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João Cândido de Oliveira

SEGURANÇA E SAÚDE
OCUPACIONAL
(Um desafio que desafia)

De como a porque acidentes ocorrem

Belo horizonte, março de 2007

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ÍNDICE

1. ASPECTOS CRÍTICOS DA SEGURANÇA NO TRABALHO AINDA


FORTEMENTE MARCANTES NAS EMPRESAS BRASILEIRAS .................... 05

1.1. Dificuldades que interferem nas ações de SSO, impedindo-as de


romper as barreiras que as situam em segundo plano nas
organizações ................................................................................................. 06

1.2. Ausência ou deficiência de sistemas de SSO capazes de comportar e


suportar o elenco de programas de SSO (legais e voluntários)
concebidos e implementados nas empresas ................................................ 10

1.3. Envolvimento da alta direção da empresa nos assuntos relacionados


à Segurança e Saúde Ocupacional .............................................................. 13

1.4. Enfoque principal das ações de Segurança e Saúde Ocupacional


centrado no atendimento à legislação que dispõe sobre a matéria ............. 24

1.5. O comportamento do trabalhador como fator gerador de acidentes do


trabalho – fatos e mitos ................................................................................. 25

1.6. A maneira como o trabalho é organizado e sua relação com o


comportamento dos trabalhadores ............................................................... 32

1.7. A inserção dos trabalhadores nos programas de SSO da empresa ............ 34

1.8. A Segurança e a Saúde Ocupacional a partir das novas regras para


concessão da aposentadoria especial. O que mudou e o que as
empresas vêm fazendo? ............................................................................... 35

1.9. O ordenamento formal do trabalho e os conflitos de poder – a quê ou


a quem o trabalhador deve obediência: aos ditames das normas
escritas ou às ordens verbais ou ao silêncio deliberado de sua chefia
imediata?........................................................................................................ 39

1.10. Postura das chefias, especialmente dos supervisores, em relação às


ações de segurança e à saúde ocupacional desenvolvidas na
empresa ...................................................................................................... 50

1.11. Pontos críticos da representação dos gerentes (gestores,


supervisores e facilitadores) acerca do que pensam e do que fazem
em relação à segurança e saúde no trabalho ............................................ 51

1.12. Impressões dos trabalhadores sobre o que pensam e o que fazem


em relação à segurança e saúde no trabalho ............................................ 75

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2. OS DESAFIOS DA TRANSPOSIÇÃO DA SEGURANÇA E DA SAÚDE
OCUPACIONAL DO SEGUNDO PARA O TERCEIRO ESTÁGIO DE
MATURIDADE ..................................................................................................... 81
2.1. Por que ainda ocorrem acidentes em ambientes supostamente
seguros? ....................................................................................................... 81

2.2. Dos riscos no trabalho: conhecer para resolver ........................................... 82

2.3. Do gerenciamento da Segurança e Saúde Ocupacional – SSO .................. 86

2.3.1. Do vértice do problema: dos riscos do trabalho .................................. 87


2.3.2. Do vértice da resolutividade: solução do problema – riscos ............... 90
2.3.3. Do vértice da governabilidade: do poder para resolver ...................... 95

3. SUGESTÕES PARA REVISÃO, ELABORAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO


DE FERRAMENTAS DE AUXÍLIO À GESTÃO DA SEGURANÇA E
SAÚDE OCUPACIONAL ................................................................................... 100
3.1. Revisão e atualização dos padrões de trabalho ......................................... 100

3.2. Definição de prioridades nas ações de SSO .............................................. 107

3.3. Ferramentas de apoio à Gestão de SSO .................................................... 114

3.4. Treinamento em SSO .................................................................................. 126

3.5. Prevenção de novos riscos ......................................................................... 127

4. SUGESTÕES DE MELHORIAS DE SSO LEVANTADAS EM


SEMINÁRIOS INTERNOS PROMOVIDOS PELAS EMPRESAS ONDE O
DIAGNÓSTICO DE MATURIDADE DE SSO FOI REALIZADO ...................... 130

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 143

NOTAS .................................................................................................................... 144

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PARTE 1

ASPECTOS CULTURAIS INFLUENCIAM AS AÇÕES DE


SEGURANÇA E SAÚDE OCUPACIONAL NAS EMPRESAS

Porque ocorrem acidentes em ambientes


supostamente seguros?

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01. ASPECTOS CRÍTICOS DA SEGURANÇA NO TRABALHO AINDA
FORTEMENTE MARCANTES NAS EMPRESAS BRASILEIRAS
(Os desafios da Segurança e Saúde Ocupacional)

Ao acompanhar há mais de trinta anos a trajetória da Segurança e Saúde


Ocupacional (SSO) no Brasil sempre incomodou não encontrar em suas ações a
mesma consistência e desenvoltura observadas nos demais segmentos das gestões
empreendidas pelas empresas, sobretudo no que se refere às finalidades de seu
negócio.

Essa impressão é fruto das vivências técnico-pedagógicas estabelecidas não só


com trabalhadores em quase todos os ramos de atividades econômicas, mas
também com profissionais dos Serviços Especializados de Segurança e Medicina do
Trabalho (SESMT), passando pelas médias gerências até os mais elevados
escalões de empresas em diversas regiões do País.

Na Fundacentro, por mais de vinte e cinco anos, foi possível acompanhar e, na


maioria das vezes, participar direta ou indiretamente de grande parte das tentativas
de concepção e desenvolvimento de sistemas de gestão de SSO que tratassem,
com a devida importância e com o rigor necessário, das questões da Segurança e
Saúde Ocupacional nas empresas.

A partir da experiência frustrante do Mapa de Riscos – que não produziu os


resultados esperados – foi necessário mudar o eixo da abordagem, coletar dados,
entrevistar pessoas, estudar programas de Segurança e Saúde Ocupacional de
empresas e levantar informações para entender melhor as razões do sucesso
parcial ou do insucesso das ações de SSO até então desenvolvidas, sobretudo nas
empresas de grande porte. A consistência dos dados levantados permitiu aventar
algumas considerações, opiniões e conclusões relevantes, como verão a seguir.

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1.1. Dificuldades que interferem nas ações de SSO, impedindo-as de romper
as barreiras que as situam em segundo plano nas organizações

Abrimos o presente capítulo com a indagação que necessariamente se impõe: como


e com que deferência é tratada a segurança no trabalho na maioria das empresas
brasileiras? O ponto de partida para o desvendamento da questão inicia-se pela
abordagem de algumas variáveis consideradas de alta relevância envolvendo a
cultura de Segurança e Saúde Ocupacional ainda fortemente marcante na maioria
das empresas, que estão direta ou indiretamente relacionadas à sua evolução ou
estagnação. Em função da extensão e complexidade dessas variáveis, com o intuito
de facilitar a sua compreensão, procuramos reuni-las em três grupos os quais
denominados de eixos.

A abordagem de um sistema ou programa de SSO, não importando sua estrutura,


poderá ser mais facilmente visualizada e compreendida, se observada por meio dos
três eixos norteadores, conforme demonstrado a seguir:

QUADRO 1

Objetivos
Pretendidos

Aspectos
Técnicos

Aspectos
Culturais

 Objetivos de SSO preconizados pelas empresas. A definição do que se


pretende fazer da Segurança e Saúde Ocupacional constitui-se no elemento

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primordial da deferência conferida pela empresa ao tema. É pela definição dos
objetivos que se percebe não apenas a importância que a empresa confere ao
tema, mas principalmente o alcance real das intenções explicitadas. Quanto mais
claros e compatíveis com a realidade da empresa forem os objetivos
determinados por ela em relação à segurança no trabalho, maiores serão as
possibilidades de obtenção de sucesso e menores as margens de erros e
consequentemente de frustrações e desgastes por não alcançá-los. Lembrando
que o engajamento das pessoas nos programas de SSO depende
fundamentalmente do que se pretende, de fato, alcançar e do “estado de
espírito” da população alvo, principalmente dos ocupantes de cargos de chefia.

 Conteúdos técnicos. Referem-se ao arsenal técnico (ferramentas de gestão)


disponibilizado e utilizado na identificação, na avaliação e no controle dos riscos
do trabalho. Entendendo-se como controle a inclusão de restrições na geração
de novos riscos. Ressalte-se que as ferramentas de gestão de SSO, em voga em
muitas empresas, foram concebidas para gerir programas de SSO - na sua
maioria de origem estrangeira – sem levar em conta os traços fundamentais da
cultura das empresas. Ferramentas de SSO, por mais aprimoradas que sejam
não operam milagres. O seu uso, correto ou incorreto, depende
fundamentalmente do nível cultural dos ambientes onde elas estejam sendo
implementadas.

 Aspectos culturais. As percepções e práticas desenvolvidas pelas empresas


no tocante à Segurança e Saúde Ocupacional têm suas bases assentadas e
consolidadas na deferência conferida ao tema, que por sua vez remonta à
história das relações de trabalho no Brasil. As relações de trabalho estabelecidas
no Brasil na passagem do século XIX para o século XX foram fortemente
influenciadas pelo modelo escravista de produção, cujo valor conferido à força de
trabalho, era por demais irrelevante.

Entre os diversos elementos que envolvem um programa ou sistema de gestão de


SSO inclusive os três citados (objetivos, tecnologias e cultura), avaliados em
termos de importância, sem sombra de dúvida, os aspectos culturais, representam,

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de longe, o que há de mais significativo para facilitar, inibir ou inviabilizar o sucesso
dessa iniciativa nas empresas. Daí a preocupação em explorar um pouco mais esse
terreno na busca de pistas que possam nos auxiliar no entendimento dos elementos
que sustentam e fomentam a cultura de SSO ainda fortemente marcante na maioria
das empresas brasileiras. O sucesso como o insucesso de qualquer iniciativa na
área de Segurança e Saúde Ocupacional decorre da compreensão e principalmente
da maneira de lidar com os traços fundamentais da cultura nesse terreno.
Compreender por que as pessoas agem e como agem são questões que devem,
necessariamente, anteceder a qualquer iniciativa da empresa nesse terreno,
especialmente em relação ao como devem agir. A expressão – “só se muda o que
se conhece” – no terreno da Segurança e Saúde Ocupacional é aplicada sem
nenhum retoque.

Por mais elaborado que seja um programa de SSO e por melhor que sejam as
ferramentas por ele disponibilizadas para o diagnóstico e a correção dos riscos do
trabalho sem um sistema consistente de SSO que dê sustentação às suas ações e
que, principalmente, assegure a participação compromissada de todas as pessoas
com elas envolvidas, especialmente dos ocupantes de cargos de chefia da empresa,
em todos os níveis, os resultados certamente serão limitados, e em muitas
situações, decepcionantes. E essa limitação não se circunscreve apenas ao
combate aos riscos instalados, mas também na manutenção das medidas corretivas
implementadas e principalmente nas restrições à geração de novas situações de
risco.

Muitas empresas investem pesado na Segurança e Saúde Ocupacional, promovem


melhorias substanciais nas condições de trabalho e não conseguem, por motivos
óbvios, alcançar os objetivos pretendidos. O primeiro desses motivos é a
incapacidade de preservar, no decorrer do tempo, as medidas de controle
implementadas. Outros que dão causas ao primeiro são os comportamentos
inconseqüentes de uma parcela considerável dos ocupantes de cargo de chefia, que
cometem falhas comprometedoras, implícitas ou explicitas, ora por imprudência ora
por negligência na gestão da Segurança e Saúde Ocupacional em suas respectivas
áreas de atuação.

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A incapacidade de preservar as medidas de controle implementadas não se reflete
apenas no aumento da probabilidade de ocorrência de acidentes, mas também e
principalmente, na capacidade de prever e impedir o surgimento de situações de
risco semelhantes ou idênticas às corrigidas. Esse paradoxo, resultante da ausência
ou da precariedade dos sistemas de SSO e do comportamento inconseqüente de
algumas chefias culmina no desgaste e na depreciação desse serviço nas empresas
levando-o ao descrédito, principalmente por parte dos altos executivos que não o vê
com bons olhos. Pior ainda, o vê como uma espécie de “saco sem fundo”, onde o
que se faz é como se nada tivesse sido feito. Paradoxalmente, esse sentimento dos
executivos, pelo menos no que pudemos avaliar, resulta das posturas assumidas por
eles mesmos em relação ao tema. Posturas expressas em discursos que não
correspondem, na prática, ao que efetivamente se faz.

Exemplo típico dessa situação foi encontrado numa das empresas onde o
diagnóstico de maturidade de SSO foi realizado. Nela, num determinado ano ao
inventariar os riscos no trabalho, foram identificadas 742 situações de não
conformidade em SSO, nas atividades de manutenção. Montou-se um programa de
controle com cronograma definido para três anos. Por ocasião do fechamento do
referido cronograma foi realizado um novo inventário de riscos, onde, para surpresa
geral, foram identificadas, nas mesmas atividades, outras 658 situações não
conforme. Estudos posteriores indicaram que muitas das situações novas
encontradas resultaram da falta de manutenção das medidas de controle
implementadas ou de sua retirada sem a devida recolocação. E pior do que a
precariedade na conservação das medidas de controle é a permissividade na
geração de novos riscos, muitos semelhantes e/ou idênticos aos que foram
corrigidos.

O exemplo relatado mostra, de forma contundente, que a questão da Segurança e


Saúde Ocupacional, não apenas na empresa em questão, mas em muitas outras,
não é tratada com a deferência e menos ainda com o rigor que o assunto requer. Tal
afirmação não é baseada em pressuposições, mas em dados concretos levantados
1
por meio de um sólido diagnóstico de maturidade de SSO realizado em oito
grandes empresas de ramos de atividades diferentes, envolvendo 16.352

10
trabalhadores e 4.046 ocupantes de cargos de chefia. O referido diagnóstico foi e
continua sendo realizado em empresas dos ramos de mineração, siderurgia,
metalurgia, construção civil, papel e celulose e logística, nos estados de Minas
Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia. É importante ressaltar que os dados
resultantes desse trabalho têm servido de base para reestruturação dos programas
de SSO, especificamente no que se refere aos aspectos comportamentais, tanto de
gestores quanto de trabalhadores.

Conforme foi levantado por meio de instrumentos apropriados de coleta de dados,


os problemas ainda existentes na maioria das empresas, que dificultam, e em muitas
situações inviabilizam o aperfeiçoamento e conseqüentemente o avanço e
amadurecimentos dos programas de SSO são, entre muitos outros, os que se
seguem:

1.2. Ausência ou deficiência de sistemas de SSO capazes de comportar e


suportar o elenco de programas de SSO (legais e voluntários)
concebidos e implementados nas empresas

Do conjunto de fatores que concorrem para dificultar e/ou inviabilizar o avanço da


Segurança e Saúde Ocupacional na maioria das empresas brasileiras, figura-se em
primeiro plano, a pobreza de informações sobre o assunto. As informações
disponibilizadas referem-se principalmente aos elementos constitutivos dos modelos
de gestão de SSO, com destaque para os riscos exististes na empresa, com
pouquíssima ou nenhuma referência aos traços fundamentais da cultura
predominante de SSO. Essa lacuna se reflete diretamente na qualidade dos
modelos de gestão de SSO, incapazes de comportar e ao mesmo tempo de suportar
as ações idealizadas e implementadas. A primeira e mais importante conseqüência
desse vazio é a definição e o delineamento dos espaços ocupados pela Segurança
e Saúde Ocupacional no conjunto dos elementos que compõem a organização da
produção. As forças motrizes da Segurança e Saúde Ocupacional, da maneira como
são concebidas e operacionalizadas na maioria das empresas não conseguem situá-
las no mesmo patamar dos demais itens que tratam das finalidades do negócio, a
despeito do discurso da direção das empresas apontar para essa direção. Por não
ser parte intrínseca e essencial do sistema produtivo e por ter o trabalhador como

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centro das atenções – quando deveria ser o sistema produtivo – a segurança no
trabalho é comumente entendida e abordada como relações trabalhistas. Deve-se
ressaltar que essa vinculação não é aqui mencionada como aspecto negativo, mas
apenas situacional. Não há dúvida de que o principal desafio a ser enfrentado em
relação à segurança no trabalho localiza-se nos traços da cultura dominante, nos
modelos de gestão de SSO e na capacidade de fazê-los funcionar.

Outras conseqüências negativas oriundas do citado vazio funcionam como efeito


retro-alimentador de suas causas originais, com destaque para:

 Despreparo técnico e gerencial, sobretudo dos supervisores e facilitadores


lotados nas áreas de riscos, para gerenciar, com a competência requerida, os
assuntos pertinentes à Segurança e Saúde Ocupacional. (esse dado apareceu
nos diagnósticos com valores superiores a 50%, principalmente na
representação dos próprios gestores).

 Profusão de regulamentos, normas e procedimentos de SSO voltados para a


identificação e a avaliação dos riscos no trabalho com vistas ao seu controle,
sem a devida constatação de que o manejo correto desses instrumentos requer
conhecimentos e habilidades específicas, e mais do que isso, comprometimento,
sobretudo dos gestores das áreas de riscos, com as questões de SSO.

Ademais, a funcionalidade desses instrumentos se alicerça na aplicação de outras


ferramentas que devem compor o sistema de gestão de SSO (comumente ausente),
tão ou mais importantes do que os primeiros. Trata-se de ferramentas
administrativas, destinadas a orientar e controlar a aplicação dos regulamentos
técnicos e das orientações normativas.

Em relação ao que acabamos de afirmar é importante ressaltar que muitas


empresas brasileiras operam com sistemas de SSO com características de “colcha
de retalhos”, isto é, constituído por fragmentos de vários sistemas, sobretudo de
origem estrangeira, que, da maneira como são estruturados dificilmente se ajustam
à realidade brasileira, especialmente no que se refere à cultura dominante de
relações de trabalho e consequentemente, de SSO. E é importante enfatizar que

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sistemas e/ou programas de SSO estruturados com base nesse expediente
terminam se transformando num labirinto burocrático onde os aspetos de “fachada”,
meticulosamente formulados, se sobrepõem aos conteúdos úteis, geradores de
resultados. No papel tais sistemas e/ou programas se afiguram como
extraordinários, na prática, no entanto, não passam de um enorme acervo
burocrático com baixíssima capacidade funcional. Burocracia perversa onde se
alardeia possuir o que efetivamente não se possui. Paradoxalmente o mesmo
fenômeno vem ocorrendo, em algumas empresas, em relação à gestão da OHSAS
18.001 que, uma vez alcançada a certificação almejada é colocada em quarentena,
melhor dizendo, esquecida.

A gestão da produção, com maior e menor desenvoltura, gera o esperado, ou quase,


porque disponibiliza e usa, com firmeza, um arsenal de ferramentas de natureza
técnica, orientadas e controladas por meio de ferramentas administrativas derivadas
das políticas de gestão de Recursos Humanos. Os gestores da produção são
suficientemente capacitados e esclarecidos sobre suas responsabilidades em
relação às suas atribuições e principalmente em como cumpri-las. Conhecem e
praticam os instrumentos de medida de sucesso e sabem, com a mesma
desenvoltura, o que estará em jogo quando cometem falhas que poderão
comprometer o sistema produtivo. Da mesma forma sabem o que fazer – onde estão
os recursos e como buscá-los – quando as coisas não andam conforme o planejado.

Infelizmente o mesmo não se verifica com as questões da Segurança e Saúde


Ocupacional, salvo no discurso ou quando ocorrem acidentes graves que ocasionam
desconforto aos executivos e estragos na imagem da empresa. A clarividência
dessa situação é um reflexo da importância conferida à Segurança e Saúde
Ocupacional e à produção pelas organizações.

A ausência ou insuficiência de ferramentas administrativas destinadas à orientação e


condução dos programas de SSO nas empresas, normalmente leva os gestores das
áreas produtivas a não se sentirem suficientemente responsáveis pela condução das
ações de Segurança e Saúde Ocupacional. E por não serem nominalmente

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responsabilizados por isso, da mesma forma não são avaliados individualmente e
menos ainda cobrados como deveriam sê-los.

De outra feita, numa verificação, ainda que superficial, constata-se não serem as
metas de SSO suficientemente claras e nem tampouco estabelecidos critérios
rígidos de como atingi-las. Se as metas não são claras, as cobranças não fogem à
regra. É importante verificar que em relação às metas de produção, além da
preocupação no seu estabelecimento e na definição do como atingi-las, há um
elenco de medidas administrativas prontas para serem usadas na correção dos
desvios. Aliás, todo o esforço é voltado para a antecipação das falhas. A pergunta
que se impõe diante dessa constatação é: porque o mesmo fenômeno não ocorre
em relação à Segurança e Saúde Ocupacional? Não há dúvida de que as respostas
podem ser encontradas em muitos outros desvios, mas principalmente na
desvinculação da segurança dos sistemas produtivos e na desobrigação dos
ocupantes de cargos de chefia, sobretudo das áreas operacionais, na sua condução.

A desvinculação das ações de SSO do sistema produtivo, além de subtrair das


gerências das áreas operacionais o dever de conduzi-las, facilita o aumento da
distância que separa o discurso da direção da empresa, acerca do tema, daquilo que
efetivamente feito, nas práticas do dia-a-dia.

1.3. Envolvimento da alta direção da empresa nos assuntos relacionados à


Segurança e Saúde Ocupacional

Não é próprio da cultura empresarial brasileira o corpo diretivo das empresas se


envolver, direta e concretamente com as questões da Segurança e Saúde
Ocupacional salvo quando da ocorrência de algum distúrbio no setor – acidentes
graves – que, além de causar danos humanos e materiais de monta, atingem
negativamente a reputação das empresas, colocando seus dirigentes em situação
de desconforto perante o público interno e principalmente perante o público externo,
com prejuízos irreparáveis à imagem de suas organizações. 2

De maneira não muito diferente, seus prepostos (média gerência e supervisores),


sobretudo das áreas de riscos – por não se considerarem ou não terem sido,

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formalmente, considerados por seus respectivos empregadores como responsáveis,
de fato, pela promoção da Segurança e Saúde Ocupacional – se esquivam, de todas
as maneiras possíveis, de assumir, sem restrição, o papel de gestores e
responsáveis pelos programas de Segurança e Saúde Ocupacional, diga-se de
passagem, caros, muitos deles propostos às vezes pela direção das empresas. É
certo que essa postura vem declinando em muitas empresas, principalmente nas de
grande porte, nos últimos anos, mas não a ponto de já ter amadurecido uma nova
experiência onde as questões relacionadas à Segurança e Saúde Ocupacional
sejam consideradas como parte integrante do sistema produtivo e administradas por
quem administra o sistema produtivo. Questões merecedoras, portanto, da mesma
importância conferida aos itens de produção, manutenção e logística, por exemplo.
A importância a que nos referimos evidentemente não se limita ao discurso, mas
principalmente às ações práticas. 3

Embora as observações aqui postas tenham caráter afirmativo e genérico, é


necessário ressaltar que muitas empresas nas quais estamos desenvolvendo o
nosso trabalho, vêm trabalhando, com afinco na tentativa de reverter essa situação.
E algumas, a despeito das dificuldades inerentes a qualquer mudança cultural, vêm
conseguindo, com razoável sucesso, conferir novas feições à Segurança e Saúde
Ocupacional. A razão do sucesso dessas empresas está nas posturas assumidas
pelos seus dirigentes, na qualidade dos sistemas de SSO e nas estratégias
utilizadas na sua operacionalização. As políticas de SSO, definidas e postas em
prática pelos responsáveis pelas empresas em questão, têm papel decisivo nessas
iniciativas.

Não há dúvida de que o sucesso, bem como o insucesso de quaisquer sistemas de


gestão de SSO está na essência da política que os definem, que os orientem e que
os mantém em funcionamento. É verificado que nas empresas nas quais a
Segurança e Saúde Ocupacional vem se firmando como item altamente relevante,
portanto merecedor da atenção de todos, o diferencial está na definição e na
aplicação de ferramentas administrativas onde se define, com absoluta clareza, os
papéis (quem deve fazer o quê), no rigor da responsabilização, no estabelecimento
de metas claras e factíveis de serem alcançadas, nos critérios de aferição de
resultados, na redução sistemática dos níveis de tolerância em relação ao
descumprimento de procedimentos ou regras de trabalho e no volume e natureza

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das cobranças. Essas ferramentas funcionam não apenas como alavanca, mas
como combustível da política de SSO preconizada pela empresa.

É conveniente lembrar que, nesse particular as políticas de SSO, de um modo geral,


são lacônicas, por isso, imprecisas. Elas não definem, com a clareza necessária,
quem é quem nesse terreno: o que compete, especialmente aos ocupantes de
cargos de chefia fazer e a contrapartida, o que ocorreria caso não fizesse o que se
afirma fazer. Essas referências, imprescindíveis ao bom andamento dos programas
de SSO nas empresas, não estão suficientemente explicitadas na maioria das
políticas de SSO.

A imprecisão na definição de atribuições e de responsabilidades, especialmente


para os ocupantes de cargos de chefia da empresa nesse terreno, termina por incutir
nos gestores dos diversos níveis hierárquicos a idéia de que sua função precípua na
empresa, não é fazer segurança, mas cuidar da produção ou de outros afazeres
para os quais foram contratados. E essa idéia, pela mesma razão, é reforçada pelos
critérios utilizados na avaliação de desempenho não apenas dos gestores e
supervisor, mas também dos trabalhadores. Não se cobra pela forma de se executar
os trabalhos, mas pelos resultados finais. E é precisamente nesse momento que se
firma o dualismo – trabalhar e trabalhar com segurança.

Ademais, os critérios de medir desempenho em SSO não são os mesmos utilizados


na avaliação de desempenho relacionado à produção. No tocante à produção ou às
áreas de apoio consideradas imprescindíveis, as regras e as metas são claramente
definidas, acompanhadas, avaliadas e refeitas, sempre que se fizer necessário. Para
isso, são utilizadas regras e outros meios conhecidos e “aceitos” por todos. Já no
tocante à Segurança e Saúde Ocupacional, muitas das metas, por exemplo, são
lacônicas ou, pior ainda, irreais. A meta “zero acidente”, por exemplo, nos ramos de
mineração, de siderurgia, de metalurgia, de papel e celulose, de construção civil,
com milhares de homens-hora expostos a toda sorte de riscos não deixa de ser uma
proposta cujo alcance se transforma num desafio que desafia. A não ser que o
conceito de metas para as empresas que o adotaram esteja sendo igualado ao
conceito de desejo. O problema dessa interpretação esbarra no princípio de que
desejo não se mede. Daí não ser prudente entendê-lo como tal.

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O estabelecimento de metas “zero acidente” em empresas dos ramos mencionados,
nas condições aventadas, não é definido com base em dados reais onde se avaliam
o que a empresa gastaria, em termos de dinheiro, tempo e de tecnologias para
zerar, de fato, os acidentes, e menos ainda quanto custaria, em termos de
credibilidade (desgaste), não alcançar as metas pretendidas, definidas e difundidas.
Assim se vê que metas de SSO, de um modo geral, na maioria das empresas, não
são definidas com base em dados concretos, em elementos exeqüíveis e
mensuráveis, resultando disso a descrença dos trabalhadores na maioria das
iniciativas da empresa nesse terreno. E o pior dessa descrença está no que a
Segurança no Trabalho representa para os trabalhadores e a associação que eles
fazem entre os resultados por ela obtidos e a figura do SESMT da empresa. Na
maioria das empresas o SESMT é visto não apenas pelos trabalhadores, mas
também pela maioria dos executivos, como um organismo incapaz de dar solução
definitiva aos problemas que afetam a segurança e a saúde dos trabalhadores nas
empresas. E o aspecto severo dessa visão é que ela não leva em conta os
fundamentos dos modelos de gestão de SSO que limitam o poder dos técnicos na
tomada de decisões em relação aos controles dos riscos. Comumente são
conferidos aos técnicos do SESMT papéis e atribuições para os quais sabidamente
não dispõem de poder para administrá-los. E ainda que o poder lhes fosse conferido,
o sistema de gestão da produção não lhes facultaria exercitá-lo, sem conflitos.

Os insucessos dos programas de SSO em algumas empresas podem estar


relacionados a motivos mais facilmente perceptíveis, verdadeiros ou falsos, não
reduzindo ou excluindo, com isso, o peso da imprecisão na formulação de alguns
itens da política de SSO, como: definição de objetivos, estabelecimentos de metas,
definição de atribuições, aferição de resultados e de estratégias de ação, por
exemplo.

A superficialidade com que alguns altos executivos de muitas empresas costumam


lidar com as questões de SSO tem sido apontada, por especialistas do ramo, como
uma das principais causas do desconforto e até mesmo constrangimentos sofridos
por eles mesmos, quando da ocorrência de acidentes graves, que carecem de
esclarecimentos perante o público externo e, sobretudo, perante os conselhos de
administração de suas respectivas empresas. A carência de informações sobre as
reais condições de trabalho não se restringe ao acima mencionado, ela tem induzido

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muitos executivos a cometer outros equívocos comprometedores na gestão de SSO
em suas empresas. O primeiro deles, por sinal, o mais danoso, é o corte de
orçamentos destinados ao saneamento de riscos no trabalho, sem avaliar as reais
conseqüências dessa decisão, explicitamente fundamentada na redução de custos,
quando se sabe que esse tipo de decisão está efetivamente centrado na escassez
de informações. Ressaltando que pior do que o corte de orçamentos é não haver
orçamentos definidos para o setor ou quando há, não priorizar adequadamente o
seu emprego.

Um alto executivo dificilmente tomaria uma decisão que pudesse comprometer sua
organização, baseada em dados sólidos. Ele coloca o assunto em segundo plano,
não porque ele assim o fosse, mas por falta de informações consistentes. O
segundo tropeço é sustentar publicamente, sem nenhuma restrição, que os
acidentes de trabalho ocorridos nas suas empresas tiveram como causa
preponderante a negligência e/ou a imprudência das vítimas. Essa colocação pode
ser cabível num ambiente onde os riscos do trabalho são sobejamente conhecidos,
avaliados e suficientemente controlados, o que nem sempre é o caso da maioria das
empresas brasileiras, especialmente dos ramos de negócios anteriormente
mencionados.

O trabalhador, por vários motivos, pode cometer erros graves na execução de suas
atividades, incluindo negligência e imprudência, mas também pode errar na tentativa
de compensar a ausência de acertos que a organização não lhe faculta. Daí não ser
prudente afirmar, sem as ressalvas devidas, que a principal causa de acidentes
numa empresa está no comportamento inconseqüente do trabalhador,
independentemente das razões que o motivam. Não há dúvida de que a maioria
esmagadora dos acidentes de trabalho tem como causa uma estreita ligação com
comportamentos inadequados ou inseguros, ora da parte do trabalhador, ora de sua
chefia imediata, que o manda ou o permite trabalhar em desacordo com os
procedimentos de trabalho. Nesse sentido, sem perder de vista a questão do
comportamento, o que tem de ser estudado e corrigido é o que está dando origem
ao comportamento inadequado.

Uma pesquisa realizada por Whiteley C. A., publicada com o título “A Organização
Totalmente Voltada para o Cliente”, mostra que de cada grupo de 100 problemas
conhecidos do pessoal da base, notadamente os trabalhadores, os supervisores

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conhecem 74% deles, perdendo, portanto, 26% de informações que podem ser
representativas nas tomadas de decisões. Dos supervisores para os gerentes os
números são ainda mais expressivos, tornando a situação ainda mais crítica. Dos
74%, de domínio dos supervisores, chegam aos gerentes apenas 9%. E destes para
a diretoria, 4%. É importante ressaltar que o livro de Whiteley foi publicado no final
dos anos noventa, e que em função da chamada “Reestruturação Produtiva”,
ocorrida no referido período, muita coisa mudou na estrutura organizativa das
empresas, com repercussão significativa nas funções dos supervisores (ver o item
“1.9. O ordenamento formal do trabalho e os conflitos de poder – a quê ou a quem o
trabalhador deve obediência: aos ditames das normas escritas ou às ordens verbais
ou ao silêncio deliberado de sua chefia imediata?”, página 39).

Em relação à Segurança e Saúde Ocupacional, não há muita diferença no perfil dos


dados. De 100 situações de riscos (não conformidades) conhecidas dos
trabalhadores, os gerentes de área conhecem de 45% a 60%. E destes à diretoria, o
volume de informações reduz para 4% a 6% 4, conforme quadro, abaixo.

QUADRO 2

Informação sobre os Riscos no Trabalho

4%
a 6% de
conhecimento
da Alta
Administração

45% a 60%
de conhecimento
das Gerências das Áreas

80% a 100% de
conhecimento dos
Trabalhadores

FONTE: Pesquisa de aspectos culturais de SSO

Esses dados mostram por que muitos dirigentes de empresas, ao abordar


publicamente o tema “Segurança e Saúde Ocupacional”, não vacilam em sustentar a

19
boa performance de suas empresas nesse terreno. A fala dos executivos, afirmando
a qualidade dos serviços de SSO de suas empresas, não deixa de ser verdadeira,
evidentemente que fundamentada nos dados de que eles dispõem. A filtragem de
informações sobre as reais condições de trabalho, na maioria das empresas
brasileiras foi e certamente continuará sendo um problema cuja solução esbarra na
cultura de SSO ainda fortemente predominante.

A falta de transparência, nesse terreno, é enorme e acarreta prejuízos incalculáveis


à boa gestão de SSO, principalmente nas organizações que desejam, de fato,
administrar a questão numa visão de resultado. Sabemos que não é nada
confortável para um gerente (líder) relatar, por escrito, para seus superiores
hierárquicos, o que ocorre, de fato, nos seus ambientes de trabalho em relação à
Segurança e Saúde Ocupacional. Essa atitude é explicável, entre outras razões, por
dois motivos básicos: primeiro, as informações de que os gerentes dispõem não são
totalmente confiáveis tanto no que diz respeito à qualidade quanto ao volume – eles,
os gerentes, sabem disso. Segundo, porque informar pressupõe reconhecer e
assumir problemas, o que certamente poderá implicar cobranças de ações
corretivas. É importante ressaltar que o reconhecimento e a aceitação de problemas
são atitudes diferentes de apenas revelar (informar) sua existência. Além disso, a
ação de informar implica lidar com dados nem sempre fáceis de reunir e aferir, e
ainda reconhecer falhas nos sistemas de gestão cuja responsabilidade recai sobre o
informante.

Curioso é que essa disposição negativa de dar fluxo às informações sobre SSO não
é totalmente consciente ou premeditada, sendo por isso, bem mais difícil de ser
abordada e corrigida. Não encontramos nas empresas, onde o trabalho foi e
continua sendo desenvolvido, propósitos deliberados de bloquear informações. O
fenômeno é espontâneo, porém muito mais arraigado do que se imagina. O bloqueio
está relacionado ao valor que se confere ao tema. Sendo assunto de somenos
importância, sua tramitação não foge à regra.

O diagnóstico de maturidade de SSO, realizado em quatro unidades industriais do


ramo de metalurgia, envolvendo 3.632 trabalhadores, 429 ocupantes de cargos de
chefia e 47 técnicos do SESMT, nas questões referentes às causas dos acidentes
ocorridos nas unidades avaliadas – respostas conferidas pelos colaboradores

20
(trabalhadores) e pelos ocupantes de cargos de chefia podem ser vistas na Tabela
18:

21
TABELA 18

Q18. Em sua opinião, os acidentes ocorridos nos últimos anos, na empresa na qual
você trabalha, tiveram como causas principais:

Cargo
Resposta Gestor Colaborador
n % n %
1. Pressões exercidas pelo Facilitador (supervisor) da
área no cumprimento dos cronogramas de 48 11,35 1.138 31,52
produção;
2. Condições inseguras do trabalho (máquinas e
143 33,81 2.011 55,71
equipamentos perigosos sem a proteção devida);
3. Deficiência na identificação e avaliação dos riscos
195 46,10 2.663 73,77
do trabalho;
4. Treinamento inadequado dos colaboradores para a
143 33,81 1.029 28,50
execução correta do trabalho;
5. Aceitação das condições de riscos como situações
224 52,96 2.445 67,73
normais de trabalho;
6. Falhas na organização do trabalho (tarefas
200 47,28 1.719 47,62
descritas de uma maneira e executadas de outra).
Nota: Os percentuais na tabela e no gráfico somam mais de 100%, pois, cada empregado pôde
citar mais de uma resposta.
Casos sem informação: Gestores  6 casos Colaboradores  22 casos

Diferença de percepção – Gestores e colaboradores

10 0
G E S TO R
90
C o la b o ra d o r
80
73 ,77
70 6 7,73
60 52 ,9 6
55,71
50 4 6 ,1 4 7,2 8
4 7,6 2
40 3 3 ,8 1
3 3 ,8 1
30 3 1, 5 2
2 8 ,5
20
11, 3 5
10
0
1 2 3 4 5 6 O p ç õ e s d e re s p o s t a

O item 3, “Deficiência no conhecimento e abordagem dos riscos do trabalho”,


aparece com 46,10% e 73,70%, respectivamente; no item 5, “Por aceitação das
condições de riscos como situações normais de trabalho”, os valores
encontrados foram 52,96% e 67,73% e no Item 6, “Falhas na organização do
trabalho (tarefas descritas de uma maneira e executada de outra)”, os valores
apurados foram 47,28% e 47,62%. O achado mais importante, na presente tabela,

22
está na combinação dos itens 3 e 5. A aceitação das condições de riscos como
situações normais de trabalho é explicada, dentre outras razões, pela deficiência de
conhecimento. O efeito imediato da aceitação das condições de risco como situação
normal de trabalho pode ser observado no perfil de respostas ao item 6, que
aparece com valores expressivos, tanto na representação dos gestores quanto dos
colaboradores.

Na Tabela 31, que trata, da mesma forma, de causas de acidentes, respostas


conferidas por gestores, destaca-se o item 4, que aparece com 99,76%.

TABELA 31

Q24. Marque entre as afirmativas abaixo, aquelas que você acredita serem as
principais causas dos acidentes ocorridos na empresa, nos últimos anos:

Cargo
Resposta Gestor
n %
1. O planejamento da produção é elaborado sem levar em conta os
48 11,40
aspectos da Segurança e Saúde Ocupacional;
2. Existência de riscos sem controle ou controlados de forma
208 49,40
precária;
3. Os trabalhadores, por dificuldades no entendimento das Normas,
238 56,53
deixam de cumpri-las parcial ou totalmente;
4. Falhas na identificação e avaliação dos riscos do trabalho; 420 99,76
5. Faltam aos Gestores das áreas, conhecimentos e recursos
66 15,67
suficientes para controlar os riscos do trabalho;
6. As ações de Segurança e Saúde Ocupacional estão a cargo dos
técnicos do SESMT que, embora tecnicamente capazes, não 127 30,16
dispõem de poder para intervir nas condições de trabalho.
Nota: Os percentuais na tabela somam mais de 100%, pois, cada empregado pôde citar
mais de uma resposta.
 8 casos sem informação

As respostas conferidas pelos ocupantes de cargos de chefia ao item 4, sustentam a


afirmação de que faltam aos gestores conhecimentos sobre os riscos do trabalho. A
deficiência de conhecimento, por parte dos gestores, termina gerando arestas
comprometedoras na gestão da SSO nas empresas em decorrência das exageradas
diferenças de percepção dos gestores em relação aos técnicos do SESMT,
sobretudo em relação aos riscos do trabalho. Em muitas situações os gestores, por
deficiência de conhecimentos, não conseguem avaliar os riscos do trabalho na sua

23
verdadeira extensão, conferindo a eles importância exagerada e/ou minimizando-os.
Não havendo entendimento em relação à natureza e importância dos riscos, não
haverá, da mesma forma, entendimento em relação à definição e implementação
das medidas de controle necessárias. A distância que separa a importância
conferida à SSO por parte dos ocupantes de cargos de chefia, sobretudo das áreas
operacionais, em relação aos técnicos do SESMT, constitui-se na principal matriz de
conflitos entre esses dois seguimentos nas empresas onde o diagnóstico de
maturidade de SSO foi realizado. O problema pode ser observado em outras
questões, como aparece no tabela 57 – “Roteiro de Entrevistas” - com destaque
para o item 1, “As atribuições e responsabilidades em SSO são nominalmente
definidas no rol de atribuições dos ocupantes de cargos de chefia” que aparece com
68,65% na representação dos gestores e com 27,66% dos técnicos do SESMT. Já
no item 5, “A empresa cobra resultados positivos em SSO, mas não é
suficientemente clara em relação ao que compete aos ocupantes de cargos de
chefia nessa área”, que aparece com 10,64% na representação dos gestores e com
66,96% dos técnicos do SESMT. A diferença de percepção entre os grupos é grande
e compromete o entendimento, especialmente na definição e implementação das
medidas de controle.

24
TABELA 57

Q03. Com que grau de clareza as gerências operacionais entendem as suas


atribuições (papéis) e responsabilidades no gerenciamento das ações de
Segurança e Saúde Ocupacional na empresa?
Cargo
Resposta GESTORES SESMT
n % n %
1. As atribuições e responsabilidades em SSO são
nominalmente definidas no rol de atribuições dos 290 68,56 13 27,66
ocupantes de cargos de chefia;
2. As atribuições e responsabilidades em SSO não
fazem parte das atribuições nominais dos ocupantes 39 9,22 16 34,04
de cargos de chefia;
3. As atribuições e responsabilidades em SSO são
76 17,97 21 44,68
descritas somente na Política de SSO;
4. As atribuições e responsabilidades em SSO não são
nominalmente descritas, mas os ocupantes de cargos
203 47,99 4 8,51
de chefia as assumem por uma questão de
consciência crítica;
5. A empresa cobra resultados positivos em SSO, mas
não é suficientemente clara em relação ao que
45 10,64 31 65,96
compete aos ocupantes de cargos de chefia nessa
área;
6. Em minha opinião não há necessidade de definição
formal de atribuições e responsabilidades em SSO 16 3,78 0 0,00
para ocupantes de cargos de chefia.
Nota: Os percentuais na tabela e no gráfico somam mais de 100%, pois, cada empregado pôde
citar mais de uma resposta.
Casos sem informação: GESTORES  6 casos SESMT  0 caso

Diferença de percepção – Gestores e técnicos do SESMT

10 0
GES TOR
90
S ES M T
80
70 6 8 ,56
6 5,9 6
60
50 4 7,9 9
4 4 ,6 8
40
3 4 ,0 4
30 2 7,6 6
17 , 9 7
20
10 , 6 4
9 ,2 2
10 8 ,51 3 ,78
0 0
1 2 3 4 5 6 O p ç õ e s d e re s p o s t a

25
É importante destacar que a combinação dos resultados obtidos nos itens referentes
5
às tabelas mencionadas não apenas comprometem os programas de SSO em
curso na empresa, mas impedi-los de cumprir as suas finalidades. E não há como
fugir à regra: “o ato de mudar começa pelo pleno conhecimento daquilo que se
deseja mudar”.

1.4. Enfoque principal das ações de Segurança e Saúde Ocupacional


centrado no atendimento à legislação que dispõe sobre a matéria

A quantidade de empresas que por força da cultura dominante, ainda mantém


programas de SSO voltados para o atendimento à legislação que dispõe sobre o
assunto é muito grande. Ocorre que os programas de SSO fundamentados nesse
princípio são, por natureza, pobres e de desempenho ruim por várias razões, mas
principalmente porque privilegiam aspectos burocráticos em detrimento de ações
concretas que pudessem, de fato, melhorar as condições de trabalho. Além disso,
programas com essa característica são comumente voltados para o enfrentamento
dos riscos, que se apresentam em franco desacordo com a lei, em detrimento de
outros possivelmente muito mais nocivos à segurança e à saúde do trabalhador,
porém não facilmente perceptíveis, como é o caso dos comportamentos
inadequados, sobretudo de ocupantes de cargos de chefia das áreas produtivas.

Um outro aspecto negativo dos denominados programas “legalistas” 6 que,


combinado com a abordagem reducionista ou “minimizadora” dos riscos do trabalho
reforça esse lado negativo, é a impossibilidade de uma efetiva fiscalização por parte
do Ministério do Trabalho e Emprego em função do reduzido número de auditores
fiscais para cobrir o universo de empresas onde existem trabalhadores expostos,
cotidianamente, a riscos de acidentes e/ou doenças do trabalho. Isso sem contar o
que é pior: muitos dirigentes de empresas acreditam que, uma vez cumpridas as
notificações do Ministério do Trabalho e Emprego, fica restabelecida a conformidade
legal da empresa em relação aos instrumentos que regulamentam a Segurança e a
Saúde Ocupacional; por conseguinte, nada mais precisa ser feito.

Essa postura, além de comprometer a segurança dos trabalhadores, é


extremamente nociva a todos os envolvidos com os processos de trabalho na
empresa por ser absolutamente equivocada. Para que isso fosse verdade seria

26
necessário ao auditor fiscal do trabalho levantar, na empresa fiscalizada, todos os
itens de SSO em desacordo com as normas legais vigentes e transformá-los em
notificações. A inviabilidade dessa ação não esbarra apenas em questões de
natureza técnica, mas principalmente na missão da fiscalização. Além disso, a
fiscalização confere, por dever de ofício, um peso considerável aos aspectos
burocráticos – verificação de documentos – em detrimento da auditagem das reais
condições dos ambientes de trabalho.

A crença de que o cumprimento dos autos de infrações aplicados pelo Ministério do


Trabalho e Emprego restabelece a conformidade legal da empresa em relação à
Segurança e Saúde Ocupacional tem provocado aborrecimentos para muitos
gestores de empresas, simplesmente pelo fato de não ser esse expediente, em
nenhum sentido, verdadeiro. A não-conformidade em relação à Segurança e Saúde
Ocupacional, na maioria das empresas brasileiras, é bem maior do que aquilo que
um auditor fiscal do MTE, por mais preparado que seja, tem a capacidade de
observar no curto espaço de tempo de permanência nos ambientes de trabalho. Daí
a inconveniência de se tomar essa referência como verdadeira na orientação dos
programas de SSO na empresa. A lei deverá ser cumprida independentemente do
programa ou sistema de SSO instituído pela empresa. O que a empresa precisa
fazer é ir além da lei. Os programas avançados de SSO são orientados muito mais
por ações voluntárias do que por ações ancoradas na legislação pertinente.

1.5. O comportamento do trabalhador como fator gerador de acidentes do


trabalho (fatos e mito)

Outro traço da cultura de SSO ainda fortemente marcante na maioria das empresas
brasileiras evidencia-se pelo estabelecimento do nexo causal dos acidentes com
base no comportamento dos trabalhadores. Relacionar o comportamento do
trabalhador com a prevenção ou a ocorrência de acidentes no trabalho – não
importando se o impacto do acidente é uma intoxicação aguda ou uma fratura óssea
ou coisa do mesmo gênero – não é tarefa difícil nem mesmo para os leigos no
assunto, quanto mais para quem milita profissionalmente no ramo da promoção da
Segurança e Saúde Ocupacional. O mesmo, todavia, não ocorre quando se
pretende elucidar as origens do comportamento dos indivíduos, o que, em última

27
instância, é o que interessa a quem lida com a gestão da Segurança e Saúde
Ocupacional.

Uma coisa é uma determinada manifestação de comportamento, certa ou


equivocada; e outra, muito diferente, é o que poderá estar por trás desse
comportamento, isto é, o que o motiva. O comportamento expresso por meio de
ações concretas, observáveis, necessariamente terá que ser entendido como
conseqüência de vivências do indivíduo em uma determinada realidade e não como
causa da referida ordem. Não é o comportamento do trabalhador que determina as
condições de trabalho, embora pareça, o contrário é que é verdadeiro. A despeito
dos estudos do comportamento humano levarem em conta ou mesmo se basearem
nas representações dos indivíduos, em se tratando de acidentes no trabalho, não se
pode desassociar do comportamento dos acidentados, os traços marcantes da
cultura das relações de trabalho, a natureza do ambiente, o potencial de riscos
oferecidos, os elementos essenciais da organização do trabalho, com destaque para
a jornada, carga, horário e ritmo do trabalho e principalmente o que a empresa vem
fazendo para controlá-los.

É sabido que uma quantidade apreciável de acidentes de trabalho ocorridos no


Brasil ou em qualquer parte do mundo tem suas origens no comportamento das
vítimas, como conseqüência direta de erros cometidos na realização do trabalho.
Quanto a isso não há nenhuma dúvida. O que é mal compreendido é por que as
pessoas se expõem, de maneira passiva, a determinadas condições de risco que
podem aleijá-las ou matá-las. E essa situação se torna mais intrigante ainda quando
os regulamentos da maioria das empresas facultam ao trabalhador se recusar a
trabalhar em situações que coloquem em risco a sua vida ou a sua saúde. Entender
e remover esse obstáculo constitui-se num desafio que desafia.

É importante ressaltar que o direito a recusa está previsto nos regulamentos de


trabalho de muitas empresas, não sendo regularmente utilizado pelos trabalhadores
7
ou não utilizado de forma alguma. A questão fundamental é entender e não julgar
com base em convicções pessoais por que isso ocorre. É importante reconhecer e
aceitar que o comportamento das pessoas, na sua relação com o trabalho, resulta
da interação do trabalhador com o conjunto de fatores que constituem as relações
de trabalho, com destaque para a qualidade do ambiente físico do trabalho e
principalmente com os elementos constitutivos de sua organização.

28
Afora os equívocos que culminam em julgamentos errôneos ou os motivos que
orientam o comportamento do trabalhador, a alteração de comportamento em
relação ao que se qualifica como sendo o corretamente esperado não deixa de ser
um sério agravante na exposição aos riscos ocupacionais, sobretudo quando esses
riscos não são suficientemente identificados, avaliados e de pleno conhecimento dos
próprios trabalhadores.

Imaginar que um trabalhador se exponha a uma condição de risco que pode lesá-lo
ou matá-lo simplesmente porque é displicente, imprudente, negligente ou
indisciplinado é não compreender os princípios naturais que norteiam a preservação
da vida e ignorar os determinantes do comportamento humano. Muitas vezes o
trabalhador se comporta de maneira equivocada no trabalho, em franca
desobediência a determinadas regras de segurança, simplesmente porque não lhe
foi proporcionada outra alternativa para realizar o trabalho com a assertiva esperada,
incluindo os aspectos de segurança. Nesse sentido é conveniente ressaltar que,
nem sempre, o trabalhador é cobrado pela maneira (certa ou errada) de como se
está trabalhando ou se deveria trabalhar, mas pelo resultado do trabalho realizado.
Daí o ímpeto do trabalhador em realizar o trabalho ainda que em desacordo com as
normas que orientam a sua realização. Às vezes o trabalhador não é apenas
incentivado a realizar determinadas tarefas em desacordo com os procedimentos de
trabalho, mas forçado pelas circunstâncias impostas pelo próprio trabalho ou por
pressões exercidas pelas suas chefias imediatas. O diagnóstico de maturidade de
SSO realizado nas empresas mencionadas não deixa dúvidas quanto ao afirmado,
sobretudo em relação ao que os trabalhadores denominam de “ausência deliberada
do supervisor”. O supervisor, em muitas situações, finge não ver o trabalhador
desrespeitar padrões ou regras de trabalho. Quando isso ocorre, o trabalhador não
se comporta de maneira diferente: ignora a presença do supervisor e passa por cima
das regras ou procedimentos normativos do trabalho.

A esse respeito é conveniente lembrar que num passado não distante, menos de
dez anos, o bom trabalhador era aquele que não reclamava de nada, não
questionava coisa alguma, que fosse dotado de enorme senso de improvisação e
que obedecesse não apenas às ordens explicitas, mas o que pudesse agradar à sua
chefia imediata. Não se pode esquecer também, que a formatação do trabalho
(definição de normas de procedimento) é coisa muito recente e nem sempre

29
formuladas com base nas reais condições de trabalho e nas vivências e
experiências dos trabalhadores.

A incidência de acidentes relacionados ao cometimento de erros no trabalho não é


pequena no universo dos acidentes registrados e estudados. Milhares de
trabalhadores morrem e se mutilam todos os anos no Brasil e em outras partes do
mundo em decorrência de acidentes de trabalho, cujas causas vão desde a
precariedade das condições físicas do ambiente onde o trabalho se realiza,
passando pelas diversas formas de distorções na sua forma de organização, até os
comportamentos inadequados dos próprios trabalhadores, traduzidos em erros
comprometedores na execução de suas tarefas.

O comportamento correto ou incorreto do trabalhador na sua relação com o trabalho,


depende da combinação de múltiplos fatores como, por exemplo: condições
ambientais de trabalho, carga e ritmo de trabalho, pressões e suscetibilidade do
trabalhador no trato com as exigências presentes nos ambientes de trabalho e no
contexto da vida, treinamento recebido para a correta execução de seus afazeres,
jornada de trabalho e principalmente relacionamento com sua chefia imediata.

Do conjunto de fatores identificados nos diagnósticos de SSO mencionados, que


certamente contribuem de forma significativa na manifestação de comportamentos
inadequados do trabalhador em relação ao seu trabalho, destacam-se os abaixo
mencionados, extraídos da representação de 3.632 trabalhadores, de 429 ocupantes
de cargos de chefia e de 47 técnicos do SESMT que compõem as amostras das
quatro unidades industriais do ramo metalúrgico, avaliadas:

 Pouca ou nenhuma identidade com o trabalho que realiza, isto é, não


encontrar no trabalho outras motivações que não sejam o salário e a imperiosa
necessidade de percebê-lo. Esse fenômeno aparece, nos diagnósticos, com mais
freqüência em trabalhadores com muitos anos de trabalho, na mesma função e
atingidos pelas reformas da Previdência Social, especialmente em relação à
Aposentadoria Especial.

 Insatisfação no trabalho por razões múltiplas, mas principalmente por falta de


perspectivas de crescimento profissional e/ou funcional. Sentir que as chances
de melhorias são demasiadamente reduzidas ou inexistentes, apesar do esforço
despendido.

30
 Dificuldades de relacionamento com colegas e/ou com chefias motivadas por
conflitos oriundos do próprio trabalho ou por fadiga resultante da sobrecarga de
trabalho.

 Falta de preparo adequado para o trabalho: executar atividades para as quais


não tenha sido suficientemente treinado, sobretudo atividades padronizadas.

 Realizar tarefas em desacordo com os procedimentos escritos (procedimento


padrão), simplesmente porque as condições de trabalho não permitem fazer
como está escrito nos procedimentos e de ser cobrado e/ou censurado por essa
postura.

 Cobranças por resultados e não pelo “como” se devesse trabalhar


(cumprimento dos procedimentos de trabalho e de segurança).

 Dificuldades de relacionamento com as chefias imediatas por


incompatibilidade no ordenamento formal do trabalho – não saber, em
determinados momentos, a quem ou a quê obedecer: se às ordens e/ou à
indiferença da chefia imediata, ou se ao que está escrito nos procedimentos de
trabalho. Ressaltando que as incompatibilidades não são francamente
explicitadas, não deixando, por isso, de influenciar na qualidade dos
relacionamentos entre trabalhadores e chefia.

 Cansaço (fadiga) decorrente das pressões no trabalho, da carga excessiva de


trabalho, do horário de trabalho (trabalho de turno), da insegurança, das
incertezas em relação ao futuro, da síndrome de ansiedade e de angústia,
somados aos problemas do contexto da vida, como: dificuldades em administrar
o orçamento doméstico, dificuldades nos relacionamentos afetivos com o cônjuge
e com os filhos, vícios, crises existenciais, entre outros.

 Síndrome de estagnação e/ou de final de carreira. Sentir-se com vontade de


se aposentar em definitivo ou mudar de função ou de emprego. Perder o gosto
pelo trabalho e pela convivência com os colegas.

 Angústia de saber que não pode mais contar com a aposentadoria especial,
como era antes da reforma da Previdência Social, e de tornar-se vulnerável à
dispensa do trabalho antes de completar o tempo necessário para a
aposentadoria, exigido pelas novas regras do sistema previdenciário. Esse item

31
aparece com mais intensidade nos trabalhadores com idade superior a cinqüenta
8
anos e que ainda não dispõem do tempo necessário para se aposentarem.

A inclusão do comportamento dos trabalhadores no conjunto dos fatores causais de


acidentes de trabalho, quando cabível, de forma alguma significa debitar aos
trabalhadores acidentados a culpa pelos acidentes e, conseqüentemente, pelos
danos deles decorrentes, incluindo a invalidez e a morte. Na arte de prevenir
acidentes, o comportamento do trabalhador, como comportamento em si, conforme
expresso na ação do acidente, ainda que tenha se revelado como causa
preponderante, é de importância secundária, servindo apenas como pista para o
direcionamento dos estudos que certamente terão de ser feitos na busca de suas
verdadeiras causas. O que deve ser levado em conta, e por todos os meios
possíveis, valorizados e cuidadosamente estudados, são os determinantes do
comportamento, ou seja, o que o motivou. O que havia de errado no ambiente, nas
relações de trabalho, incluindo os relacionamentos interpessoais, e na vida do
trabalhador que interferiam direta ou indiretamente nas vivências dele com o todo do
seu trabalho, definindo posturas traduzidas em atitudes corretas ou equivocadas.

A figura do “ato inseguro”, rebatizado com a nomenclatura de “atitude incorreta”,


“atitude abaixo do padrão” ou “erro humano” que tanto serviu e ainda continua, em
alguns ambientes, servindo para responsabilizar e até mesmo culpar trabalhadores
pelos acidentes sofridos, mais tem servido para ocultar, em alguns ambientes de
trabalho, sinais de agravos à saúde do trabalhador e, da mesma forma,
inadequações na organização do trabalho, do que propriamente atendido às
finalidades a que se propõe que é estabelecer nexo verdadeiro entre os acidentes
ocorridos e suas reais causas, com vistas à correção.

O questionamento em relação à figura do “ato inseguro” não se refere ao


comportamento do trabalhador, expresso no cometimento de erros no trabalho, mas
à parcialidade com que foi utilizado, no passado recente, na definição causal dos
acidentes. O erro na execução do trabalho, embora indesejável, é passível de
ocorrer, e todos, indistintamente, nele podem incorrer. Não é, por conseguinte, o
erro, em si, que interessa a quem lida, com imparcialidade, com a prevenção de
acidentes, mas as causas do erro – não importando sua clarividência, se visíveis ou
ocultas, se imediatas ou remotas. Não se previne nenhuma espécie de erro sem

32
estudá-lo em profundidade, definindo, qualificando e/ou quantificando suas reais
causas para, na seqüência, combatê-las utilizando-se de meios adequados.

A abordagem da segurança do trabalho a partir do raciocínio de que o trabalhador


erra ao executar suas tarefas porque é displicente, indisciplinado, negligente,
imperito ou simplesmente imprudente – princípios nos quais se fundamentam as
teses do “ato inseguro” – é tão nociva à gestão da segurança no trabalho quanto o é
a crença de que o trabalhador quando erra é porque foi induzido ao erro por motivos
alheios a sua vontade. Tanto uma quanto a outra linha de raciocínio em nada
contribui para a segurança no trabalho. Isso porque, de um lado, forja-se a idéia de
um trabalhador anárquico, irresponsável e indisciplinado em relação ao cumprimento
de normas de trabalho. Normas elaboradas, na sua maioria, por quem não está
diretamente envolvido com os processos de trabalho, que não define, por
desconhecimento, o que deve ser rigidamente observado e o que permite algum tipo
de flexibilidade orientada – resultando daí a explicação da “desobediência”, parcial
ou total, do trabalhador em relação ao seu cumprimento. De outro lado, retrata-se
um trabalhador, em todos os sentidos, duplamente vitimado, sem levar em
consideração a sua participação, direta ou indiretamente, na ocorrência do acidente.
Às vezes, o trabalhador sabe como executar a tarefa, as condições de trabalho lhe
oferecem os recursos necessários ao exercício correto do mesmo, e o individuo erra
ao optar por outra via, obscura e sem controle simplesmente por julgá-la menos
dispendiosa. Isso é perfeitamente passível de acontecer. Essa manifestação de
comportamento, pela sua natureza, da mesma forma que as outras precisam ser
estudadas em profundidade e receber o tratamento devido.

Não há dúvida de que qualquer julgamento, premeditado ou não, sobre a


causalidade dos acidentes no trabalho, que tome como base os extremos dos dois
pontos de vista aqui mencionados, é suscetível de falhas, uma vez que desvia o foco
da atenção e da análise das condições ambientais onde o trabalho se realiza e dos
elementos fundamentais de sua organização para centrá-lo na manifestação de
comportamentos do trabalhador, sem o deslindamento de suas origens.

33
1.6. A maneira como o trabalho é organizado e sua relação com o
comportamento dos trabalhadores

Um modelo de gestão de Segurança e Saúde Ocupacional que permite relacionar a


ocorrência de acidentes de trabalho ao comportamento do trabalhador,
caracterizando-o como displicente, imperito, negligente e/ou imprudente na definição
causal dos acidentes, sem levar em conta as condições físicas do ambiente laboral e
principalmente os elementos que determinam a organização formal ou informal do
mesmo, certamente, estará tratando a questão da SSO de forma imprecisa e parcial.
E, o que é pior, às vezes inconseqüente, e por isso mesmo, improdutiva. Isso
porque, por essa via, todo o esforço despendido no entendimento da questão é
centrado no comportamento da vítima, desvinculado dos fatores que o tenham
ocasionado, em detrimento da investigação científica que procura, isenta de
quaisquer parcialidades, desvendar e correlacionar os determinantes causais das
atitudes tanto dos gestores quanto dos trabalhadores, numa dada situação.

A definição da causa dos acidentes de trabalho pela via do “ato inseguro” não peca
apenas por privilegiar o comportamento do trabalhador como causa preponderante
dos acidentes de trabalho, em detrimento da qualidade dos ambientes e da
organização do mesmo, mas principalmente por imaginar que os erros cometidos
pelo trabalhador na execução de suas tarefas derivam simplesmente das limitações
do próprio trabalhador, não guardando, por isso, nenhuma relação com as condições
de trabalho, com os modos de ser e de agir da empresa, na pessoa, sobretudo de
seus prepostos. Esse entendimento combinado com o extremo de se imaginar que o
comportamento do trabalhador, não importando as razões que o determinem, não
deve ser abordado como causa de acidente, porque o trabalhador em todos os
sentidos deve ser visto e tratado como vítima, não apenas empobrece qualquer
iniciativa na área de gestão de SSO, mas concorre para reforçar as teses que
sustentam não ser a segurança no trabalho um problema de gestão empresarial em
todas as suas nuanças, mas um problema relacionado apenas à qualidade da mão-
de-obra da empresa. Sendo essa principal razão da inclusão da SSO no rol das
relações trabalhistas.

34
Essa forma equivocada de abordar a questão reflete negativamente em todas as
iniciativas de fazer segurança, mas de forma decisiva nas práticas de treinamento
em prevenção de acidentes. De um modo geral os treinamentos abordam os riscos
do trabalho desvinculados dos processos produtivos, numa falsa crença de que a
capacitação do trabalhador para fazer segurança seja a solução mais produtiva na
prevenção de acidentes, o que nem sempre ocorre. O treinamento em prevenção de
acidentes produz bons resultados, não há dúvidas, quando associado à melhoria
contínua dos ambientes e, principalmente, da organização do trabalho.

No nosso entendimento, melhor dizendo, no entendimento de quem concebe a


segurança como parte essencial dos processos produtivos, não deveria haver
treinamento especifico para prevenção de acidentes. O trabalhador deve ser
preparado (capacitado) para exercer o seu trabalho de maneira correta, que significa
completa. Quando ele assim o faz, a segurança requerida é automaticamente
contemplada.

Um outro aspecto negativo na abordagem do acidente de trabalho a partir do


comportamento do trabalhador, na visão do “ato inseguro”, está no equívoco de se
imaginar que o trabalhador comete erros no trabalho simplesmente porque, em
determinado momento, voluntariamente decide como se comportar no trabalho,
improvisando condições alternativas para a realização das tarefas, passando por
cima dos procedimentos normativos previamente definidos para sua realização.

Afirmar que o trabalhador decide por conta própria como se comportar em relação
às normas que orientam o trabalho, sem levar em conta o complexo de variáveis que
envolvem o próprio trabalho, sobretudo no que se refere às relações de poder,
revela não apenas uma inversão de papéis, mas, principalmente, uma demonstração
clara da maneira como o trabalho é organizado naquele ambiente, bem como as
fragilidades dos seus sistemas de controle.

A organização da produção e o que dela decorre – fazer o quê, por que, como,
onde, quando e especialmente por quem – sempre e necessariamente serão de
responsabilidade da empresa, na pessoa de seus prepostos, e não dos
trabalhadores. Não acreditamos que o trabalhador, em nenhuma empresa brasileira,
em face da cultura do trabalho ainda predominante no Brasil, disponha de poder
para decidir, individualmente, como deve se comportar no trabalho,

35
independentemente das determinações normativas impostas pela empresa. O que
se afigura como mais provável, nesse particular, são as falhas no ordenamento
9
formal do trabalho e as deficiências nos controles exercidos pela empresa.

1.7. A inserção dos trabalhadores nos programas de Segurança e Saúde


Ocupacional da empresa

Ainda em relação aos aspectos culturais relacionados à Segurança e Saúde


Ocupacional, algo de certa forma paradoxal, porém verdadeiro e importante é
constatado: tão nefastas quanto as doenças e os acidentes de trabalho são
determinadas formas escolhidas por algumas empresas para com eles lidar. O
enfrentamento dessa questão, pela sua complexidade e pela multiplicidade causal,
não passa apenas pelo treinamento específico de trabalhadores para fazer
segurança, independentemente das condições materiais onde o trabalho se realiza e
de suas formas de organização.

Entendemos até que treinar trabalhadores para o estrito cumprimento de normas em


ambientes agressivos, desfavoráveis à vida, onde a organização do trabalho pouco
favorece o exercício correto do mesmo, sem oferecer aos trabalhadores as
condições necessárias e abertura para discutir, ponderar e propor medidas de
melhorias, tanto no ambiente quanto na organização do trabalho, é exacerbar o
estado de angústia que caracteriza a exposição, consciente, a riscos potencialmente
capazes de gerar danos à saúde.

Esse ponto de vista apóia-se no raciocínio de que se expor a uma situação de risco
à saúde e/ou à integridade física, sem saber o que isso significa, é bem diferente do
que estar consciente do problema e ter que a ele se submeter sem condições para
agir. Nesse caso, o dano não se restringe apenas àquele ocasionado pelo risco em
questão, mas também pela angústia de saber o que está ocorrendo e não poder se
proteger. Oferecer essa condição ao trabalhador, na expectativa de que ela seja um
caminho alternativo para a solução do problema acidentário, além de não
representar solução nenhuma, aprofunda ainda mais o fosso que separa os
propósitos da empresa em relação ao tema do engajamento espontâneo e
compromissado dos trabalhadores.

36
Nada mais danoso a qualquer programa de gestão de SSO do que o
constrangimento sofrido por trabalhadores que passaram por treinamento específico
de segurança, promovidos pela própria empresa, mas que ao tentarem colocar em
prática as lições aprendidas são impedidos de fazê-lo, ora por decisão de suas
chefias imediatas, sem justificativas convincentes para isso, ora porque as
condições de trabalho não o permitem. No caso da segunda hipótese, o conflito está
intimamente relacionado ao fato de o conteúdo do treinamento não ter levado em
conta as peculiaridades do ambiente e a natureza do trabalho porque se tratava de
segurança e não de trabalho correto. Em todos os sentidos, a ocorrência desse fato
pode ser debitada à desvinculação da segurança do trabalho dos processos
produtivos e da não responsabilização das gerências das áreas operacionais pela
sua condução.

1.8. A Segurança e a Saúde Ocupacional a partir das novas regras para


concessão da aposentadoria especial. O que mudou e o que as
empresas vêm fazendo?

Antes de abordar a aposentadoria especial e sua relação com as condições de


trabalho, é importante verificar a questão das figuras denominadas adicionais. A
palavra “adicional” relacionada à SSO, vincula-se, para todos os sentidos, a
insalubridade e a periculosidade. Não há dúvidas de que muita coisa mudou, nos
últimos anos, em relação a essas duas figuras jurídicas no cenário das relações de
trabalho. Em relação à insalubridade, por exemplo, por conta das novas regras para
concessão da aposentadoria especial, muitas empresas vêm procurando corrigir
e/ou eliminar as condições insalubres, passíveis de serem eliminadas, seguidas da
supressão do adicional de insalubridade. Por diversos motivos esse expediente vem
sendo questionado e às vezes, rejeitado por algumas categorias de trabalhadores. O
questionamento mais freqüente refere-se ao entendimento do que seja “eliminar o
risco” que resultaria na supressão do adicional de insalubridade.

Eliminar, nesse sentido, pressupõe reduzir os níveis dos agentes patogênicos abaixo
dos limites legais de tolerância, o que seria feito, por meio de medida de proteção
coletiva ou pelo uso de Equipamento de Proteção Individual, que não interfere nos
agentes patogênicos, mas na atenuação de seus efeitos. O questionamento dos

37
trabalhadores, no que nos foi possível observar, reside na frase “eliminar o risco” e o
que dela decorre – a supressão do adicional de insalubridade. O trabalhador não é
contra a eliminação do risco, o que ele não quer é perder o adicional de
insalubridade.

Esse impasse revela a necessidade de uma discussão mais aprofundada sobre o


assunto, questionar os motivos reais que ainda direcionam uma parcela considerável
de trabalhadores a tal posicionamento. Não só de trabalhadores, mas também de
algumas empresas que continuam acreditando que o pagamento do adicional de
insalubridade ainda representa a saída menos onerosa para o enfrentamento da
questão. De parte dos trabalhadores, o que foi possível observar, por meio de
entrevistas realizadas em diversas empresas de ramos de atividades diferentes, é
que, nas categorias onde o salário é por demais reduzido, os trabalhadores não
abrem mão do referido adicional por ser ele parte considerável de sua remuneração,
como o são, da mesma forma, horas extras e adicionais noturnos. Já nas categorias
em que os salários são mais elevados, o pleito pelo adicional de insalubridade
associa-se à idéia de que por meio dele se assegura, na Previdência Social, a
obtenção da aposentadoria especial.

Quanto ao primeiro posicionamento, adicional como ganho pecuniário, embora não


devesse, é compreensível; já o segundo, insalubridade, como pré-requisito à
obtenção da aposentadoria especial, trata-se de desinformação, já que a concessão
da aposentadoria especial depende fundamentalmente das informações prestadas
pelas empresas por meio de Laudo Técnico das Condições Ambientais do trabalho
(LTCAT) e/ou PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário), informando as condições
de trabalho do segurado, tais como a natureza dos riscos ambientais, concentração
ou intensidade e o tempo de exposição, que ultrapasse os limites de tolerância ou
que não tenham condições de serem eliminados ou reduzidos aos limites de
tolerância legal. De qualquer forma, independentemente das razões alegadas, a
monetarização da saúde não deveria, em nenhuma hipótese, por razões humanas e
éticas, ser objeto de negociações que não objetivassem a sua supressão, não
restrita à figura jurídica da insalubridade, mas principalmente às condições de
trabalho que a ensejam.

Da parte das empresas, o que é observado é que o pagamento do adicional de


insalubridade, representa no julgamento de quem promove as negociações, a via

38
menos complicada e de menor custo para as empresas. O referido adicional incide
sobre o salário mínimo e é pago a uma parcela restrita da população de
trabalhadores expostos a riscos ocupacionais. No nosso entendimento, tanto os
trabalhadores quanto às empresas, deveriam rever suas posições, vez que muitas
outras questões envolvidas no assunto, no momento das negociações, não são
devidamente consideradas pelas partes interessadas.

De parte dos trabalhadores, a monetarização da saúde, por meio do adicional de


insalubridade, face aos novos critérios de concessão da aposentadoria especial
precisa ser revista. Não é tarefa fácil convencer os trabalhadores de que, melhor do
que quaisquer ganhos monetários, decorrentes da exposição a riscos no trabalho,
são as medidas saneadoras desses riscos. Os trabalhadores, ao longo do tempo,
associaram a concessão da aposentadoria especial à percepção do adicional de
10
insalubridade, derivando disso as resistências em relação à sua supressão.

O custeio da aposentadoria especial, a partir de dezembro de 1998, se, de um lado,


onerou a folha de pagamento de algumas empresas, em decorrência do
recolhimento das alíquotas suplementares referentes à aposentadoria especial, de
outro, serviu para demonstrar o quão frágeis e equivocadas eram as formas de lidar
com as questões de SSO, por parte da maioria das empresas. Muitas foram as
empresas que optaram pelo pagamento do adicional de insalubridade – sem a
avaliação técnica requerida – mediante acordos coletivos, com a finalidade precípua
de amortecer conflitos trabalhistas. E os trabalhadores, por seu turno, abrangidos
por esse expediente, se sentiam “favorecidos”, menos pelos valores adicionados aos
seus salários e mais pela expectativa de se beneficiarem da aposentadoria especial.
Esse acordo de cavalheiros, pela sua natureza, não deixava de representar uma
espécie de lenitivo dos embates trabalhistas, típicos de uma época em que o
assunto era tratado como relações trabalhistas e não como saúde ocupacional, na
concepção atual. Como adicionar insalubridade aos salários era menos oneroso do
que atender a outras reivindicações incluídas nas pautas de negociações, nem
impunha às empresas outras obrigações além da emissão do SB 40, muitas
empresas embarcaram nessa experiência sem avaliar os impactos futuros dessa
medida, tanto sociais quanto pessoais, principalmente quando da aposentadoria dos
seus trabalhadores.

39
Com a adoção das alíquotas suplementares destinadas ao custeio da aposentadoria
especial muita coisa mudou e continua mudando nas empresas. As condições de
trabalho vêm se alterando, em muitas situações, para melhor. E para que os
esforços não se circunscrevam apenas aos aspectos fiscais é conveniente que os
trabalhadores estejam atentos, acompanhando e avaliando a eficácia das
mudanças, sobretudo no que se refere à qualidade dos ambientes de trabalho.

Muito antes do advento da cobrança das alíquotas suplementares para custeio da


aposentadoria especial as empresas vinham sendo alertadas sobre as mudanças na
Previdência Social que poderiam culminar na definição do custeio da referida
aposentadoria. Era previsível que qualquer reforma na Previdência Social, cujo
endereço fosse o ajuste de caixa, necessariamente passaria pelo custeio da
aposentadoria especial. O volume de recursos despendido para essa modalidade de
benefício era enorme, sem fontes específicas de custeio.

As empresas que tiveram menos problemas com as referidas mudanças foram as


que optaram por montar serviços próprios de Higiene Ocupacional. 11 Esses
serviços, devidamente equipados e com profissionais altamente qualificados, fizeram
e continuam fazendo, exatamente o que era necessário. Identificaram e avaliaram,
com o devido rigor técnico, os riscos ocupacionais existentes na empresa.
Sugeriram medidas de controle para os factíveis de correção e recomendaram o
recolhimento das alíquotas suplementares referentes às atividades ou funções cujo
controle dos riscos gerava dúvidas em relação à sua eficácia. Encampar essa idéia e
transformá-la em ação concreta, sem sombra de dúvida, é o investimento mais
barato e lucrativo que as grandes empresas vêm fazendo, no momento. Essa
medida além de beneficiar os trabalhadores, previne a formação de passivos tanto
trabalhistas quanto previdenciários pela adoção de medidas equivocadas. É
importante reconhecer que muitas empresas, por uma série de motivos, optaram por
serviços terceirizados de higiene ocupacional, muitos, não resta dúvida, de
excelente qualidade. A questão é que esse tipo de serviço, de um modo geral, se
limita à geração de dados. E pior ainda, dados utilizados, na maioria das vezes, ora
para concessão e/ou rejeição de pagamentos de adicionais de insalubridade e
periculosidade ora para pagamento de alíquotas de custeio da aposentadoria
especial. Nunca ou quase nunca para definição de projetos de engenharia
destinados à melhoria das condições de trabalho.

40
1.9. O ordenamento formal do trabalho e os conflitos de poder – a quê ou a
quem o trabalhador deve obediência: aos ditames das normas escritas ou
às ordens verbais ou ao silêncio deliberado de sua chefia imediata?

Outro aspecto relevante, fruto dos traços da cultura ainda fortemente marcante na
maioria das empresas brasileiras, que interfere de maneira negativa no desempenho
da gestão da Segurança e Saúde Ocupacional, é o dualismo crescente vivenciado
cotidianamente pelos trabalhadores no atendimento ao ordenamento formal do
trabalho. O fosso que ainda separa o discurso do trabalho formal (normas e/ou
procedimentos escritos) da diversidade de formas práticas – nem sempre em
conformidade com que está escrito – de realização de tarefas por parte dos
trabalhadores, às vezes até orientados pelas suas chefias imediatas, relaciona-se,
no que pudemos identificar, entre vários outros motivos, aos que se seguem:

 Dificuldades, por parte tanto dos gestores das empresas quanto dos
trabalhadores, em lidar com trabalho orientado por regras formais. A prescrição
do trabalho, ainda que bem feita, representa para uma parcela considerável da
população trabalhadora, incluindo gestores, uma espécie de entrave – de
empecilho na realização de suas atividades;

 Incompatibilidades entre: a) padrões de trabalho (normas e/ou procedimentos


escritos); b) condições ambientais de trabalho e c) elementos constitutivos da
organização do trabalho. As condições de trabalho nem sempre favorecem a
realização das atividades laborais como descritas nos procedimentos.

 Deficiência na capacitação técnica dos trabalhadores para a correta execução


das tarefas em atendimento às prescrições normativas;

 Distanciamento dos supervisores de seus comandados em decorrência do


volume de trabalho burocrático realizado em escritório. Atualmente um supervisor
dificilmente consegue permanecer por mais do que 50% do tempo de trabalho
junto aos seus comandados.

 Declínio na capacitação técnica dos supervisores. Os supervisores estão se


transformando em gestores e perdendo ou não adquirindo informações técnicas
requeridas pelo seu trabalho, dificultando com isso, o atendimento às demandas
de informações técnicas/operacionais procedentes dos trabalhadores.

41
 Falta de cobrança por parte dos supervisores. Os critérios de avaliação de
desempenho centrados em produção terminam refletindo nas posturas dos
supervisores em relação ao descumprimento dos procedimentos tanto de
trabalho quando de segurança.

 Conflitos entre o saber técnico teórico apropriado pelos superisores e as


experiências práticas adquiridas nas vivências cotidianas dos trabalhadores com
o seu dia-a-dia de trabalho;

 Duplicidade de orientação sobre como realizar as tarefas – procedimentos


escritos e ordens verbais de seus supervisores e/ou cobranças por resultados
sem levar em conta o que está escrito nos procedimentos de trabalho;

 Desempenho avaliado pelo trabalho concluído e não pelo como se deveria


trabalhar. O trabalhador é cobrado pelo resultado do trabalho e não pela maneira
como se deveria trabalhar – aquela descrita nos procedimentos de trabalho;

 Descrença ou pouca credibilidade no sistema de trabalho formal, inclusive por


parte das chefias imediatas dos trabalhadores;

 Carga e ritmo, às vezes, incompatíveis com as reais condições e a


organização formal do trabalho;

 Procedimentos escritos mais para atendimento à burocracia dos programas


que requerem certificação formal (opinião da maioria dos trabalhadores e de
muitos gestores) e menos para agregar valor ao negócio fim da empresa;

 Incoerência na aplicação de medidas disciplinares. Não são aplicadas quando


necessário ou são aplicadas com objetivo de afirmar poderes conferidos pelo
cargo.

Os dados levantados em todas as empresas avaliadas revelam, com clareza, os


fatores inibidores e/ou impeditivos do cumprimento parcial ou total das formalidades
do trabalho ora em curso na maioria das grandes empresas. Os fatores aqui
relacionados, que por sua natureza se desdobram em muitos outros, foram
escolhidos numa amostra de vinte situações com características semelhantes e se
transformaram numa das principais fontes de informações levantadas pelo
diagnóstico de maturidade de SSO realizados nos ramos de atividades
anteriormente mencionados.

42
Dos fatores mencionados, no nosso entendimento, sem nenhuma dúvida, o
fenômeno que denominamos duplicidade de orientação é o que mais perturba os
trabalhadores no exercício de seu trabalho. Fenômeno decorrente das inúmeras
incompatibilidades existentes entre trabalhadores e condições de trabalho e
principalmente entre trabalhadores e chefias imediatas e de quebra, com técnicos de
segurança. Enfatizamos que por se tratar de um fenômeno relativamente recente,
não foi ainda suficientemente avaliado, mas que está diuturnamente presente nas
vivências dos trabalhadores no seu dia-a-dia de trabalho.

É importante destacar que a maioria dos trabalhadores brasileiros ingressou nas


empresas na condição de serventes, de aprendizes ou de ajudantes, e aprendeu a
trabalhar seguindo instruções orais – ordens verbais – de suas chefias imediatas,
passando por fases diferenciadas e distintas do processo de aprendizagem.
Aprenderam a fazer, fazendo sob a orientação e o comando direto de suas
respectivas chefias: “cachimbos”, encarregados e/ou supervisores.

Ao término de um determinado tempo, em função da aprendizagem, esses


trabalhadores eram classificados (com anotações em CTPS) nas suas respectivas
áreas de atuação, procedimento que não só determinava o andamento das
atividades laborais como também definia e estabelecia os vínculos do trabalhador
com a empresa. Isso significava que a imagem – positiva ou negativa – formada pelo
trabalhador a respeito da empresa era definida por esse expediente. O que ele
aprendia nesse lapso de tempo iria, em todos os sentidos, influenciar nas suas
vivências futuras na empresa, inclusive na definição e cultivo dos laços de amizades.

Poucas eram as ordens escritas transmitidas aos trabalhadores, diferentemente dos


dias atuais, quando praticamente todas as atividades passaram a ser orientadas por
normas ou regras contidas nos programas de gestão da qualidade – ISO 9.000, de
gestão do meio ambiente, ISO 14.000, e de gestão de SSO, OHSAS 18.001, entre
outras.

No dia-a-dia das empresas, no entanto, o que ocorre na prática é uma espécie de


rito de passagem das formas antigas de comando, orientadas por meio da fala
imperativa dos supervisores (encarregados) para uma comunicação formal,
embasada em procedimentos escritos (normas). Ressalte-se que esse rito, além de
lento, é severamente prejudicado por diversas outras razões, entre elas as aqui

43
mencionadas, e especialmente pelo fato de terem as empresas idealizado e
implementado um conjunto de mudanças internas sem ruptura com modelos
anteriores. 12

O gerente (supervisor), que exercia um papel caracteristicamente de preceptor e de


mandante, transforma-se gradativamente em facilitador, cuja função precípua é a de
estabelecer a ligação entre o trabalhador e os procedimentos formais de trabalho,
definidos pela empresa. O problema é que essa experiência é demasiadamente
nova entre nós e não amadureceu o suficiente para que supervisores e
trabalhadores a ela se ajustassem suficientemente a ponto de fazê-la funcionar sem
tropeços e conflitos, especialmente em relação ao exercício do poder.

É importante entender que no sistema formal de trabalho a chefia do trabalhador,


isto é, a quem ele deve obediência, são os procedimentos de trabalho. Nesse
sentido o entendimento da evolução nas relações de trabalho é de fundamental
importância. O capataz que evoluiu para encarregado e que se transformou em
supervisor, no sistema formal de trabalho, virou facilitador. E facilitar não é sinônimo
de chefe, mas de parceiro. Só que isso não é entendível e menos ainda praticável
sem alterar profundamente a cultura dominante no que tange às relações de
trabalho, com destaque para as relações de poder. Na cabeça da maioria dos
supervisores, chefe é aquele que manda. E o bom trabalhador, o que obedece, sem
questionamento.

As dificuldades nesse terreno, em praticamente todas as empresas por nós


pesquisadas, são notórias e certamente estão relacionadas ao fato de os
trabalhadores e menos ainda os supervisores e facilitadores não terem ainda
aprendido a se entender sem o apoio do poder para, de um lado, mandar, ordenar,
determinar; e de outro, para obedecer.

O poder, como instrumento funcional entre o ato de mandar e o de obedecer,


remonta aos mais longínquos tempos da vida humana. A inversão desse quadro não
é tarefa impossível, porém demanda investimento pesado a médio e em longo
prazo, sobretudo na educação e na disciplina. É necessário que se reconheça não
ser fácil, para a geração de trabalhadores que ingressou no mercado de trabalho há
mais de dez anos, trabalhando, portanto, em ambientes onde as relações de poder
se caracterizavam pelo mando e pela obediência, de uma hora para outra, se tornar

44
figura desenvolta, despachada, sem a necessidade de chefia para controlar os seus
movimentos, enfim, para o exercício de um trabalho onde o chefe é uma folha de
papel ou uma tela de computador onde está escrito o que fazer e como fazer. Esse
exercício requer maturidade. A essa ponderação acrescenta-se a herança escravista
que marcou profundamente as relações de trabalho no Brasil, por mais de três
séculos ininterruptos. Isso sem contar com a teorização do trabalho, exigência dos
novos tempos.

Um outro fator relevante, que não pode ser ignorado na compreensão do fenômeno
(teoria e prática) é a dificuldade de se estabelecer parâmetros entre a execução de
uma atividade pela via da prática e a realização da mesma atividade seguindo
orientações fundamentadas em elementos teóricos. É importante lembrar que o ato
“fazer” constitui-se numa ação caracteristicamente motora, aprendida e aprimorada
através da observação e da repetitividade; deferentemente da concepção teórica da
mesma atividade, que passa pelo terreno da cognição. Por essa e por outras razões
é que surgem e se avolumam os conflitos vivenciados pelos trabalhadores no seu
cotidiano de trabalho.

A primeira e mais importante fonte desses conflitos reside nas dificuldades


enfrentadas pelos trabalhadores em lidar com a profusão de informações teóricas
contidas nos procedimentos de trabalho; segundo, não menos importante, não
encontrar em seus supervisores, em muitas situações, o apoio e as informações de
que necessitam. Há momentos em que os trabalhadores se sentem confusos,
tomados de dúvidas em relação a “que” e ou a “quem” obedecer – se aos
procedimentos de trabalho, por sinal difíceis de serem compreendidos, ou às ordens
ou ao silêncio deliberado de suas respectivas chefias. No caso específico das
empresas onde o diagnóstico de maturidade de SSO foi realizado, essa questão
aparece ao longo do diagnóstico, mas principalmente na Tabela 25, onde uma
parcela considerável dos colaboradores, pelas razões apontadas, alega não receber
de sua chefia imediata respostas satisfatórias às informações solicitadas.

Os problemas identificados podem ser resumidos em duas variáveis importantes:


atraso na formulação das respostas e deficiência de conhecimentos técnicos por
parte dos supervisores e/ou facilitadores para o devido embasamento das respostas.
Os supervisores, por diversas razões, mas principalmente pelos motivos apontados

45
no diagnóstico, não estão conseguindo responder, com a presteza necessária, ao
volume de informações oriundas de seus comandados.

Os supervisores sabem que o atendimento aos procedimentos escritos é importante


e que estes foram elaborados com a finalidade de otimizar os resultados da
produção – esse era e continua sendo o objetivo de sua implementação. Sabem, no
entanto, que a cobrança que recai sobre eles no dia-a-dia diz muito mais respeito
aos cronogramas de produção do que às formalidades do trabalho. E que, entre
cumprir rigorosamente os ditos procedimentos e fazer as coisas andarem em
direção ao atendimento aos cronogramas de produção, não há dúvida de que seus
esforços serão canalizados nessa direção. As cobranças que recaem sobre eles
passam por essa via. No discurso a alta gerência nunca deixa de enfatizar a
importância do trabalho submetido a regras (normas), mas, na prática, os critérios de
aferição de resultados nem sempre passa por essa via.

As raízes desses conflitos, pelo observado, além dos traços da cultura ainda
fortemente marcante nas empresas, estão nos objetivos que nortearam a
implantação dos programas que deram origem ao ordenamento formal das
atividades produtivas: qualidade – ISO 9.000, meio ambiente – ISO 14.000 e
segurança e saúde ocupacional, OHSAS 18.001.

Esses programas não foram, a rigor, implementados na maioria das empresas


brasileiras com a finalidade precípua de agregar valor aos seus negócios, originando
daí mudanças consistentes, sustentáveis e contínuas, embasadas em rompimento
sistemático com os padrões anteriores. As razões preponderantes das mudanças
não se fundamentam nesse principio, mas no atendimento às novas regras de
mercado, especialmente no que tange à qualidade dos produtos e/ou serviços, que,
além do atendimento aos padrões estabelecidos, necessitava do reconhecimento
formal – a certificação. Daí a necessidade imperiosa de implementação dos referidos
programas, mesmo sem levar em conta os impactos que tais procedimentos
pudessem provocar tanto na organização quanto na cultura da empresa.

Uma outra questão não menos importante que emerge nesse cenário é a dificuldade
de conciliar o manancial de conhecimentos técnicos adquiridos através da educação
formal com experiências práticas resultantes das vivências diárias dos trabalhadores
com suas ocupações. Evidencia-se uma dificuldade, se não explícita, velada, por

46
parte dos detentores do conhecimento teórico em aceitar as experiências dos
trabalhadores, não apenas como verdade substancial, mas como solução para
determinados problemas para os quais o conhecimento teórico revela-se
insuficiente.

De outra feita, os trabalhadores têm dificuldade em elaborar “relatórios escritos”,


onde suas experiências práticas pudessem ser retratadas com sustentações
convincentes. Essa manifestação cultural, em alguns casos de agravos à Segurança
e Saúde Ocupacional, costuma ser apontada como responsável por um fenômeno
conhecido como “acomodação” de problemas originalmente simples, que, por falta
de solução adequada, transformam-se em problemas complexos, culminando no
cometimento de erros que resultam em acidentes graves, envolvendo instalações,
equipamentos e pessoas. É importante ressaltar que em decorrência do acúmulo de
atividades burocráticas e do pouco tempo de permanência dos supervisores nas
frentes de trabalho esse problema tende a se agravar.

É importante enfatizar, contudo, que muita coisa mudou nas empresas, e certamente
para melhor, em menos de uma década, em decorrência da implementação dos
referidos programas. E teria mudado mais se o processo de mudanças em curso
não tivesse sofrido o arrefecimento que sofreu tão logo as empresas alcançaram o
seu objetivo primordial que era a certificação formal. E principalmente se as
mudanças tivessem de início, contemplado a qualidade de vida dos trabalhadores
pelo menos na sua relação cotidiana com o trabalho.

Do acima exposto, infere-se que a dificuldade maior enfrentada pelas empresas, na


condução das mudanças propostas, não se localiza apenas nos ajustes técnicos e
organizacionais necessários à nova ordem, mas no comportamento das pessoas
envolvidas direta ou indiretamente na sua condução. Não é tarefa impossível
transformar, em curto prazo, experiências construídas e vivenciadas ao longo de
gerações, sobretudo no que se refere às relações de poder, em relações formais,
onde a fala direta verbalizada oralmente e revestida de autoridade é substituída por
procedimentos escritos, frios, e que exigem das partes envolvidas alto grau de
comprometimento e disciplina férrea na sua condução.

Porém, essa transformação exige posturas coerentes com o que se pretende mudar,
especialmente por parte das gerências das áreas operacionais e dos supervisores,

47
que fazem a ligação entre os trabalhadores e as regras definidas para o trabalho. E
os meios impulsionadores dessas mudanças, sem dúvida alguma, residem nas
diversas modalidades de educação, de médio e longo prazo, conjugados com
ferramentas administrativas apropriadas, onde estejam definidos, com a clareza
necessária, o que a empresa espera de seus colaboradores e os meios
indispensáveis para transformar o idealizado em realidades mensuráveis. Nunca é
demais lembrar que o modelo de gestão ora em curso nas empresas se assemelha
a um banco de três pernas, que podem ser entendidas como: conhecimento,
método e disciplina.

Um outro aspecto relevante, que não pode deixar de ser mencionado é a


transformação radical dos sistemas de gestão das empresas para pronto
atendimento às exigências contidas nos referidos programas. Os programas de
Qualidade, de Meio Ambiente e de Segurança e Saúde Ocupacional são, por
natureza, burocratizados; apresentam uma variedade enorme de normas e
procedimentos escritos que exigem dos gestores, sobretudo dos supervisores,
dedicação na sua compreensão e comprometimento na sua implementação e
acompanhamento. Com isso, especialmente os supervisores, que antes conviviam
diariamente com os trabalhadores, estão, em grande parte do tempo, recolhidos às
suas salas de trabalho, envolvidos com uma enormidade de informações, situação
que vem alterando profundamente as antigas formas de relacionamento,
especialmente no que se refere ao exercício do poder.

Por outro lado, essa nova forma de gerir as empresas obrigou todo o seu corpo
gerencial, especialmente às gerências de produção, inclusive os supervisores e
facilitadores a estudar e se envolver direta e fortemente com atividades de cunho
gerencial em detrimento do conhecimento técnico e das experiências práticas
exigidas pelos sistemas produtivos. Estudos recentes, realizados por nós, nesse
sentido, vêm revelando que, a partir de meados da década de noventa, de cada
cinco cursos promovidos pelas empresas principalmente para seus supervisores e
facilitadores, três a quatro são da área de gestão e apenas um ou dois, das áreas
técnicas, com conteúdos voltados para os aspectos técnicos relacionados às suas
áreas de atuação. Reflexos dessa situação podem ser observados no diagnóstico de
maturidade de SSO realizado nas unidades industriais anteriormente mencionadas,
na Tabela 25, na fala dos colaboradores, com destaque para:

48
Itens 4, “O Supervisor/Facilitador busca obter junto aos operadores informações de
como o equipamento opera, e tenta ajudar na solução de problemas”, que aparece
com valores expressivos, 40,14%. Na mesma tabela, no item 6, o fenômeno se
evidencia de outra forma, “Os operadores conhecem melhor os equipamentos e os
seus limites técnicos do que o Supervisor/Facilitador”, aparecendo com 54,23%.
Ainda em relação à Tabela 25, itens 1, “O Supervisor/Facilitador é suficientemente
capacitado e é o orientador das ações do grupo”, aparece com 36,30%, índice
considerado demasiadamente baixo. Ressalte-se que o trabalhador conhecer a
funcionalidade do equipamento mais do que o seu supervisor é compreensível e
pode não se constituir em problema. A falha está na percepção dos limites técnicos
do equipamento.

Convém ressaltar que esse fenômeno não vem interferindo no relacionamento dos
supervisores com seus comandados apenas no que diz respeito à sua presença
física nos locais de trabalho, mas também nas demandas de natureza técnica,
ligadas às suas áreas de trabalho. Antes o trabalhador recebia ordens diretas e
orientação técnica de seus supervisores até mesmo para as coisas mais simples.
Em vista dos novos sistemas de gestão, isso passou a ser dificultado por problemas
de agenda do supervisor, que pouco tempo dispõe para o atendimento a esse tipo
de demanda.

49
TABELA 25

Q25. Em relação ao conhecimento que o seu Supervisor/Facilitador tem do


processo produtivo, das características e limites técnicos do
equipamento que você opera, pode-se afirmar:

Cargo
Resposta Colaborador
n %
1. O Supervisor/Facilitador é suficientemente capacitado e é o
1.314 36,30
orientador das ações do grupo;
2. O Supervisor/Facilitador conhece os processos e os
equipamentos, mas não orienta suficientemente o grupo quanto 294 8,12
às questões relativas à correta operação dos mesmos;
3. O Supervisor/Facilitador conhece os processos, mas não tem
domínio suficiente sobre as características técnicas dos 1.159 32,02
equipamentos;
4. O Supervisor/Facilitador busca obter junto aos operadores
informações de como o equipamento funciona para melhor 1.453 40,14
orientá-los na operação dos mesmos;
5. Os conhecimentos do Supervisor/Facilitador em relação aos
835 23,07
equipamentos são limitados;
6. Os operadores conhecem melhor os equipamentos e os seus
1.963 54,23
limites técnicos do que o Supervisor/Facilitador.
Nota: Os percentuais na tabela somam mais de 100%, pois, cada empregado pôde citar mais de
uma resposta.
 12 casos sem informação

Por outro lado, o investimento que o supervisor fazia no seu aprimoramento técnico
decresceu de maneira acentuada, em função do volume de trabalho de natureza
gerencial exigido pelo próprio sistema. As conseqüências dessa defasagem podem
se manifestar no relacionamento do supervisor com seus comandados e repercutir
diretamente num dos aspectos mais importantes desse tipo de relacionamento, que
é a credibilidade. Certamente, o relacionamento entre trabalhador e supervisor se
altera para pior, no momento em que o trabalhador não obtém, por inteiro, de seu
supervisor as informações técnicas de que ele necessita por ocasião da abordagem.

Atualmente, na maioria das grandes empresas, o supervisor não é mais aquele


profissional cuja atividade se restringe a tomar conta de um grupo de trabalhadores
e, com base nas suas experiências, notadamente práticas, fazê-los produzir. Os
novos sistemas de gestão os obrigaram a investir pesado em novas linhas de
conhecimento cuja finalidade é gerir os próprios sistemas. Esse novo modo de ser
das empresas, embora de maneira diferente, alterou também as vivências dos

50
trabalhadores em relação às suas ocupações. Os trabalhadores tiveram que
aprender a trabalhar sob supervisão limitada, não apenas em termos da presença
física dos supervisores, mas também das orientações técnicas por eles prestadas.

Muitos dos problemas de trabalho enfrentados pelos trabalhadores e resolvidos em


conjunto com suas respectivas chefias, em função dos novos modelos de gestão,
geraram outro movimento: os trabalhadores passaram a ter de solucioná-los
sozinhos ou se apoiarem mutuamente, inclusive passando por cima dos ditames dos
procedimentos de trabalho. No caso específico das quatro unidades industriais
mencionadas anteriormente, essa postura pode ser observada no item 4, da tabela
10, “Solicitar auxílio de colegas de trabalho para ajudar na solução do problema”,
que aparece com 44,21%, a despeito. Verificar que 21,47% dos trabalhadores
afirmam comunicar a situação de risco ao seu supervisor, sem, contudo, interromper
a atividade. Outro achado importante consiste na afirmação de 28,89% dos
trabalhadores indicando não haver instruções escritas de como se proceder diante
de situação dessa natureza.

TABELA 10

Q10. Ao se deparar com uma situação de risco considerado grave, você foi
orientado pelo seu Facilitador/supervisor a:

Cargo
Resposta Gestor Colaborador
n % n %
1. Interromper a atividade imediatamente e comunicar
288 68,09 2251 62,35
o fato ao seu Facilitador;
2. Comunicar a situação de risco ao Facilitador e
71 16,78 775 21,47
esperar a decisão trabalhando na mesma atividade;
3. Continuar trabalhando independentemente da
36 8,51 243 6,73
situação de risco verificada;
4. Solicitar auxílio de colegas de trabalho para ajudar
107 25,30 1596 44,21
na solução do problema;
5. As Normas de Trabalho e/ou Segurança e Saúde
Ocupacional são omissas em relação a situação 54 12,77 810 22,44
dessa natureza;
6. Não há instruções escritas de como se comportar
57 13,48 1043 28,89
diante de situação dessa natureza.
Nota: Os percentuais na tabela e no gráfico somam mais de 100%, pois, cada empregado pôde
citar mais de uma resposta.
Casos sem informação: Gestores  6 casos Colaboradores  22 casos

51
Diferença de precepção – gestores e técnicos do SESMT
10 0
G ES T O R
90
S ES M T
80
70 6 8 ,0 9

60 6 2 ,3 5

50
4 4 ,2 1
40
30 2 5,3 2 8 ,8 9
2 1, 4 7
20 2 2 ,4 4
16 , 7 8 12 , 7 7 13 , 4 8
10 6 ,73
8 ,51
0
1 2 3 4 5 6 O pç õ e s d e re s p o s t a

A questão que se impõe diante de tudo isso é saber qual o grau de confiabilidade
desse sistema em relação aos riscos oferecidos pelo trabalho e a sua relação com a
ocorrência de acidentes, por sinal, alta. É importante destacar que um percentual
considerável dos acidentes graves, inclusive com mortes, ocorridos nos cinco
últimos anos, que conseguimos estudar, teve como causa principal 13 a
desobediência a procedimentos formais de trabalho. Paradoxalmente, os
procedimentos formais de trabalho que deveriam funcionar como espinha dorsal de
orientação e controle vêm se transformando, em alguns casos, em peças geradoras
de conflitos, de indutores de erros na execução das tarefas e, conseqüentemente,
de acidentes graves. Evidentemente que não são os procedimentos responsáveis
pela ocorrência de acidentes, mas pela maneira como as pessoas se comportam em
relação a eles. Assim, tão ou mais importante do que atribuir ao descumprimento de
procedimentos a responsabilidade pelos distúrbios nas relações de trabalho, é
definir por que os ditos procedimentos não são observados, pelo menos no mínimo
das expectativas. A desobediência a regras do trabalho é um fenômeno facilmente
percebível, o que não é simples é determinar e corrigir as suas causas.

1.10. Postura das chefias, especialmente dos Supervisores, Facilitadores


e/ou Líderes, em relação às ações de Segurança e Saúde Ocupacional
desenvolvidas na empresa.

Como ilustração das dificuldades das empresas em lidar com as questões da


Segurança e Saúde Ocupacional, a partir da visão de seus gestores, é retratado
aqui o conteúdo de algumas falas, extraídas do conjunto de respostas que compõem

52
o diagnóstico de maturidade de SSO realizado em oito grandes empresas mineiras,
dos ramos de metalurgia, siderurgia, mineração, construção civil e serviços, nos
anos de 1995 e 1996. Os mesmos itens abordados àquela época continuaram sendo
estudados nos anos de 2001 até a presente data, e os resultados obtidos,
comparados aos primeiros diagnósticos, não sofreram alterações substanciais como
se imaginava que pudesse ter ocorrido devido à movimentação havida no mesmo
período em decorrência do aprimoramento dos programas de segurança, qualidade
e meio ambiente, segundo prescrições contidas no conjunto de normas: ISO 9.000 e
ISO 14.000, OHSAS 18.001, referentes à Segurança e Saúde Ocupacional e na SA
8.000, referente à Responsabilidade Social.

Tanto o primeiro quanto o segundo diagnóstico foram elaborados com quarenta e


quatro perguntas, seguidas de seis alternativas de respostas que afirmavam ou
negavam o que se perguntava. O entrevistado poderia escolher mais de uma
alternativa de respostas, seguindo a ordem crescente de afirmação ou de negação.
O mesmo procedimento foi utilizado nas entrevistas realizadas com gestores, tanto
das empresas contratantes quanto das contratadas e com trabalhadores que
sofreram acidentes com afastamento e que retornaram ao trabalho.

1.11. Pontos críticos da representação dos gerentes (gerentes, supervisores


e facilitadores) acerca do que pensam e do que fazem em relação à
Segurança e Saúde Ocupacional

Das quarenta e quatro questões abordadas – itens relacionados à SSO e à


conservação e manutenção de equipamentos e sua relação com a segurança no
trabalho, 20 questões são respondidas, concomitantemente, por gestores e
trabalhadores. Do conjunto de questões, incluídas as que são respondidas somente
por gestores foram eleitos os conteúdos, explícitos, de 12 itens para apoiar os
comentários a seguir. Foram tomados como referência apenas os itens que
obtiveram uma representatividade igual ou superior a 50% de respostas afirmativas
entre os gestores, complementadas pelos resultados das entrevistas realizadas com
os mesmos gestores que responderam ao questionário. É necessário esclarecer que
entendemos por gestores todos àqueles que, direta ou indiretamente, têm como

53
atribuição orientar, coordenar e facilitar o trabalho de outrem, como gerente,
supervisor, encarregado e líder de equipes.

Os itens são os que se seguem:

O conhecimento dos gestores acerca dos riscos do trabalho é limitado e, em


algumas circunstâncias, inexistente.

Considerando-se que as questões de Segurança e Saúde Ocupacional foram


tratadas durante décadas por um seguimento específico da empresa, desvinculado
dos processos produtivos – o SESMT – os conhecimentos, as experiências e as
informações (instrumentos tecnológicos) acerca do tema também ficaram restritos
ao domínio dos profissionais desse setor. Portanto, não é de estranhar que a grande
maioria dos gestores, supervisores e trabalhadores apresente dificuldades em
compreender e de familiarizar-se com o conceito de risco, suas causas, seus
impactos e os respectivos mecanismos de controle, o que ficou patente em algumas
situações reais, que apresentaremos a seguir:

a) Atividades de pintura à pistola com emprego de solvente


orgânico (benzeno, tolueno ou assemelhado), em ambiente fechado. Perguntado
aos supervisores responsáveis por essas áreas quais seriam os possíveis efeitos
do produto sobre o organismo dos trabalhadores, e que medidas de controle
deveriam ser adotadas, bem como a periodicidade dos exames médicos a que os
trabalhadores deveriam se submeter, nenhum deles soube precisar. A resposta
dada foi que o trabalhador deveria usar “máscara de proteção”, ter cuidado com
higiene corporal e tomar leite regularmente.

b) Manuseio de cabo elétrico de alta tensão (4.160V), que serve de


alimentador de escavadeiras elétricas utilizadas por empresas do setor mineral,
realizada sem as medidas de proteção apropriadas. As luvas, por exemplo, são
equipamentos imprescindíveis de segurança para evitar o contato da pele com o
cabo de alta tensão. Testemunhamos operações em que o trabalhador segurava
o cabo elétrico com a mão enluvada, mas, devido ao grande peso transportado,
utilizava o ombro ou o abdome, desprotegido, para ajudá-lo no levantamento e na
sustentação dos cabos. Isso demonstra que os trabalhadores e os responsáveis

54
por essas operações tinham conhecimento limitado sobre o risco presente, o que
tornava a operação ainda mais perigosa e comprometedora da integridade física
dos operadores.

c) Outra situação não menos estranha foi encontrada numa oficina


de manutenção de máquinas e equipamentos numa empresa do setor
metalúrgico, onde a limpeza de peças era feita com querosene, enquanto a
limpeza das mãos era feita com thinner. Indagados sobre essa escolha, a
resposta mencionava a eficácia do thinner na limpeza das mãos. Ninguém sabia
sobre a composição do produto e menos ainda sobre os efeitos do solvente no
organismo.

d) Passarelas elevadas, com guarda-corpo e rodapé danificados


por ação de ácidos numa indústria de celulose. O gerente da área ao ser
questionado sobre a situação, respondeu afirmando que o problema não era dele,
mas da área de manutenção. Evidente que se o problema estivesse diretamente
ligado à produção, a resposta não seria a mesma.

e) Movimentação de carga suspensa por meio de pontes rolantes


trafegando sobre pessoas.

Insistimos exaustivamente na reflexão sobre as conseqüências danosas do dualismo


trabalhar com segurança – trabalhar corretamente. Se as questões de
Segurança e Saúde Ocupacional não fossem vistas em separado do processo
produtivo, certamente situações como as acima apresentadas não ocorreriam, pois,
definida a forma de executar as atividades laborais, a segurança das mesmas seria
algo intrínseco ao processo como um todo. O supervisor teria informações precisas
e completas sobre os processos, métodos e recursos disponibilizados para a efetiva
execução do trabalho.

Impõe-se, então, que a empresa desenvolva um maciço trabalho de levar aos


supervisores e trabalhadores os conhecimentos e as experiências necessários ao
exercício pleno das atividades que lhes são destinadas, incluindo nelas os itens de
Segurança e Saúde Ocupacional, com a mesma determinação de observá-los como
o fazem em suas atividades rotineiras. E cobrar resultados na prática de prevenção

55
de acidentes, da mesma forma que é feito quando se trata dos itens relacionados à
produção.

Indecisão dos gestores em assumir o compromisso de administrar as


questões de SSO nas suas áreas de trabalho, alegando, entre outros
motivos, não saber que essa atividade faz parte formalmente de suas
atribuições.

As posturas assumidas pelos gestores da empresa em relação à condução das


ações de SSO, positivas ou negativas, derivam-se das políticas de SSO definidas e
explicitadas pelas próprias empresas. Nas empresas onde as políticas de SSO são
incisivas, onde as atribuições dos ocupantes de cargos de chefia são claramente
especificadas não há ambiente favorável à manifestação de dúvidas ou de quaisquer
outras alegações que caracterizam desapreço à segurança no trabalho.

De qualquer forma, indecisões manifestas por ocupantes de cargos de chefia em


relação à SSO, retratam o grau de comprometimento da empresa com o tema.

Falar em comprometimento com a segurança no trabalho é falar em evolução, que


por sua vez nos remete ao conjunto de ações desenvolvidas pelas empresas na
busca permanente e persistente de melhorias.

Tomando-se como base o desempenho dos programas de SSO implementados nas


empresas, verifica-se que a sua evolução se dá em estágios distintos, conforme a
maneira como eles são concebidos e conduzidos, partindo-se do pior para o melhor
14
desempenho. Esses estágios podem ser compreendidos como:

1.11.1. Primeiro estágio

Quando a empresa atua nas conseqüências dos problemas. Apareceu um problema


que compromete o sistema produtivo, parcial ou totalmente, ela o corrige; apareceu
outro, ela adota a mesma providência, porém não investe na antecipação dos riscos
que estão gerando acidentes. É o que se pode chamar de efeito “serrote”. Essa fase
é comumente denominada por “administração por crise”. Crise porque não há o
mínimo de empenho na promoção de ações de identificação e de controle dos riscos

56
de forma efetiva. Dessa forma, tudo o que se faz é acompanhado do sentido, cada
vez maior, de urgência e de improvisações. Pouco ou nada é feito na antecipação
dos problemas, tudo é voltado para o atendimento precário dos problemas
instalados e acumulados ao longo do tempo. E o pior: nesse modelo de gestão estão
ausentes os responsáveis pela condução das ações de SSO, quer seja para
identificar ou corrigir os riscos presentes.

Quando os problemas se precipitam – a ocorrência de acidentes, notadamente


graves – todos se dizem responsáveis, mas ao mesmo tempo ninguém é
responsável. Não há definição clara de quem se encarrega e se responsabiliza por
essa tarefa na empresa. O que se passa é mais ou menos assim: o responsável
pela empresa diz que o problema não é dele, mas sim de seus prepostos; e estes,
por sua vez, verbalizam sua omissão, alegando que o problema é do responsável
pela empresa, que afirma ser a segurança dos trabalhadores importante, mas não
disponibiliza recursos para o devido saneamento dos riscos do trabalho. Esse é, por
conseguinte, um modelo de gestão de SSO orientado pelo faz-de-conta, pelo
princípio que determina: “se finge que me obriga a fazer, finjo que faço”. Na mesma
linha de raciocínio situam-se as cobranças. E tudo continua como antes.

Ressalta-se que o desastre maior dessa forma de lidar com as questões da


Segurança e Saúde Ocupacional, em algumas empresas, não está apenas no fato
de ser ela, por si só considerada um desastre, mas por ser, na atualidade,
responsável por mais da metade de todos os acidentes de trabalho ocorridos no
Brasil no sistema formal ou informal de trabalho. Lembramos que um contingente
expressivo de trabalhadores trabalha em ambientes caracteristicamente definidos
como micro, pequena ou média empresa – justamente os ambientes que oferecem
as piores condições de trabalho no que tange à Segurança e Saúde Ocupacional –
sem um gerenciamento adequado.

E o pior é que não há sinais de melhora devido a terceirização das atividades


produtivas, considerando-se que as empresas terceirizadas operam, com raras
exceções, com as mesmas características das empresas de pequeno e de médio
porte e apresentam ainda outros fatores que contribuem para a precarização das
condições de trabalho – alta rotatividade, salários inferiores ao da contratante,

57
excesso de horas extras, ritmo acelerado de trabalho, carga excessiva de trabalho,
pressão por produção, fadiga, entre outros. Sem contar que os trabalhadores das
empresas terceirizadas comumente ocupam o mesmo local de trabalho dos
trabalhadores da empresa principal, fazem os piores serviços, são temporários, com
ganhos indiretos praticamente nenhum e ganham bem menos que os trabalhadores
da contratante, às vezes para fazerem o mesmo trabalho.

As principais características desse estágio são: ausência de responsável pela


condução das ações de Segurança e Saúde Ocupacional, esforço voltado
para a solução de problemas já instalados, urgências, improvisações e
enfoque nos acidentes e não na prevenção.

1.11.2. Segundo estágio

Quando a atribuição de fazer segurança fica a cargo do Serviço Especializado de


Segurança e Medicina do Trabalho da empresa, eventualmente auxiliado pela CIPA.
Nesse estágio, todas as atividades relacionadas à Segurança e Saúde Ocupacional
são de responsabilidade do SESMT, quando ainda se estabelece e evidencia mais
claramente o dualismo: trabalhar e trabalhar com segurança. A Segurança e
Saúde Ocupacional não fazem parte das atividades correntes do negócio, sendo
tratadas em separado e por um organismo específico – o SESMT – coordenado
normalmente pela gerência de recursos humanos.

O resultado desse procedimento pode ser observado na própria história das


empresas. Quando o proprietário da empresa ou um dos seus executivos com poder
de decisão resolvia, por conta própria, tomar para si a responsabilidade de imprimir
segurança em sua empresa, normalmente motivado por pressões externas ou por
convicções pessaois, o SESMT funcionava. Os índices de acidentes nessas
empresas decresciam consideravelmente. Isso porque o detentor do poder
suportava as ações do SESMT. Com a saída dessas pessoas, tal serviço acabava
sofrendo um processo de descontinuidade e, em curto prazo, as conseqüências
emergiam com o recrudescimento do número e da gravidade dos acidentes. Isso
ocorre porque a segurança não é incorporada aos processos produtivos e é

58
conduzida por um SESMT que não dispõe de poder para intervir diretamente nos
processos de trabalho, que enfrenta dificuldades não só em determinar papéis e
atribuições para as gerências operacionais, mas principalmente em fazer essas
gerências cumprirem fielmente os seus papéis. Essa incumbência, na maioria das
empresas, está a cargo da gerência de Recursos Humanos, que por seu turno,
dispõe de poder relativo para decidir. Essa fase é denominada “gestão de
segurança pelo SESMT”.

A característica preponderante desse estágio é a dissociação das questões


da Segurança e Saúde Ocupacional dos processos produtivos, com pouco ou
nenhum comprometimento das gerências (supervisores) das áreas
operacionais com as questões de saúde e segurança dos trabalhadores.

1.11.3. Terceiro estágio

Define-se quando as questões de Segurança e Saúde Ocupacional passam a ser


entendidas e tratadas como partes integrantes dos processos produtivos e,
conseqüentemente incorporadas às atribuições dos ocupantes de cargos de chefia
das áreas produtivas, especialmente dos supervisores, a quem cabe a
responsabilidade não apenas de conduzi-las, mas principalmente de assumi-las
incondicionalmente, respondendo por elas em todos os sentidos: legal, técnico e
administrativamente. Nesse estágio, os técnicos do SESMT – engenheiros e
técnicos de segurança – deixam de ser os únicos responsáveis por tarefas sobre as
quais eles não dispõem da governabilidade suficiente para conduzi-las de maneira
adequada, transformando-se gradativamente em assessores técnicos dos gestores
e dos colaboradores, principalmente das áreas operacionais. Essa fase é
denominada “administração da segurança pela linha de comando”. Nessa fase
quem decide e responde pelas ações de SSO são as chefias das áreas produtivas.
O amadurecimento dessa fase culmina na aceitação, em definitivo, por parte do
quadro comando da empresa, das responsabilidades pela condução das ações de
SSO.

59
A principal característica desse estágio é a incorporação das ações da
segurança do trabalho às atividades produtivas e a transformação dos
gestores das áreas, especialmente os supervisores, de simples
colaboradores, coadjuvantes, em responsáveis, de fato, por sua condução e
pelos seus resultados.

1.11.4. Quarto estágio:

Esse estágio define-se pelo reconhecimento pleno de que os objetivos dos


programas de Segurança e Saúde Ocupacional, idealizados e implementados na
empresa e os objetivos do negócio são inteiramente congruentes, não apresentando
qualquer sinal de antagonismo. Nesse estágio as forças motrizes das atividades de
Segurança e Saúde Ocupacional são as mesmas que movem o complexo do
sistema produtivo.

Os fundamentos e práticas de SSO integraram-se totalmente à cultura da empresa,


sendo tratadas da mesma forma que os demais itens do negócio. Nessa fase, não
há mais discussões em separado sobre o tema, que merece a mesma atenção que
as demais tarefas e atividades na organização. Essa é a fase em que as ações de
SSO passam a ser conduzidas por todos os que trabalham na empresa, sem
distinção de hierarquia. Todas as decisões relacionadas à Segurança e Saúde
Ocupacional derivam-se das políticas de SSO, concebidas e conduzidas pela alta
direção da empresa. Essa fase é denominada “segurança como parte integrante
do negócio” ou “segurança classe mundial”. Essa é a fase onde se evidencia
que a empresa integrou, com sucesso, as ações de SSO ao seu sistema produtivo e
conseqüentemente ao seu negócio fim.

As empresas que vivenciam a SSO nesse estágio têm papel de destaque no


atendimento aos dispositivos legais que regulamentam a matéria, embora as
decisões relacionadas à Segurança e Saúde Ocupacional dependam menos da
força da lei e mais da importância a ela conferida e da consistência dos sistemas de
gestão de SSO. Essa é a fase na qual a empresa se beneficia diretamente de suas
políticas de Segurança e Saúde Ocupacional, revelando-se e sendo reconhecida

60
pela sociedade, e principalmente pelos seus parceiros comerciais, como empresa
verdadeiramente responsável e comprometida, de fato, com os valores éticos tão
reivindicados pela sociedade contemporânea. Nessa fase, os aspectos de
Segurança e Saúde Ocupacional não se caracterizam como objeto da ordem do dia
nas organizações, eles são partes integrantes do sistema, que não requer destaque
especial. Nessa fase, dadas as suas características, uma vez amadurecidas, a
empresa pode se beneficiar com a transferência de tecnologias de Segurança e
Saúde Ocupacional, sobretudo, para atuar no seu próprio ramo de negócio. Entre os
produtos de SSO, hoje disponibilizados no mercado internacional e comercializados
pelas consultorias do ramo muitos surgiram por meio desse expediente.

A Segurança e Saúde Ocupacional ao atingirem o quarto estágio de maturidade têm


o seu eixo automaticamente desviado da prevenção de acidentes para focar na
responsabilidade social. As ações de SSO são inteiramente voltadas para melhoria
contínua da qualidade de vida das pessoas envolvidas direta e indiretamente com as
atividades da empresa. A idéia de segurança como prevenção de acidentes, nesse
estágio, é literalmente aposentada.

A principal característica desse estágio está no envolvimento direto e


incisivo da alta direção da empresa nas questões de segurança e saúde
ocupacional. O momento ideal para se perceber que este estágio foi
suficientemente alcançado é quando se verifica que não há mais necessidade
de cobrar das pessoas o cumprimento de suas obrigações em relação ao
tema.

A elevação da Segurança e Saúde Ocupacional ao quarto estágio de maturidade


constitui-se, no momento, no grande anseio da maioria das empresas brasileiras,
especialmente as de grande porte. Fazer isso não é tarefa difícil e nem
excessivamente onerosa. O principal investimento está em mudar a concepção das
pessoas em relação ao tema, principalmente das detentoras de poder. É fazer as
pessoas enxergarem a SSO como valor a ser perseguido e alcançado em todos os
momentos e em todos os espaços ocupados pela empresa.

61
Os gestores que estão diretamente envolvidos com os riscos podem saber
de sua existência, mas não se esforçam para corrigi-los por alegação de
falta de apoio por parte de suas chefias superiores.

Essa situação foi vivenciada na quase totalidade das empresas trabalhadas por
onde passamos. Evidentemente, tal procedimento é sustentado pela filosofia de que
segurança não é parte integrante do negócio da empresa, podendo por isso ser
minimizada ou transferida para quem, sabidamente, não dispõe de poder para tomar
as decisões necessárias em relação às medidas de controle.

Essa dicotomia é piorada também por causa do modelo de seguro de acidente de


trabalho adotado no Brasil. O atual modelo de SAT – Seguro de Acidente de
Trabalho – é aquele em que o Estado banca os benefícios acidentários sem
questionar sua origem, ou seja, sem verificar se o acidente ou a doença que gerou o
benefício foi ou não resultante da inobservância das normas legais vigentes por
parte do contratante do seguro. É óbvio que, num sistema de compra e venda de
seguros de acidentes dessa natureza, poucas foram as empresas que destinaram
investimentos de monta para a melhoria das condições de trabalho. Daí se vê que a
responsabilidade maior pela situação acidentária do país é do Estado, que não
definiu políticas consistentes para o setor, reconhecendo e premiando as empresas
que investissem na melhoria das condições de trabalho e penalizando as que não o
fizessem, impondo-lhes alíquotas diferenciadas de seguro de acidente. Ao conferir a
todas o mesmo tratamento cobrando taxas unificadas de seguro, por ramo de
atividade e repararando toda sorte de danos sem questionar as suas origens, o
Estado não poderia obter outro resultado senão que a maioria das empresas
preferisse relegar o item “segurança do trabalho” a um segundo plano na
organização, administrando-o numa visão meramente legalista. 15 As posturas, em
relação as questões de SSO, assumidas por um número considerável de executivos
de empresas, verbalizando a importância da segurança do trabalho, mas pouco, de
concreto, fazendo para melhorá-la estão intimamente relacionadas às políticas
públicas para o setor.

62
A afirmação acima pode ser comprovada mediante comparação das posturas
assumidas pelas empresas em relação às políticas de meio ambiente em
comparação com as políticas de Segurança e Saúde Ocupacional. Os custos das
não conformidades em relação ao meio ambiente justificam investimentos
compatíveis na sua correção. O mesmo, infelizmente não ocorre quando se trata de
Segurança e Saúde Ocupacional, salvo em relação às alíquotas de custeio da
aposentadoria especial quando forem efetivamente cobradas.

Algumas situações de risco são mantidas porque sua existência não


atrapalha a realização do trabalho e quando atrapalha não o impede de ser
realizado realizado.

Essa é uma situação, apesar de comum e aparentemente banal, extremamente


importante, que deve ser considerada por várias razões, entre elas as que se
seguem:

 É o retrato fiel do dualismo que caracteriza a relação trabalhar com


segurança e trabalhar corretamente. Se as questões de SSO
colocadas em segundo plano e não são abordadas diretamente por chefias e
trabalhadores que as vivenciam cotidianamente – simplesmente porque os riscos
do trabalho não atrapalham, e quando atrapalham não impedem a execução das
tarefas – fica claro o quanto elas são minimizadas e, por isso, desconsideradas
nas relações de trabalho.

 As pessoas ainda não estão totalmente conscientes – especialmente as


chefias – da necessidade de incluírem, em suas atribuições, a responsabilidade
pela condução das ações de Segurança e Saúde Ocupacional. Como
conseqüência disso, fica a critério de cada gerência a determinação do que fazer
ou não em relação ao tema, o que configura a ausência de políticas (diretrizes)
para determinar critérios na abordagem do tema.

Ao que chamamos de consciência, que, em última instância, constitui-se no


determinante de suas vontades, não se determina no vazio; ao contrário, é fruto de
uma determinada ordem de coisas. A vontade de fazer isso ou aquilo ou a ausência
de vontade são determinadas pelo que a direção da empresa pretende fazer. Se o

63
dono ou quem responde pela empresa determina, com clareza e firmeza, que as
questões de Segurança e Saúde Ocupacional façam parte das atribuições de seus
prepostos, a vontade a que nos referimos está automaticamente definida e
incorporada ao modo de ser e agir das pessoas. Não nos consta que algum gerente,
por sua conta e risco, resolva definir o que fazer nas empresas, a não ser que suas
decisões sejam sobejamente vantajosas ao negócio que ele administra, e mesmo
assim é preciso convencer aos seus superiores da conveniência de tal
procedimento. O que o gestor faz é pautado em regras definidas pela empresa ou
pela ausência delas.

É importante ressaltar que tudo o que a empresa produz vincula-se não apenas à
sua marca, mas também à figura do seu titular – dono ou executivo. Assim, o que a
empresa produz não deixa de refletir a imagem de quem a dirige. As coisas boas ou
ruins produzidas pela empresa carregam indelevelmente a marca do dono, de seu
empreendedor.16 E no tocante à Segurança e Saúde Ocupacional não há nenhuma
diferença. As empresas que conhecemos que reverteram as condições de trabalho,
isto é, de condições precárias para condições aceitáveis, boas ou ótimas, foram
aquelas nas quais os seus dirigentes assim o decidiram. Os ganhos que essas
empresas auferiram e continuam auferindo, com a melhoria das condições de
trabalho, refletem o esforço e dedicação de seus dirigentes.

A exposição por longo tempo, a uma determinada condição de risco, sem o


controle devido, induz as pessoas a enxergá-la como normal e aceitável.

Ter-se acostumado a uma situação errada, onde há exposição não controlada a uma
situação de risco, é fatal para a reflexão correta sobre o problema, pois, no ato de
pensar sobre o todo, essa variável não se faz presente, não é considerada e muito
menos solucionada.

Nossa relação com a realidade se dá através de quatro momentos distintos:


percepção, interpretação, comparação e reação (Land & Jarman, 1990) somente
há reação ao que é percebido, interpretado e comparado ao que já está registrado
no cérebro. Se a situação de risco não é mais percebida, se desapareceu do quadro
de visão, desfigurada pela convivência contínua, sua leitura certamente não será

64
adequada, nem tampouco comparada com situações criadas no cérebro. Assim
sendo, não fará parte da análise do problema nem merecerá qualquer ação
corretiva. A ausência de ação é explicada, nesse caso, pela ponta inversa do
processo: não havendo percepção, reagir a quê? Daí a importância da percepção do
risco, seja por parte dos trabalhadores seja por parte do gestor, que em última
instância é quem responde legal e administrativamente por essa atividade.

O fator tempo na convivência com situações de risco, sem os controles devido, é por
demais relevante visto que quanto mais tempo o indivíduo convive com uma
determinada realidade mais familiar ela se faz e mais difícil se torna corrigi-la. Uma
coisa é corrigir uma situação de risco ainda não acomodada (aceita como tal) no
cérebro de uma pessoa, e outra muito diferente é corrigir o que de tão familiar
tornou-se parte de suas vivências cotidianas. A convivência com o que apenas
incomoda – lembrando que há situação de risco considerada grave que não
incomoda – com o passar do tempo, transforma-se em normalidade perfeitamente
aceita.

Refletir sobre essa situação coloca-nos diante de uma perspectiva: “Toda


consciência é a negação de uma consciência” (Hegel). Em outras palavras, o que
Hegel diz é que toda verdade traz em si o postulado de sua negação, isto é, o seu
contrário. O ato de negar verdades consolidadas passa pelo terreno do esgotamento
da primeira verdade. Ora, nenhuma verdade se esgota por si mesma – seu exercício
contínuo cria situações outras que a vão minando até o seu desaparecimento total.
Não é que ela tenha se esvaído no nada; foi transformada em outras situações, que
passamos a denominar novas verdades. É importante que esse raciocínio seja
levado em conta tanto no processo de assimilação de uma determinada ordem
quanto na sua negação. É conveniente lembrar que o exercício de corrigir riscos no
trabalho constitui-se em ação, primeiro de negação – aceitar que a situação requer
mudança -, depois de transformação. Corrigir o que precisa ser corrigido.

Negar a verdade posta – a vivência cotidiana com o risco – não se faz com palavras
ou ações que não sejam específicas e endereçadas a sua correção. É necessário o
surgimento de situações outras, renovadoras dos modos de perceber e agir, ao
alcance das pessoas envolvidas com a situação descrita. Ao se afirmar que uma
situação está errada é absolutamente necessário mostrar, ensinar e exigir que se

65
faça o que é correto. Sem isso, a afirmação torna-se de pouca ou nenhuma
serventia. Notificar uma situação errada sem apontar e exigir que se faça o que é
correto torna-se um exercício inócuo, especialmente em relação à mudança de
atitudes por parte de quem está envolvido com os processos de trabalho. Daí a
imprescindibilidade do conhecimento do gestor acerca dos riscos do trabalho que ele
supervisiona. Fato que vem ocorrendo, no sentido inverso, em decorrência, primeiro,
em conseqüência da deficiência na atualização de conhecimentos por parte dos
supervisores/facilitadores, segundo, pela sua pouca permanência nas frentes de
trabalho. Esse achado ficou patente no diagnóstico de maturidade de SSO realizado
em todas as empresas por onde passamos, incluindo as quatro unidades industriais
dos ramos de metalurgia.

Essa visão, melhor dizendo, esse questionamento é por demais importante no


exercício da prevenção de acidentes, tendo em vista a quantidade de acidentes
decorrentes de exposições a condições de riscos sobejamente conhecidas pelos
trabalhadores, mas que nem por isso reivindicam a sua correção. Essa situação nos
faz lembrar a transgressão das normas de trânsito expressa por ultrapassagens em
locais proibidos. Certamente o responsável pela infração já havia se comportado
dessa maneira anteriormente. Embora sabendo que se comportara de maneira
errada, não foi capaz de lidar com o erro numa visão de rejeição, transformando-o
em ação recidivante. E é importante ressaltar que o cometimento consciente de um
erro não ocorre sem objetivo, pelo contrário, o que se almeja com ele é a obtenção
de algum tipo de ganho, não importando sua banalidade. A ultrapassagem perigosa,
por exemplo, se dá pelo tempo que se pretende com ela ganhar. Tempo que poderá
custar à vida do infrator e/ou de inocentes. No trabalho não é diferente. Quando um
trabalhador transgride uma norma ou um procedimento conhecido de trabalho ou de
segurança o faz com o propósito de ganhar tempo ou de facilitar, no seu
entendimento, a realização do trabalho.

A situação de risco é mantida porque ninguém toma as providências


necessárias para corrigi-la

A ausência de providências, nessa circunstância, é explicada através de duas


vertentes de causas: a primeira, fundamentada nos comentários da questão anterior;

66
a segunda, mais ou menos, liga-se ao fato de as questões de segurança serem
tratadas por pessoas não diretamente envolvidas com os processos produtivos –
conseqüentemente, nem com as situações de risco, nem com a criação e
manutenção das mesmas. Vale ressaltar que essa alegação tem sido
frequentemente utilizada nas justificativas apontadas por todos os grupos de
trabalho que pudemos acompanhar e avaliar.

Se os gerentes – responsáveis por essas justificativas – detêm uma parcela de


poder para o exercício de suas funções, quem é esse “ninguém” a que se referem?
São os trabalhadores? As chefias superiores? Os chefes de equipe? Quem seria o
sujeito oculto dessa frase? Essa questão não pode ser ignorada. Sugerimos uma
reflexão corajosa, sem restrições pessoais, a respeito da mesma. Muitas vezes
ninguém é o próprio indivíduo que faz o questionamento.

Curioso é que, quando conversamos com trabalhadores ou mesmo com


supervisores, o que eles chamam de ninguém remete precisamente a quem está
acima deles na hierarquia da empresa. Quando a conversa é deslocada para as
chefias superiores, ninguém são os supervisores e os trabalhadores. A questão
fundamental é saber como se entender num ambiente assim. Corrigir o quê, se as
pessoas não se julgam responsáveis pelo que se pretende corrigir? Nesse jogo de
empurra, para o empregador, os desacertos de sua empresa são conseqüências de
equívocos cometidos pelos seus prepostos. Para os prepostos, o problema é do
empregador, que somente cobra resultados de produção sem levar em conta a
Segurança e Saúde Ocupacional. Nesse caso, torna-se difícil o entendimento.

Nos ambientes onde a política de SSO determina que as ações de segurança façam
parte das atribuições dos gerentes, dos gestores, e que somente a eles compete
buscar soluções, certamente não será legítima a especulação sobre quem é
chamado de ninguém. O ninguém se transforma em alguém nem tanto oculto como
antes, que pode perfeitamente ser localizado e responsabilizado por deixar de fazer
o que é de sua competência. Nesse sentido não é difícil compreender e aceitar que
um dos principais obstáculos interposto na Gestão da Segurança e Saúde
Ocupacional nas empresas é a falta de clareza na definição formal de quem, de fato,
é a responsabilidade pela segurança dos trabalhadores. E menos difícil ainda torna-

67
se compreender que a indefinição de quem é quem nesse terreno é que gera a
figura do tão decantado “ninguém”. Em relação às unidades industriais
mencionadas, o que conseguimos apurar é que elas cobram resultados em SSO,
mas não são suficientemente claras em relação às atribuições das pessoas
envolvidas com os processos produtivos no tocante à segurança dos trabalhadores.
(vide item 5, tabela 57.

A situação de risco é mantida porque todas as preocupações e recursos são


voltados prioritariamente para o atendimento às finalidades do negócio.

“O primeiro dever de qualquer empresa é sobreviver. O princípio diretor na gestão


de negócios não é maximizar os ganhos – é evitar as perdas”, assevera Peter
Drücker.
O empreendimento econômico que não remunera o capital do acionista está
fadado à falência. Não é, portanto, a isso que estamos nos referindo.

De todos os itens abordados, esse foi o que mais se sobressaiu no elenco de


“razões” apresentadas pelos ocupantes de cargos de chefia para justificar a não
correção dos riscos em suas respectivas áreas de trabalho. A maioria dos gestores
alegava não dispor de tempo para se dedicar à correção das anomalias existentes
nos ambientes e condições de trabalho, pois estava o tempo inteiro envolvida com
as azáfamas do trabalho nominalmente definido como de sua competência.

Essa afirmativa nos remete aos comentários anteriormente formulados sobre o


dualismo “trabalhar com segurança e trabalhar corretamente”. Ora, se
considerarmos que segurança no trabalho é parte essencial da realização correta de
determinada tarefa, e que o acidente é evitável a partir do ato de trabalhar com
correção, não se pode aceitar a alegação de “falta de tempo” para o devido
equacionamento das condições de trabalho. Como não haver tempo para organizar,
realizar, acompanhar e avaliar corretamente o trabalho? Nas situações que tivemos
a oportunidade de acompanhar pessoalmente não foi possível estabelecer a relação
entre a falta de tempo e a não correção do que ali seria necessário.

68
O constatado não foi “falta de tempo”, e sim falta de compromisso, caracterizado
pela vontade de fazer e pela ausência de cobrança da parte de quem tem o poder
para decidir sobre o ato de fazer. Nos lugares onde havia compromisso, vontade e
cobrança sistemática, os índices de correções foram incomparavelmente maiores
resultando em redução sistemática de erros na realização das tarefas e
consequentemente da prevenção de acidentes. Com isso, cada vez mais
acreditamos que a segurança do trabalho somente existe, de fato, onde a direção da
empresa decide que segurança é parte essencial das ações de produção, cabendo
aos ocupantes de cargo de chefia a atribuição de fazê-la, sem ressalvas. Segurança
não é questão de bom senso, como se imaginava até pouco tempo atrás, mas uma
questão de conhecimento (técnico e gerencial) e de poder para decidir.

A situação de risco é mantida porque os gestores das áreas alegam não


dispor de recursos (orçamentários e de mão-de-obra) para a sua solução.

A alegação de falta de recursos para o saneamento das condições de trabalho


aparece, com freqüência, não apenas na fala dos técnicos de segurança, mas
também na fala de muitos executivos de empresas. Essa justificativa pode ser
analisada a partir de três premissas básicas:

 Uma das origens dos argumentos de falta de recursos está condicionada a


determinada fase do empreendimento quando as decisões foram tomadas
optando-se por situações reconhecidamente não seguras e/ou contrárias às leis
vigentes, (erros de projetos), devido a problemas de custos e falta de fiscalização
por parte dos órgãos competentes. Naquele momento, a preocupação dos
dirigentes da empresa era exclusivamente com os custos de investimentos. Mais
tarde, a partir dos primeiros distúbios, aos custos iniciais iriam somar-se os
custos advindos dos problemas decorrentes da ausência de controle e/ou da não
conformidade legal. Exemplificando: unidades industriais com elevadas
concentrações de poeira, construídas sem um sistema de despoeiramento
apropriado; equipamentos ruidosos instalados sem nenhuma preocupação com a
difusão do ruído no ambiente – o que pode afetar tanto os trabalhadores
diretamente envolvidos na sua operação como outros postados nas áreas

69
próximas; opção por equipamentos desprovidos de proteção em função de
custos. Inicialmente, a empresa pode até contabilizar algum “ganho” com essas
opções. No entanto, de acordo com o sistema legal vigente (exigência tanto do
INSS como do Ministério do Trabalho e Emprego), é necessário observar
seriamente a questão do custo-benefício nesses casos específicos. Às vezes, a
economia que se faz, num dado momento, não cobre o volume de passivos que
a situação irá gerar, sem contar outros aborrecimentos, tais como o
comprometimento da imagem da empresa, cujo custo, em termos de prejuízo,
poderá ser bem maior.

 Outro argumento para a falta de recursos para SSO refere-se a investimentos


de baixo custo – como, por exemplo, proteção de máquinas, isolamento do
sistema elétrico, equipamentos de proteção individual, etc. – não são
suficientemente implementados, na maioria das vezes, devido a uma visão
equivocada da questão da segurança, que passa por uma cultura que não
aprendeu a incorporará-la ao núcleo básico dos negócios da empresa.
Normalmente, os custos a que nos referimos não são adequadamente
contabilizados nos custos finais da produção, mas sim como ‘custos adicionais’,
que podem perfeitamente ser transferidos ao cliente. Esse procedimento, no
passado, era factível. Hoje, os custos com SSO, em função das cifras –
investimentos e passivos – terão que fazer, necessariamente, parte das matrizes
de custos da produção da mesma forma que os demais itens considerados como
tal.

 Outro fator a ser mencionado na justificativa de falta de recursos refere-se a


situações comuns de risco nos ambientes de trabalho que poderiam
perfeitamente ser corrigidas sem gastos adicionais, se utilizados, de maneira
correta, apenas os recursos já disponíveis na organização. Nesse particular,
talvez, a insuficiência não seja de recursos materiais ou de mão-de-obra, mas de
“vontade política” de quem decide sobre a utilização dos recursos disponíveis.
Por extensão, é interessante chamar a atenção para o fato de que mais de 80%
dos problemas de segurança nas empresas podem ser resolvidos sem
orçamento específico para tal, utilizando-se apenas o capital traduzido em
comprometimento. A questão é que essas coisas não caem do céu, são postas

70
por decisão de quem tem poder para decidir e decide. Nesse particular
enfatizamos que não foram poucas as vezes que testemunhamos a
trasformação de ambientes agressivos, com elevados índices de ocorrência de
acidentes em ambientes de baixa agressividade, onde praticamente não há mais
acidentes. Os recursos aplicados nessas transformações decorreram do
engajamento e do comprometimento das partes interessadas, especialmente dos
gestores das áreas operacionais. E em outras circunstâncias, da vontade política
da direção das empresas. Não queremos dizer com isso que a questão dos
recursos deva ser considerada irrelevante, principalmente numa economia
alimentada por crises que repercutem seriamente na vida das empresas.
Todavia, o que se deve fazer é estabelecer prioridades, mediante investimento
nos ambientes cujas condições e riscos não podem ser relegados, nem
tampouco assumidos sem critério, e onde não haja uma margem razoável de
segurança.

Considerando-se a questão da SSO sob o ponto de vista dos custos (o que não
deveria ocorrer), torna-se absolutamente necessário o delineamento de qual das
opções é a mais vantajosa: tornar os ambientes de trabalho seguros, pelo menos
conforme o que estabelece a lei, ou correr o risco de ter que bancar as
conseqüências das não-conformidades? As experiências têm demonstrado que as
não-conformidades, além de mais onerosas, na maioria das vezes, são cobradas
com volumosos acréscimos (multas e juros) que poderiam perfeitamente ser
evitados.

Em relação à afirmação, o exemplo mais contundente é o recolhimento da alíquota


suplementar para custeio da aposentadoria especial. Por deficiência de informações
técnicas ou por considerar o fato como irrelevante, muitas empresas optaram pelo o
não recolhimento da referida alíquota, mesmo em situações críticas, sem fazer os
investimentos necessários na melhoria das condições de trabalho, que antes
motivavam a emissao de cocumentos que levavam a concessão da referida
aposentadoria. Esse item vem se constituindo no principal “calcanhar-de- aquiles” da
Gestão da Segurança e Saúde Ocupacional, sobretudo nas empresas que possuem
um elevado índice de agravos à saúde dos trabalhadores (riscos químicos e físico),

71
como é o caso da indústria química, da siderurgia e da mineração, papel e celulose,
por exempolo.

A situação de risco é mantida devido à descrença das pessoas com ela


envolvidas, por falta de respostas às inúmeras solicitações para a sua
correção.

Experiências recentes têm demonstrado que os programas de Qualidade e de Meio


Ambiente, por exemplo, adquirem características próprias, em função dos traços da
cultura das empresas onde estão sendo implementados.

Nas organizações em que os trabalhadores são verdadeiramente engajados no


processo de gestão da empresa, onde suas sugestões e opiniões, na medida do
possível, são valorizadas e acatadas, o perfil dos resultados tem sido diferente –
bem mais positivo – do que naquelas em que os trabalhadores apenas ouviram dizer
que é importante a sua participação no processo, mas ainda não compreenderam ou
não foram levados a compreender, na sua totalidade, o significado dessa assertiva.

Trazendo o mesmo raciocínio para as questões de Segurança e Saúde Ocupacional,


e acrescentando que nesse particular as recomendações de melhorias, em grande
parte, são feitas por supervisores de equipe – e raramente por trabalhadores – os
resultados não se apresentam de forma diferenciada. Se, de um lado, a segurança
no trabalho já é vista e tratada desvinculada do processo de trabalho ou como
apêndice do mesmo, já que atinge em primeira mão o trabalhador e somente depois
o sistema produtivo, a ausência de respostas às manifestações de apreço,
especialmente dos trabalhadores, termina comprometendo o sistema como um todo.
Esse raciocínio é tão relevante para a proficiência de todo o nosso trabalho, que nos
convida a uma melhor reflexão sobre o tema. Por exemplo: alguém que ocupe um
cargo de chefia sugere à sua chefia uma série de alterações julgadas necessárias e
viáveis para uma dada situação, em benefício da melhoria das condições de
trabalho. Se não encontra eco nem resposta de qualquer natureza às suas
cogitações bem-intencionadas, qual será a sua atitude mais provável? Repetiria o
mesmo gesto indefinidamente, com a mesma solicitude, ou veria esvaírem-se suas
intenções em médio ou longo prazo e dificilmente voltaria a elas?...

72
Pensar sobre essas possibilidades não serve apenas aos propósitos aqui definidos,
mas também aos dos programas de Qualidade e de Meio Ambiente adotados em
tantas empresas da atualidade e/ou a quaisquer outros movimentos educativos cuja
implantação se faça necessária nas organizações. Em relação à ausência de
respostas às solicitações de SSO, sugerimos consultar o capítulo intitulado
“Sugestões para revisão, elaboração e implementação de ferramentas de auxílio à
gestão da segurança e saúde ocupacional”, página 130, especificamente o item que
trata do cumprimento de cronogramas de SSO. A ausência de ferramentas de
gestão de SSO condizentes com a realidade da empresa, especialmente no que se
refere à cultura dominante de SSO é uma questão que não dever ser desprezada.
Não são poucas as empresas que dispõem de ferramentas sofisticadas de gestão
de SSO e nem por isso conseguem alcançar os objetivos almejados. Nesses casos
o problema não está nas ferramentas de SSO, mas na cultura da empresa que não
atingiu ainda o estágio de maturidade requerido pelas referidas ferramentas.
Ressaltando que a evolução desse processo depende fundamentalmente das
posturas assumidas pela direção da empresa.

A situação de risco é mantida e, às vezes, agrava-se em função da


indefinição do trabalhador em relação a que ou a quem obedecer – se aos
procedimentos escritos de trabalho ou às ordens, ou ao silêncio deliberado
de seus superiores hierárquicos.

Dos itens verificados nos últimos diagnósticos, comparados aos primeiros, o que
mais chamou atenção foi a duplicidade de ordens que o trabalhador, em certas
circunstâncias, continua tendo que acatar para a realização de suas tarefas. Essas
ordens consistem em procedimentos formais de trabalho, denominados
“procedimento operacional padrão, procedimento padrão operacional” ou
simplesmente “tarefa padrão”, e em instruções verbais de suas chefias imediatas –
os supervisores ou facilitadores.

73
O nó da questão está no jeito prático que os trabalhadores, por necessidade ou por
falhas nos sistemas de controle, desenvolveram para realizar a maioria das tarefas
relacionadas ao seu trabalho, nem sempre coincidente com o que está descrito nos
referidos procedimentos. E, como se impõe que as tarefas sejam realizadas a
despeito das dificuldades vivenciadas pelos trabalhadores, estes, com pleno
conhecimento de suas chefias ou, pior, às vezes até orientados e autorizados por
elas, de maneira informal, atropelam os procedimentos escritos e realizam as tarefas
do seu jeito – jeito este igual ou pior do que como se fazia antes da instituição dos
padrões escritos.

Outro complicador que se interpõe nessa dicotomia são as formas diferenciadas de


lidar com os riscos presentes ora no ambiente, ora nas tarefas que estão sendo
realizadas. Se os riscos foram corretamente avaliados e incluídos nos
procedimentos escritos, necessariamente, para o seu efetivo controle, deveria o
trabalhador seguir rigorosamente o que está determinado nos procedimentos
escritos.

Se o trabalhador não segue com rigor tais procedimentos, isso significa que ele irá
lidar com os riscos presentes, utilizando-se de práticas remanescentes à época em
que o trabalho não era formalizado. E é justamente isso que, na prática, acontece. O
problema maior é que dessa experiência surgiu um outro complicador, que na
dinâmica do trabalho tem contribuído, em muito, para piorar o relacionamento do
trabalhador com os riscos do trabalho. Trata-se do vazio que se formou entre as
experiências vivenciadas no passado, as quais o trabalhador bem ou mal dominava,
e o que se pretendeu fazer a partir da formalização sistemática do trabalho. Esse
vazio, em todos os sentidos, tem aumentado a probabilidade de o trabalhador se
acidentar pelo cometimento de erros no trabalho, em decorrência da inadequação
das práticas antigas de realizar as tarefas da maneira como são descritas, e pela
impossibilidade de colocar em prática o que seria necessário em função da nova
ordem estabelecida nas relações de trabalho.

Essa cunha interposta entre o trabalho prescrito e o trabalho real tem sido apontada
por quem vem estudando o problema, como responsável pela avalanche de

74
improvisações ou arranjos desenvolvidos pelo trabalhador para realizar suas tarefas
no tempo estipulado, do que tem resultado o crescente número de acidentes.
Lembrando que a presença do facilitador nos ambientes de trabalho é restrita. Essa
situação apareceu, com bastante evidência, nas respostas dos trabalhadores à
última versão do questionário e, sobretudo nas entrevistas nas questões que
abordam o trabalho normalizado e suas formas de realização. Das opções de
respostas previstas para as referidas questões, a que se referia à cobrança de
produção, independentemente das dificuldades de observar os aspectos formais do
trabalho, foi a que obteve maior adesão dos trabalhadores, aparecendo com mais de
40% em todas as empresas onde o diagnóstico foi realizado, especialmente nas
quatro empresas do ramo metalúrgico.

Quando da implantação dos programas de qualidade e de meio ambiente, para


atendimento aos preceitos normativos (ISO 9.000 e 14.000), as empresas investiram
pesado na formalização de padrões operacionais: definiram regras escritas para o
funcionamento de praticamente todo o sistema produtivo e na capacitação de seus
trabalhadores para suportar as mudanças pretendidas. Nos anos subseqüentes à
implantação dessa nova ordem, notadamente até a obtenção das respectivas
certificações, a situação se alterou profundamente, chegando muito perto da
obtenção dos resultados pretendidos, mais em função do volume de cobranças
procedentes, sobretudo, da direção das empresas, do que propriamente pela
maturidade alcançada por elas na condução das mudanças.

Obtidas as respectivas certificações, todavia, as cobranças vão se arrefecendo


gradativamente e o manancial de mudanças, em curso, pelo mesmo motivo, toma o
mesmo rumo e trafega pela mesma via. Análises cuidadosas a respeito do tema
revelam que a maioria das empresas brasileiras optou ou opta pela implementação
dos programas de qualidade, de meio ambiente, e mais recentemente de SSO –
tendo como base a BS 8800 ou a OHSAS 18001 – muito mais em função de sua
inclusão no rol das empresas certificadas do que propriamente para usufruir os
benefícios que tais programas certamente produziriam, caso o esforço feito para a
obtenção da certificação tivesse logrado continuidade.

75
Muitas foram as empresas que conseguiram reduzir, de maneira espetacular, a
ocorrência de acidentes, até mesmo dos quase acidentes, durante e nos anos
subseqüentes à implantação dos referidos programas, mas que, pelas razões acima
mencionadas, vêm amargando um crescimento contínuo de seus índices de
acidentes, envolvendo perdas materiais e humana. Muitas dessas empresas, em
decorrência de tal situação, vêm tentando, primeiro, compreender melhor o que está
acontecendo, desenvolvendo estudos sistemáticos que envolvem ora a natureza e a
adequação dos procedimentos de trabalho, ora a capacitação e o comprometimento
dos trabalhadores em relação a eles. Muitos achados interessantes vêm se
evidenciando nesses estudos; um deles é a assertiva de que nenhuma mudança se
consolida sem o esgotamento daquilo que se pretende superar e, em contrapartida,
o amadurecimento, não só como definição de valor, mas também e principalmente
como prática daquilo que se almeja como sendo a nova ordem pretendida.

Introduzir mudanças no trabalho, num país como o Brasil, não é tarefa simples como
imaginavam e ainda imaginam muitos dos promotores dos citados programas,
sobretudo de origem estrangeira, onde o cenário cultural, em relação ao mundo do
trabalho, é bastante diferente do brasileiro. Convém ressaltar que a formação do
patronato e da classe trabalhadora entre nós surgiu dos escombros do sistema
escravista que durou por volta de trezentos e cinqüenta anos. O modelo capitalista
que se seguiu ao escravismo, definindo regras de compra e venda de trabalho,
apenas se estabeleceu em definitivo com Getúlio Vargas, nos anos quarenta do
século XX, portanto há sessenta anos ou duas gerações.

Não é de se imaginar que as relações entre capital e trabalho já tenham


amadurecido a ponto de haver superado as mazelas de suas origens e adentrado
uma nova realidade onde os conflitos foram largamente superados. Todavia, a
despeito das dificuldades, especialmente de ordem cultural, muita coisa mudou em
todos os sentidos, e certamente para melhor. E mais teria mudado se a nossa
cultura privilegiasse aquilo que se evidencia mais francamente nas culturas de
origem luterana/calvinista: a reverência ao trabalho e a conseqüente identidade
entre o trabalhador e o ato de trabalhar. Não há dúvida de que, independentemente
de qualquer outra variável, a reverência ao trabalho (valor que se confere ao

76
trabalho) constitui-se no mais importante preventivo das tensões e das angústias
que costumam povoar a vida de uma parcela considerável de trabalhadores nas
relações cotidianas com o trabalho. Da mesma forma, não há dúvida de que as
mudanças necessárias requerem investimentos de monta, tanto na educação como
nas relações de trabalho.

1.12. Impressões dos trabalhadores sobre o que pensam e o que fazem em


relação à segurança e saúde no trabalho

Em contrapartida às impressões colhidas dos gerentes, supervisores e facilitadores


enumeramos a seguir 20 situações (impressões), extraídas do conteúdo de
respostas ao questionário de SSO e principalmente das entrevistas realizadas com
trabalhadores que sofreram acidentes e trabalhadores submetidos a trabalho com
procedimentos escritos, definidos:

1. A segurança no trabalho é mais importante no discurso dos dirigentes da


empresa do que propriamente nas áreas onde ela deveria, de fato, ser efetivada.

2. A segurança no trabalho, na prática, só adquire a importância devida nos


momentos de crises, isto é, quando ocorrem acidentes graves que podem
comprometer principalmente a imagem da empresa.

3. O fosso que separa o discurso (SSO como valor) da prática (o que efetivamente
é feito) constitui o mais importante obstáculo no desenvolvimento das ações de
SSO na empresa.

4. A desobediência aos padrões de trabalho, na expectativa de que se está fazendo


o necessário, desgasta, corrompe e inviabiliza as práticas de procedimentos
corretos.

5. As tarefas são descritas nos procedimentos com base no que é desejável, porém
nem sempre são consideradas as dificuldades que os trabalhadores enfrentam
na execução das tarefas da maneira como são descritas.
6. O treinamento para o cumprimento dos Procedimentos de Trabalho é, via de
regra, inadequado, porque não leva, ou leva pouco em conta, a realidade do

77
ambiente de trabalho e as dificuldades vivenciadas pelos trabalhadores para o
pronto atendimento aos padrões estabelecidos.

7. A empresa expressa através dos procedimentos de trabalho o que ela deseja. Na


prática, todavia, as condições de trabalho oferecidas ao trabalhador dificultam ou
não permitem que ele cumpra o que está prescrito nos procedimentos.

8. O trabalhador sabe que o que é mais importante para a empresa não é como o
trabalho está sendo executado, mas o resultado final (a produção).

9. O trabalhador não é cobrado pela maneira como está trabalhando, mas pelo
resultado do trabalho realizado. De tal postura resulta o fato de os supervisores
não verem ou fingirem que não estão vendo o cometimento de “erros” na
execução de suas tarefas – desobediência aos procedimentos de trabalho.

10. Supervisão ambígua. O supervisor sabe o que tem de ser feito (está escrito nos
procedimentos). Sabe fazer conforme o prescrito; no entanto faculta fazer com
base nas experiências consolidadas ao longo do tempo, porque sabe que o mais
importante para a empresa não é como fazer, mas o resultado final do trabalho
(a obtenção da produção esperada).

11. Ambigüidade entre o que está escrito e o que é possível fazer. O trabalhador tem
uma dificuldade enorme em definir o que ou a quem obedecer – se à prescrição
das tarefas definidas nos procedimentos de trabalho, se às ordens verbais ou ao
silêncio deliberado de seu supervisor.

12. Às vezes, o trabalhador prefere, de maneira silenciosa, correr o risco oferecido


pela atividade a correr o risco de ser mal-entendido ou censurado pela chefia em
caso de reclamação ou de recusa ao trabalho. Embora a RT – Recusa de Tarefa
fosse instituída na empresa.

13. É consenso entre trabalhadores e supervisores que, se o risco de uma


determinada tarefa é considerado leve ou moderado, é preferível se expor a ele
para agilizar a execução da tarefa do que fazer como está prescrita nos
procedimentos, gastando-se mais tempo na sua execução (sugerimos cruzar

78
essa informação com o nível de conhecimento dos supervisores acerca dos
riscos do trabalho. O diagnóstico revela que o conhecimento dos supervisores
sobre os riscos do trabalho é insuficiente).

14. O trabalhador, embora sabendo (está escrito nos procedimentos) que pode
recusar-se a executar uma tarefa perigosa sem a proteção devida, prefere
executá-la em desobediência às normas, por não ter certeza de qual seria a
reação da sua chefia em face de sua recusa.

15. A avaliação inadequada do risco (minimizar ou exagerar) dificulta a tomada de


decisões corretas em relação ao seu controle, principalmente por parte das
chefias.

16. Por não ser a segurança parte integrante das atividades produtivas, quem cria ou
mantém a situação de risco (chefias das áreas operacionais) não se sente
inteiramente responsável por sua correção.

17. Por ser a produção vista como prioritária, seus responsáveis estão sempre
alegando não dispor de recursos para correção das situações de risco, ainda que
o recurso seja apenas o comprometimento.

18. A segurança do trabalho é “exigida” pela chefias, desde que não interfira nos
cronogramas de produção.

19. Um número considerável de situações de risco poderia ser resolvido se nisso


houvesse interesse e comprometimento das chefias.

20. Uma dificuldade importante do trabalhador no enfrentamento dos riscos do


trabalho está nas freqüentes mudanças de funções para atendimento às
demandas de trabalho (multifunção), por causa do reduzido número de
trabalhadores e da fadiga resultante da sobrecarga de trabalho.

A definição dos fatores culturais como obstáculo ao avanço das questões da


Segurança e Saúde Ocupacional nas empresas constitui problema não apenas nos
países onde as relações entre o capital e o trabalho ainda se encontram em estágio
evolutivo e em algumas situações, conflitantes. Mesmo nas economias altamente

79
desenvolvidas, o problema existe e se manifesta, em alguns pontos, de maneira
bem parecida com o que ocorre no Brasil e em outros países em vias de
desenvolvimento.

Em função do que foi visto até aqui, é possível afirmar, com convicção, que o juízo
formulado pelos trabalhadores acerca da segurança e saúde no trabalho está
intimamente relacionado ao conteúdo e à maturidade dos programas de Segurança
Saúde Ocupacional desenvolvidos nas empresas onde trabalham.

Nas empresas onde os programas de SSO são concebidos e implementados


visando o estrito cumprimento das exigências legais que dispõem sobre a matéria, a
representação dos trabalhadores em relação a eles certamente se limitará ao que
lhes é exigido por parte da empresa. Quando a empresa exige com o rigor devido,
faz. Não exige, nada é feito.

É pouco provável que os trabalhadores de uma empresa que não vislumbra a


Segurança Saúde Ocupacional como valor agregado ao seu negócio, que não tem
seus programas de SSO alinhados ao seu sistema produtivo – promovendo a
melhoria contínua das condições e dos procedimentos de trabalho, investindo na
educação dos trabalhadores e de seu corpo gerencial para o correto exercício do
trabalho – possam enxergar a segurança do trabalho como valor que se equipara a
outros itens relacionados diretamente ao negócio, como produção, manutenção,
logística, por exemplo.

As experiências têm demonstrado que a participação dos trabalhadores nos


programas de SSO está intimamente vinculada à maturidade da empresa em
relação ao tema e principalmente ao conjunto de ações que ela desenvolve,
especialmente na área de educação, para incorporá-las nos seus programas.

Nas empresas onde os programas de Segurança Saúde Ocupacional são


desvinculados das atividades produtivas, organizados e implementados pelas
equipes de segurança (o SESMT), é comum os trabalhadores associarem as ações
de segurança do trabalho com aquilo que eles vivenciam no cotidiano – por
exemplo, o uso dos equipamentos de proteção individual (EPI); a realização de
exames médicos, principalmente os periódicos, além das atividades da CIPA –

80
Comissão Interna de Prevenção de Acidentes, que também são de seu
conhecimento.

Num ambiente dessa natureza dificilmente os trabalhadores associam as ações de


segurança à promoção da qualidade de vida ou a algo que possa melhorar o
relacionamento deles com o próprio trabalho, diferentemente das empresas onde os
programas de Segurança Saúde Ocupacional são abordados como parte integrante
dos processos produtivos, onde as ações de segurança são concebidas e
implementadas como parte integrante do próprio negócio.

A importância da adoção de programas dessa natureza, dentre outras vantagens,


está na desnecessidade de desenvolvimento de ações em duplicidade para abordar
o mesmo conteúdo (os aspectos produtivos) e na possibilidade de convencer os
trabalhadores de que, para fazer segurança, eles não precisam desenvolver ações
específicas para isso. Basta-lhes apenas incluir essa preocupação nos
procedimentos de trabalho e transformá-la em ações concretas que possam ser
avaliadas e medidas. Chegar nesse patamar é sem dúvida o desejo de todas as
empresas, notadamente as de grande porte. Alcançá-lo, embora perfeitamente
possível, é tarefa que requer vontade e investimento de médio e longo prazo,
sobretudo em educação.

A despeito das dificuldades, muitas empresas estão perseguindo esse objetivo, com
razoável sucesso. Muitas estão transpondo as barreiras de segundo estágio de
maturidade de SSO. Outras, já se definiram como de terceiro estágio de maturidade,
isto é, já conseguiram incluir as ações de SSO às atividades produtivas e
transformar os ocupantes de cargos de chefia, em responsáveis, de fato, pela sua
condução. O importante é acreditar que isso é perfeitamente possível e investir na
sua concretização, principalmente reduzindo a distância que separa o discurso do
que é desejável das práticas vivenciadas no dia-a-dia.

81
PARTE 2

SEGURANÇA E SAÚDE OCUPACIONAL

A DIFÍCIL TRANSPOSIÇÃO DO SEGUNDO PARA O TERCEIRO


ESTÁGIO DE MATURIDADE

82
02. OS DESAFIOS DA TRANSPOSIÇÃO DA SEGURANÇA E DA
SAÚDE OCUPACIONAL DO SEGUNDO PARA O TERCEIRO
ESTÁGIO DE MATURIDADE

2.1. Por que ainda ocorrem acidentes em ambientes supostamente seguros?

A distância que separa o entendimento da maioria dos executivos brasileiros –


dirigentes de empresas – acerca da Segurança e Saúde Ocupacional, daquilo que
efetivamente ocorre no interior de suas empresas, talvez seja dos traços negativos
da cultura brasileira no tocante à SSO, a maior barreira a ser transposta. O discurso
da maioria dos executivos a respeito do assunto baseia-se muito mais naquilo que
eles gostaria que acontecesse do que propriamente naquilo que, de fato, ocorre nos
ambientes de trabalho. Não é da nossa cultura o envolvimento direto e incisivo de
altos executivos com assuntos pertinentes à qualidade de vida dos trabalhadores de
suas empresas – tarefa que, historicamente, esteve a cargo do Serviço
Especializado de Segurança e Medicina do Trabalho – SESMT sob a coordenação
das diretorias ou gerências de RH – Recursos Humanos.

Essa preocupação, todavia, nos últimos tempos, em função principalmente do


crescente clamor por responsabilidade social de parte dos agentes econômicos, tem
sido compartilhada com todos os segmentos das empresas, especialmente com as
gerências das áreas de produção e de serviços. O discurso de SSO, com mais ou
menos intensidade tem chegado ao topo das organizações.

O distanciamento dos altos executivos das questões de SSO, por questões culturais
ou por desinformação ou, pior ainda, pelo uso de informações imprecisas, tem
provocado sérios transtornos no correto gerenciamento desse seguimento de
trabalho nas empresas. O exemplo típico dessa situação é o patrocínio de cortes ou
a não inclusão de orçamentos destinados a melhorias nas condições de trabalho,
que resultariam não apenas em prevenção de acidentes, mas também na redução
dos custos de produção decorrentes da depreciação precoce de equipamentos, da
danificação de matéria-prima, do absenteísmo e de gastos com passivos
previdenciários e trabalhistas. Isso sem contar os estragos à imagem da empresa
em decorrência de acidentes graves envolvendo pessoas e danos ao meio ambiente
83
que poderiam perfeitamente ser evitados. Outro problema, não menos importante, é
a falta ou deficiência de um serviço ou gerência corporativa que tivesse por objetivo
conceber e uniformizar políticas e diretrizes de SSO para toda a corporação. A
ausência desse serviço, entre outros distúrbios, culmina na concepção e
disseminação de práticas de SSO concebidas pelas gerências locais, nem sempre
compatíveis com o que está sendo feito em outras unidades.

2.2. Dos riscos no trabalho: conhecer para resolver

Quando se pensa em gestão de Segurança e Saúde Ocupacional não se está


referindo a um ato administrativo isolado e diferenciado dos demais atos que
culminam na consecução dos objetivos da empresa. A diferença não se identifica no
processo, mas sim no objeto a ser administrado e nos resultados pretendidos.

A concepção diferenciada de administração do conjunto de fatores que compõem,


por exemplo, a produção, a manutenção ou qualquer área de apoio, ou ainda os
serviços da empresa, em relação à Segurança e Saúde Ocupacional, está
precisamente no dualismo: trabalhar e fazê-lo com segurança. No nosso meio,
quando se fala em “fazer segurança” ou dotar o ambiente e as atividades de
mecanismos seguros e saudáveis, a idéia que se tem é a de que a segurança é uma
atividade à parte, desvinculada dos elementos que compõem o sistema produtivo.

Conceber de forma dualística o mundo do trabalho faz parecer que existem duas
situações distintas nas relações de trabalho: uma que consiste em apenas trabalhar,
e outra, trabalhar com segurança. Reforça-se a idéia de trabalhar com segurança
numa clara alusão ao fato de que é possível trabalhar sem a mesma, e que, se
pretendida a segurança, será necessária a implantação de medidas específicas,
suplementares, para garanti-la. Essa forma de pensar pode nos levar ao raciocínio
de que uma operação a ser efetivada implica procedimentos específicos da atividade
em apreço, complementados por mecanismos outros, garantidores da segurança
dos trabalhadores. 17

Nossa visão contradiz esse raciocínio, defendendo que a execução correta de uma
determinada tarefa traz em si mesma o postulado da segurança. A insegurança, por

84
conseguinte, é o pressuposto da realização de uma tarefa de forma irregular,
incorreta, incompleta ou em desacordo com o que fora planejado. Nesse caso, o que
deve ser observado e corrigido não é a insegurança evidenciada na realização de
uma dada atividade, mas a feitura em si, com correção e/ou com adequação, uma
vez que é dessa inadequação que surge, de maneira agravada, a condição de risco.
Senão vejamos: suponhamos uma operação de soldagem em um ambiente fechado,
onde a ventilação é comprovadamente precária. O que entendemos ser um trabalho
correto nessa operação? Seria o trabalhador executar a tarefa conforme
especificada no procedimento de trabalho e devidamente autorizado a realizá-la, em
um ambiente dotado de um sistema efetivo de ventilação diluidora e/ou exaustora
capaz de manter os níveis de contaminantes em seus limites mínimos; seria o
trabalhador utilizar equipamentos de proteção individual que o impedissem de inalar
substâncias tóxicas oriundas da fusão dos metais e o protegessem contra
queimaduras, radiações e ruído. E mais, o monitoramento biológico (exames
médicos) desse trabalhador, de tempos em tempos, no sentido de verificar a eficácia
das medidas de controle, coletivas e individuais, combinadas com o controle das
questões ergonômicas. Isso é o que se pode chamar de trabalho correto de
soldagem em ambiente fechado. Diferente disso seria realizar a operação de
soldagem com base em critérios de planejamento, em ambiente aberto, e observar
os demais procedimentos mencionados.

Outro exemplo que bem ilustra nossa idéia é o das frentes de mina a céu aberto, em
indústrias extrativas de minério de ferro, por exemplo, onde as bancadas acabam
18
formando outras, em nível inferior, sem a colocação de leiras . Ora, a leira é um
dos recursos imprescindíveis de segurança utilizados nessa situação, pois funciona
não apenas como sinalização, mas principalmente como barreira contra quedas de
máquinas e equipamentos, de uma bancada para outra. Uma frente de mina – nas
condições anteriormente mencionadas, onde as atividades de lavra se realizam em
regime ininterrupto, com sinalização precária e sem leira de proteção – pode
configurar situação de risco grave e iminente.

No caso de queda de equipamentos envolvendo pessoas, o impacto é de tal


magnitude que, em relação aos equipamentos, normalmente a perda é total, ao

85
passo que, para o trabalhador, pode significar a morte. Raramente um acidente
dessa natureza não culmina em morte do operador e perda total do equipamento.

Se o desejado é um trabalho correto e não um trabalho específico de segurança,


nenhuma operação deverá ser realizada no local sem a colocação dessas leiras. A
discussão é saber se as leiras são entendidas como mecanismos de segurança,
apenas, ou se são partes integrantes dos processos normais desse tipo de lavra. O
ponto nevrálgico da questão é: o sistema de lavras em apreço compõe-se, em sua
totalidade, de quais tarefas, instrumentos, técnicas e procedimentos? Se
considerarmos que as leiras instaladas nas extremidades das bancadas constituem
mecanismos normais intrínsecos às atividades desse tipo de lavra, não há que se
esperar que outros setores da empresa, como o Serviço Especializado de
Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT) ou a Comissão Interna de Prevenção
de Acidentes (CIPA) – no caso da mineração, SIPAMIN – que não fazem parte das
equipes de produção nem dispõem de poder para intervir nos processos de trabalho,
venham a reclamar da ausência dessas leiras. Deve responsabilizar-se por sua
colocação quem responde pelo trabalho de lavra: o engenheiro de minas ou o
técnico em mineração; ou, ainda, quem tem a incumbência, por determinação, de
fazê-lo. 19

Outro exemplo (ainda mais contundente) é a montagem e a utilização de


plataformas temporárias de trabalho (andaimes) na construção civil ou em qualquer
piso elevado de trabalho, como reparo de equipamentos e/ou estrutura de
edificações. Um andaime ou uma plataforma elevada de trabalho construído dentro
do rigor técnico, com materiais de boa qualidade, corretamente instalado e
adequadamente utilizado, dificilmente cai; e ainda que caia, não permite a queda de
seu ocupante. A queda do trabalhador é impedida por duas razões: primeiro, porque
não há aberturas por onde o trabalhador possa passar, toda a área de circulação é
protegida por guarda-corpo e rodapé; segundo, porque, de acordo com as normas
vigentes, não se pode trabalhar em plataforma elevada ou andaime com altura
superior a dois metros, sem o uso de cinto de segurança preso à estrutura edificada.
Nessa circunstância, o andaime ou a plataforma pode até cair; mas nunca o
trabalhador.

86
Tal procedimento nos parece trabalho correto e não necessita do concurso de
terceiros, não importando a qualificação, para determinar a sua realização. O
problema é que plataforma elevada de trabalho ou andaime não é parte integrante
da obra; sua qualidade, boa ou ruim, não agrega valor facilmente mensurável ao
produto acabado. Por seu turno, o cliente não compra andaime ou plataforma
elevada de trabalho, nem outro tipo de segurança dos trabalhadores – compra
apartamentos, pontes, instalações industriais, serviços de reparos, etc. Essa talvez
seja, ao lado da negligência da Previdência Social – que não apura causas nem
responsabilidades pelos acidentes de trabalho por ocasião da concessão dos
benefícios a que os trabalhadores lesionados fazem jus – a razão pela qual a
construção e a utilização do andaime, por exemplo, fiquem a cargo do encarregado
de obras e não do engenheiro responsável pelo empreendimento, o mesmo que
responde pela sua qualidade. Quanto aos andaimes, é comum não encontrar numa
obra um engenheiro civil que saiba projetá-los e construí-los corretamente, isto é, de
acordo com as normas técnicas e legais vigentes. Os engenheiros civis não
aprenderam isso nas escolas de Engenharia. Quando demonstram sabê-lo, o mais
provável é que tenham aprendido com os mestres ou encarregados de obras, que,
por sua vez, jamais ouviram dizer que existem normas técnicas para construção e
utilização de andaimes, salvo andaimes metálicos, que já são construídos dentro
dos padrões técnicos e legais. Depreende-se disso que a segurança do trabalho
passa às vezes mais pelas questões de ordem cultural do que propriamente pelas
questões de ordem técnica, assunto que procuraremos tratar mais adiante.

Esse modo de pensar situa-nos diante da totalidade de operações existentes nas


empresas, das mais simples às mais complexas, das manuais às mecânicas. Insistir
na separação entre trabalho seguro e trabalho correto é continuar conferindo ao
trabalho duas dimensões distintas – uma de produção, outra de segurança – o que,
além de não ser verdade, subtrai dos verdadeiros responsáveis pela segurança dos
trabalhadores (gerentes, supervisores, facilitadores) não apenas a atribuição, mas,
sobretudo o dever de fazê-la. A primeira dimensão diz respeito ao negócio, daí a
atenção que lhe é dada; a segunda, ao trabalhador, que, se acometido por alguma
doença ficar inválido ou morrer, tem a Previdência Social para zelar por ele e/ou
seus dependentes. A empregadora, nada paga a mais, a não ser quando o

87
trabalhador lesado apela para a lei para pleitear a reparação (indenização) pelo
dano sofrido, o que também não é nada fácil.

Conclui-se, portanto, que a gestão da Segurança e Saúde Ocupacional não é tarefa


específica de um determinado setor da empresa – por sinal, desvinculado da
produção, o SESMT – mas parte integrante do ato de gerenciar a produção ou o
serviço; por conseguinte, deve compor as demais atribuições daqueles que criam e
gerenciam as condições de trabalho. O paradoxo da dissociação da segurança no
trabalho das atividades produtivas está no fato de que quem cria os riscos no
trabalho – gestor da produção – não se sente responsável pela sua correção. O
questionamento que tal situação impõe é: se o gestor dispõe de poder para criar ou
manter uma condição de risco no trabalho, por que o mesmo poder não serve para
corrigir ou impedir o surgimento de novos riscos? A resposta a esse questionamento
só poderá ser encontrada – para corrigir ou manter a situação vigente – nos modelos
de SSO adotados pelas empresas.

Evidentemente que não são apenas a inclusão das ações de SSO ao sistema
produtivo e a transformação dos gestores das áreas de riscos em responsáveis pela
segurança dos trabalhadores a solução definitiva do problema. Essas duas medidas,
pela sua natureza, representam apenas o primeiro passo na transposição do
segundo para o terceiro estágio de maturidade dos programas de SSO. No entanto,
sem a efetivação dessa medida, outras requeridas pelo referido estágio dificilmente
seriam efetivadas.

3.3. Do gerenciamento da Segurança e Saúde Ocupacional – SSO

Indaguemos de início: o que se entende comumente por administrar ou, melhor


dizendo, gerenciar? Se nos apoiarmos nas teorias existentes de administração,
iremos encontrar uma variedade de respostas que, fundamentadas nas diversas
correntes de pensamento, em última análise, pode ser resumido na expressão “fazer
acontecer” (algo ou objetivo que se tem em mente).

88
Se administrar é “fazer acontecer”, impõe-se a necessidade de complementar a
questão: fazer o quê, fazer onde, fazer como, fazer quando e fazer por quê? E,
especialmente, fazer através de quem?

Dessa forma, percebe-se que o ato de administrar coloca o indivíduo-administrador,


ou assim entendido, diante de uma determinada “situação-problema”, que, embora
específica e distinta, apresenta na sua essência três vertentes diferentes, mas que,
na sua dinâmica, forma um todo integrado.

Essa situação poderia ser representada por um triângulo, em que um dos vértices
seria ocupado pelo problema, no nosso caso, pelo cenário de riscos que se pretende
gerenciar; o outro, pelo complexo de informações técnico-gerenciais capazes de
facilitar a resolutividade do problema (solução dos riscos) e o último, pela
governabilidade (poder para implementar a solução dos problemas), isto é, pela
fração de poder que o administrador dispõe para intervir nos problemas e
implementar sua solução ou criar novos problemas. Resumindo, o ato de administrar
necessariamente envolve: lidar com problemas, gerar mecanismos de solução e
dispor de poder para intervir. Essa situação poderá ser mais bem visualizada no
quadro abaixo.

QUADRO 3

Elementos requeridos por um programa de SSO


“PROBLEMA”
1. Conhecer os
riscos

Gestão de
SSO
“PODER" “SOLUÇÃO”
3. Implementar 2. Definir
e manter os medidas de
controles 89 controle
90
2.3.1. Do vértice do problema: dos riscos do trabalho

O próprio conceito da palavra “problema” (cenário de riscos) informa-nos que há


uma situação não conforme, indesejável, desviante, que precisa ser compreendida
para ser, da mesma forma, resolvida. Essa situação nem sempre é percebida por
outros meios que não sejam através de seus efeitos, alguns toleráveis em
determinadas circunstâncias e outros absolutamente comprometedores dos
resultados almejados. Os primeiros podem ser, em alguns casos, apenas
administrados de forma a manter-se em níveis baixos de interferência – quando se
considera que seus efeitos podem ser absorvidos no sistema sem conseqüências
deletérias (Riscos considerados de baixo impacto, (1 e 2) e (3 e 4). Já para os riscos
considerados de alto impacto (6 e 9), não resta outra alternativa senão fazer um
levantamento acurado de suas causas, estabelecer os seus diversos nexos e definir
e implementar os controles requeridos. Vide QUAROS 4A, 4B e 4C.

As causas dos riscos existentes nos ambientes de trabalho podem ser definidas,
para efeitos meramente didáticos, como subjetivas e objetivas. Subjetivas quando
dizem respeito às concepções, idéias e/ou posturas de quem administra ou governa;
objetivas quando dizem respeito aos elementos concretos – no caso em tela, ao
ambiente físico de trabalho envolvendo todo o complexo de riscos, aos processos e
métodos de trabalho e às demais variáveis que formam o seu complexo
organizativo.

Analisadas as causas subjetivas, depreende-se que elas são oriundas das diversas
maneiras com que os indivíduos pensam, percebem e entendem os processos nos
quais estão envolvidos. O ato de pensar, especificamente, consiste na utilização de
habilidades intelectuais e informações preexistentes na mente a fim de se chegar a
novas idéias. Já as ações originam-se dos conhecimentos adquiridos e são
conformadas por crenças e valores do indivíduo, tendo como referencial os traços
fundamentais da cultura em que ele se insere.

91
Considerando-se que o ato de governar consiste em intervir numa situação que, na
sua dinâmica, envolvem causas e efeitos, e que o ato de administrar destina-se a
“fazer acontecer”, obtém-se que é necessário transformar a situação em pauta, ou o
problema, em outra situação que, ao invés de prejudicar, determine o alcance dos
resultados almejados. Donde se conclui que o primeiro momento do ato de
administrar ou governar é o absoluto e total conhecimento de todas as variáveis
existentes numa dada realidade.

Em se tratando da gestão da Segurança e Saúde Ocupacional, esse princípio, por


sinal primário na arte de administrar, é visivelmente dificultado pelo fato de se
pretender tratar as questões da Segurança e Saúde Ocupacional como dissociadas
dos processos produtivos, conforme já foi demonstrado. Essa forma de abordar as
questões da segurança do trabalho, dominante nos modelos de gestão de SSO, de
segundo estágio de maturidade, ainda largamente em voga no Brasil, apresenta
uma série de incongruências, que, por sua natureza, geram inibições e em certas
circunstâncias inviabilizam até mesmo as melhores iniciativas nesse terreno. 20 As
dificuldades vão desde os equívocos na percepção dos riscos do trabalho, passando
pela indefinição de responsabilidades – quem, cuidar de quê – até a associação da
segurança com a monetarização da saúde dos trabalhadores, na figura dos
adicionais de insalubridade, agravada com as novas regras definidas para
concessão da aposentadoria especial. Isso sem contar o risco de se simplificar ou
mesmo banalizar uma coisa complexa como é a abordagem dos riscos no trabalho,
mediante a crença de que o principal fator causal de acidentes no trabalho é o
comportamento desviante do trabalhador, circunscrito na figura do “ato inseguro”,
rebatizado como “ato abaixo do padrão” independentemente dos fatores que o
tenham motivado. Não queremos dizer com isso que o aspecto comportamental não
seja altamente relevante na gênese dos acidentes do trabalho, apenas alertamos
para a simplificação com que é comumente entendido e tratado. A manifestação de
comportamento, positiva ou negativa, deverá ser entendida como conseqüência de
uma determinada ordem de coisas e não como causas das mesmas.

92
2.3.2. Do vértice da resolutividade: solução do problema – riscos

Conhecendo-se o problema (cenário de riscos) sobre seus diversos ângulos e


matizes, é necessário evoluir para o terreno da solução. Convém ressaltar que o
conhecimento das diversas técnicas gerenciais não é suficiente para solucionar
problemas nas organizações quando não se tem a habilidade de definir claramente o
que seja o problema e todas as suas conexões qualitativas, quantitativas,
situacionais, sobretudo quando se trata de riscos no trabalho. Ainda são abordados
fora do sistema produtivo, e pior, não merecedores nem mesmo por parte dos
trabalhadores, da mesma atenção conferida aos meios de produção. Não é raro
encontrarmos trabalhadores com bom domínio das atividades produtivas e com
conhecimento sofrível ou nulo em relação aos riscos do trabalho, oriundos dos
próprios processos produtivos.

É bastante comum encontrar nas empresas todo um conjunto de recursos, normas e


procedimentos à disposição da resolutividade dos problemas, que, na verdade, não
produzem os resultados almejados porque são disponibilizados para atuar sobre os
efeitos e não sobre as verdadeiras causas dos problemas. Daí a ênfase que se deve
dar ao conhecimento profundo dos problemas, sem o que não haverá resolutividade
satisfatória, mas, sim, tratamento paliativo, justamente o que as empresas não
21
podem mais aceitar . Ressaltamos que é justamente nessa particularidade que
encontramos dirigentes de empresas, notadamente dos grandes complexos
industriais, que implementaram programas de SSO de boa qualidade, surpreendidos
com o crescente número de acidentes e de passivos trabalhistas e previdenciários
nas suas empresas, quando acreditavam que essa questão já estava
suficientemente equacionada.

Voltemos novamente à questão das leiras nas bordas das bancadas em lavras a céu
aberto, anteriormente mencionadas. O importante não é observar as leiras em si, se
estão ou não colocadas nos locais exigidos, se são dimensionadas como determina
a Norma Regulamentadora 22, do Ministério do Trabalho e Emprego. O que se
precisa, como administrador, gerente, supervisor ou líder, é saber: quem autoriza a
93
abertura de frentes de lavras, colocar equipamentos pesados no local e homens
para operar esses e outros recursos, sem a colocação das leiras nos seus devidos
lugares de forma a proteger operadores e equipamentos? Da mesma forma que as
frentes de lavra não são abertas sem a intervenção direta de quem decide sobre os
trabalhos ali desenvolvidos, o mesmo ocorre com a ausência das leiras. Certamente
as leiras não seriam “esquecidas” se fizessem parte do processo de lavra. E
justamente por não fazerem parte do processo de lavra é que sua ausência
comporta todo tipo de “esquecimento” ou de ausências deliberadas. E mais do que
isso, uma série de argumentos desprovidos de fundamentos, porém “aceitos”, sobre
sua ausência. O poder disponível para autorizar a colocação das leiras não é
diferente do poder que autoriza a realização de trabalhos sem esse dispositivo de
segurança. A questão não está no poder de decidir, mas no valor que se atribui à
segurança no trabalho. Não é a presença ou não das leiras que deve ser o objeto
da apreciação, mas a definição e o endereçamento da responsabilidade por sua
colocação. A questão não é técnica, mas gerencial. Se o responsável pela lavra
decidir – além do discurso – que nenhuma frente de lavra será aberta sem a
presença de leiras, não há dúvida de que elas serão colocadas sem nenhum
questionamento ou resmungo. A presença ou não das leiras deve ser vista e
entendida como conseqüência das decisões gerenciais ali implementadas ou de sua
ausência. Em relação às decisões – colocação ou não das leiras – é importante
enfatizar que elas não devem ser decididas pelas gerências locais. O que as
gerências locais devem fazer é cumprir, com rigor, as determinações das gerências
ou diretorias corporativas.

É importante enfatizar que a abordagem sobre as leiras poderá ser perfeitamente


empregada para quaisquer outras situações de riscos que, em qualquer ramo de
atividade, se queira controlar se seguidos o mesmo raciocínio e a mesma linha de
orientação.

Nos sistemas de SSO de segundo estágio de maturidade, administrar significa fazer


uso correto do poder. A regra é simples: manda quem tem poder e consciência
crítica da necessidade de mandar. E a obediência não foge à regra, isto é, não deixa
de ser um fator decorrente do ato de mandar. Em todas as circunstâncias, o ato de
obedecer não existe sem o que o determina que é mandar. Comportamentos
94
inadequados (atos inseguros) cometidos por trabalhadores, quando exaustivamente
estudados, na sua grande maioria, revelam falhas nas relações de comando. O
trabalhador precisava de orientação (definição do quê, de como e de quando fazer)
que não lhe foi oferecida no momento oportuno ou não foi corrigido quando a
correção se fazia necessária.

Voltemos novamente às leiras. Determinar a instalação de leiras onde elas deveriam


estar, sem refletir sobre o porquê da sua inexistência anteriormente, é perpetuar na
prática de “apagar incêndios” ou no uso do “serrote”: apareceu um problema, corta-
o; apareceu outro, aplica-se o mesmo “remédio”. É continuar atuando nas
conseqüências e não nas causas fundamentais dos problemas. O mesmo raciocínio
aplica-se em relação às plataformas elevadas de trabalho ou andaimes
anteriormente mencionados e a quaisquer outras situações de riscos existentes nos
ambientes de trabalho, ressaltando-se que essa mudança de postura implica na
definição de quem é a incumbência nominal de zelar pela segurança e saúde dos
trabalhadores. E essa definição necessariamente terá que ser conferida, por meio de
descrição de atribuições, pela alta direção da empresa ou pelos comitês gestores de
SSO, atualmente em voga.

Não há como imaginar um sistema de gestão de SSO funcionando, com a mesma


desenvoltura dos sistemas produtivos, sem ferramentas administrativas apropriadas,
onde estejam claramente definidas as regras do “jogo”, isto é, quem é quem em
relação ao tema, quem cuida do quê e quem responde pelo quê. Os sistemas de
SSO ora em curso na maioria das empresas se apóiam nas políticas de SSO sem
muita clareza ou clareza alguma em relação ao que acabamos de comentar. As
empresas esperam que as pessoas façam aquilo que precisa ser feito, mas nem
sempre são suficientemente claras em relação às suas determinações, isto é, o que
elas esperam das pessoas. 22

Se considerarmos que toda realidade definida, consolidada e materializada é


resultante de decisões que passam pelo ato de pensar, de conjugar sensatamente
idéias e situações e de definir ações, é evidente que a existência ou não das leiras
parece secundária para uma reflexão prévia. O que estamos procurando não é o
fato como se apresenta agora, mas o que levou à sua existência tal como se
95
configurou. Face ao exposto, algumas interrogações se fazem absolutamente
necessárias:

a) Quem determina a abertura das frentes de lavra sem a


colocação de leiras?

b) Trata-se de um ato isolado do responsável pela execução da


tarefa?

c) É uma decisão superior, em função da disponibilidade ou não de


equipamentos e de homens para a realização da tarefa?

d) Faz parte do plano de lavra trabalhar dessa e não de outra


forma?

e) Não estaria relacionado ao “princípio” de que aquilo que não


impede ou não atrapalha a execução da tarefa principal (a ausência de leiras não
atrapalha a execução dos trabalhos de lavra) pode ser relegado a um último
plano ou até mesmo a plano nenhum?

f) A inexistência das leiras nas bordas das bancadas não estaria


relacionada aos critérios de avaliação de desempenho dos responsáveis pelas
frentes de lavras em relação ao fazer e fazer como?

Não se poderia comparar a existência ou não das leiras à qualidade e ao uso dos
andaimes comumente empregados na construção civil, onde a fiscalização é
precária? A movimentação de carga suspensa por meio de pontes rolantes
trafegando sobre pessoas? A empilhadeira trafegando em velocidade acima da
permitida e com carga posicionada de forma irregular? A motorista colocando lonas
em caminhões, sem proteção contra quedas? A eletricista fazendo reparo em rede
elétrica sem os bloqueios devidos? A trabalhador fazendo reparo em telhado
industrial sem uso de cinto de segurança conectado a cabo-guia? A trabalhador

96
executando trabalho em ambientes confinados sem os procedimentos de segurança
exigidos?
Para quem deseja tratar a segurança do trabalho como parte integrante do sistema
produtivo, e não como um adendo ao sistema, sem dúvida, as interrogações
formuladas procedem e precisam ser consideradas e respondidas. Sugerimos
utilizar o exemplo das leiras, adaptando-o às diversas situações de riscos existentes
nos diversos ramos de negócios e nas diversas áreas e ocupações, quaisquer que
sejam elas.

Outro exemplo ilustrativo do nosso ponto de vista: passarelas sem proteção lateral
em pisos elevados de trabalho. Como a grade de proteção (guarda-corpo e
rodapé) não é imprescindível para a passagem de pessoas pela passarela, sua
existência ou não pouca diferença faz, principalmente para os seus usuários. Pode
ser retirada por alguma razão e depois não ser recolocada, o que não impede a
passagem de pessoas pela passarela. Por outro lado, se é colocado um obstáculo
na passarela capaz de atrapalhar ou impedir a passagem, imediatamente, aparece
alguém para isso constatar e reclamar, para pensar e definir por sua retirada.

Por que o mesmo não ocorreu diante da ausência de proteção da passarela ou em


situações idênticas relacionadas a determinados mecanismos de proteção de
máquinas que são retirados, normalmente para manutenção, e não recolocados
devidamente? E pior, não reclamados pelos gestores dos equipamentos? Se
quisermos resposta para essa pergunta, teremos de voltar à velha tecla do dualismo
mencionado em parágrafos anteriores: trabalhar com segurança ou trabalhar
corretamente. Insistimos ainda que, enquanto não for incluída nas atribuições de
quem decide sobre a organização do trabalho a tarefa de proteção aos
trabalhadores, a “segurança do trabalho” continuará, na prática, sendo tratada de
forma secundária, de somenos valor, como sempre foi na maioria dos ambientes de
trabalho, mesmo considerando as enormes estruturas montadas para sua gestão. O
abismo entre o discurso e as práticas cotidianas continuará presente.

97
2.3.3. Do vértice da governabilidade: do poder para resolver

O termo “governabilidade” refere-se ao ato de governar, que, por sua vez, está
intimamente relacionado ao exercício do poder. Quem governa exercita uma fração
de poder numa dada realidade, independentemente da natureza da ocupação.

A disponibilidade de poder e o seu exercício não são por si só, capazes de produzir
os resultados almejados naquilo que se pretende realizar. Evidentemente, a
disponibilidade de poder é fator de absoluta relevância no ato de gerenciar ou
governar. Para seu exercício, há que se responder, com clareza, às questões:

a) Poder para fazer o quê? A atividade em apreço.

b) Poder para fazer como? A maneira de realizar a tarefa nas


condições aventadas.

c) Poder para fazer onde? Local ou lugar onde a tarefa será


realizada.

d) Poder para fazer quando? Tempo destinado à execução da


tarefa.

e) Poder para determinar a quem fazer? Pessoas envolvidas


com a tarefa.

Voltando ao primeiro vértice do nosso triângulo, que se refere ao problema a ser


resolvido, vemos que não basta se deparar com o mesmo e propor uma solução
imediata. É necessário que se caminhe na direção de suas verdadeiras causas,
definindo sua natureza, de onde procedem, suas diversas conexões, como se
manifestam e as pessoas envolvidas.

98
É importante ressaltar que todo problema instalado nas empresas é resultante de
decisões prévias (pensar e agir) oriundas de reflexões e comparações feitas num
dado momento, numa dada realidade. Em se tratando de situações relacionadas ao
ambiente, às condições e à organização do trabalho, nada ocorre ao acaso: tudo é
fruto de decisões de quem está envolvido na questão, fazendo ou deixando de fazer.
Se considerarmos o ato de pensar na sua relação com o ato de fazer, e
compreendermos que toda situação materializada (leiras, andaimes, proteção de
passarelas, máquinas sem proteção, uso indiscriminado de produtos tóxicos,
equipamentos de proteção individual utilizados de forma incorreta, erros na
execução do trabalho) é resultante dessa relação pensar/agir, perceberemos a
importância da governabilidade tanto para decidir o que fazer numa dada situação
como para buscar, com determinação, as verdadeiras causas geradoras dos
problemas. Agir sem conhecer, às vezes, é pior do não agir. Se o mais importante
na tarefa de prevenir acidentes é não deixar de fazer o que precisa ser feito e se não
se conhece o que precisa ser corrigido, é como se nada existisse. É como se o
ambiente de trabalho fosse totalmente desprovido de perigos e riscos. E nesse
particular é de fundamental importância relembrar que o trabalhador faz o que
determina os procedimentos de trabalho, quando existem procedimentos ou faz o
que a sua chefia imediata determina e/ou permite. Não nos consta que o trabalhador
dispõe de poder para decidir a forma de trabalhar que lhe convém, ele se orienta
pelos procedimentos de trabalho ou pelas ordens de suas respectivas chefias. Não
se esquecendo de que a omissão funciona como uma ordem, daí a necessidade de
o supervisor responder por ela. Mais grave do que uma ordem mal transmitida é a
omissão em relação ao que e ao como fazer.

A governabilidade, portanto, é um fator decisivo no processo de gestão das


condições de trabalho, porque através dela o gestor (supervisor), juntamente com o
trabalhador, tem a oportunidade de levantar os problemas existentes num ambiente,
de definir suas causas objetivas e de aprofundar no terreno das causas subjetivas –
aquelas que passam pelo campo do pensar, do refletir e do estabelecer correlações
entre as diversas variáveis, para então agir eficazmente na definição da tomada de
medidas corretivas.

99
Quando se cria na empresa um espaço facilitador para tratar dos problemas
existentes, especialmente dos riscos do trabalho, nas suas dimensões de efeitos e
causas e destas últimas – as suas vertentes já mencionadas – é possível melhorar,
de forma considerável, a visão dos problemas na sua verdadeira essência e dar-lhes
soluções adequadas. É assim que a cultura instalada deixa de ser um entrave ao
tratamento adequado das questões para tornar-se ponto de partida para a
transformação cultural necessária ao efetivo gerenciamento integrado da segurança,
da qualidade e do meio ambiente. Lembrando que é impossível pensar em gestão
integrada de segurança, qualidade e meio ambiente, antes de integrar totalmente as
ações de SSO ao sistema produtivo.

Se o supervisor (gestor) deparar com uma situação/problema que ele conhece em


toda a sua plenitude, definir suas causas e vislumbrar seus efeitos, e dispondo de
conhecimentos técnico-gerenciais de resolutividade não o faz por falta de poder
decisório, por não estar no rol de suas atribuições, ainda assim deve restar-lhe
governabilidade suficiente para construir hipóteses de solução, relacionar recursos e
procedimentos que possibilitem o encaminhamento do assunto a quem dispõe de
poder para decidir, reservando-se a prerrogativa de cobrar uma solução, agora com
pleno conhecimento de causa. Oferecer soluções e não apenas apontar problemas,
como normalmente acontece nas empresas quando o assunto é Segurança e Saúde
Ocupacional. Essa é a maneira mais adequada para que se ganhe a
governabilidade necessária ao enfrentamento dos problemas. Quando falamos de
governabilidade, falamos de poder; e nas organizações modernas o verdadeiro
poder é aquele que deriva do argumento sólido, da consistência da verdade e do
benefício que ela poderá gerar tanto para as pessoas quanto para a organização.

Do exposto acima, depreende-se por que o modelo de gestão da Segurança e


Saúde Ocupacional é dissociado dos processos produtivos, conduzido pelos
técnicos do SESMT, funcionando precariamente e produzindo, em conseqüência
disso, resultados muito aquém do esperado. Melhor dizendo, do necessário.
Razões é que não faltam para justificar o baixo desempenho da maioria dos atuais
modelos de gestão de SSO em voga no Brasil. De um lado, é o gerente/supervisor
da produção que gera e mantém os riscos do trabalho, eximindo-se, de todas as
maneiras possíveis, de assumir, de fato, a responsabilidade de promover a
100
segurança de seus trabalhadores; de outro, são os engenheiros e técnicos de
segurança a insistir, mas, de prático, pouco fazendo, porque não dispõem de poder
para intervir nos processos de trabalho com assertividade. E ainda que lhes fosse
conferido o poder necessário, o modelo de gestão de SSO em voga não os ajudaria
muito nessa empreitada, sem criar os transtornos resultantes da duplicidade de
comandos.

Aproveitamos o ensejo para lembrar que, ao tratarmos de governabilidade, estamos


tratando da disponibilidade de poder para decidir, justamente o que não é conferido
ao trabalhador para decidir sobre a adulteração de uma condição de trabalho. Se o
trabalhador assim se comporta é porque alguém, se não o mandou, não fechou
suficientemente os espaços facilitadores de postura dessa natureza.

No nosso entendimento, o comportamento correto e/ou incorreto do trabalhador é


determinado pelo conjunto de variáveis implicadas na organização do trabalho, mas
também e principalmente pelos espaços gerados em decorrência do exercício do
poder na gestão daquilo que esteja sendo realizado. É pouco provável que um
trabalhador suficientemente preparado para trabalhar em atividades normatizadas,
num ambiente onde as condições de trabalho sejam compatíveis com as
determinações normativas do trabalho e orientado por disciplina rígida, viole um
procedimento de trabalho simplesmente porque acredita ser essa a melhor maneira
de alcançar o objetivo pretendido, ou seja, a tarefa concluída. Se ele, que não detém
poder para tal assim se comporta, certamente é porque encontrou ambiente
favorável para agir dessa forma. E o ambiente a que nos referimos deriva-se da
ausência de cobranças, da permissividade em aceitar fazer o que não deveria ser
feito e de pouco incentivo às praticas corretas.

Os diagnósticos de avaliação de cultura em SSO, realizados por nós em muitas


empresas, não deixam dúvidas quanto ao que acabamos de expor. O que falta aos
programas de SSO, especialmente aos de origem estrangeira, ora em curso na
maioria das empresas não é ferramenta técnica, isso eles têm em abundância – o
que lhes falta é ferramenta gerencial compatíveis com a cultura brasileira. O que
falta é orientação administrativa de como os programas devem funcionar e pulso
suficiente para o cumprimento das regras estabelecidas. Não devemos nos
101
esquecer que a administração da produção funciona, e na maioria das vezes com
bom nível de desempenho, porque dispõe e usa, sem parcimônia, desses recursos.

Os gerentes das áreas de produção, em relação às suas atribuições, sabem se


comportar diante das dificuldades encontradas no seu trabalho. Sabem onde estão
os recursos e como buscá-los, não ocorrendo o mesmo em relação às questões de
Segurança e Saúde Ocupacional. Nesse aspecto a maioria é omissa. E não há
dúvida de que a omissão dos gestores está nos modelos de gestão de SSO que não
os consideram como responsáveis, de fato, pela Segurança e saúde Ocupacional.
Poucas são as empresas cuja descrição de cargos contemple, de maneira
adequada, o item SSO, especialmente em relação aos ocupantes de cargos de
chefia.

102
03. SUGESTÕES PARA REVISÃO, ELABORAÇÃO E
IMPLEMENTAÇÃO DE FERRAMENTAS DE AUXÍLIO À GESTÃO DA
SEGURANÇA E SAÚDE OCUPACIONAL

As sugestões que se seguem foram formuladas com base nas fontes de


informações relacionadas abaixo:

a) diagnósticos de maturidade de SSO realizados em 14 empresas ou unidades


industriais, envolvendo 16.352 trabalhadores, 4.046 ocupantes de cargos de chefia e
104 profissionais do SESMT, sendo 19 engenheiros e 85 técnicos de segurança;

b) Impressões colhidas de gerentes e supervisores por ocasião da realização de


seminários internos destinados a discutir e validar planos de ações de SSO
elaborados com base em diagnósticos de maturidade de SSO;

c) Avaliação de desempenho dos planos de ações implementados. 23

3.1. Revisão e atualização dos padrões de trabalho

Considerando o elevado percentual de respostas aos questionários e entrevistas


individuais realizadas com gerentes, supervisores e colaboradores sobre as diversas
manifestações de dificuldades em relação ao trabalho normatizado, sugerimos
estudar e definir quais as atividades e/ou tarefas que, em relação à SSO –
Segurança e Saúde Ocupacional necessitam, de fato, de procedimento escrito
(normas) para sua execução. Constatamos, por meio de entrevistas com 372
trabalhadores, que sofreram acidentes e retornaram ao trabalho, que uma
quantidade enorme de normas de SSO é deliberadamente descumprida porque as
referidas normas são consideradas desnecessárias por parte de quem tem a
incumbência de cumpri-las. Diante dessa constatação, acreditamos que o caminho
mais curto para resolver esse impasse é definir, com absoluto critério, o que deve,
de fato, ser normalizado ou padronizado. Para as atividades ou tarefas rotineiras
cuja execução pode ser avaliada e controlada informalmente, o melhor que se faz é

103
não padronizá-las. Não devemos nos esquecer que os padrões de trabalho devem
ser vistos e tratados como uma garantia de controle e não como um mecanismo de
engessamento do sistema produtivo. O descumprimento de padrões de trabalho,
independentemente da razão, além de outros prejuízos que acarretam ao sistema
produtivo, constitui-se na mais poderosa arma de corrosão de qualquer sistema
organizacional. Convém ressaltar que uma das causas identificadas do não
cumprimento dos padrões de trabalho está intimamente relacionada ao conceito de
padrão, que deve ser entendido como um objeto que serve de modelo à feitura de
outro. A falta de critério na definição dos padrões de trabalho associada à sofrível
maturidade cultural brasileira em relação ao que é formal não deixa de ser a
principal causa das dificuldades enfrentadas pelas empresas em desenvolver e
amadurecer as práticas de trabalho normalizado.

Assim sendo, o recomendável é fazer um levantamento minucioso de todos os


procedimentos de trabalho existentes na empresa que apresentam dificuldades,
tanto na compreensão quanto no cumprimento, por parte dos colaboradores.

Identificar, utilizando-se das fontes disponíveis de informações, os principais motivos


que estão interferindo na observância (cumprimento) das regras ou procedimentos
de trabalho implantados, considerando-se, entre outros motivos, os que se
seguem:24

a) Dificuldades no entendimento das regras e/ou normas de SSO por parte dos
trabalhadores. Esse item aparece com mais de 40%, na representação dos
trabalhadores, em todas as empresas avaliadas.

b) Incompatibilidades entre: padrões de trabalho (normas escritas), elementos


da organização do trabalho e condições físicas do ambiente onde o trabalho se
realiza.

c) Deficiência na capacitação dos trabalhadores para a correta execução das


tarefas conforme orientações contidas nos padrões ou regras escritas. Os
trabalhadores não são suficientemente treinados para trabalhar em conformidade
com o que está escrito nos padrões de trabalho.

104
d) Distanciamento dos supervisores de seus comandados em decorrência do
volume de trabalho burocrático realizado em escritório. Atualmente um supervisor
não consegue permanecer por mais da metade do tempo útil de trabalho junto
aos seus comandados (vide item 1.9. “O ordenamento formal do trabalho e os
conflitos de pode”, página 39). Em decorrência disso, ele precisa ter garantia de
que o trabalho, na sua ausência, seja realizado precisamente como está descrito
nos procedimentos. Essa postura exigirá, da parte do próprio supervisor, uma
constante revisão e atualização dos procedimentos de trabalho, da capacitação
dos colaboradores e de rigor na disciplina.

e) Declínio na capacitação técnica dos supervisores (os supervisores estão se


transformando em gestores envolvidos com atividades burocráticas e perdendo
ou não adquirindo, suficientemente, conhecimentos técnicos relacionados ao seu
trabalho precípuo, dificultando, com isso, o atendimento às demandas de
informações procedentes dos colaboradores). Muitas situações consideradas
ruins ou impróprias estão sendo tratadas de maneira inadequada porque os
colaboradores alegam não encontrar em suas chefias imediatas as informações
técnicas de que necessitam. Essa situação aparece, de maneira explícita, ao
longo do diagnóstico de maturidade de SSO realizado em todas as empresas
avaliadas.

f) Conflitos entre o conhecimento teórico apropriado pelos supervisores e as


experiências práticas adquiridas nas vivências cotidianas dos colaboradores no
seu dia-a-dia de trabalho. É importante considerar que a acumulação e
explicitação do conhecimento teórico ocorrem de maneira diferente do que se
verifica com as experiências práticas.

g) Duplicidade de orientações sobre como realizar as tarefas (o trabalho é


prescrito de um jeito e o supervisor, por alguma razão, ordena e/ou permite que o
mesmo seja realizado de outra, diferente do que está prescrito nas normas). A
permissão, na maioria das vezes, ocorre principalmente por omissão em relação
ao que deveria ser feito – o supervisor finge não ver o trabalhador realizar a tarefa
em desacordo com o procedimento de trabalho. Essa informação aparece nos

105
diagnóstico com valores superior a 50%, na representação dos trabalhadores e
técnicos do SESMT, em todas as empresas avaliadas.

h) Desempenho avaliado pelo trabalho concluído e não por como se deveria


trabalhar. O incentivo à prática do trabalho formal é subtraído pelos critérios de
cobranças orientados para resultados.

i) Carga e ritmo de trabalho, às vezes, incompatíveis com as reais condições e


organização do mesmo.

j) Incompatibilidade entre o cumprimento dos procedimentos de trabalho


(normas) e cumprimento dos cronogramas de produção. É comum alterar metas
de produção sem considerar os procedimentos e as condições de trabalho.

k) Inflexibilidade no cumprimento dos procedimentos de trabalho (normas). Há


uma definição clara de que todas as normas sejam rigorosamente cumpridas,
sem nenhuma distinção e/ou restrição. Como isso, na prática, está longe de
ocorrer, muitas atividades ou tarefas cujos riscos são classificados como graves
são tratadas como se assim não o fossem.

Identificado os problemas o que se impõe é reformular os procedimentos,


especificando a sua natureza. Uma via que não se constitui em solução, mas que
poderá ajudar a empresa, em curto prazo, a estreitar o fosso que separa o trabalho
prescrito do trabalho real, consiste em selecionar os procedimentos de trabalho e
reuni-los em dois grupos distintos. Essa divisão deverá ser feita tomando-se como
base a natureza e a importância dos riscos (Quadro 4A, página 108).

Um grupo será constituído de procedimentos (normas), que, pela natureza do


trabalho e pela importância dos riscos (Quadro 4A, página 108), não permitem
nenhuma flexibilidade no seu cumprimento – esses procedimentos são comumente
denominados de “Regras de Ouro” ou “Regras Inflexíveis”. O trabalho, nesses
casos, terá que ser, obrigatoriamente, realizado como está descrito nos
procedimentos. Não sendo possível, por alguma razão, cumprir os procedimentos da
maneira como estão escritos, o trabalho em questão não será iniciado ou será

106
imediatamente interrompido. Nessas circunstâncias prevalecerá o direito à Recusa
de Tarefa (RT) (vide Quadro 5, VERIFICAÇÃO DE RISCO, página 110).

É necessário que todos estejam cientes de que a inobservância desse procedimento


implicará sanções previstas nos regulamentos do sistema de gestão de SSO
definidos pela empresa (ver Quadros 8, 9, 10 e 11, páginas 117, 139 e 141,
respectivamente). As gerências das áreas juntamente com a engenharia de
segurança definirão, com base em critérios técnicos, as atividades que farão parte
desse grupo, estabelecendo, da mesma forma, os mecanismos de controle
necessários. Alertamos para a necessidade de instituição e divulgação dos
regulamentos.

O outro grupo será constituído de procedimentos (normas ou regras), que, pela


natureza do trabalho e pela importância dos riscos (Quadros 4A e 5, páginas 108 e
110, respectivamente), terão o seu cumprimento tratado de forma diferenciada, isto
é, permitindo de maneira orientada e controlada algum tipo de flexibilidade. Essa
flexibilidade, de forma alguma será aleatória. Haverá critérios na sua definição e
utilização, onde o supervisor possa coordenar e acompanhar a realização dos
trabalhos com a garantia necessária de que as regras básicas de segurança serão
preservadas e respeitadas. Os colaboradores, com base nos critérios definidos,
saberão que providência tomar e principalmente até onde poderão ir, quando um
determinado procedimento de trabalho, por alguma razão, não puder ser
integralmente cumprido da maneira como está escrito. O que se pretende com essa
medida é impedir as improvisações perigosas, os “arranjos”, que possam
comprometer o processo produtivo e a segurança e saúde de quem está realizando
as tarefas, muitas levadas a cabo sem o conhecimento e consentimento das chefias
das áreas.

NOTA IMPORTANTE: Em nenhuma hipótese será permitido flexibilizar


situações de risco caracterizadas como 6 e 9, previstas do Quadro 4A, p/108.

À primeira vista, essa medida parece absolutamente inconseqüente. Isso porque o


conceito de norma, de procedimento formal, remete-nos à idéia de disciplina, de
rigidez, de inflexibilidade. Normas existem para serem cumpridas,

107
indistintamente. Todavia, é conveniente lembrar que a formação cultural brasileira,
no tocante a esse expediente, não é a mesma dos povos cuja cultura foi largamente
influenciada pela Reforma Protestante ou dos nipônicos, por exemplo. A nossa
formação cultural, em termos de disciplina, está em via de evolução. Não podemos
afirmar que somos avessos à disciplina, como também não podemos afirmar que
somos suficientemente disciplinados.

No tocante à elaboração e ao cumprimento de normas ou procedimentos de


trabalho, duas situações são postas aqui, não apenas como objeto de reflexão, mas
principalmente para a definição de opção. Primeiro, optando a empresa pelo
cumprimento integral de todos os procedimentos de trabalho, que não são poucos,
em face dos dados revelados pelo diagnóstico de maturidade de SSO,
necessariamente ela terá que adotar, além de outras medidas de natureza
administrativa, disciplina progressiva em escala ampliada; segundo, verificar se a
referida medida, uma vez adotada, resolve, de fato, o que empresa pretende que é
fazer com que todos os procedimentos de trabalho, na prática, sejam cumpridos.

Em relação à primeira providência, a questão fundamental é saber se a empresa


está disposta a bancar os custos, em termos de desgaste, que essa medida
certamente acarretará. Ademais, é conveniente observar se os supervisores estão
suficientemente preparados para aplicar medidas corretivas, em escala ampliada,
conforme orientação constante do quadro 8, APLICAÇÃO DE MEDIDAS
CORRETIVAS, página 117. Os diagnósticos de maturidade de SSO que estamos
realizando sugerem que não. Os dados levantados comprovam que os supervisores
não têm o domínio necessário sobre os riscos do trabalho e menos ainda os pré-
requisitos essenciais para aplicar penalidades em escala ampliada. Em relação ao
tema sugerimos verificar, na empresa, o histórico de aplicação de medidas
disciplinares, não apenas em relação à quantidade, mas principalmente em relação
às alegações.

Optando a empresa pelo emprego da flexibilidade, determinar quais os


procedimentos que não poderão, em nenhuma hipótese, ser realizados de forma
diferente da descrição dos padrões, e fazer valer a qualquer custo à determinação
de cumpri-los (ver nota, página anterior). Nesse caso, como a quantidade de
pessoas envolvidas com essa situação é razoavelmente pequena, a disciplina rígida
108
poderá ser aplicada sem os transtornos que certamente causaria na outra situação.
Por essa via a empresa introduzirá, gradativamente, a noção de rigidez em relação
ao trabalho formal. Ao longo do tempo, a cultura do trabalho formal será
amadurecida e todas as normas receberão, em relação ao seu cumprimento, o
mesmo tratamento. Algumas empresas estão adotando, com razoável sucesso, uma
variante alternativa, que consiste apenas em relacionar as atividades que não
permitem flexibilidade no seu cumprimento, denominando-as de Regras de Ouro ou
Regras Inflexíveis. É passada aos trabalhadores, mediante assinatura, a listagem
das referidas regras com as instruções referentes ao seu cumprimento ou emprego
da RT – Recusa de Tarefa.

Na segunda vertente, determinar quais as normas que permitirão flexibilidade na sua


execução, definindo regras ou procedimentos administrativos para que isso seja
feito. É conveniente reafirmar que essa alternativa, de forma alguma, induz ao
descumprimento das normas, mas tão-somente define caminhos alternativos para
executar o trabalho, preservando os aspectos essenciais de segurança. Não perder
de vista que o objetivo dessa medida é fazer, com o tempo, com que todas as
normas ou procedimentos de trabalho sejam rigorosamente cumpridos. Se não se
pode fazer de uma hora para outra, pela via do convencimento, o que já deveria ter
sido feito ao longo do tempo – que é o amadurecimento da cultura do trabalho
normalizado – nem tampouco deixar de fazer o que precisa ser feito, então há que
se procurar caminhos alternativos para fazê-lo, da melhor forma possível.
Pessoalmente não vejo outra alternativa senão rever e refazer todos os
procedimentos de trabalho – principalmente os que não estejam sendo inteiramente
cumpridos – considerando a natureza dos mesmos e a importância dos riscos,
agrupando-os por categorias que permitem ou não flexibilidade na sua execução.

LEMBRETE IMPORTANTE: o cumprimento parcial ou o não cumprimento dos


procedimentos de trabalho e/ou de segurança, conforme os resultados apontados
pelos diagnósticos de maturidade de SSO realizados se afiguram como flexibilidade,
sem controle. A diferença é que a flexibilidade que estamos propondo é planejada,
avaliada, acompanhada e controlada. Por essa via, os trabalhadores saberão até
onde poderão ir e os supervisores, da mesma forma, saberão o que os seus

109
colaboradores estarão fazendo. E o mais importante, tomarão conhecimento das
causas do não cumprimento integral dos atuais procedimentos de trabalho.

3.2. Definição de prioridades nas ações de SSO

Definir prioridades nas ações de solução de riscos, considerando-se:

a) A natureza (categoria) do risco, conforme o Quadro 4A, página 108;

b) A maturidade dos programas técnicos de SSO (Quadro 6, página 111);

c) Compatibilidade entre a natureza dos riscos existentes no trabalho e a


maturidade do sistema para controlá-los de maneira adequada.

110
QUADRO 4A

DEFINIÇÃO DE CATEGORIA DE RISCOS OCUPACIONAIS

N d R - Natureza
do Risco
Severidade
Definição de
prioridades na
Solução dos riscos

3 3 6 9 Risco grave
e iminente
(intolerável)

Risco
grave
2 2 4
6
Risco médio
ou moderado

1 1 2 3
Risco leve –
tolerável

1 2 3 Probabilidade

111
QUADRO 4B – DEFINIÇÃO DE SEVERIDADE

Severidade
CRITÉRIOS Pontuação
da Lesão

Lesão de natureza leve podendo impedir o trabalhador de exercer


suas funções, num período de tempo de, no máximo, até 15 dias.
BAIXA
(pequenos cortes, escoriações, contusões, crises alérgicas cutâneas
e/ou respiratória causadas por exposição a substâncias tóxicas, 1
(1, 2) pneumonias, etc.); Algumas empresas consideram como lesão leve,
Vide quadro 4A aquela que o trabalhador não trabalha no dia do acidente, mas volta
ao trabalho no dia seguinte.
Lesão de média gravidade podendo impedir o trabalhador de
exercer suas funções por um período de tempo compreendido entre
MÉDIA 16 e 90 dias, sempre com previsão de alta definida. (fraturas
múltiplas, luxações, cortes extensos e profundos, perfurações,
queimaduras sérias, intoxicações graves, lesões de coluna, etc.).
2
(3, 4)
Vide quadro 4A Algumas empresas consideram como lesão de média gravidade,
aquela que o trabalhador é impedido de trabalhar, do dia
subseqüente ao acidente até no máximo 15 dias.

Lesão de alta gravidade ocasionando o afastamento do trabalhador


por tempo superior a 90 dias ou por tempo indeterminado, podendo
ocasionar incapacidade parcial ou total, ou ainda a invalidez
ALTA
(amputação de membros, perda de substância, fraturas graves,
queimaduras extensas e profundas, contaminações e intoxicações 3
(6 e 9) graves, escoriações generalizadas, entre outras, incluindo invalidez e
Vide quadro 4A morte). Algumas empresas consideram como lesão de alta
gravidade, aquela que o trabalhador é impedido de trabalhar por
tempo superior a 30 dias ou por tempo indeterminado ou definitivo.

QUADRO 4C – DEFINIÇÃO DE PROBABILIDADE

Probabilidade Critério Pontuação

Improvável de ocorrer - não há registro de acidentes, nem mesmo


BAIXA de quase acidentes, e as medidas de controle existentes são 1
consideradas adequadas e oferecem garantia de controle.

Provável de ocorrer - há registro de incidentes críticos e de


acidentes com ou sem perda de tempo. Existem medidas de controle,
MÉDIA 2
só que de qualidade duvidosa. Não há garantia quanto à eficácia das
mesmas.

Esperado que ocorra - há registro de incidentes e de acidente com


perda de tempo. Não existem medidas de controle e quando existem
ALTA 3
são precárias e sem nenhuma garantia de eficácia. Até mesmo os
EPI são impróprios e/ou usados de maneira inadequada.

112
QUADRO 5

VERIFICAÇÃO DE RISCO

Perguntas

Existe regra definida


para realização da NÃO Realizar
tarefa? análise de
risco

SIM

É possível realizar a
Interromper
tarefa seguindo à NÃO ou não iniciar
regra?
tarefa

SIM

Executa

Fonte: adaptado de Hermênio P. Gonçalves - G BC

NOTA: Em muitas empresas, a decisão de não iniciar uma tarefa ou interrompê-


la, por falta de segurança, é comumente conhecida pela nomenclatura de RT –
Recusa de Tarefa. Essa ferramenta ou expediente, previsto nos programas de
SSO da maioria das grandes empresas, por muitos anos foi utilizado de maneira
precária principalmente por falta de orientação de como utilizá-lo. O que se
observa na atualidade, no entanto, especialmente nos programas de SSO de
terceiro estágio de maturidade, é justamente o contrário. As empresas vêm
definindo regras claras na utilização da referida ferramenta e incentivando o seu
uso, inclusive transformando-a em ferramenta de uso compulsório nas situações
de riscos graves e graves e iminentes onde as medidas de controle não
oferecem as garantias necessárias.

113
QUADRO 6

MATURIDADE DOS PROGRAMAS DE SSO

1º PASSO 2º PASSO 3º PASSO 4º PASSO 5º PASSO

Identificar e Verificar o Implemen- Manter e Prevenir o


avaliar que não é tar medidas monitorar surgimento
riscos e aceitável e de controle medidas de de novos
exigências definir controle riscos
legais medidas de
controle

Do ponto de vista técnico, a evolução e amadurecimento dos programas de


Segurança e Saúde Ocupacional – SSO, nas empresas, estão condicionados ao fiel
cumprimento das etapas necessárias aos controles dos riscos existentes no
trabalho, conforme seqüência proposta no Quadro 6:

1) PRIMEIRO PASSO. Identificação e avaliação precisas dos riscos existentes e das


exigências legais pertinentes. Falhas na identificação e na avaliação dos riscos bem
como na sua interação com os dispositivos legais, comprometem a evolução dos
passos seguintes. Observar que a tarefa de identificar riscos não é a mesma que
avaliar risco. Na definição da importância dos riscos devem ser levadas em conta a
severidade, a probabilidade de ocorrência de acidentes, a quantidade de pessoas
expostas, a freqüência e duração da exposição e a capacidade de solução dos
mesmos.

2) SEGUNDO PASSO. Definição de medidas de controle, compatíveis com a


natureza e importância dos riscos, com os processos produtivos e com os
regulamentos legais que dispõem sobre a matéria. Medidas de controle
incompatíveis com a natureza do risco e com os processos produtivos, seguramente
não serão integralmente implementadas e nem tampouco mantidas.

3) TERCEIRO PASSO. Implementação das medidas de controle definidas na etapa


anterior. O sucesso desse passo depende fundamentalmente dos dois primeiros.
Lembrando que medidas de controle parcialmente implementadas, além de não
produzirem os resultados esperados, dificilmente serão mantidas. O terceiro passo,

114
na visão da maioria dos executivos das empresas, corresponde ao mais difícil de ser
implementado. É importante salientar que essa dificuldade está relacionada a vários
fatores, entre ele a dissociação das ações de SSO do sistema produtivo – os
gestores das áreas operacionais não enxergam a segurança como indispensável –
resultando disso falhas na identificação e avaliação dos riscos.

4) QUARTO PASSO. Avaliação e manutenção das medidas implementadas, ou,


quando não adequadas, retomar o processo verificando, onde e o que há de errado.
Havendo erro, este poderá ser facilmente identificado em uma das etapas do
processo: na identificação do risco, na avaliação do risco, na definição da medida de
controle e/ou na implementação da medida de controle.

5) QUINTO PASSO. Evitar o surgimento de novos riscos constitui-se no passo


decisivo na evolução e amadurecimento de qualquer sistema ou programa de SSO.
O sucesso dessa etapa, no entanto, depende fundamentalmente da eficácia dos
demais passos, especialmente do quarto passo que trata da manutenção das
medidas de controle implementadas.

A vantagem de se utilizar desse expediente está na possibilidade do reconhecimento


dos pontos fortes dos programas de Segurança e Saúde Ocupacional que devem
ser preservados e dos fracos que precisam ser reformulados ou corrigidos na gestão
dos riscos no trabalho. Falhas na identificação e avaliação dos riscos do trabalho,
por exemplo, refletem de maneira decisiva nas tomadas de decisões relacionadas
ao seu controle, comprometendo sobremaneira o desempenho dos programas de
SSO em curso na empresa. O mesmo fenômeno ocorre nos passos subseqüentes.
Ocorrendo falhas no decurso dos quatro passos mencionados, certamente haverá
comprometimento na prevenção de novos riscos.

A priorização das medidas de controle, necessariamente, deverá levar em conta a


natureza do risco (leve ou tolerado, médio ou moderado e grave, que é composto
de duas categorias: grave e grave iminente). A capacidade de enfrentamento, com
base no Quadro 7, página 113, – Maturidade dos Programas de SSO poderá ser
definida como:

115
Baixa, se é capaz de identificar e propor o controle, mas não é capaz de
implementá-lo inteiramente.

Média, se é capaz de identificar, propor o controle e implementá-lo totalmente, mas


não é capaz de mantê-lo.

Alta, quando é capaz de cumprir inteiramente todos os passos.

QUADRO 7

MATURIDADE DOS PROGRAMAS DE SSO

MATURIDADE BAIXA

MATURIDADE MÉDIA

MATURIDADE ALTA
PASSOS COMPLETADOS 1 2 3 4 5
NOTA: Os graus de maturidade definem-se em função de se ter completado,
com sucesso, os seguintes passos:

CORREÇÃO
IDENTIFICAÇÃO DOS RISCOS;
DEFINIÇÃO DO CONTROLE;
IMPLEMENTAÇÃO DO CONTROLE;
MANUTENÇÃO DO CONTROLE.
PREVEÇÃO
IMPEDIR O SURGIMENTO DE NOVOS RISCOS.

Sugerimos não deixar de considerar os aspectos acima mencionados, visto que


alguém, em um dado momento, poderá se encontrar diante de uma situação de risco
considerada grave e com uma capacidade de resolutividade baixa. Exemplo: uma
determinada medida de controle, necessária, não é implementada porque o
supervisor da área não dispõe de poder para decidir sobre sua implementação, ou
porque outras prioridades desviaram a sua atenção do foco do problema, ou ainda
por falta de conhecimento técnico específico para tal. E a pior delas é a que se
define por falta de vontade política.

116
3.3. Ferramentas de apoio à gestão de SSO

Elaborar, em consonância com a POLÍTICA DE SEGURANÇA, quando houver, um


guia de instruções de cunho administrativo, destinado a orientar e controlar as
atividades de SSO. O guia deve conter, entre outras instruções, as que se seguem:

3.1.1. Atribuições em SSO

É necessário que as pessoas, em função do cargo e/ou da ocupação, saibam,


pormenorizadamente, o que lhes competem fazer em termos de SSO, exatamente
como ocorre em relação aos itens relacionados à produção ou à outras atividades
para as quais elas foram contratadas. A descrição de atribuições terá que ser
precisa e compatível com o cargo. Um dos erros graves na gestão de SSO é não
informar, formalmente, às pessoas sobre o que lhes compete fazer. E esse o que
fazer, quando se tratar de ocupante de cargo de chefia, deverá estar muito bem
amarrado ao cargo e à fração de poder que o mesmo confere ao seu ocupante.
Constitui falha desastrosa cobrar de uma pessoa aquilo que ela não pode fazer, ora
porque não é ou não está claro ser de sua competência, ora porque não dispõe de
poder suficiente para tal, ora porque lhe faltam meios apropriados (conhecimentos e
recursos humanos e materiais necessários). Não havendo clareza na definição das
atribuições, certamente haverá falhas no endereçamento das cobranças.

A inclusão do item “segurança no trabalho” na descrição de atribuições dos


ocupantes de cargo de chefia, além de facilitar o endereçamento das cobranças,
favorece a empresa nos embates judiciais envolvendo reparação por dano moral.
Não são poucas as ações judiciais de reparação por danos morais movidas por ex-
ocupantes de cargo de chefia, demitidos por motivos relacionados à ocorrência de
acidentes de trabalho envolvendo colaboradores sob sua chefia. Os autores dessas
ações sabem perfeitamente o que estão pleiteando e as possibilidades de serem
bem sucedidos. Foram punidos por questões que não constavam formalmente de
suas atribuições.

117
3.1.2. Responsabilidades em relação à SSO

As responsabilidades são definidas pela natureza e pelo espectro de atribuições


formalmente imputadas ao indivíduo. Não se pode falar em responsabilidades sem
definição de atribuições. Como é possível uma pessoa ser responsabilizada por
aquilo que não lhe compete fazer ou que não está claramente entendido que seja de
sua atribuição fazê-lo? A empresa espera que as pessoas façam, prontamente, o
que precisa ser feito; mas, nem sempre é suficientemente clara em relação ao que
ela pretende de seus colaboradores. Da mesma forma, deixa de cobrar, com o rigor
devido, aquilo que não pode, em nenhuma hipótese, deixar de ser feito, e às vezes
cobra, com rigor despropositado, coisas de somenos importância. Sem contar que
as cobranças, em relação à SSO, dificilmente antecedem aos incidentes críticos ou
aos acidentes propriamente ditos.

Os meios mais práticos comumente utilizados na responsabilização dos


colaboradores, supervisores e trabalhadores, no tocante à Segurança e Saúde
Ocupacional, consistem na descrição detalhada de atribuições e na definição de
planos de ações com cronogramas definidos, mediante consenso. Os cronogramas
relacionam as tarefas a serem executadas e a descrição de atribuições define o que
competem às pessoas fazerem. Esse procedimento subtrai dos incautos as
justificativas pelo o não cumprimento de suas obrigações, na maioria das vezes,
improcedentes.

3.1.3. Instrumento de acompanhamento, avaliação e cobrança.

É necessário que cada colaborador saiba como é avaliado o seu desempenho em


SSO, como é feito e quais os instrumentos de aferição utilizados. Ninguém pode ser
avaliado por aquilo que não está claro que lhe compete fazer. No caso da cobrança,
em se tratando de ocupante de cargo de chefia, ela tem que ser corretamente
endereçada, isto é, estar perfeitamente amarrada às atribuições formalmente
definidas, aos planos de ação, aos cronogramas de trabalho, aos recursos
colocados à disposição das pessoas para o pleno exercício de suas atividades e
principalmente à fração de poder de decisão conferido pelo cargo.

118
As pessoas precisam saber, com absoluta clareza, o que estará em jogo quando
deixarem de cumprir as suas obrigações (atribuições). E mais, precisam saber
explicar (justificar) e ter ambientes favoráveis para serem ouvidas, quando deixarem
de cumprir os seus papéis por falta de recursos ou por outras injunções de ordem
administrativa provenientes de decisões superiores. Da mesma forma, é preciso que
seja do conhecimento de todos o que será ou não aceito como justificativa pelo não
cumprimento das obrigações previamente definidas, especialmente contidas nos
planos de ação. É importante que as pessoas conheçam a extensão do fosso que
separa, na empresa, o discurso de SSO daquilo que efetivamente é feito, na prática.
No discurso a empresa, na pessoa de seus dirigentes, diz fazer tudo o que precisa
ser feito e mais; na prática, todavia, pode não ser isso o que efetivamente ocorre. Na
maioria das vezes, a segurança é vista e tratada como um adendo à produção, não
sendo, por conseguinte, tratada no mesmo nível de importância com que são
tratados os itens relacionados ao negócio fim da empresa. A explicitação clara dos
papéis em SSO previne, entre outros distúrbios, a ocorrência de conflitos
decorrentes de cobranças mal endereçadas e de repreensões improcedentes.

3.1.4. Medidas corretivas (disciplina) utilizadas na gestão de SSO

A disciplina é indispensável, sobretudo em relação ao trabalho formal. Uma das


principais causas de acidentes de trabalho hoje, no Brasil, decorre do
descumprimento de procedimentos ou normas de trabalho. Todavia, é necessário
identificar e avaliar o que está levando as pessoas (colaboradores e gestores) ao
não cumprimento dos procedimentos de trabalho e procurar corrigir não apenas os
problemas manifestos, mas as reais causas dos mesmos. Se o problema é
relacionado ao ambiente de trabalho, a solução é melhorar o ambiente; se o
problema é da organização, a organização terá que ser revista, corrigindo o que está
errado ou inadequado. Se o problema localiza-se no indivíduo, verificar se há
solução à vista, investindo fortemente na educação para que haja mudança de
atitudes, pela via do conhecimento e da consciência crítica. Não sendo essas
medidas suficientes e assegurado que o problema está no comportamento
inconseqüente do infrator, o emprego de medidas disciplinares torna-se necessário,
melhor dizendo, imprescindível. Observando se os colaboradores estão investidos
de poder (orientados) para modificar ou descumprir, voluntariamente, procedimentos

119
de trabalho, ou se o descumprimento, de fato, figuram-se como indisciplina, na
acepção da palavra. Ao optarem pela aplicação de medidas disciplinares, os
supervisores devem levar em conta as considerações contidas no Quadro 8, com os
respectivos comentários, página 117.

QUADRO 8

NA APLICAÇÃO DE MEDIDAS CORRETIVAS DEVE-SE OBSERVAR:

ITEM SUPERVISOR COLABORADOR EFEITOS

1 CERTO ERRADO Poderá produzir o efeito esperado (correção)

2 DÚVIDA ERRADO Poderá produzir efeitos adversos (animosidade)

3 ERRADO CERTO Produzirá efeitos danosos (rancor)

Produzirá efeitos desastrosos (desmoralização e


4 ERRADO ERRADO
falência das relações)

Estando a empresa em dia com o que lhe compete fazer, por exemplo: descrição
clara e precisa de atribuições, treinamento apropriado do colaborador, condições
adequadas do trabalho, determinação do que fazer, e decidindo pela aplicação de
medidas disciplinares, os supervisores devem observar atentamente as referências
contidas na quadro 8, página 117.

ITEM 1, quando o supervisor estiver absolutamente CERTO, isto é, convicto de que


o que está mandando ou permitindo fazer é absolutamente correto (conforme padrão
ou APR aprovada) e, em contrapartida, o trabalhador estiver errado –
desobedecendo à procedimentos ou regras definidas - a medida disciplinar, uma vez
aplicada, poderá alcançar o resultado pretendido que é corrigir o infrator. Não se
esquecendo de que o trabalhador sabe perfeitamente quando a medida disciplinar é
justa, isto é, quando há razões para aplicá-la. E entende da mesma forma, que a
não aplicação de medidas disciplinares quando cabíveis, se afigura como
permissividade por parte da chefia. A mensagem que o supervisor passa ao não
aplicar a penalidade requerida é a de que a falta cometida pelo trabalhador é
considerada como normal, portanto, aceitável. Grifamos a palavra falta porque nem
sempre a mesma se afigura como tal.

120
ITEM 2, quando o supervisor não estiver inteiramente seguro de sua assertividade,
isto é, tiver dúvida em relação ao que está mandando ou permitindo fazer, mesmo
considerando que o trabalhador esteja errado, a probabilidade de a medida
disciplinar não produzir os efeitos esperados é muito alta. Ressaltando que quando
uma medida disciplinar fracassa no papel de corrigir, transforma-se em estímulo à
animosidade. Assim como o trabalhador sabe quando a punição é cabível, sabe
melhor ainda, quando ela é inoportuna, improcedente e injusta. Quando a punição é
cabível, o trabalhador pode não aceitá-la de bom grado, porém não a vê como
injusta e descabida ou como perseguição.

ITEM 3, estando o supervisor ERRADO e o trabalhador CERTO em relação ao que


fazer, a punição, uma vez aplicada, além de injusta e descabida se afigura como
amoral, perdendo totalmente o significado pedagógico. Da mesma forma que no
item dois, reforça e exacerba a animosidade. O trabalhador, na condição aventada,
sabe que a punição além de descabida, tem como objetivo desviar o foco do
problema – falhas de gestão -, e transformá-lo em “bode expiatório”. Nessa
circunstância a punição não se destina a corrigir os desvios cometidos pelo
trabalhador, vez que ele não estava errado, mas encobrir erros da chefia.

ITEM 4, no caso de estarem ERRADOS supervisor e trabalhador, a punição, uma


vez aplicada, além de se definir como simples demonstração de poder, se afigura
como desmando, como expressão de autoritarismo. Em ambas as situações, as
conseqüências poderão ser desastrosas. Na maioria das empresas onde o
diagnóstico de maturidade de SSO foi realizado, o fenômeno alcunhado pelos
trabalhadores de “justificativa”, apareceu com valores expressivos. Justificativa,
significa o supervisor encobrir ou justificar suas deficiências ou erros nos erros
cometidos pelos trabalhadores. Constatamos que a maioria dos erros cometidos
pelos trabalhadores deriva-se de omissões, ordens ou de pressões – explicitas ou
“veladas” – dos supervisores para desenvolverem os trabalhos independentemente
das condições do ambiente e dos procedimentos definidos para sua realização.

Daí se vê que as dificuldades e indecisões na aplicação de medidas disciplinares,


como instrumento de controle, não se localiza apenas nos traços da cultura da

121
empresa, mas no domínio do conhecimento e, sobretudo no endereçamento de
cobranças, com desdobramento nas relações de poder. A punição, ainda que
cabível, em todos os sentidos, deverá ser o último recurso a ser empregado na
correção de desvios de comportamento. Ela representa, para as partes envolvidas,
um sinal inequívoco de fracasso. Fracasso do punido que não foi capaz de fazer o
que deveria ser feito ou de não se expressar por meio da recusa ao trabalho, diante
da impossibilidade de realizá-lo como lhe fora ordenado. Fracasso do gestor por ter
atingido o limite do convencimento ou por ter, por conveniência, optado pela lei do
menor esforço, não importando as circunstâncias e menos ainda os impactos
produzidos pela medida. A punição pode ser comparada a uma faca de dois gumes,
tanto pode lograr benefícios, quando corretamente aplicada, quanto malefícios
quando aplicada indiscriminadamente. O pior dos malefícios, sem dúvida, é a
animosidade silenciosa, porém, corrosiva. Não se esquecendo de que o reforço da
motivação pela via do reconhecimento das atitudes corretas é sempre mais
construtivo do que a correção pela via da punição.

3.1.5. Incorporação das ações de Segurança e Saúde Ocupacional ao sistema


produtivo

Proceder, de forma gradual, à total incorporação das ações de SSO ao sistema


produtivo, transformando, por decisão administrativa e mediante descrição de
atribuições, os gestores (gerentes, líderes e supervisores) e colaboradores em
gestores, de fato, de sua própria segurança. Sendo a segurança no trabalho parte
intrínseca e essencial do sistema produtivo, não há como abordá-la e menos ainda
tratá-la em separado das demais ações do negócio fim da empresa.

A incorporação das ações de SSO às atividades produtivas e a conseqüente


transformação dos ocupantes de cargos de chefia em responsáveis por sua
condução se fará mediante decisão administrativa da direção empresa. As
experiências comprovam que essa decisão não comporta negociações entre as
partes envolvidas nos processos de gestão de SSO. O que deve ser discutido e
negociado entre as partes envolvidas são as ações concretas que terão que ser
implementadas visando à efetiva concretização da decisão. A decisão de incorporar
as ações de SSO ao sistema produtivo não deve ser delegada, ela é de
competência da direção da empresa.

122
Entendendo que essa medida, corretamente implementada, é uma das poucas,
senão a única, que poderá, em médio e longo prazo, colocar as ações de SSO no
primeiro plano de importância na empresa.

É importante salientar que essa decisão implica mudanças radicais na cultura de


SSO da empresa. Daí o cuidado que se deve ter, antes de tomá-la, de adotar
medidas de apoio não apenas no tocante a sua implementação, mas principalmente
na sustentação da decisão. Entre as medidas, destacamos:

a) Incorporação dos itens de SSO ao elenco de atribuições dos ocupantes de cargo


de chefia. (Isso será feito na descrição formal de cargos, levando-se em conta a
natureza do cargo e a fração de poder conferida pelo mesmo);

b) Transformação dos ocupantes de cargos de chefia (gerentes, supervisores,


facilitadores) em responsáveis, de fato, pela segurança dos colaboradores das
suas respectivas áreas de trabalho. Essa medida será adotada por decisão
administrativa do responsável pela empresa. Incorporar significa fazer parte. Na
maioria das empresas, sobretudo de grande porte, no discurso a incorporação
das ações de SSO ao sistema produtivo já se fez. Na prática, no entanto, isso
está muito longe de ocorrer.

c) Definição e/ou ajuste de ferramentas de gestão de SSO (procedimentos)


apropriadas para acompanhamento, avaliação e cobranças das ações
implementadas.

d) Definição e ampla divulgação de medidas disciplinares e de estabelecimento de


critérios na sua aplicação em relação às questões de SSO.

e) Treinamento em SSO (técnico e gerencial) para gestores. Os treinamentos


deverão ser realizados levando-se em conta a incorporação das ações de SSO ao
sistema produtivo.

f) Treinamento em percepção de ricos para colaboradores. Seguir os mesmos


princípios adotados nos treinamentos de gestores.

123
3.1.6. Fluxo das Ações de SSO (implementação, acompanhamento e
avaliação)

Os planos de ações de SSO, incluindo definição de cronogramas, devem ser


elaborados e definidos com base nas seguintes referências:

a) Traços fundamentais da cultura de SSO da empresa. Sistema ou Programas


de SSO que não levam em conta o estágio cultural de SSO da empresa (grau de
maturidade), por mais aprimorados que sejam certamente não alcançarão, em
médio e longo prazo, os resultados almejados.

Natureza e importância dos riscos. A definição de prioridades deve ser


estabelecida levando-se em conta a natureza e a gravidade dos riscos, partindo-se
dos mais graves (9 e 6) para os de média gravidade, (3 e 4) e destes para os de
menor gravidade (2 e 1) – quadro 4A, página 108. Ressaltando que diferenças
acentuadas de percepção ou erros na identificação e na avaliação dos riscos
comprometem sobremaneira a definição de prioridades das ações de controle. No
tocante às diferenças de percepção, as experiências vivenciadas na empresas onde
estamos trabalhando, proporcionaram as observações que se seguem:

Diferenças acentuadas de percepção entre as partes interessadas – gestores,


trabalhadores e profissionais do SESMT – interferem negativamente tanto na
definição da importância dos riscos quanto na definição, implementação e
manutenção das medidas de controle, necessárias. Os percentuais que se seguem
foram definidos com base em estudos de conflitos vivenciados principalmente entre
gestores e técnicos do SESMT, em muitas das empresas onde o diagnóstico de
aspectos culturais relacionados à SSO foi desenvolvido.

 até 10% – Normal/aceitável (não prejudica o entendimento);

 de 11% a 20% – Ruim (prejudica o entendimento);

 de 21% e 30% – Muito ruim (compromete o entendimento);

 acima de 30% – Péssimo (dificilmente haverá entendimento).

124
b) Capacidade de resolutividade. A capacidade de resolutividade é avaliada a
partir da descrição formal das atribuições, dos níveis de responsabilidades, da
fração de poder conferida pelo cargo que as lideranças ocupam, dos recursos
colocados à disposição do proponente das ações, bem como do seu nível de
conhecimento (gerencial e técnico) tanto dos gestores quanto dos trabalhadores
acerca do assunto. Ressaltando que é da definição formal das atribuições que
derivam as demais exigências mencionadas. Todos os colaboradores da
empresa, indistintamente, devem saber, formalmente, o que lhes competem
fazer em termos de Segurança e Saúde Ocupacional, e, da mesma forma, o que
estará em jogo quando deixarem de cumprir com as suas obrigações. Segurança
no trabalho é uma questão de decisão. E decisão decorre do exercício do poder.

c) Acompanhamento, avaliação de resultados e cobranças. Na definição dos


cronogramas de ações é imprescindível que se leve em conta, entre outras
medidas, as que se seguem:

 Estabelecimento de prazos para execução das ações propostas . A


definição de prazos deve ser estabelecida a partir da natureza e da importância
dos riscos a serem controlados e da efetiva capacidade de execução das
medidas propostas. Esses dois itens devem ser rigorosamente discutidos e
negociados entre as partes interessadas – o proponente das medidas de
controle e sua chefia imediata. Não incluir nos cronogramas o que de antemão
já se sabe que não será realizado dentro dos prazos determinados.

 Definição de margens de tolerância para o descumprimento de prazos


definidos nos cronogramas de ação. As margens de tolerância, uma vez
definidas, (muitas empresa adotam esse expediente) não devem exceder a
50% dos prazos previstos e serão definidas levando-se em conta a natureza e
a importância dos riscos a serem controlados. É recomendável que não haja
tolerância para descumprimento de prazos na execução de ações envolvendo
riscos graves, como (6 e 9), previstos no quadro 4A, página 108.

 Justificativa para o não comprimento dos prazos previstos nos


cronogramas de ação. Os motivos invocados ou alegados para o não
comprimento dos prazos previstos nos cronogramas de ação devem ser
125
previamente acertados entre as partes interessadas e rigorosamente
observados. Todos devem saber o que será aceito ou não como justificativa
para o não cumprimento dos cronogramas previamente definidos. De parte do
proponente das ações, o motivo considerado como procedente deve limitar-se
à doença que o incapacite ao trabalho. De parte da empresa, não deveria
haver nenhum motivo que justificasse o atraso no cumprimento dos
cronogramas de SSO, previamente negociados. Todavia, se por alguma razão
isso vier ocorrer, os motivos alegados deverão ser de conhecimento de todos
os envolvidos com o assunto. Assim como os supervisores das áreas devem
ser responsabilizados por suas omissões, da mesma forma, não devem
responder por situações que fogem a sua governabilidade. Lembrando que
atraso no cumprimento de cronogramas de SSO funciona como mecanismo de
desgaste das intenções da empresa nesse terreno, daí não ser tolerável.

 Definição e adoção de procedimentos administrativos (penalidades) em


caso de descumprimento de cronogramas de SSO, negociados e
acordados. Uma medida que vêm sendo utilizada, com sucesso, em caso de
descumprimento de cronogramas de ações de SSO, sem justificativas
aceitáveis é retirar do faltoso a responsabilidade pela solução do item não
cumprido no prazo especificado e transferi-lo, de pronto, para sua chefia
imediata25, que terá, nos prazos previstos nos regulamentos de SSO da
empresa, adotado as medidas necessárias. Não dando solução ao problema,
no prazo previsto, o mesmo procedimento deverá ser adotado em relação à
chefia faltosa. Obedecido aos critérios anteriormente acordados, os problemas
não resolvidos vão subindo na hierarquia da empresa até chegar à diretoria ou
comitê gestor de SSO, que terá a incumbência de definir sua solução. É
importante lembrar que, em se tratando de SSO, o papel principal da direção
da empresa é definir e aplicar regras na condução dos programas de SSO,
alocar recursos, apoiar, acompanhar o comprimento dos cronogramas de ação
e tomar decisões firmes em relação aos problemas pendentes e não cobertos
pelas justificativas acordadas. Essa é a forma prática da diretoria da empresa
demonstrar sua atenção à segurança no trabalho e ao mesmo tempo fomentar
a inclusão de suas ações ao sistema produtivo.

126
Lembrete importante: um dos piores erros cometidos na condução dos
programas de SSO é a tolerância deliberada em relação à permanência dos
riscos no trabalho. Enfatizando que a tolerância, nos diversos níveis hierárquicos
da empresa, em relação ao descumprimento de cronogramas de SSO, além do
desgaste e da desmoralização que acarretarão à política de SSO da empresa, cria
ambiente favorável à geração indiscriminada de novas situações de risco. Se falta
rigor na correção dos riscos instalados, a mesma postura certamente se repetirá na
prevenção de novos riscos. Essa é uma questão que não deve ser deixada de lado
por ser ela definidora da performance dos programas de SSO na empresa.
O controle do fluxo das ações previstas nos cronogramas de SSO poderá ser feito
pelos profissionais do SESMT, que manterão a diretoria da empresa, por meio de
relatórios sucintos, constantemente informada do andamento das ações
programadas.

3.1.7. Investigação e análise de acidentes

Todos os acidentes e incidentes críticos devem ser rigorosamente registrados,


investigados e analisados pelo gestor da área, com a participação dos técnicos do
SESMT, e em caso de acidente grave, com a participação da direção da empresa. O
foco da investigação deverá ser desviado do acidentado e do como o acidente
ocorreu para centrar-se no por quê da existência dos fatores de risco que o
motivaram. Todo o esforço da investigação deverá ser voltado para o
desvendamento dos determinantes causais dos acidentes, verificando-se a natureza
dos riscos e as origens dos mesmos – quem os criou e/ou quem os mantém.

É importante que na análise seja levada em conta a definição situacional dos riscos.
a) Primeira situação: os riscos eram conhecidos, isto é, identificados, analisados e
com medidas de controle implementadas?
b) Segunda situação: os ricos eram conhecidos, mas não suficientemente
controlados?
c) Terceira situação: os riscos não eram conhecidos?

Esse procedimento facilita o direcionamento e aprofundamento da análise, bem


como a definição das medidas de controle, especialmente relacionada à educação.

127
A existência do risco, nesse modelo de análise, é absolutamente secundária,
importante é o deslinde de suas origens. O mesmo procedimento deverá ser
adotado em relação ao comportamento inseguro. Nesse modelo de análise, o
comportamento inseguro deverá ser entendido e tratado como conseqüência e não
como causa dos eventos.

Uma análise de acidente orientada para a prevenção e não para esclarecer como o
acidente ocorreu e principalmente para nomear culpados é aquela que privilegia as
origens dos problemas. É aquela que procura desvendar o porquê dos problemas e
não apenas como os mesmos se manifestam. O mesmo critério utilizado na análise
deverá ser adotado em relação às medidas de controle. Não se devem adotar
medidas para corrigir apenas os erros explícitos (as condições de risco que geraram
o acidente), mas, principalmente, o que lhes deu causa. A correção dos fatores que
deram e/ou continuam dando origem aos problemas, em se tratando de
comportamento, notadamente de ocupante de cargo de chefia, pode não ser fácil,
por não ser simples, mas é absolutamente factível, desde que haja vontade política
de quem detém poder para tomar decisões. Mudar comportamento, especialmente
de chefia, significa mexer na cultura dominante da empresa. E isso somente se fará
com conhecimento de causa e de cima para baixo. Quem muda a cultura de uma
empresa é o seu dono ou quem dispõe de poder para tal. Lembrando que toda
mudança implica em transformação que se fará mediante ruptura com as práticas
que se pretende suprimir. Em segurança do trabalho não há meio termo, muda ou
não muda o que precisa ser mudado. Isso explica porque algumas empresas,
notadamente de grande porte, embora dispondo de uma estrutura colossal de
gestão para cuidar da segurança e saúde no trabalho não conseguem, em médio e
longo prazo, elevar a segurança e saúde ocupacional ao terceiro estágio de
maturidade, e com isso, alcançar os objetivos pretendidos.

128
3.4. Treinamento em SSO

Promover treinamento em SSO (técnico e gerencial) para ocupantes de cargo


de chefia e colaboradores, voltado para a identificação, avaliação e controle
dos riscos no trabalho. O treinamento deverá ser feito tomando-se como base
todo o conjunto dos fatores que compõem a organização da produção –
métodos e processo de trabalho, elementos da organização do trabalho e
condições do ambiente de trabalho. O treinamento necessariamente deverá
ser orientado às necessidades previamente identificadas. Enfatizando que
falhas na identificação e avaliação dos riscos comprometem os demais passos
destinados a sua correção. O treinamento deverá abranger, também, a
aprendizagem voltada para a conservação e preservação das medidas de
controle implementadas, bem como para a prevenção de novos riscos.

Lembrete importante: É conveniente que a abordagem dos riscos seja feita a


partir de suas origens e não de suas manifestações ou conseqüências.

O treinamento em SSO, de forma genérica, sem abordar em profundidade os riscos


específicos do trabalho, a partir de suas origens, termina gerando uma falsa idéia de
que as pessoas passaram a conhecer o assunto, quando na realidade isso pode
não ser verdade, aumentando, com isso, a probabilidade de ocorrência de erros na
realização das tarefas e conseqüentemente de acidentes. Em segurança do
trabalho, os processos de aprendizagem não podem ter caráter de “verniz”. O
treinamento deve abordar, sem rodeios, os riscos a que as pessoas estejam
expostas e devem contemplar: percepção dos riscos (identificação e avaliação) e
medidas de controle sejam elas coletivas e/ou individuais. Para os gestores, o
treinamento em SSO deve fazer, necessariamente, parte do PDI – Programa de
Desenvolvimento Individual. É importante que a cada treinamento seja realizada
avaliação de aprendizagem.

129
3.5. Prevenção de novos riscos

Estruturar e implementar campanhas voltadas para:

a) Conservação e Preservação das medidas de controle implementadas:


Acompanhar, por um período de pelo menos dois anos, o estado de conservação
das medidas de controle implementadas. Essa avaliação, feita em forma de
auditagem, deverá ser realizada, pelo menos no primeiro ano, de 3 em 3 meses.
Essa medida visa avaliar a eficácia das medidas de controle e, ao mesmo tempo,
a sua vida útil. A ausência desse procedimento poderá levar a empresa a corrigir,
por diversas vezes, a mesma situação de risco e ainda não prevenir o surgimento
de outras com características semelhantes. Convém lembrar que esse é um dos
grandes gargalos da segurança do trabalho na maioria das empresas brasileiras.
Faz-se, e muito, mas não se desenvolve competência para conservar e preservar
o que foi feito. Nos diagnósticos de maturidade de SSO que estamos realizando
em várias empresas, nos itens referentes a causas de acidentes, a ocorrência de
acidentes em condições de riscos conhecidas e corrigidas aparece com
percentuais elevados de respostas tanto na representação dos gestores quanto
dos colaboradores. O mesmo critério deverá ser utilizado quando se tratar de
comportamentos inadequados.

b) Prevenção de novos riscos: para ambas as situações – manter as medidas


de controle e prevenir o surgimento de novos riscos – definir metas claras,
estratégias de ação bem definidas, recursos, sistema de acompanhamento,
avaliação e cobranças rígidas. Da mesma forma que é imprescindível a
definição de atribuições na correção dos riscos do trabalho, torna-se
necessário fazer o mesmo em relação à geração de novos riscos. Os
supervisores deverão saber que tipo de riscos (vide 4A, página 108), eles
poderão gerar sem a autorização de suas respectivas chefias bem como as
providências imediatas que deverão tomar em relação aos riscos novos.

130
Os grupos de trabalho – da operação e/ou da manutenção – deverão ser
responsabilizados pela geração de novos riscos no trabalho, sem o conhecimento
e o consentimento de suas respectivas chefias, que deverão, por sua vez, assumir
integralmente a responsabilidade pelas possíveis conseqüências advindas dos
mesmos.

A diretoria da empresa deverá apoiar as gerências das áreas na definição e


aplicação de regras básicas voltadas para a prevenção, as quais envolvam critérios
rígidos para a geração de novos riscos no trabalho. Da mesma forma, sinalizar, para
todas as áreas que lidam com riscos potencialmente capazes de gerar danos
pessoais e/ou materiais, que todas as vezes que uma situação de risco, inédita ou
conhecida, por alguma razão tiver de ser gerada (às vezes isso poderá ocorrer por
necessidade imperiosa do próprio trabalho), feita a APR, a respectiva medida de
controle deverá ser, de imediato, definida e, se possível, implementada. Sempre que
uma nova situação de risco não puder ser controlada no momento em que for
gerada, a mesma deverá ser comunicada imediatamente aos técnicos do SESMT e
à gerência da unidade ou da área que encaminharão e/ou tomarão as medidas
cabíveis. Todos devem estar cientes de que a não observância desse procedimento
implica falta grave, sujeita às sanções previstas nos regulamentos do sistema de
gestão de SSO. Os aludidos regulamentos deverão ser de pleno conhecimento de
todos que trabalham na empresa.

Se a direção da empresa considera inaceitável a existência de situações de risco,


sem os controles devidos, evidentemente que essa intolerância deverá ser
estendida à geração indiscriminada de novo riscos.

A ausência desse procedimento termina transformando os programas de SSO da


empresa, por mais eficientes que sejam, numa espécie de “saco sem fundo”, isto
é, numa atividade extremamente onerosa, e pior, desacreditada.

Não há programa ou sistema de SSO que consiga reduzir e manter, em médio e


longo prazo, a ocorrência de acidentes, em patamares aceitáveis, apenas corrigindo
131
os riscos já instalados. É preciso avançar em direção ao nascedouro dos problemas,
de modo a reduzir, drasticamente, os níveis de tolerância em relação à geração de
novos riscos. Observar que o principal gargalo dos programas de SSO da maioria
das empresas se situa nesse terreno. Primeiro, no baixo desempenho na
manutenção das medidas de controle implementadas – principalmente quando se
trata de correção de atitudes incorretas -, segundo, pior ainda, na ausência de
critérios e de ferramentas de gestão voltadas à prevenção de novas situações de
riscos. É importante reconhecer que essa tarefa, decisiva no sucesso dos programas
de SSO, necessariamente deverá estar a cargo das chefias, sobretudo das áreas
operacionais.

Fazer segurança, corrigindo riscos, onde há abundância de recursos para isso,


mesmo não produzindo os resultados esperados, não é tarefa difícil. O que não é
fácil é conceber e gerenciar programas de SSO que produzam, de fato, em médio e
longo prazo, os resultados que as empresas, no momento, almejam.

132
04. SUGESTÕES DE MELHORIAS DE SSO LEVANTADAS EM
SEMINÁRIOS INTERNOS PROMOVIDOS PELAS EMPRESAS ONDE
O DIAGNÓSTICO DE MATURIDADE DE SSO FOI REALIZADO

NOTA: os itens que se seguem foram extraídos de debates e propostas de planos


de ações de SSO formulados por gerentes de oito empresas dos ramos de
mineração, siderurgia, metalurgia, papel e celulose, química e logística. Os planos
de SSO foram elaborados com base nos dados dos diagnósticos de maturidade de
SSO e apresentados em seminários internos promovidos pela empresas envolvidas
nos diagnósticos.

Revisão de procedimentos ou normas de trabalho e de segurança e saúde


ocupacional que não estejam sendo integralmente cumpridos pelos
colaboradores

Essa atividade será realizada com base em levantamento minucioso de todos os


procedimentos formais de trabalho, existentes na empresa, que apresentam
dificuldades, tanto de compreensão quanto de realização, por parte dos
trabalhadores.
Identificar e corrigir os principais motivos que estão interferindo na observância
(cumprimento) dos procedimentos de trabalho e/ou de SSO implantados. A
participação dos trabalhadores, tanto na geração de informações quanto na
reformulação dos procedimentos é absolutamente necessária.

26
Definir e difundir regras e/ou procedimentos que não permitem flexibilização

Essa atividade poderá ser desenvolvida em duas etapas distintas:

 Catalogar as atividades ou tarefas cuja realização, em função dos riscos, requer


regras específicas;

 Discutir, elaborar e difundir os procedimentos específicos de trabalho para as


atividades catalogadas como “Regras de Ouro ou “Regras invioláveis”. Por se
tratar de regras fechadas, isto é, que não permitem flexibilidade no seu
cumprimento, é necessário que o trabalhador saiba, com a clareza necessária,
133
como se proceder diante da impossibilidade de cumpri-las. O sucesso na
implementação de procedimentos com essa característica está na definição e
implementação de outra ferramenta que é a RT – Recusa de Tarefa (vide quadro
5, página 110).

Definir e difundir critérios para utilização da RT – Recusa de Tarefa

A RT – Recusa de Tarefa é uma ferramenta de gestão de SSO de extraordinário


valor e deverá ser utilizada nas atividades denominadas “especiais”, com
procedimentos definidos como “Regra de Ouro” ou “Regras Invioláveis” e em
outras situações de risco que os trabalhadores julgarem o seu emprego necessário.
O critério de aplicação da RT, para a segunda hipótese, deverá prever duas
situações distintas, a saber:

a) VOLUNTÁRIA. Para as situações de riscos consideradas como leve e/ou


moderada, sem os controles devidos, o trabalhador poderá optar por não fazer
uso da RT – Recusa de Tarefa e seguir as instruções estabelecidas pela
empresa para situações dessa natureza. A não opção pela RT implica em
assumir, conscientemente, o risco. O trabalhador deverá saber em que
circunstâncias ele poderá assumir o risco e o que estará em jogo nessa decisão.
Tendo ele consciência (certeza) de que poderá realizar a tarefa com a segurança
exigida – deve ser franqueada a ele a prerrogativa de fazê-la. No entanto, ele
deverá estar ciente de que liberdade tem preço e que este será bancado por
quem dela uso fizer ora para realizar uma determinada atividade em desacordo
com o procedimento definido, ora para recusá-la. Na mesma situação incorre o
gestor que se serve do poder, conferido pelo cargo, para constranger
trabalhadores a se comportarem de maneira indevida. A vantagem da adoção
dessa medida é responsabilizar as pessoas pelos seus atos e evitar o
engessamento do sistema produtivo. O principal motivo da reduzida ou ausência
de utilização da RT – Recusa de Tarefa, levantado pelo diagnóstico de aspectos
comportamentais em SSO refere-se a erros cometidos na utilização da referida
ferramenta. Em muitas empresas essa ferramenta foi utilizada de maneira
indiscriminada, isto é, sem uma razão concreta que justificasse o seu emprego. A
falta de critério na utilização da RT, entre outros distúrbios, pode gerar
134
engessamento do sistema produtivo, motivado por excesso de paradas, e com
isso, o desgaste da ferramenta.

b) COMPULSÓRIA. Para as atividades definidas e catalogadas como especiais,


classificadas como de risco grave e grave e iminente, a utilização da RT, quando
necessária, deixa de ser voluntária para ser compulsória. Em ambas as situações
o trabalhador será apoiado pela sua chefia imediata na tomada da decisão e no
encaminhamento e/ou na solução do problema que originou a recusa. A
utilização da RT não deverá se limitar apenas à prevenção de acidentes que
possam gerar danos pessoais graves, mas em quaisquer outras situações que
possam comprometer o patrimônio da empresa.

Revisão de responsabilidade pela segurança e saúde ocupacional

Incluir na descrição de cargos, (considerar o espectro de poder que o cargo confere


ao seu ocupante), o item SSO. Todas as pessoas que trabalham na empresa
deverão saber o que lhes competem, nominalmente, fazer em termos de SSO e o
que estará em jogo quando, sem justificativa aceitável, não o fizerem. Nenhum
colaborador poderá deixar de cumprir as determinações da empresa expressamente
explicitadas. Lembrando que compete à chefia imediata dos trabalhadores a tarefa
de informá-los sobre as determinações da empresa e principalmente sobre os riscos
a que estão expostos no trabalho.

Rever procedimentos de segurança e saúde ocupacional para empresas


prestadoras de serviços

Incluir e/ou rever itens SSO nos contratos de prestação de serviço. As empresas
contratadas deverão seguir os mesmos critérios adotados pela contratante. Os
contratos deverão prever penalidades (tipos e critérios para aplicação) por
descumprimento de normas ou regras de SSO definidas pela contratante. Rever
critérios para aprovação, acompanhamento e avaliação dos programas de SSO das
empresas prestadoras de serviços, nomeando responsáveis por essa tarefa.
Lembrando que o principal responsável pela segurança dos trabalhadores
terceirizados é o tomador do serviço em questão. Lembrando que a empresa

135
contratante responde, solidariamente, pelos acidentes sofridos por trabalhadores
terceirizados. Uma das empresas participantes dos seminários relatou ter optado
pela contratação de serviço especializado em segurança do trabalho exclusivamente
para acompanhar as ações de SSO das empresas prestadoras de serviços. Esse
serviço faz o que as chefias das áreas deveriam fazer.

Definir e implementar normas e/ou procedimentos de segurança e saúde


ocupacional em atividades de manutenção envolvendo grandes paradas

Nas empresas onde as atividades de manutenção envolvem grandes paradas,


nomear responsáveis (pessoas com competência técnica e gerencial, comprovadas)
e com poder decisório para o gerenciamento das ações que envolvem as paradas.
Essas pessoas serão responsáveis por todas as decisões envolvendo as atividades
fins das paradas, incluindo Segurança e Saúde Ocupacional e Meio Ambiente. As
decisões dessas pessoas não poderão ser questionadas e/ou contestadas em
público nem mesmo pela direção da empresa. Essa media evita desgastes e
fragmentação da autoridade nos momentos em que ela mais se faz necessária.
Eventuais desentendimentos deverão ser tratados e resolvidos em ambientes
reservados. Ressaltando que as regras e procedimentos de segurança para esse
segmento de trabalho deverão ser bem definidos, claros e de conhecimento de
todos: empresas (contratante e contratadas), gestores e trabalhadores. Em trabalhos
envolvendo grandes paradas não pode haver, em hipótese alguma, flexibilidade em
relação ao cumprimento dos procedimentos de trabalho e de segurança. (vide
quadros 9 e 11, páginas 139 e 141, respectivamente).

Melhorar o nível de conhecimento técnico/gerencial em segurança e saúde


ocupacional especialmente de gestores

O conhecimento técnico e gerencial de Segurança e Saúde Ocupacional é


imprescindível, notadamente para os ocupantes de cargos de chefia. Nos sistemas
de SSO integrados aos processos produtivos – terceiro estágio de maturidade – as
tarefas de identificar, avaliar e corrigir riscos no trabalho estarão a cargos das
chefias das áreas operacionais. Os técnicos do SESMT participam como assistentes
técnicos especialmente nas áreas de higiene ocupacional e ergonomia. Os
136
trabalhadores, da mesma forma, deverão receber treinamentos específicos para
percepção e controle dos riscos aos quais estão expostos.

Estimular o questionamento e uso adequado das ferramentas de gestão de


SSO

Os supervisores e/ou facilitadores precisam possibilitar e incentivar o


questionamento das condições de trabalho por parte dos trabalhadores. Sem
questionamento não haverá inclusão e sem inclusão dificilmente haverá crescimento
profissional e humano nem tampouco melhoria contínua das condições de trabalho.
Questionamentos não devem ser interpretados como desobediência e/ou afronta à
autoridade. Os questionamentos referem-se às condições físicas do ambiente de
trabalho e à qualidade e validade das normas e/ou procedimentos de trabalho. Num
sistema de trabalho onde as atividades são padronizadas o verdadeiro chefe do
trabalhador são as regras (padrões) de trabalho. O supervisor cumpre o seu papel
que é de facilitar o cumprimento dos padrões de trabalho. O questionamento, nessas
circunstâncias é o primeiro passo para revisão e aprimoramento das regras e/ou
padrões estabelecidos. O supervisor precisa entender que o trabalhador ao
questionar as condições e/ou procedimentos de trabalho necessariamente não está
questionando a sua autoridade, mas buscando melhoria do sistema.

Horas extras

Definir critérios rígidos para realização de horas extras. Horas extras não devem ser
utilizadas como economia de mão de obra e nem tampouco como aumento de
salário dos trabalhadores. Excesso de horas extras constitui-se numa das principais
causas de fadiga que culmina no cometimento de erros no trabalho e
consequentemente de acidentes. “Dobra”, em nenhuma hipótese deverá ser
permitida. Quando se tratar de trabalhos de manutenção envolvendo grandes
paradas, torna-se necessário redobrar a vigilância em relação às contratadas no
tocante a realização de horas extras.

137
Supervisão eventual

Definir quem responderá pelo supervisor e/ou facilitador nas suas ausências normais
e eventuais. Os trabalhadores precisam saber, com clareza, a quem recorrer na
ausência do supervisor titular. Tomar cuidado para não resgatar a figura do
“cachimbo” e prevenir eventuais reclamações trabalhistas.

Capacitação – PDI – Plana de Desenvolvimento Individual

Compete aos gestores das áreas bem como aos supervisores definir o que precisam
aprender para melhorar o seu desempenho com vista à obtenção de melhores
resultados em SSO. Fazer o mesmo em relação aos colaboradores. É importante
que as solicitações de treinamento sejam devidamente justificadas, de preferência
incluídas nos PDI.

Crescimento do grupo

O supervisor deverá buscar meios para promover o crescimento (profissional e


humano) do seu grupo de trabalho. O crescimento individual é importante, mas é
pouco provável que ele se consolide sem o crescimento do grupo.

Agenda de trabalho

Não há dúvida de que a reestruturação produtiva ocasionou sobrecarga de trabalho


para todos os envolvidos com os sistemas produtivos, especialmente para os
ocupantes de cargos de chefia. Alegação de falta de tempo para cuidar dos
assuntos pertinentes à SSO, no entanto, relaciona-se muito mais a ausência de
definição formal de atribuições e responsabilidades dos ocupantes de cargos de
chefia para cuidarem do assunto em tela do a qualquer outra variável. A solução do
problema, portanto, está na aceitação das responsabilidades em relação ao assunto
e na definição de prioridades na sua condução. Essa postura é decisiva na abertura
de espaços na agenda dos ocupantes de cargos de chefia, principalmente dos
supervisores, para tratar, de maneira adequada, não apenas os assuntos pertinentes
a SSO, mas outros que poderão estar sendo postergados pela mesma razão. É

138
importante lembrar que “sufoco” nem sempre é sinônimo e nem garantia de bom
desempenho.

Postura em relação ao cumprimento dos padrões de trabalho

Gestores e supervisores das áreas deverão assumir posturas rígidas em relação ao


cumprimento das Normas e/ou Procedimento de Trabalho e de SSO. A
permissividade em relação ao descumprimento de Normas é vista e entendida pelos
colaboradores como um sinal verde na aceitação de erros cometidos no trabalho. O
descumprimento de normas ou procedimentos de trabalho deriva-se do nível da
permissividade facultada pela chefia imediata do faltoso. Lembrando que o
trabalhador não dispõe de poder para decidir pelo não cumprimento de normas. Se
ele assim o procede é porque o ambiente (postura do supervisor) é permissivo.

Controle de pendências em SSO por parte dos supervisores

Os supervisores precisam definir prioridades no atendimento às pendências de


qualquer natureza, especialmente de SSO. As pendências que, por alguma razão,
não receberem o tratamento devido, isto é, não resolvidas, devem ser transformadas
em objeto de discussão junto aos interessados. Os trabalhadores precisam saber
por que os seus pleitos não foram atendidos. Essa é uma tarefa que o supervisor
não deve e nem pode delegar aos profissionais do SESMT. Pendências sem
justificativas corroem a credibilidade de qualquer sistema de SSO.

Incentivos

Os gestores e supervisores precisam incentivar os colaboradores na promoção da


prevenção de acidentes, reconhecendo (elogiar) publicamente os que cumprem com
os seus deveres e da mesma forma, identificar e apontar os que não os cumprem.
Os colaboradores precisam saber que os seus supervisores se preocupam com a
sua segurança, e que em função disso, são rotineiramente observados. Os que
aderem às políticas de SSO da empresa precisam ser reconhecidos e incentivados,
os recalcitrantes, precisam saber, da mesma forma, que são reconhecidos e

139
considerados como tal. E mais do que isso, monitorados. Constitui-se desserviço à
Segurança no Trabalho o tratamento idêntico à situações diferentes.

Oportunidades

Os gestores e supervisores precisam fazer chegar aos colaboradores a convicção


de que todos têm as mesmas oportunidades para promoção do seu próprio
crescimento – profissional e humano –, mas que o desejo de crescer pertence a
cada um, individualmente. A empresa oferece os meios, os colaboradores entram
com a vontade de participar e de crescer.

Penalidades

Se a empresa utiliza-se desse expediente como ferramenta de controle, torna-se


absolutamente necessário definir e difundir critérios de aplicação das sanções em
caso principalmente de desobediência às Normas e/ou Procedimentos de Trabalho e
de Segurança e Saúde Ocupacional. A empresa cobra e às vezes pune, mas não é
suficientemente clara em relação aos deveres de seus colaboradores. Os
colaboradores precisam saber que a empresa oferece todos os meios necessários
para o cumprimento dos procedimentos e/ou regras de trabalho e de segurança,
incluindo a RT – Recusa de Tarefa. Mas, que da mesma forma, é rigorosa na
aplicação das normas legais na correção dos infratores, sobretudo em relação às
Regras Inflexíveis – aquelas que não podem, em nenhuma hipótese, ser violadas.
A violação de uma Regra de Ouro, sobretudo onde é facultado ao trabalhar o direito
à recusa de tarefa, deverá ser entendida e tratada como falta grave, principalmente
se houver partição de ocupantes de cargos de chefia na decisão (omissão) de violá-
la. A empresa deverá definir e difundir o tipo de penalidade aplicável em relação à
falta grave. (vide quadros: 9, 10 e 11, páginas 139 e 141, respectivamente).

Bônus e/ou prêmio por desempenho em SSO

Não deveria haver bonificação para as atividades de segurança no trabalho, todavia


se essa prática, de fato, produz resultados mensuráveis, não deve ser descartada.
No entanto, uma vez adotada torna-se imprescindível à definição e adoção de

140
critérios de avaliação de desempenho em SSO, conhecidos e aceitos. Os itens de
avaliação de desempenho (indicadores de resultados) devem centrar
prioritariamente nas atividades de prevenção (correção dos riscos instalados e
restrições no surgimento de novos riscos) e não nos indicadores finais de acidentes,
como Coeficientes de Freqüência e de Gravidade, que estão vinculados à ocorrência
e gravidade dos acidentes. Os colaboradores precisam ser reconhecidos pelas boas
práticas de segurança, daí a necessidade de definir itens de sucesso que eles
deverão perseguir. E da mesma forma, observados quando deixarem de cumprir o
que lhes é determinado. A avaliação de desempenho será feita pelo supervisor de
cada trabalhador obedecendo a critérios definidos e largamente difundidos.
Gerentes, supervisores e colaboradores que não alcançarem à pontuação de
premiação (itens de avaliação individual) serão penalizados individualmente. O
grupo não deverá ser punido por comportamento inadequado de um dos seus
membros. 27

É opinião unânime de todos os ocupantes de cargos de chefia que participaram dos


seminários de que em se tratando de negligência e/ou imprudência deliberadas em
relação à SSO, acumulam-se pontos que resultarão na perda progressiva dos
prêmios ou bônus. Esgotados estes, com base nos mesmos critérios, serão
contabilizados pontos, que atingido patamares previamente definidos e de
conhecimento de todos, resultarão na perda do emprego. Os quadros 9, 10, 11
sugerem alguns critérios que poderão ser utilizados no controle, entre outras
ferramentas, das “Regras invioláveis” ou de quaisquer outros procedimentos que
exigem recusa de tarefa quando a segurança requerida não estiver disponibilizada
para o trabalhador.

141
QUADRO 9

DISCIPLINA PROGRESSIVA APLICADA EM SSO

Critérios para aplicação de medidas corretivas por violação de


NdR–
procedimentos ou regras de SSO
Natureza do
Risco Ato faltoso Trabalhadores e ocupantes de cargos de chefia

1e2 Primeira vez


Advertência VERBAL e reforço de treinamento para o
trabalhador. Reforço de treinamento para o supervisor.
LEVE
Vide quadro 4A, Advertência ESCRITA e reforço de treinamento para o
Reincidência
Página 108 trabalhador e para o seu supervisor.

3e4 Primeira vez


Advertência ESCRITA e reforço de treinamento para o
trabalhador e advertência verbal ao supervisor.
MODERADO
Suspensão de 1 dia + perda parcial do bônus de segurança
Vide quadro 4A, Reincidência para o faltoso. Advertência escrita ao supervisor seguida de
Página 108 perda parcial do bônus de SSO.

6e9 Suspensão de 1 dia + perda total do bônus de segurança do


Primeira vez faltoso. Suspensão do Supervisor por 1 dia e perda total do
GRAVE bônus de SSO.

Vide quadro 4A, Reincidência Demissão do faltoso e de sua respectiva chefia imediata.
Página 108

Nota: Os mesmos critérios deverão ser adotados em relação às contratadas, salvo


concessão ou retirada de bônus. É importante que todas as exigências de SSO
façam parte dos contratos firmados entre a empresa contratante e as empresas
contratadas. E que o tomador dos serviços dos terceiros seja incumbido e
responsabilizado pela gestão da segurança.

QUADRO 10

Da bonificação à perda do emprego


Pontuação que leva à confirmação do bônus 0 20 40 60 80 100

0 20 40 60 80 100 Pontuação que poderá levar à perda do emprego

Define-se uma pontuação para concessão e conservação do bônus e no sentido


inverso, a mesma pontuação para perda do emprego. Se o individuo deixar de
cumprir o seu dever em decorrência disso perde os pontos de manutenção do
142
bônus. Os pontos que serão perdidos, na seqüência, somam-se para possível perda
do emprego. Essa é a opinião unânime dos grupos que participaram dos seminários
internos de SSO. Outro ponto importante levantado pelos gestores que participaram
dos seminários, com raras exceções, converge para o princípio de que a gestão
eficaz da Segurança e Saúde Ocupacional resulta da competência dos ocupantes de
cargos de chefia em identificar, avaliar e controlar os riscos de suas áreas de
atuação, utilizando-se dos mesmos mecanismos adotados nos controles dos
sistemas produtivos. E que isso só se fará por meio da aplicação de conhecimentos
específicos e habilidades requeridas pelo tema, orientadas por atitudes corretas
calcadas em disciplina rígida. Não se esquecendo de que a aplicação de disciplina
requer conhecimento pleno daquilo que se pretende controlar.

No quadro 11, página 141, são sugeridos informes que devem ser considerados na
avaliação de desempenho onde se avalia os itens considerados como positivos que
poderão se transformar em objeto de reconhecimento e consequentemente de
premiação. Da mesma forma, itens negativos que poderão se transformar em objeto
de sanções. As avaliações deverão ser feitas mediante regras claras e de
conhecimento de todos. É importante que seja facultado ao colaborador, sujeito a
alguma penalidade, direito de defesa. Esse exercício termina conferindo a
segurança no trabalho certo grau de importância e funciona como instrumento
pedagógico.

As penalidades não deverão ser aplicadas pelas chefias e nem pelo diretor ou
gerente geral, mas pelo comitê gestor da segurança no trabalho. Essa medida, além
de dividir responsabilidades, evita responsabilizar uma única pessoa por decisões
que sabidamente inspiram antipatia.

143
QUADRO 11

MATRIZ DE RESPONSABILIDADES – RECONHECIMENTO E SANÇÕES

OBJETIVO QUEM FARÁ


O QUE CRITÉRIO
DA A RECONHECIMENTO SANÇÕES
AVALIAR UTILIZADOS
AVALIAÇÃO AVALIAÇÃO

Especificar o que foi


avaliado e reconhecido
(se metas, Especificar
cumprimento de as falhas
cronogramas de SSO, levantadas,
Definir, Definir percentual de revisão critérios
pormenori- quem fará a e cumprimento de utilizados na
zadamente, Definir e avaliação normas, tempo sem avaliação,
o que se especificar ocorrência de pontuação e
pretende os critérios incidentes, quebra sanções a
avaliar. Definir e que serão Definir precoce de serem
especificar utilizados quem terá a equipamentos, e/ou aplicadas.
o que se na incumbên- acidentes, etc.).
Enumerar o pretende avaliação cia de (Exemplo de
que se alcançar referendar a Definir o tipo de sanções:
pretende com a avaliação. premiação que será Advertência
avaliar. avaliação. Definir (Diretor, conferida (Exemplo: verbal e/ou
(posturas, como será Gerência de medalhas, troféus, escrita,
comporta- feita a área ou o churrasco, faixas suspensão,
mentos, avaliação. Comitê de alusivas, brindes, transferência,
atitudes, gestor de festas de final de ano, corte de
etc.). SSO). etc.). bônus, não
promoção
Definir se a premiação e/ou
será individual ou demissão).
coletiva (grupo ou área
de trabalho).

Recomenda-se elaborar e distribuir para os colaboradores da empresa (gestores e


trabalhadores), uma cartilha contendo, entre outras, as seguintes informações:

a) Política de SSO da empresa, especificando valores conferidos por ela à


Segurança e saúde Ocupacional.

b) Informações detalhadas sobre avaliação individual de desempenho em SSO;

c) Listagem de ocupações ou tarefas com procedimentos definidos como


“Regras de Ouro” ou “Regras invioláveis”;

d) Orientações sobre RT – Recusa de Tarefas (em que circunstâncias a mesma


deverá ser utilizada e orientações de como se proceder);

144
e) Medidas disciplinas previstas para serem aplicadas por desobediência às
regras de segurança definidas pela empresa. Sobre as medidas disciplinares é
importante que os colaboradores saibam quando e em que circunstâncias elas
serão aplicadas. Da mesma forma é importante que os colaboradores saibam
como recorrer das medidas disciplinares, julgadas por eles, incorretas ou
improcedentes.

NOTA: a cartilha deverá ser distribuída pelas chefias imediatas dos colaboradores,
preferencialmente por ocasião de algum tipo de treinamento ou no decorrer das
conversações de segurança “DDS”.

Redefinir procedimentos de aquisição, estocagem, distribuição e utilização de


equipamento de proteção individual – EPI.

A cotação dos Equipamentos de Proteção Individual deverá ser feita, levando-se em


conta a qualidade do produto. O produto tem de estar à disposição dos usuários,
sendo a distribuição feita mediante assinatura comprovando recebimento. O
trabalhador deverá assinar um termo de comprometimento de uso e conservação do
EPI. Esse procedimento deverá ser efetivado por ocasião dos treinamentos para uso
dos mesmos. O referido procedimento deverá fazer parte do prontuário do
trabalhador. A atribuição de fazer o colaborador usar corretamente o EPI é da sua
chefia imediata, que responde, perante a empresa e perante a lei pela sua
segurança.

145
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DUARTE, Edgard Filho. Programa cinco minutos diários de segurança, saúde


ocupacional e meio ambiente. Belo Horizonte: Ergo Editora Ltda, 1999.

LLORY, M. Acidentes industriais: o custo do silêncio. Rio de Janeiro: Multimais


Editorial, 1999.

LAND, George e JARMAN, Beth. Ponto de Ruptura e Transformação. Como


entender e moldar as forças de mutação. Cultrix, SP, 1990.

OLIVEIRA, João Cândido. Gestão de riscos no trabalho: uma proposta alternativa.


Belo Horizonte: Fundacentro, 1999.

____. Manual de treinamento do curso de gerência de riscos no trabalho para


gerentes e Supervisores. Minerações Reunidas Brasileiras - MBR. Nova Lima, 1995.

____. SSO - Compreensão e equívocos. Revista Proteção, São Paulo, n. 122, 113,
114. 2001.

____. Segurança e saúde no trabalho – uma questão mal compreendida. Revista


São Paulo em Perspectiva, 17(2):3-12, 2003. – Fundação SEADE, São Paulo.

____. Aspectos culturais influenciam a prevenção. Revista CIPA, Ano XXVIII, n. 327,
São Pulo, 2007.

____. Do tripalium ao trabalho. In Aposentadoria: um caminho que nem sempre leva


o caminhante ao melhor lugar. Belo Horizonte: Ed. Cultura, 2001.

OLIVEIRA, S. G. Proteção jurídica à saúde do trabalhador. 2. ed. São Paulo: Ed.


Ltr, 2003.

____. Indenizações por acidentes do trabalho ou doenças Ocupacionais. 1ª. ed. São
Paulo: Ed. Ltr, 2005.

OLEA, Manuel Alonso. Introdução ao direito do trabalho. 4. ed.. São Paulo: Ed. LTR,
1974, 294 p.

REASON, J.; Hobbs, A. Managing Maintenance Error. A Practical Guide. Hampshire:


Ashgate, 2003.

SALIM, C. A. et al. (Org.) Saúde e segurança no trabalho: novos olhares e saberes.


Belo Horizonte: Fundacentro/UFSJ, 2003, 336 p.

TRIVELATO, G. C. Curso de gestão de riscos no trabalho para auditores fiscais.


Belo Horizonte: Fundacentro, 2001. Apontamentos de aulas.

146
NOTAS:

147
1
O diagnóstico de maturidade de SSO se baseia nas seguintes fontes de informações:
1. Histórico acidentário da empresa, nos três últimos anos (acidentes com ou sem afastamento);
2. Entrevistas com trabalhadores que sofreram acidentes e que retornaram ao trabalho;
3. Acompanhamento de trabalhadores em atividades de riscos elevados, com procedimentos de trabalho
(normas) definidos;
4. Entrevistas com ocupantes de cargo de chefias – do diretor ao supervisor;
5. Entrevistas com Técnicos do SESMT (engenheiros e técnicos de segurança);
6. Questionários de SSO aplicados em toda a população trabalhadora da empresa, incluindo empresas
contratadas permanentes.
2
A esse respeito conversamos com quatro diretores de empresas onde ocorreram acidentes fatais.
Unanimemente disseram que o constrangimento não se circunscrevia apenas às mortes, mas também às
explicações prestadas aos Conselhos de Administração e principalmente à imprensa.
3
Sugerimos verificar o conteúdo das mensagens de congratulações ou de reconhecimentos por metas
alcançadas, de parte da maioria dos dirigentes das grandes corporações, endereçadas ao público interno de
suas organizações, verificando, no conjunto das referências, o item segurança no trabalho. Na maioria delas o
assunto não é tratado ou tratado de maneira imprópria.
4
Esses dados foram levantados em oito empresas de grande porte, localizadas nos Estados de Minas Gerais,
São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia, nos anos de 2002, 2003, 2004, 2005 e 2006. Os dados são parciais, uma
vez que o levantamento não foi ainda concluído.
5
O questionário de SSO, respondido por gestores é composto de 37 questões. O questionário de SSO,
respondido por trabalhadores é composto de 27 questões. Todas as questões são formuladas com seis
alternativas de respostas, facultando ao entrevistado responder mais de uma alternativa. O roteiro de
entrevistas com gestores e técnicos do SESMT segue o mesmo padrão e é composto por 10 questões
cuidadosamente elaboradas.
6
A palavra legalista, entre aspas, refere-se aos desvios, na prática, do verdadeiro sentido da palavra. Algumas
empresas, e não são poucas, “maquiam” seus ambientes de trabalho com programas legais, como Mapas de
Risco, PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO e mais recentemente com o PPP – elaborados normalmente pelos
técnicos do SESMT ou por consultor externo, sem o envolvimento direto e compromissado dos gestores das
áreas produtivas e dos trabalhadores – com o objetivo de “parecer cumprir” a Lei. Paradoxalmente, por essa
via, acabam gastando mais do que se estivessem controlando efetivamente os seus ambientes de trabalho. Por
esse expediente, algumas empresas continuam não protegendo os seus trabalhadores e abrindo espaços ao
acúmulo de passivos, especialmente de natureza previdenciário, como é o caso, no momento, da alíquota
suplementar destinada ao custeio da aposentadoria especial.
7
A RT – Recusa de Tarefa, é indiscutivelmente uma das ferramentas mais importantes no controle dos riscos
do trabalho. Seu emprego, no entanto, constitui-se num tremendo desafio. Não é tarefa fácil remover a memória
das relações de trabalho legadas pelo modelo escravista. O receio do trabalhador em fazer uso da RT, em
muitas situações, não se deve a dificuldades nos relacionamentos com suas chefias imediatas, mas na
memória da opressão que dominou as relações de trabalho até o terceiro quartel do século XX.
8
Os itens levantados nas quatro empresas do ramo de metalurgia não diferem em praticamente nada do que foi
levantado em outros ramos de atividades onde o trabalho já foi e/ou está sendo realizado, envolvendo mais de
16.000 trabalhadores e 4.000 ocupantes de cargos de chefia.
9
A respeito do descumprimento de normas, por parte dos trabalhadores, o diagnóstico de maturidade de SSO
realizado em seis grandes empresas, dos ramos de mineração, siderurgia, metalurgia, papel celulose, transporte
e construção civil, revela que o cerne da questão está na natureza e na incompatibilidade das normas com as
condições de trabalho e na falta de vontade política das empresas em corrigi-las. As normas, na sua grande
maioria, são genéricas, prolixas e de difícil compreensão e, em certos casos, de memorização impossível por
parte dos trabalhadores. A impressão que se tem é que muitas normas foram elaboradas com o propósito
precípuo de dar formato aos programas que as empresas buscam certificação formal e não para serem tratadas
como parte essencial dos processos produtivos.
10
Somente a partir de final do ano de 1998 é que a Previdência Social passou a exigir das empresas pagamento
adicional para custeio da aposentadoria especial. O custeio da aposentadoria especial é um fato inquestionável,
teria que haver. A questão é que a Previdência, ao tomar essa decisão, visou exclusivamente o ajuste de caixa
sem levar em conta o impacto da medida na vida dos trabalhadores e no caixa das empresas, sobretudo das
pequenas. Ressalte-se que os trabalhadores atingidos pela medida, na sua grande maioria, trabalham em
condições verdadeiramente agressivas à saúde; portanto, além da possibilidade de adoecerem em decorrência
das condições de trabalho, envelhecem mais cedo do que os demais. E aí é que está o cerne da questão:
envelhecimento e empregabilidade, no Brasil, não rimam facilmente a favor do trabalhador, nem mesmo para os
que trabalham em condições salubres, quanto mais para os que trabalham em ambientes desfavoráveis à saúde
– insalubres na verdadeira acepção do termo. Não é da cultura brasileira o trabalhador envelhecer trabalhando,
com vínculos formais de trabalho, sem os transtornos culturais decorrentes do processo de envelhecimento,
salvo no setor público – pelo menos, por enquanto. A atual medida impôs a um contingente considerável de
trabalhadores vinculados ao regime geral da Previdência mais tempo de trabalho, uma vez que as empresas, na
maioria das situações, vêm optando pelo controle da exposição aos riscos, principalmente pelo uso compulsório
de equipamento de proteção individual, medida tecnicamente questionável, porém legal. Ressalte-se que os
trabalhadores até então beneficiados com a aposentadoria especial trabalhavam (contribuíam) por 15, 20 e 25
anos e saíam do trabalho, como medida preventiva, com menos tempo de exposição aos riscos oferecidos pelo
trabalho em questão. Doravante, muitos terão que contribuir para a Previdência Social por mais tempo,
dependendo de duas questões fundamentais: emprego e saúde. Os efeitos dessa medida certamente
começarão a ser sentidos, mais fortemente, nos próximos anos. Daí a necessidade de os trabalhadores se
cuidarem, de participarem ativamente das políticas e dos programas de Segurança e Saúde Ocupacional das
suas respectivas empresas, especialmente daqueles que cuidam dos controles dos riscos ambientais.
11
Um bom serviço de Higiene Ocupacional, entre outros benefícios, pode servir a empresa para: 1) Identificar e
quantificar, com o rigor necessário, os agentes ambientais existentes nos ambientes de trabalho. 2) Definir e
priorizar investimentos de monta em medidas de controle de riscos ambientais. 3) Gerar memórias técnicas que
darão suficiente sustentação nos embates envolvendo a segurança e a saúde no trabalho, tais como: a)
negociações coletivas com sindicatos, b) negociações e acordos com órgãos e agências do governo, c) defesas
em processos judiciais, d) definição de pagamento de adicionais de insalubridade e periculosidade, e) definição
de pagamento das alíquotas suplementares referentes ao custeio da aposentadoria especial, entre outros.
12
Mudanças profundas, sem ruptura com os modelos anteriores, dificilmente promovem inteiramente as
transformações almejadas. As razões são várias, mas principalmente devidas as incoerências e ao volume de
ações antagônicas vivenciadas a um só tempo. As incoerências manifestam-se em todos os sentidos, mas de
forma mais visível no descaso em relação aos mecanismos (instrumentos) da nova ordem pretendida. No caso
em apreço, de um lado, os supervisores fingem que estão mandando fazer as coisas conforme prescrição
formal; de outro, os trabalhadores os imitam, reproduzindo a mesma postura, fingindo que lhes obedecem. E,
assim, as mudanças pretendidas não se realizam, pelo menos na sua totalidade. No conjunto de mudanças
levado a cabo pelas empresas nos últimos anos, esse fenômeno mais se evidenciou como árdua tarefa de
implementação dos programas de qualidade total e de meio ambiente. Em relação à SSO a situação não é
diferente, sobretudo a partir da adoção da OHSAS 18.001.
13
Dados extraídos das fichas de análise de acidentes.
14
Características preponderantes dos estágios de SSO:
o PRIMEIRO ESTÁGIO (administração movida por crise):
o As ações de Segurança e Saúde Ocupacional são movidas por crises. Toda energia e recursos são
empregados na abordagem de problemas (riscos) já instalados em detrimento das práticas preventivas ou
da antecipação dos riscos.
o Não há definição clara de responsabilidades pela condução das ações de segurança; todos na empresa
são tidos como responsáveis, mas, ao mesmo tempo, não há um responsável de quem se possa cobrar
ações e resultados.
o A Segurança do Trabalho só adquire importância em momentos de crise, isto é, quando ocorrem
acidentes de alguma gravidade ou quando a empresa é interpelada pelo sindicato dos colaboradores, por
órgãos públicos de fiscalização, pelo Ministério Público do Trabalho ou pela Justiça do Trabalho.
o As ações de controle, quando surgem são implementadas em caráter de urgência.
o O atendimento à legislação é feito, via de regra, por pressão de órgãos públicos responsáveis pela
fiscalização, por representação sindical ou por decisão judicial.
o A Segurança no Trabalho é tratada como uma questão de “bom senso”. Ela é confiada a quem não
dispõe de preparo suficiente para conduzi-la de maneira adequada. Não há Serviço Especializado em
Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho – SESMT e quando há, acumula outras funções em
detrimento da Segurança ou é totalmente desviado de suas atividades precípuas.
o A Segurança e Saúde Ocupacional são vistas como incompatíveis com a produção (aumenta custos,
dificulta e atrapalha o andamento “normal” das atividades produtivas).
o O discurso da Segurança do Trabalho é ambíguo e contraditório. Às vezes diz-se que a Segurança é
importante e necessária, mas na prática, o que é feito não é compatível com os riscos do trabalho. Os riscos
são vistos como inerentes ao trabalho e os acidentes como fatalidade e/ou descuido dos colaboradores.
o A produção é prioritária, independentemente das condições ambientais e/ou de trabalho em que a
mesma se realiza.
o As questões éticas e morais pertinentes à garantia da Segurança e Saúde Ocupacional são de pouca
relevância ou nulas.

SEGUNDO ESTÁGIO (administração orientada pelo SESMT):

o O ordenamento formal e as ações de Segurança e Saúde Ocupacional são definidas ou fortemente


influenciadas pela legislação que regulamenta a matéria.
o Não há política de SSO definida pela direção da empresa e, quando há, não é difundida ou não é
totalmente seguida. Os programas de SSO são concebidos e desenvolvidos pelo SESMT, com a
participação das áreas operacionais e da CIPA, cada uma fazendo o que considera mais conveniente.
o As ações de segurança são previstas e implementadas desvinculadas do sistema produtivo. Por parte
das áreas operacionais existe uma intenção clara de fazer segurança, só que dependem da capacidade
operacional do SESMT. Não há uniformidade na condução das ações de SSO na empresa como um todo.
o A segurança e a produção são consideradas independentes e, em algumas situações, conflitantes. As
técnicas de controle de riscos nem sempre se coadunam com os sistemas produtivos; quando isso ocorre,
as ações de segurança comumente são rejeitadas.
o Há dificuldades na condução dos programas de segurança: o SESMT recomenda uma medida de
controle; a produção, por razões técnicas, operacionais, financeiras, ou mesmo por considerar
desnecessária, não a implementa ou a implementa parcialmente.
o A Segurança do Trabalho na empresa é de responsabilidade do SESMT, independentemente do poder
que lhe é conferido para o exercício de suas atividades.
o Na definição causal dos acidentes a importância conferida ao comportamento do trabalhador não é
seguida da identificação de seus determinantes causais.
o A avaliação dos resultados da Segurança e Saúde Ocupacional é baseada, sobretudo, em mecanismos
reativos, como taxas de freqüência e gravidade. Os itens que avaliam o sucesso das ações de SSO não são
considerados ou são pouco considerados.
o A estratégia utilizada na condução das ações de segurança é centrada na “fiscalização” ou
“policiamento”. Os técnicos de segurança necessariamente, têm de estar presentes nas frentes de trabalho
até mesmo nos turnos noturnos.
o Além das dificuldades na implementação das medidas de controle recomendadas pelo SESMT, não há
mecanismos definidos de prevenção que restrinja ou impeça o surgimento de novas situações de risco,
semelhantes ou idênticas às conhecidas e, às vezes, corrigidas.

TERCEIRO ESTÁGIO (administração orientada pela linha de comando):


o As ações de SSO são orientadas e sustentadas por uma política estabelecida e difundida pela direção
da empresa, na qual estão claramente definidos os papéis, as atribuições e as responsabilidades de todas
as pessoas que trabalham na empresa, especialmente dos ocupantes de cargos de chefia. (Quando a
Política de SSO não detalhar, isto é, não for explícita, em relação às atribuições e responsabilidades dos
gestores, isso deverá ser feito, formalmente, com todos os detalhes possíveis, na descrição de funções. O
gestor precisa saber, com clareza, o que lhe compete fazer, e da mesma forma, o que estará em jogo
quando deixar fazer aquilo que é de sua competência nominal, fazer. Essa medida é dispensável para
programas de IV estágio de maturidade, onde os níveis de comprometimento e responsabilidades já se
encontram suficientemente maduros e totalmente incorporados à cultura da empresa).
o A importância conferida à segurança no trabalho pela direção da empresa é assimilada e reproduzida
integralmente pelas áreas operacionais e rigorosamente observada.
o O cumprimento da legislação que regulamenta a Segurança e Saúde Ocupacional é feito no conjunto
das ações de SSO previstas no plano geral de ação da empresa, sem merecer destaque em separado.
o Há uniformidade em toda a empresa, dos conceitos básicos que envolvem a segurança e saúde no
trabalho, tais como: perigo, exposição, risco, probabilidade, incidente crítico, acidente e dano.
o Os critérios utilizados na abordagem dos riscos (percepção e controle) são uniformes para todas as
unidades da empresa. Utilizam-se as mesmas ferramentas com critérios idênticos.
o As ações de Segurança e Saúde Ocupacional são integradas ao sistema produtivo e sua execução é de
total responsabilidade das gerências das áreas.
o O desempenho da Segurança e Saúde Ocupacional faz parte dos elementos constitutivos da avaliação
de desempenho das áreas produtivas e de quem as dirige.
o A segurança no trabalho é abordada como parte integrante do sistema operacional sendo suas ações
planejadas e executadas concomitantemente às ações de produção.
o As ações de SSO, sobretudo em relação às atividades críticas, são previstas nos padrões de trabalho
(normas) e observadas com o rigor devido.
o A atribuição dos técnicos do SESMT é de assessoramento às áreas operacionais

QUARTO ESTÁGIO (administração orientada para as finalidades do negócio):


o A Segurança e Saúde Ocupacional são entendidas e tratadas pela empresa como uma opção de
negócio.
o A política de Segurança e Saúde Ocupacional é definida e orientada pela alta direção da empresa.
o As atividades de Segurança e Saúde Ocupacional e as atividades fins da empresa são totalmente
integradas e tratadas no mesmo nível de importância.
o Todo o investimento em Segurança e Saúde Ocupacional na empresa é feito com o propósito de gerar e
agregar vantagens ao negócio.
o As metas de Segurança e Saúde Ocupacional na empresa são alinhadas às metas do negócio.
o A segurança é um valor que a empresa procura alcançar em todas as suas ações.
o O fosso que separa o discurso do que é desejável das ações concretas que produzem resultados é
diminuído ou nulo. O que se fala é o que se faz.
o O atendimento às normas legais de Segurança e Saúde Ocupacional é feito no conjunto das ações que
compõem os programas de SSO da empresa.
o Há transparência absoluta no trato das questões de Segurança e Saúde Ocupacional.
o O assunto Segurança do Trabalho não é matéria de “ordem do dia”, é parte da cultura da empresa e
tratado sem qualquer destaque.
15
O estabelecimento de nexo para concessão de benefício pela Previdência Social, em caso de acidente de
trabalho, é feito mediante apresentação da CAT – Comunicação de Acidente de Trabalho. Não é prática
corrente de a Previdência Social averiguar as condições de trabalho que deram origem aos acidentes por ela
cobertos, inclusive os que ensejam benefícios de prestação continuada, como pensão por morte, aposentadoria
por invalidez e auxílio-acidente.
16
Não há como, por exemplo, dissociar a SONY da figura do Akio Morita; o Grupo Votorantin, dos Morais; o
Bradesco, do A. Aguiar; o grupo Algar, dos Garcia.
17
O dualismo que caracteriza a desvinculação da Segurança e Saúde Ocupacional das atividades produtivas
tem suas origens ora na inclusão da Segurança e Saúde Ocupacional no conjunto das relações trabalhistas ora
nos seus efeitos.
18
Leira é uma porção do mesmo material lavrado ou de estéril colocado nas bordas das bancadas para evitar
quedas de máquinas, materiais e/ou pessoas de uma bancada superior para outra bancada situada em nível
inferior, instalada com altura mínima correspondente à metade do diâmetro do maior pneu de veículo que por
elas trafegue (Ver NR 22).
19
A menção a leiras de proteção deve-se ao fato de ser essa situação responsável por uma quantidade
razoável de acidentes graves envolvendo mortes e danificação de equipamentos nas atividades de lavra a céu
aberto. O raciocínio aqui posto pode ser aplicado em quaisquer situações de riscos existentes nos mais
diversos ambientes e/ou situações de trabalho.
20
Essa afirmação é sustentada pelo baixo desempenho – principalmente em médio e em longo prazo – dos
sistemas ou programas de SSO, de origem estrangeira, implementados em muitas empresas brasileiras. De um
modo geral os sistemas ou programas de SSO, em questão, são de excelente qualidade, muitos de classe
mundial. O problema não está nos programas, mas na cultura de SSO ainda dominante em nosso meio, que
não comporta e nem suporta tais programas. Os referidos programas tiveram origem em experiências
desenvolvidas e amadurecidas em culturas onde SSO, há muito, se situa no primeiro plano de importância nas
organizações, o que está muito distante da realidade brasileira.
21
Nas grandes empresas aonde o cenário de riscos, com a introdução de novas tecnologias, vem se tornando
cada vez mais complexa, e a busca por solução, da mesma forma, cada vez mais premente, o que se tem feito
para melhorar o desempenho do SESMT é a especificação das atividades técnicas (divisão de tarefas) por
segmentos de formação e/ou de especialização, como, por exemplo: higienistas para cuidar dos problemas
afetos à higiene ocupacional (riscos químicos, físicos e biológicos); ergonomistas para cuidar dos aspectos
ergonômicos, engenheiros e técnicos de segurança suficientemente preparados para assessorar as gerências
das áreas na melhoria contínua das condições de trabalho. O aprimoramento técnico na área de SSO não é
mais uma opção individual de crescimento profissional, mas de adaptabilidade às novas e emergentes
necessidades das empresas. Num sistema de SSO integrado ao sistema produtivo não há espaço para a
atuação dos técnicos de segurança nos moldes de “xerife”, de prancheta na mão, anotando condições
inseguras, abordando colaboradores que trabalham em desacordo com os procedimentos de trabalho e
promovendo campanhas de segurança. A função dos técnicos do SESMT num sistema de SSO de terceiro
estágio de maturidade é de assessoramento. E assessoria requer conhecimentos e habilidades que os gestores
das áreas ainda não dominam.
22
Consultamos 160 descrições de cargos (de gerente geral a operador de equipamentos) de 11 empresas de
ramo de atividades diferentes, e constatamos que em relação à SSO, todos eram insuficientes ou imprecisos.
23
Os aspectos negativos da cultura de SSO, levantados em todas as empresas avaliadas e analisados no corpo
do texto podem ser resumidos nos 12 itens, abaixo enumerados:
1. Incompatibilidades entre a Política de SSO e o que efetivamente é feito, na prática;
2. Diferenças acentuadas na percepção de riscos entre os grupos avaliados – gestores, colaboradores e
técnicos do SESMT;
3. Dissociação das ações de SSO do sistema produtivo;
4. Incompatibilidades entre o trabalho prescrito e o trabalho real (na maioria esmagadora das situações as
tarefas são realizadas em desacordo com os procedimentos escritos);
5. Falhas na identificação e avaliação dos riscos (deficiência de conhecimento em SSO, sobretudo por parte
dos gestores);
6. Matriz de riscos desatualizada e pouco utilizada (em algumas empresas essa nomenclatura é conhecida
por Mapa de Risco);
7. Ênfase no comportamento do trabalhador, como causa dos acidentes, sem definição do que está
ocasionando a adulteração dos comportamentos esperados;
8. Indecisão na aplicação de medidas disciplinares por descumprimento de procedimentos de SSO e/ou de
trabalho;
9. Avaliação de desempenho de SSO fortemente centrada nos CF e CG em detrimento das medidas de
sucesso em SSO;
10. Deficiência e/ou falta de controles tanto de eficácia como de durabilidade das medidas de controle de
riscos implementadas.
11. Deficiência na antecipação dos riscos (não há critério definido para geração de novos riscos);
12. Deficiência nos sistema de comunicação de SSO, sobretudo em relação às pendências (medidas de
controle sugeridas, aprovadas e não implementadas).
24
As questões aqui postas foram extraídas do elenco de respostas às entrevistas e aos questionários de SSO,
envolvendo gestores, colaboradores e técnicos do SESMT.
25
É recomendável que os cronogramas de ações de SSO devam ser definidos somente a partir de negociações
entre as partes interessadas - o proponente (supervisor de área e sua respectiva chefia e esta com a diretoria da
empresa). Todas as ações de SSO, excluídas as de atendimento à legislação, devem ser vistas e tratadas como
ações voluntárias, devendo, por isso, ser negociadas entre proponentes (supervisores) e chefias. O supervisor
deve propor e negociar somente o que está na sua governabilidade (competência e autoridade) para executar. É
importante que o supervisor saiba que as ações de SSO, por ele propostas, uma vez discutidas e aprovadas
terão que ser, rigorosamente, cumpridas nos prazos estabelecidos. É importante também, que o proponente da
ação saiba o que é ou não aceito como justificativa para o não cumprimento das ações propostas, nos prazos
estabelecidos. E o mais importante, o que será feito com as ações que não forem cumpridas nos prazos
determinados. As ações de revisão de procedimentos (regras e/ou normas) devem ser cuidadosamente
negociadas por causa do volume de trabalho.
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Regras que não permitem flexibilização são comumente conhecidas por “Regras de Ouro” ou “Regra
Inviolável”. A denominação “Regra de Ouro” vincula-se às doutrinas religiosas e/ou sociedades secretas
indicando sua importância e conseqüentemente sua inviolabilidade.
27
Um gestor presente a um dos seminários relatou que um de seus colaboradores foi surrado por colegas de
trabalho por ter sofrido um acidente no trabalho que resultou na perda do bônus (prêmio) para todos os
membros do grupo. O bônus em questão equivalia a um salário nominal.

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