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INICIAÇÃO

ESPORTIVA:
ESPORTES
INDIVIDUAIS E
COLETIVOS

Ericson Pereira
Corridas de resistência
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Descrever as diferenças entre as provas de fundo e meio fundo e suas


particularidades estruturais.
 Discutir as técnicas empregadas nas mais diversas corridas de resis-
tência do atletismo.
 Identificar as demandas fisiológicas nas diferentes provas de resistência.

Introdução
A corrida é um movimento natural do ser humano; as crianças, por
exemplo, correm em diversas brincadeiras. Porém, alguns hábitos nada
saudáveis têm tornado o ser humano cada vez mais sedentário e, junto
com isso, têm aumentado a incidência de doenças provenientes desses
hábitos. Dessa forma, muitos adultos têm se tornado indivíduos seden-
tários, o que acaba aumentando o risco de diversas doenças silenciosas,
como a hipertensão e o diabetes.
A corrida de resistência surge como uma opção na tentativa de tornar
esse indivíduo mais ativo. Estudos iniciados pelo médico americano
Kenneth Cooper, na década de 1970, já mostravam resultados positivos
para a saúde com a prática de corridas em ritmo moderado. Assim, a
prática dessas corridas recebeu um grande estímulo, o que resultou em
um aumento significativo no número de praticantes. Esse aumento é
facilmente percebido devido ao aumento do número de assessorias que
surgiram para atender à demanda de novos corredores. Além do apelo
da melhora na saúde, as corridas de resistência geram grande motivação
pela superação de limites; nelas, o homem é motivado a correr cada
vez mais e mais rápido. Um exemplo de motivação é a atual busca dos
atletas pelo rompimento da barreira de 2 horas na maratona masculina.
2 Corridas de resistência

Neste capítulo, você vai estudar as principais diferenças entre as provas


de resistência, assim como suas particularidades estruturais. Você também
vai identificar as técnicas utilizadas e as capacidades físicas necessárias
para essas provas.

As provas de fundo e meio fundo e suas


particularidades estruturais
As corridas de resistência podem ser praticadas tanto em pista como em outros
locais. Em pista, são conhecidas como provas de fundo, que são praticadas
em provas de 5 km e 10 km, e provas de meio fundo, que são praticadas em
provas de 800 e 1.500 metros. Fora da pista, as provas mais conhecidas são as
de pedestrianismo, que ocorrem em ruas ou estradas, normalmente asfaltadas.
A distância mais conhecida é a maratona, com a distância de 42,195 km, mas
também existem outras distâncias, como a meia maratona, com a distância de
21,097 km, além de provas de 5 km e 10 km, que são distâncias mais comuns,
e 15 km. Essas provas podem chegar a distâncias maiores, como 100 km ou
mais, que são as provas de ultramaratona, ou ultrarresistência.
As provas de pista ocorrem na pista de 400 metros; portanto, os atletas
acabam dando várias voltas e acabam não correndo em raias específicas,
normalmente se mantendo na raia interna. A prova de 800 metros é a única
prova mais longa em que os atletas largam na raia específica, mas, após a
primeira curva, já buscam se posicionar na raia interna. Já nas outras provas
(1.500, 5.000 e 10.000 metros rasos), os atletas correm livremente na pista e,
por isso, buscam se posicionar na raia interna desde o início.
A prova de 800 metros já era disputada desde os jogos antigos, em uma
distância de aproximadamente 740 metros, sendo chamada de “hippios”,
conforme aponta a Confederação Brasileira de Atletismo (CBAT; IAFF, 2017).
Está presente nos jogos modernos desde a primeira edição. Nessa prova, o
atleta realiza duas voltas completas na pista. Um dos destaques brasileiros
foi Joaquim Cruz, que conquistou o título nos jogos de Los Angeles de 1984,
junto com o recorde olímpico e a prata em Seul, em 1988. A prova feminina
foi incluída pela primeira vez em Amsterdã, em 1928, mas, como algumas
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mulheres acabaram passando mal após a prova devido ao esforço, ela foi
excluída, retornando apenas nos jogos de Roma, em 1960.
A prova de 1.500 metros está presente nos jogos também desde a primeira
edição; nela, os atletas realizam três voltas completas e ¾ de uma volta, sendo
essa prova equivalente à distância clássica da milha (1.609 metros), que era
uma corrida comum nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha, devido ao sistema
métrico. As mulheres estrearam apenas nos jogos de Munique, em 1972,
conforme aponta a Associação Internacional de Federações de Atletismo
(CBAT; IAFF, 2017).
A prova de 5.000 metros também foi disputada desde a Antiguidade,
inspirada nos grandes feitos dos mensageiros militares, e chamava-se “doli-
chos”. Nessa prova, os atletas realizam 12 voltas e meia na pista (CBAT; IAFF,
2017). Ela está presente nos jogos modernos desde 1912, em Estocolmo. As
provas de resistência feminina são recentes; sua estreia ocorreu nos jogos de
Los Angeles, em 1984, na distância de 3.000 metros; nos jogos de Atlanta, foi
substituída para os atuais 5.000 metros.
A prova de 10.000 metros está presente nos jogos modernos desde 1912,
em Estocolmo. Nela, os atletas realizam 25 voltas completas na pista. As
corridas para fins de apostas eram muito populares na Grã-Bretanha e nos
Estados Unidos no século XIX. A versão feminina estreou apenas em Seul,
em 1988 (CBAT; IAFF, 2017).
As provas de 5.000 e 10.000 metros tiveram atletas finlandeses com grande
destaque internacional, como Paavo Nurmi e Lasse Viren, além do tcheco Emil
Zatopek, conhecido com a “locomotiva humana”. A partir dos anos 1980, os
etíopes e quenianos passaram a dominar os eventos masculinos, enquanto,
entre as mulheres, a China e a Etiópia se destacam.
Normalmente, fora da pista o percurso oferece alguns obstáculos relaciona-
dos à altimetria, que se refere às subidas com diferentes graus de inclinação.
Devido a essas variações, existem locais onde são realizadas essas provas que
favorecem a quebra de recordes, por possuírem um percurso favorável, ou seja,
uma altimetria baixa. Já outros percursos acabam ficando conhecidos por sua
dificuldade. Assim, torna-se difícil reproduzir em locais diferentes provas
com as mesmas características. O Quadro 1 apresenta as melhores marcas de
algumas provas de resistência, tanto em pista como em rua.
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Quadro 1. Comparação entre os recordes mundiais nas provas de resistência

Em pista

Prova Sexo Atleta Tempo Ano

800 Masculino David Lekuta Rudisha 1’40”91 2012


metros
Feminino Jarmila Kratochvilova 1’53”28 1983

1.500 Masculino Hicham El Guerrouj 3’26”00 1998


metros
Feminino Grezebe Dibaba 3’50”07 2015

5 km Masculino Kenenisa Bekele 12’37”35 2004

Feminino Tirunesh Dibaba 14’11”15 2008

10 km Masculino Kenenisa Bekele 26’17”53 2005

Feminino Almaz Ayana 29’17”45 2016

Na rua

Prova Sexo Atleta Tempo Ano

10 km Masculino Leonard Patrick Komon 26’44” 2010

Feminino Asmae Leghzaoui 30’29” 2002

Meia maratona Masculino Abraham Kiptum 58’18” 2018


(21 km)
Feminino Netsanet Gudeta 1h06’11” 2018

Maratona Masculino Eliud Kipchoge 2h01’39 2018


(42 km)
Feminino Paula Radcliffe 2h13’25 2003

Ultramaratona Masculino Takahiro Sunada 6h13’33” 1998


(100 km)
Feminino Tomoe Abe 6h33’11” 1998

Fonte: Adaptado de CBAt e IAF (2017).

É possível observar que as marcas obtidas em pista são melhores do que as


obtidas em rua — isso pode estar relacionado ao fato de o percurso em pista
ser totalmente plano. Além disso, na pista, os atletas usam a sapatilha com
pregos no solado, o que dá maior tração ao piso.
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O tipo de piso também pode influenciar a corrida, principalmente por


causa do amortecimento do impacto. Assim, alguns pisos são mais favo-
ráveis e outros menos favoráveis para as corridas longas, conforme aponta
Machado (2011).

 Areia fofa: é um piso que possui uma capacidade de amortecimento


alta, porém, é mais recomendado para desenvolver a força e a resistência
específica.
 Asfalto: é um piso que possui uma capacidade de amortecimento baixa; é
o piso específico para as competições de rua e ideal para treinos de ritmo.
 Concreto: é um piso que possui uma capacidade de amortecimento
muito baixa; esse tipo de piso deve ser evitado.
 Grama: é um piso que possui uma capacidade de amortecimento alta,
ideal para treinos de ritmo e longos.
 Terra: é um piso que possui uma capacidade de amortecimento alta,
ideal para treinos de alta intensidade e longos.

Outra opção utilizada por alguns corredores é treinar em esteiras rolan-


tes, normalmente em academias. Algumas esteiras possuem um excelente
amortecimento, e elas podem ser utilizadas tanto por corredores iniciantes
como experientes, segundo Machado (2011). Porém, a mecânica da corrida
acaba sendo alterada, já que, na esteira, ocorre um deslocamento vertical
maior, pois a manta da esteira é que acaba se deslocando, o que também
afeta a propriocepção. Assim, normalmente, quando o atleta sai da esteira
após correr, sente uma sensação diferente ao andar, ou seja, ocorre um certo
desequilíbrio, pois muda o tipo de piso que ele está usando.
Já quando o atleta corre em solo, ele tem que empurrar ou tracionar o chão
para se deslocar e acaba também realizando um esforço maior, pois, além de
vencer a resistência do vento, dependendo do percurso, pode encontrar subidas.
Além disso, nesse tipo de local, ocorre a ativação dos músculos estabilizadores,
em função das imperfeições do terreno ou do tipo de piso.
Porém, segundo Machado (2011), existem algumas vantagens ao correr
na esteira, como uma menor resistência do vento e o controle da velocidade,
da distância e da inclinação. Além disso, com as esteiras posicionadas em
frente ao espelho, é possível corrigir a postura, além de facilitar o feedback do
professor. Por fim, trata-se de uma prática segura e que não sofre a influência
do ambiente, como frio, chuva ou calor excessivo.
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A maratona é a prova de pedestrianismo mais antiga, tendo sua origem na Grécia


Antiga, onde, segundo a lenda, o soldado Fidípedes correu aproximadamente 40 km
da planície de Maratona até Atenas, para levar a notícia da vitória dos gregos sobre
os persas. De acordo com a lenda, ao concluir a missão, ele morreu em seguida de
exaustão. A primeira maratona em jogos olímpicos ocorreu em 1896, com o percurso
original. Porém, a distância que conhecemos somente passou a ser percorrida nos
Jogos Olímpicos de Londres, em 1908. Para que a família real pudesse assistir ao início
da prova do jardim do castelo de Windsor, o comitê organizador alterou o percurso;
ao ser aferido, o percurso totalizou 42,195 km, distância usada até os dias atuais (CBAT;
IAFF, 2017).

Além das provas de pedestrianismo, existem provas do tipo cross coun-


try, ou corta-mato, e trail run, ou corridas de montanha, que possuem
percursos que, além da variação de altimetria com subidas e descidas,
também possuem obstáculos naturais, como trilhas, grama, entre outros
elementos.

Características de treinamento das corridas de


resistência
As capacidades físicas a serem trabalhadas, bem como os volumes de treino,
variam de acordo com o tipo de prova e o perfil do atleta, conforme aponta
Evangelista (2011). Assim, as corridas de 5 km exigem resistência anaeróbica
e aeróbica, potência aeróbica e velocidade, sendo sugerido para iniciantes
volumes de 15 a 20 km semanais, para intermediários, volumes entre 30 a 40
km, e para avançados, de 35 a 50 km. As corridas de 10 km também exigem
resistência anaeróbica e aeróbica, resistência de força e velocidade, sendo
sugerido para iniciantes volumes de 30 a 40 km semanais, para intermediários,
entre 40 a 60 km, e para avançados, de 60 a 80 km.
A meia maratona exige resistência aeróbica e resistência de força, sendo
sugerido para iniciantes volumes de 80 a 100 km semanais, para intermedi-
ários, entre 90 a 110 km, e para avançados, de 100 a 130 km. As maratonas
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também exigem resistência aeróbica e resistência de força, sendo sugerido


para iniciantes volumes de 80 a 100 km semanais, para intermediários, entre
120 a 150 km, e para avançados, de 160 a 200 km.
Na próxima seção, serão discutidas as demandas fisiológicas para realizar
tais corridas. Em provas de resistência, segundo McNab (1983), a manutenção
do ritmo é um fator importante para o desempenho. Portanto, descobrir o seu
ritmo, ou pace, como é chamado entre os corredores, é algo que vai ajudar o
atleta a evitar processos de fadiga devido a um esforço excessivo.

Demandas fisiológicas nas diferentes provas de


resistência
Para que ocorra a contração muscular, segundo Gomes (2009), a fonte ener-
gética utilizada é a adenosina trifosfato (ATP). A ressíntese do ATP ocorre
devido a três mecanismos energéticos:

 Mecanismo aeróbio (oxidativo): ocorre por conta da oxidação, ou seja,


com a participação direta de O2, de hidratos de carbono e de gorduras
disponíveis no organismo.
 Mecanismo anaeróbio lático (glicolítico): ocorre a dissociação anaeróbia
(sem ou com pouca participação de O2) do glicogênio, com a formação
do lactato.
 Mecanismo anaeróbio alático (ATP-CP): está ligado à utilização de
fosfagênios presentes nos músculos em atividade, principalmente o
fosfato de creatina.

Nas provas de corrida de resistência, segundo Evangelista (2010), há um


predomínio do sistema aeróbio ou oxidativo, devendo ser estimulado com
prioridade durante os treinos. No entanto, os sistemas anaeróbios lático ou
alático, agindo de forma secundária, também devem ser estimulados durante
o processo de preparação. Os estímulos anaeróbios contribuem para a melhora
da velocidade e da capacidade aeróbia. O Quadro 2 apresenta a contribuição
dos sistemas aeróbios e anaeróbios durante as provas de corridas, conforme
aponta Machado (2011).
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Quadro 2. Comparação entre os sistemas energéticos aeróbio e anaeróbio nas diferentes


provas de corridas de resistência

Prova Sistema anaeróbio Sistema aeróbio

800 metros 95% 5%

1.500 metros 70% 30%

5 km 30% 70%

10 km 20% 80%

Maratona (42 km) 5% 95%

Fonte: Adaptado de Machado (2011).

Assim, é possível perceber que o sistema anaeróbio tem uma contribuição


maior em provas mais curtas, enquanto o sistema aeróbio tem uma contribuição
maior conforme o aumento da distância. Portanto, atletas de meio fundo ainda
possuem uma parcela de fibras de contração rápida, que vão contribuir de
acordo com o perfil da prova.
Em provas de 800 e 1.500 metros, o sistema aeróbio deve ser treinado;
porém, nas provas de 800 metros, deve haver uma prioridade sobre o sistema
anaeróbio, por ser mais exigido. Assim, atletas que tenham essa característica
de resistência à velocidade mais desenvolvida terão mais facilidade nesse
tipo de prova, pois, devido à sua dinâmica, essa prova acaba exigindo uma
aceleração final nos últimos 150 metros. Já a prova de 1.500 metros tem uma
exigência da capacidade anaeróbia um pouco menor, mas bem superior às
provas de fundo. Além disso, a dinâmica estratégica da prova acaba sendo
bem importante para a exigência da via metabólica. Uma prova que começa
mais cadenciada em seu ritmo terá uma exigência anaeróbia maior no final,
enquanto uma prova que já começa em um ritmo acelerado desde o início já
terá uma exigência anaeróbia no começo.
Segundo Evangelista (2010), o sistema aeróbio pode ser treinado com
estímulos superiores a 3 minutos, com três ou mais repetições. Já o sistema
anaeróbio lático pode ser basicamente trabalhado com estímulos de 30 segun-
dos a 3 minutos e repetições, que variam de uma a oito. O sistema anaeróbio
alático pode ser trabalhado com estímulos de 10 a 15 segundos de duração e
três a seis repetições.
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O treinamento de corridas resulta em adaptações músculo esqueléticas,


com melhoras na coordenação muscular, aumentando, assim, a economia de
corrida e a velocidade. O recrutamento de fibras do tipo I, que têm por carac-
terísticas participarem do sistema oxidativo, sendo recrutadas em atividades de
longa duração, também é melhorado nesse treino, segundo Evangelista (2010).
Também podem ocorrer adaptações cardiovasculares, que envolvem a melhora
da capacidade cardíaca, pulmonar e dos vasos sanguíneos; essas adaptações
permitem um maior fornecimento de oxigênio aos tecidos musculares. Além
disso, ocorrem melhoras no volume máximo de oxigênio (VO2máx), que repre-
senta a capacidade máxima de o organismo captar, transportar e transformar
o oxigênio em energia durante o exercício.
Segundo Machado (2009), existem fatores limitantes para o VO2máx que
são genéticos, relacionados à hereditariedade, e outros relacionados ao sexo,
sendo observados maiores valores em homens. Também foi observada uma
melhora em torno de 15 a 20% com programas de treinamento. No entanto, essa
melhora pode estar limitada em indivíduos já treinados, pois a capacidade de
melhora acaba sendo reduzida, enquanto ocorrem melhoras mais expressivas
em indivíduos com um menor grau de treinamento.

Influência no desempenho
Entre os fatores que determinam o desempenho, segundo Evangelista (2010),
está a economia de corrida, que está relacionada à absorção de oxigênio pelo
corpo. Assim, atletas com os mesmos valores de VO2máx não necessariamente
correm na mesma velocidade; essa economia está relacionada à capacidade
de correr em velocidades maiores com menor gasto energético. Uma maior
quantidade de mitocôndrias está relacionada a uma menor produção de lactato,
a densidade de capilares está relacionada ao fornecimento de sangue com
oxigênio aos músculos, e uma maior capacidade cardíaca também vai fornecer
maior quantidade de sangue aos tecidos musculares.
Segundo Machado (2009), as corridas de resistência podem proporcionar
respostas agudas e crônicas. A melhora do desempenho com o treinamento
está relacionada com mudanças crônicas.
10 Corridas de resistência

A maratona exige uma grande capacidade de economia de energia; o recorde, de


aproximadamente 2 horas, foi obtido por Eliud Kipchoge em 2018. Um dos grandes
desafios do homem é correr a maratona abaixo de 2 horas; para isso, a combinação
de vários fatores é importante, como o percurso, a temperatura, a hidratação e os
corredores coelhos, que ditam o ritmo da prova, proporcionando, assim, uma excelente
economia de energia. Pensando nisso, a gigante dos materiais esportivos Nike, em
maio de 2017, tentou emplacar esse feito com três corredores, Eliud Kipchoge, Zersenay
Tadese e Lelisa Desisa, correndo um evento fechado, buscando as condições ideais.
Para isso, combinaram um percurso ideal no autódromo de Monza, na Itália. Porém,
por ser um percurso em circuito, essa marca não valeria como recorde mundial. Tam-
bém usaram uma equipe de coelhos, que se revezavam à frente dos três corredores
em uma formação em flecha, para tentar protegê-los da resistência do vento, e os
atletas usaram uma hidratação especial. Porém, a meta não foi atingida, e os atletas
ficaram a 26 segundos da tão esperada marca; Kipchoge conseguiu a incrível marca
de 2h00min25seg.

Mulheres e as corridas de resistência


A participação de mulheres em corridas é recente, e a primeira maratona
olímpica feminina foi realizada em Los Angeles, em 1984. As mulheres de-
mandam cuidados especiais durante o treinamento, principalmente devido ao
ciclo menstrual. Segundo Evangelista (2010), o débito cardíaco das mulheres
chega a ser 10% menor, o que resulta em: menos sangue oxigenado sendo
entregue aos músculos; menor quantidade de hemoglobina, que resulta em
menor transporte de oxigênio; e menor massa muscular e maior massa de
gordura, o que resulta em menor força; por isso, o cuidado com o impacto é
importante. Além disso, existem aspectos anatômicos, como um tendão de
Aquiles mais curto, que reduz a impulsão durante a corrida, e um quadril
mais largo, que resulta em joelhos mais próximos, alterando a mecânica da
corrida, o que resulta em um gasto energético maior.
Na próxima seção, serão discutidas as formas de trabalho das corridas de
resistência e suas possibilidades.
Corridas de resistência 11

Técnicas empregadas nas diversas corridas de


resistência do atletismo
Segundo Fernandes (2003), normalmente os corredores de velocidade correm
sobre a ponta dos pés, enquanto os corredores de longa distância acabam
correndo tocando o calcanhar no chão. Além disso, a movimentação de bra-
ços é mais ampla nos corredores de velocidade, enquanto os corredores de
resistência mantêm os braços mais descontraídos e com uma movimentação
mais curta. A ação dos braços é muito importante nas subidas, em que o atleta
mantém a movimentação constante, o que contribui para manter a frequência
da passada; além disso, ele também acaba encurtando um pouco a passada,
de forma a não perder tanto rendimento nas subidas.
Nas provas de resistência, durante a fase de voo, a perna de balanço não
se eleva tanto quando projetada à frente, vindo quase paralela ao solo, assim
como a elevação do joelho à frente também é menor, o que contribui para a
redução da amplitude da passada. É diferente do que ocorre na corrida de
velocidade, em que o calcanhar é direcionado ao glúteo no início da fase de
voo, e o joelho é direcionado para cima e para a frente, aumentando, assim,
a amplitude da passada. Portanto, a amplitude da passada tende a ser menor,
assim como a frequência, em provas mais longas, pois nessas provas ocorre
uma preocupação maior com a economia de energia. Busca-se um equilíbrio
entre a frequência e a amplitude da passada, assim como uma postura adequada.
Segundo Machado (2009), um dos principais problemas da corrida diurna
é o sol, que pode causar aumento excessivo da temperatura corporal, influen-
ciando, assim, na termorregulação, que resulta em uma perda de rendimento.
Já o problema das corridas noturnas acaba sendo o elevado índice de monóxido
de carbono, o que prejudica a respiração, principalmente nos grandes centros,
além da segurança, que também é outro fator em função da baixa iluminação.

Aprendizagem das corridas de resistência


Antes de iniciar um programa de treinamento, são necessários alguns cuidados,
como uma anamnese, na qual são identificados os objetivos do atleta, além de
uma avaliação física e médica. A identificação do nível do atleta também é
importante, devendo-se classificá-lo como iniciante, intermediário ou avançado.
Isso vai facilitar na prescrição do treinamento.
12 Corridas de resistência

Normalmente, como recomendação, os programas devem ter no mínimo


uma frequência de três treinos semanais e uma duração mínima de 20 minutos.
Um dos objetivos com os iniciantes é a iniciação à corrida; para tanto, são
usados pequenos percursos de corrida, alternados com percursos de caminhada
— a tendência é aumentar o percurso de corrida e diminuir o percurso de
caminhada aos poucos. Segundo Evangelista (2010), a prescrição dos progra-
mas de treinamento apresenta algumas variáveis, conforme listado a seguir.

 Volume de treino: está relacionado à quilometragem percorrida em


determinado período.
 Frequência: quantidade de treinos que o aluno treina por semana.
 Séries: estão presentes em trabalhos intervalados, sendo a quantidade
de blocos de repetições.
 Repetições: quantidade de vezes que a distância a ser trabalhada é
repetida, comumente chamadas de tiros.
 Intervalo: tempo de descanso entre as séries ou repetições (tiros).
 Intensidade: está relacionada à percepção do esforço ou à frequência
cardíaca durante a repetição ou tiro.

Corridas no ambiente aquático


Segundo Machado (2009), as corridas no meio líquido são normalmente
usadas para melhora do condicionamento, reabilitação e treino complementar,
principalmente em função do baixo impacto nas articulações. Basicamente,
estão divididas em corridas em águas rasas (water running), com água na
altura dos joelhos, e corridas em águas profundas (deep water running),
com auxílio ou não de coletes e águas acima da linha da cintura.
As propriedades físicas da água influenciam no treinamento; entre elas estão
a pressão hidrostática, que é maior de acordo com a profundidade e contribui
para o retorno venoso, a força do empuxo e a densidade, que contribuirão para
a redução da sobrecarga sobre as articulações, devido ao impacto.

Treino em altitude
Os treinos em altitudes acima de 1.800 metros podem acarretar melhoras
entre 1,8 a 2,5% na performance do atleta, segundo Evangelista (2010). Entre
as alterações encontradas, a permanência por no mínimo duas semanas em
elevadas altitudes pode gerar aumento no número de células vermelhas e,
entre 3 e 6 semanas, aumento da capacidade mitocondrial.
Corridas de resistência 13

Durante as corridas de resistência, sempre surge a dúvida: “devo respirar pela boca ou
pelo nariz?” Normalmente, em repouso, respiramos pelo nariz, pois essa respiração
atende à nossa demanda de oxigênio. Além disso, o ar é aquecido e filtrado antes de
chegar aos pulmões. Porém, durante o exercício, a frequência respiratória aumenta,
devido à necessidade de mais oxigênio para manter o trabalho. Assim, com uma
frequência elevada, fica desconfortável respirar pelo nariz, além de a quantidade de
ar demandada ser insuficiente. Por isso, a respiração pela boca acaba sendo utilizada,
pois atende à demanda de oxigênio necessária para o exercício.

Como foi observado neste capítulo, existem vários tipos de corridas de


resistência, e cada prova tem uma determinada característica que precisa ser
desenvolvida. Porém, de maneira geral, são empregados os sistemas anaeróbio
e aeróbio para a produção energética — conforme se aumenta a distância ou o
tempo de duração, ocorre um predomínio do sistema aeróbio para a produção
de energia. Além disso, a mecânica da corrida acaba mudando, de acordo
com a velocidade.

CBAT; IAFF. Atletismo: regras oficiais de competição 2016-2017. São Paulo: Phorte, 2017.
EVANGELISTA, A. L. Treinamento de corrida de rua: uma abordagem metodológica e
fisiológica. São Paulo: Phorte, 2010.
FERNANDES, J. L. Atletismo: corridas. 3. ed. São Paulo: EPU, 2003.
GOMES, A. C. Treinamento desportivo. Porto Alegre: Artmed, 2009.
MACHADO, A. Bases científicas do treinamento de corridas. São Paulo: Icone, 2011.
MACHADO, A. Corrida: teoria e prática do treinamento. São Paulo: Icone, 2009.
MCNAB, T. Corridas de velocidade, fundo e meio fundo. Porto: Talus, 1983.

Leitura recomendada
BROWN, R. L. Corrida como condicionamento físico. São Paulo: ROCA, 2005.

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