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SEGEN

SAÚDE MENTAL DO PROFISSIONAL


DE SEGURANÇA PÚBLICA

1 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E SEGURANÇA PÚBLICA
SECRETARIA DE GESTÃO E ENSINO EM SEGURANÇA PÚBLICA

Conteudistas
Darlim Saratt Mezomo
Patrícia Viana Cruz
Rebeca Moreira Rangel

Revisão Pedagógica
Ardmon dos Santos Barbosa
Márcio Raphael Nascimento Maia
Vânia Cecília de Lima Andrade

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA


SECRETARIA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
labSEAD
Comitê Gestor
Eleonora Milano Falcão Vieira
Luciano Patrício Souza de Castro
Financeiro
Fernando Machado Wolf

Consultoria Técnica EaD


Giovana Schuelter

Coordenação de Produção
Francielli Schuelter

Coordenação de AVEA
Andreia Mara Fiala

Design Instrucional
Danrley Maurício Vieira
Marielly Agatha Machado

Design Gráfico
Aline Lima Ramalho
Douglas Wilson Lisboa de Melo
Sonia Trois
Taylizy Kamila Martim
Victor Liborio Barbosa

Linguagem e Memória
Cleusa Iracema Pereira Raimundo
Victor Rocha Freire Silva

Programação
BY NC ND
Jonas Batista Todo o conteúdo do Curso Saúde Mental do Profissional
Salésio Eduardo Assi de Segurança Pública, da Secretaria de Gestão e Ensino em
Thiago Assi Segurança Pública (SEGEN), Ministério da Justiça e Segurança
Pública do Governo Federal - 2020, está licenciado sob a Licença
Pública Creative Commons Atribuição-Não Comercial-Sem
Audiovisual Derivações 4.0 Internacional.
Luiz Felipe Moreira Silva Oliveira
Para visualizar uma cópia desta licença, acesse:
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Rodrigo Humaita Witte https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/deed.pt_BR

2 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Sumário

APRESENTAÇÃO DO CURSO...............................................................................7
MÓDULO 1 – SAÚDE MENTAL E QUALIDADE DE VIDA........................................8
Apresentação.................................................................................................................9
Objetivos do módulo.............................................................................................................................. 9
Estrutura do módulo.............................................................................................................................. 9
Aula 1 – Saúde do Trabalhador.................................................................................10
Contextualizando... ............................................................................................................................. 10
Saúde biopsicossocial......................................................................................................................... 10
Saúde do trabalhador.......................................................................................................................... 16
Aula 2 – Prazer e Sofrimento no Trabalho.............................................................20
Contextualizando... ............................................................................................................................. 20
Prazer no trabalho................................................................................................................................ 21
Sofrimento no trabalho........................................................................................................................ 25
Aula 3 – Qualidade de Vida no Trabalho..................................................................33
Contextualizando................................................................................................................................. 33
Conceitos e variáveis........................................................................................................................... 33
Referências...................................................................................................................47
MÓDULO 2 – PRINCIPAIS CONCEITOS DA SAÚDE MENTAL: DO NORMAL AO
PATOLÓGICO......................................................................................................52
Apresentação...............................................................................................................53
Objetivos do módulo............................................................................................................................ 54
Estrutura do módulo............................................................................................................................ 54
Aula 1 – Da Ansiedade Saudável aos Transtornos da Ansiedade........................55
Contextualizando................................................................................................................................. 55
Ansiedade saudável............................................................................................................................. 55
Transtorno de ansiedade de separação............................................................................................. 63
Mutismo seletivo.................................................................................................................................. 65
Fobias específicas............................................................................................................................... 66
Transtornos de ansiedade social (fobia social)................................................................................. 69
Transtorno de pânico e agorafobia . ........................................................................72
Transtorno de ansiedade generalizada.............................................................................................. 74
Aula 2 – Do Estresse à Síndrome de Burnout.........................................................76
Contextualizando... ............................................................................................................................. 76
Estresse: conceitos e características................................................................................................. 76
Fases do estresse................................................................................................................................ 80
Estresse ocupacional.......................................................................................................................... 82
Estresse pós-traumático..................................................................................................................... 85
Enfrentamento do estresse................................................................................................................. 93
Síndrome de burnout: características e causas................................................................................ 99
Prevenção e tratamento da síndrome de burnout........................................................................... 104
Estudos sobre estresse em profissionais de segurança pública................................................... 106
Pesquisas realizadas no Brasil sobre estresse pós-traumático em profissionais de segurança
pública................................................................................................................................................ 112
Aula 3 – Da Tristeza à Depressão.......................................................................... 118
Contextualizando............................................................................................................................... 118
Diferenciação entre tristeza e depressão........................................................................................ 118
Características, sintomas e tratamento da depressão................................................................... 119
Depressão no contexto da segurança pública................................................................................. 122
Referências................................................................................................................ 128
MÓDULO 3 – RISCOS E AGRAVOS DA SAÚDE DO AGENTE DE SEGURANÇA
PÚBLICA...........................................................................................................141
Apresentação............................................................................................................ 142
Objetivos do módulo.......................................................................................................................... 142
Estrutura do módulo.......................................................................................................................... 142
Aula 1 – Riscos e Agravos da Saúde Mental do Agente de Segurança Pública:
Influências Organizacionais................................................................................... 143
Contextualizando............................................................................................................................... 143
Modelo de gestão.............................................................................................................................. 143
Excesso de carga de trabalho........................................................................................................... 158
Falta de treinamento e equipamento adequados............................................................................ 165
Falta de reconhecimento e apoio da instituição.............................................................................. 170
Aula 2 – Riscos e Agravos da Saúde Mental do Agente de Segurança Pública:
Influências Sociais.................................................................................................... 174
Contextualizando............................................................................................................................... 174
Estigmatização da sociedade........................................................................................................... 174
Preconceito e discriminação de gênero, raça, orientação sexual e religião.................................. 179
Uso de substâncias psicoativas: entre o uso nocivo e abusivo..................................................... 188
Manutenção da ordem num contexto de injustiça social............................................................... 191
Vitimização policial............................................................................................................................ 194
Referências................................................................................................................ 200
MÓDULO 4 – PRINCIPAIS SINTOMAS DO ADOECIMENTO.............................207
Apresentação............................................................................................................ 208
Objetivos do módulo.......................................................................................................................... 208
Estrutura do módulo.......................................................................................................................... 208
Aula 1 – Somatização Física.................................................................................... 209
Contextualizando............................................................................................................................... 209
Os sintomas físicos........................................................................................................................... 209
Vida sexual e disfunção sexual......................................................................................................... 211
Sono normal e transtornos do sono-vigília...................................................................................... 221
Irritabilidade em excesso e agressividade desmedida................................................................... 228
Aula 2 – Compulsões................................................................................................ 234
Contextualizando............................................................................................................................... 234
As compulsões.................................................................................................................................. 234
Uso abusivo de álcool e drogas........................................................................................................ 240
Referências................................................................................................................ 247
MÓDULO 5 – O SUICÍDIO.................................................................................250
Apresentação............................................................................................................ 251
Objetivos do módulo.......................................................................................................................... 251
Estrutura do módulo.......................................................................................................................... 252
Aula 1 – Entendendo o Comportamento Suicida ................................................ 253
Contextualizando............................................................................................................................... 253
Informações iniciais e Dados Estatísticos....................................................................................... 253
Entendendo o suicídio....................................................................................................................... 259
Comportamento suicida.................................................................................................................... 261
Aula 2 – O Comportamento Suicida: Fatores de Risco e Fatores de Proteção......263
Contextualizando............................................................................................................................... 263
Suscetibilidade ao suicídio................................................................................................................ 263
Fatores de risco................................................................................................................................. 267
FATORES DE PROTEÇÃO................................................................................................................... 291
Aula 3 – O Suicídio entre Profissionais de Segurança Pública no Brasil........ 293
Contextualizando... ........................................................................................................................... 293
Analisando os números..................................................................................................................... 293
Prevenção e posvenção.................................................................................................................... 303
Encaminhando o paciente................................................................................................................. 316
Referências................................................................................................................ 320
MÓDULO 6 – PREVENÇÃO, PROMOÇÃO E TRATAMENTO DA SAÚDE MENTAL ...324
Apresentação............................................................................................................ 325
Objetivos do módulo.......................................................................................................................... 325
Estrutura do módulo.......................................................................................................................... 325
Aula 1 – Descontruindo Rótulos: Crenças Equivocadas, Preconceitos e
Bullying...................................................................................................................... 326
Contextualizando............................................................................................................................... 326
Aspectos históricos relacionados ao tema de saúde mental......................................................... 326
Aula 2 – Psiquiatria e Psicologia........................................................................... 336
Contextualizando............................................................................................................................... 336
Psiquiatria........................................................................................................................................... 336
Psicologia........................................................................................................................................... 338
Aula 3 – Psicofarmacologia e Terapias Complementares ................................ 342
Contextualizando............................................................................................................................... 342
Psicofarmacologia............................................................................................................................. 342
Terapias complementares................................................................................................................ 345
Aula 4 – Rede de Assistência .................................................................................. 354
Contextualizando............................................................................................................................... 354
Rede de Assistência do SUS............................................................................................................. 354
Aula 5 – Responsabilidade do Cuidado.................................................................. 361
Contextualizando............................................................................................................................... 361
Institucional........................................................................................................................................ 361
Grupo.................................................................................................................................................. 363
Individual............................................................................................................................................ 366
Referências................................................................................................................ 369
Apresentação do Curso

Bem-vindo ao curso Saúde Mental do Profissional de


Segurança Pública.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) já publicou diversos


relatórios que identificam um crescimento no número de
pessoas com transtornos mentais na sociedade em dias
atuais. E é extrema importância que possamos debater sobre o
assunto, para que a partir do conhecimento, muitos consigam
enfrentar esse problema da melhor maneira. Especialmente,
para os profissionais de segurança pública.

A função desempenhada por um agente de segurança o


expõe a situações contínuas de risco, que podem contribuir
para o surgimento de transtornos mentais e físicos. Nesse
contexto, identificamos um preocupante agravante para o
desenvolvimento e acúmulo dos transtornos mentais dos
profissionais: a negligência dessas situações, dos sintomas
e sinais apresentados pelos agentes, além do estigma que
muitas pessoas têm, especialmente do sexo masculino, de que
a psicologia apenas trata de casos crônicos ou que é “coisa de
louco”. Desse modo, o propósito deste curso é buscar reverter
essa realidade e fornecer conhecimento para promoção
da qualidade de vida dos agentes, bem como, através da
conscientização, incentivar ações de prevenção e tratamento
de doenças mentais que sejam capazes de diminuir as taxas
de transtornos mentais, estresse, depressão e suicídio na
segurança pública.

Desejamos-lhe um excelente estudo!

Equipe do curso.
MÓDULO 1

SAÚDE MENTAL E
QUALIDADE DE VIDA

8 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Apresentação

A Organização Mundial da Saúde (OMS) já publicou inúmeros


relatórios informando um crescimento no número de pessoas
com transtornos mentais na sociedade nos dias atuais.
Assim, é importante debatermos esse assunto, para que,
a partir do conhecimento, muitos consigam enfrentar esse
problema da melhor maneira, especialmente os profissionais
de segurança pública.

A função que um profissional de segurança pública executa


deixa-o exposto a situações contínuas de risco, que são
capazes de propiciar condutas que podem resultar numa
sobrecarga de ansiedade, estresse, depressão, síndrome de
burnout e outros transtornos. Portanto, o propósito deste
curso é buscar reverter essa realidade e fornecer saberes para
promover a qualidade de vida e, por meio da conscientização,
incentivar ações de prevenção e tratamento de doenças
mentais que sejam capazes de diminuir as taxas de estresse,
depressão e suicídio na segurança pública.

OBJETIVOS DO MÓDULO
Conhecer a base teórica do conceito de saúde no trabalho, o
que se define como prazer e o que se define como sofrimento
no trabalho, bem como caracterizar a qualidade de vida do
trabalhador no local de trabalho, sempre mantendo o foco na
qualidade de vida do profissional de segurança pública.

ESTRUTURA DO MÓDULO
• Aula 1 – Saúde do Trabalhador.
• Aula 2 – Prazer e Sofrimento no Trabalho.
• Aula 3 – Qualidade de Vida no Trabalho.

9 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Aula 1 – Saúde do Trabalhador

CONTEXTUALIZANDO...
Diversos estudos e relatórios publicados pela Organização
Mundial da Saúde (OMS) demonstram um crescimento
preocupante no número de pessoas com transtornos mentais
na sociedade atual, o que nos motiva a debater, conhecer
e enfrentar o problema de forma mais eficaz e profissional,
especialmente no que diz respeito à saúde mental dos
profissionais de segurança pública.

Esses profissionais vivem sob constante pressão e tensão


devido à diversidade e instabilidade do trabalho, situações
para as quais o organismo não está preparado. Para que essa
tensão não esteja presente constantemente, são necessários
ambientes estáveis, seguros e rotineiros para que haja uma
adequação do organismo. O policial, porém, não tem essa
tranquilidade como na maioria dos empregos.

Assim sendo, é de extrema importância que esses


profissionais compreendam que a exposição contínua em
situações de risco é capaz de propiciar condutas que podem
levar a ansiedade, estresse, depressão, burnout e outros
transtornos. Então, vamos agora iniciar nossos estudos
sobre o conhecimento da saúde do profissional de segurança
Distúrbio psíquico pública no ambiente de trabalho.
resultado de
esgotamento físico
e mental intenso,
SAÚDE BIOPSICOSSOCIAL
relacionado à vida Os profissionais de segurança pública vivem constantemente
profissional. expostos a diversas situações de riscos, que podem resultar em
elevados níveis de estresse, depressão, síndrome de burnout
e muitos outros transtornos. E, nesse contexto, existe um
agravante para o desenvolvimento e acúmulo dos transtornos:
a negligência dessas situações, dos seus sintomas e sinais.

10 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Outro agravante que podemos destacar é a existência do
estigma de que a psicologia apenas trata de casos crônicos
ou que é “coisa de louco”. Nesse sentido, muitos indivíduos
se sentem envergonhados em buscar auxílio para essas
questões psicológicas, pois não querem ser taxados como
fracos ou ser perseguidos no trabalho, sendo alvo de
brincadeiras inapropriadas.

Porém, quando a ansiedade, o estresse, a


depressão e outros transtornos não são tratados, a
produtividade no trabalho, a rotina, os interesses
do cotidiano, as relações sociais, pessoais e
profissionais são afetadas. E o mais importante, a
saúde psicológica e física do sujeito, podendo gerar
mais agravamentos patológicos.

Ao longo da história, vêm se configurando concepções


sobre saúde e doença no pensamento médico ou em
suposições filosóficas concernentes ao problema mente-
corpo. O surgimento do modelo biopsicossocial proposto
por George Engel (1977 apud CRUZ, 2011) contempla uma
abordagem centrada na integralidade do ser humano, que
demanda estratégias de intervenção capaz de promover o
bem-estar físico e psíquico, e melhorar as relações sociais
e as condições de vida e trabalho, atuando no âmbito da
macroestrutura econômica, social e cultural.

Segundo a autora, entende-se que a saúde pública necessita


da implementação do paradigma biopsicossocial na Saúde
Coletiva. Isso é reforçado com a efetivação do princípio da
integralidade proposto pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no
Brasil (CRUZ, 2011).

11 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Figura 1:
Esgotamento
e transtornos
psíquicos. Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020).

Alguns estudos no campo na psicossomática se mostram


importantes para fortalecer as bases científicas que
contribuirão para a construção de uma atenção à saúde mais
interligada com os fatores sociais, econômicos, biológicos
e culturais que integram o ser humano e sua vivência na
sociedade e no meio ambiente que o cerca. Nesse contexto,
vamos observar, na imagem a seguir, as características que
envolvem os níveis biológico, psicológico e social.

O nível biológico está relacionado às


características físicas do indivíduo,
herdadas no nascimento e/ou adquiridas
ao longo de sua vida. Neste fator estão
incluídos o metabolismo, as resistências e
vulnerabilidades dos seres humanos.

O nível psicológico diz respeito ao interior


do sujeito e leva em consideração as
emoções, processos afetivos e de raciocínio
(consciente e inconsciente), que contribuem
para a formação da personalidade,
interferindo no estilo cognitivo através do
modo de perceber e se posicionar diante dos
semelhantes e das circunstâncias da vida.

12 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Paralelamente, o nível social agrupa um conjunto
Figura 2: Níveis
biológico,
de valores e crenças, que estão atrelados ao
psicológico e social. papel que cada indivíduo desempenha na
Fonte: labSEAD- sociedade (LIMONGI-FRANÇA, 2003).
UFSC (2020).

Ainda podemos destacar que os comportamentos, as escolhas


e os estímulos que o indivíduo tem no decorrer da vida, em
algum momento, implicarão em equilíbrio ou desequilíbrio com
diferentes resultados em cada uma das dimensões biológica,
psicológica, social e organizacional da vida.

Porém, somente o estado pessoal de equilibro ou


desequilíbrio não determina a qualidade de vida,
sendo necessário considerar o processo em sua
totalidade ou como se expressa a sua subjetividade.

A abordagem biopsicossocial surgiu a partir da Medicina


Psicossomática, que propõe uma visão integrada do ser
humano. Essa visão atua sob a ótica de que todo indivíduo é
um complexo-psicossomático composto de potencialidades
biológicas, psicológicas e sociais que respondem
concomitantemente às condições da vida, fatores esses que
contribuem para a formação integral do ser humano (LIMONGI-
FRANÇA, 1996; LUZ 2009; ROSSI; MEURS; PERREWÉ, 2013).

Cruz (2011) cita que o problema mente-corpo tem sido tema


de discussão desde a antiguidade. As concepções sobre saúde
e doença e sobre a natureza das enfermidades se constroem
dentro das perspectivas que vemos na figura seguinte.

13 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Monista
Considera a unicidade e
indissolubilidade de mente e corpo.

Dualista
Considera mente e corpo como
entidades distintas.

Figura 3:
Perspectiva
monista e dualista As oscilações entre ambas as concepções repercutem
de mente e corpo.
Fonte: labSEAD- também no pensamento médico. A mesma autora também
UFSC (2020). afirma que, na Grécia Antiga, Aristóteles e Hipócrates
consideravam o homem como uma unidade indivisível.

Hipócrates (460 a.C.), tentou explicar os estados de saúde


e enfermidade ao postular a existência de quatro fluidos
(humores) principais no corpo: bile amarela, bile negra,
fleuma e sangue. Nesse contexto, a saúde era considerada o
equilíbrio de tais elementos.

Para ele, o homem era uma unidade organizada e a doença era


considerada uma desorganização.

Hipócrates entendia que a doença não representava a vontade


divina, mas surgia por antecedentes lógicos. De acordo com a
sua concepção, a saúde consistia em um equilíbrio harmônico
com o mundo ao redor, enquanto a doença surgia dos desafios
a esse equilíbrio. Essa mesma visão racionalista fundamenta a
medicina moderna (VOLICH, 2000 apud CRUZ, 2011).

14 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


No decorrer dos anos, surgiram crescentes pesquisas
que evidenciam a influência da mente e das
emoções nos estados de saúde, trazendo consigo
a necessidade de se discutir uma abordagem mais
ampla em saúde, que considere o ser humano em
sua integralidade, para que se possa maximizar
os benefícios das intervenções terapêuticas e
proporcionar maior qualidade de vida.

Desse modo, estudos em psicossomática mostram-


se importantes para fortalecer as bases científicas que
contribuirão para a construção de um novo paradigma
que contemple, dentro do campo da psicossomática, os
fundamentos teóricos, as bases fisiológicas e as implicações
na saúde integral e coletiva (CRUZ, 2011).

Com base nessa compreensão, vejamos o que Machado et al.


(2007) entendem a respeito dessas implicações:

Palavra do Especialista
“Integralidade no cuidado de pessoas, grupos e coletividade

 tendo o usuário como sujeito histórico, social e político,


articulado ao seu contexto familiar, ao meio ambiente e a
sociedade na qual se insere.” (MACHADO et al., p. 123, 2007).

A Constituição da Organização Mundial da Saúde (OMS)


define a saúde como um estado de completo bem-estar
físico, mental e social, e não simplesmente a ausência de
doença ou enfermidade. Essa definição é uma concepção
bastante ampla da saúde, que vai além do enfoque centrado
na doença, abrangendo fatores biopsicossociais, com uma
visão mais integral do indivíduo e seu estado de saúde (BUSS;
PELLEGRINI FILHO, 2007).

15 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


SAÚDE DO TRABALHADOR
Ao longo da história, a palavra “trabalho” vem recebendo
diferentes definições. O termo é um importante determinante
da forma de organização das sociedades, sendo o meio
através do qual o homem constrói o seu ambiente e a si
mesmo. Para Beck et al. (2009), o trabalho visa a duas
finalidades essenciais na vida do indivíduo. Vejamos essas
finalidades na imagem a seguir.

Procura do prazer e da
satisfação com suas
Reprodução Social FINALIDADES realizações, enfatizando
DO TRABALHO as potencialidades como
Possibilidade ser humano.
de satisfazer as NA VIDA DO
necessidades, a partir
da aquisição de bens INDIVÍDUO Expressão Como Sujeito
de consumo.

Figura 4:
Finalidades do
trabalho na vida do
indivíduo. Fonte:
Dessa forma, podemos dizer que na nossa sociedade o
labSEAD-UFSC
(2020). trabalho é mediador da integração social, tanto por seu valor
econômico quanto cultural, influenciando o modo de vida das
pessoas e, consequentemente, sua saúde física e mental.

Assim, no Brasil, a área da Saúde do Trabalhador surge no


contexto do Movimento da Reforma Sanitária, que tinha como
proposta uma nova concepção de Saúde Pública. Essa reforma
também serviu como uma resposta institucional aos diversos
movimentos sociais que, entre a metade dos anos 1970 e os
anos 1990, reivindicava a Saúde do Trabalhador como parte
do direito universal à saúde, e não apenas ações dissociadas
da atenção individual, resumidas a campanhas e programas
(BRASIL, 2005).

16 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Neste contexto, considerando as ideias de
Lacaz (2000), podemos constatar que a Saúde
do Trabalhador é o campo de práticas e
co¬nhecimentos cujo enfoque teórico-metodológico
no Brasil surgiu da Saúde Coletiva, no intuito de
conhecer e intervir nas relações de trabalho e
saúde-doença, as quais têm como referência central
o surgimento da classe operária industrial, numa
época em que a sociedade vivenciava profundas
mudanças políticas, econômicas e sociais.

De acordo com o mesmo autor, a partir da década de 1980, a


configuração do campo Saúde do Trabalhador é constituída
por três vetores. Vamos conhecê-los na imagem seguinte.

PROGRAMAÇÃO
PRODUÇÃO MOVIMENTOS DOS
EM SAÚDE NA
CIENTÍFICA TRABALHADORES
REDE PÚBLICA

Figura 5:
Configuração
da Saúde do
Trabalhador.
Fonte: labSEAD-
SAÚDE DO TRABALHADOR
UFSC (2020).

17 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Vejamos também o que Nardi (2004) diz sobre a saúde do
trabalhador no Brasil.

Um conjunto de conhecimentos oriundos de


diversas disciplinas que, aliado ao saber do
trabalhador sobre as condições e a organização
do trabalho, estabelece uma nova forma de
compreensão da relação saúde-trabalho.

A partir da constituição do campo teórico das mudanças no


campo do trabalho, propõe-se, assim, uma forma diferente
de atenção à saúde dos trabalhadores e de intervenção nos
ambientes de trabalho, entendendo atenção à saúde como um
conjunto de ações de promoção, prevenção, cura, reabilitação
e de vigilância em saúde.

Dessa forma, rompe-se com a concepção hegemônica que


estabelece um vínculo causal entre a doença e um agente
específico, ou a um grupo de fatores de riscos presentes no
ambiente de trabalho.

Figura 6: O
esgotamento
do trabalhador
relacionado ao
processo produtivo.
Fonte: Pixabay
(2020).

18 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Podemos perceber que a saúde do trabalhador tenta superar o
enfoque que situa sua determinação no meio social, reduzido
ao processo produtivo, desconsiderando a subjetividade.

Assim, busca-se explicar o adoecimento dos


trabalhadores através do estudo dos processos de
trabalho, de uma forma articulada com o conjunto de
valores, crenças e ideias, as representações sociais e
a possibilidade de consumo de bens e serviços.

As formas como os indivíduos vivem, sofrem e se realizam no


ambiente laboral estão intimamente associadas ao valor moral
atribuído ao trabalho e à importância deste na configuração da
sua imagem (NARDI, 2004).

19 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Aula 2 – Prazer e Sofrimento no Trabalho

CONTEXTUALIZANDO...
Os problemas de saúde do trabalhador se devem a velhas
razões, mas isso não significa que não existam novas
situações que reflitam na saúde do trabalhador no mundo
do trabalho contemporâneo. Porém, alguns problemas
continuam a ser observados quando há falta de sintonia entre
os contextos de trabalho e os trabalhadores. Essa sintonia
não está dada ou pronta, mas deve ser construída. Nesse
contexto, regras e limites sempre existirão, e o problema não
é a existência dessas limitações, mas a impossibilidade de
negociá-las, de modificá-las e reconstruí-las, a partir não
apenas de uma lógica instrumental, mas também de uma
lógica dialogada (SATO, 2002).

No âmbito da relação saúde e trabalho, os trabalhadores


buscam o controle sobre as condições e os ambientes de
trabalho para torná-los mais “saudáveis”, mas, isso nem
sempre é possível. Nesse sentido, considerando o lugar que
o trabalho ocupa na vida e as suas consequências na saúde
do trabalhador, é de suma importância perguntar como está
a saúde dos profissionais.

Autores como Antunes (1995) e Dejours (1997) defendem


que o trabalho, além de promover a sobrevivência e mediar
a ordem individual e a ordem coletiva, é um acontecimento
social que contribui para a construção da identidade
do sujeito. Ele pode ser fonte de prazer ou sofrimento,
dependendo das condições de organização, das relações
socioprofissionais e, especialmente, da percepção e da
capacidade de enfrentamento do trabalhador frente às suas
demandas laborais.

Assim sendo, vamos seguir com nossos estudos e conhecer


mais sobre o prazer e o sofrimento no trabalho.

20 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


PRAZER NO TRABALHO
A estreita relação entre trabalho e adoecimento é bastante
complexa e vem sendo objeto de inúmeros estudos científicos
e intervenções técnicas que buscam soluções eficazes frente
às problemáticas ocasionadas pelas disfunções que ocorrem
quando há má relação saúde-trabalho. Nessa perspectiva,
são desenvolvidas diversas pesquisas, programas e projetos
relacionados à saúde do trabalhador e à qualidade de vida no
trabalho, que buscam discutir a importância do alinhamento
entre os interesses das instituições e as expectativas
e necessidades dos trabalhadores para, então, propor
alternativas que contemplem a prevenção de doenças e a
promoção da saúde dos trabalhadores e, consequentemente,
o aumento da produtividade (MEZOMO; OLIVEIRA, 2015).

Se considerarmos um contexto mais amplo, podemos dizer


que a relação trabalho-indivíduo, se pensada sob o prisma do
prazer e/ou sofrimento, envolve diversos aspectos que devem
ser objeto de discussão e reflexão.

A preocupação com o bem-estar, com a melhoria da


qualidade de vida dos trabalhadores e a prevenção
de doenças ocupacionais deve ser uma constante
nas instituições de segurança pública.

Essas instituições precisam desenvolver estratégias


capazes de minimizar os efeitos nocivos do estresse e do
sofrimento ocupacional, que frequentemente desencadeiam
somatizações. Vamos identificar na imagem a seguir o que
pode ser gerado a partir dessas somatizações no profissional.

21 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Figura 7: Resultados
do sofrimento
ocupacional.
Fonte: Pixabay
(2020), adaptado
por labSEAD-UFSC
(2020).

Sabemos que o trabalho é impulsionado pelo seu significado,


como ato de transformar a natureza e colocar a nossa
identidade no mundo, oferecendo benefícios para a
sociedade. Na atualidade, ocorreram muitas mudanças na
área profissional, e as instituições buscam melhorar seu
relacionamento com o trabalhador, mas grande parte dos
indivíduos ainda enxerga o trabalho como algo que requer
muito sacrifício e esforço.

Os problemas sempre serão inevitáveis em qualquer


área da vida e são muito comuns nos ambientes
laborais, mas podem ser enfrentados, resultando
em experiências positivas e aprendizagens
significativas para o sujeito, na sua vida profissional
e pessoal (CODO, 2006).

Para Barros e Barros (2007), a organização tem


responsabilidades com a saúde física e emocional dos
funcionários. Dessa forma, deve ser capaz de gerar
sentimentos positivos, em situações que possibilitem que os
trabalhadores se sintam úteis, autônomos e reconhecidos.

22 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Com as instituições assumindo novos modelos
administrativos com intuito de proporcionar ao trabalhador
maior realização pessoal, o sentimento de importância e
eficácia dos profissionais é fruto do prazer do trabalhador.

Esses modelos também destacam o papel dos próprios


colegas de trabalho na contribuição do prazer no ambiente
corporativo, estimulando a compreensão do trabalho como
atividade humana essencial e coletiva, resultando em um
encontro de si próprio e do outro, que estabelece um processo
contínuo de novas reflexões.

Figura 8:
Cooperação entre
os colegas para
estimular o prazer
no trabalho. Fonte:
Pixabay (2020).

Geralmente, a satisfação com o trabalho está associada ao


reconhecimento, valorização e desempenho do profissional,
aspectos fundamentais para produzir prazer ambiente
laboral. O prazer no trabalho é capaz de gerar sentimentos de
autorrealização como: orgulho, confiança, responsabilidade,
além de fortalecer a identidade própria do indivíduo.

23 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Palavra do Especialista
Vivenciando o prazer, o trabalhador adquire novas formas
de lidar com o dia a dia, possibilitando um ato de reflexão e

 ressignificação a respeito da organização, do seu propósito,


atribuição, colaboração e relação, como consequência,
reproduz uma união coletiva e afetiva com outros profissionais
(GLANZNER; OLSCHOWSKY; KANTORSKI, 2011).

Contudo, a concepção do trabalho como fonte de prazer


é bastante complexa, tendo em vista as exigências dos
procedimentos administrativos, a repetitividade da rotina, a
pressão por resultados e os relacionamentos interpessoais.
Geralmente, procura-se compensar a monotonia das
atividades com mais conforto físico, o que não é capaz
de proporcionar prazer, e sim apenas auxilia. Outro fato
importante é a falta de cultura e lazer, justificada por falta de
recursos ou de infraestrutura (LIMOGI-FRANÇA, 2006).

Antigamente, o ambiente laboral saudável envolvia apenas


aspectos de segurança física. Já, nos dias atuais, envolve a
promoção da saúde, como de comportamentos e estilos de
vida positivos, ou seja, aspectos psicossociais.

Nesse contexto, Day, Harling e Mackie (2015) consideram que


o local de trabalho é o lugar mais propício para a realização
de projetos ligados à saúde e ao bem-estar. Esses autores
também destacam seis âmbitos genéricos dos ambientes
psicologicamente saudáveis. Vamos conhecê-los na
imagem a seguir.

24 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


1 Saúde e segurança.

2 Equilíbrio entre vida profissional e pessoal.

3 Cultura e respeito.

Figura 9: Âmbitos 4 Envolvimento e desenvolvimento dos trabalhadores..


genéricos dos
ambientes
psicologicamente
saudáveis, segundo
5 Conteúdo e características do trabalho.
Day, Harling e

6
Mackie (2015).
Fonte: labSEAD- Relações interpessoais.
UFSC (2020).

Então, podemos supor que se sentir respeitado e


valorizado, ter realização profissional e o êxito nas relações
interpessoais contribuem consideravelmente para que o
agente de segurança se sinta motivado e capaz de atuar
com maior facilidade diante dos obstáculos e perigos que
enfrenta no seu quotidiano laboral.

SOFRIMENTO NO TRABALHO
Santos, Hauer e Furtado (2019) explicam que, ao longo da
história, o sofrimento humano recebeu várias significações, de
castigo dos deuses na Grécia antiga à bruxaria medieval como
consequência do pecado judaico-cristão, sempre exigindo do
ser humano uma explicação. A palavra sofrimento origina-se
do grego pathos, ou seja, aquilo que afeta o homem.

Com o surgimento da medicina moderna, a partir do século


XVIII, a dimensão do sofrimento adquire moldes de ciência
empírica. Assim, a medicina precisava definir o seu objeto de
estudo, o que fez a doença ser reduzida ao corpo do sujeito
adoecido, com necessidade e possibilidade de localização
anatômica, permitindo, assim, à medicina adequação aos
critérios de cientificidade.

25 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Contudo, Santos, Hauer e Furtado (2019) afirmam
que uma consequência de tal reducionismo foi
a exclusão do âmbito terapêutico e de todo o
sofrimento em sua dimensão subjetiva.

Nesse contexto, vamos entender historicamente os moldes da


ciência empírica:

1
Nascimento da Psiquiatria

Tem como foco se ocupar do sofrimento psíquico, ou seja,


o estudo das doenças mentais. No entanto, havia nessa
missão um dilema: naquela época, algo entendido como
doença, quando localizado no corpo orgânico e mente, não
possuía localização de apreensão orgânica. Como saída, a
psiquiatria encontrou uma forma de solucionar tal dilema:
a explicação pela vida da causalidade orgânica para
doenças no aparelho mental, decompondo o sofrimento
psíquico em seus elementos de base, para depois
compreender, classificar, estudar e tratar tais doenças.

2
Nascimento da Psicanálise

No século XX, surge uma nova forma de ver o sofrimento


psíquico. O sofrimento deixa de ser lido na superfície do
corpo e passa a ser compreendido como uma mensagem a ser
Figura 10: Histórico
dos moldes da decifrada. Para a psicanálise, o sofrimento psíquico constitui-
ciência empírica.
se em uma experiência subjetiva, uma vez que cada indivíduo
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020). vivencia um mesmo evento de forma diferente.

26 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Deve-se considerar que o sofrimento é um fenômeno inerente
ao trabalho quando um indivíduo não encontra meios para
superar esse sofrimento e transformá-lo em prazer. Assim, o
trabalho se torna uma fonte de sofrimento patológico, já que
esse sujeito não encontra meios de dar vazão ao sofrimento
encontrado no trabalho, sobretudo quando as formas como
esse trabalho se organiza bloqueiam as possibilidades de
expressão e negociação.

Palavra do Especialista
“Nesse sentido, abordando o sofrimento psíquico do trabalhador,
a patologia surge quando ocorre o rompimento do equilíbrio
e o sofrimento deixa de ser contornável, ou seja, quando

 o trabalhador já se utilizou todos os seus recursos tanto


psicoafetivos, quanto intelectuais para responder às demandas
impostas pela organização e conclui que não há mais o que
fazer para adaptar-se ou para transformar o seu trabalho.”
(SANTOS; HAUER; FURTADO, 2019, p. 18).

O sofrimento no trabalho afeta o trabalhador, seus familiares


e a própria instituição, uma vez que ocasiona o aumento dos
afastamentos médicos e do absenteísmo, maior frequência
de acidentes de trabalho, redução da eficácia e sobrecarga de
trabalho dos demais profissionais (DOLAN, 2006).

Reconhecer e compreender as características presentes nos


ambientes laborais capazes de afetar a saúde do trabalhador
não é uma tarefa fácil, pois cada contexto laboral tem suas
especificidades, que exigem um diagnóstico situacional
desenvolvido por técnico especializado, como um psicólogo
organizacional, por exemplo.

27 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Seguindo as ideias de Rossi (2013), podemos
entender que relações interpessoais conflituosas
com colegas e chefias, impossibilidade de
crescimento, falta de autonomia e de condições de
trabalho são fontes de estresse no trabalho. Bem
como burnout, assédio moral e sexual são situações
que causam extremo sofrimento e podem afetar
drasticamente a saúde do trabalhador.

Vejamos, na figura a seguir, o conceito de assédio moral e


sexual, bem como suas consequências.

Caracterizado pela CONSEQUÊNCIAS


humilhação contínua ao Geram dano moral e
trabalhador, visando forçar prejuízos na saúde mental
a sua demissão. Ele se dá e física do trabalhador,
através da repetição de resultando em ansiedade,
comportamentos abusivos depressão, estresse
e constrangedores, pós-traumático, burnout,
de inferiorização, incapacidade laboral e até
amedrontamento, mesmo ideação suicida e/
indiferença, isolamento, ou desemprego. (CATALDI,
ASSÉDIO MORAL
entre outros. 2015).

Caracterizado por
comportamentos de teor
sexual desrespeitoso, em CONSEQUÊNCIAS
que geralmente o agressor As consequências são
– que pode ser um colega diversas: ansiedade, baixa
de trabalho ou um superior autoestima, redução da
hierárquico – manifesta o produtividade, absenteísmo,
assédio com insinuações, depressão, afastamento por
gestos e contato de doenças, demissão, entre
origem sexual, chantagens, outras (BRASIL, 2019).
ameaças e/ou promessas de
ASSÉDIO SEXUAL promoções, além de outros.

Figura 11: Assédio moral e sexual e suas


consequências. Fonte: labSEAD-UFSC (2020).

28 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Sabemos que qualquer tipo de trabalho possui fatores
potencializadores da motivação ou da frustração, do bem-
estar ou adoecimento. Contudo, existem especificidades das
instituições de segurança pública que merecem ser discutidas
com maior profundidade, tendo em vista as consequências na
saúde dos profissionais, como é o caso dos profissionais de
segurança pública.

Vamos seguir com nosso estudo e conhecer sobre o


sofrimento psíquico no contexto da segurança pública.

Sofrimento psíquico no contexto da


segurança pública
Conforme Santos, Hauer, Furtado (2019), o sofrimento psíquico
pode ser compreendido como uma experiência subjetiva,
vivenciada de maneira distinta por cada indivíduo. Tal sofrimento
pode se manifestar através de sintomas, angústias, inibições,
compulsão, repetição, entre outros. Também pode ser
entendido como um conjunto de fatores psicológicos que
afetam o funcionamento adequado de um indivíduo, que foge
de seu domínio pessoal, causando-lhe sofrimento, atrelado a
sentimentos desagradáveis ou emoções que o afetam.

Estudos que relacionam saúde mental e trabalho nas mais


diversas categorias profissionais ainda são recentes no
contexto acadêmico científico. A França, país pioneiro nesse
tipo de pesquisa, desde a Segunda Guerra Mundial, vem
elaborando projetos com contribuições da Psiquiatria Social.
No Brasil, somente a partir dos anos 1980 houve impulso
desse tipo de pesquisa, sendo ainda escassos programas de
prevenção e promoção de saúde mental dos trabalhadores em
nosso país (AMADOR et al., 2002).

Apesar dessa incipiência de trabalhos, pesquisas e o


estabelecimento de bases metodológicas referentes à relação
trabalho-saúde junto às polícias vêm ocupando lugar de
destaque tanto no meio acadêmico quanto nas próprias
instituições policiais.

29 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Esse processo de debate se deu especialmente em
razão da peculiaridade da função, ou seja, o contexto
de risco diário atrelado ao movimento histórico
social, que, a partir da abertura da democracia no
Brasil, coloca em discussão a prática dos policiais,
entre outros assuntos decorrentes da função que
antes eram sigilosos.

Para Santos, Hauer e Furtado (2019), quando o peso psíquico


do trabalho é grande, isso resulta em tensão e desprazer, além
de fadiga, astenia e outras patologias.

Redução ou
perda da força e É importante destacar que profissionais de segurança pública
resistência física. têm sua missão constitucional, os seus deveres, como a
preservação da ordem pública, a segurança e a proteção das
pessoas e do patrimônio. Essa missão se dá por meio de
policiamento ostensivo, prisão de sujeitos que transgridam a
lei, orientação e advertência à população e os mais diversos
tipos de ocorrência.

Santos, Hauer e Furtado (2019) ainda entendem que a


profissão do policial está intimamente ligada a muita
cobrança institucional, disciplina rígida e um alto risco
ocupacional. A rotina desse profissional em sua função pode
provocar danos à sua integridade física e de outros.

Ser policial, portanto, pode ser entendido como estar


num alto grau de vulnerabilidade ao sofrimento
psíquico, uma vez que sua rotina de trabalho é
marcada por tensão e perigos constantes.

Um fator de destaque associado à atividade policial são os


distúrbios de sono. Esse deficit orgânico pode ocasionar uma
série de consequências para a vida do profissional. Vamos
conhecer algumas delas na figura a seguir.

30 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Condução
perigosa de
veículos

Erros
Absenteísmo
administrativos

Figura 12:
Consequências do
distúrbio do sono. Rompimento da Raiva de
Fonte: labSEAD- segurança por maneira
UFSC (2020).
conta da fadiga descontrolada

Santos, Hauer e Furtado (2019) ainda descrevem outra


característica que pode ter impacto na saúde mental do
policial: a exposição maior a tragédias humanas, que
coloca o profissional em risco para o desenvolvimento de
transtornos mentais, além de potencial risco para abuso de
álcool e outras drogas.

As instituições devem zelar pela saúde de seus profissionais,


ofertando ações de prevenção de doenças mentais,
especialmente do suicídio. Santos, Hauer e Furtado (2019)
apontam que a prevenção institucional deve considerar três
níveis, os quais estão apresentados na figura seguinte.

31 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


PREVENÇÃO PRIMÁRIA

É chamada de prevenção universal e diz


respeito à ação de conscientização acerca
da problemática de estratégias para
identificação e manejo, entre outros.

PREVENÇÃO SECUNDÁRIA

Direcionamento de grupos específicos


de baixo, médio ou alto risco de
cometer suicídio. Já existe, portanto,
a identificação dos possíveis grupos
de risco e as estratégias específicas
direcionadas a essa população.

Figura 13: Níveis PREVENÇÃO TERCIÁRIA


da prevenção
institucional contra
o suicídio. Fonte: Ação direcionada aos indivíduos que
labSEAD-UFSC já tentaram suicídio, com o objetivo de
(2020). impedir a repetição do ato.

Nesse sentido, a prevenção institucional se refere a uma


prevenção que tem por objetivo a sensibilização dos
gestores e/ou comandantes para que estejam capacitados
e busquem técnicos especializados para intervir de forma
assertiva quando for necessário. Um bom exemplo seria o
desenvolvimento de capacitações e esclarecimentos acerca
dos transtornos mentais, avaliações periódicas individuais e
institucionais sobre as fontes de estresse e sua incidência,
bem como campanhas educativas de incentivo a mudanças
comportamentais inadequadas, a superação de preconceitos e
estigmas e a valorização da qualidade de vida no trabalho.

32 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Aula 3 – Qualidade de Vida no Trabalho

CONTEXTUALIZANDO...
De acordo com Almeida et al. (2014), nos últimos anos,
há uma preocupação cada vez maior com a melhoria da
qualidade de vida do trabalhador, bem como um alerta maior
aos riscos aos quais o trabalhador pode estar exposto e
que podem ocasionar doenças ocupacionais e o aumento
dos atendimentos e afastamentos médicos, ocorrência de
acidentes de trabalho, redução da eficácia e absenteísmo.

Então, a preocupação com a qualidade de vida no trabalho


surge como empenho no sentido da humanização do trabalho.
Vamos seguir nossos estudos aprendendo sobre a qualidade
de vida no âmbito organizacional.

CONCEITOS E VARIÁVEIS
Existem inúmeros fatores que podem de alguma forma afetar
o ambiente de trabalho, gerando prejuízos no bem-estar e na
saúde do profissional e, consequentemente, na instituição a
que pertencem. Esses fatores podem ser considerados como
fontes de estresse e se diferem entre as profissões, atividades
desempenhadas e até mesmo entre os profissionais que
trabalham na mesma instituição, pois cada um terá a sua
percepção a respeito dos fatos, pessoas ou situações. Nesse
sentido, Santos (2010, p. 27) afirma que, “para algumas
pessoas, o local de trabalho pode trazer tranquilidade e
satisfação e para outras não”.

A preocupação com a qualidade de vida dos


profissionais no ambiente corporativo surge como
empenho no sentido da humanização do trabalho.

33 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Observa-se que a forma de estruturação do trabalho e das
organizações impõe uma necessidade de adaptação do
indivíduo aos parâmetros organizacionais, não considerando
os seus interesses e desejos. A abordagem da qualidade de
vida vem, então, agregar algumas preferências humanas no
desenho e gestão de princípios organizacionais, buscando
torná-los mais aceitáveis ao indivíduo e contribuir para a sua
qualidade de vida geral (SANT’ANNA, 2007).

Segundo Chiavenato (2004, p. 448), o termo “Qualidade de


Vida no Trabalho” surgiu na década de 1970, por Luiz Davis,
para referir-se à preocupação com o bem-estar geral e à
saúde dos trabalhadores no desempenho de suas tarefas.

O mesmo autor cita que atualmente o conceito se


refere aos aspectos físicos e psicológicos do local
de trabalho. Corresponde tanto às expectativas
e reivindicações dos trabalhadores quanto ao
interesse das organizações pelos efeitos na
produtividade e qualidade do trabalho executado.

Para tanto, as organizações necessitam de profissionais


motivados, comprometidos, atuantes. Estes, por sua vez,
precisam das condições ambientais adequadas, de um clima
organizacional favorável, do apoio e do reconhecimento da
equipe de trabalho (colegas) e dos gestores.

34 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Figura 14:
Profissional de
segurança pública
motivado. Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020).

Chiavenato (2004) ainda afirma que as organizações estão


cientes de que, para satisfazerem os clientes externos,
precisam primeiramente satisfazer os clientes internos, daí
a contínua valorização dos colaboradores ser a marca das
empresas internacionais. Ao investir diretamente em seus
colaboradores, a organização terá profissionais satisfeitos
que produzem melhor.

Nesse contexto, torna-se claro a importância da gestão


de qualidade de vida, para otimizar o potencial humano e
alcançar os objetivos organizacionais. Essa ideia de satisfazer
não só as organizações mas também os seus colaboradores
é primordial, pois o sistema capitalista acarretou perda de
poder do trabalhador sobre seu trabalho e de seu significado,
fazendo com que muitas vezes o trabalho seja percebido
como fonte de sofrimento para o indivíduo e de prejuízo para
sua qualidade de vida.

35 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Não se trata de uma tarefa fácil, contudo, tanto
quanto em outros contextos de trabalho, é preciso
identificar os valores praticados nas organizações, as
contradições entre os discursos correntes e a prática.

Para Rossi (2011), a qualidade de vida pode ser vista


mediante a análise de um conjunto de fatores relacionados
aos aspectos pessoais, sociais e profissionais. Não há
dúvida de que a valorização profissional é uma importante
variável nesse contexto, de maneira que isoladamente não
garante o bem-estar do profissional, mas deve ser uma
política a ser incrementada e valorizada pelos gestores.
Por outro lado, é necessário destacar que um profissional
desvalorizado tende à perseguição de comportamentos que
inviabilizam uma vida de qualidade.

Conforme Limongi-Franca (2003), a qualidade de vida no


trabalho envolve diversos fatores, os quais apresentamos na
imagem a seguir.

Relacionamento
interpessoal Satisfação com
a execução do
trabalho
Ambiente físico
e psicológico Possibilidades
de trabalho de progresso
Qualidade na organização
de vida no
Autonomia para trabalho
tomar decisões Remuneração
e benefícios

Possibilidades
de participar
ativamente das Reconhecimento
decisões da
organização

Figura 15: Fatores que envolvem a qualidade de vida do profissional no trabalho.


Fonte: labSEAD-UFSC (2020).

36 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Quando esses fatores são inexistentes, começa a ocorrer a
decadência da qualidade de vida, que se manifesta através
de vários indícios, como o surgimento de novas doenças,
dentre as quais prevalece o fenômeno do estresse. O estresse
está associado a variáveis que perpassam os níveis dos
enfrentamentos apreendidos pelos indivíduos, das exigências
de trabalho, do funcionamento do grupo e da organização.
Também está relacionado às influências exercidas pelo
ambiente externo ao sistema que está sob foco. Valores
destoantes podem estar na base da cultura que favorece
o desenvolvimento do estresse patológico e adoece a
organização de trabalho (ROSSI; MEURS; PERREWÉ, 2013).

Diante dessas necessidades, observa-se a importância


da implantação, desenvolvimento de ações, projetos ou
programas de qualidade de vida que estão diretamente
vinculados ao bem-estar dos profissionais.

Ou seja, investir em programas de qualidade de vida


é investir na saúde dos colaboradores, zelando pelo
ser humano. O resultado pode ser observado na
consolidação da cultura organizacional.

A opção por um programa de qualidade de vida deve ser


realizada com base em estudos relacionados à caracterização
psicossocial da organização, fundamentados nos princípios
e valores arraigados entre os trabalhadores. A partir dessa
dinâmica, é possível se mobilizar para a adoção de novas
práticas gerenciais e mudanças efetivas. (ROSSI; MEURS;
PERREWÉ, 2013).

A Organização Mundial de Saúde define qualidade de vida como:

37 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Palavra do Especialista
A percepção do indivíduo da satisfação de suas necessidades
 em busca de autorrealização e felicidade, independentemente
do seu estado físico, mental ou financeiro (OMS, 1998).

Assim, podemos supor que a qualidade de vida pode fornecer


o alicerce necessário para a promoção da saúde e prevenção
de doenças, no qual se faz necessário o equilíbrio entre os
diversos aspectos da vida do indivíduo: cuidados físicos,
família, trabalho, relacionamentos, espiritualidade e lazer.

Figura 16:
Atividade física
é um dos fatores
determinantes para
qualidade de vida.
Fonte: Pixabay
(2020).

A prática contínua de atividades físicas é um dos fatores


determinantes da relação entre saúde e qualidade de vida.
Geralmente está associada à prevenção de doenças ou
superação de dificuldades. Contudo, os cuidados físicos
ultrapassam a saúde corporal e abrangem a saúde mental,
auxiliando de maneira biopsicossocial o indivíduo, sendo
indicado para o tratamento de doenças como a depressão e
o transtorno de ansiedade. Entre os benefícios dos cuidados
físicos, podemos destacar:

38 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


• Aumento da autoestima.
• Melhora na qualidade do sono e redução do estresse.
• Auxílio no desempenho dos estudos, entre outros.

Os cuidados físicos não se restringem apenas a exercícios, mas


também à manutenção de uma alimentação equilibrada. Outro
fator importante é a moderação, a intensidade dos exercícios,
pois de forma demasiada pode acarretar malefícios.

Para os profissionais de segurança pública, os cuidados


físicos são essenciais, não estar com a saúde em dia
é um risco, devido a constantes situações que exigem
condicionamento físico adequado dos profissionais, visto
que na operacionalidade cotidiana frequentemente ocorrem
eventos inesperados e/ou de grande vulto.

Além disso, as guarnições estão cada vez com número de


efetivo reduzido, o que aumenta ainda mais a necessidade de os
profissionais estarem preparados para lidar com resistências de
conduzidos ou qualquer outro fator que exija preparo físico.

Saiba mais
Há países, por exemplo, onde há apenas um agente de

 segurança em cada viatura do serviço ordinário, porém,


no caso de necessidade de apoio, outras viaturas prestam
suporte rapidamente.

Mesmo em ocorrências simples, sempre haverá um grande


número de envolvidos, e o agente de segurança, muitas vezes,
precisará ter condições físicas para atuar de forma enérgica,
efetiva e resiliente.

Dependendo do contexto de atuação desses profissionais, os


equipamentos utilizados no trabalho podem chegar a pesar
mais de vinte quilos. É o caso de um equipamento comum:
os coletes. No Brasil, eles são usados nas corporações

39 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


e suas placas são muito pesadas, além de reduzirem a
mobilidade e serem extremamente quentes.

Figura 17: Colete


do profissional de
segurança exige
resistência física.
Fonte: Shutterstock
(2020).

No Brasil, outro fator que podemos destacar como atenção


aos cuidados físicos essenciais é o fato de a carga horária de
um profissional da segurança pública normalmente ser de 24
horas de trabalho por 72 horas de descanso. Isso acarreta a
diminuição da disposição dos profissionais para se exercitarem
de forma frequente e saudável, além do aumento do número de
profissionais que praticam pouca atividade física semanal.

A quantidade de horas a que os policias se expõem durante


o trabalho, seja sentados em patrulhas rotineiras dentro das
viaturas ou exercendo serviços administrativos nos quartéis,
contribui de forma significativa para o aumento no índice
de massa corporal não ideal para sua altura, tornando-
os sedentários, possibilitando morbidades relacionadas a
problemas de saúde de origem física como diabetes, hipertensão
ou colesterol alto (MINAYO; ASSIS; OLIVEIRA, 2011).

Outro aspecto fundamental para obtemos qualidade de vida é


o âmbito familiar, pois ocorre a formação e o desenvolvimento

40 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


do indivíduo, sendo importante no ciclo de parentesco e no
exercício de execução dos papéis sociais, também como
membro de uma família. Fazer com que a entidade familiar
seja saudável, na qual se possa encontrar afeto e carinho,
bem como apoio para superar as dificuldades, pode auxiliar no
desenvolvimento da resiliência, proporcionando ao indivíduo
inúmeros benefícios, os quais dificilmente serão substituídos
por outras áreas da vida.

Figura 18: A família


como aspecto
fundamental para
qualidade de vida.
Fonte: Pixabay
(2020).

A estrutura familiar, em sua convivência, permite que o agente


de segurança se desvincule dos problemas alheios das
demandas profissionais e volte a se atentar à sua intimidade
familiar, aos valores e ideias compartilhados por eles, onde
demandas próprias são de acordo com seus hábitos e
costumes desenvolvidos.

Ter a capacidade de dividir bem os momentos


profissionais, independentemente da energia
emocional gasta em serviço, com os momentos
entre familiares, é um desafio norteador que precisa
sempre de constante ressignificação e estratégia
emocional assertiva.

41 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Não é simples questão de levar ou não problemas do serviço
para casa e vice-versa, mas de construir crenças positivas
acerca do valor do trabalho exercido e de sua necessidade,
com ideia de integralidade, em que sua própria família é
afetada pelo bom andamento da vida em sociedade devido ao
serviço de outros agentes e também ao seu próprio.

Dessa forma, é propício zelar pelas relações


familiares saudáveis e resinificar os fatores
estressores diversos inerentes à profissão para se ter
maior qualidade de vida também em família, dando
significado complementar existencial ao agente.

Assim, é na própria convivência familiar que o agente poderá


manifestar suas vulnerabilidades e encontrar, por exemplo,
nos filhos, motivação para renovar o vigor e as energias. Ao se
desvencilhar dos equipamentos operacionais, dos coturnos, da
arma, da farda em geral, surge a mãe ou pai afetuoso, que, com
a mesma – ou mais intensa – coragem e disposição, manifesta
sua alegria de estar junto à família, transcendendo, assim,
os momentos tensos vividos no serviço, para canalizar sua
atenção afetiva aos seus entes queridos. É criar oportunidades,
com inteligência emocional, de convivência harmoniosa,
equilibrada e atitudes positivas.

Isso é apoiado por Souza e Hutz (2008), que apontam que os


relacionamentos contribuem para a promoção da saúde, bem-
estar e felicidade do indivíduo, além de serem importantes
para o desenvolvimento cognitivo, emocional e social. Podem
ser vistos como um processo dinâmico em que ocorre
transformações devido aos aspectos culturais e sociais.

Os relacionamentos estão, portanto, ligados a sentimentos


de prazer, companheirismo, confiança, reciprocidade,
compreensão, altruísmo, além de honestidade, compromisso,
respeito, espontaneidade, cuidado, expressão de sentimentos

42 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


e tantos outros. Dessa forma, pode-se analisar os
relacionamentos saudáveis como um fator terapêutico.

Para isso, é preciso ativar a mente para não cair


no automático nos relacionamentos familiares,
mas ser também ali constantes oportunidades de
comunicações afetivas como diálogo com interesse
na vida de cada membro familiar e em seus anseios.

Nesse contexto, é de suma importância que os


relacionamentos conjugais ou de amizade sejam funcionais e
saudáveis, pois são responsáveis por vínculos profundos para
o indivíduo, os quais se fortalecem através do respeito, do
amor, da intimidade e do investimento afetivo na relação.

Figura 19: Relações


saudáveis são um
importante aspecto
fundamental para
qualidade de vida.
Fonte: Pixabay
(2020).

Os indivíduos buscam nos relacionamentos uma ampla


afinidade emocional, mental e sexual, a fim de alcançar o
amor e a felicidade e satisfazer suas necessidades pessoais e
sociais. Algumas variáveis também devem ser consideradas,
como: motivos do início e histórico do relacionamento, divisão
financeira, diferenças de idade e cultura.

43 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


Direcionando para relações conjugais, Dessen e Braz (2005,
apud SCORSOLINI-COMIN; SANTOS, 2010) afirmam que os
relacionamentos conjugais são fundamentais tanto para a
qualidade de vida no aspecto familiar, como na percepção da
atuação de papéis de pais e mães entre os próprios cônjuges.

Na relação do casal, o equilíbrio entre a profissão,


a família e o espaço individual nem sempre é uma
tarefa fácil, mas é um aspecto a ser levado em
consideração para um relacionamento saudável,
sendo facilitado quando existe uma forte parceria
entre os dois.

Segundo Maldonado (2006), as crises sempre vão existir,


mas é preciso ver nelas uma oportunidade de abrir novos
Personalização: caminhos, vê-las por outros ângulos e ser mais flexível, pois,
a pessoa tende a após a superação, poderá ocorrer o aumento da autoestima,
atribuir culpa a si
o desenvolvimento da resiliência (capacidade de superar as
mesma, nas mais
diversas situações adversidades) e até mesmo o estreitamento dos laços.
que vive.
Distorções cognitivas como a da personalização ou do
filtro mental são desafios constantes pessoais que podem
levar o indivíduo a, sem perceber, interpretar de forma errônea
Filtro mental:
focamos nossa a convivência com seu cônjuge.
atenção somente em
aspectos negativos O lazer é outro aspecto importante. É através de atividades
e ignoramos todo o
de lazer que podemos relaxar, descontrair e sair da rotina.
resto.
Esses momentos são necessários à saúde, visto que nosso
corpo precisa de um equilíbrio, já que passamos tanto
É a condição de
relativa estabilidade tempo trabalhando ou lidando com responsabilidades, essas
da qual o organismo atividades de lazer são capazes de trazer a homeostase para
necessita nossa saúde física e psíquica.
para realizar
suas funções
adequadamente O lazer é algo subjetivo e pode ser executado de diversas
para o equilíbrio do formas como: passear, conhecer pessoas, descansar e muitas
corpo. outras atividades.

44 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


O importante é que nesses momentos ocorra um
sentimento de alegria e uma sensação de bem-estar.
Dessa forma, um tempo reservado para o lazer é
essencial para contribuir para uma melhora na
qualidade de vida.

A OMS criou um instrumento para medir a qualidade de vida, e,


entre os aspectos avaliados, estão a espiritualidade, a religião
e as crenças pessoais. Pode-se citar alguns dos fatores vistos
para análise nessa área, como otimismo e esperança, paz
interior, admiração e outros.

A espiritualidade está relacionada com o sentido da vida para


o indivíduo, ou seja, a maneira como o indivíduo percebe o
significado e o propósito de sua existência.

Os modelos mais antigos de organizações não davam muito


espaço para a espiritualidade, entretanto, nos últimos anos,
esse tem sido um dos temas pilares a ser trabalhado no que
tange à qualidade de vida e ao desenvolvimento pessoal e
profissional dentro das instituições.

Figura 20: A
espiritualidade
é um importante
aspecto
fundamental para
qualidade de vida.
Fonte: Pixabay
(2020).

45 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


A espiritualidade não necessariamente está ligada a práticas
religiosas, apenas reconhece que o ser humano possui uma
vida interior, alma e /ou espírito, que precisa ser alimentada,
agregando-se a outros temas como valores, ética, motivação,
liderança e equilíbrio.

A espiritualidade ajuda as pessoas a aumentarem o seu


nível potencial de realização, pois auxilia na reflexão
acerca dos problemas gerados pelos conflitos entre vida
de trabalho e pessoal, proporcionando aos indivíduos bem-
estar e motivação.

Por fim, podemos compreender o quão importante é


discutirmos e entendermos o que envolve a qualidade de vida
do profissional de segurança pública no âmbito corporativo.
O sofrimento que pode ser gerado pelo ambiente ou pela
exigência da função acarreta consequências graves para o
agente, então a quebra de estereótipos e o preconceito sobre
saúde mental é essencial.

Assim, lembre-se de preservar a sua saúde mental e o bem-


estar do convívio em sua unidade de trabalho. Saiba respeitar
seus limites, mas sempre cumprindo com seus deveres.

46 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


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50 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


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51 • Módulo 1 Saúde Mental e Qualidade de Vida


MÓDULO 2

PRINCIPAIS CONCEITOS
DA SAÚDE MENTAL:
DO NORMAL AO PATOLÓGICO
52 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico
Apresentação

A Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou, em 2017,


um relatório global intitulado “Depression and other common
mental disorders: gobal health estimates”, em que aponta o
Brasil como país com maior taxa de pessoas com transtorno
de ansiedade no mundo. São 9,3% dos brasileiros que, devido
à falta de auxílio em questões que envolvem a ansiedade,
desenvolveram transtornos (OPAS, 2017).

Antigamente o estresse era considerado um fenômeno


mente-corpo. Hoje é visto como um fenômeno complexo,
multifacetado ou holístico, envolvendo os componentes
mentais, físicos, emocionais e espirituais de bem-estar
(SEAWAR, 2009).

Os fatores que distinguem uma tristeza comum de um


transtorno de humor como a depressão são bem mais
complexos e merecem atenção.

Essas afirmativas demonstram transtornos desenvolvidos por


alto nível de estresse de um indivíduo, ou de sua exposição
à constante esforço mental e físico. Assim sendo, podemos
relacionar esse tema aos profissionais de segurança pública,
levando em consideração os serviços diários e os contextos
em que esses indivíduos estão inseridos. Esses profissionais
necessitam estar em constante estado de alerta, passam por
momentos estressantes, que elevam a ansiedade, e estão
propícios a terem traumas e desenvolverem transtornos.

Nesse sentido, vamos entender os principais conceitos da


saúde mental em relação aos problemas gerados pela função
do profissional de segurança, navegando por conceitos
que explicam transtornos psicológicos e mentais de sua
caracterização de normalidade ao seu nível julgado patológico.

53 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


OBJETIVOS DO MÓDULO
Conhecer a base teórica dos principais conceitos de saúde
mental, evidenciando os possíveis fatores patológicos nos
profissionais de segurança pública.

ESTRUTURA DO MÓDULO
• Aula 1 – Da Ansiedade Saudável aos Transtornos da
Ansiedade.
• Aula 2 – Do Estresse à Síndrome de Burnout.
• Aula 3 – Da Tristeza à Depressão.

54 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Aula 1 – Da Ansiedade Saudável aos
Transtornos da Ansiedade

CONTEXTUALIZANDO...
Como vimos na apresentação deste módulo, a Organização
Mundial da Saúde (OMS) publicou, em 2017, um relatório
global intitulado “Depression and other common mental
disorders: gobal health estimates”, em que aponta o Brasil
como país com maior taxa de pessoas com transtorno de
ansiedade no mundo. São 9,3% dos brasileiros que, devido
à falta de auxílio em questões que envolvem a ansiedade,
desenvolveram transtornos (OPAS, 2017).

Trata-se de um quadro complexo, principalmente se


relacionarmos o tema aos profissionais de segurança pública,
levando em consideração os serviços diários e os contextos
em que esses indivíduos estão inseridos. Esses profissionais
necessitam estar em constante estado de alerta, passam
por momentos estressantes, elevam a ansiedade e estão
propícios a terem traumas e desenvolverem transtornos.

Nesse sentido, vamos agora conhecer mais sobre a


ansiedade, em seu processo caracterizado como saudável até
evoluir aos transtornos.

ANSIEDADE SAUDÁVEL
Os profissionais de segurança pública necessitam estar
em constante estado de alerta, pois passam por momentos
estressantes, elevam a ansiedade e estão propícios a terem
traumas e desenvolverem transtornos.

O cotidiano laboral os coloca em situação de vulnerabilidade


ao sofrimento psíquico e, infelizmente, o auxílio psicológico
não é prioridade na maioria das corporações. Além da falta
de priorização do serviço, os próprios profissionais não estão

55 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


habituados com atendimento psicológico, havendo muito
preconceito em relação aos que buscam apoio, como se
estivessem admitindo que estão se tornando loucos ou fracos
(MINAYO; ASSIS; OLIVEIRA, 2008).

Nas profissões em que ocorrem fatores como má


remuneração, desgaste físico constante e risco de morte
do indivíduo, existe grande possibilidade do surgimento de
doenças psíquicas.

No caso dos profissionais focados neste estudo,


o agravante na carreira policial é que, mesmo em
seus momentos de folga, o agente de segurança
não pode diminuir seu estado de alerta. Há estudos
que mostram que o maior número de homicídios de
policiais ocorre quando estão de folga, em ambiente
alheio à profissão.

Com o crescimento do crime organizado, há uma preocupação


constante com a possibilidade de o agente de segurança
estar sendo monitorado, ou ser reconhecido por algum
criminoso. Assim, essa sensação contínua de perigo aumenta
a probabilidade do surgimento de transtornos de ansiedade
como a síndrome do pânico, por exemplo.

Figura 1:
Transtornos de
ansiedade podem
alterar o humor.
Fonte: Pixabay
(2020).

56 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Dentro desse contexto, a cultura policial traz a ideia de que
os profissionais de segurança são agentes 24 horas por dia,
resultando em uma pressão psicológica que traz grandes
problemas futuros.

Poucos são os que agentes que conseguem ter uma vida


social fora da função. A maioria vive sob pressão e não
consegue se desligar da ostensividade, da patrulha, do medo
de criminosos. Nesse contexto, há relatos de policiais que
dormem com a arma embaixo do travesseiro, pois acreditam
que, se algum criminoso adentrar em sua casa, estarão
prontos para reação.

Para muitos, isso é encarado como uma forma de se proteger.


Mas quando esse policial tem o seu momento de tranquilidade
mental, o descanso psicológico que todo ser humano precisa
ter? Quanto tempo a mente humana consegue manter a
sanidade vivendo dessa forma? (VIROTE, 2018).

Na Prática
Olhe para seu cotidiano e relembre quais os momentos de lazer/
prazer que você reserva em sua semana para serem desfrutados.

Relembre os momentos aos quais você se dedica durante a semana,


além de sua jornada de trabalho. Momentos que te fazem esquecer
 tudo à sua volta e que te mantêm ocupado prazerosamente.

Então, escreva num papel quais são esses momentos e se


dedique mais a eles, sempre que possível. E, caso você não
tenha relembrado nenhum, não acha que está na hora de
reservar um horário na sua semana para seu lazer?

Frequentemente, escutamos os profissionais de segurança


pública relatarem que estão ansiosos. Mas, afinal, isso é algo
bom ou ruim?

57 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Normalmente, associa-se a ansiedade a algo patológico, ruim,
ou que não deveria ser sentido. Mas será mesmo que não
deveria? Só de estar ansioso, já significa que você está doente?

Figura 2:
Questionamentos
relacionados à
ansiedade. Fonte:
Pixabay (2020),
adaptado por
labSEAD-UFSC
(UFSC).

São muitos os questionamentos que podem ser feitos em


relação à ansiedade.

Portanto, vamos conhecer alguns subsídios para


que você consiga diferenciar a ansiedade saudável
dos transtornos de ansiedade, para compreender
como ela pode afetar sua saúde e o seu trabalho.

Na Biblioteca Virtual em Saúde do Ministério da Saúde


(2011), em termos não técnicos, encontram-se definições de
“ansiedade” como: angústia e perturbação devido às incertezas,
relacionada com contextos de perigo etc. Ao mesmo tempo, a
Biblioteca informa que, em aspecto técnico, a ansiedade é um
fenômeno que pode tanto beneficiar quanto prejudicar o sujeito,
só dependerá da situação e da intensidade em que ela se

58 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


enquadrará. É, portanto, incorreto atribuir à ansiedade apenas
definições negativas.

Em seu momento saudável, a ansiedade é um mecanismo


do cérebro que estimula o indivíduo a ter ações e reações,
preparando-o para eventos futuros, servindo como um alerta
nessas situações adversas inesperadas.

Ou seja, é positiva quando não é desproporcional


à ameaça objetiva, impulsionando o indivíduo a
tomar atitudes.

Já os malefícios ocorrem quando a ansiedade provoca o


efeito contrário, devido ao excesso, paralisando o sujeito e
alterando seu desempenho no dia a dia, causando sintomas
físicos e psicológicos.

É algo que o profissional de segurança pública experimenta


diariamente no seu cotidiano de trabalho, pois vive sob
pressão e tensão constante devido ao perigo, à instabilidade
e diversidade da sua atividade. É necessário saber diferenciar
se a reação ansiosa possui uma duração curta ou longa,
se é autolimitada e se está relacionada ao estímulo que
ocorreu no momento, pois a ansiedade patológica surgirá
se o profissional internalizar como negativas as situações
adversas, tanto da sua vida profissional como pessoal.

Figura 3: É
importante que o
agente esteja atento
aos seus sintomas
de ansiedade.
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020).

59 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Atualmente, há uma pressão para que se consiga dar conta
do trabalho, da família, da vida social, dos cuidados com a
saúde, a espiritualidade, o desenvolvimento intelectual, e
tantos outros aspectos, e que tudo isso esteja muito bem
equilibrado e executado.

Precisamos encontrar estratégias saudáveis e prazerosas


para balancear o lado bom e as dificuldades da nossa
vida, pois encontrar o equilíbrio não é fácil, leva tempo,
precisamos ser pacientes e persistentes para tirar proveito
dos erros e crescer com eles.

Assim, por mais que não seja desenvolvido um transtorno,


pelo menos em algum momento da vida passaremos por
um pico de ansiedade elevada, que deverá ser identificada e
tratada para evitar sua permanência.

Portanto, como qualquer coisa na vida, tudo em excesso


é prejudicial. Há o benefício da ansiedade de precipitar os
eventos e perigos, dando a oportunidade de preparação para
lidar com o que irá ocorrer, ou seja, apenas estar ansioso
não significa que você está doente, mas se não conseguir
administrar bem a ansiedade, pode desenvolver patologias,
transtornos que irão prejudicar o seu funcionamento físico,
mental e emocional (CASTILLO et al., 2000; PIMENTA, 2018).

Após a instrução do contexto positivo da ansiedade e de seus


excessos, serão discutidas as questões patológicas, ou seja,
os transtornos de ansiedade.

Para melhor facilitar o cuidado, a prevenção e até mesmo o


tratamento, é preciso obter mais informações sobre o que de
fato é o transtorno de ansiedade. A partir desse ponto, iremos
conceituar transtorno de ansiedade para depois darmos início
às características inerentes aos transtornos de ansiedade e às
formas de tratamento para cada um.

60 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico



Importante salientar que os transtornos ansiosos são
quadros clínicos primários, ou seja, eles não derivam
de nenhuma outra condição psiquiátrica (depressão,
esquizofrenia, bipolaridade, entre outros). Entretanto,
seus sintomas são encontrados frequentemente em
outros transtornos mentais, mas nada que determine
de fato que seja um tipo de transtorno de ansiedade.
E, em casos em que não é possível distinguir o que é
primário, devido à presença de muitos transtornos em

um paciente, o correto é considerar como um quadro
de comorbidade (CASTILLO et al., 2000).

A comorbidade é a
ocorrência de duas O transtorno de ansiedade tem como característica o
ou mais doenças medo e/ou ansiedade crônica e intensa, perturbações no
relacionadas no comportamento e pode ser desproporcional em relação à
mesmo paciente e
situação. As pessoas que possuem transtorno de ansiedade
ao mesmo tempo.
fazem o possível para evitar as circunstâncias que provocam
o sofrimento emocional criado pelo medo (WHITBOURNE;
HALGIN, 2015).

O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais


(DSM), em sua quinta edição do ano de 2014, acrescenta que
O Manual
Diagnóstico e o medo pode estimular um comportamento de luta ou fuga
Estatístico de e a ansiedade, um comportamento de cautela ou esquiva.
Transtornos Além disso, destaca que os ataques de pânico, que são
Mentais foi criado
uma resposta específica ao medo, ocorrem no transtorno
pela Associação
Americana de de ansiedade, mas não estão limitados a ele, podendo ser
Psiquiatria para desenvolvidos em outros transtornos mentais.
definir como é
feito o diagnóstico
de transtornos
mentais.

Figura 4:
Sensação de
pânico por
esgotamento
mental. Fonte:
Pixabay (2020).

61 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Os transtornos de ansiedade vão se caracterizar conforme os
objetos ou situações que geram o medo. Assim, dependem
do contexto, do conteúdo dos pensamentos ou das crenças
associadas. E cada transtorno de ansiedade somente é
diagnosticado quando não há relação dos sintomas com efeitos
fisiológicos devido ao uso de medicamentos ou substâncias ou
quando são mais bem explicados por outro transtorno mental
(AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014).

A Biblioteca Virtual em Saúde do Ministério da Saúde (2011)


destaca que os sintomas do transtorno são mais intensos
que a ansiedade diária, e enfatiza alguns sintomas como
principais. Vamos conhecê-los na imagem a seguir.

1 Preocupações e medos avulsos ou específicos.

2 Sensações que algo ruim irá acontecer e tensões.

3
Figura 5: Principais Falta de controle dos pensamentos e/ou
sintomas de comportamentos.
transtorno de
ansiedade. Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020). 4 Pavor em momentos difíceis.

A Biblioteca Virtual em Saúde do Ministério da Saúde


(2011) ainda acrescenta três formas de tratamento para
esses transtornos: uso de medicamentos de acordo com o
transtorno; psicoterapia e junção de psicoterapia com uso
de medicamentos.

Esses preceitos englobam o contexto geral do transtorno de


ansiedade, evidenciando-o em sua totalidade. O foco em cada
transtorno de ansiedade expandirá o seu conhecimento e
melhorará a sua percepção em relação ao tema.

62 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Assim como no DSM-5 (AMERICAN PSYCHIATRIC
ASSOCIATION, 2014), os transtornos serão apresentados a
seguir, de acordo com os estágios de desenvolvimento, sendo
sequenciados pela idade típica em que se iniciam.

TRANSTORNO DE ANSIEDADE DE
SEPARAÇÃO
O transtorno de ansiedade de separação é caracterizado
pela ansiedade em excesso e pelo medo de se afastar de sua
residência ou de se separar de alguém a quem possui apego.
Seus sintomas se desenvolvem normalmente na infância,
podendo se estender até a idade adulta e desencadear
outros transtornos de ansiedade e/ou de humor (AMERICAN
PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014).

É comum bebês passarem por um período de


desenvolvimento em que ficam mais ansiosos e agitados
quando são separados da figura de afeto. Entretanto, é a
continuação dessas emoções em níveis inadequados do
desenvolvimento que podem caracterizar o início desse
transtorno (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

Figura 6: Transtorno
de ansiedade por
separação. Fonte:
Pixabay (2020).

Esse transtorno gera um sofrimento emocional em crianças ou


adolescentes devido ao afastamento de seus cuidadores, pois,
quando separados, temem que algo de ruim possa acontecer

63 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


com eles ou com o ente querido. Então, os indivíduos fantasiam
e idealizam situações que podem afastá-los definitivamente
das suas figuras de ligação e, pela angústia, evitam essas
situações que poderão separá-los, mesmo sendo algo do
cotidiano, como os pais indo trabalhar, eles indo à escola,
relutância para dormir etc. (CASTILLO et al., 2000).

O apego, assim como a ansiedade, passa a ser excessivo,


criando até mesmo sintomas somáticos de ansiedade,
interferindo na sua autonomia, quando percebem que seus
criadores irão se ausentar. Dores, palpitações e vômito
são algumas reações físicas causadas por esse transtorno
(WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

Além disso, o DSM-5 (AMERICAN PSYCHIATRIC


ASSOCIATION, 2014) informa os critérios
diagnósticos para o transtorno de ansiedade de
separação, sendo necessário ter em evidência três
ou mais desses critérios.

São critérios separados de A até D e há mais oito critérios


dentro do A. Entre os principais sintomas estão: queixa de
sintomas somáticos, sofrimento excessivo e recorrente antes
da separação, relutância, preocupação, temor, pesadelos,
entre outros. Em adultos, os sintomas são comuns com
fobias específicas, transtorno obsessivo-compulsivo e
transtorno de personalidade.

Como tratamento, a terapia cognitiva-comportamental é a


mais indicada nessa condição. As técnicas comportamentais
para tratar medo e ansiedades são as que obtêm mais
eficácia, juntamente com o ensinamento parar adquirir
controle sobre situações provocadoras dessa patologia
(WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

64 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


É interessante para o tratamento a conscientização da família
e da escola sobre o transtorno, para que seja indicado que
estes auxiliem a autonomia da criança ou do adolescente.
Em casos mais severos, podem ser feitas intervenções
farmacológicas, mas deverá ser algo administrado com muita
cautela e limite (CASTILLO et al., 2000).

MUTISMO SELETIVO
Os indivíduos com mutismo seletivo são completamente
capazes de se comunicarem. Não há problemas em relação
à linguagem, entretanto, são pessoas extremamente
silenciosas, isso porque o principal aspecto desse transtorno
é o fato de o sujeito se recusar a falar em determinadas
situações (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

Essas pessoas têm características de serem tímidas


em excesso, isoladas e retraídas socialmente, ansiosas
e quase sempre têm sintomas de ansiedade social.

Ao se depararem com uma situação em que terão interação


social, o medo de constrangimento é grande, acarretando no
fracasso na fala. Logo, pessoas com mutismo seletivo não
iniciam a conversa ou respondem às perguntas que fazem para
elas. Apenas conseguem ter diálogos com os familiares mais
próximos AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014).

O DSM-5 (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014)


também traz critérios diagnósticos. Vamos entendê-los na
imagem a seguir.

Fracasso persistente na fala em situações de interação


Figura 7:
1 social em que é criada uma expectativa no sujeito.
Diagnósticos do
mutismo seletivo
Problemas em questões educacionais,
2
pelo DSM-5. Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020).
sociais e profissionais.

65 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


O tempo mínimo para diagnóstico é a permanência dos
sintomas por mais de um mês. E vale destacar que o fracasso
da fala não se dá por dificuldade com a linguagem e não é
mais bem explicado do que pelos transtornos de comunicação.

Como tratamento, Whitbourne e Halgin (2015) informam duas


maneiras de conduzir o processo. Vamos identificá-las a seguir.

MÉTODOS BEHAVIORISTAS

Utilizam modelagem e terapia de exposição como


meios adequados, o sujeito vai passando por etapas
para conseguir e estímulos para se expressar e, caso
obtenha êxito, vai sendo recompensado.

Figura 8:
Tratamento GESTÃO DE CONTINGÊNCIAS
do mutismo
seletivo, conforme Um método de abordagem comportamental que pode
Whitbourne e
Halgin (2015). Fonte:
ser feito em casa, sendo dada uma recompensa de
labSEAD-UFSC interesse do paciente ao conseguir realizar a interação.
(2020).

Agora que conhecemos sobre o mutismo seletivo, vamos seguir


nossos estudos para o conhecimento das fobias específicas.

FOBIAS ESPECÍFICAS
Segundo Whitbourne e Halgin (2015), fobia é o medo de
forma desproporcional e irracional motivado por um objeto
ou situação. E referente à fobia específica, afirmam que o
medo e a ansiedade criados por uma situação ou objeto são
extremantes acentuados e persistentes.

É comum as pessoas sentirem medo, entretanto, na fobia


específica, o sujeito elege uma situação ou um objeto que é
capaz de causar-lhe perturbações, mesmo se não representar
perigo, criando reações de esquiva, medo e ansiedade. A pessoa
evitará ao máximo ter contato com o que lhe causa esses
sentimentos e, caso não consiga ou não seja possível, suportará
com intenso sofrimento (CASTILLO et al., 2000).

66 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Figura 9: Pessoas
possuem fobias
específicas a cães.
Fonte: Pixabay
(2020).

Basta pensarmos em uma pessoa que possui medo de


cachorros: não importa se o cachorro é pequeno ou grande,
se está longe ou perto, se é filhote ou não, ou se ele está
oferecendo algum perigo. A pessoa que possui uma fobia
específica de cachorros apenas enxergará esse momento
como algo perturbador, seu medo e sua ansiedade serão
intensos, irracionais e desproporcionais a toda situação,
podendo causar até um ataque de pânico ao indivíduo. Será
dessa forma com qualquer indivíduo que possua esse tipo de
fobia, independentemente de sua categoria.

O DSM-5 (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014) relata


cinco categorias que organizam e especificam os estímulos
fóbicos, as quais estão apresentadas na imagem a seguir.

67 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Animal (ex: aranhas, cachorros,
cobras).

Ambiente Natural (ex: altura, água,


tempestades).

Sangue-injeção-ferimentos (ex: seringas,


procedimentos médicos).

Situacional (ex: locais fechados, avião).

Figura 10: Estímulos


fóbicos, segundo o
DSM-5 (AMERICAN
PSYCHIATRIC
ASSOCIATION, Outros (ex: barulhos, fantasias).
2014). Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020).

Desta forma, é mais fácil identificar e diagnosticar o sujeito,


além de ser possível identificar mais de uma fobia, pois é
comum que o paciente desenvolva muitas delas. É preciso
levar em conta também que, para haver o diagnóstico, é
necessário que as características que já foram citadas
estejam presentes no mínimo por seis meses.

Como tratamento, Whitbourne e Halgin (2015) apresentam


a terapia cognitivo-comportamental como a mais completa
em quesitos de métodos para beneficiar o indivíduo em
relação ao controle de seu transtorno ansioso. Técnicas como
dessensibilização sistemática fazem o sujeito substituir o
medo mediante alguns passos graduais. Vamos conhecer
esses passos na figura a seguir.

68 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Imersão e
imersão in vivo. Imersão
imaginária. Exposição
gradual. Interrupção do
pensamento.
Figura 11: Passos
para técnicas de
dessensibilização. Esses passos são meios para o indivíduo parar de interpretar
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020). os estímulos fóbicos de maneira equivocada, pois são
técnicas de exposição ao estímulo que visam extinguir a
reação desproporcional e irracional do medo e da ansiedade
e/ou formas de trabalhar o autocontrole para encerrar os
pensamentos provocadores de ansiedade.

Em casos de fobias específicas, o impacto não o ocorre


apenas no indivíduo que sofre desse transtorno, é necessário
um tratamento para o paciente e para as pessoas que são
próximas e precisam lidar com essa situação, ou seja, as
famílias também precisam a ser orientadas a buscarem
formas de reagirem e de encorajarem a aplicação das técnicas
que podem beneficiar o sujeito (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

TRANSTORNOS DE ANSIEDADE SOCIAL


(FOBIA SOCIAL)
O nome desse transtorno é sugestivo ou até mesmo
autoexplicativo.

Palavra do Especialista
O transtorno de ansiedade social (antes denominado no DSM-
4 como fobia social) é justamente o medo acentuado e/ou a

 ansiedade intensa desenvolvida pelo organismo do indivíduo


quando ele vivencia situações sociais comuns ou situações
sociais nas quais ele pode ser avaliado e julgado por outro
sujeito (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

Existe uma diferenciação dentro do transtorno de ansiedade


social. Vejamos suas tipologias na imagem a seguir.

69 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


O medo e a ansiedade
excessiva em sujeitos
Relacionado ao que evitam e temem
desempenho quaisquer situações
sociais, independente se
TRANSTORNOS estão relacionadas ao
O medo e a ansiedade DE ANSIEDADE desempenho ou não.
excessiva num sujeito
estão relacionados ao SOCIAL
contexto do trabalho Situações comuns
ou âmbito acadêmico.

Figura 12:
Diferenciações
de transtornos de
ansiedade social, Então, mas o que seriam essas situações comuns sociais?
conforme o DSM-5.
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020). Qualquer interação/evento social em que se possa ser
observado e se desempenhar diante do outro; ou seja, um
simples ato social como ser observado durante uma refeição,
a necessidade de conversar com uma pessoa desconhecida,
apresentar um trabalho para a classe e tantas outras
situações do cotidianos que envolvam contato com pessoas
desconhecidas ou não tão próximas ao indivíduo.

Essas situações podem desencadear sintomas de transtorno


de ansiedade social e interferir na produtividade e no bem-
estar em todos os âmbitos da vida de um ser humano
(AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014).

Palavra do Especialista
A rotina diária do sujeito pode ser comprometida juntamente

 com sua qualidade de vida. Além de desencadear um isolamento


social e outros sintomas devido aos pensamentos, emoções e
reações irracionais (PIMENTA, 2018).

Seus sintomas ocorrem devido ao desejo do indivíduo que possui


esse transtorno ansioso de não ser humilhado ou constrangido.
Portanto, a esquiva, o medo, a ansiedade e o sofrimento são
intensos, persistentes e desproporcionais ao real risco causado
pelo contexto social e sociocultural por no mínimo seis meses
(AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014).

70 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Importante salientar que também existem sintomas físicos
que são causados por esse transtorno, tais como:

• Taquicardia e sudorese.
• Calafrios ou calores súbitos.
• Tremores, hiperventilação, entre outros (CASTILLO et al., 2000).

De acordo com o DSM-5 (AMERICAN PSYCHIATRIC


ASSOCIATION, 2014), a frequência, a intensidade e a quantidade
de sintomas físicos, psicológicos e emocionais dão chances
de comorbidade com outros transtornos depressivos, como de
humor, por uso de substâncias, entre tantos outros.

Figura 13: A
frequência, a
intensidade e a
quantidade de
sintomas físicos,
psicológicos e
emocionais causam
transtornos. Fonte:
Pixabay (2020).

No tratamento para o transtorno de ansiedade social, assim


como de outros transtornos, pode haver o uso de medicamentos.

Palavra do Especialista
Embora a psicoterapia e métodos alternativos também sejam
ótimas formas de complementar o tratamento ou até mesmo
 conduzi-lo de maneira única, apenas dependerá da disposição
e do desejo do indivíduo de aceitar os métodos (WHITBOURNE;
HALGIN, 2015).

71 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


O terapeuta, de forma gradual, poderá expor o paciente de
maneira real ou imaginaria a alguma situação que cause
o transtorno ao paciente. Isso restaura os pensamentos
do sujeito, que costuma ser negativo e incapaz de ter uma
visão realista da situação social, gerando o comportamento
de evitação. Diante disso, ao entender como funciona o
transtorno individual do paciente, o terapeuta indicará um
caminho para seguir com o tratamento.

TRANSTORNO DE PÂNICO E AGORAFOBIA


Existe um mito na vida do ser humano que é: se você teve
um ataque de pânico, automaticamente você tem transtorno
de pânico. Porém, como já relatado, os ataques de pânico
não são exclusivos de transtorno ansioso. Todavia, esse
transtorno é diagnosticado devido aos ataques repentinos,
espontâneos e inesperados.

Palavra do Especialista
Ou seja, o transtorno de pânico se refere a ataques de pânico

 frequentes e inesperados, podendo acrescentar a existência


de crises de ansiedade e sintomas físicos e psicológicos
(PIMENTA, 2018).

Mas, afinal, o que é um ataque de pânico?

O DSM-5 (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014, p.




209) descreve:

O ataque de pânico é um surto abrupto de medo


intenso ou desconforto intenso que alcança um pico
em minutos e durante o qual ocorrem quatro ou mais
de uma lista de 13 sintomas físicos e cognitivos.

Vejamos, na imagem a seguir, os sintomas físicos que estão


relacionados aos ataques e ao transtorno de pânico.

72 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Figura 14:
Sintomas físicos
do transtorno de
pânico. Fonte:
Pixabay (2020),
adaptado por
labSEAD-UFSC
(2020

Além desses sintomas, ainda podemos destacar o medo


de “enlouquecer” e medo de morrer. A complementação
desses sintomas com os psicológicos e o agravamento e
frequência dos ataques de pânico são os maiores critérios
para um diagnóstico de transtorno do pânico (AMERICAN
PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014).

Na agorafobia, o medo e a ansiedade são desencadeados pela


exposição real ou antecipados das situações temidas. Nesse
transtorno, os ataques de pânico também são algo comum.

Palavra do Especialista
Entretanto, diferentemente do transtorno de pânico, a

 agorafobia é provocada pelo temor que as pessoas sentem


por acreditarem que estão em situações em que podem não
conseguir ajuda ou fugir caso seja necessário (PIMENTA, 2018).

Assim como nos outros transtornos, o indivíduo possui medo,


ansiedade e noção de risco desproporcionais da realidade.
Como características de identificação, podemos citar:

73 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


• Sensação de impotência.
• Humor deprimido.
• Ansiedade elevada em locais que não possuem fácil
acesso à saída.
• Outros sintomas semelhantes com outros transtornos.

Embora sejam transtornos diferentes, o tratamento pode ser


indicado da mesma forma. São de extrema importância e
relevância o acompanhamento de uma equipe multidisciplinar,
o auxílio de medicamentos, caso necessário, e as técnicas
utilizadas durante as psicoterapias.

O uso de técnicas de relaxamento ajuda a afastar os


pensamentos catastróficos e o comportamento irracional
do sujeito, e a terapia de controle de pânico, a reestruturar as
questões cognitivas e expor sinais que possam estar associados
ao momento de perturbação (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

TRANSTORNO DE ANSIEDADE
GENERALIZADA
No início do módulo, vimos que a ansiedade é uma reação
natural do organismo diante de casos que podem provocar
medo, dúvidas ou expectativas. Já a ansiedade generalizada
é exatamente o excesso de preocupação e expectativa
(PIMENTA, 2018).

Esse transtorno não necessita estar associado


a objetos, situações ou eventos para causar
perturbações no ser humano. Não existe um foco
nesse transtorno, então as pessoas não conseguem
descrever e não sabem o motivo da ansiedade diária.

É uma ansiedade que prejudica toda a qualidade de vida do


indivíduo, visto que proporciona uma preocupação exagerada
de que algo ruim irá ocorrer-lhe, e abrange os sintomas físicos
e psicológicos (WHITBOURNE; HALGIN, 2015).

74 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Os sintomas apresentados no DSM-5 (AMERICAN
PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014) devem perdurar no mínimo
por seis meses. Ou seja, o indivíduo apresentará, pelo menos
por seis meses, os sintomas que caracterizam o transtorno.
Vamos vê-los na imagem abaixo.

Inquietação

Irritabilidade Insônia

Figura 15: Sintomas


de transtornos Prejuízo
de ansiedade em âmbito Tensão
generalizada. Fonte:
profissional, muscular e
labSEAD-UFSC cansaço
(2020). social e pessoal

Como tratamento, Whitbourne e Halgin (2015) informam que


a melhor forma seria o reconhecimento de seus pensamentos
e suas ações, buscando meios alternativos de romper os
pensamentos negativos que se alojam nesse transtorno.
Esse processo pode ser feito com o auxílio da psicoterapia.

75 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Aula 2 – Do Estresse à Síndrome de
Burnout

CONTEXTUALIZANDO...
Inicialmente, os estudos sobre o estresse davam ênfase aos
aspectos físicos do processo envolvido com a luta ou fuga
para justificar seus sintomas. Contudo, à medida que os
estudos sobre o tema se expandiram para explorar a relação
entre estresse e doença, passaram a sobrepor-se e até
mesclar-se com os campos da psicologia, sociologia, teologia,
antropologia, física, saúde e medicina clínica.

Assim, o que antes se pensava ser uma resposta física e


depois passou a ser considerado como um fenômeno mente-
corpo, atualmente é visto como um fenômeno complexo,
multifacetado ou holístico que envolve os componentes
mentais, físicos, emocionais e espirituais de bem-estar
(SEAWARD, 2009).

Nesse contexto, vamos agora conhecer mais sobre o estresse


e entender o processo que leva à síndrome de burnout, ou
seja, o estresse gerado pelo esgotamento físico e emocional
como resultado da atividade profissional.

ESTRESSE: CONCEITOS E
CARACTERÍSTICAS
O novo paradigma do bem-estar é holístico, podemos
pensar nele como o equilíbrio, a integração e a harmonia dos
aspectos físicos, intelectuais, emocionais e espirituais que
ocorrem através da tomada de responsabilidade pela saúde
do próprio indivíduo. Nesse contexto, o todo é considerado
maior que a soma das partes.

Assim sendo, para o gerenciamento do estresse, as


abordagens devem ser da mesma forma, ou seja, devem ser

76 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


holísticas e precisam incluir alguns aspectos, os quais são
apresentados na figura abaixo.

Figura 16:
Abordagens de
gerenciamento de
estresse, conforme
Seaward (2009).
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020).

Alguns autores se referem ao estresse como um processo


psicossocial. Villalobos (2004), ao relacionar estresse e trabalho,
diz que os fatores psicossociais do trabalho consistem na
interação entre o trabalho em si, o seu ambiente, as condições
da instituição e as características pessoais do indivíduo,
considerando sua cultura, expectativas, necessidades,
experiências, estilo de vida e a percepção de mundo.

Nesse contexto, Fernandes (1999) salienta: a influência de


aspectos intrínsecos ao indivíduo no processo do estresse
envolve fatores como: atitudes, estilo de vida, estratégias de
enfrentamento e apoio social, bem como a vulnerabilidade e a
resistência ao estresse. As interações contemplam variáveis de
um macrocontexto organizacional com a multideterminação do
indivíduo (REIS; FERNANDES; GOMES, 2010).

Rossi (2004) também se refere ao estresse considerando


o contexto biopsicossocial, citando que toda pessoa é um
complexo sociopsicossomático, dotada de potencialidades
biológicas, psicológicas e sociais que representam
simultaneamente as condições de vida. Tais potencialidades
evidenciam particularidades distintas. Vamos entendê-las na
imagem a seguir.

77 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Biológicas
Representa características físicas
transmitidas geneticamente e
envolve um conjunto de reações
vulneráveis do organismo.

Potencialidades Psicológicas
do Contexto Diz respeito à personalidade
Biopsicossocial individual, vivências sentimentais
e racionais, conscientes ou
inconscientes, da personalidade
de cada um.

Sociais
São incorporados os valores
Figura 17:
e crenças do meio que o
Potencialidades
sujeito vive.
do contexto
biopsicossocial,
conforme Seaward
(2009). Fonte: Assim, Seaward (2009) corrobora com essa percepção.
labSEAD-UFSC
(2020). Segundo ele, o estresse vem sendo considerado como
um fenômeno biopsicossocial, consequente da percepção
individual de desajustes entre as demandas do ambiente e
a capacidade de resiliência do indivíduo. Então, o estresse
tem causas e consequências fisiológicas, psicológicas
e comportamentais que são decorrentes da percepção
individual de cada sujeito.

O conceito de estresse foi descrito com base na engenharia pelo


médico Hans Selye (1936 apud ROSSI; MEURS; PERREWÉ, 2013).

Para ele, o estresse é um mecanismo fisiológico


que prepara o organismo para a ação, serve para
estabelecer o equilíbrio interior, o qual sofre
modificações pelas diferentes exigências exteriores.

A sequência de eventos no qual o organismo responde ao


estresse é conhecida por síndrome geral de adaptação e se
desenvolve em três fases. Vamos vê-las na imagem a seguir.

78 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Fase de
alerta
Figura 18: Fases da
Síndrome Geral de
Adaptação, segundo Fase de
Selye (1936 apud resistência
ROSSI; MEURS;
PERREWÉ, 2013). Fase de
Fonte: labSEAD- exaustão
UFSC (2020).

Lipp (2000) adaptou o conceito de Selye e criou uma nova


fase, denominada quase exaustão. Trata-se de uma fase
intermediária, entre a resistência e a exaustão, na qual o
organismo enfraquecido torna-se vulnerável ao adoecimento
(LIPP, 2014).

Atualmente, a palavra estresse possui diversas conotações e


definições de acordo com variadas perspectivas. Na psicologia,
o estresse, conforme a definição de Lazarus e Folkman (1984
apud SEAWARD, 2009), é um estado de ansiedade, produzido
quando eventos e responsabilidades excedem as capacidades
de enfrentamento do sujeito.

Entre os conceitos mais citados na literatura brasileira, está


o de Marilda Lipp (1993, 1995, 2000, 2014). De acordo com
a autora, o estresse é um estado de tensão que causa uma
ruptura no equilíbrio interno do organismo, é causado pelas
modificações psicofisiológicas que ocorrem quando a pessoa
se confronta com uma situação que a amedronte, irrite, excite,
confunda ou que a faça muito feliz.

Nesse contexto, o estresse é considerado uma reação de


adaptação do organismo, no qual o processo bioquímico
responsável pelo estresse independe da causa da tensão.
O que será essencial para o desencadeamento é a
necessidade de adaptação a algum fato ou mudança e o
esforço para o restabelecimento da homeostase (LIPP, 2014).

79 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


FASES DO ESTRESSE
O estresse serve para estabelecer o equilíbrio interior, que
sofre modificações pelas diferentes exigências exteriores.
Como vimos anteriormente, o estresse se desenvolve em três
fases: fase de alerta, fase de resistência e fase de exaustão.

Vamos conhecê-las melhor na figura a seguir.

Como vimos na imagem acima, entre as doenças causadas


na fase de exaustão, podemos destacar a hipertensão arterial,
úlceras, gengivites, depressão, ansiedade, problemas sexuais,
enfarte e até diabetes.

1
Fase de alerta

Inicia-se quando a pessoa se confronta com o estressor pela


primeira vez. Nesse momento, uma reação de alerta se instala
e o organismo se prepara para a luta ou para a fuga com a
consequente quebra da homeostase. Quando o estressor tem uma
duração curta, a adrenalina é eliminada e ocorre a restauração
da homeostase, e a pessoa sai dessa fase sem complicações
para o seu bem-estar. É nessa fase que ocorre um aumento na
produtividade, se a pessoa sabe administrar o estresse, ela pode
utilizá-lo em seu benefício devido à motivação, entusiasmo e
energia que esta fase produz (SELYE apud LIPP, 1996).

2
Fase de resistência

Ocorre quando o estressor continua presente por períodos


bastante prolongados. Nesta fase, a pessoa utiliza toda a reserva
de energia para se reequilibrar, se essa energia é suficiente, a
pessoa recupera-se e sai do processo de estresse. Se, por outro
lado, o estressor exige mais esforço para adaptação do que é
possível, o processo de estresse pode encaminhar-se para a

80 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


exaustão. Dois sintomas aparecem com bastante frequência
nesta fase: a sensação de desgaste generalizado sem causa
aparente e dificuldade com a memória (LIPP; MALAGRIS, 2001).

3
Fase de exaustão

O estresse já se tornou intenso demais, devido à falta de


energia suficiente do indivíduo para lidar com o estressor ou
devido a outros estressores que ocorrem concomitantemente.
Esta fase está associada a várias doenças.

Quando a pessoa chega ao nível de exaustão, já existe um


comprometimento físico que necessita de ajuda médica,
e o paciente precisa aprender com um especialista a lidar
com o estresse que está sentindo e como evitar encontrar-se
novamente na mesma condição, afirmam Lipp e Malagris (2001).
Figura 19: Fases
do estresse. Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020).
Como vimos na imagem acima, entre as doenças causadas
na fase de exaustão, podemos destacar a hipertensão arterial,
úlceras, gengivites, depressão, ansiedade, problemas sexuais,
enfarte e até diabetes.

Limongi-França e Rodrigues (1997) também apresentam as


características de cada fase do estresse. Para os autores, a
fase de alarme representa a fase inicial e de fácil tratamento,
que ocorre secundários a vários estímulos como: resposta
fisiológica do organismo levando a aceleramento cardíaco,
respiração acelerada, sudorese, extremidades frias e estado
de prontidão para responder ou fugir.

A fase de resistência é a intermediária, o organismo começa


a enfraquecer pela resistência dos estímulos estressantes
e inadequação a estes com respostas do corpo, levando a
mudanças de comportamento, insônia e descontentamento.

81 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Na fase de exaustão, começa o aparecimento de doenças
crônicas e de difícil reversão, como distúrbios emocionais,
fadiga, gastrites, hipertensão e outros.

ESTRESSE OCUPACIONAL
O estresse ocupacional é um desequilíbrio entre as exigências
e expectativas do indivíduo e a capacidade de realização
diante das suas condições de trabalho, considerando que
no ambiente laboral pode ocorrer exigências excessivas e
recursos insuficientes.

Palavra do Especialista
O estresse ocupacional gera a percepção e a sensação de
ausência de controle em uma determinada situação, mesmo
frente ao esforço excessivo do trabalhador, podendo assim

 gerar consequências e prejuízos na saúde do trabalhador.


Há uma série de variáveis que podem promover o estresse
ocupacional, entre elas estão: variáveis ambientais,
características pessoais, experiência subjetiva, reações
individuais, entre outras (DOLAN, 2006).

Nesse contexto, o estresse ocupacional pode ser considerado


resultante da incapacidade de lidar com as fontes de pressão
no trabalho, tendo como consequências problemas na saúde
física e mental, bem como satisfação no trabalho, afetando
tanto o indivíduo como as organizações (ROSSI; MEURS;
PERREWÉ, 2013; CATALDI, 2015).

Cooper, Dewe e O’Driscoll (2001) salientam que o impacto


das fontes de pressão sobre o indivíduo irá depender de suas
características individuais. A partir da interrelação entre
estímulos e características individuais, podem se desenvolver
duas formas de estresse, que, apesar de biologicamente
idênticas, apresentam consequências distintas para o
indivíduo. Vamos entendê-las na imagem a seguir.

82 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Distresse
Constitui o estresse
negativo, resultante da
percepção do estímulo como
ameaça, ficando a energia
retida no organismo para
Tipologias do enfrentamento das pressões.
Estresse

Estresse
Consiste em um estresse
positivo no qual o excedente de
energia é empregado de modo
produtivo, sendo o estímulo
Figura 20: estressor percebido como um
Tipologias do desafio capaz de ser superado.
estresse, segundo
Cooper, Dewe e
O’Driscoll (2001).
Fonte: labSEAD- Esses autores identificam duas variáveis como determinantes
UFSC (2020).
da predisposição ao surgimento do quadro de estresse no
indivíduo: locus de controle e personalidade tipo A.

Na imagem a seguir, podemos entender melhor essas variáveis.

Figura 21:
Variáveis como
Locus de Controle Personalidade Tipo A
determinantes para Caracteriza indivíduos
o surgimento do Refere-se ao grau de
altamente competitivos,
estresse, segundo responsabilidade pessoal
Cooper, Dewe e impacientes e que vivem
que o indivíduo atribui
O’Driscoll (2001). com sentimento constante
aos eventos de sua vida.
Fonte: labSEAD- de urgência.
UFSC (2020).

Neste contexto, evidenciado na imagem anterior, a


combinação de vulnerabilidade individual e estímulos com
potencial estressor leva ao desenvolvimento de estresse, que
se manifesta tanto no nível individual quanto organizacional.

Do ponto de vista individual, Lipp (2014) relaciona como


principais sintomas de estresse os seguintes aspectos:
nervosismo, ansiedade, irritabilidade, fadiga, sentimentos de
raiva, angústia, período de depressão, dor no estômago, dor
nos músculos do pescoço e ombros e dores discretas no peito
quando o indivíduo se encontra sob pressão.

83 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


O aumento do aparecimento de estresse no
ambiente organizacional pode ser identificado a
partir de dados concretos do aumento no nível de
absenteísmo, de rotatividade de pessoal, doenças e
acidentes de trabalho.

Suas causas são variadas e possuem efeito cumulativo,


pois as exigências físicas ou mentais exageradas provocam
o estresse, mas este pode acontecer mais fortemente em
profissionais já afetados por outros fatores (CATALDI, 2015).

O estresse ocupacional pode ter origem em mudanças bruscas


na organização, que ultrapassem a capacidade de adaptação
do profissional. Entre os principais fatores que podem levar ao
estresse ocupacional, há o aumento do volume de trabalho,
conflitos diários, pressões por eficiência, falta de autonomia,
entre outros (ROSSI; MEURS; PERREWÉ, 2013).

Figura 22: Estresse


ocupacional. Fonte:
Pixabay (2020).

Todo e qualquer tipo de trabalho possui agentes


potencialmente estressores para o indivíduo, no entanto, os
fatores que contribuem para o desenvolvimento do estresse
diferem de uma profissão para outra. Isto porque algumas
profissões possuem maior grau de rigidez e risco que outras,

84 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


além das exigências e cobranças por parte dos superiores
ou da própria função, como é o caso dos profissionais de
segurança pública (MEZOMO; OLIVEIRA, 2015).

ESTRESSE PÓS-TRAUMÁTICO
O transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) tem seu início
após um trauma que o indivíduo tenha sofrido. As recordações
do ato estressor podem ocorrer por mais de um mês e se
iniciam até seis meses após o evento traumático. As pessoas
acometidas pelo TEPT revivem o trauma constantemente e
tendem a evitar tudo aquilo que possa remeter às lembranças
do ocorrido (GREIST, 2016).

Dessa forma, para o desenvolvimento do TEPT, o


trauma é o fator primário, sendo este transtorno um
dos únicos que permite uma situação de casualidade
direta com o trauma vivenciado. Entretanto, viver,
experimentar ou ter sido confrontado com uma
situação estressora não significa necessariamente
que o indivíduo desenvolverá o transtorno.

Apesar de grande parte da população estar exposta a situações


traumáticas, a sua maioria não será acometida pelo TEPT. Ou seja,
o desenvolvimento desse transtorno está ligado diretamente à
percepção do indivíduo e ao que ele considera como estressante
ou traumático. Assim, o TEPT é uma resposta do indivíduo frente
ao perigo vivenciado (SCHAEFER; LOBO; KRISTENSEN, 2012).

O evento traumático é revivido mesmo sem um


estímulo estressor. As incidências de memórias
vividas e que não estão sobre controle do indivíduo
acometido pelo TEPT podem vir na forma de
flashback ou pesadelos, transformando-se em uma
memorização defeituosa do trauma vivido.

85 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


As constantes evocações dessas memórias são tidas como
um dos mecanismos que estimulam a permanência dos
sintomas do TEPT por um tempo prolongado. A evocação
normal de memorias indica um fluxo relativamente ordenado
e guiado pelas questões presentes. O sujeito descreve
as memorias do trauma como isoladas ou parasitárias
(KAPCZINSKI; MARGIS, 2003).

Para Zammit, Hoskins e Lewis (2019), na maioria das


vezes, o TEPT está em comorbidade com problemas como a
depressão, a ansiedade e o abuso de substâncias como álcool
e drogas. Na avaliação do profissional competente, psicólogo
ou psiquiatra, devem ser consideradas as necessidades
físicas, psicológicas e sociais, bem como uma avaliação
de risco, desenvolvida através de um questionário de
rastreamento e um cronograma de entrevista clínica.

Vamos conhecer esses principais fatores de diagnósticos e de


riscos na imagem abaixo.

Principais Fatores de
fatores de Eventos
risco
diagnósticos traumáticos
São destacados os
Sintomas intuitivos, acidentes graves, Eventos que são
sintomas de levitação, desastre natural, vivenciados diretamente
exposição e respostas ataques terroristas, ou testemunhados
ao trauma, alterações entre outros. pelo indivíduo, estando
negativas nas cognições relacionados à violência
e no humor. física, moral como
agressão pessoal.

Figura 23: Principais fatores de diagnósticos e avaliação de fatores de risco


e eventos traumáticos, segundo Zammit, Hoskins e Lewis (2019) e Knapp e
Caminha (2003). Fonte: labSEAD-UFSC (2020).

Knapp e Caminha (2003) ainda consideram como eventos


traumáticos: roubo, sequestro, ataque sexual, combate militar,
tortura, presenciar mortes, acidentes, cenários de guerra e
desastres naturais ou causados pelo homem.

86 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Nesse caso, as memórias do evento traumático
e recordações aflitivas são ativadas se houver
lembranças indesejáveis que sejam associadas ao
trauma, fazendo o indivíduo revivê-las como se
estivesse no momento do evento estressor.

Alguns profissionais, pelo risco inerente de sua atividade laboral,


tornam-se vulneráveis ao estresse pós-traumático, como é o
caso dos profissionais de segurança pública que frequentemente
se deparam com incidentes críticos e até mesmo com a morte.

Nesse sentido, Queirós et al. (2016) destaca a importância da


sensibilização de policiais militares para as consequências
do TEPT. Em seu estudo, ela demonstra que, além do
caráter preventivo, a Psicologia poderá ajudar os policiais
a identificarem os sintomas e procurarem ajuda quando for
necessário. Também salienta a importância do apoio aos
colegas que possam estar passando por esse problema.

Sintomas do transtorno de estresse pós-traumático


Os sintomas do TEPT podem ser apresentados em três
grupos. Vamos entendê-los na imagem a seguir.

Revivescência do trauma: ocorre quando o indivíduo começa a ter


pensamentos recorrentes, e que são intrusivos, pois mesmo contra
a sua vontade eles invadem a mente, trazendo lembranças do
trauma e pesadelos.

Esquiva ou entorpecimento emocional: acontecem quando, por medo


SINTOMAS de relembrar do trauma, o indivíduo começa a fugir de situações ou
DO TEPT atividades que possam reavivar as lembranças doloridas.

Hiperestimulação autonômica ou hiperexcitabilidade psíquica:


Figura 24: está relacionada aos sintomas físicos decorrentes da descarga de
Sintomas do TEPT adrenalina, na qual o coração acelera sem motivo aparente, ocorre
(CÂMARA; SOUGEY, suor frio, tontura, dores frequentes de cabeça, insônia, distúrbios de
2001; MINAYO; concentração e irritabilidade frequente.
CONSTANTINO, 2008).
Fonte: labSEAD-UFSC
(2020).

87 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Segundo Figueira e Mendlowicz (2003), na reexperiência
traumática, muitos pacientes ficam presos em suas memórias
decorrentes do fato doloroso. Os autores descrevem o caso de
um policial militar. Vamos conhecer esse caso a seguir.

Estudo de Caso
Um policial militar de 27 anos presenciou um amigo de sua
corporação sendo morto a tiros, em uma ação onde havia
helicópteros da Polícia Civil. Desde o evento presenciado, o
agente se joga ao chão tentando fugir e se proteger dos disparos
de arma de fogo, que são imaginados por ele.

Essa ação se repete, independentemente do local onde agente se


encontra, seja trabalhando ou mesmo num momento de lazer,
ao ouvir barulho de helicóptero, ele se joga ao chão.

Esse caso demonstra como em episódios dissociativos os


pacientes podem apresentar ilusões e episódios alucinatórios
transitórios, entre outros sintomas psicóticos.

O indivíduo acometido com o TEPT pode apresentar prejuízos


relacionados à produtividade no trabalho, similares aos de
portadores de depressão, porém menor do que os indivíduos
com transtorno do pânico.

Assim, Margis (2003) destaca o absenteísmo como


diminuição na produtividade desse profissional, que afeta a
Na medicina, pode vida pessoal do portador, visto que ele deixa de realizar certas
ser entendido atividades com a família por medo constante.
como o conjunto
de causas capazes
de produzir uma
doença. O sofrimento do portador de TEPT, somado às
morbidades, pode levá-lo a um sofrimento maior,
levando em conta a falta de diagnostico adequado e
o tratamento tardio.

88 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Segundo Knapp e Caminha (2003), as mudanças no cérebro
após o evento estressor nada mais são do que respostas
adaptativas à mudança que desestruturam gerenciadores
cognitivo-comportamentais, os conjuntos de crenças, regras e
pressupostos que regem nosso modo de ver não somente nós
mesmos, mas o mundo ao nosso redor.

Figura 25:
Representação
de movimentos
de mudanças na
estrutura neural,
após evento
estressor. Fonte:
Pixabay (2020).

As mudanças derivadas do fato estressor não repercutem


somente na estrutura neural, mas também podem interferir
nos efeitos funcionais, nas cognições formadas através
do próprio trauma vivido, nas impressões afetivas, no
comportamento e nas reações fisiológicas. O trauma obriga
o organismo a criar um sistema compensatório, com gasto
energético elevado, formando um novo estado de equilíbrio,
porém menos adaptativo.

Seguindo esse mesmo raciocínio, Schaefer, Lobo e Kristensen


(2012) mencionam que nos acidentes de trabalho, embora os
danos físicos sejam facilmente perceptíveis, cada vez mais
os sintomas e transtornos psiquiátricos estão também mais
notáveis.

89 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


O TEPT é um dos transtornos mais comuns
da atualidade e infelizmente causa danos aos
trabalhadores e impactos na sua qualidade
de vida, como implicações psicológicas,
prejuízos significativos nas relações familiares,
socioeconômicas e jurídicas.

Neste sentido, os autores analisam a importância de observar o


TEPT no contexto laboral, priorizando a prevenção e o tratamento.

Segundo Dantas e Andrade (2008), para o diagnóstico de TEPT,


é preciso que o sujeito tenha o quadro sintomático de mais de
um mês e a perturbação esteja afetando o seu convívio social, no
trabalho ou em outras áreas importantes do indivíduo. Além de
esse transtorno trazer diversos problemas para a vida do paciente,
ele pode, ainda, tornar-se mais complexo, pois, adicional a ele,
existem a depressão e as morbidades, como os transtornos de
ansiedade e abuso de substâncias psicoativas (como o abuso de
álcool e drogas). Nesse sentido, é fundamental compreender esse
fenômeno para que o indivíduo receba o tratamento adequado.

É importante que o indivíduo que sofre com TEPT faça


atividades prazerosas, pois ele gasta toda sua energia tentando
evitar situações que tragam lembranças do evento estressor.

Figura 26: A família


e momentos de
lazer são peças
fundamentais na
recuperação do
transtorno. Fonte:
Pixabay (2020).

90 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


A família é peça fundamental na recuperação do indivíduo,
devendo ser corretamente orientada sobre os sintomas. Faz-se
necessário também um acampamento terapêutico e, quando
necessário, medicamentoso (MENABO; AGOSTINHO, 2011).

Terapias indicadas no tratamento do transtorno de


estresse pós-traumático
Segundo Teche e Ramos-Lima (2016), existem recomendações
de terapias para o tratamento do transtorno de estresse
pós-traumático. Primeiramente, podemos destacar a
psicoterapia focada no trauma através da terapia cognitivo-
comportamental (TCC).

A psicoterapia focada no trauma através da terapia


cognitivo-comportamental (TCC) lida diretamente
com as distorções dos pensamentos ligados ao
TEPT. A TCC focada no trauma se dá através da
combinação de exposição prolongada com o
treinamento de inoculação do estresse. Ambas se
diferenciam pela forma de trabalhar o estresse,
que faz o treinamento de introduzir o estresse e o
relaxamento muscular progressivo.

O trabalho da TCC para TEPT focados no trauma geralmente


tem um curto prazo, com 8-12 sessões de terapia individual.
As sessões têm duração de ao menos 60-90 minutos cada e
incluem a psicoeducação sobre reações comuns ao trauma,
são realizadas entre duas vezes na semana e envolvem
tarefas para fazer em casa. Cada vez mais têm sido estudadas
técnicas relacionadas a esse tipo de tratamento.

Para Soares e Lima (2003), nem todas as pessoas que


sofreram traumas importantes desencadeiam o TEPT,
podendo, assim, estar associado a uma resposta individual.
Nesse contexto, as intervenções mais utilizadas no TEPT são:
intervenção breve, aconselhamento e TCC.

91 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Figura 27:
Aconselhamento
como intervenção
ao transtorno.
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020).

Quando não existe outro quadro associado, como depressão


ou transtorno de ansiedade, na prevenção, são indicadas
intervenções não farmacológicas. Tais intervenções podem
ser indicadas pouco tempo depois do ocorrido e podem ser
desde uma única entrevista até intervenções psicoterápicas
mais complexas.

Para Gonçalves et al. (2010), a TCC utilizada no TEPT vem


destacando sua eficácia. No tratamento são utilizadas
algumas técnicas, que são apresentadas na imagem abaixo.

Psicoeducação
Reestruturação
e outras
cognitiva
técnicas

Relaxamento
muscular
Figura 28: Técnicas
aplicadas na TCC
progressivo
utilizada no TEPT,
segundo Gonçalves
et al. (2010). Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020).

92 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Nesse contexto, os autores realizaram e apresentaram o
seguinte estudo.

Estudo de Caso

Em 16 sessões de terapia e 12 sessões em terapia realizada


em ambiente extraconsultório, foram realizadas exposições
imaginárias em uma paciente vítima de assalto, para a qual foi
elaborada uma hierarquia imaginária.

A restruturação cognitiva auxiliou na construção de novas


crenças, mudando a visão do paciente sobre o efeito deixado
pelo trauma. A ansiedade da paciente na oitava sessão já havia
diminuído assim como os sintomas de transtorno obsessivo-
compulsivo (TOC), que foram identificados.

Agora que conhecemos terapias indicadas no tratamento do


transtorno de estresse pós-traumático, vamos seguir com o
conhecimento do enfrentamento do estresse.

ENFRENTAMENTO DO ESTRESSE
Enfrentamento é uma palavra derivada do idioma inglês:
coping, do verbo to cope, que significa “lidar com”, “enfrentar”,
“contender”, “lutar”. A teoria de enfrentamento atual tem origem
nos estudos realizados a partir de 1970, entre os quais, o mais
conhecido é o de Lazarus e Folkman (1984), que propõem:

Um modelo de caráter cognitivo, no qual o


enfrentamento ao estresse é um processo
transacional entre a pessoa e o ambiente.

Neste contexto, o enfrentamento ao estresse ocupacional


pode ser definido como:

93 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


O conjunto de esforços cognitivos e
comportamentais que estão em constante
mudança para gerenciar as necessidades internas
e/ou externas, avaliadas pelo organismo como
excedentes à sua capacidade.

Lazarus e Folkman (1984 apud FERNANDES; INOCENTE,


2010) afirmam que esse processo possui duas formas de
enfrentamento. Vamos conhecê-las na imagem a seguir.

Formas de Enfrentamento ao Estresse

Enfrentamento focalizado Enfrentamento centrado


Figura 29: Formas
no problema na emoção
de enfrentamento,
segundo Lazarus O indivíduo, ao focalizar O indivíduo foca no alívio
e Folkman (1984 em uma situação da emoção associada à
apud FERNANDES; específica, tenta encontrar situação de estresse, que
INOCENTE, 2010).
uma maneira de modificá- ocorre mesmo que esta
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020). la ou evitá-la no futuro. não possa ser mudada.

Dessa forma, o enfrentamento ao estresse é um fenômeno


essencial a todos, que depende da percepção e da
interpretação de cada pessoa, pois, a partir do momento em
que se observa o estresse pela perspectiva relacional, ele
deixa de ser visto apenas pelo prisma de uma motivação
externa e passa a ser também considerado o significado que
o estressor (seja ele externo ou interno) vai ter para o sujeito
e, consequentemente, como ele vai avaliá-lo e enfrentá-lo.
(LIMONGI-FRANÇA; RODRIGUES, 2011).

94 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


O fenômeno do enfrentamento é compreendido
como uma estratégia para obter o maior número
de informações sobre o que está ocorrendo,
tanto internamente (psiquicamente) como
externamente (o meio).

A partir dele é que todo o contexto estressante se desenvolve


e possibilita ao indivíduo os mecanismos necessários
para reverter, conscientemente, essa forma de incômodo
ao seu comportamento, permitindo que possa substituir o
estresse negativo pelo estresse positivo e manter o equilíbrio
necessário à vida.

Muitas vezes, quando trabalhamos em um ambiente


durante um tempo significativo, tornamo-nos conhecedores
de aspectos que nos estressam, estes, por sua vez, nos
possibilitam predizer com certo grau de certeza a nossa
reação, tornando-se dessa forma, um mecanismo de defesa
ao combate e enfretamento do que nos estressa; mas nem
sempre todos nós desenvolvemos tal capacidade de modo
equitativo ou nem mesmo desenvolvemos.

A falta de conhecimento sobre o que vai acontecer é uma das


maiores causas de estresse no trabalho, pois dela emergem
as incertezas, no caso, a predição do possível evento e,
consequentemente, influenciam na forma como os indivíduos
que se encontram nessa situação irão enfrentá-la.

Palavra do Especialista
A capacidade de predizer determinados eventos quanto ao

 grau de certeza e de incerteza, no ambiente de trabalho, pode


favorecer ao processo de enfrentamento. (LIMONGI-FRANÇA;
RODRIGUES, 2011).

95 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


No contexto da segurança pública, é evidente a necessidade
de os profissionais encontrarem estratégias de enfrentamento
ao estresse, pois lidam com os problemas da sociedade e
são vistos como protetores de todos, devendo estar sempre
prontos para toda e qualquer situação adversa. Mesmo sendo
impossível, é inaceitável qualquer tipo de erro e, se isso
acontecer, são julgados como mal-preparados.

Os policiais são, na sua própria linguagem, a ponta de lança


do Estado e normalmente são os primeiros a chegar às
ocorrências, sendo o socorro que a sociedade busca e precisa
quando as coisas saem da normalidade.

É dessa forma que eles são inseridos em diversos


contextos alheios a si com grande carga emocional,
nunca sabendo qual nível de complexidade terão
que enfrentar (o nível de risco de morte, gravidade
das vítimas, capacidade dos agressores).

Constantemente se deparam, por exemplo, com mulheres


muito machucadas em situações que envolvem violência
doméstica, crianças vítimas de pedofilia e estupro, briga
de vizinhos e familiares, sofrimento de mãe/pai ao perder
seu filho ainda jovem por morte com uso de arma de fogo,
confronto armado com traficantes, acidentes de trânsito,
muitas vezes com óbito, entre tantas outras ocorrências, que
os sobrecarregam psicológica e emocionalmente, tornando-os
vulneráveis ao estresse e/ou estresse pós-traumático.

96 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Figura 30:
Sobrecarga
emocional e
psicológica nos
profissionais
de segurança
pública devido
às atividades da
função. Fonte:
Pixabay (2020).

A estratégia emocional de enfrentamento desses profissionais


diante dessas situações pode ser ou não funcional. O problema
não está no que acontece ao indivíduo, mas como ele interpreta
e vive a situação (ANDRETTA; OLIVEIRA, 2011). Se, ao lidarem
com complexidades tão intensas, a estratégia emocional não
for a mais assertiva, esses indivíduos podem ficar adoecidos.

Logo, um agente que tem crenças do tipo “homem


não pode falar de seus sentimentos” e “não pode
ter medo” não terá a oportunidade de ressignificar
os contextos de sua profissão, podendo resultar no
alcoolismo, por exemplo, como comportamento de
esquiva a emoções inerentes à sua profissão.

Assim, a bebida alcoólica, uma substância que inicialmente


relaxa e descontrai, pode provocar em alguns sujeitos a
sensação de aumento de poder, encaixando-se como uma
luva no contexto dos agentes.

97 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Figura 31: A bebida
alcoólica como
válvula de escape
do estresse e suas
consequências.
Fonte: Pixabay
(2020).

Talvez o alívio das angústias que o álcool proporciona


explique a grande incidência de alcoolismo entre militares,
que buscam na bebida um meio de mascarar sintomas
depressivos, tendo em vista as dificuldades que nossa cultura
impõe quanto à manifestação da afetividade masculina.

Também podemos destacar que tais dificuldades estendem-


se ainda às questões de saúde física e mental, provocando um
silêncio maior entre os homens quanto aos seus sintomas,
inclusive quanto às suas angústias, suas frustrações e seus
conflitos de um modo geral (SOUZA, 2002).

O agente que precisa de sinergia e operacionalidade nas


ocorrências pode ficar com vergonha de manifestar a seus
pares que não está disposto ou motivado ao serviço por
conta de possíveis estigmas que poderá sofrer dentro da
corporação. Mesmo sem saber, muitas vezes, que o que está
sentido é decorrente do estresse.

Nesse sentido, o profissional poderá identificar o estresse a


partir da sensação dos seguintes sintomas:

• Fadiga e lentificação.
• Irritabilidade e inapetência.
• Dores, insônia e outras comorbidades.

98 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Há, possivelmente, tabus a serem vencidos quanto à
necessidade de não negar ou ter comportamento de esquiva.
Mas ressignificar os sentimentos e emoções inerentes ao
cotidiano da profissão escolhida certamente é uma estratégia
adequada de enfrentamento ao estresse ocupacional.

SÍNDROME DE BURNOUT:
CARACTERÍSTICAS E CAUSAS
Em inglês o termo burn significa fogo e out significa fora.
Assim, a palavra burnout significa aquilo que deixou de
funcionar por falta de energia.

O termo síndrome de burnout surgiu em 1974, criado


por Fregenbauer. Essa síndrome também é conhecida
como síndrome do esgotamento profissional. A principal
característica dessa síndrome é o estado de tensão emocional
e estresse crônico.

Palavra do Especialista
Ela se manifesta principalmente em profissões que exigem
 envolvimento interpessoal direto e intenso, como profissionais
da educação, saúde e segurança pública (VARELLA, 2020).

De acordo com Abreu et al. (2002), quando não


compartilhadas as dificuldades, preocupações e anseios, o
trabalhador aumenta a tensão emocional, o que pode levar ao
aparecimento dessa síndrome. A pessoa burnout, ou seja, a
pessoa sujeita ao esgotamento, pode ser afetada em seu nível
individual, profissional e organizacional.

Veja, na imagem a seguir, como a síndrome aparece em cada


um desses níveis.

99 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Nível individual
A síndrome afeta o estado físico, mental, profissional e
social do indivíduo.

Nível profissional
O ser humano atende o cliente de forma distante e
lenta, e o contato é impessoal com os colegas de
trabalho ou clientes.
Figura 32: Descrição
da síndrome em
diferentes níveis, Nível organizacional
segundo Trigo, Teng
e Hallak (2007). Há conflitos com as pessoas da equipe, rotatividade,
Fonte: labSEAD-
absenteísmo e diminuição da qualidade dos
UFSC (2020).
serviços ofertados.

O esgotamento físico e emocional são sintomas comuns da


síndrome de burnout. Grande parte das pessoas afetadas passa
a se ausentar do trabalho, isolam-se, tornam-se agressivas,
mudam rapidamente de humor, se irritam facilmente,
apresentam dificuldade de concentração, ansiedade, depressão,
baixa autoestima, entre outros (VARELLA, 2020).

Palavra do Especialista
Transtornos do sono, cefaleias, ansiedade, irritabilidade,
depressão, acidez estomacal ou azia também são indicativos
sintomáticos da síndrome de burnout em trabalhadores. Além

 do cansaço excessivo, esgotamento, revolta pela sobrecarga de


trabalho, angústia, vontade de desistir, sentimento de fracasso,
dores na nuca e no ombro, sentimento de pouco tempo para si,
também são alguns indícios alarmantes de que a síndrome está
se desenvolvendo no profissional (BULHÕES et al., 2008).

Pode-se observar que o índice da síndrome é menor em


trabalhadores que têm algum hobby, que praticam alguma
atividade física regularmente, que têm maior tempo e

100 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


experiência na área de atuação profissional ou possuem
especialização na área de trabalho (BULHÕES et al., 2008).

As características da síndrome de burnout podem ser


divididas em exaustão emocional, despersonalização e
reduzida realização profissional.

Vejamos, na imagem a seguir, o que Benevides-Pereira (2012)


escreve a respeito dessa divisão.

A reduzida realização
A exaustão profissional é sinônimo
emocional é a de insatisfação com as
sensação de atividades laborais.
esgotamento O trabalhador apresenta
físico e mental, A despersonalização baixa autoestima,
não existindo ocorre quando o desmotivação,
mais energia trabalhador apresenta insuficiência profissional,
para praticar continuamente sentimento de fracasso
Figura 33:
Características nenhuma contato impessoal e em todas as áreas.
da síndrome de atividade. frio com os usuários
burnout, segundo de seus serviços.
Benevides-Pereira
Torna-se indiferente
(2012). Fonte:
labSEAD-UFSC com os colegas e
(2020). demais ao seu redor.

Dentre os aspectos que vimos na imagem anterior, a exaustão


emocional é um elemento que aparece com maior frequência
na síndrome de burnout. Já as fontes mais corriqueiras
de estresse que estão relacionadas ao diagnóstico dessa
síndrome são: falta de reconhecimento no trabalho, problemas
relacionados à rotina, falta de apoio, falta de condições de
trabalho, falta de oportunidades no desenvolvimento pessoal,
excesso de trabalho, entre outros (BULHÕES et al., 2008).

Benevides-Pereira (2012) também classificou os sintomas da


síndrome de burnout em categorias. Vamos entendê-las em
suas particularidades nas imagens seguintes.

101 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Fadiga progressiva e constante: é a falta de energia e sensação de
vazio interno. Muitas pessoas acometidas pela síndrome relatam que,
mesmo após uma noite de sono, acordam cansadas e sem ânimo para
absolutamente nada, é como se não tivessem dormido.

Dores musculares ou osteomusculares: são frequentes dores


nos ombros e nuca, dores na coluna. Muitos profissionais
sentem-se “travados” por vários dias.

Distúrbios do sono: apresentam cansaço e pálpebras pesadas, porém


essas pessoas não conseguem dormir ou dormem imediatamente,
acordam poucas horas depois e permanecem acordadas apesar do
cansaço, podem apresentar também sono agitado e pesadelos.

Cefaleias, enxaquecas: geralmente as dores de cabeça são


tensionais. Há relatos de latejamento nas têmporas, dores
persistentes e intensas que geram sensibilidade ao som,
mesmo que mínimo, ou a qualquer fio de luz.

Perturbações gastrointestinais: queimação estomacal, gastrite,


úlcera, náuseas, vômitos e diarreias são presentes nessa fase.
SINTOMAS Algumas pessoas perdem o apetite, emagrecendo significativamente,
FÍSICOS já em outras pessoas ocorre o aumento no consumo de alimentos e,
consecutivamente, aumento de peso.

Imunodeficiência: ocorre diminuição da resistência física


e, consequentemente, tornam-se constantes os resfriados,
gripes, alergias, herpes, queda de cabelo, ou aumento da
quantidade de cabelos brancos.

Transtornos cardiovasculares: pode ocorrer hipertensão


arterial, palpitações, insuficiência cardiorrespiratória ou até
mesmo embolias e infartos.

Distúrbios do sistema respiratório: dificuldade em


respirar, bronquite, asma, suspiros profundos.
Figura 34:
Sintomas
físicos da
síndrome Distúrbios sexuais: diminuição no desejo sexual, impotência
de burnout, sexual ou ejaculação precoce. Nas mulheres pode ocorrer
segundo anorgasmia, dores durante a relação sexual.
Benevides-
Pereira (2012).
Fonte: labSEAD- Alterações menstruais: pode haver atraso ou mesmo
UFSC (2020).
suspensão da menstruação.

102 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Em relação aos sintomas psíquicos da síndrome de burnout,
Benevides-Pereira (2012) destaca o seguinte.

Falta de atenção, de concentração: muitas pessoas que sofrem desta


síndrome sentem dificuldade em se concentrar no que estão fazendo.
A atenção por vezes é seletiva, em que o portador da síndrome consegue se
concentrar em uma atividade que é de seu interesse por algum momento,
mas logo depois de concluída a atividade, volta ao estado anterior.

Alterações de memória: apresenta lapsos de memória, em alguns


momentos para de fazer sua atividade e se pergunta por que está fazendo
aquilo, sem saber a razão de estar fazendo determinada tarefa. Essa
pergunta é constante nessa fase: o que foi mesmo que vim fazer aqui?

Lentificação do pensamento: o tempo de resposta do


organismo e os processos mentais tornam-se mais lentos.

Sentimento de alienação: sente-se distante do ambiente


que frequenta e das pessoas que a cercam. É como se nada
tivesse a ver com o portador da síndrome.

Sentimento de solidão: a pessoa sente-se sozinha e não


compreendida pelas pessoas que a rodeiam.
SINTOMAS
PSÍQUICOS Impaciência: é intransigente com atrasos. A espera
para essas pessoas torna-se insuportável.

Labilidade emocional: muda bruscamente de humor. Por momentos


está sorrindo e passa em segundos para um estado de tristeza ou
agressividade. Muitas vezes sem motivo aparente.

Dificuldade de autoaceitação, baixa autoestima: a imagem idealizada


é uma e a observada é outra completamente diferente. A percepção de
si e de seus ideais são distantes do que apresenta, fazendo com que se
sinta insuficiente, fracassado, deteriorando assim sua autoimagem.

Astenia, desanimo disforia, depressão: Nesse estágio, é bastante


custoso para a pessoa com a síndrome praticar qualquer atividade,
Figura 35: mesmo sendo as de costume. Perde entusiasmo e ânimo, podendo
Sintomas evoluir para depressão.
psíquicos
da síndrome
Desconfiança, paranoia: apresenta a sensação de que não pode contar
de burnout,
segundo com nenhuma outra pessoa. Acha que as pessoas se aproveitam do
Benevides- seu trabalho e não retribuem ou retribuem muito pouco pelo serviço
Pereira (2012). prestado. A desconfiança pode se acentuar para a paranoia, passando a
Fonte: labSEAD- crer que os demais armam situações para o prejudicar.
UFSC (2020).

103 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Podemos perceber que esses sintomas estão relacionados a
comportamentos e defesas do próprio corpo e da mente do
agente que desenvolve a síndrome de burnout.

PREVENÇÃO E TRATAMENTO DA
SÍNDROME DE BURNOUT
Conforme Pereira, Teixeira e Lopes (2013), para a prevenção
ou tratamento da síndrome de burnout, a primeira medida a
ser tomada deve ser a da informação. Palestras educativas
alertando sobre as causas e os sintomas permitem que
os profissionais envolvidos com a saúde do trabalhador
possam usar medidas preventivas e adequadas, fazendo
com que os trabalhadores se autoavaliem, restabelecendo
condições saudáveis de trabalho, e, se necessário,
procurando ajuda especializada.

Palavra do Especialista
Para evitar ou prevenir essa síndrome em seus trabalhadores,
as instituições devem proporcionar capacitações e apoio aos
 profissionais para que eles estejam mais preparados e possam
lidar com situações subjetivas em suas atividades, prevenindo-
se contra essa síndrome (BULHÕES et al., 2008).

É imprescindível a implementação de atividades voltadas


para prevenção e promoção da saúde dos trabalhadores,
amenizando o risco de desenvolvimento da síndrome de
burnout. Atividades físicas, bom relacionamento interpessoal
e realização profissional são fundamentais para afastar essa
doença do ambiente de trabalho e melhorar a qualidade de
vida do profissional SOUZA et al. 2012.

De acordo com Pereira, Teixeira e Lopes (2013), podem ser


atribuídos três níveis de atuação na prevenção/tratamento da
síndrome de burnout. Podemos vê-los na imagem a seguir.

104 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Plano individual: Plano grupal: Plano organizacional:
recomenda-se a ajuda de recomenda-se que recomenda-se que a organização do
psicólogos, alimentação os gestores se ambiente de trabalho seja confortável
equilibrada, ter no mínimo comuniquem mais e proporcione bem-estar e que sejam
seis horas de sono com os funcionários, implantadas medidas de relaxamento,
noturno, não preencher estabelecendo uma como a ginástica laboral, que é muito
os horários livres com relação harmoniosa, importante na redução e na prevenção
mais trabalho, praticar cooperando uns com de problemas ocupacionais e pode ser
exercícios físicos. os outros. feita no próprio local de trabalho.

Figura 36: Níveis


de atuação na
prevenção da
Após o período pós-industrial, a sociedade exigiu do ser
síndrome de humano diversas adaptações, isso gerou reações também
burnout, segundo
Pereira, Teixeira e capazes de prejudicar a saúde psicológica e física. Veja o que
Lopes (2013). Fonte: Zanelli et al. (2010) referem a respeito disso.
labSEAD-UFSC
(2020).

Palavra do Especialista
“Surgem novos padrões de comportamento, produzindo efeitos
na estrutura e funcionamento das organizações de trabalho.

 Como decorrência dessas transformações, as pessoas são


afetadas, sendo exigidas readaptações físicas e psicológica
delas, com um custo de energia vital e com implicações para a
saúde.” (ZANELLI et al., 2010, p. 19).

As organizações devem observar que a busca pela qualidade


de vida do colaborador no trabalho não é um custo
desnecessário, e sim prevenção para a saúde do colaborador
e da empresa, uma vez que os custos com afastamentos
e ações trabalhistas são maiores do que uma medida
preventiva (ALVES, 2011).

105 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Figura 37: Bom
relacionamento
e qualidade de
vida no ambiente
corporativo
são formas de
prevenção de
exaustão dos
profissionais. Fonte:
Pixabay (2020).

Qualidade de vida significa bem-estar físico, mental,


psicológico, emocional, social, saúde e educação de qualidade
(LIMONGI-FRANÇA; RODRIGUES, 2011). As práticas de
prevenção de riscos ocupacionais resultam em ganhos
secundários para a empresa (ALVES, 2011).

ESTUDOS SOBRE ESTRESSE EM


PROFISSIONAIS DE SEGURANÇA PÚBLICA
Os profissionais de segurança pública se deparam com o
desafio diário no exercício em suas atividades, com diversas
situações, inclusive com a morte.

Palavra do Especialista
Gerenciar os efeitos provocados por esses fatores que causam
danos físicos e psicológicos é a grande questão vivenciada
por esses profissionais, pois, dependendo das condições que
 lhes são oferecidas e da disponibilidade da corporação para
amenizar os efeitos provocados pelo estresse, tais efeitos
poderão ser desastrosos (VASCONCELOS, 2011 apud MEZOMO;
OLIVEIRA, 2015).

106 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


As condições de trabalho dos policiais não são as melhores,
a própria função implica medo e insegurança, o sofrimento é
inevitável diante dos reveses inesperados, sendo cada plantão
imprevisível em função da violência exacerbada.

Na luta constante contra a violência, os policiais enfrentam


uma verdadeira crise social, a violência ganha força enquanto
as notícias na mídia julgam a imagem do policial, destacando
os desvios de conduta, o abuso de autoridade e a falhas
cometidas. Nesse contexto, o policial enfrenta uma verdadeira
crise de identidade.

O agente de segurança também recebe elogios por agir


corretamente, mas, no momento seguinte, essa mesma polícia é
vista como perversa, por ter cometido alguma irregularidade ou
não ter alcançado êxito em sua missão. Nicolau (2009) afirma,



em relação às informações que a mídia brasileira divulga:

Sempre tratam dos acontecimentos que envolvem


a polícia como parte de uma ‘agenda obrigatória’.
Ganham realce quando se refere a acontecimentos nas
principais capitais do País (NICOLAU, 2009, p. 15).

Dessa forma, os policiais encontram-se constantemente


vulneráveis às consequências do estresse negativo,
ocasionado pelos conflitos inerentes à própria função,
tornando-se suscetíveis aos sofrimentos físicos e
psicológicos ocasionados por estes.

Embora não exista uma pontuação específica


para instituições de segurança pública, a maioria
das pesquisas encontradas no Brasil apresentam
resultados com percentuais de incidência do
estresse próximo ou acima de 50% (COSTA et al.,
2007; DANTAS et al., 2010; MARQUES; BARDAGI, 2010;
SANTA CATARINA, 2011; LIPP, COSTA; NUNES, 2017).

107 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Na literatura, encontramos alguns estudos que apresentam
dados preocupantes em relação à incidência do estresse em
profissionais de segurança pública.
Saiba mais
Existem diversas pesquisas sobre o estresse e o policial. Então,
uma dica de leitura é a pesquisa realizada por Costa et al. (2007),
intitulada “Estresse: diagnóstico dos policiais militares em uma


cidade brasileira”.

Esse estudo é descritivo, com corte transversal, e teve como


objetivo diagnosticar a ocorrência e a fase de estresse em
policiais militares da cidade de Natal/RN e determinar a
prevalência de sintomatologia física e mental.

Vamos agora analisar esse estudo realizado por Costa et


al. (2007), em relação ao estresse causado em agentes de
segurança devido aos exercícios da função.

Estudo de Caso

No estudo, foram colhidos dados a partir de uma amostra de


264 sujeitos do total de 3.193 policiais militares do efetivo do
comando do policiamento da capital, no período de junho de
2004 a janeiro de 2005. O instrumento utilizado foi o Inventário
de Sintoma de Stress para Adultos de LIPP (ISSL). O resultado da
pesquisa demonstrou que 52,6% dos sujeitos não apresentavam
sintomas de estresse e 47,4% estavam com estresse; dentre
esses 3,4% encontravam-se na fase de alerta; 39,8% na fase
de resistência; 3,8% na fase de quase exaustão e 0,4% na fase
de exaustão. Os autores concluíram que os níveis de estresse
e de sintomas não indicaram um quadro de fadiga crítico.
Dessa forma, é recomendável uma ação preventiva por parte
da organização policial, que poderia incluir a aplicação de um
programa de diagnóstico, orientação e controle do estresse
(MEZOMO; OLIVEIRA, 2015).

108 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Agora vamos conhecer a pesquisa realizada por Oliveira e
dos Santos (2010), intitulada “Percepção da saúde mental em
policiais militares da força tática e de rua”, que demonstrou
que a vida laboral dos policiais militares está rodeada de
situações de intenso estresse. O objetivo do estudo foi
identificar a visão de policiais militares da força tática e de rua
sobre os aspectos que permeiam sua saúde mental.

Estudo de Caso
Nesse estudo, participaram da pesquisa 24 policiais militares
de dois Batalhões da Polícia Militar do Estado de São Paulo.
Individualmente, foi aplicada uma escala com 30 questões
abordando assuntos pertinentes ao tema em questão. Com
base nos resultados, constatou-se que os participantes (91,7%),
sempre ou às vezes, percebiam-se estressados; uma parte (41,7%)
relatou já ter agido impulsivamente em alguma ocorrência;
88,3% sempre ou às vezes se sentiam emocionalmente cansados
após o dia de trabalho; 62,5% afirmaram que às vezes percebiam-
se agressivos no trabalho; 20,8% já pensaram em suicídio e 8,3%
nunca se sentiam realizados com a profissão. As pesquisadoras
sugerem novos estudos acerca da temática.

Outro estudo realizado em Roraima em 2011, destacado por


Mezomo e Oliveira (2015), buscou mapear as principais fontes
geradoras de estresse ocupacional nos profissionais de
segurança pública do estado.

Estudo de Caso
Participaram da pesquisa 462 profissionais, o que corresponde
a 16,43% do efetivo total dos profissionais de segurança pública
de RR. Destes, 261 eram policiais militares, 100 bombeiros, 80
policiais civis e 21 agentes carcerários. Para a coleta de dados,
foram utilizados quatro instrumentos, o Inventário de Sintomas
de Stress para Adultos de Lipp (ISSL), o Questionário de Saúde
Geral de Goldberg (QSG), avaliação antropométrica, e, para

109 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


complementar os dados obtidos, bem como identificar outras
categorias de análise sobre a temática, foi aplicada a técnica de
grupo focal. Os resultados demonstraram que 260 profissionais
não estavam com estresse e 202 estavam com estresse. Destes,
126 (48,2%) eram policiais militares, 32 (40%) policiais civis, 5
(23,8%) agentes carcerários e 39 (39%) bombeiros militares.

Lipp, Costa e Nunes (2017), entre 2010 e 2012, avaliaram os


níveis de qualidade de vida, de estresse ocupacional e suas
fontes em 1.837 policiais do estado do Mato Grosso. Destes,
1.017 eram policiais militares, 108 do Corpo de Bombeiros
Militar, 454 da Polícia Civil, 68 peritos criminais e 190 do
pessoal administrativo. As autoras verificaram que 52% da
amostra apresentava estresse. Entre os policiais militares, o
estresse atingiu o percentual de 50%.

Através dos dados, as pesquisadoras observaram uma


associação significativa entre altos níveis de estresse e má
qualidade de vida, principalmente na saúde. Conforme as autoras
revelam, há necessidade de ações institucionais de promoção
e aquisição de estratégias de enfrentamento para melhorar a
qualidade de vida na segurança pública do Mato Grosso.

Figura 38: Sensação


de exaustão devido
ao nível de estresse
elevado. Fonte:
Pixabay (2020).

110 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Lopes e Marques (2018) realizaram um estudo descritivo,
com abordagem qualitativa, que teve como objetivo descrever
os possíveis fatores que contribuem para o adoecimento
psicológico dos policiais militares. Vamos entender mais
sobre essa pesquisa.

Estudo de Caso

Os sujeitos da pesquisa foram 10 policiais militares em exercício


numa cidade de Minas Gerais. O instrumento utilizado para a
coleta de dados foi um questionário semiestruturado composto
de 12 questões abertas e fechadas, e as respostas transcritas
foram analisadas com base na Análise de Conteúdo de Bardin
(1977). Os resultados demonstraram que as principais queixas
relatadas pelos policiais dizem respeito a: excesso de carga horária
de trabalho, cobrança excessiva e aspectos ligados à hierarquia
militar. Tais fatores na percepção deles criam um ambiente
propício para o desencadeamento de adoecimento psicológico.
Nesse contexto, as autoras ressaltam a importância do psicólogo
no contexto militar e a necessidade de outras pesquisas que
possibilitem o aprofundamento das questões relativas à percepção
dos policiais militares diante do afastamento de trabalho em
decorrência do adoecimento psicológico.

A dissertação de mestrado de Mezomo (2018) teve como


objetivo analisar os indicadores de estresse na polícia militar
de Roraima através de três premissas: magnitude do estresse,
condições do estresse e características do estresse. Vamos
entendê-las melhor a seguir.

Estudo de Caso
Participaram do estudo 270 policiais. O instrumento utilizado
para a coleta de dados foi o Inventario de Sintomas de Stress
para Adultos de Lipp (ISSL). Os dados foram sistematizados
e analisados através da análise estatística simples, não
paramétrica, na qual a análise inferencial por frequência

111 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


permite suposições e hipóteses a partir dos resultados
obtidos. Considerando a amostra estudada, que correspondeu
a 14,66% do efetivo total da PMRR, constatou-se que 36,30% da
amostra apresentaram estresse. Os dados demonstraram que
proporcionalmente a maior incidência do estresse estava entre
as profissionais do gênero feminino com o percentual de 57,45%
e entre os oficiais com 63,16%. Os resultados ainda apontaram
para a prevalência da fase de resistência, encontrada em
76,53% dos policiais que estavam com estresse. Em relação às
características do estresse presente nos sujeitos, os indicadores
predominantes físicos foram: tensão muscular, insônia,
mudança do apetite, sensação de desgaste físico, cansaço
constante, excesso de gases e problemas dermatológicos.

Vale destacar que, nesse último estudo que vimos, os


indicadores psicológicos mais frequentes encontrados nos
agentes foram: vontade súbita de iniciar novos projetos,
sensibilidade emotiva excessiva e ansiedade diária.

PESQUISAS REALIZADAS NO BRASIL


SOBRE ESTRESSE PÓS-TRAUMÁTICO EM
PROFISSIONAIS DE SEGURANÇA PÚBLICA
Dando continuidade aos estudos relacionados ao estresse
e agentes de segurança, vamos agora conhecer pesquisas
realizadas no Brasil sobre o estresse pós-traumático
nesses profissionais.

Souza (2007) aponta que a contínua exposição a situações


de estresse vivenciadas ou testemunhadas faz parte das
atividades em missões de paz, problemas mentais podem
ser resultados previsíveis no trabalho de tropas militares nas
forças de paz. Nesse contexto, o autor destaca a prevalência
do transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) nesses
profissionais, através de um estudo com 138 militares em
missão de paz no Haiti.

112 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Esse estudo buscou identificar possíveis fatores que
levam aos sintomas referentes ao TEPT. Através do
estudo, foram identificados altos índices de afeto
negativo e diversas situações estressantes, que,
de acordo com o autor, podem contribuir para o
desenvolvimento do TEPT.

Já para Milet (2010), o TEPT foi percebido inicialmente em


veteranos de guerra no Vietnã, que, ao retornarem da guerra,
aparentavam dificuldade para dormir, pois tinham constantes
pesadelos referentes aos conflitos que vivenciaram. A autora
diz que, atualmente, o TEPT é encontrado principiante em
indivíduos com profissões de risco.

Figura 39: Soldados


que voltam da
guerra são alto
grupo de risco para
desenvolver TEPT.
Fonte: Pixabay
(2020).

Neste sentido, a autora realizou um estudo com 163


bombeiros militares de Recife (PE). A prevalência de TEPT
foi de 59,5%, dentro dos sintomas mais persistentes
encontrados estão: os distúrbios de sono, distúrbios
psicossomáticos, estresse psíquico e desconfiança no
desempenho. Por fim, a autora sugere que a corporação e
os familiares considerem esse resultado para uma melhor
qualidade de vida para esses profissionais.

Rocha (2013) desenvolveu um trabalho sobre o TEPT em


policiais militares do Rio de Janeiro. Para tanto, a autora utilizou-

113 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


se de sua longa experiência de onze anos como psicóloga da
Polícia Militar do estado do Rio de Janeiro descrevendo diversas
ocorrências sobre o seu trabalho na corporação, demonstrando
como funciona o serviço de psicologia e como enxerga o homem
policial militar, considerando a sua identidade e a instituição
à qual pertence. A autora discute o adoecimento mental entre
os policiais, especialmente o estresse pós-traumático, que ela
entende ser um problema de saúde pública que vai além da
Policia Militar do Rio de Janeiro.

Vamos continuar conhecendo outros estudos, na imagem a seguir.

1 Lima, Blank e Menegon (2015) realizaram um estudo


com os bombeiros de Belo Horizonte no período de 30
dias para identificar o TEPT e investigar se variáveis
ocupacionais estão associadas ao transtorno. Após
a realização do estudo na corporação, observou-se a
prevalência de TEPT de 6,9%. Os fatores psicossociais
do trabalho, eventos traumáticos ocupacionais, tempo
de trabalho e absenteísmo, que são as constantes faltas
ao trabalho. Além de outros fatores como: problemas
de saúde mental no passado, eventos adversos extras
laborais e a idade também foram associados ao TEPT.

2 Para Câmara Filho (2012), os policiais estão suscetíveis


a desenvolver o TEPT devido à constante exposição
aos perigos inerentes à profissão. Com isso, os autores
realizaram um estudo para avaliar a incidência de TEPT em
41 policiais militares hospitalizados devido a um trauma
físico no período de um ano, sendo utilizados instrumentos
diagnósticos pelo DCM-IV, questionários de autoavaliação
e escala de gravidade de lesão. Ao final de tal estudo,
os autores perceberam a grande incidência de TEPT,
inclusive ressaltam sua forma crônica e a consideram tão
altas quanto as descritas na literatura. Assim, enfatizam
a importância da prevenção do transtorno de estresse

114 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


pós-traumático nessa área de atuação devido à grande
exposição ao perigo que esses profissionais de segurança
pública estão envolvidos.

3 Para o surgimento do TEPT, faz-se necessário que


ocorra um fato estressor, porém esse não é o único
aspecto para o desenvolvimento do TEPT. Nesse
contexto, Maia et al. (2011) desenvolveram um estudo
em policiais brasileiros em atividade, para analisar
quais são os fatores de risco para o desenvolvendo
do TEPT nesses profissionais. Ao final das pesquisas,
os autores concluíram que, dentro das variações
de sintomas de TEPT, 55%, estão relacionadas
ao tempo de serviço, dissociação peritraumática
(resposta aguda ao trauma que resulta em amnésia,
despersonalização e perturbações de identidades),
apoio social diminuído, afeto negativo, exposição
constantes a situações traumáticas.

4 Rodrigues e Belchior (2018) realizaram pesquisas na


Polícia Militar do Primeiro Batalhão de Anhanguera
para levantar quais são os principais problemas que
ocasionam o estresse pós-traumático nos policiais
militares. Na pesquisa realizada, constataram que os
principais problemas estão relacionados a inúmeros
tipos de situações traumáticas enfrentadas ao longo
tempo de serviço na corporação, relacionados a risco
de morte e como lidar com mortes de indivíduos em
combate. Essas situações de forte estresse podem
levar o adoecimento da corporação, confirmando assim
grande probabilidade de TEPT nos policiais. Sendo
assim, os autores destacam a grande importância
da pesquisa, pois, através dela, são identificados os
problemas que podem interferir na saúde do policial.

115 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


5 Para Moura, Alchieri e Dantas de Lucena (2014), o
trabalho dos Bombeiros Militares no Brasil tem uma
rotina complexa com desenvolvimento de novas técnicas
para demandas específicas no trabalho. Para tanto, os
autores enxergam a extrema importância de cuidar da
saúde desses profissionais no que diz respeito ao TEPT.
Os autores desenvolveram um estudo em 216 bombeiros
militares, do sexo masculino, com idade média de 35
anos. Após as pesquisas, os autores constataram que a
maioria dos bombeiros não apresentavam TEPT, porém
o grupo que portava o transtorno tinha um número
expressivo de elevação do TEPT. Assim, os autores
destacam a necessidade de intervenções preventivas no
ambiente de trabalho que são de extrema importância,
legitimando a continuidade da pesquisa.

6 Guimaro et al. (2010) realizaram um estudo em


profissionais que prestaram ajuda humanitária à
Figura 40: população haitiana, após o terremoto ocorrido no
Pesquisas
brasileiras sobre ano de 2010, com o objetivo de identificar sintomas
TEPT. Fonte: do transtorno de TEPT. Participaram desse estudo 66
labSEAD-UFSC
(2020). indivíduos. Destes 32 eram brasileiros e não houve uma
diferença significativa na população entre homens e
mulheres. O estudo mostrou que a maioria apresentou
número de sintomas abaixo do ponto de corte. Porém,
os resultados sugerem que quanto maior a experiência
profissional prévia em situação de desastre, maior a
ocorrência das memorias intuitivas.

Costa et al. (2019) também realizaram um estudo na


região metropolitana de São Paulo, como o intuito de
estimar a prevalência do TEPT e descrever seu perfil de
morbidade com outros transtornos. Foi avaliada uma
amostra de 2942 indivíduos com 18 anos ou mais anos, e
o instrumento utilizado para diagnóstico foi o Composite

116 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Internacional Diagnostic. O resultado mostrou que 85,2%
dos indivíduos que tinham o TEPT apresentaram algum tipo
de comorbidade. A maior prevalência foi de transtorno de
ansiedade, transtorno de humor e transtornos relacionados
ao uso de substâncias. Com isso, o estudo mostrou a
grande incidência de transtornos mentais em comorbidade
com o TEPT.

Vários transtornos mentais podem acometer profissionais que


tenham que lidar constantemente com situações de riscos em
suas atividades laborais, entre eles o TEPT. Com isto, Correia e
Dunningham (2016) realizaram um estudo com os policiais da
Bahia. A amostra foi composta por 228 policiais militares, que
preencheram questionário sociodemográfico e questionário
de transtorno de estresse pós-traumático. De acordo com
a nota de corte, 35,53% dos participantes apresentaram os
sintomas do TEPT, e 16,7% foi a taxa estimada de provável
TEPT, de acordo com o critério agrupamento. No item
sociodemográfico, não foi observado associação com a
presença do TEPT.

117 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Aula 3 – Da Tristeza à Depressão

CONTEXTUALIZANDO...
Tristeza e depressão são termos bastante utilizados no
dia a dia, há quem ainda confunda uma com a outra, uma
vez que depressão se tornou uma palavra popularizada e
frequentemente atribuída a um indivíduo que se encontra em
estado de humor triste. Quem nunca ouviu dizer que alguém
estava deprimido por demonstrar-se mais triste, mesmo sem
nunca ter passado por um diagnóstico profissional?

No entanto, os fatores que distinguem uma tristeza comum


de um transtorno de humor como a depressão são bem mais
complexos e merecem atenção.

Nesse sentido, vamos agora entender o que se define como


tristeza e o que é depressão, bem como seus sintomas e
consequências.

DIFERENCIAÇÃO ENTRE TRISTEZA E


DEPRESSÃO
Historicamente, a depressão é conhecida desde os tempos
mais remotos, podendo ser encontrada em registros
históricos de diversas culturas e povos. Em determinadas
culturas antigas, era percebida como fator sobrenatural
e mediação divina. Em culturas como a grega antiga, era
explicada como consequência de conflitos impostos pelo
destino, como descrevem Campos e Feitosa (2018).

Saiba mais


Segundo a mitologia grega, Orestes havia recebido uma ordem
do Deus Apolo para que matasse sua própria mãe. Por não
obedecer à ordem, recebeu como castigo a depressão.

118 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


No conceito filosófico antigo de Hipócrates, considerado pai da
medicina, a depressão surgia como consequência do excesso
de bile negra, talvez uma explicação mais organicista para
compreender melhor a doença. Esses questionamentos a respeito
da depressão são muito antigos (CAMPOS; FEITOSA, 2018).

Há relatos de que, na Idade Média, acreditava-se que a


depressão estava ligada à astrologia e o planeta saturno era o
guia e condutor da depressão nos humanos. Já no período da
Renascença, a depressão era atribuída à falta de circulação do
ar, excesso de preocupações, situações que estavam fora do
controle do indivíduo (CAMPOS; FEITOSA, 2018).

Figura 41:
Astrologia como
condutora da
depressão na Idade
Média. Fonte:
Pixabay (2020).

Somente no século XIX a depressão recebeu um significado


novo, mais ligada à afetividade e cientificamente caracterizada
com a tristeza, abatimento e desgaste com a vida, geralmente
acompanhados de ideia fixa e delírios.

CARACTERÍSTICAS, SINTOMAS E
TRATAMENTO DA DEPRESSÃO
Atualmente, a classificação dos sintomas e sinais da
depressão distingue-se bastante de como era feita ao
longo da história. Hoje, existem manuais diagnósticos
e classificações internacionais que são utilizados por
psicólogos, psiquiatras, cientistas, pesquisadores e demais

119 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


profissionais da saúde do mundo inteiro (Classificação
Internacional de Doenças (CID-10) e Manual Diagnóstico e
Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5)).

O DSM-5 classifica os transtornos depressivos em vários


tipos, como: transtorno disruptivo da desregulação do
humor, transtorno depressivo maior, transtorno depressivo
persistente (distimia), transtorno disfórico pré-menstrual,
transtorno depressivo induzido por substância ou
medicamento, entre outros.

A característica comum em todas essas categorias


de transtornos depressivos é a presença dos
sintomas e sinais de humor triste, vazio ou irritado,
acompanhado de mudanças somáticas e cognitivas
que afetam de forma significativa a capacidade de
funcionamento do indivíduo.

O que difere um transtorno depressivo do outro são aspectos


como a duração, momento ou etiologia.

Ainda conforme o DSV-5, os aspectos da depressão, de uma


forma geral são: humor deprimido, perda de interesse ou
prazer, sentimento de tristeza, vazio, desesperança, acentuada
diminuição do interesse ou prazer na maioria das atividades
na maior parte do dia, quase todos os dias.

Figura 42:
Sentimento
profundo de tristeza
como aspecto de
depressão. Fonte:
Pixabay (2020).

120 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Fisicamente, o indivíduo percebe a perda ou ganho de peso
sem estar fazendo dieta. Há também alteração no sono, como
insônia ou hipersonia quase todos os dias.

O indivíduo apresenta agitação ou retardo psicomotor quase


todos os dias, além de fadiga, perda de energia, sentimento de
inutilidade, culpa excessiva ou inapropriada, capacidade de
pensar diminuída ou na concentração, dificuldade de decisão,
pensamentos recorrentes de morte, ideação suicida recorrente.

Esses sintomas causam no indivíduo sofrimento


significativo ou ainda prejuízo social, profissional e
outras áreas da vida que lhe são importantes.

A duração e a intensidade desses sintomas são importantes no


processo de observação e diagnóstico da depressão, uma vez
que, conforme o DSM-5, uma perda significativa como luto, ruína
financeira, perdas por desastre natural, descoberta de doença
médica grave ou incapacitante podem incluir sentimento de
tristeza intensa e variação dos sintomas acima listados.

A diferenciação entre tristeza e depressão deve ser


cuidadosamente considerada a partir do exercício
do julgamento clínico baseado na história do sujeito
e nas normas culturais.

A depressão é considerada um dos transtornos psiquiátricos


mais recorrentes no mundo. O tratamento por meio de
psicoterapia é um caminho para o indivíduo com depressão,
através da terapia cognitivo-comportamental ou analítico-
comportamental, terapia da aceitação e compromisso, terapia
comportamental, entre outras.

121 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


O indivíduo que tem depressão tende a apresentar redução
de comportamento positivamente reforçado como atividades
prazerosas e aumento de comportamentos de fuga e esquiva
de situações aversivas. É importante um olhar global do
profissional sobre o sujeito, uma vez que permite que este
identifique os deficits comportamentais daquele, além de
tratamento multidisciplinar, que tem mostrado resultados
eficientes na redução da sintomatologia da depressão
(CARDOSO, 2011).

DEPRESSÃO NO CONTEXTO DA
SEGURANÇA PÚBLICA
No contexto da segurança pública, observa-se que os
policiais, por exemplo, são influenciados na maior parte do
tempo por variados fatores negativos que geram depressão.
Cansaço físico e mental, além da falta de equilíbrio
emocional, conduzem esses profissionais a tomarem atitudes
inconsequentes durante situações confusas, conforme
refletem Costa e Estevam (2014).

Mas afinal, o que potencializa e faz do policial um grupo de


risco para o desenvolvimento da depressão e outras doenças
de caráter psicológico?

Além da subjetividade dos agentes, vale a pena pensarmos


aqui também as defasagens organizacionais, pois, dentre os
fatores elencados como causas dos adoecimentos, aparecem
prioritariamente as condições insalubres próprias do trabalho
policial militar. Essas estão expressas nos discursos de
denúncia, nos quais os militares aparecem como submetidos
a escalas exaustivas.

Muitas vezes estão associadas ao desgaste físico, ao estresse


e ao sofrimento psíquico, além do próprio risco de morte
que a profissão carrega. Essas condições provocam danos
psicológicos, às vezes em caráter permanente, que, em casos
mais graves, levam ao suicídio.

122 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Palavra do Especialista
Ainda segundo o ponto de vista dos policiais, outros elementos
também podem ser propiciadores de sofrimento: o medo de sofrer
 alguma lesão, a incerteza dos julgamentos morais dos outros, o
tédio das atividades repetitivas, a confusão entre os interesses
pessoais e os da corporação e a má remuneração (SALES; SÁ, 2016).

Em todas as profissões, os fatores como má remuneração,


desgaste físico e risco de morte do indivíduo, existe grande
possibilidade de doenças psíquicas, o detalhe agravante à
carreira policial é que, mesmo em seus momentos de folga, o
agente de segurança não pode diminuir seu estado de alerta.

Desde o processo de formação das carreiras policiais, há uma


demanda para que esses indivíduos pensem com “espírito de
corpo”, ou seja, junto com a tropa, para isso é preciso que esse
agente esteja pronto a qualquer momento que demande maior
número de agentes, ainda que esteja na sua folga, mesmo
resguardada sua folga em lei caso seus “irmãos de farda”
precisem. Não ir em caso de necessidade seria como uma
traição ou omissão, pois, caso fosse esse agente de folga que
precisasse, outros estariam com esse mesmo sentimento de
precisar ajudar o outro que sofre os mesmos riscos cotidianos.

Figura 43: Irmãos


de farda. Fonte:
Pixabay (2020).

123 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


É de fácil percepção empírica nas grandes cidades o estado
de semiguerra civil. E faz realmente parte do discurso da
ética que norteia os ideais policiais não se deixar subjugar
por nenhum agressor nem deixar seu parceiro de serviço para
trás, trazendo a responsabilidade pra si, para sua realidade
subjetiva, que a ordem social seja mantida.

Mesmo assim, em nossa convivência dentro das realidades


policiais, é comum ouvir relatos sobre presos que são, por
conta das brechas das leis, liberados antes mesmo de o
policial ser ouvido pela autoridade policial, também sendo
soltos na audiência de custódia. Esses indivíduos voltam a
cometer crimes de diversas modalidades e, em alguns casos,
reencontram o mesmo agente de segurança que atuou em
apreensões anteriores. Assim, o chavão “enxugar gelo” é a
forma de o policial brasileiro explicar sua atuação cotidiana.

Mesmo sendo multifacetadas as causas da


depressão, alguns autores conceituam a depressão
como uma “síndrome de esgotamento” por causa da
proeminência de factibilidade.

Esses autores postulam que o paciente esgota a energia


disponível durante o período que antecede o início da depressão,
e o estado deprimido representa uma espécie de hibernação,
durante a qual o paciente paulatinamente acumula uma nova
reserva de energia, a factibilidade pode ser a manifestação da
perda de uma motivação positiva (BECK, ALFORD, 2009).

É essencial, ao nosso entender, no Estado democrático


de direito, a atividade policial. O manejo das situações
corriqueiras na prática policial dentro de seus afetos e
comportamentos é influenciado pela forma como esse agente
interpreta e percebe o mundo (BECK, 1997).

124 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Logo, não são as brechas da lei ou condições insalubres em
si mesmas os causadores dos transtornos psiquiátricos,
mas a implicação emocional dentro de suas interpretações
na realidade do sujeito, podendo provocar comportamentos
disfuncionais contínuos.

As pessoas explicam os diversos contextos personalizando-os


de forma interna (atribuindo os acontecimentos a si mesmo)
ou de forma externa (atribuindo a outros). São estilos diversos
de atribuir sucesso e fracasso do que vivem na dimensão
organizacional, que variam em três dimensões: personalização,
abrangência e permanência.

Segundo Serra (2000), esses estilos de atribuição correlacionam-


se com alguns aspectos, na esfera ocupacional. Vejamos na
imagem abaixo.

Suscetibilidade à Desmotivação
depressão clínica no desempenho
e à doença em educação e
orgânica. Risco de recaída esportes. Insatisfação no
em depressão. trabalho.

Figura 44: Estilos


de atribuição
correlacionados na O manejo terapêutico dos primeiros sinais do quadro
esfera ocupacional,
segundo Serra sintomático das crenças e esquemas disfuncionais
(2000). Fonte: oportunizada no ambiente policial é um desafio permanente
labSEAD-UFSC
(2020). que necessita de verdadeiro esforço das entidades envolvidas,
principalmente com relação ao acesso a dados e coerência
entre os órgãos coercitivos. Indivíduos barrados nos testes
psíquicos nas etapas dos certames das carreiras policiais
hoje podem continuar as etapas de formação através do
mandato de segurança.

Segundo Brito e Goulart (2005), 38,04% dos candidatos


contraindicados, indicados com restrição ou eliminados dos
certames que conseguiram obter êxito e tomar posse em carreira
policial, entre 1994 e 2002, tiveram problemas disciplinares e
incorreram em crimes dentro da Polícia Militar de Minas Gerais.

125 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


Isso demonstra que, mesmo já havendo o
entendimento também em lei, há necessidade
de um contínuo trabalho conscientizador da
importância da saúde psíquica e suas descobertas
serem oportunizadas na prática para uma posterior
melhora da qualidade de vida dos profissionais de
segurança pública.

O manejo terapêutico cognitivo-comportamental possibilita


que estilos de atribuição sejam modificados. Através de
programas de treinamento em estilos de atribuição, podemos
transformar pessimistas em otimistas. Marback e Peliscoli
(2014) afirmam que esses programas possuem alguns
objetivos. Vamos conhecê-los na figura abaixo.

Melhorar
Aumentar a o estado
satisfação no intrapessoal Reduzir a Melhorar o
trabalho e a dos indivíduos, rotatividade desempenho
qualidade do reduzindo a e baixa operacional de
relacionamento depressão e persistência. indivíduos nas
interpessoal. a ansiedade, organizações.
quando
presentes.

Figura 45: Objetivos dos programas de manejo terapêutico.


Fonte: labSEAD-UFSC (2020).

A prática policial, a partir das conquistas da psicologia


atual, pode ser motivada a uma operacionalidade que inclua
experimentação e aplicação de novas estratégias para
interpretações mais assertivas, em que há uma busca pelo
desenvolvimento de processos conscientes e adaptativos
de pensamento, como o pensamento racional e a solução
de problemas. Além disso, espera-se que, nesse processo,

126 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


o agente de polícia reconheça e modifique sua maneira
patológica de pensar, especificamente em dois níveis de
processamento de informações, que são os pensamentos
automáticos e os esquemas (WRIGHT; BASCO; THASE, 2008).

Diante disso, vejamos na imagem a seguir dados referentes às


consequências geradas pela depressão.

Anualmente, 800 mil casos de suicídio


são registrados no mundo segundo a
A depressão pode resultar, em seus Organização Mundial de Saúde (OMS).
casos mais graves, em suicídio, No Brasil, 5,8% da população sofre
principalmente quando não de depressão, o que significa mais de
diagnosticada e tratada. 11,5 milhões de pessoas.


Mais de 18,6 milhões de pessoas Henrique (2017) diz que, só no estado
(9,3% da população brasileira) têm de São Paulo, mais de 228 agentes
distúrbios relacionados à ansiedade, de segurança cometeram suicídio na
sendo essa previsão crescente para última década, o que equivale ao dado
os próximos anos. estarrecedor de um suicídio na polícia
a cada 17 dias.

Figura 46:
Consequências da Em nosso contexto de segurança pública, quando há suicídio
depressão. Fonte:
labSEAD-UFSC de um agente, a causa da morte é divulgada como uma
(2020). comorbidade equivalente.

Diante de tudo que aprendemos até aqui, podemos entender a


urgente necessidade de quebra de tabu e divulgação dos possíveis
problemas de transtornos psíquicos, enfatizando positivamente
sua possibilidade terapêutica e melhoria de qualidade de vida,
para posterior atuação contínua de ressignificação paradigmática
de ser agente de segurança no Brasil. Não mais como um
agente “herói”, mas como um cidadão participante dos mesmos
processos cognitivos, emocionais e comportamentais de outras
profissões, com singularidades práticas de sua operacionalidade.

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140 • Módulo 2 Principais Conceitos da Saúde Mental: do Normal ao Patológico


MÓDULO 3

RISCOS E AGRAVOS DA
SAÚDE DO AGENTE DE
SEGURANÇA PÚBLICA
141 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública
Apresentação

Num mundo ideal, saber a causa das doenças facilitaria o


tratamento e evitaria a probabilidade de sua recorrência.
Muitas pessoas, se não a maioria, buscam a medicina
quando sintomas aparecem, mas, tão importante quanto
saber a sintomatologia é conhecer as possíveis causas do
adoecimento para tratá-las de forma adequada.

No que tange à saúde mental, não seria diferente, ou seja, tratar


apenas os sintomas dos adoecidos, sem entender as causas, é
um grande erro, dispêndio orçamentário e leva a reincidências
no adoecimento. Na segurança pública, reincidência implica
erros, perdas de outras vidas e, por fim, possível suicídio.

Nesse contexto, vamos conhecer a origem dos principais riscos


e agravos da saúde mental do agente de segurança pública.

OBJETIVOS DO MÓDULO
Conhecer, por meio de base teórica, a causa e os principais
riscos e agravos da saúde mental dos profissionais de
segurança pública.

ESTRUTURA DO MÓDULO
• Aula 1 – Riscos e Agravos da Saúde Mental do Agente de
Segurança Pública: Influências Organizacionais.
• Aula 2 – Riscos e Agravos da Saúde Mental do Agente de
Segurança Pública: Influências Sociais.

142 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Aula 1 – Riscos e Agravos da Saúde
Mental do Agente de Segurança Pública:
Influências Organizacionais

CONTEXTUALIZANDO...
Para iniciarmos nosso estudo neste módulo, é importante
sabermos que o indivíduo é um ser biopsicossocial e seria
leviano afirmar que, se alguma pessoa adoece mentalmente, a
culpa é única e exclusivamente de um agente causador. O ser
humano tem história de vida, de aprendizado, histórico genético
e também desempenha papéis social e profissional, que
contribuem para sua saúde mental. Importante essa observação
para que não se acredite que apenas a atividade profissional,
ou a instituição, quase que exclusivamente, seja a causa do
adoecimento do agente de segurança pública.

Após estudos realizados no contexto de segurança pública,


vamos entender agora os riscos e agravos que foram mapeados
no que há disponível nas pesquisas publicadas e aplicadas
em órgãos de segurança pública. Nesse momento, vamos
direcionar para o ambiente organizacional. Mas, lembramos:
não é apenas a atividade profissional ou a instituição a causa
do adoecimento do agente de segurança pública, são fatores
diversos que conheceremos ao longo este módulo.

MODELO DE GESTÃO
Entender o que é gestão é importante para saber qual o papel
de cada um num contexto organizacional. Portanto, segundo o
dicionário Houaiss (2001), gestão é:

“Administração; ação de gerir, de administrar, de governar ou


de dirigir negócios públicos ou particulares.”

Esse é o conceito de gestão que será abordado neste primeiro


tópico do Módulo 3.

143 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Administrar e gerir são comportamentos que todos os
indivíduos emitem durante toda a vida. Para sermos mais
específico, vamos pensar no processo de aprendizagem
quando estávamos na infância, em fase de socialização.

Figura 1: Processo
de aprendizagem
de socialização na
infância. Fonte:
Pixabay (2020).

Na escola ou em casa, deveríamos administrar até onde


poderíamos brincar e até que horas, quem faria o que na
brincadeira, depois tínhamos de administrar os brinquedos e
assim por diante. Fomos crescendo e o processo de gestão
continuou na vida adolescente: administrar o tempo de estudo,
o tempo de descanso, o tempo de brincadeira.

Caso não cumpríssemos as regras do gestor superior (os


responsáveis legais), poderia haver perdas e/ou punições.
Vira-se um adulto e esse processo de ter um gestor e, ao
mesmo tempo, gerir o que foi determinado por ele, é um
comportamento aprendido, por isso, quando exercemos uma
atividade laboral, buscamos fazer o que dizem as atribuições,
cumprir a carga horária, cuidar da nossa aparência física e
higiene, gerir a nossa remuneração, agendar médicos, entre
outros. É importante ter consciência de que, durante todo o
processo de aprendizagem, existe o aprender a gerir. Mas
se faz imprescindível reforçar que, durante esse processo de
aprendizagem de gestão, sempre foi fundamental ficar claro
o que precisava ser feito.

144 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Prestem atenção: mesmo que vocês não exerçam
funções de chefia, vocês são gestores em algum nível
e também podem falhar (em casa, no trabalho, nas
finanças, com a saúde), não é mesmo?

Os gestores também sofrem pressões: de seus subordinados


e de seus próprios gestores. Então a mesma pessoa que gere
também é gerida, e o modelo precisa ser mais adequado em todas
as esferas de gestão. Vamos entender, na imagem a seguir, um
processo de hierarquia e subordinação no nível organizacional.
Perceba que o topo gere os demais e assim por diante.

SECRETÁRIO

SECRETÁRIO ADJUNTO

DIRETOR EXECUTIVO

OUVIDORIA ASSESSORIA GABINETE

Coordenadoria Gerência Gerência Gerência Gerência de Gerência de


Gerência de Gerência de de apoio e Gerência de Gerência de
de adm e de recursos de controle int e seg e estratégia e
tecnologia logística execução planejamento convênios
finanças humanos interno fronteira inteligência

Núcleo Núcleo Núcleo Núcleo Núcleo Núcleo Núcleo Núcleo Núcleo Núcleo
apoio apoio apoio apoio apoio apoio apoio apoio apoio apoio

Figura 2: Exemplo Podemos observar que o modelo de organograma de uma


de organograma
organizacional. instituição consegue exemplificar, por uma estrutura gráfica,
Fonte: Rondônia a hierarquia de uma organização formal por onde as ordens
(2020), adaptado
por labSEAD-UFSC internas caminham e quem gere quem.
(2020).

145 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


A ideia deste tópico não é demonizar chefias e
vitimizar subordinados, mas elucidar, em seu
núcleo de atuação, onde você também está gerindo,
e provavelmente com equívocos, bem como mostrar
resultados de estudos que sinalizam que o modelo
atual de gestão na segurança pública precisa ser
revisado e, quem sabe, mudado.

Para ajudar no processo de mudanças, vamos destacar uma


sugestão simples do que pode ser feito para construir uma
boa gestão: formação de gestores. É por esse viés que as
instituições privadas adotam técnicas de desenvolvimento de
habilidades administrativas, investem em programa de formação
de líderes e avaliação de resultados para mensurar o quanto
um gestor é bom ou não, entre muitos outros programas de
incentivo de habilidades. Para ser um gestor, é preciso técnicas e
desenvolvimento de melhores habilidades administrativas.

Nesse contexto, vamos avaliar a Polícia Rodoviária Federal!

Na Polícia Rodoviária Federal, a carreira é única, então, um agente


que hoje está atuando como gestor, amanhã pode voltar a atuar
na pista. Diante disso, podemos perceber um grande desafio.

Esse agente é nomeado “gestor”, mas não lhe é proporcionado


um treinamento para exercer uma chefia. Em muitos casos,
não é reconhecido e respeitado pelos pares como gestor.

É interessante avaliar que, em muitos casos, os


gestores ou líderes sequer recebem algum valor
significativo para atuarem como tal, apenas recebem
a ordem de gerir uma equipe, que, em muitos
momentos, não os reconhece como tal. Não só quem
é liderado adoece, quem lidera também está passível
de ser acometido pelo adoecimento.

146 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Mas, afinal, como se faz a gestão na segurança pública?

Hierarquia e disciplina. Mesmo nas instituições não


militarizadas, existe chefia e, por isso, subtende-se que
também atuam com esses dois princípios. Esse talvez seja um
dos principais desafios na gestão da segurança pública.

Todas as instituições de segurança vêm passando por


mudanças, em especial no que tange ao cognitivo de quem
quer fazer parte dela. Atualmente, se alguma pessoa quer ser
um agente de segurança, ela passa por um teste cognitivo de
entrada que exige muito conhecimento.

Outra sugestão de mudança: uma equipe melhor


preparada cognitivamente precisa ser envolvida
no processo de gestão, construindo uma gestão
compartilhada, na qual acerto e equívocos passam a
ser responsabilidades de todos.

A segurança pública é definida pela Constituição


Federal, no artigo 144, como dever do Estado, direito e
responsabilidade de todos. Cabe ao poder público, em cada
esfera de governo (União, estados, municípios), e com a
participação da sociedade civil, atuarem conjuntamente em
prol de uma segurança pública de qualidade, participativa e
inclusiva. E como ela deve ser efetivada?

Vamos identificar na imagem na imagem a seguir.

147 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


POLÍTICAS PÚBLICAS DE SEGURANÇA

Interesse Exercício da
público cidadania

Figura 3: Políticas Interesse


públicas de Controle
segurança.
coletivo social
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020).

É com a premissa apresentada nessa imagem que se levanta


a importância de uma gestão compartilhada. Seria simplista
apenas sinalizar que a polícia deva ser unificada, com entrada
única, com ascensão por competência e desempenho,
poderíamos trabalhar com gestão compartilhada.

Porém, há de se pensar que não é simples, e hoje existem


no Brasil diversas instituições de segurança pública com
diferentes especificidades. Vamos conhecer alguns exemplos
na figura a seguir.

Polícia Federal: Diversos cargos,


1 atribuições e requisitos.

Polícia Rodoviária Federal: Cargo único e uma série de


Figura 4:
2 atribuições voltadas especificamente ao trânsito.
Especificidades
em instituições
públicas de
Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN):
segurança no Brasil.
Fonte: labSEAD-
3 Atribuições no que diz respeito ao sistema prisional.
UFSC (2020).

148 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Ressaltamos que essas especificidades demonstradas na
imagem acima são na esfera federal. No âmbito estadual,
podemos destacar: a Polícia Civil, a Polícia Militar e o Corpo de
Bombeiros, com seus diversos cargos, atribuições e requisitos;
a Polícia Penal, com suas atribuições carcerárias; e as Guardas
Municipais, com suas atribuições e desafios, que são integrantes
operacionais do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP).

Saiba mais
O SUSP foi implantado pela Lei 13.675/2018, que dá arquitetura
uniforme ao setor em âmbito nacional e prevê, além do
compartilhamento de dados, operações e colaborações nas
estruturas federal, estadual e municipal.

 São integrantes estratégicos do SUSP: a União, os estados, o


Distrito Federal e os municípios, por intermédio dos respectivos
Poderes Executivos, além dos Conselhos de Segurança Pública e
Defesa Social dos três entes federados.

Para tentar exemplificar e afirmar que não é um desafio fácil de se


resolver, vejamos, a seguir, um exemplo de atribuições de cargos
e considerações a respeito de um delegado de Polícia Federal.

Instaurar e presidir
procedimentos
policiais de
investigação.

Desempenhar
outras atividades, Orientar e comandar
semelhantes ou a execução de
investigações
destinadas a apoiar o
relacionadas com a
órgão na consecução prevenção e repressão
dos seus fins. de ilícitos penais.

Figura 5: Atribuições
do cargo de
delegado, conforme
informações da Participar do
Polícia Federal. planejamento de
Supervisionar operações de segurança
Fonte: labSEAD- e investigações e da
e executar
UFSC (2020). missões de execução das medidas
caráter sigiloso. de segurança
orgânica.

149 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


É perceptível que a atribuição do cargo acima descrito relata
apenas sobre a atividade policial. Mas o servidor desse cargo, por
exemplo, exerce chefia de pessoas, e não só de processos e nem
só de atividade policial.

Uma das lacunas que facilmente é identificada na segurança


pública chama-se: mapeamento de cargos e competências com
requisitos mínimos para sua ocupação. Ocorre que, em geral, o
gestor de qualquer pasta na segurança pública atua em várias
frentes, entre elas:

• Orçamento.
• Logística.
• Redução da criminalidade etc.

Além dessas atribuições, também compete a ele a gestão de


pessoas, sendo, em muitos casos, a escolha feita apenas com
base nas competências técnicas, deixando as comportamentais
quase esquecidas ou desconhecidas. É nesse momento que, por
falta de competência comportamental, a máxima “hierarquia e
disciplina” se apresenta.

Em linhas gerais, o mapeamento fica estritamente relacionado


à atividade policial, porém a gestão vai bem além da atividade
policial, e, nessa ausência de mapeamento de competências
e desenvolvimento de gestores, perdem-se oportunidades de
melhorias e não se obtêm melhores resultados.

Nesse contexto, vamos conhecer outro exemplo de atribuição


de cargo, agora de um capitão da Polícia Militar, que tem como
atribuição exclusiva a realização do policiamento ostensivo,
assegurando o cumprimento da lei e a manutenção da ordem.

150 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Exercício da policia ostensiva, compreendendo planejamento, controle,
supervisão e execução de ações policiais.

Comando de órgãos de Polícia Militar e chefia de seções de


escalão intermediário, com gestão de recursos humanos, logísticos,
patrimoniais, financeiros e operacionais de polícia ostensiva.

Realização de atos de gestão de polícia administrativa.

Ministrar treinamentos ao efetivo sob sua responsabilidade.

Presidir inquéritos policiais militares, processos


administrativos disciplinares.

Proceder à verificação e exame dos atos ilícitos que tomar


conhecimento, tomando as providências jurídicas que o caso requer,
além de inquéritos técnicos e sindicâncias administrativas.

Expedir e fiscalizar a emissão de documentos públicos


de sua competência.

Figura 6: Atribuições
do cargo de capitão
da Policia Militar, Spode e Merlo (2006) também destacam a existência de
conforme Spode e
Merlo (2006). uma gama de prescrições e um sistema de punições e
Fonte: labSEAD- recompensas que incidem diretamente na execução do
UFSC (2020).
trabalho, nas relações que se estabelecem entre os policiais e
nos princípios que devem pautar a conduta deles, mesmo que
fora do ambiente de trabalho.

Como um oficial, com uma quantidade de atribuições dessas,


conseguirá entregar a tempo toda sua demanda e ainda
gerenciar pessoas?

No final, ocorre o que estudos já comprovam: uma distinção


importante entre o trabalho prescrito e o trabalho real. Nesse
sentido, vamos entender o que autores relatam a respeito.

151 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública



O primeiro diz respeito àquilo que é apresentado aos
trabalhadores como o que deve ser feito segundo
normas e definições precisas – a tarefa a ser cumprida
– cujas diretrizes geralmente são dadas considerando
uma situação modelo, negligenciando as variabilidades
das situações de trabalho. No entanto, trabalhar exige
dar conta de uma realidade bem mais complexa do que
aquela prevista pela prescrição. (BARBARINI, 2001 apud


SPODE; MERLO, 2006, p. 363).

Trabalhar exige dar conta daquilo que, independente da


qualidade da concepção e da precisão dos procedimentos,
impõe-se inexoravelmente aos trabalhadores por meio do
imprevisto, do inesperado, daquilo que foge à prescrição.

“Estamos, portanto, no âmbito do trabalho real.” (DEJOURS,
1997 apud SPODE; MERLO, 2006, p. 363).

Olhar o cenário da segurança pública é saber que os gestores


e subordinados estão sobrecarregados, e que o nível de
violência e criminalidade vem aumentando significativamente.
Assim, o modelo de gestão atual pode ser uma das causas
de adoecimento (tanto no gestor como nos subordinados)
pela falta de apoio no trabalho, no reconhecimento das
doenças e na liberação e suporte para o tratamento. Em uma
pesquisa realizada por Nogueira (2007), os oficiais relataram
em entrevistas que as queixas de sofrimento psíquico têm o
intuito de conseguir dispensa do serviço, e que, devido a isso,
esses problemas não constituem prioridade da corporação.

Nos modelos de gestão observados, vê-se que


disciplina e hierarquia são centradas em processos,
e não em pessoas, tem-se a cultura de que o policial
é “super-homem”, e se desconhecem os sintomas
e as formas de tratamento para a doença. Daí se
estabelece o preconceito, que e muitas vezes não
permite a abordagem pela maioria dos gestores da
segurança pública.

152 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Estudiosos da área de segurança pública chegam a questionar
a eficiência da organização do trabalho que as polícias
brasileiras empregam (SILVA; VIEIRA, 2008). Em se tratando
especificamente desses trabalhadores, as exigências do
contexto de risco permanente vivido nas ruas, somadas
àquelas relacionadas à forma como o trabalho está organizado
pelo alto rigor prescritivo e alicerçado em um sistema de
disciplina e vigilância permanente (SPODE; MERLO, 2006), são
variáveis capazes de gerar o estresse nos policiais.

Conforme dados da Organização Mundial da Saúde (OMS),


diante dos agravantes do adoecimento das pessoas de um
modo geral e da carreira de policial – por ser fonte geradora
de adoecimento –, a participação dos gestores na prevenção
e apoio ao tratamento deveria ser obrigatória. Interessante
ressaltar que as polícias militares brasileiras seguem os
preceitos das Forças Armadas, mas o próprio Exército
Brasileiro (EB), no primeiro semestre de 2017, divulgou um
Guia de orientação para comandantes sobre o suicídio, o que
leva a entender que é uma preocupação geral.

Saiba mais
O Guia de orientação para comandantes sobre o suicídio tem
como objetivo conscientizar e sensibilizar os comandantes
e o público interno quanto aos sinais e fatores de risco que

 indiquem a necessidade de intervir na prevenção do suicídio.

Para acessá-lo, basta clicar no link:


http://www.dcipas.eb.mil.br/images/PDF/slides/Suicdio.pdf.

Alguns estudos mostram como o modelo “disciplina


e hierarquia” pode contribuir para o adoecimento dos
profissionais. Vejamos a seguir alguns relatos anônimos
apresentados por profissionais de segurança pública em
relação a cargos de chefia.

153 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


“Nossa punição é velada, um
exemplo: o chefe não libera a gente “Não há comunicação
pra missões ou quando libera põe com a chefia.”.
nas piores missões.”. “As melhores
atividades da unidade
“Chefia não ficam para quem apoia
“Se questionamos o gestor compartilhada o chefe, ou seja, toda a
podemos responder a das decisões.”. parte operacional, que
processos disciplinares.”. é o tesão da atividade,
vai para quem tem
bom relacionamento
“Quando sinalizamos que há colegas com o chefe.”.
apresentando comportamentos inadequados,
o chefe não encaminha para avaliação e ainda
manda para missões.”.
“Se o policial se afasta por conta de problemas
psiquiátricos, quando ele retorna é dada a arma a ele
e ele é colocado em missões, não há o cuidado com
o policial ao retornar pra atividade.”.

Figura 7:
Depoimentos
anônimos de Segundo Anchieta et al. (2011), em uma pesquisa realizada
agentes de
segurança em na Polícia Civil do Distrito Federal sobre trabalho e riscos
relação às chefias. de adoecimento, com a ótica dessa percepção gestora, foi
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020). verificado que as maiores reclamações eram que os policiais
estavam excluídos das decisões porque existem dificuldades
na comunicação entre chefia e subordinado e falta apoio das
chefias para o desenvolvimento profissional.

Em 2017, foi conduzida uma pesquisa pela Universidade


de Brasília sobre os riscos psicossociais relacionados ao
trabalho na Polícia Rodoviária Federal com foco em quatro
dimensões, sendo elas:

154 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


• Organização do trabalho.
• Estilos de gestão.
• Indicadores de sofrimento no trabalho.
• Danos físicos e psicossociais.

O resultado desse estudo sobre o estilo gestor constatou os


seguintes fatores em relação à comunicação pessoal.

• Centralização das decisões no papel do gestor.


• Forte sistema burocrático.
• Valorização das regras em detrimento dos sujeitos.
• Sistema disciplinar rígido e alto controle do trabalho.

Assim, podemos observar, com a análise desses estudos, que


resultados caminham para a definição de uma gestão bem
hierarquizada, cujos gestores, talvez e também por excesso
de trabalho e falta de competência comportamental para gerir
pessoas, parecem não considerar os limites da realidade e
têm dificuldade de reconhecimento do outro. Fica nítido que o
modelo de gestão e organização é variável e pode ser causa de
adoecimento de pessoas, não só no mundo das instituições de
segurança pública, mas em todos os ambientes organizacionais.

Cabem aqui vários questionamentos sobre a questão do


modelo de gestão e formação de líderes atual da segurança
pública brasileira. Vamos destacar alguns na imagem a seguir
para refletirmos juntos sobre eles.

155 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Os gestores são formados para
serem líderes ou para serem
policiais que, por acaso, lideram
pessoas?
O gestor de pessoas tem tempo
de gerenciá-las ou são tomados
de infinitas reuniões e pouco
tempo para olhar o efetivo e
gerenciar resultados?
O gestor tem habilidade e
confiança em delegar,
acompanhar e cobrar demandas,
desenvolvendo assim sua
equipe?
Figura 8:
Questionamentos Cabe ao gestor liberar o policial
relacionados ao quando ele já foi afastado por um
modelo de gestão médico psiquiatra?
e formação de
líderes na área de O gestor se interessa pelo
segurança pública. bem-estar de sua equipe ou
Fonte: labSEAD- apenas os considera como
UFSC (2020). matrículas?

Além desses questionamentos, também vale considerarmos:


esse formato de polícia e formação de carreira no país tem
sido o mais eficiente? Como funcionam as polícias em
países em que se controla a criminalidade? Qual o formato
de gestão de organização policial que é exemplo no mundo?
Para um cargo de segurança pública que envolve extrema
confiança e execução de função, a meritocracia não seria uma
possibilidade a ser pensada?

E, ainda: não seria a violência crescente o maior desafio da


segurança pública? A resposta a esta questão é sim.

Mas sem uma gestão adequada não haverá muitos


avanços para o combate da criminalidade. Gestores
e tropa adoecida, abandonada e não cuidada não
executam bem a missão dada!

156 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Independente dos questionamentos feitos e longe de afirmar
que as respostas dadas até aqui resolveriam a problemática
atual das polícias, o fato é que esses modelos atuais de gestão
em todas as organizações policiais são uma problemática e
podem promover e potencializar o adoecimento do profissional
de segurança pública.

Figura 9:
Adoecimento
mental por
consequência de
modelos atuais
de gestão. Fonte:
Pixabay (2020).

Iniciamos este tópico reforçando que riscos e agravos


presentes na organização não são os únicos causadores do
adoecimento mental. Isso porque, se assim fosse, teríamos
uma equipe de segurança pública praticamente toda adoecida,
o que também não é uma verdade. Mas as combinações de
fatores aliados à história de vida de cada indivíduo podem
acelerar o adoecimento.

Então, podemos considerar que o modelo de gestão adotado


pela organização é um dos fatores que podem levar o
desenvolvimento de adoecimento de um profissional de
segurança. Também existem outros fatores, que vamos
conhecer a partir de agora.

157 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


EXCESSO DE CARGA DE TRABALHO
Falta de pessoal é uma das maiores problemáticas no
contexto atual da segurança pública em todas as esferas,
nas quais a deficiência de pessoal é altíssima, considerando
as aposentadorias, falecimentos, afastamentos e pedidos de
exoneração. Porém, a reposição das vagas em aberto não
acontece com a mesma velocidade, resultando em sobrecarga
de trabalho e, por consequência, em adoecimento.

Saiba mais
Você sabe a quem se dirige a responsabilidade de solicitar novas
vagas dentro da organização de segurança pública?

 É de responsabilidade do gestor da organização realizar a


solicitação de novos concursos para preenchimento das vagas,
mas é o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão
(MPOG) que autoriza ou não a realização dos concursos.

As escalas de trabalho da maioria dos policiais são


desgastantes e, em muitos momentos, mesmo cumprindo
a escala, se estiverem em alguma ação policial (flagrante,
ocorrência, manifestação, missão e outros) não podem
simplesmente abandonar o posto. O formato de alguns
postos policiais do Brasil implica, necessariamente, sobre a
atividade administrativa, que é de suma importância para o
funcionamento das instituições, mas não é atividade-fim, é uma
atividade-meio que sobrecarrega o policial que precisa realizá-la.

Na Polícia e Corpo de Bombeiros Militar, os oficiais, além de


gerirem pessoas e estarem prontos para atendimento na rua,
contam ainda com uma carga de procedimentos e processos
que precisam investigar, tais como: possíveis infrações
disciplinares cometidas por policiais e bombeiros militares que
englobam inquéritos técnicos, sindicâncias administrativas,
inquéritos policiais militares e procedimentos administrativos
disciplinares, e cada formato e prazos específicos. Spode e
Merlo (2006) sinalizam que essa demanda faz com que os

158 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


policiais oficiais tenham que chegar mais cedo no trabalho
e sair mais tarde para que possam cumprir no prazo suas
atividades e também não serem punidos.

Figura 10:
Sobrecarga devido
ao excesso de
trabalho. Fonte:
Pixabay (2020).

Resumidamente, existe uma sobrecarga de trabalho interno,


um aumento significativo da criminalidade e falta de pessoal,
fatores suficientemente fortes para que se acometa o
estresse na atuação profissional. Ocorre que é necessário
o policiamento na rua, todavia o número de policiais é
insuficiente e não há autorização do MPOG para realização
de concursos, então criam-se soluções paliativas em busca
de resolução do problema. Um exemplo de solução paliativa
criada são as escalas chamadas de serviço voluntário.
São escalas que
vão além da escala Como existe uma lacuna de pessoal, foi uma maneira
normal e da escala encontrada pela gestão de fazer o policial trabalhar na sua
extra, pois os
hora de folga e, assim, ter o policiamento desejável na cidade.
profissionais são
extrarremunerados. No primeiro momento, parecia ser uma solução razoável, pois
assim garantiria o policiamento desejado na cidade e um
incentivo para o aumento da renda do servidor.

159 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


No entanto, muitos agentes acabam
voluntariamente fazendo mais serviços do que o
organismo deles considera “aceitável”, ou seja, além
de a escala normal já ser elevada, os servidores
ainda buscam realizar mais serviço com o objetivo
de aumentar sua renda mensal.

O profissional incorpora essa renda ao salário e, com o passar


do tempo, começa a prejudicar sua saúde física e mental.
Daí decorrem os adoecimentos mentais mais comuns na
segurança pública, que são:

• Irritabilidade excessiva, que se revela por meio da


agressividade exagerada.
• Insônia e compulsões (gastos, comidas e bebidas alcoólicas).
• Disfunção sexual.

Nas Polícias Federais, Rodoviárias Federais e Força Nacional,


o relato é um pouco parecido sobre o excesso de carga de
trabalho por ocasião da quantidade de missões que são
determinadas por delegacias, unidades e tropas, às quais
estão submetidas. Muitas vezes, a demanda exige que os
agentes de segurança pública fiquem meses fora de casa,
causando um grande impacto na vida pessoal e até mesmo
físico, por não poder desenvolver uma rotina. Vale considerar
que muitas missões são buscadas pelos próprios policiais, que
encontram nelas oportunidade de renda extra.

Figura 11: A
quantidade de
dinheiro imediato
obtido pelas
missões pode levar
o agente a entrar
num looping e
adoecer. Fonte:
Pixabay (2020).

160 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Se o foco da ida para a missão for exclusivamente financeiro
e o objetivo estiver sendo alcançado, é mais difícil ainda o
policial parar para racionalizar o futuro com possibilidades
de perdas, pois o ganho está sendo imediato. Sem contar
que também é muito comum o fato de alguns agentes de
segurança estarem sempre em missão para poder fugir de
situações ou convívios conturbados, os quais não querem
dispor de tempo e emoções para resolver.

Trata-se de um clássico comportamento de fuga e esquiva


de conflito e baixa capacidade de resolução de problemas.
No entanto, o problema continua e surge o famoso ditado:
“empurrar com a barriga”, que passa a gerar problemas
emocionais, e a falta de rotina, de hábitos saudáveis e de
convivência social potencializa o sofrimento do agente de
segurança pública.

Perceba que essa ausência de rotina faz com que surjam


problemas que afetam o profissional e sua família, tais
como: casamentos desfeitos, filhos depressivos e/ou com
problemas na escola, o sentimento de voltar para casa e
se sentir um estranho, entre outros. Em alguns momentos
também, essa escolha de excesso de escalas e missões
é feita para pagar uma universidade do filho (se for o caso
de agentes de segurança pública de determinados estados
onde a remuneração é muito baixa), comprar a casa própria,
fazer intercâmbio ou até mesmo a própria fuga de casa, do
casamento ou de conflitos.

Em longo prazo, quando o agente de segurança se dá conta


de todas as perdas, a probabilidade de adoecimento é maior.
A impressão que se tem é que esses policiais não conseguem
perceber os impactos das escolhas no próprio organismo e
na vida. Todas as escalas noturnas, privação de sono e lazer,
de convívio com a família e de uma rotina profissional podem
acarretar adoecimento físico, mental e erros. Observe a
imagem a seguir.

161 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Comportamento Acúmulo de
de fuga de Falta de Adoecimento
Problemas rotina, hábitos sentimentos,
conflito e baixa pensamento e do agente de
emocionais e saudáveis e segurança
conflitos capacidade de potencialização
resolução de convivência pública
social de sofrimentos
problemas

Figura 12:
Consequências de Do ponto de vista emocional, os estudos levantados para esta
se “empurrar com a disciplina reafirmaram os efeitos do risco e do desgaste sobre o
barriga”.
Fonte: labSEAD- psiquismo dos agentes de segurança pública. As consequências
UFSC (2020). são as mais adversas e devemos ressaltar: o alcoolismo e uso
abusivo de drogas, insônia, estado de hipervigilância, aumento
da agressividade ou embotamento da sensibilidade, tentativa ou
ideação de suicídio, sendo o ponto de maior atenção os casos
em que o próprio policial se coloca em situação de estafa.

Aí se chega ao ponto gravíssimo de adoecimento


do agente de segurança pública que escolhe não se
tratar na instituição da qual faz parte, porque, se o
fizer, perderá o porte de arma e sem ela não pode
fazer os chamados serviços voluntários e missões,
resultando num círculo vicioso.

Mas o que pensam os profissionais de saúde mental sobre a


perda temporária do porte de arma?

A retirada do porte de arma é uma ação importante


para a garantia de segurança coletiva, tanto da
família e dos envolvidos quanto do próprio agente.

Outra problemática que ocorre por ocasião da defasagem


salarial, e que também é constatada em pesquisas, é o
número considerável de policiais que realizam “bicos” nos
horários de folga, em especial trabalhando como segurança
particular. Eles alegam “necessidade financeira”, já que o
salário de muitos em vários estados do país é muito baixo.

162 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Os “bicos” nos horários de folga também privam o agente de
segurança pública de desfrutar momentos com a família, de
lazer e descanso, expondo-se a maiores riscos, podendo agravar
ainda mais seu estado de saúde. Além de ser uma prática
proibida, também pode ser um indicador da alta vitimização de
agentes de segurança pública fora do horário de expediente,
conforme dados do Anuário de Segurança Pública de 2019.
Vamos conhecer alguns desses dados na figura abaixo.

343 policiais
civis e militares
assassinados
em 2018.

Figura 13: Número


de mortes dos
agentes de 75% mortos fora de
segurança no país, serviço, totalizando 256
segundo o Anuário vítimas, e 104 suicídios, ou
de Segurança seja, tivemos mais policiais
Pública de 2019. mortos fora do trabalho
Fonte: labSEAD- e por suicídio do que em
UFSC (2020). serviço.

Mas podemos perceber que os números acima descritos


podem ser ainda maiores se se contabilizassem todos os
agentes de segurança pública.

Enquanto doenças mundiais que podem afetar qualquer


pessoa, independentemente do gênero, etnia, classe
social e país, o estresse, a ansiedade e a depressão não
seriam doenças incomuns na segurança pública, também
desmistificando a crença de que quem atua nessa área está
acima de qualquer problema que aflige o cidadão comum.

O documento intitulado Doenças relacionadas ao trabalho:


manual de procedimentos para os serviços de saúde (2001),
elaborado pelo Ministério da Saúde do Brasil (MS) e a
Organização Pan-Americana da Saúde/Brasil (OPAS), destaca

163 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


um capítulo inteiro para tratar somente de transtornos
mentais e comportamento no trabalho e sinaliza que o
trabalho também ocupa um lugar fundamental na dinâmica
do investimento afetivo das pessoas. Nesse contexto, vamos
entender mais sobre as consequências para o profissional
geradas pelas condições de trabalho.

Jornadas de trabalho
longas, com poucas pausas
destinadas ao descanso e/
Quadros ansiosos,
ou refeições de curta duração,
fadiga crônica e
em lugares desconfortáveis,
distúrbios do sono.
turnos de trabalho noturnos,
CAUSA DOS alternados ou iniciando muito
PROBLEMAS cedo com ritmos intensos.

Condições de DEMANDAS DO CONSEQUÊNCIAS


trabalho TRABALHO

Altos níveis de atenção e


concentração exigidos para
Tensão, fadiga
a realização das tarefas,
e síndrome de
combinados com o nível
burnout.
de pressão exercida pela
organização do trabalho.

Figura 14: Doenças Destacamos que a síndrome de burnout é caracterizada por


geradas nos
agentes pelas sintomas e sinais de exaustão física, psíquica e emocional
condições de decorrente de uma má adaptação do indivíduo a um trabalho
trabalho. Fonte:
labSEAD-UFSC prolongado e com uma grande carga de tensão.
(2020).
A literatura aponta que os agentes de segurança pública estão
entre os profissionais que mais sofrem de estresse, pois estão
constantemente expostos ao perigo e à agressão, devendo
frequentemente intervir em situações de problemas humanos de
muito conflito e tensão (COSTA et al., 2007). Considerando tal
fato, exercer essa atividade exaustiva é um tanto arriscado para
o profissional e para a sociedade que recebe seus serviços.

164 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Nesse contexto, vamos analisar, no quadro a seguir, os
desafios das instituições relacionados aos comportamentos
individuais dos agentes.

DESAFIOS DAS INSTITUIÇÕES COMPORTAMENTO INDIVIDUAL

Adequação do quadro de servidores para Entender os limites do corpo e não fazer


que os mesmos não se sobrecarreguem mais voluntários que o exequível.
em escalas desumanas.
Aprender sobre finanças e emitir
Adequação salarial para que diminua comportamentos financeiros adequados.
essa diferença tão significativa entre as
Instituições e cargos. Realizar exames anuais para verificar a
saúde física.
Estabelecer limites de extras, voluntários
e missões que os agentes de segurança Praticar atividade física diariamente no
podem realizar num ano. horário que já é disponibilizado pelas
instituições com essa finalidade.
Acompanhar mais efetivamente os
agentes que apresentam comportamentos Fazer a prevenção da saúde mental para
disfuncionais, não com finalidade punitiva, entender se alguns sintomas que tem do
mas com finalidade de prevenção e adoecimento é de natureza laboral ou
tratamento. de problemas em geral que precisam ser
resolvidos.

Quadro 1: Desafios Os dados apontam que o acompanhamento do excesso de


das instituições x
comportamento escalas de trabalho, sobrecarga e adoecimento do servidor
individual. público, a garantia da capacitação de seu efetivo, bem como
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020). do material adequado para a atividade-fim, deveriam ser
também responsabilidade da gestão da instituição, pois são
fatores de possível adoecimento.

FALTA DE TREINAMENTO E
EQUIPAMENTO ADEQUADOS
A realidade do policial trabalhador de ser exposto diariamente
ao risco e ser vítima da violência pode ser confirmada nos
Anuários Brasileiros de Segurança Pública (2016, 2017,
2018). Esses documentos demonstram que o Brasil tem sido
considerado um dos países mais violentos do mundo. Vejamos
alguns dados relacionados na imagem a seguir.

165 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


1
Foram 57.341 mortes violentas intencionais em 2018 e
343 mortes de policiais civis e militares. Em 2017, foram
63.880 mortes violentas e 367 mortes de policiais. Nesse
ano, também, houve um gasto de R$ 84.7 bilhões com a
segurança pública, já em 2018, foram gastos 91 bilhões, mas
não se detalha o que foi para capacitação, equipamentos e
o que foi para outras demandas.

O anuário de 2019 afirma que 17 pessoas são mortas por


dia de forma violenta no Brasil (no ano de 2015, o Brasil
registrou mais vítimas de mortes violentas intencionais,
em cinco anos, do que a Guerra na Síria no mesmo
período). Os anuários mostram que, dos policiais mortos no
ano 2018, 75% estavam fora do serviço.

Figura 15: Dados


sobre a violência Diante desses dados, cabe-nos uma reflexão sobre o número
no Brasil, segundo elevado de policiais mortos dentro e fora do serviço: será falta
os Anuários
Brasileiros de de competência, habilidade técnica ou fatalidade?
Segurança Pública
(2016, 2017, 2018).
Fonte: labSEAD- Essas estatísticas, por si só, já demonstram que o policial é
UFSC (2020).
bastante vulnerável ao adoecimento psíquico, uma vez que
a sua atividade é marcada por perigo, tensão e risco de vida
dentro e fora do trabalho. Ser um agente de segurança pública
ostensivo prevê que o profissional dê conta de uma realidade
diária bem complexa.

Trabalhar como agente de segurança pública impõe-se,


inevitavelmente, ao inesperado e aquilo que foge à prescrição.
É comum alguns policiais verbalizarem aos profissionais de
saúde e às pesquisas o fato de o trabalho ser uma “caixa de
surpresas”, porque não podem prever o que vai acontecer em

166 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


nenhuma ocorrência. Isso implica necessariamente assumir
riscos maiores que errar e sobrepõe-se a isso o fato de que,
em geral, trata-se de situações tensas nas quais está em jogo
a segurança e a vida de pessoas (a do agente, a dos outros
agentes e a dos civis envolvidos).

Em outras palavras, o agente convive com situações


que o expõem a risco de morte, ausência de
reciclagem e capacitação continuada, acidentes
e outras condições que o deixam vulnerável e
potencializam sentimentos de ansiedade e angústia.

Embora precise ser melhorada a questão da reciclagem e


capacitação continuada para toda a tropa, em especial a
de linha de frente, as unidades operacionais apresentam
preparo para toda e qualquer atividade/demanda policial,
mas precisam investir mais em formação comportamental.
Isso significa que os agentes precisam entender que ainda
que capacitação técnica seja importantíssima, é na operação
simulada e/ou treinamento real que se observam e se mapeiam
comportamentos inadequados e disfuncionais, para, então,
trabalhar os comportamentos que podem promover o erro.

Essa sugestão de treinamento simulado é válida tanto para


a formação dos agentes de segurança pública na academia,
para formação, quanto nos cursos de reciclagem e de
capacitação continuada. Algumas instituições das forças
policiais estaduais já estão capacitando nesse formato, mas a
unificação e a padronização devem ser o foco.

167 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Figura 16:
Treinamentos
reais dos agentes
ajudam a identificar
comportamentos
que precisam de
mais atenção e
desenvolvimento.
Fonte: Pixabay
(2020).

Há ainda muito a se evoluir, até mesmo na formação de


profissionais de psicologia, no que tange à formação de
agentes de segurança pública, especialmente os operacionais.
É preciso formar psicólogos que participem da imersão nas
atividades dos agentes de segurança pública e que entendam
a demanda psicológica diferenciada desses trabalhadores.

Sobre material adequado para atividade-fim, mapearam-se


pontuações de diversas naturezas referentes às condições de
uso. Vamos identificar, na imagem a seguir, os direcionados
aos coletes de provas de balas.

Quantidade
insuficiente de
colete a prova de
bala para toda
tropa.

Figura 17:
Pontuações diversas
relacionadas aos Coletes a Coletes à
coletes à prova prova de bala prova de balas
de balas. Fonte: vencidos. inadequados para
labSEAD-UFSC as mulheres.
(2020).

168 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Vale entendermos que, em algumas instituições, as armas
usadas eram as que a fabricação havia sido proibida pelo
Exército, por conta da baixíssima qualidade. Outro ponto
levantado sobre as condições dos materiais para atividades-
fim são as viaturas que não são preparadas para fazer
perseguições, pois correm o risco de capotarem, além de falta
de manutenção.

Quando se fala de compras e aquisição para o governo, são


necessários e imprescindíveis o interesse de pessoal para
atuar especificamente com essa demanda e a formação
técnica para licitação e compra de material adequado e de
ponta, bem como treinamento para uso desses maquinários e
equipamentos novos e manutenção.

Tão importante quanto adquirir material, é adquirir o material


adequado. Para isso, é importante a participação colaborativa
entre quem vai comprar e o profissional que vai usar nas
pontas, aquele que combate a criminalidade e dá assistência à
sociedade como um todo.

Conforme pesquisas, o agente de segurança pública vai para a


rua combater a criminalidade ou fazer atendimentos não com
o que há de mais moderno e eficaz, mas com o que tem e que
está disponível e sem a reciclagem continuada.

Não confiar no que você tem disponível e


insegurança quanto à capacidade técnica podem
levar ao quadro de ansiedade, medo de que algo
dê errado e da série de punições que vem por
consequência (seja da sociedade, da instituição, do
Estado e do próprio agente de segurança pública).

É importante ressaltar que, segundo as pesquisas,


frequentemente, alguns agentes de segurança pública são
escalados para serem disseminadores de conhecimento e

169 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


ministrarem alguns treinamentos (defesa pessoal, tiro, direção
e outros). Nesse contexto, muitos servidores não querem
ministrar porque o treinamento acontece em horários fora de
sua jornada de trabalho, além de relatos de servidores que
montam treinamentos para reciclar equipes e a própria equipe
se recusa a participar por também não querer se capacitar fora
do horário de expediente.

Contudo, cabe à gestão realizar toda e qualquer capacitação


necessária para poder manter os agentes de segurança
preparados para sua atuação, além de acompanhar o
efetivo que se capacita. Mas cabe ao agente promover
o autoconhecimento no sentido de se desenvolver, seja
sozinho ou com as equipes, para melhorar desempenho.
A responsabilidade de se manter capacitado, compartilhar
conhecimento e aprimorar é de cada um dos agentes de
segurança pública.

Perceba que este curso e todo o conhecimento que você está


adquirindo é uma capacitação. Então, aproveite-o ao máximo
para agregar à sua função e contribuir com melhorias nas
condições do seu trabalho na sua instituição.

FALTA DE RECONHECIMENTO E APOIO DA


INSTITUIÇÃO
Segundo Oliveira e Santos (2010), no dia a dia os policiais
precisam distinguir o bem do mal e levar em conta o elemento
ético de sua conduta. Em diversos momentos, terá que decidir
entre o legal, ilegal, justo, injusto e também entre o honesto e o
desonesto, tudo isso em fração de segundos.

Profissionais de segurança pública, em sua grande maioria,


acreditam que os valores democráticos devem permanecer,
porque isso diz respeito aos direitos humanos. Porém, nem
sempre na prática existe a clareza na atuação, ou a natureza
da ocorrência é facilitadora para isso, e essa pressão gera, no
profissional, estados de incerteza e angústia.

170 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Essas situações podem levar o agente de
segurança pública a emitir comportamentos
irracionais em situações caóticas e de crises. Esses
comportamentos, além de erros e mortes, em geral,
têm como consequência a investigação e punição,
que despertam muitos sentimentos.

Quando o agente de segurança pública erra, ele é denunciado


pelo Ministério Público (MP) e a instituição não provê apoio
jurídico para sua defesa. Quando isso acontece, geralmente
o MP não avalia toda a situação da operação e a natureza
da atividade, atem-se apenas ao erro e denuncia o agente de
segurança pública, e não a instituição da qual ele faz parte.
Isso leva o agente de segurança pública ao colapso, inclusive
financeiro, pois precisa, em muitos momentos, custear um
advogado para que possa defendê-lo de uma atuação ou um
erro que aconteceu durante a atividade-fim (de uma atividade-fim
que vem acompanhada de excessiva carga de trabalho, falta de
treinamento e de uma gestão que precisa de mudanças).

Diversos são os exemplos de falta de apoio que vão além de apoio


jurídico. Vamos conhecer mais alguns exemplos na figura abaixo.

Agente em missão que leva um tiro e fica


hospitalizado: a instituição não provê apoio à família
que está em outro estado e nem suporte ao agente,
além de não existir rede médica credenciada.

Policial que mata no exercício da atividade, bombeiros


que passam por ocorrências gravíssimas, agentes
penitenciários que se deparam com crimes de
natureza extremamente brutal: não têm apoio ou
acompanhamento psicológico necessário ou imediato
e em algumas vezes são colocados em novas missões.

Figura 18:
Exemplos de Profissionais que se tornaram alcoolista: não têm
falta de apoio aos apoio e nem acompanhamento biopsicossocial, além
agentes. de ser afastado da função. O relato é de que se sentem
Fonte: labSEAD- completamente abandonados.
UFSC (2020).

171 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Para essas problemáticas, cabem várias reflexões e
pontuações. Seria ideal que as instituições de segurança
pública tivessem toda a rede de apoio jurídico, de imagem e
biopsicossocial. Fora isso, o correto é um efetivo adequado para
que os agentes de segurança pública possam cumprir cargas
horárias adequadas e equilibrar a vida profissional e pessoal.
Ter uma gestão voltada para pessoas e resultados também
traria uma excelente qualidade de vida para os liderados.

Sendo as forças policiais um ambiente predominantemente


masculino, ações de prevenção e cuidados com a saúde não
são rotina. Na maioria das vezes, os agentes de segurança
pública se referem ao outro e nunca a eles mesmos.
Culturalmente, os homens não têm o hábito de cuidar da saúde
e por isso não procuram médicos com a única finalidade de
prevenção, diferentemente das mulheres.

Os agentes de segurança pública homens, em geral, só


fazem exames nas bienais pela obrigatoriedade e também se
preparam para os Testes de Aptidão Física (TAF) para realizar
o mínimo esperado.

Assim, é importante destacar que o adoecimento


físico, mental e o erro por falta de treino também
podem se relacionar ao descuido do profissional
com ele mesmo.

Embora os agentes de segurança pública sinalizem que


seria importante a presença de um corpo de psicólogos nas
instituições, existe uma crença equivocada, nesse ambiente,
de que a presença de psicólogos nas forças policiais seria a
resolução dos problemas, garantia de apoio e a certeza da
busca de ajuda por parte dos servidores.

172 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Palavra do Especialista
Uma pesquisa realizada na Polícia Militar do estado do Rio de
Janeiro sinaliza essa visão e apresenta preconceito do policial

 militar em buscar o quadro médico da polícia, porque ele


visualiza as relações hierárquicas, o que dificulta a efetividade
plena do atendimento e causa insatisfação e descrédito nos
policiais atendidos (PESSANHA, 2009).

Em resumo, a gestão organizacional precisa ser melhorada


para que se promova ao servidor garantias de apoio no
caso de ações judiciais. A responsabilização sobre erros
em ocorrências também cabe à instituição, que pode estar
em falta com a capacitação adequada ou reciclagens com
frequência, assim como também é responsabilidade do
agente de segurança pública procurar se capacitar sempre que
possível, para minimizar erros.

Para além do apoio jurídico, é necessário que se tenha um


apoio para a área de saúde adequado e disponível, mas
também é sabido que muitas instituições já possuem quadros
de saúde, clínicas conveniadas, psicólogos contratados,
mas a procura por prevenção é individual e, para tratamento
adequado, é necessária a aceitação da doença e busca correta
dos profissionais da saúde.

173 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Aula 2 – Riscos e Agravos da Saúde
Mental do Agente de Segurança Pública:
Influências Sociais

CONTEXTUALIZANDO...
Iniciamos este módulo reforçando que riscos e agravos
presentes na organização não são os únicos causadores do
adoecimento mental. Isso porque, se assim fosse, teríamos
uma equipe de segurança pública praticamente toda adoecida, o
que também não é uma verdade. Mas a combinação de fatores
que serão estudados a seguir, aliados à história de vida de cada
indivíduo, também pode acelerar o adoecimento.

ESTIGMATIZAÇÃO DA SOCIEDADE
Observe as notícias a seguir, retiradas de um site de grande
veiculação sobre duas atuações:

Juiz: “reage”. Vítimas eram “criminosos.” (ALEIXO, 2017).


PM: “reage”. Vítimas eram “suspeitos.” (CASTRO, 2018).

Com frequência, é veiculada na mídia a atuação dos agentes


de segurança pública, ora combatendo o crime, o que os
coloca em posição heroica, ora mostrando-os como inimigos
da sociedade, matando inocentes.

Palavra do Especialista
Spode e Merlo (2006) sinalizaram, há uma década, um ponto
importante que é o desconhecimento da sociedade quanto à

 realidade do policial trabalhador, na qual sua atividade é conter


a violência e, ao mesmo tempo, correr o risco de reproduzi-la e/
ou de ser vítima dela.

174 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Ou seja, ainda que um dos objetivos da polícia seja reduzir os
índices de violência, os agentes enquanto indivíduos estão
expostos às diversas formas de violência. Mesmo que a
intenção dos profissionais de segurança pública seja sempre
acertar e que tudo termine bem com o resguardo da vida e da
segurança de todos, essa garantia não existe.

Figura 19: A mídia


como canal de
conhecimento da
atuação de agentes
para a sociedade.
Fonte: Pixabay
(2020).

A imagem do agente de segurança pública está fortemente


ligada a fatos negativos expostos diariamente pela mídia, é
um fator relevante para a falta de credibilidade pública, em
especial relativa ao policial militar. Mas, além da falta de apoio
dentro das próprias instituições, a falta de reconhecimento
por parte da sociedade é um fator de relevância para
esses servidores. Alguns resultados encontrados quanto à
autoimagem e autoestima que o profissional tem dele mesmo
é o de “estressado” e esse estresse se ocasiona de diversos
fatores, alguns já citados anteriormente, mas, dentre eles, foi
evidenciado um de forte cunho emocional: o medo de errar.

175 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Palavra do Especialista
Segundo Andrade, Sousa e Minayo (2009), o significado
da autoestima implica o compromisso do ser humano em

 conscientizar-se, responsavelmente, de suas possibilidades de


escolha e, num dado momento, sentir-se livre para exercer seu
poder de decisão.

Como a atividade agente de segurança pública, em especial


o operacional, é de difícil previsibilidade, o erro pode implicar
várias punições (da instituição e da sociedade). Dessa forma,
não há outra opção senão assumir os riscos e admitir que a
punição e o reconhecimento façam parte da vida, sobretudo
dos que exercem atividades operacionais.

Quanto à imagem das polícias perante a sociedade, Anchieta


et al. (2011) evidenciam o pouco interesse em estudos sobre
o policial. Segundo as autoras, essa carência pode ser reflexo
de um ressentimento de origem que acabou por colocar
a população e intelectuais em oposição aos agentes da
segurança pública, o que foi potencializado nos períodos de
ditadura militar no Brasil.

A consideração da segurança pública como questão


da construção democrática e objeto da ciência
social se consolidou apenas a partir dos anos 1990.

Oliveira e Santos (2010) sinalizam que muitas vezes os


policiais são vistos pela população como violentos e
imprevisíveis. Muitos cidadãos não confiam nos policiais, pois
julgam que os agentes apresentam conduta discriminatória e
duvidosa diante da comunidade.

As autoras afirmam ainda que a imagem do policial fica


prejudicada, especialmente quando se considera que diversos
policiais demonstram uma conduta profissional respaldada

176 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


na ética e na responsabilidade de seus atos e repudiam ações
inapropriadas. No entanto, não é incomum os episódios nos
quais a polícia excede-se na sua conduta contra civis e em alguns
momentos contra eles mesmos, porque é mais comum do que se
imagina policiais de diferentes forças entrarem em conflito.

Há que se reconhecer que a sociedade vivencia os equívocos


cometidos pelos agentes de segurança pública, em especial os
policiais estaduais, que têm a finalidade de atendimento direto
ao público, mas não se pode desconsiderar que, em muitos
momentos, a própria sociedade muda o seu discurso quanto à
atuação da polícia.

Exemplos que corroboram essa afirmação são relatos dos


agentes de que é muito comum, numa abordagem quotidiana,
multarem cidadãos que estão dirigindo sem habilitação,
sem documentação do carro, sem cinto de segurança e
embriagados. Veja, na imagem a seguir, um discurso comum
dentre cidadãos infratores da lei.

“Por que estão


“Por que vocês aqui multando ao
não vão prender invés de prender
bandidos?” bandidos?”

Figura 20:
Discurso de um
infrator relacionado A lei é clara e é para todos!
à estigmatização
do agente.
Fonte: labSEAD- Além desse discurso, há relatos de pais que, quando acionados
UFSC (2020). pela polícia para comparecer a uma delegacia porque o filho,
menor de idade, está com drogas, argumentam que os filhos
estão em fase difícil e questionam se o policial não poderia ter
bom senso quanto a isso.

A sociedade cria grupos de redes sociais para avisar sobre


blitz da Lei Seca, ainda que haja diversas mortes por ocasião
da combinação de direção e álcool.

177 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública




A sociedade espera um policial honesto e que aplique
a lei, desde que a lei seja aplicada no outro, se a lei for
aplicada na pessoa, ela espera, sim, um policial corrupto.
(Depoimento de um policial anônimo).

Spode e Merlo (2006) lembram que a resolução de crimes e


contato com o cidadão gera em boa parte dos policiais uma
grande fonte de prazer. Ou seja, apesar dessa impressão de
imagem negativa da polícia perante a sociedade, há diversos
discursos da satisfação dos servidores em recuperarem carros,
apreenderem armas e drogas, prenderem bandidos, resgatarem
vítimas de sequestros relâmpagos, resgatarem mulheres e
crianças vítimas de tráfico de pessoas, prenderem pedófilos etc.

Veja um relato de um policial que estava a poucos anos


de sua aposentadoria, depois de um curso de combate ao


crime organizado.

Entender que sua atividade de investigação para


combater os roubos de cargas e prender quadrilhas do
crime organizado garante a manutenção das grandes

empresas no Brasil e que isso garante o emprego das
pessoas e isso move a economia do país.

Os agradecimentos da sociedade, em diversos momentos,


são altamente gratificantes e reforçadores para a maioria dos
servidores, ainda que eles tenham que trabalhar colocando a
vida em risco.

Em pesquisa conduzida por Bezerra, Minayo e Constantino


(2013), policiais mulheres entrevistadas, em seu conjunto,
percebem seu trabalho como sendo reconhecido socialmente
e não se queixam da distorção de sua imagem, como relatam
os policiais em estudos de Minayo, Souza e Constantino (2008
apud BEZERRA; MINAYO; CONSTANTINO, 2013). Consideram,
ao contrário, ser mais difícil o relacionamento com o público
interno (colegas e chefes) do que com o externo (população).

178 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Perceba que há aqui um diferencial de gênero na percepção da
sociedade, que atribui características para cada gênero. Nesse
contexto, seguimos para o próximo tópico, no qual trataremos
mais detalhadamente esse assunto.

PRECONCEITO E DISCRIMINAÇÃO DE
GÊNERO, RAÇA, ORIENTAÇÃO SEXUAL E
RELIGIÃO
Como já sinalizado anteriormente, poucas são as pesquisas a
respeito dos agentes de segurança pública e, para este tópico,
há muito pouco. Porém, não poderíamos deixar de abordar
assuntos referentes à estigmatização advinda do preconceito
e discriminação de gênero, raça, orientação sexual e religião.

Ainda que, de forma acadêmica, haja poucas


pesquisas sobre esse tema, não significa que não
existam preconceito e discriminação. Cabe ressaltar
que, por ocasião de pouca literatura, parte do que
será tratado terá a finalidade de se refletir a respeito
desse tema.

O Ministério da Justiça, em 2013, publicou um relatório


técnico sobre a entrada das mulheres na segurança pública.
Utilizamos, então, esse documento para a construção deste
tópico. Segundo esse estudo técnico, verificou-se que a entrada
de mulheres nas instituições de segurança pública no Brasil é
recente, somando pouco mais de 56 anos de história. Segundo
Bezerra, Minayo e Constantino (2013), embora a intenção
tenha sido louvável, nunca houve, por parte das instituições
de segurança pública, culturalmente masculina, a intenção de
mexer na sua estrutura para adequá-la a uma visão de gênero.

No Brasil, a bibliografia aponta que o acesso das mulheres


às policias civis e militares passou a ser ampliado a partir
dos anos 1980 (no contexto de redemocratização política)
e, especialmente, a partir de 1988, com a promulgação

179 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


da Constituição Federal, marco para a consolidação da
democracia no país.


Segundo Calazans (2003, apud BRASIL, 2013, p. 17):

[...] esse contexto foi caracterizado pelo debate


sobre reforma policial, políticas afirmativas e novas
concepções de segurança pública que visavam romper
com um passado de repressão e truculências que
caracterizavam negativamente as corporações policiais

e avançar na incorporação dos princípios de respeito aos
direitos humanos em um modelo de segurança cidadã.

Assim, o marco para a entrada de mulheres na segurança pública


foi a abertura da primeira Delegacia de Defesa da Mulher, na
cidade de São Paulo, em 1985. Quando passaram a ser criadas
outras unidades em outros estados brasileiros, as polícias
precisaram ampliar seus quadros de mulheres para atender a
essas novas delegacias, que tinham, entre as características
definidoras da especialização, a premissa de que todo o
atendimento deveria ser realizado por efetivo do sexo feminino.

Figura 21: Entrada


de mulheres nas
instituições de
segurança pública
no Brasil.
Fonte: Pixabay
(2020).

180 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Nessa nova abordagem, a inclusão de mulheres teve como
objetivo a humanização de setores das corporações policiais
com o intuito de melhorar a imagem da polícia, aproximá-la
da população e oferecer atendimento adequado à população
vulnerável – mulheres, crianças, idosos, entre outros. A literatura
também não ignora que a entrada de mulheres para essas
funções contribuiu para liberar os homens das atividades
administrativo-burocráticas, permitindo que estivessem
atuando nas linhas de frente, ocupando os postos mais altos
da hierarquia e participando de atos de bravura e coragem no
combate à criminalidade urbana.

Esse lamentável fato citado anteriormente ainda é muito


presente nas instituições, em especial quando se fala de
unidades operacionais, que ainda mantêm a cultura de que
não são lugares para mulheres.

O levantamento feito na literatura mostra que elas precisam


ser melhores que os homens para poderem ser tratadas
como iguais, ou seja, precisam fazer muito mais do que lhes é
exigido para que consigam mostrar que dão conta do serviço
operacional. Partindo dessa premissa, muitas mulheres
acabam não se colocando nessa posição e aceitando as
atribuições menos operacionais ou apenas administrativas,
além de lidar com o sentimento de estigmatização, que pode
afetar sua saúde mental.

O estudo conduzido por Bezerra, Minayo e Constantino


(2013) sobre estresse ocupacional entre mulheres na polícia
revelou que as policiais relacionam o cotidiano do trabalho
ao estresse, citam diversos sintomas e mostram como a vida
pessoal é afetada. Afirmaram que o estresse tem origem
basicamente na questão organizacional e gerencial do trabalho
e que há discriminação de gênero, assédio moral e sexual, e
que isso é percebido como importantes fatores estressantes.

181 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Figura 21:
O estresse nas
agentes mulheres
também pode
estar atrelado
aos assédios
morais, sexuais e
discriminação de
gênero.
Fonte: Pixabay
(2020).

O sofrimento psíquico aparece mais fortemente entre os


oficiais com cargos de chefia, e as atividades operacionais são
percebidas como mais estressantes pelo risco que oferecem.
Como já vimos anteriormente em outros tópicos, o exercício
físico é a estratégia considerada mais eficaz para prevenir as
consequências do estresse, independente de gênero.

Nesse contexto, conclui-se que, embora as mulheres


estejam presentes na segurança pública há muitos anos,
a organização e o gerenciamento praticamente continuam
sob a ótica masculina e são necessários investimentos em
ações preventivas do estresse sob a perspectiva de ambos os
gêneros, visto que o estresse e o esgotamento psíquico podem
surgir a partir de sobrecargas.

Uma consideração importante quanto ao assédio sexual


sofrido pelas mulheres nas instituições de segurança pública:

Quando você, agente (homem ou mulher), presencia


ou sabe sobre algum evento de assédio sexual e
moral, o seu comportamento diante desse tipo de
crime dirá muito a respeito de você e de como você
vê a seriedade do seu trabalho para a sociedade.

182 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Ainda segundo relatório técnico, as mudanças provocadas
pela entrada de mulheres não foram acompanhadas por
mudanças estruturais significativas e, passados 50 anos,
as políticas institucionais estão distantes de incorporar
a igualdade de oportunidade para homens e mulheres
no acesso às carreiras policiais, bem como reconhecer
a contribuição das mulheres a partir de sua formação
profissional e técnica, o que representaria uma mudança
substantiva para o funcionamento dessas instituições.

Segundo Bezerra, Minayo e Constantino (2013), ao ingressar


na segurança pública, num primeiro momento, as mulheres
trabalharam nos batalhões de trânsito com um desempenho
considerado exitoso e que trazia para a corporação
um diferencial importante: as mulheres policiais eram
consideradas menos corruptíveis, mais rígidas em relação aos
desvios e desobediências. Essa experiência se desenvolveu
durante quase dez anos e foi muito bem avaliada, inclusive
pela população, pelos resultados que apresentou.

Porém, elas sentiam que o trabalho restrito ao trânsito gerava


muitos desgastes físicos e era realizado em condições muito
desfavoráveis: trabalho realizado em pé durante muitas
horas, sob sol forte e com ausência de banheiros adequados,
gerando desconforto físico, o que facilitava o agravamento dos
sintomas de estresse.

Quando existe uma luta para buscar a igualdade no trabalho,


a justificativa das mulheres reside nos mesmos problemas
enfrentados pelos agentes do sexo masculino. É preciso
buscar a adequação ao que diferencia mulheres e homens
(fisiologicamente) e a natureza da atividade que precisa ser
feita pelos dois. E é nesse movimento que parte dos agentes
homens de segurança pública questiona a participação
das mulheres, e também relata que estar em posição
administrativa, em muitos momentos, é desejo delas.

183 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Vale ressaltar, como verificado em pesquisas sobre
mulheres no mercado de trabalho, que vários
autores sinalizam que, no caso das mulheres, elas
somam as chamadas duplas jornadas.

O emprego feminino, que historicamente era considerado


complementar ao emprego masculino, hoje constitui sua
profissão com todos os ônus que isso implica sem liberar
as mulheres de seus papéis familiares. Ainda hoje, além
do trabalho fora de casa, as mulheres, num contexto
geral, continuam a assumir o trabalho doméstico e a se
responsabilizar pelos cuidados com a família. Somam-se a
isso outros fatores que fazem com que sejam possivelmente
mais propensas ao adoecimento mental.

Ponto de atenção: a mesma pesquisa feita com as mulheres


policiais apontou que o uso de álcool e remédios aparece
como recurso para aliviar o estresse. Esse problema tem sido
referendado em vários outros trabalhos. Entre eles, podemos
citar o que Minayo, Souza e Constantino (2008 apud BEZERRA;
MINAYO; CONSTANTINO, 2013, p. 665) afirmam a respeito.

Palavra do Especialista
“Consumo de tranquilizantes para aliviar a ansiedade é a

 principal forma de ingestão de droga entre os dois grupos


[oficiais e praças]”.

Contudo, podemos entender que as mulheres ocupam


lugares considerados por muitos de respeito e valorização,
mas especificidades relacionadas somente à questão de
gênero fazem com que pensamentos e atitudes machistas,
reproduzidos pela sociedade, repercutam dentro das
instituições de segurança pública. Assédio sexual é um
exemplo. Cabe a todos os profissionais conservar um
ambiente de respeito no local de trabalho, independente de

184 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


gênero, contribuindo para a qualidade de vida no trabalho e a
diminuição de casos de adoecimentos dos profissionais.

Seguindo com nosso estudo, em relação ao preconceito


e discriminação de etnia, orientação sexual e religião, foi
realizada pelo Ministério da Justiça, por meio da Secretaria
Nacional de Segurança Pública (SENASP), em 2009, a pesquisa
intitulada O que pensam os profissionais da segurança pública
no Brasil, que apresenta algumas considerações relacionadas
aos assuntos. Vamos conhecê-las a seguir.

Humilhados e desrespeitados nas corporações


A desvalorização dos policiais é paradoxalmente uma reposta
das várias dinâmicas construídas por suas próprias instituições.
Nesse contexto, conheça, na imagem a seguir, dados referentes
a relatos de humilhação e desrespeito de agentes, apresentados
pela pesquisa O que pensam os profissionais da segurança
pública no Brasil (SOARES; ROLIM; RAMOS, 2009).

Não casualmente, 53,9% dos respondentes da


1 amostra ponderada relataram já terem sido
vitimados por humilhação e desrespeito por parte
de superiores hierárquicos.

2
Figura 23: Dados 21,1% sofreram o mesmo por parte de colega
referentes a relatos
de humilhação
da mesma posição hierárquica.
e desrespeito de
agentes, segundo
Soares, Rolim e
Ramos (2009).

3
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020).
7,2%, por colega de posição
hierárquica inferior.

É possível que esse fenômeno traduza também uma


sensibilidade específica dos segmentos com maior
escolarização frente à vitimização por humilhação. Nessa
hipótese, policiais com formação mais rudimentar relevariam

185 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


certos tipos de conduta de seus superiores, não as enquadrando
como humilhantes, pelo simples fato de terem, até certo ponto,
“naturalizado” a própria humilhação.

Nessa hipótese, estaríamos diante do fenômeno da “violência


simbólica”, como definido por Bourdieu (1989 apud SOARES;
ROLIM; RAMOS, 2009). Seja como for, os dados expostos são
contraintuitivos e sugerem que as práticas humilhantes são,
infelizmente, pelo menos tão comuns entre oficiais e entre
delegados quanto entre estes e seus subordinados.

Vitimados pelo racismo


Do total dos respondentes na amostra ponderada no documento,
5,3% consideraram já terem sido vítimas de racismo. As respostas
afirmativas para a experiência de vitimização por racismo se
distribuem de maneira bem distinta quando se examina a cor
autorrelatada. Os negros são os mais atingidos pelo racismo.

Quase um entre cada quatro agentes de segurança


pública de cor negra já foram vítimas de racismo.

Também foram relatados casos de discriminação por racismo


por indígenas.

Discriminados por orientação sexual


Segundo dados do documento, 1,1% dos respondentes admitiram
ter sofrido discriminação por orientação sexual. Embora a
pergunta tenha incorporado diferentes orientações sexuais, o
tipo de discriminação que se pretendeu estimar envolve aquela
praticada, muito frequentemente no Brasil, contra homossexuais.

No caso, os baixos percentuais encontrados podem traduzir


fenômenos superpostos.

Primeiramente, sabe-se que a homofobia é muito forte nas


subculturas policiais.

186 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Palavra do Especialista
Vários estudos internacionais têm demonstrado, em diferentes

 países, que as instituições policiais frequentemente se recusam


a contratar homossexuais (BUHRKE, 1996; MAROTTA, 1981 apud
SOARES; ROLIM; RAMOS, 2009).

Essa circunstância poderia ter inibido respostas positivas neste


ponto, mesmo em questionários anônimos. Outra hipótese seria
a de uma sub-representação de homossexuais nas polícias —
exatamente pela maior presença de preconceitos homofóbicos
nas agências de segurança pública.

Discriminados por convicção religiosa


7,8% dos respondentes da pesquisa relataram já terem sido
discriminados por conta de suas convicções religiosas. Não foi
possível identificar diferenças estatisticamente relevantes entre
as vítimas, segundo suas crenças ou igrejas.

O percentual de discriminados neste item sugere


um problema que deve ser melhor conhecido, até
para saber se há uma tendência de intolerância
crescente nesse aspecto dentro das corporações e
na sociedade.

O percentual de 7,8% de respostas afirmativas não deve ser


menosprezado até mesmo pelo contexto caracterizado pelos
altos percentuais para as alternativas “não tenho religião” e
“não tenho religião, mas acredito em Deus”, que somaram
28,4% da amostra.

Agora que vimos detalhadamente dados relacionados ao


referido documento em relação a preconceitos e situações
de preconceitos das individualidades dos profissionais
de segurança pública, seguimos com nossos estudos por
outros conhecimentos.

187 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


USO DE SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS:
ENTRE O USO NOCIVO E ABUSIVO
O consumo de bebidas alcoólicas é uma prática comum,
vivenciada nos mais diversos tipos de sociedade. A história da
humanidade indica que esse costume, além de ser banalizado,
tem significados que estão intrinsecamente relacionados com
aspectos sociais, políticos, econômicos e culturais. No Brasil, o
consumo do álcool é permitido por lei (para maiores de 18 anos)
e, na maioria das vezes, essa prática acaba se tornando a porta
de entrada para o uso de outras drogas consideradas ilícitas.

Palavra do Especialista
Estima-se que 187.100 das mortes no ano de 2013, no mundo,
estão relacionadas com as drogas. Em relação ao álcool,
em 2012, aproximadamente 5,9% das mortes no mundo

 foram associadas ao seu consumo, e, na América Latina, foi


verificado que o álcool afeta 16% dos anos de um indivíduo
economicamente ativo, quatro vezes maior que a média mundial
(SOUZA; SIQUEIRA, 2015).

Ao mesmo tempo que o consumo do álcool é bastante


propagado e “aparentemente” aceito no meio social, as
consequências do uso inadequado são drasticamente
combatidas através do preconceito e desprezo com que são
tratados os alcoolistas e dependentes químicos. Mesmo que a
realidade demonstre que a dependência química pode alojar-
se independente de classe social, idade, cor ou sexo. Além
disso, ela pode atingir diversas classes profissionais, inclusive
aquelas que são responsáveis pela manutenção da ordem
pública: os agentes de segurança pública.

O alcoolismo é uma doença psiquiátrica crônica não


transmissível capaz de provocar diversas consequências
para o indivíduo, a família e a sociedade. É identificado pela
Classificação Internacional de Doenças (CID-10 F10 – F19 -
Transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de

188 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


substância psicoativas), a qual, em sua décima versão, objetiva
ajudar o profissional a qualificar doenças em questão ao uso
de substâncias.

Portanto, a dependência química não se deve


ao caráter do indivíduo e necessita de um
acompanhamento profissional para evitar a
sua progressão e, consequentemente, doenças
que podem ser fatais. Atitudes impregnadas de
preconceito ou a falta de confiança no tratamento
influenciam, de forma direta ou indireta, na
assistência e na qualidade da recuperação.

Diante do exposto, é necessário que o profissional de


segurança pública reflita acerca de suas próprias ações,
praticando atitudes mais humanas, para, assim, mudar
atitudes denotadas negativas.

No tocante aos profissionais de segurança pública, o uso


indevido do álcool ou outras drogas revela-se um fator
bastante crítico, pois, além dos males causados no próprio
usuário e em seus familiares, pode afetar o desempenho de
suas funções profissionais e refletir uma má prestação de
serviços à sociedade, uma vez que a atuação de um policial
depende, além de outros fatores, de um estado de equilíbrio
físico e psíquico.

Ocorre que várias dependências químicas iniciam com o uso


social e aceitável, como o álcool, por exemplo. Em relação a
agentes de segurança pública, o uso indiscriminado de álcool,
aliado ao uso frequente e irrestrito da arma, acaba levando à
emissão de comportamentos inadmissíveis e até mesmo a
homicídios e suicídios.

189 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Figura 24: O uso
abusivo de álcool
pode gerar graves
problemas ao
profissional de
segurança. Fonte:
Pixabay (2020).

Um ponto que merece atenção diz respeito ao preconceito


sofrido por esses indivíduos e à dificuldade que eles
apresentam de se reconhecerem como dependentes químicos,
dificultando o enfrentamento dessa questão e o acesso aos
serviços de saúde destinados a essa problemática. O uso
abusivo do álcool e de outras drogas por parte de agentes de
segurança pública tem representado um grave problema de
saúde pública que desafia os gestores.

Além disso, assim como ocorre com a saúde mental,


os servidores atingidos por essa doença só́ buscam
auxílio quando já́ estão com suas vidas comprometidas
e em estágios de punições disciplinares, além de
apresentarem diversos problemas no âmbito familiar.

O agente de segurança pública precisa aprender a discriminar


motivações que o fazem se entorpecer e procurar ajuda. Se um
servidor só consegue relaxar, dormir, se distrair e se desligar
do trabalho fazendo uso de substâncias psicoativas, ele já
está adoecido. E nem sempre o que leva o servidor a fazer
uso dessas substâncias é a atividade em si e por isso se faz
necessária a auto-observação e o tratamento da demanda de
sofrimento emocional, e não apenas o entorpecimento.

190 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


MANUTENÇÃO DA ORDEM NUM
CONTEXTO DE INJUSTIÇA SOCIAL
Esse papel essencial do agente de segurança pública de
manter a ordem num contexto de injustiça social não pode
ser ignorado no processo de adoecimento. Isso o expõe
necessariamente a práticas de violência, tanto aquelas
decorrentes de sua atividade quanto as que são dadas em
resposta à sua atuação. Ou seja, a atividade do policial o
expõe necessariamente a situações nas quais a violência e a
ausência do Estado estão envolvidas, elas estão, portanto, no
cerne dessa atividade.

Palavra do Especialista
Nogueira (2007) reforça que a questão aqui envolvida é que,


no tocante a suas condições de saúde mental, parece que os
próprios servidores são vítimas dessa violência, em função do
fato de terem que conviver diariamente com ela.

Em contato com agentes de segurança pública, são comuns


relatos relacionados à injustiça social. Vamos conhecer alguns
relatos de policiais anônimos a seguir.

1 “Sabe o que é você chegar numa ocorrência sobre


denúncia de abandono de crianças, e quando você chega
à casa tem 2 crianças pequenas, sozinhas e aí começam
a chorar porque quando nos vê acham que terão um
grande problema e aí quando conseguimos localizar
a mãe, ela estava trabalhando para poder garantir a
comida, o aluguel, não tem dinheiro para pagar ninguém
pra cuidar, não tem família em Brasília, não pode levar
para o trabalho, não tem creche ou vaga disponível
oferecida pelo Estado e você tem que levar a mãe para a
delegacia e ela é denunciada por abandono de incapaz.”

2 “Trabalho numa periferia, e aí o planejamento de ação


era fazer atuação voltada para o trânsito. Ai quando

191 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


2 colocamos em prática, ao abordar os motoristas, vimos
que eram pessoas muito humildes, trabalhadoras (em
geral serralheiro, pedreiro, pintor) que só tinham aquele
meio de locomoção para fazer os bicos do dia a dia.
Mas em geral os carros não têm documentação, são
velhos demais, carros que deveriam ir para o depósito.
E aí em muitos momentos ou usamos o bom senso ou
dificultamos mais ainda a vida de um pai de família,
trabalhador e honesto, mas que não consegue arcar com
os impostos do Estado e nem tem emprego para isso,
pois fazia bicos para se sustentar, para comer.”

3 Trabalhei numa região em que não existia serviço


de transporte público, então era muito comum você
encontrar famílias inteiras montadas numa única moto.
Falo de quatro, cinco ou seis pessoas. Num dos casos,
estava o pai com mais três crianças e ele só tinha um
capacete. Nunca entendi qual foi o raciocínio dele,
mas ele usava o capacete. Inicialmente ele tentou se
esconder da equipe, o que levantou suspeita, e logo
foi abordado. Ao verificarmos a situação, percebemos
que era um pai de família, desempregado, com a
documentação da moto atrasada, que precisou ir à
cidade e não tinha com quem deixar as crianças”.

4 “Recentemente prendemos um rapaz que permitiu que


usassem um bueiro da casa dele como depósito de
maconha. 115 quilos. O patrão sempre se safa.
A esposa, mãe de duas crianças, uma de seis meses
com hidrocefalia. A criança acabara de voltar de uma
cirurgia. Aceitaram o serviço no desespero, por causa
Figura 25: Relatos
anônimos da situação de saúde da criança. Prendemos o pai.
de policiais Isso ocorre sempre. Peguei o telefone da mãe para
relacionados à
injustiça social. tentar um emprego para ela. Era manicure, mas estava
Fonte: labSEAD-
desempregada e não podia trabalhar por conta da
UFSC (2020).
moléstia da criança.”

192 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Essa injustiça social é vista também entre as polícias, em
especial civis e militares, quando se percebe a diferença
salarial entre eles (diferenças entre estados). É uma diferença
tão grande que é capaz de tornar o policial de um determinado
estado ou instituição rico e de outro completamente
pobre. Essa última situação, em muitos momentos, leva os
profissionais a fazerem “bicos” para complementar renda,
a não pagarem os impostos devidos dos seus bens móveis
e imóveis, a morarem na periferia e na comunidade em que
trabalham, vendo-se reféns dos próprios criminosos, a não
conseguirem vagas em creches e escolas para seus filhos.
Enfim, esses profissionais se veem num contexto de tanta
violência e abandono quanto a própria população que eles
atendem diariamente.

Pessanha (2009) afirma que esse quadro social em


que vivemos se torna um desafio para os policiais
exercerem suas atividades num ambiente cultural
que lhes exige “ausência de emoções”, “valentia”,
“coragem”, ou seja, uma máquina capaz de “sufocar
todos os seus conflitos”.

O autor ainda destaca que, como no Brasil as desigualdades


sociais vêm contribuindo para o aumento da criminalidade e
violência, a expectativa da população em relação aos agentes
de segurança pública é maior. Ou seja, espera-se que os
policiais tenham um comportamento ético capaz de assegurar
a confiança do povo.

Porém, é claro que existe uma lacuna entre a expectativa da


sociedade pela atuação da segurança pública e as possíveis
condições de trabalho para exercê-la. Não obstante, é evidente
o sentimento de desvalorização que atinge diretamente o
policial que sofre na pele as mazelas de seu trabalho e tem, no
dia a dia, que fazer justiça dentro da lei.

193 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


O aumento crescente da criminalidade no Brasil contribui
para uma exposição constante dos servidores de segurança
pública ao perigo. A atividade policial na sociedade moderna
passa por uma transformação que implica a mudança de
comportamento, o que exige a quebra de antigos paradigmas,
tais como o de se preparar para a repressão ao crime, quase
que exclusivamente. No contexto atual, a exigência social tem
seu foco na prevenção do ato ilícito, no envolvimento de toda
a sociedade no trabalho de contenção da violência, trabalho
esse que agrava o estado nas áreas social e econômica, por
conta do aporte de recursos necessários.

VITIMIZAÇÃO POLICIAL
A Constituição brasileira aponta em seu texto diversos direitos
e garantias fundamentais dos cidadãos, como se pode


observar a seguir.

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção


de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e
aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do

direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes. (BRASIL, 1988).

Se “todos são iguais perante a lei”, isso significa que o policial


também é contemplado por este artigo da Carta Magna, pois,
assim como qualquer outro cidadão, este profissional de
segurança pública goza de todos os benefícios previstos em
lei, inclusive a inviolabilidade do direito à vida.

Já a Portaria Interministerial n. 2 da Secretaria de Estado


dos Direitos Humanos e do Ministério da Justiça (SEDH/MJ)
estabelece as Diretrizes Nacionais de Promoção e Defesa dos
Direitos Humanos dos Profissionais de segurança Pública
(BRASIL, 2010). Essas diretrizes têm por objetivo nortear os
procedimentos dos gestores no sentido de proporcionar uma
melhor qualidade de vida pessoal e profissional aos agentes
de segurança pública, como pode ser observado nos artigos
apresentados a seguir:

194 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


§ 5º- Proporcionar equipamentos de proteção individual e
coletiva aos profissionais de segurança pública, em quantidade
e qualidade adequadas, garantindo sua reposição permanente,
considerados o desgaste e prazos de validade.

§ 7º - Garantir aos profissionais de segurança pública instrução e


treinamento continuado quanto ao uso correto dos equipamentos
de proteção individual.

§ 18º - Assegurar o acesso dos profissionais do sistema de


segurança pública ao atendimento independente e especializado
em saúde mental.

§ 19º - Desenvolver programas de acompanhamento e tratamento


destinados aos profissionais de segurança pública envolvidos em
ações com resultado letal ou alto nível de estresse.

§ 21º - Desenvolver programas de prevenção ao suicídio,


disponibilizando atendimento psiquiátrico, núcleos terapêuticos de
apoio e divulgação de informações sobre o assunto.

§ 30º - Manter política abrangente de prevenção de acidentes


e ferimentos, incluindo a padronização de métodos e rotinas,
atividades de atualização e capacitação, bem como a
constituição de comissão especializada para coordenar esse
trabalho. (BRASIL, 2010).

A Constituição de 1988 e a portaria citada são somente dois dos


diversos dispositivos que visam preservar a integridade física
e a vida dos policiais. Porém, como já vimos anteriormente, os
índices de violência e de mortes que ocorrem todos os anos
no Brasil são altíssimos e o agente de segurança pública está
ligado diretamente a essa violência no dia a dia.

195 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


Palavra do Especialista
No vocabulário jurídico, o termo “vítima” se dirige a toda
pessoa que é sacrificada em seus interesses, que sofre um

 dano ou é atingida por qualquer mal. E sem fugir ao sentido, na


linguagem penal, designa o sujeito passivo de um delito ou de
uma contravenção. É assim o ofendido, o ferido, o assassinado, o
prejudicado, o burlado (SILVA; VIEIRA, 2008 apud CRUZ, 2010).

Martins (2016), em sua pesquisa sobre fatores de risco e


vitimização fatal de policiais, sinaliza que vitimização é o
processo de alguém tornar-se vítima (de outrem ou de si
próprio) ou de fazer alguém de vítima.


Vejamos o que Martins (2016) ainda afirma.

No exercício da sua profissão, o policial pode ser


vitimizado de várias maneiras, quer sejam de ordem
física, como nos casos das lesões provocadas por
armas de fogo, acidentes automobilísticos, etc. ou
de ordem psicológica, como o stress e a síndrome do
pânico, já que o acompanhamento psicológico, além
de ser bastante deficitário em suas organizações, é
ainda eivado de preconceitos, inclusive por parte dos
próprios colegas. Há dentre os Policiais/Militares
um jargão que diz “O Policial/Militar é superior as
intempéries” dando a ideia de que são seres humanos
que não podem sentir frio, sono, fome, sede, cansaço e
até mesmo medo ou qualquer outro tipo de sensação
que não fosse característica de um “ser imortal”. Ao
procurar o serviço psicológico de sua instituição, pode
ser rotulado pelos demais colegas como “fraco” ou
“perturbado mental”, o que o faz desistir de buscar o
auxílio adequado. Sem esse auxílio, os policiais estão
sujeitos a diversos transtornos mentais que inclusive
podem contribuir para desfechos trágicos como por
exemplo o suicídio. O policial ainda deve primar por sua
conduta legal, humana e ética determinada pelas leis,

196 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública



enquanto isso, está sujeito à vitimização provocada por
criminosos com os seus procedimentos desumanos,
antiéticos e cruéis. (MARTINS, 2016, p. 27).

Neste contexto, Soares, Rolim e Ramos (2009) apontam que


a vitimização dos policiais é também uma circunstância
produzida pelas próprias instituições às quais estes
profissionais estão vinculados. Mencionam também que,
para várias modalidades de violência, pelo menos, o que se
pode afirmar é que elas são amparadas e reproduzidas pelas
relações hierárquicas e pela própria cultura que formatam
as instituições policiais, o que faz com que os profissionais
da segurança tenham razões consideráveis para temer as
instituições onde trabalham.

Segundo esses autores, os policiais constituem uma categoria


de servidores públicos para quem o risco não é mero acidente,
mas desempenha papel estruturante das condições laborais,
ambientais e relacionais. Esses profissionais têm consciência
de que perigo e audácia são inerentes aos atributos de
suas atividades. Seus corpos estão permanentemente
expostos e seus espíritos não descansam. Nesse sentindo
então, a vitimização se materializa em traumas, lesões ou
mortes ocorridas na confrontação com a criminalidade e na
manutenção da ordem.

O próprio estudo do Ministério da Justiça, referido


anteriormente, já apresentou as seguintes conclusões que
podemos identificar na imagem a seguir.

197 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


A falta de atenção à saúde do policial enquanto trabalhador: faz
parte desse hiato do conhecimento do setor/serviço, mas também
por raízes históricas mais profundas. Sinaliza que o tema polícia tem
sido sistematicamente inserido apenas como “apêndice da história
das classes populares e do movimento operário, sobre o qual a polícia
estendia sua implacável repressão”. E por esse histórico da polícia
e segurança pública apenas como mantenedores da ordem, há uma
espécie de negação de positividade sociológica da categoria, lembrada
tão somente na formalidade da aplicação da lei. Além de outros
motivos, a aversão ao tema remonta a um ranço, desde a origem no
Brasil, perpetuado durante a ditadura militar.

A urgência de tratar o tema do risco e da vitimização dos policiais:


há necessidade de superarmos o vazio da ciência social em
relação ao setor e os problemas ideológicos que excluíram os
agentes de segurança da pauta da cidadania. A literatura atual só
agora vem apre- sentando aumento de investigações sobre essa
categoria de servidores públicos.

A opinião pública negativa sobre policiais faz parte do ônus da


atividade que desempenham no mundo inteiro, e os estudos
mostram, acrescentando-se a outros, um elevado grau de
sofrimento no trabalho pela falta de reconhecimento social.
Policiais que sofreram elevado risco decorrente do trabalho são
aqueles que mais vivenciaram violências do tipo: ferimento por
projétil de arma de fogo ou por arma branca, agressão física,
violência sexual, tentativa de suicídio e tentativa de homicídio.
Diferentes variáveis se associam à vivência de risco nas duas
corporações, destacando-se especialmente as condições de
trabalho, o exercício de outras atividades sem descanso, indicando
sua importância para se pensar formas de prevenir os riscos vividos.

Sobre a organização do trabalho: observou-se que alguns fatores se


associam à vitimização – excessiva rotatividade dos policiais dificulta
o conhecimento dos problemas e a responsabilização pelos atos.
A falta de instâncias coletivas de reflexão e avaliação do trabalho
dificulta a superação das falhas e dos problemas, que acabam sendo
tratados apenas nos escalões hierárquicos superiores. O imediatismo,
as condições materiais precárias de trabalho, as cargas horárias
Figura 26: excessivas, o número insuficiente de profissionais e os salários
Conclusões sobre inadequados ao risco e à importância da missão são elementos que
vitimização, segundo
Soares, Rolim e
contribuem para a baixa produtividade. O fato de mais da metade da
Ramos, (2009). corporação ter dupla vinculação de ocupação constitui sério problema
Fonte: labSEAD- para a saúde, para o desempenho profissional e para a produtividade
UFSC (2020). das corporações.

198 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


É fundamental e urgente que haja um movimento das
instituições de segurança pública por conta das absurdas
taxas de morte dos policiais, ressaltando que não existe
fatalidade nessa imensa perda de vidas que tanto afeta as
famílias e a sociedade em geral. Ainda segundo Soares, Rolim
e Ramos (2009), o agente de segurança pública legitima e
naturaliza a violência que os vitimiza, muito mais do que a
qualquer trabalhador, durante a jornada de trabalho ou nos
tempos de folga, que aumentam as ocorrências de lesões e
traumas dos quais são vítimas.

Por fim, podemos considerar que, no que tange à saúde


mental, tratar apenas os sintomas dos adoecidos, sem
entender as causas, é um grande erro, dispêndio orçamentário
e leva a reincidências no adoecimento. Na segurança pública,
a reincidência implica erros, perdas de outras vidas e, por
fim, possível suicídio. Então, este estudo demonstrou as
diferentes causas, em diferentes contextos que influenciam
no adoecimento e na saúde mental dos profissionais de
segurança pública. Lembre-se de aplicar ações individuais que
possam refletir no coletivo de sua corporação para torná-la
um ambiente de mais respeito e com mais qualidade de vida
no trabalho, ressaltando a preservação da saúde mental de
toda a corporação.

199 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


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205 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


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206 • Módulo 3 Riscos e Agravos da Saúde do Agente de Segurança Pública


MÓDULO 4

PRINCIPAIS
SINTOMAS DO
ADOECIMENTO
207 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento
Apresentação

Como já estudamos em módulos anteriores, vários transtornos


são desenvolvidos em razão do alto nível de estresse de um
indivíduo ou de sua exposição a constante esforço mental
e físico. Estamos direcionando nosso estudo com foco nos
temas relacionados aos profissionais de segurança pública,
levando em consideração os serviços diários e os contextos em
que esses indivíduos estão inseridos.

Nesse sentido, vamos conhecer os principais sintomas


do adoecimento e dos transtornos mentais do agente de
segurança pública.

OBJETIVOS DO MÓDULO
Conhecer, por meio de base teórica, diversos transtornos e
os principais sintomas do adoecimento dos profissionais de
segurança pública.

ESTRUTURA DO MÓDULO
• Aula 1 – Somatização Física.
• Aula 2 – Compulsões.

208 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Aula 1 – Somatização Física

CONTEXTUALIZANDO...
Os sintomas físicos sem explicação médica são frequentes e
estão associados ao sofrimento mental em vários contextos
médicos, especialmente na Atenção Primária à Saúde e na
população em geral.

Na área da segurança pública, os agentes são propensos a


fazerem parte de grupos de riscos no desenvolvimento de
transtornos e doenças geradas pelo alto nível de estresse
ou de exposição a constante esforço mental e físico. Assim
sendo, vamos agora conhecer os principais sintomas de
adoecimento de um agente de segurança pública, destacando
sintomas físicos que surgem no desenvolvimento de doenças.

OS SINTOMAS FÍSICOS
Sadock, Sadock e Ruiz (2017) afirmam que, apesar de não
apresentarem etiologia clara, certas doenças, mesmo com
lesões ou achados físicos — como a asma, a psoríase, a
Estudo das causas
das doenças. candidíase de repetição e outras — têm em seus fatores de
base elementos pouco passíveis de mensuração médica,
como os impactos estressores dos eventos da vida, as perdas,
separações, e outros acontecimentos aos quais o indivíduo
está sujeito, considerados, na quinta edição do Manual
Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM), de
2014, como transtornos de sintomas somáticos.

Palavra do Especialista
Acredita-se que fatores psicológicos e psicossociais desempenham
um papel importante na etiologia dessa condição. Em pacientes
 com esses transtornos, há considerável sofrimento emocional,
além de as situações difíceis da vida serem experimentadas como
sintomas físicos (LAZZARO; ÁVILA, 2004).

209 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Os autores ainda consideram que os transtornos são de difícil
diagnóstico por sugerirem, a partir do relato do paciente, a
presença de outras doenças clínicas, mas que não conseguem
ser explicadas por nenhuma patologia conhecida.

Outra característica importante é a dificuldade do paciente em


aceitar a possibilidade de que suas doenças tenham origem
psicológica, e não clínica.

Segundo o DSM-5 (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION,


2014), o que caracteriza o diagnóstico não são os sintomas
somáticos em si, mas como se apresentam e como são
apresentados. Vamos conhecer, na imagem abaixo, critérios
que podem facilitar o diagnóstico.

1 Um ou mais sintomas somáticos que causam


aflição e incômodo na vida diária.

2 Pensamentos e preocupações excessivas


relacionadas aos sintomas somáticos.
Figura 1: Critérios
que podem facilitar
o diagnóstico.
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020).
3 Ao menos seis meses de apresentação
dos sentimentos.

Nesse contexto, os sintomas podem ser específicos (dor


localizada) ou relativamente inespecíficos (fadiga), e o
sentimento do indivíduo é autêntico, mesmo sendo, ou não,
explicado em termos médicos.

Os sintomas somáticos podem ser também


explicados pela psicanálise, que aponta que eles
representam um mecanismo defensivo no qual
o indivíduo converte o problema psicológico em
fisiológico, e isso representa a reação adaptativa à
ansiedade experimentada.

210 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


A etiologia dos sintomas somáticos pode ser explicada pela
presença de ansiedade ou depressão associada a traços
de personalidade e afetividade negativos. No que se refere
aos fatores ambientais, há prevalência em pessoas de baixa
escolaridade e baixo nível socioeconômico, além de serem mais
comuns no sexo feminino, em idades mais avançadas, no caso
de vivências anteriores de violência, desemprego, entre outros.

O tratamento mais eficaz para esse transtorno é a


psicoterapia, apesar da alta resistência dos pacientes
em relação à aceitação da preponderância de fatores
psicológicos como associados a esse adoecimento. Há ainda
a possibilidade de tratamento farmacológico, dependendo da
severidade dos sintomas causados pelo transtorno.

VIDA SEXUAL E DISFUNÇÃO SEXUAL


Outro sintoma físico que se manifesta no agente se dá na vida
sexual do profissional. Então, inicialmente, para abordarmos o
tema ‘disfunção sexual’, entenderemos a sexualidade humana
em suas complexidades, para que, a partir da compreensão
sobre a vida sexual “normal”, possamos discutir as disfunções.

Figura 2: Sintomas
físicos na vida
sexual do agente.
Fonte: Pixabay
(2020).

A sexualidade é determinada biopsicossocialmente, envolvendo


anatomia, fisiologia, cultura e relações interpessoais, todas

211 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


elas entrelaçadas entre si. Também envolve dimensões
subjetivas do ser humano, como a capacidade de relacionar-se,


aproximar-se e separar-se do outro e de sentir-se valorizado.

“Saúde sexual é a integração dos elementos


somáticos, emocionais, intelectuais e sociais do
ser sexual, por meios que sejam positivamente
enriquecedores e que potencializem a personalidade,

a comunicação e o amor.” (OMS, 1975 apud
MARQUES; CHEDID; EIZERIK, 2008, p. 176).

A vida sexual “sadia” depende de uma sequência de ocorrências


hormonais e fisiológicas vulneráveis às excitações, sendo
coordenada pela inter-relação de três sistemas: o neurológico,
o vascular e o endocrinológico.

Dentre os fatores psicossociais, podemos citar: ansiedade de


desempenho na relação sexual, medos, culpas, mitos e tabus
(alguns associados a questões religiosas), estresse, abuso
de drogas, disfunção sexual do parceiro, ausência de atração
pelo parceiro, entre outros.

Em relação aos fatores psicossexuais, Sadock, Sadock e Ruiz


(2017) afirmam que a sexualidade depende de quatro fatores que
se inter-relacionam, conforme apresentados na imagem a seguir.

Identidade sexual:
padrão das características sexuais
biológicas relacionadas às
características sexuais primárias e
secundárias (hormônios, genitálias etc.).

Identidade de gênero:
identificação de acordo com a
masculinidade ou feminilidade. É a
maneira como você se enxerga, o gênero
do qual você se identifica fazer parte.

212 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Orientação sexual:
descreve o objeto dos impulsos sexuais
de uma pessoa. Indica pelo que você
sente atração (heterossexual – sexo
oposto; homossexual – mesmo sexo;
bissexual – ambos os sexos; etc.).

Comportamento sexual:
Figura 3: Fatores é o conjunto das atitudes e
psicossexuais.
Fonte: labSEAD-
posicionamentos do ser humano em
UFSC (2020). relação ao sexo.

Agora que conhecemos um pouco sobre a sexualidade


humana e suas complexidades, vamos abordar as disfunções
sexuais, sintomas físicos que podem ser gerados pelo
estresse e esgotamento do agente de segurança pública.

Disfunções sexuais
As disfunções sexuais se referem à dificuldade ou
incapacidade de responder à estimulação sexual, perturbação
no sentimento subjetivo de prazer ou experiências de dor
associadas ao ato sexual (SADOCK; SADOCK; RUIZ, 2017).

Palavra do Especialista
É caracterizada, ainda, por um distúrbio no desejo ou

 mecanismo psicofisiológico sexual, que ocorre durante as


respostas sexuais, que envolvem, para além do ato, os desejos.
(PINHEIRO; VINHOLES; TREVISOL, 2018).

As disfunções sexuais são diagnosticadas apenas quando


comprometem a rotina e as relações íntimas, além de ter que
se considerar o tempo que elas perduram. Segundo o DSM-5
(AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014), a gravidade
da disfunção é considerada de acordo com o sofrimento do
paciente em leve, moderado e grave.

213 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


As disfunções sexuais atingem um número elevado
de pessoas, afetando 43% das mulheres e 31% dos
homens (dados de 2010), e causam importante
impacto no funcionamento interpessoal e na
qualidade de vida dos atingidos.

As disfunções podem ser classificadas em algumas fases


consideráveis. Vamos identificá-las na imagem a seguir.

Primária ou secundária:
quando ocorrem Situacional ou geral:
desde o início ou se só quando ocorrem em
surgem após período de determinada situação
funcionamento sexual ou em todas.
normal.

Transitória ou
permanente:
Figura 4: Fases de acordo com a
consideráveis nas duração.
disfunções sexuais.
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020).

Frequentemente, as disfunções estão associadas a outros


transtornos mentais, como a depressão e ansiedade,
transtornos de personalidade e esquizofrenia. O tratamento
deve ter como foco o transtorno principal identificado.

Elas podem também ser atribuíveis a condições médicas


em geral, uso de substâncias ou efeitos adversos de
medicamentos, além de condições psicossociais que não se
enquadram como transtornos.

214 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Observa-se ainda que indivíduos com rigidez
afetiva, que apresentam dificuldade em demonstrar
carinho, são fortes candidatos a apresentar mais
dificuldades sexuais que as pessoas que lidam mais
facilmente com suas emoções e sentimentos.

Esse dado torna-se relevante, principalmente quando


considerada a população de agentes de segurança pública,
que apresentam fortes tendências a tornarem-se mais
desconfiados e fechados em decorrência, principalmente, da
atividade que realizam.

Para o diagnóstico de uma disfunção sexual, ela deve estar


presente há pelo menos seis meses, ser persistente ou
recorrente (e não ocasional) e causar sofrimento inter ou
intrapessoal. A avaliação e o tratamento das disfunções
abordam não apenas o indivíduo, mas o companheiro,
considerando as relações e as dificuldades.

Vamos então conhecer as principais disfunções sexuais nos


homens e as principais disfunções sexuais nas mulheres.

Principais disfunções sexuais masculinas e femininas


O diagnóstico de disfunções sexuais masculinas nem sempre
é alcançado, devido à ignorância, às inibições, expectativas
superdimensionadas e ansiedade de desempenho, pois, em
comparação com as mulheres, os homens com disfunção
sexual parecem ter mais dificuldade para buscar ajuda, pelo
estigma de serem menos potentes e pelo constrangimento de
exporem sua intimidade.

215 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


No caso de homens que atuam na segurança
pública, percebe-se que existem, além da
dificuldade de pedir ajuda de modo geral, maiores
dificuldades ainda em se tratando de disfunções
relacionadas à sexualidade, devido ao machismo
(principalmente nas instituições militares).

Nem sempre é fácil identificar a causa das disfunções


masculinas, sendo muitas vezes necessária a presença
de seus pares, a fim de facilitar a identificação de alguns
motivos. Vamos conhecer, na imagem a seguir, alguns fatores
citados por Marques, Chedid e Eizerik (2008).

Fatores predisponentes:

1 criação rígida, questões relacionais, experiências sexuais


traumáticas, que podem tornar um homem mais suscetível a
apresentar alguma disfunção sexual.

Fatores precipitantes:
2 disfunção da parceria, depressão, ansiedade, que pode ter
desencadeado o problema em questão.
Figura 5: Fatores
que contribuem
para identificação
de disfunção sexual Fatores mantenedores:
masculina. Fonte:
labSEAD-UFSC 3 ansiedade de desempenho, discórdias na relação, medo de
intimidade, baixa autoestima, comunicação pobre.
(2020).

Conforme exposto, vários são os fatores que interferem


na saúde sexual masculina, alguns levam à disfunção,
outros levam a maior duração das dificuldades. Na imagem
abaixo citamos as principais disfunções masculinas,
segundo informações do DSM-5 (AMERICAN PSYCHIATRIC
ASSOCIATION, 2014).

216 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


1
Disfunções da ejaculação

As disfunções da ejaculação se referem à dificuldade


em controlar a ejaculação (liberação do esperma) e se
dividem em:

• Ejaculação precoce: ocorre quando, sempre ou quase


sempre, a ejaculação ocorre antes ou no período
de um minuto da penetração vaginal, por falta
capacidade do homem em adiar a ejaculação.
• Ejaculação retardada: ocorre quando o homem
apresenta dificuldade de ejacular durante o coito,
quando o consegue. O problema raramente está
presente na masturbação.
• Ausência de ejaculação (anorgasmia masculina).

2
Disfunção erétil ou transtorno erétil

A disfunção erétil é a incapacidade persistente de iniciar


e manter uma ereção suficiente para uma penetração
e função sexual satisfatória. Durante muito tempo foi
classificada como ‘impotência’, porém, por ter uma
conotação pejorativa, essa denominação foi substituída por
uma designação mais médica.

Apresenta causas psicogênicas (ansiedade, estresse,


depressão) ou orgânicas (vascular, neurológica e hormonal).
Figura 6: Principais
disfunções sexuais Foi reportada em 10 a 20% de todos os homens, sendo a
masculinas. Fonte:
queixa principal de 50% de todos os homens tratados para
labSEAD-UFSC
(2020). transtornos sexuais.

217 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Em relação à sexualidade feminina, consideramos que esse
tema foi e é objeto de debate científico e, se considerarmos
historicamente, a mulher alcançou o “direito de desejar” há
menos de um século. A “descoberta” da sexualidade feminina
e suas repercussões levam a uma melhor compreensão sobre
a vivência sexual feminina e suas dificuldades.

Se considerarmos que, na vivência sexual da mulher, a


combinação de interesse (ou desejo) e excitação não está
sempre associada — principalmente quando consideramos
mulheres em relacionamentos estáveis —, percebemos
que muitas apresentam dificuldade em avançar, de forma
gradual, do desejo à excitação. Para muitas mulheres, é o
desejo de intimidade, ao invés de um impulso biológico, o
desencadeador do ciclo de resposta sexual.

Outro fator complicador é que a excitação frequentemente


está pouco relacionada à lubrificação em mulheres sadias ou
com disfunções, portanto as queixas de ausência de prazer
são suficientes para o diagnóstico, mesmo quando o restante
do funcionamento está preservado.

Entre as disfunções sexuais femininas, o desejo


sexual hipoativo é o mais comum, consistindo na
diminuição ou ausência de interesse e fantasias
sexuais. Nesses casos, não existe nenhuma
motivação para que o ato sexual aconteça.

Há uma prevalência de disfunções sexuais em 20 a 50% das


mulheres. Nesse sentido, vamos conhecer, na imagem abaixo,
as principais disfunções sexuais femininas.

218 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


1
Disfunção orgásmica ou transtorno do
orgasmo feminino

É caracterizada como a inibição recorrente ou


persistente do orgasmo feminino. É presente num
número elevado de mulheres e apresenta muitos
fatores psicológicos associados. Importante ressaltar
que as expectativas sociais e culturais em relação às
mulheres refletem, ainda de forma bastante evidente,
na dificuldade orgásmica.

2
Dispareunia

É a dor no intercurso sexual e ocorre antes, durante ou


depois da relação sexual. Geralmente está associada a
vaginismo. As causas são predominantemente orgânicas.
As dores são reais e tornam a relação desagradável ou
insuportável, fazendo com que algumas mulheres tenham
receio de iniciar novas relações sexuais em decorrência de
experiências anteriores dolorosas.

3
Vaginismo

É a constrição de parte da vagina devido ao estreitamento ou


espasmo involuntário da musculatura do assoalho pélvico.
Provoca o impedimento total ou parcial da penetração.

4
Transtorno do orgasmo feminino

Também conhecido como anorgasmia, é descrito


como a inibição recorrente ou persistente do orgasmo
feminino, mesmo depois de excitação sexual adequada
(masturbação ou coito).

219 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Figura 7: Principais Importante ressaltar que nem todas as mulheres que não
disfunções sexuais
femininas. Fonte:
atingem o orgasmo por um desses meios serão consideradas
labSEAD-UFSC anorgásmicas, embora haja alguma inibição sexual.
(2020).

Nesse contexto, as consequências das disfunções sexuais


masculinas e femininas são variadas, podendo atingir a
autoestima e autoconfiança, e gerar ansiedade, desconforto,
frustração, instabilidade de humor e irritabilidade. Pode interferir
ainda, como consequência, na infertilidade, produzindo
desconforto individual e interpessoal.

Não são raros os casos que levam o indivíduo


à fuga e ação de evitar a intimidade sexual,
comprometendo a vida íntima e social do indivíduo
e, em muitos casos, dos companheiros e familiares.

Mas, afinal, qual o tratamento para a disfunção sexual?

Durante muitos anos, a recomendação em relação às


disfunções sexuais era, além do acompanhamento com
um médico especialista (ginecologista, urologista), a
psicoterapia individual. Devido à constatação da relevância
dos aspectos psicossociais, hormonais, e da importância do
companheiro, tanto para detecção, quanto para o tratamento
dos transtornos sexuais, foram estabelecidas outras
possibilidades de tratamento.

Aconselhamento e ajuste do estilo de vida, bem


como intervenção adequada nos fatores de risco,
são os primeiros passos para uma abordagem
holística em relação ao tratamento eficaz das
disfunções sexuais.

220 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


O tratamento pode ser feito de forma multidisciplinar,
dependendo da etiologia e do tipo de disfunção, e consiste
em educação, informação e aconselhamento sobre a resposta
sexual. Ainda são considerados dois aspectos que podemos
identificar na imagem a seguir.

Terapia sexual dual:


consideração de que o casal deve ser
tratado. A principal meta do tratamento é
que o casal tenha mais satisfação e prazer,
e não somente um perfeito desempenho
genital. Além de melhorar a comunicação,
Tratamento pode solucionar conflitos relacionais.
multidisciplinar
Farmacoterapia:
com várias opções masculinas, mas
ainda são precárias as opções femininas.

Figura 8: Tratamento multidisciplinar da disfunção sexual.


Fonte: labSEAD-UFSC (2020).

Independente da opção terapêutica utilizada, o tratamento de


um paciente melhora, como consequência, sua autoestima,
qualidade de vida, satisfação pessoal e conjugal e possíveis
sintomas de depressão.

SONO NORMAL E TRANSTORNOS DO


SONO-VIGÍLIA
Outros sintomas de adoecimento que devemos considerar no
contexto das realidades dos agentes de segurança pública
são os transtornos de sono-vigília. Assim, vamos conhecer
o que se caracteriza um sono normal e os transtornos que
podem ser desenvolvidos nessa área.

Sono normal
O sono é um estado fisiológico completo que ocupa
aproximadamente um terço de nossas vidas. É durante o sono
que o organismo recupera o desgaste físico e mental, e ainda
cumpre tarefas essenciais para o seu bom funcionamento.

221 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Durante o sono, há redução ou ausência da atividade motora,
porém com permanência da atividade cerebral, além de um
elevado limiar para resposta a estímulos externos.

Figura 9: O sono.
Fonte: Pixabay
(2020).

O sono é composto de dois estados fisiológicos: sono não


REM e sono REM, sendo este último um tipo qualitativamente
diferente, caracterizado por altos níveis de atividade cerebral,
e é nele que são produzidos os sonhos. Segundo dados do
Compêndio de Psiquiatria, apenas 90 minutos após o início do
sono é que passamos para o sono REM.

Segundo Borges e Iannini (2018), o sono é induzido pela


produção de um neuro-hormônio chamado melatonina, que é
fabricado pela hipófise na ausência de luz. Há indícios de que,
no caso do sono durante o dia (pessoas que trocam a noite pelo
dia), mesmo com ausência parcial de luz, há comprometimento
da produção desse hormônio.

Palavra do Especialista
De acordo com Sadock, Sadock e Ruiz (2017), enquanto estamos
dormindo, o organismo regula o sistema imunológico, o sistema

 hormonal e recompõe os neurotransmissores, o que faz do sono


uma necessidade básica. Desse modo, o sono é relevante para a
manutenção dos processos básicos da atividade humana, como
atenção, memória e raciocínio.

222 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


No que se refere à quantidade de horas de sono necessárias,
há variações entre as pessoas de acordo com características
individuais e também de acordo com a idade. Nesse sentindo,
vamos conhecer, na imagem a seguir, a quantidade de horas
necessária para cada faixa etária do ser humano.

Bebês recém- Adolescentes


nascidos devem dormir
dormem em entre 8 e 10
média 80% do horas diárias.
seu tempo.

HORAS
DE SONO
Crianças Adultos devem
pequenas devem dormir de 5 a 8
Figura 10: Horas dormir de 10 a
de sono. Fonte: horas por dia.
12 horas por dia.
labSEAD-UFSC
(2020).

Nesse sentido, a ausência do sono adequado promove


alterações na atenção, memória, disposição, raciocínio,
produtividade, afetando a saúde do indivíduo. O período
ao qual o indivíduo é submetido à privação de sono
comprometerá a sua qualidade de vida, podendo levar à
ocorrência de transtornos de sono-vigília, fadiga e alterações
no humor e irritabilidade.

Devido à necessidade da atuação diária da segurança


pública, sempre haverá a necessidade de profissionais
que trabalhem em horários noturnos. Dependendo das
atividades desempenhadas, da jornada de trabalho,
e do local onde atuam, haverá menor ou maior
comprometimento na quantidade e qualidade do sono dos
profissionais, pois, na maioria dos casos, além de serem
escalados para atuar em horários que ultrapassam os
preestabelecidos, também devido ao tipo de atividade que
desempenham, muitos não conseguem recompensar as

223 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


horas de sono perdidas naquela noite. Esse fato se deve
também à convivência familiar, ao barulho de crianças, das
pessoas na casa, entre outros aspectos.

Transtornos do sono-vigília
Os transtornos de sono-vigília, segundo DSM-5 (AMERICAN
PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014), abrangem 10 tipos de
diagnósticos. Em todos eles há comum queixa em relação
à quantidade, qualidade e tempo de sono, além de relatos
de sofrimento e prejuízo resultantes durante o dia. Abaixo,
citaremos os mais comuns e que atingem a maior parte da
população em geral, principalmente agentes de segurança.

Transtorno de insônia
É definida pela dificuldade de iniciar, manter o sono ou
despertar antes do horário habitual com incapacidade para
retornar ao sono. É a mais comum entre as alterações do
sono, atingindo de 30 a 45% dos adultos. Para que possa
ser considerado um transtorno, necessita apresentar alguns
dos outros sintomas associados. Vamos conhecer esses na
imagem abaixo.

Prejuízo social, acadêmico, laboral ou em outras


áreas da vida do indivíduo, em decorrência da
perturbação do sono.

Dificuldades constantes acontecendo pelo menos


três vezes na semana e permanecendo por pelo
menos três meses. A dificuldade acontece mesmo
quando há condições adequadas para o sono.

Figura 11: Sintomas


associados à falta
de sono. Fonte: Quando a falta de sono não é atribuída ao uso de
labSEAD-UFSC
(2020).
nenhuma substância.

224 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Em relação aos fatores de risco associados à insônia,
podemos conhecê-los na imagem a seguir.

Temperamentais
Ansiedade, estilos cognitivos ou traços de
personalidade propensa a preocupações
(a exigência e cobranças de atenção
exacerbadas da atividade também influenciam
no caso dos agentes de segurança).

Ambientais
Ruído, iluminação, temperaturas
Fatores desconfortáveis (no caso dos profissionais
que atuam em turnos noturnos, observa-se
de Risco que a frequente exposição a alterações na
quantidade e qualidade do sono pode levar a
alterações mais graves e duradouras como
a insônia).

Genéticos e fisiológicos
Figura 12: Fatores Sexo feminino e idade avançada
de risco associados são características que aumentam a
à insônia. Fonte: suscetibilidade ao transtorno, mas ainda não
labSEAD-UFSC
(2020).
há conclusões sobre a interferência genética.

Ainda em relação às consequências, podemos considerar que


a ausência de sono pode gerar efeitos em vários âmbitos da
vida do indivíduo, como nas relações interpessoais, na vida
social e também profissional. Nesse contexto, como principais
sintomas foram observados: aumento da irritabilidade diurna
e falta de concentração, além de estar associado, em longo
prazo, com aumento do risco de transtornos depressivos
graves, hipertensão e infarto do miocárdio, absenteísmo
elevado, queda da produtividade, qualidade de vida
insatisfatória, além de problemas financeiros.

A preocupação aumenta no caso dos profissionais de


segurança devido ao fato de muitos deles apresentarem
transtorno de insônia. Além disso, a maioria dos sintomas

225 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


apresentados acima está presente em várias obras acerca do
adoecimento dos profissionais em decorrência da atividade.

Segundo Bernardo et al. (2015), como consequência


do aumento da atuação em turnos noturnos, foi
percebido, no público policial militar, crescimento
no número de pessoas com dificuldades de sincronia
entre os ambientes físicos, sociais e profissionais.

Isso tudo tem como consequência dificuldade de atenção,


sonolência em outros horários de serviço, problemas
familiares, alteração nas relações interpessoais, aumento do
número de acidentes de viaturas, além de outros problemas
de saúde associados.

Transtorno de hipersonolência
O diagnóstico ocorre em decorrência do relato do próprio
indivíduo acerca de sonolência excessiva, apesar de o sono
durar 7 horas, no mínimo. Afeta não só o indivíduo como
também sua família e seu trabalho. A sonolência pode ser
consequência de:

• Sono insuficiente.
• Disfunção neurológica nos reguladores de sono.
• Sono perturbado.
• Fase do ritmo circadiano do indivíduo, que se refere ao
período de cerca de 24 horas sobre o qual o ciclo biológico
de quase todos os seres vivos se baseia.

De acordo com o tempo de duração, o transtorno classifica-se


em três aspectos. Vamos conhecê-los na imagem a seguir.

226 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


AGUDO: SABAGUDO: PERSISTENTE:
DURAÇÃO DURAÇÃO DURAÇÃO DE
MÉDIA DE DE 1 A 3 MAIS DE TRÊS
UM MÊS. MESES. MESES.

Figura 13: Tempo


de duração do
transtorno de

TEMPO DE DURAÇÃO
hipersonolência.
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020).

Os fatores de risco desse transtorno se caracterizam em


ambientais (estresse psicológico e consumo de álcool) e
genéticos e fisiológicos (possibilidade de ser familiar).
A sonolência afeta a atenção, a concentração, a memória e
os processos cognitivos mais elevados, produzindo como
resultados graves fracasso escolar, perda de emprego,
acidentes com veículos automotores e acidentes industriais.

Narcolepsia
Pode ser descrita como a necessidade irresistível de dormir,
cair no sono ou cochilar em períodos recorrentes no decorrer do
dia, acontecendo pelo menos três episódios na semana, além
de duração de pelo menos três meses. Os episódios podem
levar de 10 a 20 minutos de sono, após os quais o paciente se
descreve como “revigorado”, pelo menos brevemente.

Por não permitir controle por parte do indivíduo,


os episódios de sono podem ocorrer nos momentos
mais impróprios possíveis, podendo ser perigoso
para o paciente, como quando ele está dirigindo ou
mesmo em pé em algum lugar inadequado para isso.

227 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Segundo informação do DSM-5 (AMERICAN PSYCHIATRIC
ASSOCIATION, 2014), a narcolepsia ocorre em 0,02 a 0,4%
da população, não chegando a ser considerada rara, embora
também não seja comum. Um dos modos de fechar o
diagnóstico é através do exame de polissonografia, em que o
paciente é monitorado no decorrer de uma noite de sono.

Na imagem a seguir vamos conhecer os fatores de riscos


causados pela narcolepsia.

Temperamentais
sonambulismo, bruxismo (ranger de dentes ao
dormir), transtorno comportamental do sono
REM e enurese (urinar enquanto dorme) talvez
sejam mais comuns em indivíduos
com narcolepsia.
Fatores
de Risco
Ambientais
infecções, gripes, além de alterações
repentinas nos padrões do sono-
vigília (mudança de emprego, fim de
relacionamento, estresse).
Figura 14: Fatores
de risco associados
à narcolepsia.
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020).
A narcolepsia também resulta em prejuízos nas atividades
de direção e de trabalho. Após o controle da alteração, o
indivíduo pode voltar a dirigir, mas deve evitar fazê-lo por
distâncias muito longas, além de evitar realizar atividades que
o coloquem em risco.

IRRITABILIDADE EM EXCESSO E
AGRESSIVIDADE DESMEDIDA
A apresentação dessas duas alterações de forma conjunta
se deve a ambas serem bastantes presentes em decorrência
do estresse presente nas atividades de profissionais de
segurança, além de, quando consideradas juntas, podem ser
vistas com demasiada preocupação por parte dos superiores,
das famílias e da sociedade em geral.

228 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Irritabilidade excessiva
A irritabilidade é uma resposta excessiva ou demasiado
intensa a um estímulo, podendo ser descrita ainda como o
aumento exagerado a estímulos do ambiente e uma baixa
tolerância a incômodos.

A irritabilidade não pode ser considerada como


um transtorno, mas como um sintoma. Pode estar
presente em quadros como depressão maior, estresse
elevado, síndrome de burnout, transtorno de sono-
vigília, entre outros. Apresenta relação com baixo
controle dos impulsos e descontrole emocional.

A irritabilidade pode ser provocada por alterações na


quantidade e qualidade do sono, alterações hormonais,
elevada exposição a situações de estresse, além de outras
situações adaptativas abruptas para as quais o indivíduo não
esteja preparado.

A irritabilidade é descrita como um dos sintomas presentes


em processos de adoecimentos de profissionais de segurança,
principalmente policiais. Entre os autores que pesquisam
sobre a atividade policial e o adoecimento, Minayo, Muniz
e Miranda percebem que a jornada exaustiva de trabalho,
as constantes alterações no ciclo circadiano (as 24 horas
em que se baseiam o ciclo de vida dos indivíduos), a falta
de alimentação adequada, a exposição excessiva a cenas
de violência, a presença de cobranças e, em alguns casos,
assédio moral, provocam, entre muitas consequências, o
aumento da irritabilidade do sujeito.

229 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Figura 15:
Irritabilidade. Fonte:
Pixabay(2020).

A irritabilidade, na maior parte das vezes, está associada


também a dificuldades do indivíduo em conseguirem lidar,
de forma saudável, com as exigências familiares e sociais,
pois os agentes que atuam na área da segurança pública, na
sua maioria, não desempenham o “papel” de profissional de
segurança apenas nos horários de trabalho, mas também nos
seus períodos de folga.

A irritabilidade pode ocorrer ainda devido ao uso de algumas


substâncias como o metilfenidato (Ritalina), o uso inicial de
antidepressivos ou em decorrência do uso de outras drogas
(no consumo e na fase de abstinência).

A irritabilidade, quando considerada em excesso, pode provocar


prejuízos em vários âmbitos da vida individual, tais como:

• Prejuízo em relacionamento interpessoal.


• Alterações na capacidade de desaceleração ou de
descanso do corpo, influenciando na qualidade de vida.
• Realização de algumas atividades laborais, como no caso
dos profissionais de segurança que portam armas.

230 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


A ocorrência de momentos de irritabilidade excessiva pode
provocar consequências bem graves devido ao uso de
armas de fogo, o que pode levar o indivíduo a agir de forma
explosiva e impulsiva.

Agressividade
O termo agressividade ainda hoje provoca discussões e
controvérsias entre os mais diversos teóricos da psicologia.
A agressividade é considerada por alguns como uma
tendência em agir ou responder de forma violenta, sendo
relacionado com o conceito de acometividade, isto é, a
propensão para acometer, atacar e criar confusão.

Sigmund Freud considerava a agressividade como


constituinte do sujeito, sendo considerada como diferente da
violência. Para ele, o ser humano nascia agressivo e, a partir
da influência da cultura, ele era “convidado” a conter sua
agressividade para, então, poder conviver em sociedade.

Figura 16:
Agressividade.
Fonte: Pixabay
(2020).

Agressividade, enquanto constituinte do indivíduo, também


é usada para fazer referência à determinação, ao espírito
empreendedor e à decisão de dar seguimento a algo e enfrentar
as dificuldades. No senso comum, a agressividade é vista de
forma pejorativa e associada, de modo geral, à violência.

231 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Mas como podemos diferenciar até que ponto essa
agressividade pode ser considerada “normal”?

Agressividade normal x agressividade desmedida


Os animais, em geral, possuem como uma das características
a agressividade, que é o que permite que eles tanto reajam
a situações como busquem sua sobrevivência. No caso dos
seres humanos, a agressividade pode ser considerada uma
característica do indivíduo, que está presente como traço de
sua personalidade.

Ao realizarmos uma avaliação psicológica,


buscamos investigar, entre outras coisas, os traços
de personalidade. Desse modo, haver a presença de
traços de agressividade num indivíduo não faz dele
alguém violento.

A agressividade, vista por este ponto, é considerada como


positiva, quando surge em consonância com traços de
estabilidade emocional, levando o indivíduo a ser combativo, a
buscar seus objetivos. Porém, no caso em que a agressividade
aparece associada à falta de controle, podemos considerar
que é algo preocupante, pois será possível a ocorrência de
respostas impulsivas e explosivas, das quais às vezes não
conseguimos avaliar as repercussões.

A presença da agressividade em si não pode ser


vista como negativa, porém, quando associada à
irritabilidade excessiva, pode ocasionar em perda
de controle.

No caso dos profissionais de segurança, é comum perceber


a existência de traços de agressividade, porém, quando essa
agressividade aparece de forma desmedida, o que pode ser

232 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


potencializado pela vivência de situações de estresse, as
reações decorrentes podem ser desastrosas.

Irritabilidade, falta de controle sobre os impulsos, presença de


explosões emocionais são, desse modo, consideradas como
preocupantes e, em muitos casos, provocadas por alterações
na qualidade de vida do indivíduo.

233 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Aula 2 – Compulsões

CONTEXTUALIZANDO...
As compulsões, de modo geral, podem ser descritas como
comportamentos com elevado número de repetições em
pequenos períodos de tempo. A etiologia das compulsões
pode estar relacionada tanto com desequilíbrios da vida
Estudo das causas
das doenças. pessoal e emocional do indivíduo quanto com transtornos
mentais como: transtorno depressivo, transtorno afetivo
bipolar, transtorno de ansiedade, dentre outros.

Nesse contexto, as compulsões também se apresentam como


um dos principais sintomas de adoecimento do profissional
de segurança pública. Então, seguiremos nossa aula pelo
conhecimento das compulsões.

AS COMPULSÕES
Em se tratando do público de profissionais de segurança,
devido às alteradas rotinas de sono, dificuldade na manutenção
das práticas de exercícios, dificuldade em manter uma
rotina alimentar adequada, convívio contínuo com situações
de estresse e violência, percebe-se uma maior incidência
de comportamentos compulsivos, o DSM-5 (AMERICAN
PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014) destaca principalmente os
relacionados ao financeiro e ao consumo abusivo de álcool e
drogas, que apresentam como consequência adoecimentos
por vezes bastante graves, sendo inclusive considerados como
fatores de risco para o comportamento suicida.

Vamos agora conhecer mais sobre algumas dessas compulsões.

Compulsões alimentares
Compulsão alimentar se refere ao consumo recorrente de
grande quantidade de alimentos em curto período de tempo,
vinculado ao sentimento de falta de controle sobre a ingestão
desses alimentos.

234 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


De acordo com o DSM-5 (AMERICAN PSYCHIATRIC
ASSOCIATION, 2014), os episódios de compulsão alimentar estão
associados a alguns aspectos. Veja-os na imagem a seguir.

1 Comer mais rapidamente que o normal.

2 Comer até se sentir desconfortavelmente cheio.

3 Comer grandes quantidades de alimento, mesmo


sem fome.

4
Figura 17: Aspectos
associados Comer sozinho por vergonha do quanto se está comendo.
à compulsão
alimentar.
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020). 5 Sentir-se desgostoso de si mesmo ou culpado em seguida.

Para consideração do diagnóstico, são necessários episódios


repetidos, pelo menos uma vez por semana, no decorrer de
pelo menos três meses.

É relevante ainda diferenciarmos a compulsão alimentar da


bulimia, devido a primeira não apresentar comportamentos
compensatórios como a segunda (expurgação – vômito
forçado). Há apenas a ingestão exacerbada e em curtos
períodos de tempo, e, mesmo com o sentimento de culpa
presente, não há outros comportamentos associados.

Ocorre tanto em indivíduos obesos como de peso normal,


porém é mais consistente quando associada ao sobrepeso,
além de ter incidência nos públicos de todas as idades.
A compulsão alimentar tem maior prevalência entre as
mulheres, os mais jovens e os solteiros.

235 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Palavra do Especialista
Segundo Sadock, Sadock e Ruiz (2017), não há causas
conhecidas da compulsão alimentar, porém há uma maior

 prevalência em estilos de personalidade impulsiva e


extrovertida, além de ocorrer durante períodos de estresse, nos
quais o consumo dos alimentos passa a ser usado para reduzir a
ansiedade ou aliviar o humor deprimido.

Gralle (2015), no que se refere ao estresse ocupacional


enquanto fator correlacionado à compulsão alimentar,


observou que há:

“[...] maior prevalência de compulsão alimentar entre

e mais baixos entre aqueles com baixa exigência.


Quanto às dimensões, a compulsão alimentar foi mais
prevalente entre aqueles com altos níveis de demandas

aqueles classificados como trabalho de alta exigência,

psicológicas, menor controle e menor apoio social no


trabalho.” (GRALLE, 2015, p. 42).

Elevados níveis de demandas psicológicas, baixo


reconhecimento e apoio social, além de trabalho de alta
exigência são fatores ligados à atividade dos profissionais de
segurança pública, o que remete à sua suscetibilidade a esse
tipo de transtorno.

A compulsão alimentar está associada a várias consequências


na vida pessoal, social e laboral do indivíduo, como: prejuízo
no desemprenho de papéis sociais, na qualidade de vida e na
satisfação com a vida relacionada à saúde, isolamento social
nos períodos de refeição, além de ganho de peso e obesidade.

Vejamos os tratamentos propostos para a compulsão


alimentar na imagem a seguir.

236 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Psicoterapia: bastante Grupos de mútua
recomendada devido ajuda: existem
à alta incidência de grupos de ajuda
compulsão alimentar para os mais
associada a atividades variados tipos
mais estressantes de transtornos
e com maiores Acompanhamento
nutricional: um alimentares, com
cobranças. Relevante boas respostas
também em decorrência acompanhamento
com a proposta terapêuticas.
Figura 18: da tendência de
Tratamento para isolamento social e de mudanças na
a compulsão da presença de baixa vida alimentar do
alimentar. Fonte:
autoestima associada. indivíduo pode
labSEAD-UFSC complementar o
(2020).
tratamento.

Além desses tratamentos destacados, ainda podemos


considerar a farmacoterapia.

Compulsões financeiras
As compulsões financeiras podem ser descritas como a
dificuldade em controlar gastos, usualmente promovendo
compras e mais compras, em sua maioria desnecessárias.

Na realidade capitalista em que vivemos, somos diariamente


convocados a nos deparar com a extensa disponibilidade
de produtos no mercado. O estímulo à competitividade e
a falta de educação financeira nas escolas provoca como
consequência a dificuldade dos indivíduos em manterem
equilíbrio em suas vidas econômicas.

O grande problema aqui é que o indivíduo


compulsivo geralmente procura buscar satisfação
naquele momento da compra, mas não para para
pensar se tem ou não dinheiro, gerando descontrole
e impactando negativamente sua vida financeira.

237 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


As causas da compulsão financeira podem ser as mais
variadas. Vamos conhecê-las na imagem a seguir.

Busca de satisfação instantânea e redução do


estresse: em muitos casos, as compras são realizadas
de modo a gerar sentimentos de “felicidade”
provisória, pois não é incomum a associação de fazer
compras com alívio da tensão, angústia.

Causas da Forma de recompensa: muitos buscam


compulsão comprar bens materiais como forma de
financeira preenchimento de um vazio existencial.

Não ter planejamento financeiro: algumas


pessoas iniciam comportamentos compulsivos
pelos motivos elencados acima, associados à
Figura 19: Causas
falta de preparação para planejar gastos e custos.
da compulsão
financeira. Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020).
As compulsões financeiras podem ainda estar associadas
a transtornos maiores como no caso do transtorno afetivo
bipolar, em que, no decorrer do episódio hipomaníaco há
comportamentos compulsivos, muito deles associados a
compras excessivas.

Figura 20:
Compulsão
financeira. Fonte:
Pixabay (2020).

Problemas financeiros geralmente estão associados a muitos


adoecimentos quando nos referimos aos profissionais da

238 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


segurança pública. Muitos dos profissionais relatam que os
problemas financeiros e comportamentos compulsivos têm
início desde o começo da carreira.

Há diversos relatos sobre falta de controle, endividamento e


comportamentos compulsivos, além do elevado número de
empréstimos que são realizados para tentar contornar esses
problemas, o que só piora a situação (MINAYO; FRAGA).

Os problemas financeiros aparecem ainda muitas vezes como


fatores de risco para comportamentos suicidas. Quando
há descontrole financeiro, é perceptível a ocorrência de
problemas no relacionamento conjugal e na família, além do
sentimento de impotência e da sensação de que não haverá
possibilidade de resolver a dívida (SOUSA; MIRANDA).

As dificuldades financeiras, além de


desestabilizarem as relações sociais, geram ainda
sentimentos de incapacidade e descontrole, que,
se não são acompanhados adequadamente, podem
servir de gatilhos para comportamentos autolesivos.

Os tratamentos propostos para a compulsão financeira são:

• Psicoterapia.
• Grupos de mútua ajuda: possibilidade de o indivíduo se
identificar com os demais, não se sentindo o único a
apresentar essa dificuldade.
• Acompanhamento financeiro: já ocorrem, em algumas
instituições de saúde, propostas de acompanhamento e
educação financeira para profissionais que apresentam
dificuldades em controlar sua vida econômica. No caso da
segurança pública, há programas em alguns estados que
promovem eventos de esclarecimentos e oferta de ajuda
para uma reorganização financeira.

239 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


• Farmacoterapia: no caso, no tratamento da doença de base
(transtorno de ansiedade, transtorno afetivo bipolar etc.).

USO ABUSIVO DE ÁLCOOL E DROGAS


Como já vimos durante o nosso processo de aprendizagem,
do ponto de vista emocional, os estudos levantados para esta
disciplina reafirmaram os efeitos do risco e do desgaste no
psiquismo dos agentes de segurança pública. As consequências
são as mais adversas e devemos ressaltar: o alcoolismo e uso
abusivo de drogas.

Inicialmente, ao falarmos sobre uso de substâncias, faz-se


necessário esclarecer que há uma diferença entre o uso nocivo de
substâncias e o uso dependente, pois nem todos que consomem
álcool ou outras substâncias psicoativas, como maconha e
cocaína, estarão em uso dependente (AMERICAN PSYCHIATRIC
ASSOCIATION, 2014; SADOCK; SADOCK; RUIZ, 2017).

No que diz respeito ao uso nocivo, podemos entendê-lo


conforme demonstrado na imagem a seguir.

Natureza do dano é
identificável: no consumo
nocivo, há percepção das
alterações causadas pelo
consumo das substâncias.

Uso Nocivo
Uso responsável
por dano físico ou
psicológico: o álcool e Não satisfaz critérios
Figura 21: Uso muitas das substâncias para dependência: há o
psicoativas geram, consumo, porém não há
nocivo de dependendo da quantidade
substâncias
indícios de dificuldade em
do uso e da substância controlar o uso.
psicoativas. Fonte: ingerida, efeitos físicos
labSEAD-UFSC e/ou psicológicos.
(2020).

240 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Em relação ao uso dependente, podemos conhecer suas
características na imagem a seguir.

Forte desejo ou compulsão para consumir a substância:

1 levando o sujeito a fazer o necessário para adquiri-la,


quando em quadros mais evoluídos da doença.

2 Falta de controle: o indivíduo não tem controle sobre


a substância, e por isso diz-se que será um alcoolista
(temos usado para dependentes do álcool) ou adicto
(termo usado para dependentes de substâncias,
anteriormente, dependentes químicos) em recuperação,
mesmo estando há muitos anos sem consumir.

3 Síndrome de abstinência: ocorre após a interrupção ou


redução da quantidade da droga ou substância de uso
regular durante um período prolongado. Caracteriza-se
por sinais e sintomas fisiológicos, além de alterações
psicológicas, como perturbações no pensamento,
sentimentos e no comportamento. São exemplos de
alterações decorrentes da síndrome: tremores, insônia,
náusea ou vômitos, alucinações ou ilusões visuais,
ansiedade e agitação psicomotora.

4 Desinteresse/ abandono de atividades: em decorrência


do uso contínuo, o indivíduo passa a evitar muitas das
atividades diárias que eram consideradas importantes
por ele anteriormente, levando ao aumento do número
de absenteísmo no trabalho e a falta de motivação para
atividades de lazer, tendo como prioridade o consumo
da substância.

241 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


5 Tolerância: fenômeno no qual, após a administração
repetida, uma determinada quantidade de droga possui
efeito diminuído, e o indivíduo necessita de doses cada
vez maiores das substâncias para atingir o prazer do
primeiro uso.

Figura 22: Uso


dependente de
substâncias.
6 Uso persiste mesmo acarretando consequências nocivas:
apesar da existência de comorbidades relacionadas ao
Fonte: labSEAD- uso, os indivíduos não param o consumo.
UFSC (2020).

É importante ressaltar que há situações nas quais há o


consumo sem que haja dependência, e outras em que não
é necessário ser dependente para apresentar problemas
relacionados ao consumo.

Outro ponto relevante diz respeito aos medicamentos


que, dependendo de como são utilizados, podem também
gerar dependência. Alguns medicamentos, como os
benzodiazepínicos, são mais comumente relacionados com a
possibilidade de dependência. Exemplos desses medicamentos
são os ansiolíticos, que apresentam elevado consumo por parte
da população, muitas vezes, inclusive, de modo indiscriminado.

Figura 23: Uso de


medicamentos
também
pode causar
dependência. Fonte:
Freepik (2020).

242 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Há vários relatos de profissionais de segurança que utilizam
medicamentos sem acompanhamento médico, e de forma a
tentar compensar os sintomas provenientes de alterações que
já se mostram presentes e acabam ficando camufladas pelo
uso. O grande problema disso é que, ao se automedicarem,
eles estão provocando reações no organismo que não estão
sendo acompanhadas da maneira adequada.

Nesse sentido, as alterações provocadas pelas drogas no


nosso psiquismo não são sempre no mesmo sentido e
direção, mas dependem do tipo de substância consumida.

Sadock, Sadock e Ruiz (2017) afirmam que, dependendo da


ação no cérebro, as drogas psicotrópicas podem ser divididas
em três grandes grupos: as depressoras, as estimulantes e as
perturbadoras. Vamos conhecê-las na imagem a seguir.

Depressoras

Diminuem a atividade cerebral, ou seja, deprimem seu


funcionamento e, por essa razão, são chamadas de “depressoras da
atividade do sistema nervoso central” (SNC). A pessoa que faz uso
desse tipo de droga fica “desligada”, “devagar”, “flutuando”.
São exemplos delas o álcool, os soníferos ou hipnóticos, os
ansiolíticos, os opiláceos ou narcóticos e os inalantes ou solventes.
Estimulantes

Aumentam a atividade do cérebro e recebem o nome técnico


de “estimulantes da atividade do SNC”. O usuário fica “ligado”,
“elétrico”. Entre as drogas desse tipo encontram-se a cocaína, o
crack, a nicotina (presente no cigarro), a cafeína e as anfetaminas.

Perturbadoras

Elas fazem com que alguns órgãos passem a funcionar fora de seu
normal, ou seja, a pessoa fica com a mente perturbada. São também
Figura 24: Efeitos
fisiológicos do uso
chamadas de alucinógenas. Algumas drogas desse tipo são de
de substâncias. origem vegetal como o THC (contido na maconha), a mescalina,
Fonte: labSEAD- certos tipos de cogumelos, lírio, trombeteira, e outras são de origem
UFSC (2020). sintética, como o LSD-25, o ecstasy e os anticolinérgicos.

243 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Os efeitos psicológicos do abuso de substâncias são os mais
variados e dependem da substância utilizada, da quantidade
e do tempo de uso. A partir da continuidade do uso, os efeitos
vão se intensificando. Por exemplo: alteração do sono,
alteração de humor, memória, irritabilidade, impulsividade,
alteração no apetite, entre outros.

Considera-se ainda que, quanto maior o grau de dependência do


indivíduo, maiores serão as complicações em vários setores de
sua vida social, amorosa, e profissional. Além da possibilidade
de surgimentos de outros transtornos psiquiátricos em
decorrência do uso dependente, há um acometimento de
prejuízos em todas as esferas da vida da pessoa, sendo
considerado, inclusive, como fator de risco para o suicídio
(AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014).

A dependência atinge não apenas o indivíduo que


faz uso da substância, mas também as pessoas
próximas dele. Em muitos casos, observamos o
que chamamos de codependência, que se refere
aos familiares afetados ou que influenciam
o comportamento do indivíduo que abusa de
substâncias. No caso do tratamento, ele deverá ser
estendido também a esses familiares, pois eles
também podem ser considerados em processo
de adoecimento, e interferem diretamente no
tratamento dos dependentes.

No tratamento de pessoa dependente (adicto), devem ser


considerados a substância utilizada, o tempo de uso e os
agravamentos físicos decorrentes do abuso da substância.
Em alguns casos, e em decorrência da síndrome de
abstinência, pode-se fazer necessária a internação do
paciente na fase inicial do tratamento.

244 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


O tratamento é para toda a vida, pois o adicto será
considerado sempre em recuperação, mesmo estando há
vários anos sem uso. Há pesquisas que mostram que recaídas
podem ocorrer no decorrer de toda a vida do indivíduo, sendo
mais comuns no início do tratamento, devido à dificuldade
inicial de, além de evitar o uso, não compreender ainda as
causas que o levaram à dependência, o que é essencial para
mudanças de comportamentos futuros.

Psicoterapia

Tratamento
Grupos Farmacoterapia
de apoio Multiprofissional (pelo menos inicial)

Figura 25:
Tratamento
multiprofissional Internamento
para pessoas (em alguns casos)
dependentes.
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020).

É relevante citar ainda a existência da Redução de Danos


(RD) como proposta de tratamento, a qual consiste em um
conjunto de políticas e práticas cujo objetivo é reduzir os danos
associados ao uso de drogas psicoativas em pessoas que
não podem ou não querem parar de usar drogas. A RD ainda

245 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


provoca bastantes discussões, mas já é utilizada em outros
países com respostas significativas dos pacientes.

Em relação ao uso dependente de medicações, é de extrema


importância que todos que sintam necessidade de fazer uso
de alguma medicação procurem o atendimento médico, em
busca de tratamento e acompanhamento mais adequados,
evitando, inclusive, outros problemas futuros.

Por fim, podemos entender que conhecer os principais


sintomas do adoecimento e dos transtornos mentais do
agente de segurança pública fará com que você possa
identificar a presença deles em seu corpo, de forma fisiológica
ou psíquica. Então, esteja sempre em alerta com você
mesmo para reconhecer suas necessidades e buscar ajuda
profissional o mais rápido possível. Você é um ser humano e
não será menos profissional por isso, muito pelo contrário.

246 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


Referências
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247 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


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248 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


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PIXABAY. [S.l.], 2020. Disponível em: https://pixabay.com/pt/.


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SADOCK, B. J.; SADOCK, V. A.; RUIZ, P. Compêndio de


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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA. Laboratório


da Secretaria de Educação a Distância (labSEAD-UFSC).
Florianópolis, 2020. Disponível em: http://lab.sead.ufsc.br/.
Acesso em: 10 fev. 2020.

249 • Módulo 4 Principais Sintomas do Adoecimento


MÓDULO 5

O SUICÍDIO

250 • Módulo 5 O Suicídio


Apresentação

Olá, cursista!

Dando continuidade aos nossos estudos sobre prevenção,


promoção e tratamento da saúde mental, neste módulo vamos
dar atenção ao suicídio por meio de reflexões que permitam a
nossa compreensão acerca desse ato. Assim, no decorrer das
aulas, você conhecerá o assunto, entenderá o comportamento
suicida e algumas diferenciações necessárias para os estudos
da área. Para compreendermos a realidade em que vivemos,
utilizaremos dados que refletem os casos de suicídio no
Brasil, principalmente entre os agentes de segurança pública,
e junto a isso refletiremos sobre os métodos utilizados.

Nesta proposta, você vai ter acesso a reflexões indispensáveis


para a compreensão do suicídio enquanto ato multifatorial,
bem como dos fatores que influenciam o surgimento de
comportamento suicidas e dos que diminuem a chance de os
indivíduos desenvolverem esse comportamento.

Neste módulo, vamos tratar o suicídio como um problema de


saúde pública, ideia que precisa ser levada em conta para que
sejam propostos programas eficazes que tenham como meta
principal limitar certos fatores de risco e maximizar os fatores
que reforçam a resiliência.

OBJETIVOS DO MÓDULO
Refletir sobre o suicídio e entender como ocorre o
comportamento suicida; conhecer os números que refletem
os casos de suicídio no Brasil e como os fatores de riscos
e os fatores de proteção funcionam, além de compreender
a discussão dentro da realidade dos agentes de segurança
pública no Brasil; por fim, visualizar o suicídio como um
problema de saúde pública e que é algo que pode ser evitado.

251 • Módulo 5 O Suicídio


ESTRUTURA DO MÓDULO

• Aula 1 – Entendendo o Comportamento Suicida.


• Aula 2 – O Comportamento Suicida: Fatores de Risco e
Fatores de Proteção.
• Aula 3 – O Suicídio entre Profissionais de Segurança
Pública no Brasil.

252 • Módulo 5 O Suicídio


Aula 1 – Entendendo o Comportamento
Suicida

CONTEXTUALIZANDO
O suicídio sempre existiu, sendo já observado nas sociedades
antigas com diferentes representações que variam de acordo
com a cultura, a sociedade e o período histórico. Assim, ao
longo dos anos, surgiram muitos estudos abordando o tema.

Nesse contexto, vamos entender um pouco mais sobre o


comportamento suicida, abrangendo aspectos sobre o tema,
principalmente, com os dados apresentados pela Organização
Mundial da Saúde.

INFORMAÇÕES INICIAIS E DADOS


ESTATÍSTICOS
Dentre os estudos mais relevantes sobre suicídio, estão a
obra O suicídio, publicada em 1897 por Émilie Durkheim e as
obras do pai da suicidologia, ciência que estuda o suicídio,
Edwin S. Shneidman.

Atualmente, o suicídio é considerado pela


Organização Mundial de Saúde (OMS) como um
grave problema de saúde pública, que ocorre em
todas as regiões do mundo e atinge países de alta e
de baixa renda, prevalecendo, porém, em países de
baixa e média renda, chegando a 79% dos casos.

Em 2014, a OMS divulgou seu primeiro relatório sobre o


suicídio no mundo, que buscava esclarecer sobre o que é o
suicídio, conscientizando a população sobre a importância das
tentativas e dos suicídios consumados para a saúde pública.
Segundo o relatório, o número de suicídios e de tentativas é
alarmante, confira!

253 • Módulo 5 O Suicídio


Figura 1: Número
de suicídios e de
tentativas, segundo
a OMS (2014).
Fonte: Pixabay
(2020), adaptado
por labSEAD-UFSC
(2020).

Outro objetivo do documento foi incentivar os países


a desenvolverem programas de prevenção ao suicídio,
considerando que 90% dos suicídios podem ser evitados.

Número de suicídios por ano:

65 mil nas
Américas

800 mil pessoas.


Figura 2: Número de suicídios anuais no mundo, segundo a OMS (2014).
Fonte: labSEAD-UFSC (2020).

254 • Módulo 5 O Suicídio


Esse número é preocupante, mas não reflete diretamente o
tamanho do problema a ser enfrentado. Por quê?

Porque, quando comparamos esses valores com o número de


indivíduos que tentaram o suicídio, percebemos que o dado se
torna ainda mais expressivo! Mas, ao mesmo tempo, devido
à dificuldade e ao estigma que existe ao redor do tema, os
números se tornam cada vez mais inconclusivos e de difícil
medida, considerando a falta de metodologia apropriada para
alcançarmos os dados.

Segundo a OMS (2018), para cada suicídio


consumado, há um número muito maior de pessoas
que o tentaram, pois a tentativa prévia é o fator de
risco mais importante para o suicídio na população, o
que será mais bem aprofundado no decorrer do texto.

Veja os métodos mais utilizados no mundo em tentativas


de suicídio.

Ingestão de pesticidas

Enforcamento
Figura 3: Métodos
mais comuns de
suicídio segundo a
OMS (2014). Fonte:
labSEAD-UFSC Uso de arma de fogo
(2020).

No caso dos agentes de segurança pública, o método mais


utilizado é por meio do uso de armas de fogo.

Ao contextualizarmos a situação do Brasil, considerando as


últimas três décadas, de acordo com o Sistema de Informação

255 • Módulo 5 O Suicídio


de Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde (MS), temos os
seguintes dados:

Taxa média nacional


de suicídios a cada
100 mil habitantes
1980 3,3

2011 5,1
Figura 4: Números
referentes ao
suicídio no Brasil,
2018 5,8
segundo dados
do Sistema de
Informação de
Mortalidade do
Ministério da
Saúde (2018). Fonte: 205.990
labSEAD-UFSC suicídios no Brasil nas
(2020).
últimas três décadas

Esses números vêm aumentando, acompanhados dos


crescentes números de homicídios e também de acidentes,
considerados como mortes por causas externas. Outros
dados nos revelam que o problema de suicídio e depressão no
Brasil está cada vez mais acentuado no decorrer das décadas,
vejamos na imagem a seguir.

256 • Módulo 5 O Suicídio


2017 – 5º lugar
no ranking mundial
de indivíduos com
depressão. 2017 – 1º lugar no
ranking latino-americano
de indivíduos com
depressão.

2014 – 8º lugar no
ranking dos países do
Figura 5: A mundo em número
posição do Brasil
nos rankings de suicídios.
de suicídio e
depressão. Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020).

O suicídio afeta não apenas o indivíduo que tira a própria


vida, mas pode ser considerado como uma tragédia que
afeta familiares, amigos, além da sociedade de modo geral,
deixando marcas duradouras em todos os que estão ao redor,
e podendo ainda influenciar na ocorrência de outras tentativas
e suicídios de pessoas próximas.

257 • Módulo 5 O Suicídio


Figura 6: O suicídio
deixa marcas
duradouras em
todos os que estão
ao redor. Fonte:
Pixabay (2020).

O suicídio é multicausal, e pode atingir pessoas de qualquer


idade, sexo, gênero, escolaridade, religião e situação
econômica. Porém, os suicídios entre jovens de 15 a 29 anos
têm alcançado números cada vez mais expressivos, sendo a
segunda principal causa de morte no mundo, no ano de 2016.

Podemos entender que o suicídio é um problema de


saúde pública, mas que pode ser prevenido. Segundo
evidências, a abordagem deve ser realizada no
momento adequado, através de intervenções, em sua
maioria, de baixo custo e de forma multissetorial, ou
seja, envolvendo diversos grupos da sociedade.

É essa multifatoridade do suicídio que precisa ser levada em


conta para que os programas sejam propostos de forma mais
eficaz, considerando que o suicídio pode acontecer tanto com
crianças quanto com adolescentes, adultos ou idosos, e pode
ocorrer nas casas, nas escolas, nos locais de trabalho, nos
locais de lazer. Por isso, a meta principal é eliminar ou mitigar
os fatores de risco e maximizar os fatores que reforçam a
resiliência dos indivíduos.

258 • Módulo 5 O Suicídio


Mas como podemos definir o suicídio? Vamos ver, a seguir, alguns
conceitos e discussões, para compreendermos as dificuldades
que envolvem o tema. Continue seus estudos e confira!

ENTENDENDO O SUICÍDIO
O suicídio é considerado como a consequência final de
vários fatores que se acumulam na vida de um indivíduo, um
somatório de frustrações e problemas decorrentes de várias
áreas da vida de uma pessoa.

Podemos definir o suicídio como um ato consciente,


intencional e deliberado, executado pelo próprio
indivíduo, tendo como intenção a morte, usando um
instrumento ou meio que acredite ser letal.

Como vimos, trata-se de um ato que tem natureza multifatorial


e pode ser evitado na grande maioria dos casos.

Sociais Culturais

Biológicos Genéticos

Figura 7: O suicídio
é o resultado de
uma complexa MULTIFATORIAL Ambientais
interação de vários Psicológicos
fatores. Fonte: ABP
(2014), adaptado
labSEAD-UFSC
(2020).

Nesse sentido, um dos fatores que mais prejudicam na


prevenção ao suicídio é o estigma relacionado ao assunto.

259 • Módulo 5 O Suicídio


O suicídio sempre aconteceu no decorrer da
história, mas, por questões religiosas, morais e
culturais, foi considerado como “pecado” por muito
tempo, criando um estigma em torno do tema que
dificultava comunicação de maneira adequada.

Ainda nos dias de hoje, por mais que o suicídio esteja mais
evidente e sendo mais discutido, existe muita dificuldade em
se falar sobre o tema.

Palavra do Especialista
Conforme relata Botega (2015), há ainda muito desconhecimento
sobre o suicídio, sobre comportamentos suicidas e sobre tudo
 o que envolve o assunto, pois o suicídio provoca nas pessoas
(parentes, amigos, colegas) vários sentimentos, entre eles, o de
culpa sobre o que poderia ter sido feito para evitar o ato.

Compreendemos ainda que outro fator que dificulta uma


melhor compreensão do suicídio: a dificuldade de acesso
aos dados sobre esse fenômeno. Não é possível saber se a
falta de acesso aos dados deve-se ao estigma em se tratar
sobre o assunto, como dito anteriormente, ou à dificuldade em
detectar adequadamente a causa da morte, quando se trata
de mortes violentas (homicídios, suicídios e acidentes).

Desse modo, para podermos propor estratégias de


prevenção, será necessário antes realizarmos uma
explanação sobre o comportamento suicida, fatores de
risco, fatores de proteção e como se dá a ocorrência dos
suicídios em cada sociedade, a fim de compreendermos esse
fenômeno que, por si só, é tão complexo.

260 • Módulo 5 O Suicídio


COMPORTAMENTO SUICIDA
O comportamento suicida engloba desde o pensamento sobre
a realização do ato de tirar a própria vida até o planejamento,
tentativa e, em alguns casos, consumação.

Para que você tenha uma compreensão melhor, vamos


apresentar a diferença entre: ideação suicida, tentativa de
suicídio e suicídio consumado. Veja na imagem a seguir.

1
Ideação suicida

Ideação é pensar, considerar ou até planejar o suicídio. Há


também o “pensamento suicida”, em que o indivíduo passa a
imaginar ou considerar a real possibilidade de pôr fim à sua
vida. Quanto mais elaborado for esse pensamento, maior deve
ser a atenção dada, visto que, em muitos casos, observa-se o
pensamento associado ao planejamento sobre a execução do ato.

2
Tentativa de suicídio

A tentativa é o ato de autoagressão cuja intenção é a morte,


mesmo que ela não ocorra. A tentativa pode ou não ocasionar
lesões, como nos casos de tentativa por ingestão de remédios
em uma quantidade menos efetiva. É relevante aqui fazer uma
diferenciação entre tentativa de suicídio e automutilação não
suicida, pois a segunda não tem como objetivo a morte, como no
Figura 8: Diferença
caso de arranhões nos braços, nas pernas, queimar a si mesmo
entre conceitos. com cigarros, dentre outros.
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020). 3
Suicídio consumado

Quando o ato intencional de autoagressão tem como consequência


a morte.

261 • Módulo 5 O Suicídio


A compreensão do fenômeno do suicídio acontece a partir
do entendimento sobre possíveis comportamentos suicidas,
associado ao que compreendemos como fatores que podem
influenciar positiva ou negativamente para a ocorrência do ato.

Esses fatores são conhecidos como fatores de proteção e fatores


de risco. Para entendê-los, continue seus estudos e confira.

262 • Módulo 5 O Suicídio


Aula 2 – O Comportamento Suicida:
Fatores de Risco e Fatores de Proteção

CONTEXTUALIZANDO...
Como vimos na aula anterior, a compreensão do fenômeno
do suicídio acontece a partir do entendimento sobre
possíveis comportamentos suicidas, associado ao que
compreendemos como fatores que podem influenciar positiva
ou negativamente para a ocorrência do ato.

Então, a partir de agora, vamos entender mais sobre os fatores


de risco de proteção relacionados aos comportamentos suicidas.

SUSCETIBILIDADE AO SUICÍDIO
Embora haja uma vinculação entre suicídio e distúrbios mentais,
como depressão, abuso de álcool e drogas ou esquizofrenia,
em países de alta renda, a maioria dos casos ocorrem de forma
impulsiva, em decorrência de um momento de crise.

Normalmente esses momentos são relacionados a fatores


emocionais, como o fim de relacionamentos amorosos,
problemas financeiros, doenças, ou mesmo dificuldade em
lidar com as situações estressoras da vida.

Quanto menor é a capacidade do indivíduo de reagir


às adversidades da vida e seguir em frente, maior é
a suscetibilidade dele ao adoecimento e até mesmo
a comportamentos suicidas.

Além das crises e dificuldades do mundo cotidiano, outros


conflitos gerados por situações de desastres, violência,
abusos e perdas podem levar a um sentimento de isolamento
físico e social, sendo considerados fatores que podem
influenciar na presença de comportamentos suicidas.

263 • Módulo 5 O Suicídio


Figura 9:
Fatores sociais
influenciam em
comportamentos
suicidas. Fonte:
Pixabay (2020).

Um exemplo dessas influências foi o aumento na elevação


nos números de suicídio, divulgados pela secretaria de
saúde local, após o desastre de Brumadinho. Nesse sentido,
podemos citar também vivências que envolvem situações de
violência física, sexual e de abandono, entre outras.

Tais números sofrem uma acentuação quando pensamos em


grupos que são considerados socialmente como vulneráveis
ou minorias.

264 • Módulo 5 O Suicídio


A discriminação, a segregação social e a
violência contra essas pessoas só aumentam a
possibilidade de suicídios, sendo considerada três
vezes maior do que no público em geral.

Figura 10: Grupos onde há aumento nos índices de tentativas e também de


consumação do suicídio. Fonte: OMS (2014), adaptado labSEAD-UFSC (2020).

A prevenção ao suicídio diz respeitos aos fatores de risco e de


proteção, conforme apontam os autores da área. Confira:

Palavra do Especialista
É uma perspectiva comum entre autores e órgãos de
representantes da saúde, como a Organização Mundial da Saúde
(2000), Organização Pan-Americana da Saúde, Botega (2006),
 Sousa (2016), que a prevenção do suicídio acontece por meio de
reforço dos fatores que são chamados protetores, e diminuição
dos fatores de risco, tanto no que se refere ao indivíduo quanto
ao que se refere ao coletivo.

Em geral, esses fatores não atuam como impedimento de


ocorrência de suicídio, mas, segundo os autores, servem de
proteção, minimizando adoecimentos e tentativas de suicídio.
Porém, sabemos que, dependendo do tipo de sociedade, esses
fatores podem ainda atuar como fatores de proteção ou de
risco, como é o caso da religião.

265 • Módulo 5 O Suicídio


Figura 11: Fatores
de proteção como
fatores de risco.
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020).

Outro exemplo que podemos citar é no que se refere ao grau


de independência que é estimulado aos indivíduos.

Figura 12: Grau de


independência do
indivíduo como
influência. Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020).

pertencimento O sentimento de
O isolamento, pertencimento
por outro lado, é um fator
deixa o sujeito que pode ser
mais vulnerável considerado
e é considerado como protetor.
fator de risco. isolamento

266 • Módulo 5 O Suicídio


Sociedades que estimulam a dependência e a vida coletiva
podem atuar como fatores protetivos, diminuindo os índices
de suicídio. Já as que estimulam a independência e a
autossuficiência podem perpetuar a ideia de pedir ajuda como
um sinal de fraqueza, aumentando os índices de suicídio.

FATORES DE RISCO
Vamos entender como funcionam os fatores de risco para o
suicídio. São cinco fatores principais que vão constituir nossa
reflexão ao longo desta aula: fatores sociodemográficos, fatores
sociais, fatores psicológicos, condições clínicas incapacitantes e
transtornos mentais. Além desses fatores, temos o principal fator
de risco para o suicídio: a tentativa prévia.

Pacientes que já tentaram suicídio anteriormente


apresentam de cinco a seis vezes mais chance de
tentar o suicídio novamente, pois acredita-se que
50% dos que consumaram o suicídio já haviam
tentado anteriormente.

A seguir, vamos aprofundar os demais fatores de risco, sem


esquecer que o suicídio é multicausal, ou seja, não acontece
por apenas um fator específico.

Fatores sociodemográficos
Os fatores sociodemográficos são: sexo, idade, situação
financeira, situação laboral, residência urbana ou rural e
estado civil, os quais estão representados na figura a seguir.

267 • Módulo 5 O Suicídio


Sexo: As mulheres tentam mais o suicídio, mas o índice
de mortalidade é maior entre os homens, devido à
utilização de métodos mais letais.

Idade: As faixas etárias que apresentam os índices mais


elevados são indivíduos de 15 a 35 anos e acima de 75
anos, porém, ainda prevalecendo o suicídio entre jovens.

Situação financeira: Houve um aumento nos índices de


suicídio em pessoas com condições financeiras extremas.

Residência:Apesar de haver um número relevante de


suicídios de agricultores por meio de agrotóxicos, em geral,
residir em área urbana aparece como fator de risco.

Situação laboral: O desemprego aparece como um


fator de risco, que é mais relevante quanto mais
recente for a saída do emprego.

Aposentados: Há indícios que a aposentadoria/ reserva


apresenta-se como fator de risco, principalmente
devido à sensação de inutilidade que pode vir
associada a essa finalização da atividade laboral.

Estado civil: Os índices de pessoas que cometeram


suicídio solteiras é maior do que em pessoas casadas
Figura 13: Fatores
sociodemográficos. ou que possuem um relacionamento amoroso fixo.
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020).

268 • Módulo 5 O Suicídio


Podemos destacar também o fenômeno multicausal.
Então, nesse contexto, veremos a seguir como os fatores
sociais podem desencadear também o surgimento de
comportamentos suicidas.

Fatores sociais
O ser humano é social, e sua ligação a outros indivíduos e grupos
ou separação destes pode ser percebida como fator de risco.

Figura 14:
Isolamento do
contexto social
pode ser sinal
de fator de risco.
Fonte: Pixabay
(2020), adaptado
por labSEAD-UFSC
(2020).

No século XIX, o sociólogo Emile Durkheim assinalou,


em sua obra O suicídio, acerca da necessidade humana
de vínculos sociais, colocando como risco o isolamento
social do indivíduo, pois, quanto mais isolado e menos se
sentir pertencente a grupos sociais, maior é a tendência do
aparecimento de adoecimentos e pensamentos suicidas.

Fatores psicológicos
O suicídio geralmente não se dá de forma inesperada, mas
isso também pode ocorrer em poucos casos.

Em geral, o comportamento suicida se inicia a partir


da ideação suicida, com o pensamento, intenção,
e apenas após um planejamento de execução,
que pode ser imaginário ou até se dar como uma
preparação que culmina no ato suicida.

269 • Módulo 5 O Suicídio


Mas essa organização nem sempre se apresenta dessa forma,
e por isso o comportamento suicida pode ser influenciado por
inúmeras variáveis.

Palavra do Especialista
Para compreendermos os fatores psicológicos ligados
ao suicídio, faz-se necessária a explanação sobre as três
 características próprias do estado em que se encontram a
maioria das pessoas sob risco de suicídio, conhecidas como os
“tentantes” (pessoas que tentaram o suicídio) (SOUSA, 2018).

Essa identificação acerca do estado em que se encontram


será extremamente importante, principalmente na forma de
conduzir o atendimento às tentativas de suicídio (BOTEGA,
2015). As características são diversas, conforme podemos
observar na imagem a seguir.

1
Ambivalência

É a atitude mais comum presente em pessoas com


comportamentos suicidas, que, ao mesmo tempo querem morrer,
mas também querem viver. O dado da OMS que relata que 90%
dos suicídios podem ser evitados se baseia, principalmente, na
presença desta atitude. Por mais problemas e dores que o indivíduo
esteja vivenciando, o desejo de vida prevalece sobre o desejo de
morte quando esse consegue ser alcançado e apoiado no momento
adequado. Ressalta-se ainda que, após a tentativa, caso seja dado o
apoio adequado (com acompanhamento psicológico, psiquiátrico, e
encaminhamentos), diminui-se o risco de novas tentativas.

2
Impulsividade

Algumas vezes o suicídio ocorre a partir de um ato impulsivo,


o que pode ser algo rápido, que ocorre em questão de minutos,

270 • Módulo 5 O Suicídio


ou que leve até horas, mas que esteja vinculado a uma reação
menos planejada. Em geral, a contenção do indivíduo no
momento de sua crise e do desespero (porque muitas vezes
o suicídio é um ato de desespero) pode evitar a consumação.
Nesses casos, a crise suicida geralmente está associada a
fatores recentes, ocorridos no mesmo dia ou próximo.

3
Rigidez/constrição

Nesses casos, o indivíduo passa a funcionar de modo rígido, em que


os pensamentos, sentimentos e ações são limitadas ao suicídio.
O indivíduo passa a ver como única solução o suicídio, e tem mais
dificuldades de perceber demais soluções para os problemas, e o
único caminho passa a ser a morte. Parecida com essa condição é a
chamada ‘visão de túnel’, em que ocorre o estreitamento das opções
de saídas. Nos casos em que prevalece a característica da rigidez,
percebemos que há maior dificuldade de diálogo e de auxílio a quem
está tentando se matar, conforme relatado na obra Abordagem na
Tentativa de Suicídio, de 2018.

Figura 15: Características percebidas nas tentativas de suicídio.


Fonte: labSEAD-UFSC (2020).

Nos comportamentos suicidas, existe uma distorção do modo


como o indivíduo percebe a realidade presente, passada e futura,
avaliando de forma negativa tudo o que há em si e no mundo.

Há uma presença de sentimentos recorrentes nos


comportamentos suicidas, causados pela distorção da
realidade enfrentada pelo indivíduo.

271 • Módulo 5 O Suicídio


Figura 16:
Sentimentos
recorrentes em
comportamento
suicidas. Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020).

Há também sentimento de algo intolerável (não suportável),


inescapável (sem saída), interminável (sem fim), além de um
medo irracional e uma preocupação excessiva.

A junção desses sentimentos e pensamentos


pode culminar no ato suicida, pois o modo como
o sujeito vai tomar suas decisões também estará
comprometido o suficiente para justificar a decisão
por tal ato.

Percebemos ainda a associação de atos de suicídios com


a ocorrência de eventos como perdas recentes, vivência de
alguma situação de violência, perdas de figuras parentais
na infância, conflitos familiares, datas importantes e
personalidade com traços significativos de impulsividade,
agressividade e humor instável.

Condições clínicas incapacitantes


Outro fator que também pode ser considerado de risco é
a existência de doenças e quadros clínicos considerados
incapacitantes parcial ou totalmente. Segundo Soares
(2019), é o caso de algumas doenças, que verificamos na
imagem a seguir.

272 • Módulo 5 O Suicídio


Doenças orgânicas incapacitantes:
tuberculose ativa, alienação mental,
esclerose múltipla, neoplasia maligna,
cegueira, hanseníase, cardiopatia grave,
doença de parkinson, entre outras.

Doenças Doenças crônicas:


e quadros provocadas por doenças como artrites,
câncer, doenças degenerativas.
clínicos como
fatores de
risco Lesões desfigurantes perenes.

Epilepsia.

Figura 17: Doenças


e quadros clínicos Traumas medulares.
como fatores
de risco. Fonte:
labSEAD-UFSC Aids.
(2020).

Todas as condições citadas apresentam como consequência


a existência de situações de desconforto ou dor, além
da perda de autonomia do paciente (parcial ou total), há
ainda a vivência de situações em que o prognóstico não é
considerado positivo, de melhoria para o paciente.

Transtornos mentais
Assim como os fatores anteriores, os transtornos mentais não
estão presentes em todos os casos de suicídios consumados,
mas, segundo estudos, há a associação de transtornos mentais
em uma grande parcela dos casos. Veremos a seguir os
transtornos com maior grau de congruência com o suicídio.

Transtornos de humor
Entre os transtornos de humor mais associados ao ato suicida
encontram-se: o transtorno depressivo e o transtorno afetivo
bipolar (TAB).

273 • Módulo 5 O Suicídio


• Transtorno depressivo
O transtorno depressivo pode iniciar em decorrência de
outras situações de adoecimento clínico ou psíquico, além
de poder ser provocado por situações estressantes, perdas
inesperadas (emprego, entes queridos etc.) ou mudanças
maiores na vida do indivíduo.

Esse transtorno é mais comum em mulheres (10 a 25%)


que em homens (5 a 12%) e pode aparecer pela primeira vez
em qualquer idade, mas a probabilidade de início aumenta
sensivelmente com a puberdade, em torno dos 20 anos.
Porém, pode haver casos em que o primeiro episódio acontece
já em idade avançada. Assim, quanto mais precoce é o
tratamento, mais rápida será a remissão dos sintomas e


menor será a chance de cronificação do quadro.

“É caracterizado por episódios distintos com


duração de pelo menos duas semanas de duração
(embora a maioria dos episódios dure um tempo
consideravelmente maior), envolvendo alterações
nítidas no afeto, na cognição e em funções

neurovegetativas.” (AMERICAN PSYCHIATRIC
ASSOCIATION, 2014, p. 156).

Para o diagnóstico adequado, será necessário avaliar a


apresentação dos sintomas, tomando como referência o
tempo que eles perduram.

274 • Módulo 5 O Suicídio


Figura 18: Sintomas
mais comuns
do transtorno
depressivo. Fonte:
Pixabay (2020),
adaptado por
labSEAD-UFSC
(2020).

O transtorno depressivo pode ser dividido em: leve, moderado


e grave, sendo importantes para a classificação a duração dos
sintomas, a intensidade e a interferência dos sintomas na vida
cotidiana do indivíduo.

Figura 19: Grau


de intensidade
dos transtornos Leve Moderado Grave
depressivos. Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020).

Quando há a existência de ideações suicidas, independente


dos sintomas associados, podemos classificar o transtorno
como grau grave.

Uma forma mais crônica de depressão é o transtorno


depressivo persistente, conhecido por distimia.
A distimia difere do transtorno depressivo devido ao
tempo de persistência dos sintomas, que pode durar
até dois anos em adultos e um ano em crianças.

Mas é importante fazer uma ressalva sobre a diferenciação da


tristeza e do luto normais em relação a um episódio depressivo

275 • Módulo 5 O Suicídio


maior, pois, embora ambos provoquem um grande sofrimento,
não podem ser caracterizados como depressão. Em episódios
depressivos maiores, a possibilidade de comportamento
suicida existe permanentemente.

Entre os
gravemente
deprimidos, 15%
se suicidam

66,6% 2/3 das pessoas


tratadas
respondem
satisfatoriamente
ao primeiro
antidepressivo
prescrito.

15%
Figura 20:
Diferenciação da
tristeza e do luto. O tratamento da depressão demora, em geral, de cerca de
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020). duas a três semanas para início de ação dos antidepressivos,
período em que pode ser utilizado ansiolítico em associação
para auxiliar nessa fase inicial. Após a remissão dos sintomas,
é fundamental dar continuidade ao tratamento, o que
chamamos de fase de manutenção.

Figura 21:
Temporariedade
relacionada ao
tratamento com
ansiolíticos. Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020).

276 • Módulo 5 O Suicídio


O início do tratamento, quando ocorre logo que aparecem
os sintomas, representa um forte determinante para que o
processo de recuperação seja bem-sucedido e a remissão
ocorra em menor espaço de tempo. O risco de recorrência é
maior quando a intensidade do episódio anterior foi grave ou
em caso de idade avançada.

• Transtorno afetivo bipolar (TAB)


As pessoas que possuem esse transtorno geralmente
vivenciam episódios maníacos, depressivos e/ou mistos no
decorrer de suas vidas. Sua prevalência na população geral
gira em torno de 1,5%. Apesar da cronicidade do quadro, a
maior parte dos indivíduos corretamente tratados atinge a
estabilização do humor e consegue levar uma vida normal.

Este transtorno geralmente necessita de um pouco


mais de tempo para que o diagnóstico seja fechado,
porque nem sempre o indivíduo apresenta tão
claramente ambas as fases maníaca e depressiva.

O episódio maníaco é um período distinto de humor anormal e


persistentemente elevado, expansivo ou irritável, acompanhado
de aumento da atividade e agitação, com duração de pelo
menos uma semana e presente na maior parte do dia.

Figura 22: Episódio


maníaco é um
período de humor
anormal. Fonte:
Pixabay (2020).

277 • Módulo 5 O Suicídio


Em geral, pode ser caracterizado por humor eufórico,
excessivamente alegre ou elevado, percebido como
entusiasmo ilimitado e indiscriminado para interações
interpessoais, sexuais e profissionais.

Para o estabelecimento adequado da classificação, devem


estar presentes três ou mais dos sintomas num grau
significativo. Observe a imagem a seguir.

Autoimagem inflada ou
grandiosidade

Pôr-se em situações de
Pensamento de grandeza
risco (inadequação social,
hipersexualidade, compras
inadequadas)

Agitação Classificação do Menor necessidade


psicomotora humor eufórico de sono

Hipotenacidade Fala exacerbada


(dificuldade de concentração) (logorreia)

Aumento da velocidade do
pensamento
Figura 23:
Classificação do
humor eufórico. Assim, para o estabelecimento do diagnóstico, faz-se
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020). necessário que o indivíduo tenha apresentado pelo menos um
episódio maníaco ao longo da vida.

Em relação às características do episódio depressivo,


podemos destacar que são as mesmas características
esclarecidas no transtorno depressivo. A média de início
do primeiro episódio ocorre por volta dos 18 anos, porém
também pode ocorrer em crianças. Segundo o Manual de

278 • Módulo 5 O Suicídio


Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (AMERICAN
PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014), há uma relação entre
episódios maníacos e episódios depressivos em indivíduos e
uma relação dessas doenças com o suicídio.

Palavra do Especialista
Mais de 90% dos indivíduos que tiveram pelo menos um

 episódio de mania terão episódios recorrentes de humor.


Indivíduos que apresentam transtorno bipolar têm 15 vezes mais
risco de consumarem o suicídio do que a população em geral.

Assim como ocorre no transtorno depressivo, o TAB incide


com mais frequência em indivíduos do sexo feminino.
Episódios depressivos e transtornos decorrentes do uso de
álcool também acometem mais mulheres.

O TAB é associado a um maior risco de suicídio, especialmente


nas fases de depressão e nos casos de ciclagem rápida,
quando o indivíduo muda rapidamente de humor. Segundo
o DSM-5 (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014), o
tratamento mais comum se dá a partir de psicoterapia, em
associação a acompanhamento psiquiátrico.

Palavra do Especialista
Geralmente o lítio é a primeira opção para o tratamento,
porém, deve ser administrado com cuidado, pois a ingestão
 excessiva de lítio pode ser fatal. Por isso, em casos de risco
de suicídio, é aconselhável que alguém próximo do paciente
controle a medicação.

A classificação do transtorno afetivo bipolar se subdivide


em transtorno bipolar tipo I e transtorno bipolar tipo II,
que dependerá da presença maior ou menor de episódios
depressivos e episódios maníacos, e do modo como ocorrem.

279 • Módulo 5 O Suicídio


Transtornos relacionados a substâncias e
transtornos aditivos
Os transtornos relacionados a substâncias compreendem o
uso de vários tipos de substâncias, entre elas: álcool, cafeína,
alucinógenos, inalantes, sedativos, estimulantes, entre outras.

Essas substâncias possuem em comum a


capacidade de ativar o que chamamos de “sistema
de recompensa” do cérebro, levando o indivíduo
a negligenciar atividades normais. Inicialmente,
e dependendo da quantidade, elas produzem
recompensas diferentes, na forma de prazer.

Porém, indivíduos com baixo nível de autocontrole podem


ser predispostos a desenvolver transtornos por uso de
substâncias. Entre as substâncias citadas, a que afeta um
maior número de pessoas é o álcool, principalmente quando
consideramos que, além de ser permitida por lei, é socialmente
aceita, e inclusive estimulada, quando consideramos a
população jovem brasileira.

Figura 24: O álcool


afeta um maior
número de pessoas.
Fonte: Pixabay
(2020).

O uso nocivo de álcool tem atingido populações cada vez mais


jovens e seu consumo está atrelado a questões sociais de

280 • Módulo 5 O Suicídio


pertencimento, e, em casos mais graves, vinculado a situações
de conflito e violência. Uma parte importante das doenças
clínicas atendidas na atenção primária, ou que requerem
internação hospitalar, é consequência ou condição agravada
por tais padrões de uso.

No caso do álcool, cerca de 11,2% da população


brasileira pode ser considerada dependente dessa
substância. O número de pessoas que faz uso
nocivo, ou seja, sem dependência, mas que afeta a
saúde, é ainda maior.

O transtorno por uso de álcool também pode vir associado


ao consumo de outras substâncias, às vezes não sendo a
substância de dependência principal. Problemas de conduta,
depressão, ansiedade e insônia também são frequentemente
acompanhados pelo consumo intenso da substância, e às
vezes até o antecedem. Fatores de risco para o transtorno
incluem alguns aspectos. Vejamos na imagem a seguir.

ATITUDES
CULTURAIS

ESTRESSE DISPONIBILIDADE

Figura 25: Fatores


de risco para o
transtorno de
uso abusivo de
substâncias. Fonte:
labSEAD-UFSC EXPERIÊNCIAS
PREÇO
(2020). PROFISSIONAIS

281 • Módulo 5 O Suicídio


Quando o indivíduo está num ambiente onde há consumo
intenso e tem expectativas exageradas em relação ao efeito,
como ficar mais espontâneo, menos introvertido, fugir dos
problemas ou enfrentá-los de formas inadequadas, isso pode
vir a se transformar em um problema.

Na população em geral, e especificamente na


população que atua com segurança pública,
percebemos um elevado uso de álcool, muitas vezes
justificado como válvula de escape para as situações
de estresse cotidianas, ou mesmo para os problemas
familiares existentes.

A dependência do álcool também está relacionada a faltas


no trabalho e à diminuição da capacidade laboral, além de
aumento da irritabilidade, alteração no humor e elevação de
respostas impulsivas, o que eleva o risco de suicídio.

Existem atualmente diversos questionários criados pelas


instituições de saúde que buscam melhor diagnosticar e
diferenciar o uso nocivo do uso abusivo. Dois exemplos são o
ASSIST e o AUDIT.

O transtorno por uso de álcool afeta o indivíduo nos níveis


fisiológico, comportamental e cognitivo, quando o uso de uma
substância alcança prioridade na vida do indivíduo, mesmo que
ele tenha dificuldade em se reconhecer enquanto dependente.

Pelo menos três dos seguintes critérios devem estar presentes


no último ano para identificação do transtorno. Identifique-os
na imagem a seguir.

282 • Módulo 5 O Suicídio


Forte desejo ou compulsão pelo consumo (com
dificuldade de controle após o início do consumo).

Sinais e sintomas
de abstinência
quando o uso cessa
ou é reduzido, ou
uso da substância
Persistência do Identificação do para evitar ou
uso a despeito de transtorno por aliviar sintomas de
consequências que abstinência.
causem mal.
uso de álcool

Evidência de
tolerância.

Abandono de atividades e interesses em favor do


uso da substância.

Figura 26: Critérios


presentes que Inicialmente, o consumo se dá de forma mais controlada, e
identificam o
transtorno por uso o indivíduo consegue manter o controle sobre o consumo.
de álcool. Fonte:
No decorrer da instalação da dependência, há uma
labSEAD-UFSC
(2020). tendência a perder esse controle e ampliar o consumo para
horários e momentos não adequados, comprometendo as
atividades diárias.

Outro fator é que, quanto maior a dependência, maior será


a necessidade de consumo do álcool, além da tendência de
buscar bebidas com teor alcoólico cada vez maior.

No que se refere ao tratamento da dependência do álcool,


é importante considerar a existência da síndrome de
abstinência, que é um importante fator que desencadeia
recaída. A partir da retirada do álcool, o sujeito pode
apresentar vários sintomas físicos e psíquicos, tais como os
apresentados na imagem a seguir.

283 • Módulo 5 O Suicídio


Tremores

Boca seca

SINTOMAS
APRESENTADOS
Complicações
clínicas DEPOIS DE RETIRADA Agitação
DO ÁLCOOL NO
ORGANISMO

Convulsão Insônia

Figura 27: Sintomas


apresentados Alucinação
depois de retirada
do álcool no
organismo. Esses sintomas, entre outros, caso não sejam considerados e
Fonte: labSEAD- tratados da forma adequada, atrapalharão o tratamento
UFSC (2020).
do transtorno.

A dependência do álcool é relativamente difícil de


ser tratada devido primeiramente à dificuldade de
percepção da condição de dependência, o que se torna
mais relevante ainda quando consideramos agentes
de segurança, que possuem no imaginário o herói que
não pode falhar, e nem se mostrar como fraco.

É relevante que, no momento do tratamento, o indivíduo possa


ser esclarecido sobre as complicações, além de poder identificar
o transtorno como um adoecimento, que precisa, antes de
qualquer coisa, da aceitação para que a situação seja mudada.

284 • Módulo 5 O Suicídio


Não é conveniente confrontar o paciente, pois, ao invés de
ajudá-lo, irá apenas aumentar a resistência sobre o tratamento.

Em alguns casos, é necessária a internação para que


o paciente consiga, pelo menos inicialmente, lidar de
forma mais adequada com a síndrome de abstinência,
para só então conseguir iniciar a compreensão sobre o
adoecimento e busca de tratamento.

O tratamento é realizado a partir de atendimentos com


psicólogo, psiquiatra, além da possibilidade de participação
em grupos de apoio, como o Alcoólicos Anônimos (AA).
No caso de transtornos relacionados ao uso de outras
drogas, percebemos uma elevação do consumo de drogas
como cocaína, crack e maconha por parte dos agentes de
segurança, o que vem gerando preocupação por parte das
instituições de saúde. A preocupação em relação ao consumo
dessas substâncias deve-se ao fato de que, diferentemente
do álcool, elas não são facilmente detectáveis, dificultando
inclusive a ajuda a essas pessoas.

A dependência do álcool também está associada a vários


transtornos psiquiátricos, sendo responsável por uma boa
parte das internações psiquiátricas, quando em nível de
dependência mais elevado.

Esquizofrenia
No senso comum, a esquizofrenia é muitas vezes associada
ao que conhecemos como “loucura”, devido à presença de
alucinações e delírios. É importante esclarecermos que,
dependendo do grau do transtorno e de um tratamento
adequado, indivíduos com esquizofrenia podem dar
continuidade às suas atividades normalmente.

285 • Módulo 5 O Suicídio


A prevalência da esquizofrenia
situa-se ao redor de 1% da
Figura 28:
Prevalência da
população.
esquizofrenia ao
redor da população
mundial. Fonte:
Freepik (2020),
adaptado por
labSEAD-UFSC
(2020).

As características psicóticas da esquizofrenia costumam


surgir entre o fim da adolescência e meados dos 30 anos,
tendo como idade de pico os 20 anos. A incidência tende a ser
maior no sexo masculino que no feminino.

É preciso diferenciar a esquizofrenia de outros transtornos


psicóticos, pois essa diferenciação será relevante para o
tratamento. Para fazer o diagnóstico da esquizofrenia, é
preciso que haja a ocorrência de determinados sintomas
no espaço de tempo de um mês ou mais. Assim, podemos
considerar como esquizofrenia indivíduos que apresentam
dois ou mais sintomas descritos na imagem abaixo.

Figura 29: Sintomas Sintomas negativos: expressão emocional


de esquizofrenia. diminuída, diminuição da vontade etc.
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020).

Comportamento motor Delírios: alterações


desorganizado ou de pensamento
catatônico: a pessoa em que o indivíduo
apresenta desde o Esquizofrenia crê em algo não
comportamento tolo e condizente com
infantil até a agitação sua realidade, por
imprevisível. mais que lhe seja
mostrado o contrário.

Discurso desorganizado:
o paciente apresenta
desorganização no Alucinações: alterações de percepção em que
pensamento e no discurso, não há um objeto presente. São vívidas, claras,
sendo difícil compreender como se fossem percepções normais. Podem ser
o que ele fala. táteis, visuais, olfativas, auditivas e gustativas.

286 • Módulo 5 O Suicídio


O início pode ser abrupto e inesperado, a partir de uma crise,
mas em geral manifesta um desenvolvimento lento e gradativo.
A esquizofrenia dura pelo menos seis meses, incluindo ao
menos um mês da fase ativa.

No que se refere a riscos de suicídio em indivíduos com


esquizofrenia, temos alguns dados destacados na imagem
a seguir.

5% a 6% dos indivíduos 20% dos indivíduos que


que possuem possuem esquizofrenia
esquizofrenia falecem tentam suicídio em uma
por suicídio. ou mais ocasiões.

Figura 30: Riscos


de suicídio em
indivíduos com
esquizofrenia.
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020).

A porcentagem de indivíduos com ideação suicida no decorrer


da vida é ainda maior devido à presença de alucinações e
delírios que tendem a confundir o sujeito, potencializando a
ideação suicida. Nesse contexto, os momentos de maior risco
são apresentados na imagem abaixo.

1
PERÍODO INTERCRISE
Quando o indivíduo percebe e não elabora toda a
limitação e o prejuízo que a doença acarretou à sua vida.

2
DURANTE A CRISE
Por exemplo, ao seguir vozes de comando que o
mandam se matar

Figura 31:
Momentos de

3
maior risco. Fonte: PÓS INTERNAÇÃO
labSEAD-UFSC Casos de suicídio podem acontecer após a alta de uma
(2020 ). internação psiquiátrica

287 • Módulo 5 O Suicídio


O tratamento da esquizofrenia, diferente dos outros
transtornos apresentados, geralmente acompanha o indivíduo
no decorrer de sua vida.

É recomendável um tratamento multidisciplinar


a partir da utilização de fármacos, além de
acompanhamento psiquiátrico e psicológico, além
de terapia ocupacional.

É necessário um acompanhamento mais efetivo, inclusive no


uso de medicações, pois o paciente pode não estar tomando
os remédios da maneira adequada, além de ser desejável
uma maior estimulação, principalmente em pacientes
crônicos, pois tendem a ter maiores perdas cognitivas e
emocionais ao longo do tempo.

Transtornos de personalidade
Segundo o DSM-5 (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION,
2014), os transtornos de personalidade são padrões
de comportamento e experiência interna que desviam
acentuadamente da cultura do indivíduo, tendo seu início
na adolescência ou no início na fase adulta, apresentando
as seguintes características básicas: o indivíduo sofre e faz
sofrer, além de não aprender com a experiência.

Os indivíduos que possuem transtorno de


personalidade apresentam dificuldade em lidar com
situações de estresse ou problemas mais sérios,
tendendo a reagir de forma mais primitiva nesses
casos, gerando problemas.

Embora o transtorno traga sofrimento para a pessoa e


para os que a rodeiam, percebe-se que esses indivíduos
têm dificuldade em modificar suas ações ao longo da vida.

288 • Módulo 5 O Suicídio


Os transtornos de personalidade tendem a manifestar-se
atingindo alguns aspectos emocionais. Vamos conhecê-los na
imagem a seguir.

COGNIÇÃO
A forma de perceber e interpretar
a si e a ao outro.

AFETIVIDADE
Há variação e intensidade das respostas
emocionais, além de rápidas alterações de humor.

FUNCIONAMENTO INTERPESSOAL
Figura 32: Áreas
de manifestação
do transtorno de
personalidade.
Fonte: labSEAD- CONTROLE DE IMPULSOS
UFSC (2020).

São mais de dez os transtornos de personalidade citados no


DSM-5 (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014), porém
é possível perceber maior relevância nos casos de suicídio em
indivíduos com o transtorno da personalidade borderline.

Transtorno de personalidade borderline


O transtorno de personalidade borderline apresenta
como característica principal a instabilidade nas relações
interpessoais, da autoimagem, dos afetos e impulsividade
acentuada. Tais características podem ser descritas mais
precisamente na imagem a seguir.

289 • Módulo 5 O Suicídio


Raiva intensa e inapropriada, com
dificuldade de ser controlada.

Relações interpessoais
Possibilidade de instáveis e intensas
repetidos atos com momentos
autolesivos. de aproximação e
distanciamento.
Transtorno de
personalidade
borderline

Sentimento crônico
de vazio.
Instabilidade afetiva.

Impulsividade em pelo menos duas áreas


Figura 33:
Transtorno de
potencialmente autodestrutivas (gastos, sexo,
personalidade abuso de substâncias, direção perigosa).
borderline. Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020
Esses indivíduos tentam de tudo para evitar o abandono real ou
imaginado, e a presença de uma ruptura, rejeição ou perda real
pode levar a mudanças profundas na autoimagem, no afeto, na
cognição e no comportamento.

Os pacientes com transtorno de personalidade


borderline apresentam dificuldades em aderir
aos tratamentos, muitas vezes não comparecendo
ou alternando em desistências e retornos. Eles
necessitam de apoio da equipe e de limites
para se adequar ao ambiente em que vivem e às
limitações existentes.

Para fazer a intervenção, é preciso agir sempre com duas


partes, de maneira firme e sem agressividade ou sentimento de
punição. Confira na imagem a seguir.

290 • Módulo 5 O Suicídio


Reconhecer
as dificuldades
pelas quais a pessoa Estabelecer limites
está passando, enaltecer objetivos de forma calma
os aspectos positivos que ela e firmemente. Se houver
possui e não incitar reações ameaças de agressão a si ou a
de raiva. Evitar estimular terceiros, assegure que todas
demandas por cuidados as medidas serão tomadas
e proximidades para protegê-la.
excessivas.

Figura 34:
Intervenção dos
pacientes. Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020). Agora que refletimos sobre os fatores de risco relacionados ao
suicídio, vamos falar dos fatores de proteção, ou seja, vínculos
positivos que diminuem a possibilidade de desenvolvimento de
comportamentos suicidas. Vamos adiante!

FATORES DE PROTEÇÃO
A prevalência dos estudos sobre suicídio recai na análise dos
fatores que podem ter contribuído direta ou indiretamente para
o ato suicida. No entanto, dentro dessa reflexão, é importante
pensar nos fatores de proteção que podem agir de forma
oposta às condições de risco.

291 • Módulo 5 O Suicídio


Autoestima
elevada

Estabilidade Bom suporte


financeira familiar

Boas Relações
condições físicas sociais estáveis
com ausência e inserção em
de doenças grupos sociais e
incapacitantes de convivência

Apresentar
boa capacidade de
reagir às adversidades FATORES DE Espiritualidade
(resiliência) e resolver
problemas
PROTEÇÃO desenvolvida

Ter filhos Ausência de


pequenos doença mental

Estar em
relacionamentos Estar
amorosos fixos empregado
Sentimento
de utilidade e de
responsabilidade

Figura 35: Fatores


de proteção. Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020).

Assim, para realizar uma avaliação de risco adequada, é


necessário observar os aspectos que podem ser considerados
de risco, além de considerar a capacidade desse indivíduo de
responder positivamente aos eventos externos.

292 • Módulo 5 O Suicídio


Aula 3 – O Suicídio entre Profissionais
de Segurança Pública no Brasil

CONTEXTUALIZANDO...
Os estudos sobre suicídio direcionados aos profissionais
de segurança pública ainda são bastante incipientes no
Brasil. Alguns autores se destacam a partir de produções
regionalizadas acerca do tema, mas ainda há muito o que se
compreender sobre a especificidade desse fenômeno em se
tratando de profissionais que convivem constantemente com
estresse em graus elevados, riscos físicos e psicológicos.

Nesse contexto, vamos agora entender mais sobre o suicídio


entre os profissionais de segurança pública no país.

ANALISANDO OS NÚMEROS
Os estudos sobre suicídio direcionados aos profissionais de
segurança pública no Brasil destacam que esses profissionais
apresentam de 3 a 4 vezes mais propensão a consumarem o
suicídio do que as demais categorias profissionais.

Temos ainda que considerar que, do mesmo modo que há


subnotificação nos números de suicídios na população em
geral, há também a subnotificação do número de suicídios
cometidos pelos profissionais de segurança pública.

O diferencial das taxas de suicídio de policiais


e da população geral é percebido não apenas na
população brasileira, mas em todo o mundo.

Outro agravante são as variações de atividades e de culturas


que cercam o profissional de segurança em relação ao Brasil e
outros países. Um exemplo desse fator é o estigma vivido por

293 • Módulo 5 O Suicídio


parte dos policiais militares no Brasil, em relação à atividade
policial de outros países, como o respeito da população aos
agentes de segurança da polícia americana.

Segundo um estudo realizado por Muniz e Soares (1998),


tivemos os seguintes dados:

Palavra do Especialista
A partir do estudo realizado, foi constatado que a taxa de

 suicídio da polícia militar carioca em 1995 foi 7,6 vezes superior


à da população geral, ainda que 100% das mortes tenham
acontecido durante a folga do policial.

Minayo, Assis e Oliveira (2011), ao analisarem as condições


de trabalho, de saúde e de qualidade de vida de 1.058 policiais
civis e 1.108 policiais militares, concluíram alguns dados
sobre a taxa de sofrimento psíquico de policiais, que vemos na
imagem seguinte.

Figura 36: Taxa de


sofrimento psíquico PMERJ 33,6%
de policiais,
segundo Minayo,
Assis e Oliveira
Polícia
20,3%
(2011). Fonte:

Civil
labSEAD-UFSC
(2020).

Os policiais entrevistados de ambas as organizações


declararam tristeza, tremores e um sentimento de inutilidade.
Os adoecimentos e elevação nos números de suicídio tornam-
se, desse modo, preocupantes, principalmente ao avaliarmos
os dados apresentados a seguir.

294 • Módulo 5 O Suicídio


• 94% possuem estresse
• 2010 a 2014 ocupacional
173 tentativas • 34% relatam estresse
de suicídio em grau elevado
SSPDS PF, PRF • 36% possuem outras
doenças mentais
Figura 37:
– CE e PCDF
Dados sobre
adoecimentos/
suicídio de agentes
da segurança
pública brasileiros. PMSP FENAPEF • 88% afirmam não haver
Fonte: ABP (2014), • 2017 e 2018 programa de bem-estar
SOUSA (2016), 73% de • 53% desejam deixar a PF
SENASP (2019), aumento de • 39% se sentem inúteis
adaptado por
suicídios • 21% já pensaram em
labSEAD-UFSC
suicídio
(2020).

A seguir, citaremos sucintamente as últimas pesquisas


realizadas, para entendermos quem são os policiais que se
matam, considerando a dificuldade em delimitarmos qual é
o perfil geral desses casos, em razão da multicausalidade
do suicídio. Assim, nós vamos buscar uma descrição dos
fatores que podem atuar como fatores de risco para os
agentes de segurança pública.

Ouvidoria da Polícia de São Paulo (2019)


Essa pesquisa foi realizada a partir dos dados de suicídios
entre os anos de 2017 e 2018, da corregedoria e serviços de
saúde da Polícia Militar e Civil de São Paulo.

Os dados apresentam que a taxa bienal de suicídio


nas polícias compõe uma média de 23,9. Para a OMS,
quando o índice passa de 10 para 100 mil habitantes,
é considerada uma situação epidêmica.

Em São Paulo, os policiais cometiam suicídio em uma


proporção 4,5 vezes maior que no país. Quando comparado
com a taxa de vitimização policial, no estado, temos um
número ainda mais alarmante. Observe na imagem a seguir.

295 • Módulo 5 O Suicídio


Figura 38: Dados
relacionados ao
estado de São Paulo.
Fonte: São Paulo
(2019), adaptado Homicídio
por labSEAD-UFSC em serviço Suicídio PM
(2020).
3,6 21,7

Abaixo, apresentamos um quadro com o perfil dos policiais


da Polícia Militar que consumaram o suicídio apresentados
nesse estudo.

Sexo
masculino
89% Arma de
31 a 35 anos
fogo
26% 85%

Trabalhavam
na capital Enforcamento
49% 11%

Figura 39: Perfil


dos policiais que
consumaram o
Ensino Queimadura
médio
suicídio nos anos
de 2017 e 2018 nas 81% 2%
Polícias Militar e
Civil de São Paulo. Estavam
Fonte: São Paulo no dia de Medicamentos
(2019), adaptado folga
por labSEAD-UFSC
96% 2%
(2020).

Assim sendo, podemos ressaltar que, na Polícia Civil de


São Paulo, o cargo com maior índice de suicídio foi o
de investigadores (35%), enquanto os delegados foram
responsáveis por 12% dos suicídios. Já na Polícia Militar, 44%
dos suicidas eram cabos e 39% soldados.

296 • Módulo 5 O Suicídio


É importante relatar que, segundo os autores, é possível que a
motivação dos inativos seja diferente dos que estavam na ativa,
todavia o instrumento mais utilizado foi o mesmo: arma de fogo.

Aposentados e inativos
Idade 18% 31 a 35 anos
Sexo 92% Masculino
Instrumento 83% Arma de fogo
Local de operação 47% Capital
Tabela 1:
Aposentados e 55% Sargentos
inativos.
Polícia Militar
10% Coronéis
Fonte: São Paulo
(2019), adaptado Polícia Civil 40% Investigadores
por labSEAD-UFSC
(2020). Escolaridade 80% Ensino Médio

Assim, no que se refere aos policiais civis, foram percebidas


algumas condições que podem ser consideradas como
agravos à saúde ou até mesmo como fatores de risco. Veja.

Escala de trabalho exercida: os horários alternados, o baixo


contingente de indivíduos na corporação e as características
da função, exigindo alerta e constante prontidão produzem
desconforto e dificultam uma rotina profissional de qualidade.

POLICIAIS Conflitos no âmbito familiar, conjugal e profissional,


CIVIS além de problemas financeiros, recente envolvimento em
ocorrência com homicídio e histórico de suicídio na família.

Figura 40:
Percepções dos Dificuldade de esquecerem determinadas situações
fatores de risco vivenciadas no trabalho.
entre policiais civis.
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020).
Também podemos considerar que a maioria dos policiais
militares ativos e inativos eram católicos, esses dados
não foram possíveis de serem levantados entre policiais
civis. Em relação às percepções dos fatores de risco entre
policiais militares, podemos observar o seguinte.

297 • Módulo 5 O Suicídio


Escala de trabalho como um importante fator para
possivelmente desencadear um processo de adoecimento,
ou mesmo de uso do poder como mecanismo de assédio por
parte da instituição.

POLICIAIS A interferência de transferências e mudanças de postos


MILITARES de serviço nos adoecimentos, sendo percebidas, em
muitos casos, como “punição”.

A rigidez de comportamento, tanto na instituição


Figura 41:
Percepções dos
quanto fora dela, a introspecção e comportamentos de
fatores de risco ansiedade e inquietação.
entre policiais
militares. Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020). Foi comum, em ambas as instituições, a visão de que a
ansiedade do colega era natural, com justificativas de que a
própria atividade profissional causasse malefícios à saúde
mental, principalmente quando esta mantém o nível de alerta
constante, gerando desgaste físico e psicológico.

Palavra do Especialista
Segundo os autores da pesquisa: “A atividade policial requer de
seu profissional o constante firmamento de uma conduta heroica,

 que não permite falhas e/ou ‘fraquezas’.” (SÃO PAULO, 2019, p. 36).
Ressaltam ainda que, por vezes, os agentes sentem a necessidade
de pedir ajuda, mas têm receio de serem ridicularizados entre
seus pares e/ou demonstrar inaptidão para as tarefas diárias.

Foi citada, ainda, a presença do assédio moral como fator


agravante de adoecimentos:

Palavra do Especialista
A exposição de alguém a situações humilhantes e
constrangedoras, repetitivas e prolongadas, praticadas por

 superiores, durante a jornada de trabalho e no exercício de suas


funções, torna-se um dos fatores para o adoecimento do agente
de segurança pública no exercício de sua função.

298 • Módulo 5 O Suicídio


Em decorrência de assédios, foi possível observar
adoecimentos, alguns casos com verbalizações do desejo de
morrer, e, em determinados casos, a ocorrência de tentativas
de suicídio. Lembramos que o comportamento suicida não
é causado por um fator apenas, apesar disso, o assédio
apresentou-se como um dos fatores de maiores riscos para o
ato entre policiais.

Foram observados ainda desdobramentos nas relações


familiares e sociais, além do processo de adoecimentos
decorrentes da atividade profissional.

A ocorrência de suicídios de profissionais surgiu


também como fator desestabilizador para os outros
colegas de trabalho, pois foi percebido que, quando
aconteciam, geravam um sentimento de impotência,
culpa e responsabilidade diante do ocorrido.

Os colegas de trabalho dos policiais vítimas de suicídio


mencionaram apresentarem um conjunto de sentimentos
e conflitos oriundos de tal violência, como: dificuldade de
aceitação, negação e sofrimento decorrente do fato.

Tentativas de suicídio e suicídio em profissionais


de segurança pública do Ceará
A pesquisa compreendeu o estudo de suicídios de agentes da
Polícia Militar, Bombeiro Militar, Polícia Civil e Perícia Forense
do Ceará, entre os anos de 2000 a 2014.

O estudo apresentou primeiramente um esclarecimento sobre


as taxas de suicídio na população do Ceará, mostrando haver
cidades com taxas bastante elevadas, tendo 15 das 100
cidades brasileiras com maiores taxas de suicídio.

299 • Módulo 5 O Suicídio


Em relação ao risco relativo de suicídio
dessa população, calculou-se que os agentes
apresentam quatro vezes mais chance de tirar
a própria vida quando comparados à população
cearense, o que também corrobora a ideia de
vulnerabilidade desse público.

Sobre o perfil mais recorrente dos agentes que consumaram o


suicídio no período, podemos destacar os aspectos que vemos
na imagem a seguir.

Meia idade
63,2%
Casado Sexo
masculino
61,4% 98,2%

Utilizaram
como
instrumento a Ensino
arma de fogo Fundamental
73,7% 63,2%

Local
do suicídio Renda
diferente do de até
Figura 42: Perfil
dos agentes que trabalho e casa três salários
mínimos
consumaram o 63,2%
suicídio. Trabalhavam Patente: 75,4%
Fonte: Sousa (2016)
no serviço 36,8% Cabos
adaptado por
labSEAD-UFSC
operacional
33,3% Soldados
(2020). 64,8%

No decorrer da pesquisa, foi abordado o caráter estressante


da atividade desses agentes, que lidam continuamente com
violência, morte, além de serem vistos de forma negativa pela
sociedade e não possuírem apoio de saúde adequado das
instituições no período.

300 • Módulo 5 O Suicídio


Por que os policiais se matam?
A pesquisa foi realizada por Dayse Miranda, no ano de 2009,
em 18 batalhões da Polícia Militar do Rio de Janeiro. Entre
os levantamentos feitos por essa autora, estão os dados
apresentados na imagem a seguir.

10%
já haviam
22% 68%
pensaram, não pensaram
tentado mas não e não
suicídio tentaram tentaram

59% 64%

30 e 39 anos 30 e 39 anos

55% 64%

Ensino médio Ensino médio

50% 46%
Figura 43: Dados
da pesquisa de
Miranda (2016). Sargentos Cabos
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020).

Dos 22 casos de tentativas observados pela pesquisa, 14


policiais militares utilizaram como principal meio para se matar
o seu próprio instrumento de trabalho: a arma de fogo. Apenas
duas dessas pessoas declararam ter ingerido medicamentos
para pôr fim à sua própria vida.

301 • Módulo 5 O Suicídio


Sobre o perfil dos policiais que consumaram o suicídio no
período de 2005 a 2009, os principais dados obtidos na
pesquisa estão apresentados na imagem a seguir.

• Mulheres (2/26 indivíduos)


• Idade de 31 e 40 anos (55%)
• Casados ou viviam em união
consensual (14/26 indivíduos)
• Filhos (14/26 indivíduos)
• Evangélicos (10/26 indivíduos)
Figura 44: Perfil dos • Praças – sargentos, cabos e
policiais destacados
na pesquisa. soldados (23/26 indivíduos)
Fonte: labSEAD- • Coronéis (2/26 indivíduos)
UFSC (2020).
• Subtenente (1/26 indivíduos)

Em relação à situação funcional, 19 eram da ativa e sete


inativos. Em relação às unidades, 13 trabalhavam em unidades
operacionais e três em unidades administrativas.

Sobre as possíveis motivações elencadas, a maioria dos


policiais atribuiu os seguintes fatores, apresentados a seguir.

12
Questões 7
familiares
Conflitos no
ambiente de
trabalho
2
Figura 45: Fatores Questões 1
de motivação. de saúde
Fonte: labSEAD-
Problemas
UFSC (2020).
financeiros

Percebemos, dessa forma, que há conformidade com os


dados apresentados nas mais diversas corporações e
instituições de segurança pública, independente do estado ou

302 • Módulo 5 O Suicídio


do local onde trabalham. Eles constituem público vulnerável
ao comportamento suicida e necessitam, assim, de um
cuidado especializado.

PREVENÇÃO E POSVENÇÃO
Ao pensarmos sobre a prevenção e posvenção do suicídio,
faz-se necessário discutirmos acerca dos mitos que cercam
esse fenômeno, para, só então, conseguirmos clarificar
como podemos contribuir para a erradicação ou diminuição
dos suicídios.

Abaixo, apresentamos alguns dos mitos que existem sobre o


suicídio, que precisam ser repensados de modo a contribuir
para a prevenção.

Mitos Verdades
Ao invés de encorajar, conversas abertas podem
Conversar sobre suicídio pode
esclarecer, dar outras opções e tempo para que a
encorajar alguém a fazê-lo.
decisão seja repensada.

Pessoas que falam sobre suicídio só


A maioria das pessoas que fala sobre suicídio
querem chamar atenção, sem a real
chega ao ato.
intenção de se matar.

A maioria dos suicídios acontece A maioria dos suicídios é precedida por sinais e
repentinamente, sem avisos. comportamentos.

Suicídio é um ato de covardia,


Suicídio é um ato de desespero, de quem já não
coragem ou falta de Deus
sabe como lidar com a dor.
no coração.

Alguém com propensão ao suicídio As pessoas em risco de suicídio apresentam


está determinado a morrer. ambivalência entre querer e não querer fazer.

O comportamento suicida é provável quando há


Somente pessoas com transtornos
sofrimento intenso, independente da existência de
mentais cometem suicídio.
transtornos mentais.

Quadro 1: Mitos e verdades sobre o suicídio.


Fonte: labSEAD-UFSC (2020).

303 • Módulo 5 O Suicídio


Você deve lembrar de quando falamos que os suicídios são
evitáveis e para isso é necessária a implantação de várias
medidas de proteção e prevenção para toda a população.
Essas medidas podem ser realizadas de forma individual
ou em grupo, atreladas ao incentivo do debate sobre o tema
levantado de forma assertiva e cuidadosa.

Entre as medidas tomadas, destacamos as seguintes.

Redução de acesso aos meios utilizados (por exemplo, pesticidas, armas


de fogo e certas medicações). No caso dos agentes de segurança, faz-se
necessário que, na presença de comportamentos suicidas, sejam retiradas as
armas de fogo, visto serem os instrumentos mais utilizados pelos profissionais.

Cobertura responsável pelos meios de comunicação, de modo a apresentar


o suicídio de forma cuidadosa, e como é possível prevenir e evitar, além de
esclarecer as possibilidades de busca de ajuda.

Introdução de políticas para reduzir o uso nocivo do álcool, visto ser, dentre
as substâncias que geram dependência, a de maior consumo.

Identificação precoce, tratamento e cuidados de pessoas com transtornos


mentais, transtornos decorrentes do uso de substâncias, dores crônicas, além
de estresse emocional agudo, que no caso dos agentes é apresentado como
um fator de risco real e presente na própria atividade.

Formação de trabalhadores em gatekeepers (guardiões da vida),


profissionais que vão identificar mensagens verbais ou comportamentos
suicidas entre seus companheiros de trabalho da segurança pública, e vão
intervir ajudando, acolhendo, encaminhando para o serviço de saúde mental
da instituição, ou fora dela.

Figura 46: Medidas Acompanhamento de pessoas que tentaram suicídio, de modo a evitar
de proteção e tentativas futuras. Pode se dar por meio de apoio psicológico, social,
prevenção. financeiro e de saúde em geral, dependo das motivações citadas pelos
Fonte: labSEAD- indivíduos como associadas à tentativa.
UFSC (2020).

O suicídio, enquanto fenômeno multicausal e complexo, necessita,


para a sua prevenção, coordenação e colaboração entre os
múltiplos setores da sociedade, incluindo saúde, educação,
trabalho, agricultura, negócios, justiça, lei, defesa, política e mídia.

304 • Módulo 5 O Suicídio


Esses esforços devem ser abrangentes e integrados, pois
apenas uma abordagem não pode impactar em um tema tão
complexo quanto o suicídio.

Vamos refletir sobre medidas de prevenção ao suicídio nos


itens que serão apresentados a seguir. Confira!

Sinais de alerta
A maioria das pessoas com ideações suicidas comentam sua
intenção de tirar a própria vida, seja de forma direta ou indireta.

Em geral, elas apresentam mudanças de comportamento, além


de ser comum a ocorrência de comentários, que podem ser
identificados como frases de alerta, escutadas por quem as
ouvir de modo mais atento e cauteloso.

Figura 47:
Comentários
ocorrentes. Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020).

Alguns chegam a verbalizar claramente a intenção de se matar,


inclusive, com a divulgação do planejamento de como ocorrerá.
Entretanto, existem alguns sinais que não estão diretamente
associados à crise suicida, e que podem estar presentas na
história de vida e no comportamento das pessoas. Portanto,
deve-se ficar mais atento com aqueles que apresentam alguns
comportamentos destacados na imagem a seguir.

305 • Módulo 5 O Suicídio


    

Comportamento
retraído,
dificuldade de
Uso abusivo
Tentativa relacionamento Existência de Crises de
de álcool ou
de suicídio social, com transtorno ansiedade ou
de outras
anterior. família ou psiquiátrico. de pânico.
drogas.
amigos, até
mesmo com
colegas de
trabalho.

   

Baixa autoestima,
Uma perda
sentimento de
Mudança no recente
menosvalia,
comportamento, Alteração importante –
sentimento de
irritabilidade, no hábito morte, divórcio,
culpa, de se sentir
pessimismo, alimentar separação
sem valor ou
depressão ou e de sono. ou alteração
com vergonha,
apatia. nos postos de
sentimentos de
trabalho.
solidão, impotência,
desesperança.

    

Desejo súbito
de concluir
os afazeres
Doença física Menção
Histórico pessoais, Escrita
crônica, repetida de
familiar de organizar de cartas de
limitante ou morte ou
suicídio. documentos, despedida.
dolorosa. suicídio.
escrever um
testamento, sem
nenhum motivo
aparente.

Figura 48: Sinais


que indicam risco
relacionados ao Esses sinais indicam que determinada pessoa tem risco para o
comportamento
suicida. Fonte:
comportamento suicida.
labSEAD-UFSC
(2020).
Como ajudar a quem pede ajuda?
O contato inicial com o indivíduo que apresenta
comportamento suicida pode variar bastante, ele pode

306 • Módulo 5 O Suicídio


acontecer em um local de cuidado (como no caso de clínicas,
setores de saúde das instituições) e também nos locais de
trabalho, na residência dos indivíduos ou mesmo em situações
de crise, que podem ser em qualquer lugar, o que pode
dificultar uma conversa em particular.

No caso específico das situações onde há crise


suicida, vários outros fatores terão que ser levados
em conta, como ambiente, risco de morte eminente,
pessoas ao redor, entre outros.

Abordaremos aqui como esse primeiro contato pode se dar de


forma mais eficaz.

1
Primeira atitude

É preciso fazer um contato, buscando achar um lugar


adequado, onde uma conversa tranquila possa ser mantida com
privacidade razoável, quando possível.

2
Segunda atitude

Em seguida, precisamos ter em mente que teremos que


disponibilizar de certo tempo para isso, pois usualmente
pessoas com comportamentos suicidas necessitam de mais
tempo para deixar de se achar um fardo. Por isso, é preciso
também estar disponível emocionalmente para lhes dar
atenção. É importante lembrar que nem todos estão preparados
para lidar com a dor dos outros, e que é necessário que quem
está se disponibilizando a ajudar busque alguém preparado, no
caso de não se sentir confortável em manter essa conversa.

307 • Módulo 5 O Suicídio


3
Terceira atitude

O ponto mais importante desse primeiro contato é ouvir


atentamente, buscando demonstrar que está escutando, e que se
importa com o que está ouvindo, evitando juízos de valor sobre o
que está sendo dito. Conseguir esse contato e ouvir é por si só o
maior passo para reduzir o nível de desespero suicida. A pessoa
precisa se sentir acolhida e que não está sozinha. O objetivo é
preencher uma lacuna criada pela desconfiança, pelo desespero
e pela perda de esperança e dar à pessoa a esperança de que as
coisas podem mudar para melhor.

Figura 49: Primeiro contato.


Fonte: labSEAD-UFSC (2020).

É importante que, no decorrer de todo o contato, seja


mantida uma postura calma, que passe tranquilidade e
demonstre aceitação sem julgamento, o que certamente
facilitará a comunicação e, consequentemente, ajudará o
indivíduo em crise.

Outro ponto relevante refere-se ao sigilo, pois muitas


pessoas que apresentam comportamentos suicidas
apresentam desconfiança e descrença em si próprios e em
relação aos outros.

Quando se trata de pessoas que atuam na segurança


pública, é importante reafirmar ainda mais o quanto
isso é essencial.

Muitos dos agentes, mesmo os que não apresentam


comportamentos suicidas, demonstram elevado nível de
desconfiança no seu dia a dia e nas suas relações, o que,
provavelmente, tende a ser exacerbado nos momentos de crise.

308 • Módulo 5 O Suicídio


É preciso lembrar, ainda, que a idealização de ser o
herói dificulta ainda mais isso, devido ao medo de ser
percebido pelos colegas de instituição como fraco.

Afinal, como podemos fazer a comunicação com alguém


em crise e o que evitar durante a aproximação? Confira a
abordagem correta e a incorreta a seguir.

Abordagem correta
 Abordagem incorreta 
• Ouvir atentamente, com calma e sem • Interromper a fala frequentemente.
demonstrar pressa. • Demonstrar espanto ou emoção com o
• Demonstrar a preocupação em entender os que está sendo ouvido.
sentimentos da pessoa (empatia). • Não se mostrar disponível para ouvir,
• Dar mensagens não verbais de aceitação e dizer que você está ocupado.
respeito (comunicação ativa). • Fazer o problema parecer simples,
• Expressar respeito pelas opiniões e pelos desmerecendo o sofrimento do outro.
valores da pessoa, evitando julgamentos • Tratar a pessoa com ar de superioridade.
ou simplificação da situação.
• Dizer simplesmente que tudo vai
• Conversar honestamente e com ficar bem, ou fazer promessas para o
autenticidade. paciente para demovê-lo.
• Mostrar sua preocupação, seu cuidado e • Fazer perguntas indiscretas.
sua afeição.
• Emitir julgamentos (certo x errado).
• Focalizar nos sentimentos da pessoa.

Figura 50:
Abordagem correta A maioria das pessoas acredita que é complicado falar sobre
e incorreta. Fonte:
labSEAD-UFSC o suicídio e questionar sobre possíveis ideações suicidas, e
(2020).
muitos não se sentem preparados para isso.

Mesmo que você não se julgue capaz de conduzir


tal diálogo, acredite que o simples fato de
demonstrar disponibilidade e interesse em ouvir
pode salvar vidas.

309 • Módulo 5 O Suicídio


Caso não consiga ou não saiba bem como abordar o tema,
demonstre que está ali para ouvir o indivíduo e inicie as
perguntas à medida que perceber que vai se estabelecendo
uma relação de confiança. Algumas questões podem auxiliar
esse contato, veja.

Você se sente
triste?
Você sente
que ninguém se
preocupa com
você?
Você sente que a
Já pensou vida não vale mais a
que seria pena ser vivida?
Figura 51: Reflexões melhor estar
que colaboram para
o contato. Fonte:
morto ou tem
labSEAD-UFSC vontade de
(2020). morrer?

O principal é respeitar o outro e demonstrar que está ali para


ajudar. Desde o início tente estabelecer um vínculo que garanta
a confiança e a colaboração do paciente, pois este pode ser
um momento em que ele se encontra enfraquecido, hostil e
nem sempre estará disposto a colaborar.

Caso você tenha dúvidas sobre o momento


adequado para fazer as perguntas, infelizmente
não há um momento ideal ou específico. Em cada
caso haverá um momento mais adequado e que o
paciente demonstrará estar mais disponível, e você
terá de perceber isso.

310 • Módulo 5 O Suicídio


As perguntas vão surgindo aos poucos e sem uma ordem
definida, e em algumas vezes, dependendo da angústia do
indivíduo, ele mesmo irá falar antes de você perguntar.

Foque em descobrir se a pessoa tem um plano definido para


cometer suicídio, se ela possui os meios para se matar e se ela
fixou uma data para o ato.

No caso de agentes de segurança, lembre-se sempre


de perguntar se eles possuem armas acauteladas, e
se possuem armas de fogo pessoais, buscando saber
onde essas armas estão.

Por isso, no decorrer do contato, algumas perguntas podem


ajudar a quantificar o risco, tais como:

• Você fez algum plano para acabar com


sua vida?
Figura 52:
Perguntas que • Você tem uma ideia de como vai fazê-lo?
colaboram na
quantificação • Você tem pílulas, uma arma, veneno ou
do risco. Fonte: outros meios?
labSEAD-UFSC
(2020). • Quando você está planejando fazê-lo?

Lembre-se de respeitar a condição emocional e a situação


de vida que levou o indivíduo a pensar sobre suicídio, sem
julgamento moral, em uma atitude de acolhimento.

311 • Módulo 5 O Suicídio


Por mais estranho que possa parecer tocarmos
no assunto, na maior parte das vezes a pessoa só
precisa falar, perceber que está diante de alguém
que está disposto a realmente ouvi-la e auxiliá-la,
mesmo que seja sobre algo tão sério.

Todas essas questões precisam ser perguntadas com cuidado,


preocupação e compaixão, sempre deixando claro que seu
objetivo é ajudá-la.

Abordagem de baixo risco


Consideramos situações de baixo risco quando há
pensamentos suicidas, mas sem planejamento. Nesse caso,
a primeira coisa a fazer é oferecer apoio emocional. O melhor
será se houver alguém treinado para isso, mas, se isso não for
possível, demonstre estar disponível para ouvir a pessoa que
está em crise.

• Ouça atentamente: possibilite que os pensamentos se


tornem mais claros, pois, quando há ideações, a pessoa
pode ficar confusa e ter dificuldade em compreender seus
próprios pensamentos e emoções.

• Faça-a falar sobre soluções: possibilite que a pessoa lembre


não apenas dos problemas atuais, fazendo-a falar também
sobre como resolveu outros problemas anteriores. Isto
permite que a pessoa amplie sua visão e perceba que já
teve problemas anteriores também e conseguiu resolvê-los,
tornando-a mais confiante em si mesma.

Quanto mais ela se sentir confortável, mais falará, e terá


melhores condições de refletir e se organizar diante da
situação em que se encontra; na maioria das vezes, ela
perceberá que não deseja morrer, mas, sim, fugir de algo que
provoca dor e que parece não ter saída.

312 • Módulo 5 O Suicídio


Caso você perceba que não está conseguindo ajudar
a pessoa, encaminhe-a para um profissional que
possa atendê-la, denotando preocupação e busca de
ajuda o mais adequada possível.

Avalie a real necessidade de encaminhamento para rede de


apoio. Em alguns casos, a possibilidade de ser escutado da
forma adequada ajuda a reorganizar o paciente e não necessita
de encaminhamento para equipe especializada. No caso em
que o paciente tiver que esperar para ser atendido, busque
contatos enquanto ele aguarda o atendimento adequado. Isso
é importante, pois em muitas instituições não há atendimento
adequado e imediato para os pacientes.

Mas caso não fique claro que o risco é baixo ou médio, faça os
encaminhamentos necessários como forma de prevenção.

Abordagem de médio risco


A situação é considerada de médio risco quando a pessoa tem
pensamentos e planos, mas não tem intenção de cometer o
suicídio no atual momento. Nesse caso, da mesma forma que
antes, ofereça apoio emocional e faça-a lembrar de resoluções
positivas anteriores.

• Focalize os sentimentos de ambivalência: procure focalizar na


ambivalência sentida pela pessoa em risco de suicídio entre
viver e morrer, em busca de que a escolha pela vida vá se
fortalecendo e sobressaindo em relação à escolha pela morte.

• Explore alternativas ao suicídio: tentativa de compreender


todas as formas possíveis de alternativas ao suicídio.

A partir desse momento, é necessário que seja estabelecido


um contrato a partir da demonstração de preocupação e do
desejo de ajudar advindos do profissional da saúde.

313 • Módulo 5 O Suicídio


O contrato deve estabelecer que o paciente não
cometerá o suicídio sem que a equipe seja avisada e
num determinado período. O objetivo é que a ajuda
especializada chegue e até mesmo que as medidas
de apoio tomadas comecem a surtir resultado.

A partir desse momento, encaminhe a pessoa ao psiquiatra da


equipe ou agende uma consulta o mais breve possível dentro
do período em que foi feito o contrato. Entre em contato com
a família, os amigos e/ou colegas e reforce seu apoio, sempre
lembrando de deixar o paciente consciente dos procedimentos
que estão sendo realizados, de modo que a confiança que foi
estabelecida se mantenha.

Quando falar com os familiares e amigos, é


preciso esclarecer sobre o risco da situação,
além de informar sobre como administrar esses
riscos (evitando o acesso a meios para cometer
o suicídio, como deixar portas com chave, deixar
medicamentos de fácil acesso e evitar que o
paciente se isole).

Essas informações já terão sido esclarecidas antecipadamente


também ao paciente, de modo que ele compreenda que
as atitudes que serão tomadas serão para sua saúde e
preservação da sua vida.

Toda as orientações são por períodos de tempo determinado,


pois visam ajudar o paciente enquanto ele não apresenta
condições de fazê-lo sozinho. Após a crise, é relevante
esclarecer que ele reestabelecerá o controle sobre suas vidas,
inclusive sua arma, como no caso dos agentes de segurança.

314 • Módulo 5 O Suicídio


Abordagem de alto risco
O alto risco é quando a pessoa tem um plano definido, tem
os meios para fazê-lo e planeja fazê-lo prontamente. Muitas
vezes já tomou algumas providências prévias e parece estar
se despedindo. Veja na imagem como podemos ajudá-la
nesse caso.

Gentilmente Fazer um
explicar para a contrato,
pessoa que você como descrito
está ali para ajudá- anteriormente,
la, protegê-la e que Falar com a e tentar ganhar
Estar junto da no momento ela pessoa e remover tempo.
pessoa, nunca parece estar com quaisquer meios
deixando-a que possam Informar a
muita dificuldade
sozinha, ser utilizados família e
para comandar a
inclusive em para cometer o reafirmar
própria vida.
situações como suicídio: pílulas, seu apoio,
ir ao banheiro, se faca, arma, conforme já
alimentar, dormir, venenos etc. descrito.
entre outras.

Figura 53: Atitudes Caso não haja equipe de saúde mental adequada para atender
que acolhem. Fonte:
labSEAD-UFSC
o paciente, entre em contato com locais de atendimento
(2020). emergenciais, pois essa é uma emergência.

O indivíduo, quando se encontra nesse estado, tem


grandes probabilidades de consumar o ato num
momento de descuido de quem está realizando o
cuidado. Ele precisa ser atendido por um psiquiatra
e, inclusive, deve-se avaliar a necessidade de
internamento, caso não haja apoio familiar que
possa realizar a vigilância citada anteriormente.

Se você esgotar todas as tentativas de convencimento do


paciente para uma internação voluntária e perceber um risco
de suicídio iminente, peça ajuda à família, pois uma internação
involuntária poderá ser necessária.

315 • Módulo 5 O Suicídio


ENCAMINHANDO O PACIENTE
O paciente deve ser encaminhado para atendimento de saúde
mental nos casos acima citados.

É importante ressaltar que nem todos os


profissionais de saúde apresentam treinamento
adequado para lidar com comportamentos suicidas,
sendo necessários treinamentos adequados da
equipe e encaminhamento externo quando não
houver equipe especializada na instituição.

Nesse contexto, vamos observar como encaminhar e para


quem encaminhar.

Você deve ter tempo para explicar à pessoa a razão do encaminhamento,


sendo necessário que ela esteja ciente das providências tomadas.

Marque uma consulta ou leve a pessoa ao serviço de emergência


psiquiátrica disponível em sua cidade, no caso de situações de alto risco.

Esclareça à pessoa que o encaminhamento não significa que o


profissional da saúde está lavando as mãos em relação ao problema,
apenas que, nesse momento, faz-se necessário um acompanhamento
multidisciplinar, com o apoio de outros profissionais qualificados.

Acompanhe a pessoa no atendimento psiquiátrico, nos casos de alto


Figura 54: Como risco, além de realizar acompanhamento posterior à consulta com
e para quem a equipe de saúde mental. Você estabeleceu uma relação com esse
encaminhar a paciente e é importante não abandoná-lo no meio desse processo,
pessoa. Fonte: enquanto ele ainda está frágil e suscetível a recaídas.
labSEAD-UFSC
(2020).

Além das equipes de saúde mental disponíveis para


atendimento, é importante apresentar outras fontes de apoio
que podem ser indispensáveis nesse processo.

316 • Módulo 5 O Suicídio


Saiba mais
No Brasil, o Centro de Valorização da Vida (CVV) realiza apoio
emocional e prevenção do suicídio, atendendo voluntária
e gratuitamente todas as pessoas que querem e precisam

 conversar, sob total sigilo, por telefone (basta discar 188), e-mail
e chat 24 horas todos os dias.

Você pode obter mais informações por meio do site: cvv.org.br/


informacoes-sobre-o-atendimento-pelo-numero-188/

As fontes de apoio usualmente disponíveis são: família,


companheiros(as) namorados(as), amigos, colegas, apoio
religioso/espiritual, profissionais de saúde e grupos de apoio.

Posvenção do suicídio
Um suicídio deixa marcas, muitas vezes tão fortes que podem
vir a adoecer parentes, colegas e amigos, e pode até mesmo
levar estes que ficaram a tentativas de suicídio.

Conforme refletido anteriormente, um dos fatores


de risco se refere a ter perdido pessoas próximas
em decorrência do suicídio. Desse modo, no caso
de ocorrência de um suicídio em uma instituição,
por exemplo, torna-se necessário um maior cuidado
com quem estava presente, quem era próximo, e, até
mesmo, quem simplesmente convivia com o falecido.

O espírito de corpo, presente em algumas instituições de


segurança, pode levar a consequências naqueles que ficaram,
gerando uma identificação através da atividade e dos problemas
que “supostamente” seriam os influenciadores do suicídio.

317 • Módulo 5 O Suicídio


Palavra do Especialista
O termo posvenção é conhecido mundialmente como uma
ferramenta de cuidado da saúde mental das pessoas. Teve

 seu surgimento a partir de estudos realizados por Shneidman


(1973) e se refere a ações, atividades, intervenções, suporte e
assistência para aqueles impactados por um suicídio completo,
ou seja, os sobreviventes.

O termo sobreviventes se refere a todas as pessoas afetadas


por um suicídio: pais, filhos, irmãos, familiares, amigos, colegas
etc. Além disso, pessoas que perderam alguém significativo por
suicídio e aquelas que tiveram a vida afetada ou mudada por
causa dessa morte são consideradas sobreviventes.

Nas pesquisas apresentadas aqui com agentes


de segurança pelo Brasil, foi evidenciado o
efeito negativo de um suicídio no restante das
corporações/instituição.

Desse modo, é relevante que seja realizada uma proposta


de cuidado também com os que ficaram, desde os
agentes, colegas de trabalho, até mesmo com familiares
mais próximos. No caso das instituições que possuam
núcleos de saúde, é relevante que seja disponibilizado
acompanhamento adequado no caso de ocorrências de
suicídio com as equipes de trabalho.

Por fim, podemos ter acesso a reflexões indispensáveis


para a compreensão do suicídio como ato multifatorial,
conhecer quais fatores contribuem para o surgimento de
comportamentos suicidas e quais fatores diminuem a chance
de os indivíduos desenvolverem esse comportamento.
Reforçamos que o suicídio é um problema de saúde pública
e que precisa ser levado em conta para que os programas

318 • Módulo 5 O Suicídio


sejam propostos de forma eficaz, tendo como meta principal
limitar certos fatores de risco e maximizar os fatores que
reforçam a resiliência.

Seja você também uma rede de apoio para seus colegas e


pessoas à sua volta e procure ajuda profissional sempre
que precisar.

319 • Módulo 5 O Suicídio


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320 • Módulo 5 O Suicídio


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321 • Módulo 5 O Suicídio


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322 • Módulo 5 O Suicídio


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323 • Módulo 5 O Suicídio


MÓDULO 6

PREVENÇÃO, PROMOÇAO
E TRATAMENTO DA
SAÚDE MENTAL
324 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental
Apresentação

Apesar de o termo saúde mental ser tão divulgado nos


dias atuais, ainda existe um histórico de preconceitos e
discriminações no mundo todo em relação ao tema. E como é um
comportamento emitido há tantos anos, ressignificar a percepção
que as pessoas têm a respeito do tema é um trabalho que
demandará ainda muito tempo, mas que é necessário.

Neste último módulo do curso, diante de tudo o que aprendemos,


vamos abordar a importância da saúde mental dos profissionais
de segurança pública, por meio de aspectos que incentivam a
prevenção, promoção e tratamento da saúde mental.

OBJETIVOS DO MÓDULO
Conhecer, por meio de base teórica, diversos temas
relacionados a prevenção, promoção e tratamento da saúde
mental do agente de segurança pública.

ESTRUTURA DO MÓDULO
• Aula 1 – Descontruindo Rótulos: Crenças Equivocadas,
Preconceitos e Bullying.
• Aula 2 – Psiquiatria e Psicologia.
• Aula 3 – Psicofarmacologia e Terapias Complementares.
• Aula 4 – Rede de Assistência.
• Aula 5 – Responsabilidade do Cuidado.

325 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Aula 1 – Descontruindo Rótulos: Crenças
Equivocadas, Preconceitos e Bullying

CONTEXTUALIZANDO...
O preconceito deixa de existir quando passamos a ter
conhecimento, quando entendemos o que é a saúde
mental, e, a partir de então, torna-se obrigatória a emissão
de comportamento de ajuda, desconstruindo rótulos e
minimizando preconceitos e bullying.

Assim sendo, para começar a falar de saúde mental nos


tempos atuais, é interessante contextualizar esse assunto
historicamente e identificarmos quando e como surgiu o
olhar para ela.

ASPECTOS HISTÓRICOS RELACIONADOS


AO TEMA DE SAÚDE MENTAL
Um dos precursores sobre saúde mental foi Philippe Pinel.
Ele foi pioneiro no tratamento de doentes mentais e no
avanço da psiquiatria moderna.

Philippe Pinel

Formado em Medicina pela Universidade de Tolouse (França),


dirigiu os hospitais de Bicêtre e Salpêtrière. Na sua biografia,
Figura 1: Philippe consta que se interessou por essa área depois que um amigo
Pinel. Fonte: tomado de loucura fugiu para uma floresta, tendo sido devorado
Philippe... (2020), por lobos. Da observação dos seus próprios pacientes, em 1801,
adaptado por
publicou seu Tratado médico-filosófico sobre a alienação mental.
labSEAD-UFSC
(2020).

326 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


No Tratado médico-filosófico sobre a alienação mental, Philippe
Pinel defende a doença mental “Grupo 1 – Aposentadoria” como
consequência de uma excessiva exposição a situações de
estresse, bem como a danos hereditários capazes de provocar
alterações patológicas no cérebro.

Com base nisso, ele baniu antigos tratamentos que eram


empregados, tais como: vômitos induzidos, sangrias,
purgações e ventosas, substituindo-os por um tratamento
digno e respeitoso, que inclui terapias ocupacionais. Foi, ainda,
um dos primeiros a libertar os pacientes das correntes e dos
manicômios, propiciando-lhes, assim, momentos de liberdade
que, por si só, eram terapêuticos (SÃO PAULO, 2003).

As teorias de Pinel eram consideradas avançadas


para a época e nem sempre foram totalmente
aceitas. Assim, havia instituições que, mesmo
depois da publicação de seus estudos, tratavam os
loucos como criminosos ou “endemoniados”.

Essas instituições não dispensavam os tratamentos físicos,


em que se buscava dar um “choque” nos pacientes, para que
saíssem de seu estado de alienação. Também eram frequentes
banhos de água fria, isolamentos em quartos escuros, uso
de aparelhos que rodopiavam os pacientes em macas por
horas, ou até que perdessem a consciência. Assim, Pinel foi
pioneiro em separar pacientes dos criminosos e colocá-los sob
cuidados médicos (SÃO PAULO, 2003).

327 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Saiba mais
Philippe Pinel teve grandes contribuições para os estudos de
saúde mental. Para saber mais sobre sua vida e seus estudos,

 clique no link abaixo e conheça.

Quem foi Philippe Pinel: http://www.saude.sp.gov.br/caism-


philippe-pinel/institucional/quem-foi-philippe-pinel.

De acordo com Almeida e Campos (2019), no Brasil, um


primeiro olhar sobre a loucura, ao menos na identificação
dos “sujeitos desviantes”, data do período colonial, em uma
sociedade escravista e ruralista, na qual o Estado e a Igreja
controlavam os “loucos”, por meio da exclusão.

No período de 1830 até a República (1989), a classe médica


se movimentou para que essa população pudesse receber
tratamento à luz da psiquiatria, transformando a “loucura”
em doença mental, caracterizando uma mudança qualitativa
na atenção.

A pesquisa diz ainda que, nas décadas seguintes até 1960,


ocorreu o aumento da população internada, superlotação das
instituições e precarização da atenção, ao mesmo tempo que
se ampliaram os estudos e possibilidades de tratamento, como
a eletroconvulsoterapia e a farmacoterapia, agregando novos
interesses à saúde mental, como o da indústria farmacêutica e
das instituições privadas de prestação de serviços de saúde.

Almeida e Campos (2019) referem ainda que, na década


de 1970, em meio ao Regime Militar, a conjuntura era de
investimento no crescimento econômico do país, que
prevalecia sobre os interesses sociais. Tal contexto agravava
as condições gerais da população e fazia emergir forças,
movimentos pró-reforma, pautados na luta por direitos.

328 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


As políticas públicas para a atenção à saúde
mental eram questionadas. Ideários progressistas
reconheciam a necessidade de integração da saúde
mental à saúde pública, e ao mesmo tempo defendia-
se o hospital psiquiátrico como empresa privada.

O Movimento da Reforma Psiquiátrica iniciou no final da


década de 1970, em pleno processo de redemocratização do
país. Em 1987, dois eventos foram importantes para a escolha
do dia que simboliza essa luta. Vamos conhecê-los a seguir.

Figura 2: Marcos O Encontro dos A 1ª


importantes Trabalhadores Conferência
do Movimento
da Reforma
da Saúde Nacional de
Psiquiátrica. Fonte: Mental, em Saúde Mental,
labSEAD-UFSC Bauru/SP. em Brasília.
(2020).

Segundo a Biblioteca Virtual da Saúde (BRASIL, 2018), do


Ministério da Saúde, diferentes categorias profissionais,
associações de usuários e familiares, instituições acadêmicas,
representações políticas e outros segmentos da sociedade
questionaram o modelo clássico de assistência centrado em
internações em hospitais psiquiátricos. Foram denunciadas
as graves violações aos direitos das pessoas com transtornos
mentais e foi proposta a reorganização do modelo de atenção
em saúde mental no Brasil a partir de serviços abertos,
comunitários e territorializados.

O objetivo era buscar a garantia da cidadania de usuários


e familiares, historicamente discriminados e excluídos da
sociedade, com o lema “Por uma sociedade sem manicômios”.

Assim como o Movimento da Reforma Sanitária, que resultou


na garantia constitucional da saúde como direito de todos e

329 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


dever do Estado, por meio da criação do Sistema Único de
Saúde, o Movimento da Reforma Psiquiátrica contribuiu para a
aprovação da Lei 10.216/2001, nomeada “Lei Paulo Delgado”.

A lei trata da proteção dos direitos das pessoas


com transtornos mentais e redireciona o modelo de
assistência. Este marco legal também estabelece
a responsabilidade do Estado no desenvolvimento
da política de saúde mental no Brasil, por meio do
fechamento de hospitais psiquiátricos, abertura
de novos serviços comunitários e participação
social no acompanhamento de sua implementação
(BRASIL, 2018).

A Biblioteca Virtual da Saúde também apresenta o Movimento


da Luta Antimanicomial, que se caracteriza pela busca dos
direitos das pessoas com sofrimento mental. Vamos entender
melhor o movimento na imagem a seguir.

Combate à ideia de que se deve isolar


o adoecido em nome de pretensos
tratamentos, baseada apenas nos
preconceitos que cercam a doença mental.

Destacam que, como todo cidadão, as


pessoas adoecidas mentalmente têm
o direito fundamental à liberdade, o
direito a viver em sociedade, além do
Figura 3:
Movimento da Luta
direto a receber cuidado e tratamento
Antimanicomial. sem que para isto tenham que abrir
Fonte: labSEAD- mão de seu lugar de cidadãos.
UFSC (2020).

Diante do apresentado, podemos entender que desde sempre


a saúde mental vem associada a manicômio e loucura. Porém,
faz-se necessária a separação dos diagnósticos e, portanto,

330 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


a clarificação de que transtorno mental engloba uma série de
diagnósticos, e não necessariamente os associados à “loucura”.

Além disso, ainda que o diagnóstico seja o mais grave, os


chamados de “loucos” têm os mesmos direitos de tratamento
que os chamados de “normais”. Em aspas porque vale sempre
aprofundar sobre o que chamamos de normal e de anormal e
qual a nossa referência de normalidade.

Foi por ocasião dessa ressignificação do tratamento da saúde


mental que ocorreu o surgimento do ambulatório psiquiátrico.

Palavra do Especialista
Tal ato ocorreu a partir do aparecimento de denúncias sobre as
condições precárias de tratamentos aos usuários de internações
hospitalares psiquiátricas, que foram influenciadas pelo processo de

 reorganização do que significava a loucura. Assim, criou-se a proposta


do ambulatório de assistência psiquiátrica, que serviria para aliar-se
ao hospital, propiciando melhor atendimento aos que acabassem
de sair de uma internação psiquiátrica e à população em geral,
oferecendo atendimento psicoterapêutico (LEONARDO et al., 2017).

A história do Diagnóstico dos Transtornos Mentais (DSM)


se dá em meados de 1840. Os Estados Unidos da América
(EUA) empreenderam um censo que contava com a categoria
“idiotia/loucura”, procurando registrar a frequência de doenças
mentais. No censo de 1880, essas doenças foram divididas
em sete categorias: mania, melancolia, monomania, paresia,
demência, dipsomania e epilepsia.

Araujo e Lotufo Neto (2014) observaram as primeiras


classificações norte-americanas de transtornos
mentais aplicadas em larga escala, que tinham
objetivo primordialmente estatístico.

331 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Os autores ainda destacam que, no início do século XX, o
Exército norte-americano, juntamente com a Associação
de Veteranos, desenvolveu uma das mais completas
categorizações para aplicação nos ambulatórios que
prestavam atendimento a ex-combatentes. Em 1948, sobre
forte influência desse instrumento, a Organização Mundial da
Saúde (OMS) incluiu pela primeira vez uma sessão destinada
aos transtornos mentais na sexta edição de seu sistema de
Classificação Internacional de Doenças (CID-6).

A primeira edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de


Transtornos Mentais (DSM) foi publicada pela Associação
Americana de Psiquiatria (APA) em 1953, sendo o primeiro
documento orientador de transtornos mentais focado na
aplicação clínica. A primeira edição do documento consistia
basicamente em uma lista de diagnósticos categorizados,
com um glossário que trazia a descrição clínica de cada
categoria diagnóstica.

Palavra do Especialista
Apesar de rudimentar, o manual serviu para motivar uma série de
revisões sobre questões relacionadas às doenças mentais.
 O DSM-II, desenvolvido paralelamente com o CID-8, foi publicado
em 1968 e era bastante similar ao DSM-I, trazendo discretas
alterações na terminologia (ARAUJO; LOTUFO NETO, 2014).

O DSM-5, oficialmente publicado em 18 de maio de 2013,


é a mais nova edição do DSM da APA (ARAUJO; LOTUFO
NETO, 2014). A publicação é o resultado de um processo
de doze anos de estudos, revisões e pesquisas de campos
realizados por centenas de profissionais divididos em
diferentes grupos de trabalho.

332 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Palavra do Especialista
O objetivo final foi o de garantir que a nova classificação, com a

 inclusão, reformulação e exclusão de diagnósticos, fornecesse


uma fonte segura e cientificamente embasada para aplicação na
pesquisa e na prática clínica (ARAUJO; LOTUFO NETO, 2014).

Vamos identificar na figura abaixo o índice da quinta edição


do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais
(ARAUJO; LOTUFO NETO, 2014).

Figura 4: Índice da
quinta edição do
Manual Diagnóstico
e Estatístico
de Transtornos
Mentais. Fonte:
DSM-5 (ARAUJO;
LOTUFO NETO,
2014), adaptado
por labSEAD-UFSC
(2020).

Conforme pode ser verificado na figura acima, não se identifica


nenhum diagnóstico chamado de “idiotia/loucura”, tampouco
retardo mental, maluco, doido, pinel, entre tantos outros
adjetivos atribuídos pelos próprios agentes de segurança
pública aos seus colegas.

333 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


E é justamente sob esta observação que se objetiva
este módulo: alertar sobre as consequências que
as forças de segurança pública estão sofrendo
por ocasião do comportamento de preconceito
e discriminação acerca do adoecimento e do
tratamento da saúde mental.

A Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) criou uma


campanha contra a psicofobia, que é o preconceito contra os
portadores de transtornos mentais.

Figura 5: Chico
Anysio. Fonte:
Chico... (2020), Chico Anysio
adaptado por
labSEAD-UFSC
(2020).
A palavra foi criada em parceria com o mestre do humor brasileiro
Chico Anysio, que tratava da depressão há 24 anos e fez questão
de gravar um depoimento para ABP contando a sua história e
falando sobre a importância do tratamento psiquiátrico. Segundo
ele, se não fosse o tratamento psiquiátrico, não teria feito nem
20% do que fez em vida. Chico chamou atenção para a falta de um
nome para descrever esse preconceito, assim como existe para
Atitudes homofobia e racismo. E foi uma ideia de gênio, como todas as que
preconceituosas ele tinha, e ficou estabelecido o dia 12 de abril como Dia Nacional de
e discriminatórias Enfrentamento à Psicobofia.
contra os
deficientes e
os portadores
transtornos Importante alertar também sobre o Projeto de Lei n.º 74, de
mentais. 2014, de autoria do senador Paulo Davim, que visa tornar a
psicofobia um crime, assim como são crimes a homofobia
e o racismo. O que se pretende com isso é divulgar que
existe o preconceito, que até então era encoberto, e que se
deve combatê-lo para ajudar 50 milhões de portadores de
transtornos mentais que sofrem discriminação no Brasil.

334 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Saiba mais
A psicofobia é um assunto pouco discutido na sociedade, mas
que merece e precisa de total atenção. Acesse o link abaixo e


entenda mais sobre o tema por meio de depoimentos de pessoas
que vivem na pele esse preconceito.

Psicofobia: seu preconceito causa sofrimento – https://www.


psicofobia.com.br/.

Agora que conhecemos esse pequeno histórico sobre o


que ocorre no âmbito de diagnóstico, tratamento, lutas
antimanicomiais e psicofobia, esperamos de você o mínimo de
autorreflexão sobre os próprios comportamentos e de como o
seu preconceito por desconhecer o que é a saúde mental pode
contribuir para o seu adoecimento ou de outros à sua volta.
Reflita sobre a importância de pedir ajuda, de não se esconder
e sobre o próprio suicídio. A luta e o olhar para as pessoas
acometidas por doenças mentais ainda estão no começo, e a
responsabilidade é de todos, e é por meio do conhecimento
que se constrói uma comunidade mais justa e responsável.

335 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Aula 2 – Psiquiatria e Psicologia

CONTEXTUALIZANDO...
No Brasil, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) mostra que
cerca de 23 milhões de pessoas possuem algum transtorno
mental, e cinco milhões desses brasileiros sofrem de
transtornos persistentes e graves. De acordo com a ABP, a
política de saúde mental prioriza a esquizofrenia e o transtorno
bipolar como as doenças mais graves, e a depressão, a
ansiedade e a dependência como as mais prevalentes.

A psiquiatria é uma área que atua com a prevenção, atendimento,


diagnóstico, tratamento e reabilitação das diferentes formas de
sofrimentos mentais. Já a psicologia é uma ciência que envolve o
atendimento clínico psicológico que pode ser realizado de forma
individual, em grupo, familiar ou casal.

Nesse contexto, vamos entender o papel da psiquiatria e da


psicologia no combate ao adoecimento mental, tratamento e
prevenção da saúde mental dos agentes físicos.

PSIQUIATRIA
A psiquiatria é uma especialidade da medicina que trabalha
com prevenção, atendimento, diagnóstico, tratamento e
reabilitação das diferentes formas de sofrimentos mentais,
seja de cunho orgânico ou funcional, com manifestações
psicológicas severas. É também atribuição do psiquiatra,
por meio de exames clínicos, físicos e demais avaliações, o
diagnóstico de adoecimento mental.

336 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Figura 6: Médico
psiquiátrico. Fonte:
Pixabay (2020). Também é competência exclusiva do médico psiquiátrico
a prescrição de psicofármacos quando se faz necessário
o tratamento por meio medicamentoso. Essa informação é
importante porque a realidade no Brasil hoje não limita apenas
ao psiquiatra a prescrição de psicofármacos e não é incomum
pessoas acometidas por alguma doença mental serem
tratadas por outras especialidades médicas.

Infere-se que tal comportamento do paciente de


buscar outras especialidades para tratamento
medicamentoso dar-se-á por ocasião da psicofobia
e da associação direta da psiquiatria com a loucura.

Todavia deveria ser obrigatório os médicos de outra


especialidade encaminharem pacientes que apresentem
sintomas de adoecimento mental para o médico responsável,
porque o psiquiatra é o profissional mais preparado para
diagnosticar, medicar (se for necessário), acompanhar e tratar.

337 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Palavra do Especialista
Segundo Araujo e Lotufo Neto (2014), a visão da psiquiatria
traduzida por meio da psicopatologia segue o modelo médico
instituído desde os tempos hipocráticos, nos quais o diagnóstico

 era fundamentalmente empírico. A observação, descrição e


categorização de enfermidades que compartilham sinais e
sintomas permite a formulação de diagnósticos que, por sua vez,
auxiliam na identificação da causa de uma determinada patologia,
na previsão de sua evolução e no planejamento terapêutico.

Perceba que, a partir da existência de transtornos mentais, a


psiquiatria atuará como peça fundamental. É uma das ciências
responsáveis pelo diagnóstico e direcionamento de tratamento
mais eficaz para cada tipologia de doença mental, além da
competência exclusiva do médico psiquiátrico de prescrever
psicofármacos, quando se faz necessário. Então, sempre que
for preciso, deve-se procurar um psiquiatra.

PSICOLOGIA
A psicologia é uma ciência que, dentre tantas possibilidades de
atuação profissional, atua com o atendimento clínico psicológico,
que pode ser realizado de forma individual, em grupo, familiar ou
casal, e pode ser feito presencialmente ou on-line, em clínicas,
consultórios psicológicos, hospitais de apoio, centros de
internação, hospitais-dia, policlínicas e outros.

O objetivo central do psicólogo clínico é ajudar o


paciente a compreender o que causa o sofrimento
emocional e planejar tratamento.

Por conta desse objetivo, Macedo e Dimenstein (2010)


realizaram uma pesquisa sobre a formação de psicólogos
para a saúde mental, e chegaram ao resultado de que os
cursos de psicologia lidam claramente com duas concepções

338 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


e entendimentos para instrumentalizarem saberes e práticas
para a saúde mental. Vamos entendê-los na imagem a seguir.

Expressa uma perspectiva completamente centrada na


1 doença, apoiada pelo paradigma biomédico ou asilar, com
foco no diagnóstico e remissão dos sintomas a partir da
ação farmacológica e psicoterápica.

Expressa uma perspectiva centrada nas potencialidades dos


Figura 7:
Entendimentos
usuários e familiares, apoiada pelo paradigma psicossocial,
sobre estudantes com foco no cuidado e enfrentamento das dificuldades
de psicologia frente ao processo de sofrimento e adoecimento
psíquico. Segundo os autores, o curioso é que essas duas
em relação ao
uso dos saberes 2 concepções são apresentadas sem qualquer referência
e práticas para crítica e reflexiva uma da outra, fazendo, inclusive, com
a saúde mental,
segundo Macedo e
que sejam entendidas como complementares. O principal
Dimenstein (2010). efeito disso não seria outro senão a manutenção de ações
Fonte: labSEAD- centradas na doença e na objetificação do sujeito.
UFSC (2020).

O foco do tratamento psicológico, em especial dos agentes


de segurança pública, deve ser o de estabelecer a confiança,
entender as demandas por meio de uma escuta empática
a respeito da sua dor e apresentar sempre evoluções para
que sintam motivação em se manter comprometidos com o
processo terapêutico. O psicólogo precisa ser capaz de realizar
plano de ação e dar previsão de alta no caso de sucesso no
tratamento, e, por essa razão, para a análise do comportamento,
que é uma das abordagens teóricas, a formulação de um
diagnóstico passa pela compreensão dos comportamentos
que são tidos como inadequados, e isso requer a análise das
contingências que os instalaram e que os mantêm.

Por ocasião da necessidade de conhecimento no que tange à


área de saúde mental, é importante entender a necessidade
do DSM-5, mas deve-se também, conforme alertam Macedo e
Dimenstein (2010), ter o cuidado para não centrar somente na
doença, e sim no paciente, para saber o que fazer com o que
ouve e com o que vê.

339 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Assim como na psiquiatria, na psicologia também DEVE ser
obrigatória a especialização para atuação clínica. Mas por que
isso é importante?

O curso de psicologia é generalista e, para que o


psicólogo tenha habilidade e competências técnicas
para lidar com o sofrimento do outro, é necessária a
formação clínica em alguma abordagem teórica.

Ou seja, psiquiatra é o médico com especialização em


psiquiatria, e psicólogo é o profissional que você deve escolher
entre os que têm formação e/ou especialização em alguma
abordagem teórica. Entendendo isso, parte-se para o processo
de tratamento em conjunto.

Saiba mais
Existem diferentes abordagens teóricas utilizadas por
psicólogos, elas são importantes para direcionar o tratamento
adequado para cada paciente.

 Assista o vídeo no link a seguir e entenda as mais influentes


abordagens teóricas da psicoterapia.

Quais são as abordagens na psicoterapia? https://www.youtube.


com/watch?v=PbdwQMfhALA

É importante reforçar que nem todo paciente que faz uso


de medicamentos necessita de psicoterapia (caso sua
deficiência seja orgânica), bem como nem todo paciente que
faz psicoterapia precisa fazer uso medicamentoso. Há ainda
aqueles que precisam fazer uso medicamentoso e terapia ao
mesmo tempo. Cada caso é um caso.

340 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


É muito comum que os agentes de segurança pública busquem
ajuda para o sofrimento emocional quando começam a ter
perdas reais (profissionais, familiares, financeiras, compulsões
etc.). A depender da gravidade do adoecimento, é fundamental
e obrigatório o atendimento em conjunto do médico psiquiatra
e psicólogo, que irão avaliar a necessidade de afastamento
total das atividades laborais ou de afastamento das atividades
de rua com a perda obrigatória do porte de arma, ou, ainda,
a necessidade de internação. No entanto, em muitas
vezes é possível limitar-se apenas ao acompanhamento
psicoterapêutico, com a manutenção das atividades.

341 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Aula 3 – Psicofarmacologia e Terapias
Complementares

CONTEXTUALIZANDO...
A terapia medicamentosa para o tratamento de transtornos
mentais é feita pelo uso de psicofármacos, que são
medicamentos que alteram a atividade cerebral aliviando
os sintomas dos transtornos psiquiátricos e ajudando na
reintegração do indivíduo ao meio familiar e social. Leonardo
et al. (2014) referem que os medicamentos podem, ainda,
contribuir para a diminuição do número de recaídas e para
maior adesão ao tratamento, e existe uma grande prevalência
de uso de psicofármacos pela população mundial, os quais
são ferramentas importantes no tratamento de pessoas com
transtornos mentais.

Também existem as terapias complementares e


comportamentos saudáveis que podem servir tanto para
tratamento como para prevenção da saúde mental do agente
de segurança pública. E é por esses dois caminhos que
seguiremos com nosso conhecimento a partir de agora.

PSICOFARMACOLOGIA
O aumento do uso desses medicamentos vem sendo atribuído
ao crescimento de diagnósticos de transtornos mentais na
população, bem como à introdução de psicofármacos novos
no mercado farmacêutico e às novas indicações terapêuticas
dos psicofármacos já existentes. Porém, o uso deles é um
dos maiores tabus atrelados aos preconceitos que rodeiam o
tratamento dos transtornos mentais.

Existem divergências na comunidade médica sobre doenças


como depressão e ansiedade serem causadas por um
desequilíbrio químico cerebral. Entretanto, a prática do
tratamento com remédios é a mais utilizada atualmente.

342 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Muitas vezes, a prática do tratamento com medicamentos surte
bons efeitos, porém seu uso é, cada vez mais, banalizado e
empregado em problemas pontuais. O que isso significa? Que
várias pessoas, ao invés de resolver os problemas, querem fingir
que eles não existem e apenas se medicam. É como se sentir-se
triste por alguns dias fosse inaceitável, ter preocupações
eventualmente que tirem o apetite ou causem insônia fosse
inadmissível ou comprar um inibidor de apetite ao invés de se
alimentar corretamente quando se quer emagrecer.

Para estabelecer qual medicação deve ser receitada, o médico


leva em consideração o possível diagnóstico.

Casos de transtornos mentais são repletos de


peculiaridades em relação aos sintomas e levam
mais tempo para um diagnóstico preciso. Idade do
paciente, seus problemas físicos (problemas hepáticos
ou vasculares) e a resposta ao uso de medicamentos
anteriormente também são levados em conta.

Quando um paciente inicia um tratamento medicamentoso,


este pode levar até 15 dias para fazer efeito e em muitos casos
apresenta uma série de efeitos colaterais que fazem com que
muitos abandonem o tratamento sem a devida orientação.

Os psicofármacos podem ser divididos em quatro classes


amplas. Vamos entendê-las na imagem a seguir.

Ansiolíticos Antidepressivos
São utilizados para Usados para
ansiedade. depressão.

343 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Figura 8: Antimaníacos Antipsicóticos
Psicofármacos.
Fonte: labSEAD- (estabilizadores do humor) Utilizados no tratamento
UFSC (2020). Usados para depressão. das psicoses.

Ao ter um tópico para falar dos psicofármacos, busca-se


desconstruir o rótulo de loucura e atribuir uma deficiência
química cerebral. Portanto, de uma maneira bem superficial,
é importante saber que a maioria dos ansiolíticos atua em
um neurotransmissor denominado GABA, atuando sob seus
receptores e melhorando sua afinidade. Os ansiolíticos se
dividem entre benzodiazepínicos e barbitúricos. A diferença é que
o segundo aumenta a receptividade dos neurotransmissores de
outras formas que não por atuação no GABA.

Figura 9:
Ansiolíticos atuam
no sintoma da
doença. Fonte:
Pixabay (2020).

Os ansiolíticos, diferentemente dos antidepressivos, atuam


no sintoma, e não em sua causa. Os efeitos colaterais mais
comuns dos pacientes que utilizam esse tipo de medicação são:
perda de memória, fadiga, sedação, sonolência, incoordenação
motora, diminuição da concentração, atenção e reflexos.

Os efeitos em longo prazo que mais preocupam os pacientes que


são tratados com ansiolíticos são uma possível dependência,

344 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


crises de abstinência e efeito rebote. Para evitar esses problemas,
é necessário estabelecer um tempo de tratamento e retirar a
Retorno dos
sintomas mesmo medicação de forma gradual e com acompanhamento médico.
após o tratamento.
Os pacientes depressivos apresentam uma falha na
neurotransmissão por serotonina e noradrenalina. Nesse
caso, o uso de antidepressivos é de fundamental importância,
a depender do diagnóstico; porém, há uma série de efeitos
colaterais causados pelo seu uso que são relevantes na vida
das pessoas, tais como: boca seca, retenção urinária, queda
de pressão, constipação intestinal, visão borrada, taquicardia,
tonturas, sudorese, sedação, ganho de peso, tremores, cefaleia,
ansiedade, náuseas, diminuição do apetite e do desejo sexual,
inquietude, insônia, nervosismo e tremores.

É importante ressaltar que a medicação é apenas uma das


ferramentas que há para o tratamento. Ela apresenta uma série
de contraindicações e riscos, mas pode ser a melhor opção em
alguns casos. Indica-se associar o tratamento medicamentoso
à psicoterapia e fazer visitas frequentes ao psiquiatra e
outros profissionais da área. Eles podem estabelecer o melhor
tratamento e intervir em situações de risco.

Dito isso, seguem algumas possibilidades de terapias


complementares e comportamentos saudáveis que também
podem servir tanto para tratamento e prevenção de doenças e
transtornos mentais quanto para a manutenção e motivação da
saúde mental dos agentes de segurança ou de qualquer indivíduo.

TERAPIAS COMPLEMENTARES
As terapias complementares, como a própria denominação
sugere, servem como complemento às terapias com uso de
psicofármacos. Por meio delas, pode-se estimular prevenção
e tratamento às doenças e transtornos mentais, mas o mais
importante é a manutenção e motivação da saúde mental
proporcionada por essas práticas. Vamos conhecer algumas
delas, a partir de agora.

345 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Psicoterapia
A primeira delas é a psicoterapia. Por meio da psicologia,
pode-se identificar o que te incomoda e por que te incomoda,
o que te causa dor e por que dói. Ela ajuda a entender
quais são as decisões que precisam ser tomadas na vida,
a fazer avaliação de perdas e ganhos com elas, quais
comportamentos que precisam ser modificados, entre
outros. A psicoterapia não tem tempo definido, depende
do compromisso do paciente com o tratamento e das
consequências no ambiente em que está inserido.

É fundamental informar que na psicologia existem diversas


abordagens clínicas e que cada uma delas pode seguir um modelo
de tratamento diferente, mas todas buscam o mesmo resultado:
o bem-estar do paciente em sofrimento. Saber dessa diversidade
de abordagem é importante para que o paciente possa escolher a
abordagem com a qual ele se identifique. As mais comuns entre
elas estão destacadas na imagem a seguir.

Psicanálise

Humanista, que
Terapia cognitivo- se caracteriza pela
comportamental psicologia centrada
(TCC) na pessoa

Figura 10: Behaviorismo,


Abordagens da ou psicologia Gestalt-terapia
psicoterapia. Fonte: comportamental
labSEAD-UFSC
(2020).

O importante a se reforçar é que ter o acompanhamento de


um psicólogo no dia a dia pode promover transformações

346 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


significativas em sua vida, independente do que o motivou a
iniciar a psicoterapia. Com a ajuda do psicólogo, é possível
identificar as causas e os padrões comportamentais que
possam estar te impedindo de ter uma vida mais feliz.

Psicoterapia
Figura 11: O que
a psicoterapia
representa. Fonte: A psicoterapia ilustra de maneira nítida os pontos que
Freepik (2020),
adaptado por
necessitam de atenção e reparo em nosso cotidiano, para
labSEAD-UFSC que possamos gerar mudanças.
(2020).

O ponto de atenção na segurança pública é porque, como


existe uma crença de seres humanos superiores a tudo (frio,
calor, sono, sede, fome etc.), a procura por ajuda profissional
caracteriza fraqueza, e a grande maioria quando busca o
tratamento já chega num estado de sofrimento tão grande que
torna o processo muito mais longo e difícil.

Por essa razão, sempre que você entender que precisa


conversar com alguém que tenha uma escuta empática,
sem julgamentos, ou para compreender muita coisa sobre
você, procure o psicólogo. Ele é a pessoa indicada para te
ajudar a se conhecer.

Yoga e atividades similares


Para quem apresenta um alto grau de ansiedade, a prática
diária de yoga e respiração do diafragma é bastante útil.
Um estudo conduzido por Li et al. (2019) teve como objetivo
agrupar literatura sobre o exercício mente-corpo e provar que
tem sido reconhecido como uma estratégia benéfica para a
saúde mental.

347 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Exercícios para
Figura 12: mente e corpo
Combinação de
exercícios mente e Os resultados desse agrupamento literário sugerem que
corpo como terapia exercícios mente-corpo (tai chi, qi gong, yoga) podem reduzir
complementar. a ansiedade e a depressão em pacientes e que, na condição
Fonte: Freepik
de nenhuma reação adversa, os médicos podem combinar
(2020), adaptado
por labSEAD-UFSC exercícios mente-corpo com assistência médica para otimizar o
(2020). tratamento da ansiedade e da depressão em pacientes.

Outro estudo, realizado por Shannahoff-Khalsa et al. (2019),


aborda o transtorno obsessivo-compulsivo (TOC), um distúrbio
que, ao longo da vida, apresenta um alto comprometimento
psicossocial. O estudo diz que cerca de 30% dos pacientes
pesquisados não responderam a terapias combinadas de
primeira linha (medicamentos e prevenção de exposição e
resposta) e relata que pesquisas anteriores demonstraram que
a meditação da kundalini yoga (KY) pode levar a uma melhora
nos sintomas de gravidade obsessivo-compulsiva.

Atividade física
Com o envelhecimento da tropa e o aumento da expectativa de
vida, o objetivo principal da atividade física deixa de ser apenas
prolongar a vida, mas principalmente manter a independência
e autonomia do agente pelo maior tempo possível. E uma vez
que o estilo de vida dos agentes de segurança pública tem sido
caracterizado por um conjunto de fatores comportamentais
que trazem risco para a sua saúde, faz-se necessário
considerar intervenções que reduzam o comportamento
sedentário e aumentem o nível de atividade física.

Esse é o desafio. Mesmo que as instituições liberem seus


agentes 1 hora do expediente todos os dias para a prática de
atividade física, não são todos que fazem uso desse benefício.

348 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Atividade física

Figura 13: Segundo Meneguci et al. (2016), considerando a atividade física


A importância das em seus aspectos morfofisiológicos, pode-se dizer que não só
atividades físicas, é importante mas é essencial à vida. Ela estimula o sistema
segundo Meneguci
imunológico, fortalece os músculos, melhora a oxigenação em
et al. (2016). Fonte:
Freepik (2020), todo o corpo, evita doenças que afetam o sistema circulatório,
adaptado por além de melhorar o sistema cardiovascular.
labSEAD-UFSC
(2020).

Ainda segundo estudo do autor, a atividade física promove


também benefícios no que chamamos de saúde psíquica ou
mental, a qual envolve certo equilíbrio de emoções, o controle
do estresse, a obtenção de prazer na vida. Ela também beneficia
aqueles que já estão na fase de exaustão do estresse, em
depressão ou com crises de ansiedade. O indivíduo que se
encontra dessa forma terá redução na sua capacidade de
aprender e memorizar. Tanto nessa situação quanto em outros
fenômenos, a atividade física pode auxiliar na manutenção ou
recuperação da saúde psíquica.

Quando se fala em atividade, pode-se entender QUALQUER


prática, seja ela coletiva, individual, de alto desempenho, luta,
dança, musculação etc. De acordo com Beck e Magalhães
(2017), a ludicidade é fundamental para que o ser humano aja
com motivação. Segundo eles, podemos dizer que a maior
parte do comportamento humano busca obter prazer (diversão,
companheirismo, amor, sexo, alimentos saborosos etc.) e evitar
a dor (física, decepções nas relações pessoais, frio e calor
excessivos, fome e sede, entre outros). Dessa forma, observa-
se um importante papel da educação física como disciplina,
adicionando prazer, diversão, criando bons hábitos em relação à
atividade física, o que propiciará mais saúde mental e física.

349 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Portanto, procure uma atividade que lhe traga
prazer, que você tenha motivação de praticar todos
os dias e faça. O foco é mobilidade e autonomia e
ainda contribui para a boa aparência física e para a
sua saúde mental.

No estudo de Beck e Magalhães (2017), é reforçada a


informação de que, uma vez estabelecida a rotina de
atividade física, acontece a descarga de endorfina que
tem efeito relaxante sobre o estado de ansiedade, entre
outros efeitos surpreendentes que vêm sendo descobertos.
Segundo Matsudo (2009, apud BECK; MAGALHÃES, 2017),
a atividade física tem efeitos benéficos, cognitivos e
psicossociais para a saúde humana.

Melhora o autoconceito, autoestima, imagem


corporal, estado de humor, tensão muscular e insônia,
prevenção ou retardo do declínio das funções
cognitivas, diminuição de risco de depressão, do
estresse, da ansiedade, do consumo de medicamentos,
além de gerar incremento da socialização.

Está esperando o quê? Procure ainda hoje algo que você goste
de fazer e movimente seu corpo. A atividade física sempre
contribuirá para sua saúde mental.

Comportamento alimentar
O comportamento alimentar diz muito sobre os hábitos e estilo
de vida de cada indivíduo e a sua alimentação está associada
à saúde e à doença. Segundo Viana (2002), algumas das mais
assustadoras doenças do nosso tempo são em grande parte
atribuíveis a hábitos alimentares não saudáveis adquiridos na
infância e na adolescência.

350 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


De acordo com esse estudo, a perspectiva nutricional se
enquadraria na prevenção secundária, e isso significava
tratar, impedir ou reduzir os efeitos negativos das deficiências
nutricionais, e tratar as perturbações do comportamento
alimentar. O autor afirma que hoje, por conta da relevância
atual do ponto de vista curativo, a nutrição e o comportamento
alimentar têm sido, cada vez mais, considerados na
perspectiva da prevenção primária.

Figura 14: A
importância de
alimentação
saudável para
a saúde. Fonte:
Freekpik (2020),
adaptado por
labSEAD-UFSC
(2020).

O estudo ainda reforça que características da dieta,


desequilíbrio nos nutrientes que a compõem, excessos ou
deficit relativo de alguns elementos têm consequências
negativas nos índices de saúde imediatos e em longo prazo
dos indivíduos. E as possíveis consequências de uma
alimentação inadequada estão relacionadas ao acometimento
de doenças como as cardiovasculares, obesidade, diabetes,
cirrose hepática e osteoporose.

Palavra do Especialista
Viana (2002) também reforça sobre a importância da história

 de vida e afirma que “a história pessoal e familiar e ainda o


envolvimento cultural, permitem compreender o porquê do
desenvolvimento dos hábitos alimentares.” (VIANA, 2002, p. 619).

351 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Uma pesquisa conduzida por Głąbska et al. (2020) teve
como objetivo realizar uma sistemática revisão dos estudos
observacionais analisando a associação entre ingestão
de frutas e vegetais e a saúde mental em adultos. Buscou
também verificar o papel de uma dieta adequadamente
equilibrada na prevenção e tratamento de transtornos mentais,
utilizando vegetais e frutas que tinham um alto teor de
nutrientes e que podem ser de grande importância no caso de
transtornos depressivos.

O estudo incluiu principalmente enfoque na depressão


e sintomas depressivos, mas também analisou outras
características que variavam de bem-estar geral e mental,
qualidade de vida, qualidade do sono, satisfação com a vida,
prosperidade, humor, autoeficácia, curiosidade, criatividade,
otimismo, autoestima, estresse, nervosismo ou felicidade,
ansiedade, distúrbios psiquiátricos menores, angústia ou
tentativa de suicídio.

Os resultados mais proeminentes indicaram que alta ingestão


total de frutas e vegetais, e alguns de seus subgrupos
específicos, incluindo frutas, citros e vegetais de folhas verdes,
podem promover níveis mais altos de otimismo e autoeficácia,
além de reduzir o nível de sofrimento psicológico, ambiguidade
e fatalismo do câncer, e proteger contra sintomas da depressão.

Em conjunto, pode-se concluir que frutas e/ou


vegetais, e alguns de seus subgrupos específicos,
incluindo os alimentos processados, parecem ter
uma influência positiva sobre a saúde mental, como
declarado na grande maioria dos estudos incluídos.
Portanto, recomenda-se consumir pelo menos
cinco porções de frutas e vegetais por dia, e esse
comportamento pode ser benéfico para saúde mental.

352 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


No geral, a ação de prevenção da saúde mental requer mais
um desenvolvimento de novos hábitos saudáveis e disciplina
do que algo subjetivo e inalcançável. É bem verdade que
algumas pessoas nascem com o componente genético e,
mesmo que façam todas as ações previstas, ainda precisam
do uso da medicação e terapia; mas é no dia a dia que
prevenimos a depressão e reduzimos a ansiedade. Por isso,
tente sempre manter uma alimentação e hábitos saudáveis.

353 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Aula 4 – Rede de Assistência

CONTEXTUALIZANDO...
Em 1988, proclamou-se a nova constituição, e a saúde passou
a ser direito de todos e dever do Estado. Aprovou-se, então,
o Sistema Único de Saúde (SUS), que foi regulamentado
em 1990, com a Lei Orgânica da Saúde (Lei 8080/1990).
Segundo Almeida e Campos (2019), as ações em saúde
mental foram integradas à atenção em saúde e visavam à
substituição do modelo manicomial. A proposta era construir
uma rede substitutiva, consoante aos princípios do SUS
(regionalização, integralidade das ações, ações de referência e
contrarreferência, participação popular).

Assim sendo, na Lei Federal 10.216/2001, ressaltou-se a


importância da construção de uma rede de atenção que
pensasse e realizasse o cuidado em saúde mental de modo
ampliado e compartilhado, para além dos muros institucionais
dos hospitais psiquiátricos: Rede de Assistência. É destacando
a importância desse tema que iremos navegar agora.

REDE DE ASSISTÊNCIA DO SUS


Com intuito de concretizar redes de assistência no país, em
fevereiro de 2002, a Portaria 336/2002 do Gabinete do Ministro
do Ministério da Saúde orientou sobre a implantação dos
Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), estabelecendo as
modalidades, de acordo com a população do município e as
especificidades do público atendido.

O SUS é subdividido em Atenção Primária, Secundária e


Terciária. Vamos então entender cada uma delas com a
imagem a seguir.

354 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


1
Atenção Primária

Na Atenção Primária, as Unidades Básica de Saúde


(UBS) são a “porta de entrada” inicial do SUS.
O objetivo desse equipamento é atender até 80%
dos problemas relacionados à saúde da população,
sem que haja necessidade de encaminhamento
de pacientes para a realização de serviços de
emergência ou para hospitais. Nas UBSs, é
possível receber atendimento básico e gratuito em
pediatria, ginecologia, clínica médica, enfermagem
e odontologia. Os principais serviços oferecidos
nos postos de saúde são consulta médica, inalação,
injeção, curativos, vacinas, coleta de exames
laboratoriais, tratamento odontológico, fornecimento
de medicamentos básicos e encaminhamento para
hospitais com médicos especializados.

2
Atenção Secundária

Na Atenção Secundária, atuam as Unidades de


Pronto Atendimento (UPA), bem como ambulatórios
e hospitais que oferecem atendimento especializado,
SAMU 192 (Serviço de Atendimento Móvel de
Urgência) e Hospitais de Média Complexidade.
Os profissionais e os equipamentos da atenção
secundária de saúde estão preparados para realizar
a intervenção e o tratamento de alguns casos de
doenças agudas e crônicas, bem como prestar os
atendimentos de urgência.

O Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU


192) é um programa que tem como finalidade prestar
os primeiros socorros à população em casos de
urgência e emergência. O atendimento funciona 24
horas por dia, com equipes de profissionais de saúde,

355 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


compostas por médicos, enfermeiros, auxiliares de
enfermagem e socorristas que atendem às urgências
de natureza traumática, clínica, pediátrica, cirúrgica,
gineco-obstétrica e de saúde mental da população.

A Rede de Atenção Secundária de saúde, ou seja,


os Hospitais de Atenção Secundária, servem para
atendimentos de média complexidade e atendem
por demanda espontânea todos os dias da semana,
durante 24 horas.

3
Atenção Terciária

No Nível Terciário de atenção à saúde estão reunidos


os serviços de alta complexidade, representados
pelos grandes hospitais e pelas clínicas de alta
complexidade. Nessa esfera, os profissionais são
altamente capacitados para executar intervenções
que interrompam situações que colocam a vida
dos pacientes em risco. Trata-se de cirurgias e
de exames mais invasivos, que exigem a mais
avançada tecnologia em saúde, com atendimento
por demanda espontânea.
Figura 15:
Subdivisão da rede
de assistência
do SUS. Fonte:
labSEAD-UFSC
(2020). Em relação à Atenção Terciária, conforme o que vimos na
imagem anterior, fica evidente que o município possui enormes
desafios no tocante à saúde mental no SUS. Desafios esses
que englobam tanto a diversidade dos territórios (modo de
ocupação, cultura, aspectos econômicos, sociais etc.) e o
contingente populacional quanto as estratégias adotadas
pela gestão municipal, sendo estas da ordem política, do
planejamento, da gestão e dos modelos de atenção propostos.

Em relação à saúde mental, os serviços são ofertados pelos


Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), que dispõem de

356 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


acolhimento diurno e noturno, avaliação inicial/anamnese,
atendimento intensivo, semi-intensivo, não intensivo,
reavaliação, busca ativa, visita domiciliar, visita institucional,
ações intersetoriais, apoio matricial, assembleia de usuários,
abordagem de rua, encaminhamento, oficina terapêutica,
oficina produtiva, grupo de arte, grupo de famílias, grupos
diversos, terapia comunitária e as atividades individuais:
serviço social, clínica médica, assistência farmacêutica,
educador físico, enfermagem, técnico de enfermagem,
psicologia, terapia ocupacional, massoterapia, educador
físico, fonoaudiologia, nutricionista e psiquiatra. Demanda
espontânea ou encaminhamento pelos postos de saúde.
Os CAPS se diferenciam em CAPS I, CAPS II, CAPS III, CAPSi
e CAPSad, de acordo com os tipos de demanda dos usuários
atendidos, da capacidade de atendimento e do tamanho.
Vamos conhecê-los na imagem abaixo.

1 Os CAPS I oferecem atendimento a municípios com


população entre 20 mil e 50 mil habitantes (19% dos
municípios brasileiros, onde residem aproximadamente
17% da população do país), tendo uma equipe mínima
de 9 profissionais de nível médio e superior. O foco são
usuários adultos com transtornos mentais graves e
persistentes, transtornos decorrentes do uso de álcool
e outras drogas. Pode acompanhar por volta de 240
pessoas por mês, de segunda a sexta-feira, funcionando
das 8h às 18h.

2 Os CAPS II oferecem atendimento a municípios com


mais de 50 mil habitantes (equivalente a 10% dos
municípios, onde residem aproximadamente 65% da
população brasileira). O público-alvo é adulto com
transtornos mentais persistentes. Operam com uma
equipe mínima de doze profissionais, com nível médio

357 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


e superior, tendo um suporte para acompanhar cerca de
360 indivíduos por mês, de segunda a sexta-feira, com
horário de funcionamento das 8h às 18h – podendo
oferecer um terceiro período, funcionando até as 21h.

3 Os CAPS III são caracterizados por serem os serviços de


maior porte da rede. Com uma previsão de cobertura para
municípios com população acima de 200 mil habitantes,
que representam uma baixa parcela dos municípios do país,
apenas 0,63%, entretanto, concentram cerca de 29% de toda
a população do Brasil. Podem funcionar 24 horas, inclusive
feriados e fins de semana. Os CAPS III trabalham com uma
equipe mínima de 16 profissionais com instrução entre nível
médio e superior, equipe noturna e nos finais de semana.

4 O CAPSi é um tipo de serviço especializado em atender


crianças e adolescentes com transtornos mentais e se
operacionaliza em municípios com população acima de 200
mil habitantes. O funcionamento acontece de segunda a
sexta-feira, das 8h às 18h, podendo também ter um terceiro
período, funcionando até às 21h. O trabalho é realizado com
uma equipe mínima de 11 profissionais com instrução entre
nível médio e superior, com capacidade média de realizar 180
acompanhamentos com crianças e adolescentes por mês.

5 Os CAPSad focam no atendimento a pessoas que utilizam


o álcool de maneira prejudicial e outras drogas, em cidades
com mais de 200.000 habitantes ou aquelas que estejam
nas fronteiras, ou, ainda, as que façam rota de tráfico de
drogas e possuem relevantes cenários epistemológicos,
Figura 16: Diferença
entre os CAPS. que precisem desse tipo de serviço para responder de
Fonte: labSEAD- forma eficaz à demanda da saúde mental.
UFSC (2020).

358 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Além da oferta do Estado, algumas instituições de segurança
pública têm em seus quadros servidores que fazem o trabalho
de assistência à saúde. Em algumas, existem Diretoria ou
Centro de Assistência Social, outras têm as suas policlínicas.
E há também algumas instituições que, além dos quadros de
saúde, têm também clínicas e hospitais conveniados para que
o servidor possa procurar ajuda.

Por ocasião dos comportamentos de discriminação,


medo de perda de porte de arma ou qualquer outra
justificativa, muitos servidores não buscam o
tratamento pela instituição. O acompanhamento
institucional pode ainda necessitar de melhorias,
mas muitas têm esse apoio e o servidor deveria
fazer uso em prol de um benefício muito maior.

Algumas instituições não possuem nenhum programa de atenção


social e/ou saúde ao servidor, mas têm, por meio de sindicatos,
a facilidade de acesso a planos de saúde. Os planos de saúde
devem oferecer o serviço de psiquiatria e psicologia, e, em muitos
casos, também fazem reembolsos de atendimentos médicos e
psicológicos; mas a busca pelo formato de cada plano é função
do servidor que faz parte desses planos de saúde.

Ainda que não tenha o plano de saúde e também não queira


buscar atendimento pela instituição, outra forma de se tentar
atendimento para saúde mental é por meio de clínica escola.
O que seria isso?

359 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


São universidades que têm os cursos de Medicina
e Psicologia ou centros de especialização em
formação clínica, e que precisam de pacientes para
atendimento. Os voluntários serão atendidos por
um preço simbólico e todos os alunos possuem
supervisão de casos. A única desvantagem
desse serviço é que ele é interrompido a cada
final de semestre, o que pode, em alguns casos,
comprometer a evolução do paciente.

Outra possibilidade é por meio de atendimentos particulares, e o


servidor poderá buscar fazer a terapia e atendimento médico com
o profissional que lhe convém e conforme sua disponibilidade.
Porém, a busca sempre é individual, e o tratamento depende do
compromisso do servidor com a sua saúde mental.

360 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Aula 5 – Responsabilidade do Cuidado

CONTEXTUALIZANDO...
Em resumo, depois de toda a contextualização dada neste
curso, sinalizamos a importância da responsabilidade do
Estado e das instituições para que provenham o necessário.
Cabe ao Estado disponibilizar e manter a Rede de Assistência
sinalizada na aula anterior, bem como garantir os direitos da
Constituição Federal Brasileira.

De acordo com Višnikar e Meško (2002), todas as


forças policiais do mundo estão defrontando-se com as
consequências do estresse a que seus policiais estão
expostos e, diante desse quadro, é premente a busca de
alternativas para minimizar o sofrimento, tendo em vista,
inclusive, a eficácia de suas ações. Ao discutir acerca da
organização do trabalho, Dejours (1992) destaca que fatores
como conteúdo da tarefa, divisão de trabalho, sistema
hierárquico, modalidades de comando e as relações de poder
são chaves para se entender o processo saúde-doença.

Nesse contexto, seguiremos com nosso estudo direcionado às


responsabilidades do cuidado existente para a preservação e
manutenção da saúde do profissional de segurança pública.

INSTITUCIONAL
Ao Estado, cabe disponibilizar a Rede de Assistência e, à
instituição, zelar pelos seus servidores. Para tanto, é de suma
importância promover capacitação de gestores, revisão da
questão de cargos e salários e equiparação salarial, inclusive
das forças estaduais, capacitar todos os agentes de segurança
pública de forma continuada e lutar para autorização do
aumento do quadro de servidores, a fim de garantir uma escala
de trabalho mais adequada. É necessário também controlar a
quantidade de extras e voluntários que os agentes têm feito,
garantindo que eles não se sobrecarreguem e cometam erros

361 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


graves; investigar e punir agentes, se possível com demissões
(chefes e subordinados) dos que praticam assédio moral e
sexual, e atos ilícitos, corruptos ou criminosos.

As instituições de segurança pública militares ainda precisam


repensar o formato atual, pois, conforme Barbosa e Menezes
(2019), o indivíduo sente o impacto das regras para a
convivência social intramuros. Não se pode simplesmente
chegar perto de um superior para conversar, é necessário
pedir permissão, fazer continência, mostrar deferência, sem se
esquecer de pedir permissão para sair.

As relações interpessoais, nesse primeiro momento,


se revestem de uma capa de artificialismo, perdem
a naturalidade e geram medo, receio de erro e tudo o
que ele pode acarretar.

Na segurança pública, o medo de errar é algo intrínseco


à profissão por ocasião dos erros e, por essa razão, deve
ser papel da instituição também prover apoio jurídico de
qualidade para que os seus agentes sejam defendidos quando
necessário, uma vez que eles atuam em prol da instituição.

Suporte à saúde
Figura 17: Suporte
à saúde pela A instituição de segurança pública precisa ter condições de dar
instituição. Fonte: suporte à saúde ao seu servidor, ou seja, ser credenciada com
Freepik (2020), o maior número de redes de hospitais e clínicas, possibilitando,
adaptado por
labSEAD-UFSC assim, ao servidor que tenha acesso aos profissionais
(2020). necessários para a manutenção da sua saúde.

362 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


A instituição deve manter a liberalidade de 1 hora no
expediente para que o agente possa continuar a praticar a
atividade física, bem como deveria incluir nessa liberalidade
casos de atendimento psicoterápico para que possa incentivar
o servidor a buscar seu tratamento e/ou a prevenção de
maneira adequada ao seu horário de expediente, evitando,
assim, afastamentos futuros devido ao não tratamento.

Cabe também à organização montar equipe de


acompanhamento de pessoas que forem afastadas por
ocasião de saúde mental, garantindo assim que os afastados
realmente se tratem. A elas também cabe a responsabilidade
de fazer, durante todo o ano, campanhas que garantam
a saúde física e mental de seu servidor, como palestras,
encontros, prática de yoga, informativos, bem como usar de
forma mais inteligente a intranet na divulgação de tudo que
vem produzido em relação à saúde física e mental do agente
de segurança pública e também abrir um canal de acesso
direto do servidor com alguém que o possa ajudá-lo, como
uma ouvidoria, por exemplo.

Primordialmente, cabe à chefia buscar orçamento e/ou


usar os orçamentos que estão disponíveis para valorização
profissional, qualidade de vida e segurança no trabalho com
as diretrizes da Portaria 790/2019 do Ministério da Justiça.
E esse orçamento, que é disponível, pode e só deve ser
usado para valorização profissional e para a prevenção e
promoção da saúde mental.

GRUPO
Partindo do pressuposto de que o Estado e as instituições
façam o que tem que ser feito, pouco ou nada adiantará se
o comportamento dos agentes de segurança pública, em
especial quando em grupo, não mudar. Mas, para falar do
grupo, vamos entender que grupos são interações entre três ou
mais pessoas, em relações sociais.

363 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Figura 18: Interação Interação social
social entre pessoas
que caracterizam
um grupo. Fonte: Partindo dessa afirmação, o que se vê todos os dias no trabalho
Freepik (2020),
adaptado por
são sistemas de relações sociais e, nesse sentido, espera-se
labSEAD-UFSC dos grupos uma contribuição para relações saudáveis e com
(2020). qualidade, visto que, por meio desses grupos, os agentes
deveriam poder interagir e expor suas dificuldades.

A participação em grupos pode afastar os agentes de


segurança pública da solidão e do isolamento social, já
que uma das constantes falas em pesquisas diz respeito à
dificuldade de criar novos relacionamentos por ocasião da
profissão. Barbosa e Menezes (2019) dizem em pesquisa
que, no momento em que o candidato entra na instituição, em
especial os militares, é concitado a mudar seu comportamento,
deve se destituir de valores e crenças e renunciar a um modo
de vida civil que não esteja em consonância com o modo de
vida militar preconizado pelos regulamentos da instituição.

Figura 19: Troca de


estado do candidato
civil para militar.
Fonte: labSEAD-
UFSC (2020).
CIVIL MILITAR

Essa realidade é sentida por todos e é por meio do grupo que


se promove a integração, aumenta a autoestima, além de
possibilitar o resgate de valores pessoais, sociais e suporte
social. Se eles encontram, em seus companheiros, pessoas
comuns, que vivem as mesmas dificuldades que as outras
pessoas, deveriam ser mais fáceis as relações, mas não são.

364 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Palavra do Especialista
Andrade, Souza e Minayo (2009) já apontavam que os grupos, de
modo geral, exercem uma ação intimidativa sobre o indivíduo,
 compelindo-o a seguir o exemplo dos que os cercam, sendo a
limitação de liberdade do indivíduo no grupo um dos principais
fenômenos da psicologia de grupo.

Barbosa e Menezes (2019) acrescentam que, no ambiente


policial-militar, essa característica do funcionamento grupal
pode ser observada. Tendo em vista os ideais difundidos,
a instituição militar tende a dificultar a expressão do que
é individual e singular, através de uma padronização das
condutas, comportamentos, atos e fardamento. Essas
exigências comportamentais extrapolam as atividades
profissionais, impondo ao indivíduo padrões ideais difíceis de
serem alcançados. Vale dizer que o ideal de comportamento


ou o ideal de sociedade sem violência é algo utópico.

“Há caminhos diferentes que cada um pode tomar para

soluções mais drásticas. A convivência frequente com



buscar as suas saídas frente à infelicidade, porém vê-
se que no meio militar é comum que se busquem as

a morte pode levar à sua banalização. Ao banalizá-lá, é


possível que o indivíduo, frente a situações de perda ou
que envolvam sofrimento, a veja como uma saída rápida
da infelicidade.” (BARBOSA; MENEZES,2019).


Parafraseando Nietzsche (apud PERCY, 2011):

“Preciso de companheiros, mas de companheiros vivos,


não de cadáveres que eu tenha que levar nas costas
por toda parte.”

Com o profissional fazendo parte de um grupo e sendo a


coesão entre o grupo sinérgica, ganha o indivíduo, ganha o
grupo, ganha a instituição e a sociedade.

365 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Um agente de segurança pública que sente
segurança para expor o que sente, sem que
isso vire chacota, piada ou motivo de bullying,
pode encontrar no grupo a força para fazer um
tratamento, e quem faz ironias não precisará
enterrar um irmão de farda que cometeu suicídio.

O seu sentimento de perda só acontece quando a tragédia


ocorre, mas você pode evitar essa tragédia. Tenha ouvidos para
quem precisa falar e fale para que seja ouvido, porque, caso isso
não aconteça, os adoecimentos podem ser mais presentes.

INDIVIDUAL
“Sabe o que é doutor? Eu não queria fugir da vida, eu só quero
que ela me deixe em paz um pouquinho.” (CORTELLA, 2019).

Falar de responsabilidade individual pode ser difícil, porque


é falar de uma zona de conforto na qual os indivíduos se
colocam e da qual é difícil sair. Ainda que houvesse uma
instituição de segurança pública com toda rede de apoio no
que tange ao atendimento psicológico, jurídico, nutricional, de
educação física e de todas as outras terapias complementares,
sempre caberá ao indivíduo a busca por ajuda. Isso quando
falamos de prevenção e promoção da saúde em sua
totalidade. Exceto em casos de extrema gravidade é que essa
responsabilidade sai do indivíduo, e é por isso que algumas
pessoas acabam sendo internadas, mesmo contra a própria
vontade, na tentativa de tratamento.

Mas é bem verdade que, para chegar ao extremo (tentativa de


suicídio e homicídio), o agente de segurança pública passa
pelos outros estágios do adoecimento, e é responsabilidade do
próprio indivíduo a busca da promoção da sua saúde.

366 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


Partindo da premissa constitucional de o indivíduo
ser livre, isso deveria trazer uma sensação
libertadora, porque é uma ação que só depende de
você para realizar a promoção da sua saúde.

Pode até soar como frase de autoajuda, mas o que falta nas
pessoas é responsabilização por si. E não só na saúde mental,
mas também em outras áreas da vida como: financeira,
alimentar, física, espiritual, de conhecimento, de cultura etc.
A velocidade com que as coisas estão acontecendo garante
a todos rápido acesso à informação, e é por meio dela que o
conhecimento acontece. E o conhecimento, por sua vez, leva a
mudança comportamental.

Sabe-se que hoje muita gente entra em sofrimento devido


a uma busca incessante por felicidade, prazer, sucesso,
dinheiro e satisfação em tudo que faz. Parece que a busca é
para que isso aconteça todos os dias da vida do indivíduo, ou
seja, não pode haver momentos infelizes, desprazer, erros e
insucesso, insatisfação etc.

Nesse sentido, quando alguns momentos felizes


acontecem, eles não são percebidos. A felicidade não é
algo permanente, nem a infelicidade, e o mesmo acontece
com o prazer. E é na infelicidade e no desprazer que
reconhecemos os outros sentimentos.

Se vivêssemos em plena felicidade e prazer, isso não seria


mais algo bom, pois, diante da abundância, começaríamos a
sentir falta de alguma coisa. Porque é assim o ser humano:
um eterno insatisfeito em busca do que não tem para
encontrar a felicidade.

A felicidade e o prazer em muitos momentos estão no


caminho, e não no fim. E embora você tenha sucesso, sempre
será cobrado por mais um êxito, assim como a satisfação

367 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


em tudo que faz. Você pode verdadeiramente amar a sua
profissão, mas certamente em muitos momentos ela é
exaustiva, cansativa, injusta, perigosa, mal remunerada, e tudo
isso vai trazer um desprazer. E isso é normal! Mas nos dias em
que você salva vidas, prende pedófilos e estupradores, quando
participa de uma operação para prender uma quadrilha de
roubos, são essas experiências que renovam as esperanças e
é na esperança que você vai reconhecer a felicidade, o prazer,
o sucesso e a verdadeira satisfação do que você faz. E ela não
vai acontecer todo dia, infelizmente!

Na Prática
Para encerrar, convido-o a fazer a seguinte reflexão: depois de
fazer este curso e com tantas informações, você se enquadrou
em algum momento da leitura? Seu amigo do lado parece

 apresentar alguns dos sintomas apresentados? Alguém da sua


família está apresentando sofrimento?

Se a resposta for sim para esses questionamentos, busque ajuda!


Ajude seus colegas a procurarem ajuda.

Simplifique o processo dando o primeiro passo, para que


sua vida seja uma mistura de alegria e tristeza, dias felizes e
infelizes, de prazer e desprazer, de ganhos e perdas, dias de
lutas e de glórias. O equilíbrio sempre é o melhor caminho
para nossa saúde mental.

Por fim, este curso buscou apresentar a importância do


conhecimento sobre doenças mentais que possam surgir
durante sua jornada profissional e pessoal. Por meio deste
estudo, você teve mais acesso aos aspectos que devem ser
cuidados e observados durante sua rotina. Portanto, mude o
que precisa, reveja seus hábitos, colabore com a qualidade de
vida no trabalho para todos e procure ajuda profissional, sem
qualquer estigma reproduzido pela sociedade. Preconceito é
falta de informação, e sua saúde deve sempre ser conservada.

368 • Módulo 6 Prevenção, Promoção e Tratamento da Saúde Mental


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