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CURSO DE LICENCIATURA EM DIREITO

1º Ano

DISCIPLINA: DIREITO E PENSAMENTO JURÍDICO


Código: ISCED11 – CPOLCFE003

Total Horas/1o Semestre: 125

Créditos (SNATCA): 5

Número de Temas: 17

INSTITUTO SUPERIOR CIÊNCIAS E EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - ISCED


Direitos de autor (copyright)

Este manual é propriedade do Instituto Superior de Ciências e Educação a Distância (ISCED),


e contêm reservados todos os direitos. É proibida a duplicação ou reprodução parcial ou
total deste manual, sob quaisquer formas ou por quaisquer meios (electrónicos, mecânico,
gravação, fotocópia ou outros), sem permissão expressa de entidade editora (Instituto
Superior de Ciências e Educação a Distância (ISCED).

A não observância do acima estipulado o infractor é passível a aplicação de processos


judiciais em vigor no País.

Instituto Superior de Ciências e Educação a Distância (ISCED)


Coordenação do Programa de Licenciaturas
Rua Dr. Lacerda de Almeida. No 211, Ponta - Gea
Beira - Moçambique
Telefone: 23323501
Cel: +258 823055839

Fax: 23323501
E-mail: direcção@isced.ac.mz
Website: www.isced.ac.mz
Agradecimentos

O Instituto Superior de Ciências e Educação a Distância (ISCED) e o autor do presente manual


agradecem a colaboração dos seguintes indivíduos e instituições na elaboração deste
manual:

Pela coordenação Direcção Acadêmica do ISCED

Pelo design Direcção de Qualidade e Avaliação do ISCED


Financiamento e logística Instituto Africano de Promoção da Educação
à Distância (IAPED)

Pela revisão final Dr. Emílio Jovando Zeca

Elaborado por:

Dr. José Bernardo José Rafael – Licenciado em Relações Internacionais e Diplomacia


ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Índice

Instituto Superior de Ciências e Educação a Distância (ISCED) 1

Visão geral 1
Bem vindo ao Módulo de Direito e Pensamento Jurídico ................................................ 1
Objectivos do Módulo....................................................................................................... 1
Quem deveria estudar este módulo ................................................................................. 1
Como está estruturado este módulo ................................................................................ 2
Ícones de actividade ......................................................................................................... 4
Habilidades de estudo ...................................................................................................... 4
Precisa de apoio? .............................................................................................................. 7
Tarefas (avaliação e auto-avaliação) ................................................................................ 8
Avaliação ........................................................................................................................... 9

TEMA-1: INTRODUÇÃO GERAL 11


Unidade Tematica 1.1: (Direito Penal) ou a Lei civil (Direito Civil)………………………….11
Unidade Tematica 1.2: Direito Civil, Direito Comercial)………………………………………… 13
Exercicios…………………………………………………………………………………………………………….. 15
Exercicios…………………………………………………………………………………………………………….. 23
Exercicios…………………………………………………………………………………………………………….. 28
Exercicios……………………………………………………………………………………………………………… 30
Exercicios……………………………………………………………………………………………………………… 34

Tema 2: Noções gerais de Direito e Lei 47


Exercicios……………………………………………………………………………………………………………… 48
Unidade Tematica 2.1: DIVERSOS USOS DA PALAVRA DIREITO………………………………49
Exercicios……………………………………………………………………………………………………………… 50
Unidade Tematica 2.2: Ideologias jurídicas…………………………………………………………… 51
Exercicios……………………………………………………………………………………………………………… 51
Unidade Temática 2.3: Direito como ordem normativa………………………………………. 51
Exercicios……………………………………………………………………………………………………………… 53
Unidade Tematica 2.4: POSITIVISMO COMO IDEOLOGIA……………………………………… 54
Unidade Tematica 2.5: Legislação………………………………………………………………………….55
Unidade Tematica: 2.5.1 Jurisprudência………………………………………………………………. 56
Exercicios…………………………………………………………………………………………………………….. 58
Unidade Tematica 2.5.2: Doutrina………………………………………………………………………… 58
Unidade Tematica 2.5.3: Costume jurídico…………………………………………………………… 59
Exercicios…………………………………………………………………………………………………………….. 60
Unidade Tematica 2.5.4: Negócio Jurídico……………………………………………………………. 60
Unidade Tematica 2.5.5: Poder normativo dos grupos sociais……………………………….61
Exercicios……………………………………………………………………………………………………………… 68
Unidade Tematica 2.6: Teoria da Justiça………………………………………………………………. 71

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Tema 3: Breve evolução histórica do direito Moçambicano 79


Exercicios…………………………………………………………………………………………………………….. 82
Unidade Tematica 3.1: Do pluralismo jurídico à interlegalidade. O palimpsesto
político e jurídico Moçambicano………………………………………………………………………….. 82
Exercicios……………………………………………………………………………………………………………… 84
Unidade Tematica 3.3: A revolução socialista e a construção de uma justiça……… 85
Exercicios……………………………………………………………………………………………………………… 99

Tema 4:Escola histórica do direito 101


Unidade Tematica 4.1: Friedrich karl von savigny e a escola histórica do direito… 101
Exercicios…………………………………………………………………………………………………………….105
Unidade Tematica 4.2: Pensamento jurídico e metodologia jurídica……………………106

Tema 5: Teoria contemporânea da interpretação…………………………………………………………. 108


Exercicios…………………………………………………………………………………………………………….110

Tema 6: Pensamento jurídico e problematização……………………………………………………………111


Exercicios…………………………………………………………………………………………………………….115

Tema 7: O Pensamento Crítico no Direito……………………………………………………………………….116


Exercicios…………………………………………………………………………………………………………… 117

Tema 8 O pluralismo jurídico moçambicano: uma abordagem histórica………………………… 119


Exercicios…………………………………………………………………………………………………………….122

Tema 9: Crítica da razão jurídica………………………………………………………………………………….. 123


Exercicios…………………………………………………………………………………………………………….126

Tema 10: Pensamento jurídico e decidibilidade…………………………………………………………… 127


Execicios…………………………………………………………………………………………………………… 130

Tema 11: A influência do pensamento jurídico……………………………………………………………. 131


Exercicios………………………………………………………………………………………………………….. 132

Tema 12: A INTERPRETAÇÃO DA NORMA JURÍDICA…………………………………………………….. 133


Exercicios…………………………………………………………………………………………………………… 136
Exercicios…………………………………………………………………………………………………………… 137
Exercicios………………………………………………………………………………………………………….. 150
Exercicios…………………………………………………………………………………………………………… 154

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS 161

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Visão geral
Bem vindo ao Módulo de Direito e Pensamento Jurídico

Objectivos do Módulo
Ao terminar o estudo deste módulo de Direito e Pensamento
Jurídico deverás ser capaz de possuir elementos atinentes ao
saber e ao saber-fazer essencial no campo do Direito e à
formação e desenvolvimento da personalidade do aluno como
futuro jurista. Fornecer quadros do pensamento necessários à
compreensão do fenómeno jurídico e à solução dos
respectivos problemas.

Resultados Esperados

Espera-se que o estudante:

 Adquira conhecimento dos princípios gerais do Direito;


Objectivos  Adquira capacidades de investigação e de compreensão
Específicos crítica do Direito;
 Desenvolva capacidades de recolha de informação em
textos jurídicos bem como da respectiva ordenação;
 Adquira capacidades de relacionamento do texto com o
saber abstracto;
 Desenvolva conhecimentos básicos do sistema jurídico
português, europeu e mundial, bem como da sua
evolução.

Quem deveria estudar este módulo


Este Módulo foi concebido para estudantes do 1º ano do curso de
licenciatura em Direito do ISCED e outros como, Gestão de
Recursos Humanos, Administração Pública, Contabilidade e
Auditoria, etc. Poderá ocorrer, contudo, que haja leitores que
queiram se actualizar e consolidar seus conhecimentos nessa
disciplina, esses serão bem-vindos, não sendo necessário para tal
se inscrever. Mas poderá adquirir o manual.

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Como está estruturado este módulo


Este módulo de Direito e Pensamento Jurídico, para estudantes do
1º ano do curso de licenciatura em Direito, à semelhança dos
restantes do ISCED, está estruturado como se segue:

Páginas introdutórias

 Um índice completo.

 Uma visão geral detalhada dos conteúdos do módulo,


resumindo os aspectos-chave que você precisa conhecer para
melhor estudar. Recomendamos vivamente que leia esta
secção com atenção antes de começar o seu estudo, como
componente de habilidades de estudos.

Conteúdo desta Disciplina / módulo

Este módulo está estruturado em Temas. Cada tema, por sua vez
comporta certo número de unidades temáticas visualizadas por
um sumário. Cada unidade temática se caracteriza por conter uma
introdução, objectivos, conteúdos. No final de cada unidade
temática ou do próprio tema, são incorporados antes exercícios de
auto-avaliação, só depois é que aparecem os de avaliação. Os
exercícios de avaliação têm as seguintes características: Puros
exercícios teóricos, Problemas não resolvidos e actividades
práticas algumas incluído estudo de casos.

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Outros recursos

A equipa dos académicos e pedagogos do ISCED pensando em si,


num cantinho, mesmo o recôndito deste nosso vasto Moçambique
e cheio de dúvidas e limitações no seu processo de aprendizagem,
apresenta uma lista de recursos didácticos adicionais ao seu
módulo para você explorar. Para tal o ISCED disponibiliza nas
bibliotecas física e virtual do seu centro de recursos mais material
de estudos relacionado com o seu curso como: Livros e/ou
módulos, CD, CD-ROOM, DVD. Para além deste material físico ou
electrónico disponível nas bibliotecas físicas e virtuais, pode ter
acesso a Plataforma digital moodle para alargar mais ainda as
possibilidades dos seus estudos.

Auto-avaliação e Tarefas de avaliação

Tarefas de auto-avaliação para este módulo encontram-se no final


de cada unidade temática e de cada tema. As tarefas dos
exercícios de auto-avaliação apresentam duas características:
primeiro apresentam exercícios resolvidos com detalhes. Segundo,
exercícios que mostram apenas respostas.

Tarefas de avaliação devem ser semelhantes às de auto-avaliação


mas sem mostrar os passos e devem obedecer o grau crescente de
dificuldades do processo de aprendizagem, umas a seguir a outras.
Parte das tarefas de avaliação será objecto dos trabalhos de
campo a serem entregues aos tutores/docentes para efeitos de
correcção e subsequentemente nota. Também constará do exame
do fim do módulo. Pelo que, caro estudante, fazer todos os
exercícios de avaliação é uma grande vantagem.

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Comentários e sugestões

Use este espaço para dar sugestões valiosas, sobre determinados


aspectos, quer de natureza científica, quer de natureza diadáctico-
pedagógica, etc sobre como deveriam ser ou estar apresentadas.
Pode ser que graças as suas observações, o próximo módulo
venha a ser melhorado.

Ícones de actividade
Ao longo deste manual irá encontrar uma série de ícones nas
margens das folhas. Estes icones servem para identificar
diferentes partes do processo de aprendizagem. Podem indicar
uma parcela específica de texto, uma nova actividade ou tarefa,
uma mudança de actividade, etc.

Habilidades de estudo
O principal objectivo deste capítulo é o de ensinar aprender a
aprender. Aprender aprende-se.

Durante a formação e desenvolvimento de competências, para


facilitar a aprendizagem e alcançar melhores resultados, implicará
empenho, dedicação e disciplina no estudo. Isto é, os bons
resultados apenas se conseguem com estratégias eficientes e
eficazes. Por isso é importante saber como, onde e quando
estudar. Apresentamos algumas sugestões com as quais esperamos
que caro estudante possa rentabilizar o tempo dedicado aos
estudos, procedendo como se segue:

1º Praticar a leitura. Aprender a Distância exige alto domínio de


leitura.

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

2º Fazer leitura diagonal aos conteúdos (leitura corrida).

3º Voltar a fazer leitura, desta vez para a compreensão e


assimilação crítica dos conteúdos (ESTUDAR).

4º Fazer seminário (debate em grupos), para comprovar se a sua


aprendizagem confere ou não com a dos colegas e com o padrão.

5º Fazer TC (Trabalho de Campo), algumas actividades práticas ou


as de estudo de caso se existir.

IMPORTANTE: Em observância ao triângulo modo-espaço-tempo,


respectivamente como, onde e quando, estudar, como foi referido
no início deste item, antes de organizar os seus momentos de
estudo reflicta sobre o ambiente de estudo que seria ideal para si:
Estudo melhor em casa/biblioteca/café/outro lugar? Estudo
melhor à noite/de manhã/de tarde/fins-de-semana/ao longo da
semana? Estudo melhor com música/num sítio sossegado/num
sítio barulhento!? Preciso de intervalo em cada 30 minutos, em
cada hora, etc.

É impossível estudar numa noite tudo o que devia ter sido


estudado durante um determinado período de tempo; Deve
estudar cada ponto da matéria em profundidade e passar só ao
seguinte quando achar que já domina bem o anterior.

Privilegia-se saber bem (com profundidade) o pouco que puder ler


e estudar, que saber tudo superficialmente! Mas a melhor opção é
juntar o útil ao agradável: Saber com profundidade todos
conteúdos de cada tema, no módulo.

Dica importante: não recomendamos estudar seguidamente por


tempo superior a uma hora. Estudar por tempo de uma hora
intercalado por 10 (dez) a 15 (quinze) minutos de descanso

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

(chama-se descanso à mudança de actividades). Ou seja que


durante o intervalo não se continuar a tratar dos mesmos assuntos
das actividades obrigatórias.

Uma longa exposição aos estudos ou ao trabalho intelectual


obrigatório, pode conduzir ao efeito contrário: baixar o rendimento
da aprendizagem. Por que o estudante acumula um elevado
volume de trabalho, em termos de estudos, em pouco tempo,
criando interferência entre os conhecimentos, perde sequência
lógica, por fim ao perceber que estuda tanto mas não aprende, cai
em insegurança, depressão e desespero, por se achar injustamente
incapaz!

Não estude na última da hora; quando se trate de fazer alguma


avaliação. Aprenda a ser estudante de facto (aquele que estuda
sistematicamente), não estudar apenas para responder a questões
de alguma avaliação, mas sim estude para a vida, sobre tudo,
estude pensando na sua utilidade como futuro profissional, na área
em que está a se formar.

Organize na sua agenda um horário onde define a que horas e que


matérias deve estudar durante a semana; Face ao tempo livre que
resta, deve decidir como o utilizar produtivamente, decidindo
quanto tempo será dedicado ao estudo e a outras actividades.

É importante identificar as ideias principais de um texto, pois será


uma necessidade para o estudo das diversas matérias que
compõem o curso: A colocação de notas nas margens pode ajudar
a estruturar a matéria de modo que seja mais fácil identificar as
partes que está a estudar e Pode escrever conclusões, exemplos,
vantagens, definições, datas, nomes, pode também utilizar a
margem para colocar comentários seus relacionados com o que

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

está a ler; a melhor altura para sublinhar é imediatamente a seguir


à compreensão do texto e não depois de uma primeira leitura;
Utilizar o dicionário sempre que surja um conceito cujo significado
não conhece ou não lhe é familiar;

Precisa de apoio?
Caro estudante, temos a certeza que por uma ou por outra razão, o
material de estudos impresso, lhe pode suscitar algumas dúvidas
como falta de clareza, alguns erros de concordância, prováveis
erros ortográficos, falta de clareza, fraca visibilidade, páginas
trocadas ou invertidas, etc). Nestes casos, contacte os serviços de
atendimento e apoio ao estudante do seu Centro de Recursos (CR),
via telefone, sms, e-mail, se tiver tempo, escreva mesmo uma carta
participando a preocupação.

Uma das atribuições dos Gestores dos CR e seus assistentes


(Pedagógico e Administrativo), é a de monitorar e garantir a sua
aprendizagem com qualidade e sucesso. Dai a relevância da
comunicação no Ensino a Distância (EAD), onde o recurso as TIC se
torna incontornável: entre estudantes, estudante – Tutor,
estudante – CR, etc.

As sessões presenciais são um momento em que você caro


estudante, tem a oportunidade de interagir fisicamente com staff
do seu CR, com tutores ou com parte da equipa central do ISCED
indigitada para acompanhar as sua sessões presenciais. Neste
período pode apresentar dúvidas, tratar assuntos de natureza
pedagógica e/ou administrativa.

O estudo em grupo, que está estimado para ocupar cerca de 30%


do tempo de estudos a distância, é muita importância, na medida
em que permite lhe situar, em termos do grau de aprendizagem
com relação aos outros colegas. Desta maneira ficará a saber se

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

precisa de apoio ou precisa de apoiar aos colegas. Desenvolver


hábito de debater assuntos relacionados com os conteúdos
programáticos, constantes nos diferentes temas e unidade
temática, no módulo.

Tarefas (avaliação e auto-avaliação)


O estudante deve realizar todas as tarefas (exercícios, actividades e
autoavaliação), contudo nem todas deverão ser entregues, mas é
importante que sejam realizadas. As tarefas devem ser entregues
duas semanas antes das sessões presenciais seguintes.

Para cada tarefa serão estabelecidos prazos de entrega, e o não


cumprimento dos prazos de entrega, implica a não classificação do
estudante. Tenha sempre presente que a nota dos trabalhos de
campo conta e é decisiva para ser admitido ao exame final da
disciplina/módulo.

Os trabalhos devem ser entregues ao Centro de Recursos (CR) e os


mesmos devem ser dirigidos ao tutor/docente.

Podem ser utilizadas diferentes fontes e materiais de pesquisa,


contudo os mesmos devem ser devidamente referenciados,
respeitando os direitos do autor.

O plágio1 é uma violação do direito intelectual do(s) autor(es). Uma


transcrição à letra de mais de 8 (oito) palavras do texto de um
autor, sem o citar é considerado plágio. A honestidade, humildade
científica e o respeito pelos direitos autorais devem caracterizar a
realização dos trabalhos e seu autor (estudante do ISCED).

1
Plágio - copiar ou assinar parcial ou totalmente uma obra literária,
propriedade intelectual de outras pessoas, sem prévia autorização.

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Avaliação
Muitos perguntam: como é possível avaliar estudantes à distância,
estando eles fisicamente separados e muito distantes do
docente/tutor!? Nós dissemos: Sim é muito possível, talvez seja
uma avaliação mais fiável e consistente.

Você será avaliado durante os estudos à distância que contam com


um mínimo de 90% do total de tempo que precisa de estudar os
conteúdos do seu módulo. Quando o tempo de contacto presencial
conta com um máximo de 10%) do total de tempo do módulo. A
avaliação do estudante consta detalhada do regulamento de
avaliação.

Os trabalhos de campo por si realizados, durante estudos e


aprendizagem no campo, pesam 25% e servem para a nota de
frequência para ir aos exames.

Os exames são realizados no final da cadeira disciplina ou modulo e


decorrem durante as sessões presenciais. Os exames pesam no
mínimo 75%, o que adicionado aos 25% da média de frequência,
determinam a nota final com a qual o estudante conclui a cadeira.

A nota de 10 (dez) valores é a nota mínima de conclusão da


cadeira.

Nesta cadeira o estudante deverá realizar pelo menos 2 (dois)


trabalhos e 1 (um) (exame).

Algumas actividades práticas, relatórios e reflexões serão utilizados


como ferramentas de avaliação formativa.

Durante a realização das avaliações, os estudantes devem ter em


consideração a apresentação, a coerência textual, o grau de
cientificidade, a forma de conclusão dos assuntos, as

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recomendações, a identificação das referências bibliográficas


utilizadas, o respeito pelos direitos do autor, entre outros.

Os objectivos e critérios de avaliação constam do Regulamento de


Avaliação.

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TEMA-1: INTRODUÇÃO GERAL


Pretende-se nesta unidade temática que o estudante, ao completar esta
unidade, esteja capaz de:

 Definir o que é Direito, e os várias normas de Direito.


 Identificar os varios sentidos do Direito

 Conhecer os ramos do direito


Analisar a estrutura hierarquizada das normas juridicas
Diferenciar o direito objectivo e subjectivo.

Unidade Tematica 1.1: (Direito Penal) ou a Lei civil (Direito Civil)


O termo “direito” comporta diversos sentidos: faculdade de realizar ou
não realizar um dado comportamento na zona social do permitido
(direito subjectivo); realização de uma ideia universal e absoluta de
justiça (direito natural); conjunto de normas éticas que organizam as
relações fundamentais do Estado e da sociedade civil (direito positivo).

Assim como não se pode resolver uma equação matemática sem


conhecer previamente as operações básicas (adição, subtracção,
multiplicação e divisão), o conceito de Lei é uma premissa conceitual
indispensável para que o estudante do direito possa entender a Lei
fundamental (Direito Constitucional), a Lei tributária (Direito Tributário),
a Lei penal

Eis a grande tarefa do Direito: oportunizar o conhecimento da linguagem


própria da ciência jurídica, que não corresponde muitas vezes ao sentido
da linguagem comum, podendo, inclusive, sofrer variações no tempo e no
espaço, já que a ciência jurídica é relativa, espelhando as singularidades
de cada cultura humana.

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Para fins didácticos, deve-se, desde já, diferenciar as duas grandes


ramificações da árvore jurídica: o Direito Público e o Direito Privado.

(por exemplo, Direito Constitucional, Direito Administrativo, Direito


Tributário)
De um lado, o Direito Público engloba todos aqueles ramos jurídicos que
normatizam as relações verticais entre o Estado e os particulares ou as
relações entre os órgãos estatais, tendo em vista a realização obrigatória
do princípio da supremacia do interesse colectivo ou publico.

Exercicios

P/Fale dos varios sentidos do termo Direito.

R/ O termo “direito” comporta diversos sentidos: faculdade de realizar ou


não realizar um dado comportamento na zona social do permitido
(direito subjectivo); realização de uma ideia universal e absoluta de
justiça (direito natural); conjunto de normas éticas que organizam as
relações fundamentais do Estado e da sociedade civil (direito positivo).

Exercicios

P/Qual seria no seu entender a grande tarefa do Direito?

R/ A grande tarefa do Direito: oportunizar o conhecimento da linguagem


própria da ciência jurídica, que não corresponde muitas vezes ao sentido
da linguagem comum, podendo, inclusive, sofrer variações no tempo e no
espaço, já que a ciência jurídica é relativa, espelhando as singularidades
de cada cultura humana.

P/Fale de uma maneira resumida do Direito Publico.

R/ o Direito Público engloba todos aqueles ramos jurídicos que


normatizam as relações verticais entre o Estado e os particulares ou as

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

relações entre os órgãos estatais, tendo em vista a realização obrigatória


do princípio da supremacia do interesse colectivo ou publico.

Unidade Tematica 1.2: Direito Civil, Direito Comercial)


Por outro lado, o Direito Privado engloba todos aqueles ramos jurídicos
que normatizam as relações horizontais entre os particulares,
resguardando-se um maior espaço de liberdade individual, tendo em
vista a realização do princípio da autonomia da vontade (por exemplo,

No Direito Público, prevalece o princípio da supremacia do interesse


colectivo, pelo que, nas relações juspublicistas, o Estado figura como um
sujeito de direito em posição de destaque perante os particulares. Já em
relação do Direito Privado, prevalece o princípio da autonomia da
vontade, pelo que a relação no direito privado figura como uma relação
horizontal entre seres que ocupam o mesmo patamar jurídico.

Como as sociedades humanas não são regidas por um rígido


determinismo biológico, tornasse necessário organizar um sistema de
controlo social capaz de harmonizar as diversas esferas de liberdade
individual e equilibrar as interacções da conduta humana.

No âmbito do sistema de controlo social, são previstas normas éticas que


estabelecem qual deve ser o comportamento socialmente aceito e qual
deve ser a punição aplicada na hipótese de descumprimento dos
preceitos normativos.

As normas éticas regulam o comportamento humano priorizando o uso


de meios socialmente legítimos para a realização de determinados fins,
comportando as normas de etiqueta, as normas morais e as normas
jurídicas.

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

As normas de etiqueta são regras que disciplinam certos hábitos de


polidez ou decoro no trato com as pessoas ou coisas, disciplinando
aspectos éticos de menor relevância para a vida social, visto que a
sociedade sobrevive sem elas, como, por exemplo, as normas para uso de
talheres no jantar.

O descumprimento de uma norma de etiqueta configura uma


descortesia, gerando uma sanção social difusa. Esta recebe esse nome
porque todo e qualquer actor social pode aplicá-la através do ostracismo
(sorriso, olhar, silêncio, gesto), não havendo, portanto, monopólio ou
exclusividade na aplicação desta sanção. Outra característica desta
sanção é o facto dela ser espontânea porque brota no seio das relações
concretas sem que seja possível prever o seu conteúdo.

As normas morais são regras que disciplinam aspectos éticos mais


relevantes para o convívio grupal. Os princípios e valores regulados pela
moral já traduzem uma maior importância no sentido de assegurar o
equilíbrio e coesão da sociedade. A falta de cumprimento de uma norma
moral configura uma imoralidade, que oportuniza também a aplicação de
uma sanção difusa. Por exemplo 1:, obedecer a ordem de uma fila é uma
norma moral, porém você obedece se quiser.

Exemplo 2: Deixar passar uma mulher gravida na bicha de ATM

As normas jurídicas são regras sociais que correspondem ao chamado


mínimo ético, visto que, ao disciplinar o comportamento humano,
versam os padrões de conduta e os valores indispensáveis para a
sobrevivência de uma sociedade. Não existe sociedade sem direito (ubi
societas, ib jus), porque o direito está situado na última fronteira do
controle social. Ex: ter carteira de habilitação para dirigir é uma norma
jurídica.

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

O descumprimento de uma norma jurídica gera uma ilicitude. A sanção


oriunda de uma ilicitude é organizada, pois já está previamente
determinada na norma jurídica, ao contrário do que sucede com sanção
difusa. Ademais, o Estado (Poder Judiciário, Administração Pública)
detém o monopólio da aplicação da sanção jurídica (indemnização por
perdas e danos, multas, privação de liberdade), ao contrário da sanção
difusa que pode ser aplicada por qualquer agente social.

A ciência jurídica costuma diferenciar os dois principais tipos de normas


éticas: as normas morais e as normas jurídicas. Para tanto, são utilizados
os seguintes critérios:

Sanção difusa As sanções oriundas do descumprimento das normas


morais são aplicadas por todo e qualquer indivíduo, de forma espontânea
e concreta.

Sanção organizada O Estado detém o monopólio de aplicação da sanção


prevista na norma jurídica, podendo ser conhecida de antemão pela
sociedade.

Exercicios
P/. Nos meandros do jurídico, é frequente afirmar que no Direito Público,
prevalece o princípio da supremacia do interesse colectivo, e no Direito
Privado, prevalece o princípio da autonomia da vontade. Comente.

R/. No Direito Público, prevalece o princípio da supremacia do interesse


colectivo pelo que, nas relações juspublicistas, a Estada figura como um
sujeito de direito em posição de destaque perante os particulares. Já em
relação do Direito Privado, prevalece o princípio da autonomia da
vontade, pelo que a relação no direito privado figura como uma relação
horizontal entre seres que ocupam o mesmo patamar jurídico.

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

P/. Debuce de forma exaustiva sobre o fim último das normas éticas.

R/. No âmbito do sistema de controlo social, são previstas normas éticas


que que tem como fim último, estabelecer qual deve ser o
comportamento socialmente aceite e qual deve ser a punição aplicada na
hipótese de descumprimento dos preceitos normativos.

P/. As normas éticas regulam o comportamento humano priorizando o


uso de meios socialmente legítimos para a realização de determinados
fins, comportando as normas de etiqueta, as normas morais e as normas
jurídicas. Refira-se sobre as normas de etiquetas.

R/. As normas de etiqueta são regras que disciplinam certos hábitos de


polidez ou decoro no trato com as pessoa ou coisas, disciplinando
aspectos éticos de menor relevância para a vida social, visto que a
sociedade sobrevive sem elas, como, por exemplo, as normas para uso de
talheres no jantar.

P/. O descumprimento de uma norma de etiqueta configura uma


descortesia, gerando uma sanção social difusa. Porque e que recebe este
nome?

R/. Esta recebe esse nome porque todo e qualquer actor social pode
aplicá-la através do ostracismo (sorriso, olhar, silêncio, gesto), não
havendo, portanto, monopólio ou exclusividade na aplicação desta
sanção. Outra característica desta sanção é o facto dela ser espontânea
uma vez que brota no seio das relações concretas sem que seja possível
prever o seu conteúdo.

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Caracteristica das normas

a)Autonomia

As normas morais se revelam como instâncias autónomas de


normatização do agir humano, porque o sujeito moral ostenta a
prerrogativa de orientar-se conforme soa vontade. Nesse sentido, o
sujeito moral adere ou não ao preceito da moralidade, não podendo ser
obrigado por outrem para se comportar em conformidade com os
padrões morais.

b)Prévia concordância dos agentes sociais


Heteronomias As normas jurídicas são heterónimas, uma vez que são
impostas por um ente distinto do indivíduo (como no caso de uma Lei
produzida pelo Estado), independentemente da vontade do sujeito de
direito. Logo, a norma jurídica deve ser acatada.

c)Interioridade

As normas morais se dirigem para as dimensões interiores da existência


humana, porque regulam a consciência individual. Daí porque o mau
pensamento pode ser uma imoralidade.

d)Exterioridade

As normas morais necessitam de comportamentos exteriores para serem


aplicadas. Essa é a razão pela qual os crimes para serem punidos exigem
a materialização de certos comportamentos, não se podendo sancionar a
mera cogitação de um delito na mente do criminoso.

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

e)Unilateralidade:

As normas morais estão destinadas à disciplina do comportamento de um


indivíduo isolado. Logo, uma norma moral pode ser descumprida de
forma individual. O dever moral não pode ser exigido compulsoriamente
por outro agente social. Logo, não se pode obrigar alguém a conceder
esmolas, para seguir um preceito de moralidade cristã.

f)Bilateralidade:

As normas jurídicas regulam sempre uma relação intersubjectiva. Em


toda relação jurídica, é possível identificar um sujeito activo, titular da
faculdade de exigir um dever jurídico, e um sujeito passivo, obrigado ao
cumprimento deste mesmo dever jurídico. O dever jurídico pode ser
exigido institucionalmente, através da instauração de um processo
administrativo ou jurisdicional, quando se propõe uma acção, o que
ocorre quando o credor (sujeito activo) promove a execução judicial de
uma dívida assumida pelo devedor (sujeito Menor grau de coercitividade
Menor grau de coercitividade.

As normas morais são, geralmente, menos coercitivas do que as normas


jurídicas, actuando no psiquismo do potencial infractor de modo menos
contundente, já que o temor da aplicação de uma sanção moral é menor
que a aflição gerada pela possibilidade de privação da liberdade.

As normas jurídicas são, geralmente, mais coercitivas do que as normas


morais, actuando no psiquismo do potencial infractor de modo mais
contundente, já que o temor da aplicação de uma sanção jurídica é maior
que a aflição gerada pela possibilidade de materialização de uma sanção
moral. Na maioria das vezes, é preferível praticar um pecado
(imoralidade religiosa) a realizar uma ilicitude, que pode acarretar um
maior constrangimento ao indivíduo, seja de natureza patrimonial
(indemnização por perdas e danos), seja de natureza pessoal

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

• Validade • Vigência

• Vigor

• Eficácia: técnica (aplicabilidade) social (efectividade)

• Legitimidade

f)Validade – A validade normativa é verificada através da


correspondência vertical de uma norma jurídica inferior com uma norma
jurídica superior, seja porque o conteúdo é compatível (validade
material), seja porque foi produzida por um órgão competente, dentro do
procedimento previamente estabelecido pela normatividade jurídica
superior (validade formal).

Nesse sentido, a norma jurídica superior estabelece a matéria da norma


jurídica inferior (o que deve ser prescrito), assim como prevê o órgão
habilitado para produzi-la (quem deve prescrever) e o conjunto de ritos
que devem ser seguido para a criação da normatividade jurídica inferior
(como deve ser prescrito).

O exame da validade requer o estudo da pirâmide normativa proposta


pelo jurista austríaco Hans Kelsen:

h)Vigência – Entende-se por vigência o tempo de validade da norma


jurídica. A vigência pode ser determinada ou indeterminada.

A vigência é determinada quando o término da validade norma jurídica é


conhecido antecipadamente, como na hipótese das leis orçamentárias
anuais ou das medidas provisórias.

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

A vigência é indeterminada quando não se pode precisar o término da


validade normativa. Isso porque as normas jurídicas serão válidas até que
sejam revogadas, total ou parcialmente, de forma tácita ou expressa, por
outras normas jurídicas de igual ou superior hierarquia.

i)Prazo de vacatio legis


Não se pode confundir vigência com incidência, já que esse último termo
designa o nexo entre publicação e início da vigência. Pode-se falar de
normas jurídicas de incidência imediata, cujo início da vigência coincide
com a data de publicação, ou normas jurídicas de incidência mediata,
cujo início da vigência ocorre após a data de publicação, prevendo-se um
lapso temporal de vacância normativa (vacatio legis).

Eficácia – A eficácia normativa consiste na possibilidade concreta de


produção dos efeitos jurídicos. A eficácia pode ser:

• Técnica (aplicabilidade) – uma norma é aplicável toda vez que


estiverem asseguradas as condições jurídicas para a produção dos seus
efeitos, não dependendo da elaboração de uma posterior norma jurídica
para apresentar eficácia.

• Social (efectividade) – atributo normativo que assinala a


correspondência da norma jurídica com a realidade social no sentido de
que os dispositivos normativos são assimilados e cumpridos pelos
cidadãos na realidade concreta. Por exemplo, o jogo

Leis

Actos administrativos

Contratos, Testamentos, Decisões Judiciais

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Constituição

j)Legitimidade – A legitimidade é o atributo normativo que designa a


correlação da norma jurídica com o valor socialmente aceito de justiça. A
norma jurídica é considerada legítima, quando a sociedade a considera
justa, em dadas circunstâncias histórico-culturais.

Entende-se por relação jurídica o vínculo intersubjectivo, surgido com a


exteriorização do facto jurídico, polarizando no campo da licitude, direito
subjectivo e dever jurídico e, no campo da ilicitude, a não-prestação do
dever jurídico e a respectiva sanção.

k)Jurídico, ilícito e sanção


São elementos da relação jurídica: facto jurídico, sujeitos de direito,
direito subjectivo, dever

l)Facto Jurídico

As relações jurídicas decorrem de certos acontecimentos que o Direito


considera importantes e que por isso lhes confere eficácia jurídica. Estes
acontecimentos que repercutem no universo do Direito são chamados
fatos jurídicos. Logo, facto jurídico é todo evento natural ou
acção/omissão humana que cria, modifica ou extingue direitos.

Se a norma constitui uma representação intelectual da conduta, há de


haver um momento no tempo, a partir do qual a conduta de determinada
pessoa estará compreendida por determinada norma, vale dizer, um
facto exterior temporal que sirva de ponto de referência para marcar a
incidência normativa sobre o comportamento de alguém. Pois bem; a
qualquer acontecimento temporal, natural ou humano (voluntário) a que
a norma jurídica enlace consequências de direito, chama-se facto
jurídico.

21
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Somente através da realização do suposto jurídico – hipótese ou


representação lógica e ideal do acontecimento – é que a relação jurídica
se desenvolve, dando como consequência a actualização do dever
jurídico e do direito subjectivo.

São caracteres ou Traços Particulares dos factos jurídicos: a) podem ser


naturais ou humanos; b) devem afectar duas ou mais pessoas
(bilateralidade); c) devem ser exteriores (intersubjectividade).

No tocante à eficácia, os factos jurídicos podem determinar a aquisição


(v.g., compra), a conservação (e.g., legítima defesa), a transferência (v.g.,
herança), a modificação (e.g., transformação da obrigação de fazer em
indemnização) e a extinção de direitos subjectivos (e.g., perecimento da
coisa)

Nem sempre a eficácia é imediata, podendo ser diferida, porque referida


a algum acontecimento posterior – termo, condição ou encargo. O termo
é o acontecimento futuro e certo de que fica a depender a eficácia de um
facto jurídico (v.g., vendas ou empréstimos a prazo). A condição é o
acontecimento futuro e incerto de que fica a depender a eficácia de um
facto jurídico (e.g, venda a contento). O encargo é uma determinação
acessória que

Em sentido amplo, facto jurídico lato sensu abrange tanto os


acontecimentos naturais e, pois, independentes da vontade humana
(factos jurídicos stricto sensu), bem como os acontecimentos decorrentes
da vontade humana (actos jurídicos).

Por sua vez, os fatos jurídicos stricto sensu podem ser ordinários (v.g.,
nascimento, morte, decurso do tempo) como extraordinários (e.g.
enchente - caso fortuito ou força maior).

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Os actos jurídicos podem ser lícitos – actos jurídicos stricto sensu


(manifestações de vontade) ou negócios jurídicos (declarações de
vontade) - ou ilícitos.

Acto Jurídico stricto sensu é o acto praticado pelo homem, cujos efeitos
não são determinados pela vontade do agente, mas decorrem da lei, v.g,
invenção de um tesouro.

Negócio Jurídico é o acto praticado pelo homem com a intenção negocial,


que estabelece normas para auto-regular, nos limites da lei, seus próprios
interesses, v. g. Contrato.

Acto ilícito é o acto humano que ocasiona efeitos contrários à lei,


causando dano a outrem. É um acto antijuridico.

Ex: matar, roubar, agredir outro, violar menor...

Exercicios
P/Negocio juridico e acto ilicito. Quid Juris?

R/ Negócio Jurídico é o acto praticado pelo homem com a intenção


negocial, que estabelece normas para auto-regular, nos limites da lei,
seus próprios interesses, v. g. Contrato.

Acto ilícito é o acto humano que ocasiona efeitos contrários à lei,


causando dano a outrem. É um acto antijuridico.

P/Fale das normas morais, de seu cumprimento, e exemplifique.

R/ As normas morais são regras que disciplinam aspectos éticos mais


relevantes para o convívio grupal. Os princípios e valores regulados pela
moral já traduzem uma maior importância no sentido de assegurar o

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

equilíbrio e coesão da sociedade. A falta de cumprimento de uma norma


moral configura uma imoralidade, que oportuniza também a aplicação de
uma sanção difusa. Por exemplo: obedecer a ordem de uma fila é uma
norma moral, porém você obedece se quiser.

P/ caracteres ou Traços Particulares dos factos jurídicos. Queira


enumerar?

R/ São caracteres ou Traços Particulares dos factos jurídicos: a) podem


ser naturais ou humanos; b) devem afectar duas ou mais pessoas
(bilateralidade); c) devem ser exteriores (intersubjectividade).

P/ Quando é que podemos dizer que a vigência é determinada?

R/ A vigência é determinada quando o término da validade norma


jurídica é conhecido antecipadamente, como na hipótese das leis
orçamentárias anuais ou das medidas provisórias.

P/ O que entende por Entende-se por relação jurídica?

R/ Entende-se por relação jurídica o vinculo intersubjectivo, surgido com


a exteriorização do facto jurídico, polarizando no campo da licitude,
direito subjectivo e dever jurídico e, no campo da ilicitude, a não-
prestação do dever jurídico e a respectiva sanção.

P/. As normas jurídicas são regras sociais que correspondem ao chamado


mínimo éticas. Porquê?

R/. Porque disciplina o comportamento humano, versando sobre os


padrões de conduta e os valores indispensáveis para a sobrevivência de
uma sociedade. Não existe sociedade sem direito (ubi societas, ib jus),
porque o direito está situado na última fronteira do controle social. Ex:
ter carteira de habilitação para dirigir é uma norma jurídica.

24
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

P/. O descumprimento de uma norma jurídica gera uma ilicitude.


Concorda? Comente.

R/. A sanção oriunda de uma ilicitude é organizada, pois já está


previamente determinada na norma jurídica, ao contrário do que sucede
com sanção difusa. Ademais, o Estado (Poder Judiciário, Administração
Pública) detém o monopólio da aplicação da sanção jurídica
(indemnização por perdas e danos, multas, privação de liberdade), ao
contrário da sanção difusa que pode ser aplicada por qualquer agente
social.

P/. A ciência jurídica costuma diferenciar os dois principais tipos de


normas éticas: as normas morais e as normas jurídicas. Para tanto, são
utilizados alguns critérios quais são e explique-se:

R/. Sanção difusa As sanções oriundas do descumprimento das normas


morais são aplicadas por todo e qualquer indivíduo, de forma espontânea
e concreta. Sanção organizada O Estado detém o monopólio de aplicação
da sanção prevista na norma jurídica, podendo ser conhecida de antemão
pela sociedade.

P/. Faca um rasgo exaustivo sobre as caracteristicas das normas morais.

R/. a) Autonomia: As normas morais se revelam como instâncias


autónomas de normatização do agir humano, porque o sujeito moral
ostenta a prerrogativa de orientar-se conforme sua vontade. Nesse
sentido, o sujeito moral adere ou não ao preceito da moralidade, não
podendo ser obrigado por outrem para se comportar em conformidade
com os padrões morais.

b)Prévia concordância dos agentes sociais

Heteronomias As normas jurídicas são heterónimas, uma vez que são


impostas por um ente distinto do indivíduo (como no caso de uma Lei

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

produzida pelo Estado), independentemente da vontade do sujeito de


direito. Logo, a norma jurídica deve ser acatada.

c)Interioridade: As normas morais se dirigem para as dimensões


interiores da existência humana, porque regulam a consciência individual.
Daí porque o mau pensamento pode ser uma imoralidade.

d)Exterioridade: As normas morais necessitam de comportamentos


exteriores para serem aplicadas. Essa é a razão pela qual os crimes para
serem punidos exigem a materialização de certos comportamentos, não
se podendo sancionar a mera cogitação de um delito na mente do
criminoso.

e) Unilateralidade: As normas morais estão destinadas à disciplina do


comportamento de um indivíduo isolado. Logo, uma norma moral pode
ser descumprida de forma individual. O dever moral não pode ser exigido
compulsoriamente por outro agente social. Logo, não se pode obrigar
alguém a conceder esmolas, para seguir um preceito de moralidade
cristã.

f) Bilateralidade: As normas jurídicas regulam sempre uma relação


intersubjectiva. Em toda relação jurídica, é possível identificar um sujeito
activo, titular da faculdade de exigir um dever jurídico, e um sujeito
passivo, obrigado ao cumprimento deste mesmo dever jurídico. O dever
jurídico pode ser exigido institucionalmente, através da instauração de
um processo administrativo ou jurisdicional, quando se propõe uma
acção, o que ocorre quando o credor (sujeito activo) promove a execução
judicial de uma dívida assumida pelo devedor (sujeito Menor grau de
coercitividade Menor grau de coercitividade).

P/. As normas morais sao em parte menos coercitivas do que as normas


juridicas. Justifique-se com precisao e objectividade.

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

R/. As normas morais são, geralmente, menos coercitivas do que as


normas jurídicas, porque actuam no psiquismo do potencial infractor de
modo menos contundente, já que o temor da aplicação de uma sanção
moral é menor que a aflição gerada pela possibilidade de privação da
liberdade. Na maioria das vezes, é preferível praticar um pecado
(imoralidade religiosa) a realizar uma ilicitude, que pode acarretar um
maior constrangimento ao indivíduo, seja de natureza patrimonial
(indemnização por perdas e danos), seja de natureza pessoal.

1.3 Sujeitos de Direito

A bilateralidade essencial do direito (conduta em interferência


intersubjectiva) implica que toda relação se passe entre dois sujeitos, um
dos quais estará obrigado à prestação (sujeito passivo) e outro facultado
a exigir a prestação, porque titular de um direito subjectivo (sujeito
activo).

Embora haja relações jurídicas em que o sujeito passivo seja


indeterminado – porque figura um direito subjectivo absoluto – o certo
em que não se pode conceber, sob pena de comprometer a
bilateralidade e humanidade do fenómeno jurídico – uma relação sujeito-
coisa.

Quem exerça um papel em dada relação jurídica como sujeito activo ou


passivo é, em direito, uma pessoa. Possui, assim, personalidade jurídica.
Do ponto de vista lógico-jurídico, são pessoas todos os entes susceptíveis
de adquirir direitos e contrair obrigações, incluindo seres e associações
humanas. Do ponto de vista ontológico, indaga-se sobre a natureza da
personalidade em direito. Evidentemente que, nesta perspectiva, não se

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

pode conceber animais e coisas como pessoas de direito, cabendo


somente ao homem a condição de sujeito de direitos e deveres.

Distinguem-se, assim, as pessoas naturais ou físicas – indivíduo humano


actuando na esfera jurídica – das pessoas jurídicas – entidades colectivas
que titularizam direitos e deveres.

Do ponto de vista ontológico, não se sustenta a tese normativista do ser


humano não figurar como sujeito de direito (escravo), ante a existência
do direito de inordinação e da licitude da conduta subjectiva, embora a
Moral possa condená-la no plano psicológico, v.g., mau pensamento.

A personalidade natural pode sofrer, ainda, algumas limitações


normativamente estipuladas nos casos de incapacidade, visto que alguns
seres humanos não podem exercer pessoalmente certos actos da vida
jurídica. A capacidade é, pois, a medida da personalidade, apresentando-
se como um dos atributos da personalidade natural como o nome, o
estado e o domicílio.

No tocante à natureza da pessoa jurídica, digladiam-se várias correntes


de pensamento.

As teorias negadoras concluem pela inexistência das pessoas jurídicas,


seja porque quem actua são os indivíduos humanos – teoria da mera
aparência (Jhering), seja porque figura como uma propriedade colectiva
(Planiol) seja porque não existe direito subjectivo e, pois, qualquer
personalidade de direito, mas situações jurídicas subjectivas .

Exercicios
P/Distingue as pessoas naturais ou fisicas das pessoas juridicas.

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

R/ Distinguem-se, assim, as pessoas naturais ou físicas – indivíduo


humano actuando na esfera jurídica – das pessoas jurídicas – entidades
colectivas que titularizam direitos e deveres.

P/Fale da implicacao da bilateralidade do direito.

R/ A bilateralidade essencial do direito (conduta em interferência


intersubjectiva) implica que toda relação se passe entre dois sujeitos, um
dos quais estará obrigado à prestação (sujeito passivo) e outro facultado
a exigir a prestação, porque titular de um direito subjectivo (sujeito
activo).

1.4 Direito Objectivo

As teorias da realidade abarcam fundamentações organicistas – pessoa


jurídica como organismo similar aos seres humanos, volitivas – pessoa
jurídica como expressão de uma vontade colectiva (Zitelman) e
objectivistas – pessoa jurídica como criação do direito

Pela teoria da ficção (Windscheid), os entes colectivos são considerados


pessoas por ficção legal, visto que não possuiriam vontade ao menos no
mesmo sentido dos seres humanos.

Pela teoria lógico-formal de Hans Kelsen, pessoa designaria um feixe de


obrigações, de responsabilidades e de direitos subjectivos, vale dizer, um
conjunto de normas jurídicas. Tanto a pessoa natural quanto a pessoa
jurídica seriam centros de imputação, funcionando como pequenas
ordens jurídicas subordinadas à ordem nacional, assim como esta se liga
ao ordenamento jurídico internacional. Como as normas jurídicas
regulam os comportamentos humanos, a imputação será imediata, em
face dos sujeitos individuais de direito, e , apenas, mediata, no que se
refere às pessoas jurídicas, estas últimas, através de suas normas

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

constitutivas e organizatórias, incumbidas de especificar o ser humano


obrigado a uma prestação

No tocante à classificação, pode-se afirmar a existência de pessoas de


direito público interno (v.g., entes provinciais) e externo (e.g., Estados e
organismos internacionais), bem assim pessoas de direito privado (v.g,
associações civis, fundações particulares e sociedades comerciais).

Exercicios
P/De acordo com a teoria de Windescheid, diga porque os entes
colectivos são considerados pessoas por ficção legal.

R/ Pela teoria da ficção (Windscheid), os entes colectivos são


considerados pessoas por ficção legal, visto que não possuiriam vontade
ao menos no mesmo sentido dos seres humanos.

P/. As teorias da realidade abarcam fundamentações organicista, teoria


da ficção e teoria lógico-formal. Como é definida a pesssoa de acordo
com estas perspectivas?

R/. Na perspectiva organicista, pessoa jurídica é entendida como


organismo similar aos seres humanos, volitivas – pessoa jurídica como
expressão de uma vontade colectiva (Zitelman) e objectivistas – pessoa
jurídica como criação do direito. Pela teoria da ficção (Windscheid), os
entes colectivos são considerados pessoas por ficção legal, visto que não
possuiriam vontade ao menos no mesmo sentido dos seres humanos.
Pela teoria lógico-formal de Hans Kelsen, pessoa designaria um feixe de
obrigações, de responsabilidades e de direitos subjectivos, vale dizer, um
conjunto de normas jurídicas. Tanto a pessoa natural quanto a pessoa
jurídica seriam centros de imputação, funcionando como pequenas
ordens jurídicas subordinadas à ordem nacional, assim como esta se liga

30
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

ao ordenamento jurídico internacional. Como as normas jurídicas


regulam os comportamentos humanos, a imputação será imediata, em
face dos sujeitos individuais de direito, e , apenas, mediata, no que se
refere às pessoas jurídicas, estas últimas, através de suas normas
constitutivas e organizatórias, incumbidas de especificar o ser humano
obrigado a uma prestação

P/. O conceito pessoa é visto em dois grandes âmbitos. Refira-se sobre


eles.

R/. No tocante à classificação, pode-se afirmar a existência de pessoas de


direito público interno (v.g., entes provinciais) e externo (e.g., Estados e
organismos internacionais), bem assim pessoas de direito privado (v.g,
associações civis, fundações particulares e sociedades comerciais).

P/De acordo com a teoria de Windescheid, diga porque os entes


colectivos são considerados pessoas por ficção legal.

R/ Pela teoria da ficção (Windscheid), os entes colectivos são


considerados pessoas por ficção legal, visto que não possuiriam vontade
ao menos no mesmo sentido dos seres humanos.

1.5 Direito Subjectivo

Direito Subjectivo Tradicionalmente a noção de direito subjectivo é


contraposta à noção de direito objectivo.

É na era moderna que esta distinção ganha os contornos actuais. Para


isso contribui uma nova noção de liberdade. Para os antigos, a liberdade
era um status (status libertatis), qualificação pública do agir político, e
não uma qualidade interna da vontade individual. O cristianismo trouxe
uma outra noção: a noção interna de livre arbítrio. Foi o lado público da
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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

livre arbítrio que permitiu, assim, a compreensão da liberdade como não-


impedimento. É o conceito negativo de liberdade – o homem é livre à
medida que pode expandir o que quer. Esta noção se torna crucial para a
liberdade de mercado do capitalismo nascente. Nesta trajectória
histórica, a burguesia cunhará ainda o conceito positivo de liberdade. È a
liberdade como autonomia, a capacidade de dar-se as normas do seu
comportamento, base do contrato social. Assim sendo, a liberdade
moderna é intimista e pública, funcionando como um limite à actividade
legiferante do Estado. Configurou-se, assim, a oposição entre direito
subjectivo e direito objectivo.

Deve-se, no entanto, evitar esta dicotomia visto que se por direito


entendemos a conduta compartida, ela será fatalmente conduta
impedida ou proibida para um sujeito – dever jurídico – e,
correlativamente, conduta permitida ou faculdade de impedir conduta
alheia – direito subjectivo.

O termo direito subjectivo é plurívoco, abarcando diversos significados:


faculdade de exigir uma prestação pelo sujeito obrigado, movimento
espontâneo dentro do não-proibido pelo ordenamento jurídico
(liberdade jurídica), faculdade de criar normas individuais (testamentos
ou contratos) ou o direito de cumprir o próprio dever (direito de
inordinação).

Há uma unidade conceitual: a oponibilidade de um dever jurídico.

No tocante à natureza do direito subjectivo, podem ser observadas as


seguintes correntes de pensamento. De um lado, podem ser arroladas as
teorias substancialistas, heranças do jusnaturalismo e historicismo, as
quais tratam o direito subjectivo como um conceito e uma realidade
substantes e opostos à norma como direito objectivo, que viria ratificar

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

estas faculdades jurídicas anteriores. Neste sentido, torna-se possível


vislumbrar:

Teoria da vontade (B. Windscheid) – o direito subjectivo é um poder ou


senhorio da vontade, reconhecido pela ordem jurídica. Esta concepção de
fundo psicológico não explica satisfatoriamente a incapacidade dos
loucos de todo género, a indisponibilidade de certos direitos, como no
plano laboral, e as formalidades exigidas para que seja válido o conteúdo
da vontade, como na elaboração de um testamento e a alienação de um
imóvel.

Teoria do interesse (R. Jhering) – o direito subjectivo é um interesse


juridicamente protegido. Esta concepção não logra explicar o direito de
inordinação e certas liberalidades, como o empréstimo de uma quantia a
um amigo pobre.

Críticas, visto que pressupõe um direito subjectivo subsistente em si.


Teoria eclética (G. Jellinek) - o direito subjectivo é o interesse tutelado
pela ordem jurídica mediante o reconhecimento da vontade individual.
Esta concepção é passível das mesmas

Teoria da garantia (Thon) – o direito subjectivo seria a possibilidade de


fazer a garantia da ordem jurídica tornar efectiva a protecção do direito
(o que implica em certa dessubstancialização).

No segundo grupo, encontramos as teorias de progênie normativista, que


fazem derivar da norma ou da incidência da norma sobre a conduta
compartida as noções correlatas de direito subjectivo e dever jurídico.

Teoria Pura do Direito (Hans Kelsen) – Em coerência com o normativismo


puro, ocorre a redução do dever jurídico e, correlativamente, do direito
subjectivo à norma jurídica. Se o dever jurídico é a conduta que evita a

33
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

imputação do ato coactivo da sanção, o direito subjectivo se manifesta


toda vez que a aplicação da sanção pelo Estado depende da iniciativa do
particular.

Teoria Egológica do Direito (Carlos Cossio) – A noção de direito subjectivo


recebe um duplo tratamento. No plano lógico, o direito subjectivo é a
determinação do dever jurídico pelo sujeito pretensor. No plano
ontológico, o direito subjectivo se identifica com a liberdade, porquanto,
originariamente, toda conduta é liberdade metafísica fenomenizada.
Depois da menção normativa, se o comportamento recai sobre no
contínuo de licitudes será faculdade (tudo que não está juridicamente
proibido, está facultado), se recai sobre o descontínuo de ilicitudes, será
ilícito. Esta restauração lógico-ontológica do conceito traz uma
repercussão humanística notável, qual seja, a impossibilidade de uma
escravidão absoluta, em face do direito de inordinação e a zona não
especificada da liberdade ontológica.

Frise, por oportuno, a existência de teorias que negam a existência de


direitos subjectivos como a teoria realista de L. Duguit, que o reconhece
vinculado ao ideário jusnaturalista, e a teoria transpersonalista de K.
Larenz, que substitui a noção de direito subjectivo pela de deveres ou
funções comunitários, em oposição ao individualismo liberal.

Classificação egológica dos direitos subjectivos:

Conforme a determinação heterónima ou autónoma do conteúdo da


conduta, teremos as faculdades de inordinação e senhorio.

Exercicios
P/O termo direito subjectivo abarca diversos significados. Queira definir
pelo menos 2 deles?

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

R/O termo direito subjectivo é plurívoco, abarcando diversos significados:


faculdade de exigir uma prestação pelo sujeito obrigado, movimento
espontâneo dentro do não-proibido pelo ordenamento jurídico
(liberdade jurídica), faculdade de criar normas individuais (testamentos
ou contratos) ou o direito de cumprir o próprio dever (direito de
inordinação).

P/. No campo do direito é pertinente tomar em consideração a existencia


da bilateralidade nas relações jurídicas. Concorda? Comente.

R/. A bilateralidade essencial do direito (conduta em interferência


intersubjectiva) implica antes de mais, toda relação que se passa entre
dois sujeitos, um dos quais estará obrigado à prestação (sujeito passivo) e
outro facultado a exigir a prestação, porque titular de um direito
subjectivo (sujeito activo).

P/. Vezes há relações jurídicas em que o sujeito passivo é indeterminado


porque?

R/. Porque figura um direito subjectivo absoluto – o certo em que não se


pode conceber, sob pena de comprometer a bilateralidade e humanidade
do fenómeno jurídico – uma relação sujeito-coisa.

P/. Diga como se chama a pessoa que exerce um papel numa relação
jurídica como sujeito activo ou passivo?

R/. A pessoa que exerce um dado papel numa relacao jurídica chama-se
pessoa com personalidade jurídica.

P/. O que são pessoas dp ponto de vista lógico-jurídico?

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

R/. Do ponto de vista lógico-jurídico, são pessoas todos os entes


susceptíveis de adquirir direitos e contrair obrigações, incluindo seres e
associações humanas.

R/. A personalidade natural pode sofrer limitações normativas


estipuladas nos casos de incapacidade visto que alguns seres humanos
não podem exercer pessoalmente certos actos da vida jurídica. A
capacidade é, pois, a medida da personalidade, apresentando-se como
um dos atributos da personalidade natural como o nome, o estado e o
domicílio.

P/. No tocante à natureza da pessoa jurídica, digladiam-se várias


correntes de pensamento. Debate a tese.

R/. As teorias negadoras concluem pela inexistência das pessoas jurídicas,


seja porque quem actua são os indivíduos humanos – teoria da mera
aparência (Jhering), seja porque figura como uma propriedade colectiva
(Planiol) seja porque não existe direito subjectivo e, pois, qualquer
personalidade de direito, mas situações jurídicas subjectivas .

P/ Distingue as pessoas naturais ou fisicas das pessoas juridicas.

R/ Distinguem-se, assim, as pessoas naturais ou físicas – indivíduo


humano actuando na esfera jurídica – das pessoas jurídicas – entidades
colectivas que titularizam direitos e deveres.

P/. Fale da implicacao da bilateralidade do direito.

R/ A bilateralidade essencial do direito (conduta em interferência


intersubjectiva) implica que toda relação se passe entre dois sujeitos, um
dos quais estará obrigado à prestação (sujeito passivo) e outro facultado

36
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

a exigir a prestação, porque titular de um direito subjectivo (sujeito


activo).

1.5.1 Faculdade de inordinação jurídica.

Faculdade de senhorio – Direitos absolutos (o sujeito obrigado são todos


os membros da comunidade

Privados (direitos pessoais – nome e honra; direitos reais (propriedade e


servidão); direitos intelectuais (direitos autorais, marcas e patentes)

Públicos (Estado como sujeito obrigado ou titular destes direitos)

Faculdade de senhorio – Direitos Relativos (o sujeito obrigado é um


sujeito

Privados (direitos potestativos – pátrio poder; creditórios ou


obrigacionais – resultantes de contratos)

Públicos (Estado como sujeito obrigado – direito de acção – ou como


sujeito activo – direito de instituir e cobrar tributos perante o
contribuinte)

Exercicios

P/. Distinga claramente direitos públicos dos privados.

R/. Direitos publicos se circunscrevem no própio Estado como pessoa


colectiva pública, enquanto que direitos privados são direitos
potestativos – pátrio poder; creditórios ou obrigacionais resultantes de
contratos.

1.5.2 Dever Jurídico

37
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Se admitirmos a essência intersubjectiva do fenómeno jurídico e, pois, a


impossibilidade da relação entre seres humanos e coisas, o objecto do
direito não poderá ser uma fracção da realidade natural, mas uma
especial conduta do sujeito obrigado – prestação ou dever jurídico.

Não se pode confundir objecto de direito – prestação – com a noção de


bem – a matéria mesma que serve para o cumprimento do dever jurídico.
Pode-se, no entanto, atendendo a fins didácticos, conceber tanto um
objecto imediato – a prestação, quanto um objecto mediato do direito –
o bem.

O objecto imediato pode consistir numa prestação dar (v.g., a entrega ou


restituição de coisa), fazer (e.g., realização de um serviço) ou de não fazer
(v.g., abstenção de uma conduta).

Sendo bilateral o fenómeno jurídico, a conduta do sujeito obrigado -


prestação – figura como o conteúdo mesmo do direito subjectivo,
titularizado pelo sujeito pretensor. O sujeito passivo está, assim, obrigado
a não impedir o exercício da faculdade jurídica.

Permanente (v.g., respeitar a vida) de dever temporário (v.g, pagamento


de uma dívida)
No tocante à classificação dos deveres jurídicos, é possível diferenciar
dever positivo (comissão – v.g., débito) de dever negativo (omissão – v.g.,
não matar ou furtar); dever público (e.g, recolhimento de tributo) de
dever privado (e.g, pagamento de aluguer); dever

Exercicios

P/. Se admitirmos a essência intersubjectiva do fenómeno jurídico e, pois,


a impossibilidade da relação entre seres humanos e coisas, o objecto do

38
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

direito não poderá ser uma fracção da realidade natural. Justifique a


afirmação.

R/. Porque não se pode confundir objecto de direito – prestação – com a


noção de bem – a matéria mesma que serve para o cumprimento do
dever jurídico. Pode-se, no entanto, atendendo a fins didácticos,
conceber tanto um objecto imediato – a prestação, quanto um objecto
mediato do direito – o bem. O objecto imediato pode consistir numa
prestação dar (v.g., a entrega ou restituição de coisa), fazer (e.g.,
realização de um serviço) ou de não fazer (v.g., abstenção de uma
conduta).

1.5.3 Ilícito

Tradicionalmente, a visão imperativista da norma jurídica implicava em


conceber a não prestação como o antijurídico ou o antidireito por
excelência. Tanto jusnaturalistas quanto sociologistas vislumbravam a
norma como um comando, expurgando a ilicitude do campo da
juridicidade.

Somente a partir a negação kelseniana ao imperativismo, foi possível a


colocação intrasistemática do ilícito como elemento da relação jurídica,
como condição imputativamente enlaçada à sanção, ressalvado o
exagero da teoria pura de considerar a ilicitude como a pedra de toque
do direito.

Avançando neste entendimento, coube a Carlos Cossio (Teoria Egológica


do Direito) banir a concepção tradicional do ilícito como violação da
norma jurídica, sem recorrer ao expediente de afastar a faculdade e a
prestação, dentro da fórmula disjuntiva do pensamento normativo.
Sendo assim, dentro da perspectiva lógico-jurídica, ato ilícito designa a
conduta humana contrária ao dever jurídico ou prestação.

39
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Do ponto de vista empírico, a Dogmática Jurídica costuma contrapor a


ilicitude civil e a ilicitude penal, os quais assumem conteúdos ao sabor
das circunstâncias histórico-culturais, tal como assevera E. Durkheim, ao
estudar o fenômeno da solidariedade e a lei sociológica da evolução
jurídica dos povos.

O abuso do direito pode ser enquadrado, para alguns doutrinadores,


dentro da categoria da ilicitude.

Sanção Trata-se de elemento da relação jurídica que comporta diversas


perspectivas de abordagem.

Dentro de uma visão sociológica, as sanções jurídicas emergem como um


dos mecanismos do sistema de controlo social, caracterizando-se pelo
carácter organizado e incondicionado (imposição inexorável – Recaséns
Siches).

Na perspectiva filosófico-ética, o problema da sanção jurídica irá confluir


para a questão mais substancial da liberdade e para o exame da
proporcionalidade com o mal cometido pelo sujeito.

Exercicios

P/. Tradicionalmente, a visão imperativista da norma jurídica implicava


em conceber a não prestação como o antijurídico ou o antidireito por
excelência. Justifique de forma resumida o exposto acima sem exder duas
linhas.

R/. Porque tanto jusnaturalistas quanto sociologistas vislumbravam a


norma como um comando, expurga a ilicitude do campo da juridicidade.

40
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

P/. Quais são as perspectivas de abordagem que o conceito sansão


abarca?

R/. A sanção, tratando-se de elemento da relação jurídica, a sau


abordagem abarca as seguintes perspectivas: Na visão sociológica, as
sanções jurídicas emergem como um dos mecanismos do sistema de
controlo social, caracterizando-se pelo carácter organizado e
incondicionado (imposição inexorável – Recaséns Siches). Na perspectiva
filosófico-ética, o problema da sanção jurídica irá confluir para a questão
mais substancial da liberdade e para o exame da proporcionalidade com
o mal cometido pelo sujeito.

1.5.4 Acção judicial – demande a iniciativa do particular ofendido


Do ponto de vista lógico-jurídico, a sanção aparecerá como a
consequência jurídica imputativamente enlaçada à não-prestação. Para
Hans Kelsen, a sanção figura, na norma primária, como a conduta do
funcionário que a impõe. Para Carlos Cossio, representa a própria vida do
obrigado (consequência jurídica perinormativa), algo que lhe deve
ocorrer pela sua liberdade ter encaminhando-se para a não prestação,
sendo a conduta do funcionário um dever jurídico endonormativo. A
comunidade jurídica aparece assim como o sujeito pretensor ao direito
de sancionar, ainda que a provocação da ordem jurídica – através da

Não se deve confundi-la com os conceitos de coerção (fenômeno psico-


social decorrente da antecipação dos efeitos aflitivos da sanção) e de
coação (imposição inexorável /execução da sanção, mediante o emprego
da força).

Exercicios

P/. Juridicamente falando, quando é que aparece a sanção?

41
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

R/. Juridicamente falando, a sanção aparece como consequência jurídica


imputativamente enlaçada à não-prestação. Como defende Hans Kelsen,
a sanção figura, na norma primária, como a conduta do funcionário que a
impõe. Por sua vez, Carlos Cossio, sanção representa a própria vida do
obrigado (consequência jurídica perinormativa), algo que lhe deve
ocorrer pela sua liberdade ter encaminhando-se para a não prestação,
sendo a conduta do funcionário um dever jurídico normativo.

P/. Qual é a difereça entre a sanção e a coerção?

R/. Não se deve confundir sanção com os conceitos de coerção. O


primeiro corresponde a consequência jurídica imputativamente enlaçada
à não-prestação. O segundo, é um fenómeno psico-social decorrente da
antecipação dos efeitos aflitivos da sanção e de coação (imposição
inexorável ou mesmo execução da sanção, mediante o emprego da
força).

1.5.6 Vingança privada


No tocante à classificação das sanções, Jimenez de Arechaga faz a
diferenciação entre sanções não coactivas, que dispensam o uso da força
(v.g., direito de retenção e excepção de contrato não cumprido) e
coactivas, que reclamam a força, podendo ser não organizadas (força
aplicada pelo particular) ou organizada (força aplicada pelo Estado), esta
última mais comum, desde que civilização superou a fase primitiva da
autodefesa e da

Descrevendo esta derradeira modalidade de sanção, destaca-se a


contribuição de Eduardo Garcia Maynez.

Se há coincidência entre o dever da sanção e o dever primário de cuja


não-prestação. Se não há coincidência entre o dever da sanção e o dever
primário de cuja não-prestação resultou a sanção, teremos a
indemnização (e.g., inadimplemento de uma obrigação de fazer) e o

42
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

castigo (v.g, aplicação de uma pena diante do delito de homicídio),


sempre que houver a impossibilidade objectiva de restaurar a situação
jurídica anterior à não-prestação

A teoria do ordenamento jurídico é uma proposta de compreensão do


Direito como um sistema.

Entende-se por sistema toda ordenação racional de elementos naturais


ou sociais, que comporta duas dimensões: o repertório (conjunto dos
elementos sistémicos) e a estrutura (padrão de organização dos
elementos sistémicos).

Em se tratando da concepção do sistema jurídico, permanece ainda


hegemónica a contribuição do jurista austríaco Hans Kelsen, autor da
chamada Teoria Pura do Direito.

Exercicios

P/. Diga como é que Jimenez de Arechaga classifica as sanções?

R/. No tocante à classificação das sanções, Jimenez de Arechaga faz a


diferenciação entre sanções não coactivas, que dispensam o uso da força (v.g.,
direito de retenção e excepção de contrato não cumprido) e coactivas, que
reclamam a força, podendo ser não organizadas (força aplicada pelo particular)
ou organizada (força aplicada pelo Estado), esta última mais comum, desde que
civilização superou a fase primitiva da autodefesa.

P/. Diga jusridicamente quando é que se chega a indemnizacao?

R/. Se há coincidência entre o dever da sanção e o dever primário de cuja não-


prestação. Se não há coincidência entre o dever da sanção e o dever primário de
cuja não-prestação resultou a sanção, teremos a indemnização (e.g.,
inadimplemento de uma obrigação de fazer) e o castigo (v.g, aplicação de uma

43
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

pena diante do delito de homicídio), sempre que houver a impossibilidade


objectiva de restaurar a situação jurídica anterior à não-prestação.

1.6 Estrutura hierarquizada e piramidal:


Quanto maior for a generalidade da norma jurídica, por sua abstracção e
por sua larga abrangência, maior será o escalão hierárquico, pelo que as
normas jurídicas mais individualizadas, por regularem uma situação
concreta e alcançar destinatários específicos, estão situadas na base da
pirâmide normativa.

O ordenamento jurídico se dinamiza por laços de fundamentação e


derivação entre as normas de direito: a norma jurídica inferior se
fundamenta na norma jurídica superior ou, vice-versa, a norma jurídica
inferior deriva da norma jurídica superior.

Esses laços de fundamentação e derivação são, ao mesmo tempo,


materiais e formais.

O aspecto material significa que o conteúdo da norma jurídica inferior


deve ser compatível com o conteúdo de uma norma jurídica inferior. Por
exemplo, uma lei penal não pode prever a pena de morte em
Moçambique, pois o art. 40da Constituição da Republica de Moçambique
veda a adopção de pena de morte.

(iniciativa, discussão, votação, sanção, promulgação e publicação)


O aspecto formal significa que a norma jurídica inferior é produzida pelo
órgão competente e pelo procedimento previstos na normatividade
jurídica superior. Essa é a razão pela qual somente o parlamento tem
competência para legislar sobre Direito Penal.

Leis

44
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Actos administrativos

Contratos, Testamentos, Decisões Judiciais

Constituição

O estudo das espécies de normas jurídicas está estreitamente vinculado


ao problema das fontes do direito, existindo, por isso mesmo, a
necessidade de investigar-se a origem ou nascituro do fenômeno jurídico.

As fontes do direito são os modos de surgimento e de manifestação da


normatividade

As fontes materiais do direito são os elementos económicos, políticos e


ideológicos que perfazem uma dada realidade social, influenciando a
produção da normatividade jurídica, visto que a matéria-prima para a
confecção do sistema jurídico.

As fontes formais do direito correspondem aos canais de


institucionalização das normas jurídicas, através da formalização dos
elementos económicos, políticos e ideológicos que compõem a estrutura
social.

São fontes formais do direito: a legislação, a jurisprudência, a doutrina, o


costume jurídico, o negócio jurídico e o poder normativo dos grupos
sociais.

Exercicios

P/. Atente-te a seguinte afirmação: Quanto maior for a generalidade da


norma jurídica, por sua abstracção e por sua larga abrangência, maior
será o escalão hierárquico, pelo que as normas jurídicas mais

45
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

individualizadas, por regularem uma situação concreta e alcançar


destinatários específicos, estão situadas na base da pirâmide normativa.
Debate a tese.

R/. O ordenamento jurídico se dinamiza por laços de fundamentação e


derivação entre as normas de direito: a norma jurídica inferior se
fundamenta na norma jurídica superior ou, vice-versa, a norma jurídica
inferior deriva da norma jurídica superior. Esses laços de fundamentação
e derivação são, ao mesmo tempo, materiais e formais. O aspecto
material significa que o conteúdo da norma jurídica inferior deve ser
compatível com o conteúdo de uma norma jurídica inferior. Por exemplo,
uma lei penal não pode prever a pena de morte em Moçambique, pois o
art. 40da Constituição da Republica de Moçambique veda a adopção de
pena de morte.

P/. Custuma-se dizer que em Direito que quanto maior for a generalidade
da norma jurídica, por sua abstracção e por sua larga abrangência, maior
será o escalão hierárquico. Queira omentar?

R/. Porque as normas jurídicas são individualizadas, por regularem uma


situação concreta e alcançar destinatários específicos, estão também
situadas na base da pirâmide normativa.

P/. O ordenamento jurídico de qualquer País se dinamiza por laços de


fundamentação e derivação entre as normas de direito: Debata com
profundeza e precisão a tese em questao.

R/. Sim. O ordenamento jurídico de qualquer País se dinamiza por laços


de fundamentação e derivação entre as normas de direito na mediada
emque a norma jurídica inferior se fundamenta na norma jurídica
superior ou, vice-versa, a norma jurídica inferior deriva da norma jurídica
46
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

superior. Esses laços de fundamentação e derivação são, ao mesmo


tempo, materiais e formais.
P/. O que significa a derivação da norma jurídica inferior do superior
materialmente falando?
R/. O aspecto material significa que o conteúdo da norma jurídica inferior
deve ser compatível com o conteúdo de uma norma jurídica inferior. Por
exemplo, uma lei penal não pode prever a pena de morte em
Moçambique, pois o art. 40 da Constituição da Republica de Moçambique
veda a adopção de pena de morte.

Tema 2: Noções gerais de Direito e Lei


O Direito é um fenómeno das rotinas quotidianas, que encontramos a
todo o momento e em toda parte. Estamos todos de forma voluntária ou
involuntária mergulhados no Direito.

O Direito ampara, defende, protege e serve o indivíduo em todos os


momentos da vida. Se agimos ou abstemo-nos de agir de alguma maneira
no que diz respeito ao Direito. Ele regula as relações dos indivíduos em
sociedade, apodera-se do sujeito e mantém-no sob protecção, mas o
considera parte da sociedade, até porque o Direito e a sociedade se
pressupõem. Onde existe sociedade, existe o Direito.

Imagine-se um Homem só no mundo, a viver isolado, por exemplo, numa


Ilha. Ele é senhor das suas atitudes e de seu comportamento. Ninguém
interfere nas suas decisões quando se alojar aqui ou acolá, derrubar esta
árvore ou aquela, pescar ou não pescar, apoderar-se destes ou daqueles
bens, de torná-los úteis ou inúteis, etc. etc. O Direito parece não
interferir na vida desse cidadão, pois estabelece uma diferença entre as
atitudes possíveis, separando as justas das injustas e ninguém, a rigor,
pode nelas interferir, julgando-as justas ou não, certas ou erradas,
possíveis ou descabidas.

47
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Segundo Kelsen, onde não há conflito de interesses, não há necessidades


de justiça.

Ao contrário, se de um momento para outro desembarcar naquela ilha


uma multidão organizada em pequenos grupos ou mesmo, de forma
isolada, terá aí o estabelecimento de uma sociedade circunscrita num
território.

Mesmo que cada membro dessa sociedade queira cuidar das suas
necessidades e interesses, a qualquer momento poderá haver
interferência da atitude de um em relação ao interesse de outrem e,
nesse momento poderá prevalecer o direito do mais forte, originando um
conflito, ou instala-se um estado de direito com regras estabelecidas de
acordo com os interesses dessa sociedade, pois “ubi societas íbis jus”,
quer dizer, onde há sociedade, existe Direito.

Exercicios
P/. O Direito é como vimos um fenómeno das rotinas quotidianas, que
encontramos a todo o momento e em toda parte. Estamos todos de
forma voluntária ou involuntária mergulhados no Direito. De rasgos
exaustivos em torno da tese apresentada.

R/. O Direito ampara, defende, protege e serve o indivíduo em todos os


momentos da vida. Se agimos ou abstemo-nos de agir de alguma maneira
no que diz respeito ao Direito. Ele regula as relações dos indivíduos em
sociedade, apodera-se do sujeito e mantém-no sob protecção, mas o
considera parte da sociedade, até porque o Direito e a sociedade se
pressupõem. Onde existe sociedade, existe o Direito. Imagine-se um
Homem só no mundo, a viver isolado, por exemplo, numa Ilha. Ele é
senhor das suas atitudes e de seu comportamento. Ninguém interfere
nas suas decisões quando se alojar aqui ou acolá, derrubar esta árvore ou
aquela, pescar ou não pescar, apoderar-se destes ou daqueles bens, de
torná-los úteis ou inúteis, etc. etc. O Direito parece não interferir na vida

48
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

desse cidadão, pois estabelece uma diferença entre as atitudes possíveis,


separando as justas das injustas e ninguém, a rigor, pode nelas interferir,
julgando-as justas ou não, certas ou erradas, possíveis ou descabidas.

P/. Segundo Kelsen, onde não há conflito de interesses, não há


necessidades de justiça. Quidi iuris.

R/. Oviamente que sim, a justiça nasce quando o Homem passou a viver
em sociedade. Isto porque a partir do momento em que o homem passou
a viver em sociedade, igualmente foram nascendo muitos conflitos
decorrentes do seu relacionamento com o outro. Ai a necessidade da
justiça foi chamada para derimir conflitos.

Unidade Tematica 2.1: DIVERSOS USOS DA PALAVRA DIREITO


A palavra Direito apresenta-se, pelo menos, em quatro sentidos,
nomeadamente:

a) Como norma (por exemplo “o Direito Moçambicano acolhe o


divórcio”).
b) Como faculdade (Na Academia de Ciências Policiais de Maputo
temos o Direito de reclamar que as refeições sejam bem
confeccionadas).
c) Como acepção do justo (o aluno n 5 da Turma A do 1 Ano
comportou-se Direito);
d) Como ciência (Estudamos Direito na Faculdade).

O Direito como norma, formulado por códigos e leis, é o Direito Positivo,


isto é, um sistema de normas jurídicas que em determinado momento
histórico regula relações de um povo. Tais relações envolvem tanto o
Estado ou Nação (Poder Público) com outros Estados e Nações, como os
indivíduos entre si e entre estes e o poder público.

O Direito Positivo, que é um sistema de normas jurídicas que em


determinado momento histórico regula as relações de um povo.

49
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Apesar de lei e Direito serem comummente confundidos, eles não


significam a mesma coisa. A lei sempre emana do Estado e permanece,
em última análise, ligada à classe dominante, pois o Estado, como
sistema de órgãos que rege a sociedade politicamente organizada, fica
sob o controle daqueles que comandam o processo económico, na
qualidade de proprietários dos meios de produção. Nem toda legislação
constitui Direito autêntico, legítimo e indiscutível. O Estado, em sua
posição privilegiada, deseja que lei e Direito se identifiquem como forma
de eliminar as contradições existentes entre poder e vontade do povo,
como se não houvesse Direito a procurar além ou acima das leis. Mas a
legislação deve ser examinada criticamente. O Direito se encontra
aprisionado pelas normas estatais, mas é muito mais que isso. Ele deve
ser autêntico e global e, portanto, não pode esgotar-se na lei, pois está
relacionado a princípios e normas libertadoras, tendo a lei, apenas, como
uma de suas conseqüências. Reduzi-lo à pura legalidade é reduzi-
lo a uma dogmática.

Exercicios
P/. A palavra Direito apresenta-se, pelo menos, em quatro sentidos
distintos. Diga quais são.

R/. Direito como norma; como faculdade; acepção do justo e como


ciência.

p/. Apesar de lei e Direito serem comummente confundidos, eles não


significam a mesma coisa. Concorda? Justifique a sua resposta.

R/. Sim. A lei sempre emana do Estado e permanece, em última análise,


ligada à classe dominante, pois o Estado, como sistema de órgãos que
rege a sociedade politicamente organizada, fica sob o controle daqueles
que comandam o processo económico, na qualidade de proprietários dos

50
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

meios de produção. O Direito se encontra aprisionado pelas normas


estatais, mas é muito mais que isso. Ele deve ser autêntico e global e,
portanto, não pode esgotar-se na lei, pois está relacionado a princípios e
normas libertadoras, tendo a lei, apenas, como uma de suas
conseqüências. Reduzi-lo à pura legalidade é reduzi-lo a uma dogmática.

Unidade Tematica 2.2: Ideologias jurídicas

Ao se analisar as ideologias jurídicas ocidentais encontradas entre a


Antiguidade e os dias actuais, é possível se identificar a essência do
Direito, mesmo que de maneira incompleta ou distorcida. O termo
ideologia possui significados variados, mas é possível a demonstração de
que tais significados não se excluem reciprocamente, mas, ao contrário,
se integram, assim, o que realmente varia é o ponto de vista utilizado na
observação de um único fenômeno.

Exercicios
P/. Ao se analisar as ideologias jurídicas ocidentais encontradas entre a
Antiguidade e os dias actuais, é possível se identificar a essência do
Direito, mesmo que de maneira incompleta ou distorcida. Queira
comentar?

R/. Poque o termo ideologia possui significados variados, mas é possível a


demonstração de que tais significados não se excluem reciprocamente,
mas, ao contrário, se integram, assim, o que realmente varia é o ponto de
vista utilizado na observação de um único fenômeno.

Unidade Temática 2.3: Direito como ordem normativa


Outra determinação fundamental do direito positivo, evidenciada pela
experiência, é a que consiste na sua imperatividade e normatividade.
Todos os preceitos jurídicos se deixam reduzir a um imperativo ou ordem
dada a alguém, sendo a designação dessa ordem, sobretudo quando
referida a uma generalidade de homens e igualdade de condições, o

51
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

mesmo que norma ou normatividade e imperativo, sendo esta


determinação aliás uma determinação que pertence ao próprio conceito
de direito.

São ainda determinações fundamentais ou características do direito


positivo as suas obrigatoriedades e coercibilidade. Pela primeira,
entende-se uma obrigatoriedade de consciência.

O homem obedece às normas do direito, desde que o faça


conscientemente, tem de o fazer no sentimento de quem presta uma
homenagem a certas ideias de valor, mesmo que isso lhe custe.

A obrigatoriedade do direito em consciência só pode ser uma


obrigatoriedade moral, ou então não será coisa alguma; será tão só
coacção, medo, conveniência ou despotismo. Esta consideração coloca,
porém, diante de uma derradeira determinação ou característica
essencial do direito positivo: a sua coercibilidade.

Costuma-se dizer que o direito é norma coactivamente imposta pelo


Estado aos homens na vida social. À primeira vista, pode ser contraditório
falar em coercibilidade do direito, justamente depois de se ter acabado
de dizer que ele se funda só numa obrigatoriedade toda moral de adesão
aos seus preceitos, fora de qualquer coacção. Todavia a contradição é
meramente aparente. Ela só existirá se disser, ser todo o direito só
coacção, mas direito só se torna coactivo eventualmente; torna-se
coactivo, ainda em homenagem a um dever-ser moral, só na medida em
que o não acatamento dos seus preceitos por parte de alguns homens
arraste necessariamente consigo: ou a ofensa dos direitos dos outros, ou
a ruína da ordem social estabelecida.

As normas em que se objectiva o direito constituem uma ordem, num


amplo sentido: por um lado, formam um conjunto ordenado a partir dos
princípios, valores ou ideias de cuja visualização ou interpretação são

52
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

objectivada expressão; por outro lado, procuram ordenar, reflectir ou


tornar direita ou recta a vida social, a convivência entre os homens, as
suas relações, substituindo por uma ordem, caos a que a desordenada
conduta individual inevitavelmente conduziria, no seu jogo de egoísmos e
na luta em que o mais fraco sucederia ao arbítrio do mais forte.

A ordem que o direito visa instituir, porque referida a valores, princípios


ou ideias, não é uma ordem neutra ou indiferente, mas sim uma ordem
justa, uma ordem concreta, definida a partir do princípio ou valor justiça,
que é precisamente, aquele que dá sentido e conteúdo ao direito na sua
essencial dimensão axiológico-cultural.

Partindo da justiça como princípio, valor ou ideal, o direito é, pois, o meio


de que o homem se serve para alcançar uma adequada ordenação da sua
conduta social, com o fim de coordenar o exercício da liberdade de cada
um com a liberdade dos restantes, realizando deste modo, o bem comum
da sociedade política.

Exercicios
P/. A determinação fundamental do direito positivo, evidenciada pela
experiência, é a que consiste na sua imperatividade e normatividade.
Porquê?

R/. Todos os preceitos jurídicos se deixam reduzir a um imperativo ou


ordem dada a alguém, sendo a designação dessa ordem, sobretudo
quando referida a uma generalidade de homens e igualdade de
condições, o mesmo que norma ou normatividade e imperativo, sendo
esta determinação, aliás, uma determinação que pertence ao próprio
conceito de direito.

P/. As normas em que se objectiva o direito constituem uma ordem, num


amplo sentido. Discuta de forma objectiva o exposto.

53
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

R/. Sim, porque por um lado, formam um conjunto ordenado a partir dos
princípios, valores ou ideias de cuja visualização ou interpretação são
objectivada expressão; por outro lado, procuram ordenar, reflectir ou
tornar direita ou recta a vida social, a convivência entre os homens, as
suas relações, substituindo por uma ordem, caos a que a desordenada
conduta individual inevitavelmente conduziria, no seu jogo de egoísmos e
na luta em que o mais fraco sucederia ao arbítrio do mais forte.

Unidade Tematica 2.4: POSITIVISMO COMO IDEOLOGIA

Apresenta-se em 2 vertentes, a primeira, mais radical, defende que o


Direito representa o critério do que é justo (o que manda) e do que é
injusto (o que proíbe), da onde se deduz uma obrigação moral de
obediência ao Direito, e a segunda que sustenta que o Direito pelo fato
de ordenar e regular a convivência, garante certos valores morais.

 CONSTITUCIONALISMO: seria incompatível com o positivismo. As


mudanças dizem respeito às fontes de direito e quanto a sua
interpretação e aplicação. Afirma-se a superioridade da
Constituição em detrimento da lei, rematerialização dos textos
constitucionais, agora com um conteúdo material com princípios e
direitos fundamentais (deixa de ser a valorativa) que condicionam
a validez de outras normas, inferiores, de acordo com as
exigências constitucionais. Conexão entre Direito e Moral,
presente no sistema como um todo.
 CONSTITUCIONALISMO E POSITIVISMO METODOLÓGICO: o ponto
central do positivismo metodológico se resume na separação
entre Direito e Moral, ou melhor, que não existe conexão
necessária entre eles. – O Direito pode ser estudado como um
fato social, o que o define é a técnica utilizada, vinculada à
organização do uso da força; o conhecimento do Direito pode ser
neutro, sem estar comprometido com valorações morais, já que

54
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

ele pode ser justo ou injusto; e não há uma obrigação de


obediência somente pelo fato da norma ser jurídica.

Crítica: advém do fato das Constituições contemporâneas incorporarem


muitos valores morais, da rematerialização dos textos constitucionais. As
normas, além de obedecer aos requisitos formais e procedimentos,
devem também estar de acordo com princípios e valores morais e
jurídicos. Porém, o positivismo pode ser compatível com o
Constitucionalismo, pois afirma não haver a necessidade de conexão
entre Direito e Moral, mas não que não exista.

Pós-positivismo: não se pode falar de validez sem recorrer a critérios


normativos externos ao sistema jurídico, por isso, a teoria do Estado
Constitucional parte dos princípios de justiça e moralidade social, ao
contrário dos positivistas, da pretensão de neutralidade valorativa. A
obrigatoriedade das normas no Estado constitucional tem um
fundamento moral, por isso, há uma conexão necessária entre direito e
moral. Há uma busca por respostas morais aos problemas jurídicos.

P/. Explique sao as idealogia patentes na corrente positivista?

R/. As idealogia do posivismo apresentam-se em 2 vertentes, a primeira,


mais radical, defende que o Direito representa o critério do que é justo (o
que manda) e do que é injusto (o que proíbe), da onde se deduz uma
obrigação moral de obediência ao Direito, e a segunda que sustenta que
o Direito pelo fato de ordenar e regular a convivência, garante certos
valores morais.

Unidade Tematica 2.5: Legislação


Nas sociedades modernas, a lei é a mais importante das espécies
normativas de conteúdo jurídico, como expressão formal do direito,
nomeadamente nos ordenamentos jurídicos de tradição romano-

55
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

germânica (sistemas de civil law), como o Brasil, emanando do poder


estatal de legislar com a finalidade de regular a conduta humana.

A lei pode ser definida como uma regra de direito geral, proclamada
obrigatória pela vontade da autoridade competente (Poder Legislativo ou
mesmo Poder Executivo) e expressa em fórmula escrita (jus scriptum).

As normas legislativas são normas gerais pela abstracção de conteúdo


(previsão abstracta de hipóteses) e impessoais por alcançarem toda a
comunidade jurídica (indefinição dos destinatários). Podem ser
elaboradas por um parlamento ou mesmo pelo Chefe do Poder Executivo
para disciplinar direitos e deveres.

Para sua criação, a lei pressupõe a observância do processo legislativo,


que, em nosso sistema jurídico regula e que compreende a elaboração de
emendas à Constituição, leis complementares, leis ordinárias, leis
delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos e resoluções. Além
dessas espécies normativas, devem ser incluídas as leis estaduais,
provinciais (assembleia provincial)e as leis municipais( conselho
municipal) como integrantes do conceito de legislação no sistema jurídico
Moçambicano.

P/. O que entende por lei?

R/. A lei pode ser definida como uma regra de direito geral, proclamada
obrigatória pela vontade da autoridade competente (Poder Legislativo ou
mesmo Poder Executivo) e expressa em fórmula escrita (jus scriptum).

Unidade Tematica: 2.5.1 Jurisprudência


Como fonte do direito, entende-se por jurisprudência o conjunto das
decisões reiteradas de juízes e tribunais que formam um padrão
interpretativo capaz de inspirar futuros julgamentos. A Jurisprudência
56
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

pode ser reunida em forma escrita através de enunciados chamados de


súmulas. Ao lado dos costumes, a jurisprudência é considerada a
principal fonte do direito nos sistemas jurídicos anglo-saxônicos
(common law), como na Inglaterra e nos Estados Unidos, embora seja
também largamente utilizada nos sistemas jurídicos romano-germânicos
(civil law), como em Moçambique.

Tendo em vista que o juiz não é o aplicador mecânico das regras legais,
mas um verdadeiro criador de direito concreto, as decisões
jurisprudenciais configuram o poder de decidir próprio dos órgãos
judiciários, em simetria com o que se processa em relação aos Poderes
Executivo e Legislativo. A jurisdição é, pois, o poder que tem o juiz de
explicitar as normas jurídicas, expressando seu sentido e alcance.

Nos países que adoptam o sistema judiciário desvinculado da norma


legal, como na Inglaterra e nos Estados Unidos, destaca-se a descoberta
do Direito através de precedentes judiciais, que consubstanciam as
decisões judiciais do passado sobre casos semelhantes.

Observa-se que o precedente judicial desempenha importante papel nos


regimes anglo-saxónicos de common law, equiparado à lei nos sistemas
romano-germânicos de civil law, como o sistema jurídico brasileiro. No
sistema do common law, a lei desempenha papel secundário,
emprestando-se maior importância à norma singular e concreta, em face
da norma geral e abstracta, que só é reconhecida como norma concreta
após passar pelo crivo da decisão judicial. Cada vez que um juiz adopta
uma regra de direito formulada anteriormente por outro colega, um novo
precedente ajunta-se ao corpo de precedentes, no âmbito do sistema de
common law.

57
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Não há como negar, portanto, à jurisprudência o valor de fonte jurídica,


como suplemento da própria legislação Moçambicana.

Exercicios
P/. Diga qual é o lugar que a jurisprudencia ocupa diante do costume nos
sistemas jurídicos anglo-saxônicos (common law)?

R/. Ao lado dos costumes, a jurisprudência é considerada a principal


fonte do direito nos sistemas jurídicos anglo-saxônicos (common law),
como na Inglaterra e nos Estados Unidos, embora seja também
largamente utilizada nos sistemas jurídicos romano-germânicos (civil
law), como em Moçambique.

Unidade Tematica 2.5.2: Doutrina


A doutrina é o estudo científico que os juristas realizam a respeito do
direito, seja com o propósito puramente especulativo de conhecimento e
sistematização, seja com a finalidade prática de interpretar as normas
jurídicas para sua aplicação aos casos concretos. Trata-se, pois, do
conjunto de obras e pareceres que exprimem o conjunto da produção
científica do direito.

Houve épocas e sistemas jurídicos que adoptavam a doutrina como fonte


formal do Direito. Em Roma, no período de Adriano, o Imperador
conferiu força obrigatória à opinião de certos jurisconsultos, quando
fossem concordantes durante certo tempo (communis opinio doctorum).
Também algumas legislações medievais e até mesmo modernas
admitiram expressamente a doutrina como fonte subsidiária da lei, como
são exemplo as Ordenações Afonsinas.

Embora alguns autores rejeitem sua condição de fonte jurídica, por


carecer de valor vinculante e obrigatório, a doutrina cada vez mais
contribui na formação do Direito, pois, na obra dos grandes juristas, o

58
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

legislador e o magistrado têm encontrado substrato, respectivamente,


para a feitura de leis e decisões judiciais.

P/. Diga qual é a importancia da doutrina nos sistemas jurídicos?

R/. Embora alguns autores rejeitem sua condição de fonte jurídica, por
carecer de valor vinculante e obrigatório, a doutrina cada vez mais
contribui na formação do Direito, pois, na obra dos grandes juristas, o
legislador e o magistrado têm encontrado substrato, respectivamente,
para a feitura de leis e decisões judiciais.

Unidade Tematica 2.5.3: Costume jurídico


Entende-se por costume jurídico o conjunto de práticas sociais reiteradas,
acrescidas da convicção de sua necessidade jurídica para a disciplina das
relações sociais.

Os costumes nascem no campo da moralidade, mas podem adquirir uma


natureza jurídica, ao estabelecer direitos e exigir o cumprimento
obrigatório de deveres.

O contraste entre o direito costumeiro e o direito estatal é representado


pelas codificações dos séculos XVIII e XIX, através das quais o chamado
direito comum foi absorvido pelo direito estatal. É indiscutível, no
entanto, que inobstante a quase inteira absorção do direito costumeiro
pelo direito positivado estatal, manteve-se a tradição dos povos anglo-
saxões, nos quais o Direito se revela muito mais pelos usos e costumes e
pela jurisprudência do que pelo trabalho abstracto e genérico dos
parlamentos, constituindo, assim, o chamado direito consuetudinário.

Os autores definem o costume como a norma constante não-escrita


obrigatória, só diversa da lei no aspecto formal, pois a lei é escrita, o

59
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

costume, não. Também a lei é intencionalmente elaborada, enquanto o


costume forma-se espontaneamente.

Comparados com as leis, os costumes podem ser: secundum legem, ou


seja, servem de suporte ou modelo da lei; praeter legem, os que
convivem pacificamente com a lei, tendo por função sanar as lacunas do
texto legal, complementando o direito escrito; e, por fim, contra legem,
que, como o próprio nome indica, são contrários à lei, opondo-se
frontalmente à ela, daí porque são inadmitidos nos sistemas legislativos
modernos, dada a necessidade de preservar a segurança jurídica.

Em que pese a pequena actuação do costume no direito moderno, no


qual é exacerbada a importância da lei escrita, essa espécie normativa
ainda tem relativa influência no Direito Internacional Público e no Direito
Comercial, despontando, nesse último ramo jurídico, o uso do cheque
pré-datado como um exemplo inconteste.

Exercicios
P/. Qual é o espaco do costume no direito moderno, no qual é
exacerbada a importância da lei escrita?

R/. Essa espécie normativa ainda tem relativa influência no Direito


Internacional Público e no Direito Comercial, despontando, nesse último
ramo jurídico, o uso do cheque pré-datado como um exemplo inconteste.

Unidade Tematica 2.5.4: Negócio Jurídico


Entende-se por negócio jurídico todo acordo de vontades humanas que
se revela capaz de estabelecer direitos e deveres jurídicos para os
sujeitos envolvidos.

60
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

O negócio jurídico consiste numa auto-regulamentação dos interesses


particulares pelo ordenamento jurídico, oriunda do reconhecimento da
autonomia privada das partes.

O exemplo mais citado de negócio jurídico é o contrato


Discute-se muito se o contrato pode ser colocado como uma das fontes
jurídicas, elevando-o ao mesmo plano da lei e dando-lhe igual força e
significação, dada a diversidade de sua posição no mundo jurídico, que se
restringe a um dado caso concreto, enquanto a lei actua sempre de
forma abstracta.

Torna-se incontestável, contudo, a importância do poder negocial como


força geradora de normas jurídicas individualizadas aos participantes da
relação jurídica, já que se costuma dizer que “o contrato tem força de lei
entre as partes".

P/. Diga de forma resumida o entende por negócio jurídico?

R/. Entende-se por negócio jurídico todo acordo de vontades humanas


que se revela capaz de estabelecer direitos e deveres jurídicos para os
sujeitos envolvidos.

P/. Em uma palavra diga qual é a forma mais comum entre os negócio
jurídicios?

R/. Contrato.

Unidade Tematica 2.5.5: Poder normativo dos grupos sociais


O poder normativo dos grupos sociais é a prerrogativa conferida aos
agrupamentos humanos de elaborar seus próprios ordenamentos
jurídicos.

61
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Para tanto, deve-se reconhecer que não somente o Estado produz


Direito, mas todo o conjunto de agrupamentos humanos que perfazem a
sociedade (pluralismo jurídico).

Exemplos de manifestação do poder normativo dos grupos sociais são os


regulamentos elaborados dentro das empresas e as convenções criadas
pelos moradores dos condomínios residenciais.

Entende-se por integração do direito a actividade de preenchimento das


lacunas jurídicas, que são vazios ou imperfeições que comprometem a
ideia de completude do sistema

A integração do direito é um tema cuja compreensão exige a análise da


completude do sistema jurídico. É indispensável saber se o sistema
jurídico é completo ou incompleto, vale dizer, se ele pode alcançar todos
os campos das interacções sociais ou se há condutas não alcançadas pela
ordem jurídica.

Podemos visualizar duas grandes correntes: aqueles que defendem um


sistema jurídico fechado (completo) e, de outro lado, aqueles que
visualizam um sistema jurídico aberto (incompleto), e,
consequentemente, lacunoso.

O principal argumento em favor da completude do sistema jurídico


consiste na utilização do raciocínio lógico, segundo o qual “tudo o que
não está juridicamente proibido, está juridicamente permitido”.

Há doutrinadores que, por sua vez, situam o problema das lacunas


jurídicas no campo da jurisdição, considerando a actuação do julgador. Os
doutrinadores negam, assim, a existência de lacunas, visto que o
magistrado nunca poderá eximir-se de julgar, alegando a falta ou a
obscuridade da lei. Ao decidir um caso concreto, o juiz já estaria criando

62
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

uma norma individualizada para o conflito de interesses e, portanto,


oferecendo a resposta normativa capaz de assegurar a completude do
sistema jurídico.

Salvo melhor juízo, defendemos a ideia de que o sistema jurídico é


aberto, porque o Direito é um fenômeno histórico-cultural e submetido,
portanto, às transformações que ocorrem no campo dinâmico dos
valores e dos fatos sociais. Decerto, o legislador não tem como prever e
regular a totalidade das relações sociais.

Lacunas jurídicas: normativas, fácticas e valorativas


Sendo aberto (incompleto) o sistema jurídico, poder-se-ia falar da
existência das seguintes

A lacuna normativa se configura toda vez que inexiste norma regulando


expressamente um dado campo da interacção social, como sucede com o
comércio electrónico no Brasil, ainda carente de uma regulação
normativa expressa.

A lacuna fáctica ocorre quando as normas jurídicas deixam de ser


cumpridas pelos agentes da realidade social, evidenciando o fenômeno
da revolta dos factos contra o sistema jurídico, o que ocorre com o
descumprimento da legislação municipal que exige que o cliente não

A lacuna valorativa se verifica quando a norma jurídica vigente não é


valorada como justa, não estando em conformidade com os valores
socialmente aceitos, o que sucede com a legislação tributária em geral,
por ser considerada excessivamente onerosa para o contribuinte, não
realizando justiça fiscal.

Nesse sentido, pode-se afirmar que o sistema jurídico é lacunoso, mas ele
próprio oferece mecanismos para preencher as referidas. São os

63
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

chamados instrumentos de integração do direito: a analogia; os


costumes; os princípios gerais do direito; e a equidade.

A analogia é a aplicação de uma norma jurídica que regula um


determinado caso concreto à outra situação fáctica semelhante, o que
ocorre quando se aplicam as disposições do Código Civil que regulam os
contratos celebrados na realidade concreta para as avenças. Os
costumes, além de figurarem como fonte do direito, podem também
apresentar-se como elemento de integração da lei, especialmente
quando a norma legal expressamente autorize.

Os princípios gerais de direito são directrizes éticas, implícitas ou


expressas na legislação, que apontam para a realização dos valores e
finalidades maiores da ordem jurídica, potencializando a tomada de
decisões mais justas, mormente nas hipóteses de lacunas valorativas,
como sucede com a aplicação dos princípios da insignificância no Direito
Penal em Moçambique, que autoriza o uso do juízo equitativo na
resolução de conflitos de interesses.

A equidade consiste na aplicação prudente pelo julgador do seu


sentimento de justiça, ao observar as singularidades de um dado caso
concreto, como sucede com a arbitragem na mediação Laboral.

A teoria das antinomias jurídicas está ligada ao problema da coerência do


sistema jurídico. Para que um sistema seja coerente, é necessário que os
seus elementos não entrem em contradição entre si.

No Direito, os elementos que compõem um sistema jurídico podem


entrar em conflito, surgindo, assim, as chamadas antinomias jurídicas.
Geralmente isso ocorre quando diferentes normas jurídicas permitem e
proíbem um mesmo comportamento, o que suscita

64
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

No que se refere à classificação das antinomias jurídicas, podemos falar


de antinomias próprias e de antinomias impróprias (teleológica,
valorativa, principiológica e semântica)

As antinomias próprias se verificam toda vez que uma norma jurídica


proíbe uma dada conduta enquanto que outra norma jurídica faculta a
mesma conduta, o que ocorre quando um soldado recebe a ordem de um
oficial para fuzilar um prisioneiro, sendo crime tanto descumprir a ordem
do superior hierárquico, quanto praticar o delito de homicídio.

As antinomias impróprias são aquelas contradições mais sutis entre as


normas jurídicas, envolvendo o conflito de valores, finalidades sentidos e
terminologias do sistema jurídico.

A antinomia imprópria teleológica ocorre quando uma norma jurídica


estabelece os meios para a aplicabilidade de outra norma jurídica, mas os
meios oferecidos se revelam incompatíveis com o fim previsto na norma
originária, como sucede com a lei que fixa o valor actual do salário
mínimo, não atendendo as necessidades vitais do trabalhador,

A antinomia imprópria valorativa sucede toda vez que ocorre uma


discrepância entre os valores cristalizados por duas ou mais normas
jurídicas, quando a ordem jurídica pune mais severamente uma infracção
social branda e mais levemente uma infracção social mais grave, como
ocorre com a punição mais severa dos crimes de furto e roubo, quando
comparada com a punição dos crimes contra a administração pública, no
Código Penal brasileiro.

e da vida privada das autoridades públicas


A antinomia imprópria principiológica se verifica toda vez que os
princípios jurídicos entram em colisão, sinalizando soluções diversas para

65
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

o intérprete/aplicador do direito, como sucede com o conflito entre os


princípios constitucionais da liberdade de informação

A antinomia imprópria semântica surge toda vez que uma mesma palavra
comporta diferentes sentidos, a depender do ramo jurídico em que é
utilizada, como sucede com a palavra posse no Direito Civil e no Direito
Administrativo.

Diante da ocorrência de antinomias jurídicas, deverão ser utilizados os


critérios de solução hierárquico, cronológico e da especialidade. De todos
estes critérios, o mais importante é o hierárquico, prevalecendo,
inclusive, sobre todos os demais.

Pelo critério hierárquico, havendo antinomia entre uma norma jurídica


superior e uma norma jurídica inferior, prevalece a norma jurídica
superior, dentro da concepção piramidal e hierarquizada do sistema
jurídico. Por exemplo, havendo conflito entre a Constituição e uma Lei
Ordinária, prevalece a Constituição por ser um diploma normativo de
hierarquia superior.

A Hermenêutica Jurídica é um saber que se propõe a estudar a


interpretação do direito. O termo provém da mitologia greco-latina,
baseada na crença no Deus Hermes, que é o mensageiro dos deuses e
que “criou” a escrita. O objecto da hermenêutica é a interpretação que
serve como mediadora entre a obra e a realidade social.

A interpretação do direito é uma actividade de mediação comunicativa,


através da qual o intérprete fixa o sentido e o alcance das expressões
linguísticas que compõem as normas jurídicas, mediando a relação entre
o sistema jurídico e a sociedade. O problema fundamental da linguagem
jurídica é que ela está baseada na linguagem comum, que comporta
sempre diversos significados.

66
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

No que se refere aos tipos de interpretação jurídica, a classificação mais


utilizada é aquele que diferencia 03 (três) categorias: declarativa, que se
processa quando o interprete utiliza a expressão normativa em seu
significado comum ou actual, sem aumentar ou reduzir o sentido e o
alcance das normas; extensiva, que busca ampliar o sentido e o alcance
das expressões normativas; e restritiva, que objectiva reduzir o sentido e
o alcance das expressões normativas.

O intérprete do direito utiliza técnicas interpretativas que orientam o


exercício da interpretação/aplicação do Direito, tendo em vista a
delimitação do sentido da norma jurídica. São os métodos gramatical,
sistemático, histórico, sociológico e teleológico.

O método gramatical busca mapear a origem dos vocábulos e, com base


nas regras de gramática, definir o significado literal e mais superficial da
expressão normativa.

O método sistemático procura comparar os dispositivos normativos de


modo a evidenciar o significado dos vocábulos utilizados pelas normas
jurídicas, partindo da premissa de que o sistema jurídico é uno, não
podendo interpretá-lo de forma isolada e sim de uma forma integrada,
correlacionando com os demais preceitos do ordenamento jurídico.

O método histórico busca rastrear os antecedentes que influenciaram a


elaboração das normas jurídicas, de modo a determinar o sentido e o
alcance das expressões normativas.

O método sociológico busca correlacionar os modelos normativos com as


novas circunstâncias sociais, políticas, ideológicas, culturais, ou seja,
busca adequar a norma ao fluxo ininterrupto da realidade social.

67
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

O método teleológico procura depreender a finalidade do discurso


normativo, ou seja, a interpretação teológica se baseia na delimitação
dos fins a serem atingidos pelo sistema normativo.

Para alguns estudiosos do direito, a interpretação jurídica deve voltar-se


para a determinação da chamada vontade do legislador (voluntas
legislatoris). A função do intérprete é a de buscar o sentido original da
norma legal. Essa visão é ultrapassada, já que se entende, actualmente,
que a interpretação jurídica deve voltar-se para a delimitação da vontade
da lei (voluntas legis), ou seja, a função do interprete não é outra se não a
de determinar o sentido objectivo da norma legal, que se destaca do
legislador para adquirir uma nova significação social.

Exercicios
P/. Em termos de Direito, o poder normativo é reservado ao Estado pura
e simplesmente?

R/. O poder normativo não é reservado ao Estado pura e simplesmente,


mas a todos os grupos sociais tem a prerrogativa de elaborar seus
próprios ordenamentos jurídicos.

P/. Quais são os exemplo práticos, de manifestação do poder normativo


dos grupos sociais.

R/. Os exemplos práticos do poder normativo dos grupos sociais são os


regulamentos elaborados dentro das empresas e as convenções criadas
pelos moradores dos condomínios residênciais.

P/. O que etende por integração do direito?

R/. A actividade de preenchimento das lacunas jurídicas, que são vazios


ou imperfeições que comprometem a ideia de completude do sistema. A
integração do direito é um tema cuja compreensão exige a análise da
completude do sistema jurídico. É indispensável saber se o sistema

68
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

jurídico é completo ou incompleto, vale dizer, se ele pode alcançar todos


os campos das interacções sociais ou se há condutas não alcançadas pela
ordem jurídica.

P/. Quando é que se verifica a lacuna valorativa?

R/. A lacunaa a valorativa verifica quando a norma jurídica vigente não é


valorada como justa, não estando em conformidade com os valores
socialmente aceites, o que sucede com a legislação tributária em geral,
por ser considerada excessivamente onerosa para o contribuinte, não
realizando justiça fiscal.

P/. Em matéria de Direito, tem-se recorrido a interpretção análoga de


casos em concreto. Concorda? Justifique.

R/. Sim, concordo. Porque a analogia é a aplicação de uma norma jurídica


que regula um determinado caso concreto à outra situação fáctica
semelhante, o que ocorre quando se aplicam as disposições do Código
Civil que regulam os contratos celebrados na realidade concreta para as
avenças. Os costumes, além de figurarem como fonte do direito, podem
também apresentar-se como elemento de integração da lei,
especialmente quando a norma legal expressamente autorize.

P/. Que entende por princípios gerais de direito?

R/. Princípios gerais de direito são directrizes éticas, implícitas ou


expressas na legislação, que apontam para a realização dos valores e
finalidades maiores da ordem jurídica, potencializando a tomada de
decisões mais justas, mormente nas hipóteses de lacunas valorativas,
como sucede com a aplicação dos princípios da insignificância no Direito
Penal em Moçambique, que autoriza o uso do juízo equitativo na
resolução de conflitos de interesses.

69
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

P/. Em sede de julgamento, os juizes tem as vezes recorrido a equidade


como uma das fontes do direito para a resolução de litígios. De maneira
clara e simples, diga o que entende por equidade?

R/. Equidade consiste na aplicação prudente pelo julgador do seu


sentimento de justiça, ao observar as singularidades de um dado caso
concreto, como sucede com a arbitragem na mediação Laboral.

P/. Quando é que surgem antinomias jurídicas?

R/. As antinomias jurídicas surgem quando os elementos que compõem


um sistema jurídico entram em conflito. Geralmente isso ocorre quando
diferentes normas jurídicas permitem e proíbem um mesmo
comportamento, o que suscita.

P/. Qual é o significado do termo hermeneutica jurídica e diga qual é o


seu fim último?
R/. A Hermenêutica Jurídica é um saber que se propõe a estudar a
interpretação do direito. O termo provém da mitologia greco-latina,
baseada na crença no Deus Hermes, que é o mensageiro dos deuses e
que “criou” a escrita. O objecto da hermenêutica é a interpretação que
serve como mediadora entre a obra e a realidade social.

P/. No que se refere aos tipos de interpretação jurídica, a classificação


mais utilizada é aquele que diferencia 03 (três) categorias. Quais são e
explique.
R/. As categorias em causa são: declarativa, que se processa quando o
intérprete utiliza a expressão normativa em seu significado comum ou
actual, sem aumentar ou reduzir o sentido e o alcance das normas;
extensiva, que busca ampliar o sentido e o alcance das expressões
normativas; e restritiva, que objectiva reduzir o sentido e o alcance das
expressões normativas.

70
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

P/. O intérprete do direito utiliza técnicas interpretativas que orientam o


exercício da interpretação/aplicação do Direito, tendo em vista a
delimitação do sentido da norma jurídica. Aponte os métodos em
questão.
R/. Os métodos em causa são: gramatical, sistemático, histórico,
sociológico e teleológico.
P/. Para alguns estudiosos do direito, a interpretação jurídica deve voltar-
se para a determinação da chamada vontade do legislador (voluntas
legislatoris). Discuta com precisão e objectividade a tese.
R/. A função do intérprete é a de buscar o sentido original da norma
legal. Essa visão é ultrapassada, já que se entende actualmente, que a
interpretação jurídica deve voltar-se para a delimitação da vontade da lei
(voluntas legis), ou seja, a função do interprete não é outra se não a de
determinar o sentido objectivo da norma legal, que se destaca do
legislador para adquirir uma nova significação social.

Unidade Tematica 2.6: Teoria da Justiça


• O problema da validade constitui o conjunto de investigações
destinadas a descobrir em que consiste o direito como norma obrigatória
e coactiva. Daqui nasce a Filosofia do Direito como Teoria Geral do
Direito
• O problema da eficácia leva-nos ao terreno da aplicação das normas
jurídicas e do comportamento dos homens em sociedade, as suas
reacções frente à autoridade. De aqui nasce o aspecto da filosofia do
Direito que nos leva à Sociologia Jurídica há três modos diferentes de
considerar o direito:
Segundo se o examine no seu valor ideal (a Justiça), no seu valor formal
(a validade), ou no seu valor prático (a eficácia)

71
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Conclusão – Os três problemas, são três diversos aspectos do mesmo


problema e se insistimos na distinção e independência destes três valores
é para evitar as confusões e refutar as teorias que não fazem estas
distinções, como as teorias “reducionistas” que pretendem reduzir um
destes três aspectos aos outros dois. Há 3 teorias “reducionistas”:
Concepção do Direito natural, que reduz a validade à justiça: A NORMA
SÓ É VÁLIDA PORQUE É JUSTA
Concepção Positivista (sentido estricto) que reduz a justiça à validade: A
NORMA SÓ É JUSTA PORQUE É VÁLIDA
Concepção do Realismo jurídico que reduz a validade à eficácia: A
NORMA SÓ É VÁLIDA SE EFICAZ
DIREITO NATURAL, pensamento jurídico que reduz a validade da norma
jurídica à justiça. A NORMA SÓ É VÁLIDA SE FOR JUSTA. Pretende
estabelecer o que é justo de modo universalmente válido.
Crítica
Para KANT jusnaturalista moderno a liberdade era natural, mas para
ARISTÓTELES a escravatura era natural, então a universalidade da justiça
cai por terra POSITIVISMO JURÍDICO Teoria oposta ao jusnaturalismo,
reduz a justiça à validade. A NORMA SÓ É JUSTA SE FOR VÁLIDA.
THOMAS HOBBES diz que o único critério de justo ou injusto é o da lei
positiva, lei vigente. Os indivíduos transmitem todos os seus direitos
naturais ao soberano, incluindo o direito de dizer o que é justo ou injusto.
Não existe Justiça natural mas sim justiça convencional. É a força que cria
o Direito
REALISMO JURÍDICO teoria de origem anglo-saxónica que observam o
direito como ele é e não como deve ser; para estes tanto os
jusnaturalistas como os positivistas pecam por abstracção, pois o único
direito que interessa é o concreto o que efectivamente é aplicado. A
NORMA SÓ É VÁLIDA SE FOREFICAZ.
Para SAVIGNY representante da ESCOLA HISTÓRICA DO DIREITO, o
direito não se deduz de
72
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

princípios universais mas constitui um fenómeno histórico-social que


nasce espontaneamente do povo, o costume é a fonte primária do
direito e não imposto pela vontade do grupo dominante. Concepção
SOCIOLÓGICA DO DIREITO surge depois da revolução industrial,
resultante da divergência entre o direito escrito (válido) e a realidade
social (direito eficaz) O juiz como criador de direito atribui a validade a
normas consuetudinárias que já eram válidas.
O que é o Direito? – Sistema de normas dotadas de coacção organizada e
institucionalizada (desta matéria trata a ciência do Direito e a Sociologia
do Direito) O que deve ser o direito? (dos valores trata a Filosofia do
Direito) As noções de segurança e justiça estão associadas à ideia de
Direito.
A segurança é sinónima de paz, protecção do indivíduo contra os demais.
O problema da segurança nas relações inter-individuais Prescrição
aquisitiva ou figura de usucapião uma pessoa acaba por adquirir a
propriedade de uma coisa, que possui durante um certo lapso de tempo
de boa fé, sem ser o proprietário.
Porquê? Porque seria contrário à segurança, despojar alguém que possui
durante um certo tempo um bem, de boa fé Prescrição extintiva ex: se
uma pessoa pode exigir o cumprimento de uma dívida, mas deixa passar
um determinado tempo sem o fazer, não pode depois de decorrido este
prazo, fazê-lo.
Princípio da segurança do tráfico neste caso protege-se os interesses de
quem adquire de boa fé, um bem dum falso titular.
a) Segurança do homem face ao Estado
Limitar o poder do Estado e controlar o seu exercício. O direito deve ser
conhecido por todos (PUBLICIDADE). A lei só se torna obrigatória de pois
de ser publicada;
Geralmente há um lapso de tempo entre a publicação e a entrada em
vigor da lei
(VACATIO LEGIS)
73
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

MONTESQUIEU dizia que as leis deviam ser Concisas, precisas e simples


Dizia: “é essencial que as palavras da lei despertem em todos os homens
as mesmas ideias.”
O princípio da não retroactividade, embora aceite pelos sistemas
jurídicos modernos, só tem dignidade constitucional em matéria penal, e
leis restritivas de direitos, liberdades e garantias.
A segurança jurídica implica que o Direito seja certo, que as normas
sejam conhecidas, compreendidas e fixem com razoável previsão o que
ordenam.
Mas a segurança não se opõe a que a Administração ou os Tribunais,
gozem de uma certa liberdade na aplicação das leis, que possuam uma
certa elasticidade para permitir atender às particularidades dos casos
concretos por elas regulados.
A segurança supõe algo mais que a certeza, supõe que um conjunto de
interesses do indivíduo estejam protegidos pelo Direito, para que haja
uma existência humana digna. Esses interesses andam à volta da noção
de liberdade e foram catalogados na famosa Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão em 1789.
Históricamente esta concepção de segurança jurídica esta ligada a duas
ideias fundamentais: a concepção liberal do Estado e a Doutrina do
Estado de Direito.
Estado liberal assenta na defesa da liberdade dos cidadãos e na
protecção das “regras do jogo”que os indivíduos têm de observar para
viver harmoniosamente em sociedade.
Estado de Direito parte da ideia fundamental, que o poder do Estado
está limitado pelos direitos naturais dos cidadãos, que são anteriores e
superiores ao Estado.
Estado Social de Direito O Estado Liberal no decurso deste século evoluiu
para um modelo de Estado, em que não só se protege as liberdades
individuais mas também as condições materiais da vida dos cidadãos.

74
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

A partir de 1980 há um ressurgimento das ideias liberais. (neo-


liberalismo)
A justiça
Justiça é sinónimo de legalidade, o Juiz tem de aplicar bem as leis e só as
leis igualdade o que é igual deve ser tratado como igual
proporcionalidade a sanção tem de ser proporcionada ao acto que a
determina)
A justiça não é um valor abstracto, mas sim a expressão da vontade e
do interesse geral
A sociedade será tanto mais justa quanto mais se realizarem os direitos e
as liberdades fundamentais de cada um; não só os direitos e liberdades
pessoais, mas também os de participação política e sindical, os
económicos, sociais e culturais.
Critérios para o conceito de justiça
• Igual tratamento para todos (pode por vezes ser injusto)
• A cada um segundo os seus méritos (conceito muito subjectivo que
tem em conta a intenção)
• A cada um segundo as suas obras (concepção mais objectiva que tem
em conta o resultado da acção)
• A cada um segundo as suas necessidades (caridade? Conceito
subjectivo, mas muito importante para assegurar a justiça social. Claro
que os neo-liberais não estão muito de acordo com este conceito de
Justiça).
• A cada um segundo a sua posição conceito de justiça característico de
Aristóteles e Platão, que tratava os indivíduos segundo o seu estrato
social, tais como os servos e os homens livres; outro exemplo é o caso
das forças armadas, em que um general não tem o mesmo tratamento
que uma praça rasa.
A cada um o que a lei lhe atribui
Em todos estes critérios, há algo de comum que é o conceito de
igualdade, quer dizer que todos os que praticam ilícitos iguais devem ter
75
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

sanções iguais, no caso de possuírem a mesma capacidade (loucos,


menores de idade, professores universitários, idosos, etc., têm
capacidades diversas)
As sentenças devem ser proporcionais ao acto cometido. Esta noção
variou com a história, noção de proporcionalidade.
pensamento jurídico actual

A investigação do pensamento jurídico actual analisa as dimensões e


relevos da ligação entre pensamento e concretização, ideia e realização
prática. Nesse passo, são reafirmadas as premissas lançadas no projecto
matriz e reafirmadas no sentido de desvendar a compreensão efectiva do
direito enquanto ordenamento para a vida social.

O interesse pela compreensão da argumentação jurídica permanece para


ser aprofundado no âmbito da comunicação linguística dos Tribunais,
visando agregar elemento fundamental para compreender a autonomia
do juízo jurídico.

Presentemente, indaga-se desta autonomia e respectiva ligação entre o


pensamento jurídico contemporâneo e sua aplicação na decisão do caso
concreto (problema). Importante salientar o próprio conceito de
aplicação do direito. Assim sendo, será percorrida, no âmbito da
interpretação dos Tribunais, a presença da chamada interpretação da
intenção prática e as respectivas ligações com os pressupostos
metodológicos dos princípios, dirigidos às consequências práticas. O
estudo visa constatar o quanto avançou a compreensão acerca da
interpretação do direito definido nas decisões jurídicas que não se
limitam a conhecer os princípios, e sim aplicá-los, concretamente, no
deslinde dos casos concretos. Aí então, o momento da chamada
dimensão humana do direito onde a presença dos valores são
indispensáveis como regramento de condutas.

76
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Na sequência, a prática dos valores-princípios deve ser apreciada em


nível do discurso jurídico, especialmente, dirigida à comunicação do
julgador do tribunal Superior. A teia investigativa alcança como se
comunicam, em nível jurídico, os julgadores no ambiente dos limites e
possibilidades da realização da justiça social.

A fase seguinte permanece atrelada ao carácter inovador do projecto


matriz. Assim, mantém a prioridade na busca da formulação dos
caminhos de interconexão, objectivando reunir a investigação
metodológica aos canais de decidibilidade, para daí concluir pela
adequação ou inadequação do emprego da razão prática no mérito das
decisões.

Exercicios

P/. Concepção do Direito natural reduz a validade à justiça: Agora numa


só frase diga quando é uma norma e valida?

R/. Uma norma é valida quando é justa.

P/. O direito deve ser conhecido por todos. Portanto, é um dos principios
do direito. Numa só frase diga como é que se chama tal princípio?

R/. Tal principio chama-se PUBLICIDADE

P/. Charles de Montesquieu, dizia que as leis para que sejam conhecidas,
há uma carácter que devem seguir: Em três palavras diga quais são?

R/. Concisas, precisas e simples

P/. O princípio da não retroactividade, embora aceite pelos sistemas


jurídicos modernos, só tem dignidade constitucional em certos campos
de direito. Refira-se a estes.

77
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

R/. Campo penal, e leis restritivas de direitos, liberdades e garantias.

P/. Históricamente a concepção de segurança jurídica está ligada a duas


ideias fundamentais: a concepção liberal do Estado e a Doutrina do
Estado de Direito. De rasgos exaustivos sobre a materia em causa.

P/. Estado liberal assenta na defesa da liberdade dos cidadãos e na


protecção das “regras do jogo” que os indivíduos têm de observar para
viver harmoniosamente em sociedade.

R/. Estado de Direito parte da ideia fundamental, que o poder do Estado


está limitado pelos direitos naturais dos cidadãos, que são anteriores e
superiores ao Estado. Estado Social de Direito. O Estado Liberal no
decurso deste século evoluiu para um modelo de Estado, em que não só
se protege as liberdades individuais mas também as condições materiais
da vida dos cidadãos.

P/. Quas são os critérios para o conceito de justiça? Explique pelo menos
dois.

R/. Igual tratamento para todos;

A cada um segundo os seus méritos (conceito muito subjectivo que tem


em conta a intenção);

A cada um segundo as suas obras;

A cada um segundo as suas necessidades

A cada um segundo a sua posição

78
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Tema 3: Breve evolução histórica do direito


Moçambicano
A história da humanidade ensina-nos que o Direito pode assumir várias
formas culturais. Quer o fenómeno da recepção do Direito romano na
Europa a partir do Século XII, quer o direito codificado dos Séculos XIX e
XX, são exemplos dessas formas. Os dois fenómenos são resultado de
uma longa evolução histórica, jurídica, política, económica e social. Ainda
é necessário ter presente que a própria técnica jurídica move-se sempre
num espaço habitado por conceito e teorias que exprimem valores
perseguem interesses irremediavelmente conexionados com os
fenómenos sociais e culturais.

Compreende-se assim a utilidade de uma aproximação histórica do facto


jurídico. Todavia, enquanto a doutrina nacional estudou vários aspectos
do direito positivo vigente com sucesso, não existe, até hoje, um trabalho
de investigação científica de natureza histórica sobre o direito
moçambicano.

Ora, a história do direito moçambicano começa a trinta e sete anos, a


contar a partir do período da proclamação da Independência, a 25 de
Junho de 1975. Pois foi nesse período quer Moçambique se tornou
sujeito de Direito Internacional Público com todos os requisitos
necessários de um Estado soberano (Território, Povo e Poder Político).

A publicação e a entrada em vigor da primeira Constituição que coincide


com a proclamação da Independência Nacional, aprovada pela VII Sessão
do Comité Central da FRELIMO, realizada a 25 de Junho de 1975, no Tofo,
Província de Inhambane que instituiu um Estado de democracia popular,
constituiu um marco não menos importante, dos primeiros passos do
direito moçambicano.

O direito moçambicano, embora tivesse a sua evolução a partir do


nascimento como Estado soberano, ele herdou do sistema colonial

79
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

português, sobretudo pelas características romanísticas das suas fontes.


Assim, no sentido técnico as fontes do Direito Moçambicano, são as
seguintes:

1. A Constituição que é a lei-mãe, norma jurídica directamente


imposta por órgão competente;
2. O Costume- tal como nos outros Países civilizados, norma que
resulta duma prática social constante, acompanhada da convicção
da sua obrigatoriedade.
3. A Jurisprudência- conjunto de orientações seguidas pelos
Tribunais (ou outros organismos) no julgamento dos casos
concretos da vida real
4. A Doutrina- actividade de estudo teórico do Direito (que formula
juízos sobre a adequada regulamentação das relações sociais).
5. Equidade- é processo da criação do Direito que consiste em
atribuir aos órgãos jurisdicionais competência para formular, em
presença dos casos concretos submetidos ao seu juízo uma regra
adequada às particularidades do caso e baseada nos princípios
gerais e na consciência do julgador.

O pluralismo jurídico em Moçambique caracteriza-se por uma grande


riqueza e complexidade. Ao longo do tempo, o Estado, sob diferentes
formas e face a diferentes pressões externas e internas, foi integrando ou
excluindo algumas das instâncias de resolução de conflitos que compõe o
quadro da pluralidade jurídica. As diferentes lógicas políticas e jurídicas
que fazem parte da história do país não foram sempre totalmente
substituídas, coexistindo, em grande medida, na sociedade de hoje.
Dividindo a história de Moçambique em três períodos – colonialismo,
socialismo e neoliberalismo/democracria - analiso a evolução da relação
entre as várias formas de Estado e os tribunais populares de base, as
autoridades tradicionais e os tribunais comunitários, centrando-me não

80
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

apenas nas configurações que o Estado pretendeu criar, mas também no


modo como aquelas instâncias foram resistindo às imposições exteriores.

O pluralismo jurídico tende a estar presente em todas as sociedades,


ainda que com especificidades a vários níveis. Em Moçambique, é
extremamente rico pela quantidade e diversidade de ordens normativas
e de instâncias de resolução de conflitos que actuam no terreno; pelas
complexas interligações que se estabelecem entre as mesmas; bem como
pelas várias estratégias que, ao longo da história, o Estado usou para
integrar ou excluir a pluralidade.

Neste texto, percorrendo um pouco da história de Moçambique, desde o


período colonial até ao presente, procuro mostrar como o Estado, em
diferentes momentos e sob diferentes pressões externas e internas, foi
integrando ou excluindo as instâncias de resolução de conflitos que
compõe o quadro da pluralidade jurídica, bem como a forma como estas
foram resistindo às imposições exteriores ou, em alguns momentos,
servindo-se do Estado para consolidar a sua legitimidade. Dada a
complexidade da pluralidade de instâncias de resolução de conflitos em
Moçambique, este é necessariamente um trabalho incompleto, que se
centrará essencialmente nas configurações e reconfigurações dos
tribunais populares de base, dos tribunais comunitários e das autoridades
tradicionais.

A discussão está dividida em duas partes. A primeira constituiu uma


introdução teórica, em que, muito brevemente, analiso o que se entende
por pluralismo jurídico e interlegalidade e abordo dois conceitos de
Boaventura de Sousa Santos – estado heterogéneo e palimpsesto político
e jurídico – que permitem perceber como as diferentes lógicas políticas e
jurídicas que fazem parte da história de Moçambique não foram sempre
totalmente substituídas, coexistindo, em grande medida, na sociedade de
hoje. Na segunda parte analiso a evolução da relação entre o Estado e as

81
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

instâncias acima mencionadas nos três períodos em que divido a história:


colonialismo, socialismo e neoliberalismo/democracia multipartidária.

Exercicios
P/. Enquanto a doutrina nacional estudou vários aspectos do direito
positivo vigente com sucesso, não existe, até hoje, um trabalho de
investigação científica de natureza histórica sobre o direito
moçambicano. Queira comentar?

R/. Isto porque a história do direito moçambicano começa a trinta e sete


anos, a contar a partir do período da proclamação da Independência, a 25
de Junho de 1975. Pois foi nesse período quer Moçambique se tornou
sujeito de Direito Internacional Público com todos os requisitos
necessários de um Estado soberano (Território, Povo e Poder Político).

Unidade Tematica 3.1: Do pluralismo jurídico à interlegalidade. O


palimpsesto político e jurídico Moçambicano
No primeiro período, o pluralismo jurídico era O reconhecimento
empírico do conceito de pluralismo jurídico remonta aos estudos
antropológicos sobre as sociedades coloniais no início do século XX, que
Merry definiu como o primeiro período de produção de estudos sobre o
pluralismo jurídico e apelidou de «pluralismo jurídico clássico». A este
somou-se um segundo, o «novo pluralismo jurídico», que aplica o
conceito na abordagem das sociedades industrializadas do Norte. A estes
dois períodos, Boaventura de Sousa Santos acrescentou um terceiro, cuja
análise inclui, para além das ordens locais e infra-estatais, as ordens
jurídicas transnacionais e supra-estatais. Estas três fases diferem não
apenas quanto aos espaços que estudam (designadamente, sociedades
colonizadas, sociedades nacionais e espaço mundial), mas na forma
crescentemente dinâmica com que o pluralismo jurídico passou a ser
concebido. entendido como a presença de ordens normativas paralelas,

82
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

isto é, de um lado existiam os direitos costumeiros dos povos indígenas;


do outro, o direito Europeu. No segundo período, a ideia de interligação
entre os direitos passa a integrar as abordagens dos cientistas sociais. Na
terceira fase, no contexto de combinação entre o pluralismo jurídico
nacional e o pluralismo jurídico supranacional, Santos reitera a ideia de
«porosidade das ordens jurídicas», afirmando que a maior densidade de
relações, propiciada pela globalização, torna as diferentes ordens
normativas mais abertas e permeáveis a influência mútuas. Vivemos,
segundo o autor, «num mundo de hibridações jurídicas, uma condição a
que não escapa o próprio direito nacional estatal». Esta hibridação
acontece também ao nível micro, na medida em que os cidadãos e os
grupos sociais organizam as suas experiências segundo o direito oficial
estatal, o direito consuetudinário, o direito comunitário, local, ou o
direito global, e, na maioria dos casos, segundo complexas combinações
entre estas diferentes ordens jurídicas. A esta fenomenologia jurídica que
Santos dá o nome de interlegalidade.

Boaventura de Sousa Santos distingue o pluralismo jurídico em sentido


amplo do pluralismo jurídico interno. O primeiro é o que acabei de
mencionar. O segundo diz respeito ao pluralismo interno ao Estado e
deriva da condição heterogénea do mesmo. O conceito de Estado
heterogéneo «requer a coexistência de diferentes lógicas de regulação
executadas por diferentes instituições do Estado com muito pouca
comunicação entre si». A heterogeneidade do Estado deriva em grande
medida da porosidade acima referida, que é tanto maior quanto mais
intensa é a globalização. O Estado é um espaço de cruzamento de
diferentes ordens normativas, com diferentes culturas e diferentes
lógicas, variáveis ao longo do tempo, que causam incongruências na sua
forma de actuação.

Entre o período colonial e o presente, o Estado Moçambicano passou por


uma série de modelos políticos, cujas rupturas não os apagaram de vez.

83
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Desde 1975 até hoje, foram várias as transformações radicais, como o fim
do modelo colonial; a construção do Estado socialista; e a criação de uma
economia neoliberal capitalista e de uma democracia multipartidária.
Três culturas político-jurídicas eurocêntricas (colonial,
socialista/revolucionária, capitalista/democrática) cruzam-se entre si e
com as tradicionais, mostrando que o binómio tradicional/moderno é
muito mais complexo do que à primeira vista se poderia pensar.
Moçambique é um Estado cuja condição de heterogeneidade é não só
acentuada, como complexa de analisar. Boaventura de Sousa Santos
serve-se de uma metáfora para caracterizar a sociedade moçambicana: o
palimpsesto de políticas e culturas jurídicas. Um palimpsesto é um
pergaminho ou outro material sobre o qual se escreve a segunda vez,
mas cuja primeira escrita não desaparece totalmente. Deste modo,
Santos pretende mostrar como as diferentes culturas políticas e jurídicas
que perpassaram o Estado Moçambicano ao longo da sua história ainda
hoje se cruzam na realidade política e judiciária moçambicana.

No próximo ponto analisarei a forma como essa rupturas foram


acontecendo e em que medida os tribunais populares de base, os
tribunais comunitários (TCs) e as autoridades tradicionais (ATs) se foram
reconfigurando no cruzamento das estratégias do Estado, de instâncias
internacionais e das próprias instâncias da comunidade, criando e
recriando um pluralismo jurídico bastante complexo.

Exercicios
P/. Boaventura de Sousa Santos distingue o pluralismo jurídico em dois
sentidos distintos. Qua?

R/. A pluralismo amplo e jurídico interno. O primeiro é o que acabei de


mencionar. O segundo diz respeito ao pluralismo interno ao Estado e
deriva da condição heterogénea do mesmo. O conceito de Estado
heterogéneo «requer a coexistência de diferentes lógicas de regulação

84
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

executadas por diferentes instituições do Estado com muito pouca


comunicação entre si». A heterogeneidade do Estado deriva em grande
medida da porosidade acima referida, que é tanto maior quanto mais
intensa é a globalização. O Estado é um espaço de cruzamento de
diferentes ordens normativas, com diferentes culturas e diferentes
lógicas, variáveis ao longo do tempo, que causam incongruências na sua
forma de actuação.

P/. No primeiro período, o pluralismo jurídico era o reconhecimento


empírico do conceito de pluralismo jurídico remonta aos estudos
antropológicos sobre as sociedades coloniais no início do século XX qual
foi o contributo de Merry em torno da matéria?

R/. O contributo da Merry consistiu em definir o primeiro período de


produção de estudos sobre o pluralismo jurídico e apelidou de
«pluralismo jurídico clássico». A este somou-se um segundo, o «novo
pluralismo jurídico», que aplica o conceito na abordagem das sociedades
industrializadas do Norte. A estes dois períodos, Boaventura de Sousa
Santos acrescentou um terceiro, cuja análise inclui, para além das ordens
locais e infra-estatais, as ordens jurídicas transnacionais e supra-estatais.
Estas três fases diferem não apenas quanto aos espaços que estudam
(designadamente, sociedades colonizadas, sociedades nacionais e espaço
mundial), mas na forma crescentemente dinâmica.

Unidade Tematica 3.3: A revolução socialista e a construção de uma justiça


popular
Depois de uma luta armada de cerca de dez anos, conduzida pela Frente
de Libertação Nacional (FRELIMO), uma união de vários grupos de
resistência ao colonialismo, Moçambique tornou-se independente em 25
de Junho de 1975. A FRELIMO, transformada em partido político,
governou em regime de partido único até 1994, data das primeiras
eleições democráticas. Como a afirmam Albie Sachs e Gita Welch, ao
contrário de outros estados africanos independentes que optaram pela

85
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

continuidade e pela menor ruptura possível, «a teoria era clara:


desmantelar completamente o aparato do Estado colonial e substitui-lo
por um novo, desenhado para servir os interesses das massas
populares». Ainda durante a guerra de libertação nacional, largas zonas
no norte de Moçambique dominadas pela FRELIMO, as designadas zonas
libertadas, tinham experimentado modelos de governo, que deveriam ser
expandidos para o restante país.

A expressão «escangalhamento do Estado», usada, por exemplo, no


Relatório do Comité Central ao 3.º Congresso da FRELIMO, dá conta da
ideia de destruição das estruturas do passado. Era necessário
desenvolver uma cultura nacional, construindo um país unido. No que diz
respeito ao crescimento económico, acreditava-se que, «apoiando-se nas
próprias forças e utilizando formas colectivas de produção, veriam a
curto prazo melhoradas as respectivas condições de vida». No âmbito da
justiça, se o sistema jurídico colonial era fascista, colonial e elitista; tinha
que ser transformado num sistema popular, moçambicano e
democrático. A concretização dessa tarefa passava pelo fim das
autoridades e da justiça tradicionais e pela implementação de uma
organização judiciária que se estendesse a todas as circunscrições
territoriais e promovesse a participação popular.

Nas zonas libertadas, tinha sido já experimentado um modelo de justiça


popular, que devia substituir o papel das autoridades tradicionais e do
direito costumeiro. Com base nessa experiência, em 1978, foi aprovada a
Lei Orgânica dos Tribunais Populares, que previa a criação de tribunais
populares em diferentes escalões territoriais. O Tribunal Popular
Supremo ocupava o topo da hierarquia e era seguido pelos tribunais
populares provinciais, pelos tribunais populares distritais e, finalmente,
pelos tribunais populares de bairro ou localidade. Em todos os escalões
participavam, no exercício da actividade judicial, juízes eleitos, isto é,
juízes desprofissionalizados, eleitos pelas assembleias populares para

86
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

exercerem funções judiciais. Estes exerciam funções verdadeiramente


jurisdicionais, intervindo, nos casos penais, sobre matéria de facto e de
direito. Na base da pirâmide, os tribunais populares de localidade e de
bairro funcionavam exclusivamente com juízes eleitos, que conheciam
das infracções de pequena gravidade e decidiam «de acordo com o bom
senso e a justiça e tendo em conta os princípios que presidem à
construção da sociedade socialista», sempre que não fosse possível a
reconciliação das partes. A ideia, afirmam Sachs e Welch, era construir
um sistema que, em vez de pressupor um dualismo entre um direito
estatal para a elite e outros direitos para a população, assentasse no
princípio de um sistema de direito único para toda a sociedade, do norte
ao sul, «do Rovuma ao Maputo». Os autores definem o sistema como
sendo simultaneamente indígena e anti-tradicional, baseado em aspectos
democráticos da tradição africana, mas transformando-os e rejeitando os
divisionismos. Citam, como esclarecedora, a frase de Samora Machel:
«para a nação nascer, a tribo deve morrer».

O papel dos juízes eleitos era fundamental na organização judiciária.


Esperava-se que conhecessem os problemas da comunidade e as
pessoas. Os tribunais distritais e superiores aplicavam em larga medida o
direito português, cabendo aos juízes leigos garantir que o sentido de
justiça popular era reflectido na prática dos tribunais. Em casos de
família, tornou-se prática comum, as partes colocarem o problema aos
juízes eleitos, antes de o apresentarem formalmente no tribunal. Com
frequência, os casos eram assim resolvidos por reconciliação, evitando o
formalismo e a morosidade do tribunal. Aos tribunais populares de base
cabia um papel determinante na promoção do acesso à justiça, na
medida em que constituíam a instância judiciária mais próxima dos
cidadãos. Os procedimentos formalistas eram reduzidos ao mínimo. A
participação da população, ainda que relevante em todos os níveis da
hierarquia do judiciário, era aqui ainda mais importante. As pessoas que

87
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

conheciam o caso deviam ajudar a esclarecer os factos e a encontrar uma


solução justa. Se, por um lado, não existiam advogados profissionais, por
outro, esse papel não deixava de existir, cabendo à população.

O governo moçambicano pretendia, assim, pôr fim à utilização do direito


costumeiro, opressivo e associado ao colonialismo e, em simultâneo,
garantir instâncias sensíveis aos cidadãos e às suas noções de justiça. A
ideia de uma justiça de reconciliação e a forma de resolução na base «do
bom senso e da justiça» garantia o último objectivo. Ao mesmo tempo,
abria espaço à subsistência do direito costumeiro, que se interligava
agora com os princípios do novo Estado. Ainda que a Constituição
devesse enquadrar a resolução de litígios, nem sempre o direito do
Estado prevalecia. Subsistiam, por exemplo, situações de discriminação
contra as mulheres, ainda que a Constituição previsse a igualdade de
género e a emancipação feminina. Isto não equivale a afirmar que a
justiça popular tenha sido sempre mal sucedida na transformação do
direito costumeiro, mas sim a existência de espaços de interlegalidade.

Por vezes, o termo justiça informal foi usado para designar a justiça
popular. A designação de justiça informal é, contudo, inconsistente com a
realidade da justiça popular moçambicana. Como nota Aase Gundersen, o
que muitas vezes foi designado por «informal» foram sistemas de justiça
com procedimentos diferentes dos tribunais formais de estilo ocidental.
Ainda que os tribunais populares usassem procedimentos informais,
faziam parte do sistema formal de justiça, divergindo das instâncias
informais da comunidade, como a família e as igrejas. Assim, os tribunais
populares estão na fronteira entre o formal e o informal.

Os tribunais populares de base deveriam substituir as autoridades


tradicionais ao nível das funções judiciais. Contudo, a estas cabiam,
ainda, funções administrativas, que, na estrutura estabelecida pelo
Estado moçambicano, passariam a ser desempenhadas pelos Grupos

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Dinamizadores (GDs). Logo no período de transição para a


independência, que duraria entre 20 de Setembro de 1974 e 24 de Junho
de 1975, a FRELIMO enfrentava os problemas da falta de experiência
organizativa em centros urbanos, bem como da não compreensão dos
objectivos do movimento por parte de operários e camponeses fora das
zonas libertadas. Foram assim formalizados os GDs, comités compostos
por oito a doze pessoas, que passaram a desempenhar um conjunto de
tarefas. Para além de funções como a mobilização das populações para a
participação político-partidária, a segurança nacional, a organização de
processos de produção colectiva e a execução de programas de
educação, foram-lhes atribuídas inicialmente funções na área da justiça.
Cabia-lhes difundir e explicar os novos valores e as novas normas
comportamentais e dirimir pequenos conflitos. Ainda que, logo após o III
Congresso da FRELIMO em 1977, e a criação dos tribunais populares em
1978, as suas tarefas tenham sido reestruturadas e lhes tenha sido
retirado o papel de resolução de conflitos, fazia parte das suas funções
«promover as relações de boa vizinhança entre os moradores, e procurar
a solução de pequenos conflitos, desde que estes não sejam da
competência do tribunal popular local». Assim, no que diz respeito à
justiça, o papel dos GDs e dos tribunais populares de base tende, por
vezes, a confundir-se, o que permanecerá uma constante, mesmo
quando, nos anos 1990’, estes são substituídos pelos tribunais
comunitários.

Apesar do esforço para lhes pôr fim, autoridades tradicionais não


desapareceram, podendo falar-se de situações de continuidade nas
estruturas do poder rural entre o período colonial tardio e o pós-
independência. Alice Dinerman mostra que a criação de instituições
sancionadas pela FRELIMO, nem sempre significou a passagem de poder
para fora das autoridades tradicionais. Em alguns casos, os funcionários
do governo local mantiveram a aliança com as autoridades que haviam

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

servido a administração colonial «em nome da ordem social, do bem-


estar, do desenvolvimento rural ou de uma combinação destes três
factores», noutros as autoridades tradicionais desenvolveram estratégias
de manutenção do controlo. A autora analisa mais pormenorizadamente
o caso de Namapa, distrito de Erati, província de Nampula,
argumentando que «os antigos régulos tiveram oportunidade de
continuar a reinar por outros meios». Em Namapa, a FRELIMO manteve a
divisão administrativa herdada, mudando apenas o nome de regedoria
para círculos. Além disso, a nova administração estatal trabalhou com as
antigas estruturas para configurar as novas. Durante vários anos, em todo
o distrito, os chefes arranjavam estratégias para colocar no poder
familiares seus, de modo a conseguirem manter o controlo. Mesmo
quando eram colocadas no poder outras pessoas, nem sempre se
viravam contra o régulo. O próprio Estado veio a sentir necessidade de se
apoiar fortemente nos régulos, assumindo e reforçando a sua
importância nas hierarquias locais. Na segunda metade da década de
1980’, face à crise económica que o país enfrentava, na província de
Nampula, os régulos foram chamados a desempenhar o papel de «chefes
de produção», voltando a actuar como controladores da economia
camponesa, à imagem do que era o seu papel no período colonial.

A economia neoliberal e a democracia. O fim dos tribunais populares, a


criação dos tribunais comunitários e o novo papel das Autoridades
Tradicionais

Ainda na década de 1980’, a FRELIMO vê-se obrigada a reconhecer o


fracasso do seu desempenho em termos económicos. Se os efeitos da
guerra não podiam ser subestimados, era impossível continuar a
acreditar na estratégia económica socialista nos moldes que até então
vinha sendo conduzida. A tendência foi, então, aderir à ideologia que
viria a tornar-se dominante em termos globais: o neoliberalismo. Em
1984, o governo aderiu às Instituições de Breton Woods, nomeadamente

90
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

ao Banco Mundial e ao Fundo Monetário Internacional. Ao novo modelo


económico impunha-se um modelo político assente na democracia
representativa multipartidária. Em 1990 foi aprovada uma nova
Constituição, que visava adequar o quadro legal ao novo contexto
económico e político, reconhecendo o fim da República Popular e a
substituição do sistema de economia centralmente planificada pela
economia de mercado. Em 1994, decorreram as primeiras eleições
multipartidárias. É, pois, neste contexto que os papéis atribuídos aos
tribunais populares, nomeadamente aos de base, e às autoridades
tradicionais têm vindo a ser reconfigurados.

A Constituição de 1990 consagra os princípios da separação de poderes,


da independência, da imparcialidade, da irresponsabilidade e da
legalidade, lançando bases para a produção de alterações substanciais na
organização judiciária. Assim, com a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais,
os juízes eleitos passam a intervir apenas nos julgamentos em primeira
instância e sobre matéria de facto (art. 10.º). Seguindo uma interpretação
restritiva da norma constitucional, segundo a qual «os tribunais decidem
pleitos de acordo com a lei», os tribunais de base foram excluídos da
organização judiciária, passando os tribunais distritais a funcionar como
primeira instância. Ainda no mesmo ano foram criados, por lei própria, os
tribunais comunitários.

No preâmbulo da lei dos tribunais comunitários pode ler-se que «as


experiências recolhidas por uma justiça de tipo comunitário no país
apontam para a necessidade da sua valorização e aprofundamento,
tendo em conta a diversidade étnica e cultural da sociedade
moçambicana». Assim, considerou-se necessária «a criação de órgãos
que permitam aos cidadãos resolver pequenos diferendos no seio da
comunidade, contribuam para a harmonização das diversas práticas e
para o enriquecimento das regras, usos e costumes e conduzam à
síntese criadora do direito moçambicano». A lei prevê que os TCs

91
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

deliberem sobre pequenos conflitos de natureza civil, conflitos que


resultem de uniões constituídas segundo os usos e costumes e delitos
de pequena gravidade, que não sejam passíveis de penas de prisão e
se ajustem a medidas definidas na lei (art. 3.º). Prevê, ainda, que os
tribunais procurem, em primeiro lugar, a reconciliação das partes e,
em caso de insucesso, julguem de acordo com «a equidade, o bom
senso e a justiça» (art. 2.º). A regulamentação destes tribunais está
por fazer até hoje. Se Gundersen colocava os tribunais populares de
base na fronteira entre o formal e o informal, Boaventura de Sousa
Santos classifica os tribunais comunitários como o híbrido jurídico por
excelência, por se encontrar num limbo institucional, na medida em
que são reconhecidos por lei, mas estão fora do sistema judicial e não
estão regulamentados.

No que diz respeito às autoridades tradicionais, foi anunciado no


ponto anterior que opção política de as abolir veio a constituir um
problema para o governo, que para além de não dispor de recursos
para criar, de raiz, novas estruturas político-administrativas, quando
as constituía, estas não eram automaticamente aceites pela
população. A verdade, como foi referido, é que as ATs mantiveram,
em grande medida, a sua legitimidade, trabalhando muitas vezes em
conjunto com os tribunais populares e até com os grupos
dinamizadores e encontrando na oposição da RENAMO uma
alternativa à recuperação do seu prestígio. O novo quadro
democrático e multipartidário abria agora espaço à descentralização
do Estado, sendo no âmbito desse processo pouco pacífico, de
avanços e recuos, que se rediscute o papel a atribuir às ATs.

A nível nacional, a urgência desta discussão passou não só pela


necessidade de reconhecimento de práticas locais que nunca
deixaram de existir, mas também, pela preocupação do partido
FRELIMO, num contexto de aproximação de eleições multipartidárias,

92
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

com a importância das autoridades tradicionais no controlo social e


político das populações. Assim, nos primeiros anos da década de
1990’, o Núcleo de Desenvolvimento Administrativo (NDA) do
Ministério da Administração Estatal deu inicio à elaboração de um
conjunto de estudos sobre o papel que efectivamente as autoridades
tradicionais desempenhavam no país e reconheceu que «dentro das
diferenças que existem de região para região, a autoridade tradicional
está presente e é importante em todo o território nacional».

A institucionalização e o reconhecimento formal das autoridades


tradicionais ocorreram com a Lei 3/94, de 13 de Setembro, o primeiro
diploma legal em matéria de descentralização, que atribuía um papel
às autoridades tradicionais no processo de consulta e tomada de
decisões locais e no arbítrio de conflitos e questões relacionadas com
o uso da terra. No entanto, nas primeiras eleições multipartidárias
ocorridas no mês de Outubro de 1994, ainda que se tenham reunido
as condições de pacificação e democratização necessárias para
proceder ao processo de descentralização do país, os bons resultados
obtidos pela RENAMO fizeram a FRELIMO sentir-se ameaçada no que
toca à sua hegemonia ao nível local. Esta situação, associada a
divergências entre a FRELIMO e a RENAMO sobre o teor da legislação,
acabou por conduzir à substituição da Lei 3/94, pela Lei n.º 2/97, de
18 de Fevereiro, que limita a participação das autoridades tradicionais
e a sujeita a regulamentação ministerial. O debate das ATs foi
reintroduzido com a discussão em torno da Lei de Terras, onde surgiu
a expressão «líderes locais» e se lhes atribuiu um papel de
intervenção na gestão dos recursos naturais, na resolução de
conflitos, no processo de titulação e na identificação das terras
ocupadas e a ocupar.

Os condicionantes internacionais mostravam-se favoráveis ao


fortalecimento das autoridades tradicionais, bem como dos tribunais

93
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

comunitários. As receitas dos Planos de Reestruturação Económica,


aplicadas em vários países «em desenvolvimento» vieram a ser
reconsideradas na década de 1990’. Ainda que os programas de
ajustamento estrutural tenham levado a uma certa estabilização
económica, não promoveram crescimento, tiveram um impacto social
negativo e, consequentemente, um impacto político ao afectar a
legitimidade dos governos africanos. Assim, o Banco Mundial foi
obrigado a reformular a filosofia dos seus programas, incorporando
uma dimensão social na sua intervenção, articulando os Programas de
Ajustamento Estrutural com o objectivo do combate à pobreza e
colocando a ênfase na democracia e na boa governação. É neste
contexto que surge o interesse pela descentralização, que aos olhos
do Banco Mundial possibilita uma maior eficiência da distribuição de
recursos ao nível local. O relatório de 1997 do Banco Mundial (1997
World Development Report. The state in a changing world) constituiu
um marco fundamental na mudança de política, ao aceitar que o
Estado é central para o desenvolvimento económico, social e
sustentável. A revigoração da capacidade institucional é tida como
fundamental e um dos meios da sua realização é a aproximação do
Estado aos cidadãos por via de uma maior participação e da
descentralização.

O Poverty Reduction Strategic Paper (PRSP), cuja subscrição, nos anos


1990’, constituiu, para um alargado conjunto de países, condição
fundamental para manter o financiamento do Banco Mundial e do
FMI, enfatiza a necessidade dos países da África Austral procederem a
um processo de descentralização por meio da gestão comunitária dos
recursos humanos, do reforço institucional dos governos locais e do
reconhecimento das autoridades tradicionais. A versão Moçambicana
desse documento é o Plano de Acção para a Redução da Pobreza
Absoluta, 2001-2005 (PARPA). As políticas que define para promover

94
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

a «boa governação» incluem, entre outras, a descentralização e a


devolução da administração pública a níveis próximos da população,
bem como o reforço da capacidade e eficiência do sistema legal e
judicial. No que diz respeito à justiça, o documento defende, ainda,
entre outras ideias, a consolidação e expansão dos Tribunais
Comunitários.

É neste quadro nacional e internacional que se assiste a alguns


desenvolvimentos no âmbito do reconhecimento das autoridades
tradicionais e se começa a trabalhar na regulamentação dos tribunais
comunitários. Assim, em 2000 foi aprovado o Decreto 15/2000 que
estabelece as formas de articulação dos órgãos locais do Estado com
as autoridades comunitárias. Não é, contudo, atribuído qualquer
papel de primazia às autoridades tradicionais, uma vez que a lei
define que «para os efeitos do presente decreto são autoridades
comunitárias os chefes tradicionais, os secretários de bairro ou de
aldeia e outros líderes legitimados como tais pelas respectivas
comunidades locais» (art. 1.º). Esta tendência para diluir as
autoridades tradicionais entre as outras vem-se manifestando desde
a promulgação da Lei de Terras. Se a Lei 3/94 definia autoridade
tradicional como «autoridades reconhecidas como tais pelas
comunidades» (Lei 3/94), a Lei de Terras já menciona «líderes locais»,
definindo-os como «aqueles que são respeitados por todos» (Lei de
Terras). Estas formulações indiciam a existência de algo mais do que a
incapacidade do governo em determinar com rigor o conteúdo desse
conceito. Existem intenções não assumidas, que passarão por
«manter uma abertura ao preenchimento do conceito com recurso a
figuras que, à partida, não caberiam numa definição restrita de
autoridade tradicional, como é o caso dos secretários de bairro e
chefes de quarteirão», bem como pela tentativa de «capitalizar as
virtualidades administrativas das autoridades tradicionais e, ao

95
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

mesmo tempo controlar a ‘força centrífuga’ que se reconhece nelas».


Como nota Santos, o n.º 2 do artigo 3.º do decreto 15/2000 sublinha
bem o carácter instrumental do reconhecimento das autoridades
tradicionais, ao afirmar que a articulação entre estas e os órgãos
locais decorre das «necessidades de serviço». O mesmo autor, não
deixa de mencionar que «simetricamente, as autoridades tradicionais
pretendem instrumentalizar o apoio do Estado para consolidar o seu
próprio controlo político sobre as comunidades».

O Plano Estratégico Integrado do Sector da Justiça para os anos 2002


– 2006, estabelece como prioritária a revisão da organização
judiciária, a revisão e regulamentação da lei dos tribunais
comunitários e a institucionalização de um novo sistema de acesso à
justiça e ao direito. Foi nesse sentido que a Unidade Técnica de
Reforma Legal (UTREL) solicitou, em 2003, ao Centro de Formação
Jurídica e Judiciária (CFJJ) a revisão da seguinte legislação: Lei
Orgânica dos Tribunais Judiciais; Lei dos Tribunais Comunitários; Lei
que criou o Instituto do Patrocínio e Assistência Jurídica e Decreto
que aprovou o respectivo Estatuto Orgânico.

A revisão Constitucional de 2004 constituiu um incentivo a propostas


mais ousadas no âmbito do reconhecimento das várias ordens
normativas e das várias instâncias de resolução de conflitos, ao
integrar um artigo sobre pluralismo jurídico, estabelecendo que «o
Estado reconhece os vários sistemas normativos e de resolução de
conflitos que coexistem na sociedade, na medida em que não
contrariem os valores e os princípios fundamentais da Constituição»
(art. 4.º). Do pacote de propostas legislativas entregues pelo CFJJ à
UTREL, destaco duas inovações que se prendem com o efectivo
reconhecimento da pluralidade jurídica: as instâncias comunitárias de
resolução de conflitos não reguladas pela lei são permitidas se aceites
pelas partes, salvo se violarem a Constituição; a base da pirâmide

96
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

judiciária é reforçada através da integração dos tribunais


comunitários no sistema de administração da justiça e do
alargamento das suas competências.

Estas propostas foram elaboradas por uma equipa independente,


constituída por investigadores do Centro de Formação Jurídica e
Judiciária e do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra,
não sendo possível prever se virá a ser aprovada ou em que moldes.
Ainda que os discursos venham a reconhecer a importância dos
tribunais comunitários na promoção do acesso à justiça, na prática
estes continuam sem apoios, sem regulamentação, jogados à sua
sorte e à sua capacidade de criação e recriação para contrariar as
dificuldades; constituindo, por vezes, um meio de acesso à justiça;
outras, atropelando os direitos mais básicos.

São três os principais momentos em que dividi a história de


Moçambique: o regime moçambicano do indigenato e a justiça
dualista; a revolução socialista e a construção da justiça popular; a
construção da economia neoliberal e da democracia multipartidária.
Como mostra Boaventura de Sousa Santos com a metáfora do
palimpsesto de culturas jurídicas e políticas, a história moçambicana é
feita de rupturas e continuidades, cujos efeitos foram tomando
diferentes formas ao nível local, onde as estratégias do Estado,
presentes e passadas, se interligam com as dinâmicas das próprias
comunidades ou do espaço global. Foi assim que, por exemplo, as
autoridades tradicionais resistiram, apesar da tentativa de lhes pôr
fim nos anos 1980’ ou os tribunais populares de base tendiam a
articular o direito revolucionário com o direito tradicional da
comunidade.

Hoje, o peso das autoridades tradicionais, dos tribunais comunitários,


bem como das restantes instâncias de resolução de conflitos,

97
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

previstas ou não na lei, varia consideravelmente ao nível local,


conforme se fazem sentir os diferentes momentos da história do
Estado. Assim, para avaliar o significado do pluralismo jurídico, é
importante proceder à elaboração de estudos contextualizados em
que se procure conhecer as diferentes configurações de instâncias de
resolução de conflitos, onde se cruzam vários direitos em
permanente conflito e mutação. Implica, assim, associar o conceito de
pluralismo jurídico aos de interlegalidade e de Estado heterogéneo,
isto é à ideia do cruzamento dos vários direitos e lógicas locais,
nacionais e globais, assumindo que a realidade é dinâmica e que não
pode ser prevista a partir as definições do Estado no momento
presente.

O amplo trabalho de investigação desenvolvido pelo Centro de


Formação Jurídica e Judiciária e pelo Centro de Estudos Sociais da
Universidade de Coimbra, que serviu de base à preparação do pacote
legislativo acima mencionado, e no qual colaborei como membro da
equipa de investigação, dá conta de alguma da diversidade local que
dá forma à metáfora acima mencionada. Por exemplo, num dos
bairros da cidade de Maputo estudados, Inhagoia «B», as principais
instâncias de resolução de conflitos são o grupo dinamizador e o
tribunal comunitário. Noutro bairro de Maputo, Jorge Dimitrov, não
existe tribunal comunitário em funcionamento, sendo a principal
instância de resolução de conflitos um Gabinete de Atendimento da
ONG Mulher Lei e Desenvolvimento (MULEIDE), que reúne na sede do
Grupo Dinamizador e é constituído por um grupo de moradores do
bairro, alguns deles ex-juizes do antigo tribunal comunitário. Em
Macossa, um distrito do interior, situado na região norte da Província
de Manica, os grupos dinamizadores não estão implementados e as
autoridades tradicionais mantêm um peso bastante forte, auferindo
de uma legitimidade acentuada. A rede dos tribunais populares não

98
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

se estendeu ao distrito e a recente tentativa por parte do Estado de


criar tribunais comunitários passou pelo aproveitamento da
legitimidade das ATs, criando-os a partir da estrutura tradicional.
Ainda assim, a maioria da população desconhece a existência de
tribunais comunitários, continuando a reconhecer os juízes como
autoridades tradicionais. Em todos estes locais, as instâncias com
maior peso funcionam no interior de redes de resolução de conflitos,
através das quais os cidadãos circulam na busca de resolução para os
seus conflitos, que integram um conjunto alargado de estruturas para
além das mencionadas, como a família, os líderes religiosos ou outros
líderes locais, a Associação de Médicos Tradicionais, entre outras.

Exercicios
P/. Discurse-se sobre a nota introdutoria da Constituição de 1990.

R/. A Constituição de 1990 consagra os princípios da separação de


poderes, da independência, da imparcialidade, da irresponsabilidade e da
legalidade, lançando bases para a produção de alterações substanciais na
organização judiciária. Assim, com a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais,
os juízes eleitos passam a intervir apenas nos julgamentos em primeira
instância e sobre matéria de facto (art. 10.º). Seguindo uma interpretação
restritiva da norma constitucional, segundo a qual «os tribunais decidem
pleitos de acordo com a lei», os tribunais de base foram excluídos da
organização judiciária, passando os tribunais distritais a funcionar como
primeira instância. Ainda no mesmo ano foram criados, por lei própria, os
tribunais comunitários.

P/Que estrategia podemos tomar para avaliar o significado do pluralismo


jurídico?

99
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

R/ Para avaliar o significado do pluralismo jurídico, é importante proceder


à elaboração de estudos contextualizados em que se procure conhecer as
diferentes configurações de instâncias de resolução de conflitos, onde se
cruzam vários direitos em permanente conflito e mutação.

P/. Nas zonas libertadas, tinha sido já experimentado um modelo de


justiça popular. Commente.

R/. Obviamente que sim, este modelo veio a substituir o papel das
autoridades tradicionais e do direito costumeiro. Com base nessa
experiência, em 1978, foi aprovada a Lei Orgânica dos Tribunais
Populares, que previa a criação de tribunais populares em diferentes
escalões territoriais. O Tribunal Popular Supremo ocupava o topo da
hierarquia e era seguido pelos tribunais populares provinciais, pelos
tribunais populares distritais e, finalmente, pelos tribunais populares de
bairro ou localidade. Em todos os escalões participavam, no exercício da
actividade judicial, juízes eleitos, isto é, juízes desprofissionalizados,
eleitos pelas assembleias populares para exercerem funções judiciais.
Estes exerciam funções verdadeiramente jurisdicionais, intervindo, nos
casos penais, sobre matéria de facto e de direito. Na base da pirâmide, os
tribunais populares de localidade e de bairro funcionavam
exclusivamente com juízes eleitos, que conheciam das infracções de
pequena gravidade e decidiam «de acordo com o bom senso e a justiça e
tendo em conta os princípios que presidem à construção da sociedade
socialista», sempre que não fosse possível a reconciliação das partes.

P/ Concorda com a afirmacao do os tribunais populares estão na fronteira


entre o formal e o informal?

R/ A designação de justiça informal é, contudo, inconsistente com a


realidade da justiça popular moçambicana. o que muitas vezes foi
designado por «informal» foram sistemas de justiça com procedimentos
diferentes dos tribunais formais de estilo ocidental. Ainda que os

100
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

tribunais populares usassem procedimentos informais, faziam parte do


sistema formal de justiça, divergindo das instâncias informais da
comunidade, como a família e as igrejas.

Tema 4:Escola histórica do direito


Unidade Tematica 4.1: Friedrich karl von savigny e a escola histórica do
direito
O historicismo marca o pensamento alemão durante o fim do século XVIII
e início do século XIX, configurando, no campo filosófico-jurídico, a
denominada escola histórica do Direito, representada magistralmente por
Savigny. O contexto em que ocorre seu advento é caracterizado pela
grande simpatia com que contava o romantismo na época, inspirando a
valorização da tradição, do sentimento e da sensibilidade, em lugar da
razão, que não é capaz de tudo gerar. Valoriza, pois, as manifestações
espontâneas, devido à individualidade e variedade do próprio homem,
demonstrando ao mesmo tempo um enorme amor ao passado, que não
apenas explica o presente, mas também gera motivações para o futuro.
Dessa forma, a história possuiria um sentido irracional, de modo que não
é possível compartilhar do optimismo iluminista, que vê na razão uma
força propulsora e transformadora do mundo, capaz de sanar todos os
males da humanidade. O Direito aqui é visto não como mero produto
racional, mas antes um produto histórico e espontâneo peculiar a cada
povo.

A escola histórica do Direito é, portanto, eminentemente anti-


racionalista, opondo-se à filosofia iluminista através de uma
dessacralização do direito natural, substituindo o abstracto e o universal
pelo particular e pelo concreto. Ao criticar radicalmente o jusnaturalismo,
a escola histórica abre caminho para o desenvolvimento do positivismo
jurídico na Alemanha. Todavia, é bom lembrar tais movimentos não são

101
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

idênticos, de forma que não é possível considerar Savigny propriamente


como um positivista, afirmativa esta que é confirmada pela posição deste
autor frente à polémica da codificação.

O movimento pela codificação, de inspiração abertamente iluminista,


marca o período de transição para o século XIX, propugnando a
positivação do direito natural através de um código posto pelo Estado,
representante de um direito universal. Rejeita, assim, o direito
consuetudinário, por ter como base o irracionalismo da tradição,
contrário aos princípios da civilização. Sustentado em um racionalismo
extremado, este pensamento foi plenamente recepcionado pela escola
da exegese francesa, e cristalizou-se através do Código napoleónico, cuja
influência se fará presente em praticamente todos os movimentos
codificadores dos demais Estados ocidentais.

A Alemanha foi um dos países europeus que mais tardiamente formulou


um Código Civil, em razão não apenas do ambiente cultural existente,
mas também devido à sua fragmentação territorial. Sua situação político-
social era obviamente bem diversa da francesa, de modo que a defesa de
princípios como o da igualdade formal entre todos os cidadãos, era uma
postura bastante inovadora para uma sociedade que ainda manifestava
características feudalistas, como a distinção da população entre nobreza,
burguesia e campesinato. Destarte, a proposta de se criar um direito
único, inspirado nos moldes do Código de Napoleão, irá gerar inúmeras
controvérsias entre os alemães, como se pode ver através do debate
entre Thibaut e Savigny.

Thibaut será um defensor da codificação, alegando que a positivação


permitiria superar a confusão de conceitos e as obscuridades presentes
no direito alemão. Ademais, tal ordenação sistemática configuraria
inclusive um passo decisivo para a futura unificação da Alemanha, de
forma que suas vantagens seriam não apenas jurídicas, mas também

102
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

políticas. É bem verdade que Savigny irá compartilhar com os defensores


da codificação a exigência de formular-se um direito mais sistemático
para por ordem a este caos jurídico. Todavia, Savigny afirma que as
condições político-culturais da Alemanha não são propícias ao
desenvolvimento de uma codificação, de modo que a melhor solução
para sanar tais defeitos estaria na própria ciência do Direito.

Portanto, a ciência do Direito não apenas produz os mesmos efeitos de


unidade e sistematização que a codificação, mas ainda tem vantagem
sobre esta na medida em que não petrifica o Direito através da uma
rigidez cega, tornando-o mais maleável e adaptável. O Direito para
Savigny tem suas bases no costume, devendo, pois, exprimir o
sentimento e o espírito do povo. Não pode, pois, ser universal e
imutável, tampouco criado arbitrariamente pelo legislador. Doravante,
o papel sistematizador que a codificação exerce em outros países, na
Alemanha, principalmente na primeira metade do século XIX, esta
função organizativa será incumbência da ciência do Direito,
principalmente por meio da actividade dos pandectistas, que
intentaram sistematizar cientificamente o direito comum então vigente
naquele país.

Como podemos perceber, a noção de sistema é essencial para Savigny,


principalmente no que diz respeito à interpretação das leis. Todavia, cabe
ressaltar que existem dois momentos no pensamento deste autor: o de
sua juventude, até aproximadamente 1814, e o de sua maturidade, após
esta data, quando o elemento sistemático torna-se objecto de maior
atenção.

Em seus primeiros trabalhos, Savigny tomava como objecto da


interpretação tão-somente a reconstrução do pensamento expresso na
lei, passível de ser extraído apenas a partir da própria norma,
demonstrando certo teor positivista-legalista em suas concepções.

103
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Rejeita, pois, qualquer interpretação que amplie (extensiva) ou limite


(restritiva) o sentido da letra da lei, assim como nega a possibilidade de
uma interpretação teleológica, uma vez que o dever do juiz se resume a
executar a lei, e não aperfeiçoá-la de modo criador, tarefa esta que cabe
tão-somente ao legislador. Todavia, em sua maturidade, Savigny irá rever
algumas de suas concepções, passando a admitir – ainda que muito
limitadamente – o uso de uma interpretação extensiva ou restritiva, com
o objectivo de rectificar uma expressão defeituosa do texto. Aqui o
Direito não é mais visto como um mero somatório de normas
rigidamente delimitadas por sua literalidade, mas enquanto um conjunto
de institutos jurídicos presentes no espírito do povo, cuja apreensão
pressupõe uma intuição do jurídico, e não um mero racionalismo
dedutivo.

Consequentemente, ao interpretar uma lei, o juiz deve se colocar em


espírito na posição do legislador, e repetir em si a actividade daquele que
elaborou a norma, para que assim esta surja de novo em seu
pensamento, tarefa esta que não consiste na mera constatação de um
fato empírico dado pela vontade psicológica do legislador histórico, mas
que representa uma actividade espiritual própria, que pode inclusive
levar o intérprete para além do que o legislador histórico tenha
concretamente pensado. Para tal, o juiz deve recorrer aos elementos
gramatical, lógico, histórico e sistemático da interpretação que, segundo
Savigny, não configuram quatro modos de interpretação distintos, mas
fazem parte de um mesmo método: Elemento gramatical, Elemento
lógico, Elemento histórico, Elemento sistemático.

Embora Savigny defendesse a existência de um Direito espontâneo, é


interessante notar que, no que tange à influência exercida pelo autor no
pensamento jurídico alemão subsequente, o factor sistemático e
cientificista de sua teoria termina por prevalecer sobre o factor
historicista, permitindo com isso o desenvolvimento do formalismo

104
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

jurídico na Alemanha através da jurisprudência dos conceitos, tão bem


representada por Friedrich Georg Puchta – antigo discípulo de Savigny –
e por Rudolf von Jhering em sua primeira fase.

Exercicios
P/. A noção de sistema é essencial para Savigny, principalmente no que
diz respeito à interpretação das leis. Todavia, cabe ressaltar que existem
dois momentos no pensamento deste autor: Explique-se.

R/. Os momentos em referência são o de sua juventude, até


aproximadamente 1814, e o de sua maturidade, após esta data, quando o
elemento sistemático torna-se objecto de maior atenção.

P/. Ao interpretar uma lei, o autor em causa reserva um determinado


lugar ao juiz onde deve se colocar. Queira?

R/. Ao interpretar uma lei, o autor diz que o juiz deve se colocar em
espírito na posição do legislador, e repetir em si a actividade daquele que
elaborou a norma, para que assim esta surja de novo em seu
pensamento, tarefa esta que não consiste na mera constatação de um
fato empírico dado pela vontade psicológica do legislador histórico, mas
que representa uma actividade espiritual própria, que pode inclusive
levar o intérprete para além do que o legislador histórico tenha
concretamente pensado.

P/. Segundo Savigny, não configuram quatro modos de interpretação


distintos, mas fazem parte de um mesmo método: Aponte.

R/. Elemento gramatical; elemento lógico; elemento histórico e lemento


sistemático.

P/. Posto isto, diga qual foi o maior legado de Savigny.

R/. Embora Savigny defendesse a existência de um Direito espontâneo,


baseado no Wolksgeist, é interessante notar que, no que tange à
influência exercida pelo autor no pensamento jurídico alemão

105
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

subsequente, o factor sistemático e cientificista de sua teoria termina por


prevalecer sobre o factor historicista, permitindo com isso o
desenvolvimento do formalismo jurídico na Alemanha através da
jurisprudência dos conceitos, tão bem representada por Friedrich Georg
Puchta – antigo discípulo de Savigny – e por Rudolf von Jhering em sua
primeira fase.

Unidade Tematica 4.2: Pensamento jurídico e metodologia jurídica


O pensamento jurídico acerca da transição marcada pela jurisprudência
dos conceitos, jurisprudência dos interesses e jurisprudência dos valores,
conduz a fase seguinte caracterizada pela dimensão da argumentação
prática, sem descuidar da advertência referente ao entendimento de que
“o pensamento jurídico como argumentação prática, pode conduzir ao
risco de, como objecto de estudo, sobrar uma importância residual ao
respectivo estudo”. (TARELLO, 1980)

De outra parte, tem-se sustentado o equívoco de apreender o


pensamento jurídico como sinónimo de metodologia jurídica. Torna-se
indispensável a diferenciação entre ambos, delimitando a estreita relação
entre pensamento jurídico e metodologia.

“O pensamento jurídico não se identifica com a metodologia jurídica. A


metodologia jurídica é apenas uma das manifestações do pensamento
jurídico. É importante evitar alguns equívocos. De um lado, não se pode
perder de vista a historicidade da formação dos conceitos de ciência e de
método; de outro, a metodologia jurídica, enquanto dimensão prática do
trabalho jurídico, não pode ser reduzida a uma única tarefa, como
pretendeu o chamado método jurídico do positivismo, na verdade um
programa de interpretação e aplicação da lei. Com isto, perde-se a
riqueza de outros temas próprios da metodologia: o método da feitura

106
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

das leis, das sentenças, do processo, do notariado, etc.” (BARBAS


HOMEM, 2003, p. 83).

Dizendo de outro modo, a metodologia jurídica é caminho de


ensinamento e aprendizagem, dos afazeres jurídicos, meio indispensável
ao estudioso para compreender o Direito criticamente.

“A metodologia jurídica é uma lógica do concreto. Como metodologia do


trabalho jurídico quotidiano, ela deve ser largamente diferenciada
segundo os tipos de normas, os tipos de funções e as situações típicas de
regulamentação e de decisão dos ramos particulares do direito”
(MÜLLER, 1996).

O Estado Democrático de Direito e Social contribui para com a


redesignação do pensamento jurídico e da metodologia jurídica na pós-
modernidade, despojando-se da trilogia liberalismo-individualismo-
normativismo para absorver a plasticidade social, explicitada pela crítica
do Direito e presente no novo modo de pensar o Direito para os
indivíduos, para o cidadão sujeito de direito, enfim para a própria
sociedade.

“A metodologia da interpretação das leis deve ser entendida sempre por


relação ao regime político, no sentido em que cada tipo de regime
procura adequar a disciplina de interpretação das leis à natureza do
regime (autoritário, democrático, monárquico); institutos como a
disciplina das inspecções aos juízes, a sua responsabilidade, tal como o
regime de acesso, exercício e responsabilidade pelo exercício da profissão
de advogado e de acusador devem igualmente ser compreendidos a esta
luz; também não pode ser ignorada a dimensão cultural das práticas da
administração e dos tribunais: a preferência pela escrita; pela decisão
colegial e por práticas concretas quanto ao modo de decidir; pela
hierarquia e delegação; do mesmo modo, deve ser tida em atenção a
dimensão espiritual do pensamento jurídico, ou a negação de tal

107
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

natureza – como sustentada por correntes naturalistas, positivistas e


outras”. (BARBAS HOMEM, 2003, p. 84 a 85).

O ordenamento jurídico nacional convive com a angústia metodológica


que implica romper com o paradigma pretérito para então e só então
conseguir absorver as pautas axiológicas definidas pelo pensamento
jurídico actual, em boa parte decorrentes do texto constitucional.

O pensamento jurídico é produto do caldo social filtrado pelo poder,


especialmente, demarcado pelo regime político ao qual se encontra
vinculado. Não por outra razão, a própria evolução e transformações do
Estado reflectem e interferem no tipo de pensamento jurídico de cada
época.

Tema 5: Teoria contemporânea da interpretação


A contemporaneidade do direito volta-se para um redirecionamento da
interpretação na busca de resultados práticos para os problemas
submetidos a apreciação do Judiciário. A questão transcende o estudo e a
absorção dos valores pelo direito, avançando para a aplicação desses
valores enquanto princípios, presentes no ordenamento jurídico.

A refinada compreensão da doutrina contemporânea indica para o papel


dos julgadores “chamados a realizar operações valorativas no momento
em que decidem” (BARBAS HOMEM, 2003, p. 94).

A ponderação de CASTANHEIRA NEVES (1967, p. 586) defende: “O direito


não é elemento, mas síntese, não é premissa de validade, mas validade
cumprida o sentido útil e viável de que o julgador deverá decidir na
concreta realização do direito [...] a decisão jurídica, em si mesma, é uma
acção [...] O direito não é prius, mas posterius, não é dado, mas solução,
não está no princípio, mas no fim”.

108
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

De acordo com BARBAS HOMEM (2003, p. 93):“A teoria contemporânea


da interpretação, mesmo que divergente em muitos pontos, converge
hoje neste sentido: a interpretação jurídica distingue-se de outros tipos
de interpretação pela sua intenção prática. Não é apenas uma prática,
mas um pensamento intencionalmente pensado para a prática. A ideia de
intencionalidade é decisiva para compreender esta relação. De novo,
rejeitamos a possibilidade de uma concepção meramente metafísica do
direito. Igualmente refutamos que os elementos empíricos possam ser
suficientes para caracterizar o direito e a ciência do direito”.

A pós-modernidade realça a importância da realização dos fins práticos


do Direito consignando a advertência indispensável à prática referenciada
integrada por uma prática permanente de valores. Praticar valores é
tarefa da hermenêutica na actualidade, vale dizer, tarefa a ser cumprida
pelo julgador do caso concreto, estruturando a decisão nos princípios
como praticados pelo ordenamento.

“É importante não perder de vista a filosofia dos valores de Scheller e


Hartmann, assente, não apenas na convicção da existência de valores,
mas na possibilidade de proceder a uma graduação e hierarquia do seu
peso e importância. Distante nos pressupostos metodológicos, a
moderna metodologia dos princípios está próxima nas conseqüências
práticas. A especificidade do direito reside neste aspecto: a decisão
jurídica não se limita a conhecer os valores, mas aplica-os aos casos
controvertidos. De novo insistimos na dimensão humana do direito; o
legislador, o juiz ou o funcionário administrativo são chamados a realizar
operações valorativas no momento em que decidem; os professores
quando ensinam; os advogados quando alegam ou quando preparam a
minuta de um contrato (BARBAS HOMEM, 2003, p. 93 a 94)

Segundo BARBAS HOMEM (2003, p. 101) “a orientação metodológica


proposta assenta nesta concepção analítica e descritiva do pensamento

109
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

jurídico, precisamente porque mais adequada a transmitir a


multiplicidade de manifestações e de conteúdos de que o pensamento
jurídico se pode revestir. A função da história do pensamento jurídico é a
de identificar os problemas de organização e de concretização do direito,
descrever as respectivas respostas e compreendê-las criticamente”.

As realizações do pensamento jurídico mais significativas são aquelas que


permitem reunir nos ambientes reais a teoria e prática, destacadamente
a prática dos valores. A interpretação e a concretização do Direito
comparecem, vez mais, vocacionadas na busca e realização do justo, este
sim, um outro nível de problema decorrente do nível anterior, quer seja,
aquele em que a decisão jurídica apresenta o problema sem conhecer
dos valores que, necessariamente, deveriam estar presentes na
composição do julgamento.

Exercicios
P/. O que é o Direito no pensamento de CASTANHEIRA NEVES?

R/. O direito não é elemento, mas síntese, não é premissa de validade,


mas validade cumprida o sentido útil e viável de que o julgador deverá
decidir na concreta realização do direito [...] a decisão jurídica, em si
mesma, é uma acção [...] O direito não é prius, mas posterius, não é
dado, mas solução, não está no princípio, mas no fim.

P/. Usando o pensamento de BARBAS HOMEM fale da teoria da


interpretação actualmente.

R/. A teoria contemporânea da interpretação de BARBAS HOMEM,


mesmo que divergente em muitos pontos, converge hoje neste sentido: a
interpretação jurídica distingue-se de outros tipos de interpretação pela
sua intenção prática. Não é apenas uma prática, mas um pensamento
intencionalmente pensado para a prática. A ideia de intencionalidade é

110
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

decisiva para compreender esta relação. De novo, rejeitamos a


possibilidade de uma concepção meramente metafísica do direito.
Igualmente refutamos que os elementos empíricos possam ser
suficientes para caracterizar o direito e a ciência do direito”.

Tema 6: Pensamento jurídico e problematização


“O estudo do direito do século XXI exige um distanciamento histórico que
em grande parte ainda não existe, como também falta um levantamento
rigoroso das fontes que faculte ao investigador um conhecimento preciso
do pensamento jurídico”. (BARBAS HOMEM, 2003, p. 117)

A doutrina mais abalizada na análise do pensamento jurídico passa a


considerar como indispensável a questão metodológica referente aos
problemas e as soluções possíveis. É neste contexto que BARBAS HOMEM
(2003, p. 111), faz referência ao binómio “problema-resposta”, sendo que
as respostas podem ser convergentes ou distintas considerando o
binómio espácio-temporal em que foram apresentadas.

De acordo CASTANHEIRA NEVES“ um momento problemático na


metodologia jurídica define-se naquele momento que temos,
entendemos como modelo metodológico em geral, e não menos capital
na compreensão metodológica da norma em particular – o momento
problemático. Efectivamente – como melhor haveremos de concluir, ao
considerar infra a questão da norma aplicável – só a norma-problema (i.
é, a norma compreendida normativamente em função do problema
normativo-jurídico que pressupõe e a que visa dar solução) poderá ser
critério para o juízo normativo que se proponha resolver o caso jurídico
concreto, já que a problematicidade desse cargo exige a problematização
da norma ou normas que lhe possam servir de critério. Como resposta-
solução jurídica tipificada de um problema prático-jurídico que
normativo-metodologicamente pressupõe, a compreensão da norma

111
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

jurídica nesse sentido só será lograda se explicitarem tanto os


pressupostos jurídicos desse problema (e que são verdadeiramente as
suas coordenadas problemático-jurídicas) como o sentido problemático
específico que o constitui (que constitui o conteúdo intencional da sua
pergunta) e vai correlativamente implícito na solução que para ele a
norma prescreve”. (CASTANHEIRA NEVES, 1993, p. 151).

O modelo metodológico de realização do direito defendido pelo autor


propõe definir o tipo de racionalidade jurídica considerada a mais
adequada a essa realização. Racionalidade que se estrutura em duas
dimensões – o sistema e o problema –.

Segundo VIEHWEG apud ROESLER “parece claro que a ligação entre


pensamento problemático, tópica e Jurisprudência seja derivada de sua
função social” (2004, p. 202). O autor procura demonstrar a constância
desta relação precisamente por causa da função social que o direito
possui. O que Viehweg afirma é que “a função social continua a mesma,
apenas a fundamentação é que foi alterada, legitimando-se antigamente
de um modo, e contemporaneamente de outro” (2004, p. 203)

Ao final, prevalece a ponderação de CASTANHEIRA NEVES defendendo:

“O objectivo é de convocar o pensamento jurídico (encarne ele no


legislador, no juiz ou no jurista em geral) para a preparação ou a
definição através do direito, das soluções socialmente mais convenientes
– não a soluções axiológico-normativamente válidas e normativamente
fundadas e sim as soluções finalístico-pragmaticamente mais oportunas
ou úteis e instrumentalmente adequadas ou eficazes – no pressuposto de
uma básica preferência pela pragmática utilidade (e a sua racional
eficiência) relativamente à axiológica justiça (e a sua apelativa
normatividade) ou da performance relativamente à validade – o técnico-
sociologismo é sempre um utilitarismo”. (1993, p. 55 e 56)

112
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

De acordo com a doutrina de CASTANHEIRA NEVES, o Direito vem dos


problemas jurídicos e a solução deve ser encontrada no sistema, sendo
que a decisão jurídica deve observar o conjunto dos enunciados crítico-
reflexivos do modelo metodológico específico: “o sentido útil e viável de
que o julgador deverá decidir na concreta realização do direito em
autónoma constituição normativa, como se fora legislador, invocando o
princípio da generalização ou da universalização kantiano, hoje tão
largamente invocado como critério de validade para a razão prática”
(1993, p. 286).

Para evitar contradições de valoração é útil orientar “a interpretação aos


princípios ético-jurídicos”. (LARENZ, 1997, p. 487). Tais princípios foram
na verdade sujeitos nas regulações particulares a uma configuração
distinta e nem sempre consequente; podem colidir com outros princípios
ou fins jurídicos de idêntico escalão (LARENZ, 1997, p. 491).

O neoconstitucionalismo institui o Estado Democrático assegurando


como valores supremos, expressos no preâmbulo da Carta Magna, “os
direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o
desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma
sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos...”. (BRASIL, 2004, p.
17).

O princípio da dignidade da pessoa humana, elencado dentre os


princípios fundamentais, impõem-se como princípio nuclear,
promovendo a interconexão em relação a ordem principiológica
constitucional. Fica estabelecido o diálogo dos princípios. A prevalência
dos direitos humanos, os princípios da liberdade, igualdade e
solidariedade conduzem à concretização do Estado Democrático que
busca construir uma sociedade livre e justa, com a erradicação da
pobreza e da marginalização, reduzindo as desigualdades sociais. Nesse

113
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

particular, a face social do Estado pós-moderno, propugna a defesa da


paz e, também, a solução pacífica de conflitos. A propriedade é
assegurada, porém, atendendo sua função social, restando superada a
concepção histórica de propriedade, herdada do Estado liberalista. “É
também verdade que estes direitos fundamentais e princípios não estão
uns a par dos outros, sem conexão, mas que se relacionam uns com os
outros de acordo com o sentido e, por isso, podem tanto complementar-
se como delimitar-se entre si”. (LARENZ, 1997, p. 483)

O Estado Democrático importa a própria Jurisprudência dos Valores, mais


que isto, valores tais, redesignados em princípios, formam a estrutura
principiológica que concretiza o ideal e as intenções do processo
democrático, configurados na ideia de Estado social. A adopção das
pautas axiológicas é reconhecida como canal de produção legislativa
infraconstitucional e veículo de interpretação indispensável ao aplicador
do Direito.

A interpretação conforme a Constituição é significante da prevalência dos


valores constitucionais em todos os âmbitos da hermenêutica jurídica e
da qual depende a interpretação dos textos normativos
infraconstitucionais. As codificações não são mais eixos interpretativos,
pois que, superadas pela constitucionalização, insuperável no que se
refere à concretização da interpretação conforme a Constituição.

“Os princípios ético-jurídicos de escalão constitucional [...] enquanto


princípios, são pautas carecidas de preenchimento, para cuja
concretização são convocados tanto o legislador ordinário como a
jurisprudência. Aqui vale, segundo a Constituição, um primado de
concretização do legislador. Este significa que onde o princípio deixe em
aberto diferentes possibilidades de concretização, os tribunais estão
vinculados à escolhida pelo legislador ordinário, não lhes sendo,
portanto, lícito substituí-la por outra – porventura, por via de uma

114
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

interpretação conforme a Constituição ou de uma correcção da lei – que


em sua opinião seja de preferir” (LARENZ, 1997, p. 481)

“Não há hermenêutica pura. Hermenêutica é facticidade; é vida; é


existência, é realidade. É condição de ser no mundo. A interpretação não
se autonomiza da aplicação” (STRECK, 2005, p. 161). Segundo o autor, o
processo hermenêutico é vital à aplicação do Direito. A facticidade
retoma a questão dos fins sociais, implicando na compreensão da vida,
da existência, do “ser no mundo” – em paz ou em conflito – realidade
social e jurídica, vertentes indissociáveis da interpretação concretizadora
dos fins práticos do Direito.

Exercicios
P/. “Não há hermenêutica pura. Hermenêutica é facticidade; é vida; é
existência, é realidade. É condição de ser no mundo. A interpretação não
se autonomiza da aplicação” (STRECK, 2005, p. 161). Tomando o lugar do
autor, discuta a tese.

R/. Segundo o autor, o processo hermenêutico é vital à aplicação do


Direito. A facticidade retoma a questão dos fins sociais, implicando na
compreensão da vida, da existência, do “ser no mundo” – em paz ou em
conflito – realidade social e jurídica, vertentes indissociáveis da
interpretação concretizadora dos fins práticos do Direito.

P/. A interpretação conforme a Constituição é significante. O que ela


visa?

R/. Ela visa dar prevalência os valores constitucionais em todos os


âmbitos da hermenêutica jurídica e da qual depende a interpretação dos
textos normativos infraconstitucionais. As codificações não são mais
eixos interpretativos, pois que, superadas pela constitucionalização,
insuperável no que se refere à concretização da interpretação conforme
a Constituição.

115
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Tema 7: O Pensamento Crítico no Direito


A sociedade actual vive uma crise em seus pressupostos e paradigmas,
principalmente no âmbito das ciências, sejam elas naturais ou sociais.
Muitas foram as mudanças ocorridas no decorrer dos desenvolvimentos
económicos e tecnológico e ficou claro que os antigos paradigmas não
mais respondem às necessidades da sociedade contemporânea.

Assim, o actual discurso jurídico liberal-positivista, sistematizado


principalmente entre os séculos XVIII e XIX, está em desajuste frente às
complexas formas de produção de capital e às profundas contradições
sociais daí resultantes, trazendo, como consequência, ineficácia e
descrédito, além do total afastamento da realidade social e da grande
massa da população que dele fica excluída, vez que não tem força para se
inserir como protagonista deste discurso, que não liberta, mas discrimina.
É imprescindível o desenvolvimento de uma nova racionalidade
emancipatória, que, embora não negue a racionalidade técnico-
instrumental decorrente do positivismo jurídico moderno, traga ao
Direito um novo fundamento ético-político, que o aproxime da realidade
social e da vida, evitando o estreito formalismo descompromissado e
neutro.

Este é o papel da crítica jurídica, a criação de novos modelos para o


Direito, mais amplos e abertos à realidade, mais próximos às
necessidades actuais e voltados para a dignificação do homem.
Nos dizeres de Wolkmer (1995, p. 81-82) sobre o pensamento jurídico
crítico, encontra-se o seguinte trecho:
Por conseguinte, o processo de pensar criticamente o Direito implica
reflectir e questionar a legalidade tradicional, atinente a uma época ou a
um determinado momento da cultura de um país. O imaginário jurídico
crítico tenta redefinir os horizontes, constituído da linguagem normativa

116
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

repressora e ritualizada, objectivando propiciar meios instrumentais para


a conscientização e a emancipação dos sujeitos históricos na sua
condição de dominados.

Ao configurar “pensamento crítico” como repensar, redefinir e renovar os


padrões culturais de uma época ou momento histórico é quando melhor
se compreende a necessidade de tentar examinar, ainda que pareça
demasiado pretensioso, as possibilidades de um discurso crítico no
âmbito da presente cultura jurídica Moçambicana.

Posto isto, faz-se também necessário analisar outro ponto citado por
Wolkmer (1995, pg.09-10), referente às diferentes correntes de crítica
jurídica: Entende-se, Destarte, que o “pensamento crítico” nada mais é
do que a formulação “teórico-prática” de se buscar outra direcção ou
outro referencial epistemológico que atenda à modernidade presente.
Esta forma de visualizar o mundo dos valores humanos e o mundo de
materialização jurídica é incorporada por um vasto, difuso e fragmentado
movimento transnacional. Este movimento, que abarca diferentes países
da comunidade ocidental, não se reduz a uma única e específica “teoria
crítica” do Direito, pois compreende inúmeras “concepções
epistemológicas” e ma gama demasiadamente ampla de “correntes
metodologias”, representadas tanto por “críticos dialécticos” quanto por
“antidogmáticos liberais e sistémicos”.

Exercicios
P/. A sociedade actual vive uma crise em seus pressupostos e
paradigmas, principalmente no âmbito das ciências, sejam elas naturais
ou sociais. Muitas foram as mudanças ocorridas no decorrer dos
desenvolvimentos económicos e tecnológico e ficou claro que os antigos

117
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

paradigmas não mais respondem às necessidades da sociedade


contemporânea. Quais sao os desafios juridicos aqui enfretados?

R/. O actual discurso jurídico liberal-positivista, sistematizado


principalmente entre os séculos XVIII e XIX, está em desajuste frente às
complexas formas de produção de capital e às profundas contradições
sociais daí resultantes, trazendo, como consequência, ineficácia e
descrédito, além do total afastamento da realidade social e da grande
massa da população que dele fica excluída, vez que não tem força para se
inserir como protagonista deste discurso, que não liberta, mas discrimina.

É imprescindível o desenvolvimento de uma nova racionalidade


emancipatória, que, embora não negue a racionalidade técnico-
instrumental decorrente do positivismo jurídico moderno, traga ao
Direito um novo fundamento ético-político, que o aproxime da realidade
social e da vida, evitando o estreito formalismo descompromissado e
neutro. Este é o papel da crítica jurídica, a criação de novos modelos para
o Direito, mais amplos e abertos à realidade, mais próximos às
necessidades actuais e voltados para a dignificação do homem.

P/. Nos dizeres de Wolkmer (1995, p. 81-82) sobre o pensamento jurídico


crítico, encontra-se o seguinte trecho: “Por conseguinte, o processo de
pensar criticamente o Direito implica reflectir e questionar a legalidade
tradicional, atinente a uma época ou a um determinado momento da
cultura de um país” Por quê?

R/. Porque o imaginário jurídico crítico tenta redefinir os horizontes,


constituído da linguagem normativa repressora e ritualizada,
objectivando propiciar meios instrumentais para a conscientização e a
emancipação dos sujeitos históricos na sua condição de dominados.

118
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Tema 8 O pluralismo jurídico moçambicano: uma


abordagem histórica.
O regime de dominação e exploração colonial: o indigenato.

As relações entre os governos coloniais e as instituições e os direitos


africanos foram concebidas sob duas variantes principais: o governo
directo e o governo indirecto. Em regra, o primeiro é associado às
colónias francesas, o segundo às britânicas, o que nem sempre coincidiu
com a realidade.

O governo directo pressupõe a existência de uma única ordem jurídica,


assente nas leis da Europa, não reconhecendo qualquer instituição ou
direitos africanos. O domínio concretizava-se num sistema colonial
centralizado e hierárquico e na sujeição da maioria da população ao
regime do indigenato (indigénat), que definia as regras para os não
cidadões. Este regime prévio que os indígenas pudessem obter o estatuto
de assimilados, adquirindo, desse modo, direitos de cidadania, mas o
número dos que adquiriam esse estatuto permaneceu sempre muito
reduzido.

O governo indirecto parte de uma concepção oposta à universalista,


assentando na diferenciação. Na base desta forma de governo esteve
sempre a distinção entre não nativos e nativos, cuidadosamente
separados pelas ordens normativas e pelas instituições a que estavam
sujeitos: os primeiros ao direito civil da metrópole e às instituições da
mesma; os segundos aos direitos costumeiros e às autoridades
tradicionais, ambos selectivamente reconstituídos ou criados à medida
das necessidades do poder colonial.

Ainda que Portugal tenha estado presente em Moçambique desde o


século XVI, só nos últimos anos do século XIX veio a ocupar e administrar
efectivamente o território. Como afirma Ana Maria Gentili, o exemplo

119
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

britânico fez escola, principalmente perante os sucessos produtivos da


Nigéria e da Costa do Ouro atribuídos à capacidade de visão política de
governo indirecto. O regime do indigenato, introduzido formalmente nos
anos 1920’, apesar da designação, aproximava-se mais do sistema de
governo indirecto, ainda que apresentasse alguns traços
assimilacionistas. Caracterizava-se pela divisão entre cidadãos e indígenas
e assentava em dois modelos administrativos e duas formas de direito.

As áreas dos colonos seguiam o modelo administrativo metropolitano,


com concelhos e freguesias; as áreas indígenas estavam divididas em
regedorias ou chefaturas, supostamente a reencarnação das tribos pré-
coloniais, e eram administradas pelos chefes tradicionais aliados do
poder colonial – os régulos. A justiça espelhava a sociedade racial,
oferecendo regimes diferenciados a indígenas, sujeitos às leis
costumeiras, administradas pelas autoridades tradicionais, e a cidadãos e
assimilados, sujeitos ao direito moderno e às instituições do Estado de
direito. Ainda que o direito indígena não tenha chegado a ser codificado,
estava subordinado à legislação específica estatal que visava
compatibilizá-lo com os interesses do Estado colonial capitalista.

As divisões estabelecidas pelos colonizadores portugueses não


assentaram apenas no que existia, implicando uma reconfiguração que
servisse os seus interesses. As chefaturas maiores, por exemplo, foram
divididas, de modo a serem menos ameaçadoras; os chefes menos
dispostos a colaborar foram afastados ou mortos e substituídos por
outros mais maleáveis. Tal como nas outras colónias africanas, as
autoridades tradicionais procuravam equilibrar as exigências do governo
colonial com a necessidade de manter a legitimidade na comunidade.]
Assim, em muitos casos encontravam formas de resistência passiva ou
activa. No norte de Moçambique, por exemplo, os régulos sabotaram
uma plantação de algodão fervendo as sementes antes se as plantarem.
Outras formas de resistência passavam pela migração colectiva ou por

120
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

dar informação errada sobre a idade dos jovens para que escapassem do
exército colonial ou do trabalho forçado.

Os assimilados, uma pequena minoria de Moçambicanos (negros,


asiáticos e mistos) – que sabiam ler e escrever em português, abdicavam
dos «costumes tribais» e tinham um emprego na economia capitalista –
eram cidadãos, ainda que com um estatuto inferior. Em 1961, menos de
1% da população africana era legalmente assimilada.

O código do Indigenato foi formalmente imposto em 1928, mas, de


acordo com O’Laughlin, sistematizava um conjunto de normas anteriores
que definiam a cidadania em relação ao trabalho forçado. A Lei do
Trabalho de 1899 articulou, pela primeira vez, a distinção entre cidadão e
súbdito, não nativo e nativo. A lei estabelecia que «todos os nativos das
províncias ultramarinas portuguesas estão sujeitos à obrigação, moral e
legal, de tentar obter através de trabalho os meios de que necessitam
para subsistir e melhorar as suas condições sociais». Previa, ainda, que se
tal não acontecesse, o governo tinha o direito de forçar os nativos a
prestar serviços quer ao governo, quer a privados. Havia poucos
empregos disponíveis com salários que atraíssem os africanos por sua
livre vontade e só os que possuíam terrenos grandes e férteis seriam
considerados agricultores. Assim, a lei afectava a maioria da população.

Às autoridades tradicionais cabia o controlo da população e o


recrutamento para trabalho forçado daqueles que não tivessem a
iniciativa de trabalhar ou que não cumprissem a lei. Dessa forma, pôs-se
fim ao debate sobre como as colónias continuariam a ser desenvolvidas
uma vez abolida a escravatura. A base de exploração permanecia a
coerção e as autoridades tradicionais desempenhariam um papel
fundamental. Estava estabelecida a divisão entre indígenas, sujeitos ao
trabalho forçado, e não indígenas isentos daquele. O Estado Novo de
Salazar intensificou e aperfeiçoou esta politica, nomeadamente com a

121
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Constituição de 1933, que incorporava o Acto Colonial. Este é, muitas


vezes, considerado o ponto de viragem, que marca o início de um Estado
colonial.

Na década de 1960’, com as pressões internacionais contra o trabalho


forçado e o movimento de independência das colónias africanas,
Portugal, ao mesmo tempo que transformou a designação «colónias» por
«províncias ultramarinas», aboliu formalmente o regime do indigenato.

Apesar de todos passarem a ser cidadãos portugueses e a terem, em


teoria, o direito de optar pela justiça civil, o dualismo manteve-se na
prática, com a continuação dos regulados e da obediência ao régulo e ao
direito costumeiro. Os moçambicanos continuaram a possuir cartões de
identidade diferentes, a ser banidos dos centros urbanos, sujeitos a
abusos policiais e a discriminação económica e social e até a trabalho
forçado (ainda que o trabalho forçado tenha sido abolido em 1961, a
legislação permitia a coerção em situações de emergência). Como afirma
André C. José «a tardia e cosmética transformação dos indígenas em
cidadãos e a apropriação ideológica das teses do luso tropicalismo não
foram suficientes para disfarçar o regime de forte segregação que
vigorava». E, como conclui, «a metamorfose, simplesmente, tornou os
indígenas em cidadãos sem cidadania».

Exercicios
P/. As relações entre os governos coloniais e as instituições e os direitos
africanos foram concebidas sob duas variantes principais: Quais são e
explique.

R/. As variantes em causa são: governo directo e o governo indirecto. Em


regra, o primeiro é associado às colónias francesas, o segundo às
britânicas, o que nem sempre coincidiu com a realidade. O governo
directo pressupõe a existência de uma única ordem jurídica, assente nas

122
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

leis da Europa, não reconhecendo qualquer instituição ou direitos


africanos. O domínio concretizava-se num sistema colonial centralizado e
hierárquico e na sujeição da maioria da população ao regime do
indigenato (indigénat), que definia as regras para os não cidadões.

Este regime prévio que os indígenas pudessem obter o estatuto de


assimilados, adquirindo, desse modo, direitos de cidadania, mas o
número dos que adquiriam esse estatuto permaneceu sempre muito
reduzido. Em conta partida, o governo indirecto parte de uma concepção
oposta à universalista, assentando na diferenciação. Na base desta forma
de governo esteve sempre a distinção entre não nativos e nativos,
cuidadosamente separados pelas ordens normativas e pelas instituições a
que estavam sujeitos: os primeiros ao direito civil da metrópole e às
instituições da mesma; os segundos aos direitos costumeiros e às
autoridades tradicionais, ambos selectivamente reconstituídos ou criados
à medida das necessidades do poder colonial.

Tema 9: Crítica da razão jurídica


A investigação toma por marco teórico, nesta fase, a doutrina de
Alejandro Nieto, centrada na crítica da razão jurídica. Na concepção do
autor o Direito tem função instrumental, sendo considerado como “um
sistema de valores positivados para o exercício dos valores superiores:
Justiça, Ordem, Paz, Progresso assumidos pelo Poder político e pela
sociedade em cada momento histórico e em cada situação concreta”
(NIETO, 2007, p. 42).

Questão nuclear repousa na metodologia de feitura das leis, nos valores


contidos ou não nestas mesmas leis, a validade e a eficácia das leis
dirigidas à protecção dos interesses sociais. Nieto, em síntese, considera,
de forma especial, “que a aplicação da lei é feita por juristas e juízes, e

123
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

por conterem valores gerais, estas leis são facilmente corrompidas


quando aqueles não desempenham sua função. Ainda mais que cada
sujeito de direito possui uma idéia subjectiva do conceito de cada valor”
(NIETO, 2007, p. 43 a 46).

Esta é a grande fragilidade da axiologia, pois cada pessoa pode conceituar


de maneira distinta. Como os valores são materializados através do
legislador pode-se afirmar que prevalece o interesse do Poder nesta
determinação. E, é através da Constituição que se determinam estes
valores prevalecentes.

Desta forma, o Direito, ou está subordinado ao Poder ou é instrumento


deste, na medida em que decide de acordo com o império dos
dominantes. Para o autor a principal dificuldade decorre dos modelos
onde as Constituições somente determinam os valores, fracassando no
que se refere às suas interpretações que são subjectivas. “A Constituição
por si só não garante nada e de nada valem os valores por ela declarados
se não forem bem aplicados dada sua grande generalidade”. (NIETO,
2007, p. 131)

O pensamento nietiano, neste contexto, desconsidera a objectividade


dos valores consagrados pelos ordenamentos jurídicos internacionais,
reafirmados pelos textos constitucionais dos processos democráticos,
responsáveis pela consolidação do Estado de Direito. O autor, contudo,
não nega os valores objectivos, a restrição e crítica são dirigidas àquelas
circunstâncias onde o poder político controla o Direito de acordo com os
seus interesses. Sem dúvida, a subjectividade existe, mas é preciso
visualizar que a generalidade axiológica não é critério de autonomia. A
produção legislativa com base nos valores fundamentais e a
interpretação que desses valores se faz, no âmbito da decisão jurídica,
estão inseridas no contexto das cláusulas gerais, cuja leitura permanece
vinculada e limitada pela interpretação conforme a Constituição.

124
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Neste contexto, Karl Larenz observa, com muita propriedade, a questão


relativa aos “fins que o legislador intenta realizar por meio da lei”. O
autor complementa a observação ao afirmar que os fins “são em muitos
casos [...] fins objectivos do Direito, como a manutenção da paz e a justa
resolução dos litígios, o equilíbrio de uma regulação no sentido da
consideração optimizada dos interesses que se encontram em jogo, a
protecção dos bens jurídicos e um procedimento judicial justo” (LARENZ,
1997).

O que torna a Constituição um elemento essencial ao Direito é a vontade


daqueles que operam as leis. Para transformar a Constituição em algo
prático é que existem os órgãos jurisdicionais (NIETO, 2007, p. 51). Mas a
vulnerabilidade política pode transformá-la em instrumento do poder.
Assim, “o relativismo ideológico acabou se desprendendo da fase de
determinação dos valores superiores, que hoje se encontram expostos na
Constituição, e se fixando na determinação do conteúdo de tais valores.
Assim, de nada vale a garantia constitucional se não se sabe como será
aplicada” (NIETO, 2007, p. 52)

Considerando o paradigma do Estado Democrático de Direito fundado


nos valores humanos, direitos fundamentais e princípios constitucionais,
a hermenêutica neoconstitucional está dirigida à efectividade da decisão,
conforme a Constituição.

O ambiente jurídico, contudo, aponta para uma “baixa


constitucionalidade” (STRECK, 2004, p. 216). Da análise levada, verifica-se
a absorção parcial das pautas axiológicas constitucionais efectivando
resultados práticos. Ainda assim, a percepção hermenêutica das Cortes
Superiores nacionais “deve apontar para a construção das condições de
possibilidade de uma aplicação do Direito dirigidas ao resgate das
promessas da modernidade [...] sem inibir o acesso à justiça e a
realização dos direitos fundamentais [...]” (STRECK, 2004, p. 857).

125
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Exercicios
P/. A questão nuclear repousa na metodologia de feitura das leis, nos
valores contidos ou não nestas mesmas leis, a validade e a eficácia das
leis dirigidas à protecção dos interesses sociais. Qual foi a síntese a que
ele chegou?

R/. Nieto considera, de forma especial, “que a aplicação da lei é feita por
juristas e juízes, e por conterem valores gerais, estas leis são facilmente
corrompidas quando aqueles não desempenham sua função. Ainda mais
que cada sujeito de direito possui uma idéia subjectiva do conceito de
cada valor”.

P/. Em que se funda o Estado de Direito segundo Nieto?

R/. Segundo Nieto, o paradigma do Estado Democrático de Direito funda-


se nos valores humanos, direitos fundamentais e princípios
constitucionais, a hermenêutica neoconstitucional está dirigida à
efectividade da decisão, conforme a Constituição.

P/. Karl Larenz observa, com muita propriedade, a questão relativa aos
“fins que o legislador intenta realizar por meio da lei. Justifique a sua
resposta tomando em conta a perspectiva do autor sobre o assunto.

R/. O autor complementa a observação ao afirmar que os fins “são em


muitos casos fins objectivos do Direito, como a manutenção da paz e a
justa resolução dos litígios, o equilíbrio de uma regulação no sentido da
consideração optimizada dos interesses que se encontram em jogo, a
protecção dos bens jurídicos e um procedimento judicial justo.

P/. Fale da dicotomia Direito e Poder segundo Nieto.

R/. Direito, ou está subordinado ao Poder ou é instrumento deste, na


medida em que decide de acordo com o império dos dominantes. Para o

126
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

autor a principal dificuldade decorre dos modelos onde as Constituições


somente determinam os valores, fracassando no que se refere às suas
interpretações que são subjectivas. “A Constituição por si só não garante
nada e de nada valem os valores por ela declarados se não forem bem
aplicados dada sua grande generalidade.

Tema 10: Pensamento jurídico e decidibilidade


O emprego da razão prática nas decisões proferidas pelos Tribunais
Superiores, fundadas nos princípios adoptados pela hermenêutica
constitucional, visa a consecução dos fins do direito. O êxito da influência
do pensamento jurídico no âmbito das decisões das Cortes Superiores do
país se faz mediante incursões distintas, considerando limites e restrições
impostos pelo poder, na busca de um reconhecimento da jurisdição
constitucional construída no plano real pelo conjunto das decisões às
vezes justas outras injustas. Cabe reconhecer, neste ambiente, um
processo de aprendizagem em conformidade com a metodologia
direccionada à prática dos valores.

Para fins de estudo, são seleccionados julgados paradigmáticos onde a


comunicação linguística de consenso é fundamental, a um para arredar a
comunicação de imposição, a dois para dar visibilidade à recepção da
problematização no contexto prático-jurídico com base nos valores. As
decisões analisadas com o propósito de enfrentar a questão do
problema-solução, de forma eficaz, conhecem da realidade do problema,
como descrito no plano concreto, fundamentando suas razões nos
princípios norteadores da interpretação reveladora da solução adequada
ao deslinde do caso concreto.

Em síntese, o Superior Tribunal de Justiça ao apreciar recursos especiais e


agravos regimentais referentes ao tratamento de saúde e fornecimento
de medicamentos a necessitados, obrigação de fazer do Estado, tem se

127
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

manifestado, reiteradamente, pela protecção constitucional à saúde, à


vida e aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana:

Processual civil. Recurso especial. fornecimento de medicamentos pelo


estado a pessoa hipossuficiente. Antecipação de tutela. Obrigação de
fazer do estado. Inadimplemento. Cominação de multa diária. Astreintes.
Incidência do meio de coerção. Protecção constitucional à saúde, à vida e
à dignidade da pessoa humana. primazia sobre princípios de direito
financeiro e administrativo.

A função da Constituição, e de conformidade com as análises críticas


levadas a efeito, recebe consideração apropriada e distinguida por parte
dos julgadores sensíveis, que no inteiro teor do julgado assim se
manifestam:

“A Constituição não é ornamental, não se resume a um museu de


princípios, não é meramente um ideário; reclama efectividade real de
suas normas. Destarte, na aplicação das normas constitucionais, a
exegese deve partir dos princípios fundamentais, para os princípios
sectoriais. E, sob esse ângulo, merece destaque o princípio fundante da
República que destina especial protecção a dignidade da pessoa
humana”.

No mesmo julgado vem consubstanciada a realização da moderna


hermenêutica referente à busca dos fins práticos. Cabe gizar o
entendimento consolidado pelo Tribunal ao sentenciar que: “a tutela
jurisdicional para ser efectiva deve dar ao lesado resultado prático
equivalente ao que obteria se a prestação fosse cumprida
voluntariamente.”

A consolidação da transição hermenêutica da subsunção para a


hermenêutica dos valores está consagrada pelo julgado na eleição e
reconhecimento do resultado prático.

128
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Por fim, os julgadores demonstram a capacidade e autonomia do discurso


jurídico de decisão ao garantir a função social do Direito, concretizada na
solução do problema. Mais que isso, a decisão sinaliza para a
consideração da função e papel do Poder Judiciário frente ao Estado
Democrático de Direito e Social.

“O Poder Judiciário não deve compactuar com o proceder do Estado, que


condenado pela urgência da situação a entregar medicamentos
imprescindíveis protecção da saúde e da vida de cidadão necessitado,
revela-se indiferente à tutela judicial deferida e aos valores fundamentais
por ele eclipsados”.

A decisão, evidentemente, denuncia, com vigor, o Estado-Parte, parte de


muitas inadimplências, que por não fazer a sua parte, auto excluí-se da
parte social de si próprio. Este Estado Democrático abdica de sua porção
social para deixar ao Poder Judiciário atribuições e funções que lhes são
inerentes enquanto Estado Social.

“Numa palavra, é a partir da superação da crise paradigmática do Direito


(crise de modelos de Direito e de Estado) é que poderemos dar um
sentido eficacial à Constituição, inserida no novo modelo de cunho
transformador que é o Estado Democrático de Direito. Ao lodo disto, é
imprescindível uma nova hermenêutica jurídica, que possibilite ao
operador do Direito a compreensão da problemática jurídica-social,
inserida no contexto de uma sociedade excludente como a
Moçambicana, onde a dignidade da pessoa humana tem sido solapada
desde o seu descobrimento” (STRECK, 2004, p. 870 a 871). Assim sendo, a
eficácia dos princípios constitucionais, dos direitos sociais, e
fundamentais não mais se espera, senão por vias do Poder Judiciário. A
inversão de papéis decorre, desgraçadamente, de um Estado
inadimplemento de suas mais nobres obrigações para com a própria
sociedade.

129
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Execicios
P/. O Superior Tribunal de Justiça ao apreciar recursos especiais e agravos
regimentais referentes ao tratamento de saúde e fornecimento de
medicamentos a necessitados. Quais os direitos constitucionais que o
Estado visa acautelar com essa medida?

R/. O Estado, se tem manifestado, reiteradamente, pela protecção


constitucional à saúde, à vida e aplicação do princípio da dignidade da
pessoa humana.

P/. A Constituição não é ornamental, não se resume a um museu de


princípios, não é meramente um ideário. Debata a tese.

R/.Isto porque ela reclama efectividade real de suas normas. Destarte, na


aplicação das normas constitucionais, a exegese deve partir dos
princípios fundamentais, para os princípios sectoriais. E, sob esse ângulo,
merece destaque o princípio fundante da República que destina especial
protecção a dignidade da pessoa humana.

P/. A consolidação da transição hermenêutica da subsunção para a


hermenêutica dos valores está consagrada pelo julgado na eleição e
reconhecimento do resultado prático. Porque?

R/. Porque os julgadores demonstram a capacidade e autonomia do


discurso jurídico de decisão ao garantir a função social do Direito,
concretizada na solução do problema. Mais que isso, a decisão sinaliza
para a consideração da função e papel do Poder Judiciário frente ao
Estado Democrático de Direito e Social.

P/. Atraves de que pode-se garantir a eficacia dos direitos sociais


fundamentais?

130
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

R/. A eficácia dos princípios constitucionais, dos direitos sociais, e


fundamentais não mais se espera, senão por vias do Poder Judiciário. A
inversão de papéis decorre, desgraçadamente, de um Estado
inadimplemento de suas mais nobres obrigações para com a própria
sociedade.

Tema 11: A influência do pensamento jurídico


Diante das transformações do Estado, parece-nos inegável que a
influência do pensamento jurídico contemporâneo, na evolução da noção
de Constituição fortaleceu a figura do Estado. Pois, forneceu uma
sistematização, de melhor forma codificada, do respeito ao regramento
jurídico em obediência ao tipo fundamental que se configura nas
instituições jurídicas. Além ainda, que deu fim às incertezas jurídicas
fomentando uma crença maior aos princípios superiores do Direito, em
que a codificação e a busca de uma cientificidade, materializam a vida
humana regrando o arranjo dos movimentos e da dinâmica das relações
humanas.

Contudo o presente trabalho tratou da evolução da noção de


Constituição, enquanto ordenamento político de um povo, desde a
Antiguidade até a Modernidade, trazendo à luz questões sobre a sua
origem, evolução e as diversas conformações engendradas, levando-se
em conta as transformações que a trouxeram até o modelo
contemporâneo. A Constituição, em qualquer um dos perfis de sociedade
política constituída que foram expressos no texto, é uma promessa para
o futuro, como o foi à tríade da igualdade, liberdade e fraternidade, fruto
da Revolução Francesa. Aliado a isso, tem-se a questão da soberania -
marca registrada da Constituição dos Modernos - que atualmente
vincula-se a uma idéia de comunhão de esforços em direção a um fim
comum. Portanto, há um recrudescimento da soberania interna dos
países em função de entes supranacionais, que surgem com intento de

131
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

garantir interesses comuns, a fim de que o Estado possa fazer frente ao


novo cenário político-econômico-social que marca sua versão
Contemporânea.

A própria democratização das relações sociais, notadamente no período


do Pós-2ª Guerra, implicou o surgimento de novas demandas,
protagonizadas por novos atores sociais, exigindo do Estado respostas
imediatas. Por outro lado, o aumento das demandas implicou também a
burocratização deste Estado, em razão dos instrumentos destinados à
sua implementação.

É certo que todas as crises pelas quais passou o Estado acabaram por
fragilizar a Constituição, enquanto carta política que encerra todos os
anseios da sociedade constituída, vez que não consegue cumprir sua
missão de realizar condições e possibilidades de vida comum de uma
sociedade pluralista. Diante de tal circunstância, é necessária a percepção
de que administrar os conflitos da sociedade significa conservar a
sociedade e ter, como legítima, a complexidade multifacetada de suas
articulações e tensões; que não precisam ser extirpadas as diferenças
identificadas no seu envolver.

Exercicios
P/. Diante das transformações do Estado, parece-nos inegável que a
influência do pensamento jurídico contemporâneo, na evolução da noção
de Constituição fortaleceu a figura do Estado. Concorda? Justifique de
forma concisa e objectiva a sau resposta.

R/. Pois, forneceu uma sistematização, de melhor forma codificada, do


respeito ao regramento jurídico em obediência ao tipo fundamental que
se configura nas instituições jurídicas. Além ainda, que deu fim às

132
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

incertezas jurídicas fomentando uma crença maior aos princípios


superiores do Direito, em que a codificação e a busca de uma
cientificidade, materializam a vida humana regrando o arranjo dos
movimentos e da dinâmica das relações humanas.

Tema 12: A INTERPRETAÇÃO DA NORMA


JURÍDICA
A interpretação da norma jurídica é a actividade mental desenvolvida
pelo jurista, mirando traçar uma ligação entre o texto normativo
abstracto, inerte, e o fato que se apresenta cru, à espera de uma roupa-
gem produzida nos lindes da Ciência do Direito. Não raro a via da
subsunção tem mão dupla, e quão mais delicado e questionável for o
percurso pelo seu leito, mais apurada e dotada de cientificidade há que
ser a missão do operador.

Valer-se adequadamente dos processos de interpretação que lhe são


postos à mão pela ciência jurídica, não guardando escrúpulos de adentrar
com profundidade na investigação e na confecção de novas técnicas,
sempre objectivando o aclaramento e a vivificação das normas jurídicas,
é o papel reservado ao exegeta na seara do Direito. Da sua sensibilidade
dependerá o sucesso perseguido na arte de interpretar as normas de
natureza jurídica.

Ensina Miguel Reale2 que a regra ou a norma é o resultado da tomada de


posição de uma lei cultural, perante a realidade, “implicando o
reconhecimento da obrigatoriedade de um comportamento”.

A dito conselho chegou o respeitável doutrinador, após dissecar as leis,


para ele dicotomizadas em leis físico-matemáticas (ou naturais) e leis

2
Liçôes Preliminares de Direito, 1974:34.

133
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

culturais. Nestas últimas, agrupa a norma, sob suas variadas


manifestações (moral, política, religiosa, jurídica, etc).

Vê-se assim, forte influência kelseniana na formulação conceptual do


professor paulista, quando destaca a obrigatoriedade do comportamento
como nuclear para a eclosão (ou o fabrico) de uma norma. E não está
sozinho, vez que incontáveis bastiões da jusfilosofia destacam a
coercibilidade (ou a coercitividade) como o elemento identificador da
norma, quiçá da proposição jurídica.

Para Rudolf Von Jering, arauto do activismo dogmático, em sua fabulosa


obra Zweck im Recht (5ªedição, 1916, p. 256), citado por Tércio Ferraz Jr.
(Teoria da Norma Jurídica, Forense, p. 36), norma é regra, já que o seu
conteúdo é apenas a orientação do que ela contém. Segundo Pedro
Lessa, seu crítico mais ácido dentre os nacionais, Jering chegou a afirmar
que “sem a coação não haveria direito, não haveria Estado” (Estudos de
Philosophia do Direito, Livraria Francisco Alves, Rio de Janeiro, 1916, pp.
422 e 423).

O lógico finlandês Von Wright3bem estudou a obra do notável


comentarista americano John Austin, que via a norma jurídica como uma
ordem, passada pelo soberano aos seus súbditos, respaldada por
ameaças. Em havendo descumprimento da ordem, o súbdito seria pu-
nido. Estudando tal construção, Von Wright teve por certo hexapartila
em carácter, condições de aplicação, autoridade, sujeito, promulgação e
sanção.

Inúmeros enfoques foram desenvolvidos na tentativa de uma


conceituação precisa do que é norma e mais especificamente do que é
norma jurídica. De todos, alcançou particular repercussão o oferecido por
Carlos Cóssio, discípulo e depois enfrentador de Kelsen, que inverteu a

3
Norma y Áccjón, Tecnos, Madrid, 1970, capa. 1 e V.

134
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

idéia do professor vienense, transmudando a norma primária (a sanção)


em perinorma e elegendo a norma secundária da teoria kelseniana (a
instrumental) em endonorma. Para Cóssio, o privilégio seria do aspecto
orientador e pedagógico da norma, secundado pela coercibilidade da
regra.

O embate científico entre Kelsen e Cóssio é bem estudado pelo Prof.


Paulo Lopo Saraiva4, que utilizou a técnica de subsumi-lo a uma decisão
judicial e afirma que a “norma primária de Kelsen passa a ser a perinorma
(peri=periferia) de Cóssio (se a União não reparar o dano causado a
terceiro que o funcionário praticou, deve ser condenada) e a norma
secundária de Kelsen passa a ser a endonorma (endo=cerne, núcleo) de
Cóssio (se o funcionário da União der causa a dano contra terceiro, a
União deve reparar) ”. E continua dizendo que enquanto Kelsen “valoriza
o ilícito e sua consequência jurídica - a sanção -, Cóssio, sem excluí-la,
inclui também, o lícito, na estrutura normativa, o que propicia apresentar
as duas situações do comportamento humano frente à regra: o compor-
tamento aceito, contido na endonorma e o não aceito, existente na
perinorma”.

E neste caso, sine embargo dos entendimentos contrários, tenho a norma


jurídica como um ser lógico, que independentemente de ser positivada,
traça pauta de comportamento dos súbditos do Estado ou da entidade
que a proclama, para esses prevendo uma sanção em caso de
desobediência (ainda que principiológica). Mesmo na hipótese de
configuração das ditas “normas programáticas”, o elemento coercitivo se
fará presente na cadeia normativa imprescindível, mais precisamente no
elo denominado de “norma complementar” ou “executing law”.

4
Estrutura Lógica da Proposiçâo Jurídica, Vox Legis, Sugestões Literárias, vol.

151, pp. 38 e 39.

135
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Exercicios
P/. Para Rudolf Von Jering, arauto do activismo dogmático, em sua
fabulosa obra Zweck im Recht (5ªedição, 1916, p. 256), citado por Tércio
Ferraz Jr. (Teoria da Norma Jurídica, Forense, p. 36). Como é que Rudolf
define a norma?

R/. Para Rudolf, norma é regra, já que o seu conteúdo é apenas a


orientação do que ela con-tém. Segundo Pedro Lessa, seu crítico mais
ácido dentre os nacio¬nais, Jering chegou a afirmar que “sem a coação
não haveria direito, não haveria Estado.

P/. Faça um debate entre Cossio e Kelsen em torno da norma.

R/. O embate científico entre Kelsen e Cóssio é bem estudado pelo Prof.
Paulo Lopo Saraiva, que utilizou a técnica de subsumi-lo a uma decisão
judicial e afirma que a norma pri¬mária de Kelsen passa a ser a
perinorma (peri=periferia) de Cóssio (se a União não reparar o dano
causado a terceiro que o funcionário praticou, deve ser condenada) e a
norma secundária de Kelsen passa a ser a endonorma (endo=cerne,
núcleo) de Cóssio (se o funcionário da União der causa a dano contra
terceiro, a União deve reparar). E continua dizendo que enquanto Kelsen
valoriza o ilícito e sua consequência jurídica - a sanção -, Cóssio, sem
excluí-la, inclui tam¬bém, o lícito, na estrutura normativa, o que propicia
apresentar as duas situações do comportamento humano frente à regra:
o compor¬tamento aceito, contido na endonorma e o não aceito,
existente na perinorma.

A NORMA CONSTITUCIONAL

Foi visto que a norma jurídica é a pauta da convivência social mediante a


coerção, aí sendo incluído o relacionamento Estado-Cidadão. A norma
jurídica, que serve inclusive para balizar a relação entre o Estado e os
seus súbditos, se presta também para arcabouçar a entidade estatal,

136
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

definindo a organização desta, com regime político e direitos


fundamentais da pessoa humana, segundo análise de José Afonso da
Silva, anotando Carl Schimitt5. Assim, a norma jurídica constitucional,
mesmo que não esteja positivada, é lastro para todo o ordenamento
jurídico subsequente, que não pode prescindir daquela norma
fundamental, como preconizou Kelsen em sua fase de amadurecimento
filosofal.

É palpável a preocupação dos doutores em distinguir, no campo jurídico,


o que é matéria constitucional, para daí ser exibido o que é norma
constitucional. Não se consideravam constitucionais as demais normas
nela inseridas que não tratassem daquela matéria”.6 Invertendo o vector
do tempo, alcançaremos ainda mais remotamente, na antiguidade grega,
a distinção entre normas constitucionais e normas ordinárias, sendo
aquelas as estruturadoras do Estado e estas as criadas pelo governo. As
primeiras superiores às segundas, conforme entendia Aristóteles, citado
pelo Prof. Manoel Gonçalves Ferreira Filho7. Dita linha de entendimento
até hoje se faz presente, onde são tidas por constitucionais todas as
normas estruturais de uma sociedade politicamente organizada, tendo
ainda a função de regular a produção das normas chamadas
infraconstitucionais8.

Exercicios
P/. O que entende por norma constitucional?

R/. Não se consideravam constitucionais as demais nor¬mas nela


inseridas que não tratassem daquela matéria. A ma constitucional é a

5
Curso de Direito Constitucional Positivo, RT, 6’ediçlo, p. 40.

6
José Afonso da Silva, ob. op. cit., p.40.

7
Direito Constitucional Comparado: O Poder Constituinte, EDUSP. p. 2.

8
Celso Ribeiro Bastos, Elementos de Direito Constitucional, Saraiva, p. 2.

137
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

suprema de todas as outras normas. São tidas por constitucionais todas


as normas estruturais de uma sociedade politicamente organizada, tendo
ainda a função de regular a produção das normas chamadas
infraconstitucionais.

A NORMA INFRACONSTITUCIONAL

Se ficou assentada a existência de uma norma superior, privilegiada,


norteadora do Estado e do ordenamento jurídico por este e neste
produzida, lógico é que existem normas jurídicas “inferiores” àquela. A
“inferioridade” aqui destacada não desdenha a validez e a utilidade
dessas normas, mas apenas regista a submissão de tais editos aos limites
impostos pelo diploma fundamental, advindo de um poder constituinte,
embora às vezes puramente formal, como acontece nos casos em que a
ordem constitucional é alterada ex vi tomada violenta do poder por
parcela minoritária da nação.

A norma jurídica infraconstitucional abrange todo o ordenamento


“inferior” positivo do Estado, indo das leis complementares aos ex-
pedientes ordinativos de feição mais burocrática (portarias, circulares,
etc), passando pelos convénios, pelas convenções colectivas de trabalho,
etc. Entretanto, nos limites deste trabalho, é suficiente a breve análise da
norma legal, tendo-se que a lei, “no sentido técnico desta palavra, só
existe quando a norma escrita é constitutiva de direito, ou esclarecendo
melhor, quando ela introduz algo de novo em carácter obrigatório no
sistema jurídico em vigor, disciplinando comportamentos individuais ou
actividades públicas”9. Segundo Clóvis Beviláqua, a lei é uma regra geral
que, emanando de autoridade competente, é imposta coactivamente à
obediência de todos. Ouso discordar do ilustrado jurista apenas no que
tange à generalidade da lei, vez que em casos tais como a isenção
tributária, a exclusão do crédito normalmente ocorre via “lei que

9
Miguel Reale, Lições Preliminares de Direito, José Bushatsky, 2’ edição, p. 182.

138
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

especifique as condições e os requisitos exigidos para a sua concessão, os


tributos a que se aplica e, sendo caso, o prazo de duração” .

A norma jurídica, quer tenha sido fabricada intencionalmente (a lei em


sentido formal e em sentido material), quer tenha sido apurada pelos
cultores e aplicadores do Direito (a jurisprudência, os tratados, as
convenções, etc), exige uma fase de burilamento e adequação ao
momento histórico e social da sua aplicação. Enquanto texto frio e
latente, espelha tão-só o instante da sua confecção ou do seu
incorporamento ao conjunto normativo. Cabe ao intérprete vivificá-la e
dar-lhe a destinação adequada às exigências sócio-culturais dos seus
súbditos, assim entendidos pela submissão gerada pela coercibilidade das
normas. Destacando a missão do exegeta, diz Caio Mário da Silva Pereira
que “só o esforço hermenêutico pode dar vida ao nosso Código
Comercial, publicado em 1850, diante da complexidade da vida mercantil
de nossos dias; só pela actualização do trabalho do intérprete é possível
conceber-se o vigor do Código de Napoleão, que vem de 1804, ou a
sobrevivência dos cânones da Constituição americana, que é de 1787”10.

Aqui abro um parênteses para registar o meu descontentamento com a


repetida sinonímia que é atribuída aos vocábulos hermenêutica e
interpretação das normas jurídicas. Com efeito, a interpretação é a tarefa
desenvolvida pelos estudiosos, mirando alcançar o exacto sentido da
norma, perquirindo, inclusive a mens Iegislatoris e outros dados que
sirvam à correcta subsunção do fato à regra. Já a hermenêutica “é a
teoria da interpretação das leis. A hermenêutica é que fornece os
elementos ou os métodos para a interpretação”.’11A hermenêutica
instrumentaliza o exegeta, para que este proceda a interpretação.

10
Institui ções de Direito Civil, Forense, 1991, vol. 1, p. 135.

11
Joio Franzen de Lima, in Curso de Direito Civil Brasileiro, Forense, 4’edição, vol. 1, p. 109.

139
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

Volvendo ao tema mater, é sabido que várias são as espécies de


interpretação classificadas pelos doutrinadores, também chamados de
processos de interpretação. E clássica a enumeração de Tito Fulgêncio12,
ordenando ditos processos quanto à origem e quanto aos elementos.

Quanto à origem, a interpretação pode ser:

a) Autêntica, quando operada por intermédio de um novo diploma,


editado posteriormente ao texto obscuro, ao qual visa dar a clareza
originariamente omitida, vezes por despreparo intelectual do
confeccionador da norma. Nessas hipóteses, lembra Caio Mário da
impossibilidade da explicação ser dada por um diploma hierarquicamente
inferior à norma explicada.13 b) Judicial, quando proferida por órgão
judicante, independentemente de nível, assim sendo entendida tanto a
manifestação de um Juízo monocrático como o decisum de um Tribunal.
A adequação do caso sub judice à norma eleita como a ele aplicável (ou a
operação inversa), finda por exigir do julgador a demonstração do
entendimento que este auriu da norma aplicada. Mais das vezes tal
exigência é imperativo legal, inarredável, como é o caso Moçambicano.
João Franzen de Lima chama este método de interpretação judiciária,
ressaltando que “as decisões da justiça só se impõem às pessoas que
forem parte na demanda; mas a interpretação reiterada da lei num
mesmo sentido constitui a jurisprudência, que tem relevante valor para a
decisão de casos análogos” 14.

e) Doutrinária ou doutrinal, desde que feita pelos doutores do direito, ou


seja, os jurisconsultos, em seus escritos e opinamentos, detalhando o

12
Programas de Direito Civil, vol. 1, p. 7.

13
ob. op. cit., p. 137.

14
ob. op. cit., p. 110.

140
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

texto da norma em conjugação com os conceitos que inspiraram a edição


desta.

Quanto aos elementos, a interpretação é considerada:

a) Gramatical, em razão do intérprete recorrer a elementos puramente


filológicos do texto analisado, deste extraindo o sentido após acurada
apreciação do emprego das palavras, da significação dos vocábulos.
Exemplifica Amoldo Wald que “quando se declara na lei que todos os
homens têm capacidade jurídica e o intérprete quer saber se o texto
estabelecido visa não apenas ao homem, mas também à mulher, vamos
estudar qual o sentido da palavra homem utilizado pelo legislador...
Veremos, assim, que a intenção do legislador, ao empregar a palavra
todo homem era de usar o masculino, abrangendo tanto o masculino
como o feminino, quer dizer, dando a capacidade jurídica não só ao
homem como também à mulher” 15

A interpretação gramatical é também denominada literal, farisaica e


especiosa e foi introduzida na ciência jurídica pelos adeptos da Escola de
Exegese, movimento cultural contemporâneo do Código Napoleónico de
1804, e cujo fundamento-mor era a desnecessidade de analisar o diploma
sob outros prismas, já que segundo Demolombe, a lei era tudo,
competindo ao intérprete apenas “extrair o sentido pleno dos textos,
para apreender-lhes o significado, ordenar as conclusões parciais, e,
afinal, atingir as grandes sistematizações.16

Pelos filiados à Escola de Exegese, algumas regras foram erigidas a


princípio para a aplicação do método gramatical, a saber:

15
Curso de Direito Civil Brasileiro, 6’ediçio, RT. p. 70, vol. 1,1989.

16
Miguel Reale, ob. op. cit., p. 308.

141
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

1 - As palavras devem ser analisadas em articulação com os outros


vocábulos do texto.

II - Se uma palavra tem um sentido técnico ao lado de um sentido


vulgar, deve o intérprete optar pelo sentido técnico.

III - O sentido comum da palavra, entretanto, não deverá ser des-


prezado, desde que não contenha inexactidões, impropriedades ou
equivocidades.

IV - O processo gramatical deve ser considerado como o início da


actividade interpretativa do Direito, estando sujeito, pois, às falhas e às
imperfeições factíveis na actividade humana.

Críticas são disparadas contra a interpretação gramatical, pelos mais


representativos cultores do Direito. Tanto que, em reacção às Escolas de
estrito legalismo (a de Exegese e a Pandectista, esta última elevando a
norma legal ao patamar de dogma), surgiram a Escola Histórica-
Dogmática (o elemento sistemático deveria ser utilizado, reconstruindo o
sistema orgânico do Direito, do qual mostrava apenas uma face); a Escola
Actualizadora do Direito (a lei com vida própria e o Direito
acompanhando as evoluções sociais); e a Escola Teleológica (o carácter
finalista do Direito).

É preciosa a observação do Prof. Ruy Barbosa Nogueira, para quem a


interpretação gramatical “dentro do Direito é assim chamada, brevitatis
causa, porque na verdade, no campo jurídico, ela contém um plus, tem
que ser uma interpretação gramatical - jurisdicizada, isto é, uma
interpretação jurídico-gramatical, para ser válida’ 17

17
Interpreta çáo no Direito Tributário, RT, 1989, p. 13.

142
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

b) Lógica 18 consistindo na ênfase oferecida à analise do texto da


norma, em lugar das palavras que compõem o mesmo. Busca descobrir o
sentido e o alcance da lei independentemente do auxílio de elementos
exteriores, aplicando ao dispositivo regras tradicionais e precisas,
tomadas de empréstimo à lógica geral. Pode ser fraccionada em três
subespécies: analítica, sistemática e jurídica.

A interpretação analítica é lógica por excelência, contradizendo a


interpretação gramatical, afirmando o espírito do texto sobre as palavras
do texto. Para os seus defensores, cabe ao intérprete analisar a obra em
si, e não a intenção de quem a fez.

Na interpretação sistemática, todas as normas devem ser analisadas


tendo em conta as suas inter-relações com outras normas do
ordenamento.

Já a interpretação jurídica, para efeito didáctico, é desdobrada em três


campos de perquirição: a ratio legis (qual a razão da existência da
norma); a vis legis (qual o grau de vigor da norma. Se é de jus cogens ou
não, etc.); e o ocasio legis (a conjuntura sócio-histórico-cultural que
serviu de contorno à criação da norma).

O Prof. Paulo Lopo Saraiva elencou os seguintes métodos de


interpretação:

1 - Legal. Considera a obscuridade ou a dubiedade do texto da lei, outra


norma é editada para aclarar o(s) aspecto(s) controvertido (s). E a
interpretação autêntica, à qual nos referimos parágrafos acima.

18
Aqui digredimos da sistematização formulada por Tito Fulgêncio (ob. op. cit., p.

136) e ioáõ Franzen de Lima (ob. op. cit., pp. 110 e 111), preferindo analisar a interpretação sistemática
como espécie de interpretação lógica, ao lado da interpretação analítica e da interpretação jurídica. Quase ao
estilo de Miguel Reale (ob. op. cit., pp. 309 e as.).

143
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

II - Doutrinária. Também chamada doutrinal, flui da opinião dos


jurisconsultores. Já foi reportada neste trabalho.

1H - Jurisprudencial. Descende da interpretação judicial. É por demais


dinâmica, já que é oferecida a casos concretos postos ao julgamento do
poder competente, muito embora passível de cristalização.

IV - Inventiva. Bem ao gosto dos adeptos do jus faciendi, ao


preconizar que ao intérprete é facultado compor as lacunas da norma
jurídica, adequando-a ao caso sub studio, demonstra ser muito mais uma
técnica de integração da norma de que um meio de interpretação desta.

V - Estruturante. Busca vivificar a norma de conformidade com o


contexto onde a mesma está inserida. Assemelha-se à interpretação
sistemática.

VI - Sociológica. Mira adaptar a norma às reais necessidades sociais e


económicas, contemporâneas à aplicação da lei.

VII - Do refazimento da norma. Bem assemelhada à inventiva. A


interpretação tem o condão de praticamente refazer, recriar a norma, de
acordo com o instante sócio-político-, económico da aplicação.

VIII - Restritiva. Método ou processo de interpretação visto na


hermenêutica pelo ângulo do resultado. Segundo Carlos Maximiliano19, o
exegeta extrai do texto menos do que a letra da lei - à primeira vista -
traduz. Ou seja, “o legislador disse mais do que queria (dixit plus quam
voluit) e, então, obriga o intérprete a restringir o sentido da lei”.20

IX - Ampliativa. Outra que é considerada quanto ao resultado advindo


da exegese. E também conhecida como extensiva, ampla, lata, liberal e

19
Hermenéutica e Aplica çao do Direito, Forense, ça edição, p. 198.

20
Amoldo Wald, ob. op. cit., p. 72.

144
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

generosa. Ainda segundo Carlos Maximiliano (ob. op. cit.), extrai do texto
mais do que ditam as palavras (dixit minus quam voluit).

Além dos métodos acima comentados, há outras formas de interpretação


contempladas na doutrina, conforme destaque a seguir.

A interpretação histórica é aquela que toma por base os antecedentes


normativos do texto em análise. Cuida o exegeta de estudar, em caso de
lei, a exposição de motivos, os debates parlamentares, as disposições
internacionais sobre o assunto etc. Presente, passado e futuro, como
circunstâncias de tempo, são encarados pelo intérprete no
desenvolvimento do processo cognitivo da norma. Por isso, “difícil seria
entender o inteiro significado da lei sem consultar elementos históricos,
circunstâncias sociológicas e, ainda, os factores políticos”, como opina
António de Queiroz Filho21. Entretanto, Caio Mano da Silva Pereira diz
que não existe esta modalidade de interpretação, havendo sim, “o
elemento histórico para coadjuvar o trabalho do intérprete”22, que
mesmo sendo de grande valia, não tem autonomia suficiente para figurar
como espécie de interpretação.

É declarativa· ou declaratória23 a interpretação mais singela, limitada a


dizer timidamente o sentido da lei, sem maior aprofundamento do
intérprete. E mais invocada para obstar as outras espécies de
interpretação, sob o argumento de que o texto da norma já é sufi-
cientemente claro. Nesse diapasão, o velho aforismo in claris non fit
interpretatio soa mais comum “não complique o óbvio”.

Progressiva é a exegese que catapulta para o futuro o conteúdo da


norma. E como explica Eduardo Couture: “o certo é que a lei, uma vez

21
Liçôes de Direito Penal, São Paulo, RT, 1966, p. 100.
22
ob. op. cit., p. 140.

23
Amoldo Wald, ob. op. cit., p. 72.

145
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

nascida, segue vivendo ao longo do tempo e muito além da significação


originária que lhe emprestou o legislador: os actos de responsabilidade,
por prejuízos causados pelos automóveis, não estavam na idéia de
Portalís; continuamos, entretanto, a nos guiar pelos princípios do Código
Napoleónico na determinação dessa responsabilidade”24 .

A interpretação teleológica, afirmada por Rudolf Von Jering em sua obra


O Fim do Direito25, como não poderia ser diferente; mira a compreensão
finalística da norma.

A interpretação ab-rogatória é usada quando presente um conflito entre


dispositivos legais. Haverá uma opção do exegeta, conforme veremos
oportunamente.

Posto o inexaurido elenco de métodos, técnicas, processos ou


simplesmente elementos de interpretação das normas jurídicas,
notadamente as legais, está claro que os exegetas dispõem de um vasto
leque de opções para analisar e aflorar o entendimento das ditas regras.
Para selecionar, dentre tantos, qual o caminho mais adequado ao
desbravamento do real objectivo do texto, é mister que sejam adoptados
alguns critérios orientadores da opção acertada. Vejamos.

- A interpretação extensiva não se aplica em casos de:

a) Normas punitivas, em respeito ao princípio da legalidade, servido do


direito natural para o patamar dos princípios constitucionais, exigindo
expressa disposição de lei para a configuração delitiva e a respectiva
sanção

24
Interpreta çâo das Leis Processuais, tradução de Gilda Russoxnano, Max Linionad, São Paulo, 1956, p.
19

25
Citado por Miguel Reale, ob. op. cit., p. 322

146
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

b) Normas de carácter fiscal, notadamente no que diz respeito à


suspensão ou à exclusão do crédito tributário; à outorga de isenção; e à
dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias.

Justifica Pontes de Miranda: “o método de fontes e de interpretação das


leis tributárias não é precisamente o mesmo método de fontes e
interpretação das leis comuns; e a fonte é uma só: a lei. Não há tributo
sem lei que o haja estabelecido, respeitados os princípios constitucionais.
Não se pode, por meio de analogia, ou de argumentos lógicos, estender o
que se editou nas leis. O entendimento é rígido e estreito. A lei tributária
limita direitos, impõe deveres. Por outro lado, é da natureza das leis
tributárias a precisão, pela taxatividade e pelos elementos matemáticos
de que se tem de lançar mão para atingir o património das pessoas que
não são sujeitas às regras jurídicas tributárias”;26

c) Normas de carácter excepcional, quais aquelas geradas em mo-


mento de crise política ou institucional, bem assim as que exceptuam
determinados indivíduos ou entidades da órbita da sua abrangência.
Também são assim havidas aquelas normas carregadas de especifici-
dade tal, que são imprestáveis à tutela de outros casos que não aque-
les norteadores da criação da regra. Exemplo: o decreto de utilidade
pública de certo bem, para fins de desapropriação.

Os romanos resumiam as orientações analisadas nas expressões odiosa


restringenda efavorabilia amplianda: as normas que criam obrigações
devem ser interpretadas restritivamente e as normas que criam
faculdades devem ser interpretadas amplamente.

II - A interpretação extensiva é sugerida nos casos de:

26
Comentários à Constituição de 1967, RT, Tomo II, p. 382.

147
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

a) Normas que assegurem direitos, garantias e prerrogativas;

b)Normas que estabeleçam prazos;

c) Normas que favoreçam o poder público, entendido este como


autêntico representante dos interesses sociais;

d) Normas que têm por objectivo eliminar formalidades, simplifi-


cando procedimentos rotineiros; e

e) Normas que objectivam corrigir defeitos de normas anteriores. São


chamadas de corretoras.

III - A interpretação deve ser estrita:

a) Para as normas punitivas. “Só o legislador, não o Juiz, pode ampliar


o catálogo de crimes inseridos no Código e em leis posteriores”,
conforme ensina Carlos Maximiliano27. Ainda segundo este saudoso
doutrinador, a vedação da exegese lata em caso de normas punitivas,
também é aplicável às disposições apenadoras encartadas no Direito
Privado28

b) Nas normas de carácter fiscal, encaradas sob ângulo da


instrumentalização do Estado para arrecadar meios de manutenção das
suas outras actividades específicas. Para Carlos Maximiliano29, as normas
de natureza fiscal “se aproximam das penais, quanto à exegese; porque
encerram prescrições de ordem pública, imperativas ou proibitivas, e
afectam o livre exercício dos direitos patrimoniais”. Registe-se, mesmo
despiciendo, que a interpretação estrita não se aplica a todas as normas
de Direito Tributário, mas somente aquelas impregnadas de inconteste
fiscalidade. É a excepção, vez que a regra é a interpretação pós-lógica,

27
ob. op. cit., p. 322.
28
ob. op. cii., p. 328.
29
ob. op. cii., p. 332.

148
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

também chamada de interpretação moderna por Adilson Gurgel e Carlos


Gomes: “aquela interpretação que adopta um sistema misto - um
somatório de outros métodos, desde o apriorístico - in dubio pro Iege ou
in dubio pro jure - o literal (em determinados assuntos) até o teleológico
ou finalístico, que se verifica o alcance da norma segundo os fins a que se
destina e os benefícios do bem comum - mens Iegis. Essa forma
interpretativa atende ao que se convencionou chamar de processo
económico de interpretação

- o intérprete deve levar em conta os efeitos económicos do ato e não a


sua forma jurídica (LICC, art. 5Q)”30.

c) Nas normas de Direito Excepcional, ou seja, de subsunção es-


pecífica, ao contrário da generalidade da norma, que é a regra.

IV- Há que ser manejada com reservas a interpretação modificativa,


ensaiadora da primazia da investigação social do facto e da norma ele
adequável, em face do risco que o exegeta impõe ao seu trabalho e ao
resultado deste, dando base, não raro, a considerável desvirtuamento da
norma.

V - E comum a interpretação ficar revestida de autêntica função ab-


rogatória, guinando o exegeta para uma opção entre normas em conflito.
Posto frente ao dilema, poderá o intérprete valer-se das seguintes regras:

a) Dar prioridade ao dispositvo hierarquicamente superior;

b) Se as normas conflutantes forem da mesma hierarquia, opta-se


pela norma primária. Ex: dar preferência ao caput do artigo, em de-
trimento dos parágrafos, incisos ou alíneas deste;

30
Curso de Direito Tributário, Saraiva, 3 edição, p. 37.

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

c) Entre uma norma de jus cogens e outra de jus dispositium,


prevalece o jus cogens;

d) Se uma norma é inequívoca e a outra é imprecisa, opta-se pela


primeira;

e) Falhos os critérios anteriores, opte o intérprete pela norma dotada


de maior alcance social.

Exercicios
P/. O Seria norma infraconstitucional?

R/. Ao lado da norma constitucional, existem normas jurídicas


“inferiores” àque¬la. A “inferioridade” aqui destacada não desdenha a
validez e a utili¬dade dessas normas, mas apenas regista a submissão de
tais editos aos limites impostos pelo diploma fundamental, advindo de
um po¬der constituinte, embora às vezes puramente formal, como
acontece nos casos em que a ordem constitucional é alterada ex vi
tomada vio¬lenta do poder por parcela minoritária da nação. A norma
jurídica infraconstitucional abrange todo o ordenamento “inferior”
positivo do Estado, indo das leis complementares aos ex¬pedientes
ordinativos de feição mais burocrática (portarias, circula¬res, etc),
passando pelos convénios, pelas convenções colectivas de trabalho.

P/. De forma resumida, aponte os métodos de interpretação definidos


pelo Prof. Paulo Lopo Saraiva.

R/. Legal. Considera a obscuridade ou a dubiedade do texto da lei, outra


norma é editada para aclarar o(s) aspecto(s) controvertido. II -
Doutrinária. Também chamada doutrinal, flui da opinião dos
jurisconsultores. III - Jurisprudencial. Descende da interpretação judicial.
IV - Inventiva. Bem ao gosto dos adeptos do jus faciendi, ao preconizar

150
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

que ao intérprete é facultado compor as lacunas da norma jurídica,


adequando-a ao caso sub studio, demonstra ser muito mais uma técnica
de integração da norma de que um meio de interpretação desta. V -
Estruturante. Busca vivificar a norma de conformidade com o contexto
onde a mesma está inserida. VI - Sociológica. Mira adaptar a norma às
reais necessidades sociais e económicas, contemporâneas à aplicação da
lei. VII - Do refazimento da norma. Bem assemelhada à inventiva. VIII -
Restritiva. Método ou processo de interpretação visto na hermenêutica
pelo ângulo do resultado. IX - Ampliativa. Outra que é considerada
quanto ao resultado advindo da exegese. E também conhecida como
extensiva, ampla, lata, liberal e generosa.

P/. Sob que esferas a interpretação da norma deve ser estrita?

R/. Para as normas punitivas; nas normas de carácter fiscal, encaradas


sob ângulo da instrumentalização do Estado para arrecadar meios de
manutenção das suas outras actividades específicasl; Nas normas de
Direito Excepcional, ou seja, de subsunção es¬pecífica, ao contrário da
generalidade da norma, que é a regra.

A INTERPRETAÇÃO DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

Linhas acima foi esboçada uma definição de norma constitucional, sendo


esta aferível - dentre outros indicadores - pela maior dificuldade que se
impõe à sua modificação, em contraponto à relativa facilidade com que
são modificados e até mesmo extintas as normas de carácter ordinário.

Voltada à sustentação do edifício estatal, sem descurar, aí, o enxerto do


elemento humano, a norma constitucional requer do exegeta cuidados
especiais no seu entendimento. Por isso, opina José Alfredo de Oliveira
Baracho31: “os diversos conceitos de Constituição, a natureza específica
das disposições fundamentais que estabelecem regras de conduta de
31
Teoria da Constituição, Resenha Universitária, São Paulo, p. 54.

151
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

carácter supremo e que servem de fundamento e base para as outras


normas de ordenamento jurídico, contribuem para as diferenças entre a
interpretação jurídica ordinária e a constitucional”. Também é assim o
opinamento do Prof. José Augusto Delgado32: “uma metodologia própria
deve ser empregada para bem aplicar a norma constitucional, a fim de
que se destaque o aspecto de dinamismo criador que ela encerra, na
busca de procurar atender ao objecto do Direito Constitucional
materializado, positivado, na Lei Maior”.

Sem descurar do enfoque político-institucional que o intérprete deve


fazer valer em seu mister, a exegese constitucional deve mirar,
sobremodo, a eficácia social encartada na norma. Afinal, a Constituição é
meio e fim, em concomitância, do Estado e da cidadania.

Para lograr sucesso no haurimento do comando regrador, cumpre ao


exegeta, como providência exordial, destacar quais as normas eleitas, no
seio do sistema, como principiológicas. Vencida essa fase, há que montar
uma malha de indicadores, a nível de princípios, através do qual possam
ser pinçadas as normas sub exainem (programáticas, de feição ordinária,
transitórias, etc), sem provocar ranhuras no arcabouço-mor.

Vê-se, destarte, a impossibilidade de eleição de um só processo de


exegese, quando se cuida de matéria constitucional. Pela largueza nela
própria encerrada, e considerando a sua natureza publicística, aplica-se
ao tema a lição de Kelsen33, para quem”... a interpretação jurídica
científica tem de evitar, com máximo cuidado, a ficção de que uma

32
Aplicação da Norma Constitucional, Vox Lcgis, São Paulo, Sugestões Literárias, 1981.

33
Teoria Pura do Direito, Armênio Amado, Coimbra, 4’ edição, p. 472.

152
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

norma jurídica apenas permite, sempre e em todos os casos, uma só


interpretação, a interpretação correcta”.

Em termos claros, podemos afirmar que:

1 - A sensibilidade do exegeta é primordial para a firmação de um liame


entre o fato concreto e a norma, esta quase sempre abstracta.

II - A norma jurídica é um ser lógico, que traça a pauta de com-


portamento dos súbditos do Estado ou da entidade que a proclama,
sempre dotada de coercibilidade, quiçá de coercitividade.

III - A norma jurídica de carácter constitucional, mercê de arcabouçar


o Estado, liga este ao Cidadão, servindo ainda de lastro e referencial ao
ordenamento jurídico infraconstitucional.

IV - São normas constitucionais aquelas que estruturam uma so-


ciedade politicamente organizada.

V - Dentre as normas infraconstitucionais, neste trabalho é enfocada


a lei, que existe como norma escrita, originária de poder competente,
introdutora de algo novo no sistema jurídico, dotada de obrigatoriedade
e coercibilidade.

VI - A interpretação é a vivificação da norma jurídica.

VII - A interpretação da norma jurídica pode ser analisada:

a) Quanto à origem; e b) quanto aos elementos.

VIII - Sine embargo, há outros métodos de interpretação admitidos na


hermenêutica.

IX - Dentre o arsenal de métodos, técnicas, processos ou elementos


de exegese, o intérprete deve usar critérios definidos para seleccionar o
caminho que melhor resultado traga ao seu mister.

153
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

X - Na interpretação das normas constitucionais, deve o exegeta


utilizar o processo que aflore a maior utilidade social da norma, sem
descurar da natureza político-institucional do comand.

Exercicios
P/. Voltada à sustentação do edifício estatal, sem descurar, aí o enxerto
do elemento humano, a norma constitucional requer do exegeta judicial,
cuidados especiais no seu entendimento. Opina José Alfredo de Oliveira
Baracho.

R/. Obviamente que sim, os diversos conceitos de Constituição, a


natureza específica das disposições fundamentais que estabelecem
regras de conduta de carácter supremo e que servem de fundamento e
base para as outras normas de ordenamento jurídico, contribuem para as
diferenças entre a interpretação jurídica ordinária e a constitucio¬nal”.
Uma metodologia própria deve ser empregada para bem aplicar a norma
constitucional, a fim de que se destaque o aspecto de dina¬mismo
criador que ela encerra, na busca de procurar atender ao objecto do
Direito Constitucional materializado, positivado, na Lei Maior.

CONCLUSAO

O Direito e pensamento jurídico actual prioriza as dimensões da


concretização e realização prática. A argumentação jurídica é
indispensável ao âmbito da comunicação linguística dos Tribunais.

A prática dos valores-princípios deve ser apreciada em nível do discurso


jurídico presente na comunicação das decisões judiciais.

A metodologia jurídica é caminho de ensinamento e aprendizagem, “uma


lógica do concreto”.

154
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

O pensamento jurídico pós-moderno realça a importância da realização


dos fins práticos do Direito implicando na prática permanente de valores,
através da ponderação útil e necessária à concreta realização do Direito.

Ao subjectivismo contrapõe-se a objectividade dos princípios éticos e


jurídicos de escalão constitucional. A necessidade da objectivação dos
valores para contemplação dos interesses sociais representa o grande
desafio para as Cortes Constitucionais dos Estados Democráticos de
Direito para afastar as ingerências do poder.

A metodologia jurídica pós-moderna rompe com a racionalidade da


subsunção. Os julgadores da Corte Superior, sob estudo, passam a decidir
com base e fundamento nos juízos valorativos, orientados pelos
princípios, sendo que a interpretação conforme a Constituição é
indicativo de condição de transformação.

A nova metodologia realiza seus afazeres evoluindo do pensamento para


a concretização. A jurisprudência analisada sinaliza para a decidibilidade
útil dos litígios de acordo com a razão prática.

“Outro elemento fundamental para compreender a autonomia do juízo


jurídico é a ligação entre o pensamento jurídico e a aplicação ou ainda a
concretização. O conceito hermenêutico de aplicação é igualmente
decisivo para compreender a originalidade do pensamento jurídico. A
ligação entre o pensamento filosófico actual e a hermenêutica jurídica
das Luzes deve ser realçada, precisamente porque é nos autores
setecentistas que se entende pela primeira vez esta lição. Porém, é
necessário não o esquecer, era a época dos legisladores absolutos, em
que instituições censoras velavam pelo cumprimento por parte dos
professores universitários das instruções contidas nos Estatutos
pombalinos... A aplicação da hermenêutica filosófica teve uma leitura

155
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

política, indiscutível nos escritores portugueses que a ela se referem,


como Pascoal de Melo”. (BARBAS HOMEM, 2003, p. 93).

A dogmática é o caminho de tornar questões de justiça, nos seus diversos


âmbitos, juridicamente operacionais. A dogmática não constitui, apenas,
um elemento decisivo na captação do material jurídico; ela permite a
verificação racional das soluções encontradas e a sua crítica;
pressupondo um nível organizatório elevado da ordem jurídica, ela deve
servir as necessidades da vida (ESSER, 1998).

“A identificação dos problemas de que se ocupa o pensamento jurídico


constitui, assim, a primeira tarefa metodológica da história do
pensamento jurídico. [...] o estudo de diversas classes de problemas que
o pensamento jurídico historicamente tem identificado e procurado
resolver: problemas de organização, em torno da institucionalização da
sociedade e da institucionalização das controvérsias jurídicas; problemas
de comunicação, com a identificação dos instrumentos de comunicação
(dogmática) e de uma ética da comunicação; problemas de
concretização, a propósito da criação, interpretação e aplicação do
direito e da descrição de formas de pensamento jurídico de acordo com a
organização institucional (pensamento legislativo; judicial; forense;
académico). (BARBAS HOMEM, 2003, p. 101)

O saber jurídico não precisa ser compreendido como um saber menor


ou justificar-se pela sua não-cientificidade. A estrutura de discurso que
lhe é peculiar e que mostra ao mesmo tempo toda a sua complexidade,
não é nem melhor e nem pior do que qualquer outra. Avaliá-la em sua
integralidade, enquanto dogmática e enquanto zetética, pode nos
auxiliar, sustentamos, a compreender melhor o fenômeno que
estudamos. A discussão colocada nesse contexto acentua a
complexidade do saber jurídico ao mostrá-lo em relação constante
com dois pólos: a necessidade de contribuir para a decisão dos

156
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

conflitos sociais e o saber científico (VIEHWEG apud ROESLER, 2004, p.


206).

A interpretação conforme à Constituição, se quer continuar a ser


interpretação, não pode ultrapassar os limites que resultam do sentido
literal possível e do contexto significativo da lei. O Tribunal Constitucional
Federal tem tido repetidamente que uma interpretação conforme à
Constituição não é possível em face do claro teor literal da disposição. E
tão pouco deve a interpretação conforme à Constituição deixar de
atender ao escopo da lei. (LARENZ, 1997, p. 480 e 481)

Nos princípios ético-jurídicos de escalão constitucional, como o princípio


do Estado de Direito e do Estado Social, bem como o princípio geral de
igualdade do art. 3º, trata-se, bem entendido, de um Direito
directamente vigente, mas que não está, ou só o está parcialmente,
formulado em normas jurídicas, nas quais previsão e consequência
jurídica estejam claramente delimitadas. Enquanto princípios são pautas
carecidas de preenchimento, para cuja concretização são convocados
tanto o legislador ordinário como a jurisprudência. Aqui vale, segundo a
Constituição, um primado de concretização do legislador. Este significa
que onde o princípio deixe em aberto diferentes possibilidades de
concretização, os tribunais estão vinculados à escolhida pelo legislador
ordinário, não lhes sendo, portanto, lícito substituí-la por outra –
porventura, por via de uma interpretação conforme a Constituição ou de
uma correcção da lei – que em sua opinião seja de preferir. (LARENZ,
1997, p. 481 a 482)

Tribunal Constitucional Federal tem-se referido reiteradamente a uma


ordem de valores imanente à Lei Fundamental, a qual tem mesmo por
vezes denominado de ordem hierárquica de valores. Considera-se
chamado a decidir em relação à revisão de sentenças dos tribunais
comuns transitadas em julgado, sempre que a sentença viole o Direito
Constitucional. Este é sobretudo o caso quando assenta numa concepção,

157
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

em princípio incorrecta, sobre o significado e alcance de um direito


fundamental, ou quando o resultado da interpretação não é compatível
com as normas de direitos fundamentais e com a ordem de valores nelas
estabelecidas. A expressão ordem de valores, ou mesmo ordem
hierárquica de valores, é, no entanto, equívoca. Não deve conceber-se
por tal algo como um catálogo completo de valores válidos em si (com
inclusão da posição hierárquica que em cada caso lhes cabe). Algo assim
transcende, mesmo que fosse de todo em todo possível, as faculdades e
também a competência de um legislador constitucional. Mas é verdade
que subjaz à Lei Fundamental o reconhecimento de determinados valores
humanos gerais como, sobretudo, a dignidade humana e o valor da
personalidade humana, e que para a tutela destes valores foram
atribuídos ao indivíduo direitos fundamentais amplamente tutelados,
como também se elevou a Direito vigente de escalão constitucional
certos princípios ético-jurídicos e político-constitucionais – como o
princípio da igualdade, o princípio do Estado de Direito e do Estado
Social. É também verdade que estes direitos fundamentais e princípios
não estão uns a par dos outros, sem conexão, mas que se relacionam uns
com os outros de acordo com o sentido e, por isso, podem tanto
complementar-se como delimitar-se entre si (LARENZ, 1997, p. 482 a
483).

O Direito, sob uma perspectiva epistemológica, estará sempre sendo


submetido a acção da dicotomia normativismo/legitimação social, pois
enquanto ciência, precisa oferecer a segurança da regra posta, escrita ou
não. Este será o recurso imediato no qual o cidadão procurará guarida
sempre que entender terem sido limitadas ou esbulhadas suas
prerrogativas constitucionais e morais. Afinal, o cidadão, a sociedade não
estará capacitada para discutir o seu direito se não souber qual é esse
direito e onde ele se encontra. O trabalhador conhece vários dos seus
direitos com base na interacção verbal com os do seu meio, mas nem

158
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

todos eles sabem que as regras estão conjugadas na Consolidação da Lei


do Trabalho, basicamente. E por igual via busca-se a segurança jurídica na
área ambiental, de defesa do consumidor, etc. E, no plano superior,
maior, ancora sua segurança jurídica na Constituição da Republica.

No entanto, a sociedade humana possui uma característica impar: a


necessidade visceral da autocrítica. A necessidade permanente de
questionar, de reavaliar “o estado de coisas” em que se encontra em
relação a um comportamento estabelecido ou em relação a uma verdade
dada como inquestionável, faz parte da própria razão de ser da pessoa
humana. “Ser ou não ser, eis a questão” tem tudo a ver connosco.
Questiono porque existo. E por existir, posso não estar satisfeito com o
que está posto e consagrado. Posso até mesmo aceitar o que está
consagrado, porém não me é dado por direito. E cito, como exemplo, o
directo constitucional que “assegura aos presos o respeito à integridade
física e moral” ou de que “ninguém será preso senão em flagrante delito
ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária
competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime
propriamente militar, definidos em lei”. A sociedade discute criticamente,
hoje, a desconversão em realidade dos direitos a prestação social na
nossa Constituição: “São direito sociais a educação, a saúde, o trabalho, a
moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a protecção à
maternidade e à infância, a assistência aos desamparados...” A
insurgência brota porque estes estão aqui, na nossa Lei Mãe. Estão
consagrados, mas não estão legitimados, porque não foram
implementados. E o pensamento jurídico crítico, reconhecendo essa
carência jurídica, em razão da dolência normativa por omissão dos
actores jurídicos, busca anular esta lacuna quando propugna por um
positivismo de combate ou reinterpretando socialmente a norma.

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ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

A submissão à ordem legal não significa a perpétua aceitação da


normatividade que gerência o comportamento social. Na verdade, a
insurgência proactiva tem oferecido conteúdo às lacunas legais e tem
procurado trazer o elemento social com menor capacidade de
representação para o mundo jurídico, porque, historicamente, tem sido
alijado da dinâmica antropológica.

Daí, a importância de entidades como a ordem de Juízes, ordem dos


Advogados; a importância da interpretação das normas
infraconstitucionais à luz da Constituição; da leitura da lei à luz da ética
pública, consubstanciada em lídimas sentenças do Tribunal Supremo.
Importa o pensamento jurídico crítico em reconhecer a legalidade dos
anseios dos movimentos populares, amparados ou não por lei, e traze-los
para o âmbito da possibilidade do legal, pois que muitas de suas
contendas são legítimas e estão consagradas na Lei Mãe, mas ainda
carecem de reconhecimento pelas leis ordinárias.

Em que pese a incapacidade das correntes jurídicas críticas para exprimir-


se como instrumentalização prática, os efeitos da actuação têm sido
extremamente afirmativos. E tem permitido amenizar tensões dramáticas
no seio das sociedades periféricas, como é o caso típico da sociedade
Moçambicana.

160
ISCED – MANUAL DE CIÊNCIAS POLÍTICAS

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