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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO SUDOESTE DA BAHIA- UESB

Departamento de História – DH

Yasmin Silva Paixão

O CARÁTER HISTÓRICO DA FORMAÇÃO MARXISTA


CONTEMPORÂNEA E SEUS PRINCIPAIS PERSONAGENS.

VITÓRIA DA CONQUISTA - BA

OUTUBRO/2015
YASMINSILVA PAIXÃO

O CARÁTER HISTÓRICO DA FORMAÇÃO MARXISTA


CONTEMPORÂNEA E SEUS PRINCIPAIS PERSONAGENS.

Trabalho ensaístico apresentado ao


Curso de Licenciatura Plena em
História da Universidade Estadual do
Sudoeste da Bahia – sob orientação
do professor Newton Camargo.

VITÓRIA DA CONQUISTA-BA

OUTUBRO/2015
O caráter histórico da formação marxista:

Em seu famoso ensaio, “Considerações sobre o marxismo ocidental”, Perry Anderson


faz uma análise sobre uma das mais intrigantes vertentes do marxismo do século XX,
o marxismo ocidental. O termo “ocidental” é utilizado pela primeira vez no livro de
Maurice Merleau-Ponty, “As Aventuras da Dialética”, e de acordo com ele, essa
variante do marxismo tem início com a publicação do livro “História e Consciência de
Classe”, de Georg Lukács, e “Marxismo e Filosofia”, de Karl Korsch. A obra aborda as
várias tendências interligadas ao termo, e pormenoriza a vida e as construções
teóricas dos pensadores deste legado.
Em seu livro, Anderson elabora uma pequena trajetória do marxismo, com foco na
Europa. Inicia seu curso com os dois fundadores do materialismo histórico, Marx e
Engels, que impactados pelos acontecimentos de sua época, juntaram- se em uma
parceria intelectual que resultou na corrente marxista.

É bem conhecido como, sentindo-se atraído pelas primeiras


sublevações proletárias após a revolução industrial, Marx, entre os
vinte e os trinta anos, ajustou contas com o legado filosófico de Hegel
e de Feuerbach e com a teoria política de Proudhon, ao mesmo
tempo em que Engels descobria a realidade da condição da classe
operária em Inglaterra e denunciava as doutrinas econômicas que a
legitimavam [...] (ANDERSON, 1976. p. 10).

Os percursores do marxismo lançaram as obras fundamentais dessa corrente. Marx


traçou um quadro global do modo de produção capitalista no primeiro volume de “O
Capital”, e logo depois participou da fundação da I Internacional, consagrando-se no
movimento socialista organizado. Já Engels, além de auxiliar Marx na construção de
sua obra, elaborou as primeiras exposições sistemáticas do materialismo histórico,
legitimando sua força política na Europa, além de ser peça fundamental para a II
Internacional, “com a qual o materialismo histórico se tornou a doutrina oficial da maior
parte dos partidos operários do Continente. ” (ANDERSON, 1976, p.10)
O autor deixa claro que, apesar das brilhantes contribuições de Marx à sociedade
intelectual, sua influência teórica foi relativamente restrita durante sua vida. Grande
parte de seus escritos só foram publicados em data próxima a sua morte, e o que já
tinham sido publicados estavam espalhados por vários países, em diversas línguas,
dificultando o acesso, principalmente à classe a que se destinava, o proletariado.
A geração posterior a Marx e Engels ainda era muito restrita, eram homens que só
tiveram real contato com o materialismo histórico numa altura tardia da vida, porém
estavam inseridos na vida política e ideológica dos seus partidos, mesmo que não
tendo um papel central.Fazem parte desse grupo: Labriola, Plekanov, Mehring e
Kautsky. Todos eles tiveram contato com Engels, através de correspondências, fato
que causou uma grande influência, a ponto de seus trabalhos serem visto como um
segmento da fase final de Engels. Porém, apesar de suas colaborações, os trabalhos
dessa geração tiveram um intuito maior de complementação dos estudos de Marx, do
que de desenvolvimento.
Após uma modificação na dinâmica internacional do mundo capitalista, com um
arrebatador crescimento econômico nos países mais industrializados

[...] os monopólios fixaram-se nas metrópoles e a expansão


imperialista acelerou-se no estrangeiro, abrindo uma era plena de
tensões e de impetuosas inovações tecnológicas, elevando as taxas
de lucro, aumentando a acumulação do capital e fazendo crescer a
rivalidade entre as grandes potências. (ANDERSON, 1976. p. 16).

Esse cenário era extremamente diferente da fase, relativamente tranquila, que os


herdeiros de Marx e de Engels tinham sido formados, a próxima geração, muito mais
numerosa do que os seus predecessores, irromperia num ambiente muito mais
caótico, justamente quando o capitalismo europeu começava a se encaminhar para a
desordem da I Guerra Mundial.
As personalidades que figuraram esse cenário originaram-se, sem exceção, de
regiões a leste de Berlim. São nomes como: Vladimir Ilitch Lenin, Rosa Luxemburgo,
Trotsky, Hilferding. E, da mesma geração, porém um pouco tardio, Bukharine e
Preobrazhensky. Segundo Anderson (1976, p.17) “Quase toda a nova geração de
teóricos iria desempenhar funções dirigentes na condução dos seus respectivos
partidos nacionais um papel muito mais relevante e ativo do que o dos seus
predecessores. ”
Os trabalhos dessa nova formação de intelectuais tinham um intuito de desenvolver
os escritos de Marx e orientaram-se em duas novas direções. Primeiramente, por
conta das transformações no modo de produção capitalista, com a formação dos
monopólios e o imperialismo, tornou-se necessário uma nova explicação e uma
análise mais bem fundamentada. Ademais, “O Capital”, depois de tantas mudanças,
não podia mais ficar como estava, carecia de desenvolvimento.
Após um grande aperfeiçoamento do pensamento econômico marxista na Alemanha,
na Áustria e na Rússia nos primeiros quinze anos do século XX, os grandes teóricos
tinham como uma de suas prioridades decifrarem as leis fundamentais do capitalismo
em seu novo estágio de desenvolvimento histórico.
O crescimento dos partidos operários na Europa central somado a uma erupção
fervorosa de rebeliões populares contra os antigos regimes na Europa oriental criaram
as bases para um novo tipo de teoria alicerçada nas lutas do proletariado e nas
organizações partidárias. A Revolução Russa de 1905 foi o maior exemplo de
insurreição popular do período, e uma das mais estudadas em toda a Alemanha e
Áustria, dando origem à primeira análise política estratégica de tipo científico na
história do marxismo.
Com a chegada da I Guerra Mundial, o cenário europeu entra em colapso, as alas da
teoria marxista se dividem entre socialistas reformistas e revolucionários, os primeiros
dando apoio total a seus respectivos governos nacionais na declaração de guerra, e
os segundos, tencionavam o derrotismo revolucionário. Os intelectuais Kautsky e
Plekhanov, da geração mais antiga, optaram pelo social-chauvinismo. Já, Lenin,
Trotsky, Rosa Luxemburgo e Bukharine mantiveram-se numa resistência completa à
Guerra, denunciando os traidores das organizações socialdemocratas. Outros como
Hilferding e Bauer se alistaram no exército. E assim, a II internacional, que era tão
preciosa à Engels, entra em falência.
Todos esses fatos tiveram consequências, uma onda revolucionária varria a Europa.
Na Rússia, um levante popular derrubou o czarismo em fevereiro de 1917, e pouco
tempo depois, o Partido Bolchevique, sob o comando de Lenin, estava pronto para
tomar o poder e, ainda em outubro, Trotsky assumia a direção militar da revolução
socialista, e logo depois a Guerra Civil de 1918-21.
Porém, apesar dos resultados históricos obtidos, esse período revolucionário durou
apenas até 1920, quando foi esmagado pela força do capital. O socialismo estava
isolado estava isolado e encaminhava-se para uma situação complicada, um regime
tortuoso, que sob a figura de Stalin se instalava.

Os golpes selvagens infligidos pelo imperialismo sobre a própria


Revolução Russa dizimaram a classe operária russa, apesar das
vitórias militares sobre as forças brancas na Guerra Civil. Depois de
1920, não se poderia esperar um auxílio imediato por parte dos
países mais desenvolvidos da Europa. A URSS estava condenada ao
isolamento, a sua indústria arruinada, o seu proletariado
enfraquecido, a sua agricultura devastada, o seu campesinato
descontente. (ANDERSON, 1976. p. 29).

Assim, quando o stalinismo chegou ao auge, o marxismo e sua unidade revolucionária


teórica foram, praticamente, reduzidos a mera lembrança na Rússia. A situação era
evidente, o berço do socialismo, o país mais avançado do mundo no desenvolvimento
do materialismo histórico, foi reduzido ao analfabetismo, parasitismo e foi sufocado
pela censura e o autoritarismo.
Enquanto a União Soviética era sufocada pelo stalinismo, nos outros países, o
capitalismo reinava de forma violenta e agitada. Ainda assim, movimentos
revolucionários, partidos comunistas brandindo a bandeira do leninismo resistiam, e
mesmo que tenha sofrido muitas derrotas durante a crise revolucionária do pós-guerra,
a classe operária ainda representava uma forte ameaça aos países burgueses e teria
de ser controlada. Para mais, o capitalismo, pela primeira vez, parece entrar em
colapso. A recuperação econômica imperialista e a estabilização política começam a
entrar em declínio, e tem seu apogeu com a crise de 1929, que propagou o
desemprego e intensificou a luta de classes.
Desse modo, o capitalismo tinha de encontrar uma forma de reverter a situação e
suplantar os perigos que o operariado representava, e a resposta, então, veio em
forma de ditaduras teorista.

A Itália foi o primeiro país a experimentar toda a força da repressão


fascista: em 1926, Mussolini tinha acabado com toda a oposição legal
no país. O nazismo tomou o poder na Alemanha em 1933, depois do
Comintern ter imposto uma via suicida ao KPD: o movimento operário
alemão foi reduzido a nada. Um ano mais tarde, na Áustria, o
fascismo clerical [...] Na Hungria, uma ditadura branca [...]
(ANDERSON, 1976. p. 31).

Após todos esses acontecimentos, o destino da teoria marxista na zona centro-


europeia, que um dia desempenhou um papel essencial para a promoção do
materialismo histórico, encontrava-se em decadência.
Como uma forma de reavivar o marxismo na Europa, criou-se o Instituto de
Investigação Social, tendo como primeiro diretor um membro da velha geração
marxista, Carl Grunberg. O Instituto tinha uma ligação direta com o Instituto Marx-
Engels de Moscou, e incluiu nos seus trabalhos tanto comunistas como
socialdemocratas. Além disso, ele custeou a produção da única grande criação teórica
do marxismo no período entre as duas guerras, “A Lei da Acumulação e o Colapso do
Sistema Capitalista”, de Henryk Grossman. Em seu trabalho, Grossman fez um
resumo dos debates clássicos do período anterior à Guerra sobre as leis da evolução
do modo de produção capitalista no século XX, na tentativa de compreender o seu
colapso a partir da lógica dos esquemas de Marx sobre a reprodução.
Logo em seguida, Bauer publica seu último trabalho teórico, “Entre Duas Guerras
Mundiais?”, a obra traz uma reflexão sobre o fascismo, mostrando que apenas uma
reunificação entre o movimento socialdemocrata e o movimento comunista poderia
derrotá-lo, além de construir uma teoria sobre o problema do subconsumo como
origem das crises do capitalismo.
A morte de Bauer em 1938 e a eclosão da II Guerra Mundial com a ascensão do
nazismo marcaram o fim da época do marxismo no continente. Todavia, nos Estados
Unidos, Paul Sweezy,um economista americano, decide retomar os estudos com o
trabalho “A Teoria do Desenvolvimento Capitalista”, que traz uma discussão dos
debates marxistas sobre as leis do desenvolvimento do capitalismo, problematizando
as ideias de Marx, além de examinar o pensamento de outros autores.
Com o livro de Sweezy,

Pela primeira vez se atribuía a desintegração final do capitalismo a


uma determinante puramente exterior: às realizações econômicas
superiores da União Soviética e dos países que se esperava
seguissem o seu caminho no fim da Guerra, cujo «efeito de
persuasão» podia eventualmente tornar possível uma transição
pacífica para o socialismo nos próprios Estados Unidos. Com esta
concepção, A Teoria do Desenvolvimento Capitalista marcou o fim de
uma época intelectual. (ANDERSON, 1976, p. 35)

Anderson, em seu ensaio, ao fazer uma busca dos efeitos e casualidades desse rico
legado de história intelectual e política, apresenta as características marcantes do
Marxismo clássico, o forte engajamento político de seus maiores pensadores e suas
maiores obras. Além de qualificar como uma das características do marxismo a
constante revisão de ideias e a autocrítica, deixando evidente a importância do
marxismo para a história.

E, sem dúvida, assim são as coisas: todos são um pouco marxistas


sem o saber. Marx foi grande e sua ação foi fecunda não porque
tenha inventado a partir do nada, não por haver engendrado com sua
fantasia uma original visão da história, mas porque com ele o
fragmentário, o irrealizado, o imaturo, se fez maturidade, sistema,
consciência. Sua consciência pessoal pode converter-se na de todos,
e já é de muitos; por isso Marx não é apenas um cientista, mas
também um homem de ação; é grande e fecundo na ação da mesma
forma que no pensamento, e seus livros transformaram o mundo,
assim como transformaram o pensamento. Marx significa a entrada
da inteligência na história da humanidade, significa o reino da
consciência. (GRAMSCI, 1918, p. 1)
Referências:

 ANDERSON, Perry. Considerações Sobre o Marxismo Ocidental.


S/L, 1976.
 GRAMSCI, António. Marx e o Reino da Consciência. S/L, 1918.
 Konder, Leandro. Marx e a História. S/R

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