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ISCED

Manual de Curso de Licenciatura em Direito

4º Ano

Disciplina: DIREITO COMERCIAL

Código: ISCED21-CJURCFE009

Total Horas/1o Semestre:

Créditos 5 (SNATCA):

Número de Temas: 5

Instituto Superior de Ciências e Educação a Distância (ISCED).


ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial i

Direitos de autor (copyright)

Este manual é propriedade do Instituto Superior de Ciências e Educação a Distância (ISCED),


e contém reservados todos os Direitos. É proibida a duplicação ou reprodução parcial ou
total deste manual, sob quaisquer formas ou por quaisquer meios (electrónicos, mecânico,
gravação, fotocópia ou outros), sem permissão expressa de entidade editora (Instituto
Superior de Ciências e Educação a Distância (ISCED).

A não observância do acima estipulado o infractor é passível a aplicação de processos


judiciais em vigor no País.

Instituto Superior de Ciências e Educação a Distância (ISCED)


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Beira - Moçambique
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ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial ii

Agradecimentos
O Instituto Superior de Ciências e Educação a Distância (ISCED) agradece a colaboração dos

seguintes indivíduos e instituições na elaboração deste manual:

Autor: Nelson dos Santos Goncalves Muzambue, Lic. em Direito e

Mestre em Direito Empresarial

Coordenação Direção Académica do ISCED

Instituto Superior de Ciências de Educação a Distância (ISCED)

Design

Instituto Africano de Promoção da Educação a Distancia (IAPED)


Financiamento e Logística
Diana Filipa Sousa Pinto, Mestre em Direito Administrativo
Revisão

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ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial iii

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ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial iv

Índice

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ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 1

Visão geral

Benvindo ao Módulo de Direito Comercial

Objectivos do Módulo
Ao terminar o estudo deste módulo de Direito Comercial, o
estudante deverá ser capaz de: Compreender as relações
entre o direito comercial e o direito civil (comum), e os
restantes ramos de direito; Desenvolver uma visão extensa na
área de aplicação do direito comercial; Desenvolver
habilidades para a resolução prática de casos da vida
quotidiana através de hipóteses académicas; Definir actos de
comércio e comerciante; Distinguir os diversos títulos de
créditos; Distinguir a personalidade jurídica e capacidade
comercial; Distinguir e caracterizar os diferentes tipos legais
de sociedades comerciais; Descrever o processo de
constituição das sociedades comerciais Descrever o processo
de alteração das sociedades comerciais.
 Determinar o momento da constituição das sociedades e
respectiva aquisição de personalidade e capacidade
jurídicas;
 Conhecer os direitos e deveres dos sócios;
 Compreender a importância do capital social,
 Descrever os procedimentos de aumento e de redução do
capital social;
 Descrever e compreender as vicissitudes a que estão sujeitas
as sociedades comerciais;

Objectivos
Específicos

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ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 2

Quem deveria estudar este módulo

Este Módulo foi concebido para estudantes do 3º ano do curso de


licenciatura em Direito. Poderá ocorrer, contudo, que haja leitores
que queiram se actualizar e consolidar seus conhecimentos nessa
disciplina, esses serão bem-vindos, não sendo necessário para tal
se inscrever. Mas poderá adquirir o manual.

Como está estruturado este módulo

Este módulo de Direito Comunitário, para estudantes do 2º ano do


curso Direito, à semelhança dos restantes do ISCED, está
estruturado como se segue:

Páginas introdutórias

 Um índice completo.

 Uma visão geral detalhada dos conteúdos do módulo,


resumindo os aspectos-chave que você precisa conhecer para
melhor estudar. Recomendamos vivamente que leia esta
secção com atenção antes de começar o seu estudo, como
componente de habilidades de estudos.

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ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 3

Conteúdo desta Disciplina / módulo

Este módulo está estruturado em Temas. Cada tema, por sua vez
comporta certo número de unidades temáticas visualizadas por
um sumário. Cada unidade temática se caracteriza por conter uma
introdução, objectivos, conteúdos. No final de cada unidade
temática ou do próprio tema, são incorporados antes exercícios de
auto-avaliação, só depois é que aparecem os de avaliação. Os
exercícios de avaliação têm as seguintes características: Puros
exercícios teóricos, Problemas não resolvidos e actividades
práticas algumas incluído estudo de casos.

Outros recursos

A equipa dos académicos e pedagogos do ISCED pensando em si,


num cantinho, mesmo o recôndito deste nosso vasto Moçambique
e cheio de dúvidas e limitações no seu processo de aprendizagem,
apresenta uma lista de recursos didácticos adicionais ao seu
módulo para você explorar. Para tal o ISCED disponibiliza na
biblioteca do seu centro de recursos mais material de estudos
relacionado com o seu curso como: Livros e/ou módulos, CD, CD-
ROOM, DVD. Para além deste material físico ou electrónico
disponível na biblioteca, pode ter acesso a Plataforma digital
moodle para alargar mais ainda as possibilidades dos seus
estudos.

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ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 4

Auto-avaliação e Tarefas de avaliação

Tarefas de auto-avaliação para este módulo encontram-se no final


de cada unidade temática e de cada tema. As tarefas dos
exercícios de auto-avaliação apresentam duas características:
primeiro apresentam exercícios resolvidos com detalhes. Segundo,
exercícios que mostram apenas respostas.

Tarefas de avaliação devem ser semelhantes às de auto-avaliação


mas sem mostrar os passos e devem obedecer o grau crescente de
dificuldades do processo de aprendizagem, umas a seguir a outras.
Parte das tarefas de avaliação será objecto dos trabalhos de
campo a serem entregues aos tutores/docentes para efeitos de
correcção e subsequentemente nota. Também constará do exame
do fim do módulo. Pelo que, caro estudante, fazer todos os
exercícios de avaliação é uma grande vantagem.

Comentários e sugestões

Use este espaço para dar sugestões valiosas, sobre determinados


aspectos, quer de natureza científica, quer de natureza didáctico-
Pedagógica, etc. deveriam ser ou estar apresentadas. Pode ser que
graças as suas observações, o próximo módulo venha a ser
melhorado.

Ícones de actividade

Ao longo deste manual irá encontrar uma série de ícones nas


margens das folhas. Estes ícones servem para identificar
diferentes partes do processo de aprendizagem. Podem indicar
uma parcela específica de texto, uma nova actividade ou tarefa,
uma mudança de actividade, etc.

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ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 5

Habilidades de estudo

O principal objectivo deste capítulo é o de ensinar aprender a


aprender. Aprender aprende-se.

Durante a formação e desenvolvimento de competências, para


facilitar a aprendizagem e alcançar melhores resultados, implicará
empenho, dedicação e disciplina no estudo. Isto é, os bons
resultados apenas se conseguem com estratégias eficientes e
eficazes. Por isso é importante saber como, onde e quando
estudar. Apresentamos algumas sugestões com as quais esperamos
que caro estudante possa rentabilizar o tempo dedicado aos
estudos, procedendo como se segue:

1º Praticar a leitura. Aprender a Distância exige alto domínio de


leitura.

2º Fazer leitura diagonal aos conteúdos (leitura corrida).

3º Voltar a fazer leitura, desta vez para a compreensão e


assimilação crítica dos conteúdos (ESTUDAR).

4º Fazer seminário (debate em grupos), para comprovar se a sua


aprendizagem confere ou não com a dos colegas e com o padrão.

5º Fazer TC (Trabalho de Campo), algumas actividades práticas ou


as de estudo de caso se existirem.

IMPORTANTE: Em observância ao triângulo modo-espaço-tempo,


respectivamente como, onde e quando...estudar, como foi referido
no início deste item, antes de organizar os seus momentos de
estudo reflicta sobre o ambiente de estudo que seria ideal para si:
Estudo melhor em casa/biblioteca/café/outro lugar? Estudo
melhor à noite/de manhã/de tarde/fins de semana/ao longo da
semana? Estudo melhor com música/num sítio sossegado/num

5
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 6

sítio barulhento!? Preciso de intervalo em cada 30 minutos, em


cada hora, etc.

É impossível estudar numa noite tudo o que devia ter sido


estudado durante um determinado período de tempo; Deve
estudar cada ponto da matéria em profundidade e passar só ao
seguinte quando achar que já domina bem o anterior.

Privilegia-se saber bem (com profundidade) o pouco que puder ler


e estudar, que saber tudo superficialmente! Mas a melhor opção é
juntar o útil ao agradável: Saber com profundidade todos
conteúdos de cada tema, no módulo.

Dica importante: não recomendamos estudar seguidamente por


tempo superior a uma hora. Estudar por tempo de uma hora
intercalado por 10 (dez) a 15 (quinze) minutos de descanso
(chama-se descanso à mudança de actividades). Ou seja que
durante o intervalo não se continuar a tratar dos mesmos assuntos
das actividades obrigatórias.

Uma longa exposição aos estudos ou ao trabalho intelectual


obrigatório, pode conduzir ao efeito contrário: baixar o rendimento
da aprendizagem. Por que o estudante acumula um elevado
volume de trabalho, em termos de estudos, em pouco tempo,
criando interferência entre os conhecimentos, perde sequência
lógica, por fim ao perceber que estuda tanto mas não aprende, cai
em insegurança, depressão e desespero, por se achar injustamente
incapaz!

Não estude na última da hora; quando se trate de fazer alguma


avaliação. Aprenda a ser estudante de facto (aquele que estuda
sistematicamente), não estudar apenas para responder a questões
de alguma avaliação, mas sim estude para a vida, sobre tudo,

6
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 7

estude pensando na sua utilidade como futuro profissional, na área


em que está a se formar.

Organize na sua agenda um horário onde define a que horas e que


matérias deve estudar durante a semana; Face ao tempo livre que
resta, deve decidir como o utilizar produtivamente, decidindo
quanto tempo será dedicado ao estudo e a outras actividades.

É importante identificar as ideias principais de um texto, pois será


uma necessidade para o estudo das diversas matérias que
compõem o curso: A colocação de notas nas margens pode ajudar
a estruturar a matéria de modo que seja mais fácil identificar as
partes que está a estudar e Pode escrever conclusões, exemplos,
vantagens, definições, datas, nomes, pode também utilizar a
margem para colocar comentários seus relacionados com o que
está a ler; a melhor altura para sublinhar é imediatamente a seguir
à compreensão do texto e não depois de uma primeira leitura;
Utilizar o dicionário sempre que surja um conceito cujo significado
não conhece ou não lhe é familiar;

Precisa de apoio?

Caro estudante, temos a certeza que por uma ou por outra razão, o
material de estudos impresso, lhe pode suscitar algumas dúvidas
como falta de clareza, alguns erros de concordância, prováveis
erros ortográficos, falta de clareza, fraca visibilidade, páginas
trocadas ou invertidas, etc). Nestes casos, contacte os serviços de
atendimento e apoio ao estudante do seu Centro de Recursos (CR),
via telefone, sms, E-mail, se tiver tempo, escreva mesmo uma carta
participando a preocupação.

Uma das atribuições dos Gestores dos CR e seus assistentes


(Pedagógico e Administrativo), é a de monitorar e garantir a sua
aprendizagem com qualidade e sucesso. Dai a relevância da

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ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 8

comunicação no Ensino a Distância (EAD), onde o recurso as TIC se


torna incontornável: entre estudantes, estudante – Tutor,
estudante – CR, etc.

As sessões presenciais são um momento em que você caro


estudante, tem a oportunidade de interagir fisicamente com staff
do seu CR, com tutores ou com parte da equipa central do ISCED
indigitada para acompanhar as sua sessões presenciais. Neste
período pode apresentar dúvidas, tratar assuntos de natureza
pedagógica e/ou administrativa.

O estudo em grupo, que está estimado para ocupar cerca de 30%


do tempo de estudos a distância, é muita importância, na medida
em que permite-lhe situar, em termos do grau de aprendizagem
com relação aos outros colegas. Desta maneira ficará a saber se
precisa de apoio ou precisa de apoiar aos colegas. Desenvolver
hábito de debater assuntos relacionados com os conteúdos
programáticos, constantes nos diferentes temas e unidade
temática, no módulo.

Tarefas (avaliação e auto-avaliação)

O estudante deve realizar todas as tarefas (exercícios, actividades e


autoavaliação), contudo nem todas deverão ser entregues, mas é
importante que sejam realizadas. As tarefas devem ser entregues
duas semanas antes das sessões presenciais seguintes.

Para cada tarefa serão estabelecidos prazos de entrega, e o não


cumprimento dos prazos de entrega, implica a não classificação do
estudante. Tenha sempre presente que a nota dos trabalhos de
campo conta e é decisiva para ser admitido ao exame final da
disciplina/módulo.

Os trabalhos devem ser entregues ao Centro de Recursos (CR) e os


mesmos devem ser dirigidos ao tutor/docente.

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ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 9

Podem ser utilizadas diferentes fontes e materiais de pesquisa,


contudo os mesmos devem ser devidamente referenciados,
respeitando os Direitos do autor.

O plágio1 é uma violação do Direito intelectual do(s) autor(es). Uma


transcrição à letra de mais de 8 (oito) palavras do texto de um
autor, sem o citar é considerado plágio. A honestidade, humildade
científica e o respeito pelos Direitos autorais devem caracterizar a
realização dos trabalhos e seu autor (estudante do ISCED).

Avaliação

Muitos perguntam: Com é possível avaliar estudantes à distância,


estando eles fisicamente separados e muito distantes do
docente/tutor!? Nós dissemos: Sim é muito possível, talvez seja
uma avaliação mais fiável e consistente.

Você será avaliado durante os estudos à distância que contam com


um mínimo de 90% do total de tempo que precisa de estudar os
conteúdos do seu módulo. Quando o tempo de contacto presencial
conta com um máximo de 10%) do total de tempo do módulo. A
avaliação do estudante consta detalhada do regulamento de
avaliação.

Os trabalhos de campo por si realizados, durante estudos e


aprendizagem no campo, pesam 25% e servem para a nota de
frequência para ir aos exames.

Os exames são realizados no final da cadeira disciplina ou modulo e


decorrem durante as sessões presenciais. Os exames pesam no
mínimo 75%, o que adicionado aos 25% da média de frequência,
determinam a nota final com a qual o estudante conclui a cadeira.

1
Plágio - copiar ou assinar parcial ou totalmente uma obra literária,
propriedade intelectual de outras pessoas, sem prévia autorização.

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ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 10

A nota de 10 (dez) valores é a nota mínima de conclusão da


cadeira.

Nesta cadeira o estudante deverá realizar pelo menos 3 (três)


testes e 1 (um) (exame).

Algumas actividades práticas, relatórios e reflexões serão utilizados


como ferramentas de avaliação formativa.

Durante a realização das avaliações, os estudantes devem ter em


consideração a apresentação, a coerência textual, o grau de
cientificidade, a forma de conclusão dos assuntos, as
recomendações, a identificação das referências bibliográficas
utilizadas, o respeito pelos Direitos do autor, entre outros. Os
objectivos e critérios de avaliação constam do Regulamento de
Avaliação.

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ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 11

Tema I: ORIGEM, EVOLUÇÃO E FONTES DO DIREITO COMERCIAL

Unidade tematica 1.1. Origem

Unidade tematica 1.2. Exercicios da unidade

INTRODUÇÃO

Nesta primeira unidade temática, iremos nos dedicar


necessariamente as matérias relacionadas a evolução histórica do
Direito comercial, objecto do direito comercial, sua autonomia,
especialidade e suas fontes, características do Direito Comercial,
interpretação e integração de lacunas no Direito Comercial.
Para o nosso entendimento e também de acordo com alguns autores,
o Direito comercial regula uma certa espécie de normas jurídicas que
derivam do exercício do comércio e de outras actividades afins. Logo,
trata-se de um Direito Privado especial, pois afastando-se das regras
gerais do Direito Civil, vigora só para uma classe específica de relações
jurídicas, que o legislador destacou em partes para as submeter a um
regime diferenciado.
De acordo com o conceito dado por Manuel Guilherme Júnior2, O
Direito Comercial é um ramo do Direito Privado composto por um
(sistema) conjunto de normas jurídicas com a função de disciplinar os
actos do comércio e os empresários comerciais.
O objecto do Direito comercial vem definido no artigo 1º do C. Com, e
segundo o mesmo dispositivo legal, o objecto de regulação do Direito
Comercial, estabelecendo duas situações:
A parte inicial do mesmo artigo (1)3 define o objecto do direito
comercial a partir do sujeito, o empresário comercial neste caso. A
compreensão desta parte, pressupõe antes a compreensão da
qualificação do sujeito em referência. Remetemos por isso a parte
relativa ao estudo da matéria atinente ao empresário comercial.

2
JÚNIOR, Manuel guilherme, manual de direito comercial Moçambicano, escolar
editora, Maputo, 2012.
3
Vide o artigo 1º do Código Comercial, aprovado pelo Decreto-Lei n°2/2009 de 29
de Abril.
11
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 12

Na segunda parte do artigo 1º do C.Com, o legislador ordinário usou a


terminologia mais importante no âmbito do estudo deste ramo de
Direito. Com muita razão e logica, o legislador não se preocupou em
descrever os tipos de actos do comércio, pois sob ponto de vista
logico esta actividade seria inesgotável.

Objectivos específicos

Ao completar esta unidade, o estudante deverá ser capaz de:

 Saber definir o Direito comercial;

 Conhecer os conceitos básicos do Direito Comercial;

 Conhecer a relação existente entre o direito comercial e


outros ramos de Direito;

 Conhecer a autonomia do Direito Comercial;

 Conhecer e distinguir as fontes de Direito Comercial;

 Conhecer as características do Direito Comercial;

 Conhecer a interpretação e integração de lacunas no Direito


Comercial.

EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO COMERCIAL

A formação do Direito comercial4 foi justificada pela convicção,


triunfante no inicio do sec. XIX de que a vida comercial exige um ramo
autonomo de Direito a desintegrar-se do Direito Civil. As condicoes de
exercicio, nomeadamente a celeridade por este requerida, eram
incompativeis com a rigidez que caracteriza o Direito Civil, por isso, o
movimento de autonomizacao se apersentou como obvio.
No Egito antigo, cerca de 3000 a. C., o comércio era monopólio do
Estado, ou seja, do Faraó e seus parentes. Não existia o comércio
difundido entre os do povo. Entre eles se praticava a troca, como
também ocorria entre os fenícios, troianos, cretenses, sírios,

4
C. VIVANTE, Elementi di Diritto Commerciale, Milano, Ulrico Hoepli, 1936, p. 1.
12
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cartagineses, babilônicos. Os romanos, embora não possuíssem uma


legislação comercial específica, contribuíram com o Direito Comercial:
o costume da escrituração doméstica, difundido em todas as casas,
que deu origem aos livros comerciais; as regras sobre contratos e
obrigações que deram alicerce às transações mercantis; os institutos
da falência e da ação pauliana; o comércio sendo realizado pelos
escravos em nome de seus senhores, o que deu origem à
representação comercial. Este período foi fértil no aparecimento de
institutos importantes para o nosso ramo de estudo, como:
os títulos de crédito, os bancos, a falência se restringindo apenas aos
devedores comerciantes, os contratos mercantis como transporte,
comissão, sociedades. As Cruzadas ajudam a alargar os centros
comerciais, já que seus participantes, além de lutarem, também
faziam o papel de mercadores.
Modernamente, a tendência é que as regras do Direito Comercial
tenham por base o exercício profissional e organizado de uma
atividade econômica, exceto a intelectual e as de extração, o que
ocorre sempre em uma empresa, por isso este período se denomina
período subjetivo da empresa (teoria da empresa).
Empresa, segundo o Dicionário Aurélio, é a organização econômica
destinada à produção ou venda de mercadoria ou serviços, tendo
como objetivo o lucro. Por isso, a teoria da empresa é utilizada para
delimitar as regras do Direito Comercial. No Brasil, o comércio existe,
praticamente, desde seu descobrimento. Madeira, pedras preciosas,
ouro, escravos, açúcar.

Com a vinda da família real para o Brasil, em 1808, houve a abertura


dos portos brasileiros às nações amigas, através da Carta Régia, dando
origem às primeiras normas nacionais que disciplinaram o nosso
comércio.

13
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Foram usadas até 1850 as legislações portuguesas (Ordenações


Filipinas, 1603)5. Dessa época, datam a criação da Real Junta de
Comércio e do Banco do Brasil.

Com a promulgação do Código Comercial em 1850, em vigor até hoje,


com muitas alterações, o Brasil passou a ter seu diploma legal especial
para a matéria. Note-se que a importância da atividade econômica
tem sido tão grande através dos tempos, que o Brasil teve um Código
Comercial muito antes de ter seu Código Civil (1916). Por isso, muitas
questões civis estavam nele reguladas, como o mandato, a locação, a
fiança, a hipoteca, o modo de extinção das obrigações através do
pagamento, da novação e da compensação.

A redação do Código Comercial foi iniciada em 1809, terminando em


1834, ocupando um período de nove anos, portanto. A demora de
dezesseis anos na promulgação do Código foi tão sentida, que no
mesmo ano de 1850 e em 1851, outros regulamentos surgiram para
aperfeiçoá-lo. Com a Proclamação da República, a modernidade
reclamava novas leis Assim, interessam diretamente ao Direito
Comercial o comércio interno e exterior, as importações e
exportações, o comércio de coisas corpóreas e incorpóreas, de
serviços, de riscos, a circulação de produtos, por via aérea, rodoviária,
ferroviária, de cabotagem, marítima, o comércio fixo e o ambulante,
as atividades de produção e transformação de bens, em geral.

Ficam de fora as atividades do setor extrativo (mineração, agricultura,


pecuária), desde que não exploradas por pessoas jurídicas, e as
atividades intelectuais, exercidas por profissionais liberais.

Por esse alargamento na matéria regulada pelo Direito Comercial é


que se utiliza hoje a terminologia Direito Empresarial, conforme a
teoria da empresa. O Direito Comercial pode ser conceituado em
nossos tempos como o conjunto de regras que disciplinam a atividade

5
Idem, pág. 2.
14
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 15

dos empresários, das sociedades empresariais e os atos de comércio,


mesmo quando praticados por não-empresários.

NOÇÃO E NATUREZA JURÍDICA DO DE DIREITO COMERCIAL

De acordo com Manuel Guilherme Júnior6, O Direito Comercial é um


ramo do Direito Privado composto por um (sistema) conjunto de
normas jurídicas com a função de disciplinar os actos do comércio e
os empresários comerciais.
Já o professor Miguel J. A. Pupo Correia define o Direito Comercial
como o corpo de normas, conceitos e princípios jurídicos, que no
domínio do Direito Privado regem os factos e as relações jurídicas
comerciais7.
Analisemos de forma detalhada cada uma das definições da nossa
disciplina (Direito Comercial). Começando pela primeira, do Mestre
Manuel Guilherme Júnior, este começa por conceituar o direito
comercial como um ramo do direito privado, se formos a analisar os
critérios clássicos de distinção do direito publico e privado, vamos
concluir que o autor foi feliz ao enquadrar o direito comercial no
direito privado, senão vejamos:
Dos critérios supra destacados podemos mencionar três (3)
nomeadamente o dos sujeitos, de interesses e da qualidade dos
sujeitos. De acordo com o critério dos sujeitos, estaremos em face de
Direito Privado nos casos em que ambos os sujeitos são pessoas
singulares ou colectivas (de direito privado), o que acontece muitas
vezes no exercício da actividade comercial.
Encontramos na relação jurídica de comercio por um lado o
empresário comercial como uma pessoa jurídica privada quer seja ela
individual ou colectiva, casos há em que o Estado aparece como um
intervenientes da relação jurídica do direito comercial, pois neste

6
JÚNIOR, Manuel guilherme, manual de direito comercial Moçambicano, escolar
editora, Maputo, 2012.
7
CORREIA, Miguel J.A. Pupo, Direito Comercial - Direito da Empresa, 10ª Edição
revista e actualizada, Ediforum, Lisboa, 2007.
15
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 16

caso aplica-se as normas previstas no código comercial e no direito


subsidiário (Direito Civil) aplicando-se o Código Civil, pois estaremos
em face de uma relação privada, porque se fosse publica aplicar-se-
iam as normas do Direito Administrativo tal como acontece nos
contratos administrativos, que estão sujeito as normas do Direito
Administrativo.
Para além do critério dos sujeitos, temos o critério dos interesses, na
relação jurídica comercial, visam-se interesses privados, por um lado
temos o comerciante ou empresário comercial que exerce a
actividade para ganhar lucros, e por outro lado temos as pessoas
singulares ou colectivas que acorrem ao estabelecimento
comerciante para adquirirem os bens ou serviços e
consequentemente satisfazerem as suas necessidades que assumem
o caracter puramente privado, e por ultimo temos o critério da
qualidade dos sujeitos, que faz do Direito Comercial um ramo do
Direito Privado, porque na relação jurídica de direito comercial tanto
o empresário comercial ou o comerciante, assim como os clientes
aparecem despidos de qualquer poder de autoridade ou iús imperiu,
o que faz do Direito Comercial um ramo do Direito Privado.
1. O mesmo autor Guilherme Júnior diz ainda que o Direito
comercial como ramo do Direito privado será composto por
um sistema de normas, entenda-se a expressão “norma”
usada pelo autor no sentido amplo, pois salvo melhor opinião
em contrario, o autor usou a expressão em causa para
englobar todos os actos normativos que se destinam a regular
as relações jurídicas comerciais, em que podemos destacar a
lei, o Decreto-lei, os Decretos, os Diplomas Ministeriais, os
Regulamentos administrativos ou ainda posturas municipais.
2. Estas normas vão disciplinar por um lado os actos do
comércio, bem como os empresários comerciais. O Direito
Comercial pesem bora ser um ramo do Direito Privado, está
preocupado com a regulamentação da actividade comercial

16
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 17

por um lado, e por outro lado com os empresários comerciais,


pois haverá uma necessidade de regulamentação jurídica das
relações comerciais para que estas não sejam desenvolvidas
contra as normas e os princípios fundamentais do
ordenamento jurídico, bem como as regras da moral e dos
bons costumes.
3. Por um outro lado o autor nos diz que o Direito Comercial vai
regular a actividade dos empresários comerciais, o que
afigura-se como mais logico possível, pois a qualidade de
empresário comercial não deve ser adquirida a belo prazer
daquele que pretende assim de designar, pois esta qualidade
é adquirida mediante o preenchimento de alguns requisitos
previstos na lei comercial (código comercial), como por
exemplo a regra relativa a idade mínima para o exercício da
actividade comercial, sendo necessário atingir a maioridade8
(21 anos) nos termos do artigo 130º do Código Civil, ou ainda
dezoito anos (18) com autorização dos pais, do tutor ou do
juiz na falta dos pais ou do tutor tal como ilustra os artigos 9º
e 10º do Código Comercial (C. Com).9
4. Já o professor Pupo Correia começa a noção de Direito
Comercial com o corpo de normas, conceitos e princípios
jurídicos, na primeira parte desta noção podemos encontrar
uma pequena diferença com a que foi apresentada
anteriormente (pelo Mestre Manuel Guilherme Júnior) pois o
Professor Pupo Correia fala dos princípios jurídicos, algo não
abordado não primeira definição de Direito Comercial, e
destes princípios jurídicos podemos elencar alguns que
aplicam-se ao Direito Comercial como por exemplo o Principio
da Legalidade e boa-fé, o mesmo autor também enquadra o

8
Vide o artigo 130 do Código Civil.
9
Vide os artigos 9 e 10 do Código Comercial da Republica de Moçambique,
actualizado pelo Decreto-lei n° 2/2009 de 24 de Abril.
17
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 18

Direito Comercial no domínio do Direito Privado, algo que


constatamos na noção anteriormente discutida.
5. O professor Pupo Correia termina a noção de Direito
Comercial defendendo que o corpo de normas e princípios
jurídicos vai regular os factos e as relações jurídicas
comerciais, portanto, nesta noção o autor engloba todos os
aspectos inerentes ao empresário comercial e a empresa
comercial, bem como as relações jurídicas comerciais.
6. Portanto, não encontramos grandes discrepâncias nas noções
de Direito Comercial supra avançada, salvo melhor opinião
adoptámos a noção apresentada pelo Mestre Manuel
Guilherme Júnior, pois entendemos que esta afigura-se como
a mais abrangente e adequada ao sistema jurídico
moçambicano, concretamente o código comercial no seu
artigo 1º10, não obstante o autor se abster de fazer menção
aos princípios jurídicos na sua definição, pois estes afiguram-
se como de extrema importância porque servem de
parâmetro para a produção de qualquer norma jurídica,
incluindo as de Direito Comercial.

1.2 Objecto do Direito Comercial

O Direito comercial tem o seu objecto de estudo, tal como acontece


com qualquer outro ramo de estudo. O objecto do Direito comercial
vem definido no artigo 1º do C. Com, e segundo o mesmo dispositivo
legal, o objecto de regulação do Direito Comercial, estabelecendo
duas situações:
A parte inicial do mesmo artigo (1)11 define o objecto do direito
comercial a partir do sujeito, o empresário comercial neste caso. A
compreensão desta parte, pressupõe antes a compreensão da

10
Vide o artigo 1° do Código Comercial vigente em Moçambique, diploma
actualizado pelo novo Decreto-lei n° 2/2009 de 24 de Abril.
11
Vide o artigo 1o do Código Comercial, aprovado pelo Decreto-Lei n°2/2009 de 29
de Abril.
18
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 19

qualificação do sujeito em referência. Remetemos por isso a parte


relativa ao estudo da matéria atinente ao empresário comercial.
Na segunda parte do artigo 1º do C.Com, o legislador ordinário usou a
terminologia mais importante no âmbito do estudo deste ramo de
Direito. Com muita razão e logica, o legislador não se preocupou em
descrever os tipos de actos do comercio, pois sob ponto de vista
logico esta actividade seria inesgotável. Sabiamente, o legislador
submeteu a regulação a lei comercial, todos s actos que a luz da
perspectiva objectiva são tidos como comerciais.
Em termos teóricos o legislador abandonou redacção do código de
1888, que suscitava muita controvérsia de interpretação sem contudo
abandonar o método da definição do objecto da Lei Comercial. Na
verdade, tanto no actual código, como no anterior, a ideia dos
sujeitos e dos actos do comércio aparece subjacente a definição do
objecto deste ramo impondo a sua complementaridade nos artigos
que versam sobre os aspectos.

RELAÇÕES ENTRE O DIREITO COMERCIAL COM OS DEMAIS RAMOS


DE DIREITO

Com o Direito Civil, como já apontado, mantém íntimas relações no


campo obrigacional.

Relaciona-se com o Direito Tributário porque a atividade comercial é


a base da incidência fiscal em nosso país.

O Direito do Trabalho volta-se para a relação de emprego, que


ocorre, em larga escala, na atividade comercial. O Direito Penal trata
de diversas práticas que configuram crimes, como os da concorrência
desleal, contra as marcas e patentes, os contra a economia popular,
sem falar nos mai corriqueiros, perpetrados através de títulos de
crédito, como a falsificação, a fraude ou o estelionato e nos ilícitos
penais falimentares.

Necessária, também, a concorrência do Direito Processual Penal, para


a apuração e apenamento das

19
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 20

condutas típicas. O Direito Administrativo, por sua vez, regula a


atuação do Estado no mercado, muitas vezes competindo com a
iniciativa privada, e, respaldado no interesse social, exerce a
fiscalização das atividades do particular, prescrevendo normas e
órgãos próprios, especialmente destacados para tal fim, como nos
casos de intervenção e liquidação extrajudicial de empresas.

O Direito Econômico regulando a política econômico-financeira,


atinge a vida empresarial, a exemplo da regulação do poder
econômico, com se vê na Constituição Federal. Não se pode esquecer
o importante vínculo com o Direito Processual Civil, que dá vida
judicial aos conflitos oriundos dos empreendimentos rentáveis.

A Autonomia do Direito Comercial

Quando discutimos a questão da autonomia do direito comercial,


colocamos a questão que prende-se em perceber se o Direito
Comercial é um ramo do Direito autónomo, ou se está dependente de
um outro ramo do Direito. Antes o Direito Comercial estava dentro do
Direito Civil, que é um ramo do Direito Privado Comum, mas com o
desenvolvimento da ciência jurídica, e das relações jurídicas
comerciais, o Direito Comercial autonomizou-se, torando-se um ramo
do Direito Autónomo.
Sobre a autonomia do Direito Comercial12 existem varias posições na
doutrina. Temos uma concepção objectivista, encabeçada por
VIVANTE, e que influenciou alguns autores como GUILHERME
MOREIRA CUNHA GONCALVES E BARBOSA DE MAGALHÃES, sustentou
que não se justificaria a tradicional autonomização do Direito
Comercial e que preferível seria considerar o Direito Civil como
disciplina jurídica uniforme de todas as relações de direito privado, ou
seja, daquelas que se baseiam na igualdade de posições de sujeitos
das relações jurídicas (critério da posição dos sujeitos).

12
CORREIA, Miguel J.A. Pupo, Direito Comercial - Direito da Empresa, 10ª Edição
revista e actualizada, Ediforum, Lisboa, 2007.

20
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 21

Esta orientação negadora da autonomia do Direito Comercial baseou-


se essencialmente no argumento de que este teria já desempenhado
e esgotado o seu papel de catalisador da evolução do Direito privado,
pois os princípios e regras que ele foi gerando ao longo dos tempos,
acabaram por cada vez mais rapidamente ser absorvidos pelo Direito
Civil.
Entendia-se que os interesses e valores que historicamente
explicariam a autonomia do Direito Comercial a tutela de credito, da
confiança, da boa-fé, da rapidez dos negócios, teriam generalizado o
seu alcance a todos os domínios da actividade humana, em especial
de todos os ramos da economia, não havendo já motivos para os
considerar exclusivamente enformadores do regime-jurídico privado
do comercio e de algumas outras actividades a este assimiladas.
Apesar de alguns ordenamentos jurídicos integrarem a matéria do
Direito Comercial no Código Civil (CC)13, Este não perde a sua
autonomia. O facto de este ser tratado dentro do código civil não
perde a sua autonomia. Isto sucede com vários ramos do Direito
Privado, que apesar de serem tratados no código Civil não perderam a
sua autonomia, o que acontece com o Direito das Sucessões cujo
tratamento jurídico-legal tem a sua sede no livro V do Código Civil,
mas isto não poe em causa a sua autonomia científica, pedagógica ou
formal.
Na ordem jurídica Moçambicana, o tratamento da matéria atinente
ao Direito Comercial ocorre em legislação específica, que é o Código
Comercial, o principal instrumento normativo (Diploma) regulador da
actividade comercial e dos empresários Comerciais em Moçambique,
o referido diploma foi actualizado pelo Decreto – Lei n°2/2009 de 24
de Abril.

13
JÚNIOR, Manuel guilherme, manual de direito comercial Moçambicano, escolar
editora, Maputo, 2012.

21
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 22

A Especialidade do Direito Comercial


O Direito Comercial é considerado Direito especial, assim de
distinguiria do Direito Civil: Direito Comum. A relação de
especialidade ocorre, quando perante um (conjunto de normas) ou
complexo normativo que se dirigia a uma generalidade de situações
jurídicas, um segundo sistema de normas, mas restrito, mas mais
intenso, contemple uma situação que, de outro modo respeitaria ao
primeiro (Direito Civil), dispensando-lhe um tratamento
particularmente adequado14.
A adequação pode resultar de normas diferenciadas que estabeleçam
situações diversas ou de regras complementadoras que precisem,
num ou noutro sentido, soluções deixadas em aberto pelo Direito
comum. A Especialidade é relativa, impõe quando perante duas (2)
áreas normativas, seja possível estabelecer uma relação
geral/especial. O Direito Comercial seria especial em relação ao civil,
mas surgira geral em relação ao Direito bancário, ainda mais especial.
A afirmação da natureza especial do Direito Comercial permite
justificar a aplicação subsidiária do Direito Civil que é o Direito
privado comum, perante o especial, que é o Direito Comercial. A
especialidade resulta então de níveis reguladores mais gerais, e
sobretudo da propiá materialidade das regras consideradas.

DIREITO COMERCIAL OU DOS COMERCIANTES


O Direito Comercial é na verdade o Direito do Comercio ou dos
comerciantes15, alguns usam a designação, direito Comercial, outros
Direitos dos comerciantes, mas não existe qualquer diferença, pois
trata-se de uma questão meramente terminológica. Trata-se do
comércio que em Direito engloba a actividade lucrativa da produção,
distribuição e venda de bens. O termo “Comercio” pode, com
paridade aplicar-se a qualquer dos seguimentos do circuito que une
os produtores e consumidores finais, e ainda, as actividades conexas e

14
Idem, pág. 122.
15
Idem, pág. 125.
22
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 23

acessórias. De acordo com a doutrina, a expressão Direito do


Comercio enquadra-se na concepção objectiva, e por sua vez a
expressão “Direito dos Comerciantes” que também é alargada as
empresas, corresponde a concepção subjectiva, esta solução foi
encontrada pela doutrina nos anos 30 do Seculo XX, pois qualquer
ramo jurídico, por mais especial que seja, pode ser sempre
configurado num sistema subjectivo, regulando não só o comércio,
mas também os comerciantes.

FONTES DO DIREITO COMERCIAL


1. Para discutirmos a matéria atinente as fontes do Direito
Comercial, vamos começar por conceituar as fontes do
Direito16. De acordo com a doutrina, fontes de Direito são os
modos de criação e revelação das normas jurídicas, portanto
o Direito Comercial tal como qualquer outro ramo do Direito
há-de encontrar os seus modos de criação, ou seja, as formas
de criação das normas jurídicas comerciais, ou os modos em
que estas normas se revelam na ordem jurídica
moçambicana.
2. A doutrina aborda as seguintes fontes do Direito Comercial: A
lei, a doutrina, a jurisprudência e as fontes internacionais. Os
usos e costumes serão objecto de discussão mais adiante, o
que vai nos permitir tomar uma posição, se são ou não fontes
do Direito Comercial.
FONTES INTERNAS

As fontes internas são compostas por um conjunto de normas


emanadas pelos órgãos estaduais competentes para o efeito, dentre
os referidos órgãos podemos destacar a Assembleia da Republica e o
Governo, através da aprovação das leis, Decretos e Decretos-Leis.

16
Op. cit. Pág. 148.
23
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 24

A Constituição

Primeiro a constituição. A Constituição é a lei suprema de um sistema


jurídico. A Constituição da Republica contem um conjunto de normas
que prevalecem sobre todas as demais em vigor no ordenamento
jurídico.
Deste modo, torna-se infalível que esta seja fonte de Direito
Comercial. No entanto, existem na constituição normas com alcance
directo sobre o exercício da actividade comercial, a que alguma
doutrina chamaria de constituição comercial para distinguir a
constituição fiscal, constituição económica, etc.
Contudo, podemos concluir que na constituição da república existem
disposições de alcance directo na vida comercial. A esse propósito
podem-se citar os artigos 96º, 97º, 99º, 106 e particularmente o
artigo 107º todos da CRM17.

O CÓDIGO COMERCIAL

A segunda fonte18, o código Comercial aprovado pelo Decreto – Lei n°


2/2005, de 27 de Dezembro, constitui o principal instrumento de
regulação da actividade comercial em Moçambique e nos termos do
seu artigo 1º a lei comercial regula a actividade dos -empresários
comerciais, bem como os actos considerados comerciais.

FONTES EXTERNAS

Não são apenas de considerar as fontes de direito interno, pois o


direito comercial, é particularmente sensível as normas do Direito
Internacional atinente as relações económicas.
Relactivamente as fontes externas, compreende um conjunto de
instrumentos internacionais assinados e ratificados por Moçambique,

17
Vide o artigo 107 da Constituição da Republica de Moçambique, aprovada pela
Assembleia da Republica aos 24 de Novembro de 2004.
18
Cfr o artigo 1º do C.Com aprovado pelo Decreto-Lei 2/2005 de 27 de Dezembro.
24
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 25

nos referimos aos protocolos e tratados internacionais em matéria


comercial19.
São pois de ter em conta importantíssimas convenções internacionais,
que são recebidas no nosso ordenamento jurídico desde que sejam
satisfeitos os requisitos postos pelo artigo 18º da constituição. São
exemplos significativos no que toca ao Direito Comercial convenções
que aprovam as Leis uniformes sobre Letras, e Livranças e sobre
Cheques, Convenção sobre a propriedade Industrial outras
convenções pertinentes a esta matéria, poemos destacar ainda a
carta constitutiva da Organização Mundial do Comercio (OMC),
organização na qual Moçambique é Membro.
Igualmente são de ter em conta normas emanadas das instituições
internacionais e a jurisprudência dos tribunais internacionais, que
forem vinculativas nos termos dos respectivos estatutos. E ainda o
costume internacional, a doutrina em matéria internacional e os
princípios gerais de Direito reconhecidos pelas nações civilizadas.

A Lei

Como e natural no nosso sistema jurídico20, a lei é a principal fonte do


Direito, e consequentemente do Direito Comercial. A Lei deve ser
entendida no seu mais sentido amplo, isto é, abrangendo a lei
constitucional, a lei ordinária e também as normas regulamentares.
Evidentemente estamos a referirmo-nos a lei comercial, isto é,
aquelas normas legais que tiveram sido ditadas pela solução ou tutela
dos interesses específicos das actividades mercantis ou comerciais.
O seu núcleo fundamental é ainda hoje constituído pelo Código
Comercial actualizado pelo Decreto-lei n° 2/2009 de 24 de Abril. Toda

19
GONÇALVES NETO, Alfredo, Lições de Direito Comercial, Vol. 1, São Paulo: Juarez
de Oliveira, 2004.

25
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 26

via, a este código acresce uma abundantíssima legislação


extravagante de grande importância.
Entre varias leis comerciais extravagantes, em que podemos
exemplificar a lei 9/79 de 10 de Julho que define a constituição tipo e
forma de organização cooperativa em Moçambique, Lei 10/2006 de
23 de Dezembro, que visa adequar o código Comercial ao imperativo
da modernidade, segurança e eficácia da justiça, lei 7/79 de 03 de
Julho, que cria a base legal para licenciamento e funcionamento do
sector privado em Moçambique, Lei 8/79 de 03 de Julho que
estabelece o regime jurídico do arrendamento de imoveis, do parque
imobiliário do Estado para habilitação, industria, comercio e serviços,
com as alterações introduzidas pela lei 17/91 de 03 de Agosto,
Decreto- lei n° 2/2009 de 24 de Abril que introduz alterações em
alguns artigos do Código Comercial, Decreto 1/2006 de 03 de Maio,
que vem adoptar um instrumento moderno e consentâneo com o
processo de simplificação de procedimentos de revisão da respectiva
orgânica, Decreto n° 4/2006 de 12 de Abril, que tem em vista aprovar
o código de propriedade industrial aprovado pelo Decreto n° 18/99 de
04 de Maio.

OS USOS E COSTUMES

O artigo 480º n° 1 do C. Comercial21 refere-se aos usos e costumes


como fontes do Direito Comercial, e o elemento histórico de
interpretação permite-nos convencer-nos de que inspirou-se da
(fonte) do artigo 1º do código Comercial de 1882, o qual considerava
os usos e costumes como fontes do Direito Comercial22.
E certo que por vezes o próprio código comercial remete para os usos
comercias como sucede no artigo 480º n° 2 do C. Comercial. A este
propósito, convém distinguir como faz Diogo Leite Campos os usos

21
Vide o artigo 480º do C.Com.
22
Cfr o artigo 1º do Código Comercial de 1882.
26
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 27

dos costumes. Uns e outros são praticas constantes e reiteradas dos


sujeitos de direito, mas ao passo que os usos emanam na pratica
negocial, na qual se difundem e mantem por acção repetitiva das
partes, já os costumes provindo da mesma origem, são a partir de
dado momento, socialmente revestidos de opinio Júris da convicção
generalizada de que o seu acatamento é juridicamente vinculativo e
entram na ordem jurídica, normalmente através de acção dos
tribunais, como regras gerais e abstractas.
O código Civil23 admite em certas disposições os usos como fontes,
mas quando a lei civil para o efeito remeta, tal como vem previsto no
artigo 560º n° 3 do código Civil (CC) aplicável por forca do artigo 7 do
código Comercial, a lei civil é aplicável subsidiariamente nas relações
comerciais desde que as normas a aplicar não sejam contrárias ao
Direito Comercial.
Nota-se que deve-se dar uma atenção muito especial a expressão
“Princípios do Direito Comercial” e não normas do Direito Comercial,
pois salvo opinião em contrário, o legislador quis dar relevância aos
princípios norteadores da vida empresarial e não somente as normas
do Direito Comercial. Posicionando-se, as normas do Direito
Comercial só serão aplicáveis, estarão em vigor se as mesmas se
conformarem com os princípios deste ramo.

INTERPRETAÇÃO E INTEGRAÇÃO DE LACUNAS NO DIREITO


COMERCIAL

1 O Direito Civil é um direito privado geral ou comum24, que regula


genericamente as relações entre as pessoas situadas numa
posição jurídica equivalente. O Direito comercial regula uma certa
espécie dentro desse género de relações: as que derivam do

23
Cfr os artigos 7 e 560 n°3 ambos do Código Comercial Moçambicano.
24
CORREIA, Miguel J.A. Pupo, Direito Comercial - Direito da Empresa, 10ª Edição
revista e actualizada, Ediforum, Lisboa, 2007.

27
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 28

exercício do comércio e de outras actividades afins. Logo, trata-se


de um Direito Privado especial, pois afastando-se das regras gerais
do Direito Civil, vigora só para uma classe específica de relações
jurídicas, que o legislador destacou em partes para as submeter a
um regime diferenciado.
2 Note-se que esta caracterização jurídica não reduz o direito
comercial a um aglomerado de normas excepcionais. Como
sabemos, a norma excepcional é aquela que para determinado
caso, (ou tipo de casos) estabelece uma disciplina não apenas
diferente da que resulta do princípio ou norma geral, mas que
está em conflito com a regra geral.
3 Ora, se é certo que no Direito comercial nos surgem normas que
realmente constituem excepções as regras e princípios gerais do
direito civil, todavia o direito comercial, como conjunto
organizado de normas e princípios que é, não apresenta um
caracter excepcional em face do Direito Civil. O que ocorre é que o
Direito Comercial estabelece sob certos aspectos e para certos e
para certos institutos um regime próprio para certas classes de
pessoas e de relações jurídicas.
4 Esse regime pode estar ou não em contradição com os princípios e
regras do Direito Civil, com o qual apresenta pontos de contacto e
outros de divergência, não se desviando, todavia, de forma
essencial dos caracteres e princípios do Direito privado.
5 Estamos pois perante um ramo de direito especial, o que não tem
pequena importância para a dilucidação do problema da
interpretação e integração de lacunas na lei (código) comercial. O
preceito fulcral para a analise desta questão é o artigo 7º do
código Comercial25, em cujos termos: os casos que o presente
código não preveja são regulado segundo as normas desta lei
aplicáveis aos casos análogos, e, na sua falta, pelas normas do

25
Cfr o artigo 9º do Código Civil moçambicano, aprovado em 1966.
28
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 29

Direito Civil que não forem contrárias aos princípios do Direito


Comercial.
6 Diga-se desde já que a questão da interpretação das normas do
Direito comercial não coloca nenhum problema específico, pelo
que haverá, quanto a ela, quer em conta o artigo 9º do código
Civil (CC).
7 Já a questão de integração de lacunas na lei comercial necessita
de algum esclarecimento, na verdade, por um lado, as normas do
Direito comercial formam um corpo autónomo, como vimos, o
que torna possível a sua aplicação análoga dentro do próprio
corpo comercial (mercantil), que não sucederia se não fossem
normas especiais (artigo 11º do CC)26.
8 O próprio artigo 7º do C. Com prescreve a extensão análoga das
normas jurídico-comerciais a casos nelas não previstos. Alias, nada
exclui que delas faca o uso, para analogia, suprir lacunas do
próprio direito civil, se for o caso.
CARACTERISTICAS DO DIREITO COMERCIAL

1. O Direito Comercial tem um conjunto de características


peculiares que o fazem especial, são algumas dessas
características27:
2. Cosmopolitismo – é um ramo tendencialmente universal, se
assumirmos a funcionalidade do exercício do comércio. No
entanto, tem-se actualmente a ideia de considera-lo um
regime de comércio interno uma vez que surge ao lado dele
um regime internacional aplicável ao comércio internacional.
O Direito Comercial sofre influências dos mercados e se
realiza entre povos, adota institutos e convenções
estrangeiras e para uniformizar seus padrões de realização, e
acompanhando os progressos tecnológicos, que estimulam
sua continuada renovação

26
JUNIOR, Manuel Guilherme, Manual de Direito Comercial, Moçambicano, escolar
editora, Maputo, 2012.
27
Idem.
29
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 30

3. Dinamismo – E um direito de rápida evolução, Esta


característica e de facto intrínseca a natureza da actividade
que a lei comercial regula. O exercício do comércio de per si,
não se compadece com o estaticismo. O dinamismo afigura-se
ainda como uma das características do Direito Comercial para
acompanhar o movimento das relações econômicas, já que
seus atos são praticados com rapidez e em massa. Os
mecanismos de exercício do comércio tem tendências de
modernizarem-se com muita frequência e rapidez. Prova
disso, e o surgimento de novas formas de contratação
comercial, ou seja, novos contratos comerciais que muitas
vezes o legislador não acompanha com a devida
regulamentação.
4. Flexibilidade – Esta característica esta associada a anterior. E
um Direito flexível, um direito que admite margens de
manobra dos seus actores28.
5. Informalismo – que equivale a dizer que o direito comercial e
tendencialmente um direito informal, no sentido de que não
obedece no processo da sua aplicação requisitos rigorosos tal
como acontece no Direito Civil.
6. Presunção de Solidariedade – Em direito comercial, vigora a
presunção de solidariedade entre os sócios, tem em vista a
maior segurança no fluxo comercial.
7. Onerosidade – O direito comercial envolve em regra actos não
gratuitos, a gratuidade não é norma em Direito comercial.
pois o objeto do Direito Comercial é a atividade que sempre
busca lucro. Por exemplo o mandato civil pode ser gratuito
ou oneroso nos termos do artigo 1158º do C. Civil. O mandato
comercial é sempre oneroso.

28
CORREIA, Miguel J.A. Pupo, Direito Comercial - Direito da Empresa, 10ª Edição
revista e actualizada, Ediforum, Lisboa, 2007.
28
JUNIOR, Manuel Guilherme, Manual de Direito Comercial, Moçambicano, escolar
editora, Maputo, 2012.
30
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 31

8. Liberdade de Concorrência – E uma característica do Direito


Comercial, associada ao modelo económico em vigor, do qual
resulta a liberdade de exercício do comércio.
9. Protecção do Credito e da Boa-fé- exactamente pelo facto de
ser um ramo tendencialmente informal e flexível, preocupa-
se com a proteção do crédito, e da boa-fé entre os
operadores comerciais, permitem as negociações e a
contratação corra com maior fluidez.
10. Facilidade da prova – a matéria da prova em direito comercial
não é tao forte tanto quanto o Direito Civil. O simples recibo
de compra de mercadoria constante da escritura mercantil do
empresário comercial prova a existência do contrato de
compra e venda mercantil.
11. Instrumentalidade - pois o Direito Comercial se presta a dar
forma jurídica à realização de negócios e relações comerciais,
que se concretiza sem excesso de formalismos.
12.
DELIMITAÇÃO DO ÂMBITO E OBJECTO DO DIREITO COMERCIAL

A primeira concepção que surgiu a definir o objecto do Direito


Comercial foi a concepção subjectivista, segundo ela, o direito
comercial é o conjunto de normas que regem o actos ou actividades
dos comerciantes relactivos ao seu comércio29.
Prevalecentes nas idades Media e Moderna, como direito corporativo
da classe mercantil, veio ter expressão codificada no HGB Alemão de
1861, e no código Italiano de 1942, onde o fulcro delimitador do
objecto de Direito Comercial se deslocou para a empresa e a tónica
subjectiva para a figura jurídica do empresário, ao mesmo tempo que
o âmbito das actividades empresariais mercantis se alargou a outros
ramos da actividade económica.
Por seu turno, para a concepção objectivista O Direito Comercial é
ramo do direito que rege os actos do comércio, sejam ou não

29
CORREIA, Miguel J.A. Pupo, Direito Comercial - Direito da Empresa, 10ª Edição
revista e actualizada, Ediforum, Lisboa, 2007.
31
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 32

comerciantes as pessoas que o pratiquem. O nosso Direito passa a ser


encarado pelo prisma do seu objecto, isto é, da natureza dos actos
jurídicos que formam o seu núcleo normativo.
Serão estas duas concepções, todavia incompatíveis uma com a
outra? A verdade e que o seu antagonismo é mais aparente que real,
pois entre elas existem significativos pontos de contacto.
Por um lado, a concepção subjectiva para caracterizar a qualidade de
comerciante, não pode prescindir de ter em conta que esta advém da
prática de certos actos e actividades, havidos como comerciais. Alem
disto, mesmo para esta concepção, nem todos os actos dos
comerciantes são comerciais: só são aqueles que tenham em causa
mercantil, ou seja, que resultem do exercício do comercio pelo
comerciante que os pratica.
Ou seja, mesmo a concepção subjectiva não dispensa a determinação
de certos actos como objectivamente comerciais, por serem aqueles
que caracteristicamente pertencem ao exercício profissional do
comércio.
Por outro lado, mesmo no domínio da concepção objectivista, não é
possível abstrair da existência dos comerciantes, isto é, das pessoas
que habitualmente se dedicam a prática de actos e actividades
comerciais. Dai resulta que esta concepção admite a existência de
regras e institutos de direito comercial, que radicam na profissão de
comerciante, como é o caso das obrigações especiais previstas no
artigo 16º do Código Comercial30.
Não há pois sistemas puros, em ambos existem actos do comércio
objectivos e regras próprias da profissão de comerciante. E deste
modo, podemos dizer que na essência diferença entre as duas
concepções se resume a isto:
Na concepção subjectivista, só são comerciais os actos praticados por
comerciantes no exercício do comercio e no exercício do seu
comercio, pelo que não admitem actos comerciais isolados ou

30
Cfr o artigo 16º do Código Comercial Moçambicano.
32
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 33

avulsos, mormente de não comerciantes, já na concepção


objectivista, uma vez que assenta nos actos do comercio
independentemente de quem os pratique, são também como tais
considerados os actos ocasionais, mesmo que não praticados por
comerciantes, ou alheios a actividade profissional de um comerciante,
desde que pertençam a um dos tipos de actos regulados na lei
comercial.

Sumário
Na presente temática abordamos necessariamente sobre a parte
introdutória da matéria concernente ao Direito Comercial.
Abordamos desde o conceito, evolução histórica do Direito comercial,
objecto do direito comercial, sua autonomia, especialidade e suas
fontes, características do Direito Comercial, interpretacao e
integracao de lacunas no Direito Comercial.

Percebemos que o Direito Comercial trata de conjunto de regras ou


normas juridicas que disciplinam e regulama actividade dos
empresários, das sociedades empresariais e os atos de comércio,
mesmo quando praticados por não-empresários.

_________________________________________________
Exercícios do tema 1.

1. O que entende por Direito Comercial Segundo Manuel


Guilherme Júnior?
a) Conjunto de normas que regulam os comerciantes
b) Conjunto de normas que visam controlar e punir os actos
de comércio
c) Normas jurídicas, princípios, que regulam actividade
comercial através da lei da família e código de civil
d) É um ramo do Direito Privado composto por um (sistema)
conjunto de normas jurídicas com a função de disciplinar

33
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 34

os actos do comércio e os empresários comerciais.


Alínea correcta é: D

2. Quais são as fontes de Direito comercial que conhece?


a) A lei, doutrina, jurisprudência, usos e costume
b) Os manuais, a universidade, a sala de aulas
c) Os módulos elaborados por docentes para estudante de
licenciatura em Direito
d) A lei, doutrina, uso e costume excepto a jurisprudência
A resposta correcta é: A

3. Quais são as características de Direito comercial?


a) Cosmopolitismo, dinamismo, flexibilidade, informalismo,
presuncao de solidariedade, onorosidade, liberdade de
concorrência, protecao de crédito e boa-fe e a
instrumentalidade.
b) Dinamismo, flexibilidade, informalismo, presuncao de
solidariedade,
c) Protecao de crédito e boa-fe e a instrumentalidade,
d) Cosmopolitismo, dinamismo, flexibilidade.
A resposta correcta é: A

34
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 35

Tema II – A Empresa no Âmbito do Direito Comercial

Introdução

Nesta temática iremos tratar matérias sobre a empresa, é o conjunto


de actos ligados a actividade economia exercida pelo empresário
comercial de forma profissional e organizada, com vista a realização
de fins de produção ou troca de bens e serviços.
A empresa se apresnta também como um conjunto de actividades
regido pela pessoa do empresário, fazendo apelo a factores e
elementos de natureza heterogénea, actuando sobre um património
de coisas e direitos, dando origem a relações jurídicas, económicas e
sociais, polarizados numa organização apta a desenvolver uma
actividade económica
Ao completar esta unidade, o estudante deve ser capaz de:

Objectivos específicos
 Conhecer a empresa no âmbito de direito Comercial,
 Conhecer a empresa como sujeito jurídico,

35
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 36

 Conhecer a empresa como uma actividade, como objecto,


como conjunto de elementos,
 Conhecer matérias relacionadas com comerciante em nome
individual,
 Conhecer a empresa comercial,
 Obrigações do empresário,
 Saber o que é firma, conhecer os princípios relativos a
constituição de firma e transmissão da firma e,

Unidade temática 2.1. – A Empresa no Âmbito do Direito Comercial

O Direito Comercial tem vindo a reconstruir-se ou redefinir-se em


torno do conceito de empresa. Através deste regresso ao
subjectivismo, tem sido possível a doutrina sustentar a autonomia e a
homogeneidade do núcleo fundamental das matérias do nosso ramo
do direito, centrado já não tanto na pessoa do comerciante, mas sim
na organização por ele empreendida para o desenvolvimento do seu
tráfico mercantil.
Trata-se porem de uma evolução que esta longe de poder considerar-
se concluída, e desde logo porque o próprio conceito de empresa não
se acha perfeitamente adquirido para o direito.
Desde logo, como vimos, o código comercial de 1888 no seu artigo
230º acolheu o conceito de empresa, como antes fizera já o código
Francês de 180731. Só que nessa época, o conceito de empresa era
bem diferente do moderno, a linguagem corrente. Consideravam-se
empresas as actividades produtivas, como a industria e os serviços,
baseadas numa especulação sobre o trabalho (por contraoposição ao
comercio que era considerado uma activiadde de especulação sobre o

31
Crf o artigo 230 do Código Comercial de 1888.
36
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 37

risco): empresário era aquele que prestava determinados bens e


serviços usando como principal factor produtivo o trabalho de outem.
Era pois uma noção restritiva, que não abrangia as organizações
produtivas dedicadas ao comercio strictu sensu, embora o seu
emprego nos códigos comerciais objectivistas tivesse o intuito de
submeter os respectivos titulares do estatuto jurídico de
comerciantes, a par dos comercias tradicionais intermediários nas
trocas.
Dai que o artigo 3º do C. Com não mencione nas empresas que
enumera, as dos comerciantes que se dediquem actividade
tradicional, e por excelência comercial de intermediação nas trocas.
Com o advento da revolução industrial, a actividade do empresário
industrial e prestador de serviços vai sendo assimilada a do
comerciante grossista e retalhista. Dai que, no entendimento e
linguagem comum, e por conseguinte, para a linguagem jurídica,
todos estes comerciantes – lato sensu, passe, pouco a pouco, a ser
equiparados como empresários e suas organizações produtivas
uniformemente designadas como empresas.

Empresa como Sujeito ou Agente Jurídico

Numerosos textos referem-se a empresa sob perfil da pessoa que


exerce uma actividade económica de produção e distribuição de bens
e serviços, reduzindo-a portanto a própria pessoa daquele que produz
e organiza e conduz a actividade, suportando-a pelo próprio risco.
Alias, a única nota distintiva da empresa nesta acepção, em relação
ao empresário, poderá dectetar-se na ideia de que o suporte real do
risco não é o empresário, mas sim o património que ele integra na
unidade empresarial.
Note-se que o sentido comporta uma acepção restrita, em que a
empresa se reconduz a pessoa ou pessoa que organizam e dirigem a
actividade, e uma acepção mais ampla, para qual a empresa abrange

37
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 38

um conjunto de pessoas, um elemento humano, comportando não só


empresários, mas também seus colaboradores, designadamente
trabalhadores, que prestam a sua colaboração em ordem ao
desenvolvimento da actividade comercial. Alguns autores como JOSE
TAVARES entendiam num sentido subjectivo a palavra “empresa”
utilizada no corpo do artigo 3º do C.Com32.

EMPRESA COMO ACTIVIDADE

O termo empresa é por vezes contudo usado para significar a


actividade economia exercida pelo empresário comercial de forma
profissional e organizada, com vista a realização de fins de produção
ou troca de bens e serviços.
E o sentido que ressalta do artigo 2082 do Código Civil Italiano de
1942: “E empresário comercial o que exerce profissionalmente a
actividade económica organizada com o intuito de produzir bens e
serviços”.
Alias também neste sentido, pode dizer como FERNANDO OLAVO que
é, empresas comerciais as actividades referidas no artigo 3º do
Código Comercial. Mas salvo opinião em contrário, o artigo 3º do
C.Com não se circunscreve estritamente as actividades abrangidas
materialmente pelo Direito Comercial. A criatividade e o
expansionismo caracterizadores das economias capitalistas, principais
catalisadores da evolução económica das sociedades modernas, em
levado a ampliar a esfera primitiva do Direito Comercial, abarcando
uma serie de actividades (industriais, serviços, etc.) mais relacionadas
com o comércio ou, em todo caso, subsumidas ao critério geral de
especulação.
Dai que a par do artigo 3º, existam outros preceitos no código
comercial e em legislação avulsa, que incluindo outras actividades no
objecto do direito comercial, constituem outras tantas normas
delimitadoras da “matéria mercantil”.

32
Cfr o artigo 3º do Código Comercial actualmente vigente em Moçambique.
38
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 39

EMPRESA COMO OBJECTO

Trata-se neste sentido, da organização do conjunto de factores de


produção e outros elementos congregados pelo empresário
comercial, com vista ao exercício da sua actividade. Equivalente a
principal acepção da palavra estabelecimento, porventura a mais
expressiva realidade jurídica deste. É neste sentido que dissemos
empresa e estabelecimentos são sinónimos33.

EMPRESA COMO CONJUNTO DE ELEMENTOS

Este é o sentido dinâmico do termo “empresa”, que vê nela a


expressão de um circulo de actividades regido pela pessoa do
empresário, fazendo apelo a factores e elementos de natureza
heterogénea, actuando sobre um património de coisas e direitos,
dando origem a relações jurídicas, económicas e sociais, polarizados
numa organização apta a desenvolver uma actividade económica34.
E o sentido mais amplo e compreensivo da expressão “empresa” que
a reconduz a uma instituição de caracter basicamente económico,
mas também social, um organismo vivo, polarizador da criação de
riqueza, mas também de emprego e ate de cultura.
Note-se que no âmbito do direito mercantil, esta concepção aparece
mais restrita nos traços mais singelamente circunscritas as relações
jurídicas que concentra. Só uma colagem dos elementos conceituais
trazidos também dos outros ramos do Direito, que lhe dão guardia, e
que fazem surgir a plena significação institucional da empresa.
A acepção institucional da empresa, numa visão jurídico-mercantil
parece ser a que forma o artigo 557 do C.Com e seguintes. Tem sido
entendido que o artigo 3º do C.Com consagra a noção subjectiva de
empresa a par de uma concepção de actividade, ou seja, de um

34
Idem.
39
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 40

conjunto de actos entre si coordenados, para realização de certo


escopo, correspondente a um certo ramo da vida económica. Neste
sentido, são comerciais as empresas ou actividades enumeradas nas
alíneas do artigo 3º, com as ressalvas consignadas no seu número 2, e
ainda indicadas em outras disposições de leis comerciais
extravagantes, bem como as que resultem de interpretação extensiva
ou aplicação análoga das várias alíneas do corpo do artigo 3º como
oportunamente referimos.

O EMPRESÁRIO

Apesar do artigo 1º do C.Com conferir ao nosso sistema um acento


tónico objectivista, levando a que caiam sob a alçada do direito
comercial os actos e relações que tenham por sujeitos comerciantes
ou não comerciantes, a verdade é que não deixa de ser muito
relevante o estatuto jurídico que o próprio código comercial,
contemplado por legislação extravagante estabelece para os
comerciantes35.
E relevante que uma importante categoria de actos do comércio
devem esta qualidade e o inerente regime, a circunstância de serem
praticados por comerciantes no exercício do comércio: são actos
subjectivos referidos no número 2 do artigo 5º do C.Com.
Ademais, os comerciantes estão sujeitos a varias obrigações especiais
que se acham definidas no artigo 16º do C.Com, e diversas outras
consagradas em regime especial por actos e obrigações dos
comerciantes, tornando indispensável a determinação da qualidade
de comerciante dos seus sujeitos: Valor especial da escrituração
mercantil como meio de prova, prescrição presuntiva dos créditos dos
comerciantes, etc.
A qualidade de comerciante reveste-se, por conseguinte de elevada
relevância jurídica. Daqui resulta a necessidade de caracterizar com
nitidez o que é um comerciante e quais são as pessoas as quais se
aplica esta qualificação legal.

35
Cfr o artigo 1º do Código Comercial actualmente vigente em Moçambique.
40
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 41

COMERCIANTES EM NOME INDIVIDUAL E SOCIEDADES

O legislador não cuidou de nos dar uma definição propriamente de


comerciante, mas sim de indicar quais são as categorias legais de
comerciantes, a saber indicadas no artigo 2º do Código Comercial:
a) As pessoas singulares ou colectivas que em seu nome, por si
ou por intermedio de terceiros exerçam uma empresa
comercial.
b) As sociedades comerciais.
Temos assim segundo o entendimento tradicional deste artigo, de um
lado, os comerciantes que são pessoas singulares, geralmente
designados por comerciantes em nome individual, e os comerciantes
que são as pessoas colectivas – as sociedades comerciais.
Porem, no domínio do Direito comercial deve prevalecer em geral a
noção de comerciante que resulta do artigo 2º do C.Com:
Comerciante é quem enquadrando-se numa das categorias do artigo
3º do mesmo código, seja titular de uma empresa que exerça uma das
actividades comerciais tais como qualifica o mesmo artigo (3) e
demais disposições avulsas, que caracterizam e englobam no Direito
Comercial certas actividades económicas36.
Convém desde já realçar que a qualidade de comerciante ou
empresário comercial prevista no artigo 2º do Código Comercial é
sempre originária, não podendo transmitir-se nem inter vivos, nem
mortis causa.

EMPRESÁRIO COMERCIAL COMO SUJEITO DO DIREITO COMERCIAL

A terminologia empresário comercial usada no artigo 2º do C. Com e


demais reflecte a evolução do direito comercial para a evolução
moderna do direito comercial. Da evolução dos actos do comércio na
conceitualização do direito comercial, passou-se a noção da empresa.

36
Cfr o artigo 3º do C.Com.
41
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 42

Na verdade, o que era designado comerciante no código comercial de


1888, é aquilo que corresponde hoje ao empresário comercial. A
razão da adopção desta terminologia resulta não da necessidade de
adequar a terminologia com a realidade, mas também da necessidade
de conformar aquilo que hoje este sujeito comercial faz em relação a
sua própria actividade. O artigo 13º do C.Com de 1888 dizia “são
comerciantes”, mas hoje estabelece o artigo 2º no seu corpo que “são
empresários comerciais37”.
As pessoas singulares ou colectivas, que em seu nome, por si ou por
intermédio de terceiros exerçam uma em presa comercial. Esta alínea
ao introduzir as palavras “singulares ou colectivas” veio resolver o
problema que era colocado pela maioria da doutrina, na vigência do
código anterior que era o de saber se a referencia apenas as pessoas
pretendia incluir tanto as pessoas físicas como as jurídicas. Evidente
que o legislador quis abarcar tanto as pessoas singulares como
colectivas. Na verdade, quer umas, quer outras, podem ser a luz das
normas vigentes empresários comercias.
No entanto precisara que exerçam uma actividade comercial nos
termos em que ela esta contemplada no artigo 3º do mesmo código,
ou seja, é empresário comercial aquele que, satisfazendo uma das
categorias previstas no artigo 2º, exerça uma das actividades
qualificadas como comerciais a luz do artigo 3º. Sobre a qualificação
das actividades económicas ou comerciais, releva o artigo 3º a
inclusão das actividades agrícola, piscatórias que outrora não eram
contempladas nesta classificação.
Importa referir que, o exercício da empresa comercial nos termos
deste artigo pode ser por meio de terceiros, naturalmente tal
exercício por meio de terceiros exigira autorização do seu dono em
que se reunira antecipadamente os requisitos para o exercício da
empresa comercial.

Unidade temática 2.2. O EMPRESÁRIO COMERCIAL

42
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 43

Introdução
O código comercial, não fornece noção de empresário comercial
limitando-se porém, no art.º 2° C.Com38, a indicar as categorias legais
de empresário comercial, no sentido de que são empresários
comerciais, por um lado as pessoas singulares, também designadas
por comerciantes em nome individual, e por outro lado, as sociedades
comerciais. Relativamente às pessoas colectivas, elas obedecem ao
princípio da especialidade, isto é, há condições específicas para tal
qualificação. É um assunto que analisaremos mais adiante em relação
as sociedades comerciais.
Podemos assim, definir empresário comercial, como sendo aquele
que enquadrando-se numa das categorias do art.º 2° C.Com, seja
titular de uma empresa que exerça uma das actividades comerciais
tais como as qualificam o art.º 3° e as demais avulsas que
caracterizam em englobam no direito comercial certas actividades
económicas39.
A categoria do empresário comercial, não é transmissível entre vivos
e nem mortis causa, na medida em que ele exige em si a reunião de
certos requisitos. Requisitos estes associados à pessoa do empresário
comercial que a seguir indicamos.
Objectivos específicos
 Definir o empresário comercial;
 Conhecer os requisitos que se agregam ao empresário
comercial;
 Apresentar a situação as restrições ou proibições ao exercício
da profissão de empresário comercial.

EMPRESÁRIO COMERCIAL PESSOA SINGULAR: REQUISITOS

Em relação à disponibilidade jurídica, não há qualquer especificidade


em relação ao direito civil. A personalidade jurídica adquire-se com

38
Cfr o artigo 2° do código comercial actualmente vigente em Moçambique.
39
Idem.
43
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 44

nascimento completo e com vida nos termos do n° 1 do art.º 66° do


CC40.
Em relação a capacidade comercial, que é medida dos direitos e
obrigações de que uma pessoa é susceptível de ser sujeito, distingue-
se entre a capacidade de exercício e capacidade de gozo. No que se
refere aos menores, é menor toda pessoa de um ou outro sexo
enquanto não perfizer vinte e um anos de idade e, em princípio
estariam feridos de incapacidade de exercício profissionalmente
empresarial por forca do princípio da equivalência consagrado no
art.º 9° C.Com. Contudo, o art.º 10°, vem estabelecer algumas
excepções e nestes termos, o menor de vinte e um anos e maior de
dezoito anos pode exercer a actividade empresarial, desde que
devidamente autorizado.
Esta autorização pode ser dada pelos pais, desde que detenham a
guarda do menor. Sucede que, se os pais não exercem a guarda do
menor por força de decisão judicial ou outro qualquer impedimento,
não tem poderes de autorizar o menor para a prática da actvidade
empresarial41.Pelo tutor nos termos estabelecidos na lei civil e pelo
juiz na falta dos pais ou do tutor, ou quando entender e oportuno aos
interesses do menor. Assim, equivale dizer que, o juiz pode por
decisão a favor dos interesses do menor autorizar a este a prática da
actividade empresarial mesmo que sem anuência dos seus pais ou
tutores.
A lei comercial impõe que tal autorização para o exercício da
actividade empresarial seja outorgada por escrito, podendo tal
instrumento limitar os poderes do menor ou impor condições para
seu exercício, indicar o ramo da actividade a ser explorado pelo
menor, fixar prazo de validade da autorização e, mesmo quando
concedida por tempo determinado, pode ser revogada, a qualquer

40
Cfr o artigo 66 do Código Civil vigente em Moçambique, sobre a aquisição da
personalidade jurídica.
41
HUBRECHT, Geoges. Droit Commercial, Ed. Sirey 1988.

44
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 45

altura, pelo outorgante, salvaguardados os direitos adquiridos de


terceiros. Impõe igualmente o legislador que esta autorização seja
registada para que seja válida perante terceiros.

SITUAÇÃO PARTICULAR DOS INCAPAZES

O art.º 9°, ao exigir a capacidade para prática de actos de comércio


pretende referir-se a capacidade jurídica de exercício, tanto mais que
alude implicitamente o carácter profissional do comércio o que
pressupõe uma prática habitual de actos geradores, mediadores ou
extintivos de direitos e obrigações, donde resulta que, não pode
conhecer-se o exercício da profissão de empresário comercial por um
incapaz, aliás o próprio conceito de profissão e no caso a
circunstancia se traduzir numa contínua e habitual prática de actos e
negócios jurídicos, sendo portanto absorvente e responsabilizante
afigurando-se incompatível com a situação jurídica de incapacidade
por interdição por exemplo.
A inclusão dos interditos no art.º 9° C.Com deve entender-se
cungrano salis, quanto ao exercício profissional do comércio
considera-se que tal prática será a prática habitual de actos de
comércio, não directa e pessoalmente pelos incapazes, mas pelos
seus representantes, em nome e por conta daqueles, com necessária
autorização judicial a luz do art. 296° da lei n°10/2004 de 25 de
Agosto.
A profissão de comerciante pressupõe a concretização dos actos se
comércio, mas não qualquer prática, deve ser a prática profissional,
isto é, o exercício de uma empresa comercial;
No entanto, não basta a prática de actos de comércio isolados ou
ocasionais para se adquirir a qualidade de comerciante é necessária a
pratica regular, habitual, sistemática, dos actos de comércio.
Não basta por outro lado, a prática mesmo habitual, de quaisquer
actos de comércio, no sentido de que nem todos os actos tem a
mesma potencialidade de atribuir a

45
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 46

quem os pratique a qualidade de empresário;


É indispensável para que se fale de profissionalidade que o indivíduo
pratique os actos de comércio como seu modus vivendi faça o
comércio o seu dia-a-dia e a forma de viver.
O exercício profissional deve ser de modo pessoal, independente e
autónomo, isto é, em nome próprio sem subordinação de outrem.42
É necessário que se organizem factores de produção com vista a criar
utilidades económicas, resultantes de uma daquelas utilidades
económicas que a lei considera como comerciais.
Em jeito de conclusão, é empresário comercial, quem possui e exerce
uma empresa comercial, quem é titular de uma organização daquelas
que a lei qualifica como empresa comercial para através delas exercer
actividade empresarial de forma profissional.
A plena capacidade comercial civil há-de depender de uma pessoa
singular ou colectiva, ter a capacidade civil e não estar abrangida por
alguma norma, que estabeleça uma restrição ao exercício do
comércio.

RESTRIÇÕES OU PROIBIÇÕES AO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO DE


EMPRESÁRIO COMERCIAL.
Embora o exercício da actividade empresarial seja livre bastando o
preenchimento dos requisitos gerais anunciados anteriormente,
existem situações que há limitação do exercício profissional do
comércio. Tais situações podem se consubstanciar em proibições
legais e impedimentos. Inibições i incompatibilidades.

SITUAÇÃO PARTICULAR DOS INCAPAZES

O art.º 9°, ao exigir a capacidade para prática de actos de comércio


pretende referir-se a capacidade jurídica de exercício, tanto mais que
alude implicitamente o carácter profissional do comércio o que

42ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito comercial. Lisboa, AAFDL, 1993.

46
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 47

pressupõe uma prática habitual de actos geradores, mediadores ou


extintivos de direi

IMPEDIMENTOS E PROIBIÇÕES LEGAIS AO EXERCÍCIO DO COMÉRCIO

Os impedimentos consubstanciam as situações em que determinado


sujeito ainda que civilmente capaz está vedado por lei para a prática
de actos de comércio de forma profissional. Nesta situação, estão por
exemplo os administradores das sociedades por quotas. Nos termos
do art.324° do C.Com43, os administradores não podem, sem
consentimento expresso dos sócios exercer, por conta da própria ou
alheia, actividade abrangida no objecto social da sociedade, desde
que esteja a ser exercida por ela ou o seu exercício tenha sido objecto
de deliberação dos sócios.
Equivale dizer que, há proteção da concorrência e na nossa opinião,
da concorrência desleal que resultaria do exercício do comércio no
mesmo ramo de actividade ou objecto comercial pelo
administrador44.
O administrador nos termos deste artigo só poderá exercer a
actividade nos termos anteriormente ditos se consentirem os sócios
da sociedade onde ele é administrador. Esta limitação faz todo
sentido na medida que recai em geral sobre os administradores o
dever de diligência.
A questão que se pode colocar é a de saber se tal consentimento terá
de vir de todos os sócios ou se basta a vontade da maioria.
Entendemos que tal consentimento terá de ser expresso e resultará
de deliberação dos sócios seguindo as regras da maioria estabelecidas
para cada tipo de societário ou resulte do estatuto da sociedade.
Por fim, importa anotar que este impedimento que recai sobre os
administradores é parcial e não geral na medida em que só se aplica

43
Cfr o artigo 324 do código comercial vigente em Moçambique.
44
JUNIOR, Manuel Guilherme, Manual de Direito Comercial, Moçambicano, escolar
editora, Maputo, 2012.
47
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 48

ao ramo da actividade ou objecto igual ao coincidente com o da


sociedade.
Equivale dizer que, o administrador não está impedido de exercer
actividades comerciais.
Outro impedimento resulta do art.º 14° do C.Com nos termos do
qual, estão impedidos do exercício da actividade empresarial:
a) As pessoas colectivas que não tenham por objectos interesses
materiais.
b) Os impedidos por lei especial.
Relativamente ao primeiro aspecto, encontra a sua essência na
natureza do próprio direito comercial e das suas normas que se
associam ao exercício de uma actividade lucrativa. O que a lei impede,
como escrevemos noutro lugar, não é a prática de actos de
comércio45 mas sim, do exercício profissional da actividade comercial
e aquisição da qualidade de empresário comercial.
Veja-se por exemplo, a fundação para o desenvolvimento da
comunidade (FDC), desenvolve uma série de acções beneméritas e
até tira dinheiro para várias actividades mas que não faz com vista a
lucrar, ou seja, uma empresa de facturação de lucros embora em
certas circunstâncias possa vender um bem de sua pertença. O ira
acontecer é que esse acto será regulado pela lei comercial, mas no
entanto, a FDC não será por isso considerada empresário comercial.
A par dos impedimentos há aquilo que ousamos chamar proibições
legais com o intuito apenas de diferenciar aqueles actos que são
limitados a certa categoria de sujeitos e por isso, exclusivos a eles. A
título de exemplo, o comércio bancário esta reservado asa
instituições de crédito por força de Lei n° 15/99 de 1 de Novembro co
as alterações introduzidas pela Lei n° 9/2004 de 21 de Julho.
Estabelece o n° 1 do art. 7°da referida lei << só as instituições de
crédito podem exercer a actividade de recepção, do público, de

45ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito comercial. Lisboa, AAFDL, 1993.

48
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 49

depósitos ou outros fundos reembolsáveis, para a utilização por conta


própria>>.
Para o efeito, só pode ser praticado por sociedades anónimas com
certos condicionalismos em termos de capitais a investir e com
necessidade de intervenção do Banco de Moçambique quer para
autorização quer para fiscalização ou supervisão. Resulta disto que,
aquele que não estiver compreendido nas categorias legais para a
prática destes actos, não pode fazê-lo e uma vez praticados ira
consubstanciar o crime ilegal de profissão titulada previsto e punido
pelo parágrafo 2° do art.º 236° do CP.

INCOMPATIBILIDADES

A noção de incompatibilidade está associada a impossibilidade


decerto sujeito em função da posição determinada que ocupa, estar
impedido de praticar certos actos ou negócios. Não quer significar
que ele não tenha capacidade e muito menos a possibilidade física de
o fazer. Tem é, momento podendo cessar se tal posição deixa de
existir relativamente a pessoa recaia a proibição46.
Nesta situação estão os magistrados que por força da constituição de
modo geral e do seu estatuto não podem ser simultaneamente
magistrados e empresários comerciais.
Estabelece o art.º 219° da CRM47, que “os magistrados judiciais e do
Ministério Público, em exercício, não podem desempenhar quaisquer
outras funções públicas ou privadas, excepto a actividade de docente
ou de investigação jurídica ou outra de divulgação e publicação
científica, literária, artística e técnica, mediante prévia autorização do
Conselho Superior de Magistratura Judicial”. O sublinhado é nosso. Ao
não se referir este artigo a situação dos magistrados do Ministério

46
JUNIOR, Manuel Guilherme, Manual de Direito Comercial, Moçambicano, escolar
editora, Maputo, 2012.
47
Cfr o artigo 219º da Constituição da Republica de Moçambique aprovada pela
Assembleia da Republica de Moçambique aos 24 de Novembro de 2004.
49
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 50

Público de forma expressa, não quer significar na nossa opinião


isentos desta publicação.
Na verdade, nos termos do art.º 109° da Lei n° 22/2007, de 1 de
Agosto, com as alterações introduzidas pela Lei n° 14/2012, de 8 de
Fevereiro, “o exercício das funções de magistrado do Ministério
Público é incompatível com o desempenho de qualquer outra função
pública ou privada, salvo a actividade de docência, literária ou
investigação científica, mediante autorização do Conselho Superior da
Magistratura do Ministério Público”. Este comando geral vem
concretizar e conformar-se com o disposto no n°2 do art.º 234° de
CRM nos termos do qual, os magistrados do Ministério Público para
além dos deveres de legalidade, isenção, devem se conformar com as
directivas e ordens previstas na Lei.
Outra coisa são as inibições que atingem selectivamente as certas
pessoas por questões de natureza pessoal. É o que acontece com os
falidos.
Outra incompatibilidade é a que se encontra consagrada no art.º 324°
do C.Com relativa ao dever de não concorrência dos administradores
das sociedades por quotas.

SITUAÇÃO DOS CÔNJUGES

O exercício da actividade do empresário comercial é livre em regra.


Tal liberdade, não se encontra como acontecia no passado, limitada a
mulher que carecia da autorização do marido. O art.º 35° da CRM 48
estabelece que “todos os cidadãos são iguais perante a lei, e gozam
dos mesmos direitos e estão sujeitos aos mesmos deveres,
independentemente do sexo…”. O art.º 36° da CRM vem a
estabelecer o princípio da igualdade entre o homem e a mulher.

48
Cfr os artigos 35 e 36º da Constituição da Republica de Moçambique aprovada pela
Assembleia da Republica de Moçambique aos 24 de Novembro de 2004.
50
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 51

O C.Com veio concretizar esse princípio estabelecendo o outro n°1 do


art. 11° do C.Com, o princípio da independência de qualquer dos
cônjuges poder praticar a actividade empresarial independentemente
da autorização do outro cônjuge.
No entanto, há limites relativamente aos actos que compreendem o
exercício da empresa comercial que possa afectar o património
comum do casal isto quer dizer que, o cônjuge que sentir prejudicado
pelos actos praticados por cônjuge no exercício da empresa comercial
pode usar os mecanismos legais para se opor contra os mesmos.
Quando o cônjuge empresário comercial pretender prestar garantias
tais como aval ou outras, deverá obter anuência do outro cônjuge sob
pena de nulidade do socio praticado. Exceptuam-se os bens pessoais.
A existência de bens pessoais, só é possível se o casamento tiver sido
em regime de separação de bens ou de comunhão de bens
adquiridos.
Parece-nos não fazer sentido a aplicação desta disposição quando se
trate da comunhão geral de bens a menos que se tratem de
incomunicáveis independentemente do regime do casamento
adoptado pelos cônjuges49.
Havendo separação de pessoas e bens nos termos dos artigos 176°50 e
seguintes da Lei da Família ou ainda havendo apenas a separação de
bens, o cônjuge empresário comercial que tiver contraído obrigações
no âmbito do exercício da sua empresa comercial, irá responder pelo
seu património dotal cabendo-lhe inclusive a possibilidade de
empenhá-los, vendê-los, hipotecá-los ou aliená-los sem dependência
da autorização do outro cônjuge.
Tais liames previstos por lei, não terão igual valor se os cônjuges por
exemplo constituírem conjuntamente e como sócios, uma sociedade
por quotas de responsabilidade limitada nos termos do ar. 284° do
C.Com. É que, a ideia de proteção do património do sócio não

49
Op cit. Pág. 534
50
Cfr o artigo 176º da Lei 10/2004 de 24 de Agosto, adiante designada Lei de
Família.
51
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 52

empresário comercial cai por terra na medida em que haverá entre


elas um novo ente que é a sociedade por quotas a qual se aplicará o
regime consagrado para o efeito. Por isso, não fará qualquer sentido a
discussão deste assunto.

FIGURAS AFINS DO EMPRESÁRIO COMERCIAL

Para efeitos do nosso estudo, aqui trataremos de apenas duas figuras


que achamos ser mais próximas da figura do empresário comercial e
que não raras vezes, podem suscitar confusão. Veremos por isso, a
figura de mandatário comercial, do gerente, e comissário e do
mediador.
Empresa, excepto no caso de declaração de falência, se provar que o
património social não foi exclusivamente afectado ao cumprimento
das respectivas obrigações.

MANDATÁRIO COMERCIAL

O mandato comercial traduz-se na prática de um ou vários actos de


comércio realizados pelo mandatário e que produzem uma série de
efeitos jurídicos na esfera jurídica do mandante. É sempre oneroso.
O mandatário não é empresário comercial embora pratique actos a
título profissional, pois apenas os faz em representação do
mandante. O mandato comercial difere do mandato civil que nos
termos do art.º 1158° do código civil presume-se gratuito excepto se
o seu exercício corresponder actos de profissão, caso em que há
lugar a presunção da sua onerosidade. O mandato comercial é
sempre oneroso.

GERENTE

É aquele que em nome e por conta de um empresário trata do


comércio no lugar onde este empresário comercial tenha ou peça

52
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 53

para actuar, ou seja, aquele que sobre outra qualquer designação de


acordo com os usos comerciais, se coloca na situação de tratar do
comércio de outrem no lugar onde o empresário exerce a empresa ou
em qualquer outro lugar51.
O gerente tem poder representação mas este é um poder geral,
compreende todos os actos pertencentes e necessários ao exercício
do comércio que para tal tenha sido atribuído. A intervenção do
gerente é uma intervenção acessória relativamente a do empresário
comercial. Não é empresário comercial. Nos termos n° do art.º 166°
C.Com52, é-lhe aplicável relativamente a responsabilidade, mutatis
mutandi, o regime aplicável aos titulares dos órgãos sociais da
sociedade por exemplo, aos administradores. Os seus actos
recuperam-se na esfera jurídica do empresário comercial.
Entendemos que tal facto se deve à maior ligação que este, assume
para com a sociedade e/ou com os actos relativos ao exercício do
comércio no seu dia-a-dia.

O COMISSÁRIO

Trata-se de uma espécie de mandato sem representação. Em termos


gerais, dá-se por comissão quando a pessoa executa um mandato
comercial sem menção alguma do mandante (empresário comercial).
Na verdade, há aqui uma vinculação do comissário que acontece em
virtude de ter havido um acordo entre o comissário e o comitente que
neste caso é o empresário comercial. O comissário tem alguma
autonomia mas, não pode ter iniciativa individual. A sua iniciativa
deve resultar e resulta da sua vinculação com o comitente. É preciso
anotar que quando o comissário vai actuar relacionando com
terceiros não restarão dúvidas de que ele pratica actos de comércio
mas, tal só em consequência da vinculação que ele tem com o
empresário comercial. Assim, a prática actos de comércio em

53
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 54

representação de outrem numa situação de mandato sem


representação.
Há quanto a nós, e em conformidade com a posição defendida pelo
professor Luís Teles de Menezes Leitão, e fortemente consagrada pela
nossa lei civil, a consagração da teoria da dupla transferência. Assim,
quando o art.º 1180° do CC, ao refere que se o mandatário agir em
nome próprio adquire os direitos e assume as obrigações resultantes
dos negócios de celebra, os efeitos dos negócios não se repercutem
assim directamente na esfera do mandante, mas antes na esfera do
mandatário, de onde terão de ser posteriormente transferidos para o
mandante.
Adoptando a teoria da dupla transferência, no n° 1 do art.º 1181° do
CC53, vem estabelecer uma obrigação para o mandatário de transferir
para o mandante os direitos adquiridos em execução do mandato.
Assim, o comissário tem dever de transferir para o empresário
comercial os direitos adquiridos na prática dos actos de comércio em
nome do empresário comercial.

O MEDIADOR

Se atentarmos ao que escrevemos anteriormente as figuras de


mandatário, gerente e comissário podemos facilmente concluir que
estas figuras se encontram associadas à pessoa do empresário
comercial54.
O mediador é autónomo deste e em princípio não se pode assumir
que pratica actos jurídicos na terminologia rigorosa da Mota Pinto.
Para o professor Mota Pinto, os actos jurídicos simples são factos
voluntários cujos efeitos se produzem, mesmo que não tenham sidos
previstos ou queridos pelos seus autores, embora muitas vezes haja

54 CORDEIRO, António Menezes. Manual de Direito Comercial. Coimbra,


Almedina.

54
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 55

concordância entre a vontade destes e os respectivos efeitos. Não é,


todavia, necessária uma vontade de produção dos efeitos
correspondentes ao tipo de simples actos jurídicos em causa para
essa eficácia se desencadear.
É de facto o que sucede com o mediador. Na verdade, ele no
interesse de aproximar as partes para que o negócio se concretize. No
entanto, a sua concretização embora ele actue com essa intenção,
muitas das vezes, não depende dele a sua efectivação. O mediador no
contrato de compra e venda por exemplo, aproxima o comprador do
vendedor sem que ele outorgue de compra e venda ao contrário do
mandatário comercial que poderá outorgar o contrato em
representação do mandante. Limita-se a criaras condições para que o
contrato seja celebrado se as partes aproximadas assim o entender e
o seu papel termina com a aproximação das partes.
O art.º 230° do C.Com55 de 1888 fazia referência a actividade de
mediação mesmo assim entendia-se que era uma mediação em
sentido técnico muito próximo da noção de agência.
Nessa medida, porque o mediador limita-se a aproximar as partes
sem a prática de qualquer acto jurídico naquele sentido do professor
Mota Pinto, com o qual concordamos, ele não pode ser classificado
como empresário comercial. Situação diferente é aquela que
estudaremos mais adiante no nosso volume II em relação a agência56
que embora hajam dúvidas quanto a sua classificação para uma parte
da doutrina, como empresário comercial, poucas duvidas coloca esta
figura que o mediador.
Sumário
Nessa unidade tematica ficamos a conhecer a origem e a definição
jurídica de empresário comercial. Reza o Código Civil, “Considera-se
empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica
organizada para a produção ou a circulação de bens ou de

55
Cfr o artigo 230° do C.Com de 1888.
56 HUBRECHT, Geoges. Droit Commercial, Ed. Sirey 1988.

55
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 56

serviços.” Conceito este influenciado pelo Código Civil Italiano de


1942, artigo 2082. Essa definição de empresário vem em substituição
à antiga figura do comerciante e para sua compreensão leva-se em
conta a evolução do comerciante a partir da função originária e
histórica de intermediário, para abranger também as atividades de
produção. Também ficamos a saber que a empresa, o empresário e o
estabelecimento não se confundem.

Unidade temática 2.3. OBRIGAÇÕES DO EMPRESÁRIO COMERCIAL


Introdução
O comércio é executado sob uma designação nominativa, que
constitui a firma. Há, porém, no direito comparado duas concepções
diversas de firma: Para o conceito objectivo, a firma é um sinal
distintivo do estabelecimento comercial. Daí decorrem, como
corolários, a possibilidade de tal designação ser composta livremente
e ser transmitida com o estabelecimento, independentemente de
acordo expresso. Para o conceito subjectivo, a firma é um sinal
distintivo do comerciante – o nome que ele usa no exercício da sua
empresa: é o nome comercial do comerciante. Daí que, em relação ao
comerciante individual, nesta concepção, a firma deva ser formada, a
partir do seu nome civil e, em princípio intransmissível.
O art. 18º CCom57[2], está relacionado com o estatuto de comerciante.
Considera-se a firma o nome comercial do comerciante, sinal que os
identifica ou individualiza também o faz para alguns não comerciantes
– sociedades civis não comerciais.
OBRIGAÇÕES DO EMPRESÁRIO COMERCIAL
Nos termos do artigo 16° do C.com58. Constituem obrigações doa
empresários comerciais as seguintes:
a) Adoptar uma firma;
b) Escriturar em ordem uniforme as operações ligadas ao
exercício da sua empresa;

57[2]
Obrigações especiais dos comerciantes
58
Cfr o artigo 166º do C.Com actualmente vigente.
56
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 57

c) Fazer inscrever na identidade competente os actos


sujeitos ao registo comercial;
d) Prestar contas.
O art.º 16° C.Com enumera as obrigações especiais dos empresários
comerciais, o que pode nos fazer concluir que há para além destas,
outras obrigações que como tal, são gerais. O art.º 16° do C.Com
estabelecendo o que se designa por obrigações especiais dos
empresários comerciais que embora assim pareça, não se pode
considerar que os deveres profissionais comerciantes se esgotam
nesse art.16°. verdade é, que este artigo tem a peculiar relevância de
definir o estatuto jurídico-comercial da profissão do empresário
comercial.
Relativamente a estas obrigações, os pequenos empresários, cuja
qualificação deve ser feita com base em critérios fixados por lei,
podem ser dis

A FIRMA DO EMPRESÁRIO COMERCIAL

Prevista em termos gerais do art.º 16° al. a)59, a firma consubstancia o


nome do empresário comercial, o nome que usa e com ele assina os
documentos relativos a sua actividade. Portanto, é obrigação especial
do empresário comercial, usar um nome no exercício da sua empresa.
Como tal, esse nome representa a sua identidade comercial.

CONCEITO DE FIRMA
No sentido objectivo, a firma é o sinal distintivo do estabelecimento
comercial e assim pode ser constituída livremente e transmitida com
o próprio estabelecimento comercial, havendo ou não acordo
expresso60.
É que consubstanciando nessa vertente, o sinal de distinção do
estabelecimento, a tutela do mesmo por qualquer pessoa não

59
Cfr a al. a) do artigo 16º do Código Comercial.
60
CORREIA, Miguel J.A. Pupo, Direito Comercial - Direito da Empresa, 10ª Edição
revista e actualizada, Ediforum, Lisboa, 2007.
57
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 58

careceria de qualquer alteração ou imposição de obrigações na


medida em que se associa directamente ao estabelecimento como tal
No seu sentido objectivo, a firma é o sinal que pretende distinguir o
empresário comercial em si do demais, isto é, o seu nome comercial
ao lado do seu nome civil (tratando-se de empresário comercial
pessoa singular), isto é, sinal que ele vai usar no exercício da empresa
comercial, donde resulta que, tratando-se de empresário pessoa
singular a firma deve ser constituída com base no seu nome civil, e
por isso, em princípio intransmissível. A sua transmissibilidade neste
sentido implicaria o seu nome civil que como tal constituí a própria
firma.
Ora, qual dos sentidos prevalece no nosso ordenamento jurídico?
Se atentarmos ao que dispõe o art.º 36° do C.Com comercial61 quanto
a transmissibilidade da firma, que mais adiante tratamos com maior
profundeza, concluiremos que a firma no nosso Direito é
transmissível que entre vivos, quer mortis causa. No entanto,
assegura-se que tal só ocorra com autorização do cedente e tal
transmissão só é possível mediante a transmissão do próprio
estabelecimento ou empresa comercial a que se achar ligada e é
sujeita a registo.
À primeira, o legislador, parece adoptar uma posição eclética. Na
verdade, a firma é um sinal distintivo do estabelecimento mas neste,
pertence ao sujeito proprietário do estabelecimento que como tal
pode constituir a firma a partir do seu nome civil e cede-la mediante
condições impostas por lei62.
No entanto a firma desempenha o papel que o nome civil na vida
jurídica civil, todo empresário comercial deve adoptar uma firma, que
seja pessoa singular ou sociedade comercial, o que pode permitir a
separação da sua actividade civil da comercial e dada a multiplicidade
de nomes idênticos ou semelhante habilitar a quem efectue várias

61
Cfr o artigo 36º do Código Comercial aprovado pelo Decreto-Lei n° 2/2005 de 27
de Dezembro.
62
JUNIOR, Manuel Guilherme, Manual de Direito Comercial, Moçambicano, escolar
editora, Maputo, 2012.
58
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 59

composições com o nome civil que em comércio permite distinguir o


empresário dos outros com nomes próximos. (artigo 18° C.Com).
Conclui-se do artigo 18° C.Com, que nosso ordenamento jurídico
consagra o sentido subjectivo da firma, isto é, a firma é o sinal
distintivo do empresário comercial e de uso obrigatório.
Nos termos do artigo 21° C.Com a firma deve ser redigida em língua
oficial, ou mediante a juncão da tradução oficial quando se trata de
adopção de firmas em outras línguas, sendo permitido a utilização de
palavras que não pertencem a língua oficial nos termos do artigo
22°CCom.

TIPOS DE FIRMA

A firma consoante os casos pode ser formada com o nome de uma ou


mais pessoas, fala-se de firma-nome, ou pode ser constituída com a
expressão relativa ao tipo de actividade que ele exerce ou se propõe
exercer, aditada ou não de elementos de fantasia que é designada de
firma denominação ou simplesmente denominação, e em terceiro
lugar afirma mista que resulta da conjunção dos elementos anteriores
na composição de uma mesma firma.
Mas, em qualquer dos casos a firma é um sinal nominativo e não
emblemático, e como a firma desempenha o mesmo papel
desempenhado pelo nome civil do empresário comercial, quer seja
pessoa colectiva ou singular deve adoptar uma firma.
Nos termos do art.º 21° C.Com, a firma deve ser redigida
obrigatoriamente em língua oficial ou mediante a conjunção da
tradução oficial quando se trate da adopção de firma em outras
línguas, sendo admissível em casos excepcionais dispostos no mesmo
artigo, ou não uso da língua oficial.

PRINCÍPIOS RELATIVOS À CONSTITUIÇÃO DA FIRMA


Os princípios relativos a firma, constituem os limites dentro dos quais

59
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 60

o empresário comercial deve girar no processo de constituição da


firma. Encontram-se consagrados no Código Comercial. São
nomeadamente, princípio da verdade, da novidade e da
exclusividade. Este último, como demonstrará mais adiante, não
consagrado rigorosamente pelo legislador como um princípio.

PRINCÍPIO DA VERDADE

De acordo com este princípio a firma deve espelhar a realidade a que


se reporta, não introduzindo em erro relativamente à caracterização
jurídica do ente, mas sem prejuízo de utilização do vocabulário
corrente e de conhecimento geral.
É na sequência disso que, devem ser verdadeiros e não introduzir em
erro sobre a sua identificação, natureza, dimensão ou actividade do
seu titular, e por isso não se podem utilizar na composição da firma
elementos característicos que sugiram actividades diferentes das que
o seu titular propõe realizar, nem expressões que possam introduzir
em erro sobre a caracterização jurídica do empresário, quer por
pessoa singular quer possam sugerir existência de pessoa colectiva.
Donde resulta que, a firma da pessoa singular deve basear-se apenas
no seu nome, quer seja abreviado ou até de uma alcunha pela qual é
conhecido ou de expressão que manifeste a sua especialidade63.
De igual modo é proibido há pessoas colectivas de fim lucrativo, o uso
de expressões que sugiram a existência de um ente público, ou de
associações sem fins lucrativas,
Podendo porem, permitir-se para estes últimos o aditamento de
elementos que indiquem o objecto e tipo de sociedade ou a
identificação dos sócios nos termos de alínea b) do art.26° do C.Com.
Em poucas palavras, a firma deve espelhar a realidade a que se
reporta não introduzindo em erro quanto a caracterização jurídica do

63
CORREIA, Miguel J.A. Pupo, Direito Comercial - Direito da Empresa, 10ª Edição
revista e actualizada, Ediforum, Lisboa, 2007.

60
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 61

empresário, e sem prejuízo das disposições especiais do artigo


26°CCom.
Deste modo, consegue-se facilmente a partir deste princípio aferir se
estamos perante um empresário comercial pessoa singular ou
colectiva, o seu ramo de actividade, tratando-se de sociedade
comercial, o tipo de sociedade de que se trata.

PRINCÍPIO DA NOVIDADE

A firma deve manifestar a distinção entre ela e as demais já


reconhecidas ou registadas, o que não pode necessariamente que um
empresário comercial possua simultaneamente um estabelecimento
ligado a uma sociedade por quotas unipessoal e outro ou outros
ligados a outro tipo societário caso em que usará firma diferente.
Nos termos do art.º 20° C.Com, a firma deve ser distinta, e
insusceptível de confusão ou erro em qualquer outra já registada,
exigindo-se no ajuizamento dessa confusão, considerar o tipo de
empresário, o seu domicílio ou sede e bem assim a proximidade ou
afinidade, das actividades exercidas ou a exercer e ainda a existência
de nomes de estabelecimentos, insígnias ou marcas de forma
semelhante que possam induzir em erro sobre a titularidade dos
mesmos sinais distintivos.
No entanto, a exclusividade do seu uso não é extensivo aos vocábulos
de uso corrente e os topónimos, também indicação de proveniência
geográficas, e o ajuizamento do princípio da novidade deve ser feito
na globalidade, pretendendo-se apenas evitar o erro sobre a sua
identificação pelo público.
O legislador comercial, em atenção a este princípio estabeleceu no
art.º 23° C.Com, a obrigatoriedade das firmas registadas fora do país
para a sua admissibilidade entre nós, carecerem de registo em
Moçambique, para evitar a indução em confusão.

PRINCÍPIO DA EXCLUSIVIDADE

61
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 62

Como nos referimos anteriormente, o C.Com não fala relativamente a


este, como propriamente um princípio. Entendemos nós que mais do
que a protecção do uso ilegal da firma, este é verdadeiramente um
princípio.
Este princípio impõe que a firma deve ser exclusiva do ente a que diz
respeito, direito este que só se constitui após registo pelo respectivo
titular, na entidade competente sem prejuízo da declaração de
nulidade, anulação ou caducidade, nos termos do art.º 24° C.Com64.
Pelo uso ilegal da firma, assiste ao seu titular legítimo o direito de
proibir o seu uso ou até exigir danos provenientes do seu uso ilegal
sem prejuízo do procedimento criminal nos termos do art.º 25°
C.Com.
Na verdade, a disposição do art.º 25° C.Com, reconhece ao
empresário comercial, titular da firma devidamente registada não só
o direito do uso exclusivo da firma, como também e
fundamentalmente, as seguintes possibilidades legais:
a) Exigir aquele que usa ilegalmente a firma que não continue a
usá-la, evitando confusão, prejuízos futuros, mesmo que
interessado não tenha ainda sofrido efectivamente o
prejuízo, ou ainda, o usurpador da firma não tenha feito de
má-fé, ou até ignorando os prejuízos que ia causar.
O titular da firma pode ainda exigir a alimentação da
totalidade das situações potencialmente prejudiciais.
Ex: eliminação da firma da matrícula entre outras;
b) A segunda possibilidade que assiste ao titular da firma é a de
intentar uma acção por perda e danos nos termos do art.º
483° CC, para obter reparação, quer resulte na negligência ou
de culpa;
c) Em terceiro lugar, pode intentar uma acção criminal nos
termos do 25° C.Com, se a ela houver qualquer crime que
tenha resultado do uso ilegal da firma.

64
Cfr o artigo 24º do código comercial aprovado pelo Decreto – Lei n° 2/2005 de 27
de Dezembro.
62
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 63

Na vigência do C.Com anterior e tal como no actual código, não se


encontra claramente a limitação territorial correspondente ao âmbito
de protecção da firma. O legislador limita-se a estabelecer no n° 2 do
art.º 20° que ‹‹no juízo sobre a distinção e a insusceptibilidade de
confusão ou erro devem ser considerados o tipo de empresário, o seu
domicílio ou sede, bem assim, a afinidade ou proximidade das
actividades exercidas ou a exercer››. Ao nível da jurisprudência
portuguesa e na nossa, tendo em conta o anterior art.º 27° do
C.Com65, há registos de que o entendimento a dar ao termo
circunscrição do art.º 27° do código de Veiga Beirão de 1888 era o de
que o mesmo corresponde a Província.
Foi assim que, por acórdão nos autos de apelação n° 39/06, de 16 de
Abril de 2008, da secção Cível do Tribunal supremo em que era
recorrente ao cidadão José João Dalmone com domicílio na cidade de
Maxixe, Província de Inhambane e recorrida a casa dos Carimbos, Lda.
com sede em Maputo, entendeu esta secção o seguinte: ‹‹…o termo
circunscrição usado no C.Com tem de ser interpretado como área
territorial da respectiva conservatória››…mais adiante e em termos de
conclusão continua o acórdão ‹‹…de acordo com quadro jurídico-legal
acima descrito, a restrição no uso de designações por parte de
comerciantes ou sociedades comerciais só se coloca em relação a
pessoas singulares ou colectivas situadas na área territorial de
conservatória onde se queira proceder a respectiva matrícula››.
Portanto, parece ser esta ideia que o legislador quis consagrar ao
estabelecer no n° 2 do art.º 20° do C.Com, como requisito da aferição
da confusão e/ou erro, a verificação do domicilio ou sede do
empresário comercial para além dos demais requisitos referidos no
mesmo número

TRANSMISSÃO DA FIRMA

A firma como sinal distintivo do estabelecimento é susceptível de


transmissão. Nos termos do art.º 36° C.Com, o adquirente de uma

65
Cfr o artigo 27 do Código Comercial actualmente vigente.
63
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 64

empresa comercial pode continuar a geri-la sob a mesma firma,


quando para tal seja autorizado, aditando-lhe ou não a declaração de
haver nela sucedido.
Esta autorização compete ao alienante, tratando-se de transmissão
por morte, sem que o cujus tenha disposto por escrito, a autorização
é dada pelos herdeiros respeitando a maioria independentemente de
esta transmissão tiver sido a favor de terceiro ou de algum ou alguns
dos herdeiros.
Conservando a firma, o aquirente passa a usá-la como meio através
do qual funda a presença do público demonstrando a continuidade da
empresa, retirando vantagens do antigo proprietário. O código
também protege o interesse dos clientes no sentido de que não se
pode admitir uma mudança radical de condições que fizeram manter,
exigir a confiança do antigo proprietário e igualmente, procura-se
proteger os fornecedores. Tal sucede porque, como dispõe o n° 6 do
art.º 36° do C.Com, a transmissão da firma só é possível
conjuntamente com a empresa comercial a que se acha ligada66.
Deste modo, se por um lado, não é possível transmitir apenas a firma
sem o respectivo estabelecimento, por outro, o adquirente assume as
obrigações que recaíam sobre o alienante.
O alienante, deixa de ser responsável pelas obrigações contraídas na
exploração da empresa, a partir do registo e publicação do acto de
transmissão, não exigindo-se autorização no caso de exploração
temporária da empresa comercial, de outrem pelo adquirente do
direito.
Conclui-se que, a transmissão da firma não se presume, resulta do
acordo entre as partes tanto na transmissão entra vivos, como na
mortis causa67, e nesta última exigindo concordância expressa na
maioria dos herdeiros.

66
JUNIOR, Manuel Guilherme, Manual de Direito Comercial, Moçambicano, escolar
editora, Maputo, 2012.
67
CORREIA, Miguel J.A. Pupo, Direito Comercial - Direito da Empresa, 10ª Edição
revista e actualizada, Ediforum, Lisboa, 2007.

64
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 65

ALTERAÇÃO DA FIRMA

A firma pode ser alterada observando determinadas circunstâncias.


No entanto, a saída ou falecimento do sócio ou associado o cujo
nome ou firma figure na firma do empresário comercial nome
colectivo, não determina necessariamente sua alteração, a menos
que tenha sido disposto o contrário no acto da constituição da
sociedade, deixando aquele de ser responsável pelas obrigações
sociais a partir do registo e publicação do acto nos termos do n° 2 do
artigo 37° em conjugação com o n° 4 do art.º 36° ambos do C.Com.

CADUCIDADE E RENÚNCIA DA FIRMA

Em princípio a firma é constituída para durar de forma determinada.


No entanto, a lei estabelece nos artigos 38° a 41° C.Com 68. O registo
da anulação, caducidade e renúncia da firma Caduca a firma nos
termos do art.º 39° do C.Com, nas seguintes circunstâncias:
a) Com o termo prazo contratual. Se a firma tiver sido constituída
com finalidade de durar enquanto durar o contrato que
constituí o objecto e seu fundamento, com o termo prazo
normal, a firma caduca;
b) Por dissolução da pessoa colectiva. Nesta caso, é aplicável
apenas as pessoas colectivas, quando certa pessoa colectiva a
quem a firma se encontra associada, dissolve-se nos termos
gerais do Direito, a firma deixa de fazer efeito por maioria de
razão. É que a firma nestes casos está associada a pessoa
colectiva e uma vez em dissolução, o que acarreta a entrada
em liquidação dessa pessoa colectiva o que impõe a limitação
em termos de actos a praticar por parte dessa pessoa
colectiva.
c) Pelo não exercício da empresa por período superior a quatro
anos.

68
Cfr os artigos 38º e 41 do código comercial actualmente vigente.
65
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 66

Por força desta alínea c) do art.º 39°, impõe-se ao empresário


comercial o dever de provar a continuidade do exercício do comércio
em cada trimestre do ano na entidade competente para o registo, sob
pena de ver a firma caducada e sem possibilidade de invocar a
mesma.
Compete a entidade que faz o registo, o poder de declarar a
caducidade da firma, reservando-se um mecanismo processual com
vista a acautelar situações de má-fé na solicitação de caducidade de
certa firma pertencente a terceiro. Nestes termos, o titular da firma e
uma vez notificado do pedido de caducidade, tem trinta dias para se
pronunciar ao que é acompanhado de um prazo de quinze dias
contados do termo do prazo anterior para decisão do pedido de
caducidade.
Ao titular da firma, a lei reserva o direito de impugnar a decisão por
de recursos aos tribunais.

RENÚNCIA DA FIRMA

O titular da firma pode renunciá-la através de declaração expressa por


meio de escrita, assinada e reconhecida presencialmente à entidade
competente para o registo. A renúncia carece do registo e publicação
nos termos dos artigos 41° n° 3° do C.Com.

ESCRITURAÇÃO MERCANTIL

Nos termos da alínea b) do art.º 16°69, outra obrigação especial que


recai sobre os empresários comerciais, é escriturar as operações
ligadas ao exercício da empresa comercial.
Em que consiste a escrituração mercantil? Consiste em registar todas
as actividades feitas pelo empresário comercial em livros próprios que
a lei impõe e pretende-se com ela, dar a conhecer a situação
empresarial e financeira do património do empresário comercial70.
Chama-se escrituração mercantil o processo de lançamentos dos
actos relativos a empresa nos livros que para aqueles fins os

69
Cfr al. b) do artigo 16º do código comercial actualmente vigente.
70
Op. cit. Pág. 566.
66
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 67

comerciantes são obrigados a adoptar, ou seja, o lançamento em


livros adequados das diversas operações relacionadas com a
exploração mercantil do empresário comercial ou afectam o seu
património para permitir o domínio de todos os interessados quando
tal seja necessário.
A escrituração mercantil é obrigatória e deve-se efectuar em livros
adequados tais como, o diário, o livro de inventário e balanço, e outos
livros que a lei fixa-os designando de livros obrigatórios.
Deste modo, ao empresário é imposto o dever de fazer o registo dos
livros obrigatórios dando-lhe a possibilidade de usar outros livros que
permitem o conhecimento do seu código.
Modernamente fala-se de métodos mais sofisticados de registo,
compreendendo os computadores, armazenamento da informação
em disco-duro, em softwares apropriados.

FUNÇÃO DOS LIVROS OBRIGATÓRIOS

a) O livro-diário: Nos termos do art.º 45° C.Com, o livro-diário


serve para lançar individual e diariamente, todos os actos
relacionados com a actividade empresarial, isto é, o diário
sugere a ideia de lançamento das actividades quotidianas em
termos de actos singulares pelo empresário comercial.
b) Inventário e balanço: Serve para lançar detalhadamente a
situação inicial da empresa e outros tantos balanços que o
empresário comercial é obrigado por lei71.
c) Livros de actas: Este livro está associado à ideia de existência
de pessoa colectiva e no caso em concreto, sociedade
comercial.
Serve para lavar as actas das reuniões e sócios ou associados,
de administradores e do órgão de fiscalização, devendo cada
uma delas expressar sem prejuízo do disposto em disposições

71
DE VASCONCELOS, Pedro Pais, Direito Comercial: parte geral, Almedina
Editora, Coimbra 1995.
67
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 68

especiais, o seguinte: a data da realização da reunião, os


nomes dos participantes ou referência à lista de presenças
autenticadas pela mesa, os votos emitidos, as deliberações
tomadas e tudo que possa servir para as reconhecer e
fundamentar a assinatura pela mesa e na existência desta,
pelos participantes.
O livro de acta assegura que toda informação relativa as
reuniões dos órgãos sociais a compreensão dos
procedimentos e decisões tomadas na sociedade. É por isso
que, relativamente ao direito à informação que assiste os
sócios pode consultar por exemplo, os livros de acta da
assembleia geral nos termos da alínea a) do n° 1) do art. 122°
ou consultar os livros de presença nos casos em que existam
porque não havia a mesa constituída.

IMPORTÂNCIA DA ESCRITURAÇÃO MERCANTIL

 O empresário passa a conhecer sua situação


patrimonial, direitos e deveres;
 Serve de meio de prova dos factos registados nos
litígios entre empresários;
 Serve como meio de verificação da regularidade da
conduta do empresário comercial;
 Quando se está perante uma suspeita de razões da
falência pode-se recorrer à escrituração para saber
se a falência é real ou fraudulenta;
 Serve de base para a liquidação de impostos e
fiscalização do cumprimento de normas tributárias
entre outras funções.

FORMA DE ESCRITURAÇÃO

68
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 69

A escrituração deve ser efectuada nos termos do artigo 48° do


C.Com72, pelo empresário ou por qualquer outra pessoa devidamente
autorizada, devendo se presumir que aquele que efectuou a
escrituração tinha autorização para o efeito. É uma presunção iures
tantum e por isso, pode ser ilidida mediante prova em contrário. O
artigo 49° C.Com estabelece a obrigação do uso de língua e moeda
oficial, a necessidade de individualização e clareza da escrituração e
deve ser cronológica. A escrituração é secreta, porque pretende
assegurar o desconhecimento em termos públicos o património
comercial para se evitar a cobiça alheia. Os artigos 54° a 56° C.Com
indicam em que as circunstâncias em que se tornam necessárias a
consulta de livros inclusive dos auxiliares que são possíveis de
exibição e exame.
Há o dever da parte do empresário de prestar informações a favor dos
sócios, dos credores e das autoridades administrativas. Nos termos da
alínea b) do artigo 104° e 122° CCom, qualquer dos sócios tem o
direito de consultar os livros em circunstâncias especiais. O tribunal
determinará o interesse, no sentido de permitir que os livros sejam
consultados quando tal se justifique.

REGISTO COMERCIAL

Os empresários comerciais quer seja pessoa singular ou colectivas, ou


as sociedades civis sob forma comercial, são obrigados a inscrever no
registo os actos a ele sujeito. Em conformidade com art.º 58° e 59°
C.Com, e o regulamento do registo de entidades legais aprovados
pelo Decreto-Lei n° 1/2006 de 3 de Maio, existe um elenco de actos
susceptíveis, ou melhor, que carecem de registo pelo empresário
comercial73.
O registo comercial tem por fim publicar os actos que compreendem
a descrição e identificação do empresário e todos os actos relevantes
que como tal a lei só qualifica e por isso sujeito a registo. A vantagem

72
Cfr o artigo 48º do C.Com vigente.
73
MUALEIA, Fernanda e VALE, Sofia, Guião Prático de Direito comercial, pg. 181
69
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 70

do registo esta na publicidade, pois através do registo publicam-se as


actividades do empresário comercial para o conhecimento, não só
daquele que contrata com empresário comercial, como também do
público em geral nos termos do art.º 58° C.Com.
No entanto, o registo comercial não trata somente da actividade
jurídico-mercantil dos empresário, é extensivo ao registo dos navios,
relativamente aos quais embora tratando-se de bens móveis pode
existir paralelismo entre o registo de bens objecto de propriedades
visando dar publicidade como condição de eficácia relativamente a
terceiros, não apenas a sua transmissão como também em relação a
certos ônus que recaiam sobre esses bens.

_____________________________________________
Sumário
Nesta unidade, tratamos matéria relacionda com a empresa, que é o
conjunto de actos lidagos a actividade economia exercida pelo
empresário comercial de forma profissional e organizada, com vista a
realização de fins de produção ou troca de bens e serviços, ou uma
organização do conjunto de factores de produção e outros elementos
congregados pelo empresário comercial, com vista ao exercício da sua
actividade. A empresa apresenta vários elementos que compõem a
sua actividade, tais como: o próprio sujeito (o empresário), as
obrigacoes do empresário, firma, principiuos relativos a constituicao
da firma, transmissão da firma, o registo do estabelecimento
comercial.
Tratamos matéria relacionada também com a firma, que é o sinal
distintivo do estabelecimento comercial e assim pode ser constituída
livremente e transmitida com o próprio estabelecimento comercial,
havendo ou não acordo expresso.

EXERCÍCIOS

70
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 71

1. O que lhe aparece em mente quando fala-se de princípio da


novidade?
a) Entende-se que a firma deve manifestar a distinção entre
ela e as demais já reconhecidas ou registadas,
b) Entende-se que a firma deve mudar de nome sempre que
necessário,
c) Entende-se que a firma deve possuir dois nomes
obrigatoriamente,
d) Entende-se que a firma não deve manifestar a distincao
entre ela e demais já reconhecidas ou registadas.
A resposta correcta é. A

2. Indique os principios fundamentais da firma?


a) Principio da vertdade, principio da exclusividade e
principio da novidade,
b) Principio da legalidade, principio da boa-fe, princio da
novidade,
c) Principio do contraditório, principio do dispositivo,
principio oficialidade,
d) Princípio de presunção de inocência, princípio da
colaboração.
A resposta correcta é: A

3. O que diz o principio da independencia entre os conjuges?


a) Qualquer dos cônjuges poder praticar a actividade
empresarial independentemente da autorização do outro
cônjuge.
b) Nenhum dos cônjuges poder praticar a actividade
empresarial independentemente da autorização do outro
cônjuge.
c) Ambos são responsáveis pelos actos supervinientes da
actividade comercial

71
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 72

d) Nenhum dos dois é responsável pelos actos supervinientes


da actividade comercial
A resposta correcta é: A

4. Indique as obrigações do empresario.


a) Adoptar uma firma; escriturar em ordem uniforme as
operações ligadas ao exercício da sua empresa, fazer
inscrever na identidade competente os actos sujeitos ao
registo comerciale prestar contas.
b) Adoptar uma firma; escriturar em ordem uniforme as
operações ligadas ao exercício da sua empresa, fazer
inscrever na identidade competente os actos sujeitos ao
registo comercial e não prestar contas.
c) Não adoptar uma firma; escriturar em ordem uniforme as
operações ligadas ao exercício da sua empresa, fazer
inscrever na identidade competente os actos sujeitos ao
registo comerciale prestar contas.
d) Adoptar uma firma; escriturar em ordem uniforme as
operações ligadas ao exercício da sua empresa, não fazer
inscrever na identidade competente os actos sujeitos ao
registo comerciale prestar contas.
A resposta correcta é: A

TEMA III - ACTOS DE COMÉRCIO


Introdução
Nesta unidade temática, iremos abordar matérias relacionadas com
actos do comércio, a sua noção e sua base legal, sua classifição,
modelos dos actos de comércio, actos de comércio por conexão,
teoria acessória, casuais, abstrato, puro e misto.

Objectivos específicos

72
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 73

No fim desta unidade temática o estudante devera ser capaz de:


 Conhecer os actos do comércio,
 Saber classificar os actos do comércio,
 Conhecer os modelos dos actos do comércio.

UNIDADE TEMATICA 3.1. ACTOS DE COMÉRCIO


A determinação dos actos do comércio acha-se prevista nos artigos 4°
e 5° do C.Com. Extrai-se destes artigos, a ideia de que determinados
actos jurídicos, os acontecimentos jurídicos relevantes são
classificados como comerciais. E no art.º C.Com 74, a expressão acto de
comércio, é usada no sentido amplo. Isto é, abarcando vários
acontecimentos que consubstanciam actividades comerciais e por
isso assinaladamente efeitos jurídicos comerciais. Nomeadamente os
factos jurídicos voluntários lícitos ou ilícitos ou ainda simples negócio
jurídico. No entanto nem todas as disposições do C.Com refletem-se
na ideia essencial dos actos do comércio strictu sensu, embora que
esse assuma que o nosso direito comercial é um Direito dos actos do
comércio e da empresa.
Ex: factos lícitos, art.º 180°, 293° n°2 C.Com
Ex: actos jurídicos ilícitos, art.º 24° C.Com
Ex: negócios jurídicos, art.º 477° C.Com
Nos termos da al. b) n°1 do art.º 4° c.com são actos do comércio os
actos praticados no exercício de uma empresa comercial de onde
resulta que não são apenas actos de comércio os contratos, mas
também todos os actos praticados no exercício da empresa comercial
das quais emanam obrigações comerciais. Isto é a disposição tanto
abarca os actos praticados de forma isolada ou ocasional, quer por
empresário comercial, quer por não-empresário comercial tendentes
a obtenção de lucro. No entanto excluem-se do art. 4° C.Com, os
factos jurídicos naturais ou involuntários porque, aqueles que
ocorrem da verificação da vontade humana.

74
CARDOSO, J. Pires, Compêndio de Noções de Direito comercial, pg. 309

73
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 74

Exemplo, falecimento de um sócio de uma determinada Sociedade.


Este facto ocorre com repercussões na vida da sociedade, mas em si
não consubstancia qualquer facto que como tal se deva integrar como
sendo comércio.
CLASIFICAÇÃO DOS ACTOS COMERCIAIS

ACTOS DE COMÉRCIO SUBJECTIVO

São aqueles classificados como tal em função do sujeito que os


prática, isto é, a qualificação do acto como sendo do comércio terá
como base ou, a pessoa que a luz do art.º 3° c.com, pratica uma
daquelas actividades prevista. Deste modo, os actos praticados pelo
empresário comercial no exercício da empresa comercial se
presumem de comércio, salvo se das circunstâncias que rodearam o
acto. Se por exemplo, usou o capital social, se praticou uma compra
com intenção de revenda, etc.75.

ACTOS DE COMÉRCIO OBJECTIVO

É todo aquele acto independentemente do sujeito ou da qualidade do


sujeito, encontra-se previsto no código comercial ou código civil ou
ainda em qualquer legislação extravagante que qualifica o tal acto
como sendo de comércio. Conferir o n° 1 do art.º 4° do C.Com.
Há actos exclusivamente civis, aqueles que não têm qualquer
potencialidade de consubstanciar actos de comércio por isso,
nunca seriam na lei Comercial. Quando o legislador na parte
final do n° 2° do art.º 4° do C.Com exprime a ideia de que só
não será comercial quando praticado pelo empresário
comercial quando praticado pelo empresário comercial se das
circunstâncias que rodearam a sua prática resultar o contrário,
quis afastar na nossa opinião essa presunção que poderia
recair também sobre os actos exclusivamente civis. Ao acto

75
Op. Cit. Pg. 4

74
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 75

exclusivamente civil não há como representar a sua


comercialidade mesmo quando praticado pelo empresário
comercial. É por exemplo, o casamento ou a perfilhação pelo
empresário comercial.

ACTO UNILATERAL

Quando uma das partes intervenientes é empresário comercial e a


outra não é. Nos termos do art.º 5° do C.Com, esse acto é regulado
pela lei comercial relativamente aos dois sujeitos salvo no que só
deva aplicar ao empresário comercial de acordo com a sua qualidade.
3.1.4. Acto Bilateral

Quando os dois são empresários comerciais e realizam um acto de


comércio, ou seja, o acto é comercial para as duas partes. Uma
compra realizada por um empresário num armazém de outro
empresário comercial com a finalidade de revenda.
Assim, o acto de comércio não é em função da pessoa que os
praticou, mas sim em função da sua qualificação como tal pela
lei.
José Ibraímo Abudo na sua obra sobre Lições de Direito
Comercial distingue os mecanismos usados na definição dos
actos de comércio. Para o efeito, e segundo o autor, há três
mecanismos que o legislador pode adoptar na determinação
nos actos de comércio objectivo76.

MODELO DA DEFINIÇÃO

A partir do qual o legislador oferece de forma sintética o que se deve


entender por acto de comércio. Este modelo apresenta na medida em
que toda definição pode colocar problema de entendimento e
incerteza do direito;

76
JUNIOR, Manuel Guilherme, Manual de Direito Comercial, Moçambicano, escolar
editora, Maputo, 2012.

75
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 76

MODELO-SISTEMA DE ENUMERAÇÃO EXPRESSA

Onde o legislador opta por uma identificação expressa num rolo


alargado nos actos que a própria lei determina.
O inconveniente deste modelo é que limita o campo dos actos e a luz
de um direito dinâmico, tal como é no direito comercial, podem
escapar várias situações a classificação de actos de comércio.

MODELO DE ENUMERAÇÃO IMPLÍCITA

Este modelo apenas delimita actos de comércio através da remissão


para diversos actos que o código considera comerciais, acima
enumerados, optando pela indicação exemplificativa, é esta a posição
optada pelo nosso legislador, al. a) n° 1° do art.º 4° c.com, ao
estabelecer que são actos de comércio, os actos regulados na lei em
atenção as necessidades de empresa comercial designadamente os
previstos neste código e os actos análogos.

ACTOS DE COMÉRCIO ABSOLUTO

Os actos que tem de ser por si, a natureza comercial, isto é, os actos
que devem a sua comercialidade à natureza intrínseca, ou, ainda da
sua natureza funda-se o próprio comércio, na vida empresarial.

ACTOS DE COMÉRCIO POR CONEXÃO

Os actos cuja comercialidade e lei outorga tendo em consideração a


sua especial relação com certo acto de comércio, ou com o comércio,
ou seja, são actos comerciais em razão da sua peculiar ligação a um
acto de comércio absoluto ou uma actividade classificada como
comercial. Portanto, tudo depende da sua relação de conexão ou
acessoriedade, quer com um acto de

76
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 77

comércio fundamental, quer com a exploração de uma empresa


mercantil77.
Para o jurista Rocco, os actos de comércio absolutos, também
são chamados actos constitutivos na medida que caracterizam
as operações de mediação na troca, e os actos de comércio,
porque se limitam a facilitar essas mesmas operações.
Para a maioria dos comercialistas, os actos de comércio
acessórios comportam a totalidade dos actos de comércio
subjectivos, na tal teoria chamada, teoria da conexão
subjectiva, mas também abrangem uma diversidade de actos
objectivos, como por exemplo, mandato, empréstimo, que a
lei chama de conexão objectiva.

TEORIA DO ACESSÓRIO

Constatando que, determinados actos de natureza civil podem


transformar-se em comerciais, uma vez praticados no âmbito
comercial, a doutrina construiu uma teoria que apelida os actos
praticados por um comerciante no exercício de seu comércio e não
só, mas também os actos ligados a um acto de comércio absoluto de
actos de comércio acessórios.
No essencial, há duas categorias de actos de comércio acessórios:
1. Os associados a acto do comércio ligados a
actividade comercial, de um empresário
comercial,
2. Os constituídos por actos por actos que
adquirem a comercialidade em razão de
relação existente entre eles e um acto de
comércio por natureza.

77
CORDEIRO, António Menezes. Manual de Direito Comercial. Coimbra, Almedina.

77
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 78

Deste modo, os primeiros são actos e os segundos são actos de


comércio objectivos e acessórios. Embora uma tal extensão da
comercialidade pareça à primeira vista razoável, a verdade é que
falseia a razão de ser da criação da figura de actos de comércio
acessórios. Estes são considerados comerciais por estarem
presumivelmente relacionados com a actividade de um comerciante
na sua empresa comercial, isto é, por pertencerem ao âmbito do
comércio profissionalmente organizado78.

ACTOS DE COMÉRCIOS CASUAIS

Os actos relativamente aos quais a lei os contempla e os regula de


forma a preencher ou realizar uma determinada causa-função jurídico
económico;
Ex: compra e venda tem por causa a alimentação de um bem
mediante a aquisição de um preço.

ACTOS DE COMÉRCIO ABSTRATOS

Os que se manifestam com vista a preencher uma diversidade de


causas-funções, podendo as relações jurídicas que deles emanam ter
uma vida autónoma das relações que lhe deram origem. Na verdade o
acto de comércio abstrato tem também uma causa. No entanto, esta
causa não é típica, podendo integrar-se numa das diferentes relações
jurídicas integradas ao acto.
Ex: negócios jurídicos cambiários, que são negócios praticados
no âmbito dos títulos de crédito, que tanto podem ser de
origem de um contrato de compra e venda, de empréstimo.

78
CORREIA, Miguel J.A. Pupo, Direito Comercial - Direito da Empresa, 10ª Edição
revista e actualizada, Ediforum, Lisboa, 2007.

78
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 79

3.3. Actos de comércio Puro

Os actos comerciais relativamente a todos os sujeitos, são também


designados de actos bilateralmente comerciais (os dois intervenientes
são empresários comerciais).

3.3.1. Actos de Comércio Misto

Também designados unilateralmente comerciais são-no


relativamente a uma das partes e nos termos do art.º 5° C.Com, são
regulados a luz do código comercial, em relação a todos contratantes
com excepção daqueles que são aplicáveis aos comerciantes pela
natureza de ser empresário comercial.
3.3.2. Actos de comércio formalmente comerciais

Os que são regulados na lei comercial como um esquema formal que


permanece aberto para dar cobertura a qualquer conteúdo e
abstraem no seu regime de objecto ou fim para que são usados.
3.3.3. Actos Substancialmente comerciais

Os que tem a comercialidade em razão da própria natureza, isto é,


por representar em si mesmos actos próprios da actvidade
materialmente mercantil.

Sumário.
Nesta unidade temática abordamos matérias relacionadas com actos
de comércio. De acordo com a al. b) n°1 do art.º 4° do código
comercial, são actos do comércio os actos praticados no exercício de
uma empresa comercial de onde resulta que não são apenas actos de
comércio os contratos, mas também todos os actos praticados no
exercício da empresa comercial das quais emanam obrigações
comerciais. Isto é a disposição tanto abarca os actos praticados de
forma isolada ou ocasional, quer por empresário comercial, quer por
não-empresário comercial tendentes a obtenção de lucro.

79
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 80

Exercícios

1. Assinale com V as afirmações verdadeiras e com f as


afirmações falsas.
1.1. O que são actos de Comércio?
a) São actos praticados no exercício de uma empresa
comercial não são apenas actos de comércio os contratos,
mas também todos os actos praticados no exercício da
empresa comercial das quais emanam obrigações
comerciais tendentes a obtenção de lucro.
A resposta é: verdadeira - (V)
2. Actos do comércio por conexão
a) São actos comerciais em razão da sua peculiar ligação a um
acto de comércio absoluto ou uma actividade classificada
como comercial. Portanto, tudo depende da sua relação de
conexão ou acessoriedade, quer com um acto de comércio
fundamental, quer com a exploração de uma empresa
mercantil.
A resposta é verdadeira (V).

3. Acto do comércio bilateral


a) Quando os dois são empresários comerciais e realizam um
acto de comércio, ou seja, o acto é comercial para as duas
partes
A resposta é verdadeira, (V)

4. Actos de comércio objectivo são?


5. É todo aquele acto independentemente do sujeito ou da
qualidade do sujeito, encontra-se previsto no código comercial
ou código civil ou ainda em qualquer legislação extravagante

80
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 81

que qualifica o tal acto como sendo de comércio. Conferir o n°


1 do art.º 4° do C.Com.
A resposta é verdadeira (V).

UNIDADE TEMA IV - TÍTULO DE CRÉDITO


Introdução
Nesta unidade temática iremos abordar matérias relacionadas com os
títulos de créditos, onde iremos dar a noção do título de créditos, as
suas características, sobretudo da literalidade, autonomia, abstração,
autonomia da posição do portador do título de crédito, o cheque,
requisitos do cheque, sua classificação, o endosso, aval, suas
modalidades, as marcas, o uso da marca, e da livrança.

Objectivos específicos.
No fim desta unidade temática o estudante deverá ser capaz de:
 Saber o conceito do titulo de crédito,
 Saber diferenciar o cheque da livrança,
 Saber o que é endosso e quando faz se o endosso.

UNIDADE TEMATICA 4.1. -TÍTULO DE CRÉDITO


Título de crédito é um documento necessário para exercitar o direito
literal autónomo. Como noção diremos que título de crédito é um
documento que incorpora um direito literal e autónomo, que legitima
o seu titular a exercer e serve de suporte à sua circulação e
mobilização. Tem como função titular e incorporar direitos de modo a
permitir e facilitar a sua circulação e mobilização.79

O comércio, quando realizado entre praças diferentes, afastadas por


vezes por si longas distâncias exige, para poder desenvolver, modos

79
DE VASCONCELOS, Pedro Pais, Direito Comercial: Títulos de crédito, pg.3
81
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 82

de titulação, legitimação e circulação de direitos diferentes dos


clássicos do Direito Civil.

Os comerciantes ficam, por força do comércio, investidos em créditos


sobre outros comerciantes de outras praças. Podem ao mesmo tempo
ser devedores ainda outros comerciantes eventualmente da mesma
praça daqueles sobre quem têm crédito, ou ainda outras praças. As
dificuldades de circulação do dinheiro e as exigências de celeridade e
segurança no tráfego comercial trouxeram, através da história a
criação, espontânea como praxe comercial, de documentos especiais
“ cartulas” em que os comerciantes faziam constar os seus créditos.

Esses documentos serviam para definir, para circular, para cobrar e


para mobilizar os créditos que neles estavam documentados. Serviam
para definir porque se entediam o direito documentado valia
exactamente como constava do documento: não era permitido
discutir ou invocar eventuais divergências entre o direito e o
documento.

Serviam para circular os créditos documentados através da circulação


dos próprios documentos: entendiam-se que com a transmissão do
documento se transmitia o próprio crédito independentemente do
consentimento e até do conhecimento do devedor. Serviam para
cobrar e para exercer os direitos neles documentados: davam
legitimidade ao seu portador para os cobrar, desobrigando quem
pagasse ao portador, não podendo ao portador do documento que o
apresentasse a pagamento ser posto o que não fosse ele o credor
originário, nem ao devedor que tivesse pago ao portador ser oposto
que o tivesse pago ao terceiro.80

Serviam para mobilizar os créditos: permitiam ao credor a prazo


antecipar o valor económico do seu crédito vendendo o documento a
um terceiro que o iria cobrar no vencimento, ou pagando com ele

80
Op. Cit. Pg. 4
82
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 83

dívida que tivesse, o que facilitava a concessão de crédito


indispensável à actividade comercial. Os títulos de créditos nasceram
antes da existência do papel-moeda, em época em que era grande
perigo transportar somas importantes de dinheiro e então na origem
das próprias notas do banco que nasceram, elas próprias como título
de crédito.81

O regime jurídico do direito civil não permitia, nem segurança, nem


celeridade, nem circulação de direitos de que o comércio carecia. A
solução prática encontrada pelos comerciantes consistiu na
“coisificação” dos direitos através da sua “incorporação” em
documentos – títulos – que seguissem depois o regime da circulação
das coisas móveis. Os títulos de crédito e o seu regime foram criados
pela prática dos comerciantes fora dos quadros do direito civil. São
características gerais dos títulos de crédito: a literalidade, autonomia,
incorporação, legitimação e circulação.

LITERALIDADDE

O título de crédito é um documento literal, que significa que o


conteúdo literal ou gramatical do título corresponde ao direito
“cartular” que por ele representado, de modo que o conteúdo,
natureza e os limites deste têm o âmbito e valor que resultar do
próprio título. Isto é, só os dizeres e as menções constantes do
documento podem servir para definir e delimitar o conteúdo do
direito nele incorporado.82

Com palavras simples diremos que os títulos de crédito são literais.


Para dizer que os títulos de créditos são documentos escritos e que
das palavras e algarismo escritos no documento (literais) consta ou
resulta o direito nele documentado. O conteúdo e a extensão do
direito contido no título são aqueles que dele constarem escritos83.

81
OP. Cit. Pg. 5
82
MUALEIA, Fernanda e VALE, Sofia, Guião Prático de Direito comercial, pg. 181
83
OP. Cit. pg. 6
83
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 84

Cada título a lei estabelece respectivos pressupostos que constituem


o suporte desta característica.

A literalidade não é igualmente intensa em todos títulos de créditos. É


quase absoluta nos títulos abstractos: letras livrança, cheque e
estrato de facturas, em que só podem ser invocadas pelo obrigado
excepções extra cartulares originadas em convenção exteriores que o
liguem com o próprio portador-credor e não com qualquer outro dos
intervenientes cambiários.84

Nas acções das sociedades anónimas, que são títulos de crédito


causais que incorporam o direito social do acionista, a literalidade
existe por referência; o título não contêm impressa a totalidade dos
direitos e deveres do acionista, para ao quais dificilmente haveria
espaço limitando-se a remeter para o contrato de sociedade, no qual
faz contar os necessários elementos de identificação.

AUTONOMIA

Como característica dos títulos de crédito significa a independência da


posição de cada portador do título de crédito, isto é, que o direito do
portador de um título de crédito é autónomo em relação aos direitos
precedentes. O que daqui resulta é inoponibilidade das excepções
pessoais no plano das relações cartulares, que não podem ser opostas
a um portador as excepções que não lhe digam respeito, mais sim um
anterior portador.

Os títulos de créditos não surgem do ex nihilo no mundo do direito,


nem no tráfego comercial. Tem sua origem num negócio ou pelo
menos numa situação jurídica para cuja documentação, circulação,
mobilização ou cobrança são emitidos.

84
É esta situação que tem sido designada na Doutrina e na jurisprudência por relações
imediatas e que por equívoca, tem conduzido a frequentes decisões judiciais erradas
entre as quais se contam já dois assentos, um de 22/11/64 e outro de 20/7/78.
84
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 85

O direito incorporado pelo título é diferente daquele que o originou, é


um outro direito. O direito incorporado no título designa-se por
direito cartular; o direito que lhe deu origem denomina-se por direito
subjacente.

Quando alguém que é credor de outrem recebe o pagamento por


cheque, o direito em que fica investido como portador desse cheque
é diferente do direito de crédito que tem sobre o devedor que lhe
pagou com o cheque. O montante é o mesmo85. O devedor mudou:
passou a ser o banqueiro sacado.

Sendo diferente dos direitos subjacentes, o direito cartular lhes é


autónomo. Quer dizer que não são misturáveis e mantêm se distintos
os seus regimes jurídicos.

ABSTRAÇÃO OU AUTONOMIA DO TÍTULO

Os títulos valem independentemente da relação fundamental que é


subjacente à sua criação e transmissão, afirmando-se no tráfego
negocial exclusivamente com base na respectiva aparência
(literalidade). O direito inerente ao título de crédito representa uma
relação jurídica nova e distinta da que esteve na base da emissão do
título de crédito.

AUTONOMIA DA POSIÇÃO DO PORTADOR DO TÍTULO

O detentor de uma letra é considerado portador legitimo se justifica o


seu direito por uma série ininterrupta de endosso, mesmo no último
for em branco e se a pessoa foi por qualquer maneira desapossada de
uma letra, o portador dela, desde que justifique o seu direito por uma
série ininterrupta de endossos, não é obrigado a restituir salvo se
adquiriu de má-fé ou se, adquiriu-a cometeu uma falta grave.

85
O montante pode ser diferente se o pagamento for feito parcialmente em cheque e
parcialmente de outro modo, mas vai se considerar apenas o caso de pagamento total.
85
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 86

O regime de autonomia do portado diverge e não se confundido com


o da autonomia do direito cartular. Quando se fala de autonomia
cartular está-se a relacionar e autonomizar o direito emergente do
título e nele incorporado do direito subjacente, que funcionalmente o
originou a emissão, o endosso ou outro acto cartular. Quando se trata
da autonomia a propósito da posição do portador, o que se está a
relacionar e autonomizar é a titularidade do título pelo seu portador
em relação à de outros portadores anteriores que do título tenha sido
desapossado.86

Os títulos de créditos são coisa móveis, e como tais objecto idóneo de


direitos reais. Assim, os títulos podem ser objecto de propriedade,
compropriedade, de usufruto, de penhor, de retenção, usucapião e
são susceptíveis de posse.

A titularidade do título traduz-se na titularidade de direito real sobre


ele, considerando como coisa móvel. O título circula de acordo com a
sua lei de circulação e conforme à ordem, nominativo ou a portador,
circula (transmite-se) por endosso, por lançamento do pertence ou
por simples tradição.

O portador do título, quando esteja legitimado de acordo com a


respectiva circulação, tem a sua titularidade, quer dizer ao seu direito
real sobre o título, indiscutível. Se na cadeia de circulação algum
anterior titular tiver sido ilicitamente desapossado do título, não
poderá reivindicar do actual portador.

De acordo com o regime geral do direito civil, aquele que tenha sido
ilicitamente desapossado de uma coisa imóvel de que seja
proprietário não perde por isso o seu direito e pode reivindicar de
qualquer possuidor ou detentor, salvo se ocorrer usucapião a favor do
terceiro possuidor.87

86
OP. cit. pg.19
87
Op. Cit. Pg. 20
86
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 87

Neste regime do direito civil, o desapossado poderá sempre


reivindicar do portador do título. Não assim no regime dos títulos de
crédito. Autonomia da posição do portador traduz um regime
contrário: não obstante o desapossamento ilícito, o desapossado não
pode reivindicar o título do portador legitimado. O direito do
desapossado cede perante o do portador. Isto significa que a
titularidade de cada portador do título, na cadeia de circulação, é
autonomia em relação à do anterior portador e não é afectada pelos
vícios de que sofra o direito daquele de quem recebeu título88.

A aquisição do título pelo portador, desde que feita de acordo com a


sua lei de circulação é uma aquisição originária. Não se trata de
transmissão feita pelo anterior ao actual portador em que, de acordo
com o regime geral, o transmitente transmite ao transmissário o seu
direito. O portador tem sobre o título de um direito que se constitui
originariamente na sua esfera jurídica e que não lhe é transmitido
pelo portador anterior.

As categorias dos títulos de crédito são vastas e bastante discutível a


própria terminologia e instituto que dela fazem parte.

CRÉDITO

O crédito é essencialmente a troca de uma prestação presente por


uma prestação futura, ou seja o diferimento no tempo de uma contra
prestação89.

O conceito de crédito comporta dois pressustos basicos:

 A confiança, do credor na honestidade e solvabilidade do


devedor, isto é, na sua aptidão moral e patrimonial para
cumprir a obrigação no prazo concedido, ou, pelo menos o

88
Op. cit. pg. 21
89
http://www.com/octalberto.no.sapo pt/ títulos de crédito. Data 01 de Março de
2016. 10h:e 46 min.
87
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 88

valor das garantias constituidas pelo devedor para assegurar a


efectivação da prestação a que obrigou.
 Decurso do tempo entre a prestação actual do credor e a
prestação futura do devedor, normalmente fixado num
periódo certo ou a prazo; ou, o caracter futuro ou deferido da
prestação do devedor.
A promoção do crédito seja um dos objectivos fundamentais do
direito comercial, cuja prossecução esta na base e justifica a
especialidade do regime dos actos do comércio.

O título de crédito pode ser definido como um documento necessário


para exercitar o direito literal e autónomo mencionado no referido
titulo.90

Podem emitir-se títulos de crédito não especialmente regulados por


lei, desde que deles conste claramente a vontade de emitir títulos
dessa natureza e a lei os não proíba.

Título de crédito é documento representativo de um crédito que uma


pessoa tem sobre a outra. O título de crédito, também, pode ser
definido como documento necessário para se exercer o direito literal
que nele se menciona.

CLASSIFICAÇÃO

A classificação mais importante dos títulos de crédito é feita quanto a


sua circulação, da seguinte maneira91:

 Títulos ao portador, títulos ao portador são aqueles


declarados como tais pela lei ou em que, pelo texto ou pela
forma do título, se depreende sem dúvida que a prestação é
devida ao portador deles.

90
VALE, Sofia e MUALEIA Fernanda, Guia Prático de Direito Comercial, Escolar
Editora, Angola, 2003, pag.181
91
Nos termos dos n-s 1,2 e 3 do art.635º do C.Com.
88
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 89

 Títulos à ordem, são aqueles em que a pessoa do credor é


indicada no título e contém a cláusula à ordem ou que como
tais são declarados por lei.
 Títulos normativos, são aqueles em que a pessoa do credor é
indicada no título e no registo do emitente e que não são
emitidos à ordem nem declarados como tais pela lei.

CHEQUE

Cheque é um título através do qual uma pessoa ordena que uma


instituição de crédito, onde depositou fundos ou dispõe de crédito,
pague a si ou a terceiro ou a ordem a si ou ordem a terceiro
determinada quantia92.

Cheque é o título de crédito que enuncia um pagamento, tal como a


letra, mas é uma ordem de pagamento dirigida a uma instituição
bancária onde o emitente do título possui uma previsão. O cheque
funciona como um meio de mobilização de fundos, quer em benefício
do emitente, quer em benefício de um terceiro93.

Cheque é o título à ordem, sujeito a certas formalidades, pelo qual


uma pessoa, que tem qualquer importância disponível num
banqueiro, dispõe dela total ou parcialmente.

O cheque é, pois, na sua essência e tal como a letra, uma ordem de


pagamento (dada pelo depositante ao banqueiro). 94Todavia, se a
letra pode consistir numa ordem de pagamento à vista ou a prazo, e
mais ordinariamente a prazo, a verdade é que o cheque tem sempre a
natureza de ordem de pagamento à vista.

REQUISITOS DO CHEQUE

92
Cfr. art.782º do C. Com.
93
VALE, Sofia e MUALEIA Fernanda, Guia Prático de Direito Comercial, Escolar
Editora, Angola, 2003,pag.183
94
CARDOSO, J. Pires, Compêndio de noções de Direito comercial, Atlâmtida
editora, Coimbra, pag316
89
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 90

O cheque deve conter:

 A palavra cheque escrita no próprio texto do título;


 O mandato puro e simples de pagar uma quantia determinada;
 O nome de quem deve pagar (sacado);
 A indicação do lugar em que o pagamento se deve efectuar;
 A indicação da data em que e do lugar onde o cheque é
passado;
 Assinatura de quem passa o cheque (sacador).
O título a que faltar qualquer dos requisitos enumerados não produz
efeitos como cheque, mas através das excepções seguintes podem
ser consideradas cheques:

 Não se indicando o lugar do pagamento, considera-se como tal


o lugar designado ao lado do nome do sacado e, na falta deste
ou de qualquer outro, o cheque é pagável no lugar em que o
sacado tem o seu estabelecimento principal.
 Não se indicando o lugar da emissão (lugar onde o cheque é
passado), considera-se como tal o lugar designado ao lado do
nome do sacador.
Formas do Cheque

O cheque pode revestir duas formas principais:

 Cheque nominativo; e
 Cheque ao portador.
4.2.1. Cheque nominativo

É o que contém o nome da pessoa a que, ou à ordem de quem, deve


ser pago, não podendo sê-lo qualquer outra que no título não esteja
mencionada. Este cheque pode ser passado à ordem do próprio
sacador ou emitente ou de terceira pessoa beneficiário.

90
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 91

4.2.2. Cheque ao Portador

É aquele que não contém o nome da pessoa a quem deve ser pago,
podendo sê-lo a qualquer que se apresente a cobrá-lo.

É bom esclarecer que são considerados ao portador os cheques sem


indicação do beneficiário ou passados a favor duma determinada
pessoa, mas contendo a menção ou ao portador. E, nestes termos,
para que um cheque se considere nominativo, é sempre indispensável
que se risquem as palavras, é sempre indispensável que se risquem as
palavras, ou ao portador se, porventura, o impresso-cheque contiver
essas palavras.

Convém acrescentar ainda que o cheque não pode ser passado sobre
o próprio sacador, salvo no caso em que se trate dum cheque sacado
por estabelecimento sobre o outro estabelecimento, ambos
pertencentes ao mesmo sacador, nomeadamente pela Sede de um
banco sobre a sua Filial ou Agência, e vice-versa.

Qualquer cláusula de juros inserta no cheque considera-se como não


escrita, e, na hipótese de divergência entre a importância do cheque,
escrita em algarismos e por extenso, prevalece a quantia de que se
encontra mencionada por extenso.

O sacador do cheque é sempre responsável pelo seu pagamento e,


por isso, se considera como não escrita qualquer cláusula pela qual o
sacador se pretenda eximir a esta garantia.

Quais das duas espécies de cheque, nominativo ou ao portador,


encerra maiores vantagens práticas?

A resposta varia consoante as circunstâncias especiais em que o


cheque é passado. Assim, suponhamos que Trindade reside em
Lichinga, pretende pagar uma dívida que contraiu para com Marcus,
residente Nampula, e que o faz por maio de cheque enviado para esta
última cidade. Como o documento se

91
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 92

pode extraviar, convém ser nominativo a fim de se enviar que


qualquer pessoa o possa receber.

Estabelecendo uma outra hipótese em que Trindade efectuar, na


cidade de Lichinga a compra duma mobília ´na loja do comerciante
Hussene, e querer pagá-la por meio de cheque sobre um banco da
cidade de Lichinga. Hussene tem necessidade de receber
prontamente a importância do cheque e tenciona apresentá-lo de
seguida no referido banco. Neste caso é mais vantajoso o cheque ao
portador, pois as probabilidades de extravio são diminutas e as
facilidades de cobrança para estes cheques são muito maiores do que
para os cheques nominativos.

Para estes últimos serem cobrados, o beneficiário terá de passar


recibo no próprio cheque e, quando não seja depositante do banco
sacado, a sua assinatura deverá ser reconhecida por notário ou
abonada por um comerciante que no banco tenha conta.

Além de tudo isto, o cheque ao portador tem ainda a vantagem de se


poder utilizar quase como uma nota de banco, pois, com ele se pode
efectuar qualquer pagamento sem necessidade do seu endosso
(dentro dum prazo restrito, evidentemente).

4.2.3. Endosso

O cheque, quando nominativo, tem a natureza de título a ordem e,


portanto, é transmissível por meio do endosso só perde este carácter
por declaração expressa em contrário, inscrevendo-se no cheque à
cláusula não à ordem ou outra equivalente; e nestas condições, só é
transmissível pela forma e com os efeitos duma cessão ordinária.

O endosso deve ser puro e simples, considerando-se como não escrita


qualquer condição a que ele esteja subordinado. Pode ser feito
mesmo a favor do sacador ou de qualquer outro co-obrigado e estas

92
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 93

pessoas podem endossar novamente o cheque.

A lei permite o endosso ao portador, que vale como endosso em


branco, mas proíbe taxativamente certas formas de endosso:

 O endosso parcial; e
 O endosso feito pelo sacado.
Exemplos:

Cardoso é beneficiário e portador dum cheque de 100.000,00mts


sobre determinado banco, pretende com ele pagar a Carlos uma
dívida no montante de 5000,00mts e endossa-o só por metade do seu
valor.

A lei considera nulo este endosso parcial e compreende-se assim seja


por uma razão de ordem prática, além de outros motivos de ordem
doutrinária. Quem seria, no endosso parcial, o legítimo portador do
cheque ou, o que é o mesmo, quem teria o direito de o receber no
banco respectivo? O endossante ou o endossado?

Esta dificuldade é maior quanto é certo que, nos títulos de crédito, a


posse do documento é condição indispensável para se exercer o
direito nele contido.

Mas suponhamos que Cardoso beneficiário e portador do mesmo


cheque de 100.000,00mts, o foi cobrar no banco em questão. Poderá
esta entidade o banco sacado endossá-lo depois de o ter pago?

A lei estabelece a nulidade deste endosso feito pelo sacado, e a razão


de semelhante procedimento torna-se evidente se considerarmos
que a função específica do cheque é levantar uma quantia que
qualquer depositante tenha num estabelecimento bancário. Logo que
este facto o levantamento se verifica, o cheque perdeu a sua razão de
ser. Em todo o acto há um princípio e um fim: o cheque nasce com a
emissão, uma ordem de pagamento e morre logo que esta ordem é

93
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 94

cumprida.

Tal como nas letras, o endosso deve ser escrito no cheque ou numa
folha a este ligada (anexo), deve ser assinado pelo endossante e pode
revestir duas modalidades:

 Endosso completo;
 Endosso em branco (ou incompleto)
O endossante pode não designar o beneficiário ou consistir
simplesmente na assinatura do endossante (endosso em branco).
Neste caso último caso, o endosso, para ser válido, deve ser escrito no
verso do cheque ou na folha anexa, nos termos do nº2 do art.797º do
C.Com.

4.2.4. Aval

Do mesmo modo que nas letras, o pagamento dum cheque pode ser
garantido, no todo ou em parte do seu valor, por um aval. E esta
garantia pode ser dada por terceiro, excepto o sacado, e até mesmo
por qualquer signatário do cheque.

Modalidades do Aval
O aval reveste também duas modalidades:

 Aval completo – constituído pela assinatura do avalista,


precedida das palavras «Dou o meu aval a favor de A...» ou a
expressão equivalente. Pode ser escrita em qualquer parte do
cheque ou do anexo (se o houver), nos termos do nº 1 do art.
807º do C.Com;
 Aval incompleto – constituído pela simples assinatura do
dador do aval escrita na face principal do cheque. Com
excepção da assinatura do sacador qualquer outra que se
encontre nesta face do cheque considera-se como de avalista,
com base no nº3 do art.º 807º do C.Com.

94
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 95

O dador do aval deve ter sempre o cuidado de indicar a pessoa por


quem se responsabiliza, mas, na falta dessa indicação, o aval
considera-se prestado ao sacador95.

O avalista é responsável da mesma forma que o seu avalado; e desde


que pague o cheque, pode exigir o respectivo pagamento, tanto da
pessoa por quem se obrigou, como dos outros signatários para com
eles obrigados.

Pagamento, Prazos de Apresentação

O cheque é sempre pagável à vista, e por isso, a lei fixa o prazo dentro
do qual ele deve ser apresentado o pagamento96.

De acordo com o art.º 809º do C.Com. cheque é pagável à vista.


Considera-se como não escrita qualquer menção em comércio. O
cheque apresentado a pagamento antes do dia indicado como data
da emissão é pagável no dia da apresentação.

O prazo de apresentação a pagamento varia conforme os casos:

 Oito (8) dias, para os cheques pagáveis no mesmo país em que


foram passados;
 Vinte (20) dias, para os cheques pagáveis em país diferente
daquele em que foram passados, desde que ambos os países
de encontrem situados na mesma parte do mundo.
 Setenta (70) dias para os cheques pagáveis em país diferente
daquele em que foram passsados, desde que ambos os países
se encontrem situados em diferentes partes do mundo.
Os prazos acima mencionados começam a contar a partir do dia
indicado no cheque como data da emissão.

O sacado pode exigir, ao pagador o cheque, que este lhe seja


entregue munido de recibo passado pelo. Em regra, o recibo é

95
Cfr.nº4 do art.807º do C.Com.
96
CARDOSO, J. Pires, compendio de Noções de direito comercial, Atlântida Editora
S.A.R.L. Coimbra,
95
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 96

passado no verso do cheque e constituído simplesmente pela


assinatura do portador, precedida das palavras recebi ou recebemos.

Tal como nas letras, o portador do cheque também não pode recusar
o seu pagamento parcial; e, nesta hipótese, o sacado tem o direito de
exigir que esse pagamento seja mencionado no título e que lhe seja
entregue o respectivo recibo.

4.3. Cheques Cruzados

Denomina-se cruzado, o cheque atravessado, na face principal, por


duas linhas paralelas, e que nem pode ser pago senão a um banqueiro
ou a um cliente do sacado97.

O cruzamento do cheque pode ser efectuado pelo sacador ou pelo


portador e reveste duas modalidades:

 Cruzamento geral;
 Cruzamento especial.
No cruzamento geral, atravessa-se simplesmente o cheque, ao alto,
por dois traços paralelos, podendo escrever-se ou não, entre eles, a
palavra banqueiro outra equivalente. Este só pode ser pago, pelo
sacado, a qualquer banqueiro ou a um cliente do sacado.

No cruzamento especial, precede-se do mesmo modo, mas entre os


dois traços escreve-se (em regra, também ao alto) o nome do
banqueiro que o deve receber. Este cheque só pode ser pago, pelo
sacado, ao banqueiro cujo nome está escrito entre os dois traços, ou
na hipótese de este nome ser o sacado, a um dos seus clientes.

O cheque com o cruzamento geral pode, em qualquer altura, passar a


cruzamento especial; basta, para isso, escrever entre os dois traços o
nome do banqueiro. Já o mesmo não sucede com o cruzamento
especial, que nunca pode ser convertido em geral.

97
CARDOSO, J. Pires, Compêndio de Noções de Direito Comercial, Atlântida
Editora S.A.R.L. Coimbra.
96
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 97

A inutilização do cruzamento, o do nome do banqueiro indicado,


considera-se como não escrita.

4.3.1. Cheques a Levar em Conta

Dum modo geral, os cheques são pagos em numerário, em dinheiro. A


lei permite, no entanto, que o sacador ou o portador proíbam o seu
pagamento em numerário e, neste caso, o interessado não tem o
direito de receber a importância do cheque; esta só lhe poderá ser
lançada em conta, ou seja, creditada. Assim sucede sempre que o
sacador ou o portador inscrevam na frente do cheque ou outra
equivalente.

4.3.2. Acção Por Falta de Cobertura

O portador pode exercer os seus direitos de acção (isto é, pode


recorrer aos tribunais) contra os endossantes, sacador e outros co-
obrigados, se o cheque apresentado em tempo útil não for pago e se
a recusa de pagamento for verificada:

 Quer por um acto formal


 Quer por uma declaração do sacado, datada e escrita sobre o
cheque, com a indicação do dia em que este foi apresentado.
 Quer por uma declaração datada duma camara de
compensação constatando que o cheque foi apresentado em
tempo útil e não foi pago.
O modo mais prático e frequente de fazer a verificação da falta de
pagamento, cheque sem cobertura ou cheque a descoberta, ou seja,
uma declaração do sacado, datada e escrita sobre o cheque.

O pretexto ou a declaração equivalente devem ser feitos dentro do


prazo de apresentação a pagamento (8, 20 ou 70 dias, conforme os
casos) mas, se o cheque foi apresentado no último dia do prazo,
aquelas formalidades podem ainda ser realizadas no primeiro dia útil
seguinte.

97
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 98

Deve acrescer-se, também, que o não pagamento de um cheque, por


falta de previsão ou falta, de cobertura, apresentado dentro dos
prazos legais, é considerado crime e, como tal, o emitente do cheque
(sacador) está sujeito a responsabilidade criminal conexa com a
respectiva responsabilidade civil.

Nem sempre, porém o pretexto ou a declaração equivalente se


tornem imprescindíveis para garantir os direitos do portador do
cheque, por isso, à semelhança do cheque se passa nas letras.

O sacador, o endossante ou o avalista podem, pela cláusula sem


despesas, sem protestos ou outra equivalente dispensar o portador
de estabelecer um protesto ou outra declaração equivalente para
exercer os seus direitos de acção.

Nas condições a cima referidos, o portador dum cheque, que nem


haja sido pago, tem o direito de recorrer aos tribunais contra
qualquer das pessoas obrigadas, que são solidariamente responsáveis
para com ele. E pode proceder contra essas pessoas, individual ou
colectivamente, sem necessidade de observar a ordem segundo a
qual se obrigaram. O mesmo direito possui qualquer signatário que
tenha pago o cheque.

Toda a acção do portador contra os endossantes, contra o sacador ou


contra os demais co-obrigados, prescreve decorridos que sejam seis
meses, contados do termo do prazo da apresentação. E, se qualquer
dos co-obrigados pagou o cheque, o seu direito de acção contra os
outros prescreve no prazo de seis meses, contados do dia em que
tenha pago o cheque ou do dia em que ele próprio foi acionado.

A acção do cheque prescreve em certo prazo significa que, decorrido


esse prazo, deixa de existir o direito de se recorrer aos tribunais para
reclamar do não pagamento dum cheque.

Para completar o estudo do regime jurídico do cheque, convém ter

98
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 99

presentes as seguintes disposições de ordem geral:

 A palavra banqueiro compreende também as pessoas ou


instituições assimiladas por lei aos banqueiros;
 A apresentação e o proposto dum cheque só podem efectuar-
se em dia útil;
 Quando o último dia do prazo prescrito na lei, para a
realização dos actos relativos ao cheque, for feriado legal, esse
prazo é prorrogado até ao primeiro dia útil que se segui;
 Os prazos estipulados, em relação aos cheques, não
compreendem o dia que marca o seu início.
MARCAS

4.3.4. Noção e natureza jurídica

4.3.5. Marcas - São palavras ou símbolos que identificam produtos e


serviços de uma empresa distinguindo-os dos de outras empresas98.

A marca é um sinal que identifica no mercado os produtos ou serviços


de uma empresa, distinguindo-os dos de outras empresas99.

Se a marca for registrada, passa o seu titular a deter um exclusivo que


lhe confere o direito de impedir que terceiros utilizem, sem o seu
consentimento, sinal igual ou semelhante, em produtos ou serviços
idênticos ou fins (ou seja, o registo permite, nomeadamente, reagir
contra imitações).

Em princípio, o registro apenas protege a marca relativamente aos


produtos e aos serviços especificados no pedido de registo (ou a
produtos ou serviços afins).

Isto significa, por exemplo, que uma empresa que detenha um registo
de marca para assinalar computadores pode reagir contra o uso de

98
Inventa Moçambique. Mais sobre marcas in: www.inventa.co.mz/../marcas-
registadas. acesso em 26.02.2016
99
Instituto Nacional da Propriedade Industrial. Tipos de marcas in:
www.marcasepatentes.pt, acesso em 26.02.2016
99
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 100

uma marca igual ou semelhante por uma empresa que preste serviços
de reparação de computadores, mas ja nao o podera fazer, em
princípio, contra a utilização dessa marca por outra empresa que
fabrique espirradores100.

4.4. Classificação das marcas

As marcas classificam-se em:

 Marca de produto ou serviço;


 Marca de certificação; e
 Marca coletiva101.
Marca de produtos e de serviços é o sinal distintivo manifestamente
visível e ou audível, suscetível de representação gráfica permitindo
distinguir produtos ou serviços de uma empresa, dos produtos e
serviços de outra empresa, composto nomeadamente por palavras,
incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, forma do
produto ou da respetiva embalagem102.

4.4.1. As marcas de produtos e serviços classificam-se em:

 Marcas nominativas;
 Marcas figurativas;
 Marcas mistas;
 Marcas sonoras;
 Marcas tridimensionais; e
 Marcas compostas por slogans.
Marcas nominativas são compostas por elementos verbais,
nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, letras ou
números.

Marcas figurativas são compostas apenas por elementos figurativos,


como desenhos, imagens ou figuras.

100
Instituto Nacional da Propriedade Industrial. Tipos de marcas in:
www.marcasepatentes.pt, acesso em 26.02.2016.
101
De acordo com o artigo 123 do Código de Propriedade Industrial.
102
De acordo com a alínea f) do artigo 1 do Código de Propriedade Industrial.
100
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 101

Marcas mistas são compostas por elementos verbais e figurativos.

Marcas sonoras são compostas por sons.

Marcas tridimensionais são compostas pela forma do produto ou da


respetiva embalagem.

Marcas compostas por slogans são constituídas por frases


publicitárias, independentemente da sua proteção pelo direito de
Autor.

Exemplos: VÁ PELOS SEUS DEDOS; QUEM TEM PAGINAS AMARELAS


TEM TUDO.

Marcas coletivas

É aquela que permite distinguir a origem ou qualquer outra


característica comum, incluindo a qualidade de produtos ou serviços
de empresas, membros de uma associação, grupo ou entidade103.

As marcas coletivas podem ser de associação ou de certificação.

Marca de certificação é aquela que identifica os serviços que embora


utilizados por entidades diferentes, sob a fiscalização do titular,
garantem as características ou as qualidades particulares ou serviços
em que a marca é utilizada104.

Uma marca de certificação é um sinal pertencente a uma pessoa


coletiva que controla os produtos ou os serviços, ou estabelece
normas a que estes devem obedecer. Este sinal serve para ser
utilizado nos produtos ou serviços submetidos àquele controlo, ou
para os quais as normas foram estabelecidas.

Uma marca de associação é um sinal pertencente a uma associação


de pessoas singulares ou coletivas, cujos membros o usam, ou têm

103
De acordo com a alínea g) do artigo 1 do Código de Propriedade Industrial.
104
De acordo com a alínea h) do artigo 1 do Código de Propriedade Industrial.
101
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 102

intenção de usar, para produtos ou serviços relacionados com o


objeto da associação105.

O registo da marca coletiva confere ao seu titular o direito de


disciplinar a comercialização dos respetivos produtos, nas condições
estabelecidas na lei, nos Estatutos ou nos Regulamentos internos.

O DIREITO AO USO DA MARCA E SEU CARACTER FACULTACTIVO

4.4.3. Legitimidade para requerer o registo a marca

Tem legitimidade para requerer o registo a marca, os industriais ou


fabricantes, comerciantes, agricultores, artífices ou quaisquer outros
produtores e associações económicas que prestam serviços106.

4.4.5.Duração e renovação de proteção da marca

A proteção do registo da marca tem a duração de 10 anos,


ilimitadamente renovável por períodos iguais107.

A MARCA, SENDO RENOVÁVEL, PODERÁ EXTINGUIR-SE POR:

 Caducidade;
 Anulabilidade;
 Nulidade; e pela
 Renuncia.
Caducidade, nomeadamente, por falta de pagamento das taxas ou
quando tenha expirado o seu prazo de duração108.

105
Instituto Nacional da Propriedade Industrial. Tipos de marcas in:
www.marcasepatentes.pt, acesso em 26.02.2016
106
Nos termos do número 1 do artigo 123 do Código de Propriedade Industrial
Moçambicano.
107
Nos termos do artigo 120 do Código de Propriedade Industrial Moçambicano.
108
De acordo com o artigo 22 do Código de Propriedade Industrial de Moçambicano.
102
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 103

4.5.1. O registo da marca pode ainda caducar por:

 Ausência de uso serio durante 5 anos consecutivos salvo justo


motivo.
 Se a marca se tiver transformado na designação usual do
produto ou do serviço para que foi registada.
 Se a marca se tornar suscetível de induzir o público em erro,
nomeadamente acerca da natureza, qualidade e origem
geográfica dos produtos ou serviços109.
4.5.2. Nulidade ou anulabilidade

Declaradas pelo Tribunal. A nulidade é invocável a todo o tempo e por


qualquer interessado, enquanto a anulabilidade devera ser invocada
no prazo de um ano contado da data do despacho de concessão do
direito110.

Renúncia feita pelo próprio requerente da marca, que devera ser feita
mediante declaração escrita, ou pelo seu representante legal111.

4.5.3. Direito de transmissão da marca

O registo da marca é livremente transmissível intervimos e por mortes


causa, da qual a transmissão intervimos devera obedecer a forma
escrita, mediante o consentimento do titular, com assinatura
reconhecida por notário112.

4.5.4. CONSTITUIÇÃO DA MARCA

4.5.5. Instrução do pedido

Ao requerimento juntam-se os documentos seguintes:

109
Nos termos do artigo 137 do código da Propriedade Industrial Moçambicano.
110
De acordo com os artigos 20 e 21 do Código da Propriedade Industrial
Moçambicano.
111
De acordo com o artigo 19 do Código da Propriedade Industrial Moçambicano.
112
Com base nos números 1 e 3 do artigo 17 do Código de Propriedade Industrial
Moçambicano.
103
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 104

 A respetiva licença para o exercício da atividade, se o


requerente for uma pessoa física que exerce qualquer
atividade comercial ou industrial;
 Os respetivos estatutos sociais publicados no Boletim da
Republica ou a licença para o exercício de atividade comercial
ou industrial, se o requerente for uma pessoa jurídica;
 Duas representações gráficas da marca;
 Um fotolito ou outro suporte;
 Autorização do titular da marca estrangeira de que o
requerente seja agente ou representante em Moçambique
mediante apresentação da licença de exercício da atividade de
representação comercial estrangeira na Republica de
Moçambique;
 Autorização de pessoa cujo nome, firma, denominação social,
insígnia ou retracto figurem na marca e não seja o requerente;
 Autorização da autoridade competente para incluir na marca
quaisquer bandeira, armas, escudos, brasoes, moeda, ou
emblemas do Estado, municípios ou outras entidades públicas
ou particulares, nacionais ou estrangeiras, distintivos, selos e
sinetes oficiais de fiscalização e garantia, emblemas privativos
ou denominação da cruz vermelha ou outros organismos de
natureza semelhante;
 Diploma de condecoração ou outras distinções referidas ou
reproduzidas na marca que não devem considerar-se
recompensas segundo o conceito expresso no presente
diploma;
 Certidão do registo competente, comprovativo do direito a
incluir na marca o nome ou qualquer referencia a determinada
propriedade rustica ou urbana e autorização do proprietário,
para esse efeito, se este não for o requerente; e

104
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 105

 Autorização do titular do registo anterior e do possuidor de


licença exclusiva, se a houver113.
Estando os requisitos preenchidos, o IPI manda publicar
imediatamente o pedido tal como tiver sido aceite, no Boletim da
Propriedade Industrial114.

4.6. Unicidade do registo

A mesma marca destinada ao mesmo produto ou serviço, só pode ter


um registo115.

4.6.1. Linguagem usada para o pedido do registo nacional da marca

O pedido de registo da marca devera ser redigido em língua


portuguesa e depositada no IPI acompanhado do comprovativo do
pagamento da taxa correspondente, uma reprodução da marca e a
lista dos produtos ou serviços para os quais o registo da marca é
registada.116.

4.6.2. Imitação da Marca

A marca registada considera-se imitada por outra quando,


cumulativamente:

 A marca registada tiver prioridade;


 Ambas se referirem a produtos ou serviços idênticos; e
 Apresentar semelhança gráfica, fonética, ou figurativa e ser
suscetível de criar confusão ao consumidor117.
É permitido no prazo de sessenta dias, a contar da data da publicação
no Boletim da Propriedade Industrial em que o aviso seja inscrito, a
oposição ao pedido, por qualquer pessoa que se sinta prejudicada

113
Nos termos do artigo 113 do Código da Propriedade Industrial Moçambicano.
114
Nos termos do artigo 116 do Código da Propriedade Industrial Moçambicano.
115
De acordo com o artigo 114 do código da Propriedade Industrial Moçambicano.
116
Nos termos do número 1 do artigo 112 do Código de Propriedade Industrial
Moçambicano.
117
De acordo com o artigo 111 do Código da Propriedade Industrial Moçambicano.
105
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 106

pela eventual concessão da marca, mediante o respetivo pagamento


da taxa118.

O prazo concedido para a oposição ao pedido da concessão da marca


é prorrogado uma única vez.

A oposição deve ser apresentada em triplicada e conter a matéria de


facto e de direito que a sustente, e o IPI enviara a cópia da oposição
ao requerente, notificando-o para alegar no prazo de trinta dias o que
achar por conveniente, e este prazo também é prorrogado uma única
vez, a pedido do interessado, mediante pagamento da respetiva
taxa119.

A falta de alegação do prazo fixado equivale a desistência do pedido


pelo requerente120.

4.6.3. Prova do Direito a Marca

A prova do direito a marca efetua-se por meio de certificado de


registo121.

4.6.4. Vantagens da proteção da marca

O registo da marca oferece múltiplas vantagens que podem ser:

 Permite valorizar o esforço financeiro e intelectual utilizado na


conceição de novas marcas;
 Confere um direito exclusivo que permite impedir que
terceiros, sem o consentimento do titular, produzam,

118
Nos termos do número 1 do artigo 117 do Código da Propriedade Industrial
Moçambicano.
119
Nos termos dos números 3, 4, e 5, do artigo 117 do Código de Propriedade
Industrial de Moçambique.
120
De acordo com o número 6 do artigo 117 do Código de Propriedade Industrial de
Moçambique.
121
Nos termos da alínea b) do número 1 do artigo 13 do Código da Propriedade
Industrial Moçambicano.
106
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 107

fabriquem, vendam ou explorem economicamente a marca


registada122;
A propriedade e o exclusivo sobre marcas adquirem-se apenas por via
do registo, não através do simples uso no mercado.

 Impede que outros registem sinal igual ou semelhante para


produtos ou serviços idênticos ou fins.
 Durante a vigência do registo, o titular pode usar produtos a
expressão «marca registada», ou o símbolo «R» de modo a
dissuadir potenciais infrações123.
O uso destes símbolos por quem não tenha efetivamente promovido
o registo da sua marca é proibido, constituindo um ilícito
contraordenacional. No entanto, enquanto o registo não tiver sido
concedido e o requerente pretender de alguma forma divulgar a
marca, pode sempre indicar-se que se encontra pendente o respetivo
registo.

 Garante a possibilidade de transmitir o registo ou de conceder


licenças de exploração a favor de terceiros, a título gratuito ou
oneroso124.
4.6.5. MARCAS QUE NAO PODEM SER REGISTADAS

4.7. As marcas não distintivas.

Não podem ser registadas as marcas compostas exclusiva ou


essencialmente por elementos que descrevam o produto ou serviço
(as suas características, qualidades, proveniência geográfica, entre
outros aspetos), por elementos usuais na linguagem do comércio, por
determinadas formas (forma imposta pela própria natureza do
produto, forma do produto, necessária a obtenção de um resultado

122
Nos termos do número 1 do artigo 124 do Código de Propriedade Industrial
Moçambicano.
123
Nos termos do número 7 do artigo 124 do Código de Propriedade Industriais
124
De acordo com os números 1 e 4 do artigo 17 e 122 do Código de Propriedade
Industrial
107
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 108

técnico ou forma que lhe confira um valor substancial) ou por uma


única cor.

Exemplos:

 Sapatos (para identificar calçados);


 Cinema tickets (para serviços de venda de bilhetes).
 Hidratação creme (para produtos cosméticos);
 Reparação 24hras (para serviços de reparação);
 Lava mais (para detergentes de roupa);
 Supercrédito (para serviços financeiros e de créditos).
Uma marca composta exclusiva ou essencialmente por estes
elementos (com exceção das cores) apenas pode ser registada se tiver
adquirido, na prática comercial, eficácia distintiva.

Sempre que estes elementos não registáveis por si só – estejam


combinados com outros que sejam distintivos (palavras ou figuras,
por exemplo), a marca pode ser registada, ainda que os aspetos
descritivos, genéticos ou usuais não fiquem de apropriação exclusiva
do respetivo titular.

Exemplos:

 Sapatos by spaciX («spaciX» é o elemento distintivo); o termo


descritivo «sapatos» não fica de uso exclusivo).
 LKH Cinema tickets- («LKH» é o elemento distintivo). («cinema
tickets» não fica de uso exclusivo)125.
4.7.1. As marcas suscetíveis de induzir o consumidor em erro

Não podem ser registadas as marcas que possam causar enganos ao


consumidor, nomeadamente a respeito da natureza, das qualidades,
da utilidade ou da proveniencia do produto ou do serviço126.

Exemplos:

125
Instituto Nacional da Propriedade Industrial. Tipos de marcas in:
www.marcasepatentes.pt, acesso em 26.02.2016
126
Nos termos da alínea c) do artigo 110 do Código da Propriedade Industrial.
108
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 109

 Astral – like silk- (para assinalar vestuário de algodão);


 ZEUS Fitness Center – (para assinalar serviços de
engomadoria)127.
4.7.2. As marcas contrarias a lei e a ordem pública ou que ofendam a
moral os bons costumes:

Exemplos:

 DRINK E DRIVE
As marcas que contenham símbolos de estado, emblemas de
entidades públicas ou estrangeiras, brasoes, medalhas, nomes ou
retratos de pessoas, sinais com elevado valor simbólico,
nomeadamente símbolos religiosos, entre outros128.

4.7.3. As marcas que constituam infração de direitos alheios ou que


possam favorecer a prática de actos de concorrência desleal.

Não podem ser registadas as marcas constituídas por sinais que


representem uma reprodução ou imitação de outros já existentes
(salvo consentimento do titular destes últimos)129.

Exemplos:

 INPI- Instituto Nacional da Propriedade Industrial.

4.7.4. LIVRANÇA

A livrança é um título à ordem, sujeito a certas formalidades, pelo


qual uma pessoa se compromete, para com outra, a pagar- lhe
determinada importância em certa data. É um documento onde o
consumidor ou empresa se compromete a pagar o montante a pagar
da dívida à entidade financeira. Normalmente, estes títulos de crédito

127
Instituto Nacional da Propriedade Industrial. Tipos de marcas in:
www.marcasepatentes.pt, acesso em 26.02.2016
128
Nos termos das alíneas b) e d) do artigo 110 do Código da Propriedade Industrial
129
De acordo com as alíneas f) e g) do artigo 110 do Código da Propriedade Industrial
109
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 110

fazem parte integrante de um crédito, um banco só lhe concederá um


empréstimo depois de assinar a livrança. Assim, caso o devedor não
pague as prestações os bancos poderão usar esta garantia130.

As empresas recorrem a este tipo de financiamento no sentido de


obterem recursos financeiros de curto prazo, cobrir despesas de
exploração e necessidades de tesouraria.

Este financiamento é suportado por um título de crédito no qual, uma


determinada quantia num prazo estipulado. As diversas instituições
bancárias disponibilizam este tipo de empréstimo. O prazo de decisão
varia entre 3 a 5 dias úteis, o prazo mínimo de empréstimos é de 30
dias e em caso de pedido de reforma da livrança, este tem que ser
efectuado no prazo de 5 dias úteis antes do seu vencimento.

Os indexantes mais utilizados neste tipo de empréstimos são: a


Euribor a um mês, a Euribor a três meses. São utilizados indexantes
de curto prazo, pois este tipo de empréstimo caracteriza-se pelo seu
carácter de curto prazo. A convenção estabelecendo uma lei uniforme
e matéria de livranças assinada a 7 de Julho de 1930, foi aprovada em
Genebra para adesão, pelo Decreto- Lei nº 23721, de 29 de Março de
1934.

As livranças são títulos executivos nos mesmos termos em que as


letras o são art.º46 e 51 do CPC, o primeiro na redacção do DL
nº38/2003, de 8de Março, diploma rectificado pela declaração nº
5c/2003 de 30 de Abril. A portaria nº 28/2000, de 27 de Janeiro,
aprovou os modelos de letras e livranças.

A livrança é pois, um título comprovativo de dívida que tem a sua


peculiaridade - visto ser “ à ordem” de se transmitir por endosso. Em
harmonia com artigo 778 do Código Comercial moçambicano a
livrança deve conter 7 elementos: a palavra “ livrança” escrita no
texto do título; a promessa pura e simples de pagar uma quantia

130
https://pt.m.wikspedia.org/...emprestimo...26.2.2016- 16:45
110
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 111

determinada; a época do pagamento; a indicação do lugar em que se


deve efectuar o pagamento; o nome da pessoa a quem, ou à ordem
de quem, deve ser paga; a indicação data em que e do lugar onde a
livrança é passada e a assinatura de quem paga a livrança
(subscritor).Estes representam requisitos indispensáveis da livrança.

4.7.5. EFEITOS DA AUSÊNCIA DOS REQUISITOS

O escritor em que faltar algum dos pressupostos indicados e


elencados não produzirá resultados como livrança, salvo as excepções
seguintes131:

Quando se não se indique a época do pagamento, a livrança


considera-se pagável à vista; quando se não indicar o lugar do
pagamento, considera-se como tal o lugar onde o escrito foi passado,
e este considerar -se-á também lugar do domicílio do subscritor da
livrança; quando se não indique o lugar onde a livrança foi passada,
considera-se como tal o lugar designado ao lado do nome do
subscritor.

O subscritor da livrança é responsável da mesma forma que o


aceitante da letra. Em geral, são aplicáveis às livranças, na parte em
que não sejam contrárias, à natureza deste título as disposições legais
que regulam a matéria das letras132.

4.8. DISPOSIÇÃO APLICÁVEIS ÀS LIVRANÇAS

São aplicáveis às livranças, na parte em que não sejam contrárias à


natureza deste escrito, as disposições relativas às letras e
respeitantes: endossos; vencimento; pagamento; direito de acção por
falta de pagamento; pagamento por intervenção; cópias; alterações;
prescrição; dias feriados, contagem de prazos e interdição de dias de
perdão.

131
CARDOSO, J. Pires, Compêndio de Noções de Direito comercial, pg. 309
132
No nosso caso, o capítulo em questão trata da matéria da Lei uniforme relativa às
Letras e Livranças que se encontra no Código Comercial de Moçambique,3ª edição,
pg. 184
111
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 112

São igualmente aplicáveis às livranças as disposições relativas às letras


pagáveis no domicílio de terceiros ou uma localidade diversa da do
domicílio do sacado (ar.º. 707º e 741º), a estipulação de juros art.º
(708º), as divergências nas indicações da quantia a pagar (art.º 709º),
as consequências da oposição de uma assinatura nas condições
indicadas no art.º 710º, as da assinatura de uma pessoa que age sem
poderes ou exercendo os seus poderes (art.º 711º) e a letra em
branco (art.º 715º).

São também aplicáveis às livranças as disposições relativas ao aval


(artº733º a 735º); no caso previsto no nº4 do artigo 734º, se o aval
não indicar a pessoa por quem é dado, entender-se-á ser pelo
subscrito da livrança.133

Sumário.

Na presente temática que acabamos de desenvolver, abordamos


matérias relacionadas com o título de crédito que é um documento
necessário para exercitar o direito literal autónomo. Como noção
diremos que título de crédito é um documento que incorpora um
direito literal e autónomo, que legitima o seu titular a exercer e serve
de suporte à sua circulação e mobilização. Tem como função titular e
incorporar direitos de modo a permitir e facilitar a sua circulação e
mobilização.134

Abordamos matérias relacionadas com o cheque que é Cheque é um


título através do qual uma pessoa ordena que uma instituição de
crédito, onde depositou fundos ou dispõe de crédito, pague a si ou a
terceiro ou a ordem a si ou ordem a terceiro determinada quantia135.
Cheque é o título de crédito que enuncia um pagamento, tal como a
letra, mas é uma ordem de pagamento dirigida a uma instituição
bancária onde o emitente do título possui uma previsão. O cheque

133
Código Comercial de Moçambique, Pg. 201
134
DE VASCONCELOS, Pedro Pais, Direito Comercial: Títulos de crédito, pg.3
135
Cfr. art.782º do C. Com.
112
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 113

funciona como um meio de mobilização de fundos, quer em benefício


do emitente, quer em benefício de um terceiro136. Cheque é o título à
ordem, sujeito a certas formalidades, pelo qual uma pessoa, que tem
qualquer importância disponível num banqueiro, dispõe total ou
parcialmente.

Abordamos ainda sobre a livrança que é um título à ordem, sujeito a


certas formalidades, pelo qual uma pessoa se compromete, para com
outra, a pagar- lhe determinada importância em certa data. É um
documento onde o consumidor ou empresa se compromete a pagar o
montante a pagar da dívida à entidade financeira. Normalmente,
estes títulos de crédito fazem parte integrante de um crédito, um
banco só lhe concederá um empréstimo depois de assinar a livrança.
Assim, caso o devedor não pague as prestações os bancos poderão
usar esta garantia137.

Exercícios

1. O que são Títulos de crédito?


a) É um documento que incorpora um direito literal e
autónomo, que legitima o seu titular a exercer e serve de
suporte à sua circulação e mobilização.
b) É um documento que incorpora um direito literal e
autónomo.
c) É um testamento que incorpora um direito literal e
autónomo, que legitima o seu titular a exercer e serve de
suporte à sua circulação e mobilização.
d) é um documento que não incorpora um direito literal e
autónomo, que legitima o seu titular a exercer e serve de
suporte à sua circulação e mobilização.

136
VALE, Sofia e MUALEIA Fernanda, Guia Prático de Direito Comercial, Escolar
Editora, Angola, 2003,pag.183
137
https://pt.m.wikspedia.org/...emprestimo...26.2.2016- 16:45
113
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 114

A resposta corrcta é: A

2. O que é livrança?
a) É um título à ordem, sujeito a certas formalidades, pelo qual
uma pessoa se compromete, para com outra, a pagar- lhe
determinada importância em certa data.
b) É um conjunto de escritas, sujeito a certas formalidades, pelo
qual uma pessoa se compromete, para com outra, a pagar- lhe
determinada importância em certa data.
c) É um livro de pagamento, sujeito a certas formalidades, pelo
qual uma pessoa se compromete, para com outra, a pagar- lhe
determinada importância em certa data.
d) É um cheque, sujeito a certas formalidades, pelo qual uma
pessoa se compromete, para com outra, a pagar- lhe
determinada importância em certa data
A resposta correcta é: A

3. O que entende por credito?


3.1. O crédito é a troca de uma prestação presente por uma
prestação futura, ou seja o diferimento no tempo de uma
contra prestação.
Verdadeira
Falso
A resposta é verdadeira

TEMA V - PRINCIPAIS CONCEITOS DAS SOCIEDADES COMERCIAIS

Introdução

Nesta unidade temática iremos abordar matérias relacionadas com as


sociedades comerciais, a partir da própria noção, personalidade
jurídica das sociedades comerciais, capacidade, contratos de
sociedade, forma de contrato de sociedade, tipos de sociedades
comeciais existentes.

114
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 115

Objectivos específicos
No fim desta unidade temática o estudante deverá ser capaz de:
 Conhecer o conceito da sociedade comercial,
 Saber o que é personalidade e capacidade jurídica de uma
sociedade comercial,
 Conhecer e saber diferenciar as sociedades comerciais
existentes

UNIDADE TEMATICA 5.1. - PRINCIPAIS CONCEITOS DAS SOCIEDADES


COMERCIAIS

5. Sociedade Comercial

Sociedade Comercial – é aquela que tem por objecto a prática de


actos de comércio, constituem-se como tal e adoptam um dos tipos
societários previstos no artigo 82º do C.Com138 afastando por
conseguinte aquelas sociedades cujo objecto não é a prática de actos
comerciais. Consiste na reunião de esforços entre duas ou mais
pessoas denominadas de sócios, que combinam a aplicação de seus
recursos ‫״‬financeiros e know how‫ ״‬com finalidade de desempenhar
certa actividade económica, visando a divisão dos frutos e lucros por
ela gerados.

O nosso ordenamento jurídico não nos fornece um conceito completo


de sociedade comercial. Este preceito apenas refere quais são os
requisitos para que uma sociedade se considere comercial ‫״‬objecto
comercial e tipo comercial‫״‬, mas não diz o que é uma sociedade.

138
. Nos termos do nº 2 do art.82º do C.Com -as sociedades que tenham por objecto o
exercício de uma empresa comercial só pode constituir-se segundo um dos tipos
societários previstos neste artigo, estamos aqui perante o princípio da tipicidade no
que se refere a possibilidade de escolha dos tipos societários. Equivale a dizer que,
não há sequer espaço para conjugação de características diferentes destes tipos
societários para a constituição de um outro tipo que não seja os previstos no nº 1 do
artigo 82º do Ccom.
115
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 116

Tem-se que recorrer à lei civil, como direito subsidiário ‫״‬art.º 7º


C.Com‫״‬. A sociedade comercial é uma sociedade, obedecendo às
características definidoras do art.º 980º do CC acrescidas dos
requisitos específicos do nº 2 do art.º 82º do C.Com.

Em face do art.º 980º CC, deparam-se quatro elementos do conceito


geral de sociedade:

1º Elemento pessoal: alude a pluralidade de sócios. Nele


compreendem-se, quer o empresário e outros investidores de capitais,
quer os trabalhadores.

Qualquer destas entidades tem, de uma forma ou de outra, interesse


no desenvolvimento e êxito da empresa, seja para rentabilização dos
capitais investidos, seja para promoção pessoal, estabilidade e
retribuição do trabalho.

Em princípio, e porque a lei o define como um contrato, o acto


gerador da sociedade deve ser celebrado por pelo menos duas partes,
dois sujeitos de direito. É o que expressamente refere a 1ª parte do nº
1 do art.º 91º do C.Com. Todavia esta norma, in fine, abre uma brecha
em tal princípio, ao admitir que a lei “permita que a sociedade seja
constituída por uma só pessoa”.

A regra da pluralidade vale tanto para a sociedade-contrato como para


a sociedade-instituição. E, do mesmo modo, deverá pôr-se a questão
da admissibilidade de excepções àquela regra, ou seja, de sociedade
com um só sócio ‫״‬sociedades unipessoais‫״‬, tanto no que toca ao
momento da constituição da sociedade, como no que toca à
subsistência com um só sócio de uma sociedade já existente;

2º Elemento patrimonial: exigindo a obrigatoriedade dos sócios em


contribuírem com bens e serviços. O art.º 980º CC consagra um
segundo elemento do conceito de sociedade, consiste na chamada
obrigação de entrada, através da qual os sócios efectuam

116
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 117

contribuições que irão formar o património inicial da sociedade.

Esta norma limita-se a exigir, para que surja a sociedade, que os sócios
se obriguem a contribuir com bens ou serviços, mas não exige a
efectivação dessas contribuições logo no momento inicial, podendo
ser deixada para mais tarde, ao menos em parte.

As contribuições dos sócios podem revestir, a natureza de bens ou


serviços. Tas contribuições ou entradas dos sócios desempenham três
funções da máxima importância para a sociedade: Formar no seu
conjunto, o fundo comum ou património com o qual a sociedade vai
iniciar a sua actividade; Definir a proporção da participação de cada
sócio na sociedade, e Fixar o capital social139.

3º Elemento finalístico: que obriga o exercício em comum de uma


certa actividade económica que não seja de mera fruição. No que diz
respeito às sociedades em geral, a referência do art. 980º CC, ao
exercício de uma actividade económica visa abranger todas as
actividades destinadas à produção de bens ou utilidades de qualquer
natureza, materiais ou imateriais, enquadráveis em qualquer dos
sectores da economia140.

No que respeita às sociedades comerciais, é evidente que as


actividades económicas a que se dediquem terão de ser aquelas que
se enquadrem no âmbito do comércio em sentido jurídico-formal.

Por outro lado, o art.º 980º CC exige que a actividade económica seja
certa, o que significa, obviamente, que ela deverá ser definida,
determinada de forma concreta e específica, de modo a não se
adquirirem indicações tão vagas do escopo social que acabem por se
traduzir numa incerteza da actividade ou actividades a que a
sociedade se destine.

139
. Miguel Pupo Correia. Sociedades comerciais: Disponível
em:<http://octalberto.no.sapo.pt>, acesso em: 17 de Mar. 2016.
140
. Idem.
117
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 118

4º Elemento teleológico: que regula a repartição dos lucros resultantes


dessa actividade. O fim último da reunião dos sócios, com os
respectivos contributos para o exercício da actividade comum, terá de
consistir na obtenção de um enriquecimento patrimonial, de um lucro,
e não de outras vantagens ideais ou mesmo materiais141.

A fórmula do art.º 980º CC parece incutir uma noção muito estrita de


lucro: tratar-se-ia de um aumento de património gerado na própria
sociedade, para ser depois repartido entre os sócios, seja
periodicamente, seja no final da existência da sociedade.

O elemento teleológico não consiste apenas no intuito de que a


sociedade reduza lucros: é necessário que ela vise também a
repartição destes pelos sócios (vide: art.º 980º CC). Aqui encontramos
o direito abstracto aos lucros, que é inerente ao conceito de sociedade
e Direito concreto aos dividendos, isto é, à distribuição periódica de
lucros, o qual resulta da deliberação que os sócios tomem de os
distribuir142.

No campo comercial, há ainda a ter em conta outros dois elementos


específicos do conceito de sociedade comercial, nomeadamente:

5º Objecto comercial: que exige a prática de actos de comércio143.


Assim, o primeiro elemento conceitual específico das sociedades
comerciais consiste no objecto comercial. No que toca às sociedades
comerciais, portanto, o elemento finalístico, também designado, por
fim imediato ou objectivo da sociedade, tem uma conotação própria:
ele deve ter carácter comercial.

O objecto da sociedade consiste nos actos ou actividades que,


segundo a vontade dos sócios, ela deverá praticar e prosseguir. Por
conseguinte, é o carácter comercial desses actos e actividades que

141
. Manuel Guilherme júnior: Manual de Direito Comercial Moçambicano, Vol.I,
Escolar Editora, Maputo, 2013. P.110.
142
. Miguel Pupo Correia. Sociedades comerciais: Disponível
em:<http://octalberto.no.sapo.pt>, acesso em: 17 de Mar. 2016.
143
. Conferir a alínea a) do artigo 83º do Código Comercial.
118
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 119

atribui às sociedades o carácter de comerciantes. Deverá tratar-se,


pois, de actos de comércio objectivos e de actividades qualificadas de
comerciais por outras normas qualificadoras, e

6º Tipo comercial: adopção de um dos tipos societários configurados


e disciplinados na lei comercial144.

Para que uma sociedade seja comercial é ainda necessário que revista
forma comercial, comporta dois sentidos, Primeiro, ela significa que a
sociedade deverá revestir um dos tipos caracterizados e regulados na
lei comercial e num outro sentido, ela exprime a obrigatoriedade de a
sociedade respeitar, na sua constituição, os requisitos formais
estabelecidos na lei comercial.

A primeira das acepções reporta-se ao princípio da tipicidade ou


numerus clausus, que o legislador adoptou quanto às sociedades
comerciais.

Ainda por motivos de ordem pública, o legislador admite um número


muito restrito de tipos sociais. Estes distinguem-se, através de três
características: a responsabilidade dos sócios pela obrigação de
entrada. Trata-se de característica fundamental, pois identifica a
responsabilidade dos sócios para com a sociedade no que toca à
formação do património inicial desta; a responsabilidade dos sócios
pelas dívidas da sociedade é outro aspecto de suma importância, pois
por ele se fica a saber se os sócios são ou não responsáveis, perante os
credores da sociedade pelas dívidas desta, e as modalidades de
composição e titulação das participações na sociedade: trata-se de um
aspecto que, embora secundário, reveste muitas vezes importância
assinalável, pois permite caracterizar a natureza e a forma de cada
parte do sócio na sociedade145.

144
. Conferir a alínea b) do artigo 83º do Código Comercial.
145
. Miguel Pupo Correia, Sociedades comerciais: Disponível
em:<http://octalberto.no.sapo.pt>, acesso em: 17 de Mar. 2016.
119
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 120

No entanto, há sociedades que não visam o lucro, mas adoptam um


dos tipos previstos no código comercial e, por isso, sujeitas a este
mesmo regime. Se uma sociedade adoptar um dos tipos previstos e
permitidos para as sociedades comerciais, aplica-se o código comercial
independentemente de ser civil146 ou comercial.

Se visa a prática de actos comerciais, a sociedade é comercial, mas se


pratica actos civis a sociedade é civil, em qualquer dos casos, se
adoptar a forma de sociedade em nome colectivo, por quotas, em
comandita ou de capital e indústria é automaticamente objecto do
Código Comercial. Resulta do artigo 82º do C.Com que elas obedecem
ao princípio da tipicidade, princípio este que em geral se aplica a todas
as pessoas colectivas.

Na verdade, da leitura feita do nº 1 do artigo 82º do C.Com, fica claro


que não poderá ser constituído outro tipo societário para além dos
previstos nesse. Contudo, para que não sobrem dúvidas relativamente
a questão, o legislador acrescenta no nº 2 do mesmo artigo que ‫״‬as
sociedades que tenham por objecto a prática ou exercício de uma
empresa comercial só podem constituir-se segundo um dos tipos
societários previstos neste artigo‫״‬.

A PERSONALIDADE JURÍDICA

As sociedades de todos os tipos gozam de personalidade jurídica a


partir do registo definitivo147. E gozam dessa personalidade jurídica
tanto em relação a terceiros, como em relação aos próprios sócios.

Assim, é a sociedade que adquire a qualidade de comerciante em


consequência do exercício da actividade social e não os sócios. Por
isso, é a sociedade que está sujeita às obrigações impostas aos
comerciantes e não os seus sócios. Além disso, a sociedade pode ter
direitos contra os seus sócios.

146
. José de Oliveira Ascensão, sociedades comerciais, Vol. IV, Parte Geral, Lisboa,
2000, pag.45.
147
. Conferir o artigo 86º do Código Comercial.
120
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 121

Com a constituição da sociedade, os bens com que os sócios entram


para esta revertem para o seu património e os credores pessoais dos
sócios apenas poderão penhorar as respectivas participações sociais a
partir do momento em que as sociedades adquirem personalidade
jurídica.

CAPACIDADE DE JURÍDICA

A capacidade jurídica das sociedades comerciais como pessoas


colectivas está delimitada pelo seu objecto. Mas, aqui há que
distinguir o objecto mediato, que é a realização de lucros necessários,
para todas as sociedades148 do objecto imediato, a actividade
comercial concreta que a sociedade se propõe exercer e que deve
constar dos estatutos.

Esta distinção é importante, porque o princípio da especialidade, que


limita a capacidade jurídica das pessoas colectivas aos actos
necessários ou convenientes à prossecução dos seus fins149, só tem
aplicação nas sociedades comerciais, ao objecto mediato, servindo o
objecto imediato apenas para limitar os poderes de representação
dos administradores e, mesmo assim, só verificadas certas condições.

CONTRATO DE SOCIEDADE

Contrato de sociedade é aquele em que duas ou mais pessoas se


‫״‬obrigam‫ ״‬a contribuir com bens ou serviços para o exercício em
comum de certa actividade económica, que não seja de mera fruição,
a fim de repartirem os lucros resultantes dessa actividade150.

148
. Ver o artigo 980º do Código Civil.
149
. Ver o artigo 160º do Código civil.
150
. Conferir o artigo 980º do CC.
121
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 122

NATUREZA JURÍDICA DO CONTRATO DE SOCIEDADE

Embora nos pareça obvia a natureza do acto constitutivo da


sociedade comercial, imensas são as discussões que se levantam em
torno dele, há sociedades que resultam da fusão ou cisão151 das
sociedades. Há também, as sociedades unipessoais que resultam da
insuficiência superveniente do elemento pessoal da sociedade.
Há que dedicarmos aqui especificamente a olhar para o contrato de
sociedade em concreto para determinarmos a natureza jurídica do
mesmo. Existem duas teorias que se esbatem sobre a referida
natureza jurídica nomeadamente: Teoria Contratualista e Teoria
Institucionalista.

A TEORIA CONTRATUALISTA

A Teoria Contratualista assenta na ideia de que a sociedade comercial


é constituída por meio de um contrato que é o contrato de sociedade.
Considera-se a mais coerente, no entanto, importa distinguir
claramente de que tipo de contrato está a se falar.

Trata-se de um contrato plurilateral ou multilateral: o contrato de


sociedade exige a presença de pelo menos duas pessoas tal como é
definido no art.º 980º do CC. É na verdade, um contrato plurilateral
dirigido a uma finalidade comum por isso, nasce a segunda
possibilidade da sua classificação.

É um contrato de fim comum ou de organização: Luís Brito Correia


defende que esta parece ser a melhor classificação do contrato de
sociedade e foi elaborada pela doutrina alemã e italiana e também
escolhida pela doutrina portuguesa152. No essencial, os contratos de
fim comum se contrapõem aos contratos comutativos quais sejam, de
compra e venda ou troca153. Na compra e venda, os interesses das

151
. Conferir o artigo 107º e seguintes do Ccom.
152
. Manuel Guilherme júnior, Manual de Direito comercial moçambicano, p.110.
153
. Luís Brito Correia, Direito Comercial Sociedades Comerciais vol II, 3ª Tiragem
AAFDL, 1989, pag.121.

122
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 123

partes são satisfeitos de forma diferente. O comprador é satisfeito


pela aquisição da propriedade da coisa e o vendedor por perceber o
preço da coisa vendida.

Nos contratos de fim comum, há um interesse comum a todos os


contraentes. Por um lado, na sociedade, todos tem interesse no
benefício resultante da actividade económica comum, embora, para
além deste fim imediato, possa haver contraposição de interesses,
quanto ao fim último do negócio Por outro lado, no contrato de
sociedade, cada sócio tem a contrapartida da sua prestação na
participação dos resultados obtidos pela actividade em comum.

TEORIA INSTITUCIONALISTA

É no fundo, uma crítica à teoria contratualista liberal. Diz-se que a


vontade contratual não determina livremente a condição jurídica da
pessoa colectiva que criou, pelo contrário, a pessoa colectiva em si.
Como tudo ocorre na sociedade por vontade dos sócios que são na
verdade os últimos que decidem por ela ‫״‬embora hajam
administradores‫״‬, a sociedade há-de ser sempre uma instituição e não
um contrato. Isto é, o contrato de sociedade.

Não se pretende de nenhuma forma negar que a sociedade deriva de


um contrato. Pretende ˗ se sim, demonstrar que este contrato associa-
se a uma instituição que a priori fundamenta a existência do próprio
contrato.

FORMA DO CONTRATO DE SOCIEDADE

123
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 124

O contrato de sociedade está sujeito à disciplina geral dos contratos,


com as particularidades decorrentes da sua natureza de contrato de
fim comum e institucional154.

Esta sua natureza jurídica implica uma execução prolongada no


tempo, uma sequência de comportamentos das partes através dos
quais se dá concretização ao vínculo contratual.

A produção de efeitos jurídicos ‫״‬constituição, modificação ou extinção


de relações jurídicas‫ ״‬resulta principalmente no tocante à actuação
humana juridicamente relevante, de actos de vontade-máxime,
declarações de vontades-dirigidas precisamente à produção dos
referidos efeitos155. Tal liberdade de celebração de contratos
‫״‬liberdade contratual‫״‬, tanto representa a manifestação da vontade
de contratar como a possibilidade de introduzir alterações através de
conjugação de vários elementos para constituição do contrato. Todo
este fenómeno, é manifestado por via de vontade.

A extensão deste princípio alcança como se pode retirar do art.219º


do CC, a liberdade de forma como regra geral. Nos termos deste
artigo, a validade da declaração negocial não depende de observância
de forma especial, salvo quando a Lei a exigir. Retira-se, o princípio de
liberdade de forma que, à luz do nº 1 do art.º 981º do CC, com
aprofundamento do nº1 do art.º 90º do C.Com, pode-nos conduzir a
certas consequências legais que a seguir retiramos:

Primeiro, que o contrato de sociedade como regra geral, não está


sujeito a uma forma especial;

Segundo, que a não observância de forma quando esta seja exigida


pela natureza dos bens que os sócios colocam na sociedade, não
prejudica ‫״‬nulidade‫ ״‬de todo contrato com vista ao exercício do

154
. Miguel Pupo Correia. Sociedades comerciais: Disponível
em:<http://octalberto.no.sapo.pt>, acesso em: 17 de Mar. 2016, 14:10h.
155
. Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª Edição
actualizada, Coimbra Editora, Coimbra, 1999º. pag 89.
124
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 125

comércio, a menos que ele não possa se converter nos termos do


art.293º do CC, passando a ser o simples uso e fruição de bens cuja
transferência determina a forma especial, ou, se o contrato não
reduzir-se nos termos do art.292º do CC, à participações que não
ponham em causa a forma especial inobservada.

Podemos concluir que não há, em geral a exigência de forma especial


para a celebração do contrato de sociedade, tal só ocorre quando
condicionada pelas participações dos sócios, ou seja, se houver
participações em bens imóveis, exigir-se-á a escritura pública e fora
desta circunstância, basta um documento escrito, assinado e
reconhecido presencialmente por todos os sócios conforme dispõe o
nº 1 do art.º 90º do C.Com.

Resulta do art.º 980º do Código Civil que no contrato de sociedade, os


sócios só ficam obrigados a entrar na sociedade com bens e serviços.
Esta prestação dos sócios a que se chama momento de obrigação de
entrada ou cumprimento de obrigação de entrada, está prevista no
art.107º do C.Com, onde se refere que todo o sócio é obrigado a
entrar para a sociedade com bens susceptíveis de penhora ou nos
tipos societários em que tal seja permitido com prestação de serviços
e por isso, designa-se sócio de indústria. Com fundamentos neste
artigo, podemos dizer que há três tipos de bens com que os sócios
podem contribuir, a saber: dinheiro; outros bens susceptíveis de
penhora para além de dinheiro e serviços.156

RECONHECIMENTO DA SOCIEDADE COM UM SÓ SÓCIO

Dos desenvolvimentos das teorias não societárias presentes em várias


obras que versam sobre esta matéria, deixam de existir quaisquer
dúvidas teóricas ao reconhecimento da sociedade unipessoal. O
preconceito relativo à unipessoalidade societária é de carácter
meramente pragmático, embora haja dificuldade de introdução do
tipo organizativo societário em ambientes fortemente

156
. Manuel Guilherme júnior, Manual de Direito comercial moçambicano, p. 106.
125
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 126

contratualísticos. Isso, porque o conceito de sociedade esteve


historicamente ligado à pluralidade de sujeitos. Entendia-se, na altura
que a forma associativa apenas se justificava como uma maneira de
unificar a pluralidade de sócios a ela subjacente, sendo a
personalidade jurídica destinada exclusivamente a essa finalidade157.

Todavia, ao longo do tempo, o conceito de sociedade evoluiu,


passando da teoria institucionalista germânica e da escola
contratualista italiana à análise do contrato associativo e a teoria do
contrato-organização, que vê no contrato social a função de criar uma
organização, independentemente do número de pessoas envolvidas.
A teoria do contrato-organização deu espaço à discussão sobre a
unipessoalidade158.

DO CONTRATO PLURILATERAL AO CONTRATO-ORGANIZAÇÃO

Muito se negou na doutrina o carácter contratual da constituição da


sociedade. Enquanto alguns o negavam, vista, a dificuldade de
aplicação, ao conceito de sociedade, de muitos dos princípios da
teoria geral dos contratos, afirmando tratar-se da constituição da
sociedade de um acto complexo159, outros defendiam a sua essência.

Tullio Ascarelli, em sua clássica obra ‫״‬problemas das sociedades


anónimas e direito comparado‫״‬, dá novos ares à teoria contratualista,
ao diferenciar os contratos de sociedade dos contratos em geral.
Afirma aquele autor que:

«Na realidade, pode dizer-se tradicional a sensação da diferença entre


o contrato de sociedade e os contratos que poderíamos dizer,
genericamente, de permuta, e, realmente, a doutrina sempre

157
. José Inácio Ferraz de Almeida Prado Filho. ʺNota sobre as sociedades fictícias, au
de favor ˮ In : Revista de Direito Mercantil Industrial, Económico e financeiro,
v134,2004.p.85.
158
. Paolo E. F. Ferdo - Luzzi. Icontratti associativi.Milano: Giuffré : 2001.
159
. Tullio Ascarelli. Problemas das sociedades anónimas e direito comparado.
Campinas: Bookseller, 2001. P 373.
126
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 127

examinou alguns problemas “por exemplo, o da exeptio inadiplet


contractus” em relação aos quais algumas regras gerais dos contratos
pareciam de difícil aplicação ao contrato de sociedade».

O contrato de sociedade, levando em conta as suas características


formais, pode ser encaixado como subespécie da categoria dos
contratos, a que denomina contrato plurilateral160. Essa subespécie
da categoria dos contratos é por permitir a participação de duas ou
mais partes e pelo fato de que todas as partes possuírem direitos e
obrigações recíprocos decorrentes do contrato. O contrato teria um
cunho instrumental quanto à disciplina das sucessivas relações
jurídicas das partes161.

Assim, pode-se afirmar que, no momento da constituição da


sociedade, as partes têm interesses distintos e, muitas vezes,
contrapostos162. Uma vez constituída, a sociedade visa a uma
finalidade comum a todos os sócios.

Ascarelli discorre sobre uma série de distinções que podem ser feitas
entre os contratos plurilaterais e os contratos a que denomina de
permuta, e termina por concluir que o contrato plurilateral, em sua
função económica, constitui um contrato de organização.

Os instrumentos contratuais tradicionais não são aptos a regular o


fenómeno associativo163. Isso porque o conceito do contrato é
decorrente de um momento jurídico tipicamente individualista,
enquanto o fenómeno associativo é um conceito colectivo, devendo a
sua análise ser feita de forma objectiva, retirada de elementos
subjectivos.

160
. O contrato da sociedade constituiria a subespécie mais importante dos contratos
plurilaterais, mas não a única.
161
. Tullio ascarelli. Problemas das sociedades anónimas e direito comparado.
Campinas: Bookseller, 2001. P 375.
162
. Como na avaliação das contribuições, ingerência na administração, participação
de cada parte.
163
.Paolo Ferro-Luzzi. I contratti associative. Milano: Giuffré, 2001. P.234.
127
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 128

O fenómeno associativo manifesta-se juridicamente por meio do


contrato associativo, ou contrato-organização. Enquanto nos
contratos tradicionais, o ponto fundamental é a atribuição às partes
de direitos subjectivos, a função dos contratos associativos é de criar
uma organização sobre o património, ligando-o ao fim previamente
estabelecido.

Os contratos tradicionais teriam como efeito jurídico a criação,


modificação e extinção de relações jurídicas. Já, o contrato associativo
giraria em torno da criação, modificação e extinção de organizações,
cujo conceito jurídico é o da coordenação da influência recíproca
entre actos, pressupondo a noção de actividade164.

A visão, pois, centra-se na coordenação de actos, não nos


participantes. A criação da organização não depende da coincidência
de interesses de diversos sócios, porque é possível que uma única
pessoa tenha interesse em criar uma organização. Assim, a teoria de
contrato-organização abre espaço para o reconhecimento da
sociedade unipessoal como contrato associativo, e até mesmo da
sociedade sem sócio, inclusive nos sistemas contratualistas.

As sociedades corresponderiam, desse modo a estruturas


organizativas que servem de instrumento à obtenção de
determinados fins. Por conseguinte, desloca-se a ideia de pluralidade
de partes para uma ideia de estrutura corporativa. O contrato de
sociedade é um contrato de organização, assim entendida como um
centro de imputação, estruturação do comando, desenho de
responsabilidades e deveres de administradores165.

A organização criada pelo contrato associativo é sujeito de direitos e


obrigações, um centro de imputação de direitos e deveres, devendo,

164
. Márcio Ferro Catapani. “os contratos sociativos”. In: FRANÇA, Erasmo
Valhadão Azevedo e Novaes (org.). Direito societário contemporâneo I. São Paulo:
Quartier Latin, 2009.p94.
165
. Rachel Sztahn. “Associações e sociedades”. In: revista de direito mercantil
industrial, económico e financeiro, vol.
128
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 129

pois, observadas as formalidades legais, ser-lhe atribuída


personalidade jurídica. E, uma vez criada a pessoa jurídica, quando se
misturarem interesse social e interesse individual, pode e deve ser
aplicada a teoria da desconsideração da personalidade.

O contrato de sociedade tem como objectivo e finalidade a


organização dos factores de produção para o exercício da empresa. A
ideia de organização desloca-se, pois, de uma posição estrutural no
contrato de sociedade e passa a exercer um papel funcional166

SOCIEDADE EM NOME COLECTIVO

As sociedades em nome colectivo surgiram na Idade Média, de forma


natural e ampla,167 do âmago da família medieval. Compunham-se, no
princípio, apenas membros de uma mesma unidade familiar168.
Quando perecia o chefe do núcleo familiar, o património hereditário
permanecia indiviso e sua administração ficava a cargo dos
descendentes, que prosseguiam, assim, na exploração do negócio
paterno169.
Com o passar do tempo, primeiro, e numa evolução lenta e contínua,
surgiu a responsabilidade colectiva do núcleo familiar por delitos, de
modo que este era obrigado, como um todo, a reparação originada,
como por exemplo, do assassínio cometido por um dos seus membros
contra um membro de uma família da mesma vila. A mesma
responsabilidade alcançou, posteriormente, a injúria civil e, por fim, já
estava fortemente enraizado o princípio da responsabilidade

166
. Rachel Sztahn. Contrato de sociedade e formas societárias. São Paulo: Saraiva,
1989. P.37.
167
. Levin Goldschmidt. Storia universale del Diritto Commerciale. Torino: Unione
Tipografico-Editrice Torinese, 1913, p. 214.
168
. Antonio brunetti. Tratado del Derecho de Las Sociedades. Vol. I. Tradução do
italiano por Felipe de Solá Cañizares. Buenos Aires: Unión Tipográfica Editorial
Hispano Americana, 1960. v. 1, p. 523.
169
. Arnoldo Wald. Comentários ao Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2005.
129
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 130

colectiva, acrescida daquela relacionada às actividades económicas


exercidas pelo grupo familiar170.
A indústria medieval das cidades italianas durante a idade média é um
bom exemplo do tipo de organização económica da qual se originou o
germe da sociedade em nome colectivo171. Nesse caso, os negócios
eram feitos em nome da colectividade e, naturalmente, os seus
membros eram pessoalmente responsáveis pelas dívidas do grupo,
caso esses não as honrassem. Dessa evolução surgiu um tipo
societário com origem no vínculo familiar e com fundamento na mais
alta confiança entre os seus membros172.

SOCIEDADES EM COMANDITA

Por seu turno, a sociedade em comandita simples teve um


desenvolvimento completamente diverso. É praticamente unânime
que o contrato de comenda173, bastante utilizado na Idade Média,
tenha sido a semente que fez brotar esse tipo societário.
Tal contrato, praticado especialmente nas cidades italianas, consistia
na entrega de dinheiro ou mercadorias174 por um dos contratantes
‫״‬commendador, posteriormente denominado comanditário‫״‬, a outra
parte na avença ‫״‬tractator175 ou commendatarius, posteriormente
denominado comanditado‫״‬, geralmente, proprietário de um navio
‫״‬armador‫״‬, a quem incumbia negociar os bens a ele confiados, seja
vendendo aquilo que lhe foi entregue pelo comendador, ou
adquirindo e negociando bens por dinheiro que lhe foi confiado. O
negociante, tractator, suportava toda sorte de riscos pelo insucesso
do empreendimento, sejam advindos de prejuízos pela má

170
. Com o passar do tempo, esse conceito de família foi adquirindo um significado
mais amplo, passando a colectividade a compreender outros membros que não
somente aqueles de mesmo sangue.
171
. Levin Goldschmidt. Storia universale del Diritto Commerciale, p. 214.
172
. Umberto Navarrini; Gabriele Faggella. Das sociedades e das associações
comerciais. Rio de Janeiro: José Konfino Editor, 1950. p. 401 e segs.
173
. Waldemar Ferreira. Tratado de Sociedades Mercantis. Rio de Janeiro: Freitas
Bastos, 1952. p. 92.
174
.Waldemar Ferreira. Op. cit.,p. 44.
175
. Paul Rehme. História universal de Derecho Mercantil, p. 81.
130
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 131

negociação ou pelos temidos riscos de mar, naufrágio e piratas. Pelos


débitos da aventura, respondia o negociante com seus bens pessoais
de forma ilimitada.
Mas, alguns factores contribuíram para que o contrato de comenda se
desenvolvesse para a forma de sociedade. Com efeito, gradualmente,
um contrato essencialmente marítimo, que se extinguia com o
regresso da aventura comercial e pela partilha dos resultados da
mesma, a comenda, passou a ser empreendido no comércio terrestre,
não mais sendo explorada vez por vez, mas de forma reiterada176.
Passou a abranger várias operações e a reunir mais e mais pessoas,
que ambicionavam obter lucros, mas, ao mesmo tempo, eram inaptas
para o exercício do comércio ou tinham aversão à sua prática, pois, na
época, essa não era uma actividade digna de nobreza177.
Outro factor interessante, o qual igualmente levou à transformação
do contrato de comenda em sociedade em comandita, eram as
limitações à usuras impostas pela igreja. Dizia-se que a comenda era
um contrato de mútuo disfarçado, pois o capital investido na
aventura não passava de um empréstimo ao negociante, que deveria
ser restituído ao capitalista com juros altíssimos178 no regresso da
viagem. Como a Idade Média era uma época em que a Igreja gozava
de grande poder e influência na vida das pessoas, tas não estavam
inclinadas a sofrer as sanções da doutrina canónica. Assim, a
transformação do contrato de comenda em sociedade foi uma
solução natural para tal problemática179.

SOCIEDADE ANÓNIMA

Com a transição da Idade Média à Idade Moderna, surgiu um novo


tipo de negócio, o qual necessitava de uma espécie societária

176
. Levin Goldschmidt. Storia universale del Diritto Commerciale, p. 210.
177
. Anacleto de Oliveira Faria. Enciclopédia Saraiva do Direito (coord. de Rubens
Limonge França). São Paulo: Saraiva, 1977. p. 153 e segs.
178
. O retorno pelo capital investido sempre foi proporcional ao risco do negócio.
Dizem-se que, quanto maior o risco, maior a possibilidade de retorno em caso de
sucesso da operação.
179
. Francesco Galgano. Lex Mercatoria. Bologna: Il Mulino, 2001. p. 44.
131
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 132

diferente daquelas que então existiam. Fez-se necessário um veículo


de exploração adaptado à grandiosidade dos negócios que se
aproximavam. Com efeito, a responsabilidade ilimitada dos sócios nas
sociedades em nome colectivo e a mista nas sociedades em
comandita, já não trazia o grau de segurança que esse novo tipo de
empreendimento cobrava e, consequentemente, o volume de capital
ficaria aquém do necessário.
Assim, o antigo dogma pelo qual o mau administrador deve ser
punido e lhe cabe responder com seus bens pessoais pelo fracasso da
empresa, foi substituído por uma teoria mais condicente com a nova
realidade, no Século XVII, segundo a qual a responsabilidade limitada,
além de ser conditio sine qua non aos empreendimentos não
administrados pela totalidade dos sócios, era indispensável para
estimular certas actividades de risco180, das quais os investidores
naturalmente se sentiam desanimados a participar.
Mas não era essa apenas a única motivação para o surgimento de um
novo tipo societário. Nisto, era necessária uma sociedade que
transcendesse à pessoa dos sócios, que ficasse imune aos eventos
que por ventura os atingissem, como a morte ou a incapacidade. Era
importante que novos sócios nela pudessem ingressar sem a outrora
inafastável anuência dos demais e esses, quando lhes aprouvessem,
deveriam ter a possibilidade de se retirar pela simples transferência
de suas acções a outrem, sendo, consequentemente, os títulos
representativos de seu capital, passíveis de livre circulação.
Além disso, deveria estar presente a possibilidade de uma gestão
exercida por pessoas estranhas ao capital social, ou seja, por
profissionais altamente qualificados na administração de empresas. E,
por fim, já que a gestão da empresa não caberia a todos os sócios, ou
então, a nenhum deles, ou aos demais, seria muito importante, senão
essencial, a possibilidade de inspecção e controle da administração.

180
. Risco de mar, piratas e naufrágios, além dos inerentes ao próprio negócio.
132
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 133

Dessa forma, surgiram, no século XVII, as primeiras sociedades


anónimas propriamente ditas181, as sociedades coloniais de
navegação e comércio, dentre as quais as célebres Companhias
Holandesas das Índias Orientais e Ocidentais, fundadas,
respectivamente, em 1602 e 1621. Essas grandes empresas nasceram
estreitamente ligadas ao Estado de vasto império ultramarino, mas
que não dispunha de recursos financeiros suficientes para mantê-lo e
desenvolvê-lo, entre eles Holanda, Inglaterra, França, Espanha e
Portugal182.
Para que as novas terras pudessem ser exploradas de maneira
vantajosa, fez-se necessária a comunhão de esforços, sobretudo de
capitais, entre Estado e particulares, estes ávidos por riquezas e
dispostos a arriscar parcela de seu património para a consecução de
tal fim e, aquele, embora muitas vezes rico, e sem condições de
executar sozinho tão audaz empreendimento. Reside justamente aí a
motivação que levou à criação deste tipo societário.
Com esse escopo, o Estado outorgava às companhias personalidade
jurídica, reconhecia a autonomia entre o património da sociedade e
de seus sócios, a responsabilidade limitada ao capital nelas aportada,
bem como permitia a livre transmissão dos títulos representativos183
de seu capital184. São esses os genes que apontam para as
companhias coloniais de navegação e comércio como antepassado
mais similar da moderna sociedade anónima185.
O sucesso das companhias coloniais foi possível porque a sociedade
anónima se mostrou ser um mecanismo extremamente eficiente para
o fomento dos grandes empreendimentos, ou seja, para os quais se

181
. Alfredo Lamy Filho; José Luiz Bulhões Pedreira. A Lei das S/A. Rio de Janeiro:
Renovar, 1987, p. 28.
182
. Joaquim Garrigues. Problemas actuais das sociedades anónimas. Porto Alegre:
Sérgio António Fabris Editor, 1982. p. 21.
183
. Quotas, depois denominadas acções.
184
. Tullio Ascarelli. Panorama do Direito Comercial. São Paulo: Saraiva e Cia.,
1947. p. 146-147.
185
. Tullio Ascarelli. Corso di Diritto Commerciale: introduzione e teoria
dell’impresa. 3. Ed. Milano: Dott. A. Giuffrè Editore S.p.A, 1962. P.36.
133
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 134

necessitava vultosa quantidade de capital186. Neste contexto, a total


limitação da responsabilidade dos sócios ao capital investido na
companhia lhes garantia saber, de antemão, os prejuízos máximos
que poderiam ‫״‬amargar‫ ״‬em caso de insucesso da empresa.
Assim, muitas pessoas não vacilaram antes de investir consideráveis
parcelas do seu património nesses novos negócios, o que
proporcionou a arrecadação de enormes somas de capital para as
grandiosas aventuras de além-mar.

SOCIEDADE LIMITADA

Foi só em 1892, na Alemanha, que se legislou pela primeira vez a


criação de uma sociedade empresarial sob medida para os pequenos
e médios negócios187. Deveria ser a democratização do outrora
privilégio da limitação da responsabilidade dos sócios. Esse novo tipo
societário foi projectado para actuar como uma nova alavanca rumo
ao desenvolvimento económico, uma grande fonte de criação de
riquezas.
Surgiu, assim, a Gesellschaft mit beschränkter Haftung – GmbH, a
sociedade limitada do direito germânico, tipo societário mais flexível
e com um peso administrativo menor do que o da anónima, mas que
contemplava aquela que era a sua característica mais importante, a
limitação da responsabilidade dos sócios pelas dívidas sociais.

A SOCIEDADE NO DIREITO COMPARADO, EM PARTICULAR A


UNIPESSOAL

A partir das várias obras discorridas entendeu-se que foi só em 1892,


na Alemanha, que se legislou pela primeira vez sobre a criação de
uma sociedade empresarial sob medida para os pequenos e médios

186
. Tullio Ascarelli. Panorama do Direito Comercial, p. 143-144.
187
. Alfredo Gonçalves Neto, Alfredo. Lições de Direito Societário. São Paulo: Juarez
de Oliveira, 2004. v. 1, p. 188.
134
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 135

negócios188. Esse novo tipo societário foi projectado para actuar como
uma nova alavanca rumo ao desenvolvimento económico, uma
grande fonte de criação de riquezas.

Deste modo, pretendemos apresentar de forma comparativa o


tratamento que é ‫״‬dado‫ ״‬à unipessoalidade, tomando em conta que
este tipo societário foi introduzido em vários ordenamentos jurídicos
do universo. Assim, procuramos entender qual era o seu tratamento
em certos ordenamentos concretamente: o da União europeia,
França, Portugal e Espanha.

União Europeia

As sociedades limitadas com um único sócio foram reguladas no


direito comunitário europeu ainda na vigência da Comunidade
Económica Europeia ‫״‬CEE‫״‬, em 1989, pela Décima segunda directiva
do conselho ‫״‬89/667/CEE‫״‬.

Logo no preâmbulo da directiva é possível vislumbrar a necessidade


de adopção da sociedade com único sócio, especialmente no que diz
respeito às pequenas e médias empresas; mas também se verifica a
preocupação do legislador em evitar as precursões negativas que tal
estrutura pode acarretar. Assim, a Directiva procurou regular as
relações internas e externas da sociedade unipessoal, primando pela
publicidade e garantia dos credores.

A Directiva é bastante sucinta, trazendo apenas aspectos


fundamentais relativamente às sociedades unipessoais, a saber:

188
. Alfredo Gonçalves Neto. Lições de Direito Societário. São Paulo: Juarez de
Oliveira, 2004. v. 1, p. 188.
135
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 136

 Possibilidade de constituição de sociedade com um só sócio


‫״‬unipessoalidade orgânica‫ ״‬ou reunião de todas as partes
sociais em uma única pessoa ‫״‬unipessoalidade superveniente‫״‬
 Possibilidade de adopção, pelos Estados-membros, de
disposições especiais ou sanções no que diz respeito a uma
única pessoa natural ser sócia de mais de uma sociedade
unipessoal; ou b) Uma sociedade unipessoal ou pessoa
colectiva ser sócia única de uma sociedade;
 Necessidade de divulgação em caso de unipessoalidade
superveniente
 Obrigatoriedade de adopção de forma escrita para as decisões
tomadas pelo sócio único e para contratos celebrados entre o
sócio e a sociedade;
 Possibilidade de o Estado-membro deixar de adoptar as
sociedades unipessoais caso sua legislação preveja a existência
de empresas de responsabilidade limitada com património
afectado à actividade e desde que, no que se refere a essas
empresas, se prevejam garantias equivalentes às impostas às
sociedades unipessoais189.
A Directiva 89/667/CEE foi integralmente substituída pela Directiva
2009/102/02 do parlamento e Conselho Europeus de 16 de Outubro
de dois mil e nove. A nova Directiva apenas consolida as alterações
sofridas pela Directiva 89/667/CEE ao longo dos anos, em especial no
que diz respeito aos países membros e tipos societários de cada um
em que é possível a unipessoalidade.

As sociedades unipessoais na união Europeia foram adoptadas, dentre


outros, pelos seguintes Estados-membros: Irlanda, Grécia, França,
Espanha, Itália, Luxemburgo, Portugal e Reino Unido. Destes,

189
. Como foi o caso de Portugal que, inicialmente, deixou de adoptar as sociedades
unipessoais, preferindo a separação patrimonial, por meio de estabelecimentos
individuais de responsabilidade limitada ‫״‬EIRL‫״‬. Posteriormente, porem, aquele país
passou a acolher a unipessoalidade societária.
136
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 137

passamos a analisar com maior profundidade os ordenamentos


jurídicos, francês, português e espanhol.

No direito francês

A partir de 1970, teve na França um movimento no sentido de


permitir a limitação de responsabilidade do comerciante individual.
Diversos projectos de Lei se sucederam neste sentido, alguns visando
à adopção da sociedade unipessoal ‫״‬ora como tipo societário sui
generis, ora dentro do regime das sociedades limitadas‫״‬, outros a
técnica de afectação de património de afectação190.

A legislação francesa foi fortemente influenciada pela concepção


contratualista clássica. Assim, de maneira geral, o património de
afectação tinha a preferência dos autores, por uma razão
essencialmente dogmática: a sociedade, como grupo de pessoas por
essência, não poderia ser unipessoal.

Quando da discussão do repport elaborado pelo professor Claude


champaud ‫״‬1978‫ ״‬para estudo da introdução da limitação de
responsabilidade do empresário individual, o legislador local
sustentava a superioridade da fórmula não societária, com o
argumento de que era necessário evitar as ficções.

O projecto propunha a criação de trois masses actives et passeves du


patrimoine de I,enteprise : uma destinada a empresa ‫״‬património de
afectação‫״‬, que não poderia servir como garantia aos credores
pessoais do sócio; a segunda não afectado a empresa, mas que
poderia ser utilizada para as necessidades da empresa por iniciativa
de credores insatisfeitos ou do próprio empresário ‫״‬património
disponível‫ ;״‬e a terceira exclusiva do empresário, para sua
sobrevivência.

190
. Calisto Salomão Filho. A sociedade unipessoal, São Paulo: malheiros, 1995. P.
33.

137
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 138

Da mesma forma, o projecto previa a organização de um sistema de


mutualização de riscos, pelo qual seria obrigatório a adesão a uma
caixa de garantia comum aos empresários, para a qual todos deveria
contribuir.

Observam-se claramente os objectivos económicos do projecto, ao


instituir um património flexível para evitar eventuais abalos
creditícios e eliminar privilégio aos credores com maior poder de
barganha, que poderia exigir garantias pessoais. Todavia as quotas da
tal caísse de garantie seriam transferíveis, ano sendo, pois, uma
garantia efectiva, vez que poderiam ser exigidas pelos credores mais
fortes.

A título de exemplo, temos o projecto de Champaud que entendia ser


desnecessária a atribuição de personalidade jurídica à empresa
individual, uma vez que entendia que a personalização teria por
objectivo permitir a expressão de interesses comuns ligados à
existência de um património colectivo. Isso acabaria por dificultar a
transferência da empresa, já que, em regra, salvo previsão expressa
no estatuto, a empresa seria liquidada com a morte de seu titular.

Da mesma forma, a cessão intervivos dar-se-ia apenas co-relação à


totalidade da empresa, e ainda assim considerada uma cessão de
débito, atribuindo-se direito de oposição aos credores. Isso tudo
reduz a liquidez da empresa, além de criar um sistema
exageradamente complicado de separação patrimonial.

No caso da sociedade unipessoal, o sócio único, denominado associe


unique, exerce os poderes atribuídos à assembleia de sócios. Assim,
cabe à ele as deliberações ordinárias ‫״‬nomeação e destituição de
administradores, aprovação de acordos com a sociedade, aprovação
das contas e destinação dos resultados, entre outras‫״‬, as decisões
extraordinárias de alteração de status ‫״‬como aumento ou redução de
capital, incorporação, fusão ou cisão da sociedade, etc.‫״‬. E as

138
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 139

resoluções que necessitem de unanimidade na SARL ‫״‬como alteração


da nacionalidade‫״‬191.

O sócio unipessoal não pode delegar seus poderes e todas as decisões


tomadas no exercício dos poderes típicos da assembleia, devem ser
registadas por escrito, sob pena de anulação a requerimento de
qualquer interessado.

A sociedade unipessoal não pode ser sócia única de uma sociedade


limitada, sob pena de dissolução da sociedade a pedido de qualquer
interessado. Todavia, a partir da promulgação do code de commerce,
em 2000, não há mais limitação para que a pessoa física participe em
mais de uma sociedade limitada.

A Enterprase unipersonnelle à Responsabilité limitée pode, a qualquer


tempo, tornar-se uma SARL pluripessoal ou mesmo se transformar
em outro tipo societário, desde que observados requisitos legais.

No Direito português

Em 1986 o legislador português previu a necessidade de limitar a


responsabilidade do empresário em nome individual pelas dívidas
contraídas no exercício da sua empresa. Todavia, foi rechaçada, de
início, a possibilidade de adopção da limitação pela via societária
‫״‬sociedade unipessoal‫״‬. Para o legislador ressaltar, tratar-se da forma
prevalecente nos países europeus e de aceitação generalizada na
doutrina e na prática.
Preferiu-se, em Portugal, inicialmente, a criação de um novo instituto
jurídico, o Estabelecimento Individual de Responsabilidade Limitada
“EIRL”, apesar da inovação que representa e das acrescidas
dificuldades de regulamentação que determina.

191
. Jean-Jacques Daigre. ‫״‬la société unipersonnele‫״‬, in: Revue internationale de
droitcampare, v.42.nº2. société de Legislation Comparée: Paris, 1990. P.674

139
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 140

Ao analisar a disciplina legal do EIRL deveria assentar-se na


construção da pessoa jurídica ou na ideia de património de afectação
especial; o legislador português voltou-se ao pragmatismo, não
reconhecendo ao ponto a importância fundamental, uma vez que
ambas as vias apontadas conduziam a resultados satisfatórios.

Considerando-se que a atribuição de personalidade jurídica ao EIRL


pareceu ao legislador ‫״‬um processo mais complicado e,
simultaneamente, mais artificial‫״‬192, e sendo o objectivo principal do
instituto criar ‫״‬um expediente técnico legal que permita ao
comerciante em nome individual destacar do seu património geral
uma parte dos seus bens, para destinar à actividade mercantil‫״‬, viu-se
por bem conceber o EIRL com património separado, evitando a ficção.

Uma das grandes preocupações que nortearam o legislador aquando


da regulamentação jurídica do EIRL foi a garantia dos interesses de
terceiros que pretendam estabelecer relações com a empresa. Neste
sentido, o Decreto-lei n˚248/86 prevê a existência de normas que
assegurem a efectiva realização do capital do estabelecimento e a
fixação de um capital inicial mínimo, além de previsões quanto a
adequada publicidade dos actos concernentes ao estabelecimento.

Da mesma maneira, deve-se garantir a autonomia patrimonial dos


bens destinados à empresa, respondendo tais bens exclusivamente
pelas dívidas contraídas na exploração do EIRL e sem que os bens
pessoais do empresário sejam afectados por dívidas decorrentes do
exercício da actividade empresarial.

Em 1996, o legislador português reconheceu que a criação dos


estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada não atingiu
os resultados esperados, que eram, facilitar o aparecimento e,
sobretudo, o desenvolvimento de pequenas empresas. Convencido da

192
. Introduzidos pelo Decreto-Lei nº 257/96. De 31 de Dezembro, Disponível em:
www.homepagejuridica.net, acesso em 15 de Abril 2016, 10:12h

140
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 141

superioridade das sociedades unipessoais por quotas, do código das


Sociedades Comerciais ‫״‬decreto-lei n˚ 262/86‫״‬.

No final de 1996, foi publicado o Decreto-Lei n.º 257/96, de 31 de


Dezembro, que introduziu no ordenamento jurídico português uma
nova forma societária, a sociedade por quotas unipessoais ‫״‬SQU‫״‬193, e
de responsabilidade limitada ao património afecto à actividade
empresarial.

No entanto, durante dezenas de anos, a sociedade composta por um


único sócio foi, no direito português, algo de inconcebível, sendo
ainda vista como um instituto deveras estranho, contraditório nos
seus próprios termos, na medida em que a sociedade se deveria
referir necessariamente a uma pluralidade de pessoas que nela se
associam194.

Mesmo no actual estado legislativo e doutrinal, em matéria comercial,


parece entender-se que a concentração das partes sociais nas mãos
de único associado constitui uma excepção ao princípio da
contratualidade.

A legislação deixa claro o equívoco em não ter sido adoptada


limitação de responsabilidade pela forma societária na justificativa do
Decreto-lei n˚ 257/96. A título de exemplo temos:

‫״‬A consideração das sociedades de responsabilidade limitada como a


forma por excelência escolhida pelas pequenas e medeias empresa.
Na verdade, esta sociedade pode facilitar o aparecimento e,
sobretudo, o são desenvolvimento de pequenas empresas, que como
é reconhecido, constituem, principalmente em épocas de crise, um
factor não só de estabilidade e de criação de empresa mas também
de revitalização da iniciativa privada e da actividade económica em

193
. Ricardo Costa, A Sociedade por Quotas Unipessoal no Direito Português,
Livraria
Almedina, Coimbra, 2002, página 327.
194
. Ricardo Costa, ob. cit., p. 26, n. (1).
141
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 142

geral. Permitem, efectivamente que os empreendedores se


dediquem, sem recurso a sociedade fictícia indesejáveis a actividade
comercial, beneficiando do regime da responsabilidade limitada,

É certo que a instituição das sociedades unipessoais por quotas


levantou inicialmente delicados problemas doutrinais. Não faltou
quem considerasse um ‫״‬absurdo‫ ״‬a existência legal de sociedades
unipessoais. Essa dificuldade recebeu uma resposta teórica, em que a
sociedade unipessoal constituiria a excepção a regra das sociedades
pluripessoais. Mas importa sobretudo facultar as pessoas uma forma
de limitação da sua responsabilidade que não passe pela constituição
de sociedades fictícias, com ‫״‬sócios de favor‫״‬, dando azo a situações
pouco claras no tecido empresarial.

Foi esta realidade que justificou a directiva nº 89 / 667 / CE, bem


como as alterações legislativas ocorridas, designadamente em
Espanha com a lei 2/1995, de 23 de Março, em França com a lei nº 85
/ 697 de 11 de Julho de 1987.

Para a cabal prossecução dos objectivos enunciados, foram


consagrados alguns princípios de segurança, tanto do sócio como de
terceiros. Foram também tidas em conta as injunções da referida
directiva e a necessidade de prosseguir na via da harmonização das
legislações das dos Estados membros da União Europeia195‫״‬.

De acordo com o código das sociedades no direito luso a sociedade


unipessoal pode ser formada por sócio pessoa física ou pessoa
jurídica, sendo a unipessoalidade originária ou superveniente
‫״‬concentração na totalidade de um único sócio das quotas de uma
sociedade por quotas‫״‬. A transformação de sociedade colectiva em
sociedade singular dá-se por mera declaração do sócio remanescente,
que pode constar do próprio instrumento de cessão de quotas.

195
. Conferir o Decreto-lei n˚ 257/96.
142
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 143

No Direito Espanhol

A norma espanhola admite a existência de sociedades unipessoais


originárias e supervenientes. A sociedade unipessoal é considerada
originária quando ‫״‬constituída por um único sócio‫״‬, sendo esta tanto
pessoa física como jurídica. Já a unipessoalidade superveniente
decorre da sociedade que foi ‫״‬constituída de maneira plurilateral e
acaba concentrando todas as suas participações nos maus de um
único proprietário‫״‬.

Para resguardar direitos de terceiros, no caso de conversão de


sociedade pluripessoal é necessário observar a regra do artigo 129º
da Lei nº 2/1995, que determina a necessidade de registo da situação
de unipessoalidade no registo Mercantil, mediante escritura
pública196.

Apesar da sua natureza distinta, a constituição da sociedade


unipessoal deve observar a regra geral, ou seja, constar da escritura
pública inscrita no registo mercantil. Portanto, devem ser observados
os mesmos critérios para a constituição das sociedades pluripessoais,
no que diz respeito à capacidade das partes e objecto da empresa.

A sociedade unipessoal se submete a um regime de publicidade dos


actos mais amplos do que aquele que rege as demais sociedades.
Qualquer alteração relativa ao corpo social deve ser efectuada por
meio de escritura pública, arquivada no Registo Mercantil e a
identidade do sócio único sempre deve ser revelada.

Pretendeu, pois, o legislador dar ampla publicidade destes


documentos àqueles que venham a contratar com a sociedade.
Contudo, a obrigatoriedade de revelar as condições do contrato pode
beneficiar eventuais concorrentes da sociedade, que terão acesso ao
seu conteúdo.

196
. Francisco Vicent Chulia. Intruducción al derecho mercantil. Valência: Tirant lo
blanc, 1999. P.420.

143
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 144

Comparando estes três ordenamentos jurídicos, entendemos que o


legislador moçambicano não teve pensamento diferente do legislador
português, única diferença reside na distinção se quando falamos das
sociedades por quotas unipessoais estamos ou não perante um tipo
societário. Enquanto o legislador português considera uma espécie
das sociedades por quotas, o legislador moçambicano, no nosso
entender, consagra as SQUs, como um tipo societário.

A NATUREZA JURÍDICA DAS SOCIEDADES POR QUOTAS UNIPESSOAIS


NO ORDEAMENTO JURÚDICO MOÇAMBICANO

No ordenamento jurídico moçambicano, a unipessoalidade é


representada pela consagração no Código Comercial, a existência de
sociedades por quotas unipessoais, onde de acordo com o nº1 do
artigo 328º do código comercial está dito, quaisquer pessoa singular
pode constituir uma sociedade por quotas de cujo ‫״‬capital, que
constitui uma quota única, seja inicialmente um único titular, que se
rege pelas disposições deste capítulo e, com as necessárias
adaptações, pelas disposições aplicáveis às sociedades por quotas‫״‬197.
O problema principal do nosso trabalho é percebermos qual é a
verdadeira natureza jurídica do contrato de sociedade por quotas
unipessoais atendendo e considerando o artigo 980º do CC. Em
função deste problema, procuramos analisar o regime jurídico-legal
das sociedades por quotas unipessoais, discutindo em primeira
instância, se era procedente a consideração das sociedades por
quotas unipessoais como sociedades já que estas possuem um único
sócio, contradizendo assim com o preconizado no artigo acima citado
e ainda a 1ª parte do nº 1 do artigo 91º do C.Com.

Desta feita, procedemos a análise de duais teorias: a contratualista e


a institucionalista:

197
. Conferir o nº1 do artigo 328º do C.Com.
144
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 145

A primeira assenta na ideia de que a sociedade comercial é


constituída por meio de um contrato que é o contrato de sociedade.
Está claro de que trata-se de um contrato plurilateral ou multilateral,
quer dizer, exige a presença de pelo menos duas pessoas tal como é
definido no art.º 980º do CC. Também, é na verdade, um contrato
plurilateral dirigido a uma finalidade comum.

A segunda defende que a vontade contratual não determina


livremente a condição jurídica da pessoa colectiva que criou, pelo
contrário, a pessoa colectiva em si. Como tudo ocorre na sociedade
por vontade dos sócios que são na verdade os últimos que decidem
por ela, embora existam administradores, a sociedade há-de ser
sempre uma instituição e não um contrato. Isto é, o contrato em si
nada reflecte senão aquela pessoa colectiva que define e caracteriza
todo o esquema que esteve por detrás do próprio contrato de
sociedade.

Os defensores desta teoria são unânimes ao afirmarem que não se


pretende de nenhuma forma negar que a sociedade deriva de um
contrato. Pretende-se sim, demonstrar que este contrato associa-se a
uma instituição que de princípio fundamenta a existência do próprio
contrato.

Da análise das duas teorias, resultou na nossa aderência à teoria


contratualista, considerando, desta feita, como procedente a
consagração das sociedades por quotas unipessoais como tal, porque,
esta é a realidade seguida por vários ordenamentos jurídicos,
discorridos no presente trabalho que optaram na aplicabilidade desta
teoria, considerando desta feita, a sociedade não só como fruto da
celebração do contrato mas também da existência da instituição.

Também, entendemos que embora não apareça claramente na lei


manifestada essa posição, somos de opinião que a classificação do
contrato de sociedade como um contrato de fim comum apresenta

145
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 146

ser a que melhor acomoda este debate. A sua classificação como tal,
tem grande relevância na determinação e na natureza do regime
aplicável as sociedades comerciais na medida em que:

1º A Inobservância da forma não implica imediatamente a nulidade


ou anulação do contrato de sociedade, a menos que este não possa
converter-se nos termos do art.293º do CC, ou não poder reduzir-se
as prestações válidas de acordo com o regime consagrado no art.
292º por força do nº do art. 981º do CC. Dá-se aqui claramente, a
priorização da manutenção da instituição criada em prejuízo de meras
formalidades do próprio contrato com vista a assegurar a
continuidade do fim comum consagrado pelos sócios no momento da
constituição da sociedade.

2º O incumprimento do contrato por um ou alguns sócios não dá


lugar a rescisão do contrato por parte dos demais sócios
diferentemente do que acontece nos demais contratos com
fundamento na “exceptio non adimpleti contratus”.

Por estas razões, entendemos que a prevalência do fim comum


acompanha sempre a vida e os interesses da sociedade resultando daí
a nossa posição de que ele é um contrato de fim comum ou de
organização.

Portanto, somos de concordar com autores que defendem que a


sociedade unipessoal, por basear-se na figura da pessoa jurídica de
base associativa, acaba por se defrontar com o princípio de
contratualismo que exige a pluralidade de pessoas para a constituição
da sociedade. Mas com base na discussão acima apresentada e
tomando em conta a noção do art.º 980º do CC que anteriormente
apresentamos e nas finalidades que a justificam, pode-se concluir que
a nosso entender, ela corresponde a uma estrutura de colaboração,
de contribuições e de esforços para uma finalidade comum.

146
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 147

A posição que aderimos fica mais sólida quando subsidiámos a ideia


que refere à personalização das sociedades, que recebeu
contribuições de carácter institucional dos agrupamentos medievais e
das companhias de comércio dos séculos XVII e XVIII. No entender
destes, ‫״‬sociedade deixa de ser essencialmente contratual e passa a
ser também vista como instituição, quando a limitação da
responsabilidade surge e se atrela à autonomia patrimonial‫״‬198.

Não esqueçamos que o problema a que propomo-nos a analisar é de


percebermos a verdadeira natureza jurídica do contrato de sociedade
por quotas unipessoais atendendo e considerando o artigo 980º do
CC.

Tomando em consideração o ilustrado no art.980º do CC,


entendemos que o contrato de sociedades por quotas unipessoais,
reveste-se de natureza distinta, da natureza concebida para
constituição de sociedades comerciais em geral, pelo facto da retirada
de um dos elementos concebidos para o contrato da sociedade,
constantes do artigo citado no parágrafo antecedente.

Trata-se do elemento pessoal que deixa a ideia de pluralidade de


pessoas quando dispõe que o «contrato de sociedade é aquele em
que duas ou mais pessoas se obrigam…». Esta descrição da lei
encontra fundamentação no artigo 91º do C.Com.

Na verdade, ao estabelecer no nº 1, o número de sócios em dois, por


um lado o legislador reconheceu que o contrato de sociedade
pressupõe um mínimo de declarações negociais para sua
efectividade. Por outro lado, a própria palavra sociedade em termos
gerais pressupõe a existência de mais do que uma pessoa.

198
. L. A. S. Hentz, Notas sobre a desconsideração da personalidade jurídica: a
experiencia portuguesa. Revista de Direito Mercantil: Industrial, Económico e
Financeiro, São Paulo: Malheiros, n. 101, Jan. /Mar. 1996. Cordeiro, op. cit., p. 477-
478.

147
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 148

Contudo, deparamo-nos com situações que resultam da própria lei


em que o elemento pessoal pode ser reduzido. Esta redutibilidade do
elemento pessoal ocorre por exemplo na sociedade por quotas
unipessoal prevista no art.º 328º e seguintes do C.Com. Entendemos
que sempre estará presente o elemento pessoal mesmo neste caso
em que ele se reduz apenas a uma pessoa.

A questão que pode-se colocar é a seguinte: Estamos ainda neste caso


perante uma sociedade? Que tipo de sociedade é esta? Por outras
palavras, esta sociedade existe independentemente de todas as
demais e particularmente, independente da sociedade por quotas?

Se atentarmos a estrutura do Ccom moçambicano, especialmente no


seu livro II, titulo II, constataremos que a sua divisão em capítulos
compreende seis capítulos dos quais, o capitulo V é exclusivamente
reservado a esta sociedade. Do ponto de vista estrutural, dúvidas não
nos restam que foi intenção do legislador considerar um tipo
societário igual e independente de qualquer outro previsto na lei.

Conhecida a natureza do contrato das sociedades por quotas


unipessoais, passemos a análise do regime jurídico-legal pelo qual se
regem. Por conseguinte, realizamos o estudo sobre o versado nos
artigos 328º e ss do Ccom, no sentido de percebermos até que ponto
está acautelado o regime deste tipo societário.

De facto, vários ordenamentos jurídicos discorridos no presente


trabalho, reconhecem a existência de sociedades com único sócio. Por
exemplo no ordenamento jurídico português, deixa claro que a
sociedade por quotas unipessoal é simples espécie das sociedades por
quotas, tendo enquadrado no capítulo X do título III do código das
sociedades comerciais. Desta forma torna-se compreensível a
aplicação do regime jurídico das sociedades por quotas às sociedades
por quotas unipessoais.

148
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 149

No caso concreto do ordenamento jurídico moçambicano, onde o


legislador, do nosso ponto de vista, proclama as sociedades por
quotas unipessoais como um tipo societário, estas, regem-se
maioritariamente pelo regime concebido para as sociedades por
quotas. Na nossa concepção, torna-se inconcebível que este dependa
do regime de outro tipo societário porque, isso, retiraria a igualdade e
independência que o legislador atribui a este tipo societário ao
enquadrar no Capítulo V do Título II do Livro II do Ccom. Da mesma
maneira, significaria que este tipo societário desapareceria com a
extinção do tipo societário de que depende.

Prosseguindo com nosso ponto de vista, em relação ao pensamento


do legislador moçambicano, segundo qual as sociedades por quotas
unipessoais compreendem um tipo societário, entendemos que urge
a necessidade de inserirão deste tipo societário no nº 1 do artigo 82º
do C.Com como um dos tipos societários.

Há que se dizer que, de facto, esta constitui no nosso entender, uma


preocupação de extrema importância porque uma vez inseridas no
referido artigo, poderia dissipar as dúvidas que pairam a volta da
tipicidade das sociedades por quotas unipessoais e evitaria a
contrariedade patente entre o nº 1 do artigo citado no parágrafo
antecedente e Capítulo V do Título II do Livro II do Ccom
moçambicano199.

Entendemos assim porque, por um lado, embora na estrutura do


código comercial na parte relativa as sociedades comerciais seja feito
em capítulos integrando este ʺtipoʺ societário no capítulo V,
sugerindo a sua autonomia, o artigo 82º do C.Com que consagra os
tipos societários e o princípio da tipicidade destas, não faz referência
a esta sociedade. Limita-se a indicar a sociedade por quotas na lista o
que sugere desde logo que a sociedade por quotas unipessoal não

199
. Conferir o nº 1do artigo 82º e Capítulo V do Título II do Livro II todos do
C.Com.
149
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 150

goza deste estatuto. Por outro lado, a remessa que a parte final do nº
1 do artigo 328º faz ao regime das sociedades por quotas, pode ser
também, pressuposto da contrariedade que temos vindo a evocar.

Associado ao objectivo anterior que era de analisar o regime jurídico-


legal das sociedades por quotas unipessoais e explicada a razão do
seu enquadramento no nº 1 do artigo 82º do C.Com como um dos
tipos societários, cumpre-nos discutir a conveniência da separação
das sociedades por quotas unipessoais das sociedades por quotas.
Criando-se um regime próprio que possa reger tais sociedades, com
objectivo de promover maior aderência dos empresários individuais a
este tipo societário.

Na verdade, a unipessoalidade societária corresponde em termos de


consagração legal no nosso código uma novidade, que veio colmatar a
dificuldade que existia e que era imposta pelo regime do artigo 980º
do CC que exigia a presença de mais do que uma pessoa para efeitos
de constituição de uma sociedade.

Tal imposição legal criava situações de sociedades fictícias em que a


presença de outra pessoa na sociedade tinha em vista apenas a
exigência legal mas, que na verdade, e muitas vezes esses sócios do
ponto de vista factual não sabiam e nem tinham interesse de nada do
que se passava na sociedade em que eram partes.

Tomando em conta o objectivo acima referido, torna-se necessário


entender a dificuldade que possa existir em criar um regime
autónomo para esse tipo de Sociedade. Quanto a nós, um regime
autónomo para reger as sociedades por quotas unipessoais seria uma
solução eficaz em relação a dificuldade que reside na sua distinção, se
é o tipo societário ou simples espécie das sociedades por quotas.

A aplicabilidade do regime jurídico das sociedades por quotas às


sociedades por quotas unipessoal, remete-nos ao pensamento de que
estas não constituem um tipo

150
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 151

societário mas sim uma espécie de sociedades por quotas como são
as sociedades constituídas entre cônjuges200.

É nosso entender que a comparação de vários ordenamentos que


consagraram este tipo societário dever-se-ia, com base nas
disposições já existentes no código comercial, criar-se um regime
autónomo para reger as sociedades por quotas unipessoais,
complementando deste modo as existentes nos artigos 328º, 329º e
330º do C.Com, já que se sabe que as sociedades por quotas
unipessoais possuem uma designação e firma201 próprias.

Na nossa concepção, entendemos que desta forma tornaria este tipo


societário mais compreensível e facilitaria aos interessados em
desenvolver as pequenas e médias empresas, fórmulas eficazes para
sua prossecução. Estamos a falar, por exemplo, da subcapitalização
que seria bastante benéfica à instituição, à similaridade de diversos
outros países, de valores mínimos de capital para constituição de
sociedades.

Com a introdução do regime autónomo para reger as sociedades por


quotas unipessoal, entendemos que várias situações como a que nos
referimos no parágrafo anterior e tantas outras, serão de fácil
interpretação como acontece com as já previstas, que passamos a
discorrer:

“O regime das deliberações que vigora nas sociedades por quotas


pluripessoais, há-de corresponder ao das decisões nas sociedades por
quotas unipessoais. Para o efeito, as decisões sobre matérias que por
lei são da competência deliberativa dos sócios nas sociedades por
quotas serão aqui tomadas sobre a forma de decisão pelo sócio único
e lançadas num livro destinado a esse fim, com assinatura do mesmo.

200
. Conferir o artigo 284º do C.Com.
201
. Conferir o artigo 33º do Ccom.

151
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 152

O sócio único ou interposta pessoa pode directamente celebrar


contrato com sociedade mediante prévio relatório elaborado por um
auditor de contas que não tenha qualquer relação com a sociedade.

No relatório, deve constar claramente a tutela dos interesses da


sociedade e respeitar as condições e preços normais do mercado, sob
pena de não haver, lugar à sua celebração. Procedendo deste modo,
assegura-se que o sócio não coloque em risco o interesse social com
prejuízos para terceiros e igualmente, permite a separação do
interesse pessoal e interesse social, etc.‫״‬

Ainda no âmbito de apresentação dos resultados, o nosso estudo


procurou analisar as vantagens que podem advir das sociedades por
quotas unipessoais. Portanto, tornou-se pertinente recordar o
preceituado no art.980º do CC que nos diz que “ o contrato de
sociedade é aquele em que duas ou mais pessoas se obrigam a
contribuir com bens e serviços, para o exercício de certa actividade
económica que não seja de mera fruição, a fim de repartirem os
lucros resultantes dessa actividade.

Por conseguinte, como já vimos quando estávamos na


fundamentação teórica, que deparamo-nos, com a definição legal de
sociedade acima indicada, que dela decorrem 4 elementos,
nomeadamente, pessoal, patrimonial, finalístico e teleológico e
quando se trata de sociedades comerciais, com mais dois elementos
que compreendem o objecto comercial e tipo comercial.

Ora, no contexto das sociedades unipessoais, um dos elementos


acima indicados na noção de sociedade é retirado, nomeadamente o
elemento pessoal, uma vez que a mesma tem um único sócio. Assim,
quando o elemento pessoal é retirado da noção de sociedade,
estamos perante uma sociedade unipessoal, em que apenas uma
única pessoa singular é titular de uma única quota.
A partir dos vários autores cujas ideias fora sendo abordadas ao longo

152
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 153

do nosso estudo, entendemos que este tipo de sociedades tem


vantagens quando comparada aos demais tipos societários, bem
como ao empresário em nome individual, nomeadamente:
a) Inaplicabilidade do regime da responsabilidade
solidária no pagamento da quota do sócio remisso, tal como acontece
nas sociedades por quotas, porque apenas existe um titular da quota;
b) Incentivo e promoção de iniciativas empresariais
individuais;
c) Não é necessário envolver terceiros para atingir o
número mínimo de sócios conforme por vezes acontece na
constituição de sociedades;
d) O controlo sobre a actividade da empresa é igual ao
da empresa individual, uma vez que também existe apenas um
proprietário;
e) Agilidade no exercício da gestão económica da
sociedade, visto não se encontrar dependente de órgãos colegiais
para a formação da vontade social; e
f) A responsabilidade do sócio resume-se ao capital
social, ou seja, o seu património pessoal não responde pelas dívidas
contraídas no exercício da actividade da empresa, excepto no caso de
declaração de falência, se provar que o património social não foi
exclusivamente afectado ao cumprimento das respectivas obrigações.

_________________________________________________
Sumário
Nesta unidade temática, concluiu-se que uma sociedade comercial
não era nada mais ou nada menos uma organização cuja objecto a
prática de actos de comércio, constituem-se como tal e adoptam um
dos tipos societários previstos no artigo 82º do C.Com202 afastando

202
Nos termos do nº 2 do art.82º do C.Com -as sociedades que tenham por objecto o
exercício de uma empresa comercial só pode constituir-se segundo um dos tipos
societários previstos neste artigo, estamos aqui perante o princípio da tipicidade no
que se refere a possibilidade de escolha dos tipos societários. Equivale a dizer que,
não há sequer espaço para conjugação de características diferentes destes tipos
153
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 154

por conseguinte aquelas sociedades cujo objecto não é a prática de


actos comerciais. Consiste na reunião de esforços entre duas ou mais
pessoas denominadas de sócios, que combinam a aplicação de seus
recursos ‫״‬financeiros e know how‫ ״‬com finalidade de desempenhar
certa actividade económica, visando a divisão dos frutos e lucros por
ela gerados.
A sociedade comercial de acordo com o artigo 980 do código civil
apresenta quatro elementos essenciais para a sua constituição:
elemento patrimonial, teleológico, finalístico e pessoal.
As sociedades de todos os tipos gozam de personalidade jurídica a
partir do registo definitivo203. E gozam dessa personalidade jurídica
tanto em relação a terceiros, como em relação aos próprios sócios.
Abordamos matérias sobre a personalidade e capacidade jurídica das
sociedades, onde a sociedade só adquire a qualidade de comerciante
em consequência do exercício da actividade social e não os sócios. A
capacidade jurídica das sociedades comerciais como pessoas
colectivas está delimitada pelo seu objecto e por fim tratamos
também das matérias sobre a forma dos contratos das sociedades
comerciais, tipos d sociedades comerciais.

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Exercícios.

1. O que Entende por sociedade comercial?


a) É aquela que tem por objecto a prática de actos de
comércio, constituem-se como tal e adoptam um dos tipos
societários previstos no artigo 82º do C.Com204 afastando

societários para a constituição de um outro tipo que não seja os previstos no nº 1 do


artigo 82º do Ccom.
203
Conferir o artigo 86º do Código Comercial.
204
. Nos termos do nº 2 do art.82º do C.Com -as sociedades que tenham por objecto o
exercício de uma empresa comercial só pode constituir-se segundo um dos tipos
societários previstos neste artigo, estamos aqui perante o princípio da tipicidade no
que se refere a possibilidade de escolha dos tipos societários. Equivale a dizer que,
não há sequer espaço para conjugação de características diferentes destes tipos
societários para a constituição de um outro tipo que não seja os previstos no nº 1 do
artigo 82º do Ccom.
154
ISCED CURSO: Direito; Disciplina: Direito Comercial 155

por conseguinte aquelas sociedades cujo objecto não é a


prática de actos comerciais.
Verdadeira
Falsa
A resposta é verdadeira. V

2. O artigo 980 do código civil apresenta quatro elementos


essenciais para a constituição de uma sociedade.
a) Pessoal, patrimonial, teleológico e finalístico.
Verdadeira
Falsa
A resposta é verdadeira. V

3. O elemento pessoal diz que:


a) Alude a pluralidade de sócios. Nele compreendem-se, quer
o empresário e outros investidores de capitais, quer os
trabalhadores.
Verdadeira
Falsa
A resposta é: verdadeira. V

4. O elemento finalístico diz que:


a) Obriga o exercício em comum de uma certa actividade
económica que não seja de mera fruição

Verdadeira
Falsa
A resposta é verdadeira. V

155

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