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05802013 4 29
ARTIGO ARTICLE
Atenção à saúde dos homens
no âmbito da Estratégia Saúde da Família
Abstract The National Policy of Comprehensive Resumo A Política Nacional de Atenção Integral
Care for Men’s Health created the guidelines for à Saúde do Homem orientou a formulação de es-
the strategies and actions based on comprehen- tratégias e ações fundamentando-se na atenção
sive care, seeking the promotion of health and the integral, com vistas à promoção da saúde e à pre-
prevention of disease duly focused as core issues of venção de agravos, tendo sido focalizadas como ei-
the Family Health Strategy (FHS). This article xos fundamentais na Estratégia Saúde da Família
describes the specificities of men’s health care in (ESF). Este artigo teve por objetivo descrever as
the context of the FHS from the standpoint of the especificidades da atenção à saúde dos homens no
manager, the demands of the men linked to the âmbito da ESF, conforme a visão do gestor, a de-
health units assessed and the practices adopted by manda dos homens adstritos às unidades avalia-
the teams. Men’s health care was evaluated by das e as práticas desenvolvidas pelas equipes. A aten-
interviews with 43 FHS team managers (FHST), ção à saúde do homem foi avaliada por meio de
systematically selected considering the geograph- entrevista a 43 gestores de equipes da ESF (EqSF),
ical region, city size and FHS coverage; and by sorteadas de forma sistemática contemplando as
interviewing 86 adult men of the respective FHS diferentes regiões, porte dos municípios e cobertu-
coverage area. It was seen that the strategy of the ra da ESF; e pela entrevista de 86 homens adultos,
FHST is to address the health-disease process in das respectivas áreas de cobertura da ESF. Obser-
the family and environmental context. However, vou-se que as EqSF têm como estratégia abordar o
in men’s health there are still several gaps, from processo saúde/doença no contexto familiar e am-
the adaptation of the structure of primary health biental, no entanto, no que se refere à saúde do
care through to the motivation and development homem, ainda há lacunas, desde a adequação da
of actions against the most common health prob- estrutura para o atendimento na atenção básica à
lems of this population group. This situation some- motivação e desenvolvimento de ações de promo-
times limits men’s access to health services there- ção contra os agravos mais frequentes nesta popu-
by negating the goal of the Policy. lação, o que, por vezes, têm dificultado o acesso à
Key words Men’s health, Health policies, Gender saúde, por parte da população masculina, distan-
and health, Family Health Program ciando o alcance do objetivo da Política.
1
Ministério da Saúde. Asa Palavras-chave Saúde do homem, Políticas de saú-
Sul. 70.070-923 Brasília
DF Brasil. erlycm@usp.br
de, Gênero e saúde, Programa Saúde da Família
2
Instituto Fernandes
Figueira, Fiocruz.
mens, mas pouco considerada pelos gestores (Fi- ça, 10% por medo e quase 30% por valores cul-
gura 1). Diferentemente dos motivos citados para turais (o que explica não achar importante ou
busca e demanda dos homens, os gestores cita- necessário, “eu não preciso”), mas não concor-
ram como as três principais queixas apresenta- dante com incompatibilidade de horário (quase
das pelos homens ao procurarem o serviço de 30%) e espera (cerca de 10%).
saúde: presença de doença (79,1%), busca de ates- No que se refere aos dias e horários alternati-
tados (12,4%) e situações específicas da saúde do vos de atendimento, apenas uma equipe referiu
homem (7,8%). Saúde mental surge com menos atender aos sábados das 8 às 13 horas, duas que
de 1%, busca de medicamento, exames de rotina iniciavam às 6 horas e 11 estendiam o horário até
e acidentes não apareceram. às 19 horas nos dias úteis, totalizando 13 (30,2%)
Dos 86 homens entrevistados, 77 procura- unidades com horário mais compatível com as
ram por atendimento em serviços de saúde no disponibilidades de trabalhadores, o que pode-
último ano, sendo 41 em serviços públicos e, des- ria favorecer o aumento do atendimento para os
tes, 24 na EqSF local. Apenas um homem não foi homens. Duas unidades referiram já ter atendi-
atendido por falta de profissional no local. do em horário alternativo, mas não observaram
Dos 19 homens que não procuraram por redução no número de atendimentos quando
atendimento no último ano, oito não tiveram passaram a atender apenas no horário comerci-
problema de saúde e 11 tiveram algum problema al em dias úteis. Segundo os homens, o tempo de
de saúde, mas sem procura por atendimento espera médio para o atendimento no último ano
principalmente por acharem não ser importante foi de 33 minutos e nenhum deles citou limitação
ou necessário (nove de 11 casos); um homem de horário como impedimento para busca de
referiu falta de dinheiro para pagamento da con- atendimento.
sulta e outro medo de médico/injeção. Estes re- A maioria das EqSF afirmou que convida os
sultados são parcialmente concordantes com a homens para consulta pelo menos uma vez ao
opinião dos gestores que consideraram pouco ano (90,7%) e que na presença de sintomas de
mais de 10% de não busca por ausência de doen- obstrução urinária ou disfunção erétil há sem-
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gestor homem
Figura 11. Principais motivos* para procura de atendimento na unidade de saúde da família segundo visão
do gestor e demanda dos homens, dezembro de 2012.
*
doença = aguda ou crônica; medicamento = prescrição e/ou dispensa; homem = situações específicas da saúde do homem, como
disfunção erétil, obstrução urinária, suspeita de câncer de próstata, vasectomia, busca de preservativo; rotina = exames de rotina,
check-up; acidente = acidente, curativo; saúde mental = dependência química ou aconselhamento.
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evento planejamento acidentes e tabagismo abuso de demais atividades
especial familiar violências bebidas drogas no pré-natal
alcoólicas
Figura 2 . Oportunidades para participação em atividades específicas para os homens na unidade de saúde da
família ,dezembro de 2012.
pação dos pais nessas atividades, foram obtidas são (6%). Embora, em ambos os sexos, as doen-
as seguintes participações: nenhuma (uma uni- ças tenham sido a principal responsável pela pro-
dade do SE), quase nenhuma (duas unidades do cura por atendimento em saúde, as mulheres refe-
NE e duas do CO), pouquíssima (uma unidade riram maior busca por serviços de vacinação ou
no S) e pouco menos da metade (uma unidade prevenção (24% e 19% entre o sexo masculino),
no NE e uma no S). enquanto que entre os homens, os motivos mais
Das 43 unidades pesquisadas, o homem foi frequentes para a busca de atendimento em saú-
identificado como vítima em apenas 12 delas e de foram os acidentes e as violências (8,9% e 4,1%
como agressor em 31. Na primeira situação, os entre as mulheres)14. A doença, enquanto primei-
casos foram identificados principalmente durante ra causa de procura também foi identificada nes-
o acolhimento e na visita domiciliar, e na segun- te estudo, tanto nas citações dos gestores como
da, na visita domiciliar. Os encaminhamentos na dos próprios homens. Positivamente, a segunda
situação de vítima se referem a cuidados médicos causa relatada pelos homens foram exames de
e denúncia, enquanto que na situação de agres- rotina, reforçando um maior cuidado com sua
sor são realizadas denúncia e ações de assistência própria saúde, o que pode ser o principio da tran-
social, em especial à vítima e não ao agressor. sição de um cuidado curativo para a prevenção.
Nesta situação algumas unidades referiram não Neste estudo, a grande maioria dos entrevis-
se envolver, o que realça a dificuldade do setor tados buscou serviços de saúde do Sistema Único
saúde em trabalhar esta questão. de Saúde (SUS), o que alude o estado de saúde e
Do total dos homens entrevistados, 81,6% já as condições de acesso aos serviços, uma vez que
haviam sido atendidos na EqSF da respectiva área o ato de procurar um serviço de saúde depende,
de moradia e suas famílias estavam cadastradas principalmente, de fatores relacionados aos servi-
na ESF há seis anos. Dos 24 casos atendidos na ços disponíveis e de fatores próprios de cada indi-
EqSF, a maioria recebeu prescrição para medica- víduo. Capilheira e Santos15 e Fernandes et al.16
ção, sendo que duas pessoas do Nordeste não afirmam que há uma maior utilização dos servi-
conseguiram encontrar os medicamentos recei- ços por indivíduos que percebem sua saúde como
tados. Das 16 prescrições, 10 foram dispensadas regular ou ruim, corroborando com os achados
pelo serviço público sem ônus para o usuário. encontrados em estudo qualitativo realizado em
Quanto aos 11 homens que referiram problema quatro estados brasileiros4. Leal et al.17 justificam
de saúde e não busca de atendimento, quatro se que um problema reconhecido é a rede de apoio
trataram utilizando medicamentos que tinham deficitária, destacada, nesse cenário, pela ausên-
disponíveis em casa ou com amigos/parentes, três cia, em função da PNAISH, de fluxos específicos
com medicamentos prescritos pela farmácia (um para homens, o que vai de encontro às expectati-
do Centro-Oeste pelo atendente e por telefone) e vas masculinas de rapidez e resolubilidade. Os
três com remédio caseiro. A maioria dos homens profissionais de saúde acreditam que o longo tem-
relatou não haver limitação para falar sobre sua po de espera em atendimentos também agrava o
saúde com qualquer profissional da EqSF, inde- problema do absenteísmo masculino.
pendente do sexo. Dos seis casos que referiram Do total de homens entrevistados, 58% da-
algum limite, três usuários preferiam ser atendi- queles que não procuraram por atendimento ti-
dos por profissional do sexo masculino (1 no veram problemas de saúde, que os levaram à
NE e 2 no CO), dois referiram timidez (SE e CO) busca de tratamento sem orientação clínica, re-
e um gostaria de maior aproximação da equipe a forçando a cultura da automedicação. Estudo
fim oportunizar abordagem sobre problemas realizado em um município de São Paulo apon-
familiares (CO). tou que 91,1% dos domicílios apresentavam es-
toques de medicamentos e a aquisição destes
ocorreu principalmente em farmácias e drogari-
Discussão as, uma vez que os medicamentos adquiridos nas
ESF ou outras unidades de saúde requerem pres-
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de crição médica, corroborando os dados encon-
Domicílios (PNAD/2008)14 apontaram que as trados18. Homens, diante de algum problema de
principais razões, referidas pela população total, saúde, procuram medidas de tratamento alter-
para a busca de atendimento médico foram: doen- nativas, desde o uso de chás até automedicação,
ças (50%), seguidas por puericultura, vacinação buscando orientação de algum farmacêutico,
ou outros atendimentos de prevenção (22%), quando possível7. Pinheiro et al.19 apontaram a
problemas odontológicos (14%) e acidentes e le- maior incidência masculina na procura de servi-
ritariamente feminino e infantil. Gomes et al.7, de violência envolvendo homens, tanto como ví-
em estudo sobre a percepção dos homens a res- tima como agressor, porém o acolhimento se dá
peito dos serviços de atenção primária a saúde, basicamente para a vítima e o encaminhamento
mostraram que os mesmos se destinam às pes- se refere principalmente aos cuidados de saúde e
soas idosas, às mulheres e às crianças, e são con- denúncia para a vítima, reafirmando a necessi-
siderados pelos homens como um espaço “femi- dade da validação e da utilização de protocolos
nilizado”, o que se espera estar em modificação clínicos e diretrizes terapêuticas para homens e
ao longo dos últimos anos, uma vez que o pre- mulheres em situação de violência na rotina de
sente estudo aponta quase a totalidade dos ho- trabalho das equipes da ESF/UBS a partir da
mens com interesse em atividades da ESF. complexidade e importância deste tema na área
A Promoção da Saúde e a prevenção de agra- da saúde.
vos têm sido focalizadas como eixos fundamen- Em relação aos agravos específicos dos ho-
tais na ESF11. Os homens estão mais vulneráveis mens, o câncer de próstata é um dos principais
a problemas de saúde, em virtude da sua baixa problemas relacionados ao aparelho genituriná-
acessibilidade aos serviços de atenção primária9. rio e corresponde à segunda causa mais comum
Diante disto, a PNAISH orientou a formulação de óbito por câncer no Brasil, atingindo princi-
de diretrizes e ações voltadas fundamentalmente palmente homens com 50 ou mais anos de idade.
para a atenção integral, com vistas à prevenção e Embora a adoção de um programa exclusivo
à promoção da saúde, à qualidade de vida e à de rastreamento populacional para esta patolo-
educação, como dispositivos estratégicos de in- gia torne-se inviável, pois com o aumento da ida-
centivo às mudanças comportamentais10. de ocorre uma maior frequência de tumores la-
A principal causa de óbito entre os homens tentes – que na maioria das vezes evoluirão de
das cidades avaliadas foram, em 2010, as causas maneira lenta e não nociva à saúde, além de uma
externas (36,4%), seguidas por doenças do apa- alta morbimortalidade relacionada aos atuais
relho circulatório (18,6%) e neoplasias (11,1%)25. procedimentos terapêuticos empregados28, faz-
Quanto às principais morbidades – causas de se de suma importância a realização do rastrea-
internação, observou-se o predomínio de causas mento oportunístico e da vigilância ativa naque-
externas (15,7%), doenças do aparelho respira- les homens que possuem histórico familiar da
tório (15,0%) e doenças do aparelho circulatório doença em parentes de 1º grau e/ou com o recor-
(12,7%). As doenças do aparelho geniturinário te de raça/cor presente, a partir dos 40 anos, a
representaram 6,1% das causas de internação em fim de que uma morbimortalidade precoce e des-
201025. Embora os gestores considerem aciden- necessária possa ser prevenida e combatida.
tes como a quinta principal causa para a procura Estes dados também corroboram com os
da UBS pelo homem, as causas externas (aciden- observados na pesquisa que avaliou as ações ini-
tes e violências) aparecem como a primeira causa ciais da implantação da PNAISH, realizada junto
de óbitos em todos os municípios e como pri- a gestores das 27 unidades federadas e de 26
meira causa de internação na maioria deles. municípios que iniciaram a implantação da polí-
As causas externas – violências e acidentes – tica, em que há pouca ou nenhuma familiarida-
exercem grande impacto na qualidade de vida e de dos entrevistados com o tema29. Leal et al.17,
nas condições de saúde da população, pois atin- em estudo que buscou compreender o ponto de
gem um número muito maior de pessoas do que vista dos profissionais do SUS acerca da PNAISH
aquelas que se encontram diretamente envolvi- em cinco municípios do Brasil, apontaram que
das e seus efeitos ultrapassam o sofrimento indi- há uma grande diferença entre os municípios
vidual e coletivo, incidindo na cultura e no modo sobre os conhecimentos das diretrizes e rotinas
de viver das pessoas26. No Brasil, em 2010, fo- contidas na política, por parte dos gerentes e dos
ram registrados no Sistema de Informação so- profissionais da assistência.
bre Mortalidade (SIM) 75 óbitos por 100.000 Estudos sobre a utilização de serviços de saú-
habitantes (126,5/100 mil em homens e 25,6/100 de pela população contribuem para o aprimora-
mil em mulheres)25. A notificação de todo caso mento da assistência, uma vez que permitem iden-
suspeito ou confirmado de violência doméstica, tificar níveis de cobertura e grupos populacio-
sexual e/ou outras contra homens e mulheres nais excluídos, auxiliando no planejamento em
atendidos em serviços de saúde passou a ser com- saúde30.
pulsória em todo o território nacional em 201127. As EqSF têm como estratégia abordar o pro-
As visitas domiciliares são importante fonte cesso saúde/doença no contexto familiar e ambi-
de informação para a identificação de situações ental, tendo como ação básica a prevenção dos
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