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REFLEXÕES SOBRE A MONETIZAÇÃO DA SAÚDE DO

TRABALHADOR PELO ADICIONAL DE INSALUBRIDADE

Ednei Aranha
Advogado
Mestrando em Direito da Saúde, com a área de concentração Direito da Saúde: Dimensões
Individuais e Coletivas. Universidade Santa Cecília.
ednei@cunhaearanha.adv.br

Resumo: O presente artigo objetiva realizar reflexões sobre o adicional de


insalubridade, como forma de monetização do risco à saúde do trabalhador. Com
uma abordagem sobre os direitos fundamentais e o princípio da dignidade da
pessoa humana, com previsão na Constituição Federal de 1988. Busca-se, analisar
o atual critério adotado, tendo em vista o sistema capitalista, onde o que importa
muitas vezes é a geração de riquezas, ficando a saúde do trabalhador em segundo
plano.
Palavras-chave: Princípio da dignidade da pessoa humana. Adicional de
insalubridade. Monetização do risco.

Área de conhecimento: Humanas.

1. Introdução
Este artigo discute os direitos fundamentais, no âmbito da Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988, notadamente quanto à saúde do
trabalhador, e a monetização do risco pelo adicional de insalubridade.

Para o desenvolvimento do artigo, será adotada como metodologia a


pesquisa bibliográfica, bem como consultas a sites, legislação brasileira, e artigos
científicos.

O artigo também abordará os impactos sociais decorrentes da não


observância das normas de saúde e segurança do trabalho. Além disso, a análise do
princípio da dignidade da pessoa humana e a problemática do meio ambiente de
trabalho impróprio para o labor, e a monetização do risco pelos adicionais ofertados.

2. Origens da monetização e o adicional de insalubridade

O adicional de insalubridade teve origem no Brasil no ano de 1936, criado


pela Lei 185 de 14 de janeiro e Decreto Lei 399 de 30 de abril de 1938.

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No Brasil, os adicionais foram regulamentados pelas seguintes leis: Decreto-
Lei nº 2.162/40 que estabeleceu o índice de 40%, 20% e 10% do salário mínimo
para insalubridade.

A periculosidade foi estabelecida pelas seguintes leis: Lei nº 2.573/55, para


quem trabalha com inflamáveis; Lei nº 5.880/73 estendeu a periculosidade para os
trabalhos com explosivos; Lei nº 7.369/85 aos empregados do setor de energia
elétrica a Lei nº 11.901/09 instituiu a periculosidade aos bombeiros civis.

Os estudos sobre a importância da relação homem-trabalho como ferramenta


de produção e os reflexos dessa relação na sociedade despertaram no plano político
a necessidade de constitucionalizar o direito do trabalho como direito fundamental a
todo cidadão, garantindo direitos mínimos ao trabalhador, visando assegurar a
dignidade deste frente à exploração do Capital.

Nesse sentido, desde a constituição de 1934 houve paulatinamente a


constitucionalização do direito do trabalho, seguidas pelas Constituições de 1937,
1946 e 1967. Entretanto, somente na Carta Magna de 1988 o trabalho foi inserido no
capítulo dos Direitos Sociais, consagrando este como direito fundamental.

O adicional de insalubridade tem correspondência no artigo 7º, inciso XXIII da


Constituição Federal de 1988, que disciplina o seguinte:

“são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à
melhoria de sua condição social o adicional de remuneração para atividades
penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei”.

Observa-se, que o mencionado dispositivo constitucional, corresponde a uma


norma de eficácia limitada, ou seja, depende de uma norma infraconstitucional que o
regulamente para produzir os seus efeitos.

Sobre a mesma matéria o artigo 190 da Consolidação das Leis do Trabalho


dispõe que:

Art. 190. O Ministério do Trabalho aprovará o quadro das atividades e


operações insalubres e adotará normas sobre os critérios de caracterização
da insalubridade, os limites de tolerância aos agentes agressivos, meios de
proteção e o tempo máximo de exposição a estes agentes.
Os dois diplomas possuem eficácia limitada e que a definição dos critérios de
caracterização da insalubridade é de competência do Ministério do Trabalho e
Emprego, ou seja, do Poder Executivo, o qual através da Portaria 3.214, de 08 de

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julho de 19789, aprovou as Normas Regulamentadoras – NR – do Capitulo V, Titulo
II, da Consolidação das Leis do Trabalho, relativas à Segurança e Medicina do
Trabalho, e dentre elas, a NR 15 que trata especificamente dos critérios para a
caracterização ou não da insalubridade. (Portaria MTB nº 3.214, de 08 de junho de
1978. Aprovaram as Normas Regulamentadoras – NR – do Capítulo V, Título II, da
Consolidação das Leis do Trabalho, relativas à Segurança e Medicina do Trabalho).

De acordo Norma Regulamentadora Nº 15, o exercício de trabalho em


condições de insalubridade, assegura ao trabalhador a percepção de adicional,
incidente sobre o salário mínimo da região, equivalente a: (Norma regulamentadora
nº15)

40% (quarenta por cento), para insalubridade de grau máximo;


20% (vinte por cento), para insalubridade de grau médio;
10% (dez por cento), para insalubridade de grau mínimo.
Segundo a referida Norma Regulamentadora, no caso de incidência de mais
de um fator de insalubridade, será apenas considerado o de grau mais elevado, para
efeito de acréscimo salarial, sendo vedada a percepção cumulativa .

Percebe-se, preliminarmente uma regulamentação em que disciplina o quanto


o trabalhador receberá por colocar em risco sua saúde. No entanto, o fato de está
previsto como legal do ponto de vista do ordenamento jurídico, entendemos que
essa troca de saúde por porcentagens, significa uma afronta à pessoa humana.
Pois, estabelecer parâmetros de insalubridades em determinados ambientes de
trabalho, e, mesmo assim, permitir que o trabalhador fique exposto a essa
insalubridade, é o mesmo que permitir, que ele esteja trocando sua saúde pelo
adicional ofertado.

No contexto de evolução histórica, é importante destacar também, uma


transformação nas normas jurídicas de proteção da saúde e segurança do
trabalhador no ambiente de trabalho, desde uma preocupação inicial centrada
apenas no campo da segurança contra acidentes do trabalho, para a medicina do
trabalho e a cura das doenças no trabalho, até o evoluir para o campo da higiene
ocupacional e da ergonomia, integrando-se as áreas da medicina, psicologia,
fisiologia com a engenharia e arquitetura, envoltas na abrangência dos fatores
causais de acidentes do trabalho e doenças profissionais, se acentuando a
necessidade de sua prevenção.

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3. O Direito fundamental ao meio ambiente e o princípio da dignidade da
pessoa humana.
A ideia de produzir cada vez mais se sobrepõe a pessoa humana, ou seja, o
que mais importa é a produção, o crescimento econômico. Neste cenário, o
trabalhador é levado a um nível de objeto considerado descartável, pois o que é
pago para ele trabalhar em locais insalubres que permitirá doenças que o deixará
impossibilitado de trabalhar e consequentemente fora do mercado de trabalho.

O trabalhador tem o direito de laborar em um ambiente que proporcione sadia


qualidade de vida. Pactua com esse entendimento, Norma Sueli Padilha:

O direito humano fundamental do trabalhador ao meio ambiente do trabalho


equilibrado irradia seus efeitos no contrato do trabalho, e como norma de
ordem pública, impõe ao empregador o compromisso com a sadia qualidade
de vida de todos os trabalhadores no ambiente laboral, e com a sua
proteção contra os riscos inerentes à atividade econômica, cabendo-lhe
atuar por meio de práticas sustentáveis e de equidade, priorizando práticas
de precaução e a promoção do desenvolvimento sustentável em prol dos
seus funcionários e da comunidade. (PADILHA, Norma, Sueli. Texto
extraído do artigo: Meio ambiente do trabalho: um direito fundamental do
trabalhador e a superação da monetização do risco. Pág.4. Disponível
em:<https://aplicacao.tst.jus.br/dspace/bitstream/handle/1939/55993/009_pa
dilha.pdf?sequence=1>).
Em um Estado democrático de direito, onde a Constituição Federal
estabelece a dignidade da pessoa humana em nível de interpretação como princípio
garantidor do mínimo necessário para que o cidadão viva com dignidade. Por isso,
entende-se não ser coerente Permitir,que o trabalhador seja vítima da avassaladora
produção em massa em locais muitas vezes insalubres.

A colisão entre o direito à saúde e o direito de empreenderem-se atividades


econômicas insalubres, empregando pessoas para nelas atuarem, dá-se no
ponto em que se esgotam todas as medidas técnicas (quer gerais, quer
individuais, que o empregador tem o dever, imposto pela CLT e pela
Portaria nº 3.214/78 do MTE, de adotar medidas possíveis para eliminar ou
reduzir a ação de determinado agente ou fator deletério. Aí, nesse ponto,
prevalece, como valor maior, a atividade econômica, que não será proibida,
ainda que se saiba ser, em maior ou menor grau, prejudicial à saúde e/ou à
qualidade de vida dos operários que forem contratados. (ANDRADE ,p. 30,
2016).
Em face da relevância jurídica e social incita-se a uma exegese no tocante a
colisão dos princípios constitucionais fundamentais, para isso, corrobora os
ensinamentos de Robert Alexy, segundo ele:

Princípios são mandamentos de otimização em face das possibilidades


jurídicas e fáticas. A máxima da proporcionalidade em sentido estrito, ou
seja, exigência de sopesamento, decorre da relativização em face das
possibilidades jurídicas. Quando uma norma de direito fundamental com
caráter de princípio colide com um princípio antagônico, a possibilidade

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jurídica para a realização dessa norma depende do princípio antagônico.
Para se chegar a uma decisão é necessário um sopesamento nos termos
da lei de colisão. Visto que a aplicação de princípios válidos, caso sejam
aplicáveis é obrigatória, e visto que para essa aplicação, nos casos de
colisão, é necessário um sopesamento, o caráter principiológico das normas
de direito fundamental implica a necessidade de um sopesamento quando
elas colidem com princípios. (ALEXY, p.117, 2011).
Utiliza-se para o deslinde da colisão a técnica da ponderação entre os
princípios envolvidos e principalmente na análise do caso concreto, sempre com a
utilização das técnicas de interpretação constitucional.

Desse modo, em caso em colisão de direitos fundamentais, o intérprete


deverá utilizar o princípio da concordância prática ou da harmonização, de forma a
combinar os bens jurídicos em conflitos evitando o sacrifício total de um em relação
ao outro, realizando a redução proporcional do âmbito de alcance de cada qual,
sempre em busca do verdadeiro significado do texto constitucional e da harmonia do
sistema

Nesse raciocínio, entende-se que o direito ao trabalho e a saúde do


trabalhador está intrinsecamente ligado a dignidade da pessoa humana, impondo tal
princípio, limites à atuação estatal, objetivando impedir que o poder público venha
violar a dignidade pessoal, mas também implicando numa perspectiva que se pode
designar de programática ou impositiva, mas nem por isso destituída de plena
eficácia que o Estado deverá ter como meta permanente, proteção, promoção e
realização concreta de uma vida dignidade para todos, podendo-se sustentar, a
necessidade de uma política da dignidade da pessoa humana e dos direitos
fundamentais .

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 tem como seus


principais vetores de interpretação e aplicação a dignidade humana e a igualdade,
de forma que todo o ordenamento jurídico deverá obrigatoriamente levar em conta a
preservação de tais valores. No caso do meio ambiente do trabalho, a tutela deve
ser interpretada em conjunto com todos os direitos fundamentais, privilegiando a
dignidade da pessoa humana de tal maneira que o direito material seja planificado
tanto na teoria como na prática.Esse é o entendimento de Araújo:

Trata-se a proteção ambiental de forma de preservação da sadia qualidade


de vida para a atual e para as futuras gerações de seres humanos,
cuidando, assim, de direito fundamental, já que garantidora da dignidade
humana e da igualdade. Nesse sentido, a Constituição Federal tratou de
propiciar a proteção do meio ambiente, em todas as suas esferas, como o

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meio ambiente natural, o meio ambiente artificial e o meio ambiente cultural.
(ARAÚJO, p.446, 2015).
Urge salientar, a complexidade em compatibilizar o princípio da dignidade da
pessoa humana em um sistema que muitas vezes, o que mais importa, é a geração
de riquezas, ficando a saúde do trabalhador, sujeita à negociação, de forma que o
trabalho seja realizado mesmo em condições degradantes à saúde.

A ideia de crescimento econômico deve ser pautada em conjunto com os


princípios e diretrizes ambientais previstas na Constituição da República, e também
nos ditames dos direitos humanos, em especial ao princípio da dignidade da pessoa
humana.

4. O meio ambiente do trabalho e a monetização do risco


Meio ambiente, segundo a legislação brasileira, é “o conjunto de condições,
leis, influências e interações de ordem física, química e biológica que permite, abriga
e rege a vida em todas as suas formas”.( BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de Agosto de
1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos
de formulação e aplicação, e dá outras providências).

A definição legal de meio ambiente é ampla, devendo-se observar que o


legislador optou por trazer um conceito jurídico indeterminado, a fim de criar um
espaço positivo de incidência da norma. (FIORILLO, 2012).

Na tônica do direito internacional, Granziera ensina que a Conferência de


Estocolmo sobre Meio Ambiente Humano de 1972 constituiu um marco do século XX
ao considerar a variável ambiental em todas as atividades humanas. Segundo a
autora, a ideia foi tomando corpo à medida que os países estruturaram uma
legislação ambiental, estabelecendo normas para que a atividade econômica não
causasse danos irreparáveis ao meio ambiente, desafio tal a ser enfrentado por toda
a coletividade. (GRANZIERA, 2015).

A proteção e a melhora do meio ambiente são questões importantíssimas que


afetam o bem-estar dos povos e o desenvolvimento econômico do planeta,
tornando-se um direito de todos os povos e um dever de todos os Estados. ( SILVA,
2003).

Desse modo, todo homem tem o direito de exercer suas atividades em um


meio ambiente saudável e equilibrado, de acordo com suas necessidades, em

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consonância com o princípio da dignidade da pessoa humana, presente logo no art.
1, III, da Constituição Federal de 1988.

Ao garantir um meio ambiente sadio, equilibrado e sustentável, valoriza-se o


princípio da dignidade da pessoa humana, que, segundo Flávia Piovesan , simboliza
um verdadeiro super princípio constitucional, a norma maior a orientar o
constitucionalismo contemporâneo, nas esferas local e global, de modo a dotá-lo de
especial racionalidade, unidade e sentido. (PIOVESAN, 2003).

Nesse raciocínio, a tutela jurídica ambiental possui mecanismos que


possibilitam a interação com outros ramos do direito, no presente caso, no meio
ambiente do trabalho, e também de outras ciências, promovendo desta feita, um
campo vasto de atuação e consequentemente de proteção.

Há inúmeras propostas conceituais de meio ambiente laboral que buscam


trabalhar com esse conceito legal de meio ambiente. Para Ney Maranhão o meio
ambiente do trabalho é:

A resultante da interação sistêmica de fatores naturais técnicos e


psicológicos ligados às condições de trabalho, à organização do trabalho e
às relações interpessoais que condicionam a segurança e a saúde física e
mental do ser humano exposto a qualquer contexto. (MARANHÃO, p.56.
2016).
Luciana Aboim Machado Gonçalves da Silva,ensina que o direito ao meio
ambiente laboral equilibrado, que contempla a saúde física e psicológica do
trabalhador, é um direito de toda a coletividade, ou seja, é um direito denominado
difuso, considerado pelo Código de Defesa do Consumidor” como de interesse
transindividual, de natureza indivisível, cujos titulares sejam pessoas
indeterminadas, ligadas por circunstâncias de fato”. (SILVA ,2012).

A importância maior há de ser dada ao meio ambiente do trabalho, “porque


enquanto nos outros ambientes o ser humano é atingido mais indiretamente, neste,
o homem é diretamente afetado pelas consequências danosas”. (MARANHÃO,
2016).

A ideia de compensar a agressão da saúde do trabalhador por adicionais,


vem sendo questionada, sob a ótica coerente de que saúde não se vende. De fato, a
crescente dignificação do trabalho repele a política de remunerar as agressões à
saúde, acelerando o desgaste do trabalhador e, consequentemente, apressando a

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sua morte.Assim é que, sob o fundamento de que a venda da saúde e segurança do
trabalhador não se justifica por preço algum.

A monetização do risco, apesar de estar consolidada no ordenamento


jurídico brasileiro, vem ao longo do tempo, sendo mitigada. Corrobora com esse
entendimento o julgado abaixo que prevê a tendência da desmonetização como uma
corrente crescente na jurisprudência:

ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. MONETIZAÇÃO DO RISCO À SAÚDE


DO TRABALHADOR.
A conclusão da prova técnica dos autos no sentido de que a proteção
realmente eficaz contra os efeitos nocivos do agente insalutífero presente
no ambiente de trabalho do empregado seria a "adoção de medidas de
proteção coletiva no ambiente laboral de forma a eliminar ou diminuir a
patamares aceitáveis a concentração dos contaminantes", não constatada
no exame in loco do ambiente de trabalho, é consentânea com o
entendimento que vem sendo adotado por larga doutrina e jurisprudência
pátrias que defendem a desmonetização da saúde e segurança do
trabalhador e a priorização de sua tutela específica e meta individual,
coadunando, também, com a literatura técnica acerca do tema. A ordem
legal em vigor dispõe que o uso de equipamentos de proteção individual
que diminuam a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância é
considerado hábil a neutralizar a insalubridade. Se a reclamada não vem
dedicando atenção dirigida à redução dos níveis de insalubridade com a
adoção de medidas coletivas no âmbito da sua atividade produtiva, há que
dela se exigir o fornecimento de proteção adequada ao seu empregado, não
se entendendo como tal o fornecimento esporádico de filtros de máscaras
respiratórias (que são descartáveis), mesmo porque o fato de o reclamante
ter estado protegido dos efeitos do agente por duas ou três vezes durante o
mês, em razão do fornecimento dos sobreditos filtros, não desonera a
reclamada do pagamento do adicional, porquanto a intermitência da
exposição do trabalhador aos agentes agressivos à sua saúde jamais
constituiu causa excludente do pagamento do adicional de insalubridade.
(Acórdão. Adicional de insalubridade e monetização do risco à saúde do
trabalhador. TRT-3 - RO: 388003 00757-2002-072-03-00-0, Relator: Jose
Roberto Freire Pimenta, Quinta Turma, Data de Publicação: 03/05/2003
DJMG. Página 16. Disponível em: <http://trt-
3.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/129330316/recurso-ordinario-trabalhista-ro-
388003-00757-2002-072-03-00-0>).
Constata-se, que a monetização do risco insurge como um elemento a excluir
a responsabilidade do Empregador em eventuais problemas de saúde do
trabalhador, em razão de já estar pagando o adicional e pela utilização de EPI
(equipamento de proteção individual). No entanto, verifica-se, que o adicional de
insalubridade além de ser um meio de legalizar que o trabalhador apresse sua
morte, também é uma mecanismo jurídico que busca legalizara ideia da venda da
saúde pelo adicional, ou seja, em outras palavras, é a venda da saúde por dinheiro.

Sobre os fatores que incidem sobe o meio ambiente do trabalho, seguem as


palavras de Norma Suely Padilha:

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Portanto, sobe o meio ambiente do trabalho há incidência de diferentes
fatores inter-relacionados, que influenciam o bem – estar físico e mental do
trabalhador, afetando sua qualidade de vida no trabalho. (PADILHA, p. 381,
2010).
Lamentavelmente, os trabalhadores que ganham esse adicional, muitas
vezes não possuem o conhecimento necessário de que, sua saúde está sendo
deteriorada, e que o dinheiro que ele recebe, não dará para custear as
consequências oriundas dos problemas de saúde que advir decorrentes da
exposição em áreas insalubres. Notadamente, essas críticas, em primeiro momento,
devem ser observadas em um contexto dentro da realidade social. E a realidade,
como bem sabemos, é constituída infelizmente de patronos muitas vezes
aproveitadores da ignorância dos seus empregados, submetendo-os a ambientes
totalmente insalubres.

Entre junho de 2001 e outubro de 2014, os Auditores Fiscais do Trabalho


fizeram 22.796 análises de acidentes e doenças do trabalho, visando identificar
condições e fatores de risco que levaram à ocorrência de agravos à saúde do
trabalhador, bem como verificando a ocorrência de infrações às normas trabalhistas
de proteção à segurança e saúde no trabalho. (Ministério do Trabalho e Emprego.
Análise de acidentes e doenças do trabalho. Disponível
em:<http://acesso.mte.gov.br/seg_sau/analise-de-acidentes-e-doencas-do-
trabalho.htm>).

A crítica se origina em analisar a omissão do Estado frente a sua


responsabilidade na preservação da saúde do trabalhador, deixando muitas vezes a
“negociação de interesses de grupos dominantes” se sobrepor a saúde do
trabalhador. Sobre a temática referente à negociação das normas do direito do
trabalho, Dorothee Susanne Rüdiger, destaca que:

O esfarelamento do direito pela teoria pós-moderna está ligado à crise


contemporânea da sociedade e do Estado. No contexto da globalização, da
crescente importância das normas supra- e infranacionais, o Estado
Nacional perde o monopólio de promulgar regras, o que leva a uma
crescente privatização da regulação jurídica presente num direito reflexivo,
isto é, num direito primordialmente procedente de negociação. (RÜDIGER,
Dorothee Susanne. Artigo: Autonomia privada coletiva e crise paradigmática
no direito do trabalho. Disponível em:
<file:///C:/Users/pacheco26/Downloads/autonomia_em_quest_o%20(1).pdf).
A preocupante interpretação flexível das normas do direito do trabalho,
decorrente da crise contemporânea da sociedade e do Estado, reflete no contexto
da globalização, e com isso, acarreta-se a relativização muitas vezes de direitos e

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garantias constitucionais do ordenamento jurídico interno. O fato da produção em
massa, ou até mesmo da desaceleração do crescimento econômico, contribuem
para a negociação “legal” das relações trabalhistas, que por muitas vezes agridem a
dignidade da pessoa humana. Podemos destacar como exemplo, a troca de saúde
pelo adicional de insalubridade, onde o trabalhador por diversas circunstâncias não
tem possibilidade de renegar a exigência de laborar em locais insalubres, em razão
da necessidade da manutenção do emprego para o seu devido sustento e de seus
familiares.

5. O trabalhador e o risco

Com a Constituição Federal de 1988, a questão relativa à saúde do


trabalhador passou por significativas alterações cujas normas são objeto de
acirrados debates, basicamente em razão de três fatores: a integração da saúde do
trabalhador no Sistema Único de Saúde - SUS, a competência da União para
organizar, manter e executar a inspeção do trabalho e a competência administrativa
dos Estados e Municípios para cuidar da saúde, proteger o meio ambiente e
combater a poluição em qualquer de suas formas.( FERNANDES, 2009).

Enquanto o Ministério do Trabalho e Emprego, embora sem dispor de


recursos materiais e humanos para a monumental tarefa de zelar pela
higidez ambiental nos locais de trabalho do nosso imenso País, defende o
monopólio da inspeção nos locais de trabalho, numa clara posição
corporativista, mesquinha e equivocada, os índices de acidentes e doenças
crescem assustadoramente, mesmo se considerarmos apenas os casos
oficialmente constatados, dado o fenômeno da subnotificação.(
FERNANDES, p. 34, 2009).
Segundo Victor Hugo Nazário Stuchi, o equilíbrio, valorização e cuidado com
o meio ambiente do trabalho podem efetivar o ideal de trabalho decente, por meio da
valorização da dignidade da pessoa humana, na pessoa do trabalhador, como as
principais formas de se evitar qualquer forma de degradação humana ou de
ocorrência do trabalho penoso. (STUCHI, 2014).

Nesse sentido, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do


trabalho, os princípios informativos da atividade econômica e da ordem social, e o
próprio direito à saúde e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado são
argumentos recorrentes que são lançados na tentativa de sensibilizar todos os
operadores do direito do trabalho para mudar o enfoque tradicional, de cunho
essencialmente patrimonialista. (CARLESSO, 2008).

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Kant, em sua obra “Fundamentação da Metafísica dos Costumes”, defende
que as pessoas deveriam ser tratadas como um fim em si mesmas, e não como
objetos. Segundo ele:

No reino dos fins, tudo tem um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa
tem um preço, pode pôr-se em vez dela qualquer outra como equivalente;
por outro lado, mas quando uma coisa está acima de todo o preço, e por
isso não admite qualquer equivalência, compreende uma dignidade.( KANT,
p.58, 2004).
A preocupação com o bem estar do trabalhador e suas condições de trabalho
foi objeto de discussão e de aprovação de uma convenção internacional que trata da
segurança e saúde dos trabalhadores. A 67ª reunião da Conferência Internacional
do Trabalho (Genebra -1981), entrou em vigor no plano internacional em 11.8.83. No
Brasil sua aprovação ocorreu por meio do Decreto Legislativo nº. 2, de 17.3.92, do
Congresso Nacional. Com ratificação no dia 18 de maio de 1992; promulgado por
meio do Decreto nº. 1.254, de 29/9/94, com vigência nacional em 18 de maio de
1993.Dando origem a Convenção de nº. 155,( OIT.Organização Internacional do
Trabalho. Convenção Nº 155. Segurança e Saúde dos Trabalhadores. Disponível
em:<http://www.oitbrasil.org.br/node/504>). que dispõe sobre a Segurança e Saúde
dos Trabalhadores, especificamente em seu artigo 3º dispõe que:

Art. 3 — Para os fins da presente Convenção:


a) a expressão ‘áreas de atividade econômica’ abrange todas as áreas em
que existam trabalhadores empregados, inclusive a administração pública;
b) o termo ‘trabalhadores’ abrange todas as pessoas empregadas, incluindo
os funcionários públicos;
c) a expressão ‘local de trabalho’ abrange todos os lugares onde os
trabalhadores devem permanecer ou onde têm que comparecer, e que
estejam sob o controle, direto ou indireto, do empregador;
d) o termo ‘regulamentos’ abrange todas as disposições às quais a
autoridade ou as autoridades competentes tiverem dado força de lei;
e) o termo ‘saúde’, com relação ao trabalho, abrange não só a ausência de
afecções ou de doenças, mas também os elementos físicos e mentais que
afetam a saúde e estão diretamente relacionados com a segurança e a
higiene no trabalho.
A ideia de saúde, segurança e integridade física do trabalhador que, depois
de ter ocupado um espaço central na criação da Organização Internacional do
Trabalho (OIT), continua a inspirar uma parte substancial das convenções ou
recomendações que emanam desta Organização. Existe, no contexto de todas
essas normas, a consagração internacional de um verdadeiro direito fundamental do

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trabalhador, qual seja: o seu direito à integridade física. (BARUKI.Disponível em:
<http://online.sintese.com>).

Por paradoxal que possa parecer, a cumulação da "monetização" tem eficácia


plena na mudança de comportamento quanto à desmonetização das atividades
insalubres/perigosas, já que seu acúmulo terá o condão de fazer com que a saúde
ocupacional plena seja tida como objetivo permanente, no entendimento de que
saúde não tem preço, e que vida não se troca por meros percentuais de
consolação.Certamente que tal postura, de um direito do trabalho cada vez mais
atento a formalização das Relações Laborais, terá que vir acompanhada de uma
visão soberana de Nação, onde as idas e vindas dos fluxos de capitais, as novas
tecnologias, e a "inserção no Mercado Mundial" não se dê de forma submissa e
prejudicial aos interesses da população obreira. (BROTTO, A cumulação de
adicionais como fator objetivo na desmonetização das atividades insalubres e
perigosas. Disponível em: <http://online.sintese.com>).

6. Considerações finais

Pelo exposto, entende-se que a saúde do trabalhador constitui como um


direito fundamental da pessoa humana, possuindo intrínseca relação com o meio
ambiente do trabalho sadio e equilibrado. A busca pela promoção da saúde e
segurança do trabalhador deve ser cada vez mais intensificada. Não podemos
permitir que o sistema capitalista destrua, ou abrevie a vida dos trabalhadores.
Como demonstrado no presente artigo, à acumulação da monetização e a ideia da
desmonetização oriunda da jurisprudência, são indicativos que evidenciam a
mudança de entendimento sobre a troca da saúde por dinheiro na legislação
brasileira.

A materialização das normas de segurança e saúde somada com a


conscientização sobre a necessidade de eliminação de riscos à saúde no ambiente
de trabalho não é uma tarefa fácil, no entanto, necessária e que deve ser contínua.

Os trabalhadores não podem ser tratados como um objeto descartável, a


proteção com a saúde daqueles que laboram em atividades lesivas a saúde deve
ser uma temática a ser tratada com maior rigor pelo poder público e pela classe
empresária. Cabendo ao poder público em especial, fiscalizar, e normatizar regras
que desmonetizem a monetização da saúde do trabalhador, e caso isso em primeiro

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momento não seja célere, que realize com maior rigor a fiscalização sobre o
cumprimento dasnormas de segurança e saúde do trabalhador.

A preocupação em proporcionar o meio ambiente do trabalho sadio e


equilibrado deve ser um dever de toda a sociedade, tendo em vista que se um
empregado adoece em razão do meio ambiente impróprio que labora, trará
consequências pessoais negativas não só ao indivíduo, mas a toda sociedade, que
de forma indireta, arcará com os custos dos benefícios previdenciários ocasionados
pelas doenças oriundas do meio ambiente do trabalho impróprio.

7. Referências

ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. 2ª. ed. São Paulo: Malheiros,
2011.

ANDRADE, Lourenço: Adicional de insalubridade como instrumento de


monetização da saúde do trabalhador. Disponível em: http://online.sintese.com.

ARAÚJO, Luiz Alberto David. Revista de Direito Ambiental. Meio ambiente


urbano constitucional e o cumprimento das regras de acessibilidade. Ano 20,
volume 79. Julho – setembro. Editora Revista dos Tribunais, 2015.

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