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APG 02

Caroline Macêdo.

01- Compreender a diferença entre convulsão e epilepsia.

02- Descrever a etiologia, fisiopatologia e manifestações clínicas da epilepsia. (Classificação das


crises parciais, generalizadas, epilepsia pós-traumática).

Patogênese/Fisiopatologia.

Atividade neuronal normal ocorre de maneira não sincronizada, com grupos de neurônios inibidos e
excitados sequencialmente durante a transferência de informações entre áreas encefálicas
diferentes. As convulsões ocorrem quando neurônios são ativados de maneira simultânea. O tipo de
convulsão depende da localização da atividade anormal e do padrão de disseminação a partes
diferentes do encéfalo.

Descargas em ponta interictais são observadas frequente- mente em registros de EEG de pacientes
epilépticos, e se devem à despolarização sincrônica de um grupo de neurônios em uma área
anormalmente excitável do encéfalo. Experimentalmente, isso é conhecido como desvio
despolarizante paroxístico e é seguido por um potencial subsequente hiperpolarizante, que é o
orrelato celular da onda lenta que se segue a descargas em ponta no EEG. O desvio é produzido por
correntes despolarizantes geradas em sinapses excitadoras e por influxo subsequente de sódio ou
cálcio por meio de canais com portão de voltagem.

Normalmente, neurônios excitadores descarregando ati- vam interneurônios inibidores próximos


que suprimem a atividade da célula em descarga e suas vizinhas. A maioria das sinapses inibidoras
utiliza o neurotransmissor GABA. Correntes de potássio com portão de voltagem e cálcio-depen-
dentes também são ativadas no neurônio em descarga para suprimir excitabilidade. Além disso, a
adenosina gerada a partir do trifosfato de adenosina (ATP) liberado durante a excitação suprime
adicionalmente a excitação neuronal por ligação a receptores de adenosina presentes em neurônios
próximos. A interrupção desses mecanismos inibidores por alterações nos canais iônicos, ou por
lesão de neurônios inibidores e sinapses, pode possibilitar o desenvolvimento de um foco con
vulsivo. Além disso, grupos de neurônios podem se tornar sincronizados se circuitos excitadores
locais forem ampliados por reorganização de redes neurais após lesão encefálica.

A disseminação de uma descarga local acontece por uma combinação de mecanismos. Durante o
desvio despolarizante paroxístico, potássio extracelular se acumula, despolarizando neurônios
próximos. A frequência aumentada de descargas amplia o influxo de cálcio para dentro de
terminações nervosas, aumentando a liberação de neurotransmissor em sinapses excitadoras por
um processo conhecido como potenciação pós-tetânica. Isso envolve influxo aumentado de cálcio
por meio de canais com portão de voltagem e por meio do subtipo N-metil-d-aspartato (NMDA) de
canais iônicos com portão de receptor de glutamato. Pelos canais com portão de receptor NMDA
passam preferencialmente íons cálcio, mas são relativamente quiescentes durante a transmissão
sináptica normal, porque são bloqueados por íons magnésio.

O bloqueio por magnésio é aliviado por despolarização. Em contrapartida, o efeito da


neurotransmissão sináptica inibidora parece diminuir com estimulação de alta frequência. Isso pode
ser devido, em parte, à dessensibilização rápida de receptores GABAm altas concentrações de GABA
liberado. O efeito resultante dessas mudanças é recrutar neurônios vizinhos para uma descarga
sincrônica e causar uma convulsão.

Na epilepsia secundária, perda de circuitos inibidores e brotamento de fibras de neurônios


excitadores parecem ser importantes para a geração de um foco convulsivo. Em várias das epilepsias
idiopáticas, estudos genéticos têm identificado muta̧ ções em canais iônicos. Por exemplo,
convulsões neonatais familiares benignas têm sido ligadas a mutações em dois canais de K+
homólogos com portão de voltagem: KCNQ2, codificado por um gene no cromossomo 20q13.3, e
KCNQ3, codificado por um gene no cromossomo 8q24. Duas formas de epilepsia generaliza- da
associada com convulsões febris têm sido ligadas a mutações em subunidades de canal de Na+ com
portão de voltagem. Outra condição rara, a epilepsia do lobo frontal noturna autossômica
dominante, está associada com mutações no cromossomo 20q13.2 no gene para a subunidade α4
de receptores colinérgicos nicotínicos neuronais. Finalmente, um estudo de associação com
amplitude do genoma em epilepsia generalizada idiopática revelou as primeiras variantes comuns de
risco genético. Essas variantes foram encontradas em genes com vias largamente des- conhecidas:
CHRM3, VRK2, ZEB2, PNPO e SCN1A.

Modelos animais têm fornecido pistas para a patogênese das convulsões de ausência. As convulsões
de ausência se originam de descargas talâmicas sincrônicas que são mediadas por ativação de
correntes de cálcio de baixo limiar (correntes T ou “transitórias”) em neurônios talâmicos. O
anticonvulsivante etossuximida bloqueia canais T e suprime convulsões de ausência em seres
humanos. Os canais T têm maior probabilidade de serem ativados depois da hiperpolarização da
mem- brana celular. A ativação de receptores GABAB hiperpolariza neurônios talâmicos e facilita a
ativação de canais T. Camundongos letárgicos (lh/lh) demonstram crises de ausência frequentes
acompanhadas por descargas ponta-onda de 5 a 6 Hz no EEG, e respondem a fármacos usados na
epilepsia de au- sência humana. Uma mutação isolada em um gene no cromossomo 2 resulta nesse
distúrbio autossômico recessivo. Há um aumento do número de receptores GABAB no córtex
cerebral nesses camundongos, e o agonista GABAB, baclofeno, piora as convulsões, ao passo que
antagonistas as aliviam.

Isso sugere que a regulação anormal da função ou a expressão de receptor GABAB pode ser
importante na patogênese das convulsões de ausência. Isso é apoiado pelo achado de que γ-
hidroxibutirato, que causa alterações comportamentais e eletrencefalográficas semelhantes às
observadas durante crises de ausência, ativa receptores GABAB, e que agonistas GABAB aumentam
e antagonistas GABAB diminuem descargas ponta-onda em ratos geneticamente suscetíveis a
convulsões de ausência (ratos GAERS).

Os alvos principais para os anticonvulsivantes disponíveis atualmente são (1) canais iônicos com
portão de voltagem que estão envolvidos na geração de potenciais de ação e na liberação de
neurotransmissores, e (2) canais com portão de ligante que modulam excitação e inibição sináptica.
Muitos agentes atuam por mais de um mecanismo.

03- Estudar como é realizado o tratamento da convulsão e epilepsia (mecanismo de ação dos
principais fármacos antiepiléticos).

Os fármacos constituem o tratamento de primeira linha para a maioria das crises epilépticas. A
lamotrigina é considerada o fármaco de primeira escolha para as crises epilépticas focais, e o
valproato, para as crises epilépticas generalizadas. Entretanto, com os medicamentos mais novos
disponíveis no mercado, qualquer fármaco isolado ou combinação de fármacos podem ser utilizados
com as seguintes metas: (1) controle das crises epilépticas e (2) reações adversas mínimas. Outros
fatores a considerar são o tipo de crises epilépticas, a idade e o sexo do paciente, comorbidades e
custo. A maioria dos fármacos antiepilépticos têm usos específicos, isto é, são valiosos no
tratamento de tipos específicos de crises epilépticas. As categorias de fármacos utilizadas como
antiepilépticos incluem as hidantoínas, os derivados do ácido carboxílico, as succinimidas, as
oxazolidinedionas e os benzodiazepínicos. Além disso, vários fármacos mais recentes são utilizados
como antiepilépticos e não se enquadram em uma categoria específica. Todos esses fármacos têm a
capacidade de deprimir as descargas neurais anormais no sistema nervoso central (SNC), inibindo,
assim, a atividade convulsiva.

AÇÕES

Os fármacos antiepilépticos deprimem as descargas neuronais anormais no SNC. As seis categorias


de antiepilépticos exercem esse efeito por meio de diferentes modos de ação:

1.As hidantoínas estabilizam a hiperexcitabilidade pós-sinapticamente no córtex motor do


cérebro.

2.Os derivados do ácido carboxílico aumentam os níveis de ácido gama (γ)-aminobutírico (GABA),
estabilizando as membranas celulares.

3.As succinimidas deprimem o córtex motor, elevando o limiar antes que os nervos possam reagir
aos estímulos convulsivos.

4.As oxazolidinedionas diminuem a transmissão sináptica repetitiva dos impulsos nervosos.

5.Os benzodiazepínicos elevam o limiar convulsivo ao diminuir a excitação pós-sináptica.


6.Os fármacos não especificados possuem propriedades diferentes; por exemplo, gabapentina é
um agonista do GABA, enquanto o topiramato bloqueia a atividade convulsiva, em vez de elevar o
limiar.

Teoricamente, a intensidade e a frequência de ocorrência de crises epilépticas podem ser reduzidas


ou, em alguns casos, praticamente eliminadas. Para alguns pacientes, pode-se obter apenas controle
parcial do transtorno convulsivo com essa terapia.

OUTRA REFERÊNCIA.

A intervenção terapêutica visa estabilizar o potencial de repouso neuronal e, assim, diminuir a


excitabilidade. Em formas específicas de epilepsia, procura-se alcançar a total supressão dos
ataques. Para o tratamento de longo prazo inicial da epilepsia focal, são importantes a lamotrigina e
o levetiracetam; para a epilepsia generalizada, o valproato.

Antiepilépticos que apresentam como efeito adverso indução ou inibição de enzimas devem ser
evitados. Isso evita não apenas interações farmacocinéticas entre os anticonvulsivantes como
também evita dificuldades futuras, considerando o tratamento por toda a vida quando, por outras
indicações, precisam ser administrados outros medicamentos. A dosagem do antiepiléptico deve ser
aumentada gradualmente até que não ocorram mais ataques ou até que os efeitos adversos se
tornem intoleráveis. Somente quando o monotratamento com diversos fármacos é mal sucedido,
faz-se a troca para um fármaco de segunda linha ou tenta-se uma associação (adição) ( ► Fig. 40.2B),
atentando para o risco de interação farmacocinética (ver a seguir).

O essencial é que a excitabilidade possa ser diminuída mediante inibição dos neurônios excitatórios
ou ativação dos inibidores. O transmissor utilizado pela maioria dos neurônios excitatórios é o
glutamato, e a maioria dos inibidores utilizam o GABA.

Os receptores de glutamato compreendem três tipos, dos quais o denominado receptor NMDA tem
a maior importância sob aspecto terapêutico. (O N-metil-D-aspartato é um agonista seletivo
sintético.) Esse receptor é um canal iônico ativado por ligante que, sob estimulação com glutamato,
permite a entrada de íons sódio e cálcio na célula. Para o GABA inibidor, é importante um receptor
canal iônico de cloreto cuja função pode ser reforçada pela ligação em um local alostérico.

Os benzodiazepínicos aumentam a ativação do receptor GABAA por via alostérica (p. 222) mediante
liberação fisiológica de GABA. Há uma entrada de cloro na célula, o que dificulta sua despolarização.
A tiagabina bloqueia a remoção do GABA da fenda sináptica, diminuindo sua captação. A vigabatrina
inibe a metabolização enzimática do GABA (► Fig. 40.2B).

Na ► Figura 40.3, estão reunidas as frases de efeito (slogans) das informações especializadas dos
fabricantes dos medicamentos. Os mecanismos de ação dos anticonvulsivantes citados mais
frequentemente são:

• Bloqueio de canais iônicos de Na+ e Ca2+ despolarizantes, estimulantes;

• Estimulação de canais de K+ repolarizantes, inibidores da estimulação;

• Inibição de receptores ativadores, como, por exemplo, receptores de glutamato;


• Ativação de receptores inativadores, como, por exemplo, receptores GABA.

Na maioria dos casos, o mecanismo molecular de ação dos antiepilépticos não é conhecido
precisamente. Considerando a complexidade da função cerebral, que também não é bem conhecida,
isso não é uma surpresa. O farmacologista experimental que está à procura do mecanismo
molecular de ação é forçado a simplificar o complexo sistema em um modelo. Isso significa ao
mesmo tempo afastar-se da situação real. Assim, o eletrofisiologista, para avaliar a ação de um
fármaco em um determinado tipo de canal iônico, precisa “desligar” outros canais que interferem.
Medir a ligação de fármacos em possíveis estruturas-alvo pode ser feito em suspensões de
membranas de células alteradas geneticamente (p. ex., células ovarianas de hamster chinês) que
receberam o gene para a estrutura-alvo desejada. As medidas feitas em homogenados de
membranas significa, porém, que a diferença de potencial entre os lados interno e externo foi
anulada. Com esse fundamento, não se pode concluir que o mecanismo de ação molecular
observado no laboratório é decisivo para o complexo mecanismo terapêutico.

Pragmaticamente considerado, o conhecimento do mecanismo molecular satisfaz a necessidade de


causalidade do homem; é, no entanto, secundário para o valor clínico de um fármaco.
Terapeuticamente, vale a comprovação da eficácia (p. ex., o significado estatístico da redução da
frequência dos ataques), a compatibilidade (menor quantidade/intensidade de efeitos adersos) e a
utilidade (uma significativa melhora na qualidade de vida do doente).Além disso,alterações cutâneas
e hematológicas podem levar à troca do antiepiléptico. Fenobarbital, primidona e fenitoína podem
levar à osteomalacia (profilaxia com vitamina D) ou à anemia megaloblástica (profilaxia com folato).
Durante o tratamento com fenitoína, cerca de 20% dos pacientes podem apresentar hiperplasia
gengival.

A carbamazepina tem efeito antidiurético (sensibiliza os ductos coletores para a vasopressina →


intoxicação por água). Além disso, a carbamazepina é utilizada no tratamento da neuralgia do
trigêmeo e dores neuropáticas.

Valproato, carbamazepina e outros anticonvulsivantes aumentam o risco teratogênico. Apesar disso,


o tratamento deve continuar durante a gestação, pois, para o feto, o risco por uma convulsão da
gestante é maior. Contudo, deve-se empregar a menor dosagem profilática eficaz e tentar prevenir
os defeitos do tubo neural com administração de doses elevadas de ácido fólico.

Carbamazepina, fenitoína, fenobarbital e outros anticonvulsivantes induzem as enzimas hepáticas


responsáveis pela biotransformação de fármacos. A associação de anticonvulsivantes entre si, mas
também o uso simultâneo de outros fármacos, pode causar interações relevantes clinicamente
(monitorar as concentrações plasmáticas!).

Nas convulsões em crianças, deve-se diagnosticar se é epilepsia ou a denominada “convulsão febril”,


que ocorre no aumento da temperatura ou em febres altas. Se for este o caso, não são indicados
antiepilépticos, mas medidas para diminuir a temperatura corporal (p. ex., antipiréticos). No caso de
epilepsia, utiliza-se, como em adultos, os antiepilépticos de forma a evitar as crises, o que pode ser
difícil. As epilepsias infantis podem desaparecer espontaneamente. Essa feliz evolução não deve
ficar sem um tratamento criterioso e prolongado com antiepilépticos.

Deve-se notar que uma série de fármacos baixam o limiar convulsivo (p. ex., neurolépticos, o
tuberculostático isoniazida, dosagens elevadas de antibióticos β-lactâmicos) e, por isso, são
contraindicados nos pacientes epilépticos.
CAUSAS DAS CONVULSÕES E DA EPILEPSIA
As convulsões resultam de um desvio no equilíbrio normal entre excitação e inibição no SNC. Em
função das várias propriedades que controlam a estabilidade neuronal, não causa surpresa o fato de
existirem muitas formas diferentes de perturbar esse equilíbrio normal e, portanto, muitas causas
diferentes para as convulsões e a epilepsia. Três observações clínicas importantes enfatizam como
diversos fatores determinam por que certas condições causam convulsões ou epilepsia em um dado
paciente.

1.O cérebro normal é capaz de sofrer uma convulsão sob as circunstâncias apropriadas, havendo
diferenças entre as pessoas na suscetibilidade ou no limiar para as convulsões . Por exemplo, as
convulsões podem ser induzidas por febre alta em crianças normais sob outros aspectos e que nunca
desenvolvem outros problemas neurológicos, incluindo epilepsia. Porém, as convulsões febris
ocorrem apenas em uma proporção pequena de crianças. Isso implica que há vários fatores
endógenos subjacentes que influenciam o limiar para uma convulsão. Alguns desses fatores são
genéticos, visto que a história familiar de epilepsia tem uma clara influência na probabilidade de
ocorrência de convulsões em pessoas normais sob outros aspectos. O desenvolvimento normal
também desempenha papel importante, pois o cérebro parece apresentar limiares diferentes para
convulsão em diferentes estágios de maturação.

2.Há uma variedade de condições que apresentam altíssima probabilidade de acarretar um distúrbio
convulsivo crônico. Um dos melhores exemplos disso é o traumatismo craniano grave penetrante,
associado a risco de quase 45% de epilepsia subsequente. A alta propensão da lesão cerebral
traumática grave de gerar epilepsia sugere que a lesão resulte em uma modificação patológica
persistente no SNC que transforma uma rede neural presumivelmente normal em uma
anormalmente hiperexcitável. Esse processo é conhecido como epileptogênese, e as alterações
específicas que resultam em diminuição do limiar para convulsões podem ser consideradas fatores
epileptogênicos. Outros processos associados à epileptogênese incluem acidentes vasculares
cerebrais (AVCs), infecções e anormalidades do desenvolvimento do SNC. De modo semelhante, as
anormalidades genéticas associadas a epilepsia provavelmente envolvem processos que
desencadeiam o surgimento de conjuntos específicos de fatores epileptogênicos.

3.As convulsões são episódicas. Os pacientes com epilepsia têm convulsões de maneira intermitente
e, de acordo com a causa subjacente, muitos permanecem completamente normais por meses ou
até mesmo anos entre as convulsões. Isso sugere a existência de fatores desencadeantes ou
precipitantes importantes que induzem convulsões no paciente com epilepsia. De modo análogo,
fatores desencadeantes são responsáveis pela ocorrência da convulsão isolada em indivíduos sem
epilepsia. Os fatores precipitantes incluem aqueles que decorrem de processos fisiológicos
intrínsecos, como estresse psicológico ou físico, privação do sono ou alterações hormonais. Também
incluem fatores exógenos como exposição a substâncias tóxicas e a certos fármacos.

Essas observações enfatizam o conceito de que muitas causas de convulsões e epilepsia resultam de
uma interação dinâmica entre fatores endógenos, fatores epileptogênicos e fatores desencadeantes.
O papel em potencial de cada um precisa ser cuidadosamente analisado ao se definir a conduta
apropriada para um paciente com convulsões. Por exemplo, a identificação de fatores
predisponentes (p. ex., história familiar de epilepsia) em paciente com convulsões febris pode
aumentar a indicação para acompanhamento mais atento e avaliação diagnóstica mais agressiva. A
descoberta de uma lesão epileptogênica ajuda a estimar a recorrência das convulsões e a duração da
terapia. Por fim, a remoção ou modificação de um fator desencadeante pode ser um método eficaz e
mais seguro de prevenir novas convulsões do que o uso profilático de anticonvulsivantes.

CAUSAS RELACIONADAS COM A IDADE

Na prática, é útil considerar as etiologias das convulsões com base na idade do paciente, pois a idade
é um dos fatores mais importantes para determinar a incidência e a provável causa das convulsões
ou da epilepsia (Tab. 418-4). Durante o período neonatal e primeira infância, as causas em potencial
incluem encefalopatia hipóxico-isquêmica, traumatismo, infecção do SNC, anormalidades congênitas
do SNC e distúrbios metabólicos. Os recém-nascidos de mães que utilizaram substâncias
neurotóxicas como cocaína, heroína ou etanol são suscetíveis a convulsões por abstinência da
substância nos primeiros dias de vida. Hipoglicemia e hipocalcemia, que podem ocorrer como
complicações secundárias de lesão perinatal, também são causas de convulsões logo após o
nascimento. As convulsões provocadas por erros inatos do metabolismo em geral manifestam-se
quando a alimentação regular é iniciada, com 2 a 3 dias de vida. A deficiência de piridoxina (vitamina
B6), uma causa importante de convulsões neonatais, é tratada efetivamente com a reposição da
piridoxina. As formas idiopáticas e hereditárias das convulsões neonatais também são vistas nesse
período.

TABELA 418-4 ■ Causas de convulsões


Recém-nascidos (< 1 mês) Hipoxia e isquemia perinatais
Hemorragia e traumatismo intracranianos
Infecção do SNC
Distúrbios metabólicos (hipoglicemia,
hipocalcemia, hipomagnesemia, deficiência de
piridoxina)
Abstinência de substâncias
Distúrbios do desenvolvimento
Distúrbios genéticos
Infância (> 1 mês e < 12 anos) Convulsões febris
Distúrbios genéticos (síndromes metabólicas,
degenerativas, primárias epilépticas)
Infecção do SNC
Distúrbios do desenvolvimento
Traumatismo
Adolescentes (12-18 anos) Traumatismo
Distúrbios genéticos
Infecção
Uso de substâncias ilícitas
Tumor cerebral
Adultos jovens (18-35 anos) Traumatismo
Abstinência de álcool
Uso de substâncias ilícitas
Tumor cerebral
Autoanticorpos
Adultos mais velhos (> 35 anos) Doença cerebrovascular
Tumor cerebral
Abstinência de álcool
Distúrbios metabólicos (uremia, insuficiência
hepática, anormalidades eletrolíticas,
hipoglicemia, hiperglicemia)
Doença de Alzheimer e outras doenças
degenerativas do SNC
Autoanticorpos
Sigla: SNC, sistema nervoso central.
As convulsões mais comuns que surgem na segunda infância são as convulsões febris, que são
convulsões associadas a febre sem evidências de infecção do SNC ou outras causas definidas. A
prevalência global é de 3 a 5%, e ainda mais alta em algumas regiões do mundo, como a Ásia. Os
pacientes com frequência têm história familiar de convulsões febris ou epilepsia. As convulsões
febris ocorrem entre 3 meses e 5 anos de idade, e têm um pico de incidência entre os 18 e 24 meses.
O quadro típico é o de uma criança que apresenta convulsão tônico-clônica generalizada durante
uma enfermidade febril gerada por uma infecção comum da infância, por exemplo, otite média,
infecção respiratória ou gastrenterite. A convulsão é mais propensa a ocorrer durante a fase de
elevação da curva de temperatura (i.e., no primeiro dia) do que nos estágios subsequentes da
enfermidade. Uma convulsão febril simples é um evento único isolado, breve e de apresentação
simétrica. As convulsões febris complexas apresentam atividade convulsiva repetida, duram mais de
15 minutos, ou têm características focais. Cerca de um terço dos pacientes com convulsões febris
sofrem recorrência, porém < 10% têm três ou mais episódios. As recorrências são mais prováveis
quando a convulsão febril ocorre no primeiro ano de vida. As convulsões febris simples não se
associam a aumento do risco de epilepsia, enquanto as convulsões febris complexas têm risco de 2 a
5%; outros fatores de risco incluem a presença de déficits neurológicos prévios e história familiar de
convulsões não febris.

A terceira infância assinala a época em que muitas síndromes epilépticas bem definidas se
manifestam. Algumas crianças, normais nos demais aspectos, desenvolvem convulsões tônico-
clônicas generalizadas idiopáticas sem outras características que se encaixem em síndromes
específicas. A epilepsia do lobo temporal em geral manifesta-se na infância e pode ter relação com a
esclerose do lobo temporal mesial (como parte da síndrome de ELTM) ou outras anormalidades
focais, como disgenesia cortical. Outros tipos de convulsões focais, incluindo aquelas que evoluem
para convulsões generalizadas, podem ser uma manifestação relativamente tardia de um distúrbio
do desenvolvimento, de uma lesão adquirida como traumatismo craniano, de infecção do SNC (em
especial encefalite viral) ou, muito raramente, de tumor do SNC.
O período da adolescência e início da idade adulta é uma fase de transição, durante a qual
síndromes epilépticas de origem genética ou idiopática, como a EMJ e a epilepsia de ausência
juvenil, tornam-se menos comuns, enquanto as epilepsias secundárias a lesões adquiridas do SNC
começam a predominar. As convulsões que começam em pacientes dessa faixa etária podem estar
associadas a traumatismo craniano, infecções do SNC (incluindo infecções parasitárias como a
cisticercose), tumores cerebrais, anormalidades congênitas do SNC, uso de substâncias ilícitas ou
abstinência de álcool. Autoanticorpos dirigidos contra antígenos do SNC como receptores de
glutamato ou canais de potássio são uma causa recentemente reconhecida de epilepsia que também
começa a aparecer nesse grupo etário (embora casos de autoimunidade sejam cada vez mais
descritos na população pediátrica), incluindo pacientes sem um câncer identificável. Deve-se
suspeitar dessa etiologia quando um indivíduo previamente normal apresenta um padrão de
convulsões particularmente agressivo que se desenvolve ao longo de semanas a meses e que se
caracteriza por convulsões cada vez mais frequentes e prolongadas, particularmente quando
combinadas com sintomas psiquiátricos e alterações da função cognitiva (Cap. 90).

O traumatismo craniano é uma causa comum de epilepsia em adolescentes e adultos. A lesão


craniana pode ser causada por uma variedade de mecanismos, e a probabilidade de desenvolver
epilepsia correlaciona-se fortemente com a gravidade da lesão. Um paciente com trauma craniano
penetrante, fratura craniana com afundamento, hemorragia intracraniana ou coma ou amnésia pós-
traumática prolongada apresenta um risco de 30 a 50% de ter epilepsia, enquanto aqueles com
lesão craniana fechada e contusão cerebral têm risco de 5 a 25%. Convulsões recorrentes costumam
surgir em 1 ano após o traumatismo craniano, embora já se tenham descrito intervalos de mais de
10 anos. Em estudos controlados, traumatismos cranianos leves, definidos como concussão com
amnésia ou perda de consciência por < 30 minutos, estiveram associados a aumento apenas discreto
da probabilidade de epilepsia. Não obstante, a maioria dos epileptólogos conhece casos de
pacientes que apresentaram convulsões focais horas ou dias após um traumatismo craniano leve e
depois tiveram convulsões crônicas do mesmo tipo; esses casos podem representar exemplos raros
de epilepsia crônica secundária a traumatismo craniano leve.

As causas de convulsões em adultos mais velhos incluem doença cerebrovascular, traumatismo


(incluindo hematoma subdural), tumores do SNC e doenças degenerativas. A doença
cerebrovascular pode ser responsável por cerca de 50% dos novos casos de epilepsia em pacientes >
65 anos de idade. As convulsões agudas (i.e., que ocorrem no momento do AVC) são vistas com
maior frequência no acidente vascular embólico do que no hemorrágico ou trombótico. As
convulsões crônicas surgem meses a anos após o evento inicial e estão associadas a todas as formas
de AVC.

Distúrbios metabólicos como desequilíbrio eletrolítico, hipo ou hiperglicemia, insuficiência renal e


insuficiência hepática podem causar convulsões em qualquer idade. De modo semelhante, os
distúrbios endócrinos, as doenças hematológicas, as vasculites e muitas outras doenças sistêmicas
podem causar convulsões ao longo de uma ampla faixa etária. Uma extensa variedade de fármacos e
substâncias de uso abusivo sabidamente também precipitam convulsões (Tab. 418-5).

TABELA 418-5 ■ Fármacos e outras substâncias que podem causar convulsões


Agentes alquilantes (p. ex., bussulfano, clorambucila)
Antimaláricos (cloroquina, mefloquina)
Antimicrobianos/antivirais
β-lactâmicos e compostos afins
Quinolonas
Aciclovir
Isoniazida
Ganciclovir
Anestésicos e analgésicos
Meperidina
Fentanila
Tramadol
Anestésicos locais
Suplementos dietéticos
Efedra (ma huang)
Gingko
Agentes imunomoduladores
Ciclosporina
OKT3 (anticorpos monoclonais contra células T)
Tacrolimo
Interferonas
Psicotrópicos
Antidepressivos (p. ex., bupropiona)
Antipsicóticos (p. ex., clozapina)
Lítio
Agentes de contraste radiológicos
Abstinência de substâncias
Álcool
Baclofeno
Barbitúricos (de ação curta)
Benzodiazepínicos (de ação curta)
Zolpidem
Substâncias de abuso
Anfetamina
Cocaína
Fenociclidina
Metilfenidato
Flumazenila
a
Em pacientes dependentes de benzodiazepínicos.

AUSAS GENÉTICAS DE EPILEPSIA

O progresso recente mais importante nas pesquisas sobre epilepsia foi a identificação de mutações
genéticas associadas a uma variedade de síndromes epilépticas (Tab. 418-2). Embora a maioria das
mutações identificadas até o presente cause formas raras de epilepsia, sua descoberta proporcionou
avanços conceituais extremamente importantes. Por exemplo, parece que muitas das epilepsias
hereditárias resultam de mutações que afetam a função dos canais iônicos. Portanto, essas
síndromes fazem parte do grupo maior de canalopatias que causam distúrbios paroxísticos como
arritmias cardíacas, ataxia episódica, fraqueza periódica e migrânea (enxaqueca) hemiplégica
familiar. Foi constatado que outras mutações gênicas estão associadas a vias que influenciam o
desenvolvimento do SNC ou a homeostase neuronal. Mutações de novo podem explicar uma
proporção significativa dessas síndromes, em especial aquelas que começam no início da infância.
Um desafio atual é identificar os múltiplos genes de suscetibilidade que originam as formas mais
comuns de epilepsia idiopática. Estudos recentes sugerem que as mutações nos canais iônicos;; e
variantes do número de cópias podem contribuir para a causa em um subgrupo desses pacientes.

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