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Centro Universitário Fluminense – UNIFLU

Faculdade de Filosofia de Campos – FAFIC


Curso de Comunicação Social

MANIPULAÇÃO DE INFORMAÇÃO EM
PROCESSOS DE EDIÇÃO PARA TV

Formando:

Alexandro Chagas Florentino

Orientador:
Professor Ms. Jorge Rocha Neto da Conceição

Campos dos Goytacazes


Novembro-2005
Alexandro Chagas Florentino

MANIPULAÇÃO DE INFORMAÇÃO EM
PROCESSOS DE EDIÇÃO PARA TV

Monografia apresentada ao Curso de Comunicação


Social, da Faculdade de Filosofia de Campos (Centro
Universitário Fluminense), como exigência para a
obtenção do diploma de bacharel em Comunicação
Social, habilitação Jornalismo.,

Orientador:
Professor Ms. Jorge Rocha Neto da Conceição

Campos dos Goytacazes


Novembro-2005
Alexandro Chagas Florentino

MANIPULAÇÃO DE INFORMAÇÃO EM
PROCESSOS DE EDIÇÃO PARA TV

Banca Examinadora:

_______________________________________
Prof º. Ms. Jorge Rocha Neto da Conceição - Orientador

_______________________________________
Prof º. Ms. Vitor Luiz Menezes Gomes

_______________________________________
Prof º. Dr. Joel Melo

Campos dos Goytacazes


Novembro-2005
AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, Almir e Rita

Ao meu orientador, Jorge Rocha Neto da Conceição

Danielle Costa Brandão

Gerson Dudus

Alexandre Mury

Orávio de Campos Soares

Valéria Machado

André Zamana

Gabriel Priolli

Ocinei Trindade

Patrícia Daldegan

Aglomerado Terra Plana de Literatura


SUMÁRIO

1 – Introdução ..................................................................................................... 05

2 – Ideologia da comunicação
2.1 – Quem define o que é notícia ................................................................. 08
2.2 – Interesses políticos e econômicos ......................................................... 14
2.3 – Informação vrs. Contra-informação ...................................................... 20

3 – Os mitos da imparcialidade, do distanciamento e do jornalismo objetivo


3.1 – Neutralidade e distanciamento ............................................................... 25
3.2 – Jornalismo Objetivo ............................................................................... 30
3.3 – O mito da imparcialidade ....................................................................... 34

4 – Edição de informação para TV


4.1 – Processos de edição .................................................................................. 38
4.2 – Manipulação e descontextualização ......................................................... 41
4.3 - Criação e edição da informação: sob a ótica de quem faz ........................ 46

5 – Considerações finais ........................................................................................ 53

6 – Referências ...................................................................................................... 57

7 – Anexos
Anexo I - Entrevista com profissionais de TV ................................................ 61
Anexo II – Roteiro do projeto videográfico .................................................... 74
5

1 – Introdução

Sabendo que vivemos em uma interação social de 24 horas por dia, ao se construir um
produto informacional, como o telejornal, é necessário que se estabeleça critérios de
representação do mundo real, onde apenas uma pequena porção deste mundo real é
evidenciada como seus acontecimentos. A isso, dá-se o nome de edição, uma manipulação dos
acontecimentos diários, própria da produção informacional.
Tendo o resultado da prática jornalística se tornado um produto comercial, a edição no
jornalismo – na maioria dos casos – é realizada com o propósito inicial de conquistar a
audiência. Para isso, práticas de produção de entretenimento são inseridas ao modo de se fazer
jornalismo. Com isso, objetivando alcançar o emocional do público, para que este possa
formar opiniões sobre o que lhe foi exposto e corresponda a tais estímulos. Correspondendo,
na maioria das vezes, com o ato de consumir produtos agregados à difusão de informações.
Assim, este trabalho foi realizado pela crença de que estudos de políticas de
comunicação se fazem necessários. Portanto, nosso foco de análise se mantém no
estabelecimento de um pensar crítico em torno das práticas midiáticas, especialmente à
televisiva.
A escolha em analisar a TV se dá pelo seu enorme potencial de convocar as pessoas
como nenhuma outra mídia, fazendo dela o meio de comunicação possuidor de maior
audiência. Audiência esta, totalmente heterogênea, alcançando os mais diversos grupos
sociais. Ocupando, desta forma, um estratégico lugar nas dinâmicas culturais cotidianas, nas
transformações de sensibilidades, nos modos construtivos de imaginários e identidades.
Tendo como base o fato de toda nossa cultura teórica ter sido formulada através de um
pensar crítico, que têm se debatido contra a perda qualitativa do espaço televisivo informativo,
pretendemos evidenciar modos práticos para que este ideário se realize. Ou seja, segundo
autores como Ciro Marcondes Filho (2002), verificar os processos que visam reduzir o real à
unidimensionalidade do bem, do justo, do correto, o que exclui a dualidade, a polarização, o
confronto e a multiplicidade de opiniões. Pretendemos, com este trabalho, também estabelecer
contrapontos aos rumos da produção midiática, principalmente no que diz respeito à TV, que
está sob a tutela do mercado globalizado, sempre a propor – para não dizer impor – uma
concepção de verdade única.
6

Para tal tarefa, definimos como objetivo deste trabalho, definir, pesquisar e estudar
criticamente a relação entre poder político e mídia, focando a manipulação de informação em
processos de edição para TV. Portanto, tais atividades serão executadas tendo em vista a
estética da barbárie, exteriorizada através de manchetes e títulos bombásticos. Sendo esta
estética, característica do modelo de produção midiática vigente. E que temas de relevância e
necessidades sociais são excluídos das pautas, para que a cobertura jornalística possa explorar
o grotesco e o incomum, que, de maneira imperceptível, são difundidos pelas técnicas de
produção de notícia.
É neste contexto que, primeiramente, iremos mapear os processos em que os
profissionais se apóiam ao decidirem a noticiabilidade dos acontecimentos diários. Para isso,
estudaremos os conceitos da hipótese de agenda setting, newsmaking e os vínculos com a
lógica do mercado e poder público. Assim, sendo este primeiro passo, importante ao apontar
como os profissionais de informação atuam no sentido de evidenciar o grau de importância ou
relevância dos assuntos que podem virar notícias.
Tendo em vista este quadro, no que diz respeito ao atual modelo de produção de
informação, constata-se até que ponto interfere na sociedade o poder monopolizador exercido
pelos grandes conglomerados de mídia, geridos a partir dos pontos de vista da economia
globalizada. Também se mostra como fato que as informações são tratadas como produtos,
noção esta que é regida e difundida pela lei de mercado, constituindo estratégias de seduções
do público. Tais fatores, ao serem analisados criticamente, podem apontar uma certa
contaminação – nem sempre saudável – da linguagem jornalística com a do entretenimento e
da publicidade. Portanto, este nosso primeiro passo se evidencia de vital importância para o
desencadeamento das demais questões.
Após estes questionamentos, passamos para os interesses políticos e econômicos das
empresas telejornalísticas. Nesta parte, procuramos contextualizar o processo evolutivo da TV
brasileira e as concessões dadas pelo governo, além de analisar as possíveis implicações no
processo de decidir o que deve ser notícia. Para isso iremos fazer uma análise do período
anterior à ditadura, passando pela reabertura política, até os dias atuais.
Desta forma, poderemos questionar o que Ford (1999) chama de “nova ordem”, onde a
tônica política se chama globalização, configurando um quadro em que os grandes monopólios
midiáticos têm o compromisso com a legitimação do discurso neoliberal. Discurso, este, que
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tem por objetivo o esvaziamento do senso crítico, para que não haja contestações às práticas
do “mercado” neoliberal.
Ao passo que problematizamos as implicações sócio-comunicacionais desta estrutura
neoliberal, estabelecemos a conceituação do que é informação e contra-informação. E é neste
sentido que procuramos evidenciar como a informação é tratada, sendo considerada um bem
de consumo, e como sua veiculação tem um papel decisivo para o estabelecimento de uma
formatação do pensar coletivo, proliferando um senso comum superficial e nada crítico em
torno das questões sociais. E ainda, prosseguindo neste tópico, analisaremos a contra-
informação enquanto contrapartida ao problema exposto.
No segundo capítulo, tendo sempre em mente que a televisão, enquanto produto
cultural a ser consumido, satisfaz às expectativas da audiência – em sua maioria –,
verificamos de que modo a produção jornalística se respalda em técnicas possibilitadoras de
retratar o mundo real e parte de seu cotidiano. Iremos trabalhar com conceitos atribuídos ao
jornalismo – imparcialidade, distanciamento e objetividade –, no intuito de identificar se estes
constituem-se na prática jornalística ou se podem ser esclarecidos enquanto atividades
mitificadas.
O terceiro capítulo trata da questão da edição e manipulação de informação. Nele,
iremos caracterizar o que é o processo de edição e suas possíveis implicações na produção de
informação televisiva. E para concluir, iremos analisar como são essas elucidações teóricas na
prática; para isso, realizamos uma pesquisa qualitativa a respeito de questões focadas nos
capítulos anteriores, na forma de entrevistas com profissionais de telejornalismo.
Neste sentido, visto que os pensamentos mercantis, difundidos pela máquina produtiva
de informações, dão ampla voz à uma violenta crítica ao ato de se estabelecer pensamentos
críticos e elucidativos a cerca de todo o contexto socio-comunicacional. Fazendo, o que
acreditam alguns autores como Marcondes Filho (2002), com que este pensar crítico seja
execrado a campos marginais da cultura, estabelecendo o juízo criticante à categoria de
antiqüismo, melancolia anacrônica. Formatando grande inversão de valores, ao passo que a
proliferação do ideário mercantil o considera o novo estilo de violência de dominação. Iremos
desenvolver estudos, acreditando em sua grande importância, ao momento que se concretiza,
para a evidenciação destes acontecimentos vivenciados por todos nós.
8

2 – Ideologia da comunicação

2.1 – Quem define o que é notícia

Em um seminário de Comunicação, que consta no calendário da Faculdade de Filosofia


de Campos, em 2004, o repórter da Rede Globo de Televisão, Ari Peixoto 1, palestrando sobre
Jornalismo Investigativo, foi indagado por um aluno a respeito de um vídeo produzido pelo
Centro de Mídia Independente (CMI)2, que seu professor da disciplina de Comunicação
Popular e Alternativa, Jorge Rocha, havia exibido em sala de aula. Era um documentário sobre
uma manifestação ocorrida em São Paulo contra as negociações para a criação da Área de
Livre Comércio das Américas (Alca), mostrando os manifestantes sendo coagidos com muita
violência por policiais sem identificação. O referido aluno questionou o motivo de apenas a
mídia independente ter noticiado e produzido materiais informacionais sobre o assunto,
enquanto a mídia corporativa, principalmente a televisiva, não ter dado uma nota sequer. Ari
Peixoto respondeu com outra pergunta – “estudantes de Comunicação protestando contra a
Alca é notícia?” –, deixando um ar de dúvida para o público.
O exemplo desta palestra levanta uma incógnita: quem define o que é relevante ou
irrelevante para ser noticiado? Quem define o que é notícia, já que vivemos em uma interação
social 24 horas por dia, todos os dias, e os meios de comunicação nos expõem a um resumo
dos “principais” eventos cotidianos ?
No que se refere a hipótese da agenda setting, “tudo depende dos graus de percepção
da relevância ou importância do tema” (Hohlfeldt, 2001, p. 198). E o interesse acaba se
tornando palavra-chave nos critérios de determinação do que será notícia. Sendo, desta
maneira, investigado, selecionado e divulgado o que se tem interesse, prevalecendo como
referência a perspectiva do interesse público.

1
Palestra integrante do Seminário de Comunicação Social da Faculdade de Filosofia de Campos – Fafic, realizado no dia 11
de março de 2004.
2
Coletivo informacional independente que veicula suas produções midiáticas através do site www.midiaindependente.org
9

O agendamento somente ocorrerá de maneira eficiente quando houver


um alto nível de percepção de relevância para o tema e, ao mesmo
tempo, um grau de incerteza relativamente alto em relação ao domínio
do mesmo, levando o receptor a buscar informar-se com maior
intensidade a respeito daquele assunto (HOHLFELDT, 2001).

A agenda setting apóia-se na noção de que produzir notícias é uma prática formatada
na rotina produtiva da empresa midiática, devido à assimilação de critérios de relevância para
organizar acontecimentos, temas, aspectos e problemas. Segundo Meyer (1990), geralmente a
definição usual da "notícia" inclui outros atributos dos fatos ordinários como: atualidade,
proximidade (particularmente a geográfica), conseqüência (eventos que mudam ou ameaçam
mudar a vida das pessoas), interesse humano (evocando uma resposta emocional ou ilustrando
uma verdade universal), conflitual (o choque de interesses, na guerra, no esporte, na política) e
a proeminência dos atores envolvidos.
Sob a perspectiva do newsmaking, considera-se a existência de uma lógica própria dos
meios de comunicação de massa. Esta lógica foge da razão e interesses do receptor, que são
expressados mediante as exigências de produção e expressão informacional, devido a
formação de “uma espécie de atmosfera e um conjunto de interexpectativas profissionais que
predetermina o contexto de interpretação e valorização dos fatos” (Hohlfeldt, 2001, p. 206).
Sendo assim, “(...) a perspectiva do newsmaking evidencia uma espécie de auto-suficiência do
jornalismo, em que o processo comunicacional se coloca com absoluta autonomia em relação
às demais categorias sociais, o que, sabidamente, é equivocado” (Hohlfeldt, 2001, p. 206)
Desta maneira, os acontecimentos, os “fatos” – como os jornalistas gostam de chamar
– se transformam em notícias quando entram na agenda e depois de serem trabalhados pelo
órgão de informação. Portanto, como sustenta Hohlfeldt (2001), “a noticiabilidade de um fato
pode então ser analisada segundo sua possibilidade de integrar-se ou não ao fluxo normal e
rotineiro da produção de informações”. Atendendo pré-requisitos, construídos para que se faça
com que a produção de informações siga padrões de produção em série.

A cultura profissional, nesta perspectiva, é um emaranhado de


retóricas e táticas, códigos, estereótipos e símbolos relativos aos meios
10

de comunicação de massa, que criam e mantêm paradigmas


profissionais e auto-imagem. As convenções de organização deste
trabalho determinam e definem o que seja notícia e legitimam o
processo produtivo das mesmas, constituindo o conceito de
noticiabilidade, ou seja, a aptidão potencial de um fato para se tornar
notícia (HOHLFEIDT, 2001, p. 207/208)

Observa-se, através dos estudos do newsmaking realizados sobre as rotinas produtivas


e a cultura profissional, que a cobertura jornalística está centrada, prioritariamente, para
atender o ritmo do processo produtivo. Afinal, o telejornal tem que “ir ao ar” todos os dias e
precisa de fatos que sustentem essa demanda industrial. Assim, a abordagem do newsmaking
evidencia o vínculo da noticiabilidade de um fato com a capacidade de o telejornal cobrir o
fato sem comprometer sua finalização.
A hipótese do newsmaking também mostra as formas que as empresas midiáticas
desenvolveram pra dar cobertura a uma faceta específica da realidade, indo somente até onde
conseguem ter acesso e generalizando a cobertura para toda a sociedade.
Outro fator é o estabelecimento de valores profissionais que servem para garantir esse
processo de produção de notícias e dar respaldo ao fato dos veículos midiáticos se portarem
como empresas industriais. Sendo que, nesse processo industrial, até mesmo a escolha das
fontes, que é uma fase da rotina produtiva, induz a cobertura para um jornalismo pautado em
declarações. Ciro Marcondes Filho evidencia bem estes acontecimentos.

A máquina informativa tem processos que são detonados por


jornalistas – associados aos seus próprios vícios (clichês) e visões de
mundo parciais e preconceituosas –, produz, ela mesma, a
desinformação através de diversos procedimentos de intoxicação com
informação e, além disso, dá margem a processos livres,
incontroláveis, inadmissíveis de mistificação e desinformação
(FILHO, 2002, p.113).

Assim sendo, “‘fatos’ e ‘notícias’ não existem por si, só como entidades ‘naturais’. Ao
contrário, são assim designados por alguém (por exemplo, por um editor), por motivos
11

(culturais, sociais, econômicos, políticos) que nem sempre são óbvios” (Arbex Jr. 2003, p.
103).
O que acaba por nos levar a outras hipóteses para a elaboração das pautas, que são os
vínculos estabelecidos com a lógica do mercado e com o poder público. Tais hipóteses podem
ser consideradas extremamente perigosas em países subdesenvolvidos como o Brasil pois, em
se tratando de relação com o mercado, a criterização do que é notícia tem conseqüências muito
graves.

Ao tratar as notícias como “produtos” sujeitos à “lei do mercado”, a


mídia recorre ao sensacionalismo, ao sexo e à “erotização” precoce
das crianças, “glamouriza” o crime e cria estratagemas de sedução dos
leitores e telespectadores. “O mundo do espetáculo”, ou a
“espetacularização do mundo”, atenua ou até abole as fronteiras entre
os gêneros “jornalismo”, “entretenimento” e “publicidade” (ARBEX
Jr., 2003, p. 385).

Tendo em mente que o foco do estudo é a informação televisiva, que tem o telejornal
como seu maior expoente de propagação de informação. Coclui-se que ele possui uma
roupagem própria, existindo em função de uma linguagem e paradigmas específicos.
Sendo estes paradigmas, a maioria deles, incutidos pela “indústria da publicidade” e
que, como sugere Marcondes Filho (2002), “se confundem com a própria lógica da TV como
um todo”. Assim o mercado decide as pautas através de modelos padronizados, como “o
modelo esportivo de noticiário; a lógica da velocidade; a preferência pelo ‘ao vivo’; a
substituição da verdade pela emoção; a popularização e o expurgo da reflexão” (Filho, 2002,
p. 80).
No início do século XIX, segundo Arbex Jr (2003), a concretização do Estado burguês
de direito3 e a legalização de uma esfera pública, na Inglaterra, França e Estados Unidos,
fizeram com que a imprensa começasse a deixar suas características “politizadoras” 4 para se
3
“A época burguesa inverte o processo: agora tudo deve ser exposto, superexposto, ostensivamente mostrado. Uma
radicalização eufórica, contudo, também compromete a divulgação livre: tudo o que é demasiadamente exposto se ‘queima’.
Despotencia-se, esvazia-se o fato, o novo. O estranho, pelo excesso” (Marcondes Filho, 2002, p. 11)
4
“No começo de sua história, até o final do século XIII, a imprensa era organizada como empresa artesanal, mais preocupada
com a divulgação de notícias e com o eventual engajamento nas grandes lutas políticas que consolidaram o regime burguês”
(Arbex Jr., 2003, p. 57/58).
12

voltar, cada vez mais, para os negócios. Os jornais passaram a publicar anúncios, que, com o
tempo, tornaram-se a parte mais importante de suas receitas. Sendo este, uma espécie de
prelúdio de como poderia se suceder a mercantilização da informação, que hoje se encontra
nas mãos do “poder privado” e que tem como objetivo beneficiá-lo, como ressalta Arbex Jr
(2003, p. 60):

Consolidou-se uma curiosa inversão do modelo liberal de esfera


pública: se, inicialmente, a mídia nas mãos do poder privado oferecia
uma garantia frente ao poder do Estado, na medida em que os meios
de comunicação se associaram em ‘oligopólios’ eles foram obrigados
a inibir as funções críticas do jornalismo. Se em sua fase inicial a
imprensa cumpria o papel de informar, divulgar e intermediar
publicamente o raciocínio das pessoas privadas, agora, ao contrário, o
público passa a receber a informação determinada por grupos
privados. É por essa razão que, segundo Habermas, o mundo criado
pelos meios de comunicação de massa só na aparência ainda é esfera
pública.

Este quadro, que é composto por monopólios privados – em sua maioria – dos meios
de comunicação, caracteriza como as empresas decidem o que deve ser notícia, prevalecendo
apenas uma visão de mundo, o que acaba por destruir a pluralidade do debate acerca do
cotidiano público e destrói a noção de democracia.

Os maiores órgãos de imprensa são empresas enormes que integram


conglomerados ainda maiores. São estreitamente integrados com o
nexo Estado-privado que domina a vida econômica e política. Como
outras empresas, vendem um produto a um mercado. Seu mercado é
composto por outras empresas (anunciantes). O “produto” que vendem
é a audiência: no caso da mídia de elite, que estabelece a agenda para
as outras, são audiências privilegiadas. (...) O esquema geral consiste
em incentivar o debate, mas dentro de um quadro estreito de
pressupostos que constituem uma espécie de doutrina “oficial”
(CHOMSKY, 1997)
13

Outro fator que pode ser determinante para definir pautas é o vínculo da empresa de
mídia com o Estado. Este fator pode causar preocupações fundamentais, como ressalta Arbex
Jr (2003, p. 11), pontuando “o que torna a mídia tão perigosa é a sua capacidade de andar de
mãos dadas com o estado, enquanto vendem a imagem de ‘neutralidade’, ‘objetividade’ e
‘democracia’”. Assim sendo, a mídia possui a “capacidade de condicionar o imaginário,
moldar percepções, gerar consensos, criar a base psicossocial para uma operação de grande
envergadura, como a guerra” (Arbex Jr, 2003, p. 11).
Podemos utilizar como exemplo a guerra do Golfo de 1991, que evidenciou a relação
promíscua entre Estado e mídia, onde a televisão funcionou como veículo de legitimação das
ações do governo dos Estados Unidos, como observa Arbex Jr. em seu livro “O Jornalismo
Canalha”.

Em cada uma das intervenções militares subseqüentes protagonizadas


pelos Estados Unidos, a mídia teve um papel fundamental não apenas
como propaganda de um discurso legitimador das ações de Tio Sam,
como também na qualidade de arma psicossocial, componente
fundamental da guerra de propaganda contra o “inimigo” (ARBEX Jr,
2003, p. 37)

No Brasil, podemos dar como exemplo a maior rede de televisão do país, que foi
inaugurada em 26 de abril de 1965, logo após ao golpe militar de março de 1964, orientada –
tecnicamente – pela transnacional Time-Life, dos Estados Unidos, mediante um acordo
visivelmente inconstitucional que foi permitido pelos generais do regime ditatorial.

A ditadura teve na Rede Globo uma grande aliada, quando se tratou de


disseminar uma imagem positiva do regime, de mostrar à classe média
as “vantagens” do chamado “milagre econômico” e mesmo de
construir uma falsa sensação de “união nacional” em torno do poder
(ARBEX Jr, 2003. p. 43).
14

Até que ponto a idéia de se viver em uma interação de 24 horas por dia, onde as
coletividades sociais mais distintas tomam conhecimento desta diversidade através dos
interlocutores midiáticos é verdadeira? Analisando, pode-se perceber que o que acontece são
recortes e seleção de pequenas partes do cotidiano diário das coletividades, e a estas pequenas
partes, agrega-se valor notícia, dando-lhes tratamento para que possam ser transmitidas aos
consumidores do produto informação.
Evidencia-se que, para os “fatos” se tornarem notícia depende tanto da subjetividade
dos profissionais da informação quanto dos vínculos empresariais, mercadológicos e políticos
que profissionais e empresas de mídia estabelecem.São estes vínculos que irão determinar a
maneira como os produtores midiáticos irão olhar – e para o que irão olhar – no cotidiano que
se segue dia a dia.

2.2 – Interesses políticos e econômicos

2.2.3 – Do local ao global

Ao falar dos interesses políticos e econômicos em torno da comunicação de massa, se


faz importante voltarmos a um passado recente de nossa história: o período anterior à ditadura,
além das conseqüências comunicacionais percebidas com o processo de reabertura política. A
comunicação massiva, principalmente a televisiva, no Brasil, sempre apresentou
características evolutivas significativas. Esta (re)lembrança tem o intuito de contextualizar o
atual quadro em que vivemos e a discussão em torno do assunto abordado neste tópico.
Existiam dez emissoras de televisão em funcionamento no Brasil no fim da década de
cinqüenta. O Código Brasileiro de Telecomunicações foi promulgado pela Lei nº 4,117 em
1962. O que resultou em grande avanço para o setor, como observa Sérgio Mattos (2002),
porque deu mais garantias às concessionárias de rádio e televisão, além de amenizar sanções.
Porém, continuou a atribuir ao Executivo o poder de julgar e decidir, de forma unilateral, a
aplicação de sanções ou a renovação de concessões, o que foi considerado uma grande falha.
“O Código Brasileiro de Telecomunicações, aprovado pelo Congresso em 27 de agosto de
1962, foi, na verdade, um projeto de ‘inspiração militar, paralelamente identificado com as
15

teses de integração nacional, segurança e envolvimento pregadas na ESG’ ’” (Mattos, 2002, p


86).
Notadamente, configurava-se um período – independente da ideologia política vigente
– onde o Estado era forte e centralizador. Contudo, esta situação começou a se modificar com
o golpe de 64, onde se definiu e se adotou um modelo econômico para o desenvolvimento
nacional, afetando de maneira direta os meios de comunicação de massa com a total
modificação do sistema político e da situação socioeconômica do país.

O crescimento foi centrado na rápida industrialização, com tecnologia


e capital externos, baseados no tripé formado pelas empresas estatais,
empresas privadas nacionais e corporações multinacionais. Os
veículos de massa, principalmente a televisão, passaram a exercer o
papel de difusão não apenas da ideologia do regime como também da
produção de bens duráveis e não-duráveis (MATTOS, 2002, p. 89)

Todavia, o Brasil se encontrava em um regime de exceção, tendo o Estado como o


centro da vida social, econômica e política do país. Desta forma, os veículos que queriam
obter algum tipo de vantagens, mantinham estreitas relações com o regime vigente,
divulgando e apoiando os ideais políticos governamentais. Antes do golpe, o Estado também
era centralizador no que diz respeito às políticas desenvolvimentistas e reguladoras, mas
também era democrático no que diz respeito à divulgação e proliferação de idéias, o que é
diferente após o golpe, como mostra Sérgio Mattos (2002, p. 91):

No Brasil, durante os 21 anos de regime militar (1964 – 1985), o


financiamento dos meios de comunicação de massa foi uma forma
poderosa de controle estatal, uma vez que todos os bancos são
dirigidos ou supervisionados diretamente pelo governo. A concessão
de licenças para importação de materiais e equipamentos e o
provisionamento, por parte do governo, de subsídios para cada
importação favorecem aos veículos que apóiam as políticas
governamentais. Aqueles que conservam boas relações com o governo
sempre foram e continuam sendo beneficiados com empréstimos,
subsídios, isenção de impostos e publicidade oficial
16

Com a redemocratização do país, é eleito à presidência Tancredo Neves, mas não


chega a assumir devido a problemas de saúde na véspera da posse e vem a morrer dias depois,
assumindo o vice, José Sarney. E no que diz respeito a comunicação, o governo Sarney foi um
verdadeiro show de horrores. Uma enxurrada de concessões de rádio e TVs foram distribuídas
a diversos parlamentares e pessoas ligadas a eles, como moeda de troca política, de modo a
garantir seus votos no projeto que concedia 5 anos de mandato para o presidente. “Entre 1987
e 1988, o Ministério das Comunicações distribuiu 168 emissoras de rádio e televisão a
empresas ligadas a 91 parlamentares. Destes, 88 votaram a favor da emenda que concedeu
mais um ano de mandato ao Presidente” (Costa e Brener, 1997, p. 30). Esta acabou se
tornando uma prática comum nos anos posteriores, como aconteceu no governo FHC.

Em 1996, a partir do mês de março, mas principalmente em dezembro


daquele ano (um mês antes da votação que permitiu a reeleição
presidencial) o governo, através do Ministro Sérgio Motta, concedeu
102 outorgas a fundações educativas e 268 a entidades ou empresas
controladas por políticos – 19 deputados federais, 6 senadores, 2
governadores, 11 deputados estaduais, 7 prefeitos, 8 ex-prefeitos e
outros 23 políticos (COSTA e BRENER, 1997, p. 31)

Após o governo de José Sarney, vem Fernando Collor de Mello em 1990, sendo que
em 1992 é afastado por um processo de impeachment, assumindo o vice Itamar Franco, que
em seu discurso de posse, mostrou o possível caminho ao qual o país iria se encaminhar se
referindo ao mercado global e ao envolvimento do Brasil neste processo:

Abrir as fronteiras à competição internacional não significa renunciar


a soberania. O princípio que orientará as relações com os outros povos
deve ser o da estrita reciprocidade, (...) a nossa participação na
sociedade mundial, prometida pelo novo milênio, pressupõe a nossa
própria integração (FRANCO, 1992).
17

As empresas de comunicação sofreram grandes transformações com as mudanças


políticas e tecnológicas que se estabeleceram no final do século XX, que podem ser
caracterizados por um “crescente aumento das megafusões5 e do processo chamado de
‘convergência’, à constatação de que a economia das indústrias do ‘simbólico’ passava a
ocupar um lugar privilegiado na massa crítica da economia mundial” (Ford, 2003, p. 87).
Politicamente, foi o momento de afirmação do modelo capitalista no molde neoliberal e,
economicamente, assistimos ao desmonte do Estado como agente da promoção do
desenvolvimento material e árbitro do interesse coletivo, processo que terminou por se
concretizar, no Brasil, nos dois mandatos do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso 6.
Nota-se um movimento generalizado de negação, segundo Bobbio (1999, p. 25), do “primado
do público”, que se funda sobre a contraposição do interesse coletivo ao interesse individual.
É quando começa a se configurar o atual quadro em que vivemos, onde a palavra de
ordem é globalização, sendo que “a chamada grande mídia fabrica o consenso sobre a
superioridade das economias abertas, insistindo que não há saída dos pressupostos neoliberais”
(Moraes, 2003, p. 188). Constantemente, assistimos ao fortalecimento e estabelecimento das
grandes corporações empresariais e financeiras e ao enfraquecimento do Estado, restando o
papel de guardião e provedor dos interesses desses grupos, e promotor de políticas
assistencialistas junto à população mais desfavorecida. E neste sentido, Benjamim R. Barber
(2003, p. 42/43), esclarece bem quando fala que:

Na Europa, na Ásia e na América, os mercados já desgastaram as


soberanias nacionais e deram origem a uma nova cultura: a cultura
dos bancos internacionais, das organizações comerciais, dos lobbies
transnacionais como a Organização dos Países Exportadores de
Petróleo (OPEP), dos serviços mundiais de informação (CNN e BBC)
e das empresas multinacionais. São os novos soberanos de um mundo
em que os Estados-nações não são mais capazes de gerar sua própria
5
Para explicar megafusões, podemos utilizar o exemplo dado por Barber (2003), falando sobre o fato da Disney não ter
“somente estúdios de produção, parques temáticos, equipes esportivas, mas também editoras, emissoras de televisão, jornais,
cidades novas”, levando um presidente de empresa se maravilhar “com a estratégia comercial da Disney, que, ao comprar a
ABC, atingiu uma dimensão mais que mundial, Universal”. E também, falando da Paramount que adquiriu “a Simon &
Schuster, que tinha o Madison Square Garden, um time de basquete (Knicks) e um de hóquei (Rangers), logo antes de ser, ela
mesma, comprada pela Viacom. O peixe grande foi engolido por outro maior” (in MORAES(org), 2003, p. 54)
6
Interessante ressaltar que FHC em 1996, também usou da prática de conceder outorgas, de março daquele ano até dezembro,
sendo que neste último mês, foi onde houve mais concessões – coincidência ou não, foi a um mês da votação da emenda que
permitiu a reeleição presidencial (COSTA, S. e BRENER, J, 1997, p. 31).
18

economia e menos ainda de controlar os movimentos de capitais nos


mercados planetários.

Para o estabelecimento desta “nova cultura” , como coloca Barber (2003), entra em
prática uma das maiores pragas que assolam as coletividades sociais na contemporaneidade: a
massificação das idéias – o que poderíamos chamar de crise da formulação do pensar crítico.
Com isso, se forma uma sociedade uniforme, que se baseia no ato de consumir.

Uma sociedade universal de consumo que não seria composta nem por
tribos nem por cidadãos, todos maus clientes potenciais, mas somente
por essa nova raça de homens e mulheres, que são os consumidores. A
nova cultura globalizante expulsa do jogo não apenas aqueles que
criticam de um ponto de vista reacionário, mas igualmente os seus
concorrentes democráticos, que sonham com uma sociedade civil
internacional constituída de cidadãos livres oriundos das mais variadas
culturas (BARBER, 2003, p. 41)

Com isto, entram em cena as megacorporções midiáticas, que fazem parte da estrutura
básica da nova cultura mundial, que tem por objetivo propagar e hegemonizar o esvaziamento
do senso crítico, tirando proveito disto, como observa Barber (2003, p. 43):

Os bens da nova cultura mundial são tanto imagens quanto formas


materiais, tanto uma estética quanto uma gama de produtos. É uma
cultura reduzida ao estado de mercadoria, em que o hábito faz o
monge, em que o look se transforma em uma espécie de ideologia. As
galerias comerciais, as praças “públicas” privatizadas e os bairros sem
vizinhos dos subúrbios residenciais são as novas igrejas dessa
civilização mercantil. Os novos produtos são menos os bens do que as
imagens, as quais contribuem para criar uma sensibilidade planetária,
veiculada por logos, stars, canções, marcas e jingles. As relações de
força tornam-se forças de sedução: a ideologia transforma-se em uma
espécie de “videologia” à base de sons expressos em bits e de
videoclipes.
19

Para tal tarefa, as corporações utilizam-se de uma prática que é própria do mercado
global: os monopólios constituídos pelas megafusões de empresas, assim formando os grandes
conglomerados comunicacionais.

As corporações de mídia e entretenimento exercem um duplo papel


estratégico na contemporaneidade. O primeiro diz respeito à sua
condição peculiar de agentes operacionais da globalização, do ponto
de vista da enunciação discursiva. Não apenas legitimam o ideário
global, como também o transformam no discurso social hegemônico,
propagando visões de mundos e modos de vida que transferem para o
mercado a regulação das demandas coletivas. A retórica da
globalização intenta incutir a convicção de que a fonte primeira de
expressão cultural se mede pelo nível de consumo dos indivíduos
(MORAES, 2003, p. 187).

Através da “sinergia que alimenta a acumulação de capital financeiro numa economia


de interconexões eletrônicas” (Moraes, 2003, p. 189), os grupos de mídia buscam alcançar
enormes lucros como qualquer outro tipo de megaempresa transnacional. De modo que,
atuando “tanto por adesão à globalização capitalista quanto por deter a capacidade de
interconectar o planeta”, utilizam “satélites, cabos de fibra óptica e redes infoeletrônicas”
(Moraes, 2003, p. 189). Obtendo-se a concentração de poder sem a centralização operacional,
sendo, isto, resultado concreto de uma articulação existente entre o modo de produção
capitalista e as tecnologias de comunicação e informação.

Em suma, as organizações de mídia projetam-se, a um só tempo, como


agentes discursivos, com uma proposta de coesão ideológica em torno
da globalização, e como agentes econômicos proeminentes nos
mercados mundiais, vendendo os próprios produtos e intensificando a
visibilidade de seus anunciantes (MORAES, 2003, p. 191)

Ignorando os índices de miséria, desemprego e desigualdades sociais, os “titãs da mídia


e entretenimento” seguem em busca da exploração dos potenciais de consumo existentes,
20

como observa Ford (2003, p. 91), tendo como objetivo de comercialização o aumento das
relações interculturais.

2.3 – Informação versus Contra-informação

Como já vimos, a “nova ordem”, os grandes conglomerados de mídia, tratam a


informação como um produto, um bem de consumo. Por sua vez, a veiculação de informações
está interligada a venda de outros produtos, formatação do pensar coletivo, estabelecimento de
um senso comum em torno das questões sociais, sendo que este consenso deve ser superficial
e nada crítico. Em suma, “a indústria cultural sufoca a produção local, impõe gostos, sanciona
e dá visibilidade a jornalistas e intelectuais que sustentam a idéia de que ‘o mercado’ é o
melhor e o mais adequado (talvez único) juiz de valor” (Arbex Jr., 2003, p. 398).
Segundo Ford (1999, p. 301), “a palavra ‘cidadão’ foi perdendo espaço na notícia ou
no que os teóricos denominam newsmaking”, sendo substituída por “consumidor”. Esta é a
“nova ordem” vigente: somos todos tratados como consumidores em potencial e a informação,
um produto a ser consumido, atentando para o fato de ser cada vez menos perceptível o limite
entre o entretenimento e a informação.
Para a formação deste quadro, tem-se como base a crise que o poder – em seu sentido
mais amplo – sofre, onde, como ressalta Ignacio Ramonet (1999, p. 39), “de um poder
vertical, hierárquico e autoritário, estamos passando para um poder horizontal, reticular e
consensual (um consenso obtido, precisamente por meio de manipulações midiáticas)”. Assim,
caracterizamos uma das maiores – se não a maior – pragas da contemporaneidade: os
consensos, o senso comum em torno das questões sociais. A mídia tem construído as
representações da sociedade, da história, da memória e de nossas percepções. Porém, na
contramão do estabelecimento de uma única visão sobre os acontecimentos cotidianos pela
“mídia monopolizada” que “nada tem a ver com a suposta ‘liberdade de informação’
pretensamente assegurada pelas economias capitalistas liberais” (Arbex Jr., 2002, p. 390),
pode-se encontrar resistências ao quadro desenhado pelo discurso midiático contemporâneo.
Operando no sentido da contra-informação, Deleuze (1999, p. 4/5) caracteriza que
21

uma informação é um conjunto de palavras de ordem. Quando nos


informa nos dizem o que julgam que devemos crer... Em países sob
ditadura cerrada, em condições particularmente duras e cruéis, existe a
contra-informação... A contra-informação só se efetiva quando se
torna um ato de resistência.

Com esta estrutura, temos o Estado como agenciador dos interesses das grandes
corporações empresariais e financeiras e provedor de políticas assistencialistas junto às
populações mais desfavorecidas. Nessa configuração, temos ainda as classes mais abastadas
como controladores e censores da informação. Em contraposição, alguns agenciadores de
informação se vêem com a tarefa de tentar quebrar o silêncio, refutar as mentiras veiculadas
pela mídia que tem “interesses que não passam pela democratização da informação, pela
participação ativa das audiências, pela educação e cidadania ampliada que poderia gerar”
(Dudus, 2004, p. 82). Assim, configura-se uma conceituação de contra-informação.
Com a inoperância do Estado capitalista do final do século XX em ter “o papel de
apoiar os grupos menos favorecidos, em detrimento dos interesses e lucros dos agentes da
atividade privada” (Bobbio, 1999, p. 26), é comum se ter como produtores de contra-
informações os próprios movimentos políticos e sociais, em um ato de resistência ao
estabelecimento da lógica empresarial e por uma comunicação não excludente.

Essa democracia dos meios mas a resultante liberdade de expressão e


produção de informação, para uma sociedade mais justa e inteligente,
todos estes objetivos, quem procura cumprí-los, com todo o talento e
usando todas as mídias que lhe caem nas mãos, são justamente os
novos movimentos sociais, uma espécie de ativismo global que está
juntando forças. Eles estão fazendo comunicação horizontal, eles estão
criando uma Poética da Comunicação com seus atos comunicativos
inteligentes (DUDUS, 2004, p. 83).

Exemplificando: em grande evidência se encontram os grupos contrários ao modelo


neoliberal de globalização, integrando o CMI, que produz informação a partir dos pontos de
vista dos movimentos sociais. Estas informações são veiculadas, a priori, na Internet, mas
22

também são utilizadas na produção de materiais impressos, boletins de rádios comunitárias,


vídeos-documentários, etc.
O CMI é uma alternativa, que podemos classificar como bem-sucedida, à mídia
corporativa. O site do coletivo foi criado em 1999, com o intuito específico de cobrir, minuto a
minuto, os eventuais protestos contra a reunião da Organização Mundial do Comércio (OMC)
em Seattle. “Ele foi concebido, alguns meses antes, em um encontro de mídia alternativa como
um banco de dados multimídia por meio do qual diferentes veículos alternativos
intercambiariam matérias dispensando o direito autoral” (Ryoki, 2004, p. 29).
Porém, algo inesperado aconteceu, para a surpresa de todos os envolvidos no projeto:
“dezenas de colaboradores anônimos que ligavam suas câmeras e laptops, usavam celulares
como walkie-talkie, filmavam as ações e transmitiam de cibercafés,” desta forma,
desmentindo “a cobertura da mídia corporativa que dizia que nada estava acontecendo”
(Dudus, 2004, p. 92). O que acarretou em uma nova perspectiva para o projeto. As pessoas
envolvidas perceberam que algo maior era possível de ser posto em prática.

Durante os protestos em Seattle, não apenas os jornalistas utilizaram o


site. Os manifestantes, eles mesmos, publicaram diretamente seus
relatos, entrevistas, fotos e vídeos, dispensando a mediação do
jornalista. As pessoas envolvidas no projeto foram suficientemente
sensíveis pra perceber essa apropriação e transformaram isso em base
para um novo conceito de contra-informação. Não se tratava apenas de
combater a hierarquia da redação jornalística, nem o caráter industrial
e capitalista da produção de notícia; tratava-se de abolir o próprio
papel de mediador do jornalista, criando um sistema participativo de
publicação aberta (DUDUS, 2004, p.92).

O quadro estabelecido atualmente é o das grandes fusões entre as empresas telefônicas,


as grandes empresas midiáticas e de informática, sendo determinante para a fusão da
informação e entretenimento. Tal fato, para Aníbal Ford (1999, p. 303), “parece liquidar os
velhos valores do jornalismo e da liberdade de imprensa como promotora do desenvolvimento
e do debate, da e na opinião pública, do enriquecimento e do aprofundamento do político”. E é
neste contexto que se evidencia a importância de projetos como os Centros de Mídia
Independente, que hoje chegam a mais de cem centros espalhados pelo mundo – onde se tem
23

uma política editorial baseada nos conceitos de “publicação aberta” e ao do copyleft,


possibilitando, respectivamente, que qualquer uma pessoa possa publicar sua matéria e a
reprodução da informação – em seus vários formatos – desde que se cite a fonte e se respeite a
integridade do material, fazendo do CMI “uma coisa realmente nova acontecendo no mundo
jornalístico, e na maneira de utilizar a mídia” (Dudus, 2004, p. 92). Além de ser uma brilhante
alternativa à monopolização da comunicação, é uma grande possibilidade de competir com a
força do capital empresarial.

A nova mídia desenvolve sua cobertura como um documentário


ficcional cujo roteiro vai sendo escrito através das fabulações narradas
pelos próprios participantes. Se ela pode abandonar a isenção
jornalística e permanecer veraz, deve ser porque sua evidente adesão
ao acontecimento se faz para proveito do jornalismo (ANTOUN in
DUDUS, 2004, p. 92).

Sendo assim, atores sociais ativos, produtores de contra-informação, “lutam” contra a


“tipificação das identidades e das comunidades interpretativas em função do consumo e da
datavigilância” (Ford, 1999, p. 298), através da multiplicidade dos pontos de vista. Assim,
dando visibilidade a uma mobilização em defesa da igualdade e respeito às diferenças.
No entanto, mesmo com essa vital participação, a contra-informação não é
necessariamente produzida apenas por pessoas ligadas a movimentos sociais ou políticos, ou
pelos próprios movimentos. Podemos citar a última – denominada – guerra entre Iraque e as
forças lideradas pelos EUA, onde houve um grande cuidado e se criou todo um aparato em
torno do que seria noticiado a respeito do conflito. Contudo, um cidadão comum, utilizando-se
de uma ferramenta denominada blog 7, “assinando” como Salam Pax – “paz” em árabe e latim
respectivamente – publicou logo após os primeiros vinte minutos do primeiro ataque realizado
ao Iraque: “Sirenes de bombardeio em Bagdá, mas os únicos sons que dá para ouvir são as
metralhadoras antiaéreas”8.

7
Blog é a abreviação de weblog, que é uma espécie de diário virtual, mas que enquanto ferramenta pode ter
outras utilizações se não um simples diário.
8
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos/asp091220038.htm > acessado em 20 de setembro de 2005.
24

Certo que não era uma publicação com uma reflexão profunda sobre o que se estava
acontecendo no país que era regido pelo ditador Saddam Hussein. Porém, com informações
sobre o dia-a-dia daquele povo, cujas terras eram invadidas, sob a ótica de quem estava dentro
do conflito e burlando os filtros ideológicos das empresas midiáticas, o blog passou de
curiosidade de poucos para fonte fundamental de informação para muitos.
Este acontecimento pode ser considerado uma mostra de como a mídia corporativa, por
exemplo, legitimou os ataques dos EUA ao Iraque. Pois ela propagou a idéia de uma possível
existência de armas de destruição em massa sob o domínio daquele país. Ou que a reação
normal aos atentados de 11 de setembro de 2001, seria uma possível invasão ao país
endividado e com um poder militar risível.
O homem que assinava os depoimentos como Salam Pax, expôs informações durante o
conflito, que retravam o cotidiano dos ataques, e a não existência das tais armas, dando
evidências de toda a armação para que o conflito fosse legitimado.
Portanto, esta é a finalidade da contra-informação. Servir de alternativa ao modelo de
comunicação vigente, modelo este que é totalmente atrelado a lógica do mercado globalizado.
Visto que a informação, com este vínculo estreito com o mercado, se desligou da função de
bem informar a sociedade.
Para tal tarefa, as produções de informações são realizadas sob a mascara de conceitos
mitificados, como: neutralidade, distanciamento, imparcialidade e jornalismo objetivo.

3 – Os mitos da imparcialidade, do distanciamento e do jornalismo objetivo

3.1 – Neutralidade e distanciamento

No capítulo anterior, tratamos dos procedimentos teóricos e das relações profissionais,


mercadológicas e políticas para o estabelecimento da notícia. É neste contexto que iremos
trabalhar com os conceitos de neutralidade e distanciamento. Como vimos, dentro da hipótese
25

da agenda setting, a determinação do que é notícia acaba dependendo da percepção da


relevância ou importância que algo possui para que possa ser veiculado.
Mantendo nosso foco voltado à percepção dos acontecimentos cotidianos, chamamos
atenção para o fato de os produtores de informação serem seres humanos, percebendo o
mundo sob seus pontos de vista, de acordo com suas cargas subjetivas. Para um determinado
observador, algo somente chamará atenção como possível fato noticiável mediante seu modo
de observar os acontecimentos. Pensar diferente “nos conduziria ao erro de considerarmos as
produções sígnicas como simples expressões ou ilustrações de uma dada sociedade, como
mera simbolizações refletidas” (Santaella, 1989, p. 38).
Desenvolvendo esta análise, podemos pensar sobre a produção de um telejornal,
produção que é realizada com a confecção de matérias sobre fatos acontecidos no mundo real.
Para que uma dessas matérias possa ser feita, é necessário que um repórter vá observar e
analisar determinado acontecimento, interpretá-lo e o moldar em uma linguagem específica,
que é a linguagem do telejornal.
Após todo este trabalho de construção do real em matérias jornalísticas, estas são
apresentadas aos telespectadores sob jargões como “a verdade dos fatos”, como se apenas
houvesse uma forma de observar e analisar tudo o que acontece e que é notícia em potencial.
Com isso, vincula-se a errônea conceituação de neutralidade e distanciamento acerca da
construção e retratação do mundo real pois, como analisa Santaella (1989), a confecção de um
telejornal faz parte das “práticas nas e com as linguagens que o homem cria, reproduz e
transforma”, fazendo com que as técnicas da produção informativa não sejam suficientes para
garantir tais conceituações.
Para esta produção, prevalece a falsa idéia de que se toma como referência a
perspectiva do interesse público para investigar, selecionar e divulgar informações que, na
verdade, são do interesse dos agenciadores de informação. Pois, se a informação for
“considerada essencialmente uma mercadoria” (Ramonet, 2003, p. 247), tal fato faz com que o
interesse se torne palavra-chave. O interesse na obtenção de lucro, por parte das empresas
midiáticas, acaba por determinar a noticiabilidade dos acontecimentos cotidianos. Não existe a
preocupação de se fazer “um discurso que tenha a vocação ética de educar o cidadão ou de
informar, no bom sentido da palavra, o cidadão, pois tem essencialmente e antes de mais nada
uma perspectiva comercial” (Ramonet, 2003, p.247).
26

Desse modo, consideramos que esta perspectiva se configura em algo problemático,


principalmente em se tratando de Brasil. Conforme salienta Eugênio Bucci (2000), “somos um
país em que a TV comercial – cuja única finalidade é vender e cujo único indicador de
qualidade é seu sucesso em fomentar o consumo – prepondera sem o mínimo limite”; tal fato é
essencial para que um dos maiores interesses na produção de informação ocorra mediante os
vínculos com a obtenção de lucro.
Outro fator que nos faz crer nos conceitos de neutralidade e distanciamento em forma
de mitos é a maneira de obtenção de parte do real para transformá-lo em notícia. Pois, mesmo
que um jornalista não interfira de maneira direta em um acontecimento, pode acabar fazendo
isso de forma indireta. Isso se dá porque, ao presenciar um acontecimento, um “fato”, é
necessário realizar interpretações para chegar a uma conclusão do que se está acontecendo,
sendo que cada indivíduo tem sua própria maneira de interpretar o que observa e vai reportar.
Afinal, “qualquer relato é uma forma de retraduzir o mundo segundo a perspectiva de quem
conta. Intencionalmente ou não” (Filho, 2002, p.200). Esta atitude natural faz com que existam
várias versões para um único acontecimento ou “fato”, pois

as linguagens não sendo dados inocentes e transparentes, exigem de


uma ciência que as fale e nos possibilite tê-las para além das
evidências aparentes que muitas vezes camuflam o estereótipo e a
mistificação sob vestimenta retórica e a decoração do novo
(SANTAELLA, 1989, p. 38).

Sendo, desta maneira, toda a notícia fabricada mediante as referências de cada produtor
informacional, que conta com toda sua carga subjetiva e formação cultural. O que é reforçado
pela argumentação de Maria Rita Kehl:

O pensamento não passa de um longo rodeio que o ser humano é


obrigado a fazer em busca de um objeto sempre perdido; é um
movimento que tenta reconstituir, pela via simbólica, pela via da
representação, um substitutivo para esse objeto. Sabemos desde A
interpretação dos sonhos, de Freud, que o desejo não tem que se
27

realizar necessariamente em ato. Pode bastar-lhe a linguagem (KEHL,


2000, p. 136).

Compreender estes questionamentos iniciais nos faz chegar à importante proposição


feita por Elizabeth Bastos Duarte (2005) em artigo publicado no site Verso e Reverso 9: “como
compreender o que a própria televisão classifica como produtos informativos, como tele-
realidade, como tele-verdade?”. Como foi evidenciado anteriormente, ao estudarmos a
hipótese do newsmaking, as emissoras de televisão realizam coberturas de uma faceta da
realidade, indo até onde conseguem ter acesso somente e generalizam esta cobertura para toda
a sociedade, em função de que o ritmo do processo produtivo seja atendido. Pois, como já foi
dito, o telejornal tem que “ir ao ar” todos os dias e precisa de fatos que sustentem essa
demanda industrial. E essa demanda industrial comporta-se produzindo informações quase
que em “tempo real”, que não contemplam os conceitos de neutralidade e distância; conceitos
estes que são cultuados pelos produtores midiáticos.

Pois descrever ‘diretamente e em tempo real’ um evento não permite


absolutamente ao jornalista tomar distância, dar-se o tempo da
reflexão e da verificação, nem compreender simplesmente o que se
passa sob seus olhos... Ele hesita, interpreta, enfeita e, nolens volens,
acaba finalmente enganando os telespectadores. Impor à informação a
velocidade da luz é confundir informação com atualidade, jornalismo
com testemunho (RAMONET, 1999, p. 111).

Tendo jornalistas como acionadores de processos da máquina informativa, os quais


possuem suas próprias visões de mundo, o processo resultante pode remeter à alguma
desinformação “através de diversos procedimentos de intoxicação com informação” (Filho,
2002). Esse processo ocorre porque

Jornalistas, como todas as pessoas, selecionam os fatos novos e os


classificam a partir de seus próprios estereótipos. Assim eles se
9
http://www.versoereverso.unisinos.br/index.php?e=4&s=9&a=33> acessado em 17 de outubro de 2005.
28

tornam atores privilegiados na manutenção de idéias, verdadeiros


agentes conservadores da cultura, visto que têm acesso a meios de
divulgação em massa de suas idéias (e preconceitos) (FILHO, 2002, p.
109).

No que diz respeito aos vínculos políticos com os “empresários da informação”, a


contaminação da produção jornalística é preocupante. Vera de Oliveira Nusdeo Lopes (2000)
ressalta que a legislação brasileira, no que tange a regulamentação do exercício da atividade
televisiva, é no mínimo peculiar.

O Estado se limita ao seu papel de conceder canais. Fora isso, o que


impera, desde sempre, é a total falta de regulamentação da matéria,
talvez por medo de qualquer discussão sobre o assunto possa dar a
impressão de censura e obscurantismo. É preciso ressaltar que tal
incômodo é menos verdadeiro do que parece e tem sido utilizado
como perigoso argumento contra qualquer forma de avanço no
controle democrático sobre os meios de comunicação de massa. Essa
omissão se explica pelo objetivo de governantes de ganhar a simpatia
dos empresários do setor. Em nada serve aos interesses sociais
(LOPES, 2000, p. 168).

Para exemplificar no que esta relação pode implicar dentro da discussão abordada neste
tópico, podemos citar o caso da criação da Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual
(Ancinav), em agosto de 2004. A Ancinav seria uma agência que teria como atribuições
regular, estimular e fiscalizar as atividades de produção e de difusão de conteúdo audiovisuais
no país.
Nesse episódio, o governo brasileiro tentou intimidar as emissoras de TV,
principalmente a Rede Globo, principal interessada em que o projeto não chegasse ao
Congresso, e acabou perdendo a “queda de braço”. Desde o início do projeto, em 2004, a
Globo liderou ataques contra a proposta. Para isso, utilizou-se de artistas, jornalistas e
celebridades, com o intuito de criticar o projeto junto a opinião pública, assim fazendo que
pairasse no ar a sensação de censura e obscurantismo por parte dos políticos.
29

Outro fator perigoso que esta relação Estado-mídia pode estabelecer são as
legitimações de ações. Exemplificando, podemos mencionar o momento em que o governo
FHC colocou em prática a cobrança da Taxa Referencial (TR), até 40% acima da inflação,
além de cortes violentos no crédito para plantio – que trucidou a agricultura brasileira. No
entanto, nas notícias veiculadas pelos meios de comunicação – editadas de acordo com seus
estreitos vínculos com o governo –, os produtores rurais saíram como “caloteiros”. Esta
manobra foi posteriormente reconhecida como um equívoco, embora não tenha sido atribuído
a este reconhecimento o devido grau de importância.

Nos últimos dias de 1999, em entrevista à Folha de S. Paulo, o


presidente FHC reconheceu como “um dos maiores erros do seu
governo” que os agricultores tinham razão, e que ele havia pensado
que era tudo “choradeira” (esse reconhecimento por parte do
presidente não teve nenhum destaque na edição da entrevista. A
opinião pública continua a acreditar, portanto, que os agricultores são
“caloteiros”) (ABRAMO, 2003, p. 56/57).

Estas análises, além de reforçar a condição de mitos aos conceitos de neutralidade e


distanciamento, acabam por conceber uma crítica ao conceito de imparcialidade, sustentado
por quem produz o produto informação. Esta crítica pode ser melhor dimensionada com a
concepção de jornalismo objetivo, requisito necessário para melhor elucidar a mitificação da
imparcialidade.

3.2 – Jornalismo Objetivo

Acredita-se que o conceito de objetividade no jornalismo está ligado à fidelidade com


que se retrata a realidade. Porém, sabemos que na prática, não passa de um mecanismo de
síntese, sendo que a “objetividade se converteu em sinônimo de verdade absoluta e é vendida
como ingrediente para camuflar a tendenciosidade que existe no cotidiano dos veículos de
comunicação” (Melo, 1985, p. 7/9). Afinal, o profissional que produz a informação sobre o
30

real, interpreta e recria os acontecimentos de acordo com seus pontos de vista e visões sobre o
mundo.

Objetividade, na perspectiva de Kant, seria uma representação correta


da realidade e não, como se crê, aquilo que existe independente do
espírito humano e que é oposto ao mundo aparente, irreal, ilusório
(subjetivo). Esta segunda acepção não tinha, para ele, bases, pois
“aquilo que não existe para ninguém não pode ser conhecido, e sobre
isto nada se pode dizer, em todo caso, nada de certo. Tampouco ela
tem o caráter de ‘representações capazes de suscitar algum consenso’,
pois pode-se muito bem delirar ou sonhar coletivamente” (FILHO,
2002, p. 110/111).

Com base nestes questionamentos iniciais, no que tange o conceito de objetividade no


jornalismo, continuaremos a analisar a rotina produtiva de informação.
Após a definição de assuntos ou “fatos” para se dar cobertura e contá-los como os
acontecimentos do mundo externo ao ser humano – atentando para o fato desta prática ser algo
premeditado pelos agenciadores de informação, sendo assim, esta premeditação faz com que
os conceitos de neutralidade e distanciamento na produção de notícias sejam eliminados –
passamos para o estágio seguinte, que é o da estruturação da notícia.
Nesse momento, ocorre a adaptação das informações capturadas no cotidiano em
linguagem específica do telejornalismo. Linguagem que iremos chamar de “texto
telejornalístico”.

O telejornalismo foi, em seu início, uma variante do jornalismo


impresso. Era uma espécie de leitura televisionada de notícias
impressas. Como no cinema, o apresentador não passava de um
narrador, uma voz de fundo, ilustrando as imagens. Com a criação da
linguagem própria da TV, advinda do desenvolvimento técnico
(reportagens, videoteipes, do cenário específico), particularmente dos
anos 60, o telejornal ganha uma roupagem própria, transformando a
simples leitura de notícias num show televisivo (FILHO, 2002, p.
79/80).
31

Dentro desta linguagem própria, o texto telejornalístico, ao estruturar uma notícia,


define que determinado tema não é agendado pela sua qualidade, nem por ser referente ao
bem-estar econômico, político e cultural dos telespectadores. O critério que valida todo o
processo é o que Filho (2002) denomina lógica da velocidade: um critério de qualidade na
opinião do jornalista, onde assunto bom é o apresentado antes da concorrência. O autor
acrescenta problemas a esta lógica da velocidade:

Jornalistas tornam-se, assim, funcionários de uma linha de montagem


acelerada em que a rapidamente selecionam, por padrões viciados e
em geral imutáveis, sempre os mesmos enfoques, as mesmas
caracterizações. Jornalismo se torna uma máquina de produzir sempre
o mesmo, qualquer que seja o conteúdo diferente do dia-a-dia
(FILHO, 2002, p81)

No entanto, ao observar manuais de redação para televisão, é provável encontrar


recomendações como esta:

O tamanho ideal do lead para o jornal e o rádio – quatro linhas de 72


batidas ou quarenta palavras – é longo para TV. Embora não exista
uma regra para o texto na televisão, a média de 28 palavras ou de dez
segundos é usual e satisfaz o propósito de clareza, objetividade e
concisão (BAHIA, 1990, p. 146).

Para tal colocação, onde se defende um texto reducionista e rápido, um texto sintético
por necessidade, sendo que esta síntese é compensada – enquanto algo explícito e
compreensível – através dos elementos naturais do texto telejornalístico, dá-se determinada
explicação:

O princípio fundamental é de que toda imagem corresponde um som,


e não uma palavra. Dez segundos de silêncio na TV pode ser uma
pane no vídeo, um bloqueio do comunicador ou uma atitude mais
32

conseqüente que as palavras ditas com eloqüência (BAHIA, 1990, p.


146/147).

Sob estes aspectos, vale questionar se este modelo textual difundido no mercado
telejornalístico é realmente o mais adequado, se realmente é capaz de informar adequadamente
aos telespectadores. Conforme os autores citados, o fato do texto telejornalístico ser
aparentemente simples e inteligível por qualquer pessoa apresenta alguns problemas
consideráveis. Um deles, é o fato deste texto dito “claro, objetivo e conciso”, na verdade,
apresentar um alto grau de superficialidade em sua abordagem do real; afinal é considerado
“um acessório para ser usado apenas como apoio à imagem e ao som” (Bahia, 1990, p. 147).
Tal fato se torna problemático se considerarmos que determinada notícia, apresentando esta
característica, torna-se falha, em uma grande escala de valores, ao representar o real.

(...) por exemplo, a violência em determinada favela é explicada pela


ação de indivíduos “malvados”, de narcotraficantes e de “gangues de
malfeitores”, sem que se explicite o fato de que sua ação se dá num
quadro de “desemprego estrutural” que destrói a vida de milhões de
jovens, privando-os de utopias e sonhos, e em circunstancias sociais
trágicas, em locais onde não há escolas, pronto socorros, água e
esgoto, áreas de lazer e assim por diante. Com isso, a violência
aparece como um “dado da natureza”, algo causado por razões raciais
ou genéticas (ARBEX JR., 2003, p.386/387).

Assim, tendo como base a hipótese de que a objetividade está ligada à fidelidade com
que se retrata a realidade e os exemplos expostos, podemos destacar que a objetividade
jornalística acaba por se tornar uma atividade comprometida. Alguns problemas em relação à
fidelidade de retratação da realidade podem ser encontrados ao se fazer uma análise de uma
das recomendações que os manuais colocam como apropriada para a formulação de notícias:

O texto na TV deve ser tão claro, objetivo e conciso como no jornal e


no rádio, mas não é só. As palavras devem ser bem pronunciadas, o
comunicador deve satisfazer visualmente a simpatia que dele espera o
33

telespectador sem prejuízo de seriedade e credibilidade, pois nesse


meio mais que em qualquer outro a complexidade é punida pela
rejeição (BAHIA, 1990, p. 147).

Como podemos observar, os parâmetros estéticos na confecção do telejornal são


superestimados, bem mais que a preocupação com a profundidade que se pode dar ao assunto
noticiado. Há ainda a subestimação da capacidade dos telespectadores de compreenderem e
assimilarem um produto com grande carga informativa, qualificando profundidade e qualidade
da informação como prolixidade e complexidade. Pensar diferente seria errôneo, pois

Há cada vez mais pessoas educadas, mais pessoas que fizeram estudos
secundários, que fizeram estudos superiores. Na verdade, poderíamos
dizer que em nenhum momento da história, na imensa maioria dos
países de hoje, houve um nível educacional como o atual. Portanto,
enquanto o nível educacional sobe, o nível midiático desce
(RAMONET, 2003, p. 250).

Tendo esses aspectos em questão, evidencia-se a prioridade que é dada a uma


abordagem sensacionalista ao construir a informação pois, segundo os manuais, “a notícia
precisa ser direta e simples. Mas se o seu texto for excessivamente frio e impessoal,
enfraquece a ação do locutor que tem de ver nele a essência em que apóia o seu próprio estilo”
(Bahia, 1990, p. 147). Sendo assim, a emoção sempre estando presente, garantindo que o
público fique “preso” à programação, não mude de canal ou busque outra atividade,
configurando, deste modo, o que Ciro Marcondes Filho (2002) chama de show televisivo.
Esta questão também diz respeito à formação e proliferação do senso comum,
estimulando atuações acríticas por parte da sociedade. Com isso, configuramos a problemática
do jornalismo objetivo, de acordo com o conceito que é difundido e aplicado no mercado.
Porém, compreender como operam, no cotidiano de apuração e veiculação de informações,
esta falsa objetividade, aliada aos mitos do distanciamento e neutralidade pode se mostrar de
grande valor para o exercício da profissão com responsabilidade e incentivador do debate
público.
34

3.3 – O Mito da Imparcialidade

O ato de comunicar se estabelece através de linguagens; o telejornalismo possui


linguagem específica e própria de sua rotina produtiva. A partir desta perspectiva onde,
“deixa-se de lado o conceito de língua como um sistema neutro e passa-se a ver a língua como
o lugar privilegiado de manifestações enunciativas”, Vizeu (2005) nos ajuda a compreender
mais um mito da produção jornalística: a imparcialidade.
Com este propósito, vê-se a importância de não falar de linguagem de maneira
generalista, visto que é composta por algumas partes distintas uma das outras, como o texto
verbal e o imagético. Porém, em caráter contextualizador, é necessário ter em mente que

(...) é impossível encontrar enunciações sem valor performativo que só


descrevessem o mundo. Até um enunciado que parece puramente
descritivo como está chovendo, coloca-nos diante de uma realidade
nova, realiza também uma ação, no caso, um ato de afirmação (...), a
enunciação constitui a âncora da relação entre a língua e o mundo: ela
permite apresentar os fatos no enunciado, constituindo ela própria, um
fato, um acontecimento único definido no tempo e no espaço (VIZEU,
2005, p. 42).

Com base nestas elucidações, podemos começar a entender, de maneiras específicas, os


motivos da concretização do conceito imparcialidade como um mito. Vamos tomar como
exemplo inicial o primeiro passo dado nas redações telejornalísticas, que estão em constante
corrida contra o tempo, para decidir o que será noticiado ou não. Age-se sob uma lógica de
tipificações, almejando atingir fins práticos e de maneira programada para que se possa
alcançar uma rotina produtiva padrão de cada empresa midiática. Esta rotina deve ser
consensual ao estabelecer o valor de noticiabilidade dos acontecimentos a serem cobertos.
Sendo assim, “as negociações sobre noticiabilidade se dão sob o comando do deadline, que
impõe acordos ágeis e seguros, o que dá vazão aos valores-notícias” (Sekeff, 2005, p.67).
35

Portanto, quando se tem por objetivo noticiar algo devido vínculos e interesses
mercadológicos ou políticos, ou até mesmo porque determinado fato chamou mais atenção do
que outro de um determinado indivíduo – e como já vimos, faz afastar os conceitos de
neutralidade e distanciamento – tem-se como conseqüência lógica a construção do conceito de
imparcialidade como mito.
Outro fator que evidencia a imparcialidade como mito pode ser exemplificado
por um aparato técnico que é de vital importância para a produção de um telejornal: a captura
de imagens dos “fatos” a serem noticiados. Existe um consenso entre os profissionais de
informação, de que, com o auxílio deste aparato técnico, é possível mostrar a “realidade como
ela é”. Porém:

O vídeo é por definição, um meio eclético e obviamente pode ser


usado apenas para reproduzir e – se necessário – sintetizar seus vários
predecessores. Todos eles (...) lutam para se apresentar como meios
naturais e sem problemas, e seus praticantes alegam reproduzir o
mundo “tal como ele é”, quando na verdade, oferecem representações
do mundo (ARMES, 1999, p. 164/165).

Porém, este não é o único fator para esta conceituação. Também podemos apontar as
posturas e perfis editoriais das empresas midiáticas, que podem comprometer a apuração e
veiculação de informações. Portanto, com a finalidade de evidenciar tais possibilidades,
recorremos ao famoso caso da edição do debate entre os candidatos à presidência da República
Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Collor de Mello, em 1989. É importante dizer que, como
evidencia Facchini (2004), Collor era dono de uma retransmissora da Rede Globo em Maceió,
logo tinha vínculos com a empresa que o apoiou enquanto candidato à presidência da
República.
No dia 15 de dezembro de 1989, antevéspera do segundo turno da eleição presidencial,
foi ao ar no “Jornal Nacional” uma edição do debate entre os candidatos que tinha sido
transmitida ao vivo no dia anterior. A edição do debate foi francamente favorável a Collor,
que teve um minuto e 12 segundos a mais de tempo de exposição, e exibido os melhores
momentos de Collor e os piores de Lula. Foi uma evidência de parcialidade da emissora. O
36

caso teve grande repercussão que, como mostra uma matéria na revista eletrônica Consultor
Jurídico10 (2002): “tão flagrante foi a manobra que, em seguida, toda a legislação eleitoral foi
refeita para impedir a repetição desse tipo de malversação.”
Porém, o Presidente eleito e o proprietário das Organizações Globo se entenderam até
agosto de 1992, até que ocorresse a campanha pedindo o impeachment de Collor. Numa
matéria publicada no site Fazendo Media, Romero da Costa Machado (2004), faz elucidações
a cerca do rompimento entre Collor e Roberto Marinho:

De fato, Collor foi eleito com as bênçãos e influência da Globo e


Roberto Marinho (inclusive o irmão de Collor, Leopoldo, era Diretor
Geral da Globo em São Paulo). Entretanto, Collor tinha outras idéias,
muito particulares, de como administrar o país e de como deveria ser o
"império das comunicações".

Como podemos supor, estas “idéias e vontades próprias” de Collor não agradaram o
proprietário da maior empresa midiática do Brasil, que sempre fora acostumada a interferir na
vida pública do país.

Sabendo que a Globo é uma entidade que depende essencialmente do


governo (pois sem os "anúncios", reciprocidades e verbas públicas a
Globo literalmente quebra), Collor tomou sua mais audaciosa atitude:
ousou quebrar a Globo, simplesmente cortando toda a verba
publicitária governamental (MACHADO, 2004).

Este rompimento do ex-Presidente com os interesses empresariais gerou grande pânico


e um profundo temor na Rede Globo, fazendo com que Roberto Marinho iniciasse um franco e
declarado combate ao Governo Collor, expondo-o das piores maneiras possíveis em seus
noticiários.

10
http://conjur.estadao.com.br/static/text/27773,1> acessado em 31 de outubro de 2005.
37

Até que, num profundo golpe de sorte, os estudantes do Rio de Janeiro


foram para a rua protestar pela meia-entrada e pela carteira de
estudante (liderados pelo então vereador do Rio de Janeiro, Edson
Santos), quando então a Globo, aproveitando-se do fato, em novo
estelionato de mídia, em plano fechado, passou a mostrar estudantes
protestando como se fosse contra o governo Collor, trocando a história
do protesto dos estudantes pela carteirinha, criando o "Fora Collor"
(MACHADO, 2004).

É importante deixar claro que a intenção não é a de defender o ex-Presidente Fernando


Collor de Mello. O que é necessário evidenciar é a postura da empresa em questão, que
inicialmente deu amplo apoio a Collor, chegando a concretizar um ato considerado um dos
mais indecentes da história política do país, e depois, por não corresponder a suas expectativas
“comerciais”, passa a “apoiar” e dar “larga cobertura” ao processo de impeachment. Portanto,
nesse ponto, é preciso ressaltar que a imparcialidade não pode existir, se atrelada a interesses
que não os ligados a mostrar todos os lados possíveis dos fatos.

4 – Edição e manipulação de informação

4.1 – Processos de edição

É importante que se contextualize o que seriam processos de edição, para que


possamos ter uma melhor compreensão sobre que fatores podem interferir na produção de
informação. Partindo do princípio de que vivemos em uma interação social de 24 horas por dia
e que um telejornal possui um tempo limitado para que exponha os acontecimentos desta
interação, se faz necessário elaborar o conceito de edição.
38

Para isso, vamos trabalhar no sentido de esclarecer que uma edição começa na
elaboração das pautas, decidindo o que será noticiado, passando pela estruturação de exibição
do telejornal, até o processo de tratamento estético do material a ser ofertado aos
telespectadores. Assim, ao selecionar acontecimentos dentro do cotidiano do mundo real e dar-
lhes valor notícia, o processo de edição já está sendo posto em prática. Afinal, os agenciadores
da informação promovem um recorte de tudo que acontece em nossa interação social e pinçam
o que melhor convir para ser noticiado.
Esta prática é primordial à formatação do perfil editorial de uma empresa jornalística
pois, “em lugar de vender conteúdo aos clientes os praticantes do jornalismo constróem uma
relação com seu público baseada nos seus próprios valores” (Kovach, 2004, p. 98). No que diz
respeito à visão mercadológica existente nesses veículos, a formação de uma linha editorial a
ser seguida é de crucial importância, de modo que se estabeleça uma ligação com o público,
sendo capaz de formatar sua opinião e ampliando um mercado de consumo para os
anunciantes.

Um outro traço do telejornal é ser feito em fragmentos capturados da


realidade para a construção da representação de acontecimentos
noticiáveis, cuja narrativa se dá em tempo presente para mostrar seu
nível de atualização em relação aos acontecimentos representados
(SEKEFF, 2005, p. 47).

Estabelecida as pautas, os repórteres e cinegrafistas vão para o “trabalho externo”


(Sekeff, 2005, p. 49), onde buscarão capturar imagens e informações, para que as notícias
sejam produzidas. Dentro da empresa midiática, após a produção das pautas, que é uma das
fases do “trabalho interno” (Sekeff, 2005, p. 49), e após o trabalho externo, segue-se com a
estruturação do produto a ser exibido. A edição, ao estruturar um telejornal, se dá devido ao
fato de que uma ordem de exibição é imposta às notícias produzidas de acordo com os
critérios estabelecidos pela emissora e seus funcionários, o que acaba por contrariar a ordem
cronológica dos acontecimentos. “A sua estrutura de exibição é dividida em blocos de notícia,
seguindo a afinidade entre os temas. De fato, configura-se como um mosaico que reflete um
39

outro mosaico: sua macroestrutura configurada na grade de programação da emissora”


(Sekeff, 2005, p. 47).
Assim, tendo esta estrutura básica definida, o telejornal tem a abertura com uma
seqüência de manchetes chamando a atenção para os acontecimentos escolhidos como
principais. Logo após vêm os blocos de notícias. Estes blocos são intercalados pelo
denominado intervalo comercial. Porém, para se chegar a este produto final, são necessários
outros processos de edição, como textual e imagética.
A edição textual se dá por duas maneiras: na hora de produzir os textos para as
manchetes e os offs de contextualização das matérias, em suma, na estruturação do roteiro do
telejornal. A outra maneira dá-se junto à edição de imagens onde pode-se selecionar
determinadas partes de um depoimento.
A edição de imagens é o processo no qual seleciona-se as imagens mais apropriadas,
para que possam fazer parte da matéria. Exemplificando: vamos supor que uma manifestação
de greve foi pautada. No meio da cobertura dos acontecimentos, surge uma confusão
precedida de corre-corre. É natural que algumas imagens capturadas pelo cinegrafista
cheguem a redação tremidas, desfocadas etc; portanto, deve-se fazer uma seleção das melhores
imagens, para que possam compor a matéria em questão.
Todo este processo de edição é de vital importância pois, como já vimos, o telejornalismo
possui linguagem própria, formatada em sua rotina produtiva, e a função da edição é
transformar a linguagem cotidiana em linguagem telejornalística. Contudo, esta adaptação do
real para o modo telejornalístico acontece sob os vícios da rotina produtiva das redações das
emissoras, onde a lógica do dono da empresa é a que importa, lógica esta que é voltada para a
captação de lucros.

De um lado, linguagens que se estruturam em conformidade às normas


estabelecidas pela gramática de seu sistema e, produzem-se
reproduzindo as instâncias das conservações e do institucional, lugar
onde a moral, a submissão, as clausuras do saber se falam e o poder se
instala (SANTAELLA, 1989, p. 40/41).
40

E é importante ressaltar que os direcionamentos de uma edição estão sujeitos ao perfil


editorial de uma empresa que, por sua vez, está sujeito aos seus donos. Pois, “os donos da
mídia (...) são quem no final decidem a qualidade das notícias produzidas por seus
departamentos de informação” (Kovach, 2004, p. 102). Deste modo, abre-se espaço para a
possibilidade de que um mesmo fato possa ser noticiado de maneiras diferentes, interpretados
por pontos de vistas divergentes.
Como exemplo, podemos mencionar a cobertura dada pelo CMI e pela Rede Globo à
4ª Cúpula das Américas, que aconteceu nos dias 04 e 05 de novembro em Mar Del Plata,
Argentina, onde a “aliança das esquerdas latino-americanas”, promovida por Venezuela,
Argentina e Brasil, colocou-se contrária a adesão à Alca. No caso, o CMI fez uma cobertura
sobre a Cúpula, dizendo o que se pretendia com a reunião dos países americanos e as
manifestações que aconteceram, contestando a reunião dos presidentes dos 34 países
Americanos – principalmente o que iria se discutir em torno da Alca – e pela presença do
presidente Norte Americano George W. Bush.
A linha editorial apresentada pelos telejornais da Rede Globo foi pautada no sentido de
caracterizar apenas a revolta de personalidades – como o ex-jogador Diego Maradona – e de
parte da população, devido a presença do presidente dos EUA. O teor das discussões e as
resoluções tomadas, principalmente por parte dos países que integram o Mercosul – mais a
Venezuela – não foram mencionadas. Nem uma nota sobre atitudes que viraram manchete em
publicações como a do site de notícias do portal Terra11: “Chávez repete na Cúpula das
Américas que a ‘Alca morreu’”. Assim, mostrando a possibilidade de um mesmo assunto ter
direcionamentos diferentes, dependendo da linha editorial tomada por cada veículo.

4.2 – Manipulação e descontextualização

As linhas editoriais dos telejornais são formatadas no intuito de atrair a audiência. E


para tal tarefa, práticas de produção de entretenimento são acopladas à rotina produtiva de
informação. Uma das principais metas ao se produzir um telejornal é alcançar o emocional dos
telespectadores – prática muito comum na produção cinematográfica.
11
http://br.news.yahoo.com/051031/40/ytwk.html > acessado em 08 de novembro de 2005.
41

Walter Murch (2004), ganhador do Oscar pela edição dos filmes Apocalypse now e O
paciente inglês, ao fazer a montagem de um filme, sugere a utilização do que chama de “a
regra de seis”. Murch, nesse sentido, frisa que o foco principal é a emoção, deixando claro que
mecanismos como edição, posicionamento de câmeras, atuações, até mesmo o enredo, no final
não serão lembrados, e sim o que o público sentiu.

O corte ideal (para mim) obedece simultaneamente aos seis critérios


que se seguem: 1) reflete a emoção do momento; 2) faz o enredo
avançar; 3) acontece no momento “certo”, dá ritmo; 4) respeita o que
podemos chamar de “alvo de imagem” (eye trace) – a preocupação
com o foco de interesse do espectador e sua movimentação dentro do
quadro; 5) respeita a “planaridade” – a gramática das três dimensões
transpostas para duas pela fotografia (a questão da linha de eixo,
stageline, etc.); e 6) respeita a continuidade tridimensional do próprio
espaço (onde as pessoas estão na sala e em relação umas as outras)
(MURCH, 2004, p. 29).

Com isso, Walter Murch (2004) estabelece uma lista onde a emoção tem em média
51% da importância na composição do produto, o enredo 23%, o ritmo 10%, o alvo de
imagem 7%, o plano bidimensional da tela 5% e o espaço tridimensional da ação 4%. Ele
propõe que a emoção deve estar no alto da lista a todo custo, e que se for necessário eliminar
alguma coisa, fazer um corte, que se faça de baixo pra cima, na ordem do menos importante
para o item de maior relevância.

O que estou sugerindo é uma escala de prioridades. Se tiver que abrir


mão de alguma coisa, nunca abra mão da emoção em benefício do
enredo. Não abra mão do enredo em benefício do ritmo, não abra mão
do ritmo em benefício do alvo de imagem, não abra mão do alvo de
imagem em benefício dos planos de imagem e não abra mão da
dimensão dos planos em benefício da continuidade (MURCH, 2004,
p. 31).
42

Desse modo, ele frisa que, satisfazendo os critérios dos itens do topo da lista, os demais
itens são ofuscados – esta é a lógica da produção do entretenimento fílmico. E é esta lógica
que a visão mercantilista, ao produzir informação, incorpora na rotina produtiva de um
telejornal; quanto mais entreter e mais sensações causar, melhor.
Seguindo nesta linha de raciocínio, podemos utilizar o programa Big Brother Brasil 12,
exibido pela Rede Globo de Televisão, no intuito de fazer um paralelo da maneira como ele é
editado e exibido, com a maneira que é produzida a informação jornalística de TV.
A edição num programa de entretenimento como o BBB pode ser um exemplo bem
ilustrativo para comparar a produção e edição de informação com a produção de
entretenimento13, questionando assim o conceito de isenção jornalística. Este programa se
torna um exemplo explícito de como funciona o mecanismo de informação, tanto televisiva
quanto impressa e a da radiodifusão. Cabe, no entanto, reafirmar que não é intenção deste
trabalho igualar o programa referido a telejornais, e sim dizer que a produção de informação
segue o mesmo modelo de produção de entretenimento.
Portanto, o BBB é um programa que mostra imagens, “fatos” comportamentais de
participantes – que interagem socialmente – do jogo para um grande público, e a partir desta
exibição, o telespectador forma determinada opinião e corresponde aos estímulos expostos. No
caso do programa mencionado, participam com telefonemas votando em opções estabelecidas
por seus produtores.
Porém, verifica-se a ocorrência de manipulação da opinião dos telespectadores por
meio do mecanismo denominado edição, que é realizado de maneira tendenciosa por parte de
seus produtores, assim entrando em cena a política da empresa e seus interesses. Afinal de
contas, existe um confinamento onde pessoas interagem socialmente, e “fatos” ocorrem 24
horas por dia – da mesma forma que na vida real. Mas somente cerca de 20 à 60 minutos dos
acontecimentos são exibidos, depois de passarem por uma edição, para que possam ser
analisados pelo público, para que este tome um posicionamento sobre o assunto.
É importante ressaltar que o programa é um jogo e todos os participantes estão ali para
jogar; porém, através do aparato técnico, a emissora faz com que o público acredite, “sinta’ o

12
Programa criado e patenteado por uma empresa de comunicação Holandesa, a Endemol, que faz parte do grupo Espanhol
Telefónica S.A..
13
Esta comparação é para definir que a produção de informação é feita como a produção de entretenimento, e não afirmar que
programas como o BBB sejam produção de informação.
43

contrário. Desta forma, utilizando como exemplo a quinta versão do programa, o público é
estimulado a acreditar na existência de dois grupos de pessoas no jogo: os que jogam e os que
não jogam. Ainda com o mecanismo de edição, houve uma espécie de satanização do “grupo
que joga”.
Com isso, cada um dos integrantes deste grupo teve a cabeça a prêmio e alcançaram
grandes índices de rejeição da opinião pública, conforme exemplificam matérias de teor
semelhante às do site Portal ORM 14:

A Tropa de Choque do BBB 5 perde seu grande capitão, estrategista e


articulador dos paredões do programa. Com 92% dos mais de 31
milhões de votos - 27 milhões apenas no site da Globo.com - Rogério
deixa a casa com uma vitória: bateu todos os recordes do Big Brother
Brasil. Antes dele, o recruta Giulliano havia alcançado a marca inédita
de 87% de rejeição do público (Globo.com, 2005).

Como já foi mencionado, processo semelhante pode ser aferido com a produção de
informação jornalística. Todos nós estamos sujeitos a interagir socialmente – direta e
indiretamente – 24 horas por dia e desta interação social, acontecimentos e fatos se
concretizam. E como no jogo/programa, as 24 horas cotidianas em sociedade são editadas de
acordo com critérios editoriais dos veículos midiáticos e são expostas ao público, que
igualmente, toma posicionamentos, interage de acordo aos estímulos oferecidos pelas
informações veiculadas. Sendo que as interações acontecem obedecendo a um leque limitado
de opções pré-definidos pelos produtores midiáticos.
Estas interações são extremamente preocupantes, pois elas podem acabar por legitimar
determinadas ações. Como na Guerra do Golfo, onde, conforme cita Arbex Jr (2003), foi
construída uma metáfora interpretativa a respeito de um possível “choque civilizatório” entre
EUA – “portadores dos valores cristãos, democráticos e pluralistas da civilização ocidental” –
e Iraque – “representantes do Islã, uma religião intolerante, sustentada por fanáticos terroristas
que ainda vivem no tempo dos camelos e obrigam suas mulheres a usar véu” –: montagens que
fizeram com que o conflito fosse legitimado para o público. E durante o conflito, aqui no

14
http://www.oliberal.com.br/plantao/noticia/default.asp?id_noticia=54101 > acessado em 05 de março de 2005.
44

Ocidente, não tínhamos o conhecimento pleno do que acontecia no Golfo. A guerra foi editada
e televisionada de acordo com os interesses dos mantenedores do poder.

Na televisão (...), nem uma gota de sangue apareceu. Esquemas


estratégicos e imagens sintéticas reafirmavam a soberania dos “deuses”
da tecnologia. O olhar omnividente e omnipresente dessa mesma
tecnologia que permitiu a realização da primeira “guerra eletrônica em
tempo real”, segundo a designação de Paul Virílio, não podia deixar,
ironicamente, que os campos de batalha aparecessem na sua crueza e
horror característicos. (...) Lipovetsky, numa entrevista à revista Globe,
disse que a morte se tornara intolerável tanto socialmente como
moralmente. (...) “Asseptizar” a guerra tornou-se uma necessidade para
aqueles que a fizeram.(PEREIRA, Mônica. in Mario PERNIOLA, Feliz
Guatarri. Jean BOUDRILLARD et alli, 1991. apud ARBEX JR, 2003, p.
31).

Portanto, temos na edição, um poderoso mecanismo de controle e exercício de poder.


O que é um grande perigo a ser sempre observado e vigiado pois, além da lógica mercantilista
incutida na produção televisiva, existem estreitos laços entre a mídia e o poder estatal, como
ressalta Arbex Jr (2003, p. 39):

as grandes corporações de mídia mantém estreitos vínculos com o


poder do Estado, ainda que nem sempre esses vínculos sejam simples
e diretos, exemplificando com o fato da relação entre a Rede Globo e
ditadura Militar, desde 1966, quando a emissora foi fundada com a
‘missão’ declarada de contribuir para a integração nacional.

A maior emissora do país, a Rede Globo de Televisão, desde sua fundação teve
compromissos, ou melhor, esteve atrelada com quem estivesse no poder do país, assim,
sempre buscando e contribuindo para a manutenção do status quo como forma de
sobrevivência e em busca de benefícios com o continuísmo do sistema social vigente. Para tal
afirmação, podemos utilizar como exemplo algumas atitudes da emissora, onde ela interferiu,
45

descontextualizou e manipulou a produção de informações sobre importantes acontecimentos


sociais de nosso país, como mostra o editorial publicado na revista Reportagem (2004).

Em 1984, tentou impedir que os brasileiros tomassem conhecimento


de que estava em curso uma grande campanha popular por eleições
livres e diretas, noticiando o grande comício na Praça da Sé que
lançou o movimento como se fosse a festa do aniversário de São
Paulo; em 1989, manipulou o debate entre Fernando Collor de Melo e
Luiz Inácio Lula da Silva, às vésperas da eleição presidencial, para
impedir que o metalúrgico derrotasse o caçador de marajás e chegasse
à presidência da República

Desta forma, a técnica se torna um mecanismo de imposição de valores e visões que,


sob a ótica de Foucault em Microfísica do poder (1979), serve “para caracterizar não o seu
mecanismo, mas sua intensidade e constância”. E tendo a edição como um mecanismo de
criação de realidades, o aparato técnico como elemento determinante, como sugere Ciro
Marcondes Filho (2002 p. 31):

a técnica viabiliza uma melhor montagem cênica de notícias e


acontecimentos, com efeitos como se fossem reais e que os fatos
fabricados concorrem em condições de superioridade (melhor técnica,
mais dramaticidade, criação de cenas e situações vividas impossíveis de
obter na realidade) com fatos brutos ou reais.

Assim, o atual quadro mostra que os grandes produtores de notícias tratam a vida real,
a vida cotidiana, como um grande reality show, produzindo notícias, informações, supostas
verdades em produção de espetáculos em largas escalas. O mundo real é representado pelos
telejornais, porém seus acontecimentos passam por um tratamento – edição – para que se
enquadrem nas linhas editoriais.
Como já foi dito, estas linhas editoriais são regidas pela lógica mercantil, que age com
a finalidade de atrair a audiência que será ofertado aos anunciantes, assim, utilizando-se de
estratégias produtivas que possam causar impactos emocionais aos telespectadores. Deste
46

modo, configura-se um quadro de espetacularização da informação, tendo como protagonistas


as grandes corporações de mídia na incessante luta pela audiência do público, sem se importar
se o que é produzido por elas é realmente o que o público quer e necessita.

4.3 – Criação e edição de informação sob a ótica de quem faz

Em nosso trabalho, procuramos evidenciar teoricamente a rotina produtiva dos


telejornais e suas implicações no produto final. Portanto, caracterizou-se toda a rotina
produtiva como um sistema editorial que deriva outras práticas – menores – de edição. Para
identificar estes processos e como estes contribuem, de maneira prática, para a produção de
informação telejornalística, foi elaborado um questionário com oito questões acerca do tema
desenvolvido.
Este questionário foi enviado para dez profissionais que trabalham com informação
televisiva. No entanto, apenas três jornalistas se dispuseram a respondê-lo até o prazo-limite
estabelecido. Os profissionais que responderam foram: Gabriel Priolli, diretor da TV PUC,
vice-presidente do Canal Universitário de São Paulo e presidente da Associação Brasileira de
Televisão Universitária; Ocinei Trindade, repórter da afiliada à emissora Rede Record em
Campos dos Goytacazes, e Patrícia Daldegan, repórter da Rede InterTV Planície, afiliada à
Rede Globo em Campos dos Goytacazes. O questionário completo, assim como as respostas
dos jornalistas, podem ser vistos em Anexos.
No que diz respeito a primeira fase deste processo que identificamos como edição,
questionamos os profissionais sobre os procedimentos para o agendamento de acontecimentos
como elementos noticiáveis. Com isso, evidenciou-se um conjunto de fatores responsáveis
pelo agendamento, como argumenta Gabriel Priolli: “os critérios de pauta, em qualquer
veículo de comunicação, derivam de seu perfil editorial, do público atingido e dos interesses
(políticos, econômicos, etc) do grupo que o controla”.
Ocinei Trindade atribuiu um grande valor à linha editorial, ressaltando que “o editor de
um veículo de comunicação é o maestro que define o que vai ser noticiado e como vai ser
noticiado”, pois, “por mais que haja reunião de pauta com editores-adjuntos e setorizados, o
peso final da notícia vai estar subordinado à sensibilidade e interesse do editor e do veículo”.
47

Com esses argumentos, Ocinei Trindade reforça ainda o questionamento a respeito de o


conceito de imparcialidade levantando por este trabalho, especificando que “por mais que se
fale de isenção e imparcialidade, todas as empresas de comunicação são empresas comerciais,
que têm seus interesses próprios”.
Patrícia Daldegan, além de elucidar as questões abordadas pelos outros dois
entrevistados, acrescenta um dado que nos remete à hipótese do newsmaking, onde o foco para
se estabelecer pautas não é o interesse do receptor e sim as condições de pôr o fluxo da
produção informacional em movimento. Assim, ela diz que “vários fatores podem fazer com
que um assunto não seja veiculado pela TV. Desde a falta de equipes para fazer a cobertura (a
TV precisa de imagens) até a avaliação, e aí também entra o caráter pessoal, do profissional
responsável pela edição”.
O ponto seguinte a ser tratado refere-se à conceituação do jornalismo como algo
premeditado, assim, levando a eliminar os conceitos da neutralidade e distanciamento,
enquanto verdades. Todos os entrevistados apontam que tais conceitos não são rigidamente
utilizados na rotina produtiva. Porém, por uma questão ética, deve ser alvo constante da
prática jornalística pois, como diz Patrícia Daldegan, “os conceitos de neutralidade e
distanciamento são sempre e devem continuar sendo uma busca dos profissionais sérios. Mas
isto é de certa forma uma utopia”.
Este quadro, para os entrevistados, se concretiza, porque, como diz Gabriel Priolli,
“toda prática jornalística é premeditada”, pois “busca-se informar sobre determinado assunto
(pré-escolhido), a partir de determinada angulação”. Patrícia Daldegan reforça esta colocação,
ao afirmar que “quando decidimos a imagem que vai abrir a matéria ou a sonora que vai
fechá-la, de certa forma estamos atribuindo certo grau de importância a cada informação e isto
é uma interferência”.
Ocinei Trindade também considera a informação como um ponto de vista de quem a
produz e que “um noticiário precisa ser preenchido”. Para ele, “se os fatos não surgem
espontaneamente”, pode-se “provocá-los para que surjam”; sendo esta “a lei da sobrevivência
no mundo da comunicação. Se a imprensa não é provocada deve provocar interesse por
informações de qualquer sorte”. Ele crê ainda que “dar a notícia pura e simplesmente todos
podem fazer”, mas vê como diferencial a capacidade dos profissionais realizarem análises dos
48

produtos, que são as notícias em questão: “o diferencial pode surgir a partir das análises da
notícia”.
Quanto ao interesse público, os entrevistados foram questionados sobre a idéia
difundida de que o jornalismo informa sobre o que as pessoas querem saber, sendo que a
rotina produtiva de uma TV é por demais acelerada. Assim, convergindo para a idéia de que a
prática telejornalística não é algo intuitivo, Priolli acredita que esta “ao contrário, é uma
atividade eminentemente técnica, que se apóia num vasto conjunto de ferramentas e
informações para que possa existir”. Trindade corrobora, ao especificar que “fazer jornalismo
custa caro. Depende de profissionais, equipamentos, interesse e inteligência, além de dinheiro
para financiar e satisfazer de alguma forma essas possibilidades”.
Com isso, a produção das pautas são realizadas com base em informações que dão
apoio a esta produção, como pesquisas de audiência que permitem identificar o público alvo
de cada emissora. Estas dinâmicas de trabalho “são reforçadas pelas informações apuradas na
interatividade entre veículo e seus consumidores (cartas à redação, e-mail, telefonemas)”,
conforme diz Priolli.
Para Patrícia Daldegan, na produção de informação, deve-se ter a preocupação com o
que se pode contribuir para a sociedade. Ela dá um exemplo: “se uma medida do governo
federal, por exemplo, pode facilitar a vida de aposentados, cabe ao jornalista traduzir os
‘politiquês’ e torná-lo inteligível ao cidadão comum”. Contudo, a jornalista identifica que nem
sempre esta perspectiva é priorizada: “o que vemos, muitas vezes, são emissoras de âmbito
nacional que produzem programas que exploram a miséria alheia. Exibem os dramas e
constrangimentos sem o devido cuidado”.
Ocinei Trindade também coloca que o intuitivo até poderia acontecer nas redações
mas, como o “tempo esgotando” é sempre uma constante na rotina produtiva, os profissionais
buscam auxílio, para manter o fluxo informacional, à ferramentas e informações sobre o que
pode ser algo noticiável. Sendo assim, “Muitas pautas surgem com denúncias, queixas,
insatisfações, questionamentos da população”. E com relação ao modo com que os jornalistas
transmitem as informações, questionou-se a possibilidade dos profissionais interpretarem os
acontecimentos cotidianos com suas cargas subjetivas, assim, mostrando-os sob seus pontos
de vista. Patrícia Daldegan e Ocinei Trindade acreditam que a subjetividade do jornalista é, de
forma inevitável, parte integrante, e até necessária, da composição da matéria, como
49

argumenta Daldegan: “não acredito que seja possível narrar fatos sem interferir de alguma
forma, falo isto como repórter (cargo que exerço) e não como editora”. Ela defende ainda que
“a inclusão do repórter como canal que vivenciou o fato e relata sua experiência é
incondicional e, às vezes necessária”.
Trindade chama a atenção para o fato de que é importante observar quem está
interpretando os acontecimentos. E que, como os chefes nem sempre “reconhecem talentos e
inteligência”, esta prática pode proporcionar reconhecimento por parte de quem assiste a
veiculação das informações, além de as informações soarem melhor e transmitirem maior
credibilidade. O que o faz crer na existência de muitos profissionais de diferentes campos de
atuação, podendo exercer a profissão de jornalistas sem o diploma: “(...) área de economia,
política, ciências sociais, medicina e saúde , história, geografia, artes, moda, cultura costumam
render mais quando são profissionais da área”, afirma o jornalista.
Já Priolli identifica a subjetividade jornalística como uma característica que foi se
perdendo, sobretudo com a evolução das técnicas que propiciam a produção de informação de
maneira industrial. Ele tece críticas severas ao ponto que chegou a produção de informação:
“A meu ver, chegou a tal ponto de estandardização que se tornou anódino, pobre, quase
irrelevante - sobretudo com o enorme avanço das formas de comunicação interpessoais e
grupais, via internet”. Avançando com a análise, Priolli argumenta que é altamente pertinente
a busca pelo (re)estabelecimento da valorização da subjetividade no jornalismo e autoria na
produção de matérias, e identifica a indústria jornalística como empecilho. Dessa forma, a tese
de uma "re-personalização" do jornalismo, do resgate da autoria das matérias, da valorização
da subjetividade do jornalista, coloca-se com plena atualidade. Porém, existe um grande
problema, a valorização do “jornalista implica em pagá-lo bem, dar-lhe condições de trabalho,
dar-lhe liberdade. Tudo aquilo que a indústria jornalística não quer fazer”.
Portanto, a questão da subjetividade está relacionada ao modo como o jornalista retrata
a realidade, assim como o conceito de objetividade jornalística. Sobre isto, questiona-se a
possibilidade de que este conceito seja um mecanismo de síntese e um discurso feito, com o
intuito de legitimar o produto derivado da prática jornalística como verdade absoluta.
De certa forma, os três entrevistados concordam com o fato da objetividade ser
inalcançável. Como argumenta Gabriel Priolli: “a objetividade jornalística é como a perfeição:
uma meta inatingível, mas que devemos perseguir sempre. Sempre haverá tendenciosidade na
50

mídia”. Ocinei, sobre a compreensão de que uma notícia possa transmitir verdade absoluta, é
bastante categórico ao negar esta possibilidade e evidencia que a prática profissional que se
auto-proclama como verdadeira, com o tempo se mostra perceptível como falha: “não creio
em verdade absoluta. O tempo julga melhor a todos que batem no peito em nome da verdade.
Julga os jornalistas também, que costumam errar bastante ao confiar em fontes pouco
confiáveis, e vender uma história para auto-promoção”.
O conceito de objetividade acaba por se mostrar um mecanismo de síntese, um
mecanismo para auxiliar a produção telejornalística, que funciona em ritmo industrial. Assim,
Patrícia Daldegan, evidencia ao constatar que tal conceito está ligado ao fator econômico.
Afinal, as informações enquanto produto, devem estar prontas para serem consumidas em
horários pré-estabelecidos. “Isto com certeza pode nos levar a um certo tecnicismo, mas
acredito que este não seja um problema exclusivo da televisão”, conforme diz Daldegan.
Outra prática que caracteriza a produção jornalística enquanto indústria é a necessidade
de se causar sensações para que se conquiste a “audiência”. Sendo que, ao transformar os
dados coletados no mundo real em notícias é necessário um manuseio no material coletado.
Sobre os cuidados e possíveis conseqüências desta prática, todos concordam que é uma
atividade comumente utilizada. Porém, Priolli tem uma visão mais negativa desta prática do
que os outros entrevistados. Assim, acreditando que “na verdade, a mídia procura despertar o
interesse das pessoas e é sempre mais eficaz fazer isso pela via da emoção do que da razão”.
Proporcionando, desta forma, um comprometimento da percepção que as pessoas possam ter
das coisas, distorção da visão e obstrução da compreensão profunda dos fatos. Pois o
jornalismo não está preocupado em proporcionar que as pessoas possam ter uma compreensão
profunda dos fatos.
Contudo, Ocinei Trindade e Patrícia Daldegan convergem para a idéia de que
sensibilizar o telespectador depende de quais recursos são utilizados para compor a matéria.
Para Daldegan, “usar entrevistados que personifiquem situações vividas por muitos
sensibiliza, mas não me parece algo que comprometa a seriedade do conteúdo ou leve à
manipulação de fatos”.
Ocinei Trindade faz uma análise no sentido de que tal prática é inerente ao telejornal,
que, afinal, sintetiza a vida cotidiana das pessoas e “reproduz por questões de interesse o que é
mais relevante”. Sendo assim, “nos telejornais, normalmente, após muita porrada de coisas
51

que desanimam e desmotivam e mexem com as emoções para o lado pior, há sempre uma
matéria para suavizar os ânimos no encerramento”. E que “contar história de gente que dá
certo e que é feliz, e também ao contrário, é conseqüência da vida”.
Boa parte das sensações causadas pela produção televisiva, têm origem nas imagens,
que agem por impactos instantâneos. Questionando-os sobre o fato das imagens não
demonstrarem e sim fazerem constatar, pois, a um só tempo elas podem revelar e ocultar.
Concluiu-se, de certa forma, que as imagens são primordiais, sendo de extrema necessidade
para a produção dos telejornais sejam efetuadas.
Neste sentido, Gabriel Priolli e Patrícia Daldegan, concordam quanto ao poder que elas
possuem. E este valor atribuído às imagens, segundo eles é equivalente ao valor atribuído às
palavras. Sendo assim, “tanto as imagens quanto as palavras podem revelar ou ocultar –
depende da mente que está por trás delas, tomando as idéias editoriais”, como define Priolli.
No entanto, Trindade não concorda no poder único das imagens. Para ele, “o efeito
pode ser diferente nas pessoas com a narração, um fundo musical etc”, assim, dando a
entender que a eficácia ocorre quando há imagens e textos juntos. Contudo, esta afirmação
reforça a idéia de que as imagens podem “ser editadas, manipuladas de algum jeito”.
Outro ponto questionado refere-se aos processos de edição e montagem das notícias,
principalmente no que diz respeito às possibilidades da prática se dar de maneira tendenciosa.
Priolli acredita que se pode seguir, ao editar uma matéria, a tendência que se quiser. “Até
mesmo, afirmar o exato oposto do que de fato ocorreu. Não convém, não é comum, mas pode
e acontece”. Ao responder o questionamento, ele exemplifica de tal forma: “Se há problemas
de financiamento, de taxas bancárias, etc, é pau nos bancos, cobertura intensiva das greves,
críticas à ‘intransigência patronal’, etc”. Porém, “se a relação com os bancos está boa - o que é
mais frequente - passa-se o inverso: críticas ao ‘grevismo’, ao ‘incômodo para os clientes’,
etc”. Analisando tal exemplo, fica evidenciado que o modo como se produz informações,
desde a cobertura até o produto final, vai depender da relação que determinados setores da
sociedade mantêm com o veículo midiático, principalmente no que diz respeito ao setor
financeiro, como evidencia exemplificou Priolli.
Patrícia Daldegan se limitou a opinar que acredita na existência de manipulação em
vários meios de comunicação, inclusive nos de Campos dos Goytacazes. Porém em seu atual
contexto de trabalho e em suas rotinas produtivas nunca presenciou tal experiência:
52

“Jornalismo e setor comercial convivem de forma harmônica, mas, até o momento, nunca
houve este tipo de interferência”.
Também acreditando que tais práticas são possíveis, mas que “não dá pra ser tão mau
caráter às claras o tempo todo”, Ocinei Trindade faz uma abordagem sobre a credibilidade do
veículo midiático, que é necessária para que ele possa se manter. E que a “sociedade percebe
preferências e favoritismos na imprensa”. Porém, acredita que existem aqueles que se arriscam
e que se vendem.
A pesquisa com estes profissionais, serviu para elucidar e fundamentar a proposta deste
trabalho, que é a de contrapor a prática midiática, para que assim se busque a produção de
informações televisivas de maneira eficaz e de qualidade no que diz respeito ao seu conteúdo.

5 – Considerações finais

A idéia inicial, deste trabalho era evidenciar, através do pensamento crítico,


contrapontos aos rumos da produção midiática, principalmente no que diz respeito à TV,
focando o telejornalismo, sob a tutela do mercado globalizado, sempre a propor uma
concepção de verdade única. Portanto, quando nos propomos a realizar tal trabalho, o
estruturamos no sentido de fazer uma análise da rotina produtiva do telejornal, para que
fossemos capazes de identificar o tipo de pensamento vigente ao produzí-lo.
Ficou evidenciado, principalmente com o contato com os profissionais entrevistados
que o agendamento de algo como notícia pode ocorrer de maneiras a confirmar as hipóteses
estabelecidas em nossas pesquisas. Desse modo, evidenciamos que existem possibilidades de
se determinar pautas de acordo com a perspectiva do interesse público e que para tal
53

utilização, são importantes ferramentas as pesquisas de audiência, cartas e e-mails enviados às


redações, telefonemas, etc. Atentamos ainda para fato de os jornalistas também utilizam suas
cargas subjetivas, intuindo o que possa querer o público, o que nos remete à hipótese da
agenda setting, estudada neste trabalho.
Outro fator determinante são as condições técnicas e humanas capazes de cobrir um
acontecimento. Pois na lógica dos “acontecimentos de agora”, predominante na produção de
informação televisiva, não pode haver possibilidades de falhas. A captura e formatação do real
em notícias se dá em ritmos de produção em série, o que traz à tona a conceituação a cerca da
hipótese do newsmaking.
Também ficou bem elucidado o quanto são determinantes os vínculos e interesses
políticos e econômicos na confecção de uma pauta e sua concretização em notícia,
demonstrando que as empresas midiáticas têm exercido um importante papel para a
manutenção do status quo. Esta medida, conforme pontuamos neste trabalho, é utilizada para
trazer benefícios à estrutura produtiva da mídia televisiva, que, enquanto componente
capitalista, tem por objetivo a obtenção de lucro.
Com relação a estes interesses políticos e econômicos, fica evidente as implicações do
desmantelamento do Estado, enquanto provedor dos interesses das maiorias e também de seu
papel decisório sobre as questões sociais, nas políticas comunicacionais. Tal procedimento
reforça a afirmação do modelo capitalista neoliberal, permitindo surgir as megafusões
empresariais, assim, formando os grandes conglomerados comunicacionais. Sendo estes
modelos responsáveis pela proliferação do ideário capitalista global, através dos estímulos ao
não pensar crítico, legitimam e perpetuam as práticas do sistema vigente. É neste contexto e
com tais propósitos que as práticas de edição se estabelecem.
No sentido em que se caracteriza uma ditadura dos consensos por parte dos
agenciadores de comunicação, o conceito-chave da palavra “cidadão” é extinguida
gradativamente das produções informacionais em detrimento da ideologia do consumo. No
entanto, neste cenário, é possível encontrar práticas de contra-informação, que além de exibir
versões, pontos de vista diferentes aos da mídia corporativa, estabelecem contrapontos ao que
é veiculado por este segmento de midiático. Tal fato possibilita mostrar como e o que foi
veiculado ou deixou de ser, servindo como agente problematizador e elucidador em relação às
rotinas produtivas dos veículos de comunicação corporativa.
54

Outra importante questão levantada a respeito da produção de contra-informação, é o


desmonte do papel do Estado – já evidenciado –, com fins a beneficiar o mercado globalizado
a exercer um poder consensual, que é reforçado por meio de manipulações midiáticas. A
prática informacional em questão é realizada pelos próprios movimentos de setores da
sociedade que lutam contra a excludente lógica mercantil.
Contudo, ao estudarmos o tema proposto por este trabalho, encontramos condições de
concluir que os conceitos de imparcialidade, neutralidade e distanciamento – analisados no
segundo capítulo – são imprescindíveis para toda a elucidação desenvolvida e para que se
possa evidenciar uma melhor prática midiática.
Ao iniciar as pesquisas, definimos tais conceitos como mitos – o que foi comprovado
no desenvolvimento deste trabalho; porém, esses conceitos eram vistos de maneira negativa
apenas. Contudo, principalmente a partir do contato com os entrevistados, a impossibilidade
de se obter uma prática jornalística onde exista imparcialidade, neutralidade e distanciamento,
revelaram aspectos positivos a serem propostos.
Os conceitos problematizados em questão revelaram-se como mecanismos que criam
uma máscara para que a atividade jornalística possa ser praticada de maneira considerada
ineficaz em termos de serviço público. Um jornalismo que vende a idéia de verdade única,
idéia que só serve para formar e proliferar os consensos, proporciona uma sociedade
desestimulada a se inserir e promover debates críticos acerca de todo o contexto social, o que
beneficia toda a estrutura da ideologia do capital neoliberal.
Tais práticas são evidenciadas pelos laços, de maneira cúmplice, que a televisão
estabelece com as manipulações do poder e com os interesses mercantis. Estas cumplicidades
eliminam possibilidades democratizadoras da informação e as possibilidades de criatividade e
de enriquecimento cultural. Com isso, reforça-se preconceitos racistas, machistas e somos
apreendidos, ficamos fascinados com banalidades e mediocridades da maior parte da grade de
programação.
Mas, ao se aceitar tais conceitos e ter consciência dos mitos que são, podemos
engrossar o coro dos que propõem a formulação de um jornalismo autoral, subjetivo e
reflexivo, obtendo-se um jornalismo e uma TV de qualidade, o que também implicaria em
defender que as práticas de produção se tornem mais claras aos olhos do público. Desse modo,
nos apoiamos em autores como Barbero (2001), que defendem que a televisão ocupa o lugar
55

estratégico nas dinâmicas da cultura cotidiana das maiorias, também na transformação das
sensibilidades e nos modos de construir imaginários e identidades.
Pois a televisão constitui o mais sofisticado mecanismo midiático, capaz de modelar e
ao mesmo tempo deformar o cotidiano e os gostos populares. Também é, historicamente, uma
das mais expressivas formas de mediar narrativas, gestuais e cenografias do mundo cultural
popular. Evidenciamos cultura popular no sentido de que tal mediação possibilita a absorção,
formando híbridos culturais, de certas formas de enunciações do mundo globalizado por
grupos narrativos do local, nosso país por exemplo.
Garantir tal desmascaramento proporcionaria evidenciar o fato do discurso audiovisual
da informação produz um ocultamento do real. Pois, com o que Barbero (2001) chama de cifra
simbólica, que é o elo entre o passado e o presente, substituída pela fragmentação exigida pelo
espetáculo, tem-se a transformação do desejo de saber em ânsia por apenas ver.
Assumindo, assim, a noção de que o ato de informar é o de dar forma e que a própria
imprensa, dia após dia, demonstra que não existe sentido sem forma, atentamos para o fato que
toda formatação é uma imposição de sentido, assim, não existindo neutralidade. Esta
consideração nos leva a problematizar jargões como “a verdade nua e crua” e “a verdade como
ela é”, sendo que os acontecimentos diários são constituídos por fatos, e esses fatos, somente,
não são capazes de expressar a totalidade dos acontecimentos, exigindo, assim, contexto e
forma. Os “fatos” servem como disfarce para a grande imprensa pois, ao dizer que apenas
expõem os “fatos”, de maneira dissimulada, camufla a forma-mercadoria de seus discursos.
No entanto, a própria competição informacional demonstra claramente, através dos
diferentes relatos proporcionados por diferentes emissoras e linhas editoriais, que, caso não
houvesse a conversão dos fatos em notícia, colocados em discursos, seriam incapazes de
informar.
Conscientizar-se destas práticas, como diz Barbero (2001), possibilita desmascarar o
significado das necessidades tecnológicas de comunicação e não só em sua dimensão
econômica, também, enquanto rearticulação, deformação-imposição de uma sociedade que
passa sintonizar e funcionar com os requerimentos do mercado. Com este trabalho, reforçamos
a proposta de “ler” o discurso dos meios massivos como acontecimentos do poder. Porém, que
este discurso pronunciado não seja confundido com o discurso pronunciado pelo Poder e nem
com a semântica oficial dos políticos, mas sim um outro discurso, que realiza um trabalho
56

analítico em todo tipo de matéria significante visual ou sonora, com o propósito de desvendar
as operações que, através delas, possibilitam constituir e formar o controle.

6 – REFERÊNCIAS

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revisado em nov. 2005. Disponível em:
http://www.fazendomedia.com/globo40/romero18.htm> Acesso em: 31 out. 2005.
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política. 2º edição. Editora Vozes. Petrópolis – RJ, 2002.
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39. ________, Ignácio. O poder midiático. Artigo publicado em MORAES, dênis (org).
Por uma outra comunicação: mídia, mundialização cultural e poder. Editora Record.
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40. RYOKI, André. Estamos vencendo!: resistência global no Brasil. Editora Conrad
Editora do Brasil. São Paulo, 2004.
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1989.
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Agostinho. Teresina, 2005.
43. VIZEU, Alfredo. O lado oculto do jornalismo. Editora Calandra. Florianópolis, 2005.
60

7 – ANEXOS

Anexo I – Entrevista com profissionais de TV

Gabriel Priolli
61

1) Um vídeo documentário produzido pelo Centro de Mídia Independente (CMI), mostrava


uma manifestação ocorrida em São Paulo contra as negociações para a criação da Área de
Livre Comércio das Américas (ALCA), mostrando os manifestantes sendo coagidos com
muita violência por policiais sem identificação. Apenas a mídia independente noticiou e
produziu materiais informacionais sobre o assunto, enquanto a mídia corporativa,
principalmente a televisiva, não deu uma nota sequer. Que tipo de criterização você, em
sua rotina de trabalho, acredita que deve ser feita para caracterizar um acontecimento ou
assunto como noticiável ou não?

Os critérios de pauta, em qualquer veículo de comunicação, derivam de seu perfil


editorial, do público atingido e dos interesses (políticos, econômicos, etc) do grupo que o
controla. Isso vale tanto para a mídia corporativa quanto para a mídia independente. A
manifestação citada não foi noticiada pela primeira porque, em seu julgamento, era menos
notícia, ou assunto menor, em relação a outros assuntos/notícias. Inversamente, mereceu
cobertura na mídia independente, como você aponta.

2) Definir um conjunto de assuntos ou “fatos” para narrar, escolhendo o viés da narrativa


sem contrapô-lo com o todo, não faz da prática jornalística algo premeditado, eliminando
assim conceitos como neutralidade e distanciamento?

Não entendi bem o ponto da questão. Toda prática jornalística é premeditada: busca-se
informar sobre determinado assunto (pré-escolhido), a partir de determinada angulação
(pré-estabelecida pelos critérios explicitados acima). Novamente, isso vale tanto para a
mídia corporativa como para a independente. A neutralidade e o distanciamento podem ou
não existir, dependendo do fato e das circunstâncias políticas que o envolvem. A idéia de
que esses conceitos sejam absolutos e devam presidir toda a atividade jornalística segue
sendo, ainda, uma utopia. Todo mundo gosta de falar em isenção jornalística, mas poucos
gostam de praticá-la.

3) É muito comum “escutar” que a função do jornalismo é informar sobre o que as pessoas
querem saber. Mas como definir o que as pessoas querem saber? Ainda mais no corre-
62

corre de uma TV, há tempo para identificar isso? Isso não acaba fazendo do jornalismo
algo intuitivo?

O público de cada veículo é definido com base em pesquisas de audiência ou de


circulação, que são reforçadas pelas informações apuradas na interatividade entre veículo e
seus consumidores (cartas à redação, e-mail, telefonemas). Assim sendo, o jornalista está,
em geral, suficientemente informado sobre o público para o qual dirige a sua informação.
A partir desse conhecimento, faz as opções de pauta, na maior parte das vezes sabendo
quais os assuntos que vão interessar, em outras vezes intuindo. Mas não creio que o
jornalismo seja uma atividade intuitiva. Ao contrário, é uma atividade eminentemente
técnica, que se apóia num vasto conjunto de ferramentas e de informações para que possa
existir.

4) É difundido como papel histórico do jornalista o fato de ele ser um contador de histórias
e também um “explicador do mundo”. Para tal tarefa, não seria necessário que se interprete
os acontecimentos com suas cargas subjetivas, e mostre tais acontecimentos sob seus
pontos de vista?

O jornalismo já teve um forte perfil subjetivo e foi perdendo essa característica com a
evolução das técnicas de produção industriais. A meu ver, chegou a tal ponto de
estandardização que se tornou anódino, pobre, quase irrelevante - sobretudo com o enorme
avanço das formas de comunicação interpessoais e grupais, via internet. Dessa forma, a
tese de uma "re-personalização" do jornalismo, do resgate da autoria das matérias, da
valorização da subjetividade do jornalista, coloca-se com plena atualidade. O problema é
que valorizar o jornalista implica em pagá-lo bem, dar-lhe condições de trabalho, dar-lhe
liberdade. Tudo aquilo que a indústria jornalística não quer fazer.

5) Teóricos acreditam que o conceito de objetividade no jornalismo está ligado à fidelidade


com que o jornalista retrata a realidade, mas reconhece que na prática, é um mecanismo de
síntese. Sendo que, a objetividade se converteu em sinônimo de verdade absoluta e é
63

vendida como ingrediente para camuflar a tendenciosidade que existe no cotidiano dos
veículos de comunicação. Você concorda com esses conceitos ?

A objetividade jornalística é como a perfeição: uma meta inatingível, mas que devemos
perseguir. Sempre haverá tendenciosidade na mídia - em qualquer mídia -, mas o dever do
jornalista é trabalhar para que a cobertura dos fatos seja sempre a mais equilibrada,
eqüidistante e isenta possível. Nem sempre ele conseguirá isso, talvez na maioria das vezes
não consiga. Mas isso não o autoriza a desistir da luta.

6) Percebe-se, principalmente no telejornalismo, que para conquistar a “audiência”, causar


sensações é primordial. O jornalismo procura produzir determinados efeitos a partir de
dados fornecidos pelo próprio real. Ao passar esses dados para o público de maneira que
causem sensações, é necessário um manuseio do material coletado. Quais os cuidados
necessários e as possíveis conseqüências disto?

Sem dúvida, o elemento emocional é importante no telejornalismo. Mas não é


privilégio nem exclusividade sua. Também a mídia impressa é pródiga em
sensacionalismo, que pode ser temático, gráfico, imagético, etc. Na verdade, a mídia
procura despertar o interesse das pessoas e é sempre mais eficaz fazer isso pela via da
emoção do que da razão. Ora, mas isso não compromete a percepção que as pessoas têm
das coisas, não distorce a visão, não obstrui a compreensão profunda dos fatos? Sim, sem
dúvida. Mas, quem disse que o jornalismo está preocupado em levar as pessoas a ter uma
compreensão profunda dos fatos?

7) As imagens agem por impactos instantâneos: não demonstram, simplesmente fazem


constatar. Esse estatuto específico da imagem é que suscita mal-estar pois, a um só tempo,
revela e oculta. Você concorda com este estatuto, no que diz respeito à produção
televisiva?
64

Discordo de interpretações que satanizam o poder das imagens, em oposição ao poder


"libertador" das palavras. Tanto as imagens quanto as palavras podem revelar ou ocultar -
depende da mente que está por trás delas, tomando as decisões editoriais.

8) Todo acontecimento é composto por vários momentos como: início, ápice, declínio das
atividades, imprevistos e fim. Ao fazer uma edição, montagem da matéria, pode-se seguir
determinada tendência ao realizar esta tarefa. No campo das hipóteses, determinada
empresa jornalística que possui vínculos com banqueiros pode orientar a montagem com
fins a desacreditar o movimento dos bancários, para isso, pode utilizar imagens, que irão
ficar sobrepostas ao texto. O que você acha dessas possibilidades?

Quanto à primeira parte da questão, concordo: sim, pode-se seguir a tendência que se
quiser, ao editar uma mantéria. Pode-se, até mesmo, afirmar o exato contrário do que de
fato ocorreu. Não convém, não é comum, mas pode e acontece. Quanto ao exemplo dos
bancários, a possibilidade é exercitada corriqueiramente. A cobertura do setor financeiro
varia de acordo com os interesses do veículo: se há problemas de financiamento, de taxas
bancárias, etc, é pau nos bancos, cobertura intensiva das greves, críticas à "intransigência
patronal", etc. Se a relação com os bancos está boa - o que é mais frequente - passa-se o
inverso: críticas ao "grevismo", ao "incômodo para os clientes", etc.

Ocinei Trindade

1) Um vídeo documentário produzido pelo Centro de Mídia Independente (CMI), mostrava


uma manifestação ocorrida em São Paulo contra as negociações para a criação da Área de
Livre Comércio das Américas (ALCA), mostrando os manifestantes sendo coagidos com
muita violência por policiais sem identificação. Apenas a mídia independente noticiou e
produziu materiais informacionais sobre o assunto, enquanto a mídia corporativa,
principalmente a televisiva, não deu uma nota sequer. Que tipo de criterização você, em
sua rotina de trabalho, acredita que deve ser feita para caracterizar um acontecimento ou
assunto como noticiável ou não?
65

Creio que existe um conjunto de fatores. Desde o interesse coletivo, social, político,
econômico e também, editorial. O editor de um veículo de comunicação é o maestro que
define o que vai ser noticiado e como vai ser noticiado. Por mais que haja reunião de pauta
com editores-adjuntos e setorizados, o peso final da notícia vai estar subordinado à
sensibilidade e interesse do editor e do veículo. Por mais que se fale de isenção e
imparcialidade, todas as empresas de comunicação são empresas comerciais, que têm seus
interesses próprios.

2) Definir um conjunto de assuntos ou “fatos” para narrar, escolhendo o viés da narrativa


sem contrapô-lo com o todo, não faz da prática jornalística algo premeditado, eliminando
assim conceitos como neutralidade e distanciamento?

Creio que os registros e a narrativa são algo muito próprios do repórter-apurador. O


texto também estará subordinado ao editor, que pode mudar para mais ou para menos, ou
reproduzir sem interferência no texto do repórter. O que é publicado/divulgado é um ponto
de vista, mesmo sendo isento e imparcial, não se consegue reproduzir de maneira igual.
Dar a notícia pura e simplesmente todos podem fazer. O diferencial pode surgir a partir das
análises da notícia. É algo interessante, principalmente para os telejornais vespertinos. Na
Internet, texto e informação se atualizam a qualquer momento. No jornal, o texto fica ali
pra sempre como um registro, um capítulo da vida e história (nem tudo é verdade, nem
tudo é ficcional, mas o texto jornalístico não deixa de ser ficcional também, acredito).
Pode-se tentar ser neutro e distante, mas é quase impossível. Quase. Um noticiário precisa
ser preenchido. Se os fatos não surgem espontaneamente, podemos provocá-los para que
surjam. É a lei da sobrevivência no mundo da comunicação. Se a imprensa não é
provocada, deve provocar interesse por informações de qualquer sorte. Afinal, a imprensa
se dirige a uma sociedade heterogênea. Se for para falar para segmentos e guetos, o papo é
outro.

3) É muito comum “escutar” que a função do jornalismo é informar sobre o que as pessoas
querem saber. Mas como definir o que as pessoas querem saber? Ainda mais no corre-
66

corre de uma TV, há tempo para identificar isso? Isso não acaba fazendo do jornalismo
algo intuitivo?

As redações costumam receber telefonemas e e-mails que facilitam bastante essa


“pesquisa” pelo interesse do consumidor de notícia. Muitas pautas surgem com denúncias,
queixas, insatisfações, questionamentos da população. Os assuntos são comunitários,
saúde, educação, violência, defesa e direito do consumidor, entretenimento... O intuitivo
pode funcionar, mas com o tempo sempre esgotando, nem sempre se pode seguir essa
intuição. Fazer jornalismo custa caro. Depende de profissionais, equipamentos, interesse e
inteligência, além de dinheiro para financiar e satisfazer de alguma forma essas
possibilidades. Quase sempre não funciona desse jeito. Infelizmente. Mas não se deve
conformar com o esse mundo, já dizia São Paulo.

4) É difundido como papel histórico do jornalista o fato de ele ser um contador de histórias
e também um “explicador do mundo”. Para tal tarefa, não seria necessário que se interprete
os acontecimentos com suas cargas subjetivas, e mostre tais acontecimentos sob seus
pontos de vista?

Creio que sim. Acho que menciono isso de algum modo em respostas anteriores. O
lance é quem vai interpretar. É preciso ganhar um respaldo, algum tipo de sagração,
notoriedade. Nem sempre os chefes reconhecem talentos e inteligência. Há os
especialistas, uma praga que muitas vezes dá certo. Por isso, acho que há muitos
profissionais de diferentes áreas que podem ser jornalistas sem diploma. Gente da área de
economia, política, ciências sociais, medicina e saúde, história, geografia, artes, moda,
cultura costumam render mais quando são profissionais da área. A informação soa melhor
e a credibilidade também. Os jornalistas normalmente são especialistas em generalidades.
Podem saber um pouco de tudo, mas no fundo um pouco pode representar pouco. Acredito
na subjetividade do jornalismo. É possível e até necessário. É bom para comparar com
outras formas de escrita. Não há verdade absoluta.
67

5) Teóricos acreditam que o conceito de objetividade no jornalismo está ligado à fidelidade


com que o jornalista retrata a realidade, mas reconhece que na prática, é um mecanismo de
síntese. Sendo que, a objetividade se converteu em sinônimo de verdade absoluta e é
vendida como ingrediente para camuflar a tendenciosidade que existe no cotidiano dos
veículos de comunicação. Você concorda com esses conceitos ?

Não compreendo a ligação de “objetividade como sinônimo de verdade absoluta”.


Respondi isso antes. Não creio em verdade absoluta. O tempo julga melhor a todos que
batem no peito em nome da verdade. Julga os jornalistas também, que costumam errar
bastante ao confiar em fontes pouco confiáveis, e vender uma história para auto-promoção.

6) Percebe-se, principalmente no telejornalismo, que para conquistar a “audiência”, causar


sensações é primordial. O jornalismo procura produzir determinados efeitos a partir de
dados fornecidos pelo próprio real. Ao passar esses dados para o público de maneira que
causem sensações, é necessário um manuseio do material coletado. Quais os cuidados
necessários e as possíveis conseqüências disto?

Alguém já disse que quanto mais regional, mais universal é um fato. A vida das
pessoas se repete. Um telejornal sintetiza um pouco da vida de uma sociedade. Se reproduz
por questões de interesse o que é mais relevante. Hoje, corrupção no governo e denúncias,
prisões de políticos e juízes, escândalos financeiros, conseqüencias de problemas
ambientais no mundo, catástrofes, saúde coletiva com animais infectados por vírus,
miséria, violência, combate a isso, e entretenimento e artes em geral, beleza, esportes,
coisas positivas na economia e na vida pessoal das pessoas. Nos telejornais, normalmente,
após muita porrada de coisas que desanimam e desmotivam e mexem com as emoções
para o lado pior, há sempre uma matéria para suavizar os ânimos no encerramento. A vida
é dura pra todo mundo. Dar um pouco de esperança e comoção não faz mal a ninguém,
creio. Contar história de gente que dá certo e que é feliz, e também ao contrário, é
conseqüência da vida, acredito. Cada um que julgue por si.
68

7) As imagens agem por impactos instantâneos: não demonstram, simplesmente fazem


constatar. Esse estatuto específico da imagem é que suscita mal-estar pois, a um só tempo,
revela e oculta, Você concorda com este estatuto, no que diz respeito à produção
televisiva?

Não. As imagens podem ser editadas, manipuladas de algum jeito. O efeito pode ser
diferente nas pessoas com a narração, um fundo musical etc. Também depende da imagem.
Uma tsunami pode chocar muita gente, mas pode encher os olhos de surfistas e bichos-
grilos, por que não?

8) Todo acontecimento é composto por vários momentos como: início, ápice, declínio das
atividades, imprevistos e fim. Ao fazer uma edição, montagem da matéria, pode-se seguir
determinada tendência ao realizar esta tarefa. No campo das hipóteses, determinada
empresa jornalística que possui vínculos com banqueiros pode orientar a montagem com
fins a desacreditar o movimento dos bancários, para isso, pode utilizar imagens, que irão
ficar sobrepostas ao texto. O que você acha dessas possibilidades

Possíveis, mas não dá pra ser tão mau caráter às claras todo o tempo. Um veículo
depende de credibilidade pra se manter. Quem dá isso é o público e também o profissional.
Sem aprovação de público, não dá. A sociedade percebe preferências e favoristimos de
imprensa. Os políticos são os mais freqüentes. Há os que se arriscam e que se vendem,
fazer o quê? Mas até nisso há a seqüência início, ápice, declínio, imprevistos e fim. Não
superestimo a profissão, nem o jornalismo.

Patrícia Daldegan

1 - Um vídeo documentário produzido pelo Centro de Mídia Independente (CMI),


mostrava uma manifestação ocorrida em São Paulo contra as negociações para a criação da
Área de Livre Comércio das Américas (ALCA), mostrando os manifestantes sendo
coagidos com muita violência por policiais sem identificação. Apenas a mídia
independente noticiou e produziu materiais informacionais sobre o assunto, enquanto a
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mídia corporativa, principalmente a televisiva, não deu uma nota sequer. Que tipo de
criterização você, em sua rotina de trabalho, acredita que deve ser feita para caracterizar
um acontecimento ou assunto como noticiável ou não?

Para responder este questionamento é preciso primeiro caracterizar o veículo no qual


trabalho. A emissora em questão é o que a Rede Globo denomina afiliada. Um espécie de
canal conveniado que repete a programação de rede (nacional) e tem, dentro desta
programação, horários pré-estabelecidos que podem ser ocupados por produções regionais.
A Globo (me parece que é a única) exige de suas afiliadas que parte deste horário seja
dedicado ao jornalismo.
Os jornais das Praças, no nosso caso os Jornais Intetv 1ª e 2ª edição e o Intertv Rural,
seguem padrões elaborados pela Globo: desde a vinheta de abertura até o processo de
produção e veiculação da notícia.
Existem três setores fundamentais na manufatura de uma matéria jornalística dentro da
TV: a produção, que vai buscar e apurar assuntos e agendar as matérias; a reportagem
( repórter e cinegrafista) que vai burilar o que já foi apurado pelos produtores, humanizar a
matéria e transformar as informações em imagens e a edição, responsável pela linha
editorial de tudo que vai ao ar, a aprovação de textos e edição das matérias.
Dado o exposto, o editor regional e os editores de cada telejornal é que, a partir das
sugestões de produtores e repórteres, determinam o que deve ir ao ar e qual o perfil deve
ser dado à matéria.
Usando como base a experiência vivida no veículo em que trabalho atualmente, posso
afirmar que por se tratarem de jornais locais a angulação que se procura dar aos vts é
sempre voltada para os interesses da região. Temas relevantes para as cidades da área de
cobertura ou temas nacionais com enfoques regionais.
Vários fatores podem fazer com que um assunto não seja veiculado pela TV. Desde a
falta de equipes para fazer a cobertura ( a TV precisa de imagens) até a avaliação, e aí
também entra o caráter pessoal, do profissional responsável pela edição. Vale lembrar
mais uma vez, que isto não vale para todas as emissoras de TV, sejam elas afiliadas ou
não. Cada uma delas, acredito, pode possuir padrões e interferências diversas.
70

2 – Definir um conjunto de assuntos ou “fatos” para narrar, escolhendo o viés da narrativa


sem contrapô-lo com o todo, não faz da prática jornalística algo premeditado, eliminando
assim conceitos como neutralidade e distanciamento?

Os Conceitos de neutralidade e distanciamento são sempre e devem continuar sendo


uma busca dos profissionais sérios. Mas isto é de certa forma uma utopia. Enquanto
profissional, não acredito que seja possível narrar fatos sem interferir de alguma forma,
falo isto como repórter (cargo que exerço) e não como editora. Quando decidimos a
imagem que vai abrir a matéria ou a sonora que vai fechá-la de certa forma estamos
atribuindo certo grau de importância a cada informação e isto é uma interferência. O ideal
é que esta interferência seja a menor possível, mas a inclusão do repórter como canal que
vivenciou o fato e relata sua experiência é incondicional e, às vezes, se faz necessária.

3 – É muito comum “escutar” que a função do jornalismo é informar sobre o que as


pessoas querem saber. Mas como definir o que as pessoas querem saber? Ainda mais no
corre-corre de uma TV, há tempo para identificar isso? Isso não acaba fazendo do
jornalismo algo intuitivo?

Na minha opinião, o importante ao determinar um assunto a ser veiculado é de que


forma ele pode contribuir com a vida do telespectador. Se uma medida do governo
federal, por exemplo, pode facilitar a vida de aposentados, cabe ao jornalista traduzir os
“politiquês” e torna-lo inteligível ao cidadão comum. Mas nem sempre é isto que acontece.
O que vemos, muitas vezes, são emissoras de âmbito nacional que produzem programas
que exploram a miséria alheia. Exibem os dramas e constrangimentos sem o devido
cuidado. Mas também não acredito no descompromisso completo do telespectador com
esta tendência. O que explicaria a grande audiência de programas sensacionalistas como
Cidade Alerta senão uma espécie de curiosidade mórbida? São várias as maneiras de medir
se um jornalístico agrada ou não o público: pesquisas de opinião, audiência e os
“feedbacks” por telefone que até redações pequenas como a nossa recebem diariamente.
Isto, de certa forma, respalda o que é apresentado.
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4 – É difundido como papel histórico do jornalista o fato de ele ser um contador de


histórias e também um “explicador do mundo”. Para tal tarefa, não seria necessário que se
interprete os acontecimentos com suas cargas subjetivas, e mostre tais acontecimentos sob
seus pontos de vista?

Acho que respondi este questionamento no pergunta de número 2.

5 – Teóricos acreditam que o conceito de objetividade no jornalismo está ligado à


fidelidade com que o jornalista retrata a realidade, mas reconhece que na prática, é um
mecanismo de síntese. Sendo que, a objetividade se converteu em sinônimo de verdade
absoluta e é vendida como ingrediente para camuflar a tendenciosidade que existe no
cotidiano dos veículos de comunicação. Você concorda com esses conceitos ?

Enquanto profissional inserida no mercado, acredito que, no caso da televisão,


objetividade está muito mais ligada ao fator econômico do que a esta aura de verdade
absoluta, o que também pode ser questionável. A TV, diferentemente do jornal não é um
veículo totalmente voltado para a informação, mas também para o entretenimento e para
cada um deles foi definido um espaço.
Outro fator que faz da objetividade um fator relevante na matéria televisiva é a
agilidade. Atualmente a busca por informações concisas e rápidas é notável. Isto com
certeza pode nos levar a um certo tecnicismo, mas acredito que este não seja um problema
exclusivo da televisão. Na modernidade, o campo da razão humana, de certa forma,
acabou sendo limitado ao conhecimento que fosse objetivo e prático.
Acho que, mesmo assim, a busca pela objetividade tem seu lado positivo. Como bem
definiu Habermas, quanto mais clara for comunicação melhor. A distorção de palavras e
de sua compreensão pode impedir que o processo da informação se dê de forma efetiva, o
que acaba por impedir o consenso e a prática democrática.

6 – Percebe-se, principalmente no telejornalismo, que para conquistar a “audiência”,


causar sensações é primordial. O jornalismo procura produzir determinados efeitos a partir
de dados fornecidos pelo próprio real. Ao passar esses dados para o público de maneira
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que causem sensações, é necessário um manuseio do material coletado. Quais os cuidados


necessários e as possíveis conseqüências disto?

Sensibilizar o telespectador é de fato uma prática comum no jornalismo televisivo hoje


em dia. Mas como exposto na resposta de número três. Tudo depende da forma como isto
é usado na manufatura de uma matéria. Usar entrevistados que personifiquem situações
vividas por muitos sensibiliza, mas não me parece algo que comprometa a seriedade do
conteúdo ou leve à manipulação de fatos.

7 – As imagens agem por impactos instantâneos: não demonstram, simplesmente fazem


constatar. Esse estatuto específico da imagem é que suscita mal-estar pois, a um só tempo,
revela e oculta, Você concorda com este estatuto, no que diz respeito à produção
televisiva?

Acredito que as imagens são a base e o grande diferencial da TV e, sem o cuidado


necessário são facilmente manipuláveis. Boas imagens são aquelas que, assim como na
fotografia, revelam claramente o que deve ser revelado e provocam interpretação para o
que deve ser interpretado.

8 – Todo acontecimento é composto por vários momentos como: início, ápice, declínio das
atividades, imprevistos e fim. Ao fazer uma edição, montagem da matéria, pode-se seguir
determinada tendência ao realizar esta tarefa. No campo das hipóteses, determinada
empresa jornalística que possui vínculos com banqueiros pode orientar a montagem com
fins a desacreditar o movimento dos bancários, para isso, pode utilizar imagens, que irão
ficar sobrepostas ao texto. O que você acha dessas possibilidades?

Acho que existe manipulação em muitos meios de comunicação, inclusive locais. Mas
tomando como base minha atual experiência profissional, nunca tive este tipo de vivência.
Jornalismo e setor comercial convivem de forma harmônica, mas, até o momento, nunca
houve este tipo de interferência.
73

Anexo II – Roteiro do trabalho videográfico

Mão Única?

Por Alexandro F.

FADE IN.

1. INT. ANIMAÇÃO COM SEQUÊNCIA DE CENAS


Música 1.
74

Animação introdutória. Passa-se em um futuro caótico ao


estilo “Blade Runner”. Este futuro é retratado por uma
cidade onde a população é vigiada por vigilante com cabeça
de TV, e todos que fogem ao estabelecido pelo poder
vigente, os homens TV’s agem como captores e repressores
com o intuito de coibir qualquer “anomalia” social.

SEQUÊNCIA DE CENAS:

A) EM FOCO UM BECO COM ALGUMAS LIXEIRAS;

B) UM “MOLEQUE” SAI DE DENTRO DE UMA LATA DE LIXO;

C) O “MOLEQUE” OLHA PARA UM LADO E PARA O OUTRO, COM TODO


CUIDADO E PREOCUPAÇÃO;
D) O “MOLEQUE” SAI CORRENDO, COMO SE ESTIVESSE FUGINDO DE ALGO;

E) PANORÂMICA DA CIDADE QUE ESTÁ VAZIA (MAS NÃO DESERTA),


APENAS CARROS PASSANDO PELAS RUAS;

F) PANORÂMICA EM OUTRA PARTE DA CIDADE. ALGUMAS POUCAS PESSOAS


NAS RUAS;

G) TAKES DE PESSOAS ANDANDO NAS RUAS SOB A VIGILÂNCIA DOS


“HOMENS TV’S”;

H) O “MOLEQUE” CORRENDO POR BECOS E ESCADAS;

I) TEKES DE RUAS, PESSOAS, VIGILANTES (HOMENS TV’S) E CARROS;

J) TAKES DE VÁRIOS ÂNGULOS DA CIDADE

K) “MOLEQUE” SENDO PEGO E APANHANDO DOS VIGILANTES, SENDO QUE


ELE É PEGO EM FRENTE A UMA LOJA DE ELETRODOMÉSTICOS, ONDE
TERÁ UMA VITRINA CHEIA DE TELEVISORES;

L) TRÊS VIGILANTES O PEGA, DERRUBA-O NO CHÃO ENCOSTADO A


VITRINA, COMEÇÃO A CHUTÁ-LO, ENQUANTO SEU ESPANCAMENTO PASSA
NOS TELEVISORES EXPOSTOS NA VITRINA;

M) VISÃO AÉREA DA CIDADE. ENQUANTO SE TEM A VISÃO AÉREA, SURGE


A ARTE DO TÍTULO DO DOCUMENTÁRIO.

CORTA PARA:

1. EXT. MOSAICO DE IMAGENS.


Fim da música 1.

Off sobre comunicação, monopólios e o contexto social.


75

CORTA PARA:

1. INT. SONORA.

O ministro do STJ fala sobre monopólio midiático no Brasil.

CORTA PARA:

2. EXT. IMAGENS DE MANIFESTAÇÕES.


Música 3.

Seqüência de imagens formando clipe musical. A música possui


letra reflexiva que pode ser acoplada ao contexto do
documentário.

CORTA PARA:

2. INT. SONORA.

Lúcia Santaella fala sobre detenção de poder na comunicação e


distorção de informação.

CORTA PARA:

3. EXT. IMAGENS DE MANIFESTAÇÕES.


Sons referentes as manifestações.

CORTA PARA:

3. INT. SONORA.

Argolo fala sobre monopólio da informação.

CORTA PARA:
76

4. INT. SONORA.

Lúcia Santaella fala sobre mídia alternativa e proliferação de


pontos de vista.

CORTA PARA:

4. EXT. IMAGENS DE MANIFESTAÇÕES.


Música 2.
Seqüência de imagens formando clipe musical.

CORTA PARA:

5. INT. SONORA

Löis Lancaster fala sobre descentralização do poder de informar


e consumir informação

CORTA PARA:

6. INT. SONORA.

Lúcia Santaella fala sobre a ideologia na linguagem e a


inexistência de verdade única.

CORTA PARA:

5. EXT. IMAGENS DE MANIFESTOS.


Música 3.

Seqüência de imagens formando clipe musical. A música possui


letra reflexiva que pode ser acoplada ao contexto do
documentário.
77

CORTA PARA:

7. INT. SONORA.

Lúcia Santaella fala sobre pluralidade de informações,


ideologias e totalitarismo

CORTA PARA:

6. EXT. IMAGENS DE MANIFESTOS.

Imagens dos manifestos contra o G8 em Genova, e do Carlo,


cidadão assassinado pela polícia. Um minuto de seqüência de
imagens em total silêncio. Seqüência homenagem.

CORTA PARA:

7. EXT. IMAGENS DE MANIFESTOS.

Imagens dos manifestos na Argentina, pegando sonoras do povo na


rua. Finalizando com povo cantando.

FADE OUT.
78

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