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EVANGELICALISMO E PÓS-MODERNISMO
Definindo o Iluminismo
Em algum ponto por volta de 1750, uma mudança importante começou a
ocorrer na Europa ocidental e na América do Norte. O período em questão é
conhecido como "Iluminismo", destinado a causar grande impacto sobre o
cristianismo naquelas regules. 366 A característica primária do movimento
pode ser encontrada em sua declaração da onicompetência da razão humana.
A razão, argumentava-se, era capaz de revelar tudo o que precisamos saber
sobre Deus e moralidade. A idéia de alguma espécie de revelação
sobrenatural era descartada, por ser julgada sem importância, irrelevante.
Jesus Cristo era apenas um de muitos mestres religiosos, que nos contou
coisas que qualquer um com certo grau de senso comum, de alguma forma
nos teria contado. A razão reinava suprema.
A ascensão do movimento que é agora geralmente conhecida como
pósmodernismo' através do mundo ocidental é um resultado direto do
colapso dessa confiança na razão, e uma desilusão mais geral com o
assim-chamado mundo "moderno " .368 Pós-modernismo é o movimento
intelectual que proclama, em primeiro lugar, que o Iluminismo apoiava-se
em fundamentos intelectuais fraudulentos (como a fé na onicompetência
da razão humana), e, em segundo, que ele prenunciou alguns dos mais
horríficos eventos da história humana como os expurgos de stalinistas e
os campos de extermínio nazistas. 369 A nova disposição cultural que se
desenvolveu na década de 1980 rebelou-se contra o Iluminismo. Quem
quereria qualquer coisa com um movimento intelectualmente dúbio, que
tinha dado surgimento ao holocausto nazista e aos expurgos stalinistas?
Na década de 1880, Nietzsche declarou, um tanto prematuramente, como
acabou sendo revelado, que "Deus está morto!" Mais recentemente, é a
morte do Iluminismo que está sendo proclamada. Ainda está longe de ser
claramente revelado o que vai substituí-lo. O que está claro, no entanto, é
que a camisa de força, claustrofóbica e restritiva, colocada sobre o
cristianismo ocidental pelo racionalismo, se foi.
A interação entre o "Iluminismo" e a "modernidade" é sabidamente
complexa, formando um paralelo, pelo menos em alguns respeitos, com a
relação entre o "Renascimento' e o "Humanismo" 370 Para alguns
comentaristas, um
Nossa atenção agora se volta para as notáveis invasões que o
Iluminismo fez dentro do evangelicalismo.
1. A natureza da Escritura
Existe uma tendência dentro do evangelicalismo de tratar a Bíblia
sim_ plesmente como uma fonte de doutrinas cristãs, e de negligenciar,
suprimir ou negar seu cunho narrativo. Já discutimos o trabalho de Hans
Frei (ver p. 89_ 90), que argumenta que uma das mais distintas
características da hermenêutica bíblica durante o período do Iluminismo
foi negar seu caráter narrativo, ou tratá-lo como um tanto embaraçoso,
sendo melhor tratá-la como uma fonte de onde extrair a informação
conceitual que se pudesse ter.402 Particularmente, Frei traça o
desenvolvimento dessa tendência para reduzir o sentido da Escritura a uma
afirmação proposicional gramatical e logicamente sadia" à influência
continuada da filosofia de John Locke durante o século XVIII.403 A
tendência geral de tratar a Bíblia puramente como um livro-fonte de
verdades puramente proposicionais pode ser argumentada de maneira a
encontrar base especialmente na antiga escola de Princeton, em particular
nos escritos de Charles Hodge e Benjamin B. Warfield, em que a
influência das pressuposições do Iluminismo é especialmente fácil de ser
notada.
Felizmente, o evangelicalismo está agora começando aos poucos a limpar
de si este dúbio vestígio do Iluminismo,404 e movendo-se em direção a uma
posição que é bem mais sensível à natureza da própria Escritura. Por exemplo'
há maior sensitividade ao papel de narrativas, particularmente no Antigo
Testamento, em que as narrativas bíblicas podem ser vistas somadas umas às
outras para resultar numa narração cumulativa da natureza e caráter de
Deus.405 Em vez de forçar a Escritura a um molde ditado pelas preocupações
do Iluminismo, o evangelicalismo pode dedicar-se a permitir que a Escritura
seja Escriturae
2. Espiritualidade
Existe uma tendência de ver espiritualidade em termos de entendiment0
do texto bíblico — isto é, a leitura da Bíblia tirando sentido de suas palavras
e idéias, e entendendo seu fundo histórico e seu sentido para hoje. A ênfase
continua a ser sobre a razão, sobre o raciocínio. No entanto, precisamos ir para
tras
do Iluminismo, e recuperar as mais antigas e mais autênticas abordagens
espiritualidade, como as que são encontradas escritores como Jonathan
F,dwavds, ou John e Charles Wesley. O ctos racionaliqta do
Iluminismo foi muitas vezes refletido no que se pode chatnat' dc ctnbargo
espiritual em qualquer espécie de envolvitnento etnocional corn a ou qualquer uso
da faculdade hutnana da itnaginação -—-- duas abordagens leitura da Bíblia que o
evangelicalistno de tempos anteriores tinha em grande estima.
E atilplatnente aceito o fato de o protestantismo, em todas as suas
formas, ter sido influenciado pelo racionalismo do Iluminismo em grau
muito maior do que o Catolicismo Romano ou a Ortodoxia Grega do Leste
da Europa. Isso tem causado um impacto devastador sobre a espiritualidade
evangélica, e o colocou em séria desvantagem em relação à espiritualidade
tanto do Catolicismo romano como da Ortodoxia Oriental. O Iluminismo
forçou o evangelicalismo a adotar atitudes para chegar à espiritualidade que
resultaram em abordagens um tanto frias, impessoais e racionais, com
relação Escritura. O tradicional "tempo devocional" tem sido profundamente
influenciado por cssc ponto de vista.406
Contudo, o Iluminismo acabou. Precisamos expurgar, remover, o
racionalismo de dentro do evangelicalismo. E isso significa recuperar os
aspectos relacionais, emocionais e imaginativos da espiritualidade bíblica,
que o Iluminismo declarou serem impróprios. Como Martinho Lutero
insistia constantemente, o cristianismo está interessado no totus homo, a
'inteira pessoa humana não só a mente humana. Afirmando isso, Lutero
não estava fazendo nada mus do que enfatizando a importância de se
manter um entendimento bíblico de natureza humana em todos os
aspectos do viver cristão.
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3. Apologética
do evangelho feita dependente de crenças não-cristãs assim? O
evangelicalismo precisa permitir que sua abordagem ao evangelismo seja
remodelada e feita pelo Novo Testamento, em vez de por pressupostos
antiquados de um já defunto Iluminismo. Há um sério perigo de que o
evangelicalismo possa simplesmente prolongar a influência do Iluminismo
por um endosso continuado não-crítico de algumas de suas pressuposições e
valores principais, dos quais pelo menos alguns são potencialmente hostis ao
etos evangélico.
4. Evangelismo
O evangelicalistno precisa redescobrir a riqueza e a distinguibilidade dos
conceitos bíblicos de verdade. 408 A associação fundamental da raiz hebraica
normalmente traduzida como "verdade" ou "verdadeiro' (como em 'o Deus
verdadeiro") é "algo ou alguém em que se pode confiar" 409 Há claros
paralelos aqui com a noção bíblica de "retidão", que pouco têm a ver com
noções iluministas de moralidade pessoal, mas que se relacionam
essencialmente com fidelidade pactual.410 A noção de confiabilidade pessoal,
tão magnificamente articulada no conceito de fé expresso por Martinho Lutero
como fiducia (confiança), precisa ser vista como fundamental para qualquer
conceito de verdade autenticamente bíblica. O evangelismo é a proclamação e
recomendação da confiabilidade de Deus e do evangelho. E uma caricatura da
idéia bíblica de "verdade" igualá-la com a noção iluminista da correspondência
conceitual ou proposicional, ou a visão derivada de evangelismo como a
proclamação da correção proposicional da doutrina cristã.
Este conceito deficiente de evangelismo abre caminho para os tipos de
racionalismo e formalismo que têm destruído a vitalidade da fé cristã no
passado. A fé chega a significar pouco mais do que consentimento intelectual
a proposições, perdendo a ligação vital e dinâmica com a pessoa de Jesus
Cristo, que, para os cristãos, é— só ele — a verdade. As declarações do
evangelho de João precisam ser aceitas com a maior seriedade: Jesus não
apenas nos mostra a verdade, ou nos diz a verdade; ele é a verdade — e
qualquer conceito de verdade", incapaz de compreender o fato de a verdade
ser pessoal, deve sel
Jesus Cristo, em toda a sua plenitude, ao mundo, a fim de que esse mundo
possa ser remodelado e renovado à sua semelhança.
À luz desta análise, ficará evidente que o evangelicalismo está sob a
obrigação de assegurar que ele não permanece como um prisioneiro secreto do
racionalismo, Apelos ao senso comum", muitas vezes, acabam por se tornar a
aceitação ingênua de uma visão de mundo racionalista, na qual valores e
racionalidades de fora da fé cristã vêm exercer um papel normativo dentro dela.
A morte da modernidade
A pós-modernidade é uma noção vaga e mal-definida, que talvez pudesse
ser descrita, em determinado plano, como a perspectiva intelectual geral que
surge após o colapso da modernidade.413 Embora existam os que mantêm o
conceito de que a modernidade ainda está viva e ativa, essa posição está se
tornando cada vez mals rara. A modernidade acreditava num mundo que, em
princípio, poderia ser entendido e dominado. A pós-modernidade não apenas
tende a ver, em última análise, que o mundo está além da compreensão ou do
domínio; ela vê que essa compreensão e esse domínio, em qualquer dos dois
casos, são imorais. E então, na frase reveladora de Alan Wilde um mundo
precisando ser remendado é suplantado por um que não tem mais conserto 414
O pós-modernismo é caracterizado por sua desilusão fundamental com os
grandes temas da modernidade, que, impressionantemente, ele coloca dentro de
uma bateria cética de isolamento feito por pontos de aspas: Mesmo no nível de
sua ortografia, escritos pós-modernos sobre "verdade" , "razão", "justiça" ou
"realidade" tornam claro que o que um dia era visto como universal é tratado
agora como ultrapassado [fora de moda] e questionável. Como o analista
cultural Os Guinness observa:
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