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DIREITO SOCIAL E TRABALHISTA

2. Princípios do direito do trabalho

Princípios são traduzidos como ideia de início, começo, primeiro momento. (DELGADO,
2019, p.220).

“Em conclusão, para a Ciência do Direito os princípios conceituam-se como


proposições fundamentais que informam a compreensão do fenômeno
jurídico. São diretrizes centrais que se inferem de um sistema jurídico e que,
após inseridas, a ele se reportam, informando-o (DELGADO, 2019, p.222).

Sergio Pinto Martins (2003, p.75) ensina que os princípios podem ter função informadora,
quando inspiram o legislador e servem de fundamento para as normas jurídicas. Como função
normativa, os princípios atuam como uma fonte supletiva, nas lacunas e omissões da lei. Já, na
função interpretativa, podem servir como orientador para os intérpretes e aplicadores da lei.

Acerca da função de fonte supletiva, impõe mencionar que a própria CLT estabelece os
princípios como meio pelo qual as autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho podem
fundamentar suas decisões.

CLT (BRASIL, 2020)


“Art. 8º - As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de
disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela
jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais
de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os
usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum
interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.

§ 1º O direito comum será fonte subsidiária do direito do


trabalho. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vigência)

§ 2o Súmulas e outros enunciados de jurisprudência editados pelo Tribunal


Superior do Trabalho e pelos Tribunais Regionais do Trabalho não poderão
restringir direitos legalmente previstos nem criar obrigações que não estejam
previstas em lei. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vigência)

§ 3o No exame de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, a Justiça


do Trabalho analisará exclusivamente a conformidade dos elementos
essenciais do negócio jurídico, respeitado o disposto no art. 104 da Lei
no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), e balizará sua atuação pelo
princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade
coletiva. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vigência)”

No direito do trabalho podem ser identificados diversos princípios constitucionais, tais como o
princípio da dignidade da pessoa humana, princípio do valor social do trabalho, princípio da
solidariedade, princípio da não discriminação etc. (LEITE, 2020, p.96-99).

Embora muitos os princípios aplicáveis ao direito do trabalho, neste trabalho destacaremos os


princípios mais importantes que serão objetos de nosso estudo, conforme a seguir disposto.
2.1. Princípio da proteção

Ensina Leite (2020, p.105) que o princípio da proteção constitui verdadeira gênese do direito
do trabalho e “consiste em estabelecer uma igualdade jurídica entre empregado e empregador,
em virtude da manifesta superioridade econômica deste diante daquele”.

Referido princípio se desdobra em três outros:

 In dubio pro operário

Conforme ensina Leite (2020, p.105) “trata-se do princípio que auxiliar a interpretação da
norma trabalhista em prol do trabalhador, [...] diante de uma única norma que permita mais de
uma interpretação, deve prevalecer aquela que mais favoreça o empregado”.

Importante destacar que há divergência doutrinaria e jurisprudencial quanto a aplicação deste


princípio no campo do processo do trabalho (LEITE, 2020,p.106), em razão das regras de
distribuição do ônus da prova (artigos 818 da CLT e 373 do CPC).

 Norma mais favorável

Segundo Leite (2020, p.107), “cuida-se de princípio que informa a aplicação da norma
trabalhista, existindo mais de uma norma no ordenamento jurídico versando sobre direitos
trabalhistas, prevalecerá a que mais favoreça o empregado”.

O atual entendimento do Tribunal Superior do Trabalho é da aplicação da Teoria do


Conglobamento, onde na ocorrência de um conflito entre o que foi estabelecido na Convenção
Coletiva e o Acordo Coletivo ou outro instrumento normativo deverá prevalecer o mais
favorável ao empregado, no seu conjunto ou em sua totalidade.

 Condição ou cláusula mais benéfica

No entendimento de Leite (2020, p.111), “existindo uma condição ou cláusula anterior oriunda
de norma jurídica preexistente (ex.: cláusula de regulamento de empresa contendo uma
vantagem para o empregado), sobrevier outra norma versando sobre a mesma matéria,
prevalecerá aquela, anteriormente criada, salvo se a norma posterior for mais benéfica ao
trabalhador”.

Como se manifesta a jurisprudência acerca dos temas:

“RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA


VIGÊNCIA DAS LEIS NºS 13.015/2014 E 13.467/2017 . 1.
INSTRUMENTO NORMATIVO APLICÁVEL. PREVALÊNCIA
DACONVENÇÃOCOLETIVAEM FACE DOACORDOCOLETIVO.
TEORIA DO CONGLOBAMENTO. NORMACOLETIVAMAIS
BENÉFICA.TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA.
CONHECIMENTO E PROVIMENTO. I. Firmou-se nesta Corte Superior o
entendimento de que, no conflito entre acordo e convenção coletiva de
trabalho, deve ser aplicada a norma coletiva que, em seu todo, estipular
condições mais benéficas ao empregado, na forma do art. 620daCLT. II. No
caso dos autos, a Corte Regional entendeu que "os acordos coletivos em caso
de divergência se sobrepõem às convenções, por mais específicos, melhor
abordando a realidade vivida entre os signatários". III. Recurso de revista de
que se conhece e a que se dá provimento”. (TST - RR:
120181820155150153, Relator: Alexandre Luiz Ramos, Data de
Julgamento: 10/06/2020, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT 19/06/2020)

“RECURSO ORDINÁRIO OBREIRO. RESCISÃO INDIRETA DO


CONTRATO DE TRABALHO. IRREGULARIDADE DOS DEPÓSITOS
DO FGTS. FALTA GRAVE PATRONAL. DESNECESSIDADE DA
IMEDIATICIDADE ENTRE A OCORRÊNCIA DA FALTA GRAVE E O
AJUIZAMENTO DA AÇÃO. A irregularidade dos depósitos fundiários,
consoante jurisprudência reiterada do C. TST, caracteriza falta grave
patronal apta a ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho. A ausência
da imediaticidade entre a falta patronal cometida e o ajuizamento da
reclamação trabalhista não constitui empecilho ao reconhecimento judicial
da rescisão indireta do contrato. Aplicação do princípio da proteção ao
hipossuficiente, consoante entendimento do Tribunal Superior do Trabalho.
Recurso obreiro parcialmente provido. (TRT-6 - Processo: ROT - 0000916-
79.2018.5.06.0141, Redator: Gisane Barbosa de Araujo, Data de
julgamento: 28/05/2020, Quarta Turma, Data da assinatura: 28/05/2020)

2.2. Princípio da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas

Também chamado de princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas, conforme leciona


Maurício Godinho Delgado (2019, p.237) traduz-se como “a inviabilidade técnico-jurídica de
poder o empregado despojar-se, por sua simples manifestação de vontade, das vantagens e
proteções que lhe asseguram a ordem jurídica e o contrato”.

Súmula nº 276 do TST


AVISO PRÉVIO. RENÚNCIA PELO EMPREGADO (mantida) -
Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003
O direito ao aviso prévio é irrenunciável pelo empregado. O pedido de
dispensa de cumprimento não exime o empregador de pagar o
respectivo valor, salvo comprovação de haver o prestador dos serviços
obtido novo emprego.

Referido princípio teve sua mitigação pela edição da Lei nº 13.467, de 2017, a chamada
“Reforma Trabalhista”, que criou a figura do empregado hipersuficiente.

CLT (BRASIL, 2020)


Art. 444 - As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre
estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às
disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam
aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.

Parágrafo único. A livre estipulação a que se refere o caput deste artigo


aplica-se às hipóteses previstas no art. 611-A desta Consolidação, com a
mesma eficácia legal e preponderância sobre os instrumentos coletivos, no
caso de empregado portador de diploma de nível superior e que perceba salário
mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do
Regime Geral de Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 13.467,
de 2017)
2.3. Princípio da primazia da realidade

Nesse princípio a realidade fática se sobrepõe sobre os documentos.

Destaca Martins que “são privilegiados, portanto, os fatos, a realidade, sobre a forma ou a
estrutura empregada” (2003, p.79).

Mauricio Godinho Delgado leciona acerca desse princípio

“No Direito do Trabalho, deve-se se pesquisar, preferentemente, a prática


concreta efetivada ao longo da prestação de serviços, independentemente da
vontade eventualmente manifestada pelas partes na respectiva relação
jurídica. A prática habitual – na qualidade de uso – altera o contrato pactuado,
gerando direitos e obrigações novos às partes contratantes (respeitada a
fronteira da inalterabilidade contratual lesiva) (DELGADO, 2019, p.244)”.

Ademais, cumpre observar o quanto estatui o artigo 9° da CLT “Serão nulos de pleno direito
os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos
contidos na presente Consolidação”.

Súmula nº 12 do TST
CARTEIRA PROFISSIONAL (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e
21.11.2003
As anotações apostas pelo empregador na carteira profissional do empregado
não geram presunção "juris et de jure", mas apenas "juris tantum".

O que diz a jurisprudência sobre o princípio da primazia da realidade

“AGRAVO EM RECURSO DE REVISTA EM FACE DE DECISÃO


PUBLICADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. INSTRUTORES
DO DENOMINADO "SISTEMA S". ENQUADRAMENTO SINDICAL.
PROFESSOR. ARTIGO 317 DA CLT. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DA
REALIDADE. Após algumas oscilações, a jurisprudência mais recente desta
Corte firmou-se no sentido de que é o "contrato realidade" que define a
condição profissional do empregado como professor, independentemente da
nomenclatura utilizada para a contratação (Precedente da SBDI-1).
Ademais, já é pacífico que eventual desatenção aos requisitos constantes do
artigo 317 da CLT (habilitação legal e registro no Ministério da Educação)
não obsta o enquadramento do empregado como professor. Isso porque
referido preceito legal dirige-se aos estabelecimentos de ensino e contempla
mera exigência formal para o exercício da profissão. Aplicação do princípio
da primazia da realidade. Agravo conhecido e não provido”. (TST - Ag-RR:
8431020145170152, Relator: Cláudio Mascarenhas Brandão, Data de
Julgamento: 04/12/2018, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 14/12/2018).

2.4. Princípio da continuidade da relação empregatícia

Pelo princípio da continuidade da relação de emprego todo o contrato de trabalho, em regra,


vige por prazo indeterminado.
Ensina Sérgio Pinto Martins (2003, p.79) que “a exceção à regra são os contratos por prazo
determinado, inclusive o contrato de trabalho temporário”.

Dessa forma, é importante observar que os contratos por prazo determinado, para terem
validade devem ser realizados, exclusivamente, por escrito e dentro dos critérios legais.

Súmula nº 212 do TST


DESPEDIMENTO. ÔNUS DA PROVA (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19,
20 e 21.11.2003
O ônus de provar o término do contrato de trabalho, quando negados a
prestação de serviço e o despedimento, é do empregador, pois o princípio da
continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao
empregado.

Como a jurisprudência manifesta-se sobre o princípio da Continuidade da relação de emprego

“FORMA DA DISPENSA. PRESUNÇÃO EM FAVOR DO


EMPREGADO. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DA RELAÇÃO DE
EMPREGO. Diante do princípio da continuidade da relação de emprego, o
ônus probatório de comprovar a forma da resolução do vínculo era do
reclamado, ônus do qual não se desincumbiu. Por tal motivo, presume-se
que a reclamante foi dispensada sem justa causa”. (TRT-3 - RO:
00115585920175030035 0011558-59.2017.5.03.0035, Relator: Weber Leite
de Magalhaes Pinto Filho, Decima Primeira Turma)

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REFERÊNCIAS

BRASIL. DECRETO-LEI Nº 5.452, DE 1º DE MAIO DE 1943. Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm Acesso em 20 Jul. 2021.

BRASIL. LEI Nº 13.105, DE 16 DE MARÇO DE 2015. Código de processo civil. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm#art373 Acesso em: 20 Jul.2021.

BRASIL, LEI Nº 13.467, DE 13 DE JULHO DE 2017. Disponível em:


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13467.htm Acesso em: 20 Jul.2021.

BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Súmulas. Disponível em: http://www.tst.jus.br/sumulas Acesso em 20


Jul. 2021.

DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho: obra revista e atualizada conforme a lei da reforma
trabalhista e inovações normativas e jurisprudenciais posteriores. 18 ed., São Paulo: Ltr, 2019.

LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de direito do trabalho. 12.ed., São Paulo: Saraiva Educação, 2020.

MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 17.ed., São Paulo: Atlas, 2003.

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