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The visual arts, the universities and the brazilian military regime:
the case of Center of Contemporary Art at The Federal University of
Paraíba (1978-1985).
palavras-chave: O artigo propõe uma reflexão em torno da complexa relação que foi estabelecida
NAC/UFPB; Funarte;
entre o campo das artes visuais, as universidades federais e o regime militar
universidades; arte brasileira;
ditadura militar; governo Geisel brasileiro no período de 1975 a 1985. Tomando como ponto de partida o
processo que culminou com a criação do Núcleo de Arte Contemporânea da
Universidade Federal da Paraíba (1979), a autora analisa o impacto da Política
Nacional de Cultura (PNC), implementada pela Funarte, na criação de centros
de artes, na inserção de agentes do campo artístico e no fomento às artes visuais
dentro das universidades brasileiras no final da ditadura militar.
keywords: This article proposes a reflection upon the complex relationship established
NAC/UFPB; Funarte;
between visual arts, federal universities, and the Brazilian military regime from
universities; Brazilian art;
military regime; Geisel 1975 to 1985. Taking as starting point the process that lead to the establishment
administration
of the Center of Contemporary Art (Núcleo de Arte Contemporânea, NAC) at
The Federal University of Paraíba (Universidade Federal da Paraíba, UFPB)
in 1979, the author analyzes the impact of the National Culture Policy
implemented by Funarte in the establishment of centers for the arts, the
inclusion of representatives of the artistic field, and in the promotion of visual
arts inside Brazilian universities at the end of the military dictatorship.
cas repressivas e a tentativa de implantar um modelo político mais ade- militar brasileiro:
quado aos objetivos desse novo projeto militar: a distensão. Ocorre o o caso do Núcleo de
início a paulatina liberação das instituições e de quadros nos aparelhos Paraíba (1978-1985)
de projetos e pesquisas voltados para a cultura, criação de cursos para universidades e o regime
visuais nas universidades foi implementada por meio de parceria entre Universidade Federal da
O traço comum desses projetos é terem sidos implementados em 9. Funarte libera milhões para
universidades por artistas e intelectuais que, além de opositores ao re- programa de arte em várias
universidades. Jornal O Norte.
gime, possuíam forte comprometimento com o campo das artes visuais. João Pessoa, 13 abr. 1981.
Por estarem atentos às necessidades e problemas que a área enfrentava Fonte: Acervo NAC/UFPB.
183
ARS naquele momento, esses agentes conseguiram desenvolver propostas de
ano 14 extrema relevância, muitas pioneiras e avançadas para a realidade ins-
n. 27 titucional da época. Além disso, percebe-se nesses projetos a tentativa
de estabelecer um programa que procurava, simultaneamente, apoiar
os artistas locais – através do fornecimento de ações de formação, de
materiais e espaço para trabalhar –, construir um espaço voltado à re-
flexão, produção e difusão da arte contemporânea; viabilizar a realiza-
ção de projetos e a circulação de diversos artistas com pouco trânsito
nos ambientes universitários naquele momento.
A partir do exposto, é razoável considerar que, durante o pro-
cesso de abertura democrática, as políticas para artes nas universida-
des não recaiu exclusivamente na criação dos cursos de licenciatura
em Educação Artística. O quadro no qual as políticas culturais cruzam
com as educacionais é mais complexo e merece um exame mais apro-
fundado. A licenciatura em Educação Artística começou a ser inserida
nas universidades nacionais a partir de 1973. Fruto da reforma imple-
mentada em 1971, pelo acordo MEC-USAID, o curso se baseava em
um currículo mínimo de dois anos, ao final do qual o estudante deve-
ria estar preparado para lecionar música, teatro, artes visuais, desenho
geométrico e dança no ensino básico. Além da impossibilidade de se
cumprir tal objetivo, numa clara evidência do descompasso entre o que
foi proposto pela política educacional e o caminho trilhado até então
pela área, em sua formulação foram desconsiderados os 25 anos de
experiência do movimento Escolinha de Arte – que oferecia cursos em
todas as regiões brasileiras para crianças e adolescentes e formação em
arte educação para professores e artistas10.
Considerando os equívocos conceituais, metodológicos e curricu-
10. BARBOSA, Ana Mae.
Arte-Educação no Brasil: lares dos recém-criados cursos de Educação Artística, bem como a dis-
realidade hoje e expectativas
tância de sua proposta das reais necessidades da área11, certamente seu
futuras. Disponível em: <
http://www.scielo.br/pdf/ea/ impacto no campo das artes contemporâneas foi muito limitado do pon-
v3n7/v3n7a10.pdf>. Acesso
to de vista da criação e reflexão. E, muito provavelmente, a possibilidade
em: mar. 2016.
de atuar como aluno ou professor tenha sido pouco atrativa para artistas
11. Para uma caracterização
com trajetória consolidada. O depoimento de Antonio Dias sobre a sua
abrangente do campo das
artes nesse momento ver: participação na criação do NAC/UFPB ilustra bem esse argumento.
FERREIRA, Gloria. Arte
como questão: Anos 70. São
Paulo: Instituto Tomie Ohtake, Na Paraíba, apesar de eu ter ido lá como professor da UFPB, a ideia era real-
2009. Catálogo de Exposição.
mente criar um centro de artes onde artistas mais jovens pudessem apresentar
Instituto Tomie Ohtake, São
Paulo, 05 set. a 28 out. 2007. projeto. Essa era a vontade da Reitoria. (...) Paulo Sergio e eu começamos
184
a trabalhar para criar o Núcleo de Arte Contemporânea na UFPB (...) Dois Fabricia Jordão
artistas [Francisco Pereira e Raúl Córdula] e um sociólogo [Silvino Espínola] As artes visuais, as
que trabalhavam na Universidade foram chamados a colaborar. A ideia era universidades e o regime
criar um centro para exposições temporárias, que seriam produzidas por nós militar brasileiro:
(...) Eu fiz a primeira exposição na sede do NAC, para cumprir um acordo da o caso do Núcleo de
UFPB com a Funarte (...) O convite era para fazer uma exposição dos meus Arte Contemporânea da
trabalhos em João Pessoa, uma colaboração da Funarte com a UFPB. Mas Universidade Federal da
não havia espaço para isso, era como partir do zero. Nem um artista jovem ti- Paraíba (1978-1985)
nha onde expor, por exemplo, um projeto que escapasse da situação comercial
da galeria privada. Precisavam ter uma estrutura assim. Tinha uma faculdade
de artes lá, onde se formariam artistas, mas onde é que iriam parar? A Uni-
versidade não tinha nem galeria de arte (...) Então o artista é constrangido a
ter que se deslocar. A ideia era criar ali um centro produtor de exposições12.
interesses divergentes, por meio de mútuas concessões por parte dos Arte Contemporânea da
grupos que disputam o poder. Desse modo, talvez movidos pela cer- Universidade Federal da
Essas posturas, que enfatizaram ações concretas no âmbito ins- o caso do Núcleo de
titucional como parte das atribuições dos artistas, talvez expressassem Arte Contemporânea da
uma vontade de transformação dos limites impostos por circunstâncias Universidade Federal da
históricas objetivas. No contexto da repressão militar, elas podem por Paraíba (1978-1985)
adesão não ficou circunscrita aos altos funcionários, geralmente ocu- universidades e o regime
pando cargos por indicação dos militares – como Reitor, Membros dos militar brasileiro:
res “não esboçaram, durante a instalação do golpe, resistência, nem Universidade Federal da
à dominação nem à sujeição; como era de esperar, adaptaram-se ra- Paraíba (1978-1985)
tomou parte ativa, por sua própria conta e iniciativa, nos atos de arbítrio 31. Ibidem. Em 1999 a UFPB,
através da Resolução N°
que se praticavam na época (...) muitos dos que tinham poder para decidir
16/99, revogou todas as
destinos de pares e subordinados e tinham, como sempre se tem, uma cer- punições aplicadas a alunos,
ex-alunos, professores
ta margem de manobras para decidir o que fazer, definir sua opção política,
e funcionários durante a
decidiram tomar a dianteira e, por iniciativa própria, exercer o arbítrio, ditadura e fez uma retratação
institucional perante todos
impor sua intolerância, punir os que achavam incomodar, pelo simples
os que foram punidos nesse
fato de discordarem31. período.
191
ARS A fidelidade da UFPB ao regime se expressa também nas po-
ano 14 líticas e reformas educacionais implementadas no período de 1964 a
n. 27 1979. Assim, por exemplo, percebe-se um “crescimento acentuado das
áreas tecnológicas e biocientífica”32, em detrimento da área humanís-
tica, como propunha a pedagogia tecnicista do governo pós-1964, nos
três reitorados que abarcaram o período de regime ditatorial brasilei-
ro, a saber: Guilardo Martins Alves (1964-1971), Humberto Carneiro
da Cunha Nóbrega (1971-1975) e Lynaldo Cavalcanti Albuquerque
(1975-1979).
Do mesmo modo, as reformas modernizadoras empreendidas
pelos referidos reitores estavam em concordância com o projeto de re-
formulação proposto pelo acordo MEC-USAID, que buscava adequar a
tríade: educação, política desenvolvimentista do regime militar e o mo-
delo educacional privatista/empresarial americano. Inclusive, o acordo
MEC-USAID de reformulação e modernização das universidades bra-
sileiras, conforme Maria José Gomes, foi implantado “de forma pionei-
ra”33 pela UFPB, sendo adotado pelo MEC como “modelo de qualquer
32. SCOCUGLIA, Afonso
Celso. Populismo, Ditadura reestruturação acadêmica”34 que se pretendesse realizar nas universi-
e Educação: Brasil/Paraíba,
dades brasileiras.
anos 1960. João Pessoa:
Editora da Universitária da Essa postura favorável da UFPB foi reconhecida e recompen-
UFPB, 2009, p. 129.
sada pelo governo militar, que a converteu numa “espécie de modelo
33. GOMES, Maria José universitário da região Nordeste”35 passando do “25º para o 2º lugar
Teixeira Lopes. A ditadura
na concessão de verbas do Ministério de Educação e Cultura”36. Desse
na Universidade Federal da
Paraíba. In: GUERRA, Lúcia de modo, é possível considerar que a colaboração da UFPB com o regime
Fátima; FERNANDES, David
militar foi decisiva para o vultuoso crescimento que obteve ao longo da
(orgs.). Op. cit. p. 52.
década de 1960, o maior da região nordeste e 6% superior à média na-
34. UNIVERSIDADE FEDERAL
cional37, fornecendo as bases para expansão e dinamização observadas
DA PARAÍBA. Reitorado
Humberto Costa da Cunha durante a gestão do reitor Lynaldo Albuquerque.
Nóbrega 1971-1975: relatório
Portanto, o reitorado de Albuquerque, período no qual foi criado
final. João Pessoa: UFPB,
1975. p. 11. o NAC/UFPB, vem na esteira de 11 anos de fidelidade inconteste ao
regime militar e às suas políticas, podendo ser entendido como a con-
35. SCOCUGLIA, Afonso Celso.
Op. cit., p. 178. tinuação e reafirmação da posição colaborativa da UFPB. No entanto,
diferentemente dos seus antecessores, sua gestão foi beneficiada por
36. Ibidem.
uma conjuntura extremamente favorável – com o processo de abertura
37. Conforme RODRIGUES,
política e a estratégia de aproximação do conjunto de oposição, dentre
Cláudio J. L. Sociedade e
Universidade. João Pessoa: os quais estudantes e professores universitários – possibilitando que as
SEC-PB, 1986, p. 139-140
ações desenvolvidas no seu reitorado (e ele próprio) fossem percebidas
apud SCOCUGLIA, Afonso
Celso. Op. cit., p. 130. como progressistas, quando na verdade estavam não só em completa
192
consonância como foram, em grande medida, possibilitadas por essa Fabricia Jordão
nova política do regime militar. As artes visuais, as
Assim, por exemplo, o reitor Albuquerque ao tomar posse ime- universidades e o regime
desde o reitorado do capitão Guilardo Martins Alves e havia participado o caso do Núcleo de
neral da reserva Nogui Villar de Aquino, o qual, segundo Albuquerque, Universidade Federal da
possuía “muito conceito na área militar (...) mas se revelou muito com- Paraíba (1978-1985)
outros não. Então, eu fui trazendo para lá [UFPB], além de trazer muitos
41. Entrevista concedida
estrangeiros: indianos, argentinos (...) (sic)41 por Lynaldo Cavalcanti
Albuquerque à pesquisadora
Nancy A. Campos Muniz, em
A partir desse depoimento, percebe-se como, desde meados da outubro de 2007, em Brasília.
Citada no capítulo “A gestão
década de 1970, Albuquerque lança mão da conjuntura política para
de Lynaldo Cavalcanti de
atrair professores, intelectuais e pesquisadores para a UFPB e na me- Albuquerque – presidente do
CNPq no período 1980-85”.
dida em que melhorava o ensino e pesquisa oferecidos pela Universida-
In: MUNIZ, Nancy A. Campos.
de projetava sua gestão nacionalmente. Ora, uma ação dessa natureza O CNPq e sua trajetória de
planejamento e gestão em
provavelmente só foi possível por conta da política de aproximação do
C&T: histórias para não
regime com estudantes e professores materializada no relaxamento da dormir, contadas pelos seus
técnicos (1975-1995). Tese
repressão dentro das universidades e pelo elevado nível de confiança e
(Doutorado em História) –
credibilidade da UFPB, parceira de longa data do regime, e do próprio Universidade de Brasília,
Brasília, 2008, p. 144.
Albuquerque, indicado pelo ministro da educação Ney Braga para ocu-
par o cargo de reitor da UFPB42. 42. Entrevista concedida
por Lynaldo Cavalcanti de
Assim sendo, a criação do NAC/UFPB se insere no vertiginoso
Albuquerque, em 12 set. 1990,
processo de crescimento pelo qual passou a UFPB durante o reitorado ao Projeto História da UFPB-
NDIHR. Entrevistadores:
de Albuquerque. Esse crescimento foi potencializado pelo prestígio que
Cláudio José Lopes Rodrigues,
a universidade desfrutava junto aos militares e devido aos interesses, Zélia Cavalcanti de Melo,
193
ARS experiências profissionais e articulações do próprio reitor. Cabe des-
ano 14 tacar que antes de assumir o posto na UFPB, Albuquerque havia tra-
n. 27 balhando como diretor adjunto do Departamento de Assuntos Univer-
sitários (DAU) no MEC, onde coordenou a implantação do Programa
Nacional de Pós-Graduação (PNPG)43.
Portanto, pode-se argumentar, que Albuquerque além de conhe-
cer a função que cabia às universidades na política cultural do governo
Geisel, gozava de certo poder de influência, devido às “experiências, co-
nexões e relacionamentos”44 que tinha desenvolvido no “MEC, no pla-
nejamento, um pouco no CNPq com alguns diretores, principalmente
com Amílcar Ferrari, (...) que era vice-presidente do CNPq na gestão
do Geisel”45. Outro dado importante é que o reitor era a possível indi-
cação da Escola Superior de Guerra para ocupar o cargo de ministro
do MEC46. Diante desse quadro, era de suma importância o desenvol-
vimento de ações e projetos na UFPB, nas mais diversas áreas, com
caráter inovador e em consonância com os objetivos propostos pelo
Rosa Maria Godoy Silveira,
regime militar, para dar visibilidade e projeção nacional ao reitorado de
Maria das Dores Limeira
Santos. In: GUERRA, Lúcia de Albuquerque.
Fátima; FERNANDES, David
Nesse sentido, considerando que até 1978 a questão cultural
(orgs.). Op. cit., p. 104.
não havia sido colocada como algo relevante em sua gestão, é pouco
43. MUNIZ, Nancy A. Campos.
provável que o Reitor, ao decidir criar um núcleo de artes, estivesse
Op. cit.
preocupado com questões relativas à produção, circulação e fomento
44. Entrevista concedida
da arte ou com melhores condições de trabalho para os artistas. Parece
por Lynaldo Cavalcanti
Albuquerque à pesquisadora mais razoável considerar que Albuquerque estava mais interessado em
Nancy A. Campos Muniz, em
dinamizar e projetar sua gestão.
outubro de 2007, em Brasília.
In: Idem, p. 143-144. Desse modo, se por um lado a criação do NAC foi consequência
da implementação das diretrizes da PNC durante a gestão de Lynaldo
45. Idem, p. 143-144.
Cavalcanti Albuquerque na UFPB, por outro a materialização de suas
46. Pouco tempo antes da
ações só foi possível graças ao apoio da Funarte. Já seu estabelecimen-
posse de Albuquerque ocorreu
um problema com a indicação to como um espaço de produção, difusão, reflexão e formação em arte
de Antonio Carlos Magalhães
contemporânea foi decorrência da fundamental presença e atuação de
para o Ministério da Saúde;
como alternativa, Magalhães artistas/agentes do campo cultural.
indicou Eduardo Portela para
O NAC/UFPB foi criado em setembro de 1978 por meio de con-
o ministério da Educação
e Cultura, e este assumiu vênio estabelecido, via Programa Universidade (PU), entre a UFPB e
o cargo. Ver: Entrevista
a Funarte. Institucionalmente, ficou vinculado à Coordenação de Ex-
concedida por Lynaldo
Cavalcanti Albuquerque tensão e à Pró-Reitoria para Assuntos Comunitários, setores responsá-
à pesquisadora Nancy A.
veis pelas atividades culturais e pelo diálogo da UFPB com o público
Campos Muniz, em outubro de
2007, em Brasília. In: Idem. externo. Como núcleo de extensão ficou ligado ao Departamento de
194
Comunicação e Artes, especificamente ao Curso de Educação Artística, Fabricia Jordão
sendo composto por uma coordenação, um conselho técnico-científico As artes visuais, as
e uma equipe constituída pelos artistas Antonio Dias, Francisco Pereira universidades e o regime
Júnior e Raul Córdula, o crítico de arte Paulo Sergio Duarte e o soció- militar brasileiro:
O projeto foi concebido por Paulo Sergio Duarte e Antonio Dias Arte Contemporânea da
e tinha como principal objetivo a criação de um espaço voltado à difu- Universidade Federal da
são e à produção em arte contemporânea numa região que tradicional- Paraíba (1978-1985)
(...) O futuro do NAC depende de manter esta consciência diante das difi-
48. CÓRDULA, Raul. A
culdades, sem elas não se articularia a razão do trabalho. Sem os obstáculos experiência renovadora
do NAC no campo da
seria suspeito qualquer projeto. Cabe ao NAC, sem abrir mão dos elementos
extensão universitária. In:
estratégicos, estabelecer laços mais estreitos com a comunidade universi- GOMES, Dyogenes Chaves
(org.). O Núcleo de Arte
tária e os artistas locais. Isto só pode se realizar com perfeito entrosamento
Contemporânea da Paraíba/
entre o Núcleo e o trabalho de formação e extensão dos departamentos49. NAC. Rio de Janeiro: Funarte,
2004, p. 14.
Para tanto, foram desenvolvidas ações visando a aproximação, 49. DUARTE, Paulo Sergio.
Introdução. In: NAC/
inserção, compreensão e legitimação do NAC/UFPB e de sua proposta
UFPB (org.). ALMANAC.
tanto na Universidade como no meio artístico local. No âmbito da co- João Pessoa: NAC-UFPB/
FUNARTE, 1980. Grifos meus.
munidade universitária a equipe NAC buscou conquistar “um espaço
Fonte: Acervo NAC/UFPB.
teórico e crítico no interior da Universidade Federal da Paraíba”50. Esse
50. CÓRDULA, Raul. Arte
propósito foi implementado por meio do desenvolvimento de atividades
Contemporânea na Paraíba.
e aulas dirigidas para estudantes do departamento de Artes e do apoio João Pessoa, (198-) 10 f.
Mimeografado. Fonte: Acervo
às disciplinas Fundamentos da Linguagem Visual, Oficina Básica de
NAC/UFPB.
Plástica e Fundamentos da Comunicação Humana51. Também foi de-
51. Ibidem.
senvolvido um projeto que capacitava e possibilitava aos alunos da dis-
ciplina Prática de Ensino atuar como monitores das mostras e ações de- 52. CÓRDULA, Raul. O Núcleo
de Arte Contemporânea
senvolvidas pelo Núcleo52. Esse diálogo com o Departamento de Artes
da Universidade Federal
certamente contribuiu para alargar as formas, conteúdos e metodologia da Paraíba. João Pessoa:
NAC/UFPB, (198-). 4f.
do ensino de arte assim como tornar mais complexa e direta a relação
Mimeografado. Fonte: Acervo
do futuro docente/artista com a arte. NAC/UFPB.
195
ARS A proposta elaborada por Duarte e Dias também previa em seu
ano 14 regulamento a criação de um conselho técnico-científico interdisci-
n. 27 plinar formado pela equipe de coordenação e por professores dos de-
partamentos de Filosofia, de Arquitetura e de Ciências Sociais, juntos
deveriam deliberar sobre a programação e pesquisas do Núcleo53. Por
meio dessa parceria seria possível viabilizar a realização de “eventos e
mostras”, que “conjugassem a ação interdisciplinar como processo pe-
dagógico básico da educação artística contemporânea”54, contribuindo
para o desenvolvimento de ações que enfatizavam o diálogo entre as
artes visuais e outras áreas do conhecimento e linguagens artísticas.
53. Com relação às atribuições
Já em relação ao público externo, um importante elemento de
do conselho técnico-científico, aproximação foi o fato de sua sede estar localizada fora do longínquo
ver a Seção I do Regulamento
do NAC/UFPB. Fonte: Acervo
campus universitário. Por ocupar um espaço no centro da cidade de
NAC/UFPB. João Pessoa sua inserção no tecido social tornou-se mais efetiva e or-
54. Ibidem.
gânica não só para os artistas e público espontâneo mas, também, para
as escolas públicas da capital, em sua maioria localizada nessa região.
55. CÓRDULA, Raul.
O Núcleo de Arte
Para alunos e professores da rede oficial de ensino, o NAC esforçava-se
Contemporânea da em oferecer um programa de visitas guiadas. O objetivo era despertar o
Universidade Federal da
Paraíba. Op. cit.
interesse dos alunos para a arte e tornar as visitas “um aspecto rotinei-
ro”55 no cotidiano das escolas, de modo que fossem inseridas “na pro-
56. Ibidem.
gramação dos professores de educação artística como elementos para o
57. O NAC foi oficialmente trabalho de cada semestre”56.
criado em 1978 por meio da
Portaria P/GR Nº 019/78,
Essa preocupação esteve presente desde a primeira exposição
emitida pelo Reitor Lynaldo promovida em sua sede em fevereiro de 1979, a individual de Antonio
Cavalcanti de Albuquerque em
18 de setembro de 1978.
Dias57. Nessa ocasião foi estabelecida “uma ponte importante”58 com o
No entanto, apenas em “trabalho pedagógico”59 por meio “de visitas programadas organizadas
fevereiro de 1979 sua sede
é inaugurada.
por Raul Córdula com estudantes de seu curso de extensão e apoiadas
por palestras de Paulo Sergio Duarte”60. Cabe destacar que esse esforço
58. CÓRDULA, Raul.
Porque um Núcleo de
teve algum reconhecimento, como nota-se no relato de Fernando Me-
Arte Contemporânea na deiros, professor de Educação Artística do Colégio Estadual do Bairro
Universidade. João Pessoa,
[198-d]. 6f. Mimeografado.
dos Estados:
Fonte: Acervo NAC/UFPB.
59. Ibidem.
Atualmente o NAC vem desempenhando um papel importante uma vez que
tem proporcionado oportunidades de alunos secundaristas ficarem mais
60. Ibidem.
atualizados com a produção artística do Estado. Por outro lado, serve de
61. Exposição internacional incentivo a fim de que os estudantes, desde cedo, possam apreciar obras de
encerrada hoje no NAC. Jornal
O Norte, João Pessoa,
arte. Durante minhas aulas, recomendo que os estudantes tenham sempre
19 set. 1980. contato com exposições, com artistas61.
196
É importante destacar que uma das maiores contribuições do Fabricia Jordão
NAC no âmbito acadêmico, especificamente para o Departamento de As artes visuais, as
Artes e no cenário artístico local foi a implementação de uma proposta, universidades e o regime
concebida por Paulo Sergio Duarte e Antonio Dias, que conjugava a militar brasileiro:
Paraíba (1978-1985)
(...) O artista visitante viajava para João Pessoa, onde trabalhava em todas as
etapas da realização do seu trabalho, desde o contato direto com o alunado
da Universidade, com a imprensa, grupo de monitores e com o público em
geral, além de assistência à equipe de montagem. [O NAC/UFPB] estabele-
cia o contato entre todas as partes envolvidas, organizava a comunicação do
trabalho, inclusive redigindo os textos jornalísticos de apoio e, eventualmen-
te, o de apresentação, algo assim como os atuais “textos curatoriais”, além
de projetar ou assessorar a montagem62.
Para tanto, o NAC possuía uma estrutura que contava com su-
ítes para artistas convidados (quando ainda não existia o conceito de
residência artística), ateliê de litografia (único existente no nordeste),
ateliês para práticas artísticas, sala para cursos, palestras e conferên-
cias, biblioteca e um laboratório completo de fotografia, que possibili-
tou que fosse desenvolvido “todo um programa de apoio a fotografia,
desde o estágio de produção em laboratório até a apresentação final ao
público”63. Passaram pelo NAC/UFPB artistas como Tunga, Cildo Mei-
reles, Anna Maria Maiolino, Paulo Klein, Paulo Bruscky, 3NÓS3, Jota
Medeiros, Marcelo Nitsche, Falves Silva, Artur Barrio, Leonhard Frank
Duch, Vera Chaves Barcellos. Foram promovidas diversas mostras que
exploravam uma variada gama de técnicas, mídias, materiais e suportes:
xerox arte, arte correio, art-door, livro de artista, videoarte, fotografia,
instalação. As exposições, em sua maioria, foram acompanhadas por
palestras, cursos ou oficinas nas quais os artistas visitantes comenta-
62. CÓRDULA, Raul. A
vam as propostas, compartilhavam experiências, discutiam questões
experiência renovadora do
relativas a linguagem artística e/ou meios que exploravam. NAC no campo da extensão
universitária. In: GOMES,
Ou seja, por meio desse programa ampliado garantia-se o conta-
Dyogenes Chaves (org). Op.
to com uma variada gama de trabalhos e procedimentos das artes visu- cit., p. 17.
militar brasileiro:
artistas do eixo Rio-São Paulo, em João Pessoa a proposta foi recebida Arte Contemporânea da
para justificar sua existência, e cumprir com sua finalidade a qual foi pro- 68. Cf. BECHARA FILHO,
Gabriel; CARVALHO, Rosires
posta, o Núcleo de Arte Contemporânea, precisa, antes de tudo, atrair para
de Andrade. Fontes para
si, e assimilar, os artistas plásticos paraibanos e muito principalmente os o estudo das artes visuais
na Paraíba dos arquivos da
alunos dos cursos de artes da UFPB (...) Sem a participação dos dois perde o
imprensa: 1970-79. João
objetivo de existir e a própria razão de ser, tornando-se mais um órgão estatal Pessoa: Editora Universitária
da UFPB, 2009.
“bem intencionado”, mas incompetente.72
69. ALTINO, Jose. Artes
Visuais. João Pessoa: NAC/
Essa cobrança justificava-se pelo fato de que a participação de
UFPB, s.d. 1 f. Mimeografado.
artistas paraibanos na grade de programação do Núcleo era aproxima- Fonte: Acervo NAC/UFPB.
UFPB e artistas locais81. Do mesmo modo, Tunga, quando da instala- universidades e o regime
ção de Sistema Dinâmico (1979), compôs e recompôs, com diferentes militar brasileiro:
grupos, diversas versões do trabalho, além de conversar com o público o caso do Núcleo de
e com os artistas locais. Também Miguel Rio Branco e Anna Maria Arte Contemporânea da
tas paraibanos83. Do mesmo modo, Paulo Klein, na exposição Cidadão Paraíba (1978-1985)
UFPB organizou, ainda, a exposição Arte-Paraibana 80, que contou universidades e o regime
promover um programa que tinham como base a interconexão de qua- Arte Contemporânea da
interdisciplinar. Se, como mencionado em outra parte deste texto, a Paraíba (1978-1985)
Artigo recebido em
8 de Abril de 2016 e aprovado Fabrícia Jordão (fcljordao@gmail.com) é doutoranda em Artes pela ECA-USP. Atual-
em 17 de Maio de 2016.
mente, como bolsista Fapesp, pesquisa as contribuições dos artistas e intelectuais para
DOI: 10.11606/issn.2178-0447. a institucionalização do campo das artes visuais e a consolidação de um campo discur-
ars.2016.117631 sivo, teórico e prático para arte contemporânea durante a redemocratização brasileira.