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º
CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
Antropologia
Cultural
Fernanda Veloso Lima
Flávio de Oliveira Carvalho
Fernanda Veloso Lima
Flávio de Oliveira Carvalho
Antropologia
Cultural
2013
Proibida a reprodução total ou parcial.
Os infratores serão processados na forma da lei.
EDITORA UNIMONTES
Campus Universitário Professor Darcy Ribeiro
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Ministro da Educação Coordenadora Adjunta da UAB/Unimontes
Aloizio Mercadante Oliva Betânia Maria Araújo Passos
Unidade 1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
A antropologia como ciência: surgimento, teoria, método e a especificidade do campo
antropológico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
1.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
Unidade 2 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
A antropologia e a análise das sociedades primitivas – organização social, sistemas de
parentesco, economia, poder e expansão colonial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
2.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38
Unidade 3 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
A Antropologia e o estudo das sociedades complexas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
3.2 Os métodos e técnicas da Antropologia e sua utilização nos estudos das sociedades
complexas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42
Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54
Resumo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57
Atividades de aprendizagem - AA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61
Ciências da Religião - Antropologia Cultural
Apresentação
Caro(a) acadêmico(a),
Os autores.
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Ciências da Religião - Antropologia Cultural
Unidade 1
A antropologia como ciência:
surgimento, teoria, método
e a especificidade do campo
antropológico
Fernanda Veloso Lima
Flávio de Oliveira Carvalho
1.1 Introdução
Esta primeira parte da disciplina Antropologia Cultural tem por intuito principiar o(a)
acadêmico(a) do Curso de Ciências da Religião no entendimento das problemáticas fundamen-
tais da Antropologia. É, pois, uma Unidade centrada na análise de conceitos e abordagens antro-
pológicos. Almejamos que os(as) acadêmicos(as), ao se confrontarem com o esqueleto conceitual
desta disciplina, consigam refletir sobre as singularidades da Antropologia como uma Ciência pe-
rante outras Ciências da Humanidade, compreendendo, portanto, a Antropologia como um saber
erigido sobre um alicerce histórico, formado por indivíduos que colaboraram em cada contexto
distinto, para sua fundação. Assim sendo, a formatação da Antropologia, como disciplina, se emol-
dura em um contexto no qual alguns pensadores intentavam analisar as diferenças percebidas Glossário
sob uma forma sistematizada, proporcionando uma representação e compreensão mais elabora- Antropologia: antro-
das sobre as diferenças, especialmente em sociedades com características particulares. Portanto, pos, homem; logos,
constatamos que perceber as diferenças e concebê-las como um exercício da alteridade consiste estudo (LAPLANTINE,
2000).
em uma primeira forma, um rascunho de um pensamento antropológico.
Nesse sentido, verificaremos como se cunharam as primeiras reflexões sistematizadas so-
bre o confrontamento com a diversidade, inclusive verificando as especificidades das primeiras
descrições sobre o “Outro”, o diferente, por soldados, comerciantes, viajantes, cronistas, e missio-
nários, refletindo, assim, sobre qual eram seus discursos sobre outras populações, outros povos.
Poderemos ponderar, então, como, a partir da perspectiva de pensadores, uma discussão mais
metódica a respeito da diversidade cultural inaugurou o movimento de instituição da Antropolo-
gia como Ciência. Por fim, examinaremos, nesta Unidade, as representações do conceito de cul-
tura embasadas no referencial antropológico, bem como discutiremos as conceituações de etno-
centrismo e relativismo cultural, basilares para uma compreensão da Antropologia como ciência
que transita entre a unidade e a diversidade, procurando compreender a humanidade em sua
totalidade. Não obstante, estudaremos esta unidade a partir dos temas relacionados em subuni-
dades, que se apresentam da seguinte forma:
1.1 Introdução;
1.2 Antropologia na História: os primeiros contatos com a alteridade;
1.3 Um novo contexto histórico: surgimento da antropologia como ciência, conceituação,
objeto de estudo e especificidade;
1.3.1 Antropologia e método: a imersão na cultura do outro;
1.4 A construção do conceito antropológico de cultura, o etnocentrismo e o relativismo cul-
tural;
1.4.1 Etnocentrismo;
1.4.2 Relativismo Cultural.
Agora que você já conhece a estrutura desta Unidade, leia com atenção, uma, duas, ou
quantas vezes forem necessárias para assimilação do conteúdo.
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UAB/Unimontes - 1º Período
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Ciências da Religião - Antropologia Cultural
sobre os povos da América, esse Novo Mundo em vias de “descobrimento”. É claro que não de-
Glossário
vemos esquecer que, nesse contexto, século XVI, a Europa, além de viver um intenso movimento
humanista, já contava com várias nações em condições de enviar navios para exploração de ou- Helenidade: relativo
tras terras. Também já contava com um comércio bastante avançado com o Oriente. Logo, não ao período Helênico ou
Helenismo; do grego
é de se estranhar que, do século XVI até o século XVII, vários escritos tenham sido elaborados hellenizein, falar grego,
acerca das mais variadas culturas, em distintos espaços sociais, especialmente se pensarmos a in- viver com os gregos.
tensificação da expansão mercantil, bem como movimentos culturais como o Renascimento. En- Caracterizou-se pelo
tretanto, cabe ressaltar que esse contato, essas primeiras impressões dos europeus sobre os não ideal de Alexandre,
europeus ainda continuavam seguindo a lógica do estranhamento não sistematizado, isto é, o cujo propósito foi levar
e difundir a cultura Gre-
diferente como uma aberração. Nessa direção, não é de se estranhar que as populações do Novo ga, sobretudo, aos terri-
Mundo fossem sempre colocadas na condição de bestializados. Não obstante, os depoimentos a tórios conquistados
respeito desses novos “seres”, sempre se valiam de metáforas zoológicas, evidenciando sucessões (JAPIASSÚ; MARCON-
de faltas, como exemplos os seguintes discursos sobre os povos do Novo Mundo: não acreditam DES, 2001).
em Deus, não têm alma, não possuem escrita, são imorais, comem como animais, não possuem
arte, enfim, não tem passado nem futuro (LAPLANTINE, 2000). É óbvio que devemos mencionar
que todos esses relatos foram escritos por soldados, mercadores, colonos, viajantes, entre outros,
provindos da Europa que, por um motivo ou outro, travaram contato com essa nova realidade.
▲
Figura 3: Contato entre
índios e europeus.
Fonte: Canal do educador.
Disponível em: <http://
educador.brasilescola.
com/estrategias-ensino/.
Acesso em 29 jul. 2013.
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BOX 1
DICA
Os Lusíadas
O Darwinismo consti-
tui-se em um princípio
pelos quais as espécies [...] A gente se alvoroça e, de alegria,
sofrem uma seleção Não sabe mais que olhar a causa dela.
natural, ou seja, os - «Que gente será esta?» (em si diziam)
indivíduos mais adap-
«Que costumes, que Lei, que Rei teriam?»
tados à determinada
condição ecológica [...] Comendo alegremente, perguntavam,
eliminam aqueles des- Pela Arábica língua, donde vinham,
providos dessa mesma Quem eram, de que terra, que buscavam,
condição. A origem Ou que partes do mar corrido tinham?
do termo se deu a
Os fortes Lusitanos lhe tornavam
partir da publicação
da obra “A Origem das As discretas repostas que convinham:
Espécies”, de Charles - «Os Portugueses somos do Ocidente,
Darwin. Posteriormen- Imos buscando as terras do Oriente.
te, o evolucionismo se [...]- «Somos (um dos das Ilhas lhe tornou)
apropria desse discurso
Estrangeiros na terra, Lei e nação;
para pensar o próprio
desenvolvimento da Que os próprios são aqueles que criou
humanidade. A Natura, sem Lei e sem Razão.
Nós temos a Lei certa que ensinou
O claro descendente de Abraão,
Que agora tem do mundo o senhorio;
A mãe Hebreia teve e o pai, Gentio.
Fonte: CAMÕES, Luís Vaz de. Os Lusíadas de Luís Camões. Direção Literária Dr. Álvaro Júlio da Costa Pimpão.
Disponível em <http://web.rccn.net/camoes/camoes/index.html . Acesso em 12 mai. 2013.
▲
Apenas no século XVIII, na Europa, esse
Figura 4: A
discurso, que qualifica o outro como não hu-
catequização dos
índios. mano, começa a enfraquecer. Em grande
Fonte: História Digital. Dis- parte, isso se deve aos relatos dos missioná-
ponível em:<http://www. rios jesuítas que conviviam com os nativos na
historiadigital.org/histo- América. Assim sendo, as ideias sobre os selva-
ria-do-brasil/brasil-pre-co-
lonial/povos-indigenas/ gens maus, sem moral, sem humanidade, pau-
questao-enem-2008- latinamente vão sendo substituídas por outras
-catequizacao-indigena- que concebem a existência de uma natureza
-na-america/>. Acesso em
29 jul. 2013. moral pura nesses povos. A questão, então, se- que esse discurso aproxima um pouco mais os
ria de apenas direcioná-los rumo à civilização. indígenas da condição de humanos, ainda que
De qualquer forma, o que podemos notar é considerados atrasados.
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A Arqueologia, por outro lado, é uma di- ossadas, em suma, qualquer traço de atividade DICA
visão da Antropologia Cultural, que pesquisa humana. Seu intuito é restaurar sociedades já Roberto Augusto
o homem por meio de vestígios materiais que desaparecidas, especulando sobre suas técni- DaMatta é graduado e
as culturas deixaram para trás, ao longo do cas, arte, religião, organização social, entre ou- licenciado em Histó-
tempo. Muitas vezes, esses vestígios são en- tros. Em DaMatta vamos encontrar os seguin- ria pela Universidade
contrados enterrados no solo, ou na forma de tes argumentos: Federal Fluminense
(1959 e 1962). Curso
pinturas em paredes (pinturas rupestres), ou de Especialização em
Antropologia Social do
De fato o arqueólogo está interessado em pedaços de cerâmica, cemitérios mi- Museu Nacional (1960);
lenares, cacos de pedra e restos de animais, enquanto tais resíduos permitem M.A e Ph.D em, respec-
deduzir modos concretos de relações sociais ali existentes. A Arqueologia, as- tivamente, 1969 e 1971,
sim, é uma Antropologia Social, só que debruçada em cima do estudo de um pelo Peabody Museum
sistema de ação social já desaparecido. (DA MATTA, 2000, p.29) da Universidade de
Harvard. Foi Chefe
Dessa maneira, observamos que a Ar- pologia Arqueológica, cujos estudos se con- do Departamento de
queologia divide-se, ainda, em: a) Arqueolo- centram nos “primórdios da cultura, relativa Antropologia do Museu
Nacional e Coordena-
gia Clássica, que “tenta reconstruir as antigas às populações extintas”, a saber, “culturas do dor do seu Programa
civilizações letradas”, como exemplo, Egito, Paleolítico, Mesolítico e Neolítico” (MARCONI; de Pós-Graduação em
Grécia, Mesopotâmia, entre outras; b) Antro- PRESOTTO, 2006, p.05). Antropologia Social (de
1972 a 1976). É Profes-
sor Emérito da Univer-
sidade de Notre Dame,
USA, onde ocupou a
◄ Figura 10: Processo de Cátedra Rev. Edmund
Hominização. Joyce, c.s.c., de Antro-
Fonte: Curte a História. pologia de 1987 a 2004.
Disponível em: <http:// Atualmente é Professor
curteahistoria7.blogspot. Titular da Pontifícia
com.br/2010/09/processo-
Universidade Católica
-de-hominizacao.html>.
Acesso em 10 mai. 2013. do Rio de Janeiro. Reali-
zou pesquisas Etnolo-
gicas entre os índios
Gaviões e Apinayé. Foi
pioneiro nos estudos
de rituais e festivais em
sociedades industriais,
tendo investigado o
Brasil como sociedade
e sistema cultural por
meio do carnaval, do
futebol, da música, da
Como descrito por Marconi e Presotto é “fornecer uma contribuição à teoria antropo- comida, da cidadania,
(2006, p.05), a etnografia (éthos, povo; gra- lógica”. A obra, segundo o autor, não foi cogi- da mulher, da morte,
phein, escrever) “é um dos ramos da ciência da tada como uma descrição etnográfica, pois do jogo do bicho e das
cultura que se preocupa com a descrição das “[...] a maioria dos fatos a que me refiro foram categorias de tempo e
espaço.
sociedades humanas”. Porém, para o presen- publicados anteriormente. Não se deve, pois,
te momento, caro(a) acadêmico(a) ficaremos procurar qualquer originalidade nos fatos de
apenas com esse conceito, pois na subunida- que trato, mas na interpretação desses mes-
de 1.3.1 estudaremos mais detidamente sobre mos fatos” (LEACH, 1996, p. 65).
esse método e seus principais autores. Contu-
do, cabe ressaltar que essa é uma divisão da ◄ Figura 11: “Tribespeaple
Antropologia Cultural que possibilitou o cará- of the Kachin”.
ter relativista da Antropologia, bem como sua População da tribo
Kachin, Brimânia.
elevação à Ciência. Marconi e Presotto (2006, Leach, 1940-1949.
p.05) conceituam que a Etnologia (éthos, Fonte: Fields of study: Sir
povo; logos, estudo) “é outro ramo da ciência Edmund Leach, the social
da cultura, cujos pesquisadores utilizam os anthropologist Disponível
em: <http://www.kings.
dados coletados e oferecidos pelos etnógra- cam.ac.uk/ archive-cen-
fos”. Como exemplo, em “Sistemas Políticos da tre/archive-month/febru-
Alta Birmânia: um estudo da estrutura social ary-2013.html. Acesso em
09 mai. 2013.
Kachin” de Edmund Ronald Leach, publicado
em 1964, vamos encontrar o esclarecimento
de que o livro versa sobre a população kchin Entre os ramos da Antropologia Cultural,
e chan do nordeste da Birmânia, cujo objetivo a Antropologia linguística estuda especifica-
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dor, uma disposição para questionar certezas tes que todo pesquisador deve observar antes
Atividade
até então cristalizadas por sua cultura. Imergir de arremessar-se ao trabalho de campo. São
Leia o texto a seguir e na cultura do outro requer uma entrega física, elas: a) o pesquisador deve ter objetivos ge-
depois comente e es- dado o deslocamento, e também uma íntegra nuinamente científicos e deve conhecer bem
creva sobre a diferença
entre o trabalho de intelectual, tendo em vista os esforços que as teorias antropológicas; b) assegurar boas
campo e os relatos de devem ser empreendidos para uma interpre- condições de pesquisa: viver entre os nativos e
missionários, soldados tação que se tencione minimamente neutra aprender a língua deles; c) aplicar métodos es-
e viajantes. Vá até o e imparcial. Nesse sentido, Malinowski (1976), peciais de coleta (informantes), manipulação e
fórum de discussão e deixa três diretrizes metodológicas importan- registro de evidências (diário de campo).
deixe seu comentário.
BOX 2
Os Argonautas do Pacífico Ocidental
Fonte: MALINOWSKI, Bronislaw. Argonautas do Pacífico Ocidental. São Paulo: Abril Cultural, 1980, p. 43 (Os
Pensadores).
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Ciências da Religião - Antropologia Cultural
natureza humana e sua enorme diversidade grande medida, à ação uniforme de causas
cultural. Ao travar contato com essa gama de uniformes; de outro, seus vários graus podem
diferentes comportamentos, começamos a ser vistos como estágios de desenvolvimento
questionar hábitos que antes considerávamos ou evolução [...] (LARAIA, 2005). Assim, pode-
naturais e a percebê-los como construções de mos dizer que, desde o século XIX, a Antropo-
uma cultura específica, a nossa. logia construiu e se apropriou do conceito de
Então um dos conceitos mais básicos da cultura. Também percebemos que desde sua
teoria antropológica diz respeito ao concei- constituição até os dias atuais um vigoroso
to de cultura. É claro que antes devemos es- deslocamento conceitual perpassa a comu-
clarecer que a concepção de cultura adotada nidade antropológica, que ainda se descobre
pela Antropologia não tem o mesmo sentido interpretando e procurando um melhor en-
que a utilizada pelas pessoas comuns em seu tendimento sobre esse conceito. À vista disso,
cotidiano, no qual cultura está relacionada a como nos demonstra Laraia (2005), continuam
apresentações artísticas, grau de conhecimen- existindo agudas discordâncias entre as mais
to, erudição acumulada, dentre outros, pois variadas conceituações de cultura. Kroeber e
isso nos dirige à perspectiva de que algumas Kluckon, dois antropólogos, compilaram nada
pessoas seriam detentoras de cultura e outras mais nada menos que impressionantes 164
não. A grosso modo, podemos dizer que em definições distintas de cultura.
Antropologia a cultura está relacionada a for-
mas de agir, pensar e sentir. Desse modo, é
algo que se aplica a todas as pessoas e socie-
dades, sendo impensável, para a perspectiva
antropológica, dizer que existem indivíduos
sem cultura.
O primeiro autor a formular o conceito de
cultura foi Edward Tylor, em 1971, quando pu- ◄ Figura 13: Cultura:
blicou o livro Primitive Culture. Em sua obra, o um conceito
autor sintetiza o termo germânico Kultur (liga- antropológico. Roque
do à espiritualidade de uma sociedade) e o ter- de Barros Laraia.
Fonte: Google Search.
mo francês civilization (que define realizações Disponível para down-
materiais) com o intuito de compreender as re- load em: < https://www.
lações estabelecidas em uma dada sociedade google.com.br/search?q=
cultura+um+conceito+a
a partir da expressão Culture (LARAIA, 2005). ntropol%C3%B3gico&ie>.
A principal contribuição do desenvolvi- Acesso em 29 jul. 2013.
mento de um conceito de cultura, à luz dos
ensinamentos de Tylor, foi evidenciar o cará-
ter de aprendizado da cultura em detrimento
às ideias de natureza humana, de inato. As-
sim, Tylor (1958, p. 01) define que cultura “[...] é
este todo complexo que inclui conhecimento,
crença, arte, leis, moral, costumes, e quaisquer
outras capacidades e hábitos adquiridos pelo
homem enquanto membro da sociedade”.
Cultura, então, passa a ser vista como tudo Todavia, para nossos propósitos, nos cen-
que aprendemos como elementos de uma traremos em pensar a cultura como sendo
certa coletividade, mediante processos de so- um sistema organizado, afugentando assim a
cialização. Cabe ressaltar, contudo, que a defi- perspectiva da cultura como um amontoado
nição de Tylor (1958), partiu de uma premissa de leis, valores, crenças, moral, sem nenhuma
evolucionista, portanto continua no interior de ligação entre si. Isso quer dizer: refletir o “todo
uma perspectiva altamente hierarquizada, não complexo” de Tylor enxergando-o como uma
pluralista e não relativista, visto que o autor totalidade interligada, dotada de coerência,
enxergava todas as culturas como estágios de organização e lógica próprias. A partir desse
evolução de uma única cultura. horizonte, a cultura pode ser pensada como
A situação da cultura entre as várias so- um conjunto de regras e códigos que direcio-
ciedades da humanidade, na medida em que nam as ações coletivas das populações, bem
possa ser investigada segundo princípios ge- como lhes fornecem significados para inter-
rais, é um tema adequado para o estudo de pretarem suas realidades. Por fim, compre-
leis do pensamento e da ação humana. De endendo a cultura sob esse prisma, torna-se
um lado, a uniformidade que tão amplamente possível notar que toda cultura possui lógica e
permeia a civilização pode ser atribuída, em organização próprias, superando assim a con-
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UAB/Unimontes - 1º Período
jectura de que as culturas diferentes da nossa de cultura, pois materializam por meio de ati-
DICA
são monstruosidades bizarras e irracionais. tudes em relação às formas de pensar, sentir e
“Para os evolucionistas Veremos agora dois conceitos que são fun- agir do outro. Tais materializações serão, por-
do século XIX a evo-
damentais para a teoria antropológica, e que tanto, pensadas a partir do conceito de Etno-
lução desenvolvia-se
através de uma linha estão intimamente relacionados ao conceito centrismo e o conceito de Relativismo Cultural.
única; a evolução teria
raízes em uma unidade
psíquica através da 1.4.1 Etnocentrismo
qual todos os grupos
humanos teriam o mes-
mo potencial de desen- Como vimos, o homem sempre travou contatos com a alteridade ao longo de sua história.
volvimento, embora Vimos, também, que em grande parte das vezes o outro era visto como uma aberração. É a essa
alguns estivessem mais
tendência de classificar o outro a partir de nossos próprios valores que os antropólogos chamam
adiantados que outros.
Esta abordagem unili- de Etnocentrismo. De uma forma mais sistematizada, de acordo com Herskovits (1963), o etno-
near considerava que centrismo consiste em ser “[...] o ponto de vista segundo o qual o próprio modo de vida de al-
cada sociedade seguiria guém é preferível a todos os outros”. Nas palavras de Everardo Rocha:
o seu ouso histórico
através de três estágios: Etnocentrismo é uma visão de mundo onde o nosso próprio grupo é tomado
selvageria, barbaris- como centro de tudo, e todos os outros são pensados e sentidos através dos
mo e civilização. Em nossos valores, nossos modelos, nossas definições do que é existência. No pla-
oposição a essa teoria, no intelectual, pode ser visto como a dificuldade de pensarmos a diferença, no
e a partir de Franz Boas, plano efetivo, como sentimento de estranheza, medo, hostilidade, etc. Pergun-
surgiu a ideia de que tar sobre o quê é etnocentrismo é, pois, indagar sobre um fenômeno onde se
cada grupo humano misturam tanto elementos intelectuais e racionais quanto elementos emocio-
desenvolve-se através nais e afetivos. No etnocentrismo residem dois planos do espírito humano: sen-
de caminho próprio, timento e pensamento vão compondo um fenômeno não apenas fortemente
que não pode ser sim- arraigado na história das sociedades como também facilmente encontráveis
plificado na estrutura no dia-a-dia das nossas vidas. (EVERARDO ROCHA,1999, p. 7).
tríplice dos estágios.
Esta possibilidade de
desenvolvimento múlti- Portanto, caro(a) acadêmico(a), você é ca- cionamos. Para ajudar, pense: qual é o melhor
plo constitui o objeto paz de concluir que o etnocentrismo é uma time de futebol do Brasil? Pensou? Baseado em
da abordagem multili- concepção que nos leva a colocar nossos valo- que você escolheu esse time? Você já defendeu
near”. (LARAIA, Roque res e características culturais como modelo de algum time e não percebeu que por algum
de Barros. Cultura: um
normalidade, como sendo natural. Além disso, motivo particular você o fez? Se sim, o etno-
conceito antropológico.
Rio de Janeiro: Zahar, o etnocentrismo é um sentimento corriqueiro centrismo é parte integrante do ser humano e
2005., p. 59). entre todos os seres humanos, uma vez que é trata-se do primeiro encontro com o diferente;
resultado da socialização de um indivíduo no muitas vezes nem percebemos que estamos
interior de uma cultura específica. Em certo praticando. Porém, somente a forma hostil,
sentido, o etnocentrismo tem valores positivos, desrespeitosa com a qual os indivíduos mani-
PARA SABER MAIS uma vez que contribui para a solidificação dos festam esse encontro é que vai gerar as violên-
Para ampliar os conhe- laços sociais que unem o grupo, pois valoriza cias físicas e simbólicas. Caso você não tenha
cimentos sobre o tema suas características compartilhadas em oposi- escolhido um time por preferência, discuta
abordado, assista ao ção a outras coletividades. Contudo, cabe sa- com os colegas e tente observar quais as prá-
filme “Mister Johnson: lientar que quando o etnocentrismo justifica ticas que vocês realizam e que antes não con-
no coração da África”.
Direção: Bruce Beres-
ações para deteriorar ou aviltar outras culturas sideravam como sendo uma característica do
ford. EUA, Baseado no ele passa a ser uma vicissitude. Temos vários etnocentrismo. A própria Antropologia nasce
romance de Joyce Cary. exemplos disso na história, a colonização eu- etnocêntrica e, ao perceber que essa não era a
Na trama, Johnson ropeia na América, o apharteid na África do melhor forma de lidar com a diversidade, essa
apresenta-se como Sul, o tratamento dispensado pelos nazistas às Ciência busca, paulatinamente, compreender
uma pessoa negra que
assimila as normas da
pessoas não arianas, para citar apenas alguns. o outro em sua dimensão de riqueza, aspecto
cultura branca e acaba Agora que você sabe o que é etnocentrismo, esse que estudaremos a partir de agora. E en-
agindo de maneira et- reflita sobre alguns exemplos que não men- tão, vamos continuar as nossas reflexões?
nocêntrica em relação à
sua própria cultura.
1.4.2 Relativismo cultural
Discutimos que a avaliação que fazemos é a partir de uma ampliação do conhecimento
de culturas distintas da nossa são elabora- sobre a existência de padrões de comporta-
das a partir de nossa experiência, ou seja, ela mentos diferentes que tem feito com que os
é informada por nossa própria lógica cultural. homens reflitam um pouco mais sobre a na-
Lembra da pergunta que fizemos agora a pou- turalização desses mesmos comportamentos.
co? Qual o melhor time de futebol? Contudo, Isso vem contribuindo para que um novo po-
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Ciências da Religião - Antropologia Cultural
sicionamento a respeito das diferenças, e que cultural é Salhins (2004), quando pondera
procura reconhecer suas especificidades como que a própria prática antropológica se torna-
legítimas, façam parte permanente da relação ria infrutífera sem a postura relativista. Dito DICA
entre o “grupo do eu” e o “grupo do outro”. de outra forma, esse autor coloca que a com- A antropóloga Rita
Assim sendo, o Relativismo Cultural pode ser preensão genuína do outro perpassa por uma Laura Segato em seus
considerado como ideologia que, ao reco- atitude de respeito e uma busca para elaborar estudos sobre direitos
nhecer os padrões fixados em cada socieda- um mínimo de imparcialidade e neutralidade, humanos aponta que
de para dirigir sua própria existência, sustenta pois apenas nos despindo de nossos próprios existe um conflito entre
a ética a moral e a lei
que cada conjunto de costumes possui legi- valores é que conseguiremos, de certo modo, para a compreensão
timidade e reforça a necessidade da tolerân- estar no lugar do outro. Esse ponto é essencial, das populações ditas
cia perante organizações diferentes da nossa pois, como podemos perceber, o relativismo primitivas. Isso porque,
(HERSKOVITS, 1963). para esse pensador não se constitui apenas segundo a referida
Quem também tece considerações in- em uma postura, mas em um método do fazer autora, os direitos uni-
versais tomam como
teressantes sobre essa noção de relativismo antropológico. Segundo Salhins: pressupostos a relação
da dignidade da pessoa
O relativismo cultural é, antes de mais nada e sobretudo, um procedimento an- humana segundo
tropológico interpretativo – ou seja, metodológico. Ele não consiste no argu- preceitos ocidentais.
mento moral de que qualquer cultura ou costume é tão bom quanto qualquer Diante disso, povos
outro, se não melhor. O relativismo é simples prescrição de que, para que pos- que possuem costumes
sam tornar-se inteligíveis, as práticas e ideais de outras pessoas devem ser “res- diferentes acabam
situadas em seus contextos históricos, e compreendidas como valores posicio- sendo acometidos a
nais no campo de suas próprias relações culturais, antes de serem submetidas a interpretações etno-
juízos morais e categóricos de nossa própria lavra”. A relatividade é a suspensão cêntricas. Não obstante,
provisória dos próprios juízos de modo a situar as práticas em pauta na ordem Segato (2006) aponta
cultural e histórica que as tornou possíveis. Afora isso, não se trata de forma al- o relativismo cultural
guma de uma questão de advocacia [grifos nossos]. (SALHINS, 2004, p. 59). como uma forma de
mediação do conflito
Independente de pensar o relativismo Pensando nisso, estudaremos, a partir de entre ética, moral e lei
como uma atitude ou mesmo como método, agora, as sociedades que outrora foram consi- (SEGATO, 2006).
podemos notar que se constitui em uma pos- deradas primitivas com o intuito de analisar os
tura diferente do etnocentrismo, quase con- conceitos basilares da Antropologia, para que
trária. Essa postura configura-se na busca por você consiga compreender, de maneira crítica,
tentar compreender que cada cultura possui as diferenças sociais e culturais que compõem
suas singularidades e que elas são derivadas a humanidade e, também, entender as diversi-
de elementos sócio-históricos complexos que dades étnicas e culturais. Além disso, objetiva-
influenciaram e influenciam a identidade de mos localizá-lo na problemática capital da An-
seus integrantes. Nesse sentido, torna-se im- tropologia como Ciência do outro, ou ainda,
pensável a existência de culturas superiores e Ciência das diferenças. Aspectos esses que são
inferiores, pois cada uma delas tem seus cri- de suma importância para a sua formação em
térios e conceitos que estruturam valores, re- Ciência da Religião. Embora você tenha consci-
gras, etc. Quer dizer, cada cultura sabe o por- ência de que essa diversidade não é primitiva
quê valoriza sua organização, seu modo de nos moldes que o evolucionismo tratou, ainda
vida. Isso implica no fato de que, para compre- assim usaremos o termo, pois a bibliografia
endermos realmente uma cultura, precisamos consultada traz essa nomenclatura. Trata-se,
reconhecer e respeitar a existência do outro portanto, de um mecanismo de distinção uti-
como sendo diferente e não como uma varian- lizado pelos autores para analisar uma cultura
te inferior do eu. Convém, ainda, acrescentar que não a europeia, estadounidense e tantas
que isso significa enxergar que a cultura da outras sociedades capitalistas. Daí a perma-
qual somos fruto é apenas uma possibilidade nência do uso do termo, apesar de alguns au-
de organização social, meramente mais uma tores preferirem a seguinte grafia: “sociedades
entre várias. pré-capitalistas”.
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26
Ciências da Religião - Antropologia Cultural
UNIDADE 2
A antropologia e a análise
das sociedades primitivas –
organização social, sistemas de
parentesco, economia, poder e
expansão colonial
Fernanda Veloso Lima
Flávio de Oliveira Carvalho
2.1 Introdução
Estudamos na Unidade 1 que o homem, no interior da Antropologia Geral; e, também,
desde épocas remotas, alimenta uma curio- discorremos sobre a especificidade de seus
sidade sobre si mesmo e suas diversas práti- métodos, que procuram além de conviver com
cas. Basta relembrarmos discussões de auto- o nativo de forma duradoura, dar-lhe voz. Isto
res como Laplantine (2000), DaMatta (1987) e é, analisar e interpretar a cultura do nativo sob
Maybury-Lewis (2002) para rapidamente nos o ponto de vista do próprio nativo.
convencermos de que o homem sempre se Nessa direção, trataremos, nesta segunda
interrogou sobre si mesmo. Percebemos, além unidade, quais foram as relações da Antropo-
disso, que esses contatos com a alteridade (e logia com seu primeiro objeto: as sociedades
os discursos elaborados sobre ela) aumen- primitivas ou selvagens. Como se deram essas
taram consideravelmente com a expansão interpretações, que sentidos de organização
marítima principiada no século XVI e a conse- foram captados? Posto isso, abordaremos al-
quente descoberta de novos mundos. Cons- gumas contribuições específicas dessa Ciência
tatamos, também, que ainda que possamos na interpretação das sociedades primitivas no
considerar a Antropologia como sendo fruto que diz respeito às suas crenças, seus valores,
dessa curiosidade do homem sobre a diferen- normas, regras, enfim, sobre a organização
ça, falar da constituição de uma Ciência antro- social da sociedade primitiva, bem como ela
pológica é pensar em uma época muito mais adquire sentido. Para tanto, o nosso primeiro
recente, que engloba o final do século XVIII e intuito é definir dentro de uma perspectiva
o século XIX. antropológica quais são as características, os
Concordando com esse raciocínio, discu- traços de uma sociedade dita selvagem. Dito
timos como a Antropologia se institui como de outra forma, analisaremos quais foram (e
Ciência e como ela adquire identidade ao de- são) os critérios usados para classificar uma so-
finir seu objeto de estudo: as sociedades ditas ciedade como sendo primitiva, selvagem, ou
primitivas. E, posteriormente, percebemos o ainda como se diz correntemente em antropo-
paulatino desaparecimento desse objeto; a logia, uma sociedade simples.
maneira com a qual a Antropologia refluiu para Posteriormente, estudaremos como a An-
dentro de sua própria cultura e debateu sua tropologia compreende as relações que os nati-
singularidade em termos de método, ou seja, vos estabelecem entre si em diversas esferas da
o olhar que lançava sobre seu objeto e agora vida social. Assim sendo, examinaremos como
o homem em sua totalidade. Por fim, pondera- as relações de parentesco formam percebidas
mos sobre as ramificações da Antropologia; so- pelos antropólogos; quais lógicas estão subja-
bre a especificidade da Antropologia Cultural centes às classificações das linhagens de des-
27
UAB/Unimontes - 1º Período
cendência; como os nativos compreendem suas De posse dos temas que abordaremos na
obrigatoriedades parentais e em que medida se Unidade 2, apresentamos em seguida os títu-
PARA SABER MAIS sujeitam a elas. Observaremos, também, quais los das subunidades:
são as racionalidades que conferem significa- 2.1 Introdução;
Lévi-Strauss (1997), em
ção às trocas econômicas; como os nativos con- 2.2 Conceituando as sociedades primitivas;
seu livro “O Pensa-
mento Selvagem”, cebem o intercâmbio de bens, a que preceitos 2.3 Considerações sobre os sistemas de
publicado em 1962, sociais as trocas estão atreladas; enfim, qual é parentesco;
critica veementemente a concepção de comércio que permeia suas vi- 2.4 As trocas econômicas;
a nomenclatura de “sel- das. Por último, traçaremos um panorama das 2.5 Expansão colonial e suas consequên-
vagem” atribuída à po-
consequências da expansão colonial européia, cias para os povos não ocidentais.
pulação não européia,
conforme discutiremos analisando-a, especialmente, sob as luzes de Agora que já conhece as divisões desta
nesta Unidade. Por- dois conceitos já tratados aqui: o etnocentris- Unidade, você está pronto para uma nova ca-
tanto, para aprofundar mo, que nesse contexto podemos chamar de minhada intelectual no campo da Antropolo-
sobre essa temática, eurocentrismo, e o relativismo cultural. gia? Então vamos nessa!
sugerimos a leitura des-
ta obra de Lévi-Strauss.
(LÉVI-STRAUSS, Claude.
primitivas
SP: Papirus, 1997.)
28
Ciências da Religião - Antropologia Cultural
sentimento do soberano; 4) todas as pessoas e grupos do território são como PARA SABER MAIS
tal – em virtude da residência no domínio – súditos do soberano, de sua jurisdi-
ção e coerção. (SAHLINS,1983, p. 16): Para conhecer um
pouco mais sobre a
perspectiva de Pierre
Sendo assim, a dicotomia entre guerra e Diante do exposto, cabe ressaltar a im- Clastres sobre paz e
paz seria insuficiente para distinguir socieda- portância de um dos maiores pesquisadores guerra, recomendamos
des simples e complexas, uma vez que todo que contribuiu para romper com a ideia de a leitura do artigo “A
o sistema de parentesco ou as regras de tro- etapas de evolução, ou, ainda, que as socieda- sociedade contra o
Estado”, disponível em:
cas econômicas repousam em uma complexa des ditas primitivas consistem em etapas an-
https://we.riseup.net/
estrutura de normas e regras que contribuem teriores da sociedade européia, a saber, Franz assets/71282/clastres-
para coibir o conflito entre as sociedades pri- Boas. Você lembra das discussões que proferi- -a-sociedade-contra-o-
mitivas. Lienhardt (1965) utiliza-se da mesma mos na Unidade 1? Sobre o desenvolvimento -estado.pdf>.
argumentação quando explica que as labirín- do conceito de cultura? Que para refletir sobre
ticas estruturas de parentesco e de obrigações o outro se fez necessário romper com ideia de
sociais atendem às mais diversas funções e estágios de evolução? Então, vamos repensar
têm por finalidade a manutenção da convi- um pouco mais sobre esse aspecto para rati-
vência pacífica e organizada entre as socieda- ficar o que acabamos de estudar sobre o pen-
des simples. Nesse sentido, como afirma Lévi- samento de Sahlins (1983), Lienhardt (1965) e
-Strauss (1967, p. 122) “Um povo primitivo não Lévi-Strauss (1967) acerca das sociedades sim-
é um povo ultrapassado ou atrasado; num ou ples e complexas.
noutro domínio pode demonstrar um espíri-
to de invenção e realização que deixa muito
aquém os êxitos dos civilizados”.
É claro que a ideia de reduzir a diversida-
◄ Figura 16: Franz Boas
de das culturas humanas às cópias atrasadas
em campo com trajes
da civilização ocidental se choca com uma esquimó.
dificuldade: todas as sociedades possuem his- Fonte: Das Boas-
tória. E, para admitir que cada uma delas seja -Projekt. Disponível em:
uma etapa do desenvolvimento de outras, te- <http://www.franz-
-boas.de/content/index.
ríamos que consentir que enquanto em algu- php?n=7&c=71>. Acesso
mas sociedades muitas coisas aconteciam, em em 29 jul. 2013.
outras nada ocorria. Em geral, com exceção de
algumas sociedades (como as da América), to-
das as sociedades possuem uma história que
é basicamente da mesma grandeza. Porém,
como nos lembra Lévi-Strauss (1967, p. 123); “A
história desses povos nos é totalmente desco-
nhecida e, devido à ausência ou pobreza de
tradições orais e vestígios arqueológicos, nun-
ca será atingida: não poderíamos daí concluir
sua inexistência”.
Glossário
Difusionismo: pers-
pectiva teórica que ver-
sa sobre as diferenças
O alemão naturalizado americano, Franz das sociedades a partir
Boas, pensou a cultura como um emaranhado da ideia de mudança e
de relações, sendo que os indivíduos e grupos progresso segundo a
apropriação de traços
criariam para essas relações soluções, media- de uma cultura pela
ções, ou formas de convivência particulares. outra. Esses traços são
Segundo esse antropólogo culturalista, estu- aperfeiçoados e trans-
dar uma cultura é perceber a sua totalidade e feridos pela cultura
considerar as maneiras com as quais cada uma que o adquiriu, daí a
ideia de difusão (AIRES,
delas lida com o seu próprio desenvolvimento. 2003).
Antes mesmo de Malinowski ou Lévi-Strauss,
Franz Boas instituiu as primeiras observações
▲ diretas com as sociedades ditas primitivas,
Figura 15: O Antropólogo Claude Lévi-Strauss. quando estabeleceu, por um ano, contato ín-
Fonte: Enciclopédia Britannica. Disponível em:<http:// timo com os esquimós, os Inuit, da Ilha de Ba-
www.britannica.com/EBchecked/media/141902/Claude- ffin. Tal experiência possibilitou ao antropólo-
-Levi-Strauss-2001>. Acesso em 29 jul. 2013.
29
UAB/Unimontes - 1º Período
go um interesse sobre a Geografia Cultural e num conjunto de ideias bem arrumadas e aca-
DICA o direcionou para a compreensão do papel da badas” (EVERARDO ROCHA, 1988, 17).
tradição social e suas interfaces com os com- Agora você pode concluir que não so-
Clifford Geertz, em sua
obra “A Interpretação
portamentos humanos. Em outras palavras, mente o pensamento de Franz Boas contri-
das Culturas”, descre- como a cultura pode ser determinada a partir buiu, sobremaneira, para a mudança no pa-
ve a importância do de uma tradição cultural (LAPLANTINE, 2000). radigma acerca dos estudos das sociedades
desenvolvimento de As reflexões de Franz Boas trouxeram simples e complexas? Bem como a maneira
cultura para a compre- à baila um questionamento crítico sobre os com a qual os antropólogos engendraram
ensão de que o homem
também é diverso.
métodos difusionistas e evolucionistas, pois seus estudos rumo ao relativismo cultural?
Assim, como Franz pensou as culturas humanas como diversas Então, foram esses esforços que acabamos
Boas, Geertz passou a e plurais. Logo, a difusão não seria suficiente de estudar que possibilitaram à Antropologia
interpretar a cultura para pensar tal diversidade. Além disso, su- uma compreensão sobre que tipo de compa-
em uma perspectiva de geriu que a comparação entre as culturas so- ração poderá ser feita em suas pesquisas, bem
totalidade, refutando,
portanto, a ideia de
mente poderia ser realizada entre sociedades como interpretar as diversidades segundo o
progresso e evolução que possuíssem as mesmas leis, isto é, estudar que cada cultura valoriza e concebe. O intuito
do homem segundo o sociedades que possuíssem o mesmo concei- aqui não foi o de negar que existem diferentes
processo de hominiza- to de parentesco ou economia, por exemplo. graus de desenvolvimento tecnológico entre
ção (GEERTZ, Clifford. Assim, Franz Boas inaugurou duas tarefas para diferentes culturas e nem dirimir o fato de que
A Interpretação das
Culturas. Rio de Janeiro:
Antropologia: a) reconstruir “a história de po- algumas sociedades alcançam uma complexi-
Guanabara, 1989). vos ou regiões particulares”; b) comparar “a dade e diversidade social maior que outras.
vida social de diferentes povos, cujo desenvol- Como demonstrou Lévi-Strauss (1967),
vimento segue as mesmas leis” (LAPLANTIE, poderíamos distinguir duas histórias sociais:
2000, p.35). uma progressiva que acumula suas aquisições
Desse modo, a “História da Humanidade” somando-as, e outra, talvez igualmente inven-
perdeu o “H” maiúsculo e passou a ser estuda- tiva, mas que não teria a característica cumu-
da com “h” minúsculo. Consequentemente, o lativa. Contudo, isso não significa que as so-
conceito de “homem” perdeu a característica ciedades não cumulativas (digamos, simples)
PARA SABER MAIS
de universal, ou seja, falamos, portanto, em e as sociedades cumulativas (digamos, com-
Para conhecer sobre “homem” com “h” minúsculo devido à influên- plexas) constituam um só caminho do desen-
o estruturalismo de
Lévi-Strauss, indicamos
cia do impacto do conceito de cultura sobre o volvimento humano, no qual a primeira seja
a leitura do artigo “O conceito de homem. Outro argumento utiliza- a infância da segunda. Portanto, ainda que
estruturalismo de Lévi- do por Franz Boas para os estudos das culturas aceitemos, em diversos níveis, que as socieda-
-Strauss: significação do consistiu na relação que o autor fez com diver- des primitivas possam ser consideradas mais
estrutural inconscien- sas áreas do conhecimento. Assim, estudar as “simples” em relação às sociedades modernas
te”, escrito por Acílio E.
Rocha. O trabalho está
culturas, para o antropólogo, era pensar ora a (complexas), partiremos do princípio de que
disponível em: http:// língua que determinada sociedade falava; ora sendo múltiplas as culturas dos seres huma-
www.repositorium. a personalidade dos indivíduos; ora a relação nos, são múltiplos, também, os caminhos que
sdum.uminho.pt/bits- que mantinham com o ambiente no qual vi- cada povo resolve trilhar no curso de seu de-
tream/1822/8719/1/ viam; entre outros aspectos da totalidade da senvolvimento.
Estr.L.S.pdf.
cultura em estudo. Não obstante, seus discí- Estudamos a importância da substituição
pulos sofreram forte influência no fazer etno- do termo cultura (no singular) por culturas (no
gráfico. Como exemplo Gilberto Freyre e Mar- plural), sendo que a partir desse pressuposto
gareth Meed, só para citar alguns, e fundação foi possível a construção de uma nova ideia
de escolas como: Ambiente e Cultura; Persona- acerca da diversidade cultural. Lembra que
GLOSSÁRIO lidade e Cultura. Franz Boas foi quem inaugurou a escola cul-
Endogâmico: relativo à
Apesar de uma ampla discussão acer- turalista e proporcionou uma ampla discussão
endogamia; casamento ca das categorias que permeiam as culturas, sobre as diversas categorias que poderiam ser
entre pessoas que per- Franz Boas, em suas obras, não fixa nitidamen- incluídas no conceito de cultura? Assim sen-
tencem à mesma tribo. te um conceito para a cultura como fez Tylor, do, nas próximas subunidades examinaremos
Exogâmico: relativo à por exemplo. O pensamento de Franz Boas como a antropologia discutiu alguns dos sig-
exogamia; casamento
entre pessoas que
voltou-se mais para um levantamento de hi- nificados que permeiam a cultura dos diversos
pertencem a tribos póteses novas do que “torná-las sistematica- grupamentos humanos, especialmente o que
diferentes. mente formuladas”. “Era um homem de deixar os membros desses grupamentos dizem a res-
pistas férteis, instigante, inquieto, com interes- peito das relações de parentesco, e as modali-
ses demasiadamente múltiplos para se conter dades de trocas e intercâmbios econômicos.
30
Ciências da Religião - Antropologia Cultural
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UAB/Unimontes - 1º Período
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Ciências da Religião - Antropologia Cultural
portanto, o grupo A deveria trocar suas mu- recebê-las do grupo C, enquanto o grupo B
lheres com o grupo B. Quando o número de poderia enviar mulheres ao grupo C e assim
grupos aumenta, as regras tendem a ficar mais sucessivamente. É claro que aqui estamos ci-
complexas. Nesse caso, o grupo A pode ceder tando apenas um simplificado exemplo das
mulheres ao grupo B, mas somente poderia possibilidades das relações de parentesco.
Atividade
Assista ao filme “Mes-
sias do Mal”, baseado
em fatos reais de uma
comunidade cujo líder
(Roch Thérault) man-
tém relações poligâ-
micas de matrimônio
e, portanto, foge aos
padrões estabelecidos
nos Estados Unidos da
América. Na trama, e na
vida real, Roch Thérault
pratica rituais para rati-
Lienhardt (1965), ponderando sobre a Nesta subunidade, discutimos de forma ficar o seu status social,
abrangência das relações de parentesco na introdutória as representações dos sistemas o que gera mutilações
físicas, mortes e uma
vida das sociedades ditas primitivas, ainda ar- de parentesco na vida social das sociedades sentença. Em seguida,
gumenta que elas não são apenas doutrinas ditas primitivas. Percebemos que tais socie- poste no fórum de
fundamentais das relações econômicas, jurídi- dades se desenvolvem de várias formas entre discussões como você
cas e políticas dessas sociedades, mas contri- os diversos grupos, mas que estão ligadas a interpretou as relações
buem, também, para delimitar conceitos liga- preceitos muito maiores que dizem respeito de parentesco. MESSIAS
do Mal. Direção: Mario
dos à moralidade e até mesmo a questões de à organização social e às obrigações de cada Azzopardi. Canadá,
ordem religiosa. Dito de outro modo, esse ele- indivíduo ou grupo para com os outros. Assim Flashstar, 2002. DVD (94
mento moral e religioso pode ser percebido sendo, constatamos que a delimitação de pes- mim), color.
não apenas nas oferendas e rituais que circun- soas “proibidas” ou “permitidas” para o casa- O material está dis-
dam as trocas matrimoniais, mas na percepção mento encontra-se estreitamente ligada à ma- ponível no endereço
eletrônico: http://www.
que na base mesmo de qualquer sistema de nutenção da ordem e da paz sociais. Portanto, telona.org/messias-do-
parentesco está uma proibição religiosa, a do de acordo Sahlins (1983, p.18) “[...] homens de -mal-dvdrip-xvid-rmvb-
incesto, pois é essa proibição que as relações tribo vivem em agrupamentos e comunida- -dublado/.
de parentesco estabelecem para seus mem- des de parentesco dentro dos quais a briga é
bros no exato momento em que constroem usualmente suprimida [...]”. Vimos também
categorias de mulheres com as quais os ho- que essas organizações prestam-se a um pa-
mens podem ou não podem casar-se. pel moral e religioso, na medida em que são
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UAB/Unimontes - 1º Período
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Ciências da Religião - Antropologia Cultural
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UAB/Unimontes - 1º Período
da Columbia britânica. Entre esses índios, ex- E então, você consegue perceber que os
tremamente afortunados mesmo em compa- conceitos de economia pura adotados pelas
ração às mais ricas economias de subsistência, sociedades industriais estão longe de ope-
existia um labiríntico sistema de status e posi- racionalizar categorias que possam explicar
ções que era sustentado por uma competição, as motivações das transações comerciais das
Figura 26: Livro Os Nuer, segundo a qual as pessoas destruíam ou doa- sociedades ditas primitivas? Para isso, basta
de Evans-Pritchard. vam demasiadamente enormes quantidades relembrar as argumentações utilizadas pelos
Fonte: Better word books. de seus bens. Nessas relações, bens como fo- autores supracitados para ratificar que as tro-
Disponível em: <http:// lhas de cobre eram supervalorizadas, mesmo cas entre os povos selvagens estabelecem-se
images.betterworldbooks.
com/019/The-Nuer- sendo pouco úteis aos índios, ao passo que levando em consideração várias esferas da
-Evans-Prichard- cobertores ou roupas, com utilidade potencial, vida social, que não necessariamente alme-
-E-9780195003222.jpg. valiam poucas ou quase nenhuma dessas fo- jam o acúmulo de ganhos pecuniários. Essas
Acesso em 02 de jun. de
2013. lhas de cobre. Contudo, convém observar que trocas, antes, encontram-se pautadas em rela-
a finalidade dessas trocas consistia em afirmar ções pessoais que buscam fortalecer os laços
▼
ou reafirmar uma posição so- de solidariedade, mesmo que isso signifique
cial; por conseguinte, quem (e isso é impensável para o homem ocidental)
comparecia ao Potlatch era perder, doar ou mesmo destruir grandes quan-
obrigado a aceitar “presen- tidades de seus bens (talvez até com certo
tes” e retribuí-los, mesmo que prazer, pois o individuo que doa menos é clas-
passado um ano, superando o sificado como um párea nessas sociedades).
valor da doação recebida an- Como comenta Lienhardt (1965), é apenas nas
teriormente. sociedades ocidentais modernas que o dinhei-
Nesse mesmo sentido, ro e o acúmulo de bens materiais assumem
Evans-Pritchard (1978) men- uma força transcendental e torna-se um com-
ciona que negociar (trocar) portamento altamente desejável. Contudo,
mercadorias com preços e pa- cabe ressaltar que essas sociedades simples
drões de valor determinados só se tornaram conhecidas, para nós, a partir
soava como uma anomalia a dos contatos com o homem branco. Contatos
muitos povos. Os Nuer, por estes, como observado na Unidade I, que se
exemplo, consideravam suas intensificaram a partir do século XVI com as
negociações com os merca- Grandes navegações, e consolidaram-se com
dores árabes como sendo a expansão colonial européia dos séculos se-
uma troca de presentes, pois guintes. Sendo assim, quais foram as conse-
na perspectiva Nuer não exis- quências dessa expansão para os povos não
te uma relação entre merca- ocidentais? É justamente sobre isso que vamos
dorias, mas sim entre pessoas. estudar agora. Vamos nessa, então?
36
Ciências da Religião - Antropologia Cultural
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UAB/Unimontes - 1º Período
DICA
Darcy Ribeiro foi “an-
tropólogo, educador e
romancista. Nasceu em
Montes Claros (MG), em
26 de outubro de 1922,
e faleceu em Brasília,
DF, em 17 de fevereiro
de 1997. Diplomou-se Podemos perceber, então, que a história das relações dos europeus com os povos não euro-
em Ciências Sociais
peus foi marcada por uma série de conflitos que decretaram o desaparecimento de diversos des-
pela Escola de So-
ciologia e Política de ses povos. Não obstante, a Antropologia, conforme estudamos no início desta Unidade, começou
São Paulo (1946), com a refletir sobre a extinção de seu objeto de estudo, e, por conseguinte, o fim da própria Ciência
especialização em da alteridade. E você, o que pensa sobre isso? Será mesmo o fim dos estudos antropológicos? É
Antropologia. Etnólogo sobre esse tema que versaremos os nossos estudos a partir de agora.
do Serviço de Proteção
aos Índios dedicou os
primeiros anos de vida
Referências
profissional (1947-56)
ao estudo dos índios
de várias tribos do
país. Fundou o Museu
do Índio, que dirigiu
até 1947, e colaborou Aires, Almeida, org. (2003) Difuisonismo. In:___ Dicionário Escolar de Filosofia. Lisboa: Plátano.
na criação do Parque Versão online: http://www.defnarede.com/a.html.
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38
Ciências da Religião - Antropologia Cultural
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Zahar, 1983.
39
Ciências da Religião - Antropologia Cultural
Unidade 3
A Antropologia e o estudo das
sociedades complexas
Fernanda Veloso Lima
Flávio de Oliveira Carvalho
3.1 Introdução
Na Unidade 2, nosso objetivo foi apresen- irracionais por indivíduos das sociedades ca-
tar algumas das análises que a Antropologia pitalistas ocidentais (ou mesmo as ditas socia-
construiu sobre as sociedades consideradas listas) respondem a regras sociais que alme-
primitivas. Nessa altura, acadêmico(a), você jam bens simbólicos em detrimento dos bens
deve relembrar que as sociedades selvagens materiais. Por esse motivo, entre os indivíduos
foram o primeiro objeto de estudo da Antro- que praticam o Kula ou o Potlatch é extrema-
pologia. Você se lembra também que esse fato mente coerente doar ou mesmo destruir enor-
aconteceu por causa da influência das ciências me quantidade de seus bens, ou, como diria o
naturais que tinham como prerrogativa a ob- ocidental, de suas propriedades.
jetividade? Nessa direção, foi definido que a Primeiramente, como já discutimos, a An-
distância do pesquisador (ocidental) com seu tropologia se viu em uma espécie de “beco
objeto de observação (não ocidental) servi- sem saída”, essa foi a primeira motivação que
riam ao propósito de garantir a neutralidade a fez voltar os olhos para a própria cultura: o
do pesquisador em relação ao universo pes- desaparecimento paulatino das sociedades
quisado. Não obstante, podemos recordar, simples. Esse deslocamento, como você deve
também, como mostra Laplantine (2000), que, se lembrar, proveio de uma crise de identida-
no contexto do evolucionismo, as primeiras de quando a ciência antropológica previu o
comparações usadas para referir-se às popu- desaparecimento de seu primário objeto de
lações primitivas evocavam sempre metáforas pesquisa. Isto é, as sociedades selvagens. Esse
zoológicas. Em verdade, foi apenas com o for- primeiro ensejo possibilitou à Antropologia
talecimento do trabalho de campo que a ciên- uma reflexão completamente nova: sua espe-
cia antropológica passou a se preocupar mais cificidade derivava de seu objeto de estudo ou
em entender a vida do nativo segundo seu de seu “olhar” sobre ele? Dito de outra forma,
próprio ponto de vista. o que diferencia a Antropologia das demais
Assim sendo, a partir das ponderações ciências, que também tomam o homem por
de autores como Lévi-Strauss (1967), Sahlins objeto de questionamento, é o homem que é
(1983), entre outros, começamos a vislum- interpelado ou a forma como esse homem é
brar que as relações de parentesco dos povos interpelado? Além disso, as mudanças sociais,
selvagens, por exemplo, transitavam em um na civilização ocidental, colocaram novas inda-
campo muito mais amplo que a família ime- gações que diziam respeito a como o homem
diata. Seus complexos sistemas de afinidade se adequaria à urbanização, à industrialização
e obrigações respondiam não só às suas ne- e aos inéditos padrões relacionais que surgiam
cessidades diretas de sobrevivência, mas a um juntamente à nova ordem. A ciência antropo-
complicado esquema político que compreen- lógica deslocou-se, então, e principiou a tentar
dia, entre outros, a consolidação de alianças responder questões que diziam respeito aos
políticas ou econômicas ou mesmo a conquis- valores de sua própria civilização.
ta de aliados e até a manutenção da paz. Além Nesse sentido, veremos, nessa terceira
disso, com Malinowski (1976) e Mauss (2003), Unidade, como o homem ocidental passa a
observamos, também, que as transações eco- pensar a si próprio no interior de um contex-
nômicas nem sempre almejam os ganhos que to que se modifica diuturnamente. Conforme
são valorizados pelo homem ocidental. Desse aponta Bhabha (1998), dentro de uma conjun-
modo, ações que seriam consideradas como tura que está sempre inacabada, visto que fru-
41
UAB/Unimontes - 1º Período
to de um devir moldado sobre contingências Para tanto, dividimos essas análises nas
momentâneas. Por conseguinte, discutiremos seguintes subunidades:
temáticas que concernem à forma como o ho- 3.1 Introdução
mem se localiza nesse complexo emaranhado 3.2 Os métodos e técnicas da Antropolo-
de relações, buscando compreender as diver- gia e sua utilização nos estudos das socieda-
sas formas de pensar e se posicionar frente à des complexas
realidade social e pleiteando sua legitimidade. 3.3 A Antropologia Urbana
Assim sendo, em um contexto de aglomera- 3.4 Antropologia no Brasil
ção urbana, concentração de riqueza e cres- Sendo assim, o intuito nesta Unidade
cente divisão social do trabalho, intentamos perpassa pela análise de fenômenos que
identificar como o homem “civilizado” se ar- constituem as relações urbano-industriais, as
ticula nos mais variados espaços sociais. Para novas relações de trabalho, bem como as per-
tanto, abordaremos tanto as metamorfoses cepções acerca de uma diversidade cada vez
sociais quanto as reflexões que são erigidas a maior. E aí, pronto(a) para continuarmos os
partir dela. nossos estudos? Então vamos nessa!
42
Ciências da Religião - Antropologia Cultural
que a objetividade da pesquisa seria maior sociedade complexa que permita preservar
uma vez que o “outro” era muito diferente do a particularidade das situações concretas que
PARA SABER MAIS
observador. Não obstante, desvelamos a ma- analisa” (DURHAN; CARDOSO, 1973, p.54). Isso
neira dizimadora com a qual o colonialismo porque a experiência do trabalho de campo Para obter mais
informações sobre os
solapou esses povos na forma do genocídio e deveria ser orientada pelo distanciamento do
impactos da revolução
etnocídio. pesquisador de sua própria cultura, conforme industrial na sociedade
Por outro lado, em países que não pos- vimos nas Unidades 1 e 2. Assim, o antropólo- e na ciência, sugeri-
suíam colônias, a Antropologia concentrou go deveria viver entre os nativos. mos a leitura do artigo
seus esforços nos estudos de populações in- Portanto, caro(a) acadêmico(a), surge intitulado “Depois da
Revolução Industrial”.
dígenas, de grupos rurais e, por ventura, ur- para a Antropologia uma questão fundamen-
Disponível em: <http://
banos, sendo esses últimos reconhecidos por tal: quando o nativo passou a ser a própria www.antropologia.
“camadas menos favorecidas da população” cultura do pesquisador? A partir de tal ques- com.br/pauloapgaua/
(OLIVEN, 2007, p.11). Diante disso, pensare- tionamento, vários foram os esforços reflexi- trab/dep.pdf>.
mos, a partir de agora, sobre o “novo” campo vos de diversos pesquisadores que visavam
de investigação dos antropólogos: a socieda- compreender como a ciência antropológica
de complexa capitalista que vive na cidade. deveria lançar seus olhares para dentro de
Você se lembra dos avanços oriundos da re- sua própria civilização.
volução industrial? A máquina a vapor, entre
outros? Nesse momento, a Europa, já no final
do século XVIII, deixou de apresentar carac-
terísticas rurais; sofreu um grande êxodo que
provocou um inchaço populacional nas cida-
des (CARVALHO, 2007; LIMA, 2008).
◄ Figura 31: A
Interpretação das
Culturas, Clifford
Geertz.
Fonte: Skook. Disponí-
vel em: <http://skoob.
s3.amazonaws.com/
livros>. Acesso em 09 mai.
2013
▲
Figura 30: Cena do filme “Tempos Modernos”
de Charlin Chaplin onde o artista faz uma crítica
à revolução industrial e ao modo de produção
capitalista.
Fonte: História para todos. Disponível em:<http://www.
artigosdehistoria.blogspot.com>. Acesso em 29 jul. 2013. A experiência proveniente do trabalho de
campo com as sociedades consideradas pri-
Enquanto algumas sociedades consi- mitivas possibilitou, ao antropólogo, o estra-
deradas primitivas deixavam de existir, as nhamento, ou seja, observar fenômenos que
cidades encontram dificuldade em seu or- podem parecer insignificantes: distinguir pis- PARA SABER MAIS
denamento territorial, o que gerou diversos cadelas de piscadelas. Geertz (1989), em seu Para compreender
fenômenos sociais, isto é, o espaço citadino livro “A Interpretação das Culturas”, argumenta melhor o conceito de
passou a se constituir um campo de lutas e que o fazer etnográfico consiste em um esfor- identidade, assista ao
vídeo Identidade de
reivindicações de grupos que outrora não ço intelectual para elaboração de uma descri- Fernando Meireles.
receberam às atenções dos estudos das Ciên- ção densa. Sendo assim, cabe ao etnógrafo O vídeo está dispo-
cias Sociais e Humanas. saber distinguir o ato de contrair a pálpebra nível em: <http://
Pensar, portanto, nesse processo de mu- (uma piscadela); de um tique nervoso (outra www.youtube.com/
dança, é extrair, dos fenômenos sociais, algu- piscadela); de uma imitação de outrem que watch?v=yKG8no8OK
Dg.
mas categorias de análise que emergem nas acabou de piscar; ou, ainda, uma piscadela por
sociedades complexas e se tornam passíveis ato de conspiração entre duas ou mais pesso-
de investigação, como exemplo a identida- as. São essas distinções que fazem da etnogra-
de, a urbanização, a violência, a prostituição, fia um saber semiótico, uma vez que a cultura,
para citar apenas alguns exemplos. Eis que segundo Geertz (1989), consiste em uma teia
surge um impasse para Antropologia: ”ela- de significados que o próprio homem teceu e
borar um modelo geral, mas não formal da na qual ele se encontra amarrado.
43
UAB/Unimontes - 1º Período
DICA
“Pierre Bourdieu -
sociólogo francês cuja Para tornar mais claro a discussão supra-
contribuição teórica citada, vamos relembrar, como exemplo, o
mostrou-se particular-
mente importante para sistema Kula que descrevemos na Unidade 2?
diversificadas áreas, Então, o Kula desapareceu, ou se transformou
tais como a antropolo- ao longo do tempo, porém, a obra de Malino- ▲
gia, história e ciência wiski, “Os Argonautas do Pacífico Ocidental” Figura 33: Pierre Bourdieu.
política - dedicou-se, ainda existe e está em constante reimpres- Fonte: Café História. Disponível em: <http://cafehistoria.
em especial, ao estudo ning.com>. Acesso em 09 mai. 2013.
dos mecanismos que são, portanto, o “dito” dos nativos acerca do
difundem e legitimam sistema Kula não perecerá, possibilitando que
as diversas formas de outros estudiosos façam análises constantes Ademais, a diferenciação entre o cam-
dominação. Sua refle- sobre tal sistema. Podemos dizer, assim, que po simbólico e as simulações dos sujeitos é
xão teórica estabeleceu “salvar o dito” consiste em “fixá-lo” de uma de suma importância para que possamos
e consolidou conceitos
importantes para as ci- maneira que sempre um maior número de compreender uma determinada imagem da
ências humanas, como pessoas possa participar dele. O caso mais sociedade, sobretudo, a capitalista. Pois, nas
o de “violência simbóli- comum é a escrita (GEERTZ, 1989). sociedades complexas, o desenvolvimento
ca”, entre outros”. (Café Em Bourdieu (1992), vamos encontrar o dessa imagem é reflexo da divisão do trabalho
História. Disponível em: seguinte esclarecimento acerca da interpreta- social, assim como de todas as relações prove-
http://cafehistoria.ning.
com). ção da cultura: é preciso apreender os meca- nientes dessa divisão. Sendo assim, as catego-
nismos de produção simbólica da cultura que rias de análise que servem como instrumento
integram suas linhagens e representações, interpretativo da divisão do trabalho sugerido
assim como a maneira com a qual tais linha- por Bourdieu (1992), pode ser encontrado no
PARA SABER MAIS
gens e representações adquirirem uma reali- capital econômico e capital social.
Para ampliar seus dade própria. Segundo Bourdieu (1992), o capital eco-
conhecimentos sobre o
Da perspectiva adotada por Bourdieu nômico consiste na forma em que diferentes
as relações de poder na
hierarquia social, suge- (1992), porém, o que interessa é discernir as fatores de produção (terras, fábricas, trabalho)
rimos a leitura do arti- relações de sentido para além das represen- e do conjunto de bens econômicos (dinheiro,
go “Relações de poder tações que os sujeitos materializam em suas patrimônio, bens materiais) são acumulados e
segundo Bourdieu e ações (ou não ações). Em outras palavras, o reproduzidos. Ao passo que o capital cultural
Foucault: uma proposta
pesquisador deve compreender e reconstruir refere-se a um conjunto de regras, valores e
de articulação teórica
para análise das organi- a teia completa de relações simbólicas e não arranjos promovidos, sobretudo, pela família,
zações”. O trabalho está simbólicas, isto é, as circunstâncias materiais pela escola e pelos demais agentes da educa-
disponível em:<http:// e a hierarquia social que resultam dessa teia ção, que predispõem os indivíduos a uma ati-
ageconsearch.umn. de significados. Isso porque o intuito do re- tude dócil e de reconhecimento ante as práti-
edu>.
ferido autor é conhecer o arranjo interno do cas educativas.
campo simbólico cuja aplicabilidade está na De acordo com Bourdieu (1992, p. 24),
expectativa de ordenar o mundo natural e “jogo das distinções simbólicas se realiza,
44
Ciências da Religião - Antropologia Cultural
portanto, no interior dos limites estreitos de- antropólogo terá que admitir nos estudos da DICA
finidos pelas coerções econômicas e, por esse sociedade complexa, consideramos, portan- Para aprofundar a
motivo, permanece um jogo de privilegiados to, que tal distanciamento é uma tarefa árdua discussão sobre a
das sociedades privilegiadas”. Dessa forma, e esquizofrênica. Estranhar o familiar, nesse divisão do trabalho
faz-se necessário “tentar apreender as regras contexto, é mais difícil que examinar um siste- social, sugerimos a
do jogo e da divulgação da distinção segun- ma que nos parece completamente estranho, leitura do livro de Émile
Durkheim, ”Da Divisão
do as classes sociais exprimem as diferenças como o Kula, por exemplo. Isso porque quan- do Trabalho Social”
de situação e de posição que as separam”. Isso do nos voltamos para a nossa própria socie- (DURKHEIM, Émile. Da
porque a interpretação do campo simbólico dade, além de correr o risco de não conseguir divisão do Trabalho So-
deve pautar-se em uma “abstração que deve distinguir as piscadelas, estaremos diante da cial. São Paulo: Martins
revelar-se como tal, um perfil da realidade so- possibilidade de romper com certezas que Fontes, 1995).
cial que, muitas vezes, passa despercebido, ou acreditávamos serem verdades absolutas. Em
então, quando percebido, quase nunca apare- outras palavras, como descrito por Diniz (2001,
ce enquanto tal”. p.40-41), “o conflito como um valor é criação
recente da história moral da humanidade [...] DICA
isso não quer dizer que a diferença e a dis-
Débora Diniz, em seu
córdia morais não possuam passados”. Antes, artigo “Antropologia e
pelo contrário, como salienta a autora “[...] os limites dos direitos
onde houve seres humanos organizados em humanos: o dilema
sociedades existem diferenças, diferenças es- moral de Tashi”, trata
tas que conduziram ao conflito”. da possibilidade de
romper com certezas
Diante disso, “o dilema do antropólogo que acreditávamos ser
não deve ser resultante apenas do enfreta- verdades absolutas.
mento cotidiano com as etnografias impossí- Confira o artigo no
veis”, mas com o paradoxo dos dilemas morais endereço eletrônico:
que se converte, também, “no dilema pessoal http://www.abant.org.
br/conteudo/livros/
do antropólogo”. A referida autora adverte, DIREITOS%20HUMA-
ainda, que o dilema moral é uma das ilusões NOS%201%5B1%5D.
mais próximas “no campo do pensamento hu- pdf.
manista”, porém, somente o “futuro poderá
assegurar qual é a medida da desilusão que os
antropólogos serão capazes de suportar” (DI- DICA
NIZ, 2001, p.40-41).
Para aprofundar o
No que se refere ao pensamento huma- tema, sugerimos a leitu-
▲
nista, segundo Hall (2006, p.10), pensar sobre ra do livro de Stuart
suas mudanças é questionar a transformação Hall e Tomaz Tadeu da
Figura 34: Homi Bhabha. que a própria modernidade passou. Conse- Silva intitulado “Identi-
Fonte: Universiteit Utrecht. Disponível em:<https:// dade e Diferença”- (Hall,
encrypted-tbn2.gstatic.com>. Acesso em 29 jul. 2013.
quentemente, é, também, perguntar-se acerca
Stuart ; Tadeu, Tomaz.
de novas dimensões relativas à concepção es- Identidade e Diferença :
Ainda refletindo sobre a dimensão da sencialista ou fixa de identidade. a perspectiva dos estu-
cultura e sua forma de interpretação, Bhabha dos culturais. São Paulo:
(1998) salienta que não podemos analisá-la de Vozes, 2005.).
maneira única e acabada. Portanto, para que
possamos tornar evidentes as funções da cul-
tura, devemos concebê-la em sua condição
de plural. Isto é, o arranjo de forças simbólicas
que determina o objeto teórico e discursivo ◄ Figura 35: A
identidade cultural
do conjunto de bens de identificação de uma na pós-modernidade,
dada cultura. Assim, o conceito operacional Stuart Hall.
de cultura permeia tanto a contingência quan- Fonte: Armazém dos
to a contiguidade, ou seja, a possibilidade de Livros. Disponível
diversas culturas apoderarem-se de bens de em:<https:// armaze-
mdoslivros.blogspot.
identificação de outras e elaborar um determi- com>. Acesso em 29 jul.
nado bem cujo mérito e arranjo o direcione a 2013.
ser admitido por uma cultura de âmbito mais
abrangente.
Diante da complexidade de interpretação
da cultura e retomando a noção de distancia-
mento do sujeito/objeto de pesquisa que o
45
UAB/Unimontes - 1º Período
Lembra o que estudamos na Unidade terior que é o ‘eu real’, mas este é formado e
PARA SABER MAIS 1? Sobre a capacidade do homem em pen- modificado num diálogo contínuo com mun-
Para ampliar os conhe- sar sobre si mesmo? E as formulações que ele dos culturais ‘exteriores’ e as identidades que
cimentos, assista ao elaborou sobre o outro? É claro que naquele esses mundos oferecem [grifos do autor]”.
filme “O Diário de uma momento descrevemos esse outro como um Diante disso, chegamos ao terceiro tipo de su-
Babá” (2006). Annie estranho, o exótico, portanto, é justamente jeito que completa o raciocínio de Hall (2006)
Braddock depois de se sobre essa identidade fixa que o autor de- acerca da crescente complexidade do mundo
formar na faculdade de
antropologia procura nomina de sujeito do Iluminismo. Ou, ainda, moderno, ou seja: o sujeito pós-moderno.
um emprego em uma nas palavras do próprio Hall (2006, p.10-11), “o Não obstante, retomaremos essa discus-
grande empresa da sujeito do Iluminismo estava baseado numa são na subunidade 3.3, quando trataremos de
Upper East Side, em concepção da pessoa humana como um in- um dos ramos da Antropologia, que é a Antro-
Manhattan. Porém, ela divíduo centrado [...] o centro essencial do eu pologia Urbana. Por hora, concluímos que en-
ainda não sabe que
caminho deseja seguir. era a identidade de uma pessoa”. Em outras tre as diversas categorias de análise das socie-
Os questionamentos palavras, “pode-se ver que essa era uma con- dades complexas, a identidade emerge como
reforçam os laços com a cepção muito ‘individualista’ do sujeito e de um campo de estudo para os antropólogos
Antropologia, visto que sua identidade (na verdade, a identidade dele: que estudam sua própria sociedade. Sendo
a personagem começa já que o sujeito do Iluminismo era usualmente que esse campo torna-se absorto por tratar de
a estudar a família para
a qual trabalha. descrito no masculino) [grifos do autor]”. conflitos morais de sua própria sociedade, pro-
porcionando, portanto, um estranhamento do
familiar. Embora tal estranhamento apresente-
-se complexo tal qual esse novo objeto da An-
tropologia: as sociedades complexas.
Figura 36: Movimento ►
Punk de liberdade Agora você compreende a dimensão des-
Cultural. se novo caminho traçado pela Antropologia?
Fonte: Letter James. Dis- Porém, as análises não findam com os discur-
ponível em:<http://www. sos sobre identidade, pois a gama de fenôme-
letterjames.de>. Acesso nos que possibilitam a análise das sociedades
em 29 jul. 2013.
complexas é múltipla, tornando-se, portanto,
um campo fértil para novas pesquisas e mini-
mizando a crise de identidade que a ciência
antropológica passou quando percebeu que
as sociedades primitivas estavam se extingui-
do. Sendo assim, estudaremos na subunidade
3.3 outro ramo da Antropologia Cultural, a An-
PARA SABER MAIS tropologia Urbana.
Conheça mais sobre
A mudança, portanto, que Hall (2006, Tal vertente da Antropologia empreende-
Identidade segundo p.11) chama nossa atenção, refere-se àquilo rá seus estudos sobre os fatos sociais ocorridos
Bhabha. Para isso que estudamos na Unidade 2, ou seja, o sujei- na cidade. Aqui, entendemos “urbano” e “ci-
sugerimos a leitura do to sociológico que refletiu “a crescente com- dade” como sinonímias, uma vez que falar de
capítulo “Interrogando plexidade do mundo moderno”. Percebemos, urbano refere-se, portanto, discorrer sobre a
a Identidade” que está
disponível em:<http://
portanto, na Unidade 2, como a cultura passou cidade e a complexa rede de relações na qual
www.ufrgs.br/cdrom/ a ser considerada múltipla e, por conseguinte, o homem encontra-se emaranhado. Sendo as-
bhabha/bhabha.pdf>. o homem que também passou a ser cada vez sim, você está pronto(a) para desvelar mais um
mais observado na sua dimensão cultural. Hall campo de estudo da Antropologia? Leia com
(2006) aprofunda um pouco mais a discussão atenção para que você possa debater com o
da diversidade ao afirmar que o sujeito socio- professor e o tutor as ponderações que vamos
lógico “ainda tem um núcleo ou essência in- apresentar.
46
Ciências da Religião - Antropologia Cultural
47
UAB/Unimontes - 1º Período
DICA tidades, dito de outra maneira, “a identidade A normalidade está contida no fato de existir
O esquadrinhamento torna-se uma ‘celebração móvel’: formada e atos delituosos e não nos números que eles
diz respeito às formas transformada continuamente em relação às podem atingir.
como o Estado se formas pelas quais somos representados ou Ora, diante disso, podemos inferir que a ci-
debruça sobre a vida interpelados nos sistemas culturais que nos dade não é a geradora do aumento da crimina-
privada das pessoas,
investigando-a. A partir
rodeiam” [grifos do autor]. Essas postulações lidade. Em verdade, o fato ocorrido é que o es-
daí torna-se possível nos remetem também a Bhabha (1998), quan- paço urbano se consolida concomitantemente
investir nos corpos do argumenta que as designações geopolí- ao aumento da severidade da justiça. Ou seja,
dos indivíduos para ticas são deslocadas do centro de referência a formação da cidade industrial coincide com o
discipliná-los. Dito de das identidades dos indivíduos por uma se- processo de transformação de práticas sociais
outra forma, é uma
maneira de controlar os
quência de localizações que cada pessoa ocu- antes toleradas, em crimes passíveis de puni-
comportamentos hu- pa na estrutura social, tais quais gênero, raça, ção. Nesse sentido, a violência urbana ou na
manos, higienizando- geração, dentre outros, isso sem mencionar cidade esboçada por nossos meios de comuni-
-os, tanto quanto pos- as múltiplas vinculações locais, profissionais cação torna-se bastante inquietante. Nos tem-
sível para a adequação ou mesmo institucionais. Portanto, o que po- pos atuais, ela se configura em tema bastante
de uma ordem vigente.
A intenção é tornar as
demos notar é que as cidades, agrupando um debatido pelo senso comum, permeia agendas
pessoas cada vez mais crescente número de pessoas em um reduzido de propostas políticas, basta nos lembrarmos
adaptadas às regras e, espaço físico, tornam-se gradualmente um es- das últimas eleições, além de já ser amplamen-
consequentemente, paço de conflagração constante. te discutida cientificamente.
torná-las mais produ- Convergindo para a questão das cidades, Ademais, ocupa espaços significativos nas
tivas e dóceis. Enfim,
o esquadrinhamento
Foucault (1982a, 1982b) as percebe como um pautas de reunião dos poderes públicos que
transforma os indivídu- lugar que, permeado por uma diversidade procuram engendrar medidas contra a crimi-
os em peças “saudáveis” cada vez maior, agrupa paulatinamente mais nalidade. O crime, então, se converte no maior
da engrenagem social conflitos e, consequentemente, esses conflitos símbolo da violência urbana ou na cidade.
que os domina e opri- vão se tornando a principal razão que justifica Se pensarmos, então, a sociedade com-
me. Fonte: (FOUCAULT,
Michel. Vigiar e punir:
o esquadrinhamento e a vigilância das popu- plexa segundo o preceito de que ela consiste
história da violência lações. Desse modo, no final do século XVIII, a em um emaranhado de relações sociais, trocas
nas prisões. São Paulo: arquitetura citadina passa a ser cobrada como simbólicas e delimitações de espaços, não po-
Vozes, 2005, 262p.) técnica que seja capaz de organizar o espaço. deriam deixar de mencionar os bens de iden-
Nesse sentido, completa Foucault (2005) que tificação que, segundo Bhabha (1998), gera
PARA SABER MAIS tais medidas podem ser consideradas como todo esse fenômeno. Nessa tessitura, relem-
sendo muito mais responsáveis pela crença, brando a perspectiva de jogo de privilegiados
No capítulo dois, da
dissertação de Carva- bastante difundida, desse aumento incessante e sociedades privilegiadas analisado por Bour-
lho (2007), intitulado e perigoso dos crimes, do que propriamente dieu (1992) emerge, portanto, outro campo de
“Sobre mulheres, um aumento real dessas taxas de violência. E interesse da Antropologia Urbana, a saber, os
história e crime”, en- aí, caro(a) acadêmico(a), você consegue imagi- bens simbólicos não negociáveis, tais como
contramos argumentos nar qual o fenômeno social que temos como identidade gênero, sexualidades, os novos
para elucidar questões
sobre criminalidade e objeto de estudo a partir das discussões que movimentos sociais, para citar apenas alguns.
o envolvimento de mu- fizemos? Se você pensou em criminalidade, fez No que diz respeito aos novos movimen-
lheres com o tráfico de bem! E como os estudiosos da cidade perce- tos sociais, Durães, Lima, Carvalho (2005) argu-
drogas. Sendo assim, biam tal fenômeno? mentam que se trata de uma reconfiguração
sugerimos a leitura do De acordo com Carvalho (2007), das demandas dos grupos que não dizem res-
trabalho para que você
possa ampliar os seus Durkheim (1995) contribui, sobremaneira, para peito à reivindicações por moradias, melhores
conhecimentos sobre o o avanço da análise criminal quando aproxima condições de trabalho, entre outras manifesta-
tema. Fonte: A disser- o crime da noção de normalidade em um du- ções provenientes do “problema urbano”. Con-
tação está disponível plo sentido. Quer dizer, o crime é normal não siste, portanto, em manifestações que lutam
em:<http://www.ppg- só por estar presente em todas as sociedades, por bens não negociáveis, como a identidade
ds.unimontes.br/index.
php/2007>. mas também por desempenhar uma função de gênero, para citar um exemplo. Lembra das
dentro delas, ligada à própria manutenção de premissas estudadas no início desta subuni-
seu funcionamento. Nessa direção, a punição dade? A identidade do sujeito pós-moderno?
que o infrator chama sobre si funciona como Recorde que, em contraposição ao sujeito do
um revitalizador e fortalecedor dos laços so- Iluminismo, o sujeito pós-moderno não possui
ciais na medida em que reafirma a validade uma identidade fixa e acabada, logo esse su-
da vontade e do pensamento coletivos. Con- jeito é múltiplo. Contudo, esse sujeito pós-mo-
tudo, cabe-nos destacar que, embora o crime derno tornou-se fragmentado, isolado e são
seja considerado um fato normal, constituinte justamente através dos novos movimentos so-
da própria organização social, sua incidência, ciais que os sujeitos fragmentados encontrarão
principalmente quando apresenta níveis mui- pares para lutar em prol de direitos não nego-
to elevados, assume contornos patológicos. ciáveis, como exemplo a identidade de gênero.
48
Ciências da Religião - Antropologia Cultural
49
UAB/Unimontes - 1º Período
essas relações simbólicas que estudamos até o estuda, não é mesmo? Bem, sobre esse assunto
PARA SABER MAIS
presente momento. Sendo assim, acreditamos você terá que esperar um pouco mais, uma vez
Assista ao filme “A que você está curioso para saber como essas que somente na disciplina Antropologia da Re-
Antropóloga”. Direção:
Zeca Nunes Pires, Brasil. relações irão se processar na Ciência que você ligião é que essas conexões serão amarradas.
Imagem Filmes, 2010.
DVD (90min), color.
“Aos 33 anos, Maria de
Lourdes Gomes Azeve-
do Ramos (Malu) realiza
na Costa da Lagoa –
3.4 A Antropologia no Brasil
reduto açoriano na Ilha
de Santa Catarina (Flo-
rianópolis/SC/BR) – sua Estudamos como a Antropologia confi- Portanto, toda a discussão que fizemos
pesquisa de doutorado gurou-se em Ciência; o método adotado para na Unidade 1 aplica-se, no caso brasileiro, tam-
na área de etnobotâ- as pesquisas antropológicas; e nos detemos bém aos séculos XVII e XVIII. Ora, essa terra foi
nica. Sua vinda a Costa às descrições dos ramos da Antropologia. Pos- considerada inabitada, portanto, passível de
da Lagoa não será me-
ramente um marco em teriormente, examinamos como essa ciência ser povoada. É só você se recordar das aulas
sua carreira acadêmica partiu de uma análise evolucionista até conce- de História do Brasil. Porém, a análise que fa-
mais uma série de de- ber a cultura segundo os princípios do Relati- remos possibilitará uma compreensão teórica
safios emocionais que vismo Cultural. Para tanto, observamos con- de fatos que na maioria das vezes só ouvimos
coloca a protagonista
no limite entre a razão ceitos e análises de alguns antropólogos sobre falar. Sendo assim, pensar em uma Antropolo-
e a imaginação, ciência as sociedades primitivas e complexas. Agora, gia no Brasil e seu amadurecimento é buscar
e misticismo, crença perceberemos, de forma introdutória, como compreender a superação de conceitos como
e ceticismo, amor e esses estudos começaram no Brasil e quais as o de raça, superioridade e inferioridade.
paixão.
Com dona Ritinha, ben- vertentes que os antropólogos brasileiros se- Diante disso, pensar em uma Antropolo-
zedeira mais conhecida guiram. gia no Brasil remete-nos ao passado que não
na comunidade, Malu Lembre-se que Antropologia, em seu iní- está tão longe assim. Isso porque, segundo
inicia o aprendizado
da cultura mística que
cio, contou com os depoimentos de missioná- Melatti (1984), foram os memorialistas e cro-
os descendentes de rios, soldados e viajantes para a compreensão nistas que contribuíram para os primeiros rela-
açorianos preservam dos povos primitivos e, conforme a atividade tos sobre as “sociedades primitivas” do Brasil.
no local”. que você desenvolveu na Unidade 1, postando Sendo assim, as análises desses relatos têm
Fonte: Disponível em:
<http://castordownloa- seus comentários sobre o BOX 1, você com- pouco mais de 200 anos, uma vez que antes
ds.net/download-a-an- preendeu o posicionamento desses primeiros disso as Ciências Sociais ainda não existiam.
tropologa-dvdrip-avi- relatos. Diante disso, pense, agora, no Brasil do Portanto, para o referido autor, esses “missio-
-rmvb-nacional-50063. século XVI em um contexto que alguns países nários, navegantes, diplomatas, empresários”,
html.
da Europa trilhavam caminhos para além-mar. entre outros, ao escreverem suas crônicas e
Pensou? E aí? Qual foi a percepção dos portu- desenharem mapas acabaram criando, sem
gueses ao desembarcarem no Brasil, levando perceber é claro, instrumentos de coletas de
Figura 41: em consideração os estudos que fizemos na dados. Em outras palavras, foi a partir de mate-
Desembarque de Unidade 1? Se você pensou que os índios aqui riais como esses que pesquisadores, como Flo-
Cabral em Porto
Seguro, por Oscar encontrados foram considerados selvagens, restan Fernandes, desenvolveram os primeiros
Pereira da Silva. você conclui e entendeu perfeitamente qual trabalhos sociológicos no Brasil.
Fonte: Portal do Governo foi a primeira percepção dos portugueses
Brasileiro. Disponível em:< diante os povos indígenas que encontraram,
www.brasil.gov.br>. Aces-
so em 29 jul. 2013.
ou como nos narrou a historiografia por muito
tempo “descobriram”, no Brasil.
▼
▲
Figura 42: Florestan Fernandes entre índios
Xavante em 1986.
Fonte: Scielo. Disponível em: <http://www.scielo.br>.
Acesso em 05 mai. 2013.
50
Ciências da Religião - Antropologia Cultural
51
UAB/Unimontes - 1º Período
DICA
“Florestan Fernandes
(22/07/1920-10/8/1995)
nasce na cidade de São
Paulo, de origem pobre,
estuda com dificulda-
de e destaca-se pela
disciplina e esforço.
Torna-se professor da
Universidade de São
Paulo (USP), na década
de 40, sendo afastado
pelo regime militar em
1969. A partir daí, passa
a lecionar em universi- do cristianismo, esse mesmo índio foi consi- Brasil permeia discursos quanto à ausência de
dades do Canadá e dos derado como uma “criança”, logo, detentor sua capacidade adaptativa à sociedade brasi-
Estados Unidos. Denun-
de alma e passível de ser catequizado, leia-se leira. Esse pensamento, de acordo com Ribeiro
cia a marginalização
do negro na sociedade convertido à normalidade cristã. Por fim, no (1977), é proveniente da ideia de que o pro-
na tese A Integração período da independência do Brasil e em anos blema da inadaptação do índio à sociedade
do Negro nas Socieda- posteriores quando se pensava a identidade brasileira consiste no fato de se vincular a uma
des de Classe (1964). nacional, o índio elevou-se à categoria de he- tradição pré-colombiana a manutenção dos
Dedica-se, também, ao
rói, ou ainda, como parte reconhecida da na- costumes e hábitos indígenas.
estudo das sociedades
indígenas, da educação cionalidade brasileira.
e da modernização, Nessa direção, Melatti (1994, p.1), em sua
além da análise crítica obra “Os Índios do Brasil”, propõe uma revisão
da sociologia. Aborda o acerca da imagem do índio e que essa deve
processo revolucionário
se apresentar muito mais próxima da realida-
latino-americano em
Capitalismo Dependen- de. Descreve, portanto, um índio “humano” e
te e Classes Sociais na tenta combater “uma série de ideias precon-
América Latina (1973). ceituosas que sobre ele se mantêm [...]”. Sendo
Em 1975, escreve A assim, o autor demonstra que as populações
Revolução Burguesa no
indígenas não se configuram em um corpo
Brasil, sobre as classes
dominantes do país e homogêneo, ou seja, “as línguas, os costumes,
sua resistência às mu- variam de tribo para tribo”. Consequentemen-
danças históricas. Volta te, o referido autor chama nossa atenção para
ao Brasil, em 1977, o próprio conceito de índio, pois tal conceito
passa a lecionar na
nada mais é que uma categoria criada pelos
Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo europeus. Destarte, esclarece que nem todos
(PUC), a partir de 1979, os povos indígenas falavam Tupi e a imagem
retornando à USP em de unicidade da língua é proveniente de sua
1986. É considerado o apropriação para a dominação e catequização.
fundador da sociologia
Em outras palavras, no primeiro contato com
crítica no Brasil”.
os indígenas, os jesuítas e alguns colonizado-
res trataram de aprender a língua Tupi para
facilitar o processo de catequização e coloni-
zação. Portanto, os povos indígenas “converti-
dos” e “dominados” serviram como facilitado-
res para novas catequizações e dominações.
Destacamos, ainda, outro estudioso que ▲
contribuiu, sobremodo, para os estudos das Figura 46: Índios do Brasil, Júlio César Melatti.
populações indígenas, a saber, Darcy Ribeiro. Fonte: Mercado Livre. Disponível em: <http://produto.
Para o referido autor, a questão indígena no mercadolivre.com.br>. Acesso em 29 jul. 2013.
52
Ciências da Religião - Antropologia Cultural
Diante do exposto, esclarecemos que a Certamente, a criação dessas instituições PaRA SABER MAIS
Antropologia no Brasil institucionalizou-se en- ampliou o campo de investigação da Antropo- Leia o artigo “A Antro-
tre os anos de 1930 a 1960. No que diz respeito logia no Brasil e, paulatinamente, essa Ciência pologia como Ciência
às décadas de 1930, inaugurou-se, em 1933, a se consolidou no contexto brasileiro. Temas Social no Brasil” de Ma-
Escola de Sociologia e Política de São Paulo; como mudança social, mudança cultural, in- riza Peirano para apro-
em 1934, criou-se a Faculdade de Filosofia e terpretação do Brasil, identidade, cidadania, fundar seus estudos
sobre o tema. O artigo
Letras do Brasil. Em 1955, a partir do fomento para citar alguns exemplos, emergem nas está disponibilizado no
de algumas instituições das Ciências Sociais pesquisas antropológicas e contribuem para Centro de estudos de
e Humanas, institui-se a Associação Brasileira compreensão da cultura brasileira. No que diz Antropologia. Fonte:
de Antropologia (ABA). Desde então, a ABA respeito à cidadania, ou ao “jeitinho brasilei- Disponível em: <http://
passou a reunir interesses da Antropologia no ro”, citamos Roberto DaMatta que ao analisar ceas.iscte.pt/etnogra-
fica/docs/vol_04/N2/
Brasil e se mantém até os dias atuais, realizan- esses temas recorrentes no Brasil aponta uma Vol_iv_N2_219-232.
do congressos e pesquisas na área (MELATTI, outra percepção acerca das relações sociais pdf>.
1984). Destacamos, ainda, o surgimento do estabelecidas no contexto brasileiro. Para o
Departamento de Antropologia da UNB, fun- referido autor, a cidadania vivenciada no Bra-
dado em 1962, porém foi desativado em 1965 sil nos remete à relação entre “a casa e a rua”, PARA SABER MAIS
retornado ao funcionamento em 1969. pois quando:
Assista ao filme “BE-
SOURO” (2009). A trama
[...] a casa é englobada pela rua vivemos frequentemente situações críticas e se passa no recôncavo
em geral autoritárias. Situações onde momentaneamente se faz um rompi- baiano, década de
mento com a teia de relações que amacia um sistema cujo conjunto legal não 1920. A película retrata
parte da prática social, mas é feito visando justamente a corrigi-la ou até mes- a discriminação com
mo a instaurar novos hábitos sociais (DAMATTA, 1997, p.10). qual negros libertos
eram acometidos
Em posse dos argumentos de DaMat- grande maioria de homens. Esses fatos, ainda embora a abolição já
ta (1997), que também nos demonstra que o segundo o autor, podem contribuir para expli- havia sido declarada.
Brasil é uma sociedade hierarquizada, conclu- car o porquê da imensa miscigenação no Bra- Manoel (Aílton Carmo),
personagem principal
ímos que quando nos sentimos ameaçados sil, ao passo que nos Estados Unidos há uma aprendeu capoeira
da posição hierárquica, que concebemos ter, separação tão escancarada. Não obstante, Da- como Mestre Alípio
invocamos o jargão “você sabe com quem Matta (1990) aborda a questão religiosa para (Macalé), seu tutor não
está falando?” para retomar a posição que su- compreender algumas das diferenças entre somente em golpes de
postamente perderíamos, caso não nos iden- os dois países. Seguindo um raciocínio pareci- capoeira, mas, também,
as virtudes da con-
tificássemos em um status superior. Isso se dá do com o de Max Weber em seu livro “A Ética centração e da justiça.
porque, como as relações no Brasil são muito Protestante e o Espírito do Capitalismo”, o an- Besouro, como ficou
pessoais, as pessoas não conseguem se ade- tropólogo brasileiro demonstra como a crença conhecido Manuel, vai
quar à impessoalidade das leis, portanto sem- religiosa dominante em cada um desses Esta- defender o seu povo e
pre se valem de algum laço relacional para dri- dos contribui para que as pessoas tenham in- lutar contra o precon-
ceito de sua época.
blar a burocracia. Nesse sentido, os estudos de terpretações distintas acerca do trabalho.
DaMatta (1997) tornaram-se expoentes para a
compreensão das relações na sociedade brasi-
leira, bem como a concepção múltipla do con-
ceito de cidadania.
Aprofundando suas análises em um es-
tudo comparativo, DaMatta (1990), também ◄ Figura 47: A Casa & a
constrói uma ampla comparação entre Brasil Rua: espaço, cidadania,
mulher e morte
e Estados Unidos, levando em consideração no Brasil, Roberto
vários aspectos culturais das duas socieda- DaMatta.
des. Dessa forma, o autor supracitado aborda Fonte: Arquitetônico. Dis-
características que fazem com que, nessas so- ponível em: <http://www.
arquitetonico.ufsc.br/>.
ciedades, as pessoas se relacionem de formas Acesso em 29 jul. 2013.
distintas tanto entre si quanto com o próprio
Estado. Um dos exemplos que DaMatta (1990)
traz consiste na forma de colonização que foi
empreendida em cada uma dessas nações,
pois enquanto nos Estados Unidos ocorreu
uma colonização de povoamento, no Brasil
desenvolveu-se um empreendimento de ex-
ploração. No primeiro caso, foram famílias in-
teiras que saíram da Europa rumo aos Estados
Unidos, ao passo que para o Brasil veio uma
53
UAB/Unimontes - 1º Período
Atividade Por fim, o mencionado autor conclui uma maior, ao passo que nos Estados Unidos as
Assista à entrevista de diferença interessante entre os dois países, pessoas vivem separadas (por exemplo exis-
Darcy Ribeiro, “Índios e especialmente no que diz respeito às leis, a tem bairros de brancos e bairros de negros, as-
Portugueses: encon- hierarquia social e a forma como as pessoas sim como restaurante, programas de TV, etc.),
tros & desencontros” e convivem. Nesse sentido, enquanto no Brasil porém nos Estados Unidos pessoas são mais
poste no fórum o seu as pessoas vivem juntas (brancos e negros) e iguais perante a lei.
comentário levando
em consideração os até se misturaram por meio de casamentos, Em fim, você estudou diversas vertentes
argumentos que estu- nos Estados Unidos a separação foi (e ainda da Antropologia Cultural neste caderno. Per-
damos até o presente é) muito mais rígida, visto que existem luga- cebeu a trajetória da Antropologia rumo ao
momento. O Vídeo está res sociais muito bem definidos para brancos relativismo para a interpretação das culturas,
disponível em: <http:// e negros. Contudo, não podemos deixar de assim como os métodos que possibilitou a sua
www.youtube.com>.
mencionar que as leis nos Estados Unidos, elevação à Ciência e os estudos das socieda-
onde as relações pessoais são muito mais fra- des primitivas e complexas. Agora que você
cas que no Brasil, são aplicadas com maior conhece essa trajetória, os principais conceitos
DICA impessoalidade. Resumindo essas ideias, Da- e métodos, é hora de ler mais uma vez este ca-
Matta (1990) conclui que no Brasil as pessoas derno para reforçar o conteúdo.
A política indigenista
proposta pelos irmãos
vivem juntas, mas existe uma desigualdade
Villas Bôas foi de sua
importância para com-
Referências
preensão da riqueza
cultural da população
indígena Xingu. Nesse
sentido, Darcy Ribeiro
afirmou que “os Villas
Bôas dedicaram todas BHABHA, Homi. O Local da Cultura. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1998.
as suas vidas a conduzir
os índios xinguanos do BOURDIEU, Pierre; PRADO, Silvia de Almeida. A Economia das trocas simbólicas. 3. ed. São Pau-
isolamento original em lo: Perspectiva, 1992. 361 p.
que os encontraram
até o choque com as BRAGA, Christiano et. al. Território e territorialidade. In:___. Territórios em movimento: cultura
fronteiras da civilização.
e identidade como estratégia de inserção competitiva. Brasília: SEBRAE, 2004. p. 25-69.
Aprenderam a respeitá-
-los e perceberam a
necessidade imperio-
CARVALHO, Flávio de Oliveira. Desenvolvimento, mulheres e criminalidade: uma análise dos
sa de lhes assegurar relatos das presidiárias detidas por envolvimento com tráfico de drogas na cadeia pública de
algum isolamento para Montes Claros/MG. 2007. 106f. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Social) - Universidade
que sobrevivessem. Estadual de Montes Claros, Montes Claros.
Tinham uma consciên-
cia aguda de que, se os DAMATTA, Roberto. A Casa e a Rua: espaço, cidadania, mulher e morte no Brasil. 5 ed. Rio de
fazendeiros penetras- Janeiro: Rocco, 1997.
sem naquele imenso
território, isolando os DAMATTA, Roberto. Carnavais Malandros e Heróis: para uma sociologia do dilema brasileiro. 5
grupos indígenas uns
dos outros, acabariam ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1999.
com eles em pouco
tempo. Não só matan- DINIZ, Débora. Antropologia e os limites dos Direitos Humanos: o dilema moral de Tashi. In: NO-
do, mas liquidando as VAES, Regina Reyes; LIMA, Roberto Kant de (Org.). Antropologia e direitos humanos. v. 1. Niterói:
suas condições ecoló- Ed. UFF/ABA, 2001, p. 17-46.
gicas de sobrevivência.”
(RIBEIRO, 1997, p. 194). DURÃES, Sarah Jane Alves; Lima, Fernanda Veloso; CARVALHO, Flávio de Oliveira. Novos Movi-
mentos Sociais e o Movimento de Mulheres. Revista Unimontes Científica. v. 7, n. 2, jun/dez de
2005, p. 91-100.
PARA SABER MAIS
Para melhor compre- DURHAM, Eunice Ribeiro; CARDOSO, Ruth C. Leite. A investigação antropológica em áreas urba-
ensão das políticas nas. In: Revista de Cultura. Petrópolis: Vozes, v. 67, n. 2, 1973.
indigenista, sugerimos
o filme XINGU. Direção: DURKHEIM, E. Da divisão do Trabalho Social. São Paulo: Martins Fontes, 1995.
Cao Hamburger, Brasil.
DownTown Filmes, FOUCAULT, Michel. O nascimento da medicina social. In:__. MACHADO, Roberto. Microfísica do
2012. DVD (102min), poder. Rio de Janeiro: Graal, 1982a, p. 79 -98.
color. Fonte: Disponí-
vel em: <http://www. __________. O olho do poder. In:__. MACHADO, Roberto. Microfísica do poder. Rio de Janeiro:
baixarfilmesdublados. Graal, 1982b, p. 209-227.
net/baixar-filme-xingu-
-nacional/>. __________. Vigiar e punir: história da violência nas prisões. São Paulo: Vozes, 2005, 262p.
54
Ciências da Religião - Antropologia Cultural
LIMA, Fernanda Veloso. Produção do corpo e produção da cidade: um estudo sobre os espa-
ços sociais e simbólicos da prostituição feminina em Monte Claros/MG (1940-1970). 136 f. Disser-
tação de Mestrado, Unimontes: Montes Claros, 2008.
MARCONI, Mariana de Andrade; PREZOTTO, Maria Neves. Antropologia: uma introdução. 6 ed.
2ª impressão, São Paulo: Atlas, 2006.
MAUSS, Marcel. Sociologia e Antropologia. Paulo Neves. São Paulo: Cosac Naify, 2003.
A Missão. Direção: Roland Joffé, Inglaterra. Warner Bros, 1986. DVD (126 min), color.
OLIVEN, Ruben George. A Antropologia dos Grupos Urbanos. 6 ed. Petrópolis: Vozes, 2007.
SAHLINS, Marshall. Sociedades Tribais. Tradução: Yvonne Maggie Alves Velho. Rio de Janeiro:
Zahar, 1983.
SCHWARCZ, Lilia Moritz. O Espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Bra-
sil do século XIX. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.
55
Ciências da Religião - Antropologia Cultural
Resumo
Na Unidade 1, você aprendeu a definição de Antropologia e dos campos de abordagens
antropológicos, bem como a comparação entre a Antropologia e outras Ciências. O objetivo é
fazer uma reflexão sobre a especificidade do discurso antropológico e a produção de um conhe-
cimento dessa Ciência. Refletimos, também, sobre métodos e trabalho de campo na Antropolo-
gia, buscando explicitar a singularidade do saber antropológico. Para tanto, estudamos:
• como a Antropologia surge como Ciência em um contexto histórico específico e como ela
foi, a princípio, influenciada pelas Ciências Naturais;
• percebemos que a ciência antropológica definiu como seu primeiro objeto de estudo as so-
ciedades consideradas primitivas e que essa foi a primeira característica que lhe conferiu es-
pecificidade na qualidade de um campo científico de investigação;
• que o paulatino desaparecimento das sociedades ditas selvagens colocou a Antropologia
em uma crise de identidade, fazendo-a refluir sobre sua própria civilização e questionar sua
razão de ser;
• a distinção da Antropologia e demais ciências que também estudam o homem, bem como a
especificidade de seu método de investigação, ou seja, a observação participante que quer
dizer uma vivência prolongada junto à cultura que pretende interpretar;
• as divisões da ciência antropológica em diversos ramos, tais quais: Arqueologia, Antropolo-
gia Biológica, Antropologia Cultural, entre outras;
• que para a Antropologia o conceito de cultura não se refere a erudição ou acúmulo de co-
nhecimento, mas sim a formas de agir, pensar e sentir as quais são vividas de forma distinta
por populações mundo afora;
• o conceito de Etnocentrismo, que faz um grupo identificar seus valores como sendo preferí-
veis a todos os demais;
• o conceito de Relativismo Cultural, que procura compreender os comportamentos segundo
as explicações e pontos de vista da própria cultura que os origina.
57
UAB/Unimontes - 1º Período
estranhar o familiar torna-se mais complicado, uma vez que o pesquisador estuda sua pró-
pria cultura;
• que a experiência oriunda do trabalho de campo possibilitou uma interpretação científica
das sociedades complexas;
• que para estudar a cultura é preciso apreender os mecanismos de produção simbólica que
integram suas linhagens e representações, assim como a maneira com a qual tais linhagens
e representações adquirirem uma realidade própria;
• que a diferenciação entre o campo simbólico e as simulações dos sujeitos é de suma impor-
tância para a compreensão de uma determinada imagem da sociedade, sobretudo a com-
plexa;
• as três concepções de identidade e que podemos entendê-la de forma diferente em cada
contexto histórico, isto é, a percepção de identidade do sujeito do Iluminismo, do sujeito
sociológico e do sujeito pós-moderno;
• um dos campos de análise das sociedades complexas, a saber, a Antropologia Urbana, bem
como a cidade e os grupos que nela vive;
• o conceito de território e como ele contribuiu para a compreensão do espaço citadino;
• a visão da Escola de Chicago sobre os fenômenos urbanos;
• a associação equivocada entre crime e pobreza proferida por alguns discursos antropológi-
cos do século XIX;
• o esquadrinhamento e a vigilância que as populações que vivem na cidade são acometidas
cujo intuito é mediar o conflito proveniente da vida na cidade;
• a cidade complexa é dotada de um emaranhado de relações e conflitos sociais cujas reivin-
dicações versam por bens inegociáveis, como gênero, identidade, raça, entre outros;
• que no contexto da cidade, e diante dos conflitos dela provenientes, os novos movimentos
sociais eclodem em prol da dessa reivindicações;
• o modelo de controle de alguns grupos que ferem a ordem da cidade, como exemplo, a
prostituição;
• foram os memorialistas e cronistas que contribuíram para os primeiros relatos sobre as “so-
ciedades primitivas” do Brasil;
• que a partir das escavações feitas por estudos arqueológicos descobri-se que a presença do
homem no Brasil é muito antiga, podendo datar em até 14.000 a. C;
• que, até 1930, grande parte da produção antropológica acerca desses povos foi realizada
por estudiosos de outras áreas, como exemplo, juristas, médicos, botânicos, entre outras
que se interessou por índios, negros e sertanejos.;
• que durante muito tempo os estudos Antropológicos no Brasil sofreram influência do evolu-
cionismo, sobretudo no que diz respeito ao entendimento da miscigenação como um entre-
ve à pretensão de um Brasil civilizado;
• as três diferentes visões sobre o índio em períodos distintos, ou seja, na época do descobri-
mento ele era selvagem, quando da expansão do cristianismo uma criança que tem alma e
precisa ser salva, ao passo que no pós-independência, um herói;
• a proposta de revisão acerca da imagem do índio e que essa deve se apresentar muito mais
próxima da realidade;
• o problema na interpretação sobre o índio está nos discursos que pensam a questão indí-
gena, no Brasil, como uma ausência ou incapacidade adaptativa à sociedade brasileira;
• que Antropologia somente se institucionalizou no Brasil a partir das décadas de 1930 a
1960, quando divervas Faculdades de Filosofia e Ciências Humanas foram inauguradas no
Brasil;
• a importância da criação da Associação Brasileira de Antropologia como um canal de estu-
dos e pesquisas nessa área;
• a compreender o conceito de cidadania no Brasil com uma relação entre a casa e a rua.
58
Ciências da Religião - Antropologia Cultural
Referências
Básicas
BOURDIEU, Pierre; PRADO, Silvia de Almeida. A economia das trocas simbólicas. 3. ed. São Pau-
lo: Perspectiva, 1992. 361 p.
Complementares
DURHAM, Eunice. A dinâmica da cultura: ensaios de Antropologia. São Paulo: Cosac Naify, 2004.
Suplementares
VELHO, Gilberto. Individualismo e cultura: notas para uma antropologia da sociedade contem-
porânea. 7 ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004.
WIRTH, Louis. O urbanismo como modo de vida. Trad. Marina Corrêa Treuherz. In: __ Velho, Gil-
berto (org.). O Fenômeno Urbano. Rio de Janeiro: Zahar, 1979.
59
Ciências da Religião - Antropologia Cultural
Atividades de
aprendizagem - AA
1) Assinale a alternativa CORRETA sobre o conceito de ETNOCENTRISMO:
a) É a visão do mundo em que nosso próprio grupo é tomado como centro e todos os outros são
pensados e sentidos através dos nossos valores, nossos modelos, nossas definições do que é a
existência.
b) A ação humana é perfeitamente explicável a partir de uma determinação biológica.
c) É o respeito e a não negação da diversidade cultural.
d) Os hábitos e os costumes são provenientes da reação ao instinto de sobrevivência dos seres
humanos.
4) De acordo com Franz Boas, o evolucionismo não é capaz de explicar as diversidades culturais.
Assim, atribuiu à antropologia a execução de algumas tarefas que estão representadas nas alter-
nativas abaixo, EXCETO:
a) A reconstrução da história de povos ou regiões particulares.
b) A comparação da vida social de diferentes povos cujo desenvolvimento segue as mesmas leis.
c) As diversidades culturais são resultados do estágio de evolução no qual cada sociedade se en-
contra.
d) Através do particularismo histórico, cada cultura segue os seus próprios caminhos em função
dos diferentes eventos históricos que enfrentou.
61
UAB/Unimontes - 1º Período
62