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Leonardo Gomes Pereira

A TV em pânico:
O enquadramento das celebridades pelo Pânico na TV.

Dissertação apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em
Comunicação Social, como
requisito final para obtenção do título
de Mestre em Comunicação Social

Área de concentração:
Comunicação e Sociabilidade
Contemporânea

Linha de Pesquisa:
Processos Comunicativos e Práticas
Sociais

Orientadora:
Profa. Dra. Vera Regina Veiga França

Universidade Federal de Minas Gerais


Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas
Belo Horizonte
Julho de 2009
Ao Lucas, o Sr. Mecânico.
À Júlia, a Linda Rosa Juvenil.
Ao Vítor, o Cavaleiro Fracassado.
E ao tipo de afeto que despertaram em mim.
Que não sabe de distâncias.
Que motiva a outro passo...

1
Agradecimentos

Chegar ao fim deste trabalho não seria possível sem a ajuda de muitos. Talvez nem
mesmo o começaria se eu não tivesse pessoas com quem posso contar. Aos familiares,
suporte constante; aos amigos, apoio seguro que reforçou os laços que nos unem; aos
novos amigos (do Programa, da turma, do GRIS), inspiração e cooperação estimulantes;
aos professores do Programa, admiração motivante; à orientadora, guia cuidadosa e
acolhida carinhosa que faz ir adiante; ao CNPq, fomento que tornou possível minha
dedicação exclusiva; e a todas as demais pessoas queridas que, de alguma forma, estiveram
presentes ou passaram por mim durante este percurso, deixo os meus mais sinceros
agradecimentos.

2
Resumo

Este trabalho tem o objetivo de analisar o enquadramento construído pelo Pânico na TV ao


universo das celebridades, isto é, os significados, valores e o posicionamento que o
programa estabelece para o mundo dos famosos. Além disso, pretende perceber a relação
deste enquadramento com traços da situação sócio-cultural de um público, inscrito,
portanto, em uma perspectiva relacional. A partir desta perspectiva fundante, apresentamos
a busca pelas balizas teórico-conceituais e metodológicas mais adequadas aos nossos
propósitos. As referências que balizam nosso olhar sobre a televisão são apresentadas por
dois eixos complementares: a história da televisão como aparato técnico e como forma de
relação que atende, ao mesmo tempo em que ajuda a criar, demandas sociais e culturais.
Após situarmos a proposta humorística do programa na configuração histórica de um
campo de possibilidade que permite sua existência, apresentamos a nossa compreensão do
humor como vinculação social e indicativo cultural, bem como as formas que parece
ganhar no programa, quais sejam a paródia, a ironia e a sátira. Partimos assim para a
compreensão do conceito de celebridades, tal como se apresenta no cenário contemporâneo
da valorização da visibilidade midiática e das tecnologias de auto-produção e auto-
distribuição de produtos simbólicos. Como metodologia, temos um percurso composto de
etapas mutuamente imbricadas, que usamos para analisar quatro edições do programa: a
análise do panorama de inscrição do fenômeno; a caracterização do objeto enquanto forma
significativa; a análise de conteúdo; e a análise do enquadramento de casos exemplares de
interação entre o programa e quatro tipos de celebridades (uma aspirante a celebridade,
uma recém-célebre de oportunidade, uma ex-celebridade e uma celebridade reconhecida).
Percebemos, com isso, a pluralidade de enquadramentos com que o programa trabalha e
como eles se alinham com a proposta e os valores mais gerais do Pânico na TV.

Palavras-chaves: televisão, humor, celebridades, cultura contemporânea.

3
Abstract

This work aims at the analysis of the framing that a television show – Pânico na TV –
shapes to deal with the universe of celebrities, in other words, the meanings, the values and
the positions that the program stablishes to the world of the famous. Besides that, this work
intends to notice the relationship between this framing and features of the social-cultural
situation of a public, as the work is inscribed in a relational perspective. Within this
perspective, we present the search we made for the most adequate theories, concepts and
mathodology. The references that guide the way we comprehend television are presented
in two complementary axis: the history of television as a technological aparatus and as a
form of relationship that attends, at the same time that helps to create, social and cultural
demands. After situating the humouristic proposition of the show ins a historical
configuration of a field of possibilities that permits its existence, we present our
comprehension of humour as a social linkage and as a cultural indicative, as well as the
forms it seems to gain in the show, such as parody, irony and satire. We then go on to our
comprehension of the concept of celebrities, as it presents itself in the contemporary scene
of the increasing in value of mediatic visibility and of the symbolic products self-
production and self-distribution technologies. As a methodology, we have a path composed
of mutually imbricated phases, that we use to analyse four editions of the show: the
analysys of the context that the phenomenom is inscribed; the characterization of the object
as a significatve form; a content analysis; and the framing analysis of four emblematic
cases of interaction between the show and four different types of celebrities (a celebrity
wannabe, a opportunist recent-celebrity, an ex-celebrity and a reknown clebrity). We could
perceive though the plurality of framings with which the show works and how the are
linked with the wider proposition and values of Pânico na TV.

Keywords: television, humour, celebrities, contemporary culture.

4
Lista de figuras

Figura 1: Página do programa Pânico na TV no site da Rede TV!............................... 94

Figura 2: Planta do estúdio de gravação do programa................................................... 101

Figura 3: Imagem de cenário do Pânico na TV............................................................. 102

Figura 4: Reprodução da tela Whamm (1963), de Roy Lichtenstein............................ 103

Figura 5: Foto painel 3 do cenário do programa........................................................... 104

Figura 6: Imagem televisão de fundo do cenário do programa..................................... 105

5
Lista de tabelas

Tabela 1: As funções da ironia (Hutcheon, 2000, p.76)............................................... 72

Tabela 2: Programas do corpus e datas de exibição..................................................... 87

Tabela 3: Distribuição dos quadros por programa e por bloco.................................... 107

Tabela 4: Estrutura e durações dos programas............................................................. 114

Tabela 5: Distribuição dos oferecimentos por programa............................................. 118

Tabela 6: Celebridades por nº de aparições nos programas......................................... 153

6
Sumário

Introdução..................................................................................................................... 09

1. Um programa sobre TV, um programa de TV 14


1.1. O Programa ........................................................................................................... 14
1.2. A TV....................................................................................................................... 24
1.2.1. A TV: aparato técnico, linguagem............................................................... 29
1.2.2. A TV: usos, funções, propostas de relação.................................................. 40

2. Rir com a TV, rir das celebridades 53


2.1 O Humor.................................................................................................................. 60
2.1.1. Genealogia, vinculação social e indicativo cultural................................... 62
2.1.2. Possíveis formas do humor: ironia, paródia e sátira.................................. 69
2.2. As Celebridades..................................................................................................... 78

3. Apontamentos Metodológicos 87
3.1. Definição do corpus............................................................................................... 87
3.2. Procedimentos........................................................................................................ 88
3.2.1. Análise do panorama de inscrição do fenômeno......................................... 88
3.2.2. Caracterização do objeto enquanto forma significativa.......................... 88
3.2.3. Recorte das situações em que se estabelece a relação do programa com
o universo das celebridades......................................................................... 89
3.2.4. Análise do enquadramento.................................................................... 90

4. O Pânico na TV: enquadrado e enquadrante 91


4.1. O Pânico na TV enquadrado.................................................................................. 93
4.2. O Pânico na TV nas edições analisadas................................................................. 121
4.2.1. Programa 1: O dia da ganância do departamento comercial e do beijo
de Sabrina..................................................................................................... 122
4.2.2. Programa 2: O dia da Playboy de Mônica Veloso................................... 128
4.2.3. Programa 3: O dia de Rubinho, Massa e da Ferrari.................................. 132
4.2.4. Programa 4: O dia da vaca e do leite......................................................... 139

7
4.3. As celebridades no Pânico na TV.......................................................................... 144
4.3.1. Programa 1.................................................................................................. 145
4.3.2. Programa 2................................................................................................ 148
4.3.3. Programa 3.................................................................................................. 150
4.3.4. Programa 4.................................................................................................. 152

4.4. O Pânico na TV enquadrante................................................................................. 154


4.4.1. Vesgo e Sílvio Duas Caras: Globais e Dona Matilde.................................. 155
4.4.2. A mulher que abalou a República........................................................... 161
4.4.3. Rosana, a Deusa.......................................................................................... 169
4.4.4. Marieta Severo, a que tudo pôde................................................................. 172

Considerações Finais................................................................................................... 176


Referências Bibliográficas.......................................................................................... 180
Anexos.......................................................................................................................... 184
Anexo 1: Estruturação, durações e partes dos programas.......................................... 184
Anexo 2: Celebridades Citadas, em Interação e como Campo Semântico.................. 192

8
Introdução

Em seus quase seis anos de exibição, o programa Pânico na TV tem gerado grande
repercussão tanto na mídia quanto no público. A mídia já falou da criatividade do
programa e das novidades que traz para a linguagem televisiva. Porém, na maioria das
vezes, aparecem na mídia acusações acerca dos abusos e do mal gosto do programa, além
dos processos que celebridades movem contra ele. O público reage incorporando ou
rejeitando padrões de comportamento de seus personagens e seus ‘bordões’. Isso pode ser
visto em vários blogs de fãs ou críticos do programa e também no grande número de
vídeos que são postados pelos espectadores em sites como o You Tube. A cada vídeo
postado segue-se uma lista de discussão, em que muita coisa se dá a ver.
Toda essa movimentação, somada à nossa familiaridade com a TV e ao nosso
interesse pela dinâmica da cultura contemporânea, gerou um crescente interesse por este
até então estranho programa. Como entender o crescente sucesso do Pânico na TV? Quais
demandas do público este programa atende ao construir seu humor com a “canibalização”
de elementos da própria lógica da televisão? Na relação que o programa propõe estabelecer
com as celebridades midiáticas, é possível pensar em uma operação de re-enquadramento?
Em que esta operação, bem como a proposta mais geral do programa, se relaciona com
outros fenômenos midiáticos contemporâneos, podendo, assim, ser considerada reflexo e
vetor de força de uma dinâmica sócio-cultural?
Estas foram algumas questões que o Pânico na TV nos suscitou e que acabaram
por tomar a forma de um projeto de pesquisa. Como objetivo geral, pretendemos analisar o
enquadramento construído pelo Pânico na TV ao universo das celebridades, isto é, os
significados, valores e o posicionamento que o programa estabelece para o mundo dos
famosos, na relação deste enquadramento com traços da situação sócio-cultural de um
público. Esta questão central nos leva a outros objetivos, até mesmo como forma de nos
preparar para tentar apreender os indícios para os quais ela aponta. Sentimo-nos, assim,
impelidos a elaborar uma caracterização minuciosa do programa enquanto forma
significativa, revelando as misturas pelas quais se constrói e a expectativa que gera a partir
destas misturas. Pareceu-nos necessário também compreender o panorama sócio-cultural
em que o Pânico na TV se insere, com o intuito de perceber quais traços de determinado
contexto são articulados pelo programa na tentativa de estabelecer vínculos com seu
público. Dessa forma, pensar o programa em relação a outros fenômenos, propriamente

9
midiáticos ou não, se tornou tarefa importante. Por fim, e como forma de aproximação de
nossa questão central, nos propusemos a compreender a ordem da interação instaurada por
alguns dos personagens do programa em seus encontros com membros, ex-membros e
aspirantes a membros do universo das celebridades.
As indagações que fazemos se inserem em um quadro maior de discussão sobre o
campo da Comunicação e sobre os pressupostos gerais do conhecimento científico, de
maneira ainda mais abrangente. Recortes rígidos e conceitos dicotômicos que tentavam
apreender os objetos da comunicação em causalidades mecânico-positivistas têm sido
abandonados em favor de uma compreensão relacional do processo que tais objetos
permitem acontecer. Assim, acreditamos ser pertinente apresentar, de início, a perspectiva
fundante que guia nossa busca pelo referencial teórico-metodológico mais adequado aos
nossos objetivos. Como dissemos, nossa perspectiva preza pela compreensão relacional
dos processos comunicativos. Tal visada vai além do estudo do funcionamento estrito dos
meios de comunicação, mas sem deles prescindir, tratando a comunicação como um
processo de construção conjunta entre interlocutores (sujeitos sociais), a partir de discursos
(formas simbólicas que trazem as marcas de sua produção, dos sujeitos envolvidos e do
contexto) em situações singulares dentro de um panorama sociocultural – como nos ajuda a
entender, principalmente França (2002). Tomando a televisão inscrita nas relações mais
amplas da experiência cotidiana e da vida social, e também como um ambiente específico
dotado de regras, recursos e formas de se fazer reconhecer próprios, a perspectiva que
adotamos privilegia a inscrição circular da televisão na vida social. Dentro desta dinâmica,
programas são tomados como propostas e produtos da interação TV/telespectadores em sua
materialização de temáticas e valores em ressonância ou não com expectativas e gostos da
audiência. Reforçamos, destarte, que tentaremos analisar o Pânico na TV como uma
prática de comunicação que se abre como ângulo privilegiado de onde olhar determinada
dinâmica sócio-cultural.
Além disso, nossa perspectiva não pode prescindir de uma compreensão sobre o
meio e sua realidade tecnológica; sua linguagem e as propostas de relação que permitem
acontecer; assim como não pode prescindir de uma mirada histórico-contextual destes
aspectos. Iniciamos nosso trabalho apresentando, no primeiro capítulo, uma caracterização
empírica introdutória de nosso objeto, seu histórico e sua proposta enquanto programa de
televisão. O texto segue apresentando, ainda no primeiro capítulo, as referências que
balizam nosso olhar sobre a televisão. Tais referências são apresentadas por dois eixos

10
complementares: a história da televisão como aparato técnico e como forma de relação.
Para o primeiro eixo, nos apoiamos, principalmente na obra de Williams (1975) que
propõe pensar a televisão como tecnologia e como forma cultural. Como apoio central, esta
idéia nos permitiu acionar outros autores, evitando determinismos simplificadores. Assim,
pudemos pensar a televisão como parte de uma rede de aparatos tecnológicos e de uma
dinâmica cultural, ambas em movimentação constante. Para o eixo complementar – o que
pensa a história da televisão como evolução de uma forma de relação que atende, ao
mesmo tempo em que ajuda a criar, demandas sociais e culturais –, achamos iluminadoras
as idéias de Missika (2006), principalmente. Partindo da proposta de Eco (1984) e de sua
nomenclatura para as eras da TV, o autor acrescenta a era de uma Póstevê. Para não
cairmos na cômoda idéia de se pensar uma história como substituíção de períodos
cronologicamente organizados, preferimos tratá-las como tipos de disposição possíveis de
públicos em sua relação com a TV, em toda a sua pluralidade. Além disso, relacionamos
estes tipos de disposição às idéias de Bateson (1989) sobre os níveis de aprendizagem.
Por nosso objeto se apresentar como um programa televisivo de humor, no segundo
capítulo apresentamos uma breve discussão sobre gêneros televisivos, menos com o
objetivo de classificar taxonomicamente nosso objeto, e mais para tentar localizá-lo na
configuração histórica de um campo de possibilidade que permite a existência de um
programa com a sua proposta. Apresentamos, na seqüência, o resultado de nossa busca
pela compreensão do humor como vinculação social e indicativo cultural. Para isso, foram
preciosas as leituras de Minois (2003) e de Bergson (2004). Procuramos também tentar
entender o humor nas formas que parece ganhar no programa, quais sejam a paródia, a
ironia e a sátira. Nesta tarefa, as contribuições de Hutcheon (1986, 2000) e de Muecke
(1970) se mostraram o caminho principal, no percorrer do qual pudemos acrescentar outras
idéias relevantes.
O segundo capítulo também traz a discussão que guiou nossa compreensão sobre o
conceito de celebridades. Partindo das noções clássicas, como as de Morin (1989, 1997),
procuramos pelas transformações que podem ser atribuídas a este conceito, ao longo da
movimentação social, cultural e tecnológica a que vínhamos nos referindo anteriormente.
Procuramos entender, com isso, como o conceito de celebridades se fragmenta no cenário
contemporâneo, marcado por uma alta valorização da visibilidade midiática e por
tecnologias que permitem aos sujeitos comuns se midiatizarem para se lançar à disputa por
tal visibilidade. Acreditamos que é mesmo a fragmentação, dispersão e mesmo banalização

11
do conceito que tornam possíveis que as celebridades, assim como o desejo e o processo de
celebrização, sejam alvos de propostas ridicularizantes.
Apresentamos no terceiro capítulo nosso corpus, composto por quatro edições do
Pânico na TV, além de nosso percurso metodológico. Para dar conta de nossos objetivos,
propomos um método composto de quatro etapas mutuamente imbricadas: a análise do
panorama de inscrição do fenômeno; a caracterização do objeto enquanto forma
significativa; a análise de conteúdo; e a análise do enquadramento. Percorremos estas
etapas com a consciência de nossa condição de intérprete, marcada por um lugar e um
olhar específicos. Se consideramos nosso objeto como o resultado de um complexo de
relações – sobre algumas das quais nossa análise pretende lançar luz –, devemos considerar
também como um complexo de relações o próprio percurso analítico e seus resultados.
Acreditamos ter chegado a uma cuidadosa interpretação dos indícios, mas que não encerra
o objeto nem esvazia por completo as perguntas lançadas. Ao contrário, deve nos levar a
outros questionamentos.
O quarto capítulo traz a análise que procedemos junto ao corpus. Após uma
caracterização geral dos programas analisados, percebidos tais como inscritos em um fluxo
de enquadramento que vai para além deles, apresentamos a estruturação de cada uma das
edições selecionadas, procurando ver como elas mobilizaram a proposta do programa e
destacando as peculiaridades que tiveram. Com o intuito de localizar as celebridades nos
programas do corpus, criamos, a partir de uma análise de conteúdo, um mapa de aparições
distribuídas em três categorias: celebridades citadas, celebridades em interação e
celebridades como campo semântico. O resultado da leitura deste mapa é apresentado e, a
partir de determinadas regularidades e preferências percebidas, selecionamos quatro casos
exemplares que levamos para a etapa seguinte: o da análise de enquadramento. Apoiamo-
nos para esta análise em Goffman (1986, 1999) e seus conceitos de quadro de sentido (ou
frame) e da ordem interacional. Além destes conceitos, nos apoiamos também na idéia de
que estes quadros de sentido são, de certa forma, negociados entre os interagentes, nem
sempre dotados de força de definição equiparáveis. Assim, tentamos ver a força de
enquadramento, ou seja, de definição do quadro de sentido para a ordenação da interação
do Pânico na TV, a partir da relação de alguns de seus integrantes com quatro tipos de
interatores: uma aspirante a celebridade, uma recém-célebre de oportunidade, uma
decadente ex-celebridade e uma celebridade institucionalmente reconhecida.

12
Nas considerações finais, destacamos, em uma síntese, nossos principais achados,
assim como os pontos que se mostraram mais relevantes em nosso percurso teórico e
metodológico. Compondo os anexos, estão as tabelas que apresentam a estruturação e as
durações dos programas com que trabalhamos, além da grade completa que nossa análise
de conteúdo gerou.

13
1. Um programa sobre TV, um programa de TV

Fazíamos um programa de rádio pra moleque, mas


entender a linguagem da televisão é outra coisa. Rádio eu
domino e sei o que é bom, mas não televisão. O Gugu e o
Faustão colocam no ar aquilo que eles sabem que pode
dar certo. A gente coloca o que a gente acha engraçado.
(Emílio Surita, Playboy, dezembro de 2004)1

1.1. O programa

O Pânico na TV está no ar desde 28 de setembro de 2003 e faz parte da


programação de domingo2 da Rede TV!. Inicialmente, o programa tinha duração de uma
hora e era exibido às 18h00. A escolha por este dia da semana e este horário diz da
estratégia de brigar pela audiência, principalmente, com o Domingo Legal (SBT) e com o
Domingão do Faustão (Rede Globo). Além de serem os mais representativos programas
dominicais de auditório da recente história da televisão brasileira, estes últimos são base a
partir da qual o Pânico na TV configura parte de sua linguagem, como veremos.
Devido à popularidade e ao número de anunciantes-patrocinadores que foi
ganhando, o programa passou a ter duração média de duas horas e meia3. Em seus dois
primeiros anos de exibição, conseguiu excelentes índices de audiência, com picos de até 13
pontos, apesar da forte concorrência, da baixa verba de produção e da emissora
relativamente inexpressiva em que era veiculado. Em 23 de setembro de 2005, comemorou
um segundo lugar na audiência mandando um abraço para o Gugu, apresentador do
programa do SBT que a Rede TV! havia ultrapassado. Dados mais recentes dizem que o
programa tem atingido picos de 17 pontos, tem alcançado por diversas vezes a segunda
colocação e, em algumas destas vezes, tem ficado a poucos pontos da líder Globo: apenas
um no dia em que Galvão Bueno finalmente dançou a ‘Dança-do-Siri’, por exemplo. Além
disso, no levantamento TOP 5 do IBOPE4, o Pânico na TV é, via de regra, o líder de
audiência de sua emissora e, consequentemente, é responsável pelo espaço em intervalo

1
Disponível em <http://www.panicojp.blogger.com.br/2004_12_01_archive.html>. Acessado em 26 de
fevereiro de 2008.
2
O programa conta também com uma reprise editada para uma hora de duração que vai ao ar todas as sextas-
feiras por volta das 23h30.
3
A duração do programa pode sofrer pequenas alterações em função do número de atrações e de
merchandisings que cada edição exibe. A tabela 4, na página 114, mostra as durações das edições que
analisamos.
4
Levantamento dos 5 programas de maior audiência por emissora e por semana na Grande São Paulo. Os
outros dados relativos a audiência apresentados neste parágrafo também são medições do IBOPE na Grande
São Paulo.

14
comercial mais caro da Rede TV!5. Em abril de 2009, o programa bateu seus recordes de
audiência (com médias de 11 pontos), se mantendo em segundo lugar por 59 minutos
consecutivos.
Ao lado desta ascensão numérica, a parte bem-sucedida do histórico do Pânico na
TV conta com algumas críticas que reverenciam o caráter inovador da linguagem do
programa, com ovações em forma de comentários que seus telespectadores espalham pela
internet em blogs, comunidades virtuais e espaços afins. A Revista Oi, por exemplo,
publicou em sua 16a edição, a do bimestre abril-maio de 2005, uma matéria sobre três dos
mais representativos integrantes do Pânico na TV: Sabrina Sato e a dupla Vesgo e Sílvio.
O tema desta edição da revista foi “Evoluções e Mutações” e o trio foi o assunto da matéria
“Ação mutante”, cujo lead diz:

O Pânico sacudiu os domingos ao reler, com escracho quase tropicalista,


formatos tradicionais e estagnados da TV e do humor. Rodrigo, Ceará e Sabrina
(mais conhecidos como Vesgo, Sílvio Santos e, bem, Sabrina) falam dos rumos
da televisão e de sua própria evolução. (Revista Oi, abril-maio de 2005, p.25)

O ensaio fotográfico com os integrantes do Pânico que ilustra a matéria os retrata


com o visual clássico dos extintos Mutantes (túnicas negras e chapéus de bruxo) e vestidos
como Chacrinha e Chacrete. No texto, a explicação da opção por esta caracterização diz
que, assim como a turma do Pânico na TV, aqueles “misturaram novidade e tradição para
criar rumos mais engraçados, criativos e malucos para a cultura pop.” (Idem, p. 26)
Contudo, este histórico também conta com críticas negativas, reclamações de
organizações da sociedade civil que zelam pela qualidade da televisão e processos
judiciais. No dia 28 de julho de 2006, por exemplo, a 20ª Vara Cível do Rio de Janeiro
condenou a RedeTV! a indenizar a atriz Carolina Dieckmann em R$ 35 mil por danos
morais. A decisão se refere ao caso em que o Pânico na TV perseguiu a atriz no quadro
"As Sandálias da Humildade". Ainda segundo essa decisão, a emissora também ficou
proibida de fazer referência ao nome da atriz e de exibir a sua imagem ou a do local onde
reside em sua programação. No processo, Carolina Dieckmann alegou que teve sua vida
privada e tranqüilidade violadas ao ser perseguida em seus afazeres diários por Rodrigo
Scarpa (Vesgo) e Wellington Muniz (Ceará). A perseguição atingiu seu ápice quando eles
foram ao condomínio onde ela mora com guindastes e megafone. A Rede TV! entrou com

5
R$ 42.237,00 para um comercial de 30 segundos em outubro de 2005, segundo Beatriz Becker (2005) que
percebeu que apenas na Rede TV! e no SBT, os custos mais altos de veiculação publicitária não são em
programas jornalísticos.

15
um recurso que alegava a natureza humorística do programa e a não intenção de macular a
imagem da atriz. Alegou ainda que o processo movido por Carolina Dieckmann tinha a
intenção de censurar as atividades do programa e da emissora. O recurso foi recusado pelo
juiz que, considerando a natureza do programa essencialmente humorística e não
jornalística ou informativa, concluiu que a tese defensiva de que devem ser preservados a
liberdade de imprensa e o direito de informar não se aplica ao caso. Como o propósito do
quadro “As Sandálias da Humildade” era o de “premiar” celebridades tidas como
antipáticas e soberbas, o juiz ainda achou necessário incluir em sua sentença que "a atriz
não tem nenhuma obrigação de ser simpática com ninguém, eis que não existe nenhuma lei
que lhe imponha tal obrigação"6.
Além deste e de outros processos por danos morais, apelo à baixaria e regras
sociais transgredidas preenchem esta parte da história do Pânico na TV que, em alguns
casos, teve que se mexer. Um problema com o Ministério Público7, em março de 2006, fez
com que o horário de exibição do programa fosse alterado. O Pânico na TV passou a entrar
no ar às 20h30 e não mais às 18h00. Recentemente, em maio de 2009, o programa foi
reclassificado pelo Ministério Público como impróprio para menores de 14 anos e para
exibição antes das 21h008.
Claro, estes números, cifras e acontecimentos indicam que o Pânico na TV
experimenta um sucesso crescente de público. No entanto, não dizemos deste sucesso para
reforçar o aspecto massivo de nosso objeto, muito menos para julgar – para o bem ou para
o mal – o programa e sua audiência. Queremos aqui defender que este “ibope” põe em
relevo uma eficiente interação comunicativa, ou seja, que o Pânico na TV cria, reflete,
mobiliza, enfim, valores, expectativas e gostos de um público. Isso nos leva a acreditar que
a leitura do programa, inserido em uma dinâmica maior que lhe confere sentido – e, por
que não dizer, audiência – pode nos dizer de determinada disposição cultural.

6
Segundo matéria “Carolina Dieckmann ganha ação contra turma do Pânico”, publicada na Folha online no
dia 28/07/2006. Disponível em <http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u62906.shtml>. Acessado
em 15 de janeiro de 2009.
7
Em uma liminar, o Ministério Público considerou as cenas de simulações de agressão física, de exposição
de pessoas em situação constrangedora ou degradante e o uso de linguagem depreciativa e erotismos do
programa impróprios para menores de 12 anos.
8
Desta vez, o Ministério reclassificou o programa por valorizar a beleza como condição imprescindível,
expor minorias em situação degradante e por conter linguagem e cenas de conteúdo erótico. Segundo matéria
“Ministério Público altera classificação indicativa do programa Pânico na TV”, publicada no site Portal
Imprensa em 05 de maio de 2009.
Disponível em <http://portalimprensa.uol.com.br/portal/ultimas_noticias/2009/05/05/imprensa27838.shtml>.
Acessado em 20 de maio de 2009.

16
O programa é a versão televisiva de um também popular programa de rádio: o
9
Pânico , que vai ao ar de segunda à sexta, das 12h00 às 14h00, na rede nacional Jovem Pan
há mais de 16 anos e que tem uma audiência estimada em 17 milhões de ouvintes em 749
municípios brasileiros. Esta emissora, no ar desde 1o de julho de 1976, se posiciona,
segundo apresentação de seu próprio site10, como uma rádio inovadora e de referência para
as rádios FM. Destaca-se também que a Jovem Pan sempre investiu em equipamentos
modernos e em uma linguagem jovem, com a preocupação de “estar sempre à frente de seu
próprio tempo”. Ainda segundo o site, esta preocupação se desdobrou no constante sucesso
de audiência junto ao público jovem e no tom de “irreverência inteligente” em uma
programação “em total sintonia com o que de mais avançado existe no mundo atual”.
No rádio, o programa começou voltado para o público adolescente e jovem e, aos
poucos, o tom escrachado foi tomando forma. Nas palavras de Emílio Surita, idealizador e
apresentador dos programas na rádio e na TV,

no início era um programa de enquete, de duas horas, pra jovens de 15 a 24 anos.


A idéia era fazer um programa como o do Serginho Groisman, que discutisse
algum tema atual, como gravidez na adolescência ou drogas. Eu ficava no
estúdio com um convidado e tinha os repórteres na rua entrevistando o pessoal.
Mas o pessoal que ligava só queria saber de pedir camiseta, boné, música e
enchia o saco. A gente com uma médica ali esperando perguntas decentes e nada.
Quando começamos a atender mal, a coisa ganhou repercussão e os telefonemas
aumentaram. Nunca fizemos pesquisa para saber, mas percebemos que a gente
estava tratando os moleques como eles se tratam. Estava descoberta a fórmula.
Até então era aquela coisa: " Oi, tudo bem? De onde você fala? De Sapopemba?
Que beleza, que bairro bom!" Mas, quando a coisa foi pro outro lado - "Nossa,
como você mora mal" -, as pessoas gostaram mais. Depois, a gente também
começou a passar trote. (Playboy, dezembro de 2004)

Interessante perceber como, de acordo com Surita, o tom do programa foi sendo
moldado na relação com seu público. Nesta relação, valores se deixaram ver –
espontaneidade, “curtição” e até mesmo agressividade – e foram incorporados ao que o
Pânico é. Para além destes valores, a relação do programa com seu público também deixa
ver um esforço constante na negação de outros valores – a falta de compromisso, a falta de
seriedade e a falta de cuidado com a figura do outro. É forte na fala de Emílio Surita a idéia
de que a fórmula do programa estava descoberta quando perceberam que estavam
“tratando os moleques como eles se tratam”. Deste trecho, destacamos que, apesar da

9
Além das versões para rádio e tv, o grupo tem um site oficial <www.paniconainterne.com.br>, um blog
oficial <www.jovempanfm.com.br/frame.php?page=/wblog/panico/> e uma loja virtual, a Bacana Records
<http://www.lojadopanico.com.br>, em que são vendidos produtos relacionados ao programa, como
camisetas com o nome de seus quadros ou com os bordões que utiliza.
10
Disponível em <www.jovempanfm.com.br>. Acessado em 04 de novembro de 2008.

17
bagunça anunciada, o programa adquiriu sim uma fórmula. Destacamos também o uso do
termo “moleques”, carregado com a noção de descompromisso11, e como eles mesmos se
tratam, de pessoas que não devem ser levadas muito a sério, já que foi dito que o programa
passou a se dirigir a eles como eles se dirigiam a si mesmos. Ampliando esta conclusão,
acreditamos que esta forma de tratamento não se restringe à relação programa/público, mas
se desdobra na forma mesmo como os integrantes do programa se relacionam entre si. A
partir disso, podemos pensar que o programa não apenas se dirigia a “moleques”, mas
criou um terreno, por identificação/cumplicidade e pela visibilidade midiática que tem, em
torno do qual uma comunidade de “moleques” poderia se agregar.
Enfim, de uma proposta de programa tradicional de informações para o público
adolescente, o programa se tornou um entretenimento que fazia rir. Novos personagens-
apresentadores foram incorporados e entrevistas irreverentes com famosos, com entrada ao
vivo e sem censura de ouvintes, dão, atualmente, forma ao Pânico. Com as seguintes
palavras, que reforçam o seu tom descompromissado e agressivo, o programa é
apresentado no site da Jovem Pan:

Como explicar o sucesso de um programa de rádio que maltrata todos os seus


ouvintes, que não tem locutores com vozes bonitas, não tem produção, não dá
informação nenhuma e não está nem aí com nada?...Mas existe um programa
assim?...Na Jovem Pan, sim!...

Em 2001 tem início o projeto da versão televisiva, quando Tutinha, dono da Jovem
Pan, apresentou à presidência da Rede TV! a proposta de fazer o Pânico na televisão. Esta
foi aceita nos seguintes termos: a Rede TV! liberaria durante três meses o espaço em sua
grade como teste, mas não investiria dinheiro, e ofereceria também liberdade total aos
produtores do programa. Gostaríamos de destacar aqui este traço do ambiente institucional
que permitiu ao Pânico na TV ser o que é ou, pelo menos, de se construir discursivamente
como inovador e irreverente. Em 2003, a Rede TV!, uma “jovem”12 emissora no ar há
apenas quatro anos (desde novembro de 1999), não ocupava mais que a quinta colocação
entre as emissoras de TV aberta, mesmo com seus melhores programas13. Não tinha muito
o que perder na tentativa de incomodar suas concorrentes na briga por audiência.

11
Além de ser um termo que pode ser considerado ofensivo.
12
A Rede TV! foi formada a partir da extinta TV Manchete. É, portanto, uma emissora apenas relativamente
“jovem”.
13
Melhores em termos de audiência, como era o caso do Superpop, apresentado por Adriane Galisteu (entre
1999 e 2001) e depois por Luciana Gimenez

18
Tampouco já tinha cristalizado padrões para suas produções ou uma imagem institucional.
Em menos de dez anos no ar, a emissora apresentou considerável crescimento “de
audiência, qualificação e aumento de emissoras”, como diz em seu site14. Surita é sensível
à realidade institucional que circunda seu programa e diz, quando perguntado se o Pânico
daria certo na Globo:

Não. A Globo é muito careta. Dificilmente poderíamos fazer o que fazemos na


Rede TV! A Globo tem estrutura, mas não tem o nosso espírito. Não fazemos
várias reuniões para decidir as coisas por exemplo. Muita coisa que colocamos
no programa surge de um papo informal quando saímos para tomar alguma coisa
ou numa churrascaria. (Playboy, dezembro de 2004)

Surita não diz isso apenas com a idéia que ele faz, ou talvez todos nós fazemos, da
Rede Globo. Ele teve uma rápida e mal-sucedida experiência nesta emissora. Juntamente
com Marcos Chiesa (o Bola), foi convidado por Luciano Huck para fazerem parte do
Caldeirão. A idéia era que ficassem tecendo comentários ao longo do programa nas tardes
de sábado da Globo. Comentários, obviamente, com o tom “politicamente incorreto” do
programa de rádio. “Mas, na Globo, 99% do que falamos não pode ser falado. Com isso
acabamos ficando sem função. Quando mudou o diretor, a gente saiu.”, explica.
A partir da aceitação da proposta pela Rede TV!, em 2001, e durante dois anos, a
equipe do Pânico na rádio conviveu com câmeras que transmitiam o programa pela
internet. O intuito era o de que seus integrantes fossem adquirindo intimidade com a tela.
Com uma verba de produção de cinco mil reais, o Pânico na TV entra no ar em 2003, com
sua logo estampada em uma cartolina. Isso não representa nenhum demérito para o
programa. Pelo contrário, marca seu estilo até hoje – o tosco, o mal-acabado, o “qualquer
um pode fazer” – mesmo quando nitidamente já não tem problemas com verba.
Este estilo também pode ser percebido na escolha do elenco para a versão de TV.
Além dos já apresentadores do programa de rádio, com pouca ou nenhuma experiência em
televisão, vários outros apresentadores-personagens eram inexperientes, o que reforçou o
tom de improviso, de autenticidade e irreverência do Pânico na TV. Exemplo mais
marcante disso é o Repórter Vesgo, um dos carros-chefe do programa. Rodrigo Escarpa,
que o “interpreta”, era um fã-ouvinte que sempre ligava para participar na rádio, ou para
“aparecer”, como diz Surita, e acabou sendo convidado para o programa de TV. Carlos

14
Disponível em <www.redetv.com.br>. Acessado em 19 de junho de 2008.

19
Alberto Silva, que interpretava o Mendigo15, entre outros personagens, era office-boy da
Jovem Pan. Assim foi sendo constituída a trupe do Pânico na TV. Sobre a entrada de
Sabrina Sato, ex-participante do reality show Big Brother Brasil, Emílio Surita explica em
poucas palavras: “a Sabrina entrou no programa porque todo mundo era feio, e na
televisão, precisávamos de uma mulher gostosa”. Estes e outros integrantes e personagens,
alcançaram grande reconhecimento junto ao público, em um processo que os
transformaram de pessoas comuns a “celebridades”. Com isso, podemos pensar que o
programa, por mais que se proponha na “contra-mão”, não escapa a certas regras
específicas do se fazer televisão, como aquela que postula o poder da televisibilidade e a
consequente celebrificação dos que aparecem na telinha.
O Pânico na TV foi pensado com ares de programa de auditório, com a transmissão
ao vivo diante de uma platéia de aproximadamente 150 pessoas. A idéia era justamente
partir deste que é um dos mais tradicionais formatos da televisão brasileira, principalmente
aos domingos. Por ser tão tradicional, é também um formato que parece resistente a
mudanças. Esta foi a oportunidade que a equipe do Pânico viu para inovar. A proposta era,
então, de fazer um programa de auditório, mas diferente dos outros. Uma primeira
diferença pode ser percebida na relação de personificação que o programa de auditório tem
com o seu apresentador. É nítido que Emílio Surita faz as vezes de apresentador-âncora,
mas vários outros apresentadores-personagem estão com ele no palco simultaneamente e
com o microfone aberto, aparentemente, para a intervenção que quiserem, na hora em que
quiserem. Todos juntos, num tom de “bate-papo” entre amigos, vão costurando os vários
quadros e momentos de merchandising do programa. Isso reforça a imagem de
espontaneidade sem regras que pretendem mostrar. Cunha (2005) assim definiu o Pânico
na TV em seu trabalho:

Arriscando uma definição geral para o Pânico na TV, diríamos que ele é um
show de besteirol que tem como principal apelo a desconstrução do glamour das
celebridades, o escracho e a veiculação do inusitado na TV, tudo isso feito de
forma caótica, no limite tênue entre realidade e ficção, verdade e mentira. (Cunha,
2005, 187)

15
Carlos Alberto Silva e Marcos Vinícius Vieira (o Gluglu) deixaram a o Pânico na TV no final de 2007.
Estão agora no Show do Tom na Record.

20
A autora também nos lembra que, apesar de propor uma ruptura com os programas
de auditório, o Pânico na TV lança mão de vários recursos que os outros16 também usam.
Ela cita, como exemplo, o uso de tarjas e letterings que criam a expectativa sobre as
atrações vindouras do programa e conclui que o objetivo último de todos é o mesmo: a
manutenção da atenção do telespectador. Concordamos com essa conclusão. Trata-se de
um programa que vai ao ar em uma rede aberta e comercial de televisão. A manutenção da
audiência é, sem dúvida, imprescindível para a lógica deste mercado. No entanto,
gostaríamos de ir além desta conclusão para enfatizarmos a necessidade do programa, em
sua proposta parodística, de manter referências explícitas às fontes da paródia17 (os
programas de auditório, neste exemplo). Romper completamente com esta linguagem
colocaria em risco a capacidade do público de fazer a prazerosa referência ao que parece
ser o “alvo” dos ataques do Pânico.
Sabrina Sato, na matéria da Revista Oi, define sem dificuldades o programa de que
faz parte:

Parece aquilo que a gente fazia na escola, aquilo de sacanear o tempo todo todos
os colegas e a professora, que é meio surda... É um humor juvenil, sem respeito
por nada, diferente do humor dos velhos, do Chico Anysio, por exemplo.
(Revista Oi, abril-maio de 2005, p.25)

Vejamos agora como Emílio Surita define o programa, ao responder a pergunta


“Então, como você classifica o Pânico na TV?” na entrevista que concedeu à Playboy:

Eu acho que se trata de um programa anárquico. Não chega a ser humorístico,


porque humor costuma seguir um texto afiado. No nosso caso, a coisa foge
totalmente do script. Mas o charme do programa é justamente ser essa coisa que
as pessoas não sabem definir direito. Tem muita mistura. O Pânico é feito por
uma molecada. É claro que tem alguém para coordenar, colocar ordem na casa. E
esse alguém sou eu. Mas a criação do programa é coletiva. Todo mundo senta e
resolve o que fazer. (Playboy, dezembro de 2004)

É com esse tom de “anarquia sem regra”, “de molecada de escola” e de “criação
coletiva” (coletividade que o programa propõe ir além de sua equipe e englobar também
sua audiência) que o Pânico na TV se apresenta como proposta de interação marcada pelas

16
Em seu trabalho, a apresentação do Pânico na TV é feita em paralelo e, às vezes em comparação, com a
apresentação do Domingo Legal. Ambos objetos empíricos de sua pesquisa. Disponível em
<http://www.fafich.ufmg.br/gris/biblioteca/teses>. Acessado em 22 de setembro de 2008.
17
Trataremos, em profundidade, do conceito de paródia no próximo capítulo. Por enquanto, basta a idéia
senso comum: imitação com resignificação como forma de humor.

21
idéias de autenticidade e de espontaneidade. O programa recheia sua transmissão ao vivo
com quadros e esquetes, gravados e editados, que parecem não respeitar ordem alguma.
Segundo Surita, quem decide o que fica ou sai do programa é o público. Os quadros,
inclusive os já consagrados, nem sempre estão em todas as edições ou, às vezes estão, mas
não têm a temática costumeira. Um tipo de esquete que aparece hoje pode nunca mais ser
visto.
Contudo, em meio a tanto caos, algumas constantes podem ser percebidas. Uma
delas é justamente a própria proclamação do caos, um uso retórico das idéias de
autenticidade, de espontaneidade, de descompromisso e também de indefinição, presente
na fala de Surita quando diz que o charme do programa é “ser essa coisa que as pessoas
não sabem definir direto”. Com isso, o Pânico na TV mostra muita consciência do papel
que pretende desempenhar.
Outra constante é a exploração e ridicularização da figura do outro – quer sejam
dos outros comuns; quer sejam das celebridades, subcelebridades ou aspirantes a tal; dos
telespectadores ou mesmo de seus integrantes.
A relação do Pânico na TV com as celebridades é alardeada como o principal traço
de inovação do programa, inclusive quando comparado a outros programas. Vejamos em
Cunha (2005):

Aquilo que incontestavelmente o Pânico na TV consegue modificar é o tipo de


relação que os programas de auditório estabeleciam até então com as
celebridades. Como é de praxe, estes programas de auditório sempre giraram em
torno da presença de artistas e famosos de modo geral que iam até lá fazer
apresentações, (…) revelar detalhes sobre sua vida íntima. O mais comum era
que todos os programas supervalorizassem as celebridades, ressaltando o talento,
a beleza, a inteligência e o glamour de suas vidas. (…) Mas o que o Pânico na
TV parece trazer de novo é o fato de, para muitos, ele se colocar na linha tênue
que separa aquilo que, consensualmente, é aceitável ou não. (Cunha, 2005, 190-
1)

Esta colocação da autora parece ecoar a idéia presente no texto que introduz a
entrevista de Surita na revista Playboy.

Tanto os programas de auditório convencionais quanto o Pânico na TV


dependem de gente famosa para conquistar audiência. Mas, enquanto Fausto
Silva e Gugu celebram o trabalho e exemplo de vida de qualquer famoso que
adentre o palco, Emílio Surita e sua turma esculhambam essa mesma turma sem
dó nem piedade. (Playboy, dezembro de 2004)

Marta Suplicy, ex-prefeita de São Paulo, foi ridicularizada com uma versão das

22
então famosas sandálias, as galochas da humildade, quando um túnel que havia inaugurado
alagou logo na primeira chuva. Disseram que Daniella Cicarelli tinha seis dedos em um de
seus pés. Irislene Stefanelli, ex-BBB7, é constantemente chamada de “arroz de festa”.
Paulo Maluf ouviu perguntas sobre as senhas de suas contas na Suíça. Schumacher recebeu
de presente, em uma coletiva de imprensa, uma tartaruga, que o programa disse ter sido
enviado por Rubens Barrichello. E os exemplos não param por aí. No entanto, a proposta
de operar na desconstrução ou desglamourização das celebridades é controversa por vários
motivos. Trataremos disso ao longo de todo o trabalho. Nas palavras de Emílio Surita, a
relação de seu programa com as celebridades pode ser entendida como um “anticolunismo
social”.

É um colunismo com o olhar do telespectador mais crítico. Quando você está em


casa, comenta: "Nossa, não agüento mais ver esses big brothers na televisão" ou
"até quando esses caras vão estar aí?" O Vesgo faz sucesso porque ele sempre
vai chegar em alguém que o telespectador não gosta. (Idem)

Vesgo, na matéria da Revista Oi, quando perguntado sobre o que achava da


colocação feita por um jornalista de que ele “expõe o ridículo de uma das principais
características da cultura atual: o culto vazio aos famosos” 18, diz, reforçando o vínculo de
cumplicidade com o público que Surita faz questão de anunciar:

A gente chegou para questionar, mas não somos justiceiros nem juízes da
arrogância alheia. Quando escolhemos alguém para calçar as sandálias da
humildade, tentamos refletir a opinião pública. Agora, se o entrevistado entra no
clima e brinca com a gente, maravilha. Não estamos nessa só para acabar com os
artistas: o importante é o telespectador se divertir. (Revista Oi, abril-maio)

Podemos perceber nestas falas, mais um aspecto que indica como o Pânico na TV
se conforma como um produto televisivo: a lógica da audiência, a necessidade de “ibope”,
como já havíamos dito com Cunha (2005). Contudo, lembramos que não consta em nossos
objetivos definir o quão repetição ou subversão é o Pânico na TV, mas pensar na
especificidade daquilo que apresenta como proposta de relação (e, claro, disputa por
audiência) e como isso pode nos indicar determinados traços sócio-culturais.
Surita explica que a relação que o programa promete estabelecer com as
celebridades, que passou a ser quase sinônimo do pânico que pretendem gerar, surgiu, mais

18
A matéria na Revista Oi, não diz qual o jornalista, nem de qual veículo retirou a citação. Não tivemos,
portanto, como referenciá-la devidamente.

23
uma vez, de uma contingência. Na proposta inicial, queriam levar atrações, principalmente
musicais, para o palco do Pânico na TV. Porém, ou pela inexpressividade do programa no
começo, ou pelo tom pesado que tinha, as atrações se recusavam a ir e “nem mesmo
atendiam os nossos telefonemas”, conclui.

Foi quando a gente resolveu ir às festas para ferrar esses filhos da puta que não
queriam ir ao programa [risos]. Tinha o programa do Amaury Júnior e a gente
fez algo por aí. Assim o Rodrigo virou o repórter que vai atrás das celebridades
para sacaneá-las. (Idem)

Estas “sacanagens”, além de responsáveis por atrair determinados grupos de


espectadores e por repelir outros, também já foram responsáveis por problemas que o
programa e alguns de seus integrantes tiveram que lidar. Além dos processos judiciais, de
que já falamos, Vesgo recebeu um murro do ator global Victor Fasano após ouvir do
repórter a frase: “Victor, faz anos que a gente não te vê na televisão.” Ceará já teve que
implantar pinos e placas de titânio no pulso após ter invadido, fantasiado de Pelé, um
campinho de futebol na Argentina e de ter recebido uma “entrada dura” de um dos
argentinos que lá jogavam. Tais episódios parecem comprovar para o público que o
programa não tem limites em suas tentativas de “sacanear” os outros.
Por fim, através desta maneira proclamada de se relacionar com as celebridades, e
para além dela, podemos perceber mais um traço unificador da bagunça que o Pânico na
TV pretende ser: a mobilização de elementos da própria mídia. As sátiras, trotes,
comentários de notícias, encenações diversas e matérias fora do estúdio (como invasões em
festas ou abordagens de pessoas nas ruas), mostram seu caráter parasita: trituração e
rearranjo de elementos internos à lógica da TV. Seja com referências, imitações ou
paródias, o programa parece se dirigir a um público altamente familiarizado com a cultura
midiática nacional. Espinha dorsal desta cultura, a televisão é a temática última e constante
do programa. É, portanto, um programa sobre TV.

1.2. A TV

Mas é também um programa de TV e esta característica nos leva, necessariamente,


a tecer uma compreensão do que é televisão. Esta tarefa, apesar de necessária, é complexa.
Quando falamos de televisão, estamos falando de quê, especificamente? Ora, a televisão,
ao contrário do que a nomeação no singular possa fazer pensar, e como nos ajudam a

24
entender Bourdon e Jost (2005) e França (2006), não é uma coisa só. Os primeiros nos
pedem para abandonar o uso do singular, destacando o aspecto proteiforme do objeto
televisão que se transforma e se adapta a momentos sócio-culturais e tecnológicos
diferentes. No entanto, para eles, a diversidade da televisão vai além de suas
transformações históricas. Faz-se sentir também na pluralidade de gêneros que abriga, na
diversidade de “palavras” combinadas em múltiplas “vozes”, às vezes mesmo
contraditórias, que estes gêneros fazem circular. É, portanto, terreno de disputas sociais
diversas. França (2006), por sua vez, nos questiona: como falar de “televisão”, dadas sua
tamanha pluralidade e a complexidade da tarefa, mas como não falar, se é a partir da
televisão que nosso objeto nos fala? Precisamos da identificação, portanto, “de onde
estamos falando, bem como das referências que balizam nosso olhar sobre a TV” (França,
2006, 13) para não nos perdermos em nossa empreitada.
Além (e por causa) de ser recurso técnico que possibilita um tipo específico de
linguagem, de se instituir como organização produtiva tão colada e tão cara às disputas de
significado da vida social, e de assumir variados usos para amplos públicos, a televisão é
ainda, desde seu nascimento, um importante objeto de estudo para as ciências humanas e
sociais. É também múltipla no que diz respeito aos olhares que vem recebendo. Ainda em
França, que esboça uma forma de agrupamento, encontramos três grandes tendências no
panorama dos estudos sobre a televisão. A primeira delas fala em uma abordagem mais
geral dos meios considerados de massa, do binômio televisão/sociedade, privilegiando a
compreensão de relações de efeito de uma sobre a outra (mais marcadamente dos efeitos da
televisão na sociedade ou em seus indivíduos). Trata-se de uma tradição bastante arraigada
no histórico da área e marcada por uma polarização entre visões que Eco (1976) nomeou
de apocalípticas e integradas, para dizer, respectivamente das avaliações dos modernos
processos de comunicação que oscilavam entre sua rejeição e sua aprovação. O grupo dos
apocalípticos é mais bem representado pelos estudos críticos de raízes frankfurtianas, que
denunciavam a ação dos meios na manutenção do sistema exploratório capitalista. Já o
outro pólo, o dos integrados, se deixa ver nas abordagens ‘otimistas’ que avaliavam os
meios em função de uma democratização de acesso à informação e aos bens culturais. A
polarização entre estas duas visões é também representada pelos termos através dos quais
uma e outra se referem ao novo fenômeno da comunicação via meios tecnológicos de
grande abrangência: indústria cultural (Adorno e Horkheimer), por um lado, e cultura de
massas, por outro. Eco ainda nos lembra que a disputa entre estes dois pólos se mostrou

25
estéril e incapaz de fazer avançar a compreensão sobre os meios, e sobre a TV. Apesar das
distinções que marcam os dois lados, aparentemente opostos, deste “tribunal”, eles se
encontram na simplificação com que pensam o processo comunicativo. O modelo de
comunicação pressuposto tanto em uma quanto em outra visão se aproxima do
informacional clássico: comunicação pensada como uma transmissão informativa entre um
emissor, dotado de intenções e domínio sobre o processo, e um receptor, pensado como
mero depositário das mensagens enviadas, através de determinado canal. Dizendo isso, não
queremos desmerecer as contribuições que possam ter trazido para a bagagem que
configura nossa área. Gostaríamos de explicitar, por exemplo, a contribuição fundamental
da abordagem da Escola de Frankfurt que, de certa forma, inicia o processo de se pensar o
funcionamento dos meios de comunicação em articulação com outras esferas que
compõem o social, demonstrando a natureza mercadológica e ideológica de seus produtos.
Na segunda tendência, França agrupa os estudos que tratam da caracterização
técnica do meio televisivo e de sua linguagem; uma abordagem mais interna, ligada à
estética, à imagem e aos meios visuais de uma forma mais ampla. A indagação gira em
torno da natureza do produto da televisão, suas imagens e representações. Precisamos,
obviamente, de falar de linguagem para qualquer estudo que pretendemos desenvolver
sobre televisão, mas devemos estar atentos para a tendência desta abordagem a um
isolamento dos produtos televisivos, deixando em segundo plano sua inserção na
sociedade. Além disso, podem ficar configurados como trabalhos mais descritivos do que
analíticos.
Antes de falarmos da terceira tendência que França aponta, achamos pertinente
situar a obra de McLuhan (2003) na intersecção entre a primeira e a segunda tendências
acima explicitadas. Acreditamos que a proposta de McLuhan seja justamente inferir os
efeitos da televisão – e dos meios de comunicação em uma evolução crescente – sobre os
indivíduos e sua situação social e cultural através do estudo das características da
tecnologia base do meio e das possibilidades estéticas que ela consegue mobilizar. Através
de sua máxima “o meio é a mensagem”, McLuhan propõe que o efeito de uma tecnologia –
ou seja, suas conseqüências sociais e pessoais, a sua efetiva mensagem – é a mudança no
padrão de vida dos indivíduos em uma sociedade que tal tecnologia traz. Os meios, como
extensões de nós mesmos, alteram o uso de nossa capacidade sensorial e, portanto, o
funcionamento de nossa cognição, criando ambientes sócio-culturais em que passamos a
viver. Dessa forma, o autor pensa na televisão como o meio que potencializou ao máximo

26
a era eletrônica, introduzida pelo rádio. Esta era, que vai crescentemente desestabilizando o
padrão de vida tipográfico (linear, racional e fragmentário) precedente, é marcada por uma
simultaneidade e uma necessidade de agregação que nos levaria à “aldeia global”. A
televisão seria, portanto, revolucionária por natureza e estaria, independentemente do
conteúdo que veicula, trabalhando para a desestabilização das instituições racionais-
hierárquicas da modernidade tipográfica.
Para a nossa proposta, McLuhan nos chama a atenção para o fato de não podermos
prescindir de uma análise da realidade tecnológica da televisão. Porém, não podemos
incorrer no erro de sobredeterminar nossas conclusões a partir das características técnicas
do meio. Precisamos pensar a tecnologia de forma mais articulada com o social, não como
força última de sua configuração. Além disso, não podemos deixar de realizar uma análise
que verse concretamente sobre um produto de fato, condicionado por forças outras que não
apenas o constrangimento tecnológico.
O grupo de estudos mais contemporâneos que se prende a análises mais
circunscritas de programas específicos representa, finalmente, a terceira tendência
apontada por França.

Fugindo das abordagens muito amplas e totalizantes, vamos encontrar,


contemporaneamente, uma grande proliferação de estudos tratando ora dos
aspectos da produção de tal ou tal produto, ora de sua audiência. São estudos
mais pontuais que, evitando generalizações excessivas, buscam caracterizar
dinâmicas particulares que conformam múltiplas TVs. (FRANÇA, 2006, 17)

Como vimos, a televisão é um importante objeto de estudo, tão plural quanto as


inúmeras abordagens que tentaram apreendê-la. Em parte aparato tecnológico, em parte
conjunto de rotinas de produção e práticas de comunicação, “a” televisão também se
pulveriza em uma multiplicidade de vozes, canais, programas, sistemas de transmissão,
linguagens, públicos e usos. Central para a compreensão do processo de midiatização da
sociedade – e da consequente inflação do valor da visibilidade –, ela também tem uma
história e se multiplica ainda mais quando analisada na sua relação com momentos
culturais distintos. Na impossibilidade de chegarmos a uma compreensão que abarque toda
esta pluraridade, precisamos de um recorte que oriente o nosso caminho. Este recorte, que
se aproxima da terceira tendência apresentada acima, é fruto de um posicionamento
conceitual que nos abre determinada perspectiva de onde olhamos para a televisão e para o
programa que queremos analisar.

27
As indagações que fazemos se inserem em um quadro maior de discussão sobre o
campo da Comunicação e sobre os pressupostos gerais do conhecimento científico, de
maneira ainda mais abrangente. Recortes rígidos e conceitos dicotômicos que tentavam
apreender os objetos da comunicação em causalidades mecânico-positivistas têm sido
abandonados em favor de uma compreensão relacional e global do processo que tais
objetos permitem acontecer. Só assim acreditamos ser possível, em uma soma de esforços,
melhor avaliar a importância cotidiana da televisão em sua capacidade de fazer circular
discursos e representações culturais.
Estes esforços têm tentado também garantir a especificidade do ainda titubeante
campo de estudos da Comunicação. A visada que imprimem a seus objetos é marcada por
um paradigma em construção e que vem sendo conhecido pelo nome de relacional. Tal
visada vai além do estudo do funcionamento estrito dos meios de comunicação, mas sem
deles prescindir, tratando a comunicação como um processo de construção conjunta entre
interlocutores (sujeitos sociais), a partir de discursos (formas simbólicas que trazem as
marcas de sua produção, dos sujeitos envolvidos e do contexto) em situações singulares
dentro de um panorama sociocultural – como nos ajuda a entender Vera França (2002)19.
Sob esta perspectiva, nossa pesquisa apresenta, destarte, um objetivo que é maior do que a
descrição auto referenciada do programa que escolhemos para trabalhar no interior do
funcionamento do meio televisão. Tampouco nos interessará alardear sobre os possíveis
males trazidos pelo programa a seus espectadores e nem glorificar suas potências
subversivas20. Tentaremos analisar o Pânico na TV como uma prática de comunicação que
se abre como ângulo privilegiado de onde olhar determinada dinâmica sócio-cultural.
Dessa forma, o que unifica “as televisões” em nosso trabalho é este olhar que toma
a televisão inscrita nas relações mais amplas da experiência cotidiana e da vida social, e
também como um ambiente específico dotado de regras, recursos e formas de se fazer
reconhecer próprios. A inscrição da televisão na vida social é circular: a TV marca nosso
cotidiano através de sua presença constante e dos significados que nos ajudam a organizar
a nossa vida; mas, simultaneamente, é marcada por nossas leituras e expectativas, também
sofre pressões de nossos valores morais e culturais. É nesse ir e vir de significados que

19
Importante também para nossa compreensão desta perspectiva é o trabalho de Quéré (1991), Braga (2001),
Silverstone (2002) e ainda o exemplo da crítica diagnóstica que encontramos em Kellner (2001).
20
Uma interessante frase de França (2006) sobre a televisão nos ajuda a explicar o que poderia ser
considerado uma possível neutralidade (ou mesmo relatividade absoluta) de lugar de análise. Diz a autora
que “a televisão não é o remédio de todos os males – mas nem tampouco a doença da sociedade. Ela apenas
diz do seu estado de saúde.” (França, 2006, 37)

28
entendemos a televisão, em toda sua abrangência e popularidade, como um lugar
privilegiado que medeia, e deixa ver, a dinâmica das representações e valores, em sua
atualização e re-significações. Dentro desta dinâmica, programas são tomados não apenas
como resultantes das intenções e ações de produtores, mas enquanto o produto da interação
TV/telespectadores em sua materialização de temáticas e valores em ressonância ou não
com expectativas e gostos da audiência.
Como dissemos, nossa perspectiva, apesar de sua característica mais ampla, não
pode prescindir de uma compreensão sobre o meio e sua realidade tecnológica; sua
linguagem e as propostas de relação que permitem acontecer; assim como não pode
prescindir de uma mirada histórica-contextual destes aspectos.

1.2.1. A TV: aparato técnico e linguagem

A televisão é, antes de tudo, um recurso técnico que permite a captação/produção


de imagens em movimento aliadas ao som e a distribuição imediata e à distância a um
grande número de aparelhos receptores, amparada em uma lógica de mercado. A TV é
portanto um modo de produção e de organização. Meio de comunicação de largo alcance, a
mídia televisiva, em sua estrutura produtiva, é atravessada por relações de poder, uma vez
que nela estão envolvidos grandes interesses econômicos e políticos. Mas isso não deve
nos levar à precipitada conclusão de que esta característica pode explicar todo o
funcionamento da televisão como tecnologia, como linguagem ou como instituição social.
Pelo tamanho e complexidade das rotinas de produção e pela concretude específica dos
momentos de recepção, por um lado, e pela própria necessidade de se mexer na busca por
maior audiência e, portanto, maior rentabilidade comercial, por outro, a produção
televisiva é marcada por uma série de contradições, de forças tensionadoras, que nos levam
sempre a relativizar as idéias de homogeneização e manipulação. A televisão é, assim,
palco de disputas constantes.
É um meio audiovisual e, em que pese a redundância desta caracterização, tem uma
linguagem que se estrutura através de um discurso verbal – texto falado, narrações em off,
inserções de palavras escritas, dentre outros – e de um discurso não verbal – as imagens, os
ritmos e os tons, por exemplo. Como recurso técnico específico, tem por derivação uma
linguagem própria em parte condicionada por sua própria natureza técnica. Deve ser,
portanto, analisada por critérios que lhe sejam próprios. Podemos arriscar alguma síntese,

29
com a ajuda de Meniconi (2005), de como esta linguagem se constitui. A TV se faz
primordialmente com planos fechados, trocados aceleradamente com a supressão dos
“tempos mortos”, em que quase não há ação. Também se faz pelo fetiche do ao vivo, pela
possibilidade de relatar o “real” no momento em que ocorre. Imediatez e espontaneidade
controlada marcam assim sua linguagem. Esta também deve estar adaptada a uma recepção
doméstica, fragmentada e dispersa. Meniconi nos diz que o espaço físico da TV é
composto pela cena da tela luminosa e por outra, referente ao espaço de recepção desta
tela: a sala de estar, o quarto de dormir, entre outros. Contando com a dispersão da
audiência, sempre inserida em um contexto outro para além daquele da cena que vê, a
linguagem da televisão tem também predomínio da oralidade, fática e direta. Meniconi
conclui que é a partir da possibilidade do ao vivo, de seus close ups e da sua linguagem
fática e direta que a TV causa empatia em seu público.
Williams (1975) caracteriza a televisão como um sistema primariamente criado
“para a transmissão e recepção como processos abstratos, com pouca ou nenhuma
definição precedente do conteúdo” (Williams, 1975, 25). Sendo uma tecnologia que se
propôs “janela para o mundo”, a TV nasce mais parasita de conteúdos de meios e de
eventos que já existiam do que criadora de seu próprio conteúdo. Vários autores nos
mostram, em concordância com Williams e como nos lembra Meniconi (2005), que a
televisão tem uma linguagem fundamentalmente marcada pela mistura das linguagens dos
meios e atividades culturais que a precedem. É, assim um “veículo de veículos” (Pignatari,
1984), um meio “síncrese” (Távola, 1984). Balogh (2002) diz que o que chamamos,
imprecisamente, de linguagem de TV é uma mescla de conquistas de outros campos, como
a literatura, as artes plásticas, o rádio, o folhetim, o cinema e muitos outros. Heranças
múltiplas que, segundo a autora, foram sendo incorporadas de forma assimétrica pela
televisão. Balogh recorre à ilustração do Pantagruel, gigante devorador criado por Rabelais
no séc. XVI, para dizer deste gigante eletrônico que “gera e deglute programas um após o
outro, sem cessar” (Balogh, 2002, 25), que é a TV. Recorre também, reivindicando uma
maneira brasileira de ser e de fazer televisão, à idéia do movimento antropofágico de nosso
modernismo. Diz, assim, que a televisão brasileira é uma “máquina antropofágica, que
tudo devora e deglute” (Ibidem). Diz ainda que

engolimos, incorporamos, readaptamos, recriamos a cultura do outro, do


estrangeiro, ou do outro brasileiro que está ao nosso lado, reciclamos tudo, e
nessa metamorfose atingimos um fazer com o nosso carimbo tupiniquim.
(Ibidem)

30
Devemos, com isso, encarar o fato de que, talvez, o mais próprio da linguagem da
TV seja a hibridização e a aceleração de linguagens. Devemos também pensar que esta
propriedade tem sua história, e seus matizes devem ser respeitados. Torna-se, portanto,
fundamental destacarmos que a televisão foi crescentemente gerando um tipo de
parasitismo especial, que deixa marcas nos objetos parasitados e que se faz parasita de si
mesma. Voltando a Williams (1975), encontramos a idéia de que existe uma interação
complexa entre a tecnologia da televisão e as linguagens e formas de outros tipos de
atividades culturais e sociais. Inicialmente, o autor diz de combinações e desenvolvimento
de formas precedentes, mas deixa claro que

não é apenas uma questão de combinação e desenvolvimento. A adaptação das


formas recebidas para a nova tecnologia levou em muitos casos a mudanças
significativas e a algumas diferenças realmente qualitativas.21 (Williams, 1975,
44)

Depois, somando-se a estas formas adaptadas, Williams diz que a televisão passou
a criar formas mistas e novas22, apesar de considerar que raramente podemos ver inovação
absoluta. Aprofundando-se na discussão e análise destas formas, bem como da maneira
como são agrupadas em uma grade de programação, Williams chega a mais uma noção que
nos pode ser cara: a de fluxo. Com esta noção, o autor pretende ir além do conceito estático
de programação (ligado à idéia de distribuição de unidades temporais) em direção ao
conceito móvel de fluxo (ligado à experiência dos telespectadores). Uma programação
organizada e transmitida continua sendo, formalmente, um conjunto de unidades
temporais. Porém, fomos sendo acostumados a experimentá-la como uma seqüência ou um
fluxo, embora possamos não nos dar conta disso. Esta tendência rumo à experiência de
fluxo está ligada, de acordo com Williams, à crescente diversificação e mistura dos
sistemas de comunicação pública e é parte evidente de uma experiência social integral.

21
Tradução nossa do original em inglês: “... it is not only a question of combination and development. The
adaptation of received forms to the new technology has led in a number of cases to significant changes and to
some real qualitative differences.” (Williams, 1975, 44)
22
Como formas que foram apropriadas e, claro, modificadas pela televisão, Williams cita: as notícias, os
argumentos e discussões públicos, a educação, o drama, os filmes, os espetáculos de variedade, os esportes,
os passatempos e os anúncios. Como formas novas, são apresentadas: o drama-documentário, a educação
pela visão, as discussões, os especiais temáticos, as diversas seqüências (séries, mini-séries e novelas, por
exemplo) e a tele-visão (é com certa ironia que o autor propõe que a forma mais autêntica e inovadora da
televisão seja a tele-visão: a experiência de mobilidade visual).

31
Tem conexões profundas com o crescimento e desenvolvimento de maiores
mobilidades físicas e sociais, em ambas condições de expansão cultural e de
consumo mais do que uma organização cultural comunitária.23 (Idem, 88)

Balogh (2002) nos chama a atenção para o fato de que a linguagem da televisão é
também condicionada pela lógica de mercado em uma ‘estética da interrupção’. A autora
toma este termo de Virilio, que o usa para caracterizar a linguagem do cinema e, a partir
daí, um aspecto da contemporaneidade. Para Virilio, a estética da interrupção –
estruturadora da consciência contemporânea – é uma cinemática, é a capacidade que o
cinema tem de criar a impressão de continuidade, paradoxalmente, a partir de cortes
diversos. Reutilizando o conceito para a televisão, Balogh quer dizer que a TV levou às
últimas conseqüências a interrupção, não mais se importando em criar a ilusão de uma
continuidade, mas, pelo contrário, radicalizando, escancarando (e familiarizando sua
audiência com) a descontinuidade. Tendo cada minuto transmitido um valor comercial, a
temporalidade da TV se organiza em função dos espaços diversos de anúncio que tem que
abrir a seus financiadores. Diz-nos a autora:

A televisão, veículo já muito mais claramente inserido numa lógica capitalista


[em comparação com o cinema], mercadológica, tem o seu sentido interrompido
para dar lugar aos tão decantados intervalos para comerciais. A TV assume, pois,
de forma bem mais contundente que o cinema, essa “estética da interrupção”
determinante de um discurso descontínuo, de uma fragmentação de sentido em
blocos. Estamos nos distanciando das noções clássicas de um texto. (Balogh,
2002, 27)

A idéia de fluxo em Williams parece nos mostrar que esta potencialização da


descontinuidade, que, segundo Balogh, se dá na TV pela necessidade que esta tem de criar
espaço para seus anunciantes, é naturalizada a ponto de não podermos falar, de fato, em
interrupção. Williams não desconsidera em sua análise os intervalos comerciais, mas diz
ser possível perceber uma mesma lógica (ou uma mesma dinâmica) perpassando a
seqüencialidade das emissões televisivas, quer esteja a seqüência analisada em momento
de programação ou em seu intervalo comercial. O autor diz que a redução de vários estilos
de vida a situações características das convenções televisivas da “atuação rápida”24 não é
um traço exclusivo dos comerciais, mas de um tipo de televisão no qual eles são
importantes. Estas convenções televisivas dizem respeito a como definições de

23
Tradução nossa do original em inglês: “It has profound connections with the growth and development of
greater physical and social mobility, in conditions both of cultural expansion and of consumer rather than
community cultural organisation.” (Williams, 1975, 88)
24
Do inglês “fast-acting”.

32
necessidades, satisfação, ansiedade e caráter, uma realidade cultural, enfim, são geralmente
articuladas em um sistema simplificador de fácil reconhecimento. Além disso, são essas
convenções as responsáveis por criar a sensação sequencial e integradora que a TV
proporciona. Com isso, Williams conclui que “devido às características sequencial e
integradora da televisão (...) esta relação orgânica entre comerciais e outros tipos de
material é muito mais evidente do que em qualquer outro ponto dos sistemas de
publicidade anteriores”25 (Williams, 1975, 70). O autor propõe que

o que está sendo oferecido não é, em termos antigos, um programa de unidades


distintas com inserções particulares, mas um fluxo planejado, no qual a
verdadeira série não é a seqüência transmitida dos ítens do programa, mas a
seqüência transformada pela inclusão de outro tipo de seqüência, de modo que
estas seqüências em conjunto compõem o fluxo real. (...) E com a eventual
unificação destas (...) seqüências, um novo tipo de fenômeno de comunicação
precisa ser reconhecido.26 (Idem, 90-91)

A forma como Williams pensa o fluxo televisivo pode nos trazer uma ajuda
analítica. Na tentativa de caracterizar nosso objeto e o público ao qual ele parece pretender
se dirigir, podemos alinhavar características do programa com características que
venhamos a perceber nos comercias, merchandisings, produtos e marcas que o financiam.
Acreditamos, ainda, que a idéia de Williams de que a TV é um fluxo se complexifica na
contemporaneidade, frequentemente caracterizada como fluída e veloz. Os fluxos não são
exatamente mais internos aos sistemas e aos canais de televisão, mas se fazem no encontro
de canais, estilos e mesmo de aparatos tecnológicos distintos, como nos deixa pensar a
convergência digital das mídias. A origem do programa no rádio; as reverberações que
recebe na mídia jornalística; bem como aquilo que, espontaneamente, seus telespectadores
dizem e discutem sobre ele na internet; tudo isso participa do complexo fluxo que enquadra
o Pânico na TV, envolvendo o programa e suas atrações com determinados significados.
Williams ainda nos ajuda a pensar tal complexificação ao mostrar que tanto as formas que
preenchem as emissões televisivas não são estanques, quanto também não o são suas
tecnologias.

25
Tradução nossa do original em inglês: “Because of the sequential and inategranting characteristics of
television (...) this organic relationship between comercials and other kinds of material is much more evident
than at any point in earlier systems of advertising.” (Williams, 1975, 70)
26
Tradução nossa do original em inglês: “What is being offered is not, in older terms, a programme of
discrete units with particular insertions, but a planned flow, in which the true series is not the published
sequence of programme items but this sequence transformed by the inclusion of another kind of sequences,
so that these sequences together compose the real flow. (...) And with the eventual unification of these (...)
sequences, a new kind of communication phenomenon has to be recognised.” (Williams, 1975, 90-91)

33
Encontramos em Williams (1975) a contribuição fundamental para darmos conta da
tarefa de pensarmos historicamente a evolução do meio televisivo. O autor propõe
pensarmos a televisão como uma tecnologia e uma forma cultural. Estes dois aspectos são,
para ele, indissociáveis, já que toda tecnologia é uma questão de prática social e se
transforma assim em forma cultural capaz de atender a determinadas demandas de
diferentes configurações de sociedades em períodos históricos distintos. O autor se
preocupa em analisar, portanto, o desenvolvimento histórico da tecnologia da televisão, de
suas instituições, de suas formas e de seus efeitos.
Compreender a TV inicialmente como uma tecnologia é fundamental para
Williams, já que acredita que a análise social precisa estar diretamente relacionada ao
exame crítico dos materiais e processos de uma comunicação específica. Para fugir do
determinismo das abordagens que versaram sobre a evolução tecnologia das sociedades, o
autor sugere que restauremos a intenção ao processo de pesquisa e de desenvolvimento do
meio. Com isso ele pretende sugerir que pensemos a invenção da televisão não como um
evento único, ou mesmo como uma série linearmente encadeada de eventos puramente
técnicos e científicos: entra na cena de sua análise a idéia complementar de que a
tecnologia é também uma forma cultural. Afinal de contas, nem todas as invenções da
humanidade encontraram usos que garantissem o seu desenvolvimento, assim como nem
todas as descobertas tiveram as mesmas chances de se efetivarem no que diz respeito a
investimentos e incentivos. O autor assim explica:

Quando houve um investimento tão pesado em um modelo de comunicação


social particular, há um complexo restritivo de instituições financeiras, de
expectativas culturais e de desenvolvimentos técnicos específicos, que apesar de
poder ser visto, superficialmente, como o efeito de uma tecnologia, é de fato um
complexo social de um tipo novo e central.27 (Williams, 1975, 31)

Entender o “nascimento” da televisão se vincula à compreensão da realidade social


que a gestou. Williams caracteriza, de maneira a mais geral possível, esta realidade como
sendo a de uma sociedade marcada pela mobilidade e extensão da escala de sua
organização. Este cenário de complexificação do social viu nascer uma nova instituição
social: a radiodifusão.

27
Tradução nossa do original em inglês: “When there has been such heavy investment in a particular model
of social communications, there is a restraining complex of financial institutions, of cultural expectations and
of specific technical developments, which though it can be seen, superficially, as the effect of a technology is
in fact a social complex of new and central kind” (Williams, 1975, 31)

34
Para a transmissão de ordens simples, um sistema de comunicação já existia.
Para a transmissão de uma ideologia, existiam intituições tradicionais
específicas. Mas para a transmissão de notícias e de um repertório comum – o
completo processo orientador, predizível e atualizador que a imprensa
completamente desenvolvida representava – havia uma necessidade evidente
para uma nova forma, que as grandes instituições tradicionais da igreja e da
escola não poderiam cumprir.28 (Idem, 21)

A radiodifusão surge então em um cenário de crescente transformação (e eminente


crise) como uma nova e poderosa forma de integração e controle. Porém, o autor adverte,
esta forma social foi eclipsada, nos primeiros estudos que se voltaram a ela, por sua
definição como “comunicação de massa”. Para Williams, este termo é uma abstração das
características mais gerais do rádio e da TV: a transmissão centralizada e a abrangência de
seu público. Esta abstração, no entanto, obscurece o fato da oferta em aparelhos individuais
e a consequente contradição entre transmissão centralizada e recepção privatizada. Com
isso, podemos perceber que o autor se distancia das idéias simplistas de manipulação –
mesmo que, de certa forma, tenha sido para isso que a tecnologia recebera investimentos e
fora criada – e se aproxima da idéia de atividade na recepção, ampliando a maneira de se
pensar o fenômeno das comunicações de “massa”.
A contradição “transmissão centralizada / recepção privatizada” reflete uma
contradição mais geral que pode caracterizar a realidade social que viu e fez nascer a
televisão. Williams nomeia esta contradição de “privatização móvel”. De um lado, o desejo
de mobilidade, de ir e ver novos lugares, de aventurar-se. De outro, o auto-suficiente lar da
família, a segurança doméstica tornada mais cara pela experiência traumática de uma
Guerra Mundial e pela distância cada vez maior entre os lares e os centros de convívio
público. A televisão se oferece como uma “janela para o mundo”, como a possibilidade de
“locomoção” no conforto do lar enriquecido pelos melhores salários (convertidos em
eletrodomésticos) e organizado em função da rotina semanal de trabalho. A TV está,
portanto, diretamente ligada ao surgimento de uma sociedade que, como resposta ao seu
próprio funcionamento econômico, viu-se obrigada a não mais apenas oferecer aos
trabalhadores um tempo para o repouso, mas também um tempo (e dinheiro) para o
consumo, inclusive o consumo simbólico. Esta tecnologia foi mais bem-vinda para aqueles
que tinham menores oportunidades sociais, que careciam de mobilidade independente e de

28
Tradução nossa do original em inglês: “For the transmission of simple orders, a communications system
already existed. For the transmission of an ideology, therer were specific traditional institutions. But for the
transmission of news and background – the whole orienting, predictive and updating process which the fully
developed press represented – there was an evident need for a new form, which the largely traditional
institutions of church and school could not meet.” (Williams, 1975, 21)

35
acesso aos antigos espaços culturais (no sentido mais restrito do termo, ligado à idéia de
uma alta cultura), de entretenimento e de informação. Williams diz, especificamente, das
realidades norte-americana e inglesa, destacando suas diferenças iniciais. Enquanto nos
Estados Unidos a televisão surge fortemente ligada a uma dinâmica comercial, na
Inglaterra a TV, inicialmente, tinha um caráter mais público, com leis que concediam ao
estado o monopólio sobre a radiodifusão.
No Brasil a chegada da televisão se deu em outro cenário, marcado por uma
profunda desigualdade social. A TV surge como um produto de luxo e é, portanto,
relativamente bem recebida pela elite e pela intelligentsia literária, que pensavam em fazer
uso de suas potencialidades artísticas em uma programação de caráter mais educativo e
refinado, como nos lembra Freire Filho (2004, 2009). Porém este projeto nunca se
concretizou, tendo a televisão brasileira demonstrado, desde sempre, sua natureza
demandante de grandes públicos. Apesar de ainda eletrodoméstico caro, a televisão se
relacionou melhor com o (“baixo”) entretenimento. Ganhou assim a inimizade dos
intelectuais, que passaram a denunciar a sua banalidade e o “sequestro” de um público que
deveria estar sendo formado como leitor-letrado. Diz-nos o autor que

até o término dos anos 1960, eram comuns as profissões de fé nas possibilidades
artísticas e educativas da TV; logo em seguida, o entusiasmo cedeu lugar ao
asco, em consequência do marasmo da programação. (Freire Filho, 2009, p.10)

Sendo uma tecnologia criada com destino aos grandes números, a televisão
brasileira não se contentou em ser consumida por aqueles poucos que podiam pagar por
seus aparelhos. Passados os primeiros dez anos de sua existência no país, o preço dos
televisores diminuiu e as condições para a compra melhoraram. A TV foi se popularizando
pela adequação de sua programação às preferências do grande público e passando a ser
considerada, então, como responsável pela depreciação da cultura nacional. Cunha (2005)
nos diz que

muito desse declínio do status cultural da televisão pode ser pensado em função
de uma mudança ocorrida em seus conteúdos e sua programação que, por sua
vez, parece ter sido impulsionada pelo aumento significativo nas vendas de
aparelhos e televisores a partir da década de 60, com o acesso aos crediários,
fazendo com que os segmentos populares da sociedade passassem a ter a chance
de possuir em suas residências este que era antes uma espécie de artigo de luxo
das elites do país. (Cunha, 2005, 30)

Contudo, Freire Filho (2009) nos adverte, assim como já nos advertira Eco (1976) e

36
Williams (1975), que os parâmetros críticos utilizados para condenar a TV, e a cultura de
massa em geral, podem inviabilizar a compreensão mais ampla das motivações e dos
prazeres do público, bem como dos significados culturais e das ramificações sociais e
políticas de suas atrações.
Apesar destas diferenças fundantes entre a chegada e o desenvolvimento do sistema
televisivo nos EUA, na Inglaterra e no Brasil, Williams aponta para um fenômeno de
internacionalização da programação – exportação planejada de propaganda, informação e
entretenimento – e de hegemonia do modelo comercial da televisão norte-americana. O
autor afirma que

a transição geral, nos últimos vinte anos, do que era normalmente uma
radiodifusão nacional e controlada pelo estado para o que são agora, em termos
mundiais, instituições de televisão predominantemente comerciais, é uma
conseqüência desta operação planejada dos Estados Unidos.29 (Williams, 1975,
41-42)

Não queremos, com isso, generalizar e igualar todas as televisões do mundo a um


único modelo. Queremos chamar a atenção para o fato de que, somadas a todas as
particularidades de cada televisão em cada país, as misturas, inclusive em escalas
transnacionais, foram cada vez mais sendo a característica da TV e de sua linguagem. Esta
característica marcará profundamente a história do meio e de seus produtos. Reforçando as
idéias do autor (e as necessidades que nos coloca a perspectiva relacional), a compreensão
da televisão, ou de algum de seus traços, canais ou programas, deve sempre contextualizá-
la em relação à cultura e aos aparatos tecnológicos de que esta cultura dispõe para se fazer
material e disponível. O autor faz um esforço de se antecipar às mudanças culturais que
parecem estar em vias de se concretizar no aparato tecnológico da televisão, mas enfatiza
que a tecnologia não determinará seus efeitos, pelo contrário, ela é por si própria produto
de um sistema social particular. Williams lista uma série de tecnologias em
desenvolvimento (lembremos que ele escreve na década de 70) e tenta dizer das
instituições que cada uma deve criar, bem como de seus efeitos. Conclui que três
tecnologias trarão as principais transformações: a) a distribuição por cabo, que remediará
imperfeições gerais na qualidade da transmissão e possibilitará o crescimento da oferta de
canais e a segmentação cada vez mais específica da demanda; b) a comunicação via satélite

29
Tradução nossa do original em inglês: “... the general transition, in the last twenty years, from what was
normally a national and state-controlled saound broadcasting to what are now, in world terms, predominantly
commercial television intitutions, is a consequence of the planned operation from the United States.”
(Williams, 1975, 41-42)

37
que terá como maior efeito a diminuição das fronteiras nacionais e o aumento das misturas,
ainda que assimétricas, de que a televisão é feita; e c) os cassetes que, ao mesmo tempo em
que ajudam a consolidar um mercado internacional para o consumo de vídeos, permitem
uma maior autonomia por parte dos espectadores.
O interessante é perceber que o futuro da televisão para o autor aparece atrelado a
interesses mercadológicos e governamentais, mas sempre tensionado pela possibilidade de
usos desviantes das tecnologias criadas.
Pouco mais de três décadas se passaram desde a publicação desta obra de Williams
e, neste período, vários autores se dedicaram à análise e à previsão do desenvolvimento
tecnológico da TV, em abordagens mais ou menos deterministas, mais ou menos otimistas
ou anunciadoras da catástrofe. Acreditamos ser importante a apresentação de algumas
delas.
Um aparato relativamente simples, que Williams não chegou a tratar, parece ter
marcado a história sócio-tecnológica da televisão: o controle remoto. Sarlo (2000), por
exemplo, diz que as imagens televisivas perderam sua intensidade, seu mistério e sua
capacidade de gerar interesse em tempos de oferta abundante e do dispositivo de
intervenção que é o controle remoto. A autora o considera o grande avanço interativo das
últimas décadas, “uma máquina sintática (...) de resultados imprevisíveis e instantâneos,
uma base de poder simbólico que é exercido segundo leis que a televisão ensinou a seus
espectadores” (Sarlo, 2000, 57). Tais leis dizem da maior acumulação possível de imagens
por unidade de tempo (mesmo que isso resulte na baixa quantidade de informação); da
velocidade do meio, sempre maior do que aquilo que transmite; da necessidade de se evitar
pausas no fluxo das imagens; e da montagem ideal que deve mudar sempre de plano para
“encher” o vídeo. Ou seja, são leis que dizem da “cultura perceptiva que a televisão
implantou e que seu público lhe devolve multiplicada pelo zapping” (Idem, 61). Apesar de
afirmar que o controle remoto representa uma grande novidade, chama a atenção para o
fato de que o zapping “parece uma realização cheia de democracia” (Idem, 59, grifo nosso)
por dois motivos: sua novidade não faz muito mais do que exacerbar o tipo de percepção
que a TV já cultivava; as possibilidades de intervenção continuam dependentes das
emissões, tratam-se de re-edições de algo previamente selecionado e editado. Contudo,
Sarlo ratifica que o controle remoto significa um avanço rumo a uma maior autonomia e
atividade interventora dos espectadores.

38
Com um tom muito mais otimista e simplista, que é de se esperar pela sua filiação
direta ao pensamento de McLuhan, Kerkhove (1997) diz que o controle remoto foi nossa
primeira “aula” para nos tornarmos “prosumidores”, termo que cria para dizer que, no
contemporâneo, os papéis, antes bem definidos, de quem produz e de quem consome
cultura, encontram-se misturados. Diz o autor que

graças à explosão do número de computadores nos lares dos anos 80, entramos
num programa educativo de quatro fases conduzido pela tecnologia, convidando-
nos a ser produtores.
1. “Como mudar de canal” foi o nosso curso para principiantes de montagem.
2. A gravação e leitura em vídeo foi o nosso curso intermediário em produção.
3. As tecnologias portáteis de VHS e HIGH-8 (…) permitem a qualquer um
exprimir-se em formato filme.
4. Com teclados e mouses, aprendemos a atuar sobre as propriedades de
informação no ecrã, de uma forma interactiva. (Kerkhove, 1997, 51)

Recentemente, uma nova leva de profetas tecnológicos tentam dar conta das
transformações que vem afetando a televisão, tais como: a convergência digital das
linguagens; a chegada da TV digital em alta definição; a migração de produtos televisivos
para outros suportes (computador e telefones celulares, por exemplo); multiplicação de
recursos cada vez mais acessíveis de produção e de distribuição de material audiovisual
(webcams, softwares de edição e sites como o You Tube, por exemplo); e a possível união
completa entre computador e televisão na TV interativa e por demanda.
Javier Pérez de Silva chega a anunciar a morte da televisão na era da Internet.
Segundo o autor, esta morte vem de transformações em três eixos fundamentais.
Primeiramente, está morrendo a forma de se fazer televisão com a chegada de novas
tecnologias digitais de produção que acabam gerando novos formatos ligados às suas
possibilidades técnicas. Em segundo lugar, está morrendo a forma de se ver televisão com
o espectador recuperando pouco a pouco sua autonomia, intervindo nos programas, nas
grades de horário das emissoras e também produzindo seus próprios produtos audiovisuais.
Por fim, Silva aponta que está morrendo também o aparato televisor, com a dispersão dos
produtos, antes destinados a ele, em milhares de telas possíveis e com o progressivo
aumento da largura de banda que permite transmissão cada vez mais veloz de material
audiovisual com qualidade de definição. Mas mostra-se consciente de que esta “morte” é
algo planejado por suas instituições ao tentarem se adaptar a um novo cenário.

Mas os grandes heróis , como a televisão, não morrem por causalidade, nem de
qualquer maneira. Seus finais também são parte principal do show business,
porque desde sempre o sacrifício dos deuses (e o que é a TV de hoje senão um

39
deus) é garantia da sobrevivência mítica. A televisão do século XX deve se auto-
emular para renascer de suas cinzas e converter-se, talvez com outra aparência,
na televisão do século XXI.30 (Silva, s/d, 19)

Concordamos que não haverá uma “morte” da televisão, mesmo querendo


relativizar a idéia de Silva de que a morte-transformação da televisão possa ser algo
completamente planejado e controlado por suas instituições. A televisão acompanha a
movimentação dinâmica da vida social, da qual também é vetor de força. Além disso ela
tem mostrado a sua capacidade de se adaptar a momentos distintos, assim como nos mostra
a história dos meios que uma novidade em tecnologia de comunicação não substitui
tecnologias precedentes, mas as reconfiguram, assim como ajudam a reconfigurar o tecido
midiático-social.
Por fim, todos estes fenômenos e transformações são por demais recentes para
termos análises mais consolidadas e inequívocas. Porém, olhar para eles parece ser
fundamental para o nosso trabalho. Contudo, queremos olhar com a consciência, que nos
trouxe Williams (1975), de que estamos tratando de todo um sistema social em
transformação, para o qual estas tecnologias estão ajudando a criar formas culturais. Tais
formas parecem convergir, cada vez mais, com as idéias de fluidez, aceleração,
hibridização e autonomia de produção e de intervenção por parte de quem antes era
considerado mero receptor/consumidor. Não caberá a este trabalho discutir a efetividade
destas idéias – será que são apenas estratégias retóricas a serviço da lei de mercado que
precisou tornar obsoletas as formas anteriores? – e seus desdobramentos políticos –
estaríamos rumando para formas culturais mais democráticas? –, apesar de considerarmos
tais discussões muito importantes e de sabermos que a ausência delas nos afasta dos
propósitos críticos de Williams. O que tentaremos fazer é analisar como nosso objeto
trabalha estas idéias na proposta de interação que apresenta a seu público.

1.2.2. A TV: usos, funções, propostas de relação

A televisão é, também, um conjunto de usos, ou de funções que a sociedade e as


pessoas lhe conferem. Mais uma vez não devemos nos apressar para definir que ela vive

30
Tradução nossa do original em espanhol: “Pero los grandes héroes, como la televisión, no mueren por
causalidad, ni de cualquier manera. Sus finales también son parte principal del show business, porque desde
siempre el sacrificio de los dioses (y qué es la tele hoy día sino un dios) es garantía de la supervivencia
mítica. La televisión del siglo XX debe autoinmolarse para renacer de sus cenizas y convertirse, quizá con
otra apariencia, en la televisión del siglo XXI.” (Silva, s/d, 19)

40
para traduzir os interesses dominantes, apesar de isso não ser de todo falso. Como nos
lembra França (2006):

Concordando com o papel político-ideológico da TV (…), é preciso desconfiar,


no entanto, das visões monolíticas, e reagir a uma visão puramente instrumental
da TV. Sua inserção na vida social é antes polivalente: a televisão é um veículo
de informação e de socialização, estabelecendo um repertório coletivo (tanto no
que diz respeito a temas como vocabulário, formas expressivas, representações e
imagens) e estendendo o mundo comum (…) Inserida na rotina da vida
cotidiana, e prioritariamente no lar, ela preenche o espaço doméstico como
possibilidade de lazer e descanso. (França, 2006, 25)

Enfim, defendemos que a análise dos produtos midiáticos não se encerra na


dinâmica de relações econômicas e políticas que os atravessam – apesar da importância
destas relações para configurar o que estes produtos são –, nem se resume às possibilidades
da técnica que lhes conferem materialidade – apesar de sem elas estes produtos não
poderem nem mesmo existir.
Acreditar que o contexto que confere o cenário para a interação TV-público é
historicamente configurado nos leva a uma demanda que vai além da compreensão da
evolução tecnológica da televisão. Somada a esta evolução, pensaremos sobre as
transformações por que passou a relação da televisão com seu público dentro dessa
história. Faz-se necessário, a partir e para além disso, indagarmos o que sustenta, ou o que
tornou viável a existência e o sucesso de um programa como o Pânico na TV no momento
desta história que vemos diante de nós. Nosso objeto não surgiu do nada, tampouco está
sozinho em sua proposta. Não é único, portanto, ao mesmo tempo em que tem suas
especificidades.
Se no item anterior puxamos, como fio organizador, a relação
tecnologia/cultura/linguagem, pretendemos agora puxar o fio da relação público/televisão.
A distinção, o sabemos, tem caráter puramente didático. É no cruzamento destas relações
que começaremos a esboçar o panorama em que nosso objeto se insere.
No início dos anos 1980, Eco se dá conta de que uma nova televisão acontecia
diante de seus olhos. “A Neotelevisão existe. É verdadeira porque é certamente uma
invenção televisiva”, (Eco, 1984, 183) diz. Esta invenção altera a relação que a TV tinha
com aquilo que transmite e com aquele para quem transmite. Para o autor, a invenção desta
nova era pela televisão se deu a partir de suas novas instituições (multiplicação dos canais
comerciais, principalmente) e do advento de novidades tecnológicas (como o controle

41
remoto). Estas novidades desestabilizaram a maneira pela qual se construía a credibilidade
televisiva, bem como os limites que se acreditava existir entre realidade e ficção.
A diferença fundamental entre as duas eras se dá pela perda da transparência da
televisão na sua relação com o mundo. A Paleotevê era feita para todos os espectadores e
falava (ou fingia falar) do mundo exterior, “das inaugurações dos ministros e cuidava para
que o público aprendesse apenas coisas inocentes, mesmo à custa de contar mentiras”
(Idem, 182). Pretendia-se uma janela que mostrava o mundo. A Neotevê, por sua vez, fala
sempre menos do mundo exterior e cada vez mais “de si mesma e do contato que
estabelece com o próprio público” (Ibidem). Interessante percebermos que o conceito de
Paleotevê se aproxima das formas iniciais da televisão proposto por Williams (1975),
quando a tecnologia que se desenvolvera sem conteúdo específico parasitava o conteúdo de
meios e de eventos anteriores. Da mesma forma, podemos relacionar o conceito de
Neotevê à fase seguinte do parasitismo televisivo também proposto por Williams e
corroborado por Balogh (2002), quando formas híbridas e parasitas de si mesmas passam a
caracterizar a televisão. Como já havíamos dito, as duas maneiras de contar a história da
TV a que nos propusemos são complementares, não diferentes.
Eco ainda assinala outras diferenças. Por uma questão de sobrevivência em um
cenário competitivo e de crescente autonomia por parte do público, a Neotevê teve que
procurar seduzir e entreter o espectador cada vez de forma mais direta e pessoal – enquanto
a Paleotevê procurava informar “um público ideal, manso e católico” (Eco, 1984, 201). A
Paleotevê tinha pouca coisa a dizer, e o que era dito se vestia de uma linguagem depurada.
Dela “poderia fazer-se um pequeno dicionário com os nomes dos protagonistas e com o
título das transmissões” (Idem, 182). Com a Neotevê isso seria impossível – ela “nos dá
numa mesma noite Totó, o primeiro Ford e talvez Mélies” (Idem, 202) – e sua linguagem
já não traz nenhum apuro.

Ao contrário, querem que o público se reconheça e diga “somos assim mesmo”.


Por isso o comediante ou o apresentador que propõe a pergunta olha para o
traseiro da espectadora, diz palavrões e faz trocadilhos. Os adultos se
identificam, finalmente o vídeo é como a vida. Os moços pensam que aquela é a
maneira certa de se portar em público – como tinham sempre suspeitado. É um
dos poucos casos em que a Neotevê diz a verdade absoluta. (Idem, 201)

A espectadora que teve o traseiro olhado aceita tudo “na brincadeira”, como aponta
Eco, para ser vista. A Neotevê faz a televisibilidade passar a ter valor em si mesma. Tanto

42
que até quando se diz mostrando o mundo, já não é mais o mundo que vemos, mas uma
encenação de mundo que se preparou para as câmeras, salvo raras exceções.

Não está mais em questão a verdade do enunciado, isto é, a aderência entre o


enunciado e o fato, mas a verdade da enunciação que diz respeito à cota de
realidade daquilo que aconteceu no vídeo (e não daquilo que foi dito através do
vídeo). (Idem, 188, grifo do autor)

Para terminar, Eco diz que “em contato com uma tevê que fala só de si, privado do
direito à transparência, isto é, do contato com o mundo exterior, o espectador volta a si
próprio” (Idem, 200). De um veículo de fatos (Paleotevê) a um aparato para a produção de
fatos (Neotevê). Aparato este que se torna cada vez mais presente, cada vez mais visível.
Foi-se a transparência que a mediação televisiva se propunha ter. Como garantia de
veracidade, de “ao vivo”, a presença em cena de câmeras e fios torna-se fundamental.
Serelle (2005) propõe a existência de uma nova fase, a Metatevê, que acentua as
características da Neotevê e constrói uma “retórica dos bastidores”, cujo princípio seria
uma orientação para o código. Percebe que a linguagem da mídia não é apenas fenômeno
mediador, mas tornou-se experiência em si mesma. Enfatiza também que, pela
intensificação das práticas de metalinguagem – foco nos processos produtivos e
desnudamento de modos e estratégias do narrar televisivo –, a televisão constituiu uma
mediação de segunda natureza. Suas formas de mediação se tornaram ordinárias.
Característico, portanto, da Metatevê é a profusão de programas que têm como objeto
mediado a própria programação televisiva – seus arquivos, bastidores e as celebridades
produzidas por ela. Serelle diz que a televisão não ofereceu a seu público apenas modos de
ver e interpretar o mundo, mas também linguagens com as quais se expressar, cada vez
mais acessíveis. Por fim, conclui que a Metatevê pode ser compreendida como uma
cumplicidade entre espectador e TV. O público não mais apenas reconhece aquilo que a
televisão lhe traz, mas passa a ver como isso se dá e a se sentir capaz de se mostrar com a
mesma linguagem. Em última instância, a Metatevê promove um encontro do sujeito com
ele mesmo em uma sociedade altamente midiatizada.
No texto de Serelle, o autor sugere a emergência de uma Metatevê para refletir
sobre os sentidos e as estratégias das operações de metalinguagem em programas de
caráter mais jornalístico31 que incorporam em seu narrar os bastidores da construção
narrativa e a presença dos aparelhos que permitem tal construção. Apesar de não figurarem

31
Serelle (2008) trabalha com os programas Profissão Repórter e Cena Aberta, ambos da Rede Globo.

43
em nosso horizonte de interesses os programas jornalísticos (ou mesmo o possível caráter
jornalístico do Pânico na TV), nem as práticas de presentificação dos aparatos técnicos
como objetos da mediação – e não apenas como objetos para a mediação –, a contribuição
de Serelle é enriquecedora. Ela nos ajuda a compreender melhor estes programas, tão
naturalizados na televisão, que fazem do desvelamento da lógica produtiva da televisão,
como acreditamos ser o caso de nosso objeto, elemento de cumplicidade e até de
cooperação junto a seu público. Perceber as especificidades de como o Pânico na TV
atualiza essa característica geral será tarefa necessária.
Outro autor, que também parte das idéias de Eco e que se mostrou iluminador na
busca que empreendemos de balizas teóricas para pensarmos a televisão como proposta de
interação, é Missika (2006). O propósito central de seu livro é contar a história da relação
do telespectador com a TV. Em traços gerais, esta história rumou progressivamente,
segundo o autor, para mais autonomia, interação e desencantamento. A televisão mudou
(tanto como aparato tecnológico, quanto como instituição social); o telespectador mudou;
e, claro, mudou também a realidade sócio-cultural que afeta a TV e seu público ao mesmo
tempo em que sofre deles afetações.
As três eras que propõe – a Paleotevê, a Neotevê e a Pós-tevê – são, como o autor
define, estilos ou modos distintos da televisão se relacionar com o telespectador. No
entanto, adverte que, tratando-se de estilos, é importante pensarmos em uma lógica de
predominância de certos traços em cada um dos momentos. Ou seja, traços de cada uma
das eras coexistem ainda hoje, estão mais ou menos presentes em determinados canais, em
determinados programas, em determinadas celebridades que os personificam. O que
permite falar de eras é a predominância dos traços que, numa crescente, acabam por se
impor e consolidar um período dotado de características próprias. Missika diz que, se fosse
contar a história destas eras sob o ponto de vista estético, trabalharia com as idéias do
estilo clássico, barroco e rococó (decadente). Mas prefere seguir a terminologia de Eco.
A Paleotevê é caracterizada, de forma bastante similar a Eco, por uma relação
mestre-aluno entre a TV e seu público. É a televisão mensageira que, pela escassez da
oferta e novidade mesmo do fenômeno televisual, dominou a demanda. Era pensada, com
otimismo, como a ampliação da sala de aula, como um meio que teria força suficiente para
uma “alfabetização” cultural em grande escala. Como lema, repetia: “distrair sim, mas sem
jamais esquecer de informar, educar e cultivar. Conquistou, assim, o posto do que deve ser
ouvido, era a “janela para o mundo”. Conquistou também um espaço nobre dentro dos

44
lares: a sala da família. Objeto sagrado, presente e distante ao mesmo tempo, exigia de seu
telespectador reverência e deferência. Era jovem ainda para inventar seus próprios gêneros
e se apoiava em gêneros pré-existentes. Mas tinha acima de tudo critério. Respeitava e
reforçava o monopólio da palavra legítima – só os campeões poderiam passar à TV.
Reforçava também a idéia daquilo que deve ser dito, independente das preocupações
daqueles a quem se dirige. Porém, não se deu conta de que, havendo poucos canais e sendo
a TV novidade e mistério, não era ao que se falava e mostrava que as pessoas viam, mas à
própria tele-visão como um fenômeno.
A Neotevê é marcada pelo fascínio e hegemonia do modelo comercial de televisão
e a consequente proliferação da oferta em canais cada vez mais segmentados. O
telespectador se transforma em cliente e, ao invés de informar ou educar, a Neotevê, como
necessidade de sua própria sobrevivência financeira, passa a se colocar a função de entreter
e seduzir seus clientes de modo cada vez mais direto e pessoal. A relação público/TV se
torna ambivalente: os dominados passam a dispor de uma margem de ação e o dominador
passa a ter que pensar nos estados de espírito e nas expectativas dos dominados. Ainda há
quem fala e quem escuta, mas quem fala sabe que aquele que escuta pode deixar de fazê-lo
a qualquer momento. A relação de dominação se desloca para uma de sedutor-seduzido
(mais do que uma de mestre-aluno). A Neotevê precisou, portanto, procurar por novos
formatos fundados em uma relação de crescente cumplicidade com seu público, já
acostumado com a presença da televisão e capaz de compreender (ou desconstruir) melhor
sua linguagem e sua lógica produtiva. Em um movimento de desacralização do posto da
televisão, seus telespectadores passam a demandar algo que se pareça como eles ou, pelo
menos, que finja se parecer. O registro pedagógico e normativo vai sendo abandonado pelo
convivial e intimista. O televisor ganha espaço no quarto de dormir. Os heróis das
narrativas da Neotevê são psicologizados, mesmo quando dotados de poderes especiais,
sofrem por problemas de um cotidiano comum.
Pensemos, como ilustração desta diferença, nas histórias do Super-Homem
(personagem criado para os quadrinhos em 1938 e que foi para a televisão em 1951) e nas
do Homem Aranha (criado para os quadrinhos em 1962 e com primeira versão para TV em
1967). Enquanto o primeiro é um ser de outro planeta, enviado para a Terra, onde os raios
do sol amarelo fazem com que seja super poderoso, o segundo é um estudante que, numa
excursão a um laboratório, foi picado acidentalmente (poderia acontecer com qualquer um)
por um inseto modificado e recebeu dele seus poderes. O Super Homem tem uma conduta

45
sempre “reta”, seus únicos dilemas são administrar sua identidade secreta e seu amor por
Lois Lane (característica humana necessária à identificação herói-público). Já o Homem
Aranha vive uma série de questões de um adolescente comum: é extremamente tímido e
solitário; vai à escola, onde tem problemas com colegas; é rejeitado em seu amor por sua
vizinha; é explorado pelo chefe; tem que se desculpar com a tia com quem mora se deixa
de fazer uma tarefa doméstica, mesmo que tenha deixado de fazê-la para salvar a cidade.
Não se tratam, sabemos, de personagens originalmente televisivos, mas lembremos que
estamos falando da televisão inserida em uma realidade cultural maior.
Na Neotevê, ainda segundo Missika (2006), a informação passa a ser tratada de
modo mais individual, testemunhos de pessoas ordinárias se generalizam e mesmo
experiências coletivas (como grandes desastres), ganham um prisma do sentimento
pessoal. Em uma sociedade caracterizada pela dissolução do tecido da sociabilidade
tradicional e por inseguranças de todo tipo (social, financeira, identitária), a TV adota uma
relação de cumplicidade frente a um indivíduo em crise. Trata-se da televisão missionária e
sua missão é gerar evasão dos sofrimentos e identificação entre os que sofrem. Para a
evasão, “brilhos e lantejoulas”, como aponta Missika, para dizer do desenvolvimento do
gênero televisivo dos espetáculos diversos e das variedades. Porém, os gêneros mais
emblemáticos desta era são, segundo o autor, o talk-show e programas que exploram os
sofrimentos de pessoas comuns a troco de tentar ajudá-los a resolver seus problemas32 –
tudo diante das câmeras, é claro. Estes gêneros abrigam crescentemente a voz de pessoas
ordinárias que viveram experiências extraordinárias e dramáticas. A legitimidade desta voz
profana não se assenta numa expertise de um “nós” – como na sagrada Paleotevê –, mas na
experiência pessoal e na emoção sentida de um “eu” ainda com esperanças de se
reencontrar e de reconstituir seus laços: rever o irmão; voltar à casa destruída; pedir
desculpas para a esposa. “Não é mais o expert que, sob o foco dos projetores, faz a figura
do herói, mas o indivíduo mediano. Um indivíduo banal, sem qualidades particulares, que
se opõe à artificialidade da estrela e à inacessibilidade do sábio”33 (Missika, 2006, 25).

32
Missika (2006) usa para nomear este tipo de programa – como por exemplo o Márcia, de Márcia
Goldsmith, transmitido pela Rede Bandeirantes de Televisão – o termo reality show. Para falar do tipo de
programa que estamos acostumados a nomear desta forma – como o Big Brother Brasil, por exemplo – o
autor usa o termo telerealidade (téléréalité). Para evitar confusão desnecessária, manteremos neste trabalho a
nomenlatura a que estamos acostumados ou agruparemos estes formatos variados sob o rótulo de “TV de
realidade”, como nos propõe Freire Filho (2009).
33
Tradução nossa do original em francês: “Ce n’est plus l’expert qui, sous les feux des projecteurs, fait figure
de héros, mais l’individu lambda. Un individu banal, sans qualités particulières, qui s’oppose à l’artificialité
du savant.” (Missika, 2006, 25)

46
O valor que parece sustentar a emergência deste tipo de herói é a autenticidade, ou
como diz Missika, o fato de ser “não cosmético e não racional”. Sua verdade reside no fato
de que ele poderia ser eu ou qualquer um outro, mecanismo de identificação que atua como
um jogo de espelho. O ‘qualquer um’ torna-se quem fala e sobre o que se fala.

Não é mais a televisão que fala ao telespectador, mas, por um jogo de espelhos, o
telespectador que fala a si mesmo e sobre si mesmo. O telespectador-receptor
está no centro do dispositivo da neotelevisão. Aliás, o apresentador – antes
vedete – se situa agora atrás da testemunha ou do herói ordinário. (Ibidem)

Como último critério para ascender à televisão, ainda se fazia necessário viver algo
de espetacular para além da televisibilidade. Critério ainda subjacente à lógica da
televisão34.
A sugestão de Missika de que o valor que sustenta a televisibilidade na Neotevê é a
autenticidade, parece estar presente nas preocupações de vários autores. Com Eco (1976),
já havíamos visto que o público passou a demandar produtos em que se reconheça e diga
“somos assim mesmo”, ou seja, uma identificação baseada na autenticidade da
representação dos comportamentos, falas e anseios do público receptor. Serelle (2008)
percebe em sua reflexão sobre a metatevê como esta acaba por promover um encontro do
sujeito com ele mesmo. Pensamos que a tentativa de dar autenticidade ao produto
midiático criado, expondo seus processos e mecanismos de criação, é o que permite a
promoção deste encontro. Já vimos também como os valores de autenticidade e de
espontaneidade parecem caros ao público do Pânico na TV, mas não nos adiantemos à
análise.
A autenticidade é um dos conceitos centrais do texto de Freire Filho (2009) em que
ele analisa o fenômeno da “TV de realidade”, promovido pelo alargamento (consentido ou
insidioso, como faz questão de ressaltar o autor) da observação, enunciação e
representação do íntimo. O que parece assegurar o comprometimento subjetivo e prazeroso
do público em relação a esta TV, ainda segundo Freire Filho, é a procura da autenticidade
nos e dos indivíduos que preenchem, com suas intimidades, os programas de realidade.
Sobre estes programas, o autor ainda faz a consideração de que “nesse novo século,
convenhamos, é injusto acusar a televisão de falta de ousadia e inventividade.” (Freire
Filho, 2009, p.10)
34
Percebemos que a Neotevê de Missika é um pouco diferente da maneira como Eco concebe esta era. Para
este, a Neotevê já aparece como a era que fez da televisibilidade um valor por si só. Esta característica, como
veremos, é apontada por Missika como sendo referente à Pós-tevê.

47
Dissemos com o grifo pela procura da autenticidade nos indivíduos no caso de
programas como o Big Brother e outros cujos participantes são avaliados, julgados e
votados pelo público.

A audiência do Big Brother se deleita, principalmente, com a oportunidade de


esquadrinhar e debater a sinceridade e a autenticidade alojada no “espaço opaco
entre performance e ação inconsciente”, apreendida em rompantes e lampejos,
representada tanto pelo que é dito quanto pelo que é silenciado. (Idem, p.06)

Quando se trata da procura dos indivíduos, estamos nos referindo a programas de


transformação que se propõem a recuperar – através de lições sobre moda, cirurgias
estéticas, sugestões de comportamento alimentar etc. – o verdadeiro “eu” de seus
participantes. Assistindo a estes programas

somos sensibilizados, através de narrativas e explanações emocionalmente


persuasivas, para a importância da elaboração da autenticidade, da configuração
de uma identidade e de uma imagem distintiva e fiel ao nosso eu interior. A
autenticidade é exaltada como motor de uma vida significativa, psicologicamente
satisfatória e socialmente recompensadora, tornando-nos, ao mesmo tempo,
sujeitos mais confiantes e confiáveis. O compromisso com o ser autêntico
assegura que nossa aparência, nossas decisões e inclusive nossas mudanças
refletem convicções e valores interiores, não sendo pautadas ou condicionadas
por forças e interesses alheios ao self. (Idem, p.11)

Ressaltemos que, diferentemente da expertise de um “nós”, selecionada pela


legitimidade da Paleotevê (como nos propõe Missika), nestes programas, temos uma
expertise específica convocada para assegurar a um “eu” a sua autenticidade, chancelada
pela visibilidade deste processo por um “nós”, os telespectadores.
Freire Filho diz, por fim, da primazia da espontaneidade sobre as normas sociais
que governam a expressão das emoções e que a melhor atitude perante a onipresença dos
sistemas de monitoramento da conduta individual é “agir de modo espontâneo e
despreocupado”. “Apenas sorria e seja você mesmo!”, conclui o autor.
O convite, se não a necessidade, de “sermos nós mesmos” parece ser a tônica da
cultura individualista-neoliberal, saturada pela oferta de material simbólico ao mesmo
tempo em que capacitada a produzir os seus próprios, que fez nascer a Pós-tevê. De volta a
Missika (2006) encontramos a idéia de que a Pós-tevê pôs abaixo o último critério de que a
Neotevê se utilizava para a ascensão à televisibilidade. Segundo o autor, esta era representa
uma ruptura parcial em relação à era precedente. Trata-se mais de adaptação às novas
aspirações socioculturais, que a TV acompanha para se manter viva. Ela se dirige a um

48
indivíduo que tenta assumir e reivindicar a sua autêntica singularidade em uma cultura que
foi, aos poucos, abandonando a individualidade depressiva (da sociedade que se viu com
os laços tradicionais dissolvidos) para uma individualidade positiva: ao invés de solidão,
liberdade para ser eu mesmo; no lugar de desafiliação, autonomia. “É a minha escolha” e
“eu sou eu mesmo” se convertem em credos de uma nova era – ainda que para ser eu
mesmo eu me afilie a grupos instáveis de novas formas de solidariedade tribal
(comunidades por afinidade) e não esteja, obviamente, livre de sofrimentos.
Acreditamos que vários aparatos e formas que, recentemente, têm atendido às
demandas da cultura contemporânea podem ser pensados como reverberações desta era
que Missika apresenta. Tratam-se de dispositivos para que seus indivíduos, mesmo que de
maneira ilusória e limitada, exerçam suas escolhas autonomamente e expressem a
autenticidade de seus selves através delas: diários virtuais; sites de distribuição de material
audiovisual e de relacionamento a partir da auto-exposição de gostos e interesses; e a
promessa da TV interativa. Para seguir a tendência, a Pós-tevê aprofunda o processo de
identificação do telespectador com aquilo que vê da Neotevê e oferece a ilusão de que
qualquer um pode ter o seu quinhão de televisibilidade, independente de qualquer critério
externo às escolhas da própria TV e de seu público.

Não há mais necessidade de estar em crise para revelar sua intimidade, não há
mais necessidade da riqueza de uma experiência para contá-la; não há mais
necessidade de ser excluído, sofredor ou heróico para ser escutado. Basta ser.
Como se isso tivesse um valor em si mesmo.35 (Idem, 29)

Mas não somos senão diante de um outro ou para um outro. Nos tempos de uma
sociedade altamente midiatizada, o “basta ser” só parece ter a sua autenticidade garantida
pela visibilidade inflacionada. Basta, portanto, estar na TV. Esta ilusão se assenta na lógica
“sou alguém porque apareci na televisão”. Trata-se da televisão Pigmaleão, que fabrica sua
própria criatura e permite que ela transcenda seu estado de origem, mesmo com toda
efemeridade que esta transcendência tenha. É a televisão dos reality-shows, é a “TV
realidade” que nos propõe Freire Filho, é, por fim, a televisão das celebridades
instantâneas.

35
Tradução nossa do original em francês: “Plus besoin d’être en crise pour dévoiler son intimité; plus besoin
de la richesse d’une expérience pour se raconter; plus besoin d’être exclu, souffrant ou héroïque pour être
entendu. Il suffit d’être. Comme si cela avait une valeur en soi.” (Missika, 2006, 29)

49
Sabemos que contar a história da TV a partir da matriz deixada por Eco tornou-se
um lugar-comum. Sabemos também dos perigos que se corre quando nos apoiamos em
lugares-comuns sem o cuidado de nos atentarmos às especificidades daquilo que estamos a
analisar. No entanto, queríamos não tanto contar uma história36, mas pensar em traços e
tendências gerais que nos permitam caracterizar diferentes disposições – ou traços culturais
– do público em relação à televisão para podermos, mais adiante, pensar em sua relação
com as celebridades. Lembrando a nossa inscrição em uma perspectiva que pensa a
televisão em seu imbricamento circular na sociedade, tais traços não são considerados aqui
como indicativos de eras da televisão, mas como propostas de se pensar a movimentação
de valores e disposições que estão também na vida social. Neste exercício de transposição
não queremos, assim como apontou Missika, ordenar as disposições cronologicamente.
Elas podem coexistir, podem mudar de grupo de espectadores para outros grupos, ou
mesmo aparecer na relação que uma mesma sociedade estabelece com produtos midiáticos
diferentes.
A partir das características creditadas à Paleotevê, podemos pensar numa
disposição de reverência; de quem se aceita, de alguma forma, menor do que aquilo que
consome; de quem quer aprender com ou se projetar naquilo que vê. Mesmo que isso não
signifique pura aceitação ou simples passividade no ato de recepção. A partir da Neotevê,
pensamos em uma disposição que busca uma identificação autêntica; o se relacionar com
aquele que poderia ser eu, com aquilo que poderia ter acontecido comigo. Com as
características da Pós-tevê, pensamos em uma disposição mais interventora, aquilo que
consumo existe para tal, para ser consumido; para ser criado por mim, em minha
autonomia e autenticidade, ou mesmo “grafitado” pela minha apropriação; sinto-me,
mesmo que ingenuamente, maior do que aquilo que consumo.
Acreditamos que conseguiríamos uma arriscada síntese dos autores que
convocamos nesta parte do texto (Eco, Missika, Serelle e Freire Filho, principalmente)
recorrendo a Bateson (1989) e à sua idéia dos níveis de aprendizagem. Na obra deste autor,
interessado no estudo da aprendizagem da linguagem e no processo evolutivo que esta

36
A história das Eras da TV pode mesmo ser mera ilusão, como nos alerta Freire Filho (2004), ao dizer que,
principalmente no Brasil, a Paleotevê nunca existiu. A história da televisão brasileira não foi ainda
convenientemente contada, e, portanto a adequação das eras – que foram períodos em outros contextos –
pode não corresponder à nossa realidade. No entanto, acreditamos que se nos abstrairmos da idéia de que eras
são períodos que se sucedem e da idéia de que a caracterização, na sua totalidade, de cada era deva
corresponder com cada período ou objeto analisado, podemos ter indicativos que guiam nossa reflexão
produtivamente.

50
aprendizagem desencadeia, encontramos a instigante tese de que aprender é mais do que
que interiorizar determinado conteúdo. É, sobretudo aprender a aprender. Diz-nos Bateson
que “a operação de comunicação é um aprendizado permanente da maneira de comunicar”
(Bateson, 1989, p.134). O autor distingue, assim, dois níveis de que se constitui o ato de
comunicar. Um nível diz respeito ao conteúdo que está sendo comunicado, o outro, que ele
nomeia metacomunicativo, informa sobre a relação que o conteúdo comunicado instaura,
informa, portanto, sobre como o processo comunicativo está a se desenvolver.
França (2007), interessada em pensar em como nossa experiência com a mídia pode
ser considerada uma dinamizadora das práticas de recepção, propõe um exercício de
apropriação das idéias de Bateson para o estudo da comunicação midiática. A autora
sugere que a partir das contribuições de Bateson deveríamos tirar

mais conseqüências das mudanças provocadas pelas mudanças ocasionadas pelo


cenário da sociedade midiática – pelo cenário mutante, poderíamos acrescentar.
Se nos primórdios desta sociedade as pesquisas acompanharam o aprendizado da
decodificação das diferentes linguagens (a sociedade aprendeu a ler jornais, a
escutar rádio, assistir cinema e assistir televisão, ler histórias em quadrinhos e
assim por diante), diferentes estudos nos mostram hoje o quanto os receptores já
conhecem sobre o funcionamento da própria mídia, não apenas reproduzindo-a
em produções domésticas, e desenvolvendo performances midiáticas em
diferentes contextos cotidianos, mas produzindo também um discurso crítico
sobre esta mesma mídia. Reflexivamente, esta mídia vem tendo que mudar –
novos programas, novos formatos para um público mais experiente. E assim em
cadeia. (França, 2007, p.15)

Desta forma, diríamos que a possibilidade de existência das disposições que


anteriormente apresentamos (talvez sim em uma crescente, mas não em uma lógica de
substituição simples) se relaciona ao fato de a televisão, caminhando ao lado da dinâmica
sócio-cultural, e até mesmo como condição de sua manutenção financeira, precisar ter que
se abrir cada vez mais a um público que, além de “aprender” aquilo que ela comunica,
passou a “aprender” sobre como ela comunica e a se sentir – tendo recursos tecnológicos
para tal – capaz de se expressar no mesmo registro, com as mesmas linguagens. Missika
(2006) fala do fenômeno da desprofissionalização, para o autor um dos vetores de força
que marcaria o fim da televisão como a conhecemos. A desprofissionalização diz de um
desejo de participação (de efetiva interação) de uma fração do público que se mostra forte
o suficiente para transformar o sistema de valores em jogo, bem como as referências
estéticas dos programas televisivos. A relação público-televisão se desenha à nossa frente

51
de maneira mais fragmentada, múltipla, acompanhando as características da cultura
contemporânea.
Além disso, acreditamos que o exercício de acompanhar a apresentação destas eras,
que preferimos chamar disposições, relacionando-as com idéias outras que parecem
reforçá-las, forneceu-nos indícios do panorama cultural em que se insere nosso objeto. A
maneira de considerá-lo, a partir disso, receberá inegavelmente suas marcas. Para uma “TV
de realidade”, pautada pelos valores da espontaneidade e da autenticidade, talvez seja mais
adequado um “humor de realidade”, pautado pelos mesmos valores. E, em tempos de
disputa acirrada pela visibilidade midiática como garantia de autenticidade de um “eu”, o
ataque à camada “cosmética” e programada que envolve a construção das celebridades
parece ser uma promessa tentadora.

52
2. Rir com a TV, rir das celebridades

Agora que qualquer mané pode ser famoso na TV e todo


mundo é convidado a interferir e interagir com a notícia e
a indústria do entretenimento pela rede mundial de
computadores, a motivação para sorrir e para fazer graça
também ganhou outros parâmetros.
(Rolling Stone, dezembro de 2008)

No capítulo anterior, tentamos apresentar o objeto empírico de nossa proposta – o


Pânico na TV – e esboçar um quadro ainda amplo de relações históricas e contextuais que
nos ajudam a situá-lo como um programa de televisão. Porém, dizer de programas de
televisão nos leva a pensar em determinados padrões que organizam a relação do público
com estes programas. Normalmente, nomeamos estes padrões como gêneros e os
programas como formatos.
Essa é uma nova área que vem ganhando espaço como estratégia de aproximação
analítica dos programas televisivos: o estudo dos seus gêneros. Esta estratégia é devedora
dos esforços que a Teoria da Literatura empreendeu sobre os gêneros literários. Na obra de
Bakhtin (2000), uma de nossas principais referências nesta área, encontramos que gêneros
são tipos relativamente estáveis de enunciados, que funcionam como dispositivos
facilitadores para a comunicação. No campo de estudo da comunicação midiática, este
conceito tem sido resgatado como forma de compreensão das características internas de
construção de sentido – a recorrência de algumas formas, imagens e estruturas em seus
produtos – e, como conseqüência disso, para tratar das relações de recepção – pela
estrutura de reconhecimento e o estabelecimento de uma proposta de interlocução com o
outro que estas características permitem gerar. Martín-Barbero (1987) nos apresenta esta
idéia ao considerar o gênero como uma das mediações que formam seu mapa de análise
dos fenômenos comunicativos. Neste sentido, gêneros são entendidos como “estratégia de
comunicabilidade”, confluência entre os processos de produção e recepção dos produtos da
mídia. É pelo gênero que emissor-produtor e receptor se encontram no texto midiático
através das competências culturais projetadas e exigidas – pelo lado da produção – e
daquelas efetivamente ativadas – pelo lado da recepção.
No entanto, as tentativas de se trabalhar com a idéia de gêneros televisivos, ou
ainda midiáticos, têm, salvo raras exceções, gerado listagens classificatórias, movidas por
uma ansiedade taxonômica pouco consensuais, nas quais tentamos enquadrar – se não
engessar – nossos objetos. Como área de investimento recentemente aberta para os estudos
da comunicação, a discussão sobre gêneros ainda é tarefa difícil. Derivada que é das teorias

53
literárias37, ainda não amadureceu suficientemente para dar conta dos produtos televisivos.
Tais produtos são novos – Bakhtin já nos havia dito que a estabilidade de um gênero é um
processo de sedimentação histórica – e móveis, o que dificulta sua sedimentação. Porém o
empreendimento não deve ser abandonado, pois a caracterização dos gêneros nos ajuda a
perceber como os programas se estruturam para se lançar à procura do encontro: como se
apresentam, se fazem reconhecer e interpelam o público.
Itania Gomes (2002) afirma que “os gêneros permitiriam entender o processo
comunicativo não a partir das mensagens, mas a partir da interação” (Gomes, 2002, p. 182,
grifo da autora). Ao colocar as questões dos gêneros como sendo da ordem das interações,
indica que eles se configuram a partir de dois movimentos: de um lado, as intenções de um
emissor, previamente moldadas pela presença virtual de um leitor; de outro, as práticas de
leitura, guiadas pela conjugação de um sentido preferencial e das referências culturais dos
receptores. Assim como Gomes, não trabalhamos com a noção de gênero como algo
interior ao texto, mas como algo que se atualiza no encontro texto-leitor. Gêneros são
expectativas historicamente construídas, são modos de “se dirigir a” em contextos culturais
determinados.
Como já dissemos, nosso objeto não é único – ao contrário, parece se fazer mesmo
de uma confluência de referências televisivas – nem tampouco surgiu do nada – é fruto de
um contexto histórico-cultural que nos apresenta a possibilidade de seu acontecimento. É,
talvez, mais um dos programas “meta” cada vez mais comuns na contemporaneidade. No
entanto, acreditamos, atualiza gêneros e formatos precedentes e movimenta determinados
traços culturais com uma certa especificidade, que cabe a este trabalho analisar.
Enquanto programa metatelevisivo (que tem a própria TV e sua linguagem como
temática última) de humor (que parece ter como proposta para o espectador fazê-lo rir) se
aproxima de outros programas anteriores. A Revista Oi de abril-maio de 2005 traça um
breve, mas promissor, percurso histórico que permitiu à TV brasileira chegar a um
programa como o Pânico na TV:

37
Mesmo na Teoria da Literatura a noção de gênero encontra dificuldades de se estabelecer, a não ser em
estudos que se voltam para a História da Literatura.

54
Há pouco mais de 20 anos, um jovem e ainda topetudinho Marcelo Tas mandou
na lata para o então candidato governista à presidência da República, Paulo
Maluf: “Muitas pessoas dizem que o senhor é corrupto, que o senhor é ladrão. É
verdade isso, deputado?” Daquele fim de 1984 para cá – ainda nos estentores da
ditadura militar, antes que voltássemos a votar diretamente para presidente –,
muita claque riu de piada sem graça no frio siberiano dos estúdios da Rede
Globo e do SBT. Ao humor televisivo brasileiro, restou evoluir aos saltos, a
partir de mutações esporádicas como TV Pirata, Casseta &Planeta e Ernesto
Varela, o repórter-personagem de Tas. Foi mais ou menos assim que chegamos
até Vesgo e Ceará, duas das principais estrelas do Pânico na TV. (...) Eles
ficaram famosos afrontando e desconcertando celebridades, subcelebridades e
aspirantes a subcelebridades. (Revista Oi, abril-maio de 2005, p.26)

Tentemos acompanhar esta história, mas acrescentando a ela outras referências e


formatos que, acreditamos, abriram campos de possibilidade cultural e semântico para o
surgimento e o sucesso de nosso objeto. Além de Ernesto Varela, o Repórter, que a
matéria cita, temos uma outra referência da década de 1980 que nos indica algo do Pânico
na TV: trata-se do Perdidos na Noite, de Fausto Silva. Vejamos as características destes
dois produtos midiáticos que mais nos interessam. Sobre o primeiro, nos diz Braga (2007)
que

criado meio por acaso, Ernesto Varela estréia na correria de se produzir conteúdo
para um espaço em que a turma – eram todos jovens descobrindo e tentando
reinventar o meio televisivo – tinha acabado de conseguir, ainda em 1983, no
programa Goulart de Andrade na TV Gazeta de São Paulo” (Braga, 2007, p.10)

O que marcou o estilo destes “jovens descobrindo e tentando reinventar o meio


televisivo” foi a criação de um misto de ator-comediante-jornalista corporificado no
personagem “Ernesto Varela, o Repórter”, de Marcelo Tas. Como fica claro no trecho da
Revista Oi citado acima, o papel deste “repórter” era dar voz a perguntas desconcertantes,
altamente críticas, dirigidas a figuras públicas, em um conturbado cenário político
nacional. Ele passou a ser considerado o pai do “jornalismo cara-de-pau”. Ele também é
considerado o pai do Repórter Vesgo (Rodrigo Scarpa), personagem do Pânico na TV que
também faz sucesso ao abordar celebridades e anônimos em festas e eventos com
perguntas politicamente incorretas (mas, quase nunca com o mesmo viés político de
Varela) 38. Além disso, outra característica que parece ligar os dois personagens reside no
fato de ambos fazerem parte de uma “turma” que, aparentemente sem grandes

38
Segundo associação entre personagens encontrada no site Wikipedia. Disponível em
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Marcelo_Tas>. Acessado em 19 de novembro de 2008.

55
compromissos, tentou criar algo de novo para a programação televisiva, como vimos no
histórico traçado para o Pânico na TV.
O Perdidos na Noite, de Fausto Silva, estreou na TV Gazeta em março de 1984
como atração local (de São Paulo). Em setembro do mesmo ano, e devido ao sucesso que
atingiu, o programa se transferiu para a Rede Record e para a transmissão nacional. Apesar
de não ser exatamente um programa humorístico (Ernesto Varela também não o era), e de
ser de fato um programa de auditório que ia ao ar nas madrugadas de sábado para
domingo, o apresentador Fausto Silva passou a ser identificado pela irreverência com que
expunha a fragilidade técnica da televisão e pelo escracho com que dizia da confusão dos
bastidores. O apresentador ainda se dirigia aos membros de sua platéia como “pentelhos”.
Com o bordão “Ô louco, muda de canal!”, se referia elogiosamente à programação das
emissoras concorrentes (chegava mesmo a anunciar o filme que estava sendo transmitido
na Globo, por exemplo), declarando a “porcaria” que era o seu próprio programa. Levou
consigo estes traços de escracho e de esculhambação para Safenados e Safadinhos (1986,
Bandeirantes). Desde 1989 passou a comandar o Domingão do Faustão nas tardes de
domingo da Rede Globo, onde, nitidamente, foi perdendo a irreverência e adotando um
tom mais emotivo.
Importante aqui lembrarmos que o tom escrachado que foi sendo moldado pelo
Pânico na rádio é contemporâneo desta transição de Fausto Silva para a Globo, em fins da
década de 1980 e início da de 90. Como vimos, o programa radiofônico, matriz de nosso
objeto, “descobriu a fórmula” de lidar com seu público quando passou a tratá-lo mal, como
fazia Fausto Silva. O Pânico na TV ainda parece devedor de Perdidos na Noite em sua
característica de valorizar o mal-feito e o que acontecia de errado no programa. Estratégias
discursivas que, pensamos, se vinculam ao crescimento da busca por espontaneidade e
autenticidade na cultura que ia se firmando.
Da década de 1990, percebemos as heranças mais claras de humorísticos como TV
Pirata (1988-1990, 1992) e Casseta & Planeta, Urgente! (desde 1992), ambos da Rede
Globo. O primeiro era um humorístico baseado em esquetes parodísticas e satíricas que
tinham como base formatos da televisão. Era, portanto, um programa meta. A idéia parecia
mesmo ser a de subverter, ou “piratear”, a linguagem da televisão. Na vinheta de abertura,
num clima de filme de ação, um pirata invadia a central de comando da Rede Globo e
inseria nos equipamentos a sua fita cassete. Com isso, dava início à emissão de um “outro
canal não autorizado”: a TV Pirata. O segundo, também de caráter meta, entrou no ar com

56
o lema “Jornalismo Mentira, Humorismo Verdade”. A idéia de “humor de verdade”, que
lançamos ao final do capítulo anterior, ganhou com o Casseta & Planeta Urgente
expressão explícita. Aos poucos, além das esquetes que parodiavam telejornais e
satirizavam a pauta da mídia, o programa passou a incluir outras esquetes parodiando
outros formatos, como as telenovelas das oito da própria Rede Globo.
Já nos anos 2000, uma série de programas televisivos podem ser apontados como
“vizinhos” do Pânico na TV que, lembremos, surge em 2003. A revista Rolling Stone de
dezembro de 2008 estampa em sua capa um especial entitulado “Tá rindo do quê?”. Trata-
se de uma espécie de dossiê que tenta perceber a mudança do humor televisivo brasileiro
rumo a um novo tipo de escracho: o uso da “cara-de-pau” como arma e a sátira à vida real.
A idéia de um “humor de realidade” nos vai ficando mais demarcada. Este especial começa
por se questionar quem precisa de ficção – se referindo ao humor que se faz com base em
esquetes roteirizadas e que repetem a velha fórmula das piadas – quando

uma garota revelada no Big Brother, travestida de repórter e vestida com o


mínimo de roupa possível, pergunta diretamente ao craque bom-moço da Seleção
Brasileira, Kaká, carola de carteirinha que contou ao mundo que casou virgem (e
não estava fazendo piada), se ele está recuperando o tempo perdido com a
mulher – e ainda por cima arranca uma sincera e animadíssima resposta positiva?
(Rolling Stone, dezembro de 2008, p.84)

A reportagem aposta que esta tendência, que transforma a piada em um recurso não
mais fundamental para arrancar gargalhadas e atrair a audiência, está ligada à
popularização da internet, dos reality-shows e das ferramentas de auto produção e
veiculação de produtos simbólicos. Diz que o homem contemporâneo vive, desde os anos
1990, um choque de realidade, que acabou por transformar o próprio real em risível, desde
que retratado com espontaneidade, criando para o real-piada um tom de autenticidade. Os
programas que comporiam esta nova abordagem de “humor de realidade”, segundo a
Rolling Stone, são: o CQC (Rede Bandeirantes, desde 2008), o Hermes e Renato (MTV,
desde 2000), o 15 minutos (MTV, desde 2008) e o Pânico na TV.
O CQC (Custe o que Custar)39, originado a partir do modelo argentino de mesmo
nome (Caiga quien caiga, algo como “Caia quem caia”) e sucesso mundial desde 199540, é

39
O CQC, devido a traços de sua proposta, foi quase instantaneamente associado como concorrente direto do
Pânico na TV. Uma curiosidade nessa “disputa” é que o CQC ganhou o Troféu Imprensa na categoria de
"Melhor Programa Humorístico" de 2008. Com esta premiação, o programa quebrou uma tradição do Pânico
na TV, que havia conquistado três premiações consecutivas: 2004, 2006 e 2007 (em 2005 não houve a

57
também devedor da figura e da proposta que Marcelo Tas criou em Ernesto Varela, o
Repórter. O programa trata de fatos políticos, artísticos e esportivos da semana com
pitadas satíricas, brincando com as informações. Um trio de apresentadores – Marcelo Tas,
Marco Luque e Rafinha Bastos – comanda a chamada das matérias de uma bancada, como
em um telejornal, mas que tem à sua frente uma platéia. As matérias trazem os repórteres
abordando pessoas públicas, principamente políticos e celebridades, com perguntas
indiscretas e inconvenientes, no intuito de promover as mais inesperadas reações. Nesta
proposta, o programa é bem parecido com parte do que o Pânico apresenta, apesar do tom
jornalístico e politizado ser mais aparente e, por isso, ser considerado “mais inteligente”
em comparação com o humor “juvenil” do Pânico na TV.
O programa Hermes e Renato da MTV é outro sucesso longevo que guarda com o
nosso objeto alguns traços de similaridade. Trata-se de um programa criado e
protagonizado por uma turma de cinco jovens atores e que se destaca pela produção de
baixo custo (ou, nos últimos anos, pela simulação de uma produção de baixo custo). A
estética do “tosco”, do improviso, impera. Exemplo maior disso é a figura de Gil Brother,
ator-personagem-indivíduo, que passou a integrar o grupo em 2003. Ex-lavador de carro
nas ruas de Petrópolis que, durante sua atividade, cantava e dançava imitando James
Brown, foi convidado para participar do programa onde ganhou, entre outros, o
personagem “Away de Petrópolis”. “Que personagem? Fica evidente que o maior trabalho
da direção do programa é ligar a câmera. Aos 51 anos, ele fala e se comporta como o
doidão da tela” (Idem, p.89), diz a reportagem na Rolling Stone. Arnaldo Branco,
responsável pela entrevista com Gil Brother, explicita a dificulade que teve para manter o
diálogo com o “ator” que pareceu não se diferenciar de seu “personagem doidão”, como
fica claro no trecho a seguir, em que ele responde sobre a possibilidade de ser transferido
para a Rede Globo:

Maluco, só se a Globo me pagar caro, morou? Pra ficar nisso mesmo, fico lá
onde estou. A Globo é uma parada de peidão! Televisão de velho, porra, como é
que pode a gente já no ano 3000 e eles fazendo uma televisão dos anos 60? A
juventude quer ação! o jovem quer pular, o jovem quer ver porrada. O jovem não
quer amorzinho, o jovem quer violência! (Ibidem)

premiação). Curioso também concorrerem ambos na categoria de programas humorísticos, como se não fosse
problemática a filiação destes programas a gêneros bem específicos.
40
As versões estrangeiras do programa – a Argentina (original), Chile, Espanha e Itália – já receberam ao
todo sete indicações ao International Emmy Awards, considerado o Oscar da televisão. Disponível em
<http://pt.wikipedia.org/wiki/CQC_-_Custe_o_Que_Custar>. Acessado em 07 de junho de 2009.

58
Além de privilegiar a diferença em relação ao humor da velha piada – relacionado
aos humorísticos mais tradicionais da Globo e do SBT, como fez a Revista Oi (quando
disse do “frio siberiano dos estúdios da Rede Globo e do SBT”) – o “Especial Comédia” da
Rolling Stone também fez questão de valorizar o espontâneo, o vínculo com a realidade e o
improviso do novo “jeitinho brasileiro de fazer humor” (Idem, p.84).
Marcelo Adnet, apresentador do 15 Minutos é nomeado pela revista de “O Senhor
do Improviso”, título que ele reforça ao deixar claro que não precisa “entrar em um
personagem para ser humorista” (Idem, p.91). No programa, Adnet lê e-mails dos
telespectadores (que são, na verdade, o roteiro do programa), canta canções geralmente
parodiadas ou com temas relacionados ao cotidiano, imita celebridades e, claro, improvisa.
O programa dura de fato 15 minutos e seu sucesso parece ser fruto de Adnet falar direto
com o público, por pautar seu programa nos e-mails recebidos e em temas do cotidiano do
“povo”. Adnet sintetiza em sua entrevista:

Só falo de celebridade para tirar onda. Fulana de tal se esbaldando na pista de


dança. Foda-se! Programa de fofoca. Foda-se! Foi visto com não sei quem. Foda-
se! (Ibidem)

Marcelo Tas é o único que se mostra reticente em relação a essa supervalorização


da espontaneidade e da autenticidade, gerada pelo casamento ator-personagem. Deixa claro
que “aquela [a figura do apresentador do CQC] é a minha persona televisiva. Nada que é
natural sobrevive dentro desse tubo de elétrons”. (Idem, 88)
Para falar de alguns dos integrantes do Pânico na TV, a revista continua reforçando
a idéia de espontaneidade.

Sabrina Sato não se acha engraçada nem se leva a sério – e é aí que está toda a
graça. (…) Interpretando a si mesma, sem recalques, se tornou personagem
símbolo de um estilo de humor descompromissado, corrosivo. (…) Ela é
engraçada por natureza. (…) A espontaneidade é o forte dela, essa coisa de não
querer fazer tipo, de ser ela mesma. (Idem, p.86-7)

E Sabrina demonstra essa consciência ao dizer, concluindo a reportagem: “Acho


que as pessoas dão risada do meu jeito, desligado, retardado, entendeu? Não faço piada! Eu
sou o motivo da piada!” (Idem, p.87)
Sobre a trajetória de Evandro Santo, O “Christian Pior” do Pânico, a matéria
sintetiza que o ator “estava em busca da fama e acabou esbarrando em fatos reais” (Idem,

59
p. 92). Além de ressaltar que ele é “espontaneamente engraçado, mesmo nos diálogos
corriqueiros” (Ibidem).
Na interseção entre programas do “humor de realidade” e o tema das celebridades,
o especial da revista Rolling Stone ainda diz que

quando se trata de abordar “quem acha que é” e sua predisposição de pagar um


mico desde que seja em rede nacional, o conceito de que a vergonha alheia
diverte, chega a seu ápice. É aqui que uma figura como Christian Pior (que, sinal
dos novos tempos, não diverte por ser gay, mas por ser escrachado) aproveita
para falar mal de pobre, meio personagem, é verdade, mas 100% sincero ao zoar
o mundo real. (Idem, p.84, grifo nosso)

Para além destas referências e aproximações, e para os nossos propósitos, convém


marcar que o Pânico na TV também se faz na confluência de outros gêneros e formatos tais
como os programas de auditório dominicais e os programas de colunismo social. Estes
últimos, cada vez mais presentes na grade televisiva brasileira, também têm características
“meta”, se movimentam a partir da própria mídia e de seus famosos, como é o caso do TV
Fama e do Programa Amaury Jr., ambos da Rede TV!.
Contudo, não pretendemos neste capítulo, e nem teríamos como, definir o genêro
do programa Pânico na TV, mas compreender algo do que parece ser parte de sua proposta
para o público – fazer rir através da maneira como abordam as celebridades midiáticas – e
como esta proposta faz parte de uma configuração cultural mais ampla. Precisamos, agora,
de balizas para falarmos de humor e de celebridades.

2.1. O humor

Procurar compreender o humor não é tarefa fácil. Afinal, por onde começar: por
suas formas, por suas funções, por seus efeitos (seriam estes resumíveis ao riso)? Além
disso, o humor habita um campo semântico bastante amplo e de tênues (quando existentes)
fronteiras entre seus elementos. Estaríamos à procura de um conceito de humor, ou de um
conceito de cômico (ou mesmo de comédia)? Qual a relação entre o humor e o ridículo (no
sentido daquilo que é risível)?

60
“A Comédia, temos que admitir, nunca foi uma das Musas mais honradas. Ela era
em sua origem a maior expressão da pouca civilidade dos homens”41 (Meredith, 1970, p.5).
Em sua origem (séc. V a.C.), esteve ligada aos rituais em homenagem a Dionísio, ao
profano, portanto, à tendência humana de se dirigir ao indigno censurável, ao que é mau,
mas prazeroso. Segundo Aristóteles, o prazer da comédia reside em fazer rir a partir
daquilo que é desagradável ou que tem defeitos. Por isso, algumas regras éticas deveriam
ser seguidas para que o homem, através da comédia, não atingisse o mínimo de uma
desejável civilidade.

Aqueles que levam a jocosidade ao excesso são considerados bufões vulgares;


são os que procuram provocar o riso a qualquer preço e, na sua ânsia de fazer rir,
não se preocupam com a inconveniência do que dizem nem em evitar o mal-estar
daqueles que elegem como objeto de seus chistes; ao passo que os que não
sabem gracejar nem suportam os que fazem, são rústicos e grosseiros. Os que,
porém, gracejam com bom gosto são chamados espirituosos. (Aristóteles, 2005,
p.100).

Além de perceber, na citação acima, a prescrição de uma certa “etiqueta” do riso,


percebemos a idéia de que a comédia envolve uma relação triádica: há aquele que faz rir,
que se dirige a alguém em quem quer causar o riso a partir de um outro alguém que é o
alvo, o motivo da piada. Percebemos também que há um grau de cômico desejável,
daqueles que “gracejam com bom gosto”. Este grau necessário tem a função de corrigir,
castigar ou apontar algum desvio social. Já podemos concluir, assim, que o riso não é o
único objetivo da comédia.
Estas referências primeiras que buscamos dizem muito particularmente da comédia
como um gênero narrativo, quase sempre oposto ao da tragédia. Apesar de indicar
caminhos preciosos, ainda avançam pouco sobre as distinções que achamos necessárias
para iluminar nossa proposta.
Lauter (1964) compara a desproporção entre o tanto que se escreveu sobre a
tragédia e o pouco que se escreveu sobre a arte cômica. Além disso, nos diz o autor, pouco
consentimento existe sobre quais são os objetos de uma teoria do cômico, quanto mais
sobre a natureza da comédia. Usualmente relegados à inutilidade, ao prazer culpável
(sobretudo em sociedades onde o utilitarismo seja forte), e tendo o riso como o seu auto-
evidente efeito, talvez o cômico e o humor não tenham recebido merecida atenção.

41
Tradução nossa do original em inglês: “Comedy, we have to admit, was never one of the most honored of
the Muses. She was in her origin the loudest expression of the little civilization of men.” (Meredith, 1970,
p.5)

61
Sem nos ater em aprofundar toda a discussão que os campos do humor e da
comédia acumularam teoricamente, questionaremos mais pontualmente estes campos,
procurando, principalmente, entendê-los na sua relação com a vida social e nas formas que
podem adquirir. Tomaremos, inicialmente, o humor como uma categoria mais abstrata,
próxima à de cômico, e mais relacionada à idéia corrente daquilo que pode fazer rir. Não
trabalharemos tanto com a idéia de comédia por considerá-la um formato, ou mesmo um
gênero, em que o humor aparece de uma maneira mais narrativizada42: em anedotas, em
peças de teatro, ou mesmo em alguns produtos televisivos.

2.1.1. Genealogia, vinculação social e indicativo cultural

Georges Minois (2003), em um trabalho de levantamento histórico, diz que o riso,


vivendo na encruzilhada do físico e do psíquico, do individual e do social, é multiforme e
ambivalente. Ao longo dos tempos, serviu tanto como elemento conservador de afirmação
quanto de subversão. Precisar as múltiplas formas do humor e do riso sob uma perspectiva
histórica seria, para o autor, uma maneira de revelar a visão global de mundo, de épocas e
de agrupamentos humanos distintos43. Após percorrer, em detalhes, a História do riso e do
escárnio desde os gregos arcaicos até o fim do século XX, Minois chega a uma síntese de
três etapas.
A primeira, a do riso divino, compreende o período e as civilizações arcaicas pré-
cristãs (especificamente as greco-romanas). Nestas civilizações, a origem do riso é
atribuída aos deuses que, com o seu ‘riso inextinguível’, marcavam a sua suprema
liberdade. A concepção do riso é, dessa forma, positiva, ainda que alguns cuidados fossem
prescritos àqueles que riem e àqueles que pretendem fazer rir. O riso indicava a
participação dos homens na recriação do mundo, era a ferramenta sacralizante de contato
entre os deuses e os humanos, notadamente nos rituais dedicados a Dionísio (ou Baco).
Nas relações sociais, era elemento de coesão e correção entre aqueles que riem com bom-
gosto, além de instrumento de conhecimento (como no caso da ironia socrática). O riso

42
Conforme Lauter (1964), vários autores consideram o humor como sendo o espírito característico, uma
idée fixe, que preenche os personagens de uma comédia. Poderíamos, claro, pensar o Pânico na TV como
uma narrativa que tem personagens bem demarcados por certos humores: Sabrina, a ingênua, por exemplo.
No entanto, isso nos desviaria de nosso objetivo: pensar como (e se) o humor é usado, no programa, para
tornar risíveis as (ou certas) celebridades.
43
O autor trata exclusivamente dos agrupamentos humanos ocidentais que se fizeram a partir da centralidade
européia.

62
divino entra em declínio juntamente com a decadência da civilização romana e o
crescimento do cristianismo na Idade Média. A segunda etapa então se inicia, a do riso
diabólico. Nesta concepção da Europa cristã, o riso ganha um peso negativo. Torna-se
maldade e zombaria inúteis que distanciam o homem da perfeição divina. No entanto, era
tolerado como escape, alívio temporário, durante determinadas festas institucionalizadas,
como o carnaval. Por fim, a terceira etapa, a do riso humano, diz da origem do pensamento
moderno, quando o riso passa a ser interrogativo, ligado ao questionamento dos valores e
ao recuo das certezas a partir do séc. XVI. A força deste riso vinha de sua seriedade e da
capacidade racional do homem, era instrumento dessacralizante e de luta de algumas
certezas (as modernas seculares) contra outras certezas (as tradicionais religiosas).
Minois não chega a dizer de uma quarta fase do riso, mas afirma que o riso humano
está em declínio, sentido pelo autor com alguma lástima. Para ele, em sua fase mais
contemporânea, o riso se tornou produto de consumo amplamente difundido pelos meios
de comunicação na “sociedade humorística” (que define com a ajuda de Lipovetsky). Fala
de uma banalização e midiatização do riso vazio quando a agressividade do humor foi
encampada pelo desinteresse generalizado e pela incapacidade de significar do pós-
moderno. Minois considera que, “na unanimidade midiática, o riso da tribo dos
telespectadores é mimético” (Minois, 2003, p.622), inofensivo e desarmado, usado apenas
como estratégia útil de convívio indiferente. Indo além, se questiona: “o que haveria ainda
para dessacralizar?” (Idem, p.620).
Não concordamos inteiramente com a perspectiva do autor sobre o contemporâneo,
que parece ecoar teorias que dizem da impossibilidade de sentido e até mesmo do
sequestro da experiência na atualidade. Consideramos apressadas e monolíticas suas
conclusões sobre o humor via meios de comunicação. Percebemos que o autor não confere
aos meios de comunicação e aos produtos midiáticos capacidade de adaptação à dinâmica
movente da vida social e cultural. Parece-nos que a idéia que Minois faz da unanimidade
midiática que transformou o riso em produto de consumo está relacionada com a fórmula
de programas humorísticos que tem como base o esquema da velha piada. Programas estes
que tentamos diferenciar da tendência contemporânea do “humor de realidade”. Além
disso, pensamos que a própria unanimidade midiática que ele descreve e os padrões que ela
tenta impor se tornaram, de alguma forma, sagrados e pesados. Acreditamos, portanto, que
ainda há o que dessacralizar. Afinal, o Pânico na TV não poderia ser pensado como um
humor que promete se voltar contra esta unanimidade midiática e suas celebridades? Com

63
isso não queremos afirmar que o programa, e o possível riso que gera em sua audiência,
não seja um produto de consumo. Afirmamos que ele não é apenas isso. Tampouco
queremos afirmar que nosso objeto efetivamente usa o humor contra as celebridades
(conceito que ainda nem matizamos) e que de forma alguma celebrifica ou reafirma este
universo. Tais afirmações inutilizariam a análise que pretendemos fazer, oferecendo-nos,
de pronto, uma conclusão.
É, contudo, pertinente e oportuna para a nossa proposta a compreensão de Minois
de que o riso é uma forma de eco da vida social e cultural de um grupo historicamente
localizado e, portanto, não tem valor determinado em si e tem que ser lido em relação.
Henri Bergson (2004) nos ajuda a entender melhor esta relação que o humor e o
riso têm com a vida social, além de propôr um mecanismo geral da comicidade.
Preocupado em determinar os procedimentos de fabricação da comicidade, ele tem como
premissa que o cômico é algo vivo, capaz de nos informar sobre os procedimentos da
imaginação humana e, mais particularmente, da imaginação social, coletiva e popular.
Postula que o riso não acontece fora do que é propriamente humano: se algum animal ou
objeto nos faz rir é por alguma semelhança com o homem, pela marca que o homem lhe
imprime ou pelo uso que o homem lhe dá. Outro postulado fundamental é o que diz da
insensibilidade que acompanha o riso: a comicidade exige uma “anestesia momentânea do
coração”. Sua última consideração fundamental diz da necessidade de eco do riso: ele é
sempre riso de um grupo (real ou imaginário).

Para compreender o riso, é preciso colocá-lo em seu meio natural, que é a


sociedade; é preciso, sobretudo, determinar sua função útil, que é uma função
social. (...) O riso deve corresponder a certas exigências da vida em comum. O
riso deve ter uma significação social. (Bergson, 2004, p.6)

Podemos concluir com isso as condições do que gera o riso. Primeiro, ele deve se
relacionar à atividade humana. Segundo, a desvinculação emocional (a não compaixão) de
quem ri em relação ao alvo do riso. Terceiro, o descompasso da ação ou da atividade da
qual se ri com as regras de convívio social do grupo em que o riso se dá. Eis sua função
social: o apontamento ou denúncia do inapropriado, uma correção de

uma certa rigidez do corpo, do espírito e do caráter que a sociedade gostaria


ainda de eliminar para obter de seus membros a maior elasticidade e a mais
elevada sociabilidade possíveis. Essa rigidez é a comicidade, e o riso é o seu
castigo. (Idem, p.15)

64
Interessa-nos perceber que estas condições levam a análise do cômico para além da
situação cômica, que pode ser pensada como indicativa de padrões e normas – o que deve e
o que não deve ser feito socialmente – e valores – o que gera e o que não gera compaixão –
de um grupo. Visto assim, o riso vai além de simples diversão do espírito (a que muitas
teorias o reduzem) desvinculada do resto da atividade humana. Torna-se uma prática
revestida de significação social e cultural, relacionada a um grupo e a um contexto sempre
específicos.
Bergson ainda propõe que a comicidade é a variação de um mesmo mecanismo,
mas nos adverte que são sobretudo as variações concretas e matizadas que importam.
“Seria quimérico querer extrair todos os efeitos cômicos e uma única fórmula simples”
(Idem, 27), mas todos os efeitos são “cômicos por parentesco como os que dela [da
fórmula única] são deduzidos” (Ibidem). O cômico seria a sobreposição do mecânico ao
vivo, o “anormal” que impede o fluir do “normal”. Uma careta é risível na medida em que
nos leva a pensar em algo rígido, congelado, da mobilidade inerente ao rosto. Um
trocadilho pode fazer rir por quebrar o fluxo natural do uso da linguagem, trazendo para o
primeiro plano a atenção aos códigos automatizados que permitem a compreensão da fala.
No que diz respeito ao funcionamento da sociedade, Bergson diz que

risível será, portanto, uma imagem que nos sugira a idéia de uma sociedade
fantasiada e, por assim dizer, de uma mascarada social. Ora, essa idéia se forma
logo que percebemos o que há de inerte, de pronto, de confeccionado enfim, na
superfície da sociedade viva. (Idem, p.33)

Para compreendermos melhor as proposições de Bergson, devemos situar, mesmo


que sucintamente, a sua filosofia do vitalismo. Sypher (1956) nos explica que o
pensamento de Bergson sempre se voltou contra a lógica da maquinaria e do materialismo
do séc. XIX. Acreditando que a vida é um impulso vital (élan vital), propôs o vitalismo, ao
invés do mecanicismo das ciências exatas e naturais, como explicação da experiência
humana. Com isso, Bergson emerge como o filósofo moderno da intuição. “A intuição e
não a lógica alcança o absoluto”, diz Sypher citando Bergson. Suas idéias sobre o cômico,
portanto, não são mais que um aspecto de sua filosofia do vitalismo mais ampla.
Dessa forma, fica mais fácil compreender o critério que marcaria, para Bergson, a
distinção entre “anormal/mecânico” e “normal/vivo”. Este critério deriva de um tipo de
lógica, a da intuição. Mas, mesmo se a considerarmos como fruto da imaginação de um
indivíduo, ela é sempre social. “É como a lógica do sonho, mas de um sonho que não

65
estaria entregue ao capricho da fantasia individual, visto ser o sonho sonhado pela
sociedade inteira” (Bergson, 2004, p.31). Tem a ver, mais uma vez, com normas e valores
compartilhados.
Compreendendo o riso e o cômico dessa forma, Bergson acredita que eles possam
ser a cura para “a doença do tudo igual, nossa doença moderna” 44 (Sypher, 1956, p.ix).
Acredita ainda que o cômico nos ensina a sermos responsivos, honestos, a interrogarmos
nós mesmos e a corrigirmos nossas pretensões e diz que o espírito cômico nasce de nossa
inteligência social unida. Crítico, portanto, dos rumos tomados pela sociedade moderna,
Bergson retira da crise cultural da classe média45, o exemplo do tipo cômico emblemático.
Diz-nos Sypher que este tipo cômico emblemático é, para Bergson, o homem
profissional que age com rigidez, demonstrando seus vícios. Este homem está ilhado pelos
confins de seus negócios, que ele leva demasiado a sério, demonstrando suas vaidades. “As
respostas automáticas deste egoísta fazem com que ele se pareça, quando olhamos para ele
com atenção, com um produto ready-made, estandardizado para o mercado”46 (Sypher,
1956, xi). Percebemos claramente que as preocupações, as críticas e os exemplos de
Bergson estão em sintonia com uma formação social específica: a sociedade moderna dos
grandes projetos, do progresso e da realização pessoal pelo sucesso profissional. Cabe a
nós pensarmos, agora, quais os valores dominantes na sociedade contemporânea, quais os
seus vícios e vaidades, para pensarmos em possíveis tipos cômicos emblemáticos de
nossos tempos.
Acreditamos que nossa sociedade, altamente midiatizada, individualista e
neoliberal, nos impõe a necessidade de buscarmos nossa individualidade, nossa autonomia,
nossa autenticidade que, paradoxalmente, são tão mais reais quanto mais visíveis aos olhos
dos outros. No entanto, os critérios para a visibilidade, em especial para a televisibilidade –
a mais potente de todas elas –, continuam alheios aos sujeitos. Já não é o profissional
classe média esperançoso de progressão econômico-social o modelo a ser seguido, em uma
cultura cada vez mais marcada pelo hedonismo juvenil inconsequente. Morin (1997) deixa
uma pista de um tipo possível ao dizer que na cultura de massas, são os Olimpianos, as
celebridades, a nova classe alta, o alter ego idealizado de um público. Não nos adiantemos
sobre este tema. Sigamos compreendendo melhor o humor.
44
Tradução nossa do original em inglês: “the malady of sameness, our modern malady” (Sypher, 1956, p.ix).
45
Bergson se inspira em Marx para dizer que a classe média negou ao homem a sua individualidade e fez
dele um apêndice da máquina.
46
Tradução nossa do original em inglês: “The automatic responses of this egoist make him appear, when we
look at him attentively, like a ready-made product standardized for the market” (Sypher, 1956, p.xi).

66
Lembrando que, para Bergson, risível será, portanto “uma mascarada social” –
aquilo que existe de pronto e inerte na superfície da sociedade viva – e reforçando a
necessidade de insensibilidade daquele que denuncia com o seu riso esta mascarada,
Sypher diz:

A comédia demanda, para Bergson assim como para Stendhal, uma


insensibilidade da parte de quem assiste – uma “anestesia do coração”, que tira
de cena nossa piedade e nos permite examinar, insociavelmente, alguém que de
repente se parece com uma marionete. (Sypher, 1956, p.xii) 47

A idéia de que o cômico é alguma coisa que “de repente” passa a ser vista menor
do que pretende ser também é cara para Lipps (1964). Para este autor, o cômico e o
sublime não estão em contraste direto um com o outro, como é comum de se pensar. O
cômico tampouco está em contraste direto com o trágico. O verdadeiro contraste do
cômico, para Lipps, é o surpreendentemente grandioso. O cômico seria, portanto, o
surpreendentemente insignificante. Ou melhor, o insignificante que tenta tomar o lugar do
sublime. “É o insignificante que finge ser algo grandioso, faz muito de si mesmo, se coloca
no papel de uma tão “grande” coisa – mas então se mostra ser uma coisa insignificante, um
relativo nada”48 (Lipps, 1964, p.393).
Um último aspecto da concepção de Bergson sobre o riso ainda merece nossa
atenção. Além de perceber no riso a capacidade de curar as vaidades e vícios da sociedade,
o autor percebe também que o riso envolve um elemento de agressividade, sempre mais ou
menos humilhante para o objeto de que se ri.
As contribuições da psicanálise no entendimento do cômico e do humor são várias,
e estão presentes na obra de Sigmund Freud desde 1905 em “Os chistes e sua relação com
o inconsciente”. A pergunta fundamental da referida obra é o que nos faz rir em um chiste?
Freud (1988) estuda tais fenômenos psíquicos em três partes. 1) As duas técnicas
subjacentes do efeito cômico do chiste – técnicas centradas na própria palavra e em sua
expressão verbal e técnicas baseadas no pensamento – ou no senso cômico do chiste,
independente de sua expressão verbal. Ainda nesta primeira parte, Freud diferencia os
chistes inocentes dos chistes tendenciosos. 2) Os chistes como fonte de prazer e como laço

47
Tradução nossa do original em inglês: “Comedy requires, for Bergson as it does for Stendhal, an
insensitivity on the part of the beholder – an ‘anesthesia of the heart’, which numbs our pity and allows us to
examine, unsociably, someone who suddenly looks like a puppet.” (Sypher, 1956, p.xii)
48
Tradução nossa do original em inglês: “It is the insignificant which pretends to be something great, makes
much of itself, plays the role of such a ‘great’ thing – but then shows itself to be an insignificant thing, a
relative nothing.” (Lipps, 1964, p.393)

67
social. Aqui, Freud diferencia o mecanismo de economia psíquica entre os chistes
inocentes, nos quais a dinâmica de liberação de energia psíquica se esgota no próprio
chiste, dos chistes tendenciosos, nos quais o autor sustenta haver um laço social entre, no
mínimo, três pessoas: aquele que anuncia o chiste, seu alvo e seu destinatário (aquele que
ri). Tais chistes são obscenos ou desnudadores, agressivos, hostis, cínicos, blasfemos,
críticos. São, para Freud, aqueles que produzem o riso explosivo, pois são irresistíveis. O
autor subdivide os chistes tendenciosos segundo dois propósitos: o hostil – que permite
explorar no inimigo objeto do chiste algo de ridículo que não poderia aparecer sem o tom
de chiste –; e o obsceno, que visa gerar o sentimento de vergonha, desnudando o que há de
sexual (principalmente reprimido) no objeto do chiste. 3) Chistes, sonhos e variações do
cômico: nesta última parte do trabalho freudiano de 1905, o autor faz uma aproximação do
chiste ao sonho, e observa os processos de condensação e deslocamento, já conhecidos na
elaboração onírica, na produção dos chistes. Em poucas palavras, pela condensação, pode-
se dizer muita coisa. Pelo deslocamento podem-se contornar as interdições sobre os
conteúdos agressivos e/ou sexuais reprimidos.
De fato, Freud considera que o riso é uma liberação de uma carga psíquica,
especialmente a agressividade, que não poderia ser descarregada de outra forma devido a
censuras sociais, diferentemente do sonho, que segundo Freud, tem um caráter associal. O
riso é, portanto prazeroso, quanto mais reprimida for a carga que ele permitiu ser liberada.
Pode-se exemplificar de forma clara o chiste tendencioso do tipo hostil no episódio
já citado, no qual o entrevistador Vesgo aborda o ator Victor Fasano. Diz o comediante à
celebridade: “VICTOR... FAZ ANOS que a gente não te vê na televisão!” A celebridade
não gostou nada do trocadilho (chiste construído pela manipulação do seu sobrenome e
pela idéia de efemeridade ou fragilidade daquela celebridade) e deferiu no comediante um
safanão, dizendo: “Some daqui”.
Vale a pena lembrar que vinte anos depois, Freud retorna ao tema do cômico em
um artigo de 1927, intitulado “O Humor”. Diz o autor:

Em meu volume sobre Os Chistes e sua Relação com o Inconsciente (1905), na


realidade considerei o humor apenas do ponto de vista econômico. Meu objetivo
era descobrir a fonte do prazer que se obtém do humor e acho que pude
demonstrar que a produção do prazer humorístico surge de uma economia de
gasto em relação ao sentimento. Há duas maneiras pelas quais o processo
humorístico pode realizar-se. Ele pode dar-se com relação a uma pessoa isolada,
que, ela própria, adota a atitude humorística, ao passo que uma segunda pessoa
representa o papel de espectador que dela deriva prazer; ou pode efetuar-se entre
duas pessoas, uma das quais não toma parte alguma no processo humorístico, mas

68
é tornada objeto de contemplação humorística pela outra. Quando, para tomar o
exemplo mais grosseiro, um criminoso, levado à forca numa segunda-feira,
comentou: ‘Bem, a semana está começando otimamente’, ele mesmo estava
produzindo o humor; o processo humorístico se completa em sua própria pessoa e,
evidentemente, concede-lhe certo senso de satisfação. Eu, ouvinte não
participante, sou afetado, por assim dizer, a longo alcance, por essa produção
humorística do criminoso; sinto como ele talvez, a produção de prazer
humorístico. (Freud, 1969, p.23)

Nossa perspectiva, e os autores que convocamos para tratar do humor, nos chamam
a atenção para a necessidade de situar contextualmente o riso e de dissecar suas formas em
suas manifestações concretas. Para melhor nos aproximarmos de nosso objeto, apostamos
na busca de conceituações de algumas estratégias discursivas que podem levar ao riso e
que nos parecem mais presentes no Pânico na TV, quais sejam a ironia, a paródia e a sátira.

2.1.2. Possíveis formas do humor: ironia, paródia e sátira

Para dar conta de definir com a especificidade necessária e em sintonia com a nossa
concepção de comunicação, seguiremos a organização proposta por Hutcheon (1985;
2000) para os conceitos de ironia, paródia e sátira. Acrescentaremos, sempre que
enriquecedoras, idéias e noções de outros autores ao longo desta organização. Antes de
entrarmos nas particularidades de cada um, alguns apontamentos gerais. Primeiramente, a
autora refere-se a estes conceitos como estratégias discursivas ou como gêneros. Em
segundo lugar, chama a atenção para o fato de que são estratégias discursivas comumente,
mas não necessariamente, utilizadas para se fazer rir. Elas não se definem e nem se
agrupam exclusivamente nesta categoria maior que poderia ser o humor. Terceiro e mais
importante para o nosso trabalho: apesar de considerar a ironia, a paródia e a sátira como
estratégias discursivas e, consequentemente, como formas textuais, a autora não se limita a
uma perspectiva formal. Hutcheon defende uma perspectiva dupla em que a análise
formal/semântica se complementa com a análise pragmática, que envolve atenção às
intenções, às marcas formais destas intenções, ao contexto de uso das estratégias em
questão e, claro, aos efeitos que geram em comunidades discursivas. Assim ela apresenta
sua perspectiva, quando expõe seu conceito de ironia:

69
O modelo que quero sugerir aqui é um mais interagente ou relacional entre
‘condições de produção’ e ‘condições de interpretação’ dentro do contexto de
comunidades discursivas sobrepostas. Esse modelo leva em conta, então, não
apenas as intenções do ironista (se presentes e disponíveis), mas as relações de
poder complexas e contraditórias que intersectam e organizam a relação de um
público com textos culturais particulares. (Hutcheon, 2000, p.145-6)

Sua análise ganha, assim, um tom relacional, já que interessa a ela perceber as
estratégias ligando sujeitos em usos concretos e contextos singulares. Estas estratégias,
mais do que formas textuais prontas para serem “utilizadas”, “acontecem” no encontro
sempre social e culturalmente situado de autor-texto-leitor. São vistas como um processo
dinâmico. A globalidade do processo comunicativo requerida pela visada relacional parece
ser atendida.
Por fim, vale ressaltar que a autora apresenta noções que efetivamente “definem”
(no sentido de que demarcam fronteiras precisas para e ressaltam as especificidades de)
cada uma destas estratégias. No entanto, considera que estas definições têm apenas
validade didático-analítica. Defendendo que todo gênero é híbrido e instável, se interessa
pela sobreposição da ironia, da paródia e da sátira e pela ampla gama de efeitos distintos
que cada caso de mistura pode gerar. Vejamos agora as especificidades que Hutcheon
apresenta.
O que definiria para Hutcheon (2000) a ironia seria o jogo específico que um não-
dito estabelece com um dito, implicando no aparecimento de uma “aresta afiada”.
Diferentemente das perspectivas instrumentais, que igualam ironia à antífrase (dizer uma
coisa e querer dizer o oposto), a autora ressalta o jogo de complementariedade entre dito e
não-dito: um não substitui o outro, mas o problematiza para que a ironia possa “cortar”.
Para que esta problematização possa se dar, diz ser necesssário a pressuposição de quadros
comunicativos partilhados entre o ironista (proposital ou não) e aquele que lê a ironia e faz
acontecer seu tom afiado. Difere também das perspectivas que pensam a ironia como
criadora de comunidades discursivas, já que “são as comunidades discursivas que são
simultaneamente inclusivas e excludentes – não as ironias” (Idem, p.144, grifo da autora).
Com isso, a autora tenta corrigir as

lamentações feitas (...) de que os jovens estavam perdendo o que se afirmava ser
um tipo de conhecimento cultural homogêneo e geral. A minha sensação, certa
ou errada, é que eles simplesmente têm conhecimento cultural diferente e que as
ironias de suas comunidades são tão frequentemente incompreensíveis para mim
quanto as minhas são para eles. (Hutcheon, 2000, p.144)

70
Consequentemente, a autora também se distancia das análises que vêem na ironia
uma estratégia de sobrevivência que se sabe inútil frente à uniformização das linguagens e
dos significados no contemporâneo. Nesta maneira de ver, a ironia é um riso apaziguador
(o “rir para não chorar”) que torna possível nossa convivência com a falta de sentido do
pós-moderno. Representam esta vertente Minois (2003), ao lamentar o declínio do riso
humano; Lipovetsky (1983), ao dizer que no pós-moderno vivemos a esterilização e a
pacificação do cômico; e também Jeudy (2001), ao igualar ironia com todo processo
comunicativo, especialmente nas sociedades altamente midiatizadas, em que se diz muito
para não se dizer nada. Esta maneira de ver apaga, no nosso entender, qualquer
possibilidade subversiva de utilização da ironia e também qualquer movimentação cultural,
já que nos leva sempre para a impressão do mesmo e do vazio.
Sendo a ironia algo que pode “cortar”, para Hutcheon existe uma grande carga
afetiva envolvida com o fenômeno irônico, uma vez que sempre se trata do
reconhecimento e da disputa entre significados possíveis de um texto. O reconhecimento
só se dá, nos diz a autora, se um membro de alguma comunidade discursiva percebe no
texto (compreendido aqui de maneira estendida) uma marca, deixada ali com ou sem a
intenção de seu autor. Tais marcas ou “técnicas irônicas” têm duas funções não
excludentes e que, portanto, podem ser desempenhadas por um mesmo marcador. A função
metairônica sinaliza a necessidade de entrar e sair de um código para se buscar
significados complementares e problemáticos. Marcadores metairônicos não são a ironia
em si, mas gatilhos que sugerem ao interpretador a possibilidade de outros significados
para determinado dito. Parece-nos que estão no nível de comunicação que Bateson (2002)
chamaria de metacomunicativo, o nível da indicação da relação que se está a negociar.
Outros marcadores têm função estruturadora, a de tornar disponível uma base na qual se
torna possível o significado irônico, e estão mais ligados à estrutura interna do texto: várias
mudanças de registro; exagero/abrandamento; contradição/incongruência; literalização/
simplificação; repetição/menção ecoante.
Além de organizar os marcadores irônicos por suas funções, Hutcheon também
organiza, pelo mesmo critério pragmático, os níveis de ironia. Indo das ironias que
envolvem carga afetiva máxima para as que envolvem carga afetiva mínima, podem tanto
receber avaliações positivas ou negativas. Estes níveis estão representados na tabela
abaixo. No entanto, a tabela não deve nos levar a pensar na impossibilidade de
sobreposição de funções e avaliações distintas a um mesmo fenômeno irônico. Por

71
exemplo, nos interessa em especial a função assaltante, já que ela diz de quando a ironia
‘salta sobre’ determinados ditos com “garras mais afiadas”. Em sua avaliação mais
negativa, diz que são ironias que têm por finalidade uma invectiva corrosiva e um ataque
destrutivo. Em sua avaliação mais positiva, pode tratar-se de uma ironia satírica, que
objetiva ridicularizar e implicitamente corrigir determinados vícios.

Avaliação positiva Carga afetiva máxima Avaliação negativa


Inclusiva Excludente
AGREGADORA
“comunidades amigáveis” “grupos fechados”
Corretiva Destrutiva
ASSALTANTE
Satírica Agressiva
Transgressora Insultante
DE OPOSIÇÃO
Subversiva Ofensiva
Não dogmática Evasiva, hipócrita
PROVISÓRIA
Desmistificadora Dúplice
Autodepreciadora Arrogante
AUTOPROTETORA
Insinuante Defensiva
Oferece uma Indiferente
DISTANCIADORA
nova perspectiva Não compromentimento
Humorística, jocosa Irresponsável, banalizante
LÚDICA
Provocadora Redutora
Complexa, rica Enganadora, imprecisa
COMPLICADORA
Ambígua Ambígua
Enfática Decorativa
REFORÇADORA
Precisa Subsidiária
Avaliação positiva Carga afetiva mínima Avaliação negativa

Tabela 1: As funções da ironia (Hutcheon, 2000, p.76)

Mas como pensar na função assaltante sem pensar na agregadora, uma vez que já
vimos que o pertencimento a uma comunidade está na própria base da possibilidade
irônica? E ainda, para os fins de nossa proposta, como não inter-relacionar estas funções
com a função lúdica?
Apesar da minúcia e riqueza de matizes, a ordenação das funções da ironia dessa
forma acaba por dificultar a sua aplicação analítica. Recorreremos então a Muecke (1970),
que se coloca a tarefa de distinguir e ilustrar as principais formas que a ironia assume.
Inicialmente, o autor vai dizer que nem toda arte (ou nem toda linguagem) tem a mesma
capacidade de encorajar a percepção e a expressão da ironia. Isso porque ser irônico é ser
irônico sobre alguma coisa. Portanto as artes e linguagens representacionais têm mais
condições de trabalhar a ironia, desde que não estejam engajadas no projeto de representar
a partir de uma visão única ou mimética. A tentativa da representação especular leva a uma
apreensão imediata do objeto representado, já que tenta “apagar”, em função da

72
representação, os traços formais de sua linguagem, o que dificultaria a expressão irônica. O
contrário também é verdadeiro, segundo o autor. A possibilidade de ironia é prejudicada
quando a obra ou o texto chama desmedida atenção para as suas propriedades formais,
criando uma superfície opaca.

A arte e a literatura irônica devem portanto (...) ter ambas superfície e


profundidade, ambas opacidade e transparência, devem segurar nossa atenção ao
nível formal ao mesmo tempo em que a direciona para o nível do conteúdo. 49
(Muecke, 1970, p.5)

Mais uma vez nos aproximamos de Bateson (2002) e suas idéias dos níveis
metacomunicativos, que dizem da relação que se está estabelecendo entre os interagentes
(leitor e texto, por exemplo) e que interferem nas possibilidades de significado dos níveis
comunicativos, ou dos conteúdos propriamente ditos.
Apesar de estar se dedicando explicitamente às artes e, dentre elas, as
representacionais (mais especificamente a literatura), Muecke dá a pista de que suas idéias
podem ser adaptadas a outras artes ou linguagens, quando diz sobre música e artes gráficas.

O que faz com que seja possível a elas [a música e as artes gráficas] de serem
irônicas é que elas são em um sentido ‘linguagens’. A ‘linguagem’ de uma arte,
neste sentido, é o conjunto de signos ou convenções aceitos que foram se
desenvolvendo dentro da tradição de cada arte em particular.50 (Idem, p.7)

Não queremos aqui abrir a discussão se produtos televisivos são obras de arte ou
não. Sabemos que não o são. No entanto, sabemos também que a televisão, seus diversos
canais, gêneros e formatos, adquiriram dentro de uma tradição, algumas convenções que os
tornam reconhecíveis. A televisão e seus produtos têm sua linguagem, mesmo que esta seja
o resultado da mistura de várias linguagens, como vimos anteriormente.
Muecke continua dizendo que há uma grande variedade de ironia, mas não
inteiramente heterogênea: todas vivem do contraste de uma aparência e uma realidade. O
autor diz então de um tipo de ironia, a mais geral possível, que é a Ironia do Mundo ou

49
Tradução nossa do original em inglês: “Ironical art and literature should therefore (...) have both surface
and depth, both opacity and transparency, should hold our attention at the formal level while directing it to
the level of content.” (Muecke, 1970, p.5)
50
Tradução nossa do original em inglês: “What makes it possible for them [music and the graphic arts] to be
ironical is that they are in a sense ‘languages’. The ‘language’ of an art, in this sense, is the set of accepted
signs or conventions that has developed within the continuous tradition of each particular art.” (Muecke,
1970, 7)

73
Filosófica. Esta ironia vive das incongruências fundamentais do homem e do universo
(vida e morte, espiritual e material). Neste sentido, o ironista arquetípico é Deus.

A vítima arquetípica da ironia é o homem, visto, per contra, como que preso e
submerso no tempo e na matéria, cego, contingente, limitado e não livre – e
confidentemente incônscio de que este é o seu predicado.51 (Idem, p.38)

A partir desta ironia máxima, o autor vai mostrando algumas nuances. Diz, assim,
“ser irônico quando um personagem mostra confiança no futuro sendo que a audiência já
sabe o quão sombrio seu futuro será.”52 (Idem, p.43). Dessa mesma forma, existe ironia na
falta de conhecimento de um personagem que suas ações estão sendo manipuladas por
outro personagem. Com isso, e pensando em nosso objeto, acreditamos que também existe
ironia na situação daquele que não se sabe enquanto personagem vinculado a uma lógica
sobre a qual ele tem pouco ou nenhum controle.

A vítima da ironia (...) precisa apenas revelar por uma palavra ou ação que ela
nem remotamente suspeita que as coisas possam não ser o que ela ingenuamente
supõe que sejam. O elemento básico é uma inconsciência serena e confiante
preenchida, na prática, por vários níveis de arrogância, orgulho, complacência,
ingenuidade, ou inocência.53 (Idem, p.28-9)

O ironista, quando intencional, precisa fingir ‘inocentemente’ ter essa mesma


inconsciência. O observador irônico tem que estar ciente da inconsciência da vítima. Disso
ele retira o seu prazer, ao sentir “aquela bastante distintiva excitação pelo espetáculo de
alguém serenamente inconsciente que a situação pode ser outra do que ele pensa que é,
enquanto o tempo todo é o oposto do que ele assume como verdade”54 (Idem, p.13). O
autor sintetiza em três palavras o que um observador irônico tipicamente sente na presença
de uma situação irônica: superioridade, liberdade e diversão.

51
Tradução nossa do original em inglês: “The archetypal victim of irony is man, seen, per contra, as trapped
and submerged in time and matter, blind, contingent, limited, and unfree – and confidently unaware that this
is his predicament.” (Muecke, 1970, p.38)
52
Tradução nossa do original em inglês: “It is ironic when a character shows confidence in the future if the
audience already knows how black the future will be.” (Muecke, 1970, p.43)
53
Tradução nossa do original em inglês: “The victim of irony (...) need only reveal by word or action that he
does not even remotely suspect that things may not be what he ingenuously supposes them to be. The basic
element is a serene, confident unawareness coloured, in practice, by varying degrees of arrogance,
conceitedness, complacency, naïvety, or innocence.” (Muecke, 1970, p.28-29)
54
Tradução nossa do original em inglês: “... that quite distinctive thrill at the spectacle of someone serenely
unaware that the situation could be other than he thinks it is, while all the time it is the opposite of what he
assumes.” (Muecke, 1970, p.13)

74
Muecke ainda adverte que o público será incapaz de reconhecer a ironia se ele não
tiver informação prévia sobre o ironista e se não houver dicas no próprio texto. Vemos aqui
duas idéias de Hutcheon reforçadas: a de que tanto o ironista quanto o observador irônico
devem compartilhar certos quadros de sentido, ou seja, devem pertencer a uma mesma
comunidade discursiva; e a da necessidade de marcas ou “técnicas irônicas” para que o
leitor problematizar o dito e o não dito. Tentemos entender agora como a combinação entre
ditos e o não ditos podem corresponder a uma estratégia parodística.
Procurando entender o crescimento, em presença e em importância, da paródia nas
mais variadas formas de arte do séc. XX, Hutcheon (1985) segue um caminho para definir
a paródia por contraste, por aquilo com o que ela não deve ser confundida. Já de início ela
nos adverte que esta paródia recente precisa de defensores, pois fica comodamente alojada
em torno dos conceitos de parasitismo e derivação simplista. A autora defende que o vigor
que a paródia veio experimentando ao longo do séc. XX pode estar relacionado a questões
como a crise da noção do sujeito como uma fonte coerente, autônoma e contínua de
significação. O movimento parodístico que ela analisa se distanciaria, assim, do
romantismo pós-iluminista que, seguindo uma ética capitalista, tenta garantir o lugar do
autor da obra com leis de direito autoral. É a própria desmistificação da figura do autor e a
dessacralização da origem de um texto que são postos em cheque pelos movimentos da arte
parodística.
A paródia não deve ser confundida, como nos fazem crer o senso comum e as
definições de dicionário, nem com intertextualidade, nem com plágio e nem com pastiche.
A distinção fundamental em relação a estas outras formas de referência de um texto a outro
é a diferenciação crítica que a paródia estabelece entre si e o texto parodiado. Em um
máximo de síntese, postula que paródia é repetição com diferença. Esta diferença que um
texto marca em relação à sua fonte não é crítica no sentido exclusivo de se tentar denegri-la
ou mesmo ridicularizá-la; pode também ser uma forma de homenagem. É crítica no sentido
de ser a diferença que caracteriza a especificidade do tipo de repetição que a paródia é.
Mais uma vez ela ativa sua perspectiva pragmática para dizer que a paródia é mais do que
a comparação possível entre formas textuais. Sem prescindir de suas marcas formais55, ela
envolve todo o contexto enunciativo.

55
Das três estratégias discursivas em questão – ironia, paródia e sátira – a paródia é a que mais se deixa ver
pelas suas formas.

75
Para compreendermos melhor esta especificidade da paródia como repetição com
diferença, que nem sempre é usada no intuito de ridicularizar o texto parodiado e, mesmo
que o seja, não pode fugir do paradoxo da paródia – ela sempre reforça aquilo que repete
criticamente –, Hutcheon nos lembra da etimologia da palavra. Para certificar-se de que a
paródia é, por natureza, uma forma discursiva que tem como alvo outra forma codificada –
a paródia não pode ter como fonte uma forma que não se estruture sobre códigos,
convenções ou linguagem acordada –, a autora nos chama a atenção para a raíz odos do
termo, que significa canção. Para ampliar a maneira como a paródia pode ser
compreendida, ela nos lembra que o prefixo para- tem dois significados. O primeiro deles,
e o mais comumente ativado para se pensar a paródia como uma estratégia de negação e
ridicularização entre um texto e outro, diz que para- significa “contra” ou “oposição”. O
segundo, que permite à autora alargar o espectro do que pode ser percebido como parte do
fenômeno parodístico contemporâneo, significa “ao lado” ou “ao longo de” (pensemos, por
exemplo na palavra paralelo). A paródia é, portanto, uma forma que se abre para a
duplicidade rejeição/reverência, que deve ser melhor entendida na relação que estabelece
com os múltiplos níveis de ironia – como problematiza o dito (a paródia) com o não dito (a
fonte parodiada) – e na sua intenção satírica.
A sátira também não deve ser confundida com a paródia. O que define a sátira é a
sua característica mais “extramural”. Se a paródia se deixa ver mais em suas formas, a
sátira faz referência mais direta a valores sociais e morais compartilhados. “Como, então, a
paródia pode ser confundida com a sátira, que é extramural (social, moral) em seu
propósito aperfeiçoante de se deter, para ridicularizar, aos vícios e loucuras da
humanidade, com os olhos em sua correção?”56 (Hutcheon, 1985, 43). Tanto a sátira
quanto a paródia implicam em distanciamento crítico e irônico, portanto, julgamentos de
valor, mas a primeira julga por propósitos éticos (contra ‘falhas’ sociais e morais), e a
segunda por propósitos mais estéticos (reutilização de códigos de linguagens). A autora
nos dá um exemplo, a partir do filme Play it again Sam (Woody Allen, 1972) que parodia
Casablanca (Michael Curtiz, 1942): “o que está sendo parodiado é a tradição estética de

56
Tradução nossa do original em inglês: “How, then, does parody come to be confused with satire, which is
extramural (social, moral) in its ameliorative aim to hold up to ridicule the vices and follies of mankind, with
an eye to their correction?” (Hutcheon, 1985, p.43)

76
Holywood que permite apenas um certo tipo de mitologização no filme; o que está sendo
satirizado é a nossa necessidade por este tipo de heroicização.”57 (Idem, p.26)
Apesar de ter como foco principal a análise da paródia nos movimentos artísticos
do séc. XX, Hutcheon demonstra sua percepção de que “formas de arte mais populares,
como os quadrinhos e séries de televisão também têm sido analisados para revelar a
interação próxima de formas paródicas e intenções satíricas”58 (Idem, p.49). Como
exemplo, podemos citar o trabalho de Ben-Porat (1979), que analisa como a revista MAD
parodia satiricamente séries de televisão. Por se fazerem a partir de uma linguagem tão
facilmente identificável e pela vinculação que têm com a vida social, refletindo e ajudando
a criar tendências, as séries de TV são objetos ideais para a paródia satírica. Ou seja, uma
vez que são produtos seriados que configuraram para si determinadas convenções formais
e estilísticas, as séries de TV favorecem a paródia, que tem como alvo o aspecto formal do
texto parodiado. Além disso, já que se fazem a partir de, ao mesmo tempo em que ajudam
a criar, os valores, as normas, os vícios e as vaidades mais recorrentes do contexto cultural
que as contornam (até mesmo para garantir sua viabilidade econômica pela atração de
anunciantes, como nos lembra a autora), as séries de TV oferecem também amplas
oportunidades para a sátira, que tem como alvo a denúncia, ou mesmo a correção, da
realidade social compartilhada.
Hutcheon defende ainda que a ampliação que propõe para a maneira como
podemos pensar a paródia não é um simples argumento a favor do pluralismo crítico, mas
um pedido para que a teoria consiga responder à complexidade dos fenômenos
contemporâneos. Com isso, ela parece, mais uma vez, se distanciar de visões que
alardeiam a dificuldade, ou mesmo a impossibilidade, de significar na “pós-modernidade”.
Para Jameson (2002), por exemplo, com o fim dos grandes projetos, das grandes
ideologias, e com a crise da idéia de futuro, só se pode entender o pós-moderno a partir de
duas chaves: a esquizofrenia e o pastiche. O autor justifica sua posição ao dizer que os
artistas já não têm mais nada de novo a fazer, a não ser recombinar em colagens tudo o que
já foi feito. Acreditamos que recombinar, colar fragmentos diversos em uma outra
composição, são maneiras de se criar significações outras, novas até, que, por mais longe

57
Tradução nossa do original em inglês: “What is parodied is Hollywood’s aesthetic tradition of allowing
only a certain kind of mythologizing in film; what is satirized is our need for such heroicization.” (Hutcheon,
1985, p.26)
58
Tradução nossa do original em inglês: “More popular art forms such as comic strips and television series
have also been analyzed to reveal the close interaction of parodic forms and satiric intent.” (Hutcheon, 1985,
p.49)

77
que possam estar das grandes significações romântico-modernas, dizem do contexto
cultural que vivemos e devem, portanto, receber atenção analítica que não as
desqualifiquem de pronto.
Torna-se importante para os nossos propósitos perceber, com a ajuda de Hutcheon,
como a paródia vai crescentemente ganhando espaço, como forma de expressão, em uma
cultura que, também crescentemente, viu abundar o material simbólico disponível, além de
tecnologias que permitem, cada vez mais facilmente, a atividade de apropriar, cortar, colar
e resignificar. Figueiredo (2009) nos mostra como a colagem e a montagem tornaram-se,
em seus diversos modos de realização, cada vez mais um recurso comum na cultura
audiovisual contemporânea. A autora percebe que essa “naturalização” do recurso faz com
que ele perca seu impacto subversivo. Mas, por outro lado, podemos pensar que ele instiga,
ou torna possível, uma disposição mais interventora ou mesmo produtora por parte de
quem antes apenas consumia os produtos simbólicos disponíveis. Claro, podemos voltar a
pensar que aquilo que vem sendo produzido por estes “prosumidores”, representa, na sua
maioria, a tentativa de cópias de padrões ou critérios alheios às escolhas destes sujeitos. No
entanto, não podemos negar que haja nesta realidade traços de uma movimentação cultural
(e lembremos: grandes transformações culturais só são possíveis pelos campos de
possibilidade que pequenos movimentos, em finas camadas de sedimentação, abriram para
elas). Ou, como nos diria Castoriadis (2007), é sempre necessária a criação de um
pensamento que torna pensável aquilo que antes não o era.
Voltemos agora a nossa atenção para o conceito de celebridades, privilegiando a
movimentação de seu estatuto no curso das dinâmicas culturais contemporâneas de que
estamos a falar.

2.2. As celebridades

Estudos sobre a temática das celebridades parecem estar ocupando cada vez mais
trabalhos que se voltam à compreensão do contemporâneo. Herschmann e Pereira (2003),
por exemplo, percebem o crescimento do interesse por materiais biográficos, por narrativas
que nos contem sobre a vida daqueles que conhecemos por circularem na cultura midiática.
Perguntam-se, então, o que este crescente interesse pode indicar. Perseguindo os indícios,
os autores tentam fugir das respostas simplistas, que explicariam o fenômeno pela
curiosidade como característica inerente ao ser humano, por exemplo, e sugerem que a

78
condição fragmentada das identidades no contemporâneo fazem com que estas narrativas
sejam buscadas como referências para a construção de um self. No entanto, assumem que
estudos mais abrangentes ainda estão por serem feitos.

Em suma, faltam-nos estudos que identifiquem no sucesso do biográfico não só


uma demanda pelo entretenimento e escapismo, mas que também reconheçam
que essas narrativas são cruciais para a atribuição de sentido e significado ao
passado, à ‘realidade’, contribuindo para a ordenação, ainda que transitória, de
um mundo marcado pela dispersão, efemeridade e pluralidade. (Herschmann e
Pereira, 2003, p.44)

Calligaris (1998) se questiona sobre o material autobiográfico, mas pensando não


apenas nas autobiografias dos famosos, mas nas autobiografias ou auto-exposições de
pessoas comuns (em seus blogs, por exemplo). Para o autor, o escrito autobiográfico
implica uma cultura na qual, por exemplo, o indivíduo (seja qual for sua relevância social)
situa sua vida ou seu destino acima da comunidade a que ele pertence. Nesta cultura, o
sujeito concebe sua vida não como uma confirmação das regras e dos legados da tradição,
mas como uma aventura para ser inventada. Ainda segundo o autor, a modalidade
específica pela qual o sujeito contemporâneo se diz (e, portanto, se constitui) se dá a partir
de um desejo de celebridade, entendida não necessariamente como fama, mas como
publicização de uma imagem: ‘compor uma imagem para os outros’.
A inflação da necessidade de visibilidade no contemporâneo se liga, portanto, a
uma sociedade marcada pela desestruturação de instituições que conferiam certa
estabilidade identitária aos indivíduos, mas também a uma sociedade em que valores
individualistas, como a idéia neoliberal do self made man, se conjugam com capacidades
tecnológicas de auto-exposição. Para além disso, e como já nos sugere Calligaris, ser
visível para o outro pode ser considerado como uma necessidade elementar do ser humano.
São nas trocas interacionais que sujeitos se vêem, se ajustam uns aos outros e tornam
possível a convivência em sociedade. Até determinado grau, temos todos que nos
expormos frente ao outro como garantia da nossa própria existência. O que nos toca, ou
mesmo nos choca, no contemporâneo é a extensão alargada de outros para os quais os
sujeitos estão tentando se tornar visíveis, e a quais critérios seguem nesta busca pela alta
visibilidade..
A visibilidade ampliada sempre foi sinônimo de poder. Em sociedades com
estratificações sociais bem demarcadas pela tradição é fácil notar o fenômeno. Ao rei todos
devem ver e reverenciar, mesmo que à distância e mesmo sabendo que nunca terão acesso

79
a uma visibilidade daquele tipo. Resta aos ordinários se contentar com uma visibilidade
restrita a seus pares e, se possível, zombar da figura maior e mais visível, replicando a sua
imagem em caricaturas e afins.
Entre esta visibilidade assegurada a poucos por uma sociedade que se organiza com
base na tradição e a alta visibilidade perseguida por quase todos no contemporâneo, temos
ainda alguma história para contar. A partir da formação de um tipo de sociedade de caráter
mais democrático, com as mudanças trazidas desde o séc. XVIII pelas revoluções
burguesas e com o crescimento dos meios de comunicação, o estatuto da visibilidade vai
sendo alterado. Ela já não está mais assegurada à monarquia e ao clero. Tornou-se possível
perseguí-la, adquirí-la, mas ainda não a todos.
É na virada do séc. XIX para o séc. XX, período que coincide com grandes avanços
nas técnicas de comunicação, como o cinema e o rádio em conjunto com uma imprensa já
constituída, que um novo tipo de visível estabeleceu-se. Freire Filho (2009) demonstra que
desde a modernização da imprensa carioca, no início do séc. XX, a obsessão pela vida
alheia se tornava cada vez maior. Diz ainda que esta exposição do privado recebia
protestos quando envolvia a maledicência e a calúnia. Porém, nas ocasiões quando atendia
a sentimentos de vaidade, de “desesperado exibicionismo”, esta exposição era considerada
uma bênção. A vontade de aparecer havia se constituído em uma “epidemia”. No entanto,
os critérios para a alta visibilidade ainda atendiam a poucos.
O cinema foi o primeiro grande fabricante das celebridades modernas: as estrelas.
Edgar Morin (1989), nos diz de como atores e atrizes na época do cinema mudo
hollywoodiano se transformaram em entidades inatingíveis: estrelas, deuses. Com o avaço
tecnológico do aparato cinematográfico e a possibilidade do cinema sonoro, estes deuses
inatingíveis mostraram também ter um lado humano, criando uma dupla natureza que
reforçou ainda mais o seu status de mediadores entre realidade e fantasia. O novo Olimpo
do séc. XX, a cultura de massa e seus deuses e heróis, ganham o reforço ainda da televisão.
Morin (1997) caracteriza, então, as celebridades da cultura de massa como alter ego
idealizados, que se fazem em relações de projeção-identificação com seu público. Vivem
no encontro do duplo movimento da cultura de massas: do imaginário para o real e do real
para o imaginário. Têm, por isso, dupla natureza: são ideais inimitáveis (sobre-humanidade
que permite a projeção) e modelos imitáveis (substância humana, vida privada
estrategicamente acessível e glamourizada, que permite a identificação). São, para o autor,
a nova alta sociedade, a quem se refere como Olimpianos.

80
Sarlo (2002) tem uma visão similar ao definir o star-system. Para ela, estes seres
excepcionais e ao mesmo tempo familiares são mediadores cujo poder não reside na
solução de problemas de seus protegidos (seus fãs), e sim na oferta de um espaço de
reivindicações e de indenizações simbólicas. Diz serem o contraponto à tendência
contemporânea dos reality shows e programas participativos: se a televisão só nos
mostrasse a nós mesmos, seria um pesadelo hiper-realista, afirma.
Podemos perceber, na leitura destes autores, que eles conferem ao universo das
celebridades uma função bem definida para a manutenção do sistema da cultura de massa:
garantem o sucesso de seus produtos, são produtos por si próprios, geram o equilíbrio
necessário entre ‘deuses’ e ‘mortais’. Mais ainda, percebemos que estas figuras – como o
próprio termo Olimpianos nos ajuda a mostrar – são pensadas pelos autores como dotados
de um grau de inacessibilidade que nos leva a articulá-los, enquanto conceito, às
disposições exigidas pela Paleotevê: reverência, projeção. Suas celebridades e heróis são
os notáveis – por talento, beleza, habilidade ou riqueza. Estão na televisão porque têm algo
a dizer, porque são admiráveis por critérios (aparentemente) externos à própria
televisibilidade. Olimpianos são, portanto, personificações dessa cultura midiática que se
colocam acima de seus consumidores que, devemos ressaltar, recebem suas indenizações
por se submeterem ao papel de adoradores.
Precisamos aqui demarcar uma idéia que é central para a nossa proposta.
Acreditamos que devido ao valor que os Olimpianos têm para a cultura de massa, seria de
se esperar que esta cultura, no enquadramento que oferece a eles, preservasse suas
qualidades olimpianas. Ou seja, a apresentação de seus atributos mágicos e inacessíveis, ao
lado de uma estratégica exposição glamourizada de sua humanidade. Temos vários
programas na televisão que parecem respeitar este enquadramento, tal como o Estrelas,
apresentado por Angélica na Rede Globo. Mas não cabe em nossa proposta uma análise
comparativa entre programas que têm como temática as celebridades e sim o
questionamento se o universo das celebridades está sofrendo um reenquadramento.
Ora, falar em reenquadramento nos leva, automaticamente, a ter que falar de um
enquadramento primeiro que possa estar sofrendo uma reformulação no Pânico na TV.
Acreditamos, contudo, que podemos encontrar este enquadramento primeiro no
levantamento bibliográfico que fizemos sobre estas concepções mais clássicas das
celebridades midiáticas. Além disso, queremos reforçar, o programa que analisaremos está

81
vinculado a uma determinada realidade cultural que se abre como campo de possibilidade
para o possível reenquadramento que ele opera.
Sarlo, em um texto mais contemporâneo, parece contrapor, como vimos a pouco, a
necessária figura do Olimpiano ao que podemos chamar de Célebres Ordinários. Nesta
contraposição reguladora que a autora apresenta podemos perceber traços da disposição
que marcariam, como propomos, a Neotevê: a identificação. Os Célebres Ordinários são
aqueles que poderiam ser eu mesmo, que ascendem à televisibilidade por terem vivido uma
experiência forte (quase sempre dolorosa), que poderia ter se passado comigo. São, assim
como o telespectador, sofredores em uma sociedade que não consegue garantir ao
indivíduo a satisfação de suas necessidades e nem os seus laços de pertencimento. E
mesmo que desejem a visibilidade midiática, sua entrada na televisão ainda se dá a partir
de algo extraordinário que possam ter vivido. São portanto secundários em relação à sua
própria história. São referências.
Uma nova virada de séculos (do XX ao XXI), que também coincide com um
período de significativos avanços nas tecnologias de comunicação (as digitais
multimidiáticas e interativas), nos aproxima do fenômeno das celebridades e da inflamada
busca por visibilidade de que falamos no início desta seção, e lança luzes sobre o panorama
em que se inscreve nosso objeto. É neste período recente que percebemos também a
disponibilidade de aparatos tecnológicos que possibilitem que indivíduos comuns, das
classes populares, assumam a legitimidade de serem mais que público receptor, buscando
meios para se fazerem visíveis. A cultura de massa, e sobretudo a TV, soube bem explorar
esta reivindicação de sujeitos que queriam se apropriar de sua linguagem, se expressar
através da telinha. Uma enxurrada de reality-shows, dos quais o Big Brother parece ser o
exemplo mais emblemático, deu aos comuns acesso à visibilidade de seus seres
“autênticos”, aparentemente independente de qualquer história prévia que tenham vivido.
O estatuto das celebridades ganha nova dimensão.
DaMatta (1997) mostra como essa necessidade de visibilidade tornou-se
imperativo, principalmente no Brasil, onde “ficar famoso” ganhou o peso de tornar-se
cidadão, de sair do anonimato e de uma situação de privação imposta por uma enorme
desigualdade social. Segundo o autor, se nos Estados Unidos tornar-se notável, e portanto
visível, é uma estratégia para se distinguir em uma sociedade de iguais, no Brasil, é uma
estratégia de ascenção social – menos no sentido de se mover a uma classe sócio-

82
econômica superior e mais no sentido de chegar a participar do social, tornar-se um
cidadão vísivel.
Herschmann e Pereira (2003) ainda nos ajudam com a idéia de se pensar as
celebridades como estratégias narrativas em um contexto de alta visibilidade. Esta idéia é
central para a nossa proposta de se pensar as celebridades na cultura contemporânea. A
proposta de que celebridades sejam estratégias narrativas deixa claro que elas são, mais do
que pessoas (e suas habilidades, beleza ou talento), uma hitória que se conta. São, portanto,
produtos simbólicos estrategicamente construídos para a disputa por visibilidade. Porém,
acreditamos que, diferentemente do que o conceito clássico de celebridades – os seletos
que têm direito à visibilidade – faz pensar, a alta visibilidade na contemporaneidade, em
sua proliferação de recursos de auto-exposição, parece estar acessível a todos (mas, claro,
não com a mesma força). Os recursos disponíveis para se auto-narrar estrategicamente na
busca por visibilidade mostra que a idéia preconizada por Andy Warhol de que, na era
eletrônica, todos terão seus quinze minutos de fama, pode estar em vias de concretização.
Pensamos que isso fragmenta o próprio conceito de celebridades e, com isso, o papel que
desempenham na cultura em sua relação com os comuns.
Não poderíamos pensar, com isso, que a proliferação de celebridades – ou melhor,
a proliferação das possibilidades de se tornar (tele)visível –, somada às capacidades
tecnológicas de intervenção e de auto-exposição de que dispomos, levaram ao extremo
tanto o consumo quanto o status destas figuras: de deuses intocáveis a produtos
descartáveis à espera de nosso ‘grafite’ (Certeau, 1994)? Mas não ficaria ainda garantido o
lugar de algumas celebridades em um céu ainda inatingível pela maioria mesmo na
contemporaneidade?
Ao lado de Olimpianos e Célebres Ordinários, propomos a figura das Pós (ou
Pseudo) Celebridades59. Aquelas que ascendem ao universo dos notáveis, mesmo que
fugazmente, pelo simples fato de terem acessado a televisibilidade. As Pós-Celebridades
podem ativar com mais facilidade os traços típicos da disposição que relacionamos à
Póstevê: intervenção, apropriação. O público satisfaz o seu prazer ao consumi-las, ou ao
vê-las desconstruídas, destituídas, enfim, de seus fugazes postos de celebridade. As Pós-

59
Um conceito parecido com este que estamos propondo aparece em Rojeck (2008). Trata-se da idéia dos
Celetóides, celebridades efêmeras, de curta duração. Os celetóides são, para o autor, um subgrupo de uma das
três categorias de celebridades que ele apresenta: as que têm a celebridade conferida (derivada de um atributo
original, normalmente a linhagem); as que têm a celebridade adquirida (derivada de feitos e conquistas do
próprio indivíduo); e, por fim, as que têm a celebridade atribuída (resultado de um trabalho de exposição
planejada, de “representação concentrada”). Os celetóides configuram um subgrupo desta última categoria.

83
Celebridades, acreditamos, são frutos do paradoxo a que teve que se curvar a TV: se abrir
crescentemente à figura dos comuns, banalizando o próprio estatuto dos telenotáveis
quanto a si mesma. O crescente fascínio pelo estar diante das câmeras, como um valor
social, foi sendo também alimentado pela TV. Os telespectadores passaram, então, a
reivindicar a efetivação desta necessidade, diminuindo o “culto” destinado aos televisíveis.
Recuperando Benjamin (1994) na oposição que propõe entre “valor de culto” e
“valor de exposição” para dizer, respectivamente, das obras dotadas de aura e das obras
reproduzidas tecnicamente, é possível desenvolver certas idéias. Ambos os “valores” em
questão são atribuídos a um produto simbólico na sua relação com um público. Mesmo que
no conceito de “valor de exposição” esteja implicada a idéia de um produto consumível, do
qual as pessoas podem se apoderar, podemos pressupor ainda uma distância ou, no
mínimo, uma alteridade bem demarcada entre produto e público. No cenário tecnológico e
cultural do contemporâneo, tal como viemos demonstrando, talvez seja necessário pensar
em outros valores que se possa atribuir à relação produto-público. Acreditamos que a
exacerbação do “valor de exposição” acabou por gerar um “culto à exposição”. Culto este
que o público passou a reivindicar que se voltasse para si também. Estaríamos vendo,
assim, se delinear uma espécie de “valor de apropriação” ou “valor de intervenção”, em
que produto simbólico e público se misturam pela intervenção, ou mesmo manipulação,
que o público faz da linguagem e dos recursos expressivos que geram os produtos
simbólicos cuja exposição antes podiam apenas cultuar60.
Com isso poderíamos entender melhor, por exemplo, a proliferação de exposição
de “eus” em sites como o You Tube. Costa (2008), analisando este fenômeno, percebe
como, nesta forma de registro autobiográfico contemporâneo, o indivíduo constrói seus
próprios produtos midiáticos ao mesmo tempo em que essa construção é feita a partir de
uma estrutura e de uma linguagem essencialmente midiáticas. Estas videografias de si
funcionam como grande agregador das formas e formatos de outras mídias, remetendo-se
continuamente a elas. O autor percebe ainda que as auto-imagens produzidas são
esteticamente precárias61 e que, por isso, criam uma atmosfera de verossimilhança e

60
Reforçamos aqui a contribuição de Bateson (1989) através de sua idéia dos níveis de aprendizagem a que
nos referimos anteriormente, no final de nosso primeiro capítulo.
61
Ressaltamos aqui o conceito de Missika (2006) sobre o processo de desprofissionalização – para o autor
um dos vetores de força do desaparecimento da TV tal qual a conhecemos e prova da reivindicação por parte
de um público de criarem produtos simbólicos se apropriando das linguagens disponíveis. Esta idéia pode
reforçar a nossa proposição de que o Pânico na TV, reapropriando a estética criada pelo público a partir da
apropriação da linguagem televisiva, elege seu estilo tosco como forma de criar familiaridade e vinculação
com este mesmo público.

84
familiaridade, parecendo, portanto, autênticas.
Para Costa, o interessante no fenômeno é que estes vídeos podem ser pensados
como formas de materialização de um novo ethos midiático na contemporaneidade, ou
seja, de uma nova relação entre os indivíduos e a mídia. Relação intrincada, na qual não
existem mais dois indivíduos de um lado e mídia de outro.

As videografias de si são produtos de indivíduos inseridos em uma nova


configuração social em que a mídia deixou de ser um ente distante para se
transformar em um ambiente familiar. Ser, agora, é ser por e através da mídia,
um viver a partir de influência da mídia, um novo ethos. Este ethos é um novo
espaço da sociedade contemporânea invadida pela imagem, em que o regime de
visibilidade atingiu novos patamares. (Costa, 2008, p.3)

Apesar de para Costa (2008) interessar mais os vídeos que demonstram os sujeitos
em suas vidas comums expandidas para o ambiente midiático, e não particularmente os
vídeos que de forma mais explícita se mostram como “estratégias narrativas” que visam a
introduzir conferir a seus sujeitos o status das celebridades62, acreditamos serem válidas as
suas contribuições. O autor diz que as identidades que estão sendo criadas por estes
sujeitos são a de um self que “necessita não só de representações para referendar-se como
também de uma audiência que lhe confira aprovação e de uma imagem especular de si
mesmo que lhe confirme sua existência como ser e lhe permita um lugar no ethos
midiatizado e ‘imagicizado’”. (Idem, p.10)
A partir disso, pensamos que estes “eus” expressos (mesmo aqueles em que sujeitos
se apresentam em seus cotidianos e mais fortemente aqueles com os quais sujeitos buscam
se celebrizar) não são tanto busca de autonomia expressiva e sim uma tentativa de se expôr
segundo critérios midiáticos anteriores à internet e aos dispositivos de auto produção e
distribuição de material simbólico. Sobretudo segundo os critérios televisivos e sua
linguagem dos quais os sujeitos se apropriaram. O movimento seria menos o da
emancipação e mais o da auto-transformação em produto midiático a ser consumido.
Tangenciando nossa temática, a do estatuto das celebridades no contemporâneo, Costa

62
Como, por exemplo o de Penelopy GaGa, uma mulher que claramente se expressa almejando o status de
celebridade, com um vídeo intitulado “A Fama”. Este vídeo se faz a partir de uma montagem de fotos suas –
em situações várias, mas sempre com um exagero de ‘produção’, maquiagem e afins – e um áudio – sua
música – cujo trecho diz: “Quero ficar famosa. Com muitas luzes e flashes por todos os lados. Com vários
paparazzi. Quero fazer shows e dar muitas entrevistas. Quero ser artista. Sair nas revistas e ficar de bem com
a vida. O que eu realmente quero é ser clicada por vários paparazzi (...) Eu quero ser muito conhecida. Fazer
sucesso em todas as mídias. Pois bem, vou me apresentar. My name is Penelopy GaGa.”
Disponível em <http://www.youtube.com/watch?v=xtno3I9yZ-U&feature=related>. Acessado em 02 de
junho de 2009.

85
ainda nos ilumina com a análise de uma destas videografias que tem como título “Why is it
so hard to accept that maybe we are just normal?”63. Sobre ela, o autor diz:

Este video é exemplar, pois já em seu título – por que é tão difícil aceitar que
talvez sejamos normais? – ele nos intriga. Ao assistí-lo, a questão fica um pouco
mais clara, os normais se opõe às celebridades, ou seja, a pergunta é: por que é
tão difícil aceitar que não somos celebridades e sim reles anônimos. Essa é um
típica videografia de si, um pequeno registro biográfico e de viés confessional,
pois a autora nos revela que acreditava que seria uma celebridade, coisa agora do
passado, pois ela já aceitou sua condição de pessoa “normal”. A contradição
entre essa afirmação e o fato da autora ser uma das estrelas juvenis do “You
Tube” é claramente perceptível. Por exemplo, em outro de seus vídeos, ela
comemora o fato de terem sido assistidos quinhentas mil vezes. Se ela não pode
ser a celebridade que gostaria, ela virou uma celebridade da comunidade. Uma
questão então surge. Qual seria a diferença entre uma celebridade tradicional e
uma celebridade do “You Tube”? (Idem, p.11)

Vários outros exemplos poderiam ser citados. Nos interessa, porém, pensar que é
neste panora que a proposta humorística de nosso objeto se dá. Seria justamente esta
fragmentação (ou mesmo banalização) que sofreu o conceito de celebridades o que torna
possível a existência de um programa de humor que se propõe a dirigir paródias, ironias e
sátiras no intuito de desestabilizar o lugar de famosos? Desestabilizar as celebridades em
seus postos de intocáveis parece ser a promessa central do Pânico na TV. Mas que
celebridades são essas? São célebres por quê? Ativam quais tipos de disposição por parte
do público que acolhe e se diverte com a proposta do programa? E o programa, direciona o
mesmo enquadramento para todas as celebridades? O especial sobre o humor da revista
Rolling Stone acredita que não.

No momento em que o mundo das celebridades ocupa um espaço


assustadoramente grande e a própria noção de quem é célebre mudou – o Big
Brother colocou o voyerismo político opressor de Orwell e o idealismo
exibicionista pop de Warhol sob um mesmo teto – os humoristas nacionais
experimentam um radicalismo inédito na execução de suas críticas bem-
humoradas (ou nem tão engraçadas, se for o caso). (...) Se as pseudo-
celebridades, os alvos prediletos do novo escracho, acreditam no triste clichê do
“falem mal, mas falem de mim”, como não tirar sarro delas? É quase um
contrato velado. (Rolling Stone, dezembro de 2008, p.84)

63
Disponível em <http://www.youtube.com/watch?v=2PTSlMOQ35M>. Acessado em 02 de junho de 2009.

86
3. Apontamentos Metodológicos

3.1. Definição do corpus

Como já indicado, nosso trabalho de análise se atém à leitura do programa. Nosso


corpus compreende 4 edições – de 07 a 28 de outubro de 200764, cobrindo 1 mês de
apresentações. Nosso corpus está da seguinte maneira nomeado e organizado:

Programa Data de exibição


Programa 1 07/10/2007
Programa 2 14/10/2007
Programa 3 21/10/2007
Programa 4 28/10/2007
Tabela 2: Programas do corpus e datas de exibição

Esses programas passaram por uma caracterização descritiva geral (ítem 2 dos
procedimentos), que nos forneceu um melhor entendimento do quadro maior – dos
significados e dos valores – que pauta a proposta interativa do Pânico na TV em relação
com um público projetado. Lembramos aqui que, quando falamos de público, não estamos
nos referindo a um público concreto, na medida em que não integra nossos objetivos uma
pesquisa de recepção. Pensamos no público como um conjunto de expectativas,
preferências, valores e significados, tanto quanto é possível encontrar seus traços no
próprio fluxo de sentidos dos programas que analisamos. Tendo sido mapeado esse
enquadramento mais geral, aproximamo-nos de nossa questão central ao fazer passar as
edições que compõem nosso corpus por um procedimento que localizou as situações em
que aparecem celebridades – num sentido bem amplo – e significados relacionados a este
universo. Portanto, de cada uma das quatro edições selecionadas, recortamos os momentos
em que o programa se refere, mostra ou entra em interação com as celebridades
(procedimento 3). Por fim, destes recortes, selecionamos quatro casos exemplares que
passaram por um exercício de síntese analítica, que tentou articular o panorama sócio-
cultural maior, a proposta e promessas do programa e a análise do enquadramento
oferecido às celebridades nos casos selecionados (4º procedimento).

64
A escolha desta edição foi aleatória, porém o programa que foi ao ar neste dia tem a particularidade de ter
sido o primeiro depois que o Pânico na TV comemorou quatro anos de exibição

87
3.2. Procedimentos

De início, sentimos a necessidade de reforçar a inscrição de nosso trabalho em uma


visada relacional. As escolhas que se seguem são implicações metodológicas desta
inscrição fundante. Não se trata, portanto, de encontrar em um único procedimento o nosso
percurso. Trata-se da combinação de procedimentos organizados em um composto dotado
de fases que se implicam mutuamente. Nosso composto metodológico deve estar dotado de
reflexividade, responsável por dinamizar os momentos distintos de seu processo.

3.2.1. Análise do panorama de inscrição do fenômeno:

Nossa perspectiva pede-nos que tenhamos em conta a natureza relacional e


contextual do objeto. Nosso primeiro procedimento deve nos ajudar a compreender o
contexto sócio-histórico-cultural em que o fenômeno se dá. Seu objetivo é oferecer um
panorama em que se inscrevem nosso objeto e também seu público. Thompson (1995) diz
que a definição de quais condições (o recorte do contexto) são relevantes e de como elas
devem ser analisadas dependem dos objetos e circunstâncias de cada pesquisa. Não
pretendemos estabelecer procedimentos de coleta primária de dados contextuais sócio-
históricos. Nesta etapa, pretendemos recorrer a levantamento bibliográfico. O resultado de
tal levantamento aparece ao longo de todo o trabalho. Nos capítulos teóricos precedentes –
a que a análise fará referência sempre que pertinente –, se fez presente quando, por
exemplo, traçamos um panorama sócio-histórico-tecnológico e cultural da televisão,
principalmente em relação a seu público, ou quando tentamos localizar o programa dentro
de tendências, também historicamente constituídas, da grade de programação da televisão
brasileira. Aparece também ao longo da análise, quando encontramos traços que merecem
tratamento em profundidade.

3.2.2. Caracterização do objeto enquanto forma significativa:

A compreensão do contexto e de suas condições não explica totalmente nosso


fenômeno: ele é também uma materialidade simbólica, dotada de estruturação própria que
deve ser analisada em sua capacidade de significar. Casetti e Chio (1999) dizem da
necessidade de pôr em relevo a arquitetura e o funcionamento dos programas analisados,

88
de reconstruir sua estrutura e seus processos em termos qualitativos. Os autores listam
várias portas de entrada para este tipo de análise: linguagem, estruturas e processos. Em
um misto de análise da linguagem e das estruturas, propomos um trabalho de
caracterização descritiva do corpus. Uma espécie de análise morfológica que objetiva
decompor os programas em suas unidades significativas, identificando suas formas,
durações, temáticas e personagens. As partes decompostas ganham, depois, uma leitura
transversal quando postas em relação. Influenciados também pela idéia de fluxo de
Williams (1975), esta etapa se interessará por significados que sustentam o enquadramento
de nosso objeto no fluxo mesmo de seu desenrolar nas noites de domingo, mas também
num fluxo mais amplo e menos linear que configura o entrecruzamento de mídias na
contemporaneidade.
Enfim, objetivamos perceber aqui como o Pânico na TV, de forma geral e não só
quando em contato direto ou indireto com o universo das celebridades, é enquadrado.
Acreditamos que este enquadramento mais amplo se articula ao enquadramento que o
programa constrói para as celebridades, imprimindo nele determinados significados e
valores, em situações mais específicas.

3.2.3. Recorte das situações em que se estabelece a relação do programa com o universo
das celebridades:
Para complementar a caracterização formal de nosso corpus, pretendemos fazer
passar os programas selecionados por um tipo de análise de conteúdo, processo
considerado, por muitos, ultrapassado e avesso à nossa perspectiva. Aqui, este tipo de
análise adquire um papel de suporte à fase seguinte. Seu objetivo é construir uma grade de
conteúdos – personagens, eventos, temas – que nos permita ver recorrências e preferências.
Seus resultados devem ser postos em relação com as outras etapas do método. Assim, o
mapa de conteúdo ‘inventariado’ ganharia a qualidade de ‘interpretado’.
Propomos como categorias para estes recortes:
a) Celebridades Citadas: aquelas que aparecem por fala ou por imagens não
captadas pelo programa para a edição que está sendo analisada;
b) Celebridades em Interação: aparecem em interação direta com personagens do
programa e com imagens captadas para a edição que está sendo analisada;
c) Celebridades como campo semântico: momentos do programa em que surgem
significados ou situações que envolvem uma idéia expandida de celebridades.

89
3.2.4. Análise do enquadramento:
O quarto momento de nossa metodologia é um procedimento síntese. Neste ponto,
teremos a capacidade de selecionar, do recorte de nosso corpus, casos exemplares para
passarem por um processo de descrição minuciosa. Como aparecem as celebridades?
Quem é a celebridade? Como de desenvolve o quadro interativo entre o programa e a
celebridade? Com quais recursos o programa interage ou intervém na figura da
celebridade: recursos verbais (em falas diretas ou não); recursos físicos; ou recursos de
edição, montagem e computação gráfica?
Neste momento da análise, nos interessa: a descrição da ação; a intervenção e
interação dos agentes (personagens); as posições de sujeito e formas de interpelação
criadas pelas intencionalidades e pela distribuição do direito de fala; a relação de turnos da
conversa e os turnos preteridos; a tomada da palavra; como as falas se encadeiam; quais as
formas de tratamento usadas; os elementos do contexto mobilizados pela ação e como os
casos se costuram no todo do programa. Por fim, nos interessa pensar a proposta de
interação criada para a relação personagem-celebridades em articulação com a proposta de
interação programa-público e também o que é possível ver nestas propostas, em suas
promessas e valores.

90
4. O Pânico na TV: enquadrado e enquadrante

Afinal, que programa é esse? Pergunta especialmente pertinente já que ele se


apresenta como (promete ser) algo tão novo e inusitado na televisão. A quem pensa se
dirigir? O que fala de si? Como fala? O que fala do que não é e como o faz? Como se
estrutura? O que nos mostra? Quem participa? Foram perguntas assim, ainda gerais, o
ponto de partida que tomamos para um encontro mais profícuo com nosso corpus.
Apresentaremos, inicialmente, alguns dados relativos à audiência do programa.
Sabemos que estes dados dizem pouco para nossa proposta e que são colhidos em uma
perspectiva quantitativa bastante alheia à nossa abordagem e com objetivos outros que não
os nossos. Entretanto, acreditamos que possam ser válidos quando lidos em relação às
demais etapas de nossa análise, podendo, assim, nos ajudar no entendimento de nosso
objeto.
O site da Rede TV! apresenta para possíveis anunciantes do Pânico alguns dados65
sobre sua audiência e uma síntese destes dados com o seguinte texto:

O programa vem apresentando excelente performance com máximas que chegam


a 17% de audiência alcançando por diversas vezes a segunda colocação 66.
Seguindo a linha do programa no rádio, o Pânico na TV vem se destacando por
ter um público altamente qualificado e fiel, formado por ambos os sexos (83%)
das classes AB (51%) e ABC (93%), com mais de 18 anos (82%).

O destaque fica para a performance do programa em termos de audiência e na sua


caracterização através de dados do IBOPE. O público é formado, majoritariamente, por
homens (47%) – sendo composto ainda por mulheres (36%) e crianças (17%) – de classe
AB (51%) – embora traga índices significativos nas classes C (42%) e D (7%) – e que têm
entre 25 e 49 anos (51%) – com o restante da audiência nas faixas etárias de 4 a 11 anos
(5%), 12 a 17 (13%), 18 a 24 (14%) e 50 anos ou mais (17%). Consideramos interessante
destacar a pouca diferença entre o público masculino e o feminino (diferença de 11%) de
xhomens. Isso reforça nossa proposta de não trabalhar com público como sujeitos
concretos, mas como conjunto de demandas e valores buscados no programa. Estamos
tentando falar de disposições culturais, mais do que de situações sócio-demográficas.

65
Fonte: IBOPE - WM - Grande São Paulo Janeiro/2008, segundo site da emissora. Disponível em
<www.redetv.com.br>. Acessado em 19 de junho de 2008.
66
A primeira colocação fica sempre com a Rede Globo. A Rede TV!, com o Pânico na TV, tem conseguido
disputar a segunda colocação com a Rede Record e com o SBT.

91
Estranhamos, contudo, os critérios que demarcam os intervalos etários. Se 17% do
público é aferido como sendo infantil (e portanto indiferente quanto a ser classificado
como homens ou mulheres), podemos inferir, pela distribuição etária que o site apresenta,
que consideram infantil o público que tem até 17 anos67. Os adolescentes, com quem
acreditamos que o programa dialoga fortemente (basta para isso percebermos a platéia que
se inscreve para participar das trasmissões ao vivo, ou mesmo o grande número de
anúncios de vestibular e cursos técnicos que os programas de novembro apresentaram)
estariam contidos na classificação infantil. Além disso, apresentar a concentração da
maioria da audiência na extensa faixa etária que vai dos 25 aos 49 anos – em um intervalo
de 24 anos – parece ser um recurso de marketing (deve ser uma faixa mais valorizada
mercadologicamente, já que se espera que, em idades mais avançadas, a pessoa já tenha
rendimentos próprios). Se somarmos a audiência que apresentam para as faixas etárias que
vão dos 12 aos 17 e dos 18 aos 24 anos, temos 27% – o que é mais da metade dos 51%
apresentados para a faixa 25 a 49 anos. De 12 a 24 anos temos um intervalo de 12 anos, a
metade do intervalo de 24 anos apresentado para a faixa de 25 a 49 anos. Dessa forma,
acreditamos que se tívessemos os números de uma faixa que fosse de 12 a 30 anos ela
concentraria maior audiência do que a faixa 31 a 49, indicando que a maior concentração
estaria mesmo entre os adolescentes e jovens adultos.
Enfim, criticamos esta divisão por acreditar que o programa tem um caráter
altamente adolescente e jovem. Porém, consideremos aqui, como nos ajudam a pensar Pais
(2006)68, Sarlo (2000)69 e Maffesoli (2004)70, a juventude como um valor na cultura “pós-
moderna”. Ou seja, a juventude passa a se referir menos a um estado etário e mais a uma
condição valorizada e buscada na contemporaneidade71. Lembremos que o próprio elenco
do Pânico na TV, em várias situações (se não em todas), se comporta com o hedonismo, a

67
Acreditamos que a diferença de 1% entre os 17% apresentados como público infantil e os 18%, resultado
da soma das faixas etárias de 4 a 11 anos e de 12 a 17 é fruto da necessidade de se arredondar os números
aferidos para apresentá-los sem suas casas decimais.
68
O autor fala que o contemporâneo tem uma compreensão do futuro mais como um tempo de retorno
(enquanto possibilidade de escolha de novos caminhos, de procura por novos traços identitários etc.) em
contraposição à idéia de futuro como conclusão de um projeto de vida, típica da modernidade.
69
A autora examina a diferença entre as moças que frenquentavam os cafés de Buenos Aires na década de
50, que em tudo se pareciam com suas mães (roupas, penteado, comportamento), e as mães que frequentam
os shopping centers da “vida pós-moderna”, que parecem querer se parecer com suas filhas.
70
Maffesoli contrapõe o que chama de “figura emblemática”, enquanto valor almejado da modernidade e da
pós modernidade. Da primeira, a figura emblemática seria o sério e bem sucedido pai de família. Da segunda,
seria o eterno jovem hedonista e nômade.
71
Bauman (2001), diz do fenômeno do “travestismo juvenil”, que representaria a tentativa da busca de
padrões estéticos e comportamentais notadamente jovens por adultos e, não raramente, idosos.

92
inconseqüência e o descompromisso – características comumente atribuídas a adolescentes
e jovens –, apesar de não ser formado por pessoas de faixas etárias muito baixas.

4.1. O Pânico na TV enquadrado

Para além das edições selecionadas para análise, propomos a apresentação e leitura
de alguns enquadramentos que o programa recebe para se lançar como proposta de
interação junto ao público. Já dissemos, no primeiro capítulo, que o programa é derivado
de um programa radiofônico de sucesso, o Pânico. Dissemos também como este programa
foi se moldando em uma relação que foi sendo desenhada junto com seu público e pautada
tanto por valores – a espontaneidade, a diversão, a agressividade – quanto pela negação de
valores – a falta de compromisso, a falta de seriedade e a falta de cuidado com a figura do
outro. O Pânico na TV, antes mesmo de sua estréia, já trazia consigo essa carga de
significados, como deixa claro o texto usado pela Rede TV! para dizer sobre o programa:

A Rede TV! traz para as telas de TV o programa que é considerado o melhor


humorístico do rádio. Com seu jeito descontraído, criativo e bem humorado, a
trupe do Pânico na TV faz a programação mais divertida e engraçada aos
domingos e sextas-feiras. Em edições ao vivo, Emílio Surita, Bola, Sabrina,
Ceará, Vesgo, Carioca, mostram porque o Pânico na TV se tornou o programa de
maior sucesso e repercussão da televisão brasileira atualmente. Muitas atrações
rolam soltas a cada programa, pontuadas pelas piadas rápidas, impiedosas
brincadeiras e um show de improviso e versatilidade. A turma do Pânico, sob o
comando de Emílio, não perdoa.72

Percebemos que se destaca a associação com o programa de rádio, a descontração


(espontaneidade) e o sucesso da versão televisiva, além de sua equipe, “que não perdoa”. O
Pânico na TV é caracterizado como divertido, engraçado e impiedoso, sendo, com isso,
classificado como entretenimento humorístico. Essa apresentação tem também uma forma
visual: uma tela em cores fortes, explosiva que, além do texto, traz a logo do programa
(também explosiva e que não tem mais como suporte uma cartolina), uma foto da equipe
do programa e informações sobre dias e horários de exibição.

72
Disponível em <www.redetv.com.br>. Acessado em 19 de junho de 2008.

93
Figura 1: Página do programa Pânico na TV no site da Rede TV!

Na grade de programação geral da emissora73, o Pânico na TV é o único programa


enquadrado no formato “Humor”. É também como humorístico que o programa é
classificado pelo Ministério Público, com sua tarja de advertência que aparece na parte
inferior da tela tão logo o programa entra no ar. Essa tarja de recomendação diz74:

12 – Não recomendado para menor de 12 anos.


Tema: Humorístico
Contém: linguagem depreciativa e erotismo.

Desta vez, a proposta de ser um programa que foge dos padrões aceitáveis recebe
uma chancela oficial.
Pensamos que a escolha dos nomes dos programas, tanto no de rádio quanto na TV,
diz do que se pretende que eles sejam. Pânico na TV é derivação óbvia do nome do
programa de rádio. Esta associação tenta transpor para a versão televisiva o
reconhecimento e a audiência que o Pânico já havia adquirido. O nome do programa de
rádio, por sua vez, parece também uma derivação (mas desta vez com ares de trocadilho)
um pouco óbvia do nome da emissora em que vai ao ar, a Jovem Pan. Porém, um exercício
reflexivo mais atencioso pode nos levar para além destas relações mais diretas.
Podemos, de início, perceber que o trocadilho com o nome da emissora assinala a
proposta de se apropriarem de elementos do universo midiático com fins de brincar,
parodiar, resignificar. A obviedade das derivações entre os nomes também pode nos

73
Esta grade é organizada entre os seguintes formatos: Auditório, Entrevistas, Esportes, Feminino, Humor,
Jornalismo, Show. Apesar de ser gravado em auditório, o Pânico na TV não faz parte deste grupo de
programas. Programas que tangenciam o Pânico na TV, principalmente na temática celebridades, como o
programa Amaury Jr. e o TV Fama, aparecem respectivamente em Entrevistas e Show.
74
Lembremos que esta tarja, atualmente, diz ser o programa não recomendado para menores de 14 anos.

94
indicar algo da opção estética ou estilo do grupo: a sugestão de pouco elaborado, de tosco,
de ‘qualquer um poderia fazer’. Mas por que Pânico e não ‘panacéia’ ou ‘pandemônio’?
Houve aí também uma escolha que vai além da associação quase automática com o nome
da emissora de rádio.
Pânico significa aquilo “que assusta ou amedronta, sem motivo determinado”; ou
ainda “susto ou medo súbito que pode provocar uma reação descontrolada de um indivíduo
ou de um grupo”, segundo o dicionário Houaiss. A etimologia da palavra remete ao deus
Pã, representado como uma divindade semi-humana, semi-animal, dotado de prodigiosa
agilidade e de caráter zombeteiro. Acreditava-se que Pã, usando de sua velocidade,
produzia ruídos ora aqui ora ali, gerando temor e desorientação nos que se aventuravam
pelas matas. É também uma divindade que tem a sexualidade aflorada: persegue ninfas e
mancebos com igual paixão. Seu ar brincalhão levava alegria ao coração de todos no
Olimpo, por isso recebeu o nome de Pã, que significa todos75.
Podemos pensar então que, pelos nomes que carregam, os programas pretendem
estar associados à idéia de medo ou susto descompromissado, gerado aparentemente sem
maiores objetivos a não ser zombar o outro “sem piedade”76 e com recursos pouco
elaborados, a partir de material simbólico já disponível.
O Pânico na TV é composto por um elenco mais ou menos fixo. Conforme
apresentado no primeiro capítulo, parte deste elenco foi formado contigencialmente, por
pessoas que não tinham experiências de trabalho anteriores com televisão e, às vezes, com
nenhum outro meio de comunicação. Dissemos também como isso contribui para o ar de
espontaneidade que o programa pretende ter. A seguir, listaremos o elenco base das
edições analisadas77, bem como os principais papéis que desempenham no programa:

- Emílio Surita: idealizador, editor-chefe e redator do programa, é também o seu


apresentador principal, funcionando como um âncora em sua bancada; raramente
interpreta algum personagem, mas sua voz (com alterações de entonação
exageradas) preenche as locuções em off de alguns quadros.

75
Segundo Bulfinch (2000) e Grimal (2005).
76
Lembrando aqui que o adjetivo “impiedosas” foi usado para promover as atrações do programa no site da
Rede TV!. Mais uma vez, vemos o Pânico na TV ser enquadrado a partir da negação de um valor: a piedade.
77
Algumas dessas edições apresentaram personagens ou grupo de personagens que não integram o elenco
constante do período analisado. Eles serão apresentados quando estivermos tratando individualmente as
edições de nosso corpus.

95
- Marcos Chiesa (Bola): também idealizador e apresentador secundário do programa;
às vezes interpreta personagens e participa de alguns quadros.

- Sabrina Sato: apresentadora secundária e musa do programa; participa de alguns


quadros mas nunca interpretando personagens.

- Wellington Muniz (Ceará): responsável pelas principais imitações do programa,


entre elas as de Sílvio Santos, Clodovil e Galvão Bueno; apesar de ter um quadro
fixo no programa (o “Vesgo e Sílvio”), participa também de outros quadros e
também está presente no palco do programa, quase sempre como Sílvio Santos.

- Rodrigo Scarpa: formado em jornalismo, interpreta o Repórter Vesgo e raramente


faz alguma imitação; junto com Sílvio, tem quadro fixo no programa; presente no
palco, principalmente, como apresentador de alguns merchadisings.

- Márvio Lúcio (Carioca): outro imitador do programa; seu principal personagem é


Robaldo Ésperman (imitação de Ronaldo Ésper e sátira ao episódio do roubo de
vasos de um cemitério praticado pelo estilista), que tem um quadro fixo no
programa (o “Meda”). Dá vida a várias outras imitações, como a de Serginho
Groismann (Serginho Gosma, que apresenta o quadro “Baixas Horas”) e Roberto
Jefferson (Bob Jeff); também presente no palco do programa, mas raramente
atuando em uma de suas imitações.

- Evandro Santo: ator que interpreta Christian Pior (sátira a Christian Dior); junto
com Márvio Lúcio tem um quadro fixo no programa; raramente presente no palco
ao vivo.

- Carlos Alberto da Silva: seu principal personagem é o Mendigo, que já participou


de vários quadros do programa, dos quais o mais bem sucedido foi o “Vô Num
Vô”; faz também algumas imitações, entre elas, a do Presidente Lula (Presidente
Mula) e a de Milton Neves (Merchan Neves); sempre presente no palco e, na
maioria das vezes, como o Mendigo; atualmente faz parte do elenco do Show do

96
Tom, na Rede Record.

- Vinícius Vieira: mais um imitador, cujo principal personagem é o Gluglu (imitação


de Gugu, do SBT); imita também o Faustão, Nelson Rubens (Vinelson Rubens) e o
cantor e apresentador Netinho (Mano Quietinho). Este último, juntamente com o
Mendigo, apresenta o quadro “Vô Num Vô”; está sempre presente no palco do
programa ao vivo como Gluglu; atualmente também faz parte do Show do Tom, na
Rede Record.

- Daniel Zukerman: com sua imitação do cantor Supla, o Xupla, apresenta,


juntamente com Serginho Gosma, o quadro “Baixas Horas”; raramente presente no
palco durante as gravações do programa ao vivo.

- Danielle Souza: a Mulher Samambaia, a segunda mulher a integrar a trupe do


Pânico na TV depois de Sabrina Sato; seu papel, como o próprio nome sugere, é o
de “enfeitar” o programa; participa também de alguns quadros (mas sempre em
trajes diminutos).

- Tânia Oliveira, Gabriela Monteiro, Elisiane Benites, Daniella Bolina: as Panicats,


dançarinas e assistentes de palco que receberam no programa, respectivamente, os
nomes de Tânia Panicat (responsável pela saudação inicial de cada edição), Gabi
Fon-fon, Piu-piu (sempre vestida de amarelo), e Dani Bolina; participam também
de alguns quadros e estão sempre minimamente vestidas.

- Banda Viva a Noite: grupo musical composto por sete integrantes (seis homens e
uma mulher) que se encaixa no nicho aberto pelas festas de revival dos anos oitenta
(como o nome do antigo programa do SBT ajuda a sugerir), geralmente
consideradas trash; responsável pela transição entre quadros e entre
merchandisings durante o programa ao vivo; quase sempre responsáveis, também,
pelo encerramento do programa; seus integrantes estão sempre trajados segundo
algum tema, que orienta também o repertório que tocam em cada edição.

97
Sobre o elenco base, gostaríamos de destacar o grande número de imitadores e de
personagens imitação, o que reforça o caráter parodístico do Pânico na TV. As imitações e
personagens imitação são, na sua maioria, apresentadores de programas de televisão
(Sílvio, Gluglu, Faustão, Galvão, Tucano Huck, Serginho Gosma, Clô, Vinelson Rubens,
Quietinho e Merchan Neves). Além destes, aparecem imitações de outras figuras
midiáticas (Xupla e Robaldo Ésperman, por exemplo); e de figuras públicas – logo também
midiáticas – tais como políticos (Presidente Mula, Bob Jeff e Gilberto Kissab) e esportistas
(Felipe Massa, por exemplo) que estejam em voga na pauta da mídia.
Interessante pensarmos também que o papel de musa coube a uma ex-integrante de
um reality-show, o Big Brother Brasil, categoria de figura midiática que é um dos alvos
preferenciais do programa. No palco da transmissão ao vivo, Sabrina se destaca por estar
sempre bem produzida – bem vestida (em um sentido que não é o oposto de pouco
vestida), bem penteada, bem maquiada –, enquanto as outras mulheres estão com seus
biquinis ou maiôs e os homens, quando não trajados com as roupas de seus personagens,
estão sempre de camiseta de malha (as vendidas na loja do Pânico na internet), calça jeans
e tênis esportivo. Este destaque, que garante a Sabrina o status de musa, não a poupa,
entretanto, de ser a vítima preferencial das brincadeiras entre os integrantes do elenco,
tendo como algoz principal o Bola. Não são poucas as vezes em que é criticada por sua
(pelo menos aparente) falta de inteligência com adjetivos tais como “jegue” e “anta”.
Tampouco são raras as vezes em que participa de quadros que envolvem perigo ou
situações asquerosas, como ser a vela humana (vestida com roupas que dublês usam para
simular corpos em chama) da edição de aniversário de quatro anos do programa, ou ser
trancada em uma caixa de acrílico cheia de baratas. Cumprindo as vezes de apresentadora
secundária, juntamente com o Bola (Surita é o apresentador principal), Sabrina “não
interpreta” um personagem específico. No entanto, enquanto os outros dois apresentadores
– Emílio e Bola – às vezes participam de algum quadro interpretando personagens, Sabrina
participa dos quadros gravados sempre como Sabrina Sato, a japonesa bonita, “gostosa” e
estúpida, como se ser ex-BBB já configurasse este tipo de personagem. As outras mulheres
integrantes do elenco, mesmo quando participam de quadros, não saem também de seus
personagens. Porém estes foram criados pelo e para o programa: Mulher Samambaia, Piu-
piu etc.
O nome da personagem Mulher Samambaia também nos sugere algo que
acreditamos integrar a proposta do programa. Um dos tipos de pânico que se propõe a

98
instaurar é o descortinamento da lógica de funcionamento da TV78, trazendo para o
primeiro plano parte de suas estratégias. Como vimos, o próprio nome da personagem,
assim como o seu biquini-folhagem, já deixam claro o papel que ela deve desempenhar no
Pânico na TV: o de ser mero enfeite. É comum Emílio chamá-la, pedir para que ela dê uma
voltinha, dizendo: “Olha que beleza está a nossa Samambaia”. Ao final da voltinha, e
tendo a câmera já captado várias partes do corpo de Danielle, Emílio diz: “Muito obrigado,
Mulher Samambaia. Pode voltar para o seu lugar”. Reforçando o que o nome e a
vestimenta da personagem já deixa claro, estas falas de Surita escancaram que ela está lá
para ter imagens de seu corpo exploradas e nada mais. Não é raro programas de auditório
terem corpo de baile e assistentes de palco pouco trajadas, mas estas estão lá para “dançar”
ou “ajudar” o apresentador. Também não é raro a criação de uma situação em que corpos
femininos são utilizados como estratégia para gerar audiência. Como exemplo, lembremos
da “Prova da Banheira”, no Domingo Legal (SBT), de Augusto Liberato. Nesta prova,
Luiza Ambiel deveria impedir que participantes encontrassem e conseguissem pegar
sabonetes que haviam sido colocados em uma banheira. Ela, obviamente, trajava biquini
para a prova e não era incomum que, durante a movimentação de segura-empurra da prova,
o seu biquini se deslocasse, mostrando seus seios, ou parte deles. No entanto, não nos
lembramos de alguma vez Gugu ter chamado a atração e dito algo como: “Por favor, Luiza
Ambiel, venha agora para a banheira para podermos ver que beleza você é”. O intuito da
prova cobria o que parecia ser o objetivo a ser alcançado: a exposição do corpo feminino.
Contudo, queremos deixar claro que, mesmo sendo apresentada de maneira explícita a
exposição de Samambaia, acreditamos que isso, também no Pânico na TV, é capaz de
gerar interesse e audiência ao programa.
Ainda sobre o elenco, apesar de todos os integrantes que participam da transmissão
ao vivo terem cada um seu microfone79 aberto para, aparentemente, poderem falar o que
quiserem na hora em que quiserem – o que reforça, discursivamente, o tom de
espontaneidade e de bagunça que o programa pretende ter – percebemos em nossa análise
alguma ordenação. Bola e Sabrina são os que mais interagem com Emílio Surita durante a
apresentação do programa, por isso os consideramos apresentadores secundários, que

78
Uma espécie de programa típico da metatevê (Serelle, 2008), mas que, diferentemente de usar recursos de
metalinguagem para tentar criar legitimidade para a mediação ou para sugerir que o público se veja na
produção televisa, parece querer (quando mostra, demonstra ou diz sobre os procedimentos internos da lógica
televisiva) desconstruí-la, torná-la conhecida para que possa ser criticada ou, simplesmente, ironizada com o
objetivo de se produzir zombaria.
79
Excluindo-se a Mulher Samambaia e as Panicats, que são mais corpo do que voz no programa.

99
também parecem ter papéis pré-definidos para a intervenção. Enquanto Bola é a voz que
reforça a fala de Surita com interjeições como “É isso aí.” ou “Boa...boa.”, Sabrina é a voz
que se surpreende com interrogações como “Sério?” ou “É mesmo?”. Quando reforça
afirmativamente alguma fala, o faz depois do Bola. Ela é, assim, a ingênua ou a tola que
nunca está sabendo ou entendendo o que está se passando. Seu já quase-bordão “É
verdade.” fica mais reservado para os momentos de merchandising, para reafirmar as
qualidades do produto que se anuncia, e não deixa de lado o tom de menina ingênua, já que
ela o pronuncia com seu carregado sotaque interiorano. Os demais integrantes em cena,
quando entram na fala de Surita, entram quando são convidados para chamarem o quadro
que protagonizam ou no momento em que aparece um gancho com os personagens que
interpretam. Por exemplo, quando Emílio se engana quanto à atração a chamar, é comum
ouvirmos a imitação da voz do Faustão dizer, com ironia, “Quem sabe faz ao vivo!”80.
O Pânico na TV é estruturado como um programa de auditório, com presença de
uma platéia e com transmissão ao vivo. Mas, como vimos no primeiro capítulo, seus
produtores quiseram aproveitar o formato enrigessido para fazer um programa de auditório
diferente dos demais. Uma primeira diferença já foi destacada: a relação de personificação
que tais programas têm com seu apresentador. Apesar de seguir alguma ordenação, a
apresentação do Pânico na TV é feita mesmo por um coletivo de apresentadores, elenco e
personagens.
Uma análise do estúdio em que é gravado e o cenário que lhe fornece revestimento,
nos revelou outras particularidades. Verón (2001), em um estudo de como as imagens
tomam corpo na televisão81, sugere a importância da organização espacial do estúdio-
cenário para o tipo de relação que se pretende criar com o público que assiste a estas
imagens corporificadas. O autor procede, assim, com a análise de uma espécie de planta de
diferentes programas, apontando como as diferentes opções nas disposições espaciais dos
cenários marcam diferenças de propostas de cada programa analisado. Achamos

80
“Quem sabe faz ao vivo!” é um bordão repetidamente usado por Fausto Silva em seu programa. Vinícius
Vieira, que durante a transmissão do Pânico na TV ao vivo está sempre caracterizado como Gluglu, é quem
imita também o Faustão, através de caracterização (esporadicamente em algum quadro) e , sobretudo, através
da voz e do jeito de falar.
81
O autor se preocupa em verificar este processo, o de corporificação das imagens na TV, em programas de
cunho jornalístico e, depois, mais especificamente, em diferentes debates, que se deram em diferentes
programas de diferentes canais, na campanha presidencial francesa de 1981.

100
interessante este procedimento para nossa análise e propomos a verificação de como é
configurado o estúdio de gravação do Pânico na TV82.

Figura 2: Planta do estúdio de gravação do programa

De início, mais uma diferença é percebida. Emílio Surita, o apresentador principal,


não apresenta o programa e suas atrações diante da platéia (no sentido de “de frente para”).
Como podemos ver na planta do estúdio e na imagem a seguir, sua bancada (seu local fixo
durante a apresentação do Pânico na TV, salvo quando vai apresentar alguns
merchadisings) o coloca de costas para o que na planta nomeamos “arquibancada platéia
1” e de lado para a “arquibancada platéia 2”. A arquibancada para a platéia foi dividida em
duas por dois motivos: primeiro por sua localização em relação ao apresentador; segundo
pela diferença de composição destas platéias. Se tanto platéia 1 quanto platéia 2 são
compostas por adolescentes e jovens, a platéia 1 (aquela que fica atrás de Emílio) é
composta majoritariamente por garotas, enquanto a platéia 2 é formada basicamente por

82
Construímos esta planta com base na observação das imagens dos programas que analisamos. Ela não tem,
portanto, intenção de ser fiel às proporções do espaço do estúdio. Ela é mais um diagrama do que uma planta
propriamente dita. Além disso, o posicionamento do elenco e personagens (Gluglu, Carioca, Mendigo e
Sílvio) está disposto como o percebemos na maioria das edições de nosso corpus. A presença do elenco, bem
como dos personagens que interpretam, sofre algumas alterações de programa para programa.

101
garotos. Além disso, podemos pensar que platéia 1 acaba por desempenhar menos um
papel de platéia e mais um papel de cenário.

Figura 3: Imagem de cenário do Pânico na TV

Como podemos perceber na imagem acima, a bancada de Emílio, que pode sugerir
que ele é um tipo de apresentador-âncora (reforçando o caráter híbrido do programa pela
incorporação de elementos do telejornal), é uma bagunça. Bagunça que poderíamos esperar
de um quarto de adolescente. Percebemos, com isso, mais um recurso discursivo que tenta
ligar o Pânico na TV às idéias de desordem, de caos estabelecido e de juventude. Além
disso, abaixo e no centro de sua bancada, temos um aparelho de televisão com aparência de
antigo. Este televisor mostra constantemente a logo do programa e aparece na maioria das
vezes em que Emílio está em fala “direta” com o telespectador. Este vê, desta forma, um
televisor dentro de outro (o seu e o da bancada), num jogo de quadro dentro de quadro, TV
dentro de TV, que reafirma o caráter meta e parodístico do Pânico.
Além desta tela da bancada, e quando a imagem está em Surita, o telespectador
também vê outras quatro telas entre a platéia-cenário. Trata-se das telas dos “Robert83

83
“Robert” é um termo criado pela dupla Vesgo e Sílvio para designar os famosos, os quase famosos ou as
pessoas comuns que fazem algum esforço para serem entrevistados pela dupla ou para entrarem no campo
visual em suas apresentações. São os “aparecidos”.

102
Apresentadores”, espectadores que, de suas casas (no Brasil ou no mundo), são escolhidos
para participarem da platéia do programa via internet. Como que uma video platéia a
distância. Este recurso é patrocinado por uma marca de roupa que veste os manequins com
cabeça de tela – são usados manequins cuja parte da cabeça é substituída por uma tela que
recebe as imagens dos rostos dos internautas. Acreditamos que isso pode reforçar a idéia
que temos de que o público do programa possui familiaridade com os recursos
tecnológicos de interação/intervenção e, para além disso, que possuem o desejo de se
fazerem conteúdo midiático.
Os bancos para os apresentadores secundários e para os personagens em cena
durante a transmissão ao vivo (na imagem da página anterior podemos ver um deles ao
lado de Sabrina) são pouco sofisticados e se parecem com bancos de lanchonete. O clima
de amigos que se encontram para um bate-papo se reforça com esta referência.
Sobre o cenário, consideramos válido, ainda, destacar as imagens que cobrem as
paredes do estúdio e que, na planta que apresentamos, foram nomeadas de painéis 1, 2 e 3.
Os painéis 1 e 2, localizados respectivamente na lateral que serve de fundo para Emílo e na
que fica atrás da “Banda Viva a Noite”, são imagens de telas de Roy Lichtenstein, um dos
nomes mais reconhecidos, ao lado do de Andy Warhol, do movimento artístico que ficou
conhecido como Pop Art.
Abaixo temos a reprodução da tela “Whaam” (1963), nosso painel 1.

Figura 4: Reprodução da tela Whamm (1963), de Roy Lichtenstein

103
Além de ser mais uma apropriação que o programa faz de produto simbólico já
disponível, a análise da tela pode nos dizer um pouco mais. A Pop Art foi um movimento
artístico que teve início na Inglaterra da década de 1950 e que ganhou força por todo o
ocidente (na época bastante marcado pelo american way of life da cultura popular),
encontrando seu ápice na década de 1960. Seus artistas

discutiram a crescente cultura de massa que se manifestava no cinema, na


propaganda, na ficção científica, no consumismo, na mídia e nas comunicações,
no design de produtos e nas novas tecnologias que se originaram nos Estados
Unidos, mas que então se espalhavam por todo o Ocidente. (Dempsey, 2003)

Suas obras, ainda segundo Dempsey (2003), incorporaram técnicas como a


colagem, a repetição e o excesso, tendo um forte caráter de paródia. Se alimentavam,
principalmente, de objetos cotidianos, de produtos dos meios de comunicação de massa e
de demais objetos produzidos industrialmente. A tela de Lichtenstein que mostramos é
uma paródia clara do estilo e dos motivos e temáticas das histórias em quadrinhos.
Gostaríamos de ressaltar que, além de ser fruto de uma paródia, ela também expressa
agressividade e destruição, com um avião atacando e explodindo um outro avião (a Pop
Art também está ligada ao período do pós-guerra). Reapropriação de reapropriações com
temática ligada à cultura de massa, à destruição e à agressividade, este painel que compõe
o cenário do Pânico na TV nos parece bastante apropriado para os seus propósitos.
A imagem utilizada como painel 3, o que cobre o fundo da platéia 2, e que fica na
lateral direita de Emílio, é também interessante e está representada na imagem a seguir.

Figura 5: Foto painel 3 do cenário do programa

104
É uma imagem84 que retrata, justamente, uma platéia, fazendo com que a platéia 2
do programa receba uma continuidade quase infinita. Prestando atenção à platéia da
imagem, percebemos que, pelo preto e branco da foto e pelas vestimentas e penteados de
seus integrantes, trata-se de uma platéia “antiga”. Além disso, é notável o grau de
proximidade entre os indivíduos – que faz com que não vejamos muito mais que seus
rostos – e que estão em grande número. Vemos mesmo uma platéia-massa. Os óculos que
todos levam é igual, reforçando a idéia de agrupamento de indivíduos tornado massa
homogênea e indicando que estão diante de uma tela de cinema, pois são óculos usados em
projeções tridimensionais. A platéia-massa da imagem, que acaba se fundindo com a
platéia do programa, está diante de uma grande tela. Trata-se de um telão cuja moldura faz
com que ele se pareça com uma grande televisão, mais uma vez com ares retrô, como
podemos perceber na imagem abaixo.

Figura 6: Imagem televisão de fundo do cenário do programa

Torna-se interessante notar que a platéia-massa do painel e a platéia do programa –


apresentada, por contiguidade, como massa também – está diante da televisão e, mais
ainda, diante da cultura popular massiva (lembremos que os outros painéis que vêem em

84
Curiosamente, esta mesma imagem ilustra a capa do livro de Defleur e Rokeach (1993) sobre teorias da
comunicação de massa.

105
suas lateriais são as telas de Lichtenstein), de onde o programa busca recursos para, num
processo de reapropriação/intervenção parodístico, construir seu humor.
Outra diferença que o Pânico na TV guarda em relação aos outros programas de
auditório é que ele não tem, como atrações, figuras externas ao elenco do programa
(cantores, atores, calouros etc.), como é comum neste formato. As pessoas que se
inscrevem para ser a platéia, portanto, não vão para assitir presencialmente atrações
diversas (podemos considerar que a interação entre os integrantes do programa durante a
transmissão ao vivo seja uma atração por si só). Também não vão para participar de provas
e ganhar prêmios, outro filão dos programas de auditório (lembremos do Quem quer
dinheiro? de Sílvio Santos, no SBT). Raramente são convocados a algum tipo de
participação, salvo em alguns merchandisings. Parecem estar lá para dar ao Pânico na TV
o ar de programa dominical de auditório. A contrapartida mais atrativa parece ser mesmo o
“estar” na televisão (principalmente para aqueles, ou melhor, aquelas que compõem a
platéia que fica atrás de Emílio).
As atrações que o programa oferece aos telespectadores – e talvez também para a
platéia, através dos vários telões que compõem o cenário – são quadros e esquetes
gravados e editados, que normalmente são apresentados como “matérias”, além daquilo
que o elenco “encena” no palco. Como já dissemos, os quadros e esquetes podem não
respeitar uma regularidade. Alguns aparecem em apenas uma edição, outros podem
aparecer com o mesmo nome e os mesmos personagens, mas não com a mesma temática.
Porém, pudemos perceber, nas edições que analisamos, algumas constâncias, que podem
nos indicar as propostas mais bem sucedidas do programa e os significados e valores que
garantem a estas propostas sucesso dentre a grade de atrações do Pânico na TV. Para evitar
repetições e para podermos nos ater aos pontos mais relevantes (segundo nossos objetivos)
na análise de cada uma das edições de nosso corpus, seguiremos com uma breve
caracterização dos quadros85 mais recorrentes nos programas analisados86. Antes disso,
apresentaremos uma tabela que mostra a totalidade dos quadros distribuídos por programa
e pelos blocos destes.

85
Estamos considerando quadros, as atrações que não são ao vivo, ou seja, que são gravadas e editadas, ou
simplesmente montadas, e que preenchem a transmissão ao vivo. Sabemos de apenas uma exceção:
recentemente, “Vesgo e Sílvio” entrou no ar com um link ao vivo da porta da festa de 80 anos de Hebe
Camargo.
86
Quadros que apareceram em apenas uma edição receberão caracterização geral quando da análise da
edição específica.

106
Quadros dos Programa 1 Programa 2 Programa 3 Programa 4
programas 1º 2º 3º 4º 5º 1º 2º 3º 4º 5º 1º 2º 3º 4º 5º 1º 2º 3º 4º 5º
Guevara News
E o Kiko?
TV Fama
Alunos de 5º
Bola Visita
Dô Num Dô
Vesgo e Sílvio
Baixas Horas
Homemgafone
Charadex
Vô Num Vô
Meda
Mônica Veloso
Dengue
Meu Mico
Xaxala e Cirilo
Mister Gay
Tropa de Elite
Tabela 3: Distribuição dos quadros por programa e por bloco.

Os quadros mais recorrentes, em ordem de número de edições em que aparecem,


são:

- Vesgo e Sílvio:
Presente nas quatro edições analisadas e como atração do Pânico na TV desde sua
estréia, parece ser mesmo o carro-chefe do programa: responsável por seus picos de
audiência (como no dia em que ficou a apenas 1 ponto da líder Globo, quando
conseguiram fazer Galvão Bueno dançar a “Dança do Siri”) e pelas “campanhas”
de maior reverberação junto ao público (como a própria “Dança do Siri” e “As
Sandalhas da Humildade”, por exemplo) . O quadro tem como temática principal o
“anti-colunismo social”, como definiu Surita, através das paródias satíricas de
programas como o de Amaury Jr., também da Rede TV. Algumas vezes não
apresentam esta temática, e suas “matérias” cobrem curiosidades mundo afora –
como o Festival da Tomatina e a Corrida de Touros, ambos na Espanha – ou são
dedicadas a campanhas específicas como a que perseguiu Sílvio Santos (o
verdadeiro) em busca de uma autorização para que Wellington Muniz o imitasse87.
No entanto, suas matérias costumeiras são gravadas nas portas de festas de

87
Campanha que cumpriu seu objetivo. Wellington Muniz, o Ceará, é a única pessoa que pode imitar Sílvio
Santos na televisão. Todos os outros imitadores foram proibidos de fazê-lo por um impedimento legal que o
Sr. Abravanel conseguiu junto à justiça.

107
celebridades, festivais e premiações diversos, festas de estréias ou encerramento de
telenovelas da Rede Globo, entre outros lugares com concentração de famosos.
Nestes eventos, para os quais quase nunca são convidados ou estão credenciados
como imprensa, a dupla tenta sempre furar o cerco de seguranças ou pedir
permissão para entrar junto ao responsável pelo evento e, às vezes, consegue. As
abordagens que fazem aos famosos se pretendem constrangedoras, na promessa
constante de desconstruir seus status de celebridade. O quadro se alimenta da
exploração da figura dos famosos e, quase sempre, também das figuras comuns que
se aglomeram nas portas dos eventos para verem os famosos.

- Charadex:
Apesar de presente em três das quatro edições analisadas, e na maioria dos blocos
destas edições, é menos uma atração e mais um recurso que parece tentar assegurar
a continuação da audiência de um bloco a outro do programa. Trata-se de uma
animação, no melhor estilo tosco do programa88, em que a ilustração de uma figura
(inspirada no vilão “Charada” das histórias de “Batman”) narra uma situação e
lança uma pergunta: “Qual o nome do filme?” (ou do livro, ou da cidade, ou do
programa etc.) no final de um bloco. A resposta, claro, será dada no início do bloco
seguinte. Pergunta e resposta se pretendem como uma piada. Mais uma vez o tosco
entra em cena. São piadas pouco elaboradas, às vezes mesmo nonsense. Vejamos
um exemplo.
No final de um dos blocos que analisamos temos:

Locução em off: Charadex. U-huhu. Uma mulher religiosa precisa colocar três
supositórios em três bebês trigêmios. Um em cada um. Ela coloca o supositório
no primeiro bebê e o telefone toca. Ela sai para atender o telefone. Quando volta,
ela não sabe mais em qual bebê ela já colocou o supositório. Pergunta: Qual o
nome da freira? A resposta você fica sabendo em instantes, depois dos nossos
comerciais.

No início do seguinte temos:

Locução em off: Charadex. Recapitulando ... (a estória é repetida). Resposta:


Madre Tereza de Qualcuta. Ha! Ha! Ha!

88
A ilustração é quase estática, os poucos movimentos parecem mecânicos (como o abrir e o fechar da boca
no personagem que nos fala); a imagem está como que em baixa resolução; os elementos que ilustram a
estória narrada são pouco elaborados (formado por poucos traços e com uma cor só).

108
A risada estridente do Charada vai se misturando com a risada exagerada,
nitidamente falsa, dos apresentadores no palco que, com cinismo, deixam marcas
de uma ironia em que a vítima parece ser o telespectador no desvelamento do quão
idiota foi o artifício usado para tentar garantir a continuidade de sua atenção. Esse
desfecho nos pareceu mais potente na capacidade de gerar comicidade e, portanto,
cumplicidade com o público, do que o quadro em si. Em uma das edições, após a
resposta de um Charadex, Emílio Surita diz, com um sorriso sarcástico: “Ai, ai. Um
dia eu vou contar [para o público] quem faz isso [o quadro] aqui. Um dia eu vou
contar.”, deixando claro a idéia de que seria vergonhoso que se ficasse sabendo
quem cria estas piadas e gerando uma promessa junto aos espectadores.

- Vô Num Vô:
Quadro presente em três das edições analisadas, em que Mendigo e Mano
Quietinho vão às praias brasileiras fazer o que o programa chama de “um
verdadeiro censo”. Trata-se de avaliar, classificar e marcar as mulheres com três
adesivos: “Vô”, para as consideradas bonitas de rosto e de corpo; “Num Vô”, para
as que estão fora do padrão estabelecido pelo quadro (geralmente são senhoras de
mais idade ou mulheres acima do peso); e “Camarão”, para as feias de rosto e
“gostosas” de corpo. Existe ainda um quarto adesivo: o de “Guerreiro” para
namorados e maridos das mulheres “Num Vô”. As falas dos personagens são
repletas de ambiguidades que se abrem para conotações obscenas ou sexuais e as
mulheres “Vô” são tratadas como animais de raça com interjeições como “olha a
linhagem” e com comandos como “dá a pata”. A “pata” é pedida para que elas
sejam conduzidas para a “voltinha da alegria”, um rodopio que permite à câmera,
quase sempre em close, captar imagens de suas “lombas”. Se alguma escolhida
impõe dificuldades à “voltinha”, os apresentadores argumentam: “dá a voltinha,
dá... pra subir nossa audiência”. Quase sempre que a escolhida aceita iniciar a
conversa com a dupla, a “voltinha” acontece. Elas recebem em troca a
televisibilidade. Existe também a expressão “toma, toma, toma” que, em conjunto
com um efeito de edição em que luvas de boxe batem nos rostos dos
apresentadores, é usada quando alguma mulher abordada se nega, rispidamente, a
assumir o papel que o quadro tenta lhe impor. Mas, enfim, o que temos é um

109
festival de exposição de corpos femininos em trajes de praia. O quadro surgiu em
2007 e já não existe mais.

- Meda:
Também presente em três edições, este quadro, apresentado por Christian Pior e
Robaldo Ésperman, surgiu no programa em 2007 e é uma de suas principais
atrações até hoje. A temática do quadro é marcar, com bastante afetação por parte
dos apresentadores, a diferença entre ricos e pobres. Para isso, ou são mandados
para festas mais populares e de periferia – como um baile technobrega na periferia
de Belém do Pará, ou a “Festa do Racha” em Parelheiros, na periferia da Grande
São Paulo – ou para festas de ricos e famosos, bem como a lugares que estes
frequentam – como a Rua Oscar Freire, em São Paulo, e Ibiza, na Espanha. No
primeiro caso, fazem questão de demostrar descontentamento. Aproximan-se da
câmera, como se fossem estabelecer contato direto com alguém, e pedem para
Emílio tirá-los dali. O quadro se resume, nestas siturações, à humilhação e
comentários depreciativos sobre o comportamento e as roupas dos “pobres”
frequentadores com frases como: “olha isso gente... esse visual ‘eu ganho menos de
trezentos reais por mês’”. Mais uma vez temos a exploração da figura dos comuns,
principalmente dos que se sujeitam à interpelação dos apresentadores que têm
como moeda de troca a televisibilidade. No segundo caso, a demarcação da
diferença se dá por falas como: “Estamos em Ibiza, bem. Na Europa. Lugar que
você nuuuuunca vai conhecer. Ibiza é uma ilha, só se chega de avião ou iate. Não
dá pra chegar de ônibus não.” Quando estão “cobrindo” o universo dos ricos e
famosos o tratamento varia: ora glorificam uma figura e o provável (alto) preço de
sua roupa, por exemplo, ora os criticam com comentários venenosos.

- Baixas Horas:
Paródia do programa Altas Horas, da Rede Globo, este quadro apareceu em duas
das edições de nosso corpus e é apresentado por Serginho Gosma, que imita os
bordões, como "Fala garoto! Fala ga-ro-ta!", e os maneirismos, como bater com a
ficha do programa na câmera, de Serginho Groisman. Além dele, participa do
quadro o Xupla, que imita o jeito de Supla se vestir e falar, como a repetição da
expressão "totally crazy" e o uso exagerado de outros termos em inglês. O quadro

110
consiste em ir a festas e bailes populares, denominados “baladas”, e acompanhar
Xupla na "conquista do coração" das mulheres mais “fora dos padrões de beleza do
mundo globalizado” (segundo palavras de Emílio Surita em uma locução para o
quadro) que ele encontrar. O ponto alto são os beijos longos e ardentes que Xupla
dá nas escolhidas, editados em câmera lenta e com românticas melodias.
Ironicamente, o programa sugere que a proposta do Baixas Horas é dar vez às
“barangas”. Porém, de novo estamos com a temática da exploração da figura dos
comuns que, desta vez, além da televisibilidade, ganham um beijo na boca. O que
parece ter trazido sucesso ao quadro é a coragem, a “falta de noção”, ou, enfim, a
negação de limites, do Xupla em “pegar” as mulheres que ele beija. Isso é
anunciado ao longo dos programas com falas de Emílio tais como: “Vocês não vão
acreditar no que o Papito Xupla pegou na balada de hoje. Sem noção...” (grifo
nosso). Este é um quadro que figurou como atração do Pânico na TV somente no
ano de 2007.

- Meu Mico Mico Meu


Presente em metade das edições analisadas, é um quadro de oportunidade. Não é
constante na programação, já que depende de “matéria-prima” específica. Trata-se
da publicização de erros ou gafes cometidos por algum apresentador de algum
programa de outras emissoras (preferencialmente da Globo). Telejornais e demais
programas ao vivo são o terreno mais propício para que estes “micos” aconteçam.
A duplicidade que a sonoridade do nome do quadro tem – “meu mico mico meu”
ou “meu mico me comeu” – explicita bem o propósito da atração, além de se abrir a
conotações de cunho sexual que parece tanto agradar ao programa (e
provavelmente a seu público). O interessante é que o erro publicizado não é apenas
retransmitido, ele vai sendo narrado e enquadrado pelo programa, como veremos
em um exemplo de uma das edições.

- Dô Num Dô
Em um movimento de paródia de si mesmo, o Pânico na TV apresentou esta
atração em duas das edições analisadas. Trata-se da versão do “Vô Num Vô” que,
segundo Emílio Surita, provaria que o programa que “tem sido chamado de
machista”, quer atender a todos os públicos: mulheres e homossexuais, no caso. Ao

111
lado de Christian Pior, oscilaram como também apresentadores do quadro Sabrina
Sato e Robaldo Ésperman. A dinâmica é a mesma: avaliar, classificar e marcar com
um adesivo homens “Dô” e homens “Num Dô”. No entanto, apesar de dar a
entender que se trata de procurar por corpos masculinos, poucos são de fato
mostrados. Um terceiro adesivo, com a classificação ‘Xô’, é usado para marcar as
mulheres bem avaliadas e que podem fazer concorrência, na procura por homens,
aos apresentadores do quadro. Assim como no “Vô Num Vô”, esta atração se ocupa
quase que inteiramente em exibir mulheres de biquini. O “Dô Num Dô” também
surgiu em 2007, na esteira do sucesso do “Vô Num Vô”, e já não existe mais.

- Homemgafone:
Também presente em duas edições, o quadro consiste em dois homens (não fazem
parte do elenco base e não são identificados) que, equipados com megafones, saem
pelas ruas incomodando as pessoas que encontram. Gritam, assustam, imitam sons
de animais, oferecem narração para as atividade em execução, impedem que
alguém escute a conversa que estava tendo ao celular ou no orelhão. O objetivo do
incômodo parece ser gerar a reação agressiva dos incomodados, o que não é raro de
acontecer. Uma mulher que estava ao celular, por exemplo, virou-se e agarrou pela
roupa um dos “homemgafones” enquanto gritava: “Eu sou médica, estou
conversando com uma paciente. Quer fazer o favor de parar de encher o saco!”.
Enfim, a temática do quadro parece girar em torno da curtição a qualquer custo, ao
dar-se o direito de incomodar o outro89 por pura diversão.

- Bola Visita:
Mais um quadro que parece guiado pelo mesmo valor do Homengafone: a diversão
inconsequente às custas do incômodo do outro. O que marca a diferença, no
entanto, é que o outro incomodado é sempre uma celebridade. Paródia mista do
Gordo Visita, programa de entrevistas de João Gordo na MTV, e dos programas de
Athayde Patrese90, o “Bola Visita” seguiu uma estrutura padrão nas duas edições

89
Mas, diferentemente de outros quadros descritos, aqui não poderíamos dizer tanto de exploração da figura
do outro, já que este outro quase sempre aparece com a face protegida por um borrão, sinal de que não deram
permissão ao programa de exibir a sua imagem.
90
“Athayde Patrese se dedicava à cobertura do mundo das celebridades e ficou conhecido por utilizar um
microfone de ouro e pelo bordão ‘Simplesmente um luxo’. No SBT, apresentou o programa ‘Ricos e
Famosos’ e atualmente ia ao ar pelas TVs Comunitária (UHF) e Milênio (TVA) com o programa ‘Athayde

112
em que foi apresentado. Bola – trajado de forma muito elegante, tendo jazz como
trilha sonora, chegando numa limusine e levando caros presentes para o pretenso
entrevistado – tenta visitar a casa de um famoso; toca o interfone; é informado que
o entrevistado não está e que ninguém sabe de entrevista alguma; não é, portanto,
recebido, e prepara uma vingança. Nas edições analisadas, os famosos foram o
fotógrafo J. R. Duran e Galvão Bueno. Para o primeiro, a vingança foi abrir, usando
uma motoserra, um buraco no portão de madeira da casa. Para o segundo, um trio
elétrico tocando no volume máximo foi estacionado na frente de sua casa. Não
sabemos se tudo isso é combinado, mas Bola tenta mostrar que não. Mais uma vez,
um elogio à estupidez e à inconseqüência em nome da diversão. Bola termina o
quadro fugindo em altas gargalhadas.

A distribuição destes quadros, assim como a das demais atrações esporádicas e


pontuais (geradas a partir de assuntos que concentravam a atenção pública na época das
edições), pelos blocos do programa mostrou uma organização mais ou menos recorrente91.
Não nos esqueçamos de que o Pânico na TV é, como nos alerta Adorno com o conceito de
forma-produto, um bem industrial seriado e que faz uso desta recorrência para ser possível
(e rentável) a sua atualização a cada programa. No entanto, não é nossa proposta sufocar
nosso objeto por suas conformidades, mas estar atento tanto às conformidades quanto às
dissonâncias e tentar refletir sobre o que elas podem nos dizer.
Todos os programas de nosso corpus têm cinco blocos, sendo que as atrações mais
importantes do programa (mais alardeadas ao longo dos primeiros blocos e de maior
duração) se concentram no quarto bloco. O que nos indica tratar-se de uma estratégia para
segurar a audiência. Mas aqui percebemos uma particularidade: o quarto bloco é
desproporcionalmente maior do que os demais, tem quase duas horas no Programa 1, por
exemplo. Vejamos as durações92 na tabela a seguir:

Patrese, o Repórter’.” Segundo a seção Ilustrada da Folha Online em nota sobre a morte do apresentador.
Disponível em <http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u58435.shtml>. Acessado em 30 de julho
de 2008.
91
O Anexo 1, na pg. 184, traz as estruturas, durações e partes de cada um dos quatro programas analisados.
92
Consideramos para esta análise tudo o que apareceu desde que a emissora fez a transição do programa
anterior – o Bola na Rede – até a transição para o programa seguinte – Donas de casa desesperadas. Estas
transições são feitas por uma animação institucional, que mostra a logomarca da Rede TV.

113
Programa 1 Programa 2 Programa 3 Programa 4

Oferecimento 00’20’’ 00’20’’ 00’25’’ 00’25’’

Vinheta 00’20’’ 00’20’’ 00’20’’ 00’20’’


o
1 Bloco 06’00’’ 04’20’’ 06’21’’ 06’53’’

Intervalo 1 05’25’’ 05’25’’ 05’15’’ 04’55’’


o
2 Bloco 05’45’’ 05’20’’ 11’20’’ 07’45’’

Intervalo 2 05’20’’ 05’20’’ 05’17’’ 05’05’’


o
3 Bloco 11’35’’ 08’40’’ 12’05’’ 08’56’’

Intervalo 3 05’20’’ 05’35’’ 05’05’ 05’00’’


o
4 Bloco 1 45’00’’ 1 34’00’’ 1 25’26’’ 1 37’38’’

Intervalo 4 05’10’’ 05’25’’ 05’25’’ 04’40’’


o
5 Bloco 05’00’’ 06’32’’ 05’18’’ 05’42’’

Oferecimento 00’20’’ 00’20’’ 00’25’’ 00’25’’

TOTAL 2 35’35’’ 2 22’17’’ 2 23’22’’ 2 31’14’’


Tabela 4: Estrutura e durações dos programas
O quinto bloco das edições analisadas parece existir apenas para se criar a
possibilidade de um quarto intervalo comercial. Pouco acontece além de uma fala de
despedida de Emílio Surita. Os primeiros blocos se mostraram interessantes para nossa
análise. Todos os programas começam com uma tomada aérea da platéia na penumbra,
com alguns feixes de luz azuis e vermelhos em movimento, como que em uma boate. No
canto superior direito vemos a logomarca da Rede TV! e a palavra “vivo”, indicando que o
programa é ao vivo, condição sine qua non para tornar crível o valor de espontaneidade
que o programa tanto presa. Com a mesma iluminação, a imagem captura, em um close
que percorre dos pés à cabeça o corpo de Tânia Panicat que, de salto alto e maiô, dança se
insinuando para a câmera e faz a saudação do Pânico na TV, com um texto curto e
nitidamente pré-redigido93. Não é dado a ela autonomia para se dizer o que quiser.
Consideramos esta saudação como uma convocação inicial, que traz marcas da proposta
geral do programa, tanto na imagem (a exibição do corpo feminino) quanto no texto. É
durante esta convocação que vemos a tarja de recomendação (ou melhor, de não
93
A estrutura da convocação inicial se mostrou a mesma em todas as edições. Destaca-se a idéia do ao vivo,
do diretamente, como que sem mediação (lembremos que, neste momento do programa, a logo da emissora
com a expressão ao vivo embaixo aparece), e com isso a possibilidade do espontâneo, a idéia daquilo que
pode escapar ao controle, enfim, de descompromisso. Outro aspecto interessante na estrutura das
convocações iniciais é que elas sempre caracterizam o programa a partir daquilo que ele não é, mas com o
que guarda alguma semelhança. O caráter parodístico de sua proposta e a atitude da negação para se marcar
uma identidade se fazem presentes. Vejamos um exemplo: “Baranguinhos e baranguinhas, diretamente dos
estúdios da Rede TV!, vai começar agora o programa que não é pára-quedas, não é asa-delta, mas passa
voando. A partir de agora está no ar o Pânico na TV!”. As partes sublinhadas são as que sofrem alterações de
uma edição para a outra.

114
recomendação) que avisa sobre a linguagem depreciativa e o erotismo do programa.
Acreditamos que este aviso, que pode de fato funcionar como não recomendação para
alguns, pode ser altamente atrativo para outros. Na seqüência, a Banda Viva a Noite
performa, ainda à meia luz, a música tema do programa. Trata-se de uma batida agressiva
de um rock pesado e a repetição das frases:

Eu quero ver o Pânico na TV. Você vai ver o Pânico na TV. Vai começar o
Pânico na TV. Está no ar o Pânico na TV.

Enquanto a banda toca, a imagem, como em um videoclipe, vai se alternando


rapidamente entre cenas em close dos músicos e de seus instrumentos (como, por exemplo,
as mãos e as baquetas do baterista em ação), em imagens que se movimentam
desorientantemente em zoom in e zoom out, do elenco do programa que dança animado e
entre closes dos corpos da Mulher Samambaia, de Tânia e das demais Panicats. Sobre estas
imagens, aparecem também umas tarjas que têm a logo do programa no canto esquerdo e
espaço para a entrada de textos (frases, na realidade). A primeira que aparece é sempre
uma que diz: “O Pânico está no ar!!!”. Outra, ou outras, também aparecem com frases que
reportam curiosidades nonsense. Aparentemente sem razão de existir, percebemos nessas
tarjas a tentativa de se agregar ao programa idéias de absurdos, de coisas sem muito
sentido, e, mais ainda, de global. Em todas estas tarjas que analisamos, temos o nome de
um país (ou alguma coisa típica que o represente) ou uma nacionalidade expressos94.
A música acaba, as luzes se acendem e Emílio, o apresentador principal do
programa, toma a palavra para fazer a sua saudação inicial. Na sequência da saudação, o
apresentador elenca as principais atrações do programa. Emílio não parece ter texto pré-
definido e, em tom de descontração e bate-papo, tem sua fala invadida por comentários e
complementações, como já dissemos, do Bola e de Sabrina, majoritariamente. Esta fala
inicial de Emílio funciona como um sumário, que já põe em relevo o que o programa
considera suas melhores atrações e, às vezes, o assunto ou temática que vai ser recorrente
na edição. Terminado o sumário, a banda é convocada a tocar novamente a música tema.

94
Vejamos alguns exemplos: “Escocês bate recorde de ressaca após beber 36 litros de cerveja.”;
“Apfelstrudel: 6 maçãs, 1 gema de ovo, 2 colheres de manteiga, sal a gosto.”; “Babuíno solitário vira amigo
de galinha na Lituânia.”; “Dubai min. 25° max. 32°. Quebec min. -01° max. 06°.”; “Experiência em
Oklahoma afirma que elefantes são sensíveis ao L.S.D.”
Além do uso destas tarjas para apresentar estas idéias nonsense-globais, percebemos três usos básicos para
elas ao longo dos programas: 1. indicar o que está acontecendo ou qual quadro está sendo exibido no
momento; 2. anunciar atrações que estão por vir; 3. comentar depreciativamente alguém que está em cena,
mesmo que seja um dos integrantes do programa.

115
Outro tipo de sumário também é apresentado no primeiro bloco95.
Desta vez é um sumário editado, cujo texto aparece em locução e cujas imagens vêm das
mais diversas fontes, dependendo das temáticas e quadros postos em destaque. Emílio
Surita se refere a este sumário como sendo a “escalada”.

E agora, queridos telespectadores, vamos ver a nossa escalada, o que você vai
ver daqui a pouquinho aqui no Pânico. Roda, aí.

Assim, no começo do programa (com a convocação inicial, a saudaçnao-sumário de


Emílio e o sumário editado), já temos uma síntese dos quadros, temas e valores que a
edição privilegiará. Analisaremos com atenção estas unidades para cada programa que
integra nosso corpus.
Percebemos também que as edição giram em torno de uma temática, o que confere
a cada uma delas uma unicidade simbólica. Esta temática pode ter fontes diversas:
procedimentos internos da construção do programa, a data da edição ou algum assunto ou
acontecimento que esteja em relevo na pauta pública.
O programa que antecede o Pânico na TV na programação de domingo96 da Rede
TV! é o Bola na Rede. Apresentado por Fernando Vanucci, este programa se resume a uma
bancada de comentadores e de jogadores de futebol apresentando os lances e os gols dos
campeonatos em curso. Marcadamente um programa feito por homens e voltado para o
público masculino. Nos intervalos comerciais deste programa, anúncios da atração seguinte
da emissora (o Pânico na TV) já figuram uma tentativa de se criar um fluxo, mais de
audiência do que de significados, que acaba sendo o efeito indireto. Nestes anúncios, em
que cenas do programa são editadas, tendo como texto tanto uma locução em off quanto
trechos das falas de personagens ou pessoas por eles abordadas, a promessa do que o
Pânico é vai sendo reforçada. Vejamos um exemplo:

Locução:
Hoje. O Pânico na TV apresenta o maior festival de piadas do mundo.

Vesgo (interpelando uma mulher em trajes de festa):


Quem é Castro Alves?

Locução:

95
Com uma exceções: no Programa 2 ele aparece no segundo bloco, como veremos adiante.
96
Já dissemos que uma reprise editada e reduzida do Pânico na TV de domingo vai ao ar às sextas, após o
Superpop de Luciana Gimenez. Porém nossa análise se concentrará apenas nas edições completas e ao vivo
de domingo.

116
Simplesmente Genial.

Vesgo (interpelando a mesma mulher):


Machado de Assis?

Popular (aparentemente um mendigo):


Ô, meu Deus. Ah, que beleza...

Vesgo (ainda diante da mesma mulher):


Há! Há! Há! Há!...

Locução:
Hoje, logo após o Bola na Rede. Este sim é fantástico.

Carioca:
O bagulho é insanidade.

Locução:
Pânico na TV.

Destacamos: a classificação como humorístico genial (“o maior festival de piadas


do mundo”); a forma de “fragmentos colados de se construir o anúncio; a ênfase no quadro
“Vesgo e Sílvio” (o material do programa que mais é usado, intercalado com outros, para a
edição, é Vesgo interpelando e zombando uma mulher, que não teve voz durante o
anúncio); a exploração tanto da figura dos ricos e famosos quanto dos populares ordinários
(a mulher bem trajada e o homem que parece ser um mendigo); a referência à briga pela
audiência entre emissoras (“este sim é fantástico”, sendo o Fantástico da Rede Globo um
programa concorrente do Pânico nas noites de domingo); e o reforço das idéias de
descompromisso e loucura (gíria “bagulho”, adjetivada como “insanidade”, para se referir
ao programa).
Reforçando ainda mais este enquadramento, Vanucci se despede dos
telespectadores do Bola na Rede tentando direcioná-los ao Pânico na TV: “Fique agora
com o Pânico na TV. Vai azucrinar você. Segura aí.”; ou “O Pânico está chegando! Vai ser
uma loucura!”. “Azucrinar” e “loucura” são termos que participam do campo semântico
usado para sedimentar retoricamente o caráter caótico de descompromisso com qualquer
coisa ou qualquer regra que envolvem nosso objeto em sua tentativa de convocar
determinado público. Apesar de já termos citado várias conformidades e regularidades que
constrangem a efetivação da bagunça geral – conformidades estas que são inclusive
condições para que o programa exista –, acreditamos que o seu peso como valor de
agregação em uma promessa deve ser levado em conta.
Pudemos perceber, com tudo isso, que o Pânico na TV, antes mesmo de se atualizar

117
em cada uma de suas edições, é enquadrado de diversas maneiras: pelo seu histórico, por
como é divulgado, pelo que aparece na mídia sobre ele e por aquilo que o público faz
reverberar. O programa é enquadrado também pelas fontes de suas paródias (programas,
figuras ou eventos midiáticos) e pela forma com que elas são apropriadas, resignificadas.
Por fim, recebe ainda enquadramento derivado dos procedimentos rotineiros de se fazer
televisão e, consequentemente, pela sua natureza de produto. Contudo, acreditamos que o
Pânico na TV efetivamente se atualiza em edições singulares que reforçam ao mesmo
tempo em que movimentam estes enquadramentos. Sigamos, então, com a análise do fluxo
que nos leva ao escrutínio de cada uma destas edições.
Após vinheta institucional, utilizada para demarcar o fim de um programa e o início
de outro, é anunciado que o Pânico na TV vai começar. Fazendo uso de um trecho da
vinheta de abertura do programa, uma locução anuncia: “Pânico na TV. Oferecimento:”. A
tela ganha um fundo azulado e uma outra tela, menor, se abre para mostrar cenas dos
anúncios dos patrocinadores que oferecem o programa. Acima desta segunda tela, lemos a
palavra “Oferecimento”. Instigados pela noção de fluxo de Williams (1975), consideramos
válido prestar atenção a “quem oferece”, na medida em que isso pode nos dizer a “quem
está sendo oferecido” e com quais argumentos (não da retórica publicitária propriamente
dita, mas argumentos no sentido de valores que se usa para a convocação). A tabela a
seguir mostra quais anunciantes “oferecem”, ou seja, quais anunciantes são os maiores
patrocinadores de cada edição analisada e que consideram, portanto, que os valores que
geram a vinculação programa-público podem ser compatíveis com os valores que querem
para suas marcas.

Oferecimento Programa 1 Programa 2 Programa 3 Programa 4


Kaiser
Mash
Fanta
TIM Studio
Tabela 5: Distribuição dos oferecimentos por programas.

Oferecendo todas as edições analisadas estão a cerveja Kaiser e as cuecas Mash.


Percebemos estes oferecimentos muito direcionados ao público masculino. O primeiro97

97
Em um bar, um garçon se dirige a uma geladeira que, quando aberta, revela a surpresa: sobre um fundo de
cervejas Kaiser enfileiradas em prateleiras, vemos uma mulher. Vestida de vermelho (a cor da logo da

118
associa diretamente o produto a uma mulher, como se fossem ambos para o consumo. O
segundo98 associa o uso do produto à conquista da mulher.
O anunciante Fanta oferece quatro das edições analisadas. O produto anunciado é
uma edição especial do refrigerante: a Fanta Mundo Tailândia. Neste oferecimento99
pudemos perceber um tom contemporâneo pela estética adotada, e uma convocação a um
público jovem. O caminhar do boneco sobre o globo, à produra das “delícias” do mundo,
nos faz pensar em um tipo de jovem que Bauman (1999) categorizou como “turista”100:
aquele que tem recursos para se deslocar fisica e/ou simbolicamente pelo mundo, numa
cultura marcada pelo nomadismo e por uma ideologia de globalização.
As duas últimas edições analisadas foram oferecidas também pelo TIM Studio, que
convoca os clientes da operadora a criar conteúdo (vídeos, fotos e sons) e postá-lo na
internet. Aqueles cujo conteúdo for utilizado por outros clientes (sob a forma de
downloads) ganha créditos para o seu celular. Este oferecimento101 reforça nossa suspeita
de que o programa se dirige a um público que quer mais do que apenas consumir a
abundante oferta simbólica do contemporâneo: que quer também produzir ou interferir nos
bens simbólicos, dispondo de tecnologia para tal.
Os oferecimentos são de quatro diferentes marcas ou produtos. Porém acreditamos
ser possível agrupá-los em três categorias: associação produto/mulher (Kaiser e Mash);
diversão como valor de um hedonismo contemporâneo (Fanta); e tecnologia de produção e
distribuição de conteúdo (TIM Studio). Parece-nos que estas categorias não se distanciam

Kaiser), decote insinuante, segurando uma Kaiser. Com olhar sugestivo, ela eleva a cerveja à altura de sua
boca e languidamente sopra a garrafa, que, imediatamente adquire aparência de super gelada (esbranquiçada).
A locução diz: “Kaiser, mais que gostosa, surpreendente.”
98
Em primeiro plano, vemos o quadril de um homem que usa uma cueca Mash. Atrás dele, vemos o quadril
de uma mulher com calcinha rendada branca. A mão desta mulher vai deslizando sobre o abdômen do
homem em direção à sua genitália. Na outra cena, também em close, vemos o homem se deitando e sobre ele
a mulher. A locução diz: “Mash. Quem é homem sabe.” A idéia parece ser que o homem sabe que a mulher
vai desejá-lo se ele usar a cueca.
99
Animação cool em que, sobre um universo laranja, um bonequinho (parecido com os da toyart), com ares
de turista (mochilinha nas costas), vai andando pela superfície do globo terrestre até encontrar uma
bonequinha com ares orientais. Ela oferece uma lata (de Fanta) que, quando aberta, libera uma explosão de
bolhas coloridas. A locução diz: “Fanta mundo Tailândia. Com o delicioso sabor laranja com manga.
Experimente.”
100
Bauman (2001) propõe que a divisão entre classes sociais na globalização deveria se dar entre turistas e
vagabundos, estes sendo o alter ego daqueles e privados da capacidade (mas desejosos) de locomoção
geográfica e/ou simbólica pelo mundo que se oferece, ideologicamente, ao alcance de todos pelas novas
tecnologias de comunicação.
101
No centro de uma tela toda branca, um jovem trajando jeans e camiseta preta tenta produzir sons (de
flatulência) levantando e abaixando o braço direito sobre a mão esquerda, posicionada em sua axila direita. A
simplicidade da cena faz parecer ser simples a produção de conteúdo midiático. O conteúdo que o jovem está
produzindo sugere que não precisa ser nada muito genial ou elaborado. A locução diz: “Crie conteúdos para
o TIM Studio. Os downloads viram créditos no seu TIM”.

119
das propostas e dos valores centrais do Pânico na TV.
Após os oferecimentos, segue-se a vinheta de abertura do programa. Acreditamos
que ela, funcionando como um ‘cartão de visita’, pode ser pensada como uma condensação
do que o Pânico na TV se propõe a ser. A vinheta é rápida, tem ao todo 20 segundos, e a
sensação de rapidez é reforçada pelo movimento caótico das imagens, pelo zoom in e zoom
out constantes enfocando partes específicas de cada cena, sempre compostas de muitos
elementos. A trilha e efeitos sonoros também são confusos. A batida é da música Vertigo,
da banda U2. Sobre ela vão sendo sobrepostos o som da risada de Sílvio, o bordão
“Olha!!!” do personagem Gluglu, som de batida de carro, o “É verdade.” de Sabrina entre
vários outros ruídos. Confusão, excesso e referência à Pop Arte marcam nossa primeira
impressão.
Revendo com mais calma (e contando com o recurso da câmera lenta), percebemos
que trata-se da apresentação do elenco/personagens do programa em cenários inusitados,
construídos em estética colagem, com elementos que fogem a uma combinação racional ou
sensata, ‘flutuando’ ao fundo. Muitos destes elementos têm aparência de antigo, estética
retrô. A qualidade da imagem é ruim, granulada, e as cores são explosivas e contrastantes.
Também os personagens parecem colados, são bi-dimensionalizados. Seus movimentos
são mecanizados e seus lábios inferiores e queixos são recortados, como os de marionetes.
Seus olhos arregalados e suas feições parecem ameaçadoras, com exceção das feições de
Sabrina e de Emílio, que estão sorridentes.
Os primeiros a serem apresentados são Vesgo e Sílvio, que flutuam sobre o espaço
sideral entre robôs, aparelhos de TV antigos, foguetes e astronautas. Segue-se a
apresentação de Carioca e Gluglu, que estão em um carro verde, também com aparência de
antigo, dirigido em alta velocidade pelo primeiro, que tira as mãos do volante e faz em si
mesmo chifres de capeta com os dedos. Os próximos a serem apresentados são Mendigo e
Sabrina: ele sentado com uma garrafa de bebida na mão e ela, de joelhos, sobre uma
espécie de sofá e com o torso inclinado sobre um dos braços da mobília (quase “de
quatro”). Bola aparece de açougueiro afiando sua faca, com uma peça de carne à sua
frente, e uma chaleira e um pé de tênis flutuando ao fundo. Por último, o rosto de Emílio
Surita que diz “É o Pânico na TV!” enquanto o campo da imagem vai sendo aberto e
mostra todo o elenco agrupado no palco do programa. Como se a câmera estivesse num
movimento vertical, de baixo para cima, a imagem vai mostrando que eles são mesmo
marionetes e estão sendo controlados pelo diretor da emissora, que aparece numa

120
caricatura e com uma risada diabólica. A vinheta termina com a explosiva logo do
programa.
Destacamos da leitura que fizemos da vinheta: a importância conferida aos
personagens Vesgo e Sílvio (são os primeiros a aparecer); o estilo mal-acabado, a estética
tosca; o descompromisso (objetos múltiplos sempre flutuando); a apropriação de
características atribuídas ao pós-moderno (a colagem, o retrô); e a pretensão de dizer de
procedimentos internos à lógica da TV (o controle nas mãos do diretor da emissora).
Curioso perceber também como a vinheta pode ser pensada como um jogo irônico
em dois níveis. No primeiro deles, mais interno à narrativa da vinheta, o ironista é a
caricatura que personifica o diretor da emissora e as vítimas os próprios integrantes do
programa que “fazem e acontecem”, demonstrando autonomia e liberdade sem limites, e
que se vêem, ao final, comandados. No segundo nível, que inclui a presença de um
observador (o telespectador), os ironistas são os próprios integrantes do Pânico que, em
uma construção auto-irônica, posicionam o observador como a vítima. Levado a acreditar
na autonomia dos integrantes do programa, o observador se vê pego pela auto-ironia do
grupo que se mostra menos livres do que fizeram crer. Esse jogo de indefinição (promessa
– efetivação ou não da expectativa gerada) é marca de uma estrutura eminentemente
irônica com base em que o programa se faz, como veremos em outras situações e
exemplos.
Chegamos ao início da primeira edição de nosso corpus.

4.2. O Pânico na TV nas edições analisadas

Até aqui tínhamos nossa atenção voltada para as características mais gerais do
Pânico na TV, bem como para indícios outros, que estão para além do programa, que
acabam por ajudar a construir um quadro de sentido para nosso objeto. Partiremos agora
para a análise de cada uma das quatro edições, privilegiando aquilo que elas trouxeram de
específico, na maneira como cada uma delas procurou dizer do programa – principalmente
nas saudações e sumários oferecidos nos primeiros blocos – e em suas temáticas
preferenciais.

121
4.2.1. Programa 1: O dia da ganância do departamento comercial e do beijo de Sabrina

O primeiro programa que analisamos teve a seguinte convocação inicial:

Baranguinhos e baranguinhas, diretamente dos estúdios da Rede TV!, vai


começar agora o programa que não é pára-quedas, não é asa-delta, mas passa
voando. A partir de agora está no ar o Pânico na TV!.

Pela forma com que se se dirige ao público, percebemos tratar-se de um público


que não se leva muito a sério e que valoriza, portanto, as brincadeiras e piadas feitas a
partir da depreciação do outro, ainda que este outro seja ele mesmo. No caso específico
desta convocação inicial temos, mais uma vez reforçada, a idéia do descompromisso de um
programa que “passa voando” e não se fixa em lugar algum. A convocação do Programa 1
não mostrou ligação direta com as temáticas que dominaram o programa: a ganância do
departamento comercial da emissora (o exagerado número de merchandisings da edição) e
o beijo de Sabrina Sato. Assim, a convocação parece cumprir um papel mais de
caracterização geral do Pânico na TV.
Os temas da edição, que não apareceu na convocação inicial, aparecem na
saudação-sumário de Emílio Surita:

Muito boa noite, (assovios, palmas e ovação da platéia) queridos telespectadores,


respeitável público, damas e cavalheiros, senhoras e senhores. Hoje um
programa especial. (Bola: Muito.) Christian Pior, Ronaldo Ésperman lá em Ibiza
(Bola: Que beleza!) com as praias de naturalismo. Uma maté... uma festa. Eu
acho que essa festa de Vesgo e Sílvio é uma das melhores (Bola: Boa… boa…
boa…) que você (Sabrina Sato: É verdade.) já assistiu. Marcos Chiesa, o ‘Bola
Visita’. Tem Sabrina Sato pagando seu (Bola: Ai, ai, ai.) castigo! E a maior
quantidade de comerciais (Bola: do mundo) da história da televisão brasileira
(Bola: do mundo). Hoje. (Sabrina Sato: hahaha) Eu tô falando sério (Sabrina
Sato: hahaha) (Bola: vai ser recorde hoje). Presta atenção. (Bola: Se liga) Pode
cronometrar comigo, você vai ver agora a maior (Bola: hahaha) quantidade de
comerciais (Bola: da história) da televisão brasileira. (Bola: Verdade). Ao som
da banda Viva a Noite (Gluglu: Aêêê…!) está começando o Pânico!”

Apesar de cumprir o papel de apresentador principal do programa, quase um


âncora quando lembramos que ele tem uma bancada, Emílio não se limita a fixar os olhos
ou sua fala na câmera, para gerar aquilo que Verón (2001) chamou de “espaço umbilical”
com o telespectador. Além disso, sua fala é muito cruzada por comentários feitos por
outros participantes que estão em cena, principalmente Bola e Sabrina. Às vezes, ele chega

122
mesmo a se virar para eles ou a endereçar-lhes alguma pergunta. O tom de bate-papo
escrachado entre amigos predomina.
Interessante perceber como ele se dirige ao público, nesta edição, num misto de
saudações que vêem de programas de auditório, do circo e até de situações solenes – mix
bem representativo da bagunça que o programa pretende ser. Privilegiados como os
quadros ou as atrações mais interessantes da edição estão: o “Dô Num Dô” Especial em
Ibiza, nas praias de naturalismo (ou seja, promessa de exibição de corpos desnudos); o
“Vesgo e Sílvio”; o “Bola Visita” e o “Baixas-Horas” que levará Sabrina Sato para beijar
“barangos na balada” um dos temas recorrentes ao longo do programa. No final do sumário
ele fala, com ironia, do que vai ser o outro tema recorrente: a quantidade de comerciais e
merchandisings.
Analisemos agora o sumário editado, ou a “escalada” que entra para dizer, também,
das atrações do programa.

Locução em off com entonação exagerada:


Inspire-se nas fortes palavras de Martin Luther King, nos revolucionários
discursos de Che Guevara, no movimento pacifista de John Lennon e prepare-se
para o que você vai ver hoje no Pânico na TV.
Christian Pior, Robaldo Ésperman e o movimento naturalista das garotas de
Ibiza. Direto da Espanha.
Sílvio Santos e os absurdos do ensino médio com ‘Alunos de quinta categoria’.
Vesgo e Sílvio aterrorizando a nata da Rede Glóbulo de televisão no Rio de
Janeiro.
As fofocas do quadro ‘E o Kiko?’ agora cara-a-cara com as vítimas.
E o insuperável castigo de Sabrina Sato: beijar um rapaz acompanhado do Papito
Xupla. Será que ela beija ou não beija?
Tudo isso e muito mais hoje, no primeiro e único programa não aprovado pelo
congreço, com c cedilha, do Brasil: Pânico na TV.

Após buscar a ligação do programa com reconhecidos revolucionários, como se


revolucionário ou “contra-corrente” o Pânico também fosse, o sumário destaca três das
quatro atrações que Emílio apresentou em sua fala inicial, mas: esclarecendo que o
movimento naturalista que o “Dô Num Dô” vai mostrar é o das garotas de Ibiza; deixando
em suspense o desfecho do “Baixas Horas” com Sabrina; e prometendo que Vesgo e Sílvio
“aterrorizaram” a “nata” da Rede Globo. Além destas atrações, a escalada destaca os
quadros “Alunos de quinta categoria” e o “E o Kiko?”, prometendo novamente aterrorizar,
posicionando as celebridades como vítimas. Ao final do sumário, o programa tenta reforçar
a sua inadequação, ‘não tendo sido aprovado pelo congreÇo do Brasil’.
Os primeiros três blocos seguem recheados de merchandisings e com uma ou outra
atração menor. No segundo, por exemplo, tivemos o “Guevara News”, uma atração

123
esporádica, não encontrada em nenhuma outra edição analisada. Uma espécie de noticiário
produzido por computação gráfica, edição de imagens as mais diversas, e locução em
portuñol. Entre as notícias narradas pela animação computadorizada de Che Guevara, o
episódio do roubo do relógio de Luciano Huck:

Esta semana, Luciano Álvares Cabral Huck descobriu o Brasil. Despues de ser
assaltado a mano armada an San Pablo, percebeu que es mucho peligroso andar
com un Rolex de quarenta e ocho mil reais no braço apenas para saber las horas.
Los ladrones alegan que lebaran o Rolex porque o relógio era joinha, joinha.

No terceiro bloco, Emílio, antes de anunciar outra atração esporádica, se dirige a


outro personagem que está em cena. Trata-se de Merchan Neves102 (imitação de Milton
Neves, criticado pelo número de merchandisings que faz em seu programa) e o diálogo é o
seguinte:

Emílio: Merchan Neves, Merchan Neves. (Bola: hahaha) Está gostando do


programa, Merchan?

Merchan Neves: Olha, vocês falavam tanto de mim, meu querido Emílio, mas
hoje, na minha opinião particular, é o melhor programa Pânico desses quatro
anos. Sensacional. Show de merchans.

Emílio: Hoje, bateremos o recorde mundial (Bola: Verdade) de propagandas


(Bola: Verdade) dentro do programa (Sabrina Sato: É verdade. Gente!) (Bola: É
só alegria.) Mas antes. (Bola: Pois não.) (Sabrina Sato: Mas hoje tá demais…tá
engraçado.) Não, daqui a pouco tem muito mais. (Bola: Calma, gente.) Gente,
não sai daí. (Merchan Neves: Pelo amor de Deus.) Daqui a pouco tem muito
mais comercial. Espera aí. Vamos ver ‘E o Kiko?’, mas não sai daí não, hein?
(Bola: Tem mais, tem mais.) Daqui a pouco tem mais. (Sabrina Sato: mas tá
legal.)

O quadro ‘E o Kiko?’, que também não está presente em nenhuma outra de nossas
edições, se fez a partir de uma paródia do programa TV Fama, de Nelson Rubens. Um
humorista do programa, caracterizado como Vinelson Rubens, apresenta sua notícia:

Ok, ok. olha aí, olha aí. Mais notícias ur(-r…)gentes. Essa aí vai deixar(-r…)
muita gente de cabelo em pé. Porque a moça é famosa. É. É sobre Paris Hilton.
Veja. Paris Hilton tem uma nova melhor amiga. É isso aí. É. Desde
pequenininha, Paris Hilton tem várias amiguinhas. E entre as amiguinhas, uma
amiguinha se torna a nova melhor(-r...) amiguinha. Veja. É. Notícia do
momento. Paris Hilton já tem uma nova melhor amiga. Quem foi o filho da pi….
Me jogaram um tomate.

102
Merchan Neves é interpretado pelo mesmo ator que interpreta o Mendigo, personagem com o qual
normalmente está na gravação ao vivo. Porém, para se enquadrar na temática do dia, o ator se apresentou
como Merchan Neves.

124
Neste momento, entra em cena, sobre um fundo como que de um telejornal, uma
figura mal humorada que diz:

Te falar um negócio, viu. Desgraçado esse tipo de notícia. Como é que a gente
pode fazer jornalismo nesse país, né? Acha que a melhor amiga de Paris Hilton é
notícia? E aí eu te pergunto, e aí que eu te pergunto: E o kiko? E o Kiko? Pode
ser o Kiko do Chaves. Pode ser o Kiko do KLB. Pode ser Kiko Zambianchi. O
que que eu tenho a ver com isso? Ah, vai se lascar.

Este quadro paródia do TV Fama ironicamente satiriza os programas de colunismo


social e de fofocas sobre celebridades, associando-os a assuntos bobos e posicionando-os
distante do que seria o “jornalismo de verdade”. Satiriza, com isso, a necessidade
compartilhada socialmente de reverenciar figuras famosas, acompanhando até mesmo
acontecimentos insignificantes em suas vidas. Satirizam, enfim, uma sociedade altamente
midiática que fez da televisibilidade – e da reverência aos televisíveis – um valor.
Dando continuidade ao terceiro bloco, Emílio Surita chama mais um intervalo
comercial. Mas se mostra enganado e modifica o conteúdo de sua fala, convocando mais
um merchandising. Isso reforça a idéia de que o programa é feito na bagunça, de que nem
mesmo o apresentador sabe muito bem o que está para acontecer. Após o merchandising e
para encerrar o bloco, mais uma ironia:

Emílio: E agora. (assovio) O momento que o telespectador estava tanto


aguardando. Agora sim, Merchan Neves.

Merchan Neves: Faço questão, meu querido Emílio Surita. Vamos faturar, vamos
ganhar dinheiro, vamos falar com os nossos patrocinadores, vamos ganhar muito
dinheiro. Roda o break comercial, meu filho. Roda, sua anta.

O quarto bloco, desproporcionalmente maior que todos os outros (1 hora e 45


minutos de duração), reuniu as principais atrações do programa, o tele-leilão103 que
promove e, claro, alguns merchandisings.

Hoje você está acompanhando pela primeira vez na televisão brasileira. É tipo
um Teleton. (Gluglu: Exatamente.) É um recorde de números de ações
publicitárias na televisão brasileira. Nós queremos ver o departamento comercial
no final do ano (Bola: Milionário) todos eles andando de carro importado (Bola:
Porque vão vender assim lá no inferno!) e helicóptero.

103
Trata-se do “Lance Perfeito” uma espécie de leilão em que os telespectadores, através de ligações
telefônicas ou de mensagens de celular, enviam os seus lances. O prêmio deste tele-leilão é sempre um carro
e, a cada domingo, vence quem houver enviado o menor lance único.

125
E com essa discussão de assuntos aparentemente internos e desordenados, uma das
grandes atrações – classificada por eles como ‘matéria’ – da edição é anunciada. Trata-se
de uma paródia do TV Fama104, como o ‘E o Kiko?’, mas só que agora “cara-a-cara com as
vítimas”, como foi descrito no sumário do início do programa. Vinelson Rubens, Insônia
Abrão e Andréa Camparete105 abordando celebridades em uma festa promovida por uma
revista famosa (não dizem qual).
No próximo quadro, “Alunos de quinta”106, temos uma paródia de um programa do
SBT107. Este quadro não é constante na estrutura do programa e só foi exibido nesta
edição. Dele, achamos interessante citar a apresentação que Sílvio faz, criticando os
programas do SBT:

Estamos aqui para copiar mais um programa americano que eu trouxe de avião
através do aeroporto do Galeão. Porque você sabe que eu estou sempre
ressuscitando a televisão. Você sabe, tchurururu tô louco pra te ver, que o SBT
está copiando. Eu só tenho programa do passado, programa velho, do arco da
velha, do tempo que o guaraná tinha rolha. E no momento você vai ver vários
programas ressuscitados, tipo o programa ‘Tanta azia’, o programa ‘Coqueteta’,
o programa ‘Peão da casa imprópria’, e a novela ‘Currossel’. Eu só não faço de
novo o programa ‘Show de Calouros’ porque metade dos jurados já foi pra cova,
haha, hihi.

A participante do quadro é Nana Gouveia, celebridade carnavalesca, que deverá


competir com os “alunos de quinta categoria”, respondendo a perguntas de conhecimentos
gerais. O quadro tenta posicioná-la no estereótipo da mulher bonita e burra. Quando a
participante está sendo apresentada, Sílvio pede para que a produção mostre fotos de Nana
na escola. Aparecem, então, imagens da famosa em seus sumários trajes em desfiles de
escolas de samba.
Ao final do bloco, uma seção de anúncios antigos volta a tratar de um dos temas
preferidos de Emílio Surita no dia: os anúncios de merchandisings. Esta seção é assim
apresentada:

É… Ah, sim. O público está ligando para este programa. Você sabe que o
telespectador está sentindo falta de mais comerciais. (Merchan Neves: Eu já
estava passando mal, eu tô sem ar, eu preciso de comercial, pelo amor de Deus)
E é o seguinte. Nós já tivemos uma carga… hoje foi o maior número de tele-

104
Este quadro ocupou 07’50’’ do quarto bloco e só integrou o Programa 1 de noss corpus.
105
Este personagem não foi visto em outras edições que analisamos e também não foi interpretado por
alguém do elenco constante do Pânico na TV. Trata-se de um homem que, vestido com exagero e afetação, se
comporta de maneira afeminada e assume o nome de uma mulher, mesmo não estando travestido.
106
Este quadro ocupou 07’47’’ do quarto bloco.
107
Trata-se do Eu sou mais esperto que um aluno da quinta série.

126
comerciais da televisão (Merchan Neves: Um recorde!) mundial. Mas, como o
telespectador está reclamando que está faltando merchan e comercial para o
Pânico, nós fizemos uma seleção de comerciais de produtos que já não existem
mais só para atender você telespectador e a ganância do nosso departamento
comercial. Então nós vamos fazer agora uma série de comerciais que você vai
acompanhar, você em casa que gosta tanto.

Quando termina a seção de comerciais antigos, Emílio conclui:

Muito bem. Eu lembro que já são produtos que não existem. Mas nós estamos
aqui simplesmente para rodar comercial, fazer merchan. (Sílvio: Roda, roda…) É
um shoptur da tv. (Merchan Neves: Faz parte.)

O quinto bloco, o de encerramento, traz apenas mais um merchandising e a fala


final de Emílio:

Muito bem. Vamos encerrar o programa Pânico de hoje (assovio) agradecendo


você, agradecendo a todos os telespectadores. Eu peço desculpas se o começo do
programa foi muito estendido, mas infelizmente são coisas, são coisas impostas a
esse programa. Nós gostaríamos que fosse melhor dividido, certo? Mas mesmo
assim muito obrigado pela audiência. Quem quer camiseta? (Bola: Aêê…!)
(platéia: gritos e assovios) Vai pra você! Vai pra você! Banda Viva a Noite.
Obrigado. Valeu.

A temática da ganância do departamento comercial da Rede TV! (relacionada ao


desvelamento de lógicas internas da produção televisiva), pela recorrência e, portanto, pelo
tempo que ocupou do programa, acabou por se tornar uma atração. Das outras atrações que
foram destacadas no início do programa, percebemos que as atrações esporádicas (“TV
Fama” e “Alunos de Quinta”) e o quadro “Bola Visita” ocuparam mais ou menos o mesmo
tempo no programa: algo em torno de sete minutos.
As atrações que parecem ter lugar fixo na grade do Pânico, e que são anunciadas
tanto no início quanto ao longo do programa, como “Vesgo e Sílvio” (15’48’’) – com a
promessa de que iriam “aterrorizar a nata” da Rede Globo – e “Dô Num Dô” (14’52’’) –
com a promessa de exibição de corpos femininos em Ibiza, onde é natural a prática do
topless –, ocuparam praticamente o dobro daquelas.
O quadro mais alardeado pelo programa foi o “Baixas Horas”, nesta edição levando
Sabrina Sato para beijar “barango na balada”, que ocupou 22’40’’, e se tornou a temática
secundária da edição. Parte deste tempo mostrou uma, no mínimo bem encenada, briga
entre ela e o Bola, que se irritou com o tempo que ela estava demorando para “beijar o
cara”. Neste momento, uma tarja aparece dizendo: “Aproveitem o making of...”. Ao final,
o beijo aconteceu. O tom do quadro, como vimos, é a exploração e ridicularização de

127
pessoas comuns, que ganham em retorno a televisibilidade e, às vezes, um beijo. Quando o
programa volta para o estúdio, a atração continua. Sabrina se mostra encabulada e Emílio
diz:

Sabrina Sato, você é responsável pelos mais memoráveis momentos do Pânico


na TV. (Sabrina: Eu continuo acreditando no amor viu, gente?) Mas querido
telespectador, o programa não poderia ficar apenas desta maneira. Eu acho que
no calor desse beijo ficou uma grande saudade. (Sabrina: O quê?... Ah, não,
Emílio...) Senhoras e senhores, (Sabrina: Emílio...) ele está aqui. (Sabrina: Não,
não, não, gente...) para beijar ao vivo (Sabrina: Se ele entrar por ali eu vou sair
por ali) Pode entrar no palco.

Sabrina foge em direção à platéia. Outros integrantes do programa, que também


aparentam não saber que isso estava planejado, gargalham. Entra no palco o “agraciado”
da atração. O segundo beijo não acontece. Temos apenas uma declaração de amor, a que
Sabrina responde que “seu coração bate por outra pessoa”.
Para concluir, explicitação de procedimentos internos à lógica da TV, promessas de
abordagens aterrorizantes a celebridades, exposição de corpos femininos e ridicularização
de populares deram o tom ao nosso Programa 1.

4.2.2. Programa 2: O dia da Playboy de Mônica Veloso

Bonitinhos e bonitinhas, diretamente dos estúdios da Rede TV! vai começar


agora o programa que não é horário de verão mas faz você perder a noção das
horas. A partir de agora está no ar o Pânico na TV!

Esta convocação, assim como a do primeiro programa, não está relacionada com o
que vai ser a temática recorrente da edição. Ela tem caráter mais factual, uma vez que faz
referência ao horário de verão no primeiro domingo em que ele entrou em vigência no ano
de 2007. Porém, e a partir disso, a convocação faz uso do factual associando-o à
capacidade que o programa tem de entreter ou de confundir, de fazer perder a noção das
horas.
O tema da edição, o assunto a que sempre se referiam ou anunciavam que “já...já...”
os telespectadores veriam, fica guardado para o final da saudação-sumário de Emílio Surita
e é também factual. Vejamos:

Muito boa noite, (assovios, palmas e ovação da platéia) querido telespectador.


(Bola: Aê!...) Muito obrigado a vocês. Muito obrigado a vocês, Muito obrigado a
você. Hoje um programa magnífico, eu diria. (Bola: Ótimo.) (Sabrina Sato:

128
Sério?) Vocês vão ver a Festa de Canela. Vesgo e Sílvio descobriram um novo
gás. (Bola: Que que é isso?!) Você vai ver como os cantores estarão se
apresentando hoje aqui no Pânico. (Bola: ai, ai, ai…) Tem o Baixas Horas.
(assovio) Mendigo e Quietinho acabaram de chegar de Búzios. (Bola: beleza,
hein?) As garotas de Búzios nesse final de semana prolongado. Um Vô Num Vô
inédito muito bacana. E o presidente aqui está. (assovio) Ele foi conferir o
lançamento da revista de Mônica Veloso. (Sabrina: Olha…) E ela também ficou
brava com os nossos políticos (Bola: Ficou, ficou.) (Sabrina: Sério?) Tá muito
bacana. Está no ar (Gluglu: Aêêê…!) mais uma edição do Pânico na TV.

Mais uma vez o quadro “Vesgo e Sílvio” aparece em destaque nesta apresentação.
Além destes, também foram privilegiados o “Baixas-Horas”108, O “Vô Num Vô”, com as
garotas de Búzios, e o tema da edição: o lançamento da revista Playboy cuja capa traz
Mônica Veloso. Ao anunciar o tema, Surita acrescenta uma promessa: a de que iremos vê-
la “muito brava” com os políticos do Pânico na TV (Presidente Mula109, Bob Jeff, e o
deputado Clô).
Apesar de não na mesma ordem, todos os quadros citados na saudação-sumário
estiveram presentes na “escalada”. Além destes, o sumário editado anunciou também o
“Meda”, com Christian Pior e Robaldo Ésperman “agitando” a Oktoberfest. “Agito” e
“aventura” (vide os atores de filmes de ação citados) complementam a promessa da edição,
que estará cheia de “absurdos”.

Loc em off com entonação exagerada:


Esqueça as perigosas aventuras de John Rubble, toda a frieza de Chuck Norris, a
sagacidade de Charles Bronson e veja hoje no Pânico na TV. Mendigo, Mano
Quietinho e o Vô num Vô desta vez nas praias de Búzios. Meda. Christian Pior e
Robaldo Ésperman agitando a Oktoberfest. O presidente Mula e sua turma de
políticos no lançamento da Playboy de Mônica Veloso. Eles não desistem.
Serginho Gosma e o Papito Xupla curtindo a noite no show do cantor Frank
Aguiar. Vesgo e Sílvio no Festival da Música Nacional em Canela. E mais um
carro no Lance Perfeito.Tudo isso e mais alguns absurdos hoje, no Pânico na TV.

Assim como na edição passada, os três primeiros blocos foram dedicados a


merchandisings, anúncio das atrações do programa e do tele-leilão que promovem. No
quarto bloco, também desproporcionalmente maior que os demais (1 hora e 34 minutos), as
atrações começam a ser apresentadas. O “Vô Num Vô”, como anunciado, mostrando as
garotas de Búzios ocupou 13’30’’. Outro quadro, com a mesma proposta – a de exibir

108
A atração “Baixas Horas”, apesar de anunciada, tanto na saudação de Emílio quanto na “escalada” não foi
ao ar.
109
Assim como aconteceu na edição passada, o ator que interpreta o Mendigo, personagem mais comum nas
gravações ao vivo, estava fazendo outro personagem para se enquadrar na temática do dia: O Presidente
Mula.

129
corpos femininos em trajes de praia – ocupou 15’00’’ e não havia sido anunciado: o “Dô
Num Dô” em Ibiza. O que vemos é uma montagem, com poucas novas cenas, deste quadro
tal como foi exibido na edição anterior110. Uma das poucas novas cenas incluídas mostra
uma interessante fala de Christian Pior que, ao pedir para uma mulher de biquini dar uma
voltinha, diz:

Dá uma voltinha. Turn around. Pára [quando a voltinha põe em close as nádegas
da mulher]. Pára que a audiência aumenta. 9 pontos, 10 pontos, 11 pontos, 12
pontos, 15 pontos, 16 pontos, Emílio!

Esta fala nos reforça a idéia de que o Pânico na TV não se incomoda em literalizar
a lógica televisiva de que faz parte. Além disso, o tom de bate-papo geral também se
reforça, com Christian Pior se mostrando em diálogo direto com Emílio – mesmo com
aquele estando em Ibiza (em uma atração gravada e editada) e este no estúdio para o
programa ao vivo. O tom de euforia de Christian parece também sugerir como ele, um bom
funcionário, está fazendo seu trabalho a contento do patrão.
A atração de maior duração foi “Vesgo e Sílvio” (19’41’’). Eles foram à cidade de
Canela (RS) para cobrir o Festival da Música Nacional, levando um tipo de gás (o hexa-
cloreto de enxofre) que engrossa a voz, e pedindo para os cantores presentes cantarem após
inalarem o tal gás.
Outra atração anunciada foi o “Meda” na Oktoberfest. Este quadro, que ocupou
12’37’’ do quarto bloco, se resumiu a Christian Pior e Robaldo Ésperman interpelando,
com zombaria, as pessoas nesta festa de Blumenau. Ou, nas palavras de Christian Pior, que
em determinado momento da “matéria” se aproxima da câmera, como que para estabelecer
um contato “direto” com o espectador, e diz:

É tão bom zoar os outros... E ainda ganhar por isso...

Como última atração do quarto bloco, a mais alardeada ao longo do programa,


aparece a “cobertura” que os políticos do Pânico fizeram da festa de lançamento da
Playboy de Mônica Veloso. Esta atração, diretamente ligada à pauta da época e, em

110
Nosso Programa 2 foi ao ar no domingo 14 de outubro de 2007, em um final de semana prolongado pelo
feriado do dia 12 (sexta-feira). Percebemos que uma atração anunciada, o “Baixas Horas”, não foi ao ar e
uma não anunciada, o “Dô Num Dô”, entra no ar com uma base muito parecida com a que havia sido exibida
no Programa 1. Acreditamos que, devido ao feriado, a produção não teve como terminar a edição da atração
anunciada e retransmitiu, com poucas diferenças, uma atração já apresentada.

130
especial, da semana, nos chamou a atenção pelo intrincado jogo que promoveu entre
informação, entretenimento e política, além de se questionar sobre critérios de
celebrificação. Por isso, trataremos esta atração com mais cuidado em nossa análise de
enquadramento.
No quinto bloco do programa, a apresentação de uma promoção nos despertou
interesse. Trata-se do Pânico no Navio. Emílio explica que os programas que vão ao ar em
janeiro não são ao vivo e serão gravados em um navio. Depois de anunciar as atrações que
se darão durante estas gravações, convoca o público para entrar em contato com a agência
de turismo que está organizando o cruzeiro. As pessoas interessadas podem comprar os
pacotes para participar do cruzeiro e das gravações. Mas não é só isso, uma cabine para
duas pessoas será oferecida, conforme explica Emílio:

Só que é o seguinte. Só que é o seguinte. A gente vai dar uma cabine para um
telespectador. (Sabrina: Ah é?) Então é o seguinte. Para você ganhar uma cabine
com um acompanhante, você tem que convencer um famoso a fazer a Dança-do-
siri. (Bola: É isso aí.) Certo? Nós vamos escolher a pessoa mais importante.Você
vai lá e convence. (Bola: É isso aí.) Você encontra alguém na rua e grava.
Depois você manda pra siri@jovempanfm.com.br. O endereço pode baixar no
You Tube, você manda lá o link ou a foto. (Bola: É isso aí.) Você pode mandar
tudo pra siri@jovempanfm.com.br. A pessoa que nós considerarmos a mais
famosa, fazendo a dancinha do siri, (Bola: Boa. Boa) vai com a gente pro Pânico
na TV.

Ficamos em dúvida quanto a veracidade da promoção, pois logo após anunciá-la,


Emílio se despede da platéia e diz para aqueles que têm vontade de participar nas
transmissões ao vivo:

Se você quiser vir aqui como essa galera, temos um e-mail que é
plateia@redetv.com.br. Você manda plateia@redetv.com.br. Você pode vir aqui
como essa rapazeada. E depois tem um detalhe: nós pagamos um jantar para
vocês. (Bola: É isso aí. É isso aí) (Sabrina rindo: Ah é…). E nós pagamos no
Fasano (Sabrina rindo: pagamos…) (Bola: é outro padrão. É outro padrão)
Abraço para o Roberto Fasano, para a equipe do Fasano, esperando-nos nesse
belíssimo restaurante. Agora vamos todo mundo pra lá (Bola: Vamos embora.
Vamos jantar.). Gente, muito obrigado pela audiência (Bola: Valeu, rapazeada)
(Sabrina: Tchau, gente…) … Valeu.

A promessa de jantar no Fasano, sabemos que é falsa. Não só por ele ser um
sofisticado e caro restaurante paulistano, mas também pela risada de Sabrina, que funciona
como um claro marcador da ironia do que está sendo dito. Porém, a promoção para
participar do Pânico no Navio, independentemente de ser falsa ou verdadeira, nos chamou

131
a atenção por alguns motivos. Primeiro, por se dirigir a um público familiarizado com e-
mails, links, You Tube, etc e por incitá-lo a produzir conteúdo. Segundo, pelo tipo de
conteúdo que se pede para que o público produza: perseguição a famosos no intuito de
convencê-los a dançar a Dança-do-siri. Algo que o programa faz, lembremo-nos da
campanha “Dança, Galvão. Dança a Dança-do-siri”. Por fim, pela declaração da existência
de uma hierarquia entre famosos que segue critérios que eles, do programa, escolhem.
Nosso Programa 2 pôs em destaque: a exposição de corpos femininos, a
ridicularização do outro – populares ou famosos –, a aderência à pauta pública e o convite
para que o público produza conteúdo seguindo um modelo do próprio Pânico na TV.

4.2.3. Programa 3: O dia de Rubinho, Massa e da Ferrari

Fazendo uma brincadeira com o nome do piloto Felipe Massa, a convocação inicial
do terceiro programa analisado já trata da temática preferencial do dia.

Bonitinhos e bonitinhas, diretamente dos estúdios da Rede TV!, vai começar


agora o programa que não é cozinha italiana, mas adora massa. A partir de agora,
está no ar o Pânico na TV!

Emílio Surita segue na apresentação do programa e de sua temática “em alta


velocidade”.

Eu diria, querido telespectador (Bola assovia), um programa em altíssima


velocidade. Tem Vô num Vô, com Quietinho e Mendigo (imitação do som de
carro de fórmula 1), tem Christian Pior fazendo uma festa... (Bola: também em
alta velocidade) é. Cês vão, Cês vão ver essa festa que eles foram fazer... (Bola
assovia) é um absurdo. Baixas horas... Piu-piu e Samambaia fazendo um teste
em alta velocidade (Bola: Quê que é isso) Vesgo e Silvio e a frase
“pedidilari”111. Ao som da banda Viva a Noite (Bola assovia) tá começando
mais uma edição do Pânico na TV (Gluglu: êêê).

Privilegiados tanto na saudação de Emílio (acima), quanto no sumário editado


(abaixo) estão os seguintes quadros e atrações: o “Vô Num Vô”, com as “petequinhas”; o
“Meda”, com Christian Pior e Robaldo Ésperman “fazendo” uma festa que é um
“absurdo”; o “Baixas Horas”; a prova inusitada e em alta velocidade disputada por Piu-Piu

111
“Pedidilari”, derivação italianizada do nome Pedro de Lara, foi usado por Sílvio (vestido de Galvão) e
Vesgo (vestido com um macacão da Ferrari, querendo se fazer passar por Felipe Massa) como se fosse uma
senha para que conseguissem entrar na área de imprensa do Grande Prêmio de Monza de 2007 na tentativa de
encontrar Galvão Bueno e fazer com que ele dançasse a Dança-do-siri.

132
e Samambaia112; e, para não faltar à regra, “Vesgo e Sílvio” em uma corrente de energias
positivas para Rubens Barrichello. Além de outras “asneiras”.

Loc. em off com entonação exagerada:


Esqueça as emocionantes vitórias de Rubinho Barrichello. Suas decolagens. O
choro descontrolado de nosso grande herói. E veja em instantes no Pânico na
TV. Mendigo e Mano Quietinho com as petequinhas no Vô num Vô. Todo o
romantismo de Xupla no show de Frank Aguiar. Christian Pior e Robaldo
Ésperman em uma surpreendente aventura numa festa de racha. As maravilhosas
Piu-piu e Samambaia em uma inusitada corrida, enrolando brigadeiros. Fórmula
1.Vesgo e Sílvio fazendo uma corrente de energias positivas para ele: Rubinho
Barrichello. Tudo isso e outras asneiras, hoje, no Pânico na TV.

O jogo do que foi dito por Tânia Panicat em sua convocação – que o programa
adora massa –, com o que foi dito por Surita – que deixa claro que o assunto é Fórmula 1 –
e com o que foi dito de Rubens Barrichello no sumário editado – “suas vitórias”, “nosso
herói” – nos parece irônico na medida em que vai adicionando camadas de marcadores que
nos fazem pensar que o programa está sugerindo uma disputa entre Massa e Barrichello
para o posto de herói nacional da Fórmula 1. Fica nítida a preferência do programa por
Massa, quando lembramos da fala de Tânia modulada pelos marcadores que se seguiram.
Além disso, ao final do sumário editado, encontramos a idéia de que Barrichello precisa de
uma corrente de energias positivas113.
Ao final do primeiro bloco que, como os outros, foi composto basicamente de
anúncios de atrações e merchandisings, Emílio diz, com ironia, sobre a estranha divisão do
programa e a grande presença de “não-atrações”:

Não perca o Pânico. Começa daqui a pouquinho o Pânico, hein? Já, já.

No início do segundo bloco, Emílio anuncia uma novidade.

Temos uma novidade no Pânico hoje. (Bola: Ôpa!) (Sabrina: Me conta.) O


Pânico sempre trazendo novidades para os telespectadores. (Bola: Show de
bola.) (Sabrina: É verdade.) A partir de hoje você vai ter a oportunidade de
assistir o programa on e off. (Sabrina: Como assim?) É só você entrar no
www.redetv.com/paniconatv.Você vai entrar lá. Você vai ver tudo o que
acontece no Pânico, inclusive durante os comerciais você vai saber o que
acontece aqui. (Bola: Que beleza!) (Sabrina: Sério?) Se a Sabrina Sato tira catoca
do nariz. (Bola: Tira. tira...) Então acompanhe essa transmissão. A gente tá
fazendo um teste. (Bola: Show de bola.) Depois você vai ver os bastidores, os

112
Esta atração, apesar de anunciada na “escalada” não foi ao ar nesta edição.
113
Na temporada de 2007, que já chegava ao seu fim, o piloto ainda não tinha pontuado. Massa tinha
chances, à altura da data desta edição, de ser campeão pela Ferrari (antiga equipe de Barrichello).

133
camarins, os switchers. Você vai conhecer toda a estrutura da equipe (Bola:
Muito bom. Muito bom) do Pânico na TV, (Sabrina: Ai gente...) que é a equipe
número 1 da televisão brasileira. Então mais essa novidade pra você. (Sabrina:
...é muita produção!) Quem quiser pode acessar aí.

Promessa de desnudamento total, sugestão de acesso total e irrestrito às camadas


internas e produtivas do programa. Mas Surita avisa: “a gente tá fazendo um teste”. O teste
parece não ter dado certo. Não voltou a se falar nisso nas edições seguintes. Não ficamos
sabendo o porquê. No entanto, acreditamos que oferecer ao telespectador uma atração –
“ver tudo o que acontece no Pânico, inclusive durante os comerciais” – que concorra com
o intervalo comercial pago pelos anunciantes do programa pode ter gerado algum
descontentamento em quem financia o Pânico na TV.
Na seqüência, Emílio trava um diálogo com alguém da produção e pergunta: “já
temos a imagem da Ferrari ou ainda não, Ricardo?” Aparentemente recebendo a resposta
afirmativa, se volta para o público e diz, enquanto o vídeo mostra uma Ferrari vermelha
que está do lado de fora do estúdio:

Nós temos a Ferrari hoje aqui no Pânico...(Bola: temos uma Ferrari?) Vejam a
Ferrari (Sabrina: olha...). Nós hoje temos essa Ferrari aqui e eu quero saber de
vocês... (Bola: pra que que cê trouxe uma Ferrari?) Você, querido telespectador,
acha que, o que nós vamos fazer (Bola: hahaha) com esta Ferrari no final do
programa? Será que nós vamos destruir um carro de mais de 1 milhão de reais?
(Bola: ia ser bom) Será que nós vamos meter essa Ferrari no poste? Será que
Felipe Massa (Bola: Opa. Pode ser, pode ser) virá no final do programa e levará
uma menina a dar uma volta na Ferrari (Bola: Boa, boa)? No final do programa,
vocês irão ver o que nós (Bola: Vamos ver, vamos ver.) vamos fazer com a
Ferrari do Pânico (Glulu: Meu Deus!) (Sabrina: coisa boa num deve ser)

Interessante perceber como Emílio vai construindo uma expectativa que condiz
com a imagem de descompromisso total e diversão a qualquer custo que parece querer
aderir ao programa: “destruir um carro de mais de 1 milhão” e “meter essa Ferrari no
poste”. Expectativa que vai sendo confirmada com os comentários e risadas do Bola e com
a fala final de Sabrina: “coisa boa num deve ser”. Nesta edição, o suspense sobre o que se
vai fazer com a Ferrari foi alimentado a cada bloco. O que foi feito, é claro, só apareceu no
final do quarto bloco.
Nesta edição, de maneira um pouco diferente das anteriores analisadas, os segundo
e terceiro blocos foram um pouco maiores (cerca de 12 minutos cada) e apresentaram
algumas atrações esporádicas, além de anúncios e suspense sobre as atrações por vir.

134
Como por exemplo, essa chamada que Emílio e Vesgo fazem para a entrevista que fariam
com Rubinho Barrichello, reforçando a “maluquice” do programa:

Emílio: Vocês vão ver o que esses malucos aí fizeram. Vocês vão ver o que esses
caras fizeram. Vesgo e Sílvio, daqui a pouco, uma matéria muito bacana.

Vesgo: Uma entrevista com Rubens Barrichello do Brasil.

Após esta chamada, um quadro que mostra a preocupação do Pânico na TV com a


questão da dengue. O quadro é assim apresentado por Emílio:

E agora, preocupados que estamos com a situação da dengue. (Bola: É verdade.)


Inclusive o ministro (Bola: Verdade.) da saúde disse esta semana que nós
estamos vivendo uma epidemia (Bola: Que que é isso? Vamos cuidar, né,
gente?) de dengue. (Sabrina: Sério?) Então, nós vamos voltar com a nossa
campanha, não é? A ONG do Pânico: (Bola: é isso aí) “Por um mundo cheio de
peitudas”. A nossa ONG (Gluglu: Verdade.) vai agora reiniciar a campanha da
dengue. (Bola: Boa!) Por favor, vamos ver. (Sabrina: Vamos ver.)

Trata-se de um vídeo com ares de vídeo educativo. Nas imagens, vemos uma
agente social fazer uma visita a uma casa a fim de realizar uma conscientização sobre a
dengue e inspecionar se há água acumulada. No áudio, uma trilha de fundo com música
clássica e uma locução com um tom antiquado, parecido com o das campanhas “Eu te amo,
meu Brasil” da década de 1970. Se o áudio não bastasse como marcador da ironia cretina
do quadro, as imagens não deixam dúvida. A agente social é Gabi Fon-Fon, uma das
Panicats se agachando, em trajes mínimos, para conferir os pratos dos vasos de planta
enquanto a câmera explora o seu corpo. Afinal é uma campanha da ONG “Por um mundo
cheio de peitudas”114, que cedeu uma das suas para falar do perigo da dengue. E para que
não fique dúvidas quanto a isso, temos as falas de Emílio e Bola, quando o programa volta
para o palco:

Emílio: Muito importante, gente, muito importante.

Bola: Bela campanha.

Emílio: Não, é sério, é sé... (Bola: Bela campanha) O negócio da dengue é sério.
(Bola: Bela campanha) E a sociedade ... (riso), a sociedade, ela precisa, a
sociedade ela precisa também colaborar, (Bola: Conscientizar.) conscientizar,

114
Não se trata de uma ONG real. Trata-se de um recurso discursivo do programa para criar um campo de
significado para as “campanhas” que vez ou outra promovem. Já promoveram, por exemplo, uma campanha
que recolhia doações para ajudar Celso Pitta, ex-prefeito de São Paulo, a pagar a pensão à sua ex-mulher
quando o político chegou a ser preso pelo não pagamento do valor devido.

135
porque muita gente ... e agora a dengue cada vez tá dando m... mais forte. (Bola:
Vai chegar o verão agora... é pior ainda.) Muito importante. (Bola: Vamos lá,
vamos lá.)

O programa segue com um merchandising e apresenta outro vídeo de


conscientização antes de terminar o segundo bloco. Desta vez, a agente social é Dani
Bolina, outra das Panicats.
No início do terceiro bloco, Emílio volta a falar da novidade do dia – a transmissão
online do Pânico na TV – mas destacando a autonomia do telespectador:

Se você quiser você entra. Se você não quiser, você não entra. Aí é um problema
seu.

Em uma nova chamada para a atração da Ferrari, mostram o “ronco” de seu motor e
as luzes de freio se acendendo para demonstrar que a Ferrari “não é fake”. O telespectador
é convidado a mandar e-mails com suas idéias do que vai ser feito com o automóvel. O
clima de suspense continua e o de descompromisso também:

A pergunta que o público quer saber é a seguinte. O que nós vamos fazer com
essa Ferrari? Nós vamos bater ela na Imigrantes e dar uma cabeçada no
cinegrafista? (Bola: Hahaha...)

A atração do bloco fica por conta do quadro “Meu Mico Mico Meu”, que apresenta
uma falha técnica no programa de Galvão Bueno no SporTV, o Bem, Amigos. Já narrando
o quadro, com as imagens do programa de Galvão, Emílio explica a falha:

Quem assistiu ao programa Bem, Amigos na segunda feira, 15 de outubro,


percebeu um pequeno probleminha. O programa começou a ser transmitido antes
de entrar oficialmente no ar e mostrou Galvão Bueno um tanto quanto tenso.

A tensão de Galvão era expressa com gritos para a produção e colegas do


programa, como: “Arnaldo! Tá entrando... Que coisa, pô!” Quando a falha é percebida,
Galvão se desculpa com o público e Emílio enquadra:

E finalmente, Galvão oferece aquele sorriso falso que todo apresentador de TV


traz no bolso do colete. Bem, amigos, como diz o Faustão, quem sabe faz ao
vivo, quem não sabe, também. Galvão pagou mais um mico da sua coleção no
“Meu mico... mico meu”

136
Ainda no terceiro bloco, ao apresentar os “Robert Apresentadores”, Emílio
pergunta a cada um deles – uma brasileira que está morando nos EUA e um rapaz de Jaú
(SP) – o que eles acham que vai acontecer com a Ferrari. Suas respostas são:

Mariana: Nossa... destruir, será? Vocês são doidos.

Pedro: Quebrar no meio. Devia colocar a Sabrina dentro e quebrar no meio.

Achamos as respostas interessantes pois elas parecem demonstrar que o público


aceita o enquadramento proposto para o programa, ao mesmo tempo em que pode
demonstrar suas expectativas em relação a ele.
Para encerrar o terceiro bloco, Emílio diz, mais uma vez, da transmissão online do
Pânico, de uma maneira que reforça nossa idéia de que a proposta pode não ter tido
continuidade por não fazer bem para os interesses financeiros da emissora.

Se você quiser acompanhar agora os bastidores do Pânico, tem um endereço na


internet. Tem transmissão ao vivo pela internet. E você também pode
acompanhar enquanto a gente rola um break comercial. Nós temos esses breaks
maravilhosos do Pânico na TV. E você, pela internet, vai ficar vendo a gente
aqui no estúdio. Vamos pro break e na seqüência o Pânico começa. (Bola: Já,
já...)

A primeira das grandes atrações do quarto bloco foi o “Vô Num Vô” (12’00’’), em
uma outra praia de Búzios. Além da temática costumeira, a exibição de corpos femininos,
um episódio nos chamou a atenção. Uma mulher “Num Vô”, ou seja, fora dos critérios de
beleza e desejabilidade do programa, foi interpelada. Sabendo do tipo de papel que estava
sendo proposto para ela, logo tratou de se justificar, encabulada, sorrindo e tentando
recuar: “Tô de regime, hein.” Justificativa que repetiu três vezes. Após dar a “voltinha”
para que pudesse ser visto “como ela roda”, manda um beijinho para a câmera e diz
sorrindo, agora com mais confiança: “Mas já sou famosa...”. Pareceu, assim, satisfeita com
a troca que fez: exposição ridicularizante de sua figura e o pagamento em forma de
televisibilidade.
A segunda grande atração foi o “Meda” (11’55’’) cobrindo a “Festa do Racha” em
Parelheiros, na periferia da grande São Paulo. O quadro girou em torno da humilhação dos
populares que frequentavam a festa. Na fila, no camarote (que fizeram questão de mostrar
que custava R$ 10,00 e que não tinha nada a não ser poeira nas mesas) e na pista, sempre
faziam comentários jocosos sobre as pessoas de baixa renda (“Como é que pode essa gente

137
ser tão feliz, ganhando tão pouco?”), o modo como elas se vestem (“Olha só, gente, esse
modelito ‘ganho-menos-que-trezentos-reais!’”), além de outras características de seus
cotidianos. Um exemplo, em especial, nos interessou por parecer desrespeitar, ou melhor
resignificar, uma lei da televisão: a negação dos “tempos mortos”. Perguntada por
Christian Pior sobre o nome do bairro onde mora, uma mulher responde: “Jardim Icaraí”.
Após a resposta, Christian e Robaldo ficam paralisados e mudos, olhos fixos na câmera,
feição séria, por 15’’. Ao longo desse tempo (que ganha dimensões de eternidade), uma
tarja aparece com a frase: “O silêncio é a pior das verdades.” A mulher ri sem-graça, não
sabe o que fazer, olha para um, olha para o outro e, por fim, dá um beijo no rosto de
Christian Pior e vai saindo. Imediatamente Robaldo diz: “Um minuto de silêncio para
quem mora mal”. A que Christian reage com uma gargalhada.
O “Baixas Horas” (10’00’’) apresenta o de sempre: ridicularização dos populares,
desta vez no show de Frank Aguiar. “Vesgo e Sílvio”, a maior atração desta edição, dura
21’15’’. Na primeira parte do quadro, conseguem se infiltrar na área restrita à imprensa da
Globo durante o Grande Prêmio do Brasil de Fórmula 1, até que são descobertos e
expulsos. Na segunda, vão a uma churrascaria onde Rubens Barrichello estava e
conseguem uma entrevista com o piloto.
Para terminar o quarto bloco, a atração suspense. O que fizeram com a Ferrari foi
uma “depilação” no corpo do Bola. Faixas com cera para depilação foram coladas em seu
corpo e tinham cordas que as amarrava na Ferrari que, arrancando com toda a potência de
seu motor, efetuou a depilação. Bola grita de dor, enquanto os outros participantes riem. A
gravação foi feita fora do estúdio, mas com transmissão ao vivo e durou 09’00’’. Enquanto
Bola estava sendo preparado, Emílio diz, mostrando entender o que o público gosta:

Senhoras e senhores, pela primeira vez na televisão brasileira, vamos fazer a


depilação mais cara do mundo. (...) Aqui está Bola com o peito desnudo, sendo
preparado. É um momento único e maravilhoso. (...) Vocês estão vendo algo
grotesco. Uma cena única. (...) Você que está vendo essa coisa horrorosa, mas eu
sei que você gosta disso. Porque são coisas que até Deus duvida e que são
transmitidas na televisão brasileira. (...) Nós gostamos de inovação, de levar
coisas inusitadas para você.

O feito foi menor do que parte das expectativas geradas (“meter” a Ferrari no poste,
por exemplo), mas foi sim inusitado e um tanto estúpido. O quadro se fez da exploração da
figura de um dos integrantes do programa.

138
O quinto bloco, o de despedida, ainda toma 3 dos seus 5 minutos mostrando o
replay em câmera lenta da depilação e os comentários sarcásticos dos colegas de Bola, que
mantinha feição de “poucos amigos”.
O Programa 3 explorou: a exibição de corpos femininos; a ridicularização do outro
– populares, famosos (Galvão Bueno e Rubens Barrichello) e de um de seus membros
(Bola) –; a promessa de transparência (transmissão online de tudo o que acontece no
Pânico); o enquadramento que o programa tem (descompromissado, imprevisível, etc.); a
valorização irônica da inovação acima de tudo (o público gosta porque são coisas que “até
Deus duvida” e que são transmitidas na “televisão brasileira”, não apenas no Pânico); e,
por fim, a aderência factual à pauta pública (a temática da Fórmula 1 no final de semana do
Grande Prêmio Brasil).

4.2.4. Programa 4: O dia da vaca e do leite

A convocação inicial do nosso quarto programa tem caráter factual, no sentido em


que reflete discussões que fazem parte da pauta pública na época de sua exibição. Por se
tratar de uma discussão política, o público é convocado como “brasileiros e brasileiras”.

Brasileiros e brasileiras, diretamente dos estúdios da Rede TV, vai começar


agora o programa que não é CPMF, mas muita gente quer que dure para sempre.
Está começando agora o Pânico na TV!115

A saudação-sumário de Emílio Surita também inicia com um tema factual: o risco


que o Corinthians sofria, naquela época, de ser rebaixado para a segunda divisão do
Campeonato Brasileiro. O tom de “zoação” entre torcidas é marcante. Além disso, a
saudação destaca o “Vô Num Vô”, o “Vesgo e Sílvio” (“só com gente importante,
celebridades”) e muitas “surpresas”.

Saudações Corinthianas… (Bola assovia) (Sabrina: aêêê) a esta torcida que deu
mais um respiro (ovação da plateia). Parabéns (Bola assovia) aos corinthianos.
Vocês não estão rebaixados ainda. Tá no ar mais um Pânico na TV. Vai ter “Vô
Num Vô”. Vai ter uma festa do Vesgo e Sílvio só com gente importante,
celebridades. Vai ter Sabrina Sato, vai ter a corrida dos brigadeiros... vai ter
muita surpresa (Bola: boa, boa) (Sabrina: muitas surpresas). E quando eu digo
que teremos surpresa, teremos mesmo. Ao som da banda Viva a Noite está no ar
o Pânico na TV (Bola: êêê).

115
O tema da CPMF apareceu também na cobertura que o programa fez do lançamento da Playboy de
Mônica Veloso, interligando questões políticas variadas, como se fizessem parte de uma discussão única.

139
Sem fugir ao costume, o sumário editado privilegia as mesmas atrações, mas com
um pouco mais de detalhes. Assim temos: o “Vô Num Vô” (com as surfistas de Búzios); o
“Meda” (ainda aproveitando material gravado em Ibiza); a cobertura feita ao concurso
Mister Gay Brasil (com Sabrina Sato e as “gostosas”); o desafio entre Samambaia e Piu-
Piu116; o “Vesgo e Sílvio” (entre globais e a alta cúpula do Rio de Janeiro); o tele-leilão
que o programa promove, entre outras “molecagens”.

Loc em off com entonação exagerada:


Esqueça a habilidade empresarial de Alberto Dualib. A famosa fúria de Carlitos
Tevez. E veja hoje no Pânico na TV. Mendigo e Quietinho com as surfistas de
Búzios em mais um “Vô Num Vô”. Ésperman e Christian Pior conhecendo as
tendências da moda em Ibiza, na Espanha. Sabrina Sato e as gostosas
desvendando os mistérios do concurso Mister Gay Brasil. Mulher Samambaia e
Piu-Piu fazendo brigadeiro em alta velocidade. Quem perder, vai pagar o castigo
com Xupla, na balada. Vesgo e Sílvio divididos entre globais e a alta cúpula do
Rio de Janeiro. E ainda hoje, sai a Mercedes C 200 no Pânico. Tudo isso e
muitas outras molecagens, hoje no Pânico na TV.

No segundo bloco, entre merchandisings, aparece a primeira atração desta edição: o


“Meu Mico Mico Meu”. Assim como na edição anterior, o “mico” da semana fica por
conta de Galvão Bueno. Emílio nos explica:

No reino animal, só existe uma criatura que produz mais pérolas que as ostras:
Galvão Bueno. (Hahaha) No domingo passado mostramos Galvão exaltado no
Bem, Amigos quando o programa entrou no ar antes do horário combinado. (...)
Já na quarta-feira no Show do Intervalo do jogo São Paulo e Milionários, já mais
calmo, Galvão pagou dois micos adestrados, chamando duas matérias que
simplesmente não entraram no ar.

Imagens do erro duplo cometido por Galvão e sua equipe são mostradas e, ao final,
Emílio conclui em locução que entra junto com a imagem de Fátima Bernardes na bancada
do Jornal Nacional:

Bem, amigos, é uma boa notícia para a ecologia. Pelo menos os micos do Galvão
não estão em extinção.

No terceiro bloco, Galvão Bueno e sua “coleção de micos” reaparecem quando


Emílio e sua produção se embolam quanto ao que vai dar continuidade ao programa,
depois que as telas que nos apresentariam os “Robert Apresentadores” “deram uma

116
Desafio anunciado na edição anterior, mas que só foi ao ar nesta edição.

140
bichada”, nas palavras de Emílio. Os integrantes do Pânico em cena, com bom humor,
associam um erro com o outro, riem e dizem: “Olha o nosso Galvão”. Galvão Bueno
passou a ser sinônimo de “mico”.
Ainda no terceiro bloco temos a apresentação do que será a surpresa prometida por
Emílio em sua saudação. No mesmo processo de construção de suspense e de expectativas
quanto aos limites do que o programa pode fazer, que vimos na edição passada com a
Ferrari, vemos ser apresentada uma vaca que está do lado de fora do estúdio. Emílio
relembra que na semana passada tiveram uma Ferrari e pergunta aos outros apresentadores
por que eles acham que a vaca está no programa.O apresentador pergunta a Sabrina quanto
ela acha que a vaca custa. Ela diz 1 milhão. Emilio diz que o preço da vaca é 700 mil reais.
Além do preço do animal, são expressos tanto a sua raça (trata-se de um Red Angus)
quanto o seu nome (Imperor), como tentativa de se mostrar o valor da vaca. O alto custo
do objeto de suspense (assim como aconteceu com a Ferrari) é explicitado. O telespectador
é convidado a mandar e-mails e a entrar no blog do Pânico para deixar suas idéias sobre o
que vai ser feito com a vaca.
No quarto bloco, como de costume, temos a maior concentração de atrações e
quadros do programa. No início deste bloco, após um “Charadex”117, o programa volta
para o palco, onde estão os apresentadores e personagens do Pânico na TV rindo com
exagero, marcando ironicamente a falta de graça da piada. Com isso, Emílio aproveita para
dizer do programa:

Muito bem queridos, vocês sabem que apesar dessas barbaridades, o programa
Pânico, graças ao bom Deus, e com muito orgulho, é o programa que tem as
mulheres mais bonitas do Brasil (Bola assovia).

Ligando uma coisa à outra, Emílio apresenta mais um merchandising que faz uso
da associação mulher-produto. Na seqüência, na apresentação de outro merchandising, o
apresentador encontra outra chance de falar sobre como o programa quer se mostrar:
desorganizado, espontâneo e, por isso, passível de sofrer erros e desvios. Trata-se da
apresentação dos “Robert Apresentadores”, que já havia apresentado problema no bloco
anterior. Emílio vai apresentar a participante, e mais um erro se dá.

117
“Um rapaz com problemas de gases queria ir ao cinema, mas tinha vergonha de soltar um pum durante o
filme. Para disfarçar, ele colocou um apito para chamar pássaros em seu reto. Pergunta: Qual o nome do
filme? A resposta: o homem que cú piava. Ha! Ha! Ha! Ha! Ha!”

141
Emilio: Você é Sheila?

Renata: Não, eu sou a Renata.

Emilio: É Renata? Então a Sheila não está mais aqui. (Renata: eu falo de
Uberaba, Minas Gerais) É Renata de Uberaba. Porque às vezes a conexão cai e
eles não me avisam... (Bola: muito bem) isso é uma beleza aqui. (Bola: tá ótimo)
Está uma organização... (Bola: é um mico???)

Emilio (mostrando a ficha que tinha, em que se lê “Sheila Almeida – Porto


Alegre – RS”): Aqui ó. Tem Sheila Almeida, de Porto Alegre (Bola: É, de Porto
Alegre), mas não temos Sheila Almeida, de Porto Alegre (Glugu ri) (Bola: mas
ela é de Uberaba). Mas é só riscar...e colocar o nome dela.... vamos pegar uma
caneta ali... por favor produção...

Renata: Sem problemas.

Bola: Vamo agilizar, né?

Emílio (se dirigindo à Renata e modificando a ficha ao vivo): Só mais um


segundo para não errar mais uma vez o seu nome. Vamos ver se um dia vai
funcionar isso daqui... (Bola: Fica calmo, calma, calma) (Sabrina: Eu adoro essas
coisas, que acontecem.) (Bola: Isso aqui tem pouco, calma) Um dia pode ser que
funcione isso daqui... (Sabrina: Eu adoro quando acontece.)

Ao final, mais merchandising e Emílio novamente ironiza a estruturação do


programa e o número de anunciantes:

Queridos espectadores, vamos iniciar o programa. (Sabrina: hahahahaha...)

O programa “se inicia” com o “Vô Num Vô” que, sem surpresas, ocupa 13’25’’
com a exposição de alguns corpos femininos, ridicularização de outros e várias falas
ambíguas, com conotação sexual.
A atração seguinte foi uma esporádica e factual: a cobertura do concurso Mister
Gay Brasil (08’07’’). Sabrina apresenta a atração:

Eu vou fazer hoje uma matéria de cunho investigativo, uma matéria de cunho
social. Tem tanta mulher solteira, sozinha, desamparada, carente e os homens
mais bonitos são gays. Por que tem tantos gays no mercado?

Com a ajuda de Samambaia e Piu-Piu, elas vão tentar seduzir os participantes do


concurso e fazê-los “virar homens”. Após investidas mal-sucedidas (mas com muitas cenas
sensuais das “repórteres” do dia), Sabrina pede para que suas colegas localizem no mapa
do Brasil de onde vêem os participantes. Reforçando o estereótipo da mulher bonita e
burra, elas erram todas as tentativas e Sabrina conclui: “É por isso que eles não querem
saber da gente!...”

142
O suspense que foi sendo criado em torno da presença da vaca no estúdio vai
sendo, enfim, revelado. Emílio diz:

É o seguinte. Todos sabem, todos sabem que nós tivemos esta semana uma
denúncia muito grave (Gluglu: meu Deus) de que eles estariam adulterando o
leite (Bola: verdade). Sim, o leite das criancinhas. O leite que a gente dá pras
crianças... (Gluglu: que absurdo, né?) tinha no leite simplesmente soda cáustica...
(Bola: água oxigenada) água oxigenada e vários produtos (Bola: barbaridade)
(Sabrina: é verdade) nós vamos aqui hoje, evidentemente com esse exemplar...
(Bola: lindo) caríssimo. Nós vamos tirar leite da vaca para tomarmos o leite
puro. Para isso, as meninas vão ordenhar... (Bola: opa!) esse animal.

Até esta altura do quarto bloco, ficamos sabendo que a presença da vaca está
relacionada com o escândalo da adulteração do leite. Ficamos sabendo ainda que as
meninas irão ordenhar o animal. Tânia Panicat é a selecionada e começa, meio sem jeito, a
ordenha. Durante quase 6 minutos, o que temos é a ordenha acontecendo rodeada de falas
ambíguas, com conotação sexual, dos apresentadores e personagens presentes no estúdio.
Em meio a quadros que vão sendo apresentado, a atração da vaca e do leite adulterado vai
se desenhando melhor. Emílio explica:

Mas agora, aproveitando esse assunto do leite adulterado, nós vamos ordenhar
mais um pouco de leite, e na sequência, nós vamos adulterar o leite. (Gluglu e
Sabrina: Ai.) É um leite puro, que vem da origem... (Bola: Puríssimo, puríssimo.)
tirado na hora e na sequência nós vamos... evidentemente adulterar o leite e a
Sabrina Sato irá tomar leite adulterado. (Sabrina: Por que eu? Por quê?)

Uma bancada montada no meio do palco apresenta o leite puro ordenhado da


valiosa vaca, um liquidificador para se fazer as adulterações, e os ingredientes que serão
adicionados ao leite para adulterá-lo. Emílio lembra que o segredo é adulterar na proporção
de 30%, ou seja 7 partes de leite puro para 3 partes do ingrediente adulterador.
Diferentemente das substâncias que teriam sido encontradas nos lotes de leite adulterados
(soda cáustica, água oxigenada etc.), o que temos na bancada são substâncias mais
“absurdas”, mais adequadas à “molecagem” que o programa tenta ser: perfume, óleo de
carter, creme de barbear, batom, massinha de modelar, entre outros. Sabrina é a primeira a
ter que beber o leite adulterado do Pânico na TV e escolhe o perfume como a substância
estranha de seu leite. Ela bebe, faz caretas, diz que sua garganta está ardendo e começa a
ter ânsia de vômito. No que é logo chamada a atenção por Emílio: “estão colocando soda
cáustica no leite que é dado para criancinhas e você reclamando de beber leite com
perfume!”. Outras misturas – e outras vítimas – são criadas, mas nada se compara à última

143
adulteração que promovem e que volta a ter como alvo Sabrina Sato. Um membro da
platéia é escolhido e barbeado no palco. Os pelos de sua barba são batidos com leite e
oferecido a Sabrina que, como boa musa-heroína do programa, bebe um golinho -
reclamando e demonstrando nojo, já que de outra forma não teria graça alguma. Enfim,
como as palavras de Emílio não deixam dúvida, o Pânico na TV está “aproveitando esse
assunto do leite adulterado” para movimentar o seu “circo de horrores”.
Os outros quadros que o programa intercalou com a atração do leite adulterado, ao
longo do quarto bloco foram: o “Meda” (11’57’’), o “Vesgo e Sílvio” (20’42’’) e o “Tropa
de Elite” (04’52’’). O primeiro teve Christian Pior e Robaldo Ésperman mostrando a moda
da noite de Ibiza, com os seus costumeiros comentários maldosos. Vesgo e Sílvio cobriram
a festa do prêmio Cariocas do Ano, cercados de “gente importante, só celebridades”, como
já havia adiantado Emílio. A última atração foi mais uma forma de o programa
“aproveitar” o que estava na pauta pública na época: o sucesso do filme Tropa de Elite.
Nas palavras de Emílio: “está todo mundo querendo tirar uma casquinha do sucesso de
Tropa de Elite.” A atração, assim apresentada (como sendo uma “casquinha”), consistiu
em uma esquete, apresentada pelo grupo de comédia “Desnecessários”, em que cenas do
filme eram parodiadas com diálogos nonsense.
Assim, a última edição de nosso corpus foi marcada pela aderência à pauta pública
(a temática do leite adulterado, o resultado do jogo do Corinthians no campeonato
brasileiro, o sucesso de Tropa de Elite); exibição de corpos femininos; exploração,
ridicularizante ou não, da figura do outro; diversão inconsequente, ou melhor, alargamento
de limites do aceitável para fazer divertir (como foi o caso dos ingredientes utilizados para
adulterar o leite que integrantes do programa beberam).

4.3. As celebridades no Pânico na TV

A análise de conteúdo de nosso corpus tem como objetivo nos fornecer um mapa
que nos permita localizar a aparição das celebridades ao longo do programa. Para além
disso, visa também nos ajudar a perceber certas recorrências a partir das quais
selecionamos situações exemplares para proceder a análise de enquadramento.
A análise de conteúdo tinha como categorias:
a) Celebridades Citadas: aquelas que aparecem por fala ou por imagens não
captadas pelo programa para a edição que está sendo analisada;

144
b) Celebridades em Interação: aparecem em interação direta com personagens do
programa e com imagens captadas para a edição que está sendo analisada;
c) Celebridades como campo semântico: momentos do programa em que surgem
significados ou situações que envolvem uma idéia expandida de celebridades.
O resultado dessa análise, a partir deste recorte, gerou tabelas extensas e detalhadas
que foram incluídas como Anexo 2 (pg.192). A seguir apresentaremos as recorrências
percebidas, por edição e no geral dos quatro programas analisados.

4.3.1. Programa 1

O Programa 1 teve um total de 43 citações118 a celebridades. Percebemos ser


possível dividir este número em quatro tipos de utilização:
Compondo o primeiro tipo de utilização percebido, celebridades foram acionadas
para criar sugestão de similaridade na aparência entre pessoas interpeladas e as
celebridades citadas por 12 vezes. Salvo uma exceção, este uso foi feito em tom
depreciativo que aponta para dois lados: tanto para a pessoa interpelada quanto para a
celebridade citada em tom jocoso. Ângela Rô Rô, por exemplo, foi citada para designar
uma senhora acima do peso que estava em Ibiza. Ao ser abordada por Christian Pior, que
repetia o seu bordão “Coragem!”, uma tarja apareceu na tela para dizer: “Ângela Rô Rô
esparramada na praia. É carne que não acaba mais.”. O interessante é perceber que, nestes
casos, nomes de celebridades não são apenas nomes próprios que as designam. Passam a
designar características. São transformados, assim, em léxico corrente, em adjetivos, quase
sempre usados para depreciar. Maria Bethânia, um outro exemplo, foi citada duas vezes
(em duas edições diferentes) para “designar/adjetivar” duas mulheres distintas, que tinham
em comum o cabelo longo, volumoso e anelado.
Como segundo tipo de utilização, e por nove vezes, celebridades foram citadas
como sendo a temática de alguma atração119 . Como exemplo, podemos citar Luciano
Huck que, com o episódio do roubo de seu Rolex, foi o tema do “Guevara News”, sem ter
entrado em interação com personagens ou apresentadores do programa.

118
Este número diz do total de citações e não de quantas celebridades foram citadas. Algumas delas foram
citadas mais de uma vez.
119
Não contabilizamos, nesta subcategoria, aquelas celebridades que foram conteúdo ou tema dos quadros
que promoveram interação entre elas e os personagens/apresentadores do programa. Neste caso, elas
entraram na categoria Celebridades em Interação.

145
Por seis vezes, celebridades foram citadas para promover, anunciar ou apresentar
quadros e atrações do programa. Como exemplo deste terceiro uso, temos Débora Secho,
Sabrina Sato e Joana Prado, citadas por Bola como as mulheres mais desejadas do Brasil e
que já foram fotografadas por J.R. Duran, pretenso anfitrião do “Bola Visita” do Programa
1. Para este uso, percebemos uma regularidade de um tom elogioso, quase cínico. O que
parece estar em jogo é a necessidade de engrandecer a vítima que o Pânico na TV promete
ter como alvo.
O quarto tipo de utilização é, em parte, parecido com o que vimos acima. A
diferença é que a citação do nome da celebridade não tem como objetivo promover um
quadro ou atração, mas o programa como um todo. Por três vezes, foram citadas
celebridades no sumário editado na tentativa de agregar determinados significados e
valores à edição em questão. No Programa 1, fizeram uso dos nomes de Martin Luther
King, Che Guevara e John Lennon, fazendo referência à idéia de revolucionários em quem
os telespectadores deveriam se inspirar como preparação para o que iriam ver no Pânico do
dia.
Os demais casos de celebridades citadas (13) dizem respeito a usos diversos. Entre
outros, em piadinhas tolas: como Camila Pitanga, Carlos Manga e Marília Pera, citados por
Insônia Abrão ao informar que teriam sido atacados por um maníaco que queria apenas
fazer uma salada de frutas. Ou mesmo para enquadrar determinada situação: quando, por
exemplo, o rosto de Dedé Santana entra na tela ao término da piada acima, tendo como
fundo musical o tema da A Praça é Nossa. O que traz a idéia de “a mesma praça, o mesmo
banco”, o mesmo ultrapassado humorista, a mesma fórmula de piada.
A primeira edição analisada foi a que teve o maior número de celebridades em
interação (32). Percebemos que todas estas se encontram no quarto bloco do programa,
aquele que concentra as principais atrações do dia. Para as celebridades em interação, não
tivemos como criar regularidades, pois as interações são muito diversas. No entanto,
pudemos perceber que, das 32 celebridades que entraram em interação com integrantes do
Pânico, 28 são celebridades por terem suas atividades diretamente vinculadas à televisão:
são atores, apresentadores ou telejornalistas. Não que as outras quatro não circulem pelo
universo midiático, e pelo televisivo mais particularmente, mas suas atividades, as que os
tornaram conhecidos (e, portanto, conteúdo para a mídia) são de outra natureza – ainda que
ganhem na TV sua visibilidade. Nesta edição tivemos um esportista (Fernando Meligeni),
um cantor (ex-integrante do grupo BROZ), uma performer (a drag-queen Salete Campari)

146
e uma celebridade “carnavalesca” (Nana Gouveia). Além disso, pudemos perceber que das
28 celebridades televisivas, 20 são da Rede Globo, o alvo preferido do programa. A
própria diversidade de celebridades em interação – mesmo as 20 da Globo não podem ser
reunidas em um grupo homogêneo, tivemos desde Suzana Vieira, atriz de mais
longevidade na fama, a Marjore Estiano, debutante como protagonista de novela – nos
apontou interações muito diversas. No entanto, a utilização desta categoria nos ajudou a
localizar as interações distintas mais emblemáticas – nesta e nas outras edições analisadas
– que serão levadas à análise de enquadramento.
A categoria das celebridades como campo semântico recortou 23 falas do Programa
1. Percebemos que tais falas, por certas regularidades que apresentam, podem ser
reagrupadas em quatro usos principais. Nesta edição, o campo semântico em questão foi
acionado 12 vezes como temática de abordagem a populares, pessoas comuns ou aspirantes
a celebridade. Estas 12 vezes se deram em um quadro apenas, o “Vesgo e Sílvio”, e em
interações com apenas uma pessoa: Dona Matilde. Um exemplo é a pergunta que Vesgo
faz a ela: “Você é famosa?”, que teve como resposta: “Não sou famosa mas eu vou ficar”.
Este quadro, por conjugar grande número de celebridades em interação e o “caso” de Dona
Matilde, foi selecionado para a etapa seguinte de nossa metodologia.
Dos outros usos do campo semântico de celebridades que encontramos, um se
parece, em sua finalidade, com os usos que o programa faz de celebridades citadas para
promover, anunciar ou apresentar suas atrações e quadros. No Programa 1, tivemos cinco
desta utilizações. Um exemplo bastante ilustrativo é a expressão “nata da Rede Glóbulo”
encontrada na locução do sumário editado para anunciar o quadro “Vesgo e Sílvio”. Mais
uma vez, e através de um recurso discursivo mais geral (não focado em uma celebridade,
mas na idéia de celebridade), vimos a necessidade que o programa tem de engrandecer
aquilo que promete “aterrorizar”.
Outra utilização, aparentemente oposta à que vimos acima, foi acionada três vezes
no Programa 1. Trata-se de usar o campo semântico de celebridades para desmerecer a
festa ou evento em que se encontram as celebridades. Como exemplo, temos a fala de
Vinelson Rubens referindo-se à tentativa de entrevistá-lo por parte de repórteres de outros
programas que cobriam a mesma festa:

Quando começa faltar artista, eles vêm entrevistar a gente do Pânico? (...) O que
falta de famoso não faz, né gente?

147
Em um movimento de auto-depreciação (que mostra que os integrantes do Pânico
não querem receber o status de famosos) e de depreciação dos famosos presentes – e,
portanto, do evento em questão –, vemos uma estratégia de complementação ao
enaltecimento anterior. Dessa forma, e sem grandes riscos ou esforços – já que não estão
em interação direta com nenhuma celebridade –, o programa parece querer demonstrar que
está cumprindo a promessa de subjugar os famosos ao papel de vítimas.
O último dos usos recorrentes ao campo semântico de celebridades que
encontramos nesta edição diz respeito à valorização deste status na tentativa de promover
um produto ou uma marca em algum merchandising. Utilizado por duas vezes, podemos
citar como exemplo a fala de Emílio “Você pode ficar famoso!” expressa como atrativo
para que os espectadores criem conteúdos para o TIM Studio.
No total, entre citadas, em interação e como campo semântico, o Programa 1
apresentou 98 celebridades. Dentre estas, os que mais apareceram foram Luciano Huck,
Che Guevara e Alemão (ex-BBB): duas vezes cada um.

4.3.2. Programa 2

No Programa 2 encontramos um total de 61 citações a celebridades. Foi o programa


que teve o maior número nesta categoria. Subdividindo estas 60 citações segundo as
subcategorias apresentadas para o Programa 1, percebemos uma forte concentração (18
vezes) de celebridades citadas para “designar/adjetivar” pessoas interpeladas. Neste
programa, porém, houve um maior número de citações deste tipo que podem ser
consideradas como demonstração de apreço120. Foram sete e todas ganharam voz com
Christian Pior que, se referindo a celebridades para elogiar características físicas de
algumas pessoas, o fazia para depreciar os que estavam fora dos padrões elogiados. Sobre
uma européia interpelada em Ibiza, Christian Pior diz: “Olha o corpo dela, gente. Olha a
bundinha de Kate Moss121.”. Fala complementada por “A brasileira não consegue ter esse
corpinho. Ela come muito feijão.” e finalizada antipaticamente com “Se você não sabe
quem é Kate Moss, joga no google.”

120
O critério que usamos para classificar este tipo de citação como depreciativa ou apreciativa tem como
base os valores estéticos fortemente alimentados pela mídia, em especial pela publicidade. Não encontramos
dificuldades, portanto, em perceber que ter “carne que não acaba mais” é depreciativo enquanto ter pernas
longilíneas e, por isso, ser a “versão morena de Ana Hickmann” é apreciativo.
121
Uma bem sucedida modelo inglesa.

148
Por 12 vezes, celebridades foram citadas para promover, anunciar ou apresentar
quadros e atrações do programa. A campeã nesta categoria foi Mônica Veloso, a temática
da edição, com quatro citações em quatro momentos distintos do programa que
anunciavam a cobertura de lançamento de sua Playboy. Rosana, a cantora, foi citada quatro
vezes para promover o quadro “Vesgo e Sílvio”, que nesta edição cobriu a Festa da Música
Nacional.
Assim como no primeiro programa analisado, o Programa 2 por três vezes citou
celebridades no sumário editado com o objetivo de tentar agregar determinados
significados e valores à edição em questão. Se no Programa 1 fizeram referência à idéia de
revolucionários, no programa dois foram valorizados as aventuras de Jonh Rubble, a frieza
de Chuck Norris e a sagacidade de Charles Bronson, que os telespectadores deveriam
esquecer para verem, no Pânico do dia, níveis ainda mais elevados de aventura, frieza e
sagacidade.
Na segunda edição que analisamos não houve uso de celebridade citada como
temática de algum quadro. No entanto, percebemos um uso de citação que fez referência a
seis celebridades e que não havia aparecido no programa anterior. Trata-se de citar
celebridades através de imagens de arquivo do próprio programa122. Estas celebridades
foram citadas no quadro “Vesgo e Sílvio”, mostrando a cobertura que fizeram da Festa da
Música Nacional em 2005.
Foram 18 o número de celebridades com quem o programa estabeleceu interação
direta. Diferentemente da primeira edição, e por causa do tipo de evento coberto, apenas
duas destas celebridades têm ou tiveram vínculos diretos com a TV como apresentadores:
Faa Morena (apresentadora da Rede TV!) e Carlos Miéle (ex-apresentador). Em sua
maioria, 15, as interações se deram com cantores e cantoras. Solitária em sua subcategoria,
uma celebridade em interação – apesar de seu histórico como apresentadora do telejornal
da Rede Globo do Distrito Federal, o DFTV – se destacou na mídia e conquistou a capa da
Playboy devido a um escândalo político: Mônica Veloso, “a mulher que abalou a
República". Esta, já dissemos, por representar uma categoria de celebridade peculiar, será
assunto para a análise de enquadramento que faremos adiante.

122
Lembramos que para fazer parte da categoria Celebridades em interação, um dos critérios criados diz que
a interação deve se dar em imagens captadas para a edição que está sendo analisada.

149
Esta edição também nos forneceu o terceiro caso que pretendemos analisar em
profundidade: o enquadramento proposto pelo programa para a interação que estabeleceu
com um ex-sucesso da mídia nacional: a cantora Rosana.
Como campo semântico, o Programa 2 nos forneceu dez falas. O maior número
destas (cinco, o mesmo número que encontramos no Programa 1) teve como finalidade
promover, anunciar ou apresentar suas atrações e quadros.
Enquanto tentativa de desmerecer o evento que está sendo coberto, tivemos três
falas. Um bom exemplo é a fala de Christian Pior, em um de seus momentos de confissão
junto à câmera/público, reclamando da “multidão cheirando a cevada” que ele estava
enfrentando para fazer a matéria na Oktoberfest:

Olha o que a gente passa. Olha o que a gente enfrenta. É difícil ficar rico e
famoso, bem. É difícil.

Chamou-nos a atenção nesta fala o desvelamento de que o Pânico na TV não é


apenas um programa que explora a figura dos “ricos e famosos”, é também um lugar onde
eles são construídos.
Nesta edição, não encontramos nenhuma fala que fizesse uso da idéia de
celebridade para a abordagem de populares. No entanto, tivemos uma tarja em que,
destituindo Mônica Veloso do status de famosa e enquanto o programa entrevistava sua
irmã, pudemos ler: “Irmã de Mônica Veloso. Tão conhecida quanto ela.” Esta frase foi
contabilizada na subcategoria anterior – a que diz do desmerecimento ao evento – uma vez
que a irmã de Mônica Veloso é uma “anônima”, mas não uma figura do povo.
O Programa 2 citou, interpelou, ou fez referência ao universo das celebridades por
88 vezes. No geral, Mônica Veloso aparece por cinco vezes, Rosana por três, empatada
com o deputado e cantor Frank Aguiar.

4.3.3. Programa 3

O terceiro programa de nosso corpus apresentou um comportamento peculiar no


que diz respeito ao total de celebridades citadas, em interação e como campo semântico.
Durante todo o programa e distribuídas pelas três categorias, encontramos o número de 24,
pouco significativo quando comparado aos mesmos dados do Programa 1 (98) e do
Programa 2 (88). Acreditamos que isso se deu ao fato de o programa ter se construído, de

150
forma bem mais fechada, na temática do dia, ligada ao Grande Prêmio Brasil de Fórmula 1.
Os campeões de aparição foram: Rubens Barrichello (sete vezes), seguido de Felipe Massa
e Frank Aguiar123 (três vezes cada) e Galvão Bueno (duas vezes).
Nele, encontramos um total de 18 citações a celebridades. Desta vez, percebemos
uma maior concentração (13 vezes) de celebridades citadas para promover, anunciar ou
apresentar quadros e atrações do programa. Como recurso para “designar/adjetivar”
pessoas interpeladas, encontramos apenas três citações. No sumário editado, aparece
apenas uma citação a Rubinho, apresentado ironicamente como vencedor e herói nacional.
Como temática de um quadro do programa, tivemos também uma citação a Paulo Autran.
O ator havia morrido na semana anterior à nossa terceira edição e foi tema, como forma de
homenagem, do quadro “Xaxala e Cirilo”, que em uma paródia a Os Caçadores de Mito124
demonstraram os malefícios do cigarro com a morte do ator.
Apenas duas celebridades entraram em interação direta com integrantes do
programa: Frank Aguiar, com Serginho Gosma e Xupla no quadro “Baixas Horas”, e
Rubens Barrichello, no quadro “Vesgo e Sílvio”. Nenhuma delas com atividades
“imediatamente” ligadas à televisão.
Como campo semântico, o Programa 3 nos forneceu quatro falas, que apareceram
de maneira dispersa entre as quatro subcategorias percebidas nos programas anteriores. Por
duas vezes foi acionado como abordagem a populares, por uma vez para o merchandising
do TIM Studio e uma última vez para desmerecer a festa coberta, novamente com uma fala
de Christian Pior.

Emílio, eu sou um artista, eu sou um ator. Eu li Dostoievsky, eu li Stanislavsky.


Por que você me dá essa pauta?

Lembramos que a “pauta” em questão era a Festa do Racha que acontecia na


periferia de São Paulo. Com essa fala, percebemos nitidamente a reivindicação de uma
posição de superioridade a artistas e atores.

123
A repetição da figura de Frank Aguiar entre as celebridades que mais apareceram se deu, acreditamos,
pelo fato de o Programa 2 ter anunciado o “Baixas Horas” no show do cantor, mas não ter exibido a atração.
No programa 3, Frank Aguiar é citado duas vezes em anúncios do quadro e aparece uma vez em interação, já
que tivemos neste programa a exibição do quadro anunciado desde a edição anterior.
124
Enquanto paródia deste programa que busca comprovar cientificamente a veracidade ou não de crendices
populares (os mitos), o Pânico satirizou o próprio conhecimento científico, apresentando marcas irônicas tais
como a fala “A ciência já demonstrou por várias vezes os malefícios do cigarro. Mesmo assim as pessoas
continuam fumando, porque é uma delícia.” conjugada com o fato de que os personagens estavam fumando.

151
4.3.4. Programa 4

O Programa 4 também apresentou um número reduzido de celebridades citadas, em


interação e como campo semântico se comparado com os dois primeiros programas.
Porém, apresentou quase o dobro em relação ao Programa 3. Foram 41 aparições ao todo.
Galvão Bueno, Clodovil e Fátima Bernardes foram os que mais apareceram, duas vezes
cada um.
Destas 41 aparições, 21 (praticamente a metade) apareceram na forma de citação.
Dez das citações a celebridades tiveram como finalidade “designar/adjetivar” pessoas
interpeladas. Por duas vezes citou celebridades no sumário editado com o objetivo de
tentar agregar determinados significados e valores ao programa do dia: habilidade
empresarial (Alberto Dualib) e fúria (Carlos Tevez). Como temática de um quadro do
programa, tivemos também duas citações a Paulo Autran. Nesta edição, não tivemos
nenhuma citação a celebridades como recurso para promover quadros ou atrações do
programa.
Foram 15 as celebridades em interação. Todas no quadro “Vesgo e Sílvio” que, no
dia, cobria a festa Cariocas do Ano. Destas 15, 11 foram de celebridades da Rede Globo
(atores e apresentadores), duas da música (Fafá de Belém e Eduardo Dusek), uma do
esporte (Diego Hypólito) e uma da política (Sérgio Cabral). Pela alta concentração de
“globais”, que representam com o maior reconhecimento a Rede Globo como instituição
social, selecionamos uma das interações deste quadro para compor nosso quarto caso
levado à análise de enquadramento: a que se estabeleceu com Marieta Severo.
Como campo semântico, o Programa 4 nos forneceu cinco falas. Por duas vezes foi
acionado como abordagem a populares e por outras duas vezes para desmerecer a festa
coberta, como nesta fala de Vesgo que tentava convencer Luciano Huck a não entrar no
evento: “Se eu fosse você, eu ia embora. Só tem Big Brother aí.”. A última das cinco falas
que remetem ao campo semântico das celebridades desta edição também se deu no quadro
“Vesgo e Sílvio”. Trata-se de uma fala de Sílvio para Vesgo, tentando chamar a sua
atenção para a presença de William Bonner e Fátima Bernardes. Ele diz “Vesgo, Vesgo! É
o casal mais famoso da televisão!”.
A tabela a seguir lista as celebridades que tiveram mais de uma aparição, por ordem
decrescente:

152
Celebridade Nº de aparições
Rubens Barrichello 8
Frank Aguiar125 6
Galvão Bueno 5
Mônica Veloso
Felipe Massa 4
Clodovil 3
Luciano Huck
Rosana
Alemão (BBB) 2
Ângela Rô Rô
Che Guevara
Fátima Bernardes
Kiko (KLB)
Maria Bethânia
Tabela 6: Celebridades por nº de aparições nos programas

Por esta tabela, podemos perceber que o programa se movimenta em paralelo com a
pauta pública. O alto número de aparições de Rubens Barrichello e Felipe Massa, por
exemplo, se dá pelo fato de o corpus ter sido coletado em um período que coincidia tanto
com o final da temporada de Fórmula 1 de 2007 quanto com o Grande Prêmio Brasil.
Além disso, coincidia também com o fato de Rubinho não ter conquistado nenhum ponto
na temporada e de Massa ter tido chances de ser campeão. Galvão Bueno, além de estar
relacionado com a Fórmula 1, vinha sendo, desde que narrou a comemoração da vitória do
basquete masculino brasileiro nos Jogos Pan Americanos (em 29/07/2007), alvo
preferencial do programa com a campanha “Dança, Galvão. Dança a Dança-do-Siri”.
Campanha que durou até setembro quando, no dia 16, Galvão finalmente dançou. Nosso
corpus se inicia no dia 7 de outubro, a terceira edição depois da dança de Galvão. Mônica
Veloso era o assunto da vez no período de nosso corpus. Luciano Huck foi assunto pelo
roubo de seu relógio e pelo nascimento de seu segundo filho no período coletado. Alemão
ainda era novidade na mídia, já que havia vencido a edição de 2007 do Big Brother Brasil.
Rosana e Fátima Bernardes foram encontradas fortuitamente em eventos e
posicionadas, como veremos, em lugares distintos no céu do estrelato.
Clodovil era constantemente alvo do programa. Já Ângela Rô Rô, Maria Bethânia e
Kiko, aparecem mais de uma vez por terem sido transformados em vocábulos que

125
Como dissemos em nota de rodapé anterior creditamos o alto número de aparições de Frank Aguiar a uma
falha do programa, ter anunciado uma atração que o envolvia em uma edição e só apresentá-la na edição
seguinte, com novos anúncios. Além disso ele também estava presente na Festa da Música Nacional que o
Programa 2 cobriu.

153
designam, respectivamente, mulher acima do peso e mal arrumada, mulher com cabelos
longos e volumosos e homem feio.
No geral dos quatro programas, tivemos 143 citações a celebridades, 67
celebridades em interação e 49 falas que se referem às celebridades como campo
semântico, somando, portanto, 252 momentos ou situações em que o Pânico na TV, de
uma forma ou de outra, se voltou para a temática das celebridades. Se dividirmos este total
pela duração dos programas, temos uma média de uma aparição a cada dois minutos. Um
número considerável, ainda mais quando lembramos que, quando em interação, uma só
celebridade pode ocupar vários minutos do programa. O Pânico na TV, sem dúvida,
trabalha com este universo que, como vimos, é mais heterogêneo do que os conceitos
clássicos de celebridade nos fazem crer. Perceber a diversidade de enquadramentos a
celebridades que o programa opera é o assunto de nossa próxima etapa.

4.4. O Pânico na TV enquadrante

Faremos agora a análise de enquadramento nos quatro casos selecionados. A


seleção destes casos procurou privilegiar interações diversas com celebridades (ou não-
celebridades) de diferentes naturezas e pesos na cultura midiática nacional, na tentativa de
perceber a diversidade de enquadramentos com que o programa opera.
Antes disso, acreditamos dever situar melhor, mesmo que sucintamente, a nossa
idéia de enquadramento. Esta idéia é guiada por Goffman (1986, 1999) e seus conceitos de
quadro de sentido (ou frame) e da ordem interacional. Um frame é uma síntese de um
esquema mental e de marcos externos. Enquanto esquema mental, é um tipo especial de
estrutura que condiciona a interpretação das situações de interação social e é, assim,
compartilhado entre os membros de uma sociedade. Frames são acionados e modelados
em situações de interação específicas, dotadas de marcos externos, que são os elementos
contextuais objetivos tais como incorporados e processados pelo esquema mental dos
indivíduos que participam do processo interacional. Em outras palavras, e em uma
simplificação máxima, os quadros de sentido são o que tornam inteligíveis determinada
situação. São recursos que os indivíduos têm para responderem à pergunta: ‘o que está
acontecendo aqui?’.
A idéia de que quadros de sentido organizam as interações conferem ao significado
das situações uma inevitável dimensão relacional. É na relação com o outro que se define

154
em relação a qual quadro de sentido a interação está se dando. Este processo de definição
é, em parte, um processo de negociação entre os indivíduos em interação. Por
enquadramento, entendemos este processo que envolve os indivíduos interagentes em
negociação pelo quadro que ordenará a interação em curso em uma situação dada.
Porém, por trás das interações existem estruturas institucionais que distribuem
desigualmente os recursos para a definição do que está a se dar. O que significa dizer que
nem sempre os sujeitos em interação têm a mesma força para definir o quadro com o qual
pretendem atuar na situação. As negociações inerentes ao processo de enquadramento nem
sempre se dão entre interagentes equiparados em força de definição. Esta idéia nos é cara,
já que ela nos chama a atenção para a força que o Pânico na TV e seus integrantes têm
frente a diferentes pares de interação.
Faz-se necessário precisarmos algumas particularidades da maneira através da qual
pretendemos fazer uso da idéia de enquadramento, já que interessava a Goffman,
sobretudo, as interações face-a-face. As interações que analisaremos são todas de caráter
face-a-face; no entanto, antes de chegar-nos para serem analisadas, passaram por um
processo de mediação, que confere ao programa um poder último de decisão que toma
forma na edição do material gravado. Porém, ressaltamos, a edição depende da interação e
do processo de negociação que se deu entre integrantes do Pânico na TV e as pessoas com
quem interagiram no momento de captação das imagens e diálogos.
O nosso trabalho será, portanto, o de recolher indícios tanto nas intenções da
edição, é claro, quanto nas unidades de relação instauradas face-a-face. A partir destes
indícios e da forma como o programa como um todo tenta se enquadrar para a interação
com seu público – analisada nas etapas anteriores – pretendemos chegar a algumas
inferências. Vejamos os nossos casos.

4.4.1. Vesgo e Sílvio Duas Caras: Globais e Dona Matilde

O primeiro caso que vamos analisar integra o quadro “Vesgo e Sílvio” de nosso
Programa 1. Na ocasião, a dupla de repórteres cobria a festa de lançamento da novela Duas
Caras, da Rede Globo. Lembremos que, anunciando a atração ainda no início da edição, o
programa tenta dar o tom do que acontecerá:

Vesgo e Sílvio aterrorizando a nata da Rede Glóbulo de televisão no Rio de


Janeiro.

155
Antes da atração ir ao ar, no quarto bloco do dia, ela é assim apresentada, ainda no
palco ao vivo, por Sílvio:

Vamos agora com a festa no Rio de Janeiro. Aconteceu esta semana. A festa da
novela das oito, Duas Caras, com o repórter Vesgo e o Sílvio Santos. Várias
celebridades. Roda aí.

Já somos direcionados à atração com uma série de promessas e significados. Além


da promessa maior do programa – o descompromisso geral, a diversão a qualquer custo e o
‘destronamento’ das celebridades –, outras promessas e significados nos são oferecidos.
Por duas vezes já haviam citado o nome da cidade em que se deu o evento coberto. “Rio de
Janeiro”, onde se concentra as atividades da Globo, aparece como parte da convocação
para o quadro que promete ainda que veremos “várias celebridades” – expressão que na
fala de Sílvio virou uma frase completa, dotada de valor em si mesma.
Iniciando a cobertura do evento, Vesgo e Sílvio fazem uma pequena apresentação
em que se vê que eles estão vestidos por um terno só. Como siameses eles já se posicionam
como tolos bufões, garantindo a irreverência, antes mesmo de entrar em interação com a
“nata” da Rede Globo que iriam aterrorizar.
Vemos sim muitas celebridades, os atores e atrizes da novela que estava sendo
lançada. Vários globais foram interpelados, mas com tratamentos que se resumem às
piadas com conotação sexual, aos comentários irônicos e maldosos sobre aparência
(cabelo, roupa, forma física), ao apontamento do programa Malhação como lugar de
talentos menores (ora dizendo que determinados atores deveriam atuar em Malhação, ora
parabenizando cinicamente os que ascenderam deste programa para a novela das oito), à
referência a possíveis ‘testes do sofá’. Brincadeiras e piadinhas tolas, que os atores
pareceram aceitar como sendo o quadro, já mais ou menos estabelecido, que deve ordenar
a interação com a dupla do Pânico na TV. Este quadro foge nitidamente do quadro de
sentido, socialmente partilhado, que ordena interações entre entrevistadores e entrevistados
neste tipo de situação (pensemos em Amaury Jr., por exemplo). Marjore Estiano, uma
estreante atriz-protagonista e cantora, entra na seguinte interação com Vesgo e Sílvio:

Vesgo: É a primeira vez que você é protagonista?

Marjore: É

156
Sílvio: Não quero puxar seu saco não, mas você é a única atriz-cantora que dá
certo. Como é que é dar certo? É gostoso? É legal?

Marjore: É ótimo!...

Sílvio: Quando é que você vai aparecer lá em casa pra gente jantar, comer uma
pamonha?

Marjore: Me chama...

Vesgo: Você é tão legal que eu não consigo nem falar nada de mal de você.

Marjore: Só uma zoadinha...

Vesgo: Eu não consigo nem falar que você está parecendo um palmito.

Sílvio: Ele não vai falar que você fez chapinha com o ferro de passar roupa.

Vesgo: Não vou falar.

Sílvio: Não vai falar porque isso é ofender a pessoa.

Vesgo: Não pode falar que ela veio com sapato de boliche.

Sílvio: Não, esse sapato é do Palhaço Carequinha.

Vesgo: Não pode falar.

Sempre com um sorriso, a atriz demonstra se divertir e não se constranger com o


enquadramento proposto, nem com o que sugere conotações sexuais (de que ela “dá
certo”), nem mesmo com o que sugere que o jantar que ela merece é uma pamonha. Não
encontrando resistência por parte de Marjore e com cinismo, Vesgo diz que não consegue
falar nada de mal da atriz. Ciente do quadro que rege a proposta da dupla, responde: “Só
uma zoadinha...”. Seguem-se comentários sobre sua roupa, cabelo e sapato. Mas em
nenhum momento a atriz deixa indícios de estar irritada. Ela se submeteu ao quadro
proposto por opção e não por ser subjugada a ele. Tampouco demonstrou estar
aterrorizada.
Entre os globais interpelados, uma outra interação, ou melhor, tentativa de
interação, também nos chamou a atenção. Ela se deu com Suzana Vieira, atriz experiente e
de carreira sólida dentro da Rede Globo. Quando percebem que ela está chegando, Sílvio
grita: “Suzana Vieira!...”. Cercada de seguranças, ela não se aproxima da dupla. É a vez de
Vesgo tentar: “Ô Suzana, eu te amo. Eu sempre vou te amar.”. Percebemos a atriz, de
longe e fora do microfone, responder: “Obrigada, eu também.”. Ao tom de cinismo do
repórter, a atriz responde, se não com cinismo, com bastante frieza, demonstrando estar

157
ciente do enquadramento que está sendo proposto mas não disposta a participar de uma
interação ordenada por tal quadro. Com esta resposta, ela demonstrou também que o
quadro com base no qual ela atuava era o da educação social básica, que nos pede para
agradecer e retribuir um “elogio”.
Após um corte na edição, vemos Suzana Vieira já na porta de entrada da festa,
acenando para fotógrafos e fãs. Sílvio vira-se para a câmera e diz: “Suzana Vieira que vai
fazer parte agora do grupo Meia Soquete126.”, claramente ironizando os longos e loiros
cabelos da atriz já senhora, mas conhecida por sua alma e seus namorados jovens. A ironia
de Sílvio é uma forma de tentar enquadrar a situação, reforçando para o público o que eles
estão dispostos a fazer. Reforçando este enquadramento de uma interação passada, temos o
lettering colocado na edição para “identificar” a atriz. Ao invés do tradicional “Suzana
Vieira – atriz”, lemos “Suzana Vieira – e cônjuge”. Percebemos que o programa tenta, com
isso, fazer uso do seu poder final sobre o enquadramento da situação, a edição, para
direcionar críticas à atriz. Porém, as cenas da interação tentada deixa claro a força de que
dispõe Suzana Vieira para não se curvar ao quadro proposto.
Contudo, o destaque do quadro foi o tratamento dispensado a Dona Matilde. Sequer
sabemos se este é o seu verdadeiro nome. Em momento algum ela aparece dizendo como
se chama. Nomeá-la Dona Matilde já parece ser uma forma de tentar enquadrá-la em uma
categoria etária e sócio-cultural. Dona Matilde estava na porta do evento, esperando por
um ator que viria buscá-la para entrar com ela na festa. Não se tratava de uma famosa.
Tratava-se de uma figura popular: pele bastante morena; cabelos negros soltos, ondulados
e longos, tratados com algum produto de aparência constantemente molhada; baixa e de
composição corporal achatada; trajando um vestido vermelho simples; vermelho também o
batom, lápis preto em volta dos olhos escuros; aparentando ter em torno de quarenta anos.
Sílvio, antes de se aproximarem de D. Matilde, descreve: “A senhora sai do motel
com o cabelo, nem seca no secador.” Tampouco sabemos de onde D. Matilde veio, mas ela
já está enquadrada como uma senhora que saiu do motel. Eis o primeiro diálogo que
travam com ela:

Vesgo: Você está esperando o quê, um convite?

Dona Matilde: Estou esperando o ator me buscar, que me convidou.

126
Trata-se de um grupo musical da década de 80, formado por jovens e belas garotas, dentre as quais
Adriane Galisteu que, na época, tinha 14 anos.

158
Sílvio: Que ator, que ator te convidou? É famoso ou é figurante?

Dona Matilde: Não. É famoso.

Vesgo: Qual é o ator? Qual é o nome dele?

Dona Matilde: Eu não vou falar.

Neste primeiro diálogo, D. Matilde se mostra confiante, tem um pequeno sorriso


no rosto, como querendo demonstrar certeza de que vai entrar na festa. Tentando definir
melhor o quadro, Sílvio questiona se quem a convidou é famoso e qual nome tem. D.
Matilde, ainda com um leve sorriso confiante, está decidida a não falar.
Uma tarja aparece no inferior do vídeo e avisa:

Dona Matilde, personagem principal desta matéria, aguardem!

O quadro que prometeu “aterrorizar a nata da Globo” e mostrar “várias


celebridades” assume que vai mesmo é zombar de D. Matilde. Após algumas outras
entrevistas com atores da novela, Vesgo e Sílvio voltam em D. Matilde. Não sabemos o
tempo que se passou. Um dos poderes da edição é justamente reordenar o tempo captado,
mas neste outro contato, somos localizados no tempo:

Sílvio [para a câmera]: Ela chegou aqui. Tá com 10 minutos e até agora não
entrou. Tá esperando o ator que vai por ela pra dentro.

Vesgo: Que ator vai colocar você pra dentro?

Dona Matilde: O ator Ivan.

Vesgo: Quem?

Dona Matilde: O Ivan, que está passando neste momento lá.

Sílvio: Não, mas quando ele assinar um contrato ele te coloca pra dentro. Ele te
coloca até na NASA, você vai entrar na NASA, no Oscar.

Vesgo [para Sílvio]: Mas se ela não entrar até o final da festa, eu vou rir tanto…

Sílvio [para Vesgo]: Não, eu vou rir pra ‘cara...’

Desta vez, D. Matilde não leva no rosto o sorriso de confiança que demonstrou
anteriormente. Subjugada pelo quadro proposto – o de que ela estava tentando entrar em
uma festa sem ser convidada e de uma classe da qual não pertencia –, se sente na obrigação
de revelar o nome do ator e de tentar apontá-lo na festa. Sílvio e Vesgo insistem na idéia de
que a festa é para gente famosa, reforçando um enquadramento que confere poderes e

159
superioridades àqueles que assinam contrato com a Globo. Outra tarja aparece no vídeo,
reafirmando o enquadramento de que D. Matilde é “apenas” uma brasileira:

Dona Matilde é brasileira e não desiste nunca.

Outras entrevistas com atores e de volta à D. Matilde que, inquieta, tenta falar com
alguém pelo celular. Sílvio não perde a oportunidade para enquadrá-la de vez como uma
popular:

Sílvio: Não entrou ainda? Meia hora na tela. Ela ainda não entrou. Tá ligando
pro ator do celular pré-pago que ela comprou em 5 vezes.

Pouco mais tarde, D. Matilde, já demonstrando sinais de desespero, aborda Débora


Falabella, que entrava na festa. Não ouvimos o que diz a ela. Só ouvimos a atriz dizer
“Ivan? Eu falo.”. Vesgo e Sílvio se intrometem na conversa:

Vesgo [para Débora Falabella]: Ela não foi convidada, ajuda ela.

Débora Falabella: Eu aviso pra ele.

Dona Matilde [para Vesgo e Sílvio]: Ela sabe que eu fui convidada.

Vesgo e Sílvio: HAHAHAHA....

Vesgo e Sílvio se ocupam de mais alguns famosos e voltam. D. Matilde sim parece
aterrorizada:

Sílvio: 46 minutos e ela não entrou ainda, Vesgo.

Vesgo: Acabou a novela.

Sílvio: Não vai sobrar nenhum risole, nenhuma coxinha de frango pra senhora.
Você é famosa? Fala pra mim.

Dona Matilde: Não, eu não sou famosa, mas vou ficar.

Vesgo e Sílvio: HAHAHAHA....

Sílvio: Vai ficar famosa. Por gentileza, os fotógrafos. Tem uma atriz ali que não
é famosa, ela quer ficar famosa. Vamos jogar uns dez flashes em cima dela ali,
só para ela ficar feliz.

D. Matilde, em sua vontade de entrar na festa e no seu desejo de ficar famosa, não é
só ridicularizada para o deleite dos telespectadores. Os flashes pedidos por Sílvio aos
fotógrafos são disparados e o público, que se reuniu atrás do cordão de isolamento, vibra.

160
O quadro parece que vai terminar. Vemos um compacto de imagens do evento ao som de
‘Keep it comin’ love’, como no programa de Amaury Jr.. Porém, o quadro volta para
mostrar o desfecho da história de Dona Matilde. Finalmente o ator Ivan aparece e entra
com ela para a festa. Vesgo, Sílvio e o público vibram como se fosse um gol: “É do
Brasil!”. Mais uma vez, o popularesco da cena é enfatizado pelo tipo de comemoração
proposto pelo programa.
Com este caso vimos a força que tiveram Vesgo e Sílvio para moldarem o quadro
da interação com D. Matilde e vimos, também, que a maior força cômica do quadro se
voltou contra uma mulher comum que sonhava em circular entre celebridades e ser uma
delas.

4.4.2. A mulher que abalou a República

A cobertura do lançamento da Playboy de Mônica Veloso, como vimos, foi


alardeada ao longo de todo o Programa 2 como sendo a grande atração daquela edição.
Emílio, ainda no primeiro bloco, avisa que os políticos do Pânico foram conferir o
lançamento e que deixaram Mônica Veloso “muito brava”. Esta “matéria” teve uma
peculiaridade em relação às outras que se fazem da interação com celebridades. Além do
poder de enquadramento no momento da edição comuns a outras atrações – com a
manipulação das imagens, inserção de letterings e tarjas, inclusão de trilhas e de efeitos
computadorizados –, esta atração recebeu uma introdução com locução em off, que
também era utilizada entre as cenas e diálogos captados para tecer uma narrativa
enquadrante. Tal narrativa tinha, nominal e majoritariamente, o telespectador como
destinatário. Porém, às vezes também simulava se dirigir a Mônica Veloso.
Anunciada como o grande assunto da semana, a atração sobre a “famosa de
Brasília” começa com uma edição de imagens de várias capas da revista Playboy, sendo a
primeira a de Mônica Veloso, que recebeu um zoom em direção ao título que dizia: “A
mulher que abalou a República”. A trilha de fundo trazia a música “É”, de Gonzaguinha, e,
depois do trecho “a gente não tem cara de babaca”, a locução em off dizia o seguinte:

A revista Playboy sempre estampou em suas capas as mulheres mais famosas e


cobiçadas do Brasil. Exibindo a nudez perfeita de belas atrizes, apresentadoras,
cantoras e demais artistas consagradas pelo público. Neste mês de outubro,
porém, a capa da Playboy traz uma mulher praticamente desconhecida, que não é
nenhuma artista, nem celebridade de televisão. Na verdade, Mônica Veloso é

161
jornalista. Mas também não foi a sua atividade profissional que a levou a ser
chamada para posar nua na mais importante revista adulta do Brasil. A essas
alturas, é bem provável que você já saiba quem é ela. Mas, fomos às ruas
conferir se, de fato, o povo brasileiro sabe quem é a mulher que abalou a
República.

A partir desta introdução vários quadros ficam bem posicionados. O primeiro deles
(através da trilha e da imagem de um palhaço que surge quando a locução diz “Neste mês
de outubro, porém...”) aciona a idéia da falência da instituição política nacional, incapaz de
oferecer ao cidadão tratamento outro que não o de um palhaço. Essa idéia é reforçada
quando o texto deixa em aberto o motivo que levou Mônica Veloso à capa da Playboy. No
entanto, informações complementares nos ajudam a deduzir que este motivo está ligado à
política: os personagens escalados para cobrir o evento (Presidente Mula, Deputado Clô e
Bob Jeff) e a adjetivação “a famosa de Brasília” feita na apresentação do quadro.
Ao mesmo tempo em que o programa enquadra Mônica Veloso como uma
“famosa”, ela também é enquadrada como uma “desconhecida”, uma não “artista nem
celebridade de televisão”. Além disso, a locução posiciona a revista como a mais
importante para o segmento adulto do país e, portanto, lugar naturalmente reservado a
“belas atrizes, apresentadoras, cantoras e demais artistas consagradas pelo público”. Ou
seja, a revista é apresentada como um Olimpo ao qual apenas “deusas” deveriam ter
acesso. Mônica Veloso é, dessa forma, enquadrada como alguém que deveria estar fora
deste restrito universo.
Após esta introdução editada, temos imagens de pessoas nas ruas respondendo se
conhecem ou não a ex-jornalista. “Nunca vi, quem é?” e “Não faço a menor idéia” são
exemplos das 13 respostas, todas negativas, que a edição apresentou. Além do programa
“comprovar” que Mônica Veloso é uma jornalista, o programa também diz, mesmo que
indiretamente, da falta de engajamento das pessoas nas questões políticas.
A locução segue dizendo:

Sim, querido telespectador. Mônica Veloso não é uma unanimidade nacional.


Mas a revista está apostando que ela vai bater todos os recordes de venda,
inclusive de Feiticeira e Tiazinha. Para acompanhar de perto a festa de
lançamento da revista e conhecer um pouco melhor a mulher que abalou a
República, enviamos nossos três representantes do humor político nacional: o
Presidente Mula, O Deputado Clô e o cantor e delator Bob Jeff.

O enquadramento da falência da instituição política é reforçado com a idéia de um


“humor político nacional”. Fazendo do político objeto do risível, o programa não apenas

162
aponta para a decadência ou a inadequação da instituição política, mas ajuda a significá-la
como tal.
Ainda fora da festa, os políticos do Pânico conversam entre si. Quando a conversa
acaba e enquanto caminham para a entrada da festa, ouvimos um trecho de um pagode que
diz “porque malandro é malandro e mané é mané”.

Presidente Mula: Então essa moça, Mônica Veloso, está aqui no hotel.

Bob Jeff: Exatamente. Daqui a pouco a gente vai ter uma entrevista com ela. Nós
vamos conversar, tirar satisfação, você (para o presidente) vai cobrar a CPMF,
Mônica Veloso...

Presidente Mula: Mas eu não sei de nada.

Bob Jeff: Você nunca sabe de nada, né?

Deputado Clô: Você vai conhecer tudo. Essa revista que vai sair nas bancas. Já
saiu nas bancas, né?

Presidente Mula: Já saiu.

Deputado Clô: Volta quando? Essa piada a gente faz desde 2004.

Bob Jeff: Vamos ver a periquitinha do senador. Vamos lá, vamos lá.

Enquadramentos propostos para o Presidente à parte, este trecho de conversa pode


nos dizer de duas coisas sobre Mônica Veloso e o enquadramento que está sendo proposto
a ela pelo Pânico. Primeiro, que Mônica Veloso deixa de ser apenas uma “praticamente
desconhecida” e passa a ser a “periquitinha” do senador. O motivo que a levou à capa da
Playboy vai ficando mais delineado. Enquadra-se também com mais clareza, o tipo de
figura feminina que se quer acionar para posicionar a ex-jornalista. Outra coisa que nos
chamou a atenção na conversa, foi o desvelamento de que o programa está tirando proveito
do acontecimento político que colocou foco em Mônica Veloso – o que, de uma maneira
geral, poderia ser aplicada a vários outros acontecimentos e eventos. Além de declararem a
piada que fazem desde 2004, a cobertura do evento segue uma regularidade percebida:
inicia-se com o desmerecimento da festa.

Deputado Clô: Olha o que tá lotado a festa. Só tem o pessoal do Otávio


Mesquita. Nem no lançamento da revista de Tânia Panicat, teve tão pouca gente.

Outra regularidade que marca não só as coberturas que fazem a eventos e festas,
mas o programa como um todo, é percebida. Na entrada da festa, os personagens do

163
Pânico interagem com as coelhinhas da Playboy que estão na recepção do evento. A
temática gira em torno das costumeiras piadinhas com conotação sexual, tais como: “Você
quer ver o meu ovo de Páscoa?”, “Ou prefere ver a cenoura do presidente?”.
Antes de entrarem em interação com Mônica Veloso, interagem ainda com sua
irmã. O presidente Mula diz preferi-la à ex-jornalista e pergunta porque ela não saiu junto
com a irmã. A resposta demonstra bom manejo da situação: “Mas não é a opinião geral,
né? Então... e ela tá muito bem, ficou muito bem.” A irmã de Mônica Veloso se mostrou
firme em sua atuação baseada em um quadro de sentido que ordenaria uma entrevista
regular. Uma tarja surge na tela durante esta interação. Nela, lemos: “Irmã de Mônica
Veloso: tão conhecida quanto ela”. Com isso, o programa insiste em posicioná-la como
uma não-celebridade. Na seqüencia, a locução avisa:

Depois de algum tempo, Mônica Veloso finalmente adentra o recinto.

Ouvimos o trecho de uma música cuja letra diz: “Din din din din dinheiro”. A
locução tenta passar a idéia de que Mônica Veloso estava tentando evitar de se apresentar
no evento ou, pelo menos, retardar o momento de sua aparição. O que é reforçado por
outra tarja que aparece para dizer: “Agora ela não escapa.”. Desconhecida, “periquitinha” e
fugidia são as idéias propostas, até então, para enquadrar a mulher que abalou a República.
Sobre imagens de Mônica Veloso, que segura um buquê de flores, sendo fotografada no
evento, entra uma descrição do Deputado Clô:

Mas é uma mulher muito bonita, né? 39 anos, a idade da loba chegando. Ó,
gente, ela acabou de sair de um velório, tá trazendo as rosas. Eu acho que não
tem Photoshop, acho que aquelas manchas de brotoeja e catapora ela tirou com
maquiagem. Ela tem uma pele bonita, vejam só, espremeu três cravos e duas
espinhas antes de vir pra cá. Ela tem uma semelhança com Ivete Sangalo...
depois da exumação.

Entre poucos elogios e muitas depreciações, a fala de Clô, mais uma vez,
hierarquiza Mônica Veloso em relação a celebridades “de verdade” na comparação que
estabelece entre ela e Ivete Sangalo. Ouvimos, como trilha sonora, um trecho da música
“Miss Brasil” de Rita Lee: “...uma senhorita que nunca se viu...”. A imagem se congela e
um zoom põe em close um homem de terno que estava ao lado de Mônica Veloso,
enquanto a locução diz:

164
Repare que Mônica Veloso parece estar o tempo todo na defensiva, como se
estivesse com medo de responder às nossas perguntas. Sim, caro telespectador.
Por que quem leva um advogado para supervisionar as entrevistas ao vivo?

A tarja “Agora ela não escapa.” volta à tela e é reforçado o enquadramento que diz
que Mônica Veloso é fugidia, matreira. Reforça-se também o enquadramento que o
programa propõe para si: o de amedrontador.
“Eu sou um dos advogados dela.”, escutamos o homem de terno dizer, dividindo a
tela com os políticos do Pânico. Bob Jeff não perde a oportunidade e pergunta: “Ah, você
sabe tudo de vara, né? Hahaha...”. A cena é cortada. Não sabemos como o advogado
reagiu. Novamente usando como trilha sonora o trecho “...uma senhorita que nunca se
viu...”, a imagem se volta para Mônica Veloso, cercada pela equipe do Pânico. À sua
esquerda está o Presidente Mula, à sua direita estão o Deputado Clô e Bob Jeff e à sua
frente está o câmera, fechando uma espécie de círculo. Atrás de Mônica Veloso, uma
parede. Parece mesmo que vai ser difícil ela “escapar”. A interação que vemos acontecer
começa imprimindo em Mônica os quadros de sentido que o programa veio construindo
para ela:

Bob Jeff: Oi, Mônica, tudo bem. Quanto tempo. Que saudade de você, não?

Mônica Veloso: Você engordou de novo?

Bob Jeff: Eu engordei de novo, querida. Mas você tá bem... Tá bem gostosa,
hahaha...

Mônica Veloso tenta mostrar calma e disposição para participar da brincadeira,


apesar de estar com o seu torso inclinado para trás. No entanto, os personagens do
programa deixam claro que a brincadeira envolverá falas desrespeitosas para enquadrá-la
segundo suas intenções. Uma tarja, ironicamente, parece desdizer o “elogio” de Bob Jeff:
“Depois de Hortência e Mara Maravilha, ela: Mônica Veloso.”. A reação de Mônica à fala
de Bob Jeff não é mostrada. A cena seguinte mostra a ex-jornalista sendo sabatinada por
Clô:

Deputado Clô: Você quer voltar à televisão? Você quer sair linda e maravilhosa?
Por que esse momento assim?

Mônica Veloso: Ah, foi...foi uma conjunção? Foi...

Deputado Clô: Uma conjunção?

165
Mônica Veloso: Uma conjunção. O amor à arte. O nru...o nu artístico, né... né?
Não é bonito?

Deputado Clô: Não teve Photoshop?

Mônica Veloso: Não, não teve.

Deputado Clô: Nada?

Mônica Veloso: Olha, você acha que teve Photoshop?

Presidente Mula: Posso te encoxar pra sentir? Hahahaha...

Tentando manter uma imagem de que está em domínio da situação, Mônica Veloso
chega a adotar um tom de cinismo para responder às perguntas de Clô. A primeira parece
dizer que ela é uma oportunista. A segunda interrompe sua fala e, também com cinismo
por parte de Clô, reforça o caráter oportunista que pretendem associar à figura de Mônica.
Ela, por sua vez, não consegue fluência, repete palavras, se atrapalha em algumas e faz uso
do clichê “nu artístico” para designar o trabalho. Ela também tenta transformar suas
respostas em perguntas, em uma tentativa de segurar as rédeas da interação. Porém, suas
perguntas nunca são respondidas, mas rebatidas por outros questionamentos. No final desta
cena, a nobreza que Mônica tentou atribuir ao trabalho que fez por amor à arte, é posta
abaixo pela intervenção chula do Presidente Mula. Tal intervenção volta a reforçar o
quadro de mulher-objeto, de “periquitinha” do senador. A reação de Mônica desta vez é
vista. Em câmera lenta vemos ela responder movimentando negativa e charmosamente
(característica reforçado pela lentidão dos movimentos, que adquirem certa languidez) o
dedo indicador na altura de seu busto, olhando de canto dos olhos para o personagem.
A imagem mais uma vez se congela e sobre uma trilha de fundo, que nos remete a
situações de suspense, temos mais uma vez a locução em off.

Temos que admitir que Mônica é uma bela mulher. Mas além de longilínea como
uma vagem, ela também é lisa como um quiabo. Sempre pronta para escorregar
de qualquer pergunta, como você vai ver agora. E a primeira pergunta é sobre o
voto aberto.

Admitindo a beleza de Mônica, o programa tenta partir para o clássico


enquadramento: mulher bonita, alienada (ou no mínimo desinteressada quanto ao que diz
respeito a determinados assuntos, como política), mas sagaz e oportunista.

Bob Jeff: Mônica, e...eu tô muito curioso. Já que você saiu pelada na revista,
todo mundo tá vendo. Você é a favor do voto aberto?

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Mônica Veloso: Voto aberto?...

Bob Jeff: É.

Mônica Veloso: Ah, não sei...

O vocábulo “nu” é substituído, na fala do personagem do programa, por “pelada” e


a associação entre a abertura que Mônica deu para que “todo mundo” a visse pelada e o
voto aberto se fecha em uma pergunta. Transparecendo entender o enquadramento que o
Pânico pretende conferir à entrevista e tentando se mostrar indiferente e superior a ele,
Mônica diz não saber a sua opinião sobre o que foi perguntado. A partir deste gancho, até
certo ponto ingênuo, que ela deixou, a imagem é novamente paralisada e a locução diz:

Peraí, Moniquinha, você tem que ter uma opinião, querida. Não estamos falando
de esfiha aberta. Sim, querida, estamos falando de voto aberto.

O tratamento dispensado à ex-jornalista deixa nítido a intenção de diminuí-la:


“Moniquinha” e “querida” (usado por duas vezes), reforçam o lugar da mulher que não se
atenta a assuntos “mais relevantes” do que uma esfiha aberta. A cena volta com Mônica
ainda respondendo:

Eu acho que precisa perguntar pro povo na rua. Que que o povo acha: voto
aberto ou voto fechado, né?...

Mais uma vez a imagem se congela e a locução aparece para reforçar o


enquadramento a que o programa vinha, bem-sucedidamente, subjugando Mônica Veloso:

Ela não responde e joga a responsabilidade pra galera. Mas, vamos à próxima
pergunta sobre a CPMF:

De volta à interação que estava se dando na festa, assistimos ao seguinte diálogo:

Bob Jeff: Qual a taxa da CPMF hoje?... Quanto tá cobrando?

Mônica Veloso: Não sei, me conta. Quanto é?

Bob Jeff: Você não sabe?

Mônica Veloso: Não sei. Incrível!

Bob Jeff: Mônica, mais uma pergunta. Você sabe o que quer dizer CPMF?

Mônica Veloso: Eu não sei, me fala?...

167
A complementação da primeira pergunta que Bob Jeff faz – “Quanto tá cobrando?”
– propõe um quadro de sentido bastante específico. Grosseira, é uma pergunta que
enquadra Mônica Veloso como que vendendo alguma coisa. Pelo tom que a interação vem
tomando, acreditamos que a pergunta queira sugerir que ela estivesse vendendo o seu
corpo. Mônica Veloso insiste na mesma estratégia, devolver as perguntas e tentar
demonstrar estar ciente da proposta do programa, mas superior a ela. Uma tarja aparece
para nos dizer que ela não sabe sobre CPMF por preferir usar sua inteligência para outros
fins: “É claro que ela não sabe o que é a CPMF, mas pergunte para ela sobre...”. A locução
arremata:

Locução: Não! Então, quer dizer que ela não sabe o que é CPMF?

Bob Jeff responde o que a sigla significa (pelo menos dentro do contexto do
enquadramento que impuseram à situação):

Olha, Contribuição para a Periquita de Mulheres Fogosas. Hahahaha...

Enquanto Bob Jeff gargalha, vemos o braço de Mônica Veloso se esticar em


direção a alguém que está atrás do Deputado Clô. O seu rosto carrega um sorriso falso,
daqueles prontos para qualquer situação. Depois que ela recolhe o braço, ela se vira para o
lado, nitidamente incomodada com a situação, e a ouvimos dizer: “Vamos lá?” Ela então se
volta para os políticos do Pânico e diz, já partindo para cumprimentá-los com um abraço,
na tentativa de impedir novas investidas:

Gente, eu preciso falar com o resto do pessoal. Obrigada por ter vindo.

A nova investida vem em forma de mais uma locução, que tem como imagem um
zoom que vai fechando a cena em seu rosto congelado e como trilha de fundo a música
“É”:

Mônica Veloso, é uma jornalista, ex-apresentadora de um telejornal da Rede


Globo (imagem de Mônica Veloso na bancada do DFTV), que pretende ser
entrevistadora, que vai lançar um livro sobre os bastidores de Brasília e que nem
ao menos sabe o que significa a sigla CPMF. Será que é por isso que temos
tantos problemas no Brasil? (imagem de uma pessoa vestida de terno, vista da
cintura para baixo, carregando uma maleta de onde saem desorganizadamente
notas de dólares, que por pouco não couberam na maleta) Por que ninguém sabe
de nada? Será que aceitamos pagar taxas, contribuições, sem ao menos

168
questionar o que significam? Será que não tem ninguém neste país que saiba
explicar o que é CPMF?

A imagem em close crescente do rosto de Mônica Veloso é substituída pela


imagem de uma garota que parece estar no corredor de uma escola e que explica:

Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira. A CPMF é só quando


você movimenta o seu dinheiro no banco.

A locução volta para fechar a atração, acionando o quadro que propôs no início: o
da falência de nossas instituições políticas.

É, só nos resta uma saída, além do aeroporto, caro telespectador. Acreditar que
as crianças são a esperança do futuro do que restou do Brasil.

Neste caso, percebemos que as oportunidades abertas por Mônica Veloso durante a
interação com os personagens do Pânico foram exploradas pela edição e pela locução para
imprimir sobre a ex-jornalista o enquadramento pretendido. Mônica Veloso, apesar de ter
conseguido definir o fim da interação, não mostrou força suficiente para impedir o
tratamento desrespeitoso por parte dos personagens e muito menos por parte da edição.

4.4.3. Rosana, a Deusa

Na cobertura que fizeram da Festa da Música Nacional em Canela (RS), Vesgo e


Sílvio levaram um tipo de gás que, ao contrário do gás hélio que afina a voz quando
inalado, engrossa a voz das pessoas. A brincadeira nas interações que estabeleceram com
os cantores presentes girava, assim, em pedir-lhes para inalar o gás e cantar uma de suas
músicas com a voz alterada. Contudo, algumas interações estabelecidas nos chamaram a
atenção pelo tipo de enquadramento que propunham. Entre elas, selecionamos o caso de
Rosana, um ex-sucesso da música e da mídia nacional nos anos de 1980. Com o hit “O
amor e o poder”, a cantora vivenciou um sucesso enorme. Porém, a carreira e as aparições
de Rosana na mídia assumiram uma curva descendente após algumas cirurgias plásticas
mal sucedidas que deixaram cicatrizes no rosto da cantora. Ela ficou por muito tempo
esquecida e passou a ser relembrada quando a estética e a cultura trash da década em que
fazia sucesso voltaram à moda, em mais um exemplo dos movimentos de revival da
contemporaneidade. Enfim, Rosana pode ser considerada uma celebridade decadente,

169
posto pouco honroso para quem já havia sido considerada “uma deusa”. Por este histórico
e pela exploração de sua figura feita pelo Pânico na TV acreditamos que o caso Rosana
pode dizer algo para os objetivos deste trabalho.
Como vimos, seu nome foi citado várias vezes como chamada para a atração ao
longo de nosso Programa 2, que prometia ainda mostrar um clipe inédito da cantora. A
interação começa com Sílvio, ao ver Rosana, chamando seu nome. Um lettering
informava: “Rosana (cantora)” e o trecho mais conhecido de seu maior sucesso, “...como
uma deusa...” é tocado. Até então, nada demais.
A ridicularização de sua figura começa com Vesgo, que chega por trás, sem que a
cantora o veja e grita ao seu ouvido: “Rosana!... nas alturas.”. A cantora leva um susto e
grita. Esta cena é repetida como que em um movimento de loop, fazendo com que Rosana
ficasse parecida com uma marionete. No desenrolar das cenas e dos diálogos, percebemos
que Rosana foi sim tratada como tal, incapaz de negociar ou manipular os quadros de
sentido que estavam sendo acionados pela dupla para ordenar a interação que tiveram com
ela. Já na primeira pergunta, Vesgo sugere que Rosana seja um travesti:

Qual é o seu nome de batismo, Alfredo? (hahaha)

Vemos um corte na edição que pula para a resposta da cantora, mas que também
deixa claro que houve algum diálogo ou reação por parte de Rosana que não foi dado a ver.

Rosana: Meu nome é Rosana Fiemgo, mesmo.

Vesgo, olhando em detalhes o rosto da cantora numa proximidade que deixaria


qualquer um constrangido e movimentando sua cabeça para não deixar de examinar
nenhuma parte, diz ironicamente: “Tá bonito...”. Closes bem fechados no rosto de Rosana
em perfil mostram que ela ri com os olhos semi-fechados e a cabeça um pouco abaixada.
Porém, percebemos que ela ri (e tenta se esconder da situação com os olhos fechados e
cabeça inclinada para baixo) mais por não saber o que fazer naquela interação que se
desenrolava, do que por achando alguma coisa engraçada. Ouvimos Sílvio dizer:

Rosana, você é a mulher com que eu sempre sonhei, com esse seu olhar...

170
A que a cantora, que ainda tem seu rosto em close, responde, tampando com a mão
partes de sua boca e de seu queixo: “Olha...”. Ouvimos mais uma vez o trecho “...como
uma deusa...” como trilha de fundo para o rosto da cantora que ainda ria, nitidamente
constrangida. Em um de seus momentos “atitude nonsense” ouvimos Sílvio cantar outro
trecho da música (“...me levam aléééém...”), prolongando-se na última sílaba. O plano se
abre e vemos os três interagentes. Rosana está de frente para Vesgo (que aparece
parcialmente de costas) e Sílvio, cantando com a boca bem aberta, vem se aproximando da
lateral direita da cantora. Numa tentativa infeliz de tentar mudar o foco da interação,
Rosana diz a Vesgo: “Olha isso!...Olha isso! Esse bocão.” Como Sílvio não pára de se
aproximar com sua bocarra aberta, Rosana vai se encolhendo e termina por se acomodar no
ombro de Vesgo, com os olhos fechados e o semblante aflito de quem teme o que está por
acontecer. Um zoom faz com que o plano seja tomado pela testa da cantora e pelo queixo e
boca de Vesgo que, com sua língua tenta lamber a testa de Rosana.
A cena é cortada e a que se segue é a da cantora inalando o gás de um balão e
cantando com a voz alterada o trecho mais conhecido de sua música. Outro corte e a
imagem que vemos é a dos três interagentes. Desta vez estão todos de frente para a câmera
e Rosana está entre os integrantes do programa. Mais uma vez, Rosana tenta dar o tom e o
assunto da interação e uma vez mais é mal sucedida. Com ares de intimidade, como se
estivesse entre conhecidos, a cantora puxa uma conversa:

Olha, tem um negócio que eu tenho que contar pra vocês. Outro dia eu entrei em
um táxi e o rapaz do táxi me confundiu com a Sabrina.

Vesgo imediatamente solta uma gargalhada e corre com o dedo em riste apontado
para a câmera e em meio à gargalhada grita: “Sabrina!...”. Sílvio também abandona a
interação com Rosana e se aproxima da câmera dizendo: “Você tá bem, hein, Sabrina?”.
Na seqüência, Vesgo e Sílvio dialogam, como se a cantora não estivesse lá.

Vesgo: O que vão falar com a Sabrina agora na rua? Mas o corpo é igual.

Sílvio: O corpo é igual.

Rosana se sentindo, ou fingindo se sentir, lisonjeada, segura com as mãos as duas


partes de sua jaqueta e dá uma rodadinha, exibindo-se. Além da jaqueta, ela estava trajando

171
uma mini-blusa e calça jeans justa. Depois de um corte na cena, vemos Vesgo dizendo para
a cantora:

Eu, eu não sei. Eu tô meio por fora. Achei que você tinha sumido, já. Já tinha
saído. Tinha morrido.

Virando as costas para ela, Vesgo diz para a câmera:

Eu achei que a Rosana tinha morrido. Hahaha...

Vemos Rosana tentar puxá-lo pelo ombro, para dizer alguma coisa, mas a cena foi
cortada. Na próxima cena vemos Vesgo dizer: “Olha só o umbigo da Rosana.” Assistimos
então a um close da barriga da cantora, que a tenta murchar. Fazendo uso de recursos de
edição, o programa acrescenta uma minhoca saindo de seu umbigo. Com isso, temos
reforçado o enquadramento freak-show que estava sendo oferecido com a exploração da
figura de Rosana. Como vimos, a cantora não teve forças para fugir da proposta da dupla,
de suas falas e, obviamente, nem dos recursos de edição.
Ao final da atração, depois de entrarem em interação com outros cantores, Vesgo e
Sílvio anunciam o clipe inédito de Rosana. Na melhor estética tosca do programa, o clipe
apresenta um travesti e a dupla, também travestidos de mulher, dublando e dramatizando o
antigo hit “O amor e o poder”.

4.4.4. Marieta Severo, a que tudo pôde

O evento que o quadro “Vesgo e Sílvio” cobriu em nosso Programa 4 foi a festa da
premiação Cariocas do Ano. O evento já havia sido anunciado como sendo o que colocou
Vesgo e Sílvio “divididos entre globais e a alta cúpula do Rio de Janeiro”, evento “só com
gente importante, celebridades”. E, de fato, Vesgo e Sílvio se depararam com várias
celebridades de carreira sólida e de alto reconhecimento público. A interação que
estabeleceram com Marieta Severo nos chamou especial atenção.
Antes disso, porém, o quadro começou, como de costume, desqualificando ou
ridicularizando o evento como um todo, garantindo certo grau de desconstrução proposto
pelo programa e por esta atração em especial, antes de entrarem em interação com as

172
celebridades presentes. Além disso, começou também apresentando a dupla em situações
de tolas bufonarias. Vejamos:

Vesgo: Mais uma festa em frente ao Copacabana Palace, no Rio de Janeiro,


Sílvio!

Sílvio: É uma festa sensacional, de uma revista, para congratular o carioca do


ano.

Vesgo: As pessoas não tem mais o que inventar festa, tipo um motivo pra fazer
festa e fazem qualquer festa. Cariocas do ano.

Sílvio: Então eu vou ganhar o prêmio, eu sou carioca.

Vesgo: Mineiros do ano. Então eu vou fazer também.

Sílvio: É verdade

Vesgo: E o pior de tudo é fazer festa na chuva, Sílvio, no meio das poças d’água.

Vesgo então chuta uma poça d’água na direção de Sílvio, que começa a correr e ser
perseguido por seu par.

Sílvio: O que que é isso, sujeito? Pegou no meu olho! Pegou no meu olho!

Vesgo: Hahaha.

Sílvio: Você quebrou seu guarda-chuva, burro.

Após as gracinhas iniciais, Vesgo e Sílvio começam a interagir com os convidados.


Como dissemos, analisaremos aqui a interação com Marieta Severo. Ela se dá na saída da
festa. A atriz, ao ver a dupla e antes mesmo de ter sua voz captada por seus microfones, vai
em direção a eles (que estavam no caminho que ela teria que percorrer) já dizendo alguma
coisa que não escutamos. A interação, dessa forma, é iniciada por ela, mesmo que não
tenhamos o conteúdo de sua fala. A edição poderia cortar este momento e apresentar como
início de interação a dupla lhe dirigindo a palavra, mas preferiu não fazê-lo. Um lettering
surge e apresenta, sem qualquer tentativa de piada: “Marieta Severo”. Quando a atriz está
próxima à dupla, passamos a escutar o que está sendo dito na interação:

Vesgo: Marieta Severo!...

Marieta Severo: Vocês dois não descansam. Vocês trabalham muito, gente.

Sílvio: Mas, Marieta Severo...

173
Vesgo: Posso falar?

Marieta Severo: Pode

Vesgo: A gente merece ganhar mais, não merece?

Marieta Severo: Merece, merece.

Vesgo: Então, por favor, pede pro nosso chefe, por favor.

Marieta Severo: Merece. Dá um aumento pros meninos que eles merecem. Eles
trabalham muito. Estão em tudo quanto é lugar.

Vesgo: Vocês também. Só que vocês estão curtindo e a gente trabalhando.

Marieta Severo: Pois é, pois é...

Marieta Severo tem o semblante tranquilo e demonstra segurança frente à dupla. A


conversa segue um tom simpático e já temos outros indícios de que a atriz está
comandando a ordenação da interação: Vesgo pergunta a ela se ele pode falar,
interrompendo uma fala de Sílvio. A atriz responde positivamente e só depois disso a
conversa continua. Vesgo, mais polido do que o usual, usa por duas vezes a expressão “por
favor” ao fazer um pedido a ela. Marieta Severo atende ao pedido, mas não deixa de
marcar as posições na interação: Vesgo e Sílvio são, em relação a ela, uns “meninos”.
Vesgo cria ainda um coletivo a que a atriz pertence e eles não, um coletivo que está sempre
“curtindo”. Marieta Severo não nega a distinção, prefere reforçá-la.
Uma tarja aparece na tela, sugerindo que a atriz está sendo falsa ou, no mínimo,
apenas educada: “Ela não aguenta mais encontrar os dois, essa é a verdade!”. Vesgo
continua o diálogo, mas não tendo ou não sabendo o que dizer, pergunta amenamente sobre
Dona Nenê, personagem da atriz em A Grande Família. As respostas da atriz são
simpáticas, mas sempre lacônicas. A única investida tentada por Sílvio de introduzir na
interação falas ambíguas, com possíveis conotações sexuais, e, portanto, desrespeitosas em
relação ao enquadramento polido e gentil que Marieta Severo impunha, foi cortado com
poucas palavras e um olhar.

Vesgo: E a D. Nenê, vai bem?

Marieta Severo: Vai bem. Tá lá quietinha.

Vesgo: Fala pra ela trazer uns bolinhos de chuva pra mim.

Marieta Severo: Tá bom.

Sílvio: Eu adoro o quindim da D. Nenê, a coxinha...

174
Marieta Severo: É?... Que bom...

Marieta Severo manda beijos para a câmera e volta a caminhar, dando sinais de que
pretende finalizar a interação. Porém Vesgo e Sílvio seguem ao seu lado. O diálogo
continua ameno. Vesgo introduz uma leve brincadeira com o nome da atriz e percebemos
que Sílvio não dirige mais a palavra a ela. Quando diz algo, se dirige a Vesgo.

Vesgo: Marieta-ta tá me chamando. Vamos para o bingo? Daqui a pouco a gente


vai fazer um bingo beneficente.

Marieta Severo: Tá bom.

Sílvio: Mas não pode, o bingo tá fechado. Só se for um bingo lá na sua casa. Um
bode assado e um galeto.

A atriz mais uma vez dá sinais de que pretende finalizar a interação. Desta vez eles
são mais claros e aparecem na forma de uma educada pergunta. Respondendo, Vesgo põe
em palavras o que vínhamos percebendo: que a batuta da interação se encontra nas mãos
de Marieta Severo, que “pode fazer o que quiser”.

Marieta Severo: Eu posso ir agora?

Vesgo: Você pode fazer o que você quiser, minha linda.

Marieta Severo: Posso ir?...

Vesgo faz ainda um último pedido, prontamente atendido pela atriz:

Vesgo: Posso te dar um selinho?

Marieta Severo: Tá bom.

A atriz dá o selinho e vai embora. Alguns passos e ela se vira tranquila, acenando
um tchauzinho. Enquanto ela vai se afastando, Sílvio e Vesgo ainda dizem algumas coisas:

Sílvio: Marieta Severo, quantos Troféus Imprensa? Marieta Severo!...

Vesgo: Obrigado, Marieta.

175
Considerações finais

O contato que tivemos com o objeto de nossa proposta – guiado pelo referencial
teórico-conceitual que acionamos e analisado a partir do percurso metodológico que
consideramos mais pertinente aos nossos objetivos – nos mostrou o quão múltiplo o
Pânico na TV pode ser. Além dos indícios mais específicos, que diziam respeito mais
diretamente às questões que levantamos, encontramos várias outras possibilidades de
questionamentos que caberiam ao objeto. Apresentaremos aqui uma síntese de nossos
achados mais relevantes.
No que diz respeito ao conteúdo, aos temas recorrentes do programa, pudemos
perceber como ele se faz a partir de uma ligação direta com o universo midiático geral e
com suas celebridades, de maneira mais específica. A pauta pública, ou seja, os assuntos
do dia, marcaram fortemente as edições analisadas e, consequentemente, os tipos de
celebridades abordados em cada uma delas.
Não encontramos dificuldades em perceber, também, quais os valores que parecem
guiar a abordagem que o programa faz tanto aos assuntos correntes da mídia, quanto às
suas celebridades. Acreditamos que estes valores são a base a partir da qual o Pânico na
TV tenta estabelecer uma interacão comunicativa com determinado público. Recolhendo
dicas que nos chegaram de vários caminhos – do cenário do programa, do que se falava
sobre ele na mídia, de como o público estava reverberando o que via, entre outros –
conseguimos localizar os valores que sustentam tal interação: espontaneidade, diversão a
qualquer custo e agressividade, principalmente. Localizamos também como a interação
proposta se pauta na negação de certos valores: compromisso, respeito, compaixão,
preservação da figura do outro, entre outros. Tentando marcar o espaço desta negação,
pudemos ver como a abordagem do programa, principalmente na promessa de proposta, é
marcada pelo escracho, pela irreverência e pela desconstrução.
Tais valores e abordagem se deixam ver, ainda, pelo formato do programa. O
Pânico na TV é mesmo um híbrido que se apropria de linguagens diversas, imprimindo
sobre elas o seu estilo: o “tosco”. É nítido como o programa preza pelo mal-feito, pelo mal-
acabado, mesmo quando sabemos que o sucesso que tem alcançado garante-lhe verba
suficiente para um padrão de qualidade distinto. Trata-se, portanto, de uma escolha que
reforça os valores e as promessas com os quais se lança à procura do outro: a audiência.
Acreditamos que o caráter parodístico do Pânico na TV, somado ao seu estilo

176
tosco, possa nos dizer de um outro valor que o programa privilegia: o valor da intervenção
e o da apropriação. Estes valores podem ser relacionados à idéia de desprofissionalização
que vimos em Missika. Para o autor, lembramos, a desprofissionalização diz respeito a um
desejo de participação (de efetiva interação) de uma fração do público que se mostra forte
o suficiente para transformar o sistema de valores em jogo, bem como as referências
estéticas dos programas televisivos. Diz respeito ainda a um estilo que marcaria uma
grande identificação entre programa e público, já que este passa a se sentir capaz de se
expressar no mesmo registro em relação àquilo que consome.
Fazendo uso da paródia através da transformação dos próprios elementos
televisivos em algo carregado com o estilo “qualquer um pode fazer”, acreditamos que o
programa parece apontar sua carga satírica para a mídia em sua centralidade legitimada de
produção de material simbólico. Transportando esta idéia para a questão das celebridades,
acreditamos que outro alvo das suas sátiras seja mesmo a disputa por visibilidade midiática
em seu terreno mais potente: a televisão.
Percebemos, ainda, que o Pânico na TV se constrói em um jogo de promessa-
expectativa, discursivamente reforçada por diversos recursos, às vezes efetivada nas
atitudes de seus personagens, nos quadros e atrações do programa, às vezes não.
Acreditamos que esta instabilidade (ou indefinição) garante uma estrutura eminentemente
irônica ao programa, que parece fazer despertar um certo tipo de prazer na audiência, como
nos mostrou Muecke. Segundo o autor, que se dedicou ao estudo da ironia na literatura e
no teatro, principalmente, existe ironia no desconhecimento de um personagem de que suas
ações estão sendo manipuladas por outro personagem. A consciência desta manipulação
por parte de um observador irônico resultaria em um tipo de prazer que pode ser resumido
em três palavras: superioridade, liberdade e diversão. Transpondo estas idéias para a
realidade de nosso objeto, pudemos pensar que a comunidade discursiva que o Pânico
gerou em torno de si esteja ciente da indeterminação do programa quanto a cumprir ou não
as promessas que apresenta. Com isso, imaginamos que este público está ciente de que a
qualquer momento uma vítima, incônscia de seu destino nas interações estabelecidas com
integrantes do programa, pode se surpreender com o tratamento recebido. É com base nesta
estrutura irônica que acreditamos ser possível determinado público – o observador irônico
– se divertir, por exemplo, com as ingênuas tentativas da cantora Rosana de se livrar do
enquadramento constragedor a que estava sendo subjugada e ter como retorno o reforço de
tal enquadramento.

177
Tendo o Pânico na TV já quase seis anos de exibição, suas potenciais vítimas já
conhecem também a proposta do programa. Mas como esta proposta está baseada na
estrutura irônica da efetivação ou não da expectativa gerada discursivamente, é de se
imaginar que, mesmo conhecendo a proposta do programa, os interpelados nunca estarão,
ao certo, seguros do que pode se dar na interação com alguns de seus integrantes. Ou, pelo
menos, é de se imaginar que o público acredite nisto.
Aproximando-nos de nossa questão central, vimos que, se por um lado, pudemos
perceber que o Pânico na TV dirige algumas críticas e aponta como risível o lugar
reservado às celebridades, por outro, vimos este lugar também sendo reforçado pelo
programa, ao apontar como risível os ingênuos que tentam alcançar a visibilidade
midiática. Nos casos que selecionamos, percebemos a variedade de enquadramentos e
tratamentos na relação que integrantes-personagens do programa estabeleceram com
diferentes celebridades em diferentes situações. Não por acaso, optamos por casos que
envolviam uma aspirante a celebridade, uma recém-celebre de oportunidade, uma ex-
celebridade e uma celebridade com todo o peso que o termo pode adquirir na cultura
midiática nacional. Percebemos que, em relação ao conceito clássico de celebridades –
sobretudo aquele que diz respeito às idéias de Morin sobre os Olimpianos - e definido
como nosso enquadramento primário, comparado ao qual procuraríamos indícios de um
possível re-enquadramento, mesmo o honroso tratamento que o programa dispensou a
Marieta Severo se desvia do padrão. Vesgo e Sílvio não se ocuparam de perguntas que
diziam respeito à atividade que mantém célebre a atriz. Não quiseram saber de seus
projetos, como em que peça de teatro está em cartaz, por exemplo. Tampouco se
interessaram em expor, com uma camada de glamourização, aspectos da vida cotidiana da
estrela que poderiam lhe conferir a humanidade necessária para o processo de identificação
junto ao público. Apesar de amena, a interação manteve traços do caráter de absurdo que o
Pânico na TV parece querer nutrir.
No outro extremo, o tratamento dispensado a Dona Matilde – que acabou por se
transformar em uma personagem, em parte moldada pelo programa e suas intenções – nos
mostrou a força cômica que encontraram na exploração de um tipo de figura cada vez mais
comum na contemporaneidade: esta espécie de alpinista social que tem sua estratégia
baseada na tentativa de alcançar a fama e a visibilidade midiática e que age se moldando de
acordo com padrões que aprendeu com a linguagem da mídia. Talvez a versão pós-
moderna do tipo cômico emblemático que Bergson propôs para a sociedade moderna: o

178
funcionário classe média que, levando a sério o seu trabalho como caminho de ascenção
social, acaba por agir mecanicamente, como se fosse um objeto e não um ser vivo.
Percebemos, então, que no enquadramento oferecido ao universo das celebridades,
existe um desvio em relação ao padrão do enquadramento clássico. No entanto,
percebemos também haver uma gradação de quadros de escracho que parece ser
proporcional à estatura social e à capacidade de negociação da interação das figuras
abordadas.
Através dessa forma de se dirigir ao fragmentado universo das celebridades e de se
apropriar da pauta e da linguagem da mídia, acreditamos que o Pânico na TV estabelece
uma bem-sucedida interação comunicativa com um público que partilha seus valores, suas
abordagens e seu posicionamento. Acreditamos, por fim, que esse partilhamento dá
indícios de um quadro cultural mais amplo, para a compreensão do qual este trabalho
pretendeu contribuir.

179
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183
Anexos

Anexo 1
Estruturação, durações e partes dos programas

Programa 1: 07/10/2007
00’20 Oferecimento
00’20’’ Vinheta de abertura do programa
06’00’’ 1º Bloco
05’25’’ Intervalo comercial 1
05’45’’ 2º Bloco
05’20’’ Intervalo comercial 2
11’35’’ 3º Bloco
05’20’’ Intervalo comercial 3
1 45’00’’ 4º Bloco
05’10’’ Intervalo comercial 4
05’00’’ 5º Bloco
00’20 Oferecimento
2 35’35’’
0 00’40’’ – Oferecimento
0 01’00’’ – Vinhetas (abertura e entre blocos)
0 21’15’’ – Intervalo Comercial
2 12’40’’ – Programa

06’00’’ 1º Bloco
00’31’’ Convocação inicial Tânia Panicat
01’12’’ Saudação sumário Emílio Surita
01’16’’ Merchandising Promoção “Carro dos Sonhos Preserv” (marca de
preservativo)
01’05’’ Sumário Editado Edição com locução em off
01’43’’ Merchandising “Ipanema Anatômicas” (marca de sandálias de dedo)
00’08’’ Chamada para Break Emílio Surita
Comercial127
00’05’’ Vinheta

05’45’’ 2º Bloco
00’05’’ Vinheta
01’50’’ Merchandising “Princeso Maggion” (marca de pneus para motocicleta)
01’42’’ Guevara News ‘Noticiário’ editado
02’05’’ Merchandising “Mash na roleta da Sabrina” (marca de cueca)
00’08’’ Chamada para Break Comercial Emílio Surita
00’05’’ Vinheta

11’35’’ 3º Bloco
00’05’’ Vinheta
01’55’’ Merchandising “Vá de Suzuki” (Motocicleta)
02’00’’ Merchandising “Teste de sedução Axe nas ruas” (desodorante masculino)

127
Nesta edição, as chamadas para os intervalos comerciais acabaram por se transformar em atrações, devido
à temática que o programa teve e à forte ironia com que eram anunciados.

184
02’43’’ E o Kiko? Vinelson Rubens
02’00’’ Merchandising “Momento TUM” (marca de biscoito salgado)
00’30’’ Chamada para Break Comercial Emílio Surita
(erro)
01’45’’ Merchandising TIM Studio (site da TIM com coteúdos produzidos por
usuários)
00’32’’ Chamada para Break Comercial Emílio Surita e Merchan Neves
00’05’’ Vinheta

1 45’00’’ 4º Bloco
00’05’’ Vinheta
01’55’’ Merchandising “Ganhe para se divertir Intelig Web” (concurso entre
conteúdos produzidos por telespectadores)
03’53’’ Merchandising “Mistério de Fanta” (refrigerante)
02’15’’ Merchandising “Robert apresentadores” (marca de jeans)
07’50’’ TV Fama Vinelson Rubens, Insônia Abrão e Andréa Camparete
03’10’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
07’47’’ Alunos de quinta Sílvio
01’15’’ Anúncio de atrações Emílio Surita
06’59’’ Bola Visita Bola visita J.R.Duran
00’35’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
14’45’’ Dô Num Dô Christian Pior e Robaldo Ésperman em Ibiza
00’38’’ Merchandising Promoção “Carro dos Sonhos Preserv” (marca de
camisinha)
15’48’’ Vesgo e Sílvio Festa da novela Duas Caras
01’10’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
22’40’’ Baixas Horas Serginho, Xupla e o castigo de Sabrina Sato
00’46’’ Lance Perfeito (erro) Chamada falsa
03’30’’ Homemgafone Homens com megafones incomodando pessoas nas ruas
05’50’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
04’30’’ Sessão de comerciais antigos Homenagem ao departamento comercial da Rede TV!
00’25’’ Chamada para Break Comercial Emílio Surita
00’05’’ Vinheta

05’00’’ 5º Bloco
00’05’’ Vinheta
01’08’’ Merchandising Kaiser (cerveja)
03’47’’ Encerramento Emílio Surita/Banda Viva a Noite

185
Programa 2: 14/10/2007

00’20’’ Oferecimento
00’20’’ Vinheta de abertura do programa
04’20’’ 1º Bloco
05’25’’ Intervalo comercial 1
05’20’’ 2º Bloco
05’20’’ Intervalo comercial 2
08’40’’ 3º Bloco
05’35’’ Intervalo comercial 3
1 34’00’’ 4º Bloco
05’25’’ Intervalo comercial 4
06’32’’ 5º Bloco
00’20’’ Oferecimento
2 22’17’’
0 00’40’’ – Oferecimento
0 01’00’’ – Vinhetas (abertura e entre blocos)
0 21’45’’ – Intervalo Comercial
1 58’52’’ – Programa

04’20” 1º Bloco
00’35’’ Convocação inicial Tânia Panicat
01’05’’ Saudação sumário Emílio
02’08’’ Merchandising TIM Studio (site da TIM com coteúdos produzidos por
usuários)
00’27’’ Charadex
00’05’’ Vinheta

05’20” 2º Bloco
00’05” Vinheta
00’23’’ Charadex
01’10’’ Merchandising “Momento TUM” (marca de biscoito salgado)
00’57’’ Sumário editado Locução em off
02’05’’ Merchandising “Teste de sedução Axe nas ruas” (marca de desodorante
masculino)
00’35’’ Charadex
00’05” Vinheta

08’40” 3º Bloco
00’05” Vinheta
00’32’’ Charadex
03’15’’ Merchandising “Mash na roleta da Sabrina” (marca de cueca)
00’25’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
01’45’’ Merchandising “Robert apresentadores” (marca de jeans)
00’47’’ Anúncio de atrações Emílio Surita
01’45’’ Merchandising “Mistério de Fanta” (refrigerante)
00’05” Vinheta

1 34’00” 4º Bloco
00’05” Vinheta
02’43’’ Merchandising “Ganhe para se divertir Intelig Web” (concurso entre
conteúdos produzidos por telespectadores)

186
04’47’’ Bola Visita Bola Visita Galvão Bueno
02’56’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
13’30’’ Vô Num Vô Mendigo e Mano Quietinho nas praias de Búzios
00’38’’ Merchandising Promoção “Carro dos Sonhos Preserv” (marca de
camisinha)
15’00’’ Dô Num Dô Christian Pior e Robaldo Ésperman em Ibiza
00’23’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
19’41’’ Vesgo e Sílvio Em Canela
00’45’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
12’37’’ Meda Christian Pior e Robaldo Ésperman na Oktoberfest
02’56’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
10’14’’ Lançamento da Revista de Presidente Mula, Bob Jeff e Clô no lançamento da Playboy
Mônica Veloso de Mônica Veloso
04’43’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
04’00’’ Homemgafone Homens com megafones incomodando pessoas nas ruas
01’24’’ Merchandising Kaiser (cerveja)
00’35’’ Charadex
00’05” Vinheta

06’32” 5º Bloco
00’05” Vinheta
00’50’’ Charadex
01’52’’ Pânico no Navio Promoção para participar das gravações do Pânico no
Navio.
02’00’’ Merchandising “Robert apresentadores” (marca de jeans)
01’45’’ Encerramento

187
Programa 3: 21/10/2007

00’25’’ Oferecimento
00’20’’ Vinheta de abertura do programa
06’21’’ 1º Bloco
05’15’’ Intervalo comercial 1
11’20’’ 2º Bloco
05’17’’ Intervalo comercial 2
12’05’’ 3º Bloco
05’05’’ Intervalo comercial 3
1 25’26’’ 4º Bloco
05’25’’ Intervalo comercial 4
05’18’’ 5º Bloco
00’25’’ Oferecimento
2 23’22’’
0 00’50’’ – Oferecimento
0 01’00’’ – Vinhetas (abertura e entre blocos)
0 21’02’’ – Intervalo Comercial
2 00’30’’ – Programa

06’21” 1º Bloco
00’31’’ Convocação inicial Tânia Panicat
00’50’’ Saudação sumário Emílio
01’23’’ Merchandising Promoção “Carro dos Sonhos Preserv” (marca de
camisinha)
01’00’’ Sumário editado Locução em off
02’00’’ Merchandising “Mash na roleta da Sabrina” (marca de cueca)
00’32’’ Charadex
00’05’’ Vinheta

11’20” 2º Bloco
00’05 Vinheta
00’45’’ Charadex
01’00’’ Novidade: transmissão online Emílio anuncia a transmissão do programa pela internet
01’00 Chamada para a atração da
Ferrari
01’55’’ Merchandising TIM Studio (site da TIM com coteúdos produzidos por
usuários)
00’25’’ Chamada para entrevista com
Rubinho Barrichello
01’35’’ Campanha de Combate à ONG “Por um mundo cheio de peitudas”
Dengue
01’50’’ Merchandising “Ganhe para se divertir Intelig Web” (concurso entre
conteúdos produzidos por telespectadores)
01’05’’ Campanha de Combate à ONG “Por um mundo cheio de peitudas”
Dengue
01’30’’ Merchandising “Teste de sedução Axe nas ruas” (marca de desodorante
masculino)
00’35’’ Charadex
00’05” Vinheta

12’05” 3º Bloco
00’05” Vinheta

188
00’42’’ Charadex
00’33’’ Novidade: transmissão online Emílio anuncia a transmissão do programa pela internet
01’42’’ Chamada para a atração da
Ferrari
01’42 Merchandising “Stand Maggion” (marca de pneus)
02’57’’ Meu Mico Mico Meu Galvão Bueno no Bem Amigos (SporTV)
01’42’’ Merchandising “Momento TUM” (marca de biscoito salgado)
02’32’’ Merchandising “Robert apresentadores” (marca de jeans)
00’05” Vinheta

1 25’26” 4º Bloco
00’05” Vinheta
02’20’’ Merchandising Barbeadores Philips (aparelhos de barbear)
12’00’’ Vô Num Vô Mendigo e Mano Quietinho nas praias de Búzios
03’40’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
01’15’’ Chamada para a atração da
Ferrari
11’55’’ Meda Christiam Pior e Robaldo Ésperman na Festa do Racha –
Parelheiros, SP
00’30’’ Comercial Bombril Comercial do amaciante de roupas Mon Bijou
00’40’’ Chamada para as atrações do
programa
10’00’’ Baixas Horas Serginho Gosma e Xupla no show de Frank Aguiar
00’25’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
21’15’’ Vesgo e Sílvio GP Brasil de F1 e entrevista com Rubens Barrichello
01’35’’ Merchandising “Mistério de Fanta” (refrigerante)
00’15’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
00’15’’ Chamada para a atração da
Ferrari
04’25’’ Xaxala e Cirilo Paródia dos Caçadores de Mitos
04’25’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
01’31’’ Merchandising Kaiser (cerveja)
09’00’’ Atração da Ferrari Bola sendo depilado pela Ferrari
00’05” Vinheta

05’18” 5º Bloco
00’05” Vinheta
01’15’’ Merchandising “Robert apresentadores” (marca de jeans)
03’05’’ Replay Atração Ferrari Bola sendo depilado em câmera lenta
00’53 Encerramento

189
Programa 4: 28/10/2007

00’25’’ Oferecimento
00’20’’ Vinheta de abertura do programa
06’53’’ 1º Bloco
04’55’’ Intervalo comercial 1
07’45’’ 2º Bloco
05’05’’ Intervalo comercial 2
08’56’’ 3º Bloco
05’00’’ Intervalo comercial 3
1 37’38’’ 4º Bloco
04’40’’ Intervalo comercial 4
05’42’’ 5º Bloco
00’25’’ Oferecimento
2 31’14’’
0 00’50’’ – Oferecimento
0 01’00’’ – Vinhetas (abertura e entre blocos)
0 19’40’’ – Intervalo Comercial
2 10’44’’ – Programa

06’53” 1º Bloco
00’30’’ Convocação inicial Tânia Panicat
00’47’’ Saudação sumário Emílio
01’00’’ Sumário editado Locução em off
01’57’’ Merchandising “Momento TUM” (marca de biscoito salgado)
01’42’’ Merchandising “Campeonato de Game Arena Dalponte” (marca de tênis)
00’23’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
00’29’’ Charadex
00’05’’ Vinheta

07’45” 2º Bloco
00’05’’ Vinheta
00’45’’ Charadex
01’57’’ Merchandising TIM Studio (site da TIM com coteúdos produzidos por
usuários)
02’43’’ Meu Mico Mico Meu Galvão Bueno no Show do Intervalo
01’40’’ Merchandising “Mistério de Fanta” (refrigerante)
00’30’’ Charadex
00’05’’ Vinheta

08’56” 3º Bloco
00’05’’ Vinheta
00’46’’ Charadex
02’00’’ Merchandising “Teste de sedução Axe nas ruas” (marca de desodorante
masculino)
02’20’’ Chamada para a atração da Vaca
02’05’’ Merchandising “Mash na roleta da Sabrina” (marca de cueca)
00’35’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
00’30’’ Merchandising (erro) “Robert apresentadores” (marca de jeans)
00’30’’ Charadex
00’05’’ Vinheta

190
1 37’38” 4º Bloco
00’05’’ Vinheta
00’54’’ Charadex
02’20’’ Merchandising Barbeadores Philips (aparelhos de barbear)
02’57’’ Merchandising “Robert apresentadores” (marca de jeans)
13’25’’ Vô Num Vô Mendigo e Mano Quietinho e as surfistas de Búzios
03’41’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
00’23’’ Chamada para a atração da Vaca
08’07’’ Mister Gay Brasil Sabrina Sato e as gostosas cobrindo o evento
00’37’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
06’04’’ Atração da Vaca Vaca no palco sendo ordenhada por Tânia Panicat
00’30’’ Comercial Bombril Comercial do amaciante de roupas Mon Bijou
00’52’’ Atração da Vaca Vaca no palco sendo ordenhada por Tânia Panicat
11’57’’ Meda Christian Pior e Robaldo Ésperman na noite de Ibiza.
00’22’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
03’55’’ Atração da Vaca-leite Leite sendo adulterado no palco
adulterado
20’42’’ Vesgo e Sílvio Festa Carioca do Ano
00’25’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
04’52’’ Tropa de Elite Esquete do grupo “Desnecessários”.
04’40’’ Lance Perfeito Tele-leilão do programa
06’22’’ Atração da Vaca-leite Leite sendo adulterado no palco
adulterado
02’40’’ Merchandising “Ganhe para se divertir Intelig Web” (concurso entre
conteúdos produzidos por telespectadores)
01’43’’ Atração da Vaca-leite Leite sendo adulterado no palco
adulterado
00’05’’ Vinheta

05’42” 5º Bloco
00’05” Vinheta
00’46’’ Merchandising Kaiser (cerveja)
03’20’’ Atração da Vaca-leite Leite sendo adulterado no palco
adulterado
01’31’’ Encerramento

191
Anexo 2
Celebridades Citadas, em Interação e como Campo Semântico

Programa 1 – 07/10/2007

Celebridades Citadas
Celebridade Quando no programa Como
1º Bloco
Martin Luther King Sumário editado Apresentado como revolucionário
Che Guevara Sumário editado Apresentado como revolucionário
John Lennon Sumário editado Apresentado como revolucionário
Nathália Guimarães Anúncio Ipanema Se compara com a sandália que também
Anatômicas é vice, mas é mais gostosa.
2º Bloco
Che Guevara Guevara News “Apresentador” do quadro.
Luciano Huck Guevara News Tema da notícia sobre o roubo de seu
Rolex.
Marylin Monroe Guevara News Citada por “Che” para dizer que se
querem destruir um mito, deveriam tirar
a peruca dela.
Elvis Presley Guevara News Citada por “Che” para dizer que se
querem destruir um mito, deveriam
raspar as costeletas dele.
3º Bloco
Alemão (ex-BBB) Teste de Sedução Axe Um homem que vai participar de teste é
nas ruas chamado de Alemão (é loiro e com o
cabelo espetado).
Paris Hilton E o Kiko? Tema da notícia do quadro.
Kiko do Chaves E o Kiko? Citado devido ao nome do quadro.
Kiko do KLB E o Kiko? Citado devido ao nome do quadro.
Kiko Zambianchi E o Kiko? Citado devido ao nome do quadro.
Luciano Huck Merchandising Vesgo interpela uma mulher na platéia e
“Momento TUM” diz que ela se parece com o Luciano
Huck (nariz grande).
Tá parecendo o Luciano Huck. Tá linda, viu?
4º Bloco
Ronaldinho “TV Fama” Um amigo de Ronaldinho vem sendo
apresentado por Andréa Camparete
quando Vinelson pergunta:
Ele é amigo do Ronaldinho? E e o Kiko?
Gil Gomes Merchandising Sílvio narra o mistério imitando o Gil
“Mistério de Fanta” Gomes e Vesgo pergunta:
Por que que você está falando com essa voz de
Gil Gomes, Sílvio?

192
Camila Pitanga “TV Fama” Fazem parte de uma piada contada por
Carlos Manga Insônia Abrão, que diz que um maníaco
Marília Pêra foi preso por tentar atacá-la. O maníaco
alegou que só queria fazer uma salada de
frutas.

Dédé Santana “TV Fama” Seu rosto aparece na tela, na conclusão


da piada e a música de A Praça é Nossa
entra para classificar a piada de sem
graça.
Vera Verão “TV Fama” Seu rosto aparece no quadro quando
Vinelson Rubens a imita.
Patrícia Maldonado “TV Fama” Usam seu nome para se referir a Lorena
Calábria.
Presidente “Alunos de Quinta” O diploma que Nana Gouveia recebe ao
final do programa é lido:
Eu sou mais esperta que um presidente que tem
só até a 5a série.
Débora Secho; “Bola Visita” Apresentadas como as mulheres mais
Sabrina Sato; desejadas do Brasil, fotografadas por J.R.
Joana Prado, Duran.
Feiticeira; Mara Maravilha é apresentada com
Ana Paula ironia:
Bandeirinha; E é claro, ela, Mara Maravilha.
Mara Maravilha
J.R. Duran “Bola Visita” Apresentado por Bola como o maior
fotógrafo desse país.
Xuxa “Lance Perfeito” Ganhador do carro é entrevistado e
manda beijos para a família. Sem
paciência, Bola comenta:
Aqui não é a Xuxa, mas a gente manda um beijo
também.
Gorete Milagres “Dô Num Dô” Citada (e sua imagem aparece como a
Filó) para dizer que uma mulher
interpelada se parece com ela. Pedem
para ela dizer: “Ô, coitado...”. Ela atende.
Nelson Mandela “Dô Num Dô” Citado (e sua imagem aparece no canto
da tela) para dizer que uma pessoa
interpelada se parece com ele.
Juliane Moore (atriz “Dô Num Dô” Citada (e sua imagem aparece no canto
americana) da tela) para dizer que uma pessoa
interpelada se parece com ela.
Ângela Rô Rô “Dô Num Dô” Citada para dizer que uma pessoa
interpelada se parece com ela.
Tarja: Ângela Rô Rô esparramada na praia...
É carne que não acaba...
Pablo (do Qual é a “Dô Num Dô” Christian Pior pergunta a um interpelado
música?) que disse se chamar Pablo”
Qual é a música, Pablo?

193
Roberto Carlos “Vesgo e Sílvio” na Citado para dizer que uma mulher
festa de encerramento interpelada se parece com ele. Sílvio
de Paraíso Tropical. canta um trecho de “Emoções”.
Sydney Magal “Vesgo e Sílvio” na Citado para dizer que Yoná Magalhães se
festa de encerramento parece com ele.
de Paraíso Tropical. Sílvio:
Você está a cara do Magal. Se você falar com a
gente vou te dar um kit tosa no meu petshop.
Yoná, de longe, apenas sorri.
Perla “Vesgo e Sílvio” na Citada para dizer que uma pessoa
festa de lançamento de interpelada (D. Matilde) se parece com
Duas Caras. ela.
Rodrigo Santoro “Vesgo e Sílvio” na Citado na interação com Ellen Jabour,
festa de lançamento de sua namorada na época.
Duas Caras.
Aguinaldo Silva “Vesgo e Sílvio” na Citados para criticar que Sharon
(escritor de novela) festa de lançamento de Menezes fará o papel de filha de Antônio
e Duas Caras. Fagundes.
Lázaro Ramos (ator) Vesgo: Filha do Fagundes? Igualzinho, né? já
pensou, Aguinaldo Silva? Mas é uma perfeição.
É muito igual, viu? Parabéns. É do Fagundes com
quem, com o Lázaro Ramos?
Bethânia “Vesgo e Sílvio” na Citada para dizer que a mãe de Sharon
festa de lançamento de Menezes se parece com ela.
Duas Caras.
Vesgo: Não sabia que vc era filha da Betânia?

Sílvio: Como é que vai a Dona Canoa?


Kiko do KLB “Baixas Horas” Citado para dizer que o homem que
Sabrina beijou se parece com ele.

Celebridades em Interação
Celebridade Quando no programa Como
4º Bloco
Evandro Santo (o “TV Fama” Chamado de ‘linda’ por Andréa
Christian Pior) Camparete, a que responde ‘linda não,
simpática’; um lettering o aponta como
um Robert.
Monique Evans “TV Fama” Vinelson Rubens pede para que ela
acompanhe o movimento de seu dedo em
uma dança, que termina apontando para a
sua própria região genital.
Salete Campari “TV Fama” Andréa Camparete começa a entrevistá-
(drag-queen) la quando Vinelson Rubens invade o
campo do vídeo imitando Christian Pior
e diz:
Gente, a festa quando tá ruim, gente. Dá até briga
pegar Salete Campari, gente. O que falta de
famoso faz, né gente?
Oscar (ex-integrante “TV Fama” Insônia Abrão: A vida é assim mesmo, né gente?
É uma tragédia, não é, Oscar? Ele, gente, tomou

194
do grupo musical um tapete dos amigos e saiu do BROZ.
BROZ)
Vinelson Rubens: Ei, Oscar. Novidades para o
Flagra?

Oscar: Várias novidades.

Vinelson Rubens: Quais?

Oscar: Música nova junto com o…[é


interrompido]

Vinelson Rubens: Olha aí, olha aí!

Oscar: Isso mesmo

Vinelson Rubens: Mais?

Oscar: Não…

Vinelson Rubens: Acabou. Está fazendo um


tantão de coisas, hein?
Luize Altenhofen “TV Fama” É perseguida por Vinelson Rubens e se
(ex-modelo e recusa a dar a entrevista. Em uma hora
apresentadora do vira-se para ele e uma tarja é adicionada
programa Band na imagem sobre sua boca. O que ela diz
Esporte Clube) não é explicitado. Vinelson comenta:
Olha, está humilde. Depois perde o emprego e
quer dar entrevista.
Sabrina Sato “TV Fama” É ela quem zomba os colegas:
Vocês estão trabalhando aí, né? a gente não é do
mesmo nível mesmo, né? eu sou convidada...
Maria Cândida “TV Fama” Apontada como recepcionista da festa
(apresentadora do por Vinelson que pede para ela ir buscar
Programa da Tarde o carro dele, um Picasso.
da Rede Record)
(repórter esportivo “TV Fama” Perguntado se já fizeram a dança do siri
da Globo) atreas dele, responde que sim, até que já
foi fragrado... (ele se embola para falar).
FRAGRADO aparece na tela e surge a
imagem de um quadro do programa que
parodiava o soletrando de Luciano Huck,
o çoletrano, em que um professor
aparece cabisbaixo, decepcionado.
O quadro se aproveita de um equívoco
do repórter.
Bárbara Kobolt “TV Fama” Ondulando seu corpo, Vinelson Rubens
(repórter do lhe pergunta se ela gosta do movimento.
programa A noite é A resposta é positiva e Vinelson a
uma criança) convida para ir à sua casa depois.
Lorena Calábria “TV Fama” Confundida com a apresentadora Patrícia
(apresentadora do Maldonado, não sabemos se

195
Multishow) propositalmente ou não.
Alemão (ex-BBB) “TV Fama” Falam de seu cabelo espetado e sugerem
que ele já teve um caso com Monique
Evans.
Fernando Meligeni “TV Fama” Andréa Camparete diz querer pegar na
(ex-tenista e sua raquete e outras coisas do tipo.
apresentador Insônia Abrão anuncia com ele o
esportivo) absorvente Fininho (apelido de Meligeni)
Sérgio Abreu (ator “TV Fama” zombado por ter interpretado um
da Globo) homossexual na novela Paraíso
Tropical.
Nana Gouveia “Alunos de Quinta” Após várias brincadeiras de duplo
sentido (obseno) de Sílvio, Nana
responde perguntas que tem entre as
opções, respostas absurdas e a certa, que
é óbvia. Ironizam que ela é burra.
Ildi Silva “Vesgo e Sílvio” na Lettering: Ildi Silva (Caetano já foi)
festa de encerramento Sílvio, imitando a voz de Caetano, canta
de Paraíso Tropical para ela.
Yoná Magalhães “Vesgo e Sílvio” na Lettering: Yoná (Magalhães)
festa de encerramento Vesgo: Descobriu quem matou a Taís e tá indo
de Paraíso Tropical embora, né?
Yoná, de longe, apenas sorri.
Beth Faria “Vesgo e Sílvio” na Vesgo: Estávamos com saudade... Você está
festa de lançamento de muito linda.
Tarja: Reparem que a Betty Faria está meio Lelé
Duas Caras.
Criticam o corte de seu cabelo. Cantam a
música de Tieta.
Beth Faria apenas sorri
Oscar Magrini e “Vesgo e Sílvio” na Leterring: Dalton vigh (e Oscar Magrini)
Dalton Vigh festa de lançamento de
Duas Caras. Vesgo: Dalton Vigh, protagonista da novela das
oito. Não é pra qualquer um não... Gostou da
pergunta do TV Fama? É pra puxar o saco no
começo...

Dalton Vigh: Adianta falar alguma coisa? Você


vai tirar o microfone, não vai?

Vesgo: Imagina..., só vou colocar em outro lugar,


hahaha...

Sílvio (para Oscar Magrini): O seu texto no


primeiro capítulo. É um texto grande ou um
testículo, um texto pequeno?

A resposta não aparece.


Flávia Alessandra e “Vesgo e Sílvio” na Lettering: Otaviano (e Flávia)
Otaviano Costa festa de lançamento de
Duas Caras. Vesgo (narrando o casal que posa para fotos):
Aquela foto. Aquela falsidade, aquele sorriso de
creme dental.

196
Sílvio: Quando é que vc vai levar o seu marido
para fazer uma novela com vc? um par romântico

Flávia Alessandra: Nem te conto…

Sílvio (com voz de locutor): Vem aí, com Flávia


Alessandra Otaviano costa e, a próxima novela
das oitos

O casal entra na brincadeira e interpreta


uma cena.
Tarja: Bela interpretação hein Otaviano…

Sílvio (para Otaviano): Começa em Malhação


primeiro. (Vesgo: hahaha) Começa em Malhação,
depois vc vai…

Vesgo e Sílvio são derrubados por Otaviano, ‘na


brincadeira’.
Sharon Menezes “Vesgo e Sílvio” na Lettering: Sharon Menezes
festa de lançamento de
Duas Caras. Sílvio: Você está magra. Teve que emagrecer
quantas arrobas para fazer a novela?

Vesgo: Não é boi, não Sílvio. Parabéns, viu. E


qual o personagem?

Sharon Menezes: Faço a filha do Fagundes?

Sílvio: Você é filha do Fagundes?

Vesgo: Filha do Fagundes? Igualzinho, né? já


pensou, Aguinaldo Silva? Mas é uma perfeição.
É muito igual, viu? Parabéns. É do Fagundes com
quem, com o Lázaro Ramos?

Sílvio: Que horas vai começar o show daquela


cantora ali?

Sharon Menezes: É minha mãe!

Sílvio: Ah é!

Vesgo: Não sabia que vc era filha da Betânia?

Sílvio: Como é que vai a Dona Canoa?


Você saiu da praia com uma canga e já veio pra
festa, né? tá bonita…

Vesgo pede um selinho e consegue.


Sharon ri, não se mostra intimidada.
Ellen Jabour “Vesgo e Sílvio” na Lettering: Ellen Jabour (mina do
(modelo e festa de lançamento de Santoro)
apresentadora) Duas Caras.
Sílvio: Ellen Jabour!

197
Vesgo: Ellen Jabour, vem cá!

Sílvio: Que mulher linda, ô meu amor, que


simpatia!

A atriz atende o pedido:


Ellen Jabour: Tudo bom? Vocês estão no Rio,
que beleza, hein?

Sílvio: Não, não, não tamo lá em Floripa!


Hahaha

Vesgo: Cadê o Santoro?

Ellen Jabour: Tá viajando.

Sílvio: Assim ele vai ficar Santouro, se ele


começar a viajar muito? hahaha

Vesgo: Que isso, Sílvio?...

Sílvio: Se eu tivesse a sua idade, eu estou com 77


anos. você deve ter 20 anos de idade não?

Ellen Jabour: É, um pouco menos.

Sílvio: Um pouco menos.

Vesgo: Você sente atração por Rodrigos, assim,


não?

Ellen Jabour: Ah, engraçadinho, é porque é xará,


né? Eu já achei o meu Rodrigo, tá?

Vesgo: Eu vou achar uma Ellen, também, na


minha vida, viu?

Sílvio: Você está fazendo parte da novela?

Ellen: Não, estou aqui com o Vídeo Show.

Vesgo: Porque o Vídeo Show pode entrar e o


Pânico não pode?

Ellen Jabour: Ué, quer entrar? Eu boto vocês pra


dentro escondidinho.

Vesgo: Você bota a gente pra dentro?

Ellen dá um tapinha nele, mostrando que


entendeu a ambiguidade da fala de
Vesgo.
Sílvio: Não, ela é casada, Vesgo!

Vesgo: Bota pra dentro na festa, Sílvio.

198
Ellen Jabour: Mas vocês chamam muita atenção.
Mas o que que aconteceu, por que vocês estão
assim? (se referindo ao fato de os dois estarem
em um mesmo terno, como siameses)

Vesgo: É duas caras

Ellen Jabour: Ah... muito bom!

Vesgo (se virando para a câmera, para o público):


Sabe qual que é a pior piada? Aquela que a gente
tem que explicar pra pessoa.

Ellen Jabour: Ah, gente… aqui…beijo.

Ellen encerra a entrevista e entra para a


festa.
Ângelo Antônio “Vesgo e Sílvio” na Lettering: Ângelo Antônio (ator)
(ator) festa de lançamento de
Duas Caras. Vesgo: A gente virou uma pessoa só.

Ângelo Antônio: Isso tá muito bom

Sílvio (cantando): isso aqui tá bom demais….

Ângelo Antônio: Temm que fazer a dança-do-


siri.

Vesgo: Dança-do-siri! Bem bolado.

Vesgo e Sílvio fazem a Dança-do-siri e


rasgam a calça que estão usando

Sílvio: Você consegue fazer, Ângelo, a dança-do-


siri?

Ângelo Antônio: Tô estudando ainda...

Sílvio: Estuda isso aqui ó: (Cantam Zezé di


Camargo)

Sílvio: Nesta novela vc vai fazer o quê, uma


mulher grávida, uma gestante?

Ângelo Antônio: Tá achando que eu tô um


pouquinho gordo?

Sílvio: Não, imagina. Adoro vc.


Débora Fallabela “Vesgo e Sílvio” na Lettering: Débora Fallabela (e seu
(atriz) festa de lançamento de boneco Chucky)
Duas Caras.
Vesgo: A filha de Miguel Fallabela

Sílvio: Esse aqui é o Beto Lee

Vesgo: Tem chucky no nome e Chucky de feição,


parece o boneco assassino.

199
Sílvio: Que isso, Vesgo?...

Débora Falabella: Ele é lindo!

Vesgo: Ele é lindo, maravilhoso...

Sílvio: Você está precisando ir num


oftalmologista.

Vesgo: Eu que sou vesgo e você que é cega?


Suzana Vieira (atriz) “Vesgo e Sílvio” na Lettering: Suzana Vieira (e cônjuge)
festa de lançamento de
Duas Caras. Sílvio: Suzana Vieira!...

Vesgo: Ô Suzana, eu te amo. Eu sempre vou te


amar.

Suzana Vieira (de longe) parece dizer: Obrigada,


eu também.

Sílvio (depois que Suzana já havia entrado):


Suzana Vieira que vai fazer parte agora do grupo
meia soquete.
Renato Aragão Filho “Vesgo e Sílvio” na Lettering: Renato Aragão Filho (filho do
(ator) festa de lançamento de Didi)
Duas Caras.
Vesgo: É o grande filho do Didi Mocó.

Sílvio: Vc é ator?

Renato Aragão Filho: Sou ator

Sílvio: Sua mãe sabe disso?

Renato Aragão Filho: Sou

Vesgo: Hahahaha... É a primeira vez que AU


(grita, se projetando em direção ao entrevistado)
É a primeira vez que você...

Corte na edição.
Sílvio e Vesgo: HAHAHAHAHA

Silêncio súbito
Sílvio: Pode ir, vai acabar a novela. Pode ir.
Obrigado.
Maria Clara (atriz) “Vesgo e Sílvio” na Lettering: Maria Clara (Boca pequena)
festa de lançamento de
Duas Caras. Maria Clara: Que que isso que vocês estão
vestindo?

Vesgo: Duas Caras (risada sem-graça)

Sílvio: Você vai fazer parte da novela Duas

200
Caras?

Maria Clara: Não, vocês estão fazendo... Vcs


estão andando colado assim?Vcs estão ficando?

Vesgo: Gostaria de um selinho “mooooito” seu.

Maria Clara: Tá bom, eu dô o selinho...

Vesgo: O que você veio fazer na festa de Duas


Caras?

Maria Clara: Eu não estou na festa de Duas


Caras.

Sílvio: Claro que está.

Tá sim. Assiste o programa domingo pra ver se


vc não está.
Marjore Estiano “Vesgo e Sílvio” na Lettering: Marjore Estiano (cantora e
(cantora e atriz) festa de lançamento de atriz)
Duas Caras.
Vesgo: É a primeira vez que você é protagonista?

Marjore: É

Sílvio: Não quero puxar seu saco não, mas vc é a


única atriz-cantora que dá certo. Como é que dar
certo? É gostoso? É legal?

Marjore: É ótimo!...

Sílvio: Quando é que você vai aparecer lá em


casa pra gente jantar, comer uma pamonha?

Marjore: Me chama...

Vesgo: Você é tão legal que eu não consigo nem


falar nada de mal de você.

Marjore: Só uma zoadinha...

Vesgo: Eu não consigo nem falar que você está


parecendo um palmito.

Sílvio: Ele não vai falar que você fez chapinha


com o ferro de passar roupa.

Vesgo: Não vou falar.

Sílvio: Não vai falar porque isso é ofender a


pessoa.

Vesgo: Não pode falar que ela veio com sapato


de boliche.

Sílvio: Não esse sapato é do Palhaço Carequinha.

201
Vesgo: Não pode falar.
Alexandre Slavieiro “Vesgo e Sílvio” na Lettering: Rec Martin (irmão do Rick)
(ator) festa de lançamento de
Duas Caras. Sílvio: Até que enfim vc conseguiu um
personagem na novela das oito. Só faz malhação,
né? Há dez anos na Malhação, conseguiu.

Alexandre Slavieiro: Graças a Deus

Sílvio: Fez o teste do sofá, não?

Alexandre Slavieiro: Não


Renata Sorrah (atriz) “Vesgo e Sílvio” na Lettering: Renata (Sorrateira)
festa de lançamento de
Duas Caras. Vesgo: Oi, Renata tudo bem? Estamos de Duas
Caras hoje.

Renata Sorrah apenas passa, sorriso leve,


e balança a cabeça afirmativamente.
Vesgo (depois que Renata já havia entrado):
Você tem medo da gente, mas a gente deixa você
relaxadinha...
Marcelo Novaes “Vesgo e Sílvio” na Lettering: Marcelo Novaes (já pegou
(ator) festa de lançamento de alguém do Pânico)
Duas Caras.
Sílvio: Marcelo não vais falar com a gente, mas
ele vai falar ou não vai? Você vai fazer parte da
novela Duas Caras? Que personagem você vai
fazer?

Marcelo Novaes: Vou fazer o Viecente

Vesgo: Vicente é o homossexual?

Marcelo Novaes: Completamente. Você já leu a


sinopse?

Vesgo: Eu li a sinopse já.

Sílvio: Você fez um laboratório agachado, não


foi? Você ralou o joelho no carpete porque teve
que fazer isso.

Marcelo Novaes: É, de quatro

Vesgo: Porque um laboratório, Sílvio, é um


laboratório muito bacana. ele passa por várias
boates gls e depois sai com vários, vários garotos.
hahaha...

Marcelo Novaes: Mas você tá falando do


personagem?

Vesgo: Não, tô falando de você mesmo, hahaha...

Sílvio: Não, eu perguntei se o personagem entra

202
em vc, ou vc entra no personagem ou você deixa
entrar tudo em vc?

Marcelo Novaes: Você entra no personagem.

Sílvio:Parece que você se envolveu com uma


pessoa do Pânico na TV. Denúncia.

Vesgo: Mentira.

Sílvio: Denúncia.

Sílvio (falando no ouvido de Vesgo): o Carioca.

Tarja: Carioca do Pânico envolvido em escândalo


amoroso com global!

(simulam uma conversa que não pode ser


gravada)

Sílvio: O relógio do ator tque soltou... Não


comprem relógio falsificado. O ponteiro tá solto,
ó!

(Close no relogio e mostram que um dos


ponteiros está solto)

Vesgo: hahaha. A melhor coisa que eu vi. Você


pagou quanto? 2 e 99?

Sílvio: Ator da Globo, hein?

Vesgo: Você pagou quanto, 2 e 99?

Sílvio: Agora, se o ponteiro caiu isso aqui caiu


ainda?

Marcelo Novaes: Beijo.

Vesgo: Hummm... beijo, do personagem

Marcelo Novaes: Vou pegar as duas hoje.

Celebridades Campo Semântico


Expressão Quando no programa Como
1º Bloco
Nata da Rede Sumário editado Usada para anunciar o quadro “Vesgo e
Glóbulo Sílvio”.
Até Miss está Merchandising Usada para promover o produto.
usando “Ipanema Anatômicas”
3º Bloco
Notícia urgente. E o Kiko? Usada para valorizar a notícia que será
Esta vai deixar dada.
muita gente de
cabelo em pé porque

203
a moça é famosa.
Você pode ficar Merchandising Usada para incentivar a participação na
famoso. TIM Studio promoção.
Emílio:
Ó, e na semana que vem nós vamos escolher
quatro melhores vídeos para serem exibidos aqui
no Pânico. Você pode ficar famoso e além disso
lembre-se: se você participar, você pode ganhar
créditos no seu celular.
4º Bloco
Festa de uma revista “TV Fama” Chamada para o quadro.
muito famosa em
São Paulo. Muito
famosa essa matéria.
Quando começa “TV Fama” Vinelson Rubens que se encontra com a
faltar artista eles equipe de um outro programa da Rede
vêem entrevistar a TV! e diz isso que, de certa forma,
gente do Pânico. desmerece o evento (que ele mesmo
havia dito na chamada que tinha muito
famoso)
Gente, a festa “TV Fama” Vinelson Rubens quando Andréa
quando tá ruim, Camparete vai entrevistar Salete Campari
gente. Dá até briga que, assim como a festa, é desmerecida.
pegar Salete
Campari, gente. O
que falta de famoso
faz, né gente?
Mais uma “TV Fama” Vinelson Rubens quando se aproxima o
celebridade carro que traz Sabrina Sato.
chegando.
Vamos conhecer a “Bola Visita” Apresentação de quem será visitado.
casa de uma
personalidade
internacional.
Várias celebridades. “Vesgo e Sílvio” Chamada para o quadro.
Por falta de “Vesgo e Sílvio” na “Entrevistam”, zombando, um travesti
celebridade a gente festa de encerramento que estava na porta da festa.
vai ter que te de Paraíso Tropical
entrevistar.
Estou esperando o “Vesgo e Sílvio” na D. Matilde respondendo à pergunta do
ator me buscar, que festa de lançamento de Vesgo:
me convidou. Duas Caras. Você está esperando o que, um convite?
Que ator, que ator te “Vesgo e Sílvio” na Sílvio perguntando para D. Matilde.
convidou? É famoso festa de lançamento de
ou é figurante? Duas Caras.
É famoso. “Vesgo e Sílvio” na Resposta de D. Matilde.
festa de lançamento de
Duas Caras.
Qual é o ator? Qual “Vesgo e Sílvio” na Vesgo para D. Matilde
é o nome dele? festa de lançamento de

204
Duas Caras.
Eu não vou falar. “Vesgo e Sílvio” na Resposta de D. Matilde.
festa de lançamento de
Duas Caras.
Ela chegou aqui. Tá “Vesgo e Sílvio” na Sílvio para D. Matilde.
com 10 minutos e festa de lançamento de
até agora não entrou. Duas Caras.
Tá esperando o ator
que vai por ela pra
dentro.Que ator vai
colocar você para
dentro?
O ator Ivan. “Vesgo e Sílvio” na Resposta de D. Matilde.
festa de lançamento de
Duas Caras.
Ligando pro ator do “Vesgo e Sílvio” na Sílvio, narrando a situação de D.
celular pré-pago que festa de lançamento de Matilde.
ela comprou de 5 Duas Caras.
vezes.
Tem algum ator “Vesgo e Sílvio” na Sílvio para a mulher que estava
chamado Ivan aí na festa de lançamento de controlando a lista de convidados.
lista? Duas Caras.
Você é famosa? “Vesgo e Sílvio” na Vesgo para D. Matilde.
festa de lançamento de
Duas Caras.
Não sou famosa mas “Vesgo e Sílvio” na Resposta de D. Matilde.
eu vou ficar. festa de lançamento de
Duas Caras.
Tem uma atriz ali “Vesgo e Sílvio” na Sílvio para os fotógrafos que cobriam o
que não é famosa, festa de lançamento de evento.
mas que quer ficar Duas Caras.
famosa. vamos jogar
uns dez flashes em
cima dela?

205
Programa 2 – 14/10/2007

Celebridades Citadas
Celebridade Quando no programa Como
1º Bloco
Presidente Saudação-Sumário Citado para se dizer que “ele” estava ali
para conferir o lançamento da revista de
Mônica Veloso.
Mônica Veloso Saudação-Sumário Citada como uma das principais atrações
do programa.
2º Bloco
John Rubble Sumário editado Citado por suas aventuras.
Chuck Norris Sumário editado Citado por sua frieza.
Charles Bronson Sumário editado Citado por sua sagacidade.
Mônica Veloso Sumário editado Citada para anunciar a atração do
programa.
Frank Aguiar Sumário editado Citado para se dizer onde se dará o
Baixas Horas desta edição.
3º Bloco
Axel Rose Merchandising “Mash Citado por Sílvio para se referir a
na Roleta da Sabrina” Sabrina que está usando uma bandana.
Felipe Massa Merchandising “Robert Citado para dizer que um dos Robert
Apresentadores” Apresentadores se parece com ele.
Mônica Veloso Anúncio de atrações Citada para anunciar a atração do
programa.
Clodovil Merchandising Citado para Sílvio fazer a piada,
“Mistério de Fanta” interpelando uma pessoa na rua:
Você viu? Mas o Clodo-vil.
4º Bloco
Ronaldo Fenômeno, “Bola Visita” Citados como amigos do Galvão Bueno,
Roberto Carlos, na apresentação do quadro.
Ronaldinho,
Kaká,
e Felipe Massa

Galvão Bueno “Bola Visita” Apresentado por Bola como um dos


maiores locutores esportivos do país.
Gil Gomes “Dô Num Dô” Mendigo diz a um homem interpelado:
Devolve a camisa lá pro Gil Gomes.
Chico César “Dô Num Dô”
Gorete Milagres “Dô Num Dô” Citada (e sua imagem aparece como a
Filó) para dizer que uma mulher
interpelada se parece com ela. Pedem
para ela dizer: “Ô, coitado...”. Ela atende.
Juliane Moore (atriz “Dô Num Dô” Citada (e sua imagem aparece no canto
americana) da tela) para dizer que uma pessoa
interpelada se parece com ela.
Ana Hickman “Dô Num Dô” Citada para dizer que uma mulher seria

206
(modelo e atriz) sua versão morena pelas pernas longas
que tem.
Brigitte Bardot “Dô Num Dô” Citada por Christian Pior para elogiar
uma mulher interpelada.
Kate Moss (modelo “Dô Num Dô” Olha a bundinha de Kate Moss...
inglesa)
Paris Hilton “Dô Num Dô” Citada para dizer que mulher interpelada
se parece com ela.
Rosana (cantora) “Vesgo e Sílvio” em Na chamada para a atração, Sílvio diz
Canela. que o telespectador verá em primeira
mão o clipe de Rosana.
Júnior (cantor) “Vesgo e Sílvio” em Mostrado no vídeo do arquivo de 2005,
Canela. quando foi feito com os cantores a
brincadeira com o gás Hélio.
Sandy (cantora) “Vesgo e Sílvio” em Mostrada no vídeo do arquivo de 2005,
Canela. quando foi feito com os cantores a
brincadeira com o gás Hélio.
Frank Aguiar “Vesgo e Sílvio” em Mostrado no vídeo do arquivo de 2005,
(cantor) Canela. quando foi feito com os cantores a
brincadeira com o gás Hélio.
Lecy Brandão “Vesgo e Sílvio” em Mostrada no vídeo do arquivo de 2005,
(cantora) Canela. quando foi feito com os cantores a
brincadeira com o gás Hélio.
Elba Ramalho “Vesgo e Sílvio” em Mostrada no vídeo do arquivo de 2005,
(cantora) Canela. quando foi feito com os cantores a
brincadeira com o gás Hélio.
Cauby Peixoto “Vesgo e Sílvio” em Citado como um dos parceiros de Ângela
(cantor) Canela. Maria.
Sérgio Reis “Vesgo e Sílvio” em Mostrado no clipe que fez para o quadro
Canela. em 2005.
Rosana e Fofão “Vesgo e Sílvio” em Sílvio anuncia que terão um clipe com
Canela. Rosana e perguntam a Sérgio Reis se é
verdade que o Fofão da Simony é o pai
de Rosana.
Rubens Barrichello “Vesgo e Sílvio” em Citado na pergunta que Sílvio faz para
Canela. Carla Perez se sua música “A dança da
tartaruga” é em homenagem a ele.
Luísa Helena “Vesgo e Sílvio” em Citada para dizer que Frank Aguiar se
(deputada) Canela. parece com ela.
Zé do Caixão “Vesgo e Sílvio” em Citado para dizer que Miéle está se
José Mojica Canela. parecendo com ele.
Elke Maravilha “Vesgo e Sílvio” em Citada para dizer que uma mulher que
Canela. está com Gretchen é a Elke Maravilha
sem maquiagem.
Frank Aguiar “Vesgo e Sílvio” em Citado para dizer que Gretchen estava
Canela. “entrando na onda” do cantor ao se
lançar na política.
Alexandre Garcia “Vesgo e Sílvio” em Citado por Sílvio para se referir a Vesgo

207
Canela. que disse que queria falar sério com
Gretchen sobre sua candidatura.
Gisele Bündchen “Meda” na Oktoberfest Citada para dizer que uma garota
interpelada se parece com ela.
Roberto Leal “Meda” na Oktoberfest Citado para dizer que um homem
interpelado se parece com ele.
Marta Suplicy “Meda” na Oktoberfest Citada para dizer que uma mulher
interpelada se parece com ela.
Mônica Veloso Lançamento da Playboy Apresentação da cobertura do
de Mônica Veloso. lançamento de sua revista.
Ellen Rocha, Luma Lançamento da Playboy Aparecem as capas de suas Playboy na
de Oliveira, Mirella, de Mônica Veloso. apresentação da cobertura do lançamento
Juliana Paes, Xuxa, da revista de Mônica Veloso.
Ana Paula, Bárbara
Paz.
Feiticeira e Tiazinha Lançamento da Playboy Citadas como recordes de venda da
de Mônica Veloso. Playboy, que a edição com Mônica
Veloso pretende bater.
Otávio Mesquita Lançamento da Playboy Citado para dizer que só tinha a equipe
de Mônica Veloso. dele cobrindo o evento de lançamento.
Tânia Panicat Lançamento da Playboy Citada para dizer que nem no lançamento
de Mônica Veloso. da Playboy da Panicat havia tão pouca
gente.
Sheila Carvalho Lançamento da Playboy Citada para dizer que uma das
de Mônica Veloso. “coelhinhas” recepcionistas da festa se
parece com ela.
Ivete Sangalo Lançamento da Playboy Citada para dizer que Mônica Veloso se
de Mônica Veloso. parece com ela... “depois da exumação”.
Jota Quest e “Pânico no Navio” Citados como atrações do “Pânico no
Inimigos da HP. Navio”.
Evandro (O
Christian Pior)

Celebridades em Interação
Celebridade Quando no programa Como
4º Bloco
Ângela Maria “Vesgo e Sílvio” em Vesgo: Você saiu de que jardim?
(cantora) Canela.
Chamada de Anã de Jardim.

Na edição, coloca-se um gorro de anão


sobre sua cabeça.

Ela canta com a voz grossa após inalar o


gás e ri.
Faa Morena “Vesgo e Sílvio” em Ela canta com a voz grossa após inalar o
(apresentadora) Canela. gás.

208
Sérgio Reis (cantor) “Vesgo e Sílvio” em Narram uma conversa que ele estaria
Canela. tendo com alguém, sugerindo que ele
estaria comvidando esta pessoa (um
homem) para visitar o seu quarto mais
tarde.
Se aproximam do cantor e dizem que
flagraram ele convidando o homem para
ir a seu quarto.
Agradecem a participação do cantor no
quadro em 2005.
Ele canta com a voz engrossada pelo gás
e ainda faz a dança-do-siri
Xandy (cantor) “Vesgo e Sílvio” em Ele canta com a voz engrossada pelo gás.
Canela.
Carla Perez “Vesgo e Sílvio” em Ela canta com a voz engrossada pelo gás.
(dançarina e Canela.
cantora)
Neguinho da Beija- “Vesgo e Sílvio” em Criticam o medalhão que ele usa,
Flor (cantor) Canela. dizendo que ele ganhou uma meldalha no
Pan.
Vesgo e Sílvio riem quando o cantor
confunde os programas da Rede TV! e
diz: “Olha o TV Fama aí, gente!”
Tarja: Neguinho da Beija-Flor
completamente lesado!!!
Frank Aguiar “Vesgo e Sílvio” em O cantor leva um susto da dupla, que diz
(cantor e deputado) Canela. que ele está parecido com a deputada
Luísa Helena.
Tarja: Frank Aguiar com 1 kg de
manteiga no que ele chama de cabelo!!!
Ele canta com a voz engrossada pelo gás.
É ainda parabenizado pelo cabelo de
Drácula e é perseguido pela dupla que
diz que vai cortar seu cabelo.
Péricles (cantor do “Vesgo e Sílvio” em Ele canta com a voz engrossada pelo gás.
Exaltasamba) Canela.
Sandra de Sá “Vesgo e Sílvio” em Fica ao lado de Lecy Brandão enquanto
(cantora) Canela ela é abraçada e beijada por Vesgo. A
trilha sonora “romântica” colocada na
edição impede que se escute o que ela
diz.
Lecy Brandão “Vesgo e Sílvio” em Vesgo abraça a cantora por trás e fica
(cantora) Canela cheirando e beijando seu pescoço. Ela
sorri. A trilha sonora “romântica”
colocada na edição impede que se escute
o que ela diz.
Tato (cantor) “Vesgo e Sílvio” em Ele canta com a voz engrossada pelo gás.
Canela
Tarja: Ficou melhor com essa voz...

209
Rosana “Vesgo e Sílvio” em Lettering: Rosana (cantora)
Canela
Sílvio: Rosana!...

Trilha: “Como uma deusa...”

Vesgo (chega por trás, sem que a cantora veja,


gritando): Rosana!... nas alturas

A canotra leva um susto e grita.

Vesgo: Qual é o seu nome de batismo, Alfredo?


(hahaha)

Rosana: Meu nome é Rosana Fiemgo, mesmo.

Vesgo (olhando em detalhes o rosto da cantora):


Tá bonito...

Sílvio: Rosana, você é a mulher com que eu


sempre sonhei, com esse seu olhar...

Rosana: Olha...

Trilha: “Como uma deusa...”

Sílvio (imitando a voz de Rosana): “... me levam


aléééém...”

Rosana (tentando mudar o foco de atenção ao


apontar para Sílvio cantando): Olha isso!...Olha
isso! Esse bocão.

A cantora canta o trecho “Como uma


deusa” com a voz engrossada pelo gás.

Rosana: Olha, tem um negócio que eu tenho que


contar pra vocês. Outro dia eu entrei em um táxi
e o rapaz do táxi me confundiu com a Sabrina.

Vesgo (se virando pra câmera):


Hahahaha...Sabrina!....

Sílvio (se aproximando da câmera): Você tá bem,


Sabrina.

Vesgo: O que vão falar com a Sabrina agora na


rua? Mas o corpo é igual.

Sílvio: O corpo é igual.

Vesgo: Eu, eu não sei. Eu tô meio por fora. Achei


que você tinha sumido, já. Já tinha saído. Tinha
morrido. (voltando-se para a câmera) Eu achei
que a Rosana tinha morrido.

210
Rosana tenta puxá-lo pelo ombro, mas a
cena foi cortada.

Vesgo pega Rosana no colo.

Sílvio: o que é isso, Vesgo? Não! Tá sem água, tá


sem água!...

Vesgo: Olha só o umbigo da Rosana.

Close na barriga de Rosana. Na edição


põe-se uma minhoca saindo do umbigo
da contora.
Vesgo: Até o final dessa matéria, vamos fazer um
clipe com a Rosana. Tá bom? Tá marcado?

Rosana: Com certeza. Marcadíssimo.

Sílvio: Dá uma voltinha pra gente ver a


redondeza. Olha só...

Vesgo dá um tapa na bunda da cantora.


Sílvio: O que é isso, Vesgo?!...
Eduardo Araújo “Vesgo e Sílvio” em Sílvio desafia Vesgo a lamber a canela
Canela de Eduardo Araújo. Vesgo,
demonstrando relutar um pouco, acaba
lambendo.
Miéle “Vesgo e Sílvio” em Tarja: Miéle (showman)
Canela Estava sentado em um sofá, quando leva
um susto da dupla, que chega, sem que
ele perceba, gritando o seu nome.
Vesgo diz que ele está bonito vestido de
Zé do Caixão.
Miele canta um trecho de “Festa de
Arromba”. Enquanto canta, Vesgo finge
ser levado ao sono e na edição, entra
como trilha “Nana, nenê”.
Gretchen “Vesgo e Sílvio” em Tarja: Gretchen. Ex-gostosa!
Canela
Lettering: Gretchen

Close no quadril de Gretchen que rebola


junto com o Sílvio.

Vesgo: Gostaria de saber agora as novidades do


mercado pornográfico. Pornográfico e
fonográfico.

Gretchen: Do fonográfico eu posso te contar.

Vesgo: Você pode me contar dentro do quarto?

211
Vesgo (se dirigindo a um senhor que passava):
Você já viu o filme da Gretchen?

Senhor: Não.

Sílvio (pegando, com as duas mãos os ombros de


Gretchen e girando a cantora para que ela fique
de costas para o senhor): Saiba que a Gretchen
tem anos de experiência.

Tarja: Vocês já viram o filme da


Gretchen???
Vesgo: Foi o primeiro filme?

Gretchen: Foi o primeiro e único e último.

Sílvio: Não, senhora.

Gretchen: Com certeza.

Sílvio: Não, não, não...

Vesgo: Mas por quê?

Gretchen: Porque não tem nada a ver.

Vesgo: Dói muito?

Sílvio: É só usar manteiga de garrafa.

Gretchen: Não quero falar sobre esse assunto.

Sílvio: Você usa manteiga...

Vesgo: Posso falar?

Gretchen: Sobre esse assunto não.

Sílvio: Quanto tá o preço do barril de petróleo?

Vesgo: A taxa celic de juros do Banco?

Gretchen: Eu sou pré-candidata a prefeitura.

Vesgo: Deus me livre. Hahaha...

Sílvio: Ah, não. Agora não. Agora parou. Ah,


não...

Sílvio anda de lá pra cá sem rumo, como


que zonzo pela informação, e acaba por
simular dar cabeçadas em um aparador
que estava próximo.
Gretchen: Seríssimo!

212
Vesgo: Mas eu achei que não tinha coisa pior que
o filme. Ô, Gretchen, sério? não faz isso.

Sílvio: Não vai na onda. Você quer copiar o


Frank Aguiar?

Gretchen: Não.

Vesgo: O que você vai fazer pra melhorar o


Brasil.

Gretchen: Não. Primeiro eu não vou melhorar o


Brasil porque eu vou ser é ...

Vesgo: Se não for melhorar o Brasil, vai ser


vereadora lá do... Venezuela.

Gretchen: Eu vou fazer a primeira festa da


música do nordeste, tá?

Vesgo: Você vai mudar o mundo.

Sílvio: Você vai mudar o mundo e tá copiando a


festa da música aqui do sul.

Vesgo: Agora, o que você vai fazer para


combater a corrupção?

Gretchen: Ah... eu vou denunciar tudo o que eu


souber, tudo.

Sílvio: Você acha que tem muito ‘currompido’


aí?

Gretchen: Com certeza.

Sílvio: Muito ‘currompido’?

Vesgo: Vou falar sério agora.

Sílvio (caminhando em direcão à câmera):


Alexandre Garcia vai falar sério agora.

Sílvio senta cabisbaixo no aparador e


com isso toma o primeiro plano da cena.
Ele canta desanimado, alienado,
balançando a cabeça:
“Doutor, eu não me engano, meu coração
é corinthiano...”

Ao fundo, Vesgo continua com


Gretchen.
Vesgo: Quanto tempo você estudou pra ser
prefeita?

213
Gretchen: Não. Eu tô começando agora...

Vesgo: Ah, entendi...Gabriel, vem cá. Sílvio vem


cá. Sílvio vem cá. Sílvio!

Os quatro participam agora da mesma


cena.

Tarja: Gabriel o ex-pensador


Vesgo: Olha só. Eu vou contar uma piada e você
não pode rir.Tá bom?... A Gretchen vai ser
prefeita.

Gabriel sorri, um pouco sem-graça.


Vesgo: Tá rindo. Tá rindo. Não pode rir na frente
dela.

Sílvio: Deixa eu falar uma coisa. O importante é


que se você entrar nesse negócio de política, eu
vou entrar no seu partido. Eu vou entrar no seu
partido Posso entrar no seu partido?

Gretchen: No partido pode, lógico, todo mundo


pode.

Vesgo: Que delícia entrar no partido da Gretchen,


hein?

Sílvio: Partidão, né?

Gabriel: Você vai entrar na política?

Gretchen: Eu sou pré-candidata à prefeitura da


Ilha de Itamaracá.

Vesgo: Hahahaha...

Gabriel: Mas é sério, o negócio é sério...

Gretchen acena positivamente.

Tarja: Gretchen para prefeita!!! Só falta


agora o Zé do Caixão para Presidente.
Sílvio: Você precisa de um cabo eleitoral? Você
quer um cabo eleitoral?

Gretchen: Não

Sílvio: Você acha que o filme que vc fez foi


rápido, foi feito nas coxas?

Gretchen: Olha, eu já falei que sobre esse assunto


eu não falo mais, foi uma experiência única e que
eu não vou repetir.

214
Sílvio: Mas foi uma experiência gozada, não foi?

Vesgo: Foi gozada.

Sílvio canta e dança: Piri piri piri...

Gretchen também dança. Vesgo ri e


Gabriel se mostra um pouco
constrangido com um sorriso no rosto.
Sílvio: Obrigado, Gabriel, me liga. 235678.

A última cena de Gretchen é um plano


médio (da cintura para baixo), e Vesgo
ajoelhado, com o rosto voltado para as
nádegas da cantora. A edição coloca um
áudio simulando um faltus.
Gabriel, o Pensador “Vesgo e Sílvio” em Lettering: Gabriel Pescador.
(cantor) Canela
Participa da interação dos personagens
com Gretchen.
Bochecha (cantor) “Vesgo e Sílvio” em Vesgo e Sílvio apertam sua bochecha e
Canela dizem que é muito tosco o movimento
que o cantor faz ao cantar, a que ele
responde que ridículo mesmo é a
dancinha-do-siri. Todos riem. Ele canta
com voz engrossada pelo gás.
Rosana (cantora) “Vesgo e Sílvio” em Ao lado da cantora, Sílvio apresenta:
Canela Com vocês o novo sucesso da cantora Rosana em
2007.

Segue-se com um clipe musical em que


um travesti e Vesgo e Sílvio (também
travestidos) dublam e encenam
ridiculamente a música “O amor e o
poder”.
Mônica Veloso Lançamento da Playboy Entrevistada pelos políticos do Pânico
de Mônica Veloso. (Presidente Mula, Deputado Clô e Bob
Jeff) na festa de lançamento de sua
Playboy.

Celebridades Campo Semântico


Expressão Quando no programa Como
1º Bloco
Você vai ver como Saudação-Sumário Anúncio do quadro “Vesgo e Sílvio”.
os cantores estarão
se apresentando hoje
aqui no Pânico.
E ela também ficou Saudação-Sumário Anúncio da cobertura do lançamento da

215
brava com os nossos Playboy de Mônica Veloso.
políticos
Você pode ficar Merchandising Usada para incentivar a participação na
famoso. TIM Studio promoção.
4º Bloco
Um dos maiores “Bola Visita” Apresentação de quem será visitado.
jornalistas
esportivos do Brasil
Muitos artistas aqui “Vesgo e Sílvio” em Apresentação da atração.
em Canela e nós Canela
vamos fazer de novo
a brincadeira de gás.
Olha o que a gente “Meda” na Oktoberfest Christian Pior reclamando da “multidão
passa. Olha o que a cheirando a cevada” que ele está tendo
gente enfrenta. É que enfrentar.
difícil ficar rico e
famoso, bem. É
difícil.
A famosa de Lançamento da Playboy Apresentação da cobertura do
Brasília de Mônica Veloso. lançamento da revista de Mônica Veloso.
A revista Playboy Lançamento da Playboy Apresentação da cobertura do
sempre estampou de Mônica Veloso. lançamento da revista de Mônica Veloso.
em suas capas as
mulheres mais
famosas e cobiçadas
do Brasil. Exibindo
a nudez perfeita de
belas atrizes,
apresentadoras,
cantoras e demais
artistas consagradas
pelo público. Neste
mês de outubro,
porém, a capa da
Playboy traz uma
mulher praticamente
desconhecida, que
não é nenhuma
artista, nem
celebridade de
televisão.
Irmã de Mônica Lançamento da Playboy Tarja que aparece na interação dos
Veloso: tão de Mônica Veloso. personagens do programa com a irmã de
conhecida quanto Mônica Veloso.
ela.
Você tem que “Pânico no Navio” Explicação da promoção “Pânico no
convencer um Navio”.
famoso a fazer a
dança-do-siri, nós

216
vamos escolher
quem é mais
importante.

217
Programa 3 – 21/10/2007

Celebridades Citadas
Celebridade Quando no programa Como
1º Bloco
Rubens Barrichello Sumário editado Citado, ironicamente, como vencedor e
herói
Frank Aguiar Sumário editado Citado no anúncio do quadro “Baixas
Horas”, que acontecerá em um de seus
shows.
Rubens Barrichello Sumário editado Citado como o motivo da corrente de
energias positivas que Vesgo e Sílvio
farão.
2º Bloco
Felipe Massa Chamada para a atração Citado como uma das opções do que vai
da Ferrari ser feito com a Ferrari.
3º Bloco
Rubens Barrichello Chamada para a atração Mendigo diz, quando estão mostrando o
da Ferrari “ronco” da Ferrari:
Vai fundir, igual à do Rubinho. ai...ai...
Felipe Massa Chamada para a atração Citado como uma das opções do que vai
da Ferrari ser feito com a Ferrari.
Kimi Haikkonen Chamada para a atração Citado como uma das opções do que vai
da Ferrari ser feito com a Ferrari.
Rubens Barrichello Chamada para a atração Citado que Rubinho pode ser uma das
da Ferrari opções do que vai acontecer com a
Ferrari para “matar a saudade”
Rubens Barrichello Chamada para a atração Mendigo diz, quando se sugere que
da Ferrari Rubinho irá matar a saudade:
Se o Rubinho entrar, quebra.
Galvão Bueno “Meu Mico Mico Meu” Citado na apresentação do quadro.
4º Bloco
Maria Bethânia “Vô Num Vô” Citada para dizer que uma mulher se
parece com ela. Essa mulher foi
adesivada com “Num Vô”.
Felipe Massa Chamada para a atração Citado como uma das opções do que vai
da Ferrari ser feito com a Ferrari.
Rubens Barrichello Chamada para as Citado para se anunciar o quadro “Vesgo
atrações do programa e Sílvio”.
Frank Aguiar “Baixas Horas” Citado na apresentação do quadro.
Galvão Bueno “Vesgo e Sílvio” Citado na apresentação de “Vesgo e
Sílvio”
Nigel Mansel “Vesgo e Sílvio” Citado para dizer que um homem
interpelado se parece com ele.
Paulo Autran “Xaxala e Cirilo” Parodiando o programa Os caçadores de
mitos, o quadro faz uma homenagem ao
ator e tenta demonstrar “cientificamente”
os males do cigarro.

218
Tony Ramos Atração da Ferrari Citado por Mendigo para se referir ao
Bola.

Celebridades em Interação
4º Bloco
Frank Aguiar “Baixas Horas” Tarja: O cãozinho dos teclados: de onde
veio isso?

Invadem o palco do cantor e escolhem


uma “baranga” para ele beijar. Ele aceita
brincadeira.
Rubens Barrichello “Vesgo e Sílvio” Em entrevista, em que foi zombado por
não ter conquistado nenhum ponto na
temporada 2007, aceita, com um pouco
de indiferença, a brincadeira e diz:
Pode falar. O carro era ruim mesmo...

Celebridades Campo Semântico


Expressão Quando no programa Como
2º Bloco
Você pode ficar Merchandising TIM Usada para incentivar a participação na
famoso. Studio promoção.
4º Bloco
Mas já sou famosa. “Vô Num Vô” Mulher interpelada e adesivada com
“Num Vô”.
Pobre não pode ver “Meda” Robaldo Ésperman se referindo à ovação
artista, né? Da Rede que ele e Christian Pior recebem da
TV. Imagina se platéia quando sobem no palco da festa.
fosse da Globo?
Emílio, eu sou um “Meda” Christian Pior reivindicando o seu lugar
artista, eu sou um como “artista”, demonstrando revolta por
ator. Eu li estar em uma festa da periferia.
Dostoievsky, eu li
Stanislavsky. Por
que você me dá essa
pauta?

219
Programa 4 – 28/10/2007

Celebridades Citadas
Celebridade Quando no programa Como
1º Bloco
Alberto Dualib Sumário editado Citado como um habilidoso empresário.
Carlitos Tevez Sumário editado Citado como furioso.
2º Bloco
Galvão Bueno “Meu Mico Mico Meu” Erros durante o Show do Intervalo
Fátima Bernardes “Meu Mico Mico Meu” Sua imagem na bancada do Jornal
Nacional aparece, quando Emílio
conclui:
Bem, Amigos, é uma boa notícia para a ecologia.
Pelo menos os micos do Galvão não estão em
extinção.
3º Bloco
Galvão Bueno Apresentação de um Emílio chama um “Charadex”, que
“Charadex” demora um tempinho para entrar no ar.
Logo a equipe do Pânico se lembra dos
“micos” de Galvão Bueno.
4º Bloco
Christian Pior “Mister Gay Brasil” Citado em tarja:
Christian Pior não se classificou para a final.
Ângela Rô Rô “Meda” Citada para se dizer da “linha” que uma
interpelada adota:
Essa faz a linha maloqueira Ângela Rô Rô.
Rita Cadilac “Meda” Citada em tarja para fazer referência a
uma dançarina que interpelam em Ibiza:
Uma espécie de Rita Cadilac européia.
Amado Batista “Vesgo e Sílvio” Citado no “Festival de Sósias” que
Vesgo e Sílvio apresentam.
Tim Maia “Vesgo e Sílvio” Citado no “Festival de Sósias” que
Vesgo e Sílvio apresentam.
Albert Einstein “Vesgo e Sílvio” Citado no “Festival de Sósias” que
Vesgo e Sílvio apresentam.
Johnny Depp “Vesgo e Sílvio” Citado no “Festival de Sósias” que
Vesgo e Sílvio apresentam.
Simone “Vesgo e Sílvio” A gente não aguenta mais a Simone
cantar aquelas músicas de Natal no fim
de ano.
José Serra e Gilberto “Vesgo e Sílvio” Citados para convencer Sérgio Cabral a
Kassabe fazer a dança-do-siri. Imagens dos
políticos de São Paulo dançando são
mostradas.
Wagner Montes “Vesgo e Sílvio” Citado para sugerir que Bruno Gagliasso
tem uma perna mecânica.
Clodovil “Vesgo e Sílvio” Citado para dizer que Marco Nanini se
parece com ele.

220
Waldick Soriano “Vesgo e Sílvio” Citado por Sílvio para dizer que o chapéu
de Antônio Pitanga se parece com o dele.
Clodovil “Vesgo e Sílvio” Citado por Sílvio para se referir a um
vídeo em que William Bonner imita
Clodovil.
Jassa “Vesgo e Sílvio” Citado por Sílvio quando ele sugere a
William Bonner pintar o cabelo.
Roque (do Sílvio “Vesgo e Sílvio” Citado por Vesgo para dizer que William
Santos) Bonner se parece com ele.

Celebridades em Interação
4º Bloco
Rogê Gobê (ator) “Vesgo e Sílvio” Lettering: Rogê Gobê Bebê (ator)

Sugerem que o ator está sumido da mídia


e que, por isso, não têm nada para falar
com ele. Sílvio ainda diz que a cabeça do
ator parece uma caixa d’água, sugerindo
que ele tem a cabeça grande
Luciano Huck “Vesgo e Sílvio” Lettering: Luciano Huck (Loucura,
Loucura)

O apresentador é parabenizado pelo


nascimento do seu filho. Mostram
imagens da “criança” (um filhote de
tucano sendo alimentado no ninho).
Vesgo e Sílvio desaconselham Luciano
Huck a entrar na festa, pois diz que ela
não tem famosos.

Tarja: O Luciano Huck de terno parece


um pastor. Bonitinho!!!

Dizem ainda para Luciano Huck


esconder seu relógio.
Ney Latorraca “Vesgo e Sílvio” Lettering: Neyla Torrada (ator)

Dizem que o ator está parecendo um


garçom e perguntam porque ele está de
“rabo” (cabelo) solto. O ator responde:

Eu já me enchi de vcs dois, hahaha (risada falsa)

Vesgo e Sílvio pedem para que ele faça o


Barbosa e ele faz.
Fafá de Belém “Vesgo e Sílvio” Lettering: Fafá de Nazaré

Vesgo: Caramba, Fafá, vai entrar em erupção.

221
O tratamento a Fafá gira em torno do
tamanho de seus seios. Ela não parece se
importar. Ri e sai da interação quando
quer.

O melhor de Fafá é a comissão de frente.

Tarja: Fafá de Belém: 950 ml de silicone


em cada lado
Diego Hypólito “Vesgo e Sílvio” Lettering: Diego Hypólito (campeão de
ginástica e lambaeróbica)

Brincam que o ginasta ainda não sabe dar


nó em gravata (ele chega à festa com a
gravata na mão). Sílvio faz dá o nó na
gravata de Diego durante a entrevista.
Vesgo brinca com as roupas da ginástica,
dizendo que são roupinhas “mamãe
quero segurar no mastro”.
Vesgo e Sílvio notam que o atleta se
encontra encabulado e fazem questão de
dizer que ele está “vermelho como um
camarão.”

Sílvio: Alguma vez que você foi saltar no cavalo,


vc bateu a moranga, o bago naquele negócio?

Diego (respondendo como se fosse uma pergunta


séria): Já, porque a gente trabalha com o corpo
todo ali. São muitos exercícios e a gente se
machuca muito.

Sílvio: E você sabe se vc já perdeu uma bolinha?

Só depois dessa pergunta que Diego


entra no quadro de sentido proposto e
apenas ri.
Sérgio Cabral “Vesgo e Sílvio” Lettering: Sérgio Cabral (Governador do
Rio)

Pedem para que o governador dance a


Dança-do-siri.
Sérgio Cabral não dançou.
Eduardo Dusek “Vesgo e Sílvio” Lettering: Eduardo Dusek (músico)

Começam a cantar uma de suas músicas


e colocam o microfone sob sua boca para
ele continuar. Quando ele começa a
cantar, Vesgo inverte, sem que o cantor
veja, o microfone. Eduardo Dusek fica
no silêncio sem saber.

222
Bruno Gagliasso e “Vesgo e Sílvio” Lettering: Bruno Gagliasso e Camila
Camila Rodrigues Rodrigues.

Caminhando em direção à dupla, Bruno


finge mancar. Quando se encontram, o
cumprimento entre todos é cordial. Para
cumprimentar Camila Rodrigues, Sílvio
usa os clássicos dois beijinhos sociais,

Vesgo: Olha só, não acredito! É o casal 20 da


televisão brasileira.

Sílvio: Olha só, que casal bonito...

Vesgo: Posso falar uma coisa? Nós já revelamos


o segredo de Bruno Gagliasso, não vamos revelar
mais, não é verdade? ele tem a perna mecânica.

Tarja: A sorte de Bruno Gagliasso é que


sua prótese resiste bem a chuva...

Bruno Gagliasso: Não tem graça nenhuma...

Vesgo: Mas só o Pânico sabia disso. Só o Pânico


sabia disso.

Bruno: É, mas não tem graça nenhuma.

Sílvio: Você vê que a perna faz com que ele fique


menor a cada dia, porque ela vai enferrujando e a
borracha vai...

Bruno: E eu ainda paro pra falar com vcs...

Vesgo: Agora dá licensa que a gente vai


entrevistar quem tá no ar. Quem não tá no ar,
pode ir embora. E quem tá no ar agora é ela e ela
é a nossa rainha.

Sílvio: Ela é a rainha e já está preparada para o


carnaval, já.

Vesgo: A gente só entrevista quem está no ar.

Sílvio: E é o seguinte, ó. Você tá baixo, coloca


um tênis e ela coloca um salto. Parece seu filho.
Parece filho dela.

Bruno: Eu não coloco sapato porque eu não


posso botar sapato.

Vesgo: Você se sente inferior?

Camila Rodrigues: Você é super alto, né?

Gargalhada geral. Bruno Gagliasso faz

223
movimentos como se estivesse levando
murros na cara, que são colocados na
cena por um recurso de edição (usado
pelo programa quando alguém “toma”.)

Bruno: Tchau, um abraço.

O casal segue para a entrada do evento.


Bruno finge mancar. Vesgo e Sílvio
continuam dialogando:
Vesgo: Não zoa, não mostra a perna dele não,
não mostra, não, porque essas coisas a gente não
pode mostrar. Porque a gente revelou em uma
outra matéria que ele tinha uma perna mecânica.

Antes de entrar, Bruno ainda se vira e faz


um movimento com braço como quem
diz “vai embora”.
Marco Nanini “Vesgo e Sílvio” Lettering: Marco Nanini

Sílvio: Você tá a cara do Clodovil.

Marco Nanini: Você acha?

Sílvio: Não queria falar isso não. É o mesmo


corte...

Vesgo: Tá não, Sílvio.

Sílvio: Tá, parece.

Vesgo: Tá não, Sílvio.

Sílvio: Tá. Parece. É o deputado. É o deputado.

Marco Nanini: Tá ótimo...

Vesgo: Você sabe imitar ele (o Clodovil)? Dá


uma risada “hahaha”...

Marco Nanini: Eu não sei imitar, quem sabe


imitar é ele aqui (apontando para o Sílvio).

Vesgo: Você tá muito sério hoje, Nanini.

Marco Nanini: Eu sou sério.

Vesgo: Você quer um drink ali pra vc ficar mais


animadão?

Marco Nanini: Tô de regime, tô de regime.

Vesgo: Uma pinga, uma aguardente?

Marco Nanini: É bom...

224
Vesgo (pegando na papada de Marco Nanini):
Parabéns pelo bom papo que você tem.

Sílvio: Você é uma pessoa que dá pra conversar


porque você tem um papo legal.

Vesgo: Tem um bom papo sempre, olha. É um


papo de nelore. é uma coisa...

Marco Nanini: Já foi maior, eu tirei e agora tá


crescendo de novo.

Vesgo: Tá lindo, viu?

Marco Nanini: Mas vocês vão chegar lá, sem


problemas.

Sílvio: Isso aqui se tirar, dá pra alimentar a


Etiópia inteira por cinco anos.
Marieta Severo “Vesgo e Sílvio” Lettering: Marieta Severo
Vesgo: Marieta Severo!...

Marieta Severo: Vocês dois não descansam


Vocês trabalham muito, gente.

Sílvio: Mas, Marieta Severo...

Vesgo: Posso falar?

Marieta Severo: Pode

Vesgo: A gente merece ganhar mais, não merece?

Marieta Severo: Merece, merece.

Vesgo: Então, por favor, pede pro nosso chefe,


por favor.

Marieta Severo: Merece. Dá um aumento pros


meninos que eles merecem. Eles trabalham
muito. Estão em tudo quanto é lugar.

Tarja: Ela não aguenta mais encontrar os


dois, essa é a verdade!
Vesgo: Vocês também. Só que vocês estão
curtindo e a gente trabalhando.

Marieta Severo: Pois é, pois é...

Vesgo: E a D. Nenê, vai bem?

Marieta Severo: Vai bem. Tá lá quietinha.

Vesgo: Fala pra ela trazer uns bolinhos de chuva


pra mim.

225
Marieta Severo: Tá bom. (sorrindo)

Sílvio: Eu adoro o quindim da D. Nenê, a


coxinha...

Marieta Severo: É?... Que bom...(cortando)

Marieta manda beijos para a câmera e


volta a caminhar, eles seguem ao seu
lado.
Vesgo: Marieta-ta tá me chamando. Vamos para
o bingo. Daqui a pouco a gente vai fazer um
bingo beneficente.

Marieta Severo: Tá bom.

Sílvio: Mas não pode, o bingo tá fechado. Só se


for um bingo lá na sua casa. Um bode assado e
um galeto.

Marieta Severo: Eu posso ir agora?

Vesgo: Você pode fazer o que você quiser, minha


linda.

Marieta Severo: Posso ir?...

Vesgo: Posso te dar um selinho?

Marieta Severo: Tá bom.

A atriz dá o selinho e vai embora, se


virando e , tranquila, dando um
tchauzinho com o braço.
Sílvio: Marieta Severo, quantos Troféus
Imprensa? Marieta Severo!...

Vesgo: Obrigado, Marieta.


Antônio Pitanga e “Vesgo e Sílvio” Lettering: Antônio Pitágoras e Glória
Glória Pires Pires

Vesgo: Antônio Pitanga e

Sílvio: Glória Pires

Enquanto os atores se cumprimentam,


Vesgo narra:
Ai meu deus, aquela alegria...

Sílvio: Antônio Pitanga, picalcinha e picueca.


Grande ator. Chapéu do Waldick Soriano.

Vesgo se vira para cumprimentar Glória

226
Pires, encenando um cinismo.

Vesgo: Ô, Glorinha... que maravilha. Há quanto


tempo. Que alegria. Parabéns.

Glória Pires ri.

Sílvio faz o mesmo com Antônio


Pitanga.

Sílvio: Pitanga, Pitanga, rapaz. Que saudades de


você.

Glória Pires, rindo, diz:


Vocês estão muito doidos.

Vesgo: Não, mas é assim. Há quanto tempo


vocês não se vêem?

Glória Pires: Já tem tempo. A gente malhava na


mesma academia.

Vesgo: Malhava... hahahaha

Sílvio começa a rir e a correr em volta de


um vaso de plantas.
Vesgo: Pára de rir. Qual que é a graça, Sílvio.

Glória Pires: Eu não tô entendendo...


Fatima Bernardes e “Vesgo e Sílvio” Vesgo: Fátima Bernardes e William Bonner...
William Bonner
Tarja: Casal Nacional
Vesgo (narrando o abraço entre Fátima Bernardes
e Glória Pires): Há quanto tempo....

Lettering: Fátima Bonner e William


Bernardes.

Vesgo (segurando a mão de Fátima): Eu adoro


esse casal. (Sílvio: É o casal mais famoso. É o
casal mais famoso...) Todas as noites a gente fica
muito feliz de ver, de ver assim, notícias
quentinhas.

Sílvio: Quentinhas é marmita...

Vesgo: Exatamente

Vesgo: William Bonner e Fátima Bernardes, a


gente acompanha sempre o Jornal Nacional e nós
vimos um dia desses aí, passou esse ano, alguém
lá falando uma notícia e atrás, no Jornal
Nacional, a dança-do-siri.

227
Tarja: A Fátima está tão empolagada
para falar com os dois...

Entram imagens do Jornal Nacional neste


dia citado.

Vesgo: Já aconteceu com você alguma notícia e a


dança-do-siri atrás, não?

Fátima Bernardes: Não. Tem acontecido às vezes


com repórter ao vivo, né, na rua. Mas com a
gente não.

Sílvio (se aproximando da câmera até tomar todo


o quadro): Olha a pergunta que ele faz. (Vesgo:
ô, Sílvio...)A primeira pergunta que ele faz.
(Vesgo: Pára, eles vão embora) A primeira. Ao
invés dele “puxar o saco”, ao invés dele “puxar o
saco” e depois...

Sílvio (voltando para o quadro e falando para o


Vesgo): Jegue, você está com o maior casal da
televisão brasileira, do jornalismo.

Vesgo: Eu ia pedir pros dois fazer a dança-do-


siri.

Fátima Bernardes: Não consigo dançar nem mais


sapateado. Estou enferrujadíssima.

Vesgo: Você não consegue? Você fazia


sapateado, que a gente mostrou.

Fátima Bernardes: Pois é...

Entram imagens de Fátima Bernardes


dançando sapateado em ritmo acelerado
pela edição e com uma música de
lambada também em rotação acelerada.

Uma terceira pessoa, aparentemente da


produção, tenta puxar Fátima Bernardes,
mas ela não parece querer sair sem
finalizar a conversa

Fátima Bernardes: A Dança-do-Siri, quando eu


treinar, eu danço.

Sílvio: Agora, ele imitando o Clodovil não tem


como ninguém.

Vesgo (para William): Imita o Clodovil...

Sílvio (imitando o Clodovil): Meu amor, olha, na


verdade...

228
William: Vocês já viram isso?

Vesgo: no You Tube.

Entram imagens de uma aparente


brincadeira gravada entre William
Bonner e Cid Moreira, imitando o
Clodovil (“olha para a lente da
verdade...”) e um entrevistado,
respectivamente.

Tarja: Que péssima imitação de Clô,


hein, William?
Vesgo: Porque jornalista fica muito sério na
frente das câmeras, mas por trás é brincalhão que
nem a gente.

Sílvio: Por trás é ... é brincalhão. É gozado.

William Bonner: Que papo estranho...

William Bonner sai em direção à entrada


da festa. Vesgo vai atrás dele e lhe pede
para dançar a dança-do-siri.
Vesgo: A dança-do-siri, William Bonner, dança-
do-siri.

William Bonner: William Bonner tem um


problema de hérnia de disco. não leu na
imprensa?

Vesgo: Ah, e não pode fazer a dança-do-siri?

William Bonner: Bom, William Bonner não


pode.

Sílvio: Quando é que você vai tingir o cabelo?


Vai lá no Jassa tingir o cabelo...

William Bonner: De preto ou de branco?

Sílvio: Manda tingir. Tá ficando igual uma


coruja.

William Bonner: Nesse momento tá mais fácil...


tem que perguntar vai tingir de que cor. Que é pra
igualar em branco ou em preto.

Vesgo: Tá parecendo o Roque do Sílvio Santos

William Bonner (sorrindo ironicamente): Como é


que eu vou fazer agora que você descobriu a
minha identidade secreta?...

229
Celebridades Campo Semântico
Expressão Quando no programa Como
1º Bloco
Vai ter uma festa do Saudação sumário Anúncio do quadro “Vesgo e Sílvio”
Vesgo e Sílvio só
com gente
importante,
celebridades.

4º Bloco
Olha o desespero do “Vesgo e Sílvio” Sílvio para Luciano Huck na porta da
rapaz da produção festa.
porque não tem
ninguém famoso.
Se eu fosse você eu “Vesgo e Sílvio” Vesgo para Luciano Huck na porta da
ia embora. Só tem festa
Big Brother aí.
Muito bem, Vesgo e “Vesgo e Sílvio” Emílio quando o programa volta para o
Sílvio, diretamente ao vivo depois do quadro “Vesgo e
de mais uma festa Sílvio”.
com muitos globais,
não é Sr. Sílvio
Santos?
É o casal mais “Vesgo e Sílvio” Sílvio se referindo a William Bonner e
famoso. Fátima Bernardes.

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