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Barragens
Walter Duarte Costa
Conselho editorial Cylon Gonçalves da Silva; José Galizia Tundisi; Luis Enrique Sánchez;
Paulo Helene; Rozely Ferreira dos Santos; Teresa Gallotti Florenzano
Bibliografia
ISBN 978-85-7975-054-0
Responsável técnico
Geólogo Doutor Walter Duarte Costa (forma-
do em 1962 e doutorado em 2002)
endeReço administRativo
Rua Volta Grande, 581 – CEP 31.030-340
Belo Horizonte – MG
endeReço técnico
Rua Washington, 886 apto. 1201 – Bairro Sion
CEP 30.315-540 – Belo Horizonte – MG
Telefones: (31) 3241.3925 – (31) 85005813
(31) 99738407 Barragem de Irapé – Estudos geotécnicos da etapa
e-mail: walter1938@gmail.com de viabilidade executados por Walter Duarte Costa
radas, pois tal análise visa fornecer dados fatores acham-se divididos em sete clas-
para um eventual zoneamento de áreas ses, de acordo com a variação considerada
problemáticas nesse aspecto, e alguns para cada fator, em termos de influência
fatores, como o clima, são geralmente relativa média. O risco de erosão foi de-
uniformes ao longo de toda a área de uma finido em função da combinação desses
bacia hidrográfica. Outros fatores, como fatores, conforme indicado na Tab. 3.1b,
a ação antrópica, são muito localizados e na qual foram consideradas cinco classes
dinâmicos, de sorte que dificilmente as de risco, do nulo ao muito alto.
condições no início dos estudos serão as
3.1.4 Medidas preventivas
mesmas à época em que forem tomadas as
contra a erosão e o
medidas preventivas ou corretivas.
assoreamento
Assim, serão considerados como fatores
variáveis e ponderáveis de risco de erosão No estudo de um reservatório, deve-
apenas a declividade, a natureza do solo -se proceder ao levantamento de todas as
e a cobertura vegetal. Na Tab. 3.1a, esses condições que favorecem a erosão e carac-
terizar as potencialidades morfológicas
de assoreamento do futuro lago formado
Tab. 3.1 Hipóteses de agrupamento pela barragem. As medidas preventivas,
de risco
(a) Fatores influentes na erosão
estabelecidas a partir de um diagnóstico
Fator Variação Número preciso dessas potencialidades, variam
< 20% 1 desde o ataque das causas da erosão até a
Declividade 20%-50% 2 medida extrema de deslocar a barragem
> 50% 3 para um local melhor, pois o assorea-
coesivo 4 mento pode constituir-se num fator que
Solo
não coesivo 5 inviabilize a construção da obra.
eficiente 6
Vegetação O ataque às causas da erosão resume-
ineficiente 7
-se ao eficaz controle de áreas desmatadas
(b) Classificação do risco de erosão
e à proteção de pilhas de materiais soltos
Combinação de
Grau Risco provenientes de rejeitos e estéreis de mi-
fatores (Nos)
I 1+4+6 nulo neração ou da construção civil. Devem-se
1+4+7 evitar os cortes e aterros que fiquem des-
II 1+5+6 reduzido protegidos contra a erosão, bem como a
2+4+6
exposição demorada de solos entre o des-
1+5+7
matamento e o plantio agrícola.
2+4+7
III médio Reduzidos os focos de erosão e plane-
2+5+6
3+4+6
jada a localização da barragem de forma
2+5+7 a evitar situações como a mostrada na
IV 3+4+7 alto Fig. 3.1f, pode-se conviver com o assorea-
3+5+6 mento sem grandes traumas, desde que se
V 3+5+7 muito alto adotem as seguintes medidas:
4.1.1 Caracterização
4.1 Identificação geológico-
A caracterização corresponde à etapa
-geotécnica das fundações
mais importante do processo identificató-
Como fundação será considerado todo rio, pois, nessa etapa, deverão ser definidos
o embasamento geológico existente no todos os parâmetros que permitam dis-
local onde será assentada a barragem ou tinguir os diferentes materiais envolvidos
suas obras complementares (vertedouro, em uma fundação. É baseada em todos
canais, tubulações para adução, usina etc.), os meios de investigação geológica e
independentemente se tal material será geotécnica, a saber: fotointerpretação,
conservado ou retirado para a construção geologia de campo, sondagens diretas e
da obra em projeto. Assim, a fundação in- indiretas, ensaios in situ e de laboratório.
cluirá não apenas o maciço rochoso, mas Por meio dessas investigações, deverão ser
todo o material incoerente – ou regolito – buscadas, para cada material existente, as
que o recobre, seja produzido in situ, como seguintes caracterizações:
os diversos estágios de material intempe-
Geologia:
rizado, cuja gradação vai da rocha sã até o
solo residual maduro, seja transportado y Materiais incoerentes: composição
(aluvião, coluvião, tálus etc.). granulométrica, coloração, espessura,
A completa identificação desses mate- estrutura, grau de compacidade e con-
riais constitui um processo evolutivo com sistência.
as etapas de estudo de uma barragem. To- y Materiais coerentes: tipo litológico,
davia, deve-se sempre levar em conta que composição mineralógica, estruturas,
o objetivo final é chegar ao modelo geo- estágios de alteração, estados de con-
dados pontuais. Para tanto, utilizam-se sificação, ou mesmo uma seção para cada
os dados da caracterização ou da clas- compartimentação, conforme mostram as
sificação e são estabelecidas unidades Figs. 4.6 e 4.7. Além dos dados geológicos e
geológico-geotécnicas de forma bi ou tridi- geomecânicos que embasarão essas compar-
mensional, de sorte que se possa ter uma timentações, devem ser explorados todos
visão ampla de todo o maciço da funda- os elementos topográficos e hidrogeotécni-
ção, com suas variações geomecânicas na cos. Na compartimentação tridimensional,
horizontal e na vertical. Na forma bidimen- procura-se integrar as três principais di-
sional, a compartimentação é apresentada reções relacionadas com a obra. Pode-se
por meio de seções, geralmente paralelas realizá-la por meio de blocos diagramas ou
ao eixo barrável, embora possam ser com- de diagrama de cerca, em que várias seções
plementadas por outras direções. Nessas serão entrelaçadas (Fig. 4.5).
seções, devem-se plotar todas as infor-
4.1.4 Modelagem
mações obtidas nas investigações, sejam
diretas (poços, galerias e sondagens) ou in- Nessa etapa, procura-se estabelecer pro-
diretas (geofísicas). Em uma mesma seção, tótipos para as condicionantes geológicas
pode-se apresentar mais de um tipo de clas- e geotécnicas, com base em todas as fases
Fig. 4.5 Diagrama de cerca mostrando quatro seções geológicas de uma obra de barramento (barragem de
Irapé‑MG)
Fonte: cortesia da Cemig.
por I nessa figura, produz duas zonas de mobilizada a tensão de cisalhamento linear
cisalhamento, cada uma delas constituída na Fig. 4.12g.
por duas partes: uma de cisalhamento radial, A influência da direção do plano de
indicada por II e limitada por um arco de es- descontinuidade sobre a ruptura por
piral logarítmica; e outra de cisalhamento cisalhamento pode ser observada no gráfico
linear, indicado por III e definida pelo ângulo da Fig. 4.14b. Verifica-se essa influência até
de 45º - f/2 com a horizontal, explicado 45º entre as direções de descontinuidade
pelo esquema da Fig. 4.14a. A capacidade de e de aplicação dos esforços, e ela se reduz
suporte da fundação, que define a sua con- para ângulos inferiores a 45º e se anula to-
dição de estabilidade, é igual à resistência talmente a partir dos 60º. Assim, pode-se
oferecida ao deslocamento pelas zonas de prever que as descontinuidades do maciço
cisalhamento radial e linear. rochoso que possuem ângulos de 0º até 60º
Uma vez que a resistência ao no sentido de montante são passíveis de in-
cisalhamento de um maciço rochoso é con- fluenciar a estabilidade das fundações de
dicionada pelas suas descontinuidades, que barragens de peso (Fig. 4.14c). A situação
constituem planos de fraqueza do maciço, mais crítica de instabilidade é aquela em que
pode-se constatar que as piores condições ocorrem descontinuidades mergulhando
de estabilidade de uma fundação em rocha para jusante e para montante (Fig. 4.14d),
correspondem à situação em que a direção pois a intersecção desses planos favorecerá
de uma ou mais descontinuidades coincide a formação de cunhas instáveis que tendem
ou está próxima à direção em que se acha a se deslocar para jusante, a exemplo do
Entende -se por investigação ou pes- o perfeito conhecimento das feições geoló-
quisa no estudo de uma barragem o gicas e geotécnicas do projeto a implantar.
conjunto de operações que permitam O mais importante na programação
uma perfeita caracterização de todas as dessa pesquisa é racionalizar o seu uso em
feições geológicas e geotécnicas passíveis função das reais necessidades requeridas
de ser relacionadas com a implantação por cada etapa de investigação discutida
desse tipo de obra. A metodologia da no Cap. 2. Isso porque o custo dessas in-
pesquisa envolve desde a investigação vestigações cresce muito com o grau de
de campo, incluindo os estudos superfi- detalhamento requerido nas fases de pro-
ciais, os diferentes meios prospectivos e jeto básico e projeto executivo, razão
os ensaios tecnológicos desenvolvidos in pela qual é totalmente desaconselhável
situ, até os testes realizados em labora- a realização de métodos mais avançados
tório. Os estudos superficiais iniciam-se de investigação antes que seja compro-
no escritório por meio do levantamento e vada a viabilidade técnica e econômica da
da análise dos dados fisiográficos, geoló- obra na etapa de viabilidade. Esses cuida-
gicos, hidrogeológicos e geotecnológicos dos devem levar em conta não apenas o
não apenas do local de barramento, mas tipo de investigação, mas também a sua
de toda a bacia hidrográfica contribuinte. quantificação, uma vez que alguns tipos
Segue -se, ainda no escritório, a caracteri- de prospecção e de ensaios são iniciados
zação preliminar dessa área por meio da já na fase de viabilidade, como mostrado
fotointerpretação geológica. Esses estu- no Cap. 2, continuando nas fases de de-
dos têm continuidade em campo, com a talhamento do projeto. Assim, deve-se
aferição da fotogeologia, caracterização quantificar um número mínimo desses
in situ dos aspectos geológicos e geotéc- processos investigatórios na fase de viabi-
nicos da bacia e dos locais de obra, além lidade, desde que atendam à necessidade a
da identificação superficial dos materiais que se propõem, e aumentar esse número
naturais de construção e dos prognósti- nas etapas seguintes.
cos dos impactos ambientais. Outros aspectos relevantes na progra-
Essa pesquisa superficial acha-se deta- mação de uma investigação são: tipo de
lhada por etapa de investigação no Cap. 2 obra, porte da obra, natureza geológica
e será concluída com a programação das do local de implantação, riscos envolvidos
investigações subsuperficiais, por meio dos e meio ambiente. Explicitou-se no Cap. 2
diferentes tipos de prospecção, bem como que uma das recomendações a ser feita no
dos ensaios que se fizerem necessários para relatório relacionado com a fase de inven-
Como maciços naturais são considera- com a construção de uma obra de barra-
dos os solos, as rochas e os materiais de mento, principalmente pela imposição de
transição, ou saprólitos. Esses materiais novas tensões, sejam efetivas, pelo peso
podem exigir tratamento para melhorar da barragem construída, sejam neutras,
suas características independentemente pela água armazenada no reservatório for-
do local em que se encontrem em relação a mado. Como nem sempre as características
uma obra de barramento, incluindo aque- originais desse maciço natural são suficien-
las que lhe são associadas. A situação mais tes para suportar as modificações a serem
presente com relação à localização desses impostas pela obra projetada, é necessário
materiais relaciona-se com as fundações melhorar ou reforçar essas característi-
da barragem, que serão analisadas prio- cas por meio de técnicas e procedimentos
ritariamente, com considerações sobre visando a uma melhor adequação das fun-
o tratamento eventualmente necessário dações à obra projetada. Nisso consiste o
desses materiais quando localizados em tratamento das fundações.
uma encosta, no entorno de um canal, Os tipos de tratamento das fundações
de um túnel ou de outro tipo de escava- têm experimentado um sucessivo apri-
ção subterrânea. moramento ao longo dos últimos anos,
No item 4.1, foi considerado como seja em função da presença de condições
fundação de uma barragem todo o geológicas cada vez mais desfavoráveis
embasamento geológico existente no em decorrência de aproveitamentos prio-
local em que será assentada a barragem e ritários anteriores, seja pela necessidade
suas obras complementares (vertedouro, de conciliar cada vez mais os aspectos
canais, ensecadeira, usina etc.), indepen- econômicos, sociais e ambientais. Assim,
dentemente de sua constituição geológica, é comum o confronto entre o nível de se-
se formado por rocha ou pelo solo de co- gurança alcançado por um determinado
bertura. Também ficou claro que o local método de tratamento e o elevado custo
referido como fundação da barragem que este representa para a obra, ou até
propriamente dita não se restringe à área mesmo em relação às dificuldades técnicas
geralmente aplainada do fundo do vale, de sua implantação. A escolha do melhor
mas estende-se para as ombreiras laterais método de tratamento de uma fundação
que receberão parte da obra de barra- depende de uma série de fatores; porém,
mento ou de obras complementares. duas condicionantes são fundamentais
O maciço natural que constitui essa nessa escolha: a caracterização geológica
fundação sofrerá intensas modificações das fundações e o objetivo do tratamento.
propriedades para forçar sua desapro- b] Contaminação das águas por óleos,
priação vantajosa quando for realizada graxas e combustíveis: nas instalações
a desocupação dos terrenos que serão de oficina e na lavagem de máquinas e
alagados pelo reservatório. veículos, os materiais oleosos e gra-
d] Lavras clandestinas: a lavra clandes- xosos podem fluir para a drenagem
tina na área da bacia hidráulica poderá fluvial local ou se infiltrar nos solos
ser intensificada, principalmente por e contaminar as águas subterrâneas.
garimpeiros no leito do rio, criando Nos tanques de combustíveis (óleo
sérios problemas ambientais. diesel e gasolina), geralmente enter-
e] Caça predatória: a caça predatória nas rados, podem ocorrer vazamentos não
áreas florestadas que serão inundadas observáveis que também irão contami-
pode ser intensificada aos primeiros nar os solos e as águas subterrâneas.
sinais de implantação de uma obra de c] Pátio de sucatas: sucatas provenien-
barramento na região. tes da construção, como madeira,
ferragens, latas de tinta, pneus etc., se
expostas em áreas descobertas, podem
11.3 Fase de instalação do
gerar produtos contaminantes ao ser
canteiro, acampamento
carreadas pelas águas pluviais, conta-
e acessos
minando o solo e os rios locais.
Nessa fase, muitos dos impactos re- d] Geração de lixo: o lixo de natureza
lacionados para a fase de projeto serão química e orgânica gerado durante a
intensificados e outros serão criados, prin- instalação do canteiro de obras poderá
cipalmente levando em conta a grande ser direcionado aos rios pelas águas
extensão da área a ser ocupada com as in- pluviais, causando a sua contamina-
tervenções antrópicas. ção.
A escolha dos tipos de obras que in- lar, sejam de terra, de enrocamento, ou
tegram um complexo de barramento mistas, com trechos em terra e trechos em
depende de uma série de fatores, mas é enrocamento. Obviamente, as estruturas
sempre da responsabilidade do geólogo de de tomada d’água, vertedouro e adução
engenharia a análise desses fatores e as para usinas, no caso de hidrelétricas,
primeiras recomendações sobre os tipos serão construídas em concreto, na posição
de obras mais adequados para atender aos que mais se adequar na relação topogra-
objetivos do projeto em uma determinada fia/concepção de obras e em atendimento
área. às condições geológicas das fundações.
Nas considerações que se seguem, não Nas áreas de declividades acentua-
serão abordadas especificidades do pro- das, a topografia favorece a concepção
jeto, como taludes, seção tipo, drenagem de maciço em concreto, estrutural ou
etc., por serem tais atributos objeto do compactado, e a decisão acerca do tipo de
detalhamento de cada obra e de respon- seção, em gravidade ou em contrafortes, é
sabilidade do engenheiro projetista, além feita em função da geologia das fundações.
de não interferirem na escolha do tipo de Em áreas em cânions, quando a extensão
barragem e obras auxiliares. Os fatores da barragem for inferior ao triplo de sua
que realmente pesam na escolha dos tipos altura, a topografia favorecerá o projeto
de obras de barramento são: topografia, de barragem delgada em concreto com
geologia das fundações, materiais natu- dupla curvatura.
rais de construção e meio ambiente.
12.1.2 Vertedouro
Sempre que houver pontos de fuga na
12.1 Topografia
bacia hidráulica nas proximidades do eixo
As configurações morfológicas regio- barrável, haverá a possibilidade de proje-
nal e local poderão fornecer importantes tar um vertedouro nesse local, isolando-o
subsídios para a concepção das obras, não totalmente do maciço barrável, o que
apenas com relação ao corpo da barragem, constitui uma boa alternativa de projeto,
mas também para as obras auxiliares e principalmente em vales estreitos onde
desvio do rio. a melhor solução para o maciço barrável
recaia no maciço granular (terra ou enro-
12.1.1 Corpo da barragem
camento).
Nas áreas de topografia suave são mais Quando há mais de uma depressão
indicadas as barragens de maciço granu- lateral, ou ponto de fuga da bacia hidráu-