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CÂMARA LEGISLATIVA DO DISTRITO FEDERAL

Gabinete do Deputado Fábio Félix - Gab 24

PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR Nº , DE 2021


(Autoria: Deputado Fábio Felix)

Altera a redação do art. 27 da Lei


Complementar nº 264, de 14 de dezembro
de 1999, para estabelecer isenção de taxa
para emissão de segunda via de identidade
civil para pessoas travestis e transexuais.

A CÂMARA LEGISLATIVA DO DISTRITO FEDERAL decreta:

Art. 1º O art. 27 da Lei Complementar nº 264, de 14 de dezembro de 1999, passa a vigorar


com o seguinte parágrafo acrescido ao caput:

"Art. 27
(...)
§8º Não será cobrada taxa para emissão de segunda via de identidade civil se se tratar de retificação de nome
civil ou de sexo ou gênero de pessoas travestis e transexuais."

Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

O direito ao reconhecimento da identidade de gênero das travestis e demais pessoas transgênero perante o
Estado obteve avanço histórico com o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4275 em
março de 2018 pelo plenário do Supremo Tribunal Federal (STF). Com a decisão, a Suprema Corte
afirmou ser a identidade psicossocial mais importante do que os caracteres biológicos e que, portanto,
travestis e demais pessoas trans têm o direito a retificar em seu registro civil o prenome, agnome e o
campo “sexo” ou “gênero” em documentos oficiais, sem que necessitem de autorização judicial, laudos
médicos ou procedimentos cirúrgicos.
Com pouco mais de três anos da decisão, muitas pessoas travestis e trans já possuem documentos que de
fato expressam suas identidades. No entanto, para uma parcela considerável, a retificação ainda é
dificultada pelo excesso de burocracia e, em especial, pelas várias cobranças de taxas ao longo do
processo de refazer toda a sua documentação.
No Brasil não se pode cobrar para que os cidadãos tenham emitidas a sua primeira certidão de nascimento
ou o seu primeiro documento de identidade. As cobranças são realizadas somente para emissão de

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segunda via. Considerando-se a situação de pessoas travestis e transgênero, a qual foram submetidas a
uma identificação de gênero dissonante de suas verdadeiras personalidades, cobrar taxas de segunda via é
uma penalidade por já terem violado seu direito à auto-identificação.
Os primeiros documentos emitidos com a correta identificação para pessoas trans e travestis devem ser
consideradas primeiras vias, dado que, pela primeira vez, essas pessoas terão suas identidades
reconhecidas pelo Estado. Fazemos tal afirmação levando em consideração a necessidade de garantir que
as medidas legais e jurídicas tomadas para o combate à transfobia sejam de fato concretizadas.
Ademais, os Princípios de Yogyakarta, no tópico “Direito ao reconhecimento perante a Lei”, afirma como
deveres dos Estados:
c) Tomar todas as medidas legislativas, administrativas e de outros tipos que sejam
necessárias para que existam procedimentos pelos quais todos os documentos de
identidade emitidos pelo Estado que indiquem o sexo/gênero da pessoa – incluindo
certificados de nascimento, passaportes, registros eleitorais e outros documentos –
reflitam a profunda identidade de gênero autodefinida por cada pessoa. d) Assegurar que
esses procedimentos sejam eficientes, justos e não-discriminatórios e que respeitem a
dignidade e privacidade das pessoas;
d) Assegurar que esses procedimentos sejam eficientes, justos e não-discriminatórios e
que respeitem a dignidade e privacidade das pessoas.
Exposto os deveres do Estado para a consolidação dos direitos travestis e demais pessoas trans,
importa salientar que essa população, no Brasil, é vítima de profunda discriminação social, que afeta suas
condições objetivas de vida. Segundo a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), é aos
13 anos de idade que meninas travestis e trans têm os laços familiares rompidos por expulsão de suas
casas. Não por coincidência, 56% desse grupo não possui o Ensino Fundamental completo e, quanto ao
Ensino Médio, 72% não o tem concluído. Tais dados corroboram com a estimativa de que 90% das
travestis e mulheres trans precisaram ou precisam se prostituir em algum momento de suas vidas, apenas
0,02% estão na universidade e apenas 4% estão inseridas em trabalho formal com possibilidade de
progressão na carreira.
Somada às péssimas condições de vida por falta de qualificação educacional, pela negativa de
oportunidades pelo mercado de trabalho e pela incipiência das políticas públicas para combate à
transfobia, a violência extrema contra pessoas travestis e transgênero faz com que o Brasil seja
mundialmente reconhecido como o país que mais mata esse grupo social em todo o mundo. A
Transgender Europe, em pesquisa realizada com organizações da sociedade civil de dezenas de países,
inclusive a ANTRA, aponta que 40% de todas as notificações de assassinato motivado por transfobia
ocorrem no Brasil. A marginalização social a qual travestis e demais pessoas transgênero brasileiras são
impostas faz com que a perspectiva de vida dessas pessoas seja de apenas 35 anos, idade menor do que a
metade da expectativa dos brasileiros em geral.
Não condiz com um Estado democrático e que preza por igualdade prejudicar ainda mais tal grupo social
cobrando taxas para que sua identidade seja reconhecida. E, ainda assim, absurdamente, o processo de
retificação registral de prenome, agnome e do campo “sexo” ou “gênero” é atravessado por barreiras
financeiras. São cobradas taxas para emissão da certidão de protestos de todos as unidades federativas na
qual o requerente de retificação residiu nos últimos cinco anos (lembrando que, em nosso contexto
regional, é muito comum que pessoas do Entorno do DF venham aqui residir e vice-versa); taxa de
renovação da certidão de nascimento e taxa para início do processo administrativo no cartório para
retificação da certidão; após ter em mãos a certidão de nascimento retificada, as taxas para emissão de
segunda via de diversos documentos oficiais (registro geral, certificado de pessoa física, carteira nacional
de habilitação etc.).
É por isso que, em respeito à territorialidade a qual nos compete legislar, é nossa responsabilidade isentar
ao máximo as pessoas travestis e transgênero de tantas taxas, garantindo-lhes um passo a mais para a
consolidação de seu direito à identidade e do reconhecimento deste por parte do Estado.

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FÁBIO FELIX
Deputado Distrital
Praça Municipal, Quadra 2, Lote 5, 4º Andar, Gab 24 - CEP: 70094902 - Brasília - DF - Tel.: (61)3348-8242
www.cl.df.gov.br - dep.fabiofelix@cl.df.gov.br

Documento assinado eletronicamente por FABIO FELIX SILVEIRA - Matr. Nº 00146, Deputado(a)
Distrital, em 16/06/2021, às 17:20:43

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