Você está na página 1de 29

Introdução à Psicoterapia Analítica Funcional (FAP)

Passos, Sousa-Filho, Weydmann & Pacheco

A FAP (do inglês, Functional Analytic Psychotherapy) é uma terapia


comportamental contextual desenvolvida a partir da década de 80 para o tratamento de
problemas interpessoais. É também a abordagem utilizada como base para a
compreensão da aliança terapêutica dentro dos modelos de terapia comportamental
(Follette, Naugle, & Callaghan, 1996). Fortemente embasada em pressupostos da
Análise do Comportamento, do Behaviorismo Radical e mais recentemente do
Contextualismo Funcional (Capítulo 3), essa terapia tem como objetivo principal a
construção de repertórios interpessoais tais como intimidade, assertividade, empatia,
conexão interpessoal e envolvimento emocional, entre outros (Tsai et al., 2008). A FAP
oferece aos terapeutas uma perspectiva transdiagnóstica dos problemas clínicos
(Holman, Kanter, Tsai, Kohlenberg, & Hayes, 2017). Isto significa que a ênfase da FAP
está em processos interpessoais que ocorrem em diferentes entidades diagnósticas e não
em transtornos específicos (Frank & Davidson, 2014).

Ao longo do processo de tratamento da FAP, as queixas interpessoais são


trabalhadas enquanto ocorrem na relação terapêutica, sendo o terapeuta e o setting
clínico considerados como elementos de um ambiente facilitador da mudança
(Kohlenberg & Tsai, 1991). Um dos pressupostos da FAP é de que, na relação real com
o terapeuta, o cliente tende a comportar-se como o faz na interação com outras pessoas,
devido a similaridades funcionais entre o setting clínico e o ambiente extra-consultório.
O terapeuta vale-se desse pressuposto para promover intervenções em tempo real,
evocando as queixas em terapia e reforçando comportamentos de melhora. Ao invés de
modificar a relação do cliente com contingências externas à terapia, o terapeuta atua na
contingência que está em ação durante a sessão, regulando o seu comportamento com o
objetivo de promover mudanças.

Com o foco interventivo na relação cliente-terapeuta, a FAP é conduzida


respeitando as características idiossincráticas da díade. Os processos terapêuticos são
individualizados e, embora características do modelo sejam padronizadas (e.g., as
regras), a forma como cada tratamento ocorre é particular (Tsai, Kohlenberg, Kanter,
Holman, & Loudon, 2012). A idiossincrasia de cada processo é refletida nas pesquisas
em FAP, em que o delineamento mais utilizado é o experimental de caso único (n=1)
(Darrow, Callaghan, Bonow, & Follette, 2014). A FAP, assim sendo, é baseada em
processos terapêuticos derivados do modelo analítico-comportamental e não em
técnicas padronizadas.

Este capítulo tem como objetivo a apresentação de alguns desses processos


clínicos e exemplos de aplicações. Pequenos trechos de uma interação típica do
tratamento com FAP serão apresentados, assim como sugestões de perguntas a serem
feitas no processo de formulação de caso. No entanto, é altamente sugerido ao terapeuta
comportamental que este possa experimentar aproximar os princípios da FAP ao seu
próprio estilo terapêutico, resguardando os limites técnicos e éticos do trabalho
psicoterapêutico. Uma ressalva a ser feita é que o capitulo é uma introdução ao modelo
e não tem a presunção de substituir os formatos tradicionais de treinamento em FAP,
que são os workshops teórico-vivenciais, a supervisão e os cursos de formação. Por
depender de processos associados à exposição, sugere-se que os treinamentos em FAP
sejam realizados de forma vivencial (i.e., exercitando as habilidades em contingências
reais) ao invés de apenas teoricamente (i.e., fornecendo regas ao terapeuta iniciante)
(Hayes, Strosahl, & Wilson, 2016; Tsai et al., 2008).

Princípios básicos da clínica analítico-comportamental

As terapias comportamentais contextuais são baseadas em maior ou menor grau


no Behaviorismo Radical e em modelos derivados de uma visão de mundo
contextualista, como o Contextualismo Funcional (Hayes & Brownstein, 1986; Holman
et al., 2017). Esse modelo preconiza uma análise das interações entre o indivíduo1 e o
seu ambiente para entender o fenômeno denominado comportamento. Para o
Behaviorismo Radical, o comportamento é algo que o indivíduo faz em um determinado
contexto e que produz uma mudança neste contexto, que por sua vez afeta o seu próprio
padrão de comportar-se (Skinner, 1957). Diferente de outros modelos dentro da
psicologia, o foco de análise é o comportamento e sua função em um dado contexto e
não entidades mediadoras da relação indivíduo-ambiente como estados mentais ou os
processos cerebrais (Skinner, 1974). Para o Behaviorismo Radical, emoções,
pensamentos e processos neurofisiológicos devem ser analisados entendendo tais
fenômenos como comportamento e, portanto, suscetíveis aos efeitos do ambiente
(Skinner, 1974). Por exemplo, no consultório (ambiente), um dado cliente privado de

1
Muitas vezes chamado conceitualmente de organismo em função da relação histórica com a
Biologia e o modelo evolucionista.
suporte emocional por parte de sua comunidade verbal solicita validação para o
terapeuta através da pergunta: “faz sentido o que estou sentindo?” (resposta
comportamental); o terapeuta pode influenciar a frequência futura deste tipo de pergunta
fornecendo suporte emocional através de validação (consequência). Por exemplo, o
terapeuta pode responder: “sim, faz todo sentido que você se sinta assim”. O pedido de
suporte emocional só é viável quando há um contexto específico que possibilita sua
ocorrência e quando há uma consequência que influencia sua ocorrência no futuro;
assim, não existe comportamento sem contexto (figura 1).

Figura 1. Exemplo típico de uma contingência, onde A) é o ambiente/ contexto, ou seja,


o que está acontecendo na ocasião do comportamento, seja no contexto público ou
privado; B) ação de um indivíduo que modifica seu contexto; e C) as mudanças no
contexto operadas pela ação do sujeito que afetam a frequência de comportamento.

No exemplo acima, temos um padrão comportamental chamado de


comportamento operante (ou apenas operante): o indivíduo opera sobre o ambiente ao
fazer a pergunta em sessão, modificando o contexto, e o contexto (terapeuta) altera o
comportamento do indivíduo ao fornecer consequências (para mais detalhes, ler o
capítulo 3). É através das consequências fornecidas pelo terapeuta que ocorre a
ampliação de repertórios operantes na FAP.

Outras reações do organismo com o ambiente também são importantes na FAP,


tais como as respostas emocionais. As emoções são eliciadas de forma reativa por
determinados contextos, sendo por isso denominadas respondentes. Estas reações,
diferentemente dos operantes, não são governadas diretamente por suas consequências
(Darwich & Tourinho, 2005) e geralmente são considerados eventos privados (i.e.,
apenas o indivíduo acessa suas sensações). As intervenções comportamentais típicas
para problemas de alta reatividade emocional envolvem a exposição ou
dessensibilização sistemática e, mais recentemente, processos de aceitação e
mindfulness (Hayes, 2004). Cabe salientar que, em geral, as emoções são acompanhadas
de outros comportamentos operantes públicos (i.e., observados por outras pessoas). Ao
sentir medo, por exemplo, um indivíduo pode ter uma tendência a fugir de um contexto
eliciador. Embora o medo em si não afete diretamente o ambiente externo, a ação de
fugir faz com que o estimulo que eliciou a resposta de medo seja retirado, reforçando a
relação entre o respondente “medo” e o operante fugir (Pickett, Bardeen, & Orcutt,
2011). Tanto os operantes quanto os respondentes são relevantes no trabalho clínico da
FAP, visto que eles podem acontecer nas interações interpessoais dos clientes fora e
dentro de sessão (Tsai et al., 2008).

Para a FAP, quatro funções comportamentais são importantes em uma análise:


aproximação, quando uma consequência ambiental é produzida pelo comportamento e
aumenta sua frequência: Reforço Positivo (Sr+); afastamento/esquiva, quando a
consequência produzida pelo comportamento retira um estímulo indesejado ou aversivo
que está presente: Reforço Negativo (Sr-); discriminação, responder apropriadamente a
características do contexto que produzem reforçadores (Sd – estímulo discriminativo); e
eliciar emoções (i.e., respondentes) (Tsai et al., 2008). As consequências reforçadoras
positivas (Sr+) e negativas (Sr-) são assim chamadas porque aumentam a frequência de
uma resposta comportamental e são verificadas a posteriori em uma análise. Só
podemos afirmar que algo é reforçador ao analisar a frequência da resposta após a
apresentação da consequência. No exemplo que demos acima sobre o suporte
emocional, entenderemos que a validação foi reforçadora apenas se a frequência de
perguntas de suporte aumentou após a primeira validação. Não existe algo que seja
reforçador de forma generalizada e aplicável as todas as pessoas e até mesmo a uma
única pessoa em momentos diferentes de vida. Neste exemplo, caso a fala
(supostamente validante) do terapeuta vier a reduzir o padrão de pedidos do cliente, diz-
se que não foi reforçadora para esse indivíduo. Outros fenômenos relevantes para a FAP
como a punição, a extinção e os esquemas de reforçamento são mais extensivamente
explicados no capítulo 3.
Análise funcional

A análise funcional clínica é uma hipótese das possíveis causas de um


determinado comportamento ou padrão comportamental. Skinner definiu a sua
formulação funcional a partir da tríplice contingência, que engloba o contexto (a), o
comportamento (b) e a consequência (c) (Skinner, 1953). Este modelo foi ampliado a
partir dos estudos de Michael (1982) que apontou que um determinado estímulo adquire
ou perde sua função de reforço mediante condições ambientais às quais denominou
operação motivadora (OM), tais como a privação de um determinado estímulo ou sua
saciação (Leonardi, 2016). Estes quatro termos formam a base de uma análise funcional
(Figura 2).

Figura 2. Tríplice contingência.

O foco da análise funcional não está na forma (topografia) do comportamento,


mas na função da resposta comportamental (Tsai et al., 2008). Assim, um mesmo
comportamento (e.g., beber álcool) pode ter a função de aproximação em um contexto
(e.g., beber para socializar com amigos) e esquiva em outro (e.g., beber para aliviar-se
após uma briga com amigos). Por outro lado, duas respostas comportamentais diferentes
podem possuir a mesma função, como beber álcool em um bar e ligar para os amigos no
caso da socialização. Resumidamente, em uma análise funcional busca-se a interação
entre comportamentos e suas consequências.
Dado que respostas comportamentais diferentes podem ter uma mesma função, a
partir da análise funcional o terapeuta consegue deduzir similaridades funcionais entre o
comportamento do cliente fora de sessão (chamados de “O”, de outside) e os
comportamentos clinicamente relevantes (CCRs) que ocorrem em sessão. Estes
paralelos funcionais são a base de intervenção na FAP, pois é a partir destes que uma
intervenção dentro de uma sessão se generaliza para o contexto diário do cliente. Os
CCRs podem ser bastante diferentes dos Os em termos de forma, por isso o terapeuta
deve estar atento às semelhanças na função. Um exemplo seria uma pessoa que agride
verbalmente sua companheira quando ela faz algo que o chateia e, na terapia, critica o
terapeuta quando este questiona as razões dos atrasos do cliente. Em ambos os casos o
indivíduo busca esquivar-se (Sr-) de contextos interpessoais aversivos.

No processo terapêutico da FAP, o terapeuta utiliza-se das análises funcionais


para prover reforçadores para os comportamentos que se aproximem da meta almejada
do cliente. Para isso, é necessária uma aprofundada formulação de caso que contenha
dados do histórico de reforçamento do cliente (i.e., que respostas foram reforçadas ao
longo do tempo) e dos comportamentos-problemas que ocorrem dentro e fora da sessão.

Um dos objetivos da formulação é indicar quais CCRs configuram o problema


do cliente (CCR1) e quais comportamentos são funcionalmente equivalentes aos
comportamentos-problema fora de sessão (O1). De forma semelhante, também é
necessário definir quais são os possíveis comportamentos de mudança em direção às
metas, os quais serão modelados (CCR2) a partir do processo terapêutico e, então,
generalizados (O2) para fora da terapia. Análises funcionais também podem ser
aplicadas aos comportamentos do terapeuta, chamados de T1 quando interferem no
processo terapêutico e T2 quando potencializam o tratamento. Maiores informações
sobre os CCRs do cliente e do terapeuta serão apresentadas abaixo.

Formulação de caso da FAP

A formulação do caso é o processo de avaliação no qual o terapeuta reunirá e


organizará informações sobre o cliente que permitirão a construção de hipóteses na
forma de análises funcionais. A formulação pode ser apresentada ao cliente, se
necessário, e sempre que possível deve guiar o processo, devendo conter informações
cruciais que levem o terapeuta a compreender as necessidades do cliente (Hayes,
Nelson, & Jarrett, 1987). A FAP, assim como outras terapias analítico-
comportamentais, é idiográfica, ou seja, a avaliação é feita caso a caso, guardando as
especificidades de cada cliente. A formulação segue os seguintes itens (Tsai et al.,
2008):

Histórico relevante (i.e., histórico de reforçamento). Dados da vida do cliente


que indiquem como ocorreu o desenvolvimento do atual padrão comportamental e quais
variáveis ambientais mantêm o repertório atual;

Problemas do cotidiano (O1). Atuais problemas do cliente que o levaram à


terapia, bem como os comportamentos associados aos problemas. Pode conter eventos
privados importantes para a compreensão do caso, como cognições, regras e crenças,
caso a FAP seja utilizada para aprimorar terapias de foco intrapessoal como a Terapia
de Aceitação e Compromisso (ACT) e a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC);

Problemas sociopolíticos: Possíveis variáveis culturais que interferem no


funcionamento do cliente e no andamento do tratamento;

Variáveis mantenedoras do processo: Análise funcional das atuais variáveis que


mantêm o repertório do cliente ou que dificultam a generalização de respostas;

Vantagens e pontos positivos: Ganhos e aspectos desejáveis do atual repertório


inicial (O1) do cliente;

Metas para o cotidiano (O2). Quais comportamentos devem ser desenvolvidos


em terapia para a melhora clínica do cliente. Metas da vida diária (inclui melhorias
sociopolíticas) e valores a serem elaborados também são classificados como O2;

Problemas na sessão (CCR1). Comportamentos relacionados ao problema que


ocorrem em sessão ou que poderão ocorrer em terapia. Estes devem ser análogos aos
O1s em termos de função. É importante descrever operacionalmente cada CCR1, para
que seja possível uma definição clara de quais seriam os comportamentos de melhora
(CCR2, abaixo). Os CCR1s podem ser organizados em classes de comportamento, para
uma melhor compreensão do caso;

Metas de melhoras na sessão (CCR2). Repertório a ser desenvolvido através do


processo terapêutico que aproxime o cliente de suas metas e valores. É importante
definir operacionalmente cada comportamento de melhora, evitando assim o
reforçamento acidental de CCR1s que podem ocorrer em conjunto com os CCR2s;
Intervenções planejadas. Breve plano de tratamento e, se indicado, acréscimo de
intervenções de outros modelos de terapia2;

Comportamentos-problema do terapeuta em sessão (T1). Comportamentos do


terapeuta que podem manter os CCR1s do cliente ou que bloqueiam os CCR2s;

Comportamentos-alvo do terapeuta em sessão (T2). Comportamentos do


terapeuta que facilitam o processo terapêutico e estão associados ao responder
contingencial aos comportamentos do cliente que promove CCR2s.

Um dos principais instrumentos utilizados para rastrear CCRs e facilitar o


processo de formulação é o sistema idiográfico funcional de avaliação, o Functional
Idiographic Assessment Template (FIAT) (Callaghan, 2006; Darrow et al., 2014). O
FIAT está sendo utilizado em pesquisas com o intuito de identificar alvos de intervenção
e sinalizar a melhora clínica. Outros modelos de formulação vêm sendo desenvolvidos
pela comunidade de pesquisadores em FAP, mas seguem um padrão similar de análise
(Holman et al., 2017; Tsai et al., 2008).

Modelagem

Um fator comum às terapias comportamentais baseadas no Behaviorismo


Radical é o foco na construção de repertório. Isto se aplica à FAP no sentido de que o
sistema terapêutico pressupõe que novos comportamentos interpessoais (CCR2) serão
desenvolvidos. De fato, a modelagem é o processo mais importante na FAP,
embasando, por exemplo, as três primeiras regras do tratamento (explicadas abaixo).

A modelagem tem como característica a complexificação de um determinado


comportamento até a aquisição do comportamento-alvo através de aproximações
sucessivas por reforçamento diferencial. Na modelagem, respostas comportamentais
simples são reforçadas sucessivamente até que sejam adquiridos padrões
comportamentais mais complexos (Borges & Cassas, 2012). Um exemplo seria reforçar
com aceitação pausas que o cliente faz em sessão, pequenos comentários sobre o tema
da terapia e, por fim, opiniões sobre o andamento do tratamento caso a expressão de
opiniões pessoais seja um CCR2 do cliente. Estando de acordo com os princípios da
FAP, dados recentes sugerem que é possível ao terapeuta realizar tal procedimento de

2
Técnicas de terapias de outras orientações teóricas podem ser usadas com função evocativa,
como por exemplo a técnica da Cadeira Vazia da Gestalt-terapia. No entanto, elas devem ser adaptadas ao
modelo analítico-comportamental
modelagem através de reforçamento social3 (Kanter et al., 2017). Para isso, é muito
importante que o terapeuta esteja atento às pequenas mudanças do comportamento do
cliente enquanto elas ocorrem no tratamento (Tsai et al., 2012).

Modelando repertórios interpessoais através da relação terapêutica

Como descrito acima, a relação terapêutica é o contexto em que a FAP se detém


principalmente. O racional para isso decorre do fato de que as consequências que
ocorrem logo após um operante têm maior poder reforçador (ou punitivo) (Odum,
2011). Assim, intervenções psicoterapêuticas em contiguidade podem promover maior
poder de influência no comportamento do cliente (Holman et al., 2017). Em outras
palavras, a intervenção direta sobre os CCRs em sessão pode ter maior impacto do que
intervir indiretamente em problemas que ocorreram há alguns dias.

O terapeuta FAP deve ter em mente que ele tem função de estímulo para o
cliente. Ao promover uma relação terapêutica real através de uma audiência não-
punitiva, o terapeuta estará propiciando um contexto em que o cliente reagirá
naturalmente, como reage fora de sessão com outras pessoas, abrindo espaço para que
CCRs possam ocorrer durante a sessão. Ressalta-se que comportamentos, características
físicas, gênero, dentre outros aspectos do terapeuta podem evocar ou inibir CCRs, de
forma que este deve estar atento ao seu efeito no cliente, não pressupondo que uma
intervenção é reforçadora a priori (Ramnerö & Törneke, 2008). A análise funcional de
uma intervenção ocorre a posteriori, de forma que só é possível saber que uma fala do
terapeuta reforçou o cliente após o cliente responder a isso.

A audiência não-punitiva, de acordo com Skinner (1953), indica um agente (ou


agência) que, diferentemente de outras agências, não influencia de forma punitiva aos
comportamentos de um sujeito. Essa habilidade é essencial em um terapeuta
comportamental. Este deve promover um "espaço sagrado” (Tsai et al., 2008) no qual o
terapeuta se mantém essencialmente reforçador (às melhorias), evitando bloquear ou
punir o cliente. A ausência de punição em comportamentos outrora punidos ou
invalidados (e.g., demonstrar emoção na frente de alguém, falar de seus medos,
demonstrar afeto ou incômodo) faz com que o contexto da terapia seja naturalmente
evocador desses repertórios. A audiência não-punitiva também facilita processos
relevantes para a aliança terapêutica e para o tratamento com FAP. O conceito de
3
Como por exemplo, prover aceitação e validação, dar atenção às demandas do cliente, expressar
empatia, entre outros.
intimidade para a análise do comportamento, por exemplo, se relaciona justamente com
o reforçamento de respostas comportamentais de vulnerabilidade do cliente em um
contexto no qual não haverá punição, sendo algo desejável no curso da FAP (Cordova
& Scott, 2001). Para evitar rupturas na aliança terapêutica, sugere-se que
comportamentos-problema sejam colocados em extinção (i.e., sem consequências
reforçadoras) em terapia, evitando assim o uso de qualquer tipo de punição durante o
tratamento (Kohlenberg & Tsai, 1991). Um exemplo seria deixar de dar respostas a um
cliente que racionaliza demais através de perguntas nos momentos em que está sendo
convocado a expressar emoções em terapia. A extinção pode produzir reações
emocionais, no entanto, o desenvolvimento de um repertório alternativo com a
modelagem dos CCR2s pode aliviar a frustração do cliente (Lerman, Iwata, & Wallace,
1999).

Por fim, uma postura não-julgadora por parte do terapeuta serve como contexto
de exposição respondente, na qual a execução repetida de uma ação associada a
emoções dolorosas faz com que a reatividade emocional seja reduzida com o passar do
tempo, por exposição. Esse fenômeno é outra faceta da psicoterapia apontada por
Skinner (1953), juntamente ao desenvolvimento de repertório. No entanto, a
dessensibilização respondente pode apresentar curso mais lento que a construção de
repertórios de operantes, o que pode produzir uma resposta verbal do cliente como
“mesmo me comportando diferente, eu me sinto da mesma forma”. Processos de
aceitação da ACT podem ser utilizados neste contexto com o objetivo de lidar com estes
outros processos intrapessoais.

Frequentemente na clínica analítico-comportamental, verifica-se que os clientes


têm padrão histórico de contato com contextos punitivos (governados por coerção ou
controle aversivo), o que produz uma série de comportamentos com função de esquiva,
normalmente acompanhados de emoções negativas (Masuda, 2014; Sidman, 1989). No
início da terapia, muitos comportamentos interpessoais de melhora são raros ou
inexistentes no repertório do cliente, em função de terem sido punidos no passado;
comportamentos de esquiva, no entanto, são muito mais frequentes. Portanto, uma
importante implicação de contextos históricos coercitivos é a de que, em situações
similares, o indivíduo terá reações emocionais (respondentes) intensas como ansiedade,
vergonha, medo ou raiva. Quando as respostas comportamentais estão sendo
controladas por fuga ou esquiva, o reforçamento da expressão emocional (e sua
discriminação) pode ser útil por auxiliar o cliente a notar os contextos aversivos e por
promover a ocorrência de CCR2s nestes ambientes.

Aprofundando os comportamentos clinicamente relevantes

Os CCRs, como acima descritos, são os principais fenômenos trabalhados na


FAP. Problemas e dificuldades interpessoais também podem ocorrer na interação com o
terapeuta. Embora a conceitualização e a condução terapêutica sejam diferentes,
acredita-se que a ocorrência dos CCRs em terapia seja um fenômeno bastante próximo
do que a psicanálise denomina transferência (Kanter, Tsai, & Kohlenberg, 2010).

A partir da formulação de caso em FAP, é possível tecer hipóteses funcionais


acerca da relação entre os problemas e metas do cliente e o seu responder ao contexto
natural. Por exemplo, um cliente que relata estar só e com dificuldade em interagir pode
apresentar padrão comportamental de esquiva com relação a outras pessoas, negando
sair com amigos, falar coisas íntimas e pedir atenção. Na história deste cliente fictício
pode-se imaginar que este padrão comportamental se desenvolveu a partir de um
contexto coercitivo no colégio, em que houve padrão duradouro de bullying e que se
manteve na vida adulta em função da não-exposição social; a esquiva, nesse sentido, faz
com que o sujeito não entre em contato com contextos nos quais não há punição social.
Uma pergunta interessante a ser feita por um terapeuta FAP a si é “como será que estas
implicações acontecem comigo?”. Essas hipóteses irão fundamentar a construção e
descrição dos CCR1s. Imaginemos que esse mesmo cliente relata que tem como metas
na terapia o desenvolvimento de relações, ser assertivo com outras pessoas e relacionar-
se sexualmente. Com o objetivo de identificar os CCR2 o terapeuta pode perguntar:
“que repertório seria necessário desenvolver para produzir estas metas?”.

Tanto os CCR1s quanto os CCR2s são definidos funcionalmente. Não possuem


uma “forma” a priori. Uma crítica ao terapeuta pode ser um CCR1 a partir de um
cliente com problemas relacionados a tolerar pontos de vista alternativos ou um CCR2
se o cliente responde passivamente em suas relações e precisa desenvolver
assertividade. Ou seja, um mesmo comportamento pode ser um CCR1 em um contexto
e CCR2 em outro, inclusive com o mesmo cliente em momentos diferentes da terapia.
Um cliente com pouca assertividade pode se aproximar de suas metas dando feedbacks
negativos ao terapeuta, que reforça as opiniões do paciente com validação. Com o
decorrer da terapia e com a modelagem efetiva do CCR2 de assertividade, pode ser que
intervenções do terapeuta que não envolvem realizar pedidos ou validar opiniões
produzam frustração e desconforto no cliente. Caso o cliente comece a bloquear as
intervenções do terapeuta com a expressão de opiniões, o CCR2 de outrora se tornará
um CCR1, caso impeça intervenções relacionadas às suas novas metas, como por
exemplo, tolerar a frustração.

O CCR1 pode ser considerado um padrão comportamental (geralmente baseado


em reforçamento negativo) que traz problemas ao cliente. Por sua vez, o CCR2 é um
padrão comportamental deficitário em frequência, ou de frequência zero, que pode
aproximar o cliente de suas metas caso seja reforçado e desenvolvido (Törneke, Barnes-
Holmes, & Hayes, 2010).

Classes funcionais. Como comportamentos diferentes podem ter mesma função,


e vice-e-versa, o trabalho terapêutico focado em cada comportamento se torna pouco
efetivo pela variedade de ações que um único sujeito pode realizar. Somado a isso, o
foco das terapias comportamentais está na função do comportar-se e não no
comportamento em si. Dessa forma, é comum o agrupamento de diferentes
comportamentos em classes de ações que compartilham uma mesma função (Callaghan,
2006). Por exemplo, uma criança, na presença dos pais, grita, bate, fala alto, chora, pede
coisas intensamente ou pede carinhosamente com a função de receber atenção dos pais.
Nesse caso, todos os comportamentos compartilham entre si a evocação de atenção dos
pais; todos os comportamentos podem ser agrupados na mesma classe funcional. No
momento em que o terapeuta interfere em um comportamento da classe, todos os outros
com a mesma função podem se alterar. Neste sentido, os CCRs são agrupados na
mesma classe funcional dos comportamentos-alvo fora da sessão (O1 e O2). Alterando
o responder em sessão é mais provável que comportamentos na vida real também se
alterem, processo chamado de generalização.

Achando o CCR2 em um CCR1. De acordo com os princípios da análise do


comportamento, durante a modelagem o terapeuta inicia sua intervenção com o
reforçamento diferencial de comportamentos simples até chegar, progressivamente, em
comportamentos mais complexos (Del Prette & Almeida, 2012). Dessa forma, é
esperado que no início da terapia o cliente faça muito mais CCR1s que CCR2s. Os
CCR2s iniciais tendem a ser simples ou atrapalhados, e muitas vezes podem ser muito
sutis e até mesmo parte de algum CCR1. Por exemplo, um cliente que tem baixa
frequência em demonstrar desconforto e cuja meta é desenvolver comportamento
assertivo (CCR2) pode, em dado momento, falar com o terapeuta de forma bastante
rude e inassertiva sobre algo que lhe incomoda. Embora a forma desse comportamento
seja problemática em algum nível, ela é mais próxima da meta de produzir uma crítica
assertiva (CCR2) que do problema inicial: não conseguir se defender ou afastar algo que
lhe incomoda (CCR1). Reforçar a crítica que atua neste caso como CCR2 pode ser
muito importante, pois a partir desta resposta agressiva é possível construir um
repertório sucessivamente mais complexo de responder assertivo. A Terapia
Comportamental Dialética (DBT; capítulo 14) descreve o mesmo processo com a
metáfora “achar uma pepita de ouro no meio do barro” (Linehan, 1993). O terapeuta
FAP mantém-se consciente às respostas do cliente, buscando comportamentos iniciais
mais rudimentares, pois estes são a base para a construção de um repertório cada vez
mais complexo e efetivo.

CCR3. Durante o processo terapêutico, é esperado que o cliente aprenda a


descrever seu próprio comportamento em relação ao contexto, um comportamento
verbal chamado tato (Ramnerö & Törneke, 2008; Skinner, 1957). É um fenômeno
correlato ao insight no sentido em que o cliente elabora verbalmente suas próprias
análises funcionais de forma mais ou menos complexa. Um conjunto efetivo de CCR3s
pode indicar autoconhecimento, o que para as terapias comportamentais é essencial. O
repertório de autoconhecimento está relacionado à capacidade do indivíduo de controlar
seu próprio comportamento, com sua percepção de si (o self) e com a maior eficácia na
generalização de respostas (Tsai et al., 2008). No entanto, diferente dos CCRs 1 e 2, o
CCR3 é descrito com relação à sua forma (o cliente descreve a si e ao contexto), e não
com relação à sua função. A descrição de comportamentos pode ter tanto função
generalizadora, aproximando o cliente de suas metas e sendo também um CCR2, quanto
de esquiva, impedindo o cliente de experienciar fenômenos típicos da terapia como a
intimidade e o contato com as emoções (CCR1, neste caso). As racionalizações em
terapia podem ser um caso de CCR3 sendo utilizado para esquiva quando existe uma
teorização excessiva por parte do cliente que promove esquiva experiencial das
emoções (Ver capítulo 12) (Törneke et al., 2010).

Os CCRs do terapeuta

A FAP, por ser uma terapia analítico-comportamental, tem como uma de suas
ênfases um olhar diferenciado para o contexto em que um comportamento ocorre. No
caso da psicoterapia, o contexto do cliente é o próprio terapeuta, outro indivíduo com
uma história própria de aprendizagem na qual pode ter ocorrido o contato com algum
nível de coerção. Desta forma, os comportamentos do terapeuta e do cliente estão sob
controle da história de vida de cada um, o que pode interferir em como as relações serão
estabelecidas no tratamento. Em outras palavras, o terapeuta também pode apresentar
dificuldades interpessoais, as quais podem aparecer no curso da terapia (Kohlenberg &
Tsai, 1991). Essas dificuldades que interferem nas metas da terapia, tal qual os CCR1s
do cliente, são chamados de T1s. Por outro lado, os comportamentos do terapeuta que
promovem aproximações dos CCR2s dos clientes são chamados de T2. É esperado que
no curso da terapia ambos venham a acontecer. Fatores situacionais e déficits de
repertórios do terapeuta podem ser algumas condições relacionadas com T1s, assim
como características do cliente e seus CCR1s.

Como dito acima, o terapeuta é contexto do cliente, e a recíproca é verdadeira.


Análise funcionais dos comportamentos do terapeuta também são essenciais para o
sucesso da terapia e podem ser foco da própria terapia (Holman et al., 2017). Neste
sentido, autoconhecimento é parte importante do repertório terapêutico, tornando
essencial que o profissional também tenha passado por processo terapêutico próprio
para desenvolvimento pessoal. A prática supervisionada também é de extrema
importância, pois visa prover ao terapeuta o autoconhecimento dos Ts que ocorrem no
atendimento com os seus clientes (Tsai et al., 2008). A compreensão dos seus
comportamentos em sessão pode ajudar o terapeuta a tornar o tratamento efetivo. É
possível até mesmo que T1s sejam contexto favorável a evocação de CCR2s. Tome por
exemplo um T1 típico: atraso do terapeuta para a sessão. Embora, por razões óbvias, o
atraso deva ser evitado, acasos podem acontecer na vida do terapeuta. Este T1 pode ser
contexto evocativo para o desenvolvimento de comportamentos assertivos do cliente
(e.g., reclamar do atraso), de pedidos de reparação (e.g., pedidos, solicitações,
comandos, dentre outros caracterizam o comportamento verbal chamado mando) ou até
mesmo de empatia (e.g., cliente notar as possíveis dificuldades do terapeuta de forma
compassiva).

As regras da FAP

Regras para a análise do comportamento têm uma definição diferente do que


para o senso comum. Não são ordens, leis, ou comandos autoritários (Kohlenberg &
Tsai, 1991). Regra é a descrição de uma determinada contingência que pode servir
como estímulo antecedente e especificar quais respostas serão reforçadas em um
determinado contexto, ou seja, é um tipo de comportamento verbal (Törneke et al.,
2010). Ao especificar contingências elas podem ajudar um indivíduo a agir mesmo que
contingências anteriores não tenham moldado o comportamento-alvo.

Kohlenberg & Tsai (1991) propõem cinco regras para orientar o trabalho
terapêutico em FAP. Isso não significa que o terapeuta deva seguir uma pauta de
intervenção rígida ou diretiva e nem, tampouco, uma sequência pré-estabelecida de
passos de um protocolo. A função primária das regras é a de guiar ou influenciar o
comportamento do terapeuta durante o processo terapêutico, fornecendo apoio à sua
prática e permitindo a adesão ao modelo de tratamento da FAP. Para a FAP, as cinco
regras são sugestões de alguns possíveis caminhos a seguir que podem facilitar o
desenvolvimento de repertórios do cliente, e não ordens tácitas do que fazer. As regras
não são “técnicas”, no sentido estrito da palavra, pois não indicam topografias
específicas de comportamento, mas sim funções do comportamento do terapeuta (Tsai
et al., 2012). Desta forma, as cinco regras podem ser consideradas um T2 por serem
intervenções realizadas pelo terapeuta voltadas à melhora do cliente.

No intuito de promover compreensão facilitada do processo, pode-se utilizar


termos do senso-comum que descrevam funcionalmente a regra. Estas palavras não são
conceitos comportamentais, mas sim termos-meio funcionalmente congruentes com as
contingências especificadas (Tsai et al., 2008). Abaixo, elas serão apresentadas
sublinhadas, quando presentes.

Regra 1. Consciência: Estar atento aos CCRs e aos Ts e traçar paralelos

Podemos afirmar que quanto mais competente for o terapeuta em observar os


CCRs, melhores serão as chances de um processo terapêutico significativo e com
maiores chances de sucesso. A observação e seguimento dessa regra tem como efeito
um aumento na intensidade do relacionamento e, nesse sentido, a reação do terapeuta é
a principal consequência do comportamento do cliente. Não observar claramente o
comportamento do cliente e distinguir os CCR1s dos CCR2s pode fazer com que as
intervenções do terapeuta sejam inconsistentes ou iatrogênicas. Caso o terapeuta esteja
desatento ele pode reforçar CCR1s ou negligenciar CCR2s que ocorrem em sessão,
diminuindo a probabilidade de um processo terapêutico efetivo.

A primeira regra é a base para qualquer intervenção terapêutica. Ela consiste,


resumidamente, na observação momento a momento da interação terapêutica. O
terapeuta observa os comportamentos do cliente e os analisa funcionalmente, traçando
paralelos entre os Os e os CCRs. Desde o primeiro momento da terapia podem surgir
CCRs. De acordo com a meta de cada cliente, o terapeuta irá discriminar que
comportamentos são mais próximos do repertório-alvo (CCR2s) e quais se relacionam
com o problema (CCR1s). Nesta etapa, o terapeuta se beneficia de treinos
discriminativos que o ajudam a estar atento ao momento presente (incluindo
mindfulness) e também ajuda o cliente a discriminar as variáveis que por ventura
influenciam seu comportamento (tato).

Traçar paralelos. A partir da formulação de caso o terapeuta formula hipóteses


acerca da similaridade funcional entre os Os e os CCRs. É aconselhado que o terapeuta
teste estas hipóteses perguntando diretamente ao cliente sobre a existência destes
paralelos. Por exemplo, é útil questionar ao cliente se determinados problemas que
acontecem em sessão também acontecem fora (paralelo dentro-fora), ou vice-e-versa
(paralelo fora-dentro). O terapeuta poderá buscar duas ou mais situações diferentes que
aconteceram fora de sessão (paralelo fora-fora) ou até mesmo duas interações diferentes
que ocorreram com o terapeuta (paralelo dentro-dentro). A confirmação destes paralelos
pode indicar se de fato uma determinada formulação de caso (ou parte dela) pode ser
considerada “verdadeira” ou não. Também ajuda o cliente a treinar tato, necessário para
o seu autoconhecimento e para a elaboração dos CCR3s. Alguns exemplos de perguntas
são apresentados: “Como essas questões que aparecem ‘lá fora’ estão aparecendo entre
nós?”, “Você já experimentou esse sentimento em nossa sessão hoje?”, “Você já se
sentiu assim comigo? Sobre mim?”, ou “Essa história que você me trouxe agora, me
pergunto se você se sente assim também sobre essa terapia?”. Estas perguntas tem
função de promover no cliente a consciência sobre como este se relaciona com outras
pessoas e sobre possíveis significados ocultos de alguma história compartilhada. Estes
paralelos “fora-dentro” podem se mostrar uma maneira bastante consistente para evocar
CCR2 (Regra 2, abaixo).

Emoções do terapeuta como barômetro. O terapeuta, por ser o contexto do


cliente, está em uma posição privilegiada por receber as demandas do cliente
diretamente. Em outras palavras, ele é antecedente e consequência dos comportamentos
do cliente, e sente diretamente os efeitos das ações do indivíduo em atendimento. No
momento em que o terapeuta também está atento ao seu próprio sentir, ele tem ao seu
dispor uma variável de análise única. Sensações de irritação, frustração, culpa, tristeza,
pena, ansiedade e tédio podem indicar que talvez o cliente afete outras pessoas da
mesma forma. O terapeuta, obviamente, precisa estar atento a estas variáveis como
sendo função do comportamento do cliente, e não demandas próprias (as quais
indicariam um T1). Os respondentes do clínico, então, podem ser considerados como
um barômetro (ou termômetro) que demonstra como terceiros reagem às respostas do
cliente (Tsai et al., 2008).

O terapeuta deve procurar por comportamentos que indiquem esquivas


emocionais ou sinalizem a queixa explícita do cliente. Muitas vezes, terapeutas
inexperientes prestam excessiva atenção ao conteúdo das histórias contadas por seus
clientes e acabam se perdendo em um emaranhado de diferentes situações que os levam
para longe do que é realmente importante: o processo, aquilo que está acontecendo com
o seu cliente à medida que ele conta suas histórias. Ele está expressando segurança?
Aceitação? No desenrolar da sessão, expressa vulnerabilidade? O que acontece com o
seu corpo enquanto fala? A natureza e a intimidade do relacionamento, o trabalho no
processo, o significado do que está acontecendo entre o terapeuta e o paciente, estas são
as questões mais importantes as quais o terapeuta deve estar atento.

Regra 2. Coragem: Evocar CCR2s

Qualquer processo terapêutico é por si só evocativo de CCR2s, afinal o cliente


que busca a terapia está em um processo de insatisfação com algum elemento de sua
vida e quer melhorar. No entanto, nem sempre uma audiência não-punitiva por si só vai
promover CCR2s, ou até mesmo estes podem demorar para surgir. Neste caso, o
terapeuta pode buscar evocar diretamente um novo padrão de respostas. Esta evocação
consiste em prover ao cliente um contexto em que ele possa expressar comportamentos
que foram punidos em outros contextos, ou seja, prover um contexto difícil para o
cliente, estando este em um espaço protegido para exposição. Por exemplo, um cliente
com dificuldade de fazer solicitações de mudança para o outro (mando) pode se
beneficiar de um terapeuta que solicita feedbacks e incentiva o cliente a descrever que
coisas não gosta no terapeuta ou na terapia. Em outro caso, um cliente com dificuldade
de expressão emocional ou vergonha de falar sobre tópicos difíceis pode ser beneficiado
se o terapeuta questionar se há alguma coisa que lhe seja difícil dizer na sessão. Aqui o
terapeuta também pode utilizar técnicas específicas (sejam elas oriundas de uma
tradição comportamental ou não).
É importante lembrar que a FAP tem como foco a intervenção funcional,
portanto um tratamento efetivo não é um tratamento repleto de técnicas. O
desenvolvimento de habilidades interpessoais se beneficia de um contexto mais natural
possível de interação (regra 3, abaixo). O uso abusivo de técnicas pode tornar arbitrário
este contexto, o que pode prejudicar a generalização de respostas (regra 5, abaixo).

O termo coragem refere-se à execução de um comportamento que seja arriscado


ou que gere vulnerabilidade, e que se relacione com a aproximação de algo importante
pelo cliente; ou seja, coragem é fazer uma ação alinhada às metas na presença de medo.
Esta reação emocional ocorre porque tal ação foi punida no passado ou foi pouco
reforçada (Cordova & Scott, 2001). Classes de respostas envolvendo expressão
emocional, compartilhamento de histórias vergonhosas, posicionamento frente a algum
tópico, fazer pedidos e dar feedbacks, dentre outros, podem ser evocados em um
contexto não-punitivo. A intimidade na relação terapêutica, enquanto CCR2, se
expressa justamente em função da audiência não-punitiva (Tsai et al., 2008).

Uma relação aberta e franca entre terapeuta e cliente evoca o CCR1 e facilita o
desenvolvimento do CCR2. É por imergir em um relacionamento autêntico que o cliente
aprende. Para fornecer um contexto evocador de CCR1, o terapeuta espontaneamente se
apresenta com alguém que ama, luta e que está totalmente envolvido com seu paciente.
De modo geral, terapia tem como pano de fundo a construção de relacionamentos
afetivos. A expressão de comportamentos arriscados e dos medos e a redução de
bloqueios com o terapeuta é a base para que o cliente possa transpor estes ganhos com
outras pessoas (generalização).

Em geral, a maioria dos clientes precisa aprender a manter relacionamentos


íntimos. A principal razão pela qual as pessoas vêm para a terapia é o seu problema em
desenvolver e manter um relacionamento amoroso, íntimo e nutritivo com os outros.
Como evocar esses comportamentos? A sala de terapia é um “espaço sagrado”,
separado e apropriado exclusivamente para uma pessoa, dedicado a algum propósito,
protegida de punições, onde tudo o que o seu cliente pensa e sente é bem-vindo e onde
você também é autêntico quando compartilhar o que sabe e o que sente.

Podemos evocar CCR2 em sessão de forma não relacionada à díade cliente-


terapeuta. Durante uma sessão na qual o cliente conta sua história o terapeuta pode
perguntar: “você pode se conectar com aquela emoção um pouco mais?”; ou “Estou
notando que você está muito intelectual com relação a essa questão. O que você sente
em seu corpo?”; ou, ainda, ao requisitar um “tema de casa” ou um exercício
experiencial para a semana. Para evocar CCR2s dentro da relação terapêutica, existem
certas perguntas que podem ser úteis, como: “O que você pode ver na minha expressão
sobre como estou reagindo a você agora?”; “Como você pode ocupar mais espaço em
nosso relacionamento?”; “Você consegue encontrar uma maneira de expressar sua raiva
contra mim, mas não me afastar?”

Mover a relação terapêutica para processos do momento presente, é uma outra


forma de evocar CCR2. Por exemplo, desloque a conversa do conteúdo (e.g., histórias
sobre o passado ou futuro) para processos que acontecem no aqui-agora na sessão
terapêutica, questionando: “Você pode notar que há algum momento você quase...” ou
“Você está me falando sobre os seus sentimentos quando foi rejeitado por sua mãe no
passado. Quais são os sentimentos agora, nesse momento, enquanto você compartilha
isso comigo?”

O terapeuta pode ser ele mesmo, a fonte de CCR2. Para isso, com todo o
cuidado, pode fazer uso de autorrevelação, falando sobre suas experiências de vida
dentro e fora da sessão, suas reações emocionais autênticas, ou das suas próprias
vulnerabilidades. Ser verdadeiro e autêntico é uma condição fundamental, pois a perda
da credibilidade do terapeuta pode ser um problema, quando o terapeuta se utiliza do
reforço arbitrário apenas para criar condições evocadoras de CCRs. É importante, no
entanto, deixar claro que a autorrevelação do terapeuta deve ter a função de promover
mudança no cliente. Outrossim, é importante que o terapeuta possa observar em si
possíveis barreiras suas para evocar CCR2s. Ele deve estar atento aos temas que evita
abordar com seus clientes e como isso o trabalho que faz com esses clientes, assim
como com o que tende a evitar lidar em sua vida (e.g., tarefas, pessoas, memórias,
necessidades, sentimentos, anseios, pesar, raiva, tristeza, medos, ser específico). Esta
esquiva pode configurar um T1, dependendo da formulação de caso e das necessidades
de algum dado cliente. Um terapeuta que evita falar de sexualidade pode inibir CCR2s
em um cliente que tenha dificuldades em sua vida sexual, por exemplo.

Regra 3, Amor: reforçar naturalmente os CCR2s

A regra 3 é o “coração” da FAP. Ela consiste em responder de forma


contingencial aos CCRs do cliente, de forma preferencialmente reforçadora às suas
melhorias. Quando o terapeuta percebe (regra 1) ou evoca (regra 2) um CCR2, o
responder reforçador imediato promove uma maior possibilidade deste comportamento
se repetir em sessão, enquanto comportamentos concorrentes (CCR1, por exemplo), não
reforçados tendem a reduzir sua frequência.

Ao falar sobre reforço o terapeuta deve estar atento à frequência com a qual o
cliente realiza determinado CCR (ou ações dentro da classe funcional do CCR). Uma
consequência só pode ser considerada reforçadora se aumenta a frequência do
comportamento (a posteriori), portanto mesmo que o terapeuta acredite estar sendo
reforçador (a priori) com alguma intervenção, se a frequência de um comportamento
não se altera ou é suprimida não houve reforço. Uma consequência natural do
comportamento do cliente (e.g., se o cliente faz um pedido e o terapeuta o atende) tem
mais poder de ser reforçadora, enquanto consequências arbitrárias (e.g., apenas
parabenizar quando o cliente faz algo):

Reforço natural e reforço arbitrário: o reforço proporcionado pelo terapeuta


deve ser o mais natural possível, ou seja, próximo do que seria esperado em contextos
fora da terapia e diretamente associado ao comportamento do cliente. Se a meta
terapêutica estiver associada ao desenvolvimento de comportamentos assertivos e de
pedidos, por exemplo, será naturalmente reforçador o terapeuta atender pedidos e
acolher críticas a si. Obviamente, todas as consequências fornecidas pelo terapeuta
devem considerar as limitações do setting e o código de ética. Exposições arriscadas de
um cliente, como falar de um tema difícil ou dispor-se a entrar em contato com
dolorosas emoções, são naturalmente reforçadas por um terapeuta atento, acolhedor e
empático.

De acordo com o princípio da modelagem, o desenvolvimento de novos


repertórios ocorre de um comportamento mais simples até um mais complexo. Desta
forma, os CCR2s iniciais, como visto acima, podem aparecer de forma mais ou menos
atrapalhada/desengonçada, ou até mesmo no meio de um CCR1 (i.e., “achar uma pepita
de ouro no meio do barro”). O terapeuta atento à regra 1 e que consegue reforçar
naturalmente essas aproximações sucessivas de CCR2 ajudará o cliente a aproximar-se
cada vez mais do repertório complexo desejado.

Regra 4: avaliar efeito da intervenção


Enquanto as três regras anteriores envolvem basicamente os princípios do
reforçamento, a regra 4 indica que o terapeuta deve avaliar qual o efeito de suas ações
sobre o cliente, em especial, se suas intervenções foram reforçadoras aos CCR2.
Inicialmente, o terapeuta pode apenas observar se suas intervenções promovem
mudanças no cliente. No entanto, muitas vezes o efeito das intervenções pode ser
implícito (privado, apenas para o cliente), de forma que nem sempre o terapeuta observa
diretamente como ele reverbera no cliente. É usual e desejável que terapeutas solicitem
feedbacks de tempos em tempos para compreender como o cliente recebe a intervenção.
Perguntas sobre a sessão ou se alguma fala fez sentido ao cliente ajudam a fazer esta
avaliação.

A regra 4 também pode ajudar ao cliente a ficar mais consciente de seu próprio
processo terapêutico, gerando autoconhecimento (regra 1), assim como pode promover
um espaço para o cliente falar sobre questões difíceis (regra 2). Pode também fazer com
que o cliente consiga fazer tato com as intervenções do terapeuta, ficando assim mais
sensível às sutilezas do reforço natural do terapeuta (regra 3). Como visto neste
parágrafo, a regra 4 indica constante retorno às regras anteriores. Enquanto as regras
anteriores promovem a modelagem de um novo repertório, a regra 4 promove ao
terapeuta uma linha de base 4 das frequências dos comportamentos do cliente. Desta
forma, é importante que o terapeuta esteja atento aos seus efeitos não apenas no
momento presente de suas intervenções, mas também longitudinalmente, verificando se
a modelagem de fato está ocorrendo (i.e., se com o passar do tempo e intervenções os
CCR2s estão aumentando e os CCR1s diminuindo) (Kohlenberg & Tsai, 1991).

Regra 5: analisar funcionalmente o processo terapêutico e prover generalização

Embora as terapias comportamentais contextuais se foquem nos processos


ocorridos em sessão, qualquer intervenção psicológica tem como objetivo promover
melhora na qualidade de vida dos clientes em sua vida fora do consultório. Desta forma,
o objetivo da FAP é fazer com que os clientes generalizem os repertórios adquiridos em
sessão para outros contextos. Para tal, é essencial que o cliente compreenda
funcionalmente o que houve durante o processo terapêutico para verificar como e em
que contextos os ganhos serão efetivamente generalizados. Este processo é importante,
pois autoconhecimento é a base para o que Skinner (1974, p. 35) conceituou como
autocontrole: “uma pessoa que foi levada a ficar atenta a si própria por questões que lhe
4
Usa-se seguidamente o termo anglófono: baseline
foram feitas (pela comunidade verbal5) está em melhor posição de prever e controlar seu
próprio comportamento”. Autoconhecimento denota auto-observação e autodescrição
dos próprios comportamentos, assim como notar o contexto em que são emitidos e quais
as consequências.

A consequência do comportamento do cliente é o comportamento do terapeuta,


que influencia a probabilidade de aparecimento futuro do comportamento do cliente.
Nesse sentido, é desejável que ao longo do processo o terapeuta apenas observe seus
próprios comportamentos, embora seja óbvio que apenas observá-los poderá promover
algum tipo de mudança. Tal observação é útil porque se o terapeuta observa que suas
reações punem os CCR2s do cliente, por exemplo, ele pode alterar seu comportamento
para impedir que o cliente seja prejudicado em sessão assim como para produzir
respostas mais reforçadoras para as respostas de melhora. O próprio terapeuta pode
analisar seu comportamento junto com o cliente, servindo tanto como modelo para
CCR3s, quanto para que o cliente perceba quais as variáveis do terapeuta influenciaram
seus CCRs. A discriminação destas variáveis é importante para que o cliente possa ficar
atento a estas nos contextos interpessoais fora da terapia, foco da generalização.

Diferente do aspecto vivencial das regras anteriores, a regra 5 tem um aspecto


racional, mais próximo da apresentação e discussão de regras (i.e., contingências
descritas verbalmente). Um dos propósitos de uso da regra 5 é descobrir em que
contextos é passível que o cliente produza reforços naturalmente. Ademais, para uma
generalização efetiva do repertório adquirido em terapia é importante que os contextos-
alvo do cliente sejam profundamente discutidos. Tentar generalizar um repertório novo
em um contexto pouco receptivo (i.e., pouco reforçador) é contraproducente e pode
colocar em risco todo o ganho terapêutico. Se isso for necessário, no entanto, o
terapeuta terá de ajudar o paciente a desenvolver estratégias para lidar com esse
ambiente pouco receptivo sem “perder” as habilidades desenvolvidas.

Interpretações funcionam como regras para aumentar o contato com as


contingências existentes. Comparações entre os eventos da sessão e da vida diária
facilitarão a generalização dos CCR2s fora da terapia. Por exemplo, o terapeuta pode
comunicar a um cliente com dificuldades em se conectar emocionalmente com seu par
“na sessão de hoje, você se mostrou vulnerável, chorou, mostrou a sua verdade. Me
5
Comunidade verbal é o nome dado aos grupos sociais que fornecem regras e consequências
sociais através de comportamento verbal para o indivíduo em sociedade, incluindo família, terapia,
colegas, etc.
senti muito próximo a você e penso que passamos a um nível mais profundo de
conexão. Como seria para você se mostrar assim para seu par?”. As interpretações aqui
devem ser conduzidas com extrema cautela, sempre fundamentadas nas evidências
adquiridas ao longo do processo. Além disso, as interpretações podem afetar
negativamente o cliente quando se tornam uma receita ou regra que ignora o contexto
em que a resposta é emitida (e.g., “se você se vulnerabilizar, irá se conectar com seu
par” pode não ser verdade em determinados contextos). É a adaptação ao contexto
natural que vai dizer se a regra ajuda ou não. Uma das funções das interpretações
funcionais é estabelecer estímulos discriminativos que sinalizam ao cliente em que
momento certas respostas serão reforçadas (e.g., “quando sua namorada pede a você que
fale sobre questões pessoais, ela está sinalizando que você pode se vulnerabilizar”).

Com a generalização efetiva dos ganhos e com metas terapêuticas alcançadas, é


possível então proceder com o processo de alta ou rediscussão de novas metas.
Combinando dialeticamente a efetividade do processo e a promoção de autonomia do
cliente, sugere-se a redução progressiva na frequência das sessões durante a alta. Não é
incomum que ao final do processo terapêutico (assim como no início) possam existir
trocas entre cliente e terapeuta como uma forma de encerramento (e.g., confecção de
uma carta6). Por fim, embora não configurem como técnicas padronizadas, as regras são
facilitadoras do processo terapêutico.

Holman et al. (2017) apresentam uma série de questionamentos que visam


produzir autorreflexões do terapeuta acerca do processo terapêutico. Estes são
apresentados na Tabela 1 traduzidos e adaptados pelos presentes autores para os
objetivos do capítulo.

Tabela 1
Questões para reflexão acerca das 5 regras, baseadas em Holman et al. (2017, p. 85–92)

Regra 1. notar CCRs


Como o cliente se comporta em suas relações interpessoais do cotidiano? Que são os padrões problemáticos?
Como o cliente se comporta em sessão com o terapeuta? Que padrões do cliente em sessão relacionam-se com os
padrões que este possui fora do consultório?
Quais padrões do cliente são difíceis de conceituar? Ex.: Cliente confunde, perturba ou irrita o terapeuta?
Que pontos fracos, pontos cegos ou vulnerabilidades o terapeuta têm em relação à propria história que dificultam
notar os CCRs do cliente?

6
Em inglês pode-se utilizar o termo “a good goodbye” nos finais de terapia e workshops, no
qual os envolvidos se despedem de forma carinhosa e discutem os processos que lhes foram mais
significativos
Regra 2. evocar CCRs
Que contextos da terapia ou comportamentos do terapeuta evocam CCRs do cliente?
Que coisas o terapeuta evita fazer quando um CCR do cliente é aversivo para ele?
Que tópicos o terapeuta evita em relação à relação terapêutica? Que efeito tem na terapia?
Como a história do terapeuta afeta a evocação de CCRs?
Regra 3. reforçar CCR2s
O terapeuta nota os CCR2s do cliente? O terapeuta se sente envolvido no processo de mudança do cliente?
O cliente consegue notar as reações do terapeuta diante de suas melhorias, vulnerabilidades e crescimento?
O terapeuta responde ao cliente de maneira sincera e genuína?
O terapeuta esconde ou oculta as respostas emocionais autênticas utilizando-se de informações, psicoeducação ou
dados da formulação de caso?
O que o terapeuta valoriza e estima no cliente? Como o cliente o afeta? O cliente sabe destas coisas?
Regra 4. notar seu efeito
O cliente está mudando dentro da relação terapêutica com o tempo? O terapeuta nota mais CCR2s e menos CCR1s?
Terapeuta e cliente estão repetindo sempre os mesmos ciclos e padrões?
O terapeuta e cliente conversam sobre o andamento e a evolução no relacionamento terapêutico?
O terapeuta está atento e trabalhando problemas ou limitações que possamr impedir o progresso do cliente?
Regra 5. promover generalização
O cliente concorda com a conceitualização dos CCRs e com a relação funcional entre seus comportamentos em
sessão e suas ações na vida cotidiana?
Na existência de discordância, terapeuta e cliente discutiram sobre isto?
O terapeuta discutiu as maneiras pelas quais o cliente está levando suas experiências em sessão para sua vida
cotidiana?
Como está sendo a generalização dos CCR2s? O que poderia ser feito para otimizar o processo?

Nota. Perguntas traduzidas e adaptadas pelos autores do presente capítulo

Outras características da FAP

Sensibilidade cultural

Por sua ênfase contextual, as terapias comportamentais são especialmente


sensíveis à cultura e seus desdobramentos (Masuda, 2014). Para a análise do
comportamento, a cultura é um dos três níveis de seleção por consequências, os quais
são a base de qualquer análise, sendo os outros o nível filogenético (história evolutiva
da espécie) e ontogenético (a história individual de cada sujeito, caracterizada
especialmente pelo condicionamento operante) (Skinner, 1981). Humanos são
organismos verbais e estão sujeitos a influências sociais dispostas pela comunidade
verbal. Portanto, determinados padrões comportamentais (e.g., vestimenta, postura,
regras morais etc.) são selecionados pelo nível cultural através de reforço social e do
fornecimento de regras que estabelecem contingências para o convívio em uma dada
cultura.
A cultura é importante para a manutenção da coesão do grupo. No entanto,
seguidamente esta coesão se dá por coerção (controle aversivo). Ações de controle
coercitivas tem inúmeras implicações nos indivíduos da sociedade, como por exemplo:
preconceito, invalidação emocional, estigma, psicopatologias, dentre outros (Sidman,
1989). Sendo sensível à cultura, a FAP também pode desempenhar um papel terapêutico
nestes problemas causados por questões oriundas de grupos, desde que o terapeuta tenha
treinado em seu repertório competências multiculturais que envolvam a consciência das
características culturais do cliente (e.g., valores, práticas culturais, questões raciais e de
gênero, etc.) Também é importante que o terapeuta tenha consciência dos impactos da
cultura em si próprio e nas possíveis interações entre a cultura do cliente e do terapeuta
(Vandenberghe, 2008).

Relação da FAP com outras terapias: aprimoramentos e intersecções

Inicialmente, a FAP foi desenvolvida acompanhando o processo terapêutico da


terapia cognitiva (Kohlenberg, Kanter, Bolling, Parker, & Tsai, 2002). No entanto, ao
longo do processo, houve um afastamento do modelo cognitivo e uma aproximação do
Behaviorismo Radical em função da observação de que os processos ativos que
ocorriam no tratamento estavam de acordo com uma perspectiva analítico-
comportamental (Kanter et al., 2010). A partir da criação de um modelo explicativo da
interação terapêutica, a FAP se transformou em um modelo standalone de intervenção,
podendo ser considerada uma terapia per se para o tratamento de problemas
interpessoais. O foco na relação terapêutica permitiu que a FAP fosse incorporada,
como aprimoramento, a outras terapias comportamentais contextuais como a ACT e a
DBT (Kanter et al., 2010). Outras terapias de abordagens de origem epistemológica
diferente podem ser aprimoradas pela FAP (e.g., terapias psicodinâmicas, terapias
feministas, terapias de casal, entre outras) (Kanter et al., 2010), embora estas ainda
careçam de validação empírica, exigindo-se cautela durante o processo de
aprimoramento. Como o foco da FAP é o desenvolvimento de repertório interpessoal
através de princípios analítico-comportamentais, os fenômenos vistos em terapias
deverão ser interpretados à luz da análise do comportamento. Um exemplo é a Terapia
Cognitiva Aprimorada por FAP (FECT) (Kohlenberg et al., 2002). Neste modelo, o
responder em função de crenças e esquemas é interpretado como comportamento
governado por regras. A cognição é vista como parte importante da cadeia
comportamental, mas não como causa. Neste modelo, é viável questionar o cliente sobre
possíveis cognições que ocorrem não apenas durante a semana, a partir do RPD (Ver
capítulo 6), mas em relação ao terapeuta. Crenças poderão ocorrer no curso da sessão e
poderão ser trabalhadas in loco pelo terapeuta quando ocorrem em relação a este.

Conclusão

O capítulo apresentou aspectos básicos da Psicoterapia Analítica Funcional


(FAP) e do modelo teórico que embasa seus princípios. A FAP, por ser uma terapia
baseada em processos, não tem como princípio norteador o uso de protocolos ou
técnicas padronizadas, mas sim na vivência da relação terapêutica baseada nas cinco
regras fornecidas ao terapeuta. O reforçamento diferencial que ocorre em sessão é uma
ferramenta efetiva para evocar e mudar padrões comportamentais que ocorrem intra-
sessão, destacando o foco interpessoal da FAP (Kanter et al., 2017).

A FAP é especialmente recomendada a clientes com problemas interpessoais e


pode ser incluída como parte da prática em terapias comportamentais contextuais
diferentes. Atendo-se ao modelo explicativo da análise do comportamento para a
definição dos CCRs, a FAP pode ser também utilizada em conjunto com terapias de
perspectivas epistemológicas distintas. O terapeuta FAP deve ser treinado a identificar e
intervir nos comportamentos que ocorrem em sessão, para tanto, supervisão clínica e
workshops teórico-vivenciais são necessários.

Referências

Borges, N. B., & Cassas, F. A. (2012). Clínica Analítico-Comportamental: Aspectos


teóricos e práticos. Porto Alegre / RS: ARTMED.
Callaghan, G. M. (2006). The Functional Idiographic Assessment Template (FIAT)
system: For use with interpersonally-based interventions including Functional
Analytic Psychotherapy (FAP) and FAP-enhanced treatments. The Behavior
Analyst Today, 7(3), 357–398.
Cordova, J. V., & Scott, R. L. (2001). Intimacy: A behavioral interpretation. The
Behavior Analyst, 24(1), 75–86.
Darrow, S. M., Callaghan, G. C., Bonow, J. T., & Follette, W. C. (2014). The
Functional Idiographic Assessment Template-Questionnaire (FIAT-Q): Initial
Psychometric Properties. Journal of contextual behavioral science, 3(2), 124–
135.
Darwich, R. A., & Tourinho, E. Z. (2005). Respostas emocionais à luz do modo causal
de seleção por conseqüências. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e
Cognitiva, 7(1), 107–118.
Del Prette, G., & Almeida, T. A. C. de. (2012). O uso de técnicas na clínica analítico-
comportamental. In N. B. Borges & F. A. Cassas, Clínica analítico-
comportamental: aspectos teóricos e práticos (p. 147–159). Porto Alegre / RS:
Artmed.
Follette, W. C., Naugle, A. E., & Callaghan, G. M. (1996). A radical behavioral
understanding of the therapeutic relationship in effecting change. Behavior
Therapy, 27(4), 623–641.
Frank, R. I., & Davidson, J. (2014). The Transdiagnostic Road Map to Case
Formulation and Treatment Planing: Practical Guidance for Clinical Decision
Making. Oakland, CA: New Harbinger Publications.
Hayes, S. C. (2004). Acceptance and Commitment Therapy and the New Behavior
Therapies: Mindfulness, Acceptance, and Relationship. In S. C. Hayes, V. M.
Follette, & M. M. Linehan (Orgs.), Mindfulness and acceptance: Expanding the
cognitive-behavioral tradition (p. 1–29). New York, NY, US: Guilford Press.
Hayes, S. C., & Brownstein, A. J. (1986). Mentalism, behavior-behavior relations, and a
behavior-analytic view of the purposes of science. The Behavior Analyst, 9(2),
175–190.
Hayes, S. C., Nelson, R. O., & Jarrett, R. B. (1987). The treatment utility of assessment.
A functional approach to evaluating assessment quality. The American
Psychologist, 42(11), 963–974.
Hayes, S. C., Strosahl, K. D., & Wilson, K. G. (2016). Acceptance and Commitment
Therapy, Second Edition: The Process and Practice of Mindful Change. The
Guilford Press.
Holman, G. I., Kanter, J., Tsai, M., Kohlenberg, R. J., & Hayes, S. C. (2017).
Functional Analytic Psychotherapy Made Simple (1o ed). Oakland, CA: New
Harbinger Publications.
Kanter, J. W., Manbeck, K. E., Kuczynski, A. M., Maitland, D. W. M., Villas-Bôas, A.,
& Reyes Ortega, M. A. (2017). A comprehensive review of research on
Functional Analytic Psychotherapy. Clinical Psychology Review, 58, 141–156.
Kanter, J. W., Tsai, M., & Kohlenberg, R. J. (2010). The Practice of Functional
Analytic Psychotherapy. Springer Science & Business Media.
Kohlenberg, R. J., Kanter, J. W., Bolling, M. Y., Parker, C. R., & Tsai, M. (2002).
Enhancing cognitive therapy for depression with functional analytic
psychotherapy: Treatment guidelines and empirical findings. Cognitive and
Behavioral Practice, 9(3), 213–229.
Kohlenberg, R. J., & Tsai, M. (1991). Functional Analytic Psychotherapy: Creating
Intense and Curative Therapeutic Relationships. New York, NY: Springer.
Leonardi, J. L. (2016). Prática baseada em evidências em psicologia e a eficácia da
análise do comportamento clínica. USP, São Paulo / SP.
Lerman, D. C., Iwata, B. A., & Wallace, M. D. (1999). Side effects of extinction:
prevalence of bursting and aggression during the treatment of self-injurious
behavior. Journal of Applied Behavior Analysis, 32(1), 1–8.
Linehan, M. M. (1993). Terapia Cognitivo-Comportamental para Transtorno da
Personalidade Borderline. (R. C. Costa, Trad.). Porto Alegre: Artmed.
Masuda, A. (Org.). (2014). Mindfulness and Acceptance in Multicultural Competency:
A Contextual Approach to Sociocultural Diversity in Theory and Practice.
Oakland, CA: Context Press.
Michael, J. (1982). Distinguishing between discriminative and motivational functions of
stimuli. Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 37(1), 149–155.
Odum, A. L. (2011). Delay discounting: trait variable? Behavioural Processes, 87(1),
1–9.
Pickett, S. M., Bardeen, J. R., & Orcutt, H. K. (2011). Experiential avoidance as a
moderator of the relationship between behavioral inhibition system sensitivity
and posttraumatic stress symptoms. Journal of Anxiety Disorders, 25(8), 1038–
1045.
Ramnerö, J., & Törneke, N. (2008). The ABCs of Human Behavior: Behavioral
Principles for the Practicing Clinician (Context Press; 1 edition). Oakland, CA:
New Harbinger Publications.
Sidman, M. (1989). Coercion and Its Fallout (Revised edition). Boston, Mass: Authors
Cooperative.
Skinner, B. F. (1953). Ciência e Comportamento Humano. São Paulo: Martins Fontes.
Skinner, B. F. (1957). Verbal Behavior. Brattleboro, VT: Echo Point Books & Media.
Skinner, B. F. (1974). About Behaviorism (1 edition). New York: Vintage.
Skinner, B. F. (1981). Seleção por conseqüências. Revista Brasileira de Terapia
Comportamental e Cognitiva, 9(1), 129–137.
Törneke, N., Barnes-Holmes, D., & Hayes, S. C. (2010). Learning RFT. Oakland, CA:
New Harbinger Publications.
Tsai, M., Kohlenberg, R. J., Kanter, J. W., Holman, G. I., & Loudon, M. P. (2012).
Functional Analytic Psychotherapy: Distinctive Features. Routledge.
Tsai, M., Kohlenberg, R. J., Kanter, J. W., Kohlenberg, B., Follette, W. C., &
Callaghan, G. M. (2008). A Guide to Functional Analytic Psychotherapy:
Awareness, Courage, Love, and Behaviorism. Springer Science & Business
Media.
Vandenberghe, L. (2008). Culture-Sensitive Functional Analytic Psychotherapy. The
Behavior Analyst, 31(1), 67–79.

Você também pode gostar