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01/05/2020 Para onde foram as 'teses' no Supremo?

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STF

Para onde foram as ‘teses’ no Supremo?


Agora, consta no site apenas ‘Teses com Repercussão Geral’ e ‘Teses sem Repercussão Geral’

JULIA WAND-DEL-REY CANI

27/06/2018 12:09

Foto: Dorivan Marinho

PARCERIA DE CONTEÚDO
Pesquisadores de variadas expertises se unem para, com independência, conciliar a agenda
acadêmica com a velocidade da imprensa no debate da conjuntura política nacional.

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De 2016 para cá, a seção de “Jurisprudência” do site do Supremo vinha


disponibilizando a base de pesquisa “Teses Jurídicas”. Permitia-se acesso às “teses”
rmadas nos julgamentos, dividindo-as em três grupos: teses de repercussão geral,
teses de controle concentrado e teses em outros processos. Recentemente, essa
base de pesquisa foi suprimida. Agora, consta no site apenas “Teses com
Repercussão Geral” e “Teses sem Repercussão Geral”. Ou seja, estão restritas aos
recursos extraordinários. O que está por trás dessa mudança?

Incluir as “teses” de variados tipos no site não parecia ser uma simples escolha de
organização de informações. Por trás dessa escolha, poderia haver uma tomada de
posição dos ministros sobre questões relativas ao papel e ao funcionamento do
tribunal. O que essas mudanças podem nos dizer sobre as experiências recentes
dos ministros com diferentes mecanismos para controlar o alcance de suas
decisões – entre os quais está a formulação de “teses jurídicas” para todos os tipos
de processos?

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Juridicamente, o que é uma “tese”? Embora o regimento interno do Supremo não


faça menção especí ca a delimitação ou votação de teses, o Código de Processo
Civil usa o termo em diversas passagens. O §2º do art. 979, a rma que: “Para
possibilitar a identi cação dos processos abrangidos pela decisão do incidente, o
registro eletrônico das teses jurídicas constantes do cadastro conterá, no mínimo, os
fundamentos determinantes da decisão e os dispositivos normativos a ela
relacionados”.

No Supremo, vários ministros rapidamente perceberam que a gura da tese, agora


positivada no CPC, poderia ser uma útil ferramenta para a gestão de seus poderes
sobre as instâncias inferiores.

Em 29.06.16, houve um marco importante nesse processo de crescente


apropriação, pelo tribunal, da ideia de que deviam de nir e julgar “teses”. No
julgamento de uma proposta de súmula vinculante (n. 57), o então presidente
Ricardo Lewandowski propôs que se desse continuidade ao trabalho de publicação
das teses de repercussão geral. Segundo o ministro, o setor de informática do
Supremo havia inclusive desenvolvido um sistema para recuperação dessas teses
de modo facilitado.

A formulação de “teses” nunca chegou a ser regra para todos os processos. Mesmo
assim, vários sinais indicavam uma expansão da prática dentro do tribunal. Sessões
inteiras foram dedicadas à delimitação da tese jurídica – como na decisão do dia

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09.12.2015, no RE 837311, que envolveu direito à nomeação de candidatos


aprovados fora do número de vagas previstas no edital de concurso público.
Constava do site, por exemplo, texto em referência a uma sessão administrativa de
9.12.15, com o seguinte conteúdo: “As teses enunciadas pelos Senhores Ministros
nas classes processuais de controle concentrado e demais classes, quando isto
ocorre, estão disponíveis neste sítio para ns de estudo e pesquisa”. Como exemplo
dessa prática, na aba ‘Teses em controle concentrado’, constava, dentre outras, a
tese da ADI 5081: “A perda do mandato em razão da mudança de partido não se
aplica aos candidatos eleitos pelo sistema majoritário, sob pena de violação da
soberania popular e das escolhas feitas pelo eleitor”.

A base, como se vê, ia além dos recursos extraordinários, para os quais a


formulação de “teses” é inevitável devido ao mecanismo da repercussão geral. E a
supressão da base de pesquisa “Teses Jurídicas” foi acompanhada de uma aparente
ênfase em outros mecanismos pelos quais, assim como na aprovação de “teses”, o
tribunal cria orientações para o futuro e para outros juízes. Por exemplo, foram
criadas no site as abas ‘aplicação das súmulas no STF’, demonstração do
‘precedente representativo’ e ‘jurisprudência posterior ao enunciado’ para cada
súmula vinculante editada.

É possível que súmulas vinculantes e “teses” sejam vistas pelos ministros como
ferramentas funcionalmente equivalentes. Considere o grá co a seguir:

As súmulas vinham caindo após 2015 – justamente quando, em 2016, os ministros


começam a manifestar interesse nas “teses”. E agora, após dois anos sem edição
de uma única súmula vinculante, parecem voltar a atrair a atenção do tribunal: está
aberto no site o edital 1/2018 com a proposta de súmula vinculante n.131.

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Talvez não seja coincidência que a primeira PSV de 2018, após dois anos de “jejum”
de súmulas, re ra-se ao foro privilegiado. Seu edital veio após o julgamento da ação
penal 937, em que o Supremo a rmou estarem sob sua competência somente os
deputados federais e senadores nos casos de crimes cometidos no exercício do
cargo e em razão das funções a ele relacionadas. Esse é o tipo de caso que ilustra
bem as diferenças práticas entre Súmulas e Teses como mecanismos para atingir o
mesmo m – o controle das decisões futuras de instâncias inferiores.

As súmulas são um mecanismo custoso – em termos de quórum e requisitos –


para realizar esse controle do futuro. As teses, em contraste, não exigem
observação de nenhum desses requisitos formais, especialmente o quórum
quali cado de oito ministros ou a exigência de reiteradas decisões sobre a matéria
constitucional.

Tome-se como exemplo o HC 126292, em que o Supremo permitiu o cumprimento


da pena após decisão em segunda instância. A decisão ocorreu com placar de sete
a quatro – não teria havido, portanto, quórum para aprovação de uma súmula
vinculante. Além disso, sendo virada na jurisprudência anterior, poderia ser levantado
contra uma eventual proposta de súmula o requisito formal de não haver reiteradas
decisões sobre a matéria.

Essas controversas decisões sobre matéria penal – cujo impacto é potencializado


pela Lava Jato –  podem ajudar a explicar a aparente transformação do interesse
dos ministros em teses ou súmulas?

Podemos imaginar o tipo de cálculo que está em jogo: a súmula é mais difícil de
aprovar, porém mais fácil de fazer valer do que uma “tese”. Os parâmetros do
cálculo, porém, são conjunturais. Não sabemos qual o peso que os ministros
atribuem a cada variável em um dado momento, em uma dada decisão. Mais ainda,
sequer é possível assumir que todos os ministros estão de acordo quanto a esse
cálculo. Dentro do tribunal, os parâmetros e apostas certamente variam.

Se “teses” e súmulas podem ser vistas como propostas para de nir e expandir o
alcance das decisões do Supremo, podemos especular que, nesse processo, os
ministros estejam repensando internamente os riscos de médio prazo de investir em
“teses” para formalizar mudanças jurisprudenciais tão controversas e impactantes
sobre atores políticos e econômicos centrais do país.

JULIA WAND-DEL-REY CANI – Doutoranda em Direito do Estado pela USP

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