uma sociedade onde os meios de informação de massa não são confiáveis, as
notícias não são disponibilizadas ao conhecimento daqueles que se disponibilizam a se
responsabilizar pelos rumos sociais. Poder-se-ia dizer que há autonomia e consequente
responsabilidade do povo que decide diante da ausência ou da falsa informação?
Haveria, verdadeiramente, uma decisão social quanto ao futuro?
Para que de fato se possa falar em escolha é necessário que se tenham opções
reais quanto aos fatos, de presente e de futuro. Mas o que seria essa realidade dos fatos
(?), se a consciência de uma situação perpassa, necessariamente, pela interpretação
daquele que o avalia, o qual, como agente, encontra-se incluso no processo de realidade,
que já é consequencia de "escolhas" passadas, quando, como agora, o agente inseria-se
no processo de mudança, vendo os fatos de dentro do redemoinho.
É possível falar-se em interpretação de fatos e posterior escolha quando o sujeito
se localiza dentro do processo de mudança, como agente e massa do complexo
redemoinho social? Ainda que se imagine a possibilidade de um agente que exija de si
mesmo uma análise mais sóbria do contexto, colocando-se fora do ato e refletindo-o a
partir de elementos externos, seria certo que a interpretação dirigida aos elementos
avaliados não se impregnasse de valores preconcebidos tornando a realidade vista uma
fantasia fundada? Até mesmo a escolha dos elementos aos quais se dedicaria a atenção
pode ser questionada, afinal, trata-se de um agente que se insere no contexto de
mudanças, que possui valores a serem resguardados por eventual alteração de situação
social.
Assim, é possível imaginar que, para que se tenha uma análise de contexto social
livre de influências valorativas, o intérprete deve ser alheio ao contexto investigado,
pois, mesmo quando esteja incluso no contexto e se afaste para conferir maior
1
Texto produzido para a matéria Leitura e Redação de Texto Filosófico, Prof. Rafael Azize. 20016.1.
legitimidade à investigação, a escolha dos fatos compromete o resultado, pois na própria
eleição é possível que se atribua uma carga de valores capaz de desconsiderar atos
viáveis à alteração do resultado final.
Isso tudo, partindo-se do pressuposto de impossibilidade histórica de se ponderar
racionalmente a integralidade dos elementos sociais de que se dispõe, sendo necessária
a eleição de um número de fatores mais relevantes.
Então, duas ordens de fatores à investigação se destacam: a inviabilidade do
agente realizar uma análise afastado de diretivas impostas por valores, e, num intento de
distanciamento, eleger atos e fatos que considera importante a partir de uma
interpretação que não pode ser destacada dos valores pessoais de que possui.
No contexto apresentado, poder-se-ia dizer que a responsabilidade da escolha
justifica-se com a eleição de valores sociais que guiam a interpretação. A questão, então
se voltaria para a existência de liberdade na eleição de valores. É possível que entes
destacados de uma mesma sociedade apresentem grau de liberdade e independência
intelectiva que o eximam das influências do contexto em que se enquadram?
E, caso exista essa possibilidade, o que, então, definiria o indivíduo como
integrante daquela sociedade(?), se os elementos valorativos de que dispõe são deveras
destacáveis ao ponto de excluir-lhe eventual contaminação interpretativa do contexto.
Nesse caso, a sociedade poderia ser formada de integrantes que não
compartilhem uma moral? Imaginando-se a impossibilidade da formação social ultima,
sem compartilhamento de valores, que os una e os auto identifique como um grupo?
Partindo-se do pressuposto de que essa possibilidade é a negativa do que é sociedade,
tem-se que o destacamento distintivo de valores, nos moldes apontados, não é possível
para o integrante de uma sociedade, conclui-se pela impositiva pré-valoração dos
resultados investigativos, seja decorrente da eleição de fatos ou mesmo da interpretação
deles.
Ora, mas se esse for o resultado, em que consistiriam a autonomia social e a
decorrente responsabilidade? Seria possível alegar-se a inexistência de autonomia
social, seria essa autonomia contrária ao próprio conceito de sociedade? Ou, por
autonomia não se pressupõe independência de interpretação, mas apenas consciência de
resultados? E, nesse caso, é possível que se tenha consciência de resultados
desconhecendo os reais antecedentes fáticos?
Concluindo-se pelo elemento de valor como necessário ao pertencimento de um
indivíduo a uma sociedade, a eleição de qualquer fato social estará sempre, em maior ou
menor grau, tocado por eles. De modo que, a responsabilidade social pela sua própria
condução deve extrair-se de outro elemento que não o afastamento de valores.
A defesa da inexistência de uma evolução hegeliana (George W. F. Hegel)
impõe uma resposta coerente a esta indagação. O que atribui à sociedade a
responsabilidade por seus atos?
Se num contexto amplo, os indivíduos não possuem total informação sobre os
fatos sociais que os movimenta à busca de soluções, e se os detêm, interpreta-os de
modo a impregnar-los de elementos valorativos tais que lhes subtraem racionalidade.
Em que consistiria a responsabilidade social? Existiria uma autonomia social?
Poder-se-ia conceber que a responsabilidade social estaria no intento coletivo de
se realizar atos em prol do bem comum. A finalidade da ação que definiria a autonomia
e conceberia responsabilidade social para as escolhas coletivamente realizadas.
Conquanto, nesse caso, parece que o próprio paradigma de autonomia se
esvazia, e imediatamente, parece tomar corpo a sociedade inconsciente de Gadamer
(Hans-Georg Gadamer), o que não se deseja e não se acredita, pois não se deseja
acreditar que a utilidade humana se limita à sua própria existência. No que então
consiste a autonomia social? Ou somos todos irresponsáveis pelas atrocidades e raras
belezas que proporcionamos?

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