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A DINASTIA OMRIDA:
Reconstrução do Primeiro Estado Independente
de Israel a partir da Bíblia e da Arqueologia
A DINASTIA OMRIDA:
Reconstrução do Primeiro Estado Independente
de Israel a partir da Bíblia e da Arqueologia
FICHA CATALOGRÁFICA
CDD 220.93
4
DEDICATÓRIA
7
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao Eterno.
Ao meu orientador prof. Dr. José Ademar Kaefer que se tornou um amigo
nesta caminhada, e sempre me apoiou e me encorajou a prosseguir avançando
nas pesquisas sobre Israel Norte, sem me esquecer do povo das comunidades e
em como levar esse conhecimento a ele.
Ao prof. Dr. Tércio Machado Siqueira que foi meu orientador no Mestrado,
e ao prof. Dr. Edson de Faria Francisco, estudiosos da área de Bíblia, grandes
amigos e incentivadores. Também ao prof. Dr. Paulo Nogueira, por suas
observações ao meu projeto no exame de qualificação.
RESUMO
Esta pesquisa tem por objetivo analisar a dinastia omrida como a fundadora do
primeiro Estado independente de Israel, no séc. IX AEC. Este foi o único
momento da história que Israel governa de modo totalmente independente. Ao
invés de ser dominado era Israel quem dominava. A dinastia dos reis omridas
expandiu seu território alcançando a costa do mar Mediterrâneo, o sul da Síria, a
Transjordânia e dominando sobre Judá. A fundação de Samaria por Omri foi o
início do primeiro estado israelita. Omri edificou a cidade e realizou grandes
obras unindo vários aspectos arquitetônicos existentes e inovando com outros,
de forma que formou um modelo arquitetônico para todas as construções
omridas pelo vasto território. Israel Norte possui todas as características de um
estado desenvolvido, conforme as teorias de formação dos estados de Childe e
Liverani. Palácios suntuosos, edifícios públicos e administrativos, mão-de-obra
especializada, cobrança de tributos, templos, produção excedente, indústrias,
corpo de escribas e escrita desenvolvida. Judá não possuía nada disso, ao
contrário, durante o séc. IX AEC era pequeno e sem recursos. Judá se tornou
um estado desenvolvido somente no séc. VIII AEC, depois que Israel Norte foi
destruído pelos assírios. Mas apesar de tudo isso, a dinastia omrida é vista com
a pior, mais pecadora e mais perversa de todas, seus reis, principalmente, Omri
e Acab são avaliados nas narrativas bíblicas como os piores reis de Israel. Isso
porque a história de Israel como a temos na Bíblia, foi editada e compilada por
Judá, quando Israel Norte já não existia, isto favoreceu Judá na história bíblica.
Esta pesquisa pretende fazer o caminho inverso, entender a história de Israel a
partir de Israel Norte. E para isso, o método utilizado será a análise exegética e
a análise dos achados arqueológicos. A exegese com a arqueologia para
desvendar a história de Israel Norte do séc. IX AEC, que não foi registrada nos
textos bíblicos. Para isso, foram realizadas visitas de estudo em quase todos os
sítios analisados nesta pesquisa (sítios de Israel, Palestina e Jordânia), também
foram realizadas escavações no sítio arqueológico de Tel Megiddo (2016), com
o arqueólogo Israel Finkelstein, um dos referenciais desta pesquisa. Quanto aos
resultados, Israel Norte, no período da dinastia omrida, de fato foi o primeiro
estado israelita e o único de toda a história de Israel a existir e governar de
forma independente. O vasto território dominado pela dinastia omrida é
praticamente o mesmo da Monarquia Unida de Davi e Salomão. Há grande
possibilidade de que a ideia de Monarquia Unida tenha vindo das memórias de
um reino poderoso, próspero e extenso que governou o Norte e o Sul, a
Transjordânia e chegou até a Síria, que tinha fortes ligações comerciais com a
Fenícia. Enfim, o único reino que fez tudo isso foi o da dinastia omrida.
ABSTRACT
This research aims to analyze the Omride Dynasty as the founder of the first
independent state of Israel in the ninth century BCE. This was the only time in
history that Israel rules completely independently. Instead of being dominated, it
was Israel who dominated. The kings of the Omride Dynasty expanded their
territory, reaching the shores of the Mediterranean Sea, southern Syria,
Transjordan and dominating over Judah. The founding of Samaria by Omri was
the beginning of the first Israelite state. Omri built the city and made great works
by uniting various architectural aspects and innovating with others, in a way that
formed an architectural model for all buildings omridas by the vast territory.
Northern Israel has all the characteristics of a developed state, according to the
theories of the establishment of the states of Childe and Liverani. Sumptuous
palaces, public and administrative buildings, specialized labor, collection of taxes,
temples, surplus production, industries, body of scribes and developed writing.
Judah had none of this, on the contrary, during the ninth century BCE, was small
and without resources. Judah only becomes a developed state in the eighth
century BCE, after Israel North was undone by the Assyrians. But despite all this,
the Omride Dynasty is seen with the worst, most sinful and most perverse of all,
its kings, especially Omri and Ahab, are evaluated in the biblical narratives, as
the worst kings of Israel. This is because the history of Israel as we have it in the
Bible was edited and compiled by Judah, when Northern Israel was destroyed,
this favored Judah in biblical history. This research intends to do the opposite
way, understanding the history of Israel from Northern Israel. And for that, the
method used will be the exegetical analysis and the analysis of the
archaeological findings. Exegesis with archeology to unravel the history of
northern Israel from the ninth century BCE, which was not told in the biblical
texts. For this, study visits were carried out in almost all the sites analyzed in this
research (sites of Israel, Palestine and Jordan), excavations were also carried
out at the archaeological site of Tel Megiddo (2016), with archaeologist Israel
Finkelstein, one of the references of this search. As for the results, Israel North
was in fact the first Israeli state, and the only one in all of Israel's history to exist
and govern independently. The vast territory dominated by the Omride Dynasty is
practically the same as the United Monarchy of David and Solomon. There is a
strong possibility that the idea of the United Monarchy came from the memories
of a powerful, prosperous and extensive kingdom that ruled North and South,
Transjordan, and reached Syria, which had strong trade links with the
Phoenician. At last, the only kingdom that did all this, was the one of the omrida
dynasty.
RESUMEN
SUMÁRIO
ABREVIATURAS ................................................................................................14
INTRODUÇÃO ....................................................................................................16
1. As fontes bíblicas ....................................................................................... 16
2. As fontes arqueológicas ............................................................................. 17
3. O Método ................................................................................................... 19
4. As Hipóteses .............................................................................................. 20
5. Estrutura da Pesquisa ................................................................................ 21
PARTE 1: ESTADO ATUAL DA PESQUISA .....................................................23
Capítulo 1 - A Situação Atual da Pesquisa sobre Israel Norte ......................24
1. Abordagens sobre a dinastia Omrida publicadas até 1980 ........................ 25
2. Abordagens sobre os omridas publicadas entre 1980 e 2000 ................... 35
3. Abordagens sobre a dinastia omrida publicadas após 2000 ...................... 41
PARTE 2: LITERATURA ....................................................................................64
Capítulo 2 - A Ascensão da Dinastia Omrida: Estudo Exegético de 1Rs
16.15-33. ...........................................................................................................65
Introdução .........................................................................................................65
1. Tradução Literal Interlinear de 1 Reis 16.15-33 ............................................66
2. Crítica Textual ...............................................................................................69
3. Delimitação da Perícope ...............................................................................77
4. Estrutura da Perícope ...................................................................................79
5. Coesão da Perícope .....................................................................................82
6. Gênero Literário ............................................................................................86
7. Análise do Conteúdo de 1Rs 16.15-33 .........................................................89
7.1. A Ascensão de Omri (16.15-22) .................................................................90
7.1.1. Zimri usurpa o trono de Israel Norte (v.15) ........................................ 90
7.1.2. Omri, comandante do exército de Israel Norte (v.16) ........................ 94
7.1.3. Omri sitia a cidade de Tirza, capital de Israel Norte (v.17)................. 97
7.1.4. A morte de Zimri no palácio real (v.18) .............................................. 98
7.1.5. Avaliação negativa do reinado de Zimri (v.19-20) .............................. 99
7.1.6. Um concorrente de Omri ao trono de Israel Norte, Tibni (v.21) ....... 102
7.1.7. A morte de Tibni e a ascensão de Omri ao trono (v.22) .................. 104
7.2. O Reinado de Omri e a Fundação de Samaria (16.23-28) .......................106
7.2.1. Omri começa a reinar sobre Israel Norte a partir de Tirza (v.23) ..... 107
7.2.2. A fundação de Samaria, a nova capital de Israel Norte (v.24) ......... 111
7.2.3. Avaliação negativa do reinado de Omri (v.25-26) ............................ 115
7.2.4. O fim do reinado de Omri (v.27-28) ................................................. 121
7.2.5. Acréscimo no texto grego da LXX (Ralphs) em 3Rns 16.28: ........... 125
7.3. O Reinado de Acab, Filho de Omri (16.29-33) .........................................130
7.3.1. Início do reinado de Acab (v.29) ...................................................... 131
12
ABREVIATURAS
א a a ‚ A ا ’
בּ/ב b b b B ب b / ḇ
ג g g G G ج g
ד d d D d د d
ה h h H h ھ h
ו u W W w و w
ז z z Z z ز z
ח H x x x ح ḥ
ט T j j j ط ṭ
י i Y Y y ي y
ל l l L l ل l
מ/ם m M M m m م m
ס s s s S س s
ע o [ [ { ع ‘
ק q Q Q s ق q
ר r r R r ر r
שׂ/שׁ w f v V س/ش ś / š
ת t T t t ت t
16
INTRODUÇÃO
1 ELLIGER, Karl; RUDOLPH, Wilhelm (eds.). Biblia Hebraica Stuttgartensia. 5. Ed. Stuttgart:
Deutsche Bibelgesellschaft, 1997.
2 RAHLFS, Alfred (ed.). Septuaginta: Id est Vetus Testamentum graece iuxta LXX interpretes.
principais versões da Bíblia Hebraica. A tradução é datada do séc. III AEC, feita
em Alexandria, Egito. (FRANCISCO, 2008, p. 432-433). A LXX será utilizada
para comparações com o texto da Bíblia Hebraica, especificamente nos casos
de palavras com tradução incerta e nos casos de acréscimos contidos na versão
grega que não aparecem na Bíblia Hebraica.
2. As fontes arqueológicas: Serão trabalhadas três fontes arqueológicas
escritas relacionadas diretamente com a dinastia omrida de Israel Norte. Estas
fontes são duas inscrições em paleohebraico (Estela de Mesha e de Tel Dan) e
uma em cuneiforme (Obelisco Negro de Salmaneser III):
2.1. Estela de Mesha: Também chamada de Estela de Mesha, ou
ainda Estela Moabita. Ela foi encontrada na cidade de Diban, na Jordânia, em
1868, pelo missionário alemão Friederich Klein. A estela mede 1,10m de altura
por 0,60m de largura, e está atualmente no Museu do Louvre, Paris. (KAEFER,
2015, p.74-76; GALLEAZO, 2008, p. 12). Há uma réplica desta estela no Museu
de Arqueologia do Instituto de Arqueologia da Universidade Hebraica de
Jerusalém, da qual fiz vários registros fotográficos.
Esta estela mostra como Israel Norte expandiu seu domínio a leste do
Jordão, na Transjordânia, territórios de Amon e Moab. Este é um testemunho
extra bíblico importante da expansão omrida nos territórios da atual Jordânia. Ela
menciona importantes localidades que indicam fortalezas omridas de fronteira,
como: Atarote e Jahaz, além de mencionar Madaba e Monte Nebo, que estavam
sob o domínio omrida. Esta estela é importante para esta pesquisa, pois ela
indica os territórios dominados pelos omridas na região da Transjordânia, e o
ponto de vista transjordaniano a respeito de Israel Norte.
2.2. Estela de Tel Dan: Foram encontrados três fragmentos (A, B1 e
B2) de basalto desta estela durante as escavações realizadas nos anos de
1993-1994 no sítio de Tel Dan3, extremo norte de Israel. O fragmento A foi
descoberto em 21 de julho de 1993, o fragmento B1, em 20 de junho de 1994, e
o fragmento B2 em 30 de junho de 1994 (ATHAS, 2003, p.1,6,13-14; KAEFER,
2015, p. 78).
Esta estela se tornou conhecida por causa de uma expressão que aparece
escrita no fragmento A, dwdtyB “Casa de Davi”. Mas para esta pesquisa, a
importância desta estela está no fato de ela revelar novas e relevantes
informações para a compreensão da história de Israel Norte. Ela revela que foi
Hazael (possível autor do escrito), quem matou Jorão, rei de Israel e Acazias, rei
de Judá, e quem colocou Jeú no poder. Ela também mostra que os omridas
ocuparam territórios que Hazael, rei de Damasco, afirmava ter sido do pai dele,
Ben Hadad. Isto ajuda a compreender as fronteiras omridas ao norte e nordeste,
contra Aram-Damasco, região de Gilead e Ramot-Gilead (KAEFER, 2015, p.80-
82).
2.3. Estela de Kurkh de Salmaneser III: A inscrição está em
caracteres cuneiformes, e foi encontrada em 1861 pelo britânico John George
Taylor, na antiga cidade de Kurkh, leste da Turquia. Nesta inscrição, o rei
Salmaneser III (858-824 AEC), da Assíria, relata sua vitória em Qarqar sobre a
coalizão anti-assíria formada por doze reis, entre eles, Acab, Aḫabbu, rei de
Israel Norte. (KAEFER, 2015, p. 70-71; GRAYSON, 2002, p. 23-24;
PRITCHARD, 1950, p. 278-279). A Estela de Kurkh de Salmaneser III foi datada
em 853-852 AEC4
A importância desta inscrição está nas informações que ela fornece a
respeito do rei Acab, mostrando seu poderio bélico, seu destaque entre os
demais reis da coalizão, e sua força de organização e planejamento de guerra.
Além da citação do nome de Acab, Aḫabbu, e da sua expressiva quantidade de
carros de guerra e soldados a pé, os assírios conheciam o reino de Israel Norte
através da expressão “Casa de Omri”, Bit-Ḫumrii, inclusive anos após o
extermínio de sua dinastia. Tal expressão ocorre pelo menos cinco vezes nos
textos assírios de Salmaneser III (GRAYSON, 2002, p. 48, 54, 60, 149).
2.4. Sítios arqueológicos omridas estudados in loco: Foram
visitados quase todos os sítios arqueológicos pertencentes ao período da
dinastia de Omri. São sítios de Israel, Palestina e Jordânia que apresentam
evidências das características arquitetônicas omridas, as quais ajudam a
reconstruir as dimensões geopolíticas do reino de Israel Norte. Os sítios
4 The British Museum. The Monolith stelae of Shalmaneser III. Disponível em:
http://www.britishmuseum.org/research/collection_online/collection_object_details/collection_ima
ge_gallery.aspx?assetId=150815&objectId=367117&partId=1. Acesso em 14/10/2015.
19
visitados e estudados são: Samaria, Tel Jezreel, Tel Megiddo (estrato VA-IVB),
Ḥazor (estrato X), Tel Dan, Tell el-Farah [Tirza] (estrato VIIB), Tel Gezer (estrato
VII), Tel Reḥov (estrato VI-IV), En Gev (estrato IV, área A, e estrato III, área B-
C), Tell Ballata (Siquém) e Pella, Tell Hisban (Hesbon), Khirbet ‘Ataruz5 (Atarote)
e Khirbet ‘Ara‘ir (Aroer).
Também serão trabalhados outros sítios omridas que foram analisados a
partir dos seus relatórios de escavação, em livros ou nos websites das
expedições arqueológicas. Os sítios são: Abel-Bet-Maacah6, Khirbet al-
Mudayne7 (Jahaz), Kuntillet ‘Ajrud, Tel Ḥarashim, Taanak (período IIA e IIB),
Horvat Rosh Zayit (estrato 3-2), Har Adir (equivalente ao estrato X de Ḥazor), Tel
‘Amal, Tell el-Hammah e Dibon.
3. O Método
A presente pesquisa foi realizada a partir de levantamento bibliográfico,
análise exegética do texto bíblico e da pesquisa arqueológica. As obras
analisadas e estudadas aqui trazem informações sobre o estado atual das
pesquisas sobre o reino de Israel Norte e lançam luzes às novas pesquisas
sobre o período da dinastia de Omri.
Do levantamento bibliográfico, há uma quantidade de materiais produzidos
principalmente fora do Brasil sobre a história de Israel. Mas suas abordagens
são fragmentadas e do modo como são apresentadas não é possível enxergar o
todo, só partes de um contexto maior. A pesquisa bibliográfica consiste em obras
clássicas sobre o tema de estudiosos, como William Foxwell Albright, John
Bright, Thomas Thompson, Israel Finkelstein entre outros. Os relatórios das
escavações tanto em obras impressas como em relatórios publicados online nos
websites das expedições.
A análise exegética de 1Rs 16.15-33 é o ponto de partida. Uma das
principais fontes de análise será o texto hebraico dos livros de 1 e 2 Reis. O
método exegético utilizado nesta pesquisa é baseado na Crítica das Formas, um
dos passos do complexo método Histórico-Crítico. Este método segue uma
estrutura de certo modo fixa: a tradução “literal” do texto hebraico, a análise da
5 http://www.ataruz.org.
6 http://www.abel-beth-maacah.org.
7 https://mudaynathamad.wordpress.com.
20
4. As Hipóteses
A partir de levantamento bibliográfico do estado atual da pesquisa sobre os
reis omridas e das análises das evidências arqueológicas dos sítios omridas, a
hipótese que será verificada nesta pesquisa é a de que a dinastia omrida foi a
fundadora do primeiro Estado desenvolvido israelita, e que a fundação de
Samaria foi essencial para esse processo de estabelecimento do Estado, por
sua localização geográfica estratégica e por ter se tornado o centro da
administração de todo o reino de Israel Norte.
Desta forma, outra hipótese que será verificada nesta pesquisa é a de que
o único período em que Israel reinou de modo independente, que ao invés de
ser dominado dominava, foi durante o governo da dinastia omrida. Por fim, serão
analisadas as evidências das dimensões territoriais de Irsael Norte no séc. IX
AEC, comparando com o território atribuído à Monarquia Unida, com o objetivo
de verificar se é o mesmo território e se a ideia de Monarquia Unida não seria do
período dos reis omridas, durante o séc. IX AEC.
21
5. Estrutura da Pesquisa
Esta pesquisa possui seis capítulos divididos em quatro partes: 1. Bases, 2.
Literatura, 3. Arqueologia, e 4. Reconstrução Histórica. Na parte 1. Bases, está o
capítulo um, que aborda o estado atual das pesquisas sobre Israel Norte,
especificamente sobre os reis da dinastia omrida. Neste capítulo há uma seleção
de obras publicadas durante o séc. XX e XXI. No total são quinze estudiosos: 1.
William Foxwell Albright, 2. George Ernest Wright, 3. John Bright, 4. Martin Noth,
5. Werner Keller, 6. James Pritchard, 7. Herbert Donner, 8. Thomas Thompson,
9. Jorge Pixley e 10. Milton Schwantes), 11. Ildo Bohn Gass, 12. Mario Liverani,
13. José Ademar Kaefer, 14. Amihai Mazar, e 15. Israel Finkelstein). A partir
destes estudiosos, com seus pontos de vistas diferentes conforme suas épocas,
formam a base da visão sobre os reis da dinastia omrida nesta pesquisa.
A parte 2, (Literatura) possui dois capítulos: cap. 2 = A exegese de 1Rs
16.15-33, que segue em parte a Crítica das Formas, analisando a partir do texto
da Bíblia Hebraica e sua tradução e o conteúdo da perícope; e, cap. 3 = A
análise do conjunto literário sobre a dinastia omrida. Esta é a análise literária da
dinastia, desde seu surgimento e formação da dinastia por Omri, rei de Israel. O
estabelecimento da monarquia norte-israelita, a expansão do seu domínio
territorial, a vassalagem de outros povos, as listas de cidades transjordanianas
sob seu domínio e a indústria de cobre/bronze conquistada por eles. São
analisados os livros de 1 e 2 Reis, 2 Crônicas, as listas de cidades apresentadas
nos livros de Números, Deuteronômio, Josué e Juízes.
A parte 3, (Arqueologia) é composta por dois capítulos: o cap. 4 = A
fundação de Samaria a partir da Arqueologia, e cap. 5 = O território dominado
pelos omridas a partir da arqueologia. Nesta parte a análise é feita tendo como
base os relatórios e as visitas aos sítios arqueológicos dominados pelos omridas
no séc. IX AEC. Primeiro a análise dos relatórios das escavações em Samaria,
bem como dos diários de escavação de George Reisner e David Gordon Lyon,
informando com detalhes o que aconteceu e o que foi encontrado em cada dia
das temporadas de 1909-1910. Depois, no cap. 5 foi trabalhado o território
dominado pelos omridas, a partir de levantamento dos sítios de fronteira que
foram construídos ou dominados pelos omridas no séc. IX AEC. Com isso, pode-
se reconstruir as possíveis fronteiras do antigo reino de Israel Norte.
22
PARTE 1
ESTADO ATUAL DA PESQUISA
24
Capítulo 1
A SITUAÇÃO ATUAL DA PESQUISA
SOBRE ISRAEL NORTE
Introdução
Neste capítulo será apresentada uma revisão de bibliografia de alguns dos
principais estudiosos da área bíblica do séc. XX, mostrando a situação atual da
pesquisa sobre a dinastia omrida. São as bases para o prosseguimento da
pesquisa sobre os reis omridas (Omri, Acab, Acazias, Jorão e Atalia). Este
capítulo está estruturado em duas partes principais: 1. Abordagens sobre a
dinastia omrida no séc. XX, e 2. Abordagens sobre a dinastia omrida no séc.
XXI. Cada uma desta partes são apresentadas obras selecionadas e publicadas
em cada período. Desta forma, pode haver estudiosos que viveram também na
época anterior, mas que produziram obras importantes no período seguinte.
Assim, o foco está nas obras publicadas sobre a história e arqueologia de
Israel, restringindo ainda mais para o Israel Norte do período da dinastia omrida,
séc. IX AEC. Autores como William Foxwell Albright, um dos pioneiros nas
pesquisas sobre a história e arqueologia de Israel, John Bright, seu discípulo,
James Pritchard, Herbert Donner e Thomas Thompson. Estudiosos latino-
americanos, como: Jorge Pixley, Milton Schwantes e José Ademar Kaefer, e
estudiosos israelenses na área da arqueologia, como Amihai Mazar e Israel
Finkelstein.
As obras apresentadas aqui fornecem uma visão geral do tema da dinastia
omrida, de forma que é possível perceber as tendências e as mudanças de
abordagem no decorrer do séc. XX e XXI. As abordagens oscilam entre as
visões maximalistas e as minimalistas, mas também é possível perceber a
ascensão da visão centrista da história de Israel e seus principais expoentes.
25
8Sobre este assunto, veja: SCHMITH, Bryan (ed.). The Quest for the Historical Israel: Debating
Archaeology and the History of Early Israel – by Israel Finkelstein and Amihai Mazar. Number 17.
Leiden-Boston: Brill, 2007. Veja também MENDONÇA, Elcio V. S. “O Novo Paradigma
Arqueológico e os Estudos Bíblicos”. Em: VIGIL, Jose Maria (ed.). Revista Voices. The New
Biblical Archaeological Paradigm. EATWOT, 2015, p. 25-37.
26
Assim, este grupo entende que os textos têm valor e que podem ter preservado
provas confiáveis sobre a história de Israel nos tempos monárquicos, o que não
os isenta de possuírem conteúdo altamente ideológico, adaptado ao seu período
de compilação. (FINKELSTEIN, 2007, p. 14; KAEFER, 2015, p. 20-21; KAEFER,
2014, 157-158).
Vejamos, a partir de agora, como foram e tem sido as abordagens de
alguns dos principais estudiosos bíblicos referentes à dinastia dos reis omridas
do séc. XX, entre teólogos, historiadores e arqueólogos.
9 Para mais informações sobre a École Biblique et Archeologique Française de Jérusalem, veja
http://www.ebaf.edu/?cat=78&lang=en.
27
portões teriam se tornado o estilo padronizado por Salomão em várias das suas
fortalezas, tanto em Megiddo com em Gezer e Ḥazor, também em Laquish e em
Ezion-Geber, no Golfo de Aqaba. Mesmo assim, Albright não está totalmente
convicto, pois ele mesmo diz que “tem quase certeza que datam de Salomão”.
Sobre os omridas, Albright reserva poucas páginas de sua importante obra,
três ou quatro páginas onde são citados os nomes de Omri e Acab. Quando ele
cita a Estela de Mesha, ele o faz em poucas linhas, e não menciona os reis
omridas (p. 128-129, 137).
Em outra obra de referência de Albright The Archaeology of Palestine and
the Bible, de 1932, ele menciona Acab e a dinastia omrida somente em três
páginas (p.31-33). Ele não fornece muitas informações sobre os omridas,
apenas menciona os arqueólogos e as expedições que trabalharam em Samaria,
como é o caso de George A. Reisner e C. S. Fischer, nada mais.
O mesmo acontece em outra importante obra de Albright, Archaeology and
the Religion of Israel, cuja primeira edição foi impressa em 1942. Nesta obra, o
tema central é a religião no Antigo Oriente Próximo, e aborda principalmente a
religião no antigo Israel e de Canaan. Embora haja muito a se dizer da religião
em Israel Norte, Albright se limita a mencionar brevemente o período de Omri e
Acab, somente para se referir aos óstracos de Samaria, que já na época desta
edição eram datados no período de Jeroboão II, e a Estela da Mesha, para tratar
da escrita hebraica em Israel e por citar o nome de Javé, o tetragrama
(ALBRIGHT, 1956, p.41).
Outra ocorrência dos omridas nesta obra acontece no capítulo cinco,
quando trata do ciclo de Elias/Eliseu e do conflito entre os profetas de Baal e de
Aserá (ALBRIGHT, 1956, p. 157). A escassez de referências aos omridas na
obra de Albright, demonstra a pouca importância que se dava à história desta
dinastia ainda na primeira metade do séc. XX.
de 1931 e 1932, Bright viajou para participar das escavações em Tell Beit
Mirsim, na quarta e última temporada. As expedições neste sítio eram lideradas
por William Foxwell Albright, e lá John Bright o conheceu e se tornou seu
profundo admirador e discípulo, ao lado de George Ernest Wright.
Bright se encontrou com Albright novamente nas escavações em Betel, em
1935, e neste mesmo ano iniciou o doutorado sob a orientação de Albright na
John Hopkins University, cuja tese foi concluída em 1940 com o título The Age of
King David: A Study in the Institutional History of Israel. Tal tese foi publicada em
1959 sob o título History of Israel, a qual foi traduzida para vários idiomas
(BRIGHT, 2003, p. 15-16).
Bright foi mais historiador que arqueólogo, e trabalhou uma metodologia
que fosse satisfatória para o estudo da história do antigo Israel. Ele classificou
como insatisfatórios os trabalhos de Martin Noth e Yehezkel Kaufman, por causa
da análise crítica da história de Israel, que segundo ele, deixava a fé de lado
(BRIGHT, 2003, p. 19). Por isso, ele passou a utilizar a arqueologia na linha de
frente de sua pesquisa sobre a história de Israel, pois segundo ele, a
arqueologia ajudaria a compreender de forma mais objetiva os eventos históricos
narrados nos textos bíblicos.
Bright teve a tendência de estabelecer datações para as narrativas bíblicas
conforme a época que elas narram, ou seja, as narrativas sobre Abraão são
datadas no período do Bronze, talvez do Bronze Médio ou Tardio. Moisés e os
textos de Josué e de Juízes, como sendo narrativas escritas antes do período da
monarquia israelita. Isto causa certos problemas metodológicos quando
trabalhados ao lado de outras disciplinas, como a arqueologia moderna.
12 O título original da obra é “Und die Bibel hat Doch Rech” (E a Bíblia ainda está Certa).
33
nesses capítulos. Ele classifica o reinado de Davi como uma grande potência
(KELLER, 1964, p. 162).
Segundo ele, a despeito da grandeza e do poderio egípcio, Davi foi
alargando suas fronteiras para todos os lados, conquistando ao leste o território
além do Jordão, Amon e Moab, e ao sul, descendo pelo deserto de Arabá, até o
Golfo de Ácaba. Para Keller, o objetivo de Davi era o de controlar o comércio de
cobre e minério de ferro e a Estrada Real que seguia pelo território de Edom.
Davi teria ainda avançado para o leste, conquistando as terras do vale do
Jarmuk e o planalto de Gilead, seguindo para o norte. Isto deve ter incomodado
o avanço assírio. Mesmo assim, Davi avançou para o norte até Orontes, e a
ideia era expandir o império davidida até o rio Eufrates. Para Keller, Davi
avançou para o território sírio e derrotou o rei de Damasco, prestando grande
auxílio, sem saber, ao avanço do império assírio, que mais tarde aniquilaria o
reino de Israel. Davi, portanto, estendeu suas fronteiras ao norte até o vale do
Orontes (região onde ocorrera a batalha de Qarqar, quando a coalisão
antiassíria encabeçada por Acab enfrentou o poderoso exército assírio),
ocupando territórios do Líbano, descendo até Ezion-Geber, no Mar Vermelho,
uma distância de aproximadamente 600 km (KELLER, 1964, p. 161-165).
Keller descreve o território dominado por Davi como um aglomerado de
tribos que passou a ser um grande império, ocupando todo o território israelita e
sírio. Com prédios públicos e um sofisticado aparato burocrático com escribas
ocupando o segundo posto da hierarquia do Estado (KELLER, 1964, p. 166-
168).
De igual forma, Keller reservou várias páginas (p. 169-181) para abordar a
história de Salomão. Ele inicia falando da historicidade dos textos bíblicos
referentes a Salomão, principalmente 1Rs 9, que traz várias informações sobre
as cidades edificadas por Salomão (1Rs 9.15) e a citação de Ezion-Geber e o
comércio de ouro com Ofir (1Rs 9.26-28).
O arqueólogo Nelson Glueck13, rabino norte-americano, escavou na região
do Golfo de Aqaba, junto ao Mar Vermelho, encontrando as ruínas de Tell el-
Kheleifeh. Glueck encontrou vários vestígios de cobre e edificações feitas em
blocos e pedras, logo ele identificou os achados de Tell el-Kheleifeh como sendo
13Para mais informações sobre Nelson Glueck, veja http://www.ngsba.org/en/about/our-founder-
nelson-glueck.
34
Ele fala que Omri (chamado por Keller de Amri), pressentindo a ameaça
assíria, comprou uma colina e construiu Samaria, uma colina rodeada por
montanhas, junto a um fértil vale que liga o Vale do Jordão à costa litorânea.
Segundo ele, Omri teria construído a plataforma alta e Acab, seu filho, a
plataforma baixa, ambas no topo da colina, com cerca de cem metros de altura.
O rei Acab fez aliança com Ben-Hadad, rei de Damasco, com a finalidade
de fortalecer a barreira contra a Assíria. Keller menciona as inscrições de
Salmaneser III, que cita Acab e sua força bélica na batalha da coalisão
antiassíria. Mas esta aliança durou até a retirada temporária das forças assírias,
quando numa nova batalha contra Damasco Acab morre e Hazael, rei de
Damasco, toma de volta grande parte do território ocupado por Israel. Acab é
apresentado por Keller como sendo um rei idólatra, tal qual era e é a tendência
da teologia cristã (KELLER, 1964, p. 199-200).
Keller menciona as escavações realizadas em 1908-1910, pela
Universidade de Harvard, dirigidas inicialmente por George A. Reisner, seguido
por Clarence S. Fischer e D. G. Lyon, em 1931-1935 pela equipe dirigida pelo
arqueólogo inglês J. W. Crowfoot. Pelo menos com relação a Samaria, Keller
não teme em afirmar que foram os omridas que a construiram, diferentemente
de Megiddo, Ḥazor e Gezer, as quais Keller insiste em afirmar que são cidades
edificadas por Salomão, como era a tendência da época, inicialmente dos
arqueólogos cristãos, e depois de 1948, dos arqueólogos israelenses.
Ele menciona a Estela de Mesha, mas não enfatiza o domínio de Israel
Norte sobre o leste do Jordão. Sua ênfase está no ponto em que a estela e a
Bíblia concordam na derrota dos omridas. O comentário sobre os reis omridas se
encerra na menção da revolta de Jeú e da inscrição onde ele aparece,
prostrando-se diante de Salmaneser III e pagando-lhe tributo (KELLER, 1964, p.
205-207).
14Cf. DONNER, Herbert. História de Israel e dos Povos Vizinhos. Vol.1. Da época da divisão do
Reino até Alexandre Magno. São Leopoldo: Sinodal, 1997, p. 197-268.
37
orientador não aceitou sua pesquisa, e Thompson ficou sem seu título. Alguns
anos depois sua pesquisa foi publicada e fortemente criticada por ter feito uma
análise crítica sobre as narrativas patriarcais (MOOREY, 1991, p. 114).
Como resultado de sua publicação, pelas controvérsias que surgiram, ele
ficou vários anos sem conseguir vaga em universidades norte-americanas para
ser professor (THOMPSON, 1999, p. xiii). Mas em 1985 ele foi indicado como
professor na École Biblique de Jerusalém, onde atuou como professor e
pesquisador nos sítios arqueológicos protegidos pela UNESCO.
Em 1987, Thompson publicou um livro sob o título The Early History of the
Israelite People, no qual ele retoma pesquisas realizadas por ele em 1978, onde
afirma que Israel teria surgido nas terras altas ao norte de Jerusalém no séc. IX
AEC, excluindo assim qualquer possibilidade de ter havido uma Monarquia
Unida no séc. X AEC. Esta obra causou reações mais fortes que o anterior sobre
os Patriarcas. Isto fechou de vez as portas das universidades norte-americanas
para Thompson. Entretanto, isto, segundo ele, “foi uma bênção inequívoca”,
porque lhe abriu uma porta na Universidade de Copenhague, onde ele atuou
como professor por dezesseis anos (THOMPSON, 1999, p. xiv-xv).
Na obra citada The Early History of the Israelite People (1987), Thompson
critica duramente a existencia da Monarquia Unida, que segundo ele, não há
qualquer vestígio de sua existencia. Para ele, Israel surge como um povo no séc.
IX AEC. Ele não faz ligação entre a Monarquia Unida e a dinastia omrida, mas
aponta que a dinastia omrida é uma monarquia que possui muitas evidências de
sua existência, porém ele também não diz que ela foi a primeira monarquia.
Saul, assume o trono, mas Davi vai para Judá e é coroado rei.
Pixley desenvolve a história de Israel a partir do Sul, e dizendo que a
escolha e tomada de Jerusalém por Davi foi sobremaneira estratégica. Para ele,
as razões para a escolha de Jerusalém como a nova capital de Judá, são, entre
outras, sua localização geográfica, sua localização estratégica e a existência de
muralhas circundando a cidade (p. 27).
Para Pixley, Davi fundou um grande império, e isto se deu por causa de
suas grandes conquistas territoriais e suas guerras. Davi teria organizado a
sociedade israelita, estabelecido funções administrativas e burocráticas, o
exército e o sacerdócio. Javé falaria direto com ele e com o profeta da corte.
Quanto a Salomão, ele não escreve muito, mas afirma que a estrutura
social do reinado de Salomão se assemelha às estruturas clássicas do modo de
produção tributário, com somente uma diferença, o rei estava submetido
formalmente a Javé (p.34-35).
Com relação ao Reino de Israel Norte, ele apresenta a estrutura social
baseada no rei e no exército, e todas as tribos estavam submetidas a eles. Para
ele o rei tinha pouca autoridade sobre os santuários religiosos locais, e que o rei
não era mais do que um chefe militar, responsável pela segurança das tribos
(p.40-41). Esta é uma visão muito reducionista da história de Israel Norte, e
privilegiar a história de Judá, Reino do Sul.
A história de Omri é apresentada em três páginas, e é possível perceber
certo desprezo a esta dinastia. O casamento de Acab com Jezabel, para ele, foi
simplesmente por questões de política externa, para fortalecer a política interna.
Acab teria construído um templo em Samaria a exemplo de Jerusalém, mas
afirma ser impossível domesticar Javé.
Atalia foi dada em casamento a Jorão, filho de Josafá, somente para se
manter boa relação entre os dois reinos, o que é uma interpretação bastante
simplista desse relato. Nessa época Israel Norte já dominava Judá, e Atalia foi
para Jerusalém como uma representante real dos omridas, tendo se casado com
Jorão e assumido o trono logo após a morte de Acazias, seu filho.
Pixley diz nesta obra que o único objetivo ou estratégia dos omridas era a
fundação da nova capital, Samaria, e o estabelecimento de um culto oficial a
Baal, sem que os santuários de Javé em Dan e Betel deixassem de funcionar.
40
Para ele, o rei estava no centro da estrutura social do reino de Israel Norte, e
que todas as demais áreas da sociedade estavam diretamente subordinadas a
ele.
do texto e procura sempre uma ponte com a atualidade. Mas ele não tem
acompanhado, pelo que parece, os avanços da pesquisa arqueológica e
histórica da Bíblia, bem como as dificuldades textuais e de datações redacionais.
Na obra Formação do Império de Davi e Salomão (2011), o foco principal é
a ascensão de Davi e a formação da monarquia unida. Gass aborda vários
aspectos da ascensão de Davi ao trono de Israel e do domínio sobre todas as
doze tribos. A expansão do território e todo o aparato burocrático do império, e
isto depois da reprovação do reinado de Saul. Para Gass, o reinado de Saul foi
somente um período intermediário entre a sociedade tribal e a monarquia (p.23).
O filho de Saul, Ishbaal, é tido como um rei fraco e sem expressão política,
o qual não representou nenhuma ameaça para Davi, que estava sendo coroado
rei em Judá. Quando o Norte ficou sem rei, Davi reuniu as dez tribos nortista e
assim passou a reinar sobre todo o território de Israel e Judá, incluindo territórios
do planalto de Gilead e de Moab (p.26-28). Segundo Gass, o território do império
de Davi teria ido até o norte da Síria e descido até o norte da península do Sinai
e Eilat, no Golfo de Áqaba (p.31).
Para a redação deuteronomista da Bíblia, as ações de Israel Norte contra
Judá são vistas como rebelião ou rebeldia, como por exemplo, quando da revolta
de Absalão apoiado pelas dez tribos do Norte. (p.33-37). A partir da página
quarenta e um, Gass estudou a monarquia sob o domínio de Salomão em
Jerusalém, e assim segue até o final do livro.
O rei Salomão é visto como sábio e poderoso, mas Gass também percebe
que ele fez muitas injustiças, principalmente para com as tribos do Norte. Quem
pagava a conta do luxo de Salomão eram os tributos pesados cobrados das
tribos do Norte. O povo do campo é que pagava a conta disso tudo. Eram os que
sustentavam o reino propriamente dito.
Na outra obra Reino Dividido (2011), Gass aborda toda a história da
monarquia dividida, todos os reis do Norte e todos do Sul. Destes, os que mais
importam aqui são os reis da dinastia Omrida, chamada por ele como “Amri”. Ele
segue basicamente a narrativa bíblica, recontando a história e estabelecendo
paralelos com o reinado de Davi e Salomão.
Segundo Gass, o motivo pelo qual o culto em Israel Norte era plural, tendo
Baal como divindade principal, era o fato de os reis omridas manterem relações
43
Entre suas últimas publicações está o livro The Forgotten Kingdom: the
archaeology and history of Northern Israel (2013). Este novo livro é uma coleção
de palestras proferidas no Le Royaume Biblique Oublié, em Paris (2012). Teve
sua primeira publicação em francês e depois traduzido para o inglês em 2013. O
livro é muito útil para arqueólogos e biblistas, já que Finkelstein trabalha com
arqueologia e Bíblia, utilizando-se das conclusões de suas próprias pesquisas
arqueológicas para o estudo da história bíblica. O livro abrange o período do
Bronze Tardio até o período do Ferro IIB (entre os anos de 1350-720 AEC). Este
período envolve principalmente as narrativas bíblicas de 1 e 2 Reis.
O foco do livro é o reino de Israel Norte. Na introdução (p. 1-11), Finkelstein
inicia abordando questões fundamentais para a pesquisa no Israel Norte,
trabalhando primeiramente o conceito de historiografia e memória histórica,
abordando as origens dos textos bíblicos que seriam oriundos do Israel Norte. É
possível que muitos textos tenham sido escritos a partir da primeira metade do
séc. VIII AEC em Samaria e em Betel. Quando Israel Norte foi destruído pelos
assírios, seus textos escritos e suas tradições foram levados para o Sul por
refugiados israelitas depois de 720 AEC, onde as narrativas bíblicas foram
concluídas, o que privilegiou as tradições pró-davididas e jerusalemita do reino
do Sul.
O foco é a política de Siquém desde o período do Bronze Tardio até os
últimos dias das cidades-estado canaanitas do período do Ferro I Tardio. O
objetivo deste capítulo é oferecer uma visão clara dos padrões de assentamento
e processos territoriais dos que povoaram terras altas e os vales do Norte no
período do Ferro I e IIA. Parece haver uma ligação entre Siquém e Amarna, já
que há possíveis citações de Siquém e de Jerusalém nos antigos textos
egípcios. Siquém fez parte de um grupo de cidades-estado chamado de Nova
Canaan, formado por Megiddo, Kinneret, Tel Reḥov e Ḥazor. Em torno do séc. X
AEC aconteceu o declínio gradual da Nova Canaan, possivelmente por ataques
realizados pelos povos das terras altas (p. 34-36).
Finkelstein aborda a Casa de Saul e a política de Gibeá ou Gibeon, como
sendo a primeira entidade territorial do Norte israelita. Também questiona a
respeito do território de Benjamin, que ora aparece como pertencendo a Judá
ora a Israel, Norte. Finkelstein menciona uma série de sítios arqueológicos
49
15O título original desta obra é “The Bible Unearthed” (A Bíblia Desenterrada). O título “A Bíblia
não Tinha Razão” não reflete o verdadeiro título da obra e foi criado pela edição em português
da editora A Girafa.
53
Assim como Jezreel era muito similar a Samaria, ela também era muito
similar a Megiddo. Isto fez com que os arqueólogos repensassem a datação
‘salomônica’ e estabelecessem novas datações (FINKELSTEIN; SILBERMAN,
2003, p. 258). Todos esses cinco sítios (Samaria, Ḥazor, Megiddo, Jezreel e
Gezer) oferecem uma visão da arquitetura real da dinastia omrida. Mas uma das
grandes implicações para essa atribuição, é que ela anula a única evidência
arqueológica que existia da monarquia unida baseada em Jerusalém, e que Davi
e Salomão foram líderes políticos das montanhas, cujo alcance administrativo
permaneceu regular no Sul, Judá (FINKELSTEIN; SILBERMAN, 2003, p. 261).
De acordo com Finkelstein, a partir de agora é possível procurar outros
exemplos adicionais de lugares omridas em lugares mais distantes, Atarote e
Jahaz, em Moab. Atarote é um sítio não escavado de Khirbet ‘Ataruz, ao sul da
moderna Madaba. Ao norte do Arnon há uma cidade chamada Khirbet el-
Mudayna, que contém as características das cidades omridas. É possível
perceber através de fotografias aéreas do local, que ele foi construído em cima
de um grande pódio de aterro artificial. Seria essa uma fortaleza de fronteira dos
omridas? Seria essa a Jahaz descrita na Estela de Mesha?
Outra obra importante de Finkelstein é a que ele escreveu junto com
Amihai Mazar, The Quest for Historical Israel: debating archaeology and history
of early Israel (FINKELSTEIN; MAZAR, 2007). Nesta obra, Finkelstein diz que o
reino do Norte alcançou sua soberania durante o período da dinastia omrida. Ele
retoma assuntos de outras obras, como de A Bíblia não Tinha Razão e alguns
artigos, e trabalha os temas referentes aos assentamentos israelitas nas
montanhas e depois no Vale de Jezreel, e também a respeito da monarquia
unida de Davi e Salomão.
Neste capítulo sobre a monarquia unida, é o arqueólogo Amihai Mazar
quem escreve. Para ele, a monarquia unida do período de Davi e Salomão deve
ter acontecido de fato. Um dos argumentos que ele utiliza, é o de que muitos
pegam as evidências extra bíblicas, como as estelas e outras inscrições onde
aparecem os nomes dos reis omridas, e afirmam que eles foram grandes e
poderosos. Mas a diferença de anos entre Davi e Salomão e os omridas é de em
torno de meio século, o que não é suficiente para se negar esse fato
(FINKELSTEIN; MAZAR, 2007, p. 118).
57
no sul, o Vale do Jordão e o Vale de Jezreel, que foi chamado pelo Egito de “o
celeiro do Egito”.
No caso do testemunho bíblico da Monarquia Unida, Finkelstein diz que a
teoria de Yigael Yadin, arqueólogo israelense, estava cheia de problemas desde
o início. Um dos problemas é que foram encontrados muros de casamata com
portões de seis câmaras em outros locais fora do território da Monarquia Unida,
como em Asdode e no planalto da Transjordânia no séc. IX e VIII AEC.
Para Finkelstein, apesar da estratigrafia16 apresentar uma cronologia
relativa, Yadin baseou sua teoria de datação para estes sítios unicamente no
texto Bíblico. Até William Dever, estudioso norte-americano, datou um tipo de
cerâmica no séc. X somente porque eles foram encontrados nos chamados
“estratos salomônicos”. Finkelstein afirma que o livro dos Reis não foi escrito
antes do séc. VII AEC, incluindo a história acerca de Salomão. Apesar disso, o
único pilar verdadeiro na teoria de Yadin era o texto de 1Rs 9.15 (p.120,121).
Segundo Finkelstein, toda a descrição do reinado de Salomão no livro dos
Reis está baseada em dois fundamentos: 1) as realidades da época da
compilação do texto ou um pouco antes, e 2) a ideologia de Judá no período
final da monarquia (p.123).
Finkelstein propõe uma cronologia alternativa, com indícios provenientes
dos sítios da dinastia omrida, como Samaria nas terras altas e Jezreel no Vale
de Jezreel. A partir daí foi realizada uma apurada análise dos indícios e revisão
das datações dos estratos, assim, os níveis que Yadin associou a Salomão em
Megiddo são da mesma época dos níveis da dinastia omrida em Samaria,
inclusive as marcas dos construtores nas pedras são as mesmas que aparecem
em Samaria. O estilo cerâmico também é o mesmo dos sítios omridas (p. 125),
séc. IX e VIII AEC.
O método independente são as medições por radiocarbono. Amihai Mazar,
o arqueólogo que tem escavado em Tel Reḥov, tinha sido resistente à baixa
cronologia, apoiando-se sempre na cronologia tradicional. Ultimamente, ele e
sua equipe, verificaram que as datações de Tel Reḥov devem ser baseadas na
baixa cronologia, isto porque os achados de Tel Reḥov são idênticos aos de
Megiddo e de Samaria do mesmo período. Isto fortalece a ideia de que a
16 Sobre estratigrafia veja a obra: HARRIS, Edward. Principles of Archaeological Stratigraphy.
2.ed. London: Academic Press Limited, 1989.
63
Considerações Finais
PARTE 2
LITERATURA
65
Capítulo 2
A ASCENSÃO DA DINASTIA OMRIDA:
ESTUDO EXEGÉTICO DE 1REIS 16.15-33
Introdução
Para analisarmos a dinastia omrida, suas inovações e seu poder, o ponto
de partida será a análise exegética do texto que narra a fundação desta dinastia.
A perícope de 1 Reis 16.15-33 narra pelo menos três fases da ascensão dos
omridas: 1) A ascensão de Omri ao trono de Israel; 2) A fundação de Samaria
como a nova capital de Israel Norte; e, 3) o início da dinastia.
A exegese bíblica tem a finalidade de aclarar o texto, trazer os sentidos
escondidos nas palavras hebraicas e gregas, e resgatar-lhe as possibilidades de
interpretação, conforme a polissemia de cada palavra. A ideia é ler o texto bíblico
como literatura e como registro “histórico” de tempos distantes no cobiçado
território de Israel, no Antigo Oriente Próximo, mais especificamente, do séc. IX
AEC.
Analisar um texto como o da Bíblia requer cuidados, pois o pesquisador
pode se tornar tendencioso para determinada linha teológica, ideológica ou
denominacional. Por isso, o pesquisador, o exegeta bíblico, precisa ter ciência
disto e trabalhar o texto bíblico cientificamente, tendo a Bíblia como seu objeto
de pesquisa, e seguindo uma metodologia criteriosa, procurando se afastar do
objeto de pesquisa, de forma que não o contamine com leituras
institucionalizadas ou pré-concebidas.
A metodologia exegética utilizada nesta pesquisa seguirá a Crítica das
Formas, com as algumas adequações necessárias para o momento atual
acadêmico. Esta metodologia acadêmica é composta por um roteiro de análise
que dá suporte e direcionamento à pesquisa. Trabalharei bem próximo à
metodologia clássica, analisando a estrutura, o gênero literário e o lugar
66
18MARGUERAT, Daniel; BOURQUIN, Ivan. Para Ler as Narrativas Bíblicas: iniciação à análise
narrativa. São Paulo: Loyola, 2009.
67
`lae(r"f.yI-ta, ayjiÞxh] ;l. hf'ê[' rv<åa] AtaJ'x;b.W ~['bê .r"y" %r<dB<ä . ‘tk,l,’l'
a Israel. para fazer errar fez, que e no erro dele Jeroboão, no caminho de andar
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Israel? dos reis de
`~ynI)v-' vve %l:ïm' hc'Þr>tiB. hn"+v' hrEÞf.[, ~yTeîv. laeêr"f.yI-l[; ‘yrIm.[' %l:Üm'
seis anos. reinou em Tirza ano; doze sobre Israel Omri reinou
`wyn")p'l. rv<ïa]
para face dele. que
68
AtêaJ'x;bW.
a jb'ên>-!B, ~['äbr. "y" ‘%r<D<’-lk'B. %l,YE©w: 26
e no erro dele filho de Nebat, Jeroboão em todo caminho de E andou
yrIÜm.[-' !B, ba'’x.a; %l{m.YIw:û bhd"_Why> %l,m,ä as'aÞ l' . hn"ëv' ‘hn<mvo .W
filho de Omri Acab e reinou Judá; rei de para Asa ano e oito
`hn")v' c
~yIT:ßvW. ~yrIfï .[, !Arêm.voåB. ‘laer"f.yI-l[;
anos. e dois vinte em Samaria, sobre Israel
2. Crítica Textual
2.1. Notas do Aparato Crítico da BHS19
19 A interpretação das notas foi baseada em FRANCISCO, Edson F. Manual da Bíblia Hebraica:
Introdução ao Texto Massorético – Guia Introdutório para a Biblia Hebraica Stuttgartensia. 3ª Ed.
São Paulo: Vida Nova, 2008.
70
versões acadêmicas da Bíblia Hebraica (BHK e BHS) como “Tiq sof”, outros
casos de correções por motivos teológicos são chamados de ~yrIp.As yyIWNyKi
(eufemismos dos escribas). Tais correções aconteceram nos textos em que
havia termos entendidos como pejorativos, negativos ou ofensivos próximos do
tetragrama hwhy (YHWH) ou de outros títulos divinos, como por exemplo: yn"Ada]
(Senhor ou senhores) e ~yhil{a/ (Deus ou deuses). A tradição judaica acredita
que tais correções aconteceram em torno do séc. V AEC, no período do
Segundo Templo (FRANCISCO, 2008, p. 238-243; veja também de McCARTHY,
1981, p. 17-24).
A seguir estão as transcrições das notas do aparato crítico da BHS desta
perícope (1Rs 16.23-33) junto com sua interpretação:
▪ VERSO 15 Frase: a hd"êWhy> %l,mä, ‘as'a'l. hn"©v' [b;v,øw" ~yrI’f.[, •tn:v.Bi a (no ano
vinte e sete de Asa, rei de Judá)
Nota: [ 15 a–a > * ]
Interpretação: O texto original grego da LXX omite esta frase.
Como ficaria o versículo conforme a LXX: “E Zimri reinou sete dias em Tirza,
e o exército de Israel diante de Gibeton dos estrangeiros”.
20
A Peshitta é uma versão da Bíblia para o siríaco. Surgiu em torno do séc. II EC na Síria. Para
mais informações sobre a Peshitta, veja FRANCISCO, 2008, p. 497-506.
72
Como ficaria o versículo: “Por causa dos erros dele, o qual errou em fazer a
maldade aos olhos de YHWH; [ao] andar no caminho de Jeroboão, filho de
Nebate, e no erro dele, para fazer errar Israel”.
▪ VERSO 29 Frase: alaeêr"f.yI-l[; ‘%l;m' yrIªm.['-!B, ba'äx.aw; >a (e Acab, filho de Omri,
reinou sobre Israel)
Nota: [ 29 a-a > * ]
▪ Interpretação: “O texto grego da LXX (séc. III-I AEC) omite a frase laeêr"f.yI-l[;
‘%l;m' yrIªm.[-' !B, ba'äx.a;w> (e Acab, filho de Omri, reinou sobre Israel).
Como ficaria o versículo: “No ano trinta e oito de Asa, rei de Judá; Acab, filho
de Omri, reinou sobre Israel em Samaria vinte e dois anos”.
15 No ano vinte e sete de Asa, rei de Judá, reinou Zimri sete dias em Tirza; e o
povo estava acampado contra Gibeton que é dos filisteus. 16 E ouviu dizer, o
povo que estava acampado: Zimri conspirou e também feriu o rei; e naquele dia
no acampamento, fizeram reinar, todo Israel, [a] Omri, chefe do exército sobre
Israel. 17 E subiu Omri e todo Israel com ele desde Gibeton; e sitiaram contra
Tirza. 18 E aconteceu [que], conforme vendo Zimri que a cidade fora capturada,
foi para o palácio fortificado, [a] casa do rei; e incendiou sobre ele a casa do rei
no fogo e morreu. 19 Por causa dos erros dele, o qual errou em fazer a maldade
aos olhos de YHWH; [ao] andar no caminho de Jeroboão, e no erro dele, para
fazer errar Israel. 20 E o restante das ações de Zimri, e a conspiração dele;
acaso não estão escritas no Livro das Crônicas dos reis de Israel? 21
Então o povo de Israel se dividiu pela metade; metade do povo estava junto a
Tibni, filho de Ginate, para o fazer reinar, e a [outra] metade estava junto a Omri.
22 Mais forte foi o povo que [estava] junto a Omri que o povo que [estava] junto
a Tibni, filho de Genate; e Tibni morreu, e Omri reinou.
23 No ano trinta e um de Asa, rei de Judá, reinou Omri sobre Israel doze anos;
seis anos reinou em Tirza. 24 E comprou o monte de Samaria de Semer por dois
talentos de prata; e edificou o monte, e chamou o nome da cidade que edificou
de Samaria, de acordo com [o] nome de Semer, dono do monte. 25 E fez Omri o
mal aos olhos de YHWH; e praticou o mal, mais do que todos [que foram] antes
dele. 26 E andou em todo [o] caminho de Jeroboão, filho de Nebate, e no erro
dele, que induziu Israel ao erro; para provocar irritação a YHWH, Deus de Israel,
em suas inutilidades. 27 E o restante das ações de Omri, e o ato de poder dele;
não [estão] escritos sobre o livro das ações dos dias dos reis de Israel? 28 E
deitou-se Omri com seus pais, e foi sepultado em Samaria; e reinou Acab, seu
filho, em seu lugar.
29 E Acab, filho de Omri, reinou sobre Israel, no ano trinta e oito de Asa, rei de
Judá; e reinou Acab, filho de Omri, sobre Israel em Samaria, vinte e dois anos.
30 E fez Acab, filho de Omri, o mal aos olhos de YHWH; mais do que todos que
[foram] antes dele. 31 E aconteceu que, acaso era insignificante seu andar nos
erros de Jeroboão, filho de Nebate; e tomou [por] mulher a Jezabel, filha de
Etbaal, rei dos sidônios, e andou e serviu a Baal, e se prostrou para ele. 32 E
ergueu [um] altar para Baal, [uma] casa de Baal, que edificou em Samaria. 33 E
fez Acab a Aserá; e superou Acab em provocar a irritação [de] YHWH, Deus de
Israel, mais que todos [os] reis de Israel, que foram antes dele.
3. Delimitação da Perícope
Não há maiores dificuldades para se delimitar a perícope. Ela se inicia em
16.15 e vai até 16.33. A perícope que conta o surgimento da história de Omri e
de Samaria se inicia em 16.15, quando narra o momento em que Zimri sobe ao
trono, em Tirza. Este é o estopim da revolta que levou Omri ao trono de Israel
Norte. Neste verso 15, aparece um sinal massorético (do hebraico ,
significado do termo ), que é um sinal para divisão do texto para as leituras
: “parágrafo aberto”), tal sinal indica a abertura de novo parágrafo,
tema ou perícope no v.15. O parágrafo iniciado no v.15 segue até o v.20, onde
78
manuscrito do séc. X EC (entre 925 e 930), e foi trabalhado em Tiberíades, Israel. O Códice A é
conhecido como Códice de Alepo ou Codex Alepensis, ou ainda pelos seguintes nomes
hebraicos (literalmente, “Coroa de Alepo”), (literalmente, “Coroa de
Alepo”), ou (literalmente, “Coroa de Jerusalém”). Este códice foi preservado numa
sinagoga na cidade de Alepo, Síria. Em 1947, logo após a resolução da ONU em repartir o
território da Palestina em dois, Israel e Palestina, uma perseguição aos judeus foi desencadeada
na Síria, e num incêndio criminoso, parte do Códice A foi queimado, quase todo o texto do
Pentateuco. (FRANCISCO, 2008, p.311-314). Veja mais informações no website do Códice de
Alepo: http://aleppocodex.org.
24 Bruce O. Long fez parte da equipe que trabalhou na coleção conhecida pela sigla “FOTL”,
“The Forms of the Old Testament Literature”, e escreveu os dois volumes relacionados aos livros
de 1 e 2 Reis. É uma obra clássica para o tema da Crítica das Formas da Bíblia Hebraica.
79
4. Estrutura da Perícope
Da mesma forma que a delimitação não foi problemática em excesso, a
estrutura do texto também não oferece muitas dificuldades. O texto dos livros
dos Reis é formado, de modo geral, por várias perícopes e parágrafos bem
delimitados com pequenas histórias de ascensão e queda de reis e seus
problemas ou qualidades.
A perícope está delimitada em 16.15-33. Este texto é composto
basicamente por três parágrafos: v.15-22, v.23-28 e v.29-33. Cada um destes
parágrafos também está bem delimitado dentro de seu tema específico. Os
parágrafos vão elevando a história omrida para o clímax durante o reinado de
Acab. O reinado de Acab é descrito em vários capítulos incluindo os capítulos do
Ciclo de Elias/Eliseu. Esta extensão demonstra sua importância, embora a
80
para esta pesquisa. Ela não detalha o relato sobre Omri nem detalha o relato
sobre Acab. Isto torna esta estrutura inviável para o objetivo desta pesquisa.
1 Reis 16.15-33
I. A ASCENSÃO DE OMRI (v.15-22)
. Zimri usurpa o trono de Israel Norte (v.15)
. Omri, comandante do exército de Israel Norte (v.16)
. Omri sitia a cidade de Tirza (v.17)
. A morte [misteriosa] de Zimri (v.18)
. Acusação contra Zimri e o Livro da História dos Reis de
(v.19-20)
Israel
. Surge um concorrente para o trono, Tibni (v.21)
. A morte [misteriosa] de Tibni e a ascensão de Omri ao
(v.22)
trono de Israel Norte
Pode-se perceber que a história de Acab não termina com sua morte e
sepultamento, porque a terceira parte é só uma introdução ou um resumo do seu
reinado (LONG, 1984, p. 170). A história de Acab continua em meio ao Ciclo de
Elias/Eliseu, e segue até 1Rs 22.40, quando narra a morte e sepultamento de
Acab e sua sucessão ao trono de Israel Norte por Acazias.
5. Coesão da Perícope
Inicialmente, o texto de 1Reis 16.15-33 me parecia ser composto por três
perícopes independentes (v.15-22; 23-28 e 29-33), já que trata de três reis
distintos de Israel Norte, e porque cada perícope estaria separada pelo sinal
massorético , indicando separação entre elas. Porém, o sinal massorético
já aparece no v.15, yrIm.zI (Zimri)25. O nome Zimri ocorre quatro vezes nesta
Omri ocorre doze vezes na perícope (v.16, 17, 21, 22 (2x), 23, 25, 27, 28, 29 (2x)
e 30). É o nome pessoal que mais ocorre no texto, mostrando sua importância
na narrativa, embora tal narrativa seja relativamente curta. Também o nome de
as'a' (Asa), rei de Judá, ocorre três vezes na perícope, sempre utilizado como
base para datação dos reinados de Israel Norte (v.15, 23 e 29). O nome de
ba'x.a; (Acab), filho de Omri, ocorre seis vezes no texto, das quais, cinco
de Israel Norte, ela ocorre três vezes na perícope (v.15, 17 e 23). As ocorrências
de hc'r>Ti (Tirza) estão na primeira parte da perícope, onde estão acontecendo
as revoltas e toda a trama inicial, bem como o surgimento de Omri na narrativa e
na história de Israel Norte. O nome desta cidade ocorre até o v.23, quando Omri
decide edificar Samaria e transferir a capital de Tirza para a nova cidade,
Samaria.
25 Na LXX o nome yrIm.zI (Zimri) aparece escrito na seguinte grafia: Zambri (Zambri). A Vulgata
grafa como Zamri (Zamri).
26 O nome yrIm.[' (Omri) aparece grafado na LXX como Ambri (Ambri). Na Vulgata, o nome vem
grafado como Amri (Amri). A Bíblia de Jerusalém segue a Vulgata e grafa o nome como “Amri”.
Conforme as notas gramaticais do Texto Massorético (TM), e as atuais gramáticas de Hebraico
Bíblico, toda vez que o sinal vocálico qamets é sucedido por um shevá, o qamets deve ser lido
com o som da vogal “o”, por isso a opção por grafar o nome como “Omri”.
84
cinco vezes no texto (v.19, 25, 26, 30 e 33). Todas as cinco vezes o tetragrama
aparece nas avaliações negativas dos reis de Israel: Zimri (v.19), Omri (v.25 e
26) e Acab (v.30 e 33).
As outras duas divindades são, l[;B; (Baal) e hr'vea] (Aserá)27. Baal ocorre
três vezes na perícope (v.31 e 32 (2x)). Aserá ocorre somente uma vez (v.33).
Na perícope, Baal aparece ligado a Jezabel e Aserá, aparece junto a Acab.
O vocábulo %l,m, (rei) perpassa toda a perícope. Ele ocorre dezenove
vezes (v.15 (2x), 16 (2x), 18 (2x), 20, 21, 22, 23 (3x), 27, 28, 29 (3x), 31 e 33).
Isto porque todo o contexto acontece em torno dos reis, no ambiente das
monarquias, dinastias e interesses políticos e busca pelo poder. Outro vocábulo
importante que aparece em toda a perícope é o substantivo taJ'x; (erro,
27 O nome da divindade hr'vea] (Aserá) foi interpretado pelo tradutor da LXX como a;lsoj
(arvoredo, bosque). A Vulgata interpreta como plantavit (plantou, plantado/a). Isto deve ter
influenciado as traduções em português, que traduzem de diversas maneiras: “poste-ídolo” ARA,
“poste sagrado” na BJ, “Aserá” na NBP.
85
transgressão, “pecado”). Tal vocábulo ocorre seis vezes no texto (v.19 (3x), 26
(2x) e 31), sempre para desqualificar os reis israelitas. Este vocábulo é uma
derivação do verbo aj'x' (errar, transgredir, “pecar”). O verbo aj'x' ocorre três
vezes na perícope (v.19 (2x) e 26), nas avaliações dos reis Zimri e Omri. No
caso de Acab, o autor/editor do livro não utiliza o verbo aj'x,' mas narra com
mais detalhes quais foram os pecados dele.
Um verbo importante, mas que ocorre somente uma vez na perícope, é
WrcUYß "w: (v.17), que traz como opções de tradução: “cercar, sitiar, oprimir,
pressionar”. Este verbo aparece no momento que Omri e seu exército sitiaram a
cidade de Tirza. A ideia de sitiar como oprimir ou pressionar, resume o ambiente
tenso do momento da ascensão de Omri.
O vocábulo [r:h' (a maldade), ocorre três vezes na perícope (v.19, 25 e
30), sempre nos versículos que informam a avaliação de cada um dos reis que
aparecem na perícope (Zimri, Omri e Acab). Também ocorre no texto, em dois
versículos de avaliação dos reis Zimri e Omri (v.19 e 26), a expressão hebraica
~['b.r"y" %r<d< “caminho de Jeroboão”, fazendo menção de Jeroboão I como o
6. Gênero Literário
O livro dos Reis possui vários gêneros literários. De acordo com Long
(1984, p. 30), o gênero literário de 1 e 2 Reis nunca foi plenamente definido.
Para ele, a narrativa do livro dos Reis é muito similar às inscrições reais egípcias
e mesopotâmicas, as quais eram uma comemoração às vitórias militares ou às
construções monumentais de seus reis. Para ele, partes de 1 e 2 Reis se
87
29O editor da nota do aparato crítico da BHS para o livro dos Reis (A. Jepsen), não informa a
qual manuscrito da LXX ele está se referindo nesta nota. O símbolo * significa “texto da LXX”.
92
Não se sabe ao certo a origem de yrIm.zI Zimri nem do seu nome. Tal nome
ocorre quinze vezes na Bíblia Hebraica30, e destas, sete vezes só no livro de
1Reis 16 (1Rs 16.9, 10, 12, 15, 16, 18, 20). É um nome quase que exclusivo da
época da monarquia, já que não há citações dele nos demais livros bíblicos.
Segundo Hutton, em The Anchor Yale Bible Dictionary, diz que uma das
possibilidades de origem do nome yrIm.zI Zimri seja a raiz (rmz), esta é a mesma
raiz do termo musical rAmz>mi, traduzido comumente como “salmo” (HUTTON,
1992, verbete [Zimri], p. 1). Thiel, na mesma obra, sugere que o nome yrIm.zI Zimri
seja uma abreviação de um nome maior, possivelmente Why"rIm.zI “YHWH [é]
minha proteção” (THIEL, 1992, verbete [Omri], p. 1), mas não há maiores
evidências para este formato do nome, já que não ocorre em nenhuma outra
parte da Bíblia Hebraica.
A segunda frase do v.15 “reinou Zimri sete dias em Tirza”, começa com um
verbo qatal. Segundo Niccacci (1990, p. 35-45), quando uma frase hebraica
começa com qatal e em seguida vem um sujeito (substantivo próprio), o texto
quer dar ênfase à ação do sujeito, não exatamente ao sujeito. Esta é uma frase
de ação, verbal, não uma frase nominal como a primeira frase.
A frase, portanto, informa que Zimri reinou sete dias em Tirza. O foco aqui
é o reinado de Zimri, que foi extremamente curto, apenas sete dias (uma
semana), mas qual o motivo para um reinado tão curto? A reposta pode estar no
planejamento do golpe de estado que ele mesmo executou. Zimri planejou e
executou um golpe de estado contra o rei Elá, filho de Baasa (1Rs 16.8-14).
Zimri pegou o rei de surpresa, enquanto este estava se embriagando na casa de
seu mordomo Arsa. Zimri entrou na casa de Arsa e golpeou o rei Elá até a
morte, tomando-lhe o trono em Tirza. O problema, ao que tudo indica, é que ele
teria feito isso sem o apoio do exército, que estava acampado contra Gibeton,
cidade filisteia. Mas sobre isso, trataremos no próximo tópico.
O nome hl'ae (Elá), rei de Israel, ocorre inúmeras vezes na Bíblia Hebraica,
em diversas formas e classificações gramaticais. A raíz desta palavra não ocorre
somente como nome próprio Ela pode ocorrer como pronome demonstrativo,
30As ocorrências do nome yrIm.zI são: Nm 25.14; 1Rs 16.9, 10, 12, 15, 16, 18, 20; 2Rs 2.6; 1Cr
8.36 (2x); 9.42 (2x) e Jr 25.25.
93
como verbo e, ainda, como nome de um vale chamado hl'aeh' qm,[E (Vale de
Elá). A origem deste nome é discutida e não há consenso para sua etimologia. A
raiz de palavra hla também pode significar “árvore grande” ou “árvore
tanto !AtB.GI “Gibeton” quanto tg “Gat”, seriam cidades filisteias. É possível que
encerra a primeira frase rmoêale (dizer), ficando a tradução ainda um pouco literal
“e ouviu dizer”. O exército de Israel ouviu dizer desde o acampamento, que
estava contra Gibeton. A palavra “acampamento” é a mesma que aparece no
v.15 (acampamento militar).
95
seguida por hK'hi (feriu). Este verbo foi usado também em 1 Rs 16.10, quando
narra com mais detalhes o assassinato praticado por Zimri. Tal verbo traz o
sentido de golpear até a morte, golpear não necessariamente com algum objeto,
mas pode ser simplesmente com as mãos. Zimri bateu no rei até a morte dele.
Então, quando o exército ouviu dizer que Zimri havia matado o rei Elá em Tirza,
revoltou-se contra ele.
Na terceira frase temos a continuação imediata da ação narrativa “e
naquele dia no acampamento, fizeram reinar, todo Israel, [a] Omri, chefe do
exército sobre Israel”. Aqui aparece pela primeira vez o nome yrIm.[' (Omri). Omri
era o comandante do exército de Israel. Não se sabe exatamente a etimologia
do nome nem se sua origem seja israelita. Thiel propõe que o nome yrIm.[' seja
uma abreviação de um nome maior, da mesma forma que ele propõe para o
nome yrIm.zI. A forma completa do nome yrIm.[' seria Why"rIm.[' (ver KESSLER, 2009,
p. 87), mas há um problema aqui, diferente do nome yrIm.z,I o nome yrIm.[' não
possui raiz hebraica clara, a afirmação de que seja um nome hebraico é
altamente questionada (THIEL, 1992, verbete [Omri], v5, p. 17).
Conjecturando a respeito da conexão entre o nome yrIm.[' e outras palavras
hebraicas com raiz parecida, podemos indicar a raiz verbal rm[ que só ocorre
na conjugação hitpael (reflexivo) e pode ser traduzido como “o que trata alguém
96
tetragrama abreviado, mostraria que ele e sua família teriam adotado a fé javista
e assumido as tradições israelitas (THIEL, 1992, verbete [Omri], v5, p. 17).
Temos também, mais tarde, os filhos de Acab com nomes teofóricos, como
Why"z>xa; ] “Acazias”31 (2Rs 22.40) e ~r'Ahy> “Jorão”32 (2Rs 3.1). Em todos esses
31 O nome Why"z>x;a] “Acazias” ocorre sete vezes na Bíblia Hebraica: 2Rs 1.2; 9.16,23,27,29; 11.2;
2Cr 20.35.
32 O nome ~r'Ahy> “Jorão” ocorre vinte e nove vezes na Bíblia Hebraica: 1Rs 22.51; 2Rs
1.17(2x); 3.1,6; 8.16,25,29; 9.15,17,21(2x),22,23,24; 12.19; 2Cr 17.8; 21.3,4,5,9,16;
22.1.5,6(2x),7.
97
indicando que teria sido o exército quem fez Omri reinar, pelo menos pela
classificação do verbo hebraico, não se percebe nenhuma intensão de Omri em
se tornar rei neste momento, pois o exército o teria feito rei.
é utilizada para se referir ao exército, ele deu ordens para todo o exército
marchar com ele desde Gibeton.
Daí temos a segunda frase que complementa a primeira “e sitiaram contra
Tirza”. A segunda frase do v.17 mostra a direção para onde o exército estava
marchando. Omri e seu exército marchou firmemente até a capital, Tirza, onde
estava o conspirador Zimri no trono de Israel. A narrativa adianta o tempo, pois
na primeira frase diz que Omri e o exército subiu desde Gibeton, e na frase
seguinte eles já estão em Tirza, mas o texto não informa quanto tempo durou a
viagem desde Gibeton até Tirza. Segundo Marguerat (2009, p. 107-109), a
cadência narrativa se dá pela velocidade que as cenas são apresentadas no
texto. Neste caso, a mudança de cena é repentina, numa frase estão em
Gibeton e na outra já estão em Tirza. São dias de viagem escritos entre uma
frase e outra. Isto pode nos mostrar o ímpeto com que Omri viajou com seu
exército. Eles estavam verdadeiramente determinados e prontos para agir com
violência.
O verbo que inicia esta segunda frase WrcUY"w: (e sitiaram) traz o sentido de
verbo é muitas vezes confundido com o verbo “ser”, mas no hebraico bíblico não
há verbo “ser”. No hebraico moderno, a ideia de verbo ser é utilizada apenas no
tempo presente, e isto por influência de outros idiomas, já que na cultura
oriental, as línguas semíticas não possuem tal verbo. A forma verbal yhiy>w: deve
ser traduzida então como “e aconteceu”. No léxico hebraico de Holladay (2013,
p. 108-109), as primeiras opções de tradução são, “tornar-se” e “acontecer”. Esta
forma de tradução nos mostra a continuidade da ação anterior, logo após
sitiarem a cidade (v.17), Zimri percebe que está cercado, a cidade foi capturada,
foi tomada por Omri e seu exército.
Zimri foge para o palácio e parece ter se trancado lá dentro, o único refúgio
seguro para ele. Seguro, mas não tanto. Pois a terceira frase “e incendiou sobre
ele a casa do rei no fogo” mostra que o palácio foi incendiado. O verbo @rof.YIw: (e
incendiou) é um qal imperfeito, é um ativo simples e seu sujeito parece ser Zimri.
Zimri teria então, incendiado o palácio, causando um incêndio que o levaria à
morte, a quarta frase tmo)Y"w: (e morreu). Esta morte de Zimri levanta suspeita, mas
aj'êx' rv<åa] AtaJ'x;-l[; 19 19 Por causa dos erros dele, o qual errou
100
traduzida como “por causa dos erros dele”, desta forma dá mais sentido à frase
como um todo. A frase termina com um verbo qatal, aj'x' (ele errou). Este verbo
ocorre cinco vezes em toda a perícope (v.19, 25, 26, 30 e 33), todas elas nos
versículos que tratam da avaliação dos reis. Isto já mostra claramente a redação
deuteronomista no texto. A avaliação dos reis é baseada na teologia referente a
Javé (YHWH), não em relação ao que determinado rei fez ou deixou de fazer.
Na terceira frase “[ao] andar no caminho de Jeroboão” temos mais um
motivo da reprovação de Zimri, ele andou no caminho de Jeroboão. Aqui a LXX
e em parte a Peshitta, acrescenta ui`ou/ Nabat “filho de Nebate” após o nome
101
questiona se ela deveria ser lida como está ou como “induziu ao erro”. De
qualquer forma, a nota orienta a conferir com o texto da LXX, da Peshitta e da
Vulgata. Neste caso, a nota faz sentido, porque a frase que está na Bíblia
Hebraica é confusa “fez para fazer errar”, assim, traduzir como “induziu ao erro”
faz mais sentido.
O sumário caminha para o seu final, seu desfecho. Isto é o que vemos no
v.20 que está dividido em três frases. A primeira frase do v.20 “e o restante das
ações de Zimri” começa com um substantivo com uma conjunção, rt,y<w> (e o
restante). Este vocábulo sugere que Zimri cometeu muitos outros erros além dos
que foram registrados aqui.
A segunda frase do v.20 “e a conspiração dele” ou literalmente “e a
conspiração que ele conspirou” (rv"+q' rv<åa] Arßv.qiw>) denota uma certa indignação
pelo ato cometido por Zimri. Além de todos os erros que ele cometeu, e muitos e
outros que não estão escritos, temos um que o editor fez questão de deixar
registrado “ e a conspiração que ele conspirou”. Esta frase prossegue na terceira
frase do v.20 que culmina numa interrogação, “acaso não estão escritas no Livro
das Crônicas dos reis de Israel?”. Eis aqui um livro que nunca foi encontrado, o
“Livro das Crônicas dos Reis de Israel”. Este livro, se de fato existiu, seria uma
fonte primária interessantíssima, talvez mais até do que a narrativa dos livros
dos Reis a qual estamos estudando. Porque é possível que este livro não tivesse
o teor teológico deuteronomista.
ycixe_l; laerÞ "f.yI ~['îh' qle²x'yE za'ó 21 21 Então o povo de Israel se dividiu
pela metade;
Akêylim.h;l. tn:yGI-!b, ynIÜb.ti yrE’x]a; hy"h'û metade do povo estava junto a Tibni,
~['øh' yci’x] filho de Ginate, para o fazer reinar,
`yrI)m.[' yrEîxa] ; yciÞx]h;w> e a [outra] metade estava junto a
Omri.
Israel, mas o exército. Mas porque o exército estaria dividido com relação a Omri
104
significa literalmente “atrás de”, dando a ideia de que metade do exército estava
atrás de Tibni e a outra atrás de Omri, seguindo-o.
possui três verbos wayyiqtol, que são verbos cuja ocorrência caracterizam um
texto narrativo. E é também um verso que encerra este primeiro ciclo narrativo
da nossa perícope. Ele conclui toda a ação iniciada com a tomada do trono por
Zimri e a revolta do exército sob o comando de Omri. Aqui temos o desfecho da
história da ascensão de Omri ao trono. Vamos ao texto:
yrIêm.[' yrEäx]a; rv<åa] ‘~['h' qz:Üx/Y<w: 22 22 Mais forte foi o povo que [estava]
junto a Omri
tn:+yGI-!b, ynIåb.Ti yrEÞx]a; rv<ïa] ~['h§ '-ta, que o povo que [estava] junto a Tibni,
ynIëb.Ti tm'Y"åw: filho de Genate;
p `yrI)m.[' %l{àm.YIw: e Tibni morreu,
e Omri reinou.
O v.22 inicia com uma frase decisiva “Mais forte foi o povo que [estava]
junto a Omri”. O verbo wayyiqtol qz:x/Y<w:, traduzido aqui como “mais forte foi”,
o` lao.j o` w'n ovpi,sw Ambri “O povo que foi após Omri prevaleceu
u`perekra,thsen to.n lao.n to.n ovpi,sw contra o povo que foi após Tibni, filho
Qamni ui`ou/ Gwnaq kai. avpe,qanen de Ginate, e morreu Tibni e Ioram,
Qamni kai. Iwram o` avdelfo.j auvtou/ evn
seu irmão, no mesmo tempo, e reinou
tw/| kairw/| evkei,nw| kai. evbasi,leusen
Ambri meta. Qamni Omri após Tibni”.
23 No ano trinta e um de Asa, rei de Judá, reinou Omri sobre Israel doze
anos; seis anos reinou em Tirza. 24 E comprou o monte de Samaria de
Semer por dois talentos de prata; e edificou o monte, e chamou o nome da
cidade que edificou de Samaria, de acordo com [o] nome de Semer, dono
do monte. 25 E fez Omri o mal aos olhos de YHWH; e praticou o mal, mais
do que todos [que foram] antes dele. 26 E andou em todo [o] caminho de
Jeroboão, filho de Nebate, e no erro dele, que induziu Israel ao erro; para
provocar irritação a YHWH, Deus de Israel, em suas inutilidades. 27 E o
restante das ações de Omri, e o ato de poder dele; não [estão] escritos
sobre o livro das ações dos dias dos reis de Israel? 28 E deitou-se Omri
com seus pais, e foi sepultado em Samaria; e reinou Acab, seu filho, em
seu lugar.
7.2.1. Omri começa a reinar sobre Israel Norte a partir de Tirza (v.23)
O primeiro subtópico do segundo parágrafo é formado pelo v.23. O v.23
está subdividido em três frases “no ano trinta e um de Asa, rei de Judá”, “reinou
Omri sobre Israel doze anos” e “seis anos reinou em Tirza”. Ele conta o início do
reinado de Omri. São informações muito resumidas, sem detalhes. O editor não
está muito interessado em contar a história de Omri, somente a menciona
rapidamente, mas são informações escassas, mas preciosas para
compreendermos como foi o início do reinado de Omri. Vejamos:
108
35 O nome hc'r>Ti (Tirza) ocorre 18 vezes em dezessete versículos no texto da Bíblia Hebraica,
e suas referências são: Nm 26.33; 27.1; 36.11; Js 12.24; 17.3; 1Rs 14.17; 15.21; 15.33; 16.6;
16.8; 16.9 (2x); 16.15; 16.17; 16.23; 2Rs 15.14; 15.16 e Ct 6.4.
36 Os nomes dos primeiros reis de Israel que reinaram a partir de Tirza, foram: Jeroboão I (1Rs
14.17), possivelmente Nadab, Baasa (1Rs 15.21, 33; 16.6), Elá (1Rs16.8-9), Zimri (1Rs 16.15) e
Omri (1Rs 16.23).
110
Conforme o texto bíblico do livro de 1Rs 16.18 e 22, houve dois grandes
conflitos na capital Tirza, o primeiro no v.18, quando Omri e o exército sitiam a
capital e o palácio real é incendiado, o segundo conflito ocorreu no v.22, quando
diz que o exército que estava com Omri foi mais forte do que o que estava com
Tibni, e prevaleceu sobre ele de forma que Tibni foi morto. Isto poderia indicar
certo grau de destruição dentro da cidade por causa dos conflitos. Segundo
Liverani (2014, p.145), há evidências de reconstrução sobre bases anteriores na
cidade, mas são difíceis de datar, e podem ser tanto do período de Baasa como
do período de Omri. Se levarmos em conta a narrativa bíblica, poderemos datar
essa reconstrução no período de Omri, já que houve dois grandes conflitos
durante a sua ascensão ao poder.
raiz da palavra. O nome rm,v,Þ (Semer) pertence à raíz rmv (smr), esta raiz é
homônimo rm,v,,Þ que significa “borra [de vinho]” ou “resíduo [de vinho]” (conferir
HOLLADAY, 2010, p. 536-537). Este vocábulo nos fornece outra proposta de
compreensão, pois faz referência à plantação de uvas e à produção de vinho.
Neste caso, Semer teria sido um produtor de vinhos. É possível até que ele
mantivesse o negócio de vinhos por estar numa rota comercial ligando à região
portuária de Dor. Mas não dá para afirmar definitivamente sua origem e
significado, porque o texto não nos fornece mais informações sobre ele.
Esta primeira frase diz que Omri comprou a colina de Semer por dois
talentos de prata. A palavra hebraica rK'Ki (talento), conforme Holladay, era um
pedaço fino e redondo como um pão, um disco de prata que pesava em torno de
35 quilos (HOLLADAY, 2010, p. 221; CLINES, 2009, p. 176 e HARRIS;
ARCHER; WALTKE, 1998, p. 750-751). Desta forma, a expressão hebraica
@s,K_' ~yIr:åKk. iB. (por dois talentos de prata) representaria cerca de 70 quilos de
prata. Este foi o valor pago por Omri a Semer pela colina.
A segunda frase do v.24 “e edificou o monte”, é uma frase verbal iniciada
por um verbo imperfeito + waw consecutivo !b,YIw: (e edificou) tem também o
sentido de “e fortificou”. Embora este seja o mesmo verbo utilizado para falar da
construção de Siquém e de Peniel (1Rs 12.25), Ramá (1Rs 15.21) entre outras
cidades, não parece nestes casos ter o sentido de fortificar, já que a arqueologia
apresenta evidências de que não há indícios de grandes fortificações na região
de Canaan antes do séc. IX AEC.
Já neste caso, na segunda frase do v.24, o uso deste verbo referindo ao
monte e à Samaria, parece carregar o sentido de fortificar de forma maciça. A
frase diz que Omri fortificou o monte. Essa afirmação concorda com as
evidências arqueológicas de Samaria no séc. IX AEC. Tais evidências podem
ser comprovadas através dos relatórios das escavações desde as primeiras até
as mais recentes expedições arqueológicas.
114
chamou) e hn"B' (edificou). A frase hn"ëB' rv<åa] ‘ry[ih' ~veÛ-ta, ar"ªq.YwI : traduzida
literalmente significa “e chamou o nome da cidade que edificou”. Esta frase está
ligada à segunda, pois faz referência à fortificação do monte. A frase não está
completa, ela precisa da quarta frase do v.24 que lhe é subordinada, porque
continua a explicação e apresenta o nome da cidade e a origem do nome.
A quarta frase do v.24 !Ar)m.vo rh"ïh' ynEßdoa] rm,v,ê-~v, l[;ä “de acordo com [o]
nome de Semer, dono do monte” pode ser traduzida literalmente como “sobre o
nome de Semer, senhor do monte, Samaria”. A frase traduzida literalmente fica
sem sentido, por isso organizei o texto de maneira que ficasse mais inteligível.
A frase diz que Omri colocou o nome do monte sobre o nome de Semer,
que era o dono do monte. Aqui, literalmente rh"ïh' ynEßdoa] (Senhor do Monte),
curioso que Omri tenha comprado esse monte de Semer e que tenha baseado o
nome da cidade no nome de Semer, antigo dono do monte.
Como já vimos na primeira frase do v.24, o nome Semer é uma incógnita,
não se sabe quem era nem de onde veio nem quando morreu. Semer aparece
no cenário narrativo da história de Israel Norte repentinamente, e também logo
desaparece. Devido à raiz do seu nome, podemos fazer algumas deduções. A
raiz do nome Semer pode ter origem no verbo que significa “vigiar” ou “guardar”,
é a mesma raiz de vigília e manter guarda à noite. Se assumirmos esta raiz para
o nome Semer, podemos deduzir que ele deveria fazer parte do exército, um
vigia, um guarda, alguém que é vigia noturno. Isto pode fazer sentido, já que
Omri era general do exército.
Também vimos que a raiz do nome Semer pode vir de um vocábulo
hebraico que significa “borra [de vinho]” e “resíduo [de vinho]”, dando a entender
que Semer poderia ter sido um agricultor que produzia vinho. Ou poderia ter sido
um comerciante de vinhos, já que o monte chamado por Omri de Samaria, ficava
às margens de uma importante rota comercial que ligava ao porto de Dor.
O fato é que Omri parece ter feito uma homenagem a Semer, ou por causa
de uma amizade ou porque Semer poderia ter sido uma pessoa importante na
época. O texto então, finaliza dizendo que Omri colocou o nome do monte de
Samaria por causa do seu antigo dono, chamado Semer.
Embora a edificação de Samaria tenha marcado uma reviravolta na
situação político-institucional e econômica no reino de Israel Norte, ela é descrita
em apenas um versículo. Para Liverani (2008, p. 145-147), está bem claro que
por óbvio preconceito anti-samaritano, a nova capital do reino de Israel Norte é
narrada com tanto desprezo.
não importando se Omri realizou grandes coisas ou não, mas se ele serviu a
Javé ou não. E o fato é que nem sabemos se Omri realmente seguia a Baal ou a
Javé, por que o que temos é o que o editor deuteronomista deixou escrito, não o
que realmente aconteceu.
Esta avaliação faz parte da estrutura montada pelo editor do livro, que
segundo Long (1984, p. 22), está dividida basicamente em três partes: 1. Quadro
introdutório (nome e data de ascensão do rei sincronicamente com o outro reino
“irmão”, ano da ascensão, comprimento e local do reinado, nome da rainha mãe
e avaliação teológica); 2. Eventos durante o reinado; e 3. Quadro final (fórmula
citando outras fontes do reinado, notícias da morte e do sepultamento, e notícias
do sucessor). É possível encontrar esta fórmula praticamente três vezes nesta
perícope, uma em cada parágrafo. Neste caso, no v.24, temos a avaliação
teológica do reinado de Omri.
São dois versos v.25 e 26, e podem ser divididos em cinco frases verbais:
no v.25 duas frases: “e fez Omri o mal aos olhos de YHWH”, “e praticou o mal,
mais do que todos [que foram] antes dele”; e no v.26, três frases: “e andou em
todo [o] caminho de Jeroboão, filho de Nebate, e no erro dele”, “que induziu
Israel ao erro” e “para provocar irritação a YHWH, Deus de Israel, em suas
inutilidades”.
É um texto narrativo, o editor está narrando as coisas que, aos seus olhos,
Omri realizou erradamente. No texto são três verbos wayyiqtol e um hifil
infinitivo. A quantidade de wayyiqtol caracteriza a narrativa hebraica. A
conjugação Hifil aqui é secundária, pois segue a ação realizada no wayyiqtol.
Vamos ao texto:
yrI±m.[' hf,î[]Y:w: 25 25 E fez Omri
hw"+hy> ynEåy[eB. [r:Þh' o mal aos olhos de YHWH;
e praticou o mal,
`wyn")p'l. rv<ïa] lKoßmi [r:Y¨"w: mais do que todos antes dele.
ÎAtêaJ'x;bW. Ð ¿wyt'aJox;b.WÀ jb'ên>-!B, 26 E andou em todo caminho de
~['äbr. "y" ‘%r<D<’-lk'B. %l,YE©w: 26 Jeroboão, filho de Nebate,
e no erro dele,
lae_r"f.yI-ta, ayjiÞxh/ , rv<ïa] que induziu Israel ao erro;
hw"±hy>-ta, sy[iªk.h;l. para provocar irritação a YHWH,
`~h,(yleb.h;B. laeÞr"f.yI yheîl{a/ Deus de Israel, em suas inutilidades.
117
A avaliação do reinado de Omri tem início no v.25 “e fez Omri o mal aos
olhos de YHWH”, e tal avaliação começa com hf,î[]Y:w: (e fez), um verbo wayyiqtol,
que significa basicamente “e fez”, “e executou”, “e produziu”, etc. Este é um
verbo com muitas ocorrências na Bíblia Hebraica, ele ocorre mais de 2.600
vezes37 (veja HOLLADAY, 2010, p. 403-404).
Esta é uma típica frase verbal hebraica (verbo [hf,î[Y] :w]: + sujeito [yrI±m.[]' +
complemento [hw"+hy> ynEåy[eB. [r:Þh']). Frases assim, querem chamar a atenção para
as ações praticadas pelo sujeito, não exatamente para o sujeito em si. O foco
aqui são as ações “negativas” de Omri, aquilo que ele fez ou produziu de “ruim”
durante o seu reinado.
Logo após o verbo inicial, vem o autor da ação, Omri. Mas que ações ele
praticou de “ruim” para que merecesse essa avaliação negativa? O
complemento da frase indica que ele fez “o mal aos olhos de YHWH”. O termo
traduzido como “mal” é [r:h' (o mal), de [r; (mal). Tal termo ocorre em torno de
225 vezes na Bíblia Hebraica (HOLLADAY, 2010, p. 486), e traz consigo o
sentido de “má qualidade”, algo “inferior”, “mau”, ou “mal” no sentido ético
absoluto, “moralmente depravado”, “ofensivo” ou “pernicioso”. O termo [r:h' (o
mal) indica, portanto, as ações “reprováveis” realizadas por Omri, de acordo com
a visão do editor deste texto.
Tais ações, segundo o editor do texto, eram “más” aos olhos de Javé
(YHWH). Isto mostra claramente que a avaliação do reinado, neste caso de
Omri, é meramente religiosa e teológica, não é uma avaliação criteriosa baseada
no histórico de como realmente foi o reinado de Omri e o que ele realizou. A
expressão hebraica hw"hy> ynEy[eB. (aos olhos de YHWH) ocorre noventa e três
37 Segundo o softwere Bibleworks, a raiz do verbo hf[ (fazer) ocorre 2.640 vezes em 2.286
versículos e em 159 formas diferentes.
118
“e praticou o mal desde todos que para diante dele/antes dele”. Francisco, na
obra Antigo Testamento Interlinear (ATI), traduz de forma literal do seguinte
modo, “e fez mal mais do que todos os que antes dele”. Traduzir lKoßmi como
“mais do que todos”, dá mais sentido à frase. Por isso optei por seguir o ATI na
tradução desta preposição.
O verbo [r:Y"w: (e praticou) é um wayyiqtol na conjugação hifil (causativo).
Este verbo hebraico na conjugação hifil significa segundo Holladay (2010, p.
488-489), “fazer o mal”, “cometer um ato mau”, “comportar-se de forma
repreensível” etc. Kirst (2004, p. 231), além destas, outras opções de tradução,
ele sugere, “praticar o mal” e “fazer sobrevir o mal”. A opção por traduzir o verbo
[r:Y"w: como “e praticou”, pareceu-me mais interessante, por causa da ação
antes dele) ocorre somente duas vezes na Bíblia Hebraica, no v.25 com Omri e
o v.30 com Acab. Isto mostra como essa dinastia foi odiada e menosprezada
pelo editor do texto. Segundo Römer, todos os reis foram avaliados conforme
alguns critérios bem definidos, principalmente “a fidelidade a Javé” e “a
centralização do culto”.
foi traduzido na LXX pelo verbo grego evporeu,qh (procedeu), dando a ideia de
realizar a mesma coisa que Jeroboão realizou.
Aqui temos uma nota no aparato crítico da BHS. A nota [ 26 a
ywt'aOJÄ AtaJ'Ä] diz que muitas ou todas as versões do texto
bíblico, trazem como K (Ketiv) ywt'aOJx;b.W (e nos erros dele) com sufixo
Israel ao erro” , a LXX traduz nos seguintes termos, ai-j evxh,marten to.n Israhl
“com os quais fizera pecar Israel”.
Esta é uma frase verbal iniciada por uma partícula relativa rv<ïa] (que, o
qual). É uma frase informativa, faz parte da avaliação deuteronomista dos reis,
neste caso, de Omri, rei de Israel Norte. O verbo hebraico desta frase ayjiÞxh/ ,,
está na conjugação hifil, que é um causativo ativo, ou seja, ele não realizou a
ação diretamente, mas causou a ação em Israel, por isso a tradução “induziu ao
erro”. Por causa das ações realizadas anteriormente, ao andar no caminho de
Jeroboão e nos seus erros, Omri teria induzido Israel ao erro.
A terceira frase do v.26 ~h,(yleb.h;B. laeÞr"f.yI yheîl{a/ hw"±hy>-ta, sy[iªk.h;l. “para
provocar irritação a YHWH, Deus de Israel, em suas inutilidades” é subordinada
à segunda, que por sua vez é subordinada à primeira. É uma frase explicativa,
ela procura explicar o motivo das ações de Omri, e o porquê seguiu os caminhos
de Jeroboão.
O verbo hebraico sy[iªk.h;l. é um hifil, um verbo causativo ativo que
traduzido é “para provocar a irritação” ou “para provocar a ira”. Este verbo liga
diretamente esta terceira frase com a segunda, pois Omri teria induzido Israel ao
erro com a finalidade de “provocar a irritação” de Javé, hw"±hy>-ta, (YHWH).
Este vocábulo, da maneira como está no v.26, ocorre três vezes na Bíblia
Hebraica (Dt 32.21; 1Rs 16.13 e 16.26), todas traduzidas na Almeida (RA) como
“seus ídolos”. A forma singular de ~h,(yleb.h;B. “em suas inutilidades” é lb,h,
“inútil, inutilidade, vapor”. O vocábulo lb,h, ocorre oitenta e seis vezes na Bíblia
Hebraica em quatorze formatos diferentes, sendo a maior ocorrência no livro de
Eclesiastes, trinta e oito vezes. Este vocábulo refere-se a coisas inúteis, vãs.
Holladay (2008, p. 106) define o vocábulo como “sopro”, algo transitório, “nada”,
“perecibilidade” e “vazio”. A tradução por “ídolo” é a última opção que Holladay
apresenta.
Aqui a BHS apresenta uma nota no aparato crítico para o vocábulo
~h,(yleb.h;B. “em suas inutilidades”, [ 26 b ` ]. Tal nota diz que
assim está no Códice de Leningrado, e que muitos manuscritos hebraicos
medievais e edições impressas da Bíblia Hebraica, como a de Kennicott, de De
Rossi e a de Ginsburg, possuem o sinal massorético ` sof pasuq no vocábulo
~h,(yleb.h;B. “em suas inutilidades”. A LXX traduz ~h,(yleb.h;B. “em suas
Como já foi dito anteriormente, quando uma frase hebraica não começa
com verbo, a ênfase está no sujeito, não exatamente em suas ações
(NICCACCI, 2002, p. 27-37). É desta maneira que inicia a primeira frase do v.27
hf'ê[' rv<åa] ‘yrIm.[' yrEÛb.DI rt,y<“w> “e o restante das ações de Omri”. O texto começa
com o substantivo construto prefixado pela conjunção waw rt,y<w> “e o restante
de”. Este vocábulo ocorre sessenta e duas vezes na Bíblia Hebraica e destas,
sessenta e duas vezes ocorre nos livros de Reis e Crônicas, todas nas
avaliações dos reis de Israel e Judá, e significa basicamente “resto” ou
“restante”.
Este substantivo vem, na maioria das ocorrências, seguida pelo substantivo
construto yrEbD. I “coisas de”, “palavras de” ou “ações de”. A frase, numa tradução
literal, diz “o restante das ações que Omri realizou” ou “que Omri fez”. Temos o
verbo hf'[' “fez” no qal, terceira pessoa do singular, referindo-se às ações de
Omri, àquilo que ele fez ou realizou. Este verbo, também pode ser traduzido
123
inserido o vocábulo -lk'w> (e todo) logo após o nome de yrIm.[' “Omri”, e isto,
41 E Josafá, filho de
Asa, começou a reinar
Î28aÐ kai. evn tw/| evniautw/| tw/|
[28a] E no ano décimo sobre Judá no quarto
e`ndeka,tw| tou/ Ambri ano de Acab, rei de
primeiro de Omri, reinou
basileu,ei Iwsafat ui`o.j Asa Israel. 42 Era Josafá da
Josafá, filho de Asa, o reino
evtw/n tria,konta kai. pe,nte evn idade de trinta e cinco
dele [foi de] trinta e cinco
th/| basilei,a| auvtou/ kai. anos quando começou a
anos, e vinte e cinco anos
ei;kosi pe,nte e;th evbasi,leusen reinar; e vinte e cinco
reinou em Jerusalém, e o
evn Ierousalhm kai. o;noma th/j anos reinou em
nome da sua mãe [era]
mhtro.j auvtou/ Gazouba Jerusalém. Sua mãe se
Gazuba, filha de Silei.
quga,thr Selei? chamava Azuba, filha de
Sili.
Î28bÐ kai. evporeu,qh evn th/| [28b] E procedeu no 43 Ele andou em todos
o`dw/| Asa tou/ patro.j auvtou/ caminho de Asa, seu pai, e os caminhos de Asa,
kai. ouvk evxe,klinen avpV auvth/j não se desviou dele, seu pai; não se desviou
tou/ poiei/n to. euvqe.j evnw,pion fazendo o bem diante do deles e fez o que era
126
kuri,ou plh.n tw/n u`yhlw/n Senhor, entretanto, os altos reto perante o SENHOR.
ouvk evxh/ran e;quon evn toi/j não removeu, sacrificava 44 Todavia, os altos não
u`yhloi/j kai. evqumi,wn nos altos e queimava se tiraram; neles, o povo
incenso. ainda sacrificava e
queimava incenso.
46 Quanto aos mais
Î28cÐ kai. a] sune,qeto atos de Josafá, e ao
[28c] E concordou Josafá e
Iwsafat kai. pa/sa h` poder que mostrou, e
toda a dominação que fez,
dunastei,a h]n evpoi,hsen kai. como guerreou,
e as guerras que fez, isto
ou]j evpole,mhsen ouvk ivdou. porventura, não estão
não está escrito no Livro
tau/ta gegramme,na evn bibli,w| escritos no Livro da
das Crônicas dos reis de
lo,gwn tw/n h`merw/n tw/n História dos Reis de
Judá?
basile,wn Iouda Judá?
47 Também exterminou
Î28dÐ kai. ta. loipa. tw/n [28d] E o restante das
da terra os restantes dos
sumplokw/n a]j evpe,qento evn complicações praticadas
prostitutos-cultuais que
tai/j h`me,raij Asa tou/ patro.j nos dias de Asa, pai dele, ficaram nos dias de Asa,
auvtou/ evxh/ren avpo. th/j gh/j ele removeu da terra.
seu pai.
Î28gÐ to,te ei=pen o` basileu.j [28g] Então disse o rei de 50 Então, Acazias, filho
Israhl pro.j Iwsafat Israel para Josafá: “Eu de Acab, disse a Josafá:
evxapostelw/ tou.j pai/da,j sou enviarei seus jovens servos Vão os meus servos
kai. ta. paida,ria, mou evn th/| e meus rapazes no navio” e embarcados com os
39 Nasib (nasib), pode ser um cargo político, algum tipo de governante “prefeito” ou
“governador”.
127
nhi, kai. ouvk evbou,leto Josafá não quis. teus. Porém Josafá não
Iwsafat quis.
Este acréscimo da LXX em 3 Reinos 16.28 (BHS, 1Rs 16.28) possui alguns
problemas nas informações apresentadas da história de Israel. Josafá começou
a reinar quando Acab, rei de Israel Norte, estava no seu quarto ano de reinado.
Quando Josafá iniciou seu reinado em Judá, Omri já tinha morrido há quase
quatro anos, conforme é possível visualizar na tabela abaixo:
Tabela 1: Datas dos reinados baseadas em FINKELSTEIN, 2003, p. 37. Tabela minha.
realização de cultos, talvez com ritos que envolvessem a prática do sexo, mas
isso é incerto. A avaliação do editor é clara, este “homem consagrado” pertencia
a um culto concorrente do Templo de Jerusalém.
Em 3Reinos 16.28e há uma divergência com 22.48 com relação à
localidade que no momento estava sem um rei. No texto de 1Reinos 16.28e diz
128
que a Síria estava sem rei, havia apenas um nasib nasib, um tipo de governador
ou prefeito, porém, em 1Rs 22.48 o texto hebraico diz que quem estava sem rei
era Edom não a Síria. A hipótese mais plausível aqui, é a de que a LXX
represente um texto hebraico mais antigo, e que o território sírio que estava sem
rei, poderia se referir ao território ao sul de damasco, o qual foi dominado por
Israel Norte nesta época. Ou então, o texto de 1Rs 22.48 seja uma memória da
época de Jeroboão II, período em que Israel Norte dominou o território edomita.
Esta hipótese pare ser mais plausível do que Judá tendo dominado Edom, já que
existem evidências arqueológicas que fortalecem essa hipótese, por exemplo, os
achados de Kuntillet ‘Ajrud, que menciona YHWH de Teman, território edomita
no séc. VII AEC. (FINKELSTEIN; RÖMER, 2014, p. 7-8).
O v.28f e 28g de 3Reinos menciona os nau/n eivj Qarsij “navios de
Társis”. Esta expressão refere-se quase sempre aos navios mercadores de Tiro,
Fenícia. A Fenícia, segundo Aharoni, eram os “donos do mar” neste período, de
forma que se tornaram o principal poder entre as cidades-estado da costa
litorânea do Mediterrâneo (AHARONI et.al., 1999, p. 88). Mas Aharoni coloca a
forte atividade marítima fenícia principalmente no período de Salomão, dentro da
visão de Monarquia Unida de Davi e Salomão. É bem possível que, o
envolvimento de Israel com a navegação tenha surgido principalmente, com a
aliança entre Israel e Fenícia com o casamento de Acab, filho de Omri, com
Jezabel, filha de Etbaal, rei de Tiro (1Rs 16.31).
A localização de Társis ainda hoje é uma incógnita. Aharoni (1999, p. 88)
fornece pelo menos três hipóteses para a localização de Társis: 1. Que Társis
deve ser a Tarso, na Sicília, que segundo ele, é a localização mais provável; 2.
Que Társis seja a mesma cidade de Tarros, na Sardenha; e 3. Que Társis seja a
cidade de Tartessos, na Espanha.
Em 3Reinos 16.28f diz que Josafá construiu navios para ir a Társis, e que
estes navios iriam antes para Swfir “Sofir”. A localização de Sofir é incerta,
mas o texto de 1Rs 22.49 diz que tais navios iriam para a terra de hr"ypiAa
(’ôfîrāh), que é Ofir. O substantivo hebraico hr"ypiAa ocorre treze vezes na Bíblia
Hebraica, sendo oito vezes somente nos livros de Reis e Crônicas. Já o
substantivo grego Swfir “Sofir”, ocorre uma única vez no texto grego da LXX, e
129
somente no acréscimo de 1Rs 16.28 (3Rns 16.28f), o que indica ser este, uma
hápax legomenon.
Tais navios, conforme 1Rns 16.28f, tinham como destino Ofir, localidade
conhecida pela qualidade de seu ouro. Ofir estaria localizada na margem do Mar
vermelho, na região da Arábia. Do outro lado do Mar Vermelho, diante de Ofir,
estaria Havilá, na região de Cuxe, no continente africano (AHARONI et.al., 1999,
p. 21). O texto de Gn 2.11-12 diz Havilá é a terra do ouro, e que o ouro de lá era
bom.
Outra informação interessante fornecida pelo acréscimo grego em 3Rns
16.28, é o fato de os navios de Társis terem se despedaçados em Ezion-Geber
(no grego Gasiwngaber “Gaziongaber”; no hebraico rb,G") !Ayðc.[, “‘Ezion Gaber”).
O verbo hebraico utilizado em 1Rs 22.49 para descrever a destruição dos navios
de Társis é rb;v.' Tal verbo ocorre neste caso no nifal (terceira pessoa do plural)
e significa tanto “foram quebrados” como “foram despedaçados” ou ainda “foram
fragmentados”.
A cidade de Ezion-Geber (no grego Gasiwngaber “Gaziongaber”; no
hebraico rb,G") !Ayðc.[, “‘Ezion Gaber”), segundo o Atlas Bíblico de Aharoni, estava
localizada próximo da atual tlya Eilat, no golfo de Áqaba, braço direito do Mar
Vermelho (AHARONI et.al., 1999, p. 23, 45, 85, 88, 107, 109; PEREGO, 2001, p.
23).
Não é possível saber o motivo pelo qual os navios de Társis não foram
para Ofir, mas foram fragmentados em Ezion-Geber. Foram atacados? Foram
acidentados no porto ou na costa litorânea? Não é possível saber. O texto
informa ainda no v.28g, que o rei de Israel ofereceu ajuda para Josafá, mas não
diz qual rei de Israel. O texto hebraico de 1Rs 22.50 diz que foi Acazias, rei de
Israel, quem ofereceu ajuda, mas Josafá não quis a ajuda do rei de Israel.
Evidentemente que o texto faz uma leitura positiva de Josafá, e o fato de não ter
aceitado ajuda do rei de Israel, testemunha sua fidelidade a Javé e ao Templo
de Jerusalém.
O acréscimo termina em 3Rns 16.28h informando a morte de Josafá e seu
sepultamento na Cidade de Davi. Depois, finaliza indicando seu sucessor, Jorão,
seu filho, para o trono de Judá em Jerusalém.
130
29 E Acab, filho de Omri, reinou sobre Israel, no ano trinta e oito de Asa, rei
de Judá; e reinou Acab, filho de Omri, sobre Israel em Samaria, vinte e dois
anos. 30 E fez Acab, filho de Omri, o mal aos olhos de YHWH; mais do que
todos que [foram] antes dele. 31 E aconteceu que, acaso era insignificante
131
seu andar nos erros de Jeroboão, filho de Nebate; e tomou [por] mulher a
Jezabel, filha de Etbaal, rei dos sidônios, e andou e serviu a Baal, e se
prostrou para ele. 32 E ergueu [um] altar (x;BzeÞ >mi) para Baal, [uma] casa de
Baal, que edificou em Samaria. 33 E fez Acab a Aserá; e superou Acab em
provocar a irritação [de] YHWH, Deus de Israel, mais que todos [os] reis de
Israel, que foram antes dele.
A primeira frase do v.29 “e Acab, filho de Omri, reinou sobre Israel” é uma
frase informativa. Aqui temos um texto que não é puramente narrativo, é um
sumário, uma informação, um resumo. A frase começa com o nome do novo rei
de Israel, ba'x.a;w> “e Acab”, seguido pela origem familiar, demonstrando a
132
29
evn e;tei deute,rw| tw/| Iwsafat basileu,ei Acaab ui`o.j Ambri
29 No ano segundo de Josafá, reinou Acab filho de Omri
o texto grego da LXX fornece a seguinte informação: evn e;tei deute,rw| tw/|
Iwsafat basileu,ei Acaab ui`o.j Ambri “no segundo ano de Josafá, reinou
Acab, filho de Omri”. A divergência aqui está relacionada com a data de início do
reinado de Acab, filho de Omri.
O texto hebraico diz que Acab, começou a reinar no ano trinta e oito de
Asa, rei de Judá. A LXX diz que Acab, rei de Israel, começou a reinar no
segundo ano de Josafá, rei de Judá. Conforma o quadro de datações fornecida
por Gershon Galil na obra A Bíblia não Tinha Razão, de Israel Finkelstein (2003,
p. 37), Acab começou a reinar sobre Israel, três anos antes de Josafá começar a
reinar. Acab iniciou seu reinado em 873 AEC, e Josafá, somente em 870 AEC.
As datações propostas por Galil e apoiadas por Finkelstein, coincidem com
a datação apresentada no texto bíblico hebraico para o início do reinado de Acab
em Israel. A datação hebraica bate também com a narrativa sobre o início do
reinado de Josafá em Jerusalém, quando diz que Josafá começou a reinar no
quarto ano de Acab, rei de Israel (1Rs 22.41). Neste texto de 1Rs 22.41, o texto
grego da LXX concorda com o texto bíblico hebraico.
Nesta última frase do v.29 a BHS apresenta uma nota no seu Aparato
Crítico. A nota [ 29 c [B;r>a;w>; ] diz que poucos manuscritos
número ~yITv
:ß .W (e dois) do seu texto.
Assim, ao invés de Acab ter reinado sobre Israel vinte e dois anos, como
indica o Texto Massorético e a LXX, ele teria reinado vinte e quatro anos. Dois
anos a mais que o tempo apresentado pelo Texto Massorético.
A primeira frase do v.30 “e fez Acab, filho de Omri, o mal aos olhos de
YHWH” inicia com um verbo wayyiqtol, enfatizando a ação do sujeito. O rei Acab
fez o que era mau aos olhos de Javé. Há uma nota no aparato crítico nesta
frase, a nota [ 30 a-a ] diz que o texto original grego da LXX (séc. III-I
AEC) omite a expressão yrI±m.[-' !B, “filho de Omri”. A nota deixa uma pergunta em
aberto: a expressão yrI±m.[-' !B, “filho de Omri” foi apagada? O fato é que a
Esta frase wyn"p'l. rv<a] lKomi ocorre somente duas vezes na Bíblia Hebraica
1Rs 16.25 e 30, nas duas avaliações dos omridas. Isto mostra como o editor
deuteronomista não gostava desta dinastia, e principalmente de Omri e Acab,
que foram os principais reis desta dinastia.
dele (v.30), e isto também foi dito sobre Omri, seu pai (v.25). Agora a avaliação
negativa se intensifica, já que o editor começa a apresentar alguns fatos que,
para ele, pareciam suficientes para justificar sua negativa e repulsa.
Surge na história de Israel a princesa fenícia chamada Jezabel lb,z<yai (na
LXX, Iezabel). A figura de Jezabel vai se perpetuar como sinônimo de maldade
e ambição, que vai alcançar até a época cristã e seus escritos. Além da Jezabel,
teremos a divindade chamada Baal, que será um dos pilares para a condenação
de Acab pela ideologia deuteronomista.
Neste tópico, composto pelo v.31, o texto pode ser subdividido em quatro
frases, “e aconteceu que, acaso era insignificante seu andar nos erros de
Jeroboão, filho de Nebate”, “e tomou [por] mulher a Jezabel, filha de Etbaal, rei
dos sidônios”, “e andou e serviu a Baal”, e “e se prostrou para ele”. Vejamos o
texto:
A frase começa com o verbo yhiy>w: “e aconteceu”, que indica uma frase
narrativa. A maioria das traduções da Bíblia para o português, traduz esse verbo
como “ser”, neste caso “e houve”, “e sucedeu” ou “e como se fora”. Mas no
hebraico bíblico, assim como em todas as línguas semíticas, não tem verbo ser.
Por isso, a melhor tradução para este verbo é “e aconteceu” (ver no ATI,
FRANCISCO, 2014, p. 480).
Logo na sequência de yhiy>w: “e aconteceu”, temos o verbo lqEn"h] (da raiz
llq) na conjugação hifil, “ser insignificante” ou “tratar algo frivolamente ou com
desprezo”. A ideia é “e como se não fosse suficiente...”, ou seja, poderíamos
traduzir o texto da seguinte forma: jb'_n-> !B, ~['bä .r"y" twaJoßx;B. ATêk.l, lqEånh" ] ‘yhiy>w: “e
aconteceu que, como se não fosse suficiente ele andar nos erros de Jeroboão,
filho de Nebate”. O editor coloca um tom de desprezo na atitude de Acab, rei de
136
Israel, com relação aos “erros” praticados por ele, pois como se não bastasse
ele ter andado nos erros de Jeroboão, ele fez ainda coisas piores. Como a que é
narrada na próxima frase.
A segunda frase do v.31, narra o que para o editor deuteronomista, era pior
do que andar nos erros de Jeroboão, o fato de ter se casado com uma
estrangeira adoradora de Baal. O texto bíblico diz que Acab “tomou por mulher
Jezabel, filha de Etbaal, rei dos sidônios”. É uma frase iniciada por um verbo
wayyiqtol, a ênfase está na ação do sujeito, na ação de tomar, pegar, agarrar.
Tal verbo, neste caso, junto com a palavra hebraica hV'ai, forma uma expressão
que dá a ideia de casamento (hV'ai xQ;YIw: “e tomou por mulher”).
Jezabel, segundo o texto bíblico, foi atuante em algumas situações
complicadas, as quais o editor aproveitou para enfatizá-las e mostrar como ela
era “má”. Jezabel reagiu com extrema fúria quando soube que Elias tinha
matados seus profetas de Baal, e decidiu matá-lo (1Rs 19.1-18). Por conta disso
Elias fugiu para o sul. Ela também tramou a morte de Nabote, porque este não
quis vender sua propriedade para o rei Acab. Então Nabote foi condenado à
morte por apedrejamento, e Acab se apoderou de sua vinha (1Rs 21.1-16).
A ação de se casar não era um problema para o editor deuteronomista, o
problema para ele, era o se casar com uma estrangeira. Acab tomou por esposa
a lb,z<yai Jezabel, uma princesa estrangeira. O texto não informa com precisão
quando Acab teria se casado com Jezabel, mas possivelmente, seu pai, Omri,
deve ter arranjado esse casamento, com a finalidade de fechar um forte acordo
comercial e político com a Fenícia, cuja tecnologia naval era bem avançada, e
estes dominavam o comércio marítimo do mediterrâneo. Esta era uma grande
oportunidade para quem agora estava dominando a costa litorânea de Israel
Norte, e dominando a cidade portuária de Dor.
Jezabel era filha de l[;B;ta. , Etbaal, o rei dos sidônios. Era o reino que
40 Sobre o verbo WxT;v.YIw:: “O verbo hw"x]T;v.hi (curvar-se, adorar) tem recebido atenção
considerável dos lexicógrafos. Tem sido tradicionalmente considerado formação hitpolel de hx'v',
v
na qual a sibilante ( ) e o T passam por metátase (esse verbo ocorre uma vez no qal e outra no
hif‘il). Alguns gramáticos sugerem que a forma é um hištafel de hwx, com Tv.hi como o prefixo
desse tema raro. O tema šafel no semítico oriental corresponde ao hif‘il (causativo) do semítico
do noroeste, de modo que essa pode ser uma forma reflexiva ( t.hi) do tema causativo com v”
(ROSS, 2005, p. 304-305).
138
do sujeito faz com que ele se curve diante da divindade. Isto mostra um certo
grau de devoção por parte de Acab, rei de Israel Norte, para com o deus Baal.
Estas três últimas ações “negativas” de Acab no v.31, seria decorrente da
ação de ter tomado Jezabel por esposa. A princesa Jezabel, ao se casar com
Acab, teria vindo para Samaria e trazido consigo uma comitiva, com presentes,
servos e servas, oficiais, divindades sacerdotes e sacerdotisa. O deuteronomista
reprovou todas essas ações.
causou essa ação, ele fez com que levantassem para ele. Desta forma, o verbo
hebraico ~q,Y"w: “e levantou”, indica que o rei Acab foi o autor da ação, mas a
na Bíblia Hebraica somente nos livros de Reis (oito vezes) e Crônicas (uma vez),
e todas as nove ocorrências fazem referência à família da dinastia omrida (1Rs
16.32; 2Rs 10.21, 23, 25, 26, 27; 11.18; 2Cr 23.17).
Primeira frase do v.33 diz hr"_vae h] '-ta, ba'Þx.a; f[;Y:ïw: “e fez Acab a Aserá”. A
Aserá foi uma deusa bastante popular no período bíblico, ela era uma deusa da
fertilidade. O vocábulo hr'vea] ocorre quarenta vezes na Bíblia Hebraica, destas,
dezesseis vezes no livro de 1 e 2 Reis e onze vezes no livro de 2 Crônicas.
O texto informa que Jezabel sustentava quatrocentos e cinquenta profetas
de Baal e quatrocentos profetas de Aserá com os recursos da corte (1Rs 18.19).
Isto indica que esta era a religião do estado, ou pelo menos a religiosidade
apoiada pelo estado. Foram encontradas muitas estatuetas feitas em cerâmica
de Aserá/Astarte tanto em Israel Norte como em Judá, mostrando que as
divindades da fertilidade eram muito comuns no cotidiano dos israelitas deste
período (MAZAR, 2003, p. 476).
O nome hr'vea] é traduzido na maior parte das versões da Bíblia em língua
portuguesa, por “poste-ídolo” (ARA), “bosque” (ARC), “poste sagrado” (BJ) e por
a;lsoj “bosque” na LXX. Evidentemente que, como um nome de divindade, não
140
deveria ser traduzido, mas transliterado, para manter a pronúncia do nome, mas
isso não é uma realidade. A tradução do nome hr'vea] acaba escondendo a
e isto demonstrava sua felicidade. O nome hr'vea] (Aserá) deve trazer o sentido
de “a que traz felicidade”, daí a ideia de deusa da fertilidade.
Há uma proibição em Dt 16.21-22 para que ninguém levantasse uma Aserá
nem plantasse uma árvore junto ao altar de Javé. No livro dos Reis temos várias
ocasiões onde o texto bíblico hebraico testemunha a presenta de Aserá no
território de Israel Norte e de Judá, como também dentro do próprio Templo de
Jerusalém, como neste texto 1Rs 16.33 onde menciona o templo de Baal e o
estabelecimento da Aserá em Samaria. Posteriormente, temos a presença de
Aserá durante o reinado de Jeoacaz em Samaria, em 2Rs 13.4-6, quase
quarenta anos depois de Acab.
Este texto sugere que a Aserá está associada com o templo de Baal em
Samaria. Porém, é possível que o templo tenha sido de Javé, pois existem
várias evidências que apresentam Javé como a divindade de Samaria
(DIJKSTRA, 2001, p. 116-117). A Estela de Mesha, por exemplo, uma pedra de
basalto com um texto escrito em letras paleohebraicas, apresenta na linha 18, o
nome de Javé (YHWH) como a divindade de Israel Norte, que segundo Mesha,
foi derrotado por Qemosh (ou Camos), divindade moabita (GALLEAZZO, 2008,
p. 119-120, 147-148).
A Aserá aparece como um dos motivos listados pelo editor deuteronomista
como a causa da queda de Samaria diante dos assírios (2Rs 17.7-10). E
também aparece em Jerusalém na época de Ezequias (2Rs 18.4), e anos mais
tarde, dentro do Templo na época de Manassés (2Rs 21.7) e na época de
141
livros dos reis são uma intepretação teológica da história e não uma
interpretação estritamente histórica (RÖMER; PURY; MACCI, 2000, p. 24-25).
Esta acirrada discussão a respeito da datação do livro dos Reis é de longa
data, e atualmente, com os novos paradigmas arqueológicos surgindo e se
estabelecendo, os exegetas e historiadores bíblicos estão reavaliando suas
posições e outros já mergulharam na nova visão da história bíblica. Segundo
Kaefer, autor das introduções aos livros históricos da Nova Bíblia Pastoral, os
livros dos Reis e os de Samuel começaram a se formar entre as épocas de
Ezequias e Josias, quando Judá se torna um Estado desenvolvido,
Considerações Finais
Capítulo 3
O CONJUNTO LITERÁRIO SOBRE
A DINASTIA OMRIDA
42 Conferir edição de RAHLFS, Alfred (ed.). Septuaginta: Id est Vetus Testamentum graece iuxta
LXX interpretes. vols. 1 e 2. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft, 1979.
43 Cf. edição Facsímile do Códice de Leningrado em https://archive.org/details/Leningrad_Codex
44 Veja o fac-símile do Códice de Alepo em www.aleppocodex.org
149
filho de Baasa (1Rs 16.8-14). Elá subiu ao trono de Israel depois da morte de
seu pai Baasa (14.8). É possível que Omri tenha sido também general quando
Baasa ainda era rei de Israel Norte, devido ao curto período de reinado de Elá,
apenas dois anos (14.8). Segundo a narrativa, Omri estava com o exército diante
de Gibeton, cidade filisteia, e Elá ficou em Tirza.
A narrativa diz que um dos comandantes dos carros de guerra chamado
Zimri, não foi para o cerco em Gibeton, em vez disso, ficou em Tirza (16.9). Zimri
planejou um golpe para tomar o trono de Elá, e aproveitou que o rei estava na
casa de um mordomo bebendo, e o matou (16.10), assumindo o trono de Israel
em Tirza. Mas Zimri teria realizado este golpe sem o apoio do exército, o que
ocasionou numa crise. É nesse momento que Omri, o general do exército de
Israel Norte, entra na história de Israel.
Omri é aclamado rei pelo exército e marcha para Tirza para encontrar
Zimri. O exército sitia Tirza, a narrativa diz que Zimri se esconde no palácio. O
texto bíblico não informa, mas possivelmente tenha sido Omri e seu exército que
incendiou o palácio e matado Zimri.
Um personagem surge na história, Tibne. Ele não tinha sido citado na
narrativa, só aparece em dois versículos, como um forte concorrente ao trono de
israel. Contudo, parece que consegue fazer com que metade do povo de Tirza o
seguisse. Tibne morre repentinamente (1Rs 16.22). O texto não dá nenhum
151
detalhe sobre como ele morreu, deixando um mistério sobre sua morte.
Possivelmente, ele tenha sido morto por Omri, ou pelo seu exército (SIQUEIRA,
1997, p. 99). Omri sobe ao trono de Israel Norte, em Tirza, de onde reina seis
anos. Durante esse período, Omri compra uma colina ao oeste de Tirza, no final
do vale que liga a costa litorânea, perto de Dor, até Siquém, uma rota comercial
importante leste-oeste. Já que ligava a Estrada do Rei, no extremo leste de seu
território à Via Maris, rota comercial que passava pelo litoral. Estas rotas
comerciais traziam e levavam produtos para o porto de Dor e para o comércio
com a Fenícia.
Omri compra a colina de Semer e constrói nela a nova capital do novo
reino de Israel Norte, Samaria (1Rs 16.24). O livro dos reis menciona a fundação
de Samaria em apenas um versículo, de modo extremamente reduzido,
mostrando tamanho desprezo por parte dos compiladores e editores do livro.
Logo após a menção à fundação de Samaria, a narrativa é interrompida
bruscamente para dar lugar às avaliações do reinado de Omri. De Omri é dito
que ele foi o pior dos reis que até o momento e foi acusado de seguir o mesmo
caminho mau de Jeroboão (1Rs 25-26). A narrativa acerca de Omri termina no
v.28, dizendo que Omri morreu e foi sepultado em Samaria, e que Acab, seu
filho, passou a reinar no lugar dele.
breve resumo, um sumário (1Rs 16.29-33). Neste sumário estão temas que
foram abordados na análise exegética do capítulo 3. Acab é avaliado de forma
extremamente negativa, sendo chamado de o pior de todos os que foram antes
dele (1Rs 16.30), e ainda mais, o avaliador diz que como se isso fosse pouco
(ter sido o pior de todos), ele ainda se casou com Jezabel, uma princesa sidônia
(Fenícia) e é acusado de ter servido a Baal (1Rs 16.31). Além disso, Acab é
acusado de ter levantado um altar a Baal no templo de Baal que ele mesmo
tinha edificado em Samaria, e também de ter feito uma Aserá (RÖMER, 2005, p.
18). O avaliador diz que Acab cometeu mais abominações do que todos os que
reinaram antes dele (1Rs 16.32-33).
152
45
Jezreel ( la[,r>z>yI
, LXX: Iezrael) ocorre 25 vezes em todo o ciclo de Elias-Eliseu: 1Rs 18.45,46;
21.1,23; 2Rs 8.29(2x); 9.10,15(2x), 16,17,30,36,37; 10.6,7,11.
46 qpea], LXX: Afeka) ocorre três vezes: 1Rs 20.26,30; 2Rs 13.17.
Afeca (
47
Suném (~nEWv, LXX: Souman) ocorre duas vezes: 1Rs 18.45 (?); 2Rs 4.8.
48
Megiddo (ADgIm., LXX: Mageddwn) ocorre somente uma vez: 2Rs 9.27.
49 Bet-Hagan (!G"+h; tyBeä, LXX: Baiqaggan) ocorre uma vez: 2Rs 9.27;
50 Referências ao Monte Carmelo (lm,(r>K;h; rh:ï, LXX: o;roj to. Karmh,lion) ocorre cinco vezes:
53 Samaria (!Arm.vo, LXX: Semerwn) ocorre trinta e seis vezes: 1Rs 18.2; 20.1,10,17,34,43;
21.1,18; 22.10,37,38,52; 2Rs 1.2,3; 2.25; 3.1,6; 5.3; 6.19,20(2x),24,25; 7.1,18;
10.1(2x),12,17,35,36; 13.1,6,9,10,13;
153
fronteira de Israel Norte com Judá. São doze menções a Samaria durante a
história de Acab, primeiro quando Elias se apresenta a Acab em 1Rs 18.2,
quando ele diz para Acab reunir todos os profetas de Baal e de Aserá no topo do
monte Carmelo. A próxima ocorrência de Samaria aparece somente no capítulo
20, num primeiro confronte com Ben-Hadad, rei de Damasco, quando este teria
sitiado Samaria e guerreado contra ela. O texto diz que Acab derrotou os
arameus, mas não matou Ben-Hadad, ao contrário, teria feito uma aliança com
ele. O texto diz que Ben-Hadad iria devolver as cidades que eram de Omri, mas,
Acab é que teria tomado as cidades ao sudoeste de Aram e dominado este
território até os limites de Damasco, na região de Dan, Betsaida e ‘En Gev
(FINKELSTEIN, 2015, p. 133-135).
As demais ocorrências são no capítulo 21, num segundo conflito entre
Aram e Israel Norte. Acab e Josafá vão para a guerra em Ramot-Gilead, na
Transjordânia, a finalidade, conforme indica o texto parece ter sido proteger as
fronteiras ao sul de Damasco. Um ponto interessante do capítulo 21 é o
arrependimento de Acab (1Rs 21.27-29), que segundo Römer (2008, p. 155),
seria uma adição pós-exílica da história de Acab. Na última guerra que Acab
participa em Ramot-Gilead, Josafá é claramente submisso a ele. Inclusive se
vestir com as vestes reais durante a batalha no lugar de Acab (1Rs 22.30), se
fossem matar Acab matariam Josafá. Neste conflito, Acab é ferido e morre sobre
a biga real. No final deste capítulo, no v. 39 é mencionada a casa de marfim de
Acab, e diz que houve outras edificações de dele que não foram relatadas no
livro dos Reis.
As cidades de Betel55, Gilgal56 e Jericó57 são as cidades do centro-sul e sul
do reino de Israel Norte. Jericó era a fortaleza de fronteira, Gezer (que não é
citada no ciclo de Elias) ao oeste, guardando as fronteiras com Judá e com a
Filístia, e Jericó, guardando a fronteira com Judá, protegendo o fértil vale do
Jordão58. Gezer é uma das cidades com fortes características arquitetônicas dos
54 Baal-Salisa ( hv'liv' l[;B;, LXX: Baiqsarisa) ocorre uma vez: 2Rs 4.42.
55 Betel (lae-tyBe, LXX: Baiqhl) ocorre cinco vezes: 2Rs 2.2(2x),3,23; 10.29.
56 Gilgal (lG"l.G,I LXX, Galgalwn) ocorre duas vezes: 2Rs 2.1; 4.38 (Khirbat al Mafiar).
58 Jordão (!Der>y:, LXX, Iorda,nou) ocorre onze vezes: 1Rs 17.3,5; 2Rs 2.6,7,13; 5.10,14; 6.2,4;
7.15; 10.33.
154
64 Beerseba ([b;v, raeB., LXX: Bhrsabee) ocorre uma vez: 1Rs 19.3.
155
Elias-Eliseu (1Rs 19.3), quando Elias foge de Jezabel e caminha até Beerseba.
Sem levar em conta o caráter ficcional da narrativa, a menção a Beersheba e o
livre acesso entre as fronteiras Israel Norte e Judá, contribuem com a ideia de
que Judá estivesse sob o domínio de Israel Norte.
Acab construiu um palácio em Jezreel (1Rs 21.1), somando, portanto, dois
palácios principais, um em Samaria e outro em Jezreel. Jezreel tinha arquitetura
semelhante à de Samaria, o que é atestado pela arqueologia (FINKELSTEIN,
2015, p. 119-121; MAZAR, 2003, p. 393). Jezreel foi palco da trama e
apedrejamento de Nabote (1Rs 21) e do assassinato de Jorão, rei de Israel,
pelas mãos de Jeú (2Rs 9). São atos condenados pelo profeta Oséias em Os
1.4. A narrativa dos Reis também fornece informações sobre edificações feitas
por Acab, como por exemplo, a ampliação do palácio e a casa de marfim que
teria construído em Samaria 1Rs 22.39. Os textos não fornecem maiores
detalhes sobre tais edificações realizadas por Acab, rei de Israel Norte.
A narrativa também informa acerca do poderio militar de Acab, como no
episódio em que Ben-Hadad se alia com trinta e dois reis e marcha contra
Samaria (1Rs 20). A narrativa diz que Acab saiu para a guerra com um exército
de sete mil homens (1Rs 20.15). A cidade de Afec onde ocorreram as batalhas
entre Aram e Israel Norte, possivelmente seja a região de ‘En Gev, a leste do
Mar da Galileia (FINKELSTEIN, 2015, p. 132). Na última batalha contra Ben-
Hadad em Ramot-Gilead, Acab e Josafá guerrearam contra um forte exército,
com trinta e dois capitães dos carros de guerra, isto indica que o exército de
Acab e Josafá teria carros de guerra e soldados a pé, de modo que tivesse
poder para enfrentar tamanho exército com êxito, mas, Acab foi ferido na guerra
e morreu no campo de batalha, sobre sua biga real, e foi enterrado em Samaria
(1Rs 22. 29-40).
Em 1Rs 22.41-51 está o resumo do reinado de Josafá, rei de Judá. É o
resumo clássico, com nome do rei, a idade que assumiu o trono, o nome da
mãe, se foi bom ou mau, seus atos, sua morte e seu enterro. O texto avalia
Josafá como bom, com uma ressalva, que ele não retirou os lugares altos
(tAmB'). O texto informa que ele manteve paz com o rei de Israel (v.45) e que
não havia rei em Edom, somente um governador (v.48). O v.49 diz que Josafá
fez navios para Társis, com a finalidade de comercializar o ouro vindo de Ofir,
156
narrativa sobre seu reinado já começa com uma avaliação negativa, um pouco
mais amena, porque ele teria removido a maṣṣebah de Baal (l[;B;h; tb;C.m;)
erguida por seu pai em Samaria. Porém, um dos pontos que pesou na sua
avaliação negativa foi que além de ter agido conforme os feitos de Acab e
Jezabel, e por ter seguido nos erros de Jeroboão I (2Rs 3.3).
A história da revolta de Moab volta para a narrativa (2Rs 3.4-27), agora
mencionando seu líder, Mesha, o rei de Moab. Esta é a mesma história contada
na Estela de Mesha, aqui na perspectiva de Israel Norte e na estela, na
perspectiva de Moab. A narrativa da revolta inicia informando o nome do rei de
Moab e o valor do tributo cobrado por Omri e Acab, reis de Israel Norte. Os
números são exagerados, mas enfatizam o alto valor dos tributos: cem mil
cordeiros e cem mil carneiros.
157
deles, omitindo a letra ה. O nome de Jorão, rei de Israel Norte, que em toda a
narrativa anterior era ~r'Ahy> (Iwram), passou a ser ~r'Ay (Iwram); e o nome de
Jorão, rei de Judá, ficou como ~r'Ahy>. Na tradução ARA, o nome do rei de Judá
é transcrito como “Jeorão” e o do rei de Israel Norte “Jorão”, já na BJ ambos os
nomes são transcritos como “Jorão”. Jorão de Judá reinou por oito anos em
Jerusalém.
O rei Jorão, de Judá, também é avaliado negativamente. Um dos
argumentos para esta avaliação é que ele teria andado nos mesmos caminhos
dos reis de Israel Norte, seguindo o que fizera Acab. O texto bíblico fornece mais
uma informação sobre Jorão, que ele fora casado com Atalia (hy"l.t;[]) filha de
158
Omri (ou “de Acab”, veja LÓ, 2006, 55-57). Na opinião do editor deuteronomista,
Javé não destruiu Judá nessa época, porque havia prometido a Davi de lhe dar
sucessão para sempre em Jerusalém (2Rs 8.19, ver também 1Rs 11.36). Nesta
época uma série de rebeliões teria acontecido em Edom e Libna (2Rs 8.20-22).
A narrativa bíblica dá um final aparentemente mais brando para Jorão, dizendo
apenas que ele “se deitou com seus pais e foi sepultado” (2Rs 8.24).
Em seguida, assume o trono em Judá, Acazias filho de Jorão de Judá e
Atalia (2Rs 8.24,26). A transcrição do reinado de Acazias de Judá é curto, assim
como o relato sobre o reinado de Jorão de Judá; são no total cinco versículos
(2Rs 8.15-29). Ele reinou somente um ano em Jerusalém, foi avaliado
negativamente, por ter andado nos caminhos de Acab (v.27). Ele foi com Jorão
de Israel Norte guerrear em Ramot-Gilead contra Hazael, rei de Damasco. Na
guerra, Jorão é ferido e é levado para Jezreel, em seguida, Acazias de Judá vai
para Jezreel para ver Jorão, seu parente (v.29).
yTiød>q;p'’W
`lae(r"fy. I tyBeî tWkßl.m.m; yTiêB;v.hi’w>
Jeú teve duas avaliações no livro de 2Reis, em 2Rs 10.30 ele tem
avaliação positiva por parte de Javé, por ter exterminado a casa de Acab; e no
v.31, ele teve uma avaliação negativa, por ter andado nos pecados de Jeroboão,
filho de Nebate. O texto não menciona as circunstancias da morte de Jeú, diz
somente que ele se deitou com seus pais e foi sepultado em Samaria (2Rs
10.36).
No período de Jeú, Israel Norte começou a perder território para a Síria, de
maneira que Hazael dominou toda a terra de Gilead e Moab, até o vale do Arnon
(2Rs 10.32-33). Durante o reinado de Joás, em Jerusalém, Hazael chegou até
Gat e a dominou, chegando até próximo de Jerusalém (2Rs 12.17-18).
Nestes dois versículos (1Rs 22.4 e 2Rs 3.7) Josafá diz que Israel Norte e
Judá são o mesmo. O povo de Judá era um com o povo de Israel Norte e o
poderio militar de Judá era um com o de Israel Norte. Acab casou sua filha Atalia
com Jorão, filho de Josafá (2Rs 8.18, 26). Tal casamento, por um lado, favorecia
Josafá, firmando uma aliança de preservação da família do rei de Judá e de
manutenção da paz entre os dois reinos, e, por outro lado, a dinastia omrida
entrava oficialmente no trono de Judá em Jerusalém (FINKELSTEIN, 2015, p.
136).
As citações do comércio marítimo em Ezion-Geber (Khirbet el-Kheleifeh),
atual Eilat/Aqaba, ajuda a mostrar como os omridas entraram dentro do reino de
Judá e chegaram até a extremidade sul, no Golfo de Aqaba. Em 1Rs 9.26-28 diz
que Salomão construiu navios em Ezion-Geber, e explorou o comércio de ouro
de Ofir. Em 1Rs 22.49, Josafá constrói navios de Társis junto com Acazias de
Israel Norte, para comercializar o ouro vindo de Ofir, mas seus navios se
quebraram em Ezion-Geber (ver também 1Cr 20.36). Portanto, conforme a
narrativa, o comércio marítimo de ouro em Ezion-Geber estava sob o domínio
dos reis omridas. Isto pode ser visto também nos achados arqueológicos em
Khirbet Kheleifeh, uma fortaleza omrida encontrada em Eilat (sobre isto, veja
capítulo 5).
Os omridas também controlaram a produção e o comércio de cobre (ou
333). O vocábulo hebraico para “cobre” é tv,xno > (nǝḥōšet), que contêm a raiz da
palavra cobra ou serpente vxn (nḥš).
Isto faz ligação direta com a tradição do êxodo, originária em Israel Norte
(FINKELSTEIN, 2015, p. 175-182). No texto de Nm 21.4-9, a narrativa da
serpente de bronze que Moisés teria feito no deserto, diz que o povo tinha
seguido pelo caminho do Mar Vermelho, possivelmente por Eilat e Aqaba. Diz a
narrativa que eles passaram a rodear a terra de Edom, e o povo ficou sem
paciência e falou contra Moisés, então Javé teria mandado serpentes (~yvix'n>)
para matar o povo. Moisés intercede pelo povo, e Javé lhe dá ordens para fazer
uma serpente de bronze (ou cobre), para que o povo, ao olhar a serpente,
ficasse curado.
Eles estavam, possivelmente, seguindo pela Estrada do Rei, ou nos seus
arredores, e passaram a rodear aquele território, na região de Petra, onde está
localizada a indústria de cobre (ou bronze) do séc. IX AEC. Esta deve ser uma
narrativa para legitimar a posse da indústria e do comércio do cobre. Esta
localização dada pela narrativa bíblica bate com a localização de Khirbet en-
Nahas, que está próxima da Estrada do Rei, ao sul do mar Morto, no antigo
território de Edom.
de Israel e Judá, deixando de lado toda a rica história de Israel Norte e dos seus
reis, privilegiando, desta forma, a dinastia davídica (TALMON, 1997, p. 393).
A história da dinastia omrida é contada nos livros das Crônicas em poucos
capítulos, do 18.1 ao 23.15, e está em meio às histórias dos reis de Judá:
Josafá, Jorão e Acazias. Os textos não mencionam localidades geográficas nem
das fronteiras territoriais de Israel Norte. A narrativa, com relação a localidades,
apenas menciona a batalha de Acab e Josafá contra os sírios em Ramot-Gilead,
onde Acab é ferido e morre, e a revolta dos moabitas e amonitas contra Judá
(2Cr 18.2-34 e 19.1-20.30).
A expressão verbal ^Am±k' ynIAmõK' ocorre três vezes na Bíblia Hebraica (1Rs
22.4; 2Rs 3.7; 2Cr 18.3), todas elas na boca de Josafá, quando responde a uma
pergunta de Acab ou Acazias, para ir guerrear na Transjordânia. O verbo com
partícula interrogativa %lEïteh] ocorre somente três vezes na Bíblia Hebraica (1Rs
22.4 d['_l.GI tmoår" hm'Þx'l.Mil; yTi²ai %lEïteh] “Irás comigo para guerra em Ramot-
Gilead?”; 2Rs 3.7 hm'_xl' .Mil; ba'ÞAm-la, yTi²ai %lEïteh] “Irás comigo para Moab para
guerra?”; 2Cr 18.3 d['_l.GI tmoår" yMiÞ[i %lEïteh] “Irás comigo para guerra em Ramot-
Gilead?”). É interessante perceber o uso da partícula yTiai nos textos dos livros
dos Reis, que parece indicar um dialeto do hebraico norte israelita, diferente do
que aparece em 2Cr 18.3, onde ocorre o uso da partícula yMi[.i o que pode
chamado Jeú, uma condenação contra Josafá por ter ido guerrear com Acab, rei
de Israel Norte (2Cr 19.2).
Outra crítica acontece no resumo do reinado de Josafá, onde o cronista
condena Josafá por ter se aliado com Acazias, rei de Israel Norte, filho de Acab
(2Cr 20.35). A condenação continua no verso 36, dizendo que Josafá se uniu a
Acazias para fazer navios para Társis em Ezion-Geber. Por conta disso, um
profeta chamado Eliézer trouxe uma condenação severa contra Josafá, dizendo
166
que suas obras seriam destruídas e seus navios se quebrariam e não iriam para
Társis (2Cr 20.37).
Estas alianças com Acab e Acazias, reis de Israel Norte aconteceram,
conforme a narrativa, por iniciativa do próprio Josafá, rei de Judá. Isto pode ser
visto em 2Cr 18.1, na expressão hebraica ba'(x.a;l. !TEßx;tY. Iw: "e aparentou-se com
Acab”. Tal expressão possui um verbo que está na conjugação Hitpael, (!TEx
ß ;t.YIw:),
que indica uma ação reflexiva ativa, ou seja, a iniciativa de se aparentar com a
família de Acab partiu do próprio Josafá, como uma necessidade, uma maneira
de se manter no trono do reino de Judá.
O domínio de Israel Norte sobre Judá é perceptível, o que resultou em
fortes críticas por parte de seus videntes. Embora não seja a intensão do autor,
a narrativa hebraica mostra que Acab se manteve sempre na posição de
comando é ele quem dá ordens, ao passo que Josafá aparece sempre na
posição de submissão, acatando todas as ordens vindas de Acab.
Em 2Cr 18.3 Acab pergunta para Josafá d['_l.GI tmoår" yMiÞ[i %lEïteh] “Irás
Judá. O texto apresenta Jorão como um rei ruim, que matou todos os seus
irmãos e é acusado de ter andado nos caminhos dos reis de Israel (21.4-6).
Outra acusação contra Jorão, é pelo fato de que sua esposa, Atalia, que era da
família dos omridas, o induzia a fazer o que era mau aos olhos de Javé (v.6). O
próprio profeta Elias teria escrito uma carta a Jorão, acusando-o de ter feito Judá
se prostituir religiosamente, conforme Acab e seus sucessores teriam feito em
Israel Norte (v.12-13).
Como castigo, Javé o teria ferido com uma enfermidade incurável (v.18), a
qual se agravou num período de dois anos e ele morreu com grandes agonias
(v.19). O cronista diz que o povo não lamentou sua morte, como haviam feito
com seu pai, Josafá. Diz também que Jorão morreu “sem deixar saudades”, e
que foi sepultado na cidade de Davi, mas não nos sepulcros reais (v.20).
Acazias assume o trono de Judá em Jerusalém no lugar de Jorão, seu pai.
Sua história é contada em nove versículos (22.1-9). Tal brevidade mostra o
desprezo do cronista por sua história. Acazias era filho de Jorão com Atalia, que
no v.3 é chamada de filha de Omri. Acazias é acusado de seguir os caminhos da
casa de Acab, que influenciado por sua mãe, Atalia, que seguia os conselhos de
Jezabel sua mãe, agia perversamente (v.3).
Acazias vai à guerra com Jorão, rei de Israel Norte, em Ramot-Gilead,
contra Hazael, rei da Síria (v.5). Jorão é ferido e Acazias o acompanha até
Jezreel. O cronista diz que esta foi a vontade de Deus, que Jorão fosse ferido e
Acazias o acompanhasse até Jezreel, porque lá Jeú executaria o juízo de Deus
contra a casa de Acab, matando Jorão, rei de Israel Norte e Acazias, rei de Judá
(22.7-9).
Quanto a Atalia, a narrativa sobre sua morte (23.12-15) é mais extensa que
a narrativa de seu reinado (22.10-12). Atalia é vista ainda com maior desprezo
pelo narrador cronista, porque ela é vista como uma interrupção no governo da
dinastia davídica sobre Judá e Jerusalém. Ela é vista como usurpadora, quando
ao saber que seu filho, Acazias tinha sido morto por Jeú, decide exterminar os
descendentes da “casa de Judá” (22.10).
Na tomada do poder em Jerusalém e na coroação de Joás como rei de
Judá, o sacerdote Joiada dá ordem aos seus capitães que levem Atalia e a
matem fora do Templo de Jerusalém, e eles vão e executam suas ordens
168
(23.14-15). Com a morte de Atalia, rainha da dinastia omrida, o cronista diz que
o povo da terra e a cidade de Jerusalém havia ficado tranquila, porque Atalia
tinha sido morta à espada (23.21). O casamento de Atalia com Jorão, o reinado
de seu filho Acazias, e o reinado dela em Jerusalém, mostram que os omridas
estavam no domínio de Judá, mesmo que o cronista tente não mostrar
claramente isso.
É nítida a avaliação negativa e o total desprezo à dinastia omrida. 1. Omri é
citado somente uma vez (2Cr 22.2) na narrativa sobre Acazias de Judá; 2. A
fundação de Samaria não é mencionada nas Crônicas; e, 3. As histórias de
Acab, Acazias e Jorão, são contadas à sombra das histórias de Josafá, Jorão e
Acazias, reis de Judá. O cronista inverte a ordem de quem era o dominador,
colocando Judá como dominante e Israel como inferior e fraco.
Mas sabe-se que era o contrário, Omri e Acab é que tinham tomado as
cidades do sul da Síria, e quando Acab firmou uma aliança com Ben-Hadad,
poupando-lhe a vida, teria autorizado Acab a edificar praças de comércio (#Wx)66
66 #Wx (substantivo absoluto masculino). Seu significado básico é “rua” ou “praça”. Holladay
concorda com esse significado, e acrescenta outros dois: “fora” e “campos abertos” (HOLLADAY,
2010, p. 139). Kirst (et.al.) apresenta os mesmos seignificados que Holladay (KIRST et.al., 2004,
p. 65). O dicionário de Harris (et.al.), apresenta a possibilidade de traduzir como “bazares”,
trazendo um sentido comercial para o vocábulo (HARRIS et.al., 1998, p. 443). Cline sugere os
mesmos sentidos apresentados por Holladay, e diz que talvez signifique também “bazar”, dando
conotação comercial assim como Harris (CLINE, 2009, p. 110). A Bíblia ARA traduz por
“bazares”, já a BJ e a NBP traduz por “mercados”. O ATI optou por traduzir como “ruas”. Nesta
pesquisa, preferi traduzir por “praças de comércio”, pois parece fazer mais sentido neste caso.
De acordo com este texto de 1Rs 20.34, a palavra hebraica #Wx parece ter um sentido mais
amplo, e Ben-Hadad, conforme a narrativa, parece entregar para Acab o comércio de Damasco.
170
para Omri e Acab, mas, na época de Jorão, rei de Israel, Mesha, rei de Moab, se
revoltou contra o domínio de Israel Norte e recuperou seus territórios. Em 2Rs
3.9 diz que Josafá, rei de Judá, e o rei de Edom, foram para a guerra junto com
Jorão, rei de Israel Norte. Isto também mostra o domínio norte-israelita sobre
Judá e sobre Edom. O texto dos Reis não menciona o nome das cidades
ocupadas por Israel Norte, mas a Estela de Mesha fornece mais detalhes sobre
essa ocupação em Moab.
(bAj, Twb) (11.5) seriam cidades do norte do planalto de Gilead; depois, o autor
menciona o território central e sul de Gilead, que vai desde o Arnon “Wadi Al
Mujib” até o o vale do Jaboq “Wadi Al Zarqa” (11.13,22). A narrativa cita a cidade
de Hesbon (!ABv.x,, Esebwn) “Hisban” (11.26)na parte central, ao norte de
Considerações Finais
Embora a dinastia omrida seja avaliada negativamente nos livros dos Reis
e das Crônicas, é notável a quantidade de textos bíblicos referentes a esta
dinastia, que em quantidade de texto só perde para as narrativas sobre Davi e
Salomão. Ora, se esta dinastia é tão ruim e perversa, porque conservar tantos
textos sobre ela? Possivelmente, muitos textos da história dos omridas já
existissem quando foi redigida a história de Davi e Salomão, e como Israel Norte
já não mais existia nesta época, Jerusalém foi privilegiada nas narrativas.
É possível que os redatores tenham mantido as narrativas existentes do
Norte, e as compilaram, ampliando-as, inserindo a história de Judá e de
Jerusalém. Vimos que a dinastia omrida cresceu e se expandiu após a
construção da nova capital, dominou povos, dominou Judá. Foi conhecida por
impérios e citada em importantes inscrições reais de povos vassalos. As
informações contidas em outros livros que contam sobre esse período, como as
listas de cidades das tribos transjordanianas mostram a ocupação de Irsael
Norte nesta região, o que foi atestada pela inscrição de Mesha, séc. IX AEC.
PARTE 3:
ARQUEOLOGIA
174
Capítulo 4
A FUNDAÇÃO DE SAMARIA A PARTIR DA
ARQUEOLOGIA
Introdução
Os assuntos apresentados e discutidos na Parte 2 são referentes à análise
da dinastia omrida a partir da literatura. Foi trabalhada a exegese de 1Rs 16.15-
33 (cap. 1) e a análise do conjunto literário das narrativas sobre os reis da
dinastia omrida (cap. 3). Nesta Parte 4 da pesquisa, a dinastia omrida será
abordada a partir da arqueologia. Neste capítulo, especificamente, será
analisada a fundação de Samaria através das evidências arqueológicas. A partir
dos relatórios das duas expedições que aconteceram na primeira metade do
séc. XX, e das novas abordagens arqueológicas em pesquisas recentes.
Será abordada neste capítulo a fundação de Samaria com base nas
evidências arqueológicas, principalmente nos relatórios das primeiras
escavações em Samaria, escritos por George Reisner e Gottlieb Schumacher. A
partir disso, são trabalhadas as recentes pesquisas sobre o tema, as
atualizações dos estudos em arqueologia de Samaria, bem como as análises
comparativas iniciadas por Israel Finkelstein e Norma Franklin, entre Samaria e
outros sítios do mesmo período, como Tel Megiddo e Tel Jezreel69.
(هللا رام, ram’allah; hebraico: )רמאלה e Beytin (antiga Betel), passando por
km, seguindo pelo vale Nahal Nablus. De Tirza (árabe: تل الفارعة, Tell el-Far’ah
Norte) para Samaria, a distância é de cerca de 19 km ao oeste. De Samaria para
Jezreel, onde os omridas tinham uma residência real, a distância é de cerca de
44 km ao norte, passando pela cidade árabe de Jenin. Para Megiddo, fortaleza
omrida e criadouro de cavalos, a distância é de 48 km, indo pela autopista 60 até
Jenin, virando à esquerda sentido Haifa (חיפה, árabe: )خيفاaté o Tel Megiddo
(ְֹׄמגִ ּדו תֵ ל, tēl məgiddô).
Samaria possui localização estratégica, a região central do território de
Israel Norte. Ela está, em linha reta, cerca de 31 km da costa litorânea (a oeste),
e à cerca de 48 km lineares até Peniel, no vale do Jaboq (יַבֹּ ק )נַחַ ל. Em linha
reta, Samaria dista 85 km de Madaba, na atual Jordânia, à 103 km de Dhiban
(Dibon) e cerca de 108 km de Ara’ir (Aroer), isto em medições lineares. As
distâncias percorridas através das modernas autopistas aumentarão o número
de quilometragem entre estas localidades.
A partir de Samaria para a Estrada do Rei (ou Caminho Real), na
Transjordânia, é de cerca de 87 km, indo pelo Nahal Nablus, subindo à esquerda
70 Para mais informações sobre o município de Sebastia, veja o site oficial da cidade
http://www.sabastiya.org.ps/wp/.
176
pelo vale do Jaboq (hebraico: נַחַ ל יַבֹּ ק, naḥal yabôq; árabe: Nahr az-Zarqa ou
Wadi az-Zarqa), passando por Peniel (hebraico: פְ נִ יאֵ ל, penî’ēl) e Mahanaim
(hebraico: מַ ֲחנָיׅ ם, maḥănāyim)72, até a região de Hesbon (hebraico: חֶ ְשׁבּוֹ ן,
ḥešbôn; árabe: تل حسبان, tell ḥisban), onde passava o Caminho do Rei.
Atualmente há uma rodovia que passa pela antiga Estrada do Rei, a autopista
35, conhecida como King’s Highway, que sai de Amman (árabe: )عمانe desce
até as proximidades de Aqaba (العقبة, al-‘aqabah ou أيلة, ’aylah), no extremo sul
da Jordânia.
Outra rota comercial importante é a que vinha de Beersheva, sul de Judá.
Esta, passava por Jerusalém, Betel e Samaria, até Nazareth, depois subindo
para Ḥazor, e a partir daí seguindo sentido Líbano ou Damasco. Havia ainda
outra importante rota comercial, que saindo de Beersheva passava por Samaria.
Ao passar por Samaria, a rota chegava em Jenin, no Vale de Jezreel, e seguia
para o noroeste, passando por Megiddo e Joqneam, indo pelo lado norte do
Monte Carmelo, até os portos fenícios, ou subia ao norte para Tiro e Sidon, na
Fenícia (Líbano).
Samaria é uma colina com cerca de 450m de altura desde o nível do mar, e
164m de altura desde a entrada do sítio73. Ela está rodeada de outras colinas
moderadamente onduladas, com muitas plantações de oliveiras e amendoeiras,
uma região com características fortemente agrícolas (FINKELSTEIN, 2003, p.
248). A oeste, as colinas vão baixando até dar lugar à planície costeira do Mar
Mediterrâneo, norte-sul, ligando o Egito à Fenícia, à Ásia e à Mesopotâmia.
72 Peniel e Mahanaim juntas recebem o nome árabe de Tulul al-Dahab (árabe: )تلول الذهب.
73 Medidas calculadas pelo software Google Earth.
178
74 Para saber mais sobre este projeto, veja as informações no portal da Harvard University:
http://ocp.hul.harvard.edu/expeditions/reisner.html. Acesso em 14/10/2016.
75 Para saber mais sobre a biografia do arqueólogo Gottlieb Schumacher, veja o portal da
largura e dez de comprimento, e se destinam a descobrir a orientação geral faz estruturas fixas a
serem desenterradas, facilitando, devido à simetria das plantas, a suposição da localização dos
muros e principais estruturas” (2010, p. 66).
180
toda a escavação e de cada objeto encontrado no sítio, bem como das grandes
estruturas.
Reisner classificou os achados como: geológicos (aquilo que foi depositado
sem ação humana), detritos de pedreiros (os que indicam alguma atividade
humana local), decomposição, sedimentos e resíduos de descarte (restos de
alimentos e animais mortos). A forma de registro de todas as atividades de
escavação consistia em: Diário, desenhos de mapas e plantas, registro dos
objetos encontrados e registro fotográfico. Com isso, os registros de Reisner
foram muito efetivos e bem feitos, com boas descrições, belas fotografias e
detalhados diários de escavação, os quais podem ser utilizados ainda hoje
(REISNER, 1924, p. 35-42; CLINE, 2009, p. 28-29).
Reisner registrou todo o período de escavação em Samaria em sete diários
manuscritos, nos quais é possível acompanhar diariamente como foi o progresso
das escavações em Samaria, bem como saber as datas em que determinados
achados foram desenterrados. Todos os diários fazem parte do acervo da
biblioteca de Harvard University, mas podem ser encontrados disponíveis na
internet, através do próprio portal da universidade79.
Na semana anterior às escavações em Samaria (sexta-feira, 24 de abril de
1908), Schumacher e Reisner fizeram uma reunião para ajustar os métodos e os
planos de trabalho. As escavações tiveram início propriamente dito, no domingo,
dia 27 de abril de 1908, sob a direção de Gottlieb Schumacher. George Reisner
retornou para seu trabalho arqueológico no Egito e só retornaria no ano
seguinte. As escavações em 1908 aconteceram em três períodos: 1) de 24/abril
a 01/maio; 2) de 22/maio a 02/junho; e, 3) de 11/julho a 21/agosto.
Nestes três períodos de escavação foi realizado inicialmente um trabalho
amplo de surveying sobre o primeiro terraço ou plataforma superior, identificando
as ruínas que estavam visíveis na superfície, depois cavaram trincheiras de
variadas larguras, aprofundando e analisando os estratos encontrados. Um dos
primeiros edifícios desenterrados foi o templo de Herodes, sendo que, primeiro
foi encontrada a escadaria, depois a plataforma e o piso interior do templo, isto
durante o mês de julho de 1908 (REISNER, Vol. II, 1924, Plates 85-86). Depois
foi encontrado o altar diante da escadaria do templo com estelas no seu lado
leste e uma estátua danificada, possivelmente, segundo Reisner, de um
imperador romano (REISNER, Vol. I, 1924, p. 9).
As escavações, em 1908, se concentraram mais na região em torno do
templo de Herodes. Foi desenterrado um pavimento logo acima da escadaria,
que continha restos de colunas romanas. As escavações revelaram ainda,
estruturas logo abaixo dos fundamentos do templo, tais estruturas eram mais
antigas, e dataram do período de Omri. Eram as estruturas do palácio de Omri
que estavam sob o templo de Herodes (REISNE, Vol. I, 1924, p. 9-11).
Foram encontradas nestes períodos de escavação de 1908, diversas
inscrições em hebraico ou aramaico, em grego e em latim. Em torno de cento e
trinta moedas do período romano foram desenterradas, mais poucas moedas
fenícias e bizantinas cunhadas em bronze. Muitos objetos cerâmicos foram
encontrados, garrafas, jarros inteiros e fragmentados, alças de jarros, copos,
lâmpadas, etc. Também estatuetas femininas e estatuetas de animais, conchas
ossos humanos e de animais e muitos objetos de marfim (REISNER, Vol. I,
1924, p. 21-28).
No final desta temporada, Schumacher manifestou o desejo de não
continuar como diretor nas escavações em Samaria. Mudanças já estavam
acontecendo, e George Reisner finalizou suas atividades no Egito, podendo
assim assumir a diretoria da Harvard Excavations at Samaria.
Houve inicialmente dificuldades para a equipe de Reisner, porque seu
objetivo principal era escavar o período israelita, porém, havia muitas ruínas dos
períodos posteriores, principalmente do período romano (REISNER, 1924, p. 36-
42). Quanto aos níveis estratigráficos de Samaria, Reisner classificou sua
ocupação em onze períodos, os primeiros seis períodos entre a fundação da
cidade (876 AEC) e a queda do Reino de Israel Norte (722 AEC), e os demais
entre a conquista assíria (722 AEC) até o período bizantino tardio, Idade Média
(AVIGAD, 1978, p. 1041-1050). Na tabela a seguir, estão os onze períodos
organizados do último (o primeiro estrato de cima) ao primeiro (o último estrato
de baixo).
182
Estrato Período
Período bizantino: Uma torre no alto da colina, ruínas de uma
catedral bizantina dedicada a João Batista. Cinco capitéis de
XI
colunas característicos do séc. V EC, e um monastério da Idade
Média também dedicado a João Batista.
Período romano: Portões e torres, a rua colunada do comércio
X (rua do cardo), templos, o templo de Herodes, o teatro, o estádio e
o fórum.
primeiras sobre a colina de Samaria, por isso Reisner não encontrou dificuldades
para a identificação das construções desse período, as quais datavam do séc. IX
AEC.
O sítio não foi plenamente escavado, somente a parte oeste da plataforma
superior e algumas ruínas na parte leste e norte da plataforma inferior foram
escavadas, como a basílica bizantina e o teatro romano, bem como as colunas
gregas e a rua colunada do terraço sul. Os palácios foram parcialmente
escavados, mas é possível perceber as construções do período de Omri, Acab e
Jeroboão II sobre a plataforma superior, logo abaixo do templo construído por
Herodes.
80Para Franklin, o objetivo ou a função destas marcas ainda hoje é desconhecida, mas deve ter
servido a algum propósito dentre os trabalhadores da construção de origem estrangeira, uma vez
que tais marcas são muito parecidas com as letras do alfabeto Cariano, língua proveniente da
Ásia Menor, atual Turquia (FRANKLIN, 2008, p. 47-49; ADIEGO, 2007, p. 26).
185
está aterrada e não é possível visualizar suas ruínas. Mas com a parte que foi
escavada é possível fazer medições e ter uma ideia das dimensões do primeiro
palácio da nova capital israelita.
O palácio foi construído sobre um escarpado de cerca de 4m de altura,
sobre a rocha do cume da colina, que foi cortada para dar lugar aos alicerces do
edifício e em algumas partes, servir também como piso de alguns cômodos. O
palácio tem no lado leste uma longa parede de cerca de 27m de comprimento.
Esta parede se projeta na escarpa (ou talude) em 5,5m no lado norte e 7,5m no
lado sul. O muro sul do lado oeste, se estende cerca de 7,5m na direção do
talude sul da plataforma superior. O edifício tem um pátio retangular fechado
com cerca de 11m x 21,25m, que atualmente se encontra embaixo da plataforma
do tempo de Herodes (FRANKLIN, 2008, p. 50).
É possível que o palácio tenha chegado próximo do talude norte da
plataforma superior (cerca de 45m a 50m de comprimento), mas esta parte norte
do edifício está debaixo a estrutura posterior do período romano e não foi
desenterrada totalmente. Segundo Franklin (2008, p. 50), Samaria e Megiddo
são as únicas localidades que utilizam a medida de 0,45m por côvado durante o
mesmo período. De acordo com ela, no Egito, que era governado pela 22º
dinastia (proveniente da Líbia), a medida era praticamente a mesma.
Foram escavadas treze salas do palácio de Omri, todas com tamanhos
diferentes. Uma longa parede cavada na rocha que liga a parede sul à uma
grande sala retangular ao norte. Uma sala grande e quadrada no centro dessa
área escavada com duas salas pequenas no lado oeste. A parede no lado sul,
se estende em linha reta para o leste, mas não foi escavada na extremidade
leste, portanto, o comprimento desse muro do palácio é desconhecido
(FRANKLIN, 2004, p. 195).
Não há dúvidas de que esta estrutura tenha sido o palácio de Omri. Esta
constatação foi uma unanimidade entre os pesquisadores da expedição de
Harvard e entre os pesquisadores das expedições seguintes (FRANKLIN, 2004,
p. 194; FAUST, 2012, p. 46). Até porque não existem evidências de construções
monumentais anteriores a esta estrutura. Para Finkelstein (2011, p. 234), esta
estrutura de fato é o alicerce do palácio de Omri, rei de Israel Norte. Segundo
ele, somente neste período a colina agrícola recebe um composto de edificações
186
O palácio de Acab se estendia ainda mais para o lado oeste, indo até cerca
de 1,8m de distância do muro de casamata oeste da acrópole. Esta parte oeste
do palácio era um anexo administrativo real, e ficou conhecida como a “Casa
dos Óstracos” (The Ostraca House), porque foi o local onde encontraram os 63
óstracos com registros de recebimento de mercadorias em Samaria (REISNER,
Vol.1, 1924, p. 114-117, 227-246). Atualmente estes óstracos são datados do
período de Jeroboão II, séc. VIII AEC, embora haja diversas indicações de que
os óstracos sejam datados desde o reinado de Acab (873 AEC) até os dias de
Manaém (737 AEC), um espaço de tempo de quase dois séculos (KAEFER,
2015, p. 68-69).
Nº do
Destinatário Remetente Ano Doc. Mercadoria Mensagem
Óstraco
1. Gedaliah Qasah 9 4 4-7 4 Vinho ------------------
- - - - 2 - Abibaal.........II
- - - - - - Ahaz.............II
- - - - - - Sheba...........I
- - - - - - Meribaal........I
- - - - 34 - S...................
- - - - 35 - Yaw..............
- - - - - - Uzza..............I
- - - - - - Eliba..............I
- - - - - - Baalâ.............I
- - - - - - Josiah............I
5. Ahinoam ou
Gib.......... 9 1 8 1 Vinho
Aroniam [O Nº.19 é claramente
Akhinoam; mas os Nº.9
- Yasoth 9 2 9, 10 2 Vinho
e 10 parecem ser
Arinoam]
- “ 10 1 19 1 Azeite
7. Kheles
Shemîda 15 1 32 ----- ------------------
Akhima
8. Iysha
Abiezer 10 1 13 1 Vinho ------------------
Ahimelek
o caso de: Abiezer (rz{ba, אבעזר, nº 3 e 28), Ḥeleq (qlX, חלק, nº 22-27),
Shekem (mkF, שכם, nº 44), Semida ({dy~f, שמידע, nº 3, 29, 31-40, 62, 63,
65, 69), todos estes ocorrem no livro de Josué 17.2. Os nomes, No’ah (h{n, נעה,
Todos esses nomes próprios ocorrem nestes textos como sendo parte da tribo
ou da região de Manassés.
Outros nomes pessoais como, Ḥeleṣ (#LX, חלץ, nº 30, 33, 35), Aḥino‘am
(m{nXA, אחנעם, nº 8-11, 19), Aḥimelek (%LMXA, אחמלך, nº 22-29, 48), Ḥanan
(nnX, חנן, nº 45-47), Ba‘ara’ (‚r{B, בערא, [fem.], nº 45-47) e Gomer (rmG, גמר,
[fem.], nº 50), são nomes que também ocorrem em textos bíblicos.
Nomes próprios de localidades que não ocorrem nos textos bíblicos: ’El-
Mattan (ntml‚, אלמתן, nº 28), Geba‘ ({BG, גבע, nº 8), Ḥaṣerot (tR#X, חצרת, nº
18, 22-25), Yaṣot (t#y, יצת, nº 9, 19, 45, 47), Yašeḇ (BFy, ישב, nº 48), Suq (qs,
סק, nº 16, 29), ‘šrt (trFy, ישרת, nº 42), qṣh (h#q, קצה, nº 4-7) e Šaptain (!tPv,
שפתן, nº 12).
Os nomes Gaddiyau (WydG, גדיו, nº 1, 2, 4, 5, 7, 16-18, 30, 33-35, 42) e
Shemaryau (Wyrmv, שמריו, nº 14, 18, 21) são equivalentes de Gedaiah ()גדיה
e Shemariah ()שמריה. Ba‘alzamar (rmzL{B, בעלזמר, nº 12) é um nome próprio
fenício conhecido. Alguns outros nomes que aparecem no final das inscrições
dos óstracos, como: ’Abiba‘al (L{BBa, אבבעל, nº 2), ’Ahaz (zXa, אחז, nº 2),
Šeba‘ ({Bf, שבע, nº 2), ’Eliša‘ ({fyl‚, אלישע, nº 7, 41), ‘Uzza’ (‚z{, עזא, nº
1), ‘Ela’ (‚l‚, אלא, nº 38), Gera’ (arG, גרא, nº 30, 36), Rafa’ (APr, רפא, nº 24) e
Natan (!t!, נתן, nº 45-47) também são identificáveis como nomes bíblicos, além
de possuírem equivalentes ou paralelos fenícios.
Nos óstracos ainda aparecem nomes compostos que segundo Reisner, há
questões para serem analisadas sobre eles, como: Ba‘ala Elisha‘ ({Fyl‚.‚L{B,
195
(rpz‚l{B, בעלאזכר, nº 31), Ḥeleṣ Gaddiyau (WydG..#LX, חלץ גדיו, nº 30, 33-
35), Ḥeleṣ ’Afṣah (X#P‚..#LX, חלץ אפצח, nº 31), Ḥeleṣ de Ḥaṣerot (tr#X.#LX,
חלץ חצרת, nº 22, 23), ’Isha Aḥimelek (%LMX‚.‚v‚, אשא אחמלך, nº 22-29),
24).
Todos esses nomes de localidades mostram as influências que Israel Norte
sofreu de outros povos da época, principalmente da Fenícia. Israel Norte
mantinha uma aliança familiar com a Fenícia, por conta do casamento de Acab,
filho de Omri, rei de Israel Norte, e a princesa fenícia, Jezabel, filha de Etbaal, rei
dos sidônios. Isto pode ser percebido nos muitos nomes tipicamente fenícios.
nimǝšî), conforme aparece nos textos da Bíblia Hebraica de 1Rs 19.16, 2Rs 9.2,
14, 20 e 2Cr 22.7. A inscrição nmš foi encontrada em três localidades diferentes:
Tel ‘Amal (estratos IV e III) e Tel Reḥov (estrato V), localidades do vale de Bet-
Shean na entrada do Vale de Jezreel, e Samaria (óstraco 56).
ד מהתל٨
בשת
לנמשי
-- ׄעד---ׄדל
--
Óstraco de Samaria Nº.56 (REISNER, 1924, p. 237, 242)
196
lnmš (v~nl, לנמש, lenimši, “para Nimsi” ou “de Nimsi”), indicando que a
mercadoria (não se sabe qual), foi enviada por Nimsi, o pai ou avô de Jeú. É
possível que ele tenha enviado as mercadorias a partir das cidades de Tel
Reḥov e Tel ’Amal, e tenha enviado não somente vinho e azeite, mas
possivelmente mel.
Há outra inscrição encontrada no sítio que também faz referência ao nome
Nimsi. Tal epigrafia foi feita num jarro “hippo” de cerâmica, encontrado na área
encontrados até agora. Ele data os óstracos de Samaria do séc. VIII AEC, e data
alguns óstracos de Arad como sendo do séc. IX e VIII AEC, alcançando ainda o
período da dinastia dos reis omridas. Finkelstein datou os óstracos de Samaria
na primeira metade do séc. VIII AEC, mas faz uma ressalva, dizendo que essa
tradição escrita deve refletir uma realidade anterior, da organização do Reino e
Israel Norte FINKELSTEIN, 2015, p. 95).
Isto não quer dizer que os óstracos sejam exclusivamente do séc. VIII AEC
em diante, mas que a escrita foi se desenvolvendo anteriormente, no séc. IX
AEC, e as técnicas de escrita foram sendo aprimoradas gradualmente. Mazar diz
que a caligrafia dos óstracos de Samaria reflete as mãos de um escriba
habilidoso, levando em conta os contornos das letras, as curvas e a alternância
de espessura do desenho das letras, e isto, segundo ele, exige tempo de treino
e de prática de escrita. Então, isto deve refletir o séc. IX AEC (MAZAR, 2003, p.
489-490). Segundo Herzog (1984, p. 4) foram encontrados onze óstracos
datados do séc. IX AEC. Tais óstracos, segundo ele, são do período de Josafá,
rei de Judá.
Temos a Estela de Mesha em Moab e a Estela de Tel Dan, ambas do séc.
IX AEC. Também há outras duas inscrições moabitas com escrita paleohebraica
encontradas no sul da Jordânia, perto de Kerak, e datam do séc. IX AEC. O
fragmento parece fazer parte da cintura de uma estátua, e diz que um rei
moabita oferece uma oferta para o altar de Qemosh (qemošyat). A outra
inscrição é uma estela chamada Estela de Nerab, também da região de Kerak, e
datada do séc. IX AEC. Esta estela tem uma figura humana no centro em alto
relevo, e as inscrições estão ao redor da figura dentro das bordas da estela
(PARKER; ARICO, 2015, 105-109).
Há muita semelhança entre os óstracos de Samaria, Tel Reḥov a Estela de
Mesha, a estela de Tel Dan e os óstracos de Tel Arad estrato X, todos datando
do séc. IX AEC e início do séc. VIII AEC. Há fortes indícios de escrita
desenvolvida em Israel Norte neste período. A quantidade de óstracos e
inscrições em jarros, com caracteres padronizados e similares aos utilizados em
Moab e na Síria, mostram que embora em Israel não tenha sido encontrada
nenhuma inscrição monumental, havia boas condições de escrita e produção de
textos. A boa caligrafia dos escribas de Israel Norte, mostram prática e
199
א A
ב B -
ג G -
ד D
ה h -
ו W -
ז Z -
ח X
ט J - - - - -
י Y
כ ^ -
ל l
200
מ m
נ n
ס s -
ע [ -
פ @ -
צ #
ק Q
ר R -
ש V
ת t
superior da estela. Nele há uma inscrição com três letras rvA ()אשר. Mas existe
Túmulo A
Salas Sala 7
Túmulo B
tenham interpretado como sendo outra cisterna. Suas medidas são similares às
do túmulo A, e sua entrada ficava paralela à do túmulo A, na mesma escarpa
oeste do palácio de Omri, um pouco mais ao sul, debaixo das salas do palácio.
O acesso a esse túmulo B era feita através de um túnel com 12m de
comprimento, o dobro do comprimento do túnel de entrada do túmulo A. Este
também foi entulhado com pedras durante o período IV, na invasão assíria, e
ficou inacessível por um longo tempo (FRANKLIN, 2003, p. 6-7).
Ambos os túmulos possuem similaridades tanto no tamanho quanto no
plano, e estão debaixo da estrutura do palácio de Omri, do Período I de
ocupação da colina. Os textos bíblicos mencionam que os reis de Israel Norte
Omri, Acab, Jeú, Jeoacaz, Joás e possivelmente Jeroboão II, foram enterrados
em Samaria (ver 1Rs 16.28; 22.37; 2Rs 10.35; 13.9; 14.16,19). É possível que o
túmulo A, tenha sido construído no início do reinado de Omri em Samaria. O
túmulo B, embora tenha dificuldades de datação, talvez tenha sido construído no
período de Acab, o segundo rei da dinastia fundada por Omri. Independente das
dificuldades de identificação do túmulo B, estes dois túmulos, são com boa
probabilidade, os túmulos dos reis de Israel Norte, os únicos dois túmulos reais,
segundo Franklin, desenterrados até agora no antigo Israel (FRANKLIN, 2003, p.
7-8).
Plataforma Superior
Plataforma Fosso?
Inferior
Palácio Plataform
a Inferior
fixo dentro das cidades ou ao redor dela (veja também CAMPAGNO, 2007, p. 9-
11)
Mario Liverani, em sua obra Uruk: The First City (1998, 2006), aborda as
teorias marxistas sobre os estabelecimentos de grandes cidades na
Mesopotâmia, e dialoga com outras teorias mais antigas, como a de Heichelheim
(HEICHELHEM, 1938), e outras mais recentes, como a de Polanyi (POLANYI,
1944 e 1957). Para Heichelheim, a formação dos estados antigos está ligada
diretamente com a economia, e diz que os estados estavam baseados num
relacionamento recíproco com três fatores principais: 1. Recursos; 2. Trabalho;
e, 3. O capital. Para Polanyi, o mercado é o grande fator para o surgimento dos
estados antigos. Estas teorias têm certa ligação com a de Childe, com relação
ao trabalho especializado e a produção de excedentes, estes excedentes, além
de sustentar toda a burocracia estatal e religiosa, também formavam um capital,
e investimento no comércio interno e externo (CHILDE, 1950, p. 11-13), mas não
são suporte suficiente para a compreensão do surgimento de um estado
desenvolvido.
Para Liverani (2006, p. 5-14), a obra de Childe The Urban Revolution é um
clássico, e fala do legado que esta obra deixou nos estudos dos primeiros
estados e governos territoriais tanto da Mesopotâmia quanto de outras partes do
Levante. Ele trabalha a formação de Uruk, na Mesopotâmia, com os seguintes
aspectos: 1. A transformação social do território, com irrigação e plantio, criação
de tecnologias e ferramentas para o arado e beneficiamento da colheita; 2.
Administração de uma economia complexa, com calendários de plantio,
comércio e mão de obra especializada; 3. Política e Cultura, com o
desenvolvimento da escrita, do aparato burocrático, ideologias e técnicas mais
aprimoradas para armazenamento; 4. Centro e periferia, com sofisticado sistema
de governo regional periférico a partir do centro, a capital do estado (LIVERANI,
2006, p. 15-76). Liverani reorganiza e reinterpreta a teoria de Childe, atualizando
seus conceitos na aplicação dos critérios de formação de estados na cidade de
Uruk, chamada por ele de a primeira cidade, por possuir muitas destas
características de um estado antigo datado de cerca de 3000 AEC.
Para Norman Yoffee (2013, p. 120-127), os estados surgiram mediante
uma evolução da sociedade humana, formando pequenos povoados e aldeias
213
Considerações Finais
Capítulo 5
O TERRITÓRIO DOMINADO PELOS OMRIDAS A
PARTIR DA ARQUEOLOGIA
Introdução
Antes de Samaria, não houve nenhuma cidade com edificações e
fortificações semelhantes no território de Israel Norte nem no território de Judá,
que no século IX AEC, era pequeno e sem muitos recursos naturais
(FINKELSTEIN, 2011, p. 227-242). Somente a Sefelá judaíta, na fronteira com
os Filisteus, era fértil; o restante do território era em sua maior parte desértico,
como o é até hoje. Não havia grandes edificações que legitimassem ter sido um
reino estabelecido e poderoso. Jerusalém era uma pequena cidade, longe da
Sefelá e rodeada por desertos ao leste e ao sul.
Jerusalém cresceu e se destacou com uma cidade fortificada, somente
depois que o Reino de Israel Norte foi desfeito pelos assírios (722 ou 721 AEC),
quando ela passou de uma pequena aldeia de pouco mais de mil habitantes
para cerca de quinze mil; foi uma explosão demográfica. Este crescimento
favoreceu um aumento significativo de seu potencial econômico, político e
comercial no cenário internacional (KAEFER, 2015, p. 28).
Davi é descrito nos livros de Samuel e dos Reis como o rei que foi ungido
por Samuel para assumir a monarquia no lugar da casa de Saul, já que Saul
havia sido rejeitado como rei pelo próprio Javé. Davi é apresentado como o
“homem conforme o coração de Javé”, e Saul, como um rei cujo reino não
subsistirá (1Sm 13.14).
Davi sobe ao poder no lugar de Jonatas, filho de Saul. E conforme a
narrativa, Jônatas reconhece Davi como um ungido, aceitando isso por causa da
forte amizade entre eles. Davi é proclamado rei sobre Judá (2Sm 2.1-8) e sobre
as dez tribos do Norte (2Sm 5.1-5), formando então a conhecida Monarquia
218
81Sobre o reinado de Atalia, veja a dissertação de mestrado: LÓ, Rita de Cássia. Atalia Rainha
de Judá: Leitura Exegética e Histórica de 2 Reis 11.1-3,13-16. São Bernardo do Campo: Umesp,
2006. Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) – Faculdade de Humanidades e Direito,
Universidade Metodista de São Paulo (Umesp).
220
cidade, segundo Finkelstein (2015, p. 121), foi construída no final do Ferro Tardio
(estrato VIII), e ficou em funcionamento até o séc. VIII AEC, onde há vestígios de
destruição.
Há evidências de que um grande edifício fora construído no estrato X, do
período omrida. Tal edifício ocupava um espaço de 20 x 30m, e estava localizado
na beira da plataforma, recebendo a brisa vinda do oeste. É possível que este
edifício tenha sido um palácio, construído sobre as ruínas de construções
anteriores durante no séc. IX AEC (FINKELSTEIN, 2015, p. 121-122). Capitéis
proto-eólicos foram encontrados nesta área e eram suportados por pilastras de
cantaria que atualmente está exposto no Museu de Israel, em Jerusalém. Dois
edifícios adjacentes ao palácio foram desenterrados, e eram compostos por
salas, possivelmente escritórios ou residências de autoridades reais, e eram
semelhantes aos edifícios administrativos que foram encontrados em Samaria
(MAZAR. 2013, p. 393-394).
Outras duas fortalezas da Alta Galileia que guardavam as fronteiras
noroestes com o sul da Fenicia eram: Tel Har Adir84 (אָׄדׅׄיר )תֵׄל הַׄר e Tel
(FINKELSTEIN, 2015, p. 133-134), Tel Har Adir era uma fortaleza localizada
numa região densamente arborizada e pouco habitada da Alta Galileia. Ela era
quadrada medindo 80 x 80m e rodeada por um muro de casamata, essa
casamata formava uma plataforma no topo da colina. Para ele, a casamata
encontrada em Har Adir é muito semelhante à encontrada Ḥazor estrato X,
indicando que a fortaleza de Har Adir com sua casamata e plataforma, teria sido
obra dos reis omridas (MAZAR. 2013, p. 335-336). A fortaleza de Har Adir foi
encontrada e escavada na década de 1970, mas os resultados destas
escavações nunca foram publicados (FINKELSTEIN, 2015, p. 129). O que temos
são apenas menções comparativas com outros sítios da época fornecidas por
Finkelstein e Mazar. Para Finkelstein (2011, p. 237-238), não há dúvidas de que
Har Adir seja uma fortaleza omrida, isto mediante todas as evidências
apresentadas.
Na década de 1950, foram escavados restos de uma fortaleza a 8 km ao
sudeste de Har Adir, esta fortaleza era Tel Ḥarashim. A exemplo de Har Adir, não
temos muitas informações acerca do sítio de Tel Ḥarashim, mas ainda assim, há
alguns textos disponíveis sobre a fortaleza. O sítio foi escavado em 1953 por
Aharoni e Amiran, financiados pelo Israel Department of Antiquities and
Museums e pelo Israel Exploration Society. Aharoni e Amiran desenterraram o
muro de casamata da fortaleza, e segundo Ben-Ami (2004, p. 197. Veja Anexo I,
Fig. 25), o sistema de fortificação dos muros de casamata é impressionante.
Este sítio está localizado nas colinas fronteiriças com o sul da Fenícia, a 690m
acima do nível do mar, e possui características semelhantes às de Har Adir e de
Ḥazor. O muro de casamata, a plataforma e vestígios de prédios administrativos
foram encontrados tanto em Har Adir quanto em Tel Ḥarashim (FINKELSTIN,
2015, p. 136; BEN-AMI, 2004, p. 194). A fortaleza de Tel Ḥarashim deve ter
permanecido ativa entre o séc. IX e VIII AEC, já que existem vestígios de
destruição que são datados do final do séc. VIII AEC, possivelmente por parte da
invasão assíria de 722 AEC. (MEYERS, 1999, p. 93).
Um sítio importante omrida que está localizado no meio do vale da Alta
Galileia, guardando a estrada que passava junto ao rio Jordão e seguia para
Damasco, é Tel Ḥazor86. Este é um dos sítios melhor escavados da Alta Galileia,
e por isso, ele se tornou um modelo de comparação para os demais sítios
menores ou menos escavados, como os já citados Tel Abel-Beth-Maacah, Tel
Har Adir e Tel Ḥarashim. O sítio arqueológico de Tel Ḥazor (conhecido pelo nome
árabe تل القضاه, Tell el-Qedar) foi identificado pela primeira vez em 1875 pelo
pastor protestante Josias Leslie Porter, enquanto trabalhava como missionário
na região de Damasco. Mais tarde, em 1928, o arqueólogo britânico J. Garstang
conduziu as primeiras escavações em Ḥazor. Somente no final da década de
1950 é que houve grande interesse da Universidade Hebraica de Jerusalém em
escavar o sítio87.
Yigael Yadin conduziu as escavações em grande escala em Tel Ḥazor entre
1955-1958 e 1968-1969. As conclusões dele são que Ḥazor, Megiddo e Gezer
eram cidades edificadas por Salomão, e isto baseado principalmente no texto de
1Rs 9.15, que diz que Salomão edificou Gezer, Megiddo e Ḥazor (ver
Gev88 (ֵגׄב תֵׄל עֵׄין, tel ‘ēn gēv), que está localizado na margem leste do Mar da
Galileia (רת
ֶׄ כׅׄ ֶׄנ )ָׄים, dentro de um famoso Qibbutz com o mesmo nome. O sítio de
Tel En Gev89 (estrato IV, área A, e estrato III, área B-C) foi construído sobre uma
plataforma rodeada por um mudo de casamata que mede 60 x 60m, este muro
era protegido por um talude de terra em ambos os lados. De acordo com
Sugimoto, do consórcio japonês para escavações em Tel En Gev, a arquitetura
do sítio é semelhante à encontrada em Samaria e Jezreel (veja a obra de
SUGIMOTO, Vol. 122, 2010). Para Hasegawa e Paz (Vol. 121, 2009, p. 61), En
Gev deve ter sido construída por um rei israelita da dinastia omrida, porque
possui as mesmas características arquitetônicas de outras cidades omridas,
especificamente Jezreel. Para eles o muro de casamata é similar ao de Jezreel,
assim como de Tel Ḥazor.
Finkelstein (2015, p. 134, 136; 2011, p. 238) afirma que En Gev faz parte
das cidades dominadas pelos reis omridas, porque segue as mesmas
características arquitetônicas das principais cidades dessa dinastia, ela lembra
muito Ḥazor estrato X. Para ele, En Gev, juntamente com Tel Abel-Beth-Maacah,
Tel Har Adir e Tel Ḥarashim, são as cidades fortalezas que guardavam as
fronteiras do reino de Israel Norte. Tel En Gev possui evidências de muros de
casamata, uma plataforma feita com movimentação, preenchimento de terra e
nivelamento.
Uma dúvida surge com relação ao Tel Betsaida90, por que houve domínio
omrida em En Gev e Dan e não haveria em Betsaida? Essa questão ainda está
em aberto porque não se tem certeza se ela era do domínio de Damasco ou de
Israel Norte. Nos relatórios das escavações em Tel Betsaida, não é mencionado
o domínio israelita, somente de Damasco, embora afirme que há semelhanças
entre os muros e os portões de quatro câmaras com os de Tel Dan91, Khirbet
Qeiyafa e Beerseba (ARAV, 2009)92. Segundo Hasegawa, Betsaida
possivelmente estaria entre as cidades do território mencionado na estela de Tel
92 Veja: http://www.unomaha.edu/international-studies-and-programs/bethsaida/_files/docs/2009-
Dan, nas linhas 3-4 (HASEGAWA; PAZ, Vol. 121, 2009, p. 61).
Finkelstein não dá um ultimato sobre esta questão, ora ele diz que poderia
ter sido de Damasco e ora dos omridas (FINKELSTEIN, 2015, p. 139-140). Ele
também diz que Betsaida é semelhante a Tel Dan com seu portão de quatro
câmaras e muros sólidos. Colunas de basalto foram encontradas em ambos os
sítios na região do portão. Em Tel Dan há vestígios destas colunas e
possivelmente, a estela de Dan estaria no portão. Em Betsaida, uma estela com
uma representação do deus-sol foi encontrada no portão. Uma diferença entre a
arquitetura omrida e a arquitetura de Betsaida é o muro sólido e o portão com
quatro câmaras (FINKELSTEIN, 2015, p. 134). Embora com relação ao portão,
temos o de Beerseba que é semelhante ao de Tel Dan, Khirbet Qeiyafa e de
Betsaida, que foi uma cidade dominada pelos reis da dinastia omrida.
Tel Abel-Beth-Maacah
Tel Dan
Tel Bethsaida
Tel Ḥarashim
‘En Gev
Tel Dan é outra cidade que ainda permanece, assim como Betsaida, em
aberto sobre quem a dominou no séc. IX AEC, Damasco ou Israel Norte? Se Tel
Dan não foi omrida durante o séc. IX AEC, por que Hazael teria construído uma
estela mencionando sua vitória sobre Jorão, rei de Israel Norte e sobre Acazias,
rei de Judá)? Para Finkelstein (2015, p. 159-160), Dan e Betsaida seriam as
cidades edificadas por Hazael após sua expansão territorial no final do Ferro II.
228
Segundo ele, Dan teria sido israelita somente na época de Jeroboão II, séc. VIII
AEC. Davis, em sua obra Tel Dan in its Northern Cultic Context (2013), diz que
Tel Dan apresenta diversas características que a ligam com as características
arquitetônicas dos reis omridas. Para ele, uma plataforma e blocos de pedra de
cantaria seriam características suficientes para indicar uma influência omrida
(DAVIS, 2013, p. 35, 53), mas há problemas nisso, porque os omridas não foram
os criadores dos blocos de pedra de cantaria nem das plataformas, eles
trouxeram essas tecnologias de fora, possivelmente Ugarit, Chipre e Fenícia
(MAZAR, 2003, p. 447).
Greer (2013, p. 130) acredita que Dan foi uma cidade dominada pelos
omridas, especificamente no período de Acab, rei de Israel Norte. Jeroboão II
teria somente retomado os territórios anteriormente dominados pelos omridas,
incluindo Dan. Daí a memória dos santuários de Dan e Betel mencionado na
narrativa de 1 Reis. Mazar (2003, p. 449) retoma a característica omrida dos
blocos de pedra de cantaria, fazendo comparação entre os blocos de Samaria e
os de Tel Dan. De fato, os blocos de pedra são idênticos com a borda em baixo
relevo como as bordas de um quadro (veja Anexo I, Fig. 29 e 30). Segundo ele,
é possível que os omridas tenham introduzido essa tecnologia para Israel
através da sua estreita ligação com a Fenícia, e desta forma, também com o
Chipre e a região de Ugarit, devido as rotas marítimas. Este estilo de blocos de
cantaria, posteriormente foi utilizado nas construções de Herodes o Grande,
como na construção do Monte do Templo, conhecido atualmente como a
Esplanada das Mesquitas.
Megiddo93 (ְֹׄמגִ ּדו תֵ ל, estrato VA-IVB), Tel Jezreel94 (יׅׄ ְזׄרֵׄעאֵׄל )תֵׄל e Tel Reḥov95
(רחוֹׄב
ֵׄ תֵׄל, estrato VI-IV).
Das três cidades do vale de Jezreel, a mais completa e importante é sem
dúvidas Tel Megiddo. Ela tem longo histórico de ocupação e de construções que
chega a 3000 AEC, além de aparecer registrada nas paredes do templo egípcio
de Karnak em 1468 AEC, onde o faraó Tutmósis III descreve uma vitória num
combate em Megiddo (KAEFER, 2012, p. 27). A fortaleza também é citada nas
cartas de el-Amarna (Idade do Bronze Tardio), onde o governador de Megiddo
troca correspondências com o faraó egípcio da décima oitava dinastia
(SCHNIEDEWIND; COCHAVI-RAINER, 2015, p. XI, 25, EA242-EA248, EA365).
O sítio de Tel Megiddo possui pelo menos três das características
arquitetônicas omridas: o portão de seis câmaras, armazéns e celeiros. Além
destas, Megiddo ainda possui sistema de abastecimento de água, palácio e
muitos estábulos. Todas estas construções são muito similares às encontradas
em Samaria (MAZAR, 2003, p. 450-455; LAMON E SHIPTON, 1939, p. 11-18). O
portão de seis câmaras foi escavado nas temporadas de 1935 e 1936, e foi
encontrado completo. Atualmente, é possível ver somente um lado do portão
israelita (veja Anexo I, Fig. 1), porque o outro foi derrubado para escavar o
período anterior canaanita. Por cima do portão, na segunda câmara, é possível
ver os restos do portão assírio de uma única câmara (LOUD, 1948, p. 42, 47-51).
Prédios administrativos foram encontrados no lado nordeste da fortaleza,
colunas e várias salas foram desenterradas nessa área. Junto aos edifícios
administrativos, em torno de doze grandes estábulos foram escavados, alguns
deles com todas as colunas e cocheiras (veja Anexo I, Fig. 15 e 16). No lado sul,
próximo ao palácio, mais cinco estábulos e uma grande área quadrada com uma
estaca no meio foi encontrada. Este era um local para treinamento e
adestramento de cavalos (LAMON E SHIPTON, 1939, p. 32-47; MAZAR, 2003,
p. 396). Um palácio do estrato IVB foi encontrado no lado norte, junto a um
grande estábulo que teria abrigado os cavalos reais (veja Anexo I, Fig. 10). O
palácio ficava próximo ao portão da fortaleza (MAZAR, 2003, p. 396), e olhava
para o norte do vale de Jezreel, entre o Monte Tabor e o Monte Carmelo, para a
direção do sul da Fenícia. O estilo do palácio sul, com um grande pátio na frente,
é, segundo Finkelstein, do estilo bit hilani da Síria, ocupando uma área de 20 x
30m, com capitéis proto-eólicos similares aos encontrados em Samaria
(FINKELSTEIN, 2003, p. 259-261. Veja Anexo I, Fig. 11 e 12).
No lado sul, próximo de um edifício real, foi encontrado um grande celeiro,
um depósito para armazenagem de grãos. Também foram encontrados
armazéns para, possivelmente, guardar alimentos, alguma produção agrícola
restrita do vale de Jezreel, etc. Apesar de todas essas características, Megiddo
não é uma cidade totalmente semelhante às demais cidades omridas. O próprio
layout da cidade, por exemplo, é diferente do de Samaria e Jezreel. A cidade não
teve obra de nivelamento e preenchimento de terra, mesmo que tenha
casamatas. Os dois edifícios reais (norte e sul de Megiddo) são similares aos de
Samaria e Ḥazor. As características omridas, aparecem mais em locais
edificados por eles, territórios conquistados destruídos e reconstruídos, que
podem ser grandes fortalezas ou pequenas aldeias em regiões estratégicas
(FINKELSTEIN, 2015, p. 131).
Tel Jezreel97, localizada a 12km a leste de Tel Megiddo era uma fortificação
construída por Acab, rei de Israel. No local foi encontrado um composto
retangular com casamata e torres quadradas nos quatro cantos (veja Anexo II,
Fig. 11 e 18). O composto mede 270 x 140m. Blocos de cantaria foram
encontrados em alguns lugares e notou-se que as casamatas formavam uma
plataforma plana, uma das características da arquitetura omrida. É perceptível
Tel Jocneam
Tel Dor
Tel Reḥov
poder militar dos reis omridas. Como é o caso de Samaria, Tirza98 ()תׅׄרְׄצָׄה, Tel
Gezer99 (ֶׄג ֶזׄר )תֵׄלe Tel Dor100 ()תֵׄל דוֹׄר. Sobre Samaria já foi dedicado o capítulo
4, portanto, não será abordado aqui novamente. Neste tópico serão trabalhados
os sítios de Tirza, Tel Gezer e Tel Dor. Evidentemente há muitos outros sítios
igualmente importantes nesta região, e que possivelmente apresentam sinais da
presença omrida, mas o objetivo deste tópico é apresentar os sítios com as
características da arquitetura omrida que estão mais evidentes.
Tirza estava localizada num entroncamento de dois vales e rotas
comerciais: 1) O vale atualmente chamado de Wadi al-Far’a, que vinha do vale
do Jordão, um pouco abaixo o vale do Jaboq; e, 2) O vale que seguia para o sul,
para Siquém e descia para Betel. Era uma localização estratégica do ponto de
vista comercial, mas não exatamente estratégica do ponto de vista político,
porque estava escondida no meio de um vale entre montanhas. Por isso a
escolha de Samaria, mais ao centro do território e na ligação entre o vale do
Jordão e a costa litorânea.
Em Tirza não foram encontradas edificações que justificassem uma capital
de um reino, mas possivelmente de um centro de poder ou um reino com fortes
características tribais. Roland de Vaux escavou este sítio entre os anos de 1946
e 1960, e escavou uma área dividida em quatro campos: três no lado oeste do
sítio e um no lado norte. A parte central e leste do sítio não foi escavado, sendo
impossível saber com precisão se havia edifícios administrativos e palácio no
Samaria Tirza
Siquém
Na fronteira sul com Judá temos a fortaleza de Tel Gezer. Gezer é um dos
três principais sítios atribuídos a Salomão, conforme datações de meados do
234
séc. XX. Isto por causa da semelhança entre as construções e com base num
único versículo bíblico, 1Rs 9.15, que diz que Salomão edificou Gezer, Megiddo
e Ḥazor. Gezer é uma cidade importante estrategicamente, porque dela era
possível controlar o vale de Asquelon e a via Maris (KAEFER, 2012, p.23), além
de estar próximo da Sefelá judaíta. A fortaleza foi o centro logístico dos cercos
israelitas a Gibeton, conforme 1Rs 15.27 e 16.15-17. Tais textos, segundo
Finkelstein (2015, p. 135), por citar Gibeton, e não uma cidade com maior
importância na planície costeira, fornece credibilidade histórica ao relato bíblico.
Gezer, assim como Ḥazor e Megiddo, tem um longo período de ocupação
desde a Idade do Bronze, mas o período que interessa a esta pesquisa é o da
ocupação israelita, que conforme encontrado no estrato VIII, foi o período em
que surgiram as evidências arquitetônicas dos reis omridas. O estrato VIII é
datado do séc. IX AEC. Neste estrato escavado nas últimas temporadas no tel,
mostra evidências do padrão arquitetônico omrida, como o muro de casamata
que rodeava a fortaleza, a plataforma nivelada com movimentação de
preenchimento de terra, o portão com seis câmaras, um edifício público
administrativo e, possivelmente, um palácio no lado oeste do portão, e um
grande sistema de abastecimento de água (MAZAR, 2003, p. 370-375;
FINKELSTEIN, 2015, p. 135-136; KAEFER, 2015, p. 72; Kaefer, 2012, p. 23-25.
Veja Anexo I, Fig. 2, 14 e 23; Anexo II, Fig. 14).
Uma marca de pedreiro semelhante às encontradas em Samaria e
Megiddo foi encontrada em Tel Gezer (veja Anexo III, Fig. 3), mas segundo os
relatórios de Macalister (1912, p. 178-179), ela foi encontrada junto a ruínas do
período Macabeu, não tendo nenhuma ligação com o período omrida, atribuindo,
assim, ao período Macabeu, séc. II AEC. Essas marcas de pedreiro também
foram encontradas em Tel Beerseba, todas similares às de Samaria e Megiddo,
todas do séc. IX AEC, do período omrida.
Os omridas se expandiram para a costa litorânea, dominando a cidade
portuária de Dor (Tel Dor). Segundo Finkelstein (2015, p. 135), a arqueologia não
tem apresentado provas conclusivas até o momento, fazendo-se necessário o
uso das fontes documentais. Para ele, a lista dos distritos salomônicos em 1Rs
4.11 reflete a realidade do séc. VIII AEC, entre o final do governo israelita do
Norte e o domínio assírio. É possível que as fortes ligações entre Israel Norte e a
235
Tel Beerseba
Tel Arad
Khirbet en-Nahas
Cades-Barnea
Kuntillet ’Ajrud
Khirbet el-Kheleifeh
106 Qemosh (qmš) ocorre doze vezes nas linhas: 01, 03, 05, 09, 12, 13, 14, 17, 18, 19, 32 e 33.
107 Javé (yhwh) ocorre uma vez na estela, na linha 18.
241
estela possui um longo texto com 34 linhas, que contam a vitória de Moab contra
Israel. A mesma história está descrita na Bíblia em 2Rs 3.21-27, porém narra a
vitória de Israel. Essas diferenças entre as narrativas são secundárias, o mais
importante são as citações dos reis de Israel Norte, das cidades dominadas por
eles, da menção à tribo de Gad na linha 10 (D@.FA, ’š gd, “homens de Gad”) e
Na linha 5, o rei Mesha fornece informações, mesmo que esta não seja a
intenção dele, sobre Omri e Acab. Ele diz que os reis de Israel Norte oprimiram
Moab por muitos dias, que segundo o próprio texto da estela, foram quarenta
anos, que segundo a narrativa bíblica, foi o tempo de vida de Omri até Jorão.
NBR.NMy.BAM.TA.wN[yw.LARVy.kLM.yRM[
עמריׄמלךׄישראלׄויענוׄ אתׄמאבׄימןׄרבן
Omri rei de Israel oprimiu Moab [por] muitos dias
.CRA.Lk.TA.yRM[.VRywׄ. (…)
ׄ)…( וירשׄעמריׄאתׄכלׄארץ
VYW.TV.N[BRA.HNB.YMY.YCXW.HMY.HB.BVYW/ABDHM
מדבאׄוישבׄבהׄימהׄוחציׄימיׄבנהׄארבעןׄשתׄויש
(...) Omri conquistou toda a terra de
Medeba e se estabeleceu nela [em] seus dias, e metade dos dias de seu filho,
quarenta anos.
Estas três linhas selecionadas da estela, mostram que Omri dominou sobre
Moab vários anos e que Acab, Acazias e Jorão, continuaram seu domínio
durante todos os dias de seu reinado. A estela não cita escrito por extenso o
nome de Acab, nem de Acazias ou Jorão, mas os chama de HNB “seu filho”,
referindo-se a eles. Omri conquistou toda o planalto de Medeba, atual Madaba,
com todas as suas fortalezas, várias são mencionadas pelo nome no texto da
estela. Com as informações fornecidas pela estela, somadas às evidências
arqueológicas, é possível reconstruir as fronteiras de Israel Norte, bem como
identificar as principais características da arquitetura omrida em suas cidades e
fortalezas.
Hesbon
Nebo
Madaba
Atarote Jahaz
Dibon
Aroer
omridas, são: ‘Atarot [TRj[, ]עטרת (linha 10-12), Nebo [Hbn, ]נבה (linha 14),
Jahaz [chY, ]יהץ (linha 19), Dibon [nbYd, ]דיבן (linha 21) e Aroer [R{R{,
Khirbet Ara‘ir (عرعور خربة, ḫirbet ‘arā’ir), a bíblica Aroer, é uma fortaleza
moabita localizada na margem norte do desfiladeiro do Wādî Mūjib (Vale do
Arnon). A Estela de Mesha diz que foi o rei de Moab quem a construiu (linha 26)
e que os reis omridas a conquistaram. Embora a estela diga que Aroer fora
construída por Mesha, rei de Moab, ela possui características do conceito
arquitetônico omrida (FINKELSTEIN; LIPSCHITS, 2010, p. 37-38).
O forte foi construído sobre um pequeno monte de aproximadamente 10m
de altura. A construção era quadrada (50 x 50m), muros triplos davam base à
plataforma e também a protegiam de ataques. O muro triplo era composto por
três muros construídos um ao lado do outro, com um espaço entre eles, tal
espaço tinha sido preenchido com terra e entulhos, fortificando o muro composto
(veja Anexo I, Fig. 20; e Anexo II, Fig. 4). É possível ver claramente que a
fortaleza foi construída sobre uma plataforma artificial com preenchimento de
terra e nivelamento. Um talude de terra rodeia o muro triplo (FINKELSTEIN;
LIPSCHITS, 2010, p. 37-38), principalmente na parte sudeste, onde a quina no
246
o nome de “Caminho do Mar” (הַ יָם ּדֶ ֶרְך, Cf. Is 8.23 [9.1]) ou pode aparecer
também como “Caminho da terra dos Filisteus” (פְ לִ ְשׁ ִתים ּדֶ ֶרְך אֶ ֶרץCf. Ex 13.17),
rota que saída do Egito e passava por Gaza, Asquelon, Asdode, Jaffa e Dor,
seguindo para a Fenícia em direção a Ásia.
A Estrada do Rei era uma das mais importantes rotas de comércio
internacional, por onde passavam as caravanas com especiarias e diversos
outros produtos. Várias das cidades por onde passava a Estrada do Rei, eram
247
dominadas pelos omridas durante o séc. IX AEC., podemos citar, entre outras,
Aroer (Khirbet ‘Ara’ir), Dibon (Dhiban), Medeba (Madaba) e Ramot-Gilead (Tell
er-Rumeith). A rota saía do Egito e atravessava toda a península do Sinai ao
norte, seguindo na direção de Eilat/Aqaba/Ezion-Geber, e daí subia sentido
norte, passando pelas cidades dominadas pelos omridas, na região de Moab e
no planalto de Gilead, indo até a capital arameia de Damasco (AHARONI et.al,
1999, p. 80, 88; PEREGO, 2001, p. 28).
Durante a primeira metade do séc. IX AEC, os reis omridas, principalmente
Acab, dominaram estas duas importantes rotas comerciais, a Via Maris e a
Estrada do Rei (Via Régia). Todo o comércio vindo do Egito para a
Mesopotâmia, ou para a Fenícia e para a Arábia, passava obrigatoriamente pelo
território então dominado pelos omridas (GASS, 2011, p. 18-23; SIQUEIRA,
1997, p. 101), tal domínio é atestado pelas estelas de Mesha e de Tel Dan. Ter o
controle destas rotas comerciais significava o domínio de toda a riqueza
produzida e transportada para o Egito ou para a Mesopotâmia, a cobrança de
pedágios e impostos para transportar mercadorias por estas rotas
(FINKELSTEIN, 2013, p. 8, 17-20; LEVY et al, 2016, p. 317-318).
Na altura do planalto de Madaba, a Estrada do Rei passava primeiro entre
as fortalezas de Aroer e Dibon, no vale do Arnon, depois entre as de ‘Atarot e
Jahaz, quatro fortalezas que conforme as inscrições na Estela de Mesha, os
omridas teriam construído pelo menos duas delas, como está escrito nas linhas
10 e 11: “e o rei de Israel construiu ‘Atarot” e as linhas 18-19 “e o rei de Israel
construiu Jahaz”. Para Finkelstein (2013, p. 37), estas fortalezas tinham o
objetivo de vigiar a rota comercial a leste e oeste, principalmente o comércio de
cobre vindo de Khirbet en-Nahas, que era a fonte de cobre mais importante do
Levante, cuja produção parece ter chegado ao pico no séc. IX AEC, durante o
período do domínio omrida na Transjordânia. Tudo indica que os omridas,
especialmente o rei Acab, tiveram a intenção de monopolizar o comércio de
cobre e outras especiarias que passavam pela Estrada do Rei, visando além do
comércio, objetivos militares.
4. Planalto de Gilead
Há outras cidades omridas transjordanianas que não foram mencionadas
na Estela de Mesha, como as cidades e fortalezas da região de Gilead, no
248
planalto norte, acima do Vale do Jaboq. Tais cidades podem ser identificadas
como omridas através do método de comparação da arquitetura da cidade ou
fortaleza. Entre elas está Ramot-Gilead, palco de conflitos entre Israel Norte e
Damasco. Outras, mas com pouca ou quase nenhuma escavação arqueológica,
são Mispa de Gilead e Pella (Tabaqat Fahl). Pella tem atividades de escavação
até recentemente, e possivelmente, parte das ruínas desenterradas são do
período da dinastia omrida.
Tell er-Rumeith113 é o nome moderno para a antiga Ramot-Gilead. Ela está
localizada na parte nordeste de Gilead, cerca de 16 km a leste da cidade de Irbid
e 7 km ao sul de Ramtha. Por ela passa a Estrada do Rei, que neste trecho é a
rodovia 25, importante rota comercial na antiguidade e durante o séc. IX AEC,
dominada pelos reis omridas, principalmente pelo rei Acab.
O sítio foi escavado em duas grandes temporadas pelo arqueólogo Paul
Lapp na década de 1960. A primeira temporada aconteceu em 1962 e a
segunda, em 1968. As escavações de Lapp estiveram focadas especificamente
na Idade do Ferro I e II, que é o período israelita. A datação das cerâmicas
encontradas no sítio foi estabelecida entre o final do séc. X AEC e início do séc.
VIII AEC (BARAKO; LAPP, 2015, p. 3-5). Foi identificado no sítio uma fortaleza
quadrada (40 x 40m), uma plataforma e um grande fosso rodeando a fortaleza
pelo lado de fora dos muros pertencentes ao estrato VII e VIIB (FINKELSTEIN,
2015, p. 127; BARAKO e LAPP, 2015, p. 7, 73. Veja Anexo II, Fig. 4).
A plataforma era rodeada por um muro de casamata de 1,5m de largura
formando uma plataforma nivelada dentro da fortaleza. Restos de um portão foi
encontrado, mas com grandes marcas de destruição, portanto, não foi
identificada a quantidade de câmaras do portão (BARAKO; LAPP, 2015, p. 19-
30). Várias camadas de destruição foram encontradas nas escavações de Tell
er-Rumeith. É possível que 1Rs 22.29-40 e 2Rs 9.1-29 faça referência a isso.
Segundo Finkelstein, Lapp não percebeu as principais características do sítio:
(1) Que o forte foi construído sobre num pódio elevado; e (2) que
está rodeado por um amplo fosso (...), o qual está rodeado, por
sua vez, no seu lado exterior, por um muro de barro (...). O fosso
e o muro se parecem com elementos semelhantes em Khirbet
Os sítios de Sucot (atual Tell Deir Alla, árabe: تل دير عال, tell deyr ‘alla),
Peniel (hebraico: פְ נִ יאֵ ל, penî’ēl) e Mahanaim (hebraico: מַ ֲחנָיׅ ם, maḥănāyim) –
ambas são chamadas de Tulul al-Dahab (árabe: )تلول الذھب – são sítios de
domínio israelita omrida durante a primeira metade do séc. IX AEC, uma vez que
Jeroboão II também parece ter reinado ali. As histórias do Ciclo de Jacó em
Peniel e Mahanaim e as características do Tell Deir Alla indicam que eram sítios
omridas. Também o estilo da escrita paleohebraica das inscrições de Tell Deir
Alla coincidem com o estilo das inscrições de Mesha, Tel Dan, Tel Reḥov e dos
óstracos de Samaria.
Hesbon (Tall Hisban) é um dos sítios mais escavados do planalto de
Madaba, mas suas escavações enfatizaram até o momento somente o período
bizantino e otomano do sítio. O período do Ferro não foi escavado, exceto
poucas partes isoladas, como as dos estratos 21-17, onde foram encontrados
fragmentos de um muro de casamata, parte de uma plataforma e um
250
linha 9 dWdtyb (דוד “ )ביתcasa de Davi”, já que esta foi a primeira vez que o
nome Davi aparece registrado fora dos textos bíblicos. O fato de Hazael registrar
a expressão “casa de Davi” na estela, mostra que embora ela fosse conhecida
em Damasco, ela foi colocada numa posição secundária na estela, já que Jorão
(~r[Wy) na linha 7, e depois Acazias (Why]zx‚) na linha 8, aparecem antes
do nome de Davi (ATHA, 2003, p. 298-309; KAEFER, 2016, p. 70).
Na linha 5 da Estela de Tel Dan, o rei Hazael diz que Israel Norte tinha
ocupado as terras de Damasco na época de seu pai, Ben-Hadad:
(5) “[Is]rael entrou previamente nas terras de meu pai. Hadad me fez rei”
E na linha 8, Hazael diz que matou o rei Acazias, filho de Jorão, rei de
Judá, da casa de Davi:
Estes textos selecionados com as marcações nos nomes dos reis de Israel
e Judá (Jorão e Acazias), evidenciam que esta vitória de Hazael deve ter
acontecido na época da revolta de Jeú (2Rs 9.14-10.14), e é possível que o
nome Jeú estivesse no final da linha 11 “[... Jeú rei]nou sobre Is[rael ...”
(KAEFER, 2012, p. 39-40). Embora a narrativa bíblica apresente Jeú agindo
sozinho e tomando o poder em Israel Norte, a estela apresenta outra
informação. Segundo a estela de Tel Dan, parece que ter sido Hazael quem
colocou Jeú no poder, e talvez ainda tenha eliminado a dinastia omrida através
de Jeú. Porém, apesar de Jeú ter assumido o poder, Israel Norte já não era mais
uma monarquia independente, ela estava agora sob o domínio de Hazael, rei de
Damasco.
A Estela nos mostra como a dinastia omrida tinha representatividade
internacional, o que indica sua importância e poder, ao pondo de render uma
252
Estela para o rei Hazael, onde narra sua vitória contra Jorão, o último rei da
dinastia omrida, a qual deveria estar fixada no portão de entrada da cidade. A
menção aos territórios de Damasco ocupados pelos reis omridas é importante
para esta pesquisa, infelizmente a estela não menciona as cidades e fortalezas
dominadas pelos omridas, assim como consta na Estela de Mesha. Mas,
somando-se esta estela com as demais evidências dos sítios a leste e nordeste
do Mar da Galileia, dá para tentar uma reconstrução plausível dos territórios de
Damasco dominados por Israel Norte.
Com a vitória de Hazael sobre Israel Norte, a dinastia omrida chega ao fim.
As evidências das destruições promovidas por Hazael e seu domínio em todo o
território de Israel Norte pode ser visto através das evidências arqueológicas.
Tanto em Jezreel como em Rehov e em outras cidades ao sul de Israel Norte é
possível perceber os vestígios de destruição na segunda metade do séc. IX AEC
(FINKELSTEIN, 2007, p. 149).
apresentado por ANET, mas traz o texto da estela transliterado. Acab é visto
como um forte oponente e possuindo grande poder de combate, com seus dez
mil soldados a pé e seus dois mil carros de guerra . Vejamos o texto a seguir:
Hadad-ezer (Adadidri), o
1.200 1.200 20.000 -
Damasceno
116Este texto também está publicado na obra Ancient Near Eastern Text (ANET), PRITCHARD,
1969, p. 278 (col.2), p. 279 (col.1). O texto em português citado nesta pesquisa é tradução minha
e os negritos são meus.
254
- - 1.000 - Egito
Nesta inscrição (de 733 AEC), Tiglate-Pileser III diz que ocupou Damasco,
no período de Rezin, rei de Damasco, e conquistou as cidades ao sul e sudoeste
de Damasco. Ele cita numa das suas inscrições, que conquistou a cidade de
Abel-Beth-Maacah, dizendo que esta era uma cidade da “Casa de Omri”. A
dinastia dos reis omridas foitão conhecida pelos reis do império assírio, que mais
de um século depois do fim desta dinastia, ainda estava viva na memória dos
soberanos da Assíria, a existência da poderosa dinastia que governou Israel
Norte durante o séc. IX AEC (PRITCHARD, 1969, p. 283-284; TADMOR e
YAMADA, 2011, p. 57-63).
257
Considerações Finais
Isso aconteceu com todas as cidades omridas tanto em Israel Norte como
na Transjordânia, no sul da Síria e na parte sul de Judá. Na Transjordânia temos
pelo menos três cidades/fortalezas com a maior parte destas características:
Atarote (Khirbet Ataruz), Jahaz (Khirbet Al-Mudayne) e Ramot-Gilead (Khirbet er-
Rumeith). Todas estas cidades/fortalezas possuem muros de casamata,
plataforma, prédios administrativos, armazéns, taludes e fosso.
PARTE 4:
RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA
261
Capítulo 6
O PRIMEIRO ESTADO INDEPENDENTE:
MONARQUIA UNIDA
Introdução
O que vimos nos cinco capítulos anteriores são as bases para a análise e
conclusões deste capítulo. Todo o levantamento bibliográfico dos principais
estudiosos da história de Israel, especificamente da dinastia omrida, forneceram
as informações necessárias para a compreensão de como a dinastia omrida foi
entendida de forma negativa e pejorativa, durante todo o séc. XX, e como ela
tem sido entendida nas últimas décadas, principalmente nas publicações do
início do séc. XXI.
O presente capítulo está estruturado em seis tópicos principais: 1. A
primeira monarquia de Israel e Judá; 2. Uma monarquia independente; 3. O
território omrida: Monarquia Unida?; e, 4. Omri e Acab / Davi e Salomão. O
principal objetivo neste capítulo é mostrar evidências de que Israel Norte com os
reis omridas transformou-se na primeira monarquia de fato, com todas as
características de monarquia, e ocupou um vasto território, expandindo para o
norte, sul, leste e oeste, que curiosamente, é semelhante ao território atribuído à
Monarquia Unida de Davi e Salomão.
Não analisaremos toda a história de Davi e Salomão plenamente, mas
ressaltaremos os pontos de semelhança entre o governo dos omridas e o da
Monarquia Unida, bem como os territórios dominados em cada um destes
governos. Uma reconstrução da história de Israel Norte a partir do Norte,
olhando os fatos com as fontes disponíveis: a Bíblia e a Arqueologia. Ambas as
fontes são importantes e uma não se contrapõe à outra, mas o conjunto das
fontes pode fornecer uma visão mais completa sobre a história desta importante
dinastia, que fundou o primeiro grande estado israelita.
262
117No total há o registro de 150 nomes de cidades e reis. Destas, 43 cidades bíblicas foram
conquistadas pelo faraó Sisaq, as quais são: Gaza [11], Bet-Shemesh [13], Taanac [14], Suném
[15], Bet-Shean [16], Rehov (apiário) [17], Mahanaim [22], Gibeon [23], Bet.Horon [24], Kiriat-
Jearim [25], Aijalon [26], Megiddo [27], Adar [28], Soco [38], Bet-Tapuah [39], Peniel [53], Sucote
[55], Siquém [58], Tirza [59], Vale de Jezreel [65], Hebron [71/72], Fortalezas do Negev [77/78],
Gat [83], Edom [98], Arad [108/109], Jehoram [139], Maacah [145], Jordão [150] (veja a lista
completa em http://www.bible.ca/archeology/bible-archeology-sheshonq-I-shoshenq-shishak-
shishaq-bubastite-karnak-conquest-campaign-canaan-battle-relief-topographical-list-187-cities-
conquered-name-rings-926bc.htm).
265
118Esta menção a edificação de Siquém, talvez seja referente à sua destruição por Sisaq I, em
926 AEC.
266
filisteus. A Peshitta propõe o nome Gat ( tG:) no lugar de Gibeton (!AtB.GI), isto
consta no aparato crítico da BHS. Isto faz sentido, levando em conta que com o
enfraquecimento egípcio na região, o comércio de cobre/bronze teria ficado sob
manter a paz entre os dois reinos, abriu as portas do comércio marítimo, do qual
a Fenícia tinha grande experiência, tanto no comércio propriamente dito, como
na construção de navios, dominando assim, a costa litorânea, com seu porto em
Dor (DREHER, 2006, p. 206-207).
Acab assume o trono em Samaria depois da morte de Omri, e prossegue
com a política de expansão e domínio, que seu pai começara. Acab amplia o
palácio e constrói prédios públicos e administrativos sobre as plataformas de
Samaria (ver cap. 4). Ele continua seu domínio sobre Moab e expande para o
sul, dominando Judá, e casando sua filha com o filho de Josafá, rei de Judá. O
domínio sobre Judá foi necessário para o controle do comércio e produção de
cobre/bronze, no sudeste de Judá, território de Edom. Seu domínio segue ainda
mais para o sul, chegando em Ezion-Geber (Khirbet el-Kheleifeh), e edifica
fortalezas de fronteira com o Egito, ao norte da península do Sinai
267
produção agrícola de cereais nos vales férteis vales e de azeite nas regiões
montanhosas. Os omridas também investiram na criação de cavalos em
Megiddo, na indústria manufaturada, fabricação de cerâmica e no controle das
caravanas (pedágio) que passavam pelas duas principais rotas comerciais do
Antigo Oriente Próximo, a Estrada do Rei e o Caminho do Mar.
Israel Norte tinha muitas vantagens econômicas. Quase todo seu território
ao norte era fértil, tanto seus vales quanto suas montanhas. A diversidade da
flora, florestas e vales planos e extensos, favorecia a produção agrícola. A
indústria de vinho no vale de Jezreel era grande, e pode ser comprovada através
da quantidade de registros de vinho (NY, ין, equivalente a )ייןnos óstracos
encontrados em Samaria (REISNER, 1924, p. 17-22, 237-242, Plate 55). Parece
ter havido grande produção de em Israel Norte, inclusive em Samaria, cujo nome
tem origem no nome Semer (rm,v), , mencionado na narrativa de 1Rs 16.24, e o
texto da vinha de Nabot, no vale de Jezreel 1Rs 21. Sobre a produção de vinho,
a arqueologia encontrou, até agora, somente os registros nos óstracos de
Samaria (ROSEN, 1986, p. 39-45; SURIANO, 2007, p. 27-33; SURIANO, 2016,
p. 99-110; LIVERANI, 2014, p. 164-167).
Mais ao sul, no platô de Gibeon, foi encontrada uma vinícola. Ela tinha
lagares para pisar as uvas, bacias para a decantação e tanques para a
fermentação. Tudo escavado na rocha. Setenta e três cisternas no formato de
sino foram desenterradas, as quais possivelmente serviam como uma espécie
de adega, para o armazenamento do vinho. Pritchard calculou a capacidade
dessas adegas, e segundo ele, era de cerca de 125 mil litros (MAZAR, 2003, p.
464-465).
A produção de azeite também pode ser atestada através dos óstracos
encontrados em Samaria. A região montanhosa de Samaria sempre foi grande
produtora de azeite. Havia muitas plantações de oliveiras por todo o território,
inclusive até os dias de hoje (LEV-YADUM, 1997, p. 85-102). Foram
encontradas nas colinas de Samaria cerca de 40 prensas de azeite. A datação
das prensas não é fácil, mas estas, especificamente, foram datadas por Eitam,
que as pesquisou, como sendo do séc. IX e VIII AEC. Poucas prensas de azeite
269
2. Um Estado Independente
O único momento em que Israel Norte esteve independente foi nos 40 anos
do reinado da dinastia omrida, adicionando-se ainda, mais 7 anos do reinado de
Atalia em Jerusalém. Antes disso, o território tinha sido dominado pelo Egito
durante o Bronze Tardio, e posteriormente, no final do período do governo de
Saul, em 926 AEC. O enfraquecimento do domínio egípcio favoreceu a
ascensão do primeiro estado israelita.
Após o fim da dinastia omrida, desde a época de Jeú, Israel Norte passou a
ser dominado por Hazael de Damasco (845-800 AEC). Desde que Jeú começou
a reinar (842-814 AEC), Hazael passou a dominar Israel Norte, e o dominou até
cerca de 800 AEC. Somente na época de Jeroboão II é que Israel Norte derrota
os sírios. Neste mesmo período, a Síria já estava sob o domínio dos assírios, e
pagava tributo a Salmaneser II e, posteriormente, a Adad-Nirari III
(FINKELSTEIN, 2003, tabela 7).
A Assíria dominou Israel Norte a partir da época de Jeú, e dominou Judá
até a ascensão do império babilônico, entre o séc. VII e VI AEC. Israel Norte caiu
sob o domínio assírio em 722 AEC, e Judá sob o domínio babilônico, em 586
AEC. Depois disso, Israel e Judá sempre permaneceram sob o domínio dos
impérios (persa, grego e romano), até a dispersão em 70 EC.
Embora a Síria fosse uma potência no séc. IX AEC, ela nunca conseguiu
subjugar Israel Norte durante o período dos reis omridas. Estes, como já foi
visto, dominaram toda a parte sul da Síria, impondo suas fronteiras a partir da
topografia da região, chegando até as proximidades de Damasco. Esta fronteira
dentro do território sírio contornava o sul de Damasco e descia para o sul,
passando por Edrei (atual, Daraa), seguindo a Estrada do Rei. Israel Norte teve
forte influência sobre o comércio em Damasco, já que dominava toda a rota
comercial da Transjordânia. Isto deve ter impactado a economia e o comércio
sírio, tanto na importação quanto na exportação de mercadorias para o Egito e
Arábia.
Para vigiar suas fronteiras e proteger suas rotas comerciais, Israel Norte
273
dominou Moab, o verbo que aparece escrito é WN{a, אענו, cuja raiz []ענה
Judá surge como um Estado somente entre final do séc. VIII e início do
séc. VII AEC, com a queda do reino de Israel Norte. Antes disso, ele era uma
entidade territorial, governada por “reis” com fortes características tribais.
Segundo Finkelstein (2003, p. 312),
A única região fértil era a Sefelá, uma grande área baixa e verde com
longos vales férteis, bons para a agricultura. Era uma região disputada por
impérios, também pelas pequenas cidades-estado que foram surgindo em torno
do vale e lutando para viver dele. No período da monarquia bíblica, ora a Sefelá
estava nas mãos dos filisteus ora nas mãos dos judaítas. Inclusive a épica
batalha entre Davi e Golias, narrada no livro de Samuel, aconteceu nesta região,
entre Azeca, Socó Lakish e Gat (DIETRICH, 2003). Este vale era o celeiro da
parte sul de Canaan, e Judá queria conquistá-la.
Judá viveu por muito tempo à sombra de Israel Norte. Jerusalém era
pequena com baixo índice habitacional. Não há evidências de edifícios e
construções monumentais em Jerusalém durante o séc. IX AEC. A ideia de
Jerusalém com grandes construções já no séc. X AEC, na época de Davi e
Salomão, é contradizer o que a arqueologia tem dito sobre isso. Mesmo que se
saiba que a arqueologia tem suas limitações, o que foi escavado até agora não
evidencia uma Jerusalém grande e cheia de edifícios e palácios suntuosos
(FINKELSTEIN, 2015, p. 105-106).
Com a queda de Israel Norte, Judá se favorece e surge como um Estado. A
explosão demográfica experimentada por Judá e Jerusalém no final do séc. VIII
AEC, foi espantosa. Jerusalém, que era uma modesta cidade com cerca de 1 mil
habitantes, aumentou drasticamente quase 15 vezes, chegando a cerca de 15
mil habitantes (FINKELSTEIN, 2003, p. 32-331). Somente a partir deste período
é que Judá se desenvolve e se expande.
276
estela ficou mais conhecida por causa da expressão dwdtyB (“ )ביתדודCasa de
Davi”, registrada no fragmento A. Esta expressão ofuscou todo o restante do
conteúdo da estela, que permaneceu abandonado por muito tempo. Depois
deste achado, o meio acadêmico se convenceu – não totalmente – de que Davi
tenha existido, vivido e governado Judá em meados do séc. X AEC.
Davi, portanto, existiu, mas não a forma como o imaginário foi construído
acerca dele. A saga do pastor que se tornou rei e que governou um grande
império, que foi passado para seu filho Salomão, o homem mais sábio e mais
rico de todos os tempos. Sabe-se atualmente que Davi governou em Jerusalém,
mas de forma bastante modesta. Ele não teria governado um império, nem
jamais chegou a dominar a Síria até o rio Eufrates. Seu governo tinha uma
capital modesta e pequena, sem muitos recursos e com pouco comércio. Estava
situada no alto das montanhas, não tinha rotas comerciais importantes nem
grandes produções agrícolas, como houve em Israel Norte, principalmente,
durante o séc. IX AEC.
Desta forma, todas as edificações monumentais anteriormente atribuídas a
Salomão passaram a ser atribuídas aos reis omridas. Até porque ainda existem
muitas dúvidas se Salomão existiu mesmo ou não. Não se sabe exatamente se
Salomão existiu ou não, porque dele não foi encontrado absolutamente nada,
nenhuma evidência de sua existência nas escavações em Jerusalém, e
nenhuma citação extrabíblica, como é o caso dos reis omridas, que foram
citados por povos vizinhos e até pelo grande império assírio. Os reis da dinastia
omrida foram tão influentes e poderosos internacionalmente, que o temido
império assírio se referia ao reino de Israel Norte como “Casa de Omri”, mesmo
depois do fim da dinastia omrida.
Judá se desenvolveu tardiamente. Israel Norte sempre esteve no domínio
de Judá, por ser mais forte, estruturado e com poderoso exército. Judá não
possuía no séc. IX AEC as características de um estado estabelecido, as
mesmas que podem ser encontradas em Israel Norte da dinastia omrida.
277
ligação com Davi (2Sm 4). O fato é que somente após a morte de Isbaal é que
Davi assume o poder sobre Israel Norte. Em seguida Davi invade Jerusalém,
que se torna a nova capital de Judá e Israel (2Sm 6-10). A partir de Jerusalém,
Davi teria reinado 33 anos (2Sm 5.5).
Em 2Sm 8 temos um resumo das conquistas de Davi e da expansão do
seu território. Davi teria dominado os filisteus (v.1) e os moabitas (v.2), de modo
que estes ficaram vassalos de Davi, pagando-lhe tributos. No v.3 Davi teria
derrotado Hadadezer do norte da Síria, nas proximidades do rio Eufrates, e em
seguida, dominaria Damasco estabelecendo guarnições na cidade. A Síria teria
passado a lhe pagar tributos (v.4). Nos v.12-14, diz que Davi dominou os
territórios da Síria, de Moab, de Amon, da Filístia e de Edom.
Salomão teria assumido o trono de Israel após Davi seu pai (1Rs 1.32-
2.12), e reinou durante 40 anos em Jerusalém (1Rs 2.12). Salomão teria reinado
desde o rio Eufrates até a terra dos filisteus e até a fronteira com o Egito, e todos
os povos pagavam tributos a ele, de forma que enriqueceu (1Rs 4.20-21, na
Bíblia Hebraica 1Rs 4.20-5.1). Mas é interessante que redator destes textos
continua a chamar “Israel e Judá” (laer"f.ywI > hd"Why>), mesmo narrando fatos que
seriam do período da Monarquia Unida (1Rs 4,20, 25, na Bíblia Hebraica 1Rs
4.20; 5.5). Isto é bastante suspeito em se tratando de Monarquia Unida, mas
também reflete uma redação ou edição tardia dos fatos. Esta expressão aparece
nos livros tardios das Crônicas, pelo menos quatro vezes (2Cr 25.26; 28.26;
32.32; 35.18).
Rio Eufrates
Síria
Aram-Damasco
Damasco
Amon
Israel
Gileade
Norte
Moab Fronteira
Filístia
Judá
Edom
Thomas Römer, em sua obra As Origens de Javé (2016, p. 106), diz que
ideia de uma Monarquia Unida, com Davi e Salomão é mais obra da imaginação
dos autores bíblicos do que uma representação histórica da realidade. De fato,
isto é o que a arqueologia tem mostrado até agora. Não há nenhuma evidência
de um grande império antes do séc. IX AEC.
As novas datações colocam a redação dos livros dos Reis para depois do
séc. VII AEC, o que mostra uma distância considerável entre os fatos e a escrita.
Levando em consideração também que a escrita em Judá só se desenvolve no
final do séc. VIII AEC, quando Israel Norte é tomada pelos assírios, em 722 AEC
(FINKELSTEIN, 2015, p. 142-143; FINKELSTEIN, 2008, p. 121). Para
282
limites das fronteiras estão bem delimitados tanto nas evidências textuais da BH
como na arqueologia. Nos textos bíblicos dos Reis temos narrativas com
conteúdo histórico bem preservado, os quais podem nos ajudar na reconstrução
das fronteiras de Israel Norte.
Temos por exemplo, as narrativas proféticas do Ciclo de Elias-Eliseu,
mesmo que não possam ser tomadas como relatos puramente históricos, elas
informam com certa segurança as localidades por onde os profetas teriam
passado (FINKELSTEIN, 2015, p. 132). Tanto Elias como Eliseu atravessam
fronteiras sem nenhum tipo de barreiras ou impedimentos, parecendo não haver
fronteiras fechadas entre alguns reinos vizinhos de Israel Norte, como Judá,
Fenícia, Moab, Amon e Damasco. Israel dominou Judá durante o governo da
dinastia omrida, Amon e Moab também eram vassalos de Israel Norte (RÖMER,
2016, p. 106). O caso da Fenícia, para onde os profetas vão até Tiro e Sidon, as
fronteiras são livres, mas Israel Norte não dominou a Fenícia em nenhum
aspecto. Já o caso de Damasco, para onde Eliseu foi ungir o novo rei da Síria,
Hazael, é possível perceber uma submissão ao reino de Israel Norte.
Temos outras evidências textuais nos livros dos Reis, como a submissão
de Josafá, rei de Judá, a Acab, rei de Israel Norte. Josafá sempre estava
disposto a obedecer às palavras de Acab e às suas convocações, mesmo que
sua vida ficasse em perigo, como no conflito em Ramot-Gilead, onde Acab diz
para Josafá se vestir de rei no meio da batalha, para que se os sírios fossem
matar o rei de Israel Norte, matassem Josafá, que é o que quase aconteceu
(1Rs 22.29-30; 2Cr 18.28-34). O comércio de fabricação de navios e do
transporte marítimo em Ezion-Geber, bem como o comércio de ouro com Ofir, o
que é condenado pelo narrador e avaliador dos reinos no texto. Josafá foi
reprovado por ter se aliado com Acab e com seu filho, Jorão (1Rs 22.41-51; 2Cr
20.31-37). Estes são indícios de narrativas nortistas ou de tradições atribuídas a
Josafá. Segundo Rendsburg (2002, p. 75-81), boa parte da narrativa de 1Rs 22
pertence ao dialeto hebraico de Israel Norte, inclusive a conversa entre Acab e
Josafá, em 1Rs 22.29-30.
Provan (2016, p. 407), diz que no tempo dos reis da dinastia omrida houve
uma relativa integração em Israel, e entre Israel Norte e Judá, porque ambos
viveram esse período em paz um com o outro. Este não foi um período de
284
integração, mas de domínio do Norte sobre o Sul, e a relativa paz entre os dois,
se deu porque Israel Norte estava dominando Judá, e também por ter uma
rainha omrida na família real judaíta.
O reinado de Atalia, a princesa omrida, em Jerusalém, aconteceu desde
seu casamento com Jorão, filho de Josafá. Ela reinou como rainha-mãe e depois
da morte de Acazias, seu filho, ela reinou mais sete anos sozinha em Jerusalém
e Judá (2Rs 11.1-3, 13-16; 2Cr 22.10-12; 23.12-15). Atalia teria reinado em
Jerusalém, somando todo o período em que estava casada com Jorão de Judá
(2Rs 3.1-8.24) e o período em que foi rainha-mãe (2Rs 8.25-29), um total de
doze anos em Jerusalém e Judá. Enquanto ela era rainha, esposa de Jorão e
como rainha-mãe de Acazias, rei de Judá, ela reinou simultaneamente com
Jorão de Israel Norte foram pelo menos seis anos de governo omrida simultâneo
em Israel Norte e em Judá (2Rs 3.1-10.36). O reinado de Atalia mostra como os
omridas dominaram Judá por dentro, chegando ao trono em Jerusalém. O
reinado de Atalia foi uma ameaça à continuidade da dinastia davídica.
O período governado por Atalia (842-836) parece ter sido bastante estável.
Apesar do silêncio a respeito de seu reinado em Jerusalém, parece que não
houve maiores conflitos ou guerras. Mas as narrativas dos Reis sugerem que
houve certa tensão política entre a rainha, os sacerdotes e o povo da terra. O
domínio omrida em Jerusalém ainda pesava bastante sobre a elite judaíta. Os
muitos anos de domínio de Israel Norte sobre Judá levaram o povo da terra a
tramar junto com os sacerdotes, a queda da rainha omrida (SIQUEIRA, 1997, p.
106; LÓ, 2006, p. 48-55).
A história de Atalia está fragmentada. Ela aparece na história
deuteronomista somente para evidenciar a entronização de Joás, e a volta da
dinastia davídica ao poder em Jerusalém (LÓ, 2006, p. 48-49). Ela reinou como
esposa do rei e rainha-mãe (hr'ybiG>) por cerca de sete anos. Neste período,
propício para derrubar Atalia. Os omridas tinham sido exterminados por Jeú, que
assumira o poder em Samaria, portanto, ela seria a última omrida no poder.
Mesmo sozinha, ela ainda se manteve por quase sete anos como rainha
soberana em Jerusalém. A narrativa dos Reis diz que os sacerdotes teriam
levado Joás ao templo, com oito anos de idade, e o ungido como rei de Judá em
Jerusalém. Em seguida dão ordens para matar Atalia fora das dependências do
templo.
Sobre o golpe dado pelo sacerdote Jeoiada e o povo da terra, Liverani diz:
As evidências contidas nas estelas de Mesha e de Tel Dan dão uma visão
mais clara sobre o domínio dos omridas na Transjordânia e em Damasco. A
estela de Mesha informa inclusive os nomes das cidades dominadas e
edificadas em Moab e na região de Gilead, enquanto que a Estela de Tel Dan
informa somente que Omri e Acab ocuparam as terras de Damasco no período
de Ben-Hadad. Estas estelas ajudaram a reconstruir as fronteiras norte-israelitas
na Transjordânia.
Também, a identificação de outras fortalezas que foram edificadas ou
ocupadas durante o séc. IX AEC deu nova luz para a compreensão da dimensão
territorial dos reis omridas. A indústria de cobre/bronze de Khirbet en-Nahas, no
sudeste do Mar Morto e noroeste de Petra, coincide com a localização da
narrativa da construção da serpente de bronze por Moisés, e a rota do Êxodo.
Uma fortaleza quadrada com um portão com quatro câmaras, mas somente três
foram escavadas. Também as fortalezas de Khirbet el-Kheleifeh, de Kuntillet
’Ajrud e de Cades-Barnea, indicam a presença omrida no limite sul de Judá.
Isto fez com que Acab controlasse sozinho a Estrada do Rei, dominando-a
desde a saída do Egito. São quase 700 km de estrada, pelo deserto do Negev
(ao norte da Península do Sinai), desde Cades-Barnea e Kuntillet ’Ajrud,
passando pelo porto de Ezion-Geber e subindo a Transjordânia, passando por
Moab, Amon e o planalto de Gilead, chegando em Damasco, no território da
286
Síria.
Este território dominado pelos reis da dinastia omrida é praticamente o
mesmo atribuído a Davi e Salomão (1 e 2 Samuel). Davi e Salomão teriam
dominado todo o território de Judá e Israel Norte, indo desde Eilat e a fronteira
com o Egito em Cades-Barnea, até o extremo norte, na cidade de Dan. Também
teria dominado o rei da Síria, chegando até as proximidades do rio Eufrates, ao
norte de Damasco. Também teriam dominado toda a Transjordânia, desde
Edom, Moab até Amon, e daí até Damasco.
Segundo Longman (2016, p. 353),
O que temos até aqui é um aparente conflito de fontes. Por um lado, temos
a narrativa bíblica que atribui o território a Davi e Salomão, a Monarquia Unida,
por outro lado, temos a arqueologia e o Carbono-14 que mostram que as
fronteiras de tal território refletiam as do séc. IX AEC. Uma fonte não anula a
outra. Aqui vemos as limitações de cada uma das fontes, que precisam ser
vistas em conjunto. A arqueologia pode analisar os vestígios da época em que
foram construídos ou derrubados, já a narrativa bíblica tem um grande período
que a separa do fato até o momento da escrita, e neste momento o escriba
escreve baseado na realidade de sua época.
A narrativa diz que a monarquia começou com Saul e depois com Davi, em
Judá, e que Davi e Salomão reinaram a partir de Jerusalém em um vasto
território. A dinastia omrida é descrita pejorativamente, os redatores, ao que
parece, tiveram a intensão de diminuir a dinastia omrida para exaltar a dinastia
davídica. A arqueologia no séc. XIX e primeira metade do séc. XX, como visto no
cap. 1 desta pesquisa, tenderam a interpretar os vestígios arqueológicos a partir
da interpretação bíblica. Com o avanço da arqueologia, sua desvinculação com
a Bíblia, e a tecnologia do Carbono 14, todos os monumentos e cidades
atribuídas à Monarquia Unida passaram para a época de Omri e Acab, séc. IX
AEC.
287
Rio Eufrates
Filíst
FENÍCIA SÍRIA
ia Possível
domínio
GILEAD
ISRAEL
NORTE
AMOM
FILÍSTIA
JUDÁ MOAB
Fronteira
EDOM
EGITO
ARÁBIA
Território Monarquia Unida, cf. 2 Sm. Território dos omridas. Séc. IX AEC.
(Mapa 1: Google Earth). Anotações minhas. (Mapa 2: Google Earth). Anotações minhas.
119
O mapa da Monarquia Unida foi baseado em SAREL, Baruch. אטלס מבוא להבנת המקר. כרטא.
ירושליﬦ. 1997.
289
e muitos aspectos foram retroprojetados para dar vida, força e poder, aos
primeiros reis da dinastia davídica.
Poder militar
Poder militar
(1Rs 20; 22.29-40;
(1Rs 10.26-29)
Inscrições assírias de Salmaneser III)
Domina um vasto território, Israel, Domina um vasto território, Israel,
Judá e Transjordânia Judá e Transjordânia
(1Rs 20; 2Rs 3.4-6) (1Rs 4.20-25)
o nome Davi (KAEFER, 2016, p. 64-70). Então, não há dúvidas se Davi existiu
mesmo ou não, a dúvida gira em torno da existência de Salomão, se suas
histórias são lendas ou apenas memórias retroprojetadas do período da dinastia
omrida.
Isto deve ter acontecido também com a construção de um templo em
Samaria por Acab e a construção de um templo em Jerusalém por Salomão.
Para Finkelstein, um templo da capital do reino indicaria uma centralização
religiosa e de poder. A religião legitimava o rei e mostrava que a divindade
habitava na capital do reino, e toda a arrecadação de impostos e de ofertas ou
dízimos, era recolhida no templo central (FINKELSTEIN; SILBERMAN, 2006, p.
121-149). Esta narrativa sobre o templo em Jerusalém foi importante
principalmente na época em que os textos foram escritos, no final do séc. VIII
AEC e início do séc. VII AEC, época de Ezequias, rei de Judá, quando se
começou os ideais de centralização do culto em Jerusalém, a “cidade de Deus”
(ex. Salmo 45).
Há uma ênfase na narrativa sobre a ligação de Salomão com a Fenícia, o
nome Hirão ( ~r'yxi), rei de Tiro, por exemplo, ocorre 21 vezes120. Em tais
120 1Rs 15.2(2x),16, 21, 22, 24, 25(2x), 26, 32; 7.13, 40(2x), 45; 9.11(2x), 12, 14, 27; 10.11, 22.
293
Considerações finais
As evidências bíblicas e arqueológicas têm apontado para uma nova
interpretação da história de Israel. O reino de Israel Norte sempre foi visto de
forma negativa e incompleta, em toda a narrativa dos Reis ele é colocado à
margem da história de Judá. O levantamento bibliográfico do primeiro capítulo
desta pesquisa mostrou a maneira como, principalmente, a história dos reis da
dinastia omrida foi lida e interpretada tanto por comunidades de fé como no
mundo acadêmico.
Nesta reconstrução histórica do período da dinastia omrida, vimos como a
história desta dinastia influenciou fortemente a construção das narrativas sobre a
Monarquia Unida. Omri fundou Samaria e, consequentente, a primeira
monarquia israelita. As características da formação de um estado indicadas
compiladas inicialmente por Vere Gordon Childe e depois retrabalhadas e
atualizadas por Mario Liverani, deram base para a análise da formação do
294
CONSIDERAÇÕES FINAIS
omrida foram os reis que fundaram o primeiro Estado israelita e sua primeira
monarquia. Com isso, esta dinastia foi a única na história de Israel a reinar de
forma totalmente independente num vasto território, muito semelhante com o
atribuído à Monarquia Unida.
O primeiro passo para trabalhar as hipóteses propostas foi a análise
exegética da fundação desta dinastia, 1 Reis 16.15-33. Este texto possui três
pequenas perícopes, que contam 1) a ascensão de Omri ao trono, 2) a fundação
de Samaria e 3) a sucessão de Omri por Acab. A partir deste texto foi possível
compreender o modo como a narrativa foi influenciada pela redação
deuteronomista, sendo possível que houvesse pequenos trechos nestas
perícopes que possuíam redação mais antiga, nortista, isto com base nas
pesquisas de Rendsburg (1990; 2002; 2009) e Schniedewind (2013).
Na perícope, portanto, predomina a narrativa deuteronomista, com as
avaliações extremamente negativas e pejorativas de Omri e Acab. A temática
principal são os erros e mazelas dos reis omridas. Não objetivo desta pesquisa
comprovar que foram bons reis para o povo, mas que foram geniais no
estabelecimento do Estado norte-israelita e na ampliação do seu território. A
fundação de Samaria é apresentada em poucas palavras, somente um versículo
(1Rs 16.24). Sobre Omri, foram nove versículos 1Rs 16.16-23, 25) e sobre Acab,
quatro versículos (1Rs 16.29-33), sendo a maior parte, avaliações negativas e
descrição de seus erros/pecados.
Tais textos foram influenciados ou modificados pelos editores
deuteronomistas do final da monarquia judaíta e do período pós-exílio
babilônico. Esta é a hipótese defendida, principalmente, por Israel Finkelstein,
Mario Liverani e Thomas Römer, também por Ademar Kaefer e José Airton da
Silva, embora haja estudiosos que defendam que a história de Israel seja uma
construção do período macabeu e hasmoneu, segundo século AEC (veja
DAVIES, 1991 e 1996).
Ao analisar o conjunto literário sobre os reis omridas, percebe-se que os
livros dos Reis reservaram quase metade da obra para contar a história da
dinastia omrida. Mas essa não era exatamente a intensão do deuteronomista,
pois a narrativa sobre os omridas só perde em tamanho para as narrativas sobre
Davi e Salomão juntos. Embora as avaliações sobre Acab sejam as piores
298
possíveis, nos livros dos Reis, Acab sempre aparece na narrativa como alguém
temente a Javé, e nunca desobedeceu às ordens do profeta Elias. Estas partes
positivas, especialmente do ciclo de Elias-Eliseu, podem ser fragmentos de
textos nortistas sobre os reis de Israel Norte (isto pode ser verificado também em
FINKELSTEIN, 2015). Possivelmente, fato do deuteronomista ter tentado ocultar
a grandeza e o poder de Israel Norte foi porque queriam, claramente, diminuir os
reis omridas e exaltar o reinado de Davi e Salomão, apresentando-os com reis
fundantes do reino de Judá e Israel, a Monarquia Unida.
Quando Omri assumiu o poder, tanto Israel Norte quanto Judá eram
entidades políticas territoriais, não exatamente reinos. Os monarcas anteriores a
Omri, foram reis com fortes características rurais, líderes regionais. Com a
fundação de Samaria por Omri, Israel Norte começa a despontar no cenário
internacional. Acab, sucessor de Omri, conseguiu levar Israel Norte ao patamar
de potência regional, sendo citado em estelas de outros povos, bem como nas
inscrições do poderoso império assírio.
Acab expandiu o território tanto para o oeste (litoral) como para o leste
(Amom e Moab) e para o norte (territórios arameus). Seu casamento com a
princesa Jezabel fortaleceu a aliança com os fenícios, o que favoreceu o
crescimento do comércio marítimo e o comércio com a própria fenícia. Também
conseguiu dominar Judá, o reino do Sul, por alguns anos, inclusive
estabelecendo uma rainha Omrida, Atalia, no poder em Jerusalém, a qual reinou
por sete anos.
A dinastia Omrida foi aniquilada através da revolta de Jeú, o qual segundo
a narrativa bíblica, matou Jorão (Israel) e Acazias (Judá) e assumiu o poder de
Israel Norte. Enquanto isso, em Jerusalém, Atalia assume o poder de Judá,
sendo assassinada a mandado do sacerdote Jeoiada.
A história tradicional de Israel tem sido contada sempre a partir de Judá,
com a centralidade de Jerusalém e do seu templo. Nesta perspectiva, Israel
Norte é sempre rejeitado, e na narrativa bíblica os pecados dos reis nortistas são
sempre evidenciados, nunca suas conquistas.
A arqueologia ajudou na compreensão de quem foram os reis omridas. Dos
mais perversos e pecadores nas narrativas bíblicas, para os mais brilhantes e
estrategistas na arqueologia. Isto não quer dizer que uma fonte nega a outra,
299
nações e tinha grande poderio bélico. Afirmar que a dinastia Omrida fundou a
primeira monarquia de Israel, é dizer que o grande império da Monarquia Unida
não existiu e que Davi não era mais que um líder tribal numa cidade que não tem
como justificar ser uma capital imperial nesta época.
Israel foi dominado por outras nações e impérios durante quase toda a sua
existência, foi dominado pelo Egito no sec. X, dominado pela Síria no final do
séc. IX e começo do séc. VIII, foi dominado pela Assíria no séc. VIII até ser
desfeito pelos assírios. Judá continuou dominado pelos assírios, depois pela
Babilônia, Persa, Grécia e Roma. Somente no séc. IX, quando Israel se tornou
uma monarquia, com verdadeiras características de monarquia (cf. George
Childe e Mario Liverani), é que ele permaneceu independente e dominou um
vasto território, incluindo Judá.
A fundação de Samaria foi essencial para o estabelecimento da monarquia.
Uma cidade fortificada, com plataformas e taludes, muros de casamata, palácio
e edifícios públicos administrativos, sua localização na estrada que liga a via
maris à Estrada dos Reis foi realmente bem estratégica. Também, Samaria está
mais ao centro do território israelita, que facilita o acesso leste – oeste e norte –
sul.
O reino do Norte no período da dinastia Omrida possui as características
que depois foram atribuídas à chamada Monarquia Unida, embora os Omridas
não tenham chegado no extremo sul, na região entre o deserto do Negev e o
deserto do Sinai, somente na época de Jeroboão II (no séc. VIII AEC) é que
Israel Norte domina esse território.
É possível que a memória da grandeza dos Omridas, principalmente de
Acab, tenha sido reelaborada posteriormente por Judá, para dar a Davi e
Salomão essas características de grande rei, do domínio de vastos territórios e
de construções monumentais?
Reunindo todas estas informações, verificou-se que Israel Norte foi de fato
o primeiro Estado israelita, que reinou de forma independente, e que dominou os
povos vizinhos a ele. Também, pode-se verificar que Israel Norte, que já era
próspero naturalmente, enriqueceu às custas do controle das rotas comerciais,
das cobranças de impostos, e do controle de importantes indústrias e produção
agrícola. Tinha um poderoso exército e dominou Judá, desde Ezion-Geber até
301
Foi somente com Acab que Israel Norte alcançou o patamar de potência
regional, dominando povos vizinhos (Moab, Amon, Sul de Damasco) inclusive o
pequeno reino de Judá. Foram apresentadas várias evidências que comprovam
esses domínios de Israel Norte, tanto textuais quanto arqueológicas. A análise
estrutura e arquitetura das fortalezas de fronteira ajudaram a fortalecer a
hipótese relacionada às dimensões do território dominado por Israel Norte, bem
como seu domínio sobre as principais rotas comerciais da época, a Estrada do
302
Rei (Via Régea) e a Estrada do Mar (Via Maris). Também o domínio sobre as
grandes indústrias de cobre e bronze, têxtil, vinícolas e a apicultura.
As Estelas de Tel Dan escrita por Hazael de Damasco e a Estela de
Mesha, escrita por Mesha, rei de Moab, foram importantes para a comprovação
da escrita em Israel Norte na segunda metade do séc. IX AEC e início do séc.
VIII AEC. Os óstracos de Samaria, que são normalmente atribuídos ao séc. VIII
AEC, possuem evidências de que parte deles tenham sido escritos no séc. IX
AEC, durante o período do reinado de Acab, rei de Israel Norte. Outras
inscrições encontradas em sítios norte-israelitas (Tel Rehov e Tel Amal, por
exemplo) possuem escrita e caligrafia idênticas à das Estelas de Tel Dan e
Mesha, bem como dos óstracos de Samaria, indicando escrita desenvolvida em
Israel Norte no séc. IX AEC. Outra evidência foi o fragmento de uma estela em
Samaria. Tal fragmento foi esquecido nas pesquisas acadêmicas, e só existe
uma nota descritiva sobre ele, escrita por Eleazar Sukenik, que trabalhou nas
escavações em Samaria pela Joint Expedition.
Os critérios para a identificação de um estado desenvolvido desenvolvidos
e apresentados por Childe (1951) e por Liverani (2006), podem ser verificados
no Estado norte-israelita: 1. O aumento da densidade populacional; 2. Mão de
obra especializada; 3. Produção de excedente para sustentar o governo,
cobrança de impostos, dízimos e ofertas no âmbito religioso e político; 4. A
construção de edifícios públicos monumentais, palácios e templos suntuosos,
grandes celeiros e prédios militares, etc.; 5. Estabelecimento de uma elite
governante, principalmente reis e sacerdotes; 6. Desenvolvimento da escrita e
notações numéricas, para manter todo o aparato burocrático; 7. Elaboração e
desenvolvimento das ciências, como: aritmética, geometria e astronomia.; 8.
Elaborados projetos arquitetônicos, com estilos conceituados e sofisticados; 9.
Investimento no comércio interno e externo de matérias primas e produtos
manufaturados; e, 10. Estabelecimento de um estado com uma capital fixa,
desenvolvidos por Childe (1951), e os critérios apresentados por Liverani (2006):
1. A transformação social do território, com irrigação e plantio, criação de
tecnologias e ferramentas para o arado e beneficiamento da colheita; 2.
Administração de uma economia complexa, com calendários de plantio,
comércio e mão de obra especializada; 3. Política e Cultura, com o
303
Fig.1 - Metade do portão de seis câmaras de Tel Megiddo, estrato VA-IVB, séc. IX AEC.
(Foto: Acervo do autor)
121FINKELSTEIN, Israel; USSISHKIN, David; CLINE, Eric H. (ed.). Megiddo V: The 2004-2008
Seasons. Vol.3. Monograph Series 31. Institute of Archaeology of Tel Aviv University. Indiana:
Eisenbrauns for the Sonia and Marco Nadler, 2013, p. 743.
305
Fig. 4 - Portão de quatro câmaras da dinastia Omrida de Tel Beerseba, séc. IX AEC.
(Foto: Cortesia de Silas Klein Cardoso)
I. Os Armazéns Omridas
Fig. 12 - Maquete do Palácio sul. Megiddo. Período Israelita, estrato X, séc. IX AEC.
(Foto: Acervo do autor)
Fig. 13 - Palácio israelita de Tel Hazor, séc. IX AEC. (Foto: Acervo do autor)
3. Muros de Casamata
1 2 3
4. Fosso
Fosso
Fig. 28 - Fosso, Khirbet al-Mudayne, Jahaz, séc. IX AEC. Recorte
meu. (Foto: APAAME. APAAME_20151014_REB-0129.jpg)
314
5. Muros de Cantaria
Fosso
Rampa
Externa
Fortaleza
Fig. 9
Planta baixa da fortaleza
de Tell er-Rumeith
(Ramot-Gilead), Jordânia.
Recorte meu.
(Desenho: BARAKO,
2006, p. 8)
319
1. Letra וwaw;
2. Letra תtav;
3. Estrela;
4. Letra הhe;
5. Letra צtsadê;
6. (?);
7. Letra קqof;
8. Letra זzain;
9. Letra ’ אalef.
Fig. 3 – Marcas de pedreiros, Samaria
(REISNER, Vol.1, 1924, p. 119)
ÍNDICE REMISSIVO
Capital.....39, 40, 41, 49, 65, 83, 84, 85, 86, 89, Deuteronômio ........................... 21, 142, 144, 168
90, 97, 98, 107, 109, 110, 111, 115, 146, 151, Deuteronomista.....29, 36, 42, 51, 52, 82, 84, 89,
152, 175, 176, 185, 186, 196, 210, 211, 212, 100, 101, 102, 106, 116, 118, 119, 120, 121,
214, 219, 220, 228, 232, 233, 237, 247 127, 142, 143, 144, 148, 149
Capitéis ............................... 30, 60, 182, 214, 230 Diban................................................................. 17
Características arquitetônicas.....153, 215, 221, Dibon....19, 49, 53, 157, 175, 219, 240, 241, 243,
226, 228, 229 247
Carbono-14 ................... 47, 60, 61, 220, 237, 246 Dinastia omrida.....17, 18, 21, 24, 28, 30, 50, 146,
Carquemis ........................................................ 27 149, 150, 152, 158, 163, 164, 165, 167, 168,
Carros de guerra.....18, 37, 50, 54, 146, 150, 155, 187, 197, 213, 215, 222, 225, 227, 233, 239,
215, 251, 253 249, 250
Casa de Davi ...................................... 18, 53, 276 Divindade .............................. 42, 43, 84, 237, 240
Casa de Omri .................... 18, 207, 220, 222, 256 Donner, Herbert ........................ 21, 24, 35, 36, 37
Casamata.....30, 50, 55, 59, 60, 62, 146, 153, Dreher, Carlos................................................. 215
154, 182, 183, 187, 189, 190, 207, 208, 209,
210, 213, 215, 219, 220, 222, 223, 224, 225, E
226, 230, 231, 234, 235, 236, 239, 243, 244,
245, 248, 249 Edifícios administrativos.....29, 214, 222, 223,
Centrista (escola) ........................................ 25, 63 229, 232
Childe, Vere Gordon ....................... 211, 212, 214 Edom.....33, 126, 128, 155, 158, 161, 164, 168,
Ciclo de Elias/Eliseu ......................................... 28 170, 237, 238, 246
Cidade Velha .................................................... 26 Egípcio ........................ 33, 58, 146, 191, 229, 237
Cidades-estado ........................... 48, 57, 128, 213 Egito.....17, 36, 49, 51, 58, 59, 61, 146, 177, 178,
Coalisão antiassíria............................. 33, 35, 252 179, 180, 181, 185, 186, 211, 228, 237, 244,
Cobre.....21, 33, 34, 36, 156, 161, 163, 164, 215, 246, 247, 253, 254
225, 237, 238, 239, 247 Eilat.....34, 42, 129, 147, 161, 163, 164, 237, 239,
Códice de Alepo (A) ........................................ 357 247
Códice de Leningrado (L, B19a)....16, 69, 78, Ein el-Qudeirat ................................................ 237
102, 121, 148 Elá ........... 79, 92, 95, 97, 106, 109, 146, 150, 161
Colina.....27, 34, 35, 46, 55, 59, 86, 110, 113, Elias.....28, 37, 43, 58, 79, 82, 149, 151, 152,
114, 151, 175, 176, 177, 182, 183, 184, 185, 153, 154, 156, 162, 167
187, 188, 205, 206, 207, 208, 210, 214, 215, En Gev ........ 19, 49, 152, 153, 155, 226, 239, 249
220, 222, 223, 225, 231, 233, 243, 245 Epigrafia .................................................. 196, 255
Comércio.....29, 33, 34, 36, 144, 147, 151, 154, Escavações.....17, 19, 20, 21, 26, 29, 30, 31, 34,
155, 163, 164, 169, 176, 182, 211, 212, 213, 35, 36, 52, 60, 110, 113, 124, 158, 174, 177,
215, 236, 239, 246, 247, 254 178, 179, 180, 181, 205, 206, 207, 211, 220,
Compilação ........................................... 26, 51, 62 223, 224, 225, 226, 231, 235, 237, 243, 244,
Complexo real ................................... 55, 207, 220 248, 249
Crítica das Formas.................... 16, 19, 65, 66, 78 Escribas .......................... 25, 29, 33, 36, 198, 218
Crítica Textual ..................................... 66, 69, 101 Estábulos .............................. 27, 29, 30, 229, 230
Cronista .................................. 165, 166, 167, 168 Estado ......................... 1, 2, 33, 44, 145, 207, 210
Cuneiforme ....................................................... 17 Estela de Kurkh............................................... 252
Estela de Mesha.....17, 28, 30, 53, 56, 156, 168,
D 170, 198, 240, 241, 243, 244, 245, 247, 252
Estela de Tel Dan ............. 17, 169, 198, 240, 250
Damasco.....18, 33, 35, 49, 50, 51, 53, 54, 144, Estela Moabita .................................................. 17
153, 154, 157, 158, 162, 168, 169, 177, 197, Estrada do Rei.....151, 161, 164, 175, 177, 215,
200, 210, 221, 224, 226, 227, 240, 244, 246, 236, 239, 244, 246, 247, 248
247, 248, 250, 252, 254, 256 Estratigrafia ................. 47, 62, 190, 197, 206, 249
Dan (Tel).....39, 47, 49, 50, 53, 57, 58, 101, 144, Estrato.....19, 27, 30, 34, 60, 179, 181, 184, 195,
145, 153, 227, 228, 250, 338, 341, 357 196, 198, 211, 222, 223, 225, 226, 229, 234,
Davi.....27, 29, 32, 33, 34, 36, 39, 41, 42, 44, 45, 236, 239, 245, 248
46, 52, 53, 56, 57, 58, 60, 61, 88, 110, 118, Etiópia ............................................................... 29
122, 127, 128, 129, 148, 149, 156, 157, 167, Exegese .................................. 21, 40, 45, 65, 147
207, 210, 217, 218, 220, 250, 251 Êxodo ................................................................ 45
De Vaux, Roland ............................... 27, 110, 232 Expedições.....19, 26, 28, 29, 31, 32, 113, 177,
Deusa da fertilidade .................................... 43, 93 185, 239
Deusa-mãe ....................................................... 43 Ezion-Geber ................ 28, 33, 147, 163, 237, 247
333
Javé.....28, 37, 38, 39, 43, 45, 50, 84, 86, 87, 96, Khirbet en-Nahas161, 163, 164, 235, 237, 238,
100, 116, 117, 118, 120, 129, 146, 154, 157, 239, 247, 249
159, 160, 164, 167, 217, 237, 240, 241 Khirbet Qeiyafa ....................................... 226, 227
Javista ......................................... 37, 96, 118, 143 Kinneret............................................................. 48
Jebuseus .................................................... 27, 39 Klein, Friederich ................................................ 17
Jeroboão ............... 67, 68, 77, 130, 131, 135, 136 Kuntillet ‘Ajrud ....... 19, 45, 50, 128, 200, 235, 237
Jeroboão I ... 45, 49, 59, 79, 83, 85, 101, 109, 210
Jeroboão II.....28, 47, 50, 51, 59, 124, 128, 182, L
183, 189, 197, 205, 228, 233, 237
Jerusalém.....17, 20, 26, 27, 29, 37, 39, 42, 45, Labayu ................................................ 58, 59, 353
46, 47, 48, 49, 51, 52, 55, 56, 58, 60, 78, 80, Lapp, Paul ....................................................... 248
83, 88, 119, 125, 127, 129, 142, 143, 144, Layard, Austen Henry ....................................... 54
147, 149, 158, 160, 161, 163, 164, 167, 175, Levante ........................... 186, 211, 212, 237, 247
176, 177, 189, 205, 210, 217, 218, 219, 223, Literalista....................................... 27, 45, 63, 218
224, 237 Liverani, Mario.....21, 43, 44, 111, 115, 207, 212,
Jeú.....18, 30, 35, 50, 118, 124, 154, 155, 158, 214, 220
159, 160, 165, 167, 169, 182, 195, 196, 205, Loud, Gordon .................................................... 34
251, 255, 256 LXX (Septuaginta).....16, 69, 70, 71, 72, 73, 74,
Jezabel.....39, 43, 54, 83, 84, 86, 128, 147, 151, 75, 76, 83, 84, 91, 100, 101, 105, 106, 108,
154, 156, 167, 195, 235 119, 120, 121, 123, 124, 125, 127, 128, 132,
Joás .................................. 50, 124, 160, 167, 205 133, 134, 137, 139, 141, 147, 148, 150, 151,
Joint Expedition......29, 177, 187, 203, 205, 206, 152, 153, 154, 337
207 Lyon, David G. ................................... 21, 35, 178
Jorão.....18, 24, 39, 49, 53, 61, 90, 96, 127, 129,
130, 150, 155, 156, 157, 158, 162, 163, 165, M
166, 167, 168, 169, 219, 227, 250, 251, 252
Jordânia.....17, 45, 46, 53, 154, 163, 175, 177, Macabeus ......................................................... 41
198, 215, 237, 239 Macalister, R. A. Stewart........... 27, 179, 218, 234
Jordão.....17, 33, 35, 59, 62, 96, 153, 161, 168, Madaba.....17, 19, 56, 175, 242, 243, 244, 247,
176, 213, 224, 232, 245 249
Josafá.....39, 125, 126, 127, 128, 129, 130, 147, Mahanaim ............................................... 177, 249
153, 155, 156, 162, 163, 165, 166, 167, 168, Mar Vermelho ........................... 33, 129, 164, 239
170, 198, 219 Marcas de pedreiros ....................................... 184
Josué ............................ 21, 31, 87, 142, 194, 241 Marfim.....29, 30, 59, 114, 153, 155, 181, 191,
Judá.....18, 22, 27, 39, 40, 42, 44, 45, 46, 48, 50, 207, 214
51, 52, 54, 56, 57, 58, 61, 62, 70, 71, 73, 76, Marguerat, Daniel ................. 66, 88, 98, 108, 143
83, 84, 88, 89, 90, 91, 96, 99, 107, 108, 109, Maximalista (escola) ................................... 25, 63
120, 122, 123, 125, 126, 127, 128, 129, 130, Mazar, Amihai.....16, 20, 21, 24, 25, 26, 45, 46,
142, 143, 144, 145, 147, 149, 150, 152, 153, 47, 56, 57, 62, 109, 110, 186, 189, 197, 198,
154, 155, 157, 158, 159, 160, 161, 162, 163, 207, 218, 220, 221, 223, 224, 225, 228
164, 165, 166, 167, 168, 170, 198, 199, 200, Mesha.....28, 35, 43, 49, 53, 57, 58, 145, 156,
210, 213, 214, 217, 218, 219, 222, 227, 233, 157, 162, 169, 197, 199, 214, 240, 241, 243,
235, 236, 237, 239, 251 244, 245, 247, 249
Judaíta .............. 41, 143, 149, 165, 217, 234, 238 Mesopotâmia .... 29, 177, 211, 212, 244, 246, 247
Juízes ........................... 21, 31, 87, 125, 142, 170 Método exegético .............................................. 19
Minimalista (escola) .................................... 25, 63
Moab.....17, 33, 42, 43, 53, 54, 56, 57, 144, 156,
K
157, 160, 161, 162, 165, 168, 169, 198, 199,
Kaefer, José Ademar.....21, 24, 40, 45, 46, 145, 200, 219, 221, 240, 241, 242, 243, 244, 245,
234 246, 247, 249
Keller, Werner ....................................... 21, 32, 36 Moisés....................................................... 31, 164
Karnak ...................................................... 58, 229 Monarquia.....21, 22, 25, 27, 29, 31, 36, 38, 40,
Kaufman, Yehezkel ........................................... 31 41, 42, 44, 46, 52, 56, 57, 61, 62, 89, 90, 92,
Khirbet ‘Ataruz .................................... 19, 56, 243 111, 118, 145, 146, 148, 161, 207, 209, 210,
Khirbet al-Mudayne ................................... 19, 245 217, 220
Khirbet Ara’ir ........................................... 239, 243 Monarquia Unida.....27, 29, 32, 45, 60, 61, 62,
Khirbet el-Kheleifeh......................................... 239 110, 122, 128, 141, 149, 210, 218, 239
Monte Nebo ...................................................... 17
335
Siqueira, Tércio Machado.......144, 150, 246, 247, Tetragrama ..................... 28, 70, 84, 96, 100, 240
254, 267, 284, 356 Thompson, Thomas ........................ 19, 21, 24, 37
Siquém.....19, 29, 40, 48, 51, 57, 59, 109, 113, Tibni ............................................................ 67, 81
151, 175, 176, 210, 211, 232, 358 Tiglate-Pileser III ......................... 30, 51, 221, 256
Síria.....22, 27, 33, 36, 42, 57, 71, 78, 126, 128, Tirza.....19, 47, 57, 66, 67, 70, 71, 73, 76, 77, 81,
157, 158, 160, 161, 167, 168, 169, 198, 199, 83, 85, 86, 90, 91, 92, 95, 97, 98, 102, 107,
222, 230, 252 108, 109, 110, 111, 146, 150, 151, 175, 176,
Sugimoto, David.............................................. 226 210, 211, 213, 232, 233
Transjordânia.....17, 22, 36, 49, 58, 60, 62, 109,
T 152, 153, 165, 168, 170, 175, 197, 210, 213,
214, 215, 240, 247
Taanac .............................................................. 27 Tribos ................ 33, 39, 42, 51, 58, 168, 217, 218
Talude.....55, 153, 183, 184, 185, 206, 209, 226, Tributo ....................................... 35, 156, 255, 256
231, 243, 244, 245 Trincheiras .............................. 179, 180, 184, 206
Tel ‘Amal ................................................... 19, 195
Tel Arad .............................. 45, 46, 198, 199, 239 U
Tel Betsaida .................................................... 226
Tel Dan.....17, 19, 158, 162, 197, 198, 199, 226, Uruk ........................................................ 212, 343
227, 228, 236, 239, 240, 247, 249 Ussishkin, David ............................................... 55
Tel Dor .................................... 219, 232, 234, 235
Tel Gezer ............ 19, 46, 179, 222, 232, 233, 234 V
Tel Harashim............. 19, 224, 225, 226, 239, 249
Tel Ḥarashim........................................... 222, 223 Vale do Jaboque ............. 175, 176, 177, 232, 249
Tel Jezreel .................. 19, 55, 174, 209, 229, 230 Vestígios1.....6, 27, 33, 34, 49, 50, 54, 207, 223,
Tel Megiddo.....19, 20, 34, 46, 174, 175, 178, 224, 227, 233, 245, 246
184, 229, 230 Via Maris ................. 113, 151, 176, 215, 246, 247
Tel Rehov.....19, 46, 48, 62, 158, 198, 199, 249,
350, 351, 357 W
Tell Ballata ........................................................ 19
Tell Beit Mirsim ........................................... 26, 31 Wright, George Ernest ...... 21, 28, 29, 30, 31, 218
Tell el-Far‘ah ..................................................... 27
Tell el-Farah ...................................................... 19 Y
Tell el-Hammah................................................. 19
Tell el-Kheleifeh .......................................... 33, 34 Yadin, Yigael ..................................... 62, 218, 224
Tell el-Muteselim ............................................... 34 Yêmen............................................................... 29
Tell er-Rumeith ......................... 49, 247, 248, 358 Yoffee, Norman ....................................... 212, 214
Tell es-Seba‘ ................................................... 235
Templo de Jerusalém ..................... 127, 142, 167 Z
Teorias marxistas............................................ 212
Território.....21, 22, 25, 29, 30, 32, 33, 35, 36, 37, Zimri.....57, 66, 67, 70, 71, 76, 77, 79, 80, 81, 83,
42, 46, 48, 49, 50, 51, 57, 58, 61, 62, 65, 78, 84, 85, 90, 91, 92, 94, 95, 97, 98, 99, 100,
84, 128, 144, 151, 152, 153, 160, 161, 162, 101, 102, 103, 105, 106, 109, 146, 150
164, 168, 175, 178, 197, 210, 212, 213, 217,
218, 219, 232, 237, 240, 241, 247
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