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Introdução.
1
CRIMES against Humanity and Civilization – The Genocide of the Armenians. Brookline: Facing History
and Ourselves, 2004. Resource Book; CHARNY, I. W. Innocent denials of know genocides: a further
contribution to a psychology of denial of genocide. Human Rights Review, vol. 1, n. 3, p. 15-39,
abril/junho de 2002; _____. A classification of denial of the Holocaust and other genocides. Journal of
Genocide Research, vol. 5, n.1, p. 11-31, 2003;______; FROMER, Daphna. Denying the Armenian
Genocide: patterns of thinking as defence-mechanism. Patterns of Prejudice, vol. 32, n.1, 1998, pp. 39-
49; CHURCHILL, W. Denials of the Holocaust. In: CHARNY, I. (Org). Encyclopedia of Genocide. Vol I. Santa
Bárbara: Abc-Clio, 1999, p. 167-174. SMITH, R. Denial of the Armenian Genocide. In: CHARNY, I.
Encyclopedia of Genocide. Vol. 1. Santa Barbara: ABC-Clio, 1999, pp. 161-165; DADRIAN, Vahakn. The
Key Elements int the Turkish Denial of The Armenian Genocide. Cambridge: The Zoryan Institute for
Contemporary Armenian Research and Documentation, 1999; HOVANNISIAN, R. (Org.). Looking
backward, moving forward: confronting the Armenian genocide. New Brunswick: Transaction Books,
231-262; ______ (Org.) The Armenian Genocide. History, Politics, Ethics. Londres: Macmillan, 1992;
______. (Org.) Remembrance and Denial: The case of the Armenian Genocide. Detroit: Wayne State
University Press, 1999. ______. Denial: The Armenian Genocide as a prototype. In: ROTH, J.K.;
MAXWELL, E.; LEVY, M.; WHITWORTH, W. (Orgs.). Remembering for the future. The Holocaust in an Age
of Genocide. Vol. 1. Nova York: Palgrave, 2001, pp. 796-812.
constrangimentos políticos sistêmicos, questões materiais e territoriais etc), i.e., por
meio dos produtos dos cálculos das relações conjunturais entre estruturas e agências2.
5
C.f. exemplo: FRESCO, N. Les redresseurs de morts. Chambres à gaz: la bonne nouvelle. Comment on
révise l’histoire. Les Temps Moderns, n. 407, Jun. de 1980; ______. Les “revisionists negateurs de la
Shoah. Anti-Rev [Online]. Disponível em < http://www.anti-rev.org/textes/Fresco90a/> , acessado pela
última vez em 25/10/2018; ______. Rassiner, Paul. In: Maiton, J. (Org.). Dictionaire biografphique du
mouvement ouvrier français. Paris: Les Édtions Ouvrières, 1991; VIDAL-NAQUET, P. Os assassinos da
Memória: Um Eichmann de Papel e outros ensaios sobre o revisionismo. Campinas: Papirus, 1988.
6
Dixon fornece uma escala que organiza os conteúdos possíveis dos discursos pós-genocídio em dois
grupos que seguem. Um deles é o grupo (A) dos conteúdos descritivos, em que se sucedem negação,
mitificação, reconhecimento do evento, pelo reconhecimento do dano/declaração de arrependimento,
pela admissão da responsabilidade. O outro é grupo (B) dos conteúdos reparadores, que incluem a
desculpa, a reparação e a comemoração. C.f. Dixon, 2018, p. 14-19.
7
C.f., por exemplo, HOVANISSIAN, 2001.
8
DIXON, pp. 21-31
que são dados como móveis os regimes de sobreposição desses e dos outros conteúdos
que foram as narrativas oficiais na relação entre agências e estruturas9.
9
Idem; Ibidem.
10
HOVANISSIAN, 2011, DADRIAN, 1999.
11
DIXON, 2018, p. 15 ss.; _______. Defending the Nation? Maintaining Turkey’s Narrative of the
Armenian Genocide. South European Society and Politics, vol. 15, n. 3, Set. 2010, pp. 467-485.
consequências interpretativas negativas. Uma dessas formas de pensamento finalista se
manifesta na crença especializada relativamente comum de os fenômenos do mundo
social acontecem necessariamente segundo um fim, uma finalidade, um destino etc. que,
não raro, é elaborado como pressuposto e não descoberto como resultado do trabalho de
pesquisa. A outra variedade desse pensamento finalista comum a essas interpretações é
aquela que atualiza uma versão genérica do individualismo metodológico, segundo a
qual os agentes individuais, mesmo esses coletivos mas individualmente abstratos como
“o Estado”, calculam suas ações racionalmente e agem estrategicamente perseguindo
fins igualmente estabelecidos desde o início12.
12
BOURDIEU, P. O oficial e o privado. In:______. Sobre o Estado: Cursos no College de France (1989-
1992). São Paulo: Cia. Das Letras, 2014, p. 190.
13
sentido entre seus leitores que lhes dispensasse do trabalho de descrição. De todo, modo
trata-se aqui da combinação eclética, para não dizer irrefletida, de uma teoria da
ideologia como um conjunto universal de crenças irracionais com uma teoria da
ideologia como falseamento do mundo.
14
VIDAL-NAQUET, 1988.
15
LIPSTADT, D. Denying the Holocaust: the growing assault on truth and memory. Nova York: Plume,
1993; _______. History on Trial: my day in court with a Holocaust denier. Nova York: Harper & Collins,
2004;
16
ATKINS, S. Holocaust Denial as an International Movement. Westport: Praeger, 2009.
negação e os negadores existem apenas em função dos fins quase sempre antevistos de
suas ações e dos efeitos de suas ações.
Com elas, nós sabemos que a mentira sobre o passado tem, na mão dos
negadores, o potencial de transformar o mundo. Mas como ela chega nas mão dos
negadores e é, então dotada desse potencial? Enfim, como a mentira pode ser um
instrumento e um objeto da política? Até agora, as interpretações sobre a negação de
crimes contra a humanidade não ofereceram respostas para este problema. Na verdade,
ofereceram, mas de maneira impressionista, ainda que apresentadas por meio de
raciocínio dedutivo.
Assim, a defesa política da verdade que esses trabalhos realizam por meio
de se seus resultados, até agora se contentou com a demonstração da mentira e com o
“desmascaramento” dos falsários. Penso que essas batalhas pela verdade poderiam
encontrar mais munições se elas levassem em conta e demonstrassem quais e como
sistemas de relações, sistemas de classificações, categorias de percepção, hábitos de
pensamento e de ação informam a produção e a instituição política da mentira por meio
de relações sociais e simbólicas entre sujeitos diferentemente posicionados em relação a
esses processos.
Este trabalho não tem o objetivo de questionar outra vez a falsidade do texto
negacionista, nem no caso do genocídio Armênio, nem no caso do Holocausto. Não se
trata também de suspender os lugares e os papeis da Turquia, para um caso, e da
extrema-direita do pós-guerra, para outro. Trata-se antes, de devolver essas práticas e
sujeitos a seus universos sociais, situá-los em suas conjunturas e processos de
desenvolvimento, e, usando a comparação como um instrumento de controle de dados,
explicar se, como e em que medida eles se assemelham e se diferenciam.
17
Um caso paradigmático é o do julgamento Irving vs. Penguin Books. Sobre isso, c.f.: Lipstadt, 2004;
espaços sociais da negação do Genocídio Armênio? Quais são os do Holocausto? Como
eles se constituíram em relação à negação? Em que e como se eles se assemelham e se
diferenciam nesse processo?
I- Em 1988 apareceu na Turquia uma tradução para o inglês de um livro que havia sido
originalmente publicado em 1950. Tratava-se The Armenians in History and the History
of the Armenian Question (Os armênios na história e a história da Questão Armênia,
sem tradução para o português), baseada na segunda e expandida edição de Tarihte
Ermeniler ve Ermeni meselesi, de Esat Uras, em 198718.
University Press, 2011, p. 21; GOÇEK, F.M. Reading the Genocide: Turkish Historiography on 1915. In:
Idem, pp. 47-49. UNGOR, Ugur Umit. Turkey for the Turks: Demographic Engineering in Eastern Anatolia
1914-1945. In: Ibdem, p. 296; MAMIGONIAN, Marc A. Academic Denial of the Armenian Genocide in
American Scholarship: Denialism as Manufactured Controversy. Genocide Stduies International, n. 9, vol.
1, 2015, pp. 61-82; KALIGIAN, Dirkan. Anatomy of Denial: Manipulating Sources and Manufacturing a
Rebellion. Genocide Studies International, n. 8, vol. 2, 2014, pp. 208-223. GURPINAR, Dogan. The
Manufacturing of denial: the making of the Turkish ‘official thesis’ on the Armenian Genocide Between
1974 and 1990. Journal of Balkan and Near Eeastern Studies, vol. 18, n. 3, 2016, pp. 217-240.; ARAI,
Masami. Turkish Nationalism in the Young Turk Era. Lieden: E.J. Brill, 1992, pp. 1-6.
26
Idem.
27
UNGOR, 2011, p. 296; GÜRPINAR, 2016, p. 219-220.
28
C.f.: KALIGMAN, 2014, p. 210; GÜRPINAR, 2016, p. 219.
De todo modo, ainda que as circunstâncias de produção de Tarihte
Ermeniler... sejam variáveis importantes e aqui estejam elaboradas como resultado de
pensamento dedutivo, o que interessa nesta análise é o que significa e o que se realiza
por meio da tradução preparada por Artemel e Duran. Devo demonstrar que The
Armenians in History... é um dos resultados de uma das etapas da mobilização de
esforços institucionais através do recrutamento de intelectuais e burocratas para a
ressignificação pública do passado turco-otomano de maneira ampla. Trata-se de um
processo polissêmico e polivalente, que se direciona desde à restauração de
monumentos e à promoção de turismo histórico até a organização e de arquivos. The
Armenians in History... é um capítulo desse processo. E não de qualquer forma: ele foi
produzido e oferecido como um meio de mitigar e de responder negativamente as
demandas igualmente institucionalizadas de agentes da diáspora armênia por
reconhecimento e reparação.
Ainda nessa parte, a partir dessas histórias e contra elas, são derivados
dados sobre a geografia, sobre a população, sobre a etnologia, sobre a língua, sobre a
literatura, sobre as crenças e, entre outras coisas, sobre a política armênia entre a
antiguidade e o período pré-otomano. Com a apresentação desses dados, demonstra-se a
ideia que “os armênios” seriam essa unidade singular e negativa que começou a ser
elaborada com o catálogo dos mitos armênios anteriormente listados31.
Assim, “os armênios” aparecem como se não tivessem uma história, como
se não tivessem um território originário e, por consequência, como se jamais pudessem
formar uma nação legítima. A verdadeira história “dos armênios”, de acordo com a
tradução do livro de Uras, seria a de um povo errante, indistinto, indefinido, sem uma
cultura, sem uma raça, sem uma língua e sem uma população concentrada. Por isso
mesmo, a história “dos armênios” teria sido desde sempre a história de objetos de
dominação, nunca a de sujeitos autônomos de um destino unitário32.
do texto em sua integralidade, refiro-me a esta paginação. Esta edição conta ainda com uma longa
introdução em que se apresenta uma história do que seria o terrorismo armênio. A edição digital
transformada em fonte para esta pesquisa foi acessada por meio de um repositório digital do
Departamento de História da Universidade de Louisville e não contém essa parte do texto, apenas a o
prefácio e o texto de Uras traduzido d. Segundo fichas catalográficas disponíveis em bibliotecas onde
existem depositados o volume integral da segunda edição (URAS, 1987) e/ou da tradução
Ela é composta pelo prefácio do autor e pelo texto original de Uras traduzido da segunda edição (Uras,
1987), sem a introdução que, em fichas catalográficas . Dessa forma, o livro pode ser acessado em <
http://louisville.edu/a-s/history/turks/the_armenians_in_history.pdf>. Por limitações linguísticas, por
incapacidade de acesso à edição integral impressa e por adequação ao problema, apenas esta edição
tradução é fonte desta pesquisa.
30
Idem., pp.,225-308.
31
Idem., pp. 309-366.
32
Ibidem.
partes subsequentes de The Armenians in History... Ela é contada, sobretudo, por meio
de transcrições de documentos diversos e especialmente distribuídos. Textos legais,
correspondências diplomáticas, documentos administrativos, programas políticos etc.,
são dispostos e organizados de modo a dar sentido a uma cadeia de desenvolvimentos.
Além disso, eles são dados a ler como se fossem autossuficientes na descrição dos fatos
da história da “Questão Armênia”, cabendo ao autor, em muitos dos casos, apenas
comentários contextualizadores.
33
Idem, pp. 369-829.
associações nacionalistas e das elites armênias começam a se armar, a se organizar e a
recrutar mais adeptos entre as províncias otomanas34.
sobretudo do Reino Unido, que tinha interesses geopolíticos com o desmonte do Império Otomano. Por
isso, também, elas produziram provas, julgaram responsáveis e condenaram alguns militares e
burocratas do Comitê para União e Progresso pelos crimes contra populações armênias-otomanas, sem
produzir feitos retributivos significativos. Logo depois, com a instauração da República Turca, a própria
instituição das cortes marciais e os resultados dos processos funcionaram como um dos marcos
genéticos do novo estado. Sobre os processos, c.f: DADRIAN, Vahakn N.; AKÇAM, Taner. Judegment at
Istanbul: The Armenian Genocide Trials. Nova York; Oxford: Berghan Books, 2001; BALINT, Jennifer. The
Ottoman Stete Special Military Tribunal for the Genocide of the Armenians: ‘Doing Government
Business’. In: HELLER, Kevin Jon; SIMPSON, Gerry. The Hidden Histories of War Crimes Trials. Nova York:
Oxford University Press, 2013, pp. 77-100. Cap. 4.
38
Idem., pp. 855 -903.
39
Idem, pp. 879-883, 918, 943-954, 958.
armênios aparecem como justificativa e propaganda anti-turca para a criação de um
estado armênio autônomo no território Otomano, entre a Anatólia e a Cicília40.
Mas essa não é a única história que se conta aqui. Na verdade, por meio dela
se conta outra. Considerando o conteúdo das cinco partes do livro, o que se lê é uma
história “dos turcos”, ou, o que dá no mesmo, da República Turca, cuja instituição
coincide não só com o marco final e resoluto da história que se constrói e com o fim do
livro, mas com um destino: com a realização de um devir que se materializa com a
instituição do estado Turco como continuidade regeneradora do Império Otomano41.
40
Idem. pp. 924-925, 943-949, 951-958, 965-970, 976-977, 992-999.
41
Essa imagem ambígua do passado otomano em relação à república era regular e instituída entre
círculos nacionalistas do período. C.f.: GÜRPINAR, Dogan. From ‘renewal and regeneration’ to ‘decline
and collapse’: the rise and fall of Tanzimat (1830-1950). In:______. Ottoman/Turkish visions of the
Nation, 1980-1950. Nova York: Palgrave Macmillan, 2013, pp. 164-190.
42
Sobre essa definição negativa do nacionalismo turco kemalista em relação às minorias étnicas e
religiosas na Anatólia, c.f.: CAGAPTAY, Soner. Islam, Secularism and Nationalism in Modern Turkey: who
is a Turk. Nova York: Routledge, 2006.
Não há indícios de que Uras tenha sido comissionado para produzir o material
original de The Armenians in History. Ele certamente era portador de títulos e posições
que o autorizavam à empreitada. Ele havia participado da execução do genocídio como
alto burocrata do império e era bem integrado às elites kemalistas. Mas não é a partir
dessas posições que Uras, por meio de sua tradutora, conta essa história43.
Aqui ele não é oferecido como testemunha, nem como o propositor de uma
interpretação alternativa para os fatos da “Questão Armênia”. O que a tradução faz com
o material de Uras depende do recurso ao discurso neutro e descritivo, referencial e
referenciado, da seleção de documentos que ele transcreve e organiza, da forma como
esses documentos integram o discurso, da ordem retrospectiva dos fatos como cadeia de
causas e consequências, etc. Enfim, a “Questão Armênia” é tratada aqui por um sujeito
que recorre e mobiliza a retórica especializada do cientista político nacionalista, não a
do burocrata, menos ainda a do criminoso evasor.
43
C.f.: GOÇEK, F.M. Reconstructing the Turkish Historiography on the Armenian Massacres and Deaths
of 1915. In: HOVANNISIAN, R. G. (Org.) Confronting the Armenian Genocide: loocking backward, moving
forward. New Brunswick; Londres: Transaction Publishers, 2003, p. 220;
44
Refiro-me a trabalhos que tratam do livro original de Uras como uma espécie de cânone natural do
qual derivam os tropos da negação do genocídio armênio. C.f., por exemplo: GÜRPINAR, 2016; GOÇEK,
2011; BLOXHAN, 2005, p. 213; MATOSSIAN, Bedross Der. Venturing into the Minefield: Turkish Liberal
Historiography and the Armenian Genocide. In:______. HOVANNISIAN, R. (Org.) The Armenian
Genocide: cultural and ethical legacies. New Brunswick: Transaction, 2007, pp. 369-388; KALIGIAN, 2014.
imputar responsabilidade do que para marcar, pelo menos discursiva e
institucionalmente, uma ruptura profunda entre o Império Otomano e a república
kemalista dos primeiros anos. No período kemalista, essa ruptura entre o
antigo/decadente/cosmopolita do império e o moderno/ /nacional funcionou como um
princípio de legitimidade novo estado etnicamente unificado e definido45.
Essas distinções que a ruptura supõe foram, dessa forma, uma das condições
para que membros das elites otomanas ligadas ao CUP pudessem ser incorporados como
convertidos ao novo regime46 – e esse sim parece ter sido o caso de Uras. Também por
meio dessa ruptura, pelo menos até meados de 1930, o passado otomano deixou de
existir, e, com ele, o dos armênios e de outras minorias. Eles só voltariam a aparecer
depois da morte de Ataturk, quando começou a haver algum interesse pela história do
império e essa história passou a ser também uma história nacional, uma história turca,
dos turcos – uma história da qual, de modos diferentes, o livro de Uras e sua tradução
são exemplares47.
De todo modo, e não por acaso, os eventos de 1915-16 não existiam nessa
história como o massacre e deportação forçada das populações armênias do território
otomano. Em lugar nenhum eles existiam como crimes ou violações contra os quais
alguém pudesse se defender, mesmo que por antecipação. E mais uma vez, essa
ausência não é um não dito. Os crimes simplesmente não são percebidos, elaborados e
dados a ver como crimes.
45
C.f.: notas 32 e 36. Mais precisamente: DADRIAN; AKÇAN, 2001, pp. 1-2, 102-107.
46
Idem.
47
48
C.f., por exemplo: STEEL, Danie. Genocide on Fleet Street: the Armenian genocide in the Britsh press,
1915-1918. Dissertação (BA Honours in History). Departamento de História, Universidade de Caterbury.
Canterbury, 2016, 44 pp.; CHABOT, J.; GODIN, R. KAPPLER, S.; KASPARIAN, S. Introduction:
Representations of the Armenian Genocide in the Mass Media. In: ______; ______; ______; ______;
(Org.) Mass Media and the Genocide of the Armenians – one hundred years of uncertain
representantion. Nova York: Palgrave, 2016, pp. 1-15; BECKER, A; WINTER, J. Génocide arménien et les
reaction sw l’opinion internationale. In: HORNE, J (Org.) Vers la Guerre Totale. Le Tournant de 1914-
1915. Paris, Tallandier, 2016, pp. 291-313. BALAKIAN, Peter. The Burning Tigris – The Armenian
Genocide and the America’s response. Nova York: Harper & Collins, 2007, pp. 266-272;
humanidade e à civilização” ainda em 1915, durante a I Guerra Mundial, quando a
categoria jurídica de crimes contra a humanidade ainda não existia como tal49.
Nessas situações que incluem também uma série de relações mais ou menos
tensas com agentes de governos de estados que se formaram com o fim do Império
Otomano, não há registro de nenhuma demanda pública sobre a Turquia em relação aos
crimes dos membros do governo da Comissão para União e Progresso contra
populações armênias ou contra outras minorias otomanas56.Aliás, mesmo tendo passado
a integrar a Liga das Nações como membro em 1932, vale indicar que, pelo menos até a
década de 1950, a Turquia foi objeto de um vigoroso processo de secularização e
homogeneização étnica, executado, inclusive, por meio de políticas públicas de
assimilação forçada de minorias étnicas e religiosas, islâmicas ou não57.
55
C.f.:KAZEMZADEH, 1951; ORAN, B.; AKDEVELIOGLU, A.; ALPKAYA, G. et. al. Turkish Foreing Policy,
1916-2006 – Facts and analyses with documents. Salt Lake City: The University of Utah Press, 2010, pp.
143-224.
56
ORAN et. al.,2010, pp. 61-126.
57
C.f., por exemplo: YLMAZ, Hale. Becoming Turkish: Nationalist reforms and cultural negotiations in
early Republican Turkey, 1923-1945. Syracuse: Syracuse University Press, 2013; TURNAOGLU, Banu. The
formation of Turkish Republicanism. Princeton: Princeton University Press, 2017, pp. 219-243.
e instituições – e não só as relativas aos Direitos Humanos - era um incentivo e uma
marca de sua aproximação ao Bloco Ocidental58.
Outra vez, quando a edição original do livro de Uras foi publicada, não havia e,
portanto, não pesavam sobre a Turquia pressões por reconhecimento, por
responsabilidade ou por reparação. Os massacres e deportações de 1915-1916 eram um
não-evento, ou, para ser exato, não eram massacres. Agora, como na história de Uras,
eles eram desdobramentos da chamada Questão Armênia. De todo modo, o que é mais
importante: esses eventos ainda não eram um genocídio, mesmo quando poderiam ser.
Em 1950 não havia ainda crime para que um perpetrador pudesse justificar ou furtar-se
de suas responsabilidades criminais, mesmo que Uras falasse como um dos sujeitos dos
crimes e não como um agente especializado.
Estima-se, e é mesmo possível que este seja o caso, que o livro de Uras tenha
sido uma resposta às demandas soviéticas por territórios entre a Anatólia e a
Transcaucásia no pós- II Guerra Mundial. Desde 1936, a Turquia detinha o controle da
navegação no Mar Morto e no estreito de Bósforo. Um tratado multilateral, a
Convenção de Montreux sobre o Regime dos Estreitos, regulava a situação. Países
bálticos, França, Reino Unido, Turquia e União Soviética eram signatários da
Convenção. Em 1946, quando venceu a última versão do pacto de não agressão
originalmente celebrado entre Turquia e URSS em 1925, o governo soviético impôs
58
LEMKIN, R. Axis rule in occupied Europe - laws of occupation, analysis of government, proposals for
redress. Clark: Lawbook Exchange, 1943; UNITED Nations. Convention on the prevention and
punishment of the Crime of Genocide. Nova York: Secretary General of United Nations, 1948 (1951);
TAMS, C.; BERSTER, L.; SCHIFFBAUER, B. Convention of the Prevention and Punishment of the Crime of
Genocide – a commentary. Oxford: Beck – Hart- Nomos Publishing, 2014; HENHAM, R. J.; CHALFONT, P.;
BEHRENS, P. (Orgs.). The criminal law of genocide: international, comparative and contextual aspects.
Farnham: Ashgate Publishing, 2007; ORAN, et. al., 2010, pp. 285-297, 311-342.
59
ORAN, et. al. Op. Cit.. Para uma visão panorâmica sobre a condução da política externa turca entre o
bloco ocidental e a URSS, c.f.: também: ULGUL, Murat. The Soviet Influence on Turkish Foreign Policy,
1945-1960. Tese (Master in Arts). The Florida State University, College of Social Sciences, Tallahassee,
2010, pp. 1-19.
como condição para sua renovação a concessão de territórios da Anatólia que teriam
pertencido à Geórgia e à Armênia. Esses territórios permitiriam à União Soviética
acesso ao Mar Morto e ao Mediterrâneo – ambições territoriais que existiam de formas
diferentes desde o século XVIII -, além da alocação de armênios da diáspora que
haviam imigrado para a Armênia Soviética.
Entretanto, não parece ser esse o caso, ainda que os temas da insurreição e
da conspiração sejam recorrentes e ainda que, em ambos os casos, a visão “d(os)
armênios” como um unidade singular e negativa seja informada por um princípio
nacionalista e particularista.