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Richard T.

Froyen
Macroeconomia
Teorias e aplicações

2ª edição

Tradução: Cecília Camargo Bartalotti


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ISBN 9788502175228

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA
FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ.

F961m
2. ed.
Froyen, Richard T.
Macroeconomia: teorias e aplicações / Richard T. Froyen; tradução: Cecília Camargo Bartalotti. - 2. ed. - São Paulo:
Saraiva, 2013.
ISBN 9788502175228
1. Macroeconomia. I. Título.
CDD-339
CDU-330.101.541
12-6270. 038699

Traduzido de Macroecnomics – Theories and policies, 9th ed., de Richard T. Froyen.


Tradução autorizada da edição em inglês publicada por Pearson Prentice Hall.
Copyright © Richard T. Froyen, 2009
2013 Editora Saraiva
Todos os direitos reservados.

Direção editorial Flávia Alves Bravin


Coordenação editorial Rita de Cássia da Silva
Editora – Aquisições Ana Paula Matos
Editora – Universitário Luciana Cruz
Editora – Técnico Alessandra Borges
Editora – Negócios Gisele Folha Mós
Produção editorial Daniela Nogueira Secondo
Rosana Peroni Fazolari
Produção digital Nathalia Setrini Luiz
Suporte editorial Najla Cruz Silva
Tradução Cecília Camargo Bartalotti
Arte e produção Conexão Editorial
Capa Leandro Correia

Contato com o editorial


editorialuniversitario@editorasaraiva.com.br

2ª edição

Nenhuma parte desta publicação poderá ser


reproduzida por qualquer meio ou forma sem a
prévia autorização da Editora Saraiva. A
violação dos direitos autorais é crime
estabelecido na lei nº 9.610/98 e punido pelo
artigo 184 do Código Penal.
À Linda, Katherine, Sara e Andrea
Agradecimentos
Muitas pessoas ajudaram a preparar as várias edições deste livro. Foram muito úteis os
comentários de Roger Waud, Art Benavie, Alfred Field, William Parke, Mike Aguilar e Pat
Conway, todos da University of North Carolina, bem como Lawrence Davidson, Indiana
University; Dennis Appleyard e Peter Hess, Davidson College; Alfred Guender, University of
Canterbury; Ed Tower, Duke University; Homer Erekson, Miami University; Sharon Erenberg,
Eastern Michigan University; Ryan Herzog, Gonzaga University; David Van Hoose, Baylor
University; Michael Bradley, George Washington University; Art Goldsmith, Washington and
Lee University; Sang Sub Lee, Freddie Mac; David Bowles, Clemson University; e Rody Borg,
Jacksonville University. Ezequiel Cabezon e Mustafa Attar, da University of North Carolina,
também ofereceram comentários e atualizaram números da edição anterior.
Sou grato a Lindsey Sloan, David Alexander e Noel Kamm Seibert, da Pearson, por sua
cooperação editorial com esta revisão, e a Karen Slaght pela revisão do manuscrito.
Prefácio
O termo macroeconomia foi usado pela primeira vez pelo economista norueguês Ragnar
Frisch em 1933. Ela é claramente a irmã mais nova na família Economia e não é coincidência
que tenha surgido como um ramo importante da economia em meio às condições caóticas da
Grande Depressão da década de 1930. Os sérios problemas econômicos do período conferiram
importância ao tema da macroeconomia e ao comportamento da economia como um todo. O
livro Teoria geral do emprego, do juro e da moeda, de John Maynard Keynes, desenvolveu um
modelo abrangente em que considera a análise sistemática do comportamento de variáveis
econômicas agregadas, como o emprego e o produto. Durante as duas décadas seguintes à
Segunda Guerra Mundial, os seguidores de Keynes elaboraram e ampliaram suas teorias.
Desde o final da década de 1960, porém, surgiram questionamentos importantes à economia
keynesiana. Nos anos 1970, aumentou o interesse pelo monetarismo, o núcleo da teoria que
Milton Friedman e outros haviam desenvolvido a partir da década de 1940. Uma nova escola de
teoria macroeconômica, a economia novo-clássica, também entrou em cena nos anos 1970. Na
década de 1980, as prescrições de política keynesiana passaram a ser contestadas por um grupo
chamado economistas da oferta. Essa década também presenciou o desenvolvimento de duas
novas linhas de pesquisa macroeconômica: a teoria dos ciclos reais de negócios e a economia
novo-keynesiana.
Neste livro, procurei explicar a macroeconomia, incluindo seus avanços mais recentes, de
uma maneira coerente, mas sem tentar encobrir as divergências fundamentais entre os
macroeconomistas sobre questões teóricas e política econômica. As principais teorias
macroeconômicas modernas são apresentadas e comparadas, e as semelhanças e diferenças
importantes são discutidas.

O que há de novo na 2ª edição


• A crise financeira e a recessão profunda de 2007-09 foram os choques macroeconômicos
mais sérios que atingiram a economia mundial desde a Grande Depressão. A discussão dos
modelos teóricos nas Partes 2 e 3 do livro foi revisada para refletir essa experiência. Muitos
exemplos foram acrescentados para mostrar como os modelos explicam os eventos recentes.
O modo como a crise e a recessão profunda afetam uma avaliação das diferentes teorias
macroeconômicas é examinado.
• Os Capítulos da Parte 5 sobre Políticas Econômicas foram ampliados para levar em conta as
respostas de políticas à crise financeira e à recessão. Ao longo de todo o livro, iniciativas de
políticas importantes são descritas e avaliadas.
• Os Capítulos 16 e 17 foram revisados para incluir mais detalhes sobre bancos e outras partes
do setor financeiro. O congelamento dos mercados de crédito durante a crise financeira é
explicado dentro do contexto da criação de depósitos e crédito. Foi acrescentado material
sobre os novos instrumentos e iniciativas de política monetária que se classificam sob o
título de facilitação quantitativa. O problema do limite zero que levou à necessidade dessas
novas iniciativas de política é explicado.
• O Capítulo 14 sobre economia aberta inclui uma discussão atualizada da evolução dos
desequilíbrios de conta corrente no período de 2007-11 e uma nova abordagem da crise da
dívida soberana europeia.
• A discussão da política fiscal no Capítulo 18 inclui agora material sobre a dívida pública
norte-americana. A questão do peso da dívida também é examinado.
• Novos quadros Perspectivas foram acrescentados e outros foram expandidos com relação a
tópicos como: a hipótese de mercados eficientes para a precificação de ativos, o programa
de incentivo fiscal (ARRA) de 2009, as taxas de juros dos títulos europeus, o setor
financeiro no modelo keynesiano e a sequência de eventos durante a recente crise
financeira.

Organização
A Parte I (Capítulos 1 e 2) discute o tema da macroeconomia, o comportamento recente da
economia norte-americana nas últimas décadas e as questões de mensuração. A Parte II
(Capítulos 3-8) dá início a nossa comparação de modelos macroeconômicos. Começamos pelo
sistema clássico e seguimos para o modelo keynesiano. A Parte III aborda contestações ao
sistema keynesiano e refutações a esses questionamentos. O Capítulo 9 examina o monetarismo
e os temas da controvérsia entre monetaristas e keynesianos. O Capítulo 10 analisa visões
alternativas do trade-off desemprego-inflação e a teoria da taxa natural. O Capítulo 11 apresenta
a teoria novo-clássica com seus conceitos centrais de expectativas racionais e equilíbrio de
mercado. No Capítulo 12, são examinados dois rumos recentes na pesquisa macroeconômica.
Um, muito fortemente arraigado na tradição clássica, é a teoria dos ciclos reais de negócios. O
segundo, a economia novo-keynesiana, está, como o nome indica, firmemente apoiado na
tradição keynesiana. O Capítulo 13 resume e compara os diferentes modelos examinados nas
Partes II e III.
A Parte IV aborda a macroeconomia de economias abertas. O Capítulo 14 focaliza a
determinação das taxas de câmbio e o sistema monetário internacional. O Capítulo 15 usa o
modelo de Mundell-Fleming para examinar os efeitos de políticas monetárias e fiscais em
economias abertas.
A Parte V trata das políticas macroeconômicas. Os Capítulos 16 e 17 focalizam políticas
monetárias. O Capítulo 18 examina políticas fiscais.
A Parte VI estende o horizonte de tempo da análise para além do curto prazo. O Capítulo 19
aborda o crescimento em períodos de médio prazo de uma ou duas décadas. O Capítulo 20
examina o crescimento de equilíbrio a longo prazo.
Sumário
PARTE I - INTRODUÇÃO E MENSURAÇÃO
Capítulo 1 - Introdução
Capítulo 2 - Mensuração de variáveis macroeconômicas

PARTE II - A ECONOMIA CLÁSSICA E A REVOLUÇÃO KEYNESIANA


Capítulo 3 - Macroeconomia clássica (I): produto e emprego
Capítulo 4 - Macroeconomia clássica (II): moeda, preços e juros
Capítulo 5 - O sistema keynesiano (I): o papel da demanda agregada
Capítulo 6 - O sistema keynesiano (II): moeda, juros e renda
Capítulo 7 - O sistema keynesiano (III): efeitos de políticas econômicas no modelo IS-LM
Capítulo 8 - O sistema keynesiano (IV): oferta e demanda agregadas

PARTE III - A TEORIA MACROECONÔMICA DEPOIS DE KEYNES


Capítulo 9 - A contrarrevolução monetarista
Capítulo 10 - Produto, inflação e desemprego: visões alternativas
Capítulo 11 - A economia novo-clássica
Capítulo 12 - Os ciclos reais de negócios e a economia novo-keynesiana
Capítulo 13 - Modelos macroeconômicos: um resumo

PARTE IV - MACROECONOMIA EM ECONOMIA ABERTA


Capítulo 14 - Taxas de câmbio e o sistema monetário internacional
Capítulo 15 - Políticas monetária e fiscal em economia aberta

PARTE V - POLÍTICAS ECONÔMICAS


Capítulo 16 - Moeda, o sistema bancário e taxas de juros
Capítulo 17 - Política monetária ótima
Capítulo 18 - Política fiscal

PARTE VI - CRESCIMENTO ECONÔMICO


Capítulo 19 - Políticas para o crescimento de médio prazo
Capítulo 20 - Crescimento econômico de longo prazo: origens da riqueza das nações

GLOSSÁRIO
PARTE I

Introdução e Mensuração

A Parte I discute o tema da macroeconomia, o comportamento da economia e a mensuração de


variáveis macroeconômicas. O Capítulo 1 define macroeconomia e mostra as tendências
macroeconômicas nos Estados Unidos desde a Segunda Guerra Mundial, apresentando algumas
questões centrais. O Capítulo 2 trata da mensuração e define os principais agregados
macroeconômicos. Um ponto central nessa tarefa é o exame das contas nacionais americanas.
CAPÍTULO 1
Introdução

1.1 O que é macroeconomia?


Este livro examina o ramo da economia chamado macroeconomia. O economista britânico
Alfred Marshall definiu economia como “o estudo do homem nos negócios comuns da vida; ela
examina a parte da ação individual e social que está mais estreitamente ligada à obtenção e ao
uso dos requisitos materiais do bem-estar”.1 Em macroeconomia, estudamos esses “negócios
comuns da vida” de forma agregada. Observamos o comportamento da economia como um todo.
Entre as variáveis-chave que estudamos estão o produto total da economia, o nível agregado de
preços, emprego e desemprego, taxas de juros, taxas salariais e taxas de câmbio. O tema da
macroeconomia inclui fatores que determinam tanto os níveis dessas variáveis como suas
mudanças ao longo do tempo: a taxa de crescimento do produto, a taxa de inflação, as mudanças
na taxa de desemprego em períodos de expansão e recessão e a apreciação ou depreciação das
taxas de câmbio.
A macroeconomia é orientada para políticas públicas. Ela questiona: em que grau as políticas
governamentais podem afetar o produto e o emprego? Em que grau a inflação é resultado de
políticas governamentais malsucedidas? Quais políticas do governo são ótimas no sentido de
obter o comportamento mais desejável de variáveis agregadas, como o nível de desemprego ou a
taxa de inflação? A política governamental deve tentar atingir metas para as taxas de câmbio?
Por exemplo, poderíamos perguntar em que grau as políticas econômicas do governo podem
ser responsabilizadas pelo desemprego em massa durante a Grande Depressão da década de
1930 ou pelas taxas simultaneamente altas de desemprego e inflação da década de 1970. Qual o
papel do governo no declínio da inflação e no aumento do desemprego? Em que grau as
políticas governamentais foram responsáveis pelo forte declínio da taxa média de inflação nos
Estados Unidos e em outros países industrializados que ocorreu nas duas últimas décadas? Qual
foi a eficácia dos programas de estímulo implantados após a crise financeira de 2007-09?
Os economistas divergem quanto a questões de políticas públicas. Em parte, a controvérsia
nesse tema deriva de diferentes visões a respeito dos fatores que determinam as variáveis-chave
mencionadas anteriormente. Questões de teoria e políticas estão inter-relacionadas. Nossa
análise examina diferentes teorias macroeconômicas e as conclusões de políticas decorrentes
delas. Seria mais satisfatório apresentar a teoria macroeconômica e prescrição de política
pública. Poderia ser satisfatório, mas tal apresentação seria enganosa, porque existem diferenças
fundamentais entre as várias escolas da macroeconomia. Ao comparar as diferentes teorias,
porém, vemos que há áreas importantes de concordância tanto quanto de discordância.
Controvérsia não significa caos. Nossa abordagem é identificar as questões-chave que dividem
os macroeconomistas e explicar a base teórica de cada posição.
Analisamos a ortodoxia macroeconômica como ela existia no início da década de 1970, que
recebe o nome de economia keynesiana. Explicamos as raízes da teoria keynesiana como um
ataque a uma ortodoxia anterior, a economia clássica. Examinamos, então, os questionamentos à
posição keynesiana, teorias que vieram a ser chamadas de monetarismo e economia novo-
clássica. Por fim, consideramos duas teorias recentes. Uma delas, fortemente arraigada na
tradição clássica, é a teoria dos ciclos reais de negócios. A outra, a teoria novo-keynesiana,
segue, como seu nome indica, a tradição keynesiana. O modo como cada teoria explica os
eventos desde a década de 1970 até o presente, bem como as políticas propostas por cada grupo
de economistas para possibilitar um melhor desempenho econômico futuro, são preocupações
centrais de nossa análise.

1.2 O desempenho econômico americano após a Segunda Guerra


Mundial
Nossas tarefas, aqui, são traçar o quadro amplo do desempenho macroeconômico americano
durante o período seguinte à Segunda Guerra Mundial e sugerir algumas questões centrais que
serão analisadas posteriormente.

1.2.1 Produção
A Figura 1.1 mostra a taxa de crescimento do produto nos Estados Unidos nos anos de 1953 a
2006. A medida do produto na figura é o produto interno bruto (PIB) real. O produto interno
bruto mede a produção atual de bens e serviços; real significa que as medidas na Figura 1.1
foram corrigidas pela variação de preços. Os dados medem o crescimento na quantidade de bens
e serviços produzidos.

Produto interno bruto (PIB)


Medida de todos os bens e serviços finais atualmente
produzidos.

Os dados na figura mostram uma variação considerável no crescimento do PIB ao longo das
últimas cinco décadas. Durante a década de 1960, houve um crescimento constante e
relativamente alto do PIB. Em todas as outras décadas, houve anos de crescimento negativo; o
PIB declinou em pelo menos 1 ano. Ainda assim, pode-se dizer que o período de meados da
década de 1980 até 2007 foi de relativa estabilidade. Note-se que, nesse período de mais de 20
anos, houve apenas um ano em que o PIB declinou. De maneira geral, ao longo desse período,
os movimentos ano a ano do PIB foram moderados. Isso levou os economistas a chamar esse
período de “a grande moderação”. Parecia que o ciclo de negócios havia se tornado menos
pronunciado. Assim, a queda abrupta do PIB quando a economia entrou na recessão severa de
2007-09 pegou muitos de surpresa.

FIG 1.1 Variação percentual anual do PIB real nos Estados Unidos, 1953-2010
Tabela 1.1 - Crescimento do PIB real nos Estados Unidos, variação percentual média em
períodos selecionados

Anos Porcentagem
1953-69 3,8
1970-81 2,7
1982-95 3,0
1996-2006 3,2
2007-2011 1,0

A Tabela 1.1 resume as tendências de crescimento nos últimos cinquenta anos. A tabela
indica um declínio de cerca de 1 ponto percentual na taxa de crescimento do PIB no período
pós-1970. Houve alguns sinais de reversão modesta dessa desaceleração do crescimento a partir
de meados da década de 1990. O crescimento no período de 2007-2011 é baixo devido à
recessão que começou no final de 2007 e ao ritmo lento da recuperação na parte final do
período.

1.2.2 Desemprego
A Figura 1.2 mostra a taxa de desemprego nos Estados Unidos para cada ano desde 1953. A
taxa de desemprego é a porcentagem da força de trabalho que não está empregada.

Taxa de desemprego
Número de pessoas desempregadas expresso como
porcentagem da força de trabalho.

O crescimento mais lento do produto no período pós-1970 reflete-se no desemprego crescente


durante esses anos, como também pode ser observado na Tabela 1.2, que mostra as taxas de
desemprego médias para períodos selecionados. No final da década de 1990, pareceu haver uma
reversão dessa tendência, com a taxa de desemprego caindo para pouco menos de 4%, o nível
mais baixo em 30 anos. Depois, quando o ritmo de crescimento do produto caiu após 2000, a
taxa de desemprego subiu para quase 6%. Embora essa taxa não seja especialmente alta pelos
padrões de recessões anteriores, o desemprego permaneceu alto mesmo com a retomada do
crescimento do produto depois de 2002, levando a que se falasse em uma “recuperação sem
empregos”. O desemprego teve um aumento acentuado durante a mais recente recessão a partir
de 2007 e permanecia muito alto mesmo mais de dois anos após o início da recuperação.

FIG 1.2 Taxa de desemprego nos Estados Unidos, 1953-2010.

Tabela 1.2 - Taxa de desemprego nos Estados Unidos, médias para períodos selecionados.

Anos Porcentagem
1953-69 4,8
1970-81 6,4
1982-95 6,9
1996-2006 5,0
2007-2011 7,7

1.2.3 Inflação
A Figura 1.3 mostra a taxa de inflação para 1953-2010. Para calcular a taxa de inflação,
usamos um índice de preços que mede o nível de preços agregado (ou geral) relativo a um ano
base. A taxa de inflação é então calculada como a taxa percentual de variação no índice de
preços em um período determinado. Na Figura 1-3, a taxa de inflação é medida pelo índice de
preços ao consumidor (IPC); outros índices de preços serão examinados no próximo capítulo.
O IPC mede os preços de varejo de uma “cesta de mercado” fixa de milhares de bens e serviços
comprados pelas famílias.

Inflação
Elevação no nível geral de preços.

Índice de preços
Medida do nível de preços agregado relativo a um
ano-base escolhido.

Índice de preços ao consumidor (IPC)


Medida dos preços de varejo de uma “cesta de
mercado” fixa de milhares de bens e serviços
comprados pelas famílias.

Pode-se ver na figura e na Tabela 1.3 que a taxa de inflação nos Estados Unidos foi baixa e
relativamente estável na década de 1950 e início da década de 1960. No final dos anos 1960,
observa-se uma tendência de crescimento da inflação. Essa tendência ascendente continuou e
intensificou-se na década de 1970. No início dos anos 1980, houve um período de desinflação, o
que significa um declínio na taxa de inflação. A taxa de inflação permaneceu razoavelmente
baixa durante toda essa década. Houve um pico na taxa de inflação em 1990, em parte devido ao
aumento acentuado nos preços dos combustíveis após a invasão do Kuwait, país rico em
petróleo, pelo Iraque. Isso foi revertido no início de 1991, quando os preços dos combustíveis
caíram depois da vitória dos aliados na Guerra do Golfo. A inflação, então, permaneceu baixa,
no resto do período.
Um novo elemento ao considerar o comportamento do IPC ou de outros índices é sugerido
pela queda abaixo de zero na taxa de inflação em 2009, conforme observado na Figura 1.3. A
preocupação relacionada ao nível de preços durante o período após a Segunda Guerra Mundial
sempre havia sido de que os preços subissem depressa demais e que a inflação fosse muito alta.
Na última década, a deflação, um declínio no nível de preços, tornou-se uma preocupação pela
primeira vez desde a Grande Depressão da década de 1930. A meta de política econômica é a
estabilidade de preços. Por razões que examinaremos, nem inflação alta nem deflação são
desejáveis.

FIG 1.3 Taxa de inflação nos Estados Unidos, 1953-2010.


Tabela 1.3 - Taxa de inflação nos Estados Unidos, médias para períodos selecionados.

Anos Porcentagem
1953-1960 1,4
1961-1969 2,6
1970-1981 8,0
1982-1995 3,8
1996-2006 2,6
2007-2010 2,1

1.2.4 Inflação e desemprego


A Figura 1.4 mostra a taxa de desemprego anual para 1953-2006 junto com a taxa de inflação
anual nesse mesmo período. Note-se que, na porção inicial do período, até o final da década de
1960, houve uma relação negativa entre a taxa de inflação e a taxa de desemprego; anos de
inflação relativamente alta são anos de desemprego relativamente baixo. No período a partir de
1970, não há evidência de nenhuma relação simples. Em partes da década de 1970 – por
exemplo, 1973-75 –, tanto a taxa de desemprego como a taxa de inflação subiram de forma
acentuada. No início da década de 1980, a relação negativa pareceu retornar, com um forte
aumento do desemprego e queda da inflação. Mais tarde nessa década, a taxa de inflação
continuou baixa, enquanto a taxa de desemprego registrou um declínio contínuo. Entre 1990 e
1991, a taxa de desemprego subiu e a taxa de inflação caiu, mas o comportamento da taxa de
inflação parece ter sido resultado de fatores associados à Guerra do Golfo e não a qualquer
relação subjacente desemprego-inflação. De 1992 a 1999, tanto a taxa de desemprego como a de
inflação baixaram. A partir de 2001, a taxa de desemprego aumentou e a taxa de inflação caiu.
Ambas as séries inverteram seu curso em 2003, uma vez mais movendo-se em direções opostas.
Durante a recessão de 2007-09, o desemprego subiu acentuadamente, enquanto a inflação caiu.

FIG 1.4 Taxas de desemprego e inflação nos Estados Unidos, 1953-2010.


Essas mudanças na relação entre a taxa de inflação e a taxa de desemprego podem ser
observadas na Figura 1.5. Nas partes a e b do gráfico, a taxa de inflação é medida no eixo
vertical e a taxa de desemprego no eixo horizontal. A parte a refere-se aos anos 1953-69 e a
relação negativa entre as duas variáveis é evidente. A parte b refere-se a 1970-2010 e, nesses
anos, não há uma relação aparente entre inflação e desemprego.

FIG 1.5a Relação entre inflação e desemprego, 1953-1969


FIG 1.5b Relação entre inflação e desemprego, 1970-2010

1.2.5 O orçamento federal americano e os déficits da balança


comercial
Como foi comentado, o período de meados da década de 1980 a 2007 foi chamado de grande
moderação, devido à estabilidade relativa do crescimento do produto durante esses anos. A
inflação também foi moderada. Durante boa parte desse período, porém, houve preocupação
com dois desequilíbrios estruturais: os altos déficits do orçamento federal e um aumento
vertiginoso do déficit da balança comercial. Essas preocupações aumentaram quando a
economia caiu em uma profunda recessão em 2007-08.
A Figura 1.6 mostra em um gráfico o déficit do orçamento federal nos anos de 1953-2010.
Nas décadas de 1950 e 1960, os déficits orçamentários foram pequenos e, por vezes, o
orçamento esteve até superavitário. Os déficits do orçamento foram um pouco maiores na
década de 1970, particularmente durante períodos de recessão. Foi nos anos 1980 e início de
1990 que começaram a surgir déficits muito grandes. Por exemplo, os déficits de 1985-86 e
1990-91 totalizaram cada um aproximadamente 5% do PIB, um nível não registrado desde a
Segunda Guerra Mundial. Depois, a partir de 1993, uma combinação de cortes dos gastos
governamentais e aumentos de impostos começou a reduzir o déficit e, em 1998, o orçamento
voltou a registrar superávit. No início do novo século, porém, o orçamento moveu-se novamente
para uma situação deficitária, com déficits similares em magnitude aos das décadas de 1980 e
1990.

Déficit do orçamento federal


Receitas tributárias menos dispêndios do governo
federal.

A recessão profunda de 2007-2009 e os programas de incentivo para reverter a contração


fizeram o déficit crescer a níveis sem precedentes para tempos de paz em magnitude absoluta
(como é mostrado na Figura 1.6) e como porcentagem do PIB. Entre 2007 e 2010, as receitas
tributárias caíram de 18,9% para 16,7% do PIB. Os gastos do governo federal subiram de 20,6%
para 25,5% do PIB.

FIG 1.6 Déficit do orçamento federal americano, 1953-2010.

A Figura 1.7 mostra o déficit da balança comercial americano nos anos desde 1953. O
déficit comercial é o excesso de importações em relação às exportações. Os Estados Unidos
começaram a registrar déficits comerciais no final da década de 1970, mas, como no caso dos
déficits do orçamento federal, foi na década de 1980 que o déficit comercial se expandiu
enormemente, subindo a mais de US$ 150 bilhões em 1988. O déficit então recuou por alguns
anos, mas começou a subir novamente em meados da década de 1990, ultrapassando US$ 260
bilhões em 1999, subindo a mais de US$ 500 bilhões em 2003 e a mais de US$ 700 bilhões em
2005.

Déficit da balança comercial


Excesso de importações em relação às exportações.

A recessão recente fez o déficit da balança comercial cair, uma vez que o crescimento das
importações teve uma desaceleração maior que o crescimento das exportações. Ainda assim, o
déficit permanecia em níveis historicamente altos em 2011.

FIG 1.7 Balança de bens e serviços americana, 1953-2010

1.3 Questões centrais em macroeconomia


Os dados das tabelas e figuras nas páginas anteriores sugerem algumas questões
macroeconômicas importantes.

1.3.1 Instabilidade do produto


Na década de 1970 e início dos anos 1980, o produto, o emprego e a inflação tornaram-se
significativamente mais instáveis, depois de um período de expansão consistente na década de
1960. Nos anos desde o final da década de 1980, a estabilidade do produto e do emprego
aumentou.
No período de 1970 a 1984, houve quatro recessões, épocas em que ocorreu uma queda
persistente no produto e no emprego. Duas dessas recessões foram sérias. Nos anos de 1985 a
2007, houve apenas duas recessões e nenhuma delas foi grave. A estabilidade aparentemente
aumentada do produto durante o período de meados da década de 1980 a 2007 foi chamada de
“grande moderação”. Veio, então, a grave recessão de 2007-09, que foi chamada por alguns de
“a grande recessão”.
Questão 1: O que determina o comportamento cíclico do produto e do emprego? O que causa
recessões?
A resposta a essa questão requer uma teoria do comportamento do produto e do emprego em
períodos de 1 a 4 anos: uma teoria do comportamento cíclico do produto e do emprego.

1.3.2 Movimentos da taxa de inflação


Em nosso panorama da economia americana, vimos que houve variações significativas na
taxa de inflação ao longo do tempo. A década de 1970 foi o período da “grande inflação em
tempos de paz”. Tanto antes como depois desse período, a taxa de inflação foi bem mais baixa.
Questão 2: Quais são os determinantes da taxa de inflação? Que papel as políticas
macroeconômicas desempenham na determinação da inflação?

1.3.3 A relação produto-inflação


Questão 3: Que relação existe entre inflação e desemprego? Por que tanto a taxa de
desemprego como a taxa de inflação foram tão altas durante boa parte da década de 1970 nos
Estados Unidos? O que houve com a relação negativa que existia entre essas duas variáveis nas
décadas de 1950 e 1960 (ver Figura 1.5a)?
A presença de altas taxas de inflação e altas taxas de desemprego durante a década de 1970
foi especialmente intrigante para os macroeconomistas. A experiência das décadas de 1950 e
1960 tinha levado os economistas a explicar uma inflação elevada como sintoma de um nível
alto demais de demanda total pelo produto. Um desemprego substancial foi considerado
resultado de demanda inadequada. Essa explicação é coerente com a relação negativa entre
inflação e desemprego no período de 1953-69, como mostra a Figura 1-5a. Quando a demanda
era alta, a inflação era alta e o desemprego era baixo; quando a demanda era baixa, a inflação era
baixa, mas o desemprego era alto. Mas essa linha de raciocínio não pode explicar taxas
simultaneamente altas de desemprego e inflação. A demanda total por produto não pode ser ao
mesmo tempo muito alta e muito baixa.
Os acontecimentos da década de 1970 levaram os economistas a reconsiderar e modificar
teorias anteriores de inflação e desemprego, como vemos na análise a seguir. Uma parte
importante dessa reconsideração de teorias existentes refere-se ao papel da demanda total por
bens e serviços, chamada demanda agregada, na determinação do produto, emprego e inflação.

Demanda agregada
Soma das demandas pelos bens e serviços atuais em
cada setor comprador da economia: famílias,
empresas, governo e compradores estrangeiros de
exportações.

Questões adicionais sobre a relação entre inflação e desemprego foram suscitadas pelo
comportamento das duas variáveis em meados e final da década de 1990. Quando o desemprego
caiu a níveis baixos, muitos economistas esperaram um aumento da inflação. Em vez disso, a
inflação permaneceu baixa. Por quê?
No geral, a relação entre desemprego e inflação foi muito mais complexa no período pós-
1970 do que em anos anteriores. As teorias macroeconômicas que examinaremos tentam
explicar as razões.

1.3.4 Desaceleração do crescimento e reversão?


O que explica o declínio na taxa de crescimento do produto, conforme medida pelo PIB, nos
anos depois de 1970? Como vimos na Tabela 1-1, o produto cresceu a uma taxa anual média de
3,8% no período de 1953-69, em comparação com 2,7% em 1970-1981 e 3,0% em 1982-95.
Acompanhando a queda no crescimento do produto, houve declínios no crescimento da
produtividade da mão de obra e dos salários reais. Em meados da década de 1990, muitos
americanos, especialmente os jovens, reclamavam da escassez de bons empregos.
Durante boa parte do período, houve também a questão da escassez de empregos per se. Isso
certamente foi significativo depois da recessão profunda de 2007-2009. No final de 2011, a taxa
de desemprego era de 9,0%. O desemprego entre os adolescentes (16-19 anos) era de 24%.
Nos Estados Unidos, durante a década de 1990, houve sinais de que a desaceleração do
crescimento havia sido revertida. Uma leve recessão em 2001 foi um solavanco no que parecia
ser uma estrada para um crescimento maior do produto e da produtividade do trabalho. Aqui,
novamente, a queda cíclica da economia a partir do final de 2007 fez com que ficasse difícil
discernir tendências de longo prazo.
Questão 4: O que determina a taxa de crescimento do produto em períodos de uma ou duas
décadas? E em períodos mais longos como um século?
Pode-se fazer essa pergunta para um país ao longo do tempo ou em comparação com outros
países. Por que alguns países crescem muito rapidamente e outros mais lentamente?

1.3.4.1 Implicações de déficits e superávits


Quando o déficit do orçamento federal americano subiu rapidamente nos anos 1980, os
observadores fizeram especulações sobre seus efeitos. O Financial Times indagou se a economia
estaria se encaminhando para um “encontro com o desastre”. Outros acreditavam que o déficit
representava problemas de uma ordem mais sutil e de longo prazo, mais como “cupins no
porão” do que como “o lobo à porta”. Quando o orçamento se tornou superavitário no final da
década de 1990, o problema se desfez. Na verdade, houve até preocupação com os enormes
superávits projetados, que implicavam que a dívida interna seria encerrada completamente até
2012. A preocupação foi injustificada.
Hoje, há uma vez mais preocupação com grandes déficits atuais e projetados para o futuro. Se
a dívida do país vai aumentar, como serão financiados os compromissos do governo com as
aposentadorias da geração baby boom, em termos de benefícios da Seguridade Social e planos
de saúde? Os empréstimos tomados pelo governo para financiar os déficits elevarão as taxas de
juros e retardarão os investimentos e o crescimento? Haverá uma crise da dívida como a
enfrentada por alguns países europeus?
O rápido aumento do déficit da balança comercial americana também foi motivo de
preocupação. Os Estados Unidos tomam empréstimos externos para financiar esse déficit.
Assim, déficits persistentes refletiram-se em um crescimento da dívida externa americana.
Muitos preocupam-se com os efeitos dos déficits e da dívida sobre a estabilidade futura do dólar
e dos mercados de ativos dos Estados Unidos.
Em 2006, o déficit da balança comercial havia crescido para 6% do PIB. As dúvidas sobre a
sustentabilidade de déficits nessa faixa eram gerais. Então, o declínio da economia reduziu o
crescimento das importações em ritmo mais rápido que o crescimento das exportações e o déficit
da balança comercial caiu para a metade, antes de reverter a tendência e começar a subir outra
vez em 2010.

Conclusão
Não são poucas as perguntas. Os capítulos a seguir apresentam teorias que tentam explicar os
dados discutidos aqui e oferecer respostas para as questões que levantamos. Antes de examinar
essas teorias, no Capítulo 2 estudamos a mensuração das principais variáveis macroeconômicas
de interesse.

Questões de revisão
1. Cite algumas das variáveis importantes que constituem o campo da macroeconomia. Como a
macroeconomia difere da microeconomia, o outro grande ramo da teoria econômica?
2. Resuma o comportamento das taxas de inflação e desemprego nos Estados Unidos desde
1990. Os movimentos dessas taxas nesse período são mais parecidos com os da década de
1960 ou com os de 1950 e 1960?
3. Houve várias mudanças na relação produto-inflação ao longo do período de 1953-2002.
Explique a natureza dessas mudanças.
4. Usando o Economic Report of the President ou outras fontes para os anos mais recentes,
atualize os dados das Tabelas 1.1 a 1.3.
5. Resuma o comportamento dos déficits do orçamento federal americano e os déficits da
balança comercial dos Estados Unidos desde 1953. Esse comportamento sugere uma relação
entre os dois déficits? Talvez em alguns momentos e não em outros?
CAPÍTULO 2
Mensuração de variáveis macroeconômicas

O que eu quero agora são Fatos. Não ensine nada a esses rapazes e moças que não sejam
Fatos. Na vida, precisamos somente de Fatos. Não plante nada mais, e retire todo o resto. Só
é possível formar as mentes de seres que raciocinam com base em Fatos; nada mais que isso
lhes será de utilidade… Atenha-se aos Fatos, senhor!1

Em capítulos subsequentes, examinaremos modelos macroeconômicos. Esses modelos são


representações simplificadas da economia que tentam captar fatores importantes para a
determinação de variáveis agregadas como produto, emprego e nível de preços. Os elementos
desses modelos são relações teóricas entre variáveis econômicas agregadas, entre elas variáveis
de política macroeconômica. Para ajudar a entender essas relações, este capítulo começa
definindo os equivalentes no mundo real das variáveis de nossos modelos. Ele examina também
relações contábeis que existem entre essas variáveis, porque usamos essas relações para
construir nossos modelos. Começamos pela descrição das variáveis-chave que são medidas nas
contas nacionais.

2.1 As contas nacionais


Baseados em dados rudimentares como índices de ações, quantidade de fretes realizados e
indicadores incompletos de produção industrial, os relatos de alguns presidentes sobre as
políticas econômicas de combate à Grande Depressão dos anos 1930 chegam a espantar. O fato
é que, à época, não existiam medidas abrangentes do produto ou da renda nacional. A Depressão
enfatizou a necessidade de tais medidas e levou ao desenvolvimento de um conjunto abrangente
de contas nacionais.2
Como as contas de uma empresa, as contas nacionais têm dois lados: o do produto e o da
renda. O lado do produto mede produção e vendas. O lado da renda mede a distribuição do
resultado monetário das vendas.
No lado do produto há duas medidas amplamente utilizadas de produção geral: o produto
interno bruto (PIB), que vimos no Capítulo 1, e o produto nacional bruto (PNB). Eles diferem
em seu tratamento das transações internacionais. O PNB, ao contrário do PIB, inclui as rendas
dos residentes e das empresas domésticas auferidas no exterior. O PIB, por sua vez, inclui as
rendas de empresas ou residentes estrangeiros que atuam no país; o PNB exclui esses itens. Por
exemplo, os lucros auferidos no país por uma empresa de propriedade estrangeira seriam
incluídos no PIB, mas não no PNB.
Para países como os Estados Unidos, há pouca diferença entre essas duas medidas, porque
relativamente poucos residentes americanos trabalham no exterior e os ganhos de empresas
americanas no exterior são praticamente os mesmos que os ganhos de empresas estrangeiras nos
Estados Unidos. A diferença entre PIB e PNB é grande para países como o Paquistão, com um
grande número de residentes trabalhando no exterior, ou para o Canadá, onde há muito mais
investimentos estrangeiros no país do que investimentos canadenses no exterior. Em 1991, os
responsáveis pela contabilidade nacional americana deslocaram a ênfase do PNB para o PIB.
Nossa explicação do lado do produto das contas nacionais concentra-se, portanto, no PIB. O
conceito de PNB entrará na discussão posteriormente.
Do lado da renda das contas nacionais, a medida central é a renda nacional, mas outros
conceitos de renda relacionados também serão analisados.

2.2 Produto interno bruto


O produto interno bruto (PIB) é uma medida de todos os bens e serviços finais produzidos
em determinado período de tempo, avaliados a preços de mercado. Alguns aspectos dessa
definição requerem esclarecimento.

2.2.1 Produzidos em determinado período de tempo


O PIB inclui apenas os bens e serviços produzidos em determinado momento. É uma medida
do fluxo de produção por intervalo de tempo – por exemplo, por trimestre ou por ano – e inclui
apenas bens e serviços produzidos durante esse período. Transações de mercado como
transferências de casas, carros ou fábricas produzidos anteriormente não entram no PIB.
Operações com ativos financeiros, como ações e títulos, são exemplos de outras transações de
mercado que não envolvem diretamente a produção corrente de bens e serviços e, portanto, não
são incluídas no PIB.

2.2.2 Bens e serviços finais


Apenas a produção de bens e serviços finais entra no PIB. Bens usados para produzir outros
bens e não para serem vendidos aos compradores finais, os chamados bens intermediários, não
são contabilizados separadamente no PIB. Esses bens, contudo, aparecem no PIB na medida em
que contribuem para formar o valor dos bens finais de cuja produção participam. Contabilizá-los
separadamente seria contá-los duas vezes. Por exemplo, não seria adequado contabilizar o valor
da farinha usada para fazer pães separadamente e, depois, incluí-la novamente quando os pães
forem vendidos.
No entanto, dois tipos de bens usados no processo de produção são contabilizados no PIB. O
primeiro são os bens de capital produzidos no período corrente – compras de instalações e
equipamentos. Esses bens de capital acabam sendo usados no processo de produção, mas, dentro
do período específico, apenas uma parte do valor do bem de capital é consumida na produção.
Essa parte, denominada depreciação, pode ser considerada embutida no valor dos bens finais
que são vendidos. Não incluir os bens de capital separadamente no PIB seria equivalente a
pressupor que eles são totalmente depreciados no período de tempo considerado. No PIB, o
valor total do bem de capital é incluído como um item individual. Em certo sentido, isso é uma
contabilidade dupla, porque, como foi observado, o valor da depreciação é embutido no valor
dos bens finais. Mais adiante, subtrairemos a depreciação para construir uma medida do produto
líquido.
Bens de capital
Recursos de capital como fábricas e máquinas usados
para produzir outros bens.

Depreciação
Parte do estoque de capital que se desgasta a cada ano.

O outro tipo de bens intermediários que faz parte do PIB são os investimentos em estoques –
a variação líquida nos estoques de bens finais que aguardam para serem vendidos ou de
materiais usados no processo de produção. Os acréscimos aos estoques de bens finais pertencem
ao PIB porque são produção do período corrente. Esses acréscimos devem ser contabilizados no
período atual quando são acrescentados aos estoques para que o tempo do produto nacional seja
definido corretamente; não devem ser contabilizados mais tarde, quando são vendidos para os
compradores finais. Investimentos em estoques de matérias-primas pertencem similarmente ao
PIB porque também representam produção corrente cujo valor não está embutido nas vendas do
produto final realizadas no período. Note-se que o investimento em estoques pode ser negativo
ou positivo. Se as vendas finais excederem a produção, por exemplo, devido a uma diminuição
dos estoques (investimento negativo em estoques), o PIB será menor que o valor total das
vendas finais.

2.2.3 Avaliados a preços de mercado


O PIB é o valor de bens e serviços determinado pela régua comum dos preços de mercado.
Este é o truque que permite medir maçãs mais laranjas mais vagões, etc. Mas isso exclui do PIB
bens que não são vendidos em mercados, como os serviços de donas de casa ou a produção de
hortas caseiras, bem como a produção não declarada de atividades ilegais, como venda de
narcóticos, jogo e prostituição3. Além disso, por ser uma medida do valor da produção em
termos de preços de mercado, o PIB, que é essencialmente uma medida quantitativa, é sensível a
variações no nível médio de preços. A mesma produção física corresponderá a um nível de PIB
diferente conforme o nível médio dos preços de mercado varia. Para corrigir isso, além de
calcular o PIB em termos de preços de mercado vigentes, um conceito denominado PIB
nominal, os contadores da renda nacional também calculam o PIB real, que é o valor do produto
interno em termos de preços constantes. O modo de fazer este cálculo será explicado mais
adiante neste capítulo.
O PIB pode ser dividido nos componentes mostrados na Tabela 2.1. Os valores de cada
componente para anos selecionados também são mostrados na tabela.
O componente consumo do PIB consiste nas compras pelas famílias de bens e serviços
produzidos no período. O consumo pode ser dividido em bens de consumo duráveis (por ex.,
automóveis, televisores), bens de consumo não duráveis (por ex., alimentos, bebidas, roupas) e
serviços (por ex., serviços médicos, cabeleireiros). O consumo é o maior componente do PIB
dos Estados Unidos, compreendendo de 65% a 70% do PIB em anos recentes.

Consumo
Demanda das famílias por bens e serviços para uso
corrente.

Tabela 2.1 - PIB nominal e seus componentes, anos selecionados (bilhões de dólares)*

*A soma dos componentes pode não equivaler exatamente ao total devido ao erro de arredondamento.
Fonte: Bureau of Economic Analysis, Ministério do Comércio.

O componente investimento do PIB na Tabela 2.1 é constituído de três subcomponentes. O


maior deles é o investimento fixo das empresas. Esses investimentos consistem em compras de
instalações e equipamentos produzidos no período – os bens de capital discutidos acima. O
segundo subcomponente do investimento é o investimento em construção civil, a construção de
unidades residenciais para uma ou muitas famílias. O último subcomponente é o investimento
em estoques, que é a variação nos estoques das empresas. Como já foi mencionado, o
investimento em estoques pode ser positivo ou negativo. Em 2010, o investimento em estoques
nos Estados Unidos foi de US$ 71,7 bilhões, o que significa que houve esse montante de
aumento nos estoques durante o ano.

Investimento
Parte do PIB comprada pelo setor empresarial mais
construção civil.

Ao longo dos anos cobertos pela Tabela 2.1, o investimento foi um componente volátil do
PIB americano, tendo variado de 3,0% do PIB em 1933 para 18,4% do PIB em 1950. Em 2010,
o investimento foi de 12,5% do PIB, tendo caído de 14,8% em 2007 quando teve início uma
recessão. A volatilidade cíclica do investimento tem implicações para os modelos
macroeconômicos examinados adiante.
Os números na Tabela 2.1 são brutos e não líquidos, o que significa que não foi feito nenhum
ajuste para a depreciação. O investimento total na tabela é o investimento bruto, não o
investimento líquido (o investimento líquido equivale ao investimento bruto menos a
depreciação). Em 2010 nos Estados Unidos, por exemplo, a depreciação, também chamada
provisão para consumo de capital, foi de aproximadamente dois terços do investimento bruto4.
O componente seguinte do PIB na tabela são as compras governamentais de bens e
serviços. Esta é a parcela da produção corrente adquirida pelo setor público, que inclui os
governos federal, estaduais e municipais. Nem todos os gastos do governo são parte do PIB,
porque nem todos os gastos do governo representam uma demanda por bens e serviço de
produção no período. Pagamentos de transferências a indivíduos (por exemplo, pagamentos da
Previdência Social) e pagamentos de juros são exemplos de gastos não incluídos no PIB. A
tabela mostra que a participação do governo no PIB dos Estados Unidos cresceu no período após
a Segunda Guerra Mundial em comparação com o período pré-guerra. Em 1929, as compras
governamentais de bens e serviços eram 9,1% do produto total. Não é surpresa que, em 1945, o
componente governamental do produto, inchado pelo orçamento militar durante a Segunda
Guerra Mundial, tenha subido para 42%. No período pós-guerra, o setor público não retornou ao
seu tamanho anterior à guerra.

Compras governamentais
Bens e serviços que são parte do produto corrente e
vão para o setor governamental federal, estadual e
municipal.

As aquisições governamentais de bens e serviços foram de aproximadamente 20% do PIB em


1960, 1990 e 2010. As tendências do tamanho do orçamento do governo – tanto referentes às
compras de bens e serviços como a outros componentes não incluídos nas contas nacionais – são
analisadas em um capítulo posterior, quando tratarmos da política fiscal.
O último componente do PIB apresentado na Tabela 2.1 são as exportações líquidas, que
equivalem às exportações totais (brutas) menos as importações. As exportações brutas são os
bens e serviços de produção corrente vendidos a compradores estrangeiros. Elas são parte do
PIB. Importações são aquisições por compradores domésticos de bens e serviços produzidos no
exterior e não devem ser contabilizadas no PIB. No entanto, os bens e serviços importados estão
incluídos nos totais de consumo, investimentos e gastos do governo que entram no PIB.
Portanto, precisamos subtrair o valor das importações para chegar ao valor total dos bens e
serviços produzidos internamente. As exportações líquidas permanecem como o efeito direto
(líquido) de transações do setor externo sobre o PIB. Como a tabela mostra, as exportações
líquidas dos Estados Unidos foram fortemente negativas em 2007, refletindo o grande déficit da
balança comercial do país. As exportações líquidas ainda eram negativas, mas de magnitude
menor, em 2010; o déficit da balança comercial havia caído durante a recessão.

2.3 Renda nacional


Voltamo-nos agora para o lado da renda das contas nacionais. Para calcular a renda nacional,
nosso ponto de partida é o PNB total, não o PIB. A razão é que, como explicado acima, o PNB
inclui a renda auferida no exterior por residentes e firmas domésticos, mas exclui da produção
doméstica as rendas de residentes e firmas estrangeiras. Este é o ponto de partida adequado
porque queremos uma medida da renda de residentes e firmas do país.
Para passar do PIB ao PNB, somamos as rendas no exterior de residentes e firmas
domésticas. Subtraímos, então, as rendas no país de residentes e firmas estrangeiros. Esse
cálculo resulta em um PNB de US$ 14.848,7 bilhões para os Estados Unidos, em comparação
com um PIB de US$ 14.660,4 bilhões. Como foi observado antes, há pouca diferença entre essas
duas medidas de produção para os Estados Unidos.
A renda nacional é a soma das rendas dos fatores da produção de bens e serviços no período.
Essas rendas são os ganhos dos fatores de produção: terra, trabalho e capital. Cada unidade
monetária do PNB é uma unidade monetária de vendas finais e, se não houvesse outros encargos
sobre o PNB além da renda dos fatores, o PNB e a renda nacional seriam iguais. Há, de fato,
alguns outros encargos sobre o PNB que fazem a renda nacional e o PNB divergirem, mas os
dois conceitos permanecem estreitamente relacionados. Os ajustes necessários para passar do
PNB à renda nacional, com números de 2010, são mostrados na Tabela 2.2.

Renda nacional
Soma das rendas de todos os fatores de produção
originadas da produção corrente.

Exportações líquidas
Exportações totais (brutas) menos importações.

PERSPECTIVAS 2.1 - O QUE O PIB NÃO É


O PIB é a medida mais abrangente da atividade econômica de uma nação. Os formuladores de políticas usam números do
PIB para monitorar flutuações de curto prazo na atividade econômica e tendências de longo prazo da economia. É útil,
porém, reconhecer algumas limitações importantes do conceito de PIB.

AS ATIVIDADES PRODUTIVAS EXTERNAS


AO MERCADO SÃO EXCLUÍDAS

Como os bens e serviços são avaliados a preços de mercado no PIB, a produção fora dos
mercados é excluída (por exemplo, os serviços das donas de casa). Comparações do PIB
entre países superestimam as diferenças de produção entre países altamente
industrializados e nações menos desenvolvidas, onde a produção extramercado, em grande
medida agrícola, é de maior importância.
A ECONOMIA SUBTERRÂNEA É EXCLUÍDA
Também são excluídas do PIB atividades econômicas ilegais e atividades legais que não são declaradas para fugir dos
impostos – a economia subterrânea. Jogo e tráfico de drogas são exemplos do primeiro tipo. As atividades não declaradas
para evitar os impostos assumem muitas formas; por exemplo, pessoas que fazem serviços de consertos e recebem seu
pagamento em dinheiro podem declarar um valor menor ou nem declarar essa renda. É difícil estimar o tamanho da
economia subterrânea por razões óbvias. Estimativas aproximadas para os Estados Unidos variam de 5% a 15% do PIB.

O PIB NÃO É UMA MEDIDA DE BEM-ESTAR


O PIB mede a produção de bens e serviços; ele não é uma medida de bem-estar ou mesmo de conforto material. Para
começar, o PIB não leva em conta o lazer. Se todos começássemos a trabalhar 60 horas por semana, o PIB aumentaria,
mas nós estaríamos melhor?
O PIB também não subtrai alguns custos de bem-estar da produção. Por exemplo, se a produção de eletricidade causa
chuva ácida e, em consequência, poluição da água e morte de florestas, nós contabilizamos a produção de eletricidade no
PIB, mas não subtraímos a perda econômica derivada da poluição. Na verdade, se o governo gasta dinheiro para tentar
limpar a poluição, isso entra como um acréscimo no PIB também! O PIB é uma medida útil do nível geral da atividade
econômica, não do bem-estar.
PIB E FELICIDADE
Se o PIB não é uma medida de bem-estar, não se esperaria que pudesse ser uma medida de felicidade. Em anos recentes,
porém, houve muito interesse na relação, ou falta de relação, entre PIB e felicidade. Pesquisas mostram que PIB e
felicidade, medida em termos de “satisfação com a vida”, têm pouca relação. As pessoas em Gana são mais satisfeitas com
sua vida que as pessoas nos Estados Unidos; as da Nigéria são mais satisfeitas que as da França. Embora essas pesquisas
possam não ser confiáveis, outras evidências também indicam pouca relação entre o PIB e várias medidas de felicidade.
Talvez a renda relativa em uma sociedade seja mais importante do que a renda absoluta. Alternativamente, pode ser
importante a renda relativa à renda passada. Em pesquisas feitas no início do século, as pessoas das ex-repúblicas
soviéticas estavam menos satisfeitas com a vida. Sua renda, em média, havia declinado.
No reino do Butão, nos Himalaias, o governo centrou o foco na felicidade nacional bruta (FNB) em vez do PIB. As
Nações Unidas oferecem índices de bem-estar social como alternativas a medidas padrão do PIB. Teríamos de nos desviar
muito para examinar essas alternativas, mas é bom ter em conta que felicidade é mais uma coisa que o PIB não é.

Tabela 2.2 - Relação entre o PNB e a renda nacional, 2010 (bilhões de dólares)

PNB 14.848,7
Menos: Depreciação 1.868,9
Produto nacional líquido 12.979,8
Menos: Impostos indiretos e outros 158,2
Renda nacional 12.821,6
Fonte: Bureau of Economic Analysis, Ministério do Comércio.

O primeiro encargo sobre o PNB que não está incluído na renda nacional é a depreciação. A
parte do estoque de capitais consumida precisa ser subtraída das vendas finais antes de calcular a
renda nacional; a depreciação representa um custo de produção, não uma renda de fator.
Fazendo essa subtração, obtemos o produto nacional líquido (PNL), as medidas de produção
líquidas mencionadas anteriormente. Desse total na Tabela 2.2, subtraímos uma discrepância
estatística que deriva de medições do lado da renda cuja soma não equivale às do lado do
produto e alguns outros pequenos ajustes.

Produto nacional líquido


PNB menos depreciação.

A Figura 2.1 mostra os componentes da renda nacional americana (pagamentos dos fatores)
como porcentagens do total para 1959 e 2006 (o ano anterior à recessão mais recente). Em 2006,
o trabalho, que inclui ordenados e salários mais os complementos (benefícios), representava
64% da renda nacional. Isso não é muito diferente da porcentagem em 1959. Hoje, no entanto,
uma parte maior da remuneração pelo trabalho é representada por benefícios e uma parte menor
por ordenados e salários, em comparação com 1959.
Os lucros empresariais estiveram entre 12% e 14% da renda nacional nos dois anos. Os
outros componentes principais da renda nacional são a renda dos proprietários, que é a renda de
empresas não constituídas em sociedade, a renda de aluguéis e a renda de juros. Por fim, uma
parte da renda nacional é paga em impostos como impostos de consumo e impostos sobre
importações.
FIG 2.1 Componentes da renda nacional dos Estados Unidos

Fonte: Survey of Corrent Business, Ministério do Comércio.

2.4 Renda pessoal e renda pessoal disponível


A renda nacional mede a renda obtida com a produção de bens e serviços em um determinado
período. Para alguns propósitos, porém, é útil ter uma medida da renda recebida por indivíduos,
independentemente da fonte. Por exemplo, os gastos de consumo das famílias são influenciados
pela renda. O conceito de renda relevante é toda a renda recebida por indivíduos. Além disso,
queremos uma medida da renda depois de deduzir os pagamentos de impostos pessoais. Nas
contas nacionais, a renda pessoal é a medida da renda recebida por indivíduos, incluindo todas
as fontes geradoras. Quando deduzimos da renda pessoal os pagamentos dos impostos pessoais,
obtemos a renda pessoal disponível (após dedução dos impostos).

Renda pessoal
Medida da renda recebida por indivíduos, incluindo
todas as fontes geradoras.

Para passar da renda nacional para a renda pessoal, subtraímos elementos da renda nacional
que não são recebidos por indivíduos e acrescentamos as rendas de indivíduos provenientes de
outras fontes que não a produção corrente de bens e serviços. Os detalhes dos ajustes necessários
não são fundamentais para o nosso enfoque. Resumidamente, eles são os seguintes. O primeiro
dos itens principais subtraídos da renda nacional na passagem para a renda pessoal são as partes
dos lucros empresariais nas contas nacionais que não são pagos como dividendos para
indivíduos. Essas partes incluem os pagamentos de impostos sobre os lucros e os lucros não
distribuídos (lucros acumulados). Também subtraem-se da renda nacional para calcular a renda
pessoal as contribuições feitas pelo empregador e pelo empregado à Previdência Social. Esses
impostos sobre a folha de pagamentos são incluídos no item “remuneração aos empregados” na
renda nacional, mas vão para o governo, não diretamente para os indivíduos.
Os itens acrescentados ao passar da renda nacional para a renda pessoal são pagamentos a
indivíduos que não decorrem da produção corrente de bens e serviços. O primeiro item são os
pagamentos de transferências. Estes são predominantemente transferências de dinheiro feitas
pelo governo, como pagamentos da Previdência Social, pensões para veteranos de guerra e
aposentadorias pagas a funcionários do governo federal. O outro item acrescentado na passagem
da renda nacional para a renda pessoal são pagamentos de juros pelo governo a indivíduos. Os
pagamentos de juros pelo governo são feitos sobre títulos previamente emitidos pelos governos
federal, estaduais e municipais. Com esses ajustes, podemos calcular a renda pessoal.
Subtraímos, então, os impostos pessoais para obter a renda pessoal disponível. Em 2010, a renda
pessoal disponível nos Estados Unidos era de US$ 11.374,7 bilhões.
A Tabela 2.3 mostra como os residentes dos Estados Unidos usaram sua renda disponível em
2010. A maior parte dela foi gasta com consumo, as compras de bens e serviços pelo setor das
famílias. Houve dois outros tipos de gastos. O primeiro foram juros pagos a empresas
(prestações de crédito e juros de cartão de crédito). O segundo, um componente muito pequeno
dos gastos pessoais, foram transferências para estrangeiros (por ex., presentes para parentes no
exterior). A poupança pessoal é a parte da renda pessoal disponível que não é gasta. Em 2010, a
poupança pessoal nos Estados Unidos foi de US$ 653,9 bilhões, ou 5,7% da renda pessoal
disponível. Essa foi uma taxa de poupança alta em comparação com o passado recente. A
recessão de 2007-09 havia sido caracterizada por uma queda nos preços dos ativos. A riqueza
das famílias foi reduzida e as famílias aumentaram a poupança para restaurar seu balanço
patrimonial.

Tabela 2.3 - Distribuição da renda pessoal disponível, 2010 (bilhões de dólares)

Renda pessoal disponível 11.374,7


Menos
Gastos com consumo pessoal 10.349,1
Juros pagos a empresas 198,9
Transferências pessoais a estrangeiros (líquido) 172,8
Poupança pessoal 653,9
Fonte: Bureau of Economic Analysis, Ministério do Comércio.

2.5 Algumas identidades contábeis da renda nacional


As interrelações entre PIB, renda nacional e renda pessoal formam a base para algumas
definições contábeis, ou identidades, usadas para construir os modelos macroeconômicos
examinados em capítulos posteriores. Ao derivar essas identidades, simplificamos a estrutura
contábil ignorando uma série de itens discutidos anteriormente.
As simplificações aplicadas são as seguintes:
1. O setor externo será omitido. Isso significa que excluímos o item “exportações líquidas” do
PIB (veja Tabela 2.1) e o item “transferências líquidas para o exterior” das despesas pessoais na
subdivisão da distribuição da renda pessoal (veja Tabela 2.3). O setor externo será reintroduzido
em nossos modelos mais adiante, quando examinarmos questões de macroeconomia
internacional. Ao excluir o setor externo, excluímos também os ganhos no exterior de residentes
e empresas domésticos, bem como os ganhos no país de residentes e empresas estrangeiros. O
PIB e o PNB são, assim, iguais. Os termos PIB e PNB são usados de forma intercambiável,
exceto quando reintroduzirmos o setor externo.
2. Impostos indiretos e as outras discrepâncias entre o PNB e a renda nacional são ignorados
(veja Tabela 2.2). Consideraremos que a renda nacional e o produto nacional sejam iguais. Os
termos renda nacional e produto nacional são usados de forma intercambiável ao longo deste
livro.
3. A depreciação é ignorada (exceto quando explicitamente indicado). Portanto, o produto
nacional bruto e líquido são idênticos.
4. Várias simplificações são feitas na relação entre renda nacional e renda pessoal disponível.
Pressupomos que todos os lucros empresariais sejam pagos como dividendos; não há lucros
acumulados ou pagamentos de impostos empresariais. Consideramos que todos os impostos,
incluindo contribuições à Previdência Social, incidam diretamente sobre as famílias. Em
consequência, podemos especificar a renda pessoal disponível como sendo a renda (ou produto)
nacional menos os pagamentos de impostos (Tx) mais as transferências governamentais (Tr),
que inclui os pagamentos de juros pelo governo. Considerando os impostos líquidos (T) iguais
aos pagamentos de impostos menos as transferências,

temos renda (pessoal) disponível YD igual à renda nacional (Y) menos os impostos líquidos:
YD ≡ Y – Tx + Tr ≡ Y - T
Com essas simplificações, temos as identidades contábeis a seguir. O PIB (Y) é definido
como

ou seja, como consumo (C) mais investimento realizado (Ir) mais compras governamentais de
bens e serviços (G)5. O subscrito (r) no termo do investimento é incluído porque queremos
distinguir entre esse investimento realizado total que aparece nas contas nacionais e o nível
desejado de gastos em investimentos.
Do lado da renda das contas nacionais, uma vez mais usando as simplificações 1 a 4 e
ignorando os juros pagos a empresas (na Tabela 2.3), temos a identidade

que afirma que, com as suposições simplificadoras que fizemos, toda a renda disponível, que
é igual à renda nacional (Y) menos os pagamentos de impostos líquidos (T ≡ pagamentos de
impostos menos transferências), vai para gastos com consumo ou poupança pessoal (S).
Podemos escrever (2.3) como
Y≡C+S+T
e, como Y é tanto a renda como o produto nacional, podemos combinar (2.2) e (2.3) e
escrever

C + Ir + G ≡ C + S + T
Essa identidade afirma que os gastos no PIB (C + Ir + C) são, por definição, iguais ao uso da
renda nacional (C + S + T).

PERSPECTIVAS 2.2 - CONTAS NACIONAIS DA INGLATERRA E PAÍS


DE GALES EM 1688
As contas nacionais oferecem um perfil da vida econômica de um país. Embora só depois da Segunda Guerra Mundial os
governos tenham passado a registrar sistematicamente essas contas, há estimativas de épocas anteriores. Estas são de
interesse para acompanhar as mudanças sofridas pelas economias.
As Tabelas 2.4 e 2.5 mostram o PNB e as contas nacionais para Inglaterra e País de Gales (combinados) em 1688, o ano
da Revolução Gloriosa. Eles foram compilados por Gregory King e mais de um século se passou antes que os registros
administrativos permitissem a repetição de cálculos desse tipo. Em termos de completude e consistência, os cálculos de
King permaneceram únicos até o século XXa.
A Tabela 2.4 mostra que, para a Inglaterra e País de Gales em 1688 em relação à economia americana de 2010, o consumo
representava uma fração muito maior do produto nacional total (90% versus 70%). Os investimentos e gastos
governamentais eram frações muito menores do produto. As importações e exportações representavam, cada uma, 10% do
PNB, um pouco menos que na maioria das economias modernas. Ainda assim, essa era uma economia “aberta” com um
comércio exterior significativo.
Os números na Tabela 2.5 para os componentes da renda nacional mostram que, na Inglaterra e País de Gales em 1688, os
ordenados e salários compreendiam uma fração muito menor e aluguéis, lucros e juros uma parcela muito maior em
relação à economia americana atual. Ordenados e salários eram 37% da renda nacional, em comparação com 64% atuais.
Aluguéis, lucros e juros eram quase três vezes maiores como fração da renda nacional na Inglaterra e País de Gales em
1688 que nos Estados Unidos hoje.
No geral, o quadro da Inglaterra e País de Gales em 1688 é o de uma economia agrícola. Estima-se que 70% a 80% da
população estivesse ocupada na agricultura. Mas era uma economia aberta e havia investimentos significativos. O quadro
não é de uma economia de subsistência. Estimativas de outras fontes sugerem que a renda per capita na época talvez fosse
um oitavo da renda per capita atual da Inglaterra e País de Gales.

Tabela 2.4 - PNB da Inglaterra e País de Gales, 1688 (milhões de libras)

Consumo 46,0
Investimentos 1,7
Compras governamentais 2,4
Exportações 5,1
Menos importações 4,4
PNB 50,8

Tabela 2.5 - Componentes da renda nacional de Inglaterra e País de Gales, 1688 (milhões
de libras)

Ordenados e salários 17,7


Aluguéis 13,0
Lucros e juros 14,7
Camponeses e indigentes 2,6
Renda nacional 48,0

a As estimativas nas tabelas são tiradas de DEANE, Phyllis; COLE W.A. British Economic Growth: 1688-1959. London:
Cambridge University Press, 1967. p. 2. As estimativas baseiam-se nos manuscritos e planilhas originais de King e em
outras fontes da época.
2.6 Medição das variações de preços: PIB real versus PIB nominal
Até aqui, os números que estivemos examinando referem-se ao PIB nominal, que mede bens
e serviços produzidos no período, avaliados aos preços de mercado vigentes. O PIB é o valor
dos bens e serviços produzidos no período medido a preços de mercado, portanto ele mudará
quando o nível de preços geral e o volume efetivo de produção mudarem. Para muitos fins,
precisamos de uma medida de produto que varie apenas com a quantidade de bens produzidos.
Essa medida estaria, por exemplo, mais estreitamente relacionada ao emprego.

PIB nominal
PIB medido em unidades monetárias correntes

A medida do PIB que muda apenas quando quantidades, não preços, mudam é chamada de
PIB real. O modo tradicional de construir o PIB real é medir o produto em termos de preços
constantes tendo como referência um ano base. Usando 2005, por exemplo, podemos calcular o
valor do PIB em 1960, 1980 ou 2010 em termos do nível de preços ou do valor da moeda em
2005. As variações no PIB medidas em unidades monetárias pelo valor de 2005 proporcionam,
então, uma medida das mudanças de quantidade entre esses anos. A mensuração do PIB real em
termos de preços relativos a um ano base tem, porém, vários inconvenientes, que iremos
discutir. Por causa disso, em 1995 o U.S. Bureau of Labor Statistics começou a construir uma
alternativa à medida do PIB real, chamado PIB real pelo índice de preços ponderado da cadeia
produtiva (chain-weighted). Examinaremos esses dois procedimentos separadamente.

2.6.1 PIB real em preços relativos a um ano-base


A coluna 1 da Tabela 2.6 mostra o PIB nominal para anos selecionados. A coluna 2 mostra o
valor do PIB real conforme medido em preços de 2005 para cada um desses anos. Em 2005, a
renda nominal e a renda real são iguais, porque os preços no ano-base são os preços vigentes
nesse ano. Em anos anteriores, quando os preços correntes eram mais baixos que os preços de
2005, o PIB real era mais alto que o nominal. Inversamente, nos anos depois de 2005, quando os
preços eram mais altos, o PIB nominal foi maior que o PIB real.
A Tabela 2.6 mostra que o PIB real com frequência comporta-se de maneira muito diferente
do PIB nominal. O PIB nominal muda sempre que a quantidade de bens produzidos se altera ou
quando o preço de mercado desses bens muda; o PIB real muda apenas quando a produção
muda. Portanto, em épocas de forte variação dos preços, os movimentos das duas medidas
divergem drasticamente. A tabela mostra, por exemplo, que, enquanto o PIB nominal dos
Estados Unidos subiu cerca de US$ 250 bilhões de 1973 a 1975, o PIB real declinou.
Novamente, entre 1979 e 1980, houve um rápido aumento no PIB nominal, mas uma queda no
PIB real. Em ambos os períodos, o PIB real declinou porque a produção de bens e serviços
diminuiu. Os preços, porém, subiram com rapidez suficiente nesses anos inflacionários para
fazer o PIB nominal aumentar.

Tabela 2.6 - PIB nominal, PIB real e deflator implícito do PIB, anos selecionados
Fonte: Bureau of Economic Analysis, Ministério do Comércio.

Agora, consideremos os números na coluna 3 da Tabela 2.6, que mostra a razão entre o PIB
nominal e o PIB real (PIB nominal ÷ PIB real), em que a razão é multiplicada por 100 (seguindo
o procedimento das contas nacionais). A razão entre o PIB nominal e o PIB real é uma medida
do valor da produção corrente em preços correntes (por ex., em 2010) em relação ao valor dos
mesmos bens e serviços em preços do ano base (2005). Como os mesmos bens e serviços
aparecem na parte superior e na parte inferior, a razão entre o PIB nominal e o PIB real é
simplesmente o quociente do nível de preços corrente dos bens e serviços em relação ao nível de
preços no ano base. Ele é uma medida do nível agregado (ou geral) de preços, que no capítulo
anterior chamamos de índice de preços. Esse índice dos preços de bens e serviços no PIB é
chamado de deflator implícito do PIB.

Índice de preços
Mede o nível agregado de preços em relação a um ano
base escolhido.

Deflator implícito do PIB


Índice dos preços de bens e serviços incluídos no
PIB.

Medimos variações no nível agregado de preços comparando os valores do deflator implícito


do PIB em diferentes anos. Primeiro, comparemos o deflator implícito de preços entre o ano
base, 2005, e 2010. No ano base, o PIB real e o PIB nominal são iguais e o deflator implícito de
preços tem um valor 100. Pela Tabela 2.6, vemos que, em 2010, o valor do deflator implícito do
PIB americano era 111. Isso significa que o PIB a preços vigentes em 2010 (PIB nominal) foi
11% mais alto que os mesmos bens e serviços avaliados a preços de 2005. O nível agregado de
preços, conforme medido pelo deflator do PIB, subiu 11% entre 2005 e 2010.
Podemos usar também o deflator implícito do PIB para medir variações de preços entre dois
anos diferentes do ano base. Entre 2009 e 2010, o deflator implícito do PIB subiu de 109,7 para
111. Conforme medido por esse índice, o aumento percentual do nível agregado de preços (a
taxa de inflação) entre 2009 e 2010 foi
[(111,0 – 109,7) ÷ 109,7] × 100 = 1,2%.
Antes de prosseguir, veremos por que o deflator do PIB recebeu esse nome. A razão entre o
PIB nominal e o PIB real é chamada de deflator porque podemos dividir o PIB nominal por essa
razão para corrigir o efeito da inflação sobre o PIB, ou seja, para deflacionar o PIB. Isso
acontece porque

O deflator do PIB é um índice de preços implícito no sentido de que primeiro construímos


uma medida de quantidade, o PIB real, depois comparamos o movimento do PIB em moeda
corrente e constante para calibrar as variações nos preços. Não medimos explicitamente o
movimento médio dos preços. Dois exemplos de índices de preços explícitos são examinados na
próxima seção.

2.6.2 PIB real pelo índice de preços ponderado da cadeia produtiva


(chain-weighted)
Dois problemas surgem quando o PIB real é medido usando preços de um ano base. Um
problema é que, toda vez que o ano base muda, os pesos dados a diferentes setores são alterados
e a história é reescrita. Quando, por exemplo, o ano base foi alterado de 2000 para 2005, as
recessões da década de 1970 assumiram um padrão ligeiramente diferente.
Um segundo e mais sério problema envolve variações em preços relativos e substituições
consequentes entre as categorias de produtos contidas no PIB. Por exemplo, nos anos desde
2005, o preço relativo de computadores pessoais vem caindo e isso levou a que os consumidores
deslocassem seus gastos para compras de computadores. Se, ao calcular o PIB real, usarmos os
preços mais altos de 2005 para ponderar o componente referente a computadores, os
computadores serão superestimados como componente do PIB.
Para lidar com esses problemas, o Bureau of Economic Analysis (BEA), a agência
governamental americana responsável pelas contas nacionais, introduziu, recentemente, uma
nova medida do PIB real baseada nos preços ponderados da cadeia produtiva. Em vez de usar os
preços de um ano base para definir os pesos, essa medida usa a média de preços em um
determinado ano e os preços do ano anterior. Assim, o PIB real em 2010 é calculado usando os
preços de 2009 e 2010 como pesos. Na prática, a base move-se para frente a cada ano para
eliminar o problema causado por substituições relativas induzidas pelo preço como as que
aconteceram no exemplo dos computadores.

2.7 O índice de preços ao consumidor e o índice de preços no


atacado
Como o deflator do PIB mede variações nos preços de todos os bens e serviços produzidos no
período, ele é a medida mais abrangente da taxa de variação de preços. Dois outros índices de
preços, porém, são amplamente registrados e têm seus usos e vantagens.
O índice de preços ao consumidor (IPC) mede os preços de varejo de uma “cesta de
mercado” fixa que inclui milhares de bens e serviços comprados pelas famílias. O IPC é um
índice de preços explícito no sentido de que mede diretamente movimentos ao longo do tempo
da média ponderada dos preços dos bens e serviços incluídos na cesta de mercado. O IPC é o
índice de preços mais relevante para os consumidores, porque mede os preços de bens e serviços
comprados diretamente por eles. Muitas pensões governamentais americanas, incluindo
benefícios da Previdência Social, e alguns reajustes salariais são indexados ao IPC, o que
significa que há provisões para aumentos automáticos atrelados a aumentos do IPC.

Índice de preços ao consumidor (IPC)


Mede os preços de varejo de uma “cesta de mercado”
fixa de milhares de bens e serviços comprados pelas
famílias.

Outro índice de preços amplamente usado é o índice de preços por atacado (IPA), que, no
caso do Brasil, em 2010, passou a ser chamado de índice de preços ao produtor amplo. Este
índice registra as variações de preços de produtos agropecuários e industriais nas transações
interempresariais, isto é, nos estágios de comercialização anteriores ao consumo final.6

Índice de preços no atacado (IPA)


Mede os preços no atacado de aproximadamente
3.000 itens.

Como itens vendidos no atacado incluem muitas matérias-primas e bens semiacabados, os


movimentos no IPA sinalizam movimentos futuros nos preços de varejo, como os que são
medidos no IPC. Tanto o IPC como o IPA têm a vantagem de estar disponíveis mensalmente,
enquanto o deflator implícito do PIB só está disponível em intervalos maiores (trimestralmente
nos Estados Unidos).
A Figura 2.2 mostra as taxas de inflação anuais americanas para o período 1967-2010,
medidas pelos três índices de preços que examinamos. Em termos dos movimentos amplos da
taxa de inflação, os três índices apresentam padrões similares. A aceleração da inflação nos
períodos 1973-75 e 1979-80 é evidente em todas as séries, assim como a deflação nos anos pós-
1980. Há, contudo, algumas diferenças entre as três séries que refletem sua composição
diferente. O IPA, por exemplo, dá maior peso a matérias-primas do que os outros índices e,
portanto, teve um aumento mais acentuado que o IPC ou o deflator do PIB em 1973 e 1974,
quando os preços agrícolas e do petróleo bruto subiram vertiginosamente. Por outro lado,
quando os preços dessas matérias-primas caíram durante o período 1982-86 e novamente em
1996-97, o declínio na taxa de inflação registrado pelo IPA foi o maior entre as três medidas de
inflação. Na última década, o IPA foi especialmente volátil em relação às outras medidas de
inflação.

FIG 2.2 Três medidas de inflação, 1967-2010

Fonte: Ministério do Comércio, Survey of Current Business.

2.8 Medidas da variação cíclica do produto


A maior parte deste livro foca movimentos de curto prazo, ou cíclicos, do produto e do
emprego – flutuações ao longo de períodos de talvez um a quatro anos. Nesses períodos, as
flutuações no produto e no emprego decorrem essencialmente de variações do produto efetivo
em torno do produto potencial, que é definido como o nível de produto que a economia poderia
produzir se operasse a altas taxas de utilização dos recursos. Esses movimentos de curto prazo
do produto consistem em mudanças nas taxas de utilização de trabalho e capital. É no prazo
mais longo que o crescimento do produto potencial, que implica crescimento da quantidade
disponível de fatores de produção (capital e trabalho), torna-se um determinante importante do
crescimento do produto. Já discutimos a mensuração do produto real efetivo (PIB); agora falta
explicar a mensuração do produto potencial.

Produto potencial
Nível que seria alcançado se os recursos produtivos
(trabalho e capital) estivessem sendo usados nos
níveis de referência elevados.
Surge um problema na mensuração do produto potencial. Quais seriam os níveis altos
sustentáveis de alocação de recursos? Na década de 1960, o President’s Council of Economic
Advisors, que na época compilava as estimativas oficiais do produto potencial, simplesmente
estimava o nível de produto que correspondia a uma taxa de desemprego de 4%. Em anos
posteriores, economistas e formuladores de políticas concluíram, em parte com base na
experiência dos anos 1960, que 4% era uma taxa de desemprego baixa demais para ser mantida
sem produzir pressão inflacionária. Na década de 1980, era usada com frequência uma taxa de
desemprego na faixa de 5,5% a 6% como referência de alto nível de emprego. Em anos recentes,
porém, tem havido menos certeza de que qualquer taxa de desemprego seja uma referência
apropriada; em 2000, por exemplo, a taxa de desemprego havia despencado para abaixo de 4%
sem nenhum desenvolvimento aparente de pressão inflacionária. Os órgãos governamentais,
para quem uma medida precisa do produto potencial é importante, desenvolveram uma série de
maneiras sofisticadas de calcular o PIB potencial. O Congressional Budget Office dos Estados
Unidos, por exemplo, usa modelos de crescimento econômico do tipo que examinaremos em um
capítulo posterior para construir uma medida do produto potencial. Outros órgãos usam métodos
de “filtros” e estimativas de tendências nos dados.
Felizmente, para nossos propósitos não é importante ter uma medida precisa do produto
potencial. Conforme avançamos, queremos apenas distinguir os movimentos cíclicos do produto
que nossos modelos tentam explicar e o crescimento do produto potencial que resulta de
aumentos nos fatores de produção e de mudanças tecnológicas.

PERSPECTIVAS 2.3 - DATAÇÃO DOS CICLOS DE NEGÓCIOS


Falamos de recessões como períodos em que o produto efetivo cai bem abaixo do produto potencial e o desemprego sobe
acima do nível de referência de alto emprego, mas como, precisamente, medimos quando começa e quando termina uma
recessão? Por exemplo, se o produto começar a declinar em janeiro, subir um pouco em fevereiro e, então, iniciar um
declínio constante em março, a recessão começou em janeiro ou em março? Além disso, a data em que o desemprego
começa a subir pode não coincidir com o início da queda do produto.
Não há uma maneira precisa de datar recessões ou expansões. É preciso usar discernimento. Nos Estados Unidos, o mais
perto que se chegou de uma datação oficial de ciclos de negócios é a realizada pelo Business Cycle Dating Group do
National Bureau of Economic Research (NBER), uma organização privada de pesquisas. A Tabela 2.7 mostra a datação
pelo NBER dos ciclos de negócios americanos após a Segunda Guerra Mundial.
O pico mede o final de uma expansão e o vale indica o final de cada recessão. Em média, as expansões duraram pouco
menos de 50 meses e as recessões pouco mais de 10 meses. Nenhuma das recessões pós-guerra chegou perto do período
de contração econômica de 43 meses que deu início à Grande Depressão da década de 1930. A expansão econômica que
começou em março de 1991 e terminou em março de 2001 foi a mais longa do período posterior à Segunda Guerra
Mundial (120 meses).

Tabela 2.7 - Ciclos de negócios pós-guerra nos Estados Unidos


Conclusão
Examinamos aqui os equivalentes no mundo real das principais variáveis que aparecem nos
modelos da próxima seção – com uma exceção. A exceção é a moeda. A quantidade de moeda é
uma variável-chave em todos os modelos que analisaremos a seguir. O controle da quantidade
de moeda por meio da política monetária é um tipo importante de política de estabilização. A
definição de moeda revela-se um pouco mais complicada do que parece à primeira vista e será
melhor que a adiemos até mais tarde, quando questões de oferta e demanda de moeda forem
examinadas de modo detalhado. Por enquanto, é adequado usar o termo moeda em nossos
modelos com referência ao estoque de moeda corrente mais depósitos à vista (depósitos que
podem ser sacados com cheques).

Moeda
O que quer que seja comumente aceito como
pagamento em troca de bens e serviços (e pagamento
de dívidas e impostos).

política monetária
Uso pelo banco central de controle da oferta de
moeda e da taxa de juros para influenciar o nível de
atividade econômica.

Voltaremos a questões de mensuração em vários pontos adiante. Além da discussão da


definição empírica da moeda, precisamos considerar as taxas de câmbio e medidas de transações
internacionais (Capítulo 14) e examinar mais detalhadamente o orçamento federal (Capítulo 18).
Algumas outras variáveis (por ex., os salários e a taxa de juros) serão definidas à medida que
aparecerem em nossa análise.
Este capítulo começou com um dos personagens de Charles Dickens aconselhando um
professor a “Ater-se aos fatos”. Mas Lord Jim, de Conrad, reclama que “Eles queriam fatos.
Fatos! Exigiam fatos dele, como se fatos pudesses explicar qualquer coisa”. Neste ponto,
passamos a explicar, em vez de apenas medir, o comportamento de variáveis macroeconômicas.

Questões de revisão
1. Defina o termo produto interno bruto. Explique quais transações na economia são incluídas
no PIB.
2. Qual é a diferença entre PIB e PNB?
3. Defina o termo renda nacional. Por que a renda nacional não é igual ao PNB?
4. Defina os termos renda pessoal e renda pessoal disponível. Conceitualmente, como essas
medidas de renda diferem da renda nacional? Qual é a utilidade dessas medidas?
5. Três índices de preços foram examinados neste capítulo: o deflator do PIB, o IPC e o IPA.
Explique as diferenças entre essas diferentes medidas do nível de preços.
6. Usando os dados da Tabela 2.6, calcule a variação percentual no nível de preços entre 1960 e
1970, entre 1973 e 1980 e entre 1960 e 2010.
7. Explique o conceito de PIB real pelo índice de preços ponderado da cadeia produtiva. Que
problemas na medida anterior do PIB real levaram à introdução dessa nova medida?
8. Explique o conceito de produto potencial. Por que o produto potencial é difícil de medir?
9. Suponha que a renda de um trabalhador fosse US$ 15.000 em 1960 e US$ 45.000 em 2010.
Usando o deflator do PIB como índice de preços, calcule se a renda real do trabalhador
aumentou ou diminuiu ao longo desse período.
PARTE II

A economia clássica e a revolução keynesiana

Os capítulos desta parte dão início à nossa análise de modelos macroeconômicos. Começamos
pelo modelo clássico e, então, passamos ao modelo keynesiano que se desenvolveu como um
ataque ao sistema clássico – a chamada revolução keynesiana.
CAPÍTULO 3
Macroeconomia clássica (I): produto e emprego

3.1 O ponto de partida


O termo macroeconomia originou-se na década de 1930, década que testemunhou um
progresso substancial no estudo de questões econômicas agregativas. As forças que determinam
renda, emprego e preços vinham recebendo maior atenção desde a virada do século XX, depois
de um período em que questões microeconômicas dominaram o campo da economia. A
Depressão mundial, que teve início em 1929, intensificou a urgência do estudo de questões
macroeconômicas. Os resultados dessa pesquisa foram as teorias do “ciclo de negócios” e as
prescrições de políticas públicas para estabilizar a atividade econômica. Uma teoria e um
conjunto de conclusões de políticas sobressairam entre as demais e tornaram-se uma nova
ortodoxia no pensamento macroeconômico. O livro que contém essa teoria era A teoria geral do
emprego, do juro e da moeda, de John Maynard Keynes,1 e o processo de mudança no
pensamento econômico resultante dessa obra foi chamado de revolução keynesiana. Mas,
revolução contra o quê? Qual era a ortodoxia antiga? Keynes denominou-a “economia clássica”
e é esse pensamento macroeconômico que estudaremos neste capítulo e no próximo.
As ideias que formaram a revolução keynesiana, bem como a evolução dessas ideias no
período pós-keynesiano, são fundamentais para nossa análise. Um pré-requisito para
prosseguirmos é o conhecimento do sistema clássico a que Keynes se contrapôs. A teoria
clássica também tem um papel positivo no desenvolvimento posterior da macroeconomia.
Embora muitos dos primeiros autores keynesianos considerassem a teoria clássica como pronta
para a lata de lixo das ideias ultrapassadas, no decorrer do tempo, essa reação excessiva
amenizou-se e a economia keynesiana moderna contém muitas ideias que se originaram com os
economistas clássicos. O modelo clássico também proporciona o ponto de partida para
questionamentos que foram levantados contra a teoria keynesiana por monetaristas, economistas
novo-clássicos e teóricos dos ciclos reais de negócios.
Keynes usou o termo clássico para se referir a praticamente todos os economistas que haviam
escrito sobre questões macroeconômicas antes de 1936. A terminologia mais convencional
distingue dois períodos no desenvolvimento da teoria econômica antes de 1930. O primeiro,
denominado clássico, é o período dominado pela obra de Adam Smith (A riqueza das nações,
1776), de David Ricardo (Princípios de economia política, 1817) e de John Stuart Mill
(Princípios de economia política, 1848). O segundo, denominado período neoclássico, tem
como seus representantes ingleses mais importantes Alfred Marshall (Princípios de economia,
1920) e A. C. Pigou (A teoria do desemprego, 1933). Keynes acreditava que a teoria
macroeconômica dos dois períodos era homogênea o bastante para ser abordada como uma coisa
só.
Para os economistas clássicos, o nível de equilíbrio do produto a qualquer momento era um
ponto de pleno emprego ou, em termos das variáveis descritas no Capítulo 2, um ponto em que o
produto efetivo fosse igual ao produto potencial. O equilíbrio para uma variável é o estado no
qual todas as forças que atuam sobre essa variável estão balanceadas e, consequentemente, não
há nenhuma tendência para que a variável mova-se desse ponto. Era um princípio importante
dos economistas clássicos que apenas os pontos de pleno emprego podiam ser posições de
equilíbrio, mesmo no curto prazo. Na ausência de pleno emprego, os economistas clássicos
pressupunham que as forças fora de equilíbrio atuassem no sentido de levar o produto para o
nível de pleno emprego. A economia clássica do equilíbrio examinava os fatores que
determinavam o nível de produto para o pleno emprego, ao lado dos níveis associados de outros
agregados importantes, como emprego, preços, salários e taxas de juros.

3.2 A revolução clássica


A economia clássica surgiu como uma revolução contra um conjunto de doutrinas
econômicas conhecido como mercantilismo. O pensamento mercantilista estava associado à
ascensão do Estado-Nação na Europa, durante os séculos XVI e XVII. Os dois princípios
fundamentais do mercantilismo eram (1) o metalismo, a crença de que a riqueza e o poder de
uma nação eram determinados por seu estoque de metais preciosos, e (2) a crença na
necessidade de ação estatal para direcionar o desenvolvimento do sistema capitalista.
A adesão ao metalismo levou países a tentar garantir um excedente de exportações sobre
importações a fim de ganhar ouro e prata por meio do comércio exterior. Os métodos usados
para assegurar essa balança comercial favorável incluíam subsídios às exportações, impostos
sobre as importações e desenvolvimento das colônias para que atuassem como mercados para as
exportações. Acreditava-se que a ação estatal era necessária para fazer com que o sistema
capitalista em desenvolvimento agisse de acordo com os interesses do Estado. O comércio
exterior era atentamente regulado e a exportação de metais preciosos era proibida para atender
os objetivos do metalismo. O uso de ação estatal também era defendido em uma frente mais
ampla, para desenvolver a indústria local, reduzir o consumo de bens importados e desenvolver
recursos naturais e humanos.
Em contraste com os mercantilistas, os economistas clássicos enfatizaram a importância de
fatores reais na determinação da “riqueza das nações” e destacaram as tendências otimizadoras
do livre mercado na ausência de controle estatal. A análise clássica era, essencialmente, uma
análise real; o crescimento de uma economia era resultado do aumento dos estoques dos fatores
de produção e de avanços nas técnicas de produção. A moeda tinha um papel apenas por facilitar
as transações como meio de troca. A maioria das questões em economia podia ser respondida
sem analisar o papel da moeda. Os economistas clássicos desconfiavam do governo e
enfatizavam a harmonia de interesses individuais e nacionais quando o mercado era deixado
livre de regulamentações governamentais, exceto aquelas necessárias para garantir que o
mercado permanecesse competitivo. Esses dois aspectos da economia clássica – a ênfase em
fatores reais e a crença na eficácia do mecanismo de livre mercado – desenvolveram-se no curso
de controvérsias sobre questões de longo prazo, referentes aos determinantes do
desenvolvimento econômico. Essas posições clássicas quanto a questões de longo prazo foram,
contudo, importantes para moldar as ideias dos economistas clássicos sobre questões de curto
prazo.
A oposição ao metalismo levou os economistas clássicos a enfatizar que a moeda não tinha
nenhum valor intrínseco. A moeda era importante apenas em função dos bens que podia
comprar. Os economistas clássicos focaram o papel da moeda como um meio de troca. Outro
papel que a moeda havia desempenhado, na visão mercantilista, era o de estimular a atividade
econômica. No curto prazo, afirmavam os mercantilistas, um aumento na quantidade de moeda
levaria a um aumento na demanda por mercadorias e estimularia a produção e o emprego. Para
os economistas clássicos, atribuir esse papel à moeda na determinação de variáveis reais, mesmo
no curto prazo, era perigoso diante de sua redução da importância da moeda.
O ataque clássico à visão mercantilista, da necessidade de ação estatal para regular o sistema
capitalista, também teve implicações para a análise macroeconômica de curto prazo. Um papel
da ação estatal no mercantilismo era assegurar que existissem mercados para todos os bens
produzidos. O consumo, tanto doméstico como externo, devia ser incentivado à medida que a
produção aumentasse. A resposta clássica é oferecida por John Stuart Mill:

Em oposição a esses absurdos palpáveis, foi triunfantemente estabelecido pelos economistas


políticos que o consumo nunca precisa de estímulo.2

Como em outras áreas, os economistas clássicos achavam que o mecanismo de livre mercado
atuaria para criar mercados para qualquer bem que fosse produzido: “O legislador, portanto, não
precisa preocupar-se com o consumo”3. A doutrina clássica era que, no agregado, a produção de
uma determinada quantidade de produto gerará demanda suficiente por esse produto; nunca
poderia haver uma “falta de compradores para todas as mercadorias”4. Em consequência, os
economistas clássicos davam pouca atenção explícita a fatores que determinam a demanda geral
por mercadorias, que, no Capítulo 1, chamamos de demanda agregada.

Demanda agregada
Soma das demandas pelo produto corrente por parte
de cada um dos setores compradores da economia:
famílias, empresas, governo e compradores
estrangeiros.

Assim, duas características da análise clássica destacavam-se como parte do ataque ao


mercantilismo:
1. A economia clássica enfatizava o papel de fatores real em oposição a fatores monetários na
determinação do produto e do emprego. A moeda só tinha papel na economia como meio
de troca.
2. A economia clássica enfatizava as tendências de autoajuste da economia. Políticas
governamentais para assegurar uma demanda adequada pelo produto eram consideradas
desnecessárias e, de modo geral, prejudiciais.
Voltamo-nos agora para o modelo construído pelos economistas clássicos para dar suporte a
essas posições.

3.3 Produção
Uma relação central no modelo clássico é a função produção agregada. A função produção,
que é baseada na tecnologia de firmas individuais, é uma relação entre o nível de produto e o
nível de insumos. Para cada nível de insumos, a função produção mostra o nível resultante de
produto e é expressa como
Função produção
Resume a relação entre os insumos totais e os
produtos totais, pressupondo uma determinada
tecnologia.

onde Y é o produto, K é o estoque de capital (instalações e equipamentos) e N é a quantidade


do insumo trabalho homogêneo5. No curto prazo, considera-se que o estoque de capital seja fixo,
conforme indicado pela barra sobre o símbolo do capital. O estado da tecnologia e a população
também são considerados constantes ao longo do período especificado. Nesse período de curto
prazo, o produto varia unicamente em função de variações no insumo trabalho (N) oriundo da
população fixa.

Tabela 3.1 - A relação entre produto, estoque de capital fixo e trabalho


Os números na Tabela 3.1 ilustram a relação fundamental entre uma mudança no insumo
trabalho e a mudança resultante no produto, mantendo o estoque de capital K constante. Os
valores da Tabela 3.1 estão representados nos gráficos das Figuras 3.1a e 3.1b.

FIG 3.1 Função produção e curvas de PMN


Na Figura 3.1a, a função produção, Y = F(K, N), indica o produto que seria produzido pela
utilização eficiente de cada nível de insumo trabalho. Como é mostrado, a função produção tem
várias características. Em níveis baixos do insumo trabalho, a função é uma linha reta. A
inclinação da reta mostra o aumento no produto para um dado aumento no insumo trabalho,
portanto essa parte em linha reta (inclinação constante) da função produção exibe rendimentos
constantes de escala. Para níveis muito baixos de utilização de mão de obra, seria possível
presumir que trabalhadores adicionais poderiam ser introduzidos a uma quantidade dada de
instalações e equipamentos sem queda na produtividade do último trabalhador contratado. Na
maior parte das vezes, no entanto, consideramos situações em que o acréscimo de mão de obra
resultará em aumento do produto total, mas com o tamanho dos aumentos do produto declinando
conforme mais mão de obra é acrescentada. Essa parte da função produção exibe rendimentos
decrescentes de escala. Rendimentos negativos de escala ocorrem quando um acréscimo no
insumo trabalho resulta em redução do produto total. As firmas não operariam nessa parte da
função produção, uma vez que a contratação de mão de obra adicional resulta em uma
diminuição do produto total.
Na Figura 3.1b, o gráfico mostra a variação no produto em função de uma variação do
insumo trabalho. Este é o produto marginal do trabalho (PMN). O PMN é a inclinação da
função produção (ΔY/ΔN) na Figura 3.1a.6

Produto marginal do trabalho (PMN)


Aumento do produto total devido ao acréscimo de
uma unidade de trabalho (mantendo-se constante a
quantidade de outros insumos).

Na faixa de rendimentos constantes de escala, aumentos de N produzem um gráfico de


inclinação plana. Conforme mais trabalhadores são contratados, porém, a inclinação torna-se
negativa, indicando que, embora o produto marginal de cada trabalhador contratado seja
positivo, é menor que o produto marginal do trabalhador anterior. Essa área representa
rendimentos decrescentes de escala. Na área de rendimentos negativos de escala, o produto
marginal do trabalhador adicional fica abaixo do eixo horizontal.
A função produção de curto prazo representada na Figura 3.1a é uma relação tecnológica que
determina o nível de produto, para um determinado nível de insumo trabalho (emprego). O
estoque de capital, assim como o nível existente de tecnologia e o nível de capacitação da força
de trabalho, é mantido constante. Os economistas clássicos pressupunham que a quantidade de
mão de obra empregada seria determinada pelas forças de demanda e oferta do mercado de
trabalho.

3.4 Emprego
A marca da análise clássica do mercado de trabalho é a pressuposição de que o mercado
funciona bem. As firmas e os trabalhadores individuais otimizam. Eles têm informações
perfeitas sobre os preços relevantes. Não há barreiras para o ajuste dos salários; o mercado se
equilibra.

3.4.1 Demanda por trabalho


Os compradores de serviços de mão de obra são as firmas. Para ver como a demanda
agregada por trabalho é determinada, começamos examinando a demanda por trabalho por parte
de uma firma individual, designado como a firma i-ésima. No modelo clássico, as firmas são
competidores perfeitos que escolhem seu produto de forma a maximizar os lucros. No curto
prazo, o produto varia unicamente pela alteração do insumo trabalho, de modo que a escolha do
nível do produto e da quantidade do insumo trabalho é uma única decisão. A firma
perfeitamente competitiva aumentará o produto até que o custo marginal de produzir uma
unidade de produto seja igual à receita marginal recebida por sua venda. Para a firma
perfeitamente competitiva, a receita marginal é igual ao preço do produto (P).7 Como o trabalho
é o único fator de produção variável, o custo marginal de cada unidade adicional de produto é o
custo marginal do trabalho. O custo marginal do trabalho é igual ao salário monetário dividido
pelo número de unidades de produto produzidas por unidade de trabalho adicional. Definimos as
unidades de produto produzidas por unidade de trabalho adicional empregada como o PMN.
Assim, o custo marginal para a i-ésima firma (CMi) é igual ao salário monetário (W) dividido
pelo produto marginal do trabalho para essa firma (PMgNi)8.
A condição para a maximização do lucro no curto prazo no mercado puramente competitivo é

Usando na equação (3.2a) a expressão para o custo marginal (CM) da equação (3.2), temos a
posição de maximização do lucro no curto prazo para a firma que compra mão de obra no
mercado de insumos:

Multiplicando ambos os lados da equação (3.3) por PMN e dividindo ambos os lados por P,
temos a expressão

A condição de maximização do lucro na equação (3.4) pode ser explicada como se segue: a
firma contratará até o ponto em que o produto adicional obtido pela contratação de mais um
trabalhador (PMN) seja exatamente igual ao salário real (W/P) pago para contratar esse
trabalhador.
A condição para a maximização do lucro na equação (3.4) é ilustrada na Figura 3.2. A curva
de demanda por trabalho da firma, representada no gráfico em função do salário real, é a curva
de PMgN da Figura 3.1. A curva de demanda por trabalho tem inclinação descendente devido à
lei dos rendimentos decrescentes. Para um salário real como 8,0 (por ex., um salário monetário
de $8 e um preço de produto de $1), a firma contratará 3 trabalhadores. Para uma quantidade de
mão de obra abaixo de 3, digamos 2, o PMgN (10) é maior que o salário real (8,0). O pagamento
para o trabalhador em termos reais é menor que o produto real produzido. Os lucros serão
aumentados pela contratação de unidades adicionais de mão de obra. Alternativamente, para
quantidades de insumo trabalho acima de 3, se o salário real for 8, o salário real fica acima do
PMgN. O pagamento da mão de obra excede o produto marginal real do trabalhador e o custo
marginal excede o preço do produto. A firma reduzirá a mão de obra para aumentar o lucro.

FIG 3.2 Demanda por trabalho de uma firma


A condição para maximização do lucro é encontrada no ponto em que o salário real (W/P) é
igual ao PMN, conforme mostrado na equação (3.4). Se o salário real for 8, a firma maximizará
os lucros contratando 3 trabalhadores, uma vez que o PMN é 8,0. Isso é mostrado no ponto D no
gráfico da demanda por trabalho, PMN. Para fazer a firma contratar mais mão de obra, o salário
real precisa cair, já que o produto adicional gerado por cada trabalhador adicional é decrescente.
Assim, a quantidade de mão de obra maximizadora do lucro, demandada por uma firma para
cada nível de salário real, é dada pela quantidade do insumo trabalho que faz o salário real ser
igual ao PMN. A curva do produto marginal é a curva de demanda por trabalho da firma. A
implicação é que a demanda por trabalho depende inversamente do nível do salário real. A curva
de demanda por trabalho tem inclinação descendente devido à lei dos rendimentos decrescentes.
Quanto mais alto o salário real, por exemplo, mais baixo o nível do insumo trabalho que fará o
salário real ser igual ao PMN. Na Figura 3.2, se o salário fosse 5, em vez de 8, a demanda por
trabalho seria 4 em vez de 3. A curva de demanda por trabalho é a combinação das curvas de
demanda das firmas individuais na economia inteira. Para cada salário real, essa curva dará a
soma das quantidades de insumo trabalho demandadas pelas firmas na economia. Escrevemos
essa função demanda por trabalho agregada (Nd) como

onde no agregado, como nas firmas individuais, um aumento no salário real reduz a demanda
por trabalho.

3.4.2 Oferta de trabalho


A última relação necessária para determinar o emprego e o produto no sistema clássico é a
curva de oferta de trabalho. Os serviços de trabalho são fornecidos por trabalhadores individuais.
Os economistas clássicos pressupunham que o indivíduo procura maximizar a utilidade (ou
satisfação). O nível de utilidade depende positivamente tanto da renda real, que dá ao indivíduo
controle sobre bens e serviços, quanto do lazer. Há, no entanto, um trade-off entre as duas metas,
porque a renda é aumentada pelo trabalho, que, por sua vez, reduz o tempo disponível para o
lazer.
Vejamos, por exemplo, como o indivíduo j aloca um período de 24 horas entre horas de lazer
e horas de trabalho: (Njs) é a oferta de trabalho do indivíduo. A Figura 3.3 ilustra a escolha com
que se depara esse indivíduo. No eixo horizontal, medimos horas de lazer por dia. O máximo,
claro, são 24 horas. O intercepto horizontal, onde o indivíduo escolhe nenhum trabalho e só
lazer, é 24. O número de horas trabalhadas é, portanto, 24 menos o número de horas de lazer
selecionadas. A renda real é medida no eixo vertical e é igual ao salário real, W/P, multiplicado
pelo número de horas que o indivíduo trabalha. Cada intercepto vertical é o salário real
multiplicado por 24 horas no dia, o que ocorreria se o indivíduo escolhesse só trabalho e nenhum
lazer – isto é, (W/P × 24). As curvas no gráfico (identificadas como U1,U2,U3) são curvas de
indiferença. Os pontos ao longo de uma dessas curvas são combinações de renda e lazer que dão
igual satisfação ao indivíduo; assim, a pessoa é indiferente quanto a qual ponto de uma
determinada curva é selecionado. A inclinação da curva de indiferença dá a taxa em que o
indivíduo está disposto a trocar lazer por renda – ou seja, o aumento na renda que a pessoa teria
de receber para se sentir igualmente satisfeito após renunciar a uma unidade de lazer. Na
verdade, o custo de escolher cada hora de lazer é o salário real, W/P, uma vez que o indivíduo
está escolhendo não trabalhar em cada hora de lazer. Além disso, todos os pontos ao longo de
U2, por exemplo, produzem maior satisfação para o indivíduo do que qualquer ponto em U1, já
que qualquer ponto em uma curva de diferença situada mais à direita indica uma renda maior
para aquele nível dado de lazer (ou para o mesmo número de horas trabalhadas). Daí as
tentativas do indivíduo de alcançar a curva de indiferença mais alta possível. Quanto mais alto o
salário real, mais alta a satisfação que o indivíduo pode selecionar (representada por uma curva
de indiferença situada mais à direita).

FIG 3.3 Decisão individual de oferta de trabalho


A parte a mostra a escolha trabalho-lazer do indivíduo. O indivíduo ofertará trabalho (Njs) até o ponto no qual a taxa em que o
trabalho pode ser trocado por lazer no mercado, que é dada pelo salário real (W/P), for igual à taxa em que o indivíduo está
disposto a trocar trabalho (renunciar ao lazer) por renda, que é medida pela inclinação das curvas de indiferença do indivíduo
(U1, U2, U3). Para um salário real de 2,0, o indivíduo escolherá 18 horas de lazer, o ponto A no gráfico de trade-off renda-lazer.
As horas de trabalho escolhidas serão, nesse caso, 6 (24 horas no dia - 18 horas de lazer). Isso é mostrado no ponto A da curva de
oferta de trabalho. Para um salário real de 3,0, o indivíduo escolherá 16 horas de lazer, o ponto B no gráfico de trade-off renda-
lazer. As horas de trabalho escolhidas então serão 8 (24 horas no dia - 16 horas de lazer). Isso é mostrado no ponto B da curva de
oferta de trabalho. Para um salário real de 4,0, o indivíduo escolherá 15 horas de lazer, o ponto C no gráfico de trade-off renda-
lazer. As horas de trabalho escolhidas serão, então, 9 (24 horas no dia - 15 horas de lazer). Isso é mostrado no ponto C da curva
de oferta de trabalho.

Os raios originados no ponto de 24 horas no eixo horizontal representam as linhas de


orçamento do indivíduo. Começando em 24 horas (nenhum trabalho, só lazer), o indivíduo pode
trocar lazer por renda a uma taxa igual ao salário real por hora, W/P. A inclinação da linha de
orçamento é o salário real. Quanto mais alto o salário real, mais inclinada a linha de orçamento,
refletindo o fato de que, com um salário real mais alto, um indivíduo que aumente as horas de
trabalho em 1 unidade (mova-se uma unidade para a esquerda ao longo do eixo horizontal)
receberá um aumento maior de renda (subirá mais no eixo vertical ao longo da linha de
orçamento) do que teria recebido com um salário real mais baixo. Três linhas de orçamento,
correspondentes a salários reais de 2,0, 3,0 e 4,0, são mostradas na Figura 3.3a. Note-se que, a
um salário real mais alto, o indivíduo pode escolher uma curva de indiferença que produz maior
satisfação.
Na Figura 3.3b, construímos a curva de oferta de trabalho para o indivíduo j. Essa curva de
oferta consiste em pontos como A, B e C da Figura 3.3a, que indicam a quantidade de trabalho
que o indivíduo ofertará a cada salário real. Essa curva de oferta agregada de trabalho pode ser
escrita como

Duas características da teoria da oferta de trabalho clássica requerem mais comentários.


Primeiro, note que a variável salário é o salário real. A oferta de trabalho é determinada pelo
salário real, não pelo salário monetário. O trabalhador recebe utilidade, em última instância, do
consumo e, ao tomar a decisão trabalho-lazer, ele está preocupado com o poder de compra de
bens e serviços que lhe é dado por uma unidade de trabalho. Por exemplo, partindo do ponto C
no gráfico de trade-off renda-lazer, se o salário monetário for $4 e o preço for 1,0, o salário real
é 4,0 (4/1) e o indivíduo escolherá 15 horas de lazer e trabalhará 9 horas (o ponto C na curva de
oferta de trabalho). Se o salário monetário ainda for $4, mas o preço agora for $2,0, o salário
real do indivíduo será 2,0 (4/2). O indivíduo selecionará agora o ponto A no gráfico de trade-off
renda-lazer, escolhendo 18 horas de lazer. As horas de trabalho diminuem para 6 (24 – 18), que
é o ponto A na curva de oferta de trabalho. Claramente, quando o salário real aumenta
(diminui), o lazer diminui (aumenta) e as horas de trabalho aumentam (diminuem). Esse é o
significado da equação (3.6). Como o salário real (W/P) é medido ao longo do eixo vertical da
curva de oferta de trabalho, se o salário monetário ou o preço (ou ambos) mudarem, o número de
horas trabalhadas será determinado pelo deslocamento ao longo da curva de oferta de trabalho.
Em segundo lugar, pela construção da Figura 3.3, a curva de oferta de trabalho tem inclinação
positiva; supõe-se que mais trabalho é ofertado com salários reais mais altos. Essa relação reflete
o fato de que um salário real mais alto significa um preço maior para o lazer em termos de renda
não realizada. Nesse preço mais alto, pressupomos que o trabalhador escolherá menos lazer.
Esse efeito é análogo ao efeito substituição na teoria da demanda do consumidor. Há ainda outro
efeito: o equivalente ao efeito renda na teoria da demanda do consumidor. Conforme o salário
real aumenta, o trabalhador consegue alcançar um nível mais alto de renda real. Em níveis mais
altos de renda real, o lazer pode tornar-se mais desejável em relação a aumentos adicionais na
renda. Com aumentos sucessivos no salário real, pode-se chegar a um ponto em que o
trabalhador escolha ofertar menos trabalho quando o salário real aumenta e consumir mais lazer.
Nesse ponto, o efeito renda supera o efeito substituição; a curva de oferta de trabalho assume
uma inclinação negativa e dobra-se para trás no sentido do eixo vertical. Quase certamente, com
salários extremamente altos chegaríamos a uma porção da curva de oferta de trabalho voltada
para trás, e talvez os salários nem precisem ser tão “extremamente” altos. Embora as evidências
empíricas sobre essa questão sejam inconclusivas, pressuporemos que, para os salários
observados em nações industrializadas, a curva de oferta agregada de trabalho de fato tem uma
inclinação positiva; que o efeito substituição supera o efeito renda.

3.5 Produto e emprego de equilíbrio


Até aqui, foram derivadas as seguintes relações:
Essas relações, junto com a condição de equilíbrio para o mercado de trabalho,

determinam o produto, o emprego e o salário real. Na terminologia comum, produto,


emprego e salário real são designados como as variáveis endógenas no modelo apresentado até
aqui, em que uma variável endógena é aquela que é determinada dentro do modelo.
O equilíbrio dentro do modelo clássico é ilustrado na Figura 3.4. O gráfico a mostra a
determinação dos níveis de equilíbrio do emprego (N0) e do salário real (W/P)0 no ponto de
intersecção entre as curvas da demanda agregada por trabalho e da oferta agregada de trabalho.
Esse nível de equilíbrio do insumo trabalho (N0) resulta em um nível de equilíbrio do produto
(Y0) dado pela função produção, conforme mostrado na Figura 3.4b.

FIG 3.4 Teoria clássica do produto e do emprego

A parte a mostra o equilíbrio do mercado de trabalho para o salário real (W/P)0 no ponto de equilíbrio A. No agregado, a oferta
de trabalho é igual à demanda por trabalho, Nd = Ns. O nível de equilíbrio para o emprego é N0. Substituindo o emprego de
equilíbrio na função produção na parte b, encontramos o produto agregado de equilíbrio, Y0, no ponto A.

3.5.1 Os determinantes do produto e do emprego


Examinaremos, agora, quais fatores são os determinantes fundamentais do produto e do
emprego na teoria clássica. Considerando-se como variáveis exógenas aquelas que são
determinadas fora do modelo, quais são as variáveis exógenas que, quando alteradas, causam
variações no produto e no emprego? No modelo clássico, os fatores que determinam o produto e
o emprego são aqueles que determinam as posições das curvas de demanda e oferta de trabalho e
a posição da função produção agregada.
A função produção é deslocada por mudanças técnicas que alterem a quantidade de produto
derivada de determinados níveis de insumos. Como é mostrado no gráfico da Figura 3.4b, a
função produção também se desloca conforme o estoque de capital muda ao longo do tempo. A
curva de demanda por trabalho é a curva PMgN (produto marginal do trabalho), a inclinação da
função produção. Consequentemente, a posição da curva de demanda por trabalho se deslocará
se a produtividade do trabalho mudar por causa de uma mudança técnica ou de formação de
capital. Pela derivação da curva de oferta de trabalho, pode-se ver que essa relação mudaria com
a variação do tamanho da força de trabalho. O crescimento populacional, por exemplo,
deslocaria a curva de oferta de trabalho para a direita. A curva de oferta de trabalho também
seria deslocada por mudanças nas preferências dos indivíduos com relação às trocas trabalho-
lazer (isto é, U1, U2, U3 na Figura 3.3a).
Uma característica comum aos fatores que determinam o produto no modelo clássico é que
todos são variáveis que afetam o lado da oferta do mercado do produto, ou seja, a quantidade
que as firmas escolhem produzir. No modelo clássico, os níveis de produto e emprego são
determinados unicamente por fatores de oferta.
Como a determinação do produto e do emprego pela oferta é um aspecto crucial do sistema
clássico, vale a pena demonstrar essa propriedade de maneira mais formal. Para fazê-lo, vamos
examinar melhor as propriedades das funções demanda e oferta de trabalho discutidas acima. A
Figura 3.5a reproduz as curvas de oferta e demanda agregadas por trabalho. A Figura 3.5b
mostra a oferta de trabalho e a demanda por trabalho como funções do salário monetário (W).
Examinaremos primeiro a forma destas últimas relações. Para a oferta de trabalho, podemos
traçar uma curva de inclinação positiva como Ns(P1), que dá a quantidade de trabalho ofertada
para cada valor do salário monetário, dado o nível de preços P1. A curva tem inclinação
ascendente porque, em um determinado nível de preços, um salário monetário maior é um
salário real maior. Os trabalhadores estão interessados no salário real, portanto cada nível de
preços terá uma curva diferente. Para um dado salário monetário, cada nível de preços
significará um salário real diferente e, assim, uma quantidade ofertada de trabalho diferente. A
um nível de preços 2P1, ou seja, o dobro de P1, a curva de oferta de trabalho na Figura 3.5b
desloca-se para Ns(2P1); menos trabalho é ofertado para qualquer salário monetário, porque, a
um nível de preços mais alto, um determinado salário monetário corresponde a um salário real
mais baixo. Uma elevação no nível de preços desloca a curva de oferta de trabalho (traçada em
relação ao salário monetário) para cima e para a esquerda. A constatação de que o trabalhador
individual está interessado apenas no salário real pode ser observada no fato de que o mesmo
nível de trabalho(N1) é ofertado a um salário monetário W1 e a um nível de preços P1 (salário
real W1/P1) e nas combinações de salário monetário e preço 2W1 2P1 ou 3W1, 3P1 (salário real =
W1/P1 em ambos os pontos). Aumentos (ou diminuições) equiproporcionais nos salários
monetários e no nível de preços deixam inalterada a quantidade de trabalho ofertada.
Agora, examinemos a curva de demanda por trabalho traçada em relação ao salário
monetário. Na Figura 3.5, usamos para isso o fato de que as curvas de demanda por trabalho
[f(W/P) ] e PMgN são equivalentes. Lembremos que a condição satisfeita em todos os pontos da
curva de demanda por trabalho é

Se quisermos saber a quantidade de trabalho que será demandada a um determinado nível de


salário monetário, a resposta depende, como no caso da quantidade ofertada, do nível de preços.
Dado o salário monetário, a firma escolherá o nível de emprego em que
A níveis de preços sucessivamente mais altos (P1, 2P1, 3P1), a curva de demanda por
trabalho traçada em relação às mudanças no salário monetário desloca-se para a direita (de
PMgN × P1 para PMgN × 2P1 para PMgN × 3P1). Para um dado salário monetário, níveis de
preços mais altos aumentam a demanda por trabalho, porque esse salário monetário corresponde
a um salário real mais baixo9. A demanda por trabalho depende do salário real. Aumentos
equiproporcionais no salário monetário e no nível de preços de (W1, P1) para (2W1, 2P1) e (3W1,
3P1) deixam a demanda por trabalho inalterada no nível N1. E deixam o salário real inalterado
em W1/P1, que corresponde à demanda N1 na Figura 3.5a.
As informações na Figura 3.5 são úteis para construir a função oferta agregada clássica –
uma relação que deixa claro como o produto no modelo clássico é determinado pela oferta. A
curva de oferta agregada é a análoga macroeconômica do conceito microeconômico da curva de
oferta da firma. Para a firma, a curva de oferta mostra a produção obtida em cada nível de preço
do produto. Para a firma perfeitamente competitiva, os lucros são maximizados, como vimos,
quando o custo marginal (W/PMNi para a i-ésima firma) é igual ao preço do produto (P), ou,
equivalentemente, quando

Função oferta agregada


Análogo macroeconômico da curva de oferta da
firma individual, que mostra a produção obtida em
cada nível de preço do produto. A curva de oferta
agregada mostra o produto total que as firmas
ofertarão em cada valor do nível agregado de preços.

FIG 3.5 Equílibrio do mercado de trabalho e o salário monetário


A parte a mostra o emprego de equilíbrio (em N1) em que a oferta de trabalho é igual à demanda por trabalho. Na parte b, a
oferta e a demanda por trabalho são representadas como funções do salário monetário. Aumentos no nível de preços (de P1 para
2P1, depois para 3P1) deslocam as curvas de oferta e demanda por trabalho proporcionalmente para cima. O salário monetário
aumenta proporcionalmente ao nível de preços (de W1 para 2W1, depois para 3W1). O salário real e o nível de emprego
permanecem inalterados.
o produto marginal é igual ao salário real. A firma individual mantém fixo o salário monetário
ao decidir sobre o produto ótimo a ser ofertado e, portanto, sobre a quantidade de trabalho a
contratar. Uma firma individual não espera que sua iniciativa de contratar mais mão de obra
possa causar uma alteração no salário monetário, porque ela é uma parte pequena do mercado
total.
Como o salário monetário é considerado fixo, a curva de oferta do produto para a firma tem
inclinação positiva. Preços mais altos significam salários reais mais baixos; em consequência, a
firma demanda mais trabalho e produz mais produto. Ao construir a curva de oferta agregada
para a economia, não podemos considerar que o salário monetário se mantenha fixo quando
produto e trabalho variam. O salário monetário precisa ajustar-se para manter o equilíbrio no
mercado de trabalho. Com essa diferença importante, a curva de oferta agregada aborda a
mesma questão que sua análoga microeconômica: como variará o nível de produção ofertado
quando mudarmos o preço do produto?
Na Figura 3.6, construímos a função oferta agregada clássica. Consideremos o produto
ofertado nos três níveis de preços sucessivamente mais altos P1, 2P1 e 3P1 que foram
representados na Figura 3.5. No nível de preços P1 e salário monetário W1, o emprego era N1 e
pressupomos que o produto resultante seja Y1’ conforme mostrado na Figura 3.610. Como será a
variação do produto ofertado quando passarmos a um nível de preços 2P1? A um nível de preços
2P1, se o salário monetário permanecesse em W11, podemos ver na Figura 3.5b que a demanda
por trabalho aumentaria para N2. O preço mais alto representaria um salário real mais baixo e as
firmas tentariam expandir tanto o emprego como o produto. O salário monetário, porém, não
permanecerá em W1 Em um nível de preços 2P1, a curva de oferta de trabalho na Figura 3.5b
terá se deslocado para Ns(2P1) e, a um salário monetário W1, a oferta de trabalho será de apenas
N’2 unidades. Haverá um excesso de demanda por trabalho igual a (N2 - N’2) unidades e o
salário monetário subirá.
FIG 3.6 Curva de oferta agregada clássica

A curva de oferta agregada clássica vertical reflete o fato de que valores mais altos do nível de preços requerem níveis
proporcionalmente mais altos do salário monetário para que haja equilíbrio no mercado de trabalho. O salário real, o emprego e,
portanto, o nível do produto são os mesmos em P1, 2P1 e 3P1.

O processo em ação aqui é que algumas firmas reagem aos preços mais altos tentando
expandir o emprego e a produção. Para expandir o emprego, elas elevam os salários monetários
em um esforço de atrair trabalhadores de outras firmas. As firmas que se atrasam no processo de
elevar os salários monetários sofrem taxas de demissão mais altas e perdem trabalhadores. Esse
processo de elevação dos salários monetários só parará quando o salário monetário tiver subido
o suficiente para reequilibrar a oferta e a demanda no mercado de trabalho. Como pode ser visto
na Figura 3.5b, o reequilíbrio ocorre em um salário monetário de 2W1, onde o salário monetário
aumentou proporcionalmente ao nível de preços. Nesse ponto, o salário real inicial é restaurado
e o emprego volta a seu nível original. Em consequência, a produção ofertada no nível de preços
2P1 é igual a Y1, o mesmo nível de produto do nível de preços P1. Em um nível de preços ainda
mais alto 3P1, o salário monetário sobe para 3W1, mas, também neste caso, o produto permanece
inalterado em Y1. A curva de oferta agregada é vertical. Os preços mais altos só estimulam a
produção quando não são acompanhados de salários monetários proporcionalmente mais altos –
apenas se baixarem o salário real. No entanto, dadas as pressuposições que fizemos, o equilíbrio
no mercado de trabalho requer que os salários monetários subam proporcionalmente aos preços
para manter o salário real de equilíbrio nesse mercado.
A curva de oferta agregada vertical ilustra a determinação do produto pela oferta no modelo
clássico. Para que o produto esteja em equilíbrio, precisamos estar na curva de oferta; o produto
precisa estar em Y1.

PERSPECTIVAS 3.1 - CICLOS REAIS DE NEGÓCIOS: UM


COMENTÁRIO INICIAL
Afirmou-se, na Seção 3.5, que os determinantes do produto no modelo clássico são todos variáveis do lado da oferta. A visão
tradicional era de que essas variáveis do lado da oferta mudam apenas lentamente ao longo do tempo. Mas se o produto é
determinado por variáveis que mudam apenas lentamente, como o modelo clássico pode explicar movimentos cíclicos
bruscos no produto? O PIB real, por exemplo, caiu 2,5% nos Estados Unidos em 1982, subiu 6,8% em 1984 e caiu 30%
entre 1929 e 1933. Essa aparente falha do modelo de equilíbrio clássico para explicar movimentos cíclicos no produto levou
à revolução keynesiana.
No período pós-1980, porém, alguns economistas argumentaram que o ciclo de negócios é de fato causado por mudanças em
variáveis reais do lado da oferta, mais ou menos como defendia a posição clássica. Esses economistas não aceitam a noção
de que fatores do lado da oferta mudam apenas lentamente ao longo do tempo. Eles acreditam que mudanças na tecnologia e
choques que afetam a formação de capital e a produtividade do trabalho, bem como perturbações que influenciem a
disponibilidade e os preços de recursos naturais, podem explicar as flutuações de curto prazo no produto, assim como sua
trajetória de crescimento a longo prazo. Os modelos que esses economistas construíram são chamados de modelos dos ciclos
reais de negócios. No modelo descrito neste capítulo, os teóricos dos ciclos reais de negócios veem as flutuações no produto
real e no emprego como resultantes de deslocamentos das curvas da função produção e de demanda por trabalho na Figura
3.4. Se as preferências dos trabalhadores mudam, a curva de oferta de trabalho também pode se deslocar.
Eventos como o choque dos preços do petróleo promovido pela OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo),
em 1974, levaram todos os economistas a reconhecer que, às vezes, choques do lado da oferta podem afetar o
comportamento cíclico do produto. No entanto, a visão de que fatores reais do lado da oferta podem explicar totalmente os
ciclos de negócios é controversa. A recessão profunda que se seguiu à crise financeira de 2007-2008 acrescentou intensidade
à controvérsia. Vamos examinar detalhadamente os modelos de ciclos reais de negócios no Capítulo 12.

3.5.2 Fatores que não afetam o produto


Agora, consideremos os fatores que não afetarão o produto e o emprego no modelo clássico.
Como o produto e o emprego são determinados pela oferta, o nível de demanda agregada não
terá nenhum efeito sobre o produto. Conforme aconselhou John Stuart Mill ao legislador, “Não é
preciso se preocupar com a demanda por produto”. Fatores como a quantidade de moeda, nível
de gastos governamentais e nível de demanda por bens de investimento por parte do setor
empresarial são todos fatores do lado da demanda que não têm participação na determinação do
produto e do emprego. O caso da política tributária governamental é mais complexo. Mudanças
nos impostos, na medida em que afetem o lado da demanda, não afetarão o produto ou o
emprego. Porém, mudanças nas alíquotas tributárias também geram incentivos ou efeitos do
lado da oferta que são importantes para o produto e o emprego, como veremos no Capítulo 4.

Conclusão
A característica marcante do modelo clássico é o fato de produto e emprego serem
determinados pela oferta. Essa propriedade decorre da curva de oferta agregada vertical. A curva
de oferta agregada clássica é vertical devido às pressuposições que fizemos sobre o mercado de
trabalho. É útil reconhecer explicitamente a natureza dessas pressuposições. Em geral, o quadro
dos mercados de trabalho e do produto apresentado neste capítulo pode ser caracterizado pelo
termo mercado de leilão. Considera-se que trabalho e produto sejam trocados em mercados que
estão continuamente em equilíbrio e em que todos os participantes tomam decisões com base em
salários reais e preços de produtos anunciados. Duas pressuposições implícitas nessa
representação clássica do mercado de trabalho são as seguintes:
1. Preços e salários perfeitamente flexíveis;
2. Informações perfeitas sobre os preços de mercado por parte de todos os participantes desse
mercado.
Para qualquer período de tempo em que pressupusermos que o modelo de equilíbrio
determine o emprego e o produto, o equilíbrio precisa ser alcançado. Se tal modelo for usado
para explicar o emprego e o produto no curto prazo, os preços e salários devem ser
perfeitamente flexíveis nesse período de tempo.
A caracterização do mercado de trabalho como mercado de leilão também requer que os
participantes do mercado tenham informações perfeitas sobre os preços de mercado. Tanto
fornecedores como compradores de trabalho precisam conhecer os preços de troca relevantes.
Essa condição requer que, ao vender e comprar trabalho a um dado salário monetário (W), tanto
trabalhadores como empregadores conheçam o poder de compra de mercadorias que resultará
desse salário (W/P).
Essas duas pressuposições, essenciais para a natureza da teoria do equilíbrio clássica do
emprego e do produto, são os elementos da teoria clássica que Keynes combate. Antes de
examinarmos esse ataque, discutiremos outros elementos importantes da teoria clássica.

Questões de revisão
1. Em que aspectos a oposição clássica ao mercantilismo foi importante para moldar as ideias
dos economistas clássicos sobre questões macroeconômicas?
2. Explique o conceito de função produção agregada. Como você esperaria que a função
produção da Figura 3.1 fosse afetada por um aumento na produtividade média e marginal do
trabalho para um dado nível de produto, devido, por exemplo, a um aumento da instrução da
força de trabalho? Como esse deslocamento da função produção afetaria os níveis de produto
e emprego no modelo clássico?
3. Explique as teorias clássicas de oferta e demanda por trabalho. Por que a curva de demanda
por trabalho tem inclinação descendente quando representada em relação ao salário real,
enquanto a curva de oferta de trabalho tem inclinação ascendente no mesmo gráfico?
4. Suponha que o gosto do público mude de tal maneira que o lazer torne-se mais desejável que
mercadorias. Como você esperaria que essa mudança afetasse o produto, o emprego e o
salário real no modelo clássico?
5. Chamamos a visão clássica do mercado de trabalho de um mercado de leilão. Que
pressuposições estão na base dessa caracterização?
6. Em microeconomia, esperamos que a curva de oferta da firma tenha inclinação positiva para
a direita quando traçada em relação ao preço. A curva de oferta agregada clássica baseia-se
nessa teoria microeconômica da firma, mas é vertical. Por quê?
7. Quais são os principais determinantes do produto e do emprego no sistema clássico? Que
papel tem a demanda agregada na determinação do produto e do emprego?
8. Suponha que, devido, por exemplo, à reconstrução depois de uma guerra, o estoque de
capital de uma nação aumente. Use o modelo gráfico da Figura 3.4 para ilustrar o efeito que
o aumento do estoque de capital teria sobre o produto, o emprego e o salário real no modelo
clássico.
9. Considere os efeitos de um subsídio governamental ao emprego em que o governo pagasse
10% dos salários de novos trabalhadores contratados. Como o emprego e o produto seriam
afetados pelo programa no modelo clássico? Qual seria o efeito sobre a posição da curva de
oferta agregada na Figura 3.6?
CAPÍTULO 4
Macroeconomia clássica (II): moeda, preços e juros

Neste capítulo, completamos o exame do modelo clássico. Analisamos a teoria clássica da


determinação do nível agregado de preços, que introduz o lado de demanda do modelo. A
determinação da taxa de juros também é abordada. Em seguida, examinamos as conclusões de
políticas públicas que emergem do modelo clássico – as concepções clássicas sobre política
monetária e fiscal.

4.1 A teoria quantitativa da moeda


Para compreender a determinação do nível de preços no sistema clássico, analisaremos o
papel da moeda. Na teoria clássica, a quantidade de moeda determina a demanda agregada, que,
por sua vez, determina o nível de preços.

4.1.1 A equação de trocas


O ponto de partida da teoria quantitativa da moeda clássica é a equação de trocas, uma
identidade que relaciona o volume de transações pelos preços vigentes à oferta de moeda
multiplicada pela taxa de circulação de cada unidade monetária. Essa velocidade de circulação
da moeda, que mede o número médio de vezes que cada unidade monetária é usada em
transações durante o período, é chamada de velocidade da moeda. Na forma usada pelo teórico
quantitativista americano Irving Fisher, essa identidade é expressa como

onde M é a quantidade de moeda, Vt é a velocidade de transações da moeda, Pt é o índice de


preços dos itens transacionados e T é o volume de transações. Essa relação é uma identidade por
causa da definição ex post de velocidade. Se, por exemplo, ao longo de um determinado período,
o valor de transações em moeda corrente (PtT) fosse $3.600 bilhões e a oferta de moeda (M)
fosse $300 bilhões, definimos a velocidade de transações (ou velocidade de circulação) da
moeda como o número de vezes, em média, que a mesma moeda foi usada em transações:

Teoria quantitativa da moeda


Teoria clássica que afirma que o nível de preços é
proporcional à quantidade de moeda.

Velocidade da moeda
Velocidade em que a moeda circula em transações do
PIB durante um determinado período: ou seja, o
número médio de vezes que cada unidade monetária é
usada em transações incluídas no PIB.

A variável de transações (T) inclui não só vendas e compras de bens recém-produzidos, mas
também trocas de ativos financeiros e bens produzidos anteriormente. Outra expressão da
equação de trocas foca apenas as transações em termos de renda:

onde M é novamente a quantidade de moeda e V é agora a velocidade-renda da moeda, o número


de vezes, em média, que a mesma moeda é usada em uma transação envolvendo a produção
corrente. O índice de preços para o produto produzido no período é dado por P e o nível de
produção corrente por Y. Uma vez mais, essa relação seria uma identidade na medida em que a
velocidade-renda fosse definida residualmente, como o nível necessário para fazer a igualdade
ser verdadeira:

Na equação (4.3), as variáveis são mais fáceis de medir e são fundamentais para nossos
interesses, portanto vamos nos centrar nessa forma da equação.
A equação de trocas é um truísmo e não explica as variáveis que contém. Fisher e outros
teóricos quantitativistas, porém, postularam que os valores de equilíbrio dos elementos da
equação de trocas, com exceção do nível de preços, são determinados por outras forças.
Portanto, a equação de trocas determina o nível de preços. Nas palavras de Fisher:

Encontramos que, nas condições consideradas, o nível de preços varia (1) diretamente com
a quantidade de moeda em circulação (M), (2) diretamente com a velocidade de sua
circulação (V), (3) inversamente com o volume de transações realizadas por meio dela (T). A
primeira dessas três relações merece destaque. Ela constitui a “teoria quantitativa da
moeda”.1

O produto é uma medida da atividade econômica real. Como vimos no Capítulo 3, os


economistas clássicos consideravam que essa variável fosse determinada pela oferta. Em termos
mais simples, pressupunha-se uma moeda metálica, como ouro, mas levar em consideração o
papel-moeda e depósitos bancários não complica seriamente a análise. O pressuposto importante
era que a quantidade de moeda era controlada exogenamente pela autoridade de política
monetária.
Fisher argumentava que, no equilíbrio, a velocidade da moeda era determinada pelos hábitos
de pagamento e pela tecnologia de pagamentos da sociedade. Por exemplo, fatores como a
extensão média do período de pagamento, a prática de usar contas ou cartões de crédito e o uso
de crédito comercial entre empresas afetam a velocidade de circulação. Períodos de pagamento
mais curtos levam a retenção média mais curta de moeda ao longo do período de pagamento
para qualquer nível de renda dado e, assim, a um aumento na velocidade da moeda. O uso
frequente de contas de crédito por consumidores ou de crédito comercial por empresas também
aumenta a velocidade, o número de transações por unidade monetária. De acordo com Fisher e
outros teóricos quantitativistas, o nível de equilíbrio da velocidade era determinado por tais
fatores institucionais e podia ser considerado fixo no curto prazo.
Se a velocidade for predeterminada e não simplesmente definida residualmente a fim de
igualar MV e PY, a equação de trocas não é meramente uma definição. Com o produto fixado
pelo lado da oferta, a equação de trocas agora expressa uma relação de proporcionalidade entre a
oferta de moeda definida exogenamente e o nível de preços:

ou

A barra sobre o V e o Y indica que esses termos podem ser tomados como fixos. A equação
(4.6) indica como o nível de preços depende da oferta de moeda. Se M dobra, P dobra, ou um
aumento de 10% em M leva a um aumento de 10% em P. Esse é o resultado básico da teoria
quantitativa da moeda: A quantidade de moeda determina o nível de preços.

4.1.2 A abordagem de Cambridge para a teoria quantitativa


A matemática da teoria quantitativa pode estar clara pelas equações (4.5) e (4.6), mas e a
economia? Como mudanças na oferta de moeda afetam o nível de preços? Essa pergunta poderá
ser respondida mais facilmente depois de examinarmos mais uma variante da teoria quantitativa:
a abordagem de Cambridge.
A abordagem de Cambridge, que deriva seu nome da Universidade de Cambridge, o lar
acadêmico de seus criadores, Alfred Marshall e A. C. Pigou, também demonstrava a relação
proporcional entre a quantidade de moeda e o nível agregado de preços. A base dessa relação
era, no entanto, menos mecanicista do que a versão centrada em transações, ou fisheriana (de
Irving Fisher), da teoria quantitativa. Marshall começou focalizando a decisão do indivíduo
quanto à quantidade ótima de moeda a ser mantida. Alguma moeda será mantida pela
conveniência que a moeda proporciona nas transações em comparação com outras formas de
armazenar valor. A moeda também oferece segurança, por reduzir a possibilidade de
inconveniência ou de falência por não conseguir atender a obrigações inesperadas. Mas, como
observou Pigou, “a moeda mantida na mão não gera renda”, portanto a moeda será mantida
apenas na medida em que suas vantagens em termos de conveniência e segurança superem a
renda perdida por não investir em uma atividade produtiva ou a satisfação perdida por não usar
simplesmente a moeda para comprar bens de consumo. Com base nesses critérios, de quanto
seria o montante ótimo de moeda a ser mantido?

Abordagem de Cambridge
Versão da teoria quantitativa da moeda centrada na
demanda por moeda (Md = kPY).

Marshall e os outros economistas de Cambridge consideraram que a demanda por moeda


seria uma proporção da renda. A equação de Cambridge é escrita como

A demanda por moeda (Md) seria uma proporção (k) da renda nominal, ou seja, o nível de
preços (P) vezes o nível de renda real (Y). A característica desejável da moeda é sua utilidade
para transações, portanto, a demanda por moeda depende do nível de transações, que se pode
supor que varie em estreita conexão com a renda. A proporção ótima de renda a ser mantida em
forma de moeda (k) é considerada estável no curto prazo, dependendo, como na formulação
fisheriana, dos hábitos de pagamento da sociedade.
No equilíbrio, a oferta exógena de moeda deve ser igual à quantidade de moeda demandada:

Com k fixo no curto prazo e o produto real (Y) determinado, como antes, pelas condições de
oferta, a equação de Cambridge também se reduz a uma relação proporcional entre o nível de
preços e a oferta de moeda. Como na abordagem fisheriana, a quantidade de moeda determina o
nível de preços.
A equivalência formal entre a equação de Cambridge e a versão de Fisher da equação de
trocas pode ser percebida reescrevendo a equação (4.8) como

Comparando isso com a equação de Fisher (4.5), podemos ver que as duas formulações são
equivalentes, com V igual a 1/k. Por exemplo, se indivíduos quiserem manter um montante igual
a um quarto da renda nominal na forma de moeda, o número de vezes que a moeda média é
usada em transações de renda será quatro.
Embora as duas formulações da teoria quantitativa sejam formalmente equivalentes, a versão
de Cambridge representa um passo na direção de teorias monetárias mais modernas. O foco de
Cambridge era na teoria quantitativa como uma teoria da demanda por moeda. A relação
proporcional entre a quantidade de moeda e o nível de preços resultava do fato de que a
proporção de renda nominal que as pessoas queriam manter na forma de moeda (k) era constante
e o nível de produto real era fixado pelas condições de oferta. Dando seguimento à análise de
Pigou das alternativas a manter riqueza em forma de moeda, Keynes contrapôs-se à teoria
quantitativa apresentando uma nova teoria de demanda por moeda.
Além disso, o foco de Cambridge na demanda por moeda leva a uma resposta à pergunta
sobre o modo como a moeda afeta o nível de preços. Vamos supor que comecemos no equilíbrio
e, então, examinemos os efeitos de duplicar a quantidade de moeda. Inicialmente, há um excesso
de oferta de moeda em relação ao montante demandado. Os indivíduos tentam reduzir seus
estoques de moeda à proporção ótima de sua renda dando a esse excedente usos alternativos de
consumo e investimento. Eles aumentam sua demanda por mercadorias. Essa demanda
aumentada por mercadorias pressiona os preços para cima. Na linguagem dos economistas
clássicos, há moeda demais à procura de bens insuficientes. Se o produto ficar inalterado, como
seria no modelo clássico, e k for constante, um novo equilíbrio só será alcançado depois que o
nível de preços for dobrado. Nesse ponto, a renda nominal e, portanto, a demanda por moeda,
terão dobrado. Essa era a ligação no sistema clássico entre moeda e preços; uma oferta de moeda
excessiva levava a uma demanda aumentada por mercadorias e a uma pressão de alta sobre o
nível de preços.

4.1.3 A curva de demanda agregada clássica


A teoria quantitativa é a teoria implícita da demanda agregada por produto dentro do sistema
clássico. Podemos usar a teoria quantitativa para construir a curva de demanda agregada clássica
da Figura 4.1. Para tornar o exemplo mais concreto, atribuímos valores numéricos às variáveis
que nos interessam. Vamos supor que o valor de k seja um quarto, portanto a velocidade é 4.
Inicialmente, suponhamos que a oferta de moeda seja de 300 unidades. Para que as equações
(4.8) ou (4.5) sejam válidas, P × Y (renda nominal) deve ser igual a 1.200 (4 × 300). Na Figura
4.1, com o preço no eixo vertical e o produto real no eixo horizontal, a curva identificada como
Yd (M = 300) conecta todos os pontos em que P × Y é igual a 1.200 unidades.2 Os pontos na
curva são, por exemplo, níveis de renda real de 300 e 600 com níveis de preços correspondentes
de 4,0 e 2,0, respectivamente.
Agora, consideremos um valor mais alto da oferta de moeda, por exemplo, 400 unidades.
Para satisfazer as equações (4.8) ou (4.5), com k ainda igual a um quarto (V = 4), (P × Y) deve
agora ser igual a 1.600. A curva Yd (M = 400) correspondente a um valor de M igual a 400 está
acima e à direita da curva Yd (M = 300) e mostra todas as combinações (P × Y) iguais a 1.600.
Um aumento na oferta de moeda desloca a curva de demanda agregada para a direita.
Para uma dada oferta de moeda, traçamos uma curva de demanda agregada de inclinação
negativa que pode ser combinada à curva de oferta agregada vertical da Figura 3.6 para ilustrar a
determinação do preço e do produto no modelo clássico. Isso é feito na Figura 4.2.

FIG 4.1 Curva de demanda agregada clássica


A curva de demanda agregada clássica mostra combinações do nível de preços (P) e do produto (Y) compatíveis com a equação
da teoria quantitativa PY = MV, para uma dada oferta de moeda (M) e velocidade fixa (V). Com M = 300 e considerando-se que a
velocidade seja 4, pontos como P = 12,0 e Y = 100 ou P = 6,0 e Y = 200 (PY = 1.200 = MV em cada caso) estão na curva de
demanda agregada. Um aumento na oferta de moeda para M = 400 desloca a curva de demanda agregada para a direita.

A Figura 4.2 reproduz a curva de oferta agregada vertical (Y1s) da Figura 3.6 e mostra várias
curvas de demanda agregada [Yd (M1), Yd (M2), Yd (M3)] traçadas para valores sucessivamente
mais altos da oferta de moeda (M1, M2, M3). Como acabamos de explicar, o aumento da oferta
de moeda desloca a curva de demanda agregada para cima e para a direita. Como a curva de
oferta é vertical, aumentos na demanda não afetam o produto. Apenas o nível de preços
aumenta. Note-se também que, para um valor dado de k (ou V), uma mudança na quantidade de
moeda é o único fator que desloca a curva de demanda agregada. Como o valor de equilíbrio de
k (ou V) era considerado estável no curto prazo, a demanda agregada variava apenas com a
oferta de moeda.
A teoria clássica da demanda agregada foi chamada de teoria implícita. A teoria não é
explícita no sentido de focalizar os componentes da demanda agregada e explicar os fatores que
determinam seu nível. Em vez disso, na teoria clássica, um dado valor de MV [ou M(1/k) ]
implica o nível de P × Y que é necessário para o equilíbrio no mercado de moeda – para a
demanda por moeda ser igual à oferta de moeda existente. Se a demanda por moeda exceder
(não alcançar) a oferta de moeda, haverá um transbordamento (spillover) para o mercado de
mercadorias, com os indivíduos tentando reduzir (aumentar) seus gastos em mercadorias. Os
pontos ao longo da curva Yd são pontos em que as firmas e famílias estão em equilíbrio com
relação à moeda que mantêm e, portanto, também estão nas taxas de equilíbrio de seus gastos
com mercadorias.

FIG 4.2 Oferta e demanda agregadas no sistema clássico


Aumentos sucessivos na oferta de moeda, de M1 para M2 e depois para M3, deslocam a curva de demanda agregada para a
direita, de Yd (M1) para Yd (M2) para Yd (M3). O nível de preços aumenta de P1 para P2 para P3. O produto, que é determinado
pela oferta, fica inalterado (Y1 = Y2 = Y3).

4.2 A teoria clássica da taxa de juros


No sistema clássico, os componentes da demanda agregada – consumo, investimento e gastos
governamentais – desempenham um papel explícito na determinação da taxa de juros. É, de fato,
a taxa de juros que garante que mudanças exógenas nos componentes específicos da demanda
não afetem a demanda agregada.
A taxa de juros de equilíbrio na teoria clássica era a taxa em que o montante de fundos que os
indivíduos desejassem emprestar fosse exatamente igual ao montante que outros desejassem
tomar emprestado. Para simplificar, consideramos que tomar um empréstimo consista em vender
um título padrão, ou seja, uma promessa de pagar determinados montantes monetários no futuro.
Emprestar consiste em comprar esses títulos. Mais adiante, examinaremos as propriedades dos
títulos mais detalhadamente; por enquanto, o pressuposto mais simples é que o título padrão seja
uma perpetuidade, um título que pague um fluxo perpétuo de juros sem nenhum retorno do
principal. A taxa de juros mede o retorno de se manter títulos e, equivalentemente, o custo de
tomar empréstimos. A taxa de juros depende dos fatores que determinam os níveis de oferta de
títulos (tomar empréstimos) e de demanda por títulos (emprestar).

PERSPECTIVAS 4.1 - A MOEDA NAS HIPERINFLAÇÕES


A relação entre a moeda e o nível de preços postulada pela teoria quantitativa pode ser observada claramente durante
hiperinflações. Uma hiperinflação é um período em que o nível de preços explode. Quando isso acontece, a oferta de moeda
sempre explode também. Isso pode ser observado olhando para exemplos históricos de hiperinflação. Na Alemanha entre
agosto de 1922 e novembro de 1923, a taxa de inflação mensal foi de 322%. O crescimento da oferta de moeda no mesmo
período foi de 314% ao mês. Na Hungria entre agosto de 1945 e julho de 1946, a taxa de inflação mensal foi de 19.800%; o
crescimento da oferta de moeda foi de 12.200%.
A Tabela 4.1 mostra as taxas de inflação e de crescimento da oferta de moeda em alguns países que enfrentaram taxas de
inflação altas e persistentes em um período mais recente. Aqui, uma vez mais, há uma forte relação positiva entre inflação
e crescimento da oferta de moeda.
Como será visto em capítulos posteriores, muitos economistas não aceitam a aplicação da teoria quantitativa da moeda a
economias em circunstâncias normais. Os dados da Tabela 4.1, porém, ilustram uma implicação da teoria quantitativa
sobre a qual há amplo consenso: taxas de inflação persistentemente muito altas requerem o acompanhamento de altas
taxas de crescimento monetário.

Tabela 4.1 - Inflação e crescimento monetário em algumas economias com alta inflação, 1985-
95

Taxa de inflação Taxa de crescimento monetário


(% anual) (% anual)
Nicarágua 962 836
Brasil 875 996
Peru 399 389
Argentina 256 258

Fonte: Banco Mundial

No sistema clássico, os fornecedores de títulos eram as firmas, que financiavam todos os


gastos em investimentos pela venda de títulos, e o governo, que poderia vender títulos para
financiar os gastos que ultrapassassem as receitas tributárias.3
O nível do déficit público (excesso de gastos sobre as receitas), bem como a parte do déficit
que o governo poderia escolher financiar vendendo títulos para o público, são variáveis
exógenas de política econômica. No modelo clássico, o nível de investimento das empresas era
uma função da rentabilidade esperada de projetos de investimento e da taxa de juros.
Considerava-se que a rentabilidade esperada de projetos de investimento variasse de acordo com
as expectativas de demanda pelo produto ao longo da vida desses projetos e o estado dessas
expectativas estava sujeito a variações exógenas.
Para uma dada rentabilidade esperada, os gastos com investimentos variavam inversamente à
taxa de juros. Os economistas clássicos explicavam essa relação da seguinte forma: uma firma
teria um número de projetos de investimento possíveis, com retornos esperados diversos. Ela
poderia classificar esses projetos de acordo com o nível de retornos esperados. A taxa de juros
representa o custo de tomar recursos emprestados para financiar esses projetos de investimento.
A uma taxa de juros alta, menos projetos serão lucrativos após a dedução do custo dos juros. As
taxas de juros sucessivamente mais baixas (custos de empréstimo menores), cada vez mais
projetos serão lucrativos após desconto dos custos dos juros e o investimento aumentará.
Examinaremos os investimentos mais detalhadamente adiante, mas o resultado geral será o
mesmo. O investimento depende inversamente da taxa de juros. Assim, no lado da oferta
(tomada de empréstimos) do mercado de títulos, a oferta de títulos do governo é exógena e a
oferta de títulos pelas empresas é igual ao nível dos gastos com investimentos. O investimento
varia inversamente com a taxa de juros e é também influenciado por mudanças exógenas na
rentabilidade esperada dos projetos de investimento.
No lado da demanda (concessão de empréstimos) do mercado de títulos estão os poupadores
individuais que compram os títulos. No modelo clássico, a poupança era considerada uma
função positiva da taxa de juros. O ato de poupar é o ato de adiar o consumo atual para ter um
poder de compra sobre os bens em um período futuro, ou seja, uma troca de consumo atual por
consumo futuro. Quando a taxa de juros sobe, os termos da troca tornam-se mais favoráveis.
Uma unidade monetária poupada hoje renderá um retorno de juros mais alto para o poupador e
um poder de compra maior de bens de consumo em um período futuro. Os economistas clássicos
consideravam que os indivíduos decidiriam aproveitar essa troca mais favorável; eles poupariam
mais a taxas de juros mais altas.
Mas a poupança não precisa ser direcionada para títulos; a moeda também é um depósito de
riqueza potencial. Como a moeda não pagava juros, os economistas clássicos pressupunham que
os títulos seriam preferidos como forma de manter riqueza. Conforme discutido anteriormente,
alguma moeda seria mantida pela conveniência e segurança oferecidas. No entanto, a riqueza
acumulada por meio de novas poupanças seria mantida em títulos. Os economistas clássicos
acreditavam que as pessoas poderiam transferir sua riqueza para a forma de moeda em tempos
de graves crises econômicas. Nesses momentos, com a prevalência de pânico bancário e
falências, as pessoas poderiam se preocupar com a possibilidade de inadimplência dos títulos e
decidir guardar moeda, mas, em tempos normais, a pressuposição clássica era que a poupança
era uma demanda por títulos.
A determinação da taxa de juros é ilustrada na Figura 4.3. A poupança (S) é representada
como uma função positiva da taxa de juros. A poupança proporciona a demanda por títulos ou,
como diziam os economistas clássicos, a oferta de fundos de empréstimo. O investimento (I) é
uma curva de inclinação negativa em relação à taxa de juros. O investimento mais o déficit
governamental exogenamente determinado (G – T), todo o qual seria financiado pela venda de
títulos, equivale à oferta de títulos. Na terminologia clássica, essa é a demanda por fundos de
empréstimo. No gráfico, r0 é a taxa de juros de equilíbrio, a taxa de juros que iguala a demanda e
a oferta de fundos de empréstimo.

FIG 4.3 Determinação da taxa de juros no sistema clássico

A taxa de juros de equilíbrio r0 é a taxa que iguala a oferta de fundos de empréstimo, que consiste na poupança (S), e a demanda
por fundos de empréstimo, que é o investimento (I) mais o déficit público financiado por títulos (G – T).

A taxa de juros tem uma função estabilizadora no sistema clássico, como pode ser visto pelo
exame dos efeitos de uma mudança da rentabilidade esperada dos investimentos. Lembremos
que, no curto prazo, o investimento depende da taxa de juros e da rentabilidade futura esperada
de projetos de investimento. Vamos supor que, como resultado de um evento exógeno (por ex.,
medo de uma guerra futura), os administradores de empresas em geral baixem sua expectativa
quanto a lucros futuros dos investimentos. O efeito seria uma redução dos investimentos e,
assim, uma diminuição da demanda por fundos de empréstimo em todas as taxas de juros.
A Figura 4.4 ilustra o efeito desse declínio autônomo da demanda por investimento. Para
simplificar, pressupomos que o orçamento do governo esteja equilibrado (G = T), de modo que
não haja tomadas de empréstimo governamentais. O investimento é a única fonte da demanda
por fundos de empréstimo. A queda na rentabilidade esperada de projetos de investimento é
mostrada como um deslocamento da curva de investimento para baixo, de 10 para 11. A uma
dada taxa de juros, a magnitude do declínio no investimento é medida por ΔI na Figura 4.4.
À taxa de juros de equilíbrio inicial r0, após a queda nos investimentos, a oferta de fundos de
empréstimo excede a demanda, pressionando para baixo a taxa de juros. Conforme a taxa de
juros declina, dois ajustes ocorrem. Primeiro, a poupança declina; assim, o consumo (C)
aumenta. A magnitude desse declínio da poupança e o aumento equivalente do consumo são
dados pela distância marcada como A na Figura 4.44. Segundo, o investimento é retomado em
alguma medida pelo declínio da taxa de juros. Esse aumento do investimento induzido pela taxa
de juros é medido pela distância B na Figura 4.4. O equilíbrio é restaurado na taxa de juros r1,
com a poupança (a oferta de fundos de empréstimo) novamente igual ao investimento (a
demanda por fundos de empréstimo). No novo equilíbrio, o aumento do consumo (queda da
poupança) mais o aumento do investimento causado pela queda da taxa de juros, a distância A +
B na Figura 4.4, é exatamente igual ao declínio autônomo original da demanda por investimento,
a distância Δl na Figura 4.4. Devido ao ajuste da taxa de juros, a soma das demandas do setor
privado (C + I) não é afetada pelo declínio autônomo da demanda por investimento.
Esse papel estabilizador da taxa de juros é importante para o sistema clássico. O ajuste da
taxa de juros é a primeira linha de defesa do pleno emprego. Choques que afetem a demanda por
consumo, a demanda por investimento ou a demanda do governo não afetarão a demanda total
pelo produto. Esses choques não deslocarão a curva de demanda agregada da Figura 4.2. Mesmo
que o fizessem, não haveria efeito sobre o produto ou sobre o emprego, devido às propriedades
de autoajuste do mercado de trabalho clássico, conforme refletidas na curva de oferta agregada
vertical – a segunda linha de defesa do pleno emprego.

FIG 4.4 Declínio autônomo da demanda por investimento


Um declínio autônomo do investimento desloca a curva de investimento para a esquerda, de I0 para I1 – a distância ΔI. A taxa de
juros de equilíbrio cai de r0 para r1. Conforme a taxa de juros diminui, há um aumento no investimento induzido pela taxa de
juros – a distância B. Há também uma queda induzida pela taxa de juros na poupança, que é igual ao aumento no consumo – a
distância A. Os aumentos do consumo e do investimento induzidos pela taxa de juros equilibram exatamente o declínio autônomo
do investimento.

4.3 As implicações de política econômica do modelo de equilíbrio


clássico
Nesta seção, analisamos os efeitos de ações de política fiscal e monetária no modelo clássico.
Examinamos os efeitos que diversas mudanças nas políticas terão sobre o produto, o emprego, o
nível de preços e a taxa de juros.

4.3.1 Política fiscal


A política fiscal é o estabelecimento do orçamento federal e, assim, envolve decisões sobre
gastos governamentais e tributação. Ao analisar a visão clássica da política fiscal, é conveniente
começar pelos gastos governamentais.
4.3.1.1 Gastos governamentais
Considere os efeitos de um aumento dos gastos governamentais. A primeira questão que
surge é como financiar os gastos aumentados. Como uma empresa ou uma família, o governo
tem uma restrição orçamentária: a condição de que todos os gastos possam ser financiados por
alguma fonte. O governo tem três fontes de recursos: tributação, venda de títulos para o público
(tomar empréstimo de recursos do público) ou criação de mais moeda. A criação de mais moeda
pode assumir várias formas, mas, em nossa discussão aqui, não será prejudicial pressupor que o
governo simplesmente emita mais moeda para financiar seus gastos.
Para aumentar os gastos, portanto, o governo precisa aumentar a arrecadação tributária,
vender mais títulos ao público ou aumentar a oferta de moeda. Por enquanto, para evitar
introduzir uma mudança na política monetária, vamos pressupor que a oferta de moeda seja fixa.
Pressuporemos, também, que a arrecadação tributária seja fixa. Os gastos governamentais
aumentados, portanto, seriam financiados vendendo títulos ao público.
De nossa análise, até este ponto, decorre que um aumento dos gastos do governo financiado
por títulos não afetará os valores de equilíbrio do produto ou do nível de preços. Isso ocorre
porque construímos tanto a curva de demanda agregada como a de oferta agregada, que, juntas,
determinam o produto e o nível de preços, sem fazer referência ao nível de gastos
governamentais. O produto não é afetado por mudanças nos gastos do governo, portanto o
emprego também não deve ser afetado. Para compreender esses resultados, examinaremos como
uma mudança nos gastos do governo afeta a taxa de juros.
A Figura 4.5 mostra o efeito sobre o mercado de fundos de empréstimo de um aumento nos
gastos governamentais financiado por uma venda de títulos para o público. Se os gastos do
governo forem maiores que a receita tributária, então (G – T) é positivo, onde G são os gastos
governamentais, T é a receita tributária e (G – T) é o déficit público. Pressupomos que, antes do
aumento dos gastos, o orçamento do governo estivesse equilibrado, ou seja, (G = T). O déficit do
governo é, então, igual ao aumento dos gastos públicos, (G – T)1. Inicialmente, sem nenhum
déficit governamental, o mercado de fundos de empréstimo está em equilíbrio no ponto E.
Pressupondo que não haja nenhuma tomada de empréstimo por parte do governo, a taxa de juros
de equilíbrio, r0, iguala a oferta de fundos de empréstimo à demanda por fundos de empréstimo.
Inicialmente, o investimento, l, é a única fonte de demanda por fundos de empréstimo. Se o
aumento nos gastos do governo for financiado pela venda de títulos, então a demanda total por
fundos de empréstimo inclui tanto investimento, l, como empréstimos tomados pelo governo, (G
– T)1. O aumento na demanda por fundos de empréstimo é mostrado como um deslocamento
para a direita na demanda, de I para I + (G – T)1, movendo o ponto de equilíbrio E para o ponto
de equilíbrio F. Note-se que a distância do deslocamento horizontal na curva mede a magnitude
do aumento dos gastos públicos deficitários. Essa magnitude é medida pela distância (G – T)1 na
Figura 4.5.
O aumento dos gastos governamentais cria uma demanda aumentada por fundos de
empréstimo, conforme o governo vende títulos ao público para financiar os novos gastos. Isso
cria um excesso de tomadores de empréstimos em relação aos emprestadores na taxa de juros
inicial r0, o que empurra a taxa de juros para cima, até r1 O aumento da taxa de juros tem dois
efeitos. A poupança aumenta de S0 para S1; essa é a distância A na Figura 4.5. Como foi
explicado na seção anterior, um aumento na poupança reflete-se em um declínio igual no
consumo. Segundo, a quantidade de investimento diminui com a taxa de juros mais alta. Em r1,
encontramos o novo nível de investimento I1 na curva I. O declínio no investimento é a distância
B na Figura 4.5.
A figura mostra que o declínio no consumo, que é igual à magnitude do aumento da
poupança (distância A), mais o declínio no investimento (distância B) é exatamente igual à
magnitude do aumento dos gastos do governo (G – T)1. O aumento dos gastos governamentais
financiado pela venda de títulos ao público empurra a taxa de juros para cima o suficiente para
deslocar (crowd out) uma quantidade igual de gastos privados (consumo mais investimento). Os
gastos privados são desestimulados, porque as taxas de juros mais elevadas fazem as famílias
substituírem consumo imediato por consumo futuro – em outras palavras, poupar mais. O
investimento declina porque menos projetos parecem lucrativos com os custos mais altos dos
empréstimos. É esse deslocamento que impede a demanda agregada de aumentar quando o
componente governamental da demanda sobe. Como a demanda agregada não se altera, os
aumentos nos gastos governamentais financiados por títulos não afetam o nível de preços.
Quais são os efeitos de um aumento dos gastos governamentais se, alternativamente, o
governo emitir moeda para financiar os novos gastos? Nesse caso, como a quantidade de moeda
é alterada, o nível de preços mudará proporcionalmente. Analisamos anteriormente como um
aumento na oferta de moeda desloca a curva de demanda agregada para cima ao longo da curva
de oferta agregada vertical, elevando o nível de preços (veja a Figura 4.2). No sistema clássico, a
fonte do aumento da oferta de moeda não importa. Uma dada mudança na oferta de moeda tem o
mesmo efeito quer essa moeda entre na economia para financiar um aumento dos gastos
governamentais ou de alguma outra maneira. Em outras palavras – e este é o ponto crucial –, o
aumento dos gastos governamentais não tem nenhum efeito independente sobre a demanda
agregada.

FIG 4.5 Efeito de um aumento dos gastos governamentais no modelo clássico

No ponto de equilíbrio E, a taxa de juros r0 iguala a oferta de fundos de empréstimo, S, e a demanda por fundos de empréstimo, I.
O aumento dos gastos governamentais deficitários, (G – T)1, desloca a demanda por fundos de empréstimo para a direita. A taxa
de juros de equilíbrio sobe para r1 no ponto F. O aumento da taxa de juros causa um declínio no investimento de I0 para I1, a
distância B, e um aumento na poupança, que corresponde a um declínio igual no consumo, de S0 para S1, a distância A. O
declínio no investimento e no consumo compensa exatamente o aumento nos gastos do governo.
4.3.1.2 Política tributária
Efeitos do lado da demanda. Se considerarmos apenas os efeitos sobre a demanda, a análise
de uma mudança nos impostos produz resultados que são análogos aos dos gastos
governamentais. Por exemplo, por aumentar a renda disponível das famílias, um corte nos
impostos estimularia o consumo. Se, contudo, o governo vendesse títulos ao público para
substituir as receitas perdidas pelo corte nos impostos, ocorreria o mesmo processo de
deslocamento (crowding-out) que no caso de um aumento dos gastos governamentais financiado
por títulos. A taxa de juros de equilíbrio subiria, o investimento cairia e haveria também um
aumento da poupança induzido pela taxa de juros, fazendo com que o consumo voltasse ao
patamar anterior ao corte nos impostos. No caso de uma redução de impostos, como no aumento
dos gastos governamentais, a demanda agregada não seria afetada.
Se a receita perdida devido ao corte de impostos fosse substituída por meio da emissão de
moeda, então, como no caso de um aumento nos gastos do governo, a criação de moeda
aumentaria a demanda agregada e a redução de impostos faria o nível de preços subir. Uma vez
mais, porém, seria simplesmente o aumento da oferta de moeda que afetaria o nível de preços. O
corte nos impostos não teria nenhum efeito independente sobre a demanda agregada.

FIG 4.6 Efeitos do lado da oferta de uma redução no imposto de renda


Efeitos do lado da oferta. Se o corte de impostos fosse fixo e uniforme (lumpsum), por
exemplo, se todas as famílias tivessem uma redução de impostos de $100, só seria preciso levar
em conta os efeitos do lado da demanda.5 Mas suponhamos que o corte

FIG 4.6 Efeitos do lado da oferta de uma redução no imposto de renda

Na parte a, uma redução na alíquota marginal do imposto de renda (de 0,40 para 0,20) aumenta o salário real após o imposto em
relação a um determinado valor do salário real antes do imposto. A curva de oferta de trabalho desloca-se para a direita. O
equilíbrio move-se do ponto A para o ponto B. O emprego e o produto aumentam, como é mostrado na parte b do gráfico,
movendo-se do ponto A para o ponto B na função produção. Esse aumento do produto é representado pelo deslocamento para a
direita da curva de oferta agregada vertical na parte c.
de impostos ocorresse na forma de uma redução nas alíquotas do imposto de renda. Suponhamos
que a alíquota marginal do imposto de renda fosse cortada de iniciais 40% para uma nova
alíquota de 20%. Em vez de pagar 0,40 de imposto a cada unidade monetária adicional recebida,
seria preciso pagar apenas 0,20. No modelo clássico, essa mudança teria um efeito de incentivo
sobre a oferta de trabalho. A mudança afetaria o lado da oferta do modelo e afetaria o produto e
o emprego.
A Figura 4.6 ilustra o efeito de uma redução na alíquota marginal do imposto de renda dentro
do modelo clássico. A parte a mostra os efeitos no mercado de trabalho. Um corte na alíquota do
imposto aumentaria a oferta de trabalho em qualquer valor do salário real (antes do imposto) e
deslocaria a curva de oferta de trabalho para a direita. Esse deslocamento acontece porque o
trabalhador está interessado no salário real após o imposto, que, neste caso, é (1 – ty)W/P, onde
ty é a alíquota marginal do imposto de renda. Se tivéssemos incluído um imposto sobre a renda
em nosso modelo clássico no Capítulo 3, a função oferta de trabalho seria

Para um dado salário real antes do imposto (W/P), um corte no imposto de renda representa
um aumento no salário real após o imposto e, portanto, aumenta a oferta de trabalho.
Na Figura 4.6a, quando a alíquota marginal do imposto de renda cai de 0,40 para 0,20, a
curva de oferta de trabalho desloca-se de NS(ty = 0,40) para NS(ty = 0,20). O nível de emprego de
equilíbrio sobe de N0 para N1. A parte b da Figura 4.6 mostra a função produção agregada. O
aumento do emprego de N0 para Nt como resultado do aumento da oferta de trabalho leva a um
aumento do produto de Y0 para Y1.
Na parte c da figura, esse aumento no nível de produto (de Y0 para Y1) determinado pela
oferta é mostrado como um deslocamento para a direita da curva de oferta agregada, de YS(ty =
0,40) para YS(ty = 0,20). Como a demanda agregada permanece inalterada (determinada pelo
nível de oferta de moeda), esse aumento da oferta agregada resulta em uma queda no nível de
preços6.
Em suma, mudanças nos gastos governamentais ou nos impostos não têm efeitos
independentes sobre a demanda agregada, por causa do ajuste da taxa de juros e dos efeitos de
deslocamento resultantes sobre componentes da demanda do setor privado. Mudanças nas
alíquotas marginais do imposto de renda têm efeitos adicionais no lado da oferta. Uma redução
da alíquota marginal do imposto de renda, por exemplo, estimula a oferta de trabalho e leva a
um aumento do emprego e do produto.

PERSPECTIVAS 4.2 - A ECONOMIA DO LADO DA OFERTA – UMA


VISÃO CLÁSSICA MODERNA
Os economistas clássicos do século XIX e início do século XX não deram muita atenção aos efeitos no lado da oferta de
mudanças nas alíquotas do imposto de renda. Na época, a alíquota marginal do imposto de renda era baixa e dizia respeito
apenas aos relativamente ricos. Nos Estados Unidos a alíquota marginal média do imposto de renda (a média das faixas de
imposto) em 1920 era de menos de 5%. Além disso, na década de 1920 menos de 15% das famílias americanas tinham renda
suficientemente alta para ser obrigadas a fazer declaração de imposto de renda.
A situação mudou no período posterior à Segunda Guerra Mundial. Em 1980, as alíquotas federais efetivas do imposto de
renda eram muito mais altas e uma grande maioria das famílias americanas tinha renda suficientemente alta para estar
sujeita ao imposto de renda. Além disso, impostos da Seguridade Social e do Medicare haviam entrado em vigor. Na
década de 1970, um grupo que ficou conhecido como economistas do lado da oferta argumentou, mais ou menos segundo
as linhas da análise desta subseção, que esses impostos formavam uma “cunha” entre o salário real pago pelos
empregadores e o recebido pelo trabalhador.
A redução do tamanho dessa cunha, afirmavam eles, aumentaria os incentivos para a oferta de trabalho e resultaria em
produto e emprego mais altos, conforme ilustrado na Figura 4.6.
No final da década de 1970, economistas como Robert Mundell da Columbia University e Arthur B. Laffer, então na
University of Southern California, haviam popularizado a ideia de que cortes de impostos teriam efeitos fortemente
favoráveis no lado da oferta. O deputado Jack Kemp e o senador William Roth aceitaram o argumento dos economistas do
lado da oferta e, em 1977, apresentaram um projeto de lei propondo cortes gerais de 10% nas alíquotas do imposto de
renda para pessoa física por três anos sucessivos. Em 1980, Ronald Reagan endossou a proposta de Kemp-Roth e, em
1981, foi aprovada a lei tributária Reagan-Kemp-Roth, que determinava uma redução geral de 23% no imposto de renda
durante três anos. Mais tarde, a Lei de Reforma Fiscal de 1986 reduziu ainda mais as alíquotas marginais do imposto de
renda.
Em geral, ao longo das três décadas após 1980, as alíquotas do imposto de renda da maioria das famílias apresentaram
uma tendência de queda. As alíquotas tributárias para previdência social) subiram na década de 1980, depois se
estabilizaram. Houve um aumento nas alíquotas marginais do imposto de renda, especialmente na faixa mais alta, durante
a administração Clinton, como parte de um pacote de política fiscal que levou o orçamento federal a situação de superávit
em 2000. As alíquotas gerais mais baixas ocorreram em 2002-08, depois das reduções tributárias durante o governo de
George W. Bush. Esse padrão pode ser observado na Tabela 4.2, que mostra as alíquotas federais efetivas médias em anos
selecionados. As alíquotas mais baixas depois das reduções tributárias do governo Bush e o declínio nas receitas causado
pela recessão profunda de 2007-2009 produziram uma queda nas receitas tributárias de 20% para 15% do PIB entre 2000 e
2010. A recessão levou a aumentos dos gastos com itens como seguro-desemprego e auxílio-alimentação. Os gastos com
duas guerras e outros gastos discricionários somaram-se a esses para inchar as despesas orçamentárias federais para 24%
do PIB em 2010. O resultado dessas mudanças nas receitas e despesas foi um enorme déficit orçamentário federal. Mesmo
com a recuperação da economia, as projeções orçamentárias de médio e longo prazo mostram déficits grandes e crescentes
para as próximas décadas como resultado do aumento dos custos com assistência de saúde e o envelhecimento da
população. As propostas dos economistas do lado da oferta para lidar com esses déficits centraram-se em cortar gastos e
evitar aumentos de impostos. A posição do lado da oferta foi especialmente influente entre os deputados Republicanos na
Câmara norte-americana.

Tabela 4.2 - Alíquota federal efetiva do imposto de renda nos Estados Unidos, anos
selecionados (%)

FONTE: Congressional Budget Offices.

4.3.2 Política monetária


No sistema clássico, a quantidade de moeda determina o nível de preços e o nível de renda
nominal. Nesse sentido, a política monetária era muito importante para os economistas clássicos.
Uma moeda estável era um requisito para preços estáveis.
Em outro sentido, a moeda não era importante. A quantidade de moeda não afetava os valores
de equilíbrio das variáveis reais no sistema: produto, emprego e taxa de juros. A determinação
de produto e emprego com base na oferta foi o tema do Capítulo 3. A teoria da taxa de juros de
equilíbrio que construímos aqui é uma teoria real que não mencionava a quantidade de moeda.
Os fatores determinantes da taxa de juros eram a demanda real por investimento, a poupança
real e o valor real do déficit governamental – o que os economistas clássicos chamavam de
forças de “produtividade e poupança”.
Conclusão
Os economistas clássicos enfatizaram as tendências de autoajuste da economia. Livre de
ações desestabilizadoras do governo, o setor privado seria estável e o pleno emprego seria
alcançado. O primeiro desses mecanismos autoestabilizadores é a taxa de juros, que se ajusta
para evitar que choques em demandas setoriais afetem a demanda agregada. O segundo conjunto
de estabilizadores são preços e salários monetários livremente flexíveis, que impedem que
mudanças na demanda agregada afetem o produto. A flexibilidade de preços e salários é crucial
para as propriedades de pleno emprego do sistema clássico. A estabilidade inerente ao setor
privado levou os economistas clássicos a conclusões de políticas econômicas não
intervencionistas. Sem dúvida muitas das políticas mercantilistas intervencionistas a que os
economistas clássicos se opunham (tarifas, monopólios comerciais, etc.) estavam bem longe das
políticas de estabilização macroeconômica atuais, mas o modelo em si defende a não-
intervenção em um sentido muito geral.
Um segundo aspecto central do sistema clássico é a dicotomia entre os fatores que
determinam as variáveis reais e nominais. Na teoria clássica, fatores reais (do lado da oferta)
determinam variáveis reais. Produto e emprego dependem essencialmente da população,
tecnologia e formação de capital. A taxa de juros depende de produtividade e poupança. A
moeda é um véu que determina os valores nominais pelos quais as quantidades são medidas,
mas fatores monetários não participam da determinação dessas quantidades reais.
No próximo sistema teórico que examinaremos, a teoria keynesiana, vamos ver conclusões de
política econômica que são mais intervencionistas. Veremos também que as variáveis
monetárias e reais estão mais estreitamente relacionadas.

Questões de revisão
1. Explique o papel da moeda no sistema clássico. Especificamente, no modelo clássico, qual o
papel da moeda na determinação do produto real, emprego, nível de preços e taxa de juros?
Explique como a moeda afeta essas variáveis; ou, se a moeda não tiver efeito sobre algumas
delas, explique por quê.
2. Quais são as diferenças entre as versões fisheriana e de Cambridge da teoria quantitativa da
moeda?
3. Defina o termo velocidade da moeda. Que fatores determinam a velocidade da moeda no
sistema clássico? Qual é a relação entre a velocidade da moeda e o k de Cambridge?
4. Explique como a demanda agregada é determinada no modelo clássico. Quais seriam os
efeitos no produto e no nível de preços de um aumento na demanda agregada?
5. Os economistas clássicos consideravam que a velocidade era estável no curto prazo. Mas
vamos supor que, devido a uma mudança no mecanismo de pagamentos – por exemplo,
maior uso de cartões de crédito –, houvesse uma elevação exógena na velocidade da moeda.
Que efeito tal mudança teria sobre o produto, emprego e nível de preços no modelo clássico?
6. Explique como a taxa de juros é determinada na teoria clássica.
7. Explique como a taxa de juros funciona no sistema clássico para estabilizar a demanda
agregada diante de mudanças autônomas em componentes da demanda agregada como
investimento ou gastos governamentais.
8. Na forma de Cambridge da teoria quantitativa, a demanda por moeda é dada por Md = kPY.
Suponha que a renda (Y) seja definida em 300 unidades e a oferta de moeda seja fixa em 200
unidades. Suponha também que o valor de k seja inicialmente ¼; inicialmente, os indivíduos
querem manter saldos de moeda iguais a um quarto de sua renda. Suponha, então, que os
indivíduos aumentem a demanda por moeda para um terço de sua renda; k sobe para ⅓.
Como esse aumento da demanda por moeda afeta o valor de equilíbrio do nível agregado de
preços (P)? Qual era o nível de preços de equilíbrio inicial? Qual é o valor depois do
aumento da demanda por moeda? Explique o processo que leva à mudança no nível agregado
de preços.
9. Ao derivar a curva de oferta de trabalho na Figura 3.3, consideramos implicitamente que a
alíquota marginal do imposto de renda (ty) fosse igual a zero. Suponha que, em vez disso, ty
= 0,20. Desenhe novamente a figura com essa modificação e compare a curva de oferta de
trabalho resultante com a que aparece na Figura 3.3b.
10. No modelo clássico, analise os efeitos de um aumento na alíquota marginal do imposto de
renda. Explique como o produto, o emprego e o nível de preços são afetados. Considere
casos em que a receita maior produzida pelo aumento do imposto resulte em um declínio nas
vendas de títulos para o público e em que ela resulte em menos criação de moeda.
11. Quais são as principais conclusões de política econômica da economia clássica? Explique
como essas conclusões de política decorrem dos pressupostos-chave do sistema teórico
clássico.
CAPÍTULO 5
O sistema keynesiano (I): o papel da demanda agregada

5.1 O problema do desemprego


A economia keynesiana desenvolveu-se tendo como pano de fundo a Grande Depressão da
década de 1930. O efeito da Depressão na economia americana pode ser observado na Figura
5.1, que mostra as taxas anuais de desemprego para os anos 1929-41. A taxa de desemprego
subiu de 3,2% da força de trabalho em 1929 para 25,2% em 1933, o ponto mais baixo da
atividade econômica durante a Depressão. O desemprego permaneceu acima de 10% ao longo
de toda a década. O produto nacional bruto real caiu 30% entre 1929 e 1933 e demorou até 1939
para voltar ao nível de 1929.
O economista britânico John Maynard Keynes, cujo livro A teoria geral do emprego, do juro
e da moeda é a base do sistema keynesiano, foi influenciado mais fortemente pelos
acontecimentos em seu próprio país do que pela situação dos Estados Unidos. Na Grã-Bretanha,
o alto desemprego começou no início da década de 1920 e persistiu por toda a década de 1930.1
O alto nível de desemprego na Grã-Bretanha levou a um debate entre economistas e
formuladores de políticas sobre as causas e as políticas adequadas para lidar com o problema.
Keynes participou desse debate e, ao longo dele, desenvolveu sua teoria macroeconômica
revolucionária.
De acordo com a teoria de Keynes, o alto desemprego na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos
(bem como em outros países industrializados) era resultado de uma deficiência na demanda
agregada. A demanda agregada era baixa demais devido a uma demanda inadequada por
investimento. A teoria de Keynes proporcionou a base para que as políticas econômicas
combatessem o desemprego estimulando a demanda agregada. Na época da Depressão, Keynes
defendia medidas de política fiscal, principalmente gastos governamentais em projetos de obras
públicas, para estimular a demanda. De maneira mais geral, a teoria keynesiana propõe o uso de
políticas monetárias e fiscais para regular a demanda agregada. Para compreender a natureza
revolucionária dessa teoria, consideremos o estado do pensamento macroeconômico sobre o
desemprego como questão de política econômica na época em que o sistema de Keynes foi
desenvolvido.
Os economistas clássicos reconheciam o custo humano do desemprego, conforme expresso,
por exemplo, por Alfred Marshall:

A interrupção forçada do trabalho é um mal penoso. Aqueles cujo sustento está garantido,
ganham saúde física e mental com férias felizes e bem aproveitadas. Mas a falta de trabalho,
com a longa e contínua ansiedade, consome as melhores forças de um homem sem trazer
nada em troca. Sua esposa emagrece; seus filhos ficam, por assim dizer, com uma marca
horrível em suas vidas, que talvez nunca seja superada.2
FIG 5.1 Taxa de desemprego nos Estados Unidos, 1929-1941

Mas Marshall não tinha muito a dizer sobre as causas do desemprego. Ele observou que o
desemprego já existia desde o começo dos tempos e afirmou que o conhecimento era a cura, no
sentido de que aumentaria as capacitações para o trabalho e também evitaria que os
trabalhadores e as firmas tomassem decisões econômicas ruins que resultariam em falências e
desemprego. Quando Marshall sugeriu maneiras de diminuir as flutuações no emprego, esta foi a
primeira apresentada:
As causas da descontinuidade que estão em nosso âmbito de ação, e que são remediáveis,
ligam-se principalmente, de uma maneira ou de outra, à falta de conhecimento; mas há uma
que é voluntariosa: é a moda. Até pouco tempo atrás, apenas os ricos podiam trocar suas
roupas de acordo com as recomendações volúveis de seus costureiros; mas, agora, todas as
classes fazem isso. As histórias do comércio de alpaca, do comércio de rendas, do comércio
de chapéus de palha, do comércio de fitas e de uma infinidade de outros relatam explosões
de atividade febril alternando-se com inatividade sepulcral.3

Para o leitor moderno, essa análise parece esquisita; não pode ser considerada uma base para
propor soluções para o problema do desemprego na Grã-Bretanha na década de 1920. Marshall e
os outros economistas que se apoiavam na teoria clássica de equilíbrio não tinham muito mais a
oferecer.
Boa parte do debate sobre política econômica na Grã-Bretanha, nessa época, centrava-se na
conveniência de gastos governamentais em obras públicas como uma cura para o desemprego, o
que chamaríamos agora de uma ação de política fiscal expansionista. Keynes e outros
argumentavam que tais ações aumentariam o produto e o emprego. Esses gastos atuariam tanto
direta como indiretamente, porque aumentariam a renda e, por conseguinte, os gastos em
consumo daqueles que estivessem empregados nos projetos de obras públicas, gerando
empregos secundários.
Os que argumentavam contra a concepção de Keynes apoiavam-se principalmente na análise
clássica que apresentamos nos Capítulos 3 e 4. Aumentos nos gastos do governo, a menos que
fossem financiados por criação de moeda e, portanto, mudanças na política monetária, não
afetariam nem o emprego nem o nível de preços. Se projetos de obras públicas fossem
financiados pela criação de moeda, o nível de preços seria afetado, mas não os níveis de produto
ou emprego. Essa teoria clássica foi a base para a posição oficial do Partido Conservador da
Grã-Bretanha, que esteve no poder durante a maior parte da década de 1920 e começo da década
de 1930. Como Winston Churchill explicou: “É dogma ortodoxo do Tesouro, firmemente
mantido, que, quaisquer que possam ser as vantagens políticas e sociais, como regra geral, muito
pouco emprego pode ser de fato criado por meio de tomadas de empréstimos e gastos estatais”.
Nos Estados Unidos, as prescrições clássicas para políticas públicas também eram influentes.
Longe de tentar elevar a demanda ou estimular o produto e o emprego durante o auge da
Depressão em 1932, a administração de Herbert Hoover projetou um grande aumento de
impostos. A razão de Hoover para aumentar as alíquotas de impostos era equilibrar o orçamento
federal depois da queda das receitas tributárias que acompanhou o declínio da renda. Como, no
sistema clássico, a política fiscal não tinha nenhum efeito sobre a renda, a administração
prudente do orçamento passara a significar simplesmente equilibrar os gastos com receita
tributária.4 Quando Franklin Roosevelt concorreu contra Hoover para a presidência em 1932, ele
criticou Hoover por não conseguir equilibrar o orçamento e defendeu cortes nos gastos
governamentais. Bernard Baruch, consultor de vários presidentes, assim expressou a prescrição
de política convencional: “Equilibrar os orçamentos, parar de gastar o dinheiro que não temos.
Fazer sacrifícios pela frugalidade e pela receita. Cortar os gastos do governo – cortá-los como
rações são cortadas em um estado de sítio. Tributar – tributar todo mundo por tudo”.5
A elevação dos impostos ou o corte nos gastos governamentais não reduziriam a demanda
agregada, o produto e o emprego? Não no sistema clássico, porque o produto e o emprego eram
determinados pela oferta. De qualquer modo, no modelo clássico a política fiscal não afetava a
demanda agregada. Como vamos ver, tal aumento de impostos ou corte de gastos é exatamente o
oposto da ação de política “correta” segundo o modelo keynesiano.
Em suma, a situação no início da década de 1930 era de um desemprego maciço, que não era
bem explicado pelo sistema clássico e para o qual os economistas clássicos não ofereciam
nenhum remédio. Muitos economistas e políticos defenderam várias ações de política
econômica, incluindo projetos de obras públicas, para tentar aumentar a demanda agregada.
Essas políticas não funcionariam no sistema clássico, em que o produto e o emprego não eram
determinados pela demanda. Como observou Keynes: “A força da escola do autoajuste decorre
de ela ter atrás de si quase todo o conjunto de doutrina e pensamento econômico organizado dos
últimos cem anos”.6 Keynes colocava-se entre os “heréticos” em relação à visão clássica das
propriedades de autoajuste da economia. Sobre os heréticos, ele escreveu: “Eles estão
profundamente insatisfeitos. Acreditam que a simples observação é suficiente para mostrar que
os fatos não correspondem ao raciocínio ortodoxo. Eles propõem remédios induzidos pelo
instinto, pelo discernimento, pelo bom senso prático, pela experiência do mundo – parcialmente
certos, a maioria deles, e parcialmente errados”.7 Keynes achava que os heréticos jamais
prevaleceriam até que a falha da teoria clássica ortodoxa fosse encontrada. Ele acreditava que
essa falha estivesse na falta de uma teoria explícita da demanda agregada pelo produto e, assim,
do papel da demanda agregada na determinação do produto e do emprego. Examinaremos, em
seguida, a teoria apresentada por Keynes e seus seguidores para corrigir essa falha.

5.2 O modelo keynesiano simples: condições para o produto de


equilíbrio
Uma noção central no modelo keynesiano é que um nível de equilíbrio do produto requer que
o produto seja igual à demanda agregada. Em nosso modelo, essa condição de equilíbrio pode
ser expressa como

em que Y é igual ao produto total (PIB) e E é igual à demanda agregada ou aos gastos desejados
com o produto. A demanda agregada (E) é constituída de três componentes: consumo das
famílias (C), demanda desejada por investimentos pelas empresas (I) e demanda por bens e
serviços por parte do setor governamental (G). Assim, no equilíbrio, temos

A forma simples de (5.2) e das identidades discutidas adiante resulta de desconsiderar


algumas complexidades das definições de PIB e renda nacional. Essas simplificações, explicadas
no Capítulo 2, são brevemente relembradas aqui. As exportações e importações não aparecem na
equação (5.2). Por enquanto, estamos lidando com uma economia “fechada” e desconsiderando
o comércio internacional. O papel de importações e exportações no modelo keynesiano simples
será examinado na Seção 5.7. Note que, para uma economia fechada, não precisamos distinguir
entre PIB e PNB, a outra medida de produto definida no Capítulo 2. A depreciação também é
desconsiderada, de modo que não precisamos distinguir entre o PIB e o produto nacional
líquido. Também consideramos que o PIB e a renda nacional sejam equivalentes. Isso significa
que não incluímos no modelo itens que causem uma discrepância entre os dois totais
(essencialmente os impostos comerciais indiretos). Uma pressuposição final relaciona-se às
unidades em que cada uma das variáveis é medida. Neste capítulo, consideramos que o nível
agregado de preços é fixo. Todas as variáveis são variáveis reais e todas as mudanças são
mudanças em termos reais.

PERSPECTIVAS 5.1 - CONTROVÉRSIAS MACROECONÔMICAS


Nesta parte, consideramos diferentes escolas macroeconômicas. A ênfase é nas controvérsias. Deve-se ter em mente,
porém, que estamos interessados em diferenças fundamentais, que sejam parte integrante dos modelos macroeconômicos,
e não em disputas partidárias sobre políticas. A linha divisória entre elas nem sempre é clara, mas, para ver que a linha
existe, consideremos o seguinte.
Lionel Robbins foi um representante de destaque da economia clássica. Rechaçando alguns críticos dessa teoria, ele
escreveu:
Nessa esfera, não só qualquer conhecimento real dos autores clássicos é inexistente, como também seu lugar foi tomado
por um grupo de figuras mitológicas, que se apresentam com os mesmos nomes, mas com não pouca frequência são
investidas de atitudes quase exatamente opostas às que os originais adotavam. Essas réplicas são mesmo criaturas muito
malignas… Eles não conseguem ver nenhuma função para o Estado que não seja a de vigia noturno… Assim sendo,
quando um autor popular da época quiser apresentar seu ponto de vista em uma luz especialmente favorável, só o que tem
a fazer é destacar o contraste com a atitude dessas pessoas repreensíveis e o efeito desejado é produzido.a
Robbins reconheceu a necessidade de reexaminar criticamente os escritos dos economistas clássicos para verificar “em
que medida sua teoria do mercado é sustentada pelos resultados das análises mais recentes? Até que ponto elas estavam
justificadas em sua esperança de que controles financeiros (sobre cuja natureza exata nunca se chegou a um acordo)
fossem suficientes para manter a estabilidade do envelope de demanda agregada? Estavam certos os Economistas
Clássicos em suas apreensões quanto ao coletivismo em geral?”b
O fato de que Robbins não via Keynes como um autor popular da época, mas como um crítico muito sério, pode ser
percebido em uma descrição que ele oferece em um contexto diferente:
Keynes estava em sua condição mais lúcida e persuasiva; e o efeito foi irresistível. Em tais momentos, eu com frequência
me pego pensando que Keynes deve ser um dos homens mais notáveis que já viveram – a lógica rápida, a intuição
abrangente, a imaginação viva, a visão ampla, acima de tudo o incomparável senso da adequação das palavras, tudo se
combina para produzir algo vários graus acima do limite da realização humana comum… Ele usa o estilo clássico de nossa
vida e linguagem, é verdade, mas isso é permeado por algo que é não-tradicional, um tom sublime e único de que só se
pode dizer que é puro gênio.c
A citação mostra a admiração que Keynes despertava (pelo menos às vezes) mesmo naqueles a que se opunha. Também
uso isto para indicar que as discussões de Keynes com os economistas clássicos e as críticas posteriores à teoria de Keynes
por economistas como Milton Friedman e Robert Lucas constituem contribuições de algumas das mais importantes figuras
intelectuais de nossa época.
a ROBBINS, Lionel. The theory of economic policy. London: Macmillan, 1952. p. 5.
b ROBBINS, 1952, p. 206.
c Citado de SKIDELSKY, Robert. John Maynard Keynes, fighting for freedom, 1937-1946. New York: Viking, 2001. p. 341.

Com o produto nacional Y também medindo a renda nacional, podemos escrever

A equação (5.3) é uma definição contábil, ou identidade, que afirma que a renda nacional,
a qual seria paga às famílias em troca dos serviços de fatores de produção (salários, juros,
aluguéis, dividendos), é consumida (C), paga em impostos (T) ou poupada (S).8 Além disso, a
partir do fato de que Y é o produto nacional, podemos escrever

A equação (5.4) define o produto nacional como consumo mais investimento realizado (Ir)
mais gastos do governo.9
Usando as definições dadas nas equações (5.3) e (5.4), podemos reescrever a condição para a
renda de equilíbrio dada na equação (5.2) de duas maneiras alternativas, que nos ajudarão a
compreender a natureza do equilíbrio no modelo. Por (5.2), Y deve ser igual a (C + I + G) no
equilíbrio, e, em (5.3), Y é definido como (C + S + T); no equilíbrio, portanto,
C+S+T≡Y=C+I+G
ou, de modo equivalente,

De maneira similar, pelas equações (5.2) e (5.4) podemos ver que, no equilíbrio,
C + Ir + G ≡ Y = C + I + G
ou, cancelando termos,

Há, então, três maneiras equivalentes de expressar a condição de equilíbrio no modelo:


Para ajudar a interpretar essas condições, voltamo-nos para o fluxograma da Figura 5.2. Cada
item na figura (cada uma das variáveis em nosso modelo) é uma variável de fluxo. As variáveis
são medidas em unidades monetárias por período. Nas contas nacionais, elas são medidas, por
exemplo, como bilhões de reais por trimestre ou ano. O fluxo marcado pela seta mais no alto na
figura é o fluxo de renda nacional do setor empresarial para o setor familiar. Esse fluxo consiste
em pagamentos por serviços dos fatores. A soma de tais pagamentos dá a renda nacional, que é
igual ao produto nacional. Há um fluxo correspondente do setor familiar para o setor
empresarial, que consiste nos serviços dos fatores fornecidos pelo setor familiar. Esse fluxo e
fluxos similares não são mostrados no diagrama porque não são fluxos monetários.
A renda nacional é distribuída pelas famílias em três fluxos. Há um fluxo de gastos de
consumo que volta para o setor empresarial como uma demanda por produto. Portanto, o ciclo
interno de nosso diagrama ilustra um processo pelo qual as firmas produzem produto (Y), que
gera um montante igual de renda para o setor familiar, o que, por sua vez, gera uma demanda
pelo produto (C).

FIG 5.2 Fluxo circular de renda e produto

Nem toda a renda nacional retorna diretamente às firmas como demanda por produto. Há dois
fluxos que saem do setor familiar além dos gastos com consumo: o fluxo de poupança e o fluxo
de pagamentos de impostos. Se virmos o ciclo interno de nosso diagrama, que liga as famílias
(como fornecedores de serviços de fatores de produção e demandadores de produto) e o setor
empresarial (como fornecedores de produto e demandadores de serviços de fatores), como o
mecanismo central de geração de renda e produto, os fluxos de poupança e impostos são
vazamentos desse ciclo central.
O vazamento da poupança flui para os mercados financeiros, o que significa que a parte da
renda que é poupada é mantida na forma de algum ativo financeiro (moeda corrente, depósitos
bancários, títulos, ações, etc.). O fluxo de impostos é pago ao setor governamental. O fluxo de
impostos no diagrama corresponde aos impostos líquidos, ou seja, os pagamentos brutos de
impostos menos os pagamentos de transferências do governo para as famílias (benefícios da
Previdência Social, pagamentos de seguro-desemprego, etc.). Portanto, em referências
posteriores neste texto, um aumento de impostos ou um corte de impostos podem ser
interpretados como mudanças equivalentes, em direções opostas, no nível de pagamentos de
transferências.
Embora cada unidade monetária de produto e, portanto, da renda nacional não gere
diretamente uma unidade monetária de demanda por produto por parte do setor familiar, isso não
significa que a demanda total tenha de ser menor que o produto. Há demandas adicionais por
produto por parte do próprio setor empresarial para investimento e do setor governamental. Em
termos do fluxo circular, estas são injeções no ciclo central de nosso diagrama. A injeção de
investimento é mostrada como um fluxo dos mercados financeiros para o setor empresarial. Os
compradores dos bens de investimento são as próprias firmas do setor empresarial. Essas
compras, porém, precisam ser financiadas por empréstimos. Assim, o montante monetário dos
investimentos representa um fluxo equivalente de fundos emprestados às firmas. Os gastos
governamentais são uma demanda pelo produto do setor empresarial e são mostrados como o
fluxo monetário do governo para as firmas.
Podemos agora examinar as três expressões equivalentes do equilíbrio dadas pelas equações
(5.2), (5.5) e (5.6). A produção de um nível de produto, Y, gera um nível de renda equivalente
para as famílias. Uma parte dessa renda, igual à demanda por consumo (C), retorna diretamente
às firmas na forma de uma demanda por produto. O nível de produto estará em equilíbrio se essa
demanda diretamente gerada (C), quando somada aos gastos com investimentos desejados das
firmas (I) e aos gastos do governo (G), produzir uma demanda total igual a Y, ou seja, se

Na segunda versão da condição para a renda de equilíbrio

vemos que um fluxo de produto estará em estado de equilíbrio se os vazamentos (S + T) do ciclo


central de nosso diagrama forem equilibrados exatamente por injeções (I + G) nesse fluxo
circular central de renda e produto. Esse nível de produto garante que o montante de renda que
as famílias não gastam em produto (S + T) e, portanto, a quantidade de produto que é produzida,
mas não é vendida para as famílias (Y – C ≡ S + T), seja exatamente igual à quantidade que os
outros dois setores desejam comprar (I + G). Isso é equivalente a dizer que o produto total é
igual à demanda agregada e, assim, é também equivalente ao primeiro modo de expressar a
condição de equilíbrio.
A terceira forma de expressar a condição de equilíbrio, a equação (5.6) (I = Ir), afirma que,
no equilíbrio, o investimento desejado deve ser igual ao investimento realizado. O que significa
o investimento desejado diferir do investimento realizado? A contabilidade do PIB computa o
investimento como o volume total de gastos das firmas com instalações e equipamentos, mais o
investimento em estoques, ou seja, o aumento (ou declínio) dos estoques.10 Pressupomos que os
gastos desejados com instalações e equipamentos sejam iguais aos gastos efetivos conforme
registrados pela contabilidade do PIB. É na última categoria, investimento em estoques, que os
totais desejado e realizado podem diferir. A contabilidade do PIB registrará como investimento
em estoque todos os bens que são produzidos por uma firma e não vendidos – quer esse
investimento tenha sido planejado ou não.
Para ver como os investimentos em estoque realizados e planejados podem ser diferentes,
consideremos o que acontece quando é produzido um nível de produto (Y ≡ C + Ir + G) que
excede a demanda agregada (E = C + I + G). Nesse caso,
onde Ir – I é o acúmulo não planejado de estoque. A quantidade em que o produto excede a
demanda agregada (Ir – I) será produto não vendido acima da quantidade de investimento em
estoque que a firma desejava. Esse excesso é um acúmulo não planejado de estoque.
Na situação inversa, em que a demanda agregada excede o produto, temos

onde I – Ir é a insuficiência de estoque não planejada. A demanda é maior que o produto e as


firmas vendem mais do que era planejado. Os estoques acabam ficando em um nível menor que
o desejado. O ponto de equilíbrio (I = Ir) é um nível de produção que, depois de feitas todas as
vendas, deixa o investimento em estoque no nível desejado pelas firmas. Como podemos ver
pela equação (5.7) ou (5.8), esse é o nível em que o produto é igual à demanda agregada e,
assim, é equivalente aos outros dois modos de expressar a condição de equilíbrio.
Essa terceira forma de expressar a condição de equilíbrio no modelo mostra claramente por
que não pode haver um equilíbrio em nenhum outro ponto. Se, em um dado nível de produto, as
firmas estiverem acumulando estoques indesejados ou vendo seus estoques se esgotarem, há
uma tendência de que o produto mude. Se a produção exceder a demanda (Y > E), as firmas
estão acumulando estoques não desejados (Ir > I) e há uma tendência de que o produto caia, com
as firmas diminuindo a produção para reduzir os estoques. Se, por outro lado, a demanda for
maior que a produção (E > Y), há uma insuficiência de estoques (Ir < I) e uma tendência de
aumento do produto com as firmas tentando evitar novas quedas nos estoques. As firmas só
estarão satisfeitas com seu nível atual de produção quando a demanda agregada for igual ao
produto.

5.3 Os componentes da demanda agregada


Expressamos a condição de equilíbrio no modelo keynesiano simples em termos dos
componentes da demanda agregada. Para ver os fatores que determinam o nível de renda,
consideramos os fatores que afetam os componentes da demanda agregada: consumo,
investimento e gastos governamentais. Poupança e impostos também entram em nossa análise.

5.3.1 Consumo
Os gastos com consumo são o maior componente da demanda agregada, representando de
60% a 70% do PIB americano em anos recentes.
Keynes acreditava que o nível de gastos em consumo era uma função estável da renda
disponível, em que a renda disponível (YD) em nosso modelo simples é a renda nacional menos
os pagamentos líquidos de impostos (YD = Y – T).11 Keynes não negava que outras variáveis
além da renda afetassem o consumo, mas acreditava que a renda fosse o fator dominante para
determinar o consumo. Em uma primeira aproximação, as outras influências podiam ser
deixadas de lado.
A forma específica da relação consumo-renda, denominada função consumo, proposta por
Keynes era a seguinte:

Função consumo
Relação keynesiana entre renda e consumo.

A Figura 5.3 mostra em um gráfico essa relação. O termo intercepto a, que pressupomos ser
positivo, é o valor do consumo quando a renda disponível é igual a zero. Assim, a pode ser
considerado uma medida do efeito sobre o consumo de outras variáveis que não a renda, as quais
não são explicitamente incluídas neste modelo simples. O parâmetro b, a inclinação da função,
informa o aumento nos gastos com consumo a cada aumento unitário na renda disponível. Em
notação, usamos com frequência

onde, como no Capítulo 3, o símbolo diferenciador, Δ, indica a mudança na variável que vem
em seguida. O valor do incremento nos gastos de consumo por unidade de incremento na renda
(b) é chamado de propensão marginal a consumir (PMgC). O pressuposto keynesiano é que o
consumo aumentará com um aumento da renda disponível (b > 0), mas que o aumento no
consumo será menor do que o aumento na renda disponível (b < 1).

Propensão marginal a consumir (PMgC)


Aumento no consumo por unidade de aumento da
renda disponível.

FIG 5.3 A função consumo keynesiana


A função consumo mostra o nível de consumo (C) correspondente a cada nível de renda disponível (YD). A inclinação da função
consumo (ΔC/ΔYD) é a propensão marginal a consumir (b), ou seja, aumento no consumo por aumento unitário da renda
disponível. O intercepto da função consumo (a) é o nível (positivo) de consumo em um nível zero de renda disponível.

A partir da definição de renda nacional,

podemos escrever

que mostra que a renda disponível é, por definição, consumo mais poupança. Assim, uma teoria
da relação consumo-renda também determina implicitamente a relação poupança-renda. No caso
da teoria keynesiana, temos

Se o consumo é de a unidades com YD igual a 0, então, nesse ponto,

S ≡ YD – = 0 – a

= –a
Se um aumento de 1 unidade na renda disponível leva a um aumento de b unidades no
consumo, o resto (1 – b) corresponde ao aumento na poupança:
Esse incremento da poupança por unidade de aumento da renda disponível (1 – b) é chamado
de propensão marginal a poupar (PMgS). O gráfico da função poupança é mostrado na Figura
5.4.
Como foi observado anteriormente, Keynes considerava que a renda era o principal
determinante dos gastos de consumo. Teorias do consumo posteriores expandiram a teoria de
Keynes em várias direções. Para um dado nível de renda, a riqueza maior leva a um nível maior
de gastos de consumo. A riqueza familiar inclui o valor de ativos financeiros como ações e
títulos mantidos pela família. Inclui também o patrimônio imobiliário, definido como o valor da
residência menos a dívida com o financiamento imobiliário.
Outra direção tomada por pesquisas recentes sobre consumo foi a expansão do conceito de
renda, passando da renda atual para um conceito mais amplo chamado de renda permanente, que
consiste em uma média dos níveis de renda atual e esperado para o futuro. Vamos voltar a um
exame dessas teorias do consumo mais complexas em pontos posteriores de nossa análise. Ao
desenvolver o modelo keynesiano neste capítulo, permaneceremos com a função consumo
simples dada na equação (5.9).

5.3.2 Investimento
O investimento também era uma variável fundamental no sistema keynesiano. Mudanças nos
gastos desejados de investimento das firmas eram, para Keynes, um dos principais fatores
responsáveis por mudanças na renda.
Conforme observado anteriormente, Keynes acreditava que o consumo era uma função
estável da renda disponível. Essa noção não implicava que os gastos com consumo seriam
estáveis ao longo do tempo. Implicava simplesmente que, na ausência de outros fatores que
fizessem a renda mudar, os gastos com consumo não seriam uma fonte independente importante
de variabilidade da renda. O consumo era, primariamente, um gasto induzido, ou seja, um gasto
diretamente dependente da renda.

Propensão marginal a poupar (PMgS)


Aumento da poupança por unidade de aumento da renda
disponível.

Para explicar as causas subjacentes dos movimentos da demanda agregada e, assim, da renda,
Keynes voltou-se para os componentes autônomos da demanda agregada. Esses componentes
eram determinados, em grande medida, independentemente da renda corrente. Quando esses
componentes de gastos variavam, faziam a renda variar. Keynes acreditava que o investimento
era o mais fortemente variável entre os componentes autônomos da demanda agregada. Ele
achava que os gastos variáveis em investimentos eram o principal responsável pela instabilidade
da renda.
A Tabela 5.1 contém números referentes a investimentos e consumo como porcentagens do
PNB nos Estados Unidos, em anos selecionados. Os dados contrastam os gastos em
investimento e consumo em anos prósperos (1929, 1955, 1973, 1979, 1989, 2000, 2006) com os
gastos correspondentes em anos subsequentes de depressão ou recessão (1933, 1958, 1975,
1982, 1991, 2001, 2008). Os gastos com investimentos de fato parecem ser mais voláteis e são
uma escolha lógica como um fator para explicar a variabilidade da renda. A pergunta
permanece: o que determina o investimento?

FIG 5.4 Função poupança keynesiana

A função poupança mostra o nível de poupança (S) em cada nível de renda disponível (YD). A inclinação da função poupança é a
PMgS (1 – b), o aumento na poupança por aumento unitário da renda disponível. O intercepto da função poupança (–a) é o nível
(negativo) de poupança em um nível zero de renda disponível.

Tabela 5.1 - Consumo e investimento como porcentagem do PNB, anos selecionados

Ano Investimento Consumo


1929 15,7 74,8
1933 2,5 82,1
1955 17,1 63,5
1958 13,8 64,5
1973 16,1 62,6
1975 12,5 64,0
1979 16,0 62,7
1982 13,1 65,3
1989 11,0 67,1
1991 9,6 68,5
2000 17,7 68,7
2001 16,0 69,8
2006 16,7 69,7
2008 14,7 70,1

Keynes sugeriu duas variáveis como os principais determinantes dos gastos com
investimentos no curto prazo: a taxa de juros e o estado das expectativas das firmas.
Ao explicar a relação entre investimento e taxa de juros, a análise de Keynes não era
diferente da visão clássica. O nível de investimento estaria inversamente relacionado ao nível da
taxa de juros. Com taxas de juros mais altas, menos projetos de investimento têm um retorno
esperado alto o bastante para justificar a contratação de empréstimos para financiá-los. Essa
ligação será importante no Capítulo 6. Por enquanto, como não explicamos como a taxa de juros
é determinada no modelo keynesiano, vamos deixar de lado o efeito da taxa de juros sobre o
investimento e concentrar-nos no segundo fator que determina o investimento: o retorno
esperado de projetos de investimento.
As expectativas dos administradores das firmas quanto à rentabilidade futura de projetos de
investimento são um elemento central da análise keynesiana. Keynes enfatizou o “conhecimento
incerto” em que é preciso basear as expectativas sobre o futuro. Para prever a rentabilidade de
um projeto que gerará produto durante 20 ou 30 anos, um administrador precisa de muito
conhecimento sobre o futuro. Ele precisa conhecer a demanda futura pelo produto, o que requer
conhecimento dos gostos futuros dos consumidores e do estado da demanda agregada. Precisa
de conhecimento sobre custos futuros, incluindo salários monetários, taxas de juros e alíquotas
de impostos; não há como fazer uma previsão bem fundamentada dessas variáveis para 20 ou 30
anos no futuro.
Mesmo assim, decisões de investimento são tomadas. Keynes achava que administradores
racionais, vendo-se diante da necessidade de tomar decisões sob incerteza extrema, formavam
expectativas usando as técnicas a seguir:
1. Eles tendiam a extrapolar tendências passadas para o futuro, ignorando possíveis mudanças
futuras, a menos que houvesse informações específicas sobre alguma mudança esperada.
2. “Sabendo que nossa própria opinião individual não tem valor, procuramos recorrer à
opinião do resto do mundo, que, talvez, seja mais bem informado. Ou seja, procuramos
conformar-nos ao comportamento da maioria ou da média. A psicologia de uma sociedade
de indivíduos, cada um deles procurando copiar os outros, leva ao que podemos chamar
rigorosamente de opinião convencional. ”12
Keynes acreditava que uma expectativa formada dessa maneira teria a seguinte característica.

Em particular, por ser apoiada em uma base tão frágil, ela está sujeita a mudanças súbitas e
violentas. A prática da calma e da imobilidade, da certeza e da segurança, de repente se
rompe. Novos temores e esperanças virão se apossar, sem aviso prévio, da conduta humana.
As forças da desilusão podem subitamente impor uma nova base convencional de avaliação.
Todas essas técnicas bonitas e bem-comportadas, feitas para uma sala de reuniões bem
decorada, podem entrar em colapso. Em todos os momentos, os vagos temores de pânico e
as esperanças igualmente vagas e desarrazoadas não estão de fato apaziguados e
permanecem logo abaixo da superfície.13

Em suma, as expectativas de rentabilidade futura de projetos de investimento apoiavam-se


em uma base de conhecimento precária e Keynes achava que essas expectativas podiam mudar
com frequência, às vezes drasticamente, em resposta a novas informações e eventos. Em
consequência, a demanda por investimento era instável.

5.3.3 Gastos governamentais e impostos


Os gastos governamentais (G) são um segundo elemento dos gastos autônomos. Pressupõe-se
que os gastos do governo sejam controlados pelos formuladores de políticas e, portanto, não
dependam diretamente do nível de renda.
Consideramos que o nível de arrecadação tributária (T) também seja controlado pelos
formuladores de políticas e que seja, assim, uma variável de política econômica. Uma suposição
mais realista seria que o formulador de políticas define a alíquota do imposto e que a
arrecadação tributária varie com a renda. Essa suposição complicaria nossos cálculos, mas não
mudaria as conclusões essenciais (estruturas tributárias mais complexas são examinadas no
Capítulo 18, onde abordamos a política fiscal mais detalhadamente).

5.4 Determinação da renda de equilíbrio


Temos agora todos os elementos necessários para determinar a renda (produto) de
equilíbrio.14 A primeira forma da condição para um nível de equilíbrio da renda é

A renda de equilíbrio (Y) é a variável endógena a ser determinada. Os termos de gastos


autônomos I e G são dados, assim como o nível de T; estas são as variáveis exógenas
determinadas por fatores externos ao modelo. O consumo é, em sua maior parte, um gasto
induzido determinado endogenamente pela função consumo

onde a segunda igualdade usa a definição de renda disponível (YD = Y – T).


Substituindo a equação de consumo dada pela equação (5.9) na condição de equilíbrio (5.2),
podemos resolver a equação para Y, o nível de equilíbrio da renda, como se segue:

FIG 5.5 Determinação da renda de equilíbrio


Na parte a, a renda de equilíbrio é Y, no ponto A, onde a curva C + I + G = E corta a reta de 45°. Nesse ponto, os gastos
agregados são iguais ao produto, (C + I + G) = Y. No ponto A na parte b, no nível de equilíbrio do produto, Y, as curvas S + T e I
+ G se cruzam, de modo que S + T = I + G. No nível de renda YL, que é menor que o produto de equilíbrio Y, a demanda
agregada excede o produto, (C + I + G) > Y. Em pontos acima do produto de equilíbrio Y, o produto excede a demanda agregada.

A Figura 5.5 mostra a determinação da renda de equilíbrio. A renda é medida no eixo


horizontal e os componentes da demanda agregada são medidos no eixo vertical. A reta de 45° é
traçada para dividir o quadrante positivo do gráfico.
Todos os pontos nessa reta indicam que os gastos agregados são iguais ao produto agregado.
O valor das variáveis medidas no eixo vertical, (C + I + G), é igual ao valor da variável medida
no eixo horizontal, (Y). A função consumo (C = a + bYD) é mostrada no gráfico, assim como a
curva (C+ I + G) ou de gastos agregados (E), que é obtida somando os componentes de gastos
autônomos (investimento e gastos governamentais) aos gastos com consumo em cada nível de
renda. Como os componentes de gastos autônomos (I, G) não dependem diretamente da renda, a
curva (C + I + G) fica acima da função consumo a uma distância constante.
Como é mostrado na Figura 5.5b, a reta que mostra apenas esses componentes dos gastos
autônomos, a reta I + G, é horizontal porque seu nível não depende de Y. A reta de inclinação
positiva, identificada como S + T no gráfico, representa o valor de poupança mais impostos.
Essa curva tem inclinação ascendente porque a poupança varia positivamente com a renda.
Na Figura 5.5a, o nível de equilíbrio da renda é mostrado no ponto em que a curva (C + I +
G) cruza a reta de 45° e a demanda agregada, portanto, é igual à renda (Y). Essa intersecção
ilustra a condição de equilíbrio expressa na equação (5.2). No equilíbrio, é preciso também que a
curva (S + T) corte a curva horizontal (I + G). Essa intersecção, mostrada na Figura 5.5b, ilustra
a condição de equilíbrio expressa na equação (5.5).
Agora, vejamos porque outros pontos no gráfico não são pontos de equilíbrio. Consideremos
um nível de renda abaixo de Y, por exemplo, o ponto identificado como YL na Figura 5.5a. Um
nível de renda igual a YL gera consumo conforme mostrado na função consumo. Quando esse
nível de consumo é somado aos gastos autônomos (I + G), a demanda agregada excede a renda;
a curva (C + I + G) está acima da reta de 45°. De maneira equivalente, nesse ponto I + G é
maior que S + T, como pode ser visto na Figura 5.5b. Segue-se disso também que, com a
demanda superando a produção, o investimento desejado excederá o investimento efetivo em
pontos como YL(C + I + G > Y ≡ C + Ir + G; portanto, I > Ir). Haverá uma insuficiência de
estoques não planejada nesses pontos abaixo de Y e, portanto, uma tendência ao aumento do
produto.
Inversamente, em níveis de renda acima de Y na Figura 5.5a, e 5.5b, o produto excederá a
demanda (a reta de 45° está acima da curva C + I + G) e estará havendo investimento não
planejado em estoque (Y = C + Ir + G > C + I + G; portanto, Ir > I) e o produto tenderá a cair. É
apenas em Y que o produto é igual à demanda agregada; não há insuficiência ou acúmulo não
planejados de estoque e, em consequência, nenhuma tendência de alteração do produto.
Voltando à nossa expressão da renda de equilíbrio, a equação (5.14), podemos reescrever essa
equação em uma forma que apresenta a essência da visão de Keynes sobre a determinação da
renda. Nossa expressão do equilíbrio é composta de duas partes:

O primeiro termo, 1/(1 – b), é chamado de multiplicador dos gastos autônomos. Note-se
que b é a fração de qualquer incremento da renda disponível que vai para consumo: a propensão
marginal a consumir (PMgC). O termo 1/(1 – b) ou 1/(1 – PMgC) é, então, 1 dividido por uma
fração e, assim, um número maior do que 1. Alguns exemplos são os seguintes:

Multiplicador dos gastos autônomos)


Dá a mudança no produto de equilíbrio por unidade de
mudança nos gastos autônomos (por ex., gastos
governamentais).
Chamamos esse termo de multiplicador dos gastos autônomos porque cada unidade
monetária de gasto autônomo é multiplicada por esse fator para obter sua contribuição para a
renda de equilíbrio.
O segundo termo na expressão é o nível de gastos autônomos. Já examinamos dois
elementos dos gastos autônomos, o investimento (I) e os gastos governamentais (G). Os dois
primeiros termos (a e –bT) requerem algumas palavras de explicação. Esses termos medem o
componente autônomo dos gastos com consumo (a) e o efeito autônomo das deduções
tributárias sobre a demanda agregada (–bT), que também opera por meio do consumo. O
consumo é, em sua maior parte, um gasto induzido, como já foi explicado. Os dois termos (a e –
bT), porém, afetam a quantidade de consumo para um dado nível de renda (Y). Em termos da
Figura 5.5, eles determinam a altura da função consumo. Como G e I, eles afetam o nível de
demanda agregada para um dado nível de renda, em vez de ser eles próprios diretamente
determinados pela renda. São, assim, mais apropriadamente incluídos como fatores autônomos
que afetam a demanda agregada.

Gastos autônomos
Gastos determinados em grande medida por fatores
que não a renda corrente.

A teoria de Keynes em sua forma mais simples pode ser expressa da seguinte maneira. O
consumo é uma função estável da renda; ou seja, a PMgC é estável. Mudanças na renda derivam
principalmente de mudanças nos componentes autônomos da demanda agregada, em especial de
mudanças no instável componente investimento. Uma dada mudança em um componente
autônomo da demanda agregada causa uma mudança maior na renda de equilíbrio devido ao
multiplicador, por razões que explicaremos adiante. A equação (5.15) deixa claro que, na
ausência de políticas governamentais para estabilizar a economia, a renda será instável por causa
da instabilidade do investimento. Na equação (5.15) pode-se ver também que, por meio de
mudanças apropriadas nos gastos governamentais (G) e nos impostos (T), o governo poderia
contrabalançar os efeitos de mudanças no investimento. Mudanças apropriadas em G e T
poderiam manter a soma dos termos entre parênteses (gastos autônomos) constante mesmo
diante de mudanças indesejáveis no termo I.

5.5 Mudanças na renda de equilíbrio


Consideremos o efeito sobre a renda de equilíbrio de uma mudança na demanda por
investimentos autônomos. Pressupomos que os outros determinantes dos gastos autônomos, os
outros itens entre parênteses na equação (5.15), sejam fixos. Encontramos a mudança na renda
de equilíbrio pela equação (5.15) da seguinte maneira:

ou
Uma mudança de 1 unidade no investimento causa uma mudança na renda de 1/(1 – b)
unidades. Se b for 0,8, por exemplo, Y muda 5 unidades para cada mudança de 1 unidade no
investimento. Por que a renda muda por um múltiplo da mudança no investimento e por que a
quantidade precisa de 1/(1 – b)?
Uma analogia para o processo subjacente ao multiplicador é o “efeito cascata” de uma pedra
jogada em um lago. Há o efeito inicial quando a pedra perturba a água. Soma-se a isso o efeito
no resto da superfície quando a água deslocada pela pedra espalha-se pelas águas contíguas, com
uma intensidade que diminui com a distância do ponto de impacto inicial. A mudança no
investimento é a perturbação inicial; vamos supor que isso seja igual a 100 unidades. À medida
que algumas firmas experimentam um aumento da demanda como resultado desse investimento
maior, seu produto aumenta. Em consequência, seus pagamentos a fatores de produção (salários,
aluguéis, juros, dividendos) aumentam. Para as famílias, isso representa um aumento na renda e,
como os impostos são fixos, um aumento igual na renda disponível. O consumo, então,
aumentará, embora menos que o aumento na renda. Esse é o início dos efeitos indiretos do
choque. Com ΔI igual a 100 como supusemos, se a PMgC fosse 0,8, por exemplo, haveria agora
80 unidades adicionais de demanda por parte dos consumidores.
O processo não para aí; as 80 unidades de novos gastos de consumo, com o aumento
resultante na produção, geram uma segunda rodada de aumento na renda para as famílias, de 80
unidades. Haverá um novo aumento na demanda por consumo (64 unidades se o PMgC for 0,8).
Assim, a razão pela qual a renda sobe mais que o crescimento autônomo do investimento é que o
aumento nos investimentos leva a aumentos induzidos na demanda por consumo à medida que a
renda aumenta.
Por que o aumento na renda por unidade monetária de investimento é exatamente igual a 1/(1
– b)? Com os outros elementos de gastos autônomos mantidos fixos, podemos escrever a
mudança na renda de equilíbrio quando o investimento varia como

A restauração da igualdade da renda e da demanda agregada requer que a renda de equilíbrio


aumente em um montante igual ao aumento no investimento (ΔI) mais o aumento induzido pela
renda na demanda por consumo. Rearranjando os termos na equação (5.18), temos
ΔY – ΔC = ΔI
ou15

A equação (5.19) também resulta de nossa segunda maneira de expressar a condição para a
renda de equilíbrio:

Com T e G fixos, para restaurar o equilíbrio S deve aumentar a mesma quantidade do


aumento de I, conforme requerido pela equação (5.19). A restauração do equilíbrio requer que a
renda suba o suficiente para gerar nova poupança igual ao novo investimento.
Como ΔS é igual a (1 – b)ΔY, temos, a partir da equação (5.19),

Por exemplo, se b for igual a 0,8, a propensão marginal a poupar (PMgS = 1 – b) é igual a
0,2. Cada aumento de um real na renda gerará 20 centavos de aumento na poupança, e será
necessário um aumento de 5 reais na renda para gerar 1 real de nova poupança de modo a
equilibrar um aumento de 1 real no investimento. O valor do multiplicador nesse caso é 5.
O efeito de um aumento no investimento autônomo é ilustrado na Figura 5.6. Inicialmente,
com o investimento em I0 e os gastos governamentais e impostos em G0 e T0, a renda de
equilíbrio está em Y0. Agora, suponhamos que o investimento aumente para o nível mais alto I1.
A curva da demanda agregada (E) desloca-se para cima pela quantidade (ΔI = I1 – I0), de E0 (=
C + I0 + G0) para E1 (= C + I1 + G0). A curva (I + G) desloca-se a mesma quantidade para cima.
O equilíbrio é restaurado em Y1, onde a renda é agora igual ao valor mais alto da demanda
agregada. Note-se que o aumento na renda é igual ao aumento inicial no investimento mais um
aumento induzido no consumo (ΔC), como é mostrado no gráfico. Note-se também que, no novo
equilíbrio, a poupança aumentou a mesma quantidade que o investimento (ΔS = ΔI).
O conceito do multiplicador é central na teoria de Keynes, porque explica como
deslocamentos no investimento causados por mudanças nas expectativas das firmas
desencadeiam um processo que faz variar não só o investimento, mas também o consumo. O
multiplicador mostra como choques em um setor são transmitidos por toda a economia. A teoria
de Keynes também implica que outros componentes de gastos autônomos afetam o nível geral
da renda de equilíbrio. O efeito sobre a renda de equilíbrio de uma mudança em cada um dos
elementos de gastos autônomos controlados por políticas públicas – gastos governamentais e
impostos – pode ser calculado pela equação (5.15).

FIG 5.6 Efeito de um aumento no investimento autônomo sobre a renda de equilíbrio


Na parte a, começando no equilíbrio A, um aumento no investimento autônomo, de I0 para I1, desloca a curva de gastos
agregados para cima, de E0 = C + I0 + G0 para E1 = C + I1 + G0. A renda de equilíbrio aumenta do ponto A para o ponto B, de
Y0 para Y1 O aumento na renda é igual ao aumento inicial no investimento (mostrado como um aumento no intercepto), de I0
para I1, mais um aumento induzido pela renda no consumo. Esse aumento no consumo é mostrado quando nos movemos pela
função de gastos mais alta, E1, do ponto C para o ponto B. Na parte b, começando no equilíbrio A, a curva I + G desloca-se para
cima de I0 + G0 para I1 + G0. A renda de equilíbrio aumenta do ponto A para o ponto B, Y0 para Y1.

Procedemos como fizemos ao considerar os efeitos de uma mudança no investimento e


supomos que um componente dos gastos autônomos mude enquanto todos os outros
permanecem constantes. Para uma mudança nos gastos governamentais (G), temos

Para uma mudança nos impostos, temos


FIG 5.7 Efeito de um aumento nos impostos sobre a renda de equilíbrio

Um aumento nos impostos de T0 para T1 desloca a curva de gastos agregados para baixo na parte a, de (C + I + G)0 para (C + I +
G)1, para o ponto de equilíbrio B, uma vez que os impostos estão no intercepto. A renda de equilíbrio cai de Y0 para Y1. Na parte
b, começando no ponto de equilíbrio A, a curva de poupança mais impostos desloca-se para cima, de S + T0 para S + T1. O
equilíbrio move-se de A para B.

Para os gastos do governo, um aumento de um real tem o mesmo efeito que um aumento de 1
real no investimento. Ambos são aumentos de 1 real em gastos autônomos. O processo
multiplicador, pelo qual o aumento inicial na renda gera aumentos induzidos no consumo, é o
mesmo para um aumento nos gastos do governo e no investimento.
Em termos da Figura 5.6, na parte a, um aumento nos gastos do governo de ΔG deslocaria a
curva de gastos para cima pela mesma quantidade que um aumento igual no investimento. Nesse
caso, o intercepto se deslocaria para cima devido a um aumento nos gastos do governo. Na parte
b, um aumento nos gastos do governo de ΔG deslocaria a curva I + G para cima de I0 + G0 para
I0 + G1, a mesma quantidade que um aumento igual no investimento. Em ambas as figuras, ΔY
será o mesmo, Y0 para Y1.
Pela equação (5.22), vimos que o efeito de um aumento nos impostos tem direção oposta aos
efeitos de um aumento nos gastos governamentais ou no investimento. Um aumento nos
impostos reduz o nível de renda disponível (Y – T) em qualquer nível de renda nacional (Y). Esse
efeito desloca a curva de demanda agregada para baixo, porque reduz os gastos com consumo
em qualquer nível de renda nacional. O efeito de um aumento dos impostos sobre a renda de
equilíbrio é ilustrado na Figura 5.7. Supomos que os impostos subam ΔT, de T0 para T1. A curva
de demanda agregada desloca-se para baixo de (C + I + G)0 para (C + I + G)1. Isso é
consequência do deslocamento para baixo da função consumo causado pela elevação dos
impostos de T0 para T1. A renda de equilíbrio cai de Y0 para Y1.
Note-se que a curva de demanda agregada desloca-se para baixo em (–bΔT), ou seja, apenas
uma fração (b) do aumento nos impostos. A razão é que, em um dado nível de renda, um
aumento de 1 real nos impostos reduz a renda disponível em 1 real, mas diminui o componente
consumo da demanda agregada em apenas b reais. O restante do declínio da renda disponível é
absorvido por uma queda de (1 – b) reais na poupança. Ao contrário de mudanças nos gastos
governamentais e no investimento, que têm um efeito “um para um” sobre a demanda agregada
autônoma, uma mudança de uma unidade monetária nos impostos desloca a curva de demanda
agregada apenas por uma fração (–b) da unidade monetária. Essa fração (–b) vezes o
multiplicador dos gastos autônomos, 1/(1 – b), dá o efeito sobre a renda de equilíbrio de uma
mudança de uma unidade monetária nos impostos, –b/(1 – b).
Há uma relação entre os valores absolutos dos multiplicadores dos impostos e dos gastos do
governo, que pode ser observada nos exemplos a seguir:

O multiplicador dos impostos é, em valor absoluto, um a menos que o multiplicador dos


gastos governamentais. Esse fato tem uma implicação importante para os efeitos de um aumento
nos gastos governamentais acompanhado de um aumento igual nos impostos, ou seja, um
aumento com equilíbrio do orçamento. Para encontrar os efeitos dessa combinação de mudanças
de políticas, somamos os multiplicadores das duas políticas e obtemos a seguinte expressão:

Um aumento de uma unidade monetária nos gastos governamentais financiado por um


aumento de uma unidade monetária nos impostos aumenta a renda de equilíbrio em 1 unidade
monetária. Esse resultado, denominado multiplicador do orçamento equilibrado, reflete o fato
de que mudanças nos impostos têm um impacto menor por unidade monetária sobre a renda de
equilíbrio do que mudanças nos gastos. O valor de 1 para o multiplicador decorre de o
multiplicador dos impostos ser uma unidade a menos, em valores absolutos, que o valor do
multiplicados dos gastos. Este último resultado não se mantém em muitos modelos mais
complexos, mas o resultado de que mudanças nos impostos afetam menos a demanda agregada,
por unidade monetária, do que mudanças nos gastos governamentais é bastante geral.

Multiplicador do orçamento equilibrado


Dá a mudança no produto de equilíbrio que resulta de
um aumento ou redução de uma unidade monetária
simultaneamente nos impostos e nos gastos
governamentais.

5.6 Política de estabilização fiscal


FIG 5.8 Um exemplo de política de estabilização fiscal

Partindo do ponto de equilíbrio A na parte a, um declínio nos gastos autônomos em investimentos de I0 para I1 desloca a curva
de gastos agregados para baixo, de EP = (C + I0 + G0) para EL = (C + I1 + G0), movendo o sistema para o ponto de equilíbrio
B. Um aumento compensatório nos gastos discricionários do governo de G0 para G1 desloca a curva de gastos agregados de volta
para o ponto de equilíbrio A, onde (C + I1 + G1) = Ep = (C + I0 + G0). A renda de equilíbrio está novamente em Yp.. Na parte b,
partindo do ponto de equilíbrio A, o declínio nos gastos autônomos em investimentos desloca a curva I + G para baixo, de I0 +
G0 para I1 + G0, movendo o equilíbrio para o ponto B e reduzindo a renda de YP para YL. Um aumento compensatório nos
gastos discricionários do governo de G0 para G1 desloca a curva I + G para cima, para I1 + G1 retornando ao ponto de equilíbrio
A e elevando a renda de volta para Yp.

Como a renda de equilíbrio é afetada por mudanças nos gastos governamentais e nos
impostos, esses instrumentos de política fiscal podem ser alterados de várias maneiras para
estabilizar o total dos gastos autônomos e, assim, a renda de equilíbrio, mesmo que o
componente investimento seja instável.
Um exemplo de política de estabilização fiscal é ilustrado na Figura 5.8. Considera-se que a
economia esteja em equilíbrio em um nível potencial Yp, com a demanda agregada em Ep igual a
(C + I0 + G0). Suponhamos que, a partir desse ponto, o investimento autônomo decline de I0
para I1, como resultado de uma mudança desfavorável nas expectativas das firmas. Na ausência
de uma ação de política, a demanda agregada declina para EL, igual a (C + I1 + G0). O novo
nível da renda de equilíbrio está abaixo do produto potencial, YL.
Dentro do modelo, uma resposta de política fiscal apropriada seria aumentar os gastos
governamentais em um grau suficiente para restaurar o equilíbrio em Yp. No gráfico, uma
elevação dos gastos do governo de G0 para G1 desloca a curva de demanda agregada para cima,
de volta para Ep, agora igual a (C + I1 + G1). Alternativamente, seria possível usar uma redução
dos impostos para recuperar o nível inicial da demanda agregada. Como o multiplicador dos
impostos é menor, o corte apropriado nos impostos seria maior que o aumento dos gastos
necessário.

PERSPECTIVAS 5.2 - A POLÍTICA FISCAL NA PRÁTICA :


EXEMPLOS DE DUAS DÉCADAS
Um exemplo de política de estabilização fiscal é a redução de impostos da administração Kennedy-Johnson em 1964.
Houve uma grave recessão em 1958, durante a qual a taxa de desemprego subiu para 6,8%. A recuperação dessa recessão
teve vida curta. A economia mergulhou novamente em recessão em 1960. A administração Kennedy tomou posse em
1961 com um programa para “colocar a economia em movimento outra vez” – chamado de nova economia –, que se
baseava na aplicação da teoria keynesiana à política macroeconômica. Kennedy propunha um grande corte de impostos
tanto para pessoas físicas como jurídicas.
Os consultores econômicos de Kennedy achavam que a demanda agregada estava baixa demais para que a economia
operasse no nível de pleno emprego, ou potencial. A taxa de desemprego em 1961, por exemplo, era de 6,7%, em
comparação com os 4,0% que eram considerados “pleno” emprego na época. Em termos da Figura 5.8, a economia no
início da década de 1960 estava em um ponto como YL. O objetivo do corte nos impostos era descolar a curva de demanda
agregada para cima, de modo a mover a economia para o produto potencial (Yp na Figura 5.8).
A administração Kennedy não conseguiu que o Congresso aprovasse o corte de impostos, principalmente porque os líderes
congressistas preocupavam-se como o déficit orçamentário que isso criaria. Depois do assassinato de Kennedy, o
presidente Lyndon Johnson convenceu o Congresso a aprovar a redução de impostos de 20% para pessoas físicas e 10%
para as empresas no início de 1964. O produto e o emprego cresceram rapidamente, com a taxa de desemprego caindo
para 4,8% na primeira metade de 1965 e para 3,8% em 1966. Esse foi o ponto alto de influência para a teoria keynesiana
de política fiscal.
Com o envolvimento crescente dos Estados Unidos na Guerra do Vietnã no período de 1966-68, os gastos do governo com
defesa aumentaram sensivelmente. Esse aumento na demanda agregada, com a economia já no produto potencial, gerou
pressões inflacionárias. Em termos da Figura 5.8, a curva de demanda agregada estava sendo empurrada para cima do
nível compatível com o produto potencial (YP). A década de 1960 demonstrou que, na prática, a política fiscal podia tanto
desestabilizar como estabilizar a economia.
Em décadas posteriores no século XX, embora tenham ocorrido alguns exemplos de programas de estabilização fiscal, as
políticas de estabilização foram dominadas pela política monetária. Então, durante a recessão profunda de 2007-2009, a
política monetária mostrou-se inadequada para carregar todo o fardo e o governo voltou-se uma vez mais para uma
iniciativa fiscal significativa. A Lei Americana de Recuperação e Reinvestimento (American Recovery and Reinvestment
Act – ARRA) foi aprovada em fevereiro de 2009. Incluíam-se na lei iniciativas de gastos como ajuda para os estados,
ampliação do auxílio-desemprego e financiamento de projetos de construção e outros projetos de obras públicas. A ARRA
também incluiu uma série de cortes de impostos para pessoas físicas e jurídicas. O custo total da lei foi de
aproximadamente US$ 800 bilhões ao longo de vários anos.
A ARRA representa mais um teste potencial da eficácia de políticas de estabilização fiscais keynesianas e tem sido alvo de
muitas controvérsias. O órgão não partidário Congressional Budget Office estima que a ARRA produziu um aumento do
PIB entre 1,1% e 3,5% no quarto trimestre de 2010 e criou de 1,8 a 3,5 milhões de empregos até o final de 2010.

5.7 Exportações e importações no modelo keynesiano simples


Tanto as importações como as exportações vêm crescendo como porcentagem do PIB em
décadas recentes. Em 1960, as importações americanas de bens e serviços totalizavam 4,4% do
PIB. Em 2010, esse número era de 16,3% do PIB. As exportações subiram de 4,9% do PIB em
1960 para 12,7% em 2010. No geral, a economia dos Estados Unidos ficou muito mais
estreitamente ligada à das outras nações nos últimos 50 anos. Esta seção focaliza o papel de
importações e exportações na determinação da renda de equilíbrio no modelo keynesiano
simples. Lembremos do Capítulo 2 que o PIB (Y) é composto de consumo, investimento e gastos
governamentais mais exportações líquidas. Exportações líquidas são exportações menos
importações. A condição para o produto de equilíbrio na economia aberta (incluindo
exportações e importações) é

Comparando com a equação (5.2), a condição de equilíbrio na economia fechada, nós


somamos as exportações (X) à demanda agregada e subtraímos as importações (Z). Exportações
são a demanda estrangeira por produto doméstico e, portanto, são parte da demanda agregada.
Além disso, como as importações estão incluídas em C, I e G, mas não são demandas por bens
domésticos, temos de subtraí-las da demanda agregada.
Para encontrar uma expressão que mostre o PIB de equilíbrio no modelo de economia aberta,
seguimos o mesmo procedimento que no caso da economia fechada; consideramos investimento
e gastos governamentais como exógenos, ou seja, como componentes dos gastos autônomos. O
consumo é dado pela função consumo

onde, por não desempenharem nenhum papel essencial em nossa análise aqui, deixamos de
fora os impostos e, portanto, não é preciso fazer a distinção entre PIB (Y) e renda disponível (YD
= Y – T). Para calcular o produto de equilíbrio no caso da economia aberta, precisamos
especificar os determinantes de importações e exportações.
Para simplificar nossa análise, consideramos que as importações consistam unicamente em
bens de consumo. A demanda por importações dependeria da renda e teria um componente
autônomo.
O parâmetro u representa o componente autônomo das importações. O parâmetro v é a
propensão marginal a importar, ou seja, o aumento na demanda por importações por unidade de
aumento no PIB, que é um conceito análogo à PMgC (b) em (5.24).16
A demanda por exportações domésticas é parte da demanda estrangeira por importações. A
demanda estrangeira por importações depende do nível de renda estrangeira e é determinada por
uma função demanda por importações análoga à equação (5.25). Pela perspectiva doméstica, a
renda estrangeira e, assim, a demanda por exportações locais são exógenas.
Variáveis adicionais que esperaríamos que influenciassem tanto a demanda doméstica por
importações como a demanda estrangeira por exportações domésticas são os níveis de preços
relativos nos dois países e o nível da taxa de câmbio. Essas variáveis determinam os custos
relativos dos produtos dos dois países para seus residentes. Note-se que estamos considerando
que os níveis de preços e a taxa de câmbio sejam fixos. Os efeitos sobre importações e
exportações de mudanças no nível de preços ou na taxa de câmbio são estudados na Parte IV.
Com as importações dadas pela equação (5.25) e as exportações consideradas exógenas,
podemos calcular a renda de equilíbrio pela equação (5.23), como se segue:

Para examinar os efeitos do comércio exterior no modelo, comparamos a equação (5.26) com
a expressão equivalente para a renda de equilíbrio do modelo de economia fechada, a equação
(5.14). Essa expressão, omitindo a variável de impostos (T), pode ser escrita como

Em ambas as equações (5.26) e (5.27), a renda de equilíbrio é expressa como o produto de


dois termos: o multiplicados dos gastos autônomos e o nível de gastos autônomos. Vejamos
como cada um deles é alterado quando se acrescentam importações e exportações ao modelo.
Peguemos primeiro o multiplicador dos gastos autônomos, 1/(1 – b + v) na equação (5.26),
em contraste com 1/(1 – b) na equação (5.27) para o modelo de economia fechada. Como v, a
propensão marginal a importar, é maior que zero, o multiplicador em (5.26), 1/(1 – b + v), será
menor que o multiplicador em (5.27), 1/(1 – b). Por exemplo, se b = 0,8 e v = 0,3, teríamos

e
Por essas expressões, pode-se observar que, quanto mais a economia for aberta para o
comércio exterior (quanto maior for v), menor será o multiplicador dos gastos autônomos.
O multiplicador dos gastos autônomos fornece a mudança na renda de equilíbrio por
mudança unitária nos gastos autônomos. Disso decorre, portanto, que, quanto mais aberta for
uma economia (quanto maior for v), menor será a reação da renda a choques de demanda
agregada, como mudanças nos gastos governamentais ou mudanças autônomas na demanda por
investimento. O declínio no valor do multiplicador dos gastos autônomos com a elevação de v
pode ser explicado com referência ao processo multiplicador (Seção 5.5). Uma mudança nos
gastos autônomos – uma mudança nos gastos do governo, por exemplo – terá um efeito direto
sobre a renda e um efeito induzido sobre o consumo, com um novo efeito sobre a renda. Quanto
mais alto for o valor de v, maior a proporção desse efeito induzido que representará uma
mudança na demanda por bens de consumo estrangeiros, não domésticos. Em consequência, o
efeito induzido sobre a demanda por bens domésticos e, assim, sobre a renda doméstica será
menor.17 O aumento nas importações por unidade de renda constitui mais um vazamento do
fluxo circular de renda (doméstica) em cada rodada do processo multiplicador e reduz o valor do
multiplicador dos gastos autônomos.
Agora, consideremos o segundo termo da expressão da renda de equilíbrio no caso da
economia aberta [equação (5.26)], o nível de gastos autônomos. Além dos elementos de uma
economia fechada (a + I + G), os gastos autônomos na economia aberta incluem exportações e o
componente autônomo das importações. Lembremos que os componentes autônomos da
demanda agregada não são diretamente determinados pela renda. Em vez disso, deslocamentos
nos componentes dos gastos autônomos afetam o nível de demanda agregada para um dado
nível de renda e resultam em mudanças na renda de equilíbrio. Assim, mudanças nas
exportações e mudanças autônomas na demanda por importações são choques adicionais que
alterarão a renda de equilíbrio.
Pela equação (5.26), podemos calcular os efeitos multiplicadores de mudanças em X e u.

Um aumento na demanda por exportações domésticas é um aumento na demanda por


produtos produzidos no próprio país e aumentará a renda de equilíbrio da mesma forma como o
faria um aumento nos gastos governamentais ou um aumento autônomo no investimento.18
Em contraste, um aumento autônomo na demanda por importações, ou seja, um aumento em
u, causará um declínio na renda de equilíbrio. Um aumento autônomo na demanda por
importações representa um deslocamento da demanda por bens domésticos para a demanda por
bens estrangeiros. Por exemplo, por causa dos grandes aumentos nos preços da gasolina na
década de 1970, os consumidores americanos deslocaram a demanda de automóveis domésticos
para automóveis estrangeiros (menores). Assim sendo, o aumento autônomo na demanda por
importações é um declínio na demanda por produto doméstico e faz a renda de equilíbrio
diminuir.
Em suma, um aumento na demanda pelas exportações domésticas tem um efeito
expansionista sobre a renda de equilíbrio, enquanto um aumento autônomo nas importações tem
um efeito de contração sobre a renda de equilíbrio. Esse resultado não deve ser interpretado
como um indicador de que exportações são boas e importações são prejudiciais em seus efeitos
econômicos. Os países importam bens que podem ser produzidos mais eficientemente no
exterior e o comércio aumenta a eficiência geral da alocação internacional de recursos. No
entanto, o efeito de expansão de aumentos nas exportações e o efeito de contração de aumentos
nas importações de fato explicam por que, às vezes, as nações têm tentado estimular a economia
doméstica promovendo as exportações e restringindo as importações.

Conclusão
O modelo apresentado neste capítulo é incompleto. Precisamos levar em conta a moeda e as
taxas de juros e explicar o comportamento de preços e salários antes de completar nossa análise
do sistema keynesiano. No entanto, este modelo simples destaca várias características do
sistema.
O modelo simples ilustra com clareza o papel da demanda agregada na determinação da
renda no sistema keynesiano. Como veremos adiante, ele exagera o papel da demanda agregada.
Seja como for, um aspecto-chave de todos os modelos keynesianos é que a demanda
desempenha um papel crucial na determinação da renda. Na visão keynesiana, mudanças nos
elementos autônomos da demanda agregada, em especial a demanda por investimento, são
fatores fundamentais que causam mudanças no nível de equilíbrio da renda. Por meio do
processo multiplicador, tais mudanças nos gastos autônomos induzem também mudanças nos
gastos com consumo. O investimento inadequado, e um consequente nível baixo de demanda
agregada, foram a explicação keynesiana para o desemprego maciço na Depressão da década de
1930.
O modelo também ilustra o papel da política de estabilização fiscal na administração da
demanda agregada para proteger o produto de equilíbrio de deslocamentos na instável demanda
por investimento. Embora as expressões simples que derivamos para os multiplicadores dos
gastos do governo e dos impostos requeiram modificações, os princípios que as fundamentam
permanecem intactos.
Além disso, este capítulo examinou o papel de importações e exportações no modelo
keynesiano simples. Mudanças exógenas nesses componentes da demanda agregada são fatores
adicionais que alteram a renda de equilíbrio. Vimos também que a abertura da economia afeta o
valor do multiplicador dos gastos autônomos e, assim, a vulnerabilidade da economia tanto a
mudanças estrangeiras como domésticas nos gastos autônomos.

Questões de revisão
1. Explique como as origens da revolução keynesiana podem ser encontradas no problema do
desemprego.
2. Interprete cada uma das três maneiras de expressar a condição da renda de equilíbrio no
modelo keynesiano simples [equações (5.2), (5.5) e (5.6)]. Explique por que as três maneiras
são equivalentes.
3. Explique a diferença entre investimento realizado e investimento desejado. Em qual
componente do investimento ocorre a discrepância entre os dois totais?
4. Explique a teoria de Keynes sobre como as expectativas afetam a demanda por investimento.
Como essa teoria se relaciona à noção de Keynes de que a demanda agregada seria instável
na ausência de políticas de estabilização governamentais?
5. Considere os números da Tabela 5.1 que apresentam o consumo como uma porcentagem da
renda em anos prósperos (1929, 1955, 1973, 1979, 1989, 2000, 2006) comparados a anos de
recessão (1933, 1958, 1975, 1982, 1991, 2001, 2008). Note que, em todos os casos, o
consumo é mais alto como porcentagem da renda nos anos de recessão. Seria esse o
resultado previsto com base na função consumo de Keynes dada pela equação (5.9)?
Explique.
6. No modelo keynesiano simples, um aumento de 1 unidade monetária nos gastos autônomos
fará a renda de equilíbrio aumentar por um múltiplo desse aumento de 1 unidade. Explique o
processo pelo qual isso acontece.
7. Explique detalhadamente por que o multiplicador dos impostos [ΔY/ΔT = –b/(1 – b)] é
negativo e por que ele é menor em valor absoluto que o multiplicador dos gastos
governamentais [ΔY/ΔG = 1/(1 – b)].
8. Suponha que, para uma determinada economia e período, o investimento fosse igual a 100,
os gastos governamentais fossem iguais a 75, os impostos líquidos fossem fixos em 100 e o
consumo (C) fosse dado pela função consumo
C = 25 + 0,8YD
onde YD é a renda disponível e Y é o PIB.
a. Qual é o nível da renda de equilíbrio (Y)?
b. Qual é o valor do multiplicador dos gastos governamentais (ΔY/ΔG)? E do multiplicador
dos impostos (ΔY/ΔT)?
c. Suponha que o investimento tenha declinado 40 unidades, para um nível de 60. Qual será o
novo nível da renda de equilíbrio?
9. Suponha que a renda de equilíbrio fosse inicialmente 200 unidades e que esse fosse também
o nível de renda de pleno emprego. Considere que a função consumo seja
C = 25 + 0,8D
e que, partindo desse nível de equilíbrio inicial, tenhamos agora um declínio no investimento
de 8 unidades. Qual será o novo nível de equilíbrio da renda? Que aumento nos gastos
governamentais seria necessário para levar a renda de volta ao nível inicial de 200?
Alternativamente, que redução na arrecadação tributária seria suficiente para restaurar o
nível de renda de 200?
10. Suponha que os gastos governamentais tenham aumentado em 10 unidades e que esse
aumento tenha sido financiado por um aumento de 10 unidades nos impostos. A renda de
equilíbrio mudaria ou permaneceria a mesma como resultado dessas duas ações de política?
Se a renda de equilíbrio mudar, em que direção ela se moveria e quanto? Explique.
11. Suponha que, em vez de um nível de impostos fixo, tivéssemos um imposto de renda tal que
T = T1Y
onde T1 fosse a alíquota do imposto de renda. Seguindo o procedimento da Seção 5.4, derive
uma expressão para a renda de equilíbrio Y análoga à equação (5.14) para este caso em que o
nível de arrecadação tributária depende da renda. Qual é a expressão equivalente ao
multiplicador dos gastos autônomos [1/(1 – b)] para este caso de um imposto de renda?
12. Na pergunta 8, suponha que, partindo da posição de equilíbrio inicial (investimento igual a
100, gastos governamentais iguais a 75 e impostos líquidos fixos em 100), houvesse uma
queda autônoma no consumo e um aumento na poupança de modo que a função consumo se
deslocasse de
C = 25 + 0,8YD
para
C = 5 + 0,8YD
a. Calcule a mudança na renda de equilíbrio resultante desse aumento autônomo na
poupança.
b. Calcule o nível de poupança antes e depois do deslocamento do consumo e, portanto, a
função poupança. Como você explica esse resultado?
13. Suponha que, na versão de economia aberta do modelo keynesiano na Seção 5.7, incluamos
agora os impostos. A renda disponível (YD = Y – T), portanto, substitui o PIB (Y) na função
consumo (5.24). Calcule a expressão da renda de equilíbrio para essa versão do modelo de
economia aberta. Calcule uma expressão para o multiplicador dos impostos (ΔY/ΔT) no
modelo.
14. Na versão da economia aberta do modelo keynesiano, incluindo impostos (ver pergunta 13),
suponha que ocorra um aumento autônomo nas importações de 20 unidades [u na equação
(5.25) tem um aumento de 20]. Para contrabalançar os efeitos dessa contração na demanda
agregada doméstica, suponha que o governo corte os impostos em 20 unidades. A renda de
equilíbrio aumentará ou diminuirá? Quanto? Explique.
CAPÍTULO 6
O sistema keynesiano (II): moeda, juros e renda

No Capítulo 5, ignoramos a taxa de juros e a política monetária. Aqui, explicamos o papel da


taxa de juros e da moeda no sistema keynesiano e construímos um modelo que mostra como a
taxa de juros e a renda são determinadas conjuntamente. Para fazer isso, também é necessário
levar em conta os ativos financeiros, além da moeda - considerar estoques alternativos de
riqueza no modelo. No Capítulo 7, usamos esse modelo para oferecer uma visão mais realista de
como a renda depende da demanda agregada e deixar claro como a política monetária pode
afetar a renda por seu efeito sobre a demanda agregada. Veremos como a instabilidade nos
mercados de ativos financeiros pode ser uma fonte adicional de instabilidade para a demanda
agregada. Veremos também como os resultados do Capítulo 5 referentes à política fiscal são
modificados pela inclusão de mercados financeiros no modelo.

6.1 A moeda no sistema keynesiano


Era fundamental para a teoria da moeda de Keynes a noção de que a moeda afeta a renda por
intermédio da taxa de juros. Um aumento na oferta de moeda, por exemplo, reduz a taxa de
juros, e a taxa de juros mais baixa, por sua vez, aumenta a demanda agregada e a renda.
Precisamos examinar duas ligações na cadeia de eventos que conectam mudanças na oferta de
moeda e mudanças na renda. A primeira é a relação entre moeda e taxa de juros. A segunda é o
efeito da taxa de juros sobre a demanda agregada. Começaremos por esta última.

6.1.1 Taxas de juros e demanda agregada


Já examinamos as razões pelas quais o investimento das firmas depende da taxa de juros.
Resumidamente, um projeto de investimento será levado adiante apenas se sua rentabilidade
esperada superar o custo de tomar empréstimos para financiá-lo, em um montante suficiente
para justificar os riscos do projeto. Com uma taxa de juros alta (custo de tomar empréstimo),
menos projetos satisfazem o critério.
Ao considerar as possíveis influências da taxa de juros, levamos em conta também outros
componentes da demanda agregada além do investimento das firmas. O primeiro deles é o
investimento em construção residencial. A construção residencial é um componente do
investimento nas contas nacionais, mas a razão pela qual esse investimento é afetado pelo nível
da taxa de juros requer uma explicação mais detalhada. O valor das novas residências entra nas
contas do PIB quando as casas são construídas. Um elemento do custo de construção é o custo
de empréstimos tomados a curto prazo para financiar a construção de uma casa. Taxas de juros
mais altas significam custos mais altos para o construtor e, sendo constantes os outros fatores,
esses custos mais altos desestimulam a construção. Além disso, um fator importante que
determina a taxa de novas construções residenciais é o estado geral da demanda por moradias,
existentes e novas. A maioria das compras de casas é financiada por empréstimos de longo prazo
tomados no mercado de financiamento imobiliário, cujas taxa de juros acompanham as altas
taxas de juros nos outros mercados. As altas taxas de juros imobiliários aumentam o custo da
compra de uma casa e reduzem a demanda por novas residências e pelas já existentes. Essa
demanda reduzida no mercado imobiliário faz cair o volume de novas construções residenciais.
Outros componentes da demanda agregada não são contados como investimentos pelas
contas nacionais, mas podem ser afetados por mudanças na taxa de juros. O primeiro deles são
os gastos com consumo de bens duráveis. Esses gastos entram como consumo corrente nas
contas nacionais, mas, para o consumidor, a compra de um carro ou de um aparelho como um
computador ou um televisor é uma forma de investimento. Essas compras com frequência são
financiadas por empréstimos, especialmente as compras de carros. Taxas de juros elevadas
aumentam o custo da compra e devem reduzir esse componente da demanda agregada.
Um último componente da demanda agregada que pode ser afetado pelas taxas de juros é um
subcomponente dos gastos governamentais. Os gastos governamentais nas contas nacionais
incluem os gastos de governos estaduais e municipais com serviços, bens de consumo e bens de
investimento. Nos modelos construídos aqui, consideramos que os gastos governamentais sejam
fixados exogenamente pelo formulador de políticas. O formulador de políticas econômicas seria,
de fato, o governo federal e a variável de política apropriada são os gastos do governo federal.
Os gastos dos governos estaduais e municipais podem ser mais adequadamente incluídos com os
gastos privados com consumo e investimento. Boa parte dos gastos dos governos estaduais e
municipais é financiada por empréstimos tomados por meio de emissões de títulos. Taxas de
juros elevadas devem, em teoria, aumentar os custos desses empréstimos e desestimular essa
parte dos gastos governamentais estaduais e municipais. Há, porém, muitos determinantes da
magnitude e do momento de execução desses projetos de gastos dos governos estaduais e
municipais e, na prática, a importância das taxas de juros permanece incerta.
Dentro do modelo simples do Capítulo 5, os efeitos sobre a demanda agregada e a renda de
equilíbrio como resultado de uma mudança na taxa de juros são ilustrados na Figura 6.1.
Inicialmente, supomos que a economia esteja em equilíbrio em Y0 com a demanda agregada em
E0 igual a (C + I0 + G0), correspondendo a uma taxa de juros r0. Um declínio na taxa de juros
para r1 desloca a curva de demanda agregada para cima até E1, igual a (C + I1 + G0). Esse
deslocamento representa os efeitos combinados da taxa de juros sobre o investimento das firmas,
o investimento em construção residencial, os gastos de consumo com bens duráveis e os gastos
com investimentos dos governos estaduais e municipais. A renda de equilíbrio sobe para Y1.
Um fator importante para determinar a variação da renda de equilíbrio (Y1 – Y0) que ocorrerá
para uma dada mudança na taxa de juros é o tamanho do deslocamento da demanda agregada,
causado pela mudança na taxa de juros. Quanto mais sensíveis forem os componentes da
demanda agregada a mudanças na taxa de juros, maior será o deslocamento da função demanda
agregada na Figura 6.1 e maior o efeito sobre a renda de equilíbrio. A sensibilidade da demanda
agregada aos juros, portanto, será importante para determinar a eficácia da política monetária
para influenciar a renda de equilíbrio.

FIG 6.1 Efeito de uma redução da taxa de juros sobre o investimento e a renda de equilíbrio
Na parte a, quando a taxa de juros cai de r0 para r1, o investimento sobe de I0 para I1. Na parte b, esse aumento no investimento,
ΔI, desloca a curva de gastos agregados para cima, uma vez que o intercepto é maior, de E0 =C + I0 + G0 para E1 = C + I1 + G0.
A renda sobe de Y0 para Y1.

A Figura 6.1a ilustra a ideia de que o investimento está negativamente relacionado à taxa de
juros. À taxa de juros r0, o investimento é I0 no ponto A da curva de investimento. Se a taxa de
juros cair para r1, o investimento aumenta para I1 no ponto B. Olhando a Figura 6.1b, como o
investimento é um componente dos gastos agregados, a curva de gastos desloca-se para cima, do
ponto de equilíbrio A para o ponto de equilíbrio B, e a renda de equilíbrio aumenta de Y0 para
Y1.
Em nossos modelos, representamos o efeito das taxas de juros sobre os gastos agregados
como um efeito em I, o componente de investimento dos gastos agregados. Deve-se ter em
mente, porém, o que foi discutido nesta seção. Para captar plenamente os efeitos das taxas de
juros sobre os gastos agregados, precisamos definir investimento de forma ampla, incluindo os
outros componentes dos gastos agregados examinados aqui.
6.1.2 A teoria keynesiana da taxa de juros
A próxima relação que examinaremos é entre a quantidade de moeda e a taxa de juros.
Keynes acreditava que a quantidade de moeda desempenhava um papel fundamental na
determinação da taxa de juros e estruturou sua teoria de modo a destacar esse papel.

PERSPECTIVAS 6.1 - O SETOR FINANCEIRO NO SISTEMA


KEYNESIANO
O modelo clássico continha um papel para a moeda e a política monetária. Keynes, no entanto, quis integrar a moeda e
outros ativos financeiros entre si e com o processo na determinação do produto. Ele via um papel muito mais central para
o setor financeiro na economia real. Antes de prosseguir com o desenvolvimento do modelo keynesiano, é interessante dar
um passo atrás e considerar o setor financeiro na economia norte-americana atual. A moeda é um ativo no modelo de
Keynes, assim como no modelo clássico. Outro grupo de ativos na economia real são os ativos do mercado monetário.
Esses são ativos com prazos de menos de um ano. Um exemplo de um ativo de mercado monetário é um título do Tesouro
dos Estados Unidos. Títulos do Tesouro são instrumentos da dívida com vencimento de curto prazo emitidos pelo Tesouro
americano para prazos como 3 ou 6 meses. Outros ativos do mercado monetário são títulos negociáveis, que são emissões
de instrumentos de dívida de curto prazo por grandes empresas, e Certificados de Depósito negociáveis emitidos por
grandes bancos. Uma propriedade comum desses ativos é que eles têm um baixo risco de não pagamento. Títulos do
Tesouro dos Estados Unidos, por exemplo, são essencialmente livres de risco. Também por serem de curto prazo, eles não
têm um risco de preço. Em geral, seu portador os mantém até o vencimento e recebe seu valor nominal.
A outra categoria importante é constituída de ativos negociados em mercados de capitais. Esses incluem títulos do Tesouro
americano com vencimentos de 10 ou 30 anos, títulos corporativos, títulos municipais emitidos por governos estaduais ou
locais, títulos lastreados em hipotecas e uma série de outros ativos de longo prazo. Os ativos de mercados de capitais têm
graus variáveis de risco de não pagamento, que vão de essencialmente zero no caso de títulos do Tesouro americano a um
risco muito alto no caso de títulos corporativos sem grau de investimento (junk bonds). Como esses instrumentos de dívida
no mercado de capitais são de longo prazo, seu preço variará de acordo com as taxas de juros de mercado vigentes de uma
maneira que será descrita na próxima seção. Um último grupo de ativos de mercados de capitais são ações corporativas
(equities). Estas também são ativos de longo prazo, também têm graus variáveis de risco de incumprimento e também são
ativos de preço variável cujo valor é afetado pelas taxas de juros vigentes e muitos outros fatores que afetam as
perspectivas das empresas que emitiram a ação.
Keynes escolheu uma maneira específica de integrar todos esses elementos do setor financeiro em seu modelo, como
vamos ver agora.

A principal simplificação da teoria de Keynes é pressupor que todos os ativos financeiros


possam ser divididos em dois grupos: (1) moeda e (2) todos os ativos não monetários, que
chamamos de títulos. A distinção que Keynes enfatizava entre os grupos era que os ativos
monetários eram ativos altamente líquidos de curto prazo, enquanto os títulos eram os ativos de
longo prazo menos líquidos. Como resultado, vemos que os ativos monetários são livres de risco
e os títulos são os ativos de risco. A liquidez é a propriedade de um ativo que mede a facilidade
com que o ativo pode ser convertido em moeda corrente sem perda de valor. O componente
moeda corrente da oferta de moeda é, assim, perfeitamente líquido. Outros componentes da
oferta de moeda e alguns substitutos próximos da moeda, como títulos de curto prazo do
Tesouro americano, são altamente líquidos. Os títulos e outros ativos de longo prazo são menos
líquidos. O preço desses ativos de longo prazo varia e, portanto, eles são arriscados. Keynes
chamou a demanda pelos ativos monetários de preferência pela liquidez.1
Para os propósitos de nosso modelo, a moeda pode ser entendida como a oferta de moeda
estreitamente definida que, nas estatísticas monetárias oficiais americanas, é chamada de M1.
M1 consiste em moeda corrente mais depósitos bancários à vista. A categoria “título” inclui os
títulos propriamente ditos mais outros ativos financeiros de longo prazo, principalmente ações.
A distinção entre longo prazo (títulos) e curto prazo (moeda) é, como foi comentado, a crucial.
Além disso, durante muito tempo, os títulos foram o ativo que pagava juros e a moeda não.
Ainda é verdade que parte da oferta de moeda, moeda corrente e alguns depósitos à vista, não
pagam juros, mas juros são pagos sobre alguns componentes de M1 e sobre componentes de um
agregado mais amplo de ativos altamente líquidos. No momento, porém, essas taxas de juros são
próximas de zero e vamos ignorá-las em nosso modelo. A taxa de juros é a taxa de juros paga
sobre títulos.
Além disso, para simplificar, consideramos que os títulos no modelo sejam homogêneos em
todos os aspectos. Como em nossa discussão do sistema clássico, suporemos que os títulos são
perpetuidades, promessas de pagamento de quantias fixas a intervalos fixos no futuro (por
exemplo, 1 real ao ano), sem devolução do principal.
Dentro desse modelo simplificado, Keynes examina o modo como os indivíduos distribuem
sua riqueza financeira entre os dois ativos, moeda (M) e títulos (B). Em um ponto no tempo, a
riqueza (Wh) é fixa em algum nível e, como títulos e moeda são as únicas formas de estoque de
riqueza, temos

A taxa de juros de equilíbrio para os títulos é a taxa em que a demanda por títulos é igual ao
estoque de títulos existente. Pareceria muito natural desenvolver uma teoria da taxa de juros de
equilíbrio estudando os fatores que determinam diretamente a oferta e a demanda por títulos.
Keynes não fez assim. Note que, dada a equação (6.1), há apenas uma decisão independente com
relação à carteira de ativos, que é a divisão entre moeda e títulos. Se, para um indivíduo, a
riqueza for igual a $50.000, a decisão de manter $10.000 em forma de moeda determina
implicitamente que os $40.000 restantes serão mantidos em forma de títulos. Em termos de
posições de equilíbrio, isso significa que uma pessoa que esteja satisfeita com o nível de seu
estoque de moeda em relação à riqueza total está, por definição [equação (6.1)], satisfeita com
seu estoque de títulos; essa pessoa está na distribuição ótima de riqueza entre os dois tipos de
estoque de valor.
Dizer, por exemplo, que a demanda por moeda excede a oferta é dizer, no agregado, que o
público está tentando aumentar a proporção de riqueza mantida em forma de moeda. Isto é, por
definição, o mesmo que dizer que a oferta de títulos excede a demanda; o público está tentando
reduzir a proporção de riqueza mantida em forma de títulos.
Em consequência, há duas maneiras equivalentes de descrever a taxa de juros de equilíbrio:
como a taxa que iguala a oferta e a demanda por títulos ou, alternativamente, como a taxa que
iguala a oferta e a demanda por moeda. O equilíbrio em um mercado implica equilíbrio no outro.
Keynes escolheu a segunda dessas perspectivas, porque queria enfatizar a relação entre moeda e
taxa de juros.
Essa concepção keynesiana da determinação da taxa de juros é ilustrada na Figura 6.2.
Considera-se que a oferta de moeda seja fixada exogenamente pelo Banco Central em .A
taxa de juros de equilíbrio é r0, a taxa em que a demanda por moeda, dada pela curva de
demanda por moeda Md no gráfico, é exatamente igual à oferta fixa de moeda.
Em um sentido mais fundamental, a taxa de juros de equilíbrio é determinada por fatores que
afetam a oferta e a demanda por moeda. No caso da oferta, o principal fator serão as políticas do
Banco Central. Voltamo-nos agora para os fatores que Keynes acreditava que determinassem a
demanda por moeda, os fatores que determinam a posição e a inclinação da curva Md na Figura
6.2.

FIG 6.2 Determinação da taxa de juros de equilíbrio

No sistema keynesiano, a taxa de juros de equilíbrio (r0) é a taxa de juros que iguala a oferta
e a demanda por moeda.

6.1.3 A teoria keynesiana da demanda por moeda


Keynes considerava três motivos para reter moeda.

6.1.3.1 Demanda para transações


O primeiro motivo considerado por Keynes era o motivo de transações. A moeda é um meio
de troca e os indivíduos mantêm moeda para uso em transações. A moeda faz a ponte entre o
recebimento de renda e os gastos. A quantidade de moeda mantida para transações variaria
positivamente com o volume de transações de que o indivíduo participasse. A renda é
considerada uma boa medida do volume de transações e, assim, a demanda por moeda para
transações dependeria positivamente da renda.
A moeda recebida em uma transação pode ser usada para comprar títulos, que podem, então,
ser vendidos para obter moeda outra vez quando chegar o momento de algum gasto. O ganho de
fazer isso são os juros obtidos pelo tempo em que os títulos são mantidos. As taxas de
corretagem envolvidas na compra de títulos e os inconvenientes de fazer um grande número de
transações desse tipo tornariam não-lucrativa a compra de títulos por montantes pequenos para
serem mantidos por períodos curtos. Seria preferível manter alguma moeda para transações.
Ainda assim, há espaço para economizar nos saldos para transações por meio dessas compras de
títulos. Como o retorno a ser obtido são os ganhos de juros sobre os títulos, esperaríamos que o
incentivo para economizar com os saldos para transações aumente quando a taxa de juros
aumenta. Em consequência, além de depender positivamente da renda, a demanda por moeda
para transações estaria negativamente relacionada à taxa de juros.
Keynes não enfatizou a taxa de juros ao discutir o motivo de transações para reter moeda,
mas ela se revelou importante, em especial para o setor empresarial. Firmas com um alto volume
de transações podem, por meio de práticas de gestão de caixa, reduzir seu estoque médio de
moeda. O incentivo para fazer os gastos requeridos para a gestão de caixa depende da taxa de
juros.

6.1.3.2 Demanda precaucionária


Keynes acreditava que, além da moeda mantida para transações planejadas, saldos adicionais
de moeda eram mantidos para o caso de gastos inesperados, como despesas médicas ou com
consertos. Keynes denominou a moeda mantida por esse motivo de demanda precaucionária por
moeda. Ele acreditava que o montante mantido para esse fim dependia positivamente da renda.
Uma vez mais, a taxa de juros poderia ser um fator significativo se as pessoas tendessem a
economizar com o montante de moeda mantido pelo motivo precaucionário quando a taxa de
juros subisse. Como os motivos para manter saldos precaucionários são semelhantes aos da
demanda para transações, simplificamos nossa discussão aqui classificando a demanda
precaucionária na categoria de demanda para transações, sejam tais transações esperadas ou
imprevistas.

6.1.3.3 Demanda especulativa


O último motivo considerado por Keynes para reter moeda era o motivo especulativo. Keynes
começou perguntando por que um indivíduo manteria alguma moeda acima da necessária para
os motivos de transações e precaucionários, se títulos pagam juros e moeda não. Essa demanda
adicional por moeda existia, na opinião de Keynes, por causa da incerteza sobre as taxas de juros
futuras e da relação entre mudanças na taxa de juros e o preço dos títulos. Se fosse esperado que
as taxas de juros se movessem de modo a causar perdas de capital para os títulos, era possível
que essas perdas esperadas superassem os ganhos de juros dos títulos e fizessem com que o
investidor preferisse manter moeda. Essa moeda seria mantida pelos que especulam em relação a
mudanças futuras na taxa de juros. Para ver como essa especulação funciona, analisaremos a
relação entre a taxa de juros e os preços dos títulos.
Consideremos o caso de uma perpetuidade, que é o que estamos pressupondo que sejam os
títulos em nosso modelo. Vamos supor que, em algum ponto no passado, tenhamos pagado o
preço de mercado então vigente de $1.000 para comprar um título do governo que oferece o
pagamento de $50 por ano, denominado pagamento do cupom. Foi comprado um título perpétuo
pelo preço de $1.000, a uma taxa de juros de mercado de 5% (50/1.000 = 0,05 ou 5%). Quanto
esse título valeria se tentássemos vendê-lo hoje? O valor de um ativo financeiro que dá ao
proprietário o direito a um pagamento de cupom de $50 ao ano depende da taxa de juros de
mercado atual. Primeiro, vamos supor que a taxa de juros de mercado atual seja 5%, a mesma
que a taxa de juros vigente quando o título foi comprado. Nesse caso, o título ainda seria
vendido por $1.000; a esse preço, ele renderia a taxa de juros atual de 5%.
Em seguida, consideremos o caso em que a taxa de juros de mercado tenha subido para 10%
ao longo do tempo desde que o título foi comprado. O preço vigente hoje para um título com um
pagamento de cupom de $50 ao ano é $500 (50/500 = 0,10 ou 10%). O título não tem nenhuma
característica que permita que o vendamos por mais que isso. Embora tenhamos pagado $1.000,
devido à elevação da taxa de juros só será possível vendê-lo com uma perda de capital de $500,
o preço que o torna competitivo às taxas de mercado atuais. Uma elevação nas taxas de juros de
mercado resulta em uma perda de capital para os títulos já existentes.
Se, em vez disso, a taxa de juros de mercado tivesse caído desde que o título foi comprado, o
valor do título teria aumentado. Se a taxa de juros tivesse declinado de 5% para 2%, o preço do
título teria aumentado dos $1.000 pagos para $2.500. A esse preço, o título, que tem um cupom
de $50 ao ano, pagará 2% de juros (50/2.500 = 0,02 ou 2%). Assim, uma queda nas taxas de
juros resulta em um ganho de capital para os títulos já existentes. Tendo em mente essa relação
entre preços de títulos e mudanças na taxa de juros, voltamos à questão da desejabilidade
relativa de moeda e títulos.
Os retornos esperados dos dois ativos podem ser expressos como se segue:

O retorno da moeda é zero, porque ela não rende juros (nosso pressuposto até aqui) e porque
seu valor não está sujeito a ganhos ou perdas de capital associados a mudanças na taxa de juros.2
O título pagará uma taxa de juros r. O retorno esperado dos títulos será igual a essa taxa de juros
mais ou menos qualquer ganho ou perda de capital esperados. Por razões discutidas acima, um
investidor que previsse uma queda nas taxas de juros esperaria ter um ganho de capital,
enquanto um investidor que previsse um aumento das taxas de juros esperaria ter uma perda de
capital. Essa incerteza sobre o curso futuro das taxas de juros é crucial para a análise de Keynes.
Suponhamos que um investidor acredite que as taxas de juros irão cair. Os títulos têm,
portanto, o retorno esperado maior. Eles pagam juros e a expectativa é de que gerem ganho de
capital. Se houver uma expectativa de elevação das taxas de juros, porém, é possível que a perda
de capital esperada dos títulos seja maior que os ganhos com juros. O retorno esperado dos
títulos seria negativo nesse caso e a moeda seria o ativo preferido. A moeda mantida devido a
uma expectativa de queda dos preços dos títulos (um aumento das taxas de juros) é a demanda
especulativa por moeda de Keynes.
Até este ponto, temos uma relação entre a quantidade de moda demandada e as mudanças
futuras esperadas nas taxas de juros. Keynes converte isso em uma relação entre a demanda por
moeda e o nível da taxa de juros por meio de um pressuposto sobre como as pessoas formam
expectativas quanto a mudanças futuras na taxa de juros. Ele pressupõe que os investidores
tenham uma concepção relativamente fixa da taxa de juros normal. Quando a taxa de juros
efetiva está acima da taxa normal, os investidores esperam que a taxa de juros caia. Quando a
taxa de juros está abaixo da taxa normal, eles esperam que ela suba. Dado esse pressuposto
sobre como expectativas referentes a taxas de juros são formadas, podemos desenvolver uma
relação entre o nível da demanda especulativa por moeda e a taxa de juros. Faremos isso, em
primeiro lugar, para um investidor individual e, depois, examinaremos a relação agregada
correspondente.
Para o investidor individual, a curva de demanda por saldos especulativos é mostrada na
Figura 6.3a. Aqui, Mi2 representa a demanda especulativa por moeda do indivíduo i e Mi1 é a
demanda para transações dessa pessoa. Temos, então,

e
onde Mi, Bi e Whi são os estoques totais de moeda, os estoques de títulos e a riqueza do
indivíduo, respectivamente.
Seguindo a teoria de Keynes, considera-se que o indivíduo tenha uma noção preconcebida da
taxa de juros normal. Essa taxa é mostrada como rin na Figura 6.3a. Como a taxas acima de
rinespera-se que a taxa de juros caia, a essas taxas os títulos serão preferíveis à moeda como
ativo. A demanda especulativa por moeda será zero e os estoques de títulos serão iguais a (Whi –
Mi1). A demanda especulativa por moeda também será zero para taxas de juros dentro de uma
certa faixa abaixo de rin. Se a taxa de juros não estiver muito abaixo de rin, os ganhos com juros
sobre o título serão maiores que a pequena perda de capital esperada. A perda de capital
esperada será pequena porque apenas uma pequena elevação de r será esperada quando a taxa
retornar a rni.
Há um nível da taxa de juros abaixo de rin, porém, em que a perda de capital esperada dos
títulos, que aumenta conforme a taxa de juros declina abaixo de rin, igualará os ganhos com
juros dos títulos. Chamamos esse valor de taxa de juros crítica (ric) do indivíduo. Abaixo dessa
taxa, a moeda será preferida. O indivíduo venderá títulos e manterá saldos especulativos de (Whi
– Mi1), o que significa que toda a riqueza dessa pessoa será mantida em moeda.
Keynes considerava que diferentes indivíduos tinham noções diferentes quanto ao que seria
uma taxa de juros normal. Por exemplo, conforme a taxa de juros caísse a partir de uma taxa
muito alta em que houvesse muito pouca demanda especulativa, ela desceria sucessivamente
para níveis abaixo das taxas críticas dos diferentes investidores. Quanto mais baixa a taxa de
juros, mais investidores julgariam que, dada a sua concepção da taxa de juros normal, a moeda
seria o ativo preferível. A uma taxa de juros muito baixa, quase todos os investidores esperariam
uma elevação substancial da taxa de juros no futuro (r<ric) e a moeda seria quase unanimemente
preferida como ativo. Procedendo dessa maneira, construímos a demanda agregada por saldos
especulativos de moeda mostrada na Figura 6.3b.

FIG 6.3 Curvas de demanda especulativa individual e agregada por moeda


A demanda especulativa individual por moeda é mostrada na parte a. A qualquer taxa de juros acima da taxa crítica (ric), a
demanda especulativa por moeda é zero. Abaixo da taxa de juros crítica, o indivíduo troca títulos por moeda. A parte b mostra a
curva de demanda especulativa agregada por moeda (M2). Conforme a taxa de juros declina, ela cai abaixo da taxa crítica de cada
vez mais indivíduos e a demanda especulativa por moeda aumenta.

A curva é suave, refletindo o aumento gradual da demanda especulativa por moeda à taxas de
juros sucessivamente mais baixas. A curva vai ficando plana em uma taxa de juros muito baixa,
o que mostra que, a essa taxa baixa, há uma expectativa geral de perdas de capital com os títulos
que superam os ganhos com juros. Nessa taxa, os incrementos à riqueza seriam mantidos em
forma de moeda, sem queda adicional na taxa de juros. Keynes chamou essa situação de
armadilha da liquidez. Na maior parte do tempo, porém, pressupõe-se que estejamos na parte
de inclinação negativa da curva de demanda especulativa por moeda.

Armadilha da liquidez
Situação em uma taxa de juros muito baixa em que a
curva de demanda especulativa por moeda torna-se
quase horizontal.

6.1.3.4 A demanda total por moeda


Examinamos os três motivos para reter moeda no sistema keynesiano e podemos agora reuni-
los para construir a função demanda por moeda total. A demanda para transações e a demanda
precaucionária variam positivamente com a renda e negativamente com a taxa de juros. A
demanda especulativa por moeda está negativamente relacionada à taxa de juros. Juntando esses
fatores, podemos expressar a demanda total por moeda como

onde Y é a renda e r é a taxa de juros. Uma elevação da renda aumenta a demanda por moeda;
uma elevação da taxa de juros diminui a demanda por moeda. Na análise a seguir, faremos às
vezes a suposição simplificadora de que a função demanda por moeda seja linear:

A equação (6.4) considera que podemos traçar a função demanda por moeda como uma reta
em nossos gráficos. O parâmetro c1 fornece o aumento na demanda por moeda por aumento
unitário da renda e c2 dá a magnitude do declínio da demanda por moeda por aumento unitário
da taxa de juros.

6.1.4 Os efeitos de um aumento da oferta de moeda


Na Figura 6.4, traçamos a curva keynesiana linear de demanda por moeda [equação (6.4)]
como uma função da taxa de juros e ilustramos o efeito sobre o mercado monetário de um
aumento da oferta de moeda. A função demanda por moeda, Md, tem inclinação negativa; uma
queda da taxa de juros, por exemplo, aumenta a demanda por moeda. Para estabelecer a posição
da função demanda por moeda, precisamos estabelecer o nível de renda. A curva na Figura 6.4 é
traçada para um nível de renda Y0. Um aumento na renda desloca a curva para a direita,
refletindo o fato de que, para uma dada taxa de juros, a demanda por moeda aumenta com a
renda. Considera-se que a oferta de moeda seja uma variável de política econômica
exogenamente controlada, estabelecida inicialmente em Ms0.
Agora, consideremos os efeitos de um aumento na oferta de moeda para o nível mostrado
pela curva Ms1 na Figura 6.4. À taxa de juros de equilíbrio inicial r0, depois do aumento da
oferta de moeda, passa a haver um excesso de oferta de moeda. Em r0, as pessoas não desejam
reter a moeda adicional. Elas tentam diminuir seus estoques de moeda comprando títulos. O
aumento da demanda por títulos reduz a taxa de juros que os ofertantes de títulos (tomadores de
empréstimo) oferecem para vender seus títulos. A queda da taxa de juros faz a demanda por
moeda subir e um novo equilíbrio é alcançado na taxa de juros r1.

FIG 6.4 Equilíbrio no mercado monetário


Um aumento na oferta de moeda de Ms0 para Ms1 produz um excesso inicial de oferta de
moeda. A taxa de juros cai de r0 para r1 para restabelecer o equilíbrio no mercado monetário.

6.1.5 Indo em frente


Vimos como mudanças na oferta de moeda afetam a taxa de juros. Vimos também como uma
mudança na taxa de juros afeta a demanda agregada. Não podemos combinar a Figura 6.4 com a
Figura 6.1 para examinar o efeito sobre a renda de uma mudança na oferta de moeda?
Infelizmente, não podemos.
Na Figura 6.4, analisamos os efeitos de uma mudança na oferta de moeda no mercado
monetário sem levar em conta efeitos em outros mercados. Especificamente, mantivemos a
renda constante (em Y0) para fixar a posição da função demanda por moeda. Quando a taxa de
juros cai de r0 para r1, podemos ver pela Figura 6.1 (considerando que os subscritos tenham o
mesmo significado nos dois gráficos) que a renda aumenta de Y0 para Y1. Essa elevação da renda
deslocará a curva de demanda por moeda na Figura 6.4 para a direita. Haverá uma nova
mudança na taxa de juros de volta para r0 e, em consequência, uma nova mudança na renda. O
que precisamos encontrar é o efeito de mudanças da oferta de moeda sobre os valores de
equilíbrio da taxa de juros e da renda, valores de equilíbrio tanto para o mercado monetário
como para o mercado de bens. Temos todas as relações necessárias, mas precisamos de um
modelo em que possamos encaixá-las. Essa nova estrutura é o modelo IS-LM.

6.2 O modelo IS-LM


Nossa tarefa nesta seção é encontrar os valores da taxa de juros e da renda que equilibrem
simultaneamente o mercado de bens e o mercado monetário. Como o equilíbrio no mercado
monetário implica equilíbrio no mercado de títulos, essa combinação equilibrará os três
mercados (bens, moeda e títulos). Primeiro, identificamos combinações de renda e taxa de juros
que equilibram o mercado monetário, deixando de lado o mercado de bens. Em seguida,
identificamos combinações de renda e taxa de juros que sejam valores de equilíbrio para o
mercado de bens. Demonstramos, então, que, dentro desses dois conjuntos de combinações de
equilíbrio de taxa de juros e renda, há uma combinação que equilibra os dois mercados. Para
encontrar um ponto de equilíbrio único, precisamos supor que as variáveis de política
econômica, entre elas a oferta de moeda, os gastos governamentais e os impostos, sejam fixas
em determinados níveis. Outras influências autônomas sobre a renda e as taxas de juros (por
exemplo, a situação das expectativas das firmas, que afeta o investimento) também devem ser
consideradas fixas. Vemos que essas variáveis de política e outras influências exógenas
determinam as posições das curvas de equilíbrio dos mercados monetário e de bens,
denominadas abaixo curvas LM e IS. No Capítulo 7, vamos ver como mudanças nessas variáveis
de política econômica e outras influências exógenas afetam os valores de equilíbrio da renda e
da taxa de juros.

6.2.1 Equilíbrio do mercado monetário: a curva LM


6.2.1.1 Construção da curva LM
A demanda por moeda no modelo keynesiano depende positivamente da renda em razão da
demanda para transações. A demanda por moeda também varia inversamente à taxa de juros,
devido a demanda especulativa por moeda e porque a quantidade de saldos para transações
mantidos em qualquer nível de renda declina quando a taxa de juros (o custo de oportunidade de
manter tais saldos) aumenta.
Expressamos essa relação como

ou, em forma linear

Agora, queremos encontrar todas as combinações de r e Y que equilibram a demanda por


moeda com uma oferta de moeda fixa, indicada como Ms0. A curva formada por esses pontos é
chamada curva LM porque, ao longo dela, a demanda por moeda, que identificamos pelo
símbolo L [equação (6.3)], é igual à oferta de moeda (M). Para simplificar, examinaremos o caso
em que a demanda por moeda é dada pela forma linear (6.4). Nesse caso, a condição que deve
ser satisfeita para o equilíbrio do mercado monetário, a equação da curva LM, pode ser escrita
como

Já examinamos a natureza do equilíbrio no mercado monetário. Na Figura 6.5a, por exemplo,


são traçadas três curvas diferentes de demanda por moeda, correspondentes a três níveis de
renda sucessivamente mais altos, Y0, Y1 e Y2. Conforme a renda aumenta de Y0 para Y1 e, depois,
de Y1 para Y2, a curva de demanda por moeda desloca-se para a direita quando traçada em
relação à taxa de juros. Os pontos em que essas curvas de demanda por moeda interceptam a
linha vertical, que dá o valor da oferta de moeda fixa, são pontos de equilíbrio para o mercado
monetário. As combinações renda-taxa de juros em que o equilíbrio ocorre, (Y0, r0), (Y1, r1) e
(Y2, r2), são pontos da curva LM, que é a curva de equilíbrio do mercado monetário. Esses
pontos são representados na Figura 6.5b. Procedendo dessa maneira, podemos encontrar o valor
de equilíbrio da taxa de juros para cada nível de renda e construir a curva LM completa mostrada
na Figura 6.5b.
A curva LM tem inclinação ascendente para a direita. Em níveis mais elevados de renda, o
equilíbrio no mercado monetário ocorre a taxas de juros mais altas. A razão para a inclinação
positiva da curva LM é a seguinte. Um aumento da renda (por exemplo, de Y0 para Y1 nas
Figuras 6.5a e b) aumenta a demanda por moeda a uma dada taxa de juros, porque a demanda
por moeda para transações varia positivamente com a renda. Para que a demanda volte a um
nível igual à oferta fixa de moeda, é necessário que a taxa de juros seja mais alta (r1 em vez de
r0 nas Figuras 6.5a e b). A taxa de juros mais alta resulta em uma demanda especulativa por
moeda mais baixa e reduz o componente de transações correspondente a qualquer nível de
renda. A taxa de juros precisa aumentar até que esse declínio na demanda por moeda seja
exatamente igual ao aumento inicial da demanda para transações induzido pela renda.
Para completar nossa apresentação da curva LM, examinaremos duas questões. Primeiro,
queremos saber o que determina o valor da inclinação da curva LM. Sabemos que a curva tem
inclinação positiva, mas ela é muito inclinada ou relativamente plana? A inclinação da curva LM
é importante para nossa discussão posterior sobre os efeitos de políticas econômicas. A segunda
questão refere-se à posição da curva LM: que fatores deslocam a curva?

FIG 6.5 Equilíbrio no mercado monetário e a curva LM

(a) Aumentos na renda de Y0 para Y1 para Y2 deslocam a curva de demanda por moeda de Md(Y0) para Md(Y1), depois para
Md(Y2). O equilíbrio no mercado monetário requer taxas de juros sucessivamente mais altas r0,r1, r2 a níveis de renda mais altos
Y0, Y1, Y2. (b) A curva LM mostra combinações de renda (Y) e taxa de juros (r) que equilibram o mercado monetário.
Combinações de equilíbrio como (r0, Y0), (r1, Y1) e (r2, Y2) da parte a são pontos da curva LM (A, B, C). Como vimos na parte
a, em níveis mais altos de renda, são necessárias taxas de juros mais altas para o equilíbrio do mercado monetário; a curva LM
inclina-se para cima e para a direita.

6.2.1.2 Fatores que determinam a inclinação da curva LM


Para ver quais fatores determinam a inclinação da curva LM, começamos examinando o
efeito sobre o equilíbrio do mercado monetário de um aumento na renda, ΔY, por exemplo, de Y0
para Y1 nas Figuras 6.5a e b. O aumento da demanda por moeda induzido pela renda como
resultado dessa mudança será igual a c1ΔY, onde c1 é o parâmetro que dá o aumento da demanda
por moeda por aumento unitário da renda pela equação (6.4). A taxa de juros terá de subir o
suficiente para compensar esse aumento da demanda por moeda induzido pela renda. Quanto
maior o valor de c1, maior o aumento da demanda por moeda por aumento unitário da renda e,
portanto, maior o ajuste para cima necessário na taxa de juros para levar a demanda total por
moeda de volta ao nível da oferta de moeda fixa. Quanto maior o valor de c1, mais inclinada será
a curva LM. O valor de c1, no entanto, não é motivo de muito debate. A controvérsia nesta
questão centra-se no segundo fator que determina a inclinação da curva LM.

FIG 6.6 Elasticidade-juros da demanda por moeda e a inclinação da curva LM

A curva de demanda por moeda muito inclinada na parte a reflete o pressuposto de que a elasticidade-juros da demanda por
moeda é baixa (em valor absoluto). Com uma baixa elasticidade-juros da demanda por moeda, a curva LM é relativamente
inclinada. Na parte b, considera-se que a elasticidade-juros da demanda por moeda seja alta e, como resultado, a curva de
demanda por moeda é relativamente plana. A curva LM nesse caso também é relativamente plana.

Para um dado aumento da demanda por moeda induzido pela renda (um dado c1), o tamanho
do aumento necessário da taxa de juros para levar a demanda total por moeda de volta ao valor
da oferta de moeda fixa depende de quanto a demanda por moeda é elástica (sensível) em
relação a mudanças na taxa de juros.3 Na equação (6.4), a elasticidade-juros da demanda por
moeda depende do valor de c2, que determina a variação na demanda por moeda para uma dada
mudança na taxa de juros (–c2 = ΔMd/Δr). A relação entre a elasticidade-juros da demanda por
moeda e a inclinação da curva LM é ilustrada na Figura 6.6.
A parte a da figura mostra o caso de uma baixa elasticidade-juros da demanda por moeda. A
curva de demanda por moeda é bastante inclinada, indicando que grandes mudanças na taxa de
juros não alterarão de modo muito significativo o nível de demanda por moeda. Para ver como a
inclinação da curva LM está relacionada à elasticidade-juros da demanda por moeda,
examinemos como o equilíbrio do mercado monetário muda a níveis de renda progressivamente
mais altos. Aumentos da renda de Y0 para Y1 e, depois, para Y2 deslocarão a curva de demanda
por moeda para a direita na Figura 6.6a, de Md(Y0) para Md(Y1), depois para Md(Y2). Esses
aumentos da renda produzem aumentos da demanda por moeda para transações equivalentes a c1
(Y1 – Y0) e c1 (Y2 – Y1), respectivamente. Como um determinado aumento da taxa de juros não
reduzirá muito a demanda por moeda (c2 é pequeno), a taxa de juros terá de subir muito para
reduzir a demanda por moeda de volta ao nível Ms0 fixo. Esse fato reflete-se na curva LM na
Figura 6.6a, que é bastante inclinada.
O caso em que a demanda por moeda tem alta elasticidade-juros é mostrado na Figura 6.6b.
Aqui, a curva de demanda por moeda é pouco inclinada. Uma pequena queda na taxa de juros,
por exemplo, aumenta de modo significativo a demanda por moeda. Aqui também a curva de
demanda por moeda desloca-se para a direita quando a renda aumenta de Y0 para Y1 e, depois,
para Y2. O gráfico é construído de tal forma que o aumento da renda e o valor de c1 da equação
(6.4) são os mesmos que na Figura 6.6a. Assim, os aumentos da demanda por moeda induzidos
pela renda são os mesmos nas Figuras 6.6a e b. Note-se que, na Figura 6.6b, a taxa de juros
precisa subir relativamente pouco para restaurar o equilíbrio do mercado monetário. Como
consequência, a curva LM na Figura 6.6b é relativamente plana. Se a demanda por moeda for
fortemente sensível a mudanças na taxa de juros (c2 é grande), um aumento relativamente
pequeno da taxa de juros compensará os aumentos induzidos pela renda nos saldos de moeda
para transações quando a renda sobe de Y0 para Y1 e, depois, para Y2.
Dois casos especiais de inclinação da curva LM ocorrem quando a elasticidade-juros da
demanda por moeda é zero ou, alternativamente, quando ela é extremamente alta.
Primeiro, vamos examinar o caso em que a demanda por moeda é completamente insensível
aos juros [c2 igual a zero na equação (6.4)]. Partindo de algum equilíbrio inicial, consideremos o
aumento da taxa de juros necessário para reequilibrar o mercado monetário se a renda
aumentasse. O nível mais alto da renda resultaria em um aumento na demanda por moeda para
transações. Com a demanda por moeda completamente insensível a mudanças na taxa de juros,
não há nenhum aumento possível da taxa de juros que possa reduzir a demanda por moeda e
levá-la de volta ao nível fixo da oferta de moeda. Nesse caso, considera-se que uma elevação da
taxa de juros não faça as pessoas nem reduzir a demanda especulativa por moeda nem reduzir os
saldos para transações. Em consequência, só há um nível de renda que pode ser um nível de
equilíbrio. Para ver isso, notemos que, com c2 igual a zero, a equação (6.4) torna-se
Md = c0 + c1Y
e a equação da curva LM (6.5) é dada por
Ms0 = c0 + c1Y
Em consequência, com M fixo em Ms0, para o equilíbrio precisamos ter
Um único nível de renda pode ser um nível de equilíbrio para o mercado monetário.
A curva LM para esse caso é mostrada na Figura 6.7. Referimo-nos a esse caso como o caso
clássico, porque a função demanda por moeda keynesiana quando c2 é igual a zero não difere
substancialmente da função demanda por moeda clássica. Como na teoria clássica (veja a Seção
4.1), a demanda por moeda depende apenas da renda. A característica distintiva da teoria
keynesiana da demanda por moeda é a relação negativa entre demanda por moeda e taxa de
juros.

FIG 6.7 Curva LM: o caso clássico

A curva LM é vertical se a demanda por moeda for completamente insensível aos juros.

FIG 6.8 Armadilha da liquidez


Em níveis de renda muito baixos, Y0 e Y1, o equilíbrio no mercado monetário na parte a ocorre em pontos da parte plana da curva
de demanda por moeda, onde a elasticidade da demanda por moeda é extremamente alta. Em consequência, a curva LM na parte
b é quase horizontal nessa faixa. Em níveis de renda mais altos, como Y2 e Y3, o equilíbrio do mercado monetário está em pontos
na parte mais inclinada das curvas de demanda por moeda Md(Y2)e Md(Y3) e a curva LM torna-se mais inclinada.

O caso extremo alternativo ocorre quando a elasticidade-juros da demanda por moeda torna-
se extremamente grande, aproximando-se do infinito. O que causa isso? Nossa discussão da
teoria keynesiana da demanda especulativa por moeda mostrou que, quando a taxa de juros fica
muito baixa em relação ao que se considera ser a taxa normal, desenvolve-se um consenso de
que é provável um aumento futuro da taxa de juros. Nessa situação, com as perdas de capital
futuras esperadas superando os pequenos ganhos de juros dos títulos, o público tenderia a manter
qualquer aumento da riqueza na forma de saldos em moeda, com uma queda desprezível da taxa
de juros. Nessa faixa da curva de demanda por moeda, a elasticidade-juros da demanda por
moeda torna-se extremamente alta. Esse caso, que Keynes chamou de armadilha da liquidez, é
ilustrado na Figura 6.8. Note-se que, aqui, temos de abandonar a forma linear da função
demanda por moeda. No caso da armadilha da liquidez, estamos considerando uma mudança na
inclinação da função demanda por moeda. A função torna-se muito plana a taxas de juros baixas.
Na Figura 6.8a, consideremos primeiro as curvas de demanda por moeda Md(Y0) e Md(Y1),
correspondentes aos níveis de renda Y0 e Y1 mostrados na Figura 6.8b. Em relação aos níveis de
renda Y2 e Y3, esses são níveis baixos de renda. Consequentemente, Md(Y0) e Md(Y1) estão à
esquerda de Md(Y2) e Md(Y3) na Figura 6.8a.
Nesses níveis baixos de renda, com a oferta de moeda em Ms0, a taxa de juros de equilíbrio é
tão baixa que estamos na porção plana da curva de demanda por moeda. Dentro dessa faixa, um
aumento da renda, de Y0 e Y1, por exemplo, requer apenas uma ligeira elevação da taxa de juros
para restaurar o equilíbrio no mercado monetário; a demanda por moeda é fortemente sensível a
mudanças na taxa de juros. Nessa faixa, a curva LM na Figura 6.8 é quase horizontal.
Em níveis de renda mais altos, entre Y2 e Y3, por exemplo, um aumento da renda exigiria um
aumento maior da taxa de juros para restabelecer o equilíbrio no mercado monetário. Aqui, as
taxas de juros de equilíbrio são tais que não estamos na armadilha da liquidez. A elasticidade-
juros da demanda por moeda é mais baixa nessa parte da curva de demanda por moeda.

6.2.1.3 Fatores que deslocam a curva LM


Dois fatores que deslocam a curva LM são mudanças na oferta de moeda exogenamente
fixada e deslocamentos da função demanda por moeda. Fixamos esses dois valores em níveis
constantes para determinar a posição da curva LM. A oferta de moeda é considerada uma
variável de política econômica e, quando falamos em um aumento da oferta de moeda, por
exemplo, referimo-nos a uma ação de política que tenha definido esse instrumento de política
econômica em um novo nível.
Examinamos deslocamentos da curva de demanda por moeda traçada em relação à taxa de
juros quando o nível de renda muda. Isso não é o que chamamos aqui de um deslocamento da
função demanda por moeda. Um deslocamento da função demanda por moeda significa uma
mudança na quantidade de moeda demandada para níveis dados de taxa de juros e renda, o que
Keynes chamou de alteração na preferência pela liquidez. Por exemplo, se condições
econômicas muito instáveis aumentassem a probabilidade de falência das firmas e, assim, o risco
de inadimplemento dos títulos, a demanda por moeda aumentaria. Essa situação seria um
deslocamento nas carteiras de ativos dos indivíduos de títulos para moeda, para níveis dados da
taxa de juros e da renda.
Mudanças na oferta de moeda. A curva LM é traçada com a taxa de juros no eixo vertical e
a renda no eixo horizontal. Resolvendo a equação (6.5) para a taxa de juros, identificamos o
intercepto e a inclinação da curva LM

Resolvendo para a taxa de juros:


Quando a curva LM é traçada, o intercepto contém a oferta de moeda (Ms0). Sempre que a
oferta de moeda mudar, o intercepto mudará e a curva LM será deslocada. Se a oferta de moeda
aumentar, a curva LM será deslocada para baixo. Se a oferta de moeda diminuir, a curva LM será
deslocada para cima.
A Figura 6.9 ilustra os efeitos de um aumento da oferta de moeda de Ms0 para Ms1. Com a
oferta de moeda inicial Ms0, a curva LM é dada por LM0 na Figura 6.9b. Ao longo dessa curva
LM inicial, um nível de renda Y0, por exemplo, é um ponto de equilíbrio do mercado monetário
para um valor r0 da taxa de juros, como é mostrado no ponto A no gráfico. O equilíbrio no
mercado monetário para o nível de renda Y0 também é mostrado na Figura 6.9a na intersecção
das curvas Ms0 e Md(Y0).
Pode-se observar na Figura 6.9a que um aumento na oferta de moeda de Ms0 para Ms1 reduz a
taxa de juros de equilíbrio para r1 para um nível de renda dado Y0. Com a renda fixa, para que a
nova oferta de moeda mais alta seja igual à demanda por moeda é preciso que a taxa de juros
caia, a fim de aumentar a demanda especulativa por moeda e a demanda por moeda para
transações nesse mesmo nível de renda. Em termos da curva LM na Figura 6.9b, o ponto na nova
curva LM (para a oferta de moeda Ms1) que dá a taxa de juros de equilíbrio para o nível de renda
Y0 estará na taxa de juros r1. Essa combinação renda-taxa de juros (Y0, r1) é um ponto da nova
curva LM, LM1, conforme mostrado no ponto B no gráfico.
Em geral, com uma oferta de moeda mais alta para um dado nível de renda, a taxa de juros
que equilibra o mercado monetário será mais baixa. A nova curva LM, LM1, estará abaixo da
curva inicial LM0, como é mostrado na Figura 6.9b.

FIG 6.9 Deslocamento da curva LM com um aumento da quantidade de moeda


Partindo do ponto A no mercado monetário, com a oferta de moeda (Ms0), a taxa de juros de equilíbrio é r0. Essa é a combinação
Y0, r0 no ponto (A) na curva LM. Quando a oferta de moeda aumenta, de (Ms0) para (Ms1), dada a demanda por moeda no nível
de renda Y0, a curva de oferta de moeda desloca-se para a direita. O equilíbrio no mercado monetário muda do ponto A para o
ponto B e a taxa de juros cai de r0 para r1.

Alternativamente, consideremos o ponto na nova curva LM que dá o nível de equilíbrio da


renda correspondente à taxa de juros r0. Em Ms0, o nível de renda Y0 era um nível de equilíbrio
para a taxa de juros r0 (ponto A). Com a oferta de moeda Ms1, para que r0 fosse um valor de
equilíbrio no mercado monetário a renda teria de ser maior, em Y1. Com uma oferta de moeda
maior e uma taxa de juros constante, a renda precisa estar em um nível mais alto para que haja
equilíbrio no mercado monetário. O ponto na nova curva LM, LM1, correspondente a r0 precisa
estar à direita do ponto A. Esse ponto é mostrado como o ponto C na Figura 6.9b. A nova curva
LM, LM1, com a oferta de moeda mais alta Ms1, ficará à direita da curva LM original na Figura
6.9b.
Em resumo, um aumento da oferta de moeda desloca a curva LM para baixo e para a direita.
Invertendo a análise acima, uma redução da oferta de moeda desloca a curva LM para cima e
para a esquerda.
Deslocamentos da função demanda por moeda.4 Examinemos em seguida o efeito sobre a
curva LM de um deslocamento da função demanda por moeda. Vamos supor que ocorra um
aumento na demanda por moeda em um dado nível de renda e taxa de juros. Uma razão possível
para essa mudança, conforme sugerido anteriormente, é uma perda de confiança nos títulos.

FIG 6.10 Deslocamento da curva LM com um deslocamento da função demanda por moeda

Um deslocamento para cima da função demanda por moeda, de Md0(Y0) para Md1 (Y0 na parte a, eleva a taxa de juros de
equilíbrio para um dado nível de renda. A curva LM na parte b desloca-se para cima e para a esquerda, de LM0para LMr.

A Figura 6.10a mostra um equilíbrio inicial no mercado monetário correspondente ao nível


de renda Y0. Inicialmente, a demanda por moeda é dada por Md0(Y0). A taxa de juros de
equilíbrio é r0, conforme mostrado no ponto A na curva LM inicial, LM0 na Figura 6.10b. Agora,
vamos supor que a função demanda por moeda desloque-se para Md1 (Y0), um aumento na
demanda por moeda mantendo o nível de renda constante. Note-se aqui que é a função que se
desloca, de Md0 (Y0) para Md1 (Y0). Com o nível de renda inalterado, Y0, o equilíbrio no mercado
monetário requer uma taxa de juros r1. O ponto de equilíbrio na nova curva LM, LM1 na Figura
6.10b, para um dado nível de renda Y0, estará acima da antiga curva LM. Esse ponto é mostrado
como o ponto B na Figura 6.10b.
Similarmente, para manter o equilíbrio no mercado monetário em r0 depois do deslocamento
da curva de demanda por moeda seria necessária uma queda na renda para um nível abaixo de
Y0, o que deslocaria a curva na Figura 6.10a para baixo até o nível da reta Md0 (Y0) original.
Assim, o ponto de equilíbrio em LM1, à taxa r0, está à esquerda de LM0 e é mostrado como o
ponto C na Figura 6.10b.
Um deslocamento da função demanda por moeda que aumente a demanda por moeda a um
dado nível da taxa de juros e da renda desloca a curva LM para cima e para a esquerda. Uma
mudança inversa na demanda por moeda (reduzindo a quantidade de moeda demandada aos
níveis dados de renda e taxa de juros) desloca a curva LM para baixo e para a direita.

6.2.1.4 A curva LM: resumo


As observações fundamentais sobre a curva LM são:
1. A curva LM é a curva que dá as combinações de valores de renda e taxa de juros que
produzem equilíbrio no mercado monetário.
2. A curva LM inclina-se para cima e para a direita.
3. A curva LM será relativamente pouco (muito) inclinada se a elasticidade-juros da demanda
por moeda for relativamente alta (baixa).
4. A curva LM será deslocada para baixo (para cima) e para a direita (esquerda) com um
aumento (redução) da quantidade de moeda.
5. A curva LM será deslocada para cima (para baixo) e para a esquerda (direita) com um
deslocamento da função demanda por moeda que aumente (reduza) a quantidade de moeda
demandada a níveis dados de renda e taxa de juros.

6.2.2 Equilíbrio do mercado de bens: a curva IS


6.2.2.1 Construção da curva IS
A condição de equilíbrio no mercado de bens e serviços (ou, simplesmente, mercado de bens)
é

Uma expressão equivalente dessa condição de equilíbrio é

Construímos a curva de equilíbrio do mercado de bens, denominada curva IS, a partir da


segunda forma da condição de equilíbrio, embora os mesmos resultados pudessem ser derivados
da equação (6.7).
Procederemos encontrando o conjunto de combinações de taxa de juros e renda que
produzem equilíbrio no mercado de bens. Em seguida, examinaremos os fatores que determinam
a inclinação e a posição dessa curva de equilíbrio do mercado de bens.
Para começar, veremos o caso simplificado que omite o setor governamental (isto é, G e T
iguais a zero). Para esse caso simples, podemos reescrever (6.8) como5

A equação (6.9) também indica que o investimento depende da taxa de juros e a poupança
depende da renda. Nossa tarefa é encontrar combinações de taxa de juros e renda que igualem o
investimento e a poupança.
A Figura 6.11 ilustra a construção da curva IS para esse caso. Na Figura 6.11a, o
investimento é traçado como uma função negativamente relacionada à taxa de juros; uma
redução da taxa de juros aumentará os gastos com investimentos. A poupança é representada
como uma função positivamente relacionada à renda, com a inclinação sendo a propensão
marginal a poupar (PMgS).

FIG 6.11 Construção da curva IS (T = G = 0)

Às taxas de juros r0, r1 e r2, os níveis de investimento serão I0, I1 e I2 na parte a. Para gerar os níveis de poupança S0, S1 e S2
iguais a esses níveis de investimento, a renda precisa estar em Y0, Y1 e Y2, respectivamente. Portanto, as combinações taxa de
juros-renda (r0, Y0), (r1, Y1) e (r2, Y2) são pontos (A, B, C) da curva IS na parte b.

Consideremos uma taxa de juros r0. Para esse nível da taxa de juros, o investimento é a
quantidade I0, conforme mostrado na curva de investimento. Uma quantidade de poupança
exatamente igual a I0 é mostrada como S0 na função poupança. Esse nível de poupança ocorrerá
se a renda estiver em Y0. Assim, para a taxa de juros r0, um ponto de equilíbrio do mercado de
bens estará em Y0. Essa combinação taxa de juros-renda (r0, Y0) é um ponto da curva IS,
mostrado como o ponto A na Figura 6.11b.
Agora, consideremos um valor mais alto da taxa de juros, como r1. À taxa de juros r1, o
investimento será I1, uma quantidade menor que em r0. Para que haja equilíbrio, a poupança
precisa estar em S1, menor que S0. Esse nível de poupança é gerado pelo nível de renda Y1, que é
menor que Y0. Assim, um segundo ponto na curva IS estará em r1 e Y1, o ponto B na Figura
6.11b. Note-se que, para a taxa de juros mais alta, o nível de renda de equilíbrio correspondente
é mais baixo. A curva IS tem uma inclinação negativa. Escolhendo valores adicionais da taxa de
juros, como r2, na Figura 6.11a e encontrando o nível de renda correspondente para o equilíbrio,
Y2, onde I2 = S2, podemos determinar pontos adicionais na curva IS na Figura 6.11b, como o
ponto C. Dessa forma, traçamos o conjunto completo de combinações de níveis de renda e taxa
de juros que equilibram o mercado de bens.

6.2.2.2 Fatores que determinam a inclinação da curva IS


Em seguida, vamos examinar os fatores que determinam o grau de inclinação da curva IS.
Sabemos que a curva terá inclinação negativa, mas será muito ou pouco inclinada? Como no
caso da curva LM, a questão é de interesse porque vamos ver que a inclinação da curva IS tem
relevância para a determinação da eficácia relativa de políticas de estabilização monetárias e
fiscais.
Ao construir a curva IS, examinamos como o investimento muda quando variamos a taxa de
juros e, depois, qual alteração da renda é necessária para mover a poupança de modo a igualá-la
ao novo nível de investimento. Ao considerar a inclinação da curva IS, estamos perguntando se,
a taxas de juros progressivamente mais baixas, por exemplo, o equilíbrio do mercado de bens
requer níveis de renda muito mais altos (a curva é relativamente plana) ou apenas pequenos
aumentos na renda (a curva é muito inclinada). A resposta depende da inclinação das funções
investimento e poupança. A Figura 6.12 ilustra como a inclinação da curva IS está relacionada à
inclinação da função investimento. Duas curvas de investimento são representadas. A curva I é
muito inclinada, indicando que o investimento não é muito sensível a mudanças na taxa de juros;
a elasticidade-juros da demanda por investimento é baixa.6 A curva I’ é traçada para o caso em
que o investimento é mais sensível a movimentos da taxa de juros. Em cada curva de
investimento, o gráfico é construído de modo que uma taxa de juros r1 corresponda a um nível
de investimento I1 (as curvas têm interceptos diferentes no eixo da taxa de juros). O equilíbrio
no mercado de bens para essa taxa de juros será em Y1, como pode ser visto na Figura 6.12b
(nesse ponto, I1 = S1). Esse será um ponto das curvas de equilíbrio do mercado de bens
correspondentes a cada uma dessas curvas de investimento. Essas curvas de equilíbrio do
mercado de bens, IS para a curva de investimento I e IS’ para a curva de investimento I’, são
mostradas na Figura 6.12c. Elas têm um ponto comum em (Y1, r1), o ponto A.
Agora, consideremos o ponto em cada uma dessas curvas de equilíbrio correspondente a uma
taxa de juros mais baixa r2. Se o investimento for dado pela curva I da Figura 6.12a, à taxa de
juros mais baixa r2 o investimento aumentará para I2. O equilíbrio no mercado de bens requer
um aumento igual na poupança, para S2, o que requer que a renda esteja em Y2 na Figura 6.12b.
Na curva IS, movemo-nos para o ponto B na Figura 6.12c. Note-se que, como consideramos que
o investimento seja relativamente insensível a mudanças na taxa de juros, o aumento no
investimento quando a taxa de juros cai para r2 é pequeno. Consequentemente, o aumento
necessário na poupança e, portanto, na renda na Figura 6.12b é pequeno. A curva IS é muito
inclinada nesse caso; níveis mais baixos da taxa de juros correspondem a níveis apenas
ligeiramente mais altos de renda ao longo da curva de equilíbrio do mercado de bens.
Em seguida, consideremos o caso em que o investimento é dado pela curva mais plana I’ na
Figura 6.12a. À taxa de juros mais baixa r2, o investimento estará em I2’. Nesse caso, o nível de
renda correspondente a r2 na curva em que o investimento é igual à poupança, IS’ na Figura
6.12c, seria Y2’ no ponto C. A poupança precisa aumentar para S2’ e isso requer a renda Y2 ’.
Nesse caso, o investimento tem uma elasticidade-juros maior e aumenta mais quando a taxa de
juros cai para r2. Consequentemente, a poupança precisa aumentar mais do que quando o
investimento é inelástico em relação aos juros e, para que ocorra esse aumento maior na
poupança, a renda precisa aumentar mais. A curva de equilíbrio do mercado de bens (IS’) é mais
plana quando o investimento é mais sensível à taxa de juros.
Esse, portanto, é o primeiro dos fatores que determinam a inclinação da curva IS. A curva
será relativamente inclinada se a elasticidade-juros do investimento for baixa. A curva será mais
plana para valores (absolutos) mais altos da elasticidade-juros da demanda por investimento.
Um caso extremo da inclinação da curva IS é quando a elasticidade-juros da demanda por
investimento é zero; o investimento é completamente insensível à taxa de juros. Nesse caso, a
curva de investimento na Figura 6.12a será vertical e a curva IS também será vertical. Para esse
caso, uma queda da taxa de juros de r1 para r2 não aumentaria em nada o investimento.
Consequentemente, o equilíbrio no mercado de bens requer o mesmo nível de poupança e,
portanto, de renda tanto em r2 como em r1.
O segundo fator que afeta a inclinação da curva IS é a função poupança. Até que examinemos
teorias de consumo mais elaboradas, não encontramos controvérsias quanto à inclinação da
função poupança na Figura 6.12b, que é igual à propensão marginal a poupar (PMgS).
Consequentemente, nesta seção o valor da PMgS não tem muita importância na discussão dos
fatores que determinam a inclinação da curva IS. É possível demonstrar, porém, que a curva IS
será relativamente mais inclinada quanto maior for a PMgS.
Para ver essa relação, note-se primeiro que, quanto mais alto o valor da PMgS, mais inclinada
é a função poupança na Figura 6.12b (a poupança aumenta mais por unidade de renda). Depois
de termos determinado a inclinação da curva de investimento, estabelecemos a mudança no
investimento para uma dada mudança na taxa de juros. Um determinado declínio da taxa de
juros, por exemplo, leva, então, a um dado aumento no investimento e, para o equilíbrio do
mercado de bens na curva IS, a poupança deve apresentar um aumento igual. Se a PMgS for
relativamente alta, será preciso um aumento menor na renda para gerar essa nova poupança do
que se a PMgS fosse baixa. Assim, para uma dada queda na taxa de juros, a magnitude do
aumento da renda necessária para alcançar um novo ponto de equilíbrio no mercado de bens é
menor (maior) quando mais alto (mais baixo) for o valor da PMgS. Isso significa que, mantendo
constante outros fatores, a curva IS é relativamente mais inclinada quanto mais alta for a PMgS.

FIG 6.12 Elasticidade-juros do investimento e a inclinação da curva IS

Quando a curva de investimento é bastante inclinada (I) na parte a, uma queda na taxa de juros produzirá um pequeno aumento
no investimento. Na parte b, portanto, é necessário apenas um pequeno aumento da poupança e, assim, da renda para restabelecer
o equilíbrio no mercado de bens. Assim sendo, a curva IS na parte c (IS neste caso) será bastante inclinada. Quando a curva de
investimento é relativamente plana (I’), o investimento aumentará mais com uma queda na taxa de juros. Desse modo, a
poupança e, portanto, a renda precisam ter um aumento maior; a curva IS para esse caso (IS’) será relativamente plana.

6.2.2.3 Fatores que deslocam a curva IS


Em seguida, examinaremos os fatores que determinam a posição da curva IS e mudanças que
deslocam a curva. Aqui, abandonamos o pressuposto de que os gastos do governo e os impostos
sejam zero e trazemos o setor governamental de volta ao modelo. A curva IS será deslocada
quando qualquer componente dos gastos autônomos mudar: a, T, I e G. Com o setor
governamental no modelo, a condição para o equilíbrio do mercado de bens é dada pela equação
(6.8), que pode ser reescrita como
Note-se que a poupança deve agora ser escrita como uma função da renda disponível (YD = Y
– T), que se diferencia da renda pelo montante dos pagamentos de impostos.
A construção da curva IS para esse caso mais geral é ilustrada na Figura 6.13. Na parte a,
traçamos a função investimento e o nível de investimento mais gastos governamentais. Note-se
que a curva I + G tem inclinação negativa apenas porque o investimento depende da taxa de
juros. A curva I + G está à direita da curva I a uma distância equivalente ao montante fixo de
gastos governamentais. Na Figura 6.13b, a curva de poupança é traçada em relação ao nível de
renda. É traçada também a curva de poupança mais impostos [S(Y – T) + T]. Como
consideramos que a arrecadação tributária seja fixada exogenamente, a curva pou-pança-mais-
impostos está acima da curva de poupança a uma distância constante (igual a T).
Consideremos a taxa de juros r0 na Figura 6.13. A essa taxa de juros, o nível de investimento
[que pode ser lido na curva I(r)] mais o nível fixo de gastos governamentais é igual a I0 + G.
Para o equilíbrio, isso deve ser compensado por um total igual de poupança mais arrecadação
tributária, dado por S0 + T na Figura 6.13b. O nível de renda que gera esse nível de poupança
mais arrecadação de impostos é dado por Y0. Assim, um ponto da curva IS é o ponto A na Figura
6.13c, correspondente à taxa de juros r0 e ao nível de renda Y0. Se considerássemos uma taxa de
juros mais alta, como r1, o investimento seria menor; assim, com os gastos do governo
inalterados, o investimento mais os gastos governamentais estariam em um nível mais baixo I1 +
G. Para o equilíbrio, é necessário um nível menor de poupança mais impostos. Esse nível é
mostrado como S1 + T a Figura 6.13b, onde deve ser notado que a mudança é apenas no
componente poupança, porque os impostos são fixos. Para esse nível mais baixo de poupança, a
renda deve estar em Y1, abaixo de Y0, na Figura 6.13b. O ponto correspondente na curva IS é o
ponto B na Figura 6.13c.

FIG 6.13 A curva IS com a inclusão do setor governamental


Com a inclusão do setor governamental, a condição de equilíbrio do mercado de bens torna-se I + G = S + T. A uma taxa de juros
r1 na parte a, investimento mais gastos governamentais será igual a I1 + G. Portanto, o equilíbrio do mercado de bens requer que
poupança mais impostos, como mostrado na parte b, seja igual a S1 + T (= I1 + G), o que ocorrerá em um nível de renda Y1.
Assim, a combinação r1, Y1 é um ponto (B) da curva IS na parte c.

Por um raciocínio similar, podemos estabelecer que uma taxa de juros r2 exigirá um nível de
renda Y2 para o equilíbrio do mercado de bens (ponto C na Figura 6.13c). A curva IS completa é
construída prosseguindo dessa maneira.
Podemos agora examinar fatores que causariam um deslocamento da curva IS. A condição de
equilíbrio dada por (6.10) mostra que uma mudança no nível de gastos governamentais (G) ou
no nível de impostos (T) perturbará a posição inicial do equilíbrio do mercado de bens – isto
significa um deslocamento da curva IS. Além disso, uma mudança no investimento autônomo
que desloque a função investimento deslocará a curva IS. Note-se que, em geral, os fatores que
deslocam a curva IS são aqueles que determinavam os gastos autônomos no modelo keynesiano
simples do Capítulo 5.

FIG 6.14 Deslocamento da curva IS com um aumento dos gastos governamentais


A uma taxa de juros r0, um aumento dos gastos governamentais aumenta o total de investimento mais gastos governamentais de
I0 + G0 para I0 + G1 na parte a. Para manter a condição I + G = S + T, com um nível de impostos fixo, a poupança precisa subir
de S0 para S2, o que requer que a renda seja Y em vez de Y0 na parte b. À taxa de juros r0, o ponto de equilíbrio do mercado de
bens é o ponto B em vez do ponto A. Um aumento dos gastos governamentais desloca a curva IS para a direita, de IS0 para IS1,
na parte c.

Mudanças nos gastos governamentais. Consideremos primeiro os efeitos de uma mudança


nos gastos governamentais. O deslocamento da curva IS quando os gastos do governo aumentam
de um nível inicial G0 para um nível mais alto G1 é ilustrado na Figura 6.14. Para o nível inicial
de gastos do governo, a curva IS é dada por IS0 na Figura 6.14c. Uma taxa de juros r0, por
exemplo, será um nível de equilíbrio para o mercado de bens se a renda estiver em Y0, como é
mostrado no ponto A em IS0. À taxa de juros r0, investimento mais gastos governamentais será
I0 + G0, conforme mostrado na Figura 6.14a. Como mostra a Figura 6.14b, um nível de renda Y0
gera um total de poupança mais impostos exatamente igual a esse montante de gastos
governamentais mais investimento (S0 + T0 = I0 + G0).
Agora, façamos os gastos governamentais aumentarem para G1. A Figura 6.14a mostra que
esse aumento desloca a curva de investimento-mais-gastos-governamentais para a direita. A uma
dada taxa de juros, o investimento ficará inalterado e a soma de investimento mais gastos
governamentais será mais alta no valor do aumento dos gastos do governo (ΔG = G1 – G0).
O equilíbrio do mercado de bens requer um nível igualmente mais alto de poupança mais
impostos, mostrado como S1 + T0 na Figura 6.14b. Esse nível de poupança mais impostos será
produzido no nível de renda Y1, acima de Y0. Assim, para garantir o equilíbrio do mercado de
bens, uma dada taxa de juros r0 requer um nível de renda mais alto quando os gastos
governamentais aumentam. O aumento nos gastos do governo deslocará a curva IS para a
direita, para IS1, na Figura 6.14c, onde, em r0, o ponto de equilíbrio é no ponto B,
correspondente ao nível de renda mais alto Y1.
Será útil estabelecer a distância que a curva IS se desloca para a direita, ou seja, a distância
horizontal de A a B na Figura 6.14c. Para cada aumento de uma unidade nos gastos
governamentais, considerando os impostos inalterados, para que o equilíbrio do mercado de
bens seja restabelecido a uma taxa de juros constante a poupança precisa aumentar em uma
unidade. Essa relação pode ser vista pela equação (6.10). Assim, a distância do deslocamento
horizontal da curva IS (por ex., a distância AB) é equivalente ao aumento na renda necessário
para gerar nova poupança igual ao aumento dos gastos do governo. Como o aumento da
poupança por aumento unitário da renda é dado pela PMgS igual a (1 – b), o aumento necessário
da renda (o deslocamento horizontal da curva IS) será Δ G [1/(1 – b)],

onde o subscrito r0 no termo ΔY indica que estamos calculando o aumento no valor de Y que
será necessário para manter o equilíbrio no mercado de bens à taxa de juros r0. Esse é o valor do
deslocamento horizontal da curva IS.
Note-se que o valor do deslocamento horizontal da curva IS por aumento unitário de G é [1/(1
– b)], o multiplicador dos gastos autônomos do Capítulo 5. Ao calcular a distância horizontal de
deslocamento da curva, estamos mantendo a taxa de juros constante e, portanto, fixando o
investimento. Quando o investimento é considerado fixo, nosso modelo é idêntico ao do
Capítulo 5. Estamos procurando o aumento da renda que ocorrerá com o investimento fixo, os
gastos do governo subindo e um consequente aumento induzido do consumo. Essa é a mesma
questão analisada no Capítulo 5 e obtemos a mesma resposta.

FIG 6.15 Deslocamento da curva IS com um aumento dos impostos


Um aumento nos impostos desloca a curva S + T para a esquerda na parte b. À taxa de juros r0, que fixa I0 + G0, os impostos
mais altos fazem com que a poupança e, portanto, a renda precisem ser menores para manter a condição I + G = S + T. Depois do
aumento dos impostos, um nível de renda Y1 (ponto B) em vez Y0 (ponto A) equilibra o mercado de bens para a taxa de juros r0.
A curva IS desloca-se para a esquerda de IS0 para IS1 na parte c.

Mudanças nos impostos. Em seguida, vamos examinar o deslocamento da curva IS com


uma mudança nos impostos. O efeito sobre a posição da curva IS de um aumento nos impostos
de T0 para T1 é representado na Figura 6.15. Para cada aumento unitário nos impostos a um dado
nível de renda, os impostos ficam uma unidade mais altos e a poupança diminui em (1 – b)
unidade. Esse efeito acontece porque um aumento de uma unidade nos impostos diminui a renda
disponível em uma unidade e reduz a poupança num montante equivalente à PMgS, (1 – b). Para
um dado nível de renda, a redução da poupança é menor que o aumento dos impostos, portanto
um aumento dos impostos deslocará a curva S + T para cima. Na Figura 6.15b, um aumento nos
impostos de T0 para T1 desloca a curva de [S(Y – T0) + T0] para [S(Y – T1) + T1].
A uma taxa de juros como r0 na Figura 6.15a, podemos encontrar o nível de gastos do
governo mais investimento na curva I(r)+ G em I0 + G0. O equilíbrio do mercado de bens requer
um valor igual de poupança mais impostos. Inicialmente, com os impostos em T0, o nível de
equilíbrio de poupança mais impostos é S0 + T0 e isso requer que a renda esteja em Y0. Essa
combinação de (r0, Y0) é um ponto na curva IS inicial, IS0, o ponto A na Figura 6.15c.
Depois do aumento dos impostos, para manter o equilíbrio do mercado de bens à taxa de
juros r0 é preciso que o total de poupança mais impostos continue igual. Isso porque não houve
nenhuma alteração no investimento mais gastos governamentais. Com o nível mais elevado dos
impostos, para que poupança mais impostos permaneça inalterado é preciso que a poupança e,
portanto, a renda sejam menores. O novo nível de renda necessário para o equilíbrio do mercado
de bens é dado por Y1 na Figura 6.15b. O ponto correspondente na nova curva IS é o ponto B na
Figura 6.15c. O aumento dos impostos desloca a curva IS para a esquerda.
Como no caso da mudança nos gastos governamentais, podemos calcular a magnitude do
deslocamento horizontal da curva IS como resultado de um aumento dos impostos. Para uma
dada taxa de juros, uma mudança nos impostos não afeta o lado esquerdo da condição de
equilíbrio do mercado de bens [equação (6.10)]; o investimento e os gastos governamentais
ficam inalterados. Portanto, para que seja mantido o equilíbrio à mesma taxa de juros, o lado
direito precisa também ficar inalterado, ou seja, poupança mais impostos precisa continuar igual.
Essa condição requer que o aumento dos impostos seja exatamente compensado por uma
redução da poupança.
0 = ΔS + ΔT
Podemos expressar a alteração na poupança como
ΔS = (1 – b)Δ(Y – T) = (1 – b)ΔY – (1 – b)ΔT
Portanto, para que a equação (6.10) seja válida, é preciso que
ΔS + ΔT = 0
(1 = b)ΔY – (1 – b)ΔT + ΔT = 0
(1 – b)ΔY – ΔT + bΔT + ΔT = 0
(1 – b)ΔY + bΔT = 0
(1 – b)ΔY = –bΔT
onde, novamente na equação (6.12), o subscrito r0 é usado no termo ΔY para indicar que essa é a
mudança na renda que, à taxa de juros r0, será um valor de equilíbrio para o mercado de bens.
Pela equação (6.12) vemos que, como demonstrado anteriormente, quando o nível dos impostos
aumenta, a renda deve diminuir para manter o equilíbrio do mercado de bens à taxa de juros r0.
Além disso, o valor do deslocamento para a esquerda da curva IS em razão de um aumento de
uma unidade nos impostos, –b/(1 – b), é exatamente o multiplicador dos impostos do modelo
keynesiano simples do Capítulo 5. Quando consideramos o deslocamento horizontal da curva IS
por mudança unitária nos impostos, estamos fixando a taxa de juros e, assim, o investimento.
Portanto, estamos calculando a variação na renda de equilíbrio por mudança unitária nos
impostos para um dado nível de investimento. Isso foi dado no Capítulo 5 pelo multiplicador dos
impostos, –b/(1 – b).
Mudanças autônomas no investimento. O último fator que desloca a curva IS a ser
considerado é uma mudança autônoma no investimento. Com isso referimo-nos a um
deslocamento da curva de investimento traçada em função da taxa de juros. Por exemplo, uma
mudança favorável das expectativas sobre a rentabilidade futura de projetos de investimento
aumenta a demanda por investimentos correspondente a cada taxa de juros, deslocando a curva
I(r) e, assim, a curva investimento-mais-gastos-governamentais para a direita na Figura 6.14a.
Esse deslocamento para a direita da curva I(r), pelo montante do aumento autônomo do
investimento, tem exatamente o mesmo efeito sobre a curva IS que um aumento igual nos gastos
do governo, analisado na Figura 6.14. Ambas as variações deslocam a curva de investimento
mais gastos governamentais e, como foi visto na discussão anterior, esse deslocamento, por sua
vez, desloca a curva IS para a direita em 1/(1 – b) unidades por aumento unitário dos gastos
governamentais, ou, neste caso, dos gastos autônomos em investimentos.
Nesta seção, examinamos os vários fatores que deslocam a curva IS. Também generalizamos
a análise para incluir o setor governamental e, assim, podermos ver como variáveis de política
fiscal afetam a posição da curva IS. Como as novas variáveis, gastos governamentais e impostos,
são exógenas, as inclinações da curva de investimento-mais-gastos-governamentais e da curva
de poupança-mais-impostos foram as mesmas que nas curvas de investimento e poupança
examinadas na seção anterior. Como foi mostrado que as inclinações dessas funções determinam
a inclinação da curva IS e como elas não se alteram, a inclusão do setor governamental no
modelo não exige nenhuma revisão da discussão anterior sobre a inclinação da curva IS.

6.2.2.4 A curva IS: resumo


Derivamos os seguintes resultados sobre a curva IS, a curva de equilíbrio do mercado de
bens:
1. A curva IS inclina-se para baixo e para a direita.
2. A curva IS será relativamente pouco (muito) inclinada se a elasticidade-juros do
investimento for relativamente alta (baixa).
3. A curva IS será deslocada para a direita (esquerda) quando houver um aumento (declínio)
dos gastos governamentais.
4. A curva IS será deslocada para a esquerda (direita) quando os impostos aumentarem
(diminuírem).
5. Um aumento (declínio) autônomo dos gastos com investimentos deslocará a curva IS para a
direita (esquerda).

6.2.3 As curvas IS e LM combinadas


FIG 6.16 Curvas IS e LM combinadas

O ponto de intersecção das curvas IS e LM dá a combinação de taxa de juros e renda (r0, Y0) que produz equilíbrio tanto no
mercado monetário como no mercado de bens.

Na Figura 6.16, combinamos as curvas LM e IS. A curva LM de inclinação ascendente mostra


os pontos de equilíbrio do mercado monetário. A curva de inclinação descendente IS mostra os
pontos de equilíbrio do mercado de bens. O ponto de intersecção das duas curvas, ponto E na
figura, é o (único) ponto de equilíbrio geral para os dois mercados. Como foi observado no
início de nossa análise, se o mercado monetário estiver em equilíbrio, o mercado de títulos
também deve estar em equilíbrio. Assim, a taxa de juros e o nível de renda na intersecção das
curvas IS e LM na Figura 6.16, indicados por r0 e Y0, são valores que produzem um equilíbrio
simultâneo no mercado monetário, mercado de bens e mercado de títulos. Pode-se compreender
melhor a natureza do equilíbrio no modelo IS-LM examinando por que outros pontos além do
ponto de intersecção das duas curvas não são pontos de equilíbrio. A Figura 6.17 mostra quatro
pontos fora das curvas IS e LM (A, B, C e D).

FIG 6.17 Ajuste ao equilíbrio no modelo IS-LM


Em pontos como A, B, C e D, há excessos de oferta ou de demanda nos mercados monetário e de bens e, portanto, pressões por
mudanças na taxa de juros e no produto. No ponto F, o mercado de bens está fora de equilíbrio e há pressão para mudanças no
produto. Apenas no ponto E o mercado monetário e o mercado de bens estão ambos em equilíbrio.

Primeiro, consideremos pontos acima da curva LM, como os pontos A e B. Em todos os


pontos acima da curva LM, haverá um excesso de oferta de moeda (XSM). No nível de renda do
ponto A ou do ponto B, a taxa de juros correspondente é alta demais para haver equilíbrio no
mercado monetário. Com um excesso de oferta de moeda, há uma pressão de baixa sobre a taxa
de juros, conforme indicado pela seta para baixo. Há uma tendência de movimento em direção à
curva LM. Inversamente, em pontos abaixo da curva LM, como os pontos C e D, haverá um
excesso de demanda por moeda (XDM) e, em conseqüência, uma pressão de alta sobre a taxa de
juros.
Agora, consideremos os mesmos pontos em relação à curva IS. Em pontos como B e C, à
direita da curva IS, o produto excederá a demanda agregada ou, analogamente, poupança mais
impostos será maior que investimentos mais gastos governamentais. No nível da taxa de juros do
ponto B ou do ponto C, o nível de produto correspondente que igualará investimento mais gastos
governamentais e poupança mais impostos, dado pelo ponto na curva IS, está abaixo do nível de
produto efetivo. Há um excesso de oferta de produto (XS0) e, portanto, uma pressão de queda
sobre o produto, conforme indicado pelas setas apontando para a esquerda. Inversamente, em
pontos à esquerda dessa curva IS, como os pontos A e D, o produto efetivo está abaixo do nível
que equilibrará o mercado de bens. Há um excesso de demanda por produto (XD0) e haverá uma
pressão por aumento do produto, como indicado pelas setas para a direita nesses pontos.
Por fim, notemos que os pontos que estão em uma curva, mas não na outra, são pontos de
desequilíbrio em relação a um dos dois mercados. Um ponto como F, por exemplo, é um ponto
de equilíbrio para o mercado monetário, mas um ponto de excesso de oferta para o mercado de
bens. Similarmente, qualquer ponto na curva IS que não seja o ponto E resultaria em
desequilíbrio no mercado monetário. Apenas no ponto E tanto o mercado monetário como o
mercado de bens estão em equilíbrio. Não há excesso de demanda nem de oferta em nenhum dos
dois mercados e, portanto, não há pressões por mudanças na taxa de juros ou no produto.

Conclusão
Neste capítulo, acrescentamos o mercado monetário ao nosso modelo keynesiano. O papel da
moeda e da política monetária no sistema keynesiano foi examinado. Analisamos, então, como o
nível de equilibro da renda e da taxa de juros são determinados simultaneamente no modelo IS-
LM. A próxima tarefa é ver como esses valores de equilíbrio são afetados por variáveis de
política monetária e fiscal e por outros choques ao modelo.

Questões de revisão
1. Explique a teoria keynesiana da determinação da taxa de juros. Que diferenças você vê entre
essa teoria e a teoria clássica da taxa de juros?
2. Como o nível de demanda agregada seria afetado por uma elevação da taxa de juros na teoria
keynesiana? Que componentes seriam afetados mais fortemente?
3. Quais são os três motivos para reter moeda de acordo com a teoria keynesiana da demanda
por moeda? Explique cada motivo.
4. Que propriedade é compartilhada por todos os pontos da curva LM? E pelos pontos da curva
IS?
5. Explique por que a curva IS no modelo IS-LM tem inclinação negativa e a curva LM tem
inclinação positiva.
6. Que fatores determinam a magnitude da inclinação da curva IS? Ou seja, que fatores
determinam se a curva é muito ou pouco inclinada?
7. Que variáveis deslocarão a posição da curva IS? Explique como uma mudança em cada
variável deslocará a curva (para a direita ou para a esquerda).
8. Que fatores determinam a magnitude da inclinação da curva LM? Ou seja, que fatores
determinam se a curva é muito ou pouco inclinada?
9. Descreva o procedimento para derivar a curva IS, como foi feito na Figura 6.13, para o caso
em que, em vez de um nível fixo de impostos (T), tenhamos impostos dependentes da renda:
T = T1Y,
em que t1 é a alíquota marginal do imposto de renda.
A curva IS nesse caso será mais inclinada ou mais plana do que quando o nível dos impostos
é fixo?
10. Suponha que a elasticidade-juros da demanda por investimento seja zero. Qual será a
inclinação resultante da curva IS? Explique.
11. Se o nível de gastos governamentais aumentasse em 50 unidades no modelo IS-LM, como
isso afetaria a posição da curva IS ? Em que direção a curva se deslocaria e de quantas
unidades seria esse deslocamento?
12. Que variáveis deslocarão a posição da curva LM? Explique como uma mudança em cada
variável deslocará a curva (para a esquerda ou para a direita).
13. Que condição é necessária para que a curva LM seja vertical? Que condição é necessária para
o caso extremo oposto, em que um trecho da curva LM torna-se quase horizontal?
14. Por que podemos ter certeza de que, quando os mercados monetário e de bens estão em
equilíbrio, o mercado de títulos também estará em equilíbrio?
15. Explique por que, em um ponto como B na Figura 6.17, há uma pressão para baixo tanto
sobre o nível de produto como sobre a taxa de juros.

APÊNDICE

A ÁLGEBRA DO MODELO IS-LM


Neste apêndice, o modelo IS-LM é apresentado em forma algébrica. Essa apresentação algébrica é um complemento da
explicação textual e gráfica oferecida no capítulo.
Para simplificar, lidaremos com uma forma linear das equações de IS e LM. Já escrevemos uma forma linear da equação
LM
A equação (6.5) declara que a oferta de moeda fixa (Ms) é igual à demanda por moeda (Md), que depende positivamente
do nível de renda (Y) e negativamente da taxa de juros (r).

A condição satisfeita por todos os pontos da curva IS é

Investimento (I) mais gastos governamentais (G) é igual a poupança (S) mais impostos (T). Vamos derivar uma forma
linear dessa condição.
No Capítulo 5, a poupança foi representada pela função poupança

Considera-se que o investimento tenha um componente autônomo e dependa negativamente da taxa de juros. Em forma
linear, podemos escrever uma função investimento como se segue:

onde I é o componente autônomo do investimento e I1, é um parâmetro que mede a sensibilidade do investimento aos
juros (isto é, –I1, = ΔI/Δr).1 Consideramos que os níveis de gastos governamentais (G) e os impostos (T) sejam fixados
exogenamente por formuladores de políticas.
Substituindo S pela equação (5.12) e I pela equação (A.1) na equação de IS (6.8), podemos escrever uma equação linear
para IS

Se rearranjarmos os termos de modo a deixar a renda sozinha no lado esquerdo, temos

Também podemos rearranjar os termos em nossa equação LM (6.5) para que a taxa de juros (r) fique sozinha no lado
esquerdo, com se segue:

As equações (A.3) e (A.4) são curvas IS e LM lineares. Essas duas equações determinam as duas variáveis endógenas no
modelo, renda (Y) e taxa de juros (r). Partindo daqui, vamos examinar as propriedades da curva LM e, depois, da curva IS,
derivando em forma algébrica os resultados gráficos da seção 6.2. Examinaremos por fim a solução dessas duas equações
para os níveis de equilíbrio da renda e da taxa de juros, o que seria análogo à representação gráfica do equilíbrio mostrada
na Figura 6.16.

A.1 A CURVA LM

A INCLINAÇÃO DA CURVA LM
A inclinação da curva LM é a variação em r (movimento para cima no eixo vertical do gráfico IS-LM) por variação
unitária em Y (movimento ao longo do eixo horizontal), mantendo constantes os fatores que determinam a posição da
curva. Pela equação (A.4), calculamos essa inclinação como Δr/ΔY para valores fixos de (c0/c2) e (-Ms/c2), o que dá
A curva LM tem inclinação positiva. Se a expressão da inclinação da curva for grande (pequena), a curva será muito
(pouco) inclinada. Pela equação (A.5), pode-se ver que a curva será mais inclinada quanto maior o valor de c1 e menor o
valor de c2. Isso significa que, quanto mais a demanda por moeda aumentar por aumento unitário da renda (quanto maior
c1,) e quanto menos a demanda por moeda for sensível à taxa de juros (quanto menor c2), mais inclinada será a curva
LM1.

FATORES QUE DESLOCAM A CURVA LM


Agora, consideremos fatores que deslocam a curva LM. Uma maneira de ver esses deslocamentos matematicamente é
estudar a variação de r associada a uma variável do lado direito da equação da curva LM (A.4), mantendo a renda e as
outras variáveis do lado direito constantes. Esse é o deslocamento vertical da curva. Por exemplo, se a oferta de moeda
mudar, todas as outras variáveis permanecendo iguais, então

Um aumento da oferta de moeda (Ms) causa um deslocamento para baixo da curva LM; Δr/ΔMs é negativo. Isso é o que
encontramos na Figura 6.9.
O outro fator examinado que deslocaria a curva LM foi um deslocamento da função demanda por moeda, uma mudança no
nível de demanda por moeda para níveis dados da renda e da taxa de juros. Em nossa versão linear do modelo IS-LM, esse
deslocamento da função demanda por moeda é representado como uma mudança no termo c0 na equação (6.5) e, portanto,
em (c0/c2) na equação (A.4). Por exemplo, um aumento em c0 significaria uma maior demanda por moeda nos níveis
dados da renda e da taxa de juros. Pela equação (A.4), podemos ver que, se c0 aumenta, mantendo constantes os outros
termos do lado direito da equação, a taxa de juros também sobe. Isso significa que, conforme ilustrado na Figura 6.10, um
deslocamento para cima da função demanda por moeda deslocará a curva LM para cima e para a esquerda.

A.2 A CURVA IS

A INCLINAÇÃO DA CURVA IS
Para calcular uma expressão para a inclinação da curva IS, consideramos uma vez mais a relação entre r e Y, mantendo
constantes os valores dos termos que determinam a posição da curva [os termos entre colchetes na equação (A.3)]. Pela
equação (A.3), mantendo esses termos constantes, podemos escrever

ou, depois de rearranjar os termos,

Como foi explicado na Seção 6.2, a inclinação de IS é negativa. Quanto maior o valor absoluto da inclinação da curva IS,
mais inclinada será a curva. Da equação (A.7), segue-se que a curva IS será mais inclinada quanto maior for (1 – b),
quanto mais alta for a propensão marginal a poupar, e quanto menor for o valor de I1 o parâmetro que mede a
sensibilidade do investimento aos juros.2
FATORES QUE DESLOCAM A CURVA IS
Quando usamos a equação (A.3), é muito conveniente examinar o deslocamento horizontal da curva IS como resultado de
mudanças nos fatores que determinam a posição da curva. Para fazer isso, examinamos como Y muda na equação (A.3)
quando uma das variáveis do lado direito muda, mantendo constantes a taxa de juros e as outras variáveis do lado direito.
Se, mantendo esses outros fatores constantes, um aumento em uma variável elevar (reduzir) Y, isso representa um
deslocamento para a direita (esquerda) da curva IS.
Por exemplo, se o nível de gastos governamentais mudar, pela equação (A.3) calculamos

Este é o mesmo resultado que encontramos na equação (6.11); um aumento dos gastos do governo desloca a curva IS para
a direita. Pela equação (A.3) podemos ver que a expressão análoga para o deslocamento horizontal da curva IS como
resultado de uma mudança dos gastos autônomos (Ī) ou do intercepto da função consumo (a) seria idêntica à equação
(A.8). Um aumento de 1 unidade em cada uma dessas variáveis representaria um aumento nos gastos autônomos de 1
unidade e ambas teriam efeitos idênticos no modelo IS-LM.
Por fim, consideremos o efeito sobre a curva IS de uma mudança nos impostos (T). Pela equação (A.3), calculamos

ou

Como no capítulo [ver equação (6.12)], vemos que um aumento nos impostos reduz a renda (sendo todos os outros fatores
constantes), deslocando a curva IS para a esquerda.

A.3 EQUILÍBRIO NO MODELO IS-LM


Um ponto de equilíbrio no modelo IS-LM é uma combinação de renda e taxa de juros que satisfaz as condições tanto de IS
como de LM. Em termos de nossas curvas IS e LM lineares, os valores de equilíbrio de Y e r são os valores que satisfazem
as equações (A.3) e (A.4).
Para encontrar esses valores, resolvemos as duas equações.
Primeiro, usamos o valor de r da equação (A.4) na equação (A.3). Resolvendo a equação resultante para Y1’ temos o valor
de equilíbrio para a renda (Y0):

Podemos, então, encontrar o valor de equilíbrio da taxa de juros (r0) substituindo a equação (A.10) ou, alternativamente, a
equação (A.3) na equação LM (A.4). A expressão resultante é
Note-se a diferença entre as equações de IS e LM (A.3 e A.4) e as soluções para os valores de equilíbrio de Y e r (equações
A.10 e A.11). As primeiras equações são relações que devem ser mantidas entre as duas variáveis, com Y e r aparecendo
em ambas as equações. A solução para Y e r de equilíbrio expressa essas variáveis endógenas como dependentes das
variáveis exógenas do modelo. No Capítulo 7, examinaremos como esses valores de equilíbrio de Y e r mudam com
mudanças nas variáveis exógenas. O apêndice ao Capítulo 7 estende essa análise para o modelo linearexaminando aqui.
1 Um parâmetro é um valor dado ou conhecido. Um exemplo de um parâmetro em nossa análise anterior é a PMgS (1 – b)
em (5.12).
2 Note-se também na equação (A.5) que, conforme c2 aproxima-se de zero, o valor da expressão torna-se extremamente
grande, indicando que a curva LM fica vertical. Esse é o chamado caso clássico ilustrado na Figura 6.7. Alternativamente,
conforme c2 se torna extremamente grande, o valor da expressão da inclinação da curva LM aproxima-se de zero, indicando
que a curva LM torna-se plana. Esse é o caso da armadilha da liquidez ilustrado na Figura 6.8. Um caso especial da curva IS
é quando I1 aproximase de zero; o investimento é quase completamente insensível aos juros. Nesse caso, a inclinação da
curva IS, dada pela equação (A.7), torna-se extremamente grande; a curva fica quase vertical.

Questões de revisão
1. Suponha que
C = 60 + 0,8YD
I = 150 - 10r
G = 250
T = 200
Ms = 100
Md = 40 + 0,1Y – 10r
a. Escreva as equações para as curvas IS e LM.
b. Encontre os valores de equilíbrio para a renda (Y0) e a taxa de juros (r0).

2. Suponha que alteremos o modelo do problema 1 de tal modo que o investimento seja
considerado completamente inelástico em relação aos juros; o investimento não depende da
taxa de juros e temos I = 150.
a. Escreva as novas equações para as curvas IS e LM. Mostre as curvas graficamente.
b. Encontre os novos valores de equilíbrio para a renda e a taxa de juros
CAPÍTULO 7
O sistema keynesiano (III): efeitos de políticas econômicas no modelo IS-LM

Neste capítulo, usamos o modelo IS-LM para analisar os efeitos de ações de política
econômica sobre a renda e a taxa de juros. Examinamos também outros fatores que afetam a
renda e a taxa de juros. Os fundamentos para essa análise foram estabelecidos no Capítulo 6. Os
níveis de equilíbrio da renda e da taxa de juros são dados pela intersecção das curvas IS e LM.
Os fatores que alteram esses níveis de equilíbrio são os que deslocam a curva IS ou a curva LM.
Na Seção 7.1, veremos como esses deslocamentos afetam a renda e a taxa de juros quando
consideramos as duas curvas conjuntamente. Na Seção 7.2, vamos ver como a magnitude dos
efeitos de diferentes políticas econômicas depende da inclinação das curvas IS e LM. No
Capítulo 6, foi mostrado que a inclinação das curvas IS-LM depende de vários aspectos do
sistema econômico, sendo o mais importante deles a sensibilidade do investimento e da
demanda por moeda aos juros.

7.1 Fatores que afetam a renda e a taxa de juros de equilíbrio

7.1.1 Influências monetárias: deslocamentos da curva LM


Consideremos os efeitos sobre a renda e a taxa de juros de mudanças na oferta de moeda. A
Figura 7.1 ilustra os efeitos de um aumento da oferta de moeda de M0 para M1 Inicialmente,
consideramos que as curvas IS e LM sejam IS0 e LM(M0). A renda e a taxa de juros estão em Y0
e r0, respectivamente. Como vimos no Capítulo 6, um aumento da oferta de moeda desloca a
curva LM para a direita, para uma posição como LM(M1) na Figura 7.1. Consequentemente, a
taxa de juros cai de r0 para r1 e a renda sobe de Y0 para Y1.
O processo econômico que produz esses resultados é simples. O aumento da oferta de moeda
cria um excesso de oferta de moeda, que faz a taxa de juros cair. Quando a taxa de juros cai, o
investimento aumenta e esse aumento causa um aumento da renda, com um consequente
aumento do consumo induzido pela renda. Um novo equilíbrio é alcançado quando a queda da
taxa de juros e o aumento da renda elevam conjuntamente a demanda por moeda em um
montante que iguale o aumento da oferta de moeda. Essa equivalência ocorre no ponto em que a
nova curva LM corta a curva IS.
Um declínio na oferta de moeda tem os efeitos opostos. A curva LM desloca-se para a
esquerda; a renda de equilíbrio cai; e a taxa de juros de equilíbrio sobe.
O outro fator que desloca a curva LM é um deslocamento da função demanda por moeda.
Considere-se, por exemplo, um aumento da demanda por moeda a níveis dados de renda e taxa
de juros. Essa substituição de títulos por moeda na carteira de ativos deslocará a curva LM para
a esquerda. Conforme as pessoas tentarem reduzir seus estoques de títulos para aumentar seus
estoques de moeda, a taxa de juros subirá. A taxa de juros mais alta fará a renda declinar. Um
aumento da demanda por moeda, no sentido de um deslocamento da função de modo que mais
moeda seja demandada a um dado nível de renda e taxa de juros, tem o mesmo efeito que um
declínio da oferta de moeda. A renda de equilíbrio cai e a taxa de juros sobe. Um deslocamento
inverso na carteira de ativos, no sentido de manter mais títulos e menos moeda, tem os efeitos
opostos.

PERSPECTIVAS 7.1 - A CRISE FINANCEIRA DE 2007-08: UM EXAME


INICIAL
Em novembro de 2008, a rainha Elizabeth visitou a London School of Economics para inaugurar um novo prédio
acadêmico. Ao se encontrar com o corpo docente, ela perguntou: “Por que ninguém notou isso?” “Isso” referia-se à crise
financeira que havia atingido um clímax em meados de setembro de 2008 com a falência do Lehman Brothers e o socorro
financeiro ao grupo de seguros AIG. A crise começara em 2007 quando vários fundos que tinham tomado volumosos
empréstimos para investir em hipotecas subprime ficaram insolventes. Um passo seguinte foi a perda de confiança nos
bancos de investimento que haviam estabelecido os fundos. Um deles, o Bear Stearns, faliu em março de 2008. O Lehman
o seguiu em setembro. Houve uma perda geral de confiança em ativos de risco e nas instituições que os emitiam.
Em setembro, houve uma corrida por liquidez, com os investidores procurando segurança em dinheiro, títulos do Tesouro
e depósitos bancários. Na teoria de Keynes, esse é um deslocamento clássico na preferência por liquidez. Em termos do
modelo IS-LM, essa corrida por liquidez aparece como um deslocamento para a esquerda da curva LM. A taxa de juros é
pressionada para cima e a renda diminui. Com um choque violento como a crise financeira, esses efeitos serão grandes.
Há também efeitos secundários sugeridos pelo modelo. Como foi explicado no Capítulo 5, embora Keynes considerasse a
renda a variável dominante para determinar o consumo, economistas posteriores examinaram o efeito da riqueza sobre o
consumo. Na crise financeira, quando o valor dos ativos de risco declinou, os consumidores cortaram os gastos. Um
exemplo desse declínio da riqueza foi a queda nos preços das ações. A média do Dow Jones caiu de 14.000 para 7.000
entre o verão de 2007 e a primavera de 2009.
Os preços das moradias, que haviam atingido um pico em 2006, também caíram abruptamente. Dentro do modelo IS-LM,
esse declínio do consumo para um dado nível de renda deslocaria a curva IS para a esquerda, piorando o declínio da renda.
Isso teria o mesmo efeito que uma redução de “a”, o intercepto da função consumo. (Veja a questão 3 no final do
capítulo.) Um efeito secundário adicional é uma queda no investimento se as firmas simplesmente não puderem obter
crédito quando os mercados financeiros se congelam. Isso também deslocará a curva IS para a esquerda, mais ou menos
como aconteceria com um declínio autônomo da demanda por investimento.
A resposta de política desejada é clara no modelo IS-LM. Mais diretamente, o modelo sugere que o Banco Central
americano deveria proporcionar a liquidez que os investidores estão procurando. No modelo, isso significa aumentar a
oferta de moeda para deslocar a curva LM de volta para a direita. Como vamos ver no Capítulo 17, isso é exatamente o
que o Federal Reserve fez, usando todas as ferramentas de que dispunha e criando outras novas para aumentar a liquidez e
descongelar os mercados de crédito. Quando essas ações se mostraram insuficientes para deter a contração da economia,
políticas fiscais expansionistas foram acrescentadas ao pacote a fim de reverter o deslocamento da curva IS.
Nosso modelo neste capítulo pode, então, ser usado para interpretar a crise financeira e as iniciativas de política
econômica resultantes. Há muitos aspectos que o modelo não consegue explicar, por exemplo, a amplificação de choques
que ocorre quando ativos são liquidados e instituições entram em falência. Há também aspectos internacionais na crise.
Alguns aspectos adicionais da crise financeira serão examinados em capítulos posteriores.

FIG 7.1 Efeitos de um aumento na quantidade de moeda


O equilíbrio inicial é na taxa de juros r0 e no nível de renda Y0. Um aumento da oferta de moeda de M0 para M1 desloca a curva
LM para a direita, de LM(M0) para LM(M1). A taxa de juros cai de r0 para r1 e a renda sobe de Y0 para Y1.

7.1.2 Influências reais: deslocamentos da curva IS


As variáveis de política fiscal são um conjunto de fatores que deslocam a curva IS e, assim,
afetam a renda e a taxa de juros de equilíbrio. A Figura 7.2 ilustra os efeitos de uma mudança de
política fiscal: um aumento nos gastos governamentais de G0 para G1 As posições iniciais das
curvas IS e LM são dadas por IS(G0) e LM0. O aumento dos gastos governamentais para G1,
conforme mostrado no Capítulo 6, desloca a curva IS para a direita, para uma posição como
IS(G1) na Figura 7.2. O nível de equilíbrio da renda sobe, assim como a taxa de juros de
equilíbrio.
A força que empurra a renda para cima é o aumento da demanda agregada, tanto diretamente,
à medida que a demanda governamental sobe, quanto indiretamente, como resultado de um
aumento dos gastos de consumo induzido pela renda. As forças que empurram para cima a taxa
de juros requerem alguma explicação. Note que a curva LM não muda. Em um dado nível de
renda, o equilíbrio no mercado monetário e, portanto, no mercado de títulos não é perturbado
pela mudança nos gastos do governo. É o aumento da renda em resposta à mudança da política
fiscal que exige o ajuste da taxa de juros. Quando a renda aumenta, a demanda por moeda para
transações sobe. A tentativa de aumentar os saldos para transações produz um declínio da
demanda por títulos. Esse aumento da demanda por moeda induzido pela renda e o declínio da
demanda por títulos levam à elevação da taxa de juros.

FIG 7.2 Efeitos de um aumento dos gastos governamentais


Um aumento dos gastos governamentais desloca a curva IS para a direita, de IS(G0) para IS(G1). A renda sobe de Y0 para Y1; a
taxa de juros sobe de r0 para r1.

Como o estoque de moeda é fixo, no agregado, o público não pode aumentar seus estoques de
moeda. A tentativa de fazer isso, no entanto, empurrará a taxa de juros para cima, reduzindo a
demanda especulativa por moeda e fazendo os indivíduos reduzirem o montante de saldos para
transações mantidos em qualquer nível de renda. No novo equilíbrio, a taxa de juros deve subir o
suficiente para que a demanda por moeda permaneça inalterada mesmo com a renda mais alta.
No Capítulo 6 mostramos que a distância horizontal do deslocamento da curva IS quando os
gastos do governo aumentam é igual a ΔG [1/(1 - b)], onde ΔG é igual a (G1 - G0). A distância
do deslocamento da curva IS é o aumento dos gastos governamentais vezes o multiplicador dos
gastos autônomos do modelo keynesiano simples (sem mercado monetário). Essa distância é
igual ao montante que a renda teria aumentado nesse modelo simples. Na Figura 7.2, esse
aumento da renda de equilíbrio seria para Y’1. Quando levamos em conta o ajuste necessário no
mercado monetário, podemos ver que a renda sobe menos que isso, para Y1 na Figura 7.2. Por
quê?

FIG 7.3 Efeitos de um aumento dos impostos


Um aumento nos impostos desloca a curva IS para a esquerda, de IS(T0) para IS(T1). A renda cai de Y0 para Y1 e a taxa de juros
cai de r0 para r1.

A diferença entre o modelo keynesiano simples e o modelo IS-LM é que este último inclui um
mercado monetário. Quando os gastos do governo aumentam, como acabamos de ver, a taxa de
juros precisa subir para manter o equilíbrio no mercado monetário. O aumento da taxa de juros
causará um declínio nos gastos com investimento. O declínio do investimento compensará
parcialmente o aumento da demanda agregada resultante do aumento dos gastos do governo. Em
consequência, o aumento da renda será menor que no modelo keynesiano simples, onde o
investimento era considerado completamente autônomo.
Em seguida, consideremos os efeitos de um aumento na arrecadação de impostos (T)
conforme ilustrado na Figura 7.3. Um aumento na arrecadação tributária de T0 para T1 deslocará
a curva IS para a esquerda, como foi mostrado no Capítulo 6. Na figura, essa situação é
representada como um deslocamento da curva IS de sua posição inicial, IS(T0), para IS(T1).
Como pode ser visto, a renda declina de Y0 para Y1. A taxa de juros cai de r0 para r1.
A renda cai quando os impostos sobem porque o aumento dos impostos reduz a renda
disponível (Y – T) e faz o consumo diminuir. A razão da queda da taxa de juros é semelhante à
do aumento da taxa de juros induzido pela renda quando os gastos governamentais são
aumentados. Quando a renda declina devido ao aumento dos impostos, a demanda por moeda
diminui e a demanda por títulos aumenta. Essa mudança provoca a queda da taxa de juros.
A Figura 7.3 indica que, como no caso de uma mudança nos gastos governamentais, a renda
cai menos que a distância horizontal do deslocamento da curva IS. Como foi explicado no
Capítulo 6, a distância horizontal que a curva IS se desloca com uma mudança nos impostos é
igual a ΔT [-b/(1 - b)], o multiplicador dos impostos do modelo keynesiano simples vezes a
variação nos impostos. Assim, ocorre novamente que, no modelo IS-LM, os multiplicadores de
política fiscal são menores que nossos resultados para o modelo keynesiano simples. Para um
aumento dos impostos, a razão é que a redução da taxa de juros discutida anteriormente fará o
investimento subir, compensando em parte o declínio no consumo causado pelo aumento dos
impostos.
Uma redução dos impostos tem os efeitos opostos aos de um aumento. A curva IS desloca-se
para a direita e tanto a renda como a taxa de juros sobem. Similarmente, um declínio dos gastos
do governo tem efeitos exatamente opostos aos de um aumento nos gastos do governo.
Variáveis de política fiscal não são os únicos fatores que deslocam a curva IS. Qualquer
variação autônoma na demanda agregada terá esse efeito. Uma dessas variações é a mudança
autônoma na demanda por investimento, o que significa um deslocamento da função que mostra
o nível de investimento para cada nível da taxa de juros. Por exemplo, uma mudança desse tipo
ocorreria se, como resultado de algum evento exógeno, a rentabilidade esperada de projetos de
investimento se alterasse.
A Figura 7.4 ilustra os efeitos de um declínio autônomo do investimento. Na parte a, é
mostrada a curva de investimento. A curva inicial é I0(r). O declínio autônomo do investimento
de ΔI_ desloca a curva para a esquerda, para I1(r), reduzindo o investimento em cada taxa de
juros. Na Figura 7.4b, esse declínio autônomo no investimento desloca a curva IS para a
esquerda, de IS(I0) para IS(I1). A renda cai de Y0 para Y1. A taxa de juros diminui de r0 para r1.
A renda declina porque o investimento à taxa de juros inicial caiu (de I0 para I’1 na Figura 7.4a).
Quando a renda cai, ocorre também um declínio do consumo induzido pela renda. A queda da
taxa de juros também é induzida pela renda, como no caso em que examinamos os efeitos de
mudanças na política fiscal. O declínio da renda faz a demanda por moeda cair e a demanda por
títulos subir; em consequência, a taxa de juros cai.

FIG 7.4 Efeitos de um declínio autônomo do investimento


Um declínio autônomo do investimento desloca a curva de investimento para a esquerda na parte a. À taxa de juros inicial r0, o
investimento cai de I0 para I’1. O deslocamento da função investimento faz a curva IS na parte b deslocar-se para a esquerda, de
IS0 para IS1. A renda de equilíbrio cai de Y0 para Y1 e a taxa de juros de equilíbrio cai de r0 para r1 Como resultado da queda da
taxa de juros, o investimento recupera-se um pouco, indo para I1 na parte a.

Note que o declínio da taxa de juros faz o investimento se mover no sentido de seu nível
inicial. No novo equilíbrio, o investimento está em I1 na Figura 7.4a, tendo aumentado de I’1
para I1 como resultado da queda da taxa de juros.
É interessante comparar os efeitos de um declínio autônomo do investimento na versão IS-
LM do modelo keynesiano com os efeitos da mesma mudança no modelo clássico analisado na
Seção 4.2. Lá, a taxa de juros desempenhava um papel estabilizador, de modo que uma mudança
no investimento não afetava a demanda agregada. A taxa de juros caía o suficiente para levar a
demanda agregada de volta a seu nível inicial. No modelo IS-LM, o ajuste da taxa de juros é
estabilizador, mas incompleto. Para que a renda ficasse inalterada com um declínio autônomo do
investimento, a taxa de juros teria de cair para o nível r2 na Figura 7.4b. A esse nível da taxa de
juros, a renda estaria no nível original Y0 na nova curva IS, IS(I1). A Figura 7.4a mostra que, no
nível r2, a taxa de juros caiu o suficiente para levar o investimento de volta ao seu nível inicial,
I0. A taxa de juros, porém, cai apenas para r1; a compensação da queda autônoma inicial do
investimento é incompleta.
Há um caso que a compensação é completa, quando a curva LM é vertical. Assim, quando a
curva IS se desloca de IS(I0) para IS(I1), simplesmente nos movemos para baixo na curva LM
vertical até um novo equilíbrio no nível de renda inicial Y0 e com a taxa de juros declinando
para r2. A curva LM vertical foi chamada de caso clássico, assim não deve ser surpresa que essa
situação resulte em conclusões clássicas. Uma explicação desses resultados para a curva LM
vertical é oferecida na próxima seção.
PERSPECTIVAS 7.2 - O MIX DE POLÍTICAS MONETÁRIA E FISCAL:
ALGUNS EXEMPLOS HISTÓRICOS
Vimos que tanto a política monetária como a política fiscal podem afetar a renda no modelo keynesiano. Mas os efeitos
das duas sobre a taxa de juros e, portanto, sobre o investimento são diferentes. No caso de uma política monetária
expansionista, a taxa de juros cai e o investimento aumenta. Com uma ação fiscal expansionista – uma redução no imposto
de renda, por exemplo –, a taxa de juros sobe e o investimento cai. Essa é uma diferença significativa, porque o nível de
investimento determina a velocidade de formação de capital e é importante para o crescimento de longo prazo da
economia.
Nossa análise, portanto, sugere que, dentro de uma estrutura keynesiana, há uma preferência por um mix de política fiscal
relativamente “rígida” e política monetária “frouxa” a fim de manter a taxa de juros baixa e estimular o investimento.
Além disso, sempre que ações de política fiscal como reduções do imposto de renda são usadas para expandir a economia,
os keynesianos gostariam de ver uma política monetária de acomodação: um aumento correspondente na oferta de moeda
que impeça a taxa de juros de subir e, assim, evite o deslocamento do investimento. Essa combinação de política
monetária e fiscal é ilustrada na Figura 7.5. Ao mesmo tempo em que a curva IS é deslocada para a direita por uma
redução de impostos, a oferta de moeda é aumentada o suficiente para que a curva LM desloque-se para a direita o bastante
para evitar uma elevação da taxa de juros.
Como exemplo de uma expansão coordenada, os keynesianos apontam o corte de impostos de 1964 e o aumento da oferta
de moeda que o acompanhou. Como foi explicado em Perspectivas 5.2, o corte de impostos foi de 20% para pessoas
físicas e 10% para pessoas jurídicas. O crescimento da oferta de moeda aumentou para 4,7% no período de 1964-65, em
comparação com 3,7% em 1963. O resultado foi um crescimento do PNB de 5,4% em 1964 e 5,5% em 1965 (taxas bem
acima do crescimento do produto potencial). Como resultado da política monetária de acomodação, a taxa de juros (taxa
de títulos privados) subiu muito pouco, de 4,0% em 1963 para 4,3% em 1965. As reduções de impostos das empresas
incluídas no corte de impostos de 1964 tinham também o objetivo de evitar qualquer declínio no investimento. De fato, o
investimento fixo das empresas subiu de 9,0% para 10,5% do PNB entre 1963 e 1965. Mais tarde, os economistas
keynesianos assumiram uma postura crítica diante do mix de políticas monetária e fiscal na primeira administração
Reagan. Eles interpretaram esse mix como sendo de política monetária rígida, já que o ritmo de crescimento da oferta de
moeda diminuiu, e política fiscal frouxa, principalmente as grandes reduções de impostos para pessoa física e jurídica. Os
keynesianos achavam que as duas iniciativas de política cancelavam-se mutuamente em termos de seu efeito sobre o PNB.
O economista keynesiano James Tobin comparou a política de Reagan a colocar um trem em New Haven, Connecticut,
com um motor na frente dirigido para Boston e outro motor atrás voltado para Nova Iorque. Em termos gráficos, os
keynesianos achavam que a política monetária da administração Reagan deslocava a curva LM para a esquerda para
reduzir a renda enquanto a política fiscal deslocava a curva IS para a direita para aumentar a renda. Eles acreditavam que
ambas as políticas aumentariam a taxa de juros (ambas as curvas se deslocariam para cima), com efeitos desfavoráveis
sobre o investimento.
Recentemente, na sequência da crise financeira de 2007-09, políticas monetárias e fiscais foram usadas cooperativamente
para tentar conter a contração resultante. As políticas do Federal Reserve para expandir a oferta de moeda e baixar as taxas
de juros foram acompanhadas por aumentos dos gastos do governo e reduções de impostos, com os formuladores de
política tentando evitar que uma recessão se transformasse em uma depressão.

FIG 7.5 Combinação de políticas monetária-fiscal


Um corte nos impostos de T0 para T1 desloca a curva IS de IS(T0) para IS(T1). Por si só, essa mudança de política fiscal
empurraria a taxa de juros para cima, para r’1 Se o corte nos impostos fosse acompanhado por um aumento na oferta de moeda
de M0 para M1, a curva LM se deslocaria para a direita, de LM(M0) para LM(M1). Juntas, as duas ações de política aumentariam
o produto para Y1, com a taxa de juros permanecendo em r0.

7.2 A eficácia relativa das políticas monetária e fiscal


Na Seção 7.1, examinamos os efeitos qualitativos de ações de política monetária e fiscal no
modelo IS-LM, conforme resumido na Tabela 7.1. Como a tabela mostra, tanto instrumentos de
política fiscal como monetária podem afetar o nível de renda. Nesta seção, examinaremos a
eficácia relativa dos dois tipos de ações de política econômica. Por eficácia referimo-nos ao
tamanho do efeito sobre a renda de uma determinada mudança na variável de política
econômica. Será mostrado que a eficácia de cada tipo de política (monetária e fiscal) depende da
inclinação das curvas IS e LM, que, por sua vez, é determinada por certos parâmetros
comportamentais de nosso modelo.

Tabela 7.1 - Efeitos de variáveis de política monetária e fiscal


Nota: M, estoque de moeda; G, nível de gastos governamentais; T, impostos. Um sinal (+) indica que uma mudança no
instrumento de política faz a variável nessa linha (Y, renda, ou r, taxa de juros) mover-se na mesma direção da mudança. Um
sinal (-) indica o contrário.

7.2.1 Eficácia das políticas econômicas e a inclinação da curva IS


Primeiro, examinaremos como a inclinação da curva IS influencia a eficácia das políticas
monetária e fiscal. Como vimos anteriormente, o parâmetro fundamental que determina a
inclinação da curva IS é (o valor absoluto da) elasticidade-juros do investimento. Se a demanda
por investimento for altamente elástica em relação aos juros, indicando que um dado aumento na
taxa de juros reduzirá significativamente o investimento, a curva IS será relativamente plana.
Quanto menor o valor da elasticidade-juros da demanda por investimento, mais inclinada será a
curva IS.
Aqui, e quando examinarmos a influência da inclinação da curva LM sobre a eficácia das
políticas mais à frente, procederemos da seguinte maneira. Primeiro, comparamos os efeitos das
políticas fiscal e monetária sobre a renda quando a curva é bastante inclinada e quando ela é
plana. A ação de política monetária considerada é um aumento na oferta de moeda. A ação de
política fiscal é um aumento nos gastos do governo. Como tanto variações nos impostos como
nos gastos atuam deslocando a curva IS, mudanças nos impostos e nos gastos do governo são
eficazes ou ineficazes nas mesmas circunstâncias.
Para medir se as ações de política fiscal são eficazes, comparamos o efeito da ação da política
sobre a renda com o efeito previsto pelo modelo keynesiano simples. Ao passar para o modelo
IS-LM, acrescentamos o mercado monetário ao sistema keynesiano. Comparando o efeito da
política fiscal no modelo IS-LM com o efeito no sistema keynesiano simples, vemos como a
inclusão do mercado monetário modifica nossos resultados anteriores. A distância do
deslocamento horizontal da curva IS para uma dada ação de política fiscal é igual ao efeito sobre
a renda no modelo keynesiano simples, por exemplo, ΔY = ΔG[1/(1 - b)], de uma mudança nos
gastos governamentais. Em consequência, para avaliar a eficácia da política fiscal nos gráficos a
seguir, comparamos a mudança na renda com o deslocamento horizontal da curva IS.
Para avaliar a eficácia da política monetária, comparamos o efeito sobre a renda de uma
mudança na oferta de moeda com a distância horizontal do deslocamento da curva LM. O
deslocamento horizontal da curva LM quando a oferta de moeda muda é igual a ΔM(1/c1), onde
c1 é o coeficiente da renda na função demanda por moeda [equação (6.4)]. O coeficiente c1 dá o
montante do aumento da demanda por moeda por unidade de renda; portanto, ΔM (1/c1) dá o
aumento na renda que poderia ocorrer em razão de um aumento na oferta de moeda se todos os
novos saldos de moeda fossem destinados a suprir a maior demanda por moeda para transações
devida ao aumento da renda. Essa distância mede o máximo aumento possível da renda para um
dado aumento da oferta de moeda.

7.2.1.1 Eficácia da política monetária e a inclinação da curva IS


As partes a e b da Figura 7.6 mostram os efeitos de um aumento da oferta de moeda para
duas curvas IS de inclinação diferente. Em ambos os casos, o aumento da oferta de moeda
desloca a curva LM de LM0 para LM1. Na Figura 7.6a, a curva IS é bastante inclinada, refletindo
uma baixa elasticidade-juros do investimento. Como pode ser visto no gráfico, a política
monetária é relativamente ineficaz nesse caso. A renda sobe muito pouco como resultado do
aumento da oferta de moeda.
Na Figura 7.6b, a inclinação da curva LM foi mantida a mesma que na Figura 7.6a. O
tamanho do deslocamento horizontal da curva LM, ΔM(1/c1), que determina a magnitude da
ação de política, também foi mantido igual. A diferença é a inclinação da curva IS. Na Figura
7.6b, essa curva é traçada muito mais plana, refletindo uma elasticidade-juros maior do
investimento. Como pode ser visto, a política monetária torna-se mais eficaz quando a curva IS é
mais plana.
No modelo IS-LM, a política monetária afeta a renda ao reduzir a taxa de juros e estimular o
investimento. Se o investimento for pouco afetado por mudanças na taxa de juros, o que é o
pressuposto da Figura 7.6a, a política monetária será ineficaz. Na Figura 7.6b, em que a
sensibilidade do investimento aos juros é substancialmente maior, a política monetária tem
efeitos correspondentemente maiores. Portanto, nosso primeiro resultado é que a política
monetária é ineficaz quando a curva IS é muito inclinada – ou seja, quando o investimento é
inelástico em relação aos juros. A política monetária é mais eficaz quanto maior for a
elasticidade-juros do investimento e, assim, quanto menos inclinada for a curva IS.

FIG 7.6 Efeitos da política monetária e a inclinação da curva IS


Um aumento da oferta de moeda desloca a curva LM para a direita, de LM0 para LM1. Essa ação de política monetária
expansionista tem apenas um pequeno efeito sobre o produto na parte a, onde a curva IS é muito inclinada. Ela tem um efeito
muito maior na parte b, onde a curva IS é relativamente plana. Na parte c, em que a curva IS é vertical, o aumento da oferta de
moeda não tem nenhum efeito sobre a renda de equilíbrio.

Aqui e adiante, consideramos alguns casos extremos de inclinação das curvas IS e LM. O
exame de casos extremos é útil para entender nossos resultados em casos normais.
O primeiro caso extremo é o da curva IS vertical. A curva IS será vertical se o investimento
for completamente insensível a mudanças na taxa de juros (elasticidade-juros igual a zero). Os
efeitos de um aumento da oferta de moeda nesse caso são mostrados na Figura 7.6c. Se a curva
IS for vertical, o aumento da oferta de moeda simplesmente desloca a curva LM para baixo ao
longo da curva IS. A taxa de juros cai até que a demanda por moeda aumente o suficiente para
restabelecer o equilíbrio no mercado monetário, mas a renda fica inalterada. Para aumentar a
renda, o aumento da oferta de moeda e a resultante queda da taxa de juros precisam estimular o
investimento. Quando a curva IS é vertical, o investimento não é afetado pela política monetária
porque, como premissa, o investimento não depende da taxa de juros. Quanto mais inclinada a
curva IS, mais perto estaremos desse caso extremo.

7.2.1.2 Eficácia da política fiscal e a inclinação da curva IS


As partes a e b da Figura 7.7 mostram os efeitos de um aumento dos gastos do governo no
caso de uma curva IS muito inclinada (7.7a) e de uma curva IS relativamente plana (7.7 b). Em
ambos os casos, o aumento dos gastos do governo desloca a curva IS de IS0 para IS1. A distância
horizontal do deslocamento da curva, ΔG[1/(1 - b)], é a mesma em ambos os casos, o que
significa que o tamanho do impacto da ação de política e o multiplicador dos gastos autônomos
do modelo keynesiano simples são iguais. Como esses gráficos mostram, a política fiscal é
muito mais eficaz quando a curva IS é bastante inclinada (Figura 7.7a).
A curva IS muito inclinada ocorre quando o investimento é relativamente inelástico em
relação aos juros. Vimos que quanto menos sensível à taxa de juros for o investimento, maior o
efeito de uma dada ação de política fiscal. Para entender por que, consideremos o papel da
mudança da taxa de juros no ajuste a um novo equilíbrio depois de um aumento nos gastos do
governo. Quando a renda aumenta, a taxa de juros precisa subir para manter o mercado
monetário em equilíbrio. Essa elevação da taxa de juros faz o investimento declinar,
compensando em parte o efeito expansionista do aumento dos gastos do governo. Esse declínio
do investimento induzido pela taxa de juros faz com que a reação da renda no modelo IS-LM
seja menor que a reação dada pelo multiplicador do sistema keynesiano simples; ou seja, a renda
sobe menos que o deslocamento horizontal da curva IS.
Qual é a importância desse efeito sobre o investimento, com frequência chamado de
crowding out (ou efeito deslocamento)? Um fator que determina a importância desse crowding
out do investimento privado é a inclinação da curva IS. Se o investimento não for muito sensível
a mudanças na taxa de juros, a premissa da Figura 7.7a, o aumento da taxa de juros causará
apenas uma queda muito pequena no investimento e a renda subirá quase o valor total do
deslocamento horizontal da curva IS. Alternativamente, se o investimento for muito sensível aos
juros, a premissa da Figura 7.7b, o aumento da taxa de juros diminuirá substancialmente o
investimento e o aumento da renda será significativamente reduzido em relação à previsão do
modelo keynesiano simples.
FIG 7.7 Efeitos da política fiscal e a inclinação da curva IS

Em todas as partes da figura, um aumento dos gastos governamentais desloca a curva IS para a direita, de IS0 para IS1 Na parte a,
onde a curva IS é muito inclinada, essa ação de política fiscal expansionista resulta em um aumento relativamente grande da
renda. Essa ação de política fiscal é muito menos eficaz na parte b, em que a curva IS é relativamente plana. A política fiscal é
mais eficaz na parte c, onde a curva IS é vertical.

O caso da curva IS vertical é mostrado na Figura 7.7c. Aqui, o investimento é completamente


insensível aos juros. O aumento dos gastos do governo faz a taxa de juros subir, mas essa
elevação não resulta em nenhum declínio no investimento. A renda aumenta o valor total da
distância do deslocamento horizontal da curva IS; não há nenhum deslocamento do
investimento.
A comparação dos resultados desta subseção com os da subseção anterior mostra que a
política fiscal é mais eficaz quando a curva IS é muito inclinada (baixa elasticidade-juros do
investimento), enquanto a política monetária é mais eficaz quando a curva IS é pouco inclinada
(alta elasticidade-juros do investimento). Isso é resultado do papel diferente que a taxa de juros
desempenha na transmissão dos efeitos dessas ações de política. A política monetária afeta a
renda por afetar as taxas de juros. Em consequência, quanto maior o efeito das taxas de juros
sobre a demanda agregada, ceteris paribus, maiores serão os efeitos de uma dada ação de
política monetária. No caso da política fiscal, a mudança da taxa de juros anula os efeitos da
política fiscal. Uma maior elasticidade-juros do investimento significará que uma parcela maior
do efeito expansionista de um aumento nos gastos do governo será compensada por um declínio
no investimento induzido pela taxa de juros e, assim, maior será o efeito deslocamento. A
política fiscal será mais eficaz, novamente ceteris paribus, quanto menor for a elasticidade-juros
do investimento.

7.2.2 Eficácia das políticas econômicas e a inclinação da curva LM


A inclinação da curva LM depende crucialmente da elasticidade-juros da demanda por
moeda. Uma alta elasticidade-juros da demanda por moeda faz a curva LM ser relativamente
plana. A valores progressivamente mais baixos da elasticidade-juros da demanda por moeda, a
curva LM torna-se mais inclinada. Se a demanda por moeda for completamente insensível à taxa
de juros (elasticidade-juros igual a zero), a curva LM é vertical. Nesta subseção, vamos ver
como a eficácia das políticas monetária e fiscal depende da inclinação da curva LM e, assim, da
elasticidade-juros da demanda por moeda.

7.2.2.1 Eficácia da política fiscal e a inclinação da curva LM


A Figura 7.8 ilustra os efeitos de um aumento dos gastos governamentais para três
pressupostos em relação à inclinação da curva LM. Na Figura 7.8a, a curva LM é muito pouco
inclinada, em 7.8b a curva é muito inclinada e em 7.8c a curva é vertical. Em todos os casos,
considera-se que o aumento dos gastos governamentais desloque a curva IS de IS0 para IS1. A
inclinação da curva IS é a mesma nos três gráficos. O tamanho do aumento dos gastos do
governo também é o mesmo. Como os gráficos mostram, o efeito sobre a renda dessa ação de
política fiscal expansionista é maior quando a curva LM é relativamente plana (Figura 7.8a) e
menor quando a curva é relativamente inclinada (Figura 7.8b). No caso extremo em que a curva
LM é vertical, o aumento dos gastos do governo não tem nenhum efeito sobre a renda de
equilíbrio.
A política fiscal é mais eficaz quando a elasticidade-juros da demanda por moeda é alta,
tornando a curva LM relativamente plana. A razão disso tem a ver com o efeito do ajuste da taxa
de juros sobre o investimento depois da mudança da política fiscal. O aumento dos gastos do
governo faz a renda subir. Quando a renda sobe, a demanda por moeda para transações aumenta
e, para reequilibrar o mercado monetário sem que ocorra uma alteração na oferta de moeda, é
preciso elevar a taxa de juros. O aumento da taxa de juros deve baixar a demanda especulativa
por moeda e levar indivíduos e empresas a reduzir os saldos para transações. Se a demanda por
moeda for altamente sensível a mudanças na taxa de juros, é preciso apenas um pequeno
aumento da taxa de juros para restaurar o equilíbrio no mercado monetário. Este é o caso na
Figura 7.8a, em que a taxa de juros sobe muito pouco, de r0 para r1.
Como nesse caso há um aumento pequeno da taxa de juros, sendo constantes os outros
fatores, o declínio no investimento será pequeno1. Com pouco efeito deslocamento do
investimento privado, a renda sobe praticamente todo o valor do deslocamento horizontal da
curva IS.

FIG 7.8 Efeitos da política fiscal e a inclinação da curva LM


Em todas as partes da figura, um aumento dos gastos do governo desloca a curva IS para a direita, de IS0 para IS1. A política
fiscal é mais eficaz na parte a, onde a curva LM é relativamente plana; menos eficaz na parte b, onde a curva LM é muito
inclinada; e completamente ineficaz na parte c, onde a curva LM é vertical.

Quando a demanda por moeda é relativamente inelástica em relação aos juros (Figura 7.8b),
um aumento maior da taxa de juros (de r0 para r1 na Figura 7.8b) é necessário para reequilibrar o
mercado monetário quando a renda sobe. O aumento maior da taxa de juros leva a um declínio
maior no investimento, anulando uma porção maior do efeito expansionista do aumento dos
gastos do governo. Em consequência, o aumento da renda na curva LM mais inclinada (Figura
7.8b) é menor. Se a demanda por moeda for completamente insensível a mudanças na taxa de
juros (Figura 7.8c), apenas um nível de renda pode ser um nível de equilíbrio: o nível que gera
uma demanda para transações exatamente igual à oferta de moeda fixa. Um aumento da
demanda agregada, causado por um aumento dos gastos governamentais, cria uma pressão para
cima sobre a renda a uma dada taxa de juros. Há um excesso de demanda por bens (G é mais
alto, C e I são inalterados). No entanto, a tentativa de aumentar a renda (ou um aumento
temporário da renda) leva a um aumento da demanda por moeda para transações e faz a taxa de
juros subir. A renda de equilíbrio não pode, na verdade, ser maior que Y0, porque nenhum
aumento possível da taxa de juros reequilibrará o mercado monetário em um nível de renda mais
alto. Um novo equilíbrio será alcançado quando, na tentativa de obter moeda para transações
para atender ao nível mais alto de renda, tentativa esta que deve falhar no agregado, os
indivíduos levarem a taxa de juros para cima o suficiente para fazer a demanda agregada
retornar ao seu nível inicial. Na Figura 7.8c, isso ocorre à taxa de juros r1. Nesse ponto, o
investimento privado declinou um montante exatamente igual ao aumento dos gastos do
governo. O efeito deslocamento está completo.
O caso da curva LM vertical foi chamado anteriormente de clássico porque os economistas
clássicos não levavam em conta sistematicamente a dependência entre a demanda por moeda e a
taxa de juros. Implicitamente, eles pressupunham que a demanda por moeda fosse
completamente inelástica em relação aos juros. Note que, nesse caso clássico, nossos resultados
de política fiscal têm natureza clássica. Um aumento dos gastos do governo afeta a taxa de juros,
mas não a renda.
No final da Seção 7.1, vimos que, para esse caso de uma curva LM vertical, uma mudança
autônoma na demanda por investimento também deixaria a renda inalterada. O ajuste da taxa de
juros compensaria completamente a queda inicial da demanda por investimento. Também aqui,
para mudanças no componente governamental dos gastos autônomos, a taxa de juros ajusta-se
por completo, de modo que a demanda agregada total (C + I + G) não é afetada pela mudança.
Um elemento necessário, portanto, na concepção keynesiana de que variações nos gastos
autônomos resultantes de ações de política fiscal afetam a renda é a crença de que a demanda
por moeda de fato depende da taxa de juros. Essa crença decorre de se levar em conta o papel
que a moeda desempenha como um ativo, um modo alternativo aos títulos para estocar riqueza.
A visão clássica da moeda centrava-se simplesmente em seu papel em transações e, por isso, os
economistas clássicos negligenciavam o papel da taxa de juros na determinação da demanda por
moeda.

7.2.2.2 Eficácia da política monetária e a inclinação da curva LM


A Figura 7.9 mostra os efeitos de um aumento da oferta de moeda para as mesmas três
premissas sobre a curva LM consideradas anteriormente. Na parte a, a curva LM é relativamente
plana. Na parte b, a curva é muito inclinada; e na parte c a curva é vertical. Em todos os casos, o
aumento do estoque de moeda desloca a curva LM uma distância igual, de LM0 para LM1.
Como pode ser visto na figura, a política monetária é menos eficaz na Figura 7.9a, onde a
curva LM é relativamente plana (a elasticidade-juros da demanda por moeda é alta). O efeito
sobre a renda do aumento da oferta de moeda é sucessivamente maior quando consideramos a
Figura 7.9b, onde a elasticidade-juros da demanda por moeda é mais baixa, e a Figura 7.9c, onde
a elasticidade-juros da demanda por moeda é zero e a curva LM é vertical.
A razão disso pode ser percebida quando se compara a queda na taxa de juros resultante do
aumento da oferta de moeda em cada caso. No nível inicial de renda e taxa de juros, o aumento
da oferta de moeda criará um excesso de oferta de moeda, fazendo a taxa de juros cair. Essa
queda estimulará o investimento e, assim, a renda. A taxa de juros precisa cair até um ponto em
que a taxa de juros mais baixa e a renda mais alta tenham aumentado a demanda por moeda em
um montante igual ao aumento da oferta de moeda. Na Figura 7.9a, onde a demanda por moeda
é muito sensível aos juros, uma pequena queda da taxa de juros é suficiente para isso. Em
consequência, o aumento do investimento e, assim, da renda, será pequeno nesse caso. Com uma
demanda por moeda altamente elástica em relação aos juros, quando a taxa de juros cai os
indivíduos aumentam substancialmente seus saldos especulativos e cortam menos os saldos para
transações. A maior parte da moeda recém-criada é usada para esses fins e relativamente pouco
acaba como saldos para transações requeridos por um nível de renda mais alto.
Na Figura 7.9b, a elasticidade-juros da demanda por moeda é mais baixa e é necessária uma
queda maior dos juros para reequilibrar o mercado monetário depois do aumento da oferta de
moeda. Como consequência, o investimento e, portanto, a renda têm um aumento maior. Na
Figura 7.9c, onde a demanda por moeda é completamente inelástica em relação aos juros, a taxa
de juros também cai depois de um aumento da oferta de moeda. Aqui, porém, a queda da taxa de
juros por si só não tem nenhum efeito para aumentar a demanda por moeda e restaurar o
equilíbrio no mercado monetário, porque, neste caso, a demanda por moeda não depende da taxa
de juros. A queda da taxa de juros, no entanto, faz o investimento e a renda subirem. O aumento
da renda continuará até que toda a nova moeda seja absorvida em saldos para transações
adicionais. Esse é o máximo aumento possível da renda para um dado aumento da oferta de
moeda, porque todos os novos saldos de moeda acabam como saldos para transações requeridos
pelo nível mais alto de renda. Nenhuma parcela da nova moeda resulta em aumento da demanda
especulativa quando a taxa de juros cai. Também não há nenhuma tendência para um aumento
da quantidade de saldos para transações mantidos em um determinado nível de renda quando a
taxa de juros cai. Em suma, o efeito sobre o nível de renda de um determinado aumento da
oferta de moeda é tanto maior quanto menor for a elasticidade-juros da demanda por moeda.

FIG 7.9 Efeitos da política monetária e a inclinação da curva LM

Em todas as partes da figura, um aumento da oferta de moeda desloca a curva LM para a direita, de LM0 para LM1. A política
monetária é menos eficaz na parte a, onde a curva LM é relativamente plana; é mais eficaz na parte b, onde a curva LM é muito
inclinada; e mais eficaz ainda na parte c, onde a curva LM é vertical.

Como em nossa discussão sobre a curva IS, encontramos aqui que a condição que torna a
política monetária mais eficaz é a que torna a política fiscal menos eficaz. A eficácia da política
monetária aumenta quando a elasticidade-juros da demanda por moeda diminui. A política fiscal
é mais eficaz quanto maior for a elasticidade-juros da demanda por moeda. A razão para essa
diferença é, uma vez mais, o papel diferente do ajuste da taxa de juros na transmissão dos efeitos
das políticas monetária e fiscal. No caso da política monetária, que afeta a renda por meio de
mudanças na taxa de juros, quanto maior a resposta à taxa de juros, mais eficaz será a ação de
política. Como acabamos de ver, a resposta à taxa de juros é maior quando a elasticidade-juros
da demanda por moeda é baixa (isto é, a curva LM é muito inclinada).
No caso da política fiscal, onde a resposta à taxa de juros, com o resultante deslocamento do
investimento, cancela parte do efeito da ação de política, a resposta da renda é maior quanto
menor for a reação à taxa de juros. Uma alta elasticidade-juros da demanda por moeda reduz os
efeitos de uma ação de política fiscal sobre a taxa de juros (comparem-se as partes a e b da
Figura 7.8). Portanto, a política fiscal é mais eficaz quando a elasticidade-juros da demanda por
moeda é alta (isto é, a curva LM é pouco inclinada).

Conclusão
Na Seção 7.1, examinamos os efeitos de ações de política monetária e fiscal sobre a renda e a
taxa de juros, supondo que as curva IS-LM tivessem inclinações normais, isto é, que as
inclinações tanto da curva IS como da curva LM estivessem em uma faixa intermediária – nem
tão inclinadas nem tão planas a ponto de tornar a política fiscal ou a política monetária ineficaz.
Na Seção 7.2, foram examinadas as relações entre as inclinações das curvas IS e LM e a eficácia
relativa das políticas monetária e fiscal. Os resultados dessa análise são resumidos na Tabela 7.2.
Uma questão relevante neste ponto é: qual dos casos na Tabela 7.2 caracteriza a economia de
fato? Quais são as inclinações efetivas das relações que correspondem às curvas IS e LM do
modelo em nossa economia?

Tabela 7.2 - Eficácia das políticas monetária e fiscal e as inclinações das curvas IS e L

Política monetária
Curva IS Curva LM
Muito inclinada Ineficaz Eficaz
Pouco inclinada Eficaz Ineficaz
Política fiscal
Curva IS Curva LM
Muito inclinada Eficaz Ineficaz
Pouco inclinada Ineficaz Eficaz

Se considerarmos a posição dos economistas keynesianos atuais, a resposta seria que, em


circunstâncias econômicas normais, eles acreditam que as inclinações tanto da curva IS como da
curva LM estão na faixa intermediária, em que a política monetária e a política fiscal são ambas
eficazes.
Nossos resultados da Seção 7.1, resumidos na Tabela 7.1, caracterizam essa posição
keynesiana moderna. Há situações extremas, como a dos Estados Unidos na recente recessão e
em sua sequência, e do Japão nas duas últimas décadas, em que o caso da armadilha da liquidez
torna-se relevante, reduzindo a eficácia da política monetária.

FIG 7.10 O PIB e o deflator do PIB do Japão

FIG 7.11 Taxa de juros de curto prazo no Japão (1992-2006)

PERSPECTIVAS 7.3 - JAPÃO EM RETRAÇÃO E A ARMADILHA DA


LIQUIDEZ
Uma ressalva à noção keynesiana de que tanto a política fiscal como a monetária serão eficazes relaciona-se à política
monetária em períodos nos quais a taxa de juros fica muito baixa, aproximando-se ou atingindo o “zero bound”, ou nível
mínimo. Nessas situações, a economia pode mergulhar em uma armadilha de liquidez, conforme discutido no Capítulo 6 e
ilustrado na Figura 6.8.
Muitos economistas acreditam que a economia americana esteve em uma armadilha da liquidez durante a Grande
Depressão da década de 1930, quando as taxas de juros de curto prazo caíram abaixo de 1%. A discussão da armadilha da
liquidez praticamente desapareceu na década de 1970 e início dos anos 1980, quando as taxas de juros das principais
economias estiveram com frequência na casa dos dois dígitos. O interesse pela armadilha da liquidez renasceu quando as
taxas de juros caíram a níveis muito baixos em alguns países em anos recentes. O Japão é um bom exemplo.
Em meados da década de 1980, a economia japonesa estava crescendo rapidamente. Nos Estados Unidos, as discussões
sobre o Japão pareciam-se, então, com as referentes à China hoje. Os comentadores temiam que o “Japão Incorporated”
pudesse deixar para trás a economia americana. Os Estados Unidos tinham um grande déficit comercial com o Japão e
produtos japoneses como automóveis e eletrodomésticos vinham substituindo os produtos americanos. Então, na década
de 1990, depois de um ciclo de sobe-e-desce nos mercados imobiliário e financeiro japoneses, a economia do país caiu em
uma prolongada retração da qual ainda não se recuperou por completo. A retração da atividade econômica foi
acompanhada por deflação.
Essas tendências podem ser observadas na Figura 7.10, que mostra a taxa de crescimento percentual do PIB japonês e do
deflator do PIB como medida da inflação. Após um crescimento real do PIB de 4,8%, em média, de 1981 a 1990, o
crescimento depois de 1992 desacelerou fortemente, com o PIB tendo de fato declinado em 3 desses anos. O deflator do
PIB caiu durante boa parte do período pós-1992. O Japão estava em uma contração deflacionária. Como a Figura 7.11
mostra, a taxa de juros de curto prazo caiu rapidamente, atingiu o nível mínimo e permaneceu ali depois de 2003. Isso foi
resultado da contração econômica e do fato de o Banco do Japão ter seguido uma política expansionista para revigorar a
economia.
A Figura 7.12 ilustra a ineficácia da política monetária em uma armadilha de liquidez. Ao nível baixo vigente das taxas de
juros no Japão, a curva LM seria muito pouco inclinada, refletindo uma alta elasticidade-juros da demanda por moeda. Isso
acontece porque, a um nível tão baixo da taxa de juros, a curva de demanda especulativa por moeda seria muito plana;
haveria um consenso quanto à probabilidade de aumentos futuros da taxa de juros, com perdas de capital esperadas para os
títulos. Um aumento da oferta de moeda seria absorvido com uma queda apenas mínima da taxa de juros e, portanto,
pouco estímulo para o investimento. Na situação japonesa recente, em que a taxa de juros de curto prazo chegou a zero,
não esperaríamos que nenhum declínio adicional fosse possível.
Antes de deixarmos a experiência do Japão, mais alguns pontos devem ser observados. Nossa análise neste capítulo nos
levaria a acreditar que, em uma armadilha da liquidez, a política fiscal deveria ser altamente eficaz. O caso de uma curva
LM plana significa que há pouco efeito deslocamento (crowding out). O governo japonês de fato seguiu uma política fiscal
expansionista durante boa parte do período pós-1992. O déficit orçamentário subiu para mais de 6% do PIB devido ao
aumento dos gastos do governo e a algumas reduções de impostos. Ainda assim, o Japão permaneceu em retração
econômica. Isso e muitas outras coisas na experiência japonesa desde 1992 são intrigantes. O que causou uma retração tão
prolongada mesmo com ações de política econômica para estimular a economia? Os economistas foram levados a procurar
as causas em problemas estruturais da economia japonesa, como um sistema bancário ineficiente, supervisão regulatória
fraca, infraestrutura insuficiente, baixa mobilidade da força de trabalho e dependência excessiva da demanda por
exportações. As políticas fiscais foram criticadas por serem governadas mais por interesses políticos do que econômicos e
como atrasadas e ineficientes. De modo geral, as instituições que serviram bem ao Japão na recuperação e rápida expansão
nos anos após a Segunda Guerra Mundial mostraram-se inadequadas para o estágio que a economia havia atingido em
1990a.
Quando as taxas de juros de curto prazo caíram para perto de zero depois de 2008, os Estados Unidos pareceram estar em
uma armadilha da liquidez. Os formuladores de políticas procuraram políticas monetárias e fiscais que possibilitassem aos
Estados Unidos evitar a prolongada retração que afligiu a economia japonesa.

FIG 7.12 Ineficácia da política monetária em uma armadilha da liquidez

Aos níveis baixos da taxa de juros que predominariam em uma armadilha da liquidez, os keynesianos esperam que a
economia esteja em um trecho quase horizontal da curva LM. A política monetária é ineficaz nessa situação.
a Sobre essas questões, veja os artigos em ITO, Takatoshi; PATRICK, Hugh; WEINSTEIN, David (Orgs.). Reviving Japan’s
Economy: problems and prescriptions. Cambridge: MIT Press, 2005.
Questões de revisão
1. No modelo IS-LM, mostre como a renda e a taxa de juros são afetadas pelas seguintes
situações:
a. Um aumento dos gastos do governo.
b. Um declínio autônomo dos gastos com investimentos.
c. Um aumento dos impostos.
d. Um aumento da oferta de moeda.
Em cada caso, explique por que ocorrem as variações na renda e taxa de juros.
2. No modelo IS-LM, analise os efeitos de um aumento nos gastos do governo financiado por
um aumento igual nos impostos. Primeiro, considere o deslocamento horizontal líquido da
curva IS como resultado desse aumento do orçamento equilibrado. Depois, considere os
efeitos sobre a renda e a taxa de juros. Por fim, compare os resultados com o multiplicador
do orçamento equilibrado da Seção 5.5.
3. No modelo IS-LM, qual seria o efeito de um aumento autônomo na poupança acompanhado
de uma queda equivalente do consumo, ou seja, uma queda em a na função consumo?
C = a + b(Y - T)
Qual curva se deslocaria? Como a renda e a taxa de juros seriam afetadas?
4. Explique a relação entre a eficácia da política monetária e a elasticidade-juros do
investimento. A política monetária será mais ou menos eficaz quanto mais alta for a
elasticidade-juros da demanda por investimento? Agora explique a relação entre a eficácia da
política fiscal e a elasticidade-juros da demanda por investimento. Por que as duas relações
são diferentes?
5. Explique a relação entre a eficácia da política monetária e a elasticidade-juros da demanda
por moeda. A política monetária será mais ou menos eficaz quanto mais alta for a
elasticidade-juros da demanda por moeda? Explique. Agora explique a relação entre a
política fiscal e a elasticidade-juros da demanda por moeda. Por que as duas relações são
diferentes?
6. Suponha que tivéssemos um caso em que a elasticidade-juros tanto da demanda por moeda
como da demanda por investimento fossem muito baixa. A política fiscal ou a política
monetária seriam muito eficazes? Como você interpretaria essa situação?
7. Vimos que a taxa de juros desempenhava um papel estabilizador no sistema clássico,
ajustando-se para que um choque em um componente da demanda, por exemplo, um declínio
do investimento autônomo, não afetasse a demanda agregada. A taxa de juros desempenha
uma função estabilizadora similar no modelo keynesiano?
8. Em que sentido a curva LM vertical é um caso clássico?
9. Por que os keynesianos poderiam ser pessimistas quanto à capacidade da política monetária
de estimular o produto em situações como as da Depressão da década de 1930 nos Estados
Unidos ou as recessões no Japão na década de 1990? Que tipo de política econômica os
economistas keynesianos esperariam que fosse eficaz nessas situações?
10. Considere o caso em que a curva LM é vertical. Suponha que ocorra um choque que aumente
a demanda por moeda nos níveis dados da renda e da taxa de juros. Ilustre o efeito do choque
em um gráfico e explique como a renda e a taxa de juros são afetados.

APÊNDICE: OS MULTIPLICADORES DA POLÍTICA MONETÁRIA E


FISCAL NO MODELO IS-LM
Aqui, estendemos o tratamento algébrico do modelo IS-LM apresentado no apêndice ao Capítulo 6. Examinamos agora
como o valor de equilíbrio da renda que derivamos ali se altera quando variáveis de política monetária e fiscal são
alteradas. Ao fazer isso, estabeleceremos algebricamente os resultados gráficos da Seção 7.1. Consideraremos, em
seguida, a mesma questão abordada na Seção 7.2, a eficácia relativa das políticas monetária e fiscal, na versão linear do
modelo IS-LM.

OS EFEITOS DAS POLÍTICAS MONETÁRIA E FISCAL SOBRE A RENDA


No apêndice ao Capítulo 6, derivamos as expressões a seguir1 para os valores de equilíbrio da renda (Y0) e da taxa de
juros (r0) no modelo IS-LM:

Podemos usar essas duas equações para ver como a taxa de juros e a renda mudam quando alguma das variáveis exógenas
do modelo é alterada. Isso é o equivalente matemático a ver como esses valores de equilíbrio mudavam nos gráficos da
Seção 7.1 com um deslocamento das curvas IS ou LM. Nesta seção, construímos expressões que mostram como a renda
muda com mudanças nas variáveis de política econômica usando a equação (A.10). O cálculo dos efeitos sobre a taxa de
juros de mudanças nessas variáveis ficará como exercício (veja o problema de revisão 1).

POLÍTICA FISCAL
Consideremos primeiro como a renda de equilíbrio muda com uma variação nos gastos do governo. Pela equação (A.10),
fazendo G variar e mantendo constantes todas as outras variáveis exógenas, e para valores dados dos parâmetros,
calculamos
A equação (A.12) indica que, como vimos graficamente (Figura 7.2), um aumento nos gastos do governo levará a um
aumento da renda de equilíbrio no modelo IS-LM. Além disso, o aumento da renda de equilíbrio por aumento unitário dos
gastos do governo, conforme dado pela equação (A.12), é menor que no modelo keynesiano simples. No modelo
keynesiano simples analisado no Capítulo 5, o aumento da renda de equilíbrio por aumento unitário dos gastos do governo
era dado pelo multiplicador dos gastos autônomos, 1/(1 - b). O multiplicador na equação (A.12) contém um termo positivo
adicional no denominador (i1c1/c2) e, portanto, é menor. Note também, olhando de novo para a equação (A.10), que a
mudança da renda de equilíbrio por variação unitária do investimento autônomo (ΔY/ΔĪ) seria exatamente a mesma que
ocorre com uma mudança nos gastos do governo. O efeito sobre a renda de uma mudança nos impostos é

Esse multiplicador dos impostos é oposto em sinal ao multiplicador dos gastos do governo e menor em valor absoluto,
porque tem –b em vez de 1 no numerador.

POLÍTICA MONETÁRIA
Pela equação (A.10), calculamos os efeitos sobre a renda de uma mudança na oferta de moeda como

ou

O que pode ser simplificado para

Um aumento da oferta de moeda faz a renda de equilíbrio subir, conforme foi ilustrado na Figura 7.1.

EFICÁCIA DAS POLÍTICAS ECONÔMICAS E A INCLINAÇÃO DAS CURVAS


IS E LM
As expressões dadas pelas equações (A.12) e (A.14) são, respectivamente, multiplicadores de política fiscal e monetária.
Eles indicam a variação na renda de equilíbrio por mudança unitária nas variáveis de política G e Ms. Nesta seção,
examinaremos a relação entre a magnitude desses multiplicadores e a inclinação das curvas IS e LM. Nossos resultados
equivalem aos da Seção 7.222.

A CURVA IS E A EFICÁCIA DAS POLÍTICAS ECONÔMICAS


No apêndice ao Capítulo 6, encontramos que a inclinação da curva IS era dada por
O parâmetro crucial, em relação ao qual há controvérsias, é i1, que mede a sensibilidade da demanda por investimento à
taxa de juros. Se i1 for grande (pequeno), a demanda por investimento será sensível (insensível) aos juros e a curva IS será
pouco inclinada (muito inclinada).
Agora, examinemos o papel desempenhado por i1 nas duas expressões de multiplicadores. Vemos pela equação (A.12)
que, conforme i1 diminui, ΔY/ΔG fica maior. Ou seja, conforme o investimento torna-se menos sensível à taxa de juros e a
curva IS fica mais inclinada, a política fiscal torna-se mais eficaz (veja a Figura 7.7). Se i1 chegar a zero, a equação (A.12)
reduz-se a 1/(1 - b), o multiplicador do modelo keynesiano simples do Capítulo 5.
Veremos em seguida a equação (A.14), o multiplicador da política monetária. Conforme i1 diminui (a curva IS torna-se
mais inclinada), o numerador da equação (A.14) torna-se proporcionalmente menor, enquanto apenas um termo do
denominador se reduz. Portanto, o valor da expressão diminui3. Quanto menor a elasticidade-juros do investimento, mais
inclinada a curva IS e menos eficaz a política monetária (veja a Figura 7.6). No caso extremo em que i1 é igual a zero
(curva IS vertical), o valor da equação (A.14) vai para zero e a política monetária torna-se completamente ineficaz.
A curva LM e a eficácia das políticas econômicas
A expressão no apêndice ao Capítulo 6 para a inclinação da curva LM era

O parâmetro crucial (que é objeto de controvérsia) que determina se a curva é muito ou pouco inclinada é c2, que mede a
sensibilidade da demanda por moeda aos juros. Se c2 for grande (pequeno), indicando que a demanda por moeda é
sensível (insensível) aos juros, a curva LM será relativamente pouco inclinada (muito inclinada). Esse resultado acontece
porque a expressão na equação (A.5) diminui de valor conforme c2 fica maior.
Agora, examinemos o modo como c2 afeta o multiplicador da política fiscal dado pela equação (A.12). Conforme c2 fica
menor, o segundo termo do denominador da equação (A.12) fica maior. Nenhum outro termo é afetado, portanto toda a
expressão fica menor. Quanto mais baixa a sensibilidade da demanda por moeda em relação aos juros, mais inclinada é a
curva LM e menos eficaz é a política fiscal (veja a Figura 7.8). No caso extremo em que c2 aproxima-se de zero, o
denominador da equação (A.12) torna-se extremamente grande e a expressão como um todo tende a zero. Quando a curva
LM torna-se vertical, a política fiscal é completamente ineficaz.
Por fim, consideremos a relação entre c2 e a eficácia da política monetária conforme medida pela equação (A.14).
Conforme c2 diminui, o denominador da equação (A.14) fica menor e a expressão torna-se maior. Quanto menos sensível
à taxa de juros for a demanda por moeda, mais inclinada será a curva LM e mais eficaz é a política monetária (veja a
Figura 7.9). Se c2 for zero, a equação (A.14) reduz-se a 1/c1 A curva LM é vertical e a renda de equilíbrio aumenta em
valor equivalente a toda a distância do deslocamento horizontal da curva LM quando a oferta de moeda aumenta (Figura
7.9c).
1 Como voltamos às equações do apêndice ao Capítulo 6, para evitar confusão numeramos as equações aqui
consecutivamente às equações daquele apêndice.
2 Como no capítulo, não precisamos considerar separadamente a eficácia da política tributária. Os mesmos fatores que
influenciam a eficácia de mudanças em G determinam a eficácia de mudanças em T.
3 Para ver isso claramente, reescreva o lado direito da equação (A.14) como 1/[(1 – b)c2/I1 + c1]. Quando i1 diminui, o
denominador aumenta de valor e o tamanho do multiplicador diminui.

Questões de revisão
1. Usando a equação (A.11), mostre como o valor de equilíbrio da taxa de juros (r) será afetado
por
a. Um aumento da oferta de moeda (Ms).
b. Um aumento dos gastos do governo (G).
c. Um aumento dos impostos (T).
2. Partindo da solução para os valores de equilíbrio de Y e r na pergunta de revisão 1 do
apêndice ao Capítulo 6, mostre como esses valores mudariam se os gastos do governo
subissem de 250 para 310.
CAPÍTULO 8
O sistema keynesiano (IV): oferta e demanda agregadas

Os Capítulos 5, 6 e 7 analisaram a determinação da renda pressupondo que o nível de preços


e o salário monetário fossem fixos. A versão preço fixo-salário fixo do sistema keynesiano
destaca o papel da demanda agregada. A natureza determinada-pela-demanda do produto nesse
modelo keynesiano contrasta nitidamente com a natureza determinada-pela-oferta do produto no
modelo clássico. Neste capítulo, examinaremos o sistema keynesiano quando preços e salários
não são mantidos constantes e veremos que tanto fatores de demanda como de oferta influem na
determinação do produto. Nesse sentido, os modelos deste capítulo são uma síntese dos sistemas
clássico e keynesiano.
Na seção 8.1, ilustramos a natureza determinada-pela-demanda do produto nos modelos
keynesianos considerados até aqui e construímos uma curva de demanda agregada keynesiana.
Na Seção 8.2, essa curva de demanda agregada keynesiana é combinada à análise da oferta
clássica. Será observado que, desde que mantenhamos a premissa clássica de informações
perfeitas no mercado de trabalho e flexibilidade perfeita de preços e salários, a introdução da
curva de demanda agregada keynesiana não altera a natureza clássica do modelo. Desde que a
curva de oferta permaneça vertical, como de fato acontece se as premissas sobre o mercado de
trabalho feitas acima forem mantidas, o produto agregado será determinado independentemente
da demanda. Para que a demanda agregada influa na determinação do produto, as premissas
clássicas sobre o mercado de trabalho precisam ser modificadas.
Premissas keynesianas alternativas sobre o lado da oferta da economia são analisadas nas
Seções 8.3 e 8.4. Nessas seções, desenvolvemos a função oferta agregada keynesiana. Na Seção
8.5, veremos como deslocamentos dessa função oferta agregada influem na determinação do
preço e do produto no modelo keynesiano. A última seção do capítulo compara os sistemas
clássico e keynesiano.

8.1 A curva de demanda agregada keynesiana


O modelo do Capítulo 5 apresentou a teoria keynesiana da demanda agregada por produto. A
noção essencial embutida nesse modelo keynesiano simples era que, para o produto estar em um
nível de equilíbrio, a demanda agregada devia ser igual ao produto. Nos Capítulos 6 e 7, foi
considerado o efeito da taxa de juros sobre o investimento e, assim, sobre a demanda agregada.
Mostrou-se que, para que uma combinação de produto (Y) e taxa de juros (r) estivesse em um
ponto de equilíbrio, o produto tinha de ser igual à demanda agregada e a demanda por moeda
devia ser igual à oferta de moeda.
O que garante que esse nível de produto será igual à oferta agregada – igual à quantidade que
as firmas escolherem produzir? Nossa suposição implícita sobre a curva de oferta agregada é
mostrada na Figura 8.1. Consideramos que qualquer nível de demanda pelo produto poderia ser
satisfeito no nível de preços dado.
FIG 8.1 Curva de oferta agregada no modelo keynesiano de preços fixos

Nos capítulos anteriores sobre o modelo keynesiano, onde o nível de preços era fixo e o produto era determinado pela demanda
agregada, consideramos que a curva de oferta agregada fosse horizontal.

Essa suposição poderia ser plausível quando o produto está bem abaixo da capacidade da
Economia. Nessas condições – por exemplo, durante a Depressão da década de 1930 –,
aumentos do produto podiam não exercer pressão de alta sobre o nível do salário monetário,
dado o alto nível de desemprego. Além disso, o produto marginal do trabalho (PMgN) poderia
não cair conforme mais trabalho fosse empregado quando partimos de um nível baixo de
emprego (veja a Figura 3.1). Como conseqüência, o custo de produzir unidades adicionais de
produto, W/PMgT, poderia permanecer constante mesmo com aumentos do produto. Em
condições mais normais, um aumento do produto exerceria uma pressão para cima tanto sobre o
salário como sobre o nível de preços. Esperaríamos que a curva de oferta tivesse inclinação
positiva.
No caso mais geral da curva de oferta agregada de inclinação positiva, não podemos
pressupor que o preço seja constante (que a oferta não seja uma limitação) e determinar o
produto simplesmente determinado a demanda agregada. O produto e o preço serão
determinados conjuntamente por fatores de oferta e de demanda. A curva de oferta agregada
keynesiana será discutida nas Seções 8.3 e 8.4. Primeiro, vamos construir a curva de demanda
agregada keynesiana, a relação entre a demanda agregada e o nível de preços no modelo
keynesiano.
Os fatores que determinam a demanda agregada no sistema keynesiano foram analisados
detalhadamente. Esses fatores determinam a posição das curvas IS e LM e, portanto, a
combinação renda-taxa de juros que equilibra o mercado monetário e faz o produto ser igual à
demanda agregada. Ao construir uma curva de demanda agregada, queremos encontrar o nível
de produto demandado em cada nível de preço. Para fazer isso, examinamos como a posição das
curvas IS e LM e, consequentemente, como os níveis da taxa de juros e do produto em que as
curvas se cruzam são afetados por variações de preços. O nível de produto em que as curvas IS e
LM se cruzam para um dado nível de preços é um ponto da curva de demanda agregada
keynesiana. Consideremos primeiro como uma mudança no nível de preços afeta a posição da
curva IS. A condição de equilíbrio ao longo da curva IS é

onde I = investimento
G = gastos do governo
S = poupança
T = impostos
Y = produto
Para ver como o nível de preços influencia a posição da curva IS, examinemos como cada
variável da equação (8.1) é afetada por mudanças nos preços.
Consideramos que duas variáveis, gastos governamentais (G) e impostos (T), sejam fixadas
pelo governo em termos reais, ou seja, consideramos e continuaremos a considerar que seus
níveis reais não são afetados por mudanças de preços. Pressupomos que também o nível de
investimento seja determinado em termos reais; uma dada taxa de juros determina um nível de
investimento real. Mudanças no nível de preços não afetam diretamente o investimento.
Similarmente, consideramos que a poupança real dependa da renda real e não seja
diretamente afetada por mudanças no nível de preços. Nenhum dos quatro termos da equação
(8.1), a condição de equilíbrio da curva IS, depende diretamente do nível de preços, portanto
uma mudança no nível de preços não desloca a curva IS.
E quanto à curva LM? A condição de equilíbrio para o mercado monetário, a curva LM, é

FIG 8.2 Construção da curva de demanda agregada


A níveis de preços sucessivamente mais elevados, P0, P1, P2, a curva LM na parte a desloca-se mais para a esquerda. Esse
deslocamento resulta em níveis sucessivamente mais baixos de demanda agregada Y0, Y1, Y2. Essas combinações de preço e
demanda agregada são representadas em gráfico e produzem a curva de demanda agregada de inclinação negativa mostrada na
parte b.

A condição iguala a oferta real de moeda (M/P) e a demanda por moeda em termos reais. A
oferta real de moeda é igual à oferta nominal de moeda exogenamente fixada (M) dividida pelo
nível de preços (P).
A teoria keynesiana da demanda por moeda apresentada no Capítulo 6 relacionou a demanda
por moeda em termos reais com o nível de renda real e a taxa de juros, embora, desde que os
preços fossem mantidos constantes, não houvesse necessidade de distinguir entre mudanças em
valores reais e nominais. As pessoas desejam reter uma certa quantidade de saldos de moeda
reais para um dado volume de transações medido em termos reais (valor da moeda constante),
onde a renda real é uma aproximação do volume real de transações. Em consequência, o
equilíbrio no mercado monetário ocorre quando a demanda por saldos de moeda reais é igual
exatamente à oferta real de moeda. É a oferta nominal de moeda, não a oferta real de moeda, que
pode ser fixada exogenamente pela autoridade monetária. Qualquer mudança no nível de preços
afetará a oferta real de moeda e, em consequência, deslocará a curva LM.
A Figura 8.2a ilustra o efeito de mudanças no nível de preços sobre a oferta real de moeda e,
portanto, sobre a posição da curva LM. Mantendo a oferta nominal de moeda fixa em M0, três
níveis de preços são considerados, em que P2 > P1 > P0. Note-se que, quando consideramos o
efeito de um aumento de preços de P0 para P1, depois de P1 para P2, no preço mais alto a curva
LM é deslocada para a esquerda. O efeito de um nível de preços mais alto reduz a oferta real de
moeda,

No geral, o efeito de um nível de preços mais alto é o mesmo que o de uma queda da oferta
nominal de moeda; ambos reduzem a oferta real de moeda (M/P). A curva LM desloca-se para a
esquerda, elevando a taxa de juros e reduzindo o investimento e a demanda agregada.
Na Figura 8.2b, representamos o nível de demanda agregada correspondente a cada um dos
três níveis de preços considerados. Essa curva, chamada de Yd, é a curva de demanda agregada.
Como pode ser visto pela construção da curva, esse nível de produto demandado é o nível de
equilíbrio do produto pelo modelo de curvas IS-LM, o nível de produto que, para um dado nível
de preços, iguala exatamente o produto e a demanda agregada, equilibrando simultaneamente o
mercado monetário.
A curva de demanda agregada reflete influências monetárias (fatores que afetam a curva LM)
e também influências diretas sobre a demanda agregada (fatores que afetam a curva IS). Os
fatores que aumentam o nível da renda de equilíbrio no modelo IS-LM (aumentam o nível de
produto demandado a um dado nível de preços) deslocarão a curva de demanda agregada para a
direita. Fatores que fazem a renda de equilíbrio declinar no modelo IS-LM deslocarão a curva de
demanda agregada para a esquerda.
Consideremos, por exemplo, o efeito de um aumento da oferta de moeda, de M0 para M1,
como mostrado na Figura 8.3. Partindo do ponto de equilíbrio A, com

FIG 8.3 Efeito sobre a demanda agregada de um aumento na oferta de moeda


Um aumento na oferta de moeda desloca a curva LM na parte a para a direita, de LM(M0/P0) para LM(M1/P0), e desloca a curva
de demanda agregada para a direita de Yd0 para Yd1 na parte b.
o aumento da oferta de moeda desloca a curva LM para

O novo ponto de equilíbrio é em B, como mostrado na Figura 8.3a. A renda de equilíbrio


para um dado nível de preços P0 na figura aumenta de Y0 para Y1. A curva de demanda agregada
mostrada na Figura 8.3b desloca-se para a direita, de Yd0 para Yd11. Note-se que a distância do
deslocamento horizontal da curva de demanda agregada é (Y1 – Y0), o valor do aumento da renda
de equilíbrio no modelo IS-LM. Esse é o aumento da renda e da demanda agregada resultante
para um dado nível de preços. Similarmente, mudanças nos gastos do governo ou nos impostos
que desloquem a curva IS deslocam a curva de demanda agregada de tal modo que a distância do
deslocamento horizontal da curva é igual à mudança da renda de equilíbrio no modelo IS-LM.

8.2 A curva de demanda agregada keynesiana combinada à teoria


clássica da oferta agregada
Quando preços e salários não são constantes, saber os efeitos de uma ação de política
econômica sobre a demanda não é suficiente para determinar seus efeitos sobre a renda. O efeito
sobre a renda dependerá dos pressupostos que fizermos a respeito da oferta agregada. Na Figura
8.4, são comparados os efeitos de um aumento nos gastos do governo para três diferentes
pressupostos sobre a oferta agregada.
Em todos os casos, o aumento nos gastos do governo desloca a curva de demanda agregada
para a direita, de Yd0 para Yd1. Se a curva de oferta for dada por Ys2, uma curva horizontal, o
aumento do produto é equivalente a toda a distância do deslocamento horizontal da curva de
demanda agregada. Lembre-se da Seção 8.1 que esse é o aumento da renda de equilíbrio pelo
modelo IS-LM, que considerou implicitamente que a curva de oferta fosse horizontal. Se a curva
de oferta tiver inclinação positiva (Ys1), os preços subirão e o aumento da renda será menor, Y1 –
Y0, em comparação com Y2 – Y0 na Figura 8.4. Se a curva de oferta fosse vertical (Ys0 na Figura
8.4), não haveria nenhum aumento na renda. Claramente, portanto, os efeitos de mudanças de
política econômica sobre a renda dependem dos pressupostos feitos em relação à oferta
agregada. Quais são as implicações de se fazer os pressupostos clássicos a respeito da oferta e
manter a estrutura keynesiana da curva de demanda agregada?

FIG 8.4 Papel da oferta agregada na determinação da resposta do produto a um choque de


política econômica
Um aumento nos gastos do governo desloca a curva de demanda agregada de Yd0 para Yd1. Se a curva de oferta agregada for
horizontal (Ys2), o produto aumenta de Y0 para Y2. Se a curva de oferta agregada tiver inclinação positiva (Ys1), o produto
aumenta apenas para Y1. Se a curva de oferta for vertical (Ys0), o produto fica inalterado em Y0.

A análise clássica da oferta agregada foi explicada no Capítulo 3. Os elementos centrais dessa
análise são que, no mercado de trabalho, tanto a oferta como a demanda dependem unicamente
do salário real (W/P), que se supõe ser conhecido por todos. Além disso, supõe-se que o
mercado de trabalho esteja sempre em equilíbrio, com um salário monetário perfeitamente
flexível que se ajusta para igualar oferta e demanda.
Esses pressupostos clássicos resultam em uma curva de oferta agregada vertical (veja a Seção
3.5). Com os pressupostos clássicos, a curva de oferta agregada seria dada por Ys0 na Figura 8.4;
o produto seria determinado pela oferta. Fatores como mudanças nos gastos do governo,
impostos e oferta de moeda, que deslocam a curva de demanda, não afetariam o produto de
equilíbrio2.
Esta análise mostra que a teoria clássica da oferta agregada baseada na caracterização
clássica de mercado de leilão para o mercado de trabalho é fundamentalmente incompatível
com o sistema keynesiano. A característica central da análise keynesiana é a teoria da demanda
agregada. Com os pressupostos clássicos sobre a oferta agregada, que levam à curva de oferta
vertical, não há papel nenhum para a demanda agregada na determinação do produto e do
emprego. Por isso, foi necessário que Keynes e seus seguidores se opusessem aos pressupostos
clássicos e desenvolvessem uma teoria keynesiana do lado da oferta.
8.3 Uma visão contratual do mercado de trabalho
Keynes acreditava que o salário monetário não se ajustaria suficientemente para manter a
economia em um nível de pleno emprego. No sistema clássico, tanto a oferta como a demanda
por trabalho são funções do salário real e a intersecção das curvas de oferta e de demanda de
trabalho determina um salário real e um nível de emprego de equilíbrio. As negociações
salariais, no entanto, são definidas em termos de salários monetários, e um pressuposto crucial
do modelo clássico é que o salário monetário é perfeitamente flexível.

8.3.1 Fontes de rigidez dos salários


A teoria keynesiana oferece uma série de razões pelas quais o salário monetário não se
ajustará rapidamente, em especial para baixo, a fim de manter o equilíbrio no mercado de
trabalho. As mais importantes dessas explicações para a rigidez dos salários monetários são as
seguintes.
1. Keynes afirmava que os trabalhadores estão interessados tanto em seu salário relativo
como em seu salário absoluto. Existe em qualquer mercado de trabalho um conjunto de
diferenciais salariais entre trabalhadores com diferentes áreas de atuação e especializações. Boa
parte do trabalho de negociação salarial é feita para chegar a uma estrutura de salário relativa
que seja aceitável tanto para os trabalhadores como para os empregadores. Os diferenciais
salariais podem ser medidos pelos salários monetários relativos, porque mudanças nos níveis de
preços afetam todos os salários simetricamente.
Keynes acreditava que os trabalhadores resistiriam a cortes nos salários mesmo quando a
demanda por trabalho caísse. Eles veriam os cortes salariais como mudanças injustas na
estrutura de salários relativos. Os trabalhadores de uma firma ou setor não teriam nenhuma
garantia de que, se aceitassem uma redução dos salários monetários, os trabalhadores de outros
setores do mercado de trabalho fariam o mesmo. Um declínio do salário real como resultado de
uma elevação dos preços, por sua vez, não seria percebido pelos trabalhadores como algo que
afetasse a estrutura dos salários relativos. Por essa razão, Keynes acreditava que declínios nos
salários reais causados por aumentos nos níveis de preços encontrariam muito menos resistência
por parte dos trabalhadores do que uma queda equivalente nos salários reais decorrente de um
corte nos salários monetários.
2. Outro fator que leva a rigidez no nível dos salários monetários é institucional. No setor
sindicalizado do mercado de trabalho, os salários são definidos por contratos trabalhistas, que
geralmente fixam o nível do salário monetário para toda a duração do contrato. O salário
monetário não responderá a eventos como declínio na demanda por trabalho enquanto durar o
contrato. A indexação do salário monetário estabelecida no contrato (isto é, disposições que
vinculam mudanças no salário monetário a mudanças nos níveis de preços) proporciona alguma
flexibilidade ao salário monetário durante a vigência do contrato. Nos Estados Unidos, porém,
quando existe alguma indexação em contratos de trabalho, ela geralmente é incompleta. Assim,
contratos de salários monetários fixos conferem rigidez aos salários monetários. Depois que um
contrato de trabalho desse tipo é assinado, a decisão de quanta mão de obra contratar é do
empregador. A função oferta de trabalho não tem mais influência na determinação do emprego.
A firma contrata a quantidade de trabalho maximizadora do lucro pelo salário monetário fixo.
3. Mesmo em segmentos do mercado de trabalho em que nenhum contrato explícito fixa o
salário monetário, há com frequência um acordo implícito entre empregador e empregado que
fixa o salário monetário durante um período de tempo. Em particular, esses contratos implícitos
impedem os empregadores de reduzir salários diante de uma queda da demanda por seus
produtos e um consequente declínio na demanda por trabalho. O incentivo para que os
empregadores tentem obter esses cortes salariais, ou alternativamente, para que não contratem
trabalhadores entre o conjunto de desempregados que poderiam estar dispostos a trabalhar por
um salário mais baixo, é o desejo de manter uma reputação de bom empregador. As firmas
talvez pudessem obter um ganho temporário forçando um corte nos salários monetários para
reduzir os custos do trabalho, mas esse ganho poderia ser superado pelo efeito das más relações
de trabalho com os empregados atuais e dificuldade para contratar novos empregados. Os
keynesianos acreditam que as convenções dos mercados de trabalho são tais que as firmas
consideram de seu interesse diminuir o número de horas da semana de trabalho ou promover
dispensas de empregados para reagir a quedas na demanda em vez de tentar reduzir os salários
monetários.
Os keynesianos acreditam que os acordos contratuais são fundamentais para compreender
como os mercados de trabalho modernos funcionam. A visão contratual do mercado de trabalho
contrasta com a visão sem atritos do mercado de leilão dos economistas clássicos. Na concepção
keynesiana, conforme expresso por Arthur Okun,

Salários não são definidos para equilibrar mercados no curto prazo; eles são fortemente
condicionados por considerações de prazo mais longo envolvendo… relações empregador-
empregado. Esses fatores isolam os salários… em um grau significativo do impacto de
mudanças na demanda, de modo que os ajustes devem ser feitos no emprego e no produto.3

PERSPECTIVA 8.1 - AJUSTES DE PREÇOS E QUANTIDADES NA


GRÃ-BRETANHA, 1929-1936
A noção de Keynes de que o salário monetário não se ajustaria rapidamente para equilibrar o mercado de trabalho foi em
parte resultado de sua observação dos acontecimentos na Grã-Bretanha. A Tabela 8.1 apresenta dados sobre salário
monetário, nível de preços, salário real e taxa de desemprego na Grã-Bretanha entre os anos de 1929 e 1936.
O salário monetário caiu durante a primeira parte do período, mas apenas 5% até 1933. Depois de 1933, o salário
monetário subiu lentamente apesar da taxa de desemprego excepcionalmente alta. Os dados de níveis de preços, salário
real e taxa de desemprego indicam claramente que não ocorreu nenhum ajuste para baixo no salário real – o ajuste clássico
do mercado de trabalho – para equilibrar o mercado de trabalho.

Tabela 8.1 - Salários, preços e desemprego na Grã-Bretanha, 1929-1936


Fonte: MITCHELL, B. P.; DEANE, P. Abstract of British historical statistics. Cambridge: Cambridge University Press,
1962. p. 67 e 345.

8.3.2 Um modelo de preços flexíveis e salário monetário fixo


Para representar essa visão contratual do mercado de trabalho, consideramos que, embora os
preços sejam livres para variar, o salário monetário é fixo.4 Um salário monetário fixo é uma
versão extrema de salário rígido, e os economistas keynesianos não acreditam que o salário
monetário seja completamente rígido. Ainda assim, se a resposta do salário monetário às
condições do mercado de trabalho for lenta para se materializar, como a abordagem contratual
do mercado de trabalho sugere, os resultados baseados no pressuposto de um salário monetário
fixo serão aproximadamente corretos para o curto prazo.
Por fim, antes de analisarmos esse modelo de preços flexíveis e salários monetários fixos, é
preciso ressaltar que a preocupação de Keynes era com a rigidez dos salários monetários em
relação a reduções, ou seja, a dificuldade de que os salários monetários caíssem o suficiente para
restaurar o pleno emprego. As principais situações a que poderíamos aplicar o modelo de
salários fixos são aquelas em que há um excesso de oferta de trabalho.
Com o salário monetário fixo e a oferta de trabalho maior do que a demanda por trabalho, o
emprego efetivo será determinado pela demanda. As firmas poderão contratar a quantidade de
trabalho que demandarem pelo salário vigente. Keynes não fazia objeções à teoria clássica da
demanda por trabalho. De acordo com essa teoria, a firma maximizadora do lucro demanda
trabalho até o ponto em que o salário real (W/P) é igual à PMgN ou, equivalentemente, o ponto
em que

O salário monetário é igual ao valor monetário do produto marginal (a receita marginal com o
produto) do trabalho. Uma vez que, com um excesso de oferta de trabalho e um salário
monetário fixo, o emprego depende apenas da demanda por trabalho, a determinação do
emprego é como ilustrado na Figura 8.5. Com um salário monetário fixo W, a demanda por
trabalho e, portanto, o emprego serão N0.
A curva de oferta de trabalho é mostrada na Figura 8.5 como uma linha tracejada. Note-se
que, com o salário monetário fixo (W), a curva de oferta de trabalho está à direita de N0,
indicando um excesso de oferta de trabalho. A demanda, não a oferta, é o fator limitante do
emprego. A curva de oferta de trabalho não exerce nenhuma influência e não é mostrada nas
figuras subsequentes desta seção. As propriedades da função oferta de trabalho keynesiana são
explicadas na próxima seção, onde analisamos um modelo keynesiano em que o salário
monetário é livre para variar.

FIG 8.5 Emprego com um salário monetário fixo

Com o salário monetário fixo em W, o emprego estará em N0, a quantidade de trabalho demandada.

A posição da curva de demanda por trabalho, a curva que dá o valor monetário do PMgN
correspondente a cada nível de emprego (a curva PMgN · P0 na Figura 8.5), depende do nível de
preços. O número de trabalhadores que a firmas contratarão e, em consequência, a quantidade de
produto que elas ofertarão dependem do nível de preços. Essa relação entre produto ofertado e o
nível de preços é desenvolvida na Figura 8.6.
A Figura 8.6a mostra o nível de emprego resultante em três níveis de preços sucessivamente
mais altos, P0, P1 e P2, com o salário monetário fixo em W. Um aumento no nível de preços (de
P0 para P1, depois de P1 para P2) aumentará o valor monetário do PMgN correspondente a
qualquer nível de emprego e, portanto, aumentará a demanda por trabalho para um dado salário
monetário. A curva de demanda por trabalho (PMgN · P) desloca-se para a direita e o emprego
aumenta. Conforme o emprego aumenta, vemos na Figura 8.6b, onde traçamos a função
produção agregada que dá o nível de produto para cada nível de emprego, que o produto também
aumenta.
A Figura 8.6c combina as informações das Figuras 8.6a e 8.6b para mostrar o produto
ofertado em cada nível de preços. Preços mais altos resultam em oferta maior; a função oferta
agregada tem inclinação positiva. Em um determinado nível de renda (Yf na Figura 8.6c), o
pleno emprego seria atingido e novos aumentos dos preços não teriam efeito sobre o produto. A
curva de oferta agregada torna-se vertical nesse nível.
Abaixo do nível de pleno emprego, a curva de oferta não será vertical; deslocamentos da
curva de demanda agregada alterarão o nível do produto. Os efeitos de um aumento da oferta de
moeda e os efeitos de um aumento dos gastos do governo são ilustrados nas Figuras 8.7 e 8.8,
respectivamente.

FIG 8.6 A curva de oferta agregada keynesiana quando o salário monetário é fixo
A parte a mostra os níveis de emprego N0, N1 N2 para três níveis de preços sucessivamente mais altos, P0, P1 P2. A parte b
mostra os níveis de produto, Y0, Y1, Y2, que serão produzidos nesses três níveis de emprego. Na parte c, juntamos as informações
de a e b para mostrar o produto ofertado em cada um dos três níveis de preços. Note-se que, a níveis de preços mais altos, o
emprego, e, assim, o produto ofertado aumentam; a curva de oferta agregada (Ys) tem inclinação positiva.

Na Figura 8.7a, um aumento da oferta de moeda desloca a curva LM de LM(M0/P0) para


LM(M1/P0). Esse deslocamento da curva LM é um resultado direto da mudança na oferta de
moeda. O aumento da oferta de moeda desloca a curva de demanda agregada para a direita na
Figura 8.7b, de Yd(M0) para Yd(M1). No nível de preços inicial P0, o produto aumentaria para
Y’1, como mostrado na Figura 8.7. Mas, para o produto aumentar, o nível de preços precisa subir
e o novo equilíbrio é alcançado não em Y’1, mas em Y1, onde o nível de preços subiu para P1. O
aumento dos preços desloca a curva LM na Figura 8.7a para LM(M1/P1).

FIG 8.7 Efeitos de um aumento da oferta de moeda quando o nível de preços é flexível
Um aumento da oferta de moeda desloca a curva LM de LM(M0/P0) para LM(M1/P0) (parte a) e desloca a curva de demanda
agregada de Yd(M0) para Yd(M1) (parte b). O aumento da demanda agregada faz o produto subir de Y0 para Y1 e o nível de
preços subir de P0 para P1. O aumento do nível de preços desloca a curva LM de LM(M1/P0) para LM(M1/P1).

FIG 8.8 Efeitos de um aumento dos gastos do governo quando o nível de preços é flexível
Um aumento dos gastos governamentais desloca a curva IS de IS(G0) para IS(G1) (parte a) e desloca a curva de demanda
agregada de Yd(G0) para Yd(G1) (parte b). O aumento da demanda agregada faz o produto subir de Y0 para Y1 e o nível de preços
subir de P0 para P1. O aumento do nível de preços desloca a curva LM de LM(M0/P0) para LM(M0/P1).

Assim, encontramos o mesmo tipo de resultados keynesianos de um aumento da oferta de


moeda que no modelo IS-LM com preços fixos do Capítulo 7. O produto e o emprego
aumentarão e a taxa de juros cairá, de r0 para r1, na Figura 8.7a. Quando o nível de preços é
livre para variar, o aumento do produto é menor do que quando o nível de preços é fixo. O
produto sobe para Y1 em vez de Y’1. A razão é que o aumento do nível de preços reduz a oferta
real de moeda (M/P) e essa redução compensa parcialmente os efeitos do aumento da oferta
nominal de moeda. A taxa de juros cai apenas para r1, não para r’1. Como consequência, essa
ação de política monetária expansionista tem um efeito menor sobre o investimento e, assim,
sobre o produto.
A situação é bem parecida para a política fiscal. Os resultados são keynesianos no sentido de
que a política fiscal não afeta o produto, mas, novamente, o efeito de uma dada ação de política
é menor em magnitude quando o nível de preços é variável do que quando o nível de preços é
fixo. Os efeitos de um aumento dos gastos governamentais são ilustrados na Figura 8.8.
Um aumento dos gastos governamentais desloca a curva IS de IS(G0) para IS(G1) na Figura
8.8a. O aumento dos gastos governamentais não tem nenhum efeito direto sobre a curva LM,
que é inicialmente dada por LM(M0/P0). O aumento da demanda agregada quando a curva IS
desloca-se para a direita é refletido na Figura 8.8b no deslocamento da curva de demanda
agregada de Yd(G0) para Yd(G1). O produto sobe para Y1 e o nível de preços sobe para P1. O
aumento do nível de preços reduz a oferta real de moeda (M/P), fazendo a curva LM deslocar-se
de LM(M0/P0) para LM(M0/P1) na Figura 8.8a. O produto sobe apenas para Y1 e não para Y’1,
que é o aumento no produto que teria ocorrido se o nível de preços permanecesse fixo.
Não são apenas efeitos de políticas econômicas que permanecem keynesianos quando
consideramos um nível de preços flexível; os efeitos de choques na economia também ficam
qualitativamente inalterados. Mudanças no investimento autônomo e choques na preferência
pela liquidez (demanda por moeda) continuam a afetar o produto e o emprego. Em particular,
uma corrida por liquidez como foi observada na crise financeira de 2007-2009 seria representada
no modelo por um aumento na demanda por moeda. Esse choque teria os efeitos exatamente
opostos aos de um aumento na oferta de moeda ilustrado na Figura 8.7. A demanda agregada
cairia, assim como o preço e o produto.

8.4 A oferta de trabalho e a variabilidade do salário monetário


Nesta seção, trazemos a oferta de trabalho para o cenário. Examinaremos as diferenças entre
as concepções keynesiana e clássica da oferta de trabalho e, depois, um modelo keynesiano em
que tanto o nível de preços como os salários monetários podem variar.

8.4.1 Teorias clássica e keynesiana da oferta de trabalho


Os economistas clássicos acreditavam que a oferta de trabalho dependia positivamente do
salário real,

Uma elevação do salário real aumenta a renda que pode ser ganha com uma hora de trabalho
ou, em outros termos, aumenta o custo de oportunidade de ter uma hora de lazer. Em
consequência, um aumento do salário real aumenta a oferta de trabalho.
A teoria keynesiana da oferta de trabalho começa com a observação de que a negociação
salarial é feita em termo do salário monetário, não do salário real. A teoria clássica pressupõe
que os ofertantes de trabalho (trabalhadores) conhecem o nível de preços (P) e o salário
monetário (W) e, portanto, conhecem o salário real (W/P). Os keynesianos argumentam que,
como a negociação salarial é em termos do salário monetário, podemos pressupor que os
trabalhadores conhecem o salário monetário, mas não o nível de preços. Como foi explicado
anteriormente, por meio de contratos implícitos ou explícitos os trabalhadores concordam em
fornecer seus serviços durante um determinado período, digamos, por um ano. Eles não têm
como saber qual será o valor do nível agregado de preços ao longo do ano seguinte. É esse nível
de preços que determinará o poder de compra de qualquer salário monetário que eles aceitarem
em uma negociação salarial no momento atual. Como consequência, os keynesianos acreditam
que decisões sobre oferta de trabalho dependem do salário monetário vigente e da expectativa do
nível agregado de preços. Além disso, para os keynesianos, as expectativas dos trabalhadores
sobre o nível de preços dependeriam, basicamente, do comportamento anterior dos preços.
Para entender as implicações da noção keynesiana de que os trabalhadores negociam um
salário monetário real com informações apenas imperfeitas sobre os preços, construímos uma
curva de oferta de trabalho keynesiana, que comparamos com a curva de oferta de trabalho
clássica [equação (8.4)]. Consideramos, em seguida, um modelo em que o salário monetário é
perfeitamente flexível, mas a oferta de trabalho é dada pela função oferta de trabalho
keynesiana. Nessa análise, deixamos de fora os fatores citados anteriormente que os keynesianos
acreditam ser as causas da rigidez do salário monetário. Uma das finalidades desta análise é
mostrar que, usando a curva de oferta de trabalho keynesiana, mesmo que o salário monetário
fosse perfeitamente flexível a curva de oferta agregada não seria vertical. O produto e o emprego
não seriam inteiramente determinados pela oferta; a demanda agregada também teria influência.
Na realidade, os keynesianos acreditam que o salário monetário é rígido na direção para baixo e
que grande parte do desemprego é resultado da não-contribuição do salário monetário para
equilibrar o mercado de trabalho. As informações incompletas sobre preços são, porém, um fator
adicional que, segundo os keynesianos, explica flutuações no produto e no emprego.
A função oferta de trabalho keynesiana pode ser escrita como

Um aumento do salário monetário (W) para um dado valor do nível de preços esperado (Pe)
aumentaria a oferta de trabalho, porque seria visto pelos trabalhadores como um aumento do
salário real. Um aumento no nível de preços esperado faria a oferta de trabalho declinar.
Fundamentalmente, os trabalhadores estão interessados no salário real, não no salário monetário,
e reduzem sua oferta de trabalho quando percebem que o salário real diminuiu. A diferença entre
as funções oferta de trabalho clássica e keynesiana é que, na versão keynesiana, os trabalhadores
precisam formar uma expectativa do nível de preços. A oferta de trabalho, portanto, depende do
salário real esperado. No sistema clássico, os trabalhadores conhecem o salário real; a oferta de
trabalho depende do salário real efetivo.
A teoria da oferta de trabalho keynesiana é incompleta sem um pressuposto sobre como os
trabalhadores formam uma expectativa do nível de preços (Pe). O pressuposto keynesiano é que
essas expectativas de preços baseiam-se principalmente no comportamento passado do nível de
preços. Assim

em que P–i (i = 1, 2, 3…) é o nível de preços de i períodos anteriores e a1, a2, …, an são os pesos
dados a um número de observações passadas sobre o nível de preços na formação da expectativa
do nível de preços atual. Há sem dúvida informações adicionais que poderiam ser úteis para a
previsão acurada do comportamento dos preços. O pressuposto keynesiano é que o custo de
coletar e processar essas informações adicionais é alto o bastante para que as expectativas de
preços dos ofertantes de trabalho possam ser representadas com razoável precisão por uma
formulação simples como a equação (8.6). Como veremos adiante, esse pressuposto não é imune
a questionamentos.
De acordo com a equação (8.6), as expectativas de preços são essencialmente retrospectivas,
ajustando-se ao comportamento passado do nível de preços. Além disso, na visão keynesiana, há
uma inércia considerável nesse processo de ajuste; as expectativas de preços ajustam-se
lentamente ao comportamento passado do nível de preços. Se esse for o caso, as expectativas de
preços não mudam como resultado das condições econômicas correntes. Ao analisar os efeitos
de várias mudanças de política econômica, por exemplo, podemos considerar Pe constante. No
prazo mais longo (depois de transcorridos muitos períodos curtos), teremos de levar em conta
como as políticas de estabilização afetam Pe.

8.4.2 A curva de oferta agregada keynesiana com salários monetários


variáveis
A Figura 8.9 ilustra a construção da curva de oferta agregada quando a oferta de trabalho é
dada pela equação (8.5) e supõe que o salário monetário ajuste-se para igualar a oferta e a
demanda por trabalho. Na Figura 8.9a, a oferta de trabalho (Ns) e a demanda por trabalho são
representadas como funções do salário monetário. Como na análise anterior, a demanda por
trabalho depende do salário real; considera-se que as firmas saibam o nível de preços em que
poderão vender seus produtos. A curva de demanda por trabalho será deslocada para a direita
com um aumento do nível de preços. A Figura 8.9a mostra as curvas de demanda por trabalho
para três níveis de preços sucessivamente mais altos: P0, P1 e P2, respectivamente.
A curva de oferta de trabalho é traçada para um dado valor do nível agregado de preços
esperado. Como acabamos de explicar, esse nível de preços esperado é considerado fixo no
curto prazo. Com a curva de oferta de trabalho fixa, aumentos no nível de preços deslocam a
curva de demanda por trabalho ao longo da curva de oferta, de modo que, para um nível de
preços mais alto, os níveis de equilíbrio do emprego e do salário monetário aumentam. O
processo em ação aqui é o seguinte. O aumento dos preços (de P0 para P1, por exemplo) causa
um excesso de demanda por trabalho pelo salário monetário antigo (W0). O salário monetário é
aumentado e, para um dado valor de Pe, um aumento do salário monetário faz com que mais
trabalhadores aceitem empregos (ou aumentem o número de horas de trabalho nos empregos
existentes); o nível de emprego sobe.
Aos níveis de emprego mais altos N1 e N2, correspondentes aos níveis de preços mais altos P1
e P2, o produto é maior nos níveis mostrados por e Y1 e Y2 na Figura 8.9b. Assim, um nível de
preços mais alto corresponde a um nível maior de produto ofertado. Essa informação reflete-se
na curva de oferta agregada de inclinação positiva na Figura 8.9c, que mostra o produto ofertado
para cada nível de preços.

8.4.3 Efeitos de políticas econômicas no modelo keynesiano de


salário variável
Como a curva de oferta agregada keynesiana com salário variável ainda tem inclinação
positiva (não é vertical), mudanças na demanda agregada que desloquem a curva de demanda
agregada afetarão o produto. Aumentos na oferta de moeda ou no nível dos gastos do governo
deslocarão a curva de demanda agregada para a direita, aumentando tanto o produto como o
nível agregado de preços. As ilustrações gráficas dessas mudanças de política econômica são
qualitativamente iguais às das Figuras 8.7 e 8.8.
Vamos supor que comparemos os efeitos sobre o preço e o produto de uma dada alteração na
demanda agregada quando o salário monetário é variável com os efeitos no caso em que o
salário monetário é fixo. Há uma diferença quantitativa previsível? A resposta é sim. Quando o
salário monetário é variável, um determinado aumento na demanda agregada fará o produto
aumentar menos do que quando o salário monetário é fixo. Quando o salário monetário é
variável, um aumento na demanda agregada fará o nível de preços aumentar mais do que quando
o salário monetário é fixo. A razão para esses resultados é que a curva de oferta agregada
quando o salário monetário varia é mais inclinada do que quando o salário monetário é fixo.
Quando a curva de demanda agregada é deslocada para a direita ao longo da curva de oferta
agregada mais inclinada, o aumento da demanda resulta menos em aumento do produto e mais
em aumento dos preços.

FIG 8.9 A curva de oferta agregada keynesiana quando o sálario monetário é variável
A parte a mostra os níveis de equilíbrio do emprego N0, N1, N2, correspondentes a valores sucessivamente mais altos do nível de
preços, P0, P1, P2. A parte b dá o nível de produto, Y0, Y1, Y2, que será produzido em cada um desses níveis de emprego. A
parte c combina as informações das partes a e b para mostrar a relação entre o nível de preços e o produto ofertado. Em valores
mais altos do nível de preços, o produto ofertado aumenta; como no caso dos salários fixos, a curva de oferta agregada (Ys) tem
inclinação positiva.

FIG 8.10 Curvas de oferta agregada keynesianas para os casos de salários monetários fixos e
variáveis
A curva de oferta agregada na parte c para o caso em que o salário monetário é variável [Ys (W variável)] é mais inclinada do que
quando o salário monetário é fixo [Ys (W = W)], porque o aumento do emprego (parte a) com uma elevação dos preços e,
portanto, o aumento do produto (parte b) são menores quando o salário monetário é variável do que quando ele é fixo. Esse
resultado acontece porque o aumento do salário monetário no caso dos salários variáveis ameniza o efeito de um aumento do
nível de preços sobre o emprego e o produto.

A razão para que a curva de oferta agregada seja mais inclinada no caso dos salários monetários
variáveis é ilustrada na Figura 8.10. Na Figura 8.10a, é mostrada a resposta do mercado de
trabalho a um aumento no nível de preços para os casos de salários monetários fixos e variáveis.
Se o salário monetário for fixo em W = W0, um aumento no nível de preços de P0 para P1
desloca a curva de demanda por trabalho de PMgN · P0 para PMgN · P1 e o emprego sobe de N0
para N1 Lembremos da seção anterior que, no caso do salário monetário fixo, pressupomos que
há um excesso de oferta de trabalho. A curva de oferta de trabalho nesse caso, Ns (W = W)], fica
à direita de N0 em W (como na Figura 8.5). A oferta de trabalho não representa uma limitação ao
emprego, que é determinado unicamente pela demanda por trabalho. Para esse caso de (W = W),
pode-se ver pela Figura 8.10b que o produto ofertado sobe de Y0 para Y1. A curva de oferta
agregada é dada por Ys (W = W) na Figura 8.10c.
Com um salário monetário variável, quando a curva de demanda por trabalho desloca-se de
PMgN · P0 para PMgN · P1 como resultado do aumento dos preços, o emprego sobe apenas para
N’1. Aqui, estamos pressupondo que não haja um excesso inicial de oferta de trabalho. Em W0, a
demanda por trabalho é igual à oferta ao longo da curva de oferta de trabalho Ns (W variável). O
salário monetário precisa subir de W0 para W1 W1 para aumentar a oferta de trabalho. Esse
aumento do salário monetário amortece o efeito do aumento da demanda por trabalho. Como o
emprego aumenta menos do que no caso do salário fixo, o produto ofertado também aumenta
menos, subindo apenas para Y’1, como é mostrado na Figura 8.10b. O aumento do nível de
preços leva a um aumento menor do produto ofertado e essa relação é refletida na curva de
oferta agregada mais inclinada no caso do salário monetário variável, como mostrado na Figura
8.10c, a curva Ys (W variável).
Neste ponto, é útil tirar algumas conclusões a partir das duas seções anteriores sobre como a
flexibilidade de preços e salários afeta as implicações de política econômica no sistema
keynesiano. Na Seção 8.3, vimos que, quando se considerava um nível de preços variável (com
o salário monetário ainda fixo), os multiplicadores das políticas diminuíam em relação a seus
valores no modelo IS-LM simples do Capítulo 7, em que tanto o nível de preços como os
salários monetários eram fixos. Nesse modelo IS-LM simples, o pressuposto era que a curva de
oferta agregada fosse horizontal. A oferta não representava uma barreira para o aumento do
produto. No modelo da Seção 8.3, levamos em conta o fato de que, em circunstâncias normais, à
medida que o produto aumenta, o PMgN diminui. Como o custo unitário de produzir unidades
adicionais de produto é o salário monetário dividido pelo PMgN, as firmas só ofertarão um
produto maior a um preço mais alto – mesmo que o salário monetário seja fixo. A curva de
oferta agregada tinha inclinação positiva e, portanto, aumentos da demanda agregada tinham
efeitos menores sobre o produto do que com a curva de oferta agregada horizontal.
Quando se considera que o salário monetário também seja variável, a curva de oferta
agregada correspondente fica mais inclinada. Agora, conforme o produto aumenta, não só o
PMgN declina, causando um aumento nos custos unitários (W/PMgN), como o aumento do
salário monetário necessário para induzir os trabalhadores a ofertar mais trabalho também
empurrará para cima o custo unitário. Como resultado, qualquer aumento do produto ofertado
requer um aumento maior do preço; a curva de oferta agregada é mais inclinada. Variações na
demanda agregada têm efeitos ainda menores sobre o produto.
No sistema clássico, a curva de oferta agregada era vertical; o produto era completamente
determinado pela oferta. O preço e o salário eram considerados perfeitamente flexíveis. No
modelo IS-LM simples, o produto era completamente determinado pela demanda. Os preços e
salários eram considerados completamente rígidos. Os modelos destas duas seções, ao introduzir
a flexibilidade de preços e salários no sistema keynesiano, aproximaram os resultados
keynesianos dos resultados do modelo clássico.

8.5 Os efeitos de deslocamentos da curva de oferta agregada


Até aqui em nosso desenvolvimento da teoria keynesiana da oferta agregada, focalizamos
como a inclusão de fatores de oferta na análise muda o papel da demanda agregada na
determinação do produto. Os efeitos sobre o produto e o emprego de mudanças na demanda
agregada – deslocamentos da curva de demanda agregada – dependem da inclinação da curva de
oferta agregada. Além disso, fatores da oferta têm um papel independente na determinação do
produto e do emprego. Podem ocorrer deslocamentos da curva de oferta agregada e esses
deslocamentos afetarão o produto, o emprego e o nível de preços.
Deslocamentos da curva de oferta agregada tiveram, algumas vezes, um papel importante na
explicação keynesiana de movimentos nos preços, produto e emprego. Na verdade, se
deslocamentos da curva de oferta agregada não forem levados em conta, o comportamento do
preço, produto e emprego nos Estados Unidos durante a década de 1970 não podem ser
explicados dentro de um modelo keynesiano. Para entender por quê, consideremos os dados da
Tabela 8.2. Observemos que, enquanto o deflator do PNB aumentou substancialmente em todos
os anos entre 1973 e 1981, o produto real caiu em 3 desses anos. Na verdade, o produto caiu em
3 dos 4 anos mais inflacionários.
Esse padrão de mudanças de preço e produto não é coerente com o modelo keynesiano a
menos que sejam levados em conta deslocamentos da curva de oferta agregada. Consideremos a
Figura 8.11. Na parte a, movimentos no produto e no preço são causados por deslocamentos da
curva de demanda agregada (de Yd0 para Yd1 depois para Yd2). Nesse caso, aumentos nos preços
(de P0 para P1, depois para P2) seriam acompanhados de aumentos no produto (de Y0 para Y1,
depois para Y2). A curva de demanda desloca-se para a direita ao longo da curva de oferta fixa
de inclinação positiva, aumentando tanto o preço como o produto. Deslocamentos para a
esquerda da curva de demanda agregada fazem produto e preços caírem. Portanto,
deslocamentos da curva da demanda agregada não explicam o comportamento dos preços e do
produto nos Estados Unidos em anos como 1974, 1975 e 1980, em que o produto caiu, mas os
preços subiram.

Tabela 8.2 - Taxas de crescimento percentual do PNB real e do deflator de preços do PNB nos
Estados Unidos, 1973-1981

Ano Crescimento Aumento


do PNB real do deflator do
PNB
1973 5,8 5,8
1974 –0,6 8,8
1975 –1,2 9,3
1976 5,4 5,2
1977 5,5 5,8
1978 5,0 7,4
1979 2,8 8,6
1980 –0,3 9,2
1981 2,5 9,6

Na Figura 8.11b, podemos ver que deslocamentos para a esquerda da curva de oferta
agregada (de Ys0 para Ys1 e para Ys2) resultariam em aumentos de preços (de P0 para P1, depois
para P2) associados a declínios do produto (de Y0 para Y1, depois para Y2). Esses “choques de
oferta” poderiam explicar as recessões inflacionárias da economia americana na década de 1970,
períodos em que o produto declinou e os preços subiram.

FIG 8.11 Variações do preço e do produto com deslocamentos da demanda agregada e da


oferta agregada

Se as mudanças no produto fossem resultado de deslocamentos da curva de demanda agregada ao longo de uma curva de oferta
fixa, como na parte a, esperaríamos uma relação positiva entre mudanças nos preços e no produto. Por outro lado, se as mudanças
no produto resultassem de deslocamentos da curva de oferta agregada ao longo de uma curva de demanda fixa, como na parte b,
esperaríamos uma associação negativa entre mudanças nos preços e no produto.

8.5.1 Fatores que deslocam a curva de oferta agregada


Resta ainda a questão do que causa os deslocamentos da curva de oferta agregada – a
natureza dos choques de oferta. Lembremos que os pontos da curva de oferta agregada dão o
produto desejado das firmas para cada nível agregado de preços. Cada firma e, portanto, as
firmas no agregado escolherão o nível de produto que maximiza os lucros. Isso significa, como
foi discutido no Capítulo 3, que as firmas produzem até o ponto em que o preço (P) é igual ao
custo marginal (CMg):

CMg é o acréscimo ao custo total como resultado do aumento do uso de fatores de produção
variáveis a fim de aumentar o produto. Em nossa análise anterior, consideramos que o trabalho
fosse o único fator de produção variável. Nesse caso, o CMg de produzir uma unidade adicional
de produto era o salário monetário (W), a quantia paga por uma unidade adicional de trabalho,
dividido pelo PMgN. O custo marginal (W/PMgN) aumentava conforme o produto crescia,
porque, quando mais trabalho era contratado, o PMgN declinava. Além disso, no modelo de
salários variáveis da seção anterior, para que os trabalhadores ofertassem trabalho adicional era
preciso aumentar o salário monetário, o que era mais um fator que levava o custo marginal a
subir com o aumento do produto. Esses dois fatores, o declínio do PMgN e a crescente pressão
de alta sobre os salários monetários quando o produto e o emprego aumentam, explicam por que
a curva de oferta agregada tem inclinação positiva.
Um deslocamento da curva de oferta agregada – por exemplo, um deslocamento para cima e
para a esquerda, como na Figura 8.11b – significa que, depois do deslocamento, as firmas
produzirão menos para um dado preço ou, em outros termos, as firmas acharão que a posição
ótima é continuar a produzir o mesmo produto, só que a um preço mais alto. Pela condição (8.7)
é possível ver que qualquer fator que faça o CMg aumentar para um nível inalterado de produto
produzirá esse deslocamento para cima e para a esquerda da curva de oferta agregada. Se o CMg
aumentar para um dado nível de produto, para continuar a atender a condição (8.7) sem
alteração de preços a firma terá de diminuir a produção. À medida que o produto diminui, o
CMg declinará (PMgN subirá e W cairá) e a igualdade (8.7) pode ser restabelecida.
Alternativamente, o preço teria de subir um valor equivalente ao aumento do CMg para que a
firma achasse ótimo continuar a produzir o mesmo nível de produto.
Isso é só metade da história; a próxima tarefa é determinar os fatores que alterarão o CMg
para um dado nível de produto. Esses fatores são muitas vezes chamados de fatores
pressionadores de custos, porque afetam o preço independentemente do nível de demanda,
atuando pelo deslocamento da curva de oferta. Um dos conjuntos de fatores pressionadores de
custos afeta as demandas por salários monetários por parte dos trabalhadores em um
determinado nível de emprego; esses são fatores que deslocam a curva de oferta de trabalho
conforme mostrado, por exemplo, na Figura 8.9. Até aqui, examinamos um fator que desloca a
curva de oferta de trabalho: uma mudança nas expectativas dos trabalhadores em relação ao
nível agregado de preços (Pe).
Na seção anterior, consideramos que o nível de preços esperado pelos trabalhadores
dependesse do comportamento passado dos preços e, portanto, que fosse fixo no curto prazo. Ao
longo do tempo, porém, conforme novas informações forem recebidas, os trabalhadores
ajustarão sua expectativa de preços. A Figura 8.12 mostra o efeito sobre as curvas de oferta de
trabalho e de oferta agregada de um aumento das expectativas dos trabalhadores sobre o nível
agregado de preços.

FIG 8.12 Deslocamento da curva de oferta agregada com um aumento do nível esperado de
preços
Um aumento do nível esperado de preços desloca a curva de oferta de trabalho para a esquerda, de Ns(Pe0) para Ns(Pe1), na parte
a. A um dado nível de preços, P0, o emprego cai de N0 para N1 e o produto cai de Y0 para Y1 (parte b). Esse declínio do produto
para um dado nível de preços é refletido em um deslocamento para a esquerda da curva de oferta agregada, de Ys(Pe0) para
Ys(Pe1), na parte c.

Vamos supor que, como resultado de aumentos passados observados no nível agregado de
preços, a expectativa dos trabalhadores quanto ao nível de preços corrente aumentasse de Pe0
para Pe1. A curva de oferta de trabalho seria, então, deslocada para a esquerda na Figura 8.12a,
de Ns(Pe0) para Ns(Pe1). Menos trabalho seria ofertado em cada nível de salário monetário
porque, com a expectativa mais alta em relação ao nível agregado de preços, um dado salário
monetário corresponderia a um salário real mais baixo. Ao nível de preços inicial P0, o
deslocamento da curva de oferta de trabalho reduziria o emprego (de N0 para N1). Em
consequência, o produto ao nível de preços P0 c cairia (de Y0 para Y1), como pode ser visto na
Figura 8.12b. A curva de oferta agregada seria deslocada para a esquerda na Figura 8.12c [de
Ys(Pe0) para Ys(Pe1)].
Assim, qualquer fator que desloque a curva de oferta de trabalho para cima e para a esquerda,
reduzindo a oferta de trabalho para um dado salário monetário, ou, o que equivale à mesma
coisa, aumentando o salário monetário em que uma dada quantidade de trabalho será ofertada
desloca a curva de oferta agregada para a esquerda. Se ampliarmos nossa análise para incluir
outros fatores de produção variáveis além do trabalho, observaremos que um aumento autônomo
no preço de qualquer fator de produção variável aumentará o CMg para um dado nível de
produto e deslocará a curva de oferta agregada para a esquerda.
Em particular, aumentos autônomos no preço de matérias-primas têm esse efeito de pressão
sobre os custos. Os keynesianos acreditam que os aumentos na década de 1970 dos preços
mundiais de matérias-primas para produção, em especial insumos de energia, causaram grandes
aumentos nos custos de produção para um dado nível de produto e resultaram em deslocamentos
para a esquerda significativos da curva de oferta agregada, aumentando o nível agregado de
preços doméstico e reduzindo o produto real.
Além dos efeitos diretos de aumentos nos preços de matérias-primas sobre a curva de oferta
agregada, esses choques de oferta têm efeitos indiretos que se manifestam por meio de um efeito
sobre a oferta de trabalho. Aumentos nos preços das matérias-primas – por exemplo, o preço do
petróleo importado e de outros produtos de energia – empurram para cima o nível de preços
doméstico. Quando os preços domésticos sobem e tempo suficiente decorre para que esses
aumentos de preços sejam percebidos pelos ofertantes de trabalho, a expectativa dos
trabalhadores quanto ao nível agregado de preços (Pe) aumenta. Como já foi explicado, esse
aumento no nível esperado de preços causará um deslocamento para a esquerda da curva de
oferta agregada, aumentando ainda mais o nível de preços e causando um declínio adicional do
produto real.
A explicação keynesiana para os grandes aumentos de preços e declínios do produto no
período de 1973-75 e, novamente, em 1979-80 baseia-se nesses efeitos diretos e indiretos de
choques de oferta. O choque de oferta mais importante nesses casos foi um aumento substancial
do preço do petróleo bruto no mercado mundial. A Figura 8.13 mostra o preço do petróleo bruto
em 1970-2010. Os choques de preços na série em 1974 e em 1979-80 são evidentes na figura.
(Os picos mais recentes são discutidos na próxima subseção.) Em 1974, os preços do petróleo
(nominais e reais) quadruplicaram, devido à consolidação do cartel da OPEP (Organização dos
Países Exportadores de Petróleo). Os grandes aumentos de preços em 1979-80 foram resultado
da perturbação do mercado mundial de petróleo que se seguiu à revolução iraniana.
A concepção keynesiana dos efeitos desses choques de oferta é mostrada na Figura 8.14. O
aumento inicial dos preços do petróleo e o aumento do preço de outras fontes de energia (carvão,
gás natural, etc.) resultante da tentativa dos usuários de energia de substituir o petróleo caro por
outros combustíveis, causam um deslocamento da curva de oferta agregada de Ys0(Pe0) para
Ys1(Pe0). O produto declina de Y0 para Y1 e os preços sobem de P0 para P1. Esse é o efeito direto
do choque de oferta. À medida que os preços de produtos relacionados à energia e de todos os
produtos que usam essa energia no processo de produção – uma categoria de abrangência quase
total – aumentam, os ofertantes de trabalho acabam por perceber o aumento nos preços; o nível
esperado de preços sobe (de Pe0 para Pe1). Há um novo deslocamento para a esquerda da curva
de oferta agregada, de Ys1(Pe0) para Ys1(Pe1). Os preços aumentam ainda mais, para P2, e o
produto cai para Y2.

8.5.2 Choques de oferta mais recentes


A Figura 8.13 mostra que o preço do petróleo permaneceu volátil durante o período pós-
1980. Os preços do petróleo caíram acentuadamente nos anos de 1981 a 1986, quando novas
fontes se tornaram disponíveis e o cartel da OPEP enfraqueceu. Esse foi, de fato, um choque de
oferta favorável. Pela simples inversão da análise gráfica da Figura 8.14, podemos ver que esse
choque favorável, na ausência de outras mudanças, reduziria o nível agregado de preços e
aumentaria o produto. Na verdade, durante a primeira metade desse período, houve uma
recessão séria que, na visão keynesiana, foi causada por fatores do lado da demanda. O declínio
do preço do petróleo de fato contribuiu para a queda acentuada da taxa de inflação durante esses
anos.

FIG 8.13 Preços do petróleo bruto (US$), 1970-2010

A grande mudança seguinte nos preços do petróleo aconteceu em agosto de 1990, depois da
invasão do Kuwait pelo Iraque. O preço do petróleo disparou quando a produção de petróleo do
Kuwait foi interrompida e as Nações Unidas determinaram um embargo às exportações de
petróleo iraquiano. O preço do petróleo declinou tão rapidamente quanto havia subido quando
ficou evidente a rápida vitória das forças da ONU no início de 1991. Os efeitos tanto da subida
como da queda dos preços do petróleo podem ser observados no comportamento do índice de
preços ao produtor. O índice aumentou mais de 15% (a taxas anuais) entre agosto e outubro de
1990, depois caiu 5% (novamente a taxas anuais) entre dezembro de 1990 e março de 1991.
O preço do petróleo caiu fortemente no final da década de 1990, chegando a um mínimo de
cerca de US$ 10 por barril em 1999. Essa queda contribuiu para a baixa inflação nos Estados
Unidos e na Europa nos últimos anos dessa década.

FIG 8.14 Efeitos de um aumento autônomo dos preços mundiais de insumos energéticos
Um aumento autônomo dos preços de insumos energéticos desloca a curva de oferta agregada para a esquerda de Ys0 (Pe0) para
Ys1 (Pe0); o produto cai de Y0 parmoeda e, portanto, sobrea Y1 e os preços sobem de P0 para P1 Quando os ofertantes de
trabalho percebem a elevação do nível de preços, o nível esperado de preços sobe de Pe0 para Pe1 A curva de oferta agregada
desloca-se mais para a esquerda, para Ys1 (Pe1). O produto cai para Y2 e o nível de preços sobe para P2.

Na Figura 8.13, é possível ver que o preço do petróleo apresentou tendência de alta durante o
início do século XXI, com um pico de mais de US$ 130 por barril em 2008. Com o início da
crise financeira e a recessão mundial, o preço do petróleo desabou para menos de US$ 40 por
barril, voltando a subir de forma acentuada, para mais de US$ 100 por barril, no final de 2011. A
volatilidade do preço do petróleo e de outras mercadorias básicas continua a ser uma fonte de
instabilidade macroeconômica e um desafio para os formuladores de políticas. No verão de
2008, por exemplo, no pico de alta dos preços do petróleo, o Banco Central Europeu enrijeceu a
política monetária por preocupação com a inflação. Dois meses depois, quando a crise financeira
se intensificou com a falência do Lehman Brothers, o Banco Central apressou-se em reverter o
curso.

FIG 8.15 Curvas de oferta e demanda agregada clássicas e keynesianas


A curva de oferta agregada clássica é vertical, enquanto a curva de oferta agregada keynesiana inclina-se para cima e para a
direita. A curva de demanda agregada clássica depende apenas do nível da oferta de moeda (M0); no sistema keynesiano, a
demanda agregada depende também de variáveis fiscais (G0, T0), do investimento autônomo(I0) e de outras variáveis.

Conclusão

Keynes versus os clássicos


Os Capítulos 5 a 8 analisaram a visão keynesiana da macroeconomia. Quais são as principais
diferenças entre a concepção keynesiana e a teoria macroeconômica clássica a que Keynes se
opôs? Neste capítulo, vimos como o sistema keynesiano pode ser resumido pelas relações entre
a oferta agregada e a demanda agregada. O modelo clássico foi apresentado da mesma maneira
no Capítulo 4. Um modo conveniente de resumir as diferenças entre as teorias keynesiana e
clássica é examinar as diferenças entre as relações de demanda agregada e oferta agregada nos
dois modelos.

Teorias da demanda agregada keynesiana e clássica


O modelo clássico não continha uma teoria explícita da demanda agregada. A teoria
quantitativa da moeda oferecia uma teoria clássica implícita da demanda agregada. Usando a
relação da teoria quantitativa

com o pressuposto de que V é constante, podemos determinar PY para um dado valor de M. Essa
relação produz a hipérbole retangular Yd(M0) traçada na Figura 8.15a para M igual a M0. Essa
era a curva de demanda agregada clássica.
Aumentos da demanda em um setor da economia – demanda do governo ou demanda por
investimentos autônomos, por exemplo – não afetariam a demanda agregada no sistema clássico.
Mudanças em demandas setoriais provocariam ajustes na taxa de juros. A taxa de juros
desempenhava um papel estabilizador no sistema clássico e assegurava que tais mudanças em
demandas setoriais não alterassem a demanda agregada. Apenas fatores monetários deslocam a
curva de demanda agregada clássica.
A curva de demanda agregada keynesiana é mostrada na Figura 8.15b. Embora tanto a curva
de demanda agregada clássica como a keynesiana tenham inclinação negativa, há uma diferença
importante entre elas. Enquanto a curva de demanda agregada clássica só se desloca quando há
variação na oferta de moeda, a posição da curva de demanda agregada keynesiana depende de
variáveis como o nível de gastos do governo (G0), o nível de arrecadação tributária (T0) e o nível
de gastos com investimentos autônomos (Ī0), além da quantidade de moeda (M0). Como vimos, a
curva de demanda agregada keynesiana será deslocada quando qualquer um desses outros
fatores variar. No sistema keynesiano, a taxa de juros não isola completamente a demanda
agregada de mudanças em demandas setoriais. Essa diferença nos determinantes da demanda
agregada nos modelos keynesiano e clássico produz diferenças importantes em suas respectivas
explicações de instabilidades na economia.
Keynes acreditava que a instabilidade da demanda por investimento fosse a principal causa
de flutuações cíclicas na renda. Mudanças autônomas na demanda por investimento causadas
por mudanças nas expectativas produzem deslocamentos da curva de demanda agregada e,
consequentemente, instabilidade nos preços e no produto.

Teorias da oferta agregada keynesiana e clássica


A curva de oferta agregada clássica, mostrada na Figura 8.15a, é vertical, como resultado dos
pressupostos clássicos sobre o mercado de trabalho. Considera-se que a demanda e a oferta de
trabalho dependam unicamente do salário monetário, que é conhecido por todos. O salário
monetário é considerado perfeitamente flexível, ajustando-se rapidamente para igualar oferta e
demanda. Como a curva de oferta agregada é vertical, o produto e o emprego são completamente
determinados pela oferta.
No curto prazo, a curva de oferta agregada keynesiana inclina-se para cima e para a direita.
Esperaríamos que a curva fosse muito pouco inclinada em níveis de produto bem abaixo da
plena capacidade e que se tornasse mais inclinada conforme o produto se aproximasse da plena
capacidade. A concepção keynesiana de oferta agregada (Seções 8.3 e 8.4) enfatiza a rigidez dos
salários monetários e a falha dos participantes do mercado em perceber o salário real
corretamente. Como consequência, o mercado de trabalho não estará em equilíbrio contínuo em
pleno emprego. O produto e o emprego efetivos não serão completamente determinados por
fatores de oferta. Deslocamentos da função de demanda agregada moverão a economia ao longo
da curva de oferta de inclinação positiva, fazendo o produto mudar. No sistema keynesiano, o
nível de demanda agregada é importante para a determinação do nível do produto e do emprego.
A curva de oferta agregada keynesiana na Figura 8.15b foi chamada de curva de oferta de
curto prazo para enfatizar que ela se refere a um curto período de tempo e não a uma situação de
equilíbrio a longo prazo. Fatores como contratos de trabalho explícitos de longa duração,
contratos implícitos e resistência a reduções salariais vistas como cortes no salário relativo
tornariam mais lento, mas não impediriam permanentemente, o ajuste salarial necessário para
levar a economia de volta a uma situação de pleno emprego. Informações imperfeitas sobre o
salário real por parte dos ofertantes de trabalho também seriam um fenômeno de curto prazo. As
expectativas acabariam por se aproximar do valor efetivo do nível de preços e, assim, do salário
real. Os keynesianos não negam que chegaria um momento em que a economia se aproximaria
do pleno emprego. Mas, para os keynesianos, essas propriedades clássicas de longo prazo da
economia não são importantes. Eles concordam com Keynes que “esse longo prazo é um guia
enganoso para a situação corrente. No longo prazo estaremos todos mortos. Os economistas
estabelecem para si mesmos uma tarefa muito fácil e muito inútil se, em estações tempestuosas,
só puderem nos dizer que, depois que a tempestade tiver durado tempo bastante, o oceano
voltará a ficar calmo”.5

Conclusões keynesianas e clássicas sobre políticas econômicas


Os economistas clássicos enfatizaram as tendências de autoajuste da economia. Se deixada
livre de políticas governamentais desestabilizadoras, a economia alcançaria o pleno emprego. Os
economistas clássicos eram não-intervencionistas no sentido de que não defendiam políticas
monetárias e fiscais ativas para estabilizar a economia. Essas políticas, voltadas a afetar a
demanda agregada, não teriam efeitos sobre o produto e o emprego, dada a natureza determinada
pela oferta dessas variáveis no sistema clássico.
Os keynesianos viam a economia como instável em decorrência da instabilidade da demanda
agregada, principalmente seu componente de investimentos privados. A demanda agregada afeta
o produto e o emprego na concepção keynesiana. Em consequência, mudanças na demanda
agregada causarão flutuações indesejáveis no produto e no emprego no curto prazo. Essas
flutuações podem ser evitadas usando políticas monetárias e fiscais para compensar as mudanças
indesejáveis na demanda agregada.

Questões de revisão
1. Explique por que a curva de demanda agregada keynesiana tem inclinação negativa quando
traçada em relação ao nível de preços.
2. Derive a curva de demanda agregada keynesiana para o caso em que o investimento é
completamente inelástico em relação aos juros e, portanto, a curva IS é vertical (siga o
procedimento da Figura 8.2). Explique a inclinação resultante da curva de demanda agregada
nesse caso.
3. Em que sentido a teoria clássica da oferta agregada é “fundamentalmente incompatível” com
o sistema keynesiano?
4. Por que os multiplicadores de política fiscal são menores em magnitude na versão de preços
variáveis-salários fixos do modelo keynesiano do que no modelo IS-LM com preços fixos?
Por que esses multiplicadores são ainda menores quando permitimos que o salário monetário,
além do nível de preços, também seja variável?
5. Voltemos ao caso examinado na pergunta 2, em que o investimento é completamente
inelástico em relação aos juros e a curva IS é vertical. Analise os efeitos de um aumento nos
gastos do governo nesse caso pela versão de preços variáveis e salários fixos do modelo
keynesiano. Compare os efeitos com os da versão de preços fixos do modelo.
6. Analise os efeitos de um aumento na oferta de moeda no modelo keynesiano em que tanto o
nível de preços como o salário monetário sejam considerados variáveis. Inclua em sua
resposta os efeitos sobre o nível de renda real, o nível de preços, a taxa de juros e o salário
monetário.
7. No sistema keynesiano, aumentos da demanda agregada levam a aumentos do produto
porque o salário monetário sobe menos do que proporcionalmente à elevação dos preços em
resposta a esses aumentos da demanda. Essa condição é necessária porque as firmas só
contratarão mais trabalhadores se o salário real (W/P) cair. Explique as razões possíveis para
que o salário monetário não se ajuste proporcionalmente ao nível de preços no modelo
keynesiano de curto prazo.
8. Suponha que ocorra uma queda exógena no preço do petróleo importado. Usando a análise
gráfica mostrada neste capítulo, explique como esse choque afetaria o produto e o nível de
preços. Explique o papel desempenhado por expectativas inflacionárias nesse ajuste.
9. “A moeda é mais importante no sistema keynesiano que no sistema clássico.” Você
concorda? Ou afirmaria que o oposto é verdadeiro?
10. Quais são as diferenças essenciais entre as teorias clássica e keynesiana da oferta agregada?
11. Quais são as diferenças essenciais entre as teorias clássica e keynesiana da demanda
agregada?
12. Compare os efeitos de uma ação de política fiscal expansionista, por exemplo, um aumento
nos gastos do governo financiado pela venda de títulos do governo ao público, nos modelos
keynesiano e clássico. Inclua em sua resposta os efeitos dessa mudança de política sobre o
nível de renda real, o emprego, o nível de preços e a taxa de juros.
13. Na versão de preços variáveis e salários fixos do modelo keynesiano, analise os efeitos de
um aumento na demanda por moeda (deslocamento na preferência pela liquidez) devido a
uma perda de confiança em ações e títulos de risco, como ocorreu na crise financeira de
2007-2009.
PARTE III

A teoria macroeconômica depois de Keynes

A revolução keynesiana criou um novo modelo para a abordagem dos problemas


macroeconômicos. Pouco tempo se passou, porém, antes que surgissem questionamentos à nova
ortodoxia, os quais tinham raízes no modelo clássico. Nesta parte, vamos examinar esses
questionamentos e as respostas keynesianas a eles.
CAPÍTULO 9
A contrarrevolução monetarista

A revista britânica The Economist definiu um monetarista como alguém “que julga ser mais
importante regular a oferta de moeda em uma economia do que influenciar outros instrumentos
econômicos. Isso é considerado muito perverso por aqueles que não se dão o trabalho de
descobrir o que de fato significa”. Neste capítulo, vamos examinar a posição monetarista.
O ataque keynesiano à ortodoxia clássica foi bem-sucedido. Depois que Keynes morreu em
1946, seus sucessores assumiram a tarefa de aperfeiçoar suas teorias e aplicá-las aos problemas
de política econômica enfrentados pelas nações ocidentais em sua transição para economias de
paz no ocaso da Segunda Guerra Mundial. Como vimos, um aspecto da revolução keynesiana
foi a oposição à teoria quantitativa da moeda clássica. Na verdade, os primeiros economistas
keynesianos atribuíam muito pouca importância à oferta de moeda. O monetarismo começou
como uma tentativa de reafirmar a importância econômica da moeda e, portanto, da política
monetária.
Milton Friedman, que morreu aos 94 anos em novembro de 2006, foi a principal força
intelectual no desenvolvimento inicial do monetarismo. Friedman foi professor na Universidade
de Chicago por muito tempo. Depois de se aposentar, em 1977, tornou-se pesquisador sênior na
Hoover Institution da Universidade Stanford. Friedman publicou artigos em periódicos
profissionais de economia até 2005. Por ocasião de sua morte, muitas publicações o descreveram
como um dos dois economistas mais influentes do século XX. O outro era Keynes.

9.1 Proposições monetaristas


Em vez de apresentar uma definição de monetarismo, listaremos quatro proposições que
caracterizam a posição monetarista:
1. A oferta de moeda é a influência dominante sobre a renda nominal.
2. No longo prazo, a influência da moeda ocorre principalmente nos preços e em outros
valores nominais. No longo prazo, variáveis reais, como produto e emprego, são
determinadas por fatores reais, e não monetários.
3. No curto prazo, a oferta de moeda influencia variáveis reais. A moeda é o fator dominante
que causa movimentos cíclicos no produto e no emprego.
4. O setor privado é inerentemente estável. A instabilidade na economia resulta
essencialmente de políticas econômicas governamentais.
A principal conclusão de política econômica que decorre dessas proposições é que a
estabilidade do crescimento da oferta de moeda é fundamental para a estabilidade da economia.
Os monetaristas acreditam que a melhor forma de atingir essa estabilidade é adotar uma regra
para a política monetária. Milton Friedman propôs por muito tempo uma regra de taxa constante
de crescimento da oferta de moeda. Em retrospectiva, porém, o elemento crucial da concepção
de Friedman é a preferência por regras para a política monetária, em vez de deixá-la a critério
dos formuladores de políticas. A política monetária, ele costumava dizer, era “importante demais
para ser deixada para as autoridades dos bancos centrais”.
A primeira proposição monetarista é que o nível de atividade econômica em unidades
monetárias correntes é determinado principalmente pela oferta de moeda. Um elemento
importante nessa proposição é que ela considera que a relação de causação seja essencialmente
da moeda para a renda. De maneira geral, supõe-se que mudanças na oferta de moeda causam
mudanças na renda nominal. O nível e a taxa de crescimento da oferta de moeda seriam
determinados basicamente pelo Banco Central.
A segunda proposição monetarista afirma que, no longo prazo, o nível de atividade
econômica medido em unidades monetárias reais não depende da quantidade de moeda. No
longo prazo, o produto real é determinado por fatores reais como o estoque de bens de capital, o
tamanho e a qualidade da força de trabalho e o padrão tecnológico. Se, no longo prazo, o nível
de atividade econômica real não é afetado pela quantidade de moeda, ao passo que o nível de
atividade econômica em termos nominais é quase inteiramente determinado pela oferta de
moeda, segue-se que o efeito de longo prazo da moeda incide sobre o nível de preços.
A terceira proposição diz que, no curto prazo, o produto e o emprego são fortemente
influenciados por mudanças na oferta de moeda. Os preços também são influenciados, porém,
no curto prazo, os preços, incluindo os salários monetários (o preço do trabalho), não são
perfeitamente flexíveis. Assim, quando a quantidade de moeda muda, no curto prazo os preços
não sofrem o ajuste completo. O produto e o emprego também são afetados.
A quarta proposição monetarista afirma que o setor privado (firmas e famílias) não é a fonte
de instabilidade da economia. Nas palavras de um monetarista, Karl Brunner, o setor privado é
“essencialmente um processo absorvedor de choques, estabilizador e autoajustável. A
instabilidade é produzida predominantemente pela ação do setor governamental”. O governo
causa instabilidade na economia primordialmente por permitir instabilidade no crescimento da
oferta de moeda, o principal determinante do nível de atividade econômica. Na visão
monetarista, o governo também pode desestabilizar a economia ao interferir nos mecanismos
normais de ajuste do setor privado. Controles compulsórios de preços e salários são o exemplo
mais evidente de interferência governamental nessas propriedades de ajuste. Outros exemplos
são tetos para as taxas de juros, controles de aluguéis e leis de salário mínimo.
Ao considerar essas proposições e conclusões de política econômica monetaristas, é
conveniente dividir a análise em duas partes. Primeiro, vamos examinar as razões pelas quais os
monetaristas atribuem tanta importância à moeda (isto é, a base das proposições 1 e 3).
Adiaremos até o Capítulo 10 a discussão do que a política monetária não pode fazer, que é a
base da proposição 2. Embora a proposição 4 não seja individualmente examinada aqui, ela será
importante para a nossa análise.

9.2 A reformulação da teoria quantitativa da moeda


O primeiro estágio do desenvolvimento do monetarismo centrou-se na redefinição da teoria
quantitativa da moeda levando em conta a posição de Keynes. Milton Friedman descreveu a
teoria quantitativa clássica da seguinte maneira:

Na teoria monetária, essa análise foi interpretada como significando que, na equação
quantitativa MV = PT, o termo referente à velocidade poderia ser considerado muito estável,
determinado independentemente dos outros termos da equação e, como resultado, mudanças
na quantidade de moeda seriam refletidas nos preços ou na produção.1

Essa é a proposição 1 do monetarismo. (Observe-se que a velocidade estável significa não só


que mudanças em M causarão mudanças em PT, como também que apenas mudanças em M
podem mudar PT.)
A teoria quantitativa havia caído em descrédito, juntamente com o resto da economia
clássica, como resultado da Grande Depressão da década de 1930. Friedman acreditava que os
acontecimentos dessa década haviam sido inadequadamente avaliados e, na verdade, não
ofereciam evidências contra a teoria quantitativa da moeda. Percebia, porém, a necessidade de
reformular a teoria quantitativa em termos que levassem em conta a contribuição de Keynes. Seu
objetivo era reafirmar a importância da moeda. Para entender por que ele julgava essa
reformulação necessária, vamos começar examinando o papel (ou falta de papel) que alguns dos
primeiros keynesianos atribuíam à moeda como determinante da atividade econômica.

9.2.1 A moeda e os primeiros keynesianos


Nossa análise do sistema keynesiano deixou claro que, dentro desse modelo, a moeda era um
dos determinantes importantes da atividade econômica. Mas a velocidade de circulação da
moeda não era constante, nem independentemente determinada; ela era determinada dentro do
sistema. Outros fatores além da moeda também podiam afetar o nível de atividade econômica.
Considere-se, por exemplo, a resposta do sistema a um aumento nos gastos do governo, como é
mostrado na Figura 9.1.

FIG 9.1 Efeitos de um aumento nos gastos do governo: a visão keynesiana


Um aumento nos gastos do governo desloca a curva IS para a direita. A taxa de juros e o nível de equilíbrio da renda sobem.
Como a oferta de moeda manteve-se inalterada e a renda subiu, a velocidade da moeda, ou a proporção entre renda e moeda,
aumentou.

O aumento nos gastos do governo de G0 para G1 desloca a curva IS de IS(G0) para IS(G1). A
renda aumenta de Y0 para Y1 e a taxa de juros sobe de r0 para r1. A oferta de moeda é mantida
constante aqui, pressupondo-se que os gastos aumentados do governo sejam financiados pela
venda de títulos ao público. O nível de renda mais alto produz um aumento na demanda por
moeda para transações. Para igualar novamente a demanda por moeda à oferta de moeda que
permaneceu inalterada, é preciso que a taxa de juros aumente. Com a taxa de juros mais alta, a
demanda especulativa por moeda declina e a demanda por saldos de moeda para transações,
para um dado nível de renda, também cai. Assim, a mesma oferta de moeda pode ser compatível
com um nível de renda mais alto. Outra maneira de expressar essa conclusão é dizer que a
velocidade varia positivamente com a taxa de juros.
Como a velocidade é variável no sistema keynesiano, não há um nível único de renda que
corresponda a uma dada oferta de moeda. Não seria sequer aproximadamente correto afirmar
que, no curto prazo, a renda nominal ou real é determinada unicamente pelo nível de oferta de
moeda. Isso não significa, porém, que os keynesianos não atribuam importância à moeda. A
quantidade de moeda é um dos principais determinantes da renda no sistema keynesiano.
Muitos dos primeiros economistas keynesianos (por volta de 1945-1950), no entanto, de fato
acreditavam que a moeda tinha pouca importância. Essa opinião baseava-se em juízos empíricos
sobre a inclinação das curvas IS-LM, que, como vimos em nossa análise do sistema keynesiano,
é importante para determinar a eficácia relativa das políticas fiscal e monetária. Influenciados
pela experiência da Depressão, eles acreditavam que a curva LM era muito plana e a curva IS
muito inclinada – a configuração que seria característica de condições de depressão como as da
década de 1930. A Depressão foi caracterizada por baixos níveis de renda e da taxa de juros.
Nesse nível baixo da taxa de juros, a elasticidade da demanda por moeda seria alta, por razões
discutidas no Capítulo 6. Tal situação aproxima-se do caso da armadilha da liquidez; a curva LM
torna-se muito plana. Além disso, em condições de depressão, os primeiros economistas
keynesianos acreditavam que o investimento seria relativamente inelástico em relação aos juros,
tornando a curva IS muito inclinada. Durante a Depressão, a taxa de utilização das instalações e
equipamentos existentes foi muito baixa. Os primeiros economistas keynesianos acharam que,
com tamanha capacidade excedente, seria pouco provável que os investimentos reagissem muito
a mudanças nas taxas de juros.
A Figura 9.2 mostra essa configuração das curvas IS e LM e ilustra a ineficácia de um
aumento da quantidade de moeda que desloque a curva LM de LM0 para LM1. Com a curva LM
plana na região do ponto de equilíbrio, uma dada mudança na oferta de moeda tem muito pouco
efeito para reduzir a taxa de juros, o primeiro elo na cadeia que conecta moeda e renda no
modelo keynesiano. Além disso, com uma curva IS muito inclinada, uma queda na taxa de juros
não aumentaria muito os investimentos. Essa combinação de uma suposta alta elasticidade-juros
da demanda por moeda e uma baixa elasticidade-juros do investimento levou os primeiros
economistas keynesianos à conclusão de que a moeda não era importante.
Que papel havia para a política monetária? Durante a Segunda Guerra Mundial, boa parte dos
gastos de guerra tinha sido financiada pela venda de títulos para o público à taxas de juros
relativamente baixas. A manutenção de taxas de juros baixas e estáveis para os títulos teria os
efeitos desejáveis de manter baixo o custo dos pagamentos de juros da dívida e proteger o valor
de capital dos títulos para os investidores (lembremos que os preços dos títulos e as taxas de
juros variam inversamente). Baixas taxas de juros também significavam que, dentro de suas
limitações, a política monetária daria toda a contribuição possível para fortalecer a demanda
agregada. Como os primeiros economistas keynesianos temiam um retorno às condições de
depressão da década de 1930, essa era mais uma característica desejável das baixas taxas de
juros. Assim, taxas de juros baixas e estáveis tornaram-se a meta da política monetária. Para
alcançar essa meta, as autoridades monetárias atuavam em cooperação com o Tesouro
americano para fixar o nível das taxas de juros.

FIG 9.2 Visão dos primeiros keynesianos sobre a ineficácia da política monetária
Com a curva IS muito inclinada e acima da faixa em que a curva LM é quase horizontal, um aumento na quantidade de moeda,
que desloca a curva LM de LM0 para LM1, tem pouco efeito sobre a renda.

Outro elemento da visão dos primeiros keynesianos também tornava desejável a fixação da
taxa de juros. Seguindo Keynes, eles consideravam a demanda por moeda altamente instável. A
curva LM não só era plana (na faixa relevante), como também deslocava-se de maneira
imprevisível. Esses deslocamentos levariam a uma instabilidade nos mercados financeiros que
poderia ser evitada fixando-se a taxa de juros.
No Capítulo 17, vamos examinar o processo pelo qual as autoridades monetárias podem fixar
a taxa de juros. Para nossos fins aqui, o ponto importante é que, ao fazer isso, as autoridades
monetárias perdem o controle da oferta de moeda. As autoridades monetárias precisam ofertar
qualquer quantidade de moeda que seja necessária para produzir equilíbrio no mercado
monetário (e, portanto, no de títulos) à taxa de juros desejada. Para os primeiros keynesianos,
essa perda de controle da oferta de moeda não era importante, uma vez que eles consideravam
que a quantidade de moeda não tinha importância.

9.2.2 A reformulação da teoria quantitativa por Friedman


Contrariando a ideia dos primeiros keynesianos, Friedman afirmou que a demanda por moeda
era estável. Opondo-se à caracterização da quase-armadilha da liquidez, Friedman argumentou
que a elasticidade-juros da demanda por moeda certamente não era infinita e, na verdade, era
“bastante pequena”. A quantidade de moeda, longe de ser desimportante, era a influência
dominante sobre o nível de atividade econômica.

PERSPECTIVAS 9.1 - A VISÃO MONETARISTA DA GRANDE


DEPRESSÃO
Tanto Friedman como os keynesianos concordam que a Grande Depressão da década de 1930 levou ao descrédito as teorias
clássicas, inclusive a teoria quantitativa da moeda. Friedman, porém, acredita que os keynesianos interpretaram erradamente
as evidências fornecidas pela Depressão.
Friedman não nega que a experiência dos Estados Unidos e de outros países industrializados na década de 1930 contradiz a
visão clássica do mercado de trabalho, em que o salário monetário ajusta-se rapidamente para manter o pleno emprego. Mas
Friedman acredita que os keynesianos erraram ao concluir que a Depressão refutou a teoria quantitativa da moeda.
A Tabela 9.1 mostra o nível de vários agregados macroeconômicos em 1929, no início da Depressão, comparados com seu
nível em 1933, no ponto mais baixo de queda. Pela tabela, vemos que o PNB nominal caiu 46,0% e o PNB real caiu 29,6%.
O resto da queda do PNB nominal é explicado por uma redução do nível agregado de preços. A coluna 3 mostra que a oferta
de moeda estritamente definida, M1 (moeda corrente mais depósitos a vista), caiu 26,5% entre 1929 e 1933. A medida M2
da oferta de moeda, uma medida mais ampla que inclui outros depósitos bancários, caiu 33,3%.
Vemos que houve um grande declínio na oferta de moeda na Depressão, o que é coerente com a teoria quantitativa. A
velocidade da moeda também caiu, como é evidenciado pelo maior declínio percentual da renda nominal em comparação
com a queda de qualquer uma das duas medidas de oferta de moeda. Mas os teóricos quantitativistas esperariam esse
resultado, uma vez que, durante a deflação da Depressão, o valor da moeda (em termos de poder de compra) estava subindo.
Isso provavelmente aumentaria a demanda por moeda a uma dada renda nominal e, portanto, reduziria a velocidade da
moeda.
Os keynesianos contestam a explicação monetária da Depressão. Eles concordam que, se o Federal Reserve tivesse
conseguido evitar um declínio da oferta de moeda durante o período de 1929.1933, a Depressão teria sido menos séria do
que foi. Consideram, porém, que as causas primárias da Depressão foram declínios autônomos em vários componentes da
demanda agregada: consumo, investimentos e exportações, causados, por sua vez, por fatores como a quebra do mercado de
ações em 1929, o excesso de atividade no setor de construção no final da década de 1920 e o colapso do sistema monetário
internacional. Isso foi chamado de hipótese dos gastos, em contraste com a hipótese monetária proposta por Friedman e
outros monetaristasa.
Tabela 9.1 - Agregados macroeconômicos selecionados (1929, 1933)

a Para a análise de Friedman, veja FRIEDMAN, Milton; SCHWARTZ, Anna J. The great contraction. Princeton: Princeton
University Press, 1965. Também sobre o tema das causas da Grande Depressão, veja: TEMIN, Peter. Did monetary forces
cause the Great Depression? New York: Norton, 1976; TEMIN, Peter. Lessons from the Great Depression. Cambridge:
MIT Press, 1990.

As conclusões de Friedman apoiam-se em uma reformulação da teoria quantitativa da moeda


clássica. A versão de Friedman da teoria quantitativa é mais próxima da abordagem de
Cambridge que examinamos anteriormente. Essa abordagem centrava-se na demanda por
moeda. A relação central era:

expressando uma relação proporcional entre a demanda por moeda (Md) e o nível de renda
nominal [preço (P) vezes renda real (Y)]. O fator de proporcionalidade (k) era considerado
constante no curto prazo.
Friedman enfatiza que a teoria quantitativa era, como pode ser visto pela equação (9.1), uma
teoria da demanda por moeda. Como k era tratado como uma constante pelos economistas de
Cambridge e considerava-se que a oferta nominal de moeda (M) fosse definida exogenamente
pelas autoridades monetárias, a equação de Cambridge pode ser transformada em uma teoria da
renda nominal,

ou a forma alternativa (em que V, a velocidade da moeda, é igual a 1/k).

onde a barra sobre o k ou o V indica que essas magnitudes não variam. Friedman examinou as
mudanças que deveriam ser feitas na teoria da demanda por moeda de Cambridge à luz da teoria
da demanda por moeda de Keynes.
A teoria keynesiana da demanda por moeda enfatizava o papel da moeda como um ativo além
de seu papel em transações. Ao estudar os fatores que determinavam quanta moeda as pessoas
iriam reter, Keynes considerou fatores que determinavam a desejabilidade da moeda em relação
a outros ativos. Ele fez a suposição simplificadora de que os outros ativos eram um grupo
suficientemente homogêneo para poder ser agrupados sob a categoria “títulos”. Examinou,
então, como um indivíduo alocava sua riqueza entre moeda e títulos. Os principais fatores que,
para ele, determinavam essa divisão eram o nível de renda e o nível da taxa de juros. Em termos
da equação de Cambridge, Keynes centrou-se na taxa de juros como o determinante primário de
k, o montante de saldos monetários que uma pessoa reteria para um dado nível de renda. Uma
elevação da taxa de juros levava a uma queda em k ou, de forma equivalente, a um aumento da
velocidade de circulação da moeda, como vimos na subseção anterior. Como k era uma variável,
e não uma constante, a equação de Cambridge não podia, por si só, fornecer uma teoria da renda
nominal.
Friedman aceitou a ênfase de Keynes no papel da moeda como um ativo. Tendo isso como
base, ele formulou sua própria teoria da demanda por moeda. Também aqui a renda é um dos
determinantes da demanda por moeda e, como na análise de Keynes, podemos considerar que a
análise de Friedman fornece uma teoria dos fatores que determinam o k de Cambridge, os
estoques de moeda mantidos como proporção da renda nominal. A função demanda por moeda
de Friedman pode ser expressa como se segue:

onde P = nível de preços


Y = renda real
rB = taxa de juros nominal sobre títulos
rA = retorno nominal das ações
rD = retorno nominal dos bens duráveis
Considera-se que a demanda por moeda dependa da renda nominal, o produto dos dois
primeiros argumentos da função demanda. Um aumento da renda nominal aumentaria a
demanda por moeda. Para um dado nível de renda nominal, Friedman considera, assim como
Keynes, que a quantidade de moeda demandada depende da taxa de retorno oferecida por ativos
alternativos. Estes são títulos (o ativo em que Keynes se centrou), ações (participação acionária
em firmas) e bens duráveis, como bens de consumo duráveis, terras e imóveis. Bens duráveis
não pagam uma taxa de juros explícita. Seu retorno é o aumento esperado do preço do bem ao
longo do período em que ele é mantido. Portanto, a taxa esperada de inflação também é um
determinante da demanda por moeda. Um aumento na taxa de retorno de qualquer um desses
ativos alternativos faz a demanda por moeda declinar.
A teoria de Friedman difere da teoria de Keynes em vários aspectos. Primeiro, Friedman
considera que a função demanda por moeda é estável. A concepção de Keynes era que a função
demanda por moeda seria instável, deslocando-se de acordo com as mudanças de confiança do
público na economia.
Segundo, Friedman não segmenta a demanda por moeda em componentes que representam
saldos para transações, demanda especulativa e demanda precaucionária. A moeda, como outros
“bens”, tem vários atributos que a fazem útil, mas Friedman não acha que seja útil especificar
demandas separadas com base em cada um dos usos da moeda.
A terceira diferença entre as teorias da demanda por moeda de Friedman e Keynes é que
Friedman inclui rendimentos separados para títulos, ações e bens duráveis. Keynes focalizou a
escolha entre moeda ou títulos. Não está claro se isso representa uma diferença substancial, pois
o que Keynes chamou de títulos pode ser interpretado de forma mais ampla para incluir pelo
menos as ações. Isso, no entanto, geralmente não acontece e a análise keynesiana tem se
concentrado estritamente na escolha entre moeda e títulos. Friedman explicita a possibilidade de
outras substituições e também admite um deslocamento direto de moeda para mercadorias (bens
duráveis) quando as taxas de retorno mudam.
A teoria da demanda por moeda de Friedman pode ser usada para reformular a equação de
Cambridge como se segue:

onde, em lugar de um k constante, temos agora k expresso como uma função das taxas de
retorno dos ativos que são alternativas à retenção da moeda. Um aumento na taxa de retorno de
qualquer um desses ativos alternativos faria k declinar, refletindo o aumento da desejabilidade
do ativo alternativo. Nesses termos, percebemos que Friedman reformulou a teoria quantitativa,
oferecendo uma explicação sistemática de k que leva em conta a análise keynesiana do papel da
moeda como um ativo.
Se essa é a teoria quantitativa reformulada, como caracterizaríamos um teórico quantitativista
moderno? Em que aspectos ele seria diferente de um keynesiano? Na visão de Friedman, um
teórico quantitativista acredita no seguinte:
1. A função demanda por moeda é estável.
2. Essa função demanda desempenha um papel importante na determinação do nível de
atividade econômica.
3. A quantidade de moeda é fortemente afetada por fatores de oferta de moeda.
Na versão de Friedman para a equação de Cambridge, a condição de equilíbrio no mercado
monetário é

Com uma função demanda por moeda estável, um aumento exógeno na oferta de moeda ou
deve levar a uma elevação em PY ou causar declínios em rB, rA e rD (o que fará k aumentar) com
efeitos indiretos sobre PY. Um teórico quantitativista acredita que a função demanda por moeda
é de fato estável; que mudanças na oferta de moeda derivam principalmente do lado da oferta
como resultado de políticas do banco central; e, por fim, que mudanças na quantidade de moeda
são importantes para a determinação da renda nominal (que boa parte do efeito de uma mudança
em M reflete-se em uma mudança em PY).
De que modo um teórico quantitativista difere de um keynesiano? A teoria de Friedman
discorda claramente da posição dos primeiros keynesianos. Os primeiros keynesianos
acreditavam que a função demanda por moeda era instável; que a elasticidade-juros da demanda
por moeda era extremamente alta; e que, como consequência, mudanças na quantidade de moeda
não tinham efeitos previsíveis importantes sobre o nível de atividade econômica. Na visão de
Friedman, o teórico quantitativista acredita que a função demanda por moeda é estável e que a
quantidade de moeda é um determinante importante do nível de atividade econômica. Além
disso, Friedman acredita, como veremos adiante, que a elasticidade-juros da demanda por moeda
é baixa.
E quanto às diferenças entre a teoria quantitativa e a posição keynesiana moderna? Os
keynesianos hoje acreditam que a política monetária é importante. Eles creem que inovações no
setor financeiro no período após 1980 lançaram dúvidas quanto à estabilidade da função
demanda por moeda. A corrida para a liquidez durante a crise financeira de 2007-2009 também
indica uma instabilidade na demanda por moeda. Quanto à elasticidade-juros da demanda por
moeda, as estimativas de keynesianos são mais altas do que as sugeridas pelas pesquisas do
próprio Friedman. De um modo geral, se um teórico quantitativista ou monetarista tivesse de
assinar embaixo apenas das três proposições listadas por Friedman, as posições do keynesiano
moderno e da teoria quantitativa moderna difeririam, mas não o bastante para gerar conclusões
de política econômica fortemente distintas.

9.2.3 A posição monetarista de Friedman


Friedman, porém, usou sua reformulação da teoria quantitativa para desenvolver uma posição
monetarista forte que de fato apresenta diferenças nítidas em relação à posição keynesiana.
A posição monetarista de Friedman estende a teoria quantitativa de uma teoria da demanda
por moeda para uma teoria da renda nominal. Vimos como os teóricos quantitativistas de
Cambridge estenderam a teoria quantitativa usando o pressuposto de um k constante [veja a
equação (9.1) ou (9.3)]. Friedman ressalta que sua versão da teoria quantitativa também pode ser
transformada em uma teoria da renda nominal se as outras variáveis em sua função demanda por
moeda [equação (9.4)] além da renda nominal (rB, rA, rD) tiverem pouco efeito sobre a demanda
por moeda. Sendo esse o caso, essas variáveis terão pouco efeito sobre k. A retenção de moeda
como uma proporção da renda (k) será praticamente constante. Como Friedman não acredita que
a demanda por moeda seja completamente independente dessas taxas de retorno, a teoria da
renda nominal que resulta da suposição de que k seja constante será apenas uma aproximação.
Mas qualquer teoria é apenas aproximada. Friedman e outros fizeram trabalhos empíricos que os
convencem de que essa posição monetarista forte, que pode ser expressa como

é uma aproximação melhor do que a dada por representações simples da concepção keynesiana.
Essa posição monetarista é necessária para afirmações de Friedman como “eu vejo como um
exagero a descrição de nossa posição como ‘a moeda é tudo que importa para explicar mudanças
na renda nominal e mudanças de curto prazo na renda real’, mas ela dá o tom certo para nossas
conclusões”; ou “mudanças apreciáveis na taxa de crescimento do estoque de moeda são uma
condição necessária e suficiente para mudanças apreciáveis na taxa de crescimento da renda
monetária”.2

FIG 9.3 IS-LM: uma versão monetarista


Na visão monetarista, a curva IS é bastante plana, refletindo uma alta elasticidade-juros da demanda agregada. A curva LM é
quase vertical, refletindo uma elasticidade-juros muito baixa da demanda por moeda.

É interessante representar a posição monetarista em termos do diagrama IS-LM e do modelo


oferta agregada-demanda agregada usados para explicar a posição keynesiana. Na Figura 9.3,
traçamos as curvas IS-LM como os monetaristas o fariam. A curva LM é quase, mas não
totalmente, vertical, refletindo a visão de Friedman de que a elasticidade-juros da demanda por
moeda é baixa.
Outra divergência em relação à posição keynesiana refere-se à inclinação da curva IS. Aqui,
uma curva IS mais plana é coerente com a posição monetarista de que a demanda agregada é
bastante sensível a mudanças na taxa de juros. Os keynesianos modernos também acreditam que
a taxa de juros afeta a demanda agregada e não postulariam que a curva IS devesse ser tão
vertical quanto a que traçamos para o modelo dos primeiros keynesianos (Figura 9.2). A
diferença entre os keynesianos modernos e os monetaristas quanto a este ponto é de grau. Os
monetaristas afirmam que os keynesianos restringem a influência da taxa de juros sobre a
demanda agregada ao efeito sobre o investimento causado por uma mudança no custo dos
empréstimos. Os monetaristas acham que essa é uma interpretação muito limitada dos efeitos
das taxas de juros, que resulta da tendência dos keynesianos a pensar em “títulos” como uma
classe de ativos financeiros e não como um conjunto de todos os ativos fora a moeda.
Em sua teoria da demanda por moeda, Friedman não agrupou todos os ativos não-monetários
em uma única categoria. Ele considerou separadamente títulos, ações e bens duráveis. Os
monetaristas acreditam que, se uma mudança na taxa de juros representa realmente uma
mudança em todas essas taxas de retorno, seus efeitos vão além dos efeitos de uma mudança nos
custos de empréstimos para as firmas que compram bens de investimento. Além disso, uma
mudança na taxa de juros significa também uma mudança nos preços das ações privadas e no
retorno previsto de imóveis e de bens duráveis. Os monetaristas acreditam que a taxa de juros
desempenha um papel mais importante na determinação da demanda agregada do que lhe era
atribuído no modelo keynesiano.
A Figura 9.3 ilustra diversas características da visão monetarista, mas é deficiente em um
aspecto. As curvas IS-LM por si só mostram como o PNB real e a taxa de juros são
determinados, com o nível de preços mantido constante. Um nível de preços constante não é um
pressuposto dos monetaristas. A Figura 9.4 mostra a visão monetarista no modelo oferta
agregada-demanda agregada de capítulos anteriores.

FIG 9.4 Oferta e demanda agregadas: a visão monetarista

Na visão monetarista, a posição da curva de demanda agregada é determinada pela oferta de moeda. Aumentos na oferta de
moeda de M0 para M1, depois para M2, deslocam a curva de demanda agregada de Yd(M0) para Yd(M1), depois para Yd(M2).

Três posições da curva de demanda agregada são mostradas no gráfico, Yd(M0), Yd(M1) e
Yd(M2), correspondentes a três valores da oferta de moeda, M0, M1 e M2. A posição monetarista
pode ser representada como uma afirmação de que mudanças em M são necessárias para que
ocorram deslocamentos significativos da curva de demanda agregada. A moeda é a única
influência sistemática importante sobre a demanda agregada.
Resta responder à questão sobre o que determina a oferta agregada. As variáveis reais que
determinam a posição da curva de oferta agregada determinarão, na visão monetarista, o nível de
produto real no longo prazo (veja a proposição 2). Há também a questão da inclinação da curva
de oferta agregada e, consequentemente, das proporções de um aumento da renda nominal
induzido pela moeda que levam a um aumento do produto e dos preços, respectivamente. Estas
são as questões centrais do próximo capítulo.

9.3 Política fiscal e monetária

9.3.1 Política fiscal


Os modelos monetarista e keynesiano produzem conclusões bastante diferentes sobre a
eficácia de mudanças de política fiscal. A visão monetarista sobre a eficácia da política fiscal foi
expressa por Milton Friedman como se segue: “Chego ao ponto principal: em minha opinião, o
estado do orçamento por si não tem nenhum efeito significativo sobre o curso da renda nominal,
sobre a deflação ou sobre flutuações cíclicas”.3 Com referência à proposição keynesiana de que
a política fiscal era eficaz, Friedman escreveu: “Os ‘monetaristas’ rejeitaram essa proposição e
afirmaram que a política fiscal por si é, em grande medida, ineficaz e que o importante é o que
acontece com a quantidade de moeda”.4
Quando Friedman discute os efeitos independentes da política fiscal, que é o tema em
questão, ele se refere aos efeitos de mudanças no orçamento governamental mantendo constante
a quantidade de moeda. Consideremos um aumento nos gastos do governo. Se as alíquotas
tributárias não forem alteradas, o que tem sido nosso pressuposto habitual quando consideramos
uma mudança de política fiscal por vez, o novo gasto precisa ser financiado pela emissão de
moeda ou pela venda de títulos. Similarmente, no caso de uma redução nos impostos, para que
os gastos se mantenham inalterados é preciso que as receitas tributárias perdidas sejam
substituídas por vendas de títulos ao público ou pela emissão de moeda.
Se um corte nos impostos ou um aumento dos gastos for financiado pela emissão de mais
moeda, temos uma ação de política monetária (M aumenta) e uma ação de política fiscal (G
aumenta ou T cai). Em termos do modelo IS-LM, ambas as curvas IS e LM deslocam-se. Os
monetaristas não afirmam que esse tipo de mudança de política econômica será ineficaz; o que
afirmam é que o efeito da política ocorrerá principalmente porque a oferta de moeda se altera. A
controvérsia é quanto ao que Friedman chama de efeito de uma mudança no orçamento federal
por si, isto é, sem uma mudança concomitante na quantidade de moeda. Isso significa, no caso
de um corte de impostos ou de um aumento dos gastos, que o déficit criado por essas ações seria
completamente financiado pela venda de títulos ao público. A posição monetarista é que tais
ações de política econômica terão pouco efeito sistemático sobre a renda nominal (preços ou
produto real).

FIG 9.5 Efeitos de um aumento nos gastos do governo: o caso monetarista

Um aumento nos gastos do governo desloca a curva IS de IS0 para IS1. Com a curva IS relativamente plana e a curva LM quase
vertical, essa ação de política fiscal tem pouco efeito sobre a renda (Y sobe apenas de Y0 para Y1).
As razões pelas quais os monetaristas chegam a essa conclusão podem ser vistas na Figura
9.5. Nela consideramos os efeitos de um aumento nos gastos do governo quando aceitamos os
pressupostos monetaristas sobre a inclinação das curvas IS e LM. Um aumento nos gastos do
governo de G0 para G1 desloca a curva IS para a direita, de IS0 para IS1. O efeito do aumento nos
gastos do governo no caso monetarista é produzir uma elevação da taxa de juros (de r0 para r1).
O nível de renda altera-se muito pouco (de Y0 para Y1). Por quê?
A explicação já foi oferecida na discussão sobre como a eficácia relativa das políticas
monetária e fiscal depende da inclinação das curvas IS e LM, em particular de como se considera
ser a elasticidade-juros da demanda por moeda e da demanda por investimento. Os monetaristas
acham que a elasticidade-juros da demanda por moeda é pequena; a curva LM é bastante
inclinada. O aumento nos gastos do governo aumenta inicialmente a demanda agregada.
Conforme a renda começa a subir, a demanda por saldos para transações aumenta. Com a oferta
de moeda fixa, esse aumento produz uma pressão de alta sobre a taxa de juros, que sobe até que
a oferta e a demanda por moeda sejam novamente iguais. Se a demanda por moeda for inelástica
em relação aos juros, é necessário um grande aumento na taxa de juros para reequilibrar a
demanda por moeda, com a oferta de moeda fixa.
A curva IS é relativamente plana na visão monetarista. A demanda por investimento é muito
sensível a mudanças na taxa de juros. Portanto, a elevação da taxa de juros necessária para
manter o mercado monetário em equilíbrio fará com que a demanda agregada do setor privado
diminua substancialmente quando os gastos governamentais começam a estimular a renda. Essa
redução na demanda agregada do setor privado é o que chamamos no Capítulo 4 de crowding
out, ou efeito deslocamento.

9.3.2 Política monetária


Tanto os monetaristas como os keynesianos modernos acreditam que ações de política
monetária têm efeitos substanciais e sustentados sobre a renda nominal. Os primeiros
keynesianos, como vimos, duvidavam da eficácia da política monetária. A diferença hoje entre
keynesianos e monetaristas a respeito de políticas monetárias não está em se a política monetária
pode ou não afetar a renda, mas em como a política monetária deve ser usada para estabilizar a
renda.

9.3.2.1 A posição monetarista


Os monetaristas acreditam que mudanças na quantidade de moeda são a influência dominante
sobre as alterações da renda nominal e, no curto prazo, também sobre as alterações da renda real.
Disso decorre que a estabilidade no comportamento da oferta de moeda seria muito importante
para produzir estabilidade no crescimento da renda. Friedman atribui a maior parte da
instabilidade passada no crescimento da renda a um crescimento instável da oferta de moeda.
Devido à importância da moeda e ao que Friedman vê como erros passados na administração da
moeda, sua posição sobre políticas monetárias foi, por muito tempo, a seguinte:

Minha própria prescrição ainda é que as autoridades monetárias façam todo o possível para
evitar tais oscilações, adotando publicamente a política de obter uma taxa de crescimento
específica em um estoque monetário específico. O valor preciso da taxa de crescimento,
assim como do estoque monetário, são menos importantes do que a adoção de uma taxa
definida e conhecida.5

Hoje, alguns monetaristas propõem regras alternativas para a política monetária que são
menos inflexíveis do que a regra da taxa constante de crescimento da moeda de Friedman. As
razões para essas alternativas são examinadas na seção 9.4. O elemento comum nas propostas
monetaristas, porém, é que a política monetária deve ser determinada por uma regra e não
deixada ao livre arbítrio dos formuladores de políticas.
Aceitando-se o raciocínio de que as coisas correrão bem com uma regra de política
monetária, ainda persiste a questão: Por que, então, não procurar o melhor? Por que não usar a
política monetária para compensar até mesmo pequenos choques que afetem a renda? A resposta
de Friedman é, “Simplesmente não sabemos o suficiente para ser capazes de reconhecer
perturbações menores quando elas ocorrem ou para ser capazes de prever com alguma precisão
quais serão seus efeitos ou qual política monetária é necessária para compensar seus efeitos”.6
Friedman e outros monetaristas acreditam que mudanças na oferta de moeda terão um efeito
forte sobre a renda, mas que há alguma defasagem, com o efeito mais intenso ocorrendo apenas
depois de 6 a 18 meses. Assim, para compensar um pequeno choque, é preciso ser capaz de
prever seu tamanho e quando ele afetará a economia com muito tempo de antecedência.
Friedman e outros monetaristas não acham que tenhamos conhecimento suficiente para isso.
Citando novamente Friedman: “Diz um ditado que o melhor é muitas vezes inimigo do bom, o
que parece muito relevante. A meta de um grau extremamente alto de estabilidade econômica é,
sem dúvida, esplêndida; nossa capacidade de alcançá-la, porém, é limitada”.7

9.3.2.2 Contraste com os keynesianos


Os keynesianos acreditam que tanto a política monetária como a fiscal devem ser ativamente
ajustadas para compensar choques à economia. Franco Modigliani, um importante keynesiano,
expressou essa noção (que ele caracterizou como não-monetarista) como se segue:

Os não-monetaristas aceitam o que julgo ser a mensagem prática fundamental de The


General Theory: que uma economia de iniciativa privada usando uma moeda intangível
precisa ser estabilizada, pode ser estabilizada e, portanto, deve ser estabilizada por meio das
políticas monetária e fiscal adequadas.8

Os keynesianos defendem ações discricionárias ativas tanto de política monetária como de


política fiscal. Eles se opõem às regras de taxa de crescimento da moeda.
A primeira explicação para essas visões divergentes é a discordância entre monetaristas e
keynesianos quanto à necessidade de políticas de estabilização ativas. Enquanto os monetaristas
veem o setor privado como estável e capaz de absorver choques, os keynesianos percebem o
setor privado como produtor de choques e instável. Isso não significa que os keynesianos
acreditem que, sem políticas de estabilização governamentais, enfrentaríamos constantes
depressões e hiperinflações, mas sim que os choques resultariam em desvios substanciais e
prolongados das condições de pleno emprego e estabilidade de preços.
Uma segunda fonte de divergências entre monetaristas e keynesianos também está evidente
na afirmação de Modigliani. Ele acredita que podemos estabilizar a economia. Podemos prever
choques que atingirão a economia e formular políticas para combatê-los. Haverá erros, sem
dúvida, mas essas políticas, de modo geral, resultarão em um desempenho econômico mais
estável do que teríamos com simples regras de política econômica.
9.4 Velocidade instável e o declínio da influência do monetarismo
sobre as políticas econômicas
O ápice da influência monetarista sobre as políticas econômicas aconteceu no final da década
de 1970. Em outubro de 1979, o Federal Reserve americano deu início ao que foi chamado de
sua experiência monetarista: uma tentativa de assumir o controle da oferta de moeda para conter
a aceleração da taxa de inflação. Também em 1979, a administração Thatcher subiu ao poder no
Reino Unido e adotou uma política monetária que seguia linhas monetaristas. No período pós-
1980, porém, a influência dos monetaristas diminuiu, à medida que a relação moeda-renda
começou a apresentar crescente instabilidade.

FIG 9.6 Velocidade M1 (1979-2005)

9.4.1 Instabilidade recente na relação moeda-renda


A Figura 9.6 mostra a velocidade da medida M1 da oferta de moeda para cada ano de 1979 a
2005 nos Estados Unidos. Na visão monetarista, mudanças na velocidade deveriam ser um fator
menor na explicação do comportamento cíclico do PIB nominal. Se a oferta de moeda e o PIB
nominal movem-se praticamente juntos, a velocidade, que é a razão entre os dois (PY/M),
deveria ser estável. A Figura 9.6 indica, no entanto, que a velocidade esteve sujeita a
considerável instabilidade após 1980. São especialmente dignos de nota os fortes declínios da
velocidade nos períodos de 1985-1987 e 1989-1993 e, depois, o aumento pronunciado da
velocidade entre 1994 e 2001.

9.4.2 Reação monetarista


Devido à instabilidade da relação moeda-renda, a revista The Economist indagou, em 1986:
“Será este o ano em que o monetarismo desaparece?” Os dados do período pós-1980 levaram os
monetaristas a reconsiderar sua posição em algumas áreas, mas não a mudar suas concepções
fundamentais.
A instabilidade da velocidade levou muitos monetaristas a defender regras mais flexíveis para
o crescimento da moeda do que a regra da taxa constante de crescimento da moeda de Friedman.
Alguns deixaram de apoiar regras para a taxa de crescimento da moeda em favor de regras
voltadas diretamente à taxa de inflação. Essas regras serão discutidas no Capítulo 17. Outros
monetaristas continuam a apoiar Friedman, que conclui que “o resumo disso é que continuo
convencido de um princípio fundamental do monetarismo: a moeda é importante demais para ser
deixada a cargo das autoridades de bancos centrais”.9 Friedman manteve-se firme no apoio à sua
regra, tendo escrito em 2003 que “Ainda acredito… que o crescimento constante da moeda
produziria uma trajetória de preços altamente satisfatória e, se permitisse que nos livrássemos do
Federal Reserve System, esse ganho compensaria o sacrifício de outros avanços que uma regra
mais sofisticada pudesse produzir”.10

Conclusão
Neste capítulo, examinamos a crença monetarista na importância da moeda. De acordo com a
posição monetarista, a moeda é o principal determinante da renda nominal. Essa posição
contrasta com a visão keynesiana moderna de que a moeda é uma das diversas variáveis com
efeitos importantes sobre a renda. Essas posições diferentes quanto à importância da moeda
levam os monetaristas e keynesianos a conclusões diversas sobre as políticas econômicas.
Dada a redução da influência do monetarismo sobre as políticas econômicas, pode causar
surpresa que um economista não-monetarista, Bradford De Long, tenha escrito, em 2000, um
artigo com o título “The Triumph of Monetarism”. Também poderia ser motivo de espanto que
Ben Bernanke, outro não-monetarista e, na época, membro da diretoria do Federal Reserve,
tenha escrito em 2003: “O modelo monetarista de Friedman foi tão influente que, pelo menos
em suas linhas gerais, tornou-se quase idêntico à teoria e à prática monetárias modernas”.11
Mas os aspectos centrais do modelo de Milton Friedman de fato tornaram-se parte do senso
comum sobre políticas monetárias, ainda que recomendações de política específicas dos
monetaristas tenham perdido influência. Políticas monetárias baseadas em regras ganharam
popularidade entre economistas acadêmicos e autoridades de bancos centrais. O papel
dominante da política monetária na determinação da inflação foi amplamente aceito. As
concepções de Friedman sobre as limitações de políticas de estabilização também permanecem
fortemente influentes.
Por fim, a pesquisa de Friedman sobre fatores monetários e financeiros na Grande Depressão
teve uma influência pessoal direta sobre Ben Bernanke, que viria a liderar a resposta do Federal
Reserve à crise financeira de 2007-09. Em uma conferência em 2003, Bernanke reconheceu a
responsabilidade do Federal Reserve pela contração monetária de 1929-33 e disse a Friedman:
“Não voltaremos a fazer isso”. Bernanke, durante sua carreira acadêmica, havia estudado
atentamente a Grande Depressão, inclusive a interpretação de Friedman para os eventos. Ele
utilizou as lições aprendidas na formulação de políticas inovadoras para evitar uma repetição
desses eventos.

Questões de revisão
1. Compare as concepções keynesiana e monetarista sobre a determinação da velocidade da
moeda. Como suas visões divergentes sobre a velocidade afetam as respectivas conclusões
sobre políticas econômicas?
2. Por que os primeiros economistas keynesianos eram tão pessimistas quanto à eficácia da
política monetária?
3. Compare a formulação da função demanda por moeda de Milton Friedman com a
especificação keynesiana da mesma função examinada em capítulos anteriores.
4. Mostre como são as curvas IS e LM na visão monetarista. Use essas curvas para ilustrar as
conclusões monetaristas sobre a eficácia relativa das políticas monetária e fiscal.
5. Compare as concepções monetarista e keynesiana sobre a conduta adequada de política
fiscal. Para monetaristas e keynesianos, explique não só as conclusões a que eles chegam
quanto à política fiscal, mas também como essas conclusões relacionam-se às respectivas
teorias.
6. Compare as concepções monetarista e keynesiana moderna sobre a conduta adequada da
política monetária. Para monetaristas e keynesianos, explique não só as conclusões a que eles
chegam quanto à política monetária, mas também como essas conclusões relacionam-se às
respectivas teorias.
7. Analise os efeitos de uma redução dos impostos de T0 para T1 no modelo monetarista. Em
sua resposta, não esqueça de levar em conta o financiamento do déficit resultante da redução
da arrecadação tributária. Como os níveis de equilíbrio da renda e da taxa de juros são
afetados pelo corte nos impostos?
CAPÍTULO 10
Produto, inflação e desemprego: visões alternativas

Neste capítulo, vamos examinar visões alternativas sobre a relação entre os níveis de produto
e desemprego e a taxa de inflação. No Capítulo 1, vimos que, no período de 1953-1969, houve
uma relação negativa entre desemprego e inflação (Figura 1.5a), mas a relação entre essas duas
variáveis depois de 1970 era muito menos clara (Figura 1.5b). Algumas explicações para a
mudança dessa relação serão apresentadas neste capítulo, começando pela teoria da taxa natural
de desemprego de Milton Friedman. Examinaremos também visões keynesianas sobre o trade-
off produto-inflação, incluindo o conceito de taxa natural de Friedman. Por fim, veremos como o
pensamento sobre a taxa natural de desemprego variou ao longo dos 45 anos desde que
Friedman apresentou o conceito e avaliaremos a relevância atual do conceito.

10.1 A teoria da taxa natural


A teoria das taxas naturais de desemprego e produto foi desenvolvida por Milton Friedman
como parte do sistema monetarista. A teoria foi desenvolvida independentemente por Edmund
Phelps, fora do monetarismo.1 Hoje, a teoria da taxa natural é central na questão das relações de
longo prazo entre produto, desemprego e inflação, que precisam ser abordadas por qualquer
sistema macroeconômico. Vamos começar pela formulação de Friedman.
No Capítulo 9, analisamos a proposição monetarista de que mudanças de curto prazo na
oferta de moeda são o determinante primário de flutuações no produto e no emprego. No
entanto, os monetaristas põem uma limitação nos efeitos reais de mudanças na oferta de moeda,
conforme expresso na segunda das proposições monetaristas apresentadas no Capítulo 9.
No longo prazo, a influência da moeda é basicamente sobre o nível de preços e outras
magnitudes nominais. No longo prazo, variáveis reais, como produto e emprego reais, são
determinadas por fatores reais e não monetários.
A base dessa proposição é a teoria das taxas naturais de desemprego e produto
desenvolvida por Milton Friedman.
De acordo com a teoria da taxa natural, existe um nível de equilíbrio do produto e uma taxa
de emprego a ele associada, determinados pela oferta de fatores de produção, tecnologia e
instituições da economia (isto é, determinados por fatores reais). Essa é a taxa natural de
Friedman. Mudanças na demanda agregada, que Friedman acredita serem dominadas por
mudanças na oferta de moeda, causariam movimentos temporários da economia, afastando-a da
taxa natural. Políticas monetárias expansionistas, por exemplo, movem o produto para cima da
taxa natural e a taxa de desemprego para baixo da taxa natural por algum tempo. O aumento da
demanda resultante de tal política expansionista também levaria a uma elevação de preços. No
curto prazo, o ajuste dos preços não seria completo, como na teoria clássica, em que aumentos
na demanda causam elevação nos preços, mas não afetam o produto.
Friedman acredita que, ao longo de um período mais amplo, forças de equilíbrio fazem os
níveis de produto e emprego retornarem a sua taxa natural. Não é possível, na visão de
Friedman, o governo usar uma política monetária para manter a economia permanentemente em
um nível de produto que segure a taxa de desemprego abaixo da taxa natural; pelo menos não é
possível para os formuladores de políticas, a menos que estejam dispostos a aceitar uma taxa de
inflação em aceleração contínua. A taxa natural de desemprego é definida por Friedman como a
taxa de desemprego “que tem a propriedade de ser consistente com o equilíbrio na estrutura de
salários reais”.2 Assim, a taxa natural de desemprego, ou a taxa natural de emprego
correspondente, será aquela em que, a um salário real de equilíbrio, a demanda por mão de obra
é igual à oferta de mão de obra, como mostra a Figura 10.1a.
A curva de demanda por trabalho na parte a da figura é a já conhecida curva do produto
marginal do trabalho (PMgN). Em N*, a taxa natural de emprego, a demanda por trabalho é
igual à oferta de trabalho, ponto em que, ao desenhar a curva de oferta de trabalho, Ns[W/(Pe =
P)], estipulamos que o nível de preços esperado pelos ofertantes de trabalho é igual ao nível de
preço efetivo (Pe = P). Apenas nesse nível de emprego não há nenhuma tendência de mudança
no salário real. A demanda e a oferta de trabalho são equivalentes. Além disso, os ofertantes de
mão de obra têm uma expectativa correta quanto ao nível de preços. Se este não fosse o caso,
haveria uma tendência de mudança da oferta de trabalho quando os trabalhadores percebessem
que suas expectativas estavam erradas.
A taxa natural de desemprego pode ser encontrada simplesmente subtraindo os trabalhadores
empregados da força de trabalho total para encontrar o número de desempregados e, então,
expressando esse número como uma porcentagem da força de trabalho total. Usando a função
produção da Figura 10.1b, podemos encontrar o nível de produto que resultará de um nível de
emprego N*. Essa é a taxa natural de produto, Y*.

Taxas naturais de desemprego e produto


São determinadas por fatores do lado da oferta reais:
o estoque de capital, o tamanho da força de trabalho e
o nível de tecnologia.

FIG 10.1 Taxas naturais de emprego e produto


Na parte a, a taxa natural de emprego (N*) é determinada no ponto em que a oferta de trabalho é igual à demanda por trabalho,
quando os ofertantes de trabalho avaliam corretamente o nível de preço (Pe = P). A taxa natural do produto (Y*) é determinada
na parte b, na função produção.

A Figura 10.1 mostra que as taxas naturais de produto e emprego dependem da oferta de
fatores de produção e da tecnologia da economia – fatores do lado da oferta. As taxas naturais de
produto e emprego não dependem do nível de demanda agregada. Tudo isso é praticamente
igual ao sistema clássico; a diferença entre Friedman e os economistas clássicos é que a teoria de
Friedman não pressupõe que a economia se encontre necessariamente nesses níveis naturais de
emprego e produto no curto prazo.
Como no modelo keynesiano, no modelo de Friedman os ofertantes de trabalho não
conhecem o salário real. Eles precisam basear suas decisões de oferta de trabalho no salário real
esperado (W/Pe). Portanto, no curto prazo, a oferta de trabalho pode não ser dada pela curva de
oferta da Figura 10.1a; Pe pode não ser igual a P. Nesse caso, o emprego e, portanto, o produto
não estarão em suas taxas naturais.
10.2 Política monetária, produto e inflação: a visão monetarista de
Friedman
Para entender por que Friedman acredita que produto e emprego divergem de suas taxas
naturais temporariamente, mas acabarão convergindo para elas, vamos examinar a análise de
Friedman para as consequências de curto e longo prazo de um aumento na taxa de crescimento
da oferta de moeda.

10.2.1 Política monetária no curto prazo


Vamos começar por uma situação em que a economia esteja na taxa natural de desemprego e
produto. Suporemos também que a oferta de moeda (e, portanto, a renda nominal) venha
crescendo a uma taxa igual à taxa de crescimento do produto real. Assim, pressupõe-se que o
nível de preços venha se mantendo estável há algum tempo. Suponhamos agora que a taxa de
crescimento da oferta de moeda aumente para além da taxa compatível com a estabilidade de
preços. Para ter uma imagem mais concreta, vamos imaginar que a taxa de crescimento da oferta
de moeda suba de 3% para 5%.
O aumento da taxa de crescimento da oferta de moeda estimulará a demanda agregada e,
como consequência, a renda nominal. As consequências de curto prazo desse aumento na
demanda agregada são descritas por Friedman como se segue:

Para começar, muito, ou a maior parte, da elevação da renda assumirá a forma de um


aumento no produto e no emprego, mas não nos preços. As pessoas vinham esperando
preços estáveis, e os preços e salários foram definidos para um certo tempo futuro com base
nisso. Leva algum tempo para que as pessoas se ajustem a um novo estado da demanda. Os
produtores tenderão a reagir à expansão inicial da demanda agregada aumentando a
produção; os empregados, trabalhando mais horas; e os desempregados, agora aceitando
trabalhos oferecidos a salários nominais anteriores. Isso é basicamente a doutrina padrão.3

A doutrina padrão a que Friedman se refere é a curva de Phillips. A curva de Phillips é uma
relação negativa entre a taxa de desemprego (U) e a taxa de inflação (P), conforme representado
na Figura 10.2. Altas taxas de crescimento da demanda agregada estimulam a produção e, assim,
baixam a taxa de desemprego. Essas altas taxas de crescimento da demanda também produzem
um aumento na taxa de crescimento dos preços (isto é, elevam a taxa de inflação). Assim, a
curva de Phillips postula um trade-off entre inflação e desemprego; taxas mais baixas de
desemprego podem ser obtidas, mas apenas ao custo de taxas de inflação mais elevadas.4
Friedman está de acordo com essa ideia de um trade-off entre inflação e desemprego no curto
prazo.

Curva de Phillips
É a curva que mostra a relação entre as taxas de
desemprego e de inflação.

10.2.2 Política monetária no longo prazo


O elemento distintivo na análise de Friedman é sua visão dos efeitos de longo prazo da
política monetária. É aqui que a noção da taxa natural de desemprego entra em cena. Acabamos
de examinar os efeitos de curto prazo de um aumento na taxa de crescimento da oferta de moeda
de 3% para 5%. De acordo com a Figura 10.2, o equilíbrio original tinha preços estáveis (P = 0)
e desemprego igual à taxa natural, considerada como sendo 6% (ponto A na Figura 10.2).
Consideramos que, como resultado de um aumento da taxa de crescimento da oferta de moeda, a
economia move-se para um novo equilíbrio de curto prazo, com o desemprego reduzido para
4% e uma taxa de inflação de 2% (ponto B na Figura 10.2). A política de expansão da demanda
agregada reduz a taxa de desemprego para um nível abaixo da taxa natural.

FIG 10.2 A curva de Phillips

No curto prazo, um aumento da taxa de crescimento da oferta de moeda move a economia do ponto A para o ponto B ao longo da
curva de Phillips de curto prazo. O desemprego diminui e a inflação sobe.

Friedman aceita esse resultado:


Mas isso descreve apenas os efeitos iniciais. Como os preços de venda dos produtos
costumam reagir a uma elevação imprevista da demanda nominal mais depressa do que os
preços dos fatores de produção, os salários reais recebidos baixaram – embora os salários
reais esperados pelos empregados tenham subido, uma vez que os empregados avaliaram
implicitamente os salários oferecidos em relação ao nível de preços anterior. Na verdade, a
simultânea queda ex post dos salários reais para os empregadores e elevação ex ante para
os empregados é o que possibilitou o aumento do emprego. Mas o declínio ex post dos
salários reais logo passará a afetar as expectativas. Os empregados começarão a perceber
os preços crescentes das coisas que eles compram e a exigir salários nominais mais altos
para o futuro. O desemprego de “mercado” está abaixo do nível natural. Há um excesso de
demanda por trabalho, assim os salários reais tenderão a subir em direção a seu nível
inicial.5

Friedman ressalta que, no curto prazo, os preços dos produtos aumentam mais depressa que
os preços dos fatores de produção, sendo que o preço de fator crucial é o salário monetário.
Assim, o salário real (W/P) cai. Essa é uma condição necessária para que o produto cresça,
porque as firmas precisam estar na curva de demanda por trabalho mostrada na Figura 10.1. As
firmas só expandem o emprego e a produção com um declínio do salário real.
Friedman não afirma que os trabalhadores estão sempre na curva de oferta de trabalho
mostrada na Figura 10.1. Essa curva expressa a oferta de trabalho como uma função do salário
real efetivo e Friedman não pressupõe que os trabalhadores conheçam o salário real. No curto
prazo, após um período de preços estáveis, pressupõe-se que os trabalhadores avaliem as ofertas
de salário nominal de acordo com “o nível de preços anterior”. Embora os preços tenham
subido, os trabalhadores ainda não perceberam isso e aumentarão a oferta de mão de obra se lhes
for oferecido um salário monetário mais alto, mesmo que esse aumento do salário monetário
seja menor que o aumento do nível de preços, ou seja, mesmo que o salário real seja mais
baixo. No curto prazo, a oferta de trabalho aumenta, porque o salário real ex ante (ou esperado)
é mais alto como resultado do salário nominal mais alto e da percepção inalterada do
comportamento dos preços. A demanda por mão de obra aumenta devido à queda do salário ex
post (efetivo) pago pelo empregador. Em consequência, o desemprego pode ser levado para
baixo da taxa natural.
Essa situação é temporária, pois os trabalhadores acabam por observar o nível de preços mais
alto e demandar salários monetários mais elevados. Em termos da Figura 10.1, o salário real foi
empurrado para baixo de (W/P)*, o salário que equilibra o mercado de trabalho depois que os
ofertantes de mão de obra percebem corretamente o nível de preços e, portanto, o salário real. A
um salário real mais baixo, há um excesso de demanda por trabalho, o que puxa o salário real de
volta para o seu nível de equilíbrio mais alto, e essa elevação do salário real faz o emprego
retornar à taxa natural mostrada na Figura 10.1.
As implicações para a curva de Phillips desse ajuste de longo prazo de volta à taxa natural
são ilustradas na Figura 10.3. A curva denominada CP(Pe = 0) é a curva de Phillips de curto
prazo da Figura 10.2. Aqui, a curva é traçada explicitamente para uma dada taxa de inflação
esperada pelos ofertantes de mão de obra, que neste caso são preços estáveis (Pe = 0, onde Pe é a
taxa de inflação esperada). Já analisamos o processo pelo qual um aumento da taxa de
crescimento da oferta de moeda de 3% para 5% move a economia no curto prazo do ponto A
para o ponto B.

FIG 10.3 Curvas de Phillips de curto e de longo prazo


Quando os ofertantes de trabalho passam a ter expectativa de uma taxa de inflação mais alta, a curva de Phillips para curto prazo
desloca-se de CP(Pe = 0) para CP(Pe = 2%). A taxa de desemprego retorna à taxa natural de 6%; a taxa de inflação permanece
mais alta em 2% (movemo-nos do ponto B para o ponto C).

Quando os ofertantes de mão de obra perceberem que os preços estão subindo, a curva de
Phillips será deslocada para cima e para a direita. Os ofertantes de mão de obra demandarão um
aumento maior dos salários monetários e, como consequência, a qualquer taxa de desemprego
corresponderá uma taxa de inflação mais elevada. Se o crescimento da oferta de moeda
continuar em 5%, a economia retornará à taxa natural de desemprego de 6%, mas agora com
uma taxa de inflação de 2% em vez do nível de preços estável inicial. Na Figura 10.3, esse ajuste
de longo prazo move a economia do ponto B para o ponto C.
Um formulador de políticas que não esteja satisfeito com esse retorno ao desemprego de 6%
(a taxa natural) talvez continue a buscar uma meta de taxa de desemprego abaixo da taxa natural,
aumentando novamente a taxa de crescimento da oferta de moeda. Vamos supor que, desta vez,
ele aumente o crescimento da oferta de moeda de 5% para 7%. Os efeitos dessa nova expansão
da demanda agregada são ilustrados na Figura 10.4. Até que os ofertantes de mão de obra
percebam o novo aumento da taxa de inflação, o emprego vai se expandir. A economia se
moverá para um ponto como D na Figura 10.4, com o desemprego abaixo da taxa natural.

FIG 10.4 Efeito de uma tentativa de “fixar” a taxa de desemprego


Aumentos no crescimento da moeda, para 5%, depois 7%, depois 9%, resultam em reduções temporárias no desemprego
(movimentos de C para D e de E para F, por exemplo). Mas, no prazo mais longo, simplesmente nos deslocamos para cima na
curva de Phillips vertical (para os pontos E e G, por exemplo).

Os ofertantes de mão de obra, após certo tempo, passarão a antecipar a taxa de inflação mais
alta que corresponde a um crescimento de 7% na oferta de moeda. A curva de Phillips para o
curto prazo será deslocada para a curva indicada por CP (Pe = 4%) e a economia retornará à taxa
natural de desemprego, com a taxa de inflação aumentada para 4% (7% de crescimento
monetário menos 3% de crescimento da renda real). Na Figura 10.4, movemo-nos do ponto D
para o ponto E. Se o formulador de políticas persistir em sua tentativa de fixar a taxa de
desemprego, ele aumentará mais uma vez o crescimento da oferta de moeda, por exemplo, para
9%. Isso moverá a economia no curto prazo para o ponto F, mas, no longo prazo, para o ponto
G, com uma taxa de inflação ainda mais alta.
Em determinado momento, o formulador de políticas econômicas será levado a concluir que a
inflação tornou-se um problema mais sério do que o desemprego (ou será substituído por outro
que tenha tal percepção) e a aceleração da inflação será estancada. Repare, porém, que, quando a
inflação já vem persistindo por um longo tempo, expectativas inflacionárias consolidam-se no
sistema. Em um ponto como o ponto G na Figura 10.4, as políticas de expansão da demanda
agregada aumentaram a taxa de inflação esperada (e efetiva) para 6% (9% de crescimento
monetário menos 3% de crescimento da renda real). Uma tentativa de baixar a inflação
reduzindo a taxa de crescimento da oferta de moeda, suponhamos que de volta aos 3% não-
inflacionários iniciais, não fará a economia voltar imediatamente a um ponto como o ponto
inicial A. No curto prazo, nós nos moveríamos ao longo da curva de Phillips de curto prazo
correspondente a uma taxa de inflação esperada de 6%, até um ponto como H na Figura 10.4,
com inflação alta e desemprego acima da taxa natural. Assim como levou tempo para que os
ofertantes de mão de obra reconhecessem que a taxa de inflação havia subido e, portanto, para
que demandassem uma taxa de crescimento mais rápida dos salários monetários, levará tempo
para que eles reconheçam que a taxa de inflação desacelerou e modifiquem suas demandas de
salário monetário para um nível compatível com a estabilidade de preços. Enquanto isso, na
visão monetarista, a economia sofrerá com alta inflação e alto desemprego.
Friedman acreditava que uma política monetária expansionista só consegue mover a taxa de
desemprego para baixo da taxa natural temporariamente. Há um trade-off entre desemprego e
inflação apenas no curto prazo. Em termos das Figuras 10.3 e 10.4, as curvas de Phillips de curto
prazo de inclinação negativa que são traçadas para determinadas taxas de inflação esperadas
ilustram o trade-off de curto prazo entre desemprego e inflação. A curva de Phillips de longo
prazo que mostra a relação entre inflação e desemprego quando a inflação esperada já teve
tempo de se ajustar à taxa de inflação efetiva (P = Pe) – quando a inflação é totalmente
antecipada – é vertical, conforme mostrado nas Figuras 10.3 e 10.4.

10.3 Uma visão keynesiana do trade-off produto-inflação


A teoria da taxa natural de desemprego proposta por Friedman explica as relações de curto e
de longo prazo entre inflação e desemprego. Qual é a visão keynesiana da curva de Phillips e
como ela difere da teoria da taxa natural? Como os keynesianos podem defender políticas ativas
para influir no produto e no emprego se a teoria da taxa natural estiver correta e tais políticas
tiverem apenas um efeito temporário sobre o produto e o emprego? Essas são as questões
consideradas nesta seção.
Já antecipando nossas conclusões, encontramos o seguinte:
1. Os modelos keynesianos tradicionais, como os examinados no Capítulo 8, também
implicam que, uma vez que a economia tenha se ajustado totalmente a uma mudança na
inflação (causada, por exemplo, por uma mudança no crescimento da oferta de moeda), o
produto e o emprego não serão afetados. Esses modelos keynesianos também resultam em
uma curva de Phillips vertical.
2. Os keynesianos, porém, tiram conclusões de política econômica diferentes dessa ausência
de um trade-off no longo prazo entre inflação e desemprego.

10.3.1 A curva de Phillips: uma interpretação keynesiana


A visão dos keynesianos sobre a relação entre a taxa de inflação e os níveis de emprego e de
produto decorre diretamente de sua teoria de como preço e produto são determinados. Aqui,
relacionamos essa teoria à curva de Phillips.

10.3.1.1 A curva de Phillips de curto prazo


A Figura 10.5 mostra o efeito sobre preço, produto e emprego de uma sequência de ações de
política econômica expansionista que aumentam a demanda agregada. A versão do modelo
keynesiano aqui é a mesma da Seção 8.4. O salário monetário é flexível e a oferta de trabalho é
considerada dependente do salário real esperado (W/Pe), o salário monetário dividido pelo nível
de preços esperado.
No sistema keynesiano, uma política de expansão da demanda agregada poderia ser uma ação
de política monetária, como o aumento da taxa de crescimento da oferta de moeda analisado na
seção anterior, ou poderia ser uma ação de política fiscal, como uma série de aumentos nos
gastos do governo. Em qualquer um dos casos, a política produzirá uma série de deslocamentos
na curva de demanda agregada, conforme mostrado na Figura 10.5a. Como pode ser visto
observado, esses aumentos na demanda agregada aumentarão do produto (de Y0 para Y1 para Y2
e para Y3) e o emprego (de N0 para N1 para N2 e para N3), assim como o nível de preços (de P0
para P2 para P2 e para P3). Conforme o emprego aumenta, a taxa de desemprego declina. O
valor do salário monetário também sobe.

FIG 10.5 Efeitos de curto prazo de aumentos da demanda agregada no modelo keynesiano

Uma política de expansão da demanda agregada, como um aumento da taxa de crescimento da oferta de moeda, causará uma
série de deslocamentos para a direita na curva de demanda agregada (de Yd0 para Yd0 para Yd2 para Yd3) No curto prazo, o
produto, o nível de preços e o emprego aumentam.

Esses resultados podem ser interpretados em termos de uma relação de curva de Phillips.
Quanto mais depressa a demanda agregada crescer, maiores serão os deslocamentos para a
direita da curva de demanda agregada e, permanecendo os outros fatores inalterados, mais rápida
será a taxa de crescimento do produto e do emprego. Para um dado aumento da força de
trabalho, isso significa que a taxa de desemprego será mais baixa quanto mais rápida for a taxa
de crescimento da demanda agregada. Como também pode ser observado na Figura 10.5a,
aumentos na demanda agregada fazem o nível de preços subir, assim, uma vez mais
permanecendo inalterados os outros fatores, quanto mais rápido for o crescimento da demanda
agregada, maior será a taxa de inflação.
O modelo keynesiano, portanto, envolve um trade-off entre inflação e desemprego. Altas
taxas de crescimento da demanda correspondem a baixos níveis de desemprego e altas taxas de
inflação. Um crescimento mais lento da demanda agregada significa uma taxa de inflação mais
baixa, porém uma taxa de desemprego maior. A curva de Phillips resultante do modelo
keynesiano tem inclinação negativa.
Mas essa é uma relação de curto prazo ou de longo prazo? Observe que, até aqui, estamos
mantendo o nível de preços esperado constante. Estamos examinando os efeitos de aumentos na
demanda no curto prazo. Como foi explicado no Capítulo 8, os keynesianos consideram que o
nível de preços esperado depende basicamente do comportamento passado dos preços. Assim,
conforme forem ocorrendo períodos sucessivos com aumentos do nível efetivo de preços, o
nível de preços esperado vai subir. No longo prazo, precisamos levar em conta os efeitos desses
aumentos sobre o nível de preços esperado. Como não fizemos isso na Figura 10.5, nossos
resultados ali e a relação da curva de Phillips derivada deles referem-se ao curto prazo. Para
enfatizar seu caráter de curto prazo, chamamos a curva de oferta de trabalho de Ns(Pe0) e a curva
de oferta agregada de Ys(Pe0), indicando que essas curvas são traçadas para o valor inicial do
nível de preços esperado. Na Figura 10.6, identificamos curva de Phillips resultante do exemplo
da Figura 10.5 como curva de Phillips de curto prazo, CP(curto prazo).6

10.3.1.2 A curva de Phillips de longo prazo


No longo prazo, o preço esperado ajusta-se ao preço efetivo. Os ofertantes de mão de obra
percebem a inflação que resultou da política de expansão da demanda agregada.

FIG 10.6 A curva de Phillips: a perspectiva keynesiana

No curto prazo, a curva de Phillips resultante do modelo keynesiano tem inclinação negativa. No longo prazo no modelo
keynesiano, como na análise de Friedman, a curva de Phillips é vertical.

O ajuste de longo prazo do produto e do emprego depois de aumento da demanda agregada é


ilustrado na Figura 10.7. Lembre-se que, no sistema keynesiano, a oferta de trabalho depende do
salário real esperado:

onde o efeito do salário monetário sobre a oferta de trabalho é positivo e o efeito de um aumento
dos preços esperados é negativo. Quando os preços esperados sobem, a curva de oferta de
trabalho na Figura 10.5b desloca-se para a esquerda. Menos mão de obra será ofertada para
qualquer salário monetário (W), uma vez que um dado salário monetário corresponde a um
salário real esperado mais baixo (W/Pe) depois de um aumento do nível esperado de preços. Esse
deslocamento da curva de oferta de trabalho é mostrado na Figura 10.7b. Conforme o nível de
preços esperado sobe para para , e depois para a curva de oferta de trabalho desloca-se
para , para , depois para depois para .
Quando a curva de oferta de trabalho desloca-se para a esquerda, o nível de emprego para
qualquer nível de preços dado declina. Subimos novamente ao longo de uma dada curva de
demanda por trabalho (que é traçada para um determinado nível de preços). O aumento dos
preços esperados reduz o emprego em qualquer nível de preços e, portanto, reduz o produto
ofertado em qualquer nível de preços. A curva de oferta agregada também se desloca para cima
e para a esquerda a cada aumento dos preços esperados, refletindo esse declínio no produto
ofertado a um dado nível de preços. Esses deslocamentos da curva de oferta estão ilustrados na
Figura 10.7a.
As curvas de oferta de trabalho e de oferta agregada continuam a se deslocar para a esquerda
até que o preço esperado e o preço efetivamente praticado sejam iguais. A posição de equilíbrio
de longo prazo é mostrada na Figura 10.7, onde a curva de oferta de trabalho é ea
curva de oferta agregada é . Observe que, nesse ponto, a renda e o emprego voltaram
a seus níveis iniciais, Y0 e N0. Isso deve acontecer porque produto e emprego só podem ser
mantidos acima de Y0 e N0 enquanto o preço esperado estiver abaixo do preço efetivo, ou seja,
apenas enquanto os ofertantes de trabalho subestimarem a inflação. Assim que os ofertantes de
trabalho perceberem corretamente os aumentos no nível de preços, eles demandarão aumentos
no salário monetário proporcionais ao aumento do nível de preços. Nesse ponto, o salário real
terá retornado a seu nível inicial (W3/P3 = W0/P0). Tanto a oferta como a demanda por trabalho
terão voltado a seus níveis iniciais. Em consequência, emprego e produto estarão em seus níveis
iniciais de N0 e Y0.7 Um aumento na demanda agregada eleva o produto e o emprego e, em
consequência, diminui a taxa de desemprego apenas no curto prazo. Como é mostrado na Figura
10.6, a curva de Phillips de longo prazo é vertical tanto na visão keynesiana como na de
Friedman.

FIG 10.7 Efeitos de longo prazo de aumentos da demanda agregada no modelo keynesiano
No longo prazo, deslocamentos para a esquerda da curva de oferta de trabalho e da curva de oferta agregada revertem os
aumentos no produto e no emprego resultantes da política de expansão da demanda agregada. Produto e emprego retornam a seus
níveis iniciais, Y0 e N0.

10.3.2 Políticas de estabilização para o produto e o emprego: a visão


keynesiana
Por que a ausência de um efeito de longo prazo da demanda agregada sobre o produto e o
emprego não leva os keynesianos a aceitar uma posição não-intervencionista em relação a
políticas econômicas? A razão é que, na visão keynesiana, políticas de demanda agregada visam
a estabilizar o produto e o emprego no curto prazo.
A meta de tais políticas de estabilização é manter a economia em seu nível de equilíbrio
diante de choques de demanda ou oferta agregada. Em outras palavras, o objetivo de políticas de
estabilização é, como o nome indica, compensar influências potencialmente desestabilizadoras
sobre o produto e o emprego.
A conclusão de Friedman quanto a políticas não-intervencionistas baseia-se, em grande
medida, nas proposições discutidas no Capítulo 9. O setor privado é basicamente estável se
deixado por sua própria conta. Assim, não esperaríamos grandes choques desestabilizadores
sobre a demanda do setor privado por produto. Mesmo que ocorressem tais deslocamentos na
demanda do setor privado (deslocamentos indesejáveis na curva IS), eles teriam pouco efeito
sobre o produto se a oferta de moeda fosse mantida constante, por causa da forte inclinação da
curva LM. Pequenos choques poderiam fazer o produto e o emprego desviarem-se um pouco da
taxa natural, mas Friedman e outros monetaristas não acreditam que nosso conhecimento da
economia nos permita prever tais choques e projetar políticas com precisão suficiente para
compensá-los.
Ainda seria possível argumentar que, deixado à sua própria conta, o setor privado produz
níveis de equilíbrio de produto e emprego que são “indesejáveis”. O desemprego poderia ser
“alto demais”. Seria possível propor, então, que o papel da política monetária seja assegurar que
o desemprego e o produto fiquem em níveis “desejáveis”. A teoria da taxa natural de
desemprego mostra que a política monetária não pode cumprir esse papel e indica que tentativas
de alcançar tais metas de desemprego arbitrárias terão efeitos desestabilizadores sobre o nível de
preços no longo prazo.
Se não aceitarmos as outras proposições dos monetaristas – e os keynesianos não aceitam –,
há ainda um papel de curto prazo para políticas econômicas de estabilização, sejam elas
monetárias ou fiscais. Os keynesianos acreditam que a demanda agregada do setor privado é
instável, basicamente por causa da instabilidade da demanda por investimento. Os keynesianos
creem que, mesmo para uma dada oferta de moeda, tais mudanças na demanda agregada do
setor privado podem causar flutuações grandes e prolongadas na renda. Consequentemente,
acreditam que políticas monetárias e fiscais devem ser usadas para compensar tais mudanças
indesejáveis na demanda agregada e estabilizar a renda.

10.4 Evolução do conceito de taxa natural


O propósito de Milton Friedman ao sugerir o conceito de taxas naturais de produto e emprego
foi ilustrar uma limitação da política monetária. A política monetária não podia reduzir
permanentemente o desemprego a níveis abaixo da taxa natural, pelo menos não sem causar uma
taxa de inflação em aceleração constante. Nas três décadas desde que Friedman introduziu o
conceito, porém, muita atenção tem sido focada também no que determina a taxa natural e em
qual é o seu valor para diferentes países.8 Se, por exemplo, é importante para os formuladores de
políticas evitar levar a taxa de desemprego a níveis abaixo da taxa natural que desencadeiem
pressões inflacionárias, como podem saber até onde é possível reduzir com segurança a taxa de
desemprego? Esta se tornou uma questão crucial nos Estados Unidos no final da década de
1990, quando a taxa de desemprego caiu ao nível mais baixo dos últimos 30 anos.

10.4.1 Determinantes da taxa natural de desemprego


Friedman abordou a questão do que determina a taxa natural de desemprego. Como vimos, a
taxa natural é aquela que é coerente com um salário real de equilíbrio. Dentro de nosso modelo
do mercado de trabalho, isso é simplesmente o equilíbrio entre a oferta e a demanda de trabalho,
sujeitas à condição de que os ofertantes de trabalho avaliem corretamente o nível de preços.
Friedman afirmou que, no mundo real, a taxa natural seria a taxa gerada por um processo de
obtenção de equilíbrio que também seria afetado pelas “características estruturais efetivas do
trabalho e dos mercados de mercadorias, incluindo imperfeições do mercado, variabilidade
estocástica em demandas e ofertas, o custo de coletar informações sobre vagas de trabalho e
disponibilidades de mão de obra, o custo da mobilidade, e assim por diante”.9 Essas
características adicionais são consideradas determinadoras dos níveis de desemprego friccional e
estrutural. Seria de esperar que a baixa mobilidade da mão de obra em um país, por exemplo,
levasse a uma taxa natural de desemprego mais alta, porque, quando a demanda se deslocasse de
uma região do país para outra, os trabalhadores não seguiriam rapidamente. Informações ruins
sobre vagas de emprego também poderiam levar a uma taxa natural de desemprego mais alta,
uma vez que os trabalhadores demoram mais para encontrar empregos iniciais ou para se mover
entre empregos. Na visão de Friedman, portanto, a taxa natural em cada país será determinada
pelas características estruturais dos mercados de trabalho e de bens desse país.

10.4.2 Taxas naturais de desemprego que variam com o tempo


Um observador comentou que “quando Milton Friedman propôs a hipótese da taxa natural…
em 1968, era como se um edito real tivesse estabelecido a taxa natural como mais uma das
constantes invariáveis do universo”.10 Se, como Friedman afirmava, a taxa natural de emprego
depende das características estruturais dos mercados de trabalho e de bens de um país, não há
razão para que ela precise ser constante ao longo do tempo, embora se espere que as mudanças
sejam graduais e não abruptas. De fato, o comportamento do desemprego ao longo das três
últimas décadas indica que, se a taxa natural de desemprego for mesmo um conceito a ser levado
em consideração, ela precisa ser variável com o tempo.
Para entender a razão, consideremos os números referentes ao desemprego em países
selecionados da Europa na Tabela 10.1. As cinco primeiras colunas mostram as taxas de
desemprego médias em oito países em cinco períodos que variam em duração de 6 a 19 anos
(ignoremos as duas últimas colunas por enquanto). As médias ao longo de períodos dessa
extensão devem apresentar aproximações razoáveis da taxa natural. Se houver uma tendência de
que o desemprego se mova para uma taxa específica, como é sugerido pela hipótese da taxa
natural, o desemprego efetivo deve flutuar em torno dessa taxa – às vezes acima dela, às vezes
abaixo. Se a média da taxa de desemprego ao longo desses períodos de fato fornece uma
estimativa da taxa natural, então a taxa natural de desemprego nos países mostrados na tabela
esteve em ascensão nas três últimas décadas. Quase todas atingiram níveis extremamente
elevados na década de 1990.11

Tabela 10.1 - Taxas de desemprego europeias, períodos selecionados (em %)

Fonte: Historical Statistics, 1960-89, 1990-2006 (Paris: Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) e
Economic Outlook (dezembro 2007, 2011).

Nos Estados Unidos, há também evidências de uma taxa natural de desemprego variável com
o tempo. Como na Europa, a taxa de desemprego apresentou uma tendência de alta nos Estados
Unidos nas décadas de 1970 e 1980, embora menos acentuada. Na década de 1990, porém, o
comportamento da taxa de desemprego americana foi bem diferente do observado na maioria
das economias europeias. A taxa de desemprego nos Estados Unidos caiu continuamente ao
longo dessa década, até 4% em 2000, antes de subir quando uma recessão teve início em 2001.

10.4.3 Explicação das mudanças nas taxas naturais de desemprego


Há uma vasta literatura sobre o aumento aparente da taxa natural de desemprego nos países
europeus.12 Uma causa possível apontada pelos pesquisadores é a rigidez dos mercados de
trabalho europeus, especialmente nas nações que são membros da União Europeia. As
regulações do mercado de trabalho nos países da União Europeia incluem limitações para
fechamentos de fábricas e provisões para indenização obrigatória por rescisões de contratos de
trabalho que podem desestimular as firmas a expandir o emprego. Os países europeus são
também fortemente sindicalizados, o que pode resultar em rigidez dos salários. Além disso, os
países europeus costumam ter seguros-desemprego generosos e outros benefícios sociais que
tornam o desemprego menos doloroso.
O desemprego crescente na Europa pode não ser resultado de aumentos da rigidez e da
generosidade da rede de segurança sociais, mas talvez resultem da crescente concorrência de
países com salários mais baixos, em particular as economias asiáticas em rápido crescimento,
dada a rigidez existente dos mercados de trabalho e dos níveis dos benefícios. Em outras
palavras, a concorrência crescente, em vez de levar para baixo os salários reais europeus, eleva o
desemprego na Europa.
Uma explicação alternativa para o alto desemprego europeu foca-se na ideia de que o valor
corrente da taxa de desemprego pode ser fortemente influenciado por seus valores passados –
uma propriedade chamada histerese. Por essa perspectiva, o alto desemprego nas recessões das
décadas de 1970 e 1980, que foi de natureza cíclica, teve efeitos duradouros sobre o desemprego
em anos posteriores. Os processos econômicos que resultam em desemprego e apresentam a
propriedade de histerese são examinados no Capítulo 12, que estuda direções recentes da
pesquisa keynesiana.

Histerese
Propriedade de que, quando uma variável é afastada
de um valor inicial por um choque, ela não apresenta
nenhuma tendência a retornar mesmo depois de
passado o choque. Taxas de desemprego
persistentemente altas em muitos países europeus
levaram economistas a argumentar que o desemprego
exibe histerese.

O comportamento divergente do desemprego nos Estados Unidos e na Europa, especialmente


na década de 1990, foi atribuído a características estruturais diferentes dos mercados de trabalho
nas duas regiões. De acordo com essa visão, a maior flexibilidade do mercado de trabalho
americano, devido a menos regulações e menor sindicalização, fez com que a maior
concorrência internacional e mudanças tecnológicas com exigência de qualificação levassem a
uma estagnação dos salários reais nos Estados Unidos (em especial para trabalhadores não
qualificados) em vez de conduzir a uma desaceleração do crescimento dos empregos e a uma
alta do desemprego. Além disso, nos anos pós-1990, qualquer efeito de histerese foi favorável
nos Estados Unidos, uma vez que o ambiente de baixo desemprego vinha sendo mantido há um
longo período.

10.4.4 Tendências recentes


Agora, consideremos as duas colunas mais à direita na Tabela 10.1. A primeira delas traz a
taxa de desemprego média em 2005-07, que foi o pico antes da profunda recessão mundial que
teve início no final de 2007. O alto desemprego continuou nas grandes economias europeias
continentais (cinco primeiras linhas). Isso reflete o alto desemprego em toda a zona do euro
(moeda comum europeia), que foi, em média, de 8% ao longo desse período. Em contraste, nos
Estados Unidos, depois da recuperação da recessão de 2001, o desemprego estabilizou-se na
faixa de 4% a 5% durante esses anos. Essa experiência foi consistente com a explicação do
desemprego europeu mais alto como consequência da rigidez dos mercados de trabalho.
A última coluna da tabela, porém, acrescenta complexidade ao quadro. Todos os países
incluídos na tabela foram atingidos pela recessão e, em todos eles, o desemprego subiu. A
coluna mostra a taxa de desemprego em novembro de 2011, após dois anos de recuperação.
Nessa ocasião, em vários países cuja rigidez do mercado de trabalho era considerada uma fonte
de uma taxa natural de desemprego alta, o mercado de trabalho havia se recuperado. A taxa de
desemprego na Alemanha era mais baixa do que antes da recessão e praticamente a mesma de
antes na França e na Itália. No Reino Unido e nos Estados Unidos, onde a taxa de desemprego
ainda estava acima de 8% no final de 2011, o emprego havia caído mais e se recuperado mais
lentamente do que nesses países europeus continentais. Na crise, a flexibilidade do mercado de
trabalho parece ter tornado mais fácil demitir trabalhadores. Os dados sugerem que pode haver
um trade-off no tipo de estruturas de mercado de trabalho que produzem menos desemprego
cíclico e aquelas que contribuem para uma taxa natural de desemprego mais baixa.
O quadro indicado acima, porém, é complexo. A Dinamarca, que havia instituído
anteriormente reformas no mercado de trabalho que reduziram de modo significativo o
desemprego por volta de 2005, passou pela recessão com relativamente pouco desemprego
cíclico. (Veja a última linha da tabela.) A Espanha e a Irlanda, atingidas por forte crise
imobiliária e problemas bancários, viram o desemprego disparar. Atualmente, para a maioria dos
países, o alto desemprego é o problema macroeconômico predominante.

Conclusão
A teoria das taxas naturais de desemprego e produto de Friedman foi muito influente. Ela
demonstra os limites do trade-off entre inflação e desemprego. No entanto, as aparentes grandes
variações da taxa natural de desemprego na Europa levaram alguns a duvidar da utilidade do
conceito para orientar a política macroeconômica. Robert Solow, por exemplo, afirma que “uma
taxa natural que varia… sob a influência de forças inespecíficas, incluindo taxas de desemprego
passadas, não pode ser chamada de ‘natural’”.13
Em contraste, Joseph Stiglitz, chefe do Conselho de Assessores Econômicos na
administração Clinton, defende o conceito, acreditando que “a taxa natural oferece um modelo
útil para pensar sobre questões de política econômica, mesmo que haja considerável incerteza
quanto à sua magnitude exata”.14

Questões de revisão
1. Explique o conceito da taxa natural de desemprego. Quais são as implicações da teoria da
taxa natural de desemprego de Milton Friedman para a eficácia das políticas de estabilização
econômica?
2. Contraste as visões de Friedman e dos keynesianos sobre a relação entre o produto (ou o
emprego) real e a demanda agregada no curto e no longo prazo. Compare as conclusões que
Friedman e os keynesianos tiram dessa análise da relação demanda agregada-produto em
relação à utilidade de políticas econômicas ativas para estabilizar o produto e o emprego. Em
que grau as diferenças na análise teórica explicam as diferenças nas conclusões sobre
políticas econômicas?
3. Explique o conceito da curva de Phillips. Há alguma diferença entre as visões de Milton
Friedman e keynesiana da curva de Phillips de curto prazo?
4. No final da década inflacionária de 1970, há uma percepção geral de que o Federal Reserve
americano moveu-se para uma política monetária muito mais restritiva. Como você acha que
Milton Friedman usaria o esquema da curva de Phillips das Figuras 10.2 e 10.3 para analisar
os efeitos que essa mudança de política teria sobre a inflação e o desemprego?
5. “Um choque de oferta, como o aumento exógeno no preço da gasolina analisado na Seção
8.5, não teria nenhum efeito sobre a renda real ou nominal dentro do modelo monetarista.
Isso acontece porque tal choque de oferta não afetaria a quantidade de moeda que é o fator
dominante na determinação da renda nominal e, no curto prazo, também da renda real.” Você
concorda ou discorda dessa afirmação? Explique.
6. Milton Friedman dizia com frequência que o verdadeiro trade-off não era entre inflação e
desemprego, mas entre o desemprego hoje e o desemprego no futuro. O que você acha que
ele queria dizer com isso? Como essa afirmação se relaciona com as Figuras 10.2 e 10.3?
7. Tanto no modelo de Friedman como no keynesiano da curva de Phillips, a formação de
expectativas de inflação desempenha um papel importante. Explique como as expectativas
são formadas nos dois modelos. Há alguma diferença na formação de expectativas entre os
modelos?
8. A partir do final da década de 1960, o número de ingressantes no mercado de trabalho
aumentou com a chegada da geração “baby boom” à idade produtiva. Além disso, as taxas de
participação das mulheres na força de trabalho começaram a subir em meados da década de
1960. Que efeito você acha que esses fatores demográficos tiveram sobre a taxa natural de
desemprego americana na época? Que efeito tiveram sobre a taxa natural de produto?
9. Os dados da Tabela 10.1 referentes ao desemprego europeu são consistentes com a existência
de uma taxa natural de desemprego nesses países? Explique.
CAPÍTULO 11
A economia novo-clássica

O próximo sistema teórico que estudaremos, a economia novo-clássica, foi desenvolvido


tendo como pano de fundo os altos níveis de inflação e desemprego da década de 1970 e a
consequente insatisfação com a ortodoxia keynesiana dominante. Tanto o monetarismo como a
economia novo-clássica têm suas origens na economia clássica e ambas as escolas de
economistas chegam a conclusões similares em termos de políticas não-intervencionistas. Robert
Lucas, a figura central no desenvolvimento da economia novo-clássica, basicamente concorda
com a proposta de regras de política não-intervencionistas de Milton Friedman.1 Muito no
espírito de Friedman, Lucas diz, “Como uma profissão que oferece conselhos, estamos indo
além de nossas possibilidades”.2 De fato, os economistas novo-clássicos são ainda mais céticos
que Friedman quanto à utilidade de políticas ativas de estabilização.
A economia novo-clássica, porém, representa um ataque mais fundamental ao sistema teórico
keynesiano do que o monetarismo. Monetaristas e keynesianos chegam a conclusões diferentes
sobre políticas econômicas e divergem em uma série de questões empíricas, mas, no Capítulo 9,
não apresentamos um modelo teórico monetarista essencialmente distinto. Os economistas novo-
clássicos foram motivados por uma crença de que a estrutura teórica keynesiana é
fundamentalmente falha. Eles atacaram não só à utilidade da análise keynesiana para
compreender eventos econômicos e projetar políticas úteis, mas também a sua coerência interna.
O modo alternativo que os economistas novo-clássicos propõem para abordar questões
macroeconômicas é importante não só para sua própria teoria, conforme delineada neste
capítulo, mas também para a teoria dos ciclos reais de negócios e para a análise novo-
keynesiana que examinamos no Capítulo 12.
Este capítulo apresenta primeiro a crítica dos economistas novo-clássicos à macroeconomia
keynesiana, centrando-se especialmente nas diferenças das conclusões sobre políticas
econômicas dos dois grupos (Seção 11.1). Em seguida, oferecemos uma visão mais ampla da
economia novo-clássica (Seção 11.2). Examinamos em seguida a resposta keynesiana à
economia novo-clássica (Seção 11.3). A última seção (11.4) traz comentários finais sobre o
estado atual da controvérsia entre economistas keynesianos e novo-clássicos.

11.1 A posição novo-clássica


Já citamos a opinião keynesiana de Franco Modigliani de que uma economia de iniciativa
privada precisa ser, pode ser e deve ser estabilizada por uma administração governamental ativo
da demanda agregada. O princípio central de política econômica da economia novo-clássica é
que a estabilização de variáveis reais, como produto e emprego, não pode ser alcançada pela
administração da demanda agregada. Os valores dessas variáveis tanto no curto como no longo
prazo são insensíveis a políticas sistemáticas de administração da demanda agregada. Em outras
palavras, na visão novo-clássica, ações sistemáticas de política fiscal e monetária que alterem a
demanda agregada não afetarão o produto e o emprego nem mesmo no curto prazo. A isso deu-
se o nome de proposição novo-clássica da ineficácia de políticas econômicas.

Proposição novo-clássica da ineficácia de políticas econômicas


Afirma que ações sistemáticas de política fiscal e monetária que alterem a
demanda agregada não afetarão o produto e o emprego nem mesmo no curto
prazo.

11.1.1 Uma revisão da posição keynesiana


Para entender a base dessa posição novo-clássica sobre políticas, precisamos primeiro
examinar a crítica dos economistas novo-clássicos à macroeconomia keynesiana. Um bom
começo é uma revisão da análise keynesiana das relações entre produto, emprego reais e
demanda agregada, conforme discutido na Seção 10.3. Consideremos os efeitos no modelo
keynesiano de uma ação de política expansionista, por exemplo um aumento na oferta de moeda.
No curto prazo, tal ação de política econômica aumentaria a demanda agregada. A curva de
demanda agregada seria deslocada para a direita ao longo da curva de oferta agregada de
inclinação positiva (como ilustrado, por exemplo, na Figura 10.5a). O nível de preços e o nível
do produto subiriam. Paralelamente ao aumento do produto, ocorre um aumento no emprego
decorrente da maior demanda por trabalho, com a elevação dos preços deslocando a curva de
demanda por trabalho para a direita ao longo da curva de oferta de trabalho de inclinação
positiva (traçada em relação ao salário monetário), como é ilustrado, por exemplo, na Figura
10.5b.
É crucial para esses resultados o fato de que as posições da curva de oferta agregada e da
curva de oferta de trabalho são fixas no curto prazo. A posição de ambas essas curvas depende
do valor do nível de preços esperado (Pe), que se pressupõe ser basicamente dependente dos
preços passados e não mudar de acordo com as ações de política do momento.
No longo prazo, o nível de preços esperado converge para o nível de preços efetivo e tanto a
curva de oferta agregada como a curva de oferta de trabalho deslocam-se para a esquerda. Os
níveis iniciais de emprego e de produto são restaurados, e apenas o nível de preços e o salário
monetário mantêm-se permanentemente mais altos como resultado do aumento da oferta de
moeda (veja a Figura 10.7). O produto e o emprego ficam acima de seus níveis de equilíbrio de
longo prazo apenas pelo tempo necessário para que os ofertantes de trabalho percebam
corretamente a mudança no nível de preços que resulta da ação de política expansionista. Na
medida em que nossa atenção esteja confinada a ações de política monetária, os monetaristas
concordariam com essa análise acima.

11.1.2 O conceito das expectativas racionais e suas implicações


Os economistas novo-clássicos não concordam. Em particular, eles não aceitam a diferença
entre os resultados de curto e de longo prazo na análise keynesiana ou monetarista dos efeitos da
demanda agregada sobre o produto e o emprego. O ponto focal de sua crítica é o pressuposto
keynesiano (e monetarista) referente à formação de expectativas de preços. Essa formulação
pressupõe que os ofertantes de trabalho formam uma expectativa do nível de preços agregado
atual (ou da taxa de inflação) com base no comportamento passado dos preços. Na prática,
keynesianos e monetaristas pressupuseram que tais expectativas de preços ajustam-se
lentamente e podem ser consideradas fixas para a análise dos efeitos de políticas econômicas em
períodos curtos.
Os economistas novo-clássicos criticam essas formulações de formação de expectativas como
ingênuas ao extremo. Por que, perguntam eles, agentes econômicos racionais iriam se basear
apenas em valores passados para formar uma expectativa do nível de preços? Em especial, por
que fariam isso se, de maneira geral, tal comportamento resulta sistematicamente em erro
quando a demanda agregada muda? Estivemos considerando que, após mudanças na demanda
agregada, como o aumento na oferta de moeda examinado na subseção anterior, os ofertantes de
trabalho não percebem que a mudança da demanda afetará os preços.
Os economistas novo-clássicos propõem que os agentes econômicos formarão expectativas
racionais – racionais no sentido de que não cometerão erros sistemáticos. De acordo com a
hipótese das expectativas racionais, as expectativas são formadas com base em todas as
informações relevantes disponíveis sobre a variável que está sendo prevista. Além disso, a
hipótese afirma que os indivíduos usam as informações disponíveis com inteligência; ou seja,
eles compreendem o modo como as variáveis que observam afetarão a variável que estão
tentando prever. De acordo com a hipótese das expectativas racionais, portanto, as expectativas
são, como sugeriu o criador do conceito, John Muth, “essencialmente iguais às previsões da
teoria econômica relevante”,3 baseadas nas informações disponíveis.

Expectativas racionais
Formadas com base em todas as informações
relevantes disponíveis sobre a variável que está sendo
prevista. Além disso, considera-se que os agentes
econômicos utilizem as informações disponíveis com
inteligência; ou seja, eles compreendem as relações
entre as variáveis que observam e as variáveis que
estão tentando prever.

Se as expectativas forem racionais, ao formar uma previsão do valor do nível de preços


agregado os ofertantes de trabalho usarão todas as informações passadas relevantes, e não
apenas informações sobre o comportamento passado dos preços. Além disso, eles usarão todas
as informações de que dispuserem sobre os valores atuais de variáveis que participam da
determinação do nível de preços. Mais importante pela perspectiva de políticas de administração
da demanda agregada, os ofertantes de trabalho levarão em conta qualquer ação de política
antecipada (esperada). Pressupõe-se ainda que eles compreendam a relação entre tais políticas e
o nível de preços.
Um contraste útil pode ser feito entre a natureza retrospectiva das expectativas no modelo
keynesiano e a natureza prospectiva das expectativas racionais. No modelo keynesiano, as
expectativas são retrospectivas porque a expectativa de uma variável como o nível de preços
ajusta-se (lentamente) ao comportamento passado da variável. De acordo com a hipótese das
expectativas racionais, os agentes econômicos, em vez disso, usam todas as informações
relevantes disponíveis e, de maneira inteligente, avaliam a implicação dessas informações para o
comportamento futuro da variável.
Se os ofertantes de trabalho fazem previsões racionais prospectivas do nível de preços, a
análise anterior precisa ser modificada. Para entender essa modificação, vamos analisar os
efeitos de uma ação de política expansionista já examinada: um aumento único da oferta de
moeda. Para analisar essa mudança com o pressuposto de que as expectativas são racionais,
precisamos começar especificando se a mudança de política era ou não antecipada.4 Mudanças
de políticas antecipadas e não antecipadas têm efeitos muito diferentes quando se considera que
as expectativas sejam racionais. Primeiro, vamos supor que a mudança de política tenha sido
antecipada. Isso pode acontecer porque o formulador da política anunciou a mudança. Ou,
alternativamente, o público pode antecipar a mudança de política porque sabe que o formulador
de políticas age sempre de determinada maneira. Por exemplo, se o formulador de políticas
sistematicamente reage a um aumento no desemprego em um período aumentando a oferta de
moeda no período seguinte (para se contrapor ao desemprego), o público passará a prever um
aumento na oferta de moeda no período t quando observar uma elevação da taxa de desemprego
no período t – 1.

FIG 11.1 Produto e emprego no modelo novo-clássico

No modelo novo-clássico, tanto a curva de oferta agregada como a curva de oferta de trabalho dependem de expectativas
racionalmente formadas quanto a variáveis correntes, o que inclui variáveis de política fiscal e monetária (Me0, Ge0, Te0).

Para começar, examinemos a caracterização do produto e emprego de equilíbrio na análise


novo-clássica, conforme ilustrado na Figura 11.1. A diferença crucial entre o caso novo-clássico
e o caso keynesiano refere-se às variáveis que determinam as posições das curvas da oferta
agregada e da oferta de trabalho. Como na teoria keynesiana, consideramos aqui que a oferta de
trabalho depende do salário real esperado, o salário monetário conhecido dividido pelo nível de
preços esperado:

Consequentemente, a posição da curva de oferta de trabalho e, portanto, da curva de oferta


agregada dependem novamente do nível de preços esperado. Aumentos no nível de preços
esperado deslocarão ambas as curvas para a esquerda.
No modelo novo-clássico, com o pressuposto das expectativas racionais, o nível de preços
esperado depende dos níveis esperados das variáveis no modelo que efetivamente determinam o
nível de preços. Estas incluem os níveis esperados da oferta de moeda (Me), gastos
governamentais (Ge), arrecadação tributária (Te), investimento autônomo (Ie) e, possivelmente,
outras variáveis.5 A relação de dependência do nível de preços esperado e, portanto, da posição
das curvas de oferta de trabalho e de oferta agregada quanto a essas variáveis é indicada pela
designação dessas curvas na Figura 11.1. Especialmente importante é o fato de que as posições
das curvas de oferta de trabalho e de oferta agregada dependem dos níveis esperados das
variáveis de política econômica (Me, Ce, Te).

FIG 11.2 Efeitos de um aumento da oferta de moeda: a visão novo-clássica

O aumento da oferta de moeda desloca a curva de demanda agregada de Yd(M0,…) para Yd(M1,…). Por si só, essa mudança
aumentaria o produto para Y’1 e o nível de preços para P’1. O aumento no nível de preços deslocaria a curva de demanda por
trabalho de Nd(P0) para Nd(P’1) e o emprego subiria para N’1. No entanto, como o aumento da oferta de moeda foi previsto, há
também um aumento da oferta de moeda esperada. Esse aumento desloca a curva de oferta agregada para a esquerda, de Ys(Me0,
…) para Ys(Me1,…) e desloca a curva de oferta de trabalho para a esquerda, de Ns(Me0,…) para Ns(Me,…). Esses deslocamentos
fazem o emprego e o produto voltarem para seus níveis iniciais, N0 e Y0.

Agora, consideremos o efeito de um aumento totalmente antecipado da oferta de moeda de


M0 para M1, como é mostrado na Figura 11.2.6 Inicialmente, vamos pressupor que as curvas de
demanda agregada, de oferta agregada e de demanda e oferta de trabalho estejam na mesma
posição que na Figura 11.1, com o subscrito zero (0) nas variáveis efetivas e esperadas. O
aumento na oferta de moeda deslocará a curva de demanda agregada para Yd(M1,…). Se a curva
de oferta não se deslocasse, o produto subiria de Y0 para Y’1 e o nível de preços aumentaria de
P0 para P’1. Com o aumento do nível de preços, a curva de demanda por trabalho desloca-se
para a direita [para a curva tracejada Nd(P’1) na Figura 11.2b]. Se a curva de oferta de trabalho
também não se deslocasse, o emprego subiria (de N0 para N’1). Nos modelos keynesiano ou
monetarista, em que o nível de preços esperado não se relaciona com o nível atual das variáveis
de política, a posição das curvas da oferta agregada e da oferta de trabalho seria fixa no curto
prazo e nossa análise estaria completa.
Mas, como pode ser visto na Figura 11.2, no caso novo-clássico a posição das curvas de
oferta de trabalho e da oferta agregada não é fixa no curto prazo. A ação de política
expansionista foi plenamente antecipada. Portanto, o nível de oferta de moeda esperado também
aumenta. Isso aumentará o nível de preços esperado, uma vez que, com expectativas racionais,
os ofertantes de trabalho entenderão o efeito inflacionário do aumento da oferta de moeda. A
curva de oferta de trabalho e, em consequência, a curva de oferta agregada vão se deslocar para
a esquerda, para as posições dadas por Ns(Me1,…) e Ys(Me1,…), como é mostrado na Figura
11.2. Conforme o declínio da oferta agregada empurra mais para cima o nível de preços, a curva
de demanda por trabalho desloca-se para Nd(P1). O novo equilíbrio estabelece-se no ponto em
que produto e emprego voltam a seus níveis iniciais, Y0 e N0, enquanto o nível de preços e o
salário monetário mantêm-se permanentemente mais altos em P1 e W1, respectivamente.
Observe que, quando as expectativas são racionais, o retorno aos níveis iniciais de produto e
emprego ocorre no curto prazo.
A análise novo-clássica difere de uma análise keynesiana ou de uma monetarista por
considerar que os ofertantes de trabalho percebem corretamente que o aumento dos preços
resultará do aumento da oferta de moeda. Eles demandarão salários monetários
proporcionalmente mais altos. O mercado de trabalho só retornará ao equilíbrio depois que o
salário monetário e o nível de preços tiverem aumentado na mesma proporção, o salário real
estiver inalterado e, em consequência, emprego e produto retornarem a seus níveis iniciais. Dito
de outra forma, na análise keynesiana ou monetarista o aumento da oferta de moeda leva a um
aumento no emprego e no produto no curto prazo, ou seja, até que os ofertantes de trabalho
percebam corretamente a elevação no nível de preços que resulta da ação de política monetária
expansionista. Na visão keynesiana ou monetarista, como as expectativas sobre preços são
retrospectivas, esse período de curto prazo em que o aumento na oferta de moeda afeta o produto
e o emprego pode ter uma duração considerável. Se as expectativas forem racionais, os
ofertantes de trabalho prospectivos não poderão ser sistematicamente enganados por mudanças
antecipadas nas políticas de demanda agregada.
Se as expectativas forem formadas racionalmente, ações de política previstas para a demanda
agregada não afetarão o produto ou o emprego reais nem mesmo no curto prazo. Repare que,
como o público aprenderá qualquer regra sistemática de ação de política, como a resposta
hipotética da oferta de moeda para administrar o desemprego mencionada anteriormente,
qualquer um desses conjuntos de ações de política sistemáticas passará a ser antecipado e não
afetará o comportamento do produto ou do emprego.7 Os valores de variáveis reis como produto
e emprego serão insensíveis a mudanças sistemáticas em políticas de administração da demanda
agregada.
Até aqui, estivemos pressupondo que o aumento na oferta de moeda fosse antecipado por ter
sido anunciado ou por ser uma resposta de política sistemática que podia ser prevista. Veremos
agora os efeitos de um aumento não antecipado na demanda agregada. Consideraremos
novamente os efeitos de um aumento na oferta de moeda de M0 para M1, mas a análise seria
semelhante para um aumento não antecipado na demanda agregada produzido por outro
mecanismo. Os efeitos de curto prazo desse aumento não antecipado na oferta de moeda – que
pode ser chamado de uma surpresa monetária – também podem ser explicados por meio da
Figura 11.2. Como antes, o aumento na oferta de moeda desloca a curva de demanda agregada
de Yd(M0,…) para Yd(M1,…). Quando o nível de preços sobe para P’1, a curva de demanda por
trabalho também se desloca para a direita, para Nd(P’1). Se o aumento na oferta de moeda for
não antecipado, essas são as únicas curvas que se deslocam no curto prazo. O deslocamento
adicional para a esquerda na curva de oferta de trabalho e, consequentemente, o deslocamento
para a esquerda da curva de oferta agregada mostrados na Figura 11.2, onde o aumento na oferta
de moeda era antecipado, não ocorrem no caso de um aumento não antecipado da oferta de
moeda. Quando o aumento da oferta de moeda não é previsto, ele não afeta a expectativa dos
ofertantes de trabalho quanto ao valor que o nível de preços agregado assumirá ao longo do
período atual, portanto a curva de oferta de trabalho não se desloca.
Quando o aumento da oferta de moeda não é antecipado, o modelo novo-clássico indica que o
produto e o emprego serão afetados. Na Figura 11.2, o produto subirá de Y0 para Y’1 e o
emprego aumentará de N0 para N’1, resultados idênticos aos da análise keynesiana ou
monetarista para esse aumento da demanda agregada. No curto prazo, mesmo pressupondo
expectativas racionais, os ofertantes de trabalho não percebem o efeito inflacionário do aumento
na demanda agregada. Esse era o pressuposto tanto da visão keynesiana como da monetarista
para qualquer mudança na demanda agregada. Os economistas novo-clássicos negam que
mudanças antecipadas na demanda agregada possam afetar o produto e o emprego, mas sua
concepção dos efeitos de mudanças não antecipadas na demanda agregada não difere daquela
dos keynesianos e dos monetaristas.
Essa análise dos efeitos de uma ação de política monetária não antecipada ilustra uma
diferença importante entre a teoria novo-clássica e a teoria clássica original explicada nos
Capítulos 3 e 4. No modelo novo-clássico, os agentes econômicos formam expectativas
racionais, mas não têm informações perfeitas; eles cometem erros na previsão do nível de preços
e esses erros fazem com que o produto e o emprego desviem-se, no curto prazo, de suas taxas de
equilíbrio de longo prazo. No modelo clássico, pressupunha-se que os agentes econômicos
tivessem informações perfeitas. Os ofertantes de trabalho conheciam o salário real; não havia
surpresas monetárias (ou outras) nem desvios das taxas de produto e emprego determinadas pela
oferta.

11.1.3 Conclusões novo-clássicas sobre políticas econômicas


A visão novo-clássica de que mudanças não antecipadas na demanda agregada afetam o
produto e o emprego ainda assim não atribui nenhum papel significativo a políticas de
estabilização macroeconômicas. Para entender isso, consideremos o que os economistas novo-
clássicos veem como a resposta de política econômica adequada para um declínio na demanda
do setor privado, por exemplo, um declínio autônomo na demanda por investimento. Já
analisamos a visão keynesiana sobre a resposta de política adequada para esse tipo de choque.
Os keynesianos afirmam que um declínio na demanda do setor privado deve ser compensado por
uma ação de política fiscal ou monetária expansionista a fim de estabilizar a demanda agregada,
o produto e o emprego.

FIG 11.3 Efeitos de um declínio autônomo no investimento: uma visão novo-clássica


Um declínio autônomo no investimento desloca a curva de demanda agregada de Yd(I0) para Yd(I1). Esse deslocamento reduziria
o produto de Y0 para Y’1 e baixaria o nível de preços de P0 para P’1. A queda no nível de preços desloca a curva de demanda por
trabalho de Nd(P0) para Nd(P’1), o que faz o emprego cair de N0 para N’1. Estes são os únicos efeitos se o declínio no
investimento não tiver sido antecipado. Se o declínio no investimento tiver sido antecipado, o nível esperado de investimento
autônomo (Ie) também cairá (de Ie0 para Ie1). A curva de oferta agregada será deslocada de Ys(Ie1) para Ys(Ie1) e a curva de
oferta de trabalho será deslocada de Ns(Ie0) para Ns(Ie1). Esses deslocamentos fazem o produto e o emprego retornarem a seus
níveis iniciais.

Os efeitos do declínio no investimento estão representados na Figura 11.3. O declínio na


demanda por investimento desloca a curva de demanda agregada de Yd(I0) para Yd(I1) na Figura
11.3a. Isso faz o produto declinar de Y0 para Y’1. O nível de preços cairá de P0 para P’1 e, como
resultado, a curva de demanda por trabalho na Figura 11.3b será deslocada para baixo, de Nd(P0)
para Nd(P’1). A ocorrência ou não de efeitos adicionais devidos ao declínio na demanda por
investimento depende, na visão novo-clássica, de o declínio ter sido antecipado ou não. Para
começar, vamos supor que ele tenha sido antecipado.
Nesse caso, os ofertantes de mão de obra preverão o declínio no nível de preços que resultará
do declínio da demanda agregada. Esperando agora que o nível de preços seja mais baixo, eles
ofertarão mais trabalho por um dado salário monetário, uma vez que, com o nível de preços
esperado mais baixo, um dado salário monetário corresponde a um salário real esperado mais
alto. Essa queda no nível de preços esperado desloca a curva de oferta de trabalho para a direita
na Figura 11.3b [de Ns(Ie0) para Ns(Ie1)]. Como consequência, a curva de oferta agregada
desloca-se para a direita na Figura 11.3a [de Ys(Ie0) para Ys(Ie1)]. Há um declínio adicional no
nível de preços para P1 e, portanto, mais um deslocamento para baixo da curva de demanda por
trabalho, para Nd(P1). No novo equilíbrio de curto prazo, o salário monetário e o nível de preços
caíram o suficiente para levar o emprego e o produto de volta a seus níveis iniciais, N0 e Y0.
Essa análise é o exato oposto de nossa análise de um aumento antecipado da demanda
agregada resultante de um aumento da oferta de moeda. No sistema novo-clássico, produto e
emprego não são afetados por mudanças previstas na demanda agregada, mesmo no curto prazo.
Em consequência, não há necessidade de uma resposta de política de estabilização a uma
mudança antecipada na demanda, como um declínio no investimento.
Mas e se o declínio no investimento não tiver sido antecipado? Nesse caso, os ofertantes de
trabalho não teriam previsto a queda dos preços que resultou do declínio da demanda agregada.
A curva de oferta de trabalho (Figura 11.3b) e a curva de oferta agregada (Figura 11.3a) teriam
permanecido em Ns(Ie0) e Ys(Ie0), respectivamente. O declínio no investimento teria feito o
produto e o emprego caírem aos níveis dados por Y’1 e N’1. Não seria, então, o caso de uma ação
de política econômica compensatória para elevar a demanda agregada de volta a seu nível
inicial?
A resposta é que tal reação de política econômica seria desejável, mas não praticável. O
declínio no investimento foi, por definição, não antecipado. Ou seja, pressupondo expectativas
racionais, o declínio não poderia ter sido previsto com base em nenhuma das informações
disponíveis. Os formuladores de políticas, como qualquer outro agente econômico, teriam sido
incapazes de prever o declínio no investimento com antecedência. Eles não poderiam ter agido
para elevar a demanda agregada de modo a compensar o declínio. Uma vez que a quedas do
investimento tenha ocorrido e exercido seu efeito sobre o produto, os formuladores de políticas
poderiam agir para elevar a demanda agregada se esperassem que o nível baixo de investimento
pudesse se repetir em períodos futuros. Se, porém, fosse esperado que investimento continuasse
baixo, não haveria necessidade de uma resposta de política econômica, porque os agentes
privados também teriam essa expectativa. Nesse ponto, ocorreria o deslocamento das curvas de
oferta de trabalho e de oferta agregada. Em outras palavras, enquanto o choque for não
antecipado, os formuladores de políticas não têm o conhecimento necessário para agir de modo a
compensar o choque. Depois que o choque passa a ser antecipado pelos formuladores de
políticas, ele também é previsto por outros agentes econômicos, incluindo os ofertantes de
trabalho, e não há mais necessidade de compensar o choque.
A análise acima indica que a visão novo-clássica não vê nenhuma utilidade em políticas de
demanda agregada voltadas a estabilizar o produto e o emprego. As conclusões de política
econômica dos economistas novo-clássicos são não intervencionistas, assim como eram as dos
economistas clássicos. Nesse aspecto, os economistas novo-clássicos concordam com os
monetaristas. Quanto à política monetária, muitos economistas novo-clássicos defendem que
haja regras. Uma regra de política monetária para a taxa de crescimento da moeda ou a inflação
reduziria mudanças de política não antecipadas, que não têm nenhum valor de estabilização e
levam os agentes econômicos a cometer erros na previsão de preços.
No caso da política fiscal, os economistas novo-clássicos defendem a estabilidade e rejeitam
estímulos excessivos e inflacionários. Os economistas novo-clássicos Thomas Sargent e Neil
Wallace, por exemplo, foram críticos dos grandes déficits resultantes da política fiscal da
administração Reagan na década de 1980.8
A instabilidade na política fiscal causa incerteza, dificultando para os agentes que formam
expectativas racionais a previsão correta do curso da economia. Além disso, Sargent e outros
acreditam que uma política monetária não-inflacionária crível não pode coexistir com uma
política fiscal que gere grandes déficits. Déficits enormes põem a autoridade monetária sob
grande pressão para aumentar a expansão monetária a fim de ajudar a financiar o déficit. Sargent
e outros economistas novo-clássicos acreditam que o controle dos déficits orçamentários do
governo é necessário para uma política monetária não inflacionária crível.

PERSPECTIVAS 11.1 - PREÇOS DAS AÇÕES NOS ESTADOS UNIDOS:


EXPECTATIVAS RACIONAIS OU EXUBERÂNCIA IRRACIONAL?
Estivemos examinando as implicações do pressuposto das expectativas racionais para as políticas de estabilização
macroeconômicas. O pressuposto das expectativas racionais também tem implicações para outros aspectos da economia, dos
quais um importante é a determinação dos preços de ativos financeiros. Vamos examinar aqui o pressuposto das expectativas
racionais aplicado à teoria da determinação do preço das ações.
Se os agentes formam expectativas racionais, ao decidir quanto vale uma dada ação (por exemplo, da General Electric)
eles usarão todas as informações, e de modo inteligente. As informações relevantes nesse contexto seriam qualquer coisa
que se saiba sobre as perspectivas futuras de ganhos da empresa, o que se chama de fundamentos do mercado. Em um
mercado composto de tais agentes, os preços das ações se moverão muito depressa em resposta a novas informações sobre
as perspectivas de ganhos de uma empresa. Na verdade, os preços se moverão tão depressa que se considera que o preço
corrente das ações de uma empresa já reflita todas as informações disponíveis. Um mercado assim é chamado de mercado
eficiente.a
Como no caso da política de estabilização, a aplicação do pressuposto das expectativas racionais aos preços no mercado de
ações é controversa. Muitos duvidam que os investidores no mercado de ações sejam tão racionais. Esses acreditam que
decisões de comprar e vender ações são tomadas, em grande medida, independentemente de novas informações sobre os
fundamentos do mercado. Entre os primeiros que expressaram essa dúvida esteve John Maynard Keynes. Keynes
descreveu o mercado de ações como “um jogo de Tapão, de Mico Preto, de Dança das Cadeiras – um passatempo em que
o vitorioso é o que bater nas cartas na hora certa, o que passar o Mico para o vizinho antes que o jogo termine, o que
garantir uma cadeira para si quando a música para”. Keynes e outros depois dele acreditam que instintos de rebanho,
investimento por impulso e feedback trading são descrições melhores dos motivos para comprar e vender ações do que
decisões motivadas por expectativas racionais. De acordo com eles, os investidores são fortemente condicionados pelo que
outros investidores estão fazendo.
Em oposição ao comportamento dos preços das ações em um mercado eficiente, os preços em um mercado impulsionado
pelo tipo de investidores descritos por Keynes poderiam ser excessivamente voláteis conforme os investidores
influenciam-se uns aos outros e levam os preços para cima ou para baixo. Em 1996, o presidente do Federal Reserve, Alan
Greenspan, questionou se a rápida elevação dos preços das ações na época não estaria sendo induzida por “exuberância
irracional” em lugar de expectativas racionais.b
A Figura 11.4 mostra os valores de dois índices de preços de ações, o amplo Standard e Poor’s 500 e o NASDAQ, que
contém muitas empresas de alta tecnologia, para o período de 1987 a 2011. A rápida escalada dos preços das ações no
final da década de 1990 e o acentuado declínio subsequente em 2000-2002 dão apoio aos que acreditam na exuberância
irracional. A expansão e a queda no NASDAQ, em especial, pareceram ser mais consistentes com a ideia de uma bolha
especulativa do que de um mercado de ações eficiente. A forte queda dos preços das ações em 2008-2009 reacendeu as
dúvidas quanto à hipótese do mercado eficiente.
Defensores do mercado eficiente não ficaram convencidos. Burton Malkiel, em um artigo em 2003, afirmou que, embora
os preços de mercado nem sempre fossem “perfeitos”, desvios da eficiência de mercado eram mais a “exceção do que a
regra”.c Malkiel argumentou que qualquer ineficiência de mercado séria deve apresentar uma oportunidade de lucro
explorável. Se as informações não estão sendo eficientemente incorporadas nos preços das ações, deve haver um lucro
potencial em seu uso. Sobre esse ponto, ele citou Richard Roll, um teórico financeiro e administrador de carteiras de
ativos, como se segue: “Eu tentei pessoalmente investir dinheiro, dinheiro de meus clientes e meu próprio, em cada
anomalia e instrumento de previsão que os acadêmicos já inventaram… E ainda não ganhei um níquel sequer com
qualquer uma dessas supostas ineficiências de mercado”.d
A circunstância de o mercado de ações ser conduzido por expectativas racionais ou por exuberância irracional tem
implicações importantes para a economia. Uma volatilidade excessiva é cara, uma vez que pode afastar os investidores do
mercado e aumentar os custos das firmas para obter recursos. Um mercado constituído principalmente de investidores
irracionais seria um alvo mais provável para regulação do que um mercado em que os preços fossem determinados por
investidores com expectativas racionais associadas aos fundamentos do mercado.
A crise financeira de 2007-2009 levou a um reexame do que significaria “eficiente” em um mercado eficiente. Mais de 40
anos atrás, o economista William Baumol escreveu: “Se os preços dos títulos fossem independentes do potencial de
ganhos, não se poderia esperar que o mercado de ações servisse como uma força disciplinadora efetiva capaz de pressionar
a administração a manter a eficiência das operações da empresa”. Robert Lucas escreveu, defendendo a hipótese dos
mercados eficientes na sequência da crise financeira: “O termo ‘eficiente’ conforme usado aqui significa que os indivíduos
usam informações em seu próprio interesse particular. Não tem nada a ver com precificação socialmente desejável. As
pessoas muitas vezes confundem essas duas coisas”. Robert Shiller comentou que o pulo da observação de que é difícil
prever os movimentos dos preços das ações para a conclusão de que eles devem estar “certos” é “um dos erros mais
notáveis na história do pensamento econômico”. Poderíamos considerar que o mercado de ações seja eficiente no sentido
de Lucas. Além disso, como Malkiel e Roll concluem, pode ser difícil encontrar oportunidades de lucro exploráveis
devido a ineficiências do mercado. Ainda assim pode ser verdade, como Keynes afirmou, que “quando o desenvolvimento
do capital em um país torna-se um subproduto das atividades de um cassino, é bem provável que o trabalho seja mal
feito”.

FIG 11.4 O NASDAQ e o S&P 500 (2 de fevereiro de 1987-2 de fevereiro de 2011)


Fonte: Yahoo Finance.
a Uma apresentação clássica da hipótese dos mercados eficientes está em FAMA, Eugene F. Efficient capital markets: a
review of theory and empirical work. Journal of Finance, p. 383-416, 1970.
b Robert Shiller usou a expressão de Greenspan como título de seu livro Irrational exuberance (Princeton, NJ: Princeton
University Press, 2000), que questiona a validade da hipótese dos mercados eficientes.
c MALKIEL, Burton. The efficient market hypothesis and its critics. Journal of Economic Perspectives, 17, p. 59-82, Winter
2003.
d MALKIEL, 2003, p. 72.

11.2 Uma visão mais ampla da posição novo-clássica


Os economistas novo-clássicos são críticos da economia keynesiana como um todo. Os
economistas novo-clássicos Robert Lucas e Thomas Sargent usam termos como
“fundamentalmente falha”, “entulho”, “fracasso em grande escala” e “de nenhum valor” para
descrever os aspectos principais da análise teórica e de políticas keynesiana.9 Lucas, Sargent e
outros economistas novo-clássicos criticam as bases teóricas do sistema keynesiano. Eles
afirmam que, no modelo de Keynes, regras práticas, como a função consumo e a função
demanda por moeda keynesiana, substituíram funções clássicas baseadas em comportamentos
otimizadores individuais. O modelo keynesiano, na opinião deles, é constituído de elementos ad
hoc, que foram tentativas frustradas de explicar o comportamento observado da economia no
agregado. Um bom exemplo dessa falha do sistema keynesiano está na forma de lidar com as
expectativas. O sistema keynesiano usa uma regra prática em que o preço corrente esperado é
expresso como uma função do comportamento passado dos preços. Tal pressuposto não é
derivado do uso ótimo das informações pelos indivíduos e implica, de modo geral, que os
agentes econômicos escolhem ignorar informações úteis ao fazer suas previsões de preços.
Os economistas novo-clássicos também criticam o pressuposto de Keynes de que os salários
são “rígidos”, significando, em sua interpretação desse pressuposto, que os salários “são fixados
em um nível ou por um processo que poderia ser considerado independente das forças
macroeconômicas que ele se propõe a analisar”. Já examinamos os argumentos que os
keynesianos oferecem em apoio ao pressuposto da rigidez dos salários. Os economistas novo-
clássicos não acham esses argumentos convincentes. Eles defendem a visão clássica de que os
mercados, incluindo o mercado de trabalho, equilibram-se; ou seja, os preços, incluindo o
salário monetário, movem-se no sentido de igualar oferta e demanda.
Os economistas novo-clássicos afirmam que modelos macroeconômicos úteis devem corrigir
as falhas da economia keynesiana aderindo consistentemente aos seguintes pressupostos:
1. Os agentes otimizam; ou seja, agem em seu próprio interesse.
2. Os mercados equilibram-se.
Por que, então, Keynes desconsiderou esses pressupostos? A economia keynesiana foi uma
resposta ao fracasso da economia clássica em explicar o problema do desemprego e a relação
entre desemprego e demanda agregada. Lembre-se que a curva de oferta agregada clássica era
vertical. Com essa curva de oferta, o produto agregado era totalmente dependente de fatores de
oferta. O modelo clássico foi abandonado por Keynes porque não explicava desvios prolongados
do produto e do emprego em relação aos níveis de pleno emprego.
Os economistas novo-clássicos afirmam que um modelo na tradição clássica pode explicar os
desvios em relação ao pleno emprego quando se incorpora ao sistema clássico o pressuposto das
expectativas racionais. Lembre-se que a teoria clássica do mercado de trabalho, que era a base
para a função oferta agregada vertical clássica, pressupunha que os ofertantes de trabalho
conhecessem o salário real, o que implica que os ofertantes de trabalho tinham informações
perfeitas sobre o valor que o nível agregado preços assumiria no curto prazo. Os economistas
novo-clássicos usam, em vez disso, o pressuposto de que os ofertantes de trabalho fazem uma
previsão racional do nível agregado de preços. Nesse caso, como vimos, mudanças sistemáticas
e, portanto, antecipadas na demanda agregada não afetarão o produto e o emprego, que, no
entanto, serão afetados por mudanças não previstas na demanda agregada. Essas mudanças não
antecipadas na demanda agregada podem explicar os desvios em relação aos níveis de pleno
emprego.

11.3 A contracrítica keynesiana


O tema central da resposta keynesiana à crítica novo-clássica é que, embora sejam levantados
pontos válidos, especialmente no que se refere à deficiência do tratamento dado pelos
keynesianos à formação de expectativas, ainda é, nas palavras do keynesiano Robert Solow,
“muito cedo para arrancar os capítulos sobre IS-LM dos compêndios de sua possivelmente
desperdiçada juventude”.10 Os keynesianos continuam a acreditar que Keynes forneceu a base
de uma estrutura útil para analisar os determinantes do produto e do emprego. Eles continuam a
acreditar na utilidade de políticas ativas para estabilizar o produto e o emprego. As principais
áreas em que os keynesianos levantaram objeções à visão novo-clássicas são as que se seguem.

11.3.1 A questão da persistência


Na seção anterior, vimos que o modelo novo-clássico, com o conceito das expectativas
racionais, podia explicar desvios em relação ao produto potencial. Declínios não antecipados na
demanda agregada moveriam o produto e o emprego para níveis abaixo de seus níveis
potenciais. Os keynesianos afirmam que, embora tal explicação talvez seja plausível para
afastamentos breves do produto e do emprego potenciais, ela não é adequada para explicar os
desvios persistentes e substanciais que de fato presenciamos. Um declínio não antecipado no
investimento, como o que examinamos anteriormente (Figura 11.3), poderia fazer o produto e o
emprego declinarem durante um curto período, digamos, um ano. No ano seguinte, porém, esse
declínio na demanda agregada seria aparente; ele não seria mais imprevisto. Os ofertantes de
trabalho reconheceriam que o nível de preços havia baixado. Em consequência, os
deslocamentos para a direita da curva de oferta de trabalho e da curva de oferta agregada
discutidos anteriormente (veja a Figura 11.3) levariam o emprego e o produto de volta a seus
níveis iniciais.
Como, então o modelo novo-clássico pode explicar taxas de desemprego de 10% ou mais na
Grã-Bretanha durante todo o período de 1923-1939, ou durante a Grande Depressão da década
de 1930 nos Estados Unidos, quando a taxa de desemprego ficou acima de 14% por dez anos
consecutivos? Como o modelo pode explicar o movimento da taxa de desemprego durante as
profundas e prolongadas recessões de meados da década de 1970, início da de 1980 e 2007-
2009?
Os economistas novo-clássicos respondem que, embora a causa do desemprego, a mudança
não antecipada demanda agregada, seja de curta duração, os efeitos do choque persistirão.
Consideremos, por exemplo, a resposta a um declínio não antecipado da demanda agregada.
Vamos supor que, depois de cerca de um ano, todos reconheçam que a demanda caiu, de forma
que a mudança não é mais imprevista. Reduções no produto e no emprego terão ocorrido. Os
economistas novo-clássicos afirmam que levará algum tempo para que tais declínios sejam
revertidos. As firmas que já reduziram os níveis de produção não acharão conveniente restaurar
a produção imediatamente aos níveis pré-choque, por causa do custo desses ajustes. Além disso,
as firmas terão acumulado excessos de estoque ao longo do período em que o produto esteve em
declínio. Levará algum tempo para que esses estoques sejam escoados; enquanto isso, a
produção e, portanto, os níveis de emprego continuarão baixos. No lado da oferta de trabalho, os
trabalhadores que ficaram desempregados não acharão ideal aceitar a primeira oferta de trabalho
que aparecer e, em vez disso, iniciarão uma busca pela melhor oportunidade de emprego. Como
consequência desses intervalos de ajuste, os economistas novo-clássicos afirmam que desvios
duradouros dos níveis de pleno emprego, como o vivido pelos Estados Unidos em meados da
década de 1970 e início da década de 1980, podem ser explicados mesmo que os choques que os
causaram tenham sido de curta duração.
E quanto às depressões na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos na década de 1930? Um
defensor da posição novo-clássica, Robert Barro, explicou a severidade da experiência
americana pela extensão do colapso monetário em grande medida não antecipado durante os
primeiros anos da Depressão, quando a oferta de moeda caiu em um terço. A lenta recuperação é
vista como resultado da intervenção maciça do governo no período do New Deal, que subverteu
os mecanismos de ajuste normais do setor privado.11 Outros economistas novo-clássicos, como
Sargent e Lucas, concordam com os keynesianos que a Grande Depressão não é bem explicada
por sua teoria, mas também não acham que a explicação keynesiana seja convincente.
Sobre essa questão da persistência, os keynesianos não se mostram convencidos de que os
intervalos de ajuste sejam explicação suficiente para o desemprego severo e prolongado. Eles
acreditam que a aceitação do modelo clássico ou novo-clássico só pode explicar episódios como
a Grande Depressão como resultado de fatores do lado da oferta, que, em sua opinião, são os
únicos fatores nesses modelos que poderiam causar desemprego prolongado. Se os mercados se
equilibram e não há desemprego voluntário, então, nas palavras de Modigliani, para os
economistas clássico e novo-clássicos “o que aconteceu nos Estados Unidos na década de 1930
foi um sério ataque de preguiça contagiosa”.12

11.3.2 Os pressupostos informacionais extremos das expectativas


racionais
Os keynesianos aceitam a crítica dos economistas novo-clássicos quanto a formulações de
expectativas de preços baseadas apenas em informações sobre preços passados. Essas regras são
ingênuas, porque pressupõem que os agentes econômicos negligenciem informações disponíveis
e potencialmente úteis ao fazer suas previsões. Esses pressupostos ingênuos sobre as
expectativas começaram a ser usados na década de 1950 e início da década de 1960, quando a
taxa de inflação era baixa e estável. Nessas circunstâncias, tais regras podem ter sido
aproximações razoáveis do modo como as pessoas faziam previsões, uma vez que boas
previsões podiam de fato ser baseadas no comportamento passado dos preços. Com a inflação
volátil e muitas vezes alta do período pós-1970, é mais difícil acreditar que os agentes
econômicos não julgassem que valeria a pena fazer previsões mais sofisticadas.
Ainda assim, muitos keynesianos afirmam que o pressuposto das expectativas racionais erra
ao considerar que os agentes econômicos sejam previsores irrealisticamente sofisticados, em
especial quando atribui expectativas racionais a ofertantes de trabalho individuais. Os
keynesianos criticam o pressuposto de que indivíduos usem todas as informações relevantes
disponíveis ao fazer suas previsões. Tal pressuposto ignora os custos da coleta de informações.
A teoria das expectativas racionais também pressupõe que os indivíduos usem as informações
disponíveis de forma inteligente. Eles conhecem as relações que ligam as variáveis observadas
às variáveis que estão tentando prever. Também são capazes de compreender o padrão de
resposta sistemática dos formuladores de políticas. Por exemplo, se o formulador de políticas
monetárias responde tipicamente a uma alta do desemprego aumentando a oferta de moeda, o
público passará a antecipar tais ações de política. Além disso, serão capazes de prever os efeitos
dessas ações de política monetária antecipadas. Os keynesianos acham que, se a economia,
incluindo o comportamento dos formuladores de políticas, apresentasse poucas mudanças
durante um longo período de tempo, talvez fosse razoável acreditar que os agentes econômicos
acabariam por conhecer as relações subjacentes que governam variáveis de política e agregados
econômicos. O pressuposto das expectativas racionais poderia ser realista em um modelo de
equilíbrio de longo prazo, mas os keynesianos afirmam que ele não é realista no curto prazo. No
curto prazo, o custo de coletar e processar informações pode ser suficientemente alto para que os
ofertantes de trabalho, ao fazer previsões do nível agregado de preços ou da taxa de inflação,
não achem que valha a pena usar muitas informações além do comportamento passado dos
preços.
Se as expectativas não forem racionais, há um papel para políticas de administração da
demanda agregada voltadas a estabilizar o produto e o emprego. Até mesmo mudanças
sistemáticas na demanda agregada afetarão o produto e o emprego, uma vez que não serão
antecipadas pelos agentes econômicos. Se a demanda agregada do setor privado for instável,
como os keynesianos acreditam que seja, uma política de estabilização é necessária. Além disso,
as autoridades formuladoras de políticas monetárias e fiscais devem ser capazes de prever
mudanças sistemáticas na demanda agregada do setor privado. Essas autoridades formuladoras
de políticas de fato coletam o que consideram ser todas as informações importantes e
disponíveis sobre as variáveis que desejam prever e controlar. Elas também investem recursos
consideráveis na tentativa de avaliar as relações que caracterizam a economia. Os keynesianos
acham razoável ver o pressuposto das expectativas racionais como correto quando aplicado aos
formuladores de políticas. Estes podem projetar mudanças de políticas para compensar o que,
para o público, são mudanças não previstas na demanda agregada do setor privado. Em essência,
esse papel de políticas de estabilização deriva de uma vantagem informacional por parte do
formulador de políticas.
Os keynesianos concluem que:

Modelos macroeconômicos baseados nos pressupostos da hipótese das expectativas


racionais, portanto, não demonstram a ineficácia das políticas no curto prazo, porque não
são de fato modelos de curto prazo. O pressuposto da disponibilidade de informações da
hipótese das expectativas racionais posiciona implicitamente esses modelos em um contexto
de equilíbrio de longo prazo, no qual as suas propriedades clássicas… não surpreendem.13

Os economistas novo-clássicos defendem o pressuposto das expectativas racionais. Eles


admitem que a hipótese das expectativas racionais é “irrealista” mas, como afirma Bennett
McCallum, “Todas as teorias ou modelos são ‘irrealistas’ no sentido de serem descrições
extremamente simplificadas da realidade… Assim, a questão real é: de todos os pressupostos
simples sobre expectativas concebíveis, qual deve ser incorporado em um modelo
macroeconômico a ser usado para análise de estabilização?”14 Os economistas novo-clássicos
preferem o pressuposto das expectativas racionais a formulações que consideram que os
indivíduos formem expectativas de preços com base apenas na história passada dos preços.

11.3.3 O mercado de leilão versus as visões contratuais do mercado


de trabalho
No modelo novo-clássico, como na teoria clássica original, considera-se que o salário
monetário ajuste-se rapidamente para equilibrar o mercado de trabalho – para igualar oferta e
demanda por trabalho. Essa é uma caracterização do mercado de leilão. Em contraste, na visão
contratual keynesiana do mercado de trabalho, “os salários não são estabelecidos de forma a
equilibrar o mercado no curto prazo; em vez disso, são fortemente condicionados por
considerações de prazo mais longo, envolvendo… relações empregador-empregado”.15 O salário
monetário é rígido em relação a movimentos para baixo. Na expressão de Arthur Okun, o
mercado de trabalho funciona mais pelo aperto de mão invisível do que pela mão invisível de um
mecanismo de mercado competitivo. A maior parte das respostas a um declínio na demanda
agregada e, consequentemente, na demanda por trabalho assume a forma de uma redução do
nível de emprego e não de uma queda do salário monetário.
Os keynesianos consideram o mercado de trabalho como palco de arranjos de longo prazo
entre compradores e vendedores. Em geral, tais relações fixam o salário monetário e deixam o
empregador livre para ajustar as horas trabalhadas ao longo da vigência do contrato explícito ou
implícito. Dispensas ou reduções de horas de trabalho são consideradas uma resposta aceitável
do empregador a uma queda na demanda. Aplicar pressão para cortes de salário ou substituir os
trabalhadores atuais por desempregados que aceitarão trabalhar por salários mais baixos não é
aceitável. Essa visão contratual keynesiana explica a rigidez salarial com base nos mecanismos
institucionais que caracterizam o mercado de trabalho. Muitas pesquisas estão sendo feitas para
investigar as razões teóricas que levaram ao desenvolvimento de tais instituições do mercado de
trabalho. Mesmo sem essas bases teóricas, os keynesianos afirmam que mecanismos
institucionais dessa natureza existem de fato e criticam os economistas novo-clássicos por
ignorar esses elementos da realidade que seu modelo não consegue explicar.
Os economistas novo-clássicos concordam que o mercado de trabalho é, pelo menos em
parte, caracterizado por contratos de longo prazo. Eles negam, porém, que a existência desses
contratos tenha, em si, alguma implicação para determinar se o mercado de trabalho se
equilibrará ou não – ou seja, se haverá ou não desemprego involuntário. Negam que os termos
dos contratos de trabalho sejam tão rígidos a ponto de empregadores e empregados não poderem
realizar mudanças que sejam desejáveis para ambas as partes. Por exemplo, se o salário
monetário especificado for alto demais para manter o nível de emprego de equilíbrio do
mercado, os trabalhadores poderiam abdicar de outras cláusulas do contrato, aumentar o trabalho
feito por hora ou, em casos extremos, permitir alguma revisão do salário. Os economistas novo-
clássicos não negam que contratos de trabalho causam algum desvio do emprego em relação aos
níveis de equilíbrio do mercado, mas não acreditam que esse desvio seja significativo.

PERSPECTIVAS 11.2 - A GRANDE DEPRESSÃO: VISÕES NOVO-


CLÁSSICAS
A Grande Depressão da década de 1930 foi um acontecimento tão determinante no desenvolvimento de nossas ideias sobre
questões macroeconômicas que é interessante examinar como cada uma das teorias que apresentamos explica esse
fenômeno.
Vamos ver o que vários proponentes importantes do modelo novo-clássico tiveram a dizer sobre a Depressão. Primeiro,
Robert Lucas:
Se olharmos para o episódio de 1929 a 1933, veremos que houve muitas decisões que, posteriormente, as pessoas
gostariam de não ter tomado. Houve muitos que se arrependeram de ter deixado o emprego; houve ofertas de trabalho
que as pessoas recusaram por considerarem os salários ruins e que, três meses depois, gostariam de ter aceitado.
Contadores que perderam seu trabalho em contabilidade e recusaram um emprego de motorista de táxi viram-se de
repente sentados na rua enquanto seu colega dirigia um táxi. E pensaram que deveriam ter aceitado o emprego de
motorista de táxi. As pessoas cometem esse tipo de erro todo o tempo. Qualquer um pode olhar para a década de 1930 e
pensar nas decisões que poderia ter tomado para ganhar um milhão. Ações que eu teria comprado. Todo tipo de coisas.
Não vejo qual é a dificuldade nessa questão de as pessoas cometerem erros no ciclo dos negócios.a
Lucas está falando de percepções erradas – mudanças não antecipadas nos preços – que tiveram efeitos reais. Ele vê os
declínios não previstos no nível de preços como resultado do declínio abrupto na oferta de moeda, conforme Milton
Friedman sugere (veja Perspectivas 9.1).b
Robert Barro também vê políticas governamentais, monetárias e outras, como fatores essenciais na experiência de 1929-
1933: “O colapso monetário sem precedentes durante esse período corresponde quantitativamente ao drástico declínio da
atividade econômica”.c Além dos efeitos que o rápido declínio da oferta de moeda pode ter tido, Barro indica um efeito
real (ou do lado da oferta) decorrente do colapso de boa parte do sistema bancário durante esse período. (Nove mil bancos
faliram entre 1923 e 1933.) Quando os bancos faliram, por exemplo, a produção agrícola não pôde ser colhida porque os
agricultores não conseguiram empréstimos para comprar máquinas agrícolas. De modo geral, um declínio da
disponibilidade de serviços financeiros pode ter reduzido a oferta total de produtos no período 1929-1933.d
Como mais uma alternativa às explicações keynesianas para a Depressão, Barro sugere que “as intervenções
governamentais associadas ao New Deal, incluindo o volume de gastos públicos e as regulações diretas de preços,
retardaram a recuperação da economia, que, assim mesmo, foi rápida após 1933”.eTanto Barro como Lucas, porém, ainda
encontram dificuldades com certas partes do fenômeno da Depressão e, pelo menos em alguns aspectos, concordariam
com o economista novo-clássico Thomas Sargent que:
Eu não tenho uma teoria, nem conheço uma teoria de alguma outra pessoa, que dê uma explicação satisfatória para a
Grande Depressão. É um acontecimento e um processo realmente muito importante e sem explicação, pelo qual me
interesse muito e que gostaria de ver explicado.f
a KLAMER, Arjo. The new classical macroeconomics: conversations with the new classical economists and their opponents.
Totowa: Rowman and Allanheld, 1983. p. 41.
b KLAMER, 1983, p. 42.
c BARRO, Robert J. Second thoughts on Keynesian economics. American Economic Review, 69, p. 58, May 1979.
d BARRO, Robert J. Rational expectations and macroeconomics in 1984. American Economic Review, 74, p.180, May 1984.
e BARRO, 1979, p. 57.
f KLAMER, 1983, p. 69.

Conclusão
A economia novo-clássica apresenta um desafio fundamental à ortodoxia keynesiana. No
plano teórico, os economistas novo-clássicos questionam a solidez do modelo keynesiano,
afirmando que muitas de suas relações não são firmemente baseadas no comportamento
otimizador individual. Como exemplo, os economistas novo-clássicos apontam o tratamento
ingênuo dado às expectativas de preços no modelo keynesiano. Além disso, criticam o que
consideram ser pressupostos arbitrários dos keynesianos sobre a rigidez dos salários e o
consequente desemprego involuntário.
Sobre questões de política econômica, os economistas novo-clássicos afirmam que produto e
emprego são independentes de mudanças sistemáticas e, portanto, antecipadas na demanda
agregada. Esse é o postulado novo-clássico da ineficácia das políticas econômicas. Como
políticas significativas de administração da demanda agregada para estabilizar o produto e o
emprego consistem em mudanças sistemáticas na demanda agregada, os economistas novo-
clássicos não veem função para essas políticas. Eles chegam a conclusões não intervencionistas
sobre políticas semelhantes às dos economistas clássicos.
Os keynesianos criticam a teoria novo-clássica em vários aspectos. Argumentam que o
modelo novo-clássico não pode explicar o prolongado e sério desemprego enfrentado pelos
Estados Unidos e outros países industrializados. Alegam que o pressuposto das expectativas
racionais atribui uma disponibilidade de informações extrema e irrealista aos participantes do
mercado. Por fim, e mais importante, criticam a caracterização de mercado de leilão para o
mercado de trabalho no modelo novo-clássico. Os keynesianos acreditam que o mercado de
trabalho é um mercado contratual e que a natureza desses arranjos contratuais leva a rigidez dos
salários e consequente desemprego involuntário.
A crise financeira e a depressão profunda de 2007-2009 renovaram o interesse pelas questões
centrais do debate entre economistas keynesianos e novo-clássicos. Pode o modelo novo-
clássico explicar realisticamente declínios prolongados e severos do produto? Políticas de
administração da demanda agregada proporcionam um remédio para recessões graves? Críticos
keynesianos usaram os eventos de 2007-2009 para acusar os economistas novo-clássicos de
“cometerem erros analíticos velhos e básicos por toda parte” e de “apresentar argumentos
totalmente estúpidos”. Robert Lucas de fato elogiou o Federal Reserve por reagir à crise
financeira injetando grandes quantidades de dinheiro no sistema bancário, mas essa era uma
medida que visava a consertar o mecanismo de mercado, e não simplesmente estimular a
demanda agregada. Lucas chamou a ideia de que se pudesse ajudar a recuperação por meio de
um estímulo fiscal keynesiano de um “conto de fadas”. Voltaremos a essas questões de política
econômica em capítulos posteriores sobre políticas de estabilização monetárias e fiscais.

Questões de revisão
1. Explique o conceito de expectativas racionais. Como essa visão sobre a formação de
expectativas difere do pressuposto feito em capítulos anteriores de que os trabalhadores
formam expectativas dos níveis de preços atuais e futuros com base em informações
passadas sobre preços?
2. Explique as implicações do pressuposto das expectativas racionais para a eficácia de
políticas de estabilização econômica.
3. Contraste as visões novo-clássica e keynesiana quanto ao modo de funcionamento de
mercados de trabalho.
4. Dentro do esquema novo-clássico, como você explicaria um desvio persistente em relação ao
produto potencial como o que foi experimentado pelos Estados Unidos durante a recessão
profunda de 2007-2009?
5. Compare as posições novo-clássica e monetarista quanto à eficácia de políticas de
administração da demanda agregada para estabilizar o produto.
6. Mesmo dentro do modelo novo-clássico, ações de política antecipadas, como um aumento da
oferta de moeda, afetarão a renda nominal. Explique por que o ajuste das expectativas dos
agentes econômicos, que compensa os efeitos reais de tal mudança de política, não compensa
também os efeitos nominais.
7. Por que acrescentar o adjetivo novo a clássico para descrever o modelo deste capítulo? Como
essa análise difere do modelo clássico apresentado nos Capítulos 3 e 4?
8. Comente a afirmação a seguir. Você concorda ou discorda dessa opinião sobre a eficácia de
ações de política fiscal sistemáticas ou antecipadas dentro de um modelo econômico novo-
clássico? Explique.
A economia novo-clássica ou teoria das expectativas racionais oferece uma explicação
convincente para a incapacidade de uma política monetária sistemática afetar a renda ou o
emprego reais. A situação é bem diferente, porém, no que se refere a ações de política fiscal,
como aumentos nos gastos do governo, que afetarão o produto e o emprego reais quer sejam
ou não antecipadas – a diferença entre as políticas monetária e fiscal é que a política
monetária afeta a demanda agregada e, em consequência, o produto por induzir os agentes
econômicos privados a alterar suas demandas por produto. Com expectativas racionais,
esse efeito será cancelado. Um aumento nos gastos do governo afeta a demanda agregada
diretamente e não há como o setor privado cancelar seus efeitos sobre a renda e o emprego.

9. Como um choque de oferta, como o aumento exógeno no preço do petróleo que foi analisado
na Seção 8.5, afeta o nível agregado de preços e o nível do produto real no modelo novo-
clássico?
10. Durante o governo de George W. Bush, reduções nas alíquotas do imposto sobre a renda, os
dividendos e os ganhos de capital foram a peça central da política fiscal. Analise os efeitos
macroeconômicos desses cortes de impostos dentro do modelo novo-clássico.
CAPÍTULO 12
Os ciclos reais de negócios e a economia novo-keynesiana

Sobre o debate entre os economistas keynesianos e novo-clássicos, um observador comentou


que a característica mais impressionante da posição de cada lado era sua crítica ao outro. Seja
como for, o debate de fato deixou ambos os lados com a sensação da necessidade de novas
pesquisas para dar apoio à sua posição fundamental. Essa percepção gerou dois novos rumos na
pesquisa macroeconômica. Um deles, fortemente apoiado na tradição clássica, é a teoria dos
ciclos reais de negócios. O segundo, a teoria novo-keynesiana, segue, como o nome sugere, a
tradição keynesiana. A teoria dos ciclos reais de negócios é discutida na Seção 12.1. Voltamo-
nos depois para a teoria novo-keynesiana na Seção 12.2.

12.1 Modelos de ciclos reais de negócios


A teoria dos ciclos reais de negócios é um desenvolvimento da teoria novo-clássica, que, por
sua vez, evoluiu da economia clássica original. De fato, os modelos de ciclos reais de negócios
são às vezes mencionados como a segunda geração de modelos novo-clássicos.

12.1.1 Aspectos centrais dos modelos de ciclos reais de negócios


Lembre-se que os economistas novo-clássicos acreditam que os modelos macroeconômicos
precisam ter duas características:
1. Os agentes otimizam.
2. Os mercados se equilibram.
Os teóricos dos ciclos reais de negócios concordam. Um aspecto distintivo dos modelos de
ciclos reais de negócios é a atenção minuciosa às bases microeconômicas – as decisões
otimizadoras de indivíduos. Os teóricos dos ciclos reais de negócios também acreditam que o
ciclo de negócios é um fenômeno de equilíbrio, no sentido de que todos os mercados se
equilibram. Essa crença contrasta com a visão keynesiana de que o mercado de trabalho não se
equilibra. O modelo keynesiano inclui desemprego involuntário. Nos modelos de ciclos reais de
negócios, como nos modelos novo-clássicos, todo desemprego é voluntário.
Onde os teóricos dos ciclos reais de negócios afastam-se dos economistas novo-clássicos é
quanto às causas de flutuações no produto e no emprego. Os teóricos dos ciclos reais de
negócios interpretam essas flutuações como “originárias de variações nas oportunidades reais da
economia privada”.1 Entre os fatores que causam essas mudanças estão choques de tecnologia,
variações nas condições ambientais, variações nos preços reais (relativos) de matérias-primas
importadas (por ex., petróleo bruto) e mudanças nas alíquotas tributárias. Flutuações no produto
também ocorrem com mudanças nas preferências individuais, por exemplo, uma mudança na
preferência por bens em relação ao lazer. Esses são os mesmos fatores que determinavam o
produto no modelo clássico. Mas os economistas clássicos acreditavam que, de modo geral,
esses fatores variavam apenas lentamente ao longo do tempo. No curto prazo, eram considerados
estáveis.2 Eles eram os fatores que determinariam o crescimento no longo prazo. Os teóricos dos
ciclos reais de negócios afirmam que essas variáveis do lado da oferta são também a causa de
flutuações de curto prazo no produto e no emprego.
Isso distingue os teóricos dos ciclos reais de negócios dos economistas novo-clássicos, que
viam mudanças não antecipadas na demanda agregada, resultantes, por exemplo, de “surpresas
monetárias”, como a principal causa de flutuações no produto e no emprego. Nada no esquema
novo-clássico exclui a possibilidade de um papel importante para variáveis do lado da oferta,
como os choques dos preços do petróleo na década de 1970 ou mudanças nas alíquotas
tributárias, no curto prazo. Ainda assim, mudanças não antecipadas na demanda eram vistas
como a principal fonte de flutuações cíclicas no produto. Fatores como choques de tecnologia ou
mudanças nas preferências individuais recebiam menos atenção.
A ideia de que mudanças em fatores reais do lado da oferta determinam flutuações de curto
prazo no produto e no emprego também diferencia os modelos de ciclos reais de negócios dos
modelos keynesianos. Como vimos no Capítulo 8, os modelos keynesianos podem incorporar os
efeitos de choques no lado da oferta, mas um princípio central da teoria keynesiana é a
importância da demanda agregada na determinação do produto e do emprego no curto prazo.
Antes de analisarmos um exemplo de um modelo de ciclos reais de negócios, há mais duas
questões gerais a serem abordadas. A primeira é o motivo pelo qual os teóricos dos ciclos reais
de negócios rejeitam a explicação novo-clássica da causa de flutuações de curto prazo no
produto quando, em outros aspectos, as duas linhas são tão semelhantes. Uma razão é que as
evidências empíricas sobre o papel de mudanças não antecipadas na demanda agregada para a
determinação do produto são um tanto confusas. Talvez mais importante, porém, seja o fato de
os teóricos dos ciclos reais de negócios acreditarem que a ideia de que erros na previsão da
demanda agregada podem explicar flutuações grandes e custosas no produto viola, em última
instância, o postulado de que os agentes otimizam. Nas palavras de Robert Barro, “Se as
informações sobre a moeda e o nível geral de preços importassem muito para as decisões
econômicas, as pessoas poderiam gastar relativamente poucos recursos para obtê-las
rapidamente”.3 Se não o fazem, não estão otimizando.
Por fim, note-se que há duas interpretações possíveis para a teoria dos ciclos reais de
negócios. Por uma dessas interpretações, ela propõe que fatores reais do lado da oferta
simplesmente são mais importantes do que influências nominais do lado da demanda. Nessa
interpretação, porém, os modelos de ciclos reais de negócios são apenas versões do modelo
novo-clássico que, como já foi explicado, também podem incorporar choques do lado da oferta.
Quando os teóricos dos ciclos reais de negócios diferenciam seus modelos dos modelos novo-
clássicos, como o que foi examinado no Capítulo 11, eles defendem uma posição muito mais
forte, ou seja, de que choques monetários e outros choques nominais do lado da demanda não
têm nenhum efeito significativo sobre o produto e o emprego.

12.1.2 Um modelo simples de ciclos reais de negócios


Os modelos de ciclos reais de negócios, nas palavras de um de seus proponentes, veem as
variáveis econômicas agregadas como resultados das decisões tomadas por muitos agentes
individuais agindo de forma a maximizar sua utilidade, sujeitos às possibilidades de produção e
às restrições de recursos. Como tal, os modelos têm uma base firme e explícita na
microeconomia.4
Nesta seção, vamos construir um modelo simples de ciclos reais de negócios. Tendo
construído o modelo, examinaremos como agentes econômicos otimizadores reagem a
mudanças nas condições econômicas e as implicações de suas reações para o comportamento de
variáveis econômicas agregadas.
Um pressuposto habitual nos modelos de ciclos reais de negócios é que a economia é
povoada por um grupo de indivíduos idênticos. O comportamento do grupo pode então ser
explicado em termos do comportamento de um único indivíduo, chamado de agente
representativo. Vamos chamar esse agente de Robinson Crusoe.
A meta de Robinson é maximizar sua utilidade em cada período de sua vida. Ele obtém
utilidade de duas fontes: consumo e lazer. Vamos supor que ele tenha a seguinte função
utilidade (U):

onde C é consumo e le é lazer. Para consumir, Robinson precisa primeiro gerar produto. Ao
fazer isso, ele deixa de lado o lazer. Assim, como nos modelos anteriores, há um trade-off
trabalho-lazer. O produto no modelo é gerado pela função produção

A equação (12.2) é semelhante à função produção agregada no modelo clássico discutido no


Capítulo 3. A função produção especifica a quantidade de produto (Y) que resultará do emprego
de quantidades dadas de capital (K) e trabalho (N) no período de tempo t.
Há duas diferenças entre a equação (12.2) e nossa função produção anterior. A equação
(12.2) contém o termo adicional zt, que representa choques no processo de produção. Por
choques referimo-nos a eventos que mudam o nível de produto que será gerado para níveis
dados de trabalho e capital. Os teóricos dos ciclos reais de negócios incluem uma série de fatores
nessa categoria. Entre os importantes estão choques de tecnologia, fatores ambientais, mudanças
em regulamentações governamentais que afetem a produtividade e mudanças na disponibilidade
de matérias-primas.
A segunda diferença entre a equação (12.2) e nossa versão anterior da função produção é a
ausência de uma barra sobre o K na equação (12.2). No ciclo real de negócios, o estoque de
capital não é considerado fixo, mas é escolhido para cada período pelo agente representativo,
como veremos adiante.
Robinson não precisa consumir todo o produto que gera em cada período. O jovem Robinson
poderia preferir poupar para quando for um velho Robinson ou para uma futura geração de
Crusoe Júniors. O necessário é que

Poupança (S) mais consumo (C) deve ser igual à renda, ignorando a existência de impostos.
A equação (12.3) indica que, além de um trade-off trabalho-lazer, o agente representativo vê-se
diante de um trade-off entre consumo hoje e poupança para consumo futuro. A poupança hoje
aumentará o consumo no futuro porque considera-se que a poupança seja investida para
aumentar o estoque de capital no período seguinte:

O estoque de capital no período t + 1 é igual à poupança no período t mais a parte do estoque


de capital (1 – ) que sobrou do período t, onde é a taxa de depreciação do capital (a fração do
estoque de capital que se desgasta em cada período).
No cenário desse agente representativo, o comportamento do produto agregado, emprego,
consumo e poupança é descrito em termos das escolhas feitas por Robinson Crusoe. Vamos
examinar agora como essas escolhas são afetadas por uma mudança no ambiente econômico
com que Robinson se depara.

12.1.2.1 Efeitos de um choque de tecnologia positivo


Vamos supor que, num dado período de tempo, haja um choque de tecnologia favorável. Por
enquanto, vamos considerar que o choque seja temporário, com duração de apenas um período;
mais tarde, consideraremos choques mais prolongados. Suporemos que este choque ocorra
exogenamente e vamos representá-lo em nosso modelo por um aumento no termo zt na equação
(12.2), digamos, de um nível inicial z0t para um valor mais alto z1t. Dados Kt e Nt, há um
aumento exógeno em Yt.

FIG 12.1 O efeito de um choque de tecnologia positivo em um modelo de ciclos reais de


negócios

Um choque de tecnologia positivo desloca a função produção para cima, de z0tF(Kt,Nt) para z1tF(Kt,Nt). Robinson reage a esse
aumento em sua produtividade elevando seu insumo trabalho de N0 para N1. Devido ao aumento na produtividade e ao aumento
no insumo trabalho, o produto sobe de Y0 para Y1.

O efeito desse choque é ilustrado na Figura 12.1. Inicialmente, com zt igual a z0t, a função
produção é dada por z0tF(Kt,Nt). Vamos supor que, diante desse conjunto de possibilidades de
produção, Robinson escolha N0 como a quantidade ótima de trabalho a ser realizado e, como
resultado, o produto fica em Y0. O choque de tecnologia positivo desloca a função produção para
cima, para z1tF(Kt,Nt). Além desse deslocamento, presume-se que a natureza do choque seja tal
que a função produção torne-se mais inclinada para qualquer nível do insumo trabalho. Lembre-
se do Capítulo 3 que a inclinação da função produção é o produto marginal do trabalho. Estamos
considerando aqui que o choque aumenta a produtividade marginal de Robinson.
Mesmo no mesmo nível de insumo trabalho (N0), esse aumento da produtividade causaria um
aumento no produto, para Y’1, na Figura 12.1. O choque favorável, porém, alterou as
possibilidades de produção que se apresentam para Robinson. Se ele perceber a mudança, o que
consideraremos que acontece, reagirá a ela. Na figura, consideramos que ele reaja ao aumento de
sua produtividade trabalhando mais. O nível do insumo trabalho sobe para N1 na Figura 12.1 e o
produto aumenta para Y1.
Robinson precisa decidir o que fazer com o produto maior. A equação (12.3) nos diz que o
aumento no produto irá para consumo ou poupança. Ele poderia simplesmente consumir tudo.
Mas, particularmente no caso de um choque temporário, é provável que ele poupe uma parte do
aumento no produto para possibilitar que o consumo também seja mais alto no futuro. Se esse
for o caso, a equação (12.4) nos informa que a poupança maior, que, por sua vez, significa mais
investimento, fará o estoque de capital ser mais elevado no período seguinte do que seria de
outra maneira. Por causa do estoque de capital mais alto, o produto no período seguinte, assim
como em outros períodos futuros, também será mais alto do que teria sido na ausência do
choque de tecnologia. Isso se aplica mesmo que o efeito direto do choque tenha durado apenas
um período.
Se o choque tivesse durado vários períodos ou se tivesse sido permanente, as respostas de
Robinson teriam sido um pouco diferentes. Como ele saberia que o produto seria alto por um
período mais longo, seu incentivo para poupar seria reduzido e seu incentivo para consumir
aumentaria. Além disso, como ele saberia que sua produtividade seria mais alta por vários
períodos, devido ao efeito direto do choque, poderia aumentar menos o seu esforço de trabalho
em cada período. Choques de longa duração na produtividade, porém, resultarão também em
mudanças no produto, no estoque de capital e no emprego que persistem por muitos períodos.
É importante que os efeitos de choques de tecnologia durem por muitos períodos. Uma crítica
keynesiana básica ao modelo novo-clássico, que compartilha a abordagem do equilíbrio adotada
pelos teóricos dos ciclos reais de negócios, é que ele não pode explicar a persistência dos ciclos
de negócios no mundo real. Os teóricos dos ciclos reais de negócios afirmam que as respostas
dinâmicas de agentes otimizadores a mudanças nas condições econômicas terão, como acabou
de ser explicado, efeitos de longa duração. Essas respostas podem explicar períodos de atividade
econômica persistentemente alta ou baixa.
Focalizamos os choques de tecnologia porque eles são fundamentais para a explicação de
flutuações econômicas pelos teóricos dos ciclos reais de negócios. Como já foi observado,
porém, outros fatores considerados nos modelos de ciclos reais de negócios são mudanças nas
condições ambientais, preços relativos de matérias-primas, variações nas alíquotas tributárias e
mudanças de preferências. Todos esses choques são causas adicionais potenciais de movimentos
cíclicos no produto e no emprego.

12.1.3 Política macroeconômica em um modelo de ciclos reais de


negócios
Em um modelo de ciclos reais de negócios, flutuações originam-se de reações de indivíduos a
mudanças no ambiente econômico. Essas reações são resultado de comportamento otimizador.
Nesses modelos, seria sub-ótimo se os formuladores de políticas econômicas eliminassem o
ciclo de negócios, se de fato pudessem fazer isso. Qual é o papel, então, da política
macroeconômica em um modelo de ciclos reais de negócios? Vamos começar pela política
monetária e, depois, passar para a política fiscal.

12.1.3.1 Política monetária


A característica definidora de modelos de ciclos reais de negócios é que fatores reais, e não
monetários, são responsáveis por flutuações no produto e no emprego. Em modelos de ciclos
reais de negócios, o papel da moeda é determinar o nível de preços, mais ou menos como no
modelo clássico original. Mudanças na quantidade de moeda resultam em mudanças
proporcionais no nível de preços, sem mudança no produto ou no emprego.5
Disso decorre, portanto, que a política monetária deve focar o controle do nível de preços.
Uma política monetária desejável resultaria em crescimento lento e constante da oferta de moeda
e, assim, em preços estáveis ou, pelo menos, em uma baixa taxa de inflação. Quando
considerarmos a política fiscal, porém, vamos ver que a teoria dos ciclos reais de negócios gera
uma visão alternativa para a conduta ótima de política monetária. De qualquer forma, certamente
não há lugar para uma política de estabilização monetária ativa do tipo keynesiano. A política
monetária não pode afetar o produto e o emprego e, mesmo que pudesse, seria sub-ótimo tentar
eliminar o ciclo de negócios.

12.1.3.2 Política fiscal


Muitas ações de política fiscal afetarão o produto e o emprego em um modelo de ciclos reais
de negócios. Isso não se dará por um efeito sobre a demanda agregada, como no modelo
keynesiano, mas por efeitos no lado da oferta. Mudanças nas alíquotas tributárias sobre a renda
do trabalho ou sobre o retorno do capital afetarão as escolhas dos agentes otimizadores. Além
disso, esses efeitos serão causadores de distorções. Um imposto sobre a renda dos trabalhadores,
por exemplo, fará um indivíduo escolher lazer demais em relação ao emprego (com resultante
redução do consumo). Mesmo um imposto lump sum (imposto fixo por pessoa) afetará o
comportamento individual, porque afetará a riqueza ao longo do horizonte de planejamento.
A tarefa da política fiscal no modelo de ciclos reais de negócios é minimizar essas distorções
tributárias sem prejudicar os serviços governamentais necessários (como defesa). É então que
surge um papel alternativo para a política monetária (alternativo a simplesmente manter a
inflação baixa por meio de crescimento baixo e constante da moeda). Lembre-se de nossa
discussão anterior sobre a restrição orçamentária do governo (Seção 4.3) que uma alternativa a
financiar os gastos do governo por meio de impostos é financiá-los pela emissão de moeda.6 Os
formuladores de políticas econômicas podem reduzir a distorção devida à tributação financiando
uma parte dos gastos do governo com a criação de mais moeda. O termo que os economistas
usam para essa prática em que o governo obtém recursos reais por meio de criação de moeda é
senhoriagem (seigniorage). A senhoriagem, porém, também tem custos, uma vez que, quanto
mais rápido for o crescimento da oferta de moeda, mais alta será a taxa de inflação. No modelo
dos ciclos reais de negócios, segue-se que o uso ótimo das políticas fiscal e monetária é
combiná-las de forma a minimizar os custos totais da inflação e da distorção tributária. Isso é
muito diferente da visão keynesiana de políticas ótimas de estabilização monetária e fiscal.

Senhoriagem
Valor de recursos reais comprados pelo governo com
moeda recém-criada.

PERSPECTIVAS 12.1 - ROBERT LUCAS E A TEORIA DOS CICLOS


REAIS DE NEGÓCIOS
Como foi comentado no início do capítulo, os modelos de ciclos reais de negócios e os modelos novo-clássicos descritos
no capítulo anterior compartilham características importantes. Além disso, uma das interpretações da teoria dos ciclos
reais de negócios é simplesmente que os fatores reais do lado da oferta são quantitativamente muito mais importantes do
que influências nominais do lado da demanda. Com essa interpretação, as teorias dos ciclos reais de negócios são simples
extensões de modelos novo-clássicos que focam a atenção nessas variáveis reais do lado da oferta. Em um artigo recente,
Robert Lucas, a figura central no desenvolvimento dos modelos novo-clássicos, conclui que esse tipo de modelo é
característico da economia dos Estados Unidos.
Lucas, portanto, afirma que “Tomando o desempenho americano dos últimos 50 anos como referência, o potencial para
ganhos de bem-estar derivados de políticas de longo prazo voltadas para o lado da oferta excede em muito o potencial
decorrente de avanços na administração da demanda no curto prazo”.a Lucas aceita que “a estabilidade de agregados
monetários e gastos nominais nos Estados Unidos pós-guerra é uma razão importante para a estabilidade da produção e do
consumo agregados durante esses anos, em relação à experiência do período entre-guerras e à experiência contemporânea
de outras economias”. b Mas ele argumenta que ganhos importantes de bem-estar decorrentes de novos avanços nessas
políticas do lado da demanda são irrealistas. Sua estimativa de tais ganhos potenciais é de menos de um décimo de 1% do
consumo agregado.
Essa estimativa é baseada no cenário de agentes otimizadores funcionando em um ambiente como a economia de
Robinson Crusoe da Seção 12.1 e sujeito a incerteza quanto a seus fluxos de consumo. Dentro de uma economia desse
tipo, Lucas calcula o ganho de bem-estar que poderia ser obtido pela redução do risco de consumo decorrente de uma
melhor estabilização da demanda agregada.
Enquanto o ganho estimado por essa via é insignificante, Lucas cita outros estudos que indicam que ganhos de bem-estar
muito maiores resultariam de mudanças de política fiscal que melhorassem os incentivos para trabalhar e poupar. Altas
alíquotas marginais do imposto de renda e esquemas de aposentadoria ineficientes podem criar distorções nas decisões de
trabalho-lazer e consumo-poupança com custos para o bem-estar potencialmente altos. As políticas para reduzir essas
distorções, com frequência chamadas de políticas do lado da oferta, serão analisadas no Capítulo 19.
Como a avaliação de prioridades macroeconômicas de Lucas precisaria ser alterada diante da crise financeira e da recessão
profunda de 2007-2009? A gravidade da recessão levaria a uma estimativa um pouco mais alta dos ganhos de uma melhor
administração da demanda.
Uma revisão mais fundamental é necessária na suposição de Lucas de que “o problema central de prevenção de depressões
foi resolvido”. Essa ideia parece ter sido baseada no período que foi chamado de “a grande moderação”, a partir de
meados da década de 1980. O Federal Reserve certamente havia aprendido a lidar com flutuações modestas na demanda
agregada usando instrumentos de política econômica tradicionais. Estes falharam em 2008. Usando uma série de
iniciativas de política econômica não convencionais, que serão descritas no Capítulo 17, o Federal Reserve conseguiu de
fato evitar um colapso financeiro. No entanto, como disse Wellington sobre a batalha de Waterloo, “foi por pouco”.
a LUCAS, Robert. Macroeconomic priorities. American Economic Review, 93, p. 1, Mar. 2003.
b LUCAS, 2003, p. 11.
12.1.4 Questões sobre modelos de ciclos reais de negócios
Os ciclos reais de negócios têm sido uma área de pesquisa ativa em anos recentes, mas a
abordagem não está livre de críticas. Esses críticos afirmam que “a teoria dos ciclos reais de
negócios não oferece uma explicação empiricamente plausível para flutuações econômicas”.7Os
críticos levantaram uma série de questões referentes ao realismo da explicação de flutuações
econômicas pela teoria. Vamos examinar duas que parecem ser fundamentais: a questão de os
choques de tecnologia serem ou não de magnitude suficiente para explicar ciclos de negócios
observados e a questão relacionada de poderem ou não, as mudanças observadas no emprego,
ser de fato explicadas como escolhas voluntárias de agentes econômicos diante de mudanças nas
possibilidades de produção (ou com mudanças de gostos).

12.1.4.1 A importância de choques de tecnologia


Críticos da abordagem dos ciclos reais de negócios questionam se os choques de tecnologia
são grandes o bastante para causar flutuações econômicas do tipo e tamanho que observamos.
Esses críticos ressaltam que muitos choques de tecnologia tendem a ser específicos para setores
individuais. Em qualquer ano específico, enquanto alguns setores talvez estejam vivendo
choques negativos, outros terão choques positivos. No entanto, em uma recessão no mundo real,
por exemplo, o declínio do produto é disseminado por setores de estruturas muito diversas.
Embora os críticos não neguem que alguns choques de tecnologia afetem muitos setores (por
ex., a revolução da transmissão de informações), eles não creem que haja uma quantidade
suficiente de tais choques para explicar recessões em que o produto cai para até 10% abaixo do
produto potencial.
Choques de tecnologia são, claro, apenas um tipo de choque considerado na teoria dos ciclos
reais de negócios, embora eles tenham recebido a maior ênfase. Quanto aos outros choques (e
aos choques de tecnologia também) incluídos nos modelos de ciclos reais de negócios, os
críticos não dizem que choques reais no lado da oferta não são importantes, mas apenas que não
são tão importantes. Muitos economistas que não aceitam a explicação dos ciclos reais de
negócios para flutuações econômicas acreditam que a elevação abrupta do preço relativo do
petróleo importado foi de fato a causa central da profunda recessão nos Estados Unidos e em
outras nações industrializadas em meados da década de 1970. Outras recessões, como a dos
Estados Unidos no início da década de 1980, seriam mais bem explicadas, segundo os críticos,
por mudanças na demanda agregada – nesse caso, por uma política monetária restritiva do
Federal Reserve.

12.1.4.2 Mudanças voluntárias no emprego


Nos modelos de ciclos reais de negócios, mudanças no emprego acontecem quando os
agentes econômicos respondem a mudanças nas condições econômicas. Em nossa discussão dos
efeitos de um choque de tecnologia positivo, vimos que Robinson Crusoe tornou-se mais
produtivo e respondeu a isso trabalhando mais. O produto subiu tanto pelo efeito direto do
choque como pelo aumento no insumo trabalho de Crusoe. Um choque de tecnologia negativo
teria o efeito oposto: o produto e o emprego declinariam. Em ambos os casos, as mudanças no
emprego seriam voluntárias e desejáveis (os agentes são otimizadores).
Outra maneira de expressar esse conceito é dizer que os indivíduos estão se movendo ao
longo de suas curvas de oferta de trabalho em resposta a mudanças em sua produtividade
marginal e, portanto, em seu salário real. Essa foi a análise de mudanças no emprego no modelo
clássico, apresentada no Capítulo 3. Críticos da abordagem dos ciclos reais de negócios afirmam
que, para explicar as flutuações do mundo real dessa maneira, seria necessária uma resposta
implausivelmente alta da oferta de trabalho a mudanças no salário real – uma curva de oferta de
trabalho muito plana. Isso porque, embora as variações no emprego ao longo do ciclo de
negócios sejam grandes, as mudanças no salário real são pequenas. Segundo os críticos, estudos
mostram apenas pequenas respostas na quantidade de horas trabalhadas a mudanças no salário
real (uma curva de oferta de trabalho muito inclinada).8 Eles afirmam que os dados são mais
consistentes com a explicação keynesiana, em que se pressupõe que os trabalhadores são tirados
de suas curvas de oferta de trabalho; o desemprego é involuntário.

12.1.5 Comentário final


Os teóricos dos ciclos reais de negócios estão convencidos de que o ciclo de negócios pode
ser explicado como um fenômeno de equilíbrio. Flutuações no produto surgem quando agentes
econômicos otimizadores reagem a choques reais que afetam as possibilidades de produção.
Políticas econômicas para tentar evitar essas flutuações são desnecessárias e mal direcionadas.
Os críticos da abordagem dos ciclos reais de negócios, muitos dos quais interpretam o ciclo de
negócios por uma perspectiva keynesiana, acham essa explicação implausível. Eles veem os
ciclos de negócios como resultado de mudanças na demanda agregada nominal, ao lado das
mudanças em variáveis reais do lado da oferta. Os economistas que interpretam o ciclo de
negócios por essa perspectiva keynesiana acreditam que a prescrição da teoria dos ciclos reais de
negócios quanto a políticas econômicas defende erroneamente a falta de ação diante de desvios
custosos em relação ao produto potencial.

12.2 A economia novo-keynesiana


Keynes tentou explicar o desemprego involuntário – às vezes, desemprego involuntário em
massa. Ele se propôs a mostrar como a demanda agregada afetava o produto e o emprego. Os
modelos keynesianos podem explicar o desemprego e a participação da demanda agregada na
determinação do produto e do emprego. Um elemento-chave nesses modelos é a rigidez do
salário monetário. Uma queda na demanda agregada por mercadorias, por exemplo, leva a uma
queda na demanda por trabalho. Como resultado de contratos de trabalho de salário fixo e das
expectativas de preços retrospectivas dos trabalhadores, o salário monetário não cairá o
suficiente no curto prazo para manter o nível de emprego inicial. Emprego e produto cairão. O
desemprego aumentará.
Nas duas últimas décadas, economistas que trabalham na tradição keynesiana têm buscado
explicações adicionais para o desemprego involuntário. Os modelos que surgiram dessas
pesquisas são chamados de modelos novo-keynesianos. Em parte, essa nova pesquisa é uma
resposta à crítica novo-clássica aos modelos keynesianos mais antigos. N. Gregory Mankiw e
David Romer, ambos com contribuições importantes à economia novo-keynesiana, afirmam que
“os economistas novo-clássicos argumentavam persuasivamente que a economia keynesiana era
teoricamente inadequada, que a macroeconomia precisa ser construída sobre uma base
microeconômica sólida”.9 Nem todos os novo-keynesianos são tão críticos quanto aos modelos
keynesianos mais antigos, mas sua principal tarefa tem sido aperfeiçoar as bases
microeconômicas do sistema keynesiano. Como consideram a rigidez do salário e dos preços um
aspecto fundamental da explicação de Keynes para o desemprego involuntário, muito esforço foi
dedicado a demonstrar que essa rigidez pode derivar do comportamento de agentes
otimizadores.

PERSPECTIVAS 12.2 - FLUXOS NO MERCADO DE TRABALHO


Os críticos da abordagem dos ciclos reais de negócios afirmam que a natureza dos fluxos no mercado de trabalho é
inconsistente com uma teoria em que o desemprego cíclico é voluntário. A Figura 12.2 mostra a participação no desemprego
total de pessoas que deixaram o emprego e de pessoas que perderam o emprego nos Estados Unidos nos anos de 1984-96. Os
que deixaram o emprego são os trabalhadores que seriam classificados como desempregados voluntários. Os que perderam o
emprego são os que foram dispensados ou demitidos.
Repare que, durante a longa recuperação após a recessão de 1981-82, a proporção de pessoas que perderam o emprego
diminuiu e a de pessoas que deixaram o emprego subiu. Isso é consistente com um padrão: quando a atividade econômica
recuperou fôlego, as dispensas diminuíram e, com a criação de novas oportunidades de trabalho, o número de pessoas que
deixaram seus empregos cresceu. Depois, na recessão que começou em 1990, a proporção dos que perderam o emprego
subiu abruptamente, ao passo que menos trabalhadores largaram o emprego.
O padrão dos fluxos no mercado de trabalho da Figura 12.2 não é, porém, facilmente explicado pela perspectiva dos ciclos
reais de negócios. Se o desemprego cíclico é voluntário, o número de pessoas que deixam o emprego deveria subir, e não
cair, durante uma recessão. Além disso, uma explicação de ciclos reais de negócios para a Figura 12.2 deveria, de alguma
forma, levar em conta os que perderam o emprego. Eles perderam seu emprego voluntariamente? Diante disso, esses
dados parecem mais consistentes com uma explicação do desemprego cíclico como involuntário.

FIG 12.2 Perda do emprego e saída do emprego, participação no desemprego total


(Estados Unidos, 1984-96)

Os economistas novo-keynesianos não tentaram desenvolver uma única base racional para
todos os casos de rigidez de preços e salários. Em vez disso, acreditam que uma série de
aspectos do processo de definição de preços e salários explica essa rigidez. Na verdade, a
literatura novo-keynesiana é caracterizada pelo que tem sido chamado de “atordoante
diversidade” de abordagens. Essas abordagens, no entanto, têm os seguintes elementos em
comum:
1. Nos modelos novo-keynesianos, considera-se que haja concorrência imperfeita pelo
mercado de produtos. Isso contrasta com os modelos keynesianos anteriores, que
supunham uma concorrência perfeita.
2. Enquanto a rigidez nominal central nos modelos keynesianos anteriores era a do salário
monetário, os modelos novo-keynesianos também se voltam para a rigidez dos preços dos
produtos.
3. Além dos fatores que causam a rigidez de variáveis nominais (por ex., o salário monetário),
os modelos novo-keynesianos introduzem a rigidez real – fatores que provocam a rigidez
do salário real ou do preço relativo das firmas diante de mudanças na demanda agregada.
Vamos examinar três tipos de modelos novo-keynesianos: modelos de preços rígidos (custo
de menu), modelos de salário-eficiência e modelos incluído-excluído.

12.2.1 Modelos de preços rígidos (custo de menu)


Os modelos keynesianos viam o salário monetário como a variável que não se ajustava a
mudanças na demanda agregada; produto e emprego tinham de se ajustar. O mercado de
produtos nesses modelos era caracterizado por concorrência perfeita. Os economistas
keynesianos não acreditavam de fato que a maioria dos mercados de produtos da vida real fosse
perfeitamente competitiva. O pressuposto da concorrência perfeita era usado por uma questão de
simplificação e refletia a ideia de que a rigidez do salário monetário era a verdadeira culpada na
explicação do desemprego.
Um elemento crucial nos modelos de preços rígidos novo-keynesianos é que a firma não
está em uma concorrência perfeita.10 Com concorrência perfeita, os preços são definidos pelas
forças da oferta e da demanda. Firmas individuais não têm poder sobre o preço de seus produtos;
elas têm curvas de demanda horizontais. A firma perfeitamente competitiva, uma fazenda de
laticínios, por exemplo, pode vender todo o leite que quiser pelo preço de mercado vigente de,
digamos, $1,00 por galão. Se, devido a uma queda na demanda agregada, o preço de mercado
cair para $0,80 por galão, a firma pode vender tudo o que quiser por esse novo preço. Se, diante
da queda na demanda, a firma perfeitamente competitiva mantivesse seu preço de produto
original, ela não venderia nada. Não há lugar para preços rígidos neste mercado.

Modelos de preços rígidos


(Ou modelos de custo de menu) são aqueles em que
os custos para mudar os preços impedem ajustes de
preços quando a demanda muda. Em consequência, o
produto cai quando há, por exemplo, um declínio na
demanda.

Se, porém, houver um concorrente monopolista ou uma firma oligopolista, a situação é


diferente.11 Se um restaurante não baixasse os preços diante de uma queda geral na demanda por
refeições em restaurantes, ele perderia alguns, mas não todos os seus clientes. Similarmente,
durante uma recessão, quando a demanda por automóveis diminui, a Ford Motor Company pode
continuar a vender carros mesmo que os preços permaneçam inalterados. Concorrentes
monopolistas e oligopólios têm algum controle sobre o preço de seus produtos. De fato, o
incentivo para baixar preços pode ser bastante fraco para esses tipos de firmas. Se elas
mantiverem seu preço inicial quando a demanda cair, perderão vendas, mas as vendas que
mantiverem serão ainda pelo preço relativamente alto inicial. Além disso, se todas as firmas
mantiverem o preço inicial, nenhuma firma individual perderá vendas para seus concorrentes.
Ainda assim, diante de uma queda na demanda, o preço que maximiza o lucro cairá mesmo
para as firmas de um ambiente de concorrência imperfeita. Embora o lucro com a redução do
preço possa ser pequeno, há algum ganho. Por que, então, as firmas não baixariam o preço? As
firmas poderiam manter os preços dos produtos constantes mesmo com a queda da demanda se
houvesse um custo percebido na mudança de preços que superasse o benefício da redução dos
preços. Esses custos de mudanças de preços são chamados de custos de menu.

Custos de menu
Refere-se a qualquer tipo de custo incorrido por uma
firma se esta alterar o preço de seu produto.

O nome deriva do fato de que, se restaurantes alterarem preços, precisam imprimir novos
menus. De maneira mais geral, quando firmas mudam preços, incorrem em custos diretos e
indiretos de vários tipos.
Um tipo é chamado de custos gerenciais. Estes incluem os custos de coletar as informações
necessárias para decidir quanto à mudança ótima no preço, o custo de comunicar aos clientes a
lógica da mudança e, talvez, de negociar com os clientes que resistam a ela. Cada uma dessas
atividades tira o tempo gerencial de outras atividades.
Um segundo custo é a perda de prestígio junto aos clientes. Esse prestígio só seria perdido
com aumentos dos preços, mas as firmas que cortam preços em recessões precisam aumentá-los
de novo quando a economia se recuperar. As firmas podem, em vez disso, achar adequado
alterar preços quando seus custos mudam, porque essa é uma necessidade que os clientes
entenderão, mas não variar preços devido a mudanças na demanda. Desse modo, não serão
consideradas “exploradoras” em períodos de alta demanda e não baixarão os preços quando a
demanda cair.
Outro custo percebido possível de uma redução de preços em uma recessão é que isso pode
desencadear rodadas competitivas de cortes de preços ou mesmo levar a uma guerra de preços
quando outras firmas responderem. Esse custo potencial é relevante para mercados oligopolistas,
em que as firmas estão cientes das reações de outras firmas a suas decisões de preços.
Se esses custos percebidos de mudanças de preços forem suficientemente altos, existirá
rigidez de preços. Declínios na demanda agregada resultarão em quedas no produto e no
emprego, e não em reduções de preços. Claro que nem todos os preços precisam ser rígidos. Se
o número de setores em que os preços são rígidos constituir um segmento significativo da
economia, os declínios no produto e no emprego serão substanciais.
Modelos de preços rígidos sugerem, então, um papel para as políticas monetária e fiscal na
compensação de deslocamentos da demanda agregada. As políticas ideais nesses modelos, no
entanto, podem diferir das que derivavam dos modelos keynesianos tradicionais. Uma diferença
decorre do fato de que, se há elementos monopolistas na economia, o nível de equilíbrio do
produto estará abaixo do nível ótimo, portanto compensações de declínios na demanda serão
mais importantes do que compensações de aumentos. A estabilização não será simétrica. Além
disso, na presença de custos de menu, no momento de tomar decisões de preços as firmas
reconhecerão que podem ter de manter um determinado preço por algum tempo e, desse modo,
tentarão prever custos e demandas futuros em sua decisão. Isso abre um papel para políticas
monetárias ou fiscais condicionarem as expectativas de uma maneira estabilizadora. No Capítulo
17, essa possibilidade será examinada com relação à política monetária.

PERSPECTIVAS 12.3 - OS PREÇOS SÃO RÍGIDOS?


Os economistas novo-keynesianos procuraram examinar se os preços no mundo real são de fato rígidos. Em um estudo,
Stephen Cecchetti encontrou uma rigidez considerável nos preços de revistas vendidas em bancas.a A revista Readers
Digest, por exemplo, mudou seu preço de banca apenas seis vezes entre 1950 e 1980. Em muitos anos, poucas das 38
revistas no estudo tiveram alterações de preços.
Em um estudo mais amplo, Alan Blinder supervisionou entrevistas com executivos empresariais sobre a frequência com
que suas firmas alteravam os preços.b Um resumo de algumas de suas descobertas é mostrado na Tabela 12.1. Os dados do
levantamento indicam que 49,5% das firmas alteravam preços uma vez por ano ou menos. Isso indica um considerável
afastamento do comportamento de mercado de leilão.

Tabela 12.1 - Frequência de alterações de preços

Número de alterações de preços Porcentagem


por ano de firmas
Mais de 12 14,5
4 a 12 7,5
2a4 12,9
1a2 15,6
1 39,3
Menos de 1 10,2

a Stephen Cecchetti. The Frequency of Price Adjustment: A Study of the Newsstand Prices of Magazines”, Journal of
Econometrics, 31, abril de 1986, pp. 255-74.
b Alan Blinder, “On Sticky Prices”, in N. Gregory Mankiw, org., Monetary Policy, Chicago, University of Chicago Press,
1994, pp. 117-50.

12.2.2 Modelos de salário-eficiência


Em 1914, Henry Ford instituiu o dia de cinco dólares para seus trabalhadores. Na época, o
salário competitivo vigente era de dois a três dólares por dia. Ford decidiu pagar esse salário
acima do mercado porque achou que isso desestimularia as faltas ao trabalho, reduziria a
rotatividade da mão de obra e melhoria o estado de espírito dos trabalhadores; a produtividade,
como resultado, aumentaria. Os modelos de salário-eficiência modernos seguem a mesma
premissa: a eficiência dos trabalhadores depende positivamente do salário real que eles
recebem.12

Modelos de salário-eficiência
Modelos em que a produtividade do trabalho depende
do salário real que os trabalhadores recebem. Nesses
modelos, o salário real é estabelecido para maximizar
as unidades de eficiência do trabalho por unidade
monetária gasta, não para equilibrar o mercado.

A ideia do salário-eficiência pode ser formalizada pela definição de um índice de eficiência


do trabalhador, ou produtividade (e), tal que
A eficiência do trabalhador é uma função positiva do salário real. Assim sendo, expressamos
agora a função produção agregada como

Como antes, o produto (Y) depende da quantidade de capital (K).13 O produto também
depende da quantidade do insumo trabalho, que agora medimos em unidades de eficiência. O
número de unidades de eficiência do trabalho é igual ao número de unidades físicas (N),
medidas, por exemplo, em homens-horas por período, multiplicado pelo índice de eficiência (e).
O produto aumenta quando mais unidades de trabalho são contratadas (N aumenta) ou quando a
eficiência da força de trabalho existente melhora (e aumenta com um aumento em W/P).
Com a função produção dada pela equação (12.6), a meta da firma é estabelecer o salário real
de forma que o custo de uma unidade de eficiência de trabalho seja minimizado ou, em outros
termos, maximizar o número de unidades de eficiência de trabalho compradas com cada unidade
monetária gasta na folha de pagamento. Isso é feito aumentando o salário real até o ponto em
que a elasticidade do índice de eficiência [e(W/P)] em relação ao salário real seja igual a 1.
Vamos usar um exemplo para ver por que isso acontece. Primeiro, lembremos que a
elasticidade é a mudança percentual em uma variável (aqui, a eficiência de trabalho) a cada 1%
de mudança em outra variável (aqui, o salário real). Assim, estamos dizendo que a condição que
determina o nível ótimo do salário real, que, na literatura, recebe o nome de salário-eficiência,
(W/P)*, é

Suponhamos que, começando com um nível baixo, um aumento de 1% no salário real leve a
um aumento de 2% na eficiência de trabalho. A firma vai se beneficiar com esse aumento,
porque cada unidade monetária da folha de pagamento comprará mais unidades de eficiência de
trabalho (a folha de pagamento aumenta 1% e o número de unidades de eficiência sobe 2%).
Com aumentos adicionais na folha de pagamento, os ganhos em eficiência começam a declinar.
No ponto em que um aumento de 1% no salário real produz apenas 1% de aumento na
eficiência, a firma não achará ótimo aumentar ainda mais o salário real; o salário-eficiência foi
atingido.
Os proponentes da teoria do salário-eficiência afirmam que, em muitos setores, os salários
reais são determinados com base na eficiência. Os salários reais não se ajustam para equilibrar
os mercados de trabalho. Na verdade, os princípios que norteiam os modelos de salário-
eficiência implicam que as firmas definirão o salário real acima do nível de equilíbrio do
mercado. O resultado disso será desemprego involuntário persistente. Nossa próxima tarefa é
examinar esses princípios que estão por trás da noção de salários-eficiência, alguns dos quais já
foram antecipados por Henry Ford.
Várias justificativas foram oferecidas para o pagamento de salários-eficiência:
1. O modelo da negligência. Definindo o salário real acima dos níveis de mercado vigentes
(isto é, a próxima melhor oportunidade para o trabalhador), a firma dá ao funcionário um
incentivo para não “fazer corpo mole” no serviço. Se ele fizer, pode ser demitido, e sabe que
seria difícil encontrar outro emprego com um salário tão alto. Se as firmas só tiverem condições
de monitorar o desempenho no trabalho de forma imperfeita e com algum custo, esta estratégia
de salários altos pode ser lucrativa.
2. Modelos de custos de rotatividade. Ao pagar um salário acima do nível de mercado, as
firmas podem reduzir as taxas de saída do emprego e, assim, os custos de recrutamento e
treinamento. O salário alto também permite que elas desenvolvam um contingente de mão de
obra mais experiente e, portanto, mais produtivo.
3. Modelos de reciprocidade. Outra explicação para a dependência entre eficiência e salário
real centra-se no estado de espírito dos trabalhadores da firma. De acordo com este argumento,
se a firma pagar um salário real acima do salário de equilíbrio do mercado, isso melhorará o
moral dos trabalhadores e eles se esforçarão mais. A firma paga aos trabalhadores o presente de
um salário acima do mercado e os trabalhadores retribuem com uma maior eficiência.14
Nenhuma dessas justificativas pretende ser aplicável a todas as partes do mercado de
trabalho. Se, porém, considerações de salário-eficiência forem importantes e, assim, os salários
reais forem definidos acima dos níveis de equilíbrio do mercado em muitos setores, o resultado
pode ser um nível substancial desemprego involuntário. Os trabalhadores continuarão a procurar
empregos no setor de salários mais altos, trabalhando, por exemplo, quando a demanda é alta,
em vez de aceitar empregos com salários mais baixos.
Observe que é o salário real que é fixado com base na eficiência (para satisfazer a condição
(12.7)). Os modelos de salário-eficiência explicam uma rigidez real. Acabamos de ver como
essa rigidez real pode explicar o desemprego involuntário. Por si só, porém, a rigidez do salário
real devido ao pagamento de salários-eficiência não explica por que mudanças na demanda
agregada afetam o produto e o emprego e, assim, o nível de desemprego involuntário. Se
houvesse uma queda na demanda agregada nominal, resultante, por exemplo, de um declínio na
oferta de moeda, as firmas poderiam baixar seus preços o suficiente para manter o produto
(vendas) inalterado e baixar o salário monetário no mesmo montante para manter o salário real
no salário-eficiência, (W/P)*. Se, porém, as firmas não baixarem os preços por causa de custos
de menu, como foi explicado na seção anterior, então, para manter o salário real no nível de
salário-eficiência é preciso que o salário monetário também seja fixo. Nesse caso, quando a
demanda agregada declinar, produto e emprego cairão e o desemprego involuntário aumentará.
Assim, uma rigidez nominal, o custo de menu, e a rigidez do salário real devido a salários-
eficiência combinam-se para explicar o desemprego involuntário.

12.2.3 Modelos incluído-excluído e histerese


O último rumo da pesquisa novo-keynesiana que examinaremos é o que está mais
relacionado às altas taxas de desemprego persistentes na Europa desde 1980 (veja Tabela 10.2).
Esse alto desemprego persistente contrasta drasticamente com as baixas taxas de desemprego
dos mesmos países do final da década de 1950 ao início da década de 1970. Esses padrões
levaram à hipótese de que o desemprego presente é fortemente influenciado pelo desemprego
passado. As economias podem, por assim dizer, ficar presas em armadilhas de desemprego. O
termo para essa condição que usamos no Capítulo 10 é histerese. Uma variável exibe histerese
se, ao ser forçada por um choque a se afastar de um valor inicial, não apresenta nenhuma
tendência de retorno mesmo quando o choque termina. Em termos de desemprego, modelos de
histerese procuram explicar por que altas taxas de desemprego persistem mesmo depois de sua
causa inicial já ter deixado há muito de existir.
Há uma série de explicações para a histerese no processo do desemprego. A discussão aqui
ficará limitada a um modelo que recebeu considerável atenção: o modelo incluído-excluído
(insider-outsider).15 Em vez de apresentar o modelo formalmente, vamos explicá-lo com um
exemplo.

Modelos incluído-excluído
Oferecem uma explicação de histerese no
desemprego. Os incluídos (por ex., membros de
sindicatos) são o único grupo que afeta a negociação
do salário real. Os excluídos (por ex., aqueles que
querem empregos) não influem. Recessões fazem
incluídos tornarem-se excluídos. Depois da recessão,
com menos incluídos, o salário real aumenta e o
desemprego persiste.

Como acontece com os modelos de preços rígidos, as versões do modelo incluído-excluído


requerem concorrência imperfeita. No caso do modelo incluído-excluído, considera-se que tanto
o mercado de produto como o mercado de trabalho sejam imperfeitamente competitivos. Assim
sendo, vamos examinar uma situação com um sindicato pelo lado dos empregados e algumas
poucas firmas como empregadores: por exemplo, a indústria siderúrgica alemã. Os membros do
sindicato, que chamaremos de incluídos, têm poder de negociação com os empregadores porque
é caro substituí-los por excluídos (trabalhadores não pertencentes ao sindicato). O custo de
substituí-los é um custo de recrutamento e treinamento de novos trabalhadores. Os membros do
sindicato também podem impor custos aos excluídos que tentem aceitar empregos por salários
mais baixos, fazendo uso de piquetes, por exemplo.
Considera-se que os incluídos usem seu poder de negociação para empurrar o salário real
para cima do nível de equilíbrio do mercado, o que resulta em um grupo desempregado de
excluídos. Os incluídos só empurrarão o salário real para cima até um certo ponto, porém,
porque quanto mais alto for o salário real, menos incluídos estarão empregados. Essa relação
acontece porque o nível de empregos é igual à demanda por trabalho das firmas, a qual depende
negativamente do salário real. Se, em nosso exemplo, os incluídos forem 200.000, vamos
considerar que negociem por um salário real que eles acreditam que irá resultar em emprego
para todos (ou quase todos). É possível, porém, que acabem sem emprego, uma vez que, se a
demanda agregada da economia como um todo declinar inesperadamente, o produto e o
emprego cairão. Uma parte dos incluídos será dispensada.
Assim, no modelo incluído-excluído, o desemprego resulta de um salário real fixado acima
do nível de equilíbrio do mercado (desemprego de excluídos), bem como de uma resposta cíclica
a mudanças na demanda agregada. Uma característica nova desses modelos é a inter-relação
desses dois tipos de desemprego.
Para perceber essa inter-relação, consideremos o efeito de várias recessões prolongadas como
as da década de 1970, começo da década de 1980 e década de 1990. Durante as recessões,
algumas dispensas são permanentes e alguns trabalhadores saem do sindicato. Alguns incluídos
tornam-se excluídos. A velocidade com que isso acontece depende das regras do sindicato. Com
o pool de incluídos reduzido, digamos, para 160.000 trabalhadores, quando ocorrer uma
recuperação econômica o sindicato negociará por um salário real mais alto que o anterior (antes
das recessões, quando havia 200.000 incluídos). Agora há menos incluídos cujas perspectivas de
emprego precisem ser levadas em conta. (Observe aqui o pressuposto de que os incluídos não se
preocupam com os excluídos). Com um salário real mais alto, o emprego permanecerá mais
baixo do que no período pré-recessão.
O desemprego passado, portanto, causa o desemprego atual por transformar incluídos em
excluídos; esse é o fenômeno da histerese. Uma vez isso tendo acontecido, ocorre uma espécie
de armadilha de desemprego. Os excluídos não exercem pressão para baixo sobre os salários
reais, porque eles são irrelevantes para o processo de negociação de salários.16 Os modelos
incluído-excluído, assim, explicam por que altas taxas de desemprego persistiram em alguns
países europeus por períodos tão longos – períodos longos demais para serem resultado de
contratos com salários monetários fixos ou de expectativas de preços retrospectivas.

Conclusão
A teoria dos ciclos reais de negócios e a economia novo-keynesiana são extensões de duas
tradições conflitantes em macroeconomia. A teoria dos ciclos reais de negócios é uma versão
moderna da economia clássica. O ciclo de negócios é um fenômeno de equilíbrio. Ele é o
resultado das ações de agentes otimizadores diante de mudanças no ambiente econômico (por
ex., choques de produtividade) ou em preferências. Políticas de estabilização macroeconômica
são contraproducentes. Os teóricos dos ciclos reais de negócios, portanto, chegam a conclusões
não-intervencionistas quanto a políticas econômicas, assim como os economistas clássicos
originais.
A economia novo-keynesiana apóia-se firmemente na tradição de John Maynard Keynes. Os
economistas novo-keynesianos acreditam que boa parte do desemprego é involuntária. Eles
acham que os desvios do produto para baixo do produto potencial durante recessões são
socialmente nocivos. Há um papel potencial para políticas de estabilização na prevenção desses
desvios do produto e redução dos custos pessoais do desemprego involuntário. A economia
novo-keynesiana é uma tentativa de melhorar as bases microeconômicas dos modelos
keynesianos tradicionais, sem questionar suas premissas fundamentais.
Note-se que os teóricos dos ciclos reais de negócios e os economistas novo-keynesianos
compartilham um desejo de colocar a macroeconomia sobre uma base microeconômica sólida.
Em anos recentes, isso levou a considerável convergência entre as duas linhas. Como veremos
nos capítulos da Parte V, boa parte da análise de políticas moderna é realizada em modelos que
combinam elementos dessas duas escolas. Esses são modelos em que os agentes otimizam, mas
em que é incorporado algum tipo de rigidez (com frequência um custo de menu). É criado um
papel para a política econômica: levar a economia a se comportar como ela o faria na ausência
da rigidez. Para alguns keynesianos, esses modelos exageram ao incorporar outros elementos da
teoria dos ciclos reais de negócios (por ex., expectativas racionais), mas, para muitos
economistas, elas constituem um feliz meio-termo.
A crise financeira e a recessão profunda de 2007-2009 mudaram essa situação, mas o quanto
essa mudança será fundamental é algo que ainda não foi determinado. Alguns economistas
keynesianos afirmaram a necessidade de uma reconstrução total da macroeconomia e um retorno
a teorias keynesianas originais como o ponto de partida. Outros estão usando como ponto de
partida os modelos novo-keynesianos com muitos elementos de teorias dos ciclos reais de
negócios. Eles acreditam que, com a inclusão de um papel maior para os mercados financeiros e
as instituições financeiras, entre outros elementos, será possível obter uma explicação melhor
para flutuações macroeconômicas graves.

Questões de revisão
1. Compare a visão dos teóricos dos ciclos reais de negócios quanto às causas de flutuações do
produto e do emprego com a visão dos economistas novo-clássicos.
2. Dentro do modelo simples de ciclos reais de negócios apresentado na Seção 12.1, analise o
efeito de um choque de tecnologia negativo (um choque negativo para zt) que dure um (1)
período.
3. Explique as ideias dos teóricos dos ciclos reais de negócios sobre a conduta adequada de
política monetária e fiscal.
4. Suponha que tenha havido uma mudança nas preferências em um modelo de ciclos reais de
negócios de forma que o agente representativo valorize mais o lazer e menos os bens de
consumo. Como o produto e o emprego seriam afetados pela mudança?
5. Explique por que o pressuposto da concorrência imperfeita é importante em cada um dos
modelos novo-keynesianos examinados na Seção 12.2.
6. Suponha que dados sobre salários mostrem que trabalhadores com qualificações idênticas
recebem salários muito diferentes em diferentes setores. Essa diferença é consistente com o
pressuposto de que o mercado de trabalho é competitivo? Ela é consistente com o modelo de
salário-eficiência?
7. Explique como o modelo incluído-excluído explica o alto desemprego persistente em países
europeus durante o período pós-1980.
8. Os economistas novo-clássicos acreditam que modelos macroeconômicos úteis são aqueles
em que (a) os agentes otimizam e (b) os mercados se equilibram. Os modelos que surgem das
pesquisas novo-keynesianas apresentam alguma dessas propriedades? Explique.
9. Explique a relação entre os modelos novo-keynesianos e os modelos keynesianos
examinados nos Capítulos 5 a 8.
10. Durante o governo de George W. Bush, reduções nas alíquotas dos impostos sobre a renda
dos trabalhadores, os dividendos e os ganhos de capital foram a peça central da política
fiscal. Analise os efeitos desses cortes de impostos dentro da teoria dos ciclos reais de
negócios.
CAPÍTULO 13
Modelos macroeconômicos: um resumo

Este capítulo resume as teorias examinadas nos capítulos anteriores e procura esclarecer áreas
de concordância e de controvérsia entre as várias escolas.

13.1 Questões teóricas


É conveniente centrar nossa discussão na estrutura oferta agregada-demanda agregada usada
anteriormente para caracterizar os modelos econômicos. O primeiro modelo que examinamos, o
modelo clássico, considera que o produto é completamente determinado por fatores de oferta.
Essa concepção é resumida na curva de oferta agregada vertical mostrada na Figura 13.1a.
São centrais na teoria clássica os pressupostos clássicos sobre o mercado de trabalho. Tanto a
oferta como a demanda por trabalho dependem apenas do salário real, que é do conhecimento de
todos os participantes do mercado. O salário monetário é perfeitamente flexível e move-se de
forma a igualar demanda e oferta no mercado de trabalho. Aumentos na demanda agregada
fazem os preços subirem, o que, outros fatores sendo constantes, incentiva a produção. Para
equilibrar o mercado de trabalho, porém, o salário monetário precisa subir proporcionalmente ao
nível de preços. O salário real fica, então, inalterado e, em consequência, os níveis de emprego e
produto também não se alteram no novo equilíbrio.
No sistema clássico, o papel da demanda agregada é determinar o nível de preços. A teoria
clássica da demanda agregada é uma teoria implícita baseada na teoria quantitativa da moeda. A
teoria quantitativa oferece uma relação proporcional entre a quantidade exógena de moeda e a
renda nominal.
Essa relação fornece a base para a curva de demanda agregada clássica mostrada na Figura
13.1a. O processo econômico por trás dessa teoria é que se, por exemplo, houver um excesso de
oferta de moeda, um excesso correspondente de demanda por mercadorias elevará o nível
agregado de preços. O modelo clássico tem uma teoria monetária da demanda agregada.
A teoria dos ciclos reais de negócios é uma versão moderna da teoria clássica. Como no
modelo clássico, no modelo de ciclos reais de negócios o produto e o emprego são determinados
por variáveis reais. O mercado de trabalho está sempre em equilíbrio; todo o desemprego é
voluntário. O papel da moeda no modelo de ciclos reais de negócios, como no modelo clássico,
é unicamente determinar o nível de preços.

FIG 13.1 Teorias da demanda e oferta agregadas


Em sua forma mais simples, o modelo keynesiano é a antítese da teoria clássica e da teoria
dos ciclos reais de negócios. Em um modelo keynesiano simples, como o que foi discutido no
Capítulo 5, a oferta não tem nenhuma participação na determinação do produto. A curva de
oferta agregada resultante de tais modelos keynesianos simples é horizontal, indicando que a
oferta não é uma limitação para o nível de produção, um pressuposto que só é apropriado, se
tanto, a situações em que a produção está bem abaixo dos níveis de plena capacidade. No lado
da demanda, o modelo keynesiano simples concentra-se nos determinantes de gastos autônomos:
gastos governamentais, impostos e demanda por investimento autônomo. Fatores monetários são
negligenciados. Esse modelo simples destaca uma ideia central da economia keynesiana: a
importância da demanda agregada na determinação do produto e do emprego.
Mas esse modelo keynesiano simples é incompleto. A teoria keynesiana foi modificada e
aperfeiçoada desde a época em que Keynes escreveu. O modelo keynesiano moderno abre
espaço para a influência tanto de fatores de oferta sobre o produto como de fatores monetários
sobre a demanda agregada. Ainda assim, o modelo continua sendo “keynesiano”, no sentido de
que a demanda agregada é importante na determinação do produto.
No lado da oferta, a visão keynesiana é ilustrada pela curva de oferta agregada mostrada na
Figura 13.1b. Em contraste com a curva de oferta vertical clássica, a curva de oferta agregada
keynesiana inclina-se para cima e para a direita. Aumentos na demanda agregada que deslocam
a curva de demanda agregada para a direita elevarão tanto o preço como o produto. No curto
prazo, um aumento no nível de preços fará com que as firmas ofertem mais produto, porque o
salário monetário não subirá proporcionalmente ao preço.
Considera-se que o salário monetário ajuste-se incompletamente como resultado de fatores
institucionais do mercado de trabalho, dos quais os mais importantes são os contratos com
salário monetário fixo e as informações imperfeitas dos ofertantes de mão de obra sobre o nível
agregado de preços e, portanto, sobre o salário real. Boa parte das pesquisas dos economistas
novo-keynesianos dedica-se a apresentar fundamentos adicionais para a rigidez de salários e de
preços – ou seja, a melhorar a base microeconômica da curva de oferta agregada keynesiana da
Figura 13.1b.
No lado da demanda (a curva Yd na Figura 13.1b), o modelo keynesiano moderno inclui a
participação de fatores monetários (M), assim como de variáveis de política fiscal (G e T) e
outros elementos autônomos da demanda agregada (por ex., investimento autônomo, T). A teoria
keynesiana da demanda agregada é uma teoria explícita, em contraste com a teoria implícita dos
economistas clássicos, no sentido de que o nível de demanda agregada é encontrado
determinando-se primeiro o nível dos componentes da demanda agregada: consumo,
investimento e gastos governamentais. Soma-se, então, esses componentes para chegar à
demanda agregada. A moeda afeta a demanda agregada, principalmente o seu componente
investimento, por influenciar a taxa de juros. Não há razão para acreditar que tais efeitos
monetários sobre a demanda agregada sejam pequenos. Nem há razão para supor que as
influências monetárias sejam dominantes. A moeda é uma das várias influências importantes
sobre a demanda agregada no sistema keynesiano.
Há, assim, duas diferenças importantes entre os modelos keynesiano e clássico:
1. No modelo clássico, produto e emprego são completamente determinados pela oferta,
enquanto na teoria keynesiana, no curto prazo, produto e emprego são determinados
conjuntamente pela oferta e pela demanda agregadas. No sistema keynesiano, a demanda
agregada é um determinante importante do produto e do emprego.
2. A demanda agregada no modelo clássico é determinada unicamente pela quantidade de
moeda. No sistema keynesiano, a moeda é apenas um entre vários fatores que determinam
a demanda agregada.
Esses dois pontos, o papel da demanda agregada na determinação do produto e do emprego e
a importância relativa de fatores monetários e outros como determinantes da demanda agregada,
são também os que separam os keynesianos dos monetaristas e dos economistas novo-clássicos.
A principal controvérsia entre monetaristas, cuja concepção da oferta e demanda agregadas é
representada na Figura 13.1c, e keynesianos centrou-se no ponto 2, o grau em que forças
monetárias dominam a determinação da demanda agregada. Os monetaristas adotaram uma
versão da teoria quantitativa clássica como base para sua própria noção de que a moeda é a
influência dominante sobre a demanda agregada e, portanto, sobre a renda nominal. No lado da
oferta, não há diferença fundamental entre as teorias monetarista e keynesiana. Tanto no modelo
monetarista como no keynesiano, a curva de oferta agregada inclina-se para cima e para a direita
no curto prazo e aproxima-se da formulação vertical clássica apenas no longo prazo. Em ambos
os modelos, mudanças na demanda agregada afetam o produto no curto prazo.
A visão novo-clássica da determinação da oferta e da demanda agregadas é ilustrada na
Figura 13.1d. A questão que separa os economistas novo-clássicos e os keynesianos refere-se ao
ponto 1, o grau em que a demanda agregada tem participação na determinação do produto real.
Os economistas novo-clássicos acreditam que mudanças sistemáticas e, portanto, previsíveis na
demanda agregada não afetarão o produto real. Tais mudanças serão antecipadas por agentes
econômicos racionais. A curva de demanda agregada e a curva de oferta agregada deslocam-se
simetricamente, alterando o nível de preços, mas deixando o produto real inalterado. Para refletir
essa dependência da curva de oferta agregada em relação a mudanças esperadas nos
determinantes da demanda agregada e, em consequência, na expectativa racional do nível de
preços, a curva de oferta agregada na Figura 13.1d é representada como dependente do nível
esperado da oferta de moeda (Me) e dos valores esperados de variáveis de política fiscal e outros
possíveis determinantes da demanda agregada (Ge, Te, Ie, …).
Mudanças não antecipadas na demanda agregada – por exemplo, um aumento na oferta de
moeda (M) que não poderia ter sido previsto (Me não se altera) – deslocará a curva de demanda
agregada sem deslocar a curva de oferta agregada. Essas mudanças não previstas na demanda
agregada farão com que os ofertantes de mão de obra cometam erros de previsão de preços e,
portanto, afetarão o produto e o emprego. Nesse aspecto, o modelo novo-clássico é uma
modificação do modelo clássico original, em que não havia nenhuma participação da demanda
agregada na determinação do produto e do emprego. A modificação é a substituição do
pressuposto clássico das informações perfeitas pelo pressuposto das expectativas racionais na
análise novo-clássica. Na análise clássica, não havia erros de previsão de preços por parte dos
ofertantes de trabalho. Estes tinham informações perfeitas sobre o nível de preços. Não se
supunha nenhuma mudança não antecipada na demanda agregada. No lado da demanda, não há
diferenças evidentes entre as posições novo-clássica e keynesiana. (Compare as curvas Yd nas
Figuras 13.1b e d.) Isso não quer dizer, porém, que os economistas novo-clássicos concordem
com todos os aspectos da teoria keynesiana da demanda agregada. Na verdade, eles acham que
boa parte da teoria keynesiana não se apoia em bases microeconômicas sólidas.
Do que foi dito, deve estar claro que a controvérsia monetarista/keynesiana e a controvérsia
keynesiana/novo-clássica giram em torno das mesmas questões que separam os keynesianos dos
economistas clássicos e dos teóricos dos ciclos reais de negócios. A revolução keynesiana foi
um ataque à teoria clássica do produto e emprego determinados pela oferta e com pleno
emprego, e à teoria quantitativa da moeda. Economistas novo-clássicos e monetaristas
modificaram esses dois aspectos da economia clássica e utilizaram essas versões modificadas
para atacar o sistema keynesiano. Os pontos 1 e 2, que, em termos da Figura 13.1, referem-se à
inclinação da função oferta agregada de curto prazo e aos determinantes da função demanda
agregada, têm sido as questões centrais nas controvérsias macroeconômicas há 70 anos.

13.2 Questões de política econômica


Dadas as raízes clássicas das teorias dos ciclos reais de negócios, monetarista e novo-clássica,
não é surpresa que essas teorias compartilhem as conclusões não intervencionistas de política
econômica do modelo clássico original. Em contraste, os keynesianos são intervencionistas em
políticas econômicas e defendem uma administração da demanda agregada para estabilizar o
produto e o emprego.
No sistema clássico, produto e emprego são autoajustáveis ao nível de pleno emprego
determinado pela oferta. Não há lugar para políticas de estabilização da demanda agregada. Este
também é o caso nos modelos de ciclos reais de negócios, em que flutuações no produto e no
emprego resultam de respostas ótimas de agentes econômicos a mudanças no ambiente
econômico. No modelo novo-clássico, mudanças não previstas na demanda agregada afetam o
produto e o emprego. Políticas de estabilização sensatas, porém, teriam de consistir em padrões
sistemáticos de reação ao estado da economia. Tais mudanças sistemáticas na demanda agregada
seriam antecipadas pelo público e, portanto, não afetariam o produto e o emprego.
Consequentemente, os economistas novo-clássicos também veem políticas de estabilização da
demanda agregada como ineficazes.
Os monetaristas acreditam que ações de política monetária, antecipadas ou não, afetam o
produto e o emprego no curto prazo. Ainda assim, chegam às mesmas conclusões não
intervencionistas que os economistas clássicos e novo-clássicos sobre políticas econômicas.
Como os economistas clássicos, os monetaristas acham que o setor privado é estável se deixado
livre de ações de políticas governamentais desestabilizadoras. Além disso, como os monetaristas
consideram que a demanda agregada é determinada predominantemente pela oferta de moeda, a
melhor maneira de estabilizar a demanda agregada é proporcionar um crescimento estável da
oferta de moeda.
Contrária a essa visão não intervencionista é a posição keynesiana de que uma economia
monetária de iniciativa privada é instável na ausência de políticas governamentais para regular a
demanda agregada. Os keynesianos defendem políticas fiscais e monetárias ativas para
compensar choques na demanda agregada privada.
Assim, embora tenhamos examinado várias escolas de teoria macroeconômica, a principal
controvérsia com relação a políticas econômicas é entre duas posições: a posição não
intervencionista, com raízes no sistema clássico original, e a posição intervencionista
keynesiana. Essa controvérsia, como as das questões teóricas discutidas anteriormente, vem de
longa data. Na forma moderna, ela remonta ao ataque keynesiano à ortodoxia clássica. Mas
houve heréticos antes de Keynes, e as origens das controvérsias teóricas e de políticas
econômicas discutidas aqui podem ser buscadas no início do século XIX.
Como podem tais controvérsias prosseguir por tanto tempo sem solução? Em economia, não
temos como conduzir experiências laboratoriais controladas. Como Milton Friedman escreveu
sobre isso,

Experiências controladas que permitam o quase isolamento de uma ou algumas forças são
impossíveis na prática. Precisamos testar nossas proposições observando experiências não
controladas que envolvem um grande número de pessoas, inúmeras variáveis econômicas,
mudanças frequentes em outras circunstâncias e que, assim, são imperfeitamente
registradas. A interpretação da experiência também é complicada por ela afetar diretamente
muitos dos observadores, com frequência dando-lhes razões, irrelevantes do ponto de vista
científico, para preferir uma e não outra interpretação do complexo e sempre mutável curso
dos acontecimentos1.

Ou, como Keynes escreveu antes, “Em economia, não se pode condenar seu oponente por
erro – só se pode convencê-lo disso”2.

13.3 Controvérsia e consenso


A discussão das várias teorias macroeconômicas tende a enfatizar as diferenças entre elas.
Isso obscurece áreas de concordância. Antes de encerrar a discussão das teorias, é bom,
portanto, examinar algumas das áreas de concordância, de quase consenso, entre as diferentes
escolas.
No centro da teoria quantitativa da moeda clássica está a equação de trocas. Em sua versão
fisheriana, ela assume a forma
Com base na equação (13.1), podemos expressar o que pode ser chamado de núcleo válido da
teoria quantitativa: uma alta inflação persistente requer alto crescimento sustentado da moeda.
Os teóricos quantitativistas originais, e também Milton Friedman, teriam apresentado uma
formulação mais precisa sobre a relação entre crescimento da moeda e inflação, mas, da forma
expressa acima, a relação não é controversa. O crescimento do produto real (Y) é limitado a uma
faixa bastante estreita por restrições físicas. A velocidade da moeda (V) tem variado
historicamente dentro da uma faixa relativamente estreita. Assim, se o crescimento da moeda for
muito alto (por ex., taxas de dois dígitos por vários anos), o resultado deve ser alta inflação.
Passando a outra área, os economistas keynesianos e novo-clássicos estão muito menos
distanciados hoje do que estavam na década de 1980 quanto à especificação das expectativas.
Poucos economistas keynesianos hoje usariam formulações retrospectivas simples para
expectativas de inflação. Por outro lado, os economistas novo-clássicos atuais estão explorando
modelos de aprendizagem que fazem pressupostos informacionais menos extremos que as
primeiras formulações das expectativas racionais. Além disso, a maioria dos economistas
keynesianos hoje reconheceria que os efeitos de política econômica dependem em certa medida
de as mudanças de política serem previsíveis ou não e, de modo mais amplo, do ambiente em
que as políticas são formadas. Por exemplo, como veremos em nossa discussão posterior da
política monetária, a credibilidade importa.
Por fim, embora haja diferenças entre os teóricos dos ciclos reais de negócios e os
keynesianos quanto à importância relativa de choques de produtividade e da demanda agregada
na determinação do produto, a maioria dos macroeconomistas atuais aceita algum papel para a
demanda. Esse pode ser considerado o núcleo válido da economia de Keynes.

13.4 O avanço da macroeconomia


A crise financeira de 2007-2009 e a recessão profunda que se seguiu levaram a um reexame
do estado da macroeconomia. Muitos economistas e formuladores de políticas econômicas,
embora nem todos, não perceberam a aproximação da crise e, depois, não avaliaram
corretamente a gravidade da recessão que se seguiu. Isso, em si, não é muito perturbador;
poucos economistas eram especialistas nos complexos instrumentos financeiros que estiveram
no centro da crise. Ainda assim, a crise expôs várias deficiências dos modelos macroeconômicos
atuais e reacendeu controvérsias anteriores.
Parece correto dizer que o período da chamada grande moderação havia levado a
macroeconomia dominante a um estado de complacência quanto à probabilidade de uma
“grande recessão” ou uma depressão. Conforme as palavras de Robert Lucas que citamos
anteriormente, muitos acreditavam que “o problema central de prevenção de depressões foi
resolvido”. Os modelos em uso para análise de políticas econômicas incluíam um papel para a
política de estabilização monetária. O ciclo de negócios fora domado, mas não estava extinto. A
política de estabilização fiscal, no entanto, ficara relativamente negligenciada. Crises financeiras
haviam se tornado uma área de estudo para os especialistas em economias em desenvolvimento
ou em história da economia.
Houve muitos simpósios recentes com títulos como “A macroeconomia depois da crise” e
“Novas direções em macroeconomia: para onde o mundo real está nos levando?” Alguns acham
que é possível avançar dentro dos modelos existentes. Outros acreditam na necessidade de uma
reformulação da magnitude da revolução keynesiana da década de 1930.

Questões de revisão
1. Suponha que as previsões indiquem que a demanda por investimento em uma dada economia
será fraca no próximo ano, digamos, 10% abaixo do nível deste ano, devido a um choque
exógeno. Todos os outros componentes da demanda agregada, segundo as previsões, ficarão
em níveis comparáveis aos deste ano. Esses níveis foram consistentes com emprego elevado
e preços relativamente estáveis. Para cada um dos sistemas macroeconômicos a seguir,
explique os efeitos dessa queda exógena na demanda agregada e explique a resposta de
política econômica adequada sugerida pelo modelo, ou seja, que ação o formulador de
políticas deveria tomar?
a. Modelo clássico.
b. Modelo keynesiano.
c. Modelo novo-clássico.
2. A questão de quais informações os participantes do mercado possuem em um determinado
momento e a rapidez com que eles as obtêm – em outras palavras, a estrutura de informações
do modelo – é uma característica distintiva dos diferentes sistemas macroeconômicos
discutidos. Com referência aos modelos clássico, keynesiano, monetarista e novo-clássico,
explique os diferentes pressupostos sobre as informações que os participantes do mercado
possuem e o grau em que esses pressupostos diversos explicam as diferentes conclusões de
política econômica derivadas desses modelos.
3. Nos modelos clássico, de ciclos reais de negócios, keynesiano, monetarista e novo-clássico,
analise o efeito de uma queda autônoma no preço do petróleo importado. Explique o efeito
dessa mudança sobre o produto, o emprego e no nível agregado de preços em cada um dos
modelos.
4. Uma regra que foi proposta para a política fiscal é que o orçamento governamental deveria
ser equilibrado a cada ano – sem déficits orçamentários. Qual você acha que seria a posição
de cada um dos seguintes grupos de economistas sobre essa proposta?
a. Economistas novo-clássicos.
b. Keynesianos.
c. Teóricos dos ciclos reais de negócios.
5. Qual dos modelos que examinamos você considera o mais útil para explicar o
comportamento da economia e oferecer prescrições de política econômica adequadas? Os
eventos a partir de 2007 influíram em sua escolha?
PARTE IV

Macroeconomia em economia aberta

A Parte IV examina as relações econômicas internacionais dos Estados Unidos, incluindo fluxos
comerciais e movimentos de capital. O Capítulo 14 analisa como as taxas de câmbio são
determinadas em diferentes sistemas monetários internacionais e examina os méritos relativos
desses sistemas. Aspectos do desempenho dos Estados Unidos e de outras grandes economias no
período de taxas de juros flutuantes pós-1973 são analisados. No Capítulo 15, desenvolvemos
uma versão de economia aberta do modelo IS-LM. Usamos, então, esse modelo para estudar os
efeitos das políticas fiscal e monetária na economia aberta em regimes de taxas de câmbio fixas
e flexíveis.
CAPÍTULO 14
Taxas de câmbio e o sistema monetário internacional

Em 1960, as importações de bens e serviços totalizaram 4,4% do PIB nos Estados Unidos;
em 2010, esse número era de 16,2%. As exportações subiram de 4,9% do PIB em 1960 para
12,7% em 2010. Os mercados financeiros dos Estados Unidos e de outras nações também
ficaram muito mais estreitamente ligados nas últimas três décadas. Essa integração de mercados
financeiros aparece nos maiores fluxos de capitais e na maior correlação dos retornos sobre os
ativos entre os países. A economia americana tornou-se bem mais aberta, no sentido de ter
ampliado seu comércio e relações financeiras com outras economias.
Em outros capítulos, exemplos e Perspectivas enfatizam as inter-relações da economia
americana com as economias de outros países. Os capítulos desta parte focalizam explicitamente
a macroeconomia de economias abertas, o que traz essas inter-relações para o palco central. Este
capítulo examina a determinação das taxas de câmbio, o sistema monetário internacional atual e
o sistema que ele substituiu, e as interações entre a economia doméstica e as transações
econômicas internacionais.
Começamos examinando o balanço de pagamentos, que resume as transações econômicas
internacionais (Seção 14.1). Em seguida, explicamos como as taxas de câmbio são determinadas
nos mercados de divisas sob diferentes sistemas cambiais (Seção 14.2). O regime de taxa de
câmbio efetivo que compõe o sistema monetário internacional atual é examinado na Seção 14.3.
Em seguida, avaliam-se os méritos relativos dos sistemas de taxa de câmbio fixa e flexível
(Seção 14.4). Analisamos, então, a experiência americana com um sistema de taxas de câmbio
pelo menos parcialmente flexíveis ao longo dos anos desde 1973 (Seção 14.5). Por fim, são
avaliados os riscos de alguns crescentes desequilíbrios no comércio internacional (Seção 14.6).

Balanço de pagamentos
Registra as transações econômicas entre residentes e
não residentes do país, envolvendo bens e ativos.

As taxas de câmbio são centrais para o foco deste capítulo. Uma taxa de câmbio entre duas
moedas é o preço de uma moeda em relação à outra. O preço da libra britânica em relação ao
dólar-americano em 11 de novembro de 2011 era US$ 1,61 (US$ 1,61 = 1 libra); o preço de um
dólar canadense era US$ 0,99; o preço de um euro (a moeda comum de 17 países europeus) era
US$1,38. Operações de câmbio entre a moeda de um país e outras moedas acontecem quando
residentes desse país compram bens ou ativos estrangeiros, assim como quando residentes de
outros países compram bens e ativos desse país. Um exame dessas transações entre os Estados
Unidos e outros países é o ponto de partida para nosso estudo de como as taxas de câmbio são
determinadas.
14.1 O balanço de pagamentos
Nos Estados Unidos, é o Departamento de Comércio que registra as transações econômicas
internacionais no balanço de pagamentos. De um lado do balanço são registrados como créditos
todos os ganhos decorrentes de atividades internacionais de residentes e do governo nacional,
enquanto do outro lado são computados como débitos todos os gastos no exterior. Um ponto a
ser notado é que, pelos princípios habituais de contabilidade de partidas dobradas, cada crédito
deve corresponder a um débito igual, e vice-versa. Cada gasto em bens estrangeiros, por
exemplo, precisa ser financiado de alguma maneira; a fonte de financiamento é registrada como
um crédito. Uma primeira conclusão, portanto, antes de sequer olharmos para os números, é que
se todas as transações forem contabilizadas, o balanço de pagamentos sempre estará equilibrado.
Vamos, porém, examinar subcategorias de transações internacionais para as quais não há
razão para acreditar que os recebimentos do exterior serão iguais aos ganhos com operações com
o exterior. Em anos recentes, por exemplo, os gastos de residentes estrangeiros com mercadorias
de exportação americanas (um crédito no balanço de pagamentos) ficaram bem abaixo dos
gastos dos americanos com bens importados (um débito no balanço de pagamentos). Esse déficit
na balança comercial de mercadorias foi motivo de preocupação, por razões que serão
discutidas.

Balança comercial de mercadorias


Mede exportações menos importações no balanço de
pagamentos.

14.1.1 A conta corrente


O primeiro grupo de itens na tabela são as transações de conta corrente. Entre essas, os
primeiros itens listados são exportações e importações de mercadorias, que acabamos de
comentar. Exemplos de exportações de mercadorias são a venda de um sistema de computação
brasileiro para uma firma britânica ou a venda de cereais brasileiros para a Rússia. Compras de
carros japoneses, câmeras alemãs ou maçãs argentinas por residentes do Brasil são exemplos de
importações. Em 2010, as importações de mercadorias pelos Estados Unidos excederam as
exportações em U$ 645,9 bilhões. Esse foi o montante do déficit da balança comercial
americana.

Conta corrente
No balanço de pagamentos, é um registro das
exportações e importações de mercadorias do país,
bem como do comércio de serviços e das
transferências correntes.

Tabela 14.1 - Balanço de pagamentos dos Estados Unidos, 2010 (bilhões de dólares)
Fonte: Survey of Current Business, September 2011 Os dados referem-se a uma base ligeiramente diferente (amplitude e tempo)
dos dados do censo americano usados em outras partes do livro.

A categoria seguinte na tabela são as importações e exportações de serviços, contabilizadas


apenas em termos de seu valor líquido. Exemplos de transações na categoria de serviços são
serviços financeiros, de seguros e de transporte de mercadorias. Também nessa categoria estão
dividendos e juros ganhos por residentes dos Estados Unidos devido a seus ativos no exterior
(um crédito) e juros e dividendos pagos a residentes no exterior que tenham ativos americanos
(um débito). O item líquido na tabela, US$ 311,11 bilhões, indica que, em 2010, os Estados
Unidos exportaram mais serviços do que importaram. As últimas transações nas contas correntes
são transferências líquidas. São registrados aqui pagamentos de transferência privados e
governamentais feitos entre os Estados Unidos e outros países. Esses pagamentos incluem
pagamentos de auxílio a países estrangeiros (um débito) e pagamentos de benefícios privados ou
governamentais a pessoas que vivem no exterior (um débito). Qualquer transferência desse tipo
do exterior para um residente dos Estados Unidos seria um crédito nesse item.
Se pararmos ou traçarmos uma linha neste ponto, podemos calcular o saldo da conta
corrente. A tabela indica que, em 2010, as contas correntes americanas estavam com um déficit
de US$ 470,9 bilhões.
No geral, considerando apenas as transações de conta corrente, os residentes dos Estados
Unidos gastaram US$ 470,9 bilhões a mais do que ganharam no exterior.

14.1.2 A balança de capitais


Os itens seguintes na tabela registram a balança de capitais,1 ou movimento de capitais.
Entradas de capital (créditos) são compras de ativos domésticos por residentes de países
estrangeiros. Essas entradas de capital incluem compras por estrangeiros de títulos privados ou
públicos, ações e depósitos bancários domésticos. Além disso, investimentos estrangeiros diretos
no país, como a construção de uma fábrica da Honda no Brasil, são entradas de capital no
balanço de pagamentos. Compras de ativos financeiros ou investimentos diretos em países
estrangeiros por residentes do país são saídas de capital (débitos) no balanço de pagamentos.
Durante a década de 1980, os Estados Unidos começaram a ter grandes superávits na balança de
capitais que equilibraram em parte os grandes déficits na conta corrente. Em 2006, por exemplo,
esse superávit foi de US$ 412,4 bilhões. Em 2010, no entanto, as saídas de capital excederam as
entradas e esse item representa US$ 93,6 negativos na Tabela 14.1.

Balança de capitais
No balanço de pagamentos, é um registro de compras
de ativos domésticos por residentes estrangeiros
(entradas de capital) e compras de ativos estrangeiros
por residentes do país (saídas de capital).

Um ponto importante a ser notado em relação à balança de capitais dos Estados Unidos é que
as compras de ativos americanos por estrangeiros representam, em grande medida, empréstimos
tomados de residentes estrangeiros pelos Estados Unidos. As grandes entradas de capital no
período de 1982-2010 incluíram US$ 2.000 bilhões em compras de títulos do governo
americano por estrangeiros e um montante ainda maior de empréstimos ou compras de títulos
privados americanos por estrangeiros. Durante esse período, grandes excedentes de importações
sobre exportações de mercadorias (déficits comerciais) foram, na verdade, financiados por
empréstimos do exterior. Entre 1983 e 2010, como resultado desses empréstimos, os Estados
Unidos passaram de uma nação credora líquida para nação com uma dívida externa líquida de
US$ 2,5 trilhões. Em 2010, o saldo negativo da balança de capitais privados significa que, nesse
ano, em vez de aumentar o endividamento, as entradas de capital privado reduziram a dívida.
Como veremos adiante, porém, quando os fluxos do Banco Central são levados em conta, a
dívida externa americana de fato aumentou em 2010.

14.1.3 Discrepância estatística


O item seguinte na tabela é a discrepância estatística. Como nem todas as transações
econômicas internacionais são adequadamente registradas, a discrepância estatística (ou erros e
omissões) é o montante que deve ser acrescentado para equilibrar o balanço de pagamentos total.
Como pode ser visto na tabela, a discrepância estatística nos Estados Unidos em 2010 foi de
US$ 216,5 bilhões. A discrepância estatística vem crescendo em anos recentes; tornou-se mais
difícil registrar todas as transações econômicas internacionais do país.

14.1.4 Transações de reservas oficiais


Sigamos em frente e examinemos o ponto que alcançamos agora no exame das transações
econômicas externas. Vamos supor que tracemos uma linha abaixo da discrepância estatística.
Todos os itens acima da linha representam transações econômicas internacionais realizadas por
residentes ou pelo governo do país, por algum motivo independente. Com isso referimo-nos a
um motivo não relacionado ao efeito que a transação terá sobre o balanço de pagamentos ou,
como veremos adiante, sobre o valor da moeda local em relação a outras moedas. Um residente
no Brasil compra um carro japonês ou uma cota de ações de uma empresa alemã porque os acha
preferíveis aos similares nacionais. O governo pode dar auxílio financeiro a outro governo para
estabilizar a situação política desse país. Todos os itens acima da linha são o que, pela
perspectiva do balanço de pagamentos, pode ser chamado de transações autônomas, ou
independentemente motivadas.
Em contraste, as transações de reservas oficiais abaixo dessa linha são realizadas por bancos
centrais, tanto o Banco Central do próprio país como bancos centrais estrangeiros (por ex., o
Bank of England ou o Bundesbank alemão), em busca de objetivos internacionais de política
econômica. Aqui vamos explicar apenas a natureza dessas transações. Sua motivação será
explicada mais adiante neste capítulo.
O primeiro item abaixo da discrepância estatística na Tabela 14.1 é a redução nos ativos de
reservas oficiais dos EUA. Ativos de reservas oficiais são estoques de ouro, direitos especiais de
saque (DES – um ativo de reserva criado pelo Fundo Monetário Internacional)2 e moeda
estrangeira. Aumentos dos ativos de reservas oficiais são um débito no balanço de pagamentos;
eles foram financiados por alguma fonte. Em 2010, o valor desses ativos nos Estados Unidos
aumentou US$ 1,8 bilhão.
O próximo e último item na tabela do balanço de pagamentos é o aumento dos ativos
internacionais oficiais nos Estados Unidos. Os bancos centrais estrangeiros detêm uma parte de
seus ativos de reserva na forma de dólares. Dólares são um ativo de reserva importante, porque o
dólar é comumente usado em transações internacionais. Se os bancos centrais estrangeiros
compram dólares, isso é um crédito no balanço de pagamentos americano (uma entrada de
capital), uma vez que eles estão investindo nos Estados Unidos.3 Em 2010, os bancos centrais
estrangeiros aumentaram a quantidade de ativos de reservas oficiais mantidos nos Estados
Unidos em US$ 349,8 bilhões, daí o item positivo nessa linha do balanço de pagamentos
americano. Como foi observado anteriormente, isso representa um aumento do endividamento
com bancos centrais estrangeiros, ou seja, um aumento da dívida externa americana.

14.2 Taxas de câmbio e o mercado de câmbio


A demanda por moedas de outros países por parte de residentes locais é chamada de demanda
por moeda estrangeira. O mercado de câmbio é o mercado em que moedas nacionais são
comercializadas entre si. É nesse mercado, por exemplo, que residentes brasileiros vendem reais
para comprar moeda estrangeira. O mercado de moeda estrangeira oficial é composto de uma
série de corretoras e departamentos bancários de câmbio.

Câmbio
Termo genérico para se referir a um agregado de
moedas estrangeiras.

PERSPECTIVAS 14.1 – DÉFICITS DE CONTA CORRENTE


AMERICANOS – ELES SÃO SUSTENTÁVEIS?
Pela Tabela 14.1, pode-se ver que o déficit de conta corrente americano foi de US$ 470,9 bilhões ou 3,2% do PIB em
2010. Esse número foi menor que os US$ 856,7 bilhões, ou aproximadamente 6,5% do PIB, em 2006. Déficits de conta
corrente dessa magnitude são motivo de preocupação? Se sim, de quanta preocupação? Mesmo antes da crise financeira de
2007-2009, muitos afirmavam que esses déficits eram preocupantes. Em 2004, o Fundo Monetário Internacional (FMI)
alertou que o déficit de conta corrente americano representava sérios riscos tanto para a economia americana como para a
economia mundial. No plano doméstico, muitos alertaram que, em algum momento, esses déficits acabarão por resultar
em uma crise em que o valor do dólar americano despencará, a demanda por ativos financeiros americanos cairá e as taxas
de juros americanas dispararão.
Outros observadores, entre eles Alan Greenspan, presidente do Federal Reserve de 1987 a 2006, não viam nenhuma crise
iminente. Eles acreditavam que o déficit de conta corrente provavelmente seria revertido por forças de mercado de
maneira benigna. Vamos examinar a questão.
A Tabela 14.1 mostra que o déficit americano nas contas correntes é contrabalançado, por um aumento de ativos
internacionais oficiais nos Estados Unidos. Na maioria dos outros anos recentes, um item adicional no balanço foi um
superávit no fluxo de capital privado na balança de capitais. Os Estados Unidos financiam seu déficit de conta corrente
tomando empréstimos no exterior: de investidores privados (o superávit na balança de capitais) e de bancos centrais
estrangeiros (o aumento nos ativos estrangeiros oficiais). Como os Estados Unidos têm registrado déficits de conta
corrente repetidamente grandes, sua dívida externa cresceu para aproximadamente US$ 2,5 trilhões em 2010.
Os que se preocupam com os déficits de conta corrente acreditam que, em um ponto não muito distante no futuro, os
investidores estrangeiros, incluindo bancos centrais estrangeiros, não estarão mais dispostos a comprar quantidades tão
grandes de ativos financeiros americanos. Nesse ponto, o dólar cairá acentuadamente e as taxas de juros americanas
subirão. Em particular, esses observadores citam as enormes compras de dólares por bancos centrais asiáticos nos últimos
anos como um fluxo de capital insustentável para os Estados Unidos. O Banco Central chinês mantém cerca de US$ 1,3
trilhão em títulos americanos. O Banco do Japão tem cerca de US$ 950 bilhões. Além disso, como ressaltou o FMI, os
empréstimos americanos para financiar os déficits de conta corrente levaram, em decorrência do aumento geral dos
empréstimos, a um aumento nas taxas de juros mundiais, tornando mais difícil para outros países, incluindo as economias
emergentes, tomar empréstimos para financiar suas necessidades de investimento.
Aqueles que não veem o déficit de conta corrente como um problema sério imediato destacam a crescente globalização
dos mercados de capitais mundiais. Com a liberalização dos mercados de capitais de outros países, os investidores desses
países aumentaram sua demanda por ativos estrangeiros, em grande parte ativos americanos. Mesmo em países que há
muito já permitiam mobilidade de capitais, os investidores passaram a fazer mais investimentos externos em anos recentes.
Os economistas referiram-se a essa tendência como um declínio do viés doméstico. Esses observadores entendem que o
aumento da demanda por ativos em dólares por parte dos bancos centrais asiáticos deve-se às políticas específicas desses
países. A China, por exemplo, cujo Banco Central tem sido, em anos recentes, o maior comprador de dólares, atua dessa
maneira para manter o valor de sua moeda, o yuan, fixo em relação ao dólar. Na opinião deles, os fatores que levaram à
maior demanda por ativos americanos e as forças nos Estados Unidos que contribuem para o déficit de conta corrente
serão revertidos de maneira gradual.
A crise financeira afetou o debate sobre os problemas potenciais associados às contas correntes americanas em dois
sentidos. Primeiro, a recessão profunda nos Estados Unidos em 2007-2009 reduziu o déficit de conta corrente quando as
importações caíram mais rápido que as exportações; o déficit de conta corrente foi reduzido pela metade como
porcentagem do PIB. Isso afetou os cálculos quanto a se o déficit seria ou não sustentável. Segundo, a crise levou os
formuladores de políticas econômicas a ver desequilíbrios de conta corrente como um elemento de desequilíbrios gerais
nos mercados financeiros que se tornaram evidentes com a crise. O déficit de conta corrente americano é visto agora em
um contexto mais amplo, como explicaremos adiante neste capítulo.

Para ver a ligação entre o balanço de pagamentos e transações no mercado de câmbio,


começamos reconhecendo que todos os gastos de residentes do país em bens, serviços ou ativos
estrangeiros e todos os pagamentos de transferência externos (débitos no balanço de
pagamentos) também representam demandas por moeda estrangeira. Os residentes no Brasil que
compram um carro japonês pagam por ele em reais, mas o exportador japonês espera ser pago
em ienes. Assim, reais precisam ser trocados por ienes no mercado de câmbio. Para dar outro
exemplo, se um residente brasileiro quiser comprar ações na bolsa de valores de Londres, um
corretor precisa converter os reais do comprador em libras britânicas antes de fazer a compra.
Assim, os gastos totais de residentes de um país no exterior representam uma demanda por
moeda estrangeira. Olhando pela perspectiva da moeda, também podemos dizer que os gastos
totais de residentes do país no exterior representam uma oferta correspondente de moeda
doméstico no mercado de câmbio.
Inversamente, todos os ganhos de residentes de um país provenientes do exterior refletem
ganhos correspondentes de moeda estrangeira. Exportadores brasileiros, por exemplo, esperam
ser pagos em reais e, para comprar bens brasileiros, os estrangeiros precisam vender sua moeda
e comprar reais. O valor total dos créditos no balanço de pagamentos é, portanto, igual à oferta
de moeda estrangeira ou, o que é a mesma coisa, à demanda por moeda doméstica.

14.2.1 Demanda e oferta no mercado de câmbio


É no mercado de câmbio que as taxas de conversão entre as diferentes moedas nacionais são
determinadas. Em nossa discussão desse processo, vamos fazer as seguintes suposições
simplificadoras. Inicialmente, excluímos as transações de reservas oficiais pelos bancos centrais.
No jargão da economia internacional, vamos supor que os bancos centrais não intervenham no
mercado de câmbio. Atenuaremos essa suposição mais adiante nesta seção. Também para
simplificar, suporemos que haja apenas dois países: os Estados Unidos, cuja moeda doméstica é
o dólar, e a “Europa”, com o euro como unidade monetária doméstica.4 A taxa de câmbio nessa
situação simples é o preço relativo das duas moedas, que expressamos como o preço do euro em
relação ao dólar. Se, por exemplo, o preço do euro for 1 dólar, então 1 euro é trocado por 1
dólar; a 1,25 dólar, a taxa de câmbio (o preço do euro) é mais alta e 1 euro equivale a 1,25 dólar
(0,8 euro = 1 dólar). É importante lembrar que, com a taxa de câmbio expressa dessa maneira,
uma taxa de câmbio mais alta significa que o preço da moeda estrangeira (o câmbio) subiu.
Quando a taxa de câmbio sobe, dizemos que a moeda estrangeira apreciou-se ou o dólar
depreciou-se. Alternativamente, uma queda na taxa de câmbio significa que o preço da moeda
estrangeira (o preço do euro) caiu. O euro depreciou-se, enquanto o dólar apreciou-se.

FIG 14.1 Mercado de câmbio

A curva de demanda por moeda estrangeira tem inclinação negativa porque a demanda por moeda estrangeira para financiar
importações cai quando a taxa de câmbio sobe, tornando os bens estrangeiros mais caros. A curva de oferta de moeda estrangeira
tem inclinação positiva, refletindo o pressuposto de que a entrada de moeda estrangeira derivada do aumento das exportações
sobe quando a taxa de câmbio sobe, tornando os bens domésticos menos caros para os compradores estrangeiros. O valor de
equilíbrio da taxa de câmbio é π0, a taxa que iguala demanda e oferta.
A Figura 14.1 mostra as curvas de oferta e de demanda por moeda estrangeira traçadas em
relação à taxa de câmbio (π). Como foi explicado, os gastos no exterior de residentes dos
Estados Unidos (importações, compras de ativos estrangeiros e transferências externas) são
demandas por moeda estrangeira. Como essa demanda por moeda estrangeira variará em relação
ao preço da moeda estrangeira? Na Figura 14.1, a curva de demanda (Dme) tem inclinação
negativa, o que indica que, quando o preço da moeda estrangeira (preço do euro) sobe, a
demanda por moeda estrangeira cai. Isso acontece porque uma elevação no preço da moeda
estrangeira aumentará o custo em dólares da compra de bens estrangeiros. As importações,
portanto, declinarão e haverá menos demanda por moeda estrangeira. Repare que, aqui, estamos
mantendo constantes todos os outros preços com exceção da taxa de câmbio. Suponhamos que
um americano esteja querendo comprar uma câmera alemã que custe 200 euros. Se a taxa de
câmbio, o preço do euro em relação ao dólar, for 1,00, a câmera vai custar 200 dólares (200
euros = 200 dólares a 1,00 euro por dólar). Se a taxa de câmbio subir para 1,25, a câmera custará
250 dólares (200 euros = 250 dólares a 0,80 euro por dólar). Quanto mais alta a taxa de câmbio,
maior o custo em dólares de bens importados e mais baixa a demanda por moeda estrangeira.
Consideremos agora a demanda por moeda estrangeira para a compra de ativos estrangeiros e
para transferências externas. Em relação a estas últimas, não há razão para uma relação definida
entre a quantidade de transferências externas e a taxa de câmbio. Não é claro o efeito que a
mudança na taxa de câmbio teria sobre programas de ajuda externa, pagamentos de benefícios a
pessoas vivendo no exterior ou remessas de dinheiro a cidadãos do país que vivam no exterior.
No caso de compras de ativos estrangeiros, um aumento na taxa de câmbio, como no caso de
produtos importados, empurrará para cima o preço em dólares das ações ou títulos estrangeiros.
A elevação da taxa de câmbio, porém, também resultará em um aumento proporcional do
pagamento de juros ou dividendos sobre os títulos ou ações estrangeiros, medidos em dólares.
Por exemplo, um título francês que custe 800 euros e pague juros de 80 euros ao ano custará 800
dólares e pagará juros de 80 dólares ao ano com uma taxa de câmbio de 1,00 (1,00 euro = 1
dólar). Com uma taxa de câmbio de 1,25 (0,80 euro = 1 dólar), o título custará 1.000 dólares e
pagará juros de 100 dólares ao ano. Em qualquer caso, o título representa um ativo que paga um
retorno de 10% ao ano. Em consequência, não esperaríamos necessariamente algum efeito sobre
a demanda por ativos estrangeiros como resultado de uma mudança na taxa de câmbio.5 A
inclinação negativa da curva de demanda por moeda estrangeira resulta apenas do fato de que as
importações diminuem quando a taxa de câmbio sobe.
A curva de oferta de moeda estrangeira é traçada com uma inclinação positiva na Figura 14.1,
o que reflete o pressuposto de que a oferta de moeda estrangeira aumenta quando a taxa de
câmbio sobe. Quando a taxa de câmbio (preço do euro) aumenta, os bens de exportação
americanos ficam menos caros em euros para os europeus. Uma vez mais, estamos mantendo
fixos todos os outros preços, incluindo o preço em dólares dos bens de exportação americanos.
Por exemplo, o trigo americano que é vendido a 5 dólares por bushel* custaria para um europeu
10 euros por bushel com uma taxa de câmbio de 1,00, mas apenas 4 euros com uma taxa de
câmbio de 1,25.
A demanda por produtos de exportação, portanto, deve aumentar quando a taxa de câmbio
sobe. Repare, porém, que um dado volume de exportações em dólares corresponde a uma
entrada menor de moeda estrangeira (menos euros) com uma taxa de câmbio mais alta. Se, por
exemplo, a taxa de câmbio subisse 10% e, como resultado, o volume em dólares das exportações
subisse 10%, os ganhos em termos de moeda estrangeira ficariam inalterados. Os Estados
Unidos estariam vendendo 10% mais, mas ganhando 10% menos euros em cada venda.
Para que a oferta de moeda estrangeira aumente quando a taxa de câmbio sobe, a demanda
externa por produtos de exportação deve ter elasticidade-preço mais que 1, o que significa que
um aumento de 1% na taxa de câmbio (que resulta em uma queda de 1% no preço dos bens de
exportação para os estrangeiros) deve resultar em um aumento na demanda de mais de 1%. Se
essa condição for satisfeita, o volume em moeda doméstica das exportações subirá mais do que
proporcionalmente ao aumento da taxa de câmbio e os ganhos em moeda estrangeira (a oferta de
moeda estrangeira) aumentarão quando a taxa de câmbio subir. Essa é a suposição que fazemos
na Figura 14.1.6

14.2.2 Determinação da taxa de câmbio: taxas de câmbio flexíveis


Até aqui, excluímos a intervenção (transações de reservas oficiais) dos bancos centrais. As
curvas de oferta e de demanda na Figura 14.1 referem-se apenas a transações autônomas no
balanço de pagamentos. Vamos continuar com esse pressuposto e ver como a taxa de câmbio é
determinada na ausência de intervenção. Nesse caso, esperaríamos que a taxa de câmbio se
movesse de modo a equilibrar o mercado, a igualar a demanda e a oferta de moeda estrangeira.
Na Figura 14.1, essa taxa de câmbio de equilíbrio é π0. Os elementos autônomos no balanço de
pagamentos, aqueles acima das linhas em que as transações de reservas oficiais são registradas,
são igualados pelo ajuste da taxa de câmbio. Esse sistema de determinação da taxa de câmbio
em que não há intervenção do Banco Central é um sistema de taxas de câmbios flexíveis ou,
como é às vezes chamado, um sistema de câmbio flutuante. Um sistema ou regime de taxa de
câmbio é um conjunto de regras internacionais que governam a definição das taxas de câmbio.
Um sistema cambial completamente flexível ou flutuante é um conjunto particularmente simples
de regras a serem seguidas pelos bancos centrais; eles não fazem nada para afetar diretamente o
nível de suas taxas de câmbio. A taxa de câmbio é determinada pelo mercado.

FIG 14.2 Efeito no mercado de câmbio de um aumento na demanda por importados

Um aumento autônomo na demanda por importados desloca a curva de demanda por moeda estrangeira de Dme0 para Dme1. Na
taxa de câmbio de equilíbrio inicial, há um excesso de demanda por moeda estrangeira (XDme). A taxa de câmbio sobe para π1 a
fim de reequilibrar a oferta e a demanda no mercado de moeda estrangeira.

Para compreender melhor o funcionamento de um sistema de taxas de câmbios flexíveis,


vamos examinar o efeito de um choque que aumente a demanda por moeda estrangeira.
Suponhamos que haja um aumento na demanda por bens importados. Por exemplo, vamos
imaginar que um aumento nos preços da gasolina cause um deslocamento para carros
estrangeiros pequenos com menor consumo de combustível. O efeito desse aumento na demanda
por importados apareceria no mercado de câmbio como um deslocamento para a direita da curva
de demanda por moeda estrangeira – por exemplo, de Dme0 para Dme1, conforme ilustrado na
Figura 14.2. A uma dada taxa de câmbio, há uma maior demanda por importados e,
correspondentemente, uma demanda maior por moeda estrangeira. À taxa de câmbio de
equilíbrio inicial, π0, há agora um excesso de demanda por moeda estrangeira (mostrado como
XDme na Figura 14.2). Para equilibrar o mercado, a taxa de câmbio precisa subir para o novo
valor de equilíbrio, π1. O aumento da taxa de câmbio fará com que a demanda por importados
diminua, uma vez que o preço em moeda doméstica dos bens importados sobe com a taxa de
câmbio. Além disso, o volume de exportações aumentará, uma vez que o aumento da taxa de
câmbio faz com que os produtos de exportação domésticos fiquem menos caros para os
estrangeiros. No novo equilíbrio com a taxa de câmbio mais alta (π1), a oferta e a demanda por
moeda estrangeira são novamente iguais. O aumento na demanda por importados leva a uma
depreciação da moeda local.
Em 1973, os Estados Unidos moveram-se para uma maior flexibilidade da taxa de câmbio,
assim como fizeram outros países industrializados. Ao longo do período pós-1970, porém, os
Estados Unidos não tiveram um sistema cambial completamente flexível. Em graus variáveis
durante esse período, os bancos centrais, inclusive o Banco Central americano, intervieram no
mercado cambial para influir nos valores de suas moedas nacionais. As características do
sistema monetário internacional atual são discutidas mais adiante. Antes de começarmos essa
discussão, examinaremos o funcionamento do mercado cambial sob o extremo oposto a um
sistema de taxas de câmbio completamente flexível: um sistema de taxas de câmbio fixas.

14.2.3 Determinação da taxa de câmbio: taxas de câmbio fixas


Um sistema monetário internacional é um conjunto de regras que organizam a determinação
da taxa de câmbio e definem quais ativos comporão as reservas internacionais oficiais. Um
exemplo de um sistema de taxas de câmbio fixas é o sistema Bretton Woods adotado após a
Segunda Guerra Mundial. Os acordos monetários internacionais que compuseram esse sistema
foram negociados perto do final da guerra (em Bretton Woods, New Hampshire). O FMI foi
criado para administrar o sistema Bretton Woods. De acordo com regras do FMI, os Estados
Unidos deveriam definir uma paridade, ou valor de par, para sua moeda em relação ao ouro.
Outras nações definiriam paridades para suas moedas em relação ao dólar, de modo que o dólar
vinculado ao ouro também fixava o valor em ouro dessas outras moedas. Os Estados Unidos
concordaram em manter a conversibilidade entre o dólar e o ouro em um preço fixo
(originalmente 35 dólares por onça). Os outros países concordaram em manter a
conversibilidade (depois de um período de ajuste pós-guerra) com o dólar e com outras moedas,
mas não com o ouro, e concordaram em manter suas taxas de câmbio em relação ao dólar dentro
de uma margem de 1% para cada lado do nível de paridade. A responsabilidade diferencial dos
Estados Unidos em relação aos outros membros do FMI quanto à conversibilidade em ouro
parecia sensata, uma vez que os Estados Unidos detinham na época aproximadamente dois
terços das reservas internacionais mundiais de ouro.

Sistema Bretton Woods


Sistema de taxas de câmbio fixas instituído no final
da Segunda Guerra Mundial.

14.2.3.1 Atrelagem da taxa de câmbio


Para ver como um sistema de taxas de câmbio fixas funciona, vamos examinar como um país
pode “atrelar” ou fixar o nível de sua taxa de câmbio. Para isso, voltaremos ao nosso exemplo de
dois países e consideraremos que os Estados Unidos queiram fixar sua taxa de câmbio em
relação ao euro, que estamos usando para representar as moedas do resto do mundo. Vamos
ignorar a margem de 1% que acabamos de mencionar e supor que o Banco Central americano
queira fixar uma paridade exata para o dólar; digamos, uma taxa de câmbio de 1 euro igual a 1
dólar. O funcionamento do mercado cambial com esse sistema de taxas de câmbio fixas é
ilustrado na Figura 14.3.
Supomos que essa taxa de câmbio oficial fixa, 1,0, esteja abaixo da taxa de câmbio que
equilibraria um sistema de taxas flexíveis, sendo a taxa de equilíbrio na Figura 14.3 igual a 1,25
euro (0,8 euro = 1 dólar). Com a taxa de câmbio fixa nessa situação, diz-se que o dólar está
sobrevalorizado e o euro subvalorizado. Isso significa que, se a taxa de câmbio fosse
determinada pelo mercado, o preço do euro em relação ao dólar (a taxa de câmbio) teria de subir
para equilibrar o mercado. O que impede que isso aconteça?

FIG 14.3 Mercado de câmbio com uma taxa de câmbio fixa


Em um sistema de taxas de câmbio fixas, se a taxa de câmbio oficial (π = 1,0) estiver abaixo da taxa de equilíbrio do mercado (π
= 1,25), haverá um excesso de demanda por moeda estrangeira, XDme. Para impedir que a taxa de câmbio suba, os bancos
centrais locais ou estrangeiros precisam ofertar moeda estrangeira.

Lembre-se que as curvas de demanda e oferta que construímos para o mercado de câmbio
medem apenas transações autônomas; elas não levam em conta as transações de acomodação
realizadas pelos bancos centrais para financiar desequilíbrios de pagamentos. É precisamente
essa intervenção dos bancos centrais que precisa acontecer para fixar a taxa de câmbio em um
valor diferente do valor de equilíbrio, como 1,0 dólar na Figura 14.3. Para manter a taxa em 1,0,
os Estados Unidos têm de estar prontos para comprar e vender dólares a essa taxa de câmbio. Se
o Banco Central americano comprar euros por 1,0 dólar, a taxa de câmbio não pode cair abaixo
desse ponto, uma vez que ninguém venderia por menos do que isso. Similarmente, a taxa de
câmbio não pode subir acima de 1,0, porque o Banco Central estará disposto a vender euros por
esse preço.
Na situação representada na Figura 14.3, com a taxa de câmbio abaixo da taxa de equilíbrio,
há um excesso de demanda por moeda estrangeira (euros), mostrado como XDme na figura. Para
impedir que a taxa de câmbio suba, o Banco Central americano pode ofertar moeda estrangeira;
ou seja, pode trocar euros por dólares no mercado de câmbio.
Alternativamente, o Banco Central europeu poderia intervir. Esse banco ofertaria euros
(venderia euros e compraria dólares) para satisfazer o excesso de demanda por euros e manter o
preço do euro na taxa de câmbio oficial.

14.2.3.2 Implicações da intervenção


Dois pontos devem ser observados em relação à intervenção do Banco Central. O primeiro
refere-se ao efeito sobre o balanço de pagamentos como resultado de uma intervenção no
mercado cambial. Suponhamos que a intervenção seja do Banco Central dos Estados Unidos.
Onde ele obtém os euros que vende para impedir que a taxa de câmbio suba? O Banco Central
precisa fazer uso de suas reservas internacionais para comprar euros do Banco Central europeu a
fim de vendê-los no mercado de moeda estrangeira. Essa ação apareceria na Tabela 14.1 como
uma redução dos ativos de reservas oficiais dos Estados Unidos.
Alternativamente, se o Banco Central europeu ofertasse euros diretamente no mercado de
câmbio para satisfazer o excesso de demanda americana por moeda estrangeira, ele acabaria
com um estoque aumentado de dólares. No balanço de pagamentos americano (Tabela 14.1),
essa ação apareceria como um aumento dos ativos internacionais oficiais nos Estados Unidos. A
soma desses dois itens (uma redução dos ativos de reservas oficiais americanas e um aumento
nos ativos oficiais estrangeiros nos Estados Unidos) equivale ao déficit do balanço de
pagamentos americano. Isso é um déficit porque é o valor em que os gastos no exterior
(demanda por moeda estrangeira) excedem os ganhos provenientes do exterior (oferta de moeda
estrangeira), levando em conta apenas transações autônomas (aquelas refletidas nas curvas Dme
e Sme). Esse déficit precisa ser financiado por uma intervenção do Banco Central caso se deseje
manter a taxa de câmbio fixa.
Inversamente, se, com a taxa de câmbio oficial, a oferta de moeda estrangeira exceder a
demanda (há um excesso de oferta de moeda estrangeira), o país terá um superávit no balanço de
pagamentos. Nesse caso, os ganhos provenientes de vendas para residentes no exterior que
produzem a oferta de moeda estrangeira superam os gastos dos residentes locais no exterior.
Quando isso acontece, os ativos de reservas oficiais aumentam ou os ativos de reservas oficiais
estrangeiras no país diminuem.
O segundo ponto a observar sobre a intervenção do Banco Central é que países que precisam
intervir continuamente para financiar déficits acabarão ficando sem reservas oficiais. Em nosso
exemplo, está claro que, se os Estados Unidos financiassem seus déficits por meio de reduções
de seus ativos oficiais, acabariam por esgotar seu estoque de reservas. Mas e se o déficit fosse
financiado pelo Banco Central europeu (ou outros bancos centrais), aumentando seus ativos de
reservas nos Estados Unidos pela compra de dólares? Se os bancos centrais estrangeiros
continuassem a manter dólares, isso não afetaria as reservas americanas. Sob o acordo de
Bretton Woods, porém, se quisessem, os bancos centrais estrangeiros poderiam solicitar que os
Estados Unidos comprassem dólares de volta, usando ativos das reservas (ouro e DES). Caso
isso acontecesse, as reservas americanas cairiam.
Em certa medida, os Estados Unidos conseguiram manter déficits contínuos no balanço de
pagamento durante o período de Bretton Woods porque os bancos centrais estrangeiros não lhes
pediram para comprar de volta os dólares que eles haviam adquirido em intervenções no
mercado de câmbio. A princípio, eles não fizeram isso porque queriam os dólares, que lhes
serviam como um ativo de reserva. (Lembre-se que eles tinham o compromisso de manter a
conversibilidade entre sua moeda e o dólar.) Mais tarde, não pediram que os Estados Unidos
comprassem os dólares de volta porque sabiam que isso não poderia ser feito; os estoques de
dólares no exterior eram muito superiores às reservas americanas. Como veremos, essa situação
contribuiu para o colapso do sistema.
Outros países – a Dinamarca, por exemplo – não poderiam manter déficits persistentes sem
perder suas reservas. No caso da Dinamarca, sua moeda, a coroa dinamarquesa, não era usada
como um ativo de reserva, portanto outros bancos centrais esperariam que o governo
dinamarquês comprasse de volta as coroas que eles haviam obtido em intervenções no mercado
de câmbio. Para fazer isso, a Dinamarca teria de esgotar suas reservas oficiais (ouro, DES e
dólares americanos).
Há, contudo, uma assimetria importante aqui. A Dinamarca poderia manter superávits
persistentes. O Banco Central dinamarquês acumularia, então, dólares americanos comprados
com coroas dinamarquesas. Países esgotam reservas, mas não moedas próprias. Para considerar
um exemplo de anos recentes, a China registrou enormes superávits no balanço de pagamentos e
comprou grandes quantidades de dólares americanos. Eles na verdade fixam o valor do yuan em
relação ao dólar abaixo do valor de mercado.

14.3 O sistema de taxas de câmbio atual


O sistema Bretton Woods entrou em colapso em 1971. O atual sistema mundial de
determinação da taxa de câmbio pode ser descrito como flutuação administrada para o caso dos
principais países industrializados (ou, no caso dos países da zona do euro, para um grupo de
países). Nações em desenvolvimento com frequência usam sistemas de taxa de câmbio fixa,
embora algumas permitam uma flexibilidade da taxa de câmbio em graus diversos. Uma
flutuação administrada, ou flutuação suja (dirty floating), contém elementos de um sistema de
taxa de câmbio flexível (a parte da flutuação) e de um sistema de taxa de câmbio fixa (a parte
administrada). Para um país com uma flutuação administrada, a taxa de câmbio é deixada livre
para se mover em resposta a forças de mercado. O Banco Central, porém, pode intervir para
evitar movimentos indesejáveis ou desordenados da taxa de câmbio. A questão de como um
movimento indesejável ou desordenado da taxa de câmbio tem sido definido na prática e,
portanto, de quando os bancos centrais decidem intervir em mercados de câmbio será discutida
adiante. Os fatores que levaram à falência do sistema Bretton Woods também serão discutidos.

14.3.1 Regimes cambiais


A Tabela 14.2 resume os regimes de taxa de câmbio dos países-membros do FMI. Como já
foi dito, não existe um sistema único de determinação da taxa de juros. Alguns países atrelam
sua taxa de juros a uma moeda ou a uma cesta de moedas com uma margem estreita de 1% ou
menos. Esse é o grupo de 42 países incluídos em “regimes de taxa fixa” na tabela. O grupo
incluído em “taxas fixas dentro de bandas” também segue uma política de taxa de câmbio fixa,
mas dentro de uma banda maior. O grupo de “câmbio deslizante” (crawling pegs) ajusta o valor
de sua moeda em relação a uma taxa fixa central em resposta a um conjunto de indicadores
econômicos (por ex., taxas de inflação domésticas x estrangeiras) e, assim, encaixa-se em um
terreno médio entre taxas fixas e flexíveis. O grupo “participam de um mecanismo cambial”
compreende as nações europeias que adotaram uma moeda comum, o euro, mas flutuam como
grupo em relação a outras moedas. Esse regime de taxa de câmbio é descrito mais
detalhadamente mais adiante neste capítulo. O próximo grupo na tabela são 77 países que têm
regimes de taxas flutuantes, embora algumas sejam flutuações administradas. O último grupo,
chamado de “outros”, tem sistemas de taxas de câmbio que descreveremos em Perspectivas
14.2. Japão, Canadá, Reino Unido e Estados Unidos estão entre os países com taxas de câmbio
flutuantes.

Tabela 14.2 - Regimes cambiais dos países-membros do FMI

Regime cambial Número


Regimes de taxas fixas 42
Taxas fixas dentro de bandas 14
Câmbio deslizante 5
Participam de um mecanismo cambial 17
Flutuação administrada e flutuação livre 77
Outros 34
Fonte: FMI, International Financial Statistics.

14.3.2 Quanto de administração? Quanto de flutuação?


Em uma flutuação administrada, os bancos centrais intervêm em mercados cambiais para
evitar movimentos indesejáveis ou desordenados em suas taxas de câmbio. Fora isso, suas taxas
de câmbio flutuam. Durante o período pós-1973, o grau em que os países industrializados
intervieram em seu mercado de câmbio variou muito.
Nos Estados Unidos na década de 1970, houve intervenções frequentes do Banco Central
americano no mercado de câmbio. Por exemplo, em novembro de 1978, o governo americano
coordenou um extenso programa de apoio ao preço do dólar. Em 1981, o governo Reagan
anunciou que a intervenção do Banco Central ocorreria apenas quando necessário para evitar
desordens no mercado cambial iniciadas por situações de crise. Depois dessa mudança na
interpretação do que constituía um movimento desordenado da taxa de câmbio, houve um
notável declínio da intervenção americana no mercado de câmbio.

PERSPECTIVAS 14.2 - CURRENCY BOARDS E DOLARIZAÇÃO


Sem um sistema monetário internacional unificado como o sistema Bretton Woods, os países individuais ficaram livres
para escolher seu regime cambial como parte de seu programa geral de políticas macroeconômicas. Vários países
emergentes seguiram sistemas de taxa de câmbio fixa. Tal sistema destina-se a proporcionar estabilidade cambial para
estimular o crescimento do comércio e dos investimentos. Em alguns casos, o compromisso com uma taxa de câmbio fixa
é parte de um pacote anti-inflação.
Em um mundo de alta mobilidade do capital, porém, alguns países perceberam que não conseguem manter as taxas que
fixavam para suas moedas. Saídas de capitais ameaçam esgotar suas reservas e eles são forçados a desvalorizar a moeda.
Duas maneiras de dar suporte a um sistema de taxas fixas são: currency boards e dolarização. Com um sistema currency
board, o país compromete-se a fixar o valor de sua moeda em relação a alguma moeda forte, como o dólar, e a estar pronto
para converter sua moeda nessa moeda estrangeira sob demanda. Compromete-se ainda a só emitir mais moeda conforme
for acumulando a moeda estrangeira. Isso, na prática, tira a política monetária das mãos do país e alivia o medo dos
investidores estrangeiros de que a inflação destrua o valor de seus estoques de moeda local. Currency boards, portanto,
criam credibilidade para a taxa de câmbio fixa. A Argentina, que enfrentava um longo período de alta inflação, adotou um
currency board em 1991 com o dólar como a moeda estrangeira. O currency board permitiu que a Argentina detivesse a
inflação por uma década, mas perdeu sua eficácia em 2001. A opinião mais geral é que a causa do colapso tenham sido os
contínuos e crescentes déficits do orçamento do governo que acabaram por minar a credibilidade da taxa de câmbio fixa.
A dolarização avança um passo adiante de um currency board, no sentido de que o país simplesmente adota uma moeda
estrangeira forte, novamente com frequência o dólar, e elimina a sua própria moeda. Como a moeda do país fica sendo,
por exemplo, o dólar, esta é uma forma extrema de taxa de câmbio fixa (em relação ao dólar). Uma vez mais, aqui o país
abdica de sua prerrogativa de conduzir uma política monetária independente. Em meio a alta inflação e outras dificuldades
econômicas, o Equador dolarizou sua economia em 2000. O Panamá usou o dólar como a moeda desde sua independência
em 1903.

Mesmo na ausência de intervenção do Banco Central americano, o preço do dólar não flutua
livremente com o sistema de taxas de câmbio atual, porque outros bancos centrais compram ou
vendem dólares para influenciar o preço de suas moedas em relação ao dólar. Por exemplo, em
1981 e novamente em 1984, bancos centrais europeus venderam dólares de suas reservas para
desacelerar a elevação do preço do dólar, que significaria uma queda no preço das moedas locais
(um aumento de sua taxa de câmbio em relação ao dólar). Depois, com o Acordo do Plaza em
setembro de 1985, os bancos centrais dos grandes países industrializados começaram a
coordenar intervenções conjuntas com o objetivo de baixar o valor do dólar (elevando a taxa de
câmbio americana). Em 1987, por razões que serão explicadas adiante, esses bancos centrais
reverteram o curso e intervieram, novamente em conjunto, para elevar o preço do dólar.
Em anos recentes, as principais intervenções no mercado cambial têm sido compras de
dólares americanos por bancos centrais asiáticos. O Banco da China acumulou enormes reservas
a fim de manter o valor fixo de sua moeda. O Banco do Japão também comprou uma grande
quantidade de dólares para evitar (ou limitar) a valorização do iene. Outros bancos centrais
asiáticos compraram centenas de bilhões de dólares para aumentar suas reservas.

14.3.3 A falência do sistema Bretton Woods


Vimos pela Tabela 14.2 que o sistema monetário internacional atual é bastante
desorganizado. Como veio a surgir tal sistema (ou falta de sistema)? Que processo levou à
falência do sistema de taxas de câmbio fixas de Bretton Woods?
Eram centrais para o sistema Bretton Woods as taxas de câmbio fixas e o papel de moeda
principal exercido pelo dólar. Os valores de paridade definidos para as moedas não seriam fixos
para sempre; o sistema Bretton Woods pretendia utilizar taxas ajustáveis. Um país poderia
mudar sua taxa de câmbio se encontrasse um “desequilíbrio fundamental” em seu balanço de
pagamentos. Essas mudanças deveriam ser feitas por meio de consultas com o FMI. Países com
déficits crônicos deveriam desvalorizar sua moeda, o que significa baixar a paridade da moeda
em relação ao dólar e, como o valor do dólar em relação ao ouro era fixo, baixar também o valor
da moeda em relação ao ouro. Países com superávits persistentes revalorizariam sua moeda em
valores de paridade mais altos em relação ao dólar e ao ouro.
Na verdade, os ajustes mostraram-se extremamente difíceis. Países com superávits
persistentes não sofriam pressão alguma para valorizar sua moeda. Os governos de países com
déficits persistentes achavam politicamente difícil desvalorizá-la, uma vez que uma redução no
valor da moeda era interpretada como sinal de fracasso da política econômica do governo. Além
disso, rumores de que uma moeda seria desvalorizada levavam a ondas de especulação contra a
moeda, com especuladores vendendo a moeda com a intenção de comprá-la de novo depois da
desvalorização. Devido a essas dificuldades no ajuste dos valores de paridade das moedas,
durante o período do Bretton Woods alguns países (por ex., a Grã Bretanha) desenvolveram
déficits crônicos no balanço de pagamentos e outros (por ex., a Alemanha) desenvolveram
superávits crônicos.
O fator mais prejudicial ao sistema foi o déficit crônico apresentado pelos Estados Unidos,
indicando que o dólar estava sobrevalorizado. Desvalorizar o dólar significava elevar o preço do
ouro, uma vez que o dólar era conversível em ouro por um valor de par fixo. Isso apresentava
dificuldades especiais devido ao papel-chave do dólar dentro do sistema. Mas os crescentes
déficits no balanço de pagamentos americano estavam criando uma superabundância de dólares
no mercado.
No final da década de 1960, a posição do balanço de pagamentos americano piorou. Graves
pressões inflacionárias surgiram nos Estados Unidos como resultado dos gastos do governo na
Guerra do Vietnã. Esse aumento da inflação piorou o balanço de pagamentos americano. Os
preços nos Estados Unidos subiram mais rápido do que os preços em outros países
industrializados. Com a taxa de câmbio fixa, isso significou que os bens de exportação
americanos ficaram mais caros para os estrangeiros, enquanto o preço de importados caiu em
relação aos preços dos produtos nacionais. Como consequência, a demanda por bens de
exportação americanos caiu e a demanda por importados subiu; o déficit do balanço de
pagamentos dos Estados Unidos aumentou.
Em 1972, o dólar foi desvalorizado e o preço do ouro subiu para 38 dólares a onça.
Estabeleceu-se um novo conjunto de valores de paridade para as moedas dos outros membros do
FMI. No entanto, as tentativas de defender o novo conjunto de valores de paridade fracassaram
já em 1973. Uma vez mais, uma onda de inflação nos Estados Unidos e a perda de confiança no
dólar foram as causas mais imediatas dos problemas para manter um conjunto de valores de
câmbio fixos. Além disso, a partir de 1973-1974, enormes aumentos no preço do petróleo
levaram a grandes déficits no balanço de pagamentos das nações industrializadas consumidoras
de petróleo e superávits para os países produtores de petróleo. Foram necessários ajustes nas
taxas de câmbio para restaurar o equilíbrio. O sistema de flutuação administrada que surgiu na
década de 1970 foi o mecanismo pelo qual se realizaram os ajustes na taxa de câmbio exigidos
pelo declínio da força do dólar e pela elevação dos preços do petróleo.

14.4 Vantagens dos regimes cambiais alternativos


Dentro do sistema atual de determinação da taxa de câmbio, cada país ou grupo de países
escolhe um regime cambial. Um elemento-chave nessa decisão é a escolha do grau de
flexibilidade da taxa de câmbio. O país faz sua escolha ao longo de um espectro que tem em
uma extremidade a flexibilidade total da taxa de câmbio e, na outra, um câmbio fixo rígido. Há
outros aspectos na escolha de um regime cambial, como qual moeda será escolhida para
atrelamento se a moeda for atrelada a outra moeda e qual o nível e tipo de ativos de reserva a
serem mantidos. Ainda assim, a escolha do grau de flexibilidade é central para o regime
cambial.
Os méritos relativos das taxas de câmbio fixas e flexíveis têm sido há muito debatidos por
economistas e autoridades de bancos centrais. Nesta seção, vamos examinar os principais
argumentos a favor e contra cada sistema.

14.4.1 Vantagens da flexibilidade da taxa de câmbio


Começamos com os argumentos propostos a favor da flexibilidade da taxa de câmbio. Duas
vantagens citadas para uma maior flexibilidade das taxas de câmbio são:7
1. Taxas de câmbio flexíveis permitiriam que os formuladores de políticas econômicas
concentrassem-se em metas domésticas, livres de preocupações com déficits no balanço de
pagamentos. Esse sistema removeria conflitos potenciais que surgem entre o equilíbrio
interno (metas domésticas) e o equilíbrio externo (equilíbrio do balanço de pagamentos).
2. Taxas de câmbio flexíveis isolariam a economia interna de choques econômicos originados
no exterior.

14.4.1.1 Independência das políticas econômicas e flexibilidade da taxa de câmbio


Nossa análise anterior indicou que, se o Banco Central de uma nação interviesse no mercado
de câmbio para financiar um déficit no balanço de pagamentos, ele perderia ativos de reservas
oficiais. Déficits continuados acabariam levando, assim, a um esgotamento das reservas do
Banco Central. Antes que isso acontecesse, o Banco Central teria de tomar ações de política
econômica com o objetivo de eliminar o déficit do balanço de pagamentos. É nesse ponto que
ocorre o possível conflito entre metas internas e o equilíbrio do balanço de pagamentos.
Para entender a natureza do conflito mais claramente, vamos examinar como os principais
itens do balanço de pagamentos relacionam-se com o nível de atividade econômica interna.
A balança comercial e o nível de atividade econômica. A Figura 14.4 mostra importações
(Z) e exportações (X) no eixo vertical e a renda nacional interna no eixo horizontal. A curva das
importações é traçada com inclinação positiva porque a demanda por importados depende
positivamente da renda. Isso acontece porque o consumo depende positivamente da renda.
Quando a renda sobe, o consumo tanto de bens importados como de bens nacionais também
sobe. Além disso, à medida que a renda nacional interna aumenta, mais insumos importados
serão necessários (por ex., petróleo bruto importado).
Em contraste, a curva de exportações é horizontal. A demanda por produtos de exportação
domésticos é uma parte da demanda estrangeira por importados, a qual depende da renda
estrangeira. Pela perspectiva do país em questão, a renda estrangeira e, portanto, a demanda por
produtos de exportação domésticos são exógenas.

FIG 14.4 Balança comercial e o nível de atividade econômica

O nível de renda que iguala as importações (Z) com o nível exógeno de exportações (X) é Ybc = 0. Não há razão para que o nível
de equilíbrio da renda seja igual a Ybc = 0. Por exemplo, se Y0 for o nível de equilíbrio da renda, as importações excederão as
exportações e haverá um déficit na balança comercial (Z0 - X0).

Variáveis adicionais que influenciam tanto a demanda doméstica por importados como a
demanda estrangeira por produtos de exportação domésticos são os níveis de preços relativos
dos dois países e o nível da taxa de câmbio. Essas variáveis determinam os custos relativos dos
produtos dos dois países para os seus cidadãos. Por enquanto, estamos supondo que os níveis de
preços e a taxa de câmbio sejam fixos.
Como é mostrado na Figura 14.4, exportações e importações serão iguais se a renda estiver
no nível Ybc = 0 (onde bc, a balança comercial, será zero). Esse nível de renda gera uma demanda
por importados igual ao nível exógeno de exportações. Mas não há razão para esperar que Ybc = 0
será um nível de equilíbrio da renda. A renda de equilíbrio será determinada pela demanda e
pela oferta agregadas da economia como um todo, não apenas pelo setor externo. Por exemplo,
na Figura 14.4, vamos supor que a renda de equilíbrio esteja em Y0, acima de Ybc = 0. Em Y0, as
importações excedem as exportações e há um déficit comercial.
Vimos em capítulos anteriores como políticas de administração da demanda agregada podem,
pelo menos na visão keynesiana, afetar a renda de equilíbrio. Assim, políticas desse tipo
poderiam ser usadas para mover a renda de equilíbrio para o nível Ybc = 0, em que as exportações
são iguais às importações. Se os outros itens da conta corrente e a balança de capitais estivessem
em equilíbrio, essa seria uma posição de equilíbrio externo para a economia, o que, em um
sistema de taxas de câmbio fixas, significa equilíbrio do balanço de pagamentos (déficit das
transações de reservas oficiais igual a zero). Em termos da Figura 14.4, o formulador de
políticas econômicas poderia, por exemplo, usar uma política fiscal restritiva, como um aumento
de impostos, para reduzir a renda de Y0 para Ybc = 0.
Mas os formuladores de políticas também têm metas internas. Na estrutura keynesiana,
políticas de administração da demanda agregada devem ser usadas para alcançar metas de
desemprego e inflação – ou seja, para alcançar equilíbrio interno. O problema é que não há
razão para acreditar que o nível de renda que produz equilíbrio externo seja o nível ótimo no que
se refere às metas internas. Suponhamos, por exemplo, que, na Figura 14.4, o nível ótimo do
ponto de vista das metas internas seja Y0. Se uma política fiscal restritiva fosse usada para baixar
a renda para Ybc = 0, o resultado poderia ser uma indesejável alta taxa de desemprego e o
equilíbrio interno seria perturbado. Mas, se a renda for mantida em Y0, haverá um déficit
comercial; a economia não terá equilíbrio externo.
Fluxos de capital e o nível de atividade econômica. Os determinantes primários dos fluxos
de capital entre nações são as taxas de retorno esperadas dos ativos em cada país. Com um
sistema de taxas de câmbio fixas, os efeitos de movimentos esperados das taxas de câmbio sobre
retornos dos ativos podem ser ignorados (exceto nas ocasiões em que houver especulações sobre
uma mudança iminente da taxa de câmbio oficial). As taxas de juros nos vários países serão
medidas das taxas de retorno relativas. Se tomarmos a taxa de retorno de outros países como
constante, o nível do fluxo de capital para um determinado país dependerá positivamente do
nível de sua taxa de juros (r); ou seja,

em que F é a entrada de capital líquida (um valor negativo de F representa um fluxo de saída
líquido ou déficit na balança de capitais).8 O modo como mudanças na atividade econômica
afetam o equilíbrio da balança de capitais dependerá, portanto, de como a taxa de juros varia
com a mudança na atividade econômica.
Consideremos, em primeiro lugar, aumentos na atividade econômica causados por políticas
monetárias expansionistas. Uma política monetária expansionista estimulará a demanda
agregada reduzindo a taxa de juros. O efeito da taxa de juros mais baixa será desfavorável para o
equilíbrio da balança de capitais. O montante de investimentos estrangeiros diminuirá e os
investimentos do país no exterior aumentarão porque os ativos estrangeiros tornam-se
relativamente mais atraentes. Na seção anterior, vimos que aumentos na renda, por qualquer
razão, aumentam as importações e deixam as exportações inalteradas, piorando a balança
comercial. Se o aumento na renda for resultado de uma política monetária expansionista, o que
acontece é que tanto a balança comercial como a balança de capitais vão se deteriorar.
Vamos supor agora, alternativamente, que o aumento na atividade econômica seja resultante
de uma política fiscal expansionista. Quando a renda sobe, há um consequente aumento na
demanda por moeda e, com uma oferta de moeda fixa, a taxa de juros subirá. Nesse caso, o
aumento na renda é acompanhado por um aumento da taxa de juros. Consequentemente, embora
a balança comercial piore, a elevação da taxa de juros estimulará a entrada de capital. Se o efeito
geral sobre o balanço de pagamentos será favorável ou desfavorável depende da força relativa
desses dois efeitos da expansão induzida pela política fiscal: o efeito favorável sobre a balança
de capitais ou o efeito desfavorável sobre a balança comercial.
Vemos, portanto, que, num sistema de taxas de câmbio fixas, podem surgir conflitos entre
metas internas, como baixo desemprego, e a meta de equilíbrio externo medida pelo equilíbrio
do balanço de pagamentos. O conflito é especialmente grave com relação à política monetária,
em que ações de política expansionista têm efeitos desfavoráveis tanto sobre a balança comercial
como sobre a balança de capitais.
Um último vínculo entre o balanço de pagamentos e a atividade econômica dá-se pelo nível
de preços. A menos que a economia esteja longe de uma situação de pleno emprego, políticas de
expansão da demanda agregada, sejam monetárias ou fiscais, farão o nível de preços subir. Com
uma taxa de câmbio fixa, um aumento no nível de preços domésticos causará, para um nível de
preços externos constante, um aumento nas importações e um declínio nas exportações. Bens
estrangeiros serão relativamente mais baratos para os cidadãos do país e os produtos de
exportação domésticos serão mais caros para os compradores estrangeiros. Esse efeito do preço
sobre a balança comercial reforça o efeito diretamente desfavorável de uma expansão econômica
sobre a balança comercial no que se refere tanto a políticas monetárias como fiscais.

14.4.1.2 Flexibilidade das taxas de câmbio e isolamento contra choques externos


Uma segunda vantagem sugerida pelos defensores de taxas de câmbio flexíveis é que esse
sistema pode isolar a economia de certos choques. Para entender o raciocínio que está por trás
dessa afirmação, consideremos um país que esteja inicialmente em um estado de equilíbrio
macroeconômico, com um nível ótimo de desemprego, um nível ótimo de preços e equilíbrio no
balanço de pagamentos. Agora, vamos supor que haja uma recessão no exterior e a renda externa
decline. Como a demanda por importações dos países estrangeiros, que é a demanda pelos bens
de exportação do país em questão, depende da renda externa, ela cairá com a recessão no
exterior. No mercado de câmbio, esse declínio na demanda por exportações aparecerá como um
deslocamento para a esquerda da curva de oferta de moeda estrangeira. Como é mostrado na
Figura 14.5, a curva de oferta desloca-se de Sme0 para Sme1 como resultado da recessão externa.

FIG 14.5 Isolamento da economia interna em um sistema de taxas de câmbio flexíveis


Uma recessão externa resulta em uma queda nas exportações e um deslocamento para a esquerda da curva de oferta da moeda
estrangeira, de Sme0 para Sme1. Com um sistema de taxas de câmbio fixas, haverá um déficit no balanço de pagamentos
(distância AB). Em um sistema de taxas de câmbio flexíveis, a taxa de câmbio subirá para π1 para equilibrar o mercado de moeda
estrangeira.

Em um sistema de taxas de câmbio fixas, o país ficaria com um déficit no balanço de


pagamentos igual à distância AB na Figura 14.5. Além disso, como a demanda por exportações
é uma parcela de demanda agregada (a demanda estrangeira pelo produto doméstico), a recessão
externa terá efeitos de contração sobre a economia interna; a demanda agregada cairá e a renda
diminuirá.
Em um sistema de taxas de câmbio flexíveis, o excesso de demanda por moeda estrangeira
(igual ao déficit do balanço de pagamentos AB), que resultou da recessão externa, fará a taxa de
câmbio subir. O novo equilíbrio estará no ponto C, com a taxa de câmbio mais alta π1. O
aumento da taxa de câmbio eliminará o déficit do balanço de pagamentos. Observe outro aspecto
do ajuste a um novo equilíbrio. Quando passamos para o ponto C, o aumento da taxa de câmbio
estimula a demanda por exportações e reduz a demanda por importações. Esse aumento nas
exportações induzido pela elevação da taxa de câmbio terá um efeito de expansão sobre a
demanda agregada. A redução das importações que é causada pelo aumento da taxa de câmbio
também terá efeitos de expansão; a demanda agregada interna aumentará quando os residentes
do país deixarem de comprar produtos importados para comprar bens nacionais.
No caso de taxas de câmbio flexíveis, vemos que o ajuste da taxa de câmbio compensa o
efeito de contração da economia doméstica que resulta de uma recessão externa. Nesse sentido,
um sistema de taxas de câmbio flexíveis atua no sentido de isolar a economia de certos choques
externos.
14.4.2 Argumentos em favor de taxas de câmbio fixas
Os defensores de taxas de câmbio fixas acreditam que tal sistema proporcionará um ambiente
mais estável para o crescimento do comércio mundial e dos investimentos internacionais.
Afirmam também que a combinação de um sistema de taxas de câmbio fixas e uma maior
coordenação de políticas econômicas entre as economias industrializadas levará a mais
estabilidade macroeconômica.
Depois do fracasso de um sistema de taxas de câmbio fixas anterior no início da década de
1930, a economia mundial passou por um período de taxas de câmbio livremente flutuantes.
Com base nessa experiência, o economista norueguês Ragnar Nurkse apresentou a seguinte
argumentação contra taxas de câmbio flexíveis:

Taxas de câmbio livremente flutuantes envolvem três desvantagens sérias. Em primeiro


lugar, elas criam um elemento de risco que tende a desestimular o comércio internacional. O
risco pode ser coberto por meio de operações de hedging no caso de mercados de câmbio a
termo; mas essa proteção, caso seja possível, só é conseguida a um preço...

Em segundo lugar, como meio de ajustar o balanço de pagamentos, flutuações cambiais


envolvem constantes deslocamentos de mão de obra e outros recursos entre produção para o
mercado interno e produção para exportação. Tais deslocamentos podem ser caros e
perturbadores; eles tendem a criar desemprego friccional e representam óbvios desperdícios
caso as condições do mercado cambial que os induzem sejam temporárias...

Em terceiro lugar, a experiência mostrou que nem sempre é possível confiar em câmbios
flutuantes para promover ajustes. Um movimento importante e contínuo da taxa de câmbio
pode gerar expectativas de um novo movimento na mesma direção, dando origem, assim, a
transferências especulativas de capital desestabilizadoras.9

Vamos examinar cada uma dessas supostas falhas de um sistema taxas de câmbio
flutuantes.

14.4.2.1 Risco cambial e comércio internacional


As taxas de câmbio mostraram-se voláteis tanto no curto como no longo prazo durante o
período pós-Bretton Woods. Essa volatilidade representa um risco, por exemplo, para um
exportador ou um investidor local que planeje um investimento no exterior, como uma fábrica
em outro país. Alguns desses riscos podem ser cobertos nos mercados futuros de moeda
estrangeira. Um exportador que esteja para receber ienes japoneses daqui a três meses pode fazer
um contrato para converter esses ienes em moeda doméstica pelo preço que estiver definido
hoje.
Mas nem todos os riscos cambiais no comércio internacional e em investimentos
estrangeiros podem ser facilmente cobertos. Se uma firma estiver decidindo se deve ou não
entrar no mercado de exportações, o que envolve custos como realizar contatos comerciais e
propaganda no exterior, ela precisa analisar as perspectivas futuras da moeda doméstica. Uma
elevação futura no valor da moeda, por exemplo, pode tornar o produto da firma não-
competitivo no mercado de exportações. Flutuações na taxa de câmbio, portanto, são um risco
adicional.
14.4.2.2 Oscilações da taxa de câmbio e custos de ajustamento
O segundo argumento de Nurkse era que flutuações da taxa de câmbio fariam recursos serem
deslocados entre os setores de produção interna e de exportação, com consequentes custos de
ajustamento, que incluem desemprego friccional. Quando o valor do dólar americano subiu no
início da década de 1980, o desempenho do país em exportações foi prejudicado. Depois,
quando o valor do dólar caiu e as exportações melhoraram, surgiram problemas para os
exportadores alemães e japoneses. Os custos de ajustamento que acompanharam as grandes
oscilações no valor do dólar na década de 1980 foram a razão mais importante do
descontentamento com as taxas de câmbio flexíveis na época.

14.4.2.3 Especulação e instabilidade cambial


O último argumento de Nurkse era que taxas de câmbio livremente flutuantes levariam a uma
especulação desestabilizadora nos mercados de câmbio. Muitos economistas acreditam que esse
tipo de especulação pode ter sido um dos fatores envolvidos no nível de alta que o dólar
americano atingiu em 1985. Os investidores em ativos financeiros viram o dólar subir e,
acreditando que subiria ainda mais, aumentaram sua demanda por ativos em dólares. Essa
demanda fez subir ainda mais o valor do dólar. Na medida em que uma especulação desse tipo
amplia os movimentos da taxa de câmbio, ela exacerba os problemas discutidos nas duas
subseções anteriores.

14.5 Taxas de câmbio no período de câmbio flutuante


Como o sistema de taxas de câmbio flutuantes funcionou durante o período pós-1973? Como
as informações desse período podem ajudar a esclarecer a questão dos méritos relativos dos
sistemas de taxas fixas e flutuantes? Para examinar isso, vamos observar o comportamento da
taxa de câmbio dos Estados Unidos ao longo dos anos de câmbio flutuante.
A Figura 14.6 mostra o preço do marco alemão medido em centavos de dólar no período
1973-2000. O marco era a moeda alemã antes da adoção do euro em 1999. Assim, por boa parte
do período de taxas flutuantes, o marco é um análogo a π em gráficos anteriores onde π, o preço
da moeda estrangeira, foi medido em termos do euro.10 A Figura 14.7 mostra uma medida mais
abrangente do preço relativo da moeda americana, a taxa de câmbio efetiva, que mede o valor do
dólar em relação a uma média ponderada de outras moedas. Os pesos dados às moedas de outros
países dependem de sua importância no comércio exterior americano. É importante observar que
o que estamos medindo na Figura 14.7 é o valor do dólar, que é o contrário do preço da moeda
estrangeira, por exemplo, quando o valor do dólar aumenta, π (o preço da moeda estrangeira)
cai.
Nas Figuras 14.6 e 14.7, pode ser visto que a taxa de câmbio americana foi bastante volátil
durante o período de taxas flutuantes. Se examinássemos os valores mensais, observaríamos que
a volatilidade de curto prazo da taxa de câmbio também foi grande. Essa volatilidade das taxas
de câmbio no curto e no médio prazo foi uma causa de preocupação quanto ao sistema de taxas
de câmbio flexíveis.

FIG 14.6 Preço do marco alemão, 1973-2000 (em centavos de dólar)


Fonte: Federal Reserve Bulletin.

FIG 14.7 Valor do dólar americano, 1973-2010

Fonte: Board of Governors of the Federal Reserve.

14.5.1 O dólar em queda, 1976-1980


Um fator importante na determinação do comportamento das taxas de câmbio entre os países
industrializados em meados e fim da década de 1970 foram suas diferentes respostas aos
choques no preço do petróleo no período. Os países confrontados com um choque de oferta
desfavorável, como a quadruplicação do preço do petróleo em 1973-74, tiveram de escolher o
grau em que sua política de demanda agregada poderia acomodar o choque. Acomodar, nesse
contexto, significa expandir a demanda agregada para tentar compensar os efeitos desfavoráveis
dos choques de oferta sobre a produção e o emprego. O custo dessa acomodação é uma inflação
mais alta.
Embora outros fatores estivessem em ação durante o período de 1976-80, as moedas dos
países que escolheram mais acomodação, em especial por meio de políticas monetárias
expansionistas, tenderam a se depreciar em relação àquelas que tiveram pouca ou nenhuma
acomodação. Para entender por que, vamos examinar os efeitos de uma política monetária
expansionista no mercado cambial em um sistema de taxas de câmbio flexíveis, como é ilustrado
na Figura 14.8.
Na figura, consideramos que as posições iniciais das curvas de oferta e de demanda por
moeda estrangeira sejam dadas por S me0 e D me0, respectivamente. A taxa de câmbio de
equilíbrio inicial, portanto, é p0, onde essas curvas se interceptam.
Agora, vamos examinar os efeitos de uma política monetária expansionista. Uma política
desse tipo reduzirá a taxa de juros interna e aumentará a renda e o nível de preços internos.
Como já foi discutido, a demanda por importações aumentará como resultado do aumento da
renda e do aumento do nível interno de preços. Além disso, a queda da taxa de juros interna
tornará os ativos domésticos menos atraentes e os investidores locais mudarão para ativos
estrangeiros. O aumento da demanda por bens importados e por ativos estrangeiros representa
um aumento na demanda por moeda estrangeira. Em termos da Figura 14.8, a curva de demanda
por moeda estrangeira desloca-se de Dme0 para Dme1 como resultado da política monetária
expansionista. Essa política também afetará a oferta de moeda estrangeira. A queda da taxa de
juros induzida pela política monetária fará com que os investidores estrangeiros comprem menos
ativos do país e o aumento do nível interno de preços reduzirá a demanda por exportações. A
curva de oferta de moeda estrangeira na Figura 14.8 desloca-se de Sme0 para Sme1.
Com uma taxa de câmbio flexível, o aumento na demanda e a queda na oferta farão a taxa de
câmbio subir. Quando a taxa de câmbio sobe, a quantidade de moeda estrangeira demandada
diminui e a quantidade de moeda estrangeira ofertada aumenta. Um novo equilíbrio será
atingido na taxa de câmbio π1, onde a demanda e a oferta de moeda estrangeira são novamente
iguais.
Vemos, então, que, em um sistema de taxas de câmbio flexíveis, uma política monetária
expansionista faz a taxa de câmbio subir (o valor da moeda nacional cair). A Figura 14.8
examina a ação de um país isolado. Aplicada ao comportamento dos principais países
industrializados no final da década de 1970, essa análise sugere que países que seguiram
políticas monetárias de maior acomodação e, portanto, mais expansionistas teriam feito suas
taxas de câmbio subirem (e suas moedas se depreciarem). Aqueles que acomodaram menos
teriam visto suas taxas de câmbio caírem (suas moedas serem apreciadas).
A elevação da taxa de câmbio americana no período de 1976-1980, medida em relação ao
preço do marco alemão (veja a Figura 14.6), pode ser atribuída a um grau mais alto de política
de acomodação da demanda agregada nos Estados Unidos em comparação com a Alemanha. A
queda no valor do dólar medida de uma forma mais geral em relação às moedas de outros
parceiros comerciais durante esse período indica que a política americana esteve entre as mais
expansionistas.

FIG 14.8 Efeito de uma política monetária expansionista no mercado cambial: taxas de câmbio
flexíveis
14.5.2 O dólar na década de 1980
A partir de 1981, o dólar inverteu seu curso e começou a subir fortemente em relação a outras
moedas importantes, como pode ser visto na Figura 14.7. Isso significa que a taxa de câmbio
caiu ao longo desse período, como pode ser observado na Figura 14.6. Entre 1980 e o pico do
valor do dólar no início de 1985, o marco caiu de um preço de 55 centavos de dólar (menos de 2
por dólar) para 31 centavos de dólar (mais de 3 por dólar), uma queda de 44%. Em relação à
média ponderada de moedas estrangeiras (veja a Figura 14.7), o dólar subiu 64%.
Como no caso da análise dos movimentos do dólar na década de 1970, diferentes políticas
macroeconômicas em vários países oferecem uma explicação para a elevação do valor do dólar
no início da década de 1980. Nessa época, a política importante foi a política monetária
fortemente restritiva nos Estados Unidos. A política monetária restritiva levaria a um aumento
do valor do dólar (queda da taxa de câmbio americana). A análise aqui é o inverso do caso
representado na Figura 14.8. As altas taxas de juros americanas aumentam a entrada líquida de
capital. Além disso, a política monetária restritiva reduz a renda, diminuindo, assim, as
importações. Por fim, outros fatores permanecendo constantes, uma política monetária mais
restritiva levaria a uma taxa de inflação interna mais baixa, o que também desestimularia as
importações e incentivaria as exportações.
Um fator adicional que pode ser importante para explicar a subida do valor do dólar,
especialmente perto de seu pico no início de 1985, foi a compra especulativa de ativos
financeiros americanos. Na Seção 14.2, foi comentado que a demanda por ativos estrangeiros
não depende do nível da taxa de câmbio. Se, por exemplo, a taxa de câmbio subisse de um nível
inicial para outro mais alto, digamos 10% mais alto, um ativo estrangeiro custaria 10% mais na
moeda local, mas os juros pagos sobre o ativo seriam 10% mais altos, também em termos da
moda local. O retorno percentual do ativo seria o mesmo em ambos os níveis da taxa de câmbio.
O que faz diferença para a demanda por ativos, porém, são mudanças esperadas na taxa de
câmbio. Se fosse esperada uma queda da taxa de câmbio americana (ou seja, que o valor do
dólar subisse), os investidores estrangeiros iam querer comprar ativos financeiros americanos
agora, antes da mudança do câmbio. Um investidor alemão, por exemplo, compraria ativos
financeiros americanos porque espera que o dólar suba em relação ao marco, o que lhe
permitiria vender os ativos mais tarde e receber mais marcos. Ao comprar dólares para adquirir
os ativos americanos, o investidor alemão estaria especulando quanto a uma elevação futura do
valor do dólar. Muitos acreditam que essa compra especulativa estava pressionando o valor do
dólar para cima em 1984-1985.
Em outubro de 1985, os ministros da Fazenda de cinco das maiores economias de mercado (o
chamado G5, ou grupo dos cinco) reuniram-se no Plaza Hotel, em Nova York.11 Na reunião,
concordaram em intervir conjuntamente no mercado de câmbio para baixar o valor do dólar. Os
bancos centrais desses países fariam isso vendendo dólares de suas reservas (comprando suas
próprias moedas nacionais) no mercado de câmbio e, dessa forma, aumentando a oferta de
dólares (reduzindo a oferta de moedas estrangeiras) e levando a uma queda no preço do dólar.
Outros fatores também estavam provocando uma redução no valor do dólar. Assim como a
compra especulativa de dólares havia contribuído para a elevação do valor da moeda, o receio de
uma intervenção do Banco Central e outros sinais de fraqueza fizeram com que a venda
especulativa começasse, em 1986, a contribuir para a queda do dólar. Além disso, quando a
expansão econômica americana desacelerou, a política monetária tornou-se menos restritiva e a
taxa de juros nos Estados Unidos caiu.
Em 1987, em relação à média ponderada de moedas estrangeiras (veja a Figura 14.7), o valor
do dólar havia caído 32% em comparação com seu pico em 1985. Em fevereiro, os ministros da
Fazenda reuniram-se novamente, dessa vez em Paris, e chegaram ao que foi chamado de Acordo
do Louvre. Eles decidiram que o dólar havia caído o suficiente. Concordaram em usar
intervenções no mercado de câmbio para tentar manter suas taxas de câmbio mais ou menos em
torno do valor em que estavam na época.

14.5.3 O dólar em anos recentes


Como pode ser visto na Figura 14.7, a década de 1990 não trouxe mais nenhuma oscilação
acentuada no valor do dólar. Talvez não seja surpresa que, durante esse período, tenha havido
menos pressão por mudanças no sistema de determinação da taxa de câmbio.
Em anos recentes, as questões referentes ao sistema monetário internacional centraram-se nos
desequilíbrios globais, especialmente nas contas correntes das maiores economias, e não na
instabilidade da taxa de câmbio. Alguns desses desequilíbrios de fato foram atribuídos a falta de
ajustes cambiais, o mais importante dos quais refere-se à taxa de câmbio entre o dólar americano
e o yuan chinês. Outros desequilíbrios surgiram dentro da zona do euro, onde, por haver uma só
moeda, não seria possível fazer ajustes cambiais. Voltamo-nos agora a essas questões.

PERSPECTIVAS 14.3 - O EURO


Vários países europeus participaram entre si de algum tipo de sistema de taxas de câmbio fixas desde 1979. Os detalhes do
sistema e o número de países participantes variaram ao longo do tempo.
Na década de 1980 e até janeiro de 1999, como foi o caso com o sistema Bretton Woods, as taxas de câmbio não foram
fixadas de forma permanente nos mecanismos cambiais europeus. Houve realinhamentos periódicos dos valores das
moedas quando as condições econômicas assim exigiam. Como o sistema Bretton Woods, essa prática causou problemas.
Quando os especuladores esperavam que o valor de uma moeda fosse reduzido, eles lançavam um ataque especulativo à
moeda, vendendo-a em enormes volumes. Esses ataques forçaram a saída da Itália e do Reino Unido do mecanismo
cambial então vigente em 1992.
O mecanismo cambial, com todos os seus problemas, foi um passo no plano da União Europeia (UE) para formar uma
união monetária completa. No Tratado de Maastricht, em 1991, os países da UE concordaram em passar, em estágios, para
um sistema com uma única moeda e um Banco Central europeu comum. Antes de esses passos serem dados, os países
tiveram de atender a um conjunto de diretrizes referentes a níveis de taxas de juros, taxas de inflação, déficits
orçamentários federais e dívida pública. A finalidade dessas diretrizes era obter uma convergência das políticas
macroeconômicas dos países antes de fixar irrevogavelmente os valores relativos de suas moeda, que é o que significa a
adoção de uma moeda comum. Em maio de 1998, os países decidiram adotar uma moeda única, o euro. A moeda foi
lançada em janeiro de 1999. Inicialmente, 11 membros da UE adotaram o euro (Alemanha, Holanda, Luxemburgo,
Bélgica, Finlândia, Espanha, Portugal, França, Irlanda, Itália e Áustria). Tendo satisfeito mais tarde as diretrizes de
Maastricht, a Grécia entrou no sistema em 2001. O Reino Unido, a Dinamarca e a Suécia, embora sejam membros da UE,
não adotaram o euro. Conforme a UE se expandiu posteriormente, novos membros – Eslovênia, Eslováquia, Estônia,
Malta e Chipre – atenderam os critérios e foram incorporados, aumentando o número de países na zona do euro para 17.
Desde 1999, as transações interbancárias passaram a ser conduzidas em euros e os clientes podiam abrir contas em euros.
A partir de janeiro de 2002, notas e moedas de euros substituíram as moedas nacionais anteriores. O Banco Central
europeu agora estabelece a política monetária para todos os países-membros. A Figura 14.9 mostra a taxa de câmbio do
euro em relação ao dólar.
Tecnicamente, o euro foi introduzido sem problemas e, em sua primeira década, até a crise financeira mundial de 2007-
2009, foi considerado, de modo geral, um sucesso. A crise, no entanto, aguçou alguns problemas antigos referentes à
competitividade relativa dos diferentes países dentro da união monetária e aos desequilíbrios relacionados em suas contas
correntes. Políticas fiscais diversas e os déficits orçamentários e níveis da dívida resultantes também surgiram como um
problema sério para a zona do euro em 2011, como será discutido em Perspectivas 14.4.

FIG 14.9 O euro em relação ao dólar

14.6 Desequilíbrios no comércio mundial


Dizem que a história é “apenas uma coisa após outra”, com algum adjetivo desagradável
associado a “coisa”. A história dos sistemas monetários internacionais certamente parece ser um
problema após outro. O sistema de taxas flutuantes foi uma resposta ao problema dos balanços
de pagamentos que existiu na era Bretton Woods. As duas primeiras décadas de taxas flutuantes
foram caracterizadas por uma preocupação com um alto grau de volatilidade da taxa de câmbio.
Na última década, o problema que recebeu mais atenção foram os crescentes desequilíbrios
comerciais entre os principais países industrializados.

Tabela 14.3 - Superávit (+) ou déficit (-) de conta corrente como porcentagem do PIB, 2006,
2011

2006 2011
China 8,1 3,9
Japão 4,0 2,3
Alemanha 4,9 5,0
Estados Unidos -6,1 -3,2
Reino Unido -3,0 -1,9
Suíça 15,9 12,2
Holanda 7,6 7,3
Espanha -8,8 -3,8
Arábia Saudita 20,1 25,5
Taiwan 6,7 8,4
Malásia 13,5 10,4
Cingapura 23,3 17,7
Austrália -5,5 -2,2

Os desequilíbrios comerciais aparecem nos superávits e déficits de conta corrente de várias


grandes economias. Já examinamos o crescente déficit de conta corrente dos Estados Unidos. A
Tabela 14.3 mostra os saldos de conta corrente de alguns outros países também.
Vamos começar examinando a primeira coluna. Voltaremos à segunda coluna mais adiante
nesta seção. As cinco primeiras linhas dessa coluna mostram o superávit e déficit de conta
corrente em 2006 para as economias com o maior volume de comércio exterior. O déficit
americano e o superávit chinês destacam-se. O Japão e a Alemanha têm grandes superávits e o
Reino Unido tem um déficit relativamente grande. Note-se que o tamanho da economia
americana faz com que seu déficit supere os superávits combinados de China, Japão e Alemanha
em mais de US$ 200 bilhões. Assim sendo, o foco da atenção no déficit de conta corrente dos
Estados Unidos como um fator central para os desequilíbrios mundiais não é equivocado.
O grande superávit de conta corrente da Arábia Saudita reflete o alto preço do petróleo.
Alguns outros produtores de petróleo também têm grandes superávits. Como pode ser visto na
tabela, outros países asiáticos além de China e Japão também têm superávits de conta corrente
significativos.

14.6.1 Implicação de algumas identidades


Assim, há grandes desequilíbrios de conta corrente em várias economias, incluindo as
nações líderes do comércio internacional. O que devemos entender disso? Algumas identidades
podem nos ajudar aqui.
Primeiro, se somarmos as balanças comerciais de todas as nações, desconsiderando
imprecisões na conta, encontraremos que o saldo comercial se equilibra. Superávits em alguns
países devem ser equilibrados por déficits em outros. Onde, então, devemos procurar as causas
dos desequilíbrios? As políticas econômicas americanas são a causa de seus déficits de conta
corrente? Ou as políticas chinesas e japonesas são a causa de seus superávits, que devem se
refletir em déficits em outras partes do mundo?
Uma segunda identidade envolvendo a conta corrente pode ser percebida voltando à Tabela
14.1. Partindo do fato de que o saldo final dos balanços de pagamentos deve se equilibrar (todos
os gastos são financiados de alguma maneira), podemos escrever

Se ignorarmos a discrepância estatística, a soma do saldo de conta corrente (CO) mais o saldo
da balança de capitais (privados) (CA) mais o saldo de transações de reservas oficiais
(intervenções de bancos centrais, TRO) deve ser zero. A equação (14.2) indica que, por exemplo,
um país com um grande superávit de conta corrente deve ter ou uma grande saída líquida de
capitais privados ou um grande aumento nos ativos de reservas como resultado de intervenção
do Banco Central no mercado de câmbio.
Uma terceira identidade também é útil. A partir da nossa discussão das contas nacionais no
Capítulo 2, podemos escrever a seguinte relação:

onde, conforme definido anteriormente, C = consumo, S = poupança, T = impostos, Y = PIB,


I = investimento, G = gastos governamentais, X = exportações e Z = importações. Reagrupando
e cancelando os Cs, temos

O lado esquerdo da equação (14.4) pode ser entendido em relação a um país como seu saldo
poupança-investimento: poupança líquida privada (S - I) mais poupança governamental (T – G),
com o superávit no orçamento governamental medindo a poupança do setor público. Esse saldo
poupança-investimento é compensado pela balança comercial. Por exemplo, países com grande
déficit de conta corrente, como os Estados Unidos, têm investimento maior que poupança. Esse
excedente de investimento é financiado pelas entradas de capital que devem acompanhar o
déficit de conta corrente. A situação é inversa na China, Japão, Alemanha, Malásia, Cingapura e
Arábia Saudita.

14.6.2 Causas e efeitos dos desequilíbrios no comércio internacional


As identidades (14.2) e (14.4) dizem-nos várias coisas sobre a situação atual do comércio
mundial. Como foi mostrado, por uma perspectiva global o déficit de conta corrente dos Estados
Unidos é muito alto. Pelas equações (14.2) e (14.4), podemos ver que os Estados Unidos
poupam menos do que investem. Os fundos para o investimento maior que a poupança
doméstica são proporcionados por uma entrada de capital, tanto privado (CA) como resultante de
intervenção de bancos centrais estrangeiros (TRO). A situação atual pode ser entendida como
resultado de muito pouca poupança nos Estados Unidos.
Mas, alternativamente, pode-se entender a fonte dos desequilíbrios como um excesso de
poupança global, um termo usado pelo presidente do Federal Reserve, Ben Bernanke.12 Países
como China e Japão têm saídas de capital que equilibram seus superávits de conta corrente
(equação 14.2). Estas refletem uma poupança mais alta do que o investimento doméstico. O
mesmo se aplica a nações produtoras de petróleo como a Arábia Saudita, que tiveram uma
abundância de receitas do petróleo que ainda não foram investidas domesticamente.
Uma perspectiva global ajuda-nos a interpretar os desequilíbrios atuais do comércio
internacional, mas não nos leva muito longe na identificação de suas causas e avaliação de suas
consequências. As identidades nesta seção e a análise nas seções anteriores do capítulo sugerem
a importância das políticas macroeconômicas dos países. Exemplos são a taxa de câmbio fixa
dólar-yuan adotada pela China para estimular o crescimento por meio de exportações e os cortes
de impostos nos Estados Unidos em 2001 e 2003 para apoiar um boom de consumo. Também
não é respondida a questão das consequências. Como os desequilíbrios globais indicados na
Tabela 14.3 relacionam-se à crise financeira de 2007-2009? Se os desequilíbrios forem resultado
de políticas macroeconômicas dos países representados na tabela, perguntar sobre o seu papel é
perguntar sobre o papel das políticas macroeconômicas na recente crise. Essa questão deve
aguardar nosso exame mais detalhado das políticas monetária e fiscal nos capítulos da Parte V.
Um último ponto a observar antes de prosseguir é que a crise financeira e a recessão profunda
que se seguiu na verdade reduziram o tamanho dos desequilíbrios de conta corrente das maiores
economias. Isso pode ser visto na segunda coluna da Tabela 14.3, que mostra os saldos de conta
corrente para 2011. O déficit de conta corrente americano e o superávit comercial chinês foram
reduzidos mais ou menos pela metade entre 2006 e 2011. O tamanho dos desequilíbrios de conta
corrente do Japão e do Reino Unido também diminuiu. Conforme a recuperação prossegue, o
cenário favorável é que seja atingido um novo equilíbrio em que esses desequilíbrios não
retornem a seus níveis de antes da crise. Isso também dependerá das escolhas de políticas dessas
economias.

PERSPECTIVAS 14.4: A CRISE DA DÍVIDA SOBERANA NA ZONA DO


EURO
Na esteira da crise financeira mundial e da recessão subsequente, os países da zona do euro viram-se em uma crise da
dívida soberana que ameaçou a existência da moeda comum. A crise exacerbou e trouxe para o primeiro plano uma série
de problemas e desequilíbrios antigos dentro da zona do euro. Embora apenas um dos aspectos da situação, os problemas
da dívida soberana de vários membros foram o ponto focal da crise. Houve uma perda de confiança na disposição e na
capacidade de alguns países membros de servir e pagar sua dívida soberana (governamental). Toda a dívida soberana da
zona do euro é denominada na moeda comum. Assim, a perda de confiança em um país levou a um contágio para os
outros e a receios de que todo o sistema monetário pudesse desabar.
A Tabela 14.4 mostra as taxas de juros de títulos de 10 anos emitidos por cinco países da zona do euro em 2007 e em
2011. Em 2007, todos os spreads das taxas de juros eram menores que 30 pontos-base. (100 pontos-base = 1%) Para os
investidores, um título de 10 anos italiano ou grego era visto como quase tão seguro quanto um título alemão. Afinal,
todos eles eram promessas de pagamento em euros. Mas será que as promessas seriam mantidas? No final de 2011, como
a tabela mostra, o risco de não pagamento dos títulos italianos e espanhóis havia feito os spreads subirem para várias
centenas de pontos-base e a Grécia ficou, efetivamente, fora do mercado. A recessão de 2007-2009 havia criado
dificuldades para as finanças de todos os principais países industrializados, com a queda da receita tributária e o aumento
dos gastos do governo com pagamentos de transferências de renda e programas para estimular a economia. Vários países
da zona do euro enfrentaram problemas financeiros, especialmente graves. Isso, em parte, deveu-se diretamente à sua
participação na zona do euro. Seus títulos eram denominados em euros e não em suas próprias moedas, que haviam
deixado de existir (lira, dracma, etc.) Eles não podiam emitir moeda para pagar a dívida e os mercados sabiam disso. A
política monetária era conduzida pelo Banco Central europeu – uma só para todos. Assim, a política monetária não podia
ser usada para estimular suas economias como esses países desejassem.
Problemas mais básicos haviam sido expostos pela crise financeira e a recessão. Grécia, Itália e Espanha vinham
enfrentando grandes déficits de conta corrente por boa parte da década antes da crise financeira. Isso era resultado de uma
perda de competitividade por esses países devido à elevação de seus custos unitários de mão de obra em comparação com
a Alemanha, em particular. No caso mais extremo, os custos unitários de mão de obra haviam subido cerca de 30% mais
na Grécia que na Alemanha. Antes da instituição da moeda comum, a Itália ou a Grécia teriam desvalorizado sua moeda
(aumentado a taxa de câmbio) para restaurar a competitividade. Com a moeda comum, essa via de ajuste não existia mais.
Em desvantagem em termos de competitividade e pressionadas por uma alta relação dívida/PIB (150% do PIB para a
Grécia, 120% para a Itália), essas economias, assim como Irlanda e Portugal, pareciam um risco de crédito muito elevado
para os investidores mundiais. A partir de 2010, os países da zona do euro em conjunto começaram a procurar soluções
para a dívida soberana e para problemas de longo prazo mais profundos do grupo. Há muito em jogo, já que os custos
econômicos e políticos de uma dissolução da zona do euro seriam grandes, tanto para os próprios países membros como
para a economia mundial.

Tabela 14.4 - Taxas de juros de títulos governamentais de 10 anos, países selecionados

Março 2007 Novembro 2011


Alemanha 3,83 1,73
França 3,88 4,37
Itália 4,07 7,51
Espanha 3,89 5,80
Grécia 4,09 27,95

Conclusão
Este capítulo tratou da determinação das taxas de câmbio e de tema relacionado do
estabelecimento do sistema monetário internacional. Uma questão crítica nessa área é o grau
ótimo de flexibilidade na determinação da taxa de câmbio. O colapso do sistema Bretton Woods
levou a um período de flutuação administrada para a maior parte das moedas.
O valor do dólar americano esteve bastante instável durante o período de taxas de câmbio
flutuantes. Nos períodos de variações acentuadas no valor da moeda, houve defesas de
mudanças no sistema monetário internacional para proporcionar mais estabilidade às taxas de
câmbio.
Como vimos, porém, as oscilações no valor do dólar em relação a outras moedas nacionais
são devidas, em grande parte, a divergências nas políticas fiscais e monetárias domésticas
adotadas pelos países. Uma maior estabilidade cambial provavelmente exigiria maior
coordenação das políticas macroeconômicas nacionais. Há muitos obstáculos para uma
coordenação internacional eficaz das políticas, entre eles as diferentes preferências dos
formuladores de políticas e as diferentes estruturas industriais das principais economias do
mundo. O câmbio flutuante libera os países da necessidade de coordenar políticas, mas ao custo
de taxas de câmbio altamente voláteis.
Em anos recentes, os crescentes desequilíbrios de conta corrente nas principais economias do
mundo também levaram a que se sentisse a necessidade de uma maior coordenação das políticas
econômicas. Em 2006, o FMI estabeleceu um mecanismo de consulta pelo qual países
deficitários e superavitários discutiriam possíveis maneiras de reduzir os desequilíbrios. Houve
uma redução do tamanho desses desequilíbrios de conta corrente durante a recessão de 2007-
2009. Ainda assim, o problema persiste para as principais economias desenvolvidas em geral e,
em especial, na Europa.

Questões de revisão
1. Por que o balanço de pagamentos sempre se equilibra?
2. Explique como a taxa de câmbio de um país é determinada no caso de:
a. um sistema de taxas de câmbio fixas.
b. um sistema de taxas de câmbio flexíveis.
c. uma flutuação administrada, ou “suja”.
3. Analise os efeitos de uma queda autônoma na demanda pelos produtos de exportação de um
país dentro dos sistemas de taxas de câmbio fixas e flexíveis. Em cada caso, indique os
efeitos sobre o balanço de pagamentos do país e sobre a taxa de câmbio.
4. Se os bancos centrais nunca interviessem em mercados de câmbio, poderia haver déficits ou
superávits no balanço de pagamentos de um país? Explique.
5. Descreva o sistema Bretton Woods de determinação das taxas de câmbio que foi estabelecido
no final da Segunda Guerra Mundial e durou até 1973.
6. Explique a relação entre a balança comercial e o nível de atividade econômica em um
sistema de taxas de câmbio fixas. Por que essa relação cria um conflito potencial entre as
metas de equilíbrio interno e externo?
7. Levando em conta o efeito sobre a balança comercial e sobre a balança de capitais, explique
as relações entre equilíbrio do balanço de pagamentos e políticas monetárias e fiscais
expansionistas dentro de um sistema de taxas de câmbio fixas.
8. “A adoção de um sistema de taxas de câmbio flexíveis liberaria as políticas fiscal e
monetária para que fossem usadas para alcançar metas internas de pleno emprego e
estabilidade de preços.” Você concorda ou discorda dessa afirmação? Explique.
9. Quais são algumas das vantagens ou desvantagens relativas de taxas de câmbio fixas e
flexíveis?
10. Ilustre graficamente os efeitos no mercado de câmbio de uma política monetária
expansionista adotada pelo país estrangeiro em nosso modelo de dois países. Considere os
casos de taxas de câmbio fixas e de taxas de câmbio flexíveis.
11. Suponha que você observe que um país tem um grande superávit de conta corrente. Desse
fato, é possível determinar se
a. o país tem superávit ou déficit no balanço de pagamentos?
b. o país tem superávit ou déficit em sua balança de capitais?
12. Às vezes, o déficit de conta corrente de um país e o déficit do orçamento federal do país são
chamados de déficits “gêmeos” porque movem-se praticamente juntos na mesma direção.
Apoiando-se na análise da Seção 14.6 (em especial a equação 14.4), explique por que seria
esperado que esses dois déficits caminhassem juntos em algumas ocasiões. Por que isso
poderia não acontecer em outras ocasiões?
CAPÍTULO 15
Políticas monetária e fiscal em economia aberta

Economias que são abertas, como todas as economias são em certa medida, têm comércio e
fluxos de capitais com outras economias. Neste capítulo, vamos examinar as políticas fiscal e
monetária em um modelo de economia aberta. Como os efeitos de ações de políticas diferem na
economia aberta em relação à economia fechada? Como eles diferem com taxas de câmbio fixas
ou flexíveis? Vamos examinar conflitos que surgem entre os equilíbrios interno e externo em um
sistema de taxas de câmbio fixas, conforme discutido no Capítulo 14. Ilustraremos por que esses
conflitos não aparecem quando as taxas de câmbio são flexíveis.
Há vários modelos macroeconômicos de economia aberta. O usado aqui é o modelo Mundell-
Fleming, uma referência básica para a macroeconomia de economia aberta.1 O modelo é
explicado na Seção 15.1. Depois, nas Seções 15.2 e 15.3, examinamos os efeitos de mudanças
em políticas econômicas e outras variáveis sob dois pressupostos diferentes sobre a mobilidade
de capitais entre países.

15.1 O modelo Mundell-Fleming


O modelo Mundell-Fleming é uma versão de economia aberta do modelo IS-LM examinado
nos Capítulos 6 e 7. O modelo IS-LM de economia fechada consiste nas duas equações a seguir:

A equação (15.1) é o equilíbrio do mercado monetário (curva LM) e a equação (15.2) é o


equilíbrio do mercado de bens (curva IS). O modelo determina simultaneamente a taxa de juros
nominal (r) e o nível de renda real (Y), com o nível agregado de preços mantido constante. Que
mudanças serão necessárias para analisar uma economia aberta?
Quando consideramos uma economia aberta, a curva LM não muda. A equação (15.1) diz que
a oferta de moeda real, que consideramos ser controlada pelo formulador de políticas nacional,
precisa, no equilíbrio, ser igual à demanda real por moeda. É a oferta de moeda nominal que o
formulador de políticas controla de fato, mas, com a premissa de um nível de preços fixo,
mudanças na oferta de moeda nominal são mudanças na oferta de moeda real também.
A equação da curva IS (15.2) é derivada da condição de equilíbrio do mercado de bens para
uma economia fechada:

que, quando subtraímos C de ambos os lados, reduz-se a


Se acrescentarmos importações (Z) e exportações (X) ao modelo, a equação (15.3) é
substituída por2

e a equação IS torna-se

onde (X - Z), as exportações líquidas, é a contribuição do setor externo para a demanda


agregada. Se trouxermos as importações para o lado esquerdo e indicarmos as variáveis de que
cada elemento da equação depende, a equação IS da economia aberta pode ser escrita como

Poupança e investimento são os mesmos que no modelo de economia fechada. As


importações, como discutido no Capítulo 14, dependem positivamente da renda. As importações
também dependem negativamente da taxa de câmbio (π). E, também como no Capítulo 14,
estamos definindo a taxa de câmbio como o preço da moeda estrangeira – por exemplo,
quantidade de dólares americanos por euro. Uma elevação da taxa de câmbio, portanto, tornará
os bens estrangeiros mais caros e causará uma queda nas importações. As exportações
domésticas são as importações dos outros países e, assim, dependem positivamente da renda
externa e da taxa de câmbio. Esta última relação se dá porque uma elevação da taxa de câmbio
baixa o custo das mercadorias em moeda doméstica em relação à moeda estrangeira e faz com
que os bens domésticos fiquem mais baratos para os residentes no exterior.
Por uma derivação análoga à do Capítulo 6, é possível demonstrar que a curva IS para a
economia aberta tem inclinação negativa, como é representado na Figura 15.1. Valores altos da
taxa de juros resultarão em níveis baixos de investimento. Para satisfazer a equação (15.7),
nesses níveis altos da taxa de juros a renda precisa ser baixa para que os níveis de importações e
poupança também sejam baixos. Alternativamente, com níveis baixos da taxa de juros, o que
resulta em níveis altos de investimento, o equilíbrio do mercado de bens requer que a poupança
e as importações sejam altas; portanto, Y precisa ser alto.
Ao construir a curva IS da economia aberta na Figura 15.1, mantivemos constantes quatro
variáveis: impostos, gastos governamentais, renda externa e taxa de câmbio. Essas são variáveis
que deslocam a curva. Choques expansionistas, como um aumento nos gastos do governo, um
corte nos impostos, um aumento da renda externa ou uma elevação da taxa de câmbio, deslocam
a curva para a direita. Um aumento da renda externa é expansionista porque aumenta a demanda
por bens de exportação do país em questão. Uma elevação da taxa de câmbio é expansionista
porque aumenta as exportações e porque reduz as importações para um nível dado de renda;
desloca a demanda de produtos estrangeiros para produtos nacionais. Uma queda autônoma da
demanda por importações é expansionista pela mesma razão. Mudanças na direção oposta nessas
variáveis deslocam a curva IS para a esquerda.

FIG 15.1 Modelo IS-LM para economia aberta


A curva LM mostra as combinações de r e Y que são pontos de equilíbrio para o mercado monetário e a curva IS mostra as
combinações de r e Y que equilibram o mercado de bens. A curva BP mostra as combinações de r e Y que igualam a oferta e a
demanda no mercado de câmbio a uma dada taxa de câmbio.

Além das curvas IS e LM, nosso modelo de economia aberta contém uma curva de equilíbrio
do balanço de pagamentos, a curva BP na Figura 15.1. Essa curva mostra todas as combinações
taxa de juros/renda que resultam em equilíbrio do balanço de pagamentos a uma dada taxa de
câmbio. Equilíbrio do balanço de pagamentos significa que variação das reservas oficiais é zero.
A equação para a curva BP pode ser escrita como

Os dois primeiros termos da equação (15.8) constituem a balança comercial (exportações


líquidas). O terceiro item (F) é a entrada líquida de capitais (o superávit ou déficit na balança de
capitais autônomos no balanço de pagamentos. A entrada líquida de capitais depende
positivamente da taxa de juros interna menos a taxa de juros externa (r - rx), como discutido no
Capítulo 14. Uma elevação da taxa de juros interna em relação à taxa de juros externa leva a um
aumento na demanda por ativos financeiros domésticos (por ex., títulos) em lugar de ativos
estrangeiros; a entrada líquida de capitais no país aumenta. Uma elevação da taxa de juros
externa tem o efeito oposto. Considera-se que a taxa de juros externa seja exógena.3
A curva BP tem inclinação positiva, como é mostrado na Figura 15.1. Quando a renda sobe, a
demanda por importações aumenta, mas não a demanda por exportações. Para manter o
equilíbrio do balanço de pagamentos, a entrada de capitais precisa aumentar, o que acontecerá se
a taxa de juros for mais alta. Agora, consideremos os fatores que deslocam a curva BP. Um
aumento em π deslocará a curva horizontalmente para a direita. Para um dado nível da taxa de
juros, que determina o fluxo de capitais, uma taxa de câmbio mais alta exigirá um nível mais
alto de renda para equilibrar o balanço de pagamentos. Isso acontece porque a taxa de câmbio
mais alta incentiva as exportações e desestimula as importações; assim, um nível mais alto de
renda que estimule a demanda por importações é necessário para o equilíbrio do balanço de
pagamentos. Similarmente, um aumento exógeno da demanda por exportações (devido a um
aumento de Yx) ou uma queda na demanda por importações deslocará a curva BP para a direita.
Se as exportações aumentarem – por exemplo, a uma dada taxa de juros que, novamente,
determina o fluxo de capitais –, um nível mais alto de renda e, portanto, de importações é
necessário para restaurar o equilíbrio do balanço de pagamentos. A curva BP desloca-se para a
direita. Uma queda na taxa de juros externa também deslocaria a curva BP para a direita; para
uma dada taxa de juros interna (r), a queda da taxa de juros externa aumenta a entrada de
capitais. Para o equilíbrio no balanço de pagamentos, as importações e, portanto, a renda
precisam ser mais altas.
Antes de analisarmos os efeitos de várias mudanças de política econômica, há uma
observação a fazer quanto à curva BP. A curva BP terá inclinação positiva no caso de
mobilidade imperfeita de capitais. Nesse caso, ativos domésticos e estrangeiros (por exemplo,
títulos) são substitutos, mas não perfeitos. Se os ativos domésticos e estrangeiros fossem
substitutos perfeitos, uma situação chamada mobilidade perfeita de capitais, os investidores se
moveriam de forma a igualar as taxas de juros entre os países. Se um tipo de ativo tivesse uma
taxa de juros ligeiramente maior por algum tempo, os investidores mudariam para esse ativo até
que sua taxa fosse levada para baixo a fim de restaurar a igualdade.
No contexto de nosso modelo, a mobilidade perfeita de capitais implica que r = rx. Veremos
adiante que essa igualdade resulta em uma curva BP horizontal. Se os ativos não forem
substitutos perfeitos, suas taxas de juros não precisam ser iguais. Entre os fatores que poderiam
fazer dos ativos de países estrangeiros substitutos não-perfeitos para ativos domésticos estão o
diferencial de risco dos ativos de diferentes países, riscos devidos a mudanças nas taxas de
câmbio, custos de transações e falta de informações sobre características específicas dos ativos
estrangeiros. Na Seção 15.2, vamos considerar que esses fatores sejam suficientes para fazer
com que ativos estrangeiros e domésticos sejam substitutos não-perfeitos. O caso da mobilidade
perfeita de capitais é examinado na Seção 15.3.

15.2 Mobilidade imperfeita de capitais


Para examinar as políticas monetária e fiscal em uma situação de mobilidade imperfeita de
capitais, vamos começar pelo caso de taxas de câmbio fixas.

15.2.1 Políticas econômicas com taxas de câmbio fixas


15.2.1.1 Política monetária
Consideremos os efeitos de um aumento na oferta de moeda de M0 para M1, como é mostrado
na Figura 15.2. O aumento na oferta de moeda desloca a curva LM para a direita, de LM(M0)
para LM(M1). O ponto de equilíbrio desloca-se de E0 para E1 com uma queda na taxa de juros de
r0 para r1 e um aumento na renda de Y0 para Y1. O que aconteceu com o balanço de pagamentos?
Primeiro, note que todos os pontos abaixo da curva BP são pontos de déficit no balanço de
pagamentos, enquanto todos os pontos acima da curva são pontos de superávit. Quando nos
movemos de um ponto de equilíbrio na curva BP para pontos abaixo da curva – por exemplo,
aumentando a renda ou reduzindo a taxa de juros ou ambos –, estamos causando um déficit no
balanço de pagamentos. Consequentemente, quando nos movemos do ponto E0 para o ponto E1
após o aumento da oferta de moeda, o balanço de pagamentos entra em déficit. Como foi
discutido na Seção 14.4, a política monetária expansionista aumenta a renda, o que estimula as
importações e reduz a taxa de juros, causando uma saída de capitais (F diminui).

FIG 15.2 Política monetária com taxa de câmbio fixa

Um aumento na quantidade de moeda desloca a curva LM de LM(M0) para LM(M1). O ponto de equilíbrio desloca-se de E0 para
E1. A taxa de juros cai e o nível de renda sobe. O novo ponto de equilíbrio está abaixo da curva BP, indicando um déficit no
balanço de pagamentos.

O fato de que, partindo de um ponto de equilíbrio, uma política monetária expansionista leva
a um déficit no balanço de pagamentos cria conflitos potenciais entre metas internas e equilíbrio
externo. Se no ponto E0 na Figura 15.2 o nível de renda, Y0, for baixo em relação ao pleno
emprego, então o movimento para o ponto E1 e para o nível de renda Y1 pode ser preferível por
razões internas. Mas, no ponto E1, haverá um déficit no balanço de pagamentos e, com reservas
limitadas de moeda estrangeira, tal situação não pode ser mantida indefinidamente.

15.2.1.2 Política fiscal


Os efeitos de um aumento nos gastos do governo de G0 para G1 para o caso de taxas de
câmbio fixas são ilustrados na Figura 15.3. O aumento nos gastos do governo desloca a curva IS
para a direita de IS(G0) para IS(G1), movendo o ponto de equilíbrio de E0 para E1. A renda
aumenta de Y0 para Y1 e a taxa de juros sobe de r0 para r1. Como é mostrado na Figura 15.3, no
novo ponto de equilíbrio estamos acima da curva BP; há um superávit no balanço de
pagamentos. Obtemos esse resultado porque, na Figura 15.3, a curva BP é menos inclinada do
que a curva LM. Se, alternativamente, a curva BP fosse mais inclinada do que a curva LM, uma
ação de política fiscal expansionista levaria a um déficit no balanço de pagamentos, como é
mostrado na Figura 15.4.
FIG 15.3 Política fiscal com taxa de câmbio fixa

Um aumento nos gastos do governo desloca a curva IS de IS(G0) para IS(G1). O ponto de equilíbrio passa de E0 para E1. A
renda e a taxa de juros aumentam. O novo ponto de equilíbrio está acima da curva BP, o que indica que, com uma taxa de câmbio
fixa para o caso em que a curva BP é mais plana do que a curva LM, a política fiscal expansionista resulta em superávit no
balanço de pagamentos.

A curva BP será mais inclinada quanto menos os fluxos de capitais forem sensíveis à taxa de
juros. Quanto menor o aumento da entrada de capitais para um dado aumento da taxa de juros
(dado o valor fixo de rx), maior será o aumento da taxa de juros necessário para manter o
equilíbrio do balanço de pagamentos quando passamos para um nível de renda (e, portanto, de
importações) mais alto; ou seja, a curva BP será mais inclinada. A curva BP também será mais
inclinada quanto maior for a propensão marginal a importar. Com uma propensão marginal a
importar mais alta, um dado aumento na renda produzirá um aumento maior nas importações.
Para alcançar o equilíbrio no balanço de pagamentos, será necessário um aumento
compensatório maior da entrada de capitais e, consequentemente, um aumento maior da taxa de
juros.
A ação de política fiscal expansionista representada nas Figuras 15.3 e 15.4 faz a renda
aumentar, o que leva a uma deterioração da balança comercial e faz a taxa de juros subir,
resultando em uma melhora da balança de capitais. A discussão até aqui indica que quanto mais
inclinada for a curva BP, maior é o efeito desfavorável sobre as importações e a balança
comercial e menor é o efeito favorável sobre os fluxos de capitais. Portanto, quanto mais
inclinada for a curva BP, mais se torna provável que uma ação de política fiscal expansionista
leve a um déficit no balanço de pagamentos.
Por fim, observe que a inclinação da curva BP em relação à inclinação da curva LM
determina se uma ação de política fiscal expansionista resultará em superávit ou déficit no
balanço de pagamentos. Dada a inclinação da curva BP, quanto mais inclinada for a curva LM,
mais provável será que ela seja mais inclinada do que a curva BP, a condição para um superávit
como resultado de uma ação de política fiscal expansionista. Isso acontece porque, outros fatores
sendo iguais, quanto mais inclinada for a curva LM, maior será o aumento da taxa de juros (que
produz a entrada de capitais favorável) e menor será o aumento da renda (que produz o efeito
desfavorável sobre a balança comercial).

FIG 15.4 Política fiscal com taxa de câmbio fixa: um resultado alternativo

Como na Figura 15.3, um aumento nos gastos do governo desloca a curva IS para a direita, aumentando tanto a renda como a taxa
de juros. Neste caso, em que a curva BP é mais inclinada do que a curva LM, o novo ponto de equilíbrio (E1) está abaixo da
curva BP. A política fiscal expansionista resulta em um déficit no balanço de pagamentos.

15.2.2 Políticas econômicas com taxas de câmbio flexíveis


15.2.2.1 Política monetária
Vamos examinar agora o caso em que a taxa de câmbio é completamente flexível; não há
intervenção do Banco Central. A taxa de câmbio ajusta-se de forma a igualar a oferta e a
demanda no mercado cambial. Vejamos primeiro a mesma ação de política monetária analisada
anteriormente, um aumento na quantidade de moeda de M0 para M1. Os efeitos dessa ação de
política monetária expansionista no caso de taxas de câmbio flexíveis são mostrados na Figura
15.5.
O efeito inicial do aumento da oferta de moeda – o efeito antes de um ajuste na taxa de
câmbio – é o deslocamento da economia do ponto E0 para o ponto E1. A taxa de juros cai de r0
para r1. A renda sobe de Y0 para Y1 e nós passamos para um ponto abaixo da curva BP em que
há um déficit incipiente no balanço de pagamentos. Em um sistema de taxas de câmbio flexíveis,
a taxa de câmbio subirá (de π0 para π1) de forma a equilibrar o mercado cambial. (Este é o ajuste
mostrado anteriormente na Figura 14.8.) A elevação da taxa de câmbio deslocará a curva BP
para a direita; na Figura 15.5, a curva passa de BP(π0) para BP(π1). A elevação da taxa de
câmbio também faz a curva IS deslocar-se para a direita, de IS (π0) para IS (π1) na Figura 15.5,
porque as exportações sobem e as importações caem com um aumento da taxa de câmbio. O
novo equilíbrio é mostrado no ponto E2, com a taxa de juros em r2 e a renda em Y2. O ajuste da
taxa de câmbio reequilibra o balanço de pagamentos depois da política monetária expansionista
e elimina o conflito potencial entre equilíbrio interno e externo.

FIG 15.5 Política monetária com taxas de câmbio flexíveis

Um aumento na oferta de moeda desloca a curva LM para a direita, movendo o ponto de equilíbrio de E0 para E1. O ponto E1
está abaixo da curva BP, onde há um déficit incipiente no balanço de pagamentos. No caso de taxas de câmbio flexíveis, a taxa de
câmbio subirá, fazendo a curva BP deslocar-se para a direita, de BP(π0) para BP(π1), e a curva IS deslocar-se para a direita, de IS
(π0) para IS (π1). O ponto de equilíbrio final é em E2, com um nível de renda Y2, acima de Y1, que é o novo equilíbrio para uma
taxa de câmbio fixa.

Observe que a elevação da renda como resultado da ação de política monetária expansionista
é maior no caso de taxas flexíveis do que com taxas fixas. No caso de taxas de câmbio fixas, a
renda subiria apenas para Y1 na Figura 15.5 ou na Figura 15.2. Com taxas de câmbio flexíveis, a
elevação da taxa de câmbio estimulará ainda mais a renda por aumentar as exportações e reduzir
a demanda por importações (para um dado nível de renda). A política monetária é, portanto, um
instrumento de estabilização mais potente em um regime de taxas de câmbio flexíveis do que em
um regime de taxas fixas.
15.2.2.2 Política fiscal

FIG 15.6 Política fiscal com taxas de câmbio flexíveis

Um aumento nos gastos do governo desloca a curva IS para a direita, de IS(G0, π0) para IS(G1, π0), movendo o ponto de
equilíbrio de E0 para E1. Com a curva BP menos inclinada do que a curva LM, E1 está acima da curva BP inicial, BP(T0). Há um
superávit incipiente no balanço de pagamentos e a taxa de câmbio cairá, deslocando a curva BP para a esquerda, para BP(T1), e
deslocando a curva IS para a esquerda, de IS(G1, π0) para IS(G1, π1). O equilíbrio final estará em E2, com o nível de renda Y2,
abaixo de Y1, o novo equilíbrio para o caso de uma taxa de câmbio fixa.

A Figura 15.6 ilustra os efeitos de um aumento nos gastos do governo de G0 para G1 com
taxas de câmbio flexíveis. O efeito inicial – ou seja, o efeito anterior ao ajuste da taxa de câmbio
– é o deslocamento da curva IS de IS(G0, π0) para IS(G1, π0) e a movimentação da economia de
E0 para E1. A taxa de juros sobe (de r0 para r1) e a renda aumenta (de Y0 para Y1). Com a
inclinação das curvas BP e LM conforme desenhadas na Figura 15.6 (com a curva BP menos
inclinada do que a curva LM), um superávit incipiente no balanço de pagamentos resulta dessa
ação de política expansionista. Nesse caso, a taxa de câmbio deve cair (de π0 para π1) para
equilibrar o mercado cambial. Uma queda na taxa de câmbio deslocará a curva BP para a
esquerda na Figura 15.6, de BP(π0) para BP(π0). A curva IS também será deslocada para a
esquerda, de IS (G1, π0) para IS(G1, π1), uma vez que a redução da taxa de câmbio diminuirá as
exportações e estimulará as importações. O ajuste da taxa de câmbio compensará parcialmente o
efeito expansionista da ação de política fiscal. O novo ponto de equilíbrio será em Y2, que está
acima de Y0 mas abaixo de Y1, o nível que teria resultado no caso de taxas de câmbio fixas.
Não há, porém, uma relação definida entre a força da política fiscal e o tipo de regime de
taxas de câmbio, como há no caso da política monetária. Se a curva BP for mais inclinada do
que a curva LM, como na Figura 15.4, uma política fiscal expansionista, para uma dada taxa de
câmbio, causará um déficit no balanço de pagamentos. Com um déficit incipiente no balanço de
pagamentos no regime de taxas flexíveis, a taxa de câmbio precisa subir para restaurar o
equilíbrio no mercado cambial. A curva BP e a curva IS deslocam-se para a direita e reforçam o
efeito de expansão inicial do aumento nos gastos do governo. Nesse caso, a ação de política
fiscal expansionista tem um efeito maior sobre a renda do que teria no caso de taxas de câmbio
fixas.
Embora esse resultado alternativo seja possível em teoria, a maioria dos economistas acredita
que o resultado da Figura 15.6 é mais provável. Eles acham que uma política fiscal
expansionista baixará a taxa de câmbio (elevará o valor da moeda doméstica em relação às
outras moedas). Essa opinião decorre da ideia de que há um grau relativamente alto de
mobilidade de capitais internacionais, o que significa que a curva BP é relativamente plana e,
portanto, provavelmente será menos inclinada do que a curva LM, como na Figura 15.6.

15.3 Mobilidade perfeita de capitais


Até aqui, estivemos supondo que, embora ativos externos e internos sejam substitutos, eles
não são substitutos perfeitos. Nesta seção, vamos examinar as políticas fiscal e monetária para o
caso em que os ativos são substitutos perfeitos, o caso da mobilidade perfeita de capitais. Nesse
caso, o capital move-se livremente entre os países, o diferencial de risco entre ativos de
diferentes países não é importante e os custos de transações são negligenciáveis.
Nesse tipo de cenário, os fluxos de capitais levam as taxas de juros internas e externas à
igualdade.4 Se, por exemplo, a taxa de juros sobre títulos nacionais for 4,1% e a taxa de juros
sobre títulos estrangeiros for 4,0%, num mundo de mobilidade perfeita de capitais o país local
teria uma entrada maciça de capitais até que a taxa interna fosse levada para baixo de forma a se
igualar à taxa externa.
No modelo Mundell-Fleming, o pressuposto de mobilidade perfeita de capitais significa que a
equação BP (15.8) é substituída pela condição

Graficamente, o pressuposto da mobilidade perfeita de capitais torna a curva BP horizontal.


Como qualquer diferencial de taxa de juros resulta em grandes fluxos de capital, o equilíbrio do
balanço de pagamentos só pode ocorrer quando a taxa de juros interna for igual à taxa de juros
externa (mundial) exogenamente determinada.
Antes de examinarmos os efeitos de políticas econômicas no caso de mobilidade perfeita de
capitais, consideremos o pressuposto de que, no equilíbrio, a taxa de juros interna precisa ser
igual à taxa externa exogenamente determinada. Na Seção 15.2, também supusemos que a taxa
de juros externa fosse exógena, mas, no caso da mobilidade imperfeita de capitais, a taxa de
juros interna podia se desviar da taxa de juros externa. Nesse caso, há duas possibilidades. Uma
é estarmos considerando um país tão pequeno que suas ações não têm efeito sobre a economia
mundial. Uma política monetária expansionista que reduza a taxa de juros interna não tem efeito
sobre as taxas de juros mundiais ou sobre a renda em países estrangeiros, que também foi
considerada exógena. Uma segunda possibilidade é que o país seja grande, como os Estados
Unidos, mas que estivéssemos simplesmente ignorando os efeitos de suas ações sobre as
economias estrangeiras e, portanto, ignorando possíveis efeitos de repercussão. Estávamos
pressupondo que estes fossem de importância secundária.
No caso da mobilidade perfeita de capitais, apenas a primeira suposição é plausível: o país
local é tão pequeno que suas ações não podem afetar as condições do mercado financeiro
mundial e o capital é tão móvel que a taxa de juros desse país precisa mover-se em alinhamento
com as taxas de juros mundiais. Para considerar um país grande, como os Estados Unidos, no
caso de mobilidade perfeita de capitais, teríamos de incluir no modelo o efeito de suas políticas
econômicas sobre a taxa de juros mundial. Não é uma visão realista imaginar que a taxa de juros
desse país seja determinada por uma taxa de juros mundial completamente fora de sua
influência.

15.3.1 Efeitos de políticas econômicas com taxas de câmbio fixas


15.3.1.1 Política monetária
Vamos ver que, com mobilidade perfeita de capitais, a política monetária é completamente
ineficaz quando as taxas de câmbio são fixas. Para compreender esse resultado, precisamos
examinar melhor a relação entre intervenção no mercado de câmbio e a oferta de moeda.
Na Seção 15.2, vimos que, com taxas de câmbio fixas, uma política monetária expansionista
levava a um déficit no balanço de pagamentos. Suponhamos, por exemplo, que no ponto E1 na
Figura 15.2 o déficit no balanço de pagamentos seja de 5 bilhões de dólares; há um excesso de
demanda por moeda estrangeira igual a 5 bilhões de dólares. Como foi explicado no Capítulo 14,
o Banco Central local ou um Banco Central estrangeiro precisa intervir para fornecer esse
montante de moeda estrangeira a fim de que a taxa de câmbio fixa seja mantida. Aqui, veremos
apenas o caso em que a intervenção é feita pelo Banco Central doméstico.
O Banco Central doméstico vende, então, 5 bilhões de dólares em ativos de reservas
estrangeiras (moeda estrangeira, DES ou ouro). Ele compra 5 bilhões de dólares. O efeito disso é
reduzir a oferta de dólares em 5 bilhões. A oferta de moeda em circulação diminui, porque o
Banco Central aqui aumentou seu estoque de dólares em 5 bilhões e o público reduziu o seu
estoque nesse mesmo montante. O que supusemos implicitamente na Seção 15.2 foi que o
Banco Central doméstico compensou esse efeito sobre a oferta de moeda pondo os dólares que
ele comprou de volta em circulação. Isso é feito comprando títulos do governo que estavam na
posse do público. Essa ação, conhecida como esterilização, evita que a intervenção no mercado
de câmbio afete a oferta de moeda doméstica.
Visto isso, vamos examinar o efeito de uma ação de política monetária expansionista no caso
de mobilidade perfeita de capitais. De acordo com a discussão anterior, consideremos o caso em
que um país pequeno, como a Nova Zelândia, aumenta sua oferta de moeda. Como é ilustrado na
Figura 15.7, o aumento na oferta de moeda desloca a curva LM para a direita, de LM(M0) para
LM(M1). A taxa de juros neozelandesa cai temporariamente de r0 para r1. A taxa de juros
neozelandesa está temporariamente abaixo da taxa de juros externa (mundial).
Com a taxa de juros interna abaixo da taxa de juros externa no caso de mobilidade perfeita de
capitais, haverá uma enorme saída de capitais. Os investidores venderão ativos neozelandeses e,
portanto, dólares neozelandeses. Nesse caso, o Banco Central neozelandês não pode restaurar o
equilíbrio por meio de uma intervenção esterilizada no mercado de câmbio. A saída maciça de
capitais continuaria enquanto a taxa de juros neozelandesa permanecesse abaixo da taxa de juros
externa. Uma intervenção esterilizada apenas faria com que o Banco Central neozelandês logo
esgotasse suas reservas internacionais.
Para restaurar o equilíbrio, o Banco Central precisa deixar sua intervenção reduzir a oferta de
moeda por meio do processo explicado no início desta seção. A oferta de moeda cairá até que a
curva LM volte para a posição inicial, LM(M0). Nesse ponto (E0), a taxa de juros neozelandesa
volta à igualdade com a taxa de juros externa. A saída de capitais e, portanto, a contração da
oferta de moeda param. Mas, também nesse ponto, a oferta de moeda e a renda estarão de volta a
seus níveis iniciais. A ação de política monetária terá sido totalmente ineficaz.

FIG 15.7 Política monetária com taxas de câmbio fixas

Um aumento na oferta de moeda desloca a curva LM de LM(M0) para LM(M1). A taxa de juros interna cai abaixo da taxa de
juros externa, desencadeando uma saída maciça de capitais. A intervenção do Banco Central para manter a taxa de câmbio fixa
faz com que a oferta de moeda caia de volta para o nível inicial, M0. A taxa de juros interna retorna à igualdade com a taxa de
juros externa e a renda volta a seu nível inicial.

15.3.1.2 Política fiscal


A situação é bastante diferente para a política fiscal. A Figura 15.8 ilustra os efeitos de um
aumento nos gastos do governo no caso de mobilidade perfeita de capitais. O efeito direto do
aumento dos gastos é o deslocamento da curva IS para a direita, de IS(C0) para IS(G1). O
aumento nos gastos pressiona a taxa de juros interna para um nível mais alto que a taxa de juros
externa e dá início a uma forte entrada de capitais. O Banco Central doméstico, que
consideramos mais uma vez ser o da Nova Zelândia, precisa intervir e, neste caso, comprar
moeda estrangeira com dólares neozelandeses. Isso fará com que a oferta de moeda
neozelandesa se expanda. O Banco Central da Nova Zelândia terá de continuar comprando
moeda estrangeira até que a oferta de moeda tenha aumentado o suficiente para deslocar a curva
LM para LM(M1) e restaurar a igualdade entre as taxas de juros interna e externa no ponto E1.
Esse aumento endógeno da oferta de moeda fortalece o efeito de expansão do aumento dos
gastos governamentais. A produção sobe para Y1 em vez de Y’1.
Em um sistema de taxas de câmbio fixas, com mobilidade perfeita de capitais, essa política
fiscal expansionista é altamente eficaz, porque não há aumento da taxa de juros interna e,
portanto, não ocorre o efeito deslocamento (crowding out) dos gastos do setor privado.

FIG 15.8 Política fiscal com taxas de câmbio fixas

Um aumento nos gastos do governo desloca a curva IS de IS(G0) para IS(G1). A taxa de juros interna é pressionada para cima até
um nível mais alto que a taxa de juros externa, resultando em uma forte entrada de capitais. A intervenção do Banco Central para
manter a taxa de câmbio fixa faz a oferta de moeda subir. A curva LM desloca-se de LM(M0) para LM(M1). A taxa de juros
interna é levada de volta à igualdade com a taxa externa e o aumento na oferta de moeda reforça o efeito expansionista do
aumento dos gastos governamentais.

15.3.2 Efeitos de políticas econômicas com taxas de câmbio flexíveis


Em um sistema de taxas de câmbio flexíveis, a situação é inversa. Aqui, encontramos que a
política monetária é altamente eficaz, enquanto a política fiscal é totalmente ineficaz.

15.3.2.1 Política monetária


Uma vez mais examinaremos o efeito de um aumento na oferta de moeda de M0 para M1.
Como é mostrado na Figura 15.9, esse aumento na oferta de moeda desloca a curva LM de
LM(M0) para LM(M1). Como no caso de taxas de câmbio fixas, o aumento na oferta de moeda
faz a taxa de juros da Nova Zelândia cair temporariamente abaixo da taxa de juros externa,
desencadeando uma grande saída de capitais. No entanto, em um sistema de taxas de câmbio
flexíveis, isso não resulta em uma intervenção do Banco Central neozelandês no mercado
cambial.
Em lugar disso, quando os investidores vendem ativos neozelandeses e, portanto, vendem
dólares neozelandeses, a taxa de câmbio da Nova Zelândia sobe e o valor do dólar neozelandês
cai. Essa elevação da taxa de câmbio aumenta as exportações da Nova Zelândia, diminui as
importações e desloca a curva IS para a direita. A venda de dólares neozelandeses continua até
que a taxa de câmbio suba o suficiente, de π0 para π1, e desloque a curva IS de IS(π0) para IS(π1).
Nesse ponto (E1), a taxa de juros neozelandesa foi restaurada à igualdade com a taxa de juros
externa. A renda subiu para Y1.

FIG 15.9 Política monetária com taxas de câmbio flexíveis

Um aumento na oferta de moeda faz a curva LM deslocar-se de LM(M0) para LM(M1). A taxa de juros interna cai abaixo da taxa
de juros externa, desencadeando uma grande saída de capitais. A saída de capitais faz a taxa de câmbio subir, deslocando a curva
IS de IS(π0) para IS(π1). A taxa de juros interna é levada de volta à igualdade com a taxa de juros externa e a renda sobe para Y1.

A política monetária é altamente eficaz com mobilidade perfeita de capitais e taxas de câmbio
flexíveis. A renda sobe em um montante equivalente a todo o deslocamento horizontal da curva
LM. Repare que o mecanismo pelo qual a política monetária funciona não é mais pela taxa de
juros, que fica fixa no nível da taxa internacional. Em vez disso, ele atua por intermédio da taxa
de câmbio e, portanto, das exportações líquidas.

15.3.2.2 Política fiscal


Os efeitos de um aumento nos gastos do governo com taxas de câmbio flexíveis e mobilidade
perfeita de capitais são ilustrados na Figura 15.10. O efeito direto do aumento dos gastos
governamentais é o deslocamento da curva IS de IS(G0, π0) para IS(G1, π0). Como resultado, a
taxa de juros interna sobe (em direção a r1 na figura) acima da taxa de juros externa. Esse
movimento desencadeia uma forte entrada de capitais, o que, com taxas de câmbio flexíveis, fará
a taxa de câmbio cair (elevando o valor da moeda nacional). Em consequência, as exportações
diminuem e as importações aumentam. A curva IS desloca-se para a esquerda.
O equilíbrio só será restaurado quando a curva IS tiver se deslocado de volta para IS(G0, π0) =
IS(G1, π1) e a taxa de juros interna for novamente igual à taxa de juros externa. Nesse ponto, a
entrada de capitais e a pressão pela queda da taxa de câmbio terminam. Também nesse ponto, a
renda volta a seu nível inicial. A ação de política fiscal é completamente ineficaz.
FIG 15.10 Política fiscal com taxas de câmbio flexíveis

Um aumento nos gastos governamentais faz a curva IS deslocar-se de IS(G0, π0) para IS(G1, π0). A taxa de juros interna sobe
acima da taxa de juros externa, o que tem como resultado uma forte entrada de capitais. A entrada de capitais faz a taxa de
câmbio cair. A queda da taxa de câmbio desloca a curva IS de volta para IS(G0,π0) = IS(G1, π1). A taxa de juros interna iguala-se
novamente à taxa de juros externa e a renda retorna a seu nível inicial.

PERSPECTIVAS 15.1 - O ENIGMA DA CORRELAÇÃO POUPANÇA-


INVESTIMENTO
Em uma economia fechada, esperaríamos que a poupança tivesse uma forte relação positiva com o investimento. Pela
equação da curva IS para a economia fechada dada por (15.4), vemos que

S+T=I+G

ou

S + (T - G) = I

A poupança doméstica privada (S) mais a poupança governamental (T – G) (ou despoupança se houver um déficit) deve
ser igual ao investimento doméstico (I).
Em uma economia aberta, a equação (15.10) é modificada para incluir importações e exportações e torna-se

S + (T - G) + (Z - X) = I

A poupança doméstica (uma vez mais ajustada para poupança ou despoupança governamental) mais o déficit comercial (Z
- X) deve ser igual ao investimento doméstico. Os países poderiam, portanto, ter grandes desvios da poupança em relação
ao investimento se houvesse grandes superávits ou déficits de conta corrente. Um país poderia, por exemplo, ter um
grande déficit de conta corrente (Z - X), que, no balanço de pagamentos, fosse financiado por um superávit na balança de
capitais que, por sua vez, financiasse o investimento em um nível mais alto que a poupança doméstica. Esse foi o caso dos
Estados Unidos por boa parte das décadas de 1980 e 1990. Em um mundo de alta mobilidade de capitais, não esperaríamos
que poupança e investimento em um determinado país estivessem estreitamente relacionados.

FIG 15.11 Poupança (S) e Investimento (I): relação com o PNB (Y), 1974-2008
A poupança fluiria para o país em que o retorno sobre os investimentos fosse maior. Se os residentes de um país
poupassem muito, mas o retorno do investimento fosse baixo, esse país investiria no exterior e teria um déficit na balança
de capitais e um superávit comercial.
Na verdade, porém, como pode ser visto na Figura 15.11, a poupança e o investimento em uma amostra de países
desenvolvidos estão estreitamente associados (têm uma alta correlação positiva). Países com uma alta proporção de
poupança em relação à renda, como o Japão e a Finlândia, também têm altas proporções de investimento em relação à
renda. Inversamente, países com razões poupança/renda relativamente baixas, como o Reino Unido e os Estados Unidos,
têm razões investimento/renda relativamente baixas. Essa relação foi observada em um estudo de Martin Feldstein e
Charles Horioka e é, por isso, conhecida como o enigma poupança-investimento de Feldstein-Horioka.a.
O que explica o enigma? Talvez a mobilidade total de capitais não seja de fato tão alta. Mas há outras possibilidades. Se
voltarmos à equação (15.11), vemos que uma grande divergência de poupança doméstica (ajustada para poupança ou
despoupança do governo) em relação ao investimento requer um grande déficit ou superávit de conta corrente. Se os
governos derem início a políticas para limitar a extensão desses desequilíbrios de conta corrente, eles forçam uma
convergência de poupança e investimento domésticos. Certamente alguns países às vezes têm de fato desequilíbrios
substanciais de conta corrente. Os Estados Unidos em anos recentes é um exemplo, mas os limites a tais desequilíbrios
ainda poderiam ser suficientemente grandes para explicar a relação mostrada na Figura 15.11, que cobre 16 países ao
longo de mais de três décadas.
Uma segunda explicação para a correlação positiva poupança-investimento relaciona-se às limitações de acesso de muitas
firmas aos mercados de capitais em geral. Se as firmas tiverem acesso limitado aos mercados de capitais, elas terão de
financiar o investimento por meio de lucros retidos, que são parte da poupança doméstica.
Embora essas explicações da correlação positiva poupança-investimento sejam consistentes com um alto grau de
mobilidade internacional de capitais, há pouca evidência empírica de sua importância. O enigma permanece.
Antes de sairmos da questão do enigma da alta correlação poupança-investimento, é preciso observar que, embora ainda
alta, essa correlação diminuiu um pouco na última década. Isso deve-se em parte ao déficit historicamente alto nas contas
correntes dos Estados Unidos, que foi acompanhado por investimentos domésticos relativamente altos e poupança
doméstica baixa. Mas, mesmo deixando os Estados Unidos de fora, a correlação declinou. A causa mais provável para o
declínio é a crescente globalização dos mercados de capitais, que aumentou a mobilidade de capitais. Outro sinal disso é o
fato de os investidores estarem incluindo mais ativos estrangeiros em suas carteiras de investimento. Isso representou um
declínio no que os economistas chamam de viés doméstico, a preferência dos investidores por manter ativos financeiros
domésticos. Essa crescente mobilidade de capitais é um fator que tornou mais fácil o financiamento do déficit de conta
corrente americano.
a FELDSTEIN, Martin; HORIOKA, Charles. Domestic saving and international capital flows. Economic Journal, 90, p. 314-
329, June 1980.

Conclusão
Neste capítulo, analisamos as políticas fiscal e monetária em uma versão para economia
aberta do modelo IS-LM, nos casos de mobilidade perfeita e imperfeita de capitais. Vimos que
há diferenças significativas entre os dois casos. Em particular, o pressuposto de mobilidade
perfeita de capitais produz alguns resultados dignos de nota: a política monetária é
completamente ineficaz se a taxa de câmbio for fixa e a política fiscal é completamente ineficaz
se a taxa de câmbio for flexível. Com mobilidade imperfeita de capitais, nossos resultados ficam
mais de acordo com aqueles observados no modelo IS-LM para a economia fechada, como é
resumido na Tabela 7.1, embora haja algumas diferenças quantitativas.
Dadas essas diferenças, qual caso é relevante para o mundo real? Poucas coisas são perfeitas
no mundo e a mobilidade de capitais não é uma delas. Mas será que o grau de mobilidade de
capitais é suficientemente alto para que a mobilidade perfeita de capitais não seja uma
aproximação ruim? Com base na situação de meados da década de 1980, um estudo concluiu
que os mercados de capitais mundiais provavelmente estavam “a dois terços ou três quartos do
caminho, mas não mais que isso”, na direção da mobilidade perfeita de capitais.5 Os mercados
de capitais moveram-se mais nessa direção nos últimos 20 anos. Essa tendência poderia levar a
uma preferência pelo modelo com mobilidade imperfeita de capitais, mas uma curva BP
relativamente plana.
É difícil, porém, fazer uma afirmação generalizante que seja válida para todos os países.
Alguns países, embora em número cada vez menor, mantêm controles governamentais sobre os
movimentos de capitais que restringem seriamente a mobilidade de capitais. Para outros países
cujos mercados de capitais são estreitamente integrados aos de um grande vizinho, como o
Canadá e a Áustria, o pressuposto de mobilidade perfeita de capitais é preferível.

Questões de revisão
1. Explique por que a curva BP na Figura 15.1 tem inclinação positiva. Que fatores causam um
deslocamento da curva BP? Explique.
2. No modelo Mundell-Fleming, pressupondo mobilidade imperfeita de capitais, analise os
efeitos das seguintes ações de política econômica para os casos de taxas de câmbio fixas e
flexíveis:
a. Um declínio na oferta de moeda de M0 para M1.
b. Um aumento nos gastos do governo de G0 para G1.
Inclua em sua resposta os efeitos da ação de política econômica sobre a renda e a taxa de
juros, assim como os efeitos sobre o balanço de pagamentos e a taxa de câmbio.
3. Explique o que significa dizer que temos mobilidade perfeita de capitais. Por que a curva BP
é horizontal no caso de mobilidade perfeita de capitais?
4. Examine os efeitos de um corte uniforme (lump-sum) de impostos, de T0 para T1, em um
sistema de taxas de câmbio fixas. Examine ambos os casos de mobilidade perfeita e
imperfeita de capitais. Em qual caso o corte nos impostos terá o maior efeito sobre a renda?
5. O que significa esterilização dos efeitos da intervenção no mercado cambial? Explique como
a esterilização funciona no caso de mobilidade imperfeita de capitais.
6. No modelo Mundell-Fleming, pressupondo mobilidade perfeita de capitais, analise os efeitos
de um choque positivo na demanda por moeda (isto é, um aumento na demanda por moeda
nos níveis dados de renda e taxa de juros). Considere o efeito do choque sobre a renda
quando a taxa de câmbio for fixa e quando ela for flexível.
7. No modelo Mundell-Fleming, pressupondo mobilidade perfeita de capitais, analise o efeito
de um aumento uniforme (lump-sum) de impostos para o caso de taxas de câmbio flexíveis.
O corte nos impostos será eficaz? Explique.
8. No modelo Mundell-Fleming, pressupondo mobilidade imperfeita de capitais, analise o
efeito de uma queda no investimento autônomo. Concentre-se no efeito sobre a renda. Esse
efeito é maior com taxas de câmbio fixas ou flexíveis? (Considere que a curva BP seja mais
plana do que a curva LM.)
PARTE V

Políticas econômicas

Os capítulos desta parte ampliam a discussão das políticas macroeconômicas. Embora as


políticas monetária e fiscal tenham sido analisadas em capítulos anteriores, as ações de política
que examinamos eram simples mudanças de políticas como uma alteração uniforme na
arrecadação tributária ou uma mudança exógena na oferta de moeda. A consideração dessas
mudanças simples de políticas foi útil para entender as propriedades dos modelos examinados.
Nos três próximos capítulos, fazemos uma análise mais detalhada e realista da formulação de
políticas macroeconômicas.
Os Capítulos 16 e 17 tratam da política monetária. A estrutura do Banco Central americano, o
Federal Reserve System, é explicada. Abordam-se as ferramentas de política monetária reais.
Além disso, é examinada a estrutura de mercados e instituições financeiras. Nesse contexto,
analisamos a crise financeira de 2007-2009, que entrou em nossa discussão anterior sobre os
problemas econômicos recentes.
O Capítulo 18 examina políticas fiscais voltadas a estabilizar a economia. Como no caso da
política monetária, utilizamos uma abordagem mais realista dos instrumentos e processos reais
de política econômica. Questões adicionais referentes a déficits e dívida do governo federal
também entram na discussão.
CAPÍTULO 16
Moeda, o sistema bancário e taxas de juros

A política monetária refere-se às ações dos bancos centrais para afetar a oferta de moeda e o
crédito e influenciar a taxa de juros. Até aqui, representamos ações de política monetária por
meio de mudanças exógenas na oferta de moeda. Neste capítulo e no Capítulo 17, vamos fazer
um exame mais realista da política monetária. Discutiremos a estrutura do Banco Central dos
Estados Unidos, o Federal Reserve System, que conduz a política monetária do país. Parte de
nossa análise neste capítulo será um exame de como o Banco Central pode controlar a oferta de
moeda. De forma mais ampla, examinaremos as ligações entre ações do Banco Central e o
crédito e taxas de juros.
Em anos recentes, o Federal Reserve e outros bancos centrais focaram mais diretamente as
taxas de juros do que a oferta de moeda. Isso não conflita com nossa análise anterior. Nessa
análise, o Banco Central alterava a oferta de moeda para influenciar a taxa de juros. Aumentos
na oferta de moeda, por exemplo, faziam a taxa de juros cair. Neste capítulo e no próximo, no
entanto, daremos mais atenção às ligações entre as ações dos bancos centrais e as taxas de juros
e o crédito. Também examinaremos mais detalhadamente taxas de juros específicas e outros
ativos financeiros que não a moeda.
O sistema bancário desempenha um papel importante na transmissão dos efeitos da ação do
Banco Central para o resto da economia. Portanto, vamos examinar o modo como a política
monetária afeta os balanços patrimoniais e o comportamento dos bancos. O comportamento do
público não bancário também entrará em nossa análise.
Neste capítulo, vamos focar o que o Banco Central realmente faz. No Capítulo 17, o foco
muda para o que os bancos centrais deveriam fazer – a questão da política monetária ótima.
Começamos na Seção 16.1 com uma definição de moeda. A Seção 16.2 explica alguns
conceitos de taxas de juros e os ativos financeiros e mercados associados. A Seção 16.3 discute
a estrutura do Federal Reserve System e as ferramentas que ele usa para conduzir a política
monetária. Em resposta à recente crise financeira, o Federal Reserve desenvolveu novos
instrumentos de política econômica que também vamos examinar. Na Seção 16.4, explicamos a
relação entre reservas, depósitos e crédito bancários, que é uma ligação fundamental no processo
do controle do Banco Central sobre a oferta de moeda e o nível das taxas de juros. Aqui
examinaremos como o sistema financeiro ficou congelado e como os instrumentos de política
monetária recém-desenvolvidos foram usados para tentar reaquecê-lo. A Seção 16.5 conclui
nossa análise do processo da política monetária.

Federal Reserve System (Fed)


É composto de 12 bancos Federal Reserve regionais e
do Board of Governors (Conselho) localizado em
Washington.
16.1 A definição de moeda

16.1.1 As funções da moeda


A definição padrão de moeda é tudo aquilo que desempenha funções monetárias. As três
funções amplamente aceitas da moeda são (1) um meio de troca, (2) um estoque de valor e (3)
uma unidade de medida.

16.1.1.1 Meio de troca


A moeda serve como um meio de transação. Compram-se bens e serviços com moeda.
Recebe-se moeda pela venda de bens ou serviços. Não pensamos nisso com frequência, mas essa
função da moeda contribui muito para a eficiência econômica. Para fazer trocas sem moeda seria
necessário trocar bens por bens – o que se chama escambo ou simples troca. Algumas transações
de escambo existem mesmo em uma economia monetária.
Mas o escambo como meio de troca predominante é ineficiente, porque transações de
escambo requerem uma dupla coincidência de vontades. Vamos supor que Joana queira comprar
sapatos e vender joias, enquanto Suzana quer vender sapatos, mas deseja comprar um
computador. Nenhuma troca acontece nesse caso e ambas precisam perder tempo procurando
parceiros de negócios cujos desejos de compra e de venda coincidam com os seus. Em uma
economia monetária, Joana compra os sapatos de Suzana com moeda. Suzana pode, então, usar
a moeda para comprar um computador de qualquer pessoa que o esteja vendendo. Joana precisa
apenas encontrar alguém que queira comprar joias (sem necessariamente querer vender sapatos).

16.1.1.2 Estoque de valor


A moeda funciona como um estoque de riqueza, um modo de poupar para gastos futuros. A
moeda é um tipo de ativo financeiro. Outros estoques de valor (por exemplo, um título
empresarial ou governamental) não são moeda porque não realizam as outras funções
monetárias. Eles não podem ser usados como meio de troca ou como unidade de medida, que é a
terceira função central da moeda.

16.1.1.3 Unidade de medida


Os preços são medidos em moeda. No Brasil, os preços (e dívidas) são medidos em reais, na
Albânia em leks, na Polônia em zlotis, na Grã-Bretanha em libras, nos Estados Unidos em
dólares. A moeda é muito conveniente como unidade de medida. Os comerciantes simplesmente
fixam um preço em reais, ou em dólares, e não em termos de cada mercadoria que pudesse ser
trocada por seus bens.

16.1.2 Componentes da oferta de moeda


A oferta de moeda é composta dos ativos financeiros que servem às funções descritas acima.
Que ativos são esses nos Estados Unidos, por exemplo? Há duas medidas oficiais para a oferta
de moeda americana. Cada uma delas é composta de moeda corrente e depósitos em bancos
comerciais e outras instituições depositárias (por exemplo, associações de poupança e
empréstimos).
Uma medida, chamada M1, é a mais restrita das duas medidas de moeda. Ela é composta de
moeda corrente mais depósitos a vista. Depósitos a vista são aqueles sobre os quais é possível
emitir cheques, ou seja, aqueles em relação aos quais se pode instruir o banco por escrito a fazer
pagamentos a terceiros.1 A moeda corrente preenche as três funções monetárias discutidas
acima. O mesmo acontece com depósitos bancários, desde que seja possível movimentá-los por
meio de cheques. Cheques sobre depósitos podem ser usados para comprar coisas (função de
meio de troca), depósitos são um estoque de valor, e a moeda corrente ou os depósitos são
unidades de medida.

M1
É a mais restrita das duas medidas de oferta de moeda
dos Estados Unidos. Consiste em moeda corrente
mais depósitos a vista.

A outra medida, M2, é mais ampla. Ela inclui os componentes de M1 mais depósitos
bancários adicionais que não podem ser sacados por cheques ou têm limitações nesse sentido.
M2 inclui contas de fundos mútuos do mercado monetário, que com frequência permitem
cheques apenas para montantes acima de um mínimo, e contas comuns de poupança e de
depósitos a prazo, que não preveem saques com cheques.2 Detalhes sobre a composição de cada
uma dessas medidas de moeda, bem como as cifras correspondentes ao nível dessas medidas nos
Estados Unidos em outubro de 2011, são dados na Tabela 16.1.

M2
Inclui todos os componentes de M1 mais alguns
depósitos bancários adicionais que não podem ser
sacados por cheques ou têm limitações nesse sentido.

Tabela 16.1 - Medidas da oferta de moeda, Estados Unidos, outubro de 2011 (bilhões de
dólares)

M1 $2.150,1 Médias das cifras diárias referentes a (1) moeda corrente fora do Tesouro, dos
bancos do Federal Reserve e dos cofres dos bancos comerciais, (2) cheques de
viagem de emissores não bancários, (3) depósitos à vista em todos os bancos
comerciais exceto os devidos a bancos domésticos, ao governo e a bancos e
instituições oficiais estrangeiras, menos itens disponíveis líquidos em processo de
cobrança e float do Federal Reserve, e (4) ordens de saque negociáveis (NOW) e
contas de transferência automática (ATS) em bancos e instituições de poupança,
cotas de cooperativa de crédito (CUSD) e depósitos à vista em bancos de
poupança mútua
M2 $9.607,5 M1 mais poupanças e pequenos depósitos a prazo em todas as instituições
depositárias, acordos de recompra de overnight em bancos comerciais,
eurodólares de overnight mantidos por residentes dos Estados Unidos com a
exceção de bancos em filiais do Caribe de bancos associados, cotas de fundos
mútuos do mercado monetário e contas de depósito do mercado monetário
(MMDA)
Fonte: Board of Governors of the Federal Reserve.

A lógica que fundamenta a medida mais ampla da moeda é que as categorias de depósitos
adicionais incluídas em M2 em relação a M1 são muito semelhantes a depósitos a vista ou
podem ser facilmente convertidas em depósitos a vista. Saldos em contas de poupança, por
exemplo, podem ser convertidos em depósitos a vista (ou em moeda corrente) pela simples ida
ao banco (ou usando um caixa eletrônico ou a internet). Se esses tipos adicionais de depósitos
forem substitutos suficientemente próximos de depósitos a vista e moeda corrente, pode ser
adequado considerá-los como moeda.

16.2 Taxas de juros e ativos financeiros


Em capítulos anteriores, restringimos nossa análise a dois ativos financeiros: moeda e títulos.
Acabamos de apresentar uma definição mais detalhada de moeda. Vamos, agora, nos aprofundar
mais na questão dos títulos.
Em nossa análise anterior, a moeda era o ativo de curto prazo e os títulos eram o ativo de
longo prazo. Com isso, referíamo-nos ao fato de que a moeda é imediatamente disponível; ela
não tem prazo de vencimento. Um exemplo de título é o título de 10 anos do Tesouro americano.
Seu prazo até o vencimento é de 10 anos, o que significa que o retorno do principal (valor de
face) do título é pago depois de 10 anos.
Nos mercados financeiros há muitos tipos de ativos financeiros que são estoques de riqueza.
Não precisamos entrar em muitos detalhes, mas será útil nos aprofundarmos um pouco mais na
distinção título-moeda para entender como a política monetária funciona. Uma distinção em
mercados financeiros é entre os mercados de capitais e os mercados monetários.3 Os mercados
de capitais são aqueles de ativos financeiros com um prazo de vencimento de mais de um ano.
Os mercados monetários são para ativos com prazo de vencimento de menos de um ano. O título
de 10 anos do Tesouro americano e outros títulos são negociados em mercados de capitais.
Outros tipos de títulos são os títulos empresariais e títulos de governos subnacionais. As taxas de
juros sobre esses tipos de títulos são exemplos de taxas de juros de longo prazo.
Os ativos em mercados monetários, que são distintos da moeda em si, não entraram
anteriormente em nossa discussão. Um exemplo de um ativo negociado em um mercado
monetário é uma letra do Tesouro americano. Como o título do Tesouro, esse é um instrumento
de crédito emitido pelo Tesouro dos Estados Unidos, mas tem curto prazo, com vencimento em
três ou seis meses. Outro exemplo de um ativo de mercado monetário são os papéis negociáveis
de curto prazo, um instrumento de crédito de curto prazo emitido por grandes empresas e
grandes bancos. Um mercado monetário que é importante para a condução da política monetária
é o mercado de fundos federais, ou mercado interbancário. Fundos federais são empréstimos
overnight entre bancos. Como os títulos, cada ativo do mercado monetário tem uma taxa de
juros. Assim, temos a taxa de letras do Tesouro, a taxa dos papéis negociáveis e a taxa dos
fundos federais. Esses são exemplos de taxas de juros de curto prazo. A taxa dos fundos
federais, ou taxa de empréstimos interbancários de um dia, é especialmente importante nos
Estados Unidos, porque é a taxa que o Federal Reserve controla mais de perto. Na terminologia
que usamos no Capítulo 17, a taxa dos fundos federais é a meta operacional do Federal Reserve.
Taxa dos fundos federais
É a taxa usada para empréstimos interbancários.

Outro conjunto de taxas de juros são as taxas de empréstimos. Em empréstimos bancários, há


taxas de juros para empréstimos ao consumidor, para empréstimos industriais (para empresas) e
para empréstimos imobiliários. Com o auxílio adicional desta subseção e da subseção anterior,
estamos prontos para passar ao Banco Central e à condução da política monetária.

16.3 O Federal Reserve System e os Bancos Centrais

16.3.1 A estrutura do Federal Reserve


O sistema americano de Banco Central foi estabelecido pelo Federal Reserve Act de 1913.
Ao contrário do Brasil e de muitos outros países, que têm um único Banco Central, os Estados
Unidos têm um sistema de bancos Federal Reserve, um para cada um dos 12 distritos do Fed.
Cada Federal Reserve Bank recebe o nome da cidade em que está localizado: Federal Reserve
Bank of New York, Federal Reserve Bank of Chicago, Federal Reserve Bank of San Francisco e
assim por diante. Esse caráter regional do sistema americano é importante para algumas das
funções do Banco Central, mas a formulação de políticas macroeconômicas centralizou-se em
dois grupos em Washington.
O primeiro grupo é o Board of Governors of the Federal Reserve, composto de sete
membros (diretores) nomeados pelo presidente dos Estados Unidos, com recomendação e
aprovação do Senado, para um mandato de 14 anos. Um membro da diretoria é nomeado
presidente do Board pelo presidente do país, para um mandato de 4 anos. O presidente do Board
pode ocasionalmente se tornar a figura dominante na formulação de políticas monetárias.

Board of Governors of the Federal


Reserve
É composto de sete membros (diretores) nomeados
pelo presidente dos Estados Unidos, com
recomendação e aprovação do Senado, para um
mandato de 14 anos. Um membro do Board é
nomeado seu presidente.

O segundo grupo de formuladores de políticas monetárias é o Federal Open Market


Committee. O método mais importante pelo qual o Federal Reserve controla a oferta de moeda
é a compra e venda de títulos do governo no mercado aberto (open market), isto é, no mercado
de transações com títulos do governo localizado na cidade de Nova York. Vamos ver como o
Federal Reserve usa compras ou vendas de títulos no mercado aberto para aumentar ou diminuir
as reservas legais do sistema bancário. Como é exigido que os bancos mantenham uma
proporção fixa de seus depósitos na forma de reservas legais, essas operações no mercado
aberto podem controlar o componente de depósitos da oferta de moeda. O Open Market
Committee controla as operações no mercado aberto. É composto de 12 membros com direito de
voto: os 7 membros da Board of Governors e 5 dos presidentes dos Federal Reserve Banks
regionais. Os presidentes dos bancos regionais participam em um esquema de rodízio, com
exceção do presidente do banco de Nova York, o banco encarregado de executar as operações
no mercado aberto, que é membro votante permanente do Open Market Committee.

Federal Open Market Committe


É composto de 12 membros com direito de voto: os 7
membros do Board of Governors e 5 dos presidentes
dos Federal Reserve Banks regionais. Os presidentes
dos bancos regionais participam em um esquema de
rodízio, com exceção do presidente do Federal
Reserve of New York, que é vice-presidente do
Board e um membro votante permanente do comitê.

Operações no mercado aberto


São compras e vendas de títulos do governo no
mercado aberto pelo Banco Central.

16.3.2 A influência do Banco Central sobre a moeda e o crédito


Lembre-se que os agregados monetários discutidos na Seção 16.1 eram constituídos de
moeda corrente mantida pelo público, mais várias classes de depósitos bancários. Para
simplificar nossa discussão, vamos supor que apenas um tipo de depósito represente todos os
diferentes tipos de depósitos que podem ser movimentados por cheques – nós o chamaremos de
depósitos a vista. Estes incluem contas correntes, contas NOW e cotas de cooperativa de crédito.
Poupanças e depósitos a prazo serão trazidos à nossa discussão posteriormente. Moeda corrente
consiste basicamente cédulas de moeda nacional – papel-moeda emitido pelo Banco Central.
Para controlar o componente de depósitos da oferta de moeda, o Banco Central define
reservas compulsórias sobre os depósitos. Essa é a exigência de que os bancos mantenham uma
determinada porcentagem de seu passivo de depósitos na forma de moeda corrente ou como
depósitos no Banco Central. Devido à existência das reservas compulsórias, o Banco Central
pode controlar a oferta de moeda regulando a oferta de reservas legais. Tecnicamente, o
estabelecimento de reservas compulsórias e a fixação do nível de reservas definem um teto
apenas para o nível de depósitos. Se, por exemplo, a porcentagem de reservas requerida fosse
10% e as reservas fossem definidas em $60 bilhões, o montante máximo de depósitos seria de
$600 bilhões. Na verdade, antes de 2008, os bancos mantinham poucas reservas além daquelas
exigidas pelas regras do Banco Central. Assim, o nível efetivo de depósitos permanecia próximo
do valor máximo compatível com um dado nível de reservas bancárias. Essa situação mudou
durante a crise financeira, como vamos ver mais adiante nesta seção.
Um ponto de partida conveniente para analisar o controle do Banco Central sobre os
depósitos bancários e o crédito bancário é o balanço patrimonial que resume os ativos e passivos
do Federal Reserve System. Esse balanço é mostrado na Tabela 16.2. Começamos aqui com um
retrato do balanço patrimonial pré-crise, que compararemos com o balanço pós-crise na próxima
seção. Os ativos primários mantidos pelo Federal Reserve antes da crise financeira eram títulos
do governo dos Estados Unidos. Um item muito menor no lado dos ativos no balanço, mas ao
qual retornaremos mais tarde em nossa discussão, é o montante de empréstimos a bancos; estas
são as reservas emprestadas do sistema bancário. No lado do passivo, os dois itens importantes
são cédulas em circulação do Federal Reserve, que constituem o grosso do papel-moeda
americano, e depósitos de reservas bancárias. Este último item é constituído pelos depósitos
mantidos nos Federal Reserve Banks pelo sistema bancário para atender aos requisitos de
reservas legais.4
Esses dois itens no lado do passivo do balanço do Banco Central (moeda corrente mais
depósitos de reservas bancárias) formam o que é chamado de base monetária, porque, juntos,
eles proporcionam a base para a oferta de moeda. A moeda corrente é diretamente incluída na
oferta de moeda se estiver em poder do público não bancário. A parte da moeda corrente
mantida em forma de reservas dos bancos mais os depósitos de reservas bancárias proporcionam
as reservas que dão suporte ao componente de depósitos da oferta de moeda. O Banco Central
controla a quantidade de seus passivos, o que significa que pode controlar a base monetária e,
assim, as reservas bancárias e a oferta de moeda.

Base monetária
É igual à moeda circulante mais os depósitos de
reservas bancárias.

Tabela 16.2 - Balanço dos Federal Reserve Banks dos Estados Unidos, em bilhões de dólares
(fev./ 2007)

Fonte: Board of Governors of the Federal Reserve.

16.3.3 Os instrumentos de controle do Banco Central


O Banco Central usa vários instrumentos para controlar as reservas bancárias. Na Seção 16.4,
será explicado o processo pelo qual mudanças nas reservas bancárias afetam o nível de depósitos
bancários. Dois pontos devem ser observados antes de prosseguirmos. Primeiro, quando o Banco
Central toma alguma ação de alteração da base monetária – uma ação que aumente a base
monetária, por exemplo – o efeito líquido sobre as reservas bancárias depende de quanto do
aumento da base monetária resulta em aumento da quantidade de moeda corrente em poder do
público (não bancário). O comportamento de manutenção de moeda corrente pelo público,
então, influencia o efeito final das ações do Banco Central sobre o nível de reservas bancárias e,
assim, sobre os depósitos. Essa influência é explicada na próxima seção, mas, por enquanto,
vamos supor que a manutenção de moeda corrente pelo público seja fixa. Com esse pressuposto,
alterações na base monetária produzem mudanças de um para um na quantidade de reservas
bancárias. Segundo, como foi mencionado, o Federal Reserve, em resposta à crise financeira,
desenvolveu alguns novos instrumentos de política monetária. Adiaremos a discussão destes
para uma seção posterior. Antes da crise financeira, o Federal Reserve usava três instrumentos
para controlar a posição da reserva dos bancos: operações no mercado aberto, a taxa de
redesconto e a taxa de reservas compulsórias. Na prática, operações no mercado aberto eram o
meio dominante de controle da reservas bancárias. Discutiremos os outros dois instrumentos
porque eles também são usados por bancos centrais.

16.3.3.1 Operações no mercado aberto


O primeiro instrumento, operações no mercado aberto, foi mencionado anteriormente. Para
um exemplo de como uma ação no mercado aberto por parte do Banco Central afeta as reservas
bancárias, consideremos uma compra no mercado aberto de um título do governo no valor de
$1.000.

Tabela 16.3 - Efeito sobre o balanço do Banco Central de uma compra de $1.000 no mercado
aberto

Títulos do governo constituem uma parte importante dos ativos do Banco Central, como pode
ser visto na Tabela 16.2. A compra do título adicional aumenta o item de títulos do governo no
lado dos ativos do balanço do Banco Central em $1.000. Para pagar esse título, o Banco Central
emite um cheque cobrável dele mesmo. Um ponto fundamental a observar aqui é que o Banco
Central, ao emitir esse cheque, não reduz o saldo de nenhuma conta. Ele simplesmente cria um
novo passivo para si mesmo. O que acontece ao cheque? Vamos supor que um investidor
individual tenha vendido o título para o Banco Central. Ele pegará o cheque recebido e o
depositará em um banco, o Banco A, por exemplo.
O Banco A apresentará então o cheque ao Banco Central para pagamento. O Banco Central
fará o crédito de $1.000 no saldo de conta do Banco A junto ao Banco Central. A compra no
mercado aberto resulta em um aumento do mesmo valor nos depósitos de reservas dos bancos no
Banco Central. Os efeitos da compra no mercado aberto sobre o balanço do Banco Central estão
resumidos na Tabela 16.3.
De maneira similar, uma venda de títulos do governo no mercado aberto reduzirá no mesmo
montante os depósitos de reservas dos bancos. Nesse caso, o Banco Central recebe um cheque
do indivíduo que comprou o título para ser descontado em um banco. O Banco Central desconta
do saldo de depósitos desse banco no Banco Central a mesma quantia do cheque. Essas compras
e vendas de títulos no mercado aberto oferecem um meio flexível de controlar as reservas
bancárias.

16.3.3.2 A taxa de redesconto


No caso do Federal Reserve, o Open Market Committee supervisiona as operações no
mercado aberto. Os outros instrumentos de controle monetário são administrados pelo Board of
Governors do Fed. Um desses instrumentos é a taxa de redesconto, a taxa de juros cobrada pelo
Banco Central sobre seus empréstimos a bancos. O Banco Central pode elevar ou reduzir essa
taxa para regular o volume desses empréstimos. Para ver o efeito de mudanças no volume de
empréstimos do Banco Central sobre os depósitos de reservas bancárias, consideremos um
empréstimo de $1.000 do Banco Central a um banco. Os efeitos sobre o balanço do Banco
Central são mostrados na Tabela 16.4.

Taxa de redesconto
A taxa de juros cobrada pelo Banco Central sobre
seus empréstimos a bancos.

O item “empréstimos a bancos” do ativo aumenta em $1.000. Os recursos do empréstimo são


creditados na conta do banco que tomou o empréstimo no Banco Central. Nesse ponto, os
depósitos de reservas bancárias aumentam em $1.000. Reduzindo a taxa de redesconto, o Banco
Central incentiva os bancos a tomarem empréstimos e aumenta o componente de recursos
emprestados nos depósitos de reservas bancárias. A elevação da taxa de redesconto tem o efeito
oposto.

Tabela 16.4 - Efeito sobre o balanço do Banco Central de um empréstimo de $1.000 a um banco

Pela Tabela 16.2, pode-se ver que empréstimos do Federal Reserve para bancos foram um
item muito pequeno no balanço de 2007. Essas taxas de redesconto declinaram drasticamente na
década de 1990 por diversas razões. Uma delas foi que, caso se descobrisse que um banco havia
tomado empréstimo do Fed, isso seria interpretado como um sinal de possíveis problemas
financeiros do banco, com consequências adversas para o preço de suas ações.
Em alguns países, a manipulação da taxa de redesconto e o nível de empréstimos com essa
taxa é um instrumento importante de controle monetário. Em 2007, este certamente não era o
caso nos Estados Unidos. Ainda assim, esses empréstimos tinham um papel na política
monetária. O Fed desempenha uma função de “emprestador de última instância” para bancos, o
que é um papel importante para bancos centrais. O Fed emprestará a um banco e proporcionará
liquidez em tempos de crise, quando outros canais de empréstimo estiverem fechados. Quando a
recente crise financeira começou, esse papel dos bancos centrais como emprestadores de última
instância foi posto em teste nos Estados Unidos e em muitos outros países. Empréstimos com
taxa de redesconto e outros empréstimos do Federal Reserve para instituições financeiras vieram
para o primeiro plano.

16.3.4 Taxa de reservas compulsórias


Um terceiro instrumento que o Banco Central pode usar para controlar a posição das reservas
dos bancos é a taxa de reservas compulsórias – a porcentagem dos depósitos que os bancos
devem manter como reservas. Mudanças nesse instrumento de política econômica não alteram o
nível de reservas totais dos bancos, mas, por alterar a proporção de reservas compulsórias sobre
os depósitos, o Banco Central muda a quantidade de depósitos que podem ser mantidos por um
dado nível de reservas. Aumentos na proporção das reservas compulsórias reduzem a quantidade
de depósitos que podem ser apoiados por uma dada quantidade de reservas. Consideremos nosso
exemplo anterior, em que as reservas foram definidas em $60 bilhões, de forma que, com uma
reserva compulsória de 10%, o nível máximo de depósitos a vista era de $600 bilhões. Se a taxa
de reservas compulsórias fosse aumentada para 12%, o nível máximo de depósitos, com as
reservas inalteradas em $60 bilhões, seria de $500 bilhões.

Taxa de reservas compulsórias


É a porcentagem dos depósitos que os bancos devem
manter como reservas.

Embora as tenhamos incluído em nossa discussão para não deixá-la incompleta, mudanças
nas reservas compulsórias não são usadas com frequência para afetar a posição das reservas dos
bancos. Uma razão é que aumentos das reservas compulsórias são muito impopulares com os
bancos, pois a necessidade de manter um montante maior de reservas que não rendem juros
diminui os seus lucros. Reservas compulsórias são, no entanto, um instrumento importante na
política monetária da China e outros países.

16.3.5 Novos instrumentos de política monetária


A crise financeira de 2007-2009 quase levou ao colapso do sistema bancário e outras partes
do sistema financeiro dos Estados Unidos. A Europa e outras regiões do mundo enfrentaram
situação similar. O Federal Reserve, sob a liderança de Ben Bernanke, reagiu rapidamente com
uma série de ações. Algumas envolveram o uso de instrumentos existentes. Como estes se
mostraram inadequados para o desafio, o Federal Reserve entrou em áreas que havia evitado
anteriormente, como o auxílio direto a instituições individuais por meio de compras de ativos. A
história da resposta do Federal Reserve será deixada para o Capítulo 17. O assunto aqui é o que
a resposta significou em termos dos instrumentos de política monetária.
Uma vez mais, será útil começar pelo balanço patrimonial do Federal Reserve. A Tabela 16.5
mostra esse balanço em fevereiro de 2011.
O efeito da crise financeira sobre as atividades do Federal Reserve pode ser visto comparando
a Tabela 16.5 com a Tabela 16.2. Antes de examinar os itens individuais da tabela, vamos olhar
o saldo final, os ativos (ou passivos) totais. O tamanho do balanço patrimonial do Federal
Reserve havia quase triplicado em 4 anos. Comparem-se a isso os mais de 10 anos que haviam
sido necessários para esse saldo dobrar de valor até o total de 2007. Conforme o Federal Reserve
expande o lado dos ativos de seu balanço, vimos que o lado dos passivos aumenta; isso é o
controle da base monetária. A expansão do lado dos ativos também aumenta a quantidade de
crédito que o Federal Reserve oferta a alguns setores da economia. A compra de títulos do
governo, por exemplo, aumenta o crédito oferecido ao governo federal.
Os novos instrumentos adotados durante a crise aumentaram expressivamente a quantidade
de crédito disponibilizada pelo Banco Central e ampliaram os setores que receberam esses
créditos. Assim, o Federal Reserve aumentou seu estoque de títulos do governo e empréstimos a
instituições financeiras em aproximadamente US$ 440 bilhões entre 2007 e 2011. Além disso,
agora eram feitos empréstimos a instituições financeiras que não são bancos comerciais, entre
elas corretoras de títulos públicos e bancos de investimento. Um item maior na Tabela 16.5
mostra o estoque de quase US$ 1 trilhão de títulos lastreados em hipotecas comprados durante a
crise. Por meio desse item e da compra de títulos de agência, emitidos principalmente por Fannie
Mae e Freddy Mac (emprestadores do setor imobiliário patrocinados pelo governo), o Federal
Reserve procurava apoiar o financiamento imobiliário.
As ações que foram tomadas por bancos centrais para aumentar o crédito conforme eles
expandiam seu balanço patrimonial receberam o título geral de “afrouxamento quantitativo”. O
modo como essas novas atividades entram nas políticas atual e futura do Federal Reserve é um
assunto do Capítulo 17. Aqui, estenderemos nossa discussão para como o Federal Reserve usa
seus instrumentos, inclusive os novos, para tentar controlar depósitos bancários, oferta de moeda
e crédito bancário.
Antes de nos voltarmos para essa questão, destacamos um item extraordinário no lado dos
passivos na Tabela 16.5. Em fevereiro de 2011, os depósitos de reservas bancárias haviam
crescido para mais de US$ 1,2 trilhão. Conforme o afrouxamento quantitativo prosseguia, eles
cresceram para mais de US$ 1,4 trilhão até o final de 2011. Em 2007, quase todos os depósitos
de reservas bancárias eram mantidos como depósitos compulsórios. As reservas voluntárias
eram da ordem de US$ 1-2 bilhões. No final de 2011, as reservas voluntárias constituíam a
maior parte dos depósitos de reservas bancárias. Parte da razão dessa explosão das reservas
voluntárias foi o fato de que, durante a crise, o Federal Reserve começou a pagar juros sobre as
reservas voluntárias, mas houve outras razões também.

Tabela 16.5 - Balanço dos Federal Reserve Banks dos Estados Unidos, em bilhões de dólares
(fev/2011)

FONTE: Board of Governors of the Federal Reserve

16.4 Reservas bancárias e depósitos bancários


Até aqui, vimos como um Banco Central pode usar operações no mercado aberto, mudanças
na taxa de redesconto e mudanças nas reservas compulsórias sobre depósitos para afetar a
posição das reservas de bancos. Nesta seção, vamos examinar o processo pelo qual mudanças
nas reservas afetam o nível de depósitos no sistema bancário. Uma vez mais, um ponto de
partida conveniente é um balanço patrimonial, neste caso do sistema bancário comercial.
Tabela 16.6 - Balanço consolidado do sistema bancário comercial nos Estados Unidos,
novembro de 2011 (bilhões de dólares)

Fonte: Board of Governors of the Federal Reserve.

Um balanço consolidado simplificado de todos os bancos comerciais americanos é mostrado


na Tabela 16.6. Bancos são uma classe de intermediários financeiros. Eles captam fundos dos
setores poupadores e canalizam esses fundos para os setores tomadores de empréstimos. O lado
dos ativos registra sua provisão de fundos para os setores tomadores de empréstimos. O lado dos
passivos do balanço patrimonial mostra onde os bancos captam seus fundos. No lado dos ativos,
o primeiro item são ativos a vista de bancos comerciais. As reservas (moeda a vista mais
depósitos no Fed) entram nessa categoria, mas outros itens também estão incluídos (por
exemplo, depósitos bancários em outros bancos). As reservas no período de tempo para o qual a
tabela foi compilada (novembro de 2011) incluíam o total ampliado de reservas voluntárias
(mais de US$ 1,3 trilhão) mencionado anteriormente. Antes da crise financeira, quase todas as
reservas eram reservas compulsórias. Os ativos à vista no final de 2011 eram, assim, muito mais
altos do que o normal. Os outros itens principais do lado dos ativos no balanço são empréstimos
dos bancos comerciais, que incluem empréstimos a consumidores e firmas e a posse de títulos
governamentais e privados pelos bancos. Também estão discriminados como um item separado
os “Empréstimos interbancários”. Estes são empréstimos no mercado de fundos federais descrito
na Seção 16.2.
Os principais passivos dos bancos comerciais são depósitos, tanto à vista como em poupança
e depósitos a prazo. Há também uma categoria substancial denominada “empréstimos tomados”
que inclui a emissão de obrigações da dívida pelo banco como papéis comerciais. O último item
do lado dos passivos, “Outros passivos e capital”, inclui alguns empréstimos adicionais tomados
por instituições bancárias e capital bancário, que é o patrimônio líquido dos bancos mais alguns
outros itens que contam como capital para os bancos (por exemplo, ações preferenciais).

16.4.1 Um modelo de criação de depósitos


Consideremos agora os efeitos para o banco de um aumento nas reservas. Vamos voltar a
nosso exemplo do Banco A. Lembremos de nossa suposição de que o Banco Central tenha
comprado um título de $1.000 de um indivíduo, fazendo o pagamento com um cheque do
próprio Banco Central. O indivíduo depositou o cheque em sua conta no Banco A. Quando o
cheque for apresentado para pagamento no Banco Central, os depósitos de reserva do Banco A
no Banco Central têm um aumento de $1.000. Até este ponto, os efeitos sobre o balanço do
Banco A como resultado dessa compra do Banco Central no mercado aberto são mostrados na
Tabela 16.7. Tanto os depósitos à vista como as reservas tiveram um aumento de $1.000. Para
simplificar, vamos continuar supondo que haja uma taxa de reservas compulsórias uniforme de
10%. Nesse caso, o aumento nas reservas consistirá de um aumento de $100 nas reservas
compulsórias e de $900 nas reservas voluntárias, como é mostrado na Tabela 16.7.

Tabela 16.7 - Efeito inicial sobre o balanço do Banco A de uma compra de $1.000 no mercado
aberto

A Tabela 16.7, porém, mostra apenas os efeitos iniciais da compra no mercado aberto no
balanço do Banco A. A posição descrita na Tabela 16.7 não será, em condições normais, um
equilíbrio para o Banco A, porque o banco, em geral, não vai querer aumentar suas reservas
voluntárias. Como as reservas no passado não pagavam juros e, mesmo agora, pagam juros
mínimos, o banco, em circunstâncias normais, converterá as reservas voluntárias que se
encontram na forma de depósitos no Banco Central, em ativos que rendam juros. Essa conversão
põe em movimento um processo de criação de depósitos pelo qual o aumento inicial de $1.000
nas reservas faz com que os depósitos bancários aumentem segundo um múltiplo desse aumento
inicial. (Voltaremos ao que acontece nas circunstâncias anormais criadas pela crise financeira de
2007-2009.)
Ao descrever esse processo, é conveniente começar fazendo algumas suposições
simplificadoras. Primeiro, continuamos a considerar que a manutenção de moeda corrente pelo
público permanece inalterada. Nenhuma parcela do aumento inicial da base monetária, que se
deu na forma de reservas bancárias, é transferida para um aumento na manutenção de moeda
corrente pelo público. Segundo, supomos que a quantidade de depósitos a prazo e em poupança
é fixa. Continuamos a nos concentrar apenas em depósitos a vista. E, como acabamos de dizer,
pressupomos que o banco não queira mais reservas voluntárias. O efeito da alteração desses
pressupostos será examinado posteriormente.
O Banco A tem $900 em reservas voluntárias, que ele deseja converter em ativos que paguem
juros. O banco pode fazer essa conversão aumentando os empréstimos ou comprando mais
títulos. Nenhuma dessas duas ações produzirá um efeito duradouro sobre o lado do passivo no
balanço; não há nenhum efeito sobre o nível de equilíbrio dos depósitos do Banco A. A compra
de um título pelo banco não altera os depósitos. Se o banco conceder um empréstimo, ele pode
creditar temporariamente a quantia do empréstimo na conta de movimento do cliente e essa ação
aumentaria os depósitos. Mas clientes não tomam empréstimos apenas para aumentar o saldo de
sua conta. Suponhamos que o empréstimo tenha sido feito a um consumidor que utilizou os
recursos para comprar um barco novo. O consumidor paga pelo barco com um cheque do Banco
A e, quando a transação for completada, os depósitos no Banco A terão retornado a seu nível
inicial (antes do empréstimo).
O cheque do consumidor será depositado na conta da firma que lhe vendeu o barco. O saldo
em conta corrente dessa firma, suponhamos que no Banco B, terá um aumento de $900. O
Banco B apresenta o cheque ao Banco A para pagamento – o cheque é compensado através do
Banco Central –, o que resulta em uma transferência de fundos da conta do Banco A no Banco
Central para a conta do Banco B no Banco Central. Nesse ponto, os $900 em reservas
voluntárias são eliminados do balanço do Banco A; os depósitos de reservas do banco tiveram
uma redução de $900. O balanço do Banco A está agora em sua posição final, em que os efeitos
da operação no mercado aberto são mostrados na Tabela 16.8. No lado dos passivos, os
depósitos têm um acréscimo do depósito de $1.000 do indivíduo original que vendeu um título
do governo para o Banco Central. As reservas compulsórias estão $100 (= 0,10 x 1.000) mais
altas. Os ativos rentáveis do banco, empréstimos no nosso exemplo, subiram $900.

Tabela 16.8 - Efeitos finais sobre o balanço do Banco A de uma compra de $1.000 no mercado
aberto

Tabela 16.9 - Efeitos iniciais sobre o balanço do Banco B

Embora já tenhamos concluído o balanço do Banco A, o processo de criação de depósitos não


está completo. A Tabela 16.9 mostra os efeitos sobre o balanço do Banco B até este ponto.
Devido ao depósito do fabricante do barco, os depósitos a vista têm um acréscimo de $900.
Depois que o cheque é compensado por meio do Banco Central, $900 são transferidos para a
conta de reservas do Banco B. Assim, as reservas têm um aumento de $900, dos quais apenas
$90 (0,10 x 900) são necessários para dar suporte ao aumento nos depósitos. O Banco B, que se
vê com $810 de reservas voluntárias, vai convertê-las em ativos que rendam juros, procedendo
da mesma maneira que o Banco A. O banco aumentará seus empréstimos ou comprará mais
títulos.
Suponhamos que o banco use os $810 de reservas voluntárias para comprar um título, uma
debênture, por exemplo. A posição final do Banco B será a que é mostrada na Tabela 16.10. Os
depósitos permanecem $900 mais altos, aumentando as reservas compulsórias em $90. Assim
que o Banco B paga pelo título com um cheque do próprio banco e esse cheque é compensado
no Banco Central, as reservas voluntárias do banco serão igual a zero. Os ativos rentáveis terão
um aumento de $810 e o banco estará em equilíbrio.
O processo de criação de depósitos, porém, continua além desse ponto, porque o indivíduo
que vendeu a debênture para o Banco B deposita os fundos provenientes do cheque de $810 que
ele recebeu em sua conta em algum outro banco comercial. Esse banco agora tem reservas
excedentes de $729, os $810 menos os $81 de reservas compulsórias para dar suporte ao
depósito. Outra rodada de criação de depósitos terá início.
O aumento inicial de $1.000 nas reservas desencadeou um processo de criação de depósitos
em que depósitos de $1.000, depois $900, depois $810, depois $729 resultaram das tentativas do
sistema bancário de converter o que eram inicialmente reservas voluntárias em ativos rentáveis.
A tentativa do banco individual de se livrar das reservas excedentes, sob as suposições
estabelecidas até aqui, simplesmente transfere as reservas para outro banco, além de criar um
depósito nesse banco. Os depósitos recém-criados aumentam as reservas compulsórias em 10%
do aumento nos depósitos; assim, em cada rodada do processo, o depósito recém-criado é 10%
menor do que na rodada anterior. O processo vai parar quando todas as novas reservas tiverem
sido absorvidas em reservas compulsórias. Com um aumento de $1.000 nas reservas e uma taxa
de reservas compulsórias de 10%, o novo equilíbrio será alcançado quando o montante de
depósitos tiver aumentado em $10.000 ($1.000 = 0,10 x $10.000). Nesse ponto, as reservas
compulsórias terão aumentado em $1.000. Não haverá mais nenhuma reserva excedente no
sistema. A expansão do crédito bancário e a resultante criação de novos depósitos bancários
chegarão ao fim.

Tabela 16.10 - Efeitos finais sobre o balanço do Banco B

De uma maneira mais geral, um aumento nas reservas (R) de ΔR faz os depósitos
aumentarem até que as reservas compulsórias tenham aumentado no mesmo montante. O
aumento das reservas compulsórias é igual ao aumento dos depósitos a vista vezes a taxa de
reservas compulsórias sobre os depósitos a vista, ou seja,

onde rcd é a taxa de reservas compulsórias e ΔD é o aumento nos depósitos. Para o equilíbrio,
portanto,

Assim,

O aumento nos depósitos será um múltiplo (1/rcd) do aumento das reservas. Em nosso
exemplo anterior, com ΔR igual a 1.000 e rcd igual a 0,1 (uma taxa de reservas compulsórias de
10%), temos, a partir da equação (16.4),

o resultado obtido anteriormente.


Pela equação (16.4), podemos definir também um multiplicador de depósitos, que dá o
aumento nos depósitos por unidade de aumento nas reservas bancárias:

O multiplicador de depósitos para o caso simples considerado até aqui é igual ao inverso da
taxa de reservas compulsórias sobre os depósitos a vista. Para rcd igual a 0,1 em nosso exemplo,
o multiplicador de depósito seria 10.
Essa forma do multiplicador de depósitos resulta das suposições simplificadoras que fizemos
anteriormente e terá de ser modificada quando amenizarmos essas suposições. O fato, em geral,
é que, dado o sistema de taxas fracionárias de reservas legais compulsórias, um aumento nas
reservas faz os depósitos aumentarem segundo um múltiplo do aumento das reservas. Toda a
nossa análise pode ser invertida para considerar os efeitos de uma venda de títulos no mercado
aberto, o que reduz as reservas bancárias e dá início a um processo de contração de depósitos.
Observe também que um processo similar de criação de depósitos resulta de uma redução da
taxa de redesconto do Banco Central, o que aumentaria as reservas decorrentes de empréstimos,
ou de uma redução na taxa de reservas compulsórias, o que, embora não altere as reservas totais,
criaria reservas voluntárias no sistema bancário para o nível inicial de depósitos. As mudanças
no balanço no caso dessas ações de política econômica seriam um pouco diferentes daquelas
mostradas nas Tabelas 16.7 a 16.10, mas o efeito geral seria o mesmo. Essas duas alternativas de
políticas expansionistas levariam a um aumento tanto do crédito como dos depósitos bancários.
A relação que acabamos de derivar entre reservas e depósitos pode ser reformulada como
uma relação entre a base monetária (BM) e a oferta de moeda (Ms). A base monetária é igual à
moeda corrente mantida pelo público mais as reservas bancárias. Até aqui, estamos
considerando que a manutenção de moeda corrente pelo público seja constante, portanto a
mudança na base monetária é igual à mudança nas reservas (ΔBM = ΔR). Nesse caso, a mudança
na oferta de moeda será igual à mudança nos depósitos bancários, já que a moeda corrente
mantida pelo público permanece constante (ΔD = ΔM). Como consequência, podemos expressar
um multiplicador monetário que dá o aumento na oferta de moeda por unidade de aumento na
base monetária:

Multiplicador monetário
Dá o aumento na oferta de moeda por aumento
unitário na base monetária.

que, neste caso simples, é igual ao multiplicador de depósitos. Essa expressão também precisará
ser modificada quando deixarmos de lado algumas de nossas suposições simplificadoras e,
normalmente, o multiplicador monetário não será igual em valor ao multiplicador de depósitos.
De maneira geral, porém, um dado aumento na base monetária fará a oferta de moeda subir por
um múltiplo do aumento da base monetária.
Da forma como foi descrito até aqui, o processo de criação de depósitos ou de moeda parece
bastante mecânico. Novas doses de reservas são convertidas por multiplicadores simples em
novos depósitos e a oferta de moeda aumenta. Modelos simples como esse são úteis para
explicar a relação entre depósitos bancários e reservas bancárias, mas dizem pouco sobre os
processos econômicos que estão por trás da criação de depósitos e moeda. Antes de passarmos
para modelos mais complexos de criação de depósitos, é conveniente parar um pouco e
examinar a natureza desses processos.
Quando os bancos se veem com reservas excedentes depois de uma compra de títulos no
mercado aberto pelo Banco Central, eles tentam converter essas reservas em ativos rentáveis.
Eles expandem o crédito bancário concedendo mais empréstimos e comprando títulos. Para
aumentar seus empréstimos, um banco oferece taxas de juros mais baixas sobre os empréstimos
e, às vezes, adota padrões mais baixos para aprovação de crédito. Ao comprar títulos, os bancos
elevam os preços desses títulos e provocam uma redução em sua taxa de juros. Um dos ativos
rentáveis que os bancos compram são hipotecas; assim, em épocas de expansão de crédito, as
taxas de juros sobre as hipotecas também cairão. Compras do Banco Central no mercado aberto,
assim como outras ações de política econômica expansionistas, levarão, portanto, a expansão do
crédito e a uma queda geral nas taxas de juros. Este é o outro lado do processo de criação de
depósitos e de moeda.

16.4.2 Criação de depósitos: casos mais gerais


Além de obscurecer o processo econômico envolvido, modelos simples como o da seção
anterior exageram o grau de precisão na relação entre as ações do Banco Central e as mudanças
resultantes no oferta de depósitos ou de moeda. Nesta subseção, vamos comentar algumas das
complexidades envolvidas nessa relação.
Primeiro, examinaremos o efeito de modificar nossa suposição de que a manutenção de
moeda corrente pelo público é constante ao longo de todo o processo de criação de depósitos.
Em vez disso, vamos supor, como parece provável, que, quando a quantidade de depósitos
aumenta, o público também escolhe manter um montante maior de moeda corrente. Nesse caso,
parte do aumento que ocorre na base monetária como resultado de uma compra no mercado
aberto acaba não como reservas bancárias aumentadas, mas como um aumento na manutenção
de moeda corrente pelo público.
Suponhamos, para simplificar, que o público mantenha uma proporção fixa de moeda
corrente em relação aos depósitos a vista – por exemplo, $1 em moeda para cada $4 em
depósitos a vista (MC/D = 0,25, onde MC indica moeda corrente). Agora, o indivíduo que, em
nosso exemplo anterior, vendeu o título de $1.000 para o Banco Central não depositará todos os
$1.000 em uma conta corrente, mas apenas $800, mantendo os $200 restantes como moeda
corrente (200/800 = 0,25 = MC/D). As reservas bancárias aumentarão apenas em $800 como
resultado da operação de $1.000 no mercado aberto. Além disso, em cada estágio da criação de
depósitos, à medida que os depósitos a vista crescem, a demanda do público por moeda corrente
também aumentará a fim de manter constante a proporção moeda corrente/depósitos a vista. Em
cada estágio, haverá mais uma passagem de reservas bancárias para moeda corrente.
Como consequência do fato de que as reservas aumentarão menos, o aumento nos depósitos
para um dado aumento na base monetária será menor quando a manutenção de moeda corrente
pelo público aumenta do que quando ela é fixa. O aumento na oferta de moeda também será
menor. Isso acontece porque cada unidade monetária da base monetária que faz parte das
reservas bancárias dá suporte a um número múltiplo de unidades monetárias em depósitos – 10
em nosso exemplo de uma taxa de reservas compulsórias de 10% –, enquanto cada unidade da
base monetária que termina como moeda corrente mantida pelo público é simplesmente $1 da
oferta de moeda. Quanto maior a parte do aumento da base monetária que vai para reservas
bancárias, maior será o multiplicador monetário.
Ao deixarmos de lado nossa suposição de que os bancos não mudam sua manutenção de
reservas voluntárias, encontramos mais uma razão para esperar que a expressão derivada na
subseção anterior (1/rcd) seja uma estimativa exagerada do verdadeiro multiplicador monetário.
Parece provável que, à medida que os depósitos aumentem, os bancos ampliem suas reservas
voluntárias. As reservas voluntárias são mantidas como uma garantia contra fluxos de depósitos
inesperados e, quando os depósitos aumentam, o mesmo acontece com o volume potencial dos
fluxos de depósitos. Além disso, como vimos, o processo de expansão de depósitos leva a uma
queda no nível das taxas de juros. O custo de manter reservas voluntárias é o lucro perdido por
não usar esses fundos para comprar ativos rentáveis. Quando a taxa de juros cai, esse custo
torna-se menor. Os bancos provavelmente responderão mantendo mais reservas voluntárias.
Se parte do aumento nas reservas bancárias acabar como novas reservas voluntárias, a
quantidade de depósitos criados por um dado aumento nas reservas será menor do que quando as
reservas voluntárias eram constantes. Em geral, quanto mais alta for a proporção entre reservas
voluntárias/depósitos a vista (RV/D) do banco, mais baixo será o multiplicador monetário. Em
tempos de crise, esta é uma relação crucial.
Em seguida, vamos considerar o efeito de modificar a suposição de que a manutenção de
depósitos a prazo e em poupança pelo público é fixa. Uma suposição mais realista seria que o
público aumenta seus depósitos a prazo e de poupança juntamente com sua manutenção de
depósitos à vista. Atualmente nos Estados Unidos, não há exigências de reservas compulsórias
para depósitos a prazo ou de poupança. Assim, não são necessárias reservas adicionais para
lastrear aumentos nesses depósitos. Portanto, o multiplicador para M1 não é afetado por seu
crescimento. A quantidade do aumento, no entanto, afeta o tamanho do multiplicador monetário
para M2, que inclui esses depósitos. Aqui, porém, limitaremos nossa atenção a M1.
Esta discussão leva à conclusão de que a expressão para o multiplicador monetário será mais
complexa do que a que derivamos na subseção anterior. Esperaríamos, em vez disso, que o
multiplicador monetário (m) para a oferta de moeda restritamente definida (M1) seja uma
função da seguinte forma:

O multiplicador monetário (m) depende:


1. Da taxa de reservas compulsórias sobre depósitos a vista (rcd); quanto mais alta a taxa de
reservas compulsória, menor o multiplicador monetário.
2. Da proporção desejada pelo público entre moeda corrente/depósitos a vista (MC/D); quanto
maior a proporção moeda corrente/depósitos a vista, menor o multiplicador monetário.
3. Da proporção entre reservas voluntárias/depósitos a vista (RV/D); quanto mais alta a
proporção desejada pelo banco entre reservas voluntárias/depósitos a vista, menor o
multiplicador monetário.
Se o valor do multiplicador monetário (m) em (16.8) fosse conhecido, o Banco Central
poderia prever a mudança na oferta de moeda que resultaria de uma determinada mudança na
base monetária:

A mesma informação pode ser expressa de modo ligeiramente diferente definindo-se uma
função oferta de moeda que dê a oferta de moeda correspondente a um dado nível da base
monetária:

A equação (16.10) substitui nossa suposição anterior de que a oferta de moeda era
determinada exogenamente. Antes de introduzir as complicações discutidas nesta subseção, uma
função oferta de moeda na forma da equação (16.10) ainda implicaria que a oferta de moeda
fosse exogenamente definida pelo Banco Central, desde que a base monetária fosse controlada
pelo Banco Central; o multiplicador monetário (m) dependia apenas da taxa de reservas
compulsórias sobre depósitos a vista, que era definida exogenamente pelo Banco Central. Com a
base monetária e o multiplicador monetário definidos pelo Banco Central, não haveria
participação do público ou do sistema bancário na determinação da oferta de moeda. A
expressão mais complicada para o multiplicador monetário dada pela equação (16.8) contém
variáveis determinadas pelo público não bancário (MC/D) e pelo sistema bancário (RV/D),
implicando que, mesmo que o Banco Central defina a base monetária exogenamente, o nível da
oferta de moeda não seria exógeno; ele depende em algum grau do comportamento do público e
do sistema bancário.

16.4.3 Operações no mercado aberto e a taxa dos fundos federais


Como foi observado anteriormente, o outro lado do processo de criação de depósitos e de
moeda é um processo pelo qual o crédito se expande e as taxas de juros declinam. Vamos
examinar melhor esse efeito de operações no mercado aberto. Quando os bancos se veem com
reservas em excesso, eles as convertem em ativos que rendem juros. Se comprarem títulos, eles
levam para baixo a taxa de juros sobre esses títulos. Para aumentar seu volume de empréstimos a
consumidores e firmas, eles baixam suas taxas de juros sobre os empréstimos.
Outro canal de empréstimos são os empréstimos para outros bancos, ou seja, o item
“Empréstimos interbancários” na Tabela 16.6. Esses empréstimos ocorrem no mercado de
fundos federais. Quando os bancos veem-se com mais reservas, alguns deles aumentam seus
empréstimos no mercado de fundos federais. Alguns bancos que eram tomadores de
empréstimos no mercado passam a tomar menos empréstimos, ou param de fazê-lo, ou tornam-
se emprestadores.5 Com mais empréstimos concedidos e menos empréstimos tomados no
mercado, a taxa dos fundos federais (a taxa de juros sobre empréstimos interbancários) diminui.
Ao conduzir a política monetária, os bancos centrais podem decidir se centrar na oferta de
moeda, no crédito ou nas taxas de juros. Todos esses aspectos são afetados por suas ações.
Quanto às taxas de juros, há a decisão de qual (ou quais) delas enfatizar. No Capítulo 17, vamos
ver que o Federal Reserve nos Estados Unidos foca a taxa de juros dos fundos federais, por
razões que serão explicadas.

16.4.4 Criação (ou falta de criação) de depósitos e crédito na crise


financeira
Para entender os problemas que levaram o Federal Reserve a procurar novos instrumentos,
vamos voltar ao início do processo de criação de depósitos e crédito conforme mostrado na
Tabela 16.7. A compra de um título do governo pelo Banco Central aumentou as reservas do
Banco A em $1000, apenas $100 dos quais precisam ser mantidos como reservas compulsórias.
As reservas voluntárias tiveram um aumento de $900. O Banco A converteria as reservas
voluntárias em novos empréstimos e o processo de criação de depósito e crédito seguiria em
frente. Mas e se o Banco A decidir manter as novas reservas voluntárias? Nesse caso, o processo
é congelado.
Foi isso que aconteceu, em grande medida, durante 2008-2011. Quando o Federal Reserve
injetou reservas no sistema bancário, os bancos simplesmente as retiveram como depósitos no
Banco Central. Foi assim que as reservas voluntárias cresceram para mais de US$ 1,3 trilhão
com a expansão do balanço patrimonial do Federal Reserve naquele período. Os bancos
comportaram-se dessa maneira porque relutavam em emprestar: tinham muitos empréstimos
inadimplentes em sua contabilidade, muitos títulos lastreados em hipotecas que eram difíceis de
valorizar e não tinham certeza de sua capacidade de obter recursos em mercados de capitais.
Eles estiveram “acumulando” dinheiro, assim como outros setores da economia. Nessas
circunstâncias, tudo que é obtido com uma compra de títulos do governo no mercado aberto é
uma oferta de crédito para o governo e um aumento um-para-um da oferta de moeda (depósitos).
Os novos instrumentos desenvolvidos pelo Federal Reserve, o chamado afrouxamento
quantitativo, são voltados a contornar o sistema bancário congelado e oferecer crédito
diretamente para vários setores da economia. A compra maciça de títulos lastreados em
hipotecas que é registrada no balanço patrimonial do Federal Reserve na Tabela 16.5 é um
exemplo. Um programa do Federal Reserve para comprar diretamente papéis comerciais
emitidos por empresas industriais como a General Electric e a Caterpillar é outro.

PERSPECTIVAS 16.1 – A OFERTA DE MOEDA DURANTE A GRANDE


DEPRESSÃO E A RECESSÃO RECENTE
O colapso monetário durante a Grande Depressão, que demonstra a importância potencial dos bancos e do público não
bancário no processo de oferta de moeda, é ilustrado na Figura 16.1. A parte a da figura apresenta o comportamento de dois
fatores que afetam o valor do multiplicador monetário (m): a proporção moeda corrente/depósitos (MC/D) e a proporção
reservas voluntárias/depósitos (RV/D). O primeiro deles é determinado pelo público e o segundo pelos bancos. Essas duas
proporções tiveram uma elevação acentuada no início da década de 1930. A causa do aumento de ambas as proporções foi o
grande número de falências bancárias; mais de 9.000 bancos faliram entre 1929 e 1933. As falências bancárias provocaram
uma perda de confiança nos depósitos bancários. Como consequência, o público manteve uma parte maior de seus saldos
monetários na forma de moeda corrente. Os bancos que não faliram mantiveram mais reservas voluntárias para evitar
“corridas” de depositantes que pudessem resultar na insolvência do banco.

FIG 16.1 Estatísticas monetárias, Estados Unidos, 1927-1934


Como é discutido neste capítulo, um aumento na proporção moeda corrente/depósitos ou na proporção reservas
voluntárias/depósitos faz o multiplicador monetário diminuir. Esse efeito pode ser visto na representação do multiplicador
monetário (m) na parte b da Figura 16.1. Ao lado do multiplicador, o outro fato que determina a oferta de moeda é a base
monetária (BM). A parte b da figura mostra que a base monetária aumentou nesse período. Como pode ser observado na
parte c, porém, o aumento na base monetária foi pequeno demais para impedir que a medida M1 da oferta de moeda tivesse
uma queda acentuada. Entre 1929 e 1933, M1 caiu 26,5%. O declínio de M2 foi ainda maior (33,3%).
O comportamento do Federal Reserve durante esse período foi criticado, em especial por Milton Friedman e outros
monetaristas, que veem a queda na oferta de moeda como a causa da Depressão. No entanto, existem dúvidas se o Fed, no
início da década de 1930, tinha os instrumentos adequados para impedir o colapso.a Agora, avancemos quase 80 anos até a
crise financeira recente. Para fins de comparação, a Figura 16.2 traz os dois últimos painéis da Figura 16.1 acima dos
gráficos das mesmas variáveis para os anos de 2003-2010. Esses são os anos que precederam e que incluem a crise
financeira e recessão profunda recentes. Como aconteceu durante a Depressão, o multiplicador monetário caiu a partir de
2007. Neste caso, a razão foi o grande aumento nos estoques de reservas voluntárias (RV/D) mantidas pelos bancos. Em
contraste com a experiência da Depressão, no entanto, o Federal Reserve aumentou a base monetária (BM) o suficiente para
que a oferta de moeda (M1) subisse em vez de cair entre 2007 e 2010, como pode ser visto nos painéis da direita na figura.
Em uma conferência em honra de Milton Friedman em 2002, Ben Bernanke. então um dos governadores do Fed, reconheceu
os erros do Federal Reserve durante a Depressão, dizendo: “Você tem razão, nós fizemos isso. Mas, graças a você, não
tornaremos a fazer”. Quando a crise surgiu em 2007-2008, Bernanke era presidente do Fed. Ele manteve a promessa.

FIG 16.2 Continuação

a Sobre essas questões, veja FRIEDMAN, Milton; SCHWARTZ, Anna. A monetary history of the United States. Princeton:
Princeton University Press, 1963; TEMIN, Peter. Did monetary forces cause the Great Depression? New York: Norton,
1976; e TEMIN, Peter. Lessons from the Great Depression. Cambridge: MIT Press, 1990.

Conclusão
A política monetária é o uso pelo Banco Central de vários instrumentos para influenciar a
moeda, as taxas de juros e a oferta de crédito na economia. As quatro primeiras seções deste
capítulo explicaram os instrumentos que o Banco Central utiliza para controlar a base monetária
(moeda corrente mais depósitos de reservas bancárias) e as ligações entre a base monetária,
oferta de moeda, crédito e taxas de juros. O processo de criação de depósitos posto em
movimento por uma compra no mercado aberto de títulos do governo foi examinado. Problemas
recentes nos mercados financeiros que levaram o Federal Reserve dos Estados Unidos a utilizar
novos instrumentos que vieram a ser chamados de afrouxamento quantitativo também foram
abordados.
O Capítulo 17 continua a discussão da política monetária. A ênfase muda para estratégias
monetárias alternativas: a escolha de alvos e instrumentos para bancos centrais.

Questões de revisão
1. Quais são os principais grupos de formulação de políticas econômicas dentro do Federal
Reserve System dos Estados Unidos? Explique sua composição e funções.
2. Suponha que o Banco Central queira aumentar as reservas bancárias. Explique as várias
medidas que poderiam ser tomadas para alcançar essa meta. Em cada caso, ilustre a ligação
entre a ação de política econômica do Banco Central e o nível das reservas bancárias.
3. Qual é o montante máximo de aumento nos depósitos a vista que pode resultar de um
aumento de $1.000 nas reservas compulsórias se a taxa de reservas compulsórias para
depósitos a vista for de 10%? Explique como esse aumento acontece no sistema bancário. Dê
duas razões pelas quais o aumento efetivo pode ficar abaixo do máximo teórico.
4. Suponha que o nível da taxa de reservas compulsórias sobre depósitos a vista seja de 0,10.
Suponha também que a manutenção de moeda corrente pelo público seja constante, assim
como as reservas voluntárias desejadas dos bancos. Analise os efeitos sobre a oferta de
moeda de uma venda de títulos pelo Banco Central no mercado aberto no valor de $1.000.
Em sua resposta, explique o papel do sistema bancário no ajuste a essa ação de política
monetária.
5. Explique o conceito do multiplicador monetário. Que fatores determinam a magnitude do
multiplicador monetário?
6. Dentro do modelo de curvas IS-LM usado nos Capítulos 6 e 7, mostre como a renda e a taxa
de juros serão afetadas por cada uma das seguintes mudanças:
a. Um aumento na taxa de reservas compulsórias para depósitos a vista.
b. Uma venda de títulos no mercado aberto pelo Banco Central.
c. Uma redução na taxa de redesconto do Banco Central.
7. O Federal Reserve dos Estados Unidos achou necessário utilizar novos instrumentos para
expandir o crédito durante a crise financeira que teve início em 2007. Dê um exemplo dos
instrumentos que foram desenvolvidos e explique os problemas que tornaram os novos
instrumentos necessários.
8. No modelo de curvas IS-LM, ilustre o conflito que o Banco Central enfrenta entre tentar
controlar a oferta de moeda e tentar obter níveis “desejáveis” da taxa de juros.
9. Como a taxa dos fundos federais seria afetada por uma venda de títulos pelo Banco Central
no mercado aberto? A taxa aumentaria ou diminuiria? Explique.
CAPÍTULO 17
Política monetária ótima

A incerteza não é apenas um aspecto importante do cenário da política monetária; é a


característica definidora desse cenário.
Alan Greenspan

O fim de semana de 13-14 de setembro de 2008 foi o ápice da recente crise financeira.
Formuladores de políticas reuniram-se em Nova York para tentar evitar o colapso do Lehman
Brothers, um dos quatro maiores bancos de investimento americanos. Apenas alguns dias antes,
o governo havia assumido o controle dos gigantes do financiamento imobiliário Fannie Mae e
Freddie Mac. Em março de 2008, o Federal Reserve tinha incorporado US$ 30 bilhões em ativos
do Bear Stearns em sua própria contabilidade para facilitar uma aquisição desse banco de
investimento pelo J.P. Morgan. Durante dois dias, foram feitas tentativas de negociar uma venda
do Lehman Brothers para o Bank of America, depois para o Barclays, um banco britânico. O
Bank of America preferiu comprar o Merrill Lynch e a negociação com o Barclay fracassou. Na
segunda-feira de manhã, o Lehman declarou falência. Dois dias depois, o Federal Reserve
resgatou o American International Group (AIG) a um custo de US$ 85 bilhões. O Federal
Reserve via-se diante de seu maior desafio desde a crise financeira durante a Grande Depressão
da década de 1930. As ações do Fed durante a crise financeira de 2007-2009 são uma parte do
tema deste capítulo. O foco é a condução ótima da política monetária. O que os bancos centrais
devem fazer?
A primeira seção discute a estrutura do Banco Central americano, o Federal Reserve System.
Examinamos em seguida as estratégias concorrentes de política monetária entre as quais o
Banco Central pode escolher e as bases em que a escolha é feita. Abordamos, então, a evolução
efetiva das estratégias de política monetária nos Estados Unidos nas últimas décadas e as
mudanças que se fizeram necessárias devido à recente crise. A última seção examina a política
monetária em outros países. A insatisfação com a condução da política monetária dentro das
estruturas legais existentes levou a mudanças institucionais nos bancos centrais de vários países.
Antes de prosseguir, damos uma olhada no quadro geral. Ao longo dos anos desde 1970, o
estudo da política monetária avançou até o ponto em que um artigo influente teve o título de
“The Science of Monetary Policy”. Nessa literatura, considerava-se que a política monetária
tivesse duas metas. Uma é equilibrar a economia quando esta é atingida por choques. A segunda
é proporcionar um ambiente estável de inflação e, portanto, de expectativas inflacionárias, para
ter credibilidade quanto à sua meta de estabilidade de preços. Na década de 1970, quando os
Estados Unidos e outras economias industrializadas foram atingidos por grandes choques de
oferta, entre outros, a meta de compensar os efeitos de choques predominou. Mais tarde, na
década de 1980, a administração das expectativas inflacionárias por meio da credibilidade
aumentou em importância. Expectativas inflacionárias estáveis eram vistas como fundamentais
para a desinflação nessa década. O período da chamada grande moderação de meados da década
de 1980 a 2006 pareceu diminuir a necessidade de políticas de estabilização ativas. Então,
depois de 2007, os choques sérios retornaram e a política monetária entrou em modo de
prevenção de crises. Essa sequência de mudanças de ênfase da política monetária como “gestão
de risco” para política como “gestão de expectativas de inflação” é o tema central deste capítulo.

17.1 O processo de formulação de políticas monetárias


Como foi explicado no Capítulo 16, os principais órgãos do Federal Reserve System são o
Board of Governors of the Federal Reserve e o Federal Open Market Committee (FOMC). O
Board of Governors tem sete membros nomeados pelo presidente dos Estados Unidos, com
confirmação do Senado, para mandatos de 14 anos, com um dos membros designado pelo
presidente do país como presidente do órgão por um período de quatro anos. O FOMC tem 12
membros com direito de voto – os sete do Board of Governors e cinco dos presidentes dos 12
bancos regionais do Federal Reserve. Os presidentes dos bancos regionais do Federal Reserve
servem em um esquema rotativo, com a exceção do presidente do Federal Reserve Bank of New
York, que é um membro com direito de voto permanente. As operações no mercado aberto, que
são o principal instrumento usado pelo Federal Reserve na condução da política monetária, são
administradas pelo FOMC.
Uma característica importante da estrutura do Federal Reserve, e em particular do FOMC, é o
considerável grau de independência dado à autoridade formuladora de políticas monetárias. Os
mandatos de 14 anos dos membros e o fato de eles não poderem ser renomeados após o fim do
mandato mantêm-nos isolados do processo político. O presidente do Board of Governors é
nomeado para um mandato de 4 anos, mas esse mandato não é coincidente com o do presidente
dos Estados Unidos. Portanto, um novo presidente da República não pode indicar imediatamente
seu próprio preferido para presidente do Board of Governors nem pode destituí-lo se discordar
de suas ações de política econômica. Os outros membros do FOMC, os presidentes dos bancos
regionais, são indicados pelos diretores dos bancos regionais com a aprovação do Board of
Governors.
Na década de 1970, o Congresso aprovou uma legislação exigindo relatórios periódicos do
Federal Reserve sobre a condução da política econômica, mas decisões de política monetária,
como a meta para a taxa de crescimento da oferta de moeda ou a meta para as taxas de juros, não
estão no âmbito na atividade do Congresso. Essas decisões são tomadas pelo FOMC. Além
disso, o Federal Reserve tem um grau de independência em relação ao processo de dotação
orçamentária, porque suas despesas são pagas por seus ganhos com juros sobre seu estoque de
títulos do governo.
Isso não quer dizer que o Federal Reserve seja completamente autônomo ou que a política
monetária seja conduzida em um cenário apolítico. O presidente do Board of Governors pode ser
renomeado (como presidente) durante o mandato de um presidente da República. O presidente
Jimmy Carter, por exemplo, não quis renomear Arthur Burns como presidente do Fed em 1978,
substituindo-o por G. William Miller. Em 1983, o presidente Ronald Reagan renomeou Paul
Volcker (que havia sido indicado por Carter em 1979, quando Miller tornou-se Secretário do
Tesouro), mas só depois de muita especulação de que Reagan iria preferir o seu próprio
indicado. Em 1987, quando Volcker pediu para não ser considerado para um terceiro mandato e
foi, então, substituído por Alan Greenspan, houve especulações de que ele teria feito isso porque
o presidente Reagan não havia dado sinais claros de que queria que Volcker permanecesse.
Greenspan, um republicano, candidatou-se à renomeação e foi reconfirmado no cargo pelo
presidente Bill Clinton em 1996 e 2000 e foi renomeado para essa posição pelo presidente
George W. Bush em 2004. Além disso, como os membros do órgão com frequência renunciam à
posição antes do final de seu mandato, um presidente da República às vezes pode fazer várias
indicações para o órgão e, assim, mudar o curso da política monetária. Em 2007, por exemplo, o
presidente George W. Bush havia indicado todos os membros do órgão, inclusive Ben Bernanke
como seu presidente. (Bernanke foi reconfirmado nessa posição pelo presidente Obama em
2010.)
Talvez mais importante seja o fato de que a independência do Federal Reserve é ela mesma
resultado de legislação do Congresso, e o Fed reconhece que novas legislações poderiam
enfraquecer essa independência. De fato, em momentos de sério conflito entre o Federal Reserve
e o governo ou o Congresso a respeito do curso adequado da política monetária, projetos de lei
para limitar a independência do Federal Reserve são com frequência propostos no Congresso.
As ações extraordinárias do Federal Reserve após a crise recente levaram a fortes críticas de
líderes Republicanos no Congresso. Além de cartas atacando as políticas do Federal Reserve,
eles propuseram uma legislação que permitisse ao GAO (Government Accounting Office), um
órgão do Congresso, auditar as ações de política econômica do FOMC. Esses conflitos quanto à
política do Federal Reserve dificultaram o preenchimento das vagas no Board of Governors.
Depois que a indicação de um economista ganhador do prêmio Nobel foi bloqueada pela
oposição Republicana no Senado em 2011, duas cadeiras no Board permaneceram vazias em
2012.
O FOMC reúne-se cerca de oito vezes por ano. Nessas reuniões, os membros examinam a
situação econômica doméstica e internacional no momento e analisam previsões do Federal
Reserve quando a eventos econômicos futuros. Com base nessas informações, eles formulam
uma “diretiva” para o Open Market Desk do New York Federal Reserve Bank, explicando como
as operações no mercado aberto devem ser conduzidas no período até a próxima reunião do
FOMC. A questão de uma estratégia de política monetária ótima pode ser vista como a escolha
de uma diretiva pelo FOMC.

17.2 Estratégias concorrentes: metas de agregados monetários ou de


taxas de juros
Em certo sentido, o que o Banco Central precisa fazer é claro. A política monetária deve ser
conduzida de uma maneira que promova um crescimento estável da demanda agregada. O
Banco Central deve impedir que a demanda cresça depressa demais, levando a inflação, ou
devagar demais, levando a alto desemprego e crescimento econômico lento.
Mas, como a citação de Alan Greenspan no início deste capítulo indica, a política monetária
precisa ser conduzida em um mundo incerto. Dado esse fato, que estratégia guiará melhor a
política monetária? A política monetária americana nas duas últimas décadas alternou-se entre
estratégias que punham a ênfase primária nos agregados monetários e, com mais frequência,
outras que enfatizavam as taxas de juros. Então, por razões que serão explicadas, o Federal
Reserve foi forçado, em 2008, a operar em um modo de crise em que a estratégia evoluía em
resposta aos eventos.
Nesta seção, descrevemos as estratégias de metas de agregados monetários e de taxas de
juros. Seções posteriores comparam seus méritos relativos e examinam como a política
monetária reagiu à crise financeira.
PERSPECTIVAS 17.1 - INDEPENDÊNCIA DO BANCO CENTRAL E
DESEMPENHO ECONÔMICO
O grau de independência do Banco Central às vezes varia muito de um país para outro. Alguns bancos centrais têm
independência quase completa, enquanto outros são subordinados ao ministério da Fazenda de seu país. O eixo horizontal
da Figura 17.1 mede a independência do Banco Central no final da década de 1980, usando um índice construído por
Alberto Alesina e Lawrence Summers para um grupo de países industrializadosa Quanto mais alto o valor do índice, maior
a independência. Os bancos centrais mais independentes do grupo estudado foram os da Suíça e da Alemanha, seguidos
pelo Federal Reserve dos Estados Unidos. O menos independente nessa época era o Banco da Nova Zelândia.
O eixo vertical da figura mostra a taxa de inflação média desses países no período de 1955-88. Note a inclinação negativa
da distribuição dos pontos; os países com bancos centrais mais independentes tiveram taxas de inflação mais baixas. Esse
melhor desempenho da inflação levou uma série de países, entre eles a Nova Zelândia, o Reino Unido e o Canadá, a
garantir mais independência para seu Banco Central. O Banco Central Europeu instituído pelos 11 (hoje 17) países que
adotaram o euro como a moeda comum recebeu um alto grau de independência. Esses aumentos da independência do
Banco Central estão entre as reformas institucionais discutidas na Seção 17.5.

FIG 17.1 Independência do Banco Central e a taxa de inflação média; a classificação é


do menos (1) para o mais (5) independente

a ALESINA, Alberto; SUMMERS, Lawrence. Central Bank independence and macroeconomic performance. Journal of
Money, Credit and Banking, 25, p. 151-162, May 1993.

17.2.1 Metas para agregados monetários


As metas finais que a autoridade monetária tenta controlar são variáveis de metas
macroeconômicas, como taxa de desemprego, taxa de inflação e crescimento do PIB real. Em
vez de simplesmente ajustar instrumentos de política monetária, principalmente o nível de
operações no mercado aberto, com base em observações passadas dessas variáveis e em
previsões de seu comportamento futuro, no curto prazo o Federal Reserve tem tentado às vezes
influenciar essas metas finais influenciando variáveis de metas intermediárias.
Uma meta intermediária é uma variável que o Banco Central controla não por ela ser
importante em si, mas porque, pelo controle dessa variável, os formuladores de políticas
acreditam estar influenciando as metas finais da política econômica de uma maneira previsível.
Com um agregado monetário como meta intermediária, a suposição implícita na estratégia do
Banco Central é que, outros aspectos mantendo-se constantes, taxas mais altas de crescimento da
oferta de moeda aumentam a inflação e reduzem o desemprego (elevando o nível de atividade
econômica) no curto prazo. Taxas de crescimento monetário mais lentas, novamente sendo tudo
o mais constante, estão associadas a taxas de inflação mais baixas e taxas de desemprego mais
altas no curto prazo.
Na experiência implantada pelo Federal Reserve americano, o processo de metas
intermediárias para um agregado monetário acontece da seguinte maneira. No início de cada
trimestre, o FOMC escolhe a meta de taxa de crescimento monetário que considera consistente
com suas metas de política econômica finais para o ano seguinte. O comitê faz essa escolha com
base em dados passados e previsões do comportamento da economia para determinadas taxas de
crescimento monetário. Depois que essa escolha é feita, a política monetária durante o trimestre
prossegue como se a meta de crescimento monetário escolhida fosse a meta final da política
monetária. Ações de política dentro do trimestre são voltadas a alcançar essa meta de
crescimento monetário.

17.2.2 Metas para taxa de juros


A alternativa a metas de agregado monetário é uma meta de taxa de juros. Metas de taxas de
juros são a estratégia atual do Federal Reserve americano e dos bancos centrais das outras
principais economias industrializadas do mundo. Vamos usar a estratégia atual do Federal
Reserve como exemplo para explicar as metas de taxas de juros.
O Federal Reserve define uma taxa alvo para a taxa dos fundos federais. Como foi explicado
no Capítulo 16, a taxa dos fundos federais é a taxa que os bancos cobram em empréstimos
interbancários. Como as metas de oferta de moeda, a meta para a taxa dos fundos federais é
escolhida em cada reunião do FOMC de modo a ser consistente com a obtenção das metas de
política econômica finais. Depois que a meta para a taxa dos fundos de federais é definida, o
Open Market Desk do Federal Reserve Bank of New York conduz operações no mercado aberto
para manter a taxa efetiva na meta ou próximo dela. Assim, por exemplo, se a taxa efetiva
começar a subir acima da meta, o órgão compraria títulos do governo para aumentar as reservas
bancárias. Isso aumentaria a concessão de empréstimos e reduziria a tomada de empréstimos no
mercado de fundos federais (como foi explicado na Seção 16.4), levando a uma queda da taxa de
juros.
Note que, ao realizar compras ou vendas no mercado aberto, o Open Market Desk aumenta
ou reduz as reservas bancárias, os depósitos bancários e, portanto, a oferta de moeda. Por
exemplo, para manter a taxa dos fundos federais dentro da meta, podem ser necessárias grandes
compras ou vendas no mercado aberto e, assim, grandes mudanças na oferta de moeda. O ponto
é que um foco na taxa de juros é, na verdade, uma alternativa ao estabelecimento de metas de
agregados monetários. O Banco Central não pode, em geral, fazer as duas coisas.
Antes de prosseguir, é útil mencionar algumas características adicionais dos processos de
controle da taxa de juros e da oferta de moeda. Taxas de juros de curto prazo podem ser
observadas no tempo em que ocorrem e controladas de perto. O Open Market Desk apenas olha
para a tela do computador e confere a taxa dos fundos federais atual. Portanto, a taxa dos fundos
federais é uma meta operacional de curto prazo. A oferta de moeda só é observada com um
atraso de uma ou duas semanas e, mesmo assim, com erros. Se a oferta de moeda for uma meta,
alguma outra variável que for mais frequentemente observada, como o nível das reservas
bancárias, deve servir como uma meta operacional. Outro ponto a notar é que a meta de taxas de
juros foca uma taxa de juros de curto prazo, como a taxa dos fundos federais. Taxas de juros de
longo prazo também podem ser observadas enquanto ocorrem, mas não podem ser controladas
de perto pelos bancos centrais. Vamos ignorar essa distinção entre taxas de longo e curto prazo
nas duas próximas seções, mas retornaremos a isso mais tarde.

17.3 Metas monetárias versus metas de taxa de juros na presença de


choques
Quando lhe foi perguntado qual sua receita para a política monetária, Mervyn King,
presidente do Bank of England, respondeu que “O segredo de uma boa política é refletir sobre a
natureza econômica dos choques que atingem a economia no momento”. Isso é o que vamos
fazer nesta seção com referência à escolha entre oferta de moeda ou taxa de juros como meta de
política econômica.

FIG 17.2 Caso ideal para metas de agregado monetário


Se a demanda por moeda for totalmente inelástica em relação aos juros e perfeitamente estável, então, ao atingir a meta de oferta
de moeda M*, o Banco Central fixa a curva LM vertical em LM(M*). A renda estará no nível desejado Y* qualquer que seja a
posição da curva IS.

17.3.1 Implicações de metas para agregados monetários


Começamos pela estratégia de estabelecer metas para um agregado monetário. Aqui e
também quando examinarmos o caso das metas de taxas de juros, usaremos o modelo IS-LM.

17.3.1.1 O caso ideal para o estabelecimento de metas para um agregado monetário


Vamos examinar primeiro o caso ideal para o estabelecimento de metas para um agregado
monetário. Esse caso é representado no modelo IS-LM na Figura 17.2. Vamos supor que o
Banco Central tenha uma única meta final: o nível de renda real (Y), cujo nível desejado é Y*.1
Suporemos também que, em um dado trimestre, com base em previsões, a autoridade de política
monetária conclua que o nível de renda desejado será atingido se a oferta de moeda for definida
em M*.2
A curva LM na Figura 17.2 é vertical, refletindo a suposição de que a demanda por moeda é
totalmente inelástica em relação aos juros. A demanda por moeda depende apenas da renda.
Além disso, consideramos que a função demanda por moeda é perfeitamente estável. Não há
deslocamentos na função – não há mudanças na quantidade de moeda demandada para um dado
nível de renda. No lado da oferta, considera-se que o Banco Central compense mudanças na
oferta de moeda que resultem do comportamento do público e do sistema bancário. Assim, se o
Banco Central alcançar seu nível desejado de oferta de moeda (M*), a curva LM será
perfeitamente estável em LM (M*) na Figura 17.2. Isso significa que atingir com sucesso a meta
da oferta de moeda significará, na verdade, atingir com sucesso a meta final da renda (Y*).
Para ver esse resultado, consideremos a situação representada na figura. Supomos que o
Banco Central não pode prever com certeza a posição da curva IS. Vamos supor que a posição
prevista para a curva seja IS0. Os fatores de demanda do setor real, como exportações,
investimento autônomo e gastos do governo, podem acabar sendo mais fracos do que o previsto,
fazendo a curva IS ficar à esquerda de IS0, em IS1. Alternativamente, esses fatores de demanda
do setor real podem ser mais fortes do que o previsto, fazendo a curva IS ficar em IS2, à direita
de IS0. Pela definição de uma meta para a oferta de moeda, o Banco Central assegura que a
curva LM vertical ficará fixa em LM (M*) e, em consequência, a renda estará em Y*, qualquer
que seja a posição da curva IS. Quando o Banco Central usa um agregado monetário como meta
intermediária, dentro do trimestre a política econômica transcorre como se a meta escolhida para
a oferta de moeda fosse a meta final da política monetária. No caso mostrado na Figura 17.2,
alcançar a meta da oferta monetária garante que a meta de renda será alcançada. Este é o caso
ótimo para uma meta monetária.
Repare que, embora alcançar a meta da oferta de moeda garanta que atingiremos a meta da
renda, choques imprevistos que desloquem a curva IS causarão instabilidade na taxa de juros. Se
a posição da curva IS for IS1 ou IS2 em lugar da posição prevista pelo Banco Central, IS0, a taxa
de juros será r1 ou r2 em vez do nível previsto, r0. Se o Banco Central também tivesse um nível
desejado para a taxa de juros, por exemplo r0, essa meta não seria alcançada.
17.3.1.2 Casos não ideais para o estabelecimento de metas para um agregado
monetário

FIG 17.3 Casos não ideais para o estabelecimento de metas monetárias

A parte a mostra que, se a demanda por moeda não for totalmente inelástica em relação aos juros e a curva LM tiver inclinação
positiva, alcançar a meta da oferta de moeda só fará a renda ficar no nível desejado Y* se a curva IS estiver na posição prevista
IS0. Se, devido a choques imprevistos, a curva IS estiver em IS1 ou em IS2, a renda se afastará de Y*, ficando em Y1 ou em Y2,
mesmo que M esteja em M*. Na parte b, supomos que o Banco Central atinja a meta da oferta de moeda M*, o que, com base em
sua previsão da demanda por moeda, deve fixar a curva LM em LM0(M*) e alcançar meta da renda, Y*. Se, devido a um choque
imprevisto na função demanda por moeda, a curva LM deslocar-se para LM1(M*) ou LM2(M*), a renda ficará em Y1 ou em Y2 e
a meta da renda não será atingida mesmo que a oferta de moeda esteja na meta M*.

A Figura 17.3 ilustra casos em que alcançar a meta da oferta de moeda não significa, de
modo geral, que a meta de renda será atingida. Na Figura 17.3a, ainda supomos que, se o Banco
Central atingir sua meta da oferta de moeda, ele fixará a posição da curva LM. Para que isso
aconteça, precisamos continuar supondo que a função demanda por moeda seja perfeitamente
estável. Não há deslocamentos imprevisíveis na demanda por moeda que possam deslocar a
curva LM referente a um dado valor da oferta de moeda. Na Figura 17.3a, não consideramos que
a demanda por moeda seja totalmente inelástica em relação aos juros; a curva LM, portanto, não
é vertical.
Nesse caso, note que, embora o Banco Central atinja seu nível desejado da oferta de moeda,
ele só atingirá a meta final da renda se a curva IS estiver em sua posição prevista, IS0 – só se a
previsão do Banco Central para o setor real, com base na qual foi feita a escolha da meta da
oferta de moeda, estivesse correta. Se a demanda do setor real fosse mais fraca do que o previsto
e a curva IS estivesse em IS1 na Figura 17.3a em vez de em IS0, a renda estaria em Y1, abaixo de
Y*. Se a demanda do setor real fosse mais forte do que o previsto e a curva IS estivesse em IS2, a
renda excederia o nível desejado. Em ambos os casos, a meta da renda não é alcançada mesmo
que o Banco Central alcance a meta da oferta de moeda, M*. Com uma curva LM não vertical, a
fixação da oferta de moeda não fixa o nível de renda.
Na Figura 17.3b, examinamos um caso em que a função demanda por moeda não é
perfeitamente estável. Há deslocamentos imprevistos na demanda por moeda para níveis dados
da renda e da taxa de juros. Esses choques na demanda por moeda deslocam a curva LM. Nesse
caso, mesmo que o Banco Central atinja sua meta para a oferta de moeda, a curva LM não será
fixa. Na Figura 17.3b, supomos que, com base em uma previsão da demanda por moeda, o
Banco Central prevê que a curva LM estará em LM0(M*). Para isolar mais claramente os efeitos
da incerteza quanto à demanda por moeda, vamos supor que a previsão do Banco Central sobre
o setor real seja correta: que a posição prevista e efetiva da curva IS seja IS0.
Se o Banco Central estiver usando a oferta de moeda como uma meta intermediária e atingir a
meta da oferta de moeda (M*), só atingirá a meta da renda (Y*) se a previsão da demanda por
moeda estiver correta – apenas se a curva LM estiver em LM0 (M*), como previsto. Isso pode ser
visto na Figura 17.3b. Se houver um choque imprevisto que aumente a demanda por moeda
acima do nível previsto e a curva LM ficar em LM1 (M*) em vez de em LM0(M*), a renda (Y1)
ficará abaixo do nível desejado.3 No caso inverso, quando um choque imprevisto reduz a
demanda por moeda abaixo do nível previsto e a curva LM está em uma posição como LM2
(M*), a renda estará em Y2, acima do nível desejado. Uma vez mais, alcançar a meta para a
oferta de moeda não garante que a meta da renda será atingida.

17.3.2 Implicações de metas para a taxa de juros


Em seguida, consideraremos uma estratégia de estabelecimento de metas para a taxa de juros.
Como no caso da meta para a oferta de moeda, consideramos que o formulador de políticas
tenha uma única meta final, a de manter a renda real (Y) em um nível desejado (Y*).
Se o Banco Central estabelecer uma meta para a taxa de juros, no modelo IS-LM a curva LM
torna-se horizontal. A curva LM representa o equilíbrio no mercado monetário. Para fixar a taxa
de juros, o Banco Central supre toda a moeda que for necessária para que o equilíbrio do
mercado monetário ocorra no nível desejado da taxa de juros.
Para ver como uma estratégia de metas de taxa de juros funciona, vamos examinar os
mesmos casos estudados para as metas de oferta de moeda.

17.3.2.1 Incerteza sobre a curva IS

FIG 17.4 Meta de taxa de juros com incerteza em relação a IS: elasticidade-juros da demanda
por moeda igual a zero
Com uma meta de taxa de juros, a curva LM é horizontal. Se a curva IS estiver em IS1 em vez de estar na posição prevista IS0, a
renda estará em Yr,1, abaixo do nível desejado. Se a oferta de moeda for a meta, a curva LM é vertical e a meta da renda é
alcançada.

Nos dois primeiros casos, pressupomos que a única incerteza é quanto à curva IS. A Figura
17.4 mostra a situação em que, como na Figura 17.2, a posição prevista da curva IS é IS0. Mas as
posições IS1 e IS2 poderiam ocorrer se, respectivamente, a demanda for mais fraca ou mais forte
do que o esperado. Além da curva LM horizontal, que é relevante quando a taxa de juros é
fixada (linha contínua), mostramos também (como uma linha tracejada) a posição da curva LM
que teria resultado se fosse estabelecida uma meta para a oferta de moeda (em M*). Na Figura
17.4, supomos que a demanda por moeda seja totalmente inelástica em relação aos juros
(elasticidade-juros igual a zero). Portanto, se a oferta de moeda fosse a meta intermediária, a
curva LM seria vertical.
Vemos na Figura 17.4 que, com a meta da taxa de juros em r*, só atingiremos a meta da
renda, Y*, se a curva IS estiver na posição prevista IS0. Se, por exemplo, a demanda por
investimentos das firmas ficasse abaixo do previsto e a curva IS estivesse em IS1, a renda cairia
abaixo do nível desejado (para Yr,1). No caso mostrado na Figura 17.4, estamos em melhor
situação com uma meta de oferta de moeda, em que ficamos em Y* qualquer que fosse a posição
da curva IS.
A Figura 17.5 representa o caso em que consideramos apenas que haja incerteza quanto à
curva IS, mas não supomos mais que a demanda por moeda seja completamente inelástica em
relação aos juros. (Esse é o caso representado na Figura 17.3a.) A suposição sobre a
elasticidade-juros da demanda por moeda não tem efeito sobre a curva LM quando a taxa de
juros é a meta. Essa curva LM (a reta LM contínua na figura) é horizontal porque o Banco
Central supre quanta moeda for necessária para manter a taxa de juros em r*. A curva LM com
uma meta de oferta de moeda, mostrada como uma linha tracejada na Figura 17.5, LM(M*), terá
agora inclinação positiva em vez de ser vertical.
Uma vez mais, a posição prevista da curva IS é IS0, mas a curva pode acabar ficando em IS1
ou em IS2 se, respectivamente, a demanda do setor privado for mais fraca ou mais forte do que o
previsto. Como na Figura 17.4, a meta da oferta de moeda é melhor que a taxa de juros na tarefa
de manter a renda próxima de Y* quando a curva IS não está no nível previsto. Se a curva IS
estiver em IS1 ou em IS2, a renda ficará em Y1 ou em Y2, respectivamente, quando a meta é a
oferta de moeda. Com uma meta de taxa de juros, a renda ficaria em Yr,1 ou em Yr,2,
respectivamente, para as mesmas posições da curva IS; ambos os níveis são mais distantes de
Y*.
Assim, vemos que, quer a curva LM seja vertical ou tenha inclinação positiva, uma meta de
oferta de moeda é melhor que uma meta de taxa de juros quando a incerteza com que se
defronta o formulador de políticas refere-se à curva IS. A razão para isso é que, quando a curva
IS afasta-se de sua posição prevista, o movimento da taxa de juros amortece o efeito do
deslocamento sobre a renda. Quando a taxa de juros tem uma meta estabelecida, esse
amortecedor monetário é desativado.
Consideremos os efeitos de um aumento autônomo na demanda por investimentos (por
exemplo, um deslocamento de IS0 para IS2 na Figura 17.5). Se a oferta de moeda for a meta,
quando o aumento nos investimentos faz a renda aumentar, a demanda por moeda sobe e, com
uma oferta de moeda fixa, a taxa de juros precisa subir (para r2 na Figura 17.5). A elevação da
taxa de juros atuará contra o aumento autônomo da demanda e fará os investimentos subirem
menos do que subiriam de outra forma. Se o Banco Central estiver trabalhando com uma meta
de taxa de juros, isso não acontecerá. À medida que a renda aumenta, para manter a taxa de juros
em r* o Banco Central precisa fazer compras no mercado aberto a fim de expandir a oferta de
moeda o suficiente para satisfazer a maior demanda por moeda.

FIG 17.5 Meta de taxa de juros com incerteza quanto a IS: elasticidade-juros da demanda por
moeda diferente de zero
Se houver uma meta para a taxa de juros e a curva IS estiver em IS1, a renda estará em Yr,1. Se a oferta de moeda for a meta, com
a curva LM não vertical, a renda também ficará abaixo do nível desejado, mas menos, em Y1.

17.3.2.2 Incerteza com relação à demanda por moeda


A Figura 17.6 mostra o caso em que a demanda por moeda não é perfeitamente estável (o
caso mostrado na Figura 17.3b). Com a taxa de juros como meta, a curva LM é horizontal e não
se desloca quando há um deslocamento na função demanda por moeda. Se, por exemplo, um
choque positivo (um novo tipo desejável de depósito bancário) aumentar a demanda por moeda
a um dado nível de renda e da taxa de juros, o Banco Central aumenta a oferta de moeda.
Choques na demanda por moeda, portanto, não afetam a renda com uma meta de taxa de juros.
A renda real permanecerá no nível desejado Y*.

FIG 17.6 Meta de taxa de juros com incerteza em relação a LM


Se for estabelecida uma meta de taxa de juros, a curva LM é horizontal e não se desloca quando há um choque na demanda por
moeda. O choque na demanda por moeda não desloca a renda do nível desejado. Se a oferta de moeda for a meta, um choque
positivo na demanda por moeda deslocará a curva LM de LM0(M*) para LM1(M*); a renda cairá abaixo do nível desejado, para
Y1.

Com uma meta de oferta de moeda, porém, um choque positivo na demanda por moeda
desloca a posição da curva LM para fora do nível previsto, mesmo que a meta de oferta de
moeda seja atingida. Se, com a meta monetária, M*, a posição esperada da curva LM fosse a
linha tracejada LM0(M*), um choque positivo na demanda por moeda deslocaria a curva para
LM1(M*). A taxa de juros aumentaria para r1 e a renda cairia para Y1, abaixo de Y*.
Vemos, então, que, se a incerteza centrar-se na instabilidade da demanda por moeda, uma
meta de taxa de juros é preferível a uma meta de oferta de moeda. Se a taxa de juros for a meta,
o setor real (mercado de produtos) é isolado de choques na demanda por moeda; a oferta de
moeda ajusta-se para manter o nível desejado da taxa de juros. No caso de uma meta da oferta de
moeda, o choque na demanda por moeda afeta a taxa de juros e, portanto, a renda é alterada.

17.4 Méritos relativos das duas estratégias


O que é possível concluir sobre as vantagens e desvantagens relativas de escolher um
agregado monetário ou uma taxa de juros como meta para a política monetária?

17.4.1 As fontes de incerteza e a escolha de uma estratégia de


política monetária
A análise na seção anterior indica que uma consideração importante na escolha entre metas
intermediárias alternativas é a origem da incerteza enfrentada pelo formulador de políticas
monetárias. Se as fontes predominantes de incerteza forem deslocamentos imprevisíveis da
curva IS, uma meta de oferta de moeda é melhor que uma meta de taxa de juros. A implicação
disso para a economia é que, quando a incerteza vem de fontes como mudanças imprevisíveis
nos gastos com investimentos do setor empresarial, investimentos em construção de moradias e
compras de bens de consumo duráveis – ou seja, demandas do setor privado por produtos –, a
meta de oferta de moeda é preferível.
Vimos que a meta de taxa de juros é melhor quando a incerteza deriva de deslocamentos da
curva LM devidos a instabilidade da demanda por moeda. No modelo IS-LM, os ativos são
divididos em dois grupos: um identificado como moeda e o outro composto de ativos não
monetários chamados genericamente de títulos. Qualquer fator que modifique a desejabilidade
relativa dos dois ativos desloca a curva LM no modelo. A implicação disso para a economia é
que, quando a fonte predominante de incerteza centra-se em deslocamentos das demandas por
ativos (títulos e moeda), a taxa de juros é a meta intermediária preferível.

17.4.2 Outras considerações: Credibilidade e administração das


expectativas
Uma vantagem adicional de uma meta de oferta de moeda é que um forte compromisso de
manter a oferta de moeda crescendo dentro de uma faixa definida assegura o controle da inflação
para períodos de médio prazo (por exemplo, 3 a 5 anos). Praticamente todos os economistas
acreditam que uma inflação alta persistente requer uma acomodação do crescimento da oferta de
moeda. Metas rígidas de oferta de moeda limitam seriamente a acomodação monetária.
Defensores do estabelecimento de metas de agregados monetários afirmam que, ao definir
metas baixas e não inflacionárias a oferta de moeda e atingi-las, o Banco Central pode construir
uma credibilidade anti-inflacionária; o público começa a acreditar que o Banco Central realizará
as políticas anunciadas. Essa estratégia tem a vantagem de manter as expectativas inflacionárias
em um nível baixo. Uma maneira de expressar esta propriedade do estabelecimento de metas de
agregados monetários é que a estratégia proporciona uma âncora nominal para a economia
manter estáveis os níveis de preços.
Uma meta de taxa de juros não proporciona essa garantia anti-inflacionária. Se o Banco
Central estabelecer uma meta de taxa de juros, terá de aumentar a oferta de moeda para
acomodar qualquer aumento na demanda por moeda. Se surgir qualquer crescimento
potencialmente inflacionário, a demanda por moeda aumentará (maior demanda por transações).
O Banco Central pode, então, ser levado contra a sua vontade a estimular a inflação por meio de
um aumento na oferta de moeda para acomodar o aumento da demanda. Isso não é inevitável; o
Banco Central pode, em vez disso, observar o potencial de inflação e elevar a meta da taxa de
juros. A questão aqui é simplesmente que atingir uma determinada meta de taxa de juros não
oferece proteção contra inflação.
Um último ponto sobre a estratégia da taxa de juros relaciona-se à distinção entre taxas de
juros de curto e de longo prazo. A taxa de juros que o Banco Central pode controlar é a de curto
prazo, como as taxas dos fundos federais, ou de empréstimos interbancários. Mas, os gastos do
setor privado podem depender mais fortemente de taxas de juros de longo prazo, como as de
títulos empresariais. As taxas de juros de longo prazo estão sujeitas a muitas outras influências
além do controle do Banco Central. Em particular, títulos de longo prazo permanecerão no
mercado por muitos anos e competirão com ativos financeiros de curto prazo que serão emitidos
no futuro. Assim, ao avaliar a desejabilidade de títulos de longo prazo, os investidores levarão
em conta expectativas de taxas de juros de curto prazo futuras e, portanto, expectativas de ações
de política monetária futuras. O mercado de títulos de longo prazo, como a bolsa de valores, é
um mercado voltado para o futuro e fora de qualquer controle rígido do Banco Central. Isso foi
exemplificado nos Estados Unidos entre 2004 e 2006, quando o Federal Reserve elevou a taxa
dos fundos federais de 1% para 5,25%, enquanto a taxa dos títulos governamentais de 10 anos
não se moveu.

17.5 A evolução da estratégia do Federal Reserve


Nos anos desde 1970, o Federal Reserve tem alternado entre uma ênfase no controle da taxa
de juros e no estabelecimento de metas para agregados monetários. Duas vezes durante esse
período, o Federal Reserve passou drasticamente de uma estratégia para outra. Em 2008, mais
uma mudança foi necessária devido à gravidade da crise financeira. A estratégia do Federal
Reserve, assim como as razões para essas mudanças, podem ser mais bem explicadas
examinando alguns subperíodos.

17.5.1 1970-1979: estabelecimento de metas para as taxas dos


fundos federais
A estratégia do Federal Reserve na década de 1970 foi de metas de taxas de juros. Como
acontece hoje, a taxa escolhida foi a taxa dos fundos federais A estratégia não foi fixar a taxa em
um determinado valor para um longo período. A meta era revista em cada reunião do FOMC e
ajustada conforme considerado necessário diante do cenário da economia.
Os agregados monetários não foram ignorados na década de 1970. Embora numa base mensal
o controle das taxas de juros tenha recebido precedência, o Federal Reserve procurou atingir
metas anuais de crescimento em várias medidas da oferta de moeda. Ainda assim, em diversos
momentos nessa década, o Federal Reserve deixou que as metas de oferta de moeda não fossem
alcançadas a fim de manter a taxa de juros desejada.

17.5.2 1979-1982: estabelecimento de metas para agregados


monetários
A primeira mudança drástica na política econômica do Federal Reserve aconteceu em 6 de
outubro de 1979, quando o banco abandonou as metas de taxa dos fundos federais. Em vez
disso, foi adotada uma estratégia de controle direto das reservas bancárias para aumentar a
capacidade do banco de manter o crescimento dos agregados monetários (M1 e M2) dentro de
faixas estabelecidas. Nossa análise anterior neste capítulo é útil para compreender as razões
dessa mudança.
Em 1979, a taxa de inflação estava se acelerando rapidamente. A recessão que muitos haviam
esperado durante o ano não se materializara. Havia muita incerteza quanto à força da demanda
do setor privado. Nessa situação de incerteza quanto à curva IS, um agregado monetário é
melhor que uma taxa de juros como meta intermediária.
Também vimos que um compromisso com a obtenção de metas de baixo crescimento da
moeda praticamente garante que altas taxas de inflação não serão mantidas, enquanto uma meta
de taxa de juros nominal não oferece essa garantia. Com a taxa de inflação acima de 13% em
1979, essa era uma vantagem considerável.

17.5.3 1982-2008: um retorno gradual às metas de taxas dos fundos


federais
Embora o Federal Reserve não tenha sido totalmente bem-sucedido em alcançar as metas de
oferta de moeda no período de 1979-1982, a maioria dos observadores considera que a mudança
para uma política monetária mais restritiva em 1979 foi responsável pela queda da inflação para
um nível em torno de 4% em 1982, ainda que ao custo de uma recessão séria em 1981-1982.
O Federal Reserve, porém, abandonou a estratégia de metas intermediárias de agregados
monetários no verão de 1982, a segunda das mudanças de política econômica mencionadas
anteriormente. Embora o Fed tenha voltado, mais tarde, a especificar taxas de crescimento
desejadas para o agregado M2 e, em alguns anos, também para o agregado M1, essas metas não
assumiram tanta importância no período pós-1982 como durante 1979-1982.
A razão para a menor atenção aos agregados monetários foi a ruptura da relação moeda-renda
que ocorreu na década de 1980. Houve uma substancial instabilidade na demanda por moeda
durante esse período. As flutuações na demanda por moeda não refletiam as condições
econômicas subjacentes; elas eram mais fortemente influenciadas por inovações no mercado de
depósitos quando houve uma desregulamentação e os bancos passaram a oferecer muitos novos
tipos de depósitos.
A instabilidade da demanda por moeda e a consequente incerteza quanto à curva LM são a
condição que favorece a taxa de juros como meta intermediária. O Federal Reserve relutou em
voltar à estratégia de estabelecer metas para a taxa dos fundos federais, em parte pelo receio de
que, como na década de 1970, essa estratégia desse proteção insuficiente contra uma aceleração
da inflação. Portanto, ao longo da década de 1980, o Federal Reserve continuou a monitorar de
perto o comportamento dos agregados mais amplos, em especial M2, para garantir que o
crescimento da oferta de moeda não fosse rápido o bastante para gerar pressão inflacionária.
Durante a recuperação da recessão de 1990-1991, porém, M2 também começou a “se comportar
mal”. Apesar do cenário de baixas taxas de juros e expansão econômica, a demanda pelo
agregado M2 crescia muito lentamente, o que significa dizer que a velocidade de M2 crescia
muito rápido. O Federal Reserve respondeu com uma nova redução da atenção às metas de
agregados monetários. Em 1995, a política monetária havia retornado a uma estratégia de quase
completa concentração na taxa dos fundos federais. Essa reversão para a estratégia de política
econômica da década de 1970 ficou explícita em 1997, quando a diretiva de política econômica
do FOMC foi reformulada para definir uma meta específica para a taxa dos fundos federais.

17.5.4 1994-2012: um movimento em direção a maior transparência


Esta é uma frase famosa de Alan Greenspan: “Eu sei que você acredita que entende o que
acha que eu disse, mas não estou certo se percebe que o que você ouviu não é o que eu quis
dizer”. Greenspan era conhecido por suas falas obscuras. No entanto, sob sua liderança, o
Federal Reserve começou a se mover para uma maior transparência em 1994. Acabamos de
comentar que, em 1997, a diretiva do FOMC começou a definir uma meta explícita para a taxa
dos fundos federais. Antes, em 1994, o comitê havia começado a emitir um comunicado de
imprensa depois de cada uma de suas reuniões, anunciando as ações decididas. Outros passos se
seguiram. Em 1999, passou-se a anunciar “balanço de riscos” percebido, indicando suas
preocupações relativas quanto à inflação e crescimento do produto. Em 2003, o FOMC começou
a fazer uma declaração com previsões sobre a direção provável da taxa dos fundos federais nas
próximas uma ou duas reuniões. A partir de 2012, o Federal Reserve publicará previsões de cada
membro do FOMC (sem identificação) sobre os valores futuros da taxa dos fundos federais, ou
seja, previsões de suas ações futuras. Cada uma dessas inovações tinha o objetivo de
proporcionar mais orientação aos mercados financeiros sobre a política monetária atual e
futura.4

PERSPECTIVAS 17.2 - A REGRA DE TAYLOR


Com uma estratégia de meta da taxa dos fundos federais, a política monetária pode ser representada por uma função
reação da taxa de juros que mostra a resposta da taxa de juros à situação da economia. John Taylor, na época membro do
U.S. Council of Economic Advisors (depois Subsecretaria do Tesouro para Assuntos Internacionais), propôs uma regra
para definir a taxa dos fundos federais, que recebeu muita atenção.
A regra que Taylor propôs foi a seguinte:

em que: RF = a taxa dos fundos federais

pdot = a taxa de inflação

Y= o produto real
e o sobrescrito (*) é o nível desejado para cada uma dessas variáveis.
A regra sugerida por Taylor faria com que o Federal Reserve aumentasse a taxa de juros automaticamente em 1 ponto
percentual para cada ponto percentual de aumento na taxa de inflação (o primeiro termo da regra). A taxa dos fundos
federais também subiria mais 0,5 ponto percentual para cada 1 ponto percentual de aumento na taxa de inflação em relação
à sua meta (pdot*) ou no produto em relação à meta para o produto (Y* = produto potencial). A política monetária se
tornaria mais restritiva quando a inflação subisse e mais expansionista quanto o produto caísse, sempre em relação às
metas. O último termo da equação (17.1) é a taxa real de equilíbrio dos fundos federais, a taxa que, ajustada para a
inflação, seria escolhida se tanto o produto como a inflação estivessem em seus níveis desejados.
Muito da atenção dada à regra de Taylor veio do fato de que a equação (17.1) fez um bom trabalho na identificação do
comportamento efetivo da política monetária no final da década de 1980 e início de 1990. Teria o Federal Reserve seguido
algo como uma regra de Taylor durante aqueles anos? Além disso, Taylor argumentava que, se a política tivesse seguido
uma regra de Taylor, erros teriam sido evitados em anos anteriores. A política econômica, dizia ele, teria sido mais
restritiva no período inflacionário da década de 1970. Como consequência, a política teria sido menos restritiva no início
da década de 1980, reduzindo o desemprego nesse período.
A discussão da regra de Taylor é um exemplo do interesse crescente pela política monetária baseada em regras em vez de
discricionária. A regra de Taylor não é uma “regra ótima”; ela segue mais no espírito da crença de Milton Friedman de
que, ao escolher um curso para a política monetária, “O melhor não deve ser inimigo do bom”.
a Veja TAYLOR, John. Discretion versus monetary policy rules in practice. Carnegie-Rochester Conference Series on Public
Policy, 39, p. 195-214, 1993.

17.5.5 2008-2012: Confrontando o problema do limite zero


No início da crise financeira de 2007-2008, o Federal Reserve estava conduzindo a política
com uma estratégia de taxa de fundos federais. No verão de 2008, em um esforço para reverter a
contração da economia, o Banco Central havia reduzido a taxa dos fundos federais
essencialmente para zero (faixa de 0-0,25%). Zero é o limite inferior efetivo para a taxa dos
fundos federais ou para qualquer outra taxa de juros nominal. Os bancos, por exemplo, não
pagarão para outros bancos tomarem seus fundos em empréstimo5. Em meados de 2008, como
foi discutido no Capítulo 16, grandes partes do mercado de crédito ficaram congeladas. O
processo de criação de depósitos e crédito normalmente desencadeado por compras no mercado
aberto tinha parado. Essa situação levou o Federal Reserve a adotar uma série de instrumentos
de política monetária não convencionais. Como também foi discutido no Capítulo 16, essas
iniciativas de política econômica incluíram grandes compras de títulos lastreados em hipotecas e
de papéis comerciais. Outras ações foram empréstimos para proteger fundos e outras firmas de
investimento, que foram usados para financiar a compra de títulos lastreados em empréstimos
educativos, empréstimos para compra de carros e contas a receber de cartões de crédito. Em
conjunto, essas iniciativas foram chamadas de afrouxamento quantitativo. O Federal Reserve
procurava fornecer crédito para uma série de setores da economia que, de outra forma, teriam
desacelerado devido à escassez de recursos bancários.

Problema do limite zero


Confronta os bancos centrais quando a taxa de juros
nominal que eles usam como um instrumento atinge o
limite inferior zero; eles não podem mais estimular a
economia com declínios significativos dessa taxa.

17.6 Mudanças nas instituições dos bancos centrais: a experiência


internacional recente
Nos Estados Unidos, a estratégia de política monetária mudou conforme o ambiente
econômico variava. A estrutura institucional do Federal Reserve, contudo, não mudou de
nenhuma maneira significativa. Outros países industrializados, a partir do final da década de
1980, fizeram mudanças importantes na estrutura dos bancos centrais. Em resposta ao que os
governos acreditavam ser um desempenho macroeconômico insatisfatório, muitos países
alteraram os mandatos e o sistema de prestação de contas de seus bancos centrais.
A mudança mais comum foi instruir os bancos centrais a usarem metas de inflação como a
única meta da política monetária. Entre os países que adotaram metas de inflação como um
mandato para seus bancos centrais estão Canadá, Nova Zelândia, Reino Unido e Suécia. Além
disso, o novo Banco Central Europeu adotou metas de inflação.
Nos Estados Unidos, como em todos esses países, a inflação baixa sempre foi uma meta de
política monetária. Na década de 1990, esses países decidiram fazer da inflação baixa a única
meta da política monetária. Por quê?
Examinamos aqui duas linhas na argumentação em favor do movimento para metas de
inflação em muitos países industrializados. A primeira, que deriva da perspectiva
macroeconômica novo-clássica, é o reconhecimento de problemas de inconsistência temporal
que surgem quando a política monetária é conduzida segundo o critério das autoridades dos
bancos centrais. A segunda envolve considerações mais pragmáticas. Ambos nos levam de volta
aos argumentos referentes à formação de políticas macroeconômicas baseadas em regras versus
discricionárias.

Inconsistência temporal
Problemas surgem quando um plano de política
econômica para o futuro não é mais ótimo em uma
data posterior mesmo sem que nenhuma informação
nova tenha chegado nesse intervalo.

17.6.1 O problema da inconsistência temporal


Nossa análise até aqui sugere que a estratégia de política monetária deve mudar com o tempo,
conforme as fontes de incerteza enfrentadas pelos formuladores de políticas variam. Essa visão
preconiza flexibilidade, ou políticas discricionárias. O reconhecimento de problemas de
inconsistência temporal na formação de políticas, porém, oferece apoio para o argumento em
favor de políticas baseadas em regras.
Um problema de inconsistência temporal (ou dinâmica) para as políticas monetárias surge
quando, como explica Stanley Fischer, uma “política para o futuro que faz parte de um plano
ótimo formulado em uma data inicial deixa de ser ótimo na perspectiva de uma data posterior,
mesmo sem que nenhuma informação nova tenha aparecido nesse intervalo”.6 Em outras
palavras, um anúncio de política econômica será inconsistente no tempo se os agentes
econômicos souberem que o formulador de políticas vai querer passar por cima dessa decisão
quando chegar o momento de agir.
Aplicado à política monetária discricionária, o problema da inconsistência temporal surge da
seguinte maneira.7 Suponhamos que, devido a alguma distorção na economia, o bem-estar social
aumentaria se o produto subisse acima da taxa natural, o nível discutido no Capítulo 10 que é
consistente com uma previsão precisa do nível de preços pelos definidores de preços e salários.
Uma razão possível poderia ser que características não competitivas dos mercados de trabalho e
produto levam a uma taxa natural que é baixa demais (por exemplo, o resultado no modelo
incluído-excluído na Seção 12.2). Além disso, suponhamos que, em linha com a hipótese das
expectativas racionais examinada no Capítulo 11, o formulador de política monetária possa
forçar o produto a subir acima da taxa natural por meio da geração de uma taxa de crescimento
monetário inesperadamente alta. Por fim, vamos supor que, como é razoável, salários e preços
sejam estabelecidos a intervalos menos frequentes (por exemplo, anualmente) do que a
implementação de ações de política monetária (por exemplo, mensalmente).

PERSPECTIVAS 17.3 - METAS DE INFLAÇÃO NA PRÁTICA: A


EXPERIÊNCIA DA NOVA ZELÂNDIA, 1989-2012
Depois de duas décadas com taxas de inflação mais altas que a média da OCDE (Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico) e taxas de crescimento abaixo dessa média, o governo da Nova Zelândia adotou uma forma
muito rígida de meta de inflação em 1990. As principais disposições para a política monetária estão contidas no Reserve
Bank Act de 1989.a A lei especifica que a principal função do Reserve Bank of New Zealand é “manter a estabilidade do
nível geral de preços”. A lei determina que o Ministro das Finanças e o presidente do Reserve Bank cheguem a um acordo
sobre metas de política monetária para alcançar estabilidade de preços. Durante boa parte da década de 1990, a
estabilidade de preços foi definida como uma taxa de inflação dentro de uma faixa de 0-2%. Em 1997, essa definição foi
um pouco afrouxada para uma faixa de 0-3%.
O Reserve Bank está, então, livre para escolher a estratégia que achar mais adequada para alcançar a meta. Se a inflação
não for mantida dentro da faixa especificada, o presidente do Reserve Bank fica sujeito a demissão. Assim, o arranjo ficou
conhecido como um contrato de desempenho para o Banco Central.
Esse tipo de meta de inflação deixa o Banco Central com pouco espaço para buscar diretamente outras metas além da
estabilidade de preços; essa restrição foi justamente o objetivo da lei. O fato de a meta de inflação ser uma faixa acaba
deixando alguma margem para levar em conta o crescimento econômico ou o desemprego na formulação da política
monetária. Além disso, o acordo de política entre o Ministro das Finanças e o Reserve Bank admite ajuste da meta de
inflação se houver circunstâncias especiais, como mudanças nos impostos indiretos (impostos sobre vendas e consumo) ou
nas relações de troca internacionais que produzam uma mudança no nível de preços. Ainda assim, o plano da Nova
Zelândia é uma forma muito rígida de meta de inflação. Depois de um período de ajuste inicial, o desempenho da
economia neozelandesa sob o sistema de meta de inflação tem sido razoavelmente bom. O crescimento do PIB real e a
inflação têm se mantido em uma média de 2% a 3% ao ano entre 1992-2010. Isso se compara favoravelmente ao
desempenho de nações mais industrializadas.
O sistema de metas de inflação, no entanto, enfrentou algumas dificuldades. O foco da política monetária na inflação
forçou algumas vezes o Reserve Bank a elevar as taxas de juros de curto prazo da Nova Zelândia a níveis muito altos. Isso,
por sua vez, leva a grandes entradas de capitais e a uma resultante valorização do dólar neozelandês. O valor alto da
moeda é ruim para os exportadores. Em meados de 2007, com a taxa de juros de curto prazo em 8%, por exemplo, o
Reserve Bank interveio no mercado cambial para tentar baixar o valor do dólar neozelandês em resposta a queixas dos
exportadores. O regime de metas de inflação foi desafiado novamente no outono de 2008, durante a crise financeira
mundial. Quando as exportações da Nova Zelândia caíram e a economia entrou em recessão, o Reserve Bank alterou seu
objetivo. A meta agora era “promover uma economia crescente, aberta e competitiva” em que a estabilidade de preços
deveria desempenhar “um papel importante no apoio a esse objetivo”. Metas de inflação ainda foram anunciadas, mas o
Banco havia sinalizado que o crescimento também era importante.
a A experiência da Nova Zelândia com metas de inflação é descrita em FISCHER, Andreas. New Zealand’s experience with
inflation targets. In: LEIDERMAN, Leonardo; SWENSSON, Lars E. O. (Orgs.). Inflation targets. Paris: Center for
Economic Policy Research, 1995 e em GUENDER, Alfred; RIMER, Oyvinn. The implementation of monetary policy in
New Zealand, North American Journal of Economics and Finance, 19 (2008), pp. 215-34.

Em um momento, digamos que o início do ano, o formulador de políticas poderia anunciar


uma taxa de crescimento monetário não inflacionária igual a zero. Mais tarde no ano, porém,
depois que salários e preços tivessem sido estabelecidos, o formulador de políticas poderia achar
que o procedimento ótimo seria deixar de lado aquele compromisso inicial e gerar uma
inflação-“surpresa”. Firmas e trabalhadores, sabendo das preferências do formulador de políticas
(lembre-se que estamos supondo expectativas racionais), preverão que ele vai trapacear. Não
haverá aumento no produto. Haverá uma inflação mais alta do que no crescimento monetário
zero. O problema da inconsistência temporal produz um viés inflacionário na política monetária.
Se, em vez disso, uma regra de política monetária obrigasse o formulador de políticas a
manter uma política de inflação zero, a sociedade ficaria em situação melhor do que com a
política discricionária. A regra daria credibilidade ao anúncio do formulador de políticas.
Vale a pena observar que problemas de inconsistência temporal existem em outros contextos
além da política monetária. Por exemplo, consideremos o sistema de patentes. Antes de as
invenções serem feitas, é ótimo oferecer patentes como incentivo. Depois que os novos
aparelhos passam a existir, porém, o procedimento ótimo é invalidar as patentes para evitar
ineficiência monopolística.

17.6.2 Outros argumentos em favor das metas de inflação


Os problemas de inconsistência temporal são importantes para a política monetária? Alan
Blinder, professor de Princeton e ex-vice-presidente do Board of Governors do Federal Reserve,
argumenta que os economistas acadêmicos que se preocuparam com problemas de
inconsistência temporal “tem consumido sua energia com o alvo errado”.8 Ou talvez, com um
alvo que não é mais certo.
Problemas de inconsistência temporal talvez expliquem em parte as políticas monetárias
inflacionárias durante a década de 1970. No final da década de 1980 e início de 1990, porém, a
desinflação havia sido alcançada na maior parte dos países industrializados. Uma analogia com
o sistema de patentes poderia ser útil aqui. Os países industrializados não voltam atrás em
patentes mesmo que, no curto prazo, esse pareça ser o procedimento ótimo. Não o fazem por
questões de reputação, o modo como suas ações presentes poderiam afetar o comportamento de
gerações futuras de inventores. Os bancos centrais talvez tenham aprendido uma lição da década
de 1970 e, embora tentados a obter ganhos de produto por meio de inflação-surpresa, agora
dizem a si mesmos, “não faça isso”.
Se não é para resolver o problema de inconsistência temporal, qual é a motivação por trás da
mudança para regras de inflação em muitos países? Parece haver considerações mais
pragmáticas. Uma é reduzir o efeito de pressões políticas sobre os bancos centrais. Em geral, o
movimento para metas de inflação coincide com uma maior independência concedida aos
bancos centrais. Dar ao Banco Central controle independente de seus instrumentos de política
econômica e um mandato claro para ter a inflação como meta limita muito a capacidade de um
governo de manipular a política monetária para fins políticos. Mesmo antes que regras explícitas
de metas de inflação fossem comuns, a independência do Banco Central era positivamente
associada a inflação mais baixa (veja Perspectivas 17.1). Metas de inflação são uma maneira de
dar aos bancos centrais independência quanto a seus instrumentos, mantendo-os ao mesmo
tempo obrigados a prestar contas quanto a metas.
Outra motivação pragmática para o movimento para metas de inflação em vários países foi
que eles viviam problemas similares aos que os Estados Unidos experimentaram com agregados
monetários como metas intermediárias. Quando a relação moeda-renda tornou-se mais instável,
eles passaram a se apoiar mais em taxas de juros de curto prazo para implementar a política
monetária. Como já foi explicado, essa abordagem deixa a política monetária sem uma âncora
que sirva de garantia anti-inflação. Metas diretas de inflação proporcionam essa âncora.

PERSPECTIVA 17.4 - METAS DE INFLAÇÃO NOS ESTADOS UNIDOS:


TRÊS OPINIÕES INFLUENTES E UM OLHAR PARA O FUTURO
Embora, como vimos, muitos bancos centrais tenham adotado metas de inflação no período pós-1990, sob a liderança de
Alan Greenspan o Federal Reserve dos Estados Unidos não seguiu essa linha. Como a frase que inicia este capítulo indica,
Greenspan vê a incerteza como a principal característica do processo de política monetária. Quais são, então, ele pergunta,
as “implicações dessa incerteza em grande medida irreduzível para a condução da política monetária?”a Em resposta a
essa pergunta, ele sugere que a política monetária deve seguir uma abordagem de administração de riscos: “[A] condução
da política monetária nos Estados Unidos envolve, em seu núcleo, elementos cruciais de administração de riscos, um
processo que requer um entendimento das muitas fontes de risco e incerteza que os formuladores de políticas enfrentam”.
Além disso, Greenspan acredita que “a administração de riscos com frequência envolve uma quantidade significativa de
julgamento por parte dos formuladores de políticas, quando avaliamos os riscos de diferentes acontecimentos e a
probabilidade de que nossas ações alterem esses riscos”.
Aos críticos que afirmam que essa abordagem é muito indisciplinada – muito sujeita a julgamentos pessoais,
aparentemente discricionária e difícil de explicar – ele responde que amarrar a “política econômica às prescrições de uma
regra formal não deve levar a uma melhora no desempenho econômico”. A opinião de Greenspan sobre essa questão
reflete uma declaração anterior sua de que, depois de uma longa procura por uma regra para a política monetária, ele
concluiu que uma regra ideal está no domínio de Dom Quixote.
Ben Bernanke, que sucedeu Greenspan como presidente do Board of Governors, é um defensor de metas de inflação. Ele
não defende uma regra rígida para a política monetária. Em vez disso, vê as metas de inflação como um arcabouço dentro
do qual a política monetária pode ser conduzida. Especificamente, ele sugeriu que o Federal Reserve anunciasse uma meta
de inflação que ele chama de “taxa de inflação ótima de longo prazo (OLIR)”. Esta seria uma meta para o longo prazo, não
para qualquer trimestre ou ano específico. “A variação da inflação efetiva em torno da OLIR durante o ciclo de negócios
seria esperada e aceitável”.b
O principal benefício que Bernanke vê nesse tipo de meta de inflação é “uma redução da incerteza nos mercados
financeiros e na economia de modo mais amplo”. A transparência e, assim, a credibilidade da política monetária
aumentariam. Além disso, definir uma meta de inflação “serviria como um lembrete para os formuladores de políticas
ficarem de olho no longo prazo ao mesmo tempo em que reagem aos desenvolvimentos atuais na economia”. Um regime
de metas de inflação que se concentrasse no longo prazo, em sua opinião, melhoraria a comunicação e a condução da
política “sem os custos temidos pelos que se preocupam com uma potencial perda de flexibilidade”.
Benjamin Friedman, da Harvard University, escreveu muitos artigos e trabalhos para conferências influentes sobre política
monetária nos últimos 35 anos. Ele é fortemente crítico das metas de inflação como “melhor prática de política
monetária”. Não concorda que as metas de inflação aumentem a transparência da política monetária. Acredita que metas
de inflação “são um regime não para comunicar as metas e políticas do Banco Central, mas para obscurecê-las. Em
aspectos cruciais, essa não é uma janela, mas uma cortina. Não promove a transparência… mas a opacidade”.c O problema
é que o Federal Reserve tem um duplo mandato: buscar alto emprego e estabilidade de preços. Quantificar uma meta só
faz persistir a questão de como o formulador de política deve agir em um cenário de várias metas.
Talvez pior, na opinião de Friedman, é que “o regime de metas de inflação afeta não só o que o Banco Central diz, mas o
que ele faz”. Ele teme que o regime desvie a política excessivamente para o combate à inflação, com muito pouca atenção
a problemas de emprego e produto – “a questão é que a linguagem importa”.
A crise financeira e a recessão que começaram em 2007 fizeram com que a discussão de metas de inflação ficasse um
pouco de lado. Conforme a recuperação avançar e, talvez, as preocupações com a inflação voltarem, a questão retornará ao
primeiro plano. No início de 2012, o Federal Reserve deu um passo no sentido de uma meta de inflação ao anunciar uma
taxa-alvo de 2% para a inflação. Ao mesmo tempo, porém, reafirmou seu compromisso com o “mandato duplo” de alto
emprego e estabilidade de preços.

a As citações de Alan Greenspan nesta Perspectiva são tiradas de seus Comentários de Abertura da Federal Reserve Bank of
Kansas City Conference on Monetary Policy and Uncertainty, Aug. 2003, conforme publicado nas atas da conferência.
b As citações de Ben Bernanke aqui são tiradas de seus comentários em uma Federal Reserve Bank of St. Louis Conference
on Inflation Targeting: Prospects and Problems, conforme publicado na Federal Reserve Bank of St. Louis Review, July-
Aug. 2004.
c As citações de Benjamin Friedman são de seu comentário na mesma conferência que os de Bernanke, conforme publicado
no mesmo volume.

Conclusão
Este capítulo examinou questões de política monetária ótima: como os bancos centrais devem
conduzir a política monetária? No caso do Federal Reserve dos Estados Unidos, na prática a
estratégia variou de acordo com o grau de ênfase colocado na oferta de moeda ou na taxa de
juros. Nas duas últimas décadas, em resposta a mudanças nas condições econômicas,
principalmente a crescente instabilidade da relação moeda-renda, o Fed passou para uma
estratégia de metas de taxas de juros. O mesmo aconteceu em outras nações industrializadas. O
movimento para metas de taxa de juros deixou a política monetária sem uma âncora anti-
inflação como a que era proporcionada por uma meta da oferta de moeda. Em resposta, muitos
bancos centrais, embora não o Federal Reserve, passaram a usar uma estratégia de metas de
inflação.
A crise financeira e a recessão profunda que começaram no final de 2007 colocaram o
Federal Reserve em modo de combate à crise, e considerações estratégicas de prazo mais longo
ficaram de lado por algum tempo. Com a recuperação ainda morna e o desemprego ainda
elevado, o Banco Central está comprometido com uma política de taxa de juros dos fundos
federais essencialmente zero até 2014. Em algum ponto, será apropriado enrijecer a política
monetária. O balanço patrimonial inchado terá que encolher. O Federal Reserve fará isso
vendendo ativos ou, em alguns casos, apenas deixando-os vencer. Formular esse processo com
um mínimo de perturbação dos ainda frágeis mercados financeiros é o próximo desafio para o
Federal Reserve: “a mecânica de uma saída elegante”.

Questões de revisão
1. O que é o Federal Open Market Committee (FOMC)? Qual é o papel desse comitê na
formulação da política monetária?
2. Suponha que a política fiscal de um país seja caracterizada por gastos governamentais
excessivos. Suponha também que o Banco Central desse país tenha metas de taxa de juros.
Que efeito terá a política fiscal excessivamente expansionista sobre a oferta de moeda? Sobre
o produto e a inflação?
3. Usando o modelo IS-LM, analise se um aumento na instabilidade da função demanda por
moeda aumentaria ou reduziria a desejabilidade de metas intermediárias para um agregado
monetário.
4. Descreva a mudança que aconteceu na política econômica do Federal Reserve em 1979.
Explique as razões dessa mudança.
5. Suponha que o Banco Central esteja usando uma taxa de juros como meta, enquanto a renda
real é a meta final da política econômica, e que ocorra uma queda autônoma nos
investimentos das empresas imprevista pelo Banco Central. Use o modelo IS-LM para
mostrar os efeitos do choque. A renda teria sido mais ou menos afetada se o Banco Central
estivesse usando uma meta da oferta de moeda?
6. Explique o problema da inconsistência temporal no que se refere à política monetária.
7. Que relação você vê entre os problemas que muitos países enfrentaram com metas da oferta
de moeda e a mudança para as metas de inflação?
8. Suponha que a curva IS seja vertical porque a elasticidade-juros da demanda por
investimentos é zero; o investimento é totalmente insensível à taxa de juros. Ainda é verdade
que, para o caso de choque IS, uma meta da oferta de moeda é preferível a uma meta de taxa
de juros? Justifique sua resposta usando os gráficos IS-LM.
9. Atualmente, nenhum dos bancos centrais mais importantes tem metas rígidas para a oferta de
moeda. Por que você acha que isso acontece? Ainda assim, nenhum dos grandes bancos
centrais ignora completamente os números de crescimento da moeda. Por quê?
CAPÍTULO 18
Política fiscal

Em 2007, o ano em que teve início a recente recessão profunda, as receitas tributárias
federais nos Estados Unidos foram de 18,9% do PIB. Os gastos do governo federal eram de
20,6% do PIB e o déficit federal era de menos de 2% do PIB. Em 2010, as receitas tributárias
tinham caído para 16,7% e os gastos tinham subido para 25,5% do PIB. O déficit havia mais que
quadruplicado. Os déficits e os altos gastos governamentais tornaram-se grandes preocupações e
os principais temas de campanha política em 2012.
A questão do déficit vinha dominando os debates sobre política fiscal bem antes da crise
econômica recente. Nas décadas de 1980 e 1990, os déficits então considerados grandes eram
percebidos como um problema, mas seriam eles “o diabo à porta” ou, como outros sugeriram,
mais como “cupins no porão”? Antes que a pergunta fosse respondida, acordos orçamentários
entre a administração Clinton e o Congresso dominado por republicanos, encorajados pelo
rápido crescimento econômico, substituíram, no final da década de 1990, os déficits
orçamentários por superávits, e superávits ainda maiores eram projetados para o futuro de médio
prazo. Em 2001, porém, o orçamento caiu novamente em déficit. Em 2004, o déficit subira a
níveis não vistos desde a década de 1980. Ao longo de um período de 10 anos, as projeções
haviam mudado de um superávit cumulativo de mais de US$ 3 trilhões para um déficit de mais
de US$ 2 trilhões, uma oscilação de US$ 5 trilhões.
Essas preocupações com o déficit levaram economistas e formuladores de políticas a
subestimar as possibilidades de políticas fiscais estabilizadoras. A política monetária tornou-se o
instrumento de estabilização preferido e pareceu adequada para a tarefa durante o período de
relativa estabilidade de meados da década de 1980 até 2006, que foi chamado de a “grande
moderação”. A crise financeira fez renascer o interesse por políticas de estabilização fiscais
keynesianas quando os Estados Unidos e outras grandes economias mundiais tentaram adotar
programas de estímulo para afastar a depressão. Além disso, como discutimos no capítulo
anterior, a política monetária enfrentava o problema do “limite zero” e foi forçada a
experimentar novos instrumentos não convencionais e não testados. Como esses programas de
estímulo resultaram em previsíveis grandes déficits, surgiu um debate quanto à sua utilidade.
Controvérsias sobre o papel e condução adequados da política fiscal são o foco deste capítulo.
Precisamos, no entanto, oferecer alguma base antes de examinar os principais pontos em
questão.
Começaremos examinando as metas de política fiscal e a possibilidade de que as metas dos
formuladores de políticas, que, no caso da política fiscal, são o Congresso e o governo federal,
sejam diferentes das metas do público. Alguns economistas usam essa divergência como
argumento em favor da restrição do comportamento dos formuladores de políticas fiscais – de
política fiscal por regras, não discricionária. Em seguida, veremos o comportamento do
orçamento federal americano no período posterior à Segunda Guerra Mundial e a relação entre o
orçamento federal e o estado da economia. Aqui, examinamos o papel que o orçamento federal
desempenha como um estabilizador automático para a atividade econômica. Tendo analisado
essas informações, examinaremos as objeções de economistas keynesianos a regras de
orçamento equilibrado para a política fiscal. Depois, abordaremos as controvérsias de política
fiscal desde a administração Reagan até o governo Obama.

18.1 As metas da política macroeconômica


Quais são as metas da política macroeconômica? Baixo desemprego e estabilidade de preços
parecem ser metas consensuais de política econômica, embora, como vimos nas Partes II e III,
haja consideráveis divergências quanto à possibilidade de formuladores de políticas alcançarem
essas metas pela administração da demanda agregada. Também há diferenças de opinião a
respeito do peso relativo que deve ser atribuído a cada meta. O crescimento econômico é uma
terceira meta das políticas, que está estreitamente relacionada à meta de baixo desemprego, uma
vez que a criação de novos empregos requer uma economia em crescimento.
Vamos supor que estejamos de acordo que as metas da política macroeconômica sejam
alcançar os níveis desejados de inflação, desemprego e crescimento econômico. A questão da
condução ótima da política macroeconômica seria, então, como definir os instrumentos de
política, variáveis como os níveis de gastos do governo e diversas alíquotas tributárias no caso
da política fiscal, a fim de chegar o mais perto possível das metas. Uma maneira de formular
esse problema é supor que o formulador da política minimize uma função “perda de bem-estar
social” da seguinte forma:

Nessa equação, L mede a perda social que decorre de desvios das variáveis de metas
macroeconômicas em relação às metas estabelecidas – por exemplo, os custos de um
desemprego excessivamente alto. As variáveis que representam metas são o nível de
desemprego (U), a taxa de inflação (P) e a taxa de crescimento da renda real (Y). Os níveis
desejados para essas variáveis são U*, P* e Y*, respectivamente. Na forma dada pela equação
(18.1), a perda de bem-estar social depende do quadrado dos desvios das variáveis das metas em
relação aos níveis desejados. A perda social derivada de um dado aumento no desvio de uma
variável de meta em relação ao nível desejado aumenta quanto mais nos afastamos desse nível;
desvios grandes em relação aos níveis desejados recebem pesos especialmente grandes. Os
coeficientes a1, a2, e a3 na equação (18.1) representam os pesos relativos atribuídos às diferentes
metas.
A equação (18.1) é apenas uma representação da função perda social que é relevante para
políticas macroeconômicas. O principal pressuposto para formular esse tipo de política ótima é
simplesmente que o formulador de políticas minimiza alguma função perda de bem-estar social.
O problema, então, é encontrar o ajuste dos instrumentos que resulta na perda mínima. Pode-se
investigar também se alguma regra, com uma regra de orçamento equilibrado, consegue
desempenho melhor do que prescrições de políticas mais ativas.

18.2 As metas dos formuladores de políticas macroeconômicas


Há uma literatura que questiona o realismo da formulação acima para a questão da política
ótima. Examinaremos duas vertentes dessa literatura crítica: a visão da escolha pública e a
teoria do partidarismo. Um elemento comum a ambas é que a política desempenha um papel
mais importante na formulação de políticas econômicas do que foi sugerido nas seções
anteriores.

18.2.1 A visão da escolha pública


Os defensores da visão da escolha pública afirmam que os formuladores de políticas
macroeconômicas agem de forma a maximizar seu próprio bem-estar e não para maximizar o
bem social.1 Nas palavras de Gordon Tullock, um proponente da visão da escolha pública: “Os
burocratas são como os outros homens… Se os burocratas são homens comuns, eles tomarão a
maioria de suas decisões (não todas) em termos do que beneficia a eles próprios, e não à
sociedade como um todo”.2 Em lugar de uma função perda de bem-estar social como a dada por
(18.1), a função perda relevante é uma que meça variáveis de importância direta para os
formuladores de políticas. No caso de pessoas em cargos eletivos tomando decisões de política
fiscal, essa abordagem alternativa enfatiza os votos como a meta motivadora central para os
formuladores de políticas.

Escolha pública
Aplicação à formulação de políticas macroeconômicas da
teoria microeconômica de como decisões são tomadas.

Teoria do partidarismo
Vê o produto da política macroeconômica como resultado
de decisões ideologicamente motivadas tomadas por
líderes de diferentes partidos políticos. Os partidos
representam parcelas do eleitorado com diferentes
preferências quanto a variáveis macroeconômicas.

Dentro do arcabouço da escolha pública, uma representação da função perda apropriada que o
formulador de políticas tenta minimizar é

onde PV é a perda de votos e b1 é o peso dado aos votos perdidos. As variáveis de metas
macroeconômicas entram no quadro porque o comportamento da economia afeta os votos.
Por exemplo, a perda de votos poderia ser representada como

As variáveis de metas macroeconômicas e seus níveis desejados são os mesmos que na


equação (18.1). Os parâmetros c1, c2 e c3 representam a perda de votos resultante de desvios das
variáveis das metas macroeconômicas em relação a seus níveis desejados. Essa representação
específica pressupõe que a perda de votos dependa do quadrado dos desvios em relação ao nível
desejado, considerando, como antes, que um peso especialmente grande seja atribuído a grandes
desvios dos níveis desejados. O parâmetro c0 representa outras influências sobre o
comportamento dos eleitores (por exemplo, questões de política econômica externa ou outras
questões domésticas).
Vamos supor que a perda de votos seja dada pela equação (18.3) e que o formulador de
políticas atue no sentido de minimizar a perda de votos; a função perda relevante é a equação
(18.2). As ações de política econômica vão diferir daquelas que seriam tomadas caso o
formulador de políticas agisse de forma altruísta e minimizasse a função perda social dada pela
equação (18.1)? Defensores da visão da escolha pública para o comportamento do formulador de
políticas afirmam que sim. Para entender por que, vamos primeiro examinar a condição
necessária para que o comportamento seja o mesmo em ambos os casos e, depois, explicar por
que os defensores da visão da escolha pública não acreditam que essa condição possa ser
satisfeita na prática.
Primeiro, suponhamos que o comportamento do eleitor seja governado pelo que podemos
chamar de racionalidade coletiva, ou seja, a perda de votos devida a preocupações
macroeconômicas é proporcional à perda de bem-estar social. Isso significa que, quando
variáveis macroeconômicas afetam o comportamento de voto, os eleitores recompensam ou
castigam os políticos responsáveis dependendo de seu desempenho na minimização da perda de
bem-estar social. Nesse caso, a estratégia ótima para minimizar a perda de votos [equação
(18.2)] é minimizar a perda de bem-estar social [equação (18.1)]. Como foi reconhecido na
literatura sobre a escolha pública, quando não existe esse tipo de racionalidade coletiva, o
comportamento do formulador de políticas maximizador de votos desvia-se do comportamento
de maximização do bem-estar social.
As hipóteses a seguir sobre o comportamento do eleitor foram propostas na literatura sobre a
escolha pública.3
1. Os eleitores são míopes. Os defensores da visão da escolha pública afirmam que o
comportamento do eleitor é fortemente influenciado pelo estado da economia nos últimos
trimestres antes das eleições e que o nível de atividade econômica, não a taxa de inflação, é a
variável cujo desempenho recente determina os votos. “Os políticos no cargo desejam a
reeleição e acreditam que uma economia em crescimento no período pré-eleição os ajudará a
consegui-la”.4 Como consequência, temos um ciclo político de negócios em que a demanda
agregada é fortemente estimulada no período anterior à eleição, com o resultado de aumento da
inflação depois da eleição.
2. O desemprego tem mais probabilidade de resultar em perda de votos que a inflação.
Presume-se que o processo de inflação seja complexo e pouco compreendido o bastante para que
os políticos possam evitar a culpa pela inflação com mais facilidade do que pelo desemprego:
“A qualquer momento no tempo, a culpa pela inflação é jogada sobre acontecimentos que não
estão sob o controle do partido político governante e, idealmente, sobre o partido político que
esteve no governo antes”.5 Em consequência, os defensores da visão da escolha pública
argumentam que os políticos eleitos raramente respondem à inflação com políticas restritivas,
mas respondem ao desemprego com políticas expansionistas. Assim, o processo de política
fiscal tem uma tendência inflacionária.6
3. Existe uma tendência inflacionária no processo do orçamento. Essa tendência
inflacionária é reforçada pela tendência inerente a uma geração de déficits orçamentários que os
autores da visão da escolha pública acreditam ser característica das políticas fiscais de governos
democráticos. Por exemplo, nas palavras de James Buchanan e Richard Wagner:
Os políticos eleitos gostam de gastar altas somas de dinheiro público em projetos que
produzam benefícios facilmente demonstráveis para seus eleitores. Eles não gostam de
determinar impostos para esses mesmos eleitores. A norma pré-keynesiana de equilíbrio
orçamentário servia para restringir as tendências dos gastos de modo a manter os
dispêndios governamentais mais ou menos dentro dos limites da receita gerada pelos
impostos. A destruição keynesiana dessa norma, sem introduzir um substituto adequado,
removeu efetivamente a restrição. De forma previsível, os políticos responderam
aumentando os gastos acima das receitas tributárias e criando déficits orçamentários como
um curso natural das coisas.7

Se aceitarmos a caracterização da escolha pública, como pode essa tendência deficitária do


processo de política fiscal ser corrigida? Buchanan e Wagner acreditam que precisamos
restaurar a “norma pré-keynesiana de equilíbrio orçamentário”; devemos evitar todo gasto
deficitário. Eles defendem uma emenda à Constituição dos Estados Unidos no sentido de exigir
que o Congresso e o presidente equilibrem o orçamento.
Além disso, como programas de gastos governamentais novos ou expandidos teriam de ser
financiados por novos impostos em um sistema de orçamento equilibrado, o crescimento do
setor governamental seria restringido por essa emenda. Na visão da escolha pública, a política
fiscal ótima não é uma questão de projetar políticas para estabilizar a macroeconomia, mas
impor regras aos formuladores de políticas que eliminem os efeitos desestabilizadores dos gastos
deficitários.

18.2.2 A teoria do partidarismo


Na teoria do partidarismo, fatores políticos também afetam a política macroeconômica. Essa
teoria, porém, vê os políticos como líderes ideologicamente motivados de partidos
concorrentes.8 Os partidos, por sua vez, representam diferentes eleitorados com diferentes
preferências quanto a resultados macroeconômicos. No modelo mais comum do partidarismo, há
um partido liberal (ou trabalhista) e um partido conservador. O partido liberal tem sua ênfase
primária no pleno emprego e na redistribuição da renda, enquanto o partido conservador atribui
mais valor à estabilidade de preços.
Em lugar de um ciclo político de negócios, a teoria do partidarismo prevê ciclos partidários
conforme a política macroeconômica varia, dependendo do partido que estiver no poder. No
caso da política fiscal, por exemplo, o modelo do partidarismo prevê que, se o partido liberal for
eleito, os gastos do governo subirão com os políticos tentando estimular a demanda e, assim, o
emprego. Os dispêndios governamentais também podem aumentar com a ampliação dos
pagamentos de transferência para redistribuir renda. Na maioria das circunstâncias, a política
fiscal mais expansionista também elevará a taxa de inflação. Se o partido liberal perder o posto
em um momento posterior, a política fiscal ficará mais restritiva, com os conservadores tentando
combater a inflação. O desemprego aumentará e pode ocorrer recessão.
Como no caso dos ciclos políticos de negócios, os ciclos partidários seriam evitados, ou pelo
menos atenuados, por uma regra de política fiscal, como uma regra de orçamento equilibrado.
Uma regra para a política fiscal limitaria a capacidade de cada partido buscar suas metas pela
manipulação da demanda agregada. Além disso, as iniciativas de redistribuição de renda pelo
partido liberal seriam dificultadas se qualquer aumento nos pagamentos de transferência exigisse
novos impostos.
18.2.3 A teoria da escolha pública: desenvolvimentos mais recentes
Em 1999, como já foi comentado, o orçamento federal americano entrou em superávit.
Muitos países europeus também haviam reduzido ou eliminado com sucesso seus déficits
orçamentários. Seria possível imaginar que o público nesses países havia passado a compreender
melhor as consequências inflacionárias de déficits e outros custos de longo prazo decorrentes do
acúmulo de uma grande dívida pública. Talvez os políticos tenham começado a acreditar que
grandes déficits os fariam perder votos. Essa ideia é coerente com as pesquisas nos Estados
Unidos antes das eleições de 1996 e 2000, que mostraram que os eleitores classificavam a
redução do déficit como mais prioritária que uma redução dos impostos.
Os fatores políticos teriam deixado de influenciar os déficits do orçamento federal devido a
eleitores mais bem informados?
Pela perspectiva de 2012, a situação parece mais complexa. O orçamento americano passou
de superávit para déficit depois de 2001, em parte devido a uma recessão. A recuperação
subsequente reduziu um pouco o tamanho do déficit, mas cortes tributários durante a
administração de George W. Bush provocaram uma grande oscilação para déficits no orçamento
federal americano. Em 2007 nenhuma parte do déficit era devida a fatores cíclicos. A economia
estava funcionando com nível de produto potencial, de acordo com cálculos do Congressional
Budget Office. No período de 2001 a 2007, novos projetos de gastos domésticos, como o
desconto na compra de medicamentos controlados acrescentado ao Medicare, eram populares.
Cortes de impostos também eram populares. O vice-presidente Richard Cheney foi citado como
tendo dito que “Reagan provou que déficits não importam” (politicamente).
Então vieram a crise financeira e a recessão profunda de 2007-2009. Como seria de supor,
poucos defensores da escolha pública foram favoráveis ao grande programa de estímulo federal,
o American Recovery and Reinvestment Act (ARRA), posto em vigor em 2009. Uma das visões
da escolha pública para a crise e os programas governamentais resultantes estava dentro da
teoria do entrelaçamento. O modelo do entrelaçamento vê a economia privada e o governo não
como entes separados, mas como corpos interconectados com inúmeras redes de relações.
Dentro do modelo do entrelaçamento, a resposta do governo à crise é vista como um esforço de
reforçar os níveis de entrelaçamento9. Exemplos, além de partes da ARRA, são o Troubled
Assets Relief Program (TARP) e a lei financeira Dodd-Frank. Como parte do TARP, o governo
adquiriu participação acionária em todos os principais bancos e na General Motors e na Chrysler
Corporation. A lei Dodd-Frank ampliou a regulação dos bancos em várias áreas e estabeleceu
um novo órgão super-regulador para supervisionar todas as corporações financeiras que são
sistemicamente importantes – ou “grandes demais para cair”. Os teóricos da escolha pública
veem isso como uma repetição do processo de reação à Grande Depressão, quando o New Deal
expandiu fortemente o entrelaçamento de governo e indústria.

Teoria do entrelaçamento
Vê os setores empresarial e governamental como
corpos interconectados que desenvolvem inúmeras
relações para atender a seus interesses conjuntos.

PERSPECTIVAS 18.1 - EXPECTATIVAS RACIONAIS E A TEORIA DO


PARTIDARISMO
As formas originais do modelo do ciclo político de negócios e do modelo do partidarismo não pressupunham que as
expectativas fossem racionais e, portanto, voltadas para o futuro. Na verdade, o comportamento míope dos eleitores no
modelo do ciclo político de negócios é claramente inconsistente com expectativas racionais. O modelo do partidarismo
para a política fiscal foi modificado de forma a incluir expectativas racionais em um artigo de Alberto Alesina e Jeffrey
Sachs.a Como antes, consideramos que existam dois partidos: um liberal, cujo eleitorado preocupa-se essencialmente com
desemprego, e um conservador, com um eleitorado preocupado principalmente com a inflação.
O ambiente econômico imaginado por Alesina e Sachs é coerente com o modelo novo-clássico, no sentido de que as
expectativas são racionais, mas tem o elemento keynesiano de que os salários monetários são estabelecidos por contratos
de vários anos de duração. Nesse cenário, as eleições criam incerteza quanto ao comportamento futuro da taxa de inflação
e, portanto, quanto às reivindicações de salário monetário que os trabalhadores (ou seus sindicatos) devem fazer.
Consideremos a situação no ano anterior a eleições gerais. Os trabalhadores poderiam imaginar que, se os liberais
vencerem, a taxa de inflação será alta, digamos 5%, ao passo que, se os conservadores ganharem, ela será baixa, digamos
1%. Mesmo com expectativas racionais, o melhor que os trabalhadores podem fazer é formar uma expectativa da inflação
que seja uma média ponderada dos dois resultados possíveis. Se eles acharem que a eleição de um ou de outro partido é
igualmente provável, então, no exemplo anterior, a expectativa racional de inflação seria 3%. Firmas e trabalhadores
definiram os salários monetários com base nisso.
Agora, consideremos o que acontece depois da eleição.
Se os liberais ganharem, a taxa de inflação efetiva (5%) excederá a taxa de inflação esperada (3%) com base na qual os
salários monetários foram estabelecidos. Essa inflação mais alta causará uma rápida expansão do produto devido à
contratação de trabalhadores adicionais pelas firmas por causa do salário real inesperadamente baixo. Por outro lado, se os
conservadores vencerem, a inflação efetiva (1%) estará abaixo da inflação esperada (3%) e os salários monetários terão
sido fixados num nível alto demais. Isso causará um aumento no desemprego, com a possibilidade de uma recessão.
Ciclos partidários, portanto, são possíveis no modelo do partidarismo mesmo se as expectativas forem racionais. A teoria
prevê que recessões são mais prováveis nos dois primeiros anos após a eleição de um presidente conservador – uma
previsão, que foi confirmada nos Estados Unidos em 1981-1982, em 1990-1991 e em 2011. O ritmo acelerado da
recuperação da recessão de 1990-1991 depois que o presidente George W. Bush foi derrotado nas urnas por Bill Clinton
em 1992 é consistente com a versão da teoria do partidarismo com expectativas racionais.
A eleição de 2012 fornecerá outro teste para a hipótese apenas se um Republicano for eleito. Todos os candidatos
Republicanos estão defendendo grandes cortes nos gastos do governo e déficits orçamentários mais baixos. Se um deles
for eleito, a demanda agregada provavelmente será mais baixa que uma previsão baseada em um resultado eleitoral
incerto. Um modelo de ciclos partidários leva a uma desaceleração prevista da economia.
a ALESINA, Alberto; SACHS, Jeffrey. Political parties and the business cycle in the United States, 1948-1984. Journal of
Money, Credit and Banking, 20, p. 62-82, Feb. 1988.

18.3 O orçamento federal


Duas variáveis de política fiscal, gastos do governo e arrecadação tributária, foram incluídas
nos modelos teóricos examinados nas Partes II e III. A variável de gastos governamentais (G)
era o componente dos gastos do governo na renda nacional, que incluía tanto gastos federais
como estaduais e municipais em bens e serviços produzidos no período corrente. A variável de
impostos (T) incluía arrecadações tributárias federais, estaduais e municipais. A política de
estabilização fiscal é conduzida pelo governo federal. Estados e municípios têm capacidade
limitada de incorrer em déficits orçamentários. Os níveis tanto de gastos como de receitas
estaduais e municipais são determinados por necessidades locais e pelo estado da economia, em
vez de serem definido de modo a influenciar metas macroeconômicas. Por isso, nossa discussão
aqui centra-se na política orçamentária federal.
A Figura 18.1 mostra dados referentes a recebimentos e gastos totais do governo federal
americano no período de 1958-2010. Os gastos federais totais incluem pagamentos de
transferências e de juros, além de gastos federais em bens e serviços. Os números revelam um
rápido crescimento tanto nos dispêndios como nas receitas. Mas a economia também vinha
crescendo. A Figura 18.2 mostra itens do orçamento expressos como porcentagens do PIB. Aqui
podemos ver mais claramente como o governo cresceu em relação à economia como um todo.
Em 1929, o governo federal americano representava uma parcela muito pequena da economia
do país. Os gastos federais totais eram de menos de 3% do PIB. As mudanças de política fiscal
representavam tipicamente pequenos ajustes do orçamento e eram de pouca importância para a
economia de modo geral. Tanto gastos como receitas aumentaram modestamente durante a
década de 1930. Os gastos subiram mais que as receitas, com um resultante déficit orçamentário.
A Segunda Guerra Mundial trouxe uma enorme expansão dos gastos militares do governo,
apenas parcialmente pagos por meio de um aumento da receitas tributárias. Os déficits
orçamentários no início da década de 1940 subiram para até 25% do PIB, o equivalente a um
déficit de mais de US$ 3.500 bilhões em termos do PIB atual dos Estados Unidos. Esses
enormes déficits de tempos de guerra foram financiados por grandes vendas de títulos ao
público.

FIG 18.1 Receitas e gastos federais, anual, 1958-2010 (Estados Unidos)

Depois da guerra, tanto os gastos como as receitas tributárias diminuíram como proporções
do PIB. No entanto, os gastos do governo federal caíram de volta para o nível da década de
1920. Em meados da década de 1950, tanto os gastos como as receitas estavam em torno de 17%
a 18% do PIB. O governo federal havia assumido novas funções internas na década de 1930:
órgãos reguladores, o sistema de previdência social, apoio aos preços de produtos agrícolas e
eletrificação rural, entre outras. Além disso, com o início da Guerra Fria no final dos anos 1940,
os gastos com defesa continuaram altos mesmo em tempos de paz.

FIG 18.2 Gastos e receitas do governo federal como porcentagem do PIB, 1940-2010 (Estados
Unidos)
A Figura 18.2 mostra que, em décadas recentes, os gastos cresceram como porcentagem do
PIB, de 17% em 1955 para 21% em 2007, mesmo antes que fossem sentidos os efeitos da
recessão recente. As receitas tributárias cresceram também mas, a partir do final da década de
1960, o crescimento dos gastos superou o crescimento das receitas, resultando em déficits
persistentes. O déficit orçamentário cresceu rapidamente durante a primeira metade da década de
1980 com os gastos ainda em tendência de alta, enquanto as receitas declinaram ligeiramente
como porcentagem do PIB. Em 1986, o déficit orçamentário era de cerca de 5% do PIB. O
déficit declinou em termos absolutos de 1987 a 1989, depois subiu acentuadamente com a
recessão de 1990-1991. Começou a cair novamente em 1993 quando o plano de redução do
déficit do governo Clinton foi aprovado. Novos cortes de gastos praticamente eliminaram o
déficit no início de 1998 e o orçamento passou a ter superávit. O forte crescimento econômico,
associado a ações legislativas, levaram a essa reversão no orçamento.
Depois de 2001, o orçamento voltou a apresentar déficit. Como havia acontecido no final da
década de 1990, tanto ações legislativas, principalmente os cortes de impostos na administração
Bush, como o estado da economia, neste caso, a recessão de 2001, foram responsáveis pela
mudança na tendência do orçamento. Em 2007, porém, o déficit foi totalmente resultado de
cortes nos impostos e mudança em políticas que aumentaram os gastos federais, com a economia
tendo retornado ao nível de produto potencial. Então, como foi comentado na introdução a este
capítulo, os gastos subiram rapidamente e as receitas tributárias caíram quando a economia
entrou em recessão. O déficit elevou-se a níveis não observados no período após a Segunda
Guerra Mundial.

PERSPECTIVAS 18.2 - FINANÇAS DOS GOVERNOS ESTADUAIS E


MUNICIPAIS NOS ESTADOS UNIDOS
Embora nossa discussão de políticas de estabilização fiscais centre-se no governo federal, não devemos ignorar as finanças
dos governos estaduais e municipais. Os gastos dos governos estaduais e municipais nos Estados Unidos correspondem
atualmente a 8% do PIB, em comparação com 6% em 1959. Esses governos gastam para oferecer educação, bem-estar
público, saúde e hospitais, proteção policial e serviços carcerários, além de outros serviços. Eles captam recursos por meio
de impostos sobre a renda (tanto empresarial como individuais), vendas e propriedades. Também cobram tarifas diversas e
impostos específicos, como sobre álcool e cigarros.
Entre 2002 e 2004, os governos estaduais e municipais, especialmente os estaduais, enfrentaram sua crise orçamentária
mais grave desde a Segunda Guerra Mundial. A Figura 18.3 mostra as receitas e gastos dos governos estaduais e
municipais nos anos desde 1960. Tipicamente, durante períodos de recessão (1974-1975, 1981-1982, 1990-1991) as
receitas ficam abaixo dos gastos. O déficit foi especialmente acentuado depois da recessão de 2001 e, mesmo quando a
recuperação econômica começou, as finanças estaduais continuaram a piorar. No ano fiscal de 2003, os Estados
enfrentavam déficits projetados de aproximadamente US$ 80 bilhões, que forçaram cortes dos gastos e aumentos de
impostos e tarifas, inclusive para o ensino em universidades estaduais. Os Estados têm capacidade limitada de manter
déficits. A maioria tem regras que os obrigam a equilibrar o orçamento, ainda que alguns possam manter déficits por um
ano ou recorrer a outras soluções emergenciais de curto prazoa.
Uma crise ainda mais séria confrontou muitos Estados e municípios depois da recessão de 2007-2009. Programas de
estímulo federais amorteceram o início da desaceleração da receita. Esses programas incluíram concessões a Estados e um
aumento da contribuição federal para financiamento do Medicaid. Muitos Estados também aumentaram os impostos.
Ainda assim, em 2011, quando os programas de estímulo perderam a força, Estados e municípios estavam demitindo
trabalhadores. Houve cortes na força policial e demissões de professores e bombeiros, entre outros funcionários públicos.
Isso foi, novamente, uma dificuldade para a recuperação, uma vez que as perdas de emprego no setor público cancelaram
parcialmente os ganhos de empregos no setor privado.
Mesmo depois que a economia se recuperar plenamente da recessão de 2007-2009, há razões para pessimismo quanto às
finanças estaduais e municipais no longo prazo. O crescimento do Medicaid e dos custos dos seguros de saúde dos
funcionários estaduais pressionarão o lado dos gastos. Muitos Estados e municípios, além disso, têm planos de
aposentadoria subfinanciados. Muitos têm enormes obrigações futuras não financiadas com benefícios de saúde de
aposentados. No lado das receitas, o movimento para uma economia de serviços corroeu a receita proveniente dos
impostos estaduais e municipais sobre as vendas, que recaem essencialmente sobre produtos. Essa perspectiva
desfavorável para o orçamento futuro de Estados e municípios está criando tensão entre grupos de funcionários e
contribuintes tributários estaduais e municipais na arena política.

FIG 18.3 Receitas e gastos dos governos estaduais e municipais nos Estados Unidos,
1960-2010

a É o orçamento operacional corrente que precisa estar equilibrado. Estados e municípios emitem títulos para financiar
projetos de investimento como construção de escolas e hospitais. Além disso, há exceções ao equilíbrio do orçamento; a
Califórnia aprovou uma emissão de títulos de US$ 15 bilhões para financiar um déficit orçamentário em 2004.

18.4 A economia e o orçamento federal: o conceito de


estabilizadores fiscais automáticos
O orçamento federal contém três variáveis que afetam as metas macroeconômicas: compras
de bens e serviços pelo governo, pagamentos de transferência do governo (incluindo concessões
de verbas a Estados e municípios) e arrecadação tributária. Na Parte II, analisamos os efeitos de
mudanças nos gastos do governo, especificamente gastos em bens e serviços, e de mudanças na
arrecadação tributária. Nos modelos da Parte II, a arrecadação tributária excluía transferências
(impostos menos pagamentos de transferência); portanto, um aumento nas transferências teria os
mesmos efeitos nesses modelos que uma redução nos impostos. Nesta seção, vamos inverter a
questão e perguntaremos como o nível de renda afeta itens do orçamento federal. Ao fazer isso,
veremos como mudanças no orçamento do governo atuam como um estabilizador automático
para o nível de atividade econômica. O papel do orçamento como estabilizador automático é um
fator crucial na avaliação dos méritos relativos da política fiscal por regras ou da política fiscal
discricionária.

Estabilizadores automáticos
São mudanças nos impostos e nos pagamentos de
transferências que ocorrem quando o nível de renda
muda.

Para examinar como o nível de atividade econômica afeta o orçamento do governo, vamos
modificar nossa suposição de que o nível de receita tributária líquida (receita tributária bruta
menos pagamentos de transferência do governo) é exógeno. Um pressuposto mais adequado à
realidade é que a tabela de alíquotas tributárias é definida exogenamente, mas o nível de
arrecadação tributária líquida depende do nível de renda. Com esse pressuposto, podemos
especificar a arrecadação tributária líquida (T) como sendo determinada pela seguinte função
imposto líquido:

onde t0 e t1 são parâmetros que representam a estrutura tributária. O parâmetro t1 é a alíquota


marginal líquida do imposto, que dá o aumento no imposto (descontadas as transferências) por
unidade de aumento da renda (t1 = ΔT/ΔY). Se o sistema tributário fosse proporcional, o outro
parâmetro da função imposto, t0, seria zero; a arrecadação tributária seria igual a t1Y. Repare
que, nesse caso, a alíquota marginal do imposto ΔT/ΔY seria igual à alíquota média T/Y, ambas
dadas por t1. O termo negativo t0 permite que a alíquota tributária média, que, a partir da
equação (18.4), seria (t0/Y + t1), seja menor que a alíquota marginal (t1). O termo negativo t0
também leva em conta transferências, impostos líquidos negativos, que são independentes da
renda.
Da função imposto líquido dada pela equação (18.4) segue-se que, quando a renda aumenta, a
arrecadação tributária líquida também cresce e o superávit orçamentário do governo aumenta
(ou o déficit diminui); com níveis mais altos de atividade econômica, mais receita tributária é
arrecadada para qualquer conjunto dado de alíquotas tributárias. A relação positiva entre receitas
tributárias líquidas e o nível de atividade econômica também resulta do fato de que pagamentos
de transferência, principalmente pagamentos de salário-desemprego, diminuem quando a
atividade econômica aumenta. Do lado dos dispêndios orçamentários, na ausência de mudanças
políticas discricionárias, não há razão para esperar que os gastos do governo (G) respondam a
mudanças no nível de atividade econômica.10 Nossa suposição anterior de que os gastos do
governo eram exógenos pode ser mantida.
Consequentemente, o efeito líquido de um aumento da renda é o aumento do superávit do
orçamento federal ou a redução de um déficit já existente. Uma expansão da atividade
econômica, portanto, faz a política fiscal, conforme medida pelo superávit orçamentário, tornar-
se mais restritiva. Essa política mais restritiva refreia a expansão. De maneira similar, um
choque que faça a atividade econômica cair resultará automaticamente em uma redução do
superávit orçamentário federal ou em um aumento do déficit, o que ameniza a queda da renda.
Essa é a essência do conceito de estabilizadores fiscais automáticos.
Para examinar o funcionamento dos estabilizadores fiscais automáticos de forma mais
detalhada, vamos voltar à análise do multiplicador do modelo keynesiano do Capítulo 5. Vimos
como a demanda agregada respondia a choques exógenos, como mudanças na demanda por
investimentos autônomos ou nos gastos do governo. Na verdade, os estabilizadores fiscais
automáticos reduzem a resposta da demanda agregada e, assim, da renda a tais choques
exógenos. Para mostrar esse resultado, vamos analisar os efeitos sobre as expressões do
multiplicador, ou seja, as expressões que dão a resposta da demanda agregada a esses choques,
que resultam de levar em conta mudanças endógenas nas receitas tributárias líquidas.
A condição de equilíbrio para a renda obtida no Capítulo 5 é

Considera-se que o consumo (C) seja dado por

onde YD é a renda disponível, definida como a renda nacional menos a arrecadação tributária
líquida (Y – T). Investimentos, gastos do governo e o nível de arrecadação tributária são
considerados exógenos nessa versão simples do sistema keynesiano. Seguindo uma linha similar
ao procedimento usado no Capítulo 5, podemos usar a equação (18.6) para substituir C na
condição de equilíbrio para a renda dada pela equação (18.5) e, usando a definição de YD,
calculamos uma expressão para a renda de equilíbrio (Y):

A partir da equação (18.7), calculamos os efeitos sobre a renda de equilíbrio de mudanças


exógenas no investimento (I), nos gastos do governo (G) e na arrecadação tributária exógena
(T), como se segue:

A tarefa aqui é ver como essas expressões são modificadas quando a função imposto líquido
dada pela equação (18.4) é usada em substituição ao pressuposto de que a arrecadação tributária
é exógena.
Para começar, consideremos a forma da função consumo dada pela equação (18.6) com nossa
nova suposição sobre os impostos. Usando a definição de renda disponível (YD= Y – T) e com T
definido pela equação (18.4), podemos escrever a função consumo como
Usando a equação (18.9) para substituir C na condição para a renda de equilíbrio dada na
equação (18.5), podemos derivar a expressão revisada para o nível de equilíbrio da renda, como
se segue

Como no caso da expressão anterior (18.7), a equação (18.10) especifica a renda de equilíbrio
como sendo determinada por um multiplicador de gastos autônomos, neste caso 1/[1-b(1 – t1)], e
pelas influências autônomas sobre a renda dadas por a – bt0 + I + G. Como antes, podemos
calcular os efeitos sobre a renda de equilíbrio de uma mudança nos investimentos ou nos gastos
do governo.

Repare que o multiplicador de gastos autônomos e, assim, o efeito sobre a renda de uma
mudança nos gastos autônomos (mudanças em I ou G, por exemplo) é menor quando a
arrecadação tributária depende da renda do que quando o nível de arrecadação tributária é
exógeno; ou seja,

Por exemplo, se b, a propensão marginal a consumir, fosse igual a 0,8, e t1, a alíquota
marginal do imposto, fosse 0,25, teríamos

Neste exemplo, a alíquota marginal do imposto de 0,25 reduz o valor do multiplicador pela
metade.
Uma alíquota marginal líquida do imposto de renda reduz o efeito sobre a renda de equilíbrio
de choques nos gastos autônomos, como uma mudança autônoma na demanda por
investimentos. Nesse sentido, o imposto sobre a renda funciona como um estabilizador
automático. Esse efeito estabilizador de um imposto sobre a renda pode ser explicado com
referência à nossa discussão anterior do processo multiplicador (veja a Seção 5.5). Um choque
inicial na demanda por investimentos, por exemplo, muda a renda e tem um efeito induzido
sobre os gastos com consumo. Esse efeito induzido sobre a demanda por consumo faz a renda de
equilíbrio sofrer uma alteração de um múltiplo da mudança original na demanda por
investimentos. Com uma alíquota marginal do imposto de renda de t1, cada redução de uma
unidade monetária no PIB reduz a renda disponível de um indivíduo, o determinante do
consumo, em apenas (1 – t1) unidades monetárias, uma vez que o imposto a pagar do indivíduo
tem uma queda de t1 unidades monetárias. Como a renda disponível é menos afetada por uma
mudança unitária no PIB, os efeitos induzidos sobre a demanda por consumo são menores a
cada rodada do processo multiplicador. O efeito total sobre a renda de uma mudança no
investimento autônomo, que consiste no choque original no investimento mais os efeitos
induzidos sobre o consumo, é, portanto, menor quando há uma alíquota marginal do imposto de
renda do que quando as arrecadações tributárias são consideradas exógenas.
A resposta automática dos impostos e transferências ao nível de atividade econômica foi uma
força estabilizadora importante na economia americana no período após a Segunda Guerra
Mundial, em geral movendo acentuadamente o orçamento para situações de déficit durante
recessões, com redução do déficit ou, às vezes (na década de 1950 e final da década de 1990)
superávits durante períodos de expansão. O tamanho ampliado do orçamento federal no período
de pós-guerra em relação ao período anterior à guerra aumentou a eficácia dos estabilizadores
fiscais automáticos; em termos de nossa função imposto, a alíquota marginal líquida do imposto
é maior agora do que foi em um período como a década de 1920 e, assim, o multiplicador é
menor.
O uso da função imposto líquido dada pela equação (18.4) em substituição ao pressuposto de
que o nível de arrecadação tributária é exógeno também exige uma modificação da análise dos
efeitos de mudanças tributárias discricionárias no modelo. Na expressão revisada da renda de
equilíbrio dada pela equação (18.10), a política tributária é representada por duas variáveis: t0, o
intercepto da função imposto, e t1, a alíquota marginal do imposto de renda.
O análogo a uma mudança lump-sum na arrecadação tributária na equação de renda revisada
é uma mudança em t0. Essa mudança poderia representar uma restituição lump-sum de imposto
para cada contribuinte, por exemplo, ou uma mudança lump-sum nos pagamentos de
transferência. Segundo a equação (18.10), os efeitos de uma mudança em t0 podem ser
calculados como

Levando em conta a mudança no multiplicador dos gastos autônomos, essa expressão é a


mesma que o multiplicador dos impostos quando a arrecadação tributária era exógena [veja a
equação (18.8)]. Uma vez mais, o efeito de uma mudança nos impostos, aqui uma mudança no
intercepto da função imposto, é oposto em sinal ao efeito de uma mudança nos gastos do
governo ou no investimento autônomo dada pela equação (18.11). Um aumento em t0, por
exemplo, faz a renda de equilíbrio cair. Além disso, o efeito de uma mudança de uma unidade
monetária em t0 é menor em valor absoluto do que o efeito de uma mudança de uma unidade
monetária em I ou G. Como no caso anterior, a um dado nível do PIB (Y), uma mudança de uma
unidade monetária nos impostos muda os gastos autônomos [o termo entre parênteses na
equação (18.10)] em apenas b (<1) unidades monetárias, com as (1 – b) unidades monetárias
restantes absorvidas por uma mudança na poupança. Uma mudança de uma unidade monetária
nos gastos do governo ou no investimento autônomo provoca uma mudança de uma unidade
monetária inteira nos gastos autônomos.
Pela equação (18.10), também é possível perceber que a renda de equilíbrio depende da
alíquota marginal do imposto, t1. Um aumento em t1 diminui o multiplicador dos gastos
autônomos e, portanto, reduz a renda de equilíbrio, dados os valores dos componentes dos gastos
autônomos. O modo como a renda de equilíbrio é afetada por uma mudança na alíquota
marginal do imposto de renda pode ser percebido melhor graficamente. A Figura 18.4 ilustra os
efeitos de um aumento na alíquota marginal do imposto de t1 para t1’. A Figura 18.4a mostra o
efeito do aumento da alíquota do imposto sobre a função consumo.

FIG 18.4 Efeito de um aumento na alíquota marginal do imposto de renda (t1)


Um aumento na alíquota do imposto de renda de t1 para t1’ desloca a função consumo para baixo na parte a. Consequentemente,
a curva C + I + G na parte b também se desloca para baixo de (C + I + G) para (C + I + G)’. A renda de equilíbrio cai de Y para
Y’.

Com um imposto de renda, o consumo é dado pela equação (18.9). Antes do aumento da
alíquota marginal do imposto, a reta de consumo é C = (a – bt0) + b(1 – t1)Y no gráfico. O
aumento da alíquota do imposto de renda desloca a função para baixo até a reta C = (a – bt0) +
b(1 – t1’)Y. A nova reta de consumo é menos inclinada, indicando que um dado aumento em Y
faz o consumo subir menos com a alíquota do imposto mais alta. Isso acontece porque, com uma
alíquota mais alta, um dado aumento em Y, a renda nacional, causa um aumento menor na renda
disponível e, portanto, no consumo. A Figura 18.4b mostra o efeito sobre a renda de equilíbrio
de um aumento na alíquota do imposto. A função consumo desloca-se para baixo, como na
Figura 18.4a, portanto a reta C + I + G também se desloca para baixo, de (C + I + G) para (C + I
+ G)’. A renda de equilíbrio cai de Y para Y’. A alíquota do imposto mais alta reduz a demanda
agregada e faz a renda de equilíbrio cair.

18.5 Controvérsias de política fiscal: dos anos Reagan até o presente


Nesta seção, vamos examinar as controvérsias em relação ao orçamento federal ocorridas nos
Estados Unidos nas últimas décadas. Começamos considerando as diferentes visões sobre regras
de orçamento equilibrado para as políticas fiscais. Se obedecidas rigidamente, essas regras
limitariam ou eliminariam completamente os déficits do orçamento federal. As razões pelas
quais os economistas keynesianos opuseram-se a regras de orçamento equilibrado serão
explicadas.

18.5.1 Os prós e contras de regras para a política fiscal


Em seu último relatório econômico para o Congresso em 1989, o presidente Ronald Reagan
renovou seu pedido de uma emenda constitucional que exigisse um orçamento federal
equilibrado. Em 1995, com déficits orçamentários ainda altos e com ambas as Casas sob
controle republicano, faltou apenas um voto para que o Congresso conseguisse aprovar uma
emenda de orçamento equilibrado. Em 2011, a Câmara dos Deputados controlada pelos
republicanos insistiu na votação de uma emenda constitucional de orçamento equilibrado como
uma condição para aprovar um aumento no teto da dívida nacional. (A emenda não passou.) As
diretrizes de Maastricht na Europa são regras de política fiscal que, embora não exijam
orçamentos equilibrados, determinam que a política fiscal cumpra metas de déficit.
Vimos que os economistas que aceitam a visão da escolha pública para o processo
orçamentário tendem a defender regras para a política fiscal. Os principais oponentes de regras
que obriguem a política fiscal a equilibrar o orçamento (ou a cumprir outras metas de déficit
arbitrárias) são os keynesianos, que afirmam que tais regras dificultam o papel estabilizador que
a política fiscal deve desempenhar – um papel que, às vezes, requer déficits orçamentários.
O papel do sistema de impostos–transferências como um estabilizador fiscal automático, que
foi explicado na Seção 18.4, requer que o orçamento possa entrar em déficit (ou superávit) em
pontos apropriados do ciclo de negócios. Durante uma recessão, quando o nível de atividade
econômica diminui, o orçamento, na visão keynesiana, deve às vezes entrar em déficit. Elevar as
alíquotas tributárias ou cortar os gastos nesse momento só exacerbaria a recessão. Os
keynesianos citam o aumento de impostos de 1932 nos Estados Unidos como um exemplo de
políticas fiscais mal orientadas que resultaram da tentativa de buscar a meta de um orçamento
equilibrado. A administração Hoover elevou substancialmente as alíquotas tributárias em 1932
para tentar equilibrar o orçamento em um momento em que as receitas tributárias estavam
caindo por causa da Depressão. O aumento das alíquotas tributárias aconteceu em um momento
em que a taxa de desemprego era de 24%. A política não teve sucesso em equilibrar o orçamento
por causa da forte queda da renda, que resultou, em parte, do aumento dos impostos. Durante a
recessão de 1974-1975, o déficit do orçamento federal disparou para quase 70 bilhões de
dólares. Durante a recessão de 1981-1982, o déficit alcançou um pico de US$ 208 bilhões. Os
keynesianos acreditam que o governo correria o risco de repetir a Grande Depressão se tivesse
tentado equilibrar o orçamento ou limitar seriamente o tamanho do déficit nessas condições.
Além de impedir o funcionamento dos estabilizadores automáticos, uma regra de orçamento
equilibrado limitaria a capacidade dos formuladores de políticas de tomar ações fiscais
anticíclicas discricionárias. Estas são mudanças nos gastos do governo e nas alíquotas
tributárias destinadas a estabilizar a demanda agregada do setor privado – os equivalentes na
economia real às mudanças de política fiscal discutidas em capítulos anteriores. Os keynesianos
não negam que há exemplos no passado de ações de política fiscal discricionária inoportunas e,
às vezes, desestabilizadoras, e não só estabilizadoras. Além disso, eles concordam que alguns
dos fracassos de políticas fiscais discricionárias derivam de interações entre o processo político e
a formulação de políticas macroeconômicas. Os keynesianos que se opõem a emendas
constitucionais de orçamento equilibrado ou a outras regras para a política fiscal afirmam,
porém, que o histórico das políticas discricionárias não é uniformemente ruim e que o custo de
interferir no funcionamento de estabilizadores fiscais automáticos por meio desse tipo de
emendas é grande.
Vemos que essas questões voltaram ao centro do palco como resultado da profunda recessão
de 2007-2009 e da lenta recuperação subsequente.

18.5.2 E quanto ao déficit?


Em 1963, quando o senador Harry Byrd Sr. perguntou ao Diretor do Orçamento, Kermit
Gordon, um economista keynesiano, o que o equilíbrio do orçamento faria pelo país, Gordon
respondeu, “Provavelmente acrescentaria cerca de 2,5 milhões de pessoas à lista dos
desempregados, retardaria a recuperação em uns quatro anos e cortaria 10% da produção do
país”.11 No entanto, em meados da década de 1980, os economistas keynesianos estavam entre
os críticos mais duros dos grandes déficits orçamentários que surgiram nos anos Reagan. O que
havia mudado?

18.5.2.1 Déficits cíclicos e déficits estruturais


Para compreender as diferenças nas posições keynesianas quanto aos déficits do início da
década de 1960 e aqueles das décadas de 1980 e 1990 nos Estados Unidos, é útil fazer a
distinção entre déficits cíclicos e déficits estruturais. Vimos que o déficit orçamentário federal
depende em parte do nível de atividade econômica. O déficit cíclico é a parte do déficit que
resulta de um nível baixo de atividade econômica. Na visão keynesiana, déficits cíclicos que
refletem o funcionamento de estabilizadores econômicos automáticos são desejáveis.
Déficits cíclicos
São a parte do déficit federal que resulta de um baixo
nível de atividade econômica.

Déficits estruturais
São a parte do déficit federal que existiria mesmo que
a economia estivesse em seu nível de produto
potencial.

A parte do déficit que existiria mesmo que a economia estivesse em seu nível de produto
potencial é chamada de déficit estrutural. Um déficit estrutural não é diretamente atribuível ao
comportamento da economia e é a parte do déficit pela qual os formuladores de políticas são
diretamente responsáveis. Em outras palavras, o déficit estrutural é resultado de decisões
tomadas por formuladores de políticas sobre alíquotas tributárias, nível de gastos do governo e
níveis de benefícios para programas de transferência.
Para dividir o déficit em componentes cíclico e estrutural, precisamos de uma medida do
produto potencial – o nível de produto obtido quando capital e trabalho são usados em suas mais
altas taxas sustentáveis. Podemos, então, calcular as mudanças nas receitas tributárias e
pagamentos de transferências que teriam ocorrido se a economia tivesse passado do produto
efetivo para o produto potencial. Usando esses dados, podemos encontrar o déficit estrutural.
Para dar um exemplo, suponhamos que o déficit efetivo seja de $300 bilhões, mas que a
economia esteja abaixo de seu produto potencial. Se o nível de atividade econômica aumentasse
até o nível potencial, as receitas tributárias teriam um aumento, vamos supor, de $100 bilhões.
Os pagamentos de transferências cairiam, digamos que em $30 bilhões, porque os pagamentos
de seguro-desemprego diminuiriam com o aumento do emprego. O déficit estrutural – o déficit
com o produto potencial – é, então, de $170 bilhões (300 – 100 – 30).
Como um exemplo real da distinção entre déficits cíclicos e estruturais, a Tabela 18.1 mostra
a divisão do déficit orçamentário federal efetivo dos Estados Unidos em seus componentes
cíclico e estrutural para os anos fiscais de 2008-2011. O ano fiscal vai de 1o de outubro a 30 de
setembro. Portanto, o ano inicial, 2008, terminou em setembro desse ano, logo antes da queda
acentuada do PIB. Pela tabela, pode-se ver que o componente cíclico do déficit, o efeito de
estabilizadores automáticos, ficou entre US$ 300 e US$ 400 bilhões em cada um dos 3 anos
seguintes. O componente cíclico foi responsável por aproximadamente um quarto dos déficits
acumulados desses três anos. O restante deveu-se a medidas discricionárias para combater a
recessão e a outros fatores.

Tabela 18.1 - Déficits efetivos, cíclicos e estruturais, Estados Unidos (bilhões de dólares), 2008-
2011
Fonte: Congressional Budget Office (CBO).

Para dar um exemplo, em 1963, quando Kermit Gordon deu a resposta anteriormente citada
ao senador Byrd, em vez de um déficit medido ao nível de produto potencial (conforme
estimativa da época), o orçamento apresentava um superávit de 13 bilhões de dólares; havia um
superávit estrutural.12 Gordon e outros keynesianos opuseram-se ao equilíbrio do orçamento em
1963 porque o déficit refletia o funcionamento de estabilizadores fiscais automáticos em um
momento em que a economia, aparentemente, estava operando substancialmente abaixo do
produto potencial.

18.5.2.2 A visão keynesiana dos déficits da década de 1980


Na década de 1980, os keynesianos criticavam a política da administração Reagan porque
acreditavam que os grandes déficits estruturais refletiam um mix errado de políticas fiscais e
monetárias. Especificamente, eles achavam que os déficits resultavam de uma política fiscal
excessivamente expansionista. Essa política fiscal compunha-se dos grandes cortes de impostos
e gastos aumentados com defesa que mais do que contrabalançavam os cortes nos gastos com
itens de outras áreas. As políticas fiscais excessivamente expansionistas, na opinião dos
keynesianos, significaram que, ao longo de boa parte da década de 1980, a política monetária
teve de ser especialmente restritiva a fim de impedir que o nível da demanda agregada crescesse
rápido demais. Os keynesianos acreditam que esse mix de uma política fiscal branda e uma
política monetária restritiva teve efeitos desfavoráveis sobre a composição do produto, das
seguintes maneiras.
Os keynesianos acreditavam que a política monetária rígida e a política fiscal branda
resultaram em altas taxas de juros nos Estados Unidos durante boa parte da década de 1980. Eles
achavam que esse mix de políticas desestimulou o investimento à custa do consumo.
Acreditavam também que as altas taxas de juros elevaram o valor do dólar americano com a
atração de investimentos externos; isso, por sua vez, incentivou as importações e desestimulou
as exportações, levando ao que foram, na época, recordes de déficits comerciais.
Os keynesianos defendiam um mix de política fiscal mais rígida e política monetária mais
branda que teria levado a maior formação de capital (mais investimento) e mais exportações (um
déficit comercial menor).

18.5.3 O orçamento federal americano no final da década de 1990 e


início do século XXI
A partir de meados da década de 1990, uma combinação de aumentos de impostos e cortes de
gastos, auxiliada pelo rápido crescimento econômico, moveu o orçamento de grandes déficits
para um superávit. Enormes superávits futuros eram previstos para o médio termo. Havia
preocupação quanto aos efeitos da eliminação da dívida pública, que se previa que chegaria a
zero até 2011. Essa preocupação foi prematura porque, conforme observado na introdução, em
2004 as projeções orçamentárias de dez anos mostravam um déficit cumulativo de mais de 2
trilhões de dólares, em comparação a um superávit de mais de 3 trilhões projetado no início de
2001.
Parte dessa mudança foi resultado da recessão de 2001. Em 2007, quase todo o déficit era
estrutural. Essa mudança na política fiscal reacendeu os debates das décadas de 1980 e 1990
sobre os efeitos econômicos de grandes déficits estruturais.

18.5.3.1 A recessão de 2008-2009 e as implicações para o orçamento


A recessão e a crise financeira recentes testaram os limites da política monetária para evitar
declínios acentuados na atividade econômica. Os formuladores de políticas tanto de
administrações democratas como republicanas voltaram-se para a política fiscal para ajudar a
estabilizar a economia. Houve um modesto corte de impostos em 2008 durante a administração
Bush e, como vimos, um estímulo fiscal muito maior com a American Recovery and
Reinvestment Act (ARRA) em 2009, depois que Barack Obama assumiu o governo. O efeito da
ARRA sobre o orçamento foi de aproximadamente U$ 800 bilhões ao longo de 3 anos. Pela
Tabela 18.1, pode ser visto que o efeito de estabilizadores automáticos nesses 3 anos teve um
total similar. Os déficits ultrapassaram US$ 1 trilhão por 3 anos seguidos.
Esse é o pano de fundo do debate atual sobre gastos governamentais, impostos e déficits
orçamentários. A posição keynesiana continua inalterada. Os economistas keynesianos veem o
programa de estímulo e o funcionamento de estabilizadores automáticos como algo que foi
necessário para evitar outra depressão. Os déficits resultantes são um efeito colateral necessário
do processo. Os críticos, entre eles os do que ficou conhecido como “tea party”, todos os
candidatos republicanos à presidência em 2012 e os líderes republicanos de ambas as Casas do
Congresso, renovaram a defesa de uma emenda constitucional para equilibrar o orçamento. Os
Republicanos querem cortes de gastos para equilibrar o orçamento sem elevar impostos – uma
tarefa de peso, dado o tamanho dos déficits futuros projetados. Os argumentos dos republicanos
contra a elevação dos impostos apoiam-se em elementos da economia do lado da oferta que são
examinados no Capítulo 19.

PERSPECTIVAS 18.3 - DÍVIDA SOBERANA


A dívida soberana é a dívida emitida e garantida por governos federais. Com frequência, consiste em dívida emitida em
moeda estrangeira, mas, no caso dos Estados Unidos, a dívida nacional é emitida em dólares americanos. A dívida
nacional americana é resultado de déficits passados que foram financiados vendendo títulos do Tesouro (de curto, médio e
longo prazo) para o público. A preocupação com o tamanho crescente da dívida nacional é central para as preocupações
com o tamanho dos déficits orçamentários federais. Examinamos aqui algumas das principais questões referentes à dívida
nacional. Medição: Mesmo a medição da dívida soberana de um país não é direta. A medida que usaremos aqui é a dívida
federal americana mantida pelo público. Essa medida ignora, por exemplo, a dívida do Tesouro com o fundo de
Seguridade Social, bem como outras dívidas intragovernamentais. Medida dessa maneira, em 2010 a proporção dívida/PIB
era de 62,1%; para 2015, o Congressional Budget Office (CBO) projeta que essa proporção suba para 71,2%. Depois, as
estimativas do CBO mostram a proporção se estabilizando em meados da década de 2070. Mas essas estimativas baseiam-
se em disposições da legislação atual, que provavelmente não serão mantidas, como a expiração de todos os cortes de
impostos aprovados em 2001 e 2004 e estendidos temporariamente até 2011. Com pressupostos mais plausíveis sobre as
políticas futuras, a proporção dívida/PIB sobe até a faixa de 80% a 85% até 2020. Ainda assim, esses são níveis não muito
diferentes aos dos países europeus fiscalmente mais sólidos.
Mais preocupante é o fato de que, se os custos da saúde subissem a taxas consistentes com algumas das projeções atuais
mais elevadas, a proporção dívida/PIB dispararia para até 175% do PIB até 2035. Isso não é provável. Para evitar esse
resultado, no entanto, a inflação sobre o custo do atendimento de saúde precisa declinar, os impostos precisam subir,
outros gastos têm que cair ou, mais provavelmente, alguma combinação desses três fatores terá que acontecer. Fardo da
dívida nacional: Diz-se com frequência que a dívida nacional é um fardo para as futuras gerações. Em que sentido isso é
verdade? Na teoria das finanças públicas padrão, o fardo da dívida reflete o grau em que ela reflete o deslocamento
(crowding out) passado de investimentos em estoque de capital devido a gastos governamentais deficitários. Gastos
deficitários na presença do produto potencial medidos pelo déficit estrutural reduzem a quantidade de poupança nacional
que poderia ser usada para financiar investimentos privados. Se a atividade econômica estiver abaixo do produto potencial,
isso não é verdade, porque os gastos deficitários podem aumentar o produto e, portanto, a poupança. Também importa
qual a forma que os gastos governamentais assumem. Se o governo fizer investimentos produtivos, por exemplo em
infraestrutura ou educação, isso é um benefício para uma geração futura que compensa o efeito do declínio nos
investimentos privados.

Mas qualquer dívida não é um fardo pelo fato de que a geração futura tem que pagar os juros?
A resposta para essa pergunta depende de a dívida ser devida a estrangeiros ou a investidores
domésticos. Se ela for devida a investidores domésticos, então, pela perspectiva da nação,
devemos a nós mesmos. A geração futura paga impostos para fazer pagamentos de juros para
outros membros dessa geração. Ainda assim, impostos envolvem distorções e estas são um
custo. Se a dívida for vendida a investidores estrangeiros, como foi cada vez mais o caso nos
Estados Unidos nas duas últimas décadas, há um fardo mais direto. Nesse caso, algum
investimento passado, em vez de ser deslocado por déficits governamentais, foi financiado por
recursos do exterior e não por poupança doméstica. A dívida resultante deve ser paga pela
geração futura.
É provável que ocorra uma crise da dívida soberana nos Estados Unidos? Uma crise da
dívida soberana acontece quando os investidores questionam a capacidade ou disposição de um
país a servir e pagar sua dívida. A única chance de que isso venha ocorrer com os Estados
Unidos, a maior economia do mundo e um dos países mais ricos, seria como resultado de
escolhas de política econômica incrivelmente estúpidas. Um fato para ter em mente é que a
dívida americana é em dólares americanos. O país pode criar uma quantidade ilimitada de sua
própria moeda. Nesse sentido, os Estados Unidos diferem fundamentalmente da Itália, com
dívida em euros, uma moeda comum da zona do euro, ou da Argentina, que tinha uma grande
dívida em dólares americanos. Escolhas de política econômica ruins poderiam criar temores de
inflação nos Estados Unidos e elevar a taxa de juros que o país precisa pagar para financiar a
dívida.
O déficit ótimo é igual a zero? Há tantos fatores que estariam envolvidos no cálculo do déficit
efetivo ou estrutural ótimo que encontrar uma aproximação sequer razoável é uma tarefa quase
impossível. O nível ótimo certamente não é zero em todos os pontos do tempo. Mesmo aqueles
que defendem uma emenda constitucional de orçamento equilibrado incluiriam algumas
cláusulas de escape para recessões e guerras. Se em algum ponto o déficit é “grande demais” e
como o nível do déficit deve ser determinado são, assim, sem surpresa, questões controversas.

Conclusão
O déficit dominou o debate sobre política fiscal nas três últimas décadas. Qualquer papel
estabilizador potencial para a política fiscal foi complicado pela preocupação com déficits e por
considerações alternativas de políticas orçamentárias. A crise econômica de 2007-2009 mudou o
ambiente e os formuladores de políticas voltaram à política fiscal como um instrumento de
estabilização. Esse renascimento keynesiano teve vida curta, uma vez que as preocupações com
déficits e gastos governamentais “excessivos” retornaram.
As preocupações com o déficit e a dívida provavelmente continuarão centrais no futuro. A
aposentadoria gradual da geração “baby boom” nos Estados Unidos e a expectativa de vida
maior da população pressionarão com mais força os sistemas de Seguridade Social e de saúde.
Mais assustadores são os efeitos projetados da elevação dos preços da saúde sobre os sistemas
Medicare e Medicaid. Dadas essas pressões orçamentárias, as políticas de estabilização fiscais
provavelmente serão postas dentro de uma caixa trancada a cadeado e com a instrução: “Abrir
apenas em caso de crise”.

Questões de revisão
1. Alguns economistas que aceitam a visão da escolha pública para o processo de formulação
de políticas fiscais concluíram que uma emenda constitucional que exigisse um orçamento
federal equilibrado seria desejável. Resuma os argumentos deles a favor dessa emenda.
2. Explique o elemento central da teoria do partidarismo na formulação de políticas fiscais.
Compare as implicações da teoria do partidarismo para a relação entre política fiscal e o ciclo
de negócios com as da visão da escolha pública.
3. Explique o conceito de estabilizador fiscal automático. Dê exemplos.
4. Suponha que, no modelo keynesiano simples usado na Seção 18.4, o nível de gastos do
governo (G) fosse 100, o nível de gastos com investimentos (I) fosse 75 e o consumo (C)
fosse dado por
C = 25 + 0,8YD
Os impostos líquidos (T) são inicialmente dados pela função imposto
T = -50 + 0,30Y
Calcule a renda de equilíbrio (Y). Agora, suponha que a alíquota tributária seja reduzida de
0,30 para 0,25. Encontre o novo nível da renda de equilíbrio. Calcule os valores do
multiplicador de gastos autônomos antes e depois da redução do imposto.
5. Explique as objeções que os economistas keynesianos fazem a regras fixas para políticas
fiscais, como uma emenda constitucional que exija um orçamento federal equilibrado.
6. Retome a primeira renda de equilíbrio que você calculou no problema 4. Agora suponha que
o intercepto da função imposto líquido (t0) mude de –50 para –40. Encontre o novo nível de
equilíbrio da renda.
7. Retorne ao modelo keynesiano simples da Seção 18.4. Suponha que: G é 700; I é 310; e C é
dado por
C = 250 + 0,8YD
Os impostos líquidos (T) são dados pela função imposto
T = -50 + 0,25Y
Calcule a renda de equilíbrio. Agora, suponha que I caia 80 unidades, para 230. Calcule o
novo nível da renda de equilíbrio e o valor do déficit (G -T) nesse nível de renda. Suponha
que o governo aumente os impostos de modo geral (aumente t0) pelo mesmo montante do
déficit para equilibrar o orçamento. Qual será o novo nível da renda de equilíbrio? O
orçamento será equilibrado? Explique.
8. Suponha que a propensão marginal a consumir usando a renda disponível seja 0,8 e que a
alíquota marginal do imposto de renda seja 0,1. Qual é o valor do multiplicador dos gastos
autônomos? Agora, suponha que a alíquota marginal do imposto de renda suba para 0,2.
Qual é o novo valor do multiplicador? Explique a diferença.
PARTE VI

Crescimento econômico

Os capítulos desta parte expandem o intervalo de tempo de nossa análise para períodos mais
longos do que ciclos de negócios. No Capítulo 19, consideramos períodos longos demais para
nossas premissas de curto prazo, mas não consideraremos que a economia esteja em um
caminho de crescimento de equilíbrio de longo prazo. Pelo tempo de calendário, esses poderiam
ser períodos de uma ou duas décadas. Fazer modelos para esse intervalo de tempo é complicado.
Embora as premissas feitas para o curto prazo não sejam mais válidas, os fatores de ciclos de
negócios que dominam o comportamento de curto prazo da economia ainda exercem influência
em um período de uma década ou mais. Complicados ou não, esses períodos de duração
intermediária são o intervalo relevante para muitas das principais disputas de política econômica
de anos recentes, em especial com referência a efeitos de políticas fiscais. Um exemplo
proeminente é a controvérsia sobre a economia do lado da oferta.
O Capítulo 20 examina modelos de crescimento econômico de longo prazo. Nele analisaremos
os fatores que determinam o que Adam Smith chamou de “a riqueza das nações”. Uma questão-
chave é por que a riqueza é tão desigualmente distribuída entre as nações.
CAPÍTULO 19
Políticas para o crescimento de médio prazo

Este capítulo examina os fatores que determinam o crescimento do produto em períodos mais
longos que o curto prazo, mas não necessariamente períodos de equilíbrio de longo prazo: o
incômodo, mas importante, médio prazo. O presidente Bill Clinton gostava de falar sobre “fazer
crescer a economia”. O foco específico deste capítulo é em políticas que estimulam o
crescimento sustentado ao longo de períodos de uma ou duas décadas ou que entravam o
crescimento durante esse mesmo período.
O período de curto prazo de nossa análise anterior era caracterizado pelos pressupostos de
estoque de capital constante, força de trabalho fixa e tecnologia inalterada. As mudanças no
produto aconteciam quando o nível de emprego variava. Ao considerar mudanças no produto no
médio prazo, talvez 10 a 15 anos em vez de 2 a 4 anos, não podemos fazer essas suposições.
Variações nas taxas de formação de capital, crescimento da força de trabalho que resulta do
crescimento da população em idade produtiva e de mudanças nas taxas de participação na força
de trabalho, e variações no ritmo de mudanças tecnológicas são fatores que determinam as taxas
de crescimento do produto no médio prazo. E quanto à importância da demanda? Os
economistas que aceitam os modelos clássico, dos ciclos reais de negócios ou novo-clássico
veem pouco papel direto para a demanda agregada como um fator significativo para determinar
a trajetória de crescimento do produto em períodos de duração intermediária. Nas teorias
clássica ou dos ciclos reais de negócios, a demanda agregada não participa da determinação do
produto nem mesmo no curto prazo. No modelo novo-clássico, apenas mudanças não
antecipadas da demanda afetam o produto. Portanto, apenas desvios do crescimento da demanda
em relação à média, e não a taxa de crescimento média da demanda ao longo de um período de
10 a 15 anos, afetaria o produto.
A situação é diferente para as concepções monetarista e keynesiana (ou novo-keynesiana).
Como explicamos, a taxa de crescimento de equilíbrio no longo prazo é determinada pela oferta,
mas tanto monetaristas como keynesianos acreditam que mudanças na demanda afetam o
produto em períodos de vários anos. Se olharmos para qualquer período de 10 a 15 anos, a taxa
média de crescimento pode ser afetada por recessões ou expansões induzidas pela demanda
dentro desse período. Fatores de demanda poderiam, por exemplo, explicar por que a taxa de
crescimento do produto foi aproximadamente zero na década de 1929-1939 da Grande
Depressão nos Estados Unidos ou por que ela pode ser baixa na década que começou com a
recessão e a crise financeira em 2007.
Assim, como no caso da análise de curto prazo, os economistas discordam sobre a
importância relativa da oferta e da demanda na determinação do produto em períodos de médio
prazo. Vamos examinar a posição de um grupo chamado de economistas do lado da oferta.
Como o nome indica, os economistas do lado da oferta enfatizam fatores de oferta como os
determinantes do comportamento do produto. As origens de suas ideias estão na economia
clássica; consequentemente, suas teorias compartilham elementos com as teorias dos ciclos reais
de negócios e com a economia novo-clássica. Há, contudo, questões adicionais que surgem ao se
considerar o crescimento do produto no médio prazo e diferentes tipos de questões de política
econômica.
Em vez de examinar todo o conjunto de visões sobre políticas econômicas no médio prazo,
vamos nos restringir a contrastar a visão do lado da oferta com a visão keynesiana. De fato, os
economistas keynesianos têm sido os críticos mais duros da economia do lado da oferta. A
posição keynesiana afirma, como disse James Tobin, que Deus nos deu dois olhos para que
pudéssemos observar tanto a oferta como a demanda (ainda que com o perigo de se tornar um
pouco estrábico). Além da questão da importância relativa da oferta e da demanda, os
economistas do lado da oferta e keynesianos discordam quanto a quais políticas têm efeitos
favoráveis (ou desfavoráveis) sobre a oferta agregada.
Vamos examinar a posição do lado da oferta conforme ela evoluiu nas últimas três décadas e,
então, considerar a crítica keynesiana. Em seguida, descreveremos o redirecionamento da
política macroeconômica que ocorreu nos Estados Unidos durante a administração Reagan e o
primeiro governo Bush – um redirecionamento inspirado pela economia do lado da oferta.
Então, a partir de 1992, os eleitores começaram a alternar entre uma preferência por políticas
motivadas pela economia do lado da oferta e outras com um papel maior para a ação do
governo, incluindo a administração da demanda agregada keynesiana. Na década de 1990, os
eleitores americanos pareceram querer que a política econômica mudasse de direção, em relação
às políticas de Reagan-Bush, elegendo Bill Clinton duas vezes para a presidência. Em 1994,
porém, o “Contrato com a América” dos republicanos no Congresso, que se apoiava fortemente
nos preceitos da economia do lado da oferta, mostrou-se popular. Além disso, em 2000, George
W. Bush foi eleito e seguiu um programa econômico de grandes reduções de impostos alinhado
com as prescrições dos economistas do lado da oferta. Em 2006, os democratas obtiveram
maioria em ambas as Casas do Congresso e, em 2008, Barack Obama venceu as eleições
presidenciais. Depois, em 2010, os republicanos recuperaram a maioria nas duas Casas,
repetindo a situação de 1994. A única constante no processo parece ser uma insatisfação com os
titulares e um desejo de mudança.
Antes de nos voltarmos para esses tópicos, porém, será útil rever o desempenho do
crescimento da economia americana nas décadas passadas. Aqui encontraremos pistas para o
humor dos eleitores.

19.1 O crescimento econômico dos Estados Unidos, 1960-2011


A experiência de crescimento dos Estados Unidos no período de 1960-2006 é resumida na
Tabela 19.1. Como a tabela mostra, as taxas de crescimento do produto e da produtividade do
trabalho desaceleraram após 1973. A taxa de formação de capital também declinou. O
crescimento da força de trabalho aumentou no final da década de 1960 e na década de 1970,
quando a geração “baby boom” do período pós-Segunda Guerra Mundial chegou à idade adulta,
e, depois, retornou a seu nível anterior na década de 1980.
Em algum ponto da década de 1990, parece ter começado uma reviravolta. Enquanto o
crescimento da força de trabalho continuou a declinar devido a fatores demográficos, a formação
de capital e o crescimento do produto e da produtividade do trabalho subiram quase a níveis
pré-1973. A grave recessão de 2007-2009 paralisou qualquer reviravolta nas perspectivas de
crescimento de prazo mais longo que pudesse estar se desenhando. Nos anos de 2007-2011, não
houve praticamente nenhum crescimento líquido na economia americana. A taxa de crescimento
anual desses anos foi de 0,3%.
Os fatos que os economistas do lado da oferta e keynesianos precisam explicar, portanto, são
os seguintes:
1. A taxa de crescimento do produto americano desacelerou acentuadamente no período
1973-1992.
2. A taxa de crescimento da produtividade do trabalho declinou fortemente na década de
1970.
3. A taxa de formação de capital também desacelerou nas décadas de 1970 e 1980 em relação
aos anos pré-1973.
4. Depois de 1992, a formação de capital e o crescimento do produto e da produtividade do
trabalho subiram quase a níveis pré-1973.

Tabela 19.1 - Experiência de crescimento dos Estados Unidos, 1960-2006

Taxa de crescimento percentual média anual

Fontes: Historical Statistics, 1960-1989 (Paris: OCDE, 1991); Economic Report of the President, 1992, 1997, 2004; OECD
Economic Outlook, Dec. 1997, June 2003, June 2007.

PERSPECTIVAS 19.1 - DESACELERAÇÕES DO CRESCIMENTO E DA


PRODUTIVIDADE EM OUTRAS ECONOMIAS INDUSTRIALIZADAS
A Tabela 19.2 mostra as taxas de crescimento do produto e da produtividade do trabalho em seis importantes países
industrializados. Os dados são taxas de crescimento percentual médias anuais para períodos de tempo similares aos
considerados para os Estados Unidos na Tabela 19.1. A característica marcante na tabela é uma notável desaceleração do
crescimento do produto e do crescimento da produtividade no período pós-1970 em todos esses países. Os dados nas
tabelas são para grandes economias industrializadas, mas os dados de economias menores contam a mesma história. A
desaceleração do crescimento e da produtividade na década de 1970, com o crescimento relativamente lento continuando
na década de 1980 e início da década de 1990, afetou praticamente todas as economias industrializadas. Essa tendência
sugere que, quando buscarmos explicações para a desaceleração, devemos procurar causas que tenham efeitos
internacionais amplos.
A reviravolta no quadro do crescimento nos Estados Unidos na década de 1990 foi compartilhada por alguns, mas não
todos os países da tabela. O Canadá e o Reino Unido tiveram um aumento do crescimento do produto e da produtividade
do trabalho. Os países da Europa continental não. O Japão ainda estava atolado em um lento crescimento deflacionário.
Como nos Estados Unidos, o crescimento desacelerou ou cessou com a recessão mundial de 2007-2009. O ciclo de
negócios obscureceu qualquer tendência de prazo mais longo.
Tabela 19.2 - Taxa de crescimento do produto e da produtividade do trabalho, países
selecionados, médias anuais

Fontes: Historical Statistics (Paris: OCDE, 1988, 1992); OECD Economic Outlook, Dec. 1997, June 2003, June 2007.

19.2 A posição do lado da oferta


As origens da economia do lado da oferta estão nas teorias clássicas examinadas nos
Capítulos 3 e 4. Em particular, para o médio prazo, os economistas do lado da oferta aceitam a
visão clássica de que o produto é determinado por variáveis reais: crescimento da oferta de
fatores de produção e mudanças na tecnologia. Eles também adotam uma visão clássica do
processo de poupança-investimento, em que a taxa de juros é a variável crucial. Mais
fundamentalmente, os economistas do lado da oferta compartilham a crença dos economistas
clássicos no sistema capitalista de livre iniciativa e o desagrado com intervenções
governamentais na economia. Para analisar essas ideias, começamos com a exposição de
algumas das proposições da economia do lado da oferta. Explicaremos, então, cada proposição
em termos de suas raízes clássicas e mostraremos como cada uma delas pode ser aplicada às
políticas econômicas atuais.
As quatro proposições a seguir são elementos centrais da economia do lado da oferta.1
1. O crescimento do produto no médio prazo é predominantemente determinado pela oferta
por meio das taxas de crescimento da oferta de fatores de produção e da taxa de mudanças
tecnológicas.
2. A taxa de crescimento do insumo capital é determinada primordialmente pelos incentivos à
poupança e ao investimento, sendo esses incentivos os retornos da poupança e dos
investimentos após o pagamento de impostos.
3. O crescimento do insumo trabalho, embora no longo prazo seja determinado por fatores
demográficos, também pode ser significativamente afetado por incentivos, neste caso por
mudanças no salário real descontados os impostos.
4. Regulamentações governamentais excessivas das firmas desestimularam a formação de
capital e contribuíram para desaceleração do crescimento da produtividade do trabalho nas
décadas de 1970 e 1980 nos Estados Unidos.

19.2.1 O crescimento do produto no médio prazo é determinado pela


oferta
No longo prazo, o crescimento econômico depende principalmente de fatores da oferta. Os
economistas do lado da oferta acreditam que essa dependência também se aplique ao médio
prazo. Isso segue claramente o modelo clássico, em que mesmo no curto prazo o produto é
determinado pela oferta. O crescimento de médio prazo no modelo clássico é ilustrado na Figura
19.1. O produto aumenta de Y0 para Y1 para Y2 à medida que a curva de oferta se desloca para a
direita, refletindo o crescimento da oferta dos fatores de produção e mudanças na tecnologia. Se
a curva de demanda agregada permanecer em Yd0 na Figura 19.1, os preços cairão
sucessivamente para P2 e depois para P2. Se, em vez disso, a demanda aumentar como resultado
de um crescimento da oferta de moeda proporcional ao crescimento do produto, o nível de
preços será mantido em P0. Seja qual for o caso, o crescimento do produto é determinado
unicamente por deslocamentos da curva de oferta.
Seria excessivamente restritivo dizer que a Figura 19.1 representa a visão do lado da oferta. A
maioria dos economistas do lado da oferta aceita que a demanda tem um papel na determinação
da renda no curto prazo; a curva de oferta agregada no prazo muito curto tem inclinação
positiva para a direita em vez de ser vertical, como os economistas clássicos a teriam traçado.
Consequentemente, para evitar transtornos no curto prazo, muitos economistas do lado da oferta
defenderiam uma estratégia de política econômica em que a demanda fosse elevada o suficiente
para evitar a necessidade de deflação (a queda nos preços de P0 para P2 na Figura 19.1). Ainda
assim, um elemento central na posição do lado da oferta é que, para períodos de médio prazo, o
crescimento do produto é determinado pela oferta e não pela demanda.2

FIG 19.1 Crescimento de médio prazo no sistema clássico


O crescimento da oferta de fatores de produção desloca a curva de oferta para a direita (de Ys0 para Ys1 para Ys2). Se a demanda
permanecer inalterada, o nível de preços cai (de P0 para P2 para P2). Aumentos apropriados na quantidade de moeda
aumentariam a demanda o suficiente (de Yd0 para Yd2 para Yd2) para manter o nível de preços de equilíbrio inicial (P0).

19.2.2 A poupança e o investimento dependem das taxas de retorno


após o pagamento dos impostos
Os economistas do lado da oferta enfatizam a importância da taxa de retorno dos
investimentos após o pagamento dos impostos como um determinante primário do investimento
e, portanto, da taxa de formação de capital. A taxa de retorno pós-impostos é a taxa de retorno
pré-impostos multiplicada por 1 menos a carga tributária sobre o rendimento. De modo similar,
os economistas do lado da oferta acreditam que o retorno da poupança pós-impostos seja uma
influência importante sobre a taxa de crescimento da poupança. Neste caso, a taxa de retorno
relevante é a taxa de juros real pós-impostos, que é igual à taxa de juros nominal pós-impostos
(a taxa nominal multiplicada por 1 menos a carga tributária sobre o pagamento dos juros) menos
a taxa de inflação esperada.
Essa visão da poupança e do investimento é uma noção clássica. Lembre-se de nossa
discussão sobre a teoria dos juros no modelo clássico, como é ilustrada na Figura 19.2. A taxa de
juros (real) de equilíbrio é determinada pela intersecção das curvas de poupança e de
investimento. Isso reflete o pressuposto que fazemos por enquanto de que o déficit do governo
(G – T) seja zero. Se não fosse assim, o financiamento do déficit do governo representaria uma
demanda adicional por fundos de empréstimo. A posição da curva de investimento é mostrada
como dependente de lf, a taxa de lucro das firmas antes dos impostos, e de tlf, a alíquota efetiva
do imposto sobre o lucro das firmas, a ser explicada mais adiante. A posição da curva de
poupança depende de twh, a alíquota tributária sobre a renda derivada da poupança (riqueza). No
modelo clássico, a renda derivada da poupança seria a renda com juros dos títulos. Na economia
real, twh representaria também a alíquota tributária sobre a renda de dividendos e sobre ganhos
de capital produzidos por mudanças nos preços de ativos. Em nossa análise anterior,
estabelecemos que a taxa de juros real (r) era determinada pelo que os economistas clássicos
chamavam de forças de produtividade e poupança, sendo a produtividade refletida na taxa de
lucro e, portanto, na posição da curva de investimento e a poupança (ou parcimônia) refletida na
posição da curva de poupança (ambas para uma dada estrutura tributária). Aqui, o ponto
importante é que, na visão clássica, produtividade e parcimônia, assim como a estrutura
tributária, são determinantes da poupança e do investimento e, em consequência, da taxa de
formação de capital.

FIG 19.2 Teoria dos juros clássica

A posição da curva de poupança depende da alíquota tributária sobre os rendimentos provenientes de juros e dividendos (twh0). A
posição da curva de investimento depende da alíquota tributária efetiva sobre os lucros das firmas (tlf0) e da taxa de lucros das
firmas antes dos impostos (lf). Essas alíquotas tributárias, twh0 e tlf0, afetarão, portanto, a taxa de juros real de equilíbrio (r).

Os economistas do lado da oferta não precisam aceitar a especificação particular das funções
poupança e investimento em nossa versão simples do sistema clássico. Por exemplo, ao tentar
prever o nível de investimento nos Estados Unidos em 2012, os economistas do lado da oferta
utilizariam uma função investimento muito mais complexa do que a mostrada na Figura 19.2.
Eles levariam em conta fatores como intervalos de tempo e custos de ajustamento. A
característica essencialmente clássica da visão dos economistas do lado da oferta é sua ênfase na
importância das taxas de retorno como influências das taxas de poupança, de investimento e,
assim, de formação de capital. Que outra coisa seria possível enfatizar? A resposta é a renda e,
assim, a demanda agregada. Os keynesianos acreditam que a renda é o determinante mais
importante do investimento. Segundo a visão keynesiana, a melhor maneira de manter o
investimento num nível alto é manter a economia com uma alta taxa de utilização de capacidade.
Os keynesianos não ignoram as taxas de retorno, nem os economistas do lado da oferta ignoram
a renda como um determinante da poupança e do investimento. A diferença ente as duas visões é
uma questão de ênfase.
Ao enfatizarmos a importância de incentivos para a poupança e o investimento, somos
levados a buscar a causa do declínio na taxa de formação de capital nos Estados Unidos no
período pós-1970 em fatores que tenham enfraquecido esses incentivos. A solução para a lenta
formação de capital pode estar no aumento de incentivos para poupadores e investidores. Martin
Feldstein e outros economistas afirmam que a interação entre a inflação e o sistema tributário
americano enfraqueceu esses incentivos durante a década de 1970.
Primeiro, Feldstein e outros argumentaram que, dadas as leis tributárias existentes, a alta
inflação da década de 1970 elevou a carga tributária efetiva sobre a renda das firmas.3 Eles
apresentaram várias razões para isso; uma razão importante refere-se às regras para deduções de
depreciação. As firmas podem deduzir a depreciação de investimentos de capital apenas em
relação aos custos originais. Em períodos inflacionários, o custo verdadeiro do capital
depreciado é o custo de reposição. Esse custo é subestimado pela depreciação em termos do
custo original ou histórico, de forma que os lucros são superestimados e o imposto a pagar
efetivo das firmas acabou aumentando na inflacionária década de 1970.
Os economistas do lado da oferta também afirmam que a combinação da inflação e do
sistema tributário dos Estados Unidos reduziu os incentivos para poupar na década de 1970. O
imposto de renda que um indivíduo paga é baseado nos juros, dividendos ou ganhos de capital
nominais que ele obtém com seu investimento em poupança. Dois exemplos ilustrarão como a
inflação elevada e a tributação dos pagamentos de juros ou ganhos de capital nominais reduz o
retorno real da poupança. Suponhamos que, inicialmente, a taxa de juros nominal seja de 6% e a
taxa de inflação seja 2% (uma taxa real pré-impostos de 4%). Com uma alíquota tributária
marginal de 50%, um investidor teria um retorno nominal após os impostos de 3% [6% × (1 -
twh) = 6% × (1 - 0,5)] e um retorno real após os impostos de 1% (3% - 2%). Agora, suponhamos
que a taxa de juros nominal fosse de 16%, com uma taxa de inflação de 12% (uma vez mais,
uma taxa real pré-impostos de 4%). O retorno nominal após os impostos será de 8% [16% × (1 -
0,5)], o que significa que o retorno real após os impostos é agora de -4% (8% - 12%).
Ou consideremos o caso da tributação de ganhos de capital nominais sobre ações de firmas,
por exemplo. Suponhamos que um indivíduo tenha comprado ações por um preço de $100 em
1967 e vendido em 1980 por $200. Se o nível de preços subisse mais de 150% nesse período
enquanto o preço das ações duplicasse (100% de aumento), o retorno real do indivíduo seria
negativo mesmo antes dos impostos. Ainda assim, ele precisaria pagar um imposto sobre os
ganhos referente ao ganho de capital nominal (de $100), o que aumenta o tamanho da perda real.
Os economistas do lado da oferta afirmam que a tributação de ganhos de capital e de
rendimentos em juros nominais durante períodos inflacionários resulta em uma alíquota
tributária efetiva aumentada sobre os retornos reais e isso reduzirá a taxa de poupança.

FIG 19.3 Inflação, sistema tributário e o processo poupança-investimento


Um aumento da alíquota tributária efetiva para as firmas devido ao aumento da inflação fez a curva de investimento deslocar-se
para a esquerda de I(lf, tlf0) para I(lf, tlf1). Um aumento induzido pela inflação da alíquota tributária efetiva sobre a renda de juros
e ganhos de capital desloca a curva de poupança para a esquerda, de S(twh0) para S(twh1). Os níveis de equilíbrio de investimento
e poupança caem de I0 = S0 para I1 = S1.

Os efeitos da sobretributação dos lucros das empresas e do retorno da poupança durante


períodos inflacionários são ilustrados na Figura 19.3. Vamos supor que nos movamos de um
período de taxas de inflação relativamente baixas para um período de inflação mais alta. Devido
à depreciação do custo histórico, isso resulta em um aumento da alíquota tributária efetiva sobre
os lucros das firmas, de tlf0 para tlf1 na Figura 19.3. Para uma dada taxa de lucro pré-impostos lf,
esse aumento da alíquota tributária efetiva deslocará a curva de investimento para a esquerda,
como é mostrado no gráfico. Além disso, devido à tributação dos rendimentos de juros e ganhos
de capital nominais, os impostos efetivos sobre o retorno da poupança são aumentados de twh0
para twh1, o que desloca a curva de poupança para a esquerda na Figura 19.3. Depois do ajuste a
um novo equilíbrio, poupança e investimento são reduzidos dos níveis S0 e I0 para S1 e I1 na
Figura 19.3. A taxa de formação de capital é reduzida pela interação de inflação e sistema
tributário.

19.2.3 A oferta de trabalho é sensível a mudanças no salário real


após os impostos
FIG 19.4 Impostos e oferta de trabalho no sistema clássico
Um aumento na alíquota do imposto de renda de ty0 para ty1 reduz o salário real após os impostos e faz a curva de trabalho
deslocar-se para a esquerda. O emprego cai de N0 para N1.

Os economistas do lado da oferta afirmam que a oferta de trabalho é sensível a mudanças nos
salários reais após os impostos. Também aqui a visão do lado da oferta apoia-se na economia
clássica – neste caso, na análise clássica dos efeitos no lado da oferta de mudanças na alíquota
marginal do imposto de renda (veja a Seção 4.3). A Figura 19.4 ilustra a determinação do
emprego de equilíbrio no sistema clássico e o efeito de uma mudança no salário real após os
impostos como resultado de uma mudança na alíquota marginal do imposto de renda, ty.
Inicialmente, vamos supor que a alíquota do imposto de renda seja definida em ty0. A curva de
oferta de trabalho é dada por Ns(ty0) e intercepta a curva de demanda por trabalho em N0, o nível
de equilíbrio do emprego.
Agora, vamos supor que a alíquota do imposto de renda passe para um nível mais alto, ty1. De
acordo com a visão do lado da oferta, a oferta de trabalho depende do salário real após os
impostos, que será igual a (1 - ty)W/P. Por exemplo, com uma alíquota marginal do imposto de
0,20, o salário real após os impostos será 0,80 vezes o salário real antes dos impostos. A alíquota
marginal do imposto de renda cria, assim, uma defasagem entre o salário pago pelo empregador,
W/P, e o salário recebido pelo trabalhador, (1 - ty)W/P. Um aumento na alíquota tributária de ty0
para um nível ty1 faz a curva de oferta de trabalho deslocar-se para a esquerda, de Ns(ty0) para
Ns(ty1). Menos trabalho é ofertado a cada nível do salário real pré-impostos, porque, com uma
alíquota tributária mais alta, um dado salário real antes dos impostos representa um salário real
mais baixo após os impostos. O emprego cai de N0 para N1.
Os economistas do lado da oferta acreditam que a elevação da alíquota tributária marginal
nos Estados Unidos durante a década de 1970 aumentou o tamanho da “defasagem” criada pelo
imposto de renda entre o salário real pago pelo empregador e o salário após os impostos
recebido pelo empregado (veja Perspectivas 4.2). Eles afirmam que os incentivos ao trabalho
foram reduzidos, com efeitos negativos sobre o emprego e o produto. Nesse caso, uma vez mais,
políticas de demanda agregada inflacionárias e um sistema tributário mal planejado para lidar
com os efeitos da inflação merecem boa parte da culpa. O sistema de imposto de renda
americano na década de 1970 era progressivo. Em um sistema progressivo, quando a renda
nominal sobe devido à inflação, os indivíduos passam para faixas marginais de imposto mais
altas.

19.2.4 A regulamentação governamental pode contribuir para a


desaceleração do crescimento econômico
Os economistas do lado da oferta afirmam que a proliferação de regulamentações
governamentais das firmas pode contribuir de forma significativa para a desaceleração do
crescimento econômico, como aconteceu nos Estados Unidos na década de 1970, onde uma
nova onda de atividade regulatória governamental teve início na década de 1960. Foram criados
órgãos e aprovadas novas leis para controle da poluição, segurança do trabalhador, segurança de
produtos de consumo e reforma do sistema de aposentadorias. Os economistas do lado da oferta
afirmam que esse aumento da atividade reguladora governamental reduziu o crescimento
econômico de duas maneiras.
Primeiro, a obediência a essas regulamentações aumenta o custo de produzir um determinado
nível de produto. Aumentos das regulamentações governamentais, portanto, têm os mesmos
efeitos que os choques de oferta examinados no Capítulo 8. A curva de oferta agregada desloca-
se para a esquerda, reduzindo o produto. Repare que parte do aumento nos custos vem da
necessidade de contratar trabalhadores não diretamente para a produção – para fabricar aço, por
exemplo –, mas para limpar chaminés em cumprimento aos controles de poluição, eliminar
riscos de segurança no trabalho ou outras atividades requeridas para cumprir as
regulamentações. Assim, o aumento da atividade reguladora governamental é uma possível
explicação para a queda do crescimento da produtividade do trabalho.
Segundo, os economistas do lado da oferta afirmam que a atividade reguladora do governo
reduz a formação de capital, pelo menos a formação de capital que contribui para aumentar a
produtividade em termos da quantidade medida de produto.

PERSPECTIVAS 19.2 - A CURVA DE LAFFER


Um formulário de imposto de renda “simplificado” que circulou como piada dizia
Formulário “1040”
Renda deste ano_________.
ENVIE-A.
Um sistema tributário representado por esse formulário, com uma alíquota tributária de 100%, não arrecadaria nenhuma
receita. Quem iria trabalhar e informar a renda? No outro extremo do espectro das alíquotas tributárias, uma alíquota de
0% obviamente também não produziria nenhuma receita. Portanto, sabemos que, se traçarmos uma relação entre receita
tributária e alíquota tributária, com a receita no eixo vertical, a curva primeiramente subirá conforme a alíquota se afasta
de zero, mas, em algum ponto, antes que a alíquota atinja 1, ela cairá. Por exemplo, a relação poderia ser a mostrada na
Figura 19.5.
Essa curva, que mostra a receita tributária arrecadada para cada alíquota de imposto (ou para o nível geral das alíquotas), é
chamada de curva de Laffer. A curva deriva seu nome de Arthur B. Laffer, que a popularizou. A curva de Laffer recebeu
muita atenção por ilustrar a possibilidade de que aumentos nas alíquotas tributárias pudessem reduzir a receita tributária.
Inversamente, um corte nas alíquotas poderia aumentar a receita. Este último efeito ocorrerá se as alíquotas tributárias
estiverem inicialmente na faixa à direita do ponto A na Figura 19.5.
Vários economistas do lado da oferta, incluindo Laffer, afirmaram que esse foi o caso nos Estados Unidos no início da
década de 1980. Reduções tributárias expandiriam a economia pelo lado da oferta. Essa expansão aumentaria a base
tributária. Além disso, esses economistas argumentaram que a elisão fiscal (por exemplo, pelo uso de mecanismos
financeiros de incentivo fiscal) e a evasão fiscal (por exemplo, não informação de renda tributável) diminuiriam. Juntos,
afirmavam eles, esses efeitos levariam a um aumento da receita tributária mesmo com a redução das alíquotas.
Críticos da economia do lado da oferta e muitos economistas moderados do lado da oferta não acreditavam que a
economia dos Estados Unidos estivesse na parte descendente da curva de Laffer. Na opinião deles, os enormes déficits que
surgiram na década de 1980 depois de cortes tributários confirmavam sua posição.

FIG 19.5 A curva de Laffer

19.3 A crítica keynesiana à economia do lado da oferta


Nesta seção, vamos analisar a crítica keynesiana à posição do lado da oferta em termos de
cada uma das proposições discutidas na seção anterior.

19.3.1 A natureza determinada pela oferta do crescimento no médio


prazo
A posição keynesiana é que, para períodos de cerca de uma década, tanto fatores de oferta
como de demanda são importantes na determinação do crescimento do produto. Ao explicar o
crescimento menor dos Estados Unidos na década de 1970, por exemplo, James Tobin vê como
causas primárias os choques de oferta, sendo o mais importante deles o do setor energético, e
exagero da política monetária, ou seja, as ações de política monetária excessivamente restritivas
que foram impostas para desacelerar a economia quando esta já estava em queda. Tobin culpa
em parte essas ações monetárias inoportunas pela gravidade das recessões da década de 1970,
que resultaram na taxa de crescimento mais baixa nessa década.4

19.3.2 Poupança e investimento e taxas de retorno após os impostos


Sobre o papel das taxas de retorno mais baixas na redução da poupança, do investimento e da
formação de capital, há áreas de concordância e de divergência entre os economistas do lado da
oferta e os keynesianos. Os economistas keynesianos não negam que a formação de capital seja
importante para o crescimento ou que a desaceleração da formação líquida de capital tenha sido
uma das causas da redução do crescimento nos Estados Unidos no período pós-1970. Eles
também não se opõem a políticas econômicas para melhorar os incentivos ao investimento.
Tobin ressalta, por exemplo, que foi durante a administração Kennedy, um ponto alto da
influência keynesiana, que o primeiro crédito tributário sobre investimentos foi aprovado.
No entanto, na visão keynesiana, a principal explicação para a redução da formação líquida
de capital na década de 1970 está no baixo crescimento do produto durante esse período, que
causou uma defasagem na demanda por investimento. Os keynesianos acreditam que, em sua
maior parte, a causa refere-se a baixo produto levando a baixo investimento, e não o contrário.
Os baixos níveis do produto são atribuídos, como já foi explicado, a choques de oferta e, às
vezes, a políticas monetárias excessivamente restritivas.
O que os keynesianos pensam do papel dos incentivos à poupança e aos investimentos?
Embora não ignorem os efeitos de mudanças nos retornos após impostos sobre a demanda por
investimentos, os keynesianos argumentam que o produto é a principal variável que determina o
investimento. Assim, a melhor maneira de incentivar o investimento é manter a economia perto
de seu nível de produto potencial. No caso da poupança, os keynesianos não negariam que a taxa
de retorno (depois dos impostos) é um determinante da poupança. Também não negariam que
uma queda nessa taxa de retorno possa ter causado a redução da taxa de poupança que ocorreu
no final da década de 1970 nos Estados Unidos. Eles acreditam, porém, como diz Tobin, que
“uma explicação para a desaceleração da formação de capital empresarial na década de 1970
pode ser buscada na demanda por investimento e não na oferta de poupança”.

19.3.3 O efeito de cortes no imposto de renda sobre a oferta de


trabalho
Os economistas keynesianos não acreditam que ocorrerão grandes aumentos na oferta de
trabalho como resultado da redução das alíquotas marginais do imposto de renda. Eles não
acham que as alíquotas do imposto de renda vigentes sejam um obstáculo sério para a oferta de
trabalho. Como evidência disso, os economistas keynesianos citam os altos índices de
participação na força de trabalho nos países da Europa ocidental (Alemanha, por exemplo), onde
as alíquotas marginais do imposto são substancialmente mais altas que nos Estados Unidos.
Além disso, ressaltam que, embora com um imposto de renda progressivo a inflação empurre os
indivíduos para faixas de imposto mais altas, as alíquotas tributárias efetivamente pagas só
aumentarão se a tabela do imposto de renda permanecer inalterada. Se, em vez disso, o
Congresso reduzir periodicamente as alíquotas tributárias para compensar os efeitos da inflação
(ou por alguma outra razão), as alíquotas tributárias marginais efetivas podem não subir. De
acordo com estimativas citadas por Tobin, a média das alíquotas marginais federais do imposto
de renda de pessoa física incluindo todas as faixas foi na verdade, mais baixa em 1975 do que
em 1960 – 18,0%, em comparação com 18,8%. No período de 1975-1980, parece de fato ter
havido uma subida de faixas devido à inflação, com a alíquota tributária marginal média subindo
para 21,6%. Mas Tobin não encontrou nenhuma evidência de enfraquecimento da “propensão a
ofertar trabalho”.

19.3.4 Regulamentação como fonte de inflação e de crescimento


lento
Em relação aos efeitos de regulamentações governamentais sobre a inflação e o crescimento,
as questões são amplas e é incorreto afirmar que exista uma única posição keynesiana que possa
ser contrastada com a posição do lado da oferta. Como já foi dito, houve, sem dúvida, um
enorme crescimento nas regulamentações governamentais nos Estados Unidos entre o final da
década de 1960 e a década de 1980. Também não há dúvida de que a obediência a muitas dessas
regulamentações foi dispendiosa para as firmas e que boa parte do custo foi repassada aos
consumidores. Não se duvida também que muitas das regulamentações foram ineficientes em
termos de custos, no sentido de que existem maneiras mais eficientes de obter os mesmos
benefícios.
Economistas que não se disporiam a ir tão longe quanto os economistas do lado da oferta na
eliminação da estrutura reguladora que surgiu desde a década de 1960 acreditam que os
benefícios são maiores do que os economistas do lado da oferta afirmam, ou que os custos, em
termos de crescimento perdido, são mais baixos. Além disso, eles talvez sejam mais otimistas
quanto à possibilidade de melhorar a eficácia da regulamentação. Os benefícios potenciais
dessas novas regulamentações incluem um ar mais limpo, água mais limpa, ambiente de trabalho
mais seguro e bens de consumo mais seguros. Estes são, claro, benefícios desejáveis para todos,
mas há diferenças de opinião quanto ao grau de interferência do governo na economia que é
necessário para obtê-los.

19.4 Políticas de crescimento de Ronald Reagan a Barack Obama

19.4.1 Redirecionamento econômico na administração Reagan


Depois da alta inflação e desemprego da década de 1970, os eleitores dos Estados Unidos
mostraram-se dispostos, em 1980, a tentar uma nova direção. Os elementos centrais do
programa do presidente Reagan, que foi chamado de Reaganomia (Reaganomics), eram
propostas do lado da oferta.

19.4.1.1 Reduções nas alíquotas do imposto de renda de pessoa física


Na forma como foi aprovada pelo Congresso, a lei de redução de impostos da administração
Reagan reduziu as alíquotas marginais do imposto de renda, em três estágios, num total de 23%.
A lei também diminuiu a alíquota máxima sobre a renda proveniente de ganhos de capital de
70% para 50%. A partir de 1985, a lei tributária indexou as faixas do imposto à inflação para
evitar uma “subida de faixas”. Como foi discutido na Seção 19.2, na visão dos economistas do
lado da oferta, essas reduções no imposto de renda deveriam aumentar a oferta de trabalho e,
portanto, de produto (proposição 3 do lado da oferta). As reduções nas alíquotas do imposto de
renda de pessoa física também deveriam aumentar as poupanças pessoais. A diminuição da faixa
de imposto máxima de 70% para 50% visou especialmente o aumento da poupança. Além disso,
para incentivar a poupança, a lei tributária estendeu a oportunidade de uso de contas com
imposto diferido às poupanças para aposentaria.
Na segunda administração Reagan, a peça central foi a reforma tributária – vendida pelo
presidente Reagan como uma “segunda Revolução Americana”. Os objetivos da reforma
tributária eram, primeiro, ampliar a base tributária eliminando muitos itens dedutíveis e,
segundo, reduzir as alíquotas marginais do imposto. A combinação dessas ações faria com que
uma compensasse a outra, de modo que as receitas totais não subiriam nem cairiam. No entanto,
alíquotas marginais mais baixas melhorariam os incentivos para a oferta de trabalho, poupança e
investimentos. O Congresso aprovou uma lei de reforma tributária em agosto de 1986 que
refletia não só a vontade do presidente, mas também as metas dos defensores da reforma
tributária de ambos os partidos políticos no Congresso. A lei reduziu a alíquota mais alta do
imposto de 50% para 28%, o que representou a menor alíquota máxima desde 1931. A lei
também elevou os limites de isenção, de forma que cerca de 6 milhões de contribuintes de baixa
renda foram dispensados de pagar imposto de renda. Para evitar que a reforma tributária
reduzisse as receitas, a lei removeu muitas deduções e eliminou vários mecanismos de incentivo
fiscal.

19.4.1.2 Redução nos impostos das firmas


A lei tributária da primeira administração Reagan tinha várias características voltadas a
incentivar a formação de capital por meio do aumento do retorno dos investimentos após os
impostos. A mais importante delas foi o sistema de recuperação acelerada de custos (ACRS),
que consistia em um conjunto de deduções de depreciação acelerada para instalações e
equipamentos empresariais. Além disso, o crédito tributário sobre investimentos para alguns
tipos de equipamentos foi aumentado a fim de incentivar a formação de capital.
Esses cortes no imposto de pessoa jurídica visavam a compensar o aumento induzido pela
inflação da carga tributária efetiva sobre os lucros das firmas, que foi discutido na Seção 19.2.
Tais reduções tributárias são consistentes com a visão do lado da oferta (proposição 2) de que a
forma de incentivar a formação de capital é pelo aumento do retorno dos investimentos após os
impostos.

19.4.1.3 Reduções nos gastos governamentais com itens não ligados a defesa
De acordo com a visão do lado da oferta, reduções no imposto de pessoa física e jurídica
deveriam aumentar a oferta agregada e, portanto, produzir um crescimento não inflacionário do
produto real. Além disso, os economistas do lado da oferta esperavam que esse crescimento
aumentasse a base tributária e, assim, elevasse as receitas tributárias para compensar, em grande
parte (ou completamente), a perda de receita causada pela redução dos impostos. Porém, para
assegurar que a demanda não fosse excessivamente estimulada e para manter o déficit
orçamentário o mais baixo possível, o programa Reagan propôs cortes em gastos
governamentais não ligados a defesa, em áreas como moradia, educação e programas de
manutenção de renda. Esses cortes também eram necessários, em parte, para financiar um
aumento proposto nos gastos com programas de defesa.
Depois de algum sucesso inicial, os cortes nos gastos com itens não-defesa passaram a
enfrentar mais resistência. Dado o aumento nos gastos com defesa, o fato de não ter havido
muito sucesso geral no corte dos gastos não ligados a defesa fez com que os gastos do governo
como porcentagem do PNB subissem em vez de cair durante o primeiro mandato do presidente
Reagan. O fracasso no corte dos gastos, associado à redução dos impostos, levou a altos déficits
no orçamento federal tanto no primeiro como no segundo período da administração Reagan.

19.4.1.4 Reduções nas regulamentações governamentais


Em alinhamento com a visão do lado da oferta de que regulamentações governamentais em
áreas como qualidade do ar, segurança no trabalho e segurança dos bens de consumo haviam
sido excessivamente dispendiosas e retardado o crescimento econômico (proposição 4), a
administração Reagan deu início a uma revisão das regulamentações. A meta era eliminar
“regulamentações financeiramente prejudiciais ou ultrapassadas e tornar as regulamentações
necessárias mais eficientes e mais flexíveis”. Algumas iniciativas específicas nesse sentido
durante o primeiro mandato de Ronald Reagan foram a transferência para os Estados de algumas
responsabilidades pelo controle da poluição do ar, a liberação dos mercados do petróleo e a
exigência de uma análise de custo-benefício antes da emissão de qualquer nova regulamentação
federal.

19.4.2 Iniciativas da primeira administração Bush


O presidente George H. W. Bush foi, a princípio, fortemente crítico à economia do lado da
oferta, chamando-a de “economia vodu”. Além disso, quando assumiu a presidência em 1989,
ambas as casas do Congresso tinham uma substancial maioria democrata, que sempre havia sido
cética quanto às prescrições de política do lado da oferta. Ainda assim, algumas das propostas de
Bush certamente foram consistentes com posições do lado da oferta.
Quando Bush concorreu para a presidência em 1988, um ponto central de sua plataforma
econômica era a promessa de “nenhum imposto novo”. Essa promessa adequava-se à visão do
lado da oferta sobre os efeitos de desincentivo produzidos por impostos mais altos. Infelizmente,
pela perspectiva do lado da oferta, quando o déficit orçamentário inchou em 1990 e 1991, Bush
abandonou essa promessa para chegar a um acordo de redução de déficit com o Congresso. Uma
segunda proposta do governo Bush foi reduzir os impostos sobre os ganhos de capital. A análise
do lado da oferta sugere que essa redução teria um efeito favorável sobre a poupança e, assim,
sobre a formação de capital. Bush, porém, não conseguiu aprovar essa proposta no Congresso.

19.4.3 Políticas de crescimento durante as administrações Clinton


Em 1992, o público pareceu escolher uma nova direção para a política macroeconômica. A
Clintonomia (Clintonomics) substituiu a Reaganomia. O programa do presidente Bill Clinton
previa um papel mais ativo para o governo, que “reconheça tanto as eficiências como as
imperfeições do mercado”. Ele propôs um “pacote de estímulo” composto de investimentos
públicos em infraestrutura, programas de requalificação profissional e parcerias entre empresas e
o governo para mover recursos de empresas maduras para empresas novas.
Dada a preocupação com o grande déficit orçamentário na época, o Congresso estava
relutante em aprovar o pacote de estímulo. As perspectivas de uma abordagem ativa ficaram
ainda mais sombrias quando os eleitores voltaram a dar maioria republicana para as duas casas
do Congresso nas eleições de 1994. Nessa eleição, o “Contrato com a América” dos deputados
republicanos, com suas promessas de cortes de impostos e gastos, poder de veto parcial para o
presidente, a suspensão de novas regulamentações federais e uma emenda constitucional para
equilibrar o orçamento, tinha suas raízes na economia do lado da oferta. Mas os republicanos
não conseguiram obter maioria à prova de veto para os elementos de seu programa; houve
impasses quanto a questões do orçamento e, em um determinado ponto, uma paralisação
temporária de boa parte do governo federal.
Depois que o presidente Clinton foi reeleito e maiorias republicanas voltaram ao Senado e à
Câmara dos Deputados na eleição de 1996, ambos os lados estavam prontos para chegar a um
acordo. Os republicanos obtiveram as reduções de impostos, inclusive o há muito buscado corte
nos impostos sobre os ganhos de capital. As regras para contas de poupança para aposentadoria
foram liberalizadas para torná-las mais atraentes e, assim, incentivar a poupança.
Mais importante foi que, durante o segundo mandato do presidente Clinton, foram obtidos
acordos sobre o orçamento que levaram os déficits perenes a ser substituídos por superávits e (na
época) até à projeção de superávits maiores ainda no futuro. O papel desempenhado por essa
mudança do orçamento federal na grande melhora do desempenho da economia americana no
final da década de 1990 é controverso.
O crescimento econômico americano foi forte no final da década de 1990 e a taxa de
crescimento da produtividade do trabalho subiu (veja a Tabela 19.1). Mas outros fatores além da
política fiscal também estavam em ação. Muitos atribuem o forte desempenho da economia
americana nesses anos à revolução na tecnologia da informação e à condução da política
monetária. O crescimento maior da produtividade do trabalho e, assim, do produto nos Estados
Unidos em comparação com outros países desenvolvidos é atribuído à implantação mais rápida
no país dos avanços na tecnologia da informação.

19.4.4 Cortes de impostos durante a administração de George W.


Bush
Em 2000, George W. Bush venceu a eleição presidencial por uma margem muito estreita.
Desde o início de sua administração, as reduções de impostos foram o centro da política
econômica. A princípio, durante a recessão de 2001, as reduções foram apresentadas como um
estímulo de curto prazo para a recuperação. A motivação central dos cortes de impostos, porém,
era estimular o crescimento no médio prazo. Mesmo depois que a recuperação já estava em
andamento, novos cortes de impostos foram aprovados e outros ainda foram propostos. A
justificativa econômica oferecida para esses cortes apoiava-se fortemente na proposição da
economia do lado da oferta. Na verdade, diz-se com frequência que, em questões de política
econômica, George W. Bush é herdeiro de Ronald Reagan, e não de seu pai George W. H. Bush.
Os pacotes de cortes de impostos aprovados até 2004 incluíram reduções no imposto de
renda, no imposto sobre dividendos empresariais e ganhos de capital e uma eliminação
progressiva do imposto sobre heranças. Esperava-se que os cortes no imposto de renda tivessem
um efeito positivo sobre a oferta de trabalho e, portanto, sobre a oferta agregada (o oposto dos
efeitos de um aumento dos impostos na Figura 19.4). A redução do imposto sobre os ganhos de
capital e sobre os dividendos destinava-se a aumentar a poupança e o investimento por elevar o
retorno obtido após o pagamento dos impostos (o oposto do efeito de mudanças negativas nessas
taxas de retorno, ilustrado na Figura 19.3). O imposto sobre heranças incidia sobre muito poucas
propriedades, portanto é difícil ver efeitos significativos do lado da oferta decorrentes de sua
eliminação.
Os keynesianos, assim como vários outros economistas, opuseram-se a cortes nos impostos
da magnitude defendida pelo presidente Bush, especialmente depois que a recuperação da
recessão de 2001 solidificou-se. Como vimos no Capítulo 18, os cortes de impostos foram, em
2006, responsáveis por déficits estruturais correntes e projetados para o futuro no orçamento
federal. Os keynesianos argumentaram que os déficits pressionariam para cima as taxas de juros
e anulariam qualquer efeito benéfico sobre a poupança e os investimentos. Também eram
céticos quanto a se as reduções no imposto de renda de fato teriam efeitos significativos sobre a
oferta de trabalho. Outro ponto que levou muitos a criticarem os cortes de impostos foi seu
efeito sobre a distribuição de renda. Reduções de impostos sobre ganhos de capital, dividendos e
heranças beneficiam diretamente os ricos, que são os principais detentores dessas formas de
renda e riqueza.

PERSPECTIVAS 19.3 - IGUALDADE E EFICIÊNCIA: O GRANDE


TRADE-OFF
Nos primeiros anos deste século, tornou-se claro que um aumento acentuado da desigualdade de renda havia ocorrido nas
décadas anteriores. Há muitas medidas da distribuição de renda e inúmeros conceitos de igualdade ou desigualdade,
portanto essa área desafia a precisão. Ainda assim, as evidências da crescente desigualdade tanto em termos de renda
como de riqueza são consideráveis.
Uma estatística que ganha destaque na mídia é que a proporção entre os vencimentos de altos executivos americanos e os
salários médios subiu de 27 em 1973 para 300 em 2009. Em 2011, o Congressional Budget Office (CBO) divulgou uma
análise abrangente de mudanças na distribuição de renda das famílias entre 1979 e 2007. O estudo encontrou que, entre
esses anos, a renda média real após os impostos do 1% da população com a renda mais elevada cresceu 275%. Para os
60% da população no meio da escala de renda (percentis 21 a 80), o aumento ao longo desses 28 anos foi de pouco menos
de 40%. Para os 20% com a renda mais baixa, o aumento foi de cerca de 18%. A participação na renda total após impostos
dos 1% mais ricos subiu de 8% em 1979 para 17% em 2007. A participação do quintil mais alto subiu de 43% para 53%.
Outro aspecto da desigualdade é a mobilidade de renda, a capacidade de se mover pela distribuição de renda. Há alguma
evidência de que esta também está caindo nos Estados Unidos e de que é mais baixa ali do que em outros países. Um
estudo da OCDE em 2007 indica que uma criança nascida nos 20% mais pobres da distribuição de renda nos Estados
Unidos em décadas recentes tinha uma probabilidade de 40% de permanecer aí. Na Grã-Bretanha e na Dinamarca, essa
probabilidade é de menos de 30%.
O que está causando o crescimento da desigualdade de renda nos Estados Unidos e qual deveria ser a resposta de política
pública? Quanto às causas, uma valorização crescente da qualificação, em parte devido à globalização, é um fator
importante. É a fatia dos trabalhadores menos qualificados que está declinando tanto nos Estados Unidos como em outras
economias altamente industrializadas. Alguns economistas também veem uma participação nisso dos tipos de políticas de
aumento de incentivos que estivemos discutindo. Eles acham que um ambiente de políticas mutável, com sindicatos mais
fracos, alíquotas marginais do imposto de renda mais baixas e tratamento tributário favorável para a renda proveniente de
investimentos “possibilita que os ganhadores na economia expandam seus ganhos”.
Quanto à resposta de políticas públicas, as evidências de desigualdade crescente são fortes o bastante para ter atraído a
atenção de Ben Bernanke, o presidente do Federal Reserve. Ele afirma que não devemos interferir no dinamismo que
resultou na flexibilidade e adaptabilidade da política americana.a Mas “Dito isso, acreditamos também que não se deve
deixar ninguém escorregar demais escada econômica abaixo, especialmente se for por razões que estão além de seu
controle”. Ele prossegue dizendo que “outra questão difícil é como equilibrar a necessidade de manter incentivos fortes
baseados no mercado, que apoiam o crescimento econômico e a eficiência mas podem estar associados a maior
desigualdade de resultados, com a meta de proteger os indivíduos dos resultados mais adversos, o que pode reduzir a
desigualdade, mas também tende a diminuir a força dos incentivos”.
Bernanke nos traz ao trade-off atentamente examinado por Arthur Okun mais de 30 anos atrás no livro do qual foi tirado o
título desta perspectiva.b Uma distinção feita por Okun é entre direitos e mercados. Temos algumas garantias que vêm do
fato de sermos cidadãos, “parte do clube”. Estas não são determinadas pelo mercado. Definir arranjos institucionais que
determinem o ponto em que uma garantia de direitos deve levar, por exemplo, a interferência no mercado resulta em
“acomodações desconfortáveis”.
Um tema de sua análise é que “o mercado precisa de um lugar, e o mercado precisa ser mantido em seu lugar”. Precisamos
dos incentivos que o mercado proporciona. Em sua ausência, “a sociedade iria se debater em busca de incentivos
alternativos – alguns não confiáveis, como o altruísmo; alguns arriscados, como a lealdade coletiva; alguns intoleráveis,
como a coerção ou a opressão”. O mercado, porém, tem suas falhas. “Havendo a oportunidade, ele varreria todos os outros
valores e estabeleceria uma sociedade de compra e venda”. Não queremos de fato que tudo esteja à venda. Nem isso seria
aceitável em uma democracia.
Okun não ofereceu nenhuma resposta simples. Ele acreditava que os conflitos entre igualdade e eficiência são
inescapáveis. Concluiu que “capitalismo e democracia são de fato uma mistura das mais improváveis. Talvez seja por isso
que eles precisam um do outro: para colocar alguma racionalidade na igualdade e alguma humanidade na eficiência”.
No contexto atual da globalização, Martin Wolf, um observador perspicaz do processo, afirma que o retorno da “idade de
ouro” nos Estados Unidos seria ruim domesticamente e para o resto do mundo. Nos Estados Unidos, o apoio público ao
protecionismo aumentaria. Outros países de alta renda rejeitariam até mesmo os pontos positivos do modelo econômico
americano. Ele acredita que “A política certa é combinar a abertura ao comércio internacional com um compartilhamento
politicamente aceitável dos ganhos dos países de alta renda. O desafio é enorme. Mas é um em que não podemos nos dar
ao luxo de fracassar”.c
a BERNANKE, Ben. The level and distribution of economic well-being. Discurso. Feb. 2007.
b OKUN, Arthur. Equality and efficiency: the big tradeoff. Washington: The Brookings Institution, 1975.
c WOLF, Martin. Employment policies can insure a fair share of the feast. Financial Times, p. 11, Apr. 2007.

19.4.5 Presidente Obama, a crise financeira e a recessão


Barack Obama tornou-se presidente em janeiro de 2009, no meio de uma crise financeira e de
uma recessão profunda. As iniciativas de crescimento que ele talvez tivesse planejado foram
deixadas de lado pela necessidade de políticas de estabilização. Ainda assim, a abordagem de
política econômica adotada por ele seguiu as linhas keynesianas. Sua abordagem também foi
caracterizada por uma visão mais ativa do papel do governo na economia: o governo voltou a ser
visto como a solução, não o problema. A principal iniciativa de estabilização fiscal foi a Lei
Americana de Recuperação e Reinvestimento (American Recovery and Reinvestment Act -
ARRA) de 2009. Como o nome indica, a lei voltava-se ao investimento e ao crescimento, além
da recuperação. As iniciativas incluíram subsídios para energia solar e outros empregos
“verdes”, fundos para construção de trens de alta velocidade e investimentos para estender os
serviços de banda larga para acesso à internet às áreas rurais. Programas de empregos
posteriores propostos pela administração Obama incluíram um banco público de investimentos
para financiar gastos de infraestrutura em estradas, construção de escolas e pontes.

Conclusão
Mesmo mudanças modestas na taxa de crescimento econômico têm grandes efeitos
cumulativos ao longo das décadas. A política adequada para ajudar a “fazer crescer” a economia
é um tema importante e controverso para as análises econômicas. A opinião pública e, portanto,
as políticas públicas quanto à melhor abordagem para estimular o crescimento econômico
mudaram várias vezes. As propostas da economia do lado da oferta têm sido centrais para esse
debate. Em 2012, todos os principais candidatos à indicação para concorrer à presidência pelo
partido republicano defendiam uma agenda econômica de impostos baixos, menos
regulamentação e orçamento equilibrado, que são ideias consistentes com as proposições do lado
da oferta. O presidente Obama concorrerá com base em um programa que se apoiou mais em
políticas keynesianas.

Questões de revisão
1. Descreva as principais características de uma prescrição do lado da oferta para políticas
econômicas destinadas a estimular o crescimento econômico não inflacionário. Como essas
prescrições de políticas econômicas diferem das keynesianas?
2. Compare as posições keynesiana e do lado da oferta sobre os efeitos de uma redução da
alíquota do imposto de renda.
3. Compare as posições keynesiana e do lado da oferta sobre os determinantes da poupança, do
investimento e da formação de capital.
4. Na teoria do lado da oferta, qual é o papel adequado de políticas de administração da
demanda agregada?
5. Um crédito tributário sobre investimentos permite que as firmas deduzam uma parte dos
gastos com investimentos de seu imposto a pagar. Analise o efeito sobre o produto desse
crédito tributário no modelo keynesiano e, alternativamente, no modelo do lado da oferta.
6. Descreva as tendências recentes (pós-1998) das taxas de crescimento do PIB e da
produtividade do trabalho nos Estados Unidos. Quais são os possíveis fatores responsáveis
por essas tendências?
7. Use as curvas IS-LM e de demanda agregada-oferta agregadas para defender os cortes de
impostos da administração George W. Bush como um estímulo ao crescimento. Que críticas
os economistas keynesianos apresentariam para refutar essa defesa?
8. O presidente Ronald Reagan dizia com frequência que o governo não era a solução; o
governo era parte do problema. De que maneira isto é consistente com as ideias de políticas
econômicas do lado da oferta?
CAPÍTULO 20
Crescimento econômico de longo prazo: origens da riqueza das nações

Examinamos a economia clássica no contexto do comportamento cíclico da economia. O


foco principal de economistas clássicos como Adam Smith e David Ricardo, no entanto, foi o
crescimento de longo prazo da economia mundial. Adam Smith, muitas vezes chamado de pai
da economia moderna, escreveu durante os primeiros estágios da revolução industrial. Ele
testemunhou a expansão do capitalismo industrial e tentou explicar o processo que começava a
sustentar o crescimento econômico em algumas, mas não todas, partes do mundo. Neste
capítulo, como no famoso livro de Smith, o tema é “a natureza e as causas da Riqueza das
Nações”.
Os padrões de vida variam muito de um país para outro. A riqueza está espalhada muito
desigualmente entre as nações. Usando medidas oficiais de preços e taxas de câmbio, a renda per
capita nos Estados Unidos e nos países ricos na Europa é cerca de 50 vezes maior que a dos
países mais pobres da África e da Ásia. Isso certamente é exagerado, mas mesmo corrigindo em
relação a fatores como mais atividade econômica fora do mercado em países pobres, as
estimativas de renda per capita ainda são 20 vezes maiores nos países mais ricos em relação aos
mais pobres. Nas nações desenvolvidas, o padrão de vida também melhorou muito ao longo do
tempo. Entre 1870 e 2005 nos Estados Unidos, a renda nacional cresceu a uma taxa anual de
3,5%. Durante o mesmo período, a renda per capita cresceu a uma taxa anual de 1,8%. Este
último número indica que a renda per capita praticamente dobrou a cada 40 anos.
Mesmo pequenas variações nas taxas de crescimento têm grandes efeitos quando compostas
ao longo do tempo. Se, por exemplo, a renda per capita dos Estados Unidos tivesse crescido a
uma taxa de apenas 0,8% durante esse período, em 2005 a renda per capita seria 2,8 vezes, e não
10 vezes, maior que o nível de 1870.

20.1 O modelo de crescimento neoclássico


Na década de 1950, os macroeconomistas desenvolveram modelos formais do processo de
crescimento. Um conjunto importante deles foram os chamados modelos de crescimento
neoclássicos. O nome veio do tipo de estrutura de produção nos modelos, que se originaram na
microeconomia clássica (ou neoclássica).

20.1.1 O crescimento e a função produção agregada


Como foi comentado na introdução, no período de 1870-2005 a renda nacional nos Estados
Unidos aumentou a uma taxa anual de 3,5%. O produto per capita cresceu a uma taxa anual de
1,8%. Que fatores explicam esse crescimento sustentado? Uma maneira de abordar essa questão
é usar a função produção agregada vista em capítulos anteriores. A função produção agregada
relaciona o nível de produto ao nível de insumos utilizados.
Para os propósitos deste capítulo, a função produção agregada pode ser escrita como

A equação (20.1) difere das expressões da função produção agregada de curto prazo do Capítulo
3 em dois aspectos. Primeiro, há o termo adicional A(t). Esse termo representa a mudança
tecnológica, que, por enquanto, consideraremos que dependa apenas do tempo; ou seja,
conforme o tempo passa, o termo A(t) aumenta, o que significa que mais produto será gerado
para uma dada quantidade de insumos. Na equação (20.1), o termo A(t) participa de forma
multiplicativa. Com essa especificação, supõe-se que a mudança tecnológica não afeta as
produtividades marginais relativas dos dois fatores, conforme determinada pela parte F(K, N) da
função produção. Em outras palavras, a mudança tecnológica resulta em aumentos iguais na
produtividade de ambos os fatores. Tal mudança tecnológica é chamada de neutra (por não
favorecer nem o capital nem o trabalho). Robert Solow, em um estudo dos deslocamentos da
função produção agregada ao longo do tempo, encontrou evidências de que, nos Estados Unidos,
as mudanças tecnológicas haviam de fato sido neutras.1
Uma segunda diferença entre a equação (20.1) e as especificações anteriores da função
produção é a ausência da barra sobre a variável K, indicando que, aqui, não estamos supondo
que o estoque de capital seja constante. Estamos agora lidando com o longo prazo.
Com base na equação (20.1), seguimos o método de Solow no estudo mencionado e
escrevemos a seguinte especificação para o crescimento do produto ao longo do tempo:

onde o ponto sobre uma variável indica a taxa de mudança no tempo dessa variável (por
exemplo, N é a taxa em que a força de trabalho está aumentando). A equação (20.2) especifica a
taxa proporcional de aumento do produto ( /Y) como dependente da taxa proporcional de
mudança tecnológica ( /A) e das taxas proporcionais de mudança do estoque de capital e do
número de trabalhadores empregados ( /K) e ( /N). Os pesos (wk, wn) associados a essas duas
últimas variáveis são sua contribuição para o produto nacional, refletindo sua importância no
processo de produção. A equação (20.2) indica que o crescimento do produto depende da taxa
em que o progresso tecnológico ocorre ao longo do tempo e da taxa em que a oferta dos insumos
cresce com o tempo.

FIG 20.1 Função produção agregada: Equação 20.3


A forma intensiva da função produção mostra o produto por trabalhador (q = Y/N) correspondente a cada razão capital/trabalho (k
= K/N) para uma dada tecnologia [A(T0)]. Quando a razão capital/trabalho sobe, o produto por trabalhador aumenta, mas a um
ritmo decrescente, refletindo rendimentos decrescentes em relação a aumentos do capital por trabalhador.

Se a função produção dada pela equação (20.1) exibir rendimentos constantes de escala, ela
pode ser escrita em uma forma alternativa que dará algumas ideias sobre o modo como cada
fator participa do processo de crescimento. Rendimentos constantes de escala significam que, se
todos os insumos aumentarem em uma determinada proporção, o produto aumentará na mesma
proporção. Uma duplicação da quantidade de capital e de trabalho usados na produção, por
exemplo, dobraria a quantidade de produto gerado. Com rendimentos constantes de escala,
decorre que, para uma dada tecnologia, fixando-se A(t), o produto por trabalhador (Y/N)
dependerá apenas da quantidade de capital empregada por trabalhador, a razão capital/trabalho.2
Sendo q igual ao produto por trabalhador (Y/N) e k igual ao capital por trabalhador (K/N),
podemos reescrever (20.1) como

Rendimentos constantes de escala


Significa que um aumento de uma certa proporção
em todos os insumos (por exemplo, 100%) fará o
produto aumentar nessa mesma proporção (100%).

ou

onde f(k) é a função que relaciona o produto por trabalhador à razão capital/trabalho para uma
dada tecnologia – o que é chamado de forma intensiva da função produção agregada.
FIG 20.2 Crescimento do produto por trabalhador

O produto por trabalhador aumenta de q0 para q’1 quando, como resultado do avanço tecnológico, a função produção desloca-se
para cima de A(T0)f(k) para A(T1)f(k). Há um aumento adicional no produto por trabalhador de q’1 para q1 como resultado de um
aumento na razão capital/trabalho de k0 para k1.

A relação dada pela equação (20.3) é mostrada na Figura 20.1. Pressupõe-se que o estado da
tecnologia seja dado por A(T0), que fixa a posição da função produção que relaciona o produto
por trabalhador ao capital por trabalhador. Conforme nos movemos para a direita ao longo da
função produção, o produto por trabalhador aumenta com o aumento do capital por trabalhador
(k). A forma da função produção na Figura 20.1 reflete o pressuposto de que há rendimentos
decrescentes em relação a aumentos do capital por trabalhador. O incremento no produto por
trabalhador diminui com aumentos sucessivos do capital por trabalhador.3 A uma suposta razão
capital/trabalho inicial de k0, o produto por trabalhador seria q0 na figura.
A Figura 20.2 ilustra o processo de crescimento do produto por trabalhador entre dois pontos
no tempo, T0 e T1. Mudanças tecnológicas fazem a função produção deslocar-se para cima de
A(T0)f(k) para A(T1)f(k). Por si só, essa mudança tecnológica aumentaria o produto por
trabalhador, à razão capital/trabalho inicial k0, de q0 para q’1 na Figura 20.2. Além disso, porém,
consideramos que a razão capital/trabalho aumenta com o tempo, em um processo chamado de
aprofundamento do capital (capital deepening). Isso é ilustrado no gráfico por um movimento
para uma razão capital/trabalho k1. Como resultado, o produto por trabalhador aumenta ainda
mais, para q1.
Aprofundamento do capital
Processo pelo qual o capital cresce a um ritmo mais
rápido que o crescimento do trabalho e a razão
capital/trabalho aumenta.

O esquema ilustrado na Figura 20.2 [o gráfico da equação (20.3)] sugere que o crescimento
do produto por trabalhador é resultado de dois fatores:
1. Mudança tecnológica, que aumenta o produto por trabalhador para uma dada razão
capital/trabalho.
2. Aprofundamento do capital, quando a razão capital/trabalho aumenta.
Se considerarmos a taxa de crescimento do produto total, em vez do produto por trabalhador,
o crescimento da força de trabalho será uma fonte adicional de crescimento.

FIG 20.3 Efeitos de um aumento na taxa de poupança

Como resultado de um aumento da taxa de poupança, a razão capital/trabalho aumenta de k0 para k1. O produto por trabalhador
aumenta de q0 para q1. A razão capital/produto sobe de σ0 para σ1. Quando q1 é atingido, não há mais aumento no produto por
trabalhador. A taxa de crescimento de equilíbrio inicial do produto é restaurada.

20.1.2 Fontes de crescimento no modelo neoclássico


A análise da seção anterior indica que, no modelo neoclássico, os fatores que determinam a
taxa de crescimento de equilíbrio de longo prazo de um país serão aqueles que afetam a taxa de
mudança tecnológica, o crescimento da força de trabalho e a taxa de formação de capital. As
influências sobre essas variáveis são as fontes básicas de crescimento econômico. Começaremos
com um resultado um tanto paradoxal: no modelo de crescimento neoclássico, a taxa de
crescimento de equilíbrio de longo prazo não depende da taxa de poupança da nação (s = S/Y).
A independência da taxa de crescimento de uma nação em relação à taxa de poupança é, a
princípio, surpreendente, uma vez que se esperaria que a taxa de poupança afetasse a taxa de
formação de capital e, portanto, a taxa de crescimento de equilíbrio. Para ver por que a taxa de
crescimento de equilíbrio não depende da taxa de poupança no modelo neoclássico, vamos
analisar o efeito de um aumento na taxa de poupança dentro do esquema da seção anterior.
Na Figura 20.3, suponhamos que a taxa de poupança seja, inicialmente, S0 e que a economia
esteja em equilíbrio, com a razão capital/trabalho k0 e o produto por trabalhador igual a q0.
Observe o raio identificado como 1/σ0 que sai da origem e intercepta a função produção em um
nível de produto por trabalhador igual a q0. Cada ponto ao longo da reta corresponde a uma
razão constante entre a variável do eixo vertical Y/N e a variável do eixo horizontal K/N – ou
seja, uma razão produto/capital constante –, uma vez que

onde σ é a razão capital/produto (K/Y). Inicialmente, a razão capital/produto é σ0 na Figura 20.3.


Agora, imaginemos um aumento da taxa de poupança para um valor mais alto, S1 (digamos,
15% da renda em vez de 10% da renda). Inicialmente, consideramos que a economia estava em
equilíbrio à razão capital/trabalho k0; capital e trabalho estavam crescendo no mesmo ritmo.
Com o aumento da taxa de poupança, a taxa de formação de capital inicialmente aumentará.
Para ver essa relação, precisamos especificar a relação entre a formação de capital e a taxa de
poupança. A taxa de formação de capital pode ser expressa como

onde I é o investimento bruto e D é a depreciação. No equilíbrio de longo prazo, o produto


crescerá quando a oferta aumenta, portanto ignoraremos problemas de demanda inadequada.
Vamos supor que toda a poupança (S) seja canalizada para investimento (I = S). Supomos
também que a depreciação seja uma fração constante (ô) do estoque de capital. Usando esses
fatos, podemos reescrever a equação (20.4) como

onde a segunda igualdade resulta do fato de que a poupança é igual à taxa de poupança vezes o
nível de renda. Da equação (20.5), segue-se que um aumento na taxa de poupança (s) aumentará
inicialmente a taxa de formação de capital.
Como a taxa de formação de capital aumentou sem mudança na taxa de crescimento da força
de trabalho, a razão capital/trabalho aumentará. Um novo equilíbrio será atingido, como mostra
a Figura 20.3, em uma razão capital/trabalho k1 e um produto por trabalhador mais alto, q1.
Depois desse ajuste, porém, não haverá mais aumentos no produto por trabalhador e, como o
crescimento da força de trabalho permanece inalterado, a taxa de crescimento de equilíbrio
voltará a seu nível inicial.
FIG 20.4 Efeito sobre a taxa de crescimento de um aumento na taxa de poupança

No tempo t0, a taxa de poupança aumenta. Inicialmente, a taxa de crescimento do produto sobe. Esse é o período em que o
produto por trabalhador está aumentando de q0 para q1, como é mostrado na Figura 20.3. No tempo t1, quando o produto por
trabalhador atingiu q1 na Figura 20.3, a taxa de crescimento de equilíbrio inicial, g, foi restaurada.

Para entender a razão disso, repare no raio identificado como 1/σ1, que cruza a função
produção no novo nível de produto por trabalhador, q1 na Figura 20.3. Como já foi explicado,
cada ponto ao longo desse raio corresponde a uma razão capital/trabalho fixa. O raio 1/σ1 é
menos inclinado do que o raio inicial 1/σ0, indicando que a razão entre Y/N e K/N, a razão
produto/capital, é mais baixa depois do aumento da taxa de poupança. A razão capital/produto
(K/Y) é, portanto, mais alta. A uma razão capital/produto mais alta, é necessária uma taxa de
poupança (s = S/Y) maior para apenas manter uma taxa de crescimento constante do estoque de
capital. Quando a razão capital/produto tiver atingido σ1, a formação de capital terá voltado à
taxa de equilíbrio inicial igual à taxa de crescimento da força de trabalho. Não haverá mais
aumentos nem no produto por trabalhador nem na razão capital/trabalho.
O efeito sobre a taxa de crescimento econômico é mostrado na Figura 20.4. Suponhamos que
a taxa de crescimento de equilíbrio da renda seja g. Se o aumento na taxa de poupança ocorrer
no tempo T0, a taxa de crescimento ( /Y) subirá temporariamente enquanto a economia se move
do nível inicial de produto por trabalhador, q0 para o nível mais alto de produto por trabalhador,
q1. Nesse novo nível mais alto de produto por trabalhador, a taxa de crescimento retornará a g,
como é mostrado no tempo T1 na Figura 20.4. O aumento da taxa de poupança causa um período
temporário de crescimento mais rápido, mas não afeta a taxa de crescimento de equilíbrio.
Nada disso implica que a taxa de poupança não seja importante no modelo de crescimento
neoclássico. O período temporário durante o qual uma mudança na taxa de poupança afeta a taxa
de crescimento (de T0 a T1 na Figura 20.4) pode ser um período longo no tempo de calendário.
Além disso, repare que, mesmo depois do ajuste completo a uma mudança na taxa de poupança
(depois de atingirmos T1 na Figura 20.4 e k1 e q1 na Figura 20.3), a taxa de poupança mais alta
resultou em um aumento permanente tanto do capital como do produto por trabalhador. Uma
economia com uma taxa de poupança mais alta, portanto, terá um padrão de vida mais elevado
como resultado de um processo de produção com mais intensidade de capital.

20.2 Desenvolvimentos recentes na teoria do crescimento econômico


Depois de um período ativo nas décadas de 1950 e 1960, o interesse pela teoria do
crescimento econômico de longo prazo declinou na década de 1970 devido a dúvidas quanto a se
ele de fato nos dava boas informações sobre o crescimento. O modelo de crescimento
neoclássico explicava a dinâmica do processo de crescimento, mas acabava concluindo que a
taxa de crescimento de equilíbrio de longo prazo dependia de duas variáveis exógenas: a taxa de
crescimento populacional e a taxa de mudança tecnológica. Como essas variáveis eram
exógenas, a teoria não isolava as fontes fundamentais do crescimento de longo prazo. Por essa
razão, poucas conclusões de política econômica foram derivadas da teoria tradicional do
crescimento de longo prazo.
No final da década de 1980, houve uma renovação do interesse pela teoria do crescimento.
Paul Romer, um dos formuladores da nova teoria do crescimento, afirma: “Do ponto de vista de
conselhos para políticas econômicas, a teoria do crescimento tinha pouco a oferecer. Em
modelos com mudança tecnológica exógena e crescimento populacional exógeno, não importava
realmente o que o governo fizesse”.4

20.2.1 Modelos de crescimento endógeno


Pesquisas recentes estendem a análise tradicional tornando endógenas as taxas de mudança
tecnológica ou de crescimento populacional (ou ambas). Desse modo, podemos perguntar que
fatores acelerarão ou prejudicarão o processo de crescimento. Como políticas econômicas
diversas afetarão o crescimento dessas variáveis? A nova teoria do crescimento não é um ataque
à teoria tradicional. É, antes, uma extensão daquela que se aprofunda mais nas fontes
fundamentais do crescimento. Para ver os caminhos que essas pesquisas estão seguindo, vamos
examinar um modelo de mudança tecnológica endógena.

PERSPECTIVAS 20.1 - EXPLICAÇÕES PARA O CRESCIMENTO: UM


EXEMPLO REFERENTE AOS ESTADOS UNIDOS
Edward Denison estudou atentamente o crescimento econômico nos Estados Unidos. A Tabela 20.1 resume suas
descobertas sobre as fontes de crescimento do produto americano de 1929 a 1982. Como a tabela indica, o produto real
cresceu a uma taxa anual de 2,9% nesse período. Os outros números na tabela mostram a contribuição percentual
(proporção do total) de diversos fatores para a taxa de crescimento. Esses fatores são divididos em dois grupos.
O primeiro grupo, que contém um único fator, é o crescimento do insumo trabalho. Isso representa o crescimento do
produto devido ao aumento da quantidade de trabalho. Denison estimou que 32%, aproximadamente um terço, do
crescimento do produto entre 1929 e 1982 derivou dessa fonte.
As outras fontes de crescimento são fatores que aumentam a quantidade de produto por unidade do insumo trabalho (o que
chamamos de produto por trabalhador na seção anterior) – em outras palavras, fatores que aumentam a produtividade do
trabalho. Vamos examinar cada um deles.
EDUCAÇÃO POR TRABALHADOR
A primeira dessas outras fontes de crescimento relacionadas na Tabela 20-1 é a educação por trabalhador. Como explica
Denison:
A formação educacional condiciona decisivamente tanto os tipos de trabalho que um indivíduo é capaz de realizar como
sua proficiência em qualquer ocupação específica. A distribuição de trabalhadores americanos de acordo com o maior
nível de escolaridade concluído deslocou-se contínua e intensamente para cima e esse deslocamento tem sido uma
importante fonte de crescimento.a
Denison estimou que 14% do crescimento econômico dos Estados Unidos devem-se ao aumento do nível de escolaridade
da força de trabalho.

FORMAÇÃO DE CAPITAL
Denison estimou que a formação de capital foi responsável por 19%, um pouco menos de um quinto, do crescimento
econômico dos Estados Unidos entre 1929 e 1982.

Tabela 20.1 Fontes de crescimento econômico, Estados Unidos, 1929-1982 (%)

Taxa de crescimento anual do produto (%) Porcentagem de crescimento resultante de: 2,9
Crescimento do insumo trabalho 32
Crescimento da produtividade do trabalho
Educação por trabalhador 14
Formação de capital 19
Mudanças tecnológicas 28
Economias de escala 9
Outros fatores -2
Fonte: DENISON, Edward F. Trends in American economic growth, 1929-1982. Washington: The Brookings Institution,
1985. p. 30.

MUDANÇAS TECNOLÓGICAS
O fator seguinte na Tabela 20.1 são as mudanças tecnológicas, que incluem mudanças no conhecimento tecnológico (por
exemplo, modos de utilizar robôs no processo de produção) e novos conhecimentos sobre como organizar os negócios
(estratégias administrativas). Nas estimativas de Denison, as mudanças tecnológicas responderam por 28% do crescimento
americano e foram a influência mais importante sobre a produtividade do trabalho.

ECONOMIAS DE ESCALA
Denison encontrou que, em vez dos rendimentos constantes de escala que pressupusemos na seção anterior, os Estados
Unidos viveram economias de escala; mesmo considerando o estado da tecnologia, um aumento na quantidade de insumos
resultou em um aumento mais do que proporcional do produto. Denison estimou que 9% do crescimento dos Estados
Unidos resultaram dessa fonte.

OUTROS FATORES
Denison levou em consideração outros fatores que estimulam ou retardam o processo de crescimento (por exemplo,
mudanças na alocação de recursos entre os setores, efeitos do clima sobre a produção agrícola, greves trabalhistas).
Tomados em conjunto, esses fatores tiveram um efeito líquido negativo igual a 2% do crescimento econômico.
a DENISON, Edward F. Trends in American economic growth, 1929-1982. Washington: The Brookings Institution, 1985. p.
15.

Começar pelo pressuposto de que as mudanças tecnológicas são um processo a ser incluído
no modelo, em vez de considerá-las exógenas, parece sensato. Como dois dos formuladores da
nova teoria do crescimento convincentemente argumentam,

Inovações não caem do céu como maná. Elas são criadas por seres humanos, atuando sob a
variedade normal de motivações humanas, no processo de tentar resolver problemas de
produção, aprender com a experiência, encontrar maneiras novas e melhores de fazer as
coisas, lucrar com a abertura de novos mercados e, às vezes, apenas para satisfazer a
curiosidade. A inovação é, assim, um processo social… Portanto, o crescimento econômico
envolve uma interação bidirecional entre tecnologia e vida econômica: a tecnologia
transforma o próprio sistema econômico que a cria.5

Para incluir no modelo a tecnologia endógena, modificamos a estrutura de produção do


modelo de crescimento neoclássico. Primeiro, especificamos a produção de bens finais, que
continuamos a chamar de produto (Y). A forma modificada da equação (20.1) é a seguinte:

Como antes, o produto depende dos níveis dos insumos capital (K) e trabalho (N). As frações
de capital e trabalho na economia geral usadas na geração do produto são (1 – αk) e (1 – αn),
respectivamente. O produto também depende do nível de tecnologia (A), que agora chamaremos
de conhecimento, seguindo a literatura da nova teoria do crescimento. Note que At aparece agora
dentro da função produção em uma especificação mais geral do que antes. Mais importante, note
que todo o conhecimento aparece ali, e não só uma fração dele. O uso de conhecimento no outro
setor que vamos especificar – para produzir novo conhecimento – não impede que o setor de
produtos finais utilize esse mesmo conhecimento.
Agora, voltamo-nos para a função produção de novas ideias.

O crescimento do conhecimento ( ) depende do capital e do trabalho usados na produção do


conhecimento, com αk e αn sendo as frações do estoque de capital e da força de trabalho usados
nesse setor. A produção de novo conhecimento também depende de todo o estoque de
conhecimento já existente.

20.2.2 Implicações de mudanças tecnológicas endógenas


O modo como mudanças tecnológicas endógenas afetam nossas conclusões sobre o processo
de crescimento depende dos detalhes da especificação das duas funções produção, especialmente
da equação (20.7).
Na literatura da nova teoria do crescimento, é comum pressupor que a função produção para
o produto (equação 20.6) apresente rendimentos constantes de capital e trabalho. Isso implica
que dobrar a quantidade dos insumos capital e trabalho usados para gerar produto com um dado
estoque de conhecimento dobraria a quantidade de produto. Esse é o pressuposto do modelo
neoclássico.
É menos claro qual pressuposto deveríamos fazer quanto à função produção para novos
conhecimentos (Equação 20.7). Há várias alternativas na literatura da nova teoria do
crescimento. Uma questão crucial aqui é o efeito do estoque já existente de conhecimento (A)
sobre as novas descobertas ( ). Seria possível pensar que um conjunto maior de conhecimento já
existente faz com que novos avanços sejam mais difíceis; poderia haver rendimentos
decrescentes de pesquisa e desenvolvimento. Alternativamente, novas descobertas podem
estimular avanços adicionais ou pelo menos deixar constantes os rendimentos diante de novas
pesquisas. É nestes últimos casos que a mudança tecnológica endógena faz a nova teoria do
crescimento divergir do modelo neoclássico em aspectos cruciais.
No modelo neoclássico com rendimentos constantes de escala e tecnologia exógena, vimos
que um aumento na taxa de poupança inicialmente aumentava a taxa de formação de capital. No
modelo neoclássico, um aumento na taxa de formação de capital produz um aumento menos que
proporcional na taxa de crescimento do produto. A razão disso é que, com rendimentos
constantes de escala, a taxa de crescimento do insumo trabalho teria de crescer tanto quanto o
capital para que o crescimento do produto aumentasse proporcionalmente. Estamos supondo que
a taxa de crescimento do insumo trabalho será fixa. Embora a taxa de crescimento do produto
aumente proporcionalmente menos do que a taxa de crescimento do capital, a depreciação sobe
na mesma proporção, porque, tanto no modelo de crescimento tradicional como no mais novo, a
depreciação é simplesmente uma fração do estoque de capital, ô na subseção anterior. Com a
taxa de crescimento do produto subindo proporcionalmente menos, enquanto a taxa de
crescimento do capital e a taxa de depreciação sobem de forma proporcional, a depreciação
torna-se uma fração maior do produto e acaba por absorver a poupança mais elevada. A taxa de
formação de capital e a taxa de crescimento do produto retornam a seus níveis iniciais.
Um processo similar pode ocorrer em um modelo de crescimento endógeno, mas há outras
possibilidades mais interessantes. Se a resposta do novo conhecimento ao capital e ao
conhecimento existente – os fatores reproduzíveis no modelo – for suficientemente alta,
mudanças que aumentem o crescimento no modelo levarão a uma taxa de crescimento mais alta
sustentada, ou podem mesmo levar a um crescimento explosivo. Esta última situação significaria
que a taxa de crescimento move-se para uma trajetória de crescimento contínuo.
Consideremos o resultado de um crescimento explosivo. Vamos supor que comecemos
aumentando as proporções de capital (αk) e trabalho (αn) dedicadas à produção de conhecimento.
Se a função produção para novos conhecimentos indicar rendimentos crescentes em relação à
produção de conhecimento a partir de conhecimento já existente, associado ao aumento
resultante do capital quando o produto sobe, o crescimento do produto moverá para uma
trajetória temporal de crescimento contínuo. Claro que a taxa de crescimento do produto não
pode aumentar para sempre. Ainda assim, um modelo desse tipo poderia ser aplicável a um
período em que o crescimento “decole”. Além disso, para outras especificações da função
produção referente ao conhecimento, o resultado de aplicar mais capital e trabalho à produção de
conhecimento seria uma elevação única e sustentada da taxa de crescimento, em vez de um
crescimento explosivo.

20.2.3 Implicações do crescimento endógeno para as políticas


econômicas
Os modelos de crescimento endógeno implicam que uma ampla variedade de políticas
públicas pode influenciar a taxa de crescimento de longo prazo de um país. Em nosso exemplo
anterior, uma política para aumentar o investimento em pesquisa e desenvolvimento leva a uma
mudança permanente na taxa de crescimento de longo prazo. Em alguns modelos de crescimento
endógeno, o conhecimento é incorporado em novos tipos de bens de capital, portanto o
investimento em capital e em novas ideias caminham juntos. Nesse caso, políticas para aumentar
a formação de capital poderiam aumentar permanentemente a taxa de crescimento do produto
em certas especificações da função produção.
No modelo de crescimento neoclássico, a taxa de crescimento de longo prazo do produto é
impulsionada pela taxa de crescimento exógena da força de trabalho e pela mudança tecnológica
exógena. Com mudanças tecnológicas endógenas, há um âmbito de ação maior para as políticas
públicas; ou seja, há mais casos em que as ações do governo terão importância.

20.3 Diferenças de renda entre países


Vamos voltar para o ponto onde começamos este capítulo: o exame das enormes diferenças
da renda per capita entre os países que devem ser resultado de diferenças nas taxas de
crescimento econômico passadas. Como as teorias que estudamos explicam essas diferenças? O
que essas teorias preveem quanto à distribuição futura da riqueza das nações?
Boa parte da discussão dessas questões focou-se na hipótese da convergência, a ideia de que
os níveis de renda per capita entre os países tenderão a convergir com o tempo, com os países
mais ricos crescendo mais lentamente do que os mais pobres.
O modelo de crescimento neoclássico oferece apoio para a ideia da convergência. Nesse
modelo, uma economia que esteja abaixo da razão capital/trabalho de equilíbrio estacionário terá
uma taxa de crescimento relativamente alta dessa razão quando estiver se movendo para a
trajetória de crescimento de equilíbrio de longo prazo. Se funções produção, taxas de poupança e
investimento em capital humano fossem os mesmos em todos os países e a tecnologia pudesse se
mover livremente entre as fronteiras nacionais, diferentes países estariam convergindo para o
mesmo estado estacionário. As diferenças de renda per capita atuais entre países seriam, nesse
caso, resultado de choques que tivessem ocorrido no passado. Guerras passadas ou dominação
colonial teriam deslocado a economia de seu equilíbrio estacionário. Ao retornar ao seu estado
de equilíbrio, então, uma economia sujeita a um choque negativo desse tipo cresceria mais
rapidamente do que outra que não tivesse sido afetada.
O que as evidências empíricas revelam sobre a convergência? Primeiro, consideremos a
Figura 20.5, que focaliza 21 membros da OCDE, uma amostra de países altamente
industrializados. Na figura, a taxa de crescimento anual média do PIB em 1960-1997 é medida
no eixo vertical e o nível inicial do PIB (1960) está no eixo horizontal. A dispersão dos pontos
tem uma inclinação negativa consistente com a hipótese da convergência: países com o maior
PIB per capital inicial tiveram taxas de crescimento menores do que países que eram mais
pobres no início.

FIG 20.5 Convergência na OCDE, 1960-1997


Um exame dos dados referentes aos Estados americanos, que compara o crescimento pós-
1880 da renda per capita com o nível de renda em 1880, também oferece apoio para a
convergência.6 Os Estados com os níveis de renda mais altos em 1880 cresceram mais
lentamente nos anos subsequentes.
Mas olhemos agora para a Figura 20.6. Aqui, examinamos uma amostra mais ampla de
países. Além dos países da OCDE considerados na Figura 20.5, a amostra inclui países de renda
média e alguns países muito pobres, somando 71 países no total. Como pode ser visto na figura,
esse conjunto de dados não apoia a convergência. Note em particular que alguns dos países com
os níveis de renda per capita iniciais mais baixos tiveram taxas de crescimento baixas e, em
alguns casos, negativas em anos subsequentes.
Como deveríamos interpretar essas descobertas incongruentes sobre a convergência? Uma
interpretação dos dados dos países da OCDE e dos Estados americanos é que o pressuposto de
que esses grupos tinham características econômicas similares é razoável. Assim, eles podem ter
os mesmos níveis de renda de equilíbrio no estado estacionário. Países ou Estados com níveis
iniciais de renda mais baixos estavam abaixo de seu ponto de equilíbrio estacionário. A
infraestrutura econômica de alguns países da OCDE, por exemplo, certamente sofreu mais danos
na Segunda Guerra Mundial que a de outros. No caso dos Estados americanos, as economias dos
Estados do sul foram devastadas pela Guerra Civil, enquanto no norte isso não aconteceu.

FIG 20.6 Convergência na OCDE e em países fora da OCDE, 1960-1997


Quando passamos para a amostra ampla de países, o pressuposto de estruturas econômicas
similares entre os países pode se tornar insustentável. Assim, esses países têm estados
estacionários muito diferentes. Em consequência, não estão se movendo para uma única razão
capital/trabalho ou capital/produto. Seus níveis de renda não estão convergindo.
O conceito de convergência que examinamos até aqui é chamado de convergência absoluta.
Países com renda inicial mais baixa terão maiores taxas de crescimento subsequentes e ponto
final. Um conceito amenizado é a convergência condicional. Uma economia crescerá mais
rapidamente se estiver abaixo de seu próprio nível de renda per capita de estado estacionário. Os
níveis de estado estacionário, no entanto, serão diferentes de um país para outro devido às
diferentes características de suas economias. Condicionado a essas diferentes características
econômicas, os países com níveis de renda iniciais mais altos terão taxas de crescimento
menores em anos posteriores.
Vários estudos encontraram apoio para a convergência condicional em um conjunto amplo de
países como o da Figura 20.6.7 Variáveis de controle importantes, aquelas que influenciam o
nível de estado estacionário da renda entre os países, incluem o nível de capital humano per
capita, cumprimento do Estado de Direito e outros aspectos, do que é chamado de infraestrutura
social8, grau de abertura ao comércio exterior e algumas variáveis macroeconômicas como taxas
de inflação e índice de consumo do governo. Dadas essas variáveis, o nível de renda inicial tem
o efeito negativo esperado. Ainda assim, esses estudos indicam que a convergência é um
processo lento que ocorre ao longo de muitas décadas.
A ideia de que diferentes países têm diferentes níveis de estado estacionário de renda para os
quais estão convergindo tem, no entanto, algumas implicações favoráveis para o crescimento em
países pobres. Se eles pudessem fazer mudanças institucionais que tivessem efeitos positivos
sobre o nível de estado estacionário da renda, haveria a perspectiva de um crescimento mais
rápido em direção a esse nível. Uma área que tem recebido muita atenção recentemente nesse
sentido é a infraestrutura social. Uma infraestrutura social favorável para um país é aquela que
alinha os incentivos econômicos de indivíduos com os que produzem retornos para a sociedade,
com instituições que desestimulem o que os economistas chamam de atividades rent-seeking, ou
de “busca de renda”, que são aquelas voltadas a desviar recursos de um indivíduo ou grupo para
outro. As atividades de ditaduras “cleptocráticas” são um exemplo. Ditadores de países ricos em
recursos com frequência têm focado o enriquecimento individual e a preservação do próprio
poder em vez de buscar o desenvolvimento econômico. De modo mais geral, o cumprimento dos
contratos, sistemas tributários sensatos e evitação de gastos militares excessivos são algumas
características da infraestrutura social que podem levar a níveis de estado estacionário de renda
mais altos. Tudo isso, claro, é mais fácil de teorizar do que implementar8.

PERSPECTIVAS 20.2 - SUJEIRA, DINHEIRO E AS CONSEQUÊNCIAS


MORAIS DO CRESCIMENTO ECONÔMICO
Um adágio do século XIX nas Midlands da Inglaterra era que “Where there’s muck there’s money” (onde há sujeira dá
para fazer dinheiro). O crescimento econômico vinha acompanhado de danos ambientais mesmo naquela época. Neste
capítulo, estivemos preocupados com os fatores que determinam a taxa de crescimento do produto, o que é uma questão de
economia positiva. E quanto à desejabilidade ou indesejabilidade do crescimento econômico, ou seja, uma questão de
economia normativa? A sujeira é uma das preocupações. Hoje, um exemplo seriam as emissões de carbono no ambiente e
o resultante aquecimento global. Outros tipos de poluição da água e do ar também são exemplos de externalidades
negativas do crescimento econômico. Se o crescimento tem efeitos negativos que não são precificados no mercado, então,
em vez de políticas para promover o crescimento, deveríamos estar dispostos a implantar políticas que, pela precificação
adequada das consequências do crescimento, tenham o efeito de reduzi-las. Impostos sobre as emissões de carbono são um
exemplo.
Em um livro recente, porém, Benjamin Friedman argumenta que há algumas externalidades positivas no crescimento que
não devem ser ignoradas.a Ele afirma que o crescimento econômico mais rápido estimula o movimento para a abertura,
tolerância, justiça e democracia nas sociedades. O crescimento lento ou a estagnação movem as sociedades nas direções
opostas.
Friedman acredita que usamos duas referências para medir nosso bem-estar econômico: onde nos encontramos em relação
ao passado e onde estamos em relação aos outros. Em uma economia de crescimento rápido, a maioria das pessoas tem a
percepção de estar melhorando em termos da primeira dessas referências. Há, assim, menos necessidade de se preocupar
com a segunda. Com crescimento lento ou estagnação, desenvolve-se a sensação de que os padrões de vida atuais são
ameaçados pelos ganhos dos outros ou por novos grupos que entrem na sociedade para competir. A abertura e a tolerância
declinam. Discriminação, fechamento e postura defensiva florescem. Friedman oferece apoio para sua tese com um amplo
levantamento histórico dos Estados Unidos após a Guerra Civil e da Europa Ocidental nos séculos XIX e XX.
Pela perspectiva de políticas públicas, ele argumenta que “Na medida em que o crescimento econômico traga não só
maiores rendas privadas, mas também maior abertura, tolerância e democracia – benefícios que o mercado não precifica –
e na medida em que esses benefícios superem qualquer dano não precificado que possa acompanhá-los, as forças do
mercado, por si só, produzirão sistematicamente um crescimento pequeno demais”.b As externalidades que se encaixam
nessa dimensão são argumentos a favor de políticas que estimulem o crescimento.
Assim, como é tão frequentemente o caso em questões de políticas econômicas, o que nos resta dizer é: por um lado é
assim, mas há o outro lado. Há sujeira a ser levada em conta. O escritor inglês J. B. Priestly, em uma viagem aos Midlands
na década de 1930, comentou que “Mas agora não há muito dinheiro e há ainda muita sujeira. É preciso durar mais”. O
custo de evitar mais danos ambientais pode, porém, ter consequências que vão além da redução dos devoradores de gás e
das minimansões, caso leve também a uma diminuição da taxa de crescimento econômico.
a FRIEDMAN, Benjamin. The moral consequences of economic growth. New York: Alfred A. Knopf, 2005.
b FRIEDMAN, 2005, p. 15

Conclusão
O modelo de crescimento neoclássico sugere que a taxa de mudança tecnológica é o principal
determinante da taxa de crescimento da renda per capita no equilíbrio estacionário. A taxa de
poupança e, assim, a taxa de investimento tanto em capital físico como humano afetarão a taxa
de crescimento por um período de tempo considerável e também influenciarão as razões
capital/trabalho e capital/produto no estado estacionário. Nos modelos de crescimento endógeno,
a taxa de poupança e, assim, a taxa de formação de capital podem ter efeitos permanentes sobre
a taxa de crescimento de uma nação.
Devido às diferenças nessas variáveis entre os países, têm havido grandes diferenças entre
suas experiências de crescimento. Choques passados como guerras, agitação civil, ditaduras
predatórias e dominação colonial sem dúvida também influenciaram as diferenças nas taxas de
crescimento entre os países. Em consequência, há disparidades muito grandes nos níveis de
renda per capita internacionais. Os ganhos que poderiam ser obtidos por um país pela geração de
um crescimento rápido são enormes. A renda per capita em Taiwan cresceu 6,4% ao ano entre
1960 e 2000. Esse crescimento aumentou o nível da renda per capita por um fator de 13.
Cingapura, Hong Kong e Coreia do Sul tiveram taxas de crescimento acima de 5% ao ano. Esse
foi o chamado milagre asiático. Em contraste, na República Democrática do Congo a renda per
capita caiu a uma taxa anual de 3,2% nesses anos e o nível da renda per capita em 2000 era um
terço do nível de 1960.
Quanto aos fatores que levam a crescimento rápido em alguns países e estagnação em outros,
Robert Lucas escreveu: “As consequências para o bem-estar humano envolvidas em questões
como essas são simplesmente atordoantes: quando se começa a pensar nelas, é difícil pensar em
qualquer outra coisa”.9

Questões de revisão
1. Explique por que, no modelo de crescimento neoclássico com mudanças tecnológicas
exógenas, a taxa de crescimento do produto no equilíbrio de longo prazo é independente da
taxa de poupança (S/Y).
2. De acordo com as estimativas de Denison, que fatores foram os mais importantes para
explicar o crescimento do produto real nos Estados Unidos no período de 1929-82?
3. Que características do modelo de crescimento neoclássico levaram à crítica de que o modelo
não explicava realmente os processos que geravam o crescimento econômico? Como os
modelos de crescimento endógeno tentam corrigir essa possível deficiência do modelo
neoclássico?
4. Explique a hipótese da convergência. Como a hipótese de convergência absoluta difere da
convergência condicional?
5. O que significa dizer que o crescimento é exógeno ou endógeno? Qual é a diferença entre a
estrutura de produção em um modelo de crescimento endógeno e no modelo de crescimento
neoclássico?
6. Por que muitos economistas acham que é difícil conciliar grandes diferenças de renda entre
países com as implicações do modelo de crescimento neoclássico?
7. Suponha que a taxa de poupança fosse aumentada de 10% para 20% em um país de renda
média como o Egito. Qual a previsão do modelo de crescimento neoclássico para o efeito
que isso teria sobre a renda per capita no Egito ao longo dos próximos 30 anos? Ilustre o
efeito previsto com um gráfico.
GLOSSÁRIO

A
Abordagem de Cambridge é uma versão da teoria quantitativa da moeda que focaliza a
demanda por moeda (Md = kPY).
Afrouxamento quantitativo é o nome dado a uma série de ações do Banco Central americano
que expandiram o balanço patrimonial do Banco Central com o objetivo de proporcionar mais
crédito aos mercados financeiros.
Alíquota tributária efetiva é o valor do imposto devido pelo contribuinte dividido por sua
renda total.
Alíquota tributária marginal é o imposto pago sobre cada unidade monetária adicional
auferida em uma atividade.
Aprofundamento de capital é o processo pelo qual o capital cresce a um ritmo mais rápido que
o trabalho e a razão capital/trabalho aumenta.
Armadilha da liquidez é uma situação de taxa de juros muito baixa em que a curva de demanda
especulativa por moeda torna-se quase horizontal.

B
Balança comercial de mercadorias mede a diferença entre exportações e importações no
balanço de pagamentos.
Balança de capitais no balanço de pagamentos é um registro de compras de ativos domésticos
por residentes de outros países (entradas de capital) e compras de ativos estrangeiros por
residentes locais (saídas de capital).
Balanço de pagamentos registra as transações econômicas entre residentes e não residentes do
país, envolvendo bens e ativos.
Base monetária é igual à moeda corrente mantida pelo público mais as reservas bancárias.
Bens de capital são recursos de capital, como fábricas, máquinas e ferrovias, usados para
produzir outros bens.
Board of Governors of the Federal Reserve
é composto de sete membros (governors) indicados pelo presidente dos Estados Unidos, com
consulta e aprovação do Senado, para um mandato de 14 anos. Um dos membros da mesa é
nomeado como seu presidente para um mandato de 4 anos.

C
Câmbio é o termo usado para a relação entre as moedas nacionais.
Capital humano é o acúmulo de investimentos em instrução, capacitação e saúde que eleva a
capacidade produtiva das pessoas.
Compras governamentais de bens e serviços são a parte do produto corrente que vai para o
setor governamental – o governo federal e os governos estaduais e municipais.
Consumo é a demanda das famílias por bens e serviços para uso corrente. Gastos em consumo
são compras de bens duráveis (por exemplo, automóveis e televisores), de bens não-duráveis
(por exemplo, alimentos e jornais) e de serviços (por exemplo, cortes de cabelo e corridas de
táxi).
Conta corrente no balanço de pagamentos é um registro das exportações e importações de
mercadorias de um país, do intercâmbio de serviços e dos pagamentos de transferências.
Curva de demanda agregada mede a demanda pelo produto total em diferentes valores do
nível agregado de preços.
Curva de Phillips é a curva que mostra a relação entre as taxas de desemprego e de inflação.
Custo de oportunidade de uma ação é o valor da melhor alternativa descartada.
Custo de uso do capital é o custo total para uma firma de empregar uma unidade adicional de
capital por um período.
Custo marginal é o custo extra, ou adicional, de gerar mais 1 unidade de produto.
Custos de menu referem-se a qualquer tipo de custo incorrido por uma firma se ela alterar o
preço de seu produto.

D
Déficit cíclico é a parte do déficit federal que resulta do fato de a economia estar operando em
um nível baixo de atividade econômica.
Déficit comercial é o excesso de importações sobre as exportações.
Déficit do orçamento federal é o excesso de gastos governamentais em relação às suas receitas.
Déficit estrutural é a parte do déficit federal que existiria mesmo se a economia estivesse em
seu nível de produto potencial.
Definição de metas intermediárias para um agregado monetário é uma estratégia de política
monetária que visa a atingir metas de crescimento da moeda, com o objetivo final de controlar o
nível de atividade econômica.
Deflator implícito do produto nacional/interno bruto é um índice dos preços de bens e
serviços incluídos no produto nacional/interno bruto.
Demanda agregada é a soma das demandas por produto corrente por parte de cada um dos
setores compradores da economia: famílias, firmas, governo e compradores estrangeiros de
exportações.
Depreciação é a parte do estoque de capital que se desgasta a cada ano.
Desemprego cíclico resulta de flutuações no nível de atividade econômica e das consequentes
flutuações na demanda por trabalhadores.
Desemprego estrutural, como o desemprego friccional, origina-se na natureza dinâmica do mix
de produto e emprego na economia, mas o desemprego estrutural dura mais tempo.
Desemprego friccional é o desemprego devido ao tempo que os trabalhadores passam entre
empregos e ao tempo de que os ingressantes ou reingressantes na força de trabalho precisam
para encontrar emprego.
Dívida soberana é a dívida de governos nacionais, com frequência emitida em moeda
estrangeira ou, no caso da zona do euro, em uma moeda comum.

E
Economias de escala estão presentes quando uma duplicação de todos os insumos faz com que
o produto tenha um aumento acima do dobro.
Elasticidade mede a mudança percentual em uma variável a cada 1% de mudança em outra
variável: por exemplo, a elasticidade da demanda por moeda em relação à taxa de juros.
Escolha pública é a aplicação à formulação de políticas macroeconômicas da teoria
microeconômica de como são tomadas as decisões.
Estabilizadores automáticos são mudanças em impostos e pagamentos de transferências do
governo que ocorrem quando o nível de renda muda.
Euro é a moeda de 17 países da União Europeia.
Expectativas racionais são expectativas formadas com base em todas as informações relevantes
disponíveis sobre a variável que está sendo prevista. Além disso, supõe que os agentes
econômicos usem as informações disponíveis de forma inteligente; ou seja, eles compreendem
as relações entre as variáveis que observam e as variáveis que estão tentando prever.
Exportações líquidas são o total (bruto) das exportações menos as importações.

F
Fatores de produção são trabalho, terra, capital e empreendedorismo.
Federal Reserve System (ou apenas Federal Reserve, ou Fed) é o Banco Central dos Estados
Unidos, composto de 12 Federal Reserve Banks regionais e do Board of Governors localizado
em Washington, D.C.
Flutuação administrada para a taxa de câmbio de um país é um sistema em que às vezes se
permite que a taxa de câmbio responda a forças do mercado, enquanto em outras ocasiões o
Banco Central intervém para influenciar a taxa de câmbio.
Formação de capital é o crescimento no estoque de unidades e equipamento.
Função consumo é a relação keynesiana entre renda e consumo.
Função oferta agregada é o análogo macroeconômico da função oferta de mercados
individuais, que mostra a produção que estará disponível em cada nível de preço dos produtos
específicos. A função oferta agregada mostra a produto total que as firmas ofertarão a cada valor
do nível agregado de preços.
Função produção resume a relação entre insumos totais e produto total, supondo uma dada
tecnologia.

G
Ganho de capital é o aumento do valor de mercado de qualquer ativo acima do preço
originalmente pago.
Gastos autônomos são gastos determinados em grande medida por fatores diferentes da renda
corrente.
Gastos governamentais referem-se a dispêndios do governo com compras, pagamentos de
transferências e subsídios.
Gastos induzidos são dispêndios determinados principalmente pela renda corrente.

H
Hiperinflação é um período em que o nível de preços aumenta drasticamente. Na pior
hiperinflação, as taxas de inflação chegam a vários milhares por cento ao mês.
Hipótese da renda permanente compartilha com a hipótese do ciclo de vida a ideia de que o
consumo depende de uma média de longo prazo da renda auferida com o trabalho e a posse de
ativos.
Hipótese do ciclo de vida a respeito do consumo afirma que decisões de poupança e consumo
das famílias refletem um plano para um padrão de consumo ótimo ao longo da duração da vida,
sujeito à restrição de seus recursos.
Histerese descreve a tendência de uma variável afastada de um valor inicial por um choque não
retornar a esse valor mesmo depois que o choque termina. As taxas de desemprego
persistentemente altas em muitos países europeus levaram economistas a afirmar que o
desemprego exibe histerese.

I
Impostos indiretos são impostos gerais sobre vendas e seletivos (excise taxes).
Inconsistência temporal são problemas que surgem quando uma política para o futuro
formulada em uma data inicial não é mais ótima em uma data posterior mesmo sem que
nenhuma informação nova tenha aparecido.
Índice de preços mede o nível agregado de preços relativo a um ano-base escolhido.
Índice de preços ao consumidor (IPC) mede os preços de varejo de uma “cesta de mercado”
fixa de milhares de bens e serviços comprados pelas famílias.
Índice de preços no atacado (IPA) mede os preços de atacado de milhares de itens.
Instituições de depósitos são intermediários financeiros cujo principal passivo são depósitos.
Essas instituições incluem bancos comerciais, associações de poupança e empréstimos, bancos
de poupança mútua e cooperativas de crédito.
Intermediários financeiros são instituições que aceitam recursos de poupadores e fazem
empréstimos para tomadores finais (por exemplo, firmas).
Investimento é a parte do produto nacional bruto comprada pelo setor empresarial mais a
construção residencial.

M
M1 é a mais limitada das medidas de oferta de moeda. Compõe-se de moeda corrente mais
depósitos à vista. Outra medida, M2, é mais ampla. Inclui todos os componentes de M1 mais
alguns depósitos bancários adicionais que não são sacáveis por cheques ou o são de forma
apenas limitada.
Mercado aberto é o mercado de negociação de títulos do governo.
Mercados de capitais são os de instrumentos financeiros de longo prazo, como títulos do
Tesouro e empresariais, além de ações de empresas.
Mercado monetário é um conjunto de mercados para ativos líquidos de baixo risco com
vencimentos de menos de um ano.
Modelos de preços rígidos (ou modelos de custo de menu) são aqueles em que os custos de
alterações de preços impedem que sejam feitos ajustes nos preços quando a demanda muda.
Consequentemente, o produto cai quando, por exemplo, há um declínio na demanda.
Modelos de salário-eficiência, a produtividade do trabalho depende do salário real que os
trabalhadores recebem. Nesses modelos, o salário real é definido de modo a maximizar a
eficiência das unidades de trabalho por unidade monetária de gastos, e não para equilibrar o
mercado de trabalho.
Modelos incluído-excluído oferecem uma explicação para a histerese no desemprego. Os
incluídos (por exemplo, membros de sindicatos) são o único grupo que afeta a negociação do
salário real. Os excluídos (por exemplo, os que querem empregos) não afetam. Recessões fazem
com que incluídos se tornem excluídos. Depois da recessão, com menos incluídos, o salário real
aumenta e o desemprego persiste.
Moeda é tudo o que é comumente aceito como pagamento em troca de bens e serviços (e
pagamento de dívidas e impostos).
Mudança tecnológica inclui mudanças em conhecimento tecnológico (por exemplo, modos de
utilizar robôs no processo de produção) e novos conhecimentos sobre como organizar os
negócios (estratégias administrativas).
Multiplicador do orçamento equilibrado dá a mudança no produto de equilíbrio que resulta de
um aumento ou redução de 1 unidade nos impostos e nos gastos do governo.
Multiplicador dos depósitos dá o aumento dos depósitos bancários por aumento unitário das
reservas bancárias.
Multiplicador dos gastos autônomos dá a mudança no produto de equilíbrio por mudança
unitária nos gastos autônomos (por exemplo, gastos governamentais).
Multiplicador monetário dá o aumento da oferta de moeda por unidade de aumento da base
monetária.

O
Oligopólio está mais próximo do monopólio do que da concorrência perfeita, porque é
caracterizado por poucas firmas (duas ou três) e por uma entrada moderadamente difícil de
novas firmas. No oligopólio de tipos de produtos, os mercados podem ter produtos padronizados
ou diferenciados.
Open Market Committee do Federal Reserve americano é composto de 12 membros com
direito de voto: os 7 membros do Board of Governors e 5 dos presidentes dos Federal Reserve
Banks regionais. Os presidentes dos bancos regionais ocupam o cargo em um sistema de rodízio,
com a exceção do presidente do Federal Reserve Bank of New York, que é o vice-presidente e
um membro votante permanente do comitê.
Operações no mercado aberto são compras e vendas de títulos do governo no mercado aberto
pelo Banco Central. Operações no mercado aberto são o principal instrumento de controle da
base monetária.

P
Papel negociável é uma categoria de ativo de mercado monetário que consiste em dívida de
curto prazo emitida por grandes empresas.
Perda de capital é a redução do valor de mercado de qualquer ativo abaixo do preço
originalmente pago.
PIB (produto) potencial é o nível que seria alcançado se os recursos produtivos (trabalho e
capital) estivessem sendo usados nos níveis de referência mais altos.
PIB nominal é o PIB medido em unidades monetárias correntes.
Política de estabilização fiscal é o uso de gastos do governo e políticas tributárias para afetar o
nível de atividade econômica.
Política monetária é o uso pelo Banco Central de controle da oferta de moeda e das taxas de
juros para influenciar o nível de atividade econômica.
Preferência pela liquidez é um termo keynesiano para a demanda por moeda em vez de títulos.
Problema do limite zero confronta os bancos centrais quando a taxa de juros nominal que eles
usam como um instrumento atinge um limite inferior zero. Nessa situação não é mais possível
estimular a economia com declínios nessa taxa.
Produto Interno Bruto (PIB) é uma medida de todos os bens e serviços finais produzidos
durante o período.
Produto marginal de um insumo é o acréscimo ao produto total devido à adição de uma
unidade extra desse insumo (a quantidade de outros insumos sendo mantida constante).
Produto Nacional Bruto (PNB) é, como o produto interno bruto, uma medida da produção
nacional agregada. Há duas diferenças entre as duas medidas, ambas referentes a transações
internacionais. O PNB inclui ganhos no exterior de firmas nacionais e ganhos de residentes do
país que estejam trabalhando no exterior; o PIB não inclui esses itens. Por outro lado, o PIB
inclui ganhos derivados da produção corrente do país obtidos por residentes estrangeiros e por
firmas estrangeiras no país, enquanto o PNB exclui esses itens.
Produto nacional bruto real mede o produto agregado em unidades monetárias de valor
constante a partir de um ano-base.
Produto nacional líquido (PNL) é o produto nacional bruto menos a depreciação.
Propensão marginal a consumir (PMgC) é o aumento no consumo por unidade de aumento na
renda disponível.
Propensão marginal a poupar (PMgS) é o aumento na poupança por unidade de aumento na
renda disponível.
Propensão média a consumir é a razão entre consumo e renda.
Propensão média a poupar é a razão entre poupança e renda.
Proposição novo-clássica da ineficácia de políticas econômicas afirma que ações sistemáticas
de política monetária e fiscal que mudem a demanda agregada não afetarão o produto e o
emprego nem mesmo no curto prazo.

R
Receita do produto marginal (RPMg) de qualquer insumo é a receita extra que a firma ganha
ao usar 1 unidade a mais do insumo, mantendo os outros insumos constantes.
Receita marginal é a receita adicional associada à venda de 1 unidade a mais de produto.
Receitas de senhoriagem são o montante de recursos reais comprados pelo governo com moeda
recém-criada.
Recessão é um período em que a atividade econômica declina significativamente em relação ao
produto potencial, mas de forma menos grave do que em uma depressão, como a da década de
1930.
Renda nacional é a soma dos ganhos de todos os fatores de produção que derivam da produção
corrente.
Renda pessoal é a medida nas contas nacionais da renda recebida por pessoas, provenientes de
todas as fontes.
Rendimentos constantes de escala significa que um aumento de uma certa proporção em todos
os insumos (por exemplo, 100%) fará o produto aumentar nessa mesma proporção (100%).
Reservas compulsórias especificam que os bancos devem reter uma determinada porcentagem
(fração) de seus depósitos, seja em forma de moeda à vista (papel-moeda) ou de depósitos em
bancos centrais. É o que se chama de reservas fracionárias.

S
Sistema Bretton Woods foi um sistema de taxas de câmbio fixas estabelecido no final da
Segunda Guerra Mundial.
Sistema de taxas de câmbio é um conjunto de regras que organizam a determinação das taxas
de câmbio entre as moedas.

T
Taxa de câmbio é o valor da moeda de um país em relação a moedas estrangeiras.
Taxa de desemprego expressa o número de pessoas desempregadas como uma porcentagem da
força de trabalho.
Taxa de juros real é a taxa de juros nominal menos a taxa de inflação de preços antecipada.
Taxa de redesconto é a taxa que o Banco Central cobra sobre empréstimos a instituições de
depósitos.
Taxa de reservas compulsórias é a porcentagem de depósitos que os bancos precisam manter
como reservas.
Taxa dos fundos federais é a taxa que os bancos usam para fazer empréstimos entre si.
Taxas naturais de produto, emprego e, portanto, desemprego no modelo monetarista são
determinadas por fatores reais do lado da oferta: o estoque de capital, o tamanho da força de
trabalho e o nível da tecnologia. Em nosso modelo simples, as taxas naturais de produto,
emprego e desemprego são os níveis clássicos de equilíbrio dessas variáveis (o desemprego
sendo restrito às formas friccional e estrutural).
Teoria do partidarismo vê os resultados de políticas macroeconômicas como resultado de
decisões ideologicamente motivadas de líderes de diferentes partidos políticos. Os partidos
representam eleitorados com diferentes preferências no que se refere a variáveis
macroeconômicas.
Teoria dos estoques para a demanda por moeda para transações vê a moeda como um estoque
do meio de troca que é mantida de maneira similar a como firmas mantêm um estoque de bens.
Títulos empresariais são promissórias formais que exigem que a firma pague uma soma fixa de
moeda (pagamento dos juros) anualmente até o vencimento e, então, no vencimento, uma soma
fixa de moeda para pagar a quantia inicial emprestada (o principal).
Trabalho inclui a energia física, habilidade manual e capacidade mental que os seres humanos
aplicam à produção de bens e serviços.
Tratado de Maastricht de 1991 foi um passo fundamental na passagem para o euro como uma
moeda comum para 17 membros da União Europeia. O tratado definiu diretrizes para as
economias dos países-membros que tiveram de ser cumpridas antes da adoção da moeda
comum.

U
Utilidade marginal de um bem é a satisfação adicional que um consumidor deriva do consumo
de 1 unidade adicional desse bem.

V
Velocidade da moeda é a taxa de rotatividade da moeda em transações do produto nacional
bruto durante um dado período, ou seja, o número médio de vezes que cada unidade monetária é
usada em transações do produto nacional bruto.
1 MARSHALL, Alfred. Principles of Economics. 8th ed. New York: Macmillan, 1920. p. 1.
1 DICKENS, Charles. Hard times. New York: Norton, 1966. p. 1.
2 Os economistas Simon Kuznets e Richard Stone, ganhadores do prêmio Nobel, tiveram papéis pioneiros no desenvolvimento
da contabilidade nacional. Veja KUZNETS, Simon. National income and its composition, 1919-1938. New York: National
Bureau of Economic Research, 1941. Durante a Segunda Guerra Mundial, o Ministério do Comércio assumiu a manutenção
das contas nacionais. Os dados das contas nacionais americanas são publicados no Survey of Current Business. Uma descrição
de revisões recentes nas contas nacionais é o Preview of the Comprehensive NIPA Revision: Changes in Definitions and
Classifications. Survey of Current Business, p. 11-29, November 2010.
3 Para alguns serviços que não são vendidos no mercado, o Ministério do Comércio tenta atribuir o valor de mercado do serviço
e incluí-lo no PIB. Um exemplo são os serviços de aluguel de casas ocupadas pelo proprietário, que o Ministério do Comércio
estima com base no valor do aluguel.
4 Em 1933, a depreciação nos Estados Unidos foi de US$ 7,6 bilhões. Como o investimento bruto foi de apenas US$ 1,7 bilhão,
o investimento líquido foi negativo. Isso significa que o estoque de capital declinou naquele ano, porque o investimento bruto
foi insuficiente para substituir a parte do estoque de capital consumida.
5 É importante distinguir identidades como (2.1) e (2.2), que são indicadas pelo símbolo de três barras (≡), de equações, que são
indicadas pelo sinal usual de igual (=). Identidades são relações que decorrem da contabilidade ou de outras definições e,
portanto, aplicam-se a qualquer valor das variáveis.
6 Mais detalhes podem ser obtidos no site do Instituto Brasileiro de Economia (IBRE) da Fundação Getulio Vargas. Disponível
em: <http://portalibre.fgv.br>. (N.E.)
1 KEYNES, John Maynard. A teoria geral do emprego, do juro e da moeda. São Paulo: Saraiva, 2012.
2 Mill, J. S. “On the Influence of Consumption on Production”. In: Essays on Economics and Society, v. 4 de Collected Works,
Toronto, University of Toronto Press, 1967. p. 263.
3 MILL, 1967, p. 263.
4 MILL, 1967, p. 276.
5 Notações funcionais como a usada em (3.1) serão utilizadas em vários pontos de nossa análise. Em todos os casos, essas
equações significam que a função envolvida (neste caso, F) é uma relação que determina um valor único da variável do lado
esquerdo (neste caso, Y) para cada combinação dos níveis dos argumentos da função (neste caso, K e N).
6 O símbolo diferenciador Δ (delta) indica a variação no valor da variável que o segue (por ex., ΔY é a variação em Y).
7 Uma firma perfeitamente competitiva tem uma curva de demanda horizontal por seu produto. Pressupõe-se que a firma seja
uma parte tão pequena do mercado que o aumento de sua produção possa ser vendido sem deprimir o preço do produto. A
análise poderia ser reformulada para a firma que se defronta com uma curva de demanda de inclinação decrescente sem alterar
substancialmente as conclusões a que chegamos neste capítulo. A questão quanto a se as firmas são de fato perfeitamente
competitivas, porém, tem implicações importantes em pontos futuros de nossa análise.
8 O i subscrito não aparece nas variáveis de preço ou salário porque estes são uniformes entre as firmas. O PMgN para cada
i
firma é derivado da função produção de cada firma, que se supõe ser idêntica para todas as firmas, ou seja, Y1=F(Ki,Ni) para
cada firma.
9 A equação (3.9) tem uma interpretação simples. Para maximizar os lucros, o salário monetário pago ao trabalhador adicional
(W) deve ser exatamente igual à contribuição do trabalhador para a receita da firma. A contribuição do trabalhador para as
receitas monetárias é igual a seu produto marginal multiplicado pelo preço do produto (PMgN × P), o que é chamado de
receita do produto marginal.
10 Esse nível do produto é derivado da função
produção dada na Figura 3.4.
1 FISHER, Irving. The purchasing power of money. New York: Macmillan, 1922. p. 29.
2 A curva Yd (M = 300) e outras curvas de demanda agregada são construídas de modo que o produto do valor da variável no
eixo vertical pelo valor da variável no eixo horizontal (P × Y) seja igual em todos os pontos ao longo da curva. Uma curva
desse tipo é uma hipérbole retangular.
3 A palavra poderia é usada com relação à venda de títulos pelo governo para financiar um déficit porque, como será explicado
na Seção 4.3, o governo tem também a alternativa de emitir moeda para financiar déficits. Note-se também que investimento
refere-se a gastos das firmas com instalações, equipamentos duráveis e estoques – investimento no sentido das contas
nacionais. O termo investimento não se refere à compra de ativos financeiros, como títulos.
4 É importante notar que, conforme a poupança declina, ocorre um aumento igual no consumo corrente. A renda real é fixa,
assim como os impostos, de modo que todas as mudanças na poupança refletem-se em mudanças no consumo corrente.
5 Na verdade, como a redução dos impostos afetaria a riqueza, o que, por sua vez, poderia influenciar a escolha trabalho-lazer,
até mesmo um corte fixo e uniforme dos impostos poderia afetar o lado da oferta. Estamos deixando de lado aqui os efeitos da
riqueza.
6 A curva de demanda agregada é fixa na medida em que as receitas que foram perdidas por causa do corte na alíquota do
imposto de renda são compensadas por um aumento da venda de títulos para o público. Se, em vez disso, a receita perdida
fosse substituída por emissão de moeda, a curva de demanda agregada seria deslocada para a direita e o nível de preços
poderia não cair.
1 A taxa de desemprego na Grã-Bretanha estava acima de 10% já em 1923 e permaneceu acima de 10%, exceto por uma breve
queda para 9,8%, até 1936, o ano da publicação de A teoria geral do emprego, do juro e da moeda.
2 MARSHALL, Alfred. Money, credit and commerce. London: Macmillan, 1922. p. 260.
3 MARSHALL, 1922, p. 260.
4 Isso ignora os efeitos no lado da oferta de uma mudança na alíquota do imposto, discutida na Seção 4.3. Como foi explicado
ali, os economistas clássicos davam pouca atenção a esses efeitos, embora eles tenham se tornado uma consideração
importante nas políticas econômicas em anos recentes.
5 SCHLESINGER, Arthur M. The crisis of the old order. New York: Houghton Mifflin, 1957. p. 457.
6 KEYNES, John M. Collected works. London: Macmillan, 1973. v. 13, p. 489.
7 KEYNES, 1973, p. 488-489.
8 O modelo não leva em conta ganhos retidos. Todos os lucros são pagos como dividendos. Além disso, pressupõe-se que as
firmas não façam pagamentos de impostos; todos os impostos são pagos pelas famílias.
9 Lembremos do Capítulo 2 que investimento realizado é o total que aparece nas contas nacionais, quer esse investimento fosse
ou não desejado pelas firmas.
10 Aqui, para manter a explicação simples, ignoramos a construção residencial. No Capítulo 6, o conceito de investimento será
ampliado.
11 Lembremos, aqui, que T são os impostos líquidos (isto é, os pagamentos brutos de impostos menos os pagamentos de
transferências). A renda disponível (YD = Y – T) é, portanto, a renda nacional menos os impostos brutos mais os pagamentos
de transferências.
12 KEYNES, John M. The general theory of employment. Quarterly Journal of Economics, p. 214, Feb. 1937.
13 KEYNES, 1937, p. 214-215.
14 Lembramos que o produto e a renda nacionais são idênticos de acordo com as pressuposições que fizemos. Esses termos são
usados de forma intercambiável em nossa análise.
15 Note-se que as arrecadações tributárias são fixas, de modo que ΔY = ΔY . Assim, ΔY = ΔY ≡ ΔC + ΔS e, portanto, ΔY – ΔC
D D
= ΔS.
16 Note-se que, como o consumo inclui importações, b é a PMgC tanto para bens domésticos como importados. Como v é a
propensão marginal a importar (bens de consumo), b – v é a PMgC para bens domésticos.
17 Lembremos da nota de rodapé 16 que b – v é a PMgC para bens domésticos. Um v mais alto (com b fixo), portanto, significa
uma PMgC mais baixa para bens domésticos e um valor mais baixo para o multiplicador.
18 Note-se que, pela equação (5.26), podemos calcular também =
1 Preferência pela liquidez: termo de Keynes para a demanda por moeda em vez de títulos.
2 Note-se que não estamos levando em conta o efeito de mudanças nos preços dos bens. O valor real da moeda declina
proporcionalmente ao aumento do nível agregado de preços. No entanto, o mesmo acontece com o valor real dos títulos;
portanto, os retornos relativos não são diretamente afetados por mudanças nos preços dos bens.
3 O conceito de elasticidade refere-se à mudança percentual em uma variável que resulta de uma mudança de 1% em outra
variável. No caso da elasticidade da demanda por moeda em relação aos juros, a elasticidade é negativa. Um aumento de 1%
na taxa de juros fará a demanda por moeda declinar. No texto, o termo alta elasticidade refere-se ao valor absoluto da
elasticidade. Se a demanda por moeda for muito sensível a mudanças na taxa de juros, dizemos que a demanda por moeda é
altamente elástica. Se a demanda por moeda não for muito sensível a mudanças na taxa de juros, falamos que a demanda por
moeda tem uma baixa elasticidade em relação aos juros, ou baixa elasticidade-juros.
4 Durante a crise financeira de 2007-2008, houve um deslocamento maciço no sentido da liquidez. Nos modelos keynesianos,
isso apareceria dessa forma: um aumento na demanda por moeda.
5 O nome IS vem dessa versão simples da curva de equilíbrio do mercado de bens, uma igualdade entre investimento (I) e
poupança (S).
6 O conceito de elasticidade é definido na nota de rodapé 3. Aqui, como no caso da demanda por moeda, a elasticidade-juros é
negativa; um aumento da taxa de juros reduz o investimento. Ao dizer que a elasticidade é baixa, estamos falando do valor
absoluto da elasticidade.
1 O principal “outro fator” que é mantido constante neste caso é a magnitude de declínio do investimento para um dado aumento
da taxa de juros – a elasticidade-juros do investimento.
1 Para simplificar, a curva de demanda agregada keynesiana aqui e em gráficos posteriores é traçada como uma reta. A
curvatura da curva de demanda agregada não é importante em nossa análise.
2 Algumas mudanças de política fiscal, como uma mudança na alíquota marginal do imposto, têm efeitos do lado da oferta no
sistema clássico, conforme explicado na Seção 4.3. Estes estão sendo ignorados aqui.
3 OKUN, Arthur. Prices and quantities. Washington, DC: The Brookings Institution, 1981. p. 233.
4 Os modelos neste capítulo focam a noção keynesiana tradicional de que a rigidez dos salários monetários é a principal
explicação para o fato de o produto e o emprego terem de responder a mudanças na demanda agregada. Na Seção 12.2,
examinaremos modelos novo-keynesianos em que, em vez disso, a principal rigidez é dos preços dos produtos e dos níveis dos
salários reais.
5 KEYNES, John M. A tract on monetary reform. London: Macmillan, 1923. p. 80.
1 FRIEDMAN, Milton. The counter-revolution in monetary theory. London: Institute of Economic Affairs, 1970. p. 12.
2 Essas duas citações são de FRIEDMAN, Milton. A theoretical framework for monetary analysis. In: GORDON .Robert,
(Org.). Milton Friedman’s monetary framework. Chicago: University of Chicago Press, 1974. p. 27; FRIEDMAN, Milton;
SCHWARTZ, Anna. Money and business cycles. Review of Economics and Statistics, 45, p. 32-64, Feb. 1963.
3 FRIEDMAN, Milton; HELLER ,Walter. Monetary versus fiscal policy. New York: Norton, 1969. p. 51.
4 FRIEDMAN, 1970, p. 18.
5 FRIEDMAN, Milton. The role of monetary policy. American Economic Review, 58, p. 16, Mar. 1968.
6 FRIEDMAN, 1968, p. 14.
7 FRIEDMAN, Milton. The optimum quantity of money and other essays. Chicago: Aldine, 1969. p. 187.
8 MODIGLIANI, Franco. The monetarist controversy, or should we forsake stabilization policies? American Economic Review,
67, Mar. 1977.
9 FRIEDMAN, Milton. M1’s hot streak gave keynesians a bad idea. In: CLELLAND, Peter. (Org.). Readings in introductory
Macroeconomics. New York: McGraw-Hill, 1988. p. 78.
10 Citado em NELSON, Edward. Milton Friedman and U.S. Monetary History: 1961-2006. Federal Reserve Bank of St. Louis
Review, 89, p. 172, May-June 2007.
11 As referências aqui são a DE LONG, Bradford. The triumph of monetarism. Journal of Economic Perspectives, 14, p. 83-84,
Winter 2000; BERNANKE, Ben. Remarks. Federal Reserve Bank of Dallas Conference, Oct. 2003.
1 Veja, por exemplo, a contribuição de Phelps e outros em: PHELPS, Edmund. (Org.), Employment and inflation theory. New
York: Norton, 1970.
2 FRIEDMAN, Milton. The role of monetary policy. American Economic Review, 58, p. 8, Mar. 1968.
3 FRIEDMAN, 1968, p. 10.
4 A curva de Phillips deriva seu nome do economista neozelandês A. W. H. Phillips, que estudou o trade-off entre desemprego e
inflação salarial na economia britânica.
5 FRIEDMAN, 1968, p. 10.
6 A natureza de curto prazo da curva de Phillips de inclinação negativa foi reconhecida antes do trabalho de Friedman. Paul
Samuelson e Robert Solow escreveram nesse contexto: “Toda a nossa discussão foi formulada em termos do curto prazo,
lidando com o que poderia acontecer nos próximos anos… O que fizermos em políticas econômicas nos próximos anos
poderia levá-la [a curva de Phillips] a se deslocar de uma maneira definida”. (SAMUELSON, Paul; SOLOW, Robert.
Analytical aspects of anti-inflation policy. American Economic Review, 50, p. 177-194, May 1960.)
7 Nesta discussão, estamos ignorando elementos da teoria keynesiana que explicam por que o salário monetário é rígido no
curto prazo (veja a Seção 8.3). Não estamos levando em conta, por exemplo, os efeitos de contratos de trabalho implícitos ou
explícitos que impeçam que o salário monetário se ajuste a mudanças nas condições de demanda. Tais fatores podem retardar,
mas não, em última instância, impedir, o ajuste à posição de equilíbrio de longo prazo.
8 Nessa literatura subsequente, o termo taxa de desemprego não-aceleradora da inflação (NAIRU, em inglês) é com frequência
usado em lugar de taxa natural de desemprego.
9 FRIEDMAN, 1968, p. 11.
10 STIGLITZ, Joseph. Reflections on the natural rate hypothesis. Journal of Economic Perspectives, 11, p. 3, Winter 1997.
11 Há outros modos mais sofisticados de estimar a taxa natural de desemprego. Essas outras estimativas também indicam
aumentos acentuados da taxa natural para os países da tabela, bem como para algumas outras nações europeias.
12 Duas análises úteis nessa literatura são BLANCHARD, Olivier; KATZ, Lawrence F. What we know and do not know about
the natural rate of unemployment. Journal of Economic Perspectives, 11, p. 51-72, Winter 1997; BEAN, Charles. European
unemployment: a survey. Journal of Economic Literature, 32, p. 573-619, June 1994.
13 SOLOW, Robert. Unemployment: getting the questions right. Economica, 33, p. S.33, 1986. Veja também GALBRAITH,
James K. Time to Ditch the NAIRU. Journal of Economic Perspectives, 11, p. 93-108, Winter 1997.
14 STIGLITZ, 1997, p. 10.
1 LUCAS, Robert. Rules, discretion, and the role of the economic advisor. In: FISCHER, Stanley (Org.). Rational expectations
and economic policy. Chicago: University of Chicago Press, 1980. p. 259.
2 LUCAS, 1980, p. 259.
3 MUTH, John. Rational expectations and the theory of price movements. Econometrica, 29, p. 316, July 1961.
4 Os termos esperado e antecipado ou não esperado e não antecipado são usados de forma intercambiável aqui. Mudanças de
políticas são referidas como antecipadas ou não antecipadas, ao passo que nos referimos a níveis esperados para variáveis,
incluindo variáveis de políticas.
5 As mudanças esperadas nos preços do petróleo ou de outros fatores do lado da oferta, por exemplo, afetariam o nível de preços
esperado.
6 As posições da curva de demanda agregada e de outras curvas continuam a depender de todas as variáveis discutidas
anteriormente, incluindo variáveis de política econômica, mas, para simplificar as notações, os rótulos das curvas no gráfico
contêm apenas as variáveis que estariam mudando nesse caso.
7 A ideia de que o público aprenderia regras de política sistemáticas decorre do pressuposto das expectativas racionais.
Estimativas de tais regras poderiam ser feitas com base no comportamento passado das políticas econômicas. Essas
estimativas seriam úteis para prever ações de política e, em consequência, para prever o comportamento dos preços e de outras
variáveis, portanto o agente econômico racional faria uso dessas informações.
8 SARGENT, Thomas; WALLACE, Neil. Some unpleasant monetarist arithmetic. Federal Reserve Bank of Minneapolis
Review, Autumn 1981.
9 LUCAS, Robert; SARGENT, Thomas. After keynesian macroeconomics. In: After the Phillips curve: persistence of high
inflation and high unemployment. Boston: Federal Reserve Bank of Boston, 1978.
10 SOLOW, Robert. Alternative approaches to macroeconomic theory: a partial view. The Canadian Journal of Economics, 12,
p. 354, Aug. 1979.
11 Veja BARRO, Robert. Second thoughts on keynesian economics. American Economic Review, 69, p. 57, May 1979.
Exemplos dessas intervenções do New Deal incluem os códigos da National Recovery Administration para fixar preços e
salários, políticas agrícolas para restringir a produção e elevar os preços e um aumento das regulamentações do setor bancário
e de títulos, que podem ter atrapalhado a obtenção de fundos para investimento. (Veja Perspectivas 11.2.)
12 MODIGLIANI, Franco. The monetarist controversy, or should we forsake stabilization policies? American Economic Review,
67, p. 6, Mar. 1977.
13 FRIEDMAN, Benjamin. Optimal expectations and the extreme informational assumptions of “rational expectations”
macromodels. Journal of Monetary Economics, 5, p. 39-40, Jan. 1979.
14 McCALLUM, Bennett. The significance of rational expectations theory. Challenge Magazine, p. 39, Jan.-Feb. 1980.
15 OKUN, Arthur. Price and quantities. Washington: The Brookings Institution, 1981, estende essa visão contratual a mercados
de produtos, com uma resultante rigidez de preços. Modelos novo-keynesianos desse tipo são examinados no Capítulo 12.
1 KING, Robert G.; PLOSSER, Charles. Money, credit and prices in a real business cycle model. American Economic Review,
74, p. 363, June 1984.
2 As alíquotas tributárias poderiam mudar no curto prazo, com efeitos que examinamos na Seção 4.3. Como foi observado ali,
porém, os economistas clássicos davam pouca atenção ao efeito de mudanças nas alíquotas tributárias, devido a estas serem
muito baixas na época em que eles escreveram.
3 BARRO, Robert J. Modern business cycle theory. Cambridge: Harvard University Press, 1989. p. 2.
4 PLOSSER, Charles. Understanding real business cycles. Journal of Economic Perspectives, 3, p. 53, 1989.
5 Aqui, estamos considerando um modelo em que toda a moeda é emitida pelo governo: um mundo em que há apenas moeda
corrente. Se considerássemos também os depósitos bancários, o papel da moeda em um modelo de ciclos reais de negócios
ficaria consideravelmente mais complexo, porque bancos que trabalham com depósitos também oferecem crédito e outros
serviços para firmas. Esses serviços podem afetar a produtividade das firmas. Assim, mudanças no setor bancário – falências
de bancos, por exemplo - podem ter efeitos reais em um modelo de ciclos reais de negócios. Para um modelo de ciclos reais de
negócios que inclua tanto moeda corrente como depósitos bancários, veja: KING; PLOSSER. Money, credit and prices in a
real business cycle model.
6 Tomar empréstimos com o público pela venda de títulos do governo é outra maneira de pagar gastos governamentais. Em
modelos de ciclos reais de negócios, porém, o governo está obrigado a pagar todos os empréstimos em algum ponto. Assim,
vendas de títulos podem afetar apenas o momento da tributação ou do financiamento por moeda, e não seu valor.
7 MANKIW, N. Gregory. Real business cycles: a new keynesian perspective. Journal of Economic Perspectives, 3, p. 79,
Summer 1989. Outros exames da literatura sobre ciclos reais de negócios, com diversos pontos de vista, incluem
MCCALLUM, Bennett T. Real business cycle models. In: BARRO, Robert J. (Org.). Modern business cycle theory;
SUMMERS, Lawrence H. Some skeptical observations on real business cycle theory. Federal Reserve Bank of Minneapolis
Quarterly Review, 10, p. 23-27, Autumn 1986.; STADLER, George. Real business cycles. Journal of Economic Literature, 32,
p. 1750-83, Dec. 1994.; KING, Robert G.; REBELO, Sergio T. Resuscitating real business cycles. In: TAYLOR, John B.;
WOODFORD, Michael. (Orgs.). Handbook of Macroeconomics. Amsterdã: North Holland, 1999. p. 927-1007.
8 Veja, por exemplo, ALTONGI, Joseph G. Intertemporal substitution in labor supply: evidence from micro data. Journal of
Political Economy, 94, p. S176-S215, part II, June 1986.
9 MANKIW, N. Gregory; ROMER, David. (Orgs.). New Keynesian Economics. Cambridge: MIT Press, 1991. p. 1. Essa
coletânea de artigos em dois volumes é uma boa amostragem dos esforços de pesquisa novo-keynesianos. Alguns exames da
literatura novo-keynesiana são GORDON, Robert J. What is new keynesian economics. Journal of Economic Literature, 28, p.
1115-71, Sep. 1990.; ROMER, David. The new keynesian synthesis. Journal of Economic Perspectives, 7, p. 5-22, Winter
1993.; TAYLOR, John B. Staggered price and wage setting in macroeconomics”. In: TAYLOR; WOODFORD (Orgs.).
Handbook of Macroeconomics, p. 1009-50.
10 Exemplos de modelos de preços rígidos são MANKIW, N. Gregory. Small menu costs and large business cycles: a
macroeconomic model of monopoly. Quarterly Journal of Economics, 100, p. 529-38, May 1985.; AKERLOF, George;
YELLIN, Janet. A near rational model of the business cycle with wage and price inertia. Quarterly Journal of Economics, 100,
p. 823-38, 1985.
11 Lembre-se da microeconomia que a concorrência monopolista é uma situação em que muitas firmas oferecem produtos
diferenciados, por exemplo, diferentes tipos de comida em diferentes restaurantes. Oligopólio refere-se a situações em que,
devido a custos substanciais para entrar no mercado, há poucas firmas nele. O produto pode ser padronizado ou diferenciado
(por ex., alumínio ou automóveis).
12 A experiência de Ford com o dia de cinco dólares é analisada pela perspectiva da teoria moderna do salário-eficiência em
RUFF, Daniel M. G.; SUMMERS, Lawrence H. “Did Henry Ford Pay Efficiency Wages?” Journal of Labor Economics, 5, p.
S57-S86, pat II, out. 1987. Exemplos de modelos de salário-eficiência são AKERLOF; YELLIN, “A Near Rational Model of
the Business Cycle with Wage and Price Inertia”; KATZ, Lawrence. “Efficiency Wage Theories: A Partial Evaluation”, NBER
Macroeconomics Annual, Cambridge, Mass.: MIT Press, 1986. p. 235-76.
13 Aqui, voltamos à especificação da função produção agregada de capítulos anteriores, em que o estoque de capital é fixo,
conforme indicado pela barra sobre o K. Também ignoramos o choque de tecnologia introduzido na seção anterior sobre
modelos de ciclos reais de negócios e, para simplificar, omitimos os subscritos de tempo (t) usados anteriormente no capítulo.
14 Um argumento diferente para a relação positiva entre eficiência do trabalhador e salário real é aplicável a países em
desenvolvimento. Um salário real mais alto permite um nível mais elevado de consumo, o que proporciona melhor nutrição e
saúde. Isso, por sua vez, reduz as faltas ao trabalho e torna os trabalhadores mais saudáveis e produtivos. Um modelo mais
antigo dessa relação aparece em LEIBENSTEIN, Harvey “The Theory of Underemployment in Densely Populated Backward
Areas”. In Economic Backwardness and Economic Growth. New York: Wiley, 1963. Embora um argumento similar possa ser
encontrado na obra de Alfred Marshall no século XIX.
15 Uma versão mais antiga do modelo incluído-excluído é oferecida por BLANCHARD, Olivier J. SUMMERS, Lawrence.
Hysteresis and the European Unemployment Problem. In: FISCHER, Stanley (Org.). NBER Macroeconomics Annual.
Cambridge, Mass.: MIT Press, 1986. Veja também Assar Lindbeck e Dennis Snower, “Wage Setting Unemployment and
Insider-Outsider Relations”, American Economic Review, 76, maio de 1986, pp. 235-39; e Robert M. Solow, “Insiders and
Outsiders in Wage Determination”, Scandinavian Journal of Economics, 87, 1985, pp. 411-28.
16 Há extensões do modelo básico incluído-excluído em que os excluídos desempregados têm alguma influência na negociação
de salários. Nesses modelos estendidos, quanto mais alta for a taxa de desemprego, menor é o poder de negociação que os
incluídos podem exercer. Seu receio de ficar desempregados é maior, uma vez que eles sabem que sua perspectiva de
encontrar outro emprego é pequena, e a ameaça dos empregadores de substituí-los por trabalhadores desempregados é mais
digna de crédito. Nesses modelos estendidos, porém, ainda há desemprego persistente. Veja a discussão em BLANCHARD,
Olivier J. Wage bargaining and unemployment persistence. Journal of Money, Credit, and Banking, 23, p. 278-92, Ag. 1991.
1 FRIEDMAN, Milton. Why economists disagree. In: FRIEDMAN, Milton. Dollars and deficits. Upper Saddle River: Prentice
Hall, 1968. p. 15-16.
2 Citado em DAVIDSON, Paul. Money and the real world. New York: Wiley, 1978. p. IX.
a Inclui aumentos em outros ativos internacionais do governo dos Estados Unidos além dos ativos de reservas oficiais.
1 Em capítulos anteriores, o termo investimento foi usado exclusivamente com referência a compras de bens de capital físicos. O
termo capital referia-se a esses bens físicos. Na discussão de relações econômicas internacionais, o termo fluxos de capital
refere-se a trocas de ativos financeiros envolvendo indivíduos em diferentes países, além de investimentos diretos como a
compra de uma fábrica em outro país.
2 O Fundo Monetário Internacional (FMI) é um órgão que foi estabelecido ao final da Segunda Guerra Mundial para administrar
os acordos monetários internacionais assinados na época. Esses acordos, os acordos de Bretton Woods, são discutidos nas
Seções 14.3 e 14.4. Os direitos especiais de saque são às vezes chamados de “papel-ouro”. São um tipo de depósito no FMI
que pode ser trocado entre nações para ajustar desequilíbrios nos pagamentos.
3 Não é preciso que os bancos centrais possuam moeda americana em espécie. Depois de comprar dólares, eles podem usá-los
para comprar títulos públicos ou privados americanos.
4 A Europa, claro, não é um país. Referimo-nos aqui a um conjunto de países europeus que têm o euro como a moeda comum.
Detalhes são discutidos em Perspectivas 14.3.
5 É a expectativa de uma mudança na taxa de câmbio que desencadearia mudanças na demanda por ativos estrangeiros em
relação a ativos domésticos. Se, por exemplo, alguém esperasse que o preço do euro fosse subir de 1 dólar hoje para 1,25 dólar
na próxima semana, poderia comprar agora o título francês mencionado no texto por 800 dólares e vendê-lo na semana
seguinte por 1.000 dólares. Por enquanto, porém, não estamos levando em conta as mudanças esperadas na taxa de câmbio.
* Unidade de medida de capacidade para produtos secos, equivalente a 35,24 litros. (N. da T.)
6 Um apoio empírico a esse pressuposto é oferecido por HOUTHAKKER, Hendrik; MAGEE, Stephen. Income and price
elasticities in world trade. Review of Economics and Statistics, 5, p. 111-125, May 1969. Uma estimativa mais recente de
MARQUEZ, Jaime. Bilateral trade elasticities. Review of Economics and Statistics, 72, p. 75-76, Feb. 1990, indica uma
elasticidade-preço da demanda estrangeira por produtos de exportação americanos exatamente igual a 1. Isso implica uma
oferta de moeda estrangeira vertical. A suposição de uma curva de oferta vertical não alteraria nossa análise.
7 Uma exposição clássica das vantagens de taxas de câmbio flexíveis é encontrada em FRIEDMAN, Milton. The case for
flexible exchange rates. In: Essays in positive Economics. Chicago: University of Chicago Press, 1957.
8 Fluxos de capital incluem compras de ações em outros países e investimentos diretos além de compras de títulos, o ativo que
rende a taxa de juros (r). Assim, outras variáveis que influenciam os retornos esperados de ações e investimentos diretos
poderiam ser incluídos em uma especificação mais complexa da função fluxo de capital.
9 Citado em KENEN, Peter. Macroeconomic theory and policy: how the closed economy was opened. In: JONES, Ronald;
KENEN, Peter (Orgs.). Handbook of international Economics. Amsterdã: North Holland, 1985. v. 2, p. 625-677.
10 A taxa de câmbio entre o euro e o dólar é discutida em Perspectivas 14.3.
11 Os países do G5 são Estados Unidos, Japão, Alemanha, França e Reino Unido.
12 Veja Remarks by governor Ben Bernanke, the global saving glut and the U. S. current account deficit. Board of Governors of
the Federal Reserve System, Mar. 2005.
1 O modelo recebe esse nome por causa de seus desenvolvedores, Robert Mundell e Marcus Fleming. Veja MUNDELL, Robert.
Capital mobility and stabilization policy under fixed and flexible exchange rates. Canadian Journal of Economics and
Political Science, 29, p. 475-485, Nov. 1963; e FLEMING, Marcus. Domestic financial policies under fixed and under floating
exchange rates. Staff Papers. Fundo Monetário Internacional, 9, p. 369-379, Nov. 1962.
2 Transferências privadas a estrangeiros também deveriam aparecer no lado esquerdo da equação (15.5). Vamos ignorar esse
item menor em nosso modelo.
3 Repare também que não incluímos a taxa de juros externa na função demanda por moeda. Consideramos que, embora os
investidores escolham entre títulos estrangeiros ou locais com base em seus respectivos rendimentos, a demanda por moeda
depende apenas da taxa de juros interna.
4 Deve-se observar aqui que não estamos levando em conta possíveis expectativas de movimentos futuros nas taxas de câmbio.
Como foi explicado no Capítulo 14, mudanças esperadas nas taxas de câmbio são outro fator, além dos diferenciais de taxas de
juros, que influencia a escolha entre ativos internos e externos.
5 BRYANT, Ralph. International financial intermediation. Washington: The Brookings Institution, 1987. p. 86.
1 Outro pequeno item incluído em M1 são os cheques de viagem. Nossa discussão aqui ignora vários pequenos itens nas
diferentes definições de moeda. Para definições detalhadas, veja a Tabela 16.1.
2 Saldos em contas de poupança comuns são, na prática, disponíveis a vista. Depósitos a prazo, porém, são feitos por um
período de tempo especificado (por exemplo, 1 ano), e podem prever penalidades para saques antecipados.
3 Em nossos modelos, capital referia-se a bens de capital físicos. Aqui, o termo mercado de capitais refere-se a um subconjunto
de mercados financeiros.
4 Daqui em diante, deixaremos de lado o adjetivo legais ao nos referirmos aos ativos de reservas que atendem às exigências de
reservas bancárias.
5 Os empréstimos tomados no mercado de fundos federais são incluídos no item “Outros passivos e capital”, na Tabela 16.6.
1 Estamos supondo que o Banco Central não quer que a renda caia abaixo de Y* porque isso causaria desemprego excessivo.
Níveis de renda acima de Y* são indesejáveis por causa de suas consequências inflacionárias futuras.
2 Uma análise mais antiga e importante dos méritos relativos de ter a taxa de juros ou um agregado monetário como meta sob
condições de incerteza é POOLE, William. Optimal choice of monetary policy instruments in a simple stochastic macro
model. Quarterly Journal of Economics, 84, p. 197-216, May 1970.
3 Um choque que reduza (ou aumente) a demanda por moeda significa um deslocamento da função demanda por moeda que
reduz (ou aumenta) a quantidade de moeda demandada para um dado nível de renda e de taxa de juros. A maneira como isso
desloca a curva LM é explicada na Seção 6.2.
4 Para uma descrição desses movimentos em direção a mais transparência na política do Federal Reserve, veja POOLE,
William. How predictable is U. S. macroeconomic policy? Federal Reserve Bank of Saint Louis Review, 87, p. 659-668, Nov.-
Dez. 2006.
5 Por breves períodos, uma taxa de juros nominal negativa é às vezes observada para títulos do Tesouro americanos de prazo
muito curto. Isso ocorre quando os investidores estão à procura de um lugar seguro para seus fundos em um ambiente geral de
taxas de juros de curto prazo muito baixas.
6 FISCHER, Stanley. Rules versus discretion in monetary policy. In: FRIEDMAN, Benjamin M.; HAHN, Frank H. (Orgs.).
Handbook in monetary economics. Amsterdã: North Holland, 1990. v. 2, p. 1169-1170.
7 Dois artigos importantes sobre o problema da inconsistência temporal são KYDLAND, Finn; PRESCOTT, Edward. Rules
versus discretion: the time inconsistency problem. Journal of Political Economy, 85, p. 473-491, June 1977; BARRO, Robert
J.; GORDON, David B. Rules, discretion and reputation in a model of monetary policy. Journal of Monetary Economics, 12,
p. 101-121, July 1983.
8 BLINDER, Alan. What central bankers could learn from academics and vice versa. Journal of Economic Perspectives, 11, p.
13, Spring 1997.
1 De maneira mais geral, o termo escolha pública é definido como a aplicação da análise econômica teórica da escolha a
tomadas de decisões políticas. Veja, por exemplo, MUELLER, Dennis. Public choice II. Cambridge: Cambridge University
Press, 1989.
2 TULLOCK, Gordon. The vote motive. London: Institute of Economic Affairs, 1976.
3 Veja, por exemplo, BUCHANAN, James M.; WAGNER, Richard E. Democracy in deficit. New York: Academic Press, 1977;
TUFTE, Edward R. Political control of the economy. Princeton: Princeton University Press, 1978.
4 TUFTE, 1978, p. 5.
5 PERLMAN, Morris. Party politics and bureaucracy in economic policy. In: TULLOCK, 1976, p. 69.
6 Em termos das equações (18.1) e (18.3), esses autores da visão da escolha pública afirmam que, embora a inflação de fato
cause uma perda significativa de bem-estar social [a2 na equação (18.1) pode ser grande], ela não resulta em muita perda de
votos [c2 é pequeno na equação (18.3)]. Portanto, o formulador de políticas maximizador de votos não reage a ela.
7 BUCHANAN; WAGNER, 1977, p. 93-94.
8 Uma das primeiras contribuições à teoria do partidarismo foi HIBBS, Douglas. Political parties and macroeconomic policy.
The American Political Science Review, 71, p. 1467-1487, Dez. 1977. Veja também HAVRILESKY, Thomas. A partisan
theory of fiscal and monetary regimes. Journal of Money, Credit and Banking, 19, p. 308-325, Aug. 1987; ALESINA,
Alberto. Macroeconomics and politics. NBER Macroeconomics Annual, p. 13-61,1988.
9 Sobre essas questões, veja SMITH, Adam; WAGNER, Richard E.; YANDLE, Bruce. A theory of entangled political
economy, with application to TARP and NRA. Public Choice (a ser publicado, 2012).
10 Aqui e posteriormente, o termo gastos do governo refere-se apenas a compras de bens e serviços pelo governo federal, com os
pagamentos de transferências incluídos na variável do imposto líquido.
11 HELLER, Walter. Kermit Gordon. Brookings Papers on Economic Activity, 2, p. 283-287, 1976.
12 CARLSON, Keith. Estimates of the high-employment budget 1947-67. Federal Reserve Bank of St. Louis Review, 49, p. 11,
June 1967.
1 Exposições da posição do lado da oferta podem ser encontradas em GILDER, George. Wealth and poverty. New York: Basic
Books, 1981, especialmente os Capítulos 4, 15 e 16; ROBERTS, Paul Craig. The supply-side revolution. Cambridge: Harvard
University Press, 1983; LAFFER, Arthur B.; SEYMOUR, Jan P. (Orgs.). The Economics of the tax revolt: a reader. New
York: Harcourt Brace Jovanovich, 1979; MEYER, Laurence (Org.). The supply-side effects of economic policy. St. Louis:
Center for the Study of American Business, 1981. As duas últimas fontes contêm também críticas a posições do lado da oferta.
Duas análises úteis da economia do lado da oferta são BARTH, James. The Reagan program for economic recovery: economic
rationale (a primer on supply-side Economics). Federal Reserve Bank of Atlanta Review, p. 4-14, Sept. 1981; TATOM, John.
We are all supply-siders now! Federal Reserve Bank of St. Louis Review, 63, p. 18-30, May 1981. Avaliações mais recentes
são FELDSTEIN, Martin. Supply-side Economics: old truths and new claims. American Economic Review, 76, p. 26-30, May
1986; CHIMERINE, Lawrence; YOUNG, Richard. Economic surprises and messages of the 1980s. American Economic
Review, 76, p. 31-36, May 1986; KRUGMAN, Paul. Peddling prosperity. New York: Norton, 2000. Capítulos 1–3;
BARTLETT, Bruce. Imposter: how George W. Bush bankrupted America and betrayed the Reagan legacy. New York:
Doubleday, 2006.
2 Sobre essa questão e as discutidas adiante, é possível distinguir entre uma posição do lado da oferta moderada e uma posição
extrema. Em relação a muitas dessas questões, os economistas moderados do lado da oferta diferem dos keynesianos apenas
por atribuir mais importância a fatores do lado da oferta. As posições do lado da oferta mais extremas praticamente ignoram o
lado da demanda. Martin Feldstein, presidente do Council of Economic Advisors no governo Reagan, por exemplo, cujo
trabalho sobre incentivos ao investimento será descrito adiante, é um economista que enfatizou a importância de variáveis do
lado da oferta, mas algumas vezes esteve em desacordo com os defensores da posição extrema.
3 Veja FELDSTEIN, Martin: SUMMERS, Lawrence. Inflation and the taxation of capital income in the corporate sector.
National Tax Journal, 32, p. 445-470, Dec. 1979.
4 Veja TOBIN, James. Stabilization policy ten years after. Brookings Papers on Economic Activity, 1, p. 19-71, 1980.
1 Veja SOLOW, Robert. Technical change and the aggregate production function. Review of Economics and Statistics, 39, p.
312-320, Aug. 1957. Também é relevante para esta nossa discussão o livro de SOLOW, R. Growth theory. 2nd ed. London:
Oxford University Press, 2000.
2 Com rendimentos constantes de escala, o produto por trabalhador (Y/N) não depende do nível de produto. Portanto, sendo a
tecnologia fixa, se fixarmos a razão capital/trabalho (K/N), não há nenhuma outra variável que afete o produto por trabalhador;
assim, Y/N também ficará fixo.
3 Repare que esse pressuposto de rendimentos decrescentes em relação a aumentos na intensidade do capital não está em
discordância com o pressuposto anterior de que o processo de produção exibe rendimentos constantes de escala. Este último
pressuposto refere-se ao efeito de aumentos proporcionais em todos os fatores de produção. Os rendimentos decrescentes em
relação a aumentos na intensidade do capital referem-se aos efeitos de aumentos na quantidade de um único fator (capital) por
unidade do outro fator (trabalho).
4 ROMER, Paul. Capital accumulation and long-run growth. In: BARRO, Robert J. (Org.). Modern business cycle theory.
Cambridge: Harvard University Press, 1989. p. 51. Lembre-se que estamos discutindo aqui o longo prazo. Na seção anterior,
vimos que a taxa de poupança podia afetar a taxa de crescimento, talvez até por um período de tempo significativo.
Certamente existem políticas econômicas governamentais que podem influenciar a poupança. Apenas a taxa de crescimento de
equilíbrio de longo prazo era exógena.
5 AGION, Philippe; HOWITT, Peter. Endogenous growth theory. Cambridge: MIT Press, 1998. p. 1.
6 Ver BARRO, Robert J.; SALA-I-MARTIN, Xavier. Convergence. Journal of Political Economy, 100, p. 223-251, Apr. 1992.
7 Veja, por exemplo, BARRO, Robert J.; SALA-I-MARTIN, Xavier. Economic growth. 2nd ed. New York: McGraw-Hill, 2004.
Cap. 12.
8 Sobre infraestrutura social e questões relacionadas, ver ROMER, David. Advanced Macroeconomics. 3rd ed. New York,
McGraw-Hill, 2002. Cap. 3.
9 LUCAS JR., Robert. On the mechanics of economic development. Journal of Monetary Economics, 22, p. 3-42, July 1988.

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