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Belo Horizonte – MG
Faculdade de Educação – UFMG
2005
1
CDD –370.15
Catalogação da Fonte : Biblioteca da FaE/UFMG
2
___________________________________________________________
Prof. Dr. Bernardo Jéfferson de Oliveira – FaE/UFMG – Orientador
___________________________________________________________
Prof. Dr. Sérgio Dias Cirino – FaE/UFMG – Co-orientador
___________________________________________________________
Prof. Dr. Luiz Flávio Couto – FAFICH/UFMG
___________________________________________________________
Profa. Dra. Regina Helena de Freitas Campos – FaE/UFMG
AGRADECIMENTOS
Desejo registrar minha profunda gratidão às seguintes pessoas, sem as quais este
Bernardo e Sérgio, que além de orientadores, foram (e são!) grandes amigos. Sempre
minhas escolhas, e com muita elegância, indicaram onde eu poderia melhorar. Das nossas
Daniel Antipoff, Elza de Moura, Otília Antipoff e Vicente de Oliveira Torres, que
gentilmente me concederam entrevistas. Entristeço ao lembrar-me que Daniel não está mais
entre nós; ele que tanto me motivou, tão logo soube desta “aventura”.
Gislaine Pereira de Aguiar, que revisou os aspectos gramaticais sem deturpar meu
estilo de escrever.
Luiz Alberto Gonçalves, Luciano Mendes de Faria Filho, José Carlos Reis, Maria do
Carmo Lacerda Peixoto, Maria Cristina Soares de Gouvêa, Thais Nivia de Lima e Fonseca, e
Cynthia Greive Veiga. Conversei com todos estes professores, acerca do projeto de pesquisa
que naquela ocasião esboçava, e cada um contribuiu de acordo com sua especialidade.
Ana Cláudia Lopes Chequer Saraiva, Blanca Pardo, Dener Luiz da Silva, Denise
Maria Nepomuceno, Érika Lourenço, Laisa Kely Vilanova, Lilian Erichsen Nassif, Raquel M.
de Assis, Renato Diniz Silveira, Rita de Cássia Vieira e Sérgio Domingues, pelo inestimável
5
apoio nas discussões do grupo de pesquisas, orientado pela Regina. Em especial à Denise, que
Lenita de Araújo Chaves de Ouro, Carla Andréa Teixeira Dias e Olinda Terezinha da
Silva Caetano, que me guiaram pelo Memorial Helena Antipoff (em Ibirité). A Dona Lenita
Nelma Marçal Lacerda Fonseca, Sônia Aroeira Barbosa, Cláudia Maria Oliveira do
Nascimento e Rosângela Pereira dos Santos, que me conduziram pelos arquivos do Centro de
Referência do Professor.
Leno Chaves de Souza, que durante meses me auxiliou na consulta dos velhos
Maria das Graças Fernandes Soares, Marília Sarti, Patrícia Maria de Melo, Yara
Luiz Flávio Couto, ex-professor e supervisor, cuja intervenção foi crucial para fundar
Adriana Garrido, Cláudio Adriano Martins, Ariel Felipe, Francisco Assis Fernandes e
Rosemary da Silva Madeira, que me prestaram o melhor atendimento possível, sempre que
minha namorada (Alessandra), que estiveram ao meu lado, nos momentos mais difíceis,
Após reconhecer a contribuição de todas estas pessoas, necessito frisar que sou
inteiramente responsável por cada palavra deste texto. Até mesmo porque deixei de seguir
6
não é justo repartir com eles o peso de prováveis erros contidos em minhas formulações.
7
RESUMO
ABSTRACT
We have presented a history of the Belo Horizonte Teachers Training College Laboratory of
Psychology. This College was created during the administration of Antônio Carlos de
Andrada, as part of a school reform project in Minas Gerais, elaborated by his secretary
Francisco Campos; and received, amongst the most modern stuff available, a Laboratory of
Experimental Psychology, according to the classical European models. Considered one of the
earliest of this line in Brazil, it functioned since 1929 to 1946. Beyond its paper in the
complementation of theoretical lectures, permitting greater integration between theory and
practice, several investigations about the population of the State were accomplished in it,
referring to his aptitudes, interests, personality marks and intelligence signs. These studies
reveal what was considered scientific for the Psychology of that time, in syntony with the
demands of an educational system in transformation, resulting inclusively in a modification of
the conception of “laboratory” in vigour at the Teachers Training College, when the
psychological tests figured as the most important resources to attend a project of children’s
selection in homogeneous classes. Among the characters of this woof, it detaches Helena
Antipoff (1892-1974), psychologist and educator of Russian origin, subsequently radicated in
Brazil, who was responsible for the organization of the Laboratory and direction of its
activities. For completing them, she created some institutions, as the Pestalozzi Society and
the Rosário Farm-School, designated to support those children considered retarded and
abnormal, that were prejudiced by the processes of classification and grouping then
employed. These other institutions received proper laboratories, which joining that of the
Teachers Training College, engendered a functionally articulated chaining. Inspired by
Michel Foucault’s genealogical analysis model, we tried to take in evidence a portion of the
“knowledge/power” network that passed by the Laboratory and shaped the features of its
productions, that includes: divergences with the Catholic Church, contests between the
teachers of the College, the control performed by directors, student’s parents reactions,
metamorphosis in the dialog between Pedagogy and Psychology, and others. Hence it follows
that this research contributes for the understanding of some elements in the history of
Educational Psychology in Brazil, throwing light on the production of facts in laboratories
and the consequent process of legitimation and application of the knowledge based on this
facts.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................. 11
1.1 Algumas conseqüências do surgimento dos modernos laboratórios
experimentais para o diálogo entre a Psicologia e a Pedagogia ......................... 11
1.2 Um laboratório de Psicologia e um problema de pesquisa................................ 17
2 METODOLOGIA .............................................................................................. 22
2.1 O referencial teórico-metodológico ................................................................... 22
2.2 As fontes históricas ............................................................................................ 26
6 CONCLUSÃO ................................................................................................... 97
1. INTRODUÇÃO
processo delicado, pois sendo os critérios bastante arbitrários, é possível que estes
antecedentes sejam localizados nas mais diversas épocas e regiões, o que pode nos condenar a
causalidade linear ao longo de um eixo temporal. Para nos esquivarmos desta armadilha, uma
25). Articulações que se dão muito mais no formato metafórico de uma rede, do que de uma
experimentais, partiremos dos séculos XVI e XVII, quando entrou em cena uma nova ciência,
mensuração dos fenômenos que elas deviam explicar. Antes disso, tal validação era feita
através do debate, onde a razão colocava em cheque a coerência lógica das proposições.
Curiosamente, a ciência moderna começou com o estudo daqueles objetos que estão mais
12
distantes, ou seja, os corpos celestes, para pouco a pouco caminhar em direção à compreensão
e Newton, que além de teorias, consolidaram estratégias para fazer pesquisas, especialmente
porque “Para tentar melhor observar através de uma lente, é preciso renunciar a conhecer
pelos outros sentidos ou pelo ‘ouvi dizer’” (FOUCAULT, 2002a, p. 182). Este processo de
especiais, dotados de equipamentos especiais. A nova ciência não produziu apenas saberes,
mas configurou locais próprios para a sua produção: neste caso, os antigos observatórios.
laboratórios experimentais. Um universo, antes alcançado pelas lentes dos telescópios, passou
lugar à experimentação. Mas, precisamos ter o cuidado de não igualar os observatórios aos
laboratórios, pois são distintos seus pressupostos e finalidades. Uma das principais diferenças
diretamente sobre eles, em busca de relações funcionais entre eventos. A experimentação tem
do momento que, em 1825, foi criado o primeiro grande laboratório moderno, na Alemanha,
1
MAGEE, 2001, p. 63.
2
Esta sucessão de ênfases é inversa à criação destes instrumentos. Os historiadores creditam a descoberta do
microscópio composto ao holandês Zacharias Janssen, em 1590. Hans Lippershey, também holandês, teria
inventado o primeiro telescópio em 1608.
13
valor comercial, que lançaram as bases das indústrias de alcatrão e anilinas. Os estudantes que
substâncias – muitas delas vendáveis. Este modelo foi seguido em vários outros países3.
Evidenciamos, a partir deste exemplo, algo que pode ser extraído da análise de outros
casos: há um poder imanente ao saber produzido, em especial no laboratório, uma vez que a
prático da natureza, pode resultar em lucros. “Na medida em que a ciência é [...] um ‘poder
fazer’, um certo domínio da Natureza, ela se liga, por tabela, ao poder que o ser humano
possui um sobre o outro” (FOUREZ, 1995, p. 207). Um saber pragmático é mais facilmente
transformado em mercadoria. Além disso, a pesquisa por este saber pode ser financiada.
reinvestida nos laboratórios, que passam a funcionar muito mais como empresas prestadoras
livre pensador, pois seus esforços atendem às demandas do contexto no qual está inserido.
“Nem é livre o cientista ou o artista, cujo trabalho é fortemente afetado pelo sucesso
3
MARGENAU; BERGAMINI, 1972, p. 46.
14
1897, por Sir Joseph John Thomson (1856-1940). Este foi o primeiro sinal de que o átomo
não era indivisível, e valeu para Thomson o Prêmio Nobel de física, em 1906; um dos 14
descobertas, que os saberes produzidos nos laboratórios trazem imanentes não apenas um
poder com dimensões econômicas, mas também sociais. Curiosamente, a própria história dos
prêmios Nobel, entregues pela primeira vez em 1901, ilustra esta relação do saber com as
faces do poder. O criador dos prêmios foi o químico sueco Alfred Bernhard Nobel (1833-
1896), que inventou a dinamite e se tornou em poucos anos um dos homens mais ricos do
mundo. O sentimento de culpa por ter inventado uma substância causadora de tantos
ferimentos e mortes levou Nobel, a criar um fundo de cerca de nove milhões de dólares, cujos
juros provenientes deveriam ser usados para conceder prêmios anuais, sendo um destinado ao
poder, Nobel conseguiu abrandar sua imagem de inimigo público e se mantém vivo como
personalidade promotora da paz. O caso Nobel é útil para, a partir dele, evidenciarmos como
funcionar como modelos para aquelas que posteriormente surgiram. Entre as jovens
disciplinas que adotaram métodos e técnicas bem sucedidos em outras áreas, uma que é
bastante identificada com os laboratórios é a Psicologia; tanto que é muito difundida a idéia
de que seu surgimento enquanto ciência se deu em 1879, quando Wilhelm Wundt (1832-
indiscutível que ela foi legitimada enquanto ciência no momento em que surgiram os
Quer se aponte o ano de 1879, quando Wilhelm Wundt declarou ter, pela
primeira vez, realizado novas pesquisas no primeiro laboratório de
psicologia experimental; ou se escolha o ano de 1860, ano de publicação dos
Elementos de Psicofísica de Fechner; ou se selecione qualquer outra data
arbitrária como o ano de 1875, quando Wundt, em Leipzig (e James, em
Harvard), recebeu espaço para um laboratório de demonstração para a
psicologia – foi sem dúvida durante a última metade do séc. XIX, na
Alemanha, que a psicologia experimental adquiriu seu status como ciência
independente (WERTHEIMER, 1977, p. 67, grifo do autor).
consistentes sobre física, química, e fisiologia. Geralmente seguiam correntes filosóficas cujas
duas questões, ou pelo menos uma delas: 1) qual a intensidade mínima de um estímulo capaz
trataram a mente como se ela fosse um composto orgânico, e decompuseram seus processos
destinados ao estudo da mente (ou do comportamento, como preferiam alguns) por todo o
mundo. Mudaram-se os objetos de estudo, os olhares dirigidos a estes objetos, assim como os
instrumentos e métodos de pesquisa elaborados para abordá-los, mas manteve-se viva a idéia
de que é no laboratório, e para alguns somente nele, que se produz conhecimento científico.
de trabalho em laboratórios, muitos tiveram que lutar por oportunidades em outros setores. Na
16
época, havia uma grande demanda por serviços na área educacional. Além disto, várias
tornava a oferta teórica dos psicólogos compatível com a demanda prática da Educação. Com
isso,
investigações em laboratórios, era necessário que uma jovem disciplina demonstrasse, sempre
que possível, fazer uso da metodologia experimental para o reconhecimento de seus discursos.
Assim como a Psicologia fizera uso dos laboratórios das ciências físico-químicas, coube à
Pedagogia se apropriar daqueles modelos que se mostravam mais próximos de suas propostas.
proveito desta oportuna demanda e migraram para o campo educacional para fundar
laboratórios e/ou aplicar as teorias deles originadas. Como conseqüência desta mudança de
enfoque, a Psicologia também criou condições de continuar a legitimar seus discursos, agora
multiplicidade de fatores presentes na relação, analisá-la num sentido global pode ser ilusório,
4
WARDE, 1997, p. 299.
17
diálogo a partir de um contexto mais delimitado, onde uma das alternativas é o estudo de
prestar serviços à educação. Um estudo de caso nestes moldes pode oferecer grandes
Este diálogo entre a Psicologia e a Pedagogia não demorou muito a se difundir para o
Brasil, onde também manifestou as duas características anteriormente destacadas: 1) ser uma
tanto da Pedagogia quanto da própria Psicologia. Entretanto, muito além da mera constatação
singular: foi com base neste diálogo interdisciplinar que nasceu uma Psicologia autônoma no
país, ou seja, não foi a Psicologia da Educação que derivou da Psicologia, mas foi a segunda
que derivou da primeira. Historicamente, no Brasil, desde o início do Século XX, a Psicologia
5
GOULART, 2000, p. 9.
18
apresente como objeto de uma investigação histórica, delineada nos moldes de um estudo de
caso, e que nos permita compreender com maior precisão a dinâmica de poderes envolvida na
construção de tais saberes “psicopedagógicos”, que, no caso brasileiro, estão entre as bases da
que pode ser observado desde o final do século XIX6. Quanto ao século XX, um acurado
relato desta utilização é oferecido por um dos grandes personagens da renovação pedagógica
para mestres primários, logo após a vinda de especialistas estrangeiros ao Brasil para fundar
6
MASSIMI, 1990, p. 54.
19
país. Nele foram realizadas acuradas investigações sobre inteligência, ideais e interesses das
motricidade e fadiga, julgamento moral, e outros. Além disso, este Laboratório procedeu à
rendimento escolar.
presta a ser objeto de uma investigação histórica que pode lançar luz sobre o diálogo entre a
Psicologia e a Pedagogia no Brasil, porque além de sua importância para este diálogo, tem sua
história circunscrita num período de pouco mais de 15 anos (1929-1946), o que permite
vislumbrar percorrê-la do início ao fim. Além disto, há referências na literatura científica que
Já que escolhemos este Laboratório como objeto (tema), cabe-nos agora especificar
sua problematização, ou seja, qual é a pergunta que nos conduzirá em busca de respostas. Em
outros termos, devemos apresentar nosso problema de pesquisa, que é o seguinte: qual é a
normalistas? “É essa função que é preciso descrever agora como tal, ou seja, em seu
exercício, em suas condições, nas regras que a controlam e no campo em que se realiza”
A hipótese que provisoriamente adotamos para responder a esta pergunta é que além
de sua função didática, para ilustrar as aulas teóricas, o Laboratório de Psicologia da Escola
diagnóstico não parte da intenção de modificar ações, mas sim de conhecê-las. Em síntese, o
para talvez alterar. Além disso, podemos estabelecer a seguinte analogia: a experimentação
segue o modelo dos primeiros laboratórios físico-químicos, ao passo que o diagnóstico segue
caráter exclusivamente norteador. Pode até ser que os pesquisadores do Laboratório não
utilizassem estes nomes, ou dessem a eles sentidos diversos. Entretanto, a fizemos no intuito
de compreender qual o tipo de tratamento era mais freqüentemente oferecido àqueles que
um levantamento destes.
demandas e as reações da sociedade frente a estes discursos. Discursos que foram analisados
ou seja, em relação aos diversos fatores que atuaram no jogo de forças que envolveram
possibilita perceber como se deram estes complexos diálogos. Supomos que poderão se
beneficiar do presente trabalho todos aqueles que se interessam pela história da Psicologia
2. METODOLOGIA
investigação sobre como o poder pode ser considerado explicativo da produção de saberes.
Após perceber que o saber e o poder estavam sempre intrinsecamente relacionados, ele usou a
explicitar seu sentido técnico, corremos o risco de induzir a vários mal-entendidos a respeito
de sua identidade, forma e unidade7. Na genealogia, esse termo recebe uma conotação distinta
daquela geralmente oferecida pela linguagem coloquial. O poder não é considerado apenas
como coercitivo e deletério, mas também como edificador. Até mesmo aquelas ações que
rotulamos como éticas, são, nessa perspectiva, produzidas pelo poder; que também deixa de
ser considerado como uma propriedade exclusiva de poucos, e, em especial, do Estado, mas
predeterminado. Por outro lado, ela discute hipóteses ou precauções de prudência que não são,
meio a esta versatilidade, percebemos algo que se repete: “Tudo gira em volta desse
7
FOUCAULT, 2001, p. 88.
8
PORTOCARRERO, 1994, p. 53.
23
paradoxo, que é a tese central de Foucault, e a mais original: o que é feito, o objeto, se explica
pelo que foi o fazer em cada momento da história; enganamo-nos quando pensamos que o
fazer, a prática, se explica a partir do que é feito” (VEYNE, 1995, p. 164, grifo do autor).
de Aperfeiçoamento, devemos partir das práticas que a ele estiveram relacionadas. Tais
práticas não estão circunscritas no ambiente físico do Laboratório, mas se ligam às estratégias
de todos aqueles que, de uma forma ou de outra, decidiram sobre o que lá seria feito. Sendo o
material publicado pelo Laboratório um dos efeitos destas práticas, evitamos a mera descrição
do mesmo numa seqüência cronológica, já que isto nos mostraria somente o produto, e não
poderíamos deduzir dele, com clareza, o processo de produção. Cabe repetir que não tomamos
como base um encadeamento linear de eventos num eixo temporal, mas optamos pelos
recortes temáticos, pois, de acordo com Foucault, a história é marcada por rupturas e
recomeços que são definidos a partir das relações de força em questão9. Além disso, não
tentar legitimá-las.
começou a usá-lo tardiamente, quando já havia realizado boa parte de suas análises históricas.
Em seus primeiros trabalhos, ele desenvolveu aquilo que chamou de “método arqueológico”,
daqueles trabalhos de Foucault pertencentes ao período em que vigorou o “mais antigo” deles.
Contudo, a genealogia foi o projeto geral de toda a obra de Foucault, e esteve presente em
9
Cf. REIS, 2003, p. 168.
24
diferentes formatos desde o seu primeiro livro, desdobrando-se nos outros através de novas
pensamento10.
Foucault em função de possíveis divisões conferidas à sua obra, ou seja, não tomamos como
baseada nas indicações contidas em livros que trazem um apanhado do percurso de Foucault,
como, por exemplo: Billouet (2003), Eizirik (2002), Fillingham e Susser (2002), Machado
(1981), Pereira (2003), Rabinow e Dreyfus (1995), e Strathern (2003). Mas, cabe frisar,
buscamos sempre uma apropriação, e não a mera reprodução, o que se justifica por duas
razões: a primeira delas é que “Para a escrita da história, talvez a melhor utilização da obra de
Foucault esteja não em tentar encontrar uma teoria onde não existe nenhuma, ou impor rígidos
limites onde existe plasticidade, mas, antes, em deformar sua obra, fazê-la gemer e protestar”
(O’BRIEN, 1992, p. 61). A segunda razão para “deformarmos” a obra de Foucault reside no
fato de que ele não realizou nenhum trabalho específico sobre a produção de saberes em
laboratórios: esta discussão se faz presente ou nas entrelinhas de seus escritos ou em raros
10
EIZIRIK, 2002, p. 18.
25
Apesar de ser a única alusão feita sobre papel dos laboratórios ao longo do referido
livro, o conteúdo que a circunda é muito rico e sensibiliza nosso olhar para certas nuances da
estereotípica daquele que tem vontade de verdade, daquele que se esforça pela descoberta das
excludente, pois adquire, como acreditam alguns, a capacidade de interditar o senso comum, a
religião, a arte e a filosofia. Certas vezes, estas interdições resultam em contra-ataques por
parte daqueles que têm seus saberes/poderes ameaçados. Como veremos adiante, um episódio
de Aperfeiçoamento.
recorremos à pesquisa etnográfica realizada por Latour e Woolgar (1997). Publicada com o
título “A vida de laboratório: a produção dos fatos científicos”, esta se mostrou bastante
frutífera para nos auxiliar a perceber os jogos de poder a que estão submetidos os cientistas de
laboratório, e assim, compatibilizou-se muito com o modelo de história genealógica que nos
cientistas aparecem como estrategistas, que mobilizam recursos de todos os tipos, e que se
11
HOCHMAN, 1994, p. 215.
26
A maior dificuldade que encontramos para realizar esta investigação foi, sem dúvida, a
seguinte incidente:
Perdeu-se, com isso, a maioria daquelas que seriam nossas fontes primárias. Para compensar
esta perda, fizemos uso dos mais diversos tipos de itens que “sobreviveram” ao incêndio:
livros, teses, boletins etc. Em outras palavras, não estabelecemos nenhuma restrição quanto à
natureza das fontes. Para procurá-las, visitamos, além de algumas bibliotecas, os seguintes
arquivos12:
12
A escolha de alguns destes locais se deu a partir das sugestões de TORRES (2004).
27
material que indicasse a possibilidade de conter algo relevante sobre este assunto. Em muitas
das vezes, este esforço foi em vão. Em outras, encontramos somente pequenas passagens –
Sempre que possível, reproduzimos algumas destas passagens ou citamos em detalhes suas
referências em notas de rodapé. Com relação à quantidade de tais notas, preferimos correr o
risco de pecar por excesso, e não tivemos outra escolha, já que nos preocupamos sempre em
facilitar a vida daquele que pretenda dar continuidade à nossa modesta pesquisa, seja
Finalmente, cabe citar aquelas que foram nossas fontes orais, ou seja, quais foram os
nossos entrevistados:
do Laboratório.
28
APERFEIÇOAMENTO
no qual Laboratório foi instalado (montado, equipado), 2) quem foi o responsável por tal
direção destes trabalhos iniciais. Já que esta diversidade engloba tópicos fundamentais para a
escrita desta história, tivemos a preocupação de assumir uma posição frente a ela, ou seja,
esboçamos uma síntese que, mesmo sem pretender ser o veredicto final sobre o assunto, pelo
menos funcione como uma conjectura de maior valor operacional para a nossa investigação.
A primeira versão referente aos primórdios do Laboratório sugere que ele foi “[...]
instalado em 1928 sob a direção de Léon Walther13, e cuja direção foi assumida por Helena
Antipoff14, em 1929 [...]” (CAMPOS, R., 2003, p. 135). Temos então dois nomes e duas
datas, que são acareados a outro quando uma segunda versão nos diz que “A convite do
governo mineiro, em 1929, Léon Walther permaneceu durante três meses na Escola de
13
Léon Walther (1889-1963) é de origem russa, e possui especialização em Psicologia Aplicada. Estudou
Psicopedagogia no Instituto Jean-Jacques Rousseau. Retornou ao Brasil em 1948, juntamente com seu assistente
Pierre Weil, para a organização do Departamento de Orientação e Seleção Profissional.
14
Helena Wladimirna Antipoff (1892-1974) nasceu em Grodno, na Rússia. Entre outros estágios de sua
formação, estudou no Laboratório Binet-Simon e no Instituto Jean Jacques Rousseau (com Édouard Claparède).
Radicou-se no Brasil e recebeu inúmeros prêmios e condecorações em função de trabalhos aqui realizados,
sobretudo aqueles que atendiam às crianças excepcionais. Um relato sucinto da relação entre Antipoff e a
Psicologia no Brasil pode ser encontrado em CAMPOS; LOURENÇO; ANTONINI (2002).
29
comparação destas duas versões resulta nas seguintes dúvidas: Walther esteve aqui em 1928
Em princípio, uma terceira versão parece solucionar estes problemas ao pontuar que
“Com tais iniciativas, Francisco Campos possibilitou a inauguração, em 1928, com a presença
abrigava” (LOURENÇO, 2001b, p. 111). Pode até ser que Simon tenha estado aqui antes de
Walther, em 1928, assim iniciando os primeiros esforços. Mas esta provisória especulação
logo entra em crise, quando constatamos, a partir de uma quarta versão, que o mesmo Simon
“[...] foi convidado em 1929 pelo governo mineiro a colaborar na implantação do Laboratório
promovida por Francisco Campos” (ANTONINI, 2001a, p. 359). A mesma dúvida que surgiu
em relação a Walther – se ele esteve aqui em 1928 ou 1929 – aparece agora com o nome de
Simon.
Após uma breve comparação destas quatro versões, declaramo-nos hesitantes quanto
ao ano em que o Laboratório foi implantado e quanto a quem foi o responsável por tal
que narram a presença de Simon em Belo Horizonte, e em especial suas conferências e cursos,
não constatamos nenhuma ligação explícita entre seu nome e o do Laboratório de Psicologia
da Escola de Aperfeiçoamento16.
Entretanto, o de Helena Antipoff, presente apenas na primeira das quatro versões, aparece
15
Theodore Simon (1873-1961) nasceu em Dijon, na França. Formado em medicina, tornou-se
internacionalmente conhecido por sua colaboração para a construção da primeira escala de medida de
inteligência, juntamente com Alfred Binet, em 1905.
16
Cf. CONFERENCIA... 1929; CONFERENCIAS... 1929a; CONFERENCIAS... 1929b; PROFESSOR... 1929;
CURSO... 1929; SIMON, 1929; SIMON, 1930.
30
ser o que esta outra versão vem a complementar, ao nos mostrar que os
Esta quinta versão nada nos fala sobre o ano de 1928. Sobre Simon e Walther, apenas
os relaciona com o início dos trabalhos, em 1929, e não com a montagem do Laboratório.
Parece que o foco está no papel que Helena Antipoff assumiu ao longo de quase toda a vida
impressão se fortalece quando percebemos que uma sexta versão, a da própria imprensa da
época, anunciava que “A sra. Hélene Antipoff vem continuar, na Escola de Aperfeiçoamento,
os trabalhos de psychologia experimental alli iniciados pelos srs. dr. Th. Simon e prof. Leon
Walther” (ESCOLA... 1929b). Entretanto, uma sétima versão, ao nos contar sobre a trajetória
(GUIMARÃES, 1991, p. 65). Assim, o nome de Helena Antipoff passa a estar correlacionado
também com a montagem do Laboratório, e não somente com sua direção, o que é
17
Uma passagem semelhante pode ser encontrada em GUIMARÃES (1992, p. 21).
31
devagar. O que se ouve é sempre: “para amanhã”, sempre adiado (citado por
ANTIPOFF, D., 1996, p. 118).
Esta fala de Helena Antipoff, que consideramos como a oitava versão, redimensiona a
dúvida sobre quem foi o responsável pela implantação do Laboratório. Em outras palavras,
configurou o Laboratório? Tentamos solucionar este impasse quando fizemos estas perguntas
ao biógrafo de Helena Antipoff. Ele nos disse que não é correto atribuir o mérito pela
maneira18. Apesar de não ter especificado um nome, ele reforçou algo que já havia
demonstrado numa outra ocasião, ou seja, que em seus primeiros momentos na Escola de
laboratório de psicologia [...]” (ANTIPOFF, D., 1996, p. 115). Desta forma, ele sugere – nesta
que pode ser classificada como a nona versão – um antecessor, mas não especifica nem um
iniciou as atividades? Com base no material apresentado, fica difícil arriscar uma resposta.
Principalmente porque uma décima versão parece contradizer as nove já citadas. Segundo esta
décima versão:
funcionamento do Laboratório é confundido por uma nova data: 1931. Neste caso, o
18
ANTIPOFF, D., 2004.
32
terceiro ano após a inauguração da Escola de Aperfeiçoamento. O fato da autora desta décima
versão ter reproduzido literalmente esta informação num trabalho posterior sugere que a data
(1931) não foi apenas equivocadamente digitada19. Assim, esta décima versão lança uma
grande dúvida quanto ao ano de criação do Laboratório. Mas, a tensão fica ainda maior,
quando esta mesma versão explicita que “Para efeito de exatidão historiográfica, é importante
lembrar que Theodore Simon e Leon Walter [...] nunca participaram desse laboratório sob
liderança de Helena Antipoff. [...] já haviam partido quando Helena Antipoff chegou a Belo
Horizonte” (PRATES, 1989, p. 177). Esta observação, inserida numa nota de rodapé do texto
que consideramos como a décima versão, contradiz os vários argumentos sobre a possível
existência de “outros diretores”, ou seja, Helena Antipoff seria responsável tanto pela
montagem do Laboratório quanto pela orientação dos trabalhos lá realizados. Todavia, será
que podemos adotar com segurança esta última versão? Se não, o que devemos considerar?
Por maior que pareça ser este conflito entre as dez versões, ele traz algo de imperativo,
que já aludimos anteriormente: precisamos nos posicionar em relação a este impasse de modo
a não nos perdermos em detalhes, ou seja, mais importante que tentarmos elucidar todas as
nuances desta trama histórica é perceber quais aspectos devem de fato ser compreendidos e
quais podem ser descartados, seja em função de sua importância minoritária ou da ausência de
provas complementares. Assim, uma possível solução para este conflito, que na verdade é
apenas uma conjectura que julgamos ter maior valor operacional, é a seguinte: o Laboratório
Este nosso posicionamento pode parecer supersimplificador caso não seja justificado.
Em primeiro lugar, por que escolhemos o ano de 1929 como aquele no qual o Laboratório
19
Cf. PRATES, 1990, p. 25. Uma versão modificada deste artigo é apresentada em PRATES (2000).
33
começou a funcionar? Por que não as duas outras possibilidades: 1928 ou 1931? As aulas na
funcionamento do Laboratório com o ano de 1928 seria, no mínimo, inadequado para o nosso
como em 1931, esta possibilidade foi completamente descartada pelo fato de que há fortes
evidências de que o Laboratório já existia em 1929. Uma delas, que será detalhadamente
apresentada adiante, é uma publicação feita pela imprensa do Estado no final de 1929,
de suas produções. Além disso, a autora da décima versão, que afirmou ter sido o Laboratório
criado apenas em 1931, parece equivocada, visto que no mesmo trabalho, ela posteriormente
declarou que
Se o Laboratório foi visitado em 1930, é contraditório dizer que ele só foi criado em
1931. Deste modo, justificada a escolha do ano de 1929 como aquele no qual tiveram início as
atividades no Laboratório, cabe-nos dizer por que excluímos de nossa conjectura os nomes de
Walther e Simon como prováveis diretores e/ou responsáveis pela montagem do Laboratório,
ou seja, simplesmente afirmamos que Helena Antipoff foi reconhecida como sua organizadora
Aperfeiçoamento, Lúcio José dos Santos, “Mme. Antipoff vae organizar o Laboratorio de
34
1929a, p. 63, grifo nosso). Se quisermos mais um número na lista, podemos chamar esta de
décima primeira versão. Mais importante que isto, porém, é percebermos que o próprio diretor
responsabilidade pela aquisição dos equipamentos foi concedida ao governo, e não a Walther
ou Simon. Além disso, a própria Helena Antipoff confirma esta missão, ao declarar que foi
principalmente, como veremos adiante, sobre ela recaíram todos os méritos e penalidades
“Pequena foi a contribuição de Th. Simon e Léon Walther, nos cursos que deram, em Belo
Horizonte, em 1929 [...]” (LOURENÇO FILHO, 1971, p. 131). Em outras palavras, foi
até o dia em que o mesmo foi extinto, pois houve um problema quanto à renovação de seu
contrato por volta de 1945, quando ela se mudou para o Rio de Janeiro. Mas, este detalhe
pode ser abandonado, visto que nenhuma outra pessoa foi popularmente reconhecida como
No final das contas, quantas são as versões contraditórias? A respeito daquelas que
encontramos, tentamos ordená-las de modo a tornar esta exposição mais didática, e fizemos
20
Esta é uma rara passagem onde o Laboratório recebe o adjetivo “experimental”. O usual é encontrarmos a
expressão “Laboratório de Psicologia”, que é mais inclusiva. Discutiremos as possíveis razões da omissão deste
adjetivo, ou de sua ocasional substituição pela palavra “pedagógica”, que conota aplicabilidade.
35
uso de uma analogia com os dedos das mãos, ou seja, contamos somente até 10. Mas este
número poderia ser reduzido ou ampliado, seja modificando os critérios classificatórios ou até
comum na literatura, é aquele que compara “nosso” Laboratório com outros, e estabelece uma
hierarquia sobre qual teria sido o primeiro do gênero. Em certa ocasião, percebemos uma
indagação que levantou esta questão da primazia de forma bem generalizada: “Você sabia que
o 1º Laboratório de Psicologia da América do Sul foi fundado por Helena Antipoff na Escola
primeiras pesquisas no campo da educação no Brasil?” (BOLETIM... 1980). Com base nesta
como a de analisar se ele de fato começou a funcionar à semelhança do modelo proposto pelo
Laboratório de Psicologia criado por Flornoy e dirigido por Claparède, entre 1901 e 1940, em
Genebra21. Porém, nosso problema de pesquisa exige outro tipo de esforço: buscar na
levantar mais algumas informações sobre o contexto de sua criação, o que será apresentado a
seguir. Antes disso, é saudável recapitular nossa posição sobre quando o Laboratório foi
criado: ele começou a funcionar em 1929, sendo Helena Antipoff reconhecida como a pessoa
que o organizou e dirigiu. Esta suposição, certamente, exclui muitas informações que teriam
21
Cf. VILANOVA; CAMPOS, 2004, p. 140.
36
Psicologia na referida Escola, coube-nos selecionar alguns dos principais acontecimentos que
vigor.
pleno Governo de Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, num momento que pode ser
proporções desde 1927. Antônio Carlos foi eleito para a Presidência do Estado de Minas
Gerais, sem outro concorrente, no dia 7 de setembro de 1926, permanecendo no cargo até
1930, quando poderia então concorrer à Presidência da República. Por esta razão, o sucesso
os políticos viviam sob ameaça de perda de seus prestígios em função de uma crise no antigo
regime de dominação oligárquica, caracterizado por forte clientelismo; regime que ajudou a
Num outro nível, Antônio Carlos é coagido pelos setores emergentes da vida social,
que eram fruto, entre outras razões, do crescimento industrial no país, acompanhando os
que migravam do campo para as grandes cidades, ou entre grandes cidades de diferentes
estados. Muitos dos migrantes tinham como destino, em busca de melhores oportunidades, a
cidade de São Paulo, o que curiosamente ameaçava destituir Minas de sua posição de maior
37
Capital, era algo imprescindível para Antônio Carlos. Quanto àqueles que viviam no interior,
a situação era menos problemática, pois nestas localidades, ainda vigorava o mando dos
coronéis, ou seja, pelo menos num curto espaço de tempo os camponeses não ameaçavam
causar maiores conflitos. Entrementes, dissipado este controle coercitivo nas grandes cidades,
populares, entre eles o dos sindicatos. Devido a este papel mediador da Igreja, as classes
outros conflitos; como aconteceu, por exemplo, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Manter a
Igreja como aliada era, para Antônio Carlos, algo de suma importância, visto que a Igreja não
Estado, modernizado por Antônio Carlos, e que não se limitava à ação ostensiva da polícia,
mas também ao controle da entrada e saída de pessoas da cidade, à censura de filmes, peças
teatrais etc.
Este quadro social explicita o quanto era delicada a posição dos administradores
públicos, imersos num jogo de forças oriundas de múltiplas direções. Era necessário contornar
a situação, o que foi desabafado na célebre frase de Antônio Carlos: “Façamos a Revolução
antes que o povo a faça”. Entretanto, esta revolução deveria ser feita com todas as sutilezas, e
é neste aspecto que a educação se destacou como a ferramenta ideal para ajudar a reformar a
Embora “a educação seja uma das bandeiras prioritárias em cada campanha política”
(VEIGA, 1992, p. 15), ela assumiu no governo de Antônio Carlos esta particularidade de
formava o cidadão, mas apenas o ensinava a ler e escrever, havia o propósito de decidir qual
tipo de cidadão seria formado. Mas este não foi simplesmente de um processo de transmissão
disso foi um “acordo” feito entre o Governo e a Igreja Católica. Esta exercia forte influência
sobre as classes emergentes, e Antônio Carlos lhe deu o direito de ensinar a religião nas
escolas públicas em troca de maior apoio. Além deste apoio político, a educação cristã em si
modela atitudes de amor, respeito, tolerância, perdão e esperança num futuro melhor. Um
povo educado nestes princípios torna-se mais pacífico, mais complacente, sem causar as
temerosas reações comunistas e anarquistas que tanto o Governo quanto a Igreja abominavam.
Esta aliança, porém, possuía suas tensões. Principalmente porque a Igreja disputava
com o Estado o espaço educacional. Ao mesmo tempo em que pleiteava um maior número de
domínio público. E o Governo, que dependia muito do apoio da Igreja, à medida que tentava
pressionarem ainda mais o Governo, passaram a declarar que a demanda pelo ensino religioso
era, na verdade, uma demanda dos menos favorecidos, que constituíam a maioria da
população22.
Para conduzir seu projeto de reforma do ensino em meio a estas turbulências, Antônio
Carlos nomeou outro representante da oligarquia mineira: Francisco Luís da Silva Campos
(1891-1968), que ocupou até 1930 a Secretaria do Interior, pasta responsável pelas questões
educacionais23. Francisco Campos também temia uma revolução social, em especial uma
22
Cf. AMARAL, 1929b.
23
Francisco Campos foi o responsável pela elaboração da Reforma do Ensino do governo de Antônio Carlos. A
Mário Casasanta, que ocupou a função de Inspetor Geral de Instrução, coube a implantação desta Reforma.
39
de 1920 no Rio de Janeiro e em São Paulo. Para evitar problemas como este, o governo, do
qual Francisco Campos fazia parte, precisava usar sua autoridade sem gerar grandes conflitos.
parêntese para discorrer sobre a maneira como a questão da governabilidade é aqui abordada,
já que evitaremos partir de uma concepção “macro” do poder, como se verifica nas análises
marxistas, mas sim de uma concepção “micro”, que privilegia o detalhe ao invés das grandes
estruturas24. Na última, o poder deixa de ser considerado como uma propriedade concentrada
no Estado e usada para subjugar as classes inferiores, mas que transita por todos e em todos,
independente de suas posições econômicas e sociais. No final das contas, o modelo de análise
aqui adotado não desconsidera a existência de estratégias globais, mas as entende em relação
[...] melhor do que procurar a forma única, o ponto central de onde todas as
fórmulas do poder derivariam, por via de conseqüência ou de
desenvolvimento, é preciso primeiro deixá-las aparecer na sua
multiplicidade, nas suas diferenças, na sua especificidade, na sua
reversibilidade: estudá-las, portanto, como relações de força que se
entrecruzam, que remetem umas às outras, convergem ou, ao contrário, se
opõe e tendem a se anular (FOUCAULT, 1997, p. 71).
Laboratório nas várias articulações que compuseram a Reforma do Ensino elaborada por
para o exterior e contratação de professores estrangeiros. Em meio a todos estes esforços, ele
colocava como meta, a todo instante, renovar o ensino primário. Todavia, para atingir esta
24
Cf. PEREIRA, 2003, p. 123.
25
Cf. LEE; CERQUEIRA-GUIMARÃES, 2004, p. 128.
40
meta, era preciso, entre outras coisas, preparar devidamente os professores, ou seja, a
qualidade dos cursos normais determinaria a qualidade dos cursos primários. E aqueles
educação das crianças. Para centralizar este processo de aperfeiçoamento de professores, foi
criada uma escola especialmente destinada a esta finalidade, cujo nome é bastante sugestivo:
Escola de Aperfeiçoamento. Esta Escola, que não poderia ser montada num curto espaço de
Lima26. A criação da Escola Maternal, cuja foto aparece na FIG. 1, deu-se no Governo
ensino [...]” (ESCOLA... 1929c, p. 11)28. E para que este fechamento se desse com êxito, foi
preciso equipar esta Escola com o que houvesse de mais moderno nas tendências
Pedagogia foi aquecido pela propagação das idéias escolanovistas, que pretendiam reformular
o antigo sistema de ensino, estigmatizado, entre outras coisas, pela posição autoritária dos
professores e por métodos que enfatizavam a repetição (decorar sentenças, por exemplo) em
detrimento da compreensão. Foi inspirado nos princípios da Escola Nova que Francisco
Campos elaborou sua Reforma do Ensino Primário, a par dos avanços no campo das ciências.
26
Posteriormente, a Escola de Aperfeiçoamento foi transferida para outro prédio, na mesma avenida: aquele
onde atualmente funciona o Minas Centro. Segundo MOURA (2005), este prédio passou por muitas
modificações ao longo do tempo, e poucos pesquisadores as conhecem.
27
Encontramos indícios de que o diálogo entre a Psicologia e a Pedagogia era valorizado no governo de Mello
Vianna (Cf. MATTOS, 1929; MINAS... 1925a; MINAS... 1925b).
28
Os comentários sobre os discursos pronunciados na inauguração da Escola de Aperfeiçoamento encontram-se
em ESCOLA... (1929d).
41
FIGURA 1 – Prédio da antiga Escola Maternal, criada em 1925 no governo de Melo Viana,
onde posteriormente começou a funcionar a Escola de Aperfeiçoamento. Este prédio, situado à Avenida
Paraopeba (hoje Augusto de Lima), foi demolido. Em seu lugar foi construído o Fórum de Belo
Horizonte.
Fonte: SECRETARIA... 2004.
Apesar do conteúdo das matérias não ter sido delimitado por Francisco Campos no ato
normalistas, “Pois é o único caminho ou, pelo menos, o caminho mais eficaz e o que garante o
progresso: o método experimental” (ANTIPOFF, H., 1992f, v. 1, p. 262). E para garantir este
progresso, não bastava teorizar sobre a experimentação. Era preciso vivenciá-la naquele que é
29
A definição dos programas das disciplinas da Escola de Aperfeiçoamento somente aconteceu em 1937, como
veremos adiante.
42
Na verdade, havia uma cadeira, composta por duas matérias, denominada “pedologia30
curso. Já a “psychologia experimental” seria ministrada no segundo. Não temos clareza sobre
as reais distinções entre elas em termos do conteúdo, pois seus programas oficiais não foram
definidos em 1929. Porém, temos idéia do que era o Laboratório neste ano, e faremos agora
Escola de Aperfeiçoamento, destaca-se uma que foi originalmente publicada, em três partes
complementares, no jornal “Minas Geraes” dos dias 11, 12 e 14 de dezembro de 1929. Trata-
se de uma reportagem31, cujo autor não foi especificado, que relata uma visita à “Exposição
de trabalhos da Escola de Aperfeiçoamento” (este é o título dos três artigos). Esta exposição
e descreveu minuciosamente tudo o que encontrou, possibilitando aos leitores uma nítida
30
A Pedologia consiste no estudo natural e integral da criança, sob os aspectos biológicos, antropológicos e
psicológicos.
31
Cf. EXPOSIÇÃO... 1929.
32
Certamente, poder-se-ia tratar de uma autora. Para sistematizar a escrita, utilizaremos a expressão sempre no
masculino, lembrando que “Não vai nesse uso gramatical qualquer discriminação de sexo” (ECO, 2002, p. XV).
43
Laboratório, ele foi generoso em sua precisão e especificou cada equipamento, a configuração
das salas, os trabalhos em andamento etc. Para não perdermos esta meticulosidade com
citações indiretas, optamos por reproduzir literalmente dos originais uma seleção daquelas
passagens que melhor ajudam a conhecer o Laboratório. Estes excertos serão comentados à
Aperfeiçoamento enquanto espaço físico, mas principalmente sua produção, seus resultados:
preparava para eleger seu novo presidente. Curiosamente, este artigo que agora analisamos
(de 11 de dezembro), foi precedido, na mesma página em que foi impresso, por outro
dezembro. E na página da publicação do dia 14, há uma secção intitulada “Outras notas”, que
o por suas obras educacionais e mostrando apoio “pela victoria da causa de Minas, nas
E em seguida tenta persuadir o leitor a encontrar uma justificativa plausível para todo
antes do início deste evento33 – Helena Antipoff era “exposta” como a responsável pela
direção do Laboratório. Nenhuma alusão foi feita aos nomes de Walther e Simon por parte
33
Maiores detalhes sobre a inauguração desta Exposição podem ser encontrados em ESCOLA... (1929a).
45
deste autor, que, por sinal, parecia conhecer em profundidade a Escola de Aperfeiçoamento.
Talvez, seja por esta razão que omitiram seu nome destas publicações carregadas de
intencionalidades políticas.
Outro detalhe do excerto anterior, é a afirmação de que o “Museu Escolar” seria parte
numa estrutura maior, sob a responsabilidade de Antipoff. Logo adiante, falaremos deste
Museu e de sua relação com o Laboratório, o que nos ajudará a entender melhor como se
relevante sobre o Laboratório de Psicologia. Contudo, esta segunda parte será retomada no
“methodologia”, há uma extensa lista com os nomes de importantes personalidades que até
jornalistas, intelectuais etc. Os principais responsáveis pela Reforma do Ensino são citados:
Antônio Carlos, Francisco Campos e Mário Casasanta. Novamente, verifica-se que esta
interesses políticos.
46
salas da Escola de Aperfeiçoamento, ou pelo menos foi assim organizado para esta Exposição.
Seja esta organização de caráter transitório ou permanente, ela nos ajuda a esclarecer se o
Laboratório era identificado apenas com uma das três salas. E se isto acontecia, quais eram os
estimular em suas alunas o espírito científico. O que o autor não imaginava é que os
resultados de “bem observar e bem induzir” produziriam discórdias entre Antipoff e a Igreja
Católica, que possivelmente estão entre os motivos que levaram o Governo a criar
conforme veremos no item 4.1. Por hora, basta supor que esta confusão pode ter começado a
34
Édouard Claparède (1873-1940) nasceu em Genebra, na Suíça. Formou-se em medicina em 1897. É
considerado pioneiro nos estudos da Psicologia da criança neste país. Sua obra foi traduzida e divulgada no
Brasil, onde esteve em 1930, a convite de Helena Antipoff. Na época em que o Laboratório foi fundado, seu
nome era divulgado na imprensa local (Cf. LINS, 1929, 1930).
47
De fato, o Laboratório era identificado com uma sala específica. Com base no
conteúdo organizado nesta sala, começamos a perceber qual era a concepção de Laboratório
FIG. 2 representa uma provável foto desta sala, ou melhor, do Laboratório, com os
identificados por aqueles cartazes, é protegida por uma espécie de cordão de isolamento.
Próximas à parede, estão quatro mulheres: Helena Antipoff é segunda delas, contando da
direita para a esquerda, ou melhor, é aquela que foi marcada – no documento original - com
uma espécie de cruz ou estrela na altura do abdômen. As outras provavelmente são suas
alunas. Já a FIG. 3 mostra a utilização destes equipamentos, na mesma sala, durante uma aula
de Psicologia Experimental.
Tratamos as informações destas fotos como prováveis porque elas não possuem data:
não sabemos de fato se retratam esta Exposição e até mesmo se foram tiradas em dias
de Moura, ela nos relatou que estas fotos – FIG. 1 a 5 – devem ser desta época, ou seja, foram
tiradas por volta de 192935. Elza, que pertenceu a uma das últimas turmas formadas pela
Escola de Aperfeiçoamento, deduziu isto por notar que o Laboratório aqui retratado é bastante
diferente daquele no qual estudou (no segundo prédio onde funcionou a Escola). Além disto,
tomou como parâmetro as pessoas, o estilo das roupas e a decoração das salas. Infelizmente,
faltaram-nos outras fontes que permitissem uma visão do Laboratório quando este deixou o
prédio da Escola Maternal, para que pudéssemos comparar seus aspectos e melhor detalhar
35
MOURA, 2005.
49
E temos outro indício, também confirmado por Moura (2005), de que estas fotos (FIG.
2, 3 e 4) devem retratar esta Exposição de Trabalhos que agora estamos analisando: é que uma
outra foto, que parece pertencer à mesma tiragem, já que todas foram reunidas num mesmo
mesmo estilo de letra manuscrita para identificá-las. Esta foto traz a expressão: “Exposição
929. Arte Decorativa. Escola de Aperfeiçoamento” (Cf. ANEXO). Deve ser uma foto da
secção de “desenho e modelagem”, e não do Laboratório; mas nos auxilia a confirmar a idéia
de que estas imagens correspondem à primeira fase do Laboratório, ainda na Escola Maternal.
anônimo autor, bem informado sobre a Escola de Aperfeiçoamento, disse que o Laboratório
50
uma destas secções? Deixaremos esta pergunta, que pode parecer banal, provisoriamente sem
arranjo de aparelhos, e agora, fazemos a seguinte pergunta: por que tamanho esforço por parte
do Governo para montar um Laboratório como este, e mostrá-lo em detalhes ao final de seu
mandato? Sabemos que “O vigor de um laboratório não está tanto na posse deste ou daquele
concebidos para responder a uma necessidade bem definida” (LATOUR; WOOLGAR, 1997,
políticas. O anônimo autor sugere a existência de tais finalidades bem definidas, que deveriam
ser cabalmente preenchidas, mas não especifica quais são. Supomos, com base nas evidências
apresentadas pelo mesmo autor, e diferentemente da maneira como ele interpretou esta
impressionista, sedutor; que pode até não ser sua função “central”, mas que atua como uma
espécie de função periférica ou complementar: ele deveria chocar o leigo com sua grandeza,
de grandeza continua a ser evidenciada com a descrição de uma outra sala do Departamento
de Psicologia:
FIGURA 4 – “Uma secção do Laboratorio de Psychologia”. Segundo Moura (2005), esta foto
deve pertencer aos primeiros anos da Escola de Aperfeiçoamento. Provavelmente, é da Exposição de
Trabalhos, de 1929.
Fonte: MEMORIAL... 2003c.
Outra valiosa informação: os testes ficavam numa sala à parte. O autor não deu um
nome específico para esta sala. Mas, por que esta separação? Não seriam os testes
Os Laboratórios são formados somente por aparelhos, e não por testes? Ainda não temos
É provável que a FIG. 4 represente esta outra sala que continha o material referente a
testes. E parece que a foto foi tirada no mesmo dia que aquela da FIG. 2, pois é perceptível
que Helena Antipoff e pelo menos duas de suas alunas estão com as mesmas roupas. Todavia,
há controvérsias, pois existe um detalhe que precisa ser considerado: assim como a FIG. 2, a
FIG. 3 também traz a expressão “Uma secção do Laboratorio de Psychologia”. Uma vez que
as referências sobre estas fotos são incertas, nada mais podemos fazer além de levantar
desenho e modelagem”, “secção de madame Helene Antipoff”; ou b) como uma das divisões
“psychochronometria”. Dadas estas possibilidades, não sabemos em qual sentido a palavra foi
tomada pela pessoa que manuscreveu aquelas breves frases nas fotos. E mantemos a suspeita
testes. Principalmente porque, na FIG. 4, os elementos sobre as mesas e estantes não parecem
ser aqueles aparelhos listados como pertencentes ao Laboratório. Parecem-se mais com testes
psicológicos. E revendo a FIG. 2, notamos que as mesas estão enfileiradas, porém separadas.
São 3 mesas, cada uma com vários aparelhos identificados por cartazes. É muito provável que
cada mesa contivesse uma das 3 referidas secções que formavam o Laboratório. Em
contrapartida, na FIG. 3, que ilustra uma aula de Psicologia Experimental, estes aparelhos
estão espalhados sobre um número maior de mesas, sem a proteção daquele cordão de
isolamento, sugerindo que esta sala se prestava exclusivamente a tarefas que envolviam tais
informava sobre a realidade brasileira contida na sala de testes, o autor aponta com
entusiasmo um estudo feito pelo “departamento” de psicologia”. O que ele não poderia prever
é que este mesmo estudo, publicado em forma de artigo no ano seguinte (1930), causaria uma
série de conflitos com a Igreja Católica. Mas antes de nos dedicarmos a este conflito, é bom
Apesar de não ter comentado os resultados, o autor foi claro em dizer que eles foram
Possivelmente, estes padres tomaram conhecimento dos resultados deste inquérito orientado
por Helena Antipoff. Faremos uma análise mais detalhada do conflito desencadeado por estes
resultados no item 4.1. Por hora, basta ressaltar que esta querela pode ter começado neste
Outros trabalhos que nos ferem a attenção, na mesma ordem de estudos, são
os relatorios, individuaes ou collectivos, os quadros para a concretização do
ensino de anthropometria, as estatisticas de mortalidade das creanças
brasileiras, a comparação da altura destas com a das creanças de outros
54
Antipoff ocupava três salas da Escola de Aperfeiçoamento. Numa delas estava o Laboratório
de Psicologia, constituído por um conjunto de aparelhos. Na outra, que não recebeu um nome
incipiente, ocupava a terceira sala. Não foi estabelecida uma linha divisória nítida entre o que
seria a tal sala de testes e o Museu da Criança. Contudo, esta linha foi traçada para delimitar o
conjunto de aparelhos utilizados para avaliar ações motoras e sensoriais. Se assim procedeu, é
“Departamento de Psicologia”.
um dos primeiros registros detalhados do nosso objeto de estudo, muitos outros documentos,
à semelhança das FIG. 2 e 4, não são tão claros em especificar o que nomeavam “Laboratório
de Psicologia da Escola de Aperfeiçoamento”. Talvez seja por esta dificuldade de definir com
base nas fontes disponíveis o que era este Laboratório, que um dos primeiros trabalhos sobre a
laboratórios, já que cada uma de suas salas contém uma família de pesquisadores” (OLINTO,
2004, p. 29). Tentaremos resolver, na medida do possível, este enigma sobre a delimitação do
Laboratório.
Contudo, precisamos conhecer um pouco mais sobre o Museu da Criança, até mesmo
Existem também aqueles casos extremos, em que um mesmo estudo é ora atribuído a um, ora
a outro. Isto decorre do fato de que ambos estão imbricados na formação daquilo que foi
porque
Este Museu da Criança, fundado por Helena Antipoff em outubro de 1929, seria um
“centro de pesquisa relativo à criança, um centro pedagógico” (ANTIPOFF, H., 1982, p. 63),
que estas pudessem receber ali as direções necessárias para a continuidade de seus trabalhos;
Departamento de Psicologia incluía o Laboratório e o Museu (além da tal sala de testes), cujos
Laboratório. Por outro lado, os resultados de tais trabalhos realizados no Laboratório seriam
coligidos no Museu. Isto sugere que a função do Laboratório, que ainda não delineamos qual
Uma comparação entre as vezes que o Laboratório e o Museu são citados na Coletânea
das Obras Escritas de Helena Antipoff, composta por cinco volumes, pode ser encontrada no
“Apêndice”. Comentaremos esta comparação no item 4.2, quando veremos que o Laboratório
de Psicologia, além de ter sua função complementada pela do Museu, passou a tê-la
complementada também pela de outras instituições que Helena Antipoff posteriormente criou.
Não sabemos precisar como o Laboratório foi atualizado ao longo de toda a sua
algumas vezes até mesmo os criou. Em geral, eram testes compostos por lápis e papel. Mas
aqui estamos nos referindo àqueles que podemos chamar de “instrumentos de latão”,
expressão que na verdade “é uma facécia que caracteriza o tipo de psicologia que utiliza os
43). São os equipamentos cuja apropriação pela Psicologia demonstrou o grau de influência
36
BESSA (1999) esclarece que o Laboratório de Psicologia foi montado de acordo com os modelos clássicos da
Europa: os instrumentos vieram na grande maioria da cidade de Leipzig (na Alemanha), berço da Psicologia
Experimental. Contudo, não conseguimos localizar outras fontes que possam confirmar esta informação.
57
que esta recebeu dos modelos físico-químicos de análise experimental. Uma lista de
foi descrita no item 3.3. Acontece que esta relação não foi a única encontrada. Há um
Laboratório. Este é o único indício que encontramos capaz de adicionar informações sobre o
Apesar de ser o único indício sobre a atualização dos “instrumentos de latão”, este
documento sugere algo de grande importância para nossa análise: o Laboratório continuou a
ser equipado mesmo após uma interdição, em 1930, que limitou as pesquisas na Escola de
37
ARQUIVOS UFMG DE HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NO BRASIL. Biblioteca Central da UFMG: Sala
Helena Antipoff. Caixa: A1-6D; Pasta: 8; Tema: Aparelhos para testes; Documento: 1.
38
Estes dizeres, entre parênteses, foram acrescentados a lápis no manuscrito (à tinta).
58
publicação intitulada “Ideais e interesses das crianças de Belo Horizonte e algumas sugestões
pedagógicas”. É neste período que foi delimitada a função que o Laboratório assumiria ao
inquérito de dez questões que reproduzimos, quando fizemos, juntamente com um autor
anônimo, uma visita ao Laboratório, em dezembro de 1929. As polêmicas que este estudo
originou ilustram uma significativa parcela da dinâmica de forças na qual o Laboratório foi
inserido.
Os “Ideais e interesses” são um daqueles casos onde não fica claro se sua autoria
que esta é a primeira publicação do Laboratório; o que é plausível, já que a própria Helena
Mas o motivo pelo qual selecionamos os “Ideais e interesses” diz respeito a seus
39
Cf. ANTIPOFF, H., 1930a.
40
Cf. ANTIPOFF, H., 1992m, v. 2, p. 46.
59
possível delimitar, com a adição de um sistema de controle das pesquisas realizadas na Escola
autoria foi supostamente atribuída ao Laboratório. Até mesmo porque é difícil esclarecer se a
autoria pertence a ele ou ao Museu da Criança. E esta distinção é, na verdade, mais delicada
item.
ano de 1930 ele foi publicado no Boletim da Secretaria do Interior, ou em algum outro
não antes do dia 30 de agosto, pois é a partir desta data que o Laboratório sofreu a
que “Esperamos dar o resultado dessa indagação no proximo numero deste jornal”. Mesmo
não conseguindo localizar este “número”, corroboramos a suposição de que a publicação dos
41
Cf. ANTIPOFF, H., 1929, p. 75.
60
“ideais e interesses” não tardou a acontecer, e, até mesmo, poderia ter sido feita num outro
Boletim da Secretaria do Interior. Uma terceira evidência é que a separata42 de uma versão em
francês – dos “ideais e interesses” – traz a data de fevereiro de 1930; o que reforça a idéia de
que a publicação da versão em português se deu numa data próxima, isto é, num contexto
para a formação do professorado, tal como observamos numa seqüência de artigos de Gama
(1930), do mês de janeiro. Esta importância da Psicologia Experimental foi repensada nos
meses seguintes, tornando-se motivada por uma atitude mais pragmática, ou seja, foram
poderiam se manter fechados nos laboratórios e nas teorias deles originadas. Isto, certamente,
pouco gosto por questões religiosas. Este foi o estopim de uma querela que marcou para
Negromonte”, vigário da Igreja da Boa Viagem, tomou conhecimento deste fato, e com “[...]
sua penna, sempre prompta para a defesa dos sacratissimos interesses da Igreja e da Pátria”
(PE. A. NEGROMONTE, 1930), dirigiu violentos ataques à pessoa de Helena Antipoff, muito
mais que à pesquisa por ela conduzida. Ele ficou indignado com as afirmações presentes nos
“ideais”, considerando-as típicas de uma pessoa com ideologia comunista e que combatia a
russa de Helena Antipoff, dando forças a uma reivindicação da Igreja de que “Querer-se o
42
Cf. ANTIPOFF, H., 1930b, p. 153.
43
ULLMANN, 1991, p. 87.
61
Horizonte” – um artigo intitulado “Em torno de um inquerito escolar”, onde versou sobre o
dias daquela sobre os “Ideais e interesses”. Parece que houve, num primeiro momento, uma
espécie de divulgação oral, ou seja, “A notícia se espalhou pela cidade, tão jovem ainda, tão
pequena, cidade, ‘onde tudo se comenta...’ E os mineiros tão religiosos!” 44 Então, após ouvir
comentários, o padre Negromonte entrou em contato com seus companheiros católicos, que
assim como ele, deviam pensar que “Só resta um caminho: O Brasil volte para Deus, eduque
1930b). O mais problemático, portanto, é que o Padre Negromonte procurou outros católicos
e iniciou seus ataques mesmo desconhecendo o relatório de Antipoff, já que foi somente após
perceber um certo descaso – ou desinformação – por parte de seus pares é que ele decidiu ler
o documento oficial. Finalmente, foi após uma atenta leitura que ele publicou o referido artigo
Um processo como este – divulgação oral, busca de apoio, “longa” espera por uma
resposta, obtenção do artigo, leitura atenta, elaboração da crítica, envio da mesma para o
jornal, e publicação – deve ter demorado alguns dias, ou até mesmo alguns meses. Isto nos
ajuda a repensar a possibilidade dos “ideais e interesses” terem sido divulgados via texto bem
44
ARQUIVOS UFMG DE HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NO BRASIL. Biblioteca Central da UFMG: Sala
Helena Antipoff. Caixa: A1-5; Pasta: 17; Tema: Situações pitorescas sobre Helena Antipoff narradas por Jurema
Lopes; Documento: 1 [Ficha P].
62
antes do dia 30 de agosto (de 1930), quando saiu o Decreto que limitou as pesquisas na Escola
de Aperfeiçoamento.
deste específico trabalho de Negromonte para a elaboração de tal Decreto. Acontece que
estamos supondo que a querela se deu num nível muito mais oral do que escrito, e que o
dias ou meses antes. Com isto, suspeitamos de uma ligação entre estas reações “orais” do
Certamente, esta não seria a única justificativa para o Decreto. Analisaremos outras prováveis
influências.
Vejamos agora qual foi a posição do Governo frente à querela entre Negromonte e
Antipoff:
Porque na ordem das coisas afirmava-se que o comunismo deveria ser violentamente
intensa atividade política. O Governo, que contratou Antipoff para trabalhar no Brasil, e neste
sentido se tornou indiretamente responsável por aquilo que ela publicou, preferiu cruzar os
45
AMARAL, 1929a.
63
desgaste na incipiente troca de favores estabelecida: apoio político da Igreja Católica em troca
da permissão para ensinar a religião nas escolas públicas. Cabe lembrarmos que:
O problema é que este ensino religioso, que então voltara a ser administrado nas
escolas públicas, mostrou-se, através da pesquisa dirigida por Antipoff, ser extremamente
desmotivador para as crianças, pois figurou entre os níveis mais baixos de interesses
apontados pelo inquérito. Isto soou como uma ameaça para a Igreja, que pleiteava espaço no
âmbito educacional. É neste cenário que podemos enxergar as reações do padre Negromonte
como atos representativos de uma instituição que buscava campo de atuação. Se ele reagiu
como o fez, é porque se sentiu amparado não somente pela Igreja, mas também pelo Governo.
E este amparo pode ser percebido até mesmo em gestos sutis, como o do Inspetor-Geral da
Instrução, Mário Casasanta, que num pequeno aviso de jornal, demonstrou notória preferência
por autores católicos na área de psicologia educacional46. Melhor dizendo, ele fez algumas
dos livros de psicologia educacional, há uma nota ao final da lista de cinco títulos,
explicitando que os dois últimos foram escritos por católicos. Claparède, mestre de Helena
Antipoff, e único que teve dois livros citados, não figurou entre os católicos recomendados.
Se Claparède era colocado em segundo plano em relação àqueles que se mostraram católicos,
mais difícil ainda seria a situação de sua ex-aluna, que neste contexto, escrevera um artigo
46
Cf. CASASANTA, 1930.
64
intelectual, que, provavelmente, pontuavam sobre aspectos religiosos. Uma série destas
como representantes católicos. Um exemplo de apoio direto é o artigo de Mendes (1930, p. 1),
que reforçou a pressão sobre Antipoff, porém com uma análise de natureza mais
epistemológica, na qual concluiu: “[...] não creio muito na validade das respostas dadas pelas
caracter”. Havia também aqueles casos de apoio indireto, não focados nos “ideais e
encontrado em Amaral (1929c), onde foi colocada a superação do negativismo religioso que
povoou a mente dos intelectuais e foi trazido pelas ciências experimentais, que se propuseram
a dar uma explicação naturalista para os fenômenos. Outro exemplo de apoio indireto, é um
E num outro tipo de apoio indireto, que certamente foi crucial para alicerçar as ações
de Negromonte e outros, a pressão não se fez na forma de artigos ou conferências, mas sim a
Aperfeiçoamento. Isto porque “[...] a própria escolha de Lúcio dos Santos como diretor da
Escola de Aperfeiçoamento seria uma estratégia do Estado para amparar um pouco as reações
negativas que da Igreja pudessem partir contra o ensino daquela instituição” (PRATES, 1989,
47
Cf. A FORMAÇÃO... 1930.
65
p. 122). Segundo Boschi (2000, p. 83), Lúcio José dos Santos publicou em torno de vinte
obras sobre Educação, Engenharia, Religião e História do Brasil e de Minas Gerais. Mas
parece que a erudição não foi o único fator que contou no momento de sua indicação para a
diretoria da Escola de Aperfeiçoamento, pois ele era defensor das teses católicas referentes ao
ensino e figura de destaque naquela sociedade. Prova disso é um artigo de jornal, no qual ele
fala ao presidente Antônio Carlos em nome dos católicos, e o congratula, já que ele,
catecismo nas escolas, dentro do horário de aulas48. E, num outro momento, ele escreveu um
Aperfeiçoamento de Bello Horizonte”, no qual deixou bem claro que “Fortalecer a raça,
conservar a lingua e não abandonar a religião; eis tudo” (SANTOS, 1929a, p. 66). É curioso,
com base nesta frase, imaginarmos qual seria sua postura em relação a Antipoff, visto que ela
enfraquecia a religião.
Um fato pitoresco sobre a postura conservadora de Lúcio José dos Santos é narrado a
Helena Antipoff não foi a única afetada por este “controle moral-religioso”, que, como
ficou mais nítido agora, dava-se de modo furtivo, em “pequenos atos”, que incluíam o olhar, a
fala, o gesto. São os atos que costumam ficar de fora dos jornais e das revistas. Em vez de
deixarem sua impressão no papel, para que todos pudessem vê-la, tipografavam a conduta
48
SANTOS, 1929b.
66
daqueles que os recebiam: Helena Antipoff, Mlle. Milde e outros que pudessem ameaçar a
ordem vigente. Porém, um sistema de “controle moral-religioso”, para ser mais abrangente,
É neste longo cenário que percorremos até agora que situamos um decreto, estranho
tanto em relação à postura liberal de Antônio Carlos quanto ao investimento que sua
administração fez para a montagem do Laboratório. Curiosamente, foi publicado nos últimos
dias de seu mandato, sugerindo que ele saía da presidência do Estado, mas deixava algo para
Decreto n. 8.987 de 22 de fevereiro de 192950. A principal diferença entre tais decretos, que se
distam por cerca de um ano e meio apenas, é a explicitação de um sistema de controle sobre
não custa repetir, diverge de todo o esforço que o Governo fez para importar da Europa aquela
enorme lista de materiais que ele próprio orgulhosamente exibiu; sem contar que, naquela
ocasião (item 3.3), foi valorizada a atitude de Helena Antipoff de desenvolver em suas alunas
o espírito científico, de bem experimentar, observar e induzir. Além disso, neste decreto, a
49
Cf. MINAS... 1930b.
50
Cf. MINAS... 1929.
67
educação” não foi apenas uma mudança de nomes, mas, principalmente, de atitudes assim
rotuladas. Podemos resumir o sentido deste novo decreto em poucas palavras: qualquer
pelo diretor. Foi o acréscimo deste mecanismo legal de controle que fez a diferença, pois os
agir de acordo com demandas educacionais bem definidas, com praticidade, com aquilo que é
aprovado em primeira instância por seus superiores. Este processo de restringir a pesquisa na
mais a suspeita de que este decreto, que Antônio Carlos promulgou antes de deixar sua
Responderemos a esta pergunta em outros momentos. Antes, porém, precisamos pontuar que
estas mudanças no ano de 1931 nos ajudam a compreender melhor o sentido daquele decreto
de 1930, que restringiu a pesquisa na Escola de Aperfeiçoamento. É que nas duas situações
reside a influência de Francisco Campos, que primeiramente era Secretário dos Negócios do
Interior de Minas, e foi o autor da Reforma do Ensino no Governo de Antônio Carlos. Com a
que teve como primeiro titular o próprio Francisco Campos. Cabe lembrar que havia nessa
68
época uma luta entre uma corrente de pensamento católico e a vanguarda educacional,
chamada Escola Nova. E nesta luta, em 1931, a Igreja encontrou em Francisco Campos um
explícito apoiador de sua causa. Foi por meio dele que se deu a reintrodução do ensino
religioso facultativo nas escolas públicas oficiais. Enquanto alguns discordavam e debatiam, o
decreto do Governo Provisório era saudado com esperança por parte dos católicos51. E ao
longo da Era Vargas, que se iniciou com o a participação de Francisco Campos, instaurou-se
uma organização em que nada escapava à ação do Estado, na qual o professor acabou se
análise de alguns trabalhos lá realizados. Sabemos que é complicado obter uma relação que
contenha todos os estudos cuja autoria pertence ao Laboratório, seja porque grande parte do
publicações – são dele, do Museu da Criança, ou de outra instituição. Uma alternativa é fazer
uso de uma amostragem. Campos, R. (1980, p. 39) usou esta seleção: “Para acompanhar o
pesquisas por ele publicadas sobre ideais, interesses e desenvolvimento mental das crianças de
Belo Horizonte: 1930, 1936, 1937 e 1951”. Há também aquelas relações parciais, como a
apresentada por Antipoff, D. (1985), que trazem algumas das publicações do Laboratório.
volumes, esta coletânea se mostrou, para nossos propósitos, uma amostragem mais
51
CURY, 1986, p. 17.
52
PEIXOTO, 1983, p. 136. Cf. PEIXOTO, 1992.
69
quais páginas contém alusões ao Laboratório ou ao Museu, e o que se dizia a respeito deles.
Assim, direcionamos nosso olhar principalmente para qualidade dos relatos, e não para a mera
Com base nesta amostragem, verificamos que o Laboratório esteve bastante envolvido
com a aplicação de testes nas crianças da rede escolar mineira, a fim de agrupá-las em níveis
com esta prestação de serviços, os diagnósticos oferecidos pelos testes serviam como
importantes dados de pesquisa para Antipoff e suas alunas. Quanto àqueles diversos
“instrumentos de latão” importados pelo governo mineiro, eles raríssimas vezes foram
mencionados nos textos da Coletânea. Estas raras exceções são apontadas nas tabelas. Em
compensação, sempre presentes estiveram os testes, geralmente conjugados por lápis e papel.
Esta demanda para usar testes e separar crianças em classes homogêneas é anterior à
homogeneização de classes, que Theodore Simon realizou em dois grupos escolares no ano de
1929. Se a demanda por homogeneização de classes estava presente na reforma do ensino que
Francisco Campos formulou durante o governo de Antônio Carlos, não é de se estranhar que
ela também apareça nos empreendimentos educacionais da época em que ele era auxiliar de
Vargas.
53
Os cinco volumes da coletânea são ANTIPOFF, H. (1992a, 1992g, 1992h, 1992k, 1992s).
70
1930, informa que “O Presidente do Estado de Minas Geraes resolve nomear Amelia de
(PALACIO... 1930a). Não havíamos esclarecido ainda que Lúcio José dos Santos fora
substituído por Amélia de Castro Monteiro. Ela fazia parte de um grupo de brasileiras que
havia estudado em Colúmbia – nos Estados Unidos – com o apoio do governo mineiro e
depois voltou para ajudar na Reforma do Ensino. Amélia permaneceu na direção da Escola de
Aperfeiçoamento até sua extinção, em 1946. Apesar de não ser no meio religioso um nome de
destaque do mesmo calibre que o de Lúcio José dos Santos, ela era uma católica fervorosa e
Há indícios de que Amélia de Castro já substituía Lúcio José dos Santos quando ele
precisava se ausentar do cargo. Num documento bem anterior à sua nomeação, de fevereiro de
1930, ela é apontada como diretora55. O mesmo é relatado na biografia de Helena Antipoff:
foi a diretora Amélia de Castro que a recebeu em seus primeiros momentos na Escola56. Em
mostra que Lúcio era o diretor, e Amélia professora de metodologia 57. Por sinal, há um
contrato, de 23 de junho de 1930, ou seja, cerca de apenas dois meses antes do restritivo
decreto, a partir do qual Amélia foi nomeada para o cargo de Professora de Metodologia da
54
PRATES, 1989, p. 146.
55
Cf. ESCOLA... 1930.
56
ANTIPOFF, D., 1996, p. 110.
57
Cf. CONFERENCIAS... 1929c.
71
Escola de Aperfeiçoamento58. Por mais difícil que seja a leitura de todas estas datas, elas nos
esclarecem duas coisas importantes: a primeira é que havia um lugar – a diretoria da Escola
mesmo perfil, pronto para assumir o posto quando necessário. A segunda questão é o fato de
Amélia de Castro Monteiro ter sido professora de Metodologia. Analisaremos no item 4.3
uma outra querela, entre Helena Antipoff e as professoras de metodologia, referente a uma
disputa pelo ensino de questões psicológicas. Aludimos, agora, a possibilidade de que Amélia
de Castro, em função de seu histórico na Escola, tenha tomado partido nesta discórdia.
Quanto a Antipoff, ela continuou a dirigir o Laboratório, que atendia às demandas para
homogeneização de classes. E devia preparar outras professoras para a correta utilização dos
testes. Uma contratação, assinada em 23 de novembro de 1932, serve como exemplo. Sua
esforços por parte do governo, que comprou todos os aparelhos necessários, funcionou cerca
de um ano e meio sob um regulamento que dava aos professores maior liberdade de ação, e
aplicação de testes psicológicos, que eram os instrumentos mais modernos disponíveis para
conhecer as características mentais das crianças60. Neste sentido, o que se fazia na Escola de
cenário internacional, dos quais Francisco Campos estava a par. Na época, discutia-se a
desprender daqueles modelos clássicos de investigação apropriados de outras áreas. Esta fase
contexto de criação do Laboratório, onde sua identidade e sua função estavam sendo
definidas.
Além destas mudanças no seio da Psicologia, um outro fator a engendrar este cenário
parece ser uma tentativa da Pedagogia de criar seus próprios laboratórios, diferenciando-os
demonstrando que sabe caminhar com seus próprios métodos, então apresentados, como uma
inovação. Para justificar sua identidade, e os espaços a ocupar, uma ciência precisa apontar
Pedagogia viviam uma espécie de crise da adolescência científica. Quando a Pedagogia assim
procedeu, ela criou uma disputa, uma concorrência, que conduziu a uma reformulação, por
61
Cf. CESAR, 1929.
73
estar em sintonia com os regulamentos do ensino normal63 e primário, ela tentou abandonar
aquelas investigações que não demonstrassem uma ligação estreita com a prática educacional,
ou seja, não se podia mais imitar aqueles primeiros psicólogos, que se dedicaram mais a
Desta maneira, procuramos retratar uma parcela da rede de forças que perpassaram o
Laboratório em seus primórdios, e que definiram algumas das principais demandas que
recaíram sobre aqueles que lá trabalharam. Se começamos pelo efeito que os “Ideais e
Interesses” tiveram, foi porque julgamos que as reações a esta primeira publicação do
padre Negromonte, à medida que toda esta análise girou “Em torno de um inquerito escolar”,
e esclareceu que
precisa ser lida com bastante cuidado, de acordo com um alerta vindo da própria Helena
62
Cf. MINAS... 1928b, p. 3.
63
Cf. CAMPOS, F., 1928; MINAS... 1928a.
64
Cf. ANTIPOFF, H., 1992u, v. 3, p. 53.
74
Uma vez que este projeto trouxera resultados satisfatórios em outros países, caberia
verdadeiro sentido que Helena Antipoff e suas alunas davam ao termo “experimentação”, que
agora começa a emergir: um acompanhamento meticuloso dos efeitos produzidos por uma
nova “medida”, mesmo quando esta medida fosse bastante complexa, como a introdução de
Por mais que o projeto de homogeneização de classes tenha contribuído para delimitar
outras questões. Como exemplo, uma das alunas da Escola de Aperfeiçoamento, a professora
Júlia de Magalhães Viotti, com o uso de “inquéritos, observações e medidas, [...] estudou [...]
suas colegas do curso, [...] e fez uma monografia consagrada à antropologia da Mulher
mineira” (ANTIPOFF, H., 1992e, v. 1, p. 238). Uma monografia como esta era parte das
Como sugere o exemplo, havia nestas pesquisas “didáticas” uma maior liberdade para escolha
de temas e métodos, visto que elas se justificavam por sua importância para a formação das
próprias professoras-alunas. Em outras palavras, tais pesquisas didáticas não feriam o espírito
do decreto de agosto de 1930, pois mantinham um vínculo estreito com a educação (das
homogeneização de classes escolares, e utilizava esta prestação de serviços como uma forma
de colher dados de pesquisa através dos testes aplicados, foram diagnosticados alguns
65
Cf. ANTIPOFF, H., 1992f, v. 1, p. 262.
75
Aperfeiçoamento.
4. 2. Empreendimentos complementares
escolares logo começou a produzir alguns efeitos colaterais, uma vez que os professores
dispunham de poucos recursos para lidar com aqueles que se mostravam distantes da média
avaliação das crianças, Helena Antipoff sentia-se tolhida para agir a partir da Escola de
maior auxílio aos necessitados, seria imprescindível que ela buscasse espaços que trouxessem
maior autonomia tanto para si própria quanto para seus possíveis colaboradores; espaços que
66
LIMA, 1983, p. 41.
76
atacou. Este arranjo diplomático, certamente, melhoraria a relação entre Antipoff, a Igreja e o
abandonada ou desviada dos caminhos próprios da infância [...]” (ANTIPOFF, H., 1992q, v.
laboratórios, e até mesmo outras escolas que auxiliaram no treinamento de professores. Todas
estas criações foram marcadas por confrontos, impasses e conciliações. Por exemplo, com a
um pequeno pavilhão, localizado à Rua Ouro Preto 624, que foi inaugurado em 28 de outubro
de 1934, onde foi instalada uma Escola Ativa – o Instituto Pestalozzi para educação de
67
Uma curiosidade: em 1933, Helena Antipoff dirigiu uma investigação cujos resultados são opostos àqueles dos
“Ideais e interesses”, isto é, “Analisando os resultados de ambos os sexos, concluímos que o interesse dominante
é realmente Religião, sendo que outros interesses variam de modo característico” (LUSTOSA, 1983, p. 76).
68
GUIMARÃES, 1988, p. 21.
77
para que as instituições que surgiam a ele atreladas pudessem funcionar 69. Posteriormente,
não sabermos a data de sua fundação, também desconhecemos se era o único laboratório que
a Pestalozzi de Belo Horizonte possuía. Talvez, mais importante que buscarmos esclarecer
estes detalhes sobre o Laboratório da Sociedade Pestalozzi, é percebermos que nele foram
conduzidos estudos que até mesmo levaram algumas pessoas a considerar que “Foi assim que
das mais diversas áreas e os motivou a trabalhar na causa daqueles que se mostravam mais
desamparados. Através dela temos um ótimo exemplo de que “As relações de poder são, antes
exemplo, Velloso (1972, p. 10) diz que Helena Antipoff criava ratos albinos – em caixotes –
nos fundos de sua casa, em Belo Horizonte, e que também construía modestos aparelhos. As
pesquisas que utilizavam estes ratos como sujeitos iam além dos períodos letivos, já que nas
férias, ela realizava experiências sobre aprendizagem, no que parecia ser um laboratório
69
ANTIPOFF, D., 1984, p. 113.
70
ANTIPOFF, D., 1987, p. 36.
71
ANTIPOFF, H., 1992t, v. 2, p. 199.
72
ARQUIVOS UFMG DE HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NO BRASIL. Biblioteca Central da UFMG: Sala
Helena Antipoff. Caixa: A1-5; Pasta: 17; Tema: Depoimentos prestados pelos colaboradores de Helena Antipoff
sobre a mesma; Documentos: 2 e 3.
78
planejamento de outras obras73. A partir dele, ou melhor, nele, surgiu a Sociedade Pestalozzi,
rede, que se ampliou ainda mais com a fundação da Fazenda do Rosário, por ela considerada
sua mais importante obra74. Cabe ressaltar que o padre Negromonte também estava ao lado
dela no momento em que foi identificado o terreno onde seria plantado este novo
empreendimento 75. Com o auxílio de pessoas influentes na sociedade da época, ela “[...] fez
Há indícios de que este foi o segundo laboratório por ela criado no Brasil76. Não sabemos ao
certo se isto é verdade, pois poderia ser o da Sociedade Pestalozzi, aquele nos fundos de sua
casa etc. Certo é que a rede laboratorial foi tomando maiores proporções77. E este crescimento
foram cedendo seu lugar de destaque para estes novos “laboratórios”, identificados
principalmente por seu caráter assistencial. Alguns até mesmo chegaram a rotular o
73
GUIMARÃES, 1991, p. 66.
74
Cf. MAGALHÃES, 1983, p. 27.
75
LIMA, 1983, p. 42-43.
76
Cf. ANTIPOFF, D., 1985, p. 70.
77
Talvez a dimensão desta rede laboratorial ultrapasse a que estamos reconstruindo. Por exemplo, BRANDÃO
(2001, p. 64) mostrou que Helena Antipoff esteve na Faculdade Dom Bosco, em São João del-Rey, a fim de
conhecer o laboratório de Psicologia desta instituição, e verificar como ele poderia lhe ajudar em seus trabalhos
junto à fazenda do Rosário. Apesar da data não ter sido explicitada, parece que este acontecimento foi posterior à
extinção da Escola de Aperfeiçoamento.
78
Cf. ALKMIN, 1980, p. 47; CARNEIRO, 1980, p. 48.
79
quando se falava sobre sua chegada ao Brasil, em 1929. Grande ênfase foi dada à Sociedade
fizemos da “Coletânea de Obras Escritas”. Apesar de não termos incluído nos quadros (Cf.
APÊNDICE) uma coluna para a Sociedade Pestalozzi e outra para a Fazenda do Rosário,
cedeu lugar para estas outras instituições que, no final das contas, o complementavam. É
Coletânea, cuja maioria dos textos relacionados refere-se às últimas realizações de Antipoff,
Não foi somente o incêndio de 1953, que apagou parte da memória do Laboratório,
mas os próprios elementos da rede laboratorial que se tornaram mais proeminentes. Além das
instituições criadas por Antipoff, sobressaiu-se o nome da própria criadora, e para ela foram
crucial para a construção desta rede laboratorial80. Ela conseguiu transformar aqueles
79
Cf. ANDRADE, 1972; ALKMIM, 1979; CABRAL, 1981; DRUMMOND, 1974; DRUMMOND, 1979;
EDUCADORES... 1981; FELIPE, 1979; HELENA... 1974; JANUZZI, 1974; MARIA, 1980; MAURÍCIO,
1972; MAURÍCIO, 1974; .PORTUGAL, 1979; SABINO, 1974; VEJA... 1974.
80
Cf. ANTIPOFF, D., 1996, p. 131; ANTIPOFF, D., 2000; FERNADEZ, 2000, p. 28.
80
dirigida por Helena Antipoff. A mera descrição daquelas pesquisas cuja autoria foi
conflitos. Isto nos faz pensar que “O que conta nas coisas ditas pelos homens não é tanto o
que teriam pensado aquém ou além delas, mas o que desde o princípio as sistematiza,
tornando-as, pelo tempo afora, infinitamente acessíveis a novos discursos e abertas à tarefa de
princípio sistematizou aquilo que foi dito e feito por Antipoff, é importante refletirmos sobre
sua própria constituição enquanto sujeito desta trama histórica, onde parte dos fatores
Escola de Aperfeiçoamento.
central desta história. Em alguns momentos, mais particularmente quando discorremos sobre a
porque toda uma multifacetada rede de saberes/poderes a constituiu como tal. Não queremos
com isto reduzir o sujeito81 – neste caso, Antipoff – a uma espécie de autômato,
tanto o saber produzido no Laboratório quanto aquela que dirigiu a produção deste saber
onde cada um constrói o mundo que o constitui como sujeito 82. Não fomos nós, mas um
conjunto de relações de saber/poder que elegeu Antipoff como a protagonista desta história.
Já sugerimos algumas das prováveis relações de poder que contribuíram para modelar
a Helena Antipoff que conhecemos: a querela com o padre Negromonte, sua reconciliação
com o mesmo, a ajuda que ele a concedeu, o contrato que restringiu as pesquisas na Escola de
81
Para conhecer melhor a maneira como Foucault aborda o processo de constituição do sujeito, o leitor deve
consultar a obra de FONSECA (2003). Sobre o conceito foucaultiano de “sujeito”, este verbete é detalhadamente
explicado por REVEL (2005). Aqui, estamos fazendo somente uma apropriação e usando o termo num sentido
mais psicológico, cujos equivalentes mais próximos seriam: “indivíduo”, “pessoa” e “personalidade”.
82
Cf. FOUCAULT, 2002b, p. 27.
82
alegria das famílias de algumas crianças deficientes e as reações negativas de outras, já que
“Dividir as crianças por QI ou mostrar que tinham problemas de retardos criou uma série de
mal-entendidos também junto às famílias” (MARIA, 1980, p. 4). Por mais que tentássemos
enumeraremos somente mais algumas que julgamos relevantes para ampliar o entendimento
trabalhos que Antipoff dirigia. Por exemplo, o porteiro procurava artifícios para desligar a luz
Psicologia83. Não sabemos até que ponto ele se comportava tendo o respaldo da direção.
Todavia, mais uma vez confirmamos que as proibições para a pesquisa não se limitaram ao
que estava explicitado num decreto, a algo formalizado, mas ganhavam corpo em pequenos
gestos, que se tornavam públicos via relatos orais, e não através de jornais ou revistas.
com o padre Negromonte, onde ela se sentiu ameaçada pelas professoras de Metodologia da
Escola de Aperfeiçoamento. O cerne de tal problema, ou pelo menos sua justificativa, residia
no fato de que havia uma espécie de imbricação dos conteúdos de Psicologia e Metodologia, o
que gerou uma disputa sobre quem deveria ministrá-los. É possível constatar esta imbricação
já em 1929, seja num breve esboço dos programas dos cursos, redigido pelo então diretor
Lúcio José dos Santos84 ou nos trabalhos que as professoras de Metodologia apresentaram
durante aquela “Exposição” que visitamos85. Mas foi Lúcia Casasanta, uma das professoras de
83
VELLOSO, 1972, p. 10.
84
Cf. SANTOS, 1929a.
85
Não transcrevemos os trabalhos de Metodologia no item 3.3. Cf. EXPOSIÇÃO... 1929.
83
Então, criou-se logo uma questão muito interessante que eu ainda sinto que
as escolas não definiram. E foi o primeiro embaraço que nós tivemos que
resolver. Porque houve um choque entre a orientação americana e a
orientação européia. Na orientação americana, a escola estava voltada para
as necessidades fundamentais do ensino na época. E, como estava orientada
neste sentido, a parte principal era a metodologia, porque (aí) eram as
maiores deficiências. Eram as deficiências do ensino. Então a metodologia
tomou um grande vulto no trabalho da Escola. Mas a orientação do Instituto
Jean Jacques Rousseau era a seguinte: o departamento de Psicologia devia
estudar a Psicologia Infantil – a Pedologia – e também a Psicologia das
várias matérias do ensino primário. Do programa. Então, a psicologia da
leitura, da ortografia, da escrita, da composição... Tudo deveria ficar no
departamento de Psicologia. Mas a orientação americana que nós
trouxemos e aquela orientação que nós seguimos lá era o contrário. A
Psicologia Educacional está ligada à Metodologia. Como Base. E (deve ser
dada) pelo mesmo professor. O que é muito mais razoável. Porque se fosse
estudar só Metodologia, deixando a psicologia das várias matérias – da
ortografia, da ciência – no laboratório, eu deveria estar constantemente
procurando saber e acompanhar o que ia lá, no laboratório de Psicologia
(...) Foi aquele choque. Madame Antipoff a princípio resistiu muito. E nós
também resistimos por outro lado. E, afinal, acabamos vencendo sobre os
outros elementos. E o que prevaleceu foi então esta parte: a psicopedagogia e
a orientação psicopedagógica. O professor estudava a psicologia de cada
matéria e a metodologia correspondente (citado por PRATES, 1989, p. 158,
grifo nosso).
Esta vitória das professoras de Metodologia pode ter resultado em mais uma limitação
de Psicologia” por esta ex-professora. E aqui um detalhe: Amélia de Castro Monteiro, aquela
Metodologia. Não sabemos até que ponto ela tomou partido neste conflito, mas desejamos
por exemplo, o fato de que após um certo tempo, as pessoas iam até a Escola de
Aperfeiçoamento para ver Helena Antipoff, e davam pouca ou nenhuma atenção para Amélia
de Castro86.
Aperfeiçoamento, Helena Antipoff nem sempre as seguia. Por exemplo, quando havia
86
Cf. ARQUIVOS UFMG DE HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NO BRASIL. Biblioteca Central da UFMG: Sala
Helena Antipoff. Caixa: C2; Pasta: 5; Tema: Arquivo oral; Documento: 17.
84
secretaria, mas como isto causava atrasos, ela pedia a suas alunas que os levassem ao conserto
e pagava de seu próprio bolso 87. Esta transgressão não deve ter apenas resultado em aparelhos
Antipoff, pois acatavam uma ordem para quebrar outra. Quanto à questão do dinheiro, este
não somente saía do bolso de Antipoff para pagar o conserto dos aparelhos. Numa outra
situação, onde ela também cativou suas alunas, ela fez com que ele deixasse de entrar:
Um gesto como este não somente encantou as alunas, mas possivelmente evitou outras
discórdias.
o debate sobre até que ponto – ou a partir de quando – as relações de poder constituem o
sujeito, assim como o mundo que este sujeito transforma. Seria até mesmo injusto considerar
o “desprendimento pelo dinheiro”, que Antipoff demonstrou, como uma mera estratégia para
esclarecer que, no caso dela, esta conduta possui motivações que remontam à sua
adolescência, pois aos 13 anos, um incidente com o seu pai, levou-a a uma posição decisiva
quanto ao que receberia em troca do seu trabalho. Ela aceitou como aluna uma menina pobre,
que desejava aprender a ler e escrever. Dela, Antipoff obteria sua primeira remuneração
87
ARQUIVOS UFMG DE HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NO BRASIL. Biblioteca Central da UFMG: Sala
Helena Antipoff. Caixa: A1-5; Pasta: 17; Tema: Depoimentos prestados pelos colaboradores de Helena Antipoff
sobre a mesma; Documentos: 2 e 3.
88
Este trecho é reproduzido em OLIVEIRA (1992, p. 40).
85
enquanto mestra. Quando seu pai tomou conhecimento de tal cobrança, ele a admoestou de
forma vexatória. Daí em diante, ela passou a carregar um gosto mais do que desagradável pelo
dinheiro, nunca mais sendo capaz de cobrar de particulares. Ela inclusive desistiu de ter
consultório próprio e optou pelo serviço público89. Certamente, não conseguimos precisar até
trama histórica”, devemos pelo menos suspeitar de que esta trama pessoal pode ir muito além
do arbitrário recorte que fazemos. No caso do Laboratório, todos os personagens que fizeram
parte de sua história nela adentraram trazendo suas predisposições, sempre idiossincráticas, ou
seja, cada sujeito deu, ao se envolver com este contexto de vida e transformá-lo, continuidade
Quando, por exemplo, abordamos aquela rede de desdobramentos que se deram “Em
padre Negromonte não foi a primeira que Helena Antipoff vivenciou em decorrência dos
resultados de uma publicação. Cerca de cinco anos antes, ela escreveu um artigo – em russo –
no “Jornal Pedológico” de Leningrado, com o título: “O nível mental das crianças em idade
Antipoff passou por algumas dificuldades, já que a pesquisa demonstrou que os filhos de
intelectuais e nobres eram mais capazes que os de proletários. Ela foi vista como um elemento
prejudicial ao regime 90. É plausível pensar numa relação entre este episódio e a forma
diplomática adotada por Helena Antipoff frente à série de críticas que o padre Negromonte
89
ANTIPOFF, D., 1996, p. 21-22.
90
ANTIPOFF, D., 1996, p. 83.
86
levantou, o que evitou maiores conflitos, que poderiam até mesmo ter resultado em sua saída
do país.
Muitos outros exemplos entrariam nesta discussão sobre a constituição dos sujeitos,
seja no caso de Antipoff ou de qualquer outro personagem desta trama. Todavia, temos
urgência de passar para uma nova questão, ou melhor, de reformular uma “velha” suposição.
A aplicação de testes para seleção de crianças em classes homogêneas foi uma das
reafirmada.
Em geral, quando se dizia o nome do Laboratório, não havia uma especificação sobre
o que o constituía, tal como a que encontramos no relato daquela “Exposição de Trabalhos”
mensurações de processos motores e sensoriais. Ao que tudo indica, esta divisão não se
Psicologia”.
Laboratório de Psicologia era um conjunto de “instrumentos de latão”. Talvez seja por esta
razão que Helena Antipoff tenha concedido a autoria daquele polêmico estudo sobre os
87
“Ideais e interesses” ao “Museu da Criança”, uma vez que neste estudo foi utilizado um
questionário, e não aqueles aparelhos que tinham maior ligação com análises de física e
fisiologia. Com a publicação do decreto de 1930, que impôs algumas restrições à pesquisa na
“instrumentos de latão”. Estas mudanças, que têm o Decreto como marco, estavam em
sintonia com a evolução metodológica vivida pela Psicologia no cenário internacional, que se
Escola de Aperfeiçoamento, o diretor Lúcio José dos Santos deixou bem claro que o curso
1929a, p.63). Sobre os cursos de Antipoff, suas aulas eram compostas basicamente por
requisitos básicos ao ensino 91. Os testes eram uma espécie de eixo central, ao redor do qual
básicos, que requeria o uso dos “instrumentos de latão” para demonstração, tinha, em última
instância, uma relação com os testes, já que estes diagnosticavam e selecionavam com base
psicológica e social dos sujeitos, a fim de adquirirem maior clareza sobre o processo de
91
RODRIGUES, 1994, p. 63.
92
Para conhecer uma discussão sobre o estudo da “personalidade física” da criança e do adulto, Cf. ANTIPOFF,
H., 1992e.
88
aplicação dos testes, entre outras coisas. Para avaliar a personalidade, era preciso conhecer
Além disso, “No Laboratório da Escola de Aperfeiçoamento, o preparo para o uso dos
de testes nas professoras-alunas era constantemente feita de surpresa, simulando uma situação
real, para que elas não pudessem elaborar suas expectativas nos dias anteriores. Por exemplo,
ao chegarem à Escola, elas se deparavam com um aviso no quadro mostrando que deveriam
comparecer à Biblioteca num determinado horário. Lá havia um teste, que podia figurar entre
curioso é que não havia um local específico para a aplicação de testes, ou seja, esta não era
outras palavras, para Antipoff, parece que qualquer ambiente podia se transformar naquilo
93
Para conhecer a noção de “personalidade” usada por Helena Antipoff e suas colaboradoras, Cf. ANTIPOFF,
H., 1992d.
94
ARQUIVOS UFMG DE HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NO BRASIL. Biblioteca Central da UFMG: Sala
Helena Antipoff. Caixa: A1-5; Pasta: 17; Tema: Depoimentos prestados pelos colaboradores de Helena Antipoff
sobre a mesma; Documento: 2 e 3.
95
VIANNA, 1979, p. 6.
96
Cf. ANTIPOFF, H., 1992v, v. 1, p.189.
97
Esta afirmação de que as classes especiais podem funcionar como laboratórios é repetida em ANTIPOFF, H.
(1992o, v. 3, p. 50).
89
Até mesmo a escola-granja, projetada pela Sociedade Pestalozzi para atender aos
uma clínica para estagiários98. No final das contas, para Helena Antipoff, “Toda obra de
um sentido muito mais inclusivo que aquele sugerido por nossa hipótese de trabalho, aquela
entre aquilo que imaginávamos encontrar e o que de fato encontramos. Se deixamos para
fazer isto somente agora, é porque dependíamos das reflexões anteriormente levantadas.
nosso projeto. O contexto nos estimulava a arriscar um palpite com base no parco material
que tínhamos em mãos, e parte dele deixava a impressão de que a pesquisa no Laboratório foi
curiosos para descobrir se isto de fato aconteceu, e deixamos esta hipótese em suspense para
que uma análise ulterior, feita a partir de novas fontes, pudesse confirmá-la ou negá-la. À
medida que colhíamos outros documentos é que começamos a descobrir uma série de
Vamos rever aquela “velha” hipótese: “[...] além de sua função didática, para ilustrar
deixando a experimentação em segundo plano”. Cabe-nos agora confrontar esta hipótese com
98
ANTIPOFF, H., 1992x, v. 3, p. 156.
90
“velha” hipótese em três partes e discutiremos cada uma delas, para depois atualizá-la, de
Primeira parte: “[...] além de sua função didática, para ilustrar as aulas teóricas [...]”.
permaneciam passivas, escutando Helena Antipoff. Pelo contrário, elas aprendiam através da
“integrar”.
de testes [...]”. Não restam dúvidas de que o Laboratório esteve envolvido no processo de
homogeneização de classes escolares. Acontece que os testes aplicados para estes propósitos
ou seja, o Laboratório realizava uma pesquisa ao mesmo tempo em que prestava serviços. As
pesquisas não foram deixadas de lado, mas caminhavam ao lado da aplicação. Vários textos
da “Coletânea” das obras de Helena Antipoff evidenciam este duplo esforço. Além disso,
Antipoff conhecia as limitações de um “diagnóstico por meio dos testes” (ANTIPOFF, H.,
1992r, v. 3, p. 57), e por esta razão dirigia a seus pares o seguinte alerta: “Não nos deixemos
iludir, porém, com os resultados dos testes mentais. Os melhores dentre eles nunca dão
dúvida, o conteúdo daquela “velha” hipótese que mais se distanciou do total de dados
emprego dos testes. Estes não são mais do que uma técnica própria da psicologia aplicada”
sentido. No final das contas, descobrimos que ela não coincide com o cotidiano do
testes psicológicos. Ela até mesmo usava a expressão “estudo experimental por meio de
testes” (ANTIPOFF, H., 1992i, v. 2, p. 114). Além disso, valorizava recursos mais
experiências, somente ao teste? – Nada” (ANTIPOFF, H., 1992p, v. 1, p. 61). Nesta fala,
aparece uma possível separação entre “experiência” e “teste”. E Antipoff dá maiores sinais
desta distinção num outro momento, quando explicita duas vertentes do método experimental:
a dos laboratórios e a dos testes100. É bem provável que esta bifurcação tenha se refletido
99
Segundo PRATES (1989, p. 150), em 1937, Cristiano Machado, então secretário da Educação de Benedito
Valadares, incumbiu os professores da Escola de Aperfeiçoamento de elaborarem o primeiro programa de
ensino, com estrutura científica. Analisando o Decreto n. 887 de 30 de junho de 1937, verificamos que há um
“Programa de pedologia e de psicologia experimental aplicada á educação” (MINAS... 1937, p. 8). Neste
sentido, o adjetivo “experimental” volta a fazer parte do nome da cadeira dirigida por Antipoff. Apesar disso,
não percebemos consideráveis mudanças na lógica do funcionamento do Laboratório, quadro este que perdurou
até a sua extinção, talvez porque “Com o estabelecimento do Estado Novo, em 1937, as lutas ideológicas em
torno dos problemas educacionais entravam numa espécie de hibernação” (ROMANELLI, 1978, p. 153). De
volta ao referido decreto, cabe ressaltar que constatamos uma imbricação do conteúdo da cadeira dirigida por
Antipoff com o de outras, o que pode ter fomentado a já aludida disputa com as professoras de Metodologia.
100
Cf. ANTIPOFF, H., 1992j, v. 2, p. 339.
92
hipótese, quando ela é colocada frente a frente com um maior conjunto de fontes que
inteiramente válida, até mesmo porque eles cumpriram um importante papel na evolução da
Juntamente com Theodore Simon, ele construiu a primeira escala de medida da inteligência. E
Simon, que foi professor de Helena Antipoff, esteve em Belo Horizonte, iniciando o projeto
influência que recebeu quando assistente no Instituto Jean Jacques Rousseau, em Genebra,
Pedagogia não podiam se restringir às quatro paredes de uma sala de aula ou dos
normalistas, caberia oferecer a elas aquilo que houvesse de mais funcional, seja dentro ou fora
dados, que eram tratados ou trabalhados no Laboratório de Psicologia; esses dados, dentro de
um tratamento estatístico rigoroso, eram acumulados, ano após ano [...]” (FRANCISCO,
101
Cf. FRAISE, 1972.
102
Cf. GARRETT, 1959.
103
Cf. SILVA, 1989, p. 52.
104
Cf. FRANCISCO, 1982, p. 23.
93
também a ser um lugar para estruturar o conjunto de dados colhidos em situações mais
naturais, a partir de recursos mais espontâneos; função que em princípio parecia ser destinada
ao Museu da Criança.
adequada ao cotidiano do Laboratório: ele cumpria uma tríplice função que até mesmo
transcendia suas dimensões físicas. Ele cumpria uma função de pesquisa, onde se baseava
sujeito em suas dimensões física, biológica, social e psicológica. Ele cumpria uma função de
ensino, servindo como ambiente catalisador da integração entre teoria e prática, ou seja, como
cujo principal serviço prestado ao governo mineiro foi a seleção de crianças em classes
homogêneas. A separação destas três funções é meramente didática, visto que elas estão
intrinsecamente relacionadas.
Com isso, alcançamos a compreensão que necessitávamos sobre qual era a função – ou
quem sabe seja melhor dizer “as funções” – do “nosso” Laboratório. Podemos agora contar
DE APERFEIÇOAMENTO
foi extinto juntamente com a Escola de Aperfeiçoamento, o que surpreendeu todo o corpo
docente, que sequer sonhava com tal possibilidade. A diretora só tomou conhecimento do fato
objetivos, de criar unidades de ação educativa para que os esforços fossem mais rentáveis106.
No Decreto-lei n. 1.666, de 28 de janeiro de 1946, que versa sobre estas mudanças, há,
Aparece até mesmo qual seria a remuneração dos assistentes deste laboratório. Porém, é
Psicologia da Escola de Aperfeiçoamento para um outro local. Ao invés disso, houve sua
105
PRATES, 1989, p. 206.
106
Cf. PIMENTEL, 1946, p. 9.
107
Cf. MINAS... 1946, p. 2.
95
Valadares se recusou a renovar seu contrato, deixando-a numa situação de desamparo108. Com
isto, Helena Antipoff se ausentou temporariamente de Minas, e foi para o Rio de Janeiro,
apuração do material obtido em 1944, o que inclusive gerou novos problemas de pesquisa,
em 1946, mesmo ano em que foi feita uma lista dos pertences de Helena Antipoff (objetos,
móveis, livros etc), encontrados na casa da rua Tupis, 1466. Para sermos mais exatos, esta
lista foi feita – ou concluída – no dia 16 de fevereiro, ou seja, cerca de 20 dias após a
publicação do decreto referente a esta extinção 111. Consta, no final do documento, que havia
“1 Caderno sobre ratos”. Num outro documento, que parece ser o manuscrito do anterior, pois
banheiro da casa havia um armário cheio de material de laboratório112. Indagada sobre este
material, ou seja, se ele pertencia à extinta Escola de Aperfeiçoamento, Otília Antipoff nos
disse que provavelmente não, pois sua sogra levou para casa somente objetos pessoais, em
108
FERREIRA, 1992, p. 34.
109
MOURA, 1983, p. 47.
110
Cf. FRANCISCO, 1983, p. 57.
111
Cf. ARQUIVOS UFMG DE HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NO BRASIL. Biblioteca Central da UFMG: Sala
Helena Antipoff. Caixa: F1-5; Pasta: 5; Tema: Relação de objetos (lista) com pertences de Helena Antipoff
(1946); Documento: 1.
112
Cf. ARQUIVOS UFMG DE HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NO BRASIL. Biblioteca Central da UFMG: Sala
Helena Antipoff. Caixa: A1-5; Pasta: 19; Tema: Relação dos objetos encontrados na casa da rua Tupis;
Documento: 2.
96
especial alguns papéis, ou seja, não ficou com nenhum equipamento113. Também esclareceu
que naquela época era habitual listar os pertences de uma casa. Deduzimos que esta lista
refere-se àquele laboratório que Helena Antipoff possuía nos fundos de sua casa – o caderno
enquanto instituição. Sua extinção também se deu, pelo menos parcialmente, no nível da
memória. Vivenciamos isto em todos os momentos em que procurávamos por fontes que
como que diante da figura de um quebra-cabeça montado com uma pequena parcela das
peças. Como uma espécie de consolo, descobrimos que, apesar do incêndio, esta problemática
no Brasil. Alguns desapareceram sem deixar vestígios. Outros ficaram desatualizados e não
113
ANTIPOFF, O., 2004.
114
Cf. PFROMM NETTO, 2004, p. 155-156.
97
6. CONCLUSÃO
como a pessoa que o organizou e dirigiu. Mais especificamente, ela era responsável por um
configurados numa única sala, b) uma outra sala, que não recebeu nenhum rótulo específico, e
que continha material referente a testes, e c) o “Museu da Criança”, que seria um centro
Contudo, esta divisão não se manteve rígida ao longo do tempo, já que encontramos,
Psicologia” e até mesmo ligado a práticas que, em princípio, pareciam ser de responsabilidade
daquelas outras duas subdivisões deste mesmo “Departamento”, como a aplicação de testes
psicológicos.
alteração logo nos primórdios de sua história. Em 1930, um decreto restringiu as pesquisas
que seriam lá realizadas, incentivando aquelas que demonstrassem um vínculo estreito com a
estes propósitos. Esta revisão de conceitos era também perceptível no cenário internacional,
Pedagogia.
ficar mais atentos para certos detalhes: nomes, datas, conceitos, práticas, instrumentos etc. E
descobrimos, entre muitas outras coisas, que Helena Antipoff dava aos termos
que julgavam o Laboratório como um ambiente dedicado a prestar serviços, e que deixava a
pesquisa em segundo plano, constatamos que a pesquisa esteve sempre presente, e sempre se
transcendiam seu espaço físico. Em primeiro lugar, ele cumpria uma função de pesquisa, onde
coletava e organizava dados que permitissem avaliar os sujeitos em suas dimensões física,
instrumentos utilizados, e alguns testes foram criados pelo Laboratório. Em segundo lugar, ele
cumpria uma função de ensino, servindo como ambiente catalisador da integração entre teoria
cumpria uma função de aplicação, cujo principal serviço prestado ao governo mineiro foi a
forças, tanto hostis quanto apaziguadoras, que moldaram a feição que os produtos de lá
Psicologia enquanto ciência, de Helena Antipoff, de suas assistentes etc. Apesar das esparsas
e acadêmicas. Por exemplo, toda a série de empreendimentos altruístas dirigida por Antipoff
foi inicialmente motivada por tensões que circundavam a Escola, além de questões de sua
personagens de uma trama são moldados pelo próprio contexto que eles ajudam a transformar.
Esta visão de sujeito inclina-se a desmitificar o cientista, que é encarado a partir de sua
dimensão mais humana: alguém que deseja, elabora artimanhas para atingir seus objetivos,
No que diz respeito ao “final” da história do Laboratório, a maneira pela qual ele foi
extinto, em 1946, ilustra como uma agência científica pode subitamente cair no rol dos
esquecidos. Faltou-nos um maior conhecimento das razões desta ruptura, como, por exemplo,
Laboratório da Escola de Aperfeiçoamento aos ratos e à poeira, até o dia do incêndio que o
do Rosário.
100
Tentamos oferecer algumas contribuições para aqueles que se interessam pela história
do diálogo entre Psicologia e Pedagogia, e estamos certos de que nosso esforço deixou
perpassou o Laboratório, e evidenciamos uma série de fatores que constituíram não somente
as produções discursivas, mas também os sujeitos. Helena Antipoff foi o principal sujeito
analisado, e alguns de seus dados biográficos foram trabalhados. Nosso problema de pesquisa
facilitou a compreensão de quais foram as práticas mais freqüentes no Laboratório, bem como
da concepção que se tinha sobre este local de produção naquela época e como esta concepção
complementavam.
Sobre as prováveis lacunas que nossa investigação deixou, não nos preocupamos em
possíveis mudanças nas políticas educacionais que poderiam ter um efeito direto sobre a
que aqui foi abordado com ênfase na problematização de sua função, seja repensado à luz de
investigação possa fazer parte de uma futura apreciação crítica, como fizemos com trabalhos
passados. E temos certeza de que se isto for levado a cabo, revelará uma “ironia deste
101
dispositivo”. Não custa explicar: tomamos emprestada a expressão com a qual Foucault
encerrou o primeiro volume da coleção “História da Sexualidade”, para ressaltar que estamos
lamentável efeito é que deixamos de ter consciência destes mecanismos que nos governam
quando elegemos algo supostamente externo como objeto de pesquisa e nos concentramos
unicamente nele.
102
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116
Helena Antipoff
Obras Escritas de Helena Antipoff, disposta em cinco volumes. Não há quadros referentes aos
volumes quatro e cinco, pois neles não foram encontradas informações relevantes, sobre o
Visto que este material foi organizado em caráter “experimental”, com certa dose de
informalidade, ele é aqui reproduzido sem notas adicionais, tal como figura nos manuscritos
respeito; seu conteúdo também está sujeito a receber modificações e acréscimos, como, por
QUADRO 1
Esquema de leitura do primeiro volume da Coletânea das Obras Escritas de Helena Antipoff
TEXTO PÁGINAS ONDE PÁGINAS ONDE OBSERVAÇÕES
(VOLUME I) O O MUSEU DA
LABORATÓRIO CRIANÇA É
É CITADO CITADO
O nível mental das crianças
russas nas escolas infantis (p.
9-10)
Um caso de imagem eidética
espontânea (p. 11-12)
Contribuição ao estudo da
constância entre examinados
(p. 13-27)
A Experimentação Natural –
Método psicológico de A.
Lasoursky (p. 29-41)
Testes coletivos de
inteligência global (p. 43-50)
(Continua)
117
QUADRO 1
Esquema de leitura do primeiro volume da Coletânea das Obras Escritas de Helena Antipoff
(Continuação)
TEXTO PÁGINAS ONDE PÁGINAS ONDE OBSERVAÇÕES
(VOLUME I) O O MUSEU DA
LABORATÓRIO CRIANÇA É
É CITADO CITADO
Observações sobre a
compaixão e o sentimento de
justiça na criança (p. 51-57)
O trabalho psicológico (p. 59-
63)
Interesses e ideais das
crianças brasileiras –
conclusões (p. 65-69)
Questionário sobre o futebol
(p. 71-72)
O desenvolvimento mental 129 81, 90, 129 A responsabilidade pela
das crianças de Belo adaptação, aplicação e análise
Horizonte (p. 73-129) dos testes é concedida ao
Museu da Criança. O
Laboratório é relacionado à
formação de futuros
profissionais especializados
nas técnicas psicológicas.
Organização das classes nos 131-132, 134, 145 A responsabilidade pela
grupos escolares de Belo elaboração e aplicação de um
Horizonte (p. 131-150) novo teste psicológico é
concedida ao Laboratório.
O exame Alpha e “Match” 152 O pedido de alguns
intelectual (p. 151-155) exemplares-formulários do
Teste Alpha é feito pelo
“Laboratório de Psicologia da
Escola de Aperfeiçoamento”,
e não por alguma “pessoa”.
A pedagogia nas classes Cita o dinamômetro de Collin
especiais (p. 157-185) (p. 183) e o espirômetro seco
de Barnes (p. 184).
Teste Prime (p. 187-226) 187, 191, 193, 205 Atribui ao Laboratório a
criação, aplicação e
distribuição do Teste Prime.
Organização e controle das 227, 229-231 Versa sobre a apresentação
classes de 1º ano – (Prefácio) de um relatório, feito pelo
(p. 227-234) Laboratório, sobre os
resultados alcançados no ano
de 1934.
Contribuição à antropologia 235-236, 239 Afirma que o Laboratório
da moça mineira – (Prefácio) também se dedica ao estudo
(p. 235-239) da personalidade “física” da
criança e do adulto, e não
somente da “psicológica”.
(Continua)
118
QUADRO 1
Esquema de leitura do primeiro volume da Coletânea das Obras Escritas de Helena Antipoff
(Conclusão)
TEXTO PÁGINAS ONDE PÁGINAS ONDE OBSERVAÇÕES
(VOLUME I) O O MUSEU DA
LABORATÓRIO CRIANÇA É
É CITADO CITADO
As classes do 1º ano em 1933 241-243 Explicita que o Laboratório
– (Prefácio) (p. 241-243) exerce um papel ativo na
organização das classes
escolares.
Contribuição tipológica para 245, 247-248, 255, Pesquisa realizada no
o estudo de ergografia (p. 257 Laboratório, com o uso do
245-257) Ergógrafo Escolar, fabricado
pela empresa Zimmermann,
de Leipzig.
Formação das classes e 260 Evidencia a participação do
controle da sua Laboratório, caracterizada
homogeneidade (p. 259-260) por um controle metódico e
severo, na reforma escolar
realizada em Minas Gerais.
Das classes homogêneas (p. Esclarece que o agrupamento
261-264) de alunos em classes
homogêneas obedece ao
princípio da organização
racional do trabalho, de W. F.
Taylor.
Iniciação à orientação 266 Cita pesquisa realizada pelo
profissional (p. 265-278) Laboratório, em 1937.
Inquérito sobre o sentimento Estudo com data de 1948,
materno nas meninas de 9 a realizado no Rio de Janeiro.
17 anos (p. 279-289)
Experiência sociométrica Estudo realizado na década
(291-313) de 50, na Fazenda do
Rosário.
O Teste MM no seio da
família (p. 315-322)
Teste “As Minhas Mãos” – 335-336 Texto provavelmente
Manual (p. 323-369) publicado na década de 70.
Mostra que o Teste MM tem
sua origem no Laboratório de
Psicologia da Escola de
Aperfeiçoamento. Refere-se
ao incêndio de 1953, no
Instituto de Educação de Belo
Horizonte, que destruiu o
material coletado nestes
primeiros anos.
Atenção: o esquema de leitura do segundo volume da Coletânea das Obras Escritas de Helena
QUADRO 2
Esquema de leitura do segundo volume da Coletânea das Obras Escritas de Helena Antipoff
TEXTO PÁGINAS ONDE PÁGINAS ONDE OBSERVAÇÕES
(VOLUME II) O O MUSEU DA
LABORATÓRIO CRIANÇA É
É CITADO CITADO
A instalação do Museu da 11-12, 14 Funções do Museu: pesquisa,
Criança como recurso exposição, coleção e análise
pedagógico (p. 11-14) literária.
Cita estudos, em andamento,
de espirometria e
dinomometria.
O nosso “Museu da Criança” 18 15-18 Antipoff apresenta-se como
(p. 15-18) diretora do Laboratório e
mostra-se insatisfeita com a
participação das alunas no
Museu, criado em outubro de
1929.
A figura do educador (p. 19-
27)
Amparo ao pequeno
jornaleiro (p. 29-37)
O trabalho do menor (p. 39- 39 Antipoff apresenta-se como
41) diretora do Laboratório.
A psicotropia das crianças ao
saírem da escola primária (p.
43-)
O escotismo (p. 45-48) 46 Mostra que o estudo sobre os
“interesses e ideais das
crianças” está intimamente
ligado ao Laboratório (apesar
de ter sido considerado uma
publicação do Museu), o que
evidencia a integração entre o
Laboratório e o Museu da
Criança.
A formação física, intelectual 49, 51 O Laboratório está
e moral das crianças ao pesquisando sobre o tema
saírem da escola pública expresso no título do artigo.
primária de Belo Horizonte
(p. 49-52)
Preparo das crianças para sua
futura profissão (p. 55-59)
Ideais e interesses das 61 61, 62, 91 Este trabalho é considerado a
crianças de Belo Horizonte primeira publicação do
(p. 61- Museu da Criança, criado em
outubro de 1929. Antipoff diz
ter sido “Convidada pelo
Governo de Minas Gerais
para organizar um laboratório
de psicologia pedagógica, na
Escola de Aperfeiçoamento”.
Discurso de Paraninfa (p.
101-110)
Escolologia (p. 111-117)
(Continua)
120
QUADRO 2
Esquema de leitura do segundo volume da Coletânea das Obras Escritas de Helena Antipoff
(Continuação)
TEXTO PÁGINAS ONDE PÁGINAS ONDE OBSERVAÇÕES
(VOLUME II) O O MUSEU DA
LABORATÓRIO CRIANÇA É
É CITADO CITADO
Os direitos da criança (119-
122)
A personalidade e o caráter
da criança (123-133)
Prefácio ao livro de Ed.
Claparède: Psicologia da
criança (p. 135-144)
Assistência aos menores
desamparados, trabalhadores
da rua (147-154)
Ideais e interesses das 160 O Laboratório está
crianças de Belo Horizonte trabalhando no
no intervalo de 5 anos (p. aperfeiçoamento
155-162) metodológico dos inquéritos
coletivos.
O que vale o testemunho? (p.
163-164)
O sono da criança (p. 165-
175)
Movimento bandeirante na
educação feminina (p. 176-
177)
As mentiras nas crianças e os
meios para educar nelas a
veracidade (p. 178-187)
Relatório geral do exercício Afirma que “Complemento
da Sociedade Pestalozzi em indispensável ao Consultório
1938 (p. 189-201) representa o serviço do
Laboratório de pesquisas
biopsíquicas desta
Sociedade.” (p. 199). As
pesquisas “científicas”
realizadas pela Sociedade
Pestalozzi “se encaminham
em dois campos: de biologia
e medicina e de psicologia e
pedagogia.” (p. 200)
EDUCAR... (p. 203-206)
Eduard Claparède – In
Memoriam (p. 207-211)
Recreação infantil (p. 213-
214)
Edouard Claparède – Homem Esclarece que “A grande
e educador (p. 215-222) parte dos ensinamentos,
entretanto, Claparède
ministrava fora do laboratório
e fora das aulas regulares.”
(p. 217).
(Continua)
121
QUADRO 2
Esquema de leitura do segundo volume da Coletânea das Obras Escritas de Helena Antipoff
(Conclusão)
TEXTO PÁGINAS ONDE PÁGINAS ONDE OBSERVAÇÕES
(VOLUME II) O O MUSEU DA
LABORATÓRIO CRIANÇA É
É CITADO CITADO
O teatro da criança (p. 223-
228)
Palavras de Helena Antipoff
ao dar início a um curso para
formação de educadores (p.
229-231)
Vale a pena fazer teatrinho de
bonecos? (p. 233-235)
Teatro de bonecos – teatro de
máscaras (p. 237-241)
O teatro da criança (p. 243-
247)
Marco Paulo – Escoteiro de
“Fernão Dias” (p. 249-251)
As duas atitudes (p. 253-274)
DECORAR... (p. 275-279)
Alegrias de minha vida na
escola primária (p. 281-282)
Sei criar e educar meu filho – 286, 308 Estas fichas serão distribuídas
Ficha de observação (p. 283- a vários estabelecimentos, e
310) posteriormente “As
observações colhidas serão
submetidas a uma apuração
científica no Laboratório de
Psicologia da Escola de
Aperfeiçoamento, com o fim
de levantar padrões e normas
de desenvolvimento mental
da criança brasileira”. (p.
286)
Atenção: o esquema de leitura do terceiro volume da Coletânea das Obras Escritas de Helena
QUADRO 3
Esquema de leitura do terceiro volume da Coletânea das Obras Escritas de Helena Antipoff
TEXTO PÁGINAS ONDE PÁGINAS ONDE OBSERVAÇÕES
(VOLUME III) O O MUSEU DA
LABORATÓRIO CRIANÇA É
É CITADO CITADO
A questão dos anormais no
estrangeiro (p. 11-26)
Ortopedia mental nas classes 28 O Laboratório orienta classes
especiais (p. 27-29) para crianças “retardadas”.
A homogeneização das 33-34 As pesquisas do Laboratório
classes escolares (p. 31-35) revelaram que as idades de
alguns alunos não estavam
corretas, o que anulou muitas
investigações iniciadas em
1929.
Folha de observação para as
crianças das classes do 1º ano
(p. 37-38)
Plano para organização das 43 Cita estudo feito pelo
classes do 1º ano (p. 39-45) Laboratório, que relaciona
inteligência e meio social.
Classes especiais “D” e “E”
(p. 47-48)
O papel educativo e social
das classes especiais (p. 49-
51)
Seleção dos professores para
cada tipo de classes (p. 53-
54)
Progressos escolares de cada 56 Cita “experiência” feita pelo
tipo de classe e meios de Laboratório: aplicação de um
contorná-las (p. 55-60) teste misto de conhecimentos
escolares e de
desenvolvimento geral.
O ensino nas classes especiais
(p. 61-65)
Da ortopedia mental (p. 67-
74)
Inventário das funções
mentais (p. 75)
Origens dos exercícios de
ortopedia mental (p. 77-78)
Exercícios de ortopedia Cita o dinamômetro de Collin,
mental (p. 79-94) fabricado pela firma Boulitte,
em Paris; o espirômetro seco
de Barnes; o espirômetro
Dupont; e o espirômetro de
Mme. Hondré.
Exercício de imitação (p. 95-
102)
Observação (p. 103-106)
Observação visual (p. 107-
108)
Exercícios de atenção (p.
109-114)
(Continua)
123
QUADRO 3
Esquema de leitura do terceiro volume da Coletânea das Obras Escritas de Helena Antipoff
(Conclusão)
TEXTO PÁGINAS ONDE PÁGINAS ONDE OBSERVAÇÕES
(VOLUME III) O O MUSEU DA
LABORATÓRIO CRIANÇA É
É CITADO CITADO
Exercícios de memória (p. 116 Cita teste de memória usado
115-117) pelo Laboratório.
Exercícios de observação 125 Sugere utilizar padrões
auditiva (p. 119-127) oferecidos pelo Laboratório
para a aplicação de um teste.
Material para estudo da
experimentação natural no
trabalho (p. 129-138)
A função social da assistência 139 O Dr. Ulysses Pernambucano
às crianças excepcionais (p. orientava pesquisas
139-146) psicológicas, em Recife, bem
antes da criação do
Laboratório de Psicologia da
Escola de Aperfeiçoamento.
A educação das crianças
retardadas (p. 147-148)
Educação dos excepcionais
(p. 149-150)
Vida em núcleos familiares
(p. 151)
Trabalho (p. 153-156)
Assistência ao informal (p.
157-158)
Temas e roteiros para estudo
(p. 159)
124
FIGURA 5 – “Exposição. 929. Arte Decorativa”. Segundo Moura (2005), esta foto deve
pertencer à mesma seqüência daquelas referentes ao Laboratório de Psicologia da Escola de
Aperfeiçoamento (FIG. 2, 3 e 4), indicando que todas foram retiradas durante a Exposição de Trabalhos,
realizada em 1929.
Fonte: MEMORIAL... 2003b.