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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MOÇAMBIQUE

FACULDADE DE DIREITO

AMÉLIA GIGANTE

CLARA CARACADZAI EDSON

ELIZABETE CERVEJA

FAUSIA NTICAMA

FRANCISCA DA COSTA CHICO

LODOVINA TALAPA

NAIRA DE FÁTIMA

OSVALDO IUATE LIGONHA

SHEILA RAIMUNDO ANTUNES

SOLANGE MÁRIO JOSÉ VASCO DA GAMA

DIREITO DO TRABALHO:

UMA ANÁLISE EM TORNO DO DIREITO DE


TRABALHO MOÇAMBICANO

NAMPULA

2023
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MOÇAMBIQUE

FACULDADE DE DIREITO

AMÉLIA GIGANTE

CLARA CARACADZAI EDSON

ELIZABETE CERVEJA

FAUSIA NTICAMA

FRANCISCA DA COSTA CHICO

LODOVINA TALAPA

NAIRA DE FÁTIMA

NEUSA AVELINO JOSÉ

OSVALDO IUATE LIGONHA

SHEILA RAIMUNDO ANTUNES

SOLANGE MÁRIO JOSÉ VASCO DA GAMA

O DIREITO DE TRABALHO:

UMA ANÁLISE AO DIREITO DE TRABALHO MOÇAMBICANO

Trabalho em grupo de carácter


avaliativo referente à cadeira de
Direito de Trabalho, ministrada na
Faculdade de Direito da UCM,
Licenciatura em Direito, 4° Ano, 1°
Semestre.

Docente: Phd. Clara Macovela.

NAMPULA

2023

i
LISTA DE ABREVIATURAS

Art°-artigo;

CC- codígo civil;

DT- Direito de Trabalho

Ob. Cit-obra citada;

P- página;

P.p- páginas;

Séc- século;

LT- Lei de Trabalho;

ii
ÍNDICE
INTRODUÇÃO ....................................................................................................................................... 1
1. NÓTULA HISTÓRICA DO DIREITO DE TRABALHO....................................................... 2
2. O DIREITO DE TRABALHO ................................................................................................. 5
2.1. Noções Gerais .......................................................................................................................... 5
2.2. Função do Direito de Trabalho ................................................................................................. 6
2.3. Natureza Jurídica do Direito do Trabalho ................................................................................ 7
3. O DIREITO DE TRABALHO MOÇAMBICANO ................................................................. 8
3.1. Evolução do Laboral Moçambicano......................................................................................... 8
3.1.1. Evolução Legislativa ................................................................................................................ 8
3.1.1.1. Lei nº 8/85, de 14 de Dezembro ............................................................................................... 8
3.1.1.2. Lei no 8/98, de 20 de Julho ...................................................................................................... 9
3.1.2. A vida laboral do povo Moçambicano antes da penetração portuguesa ................................... 9
3.1.3. A Penetração Portuguesa ........................................................................................................ 10
3.1.3.1. A Lei do Trabalho Forçado .................................................................................................... 11
3.1.4. A Constituição de 1975 .......................................................................................................... 11
3.1.5. A Constituição de 1990 .......................................................................................................... 12
3.1.5.1. A Constituição de 2004 .......................................................................................................... 13
4. O DIREITO DE TRABALHO CONTEMPORÂNEO MOÇAMBICANO ........................... 13
4.1. Generalidades ......................................................................................................................... 13
4.2. Sujeitos Controvertidos .......................................................................................................... 14
4.2.1. Personalidade e Capacidade Jurídica...................................................................................... 15
4.2.2. Trabalho de Menores .............................................................................................................. 16
4.3. PRINCÍPIOS DO DIREITO DE TRABALHO MOÇAMBICANO ...................................... 16
4.3.1. Princípios Fundamentais ........................................................................................................ 18
4.3.2. Princípios específicos da Legislação Trabalhista ................................................................... 18
4.3.2.1. Princípio da Liberdade Contratual.......................................................................................... 19
4.3.2.2. Princípio da não discriminação .............................................................................................. 20
4.3.2.3. Princípio do Tratamento mais Favorável ............................................................................... 21
4.3.2.4. Princípio da Liberdade de Associação ................................................................................... 21
4.3.2.5. Princípio de Direito ao Trabalho ............................................................................................ 22
CONCLUSÃO ....................................................................................................................................... 24
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................................... 25
LEGISLAÇÃO ....................................................................................................................................... 25

iii
INTRODUÇÃO
Trabalho é toda actividade desenvolvida pelo homem para prover o seu
sustento e para produzir riquezas e, ao longo do tempo, diversas foram as suas formas, que
variaram conforme as condições históricas que vigoraram em cada época. A história do
trabalho começa exactamente quando o homem percebe que é possível utilizar a mão-de-obra
alheia não só para a produção de bens em proveito próprio, mas também como forma de
produzir riquezas. Assim, o trabalho se desenvolve e torna -se dependente e ligado às relações
sociais e económicas vigentes em cada período histórico específico.

A força de trabalho enquanto motor essencial e indispensável para o


desenvolvimento de qualquer sociedade, constitui uma realidade particularmente sensível e de
extrema relevância económica, social e política. O Direito do Trabalho é aquele ramo do
direito mais directamente relacionado com esta realidade e assumindo, como tal, uma
importância ímpar no quotidiano de todos e de cada um dos membros activos da sociedade.
Tendo apenas por objecto o trabalho juridicamente subordinado por contraposição ao
chamado trabalho independente, sem laços de subordinação jurídica, as normas do Direito de
Trabalho disciplinam uma multiplicidade de aspectos importantes relacionados com a relação
laboral que liga um qualquer trabalhador e a sua entidade patronal.

O presente trabalho tem como objectivo o estudo do Direito Laboral


Moçambicano e sua evolução. Tendo em conta que Moçambique foi uma colónia portuguesa
que alcançou a sua independência em 25 de Junho de 1975, faremos um estudo a partir
daquilo que foram os antigos Estados, o início da colonização, a influência da Revolução
Industrial, a conquista da independência até a actual Legislação laboral Moçambicana. Em
bom rigor, traremos aspectos de fonte do Direito de Trabalho Moçambicano com vista a
esmiuçar-nos sem descurar do carácter contemporâneo do nosso tópico. Mas também, sendo
que não é possível abordar em relação a nuance específica sem antes tocar a genérica, faremos
uma passeata em torno de componentes relativas a conceptualização, função e natureza
jurídica do Direito de Trabalho a nível global apresentando ideias de autores controversos.

Este trabalho segue uma estrutura lógica, estando dividido em partes, contendo
assim, os elementos pré-textuais, textuais e pós-textuais, de modo a tornar mais fácil a
compreensão e manuseamento deste trabalho.

Palavras-chave: Direito de Trabalho, Trabalho, Trabalhador, Empregador, Evolução.

1
1. NÓTULA HISTÓRICA DO DIREITO DE TRABALHO

É imprescindível, para entender um dado ramo jurídico, o conhecimento da sua


história, do seu surgimento, da sua evolução, analisar os aspectos políticos, sociais ou
económicos que o influenciaram etc. Isso se toma ainda mais verdadeiro quando se está diante
de um ramo jurídico extremamente dinâmico e marcadamente social, como o Direito do
Trabalho, que sofre constantes e importantes influências das questões socioeconómicas
nacionais e internacionais.1

A maioria dos autores concorda que a origem etimológica de “trabalho” advém


de tortura tripaliare, que significa torturar. A palavra tripalium significa uma máquina de três
pontas utilizada para tortura. Logo, é pacífica esta concepção histórica do trabalho concebido
como um castigo ou uma dor e até uma pena. Em grego, o termo “trabalho” tem a mesma raiz
que a palavra latina poena (pena). Na Idade Antiga, o trabalho era “coisa” de escravos, os
quais, no fundo, pagavam seu sustento com o “suor de seus rostos”. Portanto, o escravo
sequer era sujeito de direitos, pois era considerado res (coisa).2 O trabalho do escravo era,
desde o início, um trabalho por conta alheia, no sentido de que a titularidade dos frutos do
trabalho do escravo correspondia imediatamente ao dono e não ao próprio escravo.3

Podemos afirmar que o trabalho é tão antigo quanto o homem. A partir do


momento em que o homem fixou-se à terra e organizou-se o sistema de trocas, ele deixou de
trabalhar sozinho ou com sua família para seu próprio sustento e surgiu a ideia de utilização
do trabalho em benefício de pessoa diversa do próprio trabalhador. Desde então, o trabalho
assumiu, ao longo do tempo, basicamente as seguintes formas: escravidão, servidão,
corporações de ofício e emprego.4

A primeira forma de trabalho foi a escravidão antiguidade, em que o escravo


era considerado apenas uma coisa, não tendo qualquer direito, muito menos trabalhista. O
escravo, portanto, não era considerado sujeito de direito, pois era propriedade do dominus.
Nesse período, constata-se que o trabalho do escravo continuava no tempo, até de modo
indefinido, ou mais precisam ente até o momento em que o escravo vivesse ou deixasse de ter
essa condição. Entretanto, não tinha nenhum direito, apenas o de trabalhar. Na Grécia, Platão

1
PAULO, Vicente e ALEXANDRINO, Marcelo, Manual de Direito do Trabalho, 14ª EDIÇÃO, Editora
Método, São Paulo, 2010, pág. 1.
2
CALVO, Adriana, Manual de Direito do Trabalho, 5ª Edição, Editora Saraiva, São Paulo, 2020, pág. 19.
3
OLEA, Manoel Alonso, Introdução ao direito do trabalho, Editora Gênesis, Curitiba, 1997, pág. 45.
4
PAULO, Vicente e ALEXANDRINO, Marcelo, Manual de Direito do Trabalho…, Ob. Cit, pág. 1.
2
e Aristóteles entendiam que o trabalho tinha sentido pejorativo. Compreendia apenas a força
física. A dignidade do homem consistia em participar dos negócios da cidade por meio da
palavra. Os escravos faziam o trabalho duro, enquanto os outros poderiam ser livres. O
trabalho não tinha o significado de realização pessoal. As necessidades da vida tinham
características servis, sendo que os escravos é que deveriam desempenhá-las, ficando as
actividades mais nobres destinadas às outras pessoas, como a política. Hesíodo, Protágoras e
os sofistas mostram o valor social e religioso do trabalho, que agradaria aos deuses, criando
riquezas e tomando os homens independentes. A ideologia do trabalho manual como
actividade indigna do homem livre foi imposta pelos conquistadores dóricos (que pertendam à
aristocrada guerreira) aos aqueus. Nas dasses mais pobres, na religião dos mistérios, o
trabalho é considerado como actividade dignificante.5

Em Roma, o trabalho era feito pelos escravos. A Lex Aquilia (284 a.C.)
considerava o escravo como coisa. Era visto o trabalho como desonroso. A locatio conâuctio
tinha por objetivo regular a actividade de quem se comprometia alocar suas energias ou
resultado de trabalho em troca de pagamento. Estabelecida, portanto, a organização do
trabalho do homem livre. Era dividida de três formas: (a) locatio conâuctio rei, que era o
arrendamento de uma coisa; (b) locatio conâuctio operarum, em que eram locados serviços
mediante pagamento; (c) locatio conâuctio operis, que era a entrega de uma obra ou resultado
me• diante pagamento (empreitada).6

Num segundo momento, há a servidão. Era a época do feudalismo, em que os


senhores feudais davam protecção militar e política aos servos, que não eram livres, mas, ao
contrário, tinham de prestar serviços na terra do senhor feudal. Os servos tinham de entregar
parte da produção rural aos senhores feudais em troca da protecção que recebiam é do uso da
terra. Nessa época, o trabalho era considerado um castigo. Os nobres não trabalhavam.7 A era
de predomínio da escravidão foi, paulatinamente, cedendo lugar a formas intermediárias de
exploração do trabalho, com a gradual pessoalização do trabalhador, até a conformação do
sistema denominado servidão, que caracterizou as relações de trabalho na época do
feudalismo: o trabalhador (servo) trabalhava apenas em troca de protecção militar e política.
Não eram escravos, mas na prática também não eram livres, pois tinham que trabalhar nas
terras do senhor feudal e entregar a ele praticamente toda sua produção em troca da tal
5
MARTINS, Sérgio Pinto, Direito do Trabalho, 28ª Edição, Editora Atlas, São Paulo, 2012, pág. 4.
6
LEITE, Carlos Henrique Bezerra, Curso de Direito do Trabalho, 6ª ed., Editora Saraiva, São Paulo, 2015, pág.
6.
7
BARROS, Alice Monteiro de, Curso de direito do trabalho, 11ª ed., atual, Editora Ltr, São Paulo, 2017, p. 23.
3
protecção! De toda forma, é importante destacar que o servo, embora preso à terra, não era
considerado uma coisa, objecto de propriedade, sendo-lhe reconhecidas umas poucas
prerrogativas civis pelos diversos ordenamentos da época, como, por exemplo, a faculdade de
contrair núpcias e, portanto, constituir família. O trabalhador, enfim, assume o status de
pessoa.8

Ainda na Idade Média, e sendo um elemento característico desse período,


surgiram as corporações de ofício. Essas organizações, em resumo, consistiam de grupos de
trabalhadores especializados em determinado mister, com uma rígida regulação do exercício
de suas actividades,' objectivando essencialmente controlar o mercado, impedir a
concorrência e assegurar diversos privilégios aos mestres, dirigentes das corporações. Nessa
fase, já se pode falar em uma relativa liberdade do trabalhador (se comparado ao servo). Tal
liberdade, entretanto, era decorrência dos interesses das corporações, não existindo, ainda,
qualquer preocupação com eventuais direitos dos trabalhadores. Os integrantes das
corporações de ofício dividiam-se em três classes, hierarquicamente ordenadas: os mestres, os
companheiros e os aprendizes.9

A Revolução Francesa pôs fim às corporações de ofício, pois elas eram


instituições, a toda evidência, incompatíveis com o ideal de liberdade individual do homem,
cerne do Liberalismo do século XVIII, base maior dessa Revolução. Não admitiam, os
ideólogos da Revolução Francesa, a possibilidade de existirem poderes intermediários entre o
indivíduo e o Estado, como representavam as corporações de ofício, com seus estatutos
próprios, conferindo poderes quase absolutos aos mestres, infensas à intervenção do Estado
em seus assuntos internos. Graças à Revolução Francesa o trabalho tomou-se livre. Em razão
dos princípios jurídicos propugnados pelos teóricos do Liberalismo, especialmente o princípio
da autonomia da vontade e uma de suas decorrências a liberdade de contratar o trabalho
realizado por uma pessoa em proveito de outra passou a ser decorrência não mais de relações
de subordinação pessoal, mas de vinculação contratual.10

Ao passo que a Revolução Francesa forneceu as bases ideológicas e jurídicas


para o surgimento do trabalho livre, a Revolução Industrial é apontada como causa económica
directa do surgimento do Direito do Trabalho. Com a Revolução Industrial, a vinculação

8
PAULO, Vicente e ALEXANDRINO, Marcelo, Manual de Direito do Trabalho…, Ob. Cit, p.p. 1-2.
9
Idem, pág. 2.
10
MARTINS, Sérgio Pinto, Direito do Trabalho, 28ª Edição, Editora Atlas, São Paulo, 2012, pág. 3.

4
entre o trabalhador e a pessoa beneficiária do seu trabalho passou a consubstanciar a relação
que viria a ser conhecida como regime de emprego, dando origem, também, ao salário. Sem
dúvida, o Direito do Trabalho, o contrato de trabalho e o salário tiveram o seu marco inicial
de desenvolvimento na Revolução Industrial.11

2. O DIREITO DE TRABALHO
2.1. Noções Gerais

O Direito do Trabalho pode ser conceituado como o ramo do Direito que tem
por objecto as normas, as instituições jurídicas e os princípios que disciplinam as relações de
trabalho subordinado, determinam os seus sujeitos e as organizações destinadas à protecção
desse trabalho em sua estrutura e actividade. Esse ramo do Direito disciplina as relações
existentes entre empresários e trabalhadores ou as entidades sindicais que os representam,
visando a assegurar ao trabalhador melhores condições de trabalho e sociais, por meio de
medidas de protecção (normas jurídicas protectívas) que lhes são destinadas, tendo em vista o
facto de o trabalhador, em razão de sua inferioridade económica, representar o lado mais fraco
nas relações trabalhistas.12

O Direito do Trabalho é o “conjunto de princípios, normas e instituições,


aplicáveis à relação de trabalho e situações equiparáveis, tendo em vista a melhoria da
condição social do trabalhador, através de medidas protectoras e da modificação das
estruturas sociais.13 O Direito Material do Trabalho, compreendendo o Direito Individual e o
Direito Coletivo e que tende a ser chamado, simplesmente, de Direito do Trabalho, no sentido
lato, pode, finalmente, ser definido como: complexo de princípios, regras e institutos jurídicos
que regulam a relação empregatícia de trabalho e outras relações normativamente
especificadas, englobando, também, os institutos, regras e princípios jurídicos concernentes às
relações coletivas entre trabalhadores e tomadores de serviços, em especial através de suas
associações coletivas.14

11
DELGADO, Maurício Godinho, Curso de Direito do Trabalho. 17. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: LTr,
2018, pág. 12.
12
PAULO, Vicente e ALEXANDRINO, Marcelo, Manual de Direito do Trabalho…, Ob. Cit, , pag. 9.
13
MAGANO, Octavio Bueno. Manual de Direito do Trabalho. Parte Geral, 4. ed. São Paulo: LTr, 1991, p. 59.
14
DELGADO, Maurício Godinho, Curso de Direito de Trabalho…, Ob. Cit, , pág. 49.
5
2.2. Função do Direito de Trabalho

O movimento de redução e expansão do Direito do Trabalho tem reflexos na


fixação do seu próprio conceito. Em uma visão normativa, é afirmado que o Direito do
Trabalho corresponde ao conjunto de normas que disciplinam a relação de trabalho
subordinado, visando estabelecer as condições de contratação do trabalho humano a ser
prestado em favor de outrem mediante remuneração. Expandindo um pouco mais o
significado do Direito do Trabalho, é asseverado ser ele composto pelo conjunto de normas
que disciplinam a relação de trabalho subordinado, visando à tutela da parte mais vulnerável
nesta relação. Assim, à concepção normativa do Direito do Trabalho é acrescida uma
perspectiva finalística: o Direito do Trabalho disciplina a relação de trabalho subordinado,
mas o faz com a finalidade de promover a defesa do trabalhador, na condição de parte mais
vulnerável nesta relação. Note-se, porém, que o trabalhador, nesta perspectiva, é protegido
apenas por ser a parte mais fraca em uma relação contratual, em uma espécie de justiça
contratual imposta pelo Direito do Trabalho.15

Dando um passo adiante e considerando a questão sob a óptica de que a todos


devem ser asseguradas condições de trabalho e de vida que estejam em harmonia com a
dignidade humana, é sustentado que o Direito do Trabalho é formado pelo conjunto de
normas que disciplinam a relação de trabalho subordinado, visando tutelar e promover a
dignidade humana daqueles que dependem da alienação da sua força de trabalho para atender
às suas necessidades próprias e familiares. Destarte, são mantidas as concepções normativa e
finalística do Direito do Trabalho, mas com um ganho de conteúdo, na medida em que ao
Direito do Trabalho é atribuída a finalidade de tutela e promoção da dignidade humana, o que
implica atribuir significado humano ao Direito do Trabalho. “O homem possui uma
dignidade. Realizar tal dignidade é a missão especial do Direito do Trabalho. Sua função
consiste em evitar que o homem seja tratado igual às coisas. Quem quiser compreender o
espírito do Direito do Trabalho deve ver dominar esta ideia fundamental nas múltiplas
disposições que contem”.16

15
ALVES, Amauri César. Direito do Trabalho Essencial, doutrina, legislação, jurisprudência, exercício. São
Paulo: LTr, 2013, pag. 15.
16
ALVES, Ivan Dias Rodrigues e MALTA, Christovão Piragibe Tostes. Teoria e Prática do Direito do
Trabalho. São Paulo: LTr, 1995, pag. 26.
6
2.3. Natureza Jurídica do Direito do Trabalho

A Natureza Jurídica é a busca da essência de determinado instituto. É uma


precisa definição do ordenamento que envolve a matéria jurídica, contendo seus elementos
fundamentais que vão ajudar a definir o direito, que em nosso caso, o Direito do Trabalho.
Temos a palavra-chave “essência” para descobrir o que é natureza jurídica. Esta palavra vem
do latim “Essentia” que significa dizer “a natureza íntima das coisas; aquilo que faz que uma
coisa seja o que é, ou que lhe dá aparência dominante; aquilo que constitui a natureza de um
objecto”.17 Todo instituto jurídico tem no sistema seu lugar próprio. Encontrá-lo é determinar-
lhe a natureza. A localização (sedes materiae) ajuda a compreensão e aplicação das regras
agrupadas. Analisar a natureza jurídica de um instituto é procurar enquadrá-lo na categoria a
que pertence no ramo do Direito.18

Encontrar a natureza jurídica de um instituto do Direito (ou até de um ramo


jurídico, como o Direito do Trabalho) consiste em se apreenderem os elementos fundamentais
que integram sua composição específica, contrapondo-os, em seguida, ao conjunto mais
próximo de fi guras jurídicas (ou de segmentos jurídicos, no caso do ramo justrabalhista), de
modo a classificar o instituto enfocado no universo de fi guras existentes no Direito.19

O Direito do Trabalho surge, historicamente, como um ramo do Direito


Privado. As relações individuais de trabalho estão regidas no Código de Napoleão, que
constitui a primeira codificação moderna, assim como na maioria dos códigos posteriores, por
ele em grande parte influenciados. Entretanto, é bom relembrar que as relações jurídicas se
adaptam ao tempo, e, no decorrer deste, sofrem inúmeras evoluções.20 Mas, esta natureza
pode ser dividida em Direito Público, Privado ou Misto que no caso passaremos a estudar
mais detalhadamente. No Direito do Trabalho observam-se diversas normas de caráter
cogente, ou seja, com natureza de ordem pública. Isso, no entanto, não significa que o Direito
do Trabalho seja considerado Direito Público, pois, não regula, de forma preponderante, a
actividade estatal, nem o exercício de seu poder de império. O carácter imperativo de certas
normas jurídicas apenas significa a relevância para a sociedade, na sua observância.21

18
GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Manual de Direito do Trabalho. 2º Ed. Revista e Atua. Editora Método:
São Paulo, 2010. Pág. 03.
19
BERNARDES, Hugo Gueiros. Direito do Trabalho. V. I. São Paulo: LTr, 1989, pag. 34.
20
CARVALHO, Augusto César Leite de. Direito Individual do Trabalho. 2. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2007,
pag. 12.
21
GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Manual de Direito do Trabalho…, Ob. Cit, Pág. 12.
7
Temos uma visão clara que a natureza do direito do trabalho pode ser dividida
em Direito Público, Privado, Misto, ou até mesmo Social e Unitário (o que serão pouco
abordados neste texto por sua mínima tese encontrado em um estudo geral). O direito do
trabalho sendo público ou objectivo, e privado ou subjectivo tem uma abrangência especial no
ramo do Direito. É difícil conceituar outros ramos do Direito positivo tendo mais de uma
natureza jurídica, que por sua vez, o Direito do trabalho pode se confundir entre direito
público e privado em nosso tempo contemporâneo. Porém, por mais que o direito do trabalho
possa ser visto como um direito público, o entendimento majoritário diz que este direito é
privado, pois seu centro visa o contrato de trabalho. A sua essência é a relação de empregado
e empregador, seja esta público ou privado, sendo assim, um contrato que os rege.22

É importante saber que a natureza do direito do trabalho foi definida como


“privado” não porque simplesmente o direito passou a existir e assim autores fizeram suas
denominações. Todo este conceito andou juntamente com a história, pois, com o determinado
tempo houve filosofias, pensamentos divergentes, política, que assim definiu este direito.23

3. O DIREITO DE TRABALHO MOÇAMBICANO


3.1. Evolução do Laboral Moçambicano
3.1.1. Evolução Legislativa
3.1.1.1. Lei nº 8/85, de 14 de Dezembro
Moçambique conheceu 3 (três) Constituições. Com a legislação laboral aconteceu
este mesmo fenómeno; Moçambique já viveu a publicação e entrada em vigor de 3 (três) Leis do
Trabalho. a começar pela Lei nº 8/85, de 14 de Dezembro, ao mesmo tempo que nos
debruçaremos sobre a legislação avulsa conexa com cada uma das três Lei de Trabalho.

Passamos a enumerar a legislação avulsa reguladora da duração do Trabalho,


produzida pelo novo ordenamento jurídico moçambicano, após a queda do regime colonial em
Moçambique, antes e depois da Lei nº 8/85, de 14 de Dezembro, mas anterior à segunda Lei do
Trabalho, como dissemos, influenciada pelas Convenções nº 1 e nº 30 da OIT. O conteúdo
relevante desta legislação pode ser consultado nos Anexos no s 3-8: a) Decreto-Lei no 5/77, de 20
de Janeiro; b) Despacho de 31 de Janeiro de 1977 (estabelece o horário das farmácias); c)
Despacho de 16 de Fevereiro de 1977 (estabelece os horários a praticar nos estabelecimentos de
venda de peças e sobressalentes para viaturas automóveis e casas de frescos); d) Despacho de 6
de Abril de 1977 (estabelece o horário a praticar pelos estabelecimentos de venda de ferragens e
materiais de construção, de máquinas e idênticos para indústria e agricultura e de equipamento e

8
material eléctrico para indústria); e) Decreto-Lei nº 23/77, de 28 de Maio (atribui competências
aos Governadores Provinciais e aos Ministros para, em casos específicos, determinarem
alterações nos horários de trabalho); f) Decreto nº 6/87, de 30 de Janeiro (fixa o regime jurídico
da duração de trabalho); g) Decreto nº 35/87, de 23 de Dezembro (estabelece o regime jurídico de
trabalho aplicável ao trabalhador-estudante ou em formação profissional no aparelho de Estado e
nas unidades económicas); h) Despacho de 29 de Abril de 1988 (esclarece dúvidas surgidas na
aplicação do Decreto nº 35/87, de 23 de Dezembro).

3.1.1.2. Lei no 8/98, de 20 de Julho

Em 1990 entra em vigor uma nova Constituição da República que, como dissemos,
representou um corte com a de 1975. Esta última fora moldada por ventos revolucionários do
Marxismoleninismo e a de 1990 orientada para um novo estado capitalista, de economia de
mercado e de justiça social.

Tendo ocorrido aquele corte constitucional, muitos, ou pelo menos alguns, dos
preceitos nucleares da primeira Lei do trabalho tinham caído em desuso ou feriam alguns dos
princípios da nova Constituição. É o caso da muito propalada exploração do homem pelo homem,
da luta contra o imperialismo, etc. Ao longo da análise da primeira Lei fizemos estas referências,
pelo que para aí remetermos a Leitura149. No entanto, e paradoxalmente, na vigência da segunda
Lei do Trabalho, aconteceram fenómenos pouco divulgados e também nunca falados, pelo menos
em debates públicos ou académicos, aos quais vamos dedicar o último espaço deste Capítulo.

Apenas para ficar claro, temos uma segunda Lei do trabalho para dar resposta a um
corte constitucional consubstanciado na mudança de uma economia centralizada para uma
economia de mercado, na mudança de um considerado sistema socialista para o capitalista.

3.1.2. A vida laboral do povo Moçambicano antes da penetração portuguesa

Mesmo antes da chegada dos portugueses, os primeiros Estados ou sejas as


primeiras povoações tinham um modo de exercer o trabalho dividindo-o por homens,
mulheres e crianças. Sendo que, as mulheres tinham a responsabilidade de trabalhar na
machamba, apanhar lenha, carregar àgua e cozinhar os alimentos. As crianças ajudavam as
mães na machamba, na recolha de vegetais, tomavam conta dos irmãos mais novos e
afugentavam os animais. Os homens iam à caça e à pesca acompanhados dos mais velhos.24

9
3.1.3. A Penetração Portuguesa

Com a chegada dos portugueses em Moçambique, em 1498, estes foram se


infiltrando-se nos reinos dos Mwenemutapas com ajuda das suas tropas privadas, às vezes por
acordos e outras vezes forçando-os.25

Com o processo de ocupação colonial do território que atualmente conhecemos


como Moçambique, entre o final do século XIX e o início do XX, e a consequente
burocratização desse domínio, novas identidades foram criadas. A lógica colonial não era
mais a do comércio de escravos, nem deveria refletir as diferenças entre escravizados e
homens livres. Tornava-se necessário construir a imagem de inferiorizados a partir de uma
perspectiva racial, de modo que o mundo dos brancos representasse a "civilização" e o mundo
dos negros a "selvageria", com ênfase na ideia de que seres humanos "primitivos" eram
incapazes de se organizar, política e socialmente, sozinhos. A dicotomia passava a ser entre
civilizado europeu e selvagem (ou bárbaro) africano. Assim ficava mais fácil justificar a
exploração e o domínio colonial como ações humanitárias, através do discurso de que pessoas
"evoluídas" levavam a razão e a ciência aos povos incivilizados. A idéia de "indígena" veio
justamente aglutinar todas essas supostas características inferiorizantes criadas para os povos
colonizados. Através de políticas administrativas e jurídicas, grupos distintos foram reduzidos
a apenas um indivíduo - o "indígena".26

Neste período, o trabalho não era visto como um acto de dignidade, mas sim
uma repressão ou punição. O trabalho prisional foi o primeiro recurso utilizado pelos
colonizadores, aplicado através de multas de trabalho aos "indígenas" quando condenados por
"embriaguez, desordem, ofensa à moral e ao pudor, desobediência às autoridades e infracções
dos regulamentos policiais".27 Durante a administração da Companhia do Niassa foram
utilizados outros mecanismos violentos para adquirir braços para o trabalho forçado. Em
1894, a prisão foi substituída pela condenação ao trabalho forçado, enquanto, em 1903, o
imposto a ser pago pelos "indígenas" passou a ser trocado por trabalho. O trabalho forçado foi

25
BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho…, Ob. Cit, pag.84.
26
BARREIROS, José António. As instituições criminais em Portugal no século XIX: subsídios para sua a
história. Análise Social Lisboa, vol. XVI (63), 1980, pag. 87.
27
ZAMPARONI, Valdemir. Da escravatura ao trabalho forçado: teorias e práticas. Africana Studia, nº 7.
Edição da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2004, pag. 303.
10
usado em vários setores da economia colonial, com maior frequência na abertura de estradas,
em obras públicas e no cultivo das machambas (plantações).28

3.1.3.1. A Lei do Trabalho Forçado

Os portugueses, para melhor explorar as populações criaram leis sobre o


trabalho forçado, as quais eles chamavam “política Laboral indígena” ou “sistema de trabalho
indígena”. Estas leis, segundo António Enes tinham a finalidade de obrigar o africano a
trabalhar, porque ele por sua iniciativa, nunca o faria, dada a sua “inferioridade natural”.29

Estas leis, segundo António Enes tinham a finalidade de obrigar o africano a


trabalhar, porque ele por sua iniciativa, numa o faria, dada a sua “inferioridade natural”. Em
1899, é criado o “código de trabalho”, que defendia que o trabalho forcado é justo e legal.
Este trabalho é conhecido por xibalo, em que os indígenas tinham a obrigação de trabalhar,
caso não fizessem, a autoridade poderia recorrer a força.30 As populações eram obrigadas a
pagar o imposto de palhota em dinheiro, caso não pagassem, eram presas e enviadas para o
trabalho forçado nas plantações, na construção de estradas.31 Todas essas atrocidades
perpetradas pelo colonialismo tiveram como seu fim com a conquista da independência a 25
de Junho de 1975, dai surge um novo Direito moçambicano, com a constituição de 1975, este
que veio a consagrar o trabalho e a educação constituindo direitos e deveres de cada cidadão,
e cabia ao Estado a materialização dos mesmos.32

3.1.4. A Constituição de 1975

Tendo como um dos objectivos fundamentais “a eliminação das estruturas de


opressão e exploração coloniais... e a luta contínua contra o colonialismo e o imperialismo”,
foi instalado na República Popular de Moçambique (RPM) o regime político socialista e uma
economia marcadamente intervencionista, onde o Estado procurava evitar a acumulação do
poderio económico e garantir uma melhor redistribuição da riqueza. O sistema político era
caracterizado pela existência de um partido único e a FRELIMO assumia o papel de dirigente.
Eram abundantes as fórmulas ideológicas - proclamatórias e de apelo das massas, compressão

28
MEDEIROS, Eduardo da Conceição. História de Cabo Delgado e do Niassa (c. 1836-1929). Maputo:
Arquivo Histórico de Moçambique, 1997, p.p. 178-180.
29
BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 5. Ed. Ver. E ampl. São Paulo: LTr. 2009.pag.86
30
Idem, pag.87
31
Idem, pag.87
32
DORIGO, Gianpaolo; VICENTINO, Cláudio. História Geral do Direito do Trabalho. 1. ed. São Paulo:
Scipione, 2010.pag.90.
11
acentuada das liberdades públicas em moldes autoritários, recusa de separação de poderes a
nível da organização política e o primado formal da Assembleia Popular Nacional.33

Na República Popular de Moçambique o trabalho é dignificado e protegido, e é


a forca motriz do desenvolvimento. O trabalho é um direito e um dever para todos os cidadãos
de ambos os sexos, e constitui critério para a distribuição da riqueza nacional.34

3.1.5. A Constituição de 1990

A revisão constitucional ocorrida em 1990 trouxe alterações muito profundas


em praticamente todos os campos da vida do País. Estas mudanças que já começavam a
manifestar-se na sociedade, principalmente na área económica, a partir de 1984, encontram a
sua concretização formal com a nova Constituição aprovada. Resumidamente, podemos citar
alguns aspectos mais marcantes: Inserção de regras básicas da democracia representativa e da
democracia participativa e o reconhecimento do papel dos partidos políticos; Na área
económica, o Estado abandona a sua anterior função basicamente intervencionista e gestora,
para dar lugar a uma função mais reguladora e controladora (previsão de mecanismos da
economia de mercado e pluralismo de sectores de propriedade); Os direitos e garantias
individuais são reforçados, aumentando o seu âmbito e mecanismos de responsabilização. A
CRM de 1990 sofreu três alterações pontuais, designadamente: duas em 1992 e uma em
1996.35

O trabalho constitui direito e dever de cada cidadão independentemente do


sexo. Cada cidadão tem direito à livre escolha da profissão. O trabalho compulsivo é proibido,
exceptuando - se o trabalho realizado no quadro da legislação penal.36 Com certeza, em
virtude desta, existia uma lei que regia o trabalho na época, sendo a Lei 8/98 de 20 de Julho,
esta que definia os princípios gerais e estabelecia o regime-jurídico aplicável as relações
individuais e colectivas de trabalho.

33
Jorge Miranda, Direito Constitucional, Tomo I, 6ª Edição, Coimbra Editora, 1997, pg. 237
34
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Constituição da República de Moçambique, in Boletim da República I
SÉRIE n. 44, de 6 de Outubro de 1975, .art. 7.
35
Jorge Miranda, Direito Constitucional, Tomo I, 6ª Edição, Coimbra Editora, 1997, pg. 238.
36
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Constituição da República de Moçambique, in Boletim da República I
SÉRIE n. 44, de 2 de novembro de 1990, .art. 88
12
3.1.5.1. A Constituição de 2004

Esta é a última revisão constitucional ocorrida em Moçambique. Fora aprovada


no dia 16 de Novembro de 2004. Não se verifica com esta nova Constituição uma ruptura com
o regime da CRM de 1990, mas sim, disposições que procuram reforçar e solidificar o regime
de Estado de Direito e democrático trazido em 1990, através de melhores especificações e
aprofundamentos em disposições já existentes e também pela criação de novas figuras,
princípios e direitos e elevação de alguns institutos e princípios já existentes na legislação
ordinária à categoria constitucional. Um aspecto muito importante de distinção desta
constituição das anteriores é o “consenso” na sua aprovação, uma vez que ela surge da
discussão não só dos cidadãos, como também da Assembleia da República representada por
diferentes partidos políticos (o que não se verificou nas anteriores).37

4. O DIREITO DE TRABALHO CONTEMPORÂNEO MOÇAMBICANO


4.1. Generalidades

Moçambique regulamenta o trabalho subordinado. A configuração da relação


de emprego é obrigatória, independentemente da vontade das partes, desde que estejam
presentes os pressupostos que o ordenamento jurídico estabelece para esse tipo de relação.
Essa obrigatoriedade decorre da necessária limitação da autonomia da vontade nas relações de
trabalho, em razão da diferença de poder ente suas partes.38 A lei já e consagra que define os
princípios gerais e estabelece o regime hurídico aplicável às relações individuais e colectivas
de trabalho subordinado, prestado por conta de outrem e mediante remuneração.39

A subordinação consistente na situação jurídica derivada do contrato de


trabalho, pela qual o trabalhador se compromete a acolher o poder de direcção empresarial no
tocante ao modo de realização de sua prestação laborativa. Manifesta-se pela intensidade de
ordens do tomador de serviços sobre o respectivo trabalhador. A subordinação constitui uma
necessidade técnica que corresponde às exigências da produção moderna na empresa, a qual é
também uma organização hierarquizada de pessoas. Nasce da necessidade de organização de

37
Jorge Miranda, Direito Constitucional…, Ob. Cit, , p.p.. 239-240.
38
ROMITA. Arion Sayão. Direitos Fundamentais nas Relações de Trabalho. 3. ed. São Paulo: Ltr, 2009, pag.
15.
39
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Lei n.º 23/2007, de 1 de Agosto que aprova a Lei do Trabalho, publicada
no BR n.º 31, I Série, Imprensa Nacional de Moçambique, 23 de Agosto, art. 12.
13
trabalho, sendo impraticável o seu desaparecimento, muito embora possa ser atenuada pela
dita democracia industrial.40

A subordinação e o poder de direcção são verso e reverso da mesma medalha: a


subordinação é a situação em que fica o empregado e o poder de direcção é a faculdade
conferida ao empregador. Ambas se completam, de modo que em um processo judicial é
recomendável seguir uma directriz para se concluir se há ou não subordinação, tal como a
verificação da quantidade e intensidade de ordens permanentes de serviço a que está sujeito o
trabalhador.41 A subordinação corresponde ao polo antitético e combinado do poder de
direcção existente no contexto da relação de emprego. Consiste, assim, na situação jurídica
derivada do contrato de trabalho, pela qual o empregado compromete-se a acolher o poder de
direcção empresarial no modo de sua prestação de serviços.42

A característica que verdadeiramente individualiza o contrato de trabalho é a


subordinação jurídica, como já se aludiu por diversas vezes. Esta consiste no facto de, durante
a execução da sua actividade, o trabalhador permanecer sob a autoridade e direcção do
empregador e, por isso, estar obrigado a conformar-se com as ordens e instruções que lhe são
dadas, sejam directamente por aquele sejam por intermédio dos seus superiores hierárquicos.
O conteúdo ou a intensidade deste vínculo de subordinação não é idêntico em todos os
contratos de trabalho, podendo variar conforme a natureza das funções ou as condições em
que estas são prestadas. Com efeito, quanto mais complexas forem as tarefas que o
trabalhador desempenha menor será o poder de conformação do empregador; de igual modo,
a subordinação será menor se o trabalhador exerce as suas tarefas fora das instalações da
empresa ou do local habitual da actividade do empregador (é o caso, por exemplo, dos
motoristas).43

4.2. Sujeitos Controvertidos

Estas figuras surgem em virtude da relação de trabalho que se forma, esta é


todo conjunto de condutas, direitos e deveres estabelecidos entre o empregador e trabalhador,

40
XAVIER, Lobo, Curso de Direito do Trabalho, 3ª ed., Verbo, Lisboa, 2004, p. 290.
41
PINTO, Geraldo Augusto. A organização do trabalho no século 20: taylorismo, fordismo e toyotismo. 2. ed.
São Paulo: Expressão Popular, 2010, pag. 16.
42
DELGADO, Gabriela Neves. Direito fundamental ao trabalho digno. São Paulo: LTr, 2006, pag. 311.
43
SUSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANNA, Segadas; TEIXEIRA, Lima. Instituições de Direito
do Trabalho. 22. ed. atual. por Arnaldo Sussekind e João de Lima Teixeira Filho. São Paulo: LTr, 2005, pag. 45.
14
relacionados com a entidade laboral ou serviços prestados ou que devam ser prestados e, com
o modo como essa prestação deva ser efectuado.44

4.2.1. Personalidade e Capacidade Jurídica

Personalidade é um atributo, ou seja, uma qualidade voltada ao ser humano. Ou


seja, uma particularidade à pessoa humana que goza de direitos e obrigações. Contudo,
existem ainda, entidades e conjuntos de bens que também são dotados de personalidade
jurídica, tais como às associações, sociedades, fundações entre outras organizações.45

A personalidade pertence a todo e qualquer indivíduo como sendo sujeitos de


direitos. É, portanto, um atributo voltado ao ser humano, ou seja, pessoa humana. Destaca-se
que o Direito existe em razão dos homens, porque sua causa material está nas relações
pessoais, bem como nos acontecimentos mais significativos voltados à harmonia da vida em
sociedade. Isto é, o Direito foi instituído especificamente para atender o ser humano no seu
convívio diário com outras pessoas.46 Os conceitos de pessoa e de personalidade são de
extrema importância para que se possam compreender o sistema jurídico que concede direitos
e impõe deveres. Tal sistema abrange desde os direitos fundamentais das pessoas até
pequenas acções do quotidiano humano.47

Ressalta-se que a condição de pessoa vai além do ordenamento jurídico, pois


seu sentido e significado “acompanham o ser humano através dos séculos e nas mais diversas
ciências humanas”. Isto acontece em virtude da sua realidade ontológica. a concepção de
pessoa aconteceu de forma bem menos acelerada à ideia normativa, porque, no que concerne
à definição de pessoa, fazia-se necessário uma intensa abstracção, além de contraposições que
somente a História foi aprimorando. Nos termos da Lei de Trabalho, o conceito e regime de
personalidade jurídica segue os mesmos contornos do CC, apresentando a ideia de que as
pessoas adquirem esta com o nascimento completo e com vida, e cessa com a morte.48

44
. REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Lei n.º 23/2007, de 1 de Agosto que aprova a Lei do Trabalho, publicada
no BR n.º 31, I Série, Imprensa Nacional de Moçambique, 23 de Agosto, art. 19.
45
PINTO, Carlos Alberto da Mota et al, Teoria Geral do Direito Civil. 4.a ed., Coimbra: Coimbra Editora, 2012,
p. 98
46
PONTES DE MIRANDA, Tratado de Direito Privado: pessoas físicas e jurídicas, tomo I, São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2012, p. 243
47
DANTAS, Fabiana Santos - Direito Fundamental à memória. Curitiba: Juruá Editora, 2010, pag. 76.
48
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Decreto-Lei n° 47 344, de 25 de Novembro de 1966, que aprova o novo
Código Civil, in Portaria n°22 869, de 4 de Setembro de 1967, art- 66-68.
15
A Capacidade é um conceito que, por muitas vezes, é confundido com a
personalidade. Entretanto, existe diferença entre esses dois conceitos. A Capacidade é a
projecção da personalidade de determinada pessoa, que pode ser quantificada para definir a
aptidão para titularizar direitos, assumir deveres, praticar actos e celebrar negócios jurídicos.
A capacidade de alguém é a aptidão que o agente possui de contrair obrigações e adquirir
direitos.49

Na Lei de Trabalho a capacidade para celebrar contratos de trabalho rege-se


pelas regras gerais do direito e pelas normas especiais constantes da presente lei.50

4.2.2. Trabalho de Menores

Em virtude da personalidade e capacidade jurídica, com certeza, por conta das


limitações impostas aos dois tipos de capacidade do Código Civil, podem surgir
controvérsias. A questão do trabalho de menores é consagrada na Lei, esta que estabelece que
o empregador deve, em coordenação com o organismo sindical competente, adoptar medidas
tendentes a proporcionar ao menor condições de trabalho adequadas à sua idade, saúde,
segurança, educação e formação profissional, prevenindo quaisquer danos ao seu
desenvolvimento físico, psíquico e moral. O empregador não deve ocupar o menor, com idade
inferior a dezoito anos, em tarefas insalubres, perigosas ou as que requeiram grande esforço
físico, definidas pelas autoridades competentes, após consulta às organizações sindicais e de
empregadores. O período normal de trabalho do menor cuja idade esteja compreendida entre
quinze e dezoito anos, não excederá trinta e oito horas semanais e o máximo de sete horas
diárias.51

4.3. PRINCÍPIOS DO DIREITO DE TRABALHO MOÇAMBICANO

Inicialmente, apresenta-se como conceito de princípios, assim pode-se dizer


que é onde começa algo, o início de tudo, a origem, o começo, a causa. A definição de
princípio e o que se traduz, na linguagem corrente, a ideia de “começo, início” e, “o primeiro
momento da existência de algo ou de uma acção ou processo”52. Contudo, esse não é o

49
DA SILVA, J. A.; Curso de Direito Constitucional Positivo, 31.ª Edição, Malheiros Editores, São Paulo,
2008, pag. 122.
50
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Lei n.º 23/2007, de 1 de Agosto que aprova a Lei do Trabalho, publicada
no BR n.º 31, I Série, Imprensa Nacional de Moçambique, 23 de Agosto, art. 22.
51
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Lei n.º 23/2007, de 1 de Agosto que aprova a Lei do Trabalho, publicada
no BR n.º 31, I Série, Imprensa Nacional de Moçambique, 23 de Agosto, art. 23.
52
HOUAISS, Antônio, ET alii. In: Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva,
2001.p. 2299.
16
princípio que buscamos aqui e sim seu significado perante o direito. O estudo da Teoria dos
Princípios nos revela a importância do lugar que ocupam os “princípios” no sistema jurídico
moderno, enquanto normas de grande relevância que expressam ideais morais, compondo um
modelo se sistema em que as normas jurídicas se expressam por meio de princípios e regras e
se aplicam por meio de um procedimento. Então, o que são princípios?

São verdades fundantes de um sistema de conhecimento, como tais admitidas,


por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por motivos de ordem
prática de carácter operacional, isto é, como pressupostos exigidos pelas necessidades da
pesquisa e da práxis.53 Para a concepção jusnaturalista, os princípios são metajurídicos,
situam-se do direito positivo, sobre o qual exercem uma função corretiva e prioritária, de
modo que prevalecem sobre as leis que os contrariam, expressando valores que não podem ser
contrariados pelas leis positivas, uma vez que são regras de direito natural.54

Já para o positivismo jurídico os princípios estão situados no ordenamento


jurídico, nas leis em que são plasmados, cumprindo uma função integrativa das lacunas, e são
descobertos de modo indutivo, partindo das leis para atingir as regras mais gerais que delas
derivam, restritos, portanto, aos parâmetros do conjunto de normas vigentes, modificáveis na
medida em que os seus fundamentos de direito positivo são alterados.55

Em busca de compreender o real significado jurídico da palavra ―princípio‖, é


necessário compreender como são definidos os princípios pela Teoria Geral do Direito.
Define-se os Princípios Gerais do Direito da seguinte maneira: A nosso ver, princípios gerais
de direito são enunciados normativos de valor genérico, que condicionam e orientam a
compreensão do ordenamento jurídico, que para sua aplicação e integração, quer para a
elaboração de novas normas. Cobrem, desse modo, tanto o campo da pesquisa pura do direito
quanto de sua actualização prática. Alguns deles se revestem de tamanha importância que o
legislador lhes confere força de lei, com a estrutura de modelos jurídicos, inclusive no plano
constitucional, consoante dispõe nossa Constituição sobre os princípios da isonomia
(igualdade de todos perante a lei), de irretroactividade da lei para a protecção dos direitos
adquiridos, etc.56

53
REALE, Miguel. Lições Preliminares do Direito. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 2002.p. 303.
54
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho. 25ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 443.
55
Idem, 443.
56
REALE, Miguel. Lições Preliminares do Direito. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 2002.p. 304-305.
17
Os princípios fundamentais não são por si normas nem leis, apesar de apare-
cerem em vários instrumentos legais. São eles ideais que fundamentam toda a dinâmica das
leis. Eles podem se dividir em princípios constitucionais, que dominam a totalidade de uma
nação e princípios especiais, que são próprios do sector em análise, e no nosso caso, a Lei do
Trabalho.57

4.3.1. Princípios Fundamentais

Os princípios constitucionais do Direito do Trabalho podem ser divididos em


três grupos, a saber, princípios constitucionais do Trabalho, de carácter afirmativo; os
princípios constitucionais gerais aplicáveis ao Direito do Trabalho, entre os quais se destaca o
da vedação do retrocesso social; e, por fim, os princípios clássicos do Direito do Trabalho,
estes preexistentes, mas que foram incorporados à Lei de Trabalho.

Fundamentalmente, a organização económica e social da República de


Moçambique visa a satisfação das necessidades essenciais da população e a promoção do
bem-estar social e assenta nos seguintes princípios fundamentais: valorização do trabalho, nas
forças de mercado, na iniciativa dos agentes económicos, na coexistência do sector público,
do sector privado e do sector cooperativo e social, na propriedade pública dos recursos
naturais e de meios de produção de acordo com o interesse colectivo, na protecção do sector
cooperativo e social do crescimento e desenvolvimento económico e social.58 Assenta o
crescimento e desenvolvimento económico e social.59 Assenta também nos direitos de
coordenação, justiça, igualdade, liberdade de associação, liberdade de constituir e participar
de um partido político, , liberdade de consciência, de religião e de culto, o direito de recorrer
aos tribunais, infância e juventude, direito a retribuição e segurança no trabalho, incapacidade
na velhice, protecção trabalhadores portadores de HIV.60

4.3.2. Princípios específicos da Legislação Trabalhista

Os princípios do Direito do Trabalho são as razões lógicas desse ordenamento


jurídico, desse sistema, e que lhe dão o “sentido ético-político”. Os princípios jurídicos só
podem reflectir os valores e distorções que compõem a complexidade do sistema social e,
57
Os princípios são inculcados em lei, sendo estes a hegemonia.
58
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Constituição da República de Moçambique, in Boletim da República I
SÉRIE n. 51, de 22 de Dezembro de 2004, Actualizada pela Lei no 1/2018, de 12 de Junho .art. 97.
59
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Constituição da República de Moçambique, in Boletim da República I
SÉRIE n. 51, de 22 de Dezembro de 2004, Actualizada pela Lei no 1/2018, de 12 de Junho .art. 97.
60
ITF AFRICA, Compreendendo a lei do trabalho: um guia para sindicalistas, s/ed., Editora da ITF, Nairobi,
pag. 9-12.
18
posto que recepcionados pelo ordenamento jurídico, interferem na sua formação estrutural”.
Os princípios podem e devem ser qualificados como a síntese ou reflexo dos elementos
externos (sociais) que internalizados no sistema jurídico, passam a integrar a sua própria
estrutura”, ou seja, são reveladores de valores sociais, “reflectindo um modelo de conteúdo
que é adoptado pelo sistema jurídico, pelas suas normas internas, a partir da integração do
elemento valorativo revelado pelo ambiente social.61

4.3.2.1. Princípio da Liberdade Contratual

A autonomia privada não se baseia somente na autodeterminação e na


liberdade dos sujeitos para a formação de negócios jurídicos, tal como era visto com a
autonomia da vontade. Na teoria da autonomia privada não bastaria o puro consenso
suficiente para criar direito. É imprescindível ou que este consenso seja previsto como
legítimo pelo ordenamento jurídico, ou, ao menos, que este consenso não seja proscrito pelo
ordenamento jurídico. Noutras palavras, não bastaria a manifestação de vontade para que os
sujeitos se obrigassem, senão era necessária a observância de certos pressupostos de validade.
Partindo-se do pressuposto de que a autonomia privada consiste numa liberdade de
negociação dentro dos limites impostos pelo ordenamento jurídico, cabe por ora analisar a
autonomia privada dentro da relação de emprego. Primeiramente, tem-se que se ter em mente
que os direitos trabalhistas são direitos fundamentais sociais, passíveis de protecção estatal.
Tal protecção é vista sob um prisma intervencionista, de modo que o Estado consagra certos
direitos trabalhistas, permitindo um melhor desenvolvimento da relação de emprego.62

A intervenção estatal ganha força em razão da constatação de que a relação de


emprego é, em sua génese, desequilibrada. Tem-se, de um lado, o empregador, detentor de um
poder social e económico, e, de outro, o trabalhador, parte débil da relação de emprego. A
necessidade de expansão da legislação trabalhista no sentido protectivo vem do ideal marxista
de que o proprietário era quem massacrava o operário e não lhe repassava o total daquilo que
era por seu direito, colocando-o em situação de inferioridade e carente de protecção estatal.63

61
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho. 20. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva,
2005, pag. 34.
62
BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Disponibilidade dos direitos da personalidade e autonomia privada.
2. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 52-53.
63
MOLINA, André Araújo; GUERRA FILHO, Willis Santiago. Renúncia e transação no direito do trabalho –
uma nova visão constitucional à luz da teoria dos princípios. Revista LTr – Legislação do Trabalho, São Paulo,
v. 74, n. 02, fev. 2010, p. 191.
19
O contrato de trabalho rege-se pelo princípio de liberdade. É pressuposto deste
princípio que as partes, o trabalhador e entidade empregadora, são livres de fixar, alterar,
modificar as cláusulas que regem o contrato, desde que não violem os princípios e regras
estabelecidas na Lei do Trabalho.64

4.3.2.2. Princípio da não discriminação

O princípio da não discriminação supõe que deve ser dado um cuidado igual a
indivíduos em situações iguais e implica a existência de uma norma que determine essa
igualdade de tratamento.65

Este princípio que, em bom rigor, está ligado com o princípio da igualdade
estabelecido na Constituição, este que pressupõe que todos os cidadãos são iguais perante a lei
goza dos mesmos direitos, e estão sujeitos aos mesmos deveres, independentemente da cor,
raça, sexo, origem étnica, lugar de nascimento, religião, grau, de instrução, posição social,
estado civil dos pais, profissão ou opção política.66 E o homem e a mulher são iguais perante a
lei em todos os domínios da vida política, económica, social e cultural.67

Na lei laboral, estão consagrados alguns aspectos em relação a não


discriminação, consequentemente a promoção da igualdade. O empregador deve promover a
adopção de medidas adequadas para que o trabalhador com deficiência ou portador de doença
crónica goze dos mesmos direitos e obedeça aos mesmos deveres dos demais trabalhadores no
que respeita ao acesso ao emprego, formação e promoção profissionais, bem como às
condições de trabalho adequadas ao exercício de actividade socialmente útil, tendo em conta
as especificidades inerentes à sua capacidade de trabalho reduzida. O Estado, em coordenação
com as associações sindicais e de empregadores, bem como com as organizações
representativas de pessoas portadoras de deficiência, estimula e apoia, no quadro da promoção
do emprego, tendo em conta os meios e recursos disponíveis, as acções tendentes a

64
KEYNES, John Maynard. A teoria geral do emprego dos juros e do dinheiro. São Paulo: Nova Cultural,
1985, pag. 34.
65
CUNHA JÚNIOR. Dirley. Curso de Direito Constitucional. 2. ed. Bahia: Juspodivm, 2016, pag. 133.
66
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Constituição da República de Moçambique, in Boletim da República I
SÉRIE n. 51, de 22 de Dezembro de 2004, Actualizada pela Lei no 1/2018, de 12 de Junho .art. 35.
67
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Constituição da República de Moçambique, in Boletim da República I
SÉRIE n. 51, de 22 de Dezembro de 2004, Actualizada pela Lei no 1/2018, de 12 de Junho .art. 36.
20
proporcionar a reconversão profissional e a integração em postos de trabalho adequados à
capacidade residual de trabalhadores com deficiência.68

4.3.2.3. Princípio do Tratamento mais Favorável

O princípio de tratamento mais favorável é um dos princípios da própria Lei do


Trabalho. Este princípio preconiza que os instrumentos, regulamentos colectivos de trabalho e
contratos podem retirar normas não obrigatórias da Lei do Trabalho se as mesmas
estabelecerem condições mais favoráveis para o trabalhador. Na Lei do Trabalho existem
normas que não são de cumprimento obrigatório, deixando espaço para que a entidade
empregadora e o trabalhador façam regulamentos no exercício do princípio de liberdade
contratual. Ainda que assim, não podem, com pretexto de estar-se a exercer a liberdade
contratual, criar regras que conferem condições desfavoráveis ao trabalhador.69

Para explicar o princípio do tratamento mais favorável, importa relembrar que


o Direito do trabalho se autonomizou do Direito civil com vista a proteger o trabalhador.
Enquanto o direito civil coloca as partes no negócio jurídico em pé de igualdade, o direito do
trabalho surge para favorecer a parte mais fraca, e o favor laboratoris, num sistema jurídico
incipiente, serve para combater a desproteção do trabalhador, concedendo-lhe um estatuto
privilegiado. O princípio do tratamento mais favorável tem, contudo, de ser entendido num
contexto atual. Hoje, o Direito do trabalho, autonomizado do Direito civil, continua a
privilegiar a proteção do trabalhador subordinado, mas com normas próprias. As normas de
Direito do trabalho foram elaboradas tendo em vista a proteção do trabalhador – sem descurar
a tutela da empresa –, e como elas constituem, em si, um sistema coerente, retomar a ideia
tradicional do favor laboratoris é um contrassenso.70

4.3.2.4. Princípio da Liberdade de Associação

O direito à livre associação constitui uma garantia básica de realização pessoal


dos indivíduos na vida em sociedade. O Estado de Direito, respeitador da pessoa, não pode
impor limites à livre constituição de associações, senão os que forem directa e
necessariamente exigidos pela salvaguarda de interesses superiores e gerais da comunidade

68
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Lei n.º 23/2007, de 1 de Agosto que aprova a Lei do Trabalho, publicada
no BR n.º 31, I Série, Imprensa Nacional de Moçambique, 23 de Agosto, art. 28.
69
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Lei n.º 23/2007, de 1 de Agosto que aprova a Lei do Trabalho, publicada
no BR n.º 31, I Série, Imprensa Nacional de Moçambique, 23 de Agosto, art. 17.
70
VEIGA, António Jorge da Motta, Lições de Direito de Trabalho, 4ª Edição, Universidade Lisboa, Lisboa,
1992, p. 133.
21
política. No processo democrático em curso, há que suprimir a exigência de autorizações
administrativas que condicionavam a livre constituição de associações e o seu normal
desenvolvimento. O direito à constituição de associações passa a ser livre e a personalidade
jurídica adquire-se por mero acto de depósito dos estatutos. Exige-se das associações que se
subordinem ao princípio da especificidade dos fins e ao respeito pelos valores normativos que
são a base e garantia da liberdade de todos os cidadãos.71

Estabelecido também constitucionalmente, onde preconiza que os


trabalhadores têm a liberdade de se organizarem em associações profissionais ou em
sindicatos.72 O princípio de liberdade de associação na Lei do Trabalho traduz-se em aos
trabalhadores e empregadores é-lhes assegurado, sem discriminação e sem qualquer
autorização prévia, o direito de se constituírem em organização de sua escolha e de se filiarem
nelas para a defesa e promoção dos seus direitos e interesses.73

4.3.2.5. Princípio de Direito ao Trabalho

O Direito ao trabalho é estabelecido pela Constituição, e este configura-se o


direito e dever de cada cidadão, e cada cidadão tem o direito a livre escolha da sua profissão,
e o trabalho compulsivo é proibido, exceptuando-se o trabalho realizado no quadro da
legislação penal.74 O artigo seguinte a este consagra alguns princípios-direitos do trabalhador,
sendo estes a justa remuneração, descanso, férias, reforma, protecção, segurança, higiene no
trabalho, liberdade de associação e greve.75 Traduz-se em toda a pessoa tem direito de ter
acesso ao trabalho, desde que reúnam os requisitos exigidos ao posto76. O princípio de direito
de trabalho, complementa o princípio de igualdade, pois, a uma dada função onde certos
requisitos são exigidos, devem ser dados oportunidades iguais a todas as pessoas que

71
AMARAL, Lídia Miranda de Lima. Mediação e Arbitragem — uma solução para os confl itos trabalhistas
no Brasil. São Paulo: LTr, 1994, pag. 132.
72
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Constituição da República de Moçambique, in Boletim da República I
SÉRIE n. 51, de 22 de Dezembro de 2004, Actualizada pela Lei no 1/2018, de 12 de Junho .art. 86.
73
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Lei n.º 23/2007, de 1 de Agosto que aprova a Lei do Trabalho, publicada
no BR n.º 31, I Série, Imprensa Nacional de Moçambique, 23 de Agosto, art. 137.
74
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Constituição da República de Moçambique, in Boletim da República I
SÉRIE n. 51, de 22 de Dezembro de 2004, Actualizada pela Lei no 1/2018, de 12 de Junho .art. 84.
75
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Constituição da República de Moçambique, in Boletim da República I
SÉRIE n. 51, de 22 de Dezembro de 2004, Actualizada pela Lei no 1/2018, de 12 de Junho .art. 85.
76
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE, Constituição da República de Moçambique, in Boletim da República I
SÉRIE n. 51, de 22 de Dezembro de 2004, Actualizada pela Lei no 1/2018, de 12 de Junho .art. 84.
22
preenchem esses requisitos, considerando-se desde o princípio, como potenciais candidatos e
só se selecciona o melhor.77

77
BITTAR, Carlos Alberto. Curso de Direito Civil. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1994, v.1, pag. 54.
23
CONCLUSÃO

Conclui-se, portanto que, o trabalho em si não é estático e dispõe da


característica do dinamismo, sendo assim pressupomos que este está em constante evolução.
Quando olhamos para trás, não é nada difícil perceber que o trabalho humano se transformou
bastante com o passar dos séculos. A relação das pessoas com seus ofícios evolui de acordo
com as mudanças culturais e tecnológicas que passam a fazer parte das suas vidas. A história
do trabalho humano teve sua origem quando o ser humano buscou satisfazer suas
necessidades biológicas de sobrevivência.

Na economia de subsistência, o trabalhador decidia o que produzir, como


produzir, quando e a que ritmo, era dono do seu tempo. Não existia separação entre o espaço
familiar e o trabalho, optavam pela duração e a intensidade do trabalho, de acordo com as
necessidades de produção. À medida que as necessidades foram sendo satisfeitas, ampliaram-
se, contribuindo para a criação de novas relações, que passaram a determinar a condição
histórica do trabalho.

Pois bem, o sistema capitalista reduziu a actividade vital humana, ou seja, o


trabalho em emprego, e, no contexto actual, tirou da grande maioria da humanidade até
mesmo esta forma reduzida e exploradora através da qual homens e mulheres produziam suas
vidas. Destaca-se também que o Direito do Trabalho exige um acompanhamento contínuo às
evoluções na sociedade no que tange as relações trabalhistas, pois a cada momento surge uma
situação inovadora, a qual nem sempre existe respostas em códigos, leis e na Constituição
Moçambicana, razão pela qual o Direito do Trabalho deverá fazer uso de princípios,
analogias, direito comparado, jurisprudência e juízos de valores.

E assim a Justiça do Trabalho fará valer suas imposições através do uso de


interpretações flexíveis conjugadas com o que dispõe a lei, tendo uma aplicação mais
moderna e dinâmica. E quanto ao Direito de Trabalho Moçambicano, percebe-se que não
ficou por detrás, este seguiu as mesmas ideologias e dinâmicas, procurando estabelecer uma
hegemonia em virtude do trabalho subordinado através das leis protectoras da parte inferior
(trabalhador), como veremos adiante.

24
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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