Você está na página 1de 4
198 LEDA MIRANDA HOHNE GALILEU GALILEI 1564-1642 — Pisa (Italia) Fundador da Ciéncia Moderna Obra citada: O Mensageiro dos Astros “Ha aproximadamente dez meses, chegou a meus ouvidos a noticia de que um certo belga construiu uma luneta mediante a qual os objetos visiveis, ainda que muito distantes do obser- vador, se distinguiam claramente como se estivessem prdximos; e se falava de certas experiéncias que se alcancavam com esse admiravel instrumento, acreditadas por uns e negadas por outros. Poucos dias depois um ilustre francés, Jacques Badouvére, me confirmou 0 mesmo, de Paris, por carta, 0 que foi motivo para me dedicar integralmente a investigar as razdes e a descobrir os meios através dos quais chegaria a inventar um instrumento si- milar, 0 que cheguei, pouco depois, baseando-me na doutrina da refracdo, Primeiramente preparei um tubo de chumbo em cujos extremos apliquei duas lentes: ambas planas em uma das faces, e na outra face, uma céncava e outra convexa. Ao colocar o olho na face céncava, vi os objetos bem grandes e préximos; apareciam trés vezes mais préximos e nove vezes maiores do que se veriam com o sentido natural da vista. Depois, construi outra luneta mais exata, que mostrava os objetos sessenta vezes maiores. Por ultimo, sem despender trabalho nem gastos, cheguei ao ponto de construir um instrumento tao excelente que, por seu intermé- dio, as coisas se viam quase mil vezes maiores e mais de trinta vezes mais préximas do que se fossem observadas sé com as fa- culdades naturais. De qualquer ponto de vista, seria supérfluo enumerar quais e quantas seriam as vantagens deste instrumento, tanto na terra como no mar. Sem dtivida, deixando a terra, me dediquei as especulagdes siderais e, em primeiro lugar, pude ob- servar a Lua tao perto como se distasse apenas dois didmetros da Terra. Logo observei freqiientemente as estrelas, fixas ou er- rantes, com uma satisfacao incrivel ce, ao vé-las tao abundantes, comecei a refletir sobre como medir suas distancias reciprocas, © que, ao final, cheguei a descobrir. Sobre este ultimo devo fazer uma adverténcia a quem deseje dedicar-se a esse tipo de obser- vagoes. Em primeiro lugar, € mecessdério que preparem uma lu- neta exatissima que represente os objetos claros, definidos e sem obscuridade nenhuma e os multiplique pelo menos quatrocentas AS FORMAS DO CONHECIMENTO: SOBRE A CIENCIA 199 vezes, de maneira que os objetos sejam vistos vinte vezes mai proximos. Nao sendo assim tal instrumento, sera intitil tentar ver tudo o que eu observei no firmamento e que acabei de enumerar. A fim de nos assegurarmos, sem grandes problemas, da multipli- cacao do instrumento, que se recorte dois circulos ou quadrados de papel, um dos quais seja quatrocentas vezes maior do que o outro, O que se conseguird quando o diametro do maior for vinte vezes mais largo que o diametro do menor. Fixando logo ambas superficies em uma mesma parede e observando-se A distancia, a menor com um olho colocado na luneta e a maior com o outro olho livre... 0 que comodamente pode ser feito ao mesmo tempo abrindo ambos os olhos... entéo, as duas figuras apa- recerao com a mesma magnitude, se é que a luneta multiplica os objetos de acordo com a propor¢ao desejada.” F. BACON 1561-1626 — Londres (Inglaterra) Corrente: Empirismo Obra citada: Novum Organum “XXXVIII. Os idolos e nocdes falsas que ora ocupam o intelecto humano e nele se acham implantados nao somente o obstruem a ponto de ser dificil 0 acesso A verdade, como, mesmo depois de seu portico logrado e descerrado, poderao ressurgir como obstéculo a propria instauracdo das ciéncias, a nao ser que os homens, jé precavidos contra eles, se cuidem 0 mais que possam. XXXIX. Sfo de quatro géneros os idolos que bloqueiam a mente humana. Para melhor apresenté-los, Ihes assinamos nomes, a saber: [dolos da Tribo, fdolos da Caverna, Idolos do Foro e Idolos do Teatro. XL. A formacao de nogdes e axiomas pela verdadeira in- dugio é, sem duvida, 0 remédio apropriado para afastar e re- pelir os idolos. Seré, contudo, de grande préstimo indicar no que consistem, posto que a doutrina dos fdolos tem a ver com a interpretagdo da natureza, 0 mesmo que a doutrina dos elencos sofisticos com a dialética vulgar. XLI. Os idolos da tribo estao fundados na prépria natureza humana, na prdpria tribo ou espécie humana. £ falsa a assercao 200 LEDA MIRANDA HUHNE de que os sentidos do homem sao a medida das coisas. Muito ao contrario, todas as percepcdes, tanto dos sentidos como da mente, guardam analogia com a natureza humana e ndo com o universo. O intelecto humano é semelhante a um espelho que reflete desi- gualmente os raios das coisas e, dessa forma, as distorce e corrompe. XLII. Os fdolos da caverna séo os dos homens enquanto individuos. Pois, cada um — além das aberragdes prdprias da natureza humana em geral — tem uma caverna ou uma cova que intercepta e corrompe a luz da natureza; seja devido & natureza propria e singular de cada um, seja devido 4 educag&o ou con- versa¢4o com os outros, seja pela leitura dos livros ou pela auto- tidade daqueles que se respeitam e admiram; seja pela diferenga de impressdes, segundo ocorram em Animo preocupado ec pre- disposto ou em Animo equanime e tranqiiilo, de tal forma que o espirito humano — tal como se acha disposto em cada um — 6 coisa varia, sujeita a mUltiplas perturbagdes e até certo ponto sujeita ao acaso. Por isso, bem proclamou Herdclito que os ho- mens buscam em seus pequenos mundos e nao no grande ou universal. XLIII. Ha também os idolos provenientes, de certa forma, do intercurso e da associag&o reciproca dos individuos do género humano entre si, a que chamamos de fdolos do foro, devido ao comércio e consércio entre os homens. Com efeito, os homens se associam gracas ao discurso c as palavras sao cunhadas pelo vulgo. E as palavras, impostas de maneira imprépria e inepta, bloqueiam espantosamente o intelecto. Nem as definigdes, nem as explica- gdes, com que os homens doutos se munem e se defendem, em certos dominios, restituem as coisas ao seu lugar. Ao contrdrio, as palavras forcam o intelecto e o perturbam por completo. E os homens sao, assim, arrastados a indmeras e inteis controvérsias e fantasias. XLIV. Ha, por fim, idolos que imigraram para o espirito dos homens por meio das diversas doutrinas filoséficas ¢ também pelas regras viciosas da demonstragdo. Sao os idolos do teatro: por parecer que as filosofias adotadas ou inventadas so outras tantas fabulas produzidas e representadas, que figuram mundos AS FORMAS DO CONHECIMENTO: SOBRE A CIENCIA 201 ficticios e teatrais. Nao nos referimos apenas as que ora existem ou as filosofias e seitas dos antigos. Intimeras fabulas do mesmo teor se pode mreunir e compor. Ademais, néo pensamos apenas nos sistemas filoséficos, na sua universalidade, mas também nos numerosos principios e axiomas das ciéncias que entraram em vigor, mercé da tradicdo, da credulidade e da negligéncia. Con- tudo, falaremos de forma mais ampla e precisa de cada género de fdolo, para que o intelecto humano seja acautelado.” DESCARTES 1596-1650 — La Haye (Franca) Corrente: Racionalismo Obra citada: Discurso Sobre 0 Método (PARA BEM CONDUZIR A PROPRIA RAZAO E PROCURAR A VERDADE NAS CIENCIAS) “Se este discurso parecer demasiado longo para ser lido de uma s6 vez, poder-se-4 dividi-lo em seis partes. Na primeira, encontraremos diversas consideragées relativas as ciéncias. Na segunda, as principais regras do método procurado pelo autor. Na terceira, algumas das regras da moral que tirou deste método. Na quarta, as razdes com as. quais prova a exis- téncia de Deus e da alma humana, que sao os fundamentos de sua metafisica. Na quinta, a ordem das questdes de Fisica por ele investigadas ¢, particularmente, a explicacao do movimento do coracéo e de algumas outras dificuldades que pertencem & Me- dicina e, a seguir, também a diferenga que existe entre a nossa alma e a dos animais. E, na tiltima, o que julga necessdtio para progredir na investigagao da natureza e quais as razdes que le- varam a escrever.”

Você também pode gostar