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AÇÃO CIVIL EX DELICTO

Uma das consequências da prática de uma infração penal é a obrigatoriedade na reparação do dano sofrido pela
vítima (artigo 91, inciso I, do CP).

Chama-se ação civil ex delicto o processo de natureza cível decorrente da prática de um crime. Trata-se de pro-
cesso regido pelas regras do direito processual civil. Contudo, uma vez que a jurisdição é una, a decisão proferida
no processo criminal pode acarretar consequências na esfera cível.

Praticada uma infração penal, a vítima pode, desde logo, ajuizar um processo cível de conhecimento ou pode
aguardar a decisão criminal, já que, em caso de condenação, a sentença penal condenatória irrecorrível faz coisa
julgada também no juízo cível, ou seja, é titulo executivo judicial cível.

Assim, são legitimados para ação civil ex delicto o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros, que pode-
rão executar no cível a sentença penal condenatória transitada em julgado.

Até 2008, a sentença penal condenatória era título judicial certo e exigível, porém não era liquido. Com a reforma
o
implementada pela Lei n . 11.719/08, o inciso IV do artigo 387 do CPP passou a dispor:

Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória:

IV - fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos
pelo ofendido;

Portanto, hoje, ao condenar o réu criminalmente, o juiz deve fixar o quantum debeatur mínimo na sentença, que,
transitando em julgado, poderá desde logo ser executada perante o juízo cível, sem prejuízo da liquidação do
“plus”.

Contudo, a jurisprudência vem entendendo que a fixação dos valores na sentença condenatória criminal somente
poderá ocorrer em crimes praticados após a vigência da nova redação do inc. IV do artigo 387 do CPP, e desde
que respeitados os princípios da inércia, do contraditório e da ampla defesa. Vejamos:

RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIOS DUPLAMENTE QUALIFICADOS CON-


SUMADOS E HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO TENTADO. REPARAÇÃO PELOS DANOS CAUSA-
DOS À VÍTIMA PREVISTA NO ART. 387, INCISO IV, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. NORMA DE DIREI-
TO PROCESSUAL E MATERIAL. IRRETROATIVIDADE. NECESSIDADE DE PEDIDO EXPRESSO. SUBMISSÃO
AO CONTRADITÓRIO. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. A regra do art. 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, que dispõe sobre a fixação, na sentença condena-
tória, de valor mínimo para reparação civil dos danos causados ao ofendido, é norma híbrida, de direito processual
e material, razão pela que não se aplica a delitos praticados antes da entrada em vigor da Lei n.º 11.719/2008,
que deu nova redação ao dispositivo. 2. Para que seja fixado na sentença o início da reparação civil, com base no
art. 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, deve haver pedido expresso do ofendido ou do Ministério Públi-
co e ser oportunizado o contraditório ao réu, sob pena de violação ao princípio da ampla defesa. Precedentes. 3.
Recurso desprovido.

(STJ. REsp 1.193.083-RS. Quinta Turma. Rel. Ministra Laurita Vaz. J. 20/08/2013, DJe 27/8/2013. Informativo 528
do STJ)

Por outro lado, caso o réu venha a ser absolvido no processo criminal, a sentença absolutória não impedirá, via de
regra, um processo cível de conhecimento, no qual o ofendido poderá tentar demonstrar a responsabilidade civil
do agente sobre o fato praticado. Também não impedem a ação civil ex delicto o despacho de arquivamento do
inquérito ou das peças de informação e a decisão que julgar extinta a punibilidade.

Entretanto, impedem a ação civil ex delicto a absolvição fundada na inexistência material do fato e em excludentes
de ilicitude.

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Devemos estar atentos ao que dispõe o artigo 68 do CPP, que dá ao Ministério Público legitimidade para ação
civil ex delicto nos casos de vítima pobre. Trata-se de hipótese de inconstitucionalidade progressiva, uma vez que
o acesso à justiça nestes casos está hoje garantido pela institucionalização da Defensoria Pública.

COMPETÊNCIA NO PROCESSO PENAL

1. Competência constitucional

Justiça Comum (Federal e Estadual) e Justiça Especial (Eleitoral e Militar).

2. Distribuição da Competência conforme as regras processuais penais

Verificamos que a competência no Processo Penal tem suas regras de determinação no artigo 69, que dispõe:
“Determinará a competência jurisdicional: o lugar da infração; o domicilio do réu; a natureza da infração; a distri-
buição; a conexão e a continência; a prevenção; a prerrogativa de função.”

Os incisos I a IV do art. 69 são os critérios fixadores da competência, enquanto os incisos V a VII definem os crité-
rios modificadores da competência.

2.1. Competência pelo lugar da infração

O art. 70 do CPP diz que a competência pelo lugar da infração será determinada, em regra, pelo lugar onde o
crime produziu o seu resultado, e no caso de tentativa o lugar do último ato de execução. A competência pelo
lugar da infração a que se refere o art. 70 é aplicável aos crimes materiais.

Problema surge nos crimes consumados, uma vez que o Código de Processo Penal define como regra o locus
comissi delicti, ou seja, o local para processo e julgamento é o local da consumação do crime, o local onde o cri-
me produziu seu resultado.

Entretanto, sabemos que existem crimes chamados plurilocais, aqueles em que o local da ação é distinto do
local do resultado. Nestes casos, de acordo com o CPP, que não os diferenciou, o local para processo e julga-
mento seria o local onde se concretizou o resultado, muito embora as provas sejam melhor apuradas no local da
ação ou omissão. Por tal motivo, doutrina e jurisprudência são divergentes.

Para alguns, o melhor local para processo e julgamento dos crimes plurilocais seria o lugar onde estão as provas,
o que seria compatível com a teoria da atividade adotada pelo Direito Penal. No entanto, como o art. 70 do CPP
dispõe de outro modo, deve-se utilizar, de acordo com este posicionamento, a teoria da ubiquidade (art. 6º. do
CP), processando-se o agente no local da ação ou omissão, ou no local do resultado, o que seria definido pela
prevenção.

No caso de crimes à distância, os §§ 1º. e 2º. do art. 70 do CPP são expressos:

§ 1o Se, iniciada a execução no território nacional, a infração se consumar fora dele, a competência será determi-
nada pelo lugar em que tiver sido praticado, no Brasil, o último ato de execução.

§ 2o Quando o último ato de execução for praticado fora do território nacional, será competente o juiz do lugar em
que o crime, embora parcialmente, tenha produzido ou devia produzir seu resultado.

No caso de crimes formais não há disposição legal, o que se justifica pelo fato de que, nestes crimes, ação e
resultado são imediatos, não havendo dificuldades na definição da competência.

Nos crimes permanentes e continuados, prevê o § 3º. do mesmo art. 70, que a competência será definida pela
prevenção, o que se justifica pelo fato de que todos os locais seriam igualmente competentes.

Também não houve por parte do CPP disposição acerca dos crimes habituais, porém não é difícil compreender
que se aplica a estes casos a mesma ideia de prevenção.

Nos três casos (crimes permanentes, continuados e habituais), e ainda no local e território incerto, a prevenção
atua como verdadeiro critério fixador, uma vez que auxilia na definição da competência pelo lugar da infração.

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2.2. Competência pelo domicílio do réu

Utiliza-se domicílio do réu quando não se conhece do lugar da infração. É critério subsidiário, ao contrário do que
ocorre no Processo Civil.

Não podemos, entretanto, confundir lugar desconhecido com lugar incerto.

Local incerto ocorre quando a infração ocorreu no limite entre duas ou mais comarcas. Neste caso, o lugar é co-
nhecido. No entanto, permanece a dúvida sobre quem seria competente, já que, em tese, o crime ocorreu no limi-
te de todas aquelas jurisdições e todas elas poderiam, igualmente, processar o fato. Neste caso, a dúvida se re-
solve pela prevenção e não pelo domicílio do réu.

Além da hipótese de lugar desconhecido, o domicilio do réu é foro de eleição nos casos de ação penal privada,
quando a vítima pode escolher entre o lugar da infração e o domicílio do réu.

Importante ressaltar, ainda, que o domicílio do réu também é utilizado nos casos de extraterritoritoriedade, con-
forme dispõe o art. 88 do CPP:

2.3. Competência pela natureza da infração

A competência pela natureza da infração encontra amparo no art. 74 do CPP. Contudo, referido artigo nos remete
à organização judiciária de cada Estado.

Não há, portanto, uma regra específica para a distribuição das diversas espécies de crimes entre os órgãos juris-
dicionais, salvo nas hipóteses dos crimes dolosos contra a vida, cuja competência está constitucionalmente
garantida ao Tribunal do Júri, nas infrações de menor potencial ofensivo, em decorrência da Lei no. 9.099/95,
e, hoje, nas infrações de violência doméstica e familiar contra a mulher (Lei no. 11.340/2006).

2.4. Competência por distribuição

Segundo o art. 75 do CPP, a precedência da distribuição fixará a competência quando, na mesma circunscrição
judiciária, houver mais de um juiz igualmente competente.

2.5. Conexão

A conexão, prevista no art. 76 do CPP, ocorre nas hipóteses em que duas ou mais infrações são praticadas, pos-
suindo, entre elas, um mesmo nexo causal. Dependendo do nexo causal entre as infrações, três são as espécies
de conexão:

I – Subjetiva ou intersubjetiva, que se subdividem em:

a) por simultaneidade (se, ocorrendo duas ou mais infrações, houverem sido praticadas, ao mesmo tempo, por
várias pessoas reunidas);

b) por concurso ou concursal (por várias pessoas em concurso, embora diverso o tempo e o lugar);

c) por reciprocidade (por várias pessoas, umas contra as outras).

II – Objetiva ou material, lógica ou teleológica.

III – Processual, instrumental ou probatória.

No inciso I, o nexo causal se caracteriza através do vínculo entre as várias pessoas envolvidas, o motivo que as
leva à prática dos crimes, isolada ou conjuntamente. Daí falarmos em conexão subjetiva ou intersubjetiva.

Já o inciso II apresenta vínculos objetivos entre as diversas infrações. Ocorre quando uma infração é praticada
para facilitar ou ocultar outra, ou para conseguir impunidade ou vantagem em relação às demais.

Já o inc. III estabelece: “quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias elementares influ-
ir na prova de outra infração.

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2.6. Continência

A continência, prevista no art. 77 do CPP, também é causa de modificação da competência. Ocorre quando temos
uma única infração (uma única ação ou uma única omissão) e esta produz vários resultados, ou ainda quando foi
praticada por várias pessoas e, em decorrência, vários serão acusados pela mesma infração.

São, portanto, hipóteses de continência:

1) Concurso de agentes;

2) Concurso formal; aberratio ictus; aberratio criminis.


.
2.7. Prevenção

A prevenção atua como causa de modificação da competência nas hipóteses em que o juiz realiza ato jurisdicional
em processo no qual não seria territorialmente competente. Trata-se de competência relativa que é prorrogável,
sendo necessário lembrar da súmula 706 do STF.

Súmula 706 do STF: "É relativa a nulidade decorrente da inobservância da competência penal por prevenção".

2.8. Prerrogativa de função

Comparando todos os réus criminais do país, verificamos que os mesmos se encontram em uma mesma situação
dentro da relação jurídico-processual penal: são réus, polo passivo da relação jurídico processual penal.

No entanto, verificamos que determinados réus, em razão de relevante função exercida dentro das diversas esfe-
ras do poder estatal, possuem “força” hierárquica, certa influência, no exercício de cargos para os quais se exigiria
uma conduta pautada pela moralidade, legalidade e idoneidade. Receberam os mesmos, para o exercício daquela
função, um voto de confiança da sociedade, sendo certo que o último que se esperaria deles seria a prática de
crimes, devendo ser julgados por órgãos do Poder Judiciário que, ao menos em tese, não sofreriam dos mesmos
qualquer influência.

A título de exemplo, um juiz não pode ser julgado por outro juiz, que se poderia considerar seu colega ou ter sido
de alguma forma influenciado por ele durante sua formação.

Um juiz, portanto, não pode ser julgado pelos seus pares, devendo ser julgado por quem exerce a função jurisdici-
onal há mais tempo e que, na teoria, possua mais conhecimento da matéria, tenha mais experiência no exercício
da função. Por isso, juízes de primeira instância são julgados pelo Tribunal que reformaria suas decisões. Referido
Tribunal é isento para reformar sua decisão e, em consequência, deveria estar isento para julgá-lo pela suposta
prática de um crime.

Da mesma forma, desembargadores não podem ser julgados pelos próprios desembargadores do Tribunal a que
pertencem, devendo ser julgados pelo órgão que reformaria suas decisões, ou seja, o STJ, e assim por diante.
De maneira semelhante, se um prefeito comete um crime, a função por ele exercida se encontra, dentro do Poder
Executivo, em um mesmo nível hierárquico daquela exercida pelos juízes no Poder Judiciário. Portanto, se um
prefeito praticar um crime, o mesmo será julgado pelo Tribunal de Justiça, órgão que julgaria os juízes.
Dentro desta mesma sistemática conseguimos distribuir a maioria dos cargos que possui prerrogativa de função
fixada na Constituição Federal. Devemos, entretanto, tomar cuidado com eventuais exceções. A título de exemplo,
podemos citar os Conselheiros Municipais de Contas, que, embora atuem em nível municipal, possuem prerroga-
tiva de função para o STJ.

Observe, portanto, o gráfico abaixo:

STF
Presidente da Procurador-
Membros dos Senadores República Geral da Repú-
Ministros dos Tribunais Superiores
Tribunais de Deputados Fe- Vice-Presidente blica
Contas da União derais Ministros da Re- Chefes de Mis-
pública são Diplomática

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Ministros e Co- de caráter per-
mandantes das manente
Forças Armadas
STJ
Membros dos
Tribunais de
Desembargadores dos Tribunais
Contas dos Es- Membros do
de Justiça dos Estados e do Distri-
tados e do Dis- Governadores Ministério Públi-
to Federal
trito Federal dos Estados e do co da União que
Desembargadores dos Tribunais
Membros dos Distrito Federal oficiem perante
Regionais Federais
Conselhos ou tribunais
Desembargadores dos Tribunais
Tribunais de
Regionais Eleitorais e do Trabalho
Contas dos Mu-
nicípios
TJ TRF
Deputados Es-
taduais **
Juízes Federais
da área de sua
Juízes Estadu-
Membros do jurisdição Membros do
ais e do Distrito
Ministério Públi- Juízes da Justi- Prefeitos * Ministério Públi-
Federal e Terri-
co Estadual ça Militar co da União
tórios
Juízes da Justi-
ça do Trabalho
Secretários de
Vereadores **
Estado**

* Prefeitos têm prerrogativa estabelecida para o TJ, mas se o crime for federal são julgados no TRF.

** Deputados Estaduais, Vereadores e Secretários de Estado têm sua prerrogativa definida na Constituição Esta-
dual.

A prerrogativa aí estabelecida, para ser considerada constitucional, deve atender a dois critérios: simetria e não
contrariedade. Ou seja, a função exercida pelo ocupante do cargo deve ser semelhante a uma função desempe-
nhada por cargo que possua prerrogativa na Carta Magna (por não atender a este critério, p. ex., a prerrogativa
que determinadas CE estabeleceram para Delegados de Polícia foi considerada inconstitucional pelo STF). Já a
não contrariedade significa dizer que o disposto na CEstadual não pode contrariar texto da CFederal (critério con-
sagrado pela Súmula 721 do STF, que dispõe: A competência constitucional do tribunal do júri prevalece sobre o
foro por prerrogativa de função estabelecido exclusivamente pela constituição estadual.

Súmulas relevantes ao tema:

SÚMULA 704 STF. "Não viola as garantias do juiz natural, da ampla defesa e do devido processo legal a atração
por continência ou conexão do processo do corréu ao foro por prerrogativa de função de um dos denunciados."

SÚMULA 721 STF. “A competência constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de
função estabelecido exclusivamente pela Constituição Estadual.”

SÚMULA 208 do STJ. “Compete à Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal por desvio de verba sujei-
ta a prestação de contas perante órgão federal.”

SÚMULA 451 do STF. “A competência especial por prerrogativa de função não se estende ao crime cometido
após a cessação definitiva do exercício funcional.”

SÚMULA 704 do STF. “Não viola as garantias do juiz natural, da ampla defesa e do devido processo legal a atra-
ção por continência ou conexão do processo do corréu ao foro por prerrogativa de função de um dos denuncia-
dos.”

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minutos para cada aparte requerido, que serão acrescidos ao tempo desta última.

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