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TÉCNICA
FARMACÊUTICA E
FARMÁCIA GALÉNICA

I Volume

4- Edição
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Preâmbulo

Circunstâncias várias concorreram para que fosse ganhando corpo a ideia de escrever este
livro sobre Técnica Farmacêutica e Farmácia Galénica.
E como era por demais sensível a falta de um ic\lo no nosso próprio idioma sobre estas
disciplinas basilares do curriculum cios estudos farmacêuticos, não quisemos esquivar-nos, uma
vez equacionada a possibilidade da sua publicarão, a tentar converter em realidade um tão
aliciante projecto.
Por is.so, assegurada a sua edição pêlos competentes serviços da benemérita Fundação
Calouste Gulbenkian, lançámo-nos. entusiasticamente, na realizarão da tarefa que nos
propuséramos levar a cabo. guiados pela ideia de sermos tileis aos estudantes e aos nossos
colegas.
No entanto, se bem que ao iniciarmos a feitura deste livro tivéssetnos a consciência das
dificuldades com que iríamos deparar, a verdade é que elas se revelaram, à medida que
prosseguia o trabalho, bem custosas de tornear.
De facto, os assuntos relacionados com a Técnica Farmacêutica e a Farmácia Galénica são
hoje Ião vastos e multiformes que se tornou, em certos casos, extremamente difícil concatená-los
de modo a dar-lhes uma forma harmoniosa e equilibrada.
Poderá ta/vê: parecer que a obra agora apresentada se In um tatuo extensa e excessivamente
pormenorizada em certos capítulos. A razão disso filia-se, porem, f i o carácter que pretendemos
emprestar a este livro, que foi escrito com a dupla finalidade de servir de texto a estudantes e
poder, simultaneamente, interessar aos pós-gradtiados.
Exactamente por causa da sua vastidão e variedade dos tópicos nele tratados, admitimos,
francamente, que este livro não fera saído tão perfeito quanto desejávamos que ele se
apresentasse. Por isso, .serão bem acolhidas todas as críticas e sugestões tendentes a aperfeiçoá-
lo, se algum dia viermos a ter oportunidade para o fazer.
É-m>s particularmente graio reconhecer, neste momento, que um dos principais motivos que
nos levou a escrever este manual foi o caloroso incitamento que alguns categorizados colegas nos
dispensaram, fcsie fado contribuiu para que nunca nos sentíssemos desamparados e se não fosse os
estímulos deles recebidos, a ajuda que nos
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deram e os sábios conselhos que nos prodigalizaram talvez não tivéssemos »hegado ao fim. E se
apesar de tudo alguma deficiência houver que apontar nas páginas que se seguem, a culpa é
exclusivamente nossa, que não soubemos apreender convenientemente aquilo que outros nos
transmitiram correctamente.
Resta-nos agradecer a todos quantos directa ou indirectamente concorreram, de algum modo,
para tornar possível a concretização desta obra. Um imperativo de consciência impõe-nos, contudo,
que individualizemos algums agradecimentos.
Assim, confessamo-nos particularmente gratos ao E\mo. Senhor Professor Dr. José Vale
Serrano, que gentilmente se dignou discutir alguns capítulos deste livro e cujas sugestões e elevado
espírito crítico muito contribuíram para o melhorar em vários aspectos.
Também ao Exmo. Senhor Professor Dr. Carlos Ramalhào desejamos agradecer o ter
amavelmente acedido a apreciar o capítulo sobre Esterilização.
Aos nossos colegas Exmos. Senhores Doutores Aluísio Marques Leal, Alfredo do Amaral e
Albuquerque e Alberto Roque da Silva queremos, do mesmo modo, patentear a nossa gratidão pela
prestimosa ajuda que nos dispensaram.
igualmente agradecemos ao Exmo. Senhor Doutor Rui Morgado a sua valiosa colaboração, a
qual, entre outros aspectos, nos foi particularmente útil na compilação e ordenação das gravuras
que ilustram o texto.
E também com o maior prazer que registamos a amável anuência de Wulkex ao pedido para
que nos fosse permitida a utilização de várias gravuras do seu catálogo de instrumentos de vidro
para laboratório, o mesmo acontecendo com a firma Emílio de Azevedo Campos, Lda., que com a
melhor vontade nos cedeu fotografias de alguns aparelhos de marcas por si representadas.
E porque os últimos não são, necessariamente, os menos importantes, queremos terminar
expressando o nosso reconhecido agradecimento à Fundação Calousle Gulbcn-kian, sem cujo
decisivo apoio este livro talvez nunca viesse a ser publicado.

Porto, Setembro de 7967.


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I PARTE

TÉCNICA FARMACÊUTICA
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Operações farmacêuticas de uso geral

Como o seu nome indica, consideram-se neste grupo as operações


incaracterísticas do ponto de vista farmacêutico mas correntemente praticadas em todos os
laboratórios, como a pesagem e a medição de volumes de líquidos .

2.1. PESAGEM

Pode di/,er-se que a pesagem é a operação mais vulgarmente executada na preparação de


formas farmacêuticas. Tanto a teoria da pesagem como a dos instrumentos utilizados para a sua
execução são estudadas, com o devido pormenor, nos cursos de Física, motivo por que nos
dispensamos de lhes fazer aqui qualquer referencia.
Entretanto, lembramos que, por imposição legal, o farmacêutico deve possuir, no seu
laboratório, uma balança de precisão e uma balança ordinária ou de Roberval.

2.1.1. BALANÇAS DE PRECISÃO

As balanças de precisão destinam-se à pesagem rigorosa de substâncias prescritas em


pequenas quantidades c podem ser dos mais variados modelos e sensibilidades utilizando-se hoje
correntemente as balanças monopralo sensíveis a 0,1 mg.
As balanças ordinárias, muitas delas sucessoras da clássica balança de ROBIÏRVAL, são também
de diversos tipos, desde as que utili/.am massas marcadas e possuem um ou dois pratos, até às que
constituem alavancas interfixas de braços desiguais c de dimensões variáveis em que o equilíbrio é
conseguido pelo deslocamento de uma massa de peso fixo. Destinam-se ã pesagem de quantidades
de substâncias que podem oscilar entre algumas fracções do grama e vários kg de peso. A sua
sensibilidade é, na maior parte das vezes, da ordem de 0,1 a 0,2 g
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2.1.2. PESOS

Na maioria dos países vigora o sistema métrico decimal, cuja unidade fundamental é o kg,
com os seus múltiplos e submúltiplos.
Acontece que na Inglaterra e nos Estados Unidos o sistema decimal tem sido facultativo,
ulili/undo-se ainda hoje os pesos usados no comércio em geral ou em Farmácia, designando-se
estes últimos por por pesos, apotecúrios. l ' m a vê/ que lais pesos figuram nos livros sobre
Farmácia Galé nica originários daqueles países, julgamos conveniente indicar a correspondência
dos diversos pesos apotecários e o seu valor em g, a qua l é dada na Tabela I.
Tabela I. Pesos apotecários
/'*.,, Sinthvh Corresporiênci* 1 'ítlor cm <*ráuía

Libra 1ib 12 onças 373,242

On<,a ;1 8 dracmas ^ 1 . 1 00

Dracma 5 3 escrúpulos ï.SKO

Hscrópulo :) 20 grãos 1,2879

Gr:io gr 0.06-48

2.2. MEDIÇÃO DE VOLUMES DE LÍQUIDOS

2.2.1. INSTRUMENTOS UTILIZADOS

A medição do volume de líquidos é outra das operações correntemente praticada nos


laboratórios farmacêuticos e fa/-se u t i l i /a nd u instrumentos de vidro ou plástico, como buretas,
pipetas, provetas, balões volumétricos e copos graduados, os qua i s têm gravada uma escala cuja
unidade fundamental é o ml.
Sempre que seja necessário medir com rigor um determinado volume de li qui do deve
utili/ar-se uma pipeta, que pode apresentar duas modalidades de graduações. Umas apenas
permitem medir o volume que indicam e que pode ser definido a pa r t i r de um traço superior até
escoamento lotai, ou por dois traços entre os quais se limila o volume marcado e que pode ser de l,
2, ,5. IO. 20. 25. 50, 100 ml. Outras apresentam uma graduação em ml com subdivisões em
décimos e até mesmo em centésimos de ml. Assim, é evidente que deve escolher-se o tipo de
pipeta mais apropriado á medição que se pretende efectuar.
Por seu turno, os balões volumétricos destinam-se a preparar soluções de concentração
rigorosa. Diferem dos balões vulgares por apresentarem um colo bastante estreito, onde existe
um círculo gravado a toda a volta que marca o volume assinalado no balão.
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. Há-os de variadíssimas capa-


cidades, desde alguns ml até
l litro e mais.
As provetas servem para medir volumes de líquidos quando tal operação não exija um
rigor extremo. As de menor capacidade são graduadas em 0,1 ml, espaçando-se a
graduação à medida que a sua capacidade aumenta.
Finalmente, os copos graduados, de forma
cónica, são os instrumentos que menor rigor dão na
medição de volumes, dado que a sua parte
superior é sempre bastante larga, o que provoca erros
apreciáveis na lei- tura do volume pretendido. Como já alrás
dissemos a respeito dos pesos, também ainda se
usam hoje as medidas antigas de capacidade na
Inglaterra e nos Estados Unidos, indicando-se na Tabela
Fig. 1 Vários instrumentos usados para a medição
II a sua correspondência
de líquidos
com as medidas decimais.

Tabela II. Correspondência das medidas antigas de capacidade

Correspondem- ia
Medida Símbolo Inglaterra Estados Unidos
Galão C 4,546 l 3,785 1
Pinto O 0,568 l 0.473 1
Onça fluida fl. oz., f 28,4(K) ml 29,570 ml
Dracma fluida fl. dr., f 3,550 ml 3,690 ml
Mínimo m 0,059 ml 0,061 ml

2.2.2. CONTA-GOTAS NORMAL

Acontece que certos medicamentos líquidos, geralmente muito activos, são prescritos
em gotas e não em peso ou em volume. Para contar o número de gotas indicado na
prescrição é costume retirar incompletamente a rolha do frasco que contém o líquido
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e deixá-lo escoar do gargalo, ou utili/ar pequenas pipetas munidas com tetmas de borracha, o
que está longe de constituir um modo rigoroso de executar esla operação.
Qualquer destes processos não origina gotas de peso uniforme, pois tanto este como o volume
da gota dependem de vários factores, como a forma do recipiente donde aquela escoa, a
temperatura, a capilaridade e a densidade do líquido. Deste
modo, corre-se o risco mais que provável de a mesma prescrição,
executada em duas farmácias diferentes, poder apresentar uma
actividade variável se as golas forem contadas por qualquer dos
processos acima indicados, pois só por mero acaso as condições
instrumentais serão as mesmas nos dois laboratórios. Para evitar
esta variabilidade do peso das golas criou-se o conta-gotas normal,
instrumento que t a / parle do equipamento obrigatoriamente
existente em todos os laboratórios farmacêuticos, cujas
características vêm indicadas na Farm Porl. V, V. 1.1.
Como aí se di/, podem ser utili/ados outros contas-gotas
desde que satisfaçam ao seguinte ensaio: 20 gotas de água a
2()±1"C que se escoam em queda livre de um conta-golas
? normal conservado em posição vertical, com um débito de uma
gota por segundo, pesam 1000 -t 50 mg, lendo o conta-gotas
sido lavado cuidadosamente antes do emprego. Com um dado
conla-gotas, executar pelo menos 3 determinações: nenhum
resultado deverá afaslar-se mais de 5 por cento da média das
3 determinações.
Outra das vantagens do conta-goias nornuil é a de permitir determinar pequenas massas
de líquidos sem recorrer ao emprego de uma balança, o que torna esta operação exlrema-J.OU
J,O.) mente simples de executar. Na realidade, uma vê/ que o refe-Fig. 2. Conta-gotas normal r'^°
instrumento permite a obtenção de gotas de peso eons-Dimensões em milímetros (ante. basta
saber-se o número de golas originado por l g de
líquido por este processo. Na Tabela III dá-se o número de
golas correspondente a l g de líquido, medido por um conta-goitis nanuul à temperatura de
15"C. indicando-se também o peso de XX golas do mesmo líquido fornecidas pelo referido
instrumento.
Vejamos como se utili/am, na prática, os valores que figuram na Tabela 111 e, para isso,
suponhamos que pretendíamos usar 0,2 g de tintura de ópio. Conforme está indicado na referida
tabela, LV1 gotas desta tintura pesam I g; logo, por uma simples regra do três. calcula-se que a
0,2 correspondem 1 1 .2 gotas, Basta, portanto, contar XI golas de tintura de ópio, utili/.ando o
conta-goias nonuiíl. para que tenhamos o peso pretendido.
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Tabela III. N.° de gotas correspondente a 1 g e peso de xx gotas dos principais


medicamentos líquidos à temperatura de 15°C (')
A'." de golas corrres- Peso de xx golas
Medicamento pondente a l ,ç em g
Acetato de amónio (solução) 20 1,002
» » etilo 63 0,316
Ácido acético cristal izável, d =1,05 56 0,358
» clorídrico, d = 1,171 21 0,942
» láctico, d = 1,24 39 0,515
» fosfórico, d = 1,349 19 1,032
» sulfúrico, d = 1 ,84 26 0,781
Álcool absoluto 68 0,295
» de 95° 64 0,315
» » 90Ü 61 0,330
» » 80° 57 0.347
» » 70° 56 0,358
» » 60° 53 0,380
Álcool canforado 60 —
Amónia, d = 0,925 25 0,803
Bromofórmio 41 0,487
Clorofórmio 59 0,340
Cloreto férrico (sol.), d =1,260 18 1,091
Creosota, d= 1,085 41 0,487
Elixir paregórico 53 0,375
Essência de anis 42 0,478
» » hortel ã-pi menta 52 0,385
» » terebintina 56 0,358
Éter sulfúrico 93 0.214
Extracto fluido de boldo 38 0,526
» » » bardana 38 0,526
» » » coca 54 0,372
» » » cravagem 54 0,372
» » » grindélia 56 0.357
» » » hamamélia 50 0.4ÍK)
» » » hidraste 59 0,339
» » » viburno 58 0,344
Eucalipto! 53 0,378
l-.au d ano 43 0,468
óleo de cróton 50 0,398
Salicilato de metilo 37 0,537
Solução de adrenalina a l%o 20 1,000
» » digitalina a l%o 50 0,356
» » trinilrina 60 0,333
Tintura de acónito 57 0,350
» » beladona 57 0,35 1
» » dedaleira 52 0,351
» » grindélia 55 0,363
» » noz vómica 57 0,348
» » ópio 56 0,354
Vinho de ipecacuanha 22 —
Vinagre cilílico 26 —
C) Extraído de VEIGA, J. URBANO da, Formulário Oficial e Magistral, 4* Hdição, Lisboa.
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Querendo utilizar os dados indicados na coluna que nos dá o peso corresponde n lê a XX gotas de
medicamenlo, verifica-se, no exemplo apontado, que XX gotas de tintura de ópio pesam 0,354 g. Desle
modo, pelo processo atrás retendo, calcula-se que são precisas XI gotas para se obter 0,2 g de produto.

2.2.3. CORRESPONDÊNCIA ENTRE PESO E VOLUME

Ao executar uma prescrição médica é necessário ter em consideração as densidades dos líquidos que nela
figuram, nunca se devendo, sem prévia correcção, medir um volume quando se indica um peso, ou
inversamente. Assim, por exemplo, se o médico prescrever 10 g de uma tintura e quisermos executar a
prescrição medindo o volume de líquido correspondente àquele peso, teremos de medir 10,75, 11 ou 11,23 ml
conforme a tintura tiver uma densidade de 0,930, 0.910 ou 0,890. respectivamente, sendo esses volumes
calculados pela fórmula:

PV=—
d

Dum modo geral, pode dizer-se que as tinturas têm uma densidade compreendida entre 0,870 e 0,980. e os
extractos fluidos uma densidade que vai desde 1,030 a 1,10 e mais, ao passo que os xaropes são ainda mais
densos: d= 1.30-1,33.
A Tabela IV indica a densidade de alguns líquidos de interesse farmacêutico, podendo, com os dados nela
contidos, fazer-se, sem dificuldade, a conversão de um peso em volume, ou vice-versa, para o que basta
ulili/ar a fórmula acima referida.

Tabela IV. Densidades de vários líquidos a 15°C (')

Produto Densidade
Acetato de etilo 0,900-0,904
» » amónio (sol.) 1,032-1.034
Ácido acético 1,064
» azótico 1,390
» clorídrico l. l H6
» láctico 1.210-1,220
fosfórico 1,660-1,680
» sulturico 1.S30-1.843
» » diluído 1.068

(') Segundo DKNOFL, A., Cours de Pharmacie Pratique. L pág. 34. 1955, Lês Presses, Unívcrsilaires de
Licge.
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2.2.4. MEDIÇÃO DE DOSES DE MEDICAMENTOS

Um medicamento líquido para uso interno, como um xarope, uma poção, etc., raramente é prescrito para ser
administrado de uma só vez. Em regra destina-se a ser ingerido em doses fraccionadas, as quais são, quase sempre,
indicadas na respectiva prescrição. Como não é de esperar que o doente possua em casa os instrumentos de medida
usados nos laboratórios, é bastante corrente usarem-se certos utensílios caseiros, como colheres, cálices ou copos,
na medição das doses das preparações farmacêuticas líquidas.
Deste modo, c da maior conveniência que o farmacêutico conheça a capacidade dos recipientes geralmente
utilizados para esse fim, bem como o peso de medicamento que podem conter, a f i m de ser possível estabelecer, com
certo rigor, a posologia de um medicamento assim adminislrado. Na Tabela V indica-se a capacidade de algumas
dessas medidas mais utilizadas na prática diária, bem como a quantidade, expressa em g, correspondente ao volume
assinalado, para o caso da água, de um xarope e de um óleo.

Tabela V. Medidas usadas na administração de medicamentos líquidos

Volume
Medida Xarope
Colher de café 4,75
» » sobremesa
» » sopa 13,75
Cálice de licor
» >•* vinho licoroso
Copo de vinho
» » água
Chávena de café
» » chá

As capacidades referidas para os diversos tipos de colheres são obtidas enchendo--as bem e rasando, depois, a
superfície do líquido com a lâmina de uma faca. Os volumes indicados são geralmente aceites como mais ou menos
uniformes, mas já o mesmo não acontece no caso dos copos e chávenas. Na realidade, a capacidade destes
recipientes varia de tal modo que não devem ser utilizados na medição de doses de medicamenlos bastante aclivos.
Para minimi/ar este inconveniente, muitos destes medicamentos, hoje de preparação industrial, são acompanhados
de um instrumento de medida próprio que pode consistir numa colher de material plástico ou de um pequeno copo
convenientemente graduado.
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BIBLIOGRAFIA

DENOCL, A., Cours de Pharmaàe Pratique, Lês Presses Universitaires de Liège. 1955, Tomo I. GouwrhiN,
S. W., Metrology, in RF,MINGTON'S Pharniaceutical Sciences. Cap. 9, 8 1 . Marck Puhlishitig Company.
Easlon. U. S. A. 1980.
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Operações farmacêuticas propriamente ditas

As operações farmacêuticas propriamente ditas são todas aquelas que se praticam com o objectivo de
transformar um fármaco numa forma farmacêutica. Se bem que nalguns casos se utilize uma única operação,
acontece, por vezes, que a obtenção de uma forma farmacêutica implica a execução de várias operações
devidamente programadas. Assim, para obtermos um pó a partir de uma droga de natureza vegetal teremos
que a submeter, previamente, a uma série de tratamentos, como a monda, secagem e divisão grosseira, e só
então ela estará apta a ser pulverizada mediante um processo adequado. Além disso, para que o pó a obter
apresente as características de tenuidade requeridas, aquele terá que ser submetido à tamisação.
No exemplo dado verifica-se que algumas das operações citadas precedem a redução da droga a pó, ao
passo que a tamisação só se aplica à droga já dividida. É por este motivo que é costume dividir as operações
farmacêuticas, independentemente da sua natureza, em operações preliminares, operações principais e
operações complementares ou acessórias. Assim, ao fazermos a pulverização de uma droga esta será a
operação principal, enquanto que a monda, a secagem e a divisão grosseira serão operações preliminares,
A tamisação. como é evidente, representará a operação complementar.
Consideradas na generalidade, as operações farmacêuticas propriamente ditas podem dividir-se em dois
grandes grupos: as operações mecânicas e as operações físicas.
Entende-se por operações mecânicas todas aquelas que apenas modificam o aspecto exterior das
drogas, sem, no entanto, alterarem o seu estado físico ou constituição química. Conforme o objectivo a que
conduzem, podem considerar-se dois grupos: Operações de separação e de divisão.
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Operações mecânicas de separação

4.1. SEPARAÇÃO DE CORPOS SÓLIDOS

4.1.1. TRIAGEM OU MONDA

É uma operação mecânica que se pratica para separar as partes inertes ou alteradas que acompanham, por
vezes, as drogas, principalmente as de origem vegetal, ou, ainda, para eliminar as substâncias estranhas
fraudulentamente ou não adicionadas àquelas.
Com a monda pretende-se, por conseguinte, eliminar tudo o que esteja a contaminar uma droga e que
possa fazer baixar a sua actividade farmacológica por um efeito de diluição, quando se trata de produtos
inertes, ou alterar essa actividade no caso de se tratar de produtos dotados de acção farmacodinâmica
própria.
A monda constitui, como é evidente, uma operação preliminar a que devem submeter-se todas as drogas
vegetais antes de as transformar em formas medicamentosas, fazendo-se por vários processos, conforme a
natureza da droga, os quais passamos a descrever.

4.1.1.1. À mão

São várias as drogas cuja monda tem que ser feita utilizando esta técnica. Assim, as amêndoas, utilizadas
na preparação da Emulsão comum, devem ser privadas do respectivo tegumento para que fiquem
completamente brancas e sem a adstringência que os taninos existentes na película que as envolve lhes
comunicam. Para mondar as amêndoas mergulham-se em água aquecida a 60/70°C, deixando-as permanecer aí
durante alguns minutos. Deste modo, o tegumento incha e torna-se flácido, destacando--se, então, com relativa
facilidade, bastando, para tanto, premi-las entre os dedos.
Outras vezes monda-se a droga à mão, separando-a de partes inertes ou de produtos estranhos que lhe
são misturados. Se uma determinada droga é constituída por
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folhas, deverão separar-se e rejeitar-se as dores, frutos ou sementes que as acompanham.


Também é frequente proceder à separação manual de partes de caule misturadas com folhas, de cascas
juntas com lenhos, dos pedúnculos das flores ou das radículas aderentes a certas raízes.
Nalguns casos há necessidade de mondar determinadas drogas utilizando instrumentos cortantes
próprios para lazer uma raspagem. Este processo de monda está, no entanto, ligado à própria produção da
droga e raramente se pratica nos laboratórios farmacêuticos. Estão, neste caso, por exemplo, o alcaçuz, cujas
raízes devem ser privadas do respectivo súber. c a canela, cujas cascas, depois de colhidas, devem ser ras-
padas de modo a eliminar-se toda a zona cortical externa.

4.1.1.2. Por crivo

Este processo de monda é utilizado para eliminar as partículas de terra que aderem às raízes (ruibarbo,
ipecacuanha, valeriana, salsapurrilha, etc.). É executado colocando a droga num crivo ou tamis feito de
arame e tendo malhas bastante largas, ao qual se imprimem sacudidelas bruscas. Deste modo, os fragmentos
de terra destacam-se das raízes e passam alravés da rede do crivo, ficando a droga retida neste.

4.1.1.3. Por ventilação

É ulilizado para separar ceríus matérias muito leves, como poeiras, restos de pedúnculos, glumas,
glumélulas, etc., que acompanham algumas sementes. Para executar este processo de triagem pode colocar-se
a droga num pene iro e expor este ao vento ou a uma corrente de ar proveniente de um compressor ou mesmo
de uma ventoinha, a qual faz voar as partículas aderentes às sementes, ficando estas retidas no peneira
devido à sua elevada densidade.

4.1.1.4. Por lavagem

A monda por lavagem é menos utilizada do que os processos atrás referidos, estando indicada apenas
naqueles casos em que as impurezas que se pretendem eliminar estão de tal modo aderentes à droga que só
uma lavagem consegue arrastá-las.
Assim, aplica-se a lavagem com água para mondar a goma-urábica e algumas sementes utilizadas na
preparação de emulsões, como as amêndoas doces, as sementes de abóbora c outras.
Os folíolos do sene, utili/ados pela sua acção purgativa devido aos antraglucósidos que contêm,
devem ser lavados com álcool para eliminar uma substância resinosa e
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certas antraquinonas sob a forma reduzida neles existentes, as quais provocam cólicas. Para extrair esses
produtos têm sido aconselhados vários processos, todos eles baseados na maceração do seni; c.n álcool de
graduação variável, como, por exemplo, o de KRE-MEL, que utiliza álcool de 50°, e o de MAURIN, que emprega
álcool de 95°.
O sulfato ferroso cristalizado é outra droga que se recomenda mondar por lavagem com álcool, a fim de
eliminar o sesquióxido de ferro e o sulfato férrico formados à superfície dos respectivos cristais c^mo
resultado da acção oxidante do ar.

4.1.2. TAMISAÇÃO

A tamisação é uma operação destinada a separar, mecanicamente, através das malhas de um


tecido apropriado, partículas sólidas com diferentes dimensões.
Os tecidos utilizados na tamisação actuam como uma verdadeira rede, apenas deixando passar
aquelas partículas cujas dimensões sejam, pelo menos, ligeiramente inferiores à abertura das
respectivas malhas e retendo, por outro lado, as de tamanho superior, como a Fig. 3 ilustra. Deste
modo, é a largura das malhas que condiciona a dimensão das partículas que atravessam o tecido e,
assim, conhecida esta largura, poder-se-á estabelecer o tamanho dos grânulos que passarem através
dele.
A tamisação representa, portanto, não só um processo de
separação de corpos sólidos como serve, também, para estabelecer as
dimensões das partículas que constituem os pós, sendo praticada no
campo farmacêutico com esta dupla finalidade.
Umas vezes, a tamisação reveste-se do caracter de operação
principal, como no caso da preparação das polpas, em que se faz uso da
sua característica de processo separativo; outras vezes constitui uma
operação acessória, como na pulverização, em que representa um papel
da maior importância para a determinação da tenuidade e
homogeneidade dos pós.
A tamisação, como operação separativa, conduz, Fig. 3. Diagrama
necessariamente, à obtenção de um resíduo formado por grânulos de representando como
dimensões superiores à abertura das malhas do
tecido tamisante. Quando, porém, esta operação é praticada
acessoriamente a uma pulverização, serve exclusivamente para garantir a uniformidade do tamanho das
partículas resultantes da divisão da droga, e esta terá que ser dividida até que seja lotalmente
tamisada. No primeiro caso faz-se uma tamisação com resíduo e no segundo uma tamisação sem
resíduo, sendo esta a que geralmente se pratica como operação complementar da pulverização.
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4.1.2.1. Tamises
Os instrumentos utilizados para fazer uma tamisação denominam-se tamises e são constituídos
por um aro de diâmetro variável, tendo, geralmente, 15 cm de altura e
apresentando uma das extremidades fechada por um tecido aplicado de
modo a ficar bem tenso. (Fig. 4). Este tecido representa a parte fundamental
do tamis, pois é ele que, em função da abertura das respectivas malhas,
permite a separação das partículas submetidas à lamisação consoante os seus
diâmetros. Os tecidos utilizados na fabricação dos tamises são constituídos

Fig, 4. Tamis simples por fios da mais variada natureza, como ferro galvanizado, latão, aço
inoxidável, seda, crina ou fibras sintéticas,
sendo de notar que tanto a abertura das malhas dos tecidos como a homogeneidade dos pós que
originam dependem do material utilizado.
Assim, os fios de ferro servem para a preparação de tecidos de malhas relativamente largas, usados na
fabricação de tamises que recebem a designação de crivos, e cuja utilização na monda das drogas já
atrás referimos. Por sua vez, as redes de fios de latão originam pós bastante homogéneos, de
tenuidade intermédia, ao passo que os tecidos de seda são os utilizados na fabricação dos tamises de
malhas mais apertadas; os tecidos feitos de crina são irregulares, susceptíveis de se deformarem,
originando, por conseguinte, pós caracterizados por falta de homogeneidade das respectivas
partículas. Na prática farmacêutica usam-se duas espécies de tamises,
denominados, respectivamente, tamises simples e tamises cobertos. Estes
últimos devem ser empregados sempre que as drogas a tamisar sejam irritantes
ou tóxicas e são constituídos de modo a formar um conjunto fechado que evita a
disseminação das partículas na atmosfera, impedindo, assim, que elas entrem
em contacto com os olhos, o nariz e a boca do operador, panes do organismo
onde a sua acção se faz sentir imediatamente. Como se pode ver na Fig. 5, um
tamis coberto consta, essencialmente, de três partes: o tamis propriamente dito
(B), a tampa (A) c a parte inferior (C), destinada a receber o pó tamisado, e
tanto esta
como a tampa são fechadas numa das extremidades por uma carneira bem
esticada, devendo a parte lisa da pele ficar virada para o interior do tamis, a Fig. 5. Tamis coberto
fim de permitir que o pó se destaque facilmente, acabada a operação.

4.1.2.2. Classificação dos tamises

Como já tivemos ocasião de dizer, a parte principal de um tamis é o tecido utilizado como
elemento separador das partículas a tamisar e qualquer que seja a natureza do material empregue na
fabricação de um tecido este é sempre constituído por
37

um certo número de malhas por unidade de superfície, de modo que as características dessas malhas
constituem os factores fundamentais para bem se definir um tamis.
Na Fig. 6 representamos uma malha, ou seja, aquilo que se pode considerar como a unidade
constitutiva de um determinado tecido. Como o esquema indica, a malha é igual à soma do diâmetro
dos fios (d) com a distância que separa dois fios consecutivos, que é designada por lúmen ( l ) . Deste
modo, pode cscrever-sc: M = / + d. Por outro lado, qualquer tecido terá
l
um número de malhas por cm, n ~ ——. e um número
i M
de malhas por cm-, n = ——.
M2
É costume considerar ainda a superfície útil de um tamis, que é a relação entre
l—
a superfície correspondente apenas ao lúmen ou orifício da malha c a superfície
total desta, e que c dada pela expressão:

l2K = ————— =
l3 n 2
(l + d)~ Fig. 6. Malha de um tamis
-

a qual mostra que a superfície útil está directamente relacionada com o diâmetro das partículas
tamisadas, aumentando este quando aquela aumenta.
Uma vez que os tamises são especialmente usados para estabelecer a tenuidade dos pós, é necessário
dispor-se nos laboratórios farmacêuticos de vários daqueles instrumentos, os quais diferem entre si
pela abertura das respectivas malhas, a qual se escalona desde uma dimensão máxima a outra,
mínima.
Dado que a malha é a unidade basilar dos tecidos e como estes, por seu turno, constituem a
peça fundamental dos tamises, é natural que aquela fosse escolhida como o elemento sobre que
assenta a classificação destes instrumentos. Pode dizer-se, no entanto, que essa classificação está
longe de ser uniforme, tendo variado bastante através dos tempos e sendo diferente de país para país.
Em geral, os tamises foram designados sempre por um número, costume que ainda hoje se
mantém, mas antigamcnle lal numeração era puramente empírica e não tinha qualquer relação com
as dimensões das malhas. Depois começou a usar-se uma numeração que indicava o número de
malhas por polegada ou por cm, até que, modernamente, se estabeleceu um critério mais rigoroso de
classificação.
Um simples relance de olhos à Fig. 7 mostra como é inconsistente a classificação dos tamises
baseada, apenas, no número de malhas por unidade de superfície, como fazia a Farmacopeia
Portuguesa IV, 2.a edição. Suponhamos que os dois quadrados maiores A e fi, representando
pedaços de tecidos diferentes, têm l cm2 de superfície e estão divididos cm dezasseis quadrados
pequenos. Ambos têm, portanto, o mesmo número de malhas por unidade de área e seria de admitir, a
priori, que originassem um
38

tamisado igual. Porém, como a Fig. 7 mostra claramente, isso é impossível, vis to que o lúmen das
malhas do tecido A é maior do que o do tecido B, resultando, portanto, que o tamisado originado por
A será constituído por partículas maiores do que o dado por B.
Reconhecida a possibilidade de existirem tamises podendo apresentar o mesmo número de
malhas mas com abertura desiguais, foi-se levado a concluir que um tamis
só ficaria bem definido estabelecendo o número de
malhas por unidade de comprimento e f ix ando as
respectivas aberturas e o diâmetro dos fios, critério já
adoptado pelo Suplemento à Farmacopeia Portuguesa IV
(').
Na Tabela VI indicam-se os tamises inscritos na
Farmacopeia Portuguesa V (V. 1.4), bem como as
respectivas características. Estes tamises têm malhas
Fig. 7. Variação da abertura das quadradas, embora para operações não destinadas à
malhas em função do diâmetro análise possam ser utilizados instrumentos de malhas
dos fios do tecido circulares 1,25 vezes a largura das malhas quadradas
cujo diâmetro interior seja do igual
tamis correspondente. Tabela VI. Características dos tamises descritos na
Farmacopeia Portuguesa V (V.1.4.
Número dos Tolerância das aberturas Diâmelni do lïu
tamises
(Dimensões Tolerância Tolerância Tolerância Dimensões Dimensões Imijk--,
nominais dai máxima para para a média intermédia + nominais ;idiinssi\t~is
abertura^ uniu abertura das aberturas Z recomendada
+X ±Y sa d max il min
11 200 770 350 560 2500 2900 2 100
8 000 600 250 430 2000 2300 1 700
5 600 470 180 320 1 600 1 900 1 300
4 000 370 130 250 1 400 1 700 1 200
2 XOO 290 90 190 1 120 1 300 450
2 0(X) 230 70 150 900 1040 770
1 400 180 50 110 710 820 fiOO
l 000 140 30 90 560 640 4 SÓ
710 112 25 69 450 520 ,180
500 89 18 54 315 360 270
355 72 13 43 224 260 190
250 58 9,9 34 160 190 130
180 47 7,6 27 125 150 106
125 38 5,8 22 90 104 77
90 32 4,6 18 63 72 54
63 26 3,7 15 45 52 38
45 22 3,1 13 32 37 21
38 — — — 30 35 24

dcsie livro,

( ' ) O leitor poderá encontrar mais pormenores a respeito desta matéria na .V pág. 37 e
seguintes.
39

Tolerância máxima (') para uma abertura + X: nenhuma dimensão da abertura deve
ultrapassar a dimensão nominal de mais de X com

2(w°-75)
X = ————— + 4(w°'25) W = abertura da malha

Tolerância para a média das aberturas ± Y: a abertura média não deve afastar-se da abertura
nominal mais de ± Y com
,6
27

Tolerância intermédia + Z: não mais de 6 por cento do total das aberturas do tamis deve ter
dimensões compreendidas entre os limites do «nominal + X» e do «nominal + Z» com
X+Y

Diâmetro do fio d: os diâmetros dos fios dados no quadro aplicam-se à tela metálica montada
num caixilho. As dimensões nominais recomendadas dos diâmetros do fio podem afastar-se destes
valores dentro dos limites d max e d min. Estes limites correspondem a um intervalo de + 15 por
cento em relação às dimensões nominais recomendadas. Num tamis de controlo, os fios da trama e
da urdidura devem ter o mesmo diâmetro nominal.

4.1.2.3. Técnica da tamisação

Em primeiro lugar, deve escolher-se o tamis a utilizar na operação de acordo com a tenuidade
que o material tamisado deve apresentar, sendo necessário, ainda, que a rede do tamis e o produto a
tamisar sejam compatíveis entre si. Quer isto dizer que pode haver substâncias capazes de atacarem
os fios do tecido do tamis, ou vice-versa, e, por isso, deve ter-se sempre em atenção este facto ao
seleccionar o instrumento a empregar.
Ao fazer uma tamisação poderemos usar um tamis simples ou coberto, sendo de aconselhar o
emprego de um tamis deste último tipo sempre que se trabalhe com substâncias irritantes ou tóxicas.
Uma vez colocado o produto a tamisar sobre o tecido

(') Ver Norma Internacional OIN 3310/1 (1975).


40

do instrumento, imprimem-se a este movimentos alternados para um e outro lado, procurando evitar
sacudidelas e golpes violentos, de modo a que o material deslize naturalmente c sem qualquer
pressão sobre a rede tamisantc, passando através das respectivas malhas apenas as partículas cujo
diâmetro c ligeiramente inferi or à abertura
daquelas. A lamisação será dada por terminada quando já não
passar mais pó através das malhas e em nenhuma caso se deve
comprimir o produto sobre a rede tamisante. pois em tais
circunstâncias as malhas podem deformar-se e permitir a pas-
sagem de partículas maiores, o que faria com que o material
tamisado perdesse a sua homogeneidade. Na Fig. K as setas
representam os movimentos que se devem imprimir ao tamis e
como este ____________________ é um tamis simples o
tamisado é recolhido sobre
uma folha de a
Fig. 8. Movimento a ,mpnmir ao tamis P ï*l «tendida na
banca de tra-
durante a tamisação balho.

4.1.3. LEVIGAÇÃO

Esta operação, também chamada Diluição ou Elutriação, consiste em suspender um produto


sólido num líquido, geralmente a água, a f i m de se separarem, por sedimentação, as partículas
mais leves das mais pesadas.
Tal processo de separação implica que o sólido seja insolúvel no líquido utili/.ado para o
suspender e baseia-se na diferente velocidade de sedimentação das partículas em função dos
respectivos diâmetros. Na realidade, se prepararmos uma suspensão de um sólido constituído por
partículas de vários tamanhos, verifica-se que os fragmentos maiores e, portanto, mais pesados, se
depositam mais rapidamente, enquanto que os mais leves se distribuem por diferentes alturas do
líquido ou ficam mesmo à superfície deste. Pratica-se esta operação come-
çando por misturar o corpo a levigar. já no estado pulverulento, com o líquido
escolhido, que é. em regra, a água, ale formar uma pasta. Dilui-se, então, esta
massa corn uma grande quantidade do mesmo líquido, utilizando, para isso,
vasos especiais, como o que está representado na Fig. 9, agita-se e deixa-se
repousar durante algum tempo. Deste modo, as partículas que constituem o
sólido vão-se difundindo ao longo do líquido, caminhando mais rapidamente na
direcção do fundo do vaso as maiores e mais pesadas. Ao fim de alguns
instantes formam-se, ao longo da coluna líquida, camadas distintas
constituídas por fragmentos de dimensões sensivelmente iguais, que podem ser Fig. 9.
Vaso de elutriação
41

41

recolhidas pelas aberturas laterais que os vasos de levigação apresentam. Submetendo,


isoladamente, cada uma das porções assim obtidas a nova levigaçào é possível melhorar-se o grau
de separação conseguido no decurso da primeira operação e obler novas fracções cujas partículas
serão cada vez mais finas.

BIBLIOGRAFIA

ECANOW, B. e SAUIK. F — i n — Dispcnsing of Medication, pág. 98, Mack Publ. Co., Pennsylvania,
1976. Enciclopédia Farmacêutica, Editorial Científico-Médica, Barcelona, 1963, Tomo II, pág. 20.
Farmacopeia Portuguesa V (V. 1.4), 1989
GORIS, A,. LIOT. A.. JANOT, M. M., e GORIS. A., Pharmacie Galénique, Tomo I. pág. 253, Masson et Cie,
Paris. 1949.
42

4.2. SEPARAÇÃO DE SÓLIDOS DE LÍQUIDOS OU


DE LÍQUIDOS IMISCÍVEIS

4.2.1. DECANTAÇÃO

Trata-se de uma operação mecânica que tem por fim separar um líquido sobrenadante de um
sólido ou de um líquido. Para que tal separação se possa realizar é condição necessária que o
sólido se lenha depositado, previamente, no fundo do vaso contendo a mistura a decantar, ou, no
caso de dois líquidos, que estes sejam imiscíveis e se disponham cm camadas perfeitamente
separadas, de acordo com as respectivas densidades.
A decantação pratica-se, correntemente, nos laboratórios quando se pretende isolar um
precipitado formado no decurso de uma reacção química, quando se quer separar das águas-mães os
cristais obtidos numa cristalização ou quando se pretende purificar um sólido por lavagem, no
caso de este conter impurezas solúveis n u m determinado líquido. Todos estes casos constituem
exemplos de decantação em que se despreza o líquido sobrenadante, sendo a operação praticada
com o objectivo de aproveitar o sólido depositado, podendo, no entanto, acontecer que, por vezes,
seja o líquido decantado a parte que interessa conservar.
A decantação de dois líquidos é também um processo de separação muito utilizado e implica
sempre a presença de duas fases imiscíveis, sendo uma geralmente aquosa e a outra constituída por
um ou mais líquidos orgânicos. Dela se I a/ largo uso, como, por exemplo, nas técnicas de dosagem
dos alcalóides existentes nas drogas vegetais e em muitos processos extractivos e de purificação
de substâncias.

4.2.1.1. Por escoamento

É um processo de decanlação aplicado exclusivamente para separar um líquido de um sólido.


Colocada a mistura a decantar num recipiente apropriado, deixa-se repousar durante o tempo
necessário para que o sólido deposite completamente e o líquido sobrenadarHc fique límpido.
Uma vê/ conseguido isto, inclina-se lentamente o vaso que contém a mistura, vertendo o
líquido sobrenadante noutro recipienle. Deve proceder-se de modo a evitarem-se movimentos
bruscos, que provocariam a disseminação do sólido já deposilado. continuando-se a decantação até
que a parte sólida comece a misturar-se com o líquido ou atinja o bordo do vaso.
43

Durante a operarão deve apoiar-se ao bico ou hordo cio r eci p i en t e que t: n L-erra a
m i s tur a a decantar uma vareta em posição vertical (Fig. 10). para que o liquido adira e
escorra ao longo dela, diminuindo-se, assim, o el eito dos movimentos resultantes da
contracção do veio líquido, que, de outro modo, poderão Ia/e r levantar o sedimento.
4.2.1.2. Por pipeta
F.sta técnica é aplicada, indiferentemente, à
decantação de um líquido de um sólido ou de dois
líquidos, mas apenas se usa quando o volume de líquido a
decantar seja redu/.ido. Pratica-se mergulhando uma
pipeta no líquido que se pretende separar, aspirando-se
este. por sucção, com a boca ou com o a u x í l i o de uma pêra
de borracha adaptada à parle superior da pipeta. Neste
último caso. a pêra deve ser comprimida antes de imergir o
instrumento no líquido, fa/endo-se, então, a sua
descompressão gradualmente, o q ue permite controlar o
volume do líquido aspirado para a pipeta. Fig. 10. Decdntdção por escoamento
Ao decantar dois líquidos há a considerar se se pretende
retirar a camada superior ou a interior. No primeiro caso, basta mergulhar a pipeta até um
pouco acima da superfície de separação e aspirar, depois, o l í q u i d o que c o n s t it u i a (ase mais
leve. Na segunda hipótese, teremos que tapar o orifício superior da pipeta e só então ela será
mergulhada até penetrar na fase mais densa. Deslapando-a depois, o líquido que const i t u i a camada
inferior subirá até certa altura, podendo a subida ser a u x i l i ad a por sucção.
Como variantes do processo da pipeta podemos referir, ainda, o uso de conta-gotas e de
seringas hipodérmicas. as quais, graças ao seu êmbolo fa cil men te inanejável. são
especialmente indicadas pura a decantação de pequenos volumes de líquidos.

4.2.1.3. Por sifões

A s i fonação utili/a-se, sobretudo, para decantar grandes volumes de líquidos e,


ainda, na decantação de líquidos que sobrenadem sólidos, quando estes seja m constituídos por
partículas inuil o leves, pois esta técnica não exige que o recipiente contendo a mi s i ui a a
decantar seja inclinado, evitando-se, assim, movimentos susceptíveis de promovei o levantamento das
partículas sólidas depositadas.
Neste processo de decantação empregam-se instrumentos denominados sifões, os q u a is
são constituídos por um tubo de vidro, de metal ou de borracha, dobrado em
44

ângulo, distinguindo-se estes últimos pela sua grande flexibilidade, o que os torna muito úteis em
certos casos.
Os sifões apresentam, em regra, braços desiguais e quando tal acontece o braço mais curto
deve mergulhar no líquido a decantar, mas esta condição não é, todavia, absolutamente essencial
para o seu funcionamento. Na realidade, a única força que promove o escoamento é a resultante da
diferença de peso das colunas líquidas contidas nos dois ramos do sifão, a qual só depende das
alturas das referidas colunas, uma vez que, salvo casos excepcionais, os sifões são de secção
constante.
Portanto, para que um sifão funcione é, de facto, indispensável que as duas colunas de líquido
que o constituem sejam de alturas desiguais e a velocidade de escoamento depende directamente
dessa diferença, como facilmente se pode demonstrar.
Suponhamos que se pretendia transferir o líquido contido num recipiente A para outro, B, como
esquematicamente se representa na Fig. I I . A força que solicita o líquido de A para B c igual à
pressão atmosférica diminuída do peso da coluna de líquido que tem por base a secção do sifão c por
altura h. Por sua vez, a força que solicita o liquido de B para A é igual à diferença entre a mesma
pressão atmosférica
e o peso da coluna de líquido que tem também por base a
secção do sifão e por allura h'. Uma vez que a pressão
atmosférica e a secção do sifão são iguais em ambos os casos,
as duas forças dependem directamente de h c h', como já antes
referimos, e a velocidade com que o líquido se desloca pode
calcular-se pela expressão: v = \ 2g(h'-h). Desta expressão é
intuitivo dedu/ir-se que a velocidade de escoamento depende da
diferença (h'-h), que vai diminuindo à medida que os valores
das duas alturas se aproximam e se anula quando elas se
igualam, ou seja, que o sifão deixa, nesse momento, de
funcionar. Para que tal não aconteça, e reportando-no s ainda
à Fig. 11, torna-se necessário que os dois recipientes se
Fig. 11. Sifão não encontrem ao mesmo nível, só se obtendo transvasamento total do
líquido de A para B se as duas colunas de líquido nunca atingirem alturas iguais durante Ioda a
operação.
Para que um sifão funcione terá que ser posto em carga, isto é, terá que ser cheio com o líquido
a sifonar. Tratando-se de um sifão rígido e de pequenas dimensões, é relativamente fácil carregã-io,
para o que basta virar as aberturas dos ramos para cima e enchê-lo com o líquido a decantar.
Conseguido isto, tapa-se o orifício do ramo maior com um dedo e inverte-se, depois, o instrumento,
mergulhando de seguida o ramo menor no recipiente contendo o líquido a transvasar e colocando o
ramo maior no reservatório destinado a receber o decantado. Este processo toma-se, porém, de
difícil execução quando o sifão é flexível, como os constituídos por tubos de borracha, e
45

nestes casos carrega ••(• u s i f ã o as pu and o pela .thciiuia do ramo maioi. a te q ; > • o
liquido comece a i, orrer. |- s(a ;ispn,K L i,i pode !a/<T-M_- (.0111 a hoca desde que o
liquido .1 decanUu uáo s eja IOMIO nem eonosi\o ou eaustKo; t|ii.iiulo t a l aconteça c
ncccssar 10 ulih/ai di sp o^iliv os cs|ii\'i;iis. (|U'.- pcmiiluni carrcí_'.ir o sil; o
opci.klor \a \ - \ ^ . \ ?_ iTproilu/eni-se dois upos cspc ciais Je Mfoes: o niodclo \ [u-de
sei posio rin e;ui:;( por aspiiaeao ,1 liota. yi',i>,as :io mho Ji.1 SOLMHJIK;I kiie-i.il. ao
passo que o modelo f, r c;ine;j.ado por aspini^ao niecaniea udh/.indo o i-mhol.i j cie
aeopukido.
4.2.1.4. Por vasos florentinos
(K \;isos lloieiiiiiios ehissiros s.io reeipienie^-em 101 n ia
de Lianata leiuin uma iiihu ladina l ai era l dobiada em sMVio eiijj F ig. 12. ' .pó de .'toe
a l l ma e sempie mleiioi ao eai-
galo ( ] - I L T - l1^ . \ \ e s e i \ e m paia sepai.u os olros e-^seneiais ii.i .ÍLUI.I quando es(i.-s
produtos sãu prepaiatios poi de^nhKão cm oMiente de \api>i O d s- sii lado t.1 lecehido
num desies recipientes e apôs ,d»uim (empo de icpou-,0 ,t rsseiu ia. poique e menos densa,
sohicnada a aiiua e |iinl.i-se no colo elo \a--o, cnLjii.inlo es la ulíima \ a i esco ando pelo
luho lateral. Nos i^asox m,i[s NIIOS cm que a essência e de maioi densidade que a asMia
uiih/arn-se ie*. i i e i u e s unno o da f ü: l; í : em t al cnvuiisiãncia. a a^iu. a

Fiq 13 Vasos florenlmos p^rn líquidos Fíg. 14. de


mais 'f\-0f-
D! M A R f " . H M' Pr

medida que o ileslilaJu \'\\\ sendo lecolliidn. eseoa p>'|o tuho u-locado na pane
sii|>erioi direita do vaso. ücaniio a essência no lundu deste.
() aparelho di- D I S M V K I is e Mi KI > e uma moddicai,ao dos \ a s o s t lo i e nt i n o s
clássicos. disiinoiii[idii se destes pela pari K u landade de apresentai diia^- inhuladura-..
uma superioi e ouha mleiioi i f j j j . I 4i. O desnlado e iccehido no disposiii\o alu\es do
tunil de ponta huen ai neule r e e u i \ a * l a e a essência, separando-se da as.Mia. I k a a
46

sobrenadar esta. que vai sendo descarregada da proveta pelo sifào. Logo que a essência atinja o
pequeno tubo, situado na parte superior esquerda do aparelho, sai para o exterior, o que permite
recolhê-la à medida que se separa, evitando-se, assim, a substituição do vaso quando estiver cheio,
como acontece com os recipientes florentínos.

4.2.1.5. Por funis ou ampolas de decantação


São instrumentos de vidro, de forma variável, como
mostra a Fig. 15, e que servem, exclusivamente, para separar
líquidos imiscíveis.
Estes aparelhos têm um orifício na parte superior, por
onde se introduzem os líquidos, o qual é fechado por uma
rolha de vidro. Deste modo, torna--se possível agitar os
líquidos neles contidos, operação esta muito utilizada quando
se pretende extrair um sólido de uma solução por um outro
solvente. Após repouso, as duas fases líquidas separam-se
por ordem das respectivas densidades, podendo, então,
decantar-se, facilmente, a camada debaixo, para o que basta
retirar a rolha da ampola e abrir a torneira existente na
parte inferior desta, deixando escorrer o líquido até que a
superfície de separação das duas fases atinja o orifício de
saída.
Fig. 15. Ampolas de
decantação

4.2.2. EXPRESSÃO

É uma operação destinada a separar de um corpo sólido ou de consistência mole os líquidos


nele existentes. Em geral, pratica-se com o fim de aproveitar os líquidos separados, rejeitando-se,
quase sempre, a parte sólida, que se designa por marco ou resíduo.
A expressão é frequentemente utilizada nos laboratórios farmacêuticos e na indústria, podendo
representar a operação principal, como na preparação dos sucos vegetais e óleos. Muitas vezes,
porém, reveste-se do carácter de operação acessória, sendo empregue como tal quando se faz uma
solução extractiva, para se recuperar parte do líquido que fica sempre a embeber o corpo submetido
à extracção.
Trata-se de uma operação puramente mecânica, em que se submete o produto a espremer a
uma pressão que obrigue os líquidos nele contidos a fluírem para o exterior. Naturalmente que a
maior ou menor facilidade com que um corpo cede os líquidos
47

que constituem os respectivos sucos celulares depende da sua textura e, por conseguinte, o grau de
compressão a aplicar para se conseguir uma expressão conveniente dependerá da natureza do
material a tratar. Deste modo, é de esperar que as substâncias polposas ou moles e os vegetais
herbáceos, dada a relativa fragilidade das suas paredes celulares, não necessitem de ser sujeitos a
tão fortes pressões como os produtos de textura compacta para cederem os líquidos que contêm.
A expressão é, em regra, praticada a frio, devendo, em casos especiais, ser feita em aparelhos
aquecidos, e, além disso, pode ser executada manualmente ou por meio de prensas.

4.2.2.1. Expressão manual

Este processo pode apresentar duas variantes, consistindo a primeira em esmagar a substância
a espremer com a mão. Aplica-se a casos muito restritos, como na preparação de sucos de amoras e
groselhas, sendo estes frutos transformados numa pasta por pressão manual, completando-se depois a
expressão por um processo mecânico.
A segunda variante consiste em encerrar o material num tecido apropriado, aplicando-se,
seguidamente, uma torção progressiva nas extremidades daquele, o que obriga o líquido a
abandonar o sólido e escorrer para o exterior do invólucro de pano, sendo recebido num recipiente
colocado por baixo.
Se bem que este processo de expressão não possa ser considerado tão eficiente como os que
utilizam as prensas, c, no entanto, bastante utilizado como operação acessória na preparação de
soluções extractivas. Na realidade, sempre que se submete um produto vegetal a uma extracção com
um solvente, completada a operação apenas se obtém uma fracção do volume de líquido inicialmente
adicionado à droga, pois, encontrando-se esta mais ou menos seca, fixa, por embcbição das suas
células, uma parte importante do solvente. Tal facto resultaria num prejuízo considerável se nos
limitássemos a aproveitar o líquido que sobrenada o sólido e desprezássemos aquela parte que fica
retida pelas partículas da substância extraída.
Esse é o motivo porque a preparação de qualquer solução extractiva, seja um decocto,
macerado ou tintura, deve ser sempre completada com a expressão do marco, islo é, da parte da
droga submetida ao processo extractivo e que não foi dissolvida, a fim de se recuperar o líquido por
ela retido. Esta operação pode ser feita vantajosamente por meios mecânicos, mas no caso de
preparações em muito pequena escala, em que o marco a espremer pesa, no máximo, algumas
dezenas de gramas, é evidente que o processo de mais fácil e prática execução é, precisamente, a
expressão manual por torção.
48

4.2.2.2. Expressão mecânica

Exceptuando o caso de o resíduo a espremer ser diminuto, a expressão deve ser feita por um
processo mecânico, o qual é mais eficiente e origina maior quantidade de líquido. Os aparelhos
utilizados na expressão mecânica são chamados prensas* das quais existem numerosos modelos,
adequados a cada caso, permitindo operar a frio ou a quente e capazes de exercerem, por vezes,
pressões m u i t o consideráveis, e que se podem dividir em dois lipos distintos: as prensas de
parafuso e as prensas hidráulicas.

4.2.2.2.1. Prensas de parafuso

A prensa de COLLAS (Fig. 16) representa o tipo mais simples de prensa de parafuso, tendo sido
muito utilizada na oficina farmacêutica. É constituída por dois cilindros
concêntricos apoiados num suporte, sendo o interior perfurado e
de diâmetro menor que o situado externamente. O parafuso que exerce a
pressão termina por um disco justo ao cilindro interior, sendo aquele
obrigado a subir ou descer ao longo da prensa conforme o movimento que
se imprime ao volante que acciona o parafuso.
A substância a espremer é envolvida num tecido resistente, a fim de
evitar que a pressão exercida force as partículas a passarem através dos
orifícios do cilindro perfurado c. eventualmente, os obstruam, sendo
então colocada no cilindro interno. Feito isto, desce-se o disco accio-
nando o volante da prensa, de modo que a pressão exercida sobre a
substância vá aumentando progressivamente e actue de modo uniforme
Fig. 16. Prensa de COLLAS sobre toda a superfície do corpo
a espremer, o qu al deve ser disposto na prensa em camadas
uniformes que ocupem todo o cilindro. A medida que a pressão vai actuando, o líquido escorre para
o espado entre os dois cilindros e sai pelo bico da prensa, sendo recolhido n u m vaso colocado por
baixo deste.

A Fig. 17 mostra um outro modelo de prensa de parafuso, mais poderoso do


que o anteriormente descrito. A diferença fundamental entre estes dois
aparelhos reside na circunstância de a prensa de dupla ai\ão (Fig. 17) ter
uma roda dentada acopulada ao parafuso. Assim, quando este atinge o fim
do seu curso e já não desce mais por acção do volante, pode aplicar-se uma
pressão suplementar movendo a manivela lateral, que, fazendo girar a
roda dentada soldada ao parafuso, obriga este a deslocar-se para baixo,
aumentando, por isso, a pressão anteriormente exercida sobre o material
colocado na
49

Existe um outro modelo de prensa, denominado prensa


diferencial de dupla acção (Fig. 18), que permite obter pressões ainda
mais elevadas do que as fornecidas pela prensa de dupla acção, com a
vantagem de o seu accionamento exigir um esforço menor ao
operador.
O material a espremer é colocado dentro de um saco de tecido
resistente e posto no cilindro perfurado. A pressão inicial é aplicada
por uma alavanca de ferro que encaixa na cabeça do parafuso A e se
move para trás e para a frente. Cada movimento na direcção do
operador faz girar o parafuso e obriga a descer o disco a ele ligado na
extremidade inferior, mantendo-se a pressão assim aplicada durante o
recuo da alavanca, graças a um dispositivo de roda livre.
Flg. 17. Prensa de
parafuso de dupla
acção

Quando se verifique que não há mais aumento de pressão por accionamento da alavanca como
atrás se descreve, esta é retirada da posição inicial A, colocada conforme se vê na Fig. 18 e
novamente accionada para trás e para diante, conseguindo-se, deste modo, um apreciável aumcnlo
da força aplicada sobre o material. Acabada a operação, querendo subir o parafuso para poder
retirar o produto espremido e colocar outra carga
na prensa, removem-se as peças de aço terminadas em forma
de cunha (B) que se projectam sobre a superfície do anel que
rodeia o parafuso A, rodam-se e tornam-se a colocar nos
respectivos orifícios, Como as cunhas terminais destas peças
ficam, agora, colocadas ao contrário, quando se puxa a alavanca
na direcção do operador o anel funciona como roda livre, mas ao
fazer-se o movimento oposto o parafuso anda para cima e,
portanto, a pressão diminui.
Qualquer que seja o lipo de prensa de parafuso
considerado, há certos pormenores de construção a respeitar paru
que o aparelho funcione eficientemente. Assim, é de mencionar que
a rosca do parafuso deve apresentar as superfícies das espirais
Fig. 18. Prensa superior e inferior paralelas e não convergentes e terminando em
diferencial de dupla ponta aguçada, como acontece nos parafusos vulgares. Além
acção
disso, o bloco da prensa não deve estar ligado à extremidade do parafuso, para que aquela se
mantenha imóvel quanto este é accionado, e as partes interiores do aparelho serão estanhadas ou de
aço inoxidável para evitar reacções com os taninos e ácidos porventura existentes no material a
espremer. É necessário, ainda, que o parafuso exerça a pressão bem no centro do disco terminal, a
f i m de se evitar que o aparelho sofra avarias.
50

4.2.2.2.2. Prensas hidráulicas

As prensas deste tipo apenas são usadas em instalações à escala industrial, podendo espremer uma
grande quantidade de material com a maior eficiência c um dispêndio mínimo de trabalho,
baseando-se o seu funcionamento na perteita elasticidade dos líquidos, expressa pelo conhecido
princípio de Pascal.
Nestas circunstâncias, quando dois cilindros A e B, contendo um fluido qualquer ('), estão ligados
por um tubo (Fig. 19). toda a pressão exercida sobre a superfície do líquido em A é transmitida
integralmente e em todas as direcções ao líquido encerrado no (ubo de ligação e, desle, ao líquido
no cilindro 6. Se os dois cilindros tiverem a mesma secção, é evidente que a (orça ou pressão
aplicada em A será a mesma que se transmitirá a B: admitamos, porém, que o cilindro B icm uma
área da base t O vezes superior à de A. Sendo a
pressão, como se sabe, a força exercida por
unidade de superfície, fácil se torna concluir que a
torça que se exerce em A se toma, efectivamente,
10 ve/es superior em fl.
O mecanismo que opera estas prensas esiá
representado na Fig. 19. Fa/endo subir o pistão
em A por acção da respectiva alavanca, o óleo é
aspirado do reservatório f através da válvula
C. que impede, depois, que o
óleo volte para trás. O abaixamento do pistão
força o óleo a passar para o cilindro fi, sendo
impossível o seu retrocesso mercê da válvula D.
Operando a alavanca, o óleo é continuamente
Fig. 19. Diagrama de uma prensa hidráulica
bombeado para B, o que obriga o pislào H a
subir, comprimindo o material colocado na
plataforma G contra o anteparo /. Terminada a operação, diminui--se a pressão na prensa
abrindo-se uma torneira, o que faz com que o óleo abandone o cilindro B e retome para o
reservatório /' e, como consequência disto, o pistão H descerá ate atingir o seu curso mais baixo.
No mercado encontram-se vários modelos destas prensas, usadas, principalmente, na
preparação industrial de óleos obtidos por expressão de frutos ou sementes. Uns e outros são
previamente esmagados em moinhos de rnós ou rolos, colocando-se, então, a massa assim obtida em
seiras de cairo, as quais são, depois, empilhadas na prensa e convenientemente espremidas.

C) O fluido geralmente usado nestas prensas é um óleo. que serve de lubrificante e


transmissor da pressão.
51

Dadas as suas dimensões e capacidade, estes tipos de prensas raramente são utilizados para
espremer os marcos resultantes das soluções extractivas farmacêuticas. No entanto, existe um moi>'o
de prensa para trabalho em pequena escala, próprio para espremer as drogas utilí/adas na
preparação de tinturas, o qual incorpora o princípio do parafuso e da prensa hidráulica.
Uma prensa deste tipo está representada na
r
Fig. 20. O material a espremc L colocado no c ili n
dro perfurado, fazendo-se descer o disco compressor
da extremidade do parafuso accionando o volante. A
pressão adicional necessária para a expressão com
pleta do marco é aplicada movendo as alavancas
situadas à direita, que, por sua vez, fazem girar outro
parafuso, o qual aplica uma pressão ao líquido encer
rado no pequeno e estreito cilindro inferior, em cujo
interior existe um pistão. Como o cilindro perfurado
ende se colocou a droga nasce na extremidade supe
rior do pistão, este, ao subir, comprime a substância
centra o disco ligado ao parafuso e, assim, se realiza Fjg_ 20 Prensa para {inturas accío_
uma expressão bastante eficiente. nada por parafuso e pressão hidráulica

4.2.2.3. Prática da expressão

Na expressão mecânica de qualquer substância devem respeitar-se certas condições para que a
operação se realize com o máximo rendimento e os líquidos espremidos não sejam alterados. São os
seguintes os principais factores a que se deve atender ao praticar uma expressão:
1) E necessário que o material de que é fabricada a prensa .seja compatível com a substância a
espremer. Deste modo, deve ter-se em consideração que o ferro reage com os taninos existentes em
muitos vegetais, e nesse caso impõe-se a utilização de prensas estanhadas ('} ou esmaltadas. No
caso da preparação de sucos acentuadamente ácidos recomenda-se empregar prensas de aço
inoxidável.
2) O material herbáceo deve ser submetido a uma contusão prévia, a fim de se fenderem as
respectivas paredes celulares, o que facilita a expressão. Feito isto, pode ser colocado directamente
na prensa, não necessitando ser envolvido em tela.
3) Toda a substância a espremer que esteja reduzida a pó deve ser envolvida num tecid»
resistente e só então colocada na prensa, procurando-se, com isto, evitar a obstrução dos orifícios
do cilindro interno do aparelho pêlos fragmentos do produto sujeito à operação.

C) Não devem utilizar-se com algumas drogas, como as amoras.


52

4) A substância deve ser colocada na prensa de modo a formar uma camada un iforme,
isto é. lendo igual espessura em toda a superfície do cilindro.
5) A pressão deve ser aplicada lenia e progressivamente, de modo a evita r que o
tecido envolvente do material a espremer se rompa.
6) A pressão deve ser uniforme e intermitente, só se aplicando nova força depois de ter
cessado o escoamento do liquido libertado pela pressão anterior.
7) Ao atingir-se o limite da pressão dada pelo aparelho, deve deixar-se este em
repouso durante algum tempo, mas manlcndo-se a pressão, para se oblcr o máximo de
rendimento cm líquido.
8) Tratando-se de materiais que originem sucos viscosos, deve misturar-se-lhes uma
substância sólida, como pulha cortada e lavada ou casca de arroz, o que facilita o
escoamento dos sucos com tais caracteríslicas.
9) Quando a substância que se prelende obler por expressão é sólida ã temperatura
ambiente no local onde se pratica a operação, é necessário u t i l i / a r prensas com pralos e
disco compressor convenientemente aquecidos, para que ela funda e possa escorrer
livremente.

4.2.3. CENTRIFUGAÇÃO
É um» operação destinada a separar sólidos de líquidos ou líquidos não mi.scíveis.
Efectua-se utilizando aparelhos especiais — as centrífugas — que fazem a separação,
por meio de força centrífuga, de duas ou mais substâncias de densidades diferentes,
devendo uma delas ser. necessariamente, um líquido.
A centrifugação pode ser praticada com u fim de se isolar um sólido em suspensão
num líquido, operação correntemente praticada nos laboratórios de análises bioquímicas
para se conseguir, por exemplo, um sedimento de urina. Outras vezes execu Ia-se para se
obter um líquido límpido, quando a filtração através de papel ou de outra membrana
porosa não é aplicável, devido ao facto de o sólido a separar, por ser de natureza
gotnosa ou gelatinosa, obstruir os poros da superfície filtrante. A cenirifugacáo útil i/a-se,
ainda, para desfazer emulsões tantas vezes formadas durante os processos de extracção.

4.2.3.1. Tipos de centrífugas


As centrífugas de laboratório são. em regra, accionadas por um motor eléctrico,
colocado na base, donde emerge um eixo vertical sobre o qual assentam os vários tipos de
cabeça ou rotor, que está montado dentro de uma caixa metálica fechada. Fïsla tem.
habitualmente, uma lampa na parte superior e constitui um dispositivo destinado a
proteger o operador contra os fragmentos de vidro, resultantes do estilhaçamento dos
53

tubos, ou de metal, provenientes da própria centrífuga, caso esta se avarie quando em


funcionamento. As ccnirífugas são fabricadas em diversos tamanhos, desde os modelos
laboratoriais, cujos tubos comportam no máximo cerca
de 200 ml, até aos grandes modelos utilizados na
indústria.
As centrífugas usadas nos laboratórios podem ser
equipadas com três tipos de cabeça. O modelo mais
vulgar é o de cabeça vertical, representado na Fig. 21,
em que os tubos de vidro são colocados em suportes
metálicos, tendo no fundo uma almofada de borracha,
estando aqueles soldados a gonzos que se apoiam sobre
ranhuras abertas no rolor. Como o centro de gravidade
está situado abaixo dos gonzos, os tubos mantêm-se
verticais quando a centrífuga está em repouso, mas logo
que o rotor comece a girar vão-se movendo sobre os
gonzos, até atingirem a horizontalidade, retomando a Flg. 21. Centrífuga de
primeira posição logo que a centrífuga pare. cabeça
O material a separar é obrigado, nestas centrífugas,
a atravessar a camada líquida em toda a sua extensão até atingir o fundo do tubo, onde
se deposita. Em resultado disto, há um aumento de concentração de partículas sólidas
próximo do fundo durante a centrifugação, de que resulta uma certa interferência
recíproca entre elas. Estes factos
representam outros tantos defei
tos inerentes a este tipo de
centrífugas, o que torna, por
vezes, a sedimentação do sólido
incompleta, se bem que uma
centrifugação longa e feita a alta
velocidade possa, em certos
casos, remover os inconvenientes
apontados. Por outro lado, as
centrífugas de cabeça vertical
apresentam a vantagem de per-
Fig. 22. Centrífuga com cabeça cónica mitirem o uso de tubos gradua
dos, próprios para a medição do
volume dos sedimentos obtidos, pois estes depositam-se regularmente no fundo dos
tubos.
Outro tipo de centrífuga é o de cabeça angular ou cónica, no qual o rotor é um
tronco de cone com orifícios onde encaixam os suportes metálicos para os tubos, os
quais formam, geralmente, um ângulo de 45-50° com o eixo do aparelho. Nestas
centrífugas (Fig. 22) os tubos mantêm sempre a posição angular, sendo possível
54

obter-se com elas maiores velocidades do que com as do modelo anterior, resultando
daí urna melhor sedimentação. Além disso, cm vê/ de as partículas atravessarem iodo
o comprimento do tubo para sedimentarem, como acontece com y s cent rífugas de
cabeça vertical, deslocam-se neste caso segundo um ângulo de 45-5(1", chovam contra
as paredes do tubo e descem para o fundo, como
Super,ic'.e
u\/re se mostra na Fig. 23. Uma vê/ que o trajecto
rotaçã através do líquido é menor c a resistência ao
Camr.ho
seguido atrito das partículas sobre as paredes do tubo é.
pela geralmente, pequena, a sedimentação torna-se
mais fácil e rápida. É este. aliás, o mol ho por
Ui.pert.ci que alguns sólidos lïoculentos e tin;unente
e livre ern
repouso divididos, dificilmente sedimentáveis numa
centrífuga de cabeça vertical. depositam sem
dificuldade quando submetidos à
Seaim.ertj ern ângulo
centrifugação n u m rotor angular. Hste tipo de aparelho nào
Fig. 23. Sedimentação numa serve, contudo, para a medição volumétrica dos
centrífuga de cabeça sedimentos, pois estes. c'imo a |-ig. 13
cónica mostra, depositam-se formando uni ângulo com o eivo do
lubo.
O terceiro tipo c representado pelas centrífugas de cesto (Fig. 2 4 ) . usadas, sobretudo, para
separar os c ristai s das respectivas águas-màes, servindo ainda para os secar.
O cesto é constituído por um recipiente cilíndrico,
geralmente perfurado, que roda dentro de uma câmara
onde se j u n t a o líquido separado, que é depois retirado
para o exterior através cio tubo lateral que se s i t u a , no
caso da Fig. 25. na parte direita do aparelho.
A fim de se reter o sólido no interior do cesto,
este deve ser previamente forrado com papel dç filtro.
rede de arame de malhas muito apertadas ou qualquer
outro material adequado. Fstas centrífugas, no entanto,
só trabalham bem com sedimentos cristalinos cujas
partículas tenham dimensões ra/.oáveis.
Na realidade, se o produto a sedimentar c de
nature/a gelatinosa, depressa obstruirá os poros do
material filtrante q u e t e n h a sido utilizado para forrar o
cesto, de modo que a filtração, a partir de cerlo Fig. 24. Centrífuga de césio
momento, é retardada ou cessa por completo.
Em casos destes deve usar-se um césio sem orifícios, como o da Fig. 25. A
suspensão a ee n t ri f ug a r é introduzida lenta mas continuamente pela parte i n t e r i o r do
cesto, deslocando-se as partículas sólidas para a perif eria , onde se depositam sobre as
55

paredes, fluindo o líquido límpido pela parte superior para a câmara de drenagem. Quando a
camada do sedimento depositado sobre as paredes do césio atinge proporções consideráveis, o
liquido começa a sair turvo e, nessa altura, é necessário interromper a centrifugação e proceder à
limpeza do aparelho.
Por vezes, utilizam-se centrífugas especiais. Assim, emprega-se uma centrífuga aquecida
para clarificar líquidos viscosos ou quando a substância que se pretende separar tem um
ponto de fusão superior à temperatura ambiente, como acontece com a gordura do leile, cuja
dosagem se faz centrifu-gando a quente aquele Saída do líquido
produto, depois de tratado com ácido sulfúrico.
Existem também centrífugas Sedimento
refrigeradas que se utilizam para centrifugar
produtos biológicos, operando-se a temperaturas
capazes de inibirem as acções enzimáticas susceptíveis
de alterarem os referidos produtos. Estes aparelhos
servem, ainda, para separar substâncias que apenas
se mantêm sólidas a baixas lemperaturas ou para obter
os produtos formados numa cristalização fraccionada a
diferentes temperaturas, como, por exemplo, no Fifl. 25. Sedimentação numa centrífuga de
caso das proteínas do soro sanguíneo. O cesto não perfurado
processo de arrefecimento mais vulgarmente
usado nestas máquinas é um sistema de compressão e
expansão, estando a serpentina de evaporação
colocada no interior do aparelho.
A Fig. 26 representa o diagrama de uma supercentrífuga SHARPLES, tipo centrífuga contínua,
que serve para separar sólidos de líquidos e desfazer emulsões. Esta centrífuga, ao contrário do que
é usual, é movida por um motor colocado na parte superior, verificando-se a separação na parte
móvel, espécie de panela, que eslá suspensa do eixo ligado ao motor. O material a centrifugar entra
pela parte inferior do aparelho e emerge da parte superior deste. Durante o trajecto ao longo da
câmara de separação o material é submetido a uma força centrífuga relativa da ordem de 62 000 G,
de modo que, ao atingir a saída, deu-se a sedimentação das partículas que estavam em suspensão.
As ultracentrífugas constituem um outro tipo de centrífuga especial que se caracteriza pelas
altas velocidades que é capaz de desenvolver. De facto, tais máquinas, que em geral estào equipadas
com um rotor relativamente pequeno, podem
56

atingir mais de 100000 r.p.in, c exercem forças da ordem de l milhão de G. São, por isso, usadas na
investigação de colóides e para determinar o tamanho das partículas e o peso molecular de certos
compostos, como as proteínas e ácidos
nuclcicos, por observação directa ou indirecta do ritmo de separação
das partículas em solução ou em suspensão.
i ir; £s=>i
Motor —
i

i
j
j
j

S
i

.
ü
.
^
4.2.3.2. Cálculo da força centrífuga desenvolvida por uma
centrifugadora

Passados em revista os principais tipos de centrífugas


utilizadas no trabalho laboratorial, consideremos, agora, algun s
aspectos teóricos da forca centrífuga que constitui, no fundo,
o princípio sobre que se baseiam as máquinas que acabámos
de descrever.
Numa imagem bastante simples, poderemos di/er que a força
- Suporte
tntrada centrífuga é representada por um peso fixado na extremidade de um fio
do líquido
girando à volta de um eixo. Ela iguala a força, dirigida para fora do círculo descrito na sua
rotação, que o peso exerce sobre o tio , enquanto LI força
Fig. 26. Diagrama de centrípeta, que se lhe opõe, corresponde á
uma supercenlrífuga força que o fio exerce sobre o mesmo peso puxando-o para dentro e o
Sharples
mantém na sua trajectória circular.
A força centrífuga pode ser expressa em termos de m ú l t i p l o s da força gravitacional. G, e actua sempre
ern direcção perpendicular ao e i x o de rotação. No caso de este ser vertical, como acontece nas
centrífugas de laboratório, o peso do corpo que gira torna-se insignificante quando a força centrífuga
relativa é igual ou superior 25 G. De facto, nestas condições o vector resultante da torça c e n t rí fu g a
q u e p u x a o corpo para fora c o peso de \ g, actuando para baixo, é eq uiv ale nte a 25,09 g ou 25,02 G,
o que corresponde apenas a um acréscimo de 0.08% sobre a força centrífuga, tomada isoladamente. Ora,
como as centrífugas usadas desenvolvem sempre torças centrífugas relativas muito superiores a 25 G, na
prática só se consideram aquelas, despre/ando-se o efeito do peso do corpo, uma vc?. que quanto maior
for a força centrífuga desenvolvida pela máquina m u i s o vector se aproxima da normal ao eixo de
rotação (Fig. 27). A força centrífuga pode calcular-se a partir da expressão:

F = R @2 (1)
57

em que F é a força centrífuga, M a massa do corpo rolante, (O a velocidade angular, e r representa


a distância que vai do eixo de rotação ao centro de gravidade do corpo. Fazendo as necessárias
substituições, a equação (1) pode transformar-se nesta outra:

F' =0,00001117 M r N2 (2)

representando F' a força centrífuga total, expressa em G, M a massa do corpo rolante, em g, N a


velocidade de rotação em revoluções por minuto, tendo r o significado acima referido.

aio de rotação

Força centrífuga =25 G =

25 g

——— ____
a = 2 ° 3'
Vector = 25,02 g

Fig. 27. Força centrífuga

Muitas vezes usa-se uma oulra grandeza chamada força centrífuga relativa (F. C. R.), a qual se
define como o número de gravidade G que aclua sobre uma massa girando à volla de um eixo num
determinado raio e velocidade. A força centrífuga relativa pode ser calculada a partir da equação
(2), desde que se tome para valor de M a unidade. Assim lemos que:

F. C. R. = 0,00001117 r N2 (3)

Dado que a F. C. R. apenas depende do raio e da velocidade da centrífuga, Iodas as partículas,


qualquer que seja a sua forma, massa e densidade, terão, necessariamente, a mesma F. C. R., sem que
isso queira significar que depositarão todas ao mesmo lempo. Na realidade, admilindo que elas
parlem Iodas do mesmo ponlo, as de maior densidade serão as primeiras a sedimenlar, já que a força
cenlrífuga lolal depende da massa das partículas em causa.
O conhecimento exacto do valor da F. C. R. necessário para se conseguir a sedimenlação de
uma determinada suspensão é um elemento da maior importância para que a operação possa ser
executada por oulros operadores sem qualquer dificuldade de maior.
A Fig. 28 iluslra o modo como se determina a F. C. R. e, como se vê, pode lomar-se como valor
do raio de rotação a distância que vai do eixo da centrífuga à
58

superfície livre do líquido contido no tubo ou a que vai desde o referido eixo ao fundo do
mesmo. Deste modo, sabendo-se que a suspensão em causa sedimenta a uma velocidade tal
que origina uma força centrífuga relativa de 491 G à superfície livre do líquido ou de 894
G no fundo do tubo, qualquer outro operador pode conseguir o mesmo desde que meça as
distâncias indicadas na Fig. 28, bastando, depois, calcular a velocidade que se deve
imprimir à centrífuga para atingir os valores de F. C. R. indicados.

No fundo do tubo
F. C. R. = 0.0001117 X 20 X [2.000)* = 894 G
A superfície livra do liquido
F.C. R. = 0,0001117 X 11 X (2.000)2 = 491 G

Fig. 28. Determinação da força centrífuga relativa

4.2.3.3. Pressão centrífuga

Por vezes acontece que os tubos utilizados numa centrifugação rebentam. Este
fenómeno é devido à pressão que o líquido exerce sobre qualquer ponto das paredes do
recipiente que o contém. Em repouso, esta pressão, designada por pressão hidrostática, é
numericamente igual ao produto da densidade do líquido pela altura da camada líquida
medida desde a sua superfície livre até ao ponto considerado (?=hxd), e o seu valor não
justifica, por si só, o estilhaçamento dos tubos de vidro tantas vezes usados no decurso de
uma centrifugação. No caso. porém, de o líquido girar a altas velocidades, a pressão
exercida em qualquer ponto do tubo estará grandemente aumentada devido à forca
centrífuga desenvolvida pela máquina e deve ser designada, mais propriamente, por
pressão centrífuga (P. C.).
A pressão centrífuga é igual à pressão hidrostática multiplicada pela força centrífuga
relativa (3), tomando-se para o seu cálculo, neste caso, como valor de r a distância que vai
desde o centro de rotação até metade da altura do líquido nos tubos de centrifugação. Um
exemplo numérico ajudar-nos-á a fazer uma ideia da magnitude que a pressão centrífuga
pode atingir.
59

Suponhamos que num tubo de centrifugação se colocava uma urina de densidade 1,015, de
modo a atingir a altura de 6 cm. Nestas circunstâncias, a pressão hidrostática exercida pelo líquido
em causa sobre o fundo do tubo seria:

P = h x d = 6 x 1,015-6,09 g. cnr2

Ao pretendermos centrifugar esta urina, o tubo em questão foi colocado numa centrífuga em
que a distância do eixo de rotação ao fundo do tubo era de 12 cm e a que se imprimiu uma
velocidade de 3000 r.p.m. Como nas condições operatórias a distância do eixo de rotação ao centro
da coluna de líquido, C, c igual a 9 cm, a F. C. R. desenvolvida, calculada pela equação (3), será:

F. C. /?. = 0,00001117x9x(3000) 2 = 905 G

Deste modo, a pressão centrífuga a que está sujeito o fundo do tubo é PC = P x F

C. R. = 6,09 x 905 = 5511 g. cnr2

não devendo causar estranheza, portanto, que um tubo de vidro possa rebentar durante a operação,
dada a força que se exerce sobre o seu fundo.
É evidente que se podem utilizar tubos feitos de material mais resistente que o vidro,
fabricando-se tubos metálicos e de plástico para serem empregados nas centrifugações. No entanto,
é relativamente fácil contrabalançar a pressão exercida no interior de um tubo de centrifugação e
evitar, deste modo, o seu estilhaçamento. Para isso, basta encher o espaço entre o tubo de vidro e o
suporte metálico com um líquido apropriado, o qual exercerá então uma pressão centrífuga dirigida
do exterior para o interior do tubo, capaz de anular em parte a pressão interna.
Retomando o exemplo da Fig. 29, admitamos que colocávamos água dentro do suporte
metálico, de modo a obtermos uma camada com a altura de 5,5 cm. Nestas condições, a pressão
hidrostática exercida por esta sobre o fundo do tubo de vidro era

P = h.d = 5,5 g. cm-2 Por


outro lado, sendo
r =12-2,75-9,25

a F. C. R. que se desenvolve será

F. C. R. -0,00001117 x 9,25 x (3000)2= 930 G

Deste modo, a pressão centrífuga exercida pela água sobre o fundo de vidro será

5,5x930 G = 5115 g. crrr2


60

Dado que a pressão centrífuga no interior do tubo de vidro é. como vimos, de 5511 g. c m -
e existe agora uma outra, exercida de tora para dentro, de 5115 g. cm"2, o vidro fica apenas sujeito
a uma pressão de 3% g. cm 2, por ele perfeitamente suportada.
- ———————— 6 crn ———
————
1 2 cm

í ï —————— c ——————
, t
Superfície livre do

liquido Tubo de
t
-• ——————— 5.5 cm —— X K \ \ i
——— .

Suporte metálico

Fig. 29. Força centrífuga e pressão hidrostàlica

No exemplo dado o líquido usado para encher o espaço entre o suporte e o tubo foi a água,
mas em alguns casos terá que usar-se um líquido mais denso, como a glicerina ou o elilenoglicoi.
É evidente que a escolha do fluido a u l i l i / a r nesta espécie de almofadagem dos tubos de
centrifugação dependerá" da densidade do produto a centrifugar, pois quanto maior ela for, mais
elevada terá que ser lambem a densidade do líquido exterior para que a pressão .seja reduzida a um
valor compatível com a resistência do tubo. Aliás, é mesmo possível conseguir-se que as pressões no
interior e no exterior do tubo sejam perfeitamente iguais e, neste caso, aquele flutuará dentro do
suporte metálico, o que representa a condição ideal para se reali/ar uma centrifugação.

4.2.3.4 Indicadores de velocidade

As cenírifugadoras têm sempre um disposilivo acopulado que permite determinar o número de


revoluções a que giram, pois só assim é possível podermos calcular a força centrífuga por elas
desenvolvida.
Em certos modelos o indicador de velocidade está montado na lampa da caixa metálica que
encerra o rotor, sendo constituído por um mostrador lendo inscrita uma escala sobre a qual se move uma
agulha. Esta, por sua vê/, está ligada a uma mola ou a uma haste metálica que se projecta para o
interior da máquina, encaixando a respectiva extremidade na parte superior do eixo do rotor,
estando a lampa fechada. Deste modo, quando a centrífuga está a trabalhar, a agulha roda
solidariamente
61

cem o seu eixo e marca na escala o número de revoluções por minuto a que ela gira.
Noutros modelos o indicador de velocidade é um tubo de vidro, cheio, ate certa altura, de
líquido, tendo gravados traços sobre os quais estão inscritos vários números. Quando a centrífuga
está parada, a superfície livre do líquido corresponde ao zero da escala e dispòe-se
horizontalmente, mas logo que a máquina entre em movimento o líquido toma a forma de um para-
bolóide de revolução cujo vértice desce à medida que a velocidade aumenta. A
posição do vértice sobre a escala gravada nos tubos indicará, deste modo, o
número de rotações que a centrífuga está dando em determinado momento.
Estes indicadores baseiam-se, portanto, na altura que a parábola descrita
pelo líquido encerrado dentro do tubo de vidro atinge estando este em
movimento, conforme está indicado na Fig. 30. Suponhamos, então, que temos
um recipiente cilíndrico, cheio de líquido até certa altura, c rodando à Fig. 30. Indicador de
volta de um eixo cenlral com velocidade uniforme. Nestas condições, a velo-cidadde de unia
superfície livre do líquido, que em repouso c horizontal, toma a forma de centrífuga
um parabolóide de revolução cuja altura pode ser calculada pela relação

h= (4)
2g

em que v é a velocidade linear do cilindro à sua periferia c # a aceleração da gravidade; por


sua vez

ou v - 2 TC r x r.p.m./60 v = 0,1047xrxr.p.m. (5)

E de notar que a altura, hr da parábola acima da superfície livre do líquido cm repouso, é igual
a hr que representa a distância desse mesmo ponto ao vértice da parábola. Portanto,
l h^h^ —
h (6)
* 2

Sendo a altura da parábola, /;, independente da natureza do líquido, especialmente da


respectiva densidade, e apenas dependente da velocidade periférica, pode tomar-se, por conseguinte,
essa altura como indicador das velocidades atingidas pelas centrífugas, desde que os seus eixos
estejam na posição vertical. Assim, para se graduar um indi-
62

cador de velocidade deste tipo basta conhecer-se o raio do tubo para calcularmos a
velocidade linear à periferia e, a partir desse valor, a altura da parábola. Imaginemos que se
pretendia marcar um tubo com 0,6 cm de diâmetro para indicar velocidades compreendidas
entre 500 e 3000 revoluções por minuto. O zero da escala corresponde, como já se disse, á
superfície livre do líquido em repouso; para obter a marca correspondente a 500 r. p. m.
calcula-sc, em primeiro lugar, a velocidade linear periférica correspondente a esta rotação
pela fórmula (6):

v -0,1047 x 0,3 x 500 =15,7 cm. s~' A altura

total da parábola será, de acordo com a equação (4)

(15 J)2
h = ————— = 0,125 cm 2x980

mas como o vértice apenas cai abaixo da superfície livre em repouso metade d*i altura total da
parábola, isto é, h2 (Fig. 30), a distância a que ele baixa quando o cilindro gire a 500 r.p.m. será,
evidentemente, igual a 0,625 mm. Deste modo, marcar-se-á no tubo de vidro um traço distante
0,625 mm da superfície livre do líquido em repouso, o qual indicará 500 r.p.m., Procedendo a
cálculos idênticos, verificar-se-á que a distância de 2,52 mm corresponde a 1000 r.p.m., 5,7 mm a
1500 r.p.m., 10,1 mm a 2000 r.p.m., 15,7 mm a 2500 r.p.m. e 22,7 mm a 3000 r.p.m.

4.2.3.5. Prática da centrifugação

A primeira operação a fazer para se proceder a uma centrifugação consiste em carregar os


tubos com o material a centrifugar, devendo tomar-sc a precaução de que os tubos que irão
trabalhar em posição oposta tenham a mesma massa total (massa do tubo + material a centrifugar).
Esta precaução torna-se indispensável para evitar avarias graves da máquina no decurso da
centrifugação, as quais podem chegar mesmo à sua destruição. Com efeito, sendo a força centrífuga
função não só da velocidade angular mas, também, da massa do corpo que se encontra animado de
movimento circular (equação (1)), poderá acontecer que se produzam valores da citada força
acenluadamente desiguais em tubos colocados em posição oposta. O resultado deste fenómeno seria
a existência não de um movimento de rotação do eixo da centrífuga mas de um movimento de
translação que conduziria, fatalmente, à sua rotura, com todas as consequências que são fáceis de
imaginar.
Para se equilibrar dois tubos basta pô-los um ao lado do outro e enchê-los até à mesma altura,
desde que a sua capacidade não exceda 20 ml. Uma vez colocados os
63

tubos nus suportes metálicos, é conveniente encher com água ou outro líquido apropriado o
espaço entre o suporte e a parede do tubo. sempre que a c ent rifuga ção se faça a 2000 r. /j. m. ou
mais. para contrabalançar a pressão c e nt r íf u g a sobre o interior dos tubos.
Utilizando tuhos de capacidade superior a 5U ml é necessário usar um processo mais
rigoroso para avaliar a quantidade de suspensão a verter em cada par de tuhos. Em geral,
tratando-se de centrífugas de cabeça vertical, aconselha-se colocar «s tubos, encaixados nos
respectivos suportes, nos pratos de uma balança, vertendo em cada um a suspensão, até se obter
igualdade de peso dos dois conjuntos. Outras ve/cs co locam--se apenas os tubos de vidro dentro
de dois copos dispostos nos pratos de uma balança, que se equilibra, procedendo-se, então, como
no caso anterior.
Alem disso, trabalhando com tubos desta capacidade, c sempre recomendável proceder à sua
almofadagem com água ou outro líquido, independentemente da velocidade que se imprime à
centrífuga.
Uma vez colocados os tubos na centrífuga, esta é fechada, iniciando-se. assim, a operação
propriamente dita. Para isso, liga-se, em primeiro lugar, a máquina à corrente eléctrica, devendo
u reóstato que comanda a velocidade do rotor estar na posição correspondente ao zero. A
velocidade da centrífuga deve ser aumentada, depois, gradualmente, até atingir o valor
pretendido, sendo necessário, porém, nunca ultrapassar o limite marcado pelo fabricante do
aparelho, sob risco de se provocar a quebra de qualquer peça metálica e originar acidentes
graves se uma delas for lançada para fora da máquina, dada a considerável força com que
actuaria sobre qualquer obstáculo com que colidisse.
Temi i nada a centrifugação é necessário parar a centrífuga, diminuindo-se a velocidade mmVo
iggfmj.sf/mnífr, para evitar que o líquido redemoinhe dentro dos tubos e levante o sedimento formado
durante a centrifugação. Este pormenor deve ser sempre respeitado se se quiser obter um líquido
perfeitamente límpido, mas deve ser especialmente observado sempre que o sedimento não fique
bem comprimido contra o l und o do tubo, o que acontece quando é de natureza flocosa ou
constituído por partículas muito leves que têm tendência para se disseminar no líquido ao
menor movimento.
Os pormenores que acabámos de descrever d i/e m respeito apenas às centrífugas de c<j/M%Yf
wf/et// e (/«x"/^'' pois as rcv;?;Vyif,(^ f/r rrsffj são operadas de modo diferente. No caso do cesto ser
perfurado, é necessário forrá-lo, previamente, com um material filtrante apropriado, após o que se
põe a centrífuga a girar a pequena velocidade. Lança-se, então, na máquina em movimento um
pouco da suspensão a cent ri lugar, para que o elemento filtrante adira perfeitamente às paredes
do cesto, após o que se aumenta a velocidade da centrífuga. A partir deste momento vá i-se
introdu/mdo a suspensão a pouco c pouco, de acordo com o ritmo a que se faz a drenagem do
líquido para o exterior, ficando o sólido retido sobre o filtro que forra o cesto. Terminada a
operação, a centrífuga é desligada c deixada parar por si, altura em que é aberta e retirado o
sólido depositado.
64

4.2.4. FILTRAÇÃO 4.2.4.1.

Generalidades

A filtração é a separação das partículas sólidas em suspensão num líquido por efeito de uma
pressão sobre uma superfície porosa, ficando o sólido retido e passando o líquido através das
aberturas do septo filtrante.
Toda a substância capaz de fazer a referida separação é denominada filtro, o qual, para actuar
convenientemente, deve ser montado numa base ou suporte.
Para que se possa executar uma filtração são necessárias várias condições. Como é lógico,
terá que haver um septo filtrante e será preciso que durante a operação exista uma diferença de
pressão nos dois lados do mesmo; além disso, há que fornecer a suspensão a filtrar à parte onde a
pressão é mais elevada e que remover o líquido do lado do septo onde a pressão é mais baixa. Os
sólidos retidos pelo seplo filtrante constituem o resíduo, ao passo que o líquido que o atravessa
representa o filtrado.
A filtração é uma operação da maior importância, quer do ponto de vista laboratorial, quer
industrial, e pratica-se com dois objectivos distintos: para isolar e aproveitar os sólidos em
suspensão num líquido ou para obter filtrados límpidos e altamente clarificados.
Estão incluídos no primeiro caso o isolamento de precipitados e de cristais formados no
decurso de uma cristalização, a remoção de líquidos aderentes a sólidos, a obtenção de precipitados
com fins analíticos, etc., etc.
O segundo objectivo da filtração é aquele que mais interessa à Técnica Farmacêutica, pois
numerosas substâncias medicamentosas são administradas sob a forma de solução, a qual deve
apresentar-se sempre convenientemente límpida e transparente.
A natureza dos produtos sujeitos à filtração varia enormemente e dela está dependente a sua
filtrabïiidade', ou seja, a maior ou menor facilidade com que podem ser filtrados. Assim, alguns
líquidos são particularmente difíceis de filtrar, constituindo um verdadeiro problema a sua
clarificação, ao passo que certas soluções viscosas podem originar filtrados límpidos mas a um
ritmo tão lento que a operação se torna extremamente morosa.
Outra classe de produtos de difícil filtração é representada pelas suspensões coloi-dais, como
os soles de ouro, sulfuretos de arsénio, etc., que só podem ser clarificados por ultrafíltração,
utilizando membranas especiais. Por outro lado, existe uma grande variedade de substâncias,
caracterizadas por apresentarem uma estrutura cristalina ou granular, as quais, geralmente, são
filtráveis sem qualquer dificuldade.

Se relacionarmos as características dos produtos mencionados nos exemplos atrás citados e a


filtrabilidade por eles apresentada, torna-se evidente que esta se mostra dependente da forma das
partículas em suspensão, da sua falta de resistência à compres-
65

são, do grau de hidratação e, ainda, da viscosidade do líquido, a qual constitui, sem dúvida, o factor
que mais influencia a velocidade de filtração. Há, portanto, a maior vantagem em estabelecer uma
relação entre a filtrabilidade e as características das partículas sólidas em suspensão, pois deste modo
toma-se possível estabelecer o comportamento provável de qualquer produto durante uma filtração.
Para que tal relação possa ser tentada é necessário, porém, dispor-sc de uma classificação de
partículas para efeitos de filtração. Em geral, estas classificações são meramente empíricas e uma
das que se pode considerar como adaptável ao fim em vista é a que classifica os produtos sujeitos à
filtração segundo a estrutura física das partículas que os constituem, lendo em vista, especialmente, a
sua deformação sob pressão. Atendendo a este critério, agrupam-se as partículas sólidas cm três
tipos distintos: rígidas, semicompressíveis e compressíveis.
Apesar de se afirmar que as partículas finamente divididas, quando suspensas e molhadas por
um líquido, podem sofrer uma certa compressão, a verdade é que as partículas cristalinas e
granuladas são tão pouco sujeitas a deformações nas condições em que se realiza a maioria dos
processos de filtração que podem ser consideradas essencialmente rígidas. Deste modo, tais
partículas originam sobre o filtro uma camada filtrante dotada de elevada porosidade e
permeabilidade, sendo de esperar que não venham a entupir os septos filtrantes, dada a pouca
tendência que apresentam para serem forçadas a penetrar nos orifícios
daqueles. Na realidade, conforme a fig. 31 mostra, as partículas rígidas, por
não se deformarem devido à pressão sobre elas exercida pelo líquido onde
estão suspensas, originam cana-Hculos bem delimitados, através dos quais o
líquido pode f lu ir livremente até atingir a superfície filtrante, o que confere
à filtração nestas condições uma apreciável velocidade.
Já o mesmo não acontece, porém, corn as partículas com-pressíveis, que Fig. 31. Diagrama
mostrando a
sofrem apreciável deformação quando sujeitas a uma pressão. Em resultado formação de
disso, têm tendência para se encostarem umas às outras e, portanto, os canalículos na filtra-
interstícios da camada filtrante apresentam-se muito mais estreitos c menos ção de partículas
perfeitamente delimitados. Acresce, ainda, que certas partículas compressíveis podem achatar contra
a superfície filtrante, formando uma película que dificulta a passagem do líquido através dos
respectivos poros ou penetram neles, acabando por obstruí-los, o que toma a filtração dificilmente
realizável. Estão neste caso a maioria das substâncias coloidais e altamente hidratadas, bem como
os precipitados gelatinosos, de natureza gomosa, gordurosa e todos os produtos amorfos, em geral.
Por isso, a filtração de suspensões contendo partículas cujas características correspondem às que
acabamos de apontar é sempre morosa, por vezes difícil, havendo necessidade de recorrer em muitos
casos a técnicas especiais.
66

4.2.4.2. Teoria da filtração

Uma vez que os materiais a filtrar são os mais diversos e os objectivos da filtração também
variam, o aspecto teórico da filtração está longe de ter sido solucionado, pois até à data ainda não
surgiu uma teoria que abarcasse a questão nos seus múltiplos aspectos.
Em vista disso, e até porque nos parece que o assunto estaria deslocado aqui, pensamos não
ser aconselhável tratar, desenvolvidamente, os aspectos matemáticos das diversas teorias que têm
sido formuladas a respeito da filtração. Somos, porém, compelidos a fazer-lhes uma breve
referência, pois só assim se poderão compreender racionalmente os princípios básicos que regem
esta operação. Antes de mais, contudo, fixemos a nossa atenção na série de fenómenos que se
desenrolam na filtração.
Em geral, os produtos a filtrar são constituídos quase sempre por partículas sólidas de
diferentes formas e tamanhos, se não mesmo pertencentes a diferentes tipos, suspensas num líquido.
Quando se verte uma suspensão destas num filtro, o sistema sólido-
-líquido entra em contacto com aquele e, como há diferença de pressão nos dois lados do septo
filtrante, o líquido passa através dele, ficando retidas as partículas maiores. Acontece, porém, que o
líquido arrasta, usualmente, consigo algumas partículas suspensas, podendo suceder que as de
menores dimensões acabem por atravessar o filtro e que outras fiquem retidas, mecanicamente,
dentro dos poros daquele, com a consequente diminuição das respectivas aberturas. Por outro lado,
as partículas maiores, depositadas à superfície do septo filtrante, formam uma estrutura sobre as
aberturas dos poros, reduzindo as suas dimensões, sem, no entanto, os obstruírem completamente.
Deste modo, vai-se formando o verdadeiro septo filtrante, constituído por duas partes distintas
mas profundamente interligadas: o filtro e as partículas suspensas que ficam retidas e que se vão
depositando sob a forma de uma camada à superfície daquele. Pode dizer-se, então, que a filtração
está em pleno funcionamento, tornando-
-se o líquido que atravessa a camada filtrante progressivamente mais límpido e livre de partículas
sólidas. O líquido é, assim, obrigado a caminhar ao longo dos interstícios deixados entre si pelas
partículas sólidas da referida camada, até atingir o filtro propriamente dito, que constitui o último
obstáculo a vencer, para poder fluir livremente para o exterior.
Mas, como é natural, o deslocamento do líquido através dessa rede de finos canalículos faz-se
perante uma resistência que lhe é oposta pelo próprio filtro e pelas partículas que constituem a
camada filtrante. A resistência devida ao filtro não varia de modo significativo durante a filtração é
manifesta-se como consequência da sua espessura e porosidade. Já o mesmo não acontece com a
resistência oposta pela camada de partículas depositadas sobre o filtro, a qual, longe de ser
constante, aumenta, em geral, de modo contínuo durante a operação. Tal resistência depende do
aumento da espessura da camada filtrante e das características físicas das partículas que a
compõem, pois, conforme se trata de partículas rígidas, semicompressíveis ou compressíveis, assim a
67

velocidade da filtração se torna cada vê/ mais lenta, sendo, então, necessário aumentar a pressão se
quisermos manter o ritmo de escoamento.
Resumindo, poae JÍ7er-se que o escoamento do líquido através de uma camada filtrante é
comandado por duas forcas antagónicas, sendo favorecido por uma delas, ou seja, a pressão
diferencial, ao passo que é dificultado pela outra, representada pela resistência oferecida pêlos
elementos da unidade filtrante, considerada como constituída pelo filtro e pela camada sólida «^bre
ele depositada.
Estes dois factores são d_ tal importância que figuram sempre nas fórmulas que têm sido
propostas para traduzir, matematicamente, o fenómeno da filtração. Assim, no caso da camada
filtrante ser constituída por partículas rígidas, admite-se que os respectivos interstícios
correspondem a uma multiplicidade de tubos capilares e, nestas condições, a velocidade do fluxo do
líquido através deles pode ser expressa pela forma que representa a lei de POISEUILLE:

V = pnrt/8 Kl ( 1 )

em que V é o volume de líquido que escoa na unidade de tempo através de um capilar de


comprimento / e raio r quando se estabelece uma pressão diferencial p, e K é o coeficiente de fricção
interna ou viscosidade do líquido. Generalizando esta lei ao caso de uma superfície filtrante de
espessura L e formada por N capilares por unidade de área, teremos que:
V = Np^tlS KL (2).

De acordo com esta fórmula, verifica-se que, mantendo-se constantes os outros elementos, a
velocidade de filtração é directamente proporcional à diferença de pressão nos dois lados do filtro e
inversamente proporcional à espessura deste. Acontece, porém, que a equação (2) pressupõe que o
comprimento dos capilares é o mesmo em toda a espessura da camada filtrante, o que está longe de
se verificar, além de que os valeres de N e r não são, em regra, conhecidos e raramente podem ser
determinados, Deste modo, e apesar de a expressão de POISEUILLE ter servido como ponto de partida
para o tratamento matemático da filtração, tornou-se inadequada na prática, sobretudo nos casos
em que os sólidos que formam a camada filtrante são constituídos por partículas heterogéneas e
compressíveis. Os desvios geralmente observados em relação à lei de POISEUILLE são devidos à
resistência e ao seu carácter variável, e esta, como já se disse, é exercida principalmente pelo filtro e
pêlos sólidos sobre ele depositados.
A resistência oferecida pelo filtro é geralmente tomada, nas considerações matemáticas da
filtração, como o valor que atinge após iniciada esta, quando os interstícios do filtro estão
parcialmente obstruídos e se iniciou já a formação da camada filtrante. No entanto, mesmo a partir
deste momento tal resistência pode variar, pois depende de vários factores, como a pressão, a
natureza das partículas, etc. Por outro lado, a resis-
68

tência devida à camada filtrante varia com a respectiva espessura, mas é de notar que apenas no
caso de sólidos perfeitamente rígidos tal aumento é proporcional ao aumento da espessura.
Ora, uma das premissas sobre que se baseia a aplicação da lei de POISHUILLE à filtração é a de
a superfície filtrante ser constituída por partículas inteiramente inde-formáveis, mas tal condição
está longe de ser observada na prática. Na realidade, uma das causas que frequentemente modifica a
resistência oferecida pela camada filtrante no decurso de uma filtração é o rearranjo e disposição
das partículas muito finas entre os espaços deixados pelas partículas maiores, sob o efeito de uma
pressão prolongada, a qual origina, ainda, a deformação dos elementos compressíveis da camada,
tudo isto concorrendo para que a resistência vá aumentando.
Em consequência dos factos apontados surgiram outras teorias para a filtração. podendo citar-
se, entre elas, a de KOZENI, primitivamente estabelecida para as camadas porosas e aplicada, depois,
às camadas filtrantes. Como base desta teoria admite-se que a resistência oposta à passagem de um
líquido através de uma camada sólida é função da superfície com ele em contacto.
A teoria de KOZENI serviu de ponto de partida para o estabelecimento de várias equações
aplicáveis a problemas específicos da filtração. Uma dessas equações é a de KOZENI-CARMAN, que
pode ser expressa do seguinte modo ('):
\ ^ i r ^APgi
L KS2(l-e)2\ L n L J
V=
e em que

V = velocidade linear do fluxo de líquido;


5 = superfície por unidade de volume da camada filtrante, em cmVcm-1; e = porosidade da
camada, tomada como a relação volume dos poros/volume da camada filtrante;
A = área da secção horizontal da camada filtrante;
Ap = diferença de pressão de ambos os lados da camada filtrante;
Ti = viscosidade do líquido;
g = aceleração da gravidade;
L = espessura da camada filtrante; '
K = constante.

Esta fórmula, como, aliás, a de POISEUILLE, indica que o fluxo de líquido é directamente
proporcional à diferença de pressão através da camada e à respectiva área, c inversamente
proporcional à viscosidade do líquido, à espessura da camada e à super-

(') GIBALDI, M., in RemingtorTs Hharmaceutical Sciences, pág. 319.


69

fície por unidade de volume da referida camada. Como se vê, nesla fórmula são introduzidas duas
novas grandezas, S e c, para caracterizarem a camada filtrante em vez do raio dos respectivos poros,
figurando, ainda, uma constante. K, cujo valor se situa entre 3 e 6. Na prática, a utilização desta
constante não definitiva permite um maior rigor
71
no cálculo dos resultados do que a constante introduzida por POSIEUILLC —,
o
que não varia com o sistema filtrante. °
E evidente que a fórmula de KOXLNI-CARMAN também está sujeita a várias limitações, pois, entre
outros factores, exige que a porosidade se mantenha constante, que as partículas tenham dimensões
muito semelhantes, que a diferença de pressão nas duas extremidades da camada seja elevada e que
os fenómenos de superfície sejam desprezáveis. Ora, estas exigências nem sempre são satisfeitas,
motivo por que tul fórmula na© conduz, invariavelmente, a resultados exactos, mas, apesar disso,
representa um elemento muito ú t i l para o estudo da filtração. Entre as limitações da sua
aplicação citamos a filtração por papel, em que é preferível utilizar a fórmula de POISHUÍLLK. ao
contrário do que sucede tratando-se de sistemas constituídos por leitos filtrantes de materiais muito
porosos.
Mais recentemente, urna outra teoria permitiu elaborar, a partir da lei de DAKCY, a equação
seguinte que relaciona os factores de que depende a velocidade de filtração, qualquer que seja o
scpto filtrante utilizado
S x AP x B
Q-——————°-
em que
, Q = débito da filtração
S = superfície út i l de filtração
AP = pressão diferencial
B(i = permeabilidade do meio filtrante
n = viscosidade do líquido
e = espessura da camada filtrante

Nesta expressão a permeabilidade exprime-se em dareis e indica a capacidade do tildo em


deixar passar o líquido a filtrar.
Verifica-se que a filtração está dependente de factores inerentes ao líquido a filtrar e à
camada filtrante, podendo alguns deles serem modificados na prática para se conseguir uma filtração
mais rápida.
No que diz respeito ao líquido, o elemento mais importante a considerar é a respectiva
viscosidade, que retarda, apreciavelmente, o ritmo da filtração. Como, porém, u viscosidade
d i mi n u i com a temperatura, torna-se evidente que uma filtração a quente será sempre mais rápida
do que à temperatura ambiente, c mais adiante veremos como pode fazer-se uma filtração nestas
condições, que se impõe utilizar sempre que se trabalhe com líquidos altamente viscosos, como as
soluções oleosas.
Como factores inerentes à camada filtrante temos a considerar a porosidade c espessura.
Dado que a porosidade depende do diâmetro das partículas, segue-se que
70

quanto maiores elas forem maior será a velocidade média da filtração tomando-se, portanto,
evidente a conveniência de a camada filtrante ser constituída por grânulos o mais grossos possível.
Tratando-se de uma filtração de cristais, as dimensões destes podem, até certo ponto, ser
modificadas pelo operador, para o que basta intervir nas condições da cristalização, de modo a
favorecer a formação de cristais do tamanho adequado. Casos há, porém, em que é impossível
modificar as dimensões das partículas a filtrar, e, então, recorre-se a substâncias especiais,
denominadas adjuvantes de filtração, que se caracterizam por terem uma elevada porosidade e que
adicionadas ao sólido a filtrar aumentam a porosidade da camada formada por este.
A medida que a filtração se processa, a espessura da camada filtrante vai aumentando, do que
resulta uma diminuição do débido de filtrado. Esta diminuição do fluxo de líquido pode, aliás, ser
compensada aumentando a área da superfície filtrante e a pressão diferencial actuante sobre os dois
lados do septo filtrante. Deve ter-se em atenção, porém, que um aumento de pressão só beneficiará a
velocidade da filtração desde que não provoque uma diminuição da porosidade da camada,
significando isto que este último processo só facilitará o fluxo do líquido desde que o septo poroso
seja constituído, inteiramente, por partículas rígidas. Caso contrário, o aumento da pressão poderá
exercer um efeito oposto ao que se pretende obter.

4.2.4.3. Materiais filtrantes

Os materiais filtrantes, ou, como mais correntemente são designados, os filtros, podem ser
constituídos pelas mais variadas substâncias, que, no entanto, devem obedecer a certas condições.
Assim, as membranas filtrantes devem ser inertes, isto é, não devem reagir com o líquido a
filtrar nem dissolver-se nele, além de que deverão sofrer um mínimo de alterações de ordem física
por contacto com os líquidos, não devendo inchar, distorcer ou engelhar. Dada a multiplicidade de
produtos que podem ser sujeitos à filtração, deverá escolher-se o filtro mais adequado a cada caso
particular, mas tal escolha, em princípio, é norteada pela ideia de que a superfície filtranle a
empregar deverá deixar passar o máximo de líquido e reter, convenientemente, os sólidos em
suspensão. Passaremos, seguidamente, em revista alguns dos materiais filtrantes utilizados na
prática corrente.

4.2.4.3.1. Papel

O papel de filtro representa, sem dúvida, a superfície filtrante mais largamente utilizada em
todos os laboratórios químico-farmacêuticos. Usado na filtração desde há muito, o papel para fins
laboratoriais foi grandemente melhorado pelo célebre químico BFRZELIUS e a sua fabricação
continua a ser altamente especializada, a ela se dedicando apenas algumas firmas de reputação
internacional.
71

O papel de filtro é um papel não gomado e calandrado de modo especial, para que as fibras
permitam um escoamento rápido do líquido e aparece no mercado sob várias formas, as mais comuns
das quais são as variedades circular e folha quase quadrada. Mais importante do que a forma é a
textura do papel, que condiciona as suas propriedades filtrantes. A textura de um papel de filtro pode
ir desde o tipo mole até ao duro e extraduro, passando por vários graus intermédios de porosidade.
Os papéis duros podem apresentar vários aspectos, tais como lisos, rugosos ou com aparência de
crepe. Também a sua pureza varia bastante, podendo ser representada pelas seguintes qualidades:
crua, refinada, isenta de cinzas, de gordura, de amido, etc. Os papéis de filtro podem ser fabricados
com variadas espessuras, tendo os papéis mais grossos poros mais largos do que os papéis finos.
Na análise química, especialmente na análise gravimétrica, utilizam-se papéis de filtro
altamente purificados, os quais fornecem, por incineração, um peso de cinzas determinado e
conhecido, que é subtraído ao peso registado após a incineração dos precipitados. Na prática
laboratorial corrente, quando a filtração é praticada com o objectivo de se obter a clarificação de
líquidos, aconselha-se trabalhar com papéis do tipo correspondente à textura espessa, pois têm poros
mais abertos e permitem filtrações a ritmo mais acelerado. Os vários fabricantes usam uma
classificação própria para os seus papéis e cada utente deve familiarizar-se com ela, a fim de poder
escolher as qualidades que mais lhe possam interessar.

4.2.4.3.2. Polpa de papel

As polpas de papel ou de celulose podem ser empregadas na filtração por gravidade ou para
formarem camadas filtrantes na filtração por sucção. Tais produtos são ainda usados como
adjuvantes na filtração de produtos dificilmente filtráveis, adicionando-se aos líquidos sob agitação.
No comércio encontram-se vários produtos industrializados de polpa de papel, sob a forma de pó
ou de pastilhas, a qual também pode ser facilmente preparada no laboratório por desintegração de
papel de filtro. Para isso, basta humedecer com solução de hidróxido de sódio o papel cortado em
pequenos fragmentos e procurar, depois, desagregá-lo por trituração num almofariz, ou, melhor
ainda, num liquefactor provido de navalhas, colocando-se a polpa assim obtida num funil com
algodão e lavando-a com água até esta não acusar alcalinidade. Procede-se, depois, à secagem numa
estufa e conserva-se em frascos rolhados o produto assim obtido.

4.2.4.3.3. Tecidos

Tecidos feitos de variadíssimas fibras podem ser utilizados quer como suportes de superfícies
filtrantes, quer, propriamente, como filtros. Exceptuando, porém, o seu emprego na filtração de
xaropes, os tecidos raras vezes são usados na prática labora-
72

torial corrente, estando o seu uso quase exclusivamente reservado às técnicas de filtração em larga
escala.
Em princípio, qualquer tecido poderá ser empregue na filtração desde que seja compatível
com o líquido a filtrar, dependendo as suas características de filtração das fibras de que é feito, do
seu peso, trama, etc.
Geralmente, os tecidos de fibras naturais, como os de algodão, lã e juta, são mais apertados do
que os de fibras sintéticas ou de vidro, devido ao facto de aquelas apresentarem uma superfície
ondulada e coberta por filamentos extremamente finos. Apesar de se caracterizarem por uma alta
faculdade de retenção de partículas, os tecidos de fibras naturais incham frequentemente quando
humedecidos, facto este que se acentua com o seu uso repetido e os torna superfícies filtrantes
bastante morosas. Outro inconveniente apresentado por esta classe de tecido é o de engelharem
acentuadamente depois de molhados e secos.
Os materiais têxteis sintéticos, como o nylon e outros, apresentam nítidas vantagens sobre os
tecidos naturais no campo da filtração, pois não incham nem engelham depois de secos, além de que
suportam melhor o contacto com certos líquidos.
A Miliipore Filter Corporation prepara três tipos de filtros com base em nylon puro, designados,
respectivamente, por DURALON NC (14|i) ('), NS(7|4.) (') e NR(1(4.) ('), os quais se caracterizam por
serem quimicamente muito resistentes, não suportando, porém, temperaturas superiores a 75°C. A
mesma firma produz filtros de cloreto de polivinilo, denominados POLÏVIC BC (6\i) ('), os quais são
recomendados para a filtração de ácidos e bases concentrados, a temperaturas inferiores a 60"C,
Os tecidos de vidro são ainda mais resistentes, pois suportam temperaturas elevadas, podem
contactar com a grande maioria dos reagentes químicos, incluindo os ácidos concentrados. São,
porém, incompatíveis com os álcalis quentes e o acido fluorídrico, além de que o seu preço é elevado
em relação ao dos outros tecidos.

4.2.4.3.4. Materiais fibrosos

As fibras naturais, excepção feita para o algodão, pouco ou nenhum uso têm recebido no
campo da filtração. Nos laboratórios da oficina farmacêutica está, no entanto, muito generalizada a
prática de se filtrarem certas soluções através de uma pequena porção de algodão hidrófilo
adaptada a um funil. Este processo origina líquidos bem clarificados desde que o filtro seja
previamente lavado para se arrastarem as fibras soltas, mas só funcionará eficientemente com
soluções de fraca viscosidade, pois o algodão torna-se compacto uma vez molhado e por efeito da
pressão da camada líquida.
O algodão de vidro constitui um bom malerial de filtração, pois apresenta todas as qualidades
atrás assinaladas aos tecidos de igual fibra. Usa-se, geralmente, sob a forma de uma camada
aplicada a um funil e presta óptimos serviços na filtração de líquidos corrosivos, como os ácidos
concentrados, que atacam o papel e outros meios filtrantes.

(') Os números indicam os diâmetros médios dos poros dos vários tipos de filtros.
73

As fibras soltas de asbesto ou amianto também têm aplicação como meio filtrante. Assim é que
na análise química gravimétrica se utiliza nos cadinhos de GOOCH uma variedade de asbesto
designada por anfíbolo, o qual é um silicato de cálcio e magnésio bastante anidro. O amianto
destinado à filtração deve ser convenientemente escolhido e aquele destinado a ser utilizado nos
cadinhos de GOOCH deverá ser de alta pureza e constituído por fibras compridas e dotadas de certa
flexibilidade.
O amianto pode ser igualmente utilizado na filtração sob a forma de placas, pré ferindo-se,
neste caso, a variedade designada por crisótilo, a qual é um silicato de magnésio hidratado e menos
inerte que o anfíbolo, sendo dotada de certa capacidade adsorvente. Deve ter-se em conta que o teor
de ferro dos amiantos varia consideravel-mente com a sua origem, podendo, por vezes, originar
incompatibilidades com os líquidos filtrados.

4.2.4.3.5. Meios filtrantes rígidos

Como o próprio nome sugere, estes materiais filtrantes distinguem-se dos anteriores p»r serem
dotados de rigidez, o que lhes permite apresentar forma definida e permanente. As superfícies
filtrantes rígidas distinguem-se por serem dotadas de elevada robustez, o que lhes confere grande
duração, e possuírem bom poder clarificador. A par destas qualidades de carácter positivo
apresentam algumas desvantagens, a maior das quais é a de serem, por vezes, de difícil limpeza.
Alguns produtos de natureza orgânica complexa obstruem estes filtros de tal modo que os inutilizam
rapidamente. Além disso, as superfícies filtrantes rígidas originam filtrações muito lentas e
caracterizam-se por terem um efeito adsorvente, o que se verifica, principalmente, com as unidades
de poros muito finos. Nestas condições, o filtrado terá uma composição no início e poderá
apresentar uma outra, completamentc diferente, algum tempo após o começo da operação.
Em geral, os meios filtrantes rígidos são constituídos por materiais porosos da mais variada
natureza, cuja porosidade e permeabilidade é extremamente variável, o que permite utilizá-los para
numerosos fins. Assim, podem ser feitos de alumina, carvão, metais, borracha e
produtos sintéticos, sílica, terra de diatomáceas, caulino, porcelana e vidro
poroso, apresentando-se sob a forma de cadinhos, placas, tubos e velas
filtrantes. Vejamos, detalhadamente, alguns destes elementos filtrantes, pois são de
grande interesse para a Técnica Farmacêutica.

4.2.4.3.5.1. Alumina

Fig. 32. Filtro


de
Alundum
montado
Na preparação destes filtros utiliza-se o óxido de alumínio sob a forma granular. Os filtros de
Alundum são preparados fundindo a alumina com uma pequena percentagem de vidro de alumina
que
74

actua como uma espécie de cimento. Nos chamados filtros de Aloxite usam--se grãos cristalinos de
óxido de alumínio agregados por cerâmica. Estes filtros podem ser utilizados em substituição dos
cadinhos de GOOCH. servindo para a recolha de precipitados.

4.2.4.3.5.2. Carvão

O carvão sob a forma granular ou de grafite, misturado a certas substâncias ligan-tes, serve
para preparar septos filtrantes caracterizados por serem altamente refractários e resistentes aos
agentes químicos.

4.2.4.3.5.3. Septos metálicos

Estas superfícies rígidas podem ser constituídas por discos ou placas perfuradas, por
elementos em forma de cunha e ainda por placas resultantes da agregação de metais reduzidos a pó
de tenuidade adequada.
Os discos e placas perfuradas, de porosidade variável, são usados, principalmente, na
filtração sob altas pressões, podendo servir ainda como suporte a outros materiais filtrantes pouco
resistentes.
Os chamados metafiltros (Fig. 33) são constituídos por placas metálicas em forma de cunha,
dispostas umas sobre as outras e mantidas em posição por meio de um

Fig. 33. Elementos de um metafiltro '

suporte. As partes afiladas das cunhas dos diferentes elementos que formam o filtro estão orientadas
para o exterior, ficando as bases viradas para o interior. Como a Fig. 34 mostra, o espaço entre
duas placas consecutivas vai estreitando gradualmente de fora para dentro, até que na parte virada
para o centro do filtro é tão reduzida a distância que separa as placas que equivale a um verdadeiro
poro. Deste modo, a suspensão caminha ao longo das cunhas, ficando as partículas retidas pêlos
estrangula-
75

menío.s da parte interior, fluindo o líquido clarificado para a parte central do filtro. Estes filtros
trabalham melhor adicionando à suspensão a fillrar um adjuvante, como o carvão ou o kieselguhr
(terra de infusórios), que se acumula enlre as placas, constituindo, assim, uma camada filtrante
bastante eficiente, e podem ser operados por pressão ou por sucção. Nu Fig. 35 rcproduzem-se
modelos dcslcs fil tr os correspondentes às duas referidas modalidades.

Fig. 34. Elementos de um metafittro vistos em secção

Os septos representados pelas placas metálicas porosas constituem um tipo de filtro


datado de propriedades muito apreciáveis: são robustas, quimicamente inertes, resistem a
temperaturas elevadas e só não se prestam à filtração dos ácidos minerais. São preparados a
partir de aço inoxidável em pó que é aglomerado por processos especiais, dependendo a sua
porosidade das dimensões dos grânulos usados na sua fabricação.

Fig. 35. Metafiltros para laboratório. A, modelo para


filtração sob pressão. B, modelo trabalhando por
sucção

4.2.4.3.54 Materiais orgânicos

[{justem no mercado filtros rígidos feitos de borracha dura, os quais podem ser ©btidos
perfurando, mecanicamente, lâminas de borracha, de modo a obterem-se poros muito estreitos ou
provocando a sua formação por um processo especial durante a transformação d° látex natural cm
folhas.
76

4.2.4.3.5.5. Sílica

Hoje em dia, os filtros de sílica mais usados são os de BERKFELD, fabricados com kieselguhr ou
terra de infusórios natural, produto constituído quase exclusivamente por sílica, SiOr Aquela
substância, depois de lavada e tamisada, é misturada com
amianto e outros ingredientes, obtendo-se uma
massa que é prensada de modo a originar cilindros
ocos e fechados apenas numa das extremidades. Após
secagem, os cilindros são aquecidos a 1200°C e
arrefecidos seguidamente. À exlremidade aberta
adapta-se, então, uma peça de metal ou de porcelana,
mantida fixa à custa de um cimento adequado, a qual
termina por uma espécie de gargalo por onde escoa o
líquido filtrado.
Estes filtros de BERKFELD sào fabricados em
diversos tamanhos (Fig. 36) e com porosidade
variável, podendo ser utilizados para filtração sob
pressão ou por sucção. Dadas as suas características,
estão especialmente indicados na filtração de produtos
Fig. 3b. Filtros de Berkfeld bacteriológicos, pois são capazes de reter vários
microrganismos. Designam-se por letras, conforme o
grau de porosidade que apresentam: N, M, W e WW, correspondendo as duas últimas categorias
aos filtros de poros mais apertados.

4.2.4.3.5.6. Caulino e porcelana

Diversos materiais de natureza argilosa têm sido utilizados na preparação de filtros rídigos,
entre os quais os mais conhecidos são os filtros ou velas de CHAMBERLAND. Estes elementos filtrantes
são semelhantes aos filtros de BERKFELD, com a diferença de que na sua constituição entram caulino e
quart/o aglutinados por aquecimento a temperaturas controladas. São usados, principalmente, na
filtração bacteriológica, sendo fabricados com várias porosidades, as quais dependem da finura dos
grãos dos materiais usados na sua preparação e, ainda, da temperatura a que foram submetidos.
São, igualmente, classificados por uma letra e um número: LI, L2, L3..., L7, L l l . As velas L7 e L l l
utilizam-se na filtração esterilizante.
77

4.2.4.3.5.7. Vidro poroso

Entre os scptos filtrantes rígidos, os filtros de vidro poroso representam, certamente, os de


maior interesse para a filtração laboratorial e o seu uso está, actualmente, muito generalizado,
prestando-se aos mais variados fins com que a filtração é praticada.
Os diafragmas de vidro poroso começaram a ser fabricados por volta de 1920 e depressa se
impuseram como elementos filtrantes, dadas as características e a possibilidade de se acopularem a
toda a espécie de funis, cadinhos, tubos, ctc. Como resultado disso, apareceram numerosos
aparelhos destinados a resolver os mais variados problemas de filtração
laboratorial, incluindo a microfiltração.
Na preparação dos septos de vidro poroso torna-se necessário
utilizar material da melhor qualidade, dotado de reduzida
solubilidade e de baixo coeficiente de dilatação. Em geral,
utilizam--se vidros de pyrcx, lena ou quartzo, os quais são
pulverizados de modo a obte-rem-se partículas uniformes e de
dimensões convenientes. O pó assim obtido é misturado com pó
de vidro de ponto de fusão mais baixo, colocado cm moldes
e cuidadosamente aquecido a temperaturas bem controladas. O vidro
fusível actua como elemento agregante do vidro duro, dependendo a
porosidade do filtro do grau de aquecimento e do diâmetro das
partículas usadas na sua fabricação,
sendo possível obterem-se filtros cujo diâmetro médio pode variar desde
algumas centenas de \l a menos de 2 já.
Prestando-se, como dissemos, aos mais variados fins, os filtros de vidro poroso estão a ser
cada vez mais empregados na filtração clarificante, acontecendo que em muitos laboratórios
farmacêuticos se prefere hoje utilizá-los na filtração de
Fig. 37. Filtros de vidro poroso
soluções medicamentosas. A fim de resolver os problemas
levantados por essas filtrações, em que geralmente se trabalha com grandes volumes de líquidos, a
indústria prepara funis de capacidades adequadas.
Dadas as diferentes porosidades que estas placas filtrantes podem apresentar, tornou-se
necessário estabelecer uma classificação para estes filtros que facilite o seu
78

reconhecimento de modo fácil e seguro e permita escolher o filtro mais recomendável ao fim em
vista.
Na Europa tal classificação assentava, essencialmente, na letra G, antecedida e seguida de
dois números, marcados de modo bem visível no funil. O algarismo que antecedia a letra estava
relacionado com a capacidade do filtro, ao passo que o algarismo que se lhe seguia caracterizava a
porosidade (').
A nossa actual Farmacopeia (V. 1.2) adoptou o sistema de classificação proposto pela
Organização Internacional de Normalização, atribuindo a estes filtros um número de porosidade.
Na Tabela VII transcrevemos essa classificação, figurando nela, igualmente, os usos desses
diferentes filtros.

Tabela VII. Classificação dos filtros de vidro poroso adoptada pela Farmacopeia Portuguesa V
e sua correspondência noutros países
Número de porosidade Diâmetro máximo dos Rep. Fed. da França Reino Unido
(R Poit.) <2) poros em mjcrómetros Alemanha

1,6 inferior a 1,6 5f — —-


— 1 — 2 , 5 5 — S
4 1,6 — 4 — — —
— 4 — 6 — 5 —
10 4 — 10 4f — 4
16 10 — 16 4 4 —
40 16 — 40 3 3 3
— 40 — 50 — — 2
100 40 — 100 2 2 —
— 100 — 120 — — \
160 100 — 160 1 1 —
— 150 — 200 0 0 —
250 160 — 250 — — —
- 200 — 500 — 00 -—

Usos especiais
Diâmetro em micrómetros
< 2,5 filtração bacteriológica
4 — 10 filtração ultrafina, separação de microrganismos de grande diâmetro
10 — 40 filtração analítica, filtração muito fina de mercúrio, dispersão muito fina de gases
40 — 100 filtração fina, filtração de mercúrio, dispersão de gases
100 — 160 filtração de materiais grosseiros, dispersão e lavagem de gases, suporte para outros
materiais de filtração
160 — 500 filtração de materiais muito grosseiros, dispersão e lavagem de gases

(') Dado que um filtro de determinada porosidade pode ser fabricado em vários tamanhos,
teremos, por exemplo, para um filtro G5 variantes como 1G5, 2G5, 3G5, 6G5, etc. Esta era a notação
usada pêlos fabricantes alemães.
(2) Notação proposta pela Organização Internacional de Normalização (OIN).
79

9 4.2.4.3.58. Placas e discos filtrantes

As placas filtrantes são geralmente feitas de substâncias fibrosas, tais como polpa de papel e
amianto, utilizadas separadamente ou misturadas e submetidas a uma compressão conveniente até se
obterem produtos com a densidade requerida.
As fibras para a fabricação destes discos são escolhidas e sujeitas a tratamentos especiais,
conforme os fins a que se destinam, podendo aqueles serem utilizados para clarificar ou
esterilizar líquidos. Como a celulose e o amianto têm propriedades absorventes, segue-se que estas
superfícies filtrantes podem fixar certas substâncias exislenles nas soluções a clarificar. Por outro
lado, acontece que o amianto cede alcalinidade aos líquidos aquosos que contactam com ele, de
modo que se recomenda lavar, previamente, os filtros deste tipo com água acidulada, e, depois,
com água destilada, até re:iccuo neutra. Como exemplo destes filtros podemos citar os de tipo SEIT/,,
dotados de propriedades filtrantes e esterilizantes, usados com frequência na filtração de soluções
medicamentosas.
As firmas Millipore Filter Corporation e Sartorius Membranfilter GmbH fabricam uma gama
mu i t o variada de discos filtrantes dotados de extraordinária capacidade de retenção de
partículas, os quais são especialmente úteis para a esterilização de soluções farmacêuticas e de
líquidos biológicos alteráveis por acção do calor.
Tais fillros são constituídos por membranas porosas de ésteres da celulose, altamente
purificados e biologicamente inertes, sendo apresenlados em do/e porosidades diferentes, desde 8 [i
a 0,01 |a de diâmetro médio de abertura de poro (ver Tabela VII I, pág. 83) e caracterizando-se
por efeitos de adsorção e absorção praticamente nulos.
Segundo os fabricantes, estas superfícies filtrantes apresentam grande uniformidade do
diâmetro dos poros, destacando-se, ainda, pela circunstância de estes constituírem canal ículos que
atravessam directamente a espessura da membrana com um mínimo de ramificações entre si. Cada
cm2 da superfície do filtro contém milhões destes estreitíssimos canais, representando cerca de
80% do volume total do filtro, o que lhe confere uma notável porosidade e permite um débito de
filtrado cerca de 40 vezes superior ao obtido com os filtros convencionais de abertura de poros
semelhante. Assim, um disco Millipore SC (8 (0. de diâmetro de poro) filtra cerca de 950 ml de
água por minuto e por cm2 de área filtrante a 25°C e a uma pressão diferencial de 700 mm de Hg,
enquanto, por exemplo, um disco Miílipore PH (0,3 |i) filtra, nas mesmas condições, 40 ml de água.
Estes filtros actuam, principalmente, como se fossem tamises, e, assim, todas as partículas
cujas dimensões ultrapassem as aberturas dos respectivos poros ficam retidas à superfície do filtro
quando através deste passa um líquido em que elas estejam suspensas. No entanto, uma elevada
percentagem de partículas de (amanho inferior à abertura dos poros também c retida por estes
filtros graças às forças de VAN DER WAALS, a um aprisionamento ocasional ao longo do percurso
ligeiramente tortuoso dos canalículos e, ainda, pela barreira formada pêlos sólidos depositados
sobre o filtro.
80

Os filtros de membrana são obstruídos por partículas de natureza coloidal, especialmente


quando presentes em soluções, tornando-se, então, necessário utilizar um pré-
-filtro destinado a reter esse material. Esta técnica impõe-se, por exemplo, quando se pretende
esterilizar soro ou plasma sanguíneos.
Além disso, estes filtros apresentam certas limitações no seu uso, as quais estão relacionadas
com as características de solubilidade e de resistência química do material de que são feitos. Assim,
não são atacados pela água, ácidos e álcalis diluídos, hidro-carbonetos alifáticos e aromáticos,
hidrocarbonetos halogenados e líquidos não polares. Dissolvem-se, contudo, nos compostos
cetónicos, esteres, nitroparafinas e nos álcoois metílico e etílico, sendo ainda atacados pêlos álcalis
concentrados.
Apesar das incompatibilidades genericamente assinaladas, os filtros Miüipore e Sartohus
encontram largo campo de aplicação, sobretudo na filtração esterilizante de medicamentos e de
líquidos de origem biológica. Na Tabela VIII, pág. 83, indicam-se os doze graus de porosidade em
que estes filtros são apresentados, devendo salientar-
-se que são os tipos HA (0,45 (i) e GS (0,22 |i) os que maior aplicação têm para a filtração
esterilizante e os ensaios de esterilidade. Dos dois, o filtro GS é o mais utilizado, recomendando-se o
seu emprego sempre que as soluções a filtrar contenham soro, plasma ou tripsina, em que é
frequente existirem espécies de pseudomonas ou outros microrganismos de menores dimensões.
Por sua vez, os filtros HA, sob a forma de discos com 47 mm de diâmetro, são especialmenle
indicados para a execução dos ensaios de esterilidade segundo a técnica oficializada pela Food and
Drug Adminisiraíion dos E. U. A.
Como atrás dissemos, os filtros Millipore e Sartorius são obstruídos por certos materiais,
sendo, por isso, necessário submeter determinados líquidos a certos tratamentos prévios, destinados
a eliminarem esses materiais, prolongando-se, assim, a vida do
filtro. Entre os processos para esse efeito recomendados
pêlos respectivos fabricantes, conla-se o emprego de pré-
„ r -filtros constituídos por fibras de vidro, os quais podem
r
Pré-filtro _ ^
K

usar-se na filtração de sistemas líquidos, colocados sobre os filtros


propriamente ditos, conforme está esquematizado na Fig. 38.
Nestas condições, as substâncias mais grosseiras são
Fig. 38. Pré-fiitro utilizado retidas pelo pré-filtro e, deste modo, quando a solução
juntamente com os filtros de ,,.. ,, , . . . ....
membrana entra em contacto com o nitro já íoi sujeita a uma filtra
ção prévia, que reteve determinadas partículas susceptíveis
de originarem a obstrução dos poros da segunda camada filtrante. Estes pré-filtros podem ser
usados também em unidades filtrantes separadas, ligadas, por sua vez, aos dispositivos de filtração
em que estão montados os filtros propriamente ditos.
Na prática, os produtos a filtrar podem classificar-se em três classes, consoante as suas
características de filtrabilidade. No primeiro grupo estão geralmente incluídas as soluções aquosas,
e, entre elas, naturalmente, a maioria dos líquidos medicamentosos,
81

como as soluções salinas, vitamínicas e de glucose, as quais podem ser esterilizadas por simples
filtração através de um filtro GS, com ou sem pré-filtro de fibras de vidro.
Estas superfícies filtrantes são montadas cm suportes especialmente concebidos para
satisfazerem às necessidades da prática laboratorial ou industrial no domínio da filtração, podendo
obter-se dispositivos para filtração desde alguns mililitros ale volumes da ordem dos milhares de
litros.

4.2.4.4. Adjuvantes de filtração

Já por várias vezes nos referimos, ainda que episodicamente, aos adjuvantes de filtração.
Passadas que foram em revista as principais superfícies filtrantes, chegou o momento de
considerarmos mais dctalhadamcntc estas substâncias de Ião grande utilidade.
Recordemos que a maior ou menor facilidade com que uma filtração se processa depende,
fundamentalmente, da natureza das partículas suspensas no líquido a filtrar e que irão formar a
camada filtrante à superfície do seplo. No caso de tais partículas serem compressíveis, já sabemos
que se vão deformando por efeito da pressão, daí resultando uma filtração morosa pêlos motivos
atrás discutidos. Ora, é em casos como estes que os adjuvantes prestam magníficos serviços, pois
criam as condições para que a filtração se faça do modo o mais favorável possível. Poderemos,
então, dizer que um adjuvante de filtração é toda a substância inerte utilizada com o fim de aumentar
a velocidade de filtração e o grau de clarificação, pretendendo-se, umas ve/es, conseguir um só destes
objectives, havendo, porém, casos em que se procura a simultaneidade dos mesmos.
A principal função de um adjuvante é formar uma estrutura em forma de rede, que seja rígida,
porosa e permeável, a qual retenha as partículas em suspensão, deixando fluir livremente o líquido
através dos seus canalículos. Deste modo, impede-se que os sólidos se acumulem sobre a membrana
filtrante e a obstruam, e porque o adjuvante tem uma estrutura rígida a compressibüidade das
partículas nele retidas é mínima. Consegue-se, assim, que a deformação dos sólidos compressíveis
seja de tal modo diminuída que não há o risco de vir a interferir com a velocidade de escoamento do
líquido a filtrar.
Na prática, adicionam-se os adjuvantes ao próprio líquido a filtrar, o que origina uma camada
filtrante complexa constituída pelas partículas do adjuvante e dos sólidos pré--exislenies na
suspensão a clarificar. A retenção dos sólidos pode ser feita, em certos casos, por adsorção, mas em
geral deve-se a uma intervenção mecânica pura e simples da rede formada pelo adjuvante.
E intuitivo que nem todas as substâncias podem servir como adjuvantes de filtração, pois é
necessário que possuam algumas características, sem as quais não podem exercer a função que delas
se pretende. As principais propriedades que caracterizam um bom adjuvante podem resumir-se do
seguinte modo: L") possuir uma estrutura física tal que permita a formação de uma rede porosa
indeformável; 2.°) apresentar um grau de divisão suficiente para reter as partículas sólidas a filtrar;
3.°) ter aptidão para se manter em suspensão no líquido; 4.°) estar livre de impurezas; 5.") não reagir
com o líquido; 6.11) ser anidro.
82

Dentre os materiais propostos como adjuvantes de filtração, a sílica d^ diatomáceas é o que


melhores resultados proporciona, pois obedece a todos os requisitos exigidos a um tal produto, e daí
o motivo por que é o mais utili/ado. Deve usar-se sempre uma sílica calcinada e altamenle
purificada, encontrando-se no mercado várias marcas de sílica de diatomáceas para filtração, como
a Celite, Celite 52!, Sorbo-Cel, cie., com características próprias a cada uma.
O carvão é outra substância utilizada como adjuvante de filtração, especialmente de líquidos
não polares. Usado também como descorantc, o carvão tem elevado poder adsor-vente para
variadíssimas substâncias, e, portanto, só deve ser usado em casos especiais, uma vez que pode fixar
parte importante dos sólidos dissolvidos e alterar, assim, a composição quantitativa das soluções.
A polpa de papel, a que já nos referimos como superfície filtrante propriamente dita, também
pode ser utilizada como adjuvante e, como tal, deve ser empregada finamente dividida e adicionada à
suspensão a filtrar, antes de se iniciar a operação.
O talco também é usado como adjuvante de filtração. Apresenta a vantagem de não adsorver as
substâncias em solução e é quimicamente inerte. Recomenda-se não utilizar as variedades mais finas
de talco, pois estas atravessam o papel de filtro, originando filtrados turvos.
Os carbonatos de cálcio e de magnésio são empregados como adjuvantes na filtração de certas
preparações farmacêuticas. Deve ter-se em conta que reagem com os líquidos ácidos e comunicam às
soluções aquosas certa alcalinidade, sobretudo o carbonato de magnésio, o qual, apesar de ser muito
pouco solúvel na água, mesmo assim confere-lhe um pH suficiente para originar a precipitação dos
sais de alcalóides nela dissolvidos. Trata-se, por conseguinte, de produtos que apenas são utilizados
em casos especiais.
Na Tabela VIII indicam-se os diâmetros dos poros de alguns materais filtrantes. Para determinar
esses diâmetros pode emprcgar-se o método de BECHHOLD, aplicável, especialmente, às superfícies
rígidas, o qual consiste em forçar um gás sob pressão, em geral o ar ou o oxigénio, a atravessar o
filtro humedecido com água ou éter. As bolhas do gás atravessam os poros a uma pressão crítica, cuja
relação com os diâmetros daqueles é expressa pela equação:

4a frx IO4
d = K. —— , sendo K =
1033 x IO6

em que d é o diâmetro do poro (em |i), a é igual à tensão superficial dos líquidos usados à
temperatura de 20°C, respectivamente 72,5 dine. cm"1 para a água e 16,6 dine.cm ' para o éter, P a
pressão à qual sai do filtro a primeira bolha de gás (em mm de Hg), e b a pressão atmosférica,
também em mm de Hg (').

(') Segundo VICNEROU, Joumces Pharmaceuliques Françaises, 1951.


83

Tabela VIII. Valores médios das aberturas dos poros dos filtros usuais f1)

Filtro Dimensões dos poros em JX Utilização .,T - •

Papéis Bastante variáveis Filtração clarificante


desde 20 a 0,75
Berkfeld V 5 Filtração clarificante
N 3,5 a 5 »
W < 3,5 Filtração esterilizante
ww 1 a2 »
r.- saturados não saturados ,.
de água de água
Discos de amianto
Seitz EK 0,7 1,4 Filtração esterilizante '
1
'~ EKS 0,6 1,2 » ^
EKS1 0,5 1 » ! i:-.
EKS2 0,4 0,8 Retenção dos pirogénios
Chamberland L2 8,9 a 4,7 Filtração clarificante
L3 - 4,7 » 2,2 » •..'**,
L5 2,2 » 2 Filtração esterilizante • .•*,•. h
L7 .v,, ,-;• cerca de 1 » '^-
^U :
, ,. » » 0,8 »
Membranas 0,2 a 0,005 Filtração esterilizante
ultrafiltranlcs .:! .-.- •• :. , e separação de várias
-:-.;;> .,: ;•
-.,„•: moléculas
Discos de ésteres de celulose
Millipore Sartorius
(acetato de (nitrato de
celulose) celulose)
SC SM 11301 8 Filtração clarificante
SM — S Filtração esterilizante
ss SM 11 302 3 »
RA SM 11303 U * •' .
AÃ SM 11304 0,8 *
DA SM 11305 0,65 »
HA SM 11306 0,45 »
PH SM 11307 0,3 (0,2) »
GS SM 11308 0,22(0,15) »
vc SM 11309 0,1 »
VM SM 11310 0,05 » • i ' : ••
VF SM 11311 0,01 * " '-*-''1''" - '"""
í>r

(') Segundo Vigneron, loc. cit.


84

4.2.4.5. Técnicas de filtração

Depois de termos considerado o aspecto teórico desta operação e passados cm revi st a os


principais materiais IItirantes usados na prática, c chegado o momento de abordarmos as técnias
de filtração mais correntemente utilizadas.
No presente capítulo consideraremos, pois. a diversa aparelhagem para se fa/er uma filtração,
mas antes de entrarmos, propriamente, no assunto, queremos deixar bem vincada no espírito do leitor
a ideia de que tal operação oferece, com frequência, grandes dificulda-des, as quais podem ser. às v
c/e s. insuperáveis. Pretendemos d i/cr com isto que n e m sempre é de esperar que da passagem de
um líquido através de uma superfície fi lt ra nte resulte um nitrado perfeitamente clarificado. Se é
certo que a grande maioria das soluções farmacêuticas pode ser clarificada sem dificuldade de
maior recorrendo aos mais simples processos de filtração, também não é menos verdade q u e a
clarificação de certos produtos constitui um verdadeiro desafio às qualidades de saber e de
improvisação do operador que. não raramente, acabará por confessar-se impotente para obter um
f i l t r a d o convenientemente límpido.
Por este motivo, é praticamente impossível fixar condições de filtração que abarquem todos os
produtos que possam vir a ser submetidos a esta operação. Os problemas acabam por surgir cedo ou
tarde, sobretudo a quem trabalha no campo da investigação, pois aí m ai o r será a probabilidade de
se deparar com casos especiais cuja resolução só poderá ser tentada com êxit o à custa dos
fundamentos teóricos da filtração e do engenho do experimentador.
Entretanto, lembramos que um tratamento prévio e conveniente dos materiais pode ser tão
importante como a escolha da técnica de filtração, puis certos produtos não f i l t r á ve i s podem ser de
tal modo modificados que apresentem, depois de submetidos a determinadas manipulações, ru/.oáveis.
senão mesmo, boas condições de filt rabi l idade.
Assim, o aquecimento de certos produtos fa cilita a sua filtração por duas ra/ões distintas:
primeiro, porque I a/ d i m i n u i r a viscosidade dos líquidos, e. em segundo lugar, porque provoca a
coagulação das substâncias proteicas e de outros produtos sempre perturbadores de uma filtração.
Certos produtos contendi* partículas de vários tipos e dimensões são d i f i c i l m e n t e
clarificados numa só filtração. Fm muitos casos, como na filtração de extractos vegetais de
tecidos, é aconselhável remover a.s partículas maiores por filtração através de um pano, completando-
se a clarificação com o auxílio de uma superfície filtrante capa/, de reter as partículas mais finas.
Quando o produto contém uma percentagem elevada de sólidos é conveniente deixar sedimentar
por simples repouso parte deles, filtrando-se apenas o lí qu id o sobrenadante separado por
decantação. Noutros casos, a sedimentação pode ser facilitada pela adição de várias substâncias,
como a gelatina, caseína, gelose, terra de fui ler e hcntonile.
85

Certas misturas muito viscosas podem ser diluídas, conseguindo-se, assim, uma apreciável
diminuição das respectivas viscosidades, com o consequente aumento da filtrabili-dade.
Também o ajustamenlo do pH dos líquidos pode concorrer para facilitar a filtração, o mesmo
acontecendo com a adição de um electrólito e o uso judicioso de adjuvantes.
Os adjuvantes da filtração podem ser aplicados directamente ao filtro, para formarem uma
camada de revestimento que actue desde o início da filtração, ou adicionam-se ao líquido a filtrar
numa percentagem variável. A prática indicará a quantidade de adjuvante a utilizar em cada caso, não
nos devendo esquecer que o emprego destas substâncias poderá resolver muitos casos de filtração
tidos como de difícil execução.
Tais são, em resumo, alguns dos tratamentos a que se podem submeter certos produtos a filtrar,
os quais, longe de esgotarem o assunto, representam apenas sugestões destinadas a facilitar a
resolução de alguns problemas gerais de filtração, pois os casos específicos surgirão sempre e terão
que ser tratados como tal.
E posto isto, consideremos, agora, os diversos processos de filtração, para o que é necessário
agrupá-los de modo a facilitar o seu estudo. São vários os critérios usados para esse fim, baseados
em certos elementos, como a natureza da superfície filtrante, o volume do líquido a filtrar e a força
usada para conseguir-sc a filtração. Repare-se que este último elemento é comum a todas as técnicas
de filtração, pois sem uma diferença de pressão aquela é irrealizável, e, por isso, ele representa,
quanto a nós, a base mais racional para se estabelecer uma classificação.
Deste modo, agruparemos as diversas técnicas de filtração de acordo com a força nelas
utilizada, constituindo-sc, assim, três classes distintas: 1) Filtração por acção cia gravidade; 2)
filtração por sucção; 3) filtração sob pressão.
Seguidamente, estudaremos cada um destes três lipos de filtração, dando especial atenção aos
dispositivos neles utilizados, já que os materiais filtrantes foram tratados anteriormente.

4.2.4.5.1. Filtração por gravidade

Neste tipo de filtração o conjunto filtrante-suporte mais largamente utilizado é o papel de


filtro-funil, sendo esle constituído por uma parte sob a forma de cone ligada a uma haste que
termina, regra geral, em forma de bisel.
Se bem que os funis sejam geralmente feitos de vidro, fabricam-se também em porcelana, metal,
borracha e material plástico, podendo apresentar as paredes lisas ou com estreitas saliências
dispostas verticalmente, o que permite uma drenagem mais rápida do líquido filtrado. O tamanho
dos funis varia imenso, desde os que apenas comportam alguns ml de líquido aos que permitem filtrar
grandes volumes.
O septo filtrante que vulgarmente se utiliza com os funis é o papel de filtro, Uso ou pregueado,
que se aplica ao funil. A regra é a de se empregar o papel liso quando a
86

filtração é realizada com o objectivo de se aproveitar o sólido retido, devendo utilizar-se um filtro
com pregas sempre que a filtração tenha por fim obter um líquido límpido.
Além do papel, podem usar-se fibras soltas nos funis, como o algodão hidrófilo c a lã de vidro,
as quais se aplicam de modo a constituírem uma camada ou rolho sobre a parte mais estreita do
funil, onde começa a haste, na qual penetra frequentemente.

Flg. 39. Diversos tipos de funis

Para que a filtração por esta técnica se processe nas melhores condições é de toda a
conveniência ter presentes certas regras empíricas que devem ser respeitadas na prática. São elas:

1. Ao dobrar um filtro nunca se devem vincar as dobras junto do ápex, pois este é o ponto onde
aquelas convergem e tornar-se-ia demasiado fraco para suportar a pressão do líquido, podendo
romper com o peso deste. Ao colocar um filtro de pregas num funil deve ter-se o cuidado de forçá-lo
de modo u que a extremidade penetre na haste do funil, pois tal precaução permite obter maior
velocidade de filtração e evita que a ponta do filtro alargue, formando uma bolsa, e se encha de
líquido, diminuindo-se, assim, a possibilidade de ruptura.
2. Deve humedecer-se o filtro com o líquido a filtrar ou com o solvente correspondente ao
líquido a filtrar, o que torna a filtração mais rápida.
3. Quando o filtro se destina a receber um grande volume de líquido é necessário tomar
precauções para evitar a sua ruptura. Para isso, pode utilizar-se um filtro duplo ou colocar no
gargalo do funil, antes de pôr o filtro, um pouco de algodão envolvido em gaze. Pode usar-se,
também, um cone de metal perfurado.
4. Ao verter o líquido a filtrar no filtro, aquele deve ser dirigido contra as suas paredes, para
se evitar um impacto directo sobre a ponta do filtro, que é a sua parte mais frágil.
5. O papel deve ser cortado com as dimensões precisas para nunca ultrapassar as paredes do
funil, o que evita perdas por evaporação ou embebição.
87

6. Se o vaso em que se recebe o filtrado é de pequena capacidade, a ponta do funil deve


encostar à parede daquele, para que o filtrado corra ao longo dela, evitando-sc, deste modo, que a sua
queda livre provoque salpicos.
7. Ao fazer uma fillração para um frasco de gargalo estreito, em que se apoia o funil sobre a
respectiva boca, é necessário deixar um espaço enlre o funil e o frasco, para permitir a saída do ar.
Se não se tomar esta precaução a pressão do ar, dentro do recipiente, pode retardar ou impedir a
filtração.

4.2.4.5.1.1. Filtração a quente

A filtração por gravidade faz-se, por vezes, mantendo o funil aquecido e isto porque,
independentemente da natureza do produto a filtrar, o aumento da temperatura, fazendo baixar a
viscosidade dos líquidos, torna sempre mais rápida a fillração.
Na tabela IX indicam-se as viscosidades de alguns líquidos em função da temperatura, e os
números que nela figuram mostram, claramente, como os líquidos altamente viscosos se tornam
muito mais fluidos quando convenientemente aquecidos.

Tabela IX. Viscosidade de alguns líquidos a diferentes temperaturas (1)

Viscosidade em centipoisc
Líquido 0" 10" 20' 40" 70" W()"C
Agua 1,79 1,13 1,01 0,65 0,41 0,28
Álcool etílico 1,79 1,75 1,72 1,65 1,55 —
Éter sulfúrico 0,28 — 0,23 0,20 — —
Benzeno 0,91 0,76 0,65 0,50 0,36 —
Óleo de rícino — 2420 986 231 — 16,9
Azeite — 138 84 36 12,4 —
Glicerina (2) 4220 2518 830 — — —

As soluções em solventes orgânicos e aquosos são, em geral, pouco viscosas c, por isso, filtram
sem dificuldade à temperatura ambiente, mas há casos em que se torna necessário proceder a um
filtração a quente. Os óleos, por exemplo, sobretudo no inverno, são dificilmente filtráveis à
temperatura ambiente, e certas gorduras e ceras, sólidas à temperatura normal, só poderão ser
filtradas a uma temperatura superior à dos respectivos pontos de fusão. Por outro lado, algumas
soluções devem ser filtradas a lempe-

(') Segundo Cummings, in Technique ofOrganir Cfietnisrry, vnl. Ill, pág. 563.
Ç-} No caso da glicerina as temperaturas correspondem, na realidade, a 2,8". 8,1" c 2(U"C,
respectivamente.
88

raturas elevadas a fim de se evitar a precipitação de determinadas substâncias dissolvidas.


Para se realizar uma filtração a quente basta, em certos casos, quando a quantidade do
material a filtrar é diminuta, aquecer o funil previamente. Esta operação pode fazer-se, também,
colocando o filtro e respectivo suporte numa estufa regulada para uma tempe
ratura conveniente, desde que, como é óbvio, o líquido ;i filtrar
não seja inflamável.
Todos estes processos, porém, não passam de simples
improvisações, que apenas serão utilizadas quando não se
disponha do material adequado para a prática de filtrações deste
tipo. Contudo, desde que o primeiro filtro aquecido foi idealizado por
ROBRRT WARE, em 1820, apareceram modelos que tornaram rotineira
esta operação.
Um dos modelos ainda hoje dos mais utilizados na oficina
Fig. 40. Aparelhos de
filtração a quente farmacêutica está representado na Fig. 40 A, o qual é constituído por
um tronco de cone, geralmente feito de cobre, tendo uma dupla
parede, que se enche de água. O aquecimento faz-se no tubo lateral esquerdo por meio de um bico de
BUNSEN e o funil de vidro encaixa neste invólucro, que o mantém à temperatura desejada. Outro
dispositivo, representado na Fig. 40 B, consiste numa serpentina enrolada de modo a poder adaptar-
se aos funis, dentro da qual se faz circular água aquecida.
A par destes modelos, relativamente simples e baratos, existem outros mais aperfeiçoados, em
que o aquecimento dos funis se faz electricamente. Um desses aparelhos está representado na Fig.
41 e consiste num fogão eléctrico tendo várias peças metálicas inter-mutáveis, o que permite que o
aparelho possa ser usado com funis de diversos tamanhos. Mais recentemente, algumas firmas, como
a Electrothermal Engineering Ltd., introduziram no mercado dispositivos especiais para o
aquecimento de instrumentos de vidro.

Fig. 41. Aparelho de filtração aquecido electricamente


89

entre eles os funis, os quais tornaram esta operação facilmente praticável. Um dispositivo destes é
formado por uma rede de material refractário e maleável, tendo no interior uma resistência
eléctrica, bastando ligar o aparelho a uma tomada de corrente para aquecer o funil (Fig. 42).
4.2.4.5.1.2. Filtração a frio

Menos correntemente praticada do que


a filtração a quente na rotina laboratorial,
por vezes também se procede à filtração a
uma temperatura inferior à do meio ambiente,
como, por exemplo, quando se pretende
remover cristais de baixo ponto de fusão ou
sólidos amorfos de um solvente.
Em muitas circunstâncias pode utilizar-se o Fig. 42. Manta eléctrica para aquecimento de funis
dispositivo representado na Fig. 40 B e já descrito para a filtração a quente, usando-se, neste caso,
água gelada. Outro processo consiste em manter á volta do funil uma camada de gelo picado ou de
uma mistura frigorifica, ou, ainda, arrefecendo, previamente, o líquido a filtrar e o funil numa geleira
e procedendo, depois, à filtração à temperatura ambiente.

4.2.4.5.1.3. Filtração de líquidos voláteis

A filtração destes líquidos, particularmente do éter, impõe certas precauções, a fim de evitar a sua
evaporação, o que obriga a utilizar filtros especiais. Pode, no entanto, improvisar-se um filtro destes
com bastante facilidade, conforme se representa na Fig. 43. O dispositivo mantém-se fechado, sendo
o ar existente no balão deslocado através do tubo lateral para o funil.
4.2.4 5 1 4. Filtros de lã ou algodão

Como vimos, os tecidos podem ser utilizados como superfícies filtrantes,


sobretudo nos processos de filtração sob pressão. Existe, no entanto, um filtro destes
operando por acção da força da gravidade, cuja utilização está praticamente
Fig. 43.
Dispositivo restrita a Técnica Farmacêutica. Quercmo-nos referir à chamada manga de
p a r a f i l t r a ç ã o Hipócrates, filtro consti-
de
90

tuído por um cone de tecido, geralmente flanela, cuja base esta ligada a um aro de folha de Flandres
ou a um quadrado de madeira (Fig. 44). Estes filtros são usados para clarificar líquidos bastante
densos, como os xaropes, podendo u filtração ser auxiliada por um adjuvante, neste caso a polpa de
papel. Porque a filtração se pode tornar lenta a partir de certo momenlo, estes tlltros têm um fio
preso ao vértice do cone, o qual, uma vez puxado para cima, obriga a extremidade do filtro a
dobrar-se para o interior, fazendo com que o líquido contacte com nova superfície de tecido ainda
não obstruída. Na filtração de um volume apreciável de líquido utiliza-se o tecido montado num
suporte rectangular de dimensões adequadas, dispositivo este conhecido por fillro de TAYLOR.
4,2.4.5.1.5. Filtração continua
A filtração de grandes volumes de líquido por acção da gravidade obriga a
Flg. 44. Manga
de uma vigilância quase permanente da operação, sobretudo se esta se processa
Hipócrates rapidamente, para se poder manter o filtro carregado. Para evitar este
inconveniente têm-se idealizado vários dispositivos, um dos quais está representado na Fig. 45.
Consta ele de um frasco de boca larga, cuja rolha tem dois orifícios. O líquido é colocado no frasco e,
com a boca destapada, é sifonado para o funil, mantcndo-se neste o nível desejado ajustando,
convenientemente, a altura do outro tubo. Com efeito, enquanto o líquido não enche conveniente-
mente o funil, este tubo encontra-se em contacto directo com a atmosfera, permitindo a entrada de ar
no frasco e, devido a este facto, é possível o funcionamento do sifão. Quando o líquido atinge certa
altura no filtro dá-se a obturação do tubo em referência e o isolamento do sistema em relação ao ar
não permite que haja transferência do material a filtrar do frasco para o funil.

4.2.4.5.2. Filtração por sucção

A filtração por sucção é um processo bastante usado nos laboratórios,


pois torna esta operação muito mais rápida uma vez que cria uma maior
diferença de pressão nos dois lados do septo filtrante. No fundo, esta técnica Fifl. 45.
consiste em adaptar o filtro a um recipiente apropriado, onde se possa fazer um Dispositivo
para filtração cont
certo grau de vazio por intermédio de uma máquina de vácuo. ínu,:
Os recipientes típicos usados neste género de filtração são os chamados frascos de KITASATO,
tendo a forma de um matrás de ERLENMEYER de paredes suficientemente grossas para resistirem à depressão
e apresentando uma tubuladura lateral na parte superior, por onde se ligam à máquina de vazio (Fig.
46).
91

A filtração por sucção é especialmente indicada quando se utilizam certas superfícies filtrantes
rígidas, cujos poros são tão apertados que tornariam a filtração demasiado lenta se fosse praticada
nas condições normais de pressão. Entretanto, presta-se a realizar filtrações com os mais variados
tipos de funis e de materiais filtrantes.
Assim, podem servir neste tipo de filtração os funis
cónicos descritos a propósito da filtração por gravidade,
desde que os papéis de filtro sejam protegidos por um
cone perfurado que evite a sua ruptura (Fig. 47). Os cones
utilizados para este efeito são feitos de vários materiais,
como porcelana, platina, papel endurecido, ele. Desde
que se utilize um papel bastante duro, o uso de tais cones
é desnecessário, se bem que os papéis desta textura
tornem a filtração muito lenta.
Os filtros de vidro poroso, cuja importância na Fig. 46. Frascos de Kitasato para
filtração por sucção. A, com funil; B,
filtração de soluções medicamentosas já foi posla em com cadinho filtrante
relevo, constituem um exemplo típico
de filtros por sucção. Como os anteriores, trabalham montados num frasco de KITASATO de capacidade
apropriada ao volume de líquido a filtrar. Os metafiltros, a que também já fizemos referência na
altura própria, trabalham por sucção ou sob pressão e, por isso, podem ser incluídos entre os
aparelhos próprios para realizar este tipo de filtração.

Fig. 47. Cones usados para a protecção dos filtros de papel

As velas filtrantes tipo BERKFELD e CHAMBERLAND constiluem outros exemplos de aparelhos utilizados
na filtração por sucção, representando-se na Fig. 48 um esquema geralmente utilizado para
trabalhar com estes filtros. As velas são montadas numa espécie de manga metálica, apenas ficando
fora desta o respectivo tubo de saída, o qual se adapta a uma rolha de borracha que fecha a boca do
balão de Kn ASATO. O líquido é introduzido pela parte superior da manga, realizando-se a filtração
mercê da depressão criada no balão.
92

Também os filtros tipo SRITZ podem ser operados por sucção e, como no caso das velas, usam-
se para filtrar ou esterilizar líquidos. Existem vários modelos, reproduzindo-sc na Fig. 49 uma unidade
destas, própria para filtração laboratorial em pequena escala.

Entrada
!l
do liquido
_i filtrar

V
„- A Vela

Suport
e Vazio

^ Líquido
/
filtrado D Tubo de
ligação &
máquina de

Fig. 48. Dispositivo para filtração por sucção com vetas filtrantes

Os filtros Miüipore e Sartorius tanto servem para executar filtrações por sucção como sob
pressão, dependendo o modo como trabalham dos suportes utilizados.
De um modo geral, a filtração por sucção com estes filtros reserva-se apenas para pequenos
volumes de líquido, existindo vários dispositivos, como funis de BUCHNEK cm aço inoxidável ou pyrex,
os quais são constituídos por duas peças, entre as quais se

Fig. 49. Modelo de filtro Seitz para filtração em pequena escala


93

coloca o disco filtrante. Na Fig. 50 representam-se alguns destes dispositivos, mostrando a gravura C
como se procede à colocação de um disco filtrante nestes funis.

Fig. 50. Suporte para filtros


Millipore actuando por
sucção. A, Buchner em aço:
B, Buch-ner em pyrex; C,
montagem do disco filtrante
em B

Existem ainda outros filtros por sucção que se caracterizam por trabalharem quando imersos na
própria suspensão a filtrar, conforme se pode ver na Fig. í 1. As folhas propriamente ditas são
construídas de material variável, o qual serve de suporte ao septo filtrante, que pode ser um tecido ou
papel de fillro, ou funcionam elas próprias como elemento filtrante. Nestes dispositivos, que
mergulham na suspensão a filtrar, o sólido fica retido na parte exterior da superfície fillranle, sendo o
filtrado aspirado por sucção e recolhido no frasco onde se faz o vácuo (Fig. 52).

Fig. 51. Vários tipos de folhas


filtrantes; A, tecido: B, rede metálica; C,
pedra porosa; D, vidro poroso
94

Na Fig. 53 estão representados vários tipos de filtros que se utilizam imersos, próprios para
filtrações em pequena escala, os quais são designados por bastões filtrantes. Como as folhas
filtrantes, podem ser constituídos por superfícies rígidas ou por um suporte ao qual se adapta o septo
filtrante.

Fig. 52. Dispositivo Fig. 53. Alguns exemplos de bas-


mostrando como funciona uma tões filtrantes; A, pedra porosa;
folha filtrante B, lã de vidro, amianto, etc.; C.
papel ou tecido; D e E, vidro
poroso

Todos estes dispositivos acabados de descrever são utilizados na filtração por sucção com fins
clarificantes ou esterilizantes. Caso, porém, se pretenda isolar um sólido é necessário utilizar funis de
BUCHNEK, de HIRSCH, cadinhos de Goorn, de ALUNDUM e outros.
Os funis de BUCHNER e de HIRSCH (Fig. 54) são geralmente feitos de porcelana e servem para
isolar sólidos em quantidade apreciável. A placa perfurada neles existente serve de suporte ao filtro,
que pode ser uma simples rodela de papel, cortada de modo a adaptar-se perfeitamente à placa.
Actualmente fabricam-se filtros destes tipos cuja placa é feita de vidro poroso.
Os cadinhos de GOOCH, representados na Fig. 55, bem como os filtros de ALUNDUM e outros, são
exemplos típicos de filtros por sucção destinados a isolar precipitados para fins analíticos. Estes
últimos constituem uma superfície filtrante, mas os cadinhos de GOOCH representam apenas um
suporte sobre cuja placa perfurada se coloca uma camada de fibras de amianto ou outro material
filtrante.

Fig. 55.
Cadinho de
Gooch

A B
Fig. 54. A, funis de Buchner; B. funil de Hirsch

4.2.4.5.3. Filtração sob pressão


95

Neste tipo de filtração utiliza-se uma pressão exercida sobre o próprio líquido para aumentar a
velocidade de escoamento daquele, o que exige que a superfície filtrante esteja montada num
dispositivo fechado e se disponha de um meio de poder obter uma pressão adequada c controlável.
Este tipo de filtração é muito menos usado na prática laboratorial do que a filtração por
gravidade ou por sucção, se bem que esteja indicado para filtrar líquidos com certas características,
como os muito viscosos, que tenham elevadas tensões de vapor ou
contenham em dissolução um gás em apreciável quantidade.
Existem dispositivos que permitem aplicar este processo de filtração à
escala laboratorial, como o representado na Fíg. 56. O filtro c posto num W i faro
recipiente de paredes resistentes, e uma vez colocada a tampa na respectiva
posição e vedado o conjunto por meio dos parafusos com orelhas, admite-
se no reservatório ar ou oulro gás comprimido. Deste modo, exerce-se uma
maior pressão à superfície do líquido a filtrar, cuja velocidade de
escoamento aumenta mercê disso. No caso da Fig. 56, a superfície Fig. 56. Dispositivo para
filtrante é constituída por fibras soltas, como o amianto ou a lã de filtração sob pressão
vidro, mas podem usar-se outros elementos filtrantes, como as folhas e
bastões filtrantes, já anteriormente descritos. A Fig. 57 representa outros dispositivos utili/ados para
este processo de filtração, empregando-se num deles um filtro de vidro poroso e no outro um dos
referidos bastões filtrantes, mas todos eles apenas se prestam a filtrar, em cada operação, diminutos
volumes de líquidos, especialmente o aparelho correspondente à Fig. 57 A.
Existem, porém, outros dispositivos
especialmente concebidos para
corresponderem às necessidades
Saída
do encontradas na prática. Assim, a Fig. 58
representa um filtro de Stir/ funcionando
por pressão, o qual é próprio para
filtração de volumes da ordem de algumas
centenas de ml, havendo, porém, outros
modelos de maior capacidade. Tais filtros
são utilizados, sobretudo, na filtração
esteri-lizante.
B

Dispositivos para filtração sob pressão


96

As velas filtrantes usadas, como já vimos, na filtração por sucção, servem também
para com elas se fazerem filtrações sob pressão, bastando, para isso, ligar a parte superior
do invólucro metálico a um reservatório de gás comprimido ou a uma bomba. O mesmo
acontece com os metafiltros, que podem ser operados, indiferentemente,
por sucção ou sob pressão, conforme se descreve na pãg. 74.
Os filtros representados na Fig. 59, A, B e C, são modelos próprios para a
filtração clarificante de volumes apreciáveis de líquido. Os dois primeiros
trabalham com um único disco filtrante, colocado entre as placas metálicas, que
depois de apertadas fecham o conjunto hermeticamente, sendo o líquido a filtrar
introduzido sob pressão no aparelho por meio de uma bomba aspirante-premente. O
modelo da Fig. 59 C é constituído por cinco discos metálicos. A Fig. 59 C representa
o aparelho aberto, mas como depois de fechado toma uma forma cilíndrica, tal
modelo é designado por filtro de tambor. Qualquer destes filtros tem já um
rendimento apreciável e neles se usam, como elementos filtrantes, discos de papel
ou de tecido.
Os chamados filtros-prensas são utilizados, principalmente, nas instalações
Fig. 58. industriais em que haja necessidade de filtrar grandes volumes de líquidos, como,
Filtro de Seitz por exemplo, nas fábricas de antibióticos e outras. São estes filtros constituídos por
para funcionar
sob pressão uma série de placas que se apoiam geralmente sob duas barras transversais
apertadas umas contra as outras por meio de um parafuso que as comprime de encontro a uma
espécie de anteparo. Cada um destes filtros pode ter um número variável de placas, normalmente de
12 a 50, prestando-se para clarificar líquidos ou para isolar sólidos neles suspensos.

B
Fig. 59. Filtros por pressão
97

Os filtros-prcnsa são de dois tipos diferenles, conhecidos, respectivamente, pelas designações


de filtros-prensa de câmara e filtros-prcnsa de quadro. o,s quais se distinguem pela forma das placas e
pelo modo como o f iltr o é alimentado. Rm ambos os tipos c necessário criar um espaço entre duas
placas consecutivas e no fundo é o modo como tais espaços são formados que distingue as duas
modalidades destes filtros.

Fig. 60. Filtro-prensa

Assim, nos filtros de câmara, conforme se pode ver no diagrama da Fig. 61, as placas apresentam
um orifício central e têm os bordos pronunciadamcnlc salientes, de modo que ao encostarem umas às
outras unem-se por esses rebordos mas como a parte central está rebaixada formam entre si cavidades
ou câmaras, as quais recebem o liquido a filtrar através do orifício cenlral, saindo o filtrado para o
exterior por urna conduta ou torneira colocada
num dos cantos da placa
Nos filtros de quadro as placas não
apresentam os bordos salientes e, por isso, é
necessário intercalar entre cías uma esquadria
de madeira, borracha ou outro material, a qual
evita que aquelas adiram umas às outras, o que Fig. 61. Placas usadas num filtro-prensa de
permite a formação das cavidades. A câmara vistas de face e em corte
alimentação
dos filtros deste tipo é feita através de um dos orifícios existentes na margem das placas, de modo que
quando elas estão colocadas no aparelho os orifícios das diversas piar coincidem perfeitamente,
formando um canal por onde o líquido circula. As esqu' apresentam, igualmente, orifícios
coincidentes com os das placas, o que permitf acesso do líquido às diversas cavidades situadas entre
duas placas conseculivas.
98

a saída do filtrado por uma conduta formada na margem da placa por igual processo, conforme se
pode ver na Fig. 62.
Em qualquer dos casos as placas dos filtros-prensa são ligeiramente rugosas, apresen tando
saliências feitas de modo a impedir que os tecidos usados na filtração adiram com-píetamente à
superfície daquelas, pretendendo-se, com isto, criar uma espécie de canais
que permitam ao filtrado correr livremente
até aos orifícios da saída.
As suspensões a filtrar são introduzidas nos filtros sob
pressão, utilizando-se para isso bombas do tipo aspirante-
premente, sendo a pressão aplicada da ordem dos 6 a 10
kg.crrr2. Se é certo que uma pressão elevada pode aumentar,
temporariamente, o
Fig. 62. Placas usadas num filtro-prensa de quadro rendimento da filtração, não deve esquecer-se
que uma pressão exagerada pode tornar muito compacta a camada filtrante, sendo aconselhável, por
isso, trabalhar a pressões relativamente baixas durante as filtrações prolongadas. Além da pressão, os
elementos que condicionam o rendimento de um filtro são: área e número de placas filtrantes,
temperatura, viscosidade do líquido e natureza das partículas em suspensão. Existem filtros-prensa
que podem ser aquecidos, os quais devem ser utilizados nos casos já anteriormente descri-los a
propósito da filtração a quente.
Como já atrás referimos, os filtros Millipore ou Sartorius também são utilizados para filtrações
sob pressão, existindo vários modelos de suportes próprios para este tipo de filtração com tais
elementos filtrantes, os quais permitem trabalhar com volumes de líquido muito variáveis.
Assim, a Fig. 63 representa um destes filtros adaptável a uma seringa
hipodérmica, desde que esta tenha um bico metálico lipo Suporte do filtro
LUER. A peça de metal constitui o suporte propriamente
dito para o filtro, separando-se em duas partes, entre as
quais se intercala o disco. Este tem um diâmetro de 13
mm, podendo usar-se com ele, neste dispositivo, um pré-
fil-tro. Este dispositivo, depois de convenientemente
esterilizado na autoclave, é adaptado a 'ia seringa e
agulha também previamente es- Fig. 63. Adaptador de Swinny para
esterilizar líquidos através de uma seringa
adas e serve para esterilizar, por filtração, um hipodérmica
pequeno volume de líquido contido na podendo ser muito útil na Farmácia de Oficina na
esterilização de certos medica-mo os colírios.
99

a saída do filtrado por uma conduta formada na margem da placa por igual processo, conforme se
pode ver na Fig. 62.
Em qualquer dos casos as placas dos filtros-prensa são ligeiramente rugosas, apresen tando
saliências feitas de modo a impedir que os tecidos usados na filtração adiram com-píetamente à
superfície daquelas, pretendendo-se, com isto, criar uma espécie de canais
que permitam ao filtrado correr livremente
até aos orifícios da saída.
As suspensões a filtrar são introduzidas nos filtros sob
pressão, utilizando-se para isso bombas do tipo aspirante-
premente, sendo a pressão aplicada da ordem dos 6 a 10
kg.crrr2. Se é certo que uma pressão elevada pode aumentar,
temporariamente, o
Fig. 62. Placas usadas num filtro-prensa de quadro rendimento da filtração, não deve esquecer-se
que uma pressão exagerada pode tornar muito compacta a camada filtrante, sendo aconselhável, por
isso, trabalhar a pressões relativamente baixas durante as filtrações prolongadas. Além da pressão, os
elementos que condicionam o rendimento de um filtro são: área e número de placas filtrantes,
temperatura, viscosidade do líquido e natureza das partículas em suspensão. Existem filtros-prensa
que podem ser aquecidos, os quais devem ser utilizados nos casos já anteriormente descri-los a
propósito da filtração a quente.
Como já atrás referimos, os filtros Millipore ou Sartorius também são utilizados para filtrações
sob pressão, existindo vários modelos de suportes próprios para este tipo de filtração com tais
elementos filtrantes, os quais permitem trabalhar com volumes de líquido muito variáveis.
Assim, a Fig. 63 representa um destes filtros adaptável a uma seringa
hipodérmica, desde que esta tenha um bico metálico lipo Suporte do filtro
LUER. A peça de metal constitui o suporte propriamente
dito para o filtro, separando-se em duas partes, entre as
quais se intercala o disco. Este tem um diâmetro de 13
mm, podendo usar-se com ele, neste dispositivo, um pré-
fil-tro. Este dispositivo, depois de convenientemente
esterilizado na autoclave, é adaptado a 'ia seringa e
agulha também previamente es- Fig. 63. Adaptador de Swinny para
esterilizar líquidos através de uma seringa
adas e serve para esterilizar, por filtração, um hipodérmica
pequeno volume de líquido contido na podendo ser muito útil na Farmácia de Oficina na
esterilização de certos medica-mo os colírios.
100

operações unicamente na circunstância de a u Ura-filtração implicar uma diferença de pressão nos dois
lados da membrana, a qual, por isso, terá de ser incorporada num suporte que lhe dê a rigidez
necessária.
Por outro lado, repare-se que a ultra-filtração difere sensivelmente da filtração vulgar, pois
naquela é apenas a membrana filtrante que actua como agente separador das partículas de diferentes
dimensões. De facto, na ultra-filtração deve evitar-se, ao contrário do que se faz na filtração vulgar,
que os sólidos se depositem em quantidade apreciável sobre a membrana semipermeável, pois se tal
acontecer os poros desta deixarão de ser o principal elemento separador das partículas a filtrar.
As membranas utilizadas nesta operação podem ser preparadas com colódio, gelatina, acetato de
celulose, ácido silícico, etc. Estas substâncias são usadas sob a forma de gele, com o qual se impregna
o suporte a utilizar na filtração, como papel de filtro, cadinhos, filtros de vidro poroso, etc. A
porosidade das membranas depende bastante do modo como são preparadas. Assim, os filtros de
BECHHOLD, feitos com soluções diluídas de colódio, apresentam poros com 3-5 \i de abertura, ao passo
que se forem preparados com uma solução concentrada daquele produto os poros terão l (I de
diâmetro.
A ultra-filtração não é um processo muito utilizado na prática laboratorial corrente, reservando-
se a sua aplicação a casos específicos, como a filtração de colóides, a separação destes de cristalóides
e o fraccionamento de misturas de compostos tendo elevados mas diferentes pesos moleculares.
A firma alemã Membranfilter-Geseüschaft, de Gõttingen, é especializada na preparação de ultra-
fillros baseados no processo de ZSIGMONDY, oferecendo uma gama bastante grande de elementos
filtrantes deste tipo. Os filtros em questão são preparados impregnando placas de vidro poroso com
uma solução de nitrocelulose em ácido acético e acetona, secando-se a película assim formada por
uma corrente de ar com determinada percentagem de humidade.
Deste modo, é possível obterem-se membranas filtrantes com aberturas de poros de dimensões
definidas mas variáveis, susceptíveis de numerosas aplicações, entre as quais destacamos o seu
emprego na filtração esterilizantc de líquidos e em certas análises bacteriológicas. Assim, a variedade
Coli 5 é aconselhada na análise bacteriológica da água, a qual é filtrada através de uma pequena
membrana de 5 cm de diâmetro, onde ficam retidas e como que concentradas as bactérias existentes no
volume de água filtrado, procedendo-se, depois, à incubação da placa filtrante num meio de cultura
apropriado.
Esta técnica pode ter bastante interesse nos ensaios de controlo da esterilidade de soluções
farmacêuticas adicionadas de bacteriostãticos, pois no filtro apenas ficarão retidos os microrganismos
possivelmente existentes na solução, passando no filtrado as substâncias que, pela sua presença,
impedem a multiplicação daqueles. A incubação do filtro num meio de cultura, uma vez
convenientemente lavado, revelará, depois, com segurança, a presença ou ausência de agentes
microbianos no produto ensaiado.
101

Os uitra-filtros podem ser operados por sucção ou sob pressão, existindo dispositivos vários que
permitem realizar esta operação nas melhores condições possíveis. O modelo clássico é constituído pelo
filtro de ZSICMONDY, representado na Fig. 66 /t, o qual trabalha por sucção. Este aparelho, como, aliás,
todos os outros, é constituído por uma espécie de funil que se separa em duas partes mantidas
firmcmcnlc unidas, quando o filtro está montado, por dois parafusos com porcas de orelha. A placa
filtrante, como se vê no esquema, é intercalada entre as duas partes do funil. O filtro de THIESSEN (Fig.
66 fí), por seu turno, tanto pode trabalhar por sucção como sob pressão, e o modelo apresentado na Fig.
66 B serve para filtrações Rg 66 A u|tra_fi|tro de Zsig^ondy;
B
esterilizantes. < ullra-fillro de Thiessen

4.2.4.7. Métodos para avaliar o grau de clarificação dos líquidos

Constituindo um dos objectivos da filtração a obtenção de líquidos límpidos, na prática surge


muitas vezes o problema de determinar o grau de clarificação conseguido após ter-se feito tal
operação. É vulgar empregarcm-se certos termos, como turvo, límpido, claro, brilhante, etc., para se
definir o estado de clarificação que um líquido apresenta, mas, como se compreende, tais designações
têm quase sempre um valor relativo, pois dependem, na maioria das vezes, de um critério pessoal, que
pode variar de observador para observador, tornando-se especialmente difícil classificar com precisão
o grau de eficiência da filtração de líquidos altamente clarificados. Este problema, aliás, tem grande
importância no que diz respeito às soluções medicamentosas, especialmente as que se destinam a
serem administradas por via injectável, que devem apresentar-se brilhantes e límpidas. Em geral, o
exame destas soluções é feito nos laboratórios farmacêuticos e noutras indústrias por pessoal treinado
para esse fim, que observa os recipientes por simples transparência contra uma fonte luminosa, o que
permite verificar a existência de sólidos em suspensão.
Existem, porém, aparelhos especiais, como turbidímetros, nefelómetros e tin-dalómetros, que
permitem determinar rigorosamente e em bases quantitativas o grau de clarificação de um líquido.
Entre os considerados mais eficazes estào os aparelhos que se baseiam no efeito de TYNDALL, com
os quais se avalia a intensidade da luz reflectida pelas partículas suspensas no líquido em exame. Na Fig.
67 representa-se um aparelho destes, o qual lembra bastante
102

um colorímetro de DUBOSCQ e que deve trabalhar num local escurecido. Nos tubos colocam-se o líquido a
observar e um padrão, o qual pode ser constituído pela própria solução
submetida a uma filtração padronizada ou por suspen soes
preparadas cm condições definidas.
4.2.5. CLARIFICAÇÃO
Tubos
de A clarificação tem por objectivo separar do^ líquidos partículas
sólidas finamente divididas ou substâncias de natureza coloidal neles
existentes que provoquem a sua turvação, sem. no entanto, se recorrer ao
emprego de filtros como elementos primaciais para se realizar tal
operação.
Em geral, pratica-se a clarificação sempre que as características do
material a separar , como o seu estado coloidal, grau de divisão,
compressibilidade, etc., façam com que os filtros sejam obstruídos, tor-
nando, portanto, a filtração dificilmente realizável.
Lâmpa No fundo, a maioria dos métodos utilizados consiste,
da de
alta justamente, em promover a aglomeração dos sólidos dispersos
no líquido por cuja turvação são responsáveis, o qual, após a
sedimentação desse aglomerado, se torna límpido. Conseguida a
sedimentação das partículas anteriormente suspensas, o líquido
Fig. 67. Aparelho para avaliar a
limpidez de um líquido pelo efeito límpido é separado por decantação ou por filtração. Repare-se,
de Tyndall porém, que esta só é aplicada depois de o material causador da
turvação do líquido ter sido profundamente modificado por um tratamento
prévio, e daí o motivo por que se diz que os filtros não representam os
agentes verdadeiramente activos da clarificação. Sob todos os aspectos, pode considerar-se que a
filtração é executada aqui como uma operação meramente acessória.
Vejamos, seguidamente, cm que consistem os processos de clarificação mais utilizados na
prática.

4.2.5.1. Métodos de clarificação


4.2.5.1.1. Por acção do calor
É um dos métodos utilizados sempre que o líquido a clarificar seja bastante viscoso ou
contenha substâncias proteicas, como quase sempre acontece com a classe de produtos que se
pretende tornar límpidos por um processo destes, pois o calor pode concorrer para a sua clarificação
por dois mecanismos distintos.
103

Tratando-se de um líquido viscoso, o seu aquecimento torna-o menos denso e mais fluído e por
isso as partículas nele suspensas, responsáveis pela sua turvação, têm tendência a separar-se,
depositando-se as mais pesadas e juntando-se à superfície as mais leves. Em gerat, aquece-se o
produto à ebulição, pois o desprendimento de bolhas gasosas que esta provoca facilita a junção das
partículas mais leves à superfície, as quais são, depois, removidas por meio de uma escumadeira,
espécie de colher perfurada, de contorno circular c muito ligeiramente côncava.
Se o produto a clarificar contiver substâncias de natureza proteica, como é o caso dos sucos
herbáceos e dos produtos de origem animal, o aquecimento provoca a coagulação dessas
substâncias, de que resulta a formação de um precipitado mais ou menos volumoso, o qual aprisiona na
sua rede as partículas suspensas, arrastando-as ao sedimentar.
Após ter-se praticado a escumação, quando seja necessário fazê-la, e deixado depositar as
partículas mais densas, o líquido límpido é decantado com os devidos cuidados por qualquer das
técnicas descritas no respectivo capítulo.

4.2.5.1.2. Por acção do calor após a adição de substâncias


proteicas

Se bem que o calor possa concorrer para a clarificação de um líquido por simples diminuição
da sua viscosidade, a verdade é que a sua acção é muito mais eficaz se o produto a clarificar contiver
substâncias proteicas. Estão neste caso, como já referimos, os sucos vegetais e animais, mas muitos
produtos há que não contêm essas substâncias, de modo que para os clarificar convenientemente
pelo calor é necessário adicionar-lhes uma proteína estranha.
A substância que mais vulgarmente se utiliza para este fim é a albumina ou clara de ovo. Esta
pode ser adicionada directamente ao líquido, havendo quem preconize que se adicione à albumina
igual volume de líquido a clarificar e se coe, depois, a mistura através de uma gaze, juntando-se o
produto coado ao total do líquido. Este é aquecido à ebulição, até que a albumina coagule, deixando-
se, depois, que sedimente, para que se faça a clarificação.
Em geral, uma clara de ovo é suficiente para clarificar cerca de 5 l de líquido. O uso da
albumina do ovo está contra-indicado quando no material a clarificar haja substâncias reduioras.
Nestas circunstâncias, e dado que a albumina do ovo contém enxofre na sua molécula, pode suceder
que se dê a redução deste a sul fure to de hidrogénio, que confere cheiro muito desagradável ao
líquido clarificado. Podem utilizar-se outras substâncias em substituição da albumina do ovo, como o
sangue de boi, o barro espanhol, etc. A utilização de substâncias proteicas deve ser feita com a
necessária prudência, pois estas formam precipitados em presença de metais pesados e fenóis, pelo que
nunca deverão ser adicionadas a líquidos em cuja composição figurem aqueles produtos.
104

4.2.5.1.3. Pela gelatina

A gelatina é utilizada, especialmente, quando o líquido que se pretende (ornar límpido é rico em
taninos, pois aquela reage com estes compostos, precipitando-os, acontecendo que o precipitado assim
formado aprisiona nas suas malhas as partículas suspensas no líquido, arrastando-as para o fundo ao
sedimentar. Geralmente, adiciona-se a gelatina sob a forma de solução a l ou 2% em água aquecida,
não tardando que em presença de taninos se observe a formação de um precipitado floculento, que
por repouso à temperatura ambiente sedimenta ao fim de algum tempo.
Por vezes, usa-se, igualmente, a gelatina para clarificar certos líquidos não taninosos, e nesse
caso o mecanismo pelo qual aquela substância aclua consiste na neutralização das partículas
coloidais existentes no líquido. Estas, carregadas negativamente, são neutralizadas pela carga
eléctrica positiva da gelatina, daí resultando a sua aglomeração c sedimentação, com a subsequente
clarificação do líquido.

4.2.5.1.4. Por coagulantes sintéticos

As substâncias deste tipo estão sendo usadas na purificação da água e dos esgolos e actuam
exactamente como a gelatina em presença de partículas coloidais. Actualmente, os produtos mais
usados são representados por poliamidas catiónicas, que neutralizam a carga eléctrica negativa das
partículas suspensas, promovendo assim a sua floculação.
Como o preço destas substâncias é relativamente elevado, são usadas conjuntamente com
floculantes inorgânicos, como o alúmen e o sulfato férrico.

4.2.5.1.5. Pelo leite

O leite é um agente clarificante, pois a sua caseína pode originar, em determinadas


circunstâncias, um precipitado que ao sedimentar arrasta consigo as partículas sólidas suspensas num
líquido. Na técnica farmacêutica utiliza-se o leite, sobretudo para clarificar vinhos e vinagres
medicamentosos, na proporção de l colher de chá para cerca de l litro do produto a clarificar.

4.2.5.1.6. Por polpa de papel e outras substâncias

A polpa de papel e outras substâncias, como o talco, caulino e terra de infusórios, são
igualmente utilizadas na clarificação. O agente clarificante é adicionado, sob agitação, ao líquido a
clarificar, o qual, depois, é abandonado em repouso, para ser, ulteriormente, decantado ou filtrado.
Estas substâncias actuam como adsorventes, fixando portanto os sólidos responsáveis pela turvação.
105

4.2.5.1.7. Por fermentação

Este processo de clarificação é aplicado aos sucos de frutos, os quais são geralmente bandonados durante
alguns dias num local fresco, sofrendo então uma dupla fermentação que concorre para os tornar mais límpidos.
Uma dessas fermentações é a alcoólica, a qual consiste, como se sabe, na transformacão da glicose em
álcool e anidrido carbónico por acção das leveduras. O álcool formado facilita sobretudo a dissolução de
certas substâncias, como matérias corantes, e se a sua concentração atingir determinado valor, o que, aliás,
raramente acontece, poderá concorrer para a precipitação das substâncias albuminóides e mucilaginosas
existentes no suco. Por seu lado, as bolhas de anidrido carbónico, ao abandonarem o líquido, fazem o
arrastamento de certas substâncias em suspensão, as quais passam a formar uma camada à supefície, facilmente
removível por escumação.
Simultaneamente com a fermentação alcoólica, ocorre, nos sucos de frutos, a fermentacão péctica,
durante a qual a pectose, composto de natureza glucídica existente em certos frutos, se transforma em ácido péctico
por intervenção de um fermento chamado pectase.
Este ácido péctico, cuja formação demora algum tempo a observar-se e é facilitada pela presença de
um ácido e de certos catiões, como o cálcio e o bário, apresenla-se com o aspecto de um gele que engloba na sua
massa numerosas partículas sólidas contidas nos sucos, concorrendo, assim, para a sua clarificação.

4.2.5.1.8. Por sedimentação


Constitui o processo mais simples de clarificar um líquido, o que se consegue por simples acção da
força da gravidade. Para que isso se realize é necessário, porém, que as partículas suspensas apresentem
características que permitam a sua sedimentação e que o líquido a clarificar não se altere por exposição
prolongada ao ar. Esle processo é, em geral, aplicado aos óleos vegetais.

BIBLIOGRAFIA

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DENOËL, A., Cours de Pharmacie Pratique, Tomo I. pág, 47. Lês Prcsses Univcrsitaires de Liège, 1965

Expressão: BENTLEVS Text-Book of Pharmaceutics, pág. 181.


106

Centrifugação:

BRNTI.KVS Text-Book of Pharmaceufics, pág. 217.


GOLDING, H. B., Centrifuging. in Technique of Organit: Chemistry, Cap. III, vol. III, pág. 143, Interscience
Publishers, Inc., New York, 1950.

Filtração:

BACHMANN, P., Noiions pratiques de génie chimique, pág. 227, Librairie de 1'Université-Georg, Gèneve,
1965.
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CASADIO, S., Tecnologia Farmacêutica , pág. 142. vol. I, Cisalpino-Goliardica. Milano, 1972. CUMMINCS,
A. B., Fittratinn, in Technique of Organic Chemistry, Cap. VII, vol. III, pág. 485. DICKEV, G. E. e
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NOVACIC, L. e MFCARRI.I.I, E., Buli. Chim. Farm.. 39, 27 (1954). VIGNERON, M. M., Journées Pharmaccutiqucs
Françaincs, 1951, e Bibliografia Científica do l. P. Lisboa,
N." 22, vol. II, 1953.
107

Operações mecânicas de divisão

5.1. DIVISÃO DE SÓLIDOS

5.1.1. GENERALIDADES

As operações de divisão têm por fim redu/ir, mecanicamente, os corpos a partículas ou


fragmenlos de pequenas dimensões, utilizando-sc, para isso, meios adequados à natureza da
substância que se pretende dividir.
Trata-se de uma operação largamente utilizada na rotina laboratorial e que se reveste de
extraordinária importância no campo farmacêutico, pois muitas drogas, sobretudo as de origem vegetal,
dificilmente poderiam ser administradas ou submetidas a certas manipulações sem que, previamente,
tenham sido reduzidas a partículas de tamanho diminuto. Na realidade, um número importante de
fármacos vegetais é constituído por raízes, cascas, folhas, etc., sendo, por conseguinte, praticamente
impossível administrar aos doentes uma droga destas tal como se apresenta. Compreende-se, pois, a
necessidade de submeter as drogas a uma divisão conveniente para facilitar a sua administração.
Esta divisão de substâncias medicamentosas oferece ainda outras vantagens. Assim, uma droga
reduzida a pó pode misturar-sc mais facilmente com outras, também sob a forma de pó, para com
elas se comporem misturas homogéneas, constituindo tais composições uma forma muito corrente
de administrar certos fármacos.
Por outro lado, a divisão das drogas aumenta extraordinariamente a sua superfície, daí
resultando uma maior facilidade de cedência dos seus princípios activos. Uma droga dividida está,
de facto, em melhores condições para sofrer o ataque dos sucos digestivos e por tal motivo os seus
constituintes são absorvidos mais rapidamente e em maior percentagem, tornando-se, nestas
condições, mais activa do ponto de vista farmacológico.
108

Na prática laboratorial e pela razão atrás apontada, a divisão de uma substância facilita a sua
dissolução, motivo por que se aconselha pulverizar previamente os corpos que se pretende dissolver.
Também na extracção das drogas vegetais por solventes, a divisão previa daquelas desempenha
um papel da maior relevância. De facto, se pretendermos extrair uma droga inteira, como uma raiz,
uma casca ou um lenho, o solvente dificilmente penetraria nos respectivos tecidos, pois, estando
aqueles intactos, as membranas celulares actuariam como verdadeiras barreiras que dificultariam
essa penetração. Uma vez, porém, que a droga a extrair tenha sido convenientemente dividida, já isso
não acontece. Nestas circunstâncias, os tecidos foram lacerados e rebentadas, na sua maioria, as
paredes das células, deixando, assim, de existir barreiras que impeçam a penetração do solvente,
tornando-se, deste modo, muito mais rápida e eficiente a dissolução dos constituintes celulares no
líquido extractor.
É evidente que o grau de divisão a que se há-de submeter uma droga varia com o fim a que esta
se destina e, ainda, com a sua natureza, além de que a solubilidade dos seus princípios activos num
determinado solvente condiciona, também, o grau de divisão a que aquela deve ser sujeita.
Se bem que seja impossível estabelecer regras gerais quanto à divisão das drogas, pode-se, no
entanto, enunciar certos princípios orientadores. Assim:

1 — As drogas que se destinem a ser administradas sob a forma de pós, pílulas, cápsulas ou
suspensões devem ser divididas o mais finamente que é possível.
2 — Quanto mais compacta for a estrutura da droga maior deve ser o respectivo grau de
divisão.
3 — As drogas contendo princípios dificilmente solúveis devem ser mais finamente divididas do
que aquelas cujos constituintes são mais solúveis.
4 — Quanto menos a droga se deixar embeber pelo solvente, maior deve ser o seu estado de
divisão. Este facto tem grande importância na preparação de soluções extractivas, pois
quanto mais facilmente o solvente penetrar no interior das células e se misturar com o
respectivo conteúdo melhor será o rendimento da extracção. Compreende-se, por isso,
que os solventes que embebem perfeitamente o material a extrair não exigem que este se
apresente extremamente dividido para que se possa obter um bom rendimento extractivo.

Dada a extrema variedade de substâncias a pulverizar, é natural que os processos utilizados


para as dividir lenham que ser escolhidos conforme as características que elas apresentam. Se é
relativamente fácil a divisão dos produtos químicos, a pulverização das drogas vegetais e animais
levanta problemas específicos devido à sua estrutura um tanto heterogénea. Sobretudo nos vegetais,
a par de formações moles, encontram-se lecidos por vezes extramente duros, como os elementos de
natureza lenhosa, os quais
109

exigem processos adequados para serem reduzidos a pequenas partículas. Cada classe de
substâncias terá, pois, que ser submetida a técnicas especiais de divisão, as quais passamos a
estudar seguidamente.

5.1.2. DIVISÃO GROSSEIRA

A divisão grosseira representa um processo de fragmentação das drogas destinado a torná-


las aptas a sofrerem uma divisão ulterior mais perfeita ou a poderem ser submetidas a certas técnicas
extractivas.
De facto, a pulverização de drogas muito compactas ou que se apresentem com dimensões
consideráveis exige que estas sejam previamente divididas em pequenos fragmentos, o mesmo
acontecendo na preparação de algumas soluções exlractivas. Km regra, a divisão grosseira
representará, portanto, uma operarão preliminar, destinada a transformar determinado material de
modo a este poder ser submetido a ouiras manipulações, que constituem a operação principal. Em
casos especiais, porém, a divisão grosseira poderá assumir esta última característica, como na
preparação das espécies, que constituem uma forma farmacêutica obtida seccionando em fragmentos
de redu/í-das dimensões certos órgãos de plantas, como raízes, folhas e flores, que são. depois,
convenientemente misturados.
Atendendo ao que atrás se disse sobre a grande versatilidade do material a divi dir, são
vários os processos utilizados na prática para se fazer a sua divisão grosseira, como passamos a
descrever.

5.1.2.1. Por secção


A secção consiste ern dividir um corpo em pequenos fragmentos por meio de um instrumento
cortante e constitui o processo de divisão grosseira que geralmente se aplica às drogas de origem
vegetal. Utiliza-se, indistintamente, para dividir substânci

Fig. 68. Corta raízes


110

de consistência mole ou dura e caracteriza-se por ser possível obter fragmentos com o volume e a
forma desejada, diferindo, neste pormenor, da contusão.
Os instrumentos utilizados neste processo de divisão podem ser tesouras ou facas, caso as
substâncias a seccionar não sejam demasiadamente duras, como acontece com
as folhas, plantas herbáceas, certas cascas
e frutos. Geralmente, porém, usam-se
corta-raízes, empregados, sobretudo, para
seccionar os materiais fibrosos e rijos,
como as raízes, lenhos e muitas cascas.
Estes instrumentos são formados por uma
plataforma sobre a qual está montada uma
alavanca cujo ponto de apoio e a potência
se situam nas respectivas extremidades,
ficando a resistência, correspondente à
lâmina cortante, no meio. Existem vários
modelos destes intrumentos, que se dife
renciam pela forma do cutelo e pelas
dimensões, conforme se pode ver na
Fig. 68. Na indústria usam-se máquinas
especiais que permitem cortar as drogas
em fragmentos com as dimensões deseja-
Fig. 69. Aparelho para seccionar plantas das (Fig. 69).

5.1.2.2. Por contusão

É a operação que permite redu/ir os corpos sólidos a fragmentos relativamente pequenos, mas de
dimensões desiguais, por meio de choques repetidos. Aplica-se, principalmente, a substâncias duras
e secas, como raízes, cascas, certas sementes e, por vezes, a folhas muito secas, quando se destinem a ser
submetidas à acção de um solvente qualquer. E utilizada, também, para a divisão grosseira dos
produtos químicos que se apresentem sob a forma de cristais com dimensões apreciáveis.
A contusão pode ser efectuada por vários meios,
usando-se, sobretudo nos laboratórios farmacêuticos, um
almofariz, onde a droga é colocada e batida com pan
cadas verticais do pilão, até ficar devidamente fragmen
tada. Quando a substância se apresenta em fragmentos
grandes e duros está indicado proceder à sua contusão
com um martelo. Fig. 70. Esmagador de maxilas
111

Os processos que acabamos de referir apenas se utilizam no laboratório da oficina


farmacêutica, em que a quantidade de droga a contundir é quase sempre diminuta, recorrendo-se a
máquinas especiais quando se torne necessário proceder à fragmentação de grandes lotes de
material.
Um dos aparelhos usados para este fim é um esmagador de maxilas, representado na Fig. 70, o
qual é constituído por uma armação muito robusta sobre a qual está montada a maxila fixa. O
material a contundir é apertado entre esta e a maxila móvel, feita de aço e accionada por um
excêntrico, formando as duas peças um ângulo agudo pronunciado, cuja
abertura c regulável.
Um outro modelo é constituído por dois cilindros canelados,
sendo um móvel e outro fixo, montados de modo que os respectivos
dentes se encostem. Estes cilindros (Fig. 71) são mantidos em posição
por molas muito fortes, as quais, no entanto, permitem que se afastem
um do outro quando na engrenagem cai um fragmento dema- Fig. 71.
Cilindros canelados siado grande ou excepcionalmenle duro, o que evita
qualquer possível avaria do aparelho. Os moinhos de mós, constituídos por duas pedras circulares
acopuladas girando sobre uma superfície dura, também servem para se efectuar a contusão de várias
drogas.

5.1.2.3. Por rasuração

A rusuração consiste na divisão dos corpos em pequenas partículas por atrito contra uma
superfície áspera, como uma lima ou um raspador, ou por meios mecânicos diversos. Esta operação
é menos correntemente praticada que as anteriores, estando apenas reservada para o caso de
substâncias de grande dureza, como os metais e a noz--vómica, e para aquelas dotadas de certa
elasticidade, como o sabão, que se aglomera sob a acção das pancadas do pilão.
Nos laboratórios farmacêuticos os instrumentos vulgarmente utilizados para se efectuar esta
operação são limas, de preferência as de dentes grossos, e os raladores de meia cana. Na rasuração
do sabão pode utilizar-se, com bons resultados, uma simples faca, tornando-se mais fácil obter
raspas daquela substância por este processo do que por meio de limas ou raladores, sobre os quais o
sabão tem tendência a aglomerar-se se não estiver bem seco.

5.1.2.4. Por granulação

É um processo de divisão grosseira apenas reservado para os metais, sendo esta a técnica por
que se preparam as granalhas de estanho, zinco, chumbo, etc. O metal fundido é vertido num
recipiente cujo fundo é constituído por uma rede de malhas mais
112

ou menos apertadas, através das quais passam as gotículas do metal que são recebidas num outro
recipiente contendo água fria. Em contacto com esta o metal solidifica, ficando dividido em
fragmentos de forma granular cujo diâmetro dependerá, como é evidente, da abertura dos orifícios
do vaso donde escoa o melai em fusão.

5.1.2.5. Por extinção

Constitui, igualmente, um processo reservado a casos especiais, aplicando-se sobretudo na


divisão grosseira de materiais de natureza argilosa e siliciosa, como operação prévia para a sua
pulverização. Consiste a extinção em aquecer ao rubro os referidos materiais, após o que se
arrefecem bruscamente por imersão em água. Esta variação brusca de temperatura provoca a
desagregação da substância em pequenos fragmentos, adquirindo estes, após o mencionado
tratamento, uma fragilidade muito grande, o que permite reduzi-los facilmente a pó por trituração
num almofariz.

5.1.3. PULVERIZAÇÃO

De todas as operações de divisão, a pulverização é, sem dúvida, a mais importante,


distinguindo-se das técnicas até aqui consideradas por originar produtos muito mais finamente
divididos, implicando, em muitos casos, a obtenção de partículas com dimensões bem determinadas.
A pulverização de sólidos, ou somente pulverização, como é mais corrente designá-la, distingue-
se da divisão grosseira porque os produtos a ela sujeitos devem ser levados a um certo e bem
determinado grau de divisão, de modo a que as partículas formadas apresentem dimensões
previamente estabelecidas. Por isso mesmo, a pulverização implica não só a fragmentação do
material a dividir, como também a calibração dos grânulos obtidos.
A pulverização pratica-se com o f i m de reduzir uma substância a pó, entendendo--se por pó.
do ponto de vista farmacêutico, o conjunto de partículas sólidas resultantes da divisão de uma
droga, as quais apresentam dimensões variáveis de acordo com a classe de pó considerada,
mantendo, porém, dentro de cada uma, grande homogeneidade.
A redução das drogas ao estado de pó é uma operação de certo modo complexa, sobretudo
quando o fármaco a pulverizar é de natureza vegetal. A substância deverá ser objecto de certas
manipulações destinadas a torná-la mais facilmente pulverizável, e só então será reduzida a pó,
sendo necessário que à medida que a pulverização se efectua se separem as partículas cujas
dimensões correspondem à tenuidade própria da categoria
113

do pó que se deseja obter. Estamos, assim, perante uma série de operações dispostas e comportando-
se como elos de uma cadeia, cada uma com a sua acção específica mas concorrendo todas para a
obtenção dos pós, que constituem o objectivo desta longa e, por vezes, complicada série de
manipulações. Deste modo, poderemos dizer que a pulverização se divide em três fases distintas,
representadas pelas operações preliminares, a operação principal e as operações acessórias ou
complementares, cada uma das quais passaremos a considerar com o detalhe que merece.

5.1.3.1. Operações preliminares

Constituem um conjunto de operações a que é necessário submeter a droga para torná-la apta
a poder ser reduzida a pó sem qualquer dificuldade. Dum modo geral, uma mesma droga deve ser
sujeita, se não a todas, pelo menos à grande maioria das operações aqui mencionadas. É evidente
que uma pulverização só poderá ser devidamente conduzida por quem tenha um conhecimento
adequado de cada fármaco, pois não é unicamente u sua estrutura física que condiciona o processo a
escolher para a sua redução a pó. A aplicação judiciosa das operações preliminares exige, na
realidade, de quem as pratique, conhecimentos sobre a constituição química das diferentes drogas,
pois só nessas circunstâncias se poderá decidir, por exemplo, qual o processo de secagem mais
aconselhado ou em que casos é conveniente fazer-se a estabilização do material a pulverizar.
Como algumas das operações preliminares que passamos a abordar já foram anteriormente
estudadas, limitar-nos-emos, nesses casos, a enunciá-las, dedicando especial atenção àquelas que,
pela primeira vez, são mencionadas neste livro.

5.1.3.1.1. Triagem ou Monda

Toda a droga deve ser mondada, destinando-se esta operação, como se disse, a separar as
partes inúteis ou estranhas que a acompanham. Pratica-se por qualquer dos processos descritos na
respectiva secção, tendo em conta a natureza da droga.

5.1.3.1.2. Divisão grosseira

Já atrás nos referimos à necessidade de dividir grosseiramente as drogas, a fim de as


prepararmos para serem reduzidas a pó, sendo o processo a adoptar dependente das características
do produto a dividir.
114

5.1.3.1.3. Secagem

É uma das operações preliminares mais importantes, que se torna imperioso executar sempre
que a substância tenha um certo grau de humidade, pois nestas condições ela apresenta-se elástica
e toma-se pouco friável, resistindo, por isso, à desagregação. Como todos os fármacos de origem
biológica contêm uma percentagem considerável de água, segue-se que terão que ser
convenientemente secos antes de submetidos à pulverização propriamente dita, sendo, no entanto,
dispensável esta operação no caso de produtos químicos não higroscópicos.
A secagem das drogas vegetais pode fazer-se por exposição ao ar, em atmosfera seca e
arejada, mas o processo que geralmente se utiliza é a secagem em estufas, a 40-45°C, por tempo
variável. Com certa prática, é fácil reconhecer-se se uma droga está convenientemente exsicada, o
que é indicado pelo modo como ela parte, quando se trata de uma droga de textura compacta, ou
como se desagrega quando esmagada entre os dedos, no caso das folhas.
Deve ter-se em conta, porém, que a secagem por aquecimento a 40-45°C nem sempre pode ser
aplicada, pois existem numerosas drogas que não suportam uma temperatura daquela ordem, a qual
pode originar alterações ou perda de alguns dos seus princípios activos.
Em tais circunstâncias, as drogas serão exsicadas à temperatura de 25°C, também numa
estufa, e no caso de esta temperatura ser ainda excessiva recorre-se a um outro processo, corno a
secagem à temperatura ambiente em exsicadores.
Como exemplos de drogas que devem ser exsicadas por aquecimento a 25°C podemos citar as
seguintes:
a) Drogas contendo essências: Anis, badiana, funcho, alcaravia, sabina, etc., etc.
b) Drogas contendo substâncias alteráveis: rosa vermelha, castóreo, açafrão.
c) Drogas que amolecem a temperatura mais elevada: É o caso do sabão. A secagem deste deve
fazer-sc, inicialmente, à temperatura de 25°C, e só quando estiver quase totalmente seco é que se
acaba a secagem elevando a temperatura até 45°C.

As substâncias contendo resinas, porque amolecem facilmente por acção do calor, constituem
um grupo de fármacos cuja exsicação deve fazer-se, de preferência, em exsicadores. Estão neste caso
a assa-fétida, o eufórbio, a mirra, a goma-guta, a goma--amoníaca e a escamónia.

5.1.3.1.4. Amolecimento

Esta operação só é aplicada quando a substância seja muito compacta ou apresente uma
consistência córnea que a torne resistente aos processos correntes de pulverização. Representam
exemplos clássicos de drogas que devem ser submetidas a esta operação
115

o salepo e a noz-vómica, exigindo cada uma delas um processo especial de amolecimento.


Assim, para amolecer os tubérculos do salepo estes são lavados, previamente, com água, e
privados de toda a superfície que se apresente escurecida, deixando-se a macerar naquele líquido
durante algumas horas. Depois são escorridos, enxugados com um pano e secos a 30°C, após o que
estão apios a serem pulverizados.
Para se conseguir o amolecimento das sementes da noz-vómica estas devem ser expostas,
dentro de um peneiro, ao vapor de água, e só depois deste tratamento são cortadas e raladas.

5.1.3.1.5. Estabilização

A estabilização é uma operação que tem por fim manter inalterável a composição química das
drogas vegetais, procurando-se evitar, com a sua aplicação, as transformações de ordem enzimática
a que os fármacos estão sujeitos durante a secagem e, posteriormente, durante a sua armazenagem,
as quais tantas vezes provocam a sua inactivação.
Esse objectivo, como, aliás, é óbvio, só poderá ser plenamenta atingido desde que se proceda à
destruição total dos enzimas responsáveis por essas transformações.
Durante os primeiros séculos da história da civilização o homem dependia, como, aliás, ainda
hoje acontece entre as populações mais primitivas, tanto para a sua alimentação, como para o
tratamento das doenças que o afligiam, dos produtos naturais que o rodeavam. Deste modo, tinha
quase permanentemente à sua disposição as plantas de que necessitava e, por tal motivo, as drogas
eram consumidas, na sua grande maioria, no estado fresco.
À medida, porém, que o mundo conhecido se foi dilatando, muitas drogas começaram a ser
importadas de longínquas regiões, tornando-se necessário secá-las para as preservar e ser possível
conservá-las durante períodos consideráveis. Aconteceu, então, que vários fármacos tidos, durante
séculos, como altamente eficazes, começaram a perder a reputação de que até aí gozavam, uma vez
que a sua actividade diminuía depois de secos.
Este fenómeno, aparentemente sem explicação plausível, só viria a ser devidamente
compreendido e controlado quando se descobriram os enzimas e se determinaram as funções que
eles exercem no metabolismo celular. A vida das células está dependente de um conjunto de reacções
extraordinariamente complexas, umas de natureza anabólica, outras de natur/a catabólica. mas
todas comandadas por sistemas enzimáticos altamente específicos, os quais presidem à formação dos
componente celulares e à sua decomposição. Na célula viva normal os processos anabólicos e
calabouços estão harmoniosamente conjugados mas em certas condições tal equilíbrio pode ser
alterado, com consequências desastrosas para a utilidade das plantas como produtos
medicamentosos.
116

Alguns casos há em que se pode tornar benéfica c mesmo desejável -i acção dos fermentos
sobre certos constituintes da célula vegetal, pois dela resultam outros compostos de alto interesse
terapêutico. É o que acontece, por exemplo, com o amig-dalósido, que se transforma, por acção da
emulsina, em ácido cianídrico e aldeído benzóico. As sementes de mostarda, por sua vez, apenas se
tornam verdadeiramente activas depois de o sinigrósido ter sido desdobrado pela mirosina, ao passo
que a vanilina só aparece nos frutos da baunilha como consequência de um processo fermen-tativo.
É evidente que em casos destes a destruição dos enzimas responsáveis pelas transformações
conducentes à formação dos compostos considerados úteis tornará a droga desprovida de acção
terapêutica. No entanto, esta acção benéfica dos fermentos sobre os constituintes das drogas
vegetais está restrita a um número limitado de casos, acontecendo, em regra, que a actividade
enzimática levada a cabo na planta depois de colhida exerce um efeito nefasto sobre os princípios
activos nela existentes, transformando-os, por meio de hidrólises e oxidações, em compostos por
vezes muito diferentes dos produtos iniciais.
Os processos bioquímicos que têm lugar nos tecidos mantêm-se em actividade mesmo depois de
colhidas as drogas, pois a morte das células dá-se vagarosamente. Nestas condições, as reacções
enzimátieas continuam durante a secagem das plantas, acontecendo, porém, que as células vão
perdendo agora, progressivamente, a faculdade de controlar essas reacções, até aí caracterizadas
por se processarem segundo moldes sabiamente estabelecidos, de que resulta um verdadeiro caos na
actividade bioquímica celular. E assim se iniciam as acções enzimátieas de carácter destrutivo, com
a inac-tivação total ou parcial, durante a secagem, de várias drogas contendo glucósidos por
intervenção das respectivas glucosidades.
Normalmente, o enzima e o composto sobre o qual aquele actua especificamente podem
encontrar-se na mesma célula mas estão localizados em formações diferentes e, portanto, afastados,
ou existe um mecanismo desconhecido que impede a sua intervenção de modo descontrolado. A
secagem da droga, contudo, provoca a desidratação desta, o que determina a ruptura completa do
equilíbrio pre-existente nas diferentes células, podendo registar-se uma plasmólise com retracção do
protoplasma, que se destaca da membrana celular e se contrai em maior ou menor escala conforme
o grau de desidratação sofrida. Estas modificações permitem o contacto dos fermentos com os
respectivos substratos, o que nunca acontece nas células normais, e, assim, aqueles têm a
possibilidade de actuarem livremente enquanto a planta possuir certo grau de humidade, o que
explica a alteração de muitas drogas ocorrida durante a primeira fase da secagem.
Entre as alterações a que os componentes dos vegetais estão sujeitos contam-se os fenómenos
de hidrólise e de oxidação, os primeiros dos quais se devem a enzimas denominados hidrolases,
capazes de actuarem sobre vários substratos.
117

Assim, as glucosidases são fermentos hidrolisantes dos holósidos e heterósidos. Em muitas


plantas no estado fresco existem os chamados heterósidos «primários», em cuja constituição figuram
várias oses, encontrando-se nas inesmas plantas, quando secas ou envelhecidas, outros compostos
derivados daqueles mas menos ricos em açúcares, e, por isso, conhecidos pela designação de
heterósidos «secundários».
Este fenómeno hidrolítico sofrido pêlos heterósidos «primários» tem sido bem estudado em
vários fármacos. Assim, por exemplo, na Dedaleira verifica-se que os seus heterósidos «iniciais ou
primários», os purpureoglucósidos A e B e a glucogita-loxina, são desdobrados por um enzima
existente na planta, a digipurpidase. perdendo uma molécula de glucose e transformando-se na
digitoxina e gitaloxina, respectivamente. Facto análogo se passa na Digitalis lanata, cujos
digilanidos, por acção da digilanase, perdem, igualmente, uma molécula de glucose originando,
deste modo, a acetildigitoxina, a acetilgitoxina, etc., o mesmo se registando em vários outros fármacos.
Outro exemplo característico de decomposição hidrolílica c o que se regista com os glicerídeos,
desdobráveis pelas esterases em glicerol e ácidos gordos, fenómeno responsável pelo ranço ácido
das gorduras.
Nestas plantas são também frequentes fenómenos de oxidação enzimática, devendo-se à
presença de polifenoloxidase o escurecimento de muitos produtos vegetais, podendo ob.servar-se,
ainda, no decurso da armazenagem, a racemização de certos compostos. É o que acontece, por
exemplo, com a hiosciamina, alcalóide levógiro existente em várias solanáceas, que se transforma no
seu isómero racérnico, a atropina, menos activa do ponto de vista fisiológico.
Todas as plantas em que tais processos de alteração são susceptíveis de ocorrer eslão, porlanlo,
sujeitas à possibilidade de sofrerem modificações mais ou menos acentuadas na sua composição
durante a secagem. De facto, como esta se realiza, geralmente, a cerca de 40-50°C, acontece que tal
temperatura favorece os fenómenos enzi-máticos capazes de desencadearem essas alterações durante
aquele espaço de (empo crílico que decorre entre a morte da célula e o momento em que a
desidratação atinja um grau incompatível com a actividade dos enzimas.
É de notar, porém, que se a desidratação não tiver sido suficiente, essa actividade pode
continuar a processar-se, ainda que mais lenlumente, durante a armazenagem das drogas vegetais
incompletamente exsicadas, e acentuar-se-á se estas readquirirem parte da água eliminada pela
secagem. Na realidade, muitos produtos vegetais secos têm uma certa tendência para fixarem a
humidade atmosférica, motivo por que o seu grau de humidade pode considerar-se como andando à
volla de 5 a 15%. Nestas circunstâncias, os fermentos encontram novamente condições propícias
para reiniciarem a sua actividade e provocarem, por qualquer dos mecanismos atrás referidos, uma
perda de actividade dos fármacos vegetais.
São estes, em resumo, os motivos que justificam o emprego de métodos especiais capazes de
destruírem os enzimas existentes nos vegetais, de modo a tornar possível que estes, uma vez colhidos,
mantenham inalterável a sua composição.
118

5.1.3.1.6. Métodos de estabilização

Como os enzimas são de natureza proteica, os processos de desnaturação destas substâncias


são-lhes aplicáveis. Assim, precipitam pclos sais em concentração elevada, são insolúveis no álcool e
termolábcis em meio aquoso, sendo geralmente destruídos, quando dissolvidos em água, a
temperatura superior a 60°C. No entanto, nas plantas, são bastante mais resistentes ao calor, sendo
necessárias temperaturas superiores a IOO°C para se conseguir a sua destruição.

5.1.3.1.6.1. Destruição dos enzimas pelo álcool à ebulição

Esta técnica de estabilização representa o processo mais antigo e mais simples de destruição
dos enzimas vegetais e consisle em adicionar a planta fresca, cortada em pequenos fragmentos, ao
álcool fervente contendo carbonato de cálcio, cuja função é a de neutralizar os ácidos existentes no
produto a estabilizar, evitando que estes originem uma possível hidrólise dos glucósidos contidos na
planta.
A operação é realizada aquecendo à ebulição, num recipiente de capacidade apropriada,
álcool de 95", contendo alguns gramas de carbonato de cálcio, adicionando-se a
droga, a pouco e pouco, de modo a não interromper a ebulição.
Terminada a junção da planta, adapta-se ao recipiente, geralmente um balão,
um refrigerante de refluxo, e mantém-se o aquecimento durante 30-40
minutos. Deve usar-se uma quantidade de álcool correspondente a cinco vezes
o peso da droga e terminado o período de aquecimento deixa-se arrefecer,
decanta-se o líquido e repete-se o tratamento, utilizando, desta vez, álcool de
90°.
Este método, idealizado pelo bioquímico BOURQUELOT, enferma do defeito de
originar uma solução alcoólica de certos constituintes da planta fresca e não,
propriamente, uma planta estabilizada, além de que apenas se presta a tratar
pequenas quantidades de planta. Por isso sofreu algumas modificações no
decorrer dos tempos, tendo surgido aparelhos especialmente concebidos para
trabalharem em maior escala, se bem que conducentes sempre à obtenção de
um extracto estabilizado. Um desses aparelhos, já de carácter industrial, é o de
BOURQUELOT--HÉRissEY, o qual é constituído por um alambique aquecido por
um banho de água. Na tampa do alambique existem duas aberturas, estando
uma ligada a uma serpentina e a outra a um tubo mais largo, destinado à
introdução da droga. Este último tubo é hermeticamente fechado na
extremidade por uma tampa fixada
Fig. 72.
Estabilizador
119

por parafusos e tem na parte inferior uma espécie de válvula circular que se pode mover do exterior
por um manipulo que a faz rodar sobre um eixo apoiado, interiormente, às paredes do referido tubo
(Fig. 72).
Colocado o álcool e o carbonato de cálcio no alambique, A, fecha-se a abertura do tubo de
carga, B, e a respectiva válvula, C, aquecendo-se o aparelho até que o álcool entre em ebulição.
Nessa altura, mantendo-se a válvula horizontal, remove-se a tampa do tubo de carga e introduz-se a
droga, cortada em pequenos fragmentos, após o que se toma a fechar o tubo. Feito isto, roda-se a
válvula cautelosamente, para que a droga caia, a pouco e pouco, sobre o álcool ebuliente, sendo
importante que a chegada do produto à caldeira seja regulada de modo a não interromper a
ebulição do álcool. Esgotada a carga, introdu-zem-se no aparelho novas porções de planta,
conscguindo-se por este processo uma
estabilização rápida e sem grande perda
de álcool.
O aparelho de BOURQUELOT-
-HÉRissEY foi aperfeiçoado por WATTIEZ e
STERNON, consistindo a inovação mais
importante da versão destes autores na
possibilidade de fazer-se a concentração Vazio
da alcoolatura, por destilação do álcool,
no próprio estabilizador. O corpo
principal deste aparelho (Fig. 73), ou
seja, a câmara de estabilização, é
constituído por Fig. 73. Estabilizador de WATTIEZ e STERNON
três partes, A, B e C, tendo a parte
inferior, A, um duplo fundo que permite
o aquecimento do aparelho por meio de uma corrente de vapor ou o arrefecimento das alcoo-
laturas fazendo circular nela água fria. O aparelho funciona do seguinte modo:
Faz-se entrar na câmara, por F. com auxílio do vácuo e após tcr-se fechado a válvula //, a
quantidade de álcool julgada necessária. Em seguida restabelece-sc a pressão, fecha-se a válvula
/, que comunica com o refrigerante R' e abre-se H. Aquece-
-se o álcool à ebulição e introduz-se o material a estabilizar através do tubo de carga lateral,
cuja tampa, E, deve ser novamente fechada antes de manobrar a válvula D. Os vapores do álcool
passam através de // para a serpentina /í, onde são condensados, voltando através de G para a
câmara. Terminada a operação, o extracto alcoólico da planta é arrefecido substituindo o vapor
que circulava na dupla parede de A por uma corrente de água fria, fazendo sair o líquido para o
exterior abrindo a torneira M. Depois, repete-se a extracção do material por nova porção de
álcool, após prévia expressão daquele. Querendo concentrar as alcoolaturas obtidas, fecha-se a
válvula H e abre-se /, auxiliando-se a destilação, caso se queira, com o emprego de vácuo.
120

5.1.3.1.6.2. Destruição dos enzimas pelo calor húmido

A) Vapor de água. No processo de GORIS e ARNOULD a estabilização é realizada pelo vapor de


água sob pressão, numa autoclave. Utilizado inicialmente para as sementes de Cola, foi aplicado,
posteriormente, a outros produtos. No caso daquele fármaco, as sementes frescas são introduzidas na
autoclave cheia de vapor de água à temperatura de 100°C e mantidas depois, durante alguns
minutos, sob pressão a 105-110"C. A Cola, tratada deste modo, mantém-se pouco corada em virtude
de a respectiva oxidase ser destruída nestas condições.
Este método é de aplicar aos órgãos vegetais robustos, como raízes, cascas, lenhos e sementes,
e apresenta vários inconvenientes, pois o amido gelifica, as proteínas são coaguladas e os fármacos
adquirem um aspecto córneo o que dificulta a preparação de soluções extractivas,
B) Vapor de álcool. Este método, devido a PERROT-GORIS, utiliza os vapores de álcool para
destruir os fermentos e tem sobre o processo de BOURQUELOT a incontestável vantagem de permitir
obter realmente a droga estabilizada e não um extracto alcoólico da mesma.
Os autores do método começaram a praticá-lo utilizando uma autoclave vulgar, na qual a água
era substituída por álcool, colocando-se no aparelho um cesto com as plantas dispostas em camadas
paralelas e separadas por diafragmas. Fechada a autoclave, inicia-se o aquecimento, deixando-se
aberta a torneira de purga, para que o ar possa sair livremente. Logo que saiam vapores de álcool,
fccha-se a referida torneira e dcixa-sc que a pressão suba a cerca de meia atmosfera, mantendo-se o
aquecimento durante alguns minutos (l a 5, conforme a substância). Desliga-se, então, o aquecimento
e quando a pressão tiver atingido o valor normal abre-se o aparelho, retira-se o material, que deve
ser seco rapidamente numa estufa capaz de aspirar e condensar os vapores. Se a operação tiver sido
bem conduzida não é de recear o esgotamento da droga e esta apresentar-se-á com o seu aspecto
habitual. Para que isso aconteça, porém, é necessário evitar a condensação do vapor de álcool, pelo
que se recomenda aquecer a autoclave previamente, fazendo-a funcionar, durante algum tempo, com
água, e só então se deve proceder à estabilização da droga, substituindo a água por álcool.
O método de PERROT-GORIS tem sido utilizado em escala industrial, empregando--se, nestes
casos, grandes autoclaves de parede dupla, colocando-se o álcool e a planta na parte interior do
aparelho, o qual é aquecido fazendo circular na dupla parede vapor de água sobreaquecido.
A eficácia da estabilização depende, principalmente, do tempo necessário para que os vapores
do álcool atinjam a temperatura necessária para destruir os fermentos existentes na droga. Na
técnica primitiva, o álcool era aquecido até se vaporizar, de modo que mediava sempre um certo
lapso de tempo, maior ou menor, conforme as condições
121

operatórias, para que o álcool se vaporizasse e os respectivos vapores actuassem sobre os enzimas.
Ora, durante este período acontece poder registar-se um certo grau de actividade enzimática, o que,
a dar-se, provoca a decomposição parcial dos constituintes alteráveis pêlos fermentos.
Para que a estabilização possa fazer-se nas devidas condições, torna-se necessário que os
vapores do álcool actuem rapidamente e à temperatura conveniente sobre as drogas, condição que
não é obtida utilizando as autoclaves. A fim de eliminar, tanto quanto possível, este inconveniente, a
casa DFROY construiu um estabilizador baseado no método de PERROT-ÜORIS, o qual está
representado na Fig. 74.

Caldeira Autoclave
Condensador

Flg. 74. Aparelho de DEROY para a estabilização de plantas

O aparelho em questão é formado por uma caldeira produtora de vapores de álcool, .4, unia
autoclave de dupla parede, C, e um condensador, E. Para trabalhar com este estabilizador começa-se
por aquecer a autoclave, admitindo vapor de água na dupla parede pela torneira F, deixando
ligeiramente aberta a torneira A".,, a fim de permitir o escoamento da água de condensação. O álcool
é aquecido, por seu turno, na caldeira A, ate que os respectivos vapores atinjam a pressão
conveniente, introduzindo-se, então, rapidamente, a planta, disposta em tabuleiros montados num
carro, no interior da autoclave. Fechada esta, admitem-se nela os vapores de álcool através da
torneira ligada ao tubo G, mantendo-se a pressão na autoclave à roda de l kg.cm~2 e continuando
sempre o aquecimento da dupla parede.
Quando a operação estiver terminada, corta-se a admissão do vapor de álcool e liga-se o
interior da autoclave com o condensador £, para recuperar o álcool utilizado na estabilização. Logo
que a pressão no interior igualar a pressão atmosférica fecha-se a conduta de vapor de água para a
dupla parede, em f, e abre-se completa-mente a torneira K.,, podendo, então, abrir-se o aparelho
para retirar as plantas já estabilizadas.
122

5.1.3.1.6.3. Outros métodos

A) Calor seco. Tem sido utilizado desde há muito para a preparação do Chá Verde, sujeito a
uma torrefacção ligeira que lhe conserva aquela coloração, pois este tratamento destrói os fermentos
que promovem a oxidação dos taninos e catequinas, fenómeno responsável pela cor escura do Chá
Preto.
No entanto, a destruição dos enzimas pelo calor seco é uma técnica que exige o emprego de
temperaturas elevadas, havendo processos industriais que utilizam uma corrente de ar aquecido a
30Ü-800(1C, a qual deve actuar sobre o produto a estabilizar durante um curto espaço de tempo,
geralmente de 30 segundos a alguns minutos.
A utilização de temperaturas tão elevadas é motivada pelo facto de os fermentos serem mais
dificilmente dcstruíveis em meio anidro e ainda porque se toma imperioso reduzir ao máximo o
tempo crítico durante o qual os enzimas poderão actuar antes de serem destruídos. No entanto, este
processo, além de poder originar uma crosta impermeável à superfície dos órgãos vegetais de textura
compacta, é susceptível de alterar alguns constituintes das plantas, caramelizando os açúcares e
coagulando as proteínas, além de promover a volátil ização dos óleos essenciais. Como se
depreende, trata-se de uma técnica bastante drástica, susceptível de provocar acentuadas alterações
nos vegetais.

B) Correntes de alta frequência. Além dos métodos acabados de descrever, foi proposto, mais
recenlemente, o emprego de correntes de alta frequência para fazer a estabilização das drogas
vegetais. A técnica em questão foi idealizada por DANIEL-BRUNET e LAURENT, e baseia-se no facto de as
correntes com aquelas características constituírem uma apreciável fonte de calor, capaz de destruir
os enzimas existentes nas plantas. Como os vegetais são corpos semicondutores, poderão ser atra-
vessados pela corrente que à sua passagem provoca no interior das células uma acentuada elevação
de temperatura susceptível de promover a coagulação dos fermentos do suco celular.
Imediatamente após a sua colheita, o material a estabilizar é colocado entre as armaduras de
uma máquina electrostática de alta frequência, tendo um oscilador de uma potência útil de l KW,
sendo submetido, durante alguns segundos, à acção de um campo de alta frequência de milhões de
períodos por segundo. Este processo foi experimentado, com bons resultados, com a farinha de
mostarda e as folhas de Aucuba, tendo-se mostrado bastante eficiente. Todavia, mercê de
dificuldades técnicas de vária ordem, não tem sido utilizado, ale ao presente, na estabilização
industrial de drogas vegetais.
123

5.1.3.2. Operação principal ou pulverização propriamente dita

Depois de submetida às operações preliminares aconselháveis, a droga está, então, apta a ser
reduzida a pó, utilizando-se, para isso, o processo mais consentâneo com a natureza do material a
pulverizar e a tcnuidade do pó a obter. Vejamos as técnicas de pulverização mais vulgarmente
utilizadas.

5.1.3.2.1. Pulverização em almofariz

É o processo universalmente utilizado nos laboratórios e na oficina farmacêutica para reduzir a


pó pequenas quantidades de material. Existem vários tipos de almofarizes, como se pode ver na Fig.
75, os quais se diferenciam não só na forma como no material de que são fabricados. Há almofarizes
de ferro, bronze, porcelana, vidro, mármore, ágata, e, até, de madeira, devendo escolher-se o
almofariz a utilizar na pulverização de uma droga conforme a natureza física e química desta.
Assim, os almofarizes de ferro ou de bronze são reservados para a pulverização das drogas
vegetais. São, geralmente, de dimensões bastante grandes, apresentando uma forma tronco-cónica
(Fig. 75 C, G, J) com o fundo ligeiramente côncavo, A sua construção robusta e o material de que são
fabricados permite-lhes resistir aos golpes desferidos com o pilão, cuja extremidade, ou cabeça,
apresenta uma forma convexa mas aplanada, de modo a permitir uma boa superfície de contacto com
o fundo do almofariz. O instrumento deve ser suficientemente profundo para evitar que a droga seja
projectada para fora durante a contusão, existindo modelos que têm uma cobertura de pano ou de
couro, a qual está fixada à extremidade superior do almofariz e ao pilão, formando uma espécie de
fole que permite a livre movimentação daquele (Fig. 75 ./). Estes almofarizes cobertos devem ser
utilizados sempre que se preparem pós de elevada tenuidade ou quando se trabalhe com drogas
irritantes e tóxicas, como o anidrido arsenioso, o agárico, a beladona, o meimendro, a dedaleira, o
acetato de cobre, o eufórbio, a ipeca, a polígala, as cantáridas, etc. O emprego destes almofarizes
destina--se a evitar perdas de substância e a proteger o operador da acção perniciosa das partículas
resultantes da divisão da droga.
Por seu turno, os almofarizes de mármore (Fig. 75 £>) são empregados na pulverização do
amido, do sabão e do açúcar devendo fazer-se a pulverização dos sais em almofarizes de porcelana
(Fig. 75 E, F). Os de vidro (Fig. 75 //) servem, em regra, para se misturarem substâncias já
pulverizadas,
A pulverização em almofarizes pode fazer-se por duas técnicas distintas: A contusão e a trituração.
124

Fig. 75. Diversos modelos de almofarizes

5.1.3.2.1.1. Por contusão

É o processo utili/ado para pulverizar a grande maioria das drogas vegetais, como folhas,
raízes, cascas e lenhos, as drogas animais, como as cantáridas, e os produtos químicos que se
apresentem sob a forma de cristais relativamente grandes.
125

Colocada a droga no almofariz em pequenas porções, esta é contundida com o pilão, o qual se
faz descer verticalmente sobre o fundo do almofariz, continuando-se a operação até que a droga
esteja reduzida a pó. Ao proceder à pulverização de uma determinada quantidade de substância é
recomendável não a colocar toda no almofariz, poís se aquela formar uma camada muito espessa no
fundo, o choque do pilão contra este é amortecido e a operação será, por isso, mais demorada.

5.1.3.2.1.2. Por trituração

Neste processo a droga é fragmentada imprimindo-se ao pilão um movimento que se inicia no


centro do almofariz e vai descrevendo uma espiral que termina contra as paredes deste, exercendo o
operador uma pressão de acordo com a resistência oferecida pelo corpo a pulverizar. Quando o
pilão atinge as paredes, inicia-se, lentamente, um movimento no sentido oposto, até chegar ao
centro. De vez em quando é necessário destacar, com uma espátula, a droga aderente às paredes do
almofariz e à cabeça do pilão, de modo a manter todas as partículas sob o efeito da trituração, o que
encurta, sensivelmente, o tempo da operação.
Este processo de pulverização deve ser aplicado às drogas que se aglomeram por efeito da
pressão ou que amolecem em resultado do calor desenvolvido pêlos choques do pilão na técnica de
contusão; usa-se, ainda, com as substâncias explosivas, como o clorato de potássio, cuja
pulverização deve ser feita com as necessárias cautelas.
Como exemplos de drogas pulverizadas por esta técnica podemos citar as resinas e gomas-
resinas (colofónia, benjoim, escamónia, etc.), o ópio, o açafrão e o castóreo.

5.1.3.2.2. Pulverização por intermédio

Muitas substâncias, mercê das suas características físicas especiais, não são pulverizáveis
directamente, tornando-se necessário adicionar-lhes uma substância estranha para facilitar a sua
redução a pó. Tais substâncias são designadas por intermédios, os quais podem ficar
permanentemente misturados com o pó ou serem eliminados terminada a pulverização, que, em
qualquer dos casos, recebe o nome de pulverização por intermédio, podendo este ser um corpo sólido,
líquido ou gasoso,

5.1.3.2.2.1. Intermédios sólidos

Podem ser solúveis ou insolúveis. Entre os primeiros figuram o açúcar, o cloreto de sódio e o
sulfato de sódio.
126

O açúcar utiliza-se para facilitar a pulverização da baunilha e da cravagem do centeio, ao


passo que os sais acima mencionados servem para fazer a trituração dos metais em folha, como o
ouro, a prata e o estanho. Enquanto o açúcar, nos exemplos citados, fica permanentemente ligado à
droga reduzida a pó, o cloreto ou o sulfato de sódio usados, como intermédios, na pulveri/ação dos
metais, podem ser eliminados. Para isso, Jança-se .o pó obtido num vaso contendo água quente,
recolhendo-se, depois, o metal num filtro e continuando a lavagem deste ale o filtrado não acusar a
presença do sal utilizado na pulverização.
Como intermédios insolúveis temos os carbonatos de cálcio e de magnésio,
empregados na pulverização do mercúrio.

5.1.3.2.2.2. Intermédios líquidos

Os intermédios deste tipo mais vulgarmente utilizados são o álcool, o éter, a água e o azeite.
Assim, a cânfora é pulverizada num almofariz depois de humedecida com umas gotas de álcool
ou de éter, enquanto o espermacete deve ser adicionado de algumas gotas de azeite.
Na pulverização do fósforo coloca-se este num frasco cheio de água, que se aquece a banho-
maria, até fusão da substância. Deixa-se, então, arrefecer o frasco, agitando-o permanentemente,
para que a água se interponha entre as partículas do fósforo, que assim solidifica sob a forma de pó.

5.1.3.2.2.3. Intermédios gasosos

São utilizados na pulverização de substâncias volatilizáveis, cujos vapores são encaminhados


para uma câmara cheia de um gás, geralmente o ar frio. Deste modo, o.s vapores da substância
solidificam rapidamente, sob a forma de uma poeira muito fina. Utiliza-se este processo para a
obtenção do calomelanos pelo vapor e da flor de enxofre.

5.1.3.2.3. Pulverização por fricção

Esta técnica, aplicada apenas a substâncias friáveis e moles, que se aglomeram sob a acção do
pilão, consiste em friccionar o corpo a pulveri/ar sobre um tamis invertido. A substância é, deste
modo, facilmente transformada em pó da tcnuidade desejada o qual é recolhido numa folha de papel
colocada por baixo do tamis. Raros são, porém, os corpos cujas características permitem a sua
pulverização por este processo, limitando--se a sua aplicação à obtenção dos pós de magnésia e de
carbonato de magnésio.
127

5.1.3.2.4. Pulverização química

A pulverização química, como a sua própria designação indica, está longe de representar um
processo geral de pulverização, constituindo apenas um processo de preparação de certos compostos
obteníveis, em determinadas condições, sob a forma de partículas de dimensões reduzidíssimas,
equivalentes a um pó.
São vários os processos utilizados para esse fim. Assim, por exemplo, podemos intervir nas
condições de cristalização de certos compostos, a qual, normalmente, conduz à formação de cristais
de dimensões apreciáveis, de modo que ela seja perturbada e origine microcristais. Para isso
prepara-se, em geral, uma solução concentrada de uma substância, arrefecendo-a e agitando-a
continuamente até que comece a depositar o sólido.
Por vezes, alguns compostos podem ser obtidos num estado de extrema divisão graças a uma
hidratação. É o caso dos hidróxidos de cálcio e de bário, preparados por hidratação dos respectivos
óxidos.
O fenómeno inverso, ou seja, a desidratação de sais contendo água de cristalização, também
conduz ao mesmo resultado. Na verdade, é possível, por este processo, obter, sob a forma de pó, o
fosfato de sódio e os sulfates de sódio e de cobre. A eflores-cência destes compostos oblénvse
facilmente colocando-os num lugar seco, verificando--se que à medida que se dá a evaporação da
água de cristalização os cristais se vão cobrindo de uma camada de pó. A evaporação pode, em
certos casos, ser apressada, colocando o produto numa estufa, a baixa temperatura, mas este
procedimento está contra-indicado quando se trate de compostos altamente hidratados, como o
sulfato de sódio (10 H20} e o foslado de sódio (12 H.,0), pois acontece que estes sais podem fundir
na sua própria água de cristalização, formando-se, então, uma espécie de crosta que impede a sua
desidratação.
Um processo bastante comum de preparar certas substâncias num estado de grande divisão
recorre a reacções químicas. Assim, o nitrato básico ou subnitrato de bismuto obtém-se por reacção
enlre a água e o respectivo nitrato; o óxido amarelo de mercúrio prepara-se fazendo reagir soluções
de cloreto mercúrico e de hidróxido de sódio; o enxofre precipitado obtém-se fa/endo actuar o ácido
clorídrico sobre uma solução de sulfureto de sódio e o carbonato de cálcio prepara-se por reacção
entre o cloreto de cálcio e o carbonato de sódio.
Como estas reacções se passam em meio aquoso, acontece que os produtos formados, dado o
seu grau de divisão, se apresentam com o aspecto de massas pastosas, que devem ser exsicadas
rapidamente, e, para isso, é necessário dividi-las previamente em pequenos fragmentos ou trocixcos,
operação que abordaremos mais adiante, ao estudar as operações complementares da pulverização.
128

5.1.3.2.5. Porfirização

A porfirização constitui um método laboratorial para a obtenção de pós caracterizados pela


sua grande tenuidade.
Executa-se friccionando a substância por meio de um pilão especial, chamado muleta, de
encontro a uma placa de mármore, de vidro ou de pórfiro muito polido (Fig. 75 /, pág. 124). A
muleta deve ter a extremidade inferior muito ligeiramente convexa, a fim de facilitar o
aprisionamento da substância e tornar possível um atrito mais perfeito desta com a placa, pois este
facto é essencial para se conseguir uma boa
porfirização. Coloca-se a substância, em pequenas porções, sobre
o pórfiro, e, calcando-a com a muleta, imprime-se a esta um
movimento em forma de oito, deslocando-se, assim, o produto, entre
a muleta e a placa, ao longo da superfície desta (Fig. 76).
A porfiri/ação pode ser feita a seco ou a húmido,
Fig. 76. Movimentos da adicionando-se à substância, neste caso, um líquido que não reaja
muleta durante a com ela e não a dissolva. Em geral, a porfirização a húmido é feita
porfirização com a água ou com um óleo, utilizando-se este último quando se
pretenda obter pós muito finos destinados à preparação de pomadas oftálmicas que são directamente
misturados com os excipicntes utilizados.
Quando, porém, uma substância tiver sido porfirizada com água, o produto obtido deverá ser
submetido à trociscação e convenientemente exsicado.

5.1.3,2.6. Pulverização por moinhos

A pulverização por este processo utiliza-se muito raramente na oficina farmacêutica, se bem
que assuma grande importância na indústria, pois é o processo usado para reduzir a pó grandes
quantidades de substâncias.
Na realidade, pode dizer-se que são pouquíssimas as drogas que se pulverizam com auxílio de
moinhos nos laboratórios oficinais, reservando-se a sua utilização apenas para aquelas drogas
constituídas por tecidos elásticos ou contendo uma proporção elevada de gordura, como é o caso da
cravagem do centeio, que só deve ser pulverizada no momento do emprego, para evitar a sua
alteração.
Existe no mercado uma variedade muito grande de moinhos desde os modelos operados
manualmente aos accionados por motores. Estes últimos são os mais utilizados, oferecendo os
construtores aparelhos de diferentes características, permitindo a pulverização de drogas em
pequena ou grande escala e variando bastante a tenuidade dos produtos por eles fornecidos, desde
um pó grosso até um pó micronizado.
129

Dada esta diversidade de modelos, torna-se extremamente difícil referirmo-nos a todas as


espécies de moinhos, pelo que teremos de limitar o assunto, apenas fazendo referência aos tipos de
aparelhos que mais direcia ou indirectamente interessam à farmácia de oficina e à farmácia
industrial.

5.1.3.2.6.1. Moinhos manuais

Estes aparelhos apenas são utilizados na oficina farmacêutica, podendo usar-se na moedura
da cravagem de cenicio um moinho de café ou de pimenta. Em geral, os moinhos manuais dividem-
se em dois tipos: 1) os que têm superfícies planares de moenda e 2) aqueles em que essas
superfícies são cónicas.
A Fíg, 77 representa um moinho do primeiro tipo, o qual é
consumido por um esmagador helicoidal que força a droga contra o
espaço situado entre as duas rodas sulcadas colocadas na sua
extremidade. A roda com a abertura maior está adaptada ao corpo do
moinho, sendo, por isso, fixa, ao passo que a outra se encontra ligada à
barra helicoidal, movendo-se .solidariamente com esta.
O moinho HANCE pertence ao tipo de superfícies
' • A j XT *. iu i j
j i Fia. 77. Moinho manual
cónicas de moenda. Neste aparelho as rodas do modelo d* superfícies planares
anterior estão substituídas por duas peças cónicas en
caixando uma na outra, sendo uma móvel e outra fixa. As superfícies destas peças que
contactam uma com a outra estão cobertas com dentes dispostos em filas consecutivas
e coincidindo uns com os outros, sendo eles os elementos responsáveis pela pulveriza
ção da substância introduzida no moinho, podendo regular-se a tenuidade do produto
obtido por meio de um parafuso existente na base, que faz afastar ou aproximar a peça
móvel da outra.

5.1.3.2.6,2. Moinhos accionados por motores

Nesta categoria podemos considerar os moinhos de laboratório e os moinhos usados na


pulverização em grande escala.

5.1.3.2.6.2.1. Moinhos de laboratório

Entre os diversos tipos de máquinas usadas na pulverização em pequena escala são de


mencionar os moinhos de WILHY e de RAYMOND.
130

O primeiro (Fig, 78) pertence à classe dos moinhos por atrito e é largamente utilizado na
pulverização de raízes, folhas, cascas, etc. Este aparelho é constituído por uma câmara de
pulverização na qual gira uma peça central tendo quatro navalhas que
exercem a sua acção cortante contra outras seis,
montadas nas paredes da câmara. Esta está
circundada por uma rede formando um tamis, de
modo que o material só pode abandonar a câmara de
pulverização quando as suas partículas forem
suficientemente pequenas para atravessarem as
respectivas malhas. Em regra, o aparelho é fornecido
com três redes cujas malhas têm uma abertura de 0,5
mm, l mm e 2 mm, respectivamente, podendo, no
entanto, obterem-se outros tamises,
O moinho de RAYMOND é um aparelho compacto
que se presta à pulverização de quantidades
Fig. 78. Moinho de WILEY variáveis de material, desde algumas dezenas de g,
até alguns kg. Este
moinho é construído segundo o princípio dos
martelos oscilantes, tendo oito destes martelos girando à volta de um disco, o qual é movido por um
eixo accionado pelo motor.

5.1.3.2.6.2.2. Moinhos de tipo industrial

Existem numerosos tipos de moinhos para a pulverização de substâncias medicinais em escala


industrial, os quais são construídos para corresponderem às mais variadas exigências deste sector da
transformação das drogas. Assim, fabricam-se máquinas especialmente planeadas para executarem
um trabalho específico, a par de outros modelos mais pequenos e compactos, dotados de grande
versatilidade, o que permite utilizá-los em várias operações.
Qualquer que seja, porém, a maquinaria usada na indústria farmacêutica, esta deve obedecer a
certas condições para que os produtos por ela fornecidos ofereçam as necessárias garantias de
qualidade. Em geral, estes moinhos são construídos com material inoxidável, pois muitas das
substâncias submetidas à pulverização são facilmente atacadas por um metal que reaja com elas,
como o ferro, por exemplo.
Por outro lado, tais moinhos devem ser facilmente desmontáveis, de modo a permitirem a
rápida adaptação de novas peças, como tamises, possibilitando, assim, a obtenção de partículas de
diversos tamanhos e tornando possível, graças a esta característica, uma limpeza eficiente, que evite
a contaminação do material submetido à
131

pulverização com fragmentos de outra substância anteriormente pulverizada no mesmo moinho. Além
disso, estas máquinas devem caracterizar-se por grande robustez, simplicidade de operação e
manutenção, exigindo-se-lhes ainda que mantenham uma produção contínua de partículas com
dimensões específicas e de limites bastante apertados. Assim é que os moinhos industriais devem ser
capazes de originarem, em certos casos, produtos cujas partículas passem por tamises cuja abertura
de malha seja de 0,074 mm.

Em geral, o funcionamento destes aparelhos baseia-se em três princípios fundamentais:

1. Atrito. As máquinas que trabalham segundo este princípio pulverizam uma substância por
fricção entre duas superfícies, sendo especialmente utilizadas no caso de materiais fibrosos.
2. Laminagem. Os aparelhos deste tipo possuem uma peça rolante muito pesada para esmagar
e pulverizar o material. Se bem que, teoricamente, seja o movimento rolante o directamente
responsável pela pulverização, o facto é que a substância também é submetida a um ligeiro atrito
entre o rolo e o fundo do moinho.
3. Impacto. Nos moinhos que exercem a sua acção por impacto existem martelos ou barras
girando a altas velocidades que golpeiam os fragmentos do material a pulverizar, fazendo-os colidir
uns com os outros e com as paredes do aparelho. O impacto provoca a desagregação das partículas
maiores até reduzi-las às dimensões pretendidas. Em certos moinhos especiais, o impacto é
provocado por um jacto de um fluído elástico.

A moagem industrial depende de vários factores que poderemos enumerar como se segue:
abrasão, humidade, inflamabilidade, temperatura, toxicidade e composição química do material a
pulverizar e tamanho das partículas do pó obtido.

Abrasão — A abrasão ou desgaste por fricção é provavelmente o factor mais importante na


moagem industrial. Com efeito, há determinados produtos que desgastam tão facilmente as navalhas
ou os crivos de um moinho de martelos que a utilização deste tipo de aparelhos é contra-indicada por
se tornar anti-económica; por isso, um moinho de bolas, que é menos sensível à abrasão, pode ser
aconselhável para a pulverização desse mesmo produto.
O desgaste sofrido pelas peças de um moinho exprime-se, para cada produto, sob a forma de
índice de abrasão. Este, em regra, aprccia-se determinando a grandeza do desgaste operado sobre as
perfurações de um crivo novo (com 0,027 polegada de malha) que.se ajusta a um micropulverizador
cujo rotor trabalha a cerca de 14000 r.p.m. Para isso, devem pulverizar-se 5 libras do material
abrasivo a ensair, determinando-se, no final da operação e por meio de um microscópio, o desgaste
produzido. Os resultados exprimcm-se em micra, podendo dizer-se que um índice de abrasão de
132

100 \L indica que o produto ensaiado não deve ser moído por esse método. Considera--se aceitável,
do ponto de vista económico, a moagem de substâncias que apresentem índices de abrasão iguais ou
inferiores a 20 (i.

Humidade — O conteúdo em humidade de um produto afecta largamente, como já vimos, a sua


facilidade de moagem. Assim, por exemplo, a celulose e as arguas não são susceptíveis de se
reduzirem a pó, por moagem, se tiverem 1% de humidade, mas a operação é bastante fácil se o teor
daquela se situar à volta de 2-5%. Certos geles, quando cuidadosamente secos, podem tornar-se
duros e abrasivos. Entretanto, se contiverem à volta de 50% de humidade, o que ainda lhes mantém o
aspecto de secos, já são facilmente pulverizados.
Na pulverização de diversos sais contendo água de cristalização o calor desenvolvido durante a
moagem leva à separação dessa água. Assim, é impraticável moer produtos muito hidratados, como o
sulfato de alumínio, pois a água eliminada molha o material, o que impede a continuação da
operação. Nestes casos, pulveriza-se cerca de 50% do material até que passe por um crivo de 0,149
mm de abertura de malha, voltando a moer as partículas maiores.

InflamabiKdade — Diversos compostos utilizados na preparação de medicamentos são


combustíveis, chegando alguns a explodir com violência, como o amido, açúcar e enxofre. Da mesma
forma, os oxidantes potentes, como os nitratos e cloratos, devem ser manejados cuidadosamente
durante a moagem.
Os acidentes de explosão dependem, em larga medida, do conteúdo em humidade dos produtos
a pulverizar. A goma arábica com 11% de humidade não é explosiva, mas se este teor baixa para
5,5% podem ocorrer acidentes durante a pulverização.
Também o tamanho das partículas influencia largamente a inflamabilidade dos produtos,
aumentando com o grau de divisão destes.

Temperatura — Diversos materiais tendem a aglomerar-se quando submetidos a altas


temperaturas, enquanto que outros se tornam friáveis (produtos elásticos) quando arrefecidos, como
a metilcelulosc, metacrilato de metilo e proteínas.
Durante a moagem produz-se calor e a subida de temperatura pode degradar muitos produtos e
até interferir com o ritmo da operação.
O efeito térmico manifestado durante a moagem pode avaliar-se pela seguinte fórmula:

2546,4 P = T (WK - 60 V K ) - L
' * m a'

em que P é a potência do motor do moinho em cavalo-vapor, T a subida de temperatura do material


e do ar em grau Fahrenheit, W o peso do material moído em libra. .h'1, V o volume do ar que passa
através do moinho em pé cúbico, min"1, L a perda
133

devida à radiação na máquima, expressa em BTU ('), Km o calor específico do material em BTU.
libra'1, grau"1 e K calor específico do ar (0,0183 BTU. pé"3, grau'1).

Toxicidade — A pulverização de certos materiais, irritantes para a pele ou vias respiratórias


do operador, ou tóxicos, deve ser rodeada das maiores precauções. Deve procurar fazer-se a
moagem em circuito fechado, sendo o pessoal protegido com vestes adequadas e impermeáveis aos
pós, devendo usar máscaras sempre que lide com matérias do tipo das assinaladas, como o DDT,
certas hormonas, aloés, colagogos, etc.

Composição química — Vários produtos podem reagir com o material de que é feito o moinho.
Assim, o sulfato de cobre penta-hidratado ocasiona um efeito elec-trolítico que leva à corrosão do
ferro do aparelho e os brometos e os iodetos alacam as superfícies de ferro. Por estas razões, usam-
se, com frequência, moinhos cujas partes que contactam com os materiais a pulverizar são de aço
inoxidável.

Moinhos de atrito

Estes moinhos são constituídos por duas superfícies de moenda feitas de pedra ou de aço e
que se movem em sentidos opostos, havendo, porém, alguns deles em que uma das superfícies
permanece imóvel.
Um dos tipos de moinhos deste género largamente utilizado na pulverização de
drogas é constituído por duas mós de pedra siliciosa, muito dura, em que só uma delas,
que tanto pode ser a superior
como a inferior, é móvel,
sendo a outra fixa. Os dois
discos de pedra, dispostos hori
zontalmente, estão montados
muito próximos um do oulro,
podendo o espaço entre eles ser
aumentado ou diminuído, con
forme a tenuidade das par-
_____ _ _
tículas que se pretende obter. v *&
A droga é admitida no moinho .
Fig 79 Mojnho de mós horizontais
através de um orifício situado
no centro do disco superior, sendo fragmentada pelo atrito a que é sujeita mercê do movimento de
um dos discos.
Conforme se vê na Fig. 79, as superfícies das duas mós apresentam sulcos que se estendem
desde a parte central até à periferia, sulcos esses que têm por função permitir

('} Unidade do sistema British Thcrmal, expressa em pé. s^Vgrau Fharenheit. que é
igual a 1,5587. IO4 W.m-"1. K~' (Watt por metro por grau Kelvin. no sistema MKS).
134

que o pó saia para o exterior do moinho graças à força centrífuga e à corrente de ar provocada pela
rotação do disco móvel. Este tipo de moinhos tende a produzir partículas de forma esférica, ao contrário
dos moinhos de impacto, cujos pós sào preferentemente constituídos por aglomerados de partículas
mais irregulares e achatadas.

Moinhos por laminagem

Os moinhos deste género reduzem as substâncias a pequenas partículas por simples


esmagamento ou esmagando-as e cortando-as simultaneamente. Alguns destes moinhos são
formados por dois cilindros, geralmente metálicos, rolando na mesma direcção mas
com diferentes velocidades, podendo a distância que os separa ser
regulada por meio de parafusos, de modo a obte-rem-se pós com a
tenuidade desejada. Na pulverização industrial de várias drogas utili/am-
se aparelhos destes, em que os rolos apresentam superfícies onduladas,
conforme se pode ver na Figura 80.
A B Ainda pertencentes a este tipo de moinhos podemos citar os moinhos
Fig. 80. Rolos de mós verticais, muito utilizados no nosso país nos lagares de azeite.
canelados. Estas máquinas são constituídas por duas mós circulares de granito,
A, vista de frente: B, montadas verticalmente sobre um eixo horizontal, como se fossem rodas,
as quais se movem sobre uma base circular também de granito (Fig. 81). Sobre esta apoia-se uma
peça metálica ligada ao eixo móvel, espécie de raspador, cuja função é destacar da base o
material que vai sendo pulverizado. O fundo do moinho é circundado por um parapeito metálico
de forma circular e a substância é pulverizada pelo esmagamento provocado pelo grande peso das
mós e ainda por uma acção de atrito.
Estes moinhos são montados
em caixas fechadas ou em peque
nos compartimentos estanques, e o
material a pulverizar é feito cair
sobre a base através de funis alon
gados, de modo a ficar na tra
jectória das mós. A altura do
parapeito pode ser aumentada
colocando à sua volta uma tira de
papel, sendo essa altura que
regula a tenuidade do pó, uma vez Fig. 81. Moinho de mós verticais
135

que as mós, no seu rápido movimento circular, originam uma corrente de ar de baixo para cima, a
qual arrasta consigo as partículas mais leves fazendo com que caiam fora do parapeito. As maiores
e, portanto, as mais pesadas, incapazes de ultrapassarem essa barreira, cairão outra vez sobre a
base do moinho, para serem novamente pulverizadas até se tornarem suficientemente leves para
serem arrastadas para além do parapeito. Este tipo de moinho representa o género de maquinaria
mais utilizada industrialmente na produção de pós muito finos.

Moinhos por impacto

Pertencentes a este tipo podemos citar os moinhos de martelos fixos ou móveis, muitos deles
tendo acopulado um sistema gerador de uma corrente de ar, destinada a promover o arrastamento e
facilitar a recolha das partículas resultantes da pulverização do material. Nalgumas máquinas o pó é
tamisado ou separadas as partículas pelo ar em função da sua tenuidade, voltando os fragmentos
maiores à câmara de pulverização, dizendo-se, então, que se trata de um processo de pulverização em
circuito fechado (Fig. 82).
Como moinhos de martelos
oscilantes mais usados na indústria
farmacêutica contam-se o moinho de Ciclone colector
FITZPATRIK, o Micro-Atomizador e o Moinho
Tornado.
Nestes aparelhos (Fig. 83), os
martelos ou discos estão fixados sobre
um eixo por meio de uma cavilha,
sistema que permite a cada um deles
oscilar livremente quando o referido eixo
se move. O conjunto dos martelos está Separador mecânica
encerrado numa câmara que é envolvida por ar
a toda a volta por um tamis (moinho
Retorno do produto
Tornado), o qual pode também existir incompletamente
unicamente na parte inferior da câmara pulverizado ao
(moinho de FITZPATRIK) e que apenas moinho
permite a passagem de partículas de
determinadas dimensões. Conjugando a Produto acabado
velocidade a que o — Moinho

Fig. 82. Sistema de pulverização em circuito techado


136

moinho trabalha com a abertura das malhas do tamis, é possível oblerem-se pós de várias tenuidades.
Acontece, porém, que certas substâncias mostram tendência a entupirem a rede dos tamises,
impedindo, assim, a passagem das partículas através deles, observando-se tal

Fig. 83. Moinho de martelos oscilantes

facto sobretudo com as drogas de natureza resinosa, que amolecem devido ao aumento de
temperatura provocado pêlos impactos que sofrem. Este inconveniente pode ser minimizado
adicionando ao material a pulverizar pequenos fragmentos de gelo seco, o qual faz baixar a
temperatura na câmara do moinho e diminui o risco de entupimento do tamis. Por este motivo,
existem moinhos de FITZPATRIK providos de um invólucro que torna possível o arrefecimento da
câmara de pulverização de substâncias resinosas ou contendo óleos essenciais.
O moinho tipo ABBÉ (Fig. 84)
constitui outro exemplo de aparelho que
trabalha por impacto, permitindo a pulve
rização de grande variedade de drogas. A
substância a introdu/ir no moinho é colo
cada na tremonha, donde cai depois, auto
maticamente, por meio de agitação, para
uma segunda tremonha situada sobre a
porta do moinho. O material cai no cen- Fig. 84. Moinho tipo Abbé
137

tro da câmara de pulverização e é lançado contra as paredes desta pela força centrífuga gerada pelo
movimento do rotor. Este tem uma série de pás na periferia, sendo o material fragmentado em virtude
do impacto que sofre contra as referidas pás, girando a grande velocidade, e os dentes montados em
anéis concêntricos na porta e nas paredes da câmara de pulverização.
O rotor está construído para trabalhar a grandes velocidades, sendo possível reduzir uma
substância a pó bastante ténue porque as saliências da câmara c as pás apresentam uma grande
superfície. Quando a porta do moinho está fechada, as saliências da câmara formam com as pás do
rotor um espaço praticamente cerrado, donde o material introduzido só poderá sair quando estiver
reduzido a partículas tão diminutas que possam atravessar os estreitos orifícios criados entre as
superfícies de moenda. Para se obterem pós finos, coloca-se à volta do rotor um tamis conveniente e
como a câmara de pulverização oferece fácil acesso, aberta a porta do moinho, a colocação dos
tamises e a limpeza do aparelho executam-se sem qualquer dificuldade.

Fig. 85. Moinho de bolas


Fig. 86. Moinho de bolas
visto em secção

Os chamados moinhos de bolas (Fig. 85) são aparelhos em que a pulverização é conseguida
por uma acção combinada de atrito e impacto. A substância é colocada num recipiente, geralmente
cilíndrico, de aço, porcelana ou outra substância dura, contendo no interior várias esferas também
de metal ou porcelana, sendo o recipiente animado de um movimento rotativo em volta do seu eixo
maior. Deste modo, a queda das esferas umas sobre as outras e sobre as paredes do cilindro
provoca a fragmentação do material a pulverizar com um mínimo de perdas.
Estes moinhos têm a vantagem de oferecerem uma grande superfície de moenda em relação ao
limitado espaço que ocupam, sendo, além disso, extremamente fáceis de limpar. No entanto, a sua
duração depende muito da dureza do material de que são feitas as bolas, pois estas, como se
compreende, estão em permanente choque umas
138

com as outras. Tais aparelhos prestam-se bem para a pulverização de substâncias higroscópicas,
extractos e produtos químicos de elevado preço, visto que a perda de
material é mínima. As Fig. 85 e 86 representam um
desles aparelhos, existindo modelos em que se pode montar
Classificador mais do que um cilindro.
A indústria farmacêutica utiliza, actualmente,
Saída para o produto
reduzido a pó e para o várias substâncias medicamentosas sob a forma de
fluido partículas de dimensões reduzidíssimas. É o que
acontece, por exemplo, com os antibióticos administrados sob a
forma de suspensões injectáveis, cujas partículas, neste caso,
devem ter diâmetros médios da ordem de apenas alguns \L,
Ahmentador pois nestas condições o produto será absorvido num ritmo
tal que assegure concentrações sanguíneas realmente activas.
As substâncias que se apresentam num tal estado de divisão
constituem os pós
Fig. 87. Diagrama de um micronizados, os quais só podem ser preparados por
micronizador Üpo Jet-O- técnicas diferentes dos processos convencionais de
Mizer Fluid Energy
pulverização, devendo notar-se, além disso, que a classificação das respectivas partículas
também não pode ser feita recorrendo aos tamises.
Em geral, a preparação dos pós micronizados faz-se em moinhos de tipo especial,
denominados micronizadores, os quais não só promovem a divisão da droga como
efectuam, paralelamente, a sepa
ração e calibração das partículas
obtidas. Estes aparelhos, ao
contrário dos anteriormente des
critos, não possuem quaisquer
partes móveis, sendo a fragmen
tação conseguida submetendo a
substância a correntes de certos
fluidos elásticos animados de alta
velocidade. Os fluidos mais usa
dos são o ar ou um gás inerte, os
quais são comprimidos c introdu
zidos na câmara de pulverização.
Deste modo, a substância a divi
dir fica exposta à acção da cor
rente do gás, sendo arrastada pelo
violento turbilhão originado pelas Fig. 88. Modelo laboratorial de micronizador Jet-O-Mizer
139

velocidades sónica ou supersónica do fluido utilizado. Em resultado disto, as partículas


constituintes da substância adquirem também elevada velocidade e quando chocam umas com as
outras o impacto que sofrem provoca a sua fragmentação.
A Fig. 87 representa, esquematicamente, um moinho deste tipo, vendo-se que o fluido
pulverizante, neste caso o ar, é introdu/ido na câmara do aparelho através de orifícios situados na
parte i nferior do mesmo, rcalixando-se a admissão do ar a pressões que variam desde 1.8 a 20 kg.
.cm"2. O ar altamente comprimido é transformado em jactos dotados de velocidade sónica e ultra--
sónica por expansão na parte inferior do
moinho, gerando-se depois, no interior
deste, uma corrente de gás circulando a
alta velocidade. A substância é intro-
duzida no aparelho por uma tre-monha
especial e as suas partículas, sendo
apanhadas pêlos jactos de gás, são
obrigadas a chocarem umas com as outras,
sendo rapidamente fragmentadas na
própria câmara por impacto mútuo.
À medida que o material c
pulverizado, as partículas formadas são Fig. 89. Micronizador de câmara horizontal
levadas pela corrente de gás para a parte
superior do aparelho, sendo as de
menores dimensões arrastadas pelo gás
que sai do moinho para um
compartimento de recolha. Por seu turno,
as partículas maiores e, portanto, mais
pesadas, são aglomeradas por acção da força centrífuga na parte superior do micronizador,
acabando por regressar à câmara de pulverização, onde sào submetidas a novos impactos até serem
reduzidas às dimensões convenientes.
Existem vários modelos destes aparelhos, apresentados em vários tamanhos, como o
micronizador Jet-O-Mizer (Fluid Energy), representando a Fig. 88 um protótipo de escala
laboratorial. Na fig. 89 mostra-se um outro micronizador em que a câmara de pulverização e de
classificação das partículas está disposta horizontalmente.
Por seu turno, a Fig. 90 mostra, esquematicamente, como funciona o micronizador Gem T-X
(Helme Products. Inc.), o qual se diferencia dos aparelhos anteriormente descritos pelo facto de
utilizar dois jactos de fluido diametralmente opostos, os quais provocam a colisão das partículas na
câmara de pulverização. Além disso, a f i m de evitar a contaminação do material, estes
micronizadores podem ser revestidos interna-
140

mente por uma espécie de forro, facilmente substituível, feito de borracha sintética, de
teflon, de nylon, etc.
Como já atrás frisámos, esta espécie de moinhos é a única que permite obter
partículas cujas dimensões não ultrapassam alguns p, de diâmetro, mas, além disso,
apresenta ainda a importante vantagem de
impedir o aquecimento do material
Partículas grandes Para o colector
nela pulverizado. Na realidade, o
calor gerado pelo impacto dos de
Câmara Partículas reduzidas sólidos uns contra os
de outros é
"imensões
prontamente neutralizado pelo efeito
refrigerante devido à brusca expansão do
fluido na câmara de pulverização. Deste
modo, . .jdas as substâncias alteráveis pelo
Entrada calor, como, por exemplo, antibióticos e
do enzimas, podem ser reduzidas a pós
extremamente finos sem que haja o risco
de perderem actividade devido a uma
subida de temperatura.
Por outro lado, estes aparelhos
Entra distinguem-se por fornecerem partículas
da do
gás — ._.,; ,"4 cujos diâmetros são bastante unifor-
Fig. 90. Micronizador Gem T-X mes, variando apenas dentro
Cam —a de Entrada
de limites relativamente a estreitos, e quando tal facto constitui
uma característica pulverizaçã do gás imprescindível de certos pós, como
acontece com os antibióticos, corticóides e outras substâncias, o emprego dos micronizadores
permite resolver este problema da melhor maneira possível.

5.1.3.3. Operações acessórias da pulverização

5.1.3.3.1. Tamisação

A tamisação, apesar de ser considerada, habitualmente, como uma operação acessória da


pulverização, apenas deve ser tida como tal no sentido que se dá à palavra acessória de significar, no
caso presente, operação que vem imediatamente depois e que se destina a completar a primeira.
141

Na realidade, pelo menos na pulverização do ponto de vista farmacêutico, isto é, na que se


pratica com o objectivo de preparar um pó tendo determinada tenuidade, a tamisação constitui o
elemento indispensável para a calibração das partículas resultantes da divisão de uma droga. Ela
representa, por conseguinte, um dos mais importantes elos da cadeia de operações que é necessário
realizar para se obterem os pós, não sendo exagerado afirmar-se que sem tamisação não é possível a
preparação de pós farmacêuticos. A tamisação é, portanto, a operação que permite individualizar um
pó, pois este, como já dissemos, deve ser um conjunto bastante homogéneo de partículas tendo um
certo e determinado diâmetro.
O processo de pulverização limita-se a fragmentar a substância, servindo a tamisação para
separar aquelas partículas que apresentam as dimensões próprias da classe do pó que se pretende
obter. Duma maneira geral, a redução de uma droga a pequenos fragmentos não é instantânea, ou,
por outras palavras, a pulverização não consegue transformar a totalidade da substância, num
mesmo momento, em partículas apresentando todas o mesmo grau de tenuidade. Isto é
particularmente observável no caso das drogas de origem vegetal, cuja estrutura é bastante
heterogénea, pois na sua constituição figuram variadas formações histológicas, com textura muito
diferente.
Num caso destes, compreende-se que a pulverização, qualquer que seja o processo por que se
faça, comece por fragmentar os tecidos mais moles e só mais dificilmente desagregue as formações
duras e resistentes, como as partes lenhificadas. Estamos, assim, em face de uma operação que se
desenrola progressivamente, e por motivo disso torna-sc imperioso tamisar a substância à medida
que a pulverização vai progredindo, a fim de separar as partículas mais finas, continuando a
divisão daquelas que fiquem retidas pelo tamis.
Só procedendo deste modo se consegue que as partículas constituintes de um pó apresentem
homogeneidade aceitável. Na realidade, se executássemos a pulverização sem que procedêssemos a
estas tamisações repetidas a intervalos mais ou menos regulares e nos limitássemos, apenas, a
tamisar o produto numa fase adiantada da operação, aconteceria que as partes moles da droga, por
serem mais friáveis, seriam redu/.idas a partículas de dimensões inferiores às desejadas, resultando
daí a obtenção de um pó constituído por partículas muito finas, a par de outras nitidamente maiores.
Ora, t a l facto é absolutamente contrário aos preceitos a que devem obedecer os pós, tomados como
forma galénica, e por isso é preciso evitá-lo a todo o custo.
Perante o que acabámos de dizer, toma-se necessário que o produto a pulverizar seja tamisado
periodicamente por um tamis cuja abertura da malha corresponda à tenuidade do pó a obter,
voltando ao almofariz ou ao moinho a parte da droga por ele retida. Este resíduo será submetido a
novas pulverizações e tamisações até que a droga passe toda através do tamis, e só então se dará por
terminada a operação, dizendo-se que esta representa uma pulverização sem resíduo, a qual é o
processo quase invariavelmente seguido na redução das drogas a pó.
142

Como a constituição química dos vegetais não é a mesma em todos os tecidos que os formam,
compreende-se que as fracções obtidas nas diversas tam i sacões a que os sujeitamos durante uma
pulverização terão, necessariamente, uma constituição diferente. Impõe-se, por isso, que, acabada a
pulverização, se misturem intimamente os produtos resultantes das sucessivas tamisações praticadas
no decurso da operação, mistura essa que pode ser feita num almofariz ou em aparelhos especiais,
chamados misturadores de pós, a cujo uso se recorre sempre que a quantidade da droga a processar
é elevada. Para assegurar uma perfeita homogeneidade do produto recomenda-se que, após a
mistura, se proceda a uma tamisação final.
Como atrás acentuámos, a pulverização das drogas faz-se, regra geral, sem resíduo, mas em
casos muito especiais pode desprezar-se uma parte da droga e diremos, então, que se faz uma
pulverização com resíduo. Como é lógico, uma pulverização deste último tipo só é realizável se os
princípios activos da droga se localizam, especificamente, em determinados tecidos c estes
apresentam um grau de friabilidade que permite pulverizá-los numa fase separada daquela em que
são pulverizadas as partes consideradas como inertes.
O exemplo clássico e, podemos dizer, quase único, de uma droga cuja pulverização se faz
deixando resíduo c representado pelo caso da ipecacuanha. Acontece que nas raízes desta planta,
que constituem a droga, os seus princípios activos acham-se exclusivamente localizados no
parênquima corlical e no floema. Ora, como estes tecidos estão situados externamente c são bastante
mais moles do que as formações do lenho, serão eles os primeiros a fragmentar-se quando a
ipecacuanha c pulverizada. Assim, ao proceder à pulverização deste fármaco, as partes reduzidas a
pó vão sendo separadas por tamisação, considerando-se terminada a operação quando se tiverem
recolhido três quartos do peso de raiz de que se partiu inicialmente. Este procedimento tem a dupla
vantagem de evitar o penoso trabalho que seria necessário despender para conseguir a pulverização
de uma parte tão dura como é o cilindro central da ipecacuanha, além de que, e isso é mais
importante, obsta a que a parte realmente activa da droga seja diluída por aquela que não contém
princípios de interesse farmacológico.

5.1.3.3.1.1. Classificação dos pós

Como se verá na Farmácia Galénica, existem vários métodos para determinar o tamanho das
partículas que constituem um pó. Tais processos representam técnicas mais ou menos precisas mas,
pela sua natureza e demorada execução, apenas se aplicam ao produto final de uma pulverização
quando haja necessidade de estabelecer, com rigor, as dimensões das partículas constituintes de um
pó.
Por outro lado, acontece que a tamisação é uma operação fácil e rapidamente praticável, não sendo
de estranhar, por isso, que geralmente se recorra a ela para fazer a classificação dos pós. Na
realidade, sendo os tamises constituídos por tecidos cujas malhas obedecem a características bem
estabelecidas, é lógico considerar a abertura da
143

malha como o elemento calibrador das dimensões das partículas que passem através dela.
É evidente que todos os sólidos que atravessem uma rede tamisante possuirão. Teoricamente,
dimensões ligeiramente interiores ao lúmen das malhas do tamis, podendo, para fins práticos,
considerarem-se tais dimensões como sendo iguais. Por vezes, no entanto, as partículas tamisadas
poderão ser sensivelmente menores que a abertura da malha dos tamises utilizados para a sua
calibração, mas o risco de tal acontecer será diminuído ao mínimo pelas sucessivas tamisações que
se devem fazer no decurso de uma pulverização.
Apesar disso, porém, um pó será sempre constituído por um conjunto de partículas
caracterizadas por uma certa irregularidade de tamanho. Se a operação tiver sido devidamente
executada, sem dúvida que a maioria dos elementos que constituem o pó apresentará dimensões
correspondentes ao lúmen das malhas do tamis utilizado na sua preparação, os quais, todavia, serão
sempre acompanhados de uma certa proporção de elementos de menores dimensões.
É por esta razão que um pó só ficará convenientemente definido, no que diz respeito à sua
tenuidade, se se fixar a percentagem máxima de partículas de menores dimensões que poderá conter.
Quer isto dizer que a classificação de um pó, para ser estabelecida com certo rigor, deverá ser feita
em referência a dois tamises e não apenas a um. Assim, um determinado pó deverá passar
integralmente através do tamis que nominalmente lhe corresponde, e, quando submetido à tamisação
por um tamis de malhas mais apertadas, não deverá originar mais de 40% de tamisado, que
corresponderá, evidentemente, à quantidade máxima permitida de fragmentos de menor diâmetro.
Este critério é hoje seguido pelas principais farmacopeias e dado que, na realidade, é o único
que permite uma classificação consistente e precisa dos pós, foi adoptado igualmente no projecto da
monografia sobre Pós do Suplemento à Farmacopeia Portuguesa IV e também como um dos métodos
de classificação usados pela Farmacopeia Portuguesa V.
Os pós micronizadofí constituem uma classe à parte, só podendo ser obtidos recorrendo a
meios especiais, como os micronizadores, a que já atrás fizemos referência. O diâmetro médio das
suas partículas pode, em muitos casos, não exceder uma dezena de u,, e porque não existem tamises
cuja abertura de malha se aproxime dessas dimensões, as suas partículas apenas são mensuráveis
recorrendo a técnicas próprias, que serão estudadas na Farmácia Galénica, no capítulo referente aos
Pós.

5.1.3.3.1.2. Determinação do grau de tenuidade de um pó

Se bem que a maioria das farmacopeias caracterize a tenuidade de um pó em relação a dois


tamises e fixe a percentagem máxima de partículas menores que aquele poderá conter em 40%,
apenas a Farmacopeia Americana estabelece as normas a que deve obedecer a determinação da
tenuidade de um pó. Porque a maneira como o ensaio
144

é conduzido terá, necessariamente, influência nos resultados, achamos conveniente indicar a técnica
preconizada pela U.S.P. XXII, a qual, pelo facto de estar padronizada, oferece a vantagem de
conduzir a resultados comparáveis e reproduzíveis.
Assim, a referida farmacopeia recomenda que se utilizem tamises padronizados e cobertos,
fazendo-se o ensaio, no caso de pós grosseiros ou medianamente grosseiros, partindo de uma
quantidade de pó compreendida entre 25 e 100 g, procedendo-se à tamisação agitando o tamis com
movimentos rotativos horizontais, e verticalmente batendo-o levemente sobre uma superfície
compacta, como o tampo de uma mesa. A
tamisação deve fazer-se durante, pelo menos, 20 minutos, ou até que não
passe mais pó através do tamis. Terminada esta, pesa-se rigorosamente a
fracção retida no tamis e a que o atravessou e foi recolhida no recipiente
inferior.
No caso dos pós finos ou muito finos, o ensaio será praticado como
anteriormente, mas a tamisação deverá prolongar-se, no mínimo, durante
30 minutos e a quantidade de pó não deve exceder 25 g. Além disso,
tratando-se de pós com carácter oleoso ou outros que apresentem
tendência para tapar as abenuras do tamis, deve escovar-se a rede
Fig. 91. Conjunto
de tamises tamisante a intervalos regulares, assim como devem desfazer-se os agregados
padronizados formados durante a operação. Porém, em caso algum se procederá de modo a
aumentar a tenuidade do pó.
Este ensaio da determinação do grau de tenuidade pode fazer-se mecanicamente, utilizando-se,
para isso, tamises padronizados montados num agitador que produza os movimentos horizontais e
verticais da agitação manual atrás descrita, devendo-se, em tal caso, observar as instruções
fornecidas pela casa construtora do aparelho (Fig. 91). A título de exemplo, na Tabela X indicamos
as características que deviam apresentar os pós descritos na respectiva monografia publicada no
Suplemento à Farmacopeia Portuguesa IV. Segundo o critério seguido pela U. S. P., os limites
indicados não deverão ser excedidos em mais de 0,2%.

Tabela X. Características de tenuidade dos pós

Abertura da malha Quantidade máxima que pode


Designação do pó do tamis usado na atravessar um tamis cuja
sua preparação' abertura de malha é de
Pó grosso 0,700 mm 40% 0,400 mm
Pó grosso n." II 0,400 mm 40% 0,290 mm
Pó grosso ,i." III 0,290 mm 40% 0.180 mm
Pó ou pó ordinário 0,180 mm 40% 0,128 mm
Pó fino 0.128 mm 40% 0,074 mm
Pó finíssimo 0,074 mm 100% 0.074 mm
145

A trociscação é uma operação que tem por fim dividir em pequenos fragmentos
o aglomerado resultante de uma porfirização por via húmida, u fim de facilitar e tornar
mats rápida a secagem do produto pulverizado. Aplica-se, do mesmo modo, às massas
pastosas resultantes de uma pulverização por v i a
química, praticando-se por meio de um instrumento
designado trociscador, representado na Fig. 92. Este é
constituído por uma espécie de palmatória, apresentan
do na parte mais larga um orifício onde encaixa um
funil que deve ter uma base muilo curta e um tanto
larga. Colocado o produto no referido funil, bate-se
ligeiramente corn o pé fixado na face inferior da pai- Fig 92. Trociscador
maioria sobre uma folha de papel de filtro estendida
numa mesa, provocando cada impacto a queda de um pequeno cone ou Irocisco sobre o papel.
Dividida a totalidade da massa em pequenos trociscos, colocam-se estes numa estufa, até completa
cxsicação, após o que deverão ser reduzidos a pó por trituração num almofariz.

5.2. PULVERIZAÇÃO DE SUBSTÂNCIAS MOLES OU POLPAÇÃO

A divisão destas substâncias faz-se por meio de uma operação denominada polpa-ção, que se
aplica exclusivamente a produtos vegetais frescos c carnudos, com o f i m de os transformar numa
pasta mole, que se separa das partes fibrosas e duras.
A polpação origina uma forma farmacêutica designada por polpa, hoje quase caída em desuso,
representada na Farmacopeia Portuguesa IV pela polpa de tamarindos.
A polpação propriamente dita deve ser precedida de um tralamento prévio da droga, de modo a
transformá-la numa pasta. Se a substância apresentar uma textura suficientemente mole procede-se
ao seu esmagamento por epistação, ou seja, comprimindo-a, num almofariz, com o pilão, imprimindo
a este um movimento dirigido da periferia para o centro. Transformada a droga numa massa,
coloca-se esta sobre um tamis invertido, de crina, de malhas relativamente largas, comprimindo-a,
então, com uma espátula especial denominada polpadw, que a obriga a atravessar o tamis, reco-
lhendo-se o produto tamisado num recipiente colocado por baixo. Assim, as partes moles e carnudas
do vegetal, sob a forma de uma pasta mais ou menos consistente, serão poipadas e formarão uma
polpa, ficando retidas pelo tamis Iodas as formações fibrosas e duras, as quais serão rejeitadas.
Acontece que, em ccrlos casos, a substância não se apresenta branda para ser polpada e,
então, terá que ser amolecida por maceração ou digestão em água quente,
146

como se recomenda fazer na obtenção da polpa de tamarindos. Porque nestas circunstâncias o


produto final poderá apresentar-se demasiadamente fluido, é necessário proceder à evaporação da
água por ele retida, de modo a ficar com a consistência apropriada.

BIBLIOGRAFIA

BENTLEVS Textbook of Pharmaceuncs, pág. 234, London, Baillière, Tindall and Cox, 1977. CASARIO,
S., Tecnologia Farmacêutica, pág. 69, Istiluio Ediloriale Cisalpino, Milano-Varcse, 1960. GORJS, A.;
LIOT A., JANOT, M. M. e GORIS, A., Pharmacie Galénique, Tomo I, pág. 244, Masson et Cie,
Éditcurs, Paris, 1949. JONES, J. W., Physic.al and Chemical subdivision of drugs, Cap. 5, apud
American Pharmaty, 5." Edição,
J. B. Lippincott Company, Philadelphia, 1960. RIPPIE, E, G., Powders, cap. 88, in REMINGTON~S
Pharmaceutical Sciences, pág. 1535, 16." Edição, Mack
Publishing Company, Easton, U.S.A., 1980. RIPPIE, E. G., Powders, cap. 89, in REMÏNGTOKTS
Pharmaceutical Sciences, pág. 1585, 17.a Edição, 1985.
147

5.3. DIVISÃO DE LÍQUIDOS OU EMULSIFICAÇÃO

5.3.1. GENERALIDADES

A divisão de um líquido em pequenas gotículas só pode realizar-se à custa de um intermédio, o


qual terá a dupla finalidade de facilitar a divisão propriamente dita e de manter as gotículas
afastadas umas das outras interpondo-se entre elas.
Deste modo, a divisão de um líquido implica a formação de um sistema disperso em que a fase
interna ou dispersa será, necessariamente, representada pelo líquido dividido, podendo a fase
externa ser um sólido, um líquido ou um gás. Quando, porém, ambas as fases são líquidas, o acto de
dispersar uma na outra representa uma emulsi-ficação e pode originar uma forma farmacêutica
denominada emulsão.
Poderemos, então, dizer que uma emulsão é um sistema heterogéneo constituído por gotículas
de um líquido disseminadas no seio de um outro com ele imiscível. Esta é a definição clássica e
tradicional de emulsão, aceite durante longos anos, mas está longe de traduzir, fielmente, o que deve
caracterizar uma verdadeira emulsão. Não admira, por isso, que BECKER adoptasse um critério mais
preciso e rigoroso, ao definir tais produtos do seguinte modo: «Emulsão é um sistema heterogéneo
constituído, pelo menos, por um líquido imiscível intimamente disperso num outro líquido sob a
forma de gotículas, cujo diâmetro, em geral, excede 0,1 \L. Tais sistemas apresentam um mínimo de
estabilidade, a qual pode ser aumentada pela adição de certas substâncias, como agentes
tensioactivos, sólidos finamente divididos, etc.».
Este conceito distingue-se dos anteriormente formulados por salientar que toda a emulsão deve
apresentar uma certa estabilidade, a qual constitui uma das propriedades fundamentais destes
produtos, além de se referir, ainda, a algumas substâncias capazes de a tornarem mais duradoura e,
portanto, aumentarem o período de vida destes sistemas dispersos.
De facto, as emulsões assumiram actualmente grande importância no campo farmacêutico e na
indústria dos cosméticos, devendo-se o extraordinário incremento que o uso destas preparações
registou nos últimos anos ao desenvolvimento dos conhecimentos científicos e tecnológicos, os quais
permitiram aumentar, de modo considerável, a estabilidade e, por conseguinte, o prazo de utilização
destas preparações.
São muitas as vantagens que as emulsões oferecem do ponto de vista farmacêutico. Assim,
tornaram possível obter uma diluição conveniente de um óleo num líquido não miscível com ele, daí
resultando, por exemplo, o desenvolvimento de fórmulas de emulsões contendo lípidos, hidratos de
carbono e vitaminas, que permitem uma alimentação adequada, por via endovenosa, de pessoas
altamente debilitadas ou que não possam alimentar-se normalmente. Por outro lado, existem várias
substâncias medicamentosas de gosto tão desagradável que dificilmente são aceites por qualquer
paciente, cujo paladar, contudo, se torna perfeitamente aceitável quando apresentadas sob a forma
de emulsão. Em dermatologia também as emulsões são largamente utilizadas, permi-
148

tindo a formulação racional de pomadas de carácter não gorduroso, havendo, por outro lado, factos
demonstrativos de que a forma emulsão pode aumentar a actividade de certos agentes terapêuticos
quando estes constituem a fase dispersa, o que não é de causar estranheza se pensarmos no
extraordinário aumento de superfície a que tais substâncias ficam sujeitas depois de
convenientemente emulsionadas.
Acresce ainda o facto de as emulsões terem alio potencial termodinâmico e, portanto, cederem
com facilidade fármacos para locais do organismo onde eles possam formar sistemas de baixo
potencial, ou seja, termodinamicamente mais estáveis. A seu tempo este problema será devidamente
encarado.

5.3.2. TIPOS DE EMULSÕES

Se bem que, por vezes, se faça uma distinção entre emulsões naturais e artificiais, tal divisão
parece-nos destituída de qualquer importância, pois, hoje em dia, a quase totalidade das emulsões de
interesse farmacêutico pertence à segunda categoria.
Em qualquer dos casos, porém, só haverá emulsão quando um líquido estiver dividido em
pequeníssimos glóbulos no seio de um outro. Teremos, assim, que a fase que se apresenta dividida
constitui a fase interna, dispersa ou descontínua, ao passo que o líquido que rodeia as gotículas da
fase dispersa recebe o nome de fase externa,
dispersante ou contínua (Fig. 93). Além disso, em quase todas as
emulsões figura um terceiro componente, denominado agente
emulsivo, o qual nncorre para tomar a emulsão mais estável, pois
inteipõe-se entre as fases dispersa e dispersante, retardando, assim,
a sua separação, e que constitui a interfase.
Como os dois componentes básicos de uma emulsão são a
água e um óleo ou uma substância lipos-solúvel, poderemos
classificar as emulsões em dois tipos distintos, de acordo com a
natureza da respectiva fase dispersa. Assim, se o óleo constitui a
fase dispersa estaremos perante uma emulsão óleo/água (O/A),
sendo
Fig. 93 Emulsão, representando a cmu|são do üpo
l
água/ó eo (A /O) SC se verificar O
r
os círculos a fase dispersa e a parte .
tracejada a fase dispersante inverso.

5.3.2.1. Determinação dos tipos de emulsões

Dado que existem dois tipos de emulsões, levanta-se muitas vezes na prática o problema de
determinar se uma preparação é do tipo O/A ou A/O, para o que se pode recorrer a vários processos
os quais passamos a descrever.
149

Ensaio de diluição

Um dos ensaios mais simples que se pode executar para determinar o tipo a que pertence uma
emulsão consiste em misturar um pequeno volume desta com igual volume de água. Se a mistura se
mantiver inaJterada, isto é, desde que não haja separação das fases, conclui-se que estamos em
presença de uma emulsão O/A. Do mesmo modo, se a diluição de uma emulsão com óleo permanecer
estável, isso significa que ela c do tipo A/O. Este ensaio pode ser feito num tubo ou numa lâmina de
vidro, diluindo-se, neste caso, uma gota da preparação com uma ou duas golas de água ou de óleo e
observando o resultado de tal mistura ao microscópio. Desde que o líquido adicionado à emulsão
corresponda à sua fase externa, haverá apenas um efeito de diluição, não se registando, por isso,
separação das fases. Para maior segurança, é recomendável que a emulsão a ensaiar seja sempre
diluída com água e com óleo.
Em face do que acabámos de dizer, é evidente que se pode enunciar a seguinte regra: Sempre
que se adicione um determinado líquido a uma emulsão e esta continue a manter-se estável, o líquido
adicionado corresponde à sua fase externa.

Ensaio com corantes

Tal ensaio permite a identificação do tipo a que pertence uma emulsão pela diferente
distribuição de um determinado corante pelas duas fases que a constituem. Assim, se misturarmos um
corante hidrossolúvel corn uma emulsão e esta corar uniformemente, é evidente que a fase contínua
será, neste caso, representada pela água, e a emulsão pertencerá ao tipo O/A. Do mesmo modo, um
corante lipossolúvel que origine uma coloração uniforme indica que a preparação será do tipo A/O.
Se este último corante apenas tingir pequenos glóbulos dispersos num fundo não corado, isso
significa, evidentemente, que a emulsão é do tipo O/A; por outro lado, se for esse o resultado do
ensaio com um corante hidrossolúvel a emulsão é do tipo A/O.
Estes ensaios praticam-se misturando, numa lâmina de vidro, uma pequena porção de emulsão
com a solução do corante, observando-se, seguidamente, o aspecto que tal mistura apresenta ao
microscópio. Como no ensaio anterior, para maior segurança, a mesma emulsão deve ser misturada
com um corante hidrossolúvel e outro lipossolúvel, devendo, como é óbvio, coincidir o resultado dos
dois ensaios.

Ensaio de condulividade eléctrica

Como os óleos são maus condutores da corrente eléctrica, esta só poderá atravessar uma
emulsão quando a água representar a sua fase contínua. De acordo com isto, se tivermos um circuito
eléctrico no qual esteja intercalada uma lâmpada e mergulharmos
150

as duas extremidades do referido circuito na emulsão a ensaiar, a lâmpada acenderá caso a emulsão
seja do tipo O/A, mantendo-se apagada se for do tipo A/O. Por vezes, a adição de uma pequena
quantidade de um electrólito, como o cloreto de sódio, às emulsões O/A aumenta a intensidade do
fenómeno se ela tiver sido preparada com agentes emulsivos não iónicos.
Pode dizer-se que estes são os ensaios mais facilmente praticáveis e os que se usam
rotineiramente na determinação do tipo de uma emulsão. Outros, porem, têm sido propostos, mas ou
são de execução mais complicada ou as suas indicações são mais falíveis do que as fornecidas pêlos
métodos anteriormente descritos. Estão neste caso, por exemplo, as técnicas baseadas nas diferenças
de viscosidade e de tensão superficial das emulsões O/A e A/O. Outro processo de determinação do
tipo de uma emulsão fundamenta-se no facto de certos óleos se tornarem fluorescentes sob a acção
da luz ultravioleta, de modo que uma emulsão que apresente fluorescência uniformemente
distribuída, quando examinada à luz de WOOD, deverá, logicamente, ser do tipo A/O.

5.3.3. TEORIA DAS EMULSÕES

Salvo casos especiais de emulsificação espontânea, fenómeno pela primeira vê/ descrito por
GAD em 1878, a mistura íntima de dois líquidos imiscíveis não é facilmente conseguida, pois há
determinados factores que se opõem à dispersão de um deles, representando a fase interna, no outro,
constituindo a fase externa.
Na realidade, a emulsificação consiste, essencialmente, em dividir uma das fases de um sistema
hcicrogéneo em pequenos glóbulos, de que resulta um aumento por vezes extraordinário da
respectiva superfície, mas tal objectivo é contrariado pela tensão superficial que os líquidos possuem.
Esta, como é do conhecimento geral, representa a tendência que um liquido tem para reduzir a sua
área de superfície a um mínimo de energia potencial. Deste modo, se quisermos aumentar a
superfície de um líquido qualquer teremos que despender uma certa energia, sob a forma de trabalho,
para vencer a atracção que a massa do mesmo líquido exerce sobre as suas moléculas situadas à
periferia.
Se por exemplo, dispersarmos l ml de óleo em glóbulos tendo 0,01 \í (K)"6 cm) de diâmetro em l
ml de água, obteremos uma emulsão em que a superfície da fase dispersa é aumentada de modo
extraordinário. Com efeito, sendo a área das partículas
dispersas dada pela expressão S = ——, em que í/.( representa o diâmetro das
dn
partículas, em cm, teremos:

S- = 6 x IO 6 cm2, ou seja, 600 m2.


151

Para que tal grau de dispersão possa ser atingido, torna-se, porém, necessário despender
uma certa energia calculável pela fórmula

em que W representa o trabalho, y a tensão interfasial e AÃ o aumento da superfície. Sendo y = 5 7


dine. cm"1, para que seja possível obter a dispersão atrás referida será necessário aplicar uma
energia igual a

W = 5 7 x 6 x IO6- 34 X IO7 erg = 34 Joule

ou 8 Caloria, uma vez que l cal. = 4,185 Joule.


Quer isto dizer que na grande maioria dos casos é preciso despender-se uma certa quota de
trabalho ou energia para se obter uma emulsão, seja ela representada por energia humana ou
fornecida por máquinas. O trabalho realizado nesse sentido representa, pois, o que poderemos
denominar factor mecânico na obtenção de emulsões e tem como finalidade vencer a tensão
superficial do líquido a dispersar.
Este factor mecânico, se bem que imprescindível na grande maioria dos casos, não é suficiente
para permitir, só por si, uma emulsão duradoura. De facto, se agitarmos vivamente 10 ml de azeite
com 100 ml de água, veremos o óleo dividir-se em gotículas que se dispersam na água. Contudo,
logo que a agitação cesse, os glóbulos do azeite, até então dispersos, começarão a juntar-se e não
tardará que se reunam uns aos outros, passando a constituir, como inicialmente, urna camada bem
individualizada.
Tal facto tem a sua explicação na circunstância de uma emulsão representar um sistema
instável do ponto de vista termodinâmico. Na realidade, qualquer sistema que em dado momento
apresente uma energia potencial superior ao seu estado de energia inicial tem sempre tendência a
retomar esse estado inicial. Ora, como já dissemos, todos os líquidos possuem uma baixa energia
livre de superfície devido ao fenómeno da tensão superficial e a sua divisão em pequenos glóbulos
representa um aumento notável dessa energia que só é possível obter à custa de um certo trabalho.
Deste modo, no caso do exemplo atrás citado, a fragmentação do azeite em pequenas gotículas só
poderá manter-se enquanto a mistura óleo-água estiver sob o efeito da agitação. Logo que esta deixe
de actuar, a energia livre de superfície da fase dispersa, isto é, do a/eile, tende a readquirir o seu
valor normal e, como consequência disso, as partículas coales-cem e passam a constituir, de novo,
uma camada contínua.
Po*- isto se vê que o factor mecânico, seja qual for a sua natureza, apenas é capaz de originar
emulsões de duração relativamente efémera, cujas fases se separarão logo que o mesmo deixe de
actuar. Na realidade, tal facto verifica-se sempre que a quantidade de óleo a dispersar ultrapasse
2% do total da emulsão e como, em regra, as
152

emulsões farmacêuticas contêm uma proporção muito maior de fase dispersa, teremos que recorrer
ao uso de substâncias dotadas de determinadas características, chamadas agentes emulsivos ou
emulgentes, para as prepararmos.

5.3.4. AGENTES EMULSIVOS

Os agentes emulsivos desempenham um papel da maior importância na emulsifi-cação, pois


nào só facilitam a obtenção da fase dispersa como concorrem, igualmente, para a sua estabilização.
De facto, tratando-se de substâncias que reduzem a tensão interfasial entre a água e o óleo,
diminuem a energia que é necessário despender para dispersar um líquido num outro. Se
calcularmos, uma vez mais, o trabalho necessário para se obter uma emulsão correspondente ao
exemplo dado na pág. 151, mas admitindo que se utilizava na sua preparação um agente emulsivo
capaz de reduzir a tensão superficial para l dine.cnr1, verifica-se que, nestas condições, o trabalho a
realizar é de 0,6 Joule ou, aproximadamente, 0,14 Caloria, o que representa menos de 2% da
energia despendida na ausência do tênsio-activo.
Por outro lado, os agentes emulsivos actuam de modo decisivo na estabilização das emulsões,
pois, como adiante se discute, são compostos dotados da propriedade de originarem um filme
absorvido à superfície das duas fases. Admite-se hoje, quase unanimemente, que a coalescência dos
glóbulos da fase dispersa pode ser mais ou menos retardada de acordo com as características desse
filme ou película originada pelo agente emulsivo, e KING considera mesmo que o factor mais
importante na estabilidade das emulsões é representado pela solidez dessa película interfasial e que
a maioria dos elementos que a podem afectar apenas intervém na medida em que modifica as
propriedades da referida película.
Na realidade, um dos requisitos mais importantes a exigir de um agente emulsivo é o de ser
capaz de formar rapidamente um filme resistente à volta de cada gotícula da fase dispersa, de modo
a originar uma barreira que evite a coalescência dessas gotículas quando contactem umas com as
outras. É de notar que tal filme pode ser representado por uma camada monomolecular,
multimolecular ou por partículas sólidas finamente divididas, características que, como é evidente,
dependem da natureza do agente emulsivo. Assim, o primeiro tipo de filme é originado pêlos agentes
aniónicos, catiónicos e não Jónicos sintéticos, pelo colesterol e pela lecitina; o segundo tipo pela
goma arábica e pela gelatina; finalmente, o terceiro tipo é originado pela bentonite, Veegum e
hidróxido de magnésio. Além disso, outra das características que um agente emulsivo deve ter é a' de
criar nas gotículas dispersas um potencial eléctrico adequado de modo a provocar a sua repulsão
mútua.
153

Podemos afirmar, por conseguinte, que os emulgentes se utilizam com a dupla finalidade de
modificarem a tensão interfasial dos líquidos a emulsionar, facilitando, desse modo, a formação do
pretendido sistema disperso, além de promoverem a sua estabilização. Compreende-se, portanto, que tais
substâncias sejam imprescindíveis na preparação de emulsões duradouras e com bom aspecto, sendo
ainda de salientar que são elas que, na grande maioria dos casos, determinam o tipo da emulsão
formada.
Considerando que uma emulsão é constituída por uma fase aquosa e outra oleosa, se
adicionarmos um determinado composto a um sislcma desta natureza, três hipóteses se poderão
formular quanto à sua distribuição nas referidas fases: Dissolução total na parte aquosa, se a
substância for hidrossolúvel; dissolução na camada oleosa, se for lipossolúvel, ou distribuição pelas
duas fases, se o composto tiver uma constituição química tal que uma parte da molécula seja solúvel
na água e a outra solúvel nos óleos.
GIBBS estudou este fenómeno da absorção de uma substância em presença de duas fases e
estabeleceu o conceito de que as moléculas dissolvidas numa ou nas duas fases podiam emigrar para
a superfície ou interfase e criou o termo excesso de superfície. F, para designar a diferença de
concentrações de uma determinada espécie molecular no interior e à superfície de uma dada fase.
Admitindo que um certo composto apenas está dissolvido numa das fases e que, além disso, se
trata de uma solução diluída, o excesso de superfície pode ser relacionado com a concentração e a
tensão superficial do seguinte modo:

r=
-C V dC

Esta expressão, conhecida por equação de adsorção de GIBBS, indica que à medida que a
concentração varia no interior da fase, varia, concomitantemente, F. No entanto, nem sempre haverá
excesso de substância dissolvida na interfase, pois isso apenas se verifica quando o valor de F for
positivo, como acontece no caso de a substância baixar a tensão superficial. Quando, porém, o
composto aumenta a tensão superficial, F é negativo, e, nesta eventualidade, a concentração da
substância será maior no interior do que à superfície da fase.
Daqui se infere que só os compostos capazes de baixarem a tensão superficial poderão
originar um excesso de superfície ou, por outras palavras, concentrarem-sc à superfície de um
líquido ou distribuírem-se na interfase de dois líquidos imiscíveis. Este fenómeno de migração traduz
as três possibilidades de distribuição de um corpo quando adicionado a um sistema água-óleo e
depende de certas características ffsico-químicas por ele apresentadas, as quais são determinadas,
em última análise, pela sua estrutura química.
154

Para melhor compreensão do que se passa quanto à distribuição de uma substância num
sistema ãgua-óleo suponhamos que esta é constituída por uma parte hidrófila, representada por um
círculo, e por uma parte lipófila, representada por um rectângulo, conforme está esquematicamente
indicado na Fig. 94, No caso das moléculas do grupo A, o esquema mostra que a sua parte lipófila é
a predominanle c, portanto, o composto dissolver-se-á integralmente na fase oleosa. Por outro lado,
as moléculas do grupo B apresentam uma constituição equilibrada, pois as suas metades polar e não
polar são
aproximadamente iguais, motivo por que elas se dis-põem na
interfase, ficando a parte polar orientada para a água e a pane
não polar dirigida para o óleo. Finalmente, as moléculas do
grupo C têm uma constituição nitidamente polar, dissolvendo-se,
por conseguinte, na fase aquosa.
Acontece que os compostos polares aumentam a
Fig. 94. Distribuição de três tipos tensão superficial
dos líquidos e os compostos predo-
de moléculas num sistema óleo-água. , , -. ,
Aimoléculascomgruponâopolarmais minantemente não polares, como os ácidos
gordos,
forte; B: moléculascom grupos polares diminuem-na de modo pouco
acentuado. Mas, quer
e não polares de igual forga: C: mole- nu QUl
devido à &ua constituição quírmca,
cuias com um forte grupo polar i
-i
dissolvem-se totalmente numa ou noutra fase da emulsão, não
sendo capa/es de se concentrarem na interfase. Só os compostos cuja molécula seja constituída por
uma parle hidrófila e outra lipófila equilibradas se distribuem na interfase, sucedendo que, além
disso, apresentam a propriedade de actuarem sobre a tensão superficial dos líquidos, diminuindo-a
de modo apreciável. São estes, precisamente, os que constituem os agentes emulsivos primários e
caracterizam-se, como acabamos de dizer, por serem tênsio-activos e originarem uma película
disposta entre as duas fases que formam uma emulsão.
Na prática, os agentes emulsivos mais utili/.ados apresentam as duas propriedades acima
referidas, mas acontece que a sua hidrossolubilidade e lipossolubilidade nunca são precisamente
iguais. Elas devem ser, evidentemente, equilibradas, pois só deste modo é possível que se concenlrem
na interfase., mas em cada molécula há sempre um ligeiro predomínio da parte polar sobre a não
polar ou vice-versa. No primeiro caso, é intuitivo que uma parte maior da molécula se dissolve na
água, acontecendo que o composto será mais solúvel na fase oleosa quando seja a parte não polar a
predominante.
Este facto está, aliás, directamente ligado com o tipo de emulsão que um determinado agente
emulsivo origina. Na realidade, se o emulgente é predominantemente hidrófilo conduz à obtenção de
uma emulsão do tipo O/A, acontecendo que a emulsão por ele originada é do tipo A/O quando possui
características lipófilas. Esta relação entre a solubilidade preferencial de um agente emulsivo e o
tipo de emulsão a que ele
155

conduz foi estabelecida por BANCROFT, que enunciou o postulado seguinte: Aquela fase em que o
agente emulsivo for mais solúvel constituirá a fase contínua ou externa da emulsão.
Este postulado representa a primeira tentativa para explicar como um determinado agente
emulsivo origina um certo tipo de emulsão. Outros autores, como HARKINS, admitem que o tipo de
emulsão depende da fase que é curvada pelo agente emulsivo, a qual passará a representar a fase
externa. Esta teoria é classicamente aplicada ao caso dos Óleo
sabões como agentes emulsivos, representando-se na Fig. 95 Cadeia
hidrocarfaoruda
como é que os sabões de um metal monova-lenle e bivalentc
'ff
se comportam na prática. No fundo tudo depende da
configuração geométrica do composto em causa, bastando o
simples exame da Fig. 95 para se compreender como é que um
Água
sabão de sódio provoca o envolvimento do óleo pela
água. Neste caso, como a área da parte hidrófila do
composto é maior que a da parte lipófila, as moléculas,
orientando-se conforme está indicado no diagrama,
necessariamente que obrigarão a fase aquosa a curvar-se,
acabando por envolver o óleo. Tratando-se de Cadeia
hi-
uni sabão de zinco, este possui dois radicais lipófilos para drocarbon
ada
um elemento hidrófilo, tendo, evidentemente, uma maior Fig. 95. Orientação das moléculas de sabão
área da parte lipófila, o que provocará a curvatura da fase num sistema água-óleo. A: Formação de
uma emulsão A/O à custa de um sabão de
oleosa sobre a água.
A teoria de HARKINS tem sido, todavia, contestada por vários autores, os quais põem em
dúvida que as moléculas de sabão possam exercer uma influência nítida na curvatura da interfase,
até porque elas são acentuadamente menores do que os glóbulos da fase dispersa de uma emulsão.
Mais recentemente, pretendeu-se relacionar o tipo de emulsão com a coalescência da
respectiva fase dispersa. Assim, DAVIES detende que ao preparar-se uma emulsão se formam,
simultaneamente, emulsões O/A e A/O e que o tipo final que subsiste depende, directamente, da
velocidade de coalescência das partículas nas duas emulsões iniciais e simultaneamente formadas.
Desle modo, se a emulsão O/A coalescer mais rapidamente que a emulsão A/O, a preparação final
pertencerá a este último tipo, e inversamente, se se der o contrário. DAVIES mostrou, por outro lado,
existir uma relação teórica entre a cinética da coalescência e a regra de BANCROFT e o equilíbrio
hidrófilo-lipófilo, e a sua teoria c considerada por muitos como bastante plausível.
Se bem que o agente emulsivo tenha uma influência dominante sobre o tipo da emulsão, não se deve
esquecer que na prática é necessário ter em
156

capazes de condicionarem a natureza da emulsão, como, por exemplo, o método de preparação


utilizado, a viscosidade e volume das fases e a presença de substâncias nelas dissolvidas.

5.3.4.1. Equilíbrio hidrófilo-lipófilo

As considerações feitas no parágrafo anterior tiveram como finalidade chamar a atenção para
as características que um agente emulsivo deve possuir. Como então vimos, só os compostos em cuja
molécula existam grupos hidrófilos e lipófïlos poderão ser adsorvidos à superfície das duas fases
que constituem uma emulsão e, assim originarem a película interfasial, tão importante para a
estabilidade destes sistemas dispersos.
Lembramos que a hidrofilia e lipofilia desses compostos terão que ser convenientemente
equilibradas, pois, de outro modo, eles serão totalmente absorvidos no interior de uma das fases. Na
prática, porem, nunca se obtêm compostos em que a parte hidrófila e lipófila das respectivas
moléculas se contrabalaçam perfeitamente, motivo por que uma substância será sempre mais solúvel
na fase aquosa ou na fase oleosa. Uma vez, porém, que essa diferença de solubilidade nas duas fases
não seja demasiadamente acentuada, a substância nunca será inteiramente adsorvida no interior de
uma delas c originará, por conseguinte, uma película disposta na interfase.
Se bem que a formação deste filme tivesse sido relacionada, desde há bastantes anos, com a
existência de grupos polares e apoiares numa determinada molécula, a verdade é que só em 1948
GRIFFIN introduziu a noção de Equilíbrio Hidrófilo-Lipófilo. abreviadamente designado por E.H.L.,
estabelecendo assim, e pela primeira vez, um sistema para classificar, numericamente, um composto
determinado segundo as suas características de hidrofilia e lipofilia.
Este conceito de E.H.L. preconizado por GRIFFIN baseia-se, como aliás já era anteriormente
admitido, no reconhecimento de que todas as substâncias tênsio-activas são constituídas por uma
parte hidrossolúvel e oulra lipossolúvel, dependendo a sua solubilidade final da proporção em que
elas estão associadas numa mesma molécula.
A originalidade do sistema de GRIFFIN reside, contudo, em traduzir as propriedades hidrófilas e
lipótllas em termos de uma escala numérica, segundo a qual são atribuídos às substâncias (ênsio-
activas valores de E.H.L. que vão de l a 50, aumentando estes à medida que a substância se torna
mais hidrófila.
Deste modo, a noção um tanto vaga que anteriormente andava associada à hidro ou
lipossolubilidade de um determinado composto passou a ser substituída por um critério mais
objectivo e preciso, no qual cada produto c assinalado por um número que automaticamente o inclui
num grupo especial, cujas aplicações práticas figuram na própria escala de GRIFFIN.
157

De facto, conforme se pode ver na referida escala, reproduzida na Fig. 96, as substâncias
de E.H.L. muito baixo, portanto acentuadamente lipófllas, são agentes anti--espuma. Aquelas cujo
valor de E.H.L. vai de 3 a 9, possuindo ainda características de lipofilia, constituem os agentes
emulsivos A/O, mas a partir de 8 os tênsio-activos começam a apresentar propriedades
hidrófilas, as quais se acentuam com a subida do respectivo valor de E.H.L.
Assim, o grupo de substâncias cujo E.H.L. vai desde 8 a 16
engloba os agentes emulsivos O/A, situando-se os agentes
solubilizantes na zona compreendida entre 16 e 18. Estes últimos utilizam-se
para obter dispersões muito perfeitas de óleos e essências em água c, 15
desde que se empregue uma grande quantidade de fase dispersante, em relação à Detergent
fase dispersa, o produto obtido comporta-sc como uma pseudo-solução. es
Apesar de os limites de valores de E.H.L. que na escala de 12 —
GRIFFIN definem as emulsões A/O e O/A serem um tanto dilatados, Agentes
acontece que cada emulsão em particular tem um valor de E.H.L. que se pode emulsiv
considerar específico para cada caso. Esle valor dependerá do óleo ou
9-
Agentes
óleos presentes, das respectivas proporções, c, ainda, da circunstância de o óleo
malhant
constituir a fase interna ou externa da emulsão, e representa, para cada fórmula, es
o valor de E.H.L. correspondente ao seu óptimo de estabilidade.
Uma vez que são conhecidos os valores de E.H.L. de vários óleos e de muitos Agentes
emulsiv
agcnles emulsivos e existem métodos para a sua determinação quando não os os
conheçamos, a preparação das emulsões deixou de ter o carácter
empírico de que se revestia até alguns anos atrás, passando, actualmente, a ser
Agentes
feita em bases racionais e bastante precisas. anti-
Na realidade, a escolha do agente emulsivo mais apropriado para o
cada emulsão fazia-se, antigamente, por tentativas, não havendo outro Fig. 96. Escala de Griffin
caminho a seguir que não fosse o de experimentar, sucessivamente, várias
substâncias, até se encontrar
uma que conduzisse aos resultados desejados. Actualmente, porém, graças ao sistema
desenvolvido por GRIFFIN, a selecção do agente emulsivo mais adequado para cada fórmula de
emulsão tornou-se mais simples e racional, obedecendo a considerações de ordem teórica.
Assim, estabelecida a premissa de que cada emulsão tem um valor de E.H.L. que lhe é
próprio e que corresponde, simultaneamente, ao seu máximo de estabilidade, o problema
resume-se cm determinar esse valor e utilizar, na sua preparação, um agente emulsivo cujo
E.H.L. se situe o mais próximo possível do da emulsão a preparar.
158

Muitas vezes, contudo, o cmulgente é constituído por uma mistura de duas ou mais
substâncias, não raro acontecendo que uma seja um agente emulsivo O/A e outra um agente
emulsivo A/O. Sc bem que tal facto possa ser tido. à primeira vista, como um absurdo, a verdade é
que esle procedimento se explica perfeitamente do ponto de vista teórico e se justifica pêlos
resultados práticos a que conduz. Na realidade, acontece que os valores de E.H.L. são aditivos e,
por isso, se associarmos o S pá n 80, que é lipófilo (E.H.L.=4,3}, com o Twcen 80, que c hidrófilo
(E.//.L.= 15). tal mistura pode originar uma emulsão O/A ou A/O, dependendo o tipo da emulsão
apenas da proporção relativa daqueles dois agentes emulsivos que nelas figurem.
O emprego de misturas de emulgentes será pormenorizadamente considerado ao tratarmos da
forma farmacêutica Emulsão na Farmácia Galénica. e então se verá como é possível combinar dois
agentes emulsivos, de modo a conseguir-se um determinado valor de E.H.L. para assim obtermos
uma preparação com o máximo de estabilidade.
Limitamo-nos, por agora, a citar o facto e explicá-lo do ponto de vista teórico, acrescentando
que do uso desta prática resultam emulsões muito mais estáveis, pois tais misturas de emulgentes
actuam de uma maneira complexa, podendo exercer uma ou várias das seguintes acções: originar um
equilíbrio hidrófilo-lipófilo mais perfeito; estabelecer uma película interfasial mais estável; dar à
emulsão uma consistência mais conveniente.
O uso simultâneo de emulgentes de tipo oposto tem sido estudado por alguns investigadores,
como. por exemplo, por SCHULMAN e COCKBAIN, os quais admitem que as vantagens resultantes de certas
associações derivam da circunstância de alguns agentes emulsivos serem capazes de formar entre si
complexos interfasiais à superfície dos glóbulos dispersos. Segundo aqueles autores, esses
complexos provocam a formação e contribuem para a estabilização de uma emulsão porque
diminuem a tensão superficial mais acenluadamcnte do que quando se emprega um só agente
emulsivo, além de originarem uma película compacta, mas flexível, na interfase.
Deve ter-se em consideração que nem todos os emulgentes possuem a capacidade de se
complexarem e originarem uma película espessa na interfase de uma emulsão. Assim, o oleato de
sódio c o colesterol, apesar de serem agentes emulsivos de tipo contrário, podem dar origem a tal
complexo, o mesmo acontecendo com a mistura colesterol e sulfato de cetilo e sódio, tornando-se
possível, com o emprego destas combinações, a obtenção de boas emulsões O/A. Já o mesmo não
acontece, porém, com as combinações sulfato de celilo e sódio-álcool oleico e álcool celílico-oleato
de sódio, porque, segundo SCHLLMAN e COCKBAIN, a primeira não origina uma película compacta na
interfase c a segunda, apesar de a formar, apresenta apenas um fraco grau de complexação entre os
seus componentes.
Por seu turno, SFRRAI.ACH, JU.NBS e OWEN. trabalhando com emulgentes diferentes dos utilizados por
SCHULMAN e COCKBAIN, propuseram outra hipótese para explicar o notável poder emulgente de uma
mistura constituída por goma adraganta, goma arábica
159

e gelose. Segundo eles, cada um dos componentes que formam este emulgcnte exerce uma acção
específica, do somatório das quais resultariam as suas boas propriedades emulsivas, devendo-se à
goma arábica uma rápida formação da película interfasial, cuja espessura seria reforçada pela
goma adraganta, contribuindo a gelose para aumentar a consistência da emulsão.
Demonstrada a vantagem da utilização de uma mistura de emulgentes na preparação das
emulsões, deve ter-se em conta, porém, que alguns agentes emulsivos são incompatíveis e não podem
ser associados na mesma fórmula. Pelas razões atrás expostas, é um facto que a combinação de
agentes lipófilos e hidrófilos que, separadamente, conduzem a tipos opostos de emulsão, é
perfeitamente justificável e não resulta em qualquer incompatibilidade, pois o objectivo de tal
associação obedece à obtenção de um determinado valor de E.H.L. Acontece, no entanto, que certos
agentes emulsivos do mesmo tipo podem ser incompatíveis entre si, como, por exemplo, as
substâncias de natureza coloidal possuindo carga eléctrica de sinal contrário, que, uma vez
misturadas, coagulam. Também os agentes catiónicos e aniónicos, apesar de ambos favorecerem a
formação de emulsões O/A, não devem ser utilizados juntamente porque reagem entre si, anulando-
se, assim, as suas propriedades emulsivas.

5.3.4.2. Classificação dos agentes emulsivos

Dentre as várias classificações que têm sido propostas para os agentes emulsivos, a seguida
por MARTIN na obra American Pharmacy é a que nos parece mais lógica, e, por isso, resolvemos
adoptá-la igualmente.
Segundo o referido autor, os diversos emulgentes podem e devem diferenciar-se em dois grupos
principais: os agentes emulsivos verdadeiros ou primários e os estabi-lizanles, agentes emulsivos
auxiliares ou secundários. Tal distinção é perfeitamente admissível, pois os agentes emulsivos
primários são todos aqueles que actuam sobre a tensão superficial e são, por isso, os únicos que,
simultaneamente, facilitam a obtenção de uma emulsão e promovem a sua estabilização, ao passo
que os agentes secundários, porque são dotados de fracas propriedades emulsionantes, quando
utilizados separadamente, apenas se limitam a concorrer para aumentar a estabilidade do produto
por aumento da viscosidade da fase externa, uma vez associados a um agente primário.
Os agentes emulsivos primários podem dividir-se ainda em agentes de origem natural c agentes
sintéticos, sendo de considerar, nesta última classe, os agentes aniónicos, catiónicos, anfólitos e não
iónicos, conforme a sua actividade emulgente depende da porção aniónica, catiónica ou de ambas,
ou ainda de ioda a molécula. Nas Tabelas XI, XII e XÏIÍ indicamos alguns dos principais agentes
emulsivos pertencentes aos vários tipos acabados de mencionar.
160

Tabela XI. Agentes emulsivos sintéticos f)

Ase c natureza química /:. //. L.


An tónicos
Dioctilsulfossuccinalo de sódio
Monoestearato de glicerilo (Tegin) * a ...................................................... 5,5
Olealo de trietanolamina ................................................................................ 12
» » sódio.............................................................................................. IS
» » potássio ....................................................................................... 20
Sulfato de laurilo e sódio ............................................................................ 40 (aprox.)

Catiónicos
Brometo de cetiltrimelilamónio Etossulfato
de N-cetil-N-etilmortblínio
(Atlas G-263) h ........................................................................................ 25-30
Cloreto de benzaleónio (cloreto de zefiran) í- ............................................ 25-30
Cloreto de laurildimeiilben/ilamónio

Anfólitos
Trietanolaminalaurilalanina

Não
Monoleaío de sorbitano {Span 80) b .......................................................... 4,3
Monolaurato de sorbitano (Span 20) b ........................................................ 8,6
Monoestearaio de polioxietileno (Mirj 45) b .............................................. 11.1
Monolaurato de polioxietileno (Atlas G-2127) b ........................................ 12. X
Monoleato de polioxietileno sorbitano (Tween 80) b ................................ 15,0
Monolaurato de polioxietileno sorbitano (Tween 20) b ............................ 16.7
Monolaurato de polictilenoglicol 400 d ...................................................... 13.1

(') Segundo Martin. Emiihions. in American Pharmeicy.


* O Tegin é uma mistura de monocstearato de glicerilo c sabão c daí a sua inclusão nos
ajicntfs aniónicos.
n Goldschmidi Chemicul Corpuraiion, New York. N. Y.
b Alias P»wder Company, Wilmington, Del.
c Winthrop-Stcarns, Inc.. New York. N. Y'.
d Kcssler Chemical Co., Pniladelphia. Pa.

Tabela XII. Agentes emulsivos naturais


Nome Ongcm f (YWJ/7fAs;'^<m V //?^ í /f f
WH/.«
Colesterol Estcml encontrado na lanolina c em tecidos animais A/O
Extracto de malte Proteínas, dextrina O/A
Gelatina Po 1 i pé pt i d os, aminoícidos O/A
Gema de ovo Lecitina, colesterol, proteínas O/A
Goma arábica Sais de potássio, cálcio e magnésio do ácido arábico O/A
Lanolina Mistura complexa de álcoois e ácidos gordos da lã de carneiro A/O
Lecitina Foslblípidos da gem» de ovo e do tecido nervoso O/A
Saponinas Glucósidos não azotados das raízes de q u il a ia e de sé nega O/A

('] Segundo Mailin, loc. t i!.


161

Tabela XIII. Agentes emulsivos auxiliares f)

Produto Origem e composição Uso principal


Ácido esteárico Mistura de ácidos sólidos obtida Agente espessante 'ipófilo e
das gorduras e constituída por eslabilizantc para emulsões O/A.
ácidos esteário e palmítico Combinado com um álcali forma
um verdadeiro agente emulsivo
Agente espessante lipófilo e
Álcool cetílieo Álcool Principalmente C1(iH,,OH estabilizante das emulsões O/A
Idem
estearílico Alginato de Principalmente const. p o r
CITH,,OH Sal de sódio do ácido Agente espessante hidrófilo e
sódio Bentonite algínicn estabilizanle das emulsões O/A
extraído de certas algas Silicato Agente espessante hidrófilo e
de alumínio coloidal estabilizante para emulsões O/A e
Carboximetilcelulose hidratado A/0
Agente espessante hidrófilo e
Espermacete Sal sódico de ésteres carboxi- estabilizante das emulsões O/A
metílicos da celulose Cera obtida Agente espessante lipófilo e
da cabeça do cacha- estabilizante para as emulsões
lote, contendo palmilalo de O/A. Por reacção com álcalis
cetilo forma um verdadeiro agenle
Gele de sílica emulsivo
Estabilizante hidrófilo na prepa-
Gelose Sílica hidratada ração de pomadas
Agente hidrófilo espessante e
Substância retirada de certas estabilizante de emulsões O/A
algas, contendo um poli--holósído
Goma adraganta sulfatado e outros componentes
Produto de exsudação de espécies Agente hidrófilo espessante e estabi
de Astragalus, contendo uma parte l i zante da s emulsões
solúvel e outra insolúvel que O/A; emulgente O/A fraco
Hidróxido de magnésio incha na água
Mg(OH), Eslabílizante hidrófilo das emulsões
Metilcelulose O/A
Mistura de ésteres metílicos tia Agente hidrófilo espessante e es-
celulose tabilizanle das emulsões O/A.
Fraco agente emulsivo O/A
Agente lipófilo espessante e
Reclina
Monoestearato de glicerilo C1THMCOO.CHI.CHOH.CHIOH estabilizante para loções e
pomadas O/A
Agente hidrófilo espessante e es-
Hidrato de carbono purificado tabilizante das emulsões O/A.
extraído de vários frutos Fraco agente emulsivo O/A

(') Segundo Martin. Inc. i~if.


162

5.3.5. PREPARAÇÃO DE EMULSÕES

A preparação de emulsões está dependente da intervenção de um factor mecânico, o qual tem


por f i m dividir em pequenos glóbulos o líquido que há-de constituir a fase dispersa. Como já atrás
tivemos ocasião de referir, esta acção mecânica deve ser completada com a presença de um agente
emulsivo que actua com a dupla finalidade de facilitar a dispersão e formar uma película disposta à
volta das gotículas dispersas, evitando, assim, a sua rápida coalescência.
Deste modo, podemos dizer que a obtenção de uma emulsão envolve sempre a agitação dos dois
líquidos a emulsionar depois de previamente adicionados de um ou vários cmulgentes, podendo tal
agitação ser feita manualmente ou utilizando processos mecânicos.

5.3.5.1. Agitação manual

A agitação manual representa o método mais simples para a obtenção de emulsões, sendo
aquele que geralmente se utiliza na oficina farmacêutica onde estas fórmulas se preparam em
pequenas quantidades e se destinam, invariavelmente, a serem consumidas em curto prazo de tempo.
Assim, pode obter-se facilmente uma emulsão agitando os líquidos e o agente emulsivo num
recipiente que se enche parcialmente, como um frasco ou um balão rolhados. É da maior importância
que o vaso a utilizar nesta operação tenha uma capacidade tal que nunca fique cheio com a mistura a
emulsionar, pois é absolutamente necessário que haja espaço suficiente para que o líquido que irá
formar a fase dispersa possa esparrinhar livremente e se fraccione em pequenas gotas. Além disso,
tem-se verificado que em muitos casos é mais vantajoso agitar a mistura intermitentemente, alterando
a agitação com períodos de repouso. De facto, durante a agitação ambos os líquidos são mais ou
menos divididos em glóbulos e, assim, durante o repouso, aqueles provenientes do líquido que há-de
constituir a fase externa da emulsão final, que, por definição, é contínua, reunir-se-ão uns aos outros,
enquanto os glóbulos da fase dispersa vão sendo envolvidos por uma película do agente emulsivo.
Aliás, está verificado que uma agitação demasiado forte ou prolongada pode aumentar o tamanho
dos glóbulos dispersos c isso só prejudica a estabilidade de uma emulsão,
O outro processo de agitação manual consiste em utilizar um almofariz, triturando a mistura a
emulsionar com o respectivo pilão, o que provocará o fraccionamento da fase dispersa na fase
externa. Deve usar-sc, de preferência, um almofariz de porcelana, de fundo não muito abaulado, ou,
melhor ainda, um almofariz de fundo plano e paredes verticais, tendo um pilão cilíndrico, conforme
foi proposto por COOPER ('), estando

(') Tal modelo de almofariz permite uma maior superfície de contado em relação à obtida no
tipo convencional, daí resultando uma mais fácil e completa mistura de sólidos ou emulsificação de
líquidos (J. Am, Pharm. Assoe... Prat. Edkion. 10, 420 1949).
163

contra-indicada a utilização de almofarizes c pilões de vidro, pois estes não oferecem o alrilo
suficiente paia originarem a divisão da fase interna cm glóbulos de reduzidas dimensões.

5.3.5.2. Agitação mecânica

A agitação mecânica c o processo geralmente utilizado sempre que se trate de preparar


quantidades razoáveis destes produtos, mas, como os agitadores existentes se adaptam a todas as
condições de trabalho, é frequente recorrer-se a este tipo de agitação na preparação de pequenas
quantidades de uma emulsão nos laboratórios farmacêuticos.
Tais aparelhos vão desde o batedor de
claras de ovo, accionado manualmente, até aos
misturadores e batedores eléctricos de uso
doméstico, providos de pás dos mais variados
feitios, girando a velocidades controláveis
(Fig. 97). Como no caso da agitação manual,
também aqui é de considerar o grau de
agitação a que é submetida a mistura, pois dele
depende muito o aspecto do produto acabado, não sendo raro que
uma agitação prolongada provoque o aumenlo do diâmetro das partículas dispersas,
acontecendo, por vezes, dar-se a separação das fases.
Na produção de emulsões em grande escala utiliza-se equipamento
mecânico variado, incluindo misturadores c agitadores, moinhos coloidais c homogenei-

zadores. Fig. 97. Misturadores e agitadores eléctricos


Os misluradores c agitadores apresentam-se usados na preparação de emulsões
sob os mais variados modelos, diferindo, principalmente, no desenho das pás. Basicamente, são
constituídos por um recipiente metálico, muitas vezes envolvido por uma dupla parede, que permite
o aquecimento ou o arrefecimento da mistura a emulsionar, e um agitador rociando a velocidades
muito variáveis, que podem ir desde 200 a 3000 rotações por minuto. Tais aparelhos têm o
inconveniente de promoverem a incorporação de ar cm maior ou menor quantidade nas emulsões
neles preparadas, comunicando-lhes, por isso, um aspecto caseoso, além de que o ar pode oxidar
produtos que figurem tia sua composição. l'or vezes, pode acontecer, ainda, que as emulsões
preparadas nestes misturadorcs apresen-
164

tem fraca estabilidade, pois, se a quantidade de ar incorporada for considerável, pode suceder que o
agente emulsivo se disponha, preferentemente, na interfase ar/água e não na interfase dos dois
líquidos a emulsionar, ocasionando uma precipitação irreversível, designada por desnaturação, que
ocorre, sobretudo, quando se utilizam prolemas como emul gentes.

5.3.5.2.1. Moinhos coloidais

Os moinhos coloidais constituem um tipo de maquinaria muito útil na preparação das


emulsões. Existem dois tipos distintos: os moinhos de superfícies lisas e de superfícies rugosas. Em
qualquer dos casos um moinho coloídal é constituído por duas peças principais, sendo uma — o
rotor — móvel e podendo girar a velocidades compreendidas entre 1000 a 20 TOO r.p.m., ao passo
que o esiator é tlxo. A distânca entre as duas peças é igual em toda a superfície c pode ser regulável
até 0.025 mm.
Nos moinhos de superfícies lisas
o rotor e o estator podem ter a
forma de discos, cones ou
cilindros, sendo estas peças nos
moinhos de superfícies rugosas, em
geral, de forma discóide e
apresentando sulcos dispostos
radialmente.
Estes aparelhos (Fig. 98 A e B)
podem receber as duas fases da
emulsão simultaneamente e servirem,
portanto, para a sua preparação
propriamente dita ou utilizam-se,
Fig. 98. Moinho coloidal. A, vista de face; B. secção vertical muitas ve?,es, para
tratarem emulsões grosseiras,
actuando, então, como homogeneizadores. A emulsão é introduzida por um funil na parte superior do
aparelho (£'), indo cair no rotor (B), e, devido à força centrífuga gerada pela alta velocidade de
rotação daquele, é lançada contra o estator (A), sendo assim esmagados c fraccionados os glóbulos
da fase dispersa. O produto homogeneizado passa, depois, através da estreita fenda G, situada entre
o rotor e o estator. saindo do aparelho pelas aberturas /•/, e //,.

5.3.5.2.2. Homogeneizadores

A indústria fornece máquinas especialmente criadas para aumentarem c uniformizarem o grau


de divisão das partículas da fase dispersa, as quais são designadas por homogeneizadores. Na
realidade, acontece que as emulsões, quer sejam preparadas
165

manual ou mecanicamente, contêm sempre glóbulos cujas dimensões estau longe de serem
uniformes, e a função deste tipo de maquinaria é a de fragmentar os glóbulos maiores, concorrendo,
assim, para reduzir os limites entre que variam os diâmetros das gotículas da fase dispersa, oblendo-
se, com o seu emprego, uma dispersão mais homogénea, a qual se traduz na obtenção de
emulsões mais estáveis e de melhor aspecto.
Estes aparelhos representam um dos elementos mais
importantes do equipamenio mecânico utilizado na
preparação das emulsões, reproduzindo-se na Fig. 99 um
pequeno modelo de homogeneizador operado
manualmente, o qual, pelas suas reduzidas dimensões e baixo
preço, está indicado para o trabalho de um pequeno laboratório ar
de farmácia. A emulsão é preparada por agitação num frasco ou Fig.
99.
num almofariz e colocada, depois, no Homogeneizador manual
recipiente do aparelho (Fig. 99). O accionamento da alavanca
provoca a aspiração do produto a homogeneizar para o interior do aparelho e a sua passagem, sob
pressão,
através de uma placa perfurada ou de uma válvula
de abertura muito estreita, de que resulta o
fraccionamento da fase dispersa em fragmentos de
tamanho uniforme e sempre de reduzidas
dimensões, em geral inferiores a 2,5 \i.
A homogeneização de emulsões preparadas
em larga escala obriga ao emprego de aparelhos
accionados por motores eléctricos. O princípio
sobre que se fundam tais aparelhos é o de obrigar
uma emulsão grosseiramente preparada a atra-
vessar uma estreitíssima válvula, submetendo-se o
produto a elevadas pressões. Em resultado desta
acção mecânica dá-se o fraccionamento de todos os
glóbulos cujas dimensões sejam superiores ao
orifício de saída da válvula, obtendo-se, deste
modo, uma relativa uniformidade nas dimensões
dos glóbulos.
C
omo se tivesse observado que uma
Fig. 100. Homogeneizador de dois andares única homogeneização,
166

moldes atrás descritos, apesar de inicialmente originar partículas de reduzidas dimensões, originava
a obtenção de emulsões com flóculos e formando creme com facilidade, prefere-se, actualmente,
utilizar aparelhos que façam a homogeneização em fases.
De facto, quando as emulsões, especialmente aquelas que contêm proteínas, são forçadas a
passar, sob elevada pressão, através de um orifício estreito, acontece que os glóbulos tendem a
aglomerar-se e originar grumos. Se o produto passar, depois, através de uma segunda válvula sob o
efeito de uma pressão bastante menor que a anteriormente aplicada, os glóbulos ficam perfeitamente
dispersos. Esta é a razão da preferência dada aos aparelhos que fazem uma dupla homogeneização
(Fig. 100), a primeira das quais é realizada forçando a emulsão através de uma válvula sob uma
pressão de 180 a 260 kg.ctrr2, logo seguida de outra, feita numa segunda câmara do
homogeneizador, mas agora sob uma pressão de 36 a 68 kg.cnr2.
A homogeneização representa sempre uma maneira de beneficiar uma emulsão, pois, reduzindo
o diâmetro médio das partículas dispersas, contribui para a maior estabilidade do produto pelas
razões que adiante se discutem. Entretanto, poderá acontecer que a homogeneização produza um
efeito contrário, isto é, apresse a separação das fases quando o produto a homogeneizar não
contenha um excesso de agente emulsivo suficiente para acompanhar o aumento da área da fase
dispersa resultante do fraccionamento dos glóbulos provocado pela homogeneização.

5.3.6. ESTABILIDADE DAS EMULSÕES

Qualquer que seja a finalidade a que se destine uma emulsão, esta deve manter--se estável
durante um prazo mais ou menos longo.
Todavia, apesar dos cuidados postos na execução de uma fórmula destas, acontece, por vezes,
que ela se altera algum tempo após a sua preparação. Excluindo as alterações de ordem microbiana,
que não inleressa considerar neste momento, podemos agrupar em três categorias essas alterações:
1) floculação c formação de creme; 2) coalescência e separação das fases; 3) alterações físicas e
químicas diversas.
Dado que a ocorrência de qualquer destes fenómenos modifica mais ou menos profundamente a
estabilidade das emulsões, vamos tratá-los com certo pormenor, pois é do maior interesse que o
farmacêutico os conheça e saiba como evitá-los ou corrigi-los, de modo a estar apto a preparar
fórmulas que satisfaçam plenamente ao fim a que se destinam.

5.3.6.1. Floculação e formação de creme

A floculação consiste na reunião de vários glóbulos da fase dispersa em agregados ou flóculos,


os quais, devido às suas maiores dimensões, sedimentam ou sobem à superfície da emulsão mais
rapidamente que as partículas dispersas consideradas individualmente.
167

Cronologicamente, a primeira fase da alteração corresponde ao aparecimento dos


mencionados flóculos e só depois se observa a formação de creme, ou seja, a agregação dos flóculos
previamente originados, os quais passam a constituir uma camada disposta à superfície ou no íundo
da emulsão.
Do ponto de vista farmacêutico, a formação desta camada concentrada de glóbulos da fase
dispersa é absolutamente reprovável, pois as emulsões em que se tenha registado o seu aparecimento
perdem o aspecto homogéneo que normalmente as caracteriza. Desse facto resulta uma má
aparência do produto e, o que é mais grave, a possibilidade de certas substâncias medicamentosas se
concentrarem na referida camada, sendo de admitir que, em tal circunstância, uma fracção do
medicamento contenha a totalidade ou quase totalidade de alguns princípios que nele figurem.
Deste modo, se uma emulsão em que tenha ocorrido esta alteração se destina a ser
administrada em várias porções, o doente corre o risco de, numa delas, ingerir uma quantidade
excessiva de certos fármacos desde que a medição de cada dose não seja precedida de uma agitação
conveniente.
Em face disto, é da maior importância conhecer os factores que influenciam a formação de
creme numa emulsão, de modo a poder-se intervir para criar as condições que impeçam a sua
ocorrência ou a reduzam ao mínimo, para o que basta recordar a fórmula que traduz a lei de
STOKES:

V= 9r\

em que V é a velocidade de sedimentação das partículas dispersas, r o seu raio, úf, a densidade da
fase dispersa, d2 a densidade da fase dispersante, g a aceleração da gravidade e T) a viscosidade da
fase dispersante.
De acordo com esta lei, e como facilmente se pode concluir, quando as densidades da fase
dispersa e dispersante forem iguais, a velocidade de sedimentação dos glóbulos será igual a zero
(uma vez que o numerador da fracção é ?,ero) e, portanto, não haverá formação de creme. Quando,
porém, essas densidades são diferentes, o que geralmente acontece na prática, dois casos podem
verificar-se. Nas emulsões O/A, a densidade da fase dispersa (í/,) é inferior à da fase dispersante
(rf). Nestas circunstâncias, a diferença (d}-d2) é negativa e, portanto, V é também negativa. Isto
significa que a formação do creme se dará à superfície da emulsão. Contrariamente, nas emulsões
A/O em que a densidade da fase dispersa é superior à da fase dispersante, o valor de (d}-d2) é
positivo e a velocidade adquire, pois, valor positivo, querendo isto dizer que o creme se junla na
parte ' inferior da emulsão. Esta diferença de densidades das duas fases pode ser atenuada até certo
ponto, havendo autores que recomendam, por exemplo, que se aumente a densidade da fase oleosa
dissolvendo nela certos compostos, como o ot-bro-monaftaleno, bromofórmio e tetracloreto de
carbono, os quais, porém, não podem ser utilizados em emulsões medicinais. Quando se trate de
preparações farmacêuticas,
168

MILLLXS e BKCKHR ajustam a densidade da fase oleosa pela adição de uni óleo comestível bromado.
Por outro lado, a equação de STOKLS indica que a velocidade de separação dos glóbulos da
fase dispersa é proporcional ao quadrado do respectivo raio, havendo, por isso, toda a conveniência
em que as partículas da fase interna apresentem as menores dimensões possíveis. H este o motivo por
que a homogeneização é um dos passos mais importantes na preparação das emulsões, pois que,
fraccionando os glóbulos maiores cm partículas de tamanho diminuto, contribui, decisivamente, para
a maior estabilidade destas formas farmacêuticas.
Um exemplo dado por MARTIN mostra bem a influência do tamanho dos glóbulos na respectiva
velocidade de separação. Assim, consideremos o caso de uma emulsão O/A contendo óleo mineral, de
densidade í/^0,90, disperso numa fase aquosa, de densidade d. = 1,05. Se as partículas dispersas
tiverem um diâmetro médio de 5 (i e a viscosidade da fase externa for igual a 0,5 poise, a velocidade
de ascenção da camada olesosa será:

2 x (25 x lO-^x (0,9 - 1,05) x 981


——-———— = 4,1 x 10 h cm.s '

9 x 0.5 Como o dia tem 86 400 s, o

ritmo ascensional diário é

V = 4,1 x 10 b cm.s'1 x S6 400 cm.dia '

ou seja, aproximadamente, 0,36 cm por dia. Basta, porém, que o diâmelro das partículas seja igual a l ji
para que a velocidade baixe para 0,014 cm por dia, de modo que a uma diminuição de 1/5 nas
dimensões dos glóbulos corresponde uma diminuição da velocidade de separação igual a acerca
de 26 vezes o valor inicial, o que demonstra, de modo insofismável, a influência do tamanho do
raio das partículas no ritmo da formação de creme nas emulsões. Deve acrescentar-se que sempre
que o diârnerro das partículas é inferior a 5 |i os movimentos brownianos a que aquelas estão
sujeitas concorrem para impedir a sua reunião em aglomerados, o que fa/ d i mi n u i r ainda mais a
respectiva velocidade de separação.
Entretanto, deve desde já ficar bem claro que estabilizar emulsões à custa da diminuição do
raio das partículas dispersas tem, por vezes, inconvenientes graves. De facto, a biodisponibilidade
destas preparações está relacionada com o tamanho tias partículas, o que pode ter tal influência que
urna emulsão para uso tópico acabe por ser absorvida sistemicamente ou, pelo contrário, um
preparado que se pretende para uma acção geral se quede no local de aplicação.
A formula de Stokes também relaciona a velocidade de separação das partículas da fase
dispersa com a viscosidade da fase externa, tornando-se aquela tanto menor quanto maior for esta
última. B por tal motivo que se adicionam às emulsões, frequentemente.
169

várias substâncias, designadas por agentes emulsivos secundários, cuja função é a de aumentar a
viscosidade da fase externa, contribuindo, assim, para retardar o aparecimento de creme.
Tal prática encontra-se bastante generalizada, indicando-se na Tabela XIII (pág. 161) os
produtos usualmente empregados como agentes espessantes. A sua utilização impõe, no entanto, a
observância de certas precauções, pois poderá acontecer que um determinado agente flocule por
acção de algum dos constituintes da emulsão e, se isso se verificar, obter-se-á um efeito contrário ao
pretendido.
A força da gravidade não é de considerar, em condições normais, na estabilidade das emulsões,
dada a sua constância. No entanto, ela pode ser aumentada pela acção da força centrífuga e este
fenómeno constitui a base dos métodos geralmente utilizados para a formação de creme, pois em tais
circunstâncias a velocidade de separação das partículas dispersas aumenta de modo bastante
significativo. Alguns processos de quebra de emulsões, como, por exemplo, a preparação da
manteiga a partir do leite, fundamentam-se no emprego da força centrífuga.
Esta alteração das emulsões a que nos temos vindo a referir não apresenta uma modificação
irremediável, porquanto é possível recompor-se o sistema disperso inicial. De facto, admite-se que
no estado de creme as partículas que se aglomeraram, de modo a constituírem uma emulsão
concentrada, ainda estão rodeadas por uma película de emulgente, podendo, por conseguinte, serem
novamente dispersas por simples agitação.

5.3.6.2. Coalescência e separação das fases

Este tipo de alteração é muito mais profundo que o anterior, pois trata-se de um processo
irreversível e, como tal, uma vez registado não mais permite a recomposição da emulsão.
No caso presente dá-se a coalescência ou reagrupamento dos glóbulos da fase dispersa e a
breve trecho a emulsão desfaz-se, significando isto que as suas fases se separam completamente, de
modo a formarem duas camadas distintas.
Quando tal acontece, uma nova agitação é incapaz de tornar a dispersar as fases uma na outra,
o que só é possível obter-se se adicionarmos à mistura mais agente emulsivo. Este comportamento
parece sugerir que a coalescência dos glóbulos está directamente relacionada com o agente
emulsivo, admitindo-se hoje que o ritmo da coalescência depende, além de outros factores, muito
principalmente das características físicas da película formada pelo emulgente à volta dos glóbulos
dispersos. Se aquele é absorvido na interfase e se mostra capaz de formar uma película rígida e
compacta à volta dos glóbulos, comportando-se como se se tratasse de uma autêntica barreira, é
evidente que as partículas dispersas ficam envolvidas por uma parede que impede a sua junção.
Compreende-se, portanto, que a estabilidade de uma emulsão seja considerada, em grande parte,
como dependente do agente emulsivo utilizado na sua preparação, pois
170

a coalescência da fase dispersa será tanto mais retardada quanto mais eficaz for a película
interfasial que o emulgente origine.
Na realidade, SERRALACH, JONES e OWEN verificaram que um bom emulgente se caracleriza por
fazer baixar a tensão interfasial, de modo a originar glóbulos de dimensões reduzidas e uniformes e
ser capaz de formar, rapidamente, uma película que impeça o reagrupamento das partículas da fase
dispersa, dependendo a estabilidade da emulsão da circunstância de a película de emulgente se ir
tornando mais forte à medida que o tempo passa.
Por outro lado, se bem que o tamanho das partículas dispersas tenha uma influência decisiva
na velocidade de separação da fase dispersa, e o exemplo atrás citado é prova disso, KING chama a
atenção para a circunstância de que nem sempre da redução das dimensões das partículas dispersas
resulta uma maior estabilidade do sistema. Segundo aquele autor, a uniformidade do tamanho das
partículas constitui um elemento muito importante na estabilidade, pois se existirem partículas muito
pequenas, a par de outras de maior tamanho, acontece que aquelas se aglomeram entre estas
últimas, do que resulta uma coesão mais forte c, portanto, mais rápida coalescência da fase interna.

5.3.6.3. Relação entre o volume das fases

A relação entre o volume das fases, isto é, os volumes relativos de água e de óleo que figurem
numa emulsão pode, igualmente, exercer uma certa influência na estabilidade da preparação. De
facto, OSTWALD e outros mostraram que, se se tenlar incorporar mais de 74% de óleo numa emulsão
do tipo O/A, os glóbulos de óleo coalescem na maioria das vezes, desfazendo-se a emulsão. Este
valor, denominado ponto crítico, representa a concentração da fase interna para além da qual um
agente emulsivo é incapaz de originar uma emulsão eslável do tipo pretendido.
Acontece, no entanto, ser possível obterem-se emulsões estáveis cm que a fase interna é
superior a 74% do total da emulsão, mas tal facto deve-se à circunstância de nesses casos as
partículas dispersas se apresentarem com formas e dimensões irregulares, só assim se
compreendendo o aumento do ponto crítico, pois este, como é sabido, foi calculado partindo da
premissa de que todos os glóbulos dispersos são esféricos.
De um modo geral, as emulsões mais estáveis correspondem a uma relação do volume das fases
de 1:1, podendo dizer-se que a maioria destas preparações respeita tal regra, aliás descoberta
empiricamente há já muitos anos pêlos primeiros preparadores de emulsões.

5.3.6.4. Inversão das fases

Também a inversão das fases pode representar um papel importante na estabilidade das
emulsões, entendendo-se por tal fenómeno a transformação de uma emulsão O/A em outra A/O, ou
vice-versa. Do ponto de vista prático, a inversão das fases tanto pode
171

traduzir-se num prejuízo como num benefício, dependendo isso do facto de ocorrer ocasionalmente
ou ser provocada intencionalmente e com determinados fins.
Assim, por exemplo, se tivermos uma emulsão O/A estabilizada com um sabão de sódio,
podemos invertê-la numa outra do tipo A/O, por adição de cloreto de cálcio, pois nestas condições o
emulgente passará a ser um sabão de um metal bivalenle,
O mesmo fenómeno de inversão poderá ser provocado alterando a relação do volume das fases.
Suponhamos que se pretendia obter uma emulsão O/A e que misturávamos um emulgente hidrófilo
com o óleo e uma pequena quantidade de água. Uma vez que o volume de água seja pequeno em
relação ao do óleo, a agitação provocará, forçosamente, a dispersão da água no óleo, apesar de o
agente emulsivo originar, normalmente, a formação de um sistema contrário. À medida, porém, que a
primeira emulsão vai sendo gradualmente diluída com água, chega-se a um momento em que o ponto
de inversão é atingido, c desde aí a emulsão passa a ser do tipo O/A. B este, aliás, o princípio do
Método Continental utilizado na preparação de muitas emulsões farmacêuticas, e que estudaremos
na Farmácia Galénica.

BIBLIOGRAFIA

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Bibliografia Farmacêutica do Inslisuto
Pasleur de Lisboa, Vol. II, n." 24, 1954.
172
173

Operações físicas exigindo a intervenção do frio ou do calor

Estas operações distinguem-se das anteriormente estudadas por modificarem de forma


transitória ou permanente o estado físico dos corpos a elas submetidos, sem, contudo, alterarem a
sua composição química. Tais operações executam-se sobre corpos sólidos, líquidos e gasosos,
exigindo a intervenção do frio ou do calor. São elas:

1. Refrigeração.
2. Evaporação.
3. Secagem e Exsicação.
4. Liotïlização.
5. Sublimação.
6. Torrefacção.
7. Carbonização.
8. Calcinação.
9. Cristalização.
10. Fusão.
11. Destilação.

6.1. REFRIGERAÇÃO

6.1.1. GENERALIDADES

A refrigeração é uma operação que tem por fim baixar a temperatura de um corpo, podendo o
grau de arrefecimento conseguido ser mais ou menos acentuado e estando dependente, como é
intuitivo, do processo utilizado.
A refrigeração e largamente empregada na técnica laboratorial para arrefecer misturas
reagentes exotérmicas, para promover a condensação de vapores, para aumentar a solubilidade dos
gases na água e na liofilização ou secagem pelo frio. Desempenha,
174

ainda, um papel da maior importância na conservação dos alimentos c de muitos medicamentos


constituídos por substâncias de origem biológica, evitando a sua alteração pelo calor ou por agentes
microbianos.

6.1.2. MÉTODOS DE REFRIGERAÇÃO

São bastante variáveis os processos utilizados na prática para refrigerar, convenientemente,


um determinado corpo, podendo recorrer-se, para isso, à água e ao ar, ao uso de gelo e misturas
frigoríficas, à evaporação de um líquido de baixo ponto de ebulição, etc.
Vejamos em que consistem lais métodos.

6.1.2.1. Refrigeração por aumento do calor sensível do refrigerante

Qualquer subslância pode absorver calor de uma outra, tendo uma Icmperatura mais elevada,
e actuar, assim, como agente refrigerante. Como o calor transferido do corpo mais quente para o
mais frio aumenta a temperatura ou calor sensível deste último, daí nasceu a designação por que este
processo de arrefecimento é conhecido.
A água constitui o agente mais ulili/ado para fazer uma refrigeração por aumento do calor
sensível do refrigerante, pois, além de ser um produto barato e facilmente obtenível, tem ainda a
vantagem de possuir um elevado calor específico.
O ar também é usado, se bem que mais limitadamente, como agente refrigerante nesta técnica
de refrigeração, pois c menos eficiente que a água, dado que o seu calor específico é mais baixo e,
por consequência, possui um menor coeficiente de transferência de calor. A sua utilização está, por
isso, restrita aos casos em que a quantidade de calor a transferir é pequena ou quando apenas se
exige uma refrigeração lenta.
A refrigeração de corpos sólidos ou líquidos pela técnica em discussão faz-se colocando-os em
recipientes apropriados e mergulhando-os em água fria ou fazendo circular esta em serpentinas
adaptadas à volta do recipiente contendo o corpo a arrefecer. Quando a refrigeração se faz
imergindo o corpo a arrefecer na água, torna-se necessário promover a sua renovação, pois se não
se proceder assim acontece que ao fim de certo tempo estabelece-se um equilíbrio térmico entre
aquela e a subslância que se pretende arrefecer, deixando, então, de haver transferência de calor
entre ambas.
A principal aplicação laboratorial do arrefecimento pela água consiste na condensação de
vapores, obtida à custa de aparelhos especiais denominados refrigerantes ou condensadores de
refluxo. Estes são constituídos por um tubo interno, que pode apresentar forma variável, o qual está
rodeado por uma manga de vidro, onde circula a água refrigerante. Esta entra pela parte mais
próxima dos vapores a condensar e sai pela
175

parte mais distante desta, de modo que o tubo interior, ao qual tem acesso o vapor, está sempre
envolvido por uma camada de água fria, constantemente renovada.
Para que os refrigerantes actuem eficazmente é necessário que possuam duas características
fundamentais: uma rápida circulação da água. que permita a sua renovação a um ritmo acelerado, e
uma boa superfície de condensação.
Nos condensadores ditos tipo LIEBIG, que representam apenas ligeiras modificações do modelo
original devido àquele célebre químico alemão, as condições atrás referidas estão longe de se
verificarem. Na realidade, a água circula lentamente na manga envolvente do tubo de condensação e
por esse motivo os coeficientes de transferência de calor entre aquela e o referido tubo são baixos.
Tal facto, aliado ao diminuto comprimento do aparelho, torna estes refrigerantes pouco eficientes.
Em face disso, apareceram depois novos modelos de condensadores, nos quais se procurou
remediar os inconvenientes apontados ao refrigerante de LIBBIG, lendo-se construído aparelhos em que
a velocidade de circulação da água é maior e em que a superfície oferecida à condensação dos
vapores foi aumentada de modo acentuado.
Assim, no condensador de West
(Fig. 101S) conseguiu-se uma acção
refrigerante mais eficaz pelo simples
facto de se ter diminuído a distância
que vai da manga ao tubo interior.
Deste modo obteve-se urna cir-
culação mais rápida da água,
resultando disso que neste tipo de
aparelho é maior o volume de
água fria que nele circula por
unidade de tempo, o que se traduz,
como é lógico, por uma maior Fig. 101. Diversos tipos de refrigerantes; A, Refrigerante tipo Liebig; B,
capacidade de refrigeração. de West; C, de serpentina; D. condensador de bolas (Allihn)

Entretanto, as modificações introduzidas nos condensadores tem incidido, principalmente, na


forma do tubo de condensação e todas elas têm sido orientadas no sentido de lhe aumentar a
respectiva superfície.
Assim é que surgiram o condensador de serpentina ou de GRAMAM e de bolas ou de ALLIHN. Este
último, extraordinariamente eficaz, só pode ser utilizado em posição vertical, pois de outro modo
a parte inferior das bolas cncher-se-á com o produto condensado, perdendo-se, mercê disso, a
sua eficiência. Isso já não acontece, entretanto, com o refrigerante de ALLIHN-KRONBITTER, o qual pode
ser montado em posição inclinada, pois neste aparelho uma das faces do tubo interno não
apresenta concavidades (Fig. 102).
176

Tornando-se impossível referir-nos aqui a Iodos os modelos de condensadores existentes no mercado,


aconselhamos o leitor interessado no assunlo u consulta de catálogos das casas fornecedoras de
aparelhagem de laboratório e ainda à leitura do artigo sobre refrigeração publicado no vol. III da
obra Technique ofOrganic Chemistry, citada na bibliografia referenle a este capítulo.
6.1.2.2. Refrigeração por mudança de fase e absorção de calor

A maioria dos processos de refrigeração é baseada numa mudança de fase


a baixa temperatura, à qual está ligada uma absorção de calor. Esta mudança
Fig. 102. Conden- de fase pode ser representada pela fusão de um sólido (gelo), evaporação de um
sador de Allihn-- líquido ou sublimação de um sólido (gelo seco).
Kronbitter

6.1.2.2.1. Refrigeração por calor de fusão

Quando o gelo funde, o calor equivalente ao respectivo calor de fusão, ou sejam, 78,8
calorias.g~', tem que ser absorvido do meio ambiente, provocando, assim, um acentuado
arrefecimento. Este processo de refrigeração c por demais conhecido de todos para que nos
detenhamos em explicações que nos parecem escusadas.
Lembremos, entretanto, que umas vezes se utiliza apenas gelo e outras vezes se recorre ao
emprego de misturas frigoríficas, as quais se obtêm adicionando ao gelo sais minerais solúveis na
água. Neste caso, além do calor de fusão do gelo. há ainda que contar com o arrefecimento devido ao
calor de dissolução do sal utilizado, o qual, por si só, pode originar um apreciável arrefecimento.
Simultaneamente, a junção de um sal ao gelo provoca uma fusão mais rápida deste, resultando disso
que a absorção de calor do corpo a arrefecer é, também, mais rápida. O emprego das misturas
frigoríficas permite, por conseguinte, uma refrigeração mais apressada e eficiente.
A temperatura dada por uma mistura frigorífica depende de vários factores, como a natureza
do sal utilizado, das proporções relativas do sal e do gelo e, ainda, em certa medida, do tamanho das
partículas dos seus constituintes, estando demonstrado que a divisão dos componentes da mistura em
pequenos fragmentos permite, pelo menos, obter um arrefecimento mais rápido.
A temperatura mais baixa que é possível obter com um determinado sal corresponde ao seu
eutético com o gelo. Essas misturas eutéticas obtêm-se, geralmente, misturando o sal em questão com
gelo u temperatura ambiente, mas tais misturas têm que obedecer a proporções bem determinadas,
conforme se indica na Tabela XIV.
177

Tabela XIV. Temperaturas de misturas frigoríficas.


Eutéticos formados com gelo (1)

Substância adicionada Peso % cie .substância Ponto de congelação


ao gelo adicionada da mistura ("C)

2 4 ' J ............... u,w li*-"


K2SO4 ......................................... ............... 6,54 -1,55
Na,COv10H2O ........................... ............... 16,00 -2,10
KNO( ......................................... ............... 11,20 -3,00
NH4C1 ......................................... ............... 18,70 -15,80
NH4NO, ..................................... ............... 43,30 -17,50
NaCl ......................................... ............... 23,10 -22,40
CaCl2,6H,O................................. ............... 58.80 -54,90

Apesar de a mistura eutética ser aquela que origina temperaturas mais baixas, isso nem
sempre significa que seja uma mistura desse lipo a que tem maior capacidade de arrefecimento.
Um exemplo basta para ilustrar esta afirmação. De facto, a mistura eutética de CaCl^ 6H^O com
gelo congela a -54,9°C mas apenas absorve 17,7 caloria por g a essa temperatura, ao passo que
uma mistura de 26,8% do mesmo sal com gelo tem um ponto de congelação igual a -8,PC mas
absorve 57,3 caloria por g.
Na Tabela XV indicam-se algumas temperaturas facilmente obteníveis no laboratório com
várias misturas não eutéticas, utilizando gelo picado. Nessa Tabela figuram também algumas
misturas de ácidos minerais diluídos com gelo, as quais têm sobre aí de sais a vantagem de
provocarem um arrefecimento mais rápido.

Tabela XV. Misturas frigoríficas.Temperaturas obtidas com misturas de vários sais ou ácidos
minerais com gelo picado (2)
Substância adicionada ao gelo Peso de substância adicionada a 100 panes Temperatura obtida
Na.CO, ........................................ de gelo em °C
20 -2

KC1 ................................ 30 -11


NH4C1 ............................................ 25 -15
NaNO, .......................................... .................. 50 -18
HCla38% .................................... .................. 50 -18
FLSOdconc. .................................. 25 -20
2 4 .................. 33a 100 -20 a -22
H,SO4a60% ................................ ................... 100 -37
NHO, diluído ................................ ................... 100 -40
CaCl,,6H,O .................................. .................. 105 -49

{>) International Critica! Tables. Vol. [, McGraw-Hill, New York, 1926, pág. 63
(2) Houben, Die Methoden der Organischen Chemie, Vol. I Thieme, Leip/ig, 1925, pág. 1926.
178

6.1.2.2.2. Refrigeração por calor de vaporização

A absorção de calor provocada pela evaporação de um líquido de baixo ponto de ebulição pode ser
aproveitada para se obter um arrefecimento.
Operando sob pressão reduzida, obtêm-se temperaturas consideravelmente abaixo dos pontos de ebulição
dos líquidos. O mesmo efeito é conseguido fazendo borbulhar gases, como o ar, o hidrogénio ou o azoto, no líquido
a evaporar, pois, deste modo, a pressão parcial do líquido é reduzida à superfície obtendo-se uma evaporação
mais rápida e temperaturas mais baixas.
Como o ar pode formar misturas explosivas com materiais facilmente inflamáveis, tais como o éter sulfúrico,
o sulfurcto de carbono, os cloretos de metilo e de etilo e, ainda, com hidrocarbonetos, o seu uso pode tornar-se
perigoso, recomendando-se a sua substituição por outro gás, como o anidrido carbónico.
A evaporação parcial do solvente por sucção é um dos processos utilizados para
arrefecer uma solução. Também um dos meios de controlar a temperatura de uma
reacção exotérmica consiste em promover a evaporação parcial de um dos reagentes ou
de um solvente inerte, na presença do qual a reacção possa ser levada a efeito. Desde
que o ritmo de evaporação do referido solvente seja mantido adequadamente, é, assim,
possível manter a temperatura da reacção no valor desejado. Desde que a reacção seja
praticada à pressão atmosférica, deve escolher-se um líquido cujo ponto de ebulição
corresponda à temperatura da mistura reagente, podendo, evidentemente, utilizar-se um
líquido de ponto de ebulição mais elevado se a reacção for executada sob pressão re
duzida, j -i;-;.. . ; - . ... . - •-'.";;.. •• /' •''..
A refrigeração mecânica também se baseia no calor de vaporização de um líquido. Na realidade, os
aparelhos de refrigeração operam, em geral, segundo um ciclo de compressão-descompressão. Nestas máquinas,
uni determinado fluido é sujeito a uma compressão tal que se condensa e se torna líquido quando arrefecido por
água ou pelo ar circundante. O gás liquefeito é lançado, depois, através de uma válvula, numa serpentina, onde a
pressão é mais baixa, Esta súbita descompressão provoca a vaporização do líquido circulando na referida
serpentina, fazendo-se tal evaporação à custa do calor absorvido do meio ambiente, que assim é arrefecido. Os
vapores formados são aspirados depois para o compressor e sujeitos a nova compressão, iniciando-se, deste modo,
um outro ciclo. A amónia é a substância geralmente usada nas máquinas maiores, empregando-se outros gases,
como o diclorodifluormetano (Freon 12, por exemplo), nos frigoríficos menores.

6.1.2.2.3. Refrigeração por calor de sublimação

' O anidrido carbónico sólido, também conhecido por neve carbónica ou gelo seco, pode ser usado como
refrigerante quando se pretendem temperaturas inferiores às J obtidas com o gelo vulgar. A temperatura
normal de sublimação da neve carbónica é *
179

de -78,5°C, mas essa temperatura pode ser ainda mais baixa se a sublimação for executada a pressão
reduzida. Por outro lado, o emprego da neve carbónica em pequenos fragmentos provoca a sua
sublimação mais rapidamente e origina temperaturas inferiores ao seu ponto de sublimação normal,
sendo possível, deste modo, obter-se uma temperatura à volta de -95,5°C.
O anidrido carbónico sólido pode ser utilizado, isoladamente, como refrigerante. Todavia,
como a transferência de calor terá que ser feita, neste caso, através de uma camada gasosa de CO,,
os coeficientes de transferência serão baixos em tais condições. Por este motivo, o gelo seco é quase
sempre usado em mistura com um produto orgânico de baixo ponto de congelação, como o éter
sulfúrico, a acetona ou o tolueno, oblendo-se, deste modo, temperaturas vizinhas de -100°C e, o que é
mais imporlantc, boas transferências de calor entre o corpo a arrefecer e a mistura refrigerante.

6.1.2.2.4. Refrigeração por calor de dissolução

Desde que não se disponha de gelo, é relativamente fácil obter um abaixamento de temperatura
por efeito da absorção de calor registada durante a dissolução de sais. Vários sais orgânicos e
inorgânicos absorvem apreciável quantidade de calor ao dissolverem-se, provocando, por vezes, um
acentuado arrefecimento. Em geral, utilizam-se os sais minerais para esse fim, pois são mais baratos
e provocam maior abaixamento de temperatura. Na Tabela XVI indicamos as temperaturas obtidas
com a dissolução de certos compostos.

Tabela XVI. Arrefecimento provocado pela dissolução de sais í1)

Substância dissolvida em Temperatura após


Partes em peso 100 partes de água a 15 "C dissolução ("C)
14 ........................................ A1K(SO4)2,12H2O .......................................... 14
36.......................................... NaCl .............................................................. 13
12.......................................... K,SO4 .......................................................... 12
75.......................................... <NH4)2S04 .................................................... 9
30.......................................... KC1 ................................................................ 2
30.......................................... NH4C1 ............................................................ -3
250.......................................... CaCl2 .......................................................... -S
100.......................................... NH4NO^ .................................................... -12
133.......................................... NH4CNS ........................................................ -16
100.......................................... KCNS ............................................................ -24
100+100 ................................ NH4CÏ+KNO ................................................

BIBLIOGRAFIA
EGLY, R. S. — Cooling and Refrígeration, in Technique of Organic Chemistry, Vol. 111.
Cap. I, pág. 77, Interscience Publishing Inc., N. Y., 1950.
(') Houbcn, Die Methoden der Organischen Chemic, Vol. I, Thieme, Leipzig, 1925, pág. Í296.
180

6.2. EVAPORAÇÃO

6.2.1. GENERALIDADES

A evaporação consiste na formação de vapores à superfície de um líquido, os quais o vão


abandonando gradualmente, resultando disso uma diminuição progressiva do volume inicial da fase
líquida.
Mercê deste facto, a evaporação c utilizada quando se pretende concentrar uma solução ou
quando se deseja recuperar um sólido não volátil dissolvido num líquido qualquer. Esla operação
distingue-se da destilação porque nesta os vapores originados são condensados, ao passo que
naquela são deixados difundir-se lentamente na atmosfera.
Os líquidos, como aliás os sólidos, exercem uma determinada pressão de vapor, a qual pode ser
tomada como um índice da maior ou menor facilidade com que se evaporam. Essa pressão de vapor
aumenta com a temperatura e atinge o seu valor máximo quando iguala a pressão atmosférica
exercida à superfície do líquido. Nesse momento, este entra, evidentemenle, em ebulição.
Daqui se depreende que o aumento da temperatura se traduz na evaporação mais lápida de
qualquer líquido, se bem que mesmo os líquidos de elevado ponto de ebulição possam evaporar-se,
ainda que lentamente, à temperatura ordinária.
Na realidade, segundo a teoria cinética, as moléculas que constituem um líquido estão animadas
de movimento constante mas irregular. Um certo número delas mover-se-á com uma velocidade média,
dependente da temperatura, mas algumas poderão ter uma velocidade superior a essa, enquanto outras
se moverão mais lentamente. A uma temperatura inferior ao ponto de ebulição do líquido a maioria
das respectivas moléculas estão animadas de uma velocidade média que é insuficiente para lhes
permitir vencer a barreira oferecida pela camada superficial. Esta só poderá ser franqueada por
aquelas poucas moléculas que se movem a velocidades mais elevadas, motivo por que à temperatura
ambiente a evaporação dos líquidos de elevado ponto de ebulição é sempre lenta.

6.2.2. FACTORES QUE INFLUENCIAM A EVAPORAÇÃO

São vários os factores que condicionam a evaporação de um líquido, os quais se encontram


relacionados na fórmula de DALTON:

em que Q é o peso de vapor produzido por unidade de tempo; K é uma constante, que varia com a
natureza do líquido, remoção do ar, ele.; S é a superfície de evaporação;
181

F a pressão máxima do vapor do líquido a evaporar à temperatura da experiência; / a pressão actual


do vapor à superfície do líquido evaporante à mesma temperatura e H a pressão atmosférica.
Da análise da referida fórmula é fácil concluir que a velocidade de evaporação de um líquido é
directamente proporcional à superfície evaporante e à diferença entre a pressão máxima do vapor a
uma dada temperatura e a pressão actual do vapor sobre a superfície do líquido a evaporar à mesma
temperatura e inversamente proporcional à pressão atmosférica.
Como é evidente, quanto maior for a área da superfície evaporante maior será a quantidade de
líquido evaporado por unidade de tempo. Por outro lado, se acontecer que o espaço confinante com o
líquido fique saturado de vapor, isto é, se /""=/, será Q = O, e deixara, forçosamente, de se dar a
evaporação, pois as fases líquida e vapor equilibram-se. Deste modo, a pressão actual do vapor
sobre a superfície evaporante deverá manler-se o mais baixa possível, a fim de se obter uma alta
velocidade de evaporação, o que se consegue fazendo passar uma corrente de ar sobre a referida
superfície. Por este motivo, recomenda-se proceder à evaporação em local arejado.
Dado que o valor de F depende da temperatura do líquido e do vapor, a evaporação será
apressada aumentando a temperatura das duas fases. Finalmente, a evaporação será tanto mais
rápida quanto menor for a pressão atmosférica, pelo que muitas vezes se procede à evaporação de
líquidos sob pressão reduzida.

6.2.3. PROCESSOS DE EVAPORAÇÃO

6.2.3.1. Evaporação espontânea

Consiste em colocar o líquido a evaporar num recipiente apropriado, como uma cápsula ou um
cristalizador, e deixá-lo exposto à temperatura ambiente, de preferência em local seco e arejado.
Tendo em conta o que atrás se disse, uma evaporação por este processo é sempre lenta, pelo que
apenas se utiliza quando se pretende evaporar pequenos volumes de líquido ou quando este possui
elevada pressão de vapor. A velocidade de evaporação será influenciada pêlos factores já discutidos
anteriormente c neste caso particular a superfície evaporante é, certamente, o elemento a tomar em
maior consideração.

6.2.3.2. Evaporação pelo calor

Na maioria dos casos a evaporação de um líquido é feita com o auxílio do calor, pois,
aumentando a pressão de vapor com a subida da temperatura, consegue-se uma evaporação mais
rápida.
182

Para isso, desde que se trate de evaporar pequenas quantidades de líquido, este é colocado
numa cápsula e convenientemente aquecido. Tal aquecimento pode fazer-se, nalguns casos, a fogo
directo, o que nem sempre c recomendável, preferindo-se, geralmente, aquecer o recipiente contendo
o líquido a evaporar n u m banho apropriado.
Tratando-se de soluções aquosas, utiliza-se, em geral, um banho de água ou de vapor, nos quais
não se ultrapassa, em regra, a temperatura de 100"C. Quando se lorne necessário temperaturas
superiores, poder-se-á recorrer a outros banhos, como um banho de areia, ou banhos constituídos
por soluções saturadas dos seguintes sais: NaCl, P.E. 108,4"C; KNO^, P.E. 115,2ÜC; CaCl2, P.E.
179,5l)C. Usam-se ainda banhos de óleo mineral, de P.E. 300°C, banhos de silicones, etc.
Convém acentuar, mais uma vez, que o ritmo da evaporação depende muito do recipiente em
que o líquido está contido, devendo escolher-se sempre vasos pouco altos e de abertura larga, de
modo a que os líquidos possam oferecer urna apreciável superfície de evaporação. Estes requisitos
são apresentados pelas cápsulas de porcelana que constituem os recipientes mais usados para a
evaporação de volumes diminutos de líquido. Quando se trate de evaporações em maior escala
convém utilizar recipientes de outra natureza mas obedecendo às mesmas condições, tais como
aqueles representados nas Figs. 103 e 104 A.

Fig. 104. A, evaporador aquecido a banho de


água; B, banho de água permitindo aquecer
Fig. 103. Evaporador aquecido recipientes de lamanho variável
a vapor

Entretanto, a manufactura de extractos em escala industrial levanta problemas de concentração


das soluções extractivas que não podem ser resolvidos recorrendo aos processos acabados de
descrever. Em lal caso o volume da solução a concentrar é sempre importante, pelo que é necessário
utilizar aparelhagem de capacidade adequada e que permita a concentração nas melhores condições
possíveis.
Tendo em vista os factores que governam a velocidade de evaporação, os recipientes onde esta
se faz devem ser largos e pouco profundos, de modo a que a superfície de evaporação seja grande e
se torne possível aquecer toda a massa do líquido a evaporar. Em geral, o líquido é permanentemente
agitado, o que não só apressa a operação como permite, ainda, manter em suspensão no líquido os
produtos que, eventualmente, precipitem à medida que a concentração progride.
183

Os recipientes em que se faz a evaporação podem ser aquecidos a banho de água,


representando-se nu Fig. 105 um conjunto deste tipo para a preparação de extractos cm escala
industrial, o qual é constituído por um grupo de bacias munidas de agitadores mecânicos e
mergulhadas num banho de água mantido à ebulição.
Por ve/es, em certas instalações, utilizam-se evaporado-res
aquecidos por vapor de água. Porém, neste caso pode haver a
possibilidade de sobreaquecimentos em certos pontos das bacias. Estas
são montadas em posição inclinada sobre um eixo móvel, de modo
que assim o líquido a evaporar é revolvido constantemente. A Fig. 106
mostra um dispositivo destes.
Entre os aparelhos largamente utilizados para a concentração de Fig. 105. Apaielho munido de
agitadores para evaporação a
soluções extractivas à pressão normal conta-se o banho de água
evaporador de CHRNAILLIHR (Fig. 107). o qual é constituído por uma série
de pralos ocos, montados, à semelhança de rodas, sobre um eixo horizontal móvel. Estes pratos,
aquecidos interiormente por vapor de água, têm fixados nos respectivos bordos uma
espécie de alcatruzes. O líquido a evaporar, mantido numa larga goteira
existente na parte interior do aparelho, enche os referidos alcatruzes
quando estes mergulham nele, sendo, depois, despejado sobre os pratos c
rapidamente evaporado quando se espalha sobre a superfície aquecida
destes.
Fig. 106. Aparelho de eva-
Na Fig. 108 representa-se outro modelo de evaporador constiluído
poração com bacias móveis por cilindros rotativos, também aquecidos inlerior-mente. O líquido a
aquecidas por vapor evaporar é deixado cair de um depósito entre dois cilindros mantidos
muito próximos um do outro e
girando em sentido contrário. Em contacto com esses cilindros o líquido é rapidamenle vaporizado,
deixando à superfície destes uma delgada película sólida, a qual c destacada pêlos raspadores que
nele se apoiam.
Um progresso muito considerável registado na tecnologia da evaporação de líquidos foi obtido
com a introdução de um processo que consiste em introduzi-los, sob a forma de pequeníssimas
gotículas, num cone de grandes dimensões, conseguindo-se a sua
evaporação por uma correnle de ar quente e seco circulando no
aparelho.
Esta técnica, conhecida por secagem ou evaporação por
atomização ou nebulização, permite a evaporação quase instantânea
de um líquido, transformando o produto resultante da evaporação
em pó muito ténue e tem, hoje em dia, um grande interesse
industrial, sendo utilizada não só pelas fábricas de produtos Fig. 107. Evaporado' de
Chenaillier
alimentares,
184

como, também, pêlos laboratórios preparadores de produtos medicinais. As substâncias obtidas por
esta lécnica apresentam óptimas características, podendo mencionar-se o
facto de ficarem praticamente isentas de cheiro e
sabor estranhos e de, uma vê/ reidratadas, originarem
produtos semelhantes ao respectivo malerial fresco.
São numerosas as aplicações deste método de
evaporação no campo da indústria farmacêutica, sendo
de mencionar, entre outras, a sua utili/.ação na
preparação de extractos, de certos pós, de produtos
altamente oxidáveis, como a adrenalina, o ácido
ascórbico c outras vilaminas, ele.
A Fig. 109 mostra o esquema de um
Fig. 108. Evaporador constituído por cilindros
aquecidos
destes evaporadores, que fu ncio na da seguinte
maneira: o líquido a evaporar chega ao apare
lho através da conduta A e é nebulizado na câmara de secagem C, à custa do
atomizador B, geralmente uma centrífuga girando a alta velocidade. A parle central da
câmara é atravessada por uma conduta de ar quente (D), cuja abertura está situada por
debaixo do atomizador. Deste modo, o líquido nebuli/ado na câmara de secagem fica
suspenso durante alguns momentos no ar aquecido, perden
do rapidamente a água nele existente devido ã grande •
superfície oferecida à evaporação. Apesar de a temperatura
do ar ser relativamente elevada, uma vez que a evaporação
é quase instantânea, não se verificam quaisquer alterações
do material submetido a este tratamento.
O sólido resultante da evaporação é recolhido na parte inferior do
aparelho, sob a forma de pó muito fino, sendo imediatamente retirado para
fora por meio de um dispositivo transportador, situado em F. O tubo E
representa a saída do ar, estando equipado com filtros destinados a
relerem qualquer porção de sólido que possa ser arrastado pelo ar ao sair
do evaporador.
Como se depreende da descrição que acabamos de fazer dos diversos Fig. 109.
hvaporador
processos de evaporação, esta pode fa/er--se com o objectivo de se
recuperar um sólido dissolvido
ou apenas para concentrar uma solução. No primeiro caso pratica-se uma evaporação à secura e
no segundo faz-se uma evaporação ale determinado peso ou volume.
Como é intuitivo, na evaporação à secura o líquido terá que ser totalmente evaporado, de modo
a obter-se o sólido ou sólidos não voláteis nele dissolvidos. A evaporação a determinado peso
ou volume é o processo usado para se concentrarem
185

soluções e, como a própria designação indica, far-se-á, somente, uma evaporação parcial do
solvente, sendo necessário, portanlo, determinar o momento em que se deve interromper a operação.
Para evaporar uma solução até determinado peso tara-se uma cápsula, pesa-sc a solução
inicial e promove-se a sua evaporação, a qual deverá ser interrompida quando o liquido acusar o
peso desejado. Quando a concentração deva ser feita até determinado volume, a maneira lógica de
verificar se o volume pretendido to t atingido é transvasar o líquido evaporante, de tempos a tempos,
para uma proveta, e medir o respectivo volume. Como tal processo é incómodo e moroso, pois obriga
a um arrefecimento do líquido a medir, utilizam-se, por vezes, recipientes de evaporação graduados,
que permitem seguir a concentração até perto do final, e só nesse momento se fará a medição
rigorosa do líquido a concentrar.
Quando não se disponha de tais recipientes, pode-se determinar, aproximadamente, a
concentração do líquido da seguinte maneira: Coloca-se no vaso, onde se irá proceder à
evaporação, um volume de água igual ao volume a que se quer concentrar a solução. Mergulha-se,
então, verticalmente, uma vareta na água, de modo que esta toque na parte mais funda do referido
vaso, marcando-se por intermédio de um tubo de borracha a ela adaptado a altura correspondente à
superfície livre da água. Feito isto. substitui--se a água pelo líquido a concentrar, o qual deverá ser
evaporado até que a sua superfície coincida com a altura marcada na vareta. Assim se obtém uma
indicação aproximada do grau de concentração desejado, procedendo-se, enlão, à sua determinação
por um processo mais exacto. Por vezes, torna-se possível seguir a marcha da concentração
determinando a densidade do líquido concentrado, mas para isso é necessário conhecer-se, de
antemão, a densidade do produto final.

6.2.3.3. Evaporação sob pressão reduzida

Acabamos de ver que uma das grandes aplicações da evaporação no campo farmacêutico é o
seu emprego na preparação dos extractos. No capítulo precedente passámos em revista alguns dos
processos utilizados para tal fim, os quais eram realizados à pressão normal. Em tais condições
operatórias, a evaporação de líquidos aquosos obriga a um aquecimento a cerca de IOO"C,
recorrendo-se, em muitos dispositivos, a uma agitação do extracto, para apressar a sua vaporização.
Tais métodos de concentração conduzem quase sempre à obtenção de produtos de má
qualidade, pois se o calor, só por si, é susceptível de alterar um grande número de substâncias, a sua
acção é ainda mais prejudicial quando actua, simultaneamente, em presença do oxigénio. Na
realidade, se a evaporação for realizada em contacto com o ar e sob agitação, este mislura-se
intimamente com o produto a concentrar, o qual fica, assim, sujeito, durante tempo variável, à acção
conjunta de uma temperatura elevada e do oxigénio existente no ar nele incorporado pela agitação.
186

Mercê disso, os extractos obtidos por este processo podem ser mais ou menos profundamente
alterados na sua composição, o que se traduz, entre muitas outras coisas, por se tomarem menos
solúveis. Há, pois, toda a conveniência cm que a concentração das soluções contendo substâncias
alteráveis pela acção conjunta do oxigénio e do calor seja praticada ao abrigo do ar e a temperatura
o mais baixa possível.

7CO -
600-
500-
400

Álcool
melílico
Álcool
itilico
Ëler
elilico
Acetona

Piridina
D

200
100
O 20 40 60 80
100 l£0
Fig. 110. Pressões de vapor de vários
líquidos

Ora, como a temperatura de ebulição de qualquer líquido baixa quando se redu?. a pressão
sobre ele exercida, surgiu, naturalmente, a ideia de aplicar este princípio à evaporação dos líquidos.
A simples observação dos gráficos representando a variação das pressões de vapor de alguns
líquidos, reproduzidos na Fig. l K), mostra bem como é possível fazer baixar as suas temperaturas de
ebulição por redução da pressão, sendo fácil, por este meio, concentrar soluções aquosas a
temperaturas relativamente baixas, da ordem dos 4()-5í)llC. ou menos.
187

Tabela XVII. Correspondência entre a unidade de pressão do Sistema Internacional (Pa) e


unidades de pressão correntemente utilizadas (')

Correspondência á
Unidade Unidade SI (Pascal)
dinc.cm2 10-' Pa
Atmosfera (atm) 101 325 Pa = 101,325 KPa
Bar 105Pa = 0,lMPa
mm Hg 133,322387 Pa
Torr 133,322368 Pa
Psi 6894,757 Pa = 6,894757 KPa

O Farmacopeia Portuguesa V, 1986.

Esta técnica tem-se revelado de extraordinária utilidade no campo farmacêutico, pois


graças a ela tornou-se possível a preparação de muitas formas extractivas mantendo inalterados os
princípios activos existentes nas drogas a
partir das quais foram obtidas.
Como se compreende, este processo
de evaporação exige o emprego de
aparelhagem especial, a qual permite
trabalhar sob pressão reduzida. A
eficiência de tais aparelhos depende do
grau de vazio que neles se possa obter, pois
quanto maior ele for mais baixa será a
temperatura de ebulição do líquido a
evaporar.
Os evaporadores de vácuo
possibilitam, por conseguinte, fazer Fig. 111. Evaporador rotativo
concentrações a baixa temperatura
e devem ser utilizados sempre que possível. É que além de serem económicos, pois exigem menor
quantidade de energia calorífica, encurtam o período da operação e permitem a recuperação do
solvente, que pode ser utilizado novamente noutras extrac-ÇÕes. Qíerecem ainda outra vantagem
da maior importância: os produtos neles concentrados, porque estão sujeitos a temperaturas baixas
e durante menos tempo, não apresentam aspecto queimado, modificação de cor e alteração dos
respectivos constituintes.
A Fig. 111 representa um modelo desses evaporadores.
188

BIBLIOGRAFIA

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Vlack Piiblishinj: fompany. l-asl
189

6.3. SECAGEM E EXSICAÇÃO

6.3.1. SECAGEM

A secagem é a operação que tem por fim privar os corpos da humidade neles existente. Sc bem
que o material a secar possa ser um gás, um líquido ou um sólido, sem dúvida que é a secagem dos
sólidos aquela que mais vezes se pratica na lécnica farmacêutica e, por isso, a ela nos referiremos
com mais pormenor. Em geral, a secagem apenas retira dos corpos a água neles existente sob a forma
de humidade higroscópica, como alguns autores a designam, para a distinguirem da água de crista-
lização dos corpos químicos, a qual só é eliminada totalmente pela Exsicaçâo (').
Tendo em consideração que no domínio farmacêutico a secagem é principalmente aplicada a
produtos sólidos, podemos dizer que são três os objectivos a atingir com a secagem das
substâncias de carácter medicinal: Melhor conservação, redução de volume e de peso e maior
facilidade de pulverização.
De facto, a humidade é altamente prejudicial à boa conservação das drogas, sobretudo das de
origem biológica, pois um produto desta natureza com certo grau de humidade oferece óptimas
condições para o desenvolvimento de bactérias e fungos, que o podem alterar profundamente.
Por outro lado, uma droga seca em condições que não provoquem a alteração dos seus
constituintes torna-se menos volumosa e mais rica, peso por peso, em princípios activos, o que só é
vantajoso. Finalmente, como já tivemos ocasião de salientar quando tratámos da Pulverização, a
secagem é uma das operações prévias a que é necessário submeter as drogas, pois eslas,
apresentando-se húmidas, dificilmente poderão ser pulverizadas, dada a elasticidade que apresentam
em tais circunstâncias.

6.3.2. SECAGEM DE GASES

A secagem de gases pode fuzer-se por vários processos, mas na prática apenas se utiliza a
secagem por adsorção ou por contacto com substâncias higroscópicas.

6.3.2.1. Secagem por adsorção

Certas substâncias porosas, como o gele de sílica, têm grande afinidade para a água, apesar
de não formarem com ela hidratos ou compostos químicos definidos.

(') Ver pág. 203.


190

Na prática, o gás a secar é obrigado a passar através de tubos ou torres contendo o exsicante,
o qual, uma vez exausta a sua capacidade de fixar água, pode ser regenerado por aquecimento u
temperatura conveniente. A secagem de gases por adsorção é considerada bastante eficiente desde
que o adsorvenle conserve as suas propriedades de fixação de água. A certa altura atinge-se um
ponto em que o exsicante deve ser substituído ou regenerado para poder actuar eficazmente.

6.3.2.2. Secagem por contacto com substâncias higroscópicas

O contacto com produtos sólidos ou líquidos ávidos de água constitui, sem dúvida, o processo
laboratorial mais utilizado para secar gases, reproduzindo-se na Fig. 112 alguns dispositivos
usados para isso.

Fig. 112. Aparelhos laboratoriais para a secagem de gases

Na tabela XVIII indica-se a quantidade de vapor de água contida em gases secos por contacto
com vários reagentes. Quando o gás a secar não reaja com o pentóxido de fósforo, este deve ser o
agente exsicante escolhido. Acontece, porém, que este óxido apresenta uma película de ácido
metafosfórico à superfície depois de algum tempo de exposição em atmosfera húmida, a qual
impede que o óxido subjacente a essa película exerça a sua função exsicante. Por esse motivo, terá
que ser fragmentado e revolvido periodicamente, ou, então, recomenda-se peneirá-lo sobre lã de
vidro, pois assim a superfície activa do reagente é bastante aumentada.
Ao secar um gás é necessário escolher o exsicante de acordo com a natureza química do
produto a secar. Assim, tanto o pentóxido de fósforo como o ácido sulfúrico não podem ser usados
para a exsicação de amoníaco ou de aminas, caso em que está indicada a utilização, por exemplo,
da potassa fundida ou do óxido de cálcio.
191

Tabela XVIII. Quantidade de vapor de água contida em gases secos sobre


1
vários reagentes a 25°C ( )

Reagente CaSO4 (anidro)............................................ mg/l de ffás .................. 0,005

MgO ............................................................ .................. 0,008


KOH (fundido)............................................ .................. 0,002
Mg(ClO4), (anidro) .................................... .................. 5x10^
P20S ............................................................ .................. 2x10 s
AI n .................. 0,003
SiO3 ............................................................ .................. 0,003
H,S04 ........................................................ .................. 0,005
NaOH (fundido).......................................... .................. 0,16
CaO .............................................................. .................. 0,20
CaCl^ (granulado) ...................................... .................. 0,14-0,25
CaCl2 (fundido) .......................................... .................. 0,36

6.3.3. SECAGEM DE LÍQUIDOS

A secagem de líquidos pode fazer-se por vários processos, obrigando uns à evaporação da
água neles existente c recorrendo-se, noutros casos, a técnicas diferentes.

6.3.3.1. Secagem por destilação

Desde que a água e o líquido a secar não formem misturas de ponto de ebulição constante e os
respectivos pontos de ebulição sejam suficientemente afastados, a destilação simples é o processo
indicado para remover do líquido a maior parte da água com ele misturada, terminando-se a
secagem por contacto com um agente higroscópico.
Em certos casos, porém, a água forma com o líquido a secar uma mistura azeotrópica, isto é,
uma mistura de ponto de ebulição constante, cujos vapores têm a mesma composição que a fase
líquida. Em tais circunstâncias, é impossível separar a água do outro constituinte, como acontece
com uma mistura de álcool e água. Se tivermos, por exemplo, utn líquido constituído por partes
iguais, em peso, de água e álcool, e o destilarmos, forma-sc, primeiramente, um vapor mais rico em
água. Entretanto, o ponto de ebulição vai baixando gradualmente, até se fixar em 78,15°C. Neste
momento, o vapor é constituído por 96% de álcool, sendo a composição do líquido no balão a
mesma.

(') WEISSBERÜER c PKOSKAUER, Organic Solvenls, Oxford Univ. Press. Londres, 1933, pág. 94.
192

Para se conseguir a separação da água é preciso adicionar, enlão, ao líquido a secar, uma
terceira substância, que origine com os seus componentes urna nova mistura a~eotrópica. Assim, o
álcool pode ser exsicado por destilação em presença de ben/cno. Este origina uma mistura
azeotrópica ternária com o álcool e a água, de P.E. 64,16"C, a qual permite a separação da água.
Subindo a temperatura para 68,24"C destila o benzeno sob a forma de a/colropo binário, e a
VHJ^C destila o álcool puro.

6.3.3.2. Secagem por contacto com substâncias higroscópicas

As mesmas substâncias já atrás mencionadas para a secagem de gases podem ser, igualmente,
utilizadas no caso dos líquidos. Além dos compostos entào referidos, usam--se. ainda, outros
produtos, corno o carbonato de potássio, os sulfatos de sódio e de cálcio e o óxido de bário.
O agente exsicante deve ser quimicamente inerte, isto é, não deve reagir com o líquido a secar
e também deve ser completamcntc insolúvel nele. O exsicante e o produto a secar são deixados em
contacto, durante várias horas, n u m vaso rolhado, que é agitado ocasionalmente, processando-se a
secagem em melhores condições se o sólido for adicionado em excesso.
uma vez conseguida a secagem, o líquido é geralmente separado do cxsicanle. procedendo-
se, eniào. à sua destilação, mas, se aquele tiver um baixo ponto de e b u l ição, a destilação pode
fazer-se mesmo em presença do exsicante.
Os processos de secagem até aqui mencionados são baseados na formação de hidralos entre o
exsicante e a água, recorrendo-se, por ve/es, a técnicas baseadas numa reacção química entre
aquela c o agente exsicante.
Assim, vários hidrocarbonetos podem ser dessecados por acção do sódio metálico em fio ou
de uma liga de sódio e potássio (10:16). Em casos destes a destilação subsequente à secagem
deve ser conduzida com o maior cuidado, para evitar que no destilado passem vestígios do
exsicante, o que, a verificar-se, poderia alterar, de modo sensível, as propriedades do líquido.
Na Tabela XIX indicam-se alguns reagentes próprios para a secagem de vários líquidos,
segundo BROUCUTON (').

( ) G. BROI GiiTuN, i n Tccliniqut' of Organic Chemistrv, Interscience Puhlishcrs Inc.


Ni1 w York, 1950, Vol. Ill, pág. 625.
193

Tabela XIX. Reagentes exsicantes indicados para certas classes de compostos orgânicos

Indicado para Não indicado para a


Reagente exsicaníe secagem de secagem cie

Pentóxido de fósforo Halogcnetos de alquilos, hídro- Bases, cetonas e outros produtos


carbonetos, hidrocarbonetos em que possa haver polime-
halogenados, CS,,. rizacão.
Ácido sulfürico Halogenetos de alquilos, hidro- Bases, cetonas, álcoois, fenóis. etc.
carbonetos saturados, hidro-
carbonetos halogenados. Álcoois, aminas, fenóis, ácidos
Cloreto de cálcio Éteres, ésteres, etc. É o agente gordos.
exsicante mais usado Cetonas, aldeídos, ésteres, ácidos.
Hidróxido de potássio Bases. Ácidos gordos, ésteres.
Carbonato de potássio Bases, cetonas.
Sulfato de sódio Sulfato Maioria das substâncias.
de Magnésio Sulfato de Maioria das substâncias.
Cobre anidro Sódio Ésteres, álcoois, etc.
Ésteres, hidrocarbonetos satu- Álcoois, aminas, ésteres.
Sulfato de cálcio rados.
Maioria das substâncias.

6.3.4. SECAGEM DE SÓLIDOS 6.3.4.1.

Generalidades

O processo mais comum de secagem de sólidos consiste na remoção da água existente no


material a secar por evaporação desla para o ar.
A Fig. 113 indica, esquematicamente, o caminho percorrido pela água durante a secagem nas
referidas condições. O material a secar representa-se como estando contido num tubo aberto, através
do qual passa uma corrente de ar movendo-sc a determinada velocidade, a qual arrasta consigo as
moléculas de água existentes em A que tenham atravessado a camada de ar formada à superfície do
sólido. Deste modo, a quantidade de humidade à superfície da substância vai diminuindo e como
passa a existir um desequilíbrio no leor Vidro
da água entre a parte interna e externa
da substância submetida à secagem, as Ar
moléculas de água migrarão de B Camada de difusão

Solido
*-— Vidro
Fig. 113. Esquema do trajecto da água na secagem de
sólidos ao ar
194

para /l. a fi m de repor, novamente, esse equilíbrio temporariamente desfeito. Esta transferência da água
do interior para o exterior do material pode, no entanto, l a/cr-se de duas maneiras. Assim, umas
vc/es acompanha o ritmo da evaporação em Â, mas também pode acontecer que este movimento seja
mais lento, tornando-se, então, impossível manter em 4 uma humidade constante.
No primeiro caso, o ritmo da secagem c regulado pela difusão da água através da película de
ar à superfície do produto a secar, ao passo que no segundo caso o factor que influencia esse
ritmo é o movimento da água através do próprio sólido. Acontece que na primeira alternativa o ritmo
da secagem será constante, dependendo apenas da espessura f/ da película de ar c da diferença de
humidade através da mesma película, sendo inteiramente independente do conteúdo de água
existente na massa do material a secar.
Quando a migração da água é mais lenta do que o ritmo de evaporação à superfície do sólido,
acontece, então, que a secagem fica dependente da deslocação da água através da própria substância,
a qual, por sua vez. depende de vários factores, como a sua concentração no sólido, a natureza
deste, porosidade, etc.

6.3.4.2 Processos de secagem

6.3.4.2.1. Exposição ao ar livre

A exposição ao ar livre pode ser aproveitada pura a secagem dos sais cristali/.ados e das plantas
medicinais.
Assim, os produtos químicos contendo água de cristalização, colocados ao ar, vão-na perdendo
gradualmente pelo fenómeno da c florescência, tornando-se anidros ao f i m de certo tempo. A medida que se
tomam anidras, tais substâncias cobrem-se de uma camada de pó, que constitui o produto seco, a qual deve
ser removida periodicamente, para que se tome possível fazer-se a secagem das camadas subjacentes.
No entanto, é no campo da secagem das plantas medicinais que a exposição ao ar livre encontra a
sua mais importante aplicação. A secagem dos referidos produtos pode f aze r-se. por este processo, ao .w V,
à .sombru ou em c//?r/gf«.
A c.v/;m/^mv <V/r</(/(/ tvm /Y/An .w/í/w constitui uma técnica de secagem de aplicações limitadas,
pois só poderá ser utilizada com produtos pouco delicados e c u j a s qualidades não sejam influenciadas
pela acçãu directa do sol. Este método de secagem pode ser aplicado por exemplo, a raízes e rizomas, que
devem ser, previamente, cortados ao meio e colocados, depois, em tabuleiros ou redes.
195

Qualquer destes processos de secagem é bastante económico, pois não exige instalações
especiais, mas ambos requerem uma vigilância contínua uma vez que as condições atmosféricas
podem modificar-se de um momento para o outro, sendo praticamente impossível proteger as plantas
de uma chuvada súbita, que pode inutilizar uma secagem quase no seu termo.
Por isso, prefere-se fazer a secagem das drogas vegetais em abrigos especialmente construídos
para esse fim. Tais secadores devem ser instalados em locais convenientemente secos e possuírem
largas aberturas por onde entre o ar em grande quantidade. As plantas são estendidas cm prateleiras
existentes nestes secadores, as quais deverão estar suficientemenle afastadas umas das outras para que
o ar circule livremente entre elas e assim possa remover eficazmente a humidade contida nas drogas.
Por vezes, estas instalações estão equipadas com ventiladores que aspiram o ar carregado de
humidade, conseguindo-se, deste modo, uma secagem mais rápida.

6.3.4.2.2. Secagem pelo ar seco à temperatura ambiente

Este processo de secagem implica a utilização de aparelhos especiais, fechando hermeticamente,


denominados exsicadores, nos quais a concentração de vapor de água do ar neles contido é
mantida muito baixa à custa de substância
higroscópicas colocadas na sua parte .inferior.
O produto a secar c acondicionado num — Camada de ar A
recipiente apropriado, após o que se introduz
no exsicador, fazendo-se a secagem de acordo
com o diagrama representado na Fig. 114.
Como se vê, as moléculas de água do corpo a
exsicar, de pressão parcial /*,, deverão
atravessar a camada de ar A, que se lhe
sobrepõe, difundir-se através do aparelho e
atravessar a camada de ar sobre o exsicantc B,
para poderem contactar com este.
Fig. 114. Diagrama da secagem em exsicador
Sendo P a pressão parcial do vapor de
água do ar, dentro do cxsicador, e P, o valor
dessa pressão à superfície do exsicante, evidentemente que só poderá dar-se a exsicação se

P,>P
196

Quanto maior for a diferença entre P] c P-, mais rapidamente se conseguirá u secagem, pelo que
deve utilizar-se, como exsieantc, uma substância de baixa pressão de vapor. De acordo com a
Tabela XVIII (pág. 191), verifica-se que o melhor agente exsi-canlc c o anidrido fosfórico, pelo que
esta substância, juntamente com o cloreto de cálcio, são os exsicantes mais vulgarmente usados, se
bem que em muitos laboratórios se empregue, igualmente, o ácido s u lf úrico e o gele de sílica. Este
ú l t i mo produto, corado pelo cloreto de cobalto, apresenta-se azul se está anidro e róseo uma vê/
hidratado, pelo que é fácil saber-se quando é necessário substituí-lo. Alem
disso, o gele de sílica oferece ainda a
vantagem de poder ser desidratado por
aquecimento a I60"C, durante 2 horas, ficando
apto, após este tratamento, a ser utili/ado
novamente como exsicante, pelo que
constitui um produto bastante económico.
Hste facto, aliado às suas boas propriedades
exsicantes, tem contribuído para a
generalização do seu emprego como agente
cxsicanle.
Fig. 115. Modelos de exsicadores Na Fig. 115 representam-se dois modelos de
exsicadores correntemente utili/ados nos
laboratórios. De notar que os exsieadores aí reprodu/idos se diferenciam em dois tipos distintos
que se distinguem por um ter uma tampa inteiriça, ao passo que no outro a parte superior da tampa é
atravessada por um tubo ao qual está adaptada uma torneira. Nestes últimos exsicadores é possível,
mercê deste dispositivo, estabelecer comunicação com o seu interior mesmo depois de fechados, o
que permite, por isso, retirar o ai neles contido ligando o referido tubo, depois de aberta a torneira, a
uma máquina de vazio.
A vantagem destes modelos em relação aos do primeiro tipo reside na circunslân-
:ia de permitirem uma secagem mais rápida, pois que, eliminando por sucção o ar neles
ontido. permitem que as moléculas de água existentes no corpo a secar contactem mais
'aeilmente com o exsicante, o que encurta em cerca de 1/3 o tempo necessário para se
conseguir uma secagem conveniente.
197

6.3.4.2.3. Secagem pelo ar quente

E o processo mais correntemente utilizado para a secagem de corpos sólidos desde que
estes sejam termo-resistentes.
Os aparelhos geralmente usados para este fim são as estufas de ar cfucntc. das quais existe
no mercado grande variedade de modelos, na maioria aquecidos eléctrica-

mente, fazendo-se o aquecimento quer ao longo das paredes, quer nas próprias prateleiras onde se
dispõe o material a secar. Além disso, estas estufas estão, geralmente, equipadas com termostato, o
que permite a manutenção de uma temperatura constante durante o tempo desejado (Fig. 116).
A velocidade de secagem por este método depende de um certo número de factores, todos eles,
aliás, já considerados quando se tratou da Evaporação. Assim, a eliminação da humidade será
tanto mais rápida quanto mais dividido esliver o sólido a
secar, pois deste modo oferecerá uma maior superfície
à evaporação. Pelo mesmo motivo, o corpo a secar deverá
ser colocado, em camada delgada, nas prateleiras da
estufa.
Por outro lado, a secagem depende da diferença de
temperatura entre o ar circulante e o corpo a secar,
devendo procurar manter-se um afastamento acentuado
entre os valores da pressão de vapor no ar e na substância.
Para isso, é conveniente deixar escapar o ar da estufa, a fim
de evitar-se a sua saturação com vapor, pois quando tal
aconteça cessa a sua acção exsicante. Fig. 116. Diagrama de uma
estufa de ar quente
Também a velocidade a que o ar circula na
estufa tem grande importância na obtenção de uma boa secagem. Aliás, os dados que figuram na
Tabela XX mostram como alguns destes factores, tais como a temperatura de entrada e de saída do
ar e respectivo volume circulante, influenciam a velocidade de secagem. Tais valores são,
evidentemente, relativos a um determinado tipo de substância, pois variam consoante a natureza do
produto, a superfície do mesmo, etc., sem que, por isso, deixem de ser elucidativos.

Tabela XX. Quantidade de água retirada pelo ar, a diversas temperaturas e para diferentes
velocidades de fluxo, de um ambiente contendo material húmido
Temp. de entrada Temp. de saída Diferença Fluxo de ar Agua retirada
do ar("C) do ar ("C) t"C) (melhora) por m-f (}>)
40 30 10 60 16
60 40 20 30 33
SÓ 50 30 15 66
110 60 50 10 100
150 70 80 6 166
180 80 100 4 250
250 90 160 4 500
198

Acontece que na maioria das estufas a circulação do ar apenas se faz à custa de um pequeno
orifício situado na base. O ar enlra na estufa por este ventilador c sai para o exterior através de uma
abertura situada na parte superior, regulando-se o volume de ar admitido na estufa ajustando,
convenientemente, as tampas dos orifícios de entrada e de saída.
Certos modelos, porém, estão providos de um sistema de circulação forçada de ar, o que os torna
muito mais eficazes. Deste modo, conscgue-se eliminar as bolsas estagnadas de ar altamente
carregado de humidade formadas dentro da estufa, pois a circulação forçada provoca a sua
renovação constante por novas camadas de ar
mais seco. Por outro lado, a circulação forçada
aumenta a velocidade da corrente de ar que passa
sobre o corpo a secar, o que permite que a secagem se
processe mais facilmente (Fig. 117).
As estufas como a que se representa na Fig. 117
são modelos de laboratório, e, como tal, de
capacidade bastante limitada. Na industria
Fig. 117. Estufa de circulação forçada; A, farmacêutica, porém, há necessidade de secar, por
motor;
B, ventoinha; C. resistências de vezes, consideráveis quantidades de material, como
aquecimento; granulados para a preparação de comprimidos, e,
D, entrada de ar; E. saída de ar; F,
nesses casos, é v ulgar trabalhar-se com quantidades da
ordem das dezenas de kg. Em tais circunstâncias, as estufas convencionais são inadequadas para o
fim em vista, sendo necessário recorrer ao emprego de armários ou compartimentos de secagem,
cuja capacidade pode variar muito. Na Fig 118 A c B, pode ver-se um desses armários e a respectiva
secção vertical, o qual está especialmente indicado para a secagem de granulados.
A secagem de granulados fa/-se, actualmente, na indústria farmacêutica, mediante o emprego
de estufas de leito flutuante (Fluidized-Red Driers). Trata-se de estufas de ar quente, o qual incide
com certa pressão sobre o material a secar que se encontra numa câmara de secagem. Esta é
construída em tecido permeável ao ar ou a outros gases os quais a atravessam de baixo para cima, o
que ocasiona a movimentação das partículas a secar e o seu íntimo contacto com o ar ou o gás
utilizado. Nestas circunstâncias, cada partícula é complelamente rodeada pelo ar, o que confere
maior eficiência ao sistema. Além disso, o próprio turbilhão do ar mistura intimamente as partículas
entre si, o que leva à uniformização da temperatura em toda a câmara.
A Fig. 119 apresenta o esquema de uma destas estufas no qual está claramente indicado o seu
processo de funcionamento.
A propósito dos comprimidos voltaremos a considerar este assunto.
199

Também a secagem das plantas medicinais pelo ar quente, em escala industrial, só pode fazer-
se em instalações especiais. Entre outos processos usados para este fim, contam-se os secadores em
túnel, também chamados secadores contínuos ou de contra corrente, nos quais as drogas vegetais,
dispostas em tabuleiros assentes em carros metálicos deslizando sobre carris, são exsicadas por uma
corrente de ar quente, a qual se desloca em sentido contrario do do material a secar.

Fig. 118. Armário-estufa para a secagem de granulados: A, aspecto


exterior; B, vista do mesmo em secção vertical

Os secadores contínuos podem assumir ainda a forma de um cilindro inclinado que gira em
volta do seu eixo. A substância a secar, geralmente pós ou granulados, é introduzida na parte
superior, circulando o ar quente em sentido inverso ao do produto que se pretende obter seco.
A vantagem destes secadores reside no facto de a secagem se fazer progressivamente, pois à
saída do aparelho o ar está mais quente e menos carrregado de humidade, sendo nesta fase do
percurso que é eliminada a humidade que não foi retirada na
200

passagem através da parte superior do aparelho. A Fig. 120 ilustra um aparelho deste tipo.
A secagem pelo ar quente pode tornar-se mais rápida e exigir temperaturas menos elevadas se
se fizer o vazio no interior da estufa. Estas estufas de vazio são construídas
de maneira a suportarem um vácuo mais ou menos acentuado, diferindo das
estufas normais sobretudo pelo aspecto da porta, a qual está construída de
modo a permitir uma vedação estanque e, ainda, por terem um tubo, provido
de torneira, que estabelece a comunicação do interior da estufa com o
exterior, por onde se faz o vazio (Fig. 121).
Como já referimos a propósito das estufas normais, também estes
modelos de estufas de vazio só se prestam para a secagem de quantidades
diminutas de material, utilizando-se, à semelhança do caso anterior,
armários de vazio para o tratamento de consideráveis volumes de produto a
s~* «x
o o secar.
o o A Fig. 122 representa um desses armários, tipo PASSRURG, o qual é
o o
constituído, geralmente, por uma câmara paralelipipédica de dupla parede
Fig. 119.s L/Esquema de * um
Fiuidized-Bed Died. 1. exaustor; 2. aquecida por vapor,, em cujo interior estão dispostas várias prateleiras
rede de dispersão do ar aspirado; também aquecidas. A parede anterior do armário é ocupada por uma porta
3. filtro de nylon; 4. pó a secar; 5.
redes de entrada de ar; 6. estanque, munida de fechos colocados no centro ou lateralmente, dispondo-
resistências de aquecimento do ar; se o material a secar em tabuleiros que se colocam nas prateleiras
9. regulação do fluxo de saída do
ar
aquecidas. Na parede posterior estão dispostos os tubos de chegada do
vapor para o aquecimento
da dupla parede e das prateleiras, encontrando-se montado na parte superior o tubo que estabelece
comunicação entre o interior do armário, o condensador de vapores e a máquina de vácuo. Mediante
a aspiração provocada por esta última, produz-se e

Materi
al
Ar frio

Material seco •——————-Fig. 120. Esquema de um


secador contínuo tipo cilindro inclinado

mantém-se um vazio relativo dentro do armário, o que permite uma secagem mais rápida e a
temperatura mais baixa do que seria conseguido operando-se à pressão normal.
201

Quando se pretenda obter a condensação integral do vapor de água ou recuperar


o solvente que esteja a impregnar o material, o referido armário deve funcionar ligado a
dois condensadores. O primeiro é um condensador normal, arrefecido por água, estando o segundo
montado entre aquele e a bomba de vazio c arrefecido por uma mistura frigorifica.
Também existem cilindros para se efectuar a
secagem no vazio. Uns são fixos, estando neste
caso munidos de pás interiores que agitam o
material pulverulento a secar, havendo outro tipo,
este rotativo, cujo eixo de rotação pode ou não
coincidir com o eixo do cilindro.
Finalmente, ainda dentro dos processos de
secagem de sólidos pelo ar quente, queremo-nos
referir a um certo tipo de aparelhos, como o de
ARDRRHALDEN (Fig. 124), utilizados, sobretudo,
nos laboratórios de análise química, nos quais a
secagem é feita em presença de um exsi-cante, sob vazio, e
aquecendo a substância Fig. 121. Estufa de vazio
a secar. Combinam-se, assim, num único aparelho, todas as possibilidades oferecidas por cada um
dos métodos utilizados separadamente, molivo por que uma secagem realizada nestas condições é
levada ao extremo e obtida com certa rapidez.
A substância a secar é introduzida no tubo interior horizontal (Subs. a exs.), após o que se faz o
vácuo no aparelho, onde já se tinha colocado o exsicante (Exs.). que,
®
Fig. 122. Armário para a secagem por ar quente e vazio: 1, dupla parede aquecida; 2,
prateleiras aquecidas: 3,
porta estanque com
fechos laterais; 4, tabu-
leiro onde se coloca o
matéria* a secar; 5.
entrada de vapor; 6, tubo
coleclor de vapor; 7,
condensador; 8, bomba
de vazio; 9, colector do
condensado
202

geralmente, é o anidrido fosfórico. A vaporização do líquido contido no balão situado à esquerda,


escolhido de acordo com a temperatura a que se pretende aquecer a substância, faz com que a
pressão de vapor desta aumente significativamente, enquanto que a do exsicantc se manlém baixa,
pois está à temperatura ambiente. Este facto, aliado ao vazio previamente feito no aparelho, permite
uma rápida transferência das moléculas de água do corpo a secar para a substância exsicante.

Exs.
CONDENSAD
OR E VAZIO

Fig. 123. Esquema de um secador rotativo sob vazio Fig. 124. Exsicador de
Abderhalden

6.3.4.2.4. Secagem por radiações infravermelhas

Neste lipo de secagem utiliza-se como fonte de calor para a evaporação da água a energia das
radiações infravermelhas de comprimento de onda compreendido entre l O 000-20 000 À.
Os raios infravermelhos são capazes de penetrar no material com que estejam em contacto c
transformarcm-se cm energia calorífica, promovendo, assim, uma elevação de temperatura
susceptível de assegurar a evaporação da humidade existente nos corpos sobre que incidem. A
vantagem deste processo de aquecimento em relação aos métodos
convencionais, geralmente utilizados,
reside no facto de que, com estes últimos, se obtém um
Lãmpadade l. V.
aquecimento rápido à superfície mas bastante
lento no interior dos corpos a secar, ao passo
que as radiações infravermelhas permitem uma
distribuição muito mais homogénea do calor
Tapete através do produto que se pretende exsicar.
transporta
dor Utilizam-se, em geral, lâmpadas de 250 W,
Produto desenvolvendo uma tem-
seco
Fig. 125. Secador em túnel por radiações
infravermelhas (Esquema)
203

peratura de 50 a 6O'C. que se podem colocar em estufas. Nas instalações de tipo industrial a
secagem por raios infravermelhos é feita em túneis ou galenas equipadas com lâmpadas capazes de
emitirem as mencionadas radiações, sendo o material a secar deslocado sobre passadeiras rolantes
ao longo da galeria. Este transporte, no entanto, deve ser realizado a uma velocidade
predeterminada, a qual permita que o material fique exposto ã acção das radiações infravermelhas
durante o tempo considerado necessário para que se dê a secagem.

6.3.5. EXSICAÇÃO

A exsicação é a operação por meio da qual se privam as substâncias cristalinas da sua água
de cristalização por aquecimento a uma temperatura elevada.
Em geral, os compostos tendo água de cristalização perdem-na, em pane, com relativa
facilidade por eflorcscência, daí resultando que (ais substâncias podem apresentar uma composição
variável e pouco definida. Por este motivo, e a fim de tornar a composição desses produtos uniforme,
é costume, muitas vezes, proceder à respectiva exsicação, ou seja, à eliminação lolal da sua água de
cristalização.
A exsicação deve fazer-se promovendo, numa primeira fase, a cflorescëncia do produto cm
causa, expondo-o ao ar, por vezes em ambiente ligeiramente aquecido.
Esta secagem inicial a baixa temperatura tem por fim evilar a fusão dos cristais ou a sua
dissolução na água de cristalização, o que, a verificar-se, pode interferir com a fase subsequente do
processo de exsicação.
Só depois de um período mais ou menos longo de exposição ao ar é que o composto deve
começar a ser gradualmente aquecido, até que acuse peso constante, momento em que se dá a
operação por terminada.

6.3.6. CONSERVAÇÃO DAS SUBSTÂNCIAS SECAS


Certas substâncias, depois de conve- nientemente secas,
conservam-se nesse estado sem dificuldade, mantendo-se praticamente
isentas de água, ao passo que outras mostram uma pronunciada higrosco-
picidade, apresentando sempre um apreciável teor de humidade.
Tal facto verifica-se com muitos produtos farmacêuticos, como certos
pós vegetais, preparações opoterápicas, extractos secos, etc., sabendo-se, por exemplo,

Fig. 126. modelos de frascos exsicadores


204

que o pó de dedaleira, colocado numa .atmosfera contendo 100% de humidade, pode absorver 80%
do seu peso de água.
Em geral, tais produtos são muito sensíveis à humidade relativa do ar e para poderem ser
conservados nas devidas condições deverão ser encerrados em recipientes especiais.
Para esse efeilo, são hoje correntemente utilizados frascos de capacidade apropriada, providos
de rolhas ocas, no interior das quais se coloca uma substância higroscópica, a qual origina uma
atmosfera seca dentro do frasco, à semelhança do que acontece nos exsicadores, de que alrás já
tivemos ocasião de falar.
Na Fig 126 representam-se dois modelos destes frascos, cuja substância exsicante é,
geralmente, o gele de sílica ou a alumina, produtos que se caracterizam por não deliquescerem e
serem facilmente regenerados por aquecimento.

BIBLIOGRAFIA

BENTLBY'S Text-kook of Pharmaceutics, pág. 186.


CASADIO, S., Tecnologia Farmacêutica, pág. 78.
GORIS, A.. LIOT, A., JANOT, M. M. e GORIS, An., Pharmacie Galénique, Tomo II, pág. 1102. LÊ
HIR, Abre gê de Pharmacie Galénique, Masson, 2." edição, 1977. OSOL, A., RfiMiNGTON-s
Pharmaceutical Sciences, pág. 193 PONCI e GIALDI, Farmaco (Prat.), 10, 213 (1955).
BROUGHTON, G., Solvem Remova!, Evaporation and ürying, Cap. VII, Technique of Organic
Chemislry. pág. 605.
205

6.4. LIOFILIZAÇÃO 6.4.1.

GENERALIDADES

Designa-se por liofilização uma técnica especial que permite a secagem de um corpo após
prévia congelação, removendo-se a água congelada (') por sublimação à custa de um vazio intenso,
de modo a dar-se, directamente, a passagem do estado sólido ao gasoso, sem que em qualquer
momento da operação o gelo formado retome o estado líquido.
Se bem que este processo de dessecação tenha recebido outras designações, como
criodessccação, criossubUmação ou freeze-drying, a verdade é que o termo liofilização, ao que parece
utilizado, pela primeira vez, por REICHEL, MASUCCI e BOYER, para denominar esta técnica de secagem, é o
mais empregado na linguagem científica corrente.
Dado que liófilo significa, textualmente, amigo dos solventes, o referido vocábulo traduz, com
fidelidade, as propriedades que caracterizam os produtos sujeitos a tal operação, os quais se
apresentam como corpos sólidos, de aspecto geralmente esponjoso e muito ávidos da fase líquida
deles eliminada, o que torna bastante fácil a sua redis-solução no momento desejado.
A aplicação da técnica da liofilização à secagem de substâncias alteráveis exigiu anos de
pacientes e laboriosas investigações antes que se tornasse a maravilhosa realidade que é
presentemente. De facto, há muito que os cientistas procuravam um meio apropriado à dessecação de
certos produtos de origem biológica, os quais, na sua grande maioria, são total ou parcialmente
destruídos quando submetidos aos processos convencionais para esse fim utilizados. E apesar de as
primeiras tentativas realizadas com tal objectivo datarem do século XVIII, a dessecação desses
produtos, exceptuando o caso particular do vírus da varíola, continuou por resolver durante muito
tempo.
Na primeira fase destas tentativas os produtos biológicos eram dessecados por processos
naturais, em que não intervinham nem aparelhos nem quaisquer artifícios que facilitassem ou
apressassem a secagem. Daí o motivo dos insucessos registados, o que levou, a partir de certa altura,
à utilização de várias técnicas físicas e químicas, as quais permitiram, então, obter resultados
nitidamente superiores aos conseguidos anteriormente.
Entretanto, dois físicos franceses inventaram em 1903 um aparelho que pode considerar-se como o
precursor dos liofilizadores actuais. De facto, numa comunicação apresentada naquele ano à
Academia das Ciências de Paris, D*ARSONVAL e BORDAS descreviam um sistema inédito de dessecação,
baseado na congelação do material a secar c na sua vaporização subsequente à custa do vazio,
fazendo a condensação dos vapores libertados durante a operação em recipientes colocados em
tubos de DEWAR,

Actualmente, a liofilização é utilizada igualmente para a eliminação de outros líquidos.


206

contendo ar líquido ou neve carbónica misturada com acetona. Este dispositivo permitia, no dizer dos
citados investigadores, secar completamente e em poucos minutos, sem qualquer alteração do
material, farinhas, açúcares, bem como soros, vacinas e outros produtos.
Estava, assim, descoberto o princípio básico da liofilização, mas o facto passou despercebido, a
tal ponto que em 1909 o fisiologista americano SHACKELL, ignorando, certamente, os trabalhos dos
dois físicos gauleses, reinventou o processo já anteriormente posto em prática por D?ARSONVAL e BORDAS.
Desta vez, porém, um conjunto de circunstâncias várias concorreu para que as extraordinárias
potencial idades desta técnica de secagem não passassem despercebidas.
SHACKELL trabalhava no Instituto de Fisiologia da Faculdade de Medicina de St. Louis e dedicava-se
ao estudo das variações do teor de glicogénio no fígado e nos músculos. Tendo verificado que os
processos vulgares de secagem provocavam a hidrólise do glicogénio, teve a ideia de congelar o
material com que trabalhava, sendo os produtos assim congelados submetidos ao vazio, para se dar
aquilo que ele designava por volatilização do gelo, cujos vapores eram recolhidos em ácido sulfúrico.
Apesar de não utilizar o condensador que já figurava no dispositivo inventado por D!ARSONVAL e
BORDAS, nem por isso SHACKELL deixou de conseguir a sublimação do gelo formado por congelação do
material e a sua técnica permitiu-lhe resolver o problema que nessa altura o preocupava. E porque se
tratava, sem dúvida, de um cientista de larga visão, SHACKELL anteviu logo o extraordinário alcance
desta nova técnica, afirmando que ela permitia dessecar certos produtos instáveis relacionados com a
imunologia, que essas substâncias poderiam ser, então, preservadas indefinidamente e anunciava,
ainda, ter sido capaz de impedir, com a sua aplicação, os fenómenos que normalmente destroem o
complemento. E a sua intuição levou-o a acrescentar que os soros terapêuticos figuravam entre
aquelas substâncias às quais lhe parecia ser justificável aplicar este processo de dessecação.
Em 1911, ainda SHACKELL, mas agora de colaboração com HARRIS, aplicou com pleno êxito a sua
técnica de secagem à conservação do vírus da raiva, abrindo, assim, amplas perspectivas ao emprego
da liofilização como meio de preservar produtos de natureza complexa e eminentemente alteráveis.
Na realidade, a pouco e pouco foram-se alargando as aplicações desta técnica a outros campos
das ciências biológicas. Assim, dado que os microbiologistas sempre se preocuparam com o problema
da conservação das culturas bactcrianas, não é de estranhar que HAMMER utilizasse, pela primeira
vez, em 1911, a liofilização para tentar conservar em boas condições estes seres delicados,
conseguindo, deste modo, manter vivas algumys bactérias durante mais de um mês.
Em 1914, ROGERS aplicou a liofilização à preparação industrial de fermentos lácticos e, alguns
anos mais tarde, SWIFT anunciava ter conseguido manter vivos durante dois a três anos estreptococos
liofílizados.
207

Finalmente, em Junho de 1935, ano decisivo para a consagração dos méritos da liofilização,
EI.SER, THOMAS e STEFFEN publicaram a súmula das investigações que vinham realizando há cinco anos,
dando a conhecer os excelentes resultados obtidos com a aplicação da técnica da liofílização à
conservação de soros, vacinas e bactérias.
A esta comunicação seguiu-se, decorridos poucos meses, a publicação, no Journal of
immunology, de um importante trabalho sobre o mesmo assunto, devido a FLOSDORF e MUDD. Estes
autores, que fazem reviver o termo íiofilização, já anteriormente utilizado por RBICHFL e colab.,
descrevem, no citado trabalho, variados aparelhos para a prática desta operação, os quais lhes
permitiram confirmar ou demonstrar a possibilidade de liofilizar um grande número de produtos
biológicos.
A primeira consequência prática das investigações de FLOSDORF e MUDD foi a de tornar possível
a conservação de soros humanos e sua "distribuição regular para uso clínico pela Philadelphia
Serum Exchange. Isto era o prenúncio da importantíssima realização que iria seguir-se-lhe — a
liofílização do plasma, conseguida em 1940 — e que veio consagrar, de uma vez para sempre, as
ainda não ultrapassadas vantagens da íiofilização como meio de conservar corpos caracterizados
pela sua extrema fragilidade.
De facto, a liofili/ação c considerada hoje como sendo o método ideal para a secagem de
produtos tcrmolábeis ou de substâncias de natureza complexa em que figurem constituintes altamente
sujeitos a alterações por vários agentes, como o calor, o oxigénio, a humidade e tantos outros. E isso
porque, graças à congelação brusca c intensa a que os corpos a liofilizar são submetidos, estes
conservam todas as propriedades que possuíam no momento da congelação, mantendo-se
integralmente uma vez secos por sublimação do gelo formado.
Um dos exemplos mais demonstrativos do que é possível conseguir-se com a liofílização no
capítulo da preservação das características de um corpo a ela sujeito é, sem dúvida, o da
conservação dos microrganismos. Neste caso particular não interessa apenas mante-los vivos. O que
importa, sobretudo, é que possam desenvolver-se como antes de liofilizados, que apresentem os
mesmos caracteres morfológicos, culturais, bioquímicos e biológicos. Ora, isto é hoje perfeitamente
conseguido, cm muitos casos, desde que se recorra a técnicas adequadas.
As vantagens que a íiofilização oferece podem resumir-se do seguinte modo:

1 — A baixa temperatura a que se opera evita qualquer alteração química das substâncias
decomponíveis pelo calor. Por isso, um produto seco por esta técnica mantém inalterável a sua
composição química original, a sua actividade terapêutica e outras propriedades características. Se
for acondicionado e armazenado convenientemente, poderá manter-se sem alteração durante um
.longo período.
2 — A perda de constituintes voláteis está reduzida ao mínimo.
208

3 — Os produtos liofilizados apresentam uma estrutura esponjosa, o que contribui para a sua
rápida dissolução, assegurando-se, assim, a reprodução fiel do produto original uma vez posto o
liofilizado em contacto com a fase líquida primitiva.
4 — Durante a secagem o desenvolvimento de microrganismos e as reacções enzimáticas são
inibidas pelas baixas temperaturas a que se opera, o mesmo acontecendo nos produtos secos, pois o
seu teor em água é tão diminuto que torna impossível qualquer manifestação vital.
5 — A tendência que certos produtos têm paru coagularem quando dessecados por outras
técnicas está grandemente reduzida utilizando este processo.
Não é de estranhar, por conseguinte, que a lista dos produtos correntemente submetidos à
liofilização esteja a aumentar dia u dia. Entre eles, podemos citar, por exemplo, certos antibióticos,
como a pcnicilina, substâncias contendo proteínas termolábeis, soro e plasma sanguíneos, bactérias,
vírus, tecidos humanos para enxertos, etc.
Como é lógico, a liofilização, desempenha, igualmente, um papel da maior importância na
Tecnologia Farmacêutica, sendo já bastante numerosos os medicamentos preparados recorrendo à
sua utilização: soros, vacinas, globulinas, certas enzimas, hor-monas diversas, complexos vitamínicos
e antibióticos.
Esboçado, resumidamente, o caminho que foi necessário percorrer para se atingir o alio grau
de eficiência que caracteriza a liofili/ação, tal como é praticada actualmente, postas em relevo as
suas incontestáveis vantagens e dada uma ideia sumária das suas numerosas aplicações, impõe-se,
agora, que a estudemos em pormenor, para que fiquemos a conhecer os aspectos teóricos e práticos
basilares relacionados com esta importante operação.

6.4.2. TEORIA DA LIOFILIZAÇÃO

Como se depreende da definição que demos de liofilização na pág. 205, esta consiste,
essencialmente, em desidratar pelo vácuo um produto congelado, através da sublimação do gelo. O
ponto fundamental do processo está em evitar que o gelo funda durante a operação, o que se
consegue com relativa facilidade desde que se actue abaixo do ponto triplo.
Se considerarmos o diagrama da Fig. 127, que representa o equilíbrio pressão--temperatura
para a água, verifica-se que há um ponto, precisamente o ponto triplo, definido pela intercepção das
coordenadas 0,0098°C e 4,58 mm de Hg, em que aquela coexiste, simultaneamente, nos estados
sólido, líquido e gasoso. Deste modo, torna-se evidente que para todos os pontos da linha
correspondentes a valores de pressão e temperatura inferiores aos que definem o ponto triplo, a água
só poderá existir nas fases sólida e gasosa em equilíbrio. Basta, portanto, operar em condições de
pressão e
209

Pressão em rrm de Hg

6
4
2 Só ido Líq ido >
,0 = Fu ao ~^- *^ S S»
2

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S
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O' Tcrr püratura
Fig. 127. Diagrama do equilíbrio pressão-temperatura para a água

temperatura que se situem abaixo do referido ponto triplo para que se obtenha a sublimação
do gelo e se evite a sua fusão, sendo também evidente que a sublimação será tanto mais intensa
quanto mais baixa for a pressão para cada valor de temperatura inferior a 0°C. No diagrama
da Fig. 128 observa-se, de modo esquemático, a coexistência das fases sólida, l í q ui da e
gasosa no ponto triplo (T).

_
Do que acabámos de dizer ressalta que há duas fases
capitais em todo o processo da liofilização: a congelação
prévia do material a liofïlizar, seguida da sublimação do
gelo formado, estando implicitamente ligada a esta última o VAPOR DE AGUA
problema da condensação dos vapores libertados durante a
operação. TEMPERATURA
Fig. 128. Diagrama esquemático do equilíbrio
pressão-temperatura para a água
210

6.4.2.1. Fenómenos físicos da congelação

Como acabamos de ver, a liolili/.ação inicia-se pela congelação prévia do material a dessecar, e esla
deve ser condu/ida segundo condições bem determinadas para que se torne possível a obtenção de produtos
com as características desejadas.
Na realidade, durante a congelação pussam-se determinados fenómenos que podem originar sensíveis
alterações na estrutura íntima de muitos produtos biológicos correntemente submetidos a esía técnica de
secagem, pelo que é necessário conhecê-los para que seja possível eviuí-los.
Rniretanto. para que se (orne compreensível o que .se passa durante a congelação dos produtos de
origem biológica, de natureza sempre bastante complexa, i m põe-se estudar, primeiramente, a t e nome no [og ia
da congelação em sislcmas mais simples. E como é natural, começaremos por examinai' o que se pa^su na
cri;.lali/ação da água.

6.4.2.1.1. Cristalização da água

A agua pura manlém-se no estado líquido até 0"(\ desde que a pressão seja de 760 mm de Hg. começando
a congelar logo que a temperatura atinja aquele \alor. Acontece, porém, que em certos casos a água
permanece líquida a temperaturas in l e-riores a 0"C, o que corresponde a um estado üe sohre-fusão. Tal
fenómeno ocorre, principalmente, nas estruturas capilares e, d u m modo geral, sempre que a liberdade de
movimentos das moléculas está cerceada. Todavia, este estado de sobre-lusão é m u i t o instável e basta uma
variação térmica ou um eleito mecânico para se verificar a cristal i/açâo espontânea.
For outro lado. as dimensões dos cristais de gelo dependem da velocidade da congelação. Se esta é feita
lentamente, formam-se núcleos de cristali/.ação em número redi)7ido. e. deste modo, os cristais são grandes e
irregulares. Se, pelo contrario, a cofïiíclaç/ão é feita bru.sc;mienlo, origina inúmeros centros de cristali/acáo, os
quais, desenvolvendo-se. transfoiTmar-se-ào em outros tantos cristais, mas agora muilo mais numerosos por
(inidaííe de .superfície e, por conseguinte, de dimensões mais redu/idas.
Depois de terminada esta cnstalUacão ini cial , pode acontecer que se a temperatura não for muito baí\a
se ifé uma nova recrtMüii/ação inlerna do gelo, (radu/ida pela aglomeração do> erislalitos, em cristais mais
volumosos.
Além disso, em determinadas condições, sobretudo quando se opera a temperaturas muito b-üxas e a
congelação é feita bruscamente, dá-se o fenómeno da viirificíi^ao. Isto significa que a água origina um
vidro, como acontece quando se condensa o vapor de água sobre uma placa metálica mantida à temperatura
do azoto líquido. Se. entretanto, elevarmos a temperatura após formação do viclro. este permanece
inalterável até cerca de -)3()°r. Só a temperaturas superiores é que se inicia uma cristali/ação lenta, pró-
211

duzindo-se modificações que levam à formação de um estado caracterizado pela sua instabilidade, não tardando a
rcgistar-se a desvitrificação, traduzida pela cristalização normal do material até aí amorfo.

6.4.2.1.2. Cristalização de soluções

A água presente nos produtos de origem biológica contém em dissolução vários sais minerais e outras
substâncias de natureza mais ou menos complexa, as quais provocam alterações sensíveis nos fenómenos de
congelação.

6.4.2.1.2.1. Cristalização de soluções salinas

A adição de sais à água altera não só a fornia como a cristalização se dá, mas também retarda a velocidade
da formação dos cristais.
Suponhamos o caso de uma solução de cloreto de sódio a IO"/™,. Ao arrefecer lentamente tal solução, os
primeiros cristais de gelo formam-se a cerca de -0,5"C. temperatura correspondente ao abaixamento crioscópico
do referido líquido. A partir daí a cristalização progride gradualmente, mas apenas se separa gelo no estado puro.
À medida, porém, que vai aumentando o número de cristais formados, o produto sujeito à congelação adquire a
estrutura de um sólido percorrido por vários interstícios, onde se acumula o que resta da solução ainda por
congelar, a qual se torna cada vez mais concentrada. De faclo, como nesta primeira fase apenas há formação de
gelo puro à custa da água da solução, a fase líquida vai diminuindo e, por consequência, terá que aumentar,
forçosamente, a sua concentração em produto dissolvido. Está calculado que, abaixo de -6"C, 90% da água
transforma-se em gelo e, portanto, a solução por congelar apresenta agora uma concentração 10 vezes superior à
do líquido inicial. Este aumento progressivo da concentração do líquido remanescente mantém-se até ser atingida
a temperatura de cerca de -21 "C, momento em que a solução intersticial congela bruscamente, formando-se uma
mistura íntima de cristais de gelo e de NaCl,2H2O. Tal mistura constitui um eutético e a sua temperatura de
congelação é, precisamente, de -21,3°C Como já tivemos ocasião de dizer quando tratámos dos processos de
arrefecimento (pág. 176), as misturas eutéücas apresentam composição diferente de umas para as outras mas
sempre fixa para cada caso particular, além de que cada uma tem a sua temperatura própria de congelação, a
qual se chama ponto eutético. Isto significa, por conseguinte, que se torna necessário determinar o ponto de
congelação para cada caso específico ou, então, impòe-se trabalhar a temperaturas muito baixas, como aliás se
faz na prática, pois só assim há possibilidade de se atingir o ponto eutético da solução que se pretende congelar.
212

Nem sempre, porém, os limites referentes à zona de congelação são nítidos e precisos como no exemplo que
escolhemos e, por isso, muitas vezes se fala de zona de eutexia, em vez de ponto eutético, o qual é sempre
perfeitamente definido.
Por outro lado, a adição de sais à água actua sobre a velocidade da cristalização. Vários autores, como REY,
TAMMAN e BUCHNER, entre outros, puderam demonstrar que diversos sais diminuem, consideravelmente, a velocidade
de formação dos cristais de gelo. Aliás, o mesmo acontece com certas substâncias orgânicas, como a glicerina, por
exemplo, verificando-se, além disso, que paralelamente ao atraso registado na cristalização as dimensões dos
cristais diminuem de modo muito considerável, ficando o líquido congelado nestas condições com um aspecto
característico, semelhante ao feltro.
Claro que os fenómenos a que aludimos apenas se observam durante a congelação lenta e gradual de uma
solução. De facto, é possível obter, igualmente, uma estrutura criptocristalina congelando rapidamente o líquido.
Nestas circunstâncias, não há, então, separação de fases, obtendo-se um produto vítreo e instável, o qual evolui
rapidamente, não tardando a cristalizar totalmente à semelhança do que acontece com a água pura.

6.4.2.1.2.2. Cristalização de soluções complexas

Além da água e sais minerais, figuram, como constituintes dos produtos biológicos, numerosas outras
substâncias, muitas delas dotadas de elevado peso molecular, que se encontram nas células no estado coloidal.
Ora, a congelação de tais compostos é sempre delicada, pois há o risco de sofrerem alterações e romper-se de
modo irreversível o equilíbrio anteriormente existente entre as fases dos sistemas de que fazem parte. Vejamos,
resumidamente, em que podem consistir essas alterações, servindo-nos, para isso, de três exemplos diferentes.
Consideremos, em primeiro lugar, as experiências de HAZEL e SCHIPPER, com ácido silícico em solução coloidal.
Se um sole deste ácido for congelado rapidamente a temperatura inferior a -55"C e, depois, também rapidamente
descongelado, o produto mantém-se estável. Todavia, se a descongelação for realizada lentamente, dá-se a coa-
gulação irreversível do sole.
Por outro lado, se o mesmo produto for congelado rapidamente a uma temperatura superior a -55°C, por
exemplo a -40"C, e depois arrefecido com azoto líquido, haverá congelação e desnaturação, qualquer que seja a
velocidade de descongelação. O mesmo acontece sempre que a congelação seja obtida lentamente, constituindo
este caso um exemplo de como as condições de congelação e descongelação podem originar a ruptura de um
equilíbrio coloidal preexistente. Trata-se, aqui, evidentemente, de um fenómeno meramente físico.
Mas pode acontecer que a congelação actue sobre os sistemas coloidais por intermédio de variações de
concentração salina por ela originadas. Assim, ao arrefecermos
213

uma gema de ovo, a cristalização inicia-se a -0,5 8°C, e se o arrcfecimenlo não ultrapassar -6"C verifica-se que,
após descongelação, a gema conserva a sua fluidez e não foi alterada. O mesmo já não acontece se a temperatura
for mais baixa, pois neste caso sucede que durante a descongelação se forma um precipitado irreversível de
lecitovite-linas. Entretanto, congelando a gema de ovo por imersão em azoto líquido (-l96nC) e promovendo a sua
rápida descongelação, aquela não sofre qualquer alteração. Este comportamento variável do mesmo produto
perante duas condições operatórias diferentes explica-se porque na segunda eventualidade tanto o arrefecimento
como a dês congelação foram de tal modo bruscos que não houve possibilidade de se formarem soluções salinas
concentradas, responsáveis pela precipitação das lecitovitelinas, o que, todavia, acontece no primeiro caso.
Finalmente, a própria natureza do sistema coloidal tem uma influência directa sobre o modo como se dá a
congelação, conforme foi demonstrado pelas experiências de MORAN e HARDY. Estes autores procederam à
congelação de discos de gelatina e verificaram que a forma da cristalização dependia, sobretudo, do grau de
hidratação da referida substância.
Assim, quando o produto contem menos de 34% de água, a estrutura do congelado é sempre homogénea e
cristalina, qualquer que seja o modo como a congelação tenha sido conduzida. Uma vez, porém, que a quantidade
de água esteja compreendida entre 60-90%, a forma de cristalização já depende inteiramente d?, maneira como se
tiver processado a congelação, ficando o produto com aspecto diferente consoante esta é feita lenta, rápida ou
muito rapidamente.

6.4.2.2. Mecânica da congelação

6.4.2,2.1. Primeira fase da congelação. Formação de cristais de gelo

Como acabámos de ver, quando se submete um produto à congelação, a primeira fase desta é representada
pela formação de gelo puro. Mas como também já acentuámos, sempre que o corpo se assemelhe a um sistema
capilar, é frequente observar--se o fenómeno da sobre-fusão, devido ao qual se mantém o estado líquido para tem-
peraturas nitidamene inferiores ao abaixamento crioscópico normal da solução que se pretende congelar.
Entretanto, a quantidade de gelo aumenta, gradualmente, à medida que a temperatura vai baixando. Deste
modo, a fase líquida diminui progressivamente e, mercê disso, a parte ainda não congelada torna-se, como é lógico,
cada vez mais hipertónica. O produto submetido à congelação assemelha-se, assim, a uma esponja de gelo, cujos
canalículos formam uma rede contínua cheia de um líquido altamente hipertónico, o qual só congelará quando for
atingido o respectivo ponto eutéüco.
214

Nestas condições, as células constitutivas dos produtos biológicos, quando arre tecidas a uriiii
temperatura superior à sua temperatura de eutexia. ficam cm contacto com líquidos hipertómcos c sofrerão,
forçosamente, alterações resultantes dos choques osmóticos provocados pela elevada concentração das soluções
que as banham. Isto significa que cm todo o processo de congelação existe uma /ona de temperaturas propícia
à formação de soluções de elevada concentração e. se quisermos evitar a acção nociva que estas exercem sobre
os sistemas coloidais das células, teremos que franqueá-la o mais rapidamente possível.

6.4.2.2.2. Congelação final. Formação de misturas eutéticas

Pelo que atrás dissemos, ç de esperar que a uma temperatura correspondente ao pomo entérico a
cristalização seja total. Quando esse ponto é atingido, tud o se lorna sólido e não existe, por conseguinte, o
perigo de se formarem soluções hipertónicas, com os inconvenientes já referidos. Deste modo, comprende-se o
enorme interesse de que se reveste a determinação precisa da temperatura de solidificação de um determinado
material, pois este valor constitui o li mite térmico superior a não ultrapassar para que se possa executar uma
liofilização sem que haja o risco de se provocarem fenómenos de puffing l 1 ) ou de fusão localizada.

6.4.3. DETERMINAÇÃO DA TEMPERATURA DE CONGELAÇÃO TOTAL

Dado o interesse prático que o conhecimento desse valor representa, surgiram vários métodos para a
determinação da temperatura de eutexia. constituindo o método proposto por (JRLAVLS, na opinião de RF.Y, um
dos melhores processos para esse f i m propostos.
O método em questão baseia-se no estudo da condutividade eléctrica do material congelado, o qual,
dada a sua estrutura espo.ijosa inicial, com canalículos cheios de líquido salino, é bom condutor da
corrente eléctrica, aumentando a sua resistência à medida que a congelação progride, ate um ponto em que
esta se torna m u i t o elevada e se admite que -o produlo está, então, completamcnte solidificado.
Com efeito, se arrefecermos, progressivamente, uma solução salina como o líquido de EARLE, verifica-
se que a sua resistência aumenta à medida que a temperatura baixa. Quando a temperatura atinge a
vizinhança de -45"C a resistência aumenta m u i t o rapi

( 1 ) O puffinx consiste na ebulição brusca do líquido relido nos inierslícios do produto c i|ii;ini1o
este é submetido ao va/io. o que origina uma espuma abundante.
215

damente, atingindo o valor de alguns milhões de ohm. em"1 ao redor de -50"C. Pode admitir-se que a cristalização
é, então, completa, e se o produto for reaquecido a resistência baixa rapidamente à medida que vai reaparecendo
a fase líquida. A partir de -20"C esta variação é mais lenta, sem dúvida porque, como geralmente se admite, a esta
temperatura as misturas eutéticas intersticiais readquiriram, na sua maior parte, o estado líquido.
Isto mostra que as propriedades físicas de um sistema aquoso mantido a baixa temperatura não dependem,
exclusivamente, da temperatura do sistema, num dado momento, sendo também necessário considerar o tratamento
térmico a que foi sujeito. Tudo parece indicar, portanto, que o período crítico seja o da congelação. Na realidade,
as curvas de variação da resistência correspondentes ao reaquecimento, traçadas no decurso de experiências
sucessivas, são perfeitamente sobreponíveis, ao passo que as mesmas curvas respeitantes ao período de
congelação apresentam grandes divergências. Tal facto pode airibuir-sc a uma sobre-fusão dos eutéticos em jogo,
como se depreende das investigações levadas a cabo por RFY. Este autor, servindo-se da observação microscópica
directa, verificou que as soluções de cloreto de sódio a 10%o, que em condições normais deviam estar
completamente cristalizadas a -2l,3"C, podem apresentar canalículos cheios de líquido mesmo quando arrefecidas
a cerca de -4O'C, temperatura à qual cristalizam, então, bruscamente.
Quer isto significar que, por vezes, o ponto de eutexia pode aparecer a temperaturas anormalmente baixas e
originar, assim, modificações nas curvas de resistência registadas durante a fase de congelação numa série de
ensaios, sem que o mesmo se observe nas curvas traçadas durante o período de reaquecimento do produto
congelado. Na realidade, o estudo da variação da resistividade eléctrica de uma solução aquosa de cloreto de
sódio mantida a baixa temperatura mostra que o eutético formado funde exactamente a -21,3°C quando o sistema
é aquecido.
Deste modo, pode afirmar-se que, para um sistema biológico qualquer, arrefecido a baixa temperatura, não
existe uma estrutura tipo que seja característica de um determinado valor de temperatura, salvo se ela for obtida
sempre do mesmo modo. De facto, a textura de um material congelado a -40'C será outra, diferente da primeira,
se o mesmo produto for previamente arrefecido a -8()"C e reaquecido, depois, à referida temperatura de -40°C. É
evidente, portanto, que o modo como o arrefecimento for realizado influencia directamente o processo da
cristalização e será o elemento determinante da estrutura final do produto congelado.
Em certa medida, porém, o estudo da resistividade do sistema a baixa temperatura permite ligar esta ou
aquela variação estrutural com um valor mais ou menos f ix o da resistividade eléctrica. Por este motivo, a medida
da resistividade do espécime, antes e durante a liofilização, pode fornecer indicações preciosas sobre a sua
estrutura e respectiva evolução e permitir, assim, que se regule, automaticamente, a operação quando isso se
torne necessário.
216
217

transformações vítreas seguidas de desvitrificação, como nas soluções p;licerinadas (Fig. 131).
Uma das principais vantagens oferecidas por este método de análise é, pois, a de
tornar possível seguir a evolução das fases vitrosas,
permitindo determinar, caso isso seja necessário, as .,
condições óptimas do tratamento térmico a aplicar a um
tal sistema. Suponhamos, por exemplo, que uma deter- .,
minada solução originava, no decurso de uma congela
ção moderadamente lenta, um sistema sólido em que *°
figurava uma percentagem notável de material vílreo. (
Ao pretender liofilizar um tal sistema, é de crer que no
decurso do reaquecimento o vidro se transformasse ~a
lentamente num líquido muito viscoso c, depois, se _,
tornasse cada vez mais fluido, originando assim um
acidente de puffing ou de fusão local. ~'
Em casos como este, a análise térmica diferencial _2 pode
mostrar que durante a fase de reaquecimento lento o líquido
viscoso cristaliza bruscamente e origina um sólido de estrutura o 10 to 9a
123 minutos
homogénea a determinada temperatura. De posse desta indicação, Azoto '
* horss
poder-se-ia aplicar ao material a liofilizar o tratamento térmico líquido
mais indicado: um primeiro arrefecimento para congelar a Fig. 131 Diagrama da análise térmica
solução; um reaquecimento lento e regular para provocar a diferencial de uma solução fisiológica
cristalização das formas vitrosas; finalmente, um novo arrefeci- tamponada (líquido de Earie contendo 5%
mento destinado a levar o sólido cristalino formado à temperatura de glicerina) congelada rapidamente em
azoto líquido e aquecida lentamente. Após
conveniente para a sublimação do gelo. uma modificação vitrosa a
Deste modo, uma vez conhecida a temperatura de -117°C, a solução apresenta um fenómeno
cristalização total, determinada por resistividade, a temperatura de de desvitriticação a
-105n C. Observa-se depois cristalização
fusão inicial e as propriedades térmicas do sistema a baixa
exotérmica da água cúbica em água
temperatura, torna-se possível conduzir uma liofilização com exagonal (-86°C) e, seguidamente, o início
segurança e o máximo de eficácia. Na realidade, o conhecimento da fusão do eulético gltcerina-água (a -
destes elementos evita, por um lado, a realização de um número 58°C), até fusão total, a -28°C. (Segundo
Rey}.
razoavclmenle
grande de ensaios para se estabelecer a técnica mais apropriada a cada produto e toma possível um
melhor aproveitamento das instalações de liofilização.

6.4.5. CONGELAÇÃO A TEMPERATURAS MUITO BAIXAS

Como se depreende das considerações anteriormente feitas, para liofilizar um produto qualquer é
necessário arrefecê-lo suficientemente para que a sua cristalização seja total. Mas desde que se trate
de substâncias caracterizadas por grande fragilidade,
218

em particular tecidos vivos, a velocidade da congelação tem grande importância, pois entre o
aparecimento dos primeiros cristais de gelo e a crislalização total das misturas eutéticas estende-se,
por vezes, uma larga zona térmica, dentro de cujos limites se originam soluções fortemente
hipertónicas, cuja acção sobre os sistemas coloidais celulares c, como vimos, altamente prejudicial.
ImpÒe-se, portanto, que os limites dessa zona sejam atravessados o mais rapidamente possível e.
por isso, em todas as congelações lentas convém dar a devida atenção ao modo como se efectua a
transferência de calor através do espécime a congelar. Aliás, o exemplo proposto por MHRYMAN
ajuda--nos a compreender como as coisas se passam (Fig. 132).

Frente de cristalização
Fig. 132 Evolução da temperatura no interior de um sistema aquoso
isotrópico mergulhado num banho refrigerante a -196°C com contacto
térmico perfeito. (Segundo Meryman)

Suponhamos uma esfera de um líquido isotrópico mergulhada num banho refrigerante com o
qual estabelece um contacto térmico perfeito. Admitamos que no início da congelação a temperatura
do banho era de -l96"C e no centro da esfera de +20"C. Nestas condições, forma-se, muito
rapidamente, um invólucro de gelo à periferia da esfera e a sua espessura vai aumentando em
direcção ao centro desta. E como a condutibilidade calorífica do gelo é bastante superior à da água
e o seu calor específico é cerca de metade do daquela, acontece que a temperatura desce
rapidamente no interior da camada de gelo e o líquido residual no centro da esfera vai sendo
também arrefecido com facilidade. Assim, desde que a temperatura do banho seja mantida a -196"C,
a zona de temperaturas perigosas, que geralmente se estende de 0° a -40"C, será atravessada com a
rapidez suficiente para se evitar a actuação das soluções altamente concentradas.

6.4.6. PROCESSOS PARA OBTENÇÃO DE CONGELAÇÕES RÁPIDAS

Na prática, portanto, a congelação é sempre feita o. mais rapidamente possível, utilizando-se


para isso, em geral, as temperaturas finais de -SO^C, correspondente à neve carbónica, e de -\96aC,
dada pelo azoto líquido.
219

No entanto, só pode conseguir-se um abaixamento térmico muito rápido cm condições especiais


e, assim, o produto a congelar deve ser de pequenas dimensões e apresentar para um pequeno
volume uma grande superfície; por outro lado, o refrigerante usado deve ter uma temperatura
extremamente baixa, um calor específico elevado e deve contactar intimamente com o material a
congelar.
Ora, a neve carbónica utilizada isoladamente dá um mau contacto térmico, devido ao anidrido
carbónico gasoso que liberta, pelo que é geralmente utilizada em mistura com o álcool ou a acetona,
que evitam o inconveniente atrás apontado e permitem ainda a oblcnção de temperaturas um pouco
abaixo de -80°C. Quando é necessário empregar temperaturas inferiores, usa-se o azoto líquido, o
qual também não permite um bom contacto com o produto a arrefecer, pois este, de início, fica
rodeado por uma camada isolante de azoto gasoso, o que retarda o arrefecimento. Por este motivo,
prefere-se, actualmente, empregar certos líquidos orgânicos arrefecidos à temperatura do azoto
líquido, como o isopentano, para temperaturas até -150°C, e o propano líquido até -I96°C. Dado
que, em tais circunstâncias, estes líquidos estão a uma temperatura muito inferior ao seu ponto de
ebulição, não há possibilidade de se registar a formação de camadas gasosas isolantcs c o material a
congelar é perfeitamente molhado pelo banho refrigerante, do que resulta um arrefecimento muito
mais rápido.

6.4.7. SUBLIMAÇÃO DO GELO

Discutidos alguns dos aspectos mais importantes relacionados com a congelação do material a
liofilizar, passaremos, agora, a considerar os problemas que a fase seguinte do processo, ou seja, a
sublimação do gelo, envolve.
Para melhor compreensão do assunto, impõe-se que, antes de abordarmos o estudo da
aparelhagem utilizada na prática, consideremos a marcha teórica da sublimação, servindo-nos, para
isso, do esquema representado na Fig. 133.
O aparelho compreende, como se vê, uma câmara de secagem, A. ligada a um condensador, B,
por sua vez em comunicação com uma bomba de vazio. O material a secar é colocado na referida
câmara A, e se o sistema estiver fechado e em equilíbrio no vazio, existirá em A uma pressão de
vapor, p, correspondente à pressão de vapor saturante do gelo à temperatura /. Entretanto, se a
bomba de vazio trabalhar cm condições tais que a pressão no compartimento B seja mantida
constantemente a um valor inferior a p, produzir-se-á uma emissão contínua de vapor e a substância
vai secando lentamente.
Supondo que pt> é a pressão correspondente ao vazio limite dado pela máquina em B, o vapor
condensar-se-á aí se a temperatura T for tal que a pressão do vapor de água saturante do gelo a essa
mesma temperatura seja inferior a pti. Desta maneira, o gelo destilará sob a forma de vapor em A e
irá depositar-se à superfície do condensador B,
220

dependendo, como é evidente, o fluxo de vapor entre A e B das tempcralura^ / e T a que estas duas
partes do aparelho são mantidas, pois quanto mais afastadas elas estiverem mais rápido será esse
fluxo.

Prgduto
congelad
o \

Fig. 133. Esquema de um aparelho de liofilízação

No entanto, é a pressão no interior do aparelho que condiciona o regime de circulação do


vapor dentro daquele. Assim, desde que a pressão se mantenha relativamente elevada (1/10 a
1/100 de mm de Hg), o percurso médio livre das moléculas de água é pequeno em relação à
distância que separa o condensador do material, e, nestas condições, o vapor circula em regime
difuso. Quando, porém, o vazio é inferior a IO"1 mm de Hg, o percurso médio livre das moléculas
de água torna-se igual ou superior à distância que separa o condensador do malerial a sublimar e
então o fluxo é do tipo molecular.

6.4.7.1. Emissão de vapor

Como se depreende do que acabámos de dizer, o mecanismo íntimo da liofiliza-ção resume-


se a sublimar o gelo resultante da congelação do material a dessecar e, para isso, é necessário
criar as condições para que se estabeleça uma corrente contínua de vapor desde a superfície do
produto, encerrado na câmara A, até ao condensador, situado em B (Fig. 133).
221

Acontece, no entanto, que esta emissão contínua de vapor à superfície dos cristais de gelo
provoca dois fenómenos térmicos distintos; Por um lado, a vaporização origina um
arrefecimento continuo das superfícies emissoras de vapor e, por outro, exige que o meio
ambiente à periferia do produto mantido a uma temperatura fixa t. forneça a este uma quantidade
constante de calor. Na realidade, se admitirmos que o contacto térmico entre o material
congelado e o meio que o rodeia é perfeito, de tal modo que esse material esteja à referida
temperatura t, toma-se necessário, para que esta se mantenha sem variação, que se forneça
continuamente ao meio que circunda o material a secar uma certa quantidade de calor para
compensar o arrefecimento devido à sublimação do gelo. Só assim é possível, como se
compreende, manter em equilíbrio a temperatura do produto a liotïlizar com a do meio
ambiente, estando calculado que a quantidade de calor a fornecer, correspondente ao calor de
sublimação do gelo, é de 672 calorias por grama de água à temperatura de -30"C.
Isto significa, por conseguinte, que a sublimação do gelo apenas se dará a uma velocidade
razoável se o produto a liofilizar for convenientemente aquecido. Este aquecimento constitui, como é
óbvio, um dos pontos cruciais e mais delicados de todo o processo da liofilização propriamente
dita, e a ele voltaremos mais adiante; todavia, antes de o abordarmos mais pormenorizadamente
parece-nos aconselhável passar em revista outros factos ligados à sublimação.
Assim, mesmo que as condições de temperatura a que o espécime se encontre sejam as
consideradas óptimas, é preciso não perder de vista que o vapor que abandona a interfase
material-atmosfcra confinante terá que percorrer uma certa distância até chegar ao condensador
e que durante este percurso alguns obstáculos se opòem à sua marcha, sendo uns representados
pelo próprio material e outros devidos ao aparelho. Vejamos em que consistem.

6.4.7.1.1. Resistência oposta pelo espécime

Ao iniciar-se a liofilização, os cristais de gelo situados à periferia do material sublimam


facilmente, pois o produto não opõe qualquer resistência à libertação de vapor.
v
A medida, porém, que a dessecação prossegue, vai-se formando uma crosta de material seco
à superfície do produto congelado, de modo que a interfase de sublimação, definida como sendo a
Unha que separa a parte interna da camada exsicada da parte externa da massa congelada (ver
Fig. 133, pág. 220) vai-se situando a uma profundidade cada vez maior, pois, como é evidente, a
espessura da referida crosta aumenta à medida que a liofilização prossegue.
Deste modo, quando um cristal de gelo sublima na interfase, o vapor formado terá que
atravessar toda a camada seca que se lhe sobrepõe até chegar ao exterior. Segundo STEPHESON,
este fluxo de vapor é praticamente perpendicular à interfase de sublimação
222

e a sua marcha ao longo do material a liofilizar faz-se através dos espaços deixados livres pela
sublimação das sucessivas camadas de gelo. Ora, como tais espaços apresentam nas suas paredes
pequeníssimas soluções de continuidade, a camada dessecada fica atravessada por uma rede de
estreitos canalículos comunicando uns com os outros, a qual constitui a via de saída para o
exterior do vapor resultante da sublimação dos cristais de gelo à superfície da interfase.
É claro que esta travessia que o vapor é obrigado a fazer para atingir o exterior poderá
realizar-se com maior ou -menor facilidade e isso é que representa a resistência do espécime à
emissão do vapor, definindo-a GERSH e STEPHHSON como o inverso da probabilidade para que
uma molécula de água emitida por um cristal de gelo atinja a superfície exterior antes que seja
fixada de novo sobre outro cristal. São vários os factores que podem condicionar a resistência do
espécime, como a forma dos cristais de gelo, a disposição das misturas eutcticas e suas linhas de
fractura. Também a espessura da camada exsicada desempenha um papel a considerar, tendo-se
verificado ainda que, para espessuras iguais, a forma da referida camada é também um elemento
a ter em conta, sendo a forma esférica a mais permeável.
Por outro lado, o regime de circulação do vapor no interior da substância seca também
condiciona a resistência por ela oposta. Assim, no regime difuso, próprio dos produtos
congelados a temperaturas medianamente baixas, tendo originado cristais de apreciáveis
dimensões, o percurso médio livre das moléculas de água é pequeno em relação com os espaços
intercristalinos, e a resistência oferecida pelo material será, em tais condições, fraca. Tratando-
se, porém, de um regime de circulação molecular, o produto já opõe apreciável resistência à
emissão de vapor, pois neste caso o percurso médio livre das moléculas é muito grande em
relação aos interstícios que separam os cristais. É o que acontece com as soluções congeladas a
baixa temperatura, que originam uma rede microcristalina de estrutura muito fina.

6.4.7.1.2. Resistência oposta pelo aparelho

A aparelhagem utilizada na liofilização pode oferecer, igualmente, uma certa resistência à


sublimação do gelo, a qual depende, sobretudo, do volume de vapor emitido e do tipo de
circulação deste.
Desde que o fluxo do vapor seja do tipo difusivo, a resistência oposta pelo aparelho será
tanto mais fraca quanto menor a distância que separa a superfície de condensação do produto a
sublimar e quanto maior a diferença de pressões às respectivas superfícies. O regime difuso
prevalece desde a pressão atmosférica normal até à pressão de IO"1 mm de Hg, representando,
portanto, o tipo mais generalizado de circulação de vapor na liofilização, e como o percurso
médio livre das moléculas que lhe está associado é pequeno, a presença de quantidades
consideráveis de ar residual pode aumentar as dificuldades de circulação do vapor. Por esse
motivo, o vazio primário deve ser
223

levado a um grau tal que o ar dentro do aparelho seja eliminado o mais possível e, por outro lado,
é da maior importância que não existam estrangulamentos entre a câmara e o condensador. Esta
característica assume um interesse especial quando o fluxo de vapor é abundante, pois nesta
eventualidade tais estrangulamentos oferecem uma acentuada resistência à passagem daquele.
Quando a liofilização se faz a pressões da ordem de K)-4 mm de Hg o fluxo de vapor passa a
ser do tipo molecular e a resistência oferecida pelo aparelho depende neste caso, principalmenle,
da sua forma geométrica. Isto verifica-se nas liofilizaçòes executadas a lemperaturas muito
baixas, circunstância em que a dessecação é sempre bastante lenta. Por isso, o desenho da
aparelhagem desempenha, nestas circunstâncias, um papel preponderante, devendo esta ser
concebida de modo que as moléculas de vapor que deixem o produto atinjam a superfície de
condensação directamente, ou, quando muito, após uma ou duas reflexões sobre as paredes do
aparelho.

6.4.7.2. Aquecimento do material congelado

Acabámos de passar em revista alguns dos factores que podem contrariar, em certa medida,
a emissão de vapor à superfície dos cristais de gelo e já então tivemos oportunidade de salientar
a necessidade de fornecer uma certa quantidade de calor ao produto a sublimar.
De facto, as condições cm que se processa a liofilização devem assegurar um perfeito
equilíbrio entre a pressão e a temperatura a que a operação c executada, pois de outro modo esta
será extraordinariamente demorada. Com efeito, a velocidade de sublimação do gelo será tanto
maior quanto mais baixa for a pressão a que se opere e mais elevada a temperatura a que estiver
o material a dessecar, e, por este motivo, quando a liofilização for realizada a baixa temperatura
a sublimação só se verifica criando no aparelho um vazio muito pronunciado.
Entretanto, na prática recorre-se quase sempre ao aquecimento do material congelado para
apressar a sublimação do gelo, mas tal aquecimento terá que ser feito em condições
perfeitamente controladas, sob pena de conduzir a resultados desastrosos.
Na realidade, a quantidade de calor a fornecer deve ser tal que nunca, em qualquer
momento da operação, provoque a fusão dos eutéticos presentes no produto congelado, e, por
outro lado, terá que fornecer as calorias necessárias para a sublimação do gelo.
Daqui se torna evidente que os fenómenos ligados à referida sublimação constituem o fulcro
central da liofilização, podendo representar-se o processo de sublimação pela seguinte equação:

dQ dm
———— = Csub,———— O
dt dt
224

em que Q é a quantidade de calor necessária para sublimar a massa m no tempo t e Cíub! (calor de
sublimação) é uma conslanle, expressa em caloria. g~', que se calcula pela equação de CLAPEYRON:
T dp / l
(2)
J dt

a qual estabelece a relação entre a temperatura T, a. pressão do vapor saturante p e as massas específicas do
vapor e do sólido, respectivamente \ivap e |l.çrï/, sendo ./ o equivalente mecânico da caloria.
Como vimos ao descrever a marcha da emissão do vapor (pág. 220), à medida que o gelo é sublimado o material a
dessecar cobre-se de uma crosta mais ou menos espessa de material exsicado, percorrido por uma rede de canalículos
comunicando entre si, de modo que a ínterfase de sublimação se vai situando cada vez mais no interior da massa.
Considerando para uma área unitária da interfase de sublimação um canalículo a ela perpendicular, através do qual se
dá o fluxo de vapor, esse canalículo corresponderá aos espaços deixados livres pêlos cristais de gelo, que se pode
admitir serem cúbicos e todos de iguais dimensões. Representemos por A a área da face dos referidos cubos e por a a
área total das soluções de continuidade existentes nas respectivas paredes que, como vimos, constituem a via de escape
do vapor.
Ora a teoria clássica dos gases prevê a seguinte relação para a massa de vapor que passa através de um orifício, de um
ambiente para o outro, na unidade de tempo (CHAMPIONe DAVY):
dm s (/?,-/?,)
(3)
dt (2 n RT)

cm que s é a área da abertura através da qual flui o vapor,/?! e p,, são, respectivamente, as pressões interna e
externa, T a temperatura e K a constante dos gases perfeitos.
No caso que nos interessa s = a/A; p} = pf, ou seja, a pressão do vapor na interfase de sublimação; p, = p^ sendo p^ a
pressão à superfície externa. Teremos então:

dm a P -p
s
* (4)
dt A (2 TT RT)1

equação que exprime a quantidade de vapor que flui da massa a sublimar por unidade de tempo à temperatura T.
Para que o ritmo da emissão de vapor não sofra flutuações apreciáveis é necessário, portanto, que a interfase de
sublimação, cuja localização, como já dissemos, varia no decurso da secagem, receba do exterior uma quantidade de
calor que a mantenha a
225

uma temperatura constante. Ao discutirmos este assunto teoricamente partimos da premissa de que o contacto temi iço
entre a fonte de calor c o material era perlei to. mas na realidade as coisas passam-se de modo diferente, o que torna o
aquecimento do material um dos pontos mais delicados da liofilização.
De facto, acontece que, na prática, o calor fornecido ao material tem que atravessar uma serie de camadas
possuindo condutibi l idades térmicas diferentes, até atingir a superfície de evaporação, por vezes situada bem no
interior do produlo a secar. E como este é geralmente acondicionado cm frascos, cujas paredes podem apresentar uma
espessura muito variável, compreende-se como é difícil fazer chegar ao local exacto a quantidade de calor necessária
para a boa sublimarão do gelo. Acontece ainda que em vários modelos de liofilizadores de tipo industrial o fundo dos
recipientes é o único ponto em contacto com a superfície de aquecimento. Em tais aparelhos loma-sc necessário que
as superfícies de aquecimento estejam a temperaturas relativamente elevadas para aquecerem convenientemente a /ona
de sublimarão. Daqui resulta que o material congelado situado no fundo do frasco, se estiver em contacto directo com
a fonte de calor, corre o risco de ser aquecido a uma temperatura superior à da /ona de eutexia e sofrer fenómenos de
fusão. Um processo de aquecimento semelhante ao que acabamos de referir provoca, necessariamente, gradientes
térmicos variáveis conforme se trate da interfase de sublimação, da parte já seca ou da massa ainda congelada. Estas
variações de temperatura podem, contudo, anular-sc em parte se o calor fornecido for muito uniforme e
regularmente distribuído ao longo da superfície de aquecimento, sendo então de esperar que se possa estabelecer um
regime de equilíbrio entre a fonte de calor e o material. É que nas condições de vazio existentes no interior da câmara
de secagem a transferência de calor fax-se, principalmente, por radiação, o que, sem dúvida, assegura uma maior
uniformidade de distribuirão de calorias do elemento de aquecimento para o produto a liofïlizar.
Mas mesmo que se tenha atingido esse desiderato, o problema não fica complc* tamente resolvido. Lembremos,
mais uma vez, que a quantidade de calor fornecida ao produto congelado deve ser tal que nunca provoque a fusão das
misturas eutéticas nele existentes. Ora. o único processo de evitar que tal se verifique consiste em regular, com
precisão, a intensidade do aquecimento, a qual não pode ser constante à medida que o gelo sublime.
Este pormenor do aquecimento pode ser resolvido numa base empírica, fazendo-se a sublimação a uma
temperatura vizinha de -4()"C, a qual é suficiente para evitar os fenómenos de fusão. Fntrctanto. conhecida a
temperatura de cristalização total do produto a liofili/ar, pode e deve adoptar-se uma solução mais racional e mais
rentável, ou seja, a de aquecer o produto à temperatura mais elevada possível mas sempre abaixo do respectivo pomo
de eutexia, pois deste modo obter-se-á a secagem mais rapidamente.
É claro que este procedimento só c viável controlando-se a temperatura do produto durante a liofili/ação, para
o que existem, alias, vários processos. Alguns deles medem
226

directamente a temperatura da substância à custa de pares termoeléctricos ou de termómetros de resistência de


platina, ao passo que outros, como o proposto por NEUMAXN, determinam-na indirectamente por intermédio do
valor da pressão do vapor saturante no interior da câmara de secagem.
Se bem que estes métodos de controlo da temperatura permitam regular o aquecimento de modo a tirar
dele todo o partido possível e conduzam a bons resultados práticos, por vezes a determinação da temperatura
do produto congelado não é suficiente para se obter um conhecimento seguro das variações de estrutura que
nele se podem registar. Na realidade, acontece, entre outros fenómenos, que os efeitos térmicos ligados à fusão
parcial dos eutéticos têm uma amplitude tão fraca que não permitem a detecção de um princípio de fusão e por
isso procuraram-se outros métodos que garantissem um controlo mais perfeito da operação.
Um destes métodos, da autoria de REY, baseia-se no aumento considerável da resistividade eléctrica do
produto dessecado em comparação com a do produto congelado. Utilizando-se células especiais, introduzidas
nos recipientes em que se procede à liofilização, vai-se registando o aumento da resistividade à medida que a
secagem progride, sendo possível revelar, instantaneamente, o início de um fenómeno de fusão. Em tal
eventualidade, a resistência eléctrica do produto diminui vertiginosamente e permite intervir a tempo de evitar
um acidente de fabricação. Deste modo, consegue--se regular automaticamente a liofilização, pois o
aquecimento ou arrefecimento do produio c comandado directamente pela observação da variação da sua
resistividade. No dizer do seu autor, tal método de controlo, além de garantir uma segurança absoluta no
decurso da liofilização, pois com ele afastam-se os riscos de fusão, toma possível aumentar o rendimento c a
produtividade da instalação, uma vez que permite o emprego de fontes' de calor mais intensas, o que abrevia a
duração da sublimação.

6.4.7.3. Condições de vazio

O grau de vazio conseguido num liofilizador é um dos elementos da maior importância para que a
sublimação do gelo decorra com o êxito pretendido e isto por vários motivos, como passaremos a expor.
Em primeiro lugar, recordemos que a sublimação só pode realizar-se abaixo do ponto triplo, o qual,
como já dissemos, corresponde à temperatura de 0,0098°C e á pressão de 4,58 mm de Hg, o que obriga,
implicitamente, a trabalhar a uma pressão consideravelmentc inferior à pressão atmosférica normal.
Por outro lado, o vapor formado durante a sublimação do gelo terá que ser evacuado do aparelho, pois,
se assim não se fizesse, este ficaria, a breve trecho, saturado de vapor de água, o que se traduziria na
impossibilidade de se conseguir sublimar mais gelo a partir do momento em que isso se verificasse.
227

Acontece, ainda, que a velocidade de sublimação depende, como é intuitivo, das diferenças de pressão
do vapor saturante à superfície do gelo e da pressão existente na atmosfera com ele confinanle. Isto mostra a
necessidade imperiosa de se promover a aspiração do vapor resultante da sublimação para que esta se
processe a uma velocidade razoável, a qual será tanto maior quanto menor for a pressão no interior do
liolïlizador.
Acontece, ainda, que as moléculas de vapor que abandonam o material congelado podem ser reenviadas
para a superfície de sublimação se colidirem umas com as outras ou com partículas de ar existentes no
aparelho. Ora, a distância média percorrida por uma molécula sem que se registe qualquer choque,
denominada percurso médio livre, é uma função da pressão a que o sistema se encontra, como se pode ver na
Tabela XXI.

Tabela XXI. Diferentes limites de vazio

Vazio Vazio Alto Ultra-


fraco médio vazio - vazio
3 6
Limites de pressão em mm 760-1 1-10-' io- - io- IO 6 - 10"
de Hg .
N.° de partículas por cm3 IO19- IO16 IO16- IO 1 3 IO1 M O1" IO 1 0 - IO5
N." de choques por cm3 1023-102U IO20- IO17 1017-1014 K)14- 10"
de parede (por s)
Distância do percurso 10*-10"3 10^-5 5-5000 5000-10*
médio livre (cm)

No vazio fraco o caminho percorrido é de um milésimo a um milionésimo de cm e as moléculas, por


consequência, chocam quase sempre entre si e muito raramente contra as paredes. Num regime de vazio médio
o percurso médio livre é da ordem de 5 cm a IO/4 cm e, nestas condições, as moléculas tanto colidem umas
com as outras como contra as paredes, enquanto que no alto vazio os choques estão praticamente limitados
aos que se registam entre as paredes e as moléculas.
Pelo que acabámos de dizer, compreende-se como um vazio poderoso, actuando sobre múltiplos factores,
influencia de modo decisivo a liofilização, motivo por que os dispositivos de vácuo acopulados aos
liofilizadores têm merecido a maior atenção por parte dos seus construtores.
(') Segundo W. FRANK, Lê verre dans l'industrie áu vide pouse, Schott Information, caderno 3/ 1966, pág. 12. Dado não
conhecermos termos portugueses para todas as designações adoptadas pelo autor para caracterizar os diferentes graus de
va?.io, traduzimo-las do seguinte modo: Vide grossier, vide fin, vide poussé e vide uítra-poussé, respectivamente por
vazio fraco, vazio médio, alto vazio e ultra
228

Na realidade, as bombas de vazio usadas na liofilização devem satisfazer a certos requisitos e, assim,
exige-se-lhes que sejam capazes de promoverem o vazio requerido num tempo relativamente curto, geralmente
três a oito minutos, a fim de evitar que o produto pré-congelado funda. Além disso, estas bombas devem manter
essa pressão cm presença do vapor formado dentro do aparelho, da humidade e dos vapores contaminan-tes.
Deste modo, para que a bombagem se faça em boas condições, a sua tubagem deverá ser curta e ter um
diâmetro apropriado. Como, por outro lado, após ter-se realizado o vácuo inicial a bomba terá que evacuar,
principalmente, vapor de água, este, como veremos mais adiante, poderá ser absorvido por produtos químicos
ou condensado sobre uma superfície arrefecida, o que melhora extraordinariamente as condições de
sublimação.
O vazio dado pelas máquinas utilizadas na liofilização é sempre poderoso e vai, em regra, dede l mm de
Hg a 0,01 mm de Hg e a sua capacidade de aspiração pode variar desde 0,1 l/s até cerca de 10000 l/s nas
bombas de difusão com quatro e cinco andares.

6.4.7.3.1. Bombas rotativas

Uma vez que as bombas de êmbolo dão vazios muito limitados, as máquinas utilizadas nos liofilizadores
são, essencialmente, de dois tipos: bombas rotativas e de difusão.
As primeiras (Fig. 134) trabalham com óleo dotado de tensão de vapor muito baixa e são constituídas por
uma cavidade metálica cilíndrica A, existindo no interior desta um rotor B, também cilíndrico, montado
excentricamente em relação à cavidade A. O rotor, que é accionado electricamente, aspira em cada rotação
uma determinada quantidade de vapor, a qual é expelida para o exterior através do óleo, C.
Entretanto, se o óleo da máquina for contaminado pela humidade ou por vapores orgânicos, o vazio
máximo por ela originado baixará acentuadamente e, em certos casos, poderá mesmo não ullrapassr mais que
alguns mm apenas. Em geral, o óleo lubrificante não é contaminado por gases permanentes mas somenle
quando se faz a bombagem de vapores condensáveis, empregando-se diversos meios para evitar os
inconvenientes resultantes de tal condensação. Assim, wn dos dispositivos utilizados para esse fim é o da
comporia ou lastro de ar, o qual consiste num orifício de abertura regulável, permitindo a entrada de uma
quantidade controlada de ar na bomba. Daqui resulta que a pressão no interior desta passa a igualar a pressão
atmosférica antes que o vapor de água nela presente atinja a saturação e se condense. O ar é admitido na
bomba do lado da compressão, antes que esta se inicie, o que lhe permite aspirar vapores condensáveis sem
contaminarem o óleo.
O vazio máximo dado por uma determinada bomba pode ser melhorado se a ligarmos em série com uma
outra, mais pequena. Deste modo, nenhuma delas
229

trabalha em regime correspondente ao va/io extremo e à pressão atmosférica, pois a bomba mais rápida
funciona, nestas condições, entre o vazio extremo e uma pressão intermédia, ao passo que a outra trabalha entre
esta pressão e a pressão atmosférica.
Existem no mercado bombas rotativas
de dois andares, podendo, como dissemos,
utilizar-se duas delas ligadas em série, bas-
tanto apenas que a bomba directamente ligada
ao sistema a evacuar possua grande velocidade
de aspiração, podendo a outra ter uma capaci
dade dez vezes menor. Além de permitirem
um vazio maior, estas bombas de dois andares
são menos susceptíveis aos efeitos da con
taminação do óleo, que nelas aparecem
mais tarde e são de menor importância, pois
é a segunda bomba que os sofrerá e esta-
não está directamente ligada ao sistema a
aspirar. Fig. 134. Bomba rotativa (esquema)

6.4.7.3.2. Bombas de difusão

As bombas de difusão dão um vazio mais elevado do que o obtido com as bombas rotativas e estão
indicadas para as liofilizações feitas à roda de —40"C.
Como se sabe, quando uma corrente de ar atinge o orifício de um tubo aberto, cuja outra extremidade está
mergulhada num líquido volátil, o líquido ou os respectivos vapores são aspirados no tubo e arrastados pelo
jacto de ar. É este, de facto, o princípio sobre que se baseiam as bombas de difusão, que podem trabalhar com
mercúrio, um óleo apropriado ou silicone, mantido numa caldeira situada na base da máquina, a qual é
evacuada à pressão de l mm de Hg por meio de uma bomba rotativa {Fig. 135 A) . O vapor formado na
caldeira sobe a grande velocidade pelo tubo vertical, emerge na extremidade deste e é deflectido para baixo
por uma peça em forma de cone.
A parte cimeira da bomba está ligada ao sistema mantido no vazio pela bomba rotativa e as partículas de
ar que nele ainda existam difundem pela bomba c são arrastadas pelo jacto de vapor. Este, ao descer, é
condensado sobre a parede da bomba arrefecida por água ou por ar e as moléclas são aspiradas pela bomba
rotativa. O jacto, a* descer, arrasta consigo as moléculas de vapor e impede que elas penetrem no sistema.
Estas bombas de difusão podem ser compostas de vários andares, em geral cinco no máximo, o que lhes
aumenta a sua estabilidade e lhes permite suportar um vazio
230

primário menos elevado. A sua velocidade de aspiração é muito grande, da ordem de 1.000 l/s para uma bomba
com 20 cm de diâmetro. Os fluidos utilizados nestas máquinas de vazio devem ter uma baixa tensão de vapor à
temperatura da água de refrigeração, uma boa estabilidade térmica e resistirem à oxidação, sendo os mais
utilizados os pertencentes ao grupo dos Aroclors.

1.o andar Anel de guarda


Circuito de arrefecimento
Máquina de 2.° andar
vácuo Aquecimento
preliminar
A. Corte esquemático

3-° andar

Fig. 135. Bomba de difusão. A, cone


esquemático. B, bomba de difusão de 4
andares com um débito de 12 000 l/s. À esquerda vê-se o
injector e os seus 4 andares

Estas bombas de difusão apenas são postas a trabalhar depois de nelas se ter feito um vazio
apropriado à custa de uma bomba rotativa, a qual é igualmente usada para se obter um pré-vazio no
sistema a liofilizar.
Existe ainda um tipo especial de bomba de difusão modificada, conhecida por bomba BOOSTER,
cujo rendimento é extraordinário, pelo que tais máquinas são muito adequadas para a liofilização.

6.4.8. CONDENSAÇÃO

Já atrás dissemos que as bombas utilizadas na iiofilização devem ser dotadas de grande
capacidade de aspiração. No entanto, por maior que seja essa capacidade, não existe nenhum
modelo de bomba capaz de aspirar directamente a humidade existente num liofilizador sem que
trabalhe associada a um exsicante químico ou a um condensador refrigerado.
Na realidade, dada a pressão extremamente baixa a que os aparelhos funcionam, os fluidos
neles contidos ocupam um volume muito grande, acontecendo, por exemplo, que um g de água ocupa
cerca de 10 m3 à pressão de 10~' mm de Hg, estando calculado que uma bomba com a capacidade de
1500 l/min leva entre 5 e 10 horas para secar 100 ml de solução.
231

E por este motivo que os liofïlizadores estão equipados com um sistema de arrefecimento,
mantjdo a uma temperatura inferior à do material congelado, o qual promoverá a fixação do vapor
de água resultante da sublimação, condensando-o sob a forma de gelo.
Como seria de esperar, a sublimação só se verifica quando a tensão do vapor saturado à
superfície do gelo no material a líofilizar seja superior à tensão do vapor ao nível da superfície
condensante. Isto constitui o que FLOSDORF designou por motor da liüfïliztição,
Por outro lado, a intensidade do fluxo de sublimado é directamente proporcional à diferença
de tensões de vapor existentes à superfície do corpo a sublimar e do condensador e inversamente
proporcional à resistência oposta à passagem do vapor pelo espécime e o aparelho, como já atrás
dissemos. Desta maneira, é obrigatório que o condensador esteja a uma temperatura mais baixa que
o produto a sublimar (cerca de 20"C menos), oscilando essa temperatura, na prática, entre -40°C e -
60°C. A utilização destas temperaturas accntuadamentc baixas torna-se necessária porque ao fim de
certo tempo o condensador fica envolvido por uma espessa camada de gelo. Ora, como se ignora de
que modo se processa a transferência de calor através desta camada, c preferível actuar com uma
certa margem de segurança e trabalhar com o condensador a uma temperatura cerca de 10 a 15°C
inferior à temperatura teoricamente calculada.

6.4.9. SECAGEM SECUNDARIA

Quando a maior parte da água que se encontrava sob a forma de gelo tiver sido retirada por
sublimação e uma vez que a pressão no interior do aparelho se mantenha baixa, é, então, possível
aquecer o material progressivamente até à temperatura ordinária. No decurso desta segunda fase da
liofilização a água que ainda resta no material está ligada por fenómenos de adsorção c evapora-se
directamente, condensando--se sob a forma de gelo no condensador. Se a primeira fase da operação
tiver sido suficientemente prolongada, o material apenas contém nesta altura quantidades insigni-
ficantes de vapor e desde que o vácuo seja suficiente a desidratação completa-se ao fim de algumas
horas.
Entretanto, se se quiser um produto muito seco, com menos de 1% de humidade, esta secagem
secundária deve prolongar-se durante 10 a 12 horas a um vazio de l a 5 x IO"-1 mm de Hg, ligando-
se então a câmara de secagem directamente à bomba, após ter-se interrompido a sua comunicação
com o condensador. Durante esta fase o produto continua a ser aquecido, se bem que na maioria das
vezes a temperatura não deva ultrapassar 40°C. Actualmente, porém, a tendência geral é a de
efectuar a secagem secundária fora do liofilizador propriamente dito, submetendo-se o material a
secar, colocado em recintos fechados, a um vazio moderado, em presença de uma substância
exsicante e à temperatura ambiente.
232

Em qualquer dos casos, islo é, no fim da liofilização ou da secagem secundária, uma vez
terminada a operação, é necessário interromper o vácuo e restabelecer a pressão no interior do
aparelho. Para isso, admílc-sc nele ar ou . mais vulgarmente, um gás inerte, como o azoto ou o
anidrido carbónico, o qual deve estar perfeitamente seco e, por vezes, ser esterilizado.

6.4.10. ASPECTOS PRÁTICOS DA LIOFILIZAÇÃO

Nos capítulos anteriores procuramos dar uma ideia, do ponto de vista teórico, de alguns
fenómenos basilares que intervém na liofilização, discutindo as condições ideais que devem presidir
à execução deste processo de secagem para que se torne possível obter dele os melhores resultados
possíveis. Vamos agora abordar o assunto sob outro ângulo, isto é. iremos ver, nos capítulos
subsequentes, como a liofilização é realmente feita na prática, pondo desde já o leitor de sobreaviso
sobre algumas divergências que se manifestarão entre o que a teoria aconselha e o que se observa
no plano da realidade.
Essas divergências resultam, sobretudo, do facto de a liofilização ser hoje um processo de
índole industrial, aplicado à produção em larga escala, o que torna, por vezes, impossível
realizar, integralmente, na prática, aquilo que a teoria recomenda, pelo que, cm certos casos, foi
necessário adoptar soluções de compromisso.
Para ilustrar o que afirmamos, basta reparar no que se passa no domínio da congelação. A
teoria mostra-o e todos, aliás, estão de acordo sobre esse ponto, que é da maior vantagem proceder-
se à congelação rápida do material a liofilizar. Ora, se isso é possível fazer-se à escala laboratorial,
no domínio das grandes produções acontece que os produtos são congelados com certa lentidão e
isto simplesmente peía impossibilidade que há de congelar por imersão directa num banho uma
carga considerável de material acondicionado, por exemplo, em ampolas ou frascos-ampolas,
E posto isto, passemos a ver como na prática corrente se realiza a liofilização à escala
industrial.

6.4.10.1. Dispositivos e processos de congelação

Se bem que a congelação se possa obter por evaporação sob vazio, este processo apenas é
utilizado industrialmcnlc em fábricas ligadas à preparaç,~j de alimentos. Apesar de ser considerada
como a técnica que melhores resultados dó para a secagem de produtos sólidos, como vegetais,
frutos, carne, ele., não tem, contudo, qualquer aplicação na preparação de medicamentos.
A congelação por arrefecimento representa, pelo contrário, o processo mais largamente
utilizado na liofilização industrial de produtos biológicos c farmacêuticos, pelo
233

que se impõe estudá-la com o devido pormenor. Pode rcalizar-se de vários modos, consoante a
natureza do material e dos recipientes em que ele está contido, como passamos a descrever.

6.4.10.1.1. Congelação de produtos acondicionados em ampolas ou frascos-


ampolas

Para se proceder à congelação de soluções assim acondicionadas colocam-se os recipientes em


caixas de rede metálica capazes de receberem várias centenas de frascos.
Uma vez que o produto suporte, sem grandes alterações, uma congelação baslante lenta, a
prática mais generalizada é a de colocar as caixas contendo os frascos na própria câmara de
secagem e arrefecê-los aí, o que evita, assim, a operação de transferir

Fig. 136. Congelação por circulação de ar frio (Usifroid)

Isolamento
234

o material congelado para o liofilizar. O arrefecimento é conseguido por acção de uma corrente de
ar frio (Fig. 136) ou colocando as caixas sobre prateleiras refrigeradas (Hg. 137).
Quando a refrigeração por qualquer destes processos não dá resultados satisíalórios, recorre-
se a outros métodos mais eficientes de arrefecimento. Um deles consiste em
imergir as caixas com os frascos ou ampolas, cujo conteúdo
se pretende congelar, em álcool arrefecido a -45"C, mostrando a
Fig. 138 o esquema de um aparelho de congelação deste tipo.
Utilizando um dispositivo deslcs, a congelação dos produtos
encerrados em ampolas ou pequenos frascos conscgue-se em 30 a
40 minutos, tornando-se necessário conservar o material
congelado em compartimentos frigoríficos ale ser introduzido no
liofilizador.
Outro método de congelação bastante empregado consiste
em usar um dispositivo semelhante ao da Fig. 139. O
arrefecimento é obtido, neste caso, dispondo sobre a prateleira
do congelador uma camada uniforme de neve carbónica picada,
sobre a qual se colocam as caixas contendo os recipientes com o
material a congelar.
Fig. 137. Aparelho de liofilização Em qualquer destes processos a congelação é demorada
com prateleiras arrefecidas e outras
aquecidas. As primeiras servem para pela dificuldade de transferência de calor através da camada de
a congelação do material e as de ar entreposta entre o fundo dos recipientes e das caixas metálicas
cima para se proceder à liofilização
propriamente dita (Sistema Stocks) onde aqueles são colocados, havendo, no entanto, a possibilidade
de remediar em parte este inconveniente. Para isso, humedecem-se
com água os fundos dos referidos recipientes, conforme se mostra na Fig. 140. Após aspiração do
excesso de água, forma-se, por

Fig. 138. Congelação em banho de álcool arrefecido (Usifroid)


235

Fig.139. Congelação sobre camadas de neve carbónica

Fig. 140. Congelação acelerada por humedecimento do tundo dos recipientes


236

capilaridade, uma delgada película de líquido entre o fundo da caixa e dos frascos, de modo que a
congelação é, assim, bastante mais rápida. A duração da secagem ulterior não é praticamente
influenciada por esta camada exterior de gelo, pois ela, sendo muito delgada, é facilmente sublimada
e cm nada interfere no desenrolar normal da operação.

6.4.10.1.2. Congelação de produtos acondicionados em recipientes de


grande capacidade

Quando se trata de fa/.er a congelação de produtos encerrados em recipientes de grande


capacidade é necessário que o material seja espalhado, durante a congelação, sobre as paredes do
mesmo para que, terminada esta, o sólido resultante apresente, por urn lado, a menor espessura
possível e, por outro, grande superfície à evaporação. Este processo, denominado congelação em
concha, pode fazer-se de dois modos: Por rotação lenta e por rotação a grande velocidade.

6.4.10.1.2.1 Por rotação lenta

Neste processo os frascos são colocados horizontalmente ou ligeiramente inclinados sobre os


suportes rotativos, de modo a que a sua parte inferior fique mergulhada cerca de 15 a 20 mm no
banho refrigerante (Fig. 141). Este banho pode ser constituído, no

Inicio Congelação Fim dü


da em congela
congela curso ção

Fig. 141. Congelação em concha por rotação lenta

caso de aparelhos de produção reduzida, por uma mistura de álcool e neve carbónica, com a qual se
obtêm, sem dificuldade, temperaturas à volta de -70°C. Na produção em larga escala o aspecto
económico passa a entrar em linha de conla, ulilizando-se, como banho, o álcool arrefecido a —45°C
por máquinas frigoríficas, o que torna a concepção destes aparelhos mais simples e, portanto, de
preço mais acessível. Esta lempcratura é suficiente para a congelação de numerosas substâncias a
liofilizar, entre elas o plasma e outros produtos derivados do sangue, desde que os frascos sejam
mantidos em rotação, depois de congelado o seu conteúdo, durante o tempo suficiente para que a
substância fique a uma temperatura sensivelmente inferior ao seu ponto de congelação. No caso do
plasma sanguíneo, a congelação e o arrefecimento a -25°C de 300 ml de
237

produto, cm frascos de 500 ml de capacidade, obtém-se, para uma série de cinco recipientes,
em cerca de 35 minutos.

Fig. 142. Fixação de uma sonda termométrica num Irasco contendo material a
liofilizar

A fim de se controlar a temperatura do material congelado, introduzem-se, nalguns frascos


testemunhas, sondas termométricas, as quais são mantidas junto da respectiva parede por meio de
um fio metálico que lhes serve de suporte, conforme se pode ver na Fig. 142.

6.4.10.1.2.2. Por rotação a grande velocidade

Neste processo os frascos contendo o produto são submetidos, durante o arrefecimento, a uma
rotação à volta de um eixo vertical que deve coincidir, tanto quanto possível, com o seu eixo
geométrico. Deste modo, o líquido dentro do frasco descreve um parabolóidc de revolução, cuja
altura será tanto maior quanto maior a velocidade de rotação, à semelhança do que acontece com os
indicadores de velocidade das centrífugas, acabando por se estabilizar na posição representada na
Fig. 143 A, quando a velocidade atinge cerca de 900 r.p.m.
238

Os frascos são mantidos em rotação graças a um motor eléctrico e o arrefecimento pode ser
feito de dois modos:
a) por meio de uma corrente de ar frio. insuflada no dispositivo por um ventilador adequado,
como se usa nas grandes instalações tipo EDWARDS;
b) por aspersão com álcool arrefecido que proporciona uma congelação mais rápida e permite
ainda a substituição do motor eléctrico por uma turbina accionada por um jacto de álcool sobre
pressão, segundo o processo de WAÍÏNER.

Suporte
girando a
900 r. p. m.

Corrente de or fri o

Moto' cl ccl nco

Turbina

Fig. 143. Congelação vertical. A. arrefecimento por ar frio; B,


arrefecimento por aspersão com álcool arrefecido. À direita
representa-se o sistema Wagner

Em certos casos, os aparelhos utilizados para fazer a congelação fazem pane integrante dos
liofilizadorcs propriamente ditos, podendo então a câmara de secagem ser empregada,
alternadamente, para a congelação e a sublimação, c outras vezes constituem uma unidade separada
e totalmente independente. Quer se trate, porém, de um ou de outro tipo e qualquer que seja o
processo utilizado na congelação, esta tem que promover a cristalização total do produto a liofilizar
sob pena de não se conseguir o objectivo em causa.

6.4.11. TIPOS DE LIOFILIZADORES

Os aparelhos de liofilização podem agrupar-se em dois tipos distintos: de junção múltipla c de


junção única.
239

6.4.11.1. Aparelhos de junção múltipla

Neste grupo estão incluídos os liofilizadores laboratoriais e a aparelhagem de produção em


muito pequena escala. Neles os recipientes contendo o produto a liofili-zar são ligados,
individualmente, a um colector em forma de rampa, o qual eslú, por seu turno, em comunicação com
o condensador. Muitos destes aparelhos são inteiramente construídos em vidro e o condensador tem
forma variável mas c aberto, permitindo que se coloque no interior a mistura frigorífica destinada a
mante-lo à temperatura desejada, a qual pode ser a neve
carbónica adicionada de álcool ou o azoto líquido. Este
processo de refrigerar o condensador c extremamente
simples e eficaz, mas em geral só se emprega nestes
pequenos aparelhos, pois a sua utilização nas grandes
instalações torna-se bastante onerosa.
O aquecimento do produlo a liofilizar faz--se, neste
tipo de aparelhos, pelo ar ambiente. Se, por um lado, tal
processo de aquecimento é simples, muito regular e
uniforme, apresenta também várias desvantagens. Assim, o
grau de aquecimento c dificilmente controlável se se
pretende operar a uma temperatura diferenle da do meio
ambiente, além de que pode ser excessivo no início da
operação, sobretudo durante a fase de evacuação do
liofilizador, chegando a Fig. 144. Liofilizador de junção múltipla
provocar a fusão do material congelado. Por outro lado,
não é raro acontecer que na parte final da operação o calor fornecido ao material por este processo
de aquecimento seja insuficiente para se obter a sua dessecação até ao ponto desejado. Nestas
condições, toma-se necessário, então, aquecer o ar que rodeia os recipientes, quer por meio de
insuflação de ar quente, quer utilizando radiações infravermelhas.

6.4.11.2. Aparelhos de junção única

São variadíssimos os modelos de liofilizadores de junção única, mas, em princípio, uma


instalação deste tipo consta de quatro partes, a saber: uma câmara de secagem. A; um condensador.
B; uma bomba de vazio, C, e uma máquina frigorífica. D, conforme se vê no esquema reproduzido na
Fig. 145.
Nestes aparelhos, os únicos adoptados na produção industrial de produtos liofiliza-dos, a
câmara de secagem lembra um armário com várias filas de prateleiras, destinadas * rt-ceberem o
material a dessecar. Tal armário está construído de modo a poder
240

suportar as pressões negativas a que é necessário trabalhar e tem uma porta que fecha
hermeticamente, através da qual se faz a carga e a descarga do liofilizador.
A câmara de secagem está directamente ligada ao condensador B e este, por sua vez, comunica
com a máquina de va/io C. Se bem que, por vezes, o condensador seja substituído por uma
substância ávida de água, acontece que na grande maioria dos aparelhos de carácter industrial o
único meio utilizado para fixar o vapor formado pela sublimação do gelo é ainda o condensador
clássico.

Fig. 145. Esquema de uma instalação de liofilizaçáo por junção única. A,


câmara de secagem; B, condensador; C. máquina de vazio; D,
compressor frigorífico

Na prática corrente, o material a liofilizar é mantido entre -20°C e -40°C, sendo raros os casos
cm que é necessário empregar temperaturas mais baixas. Nestas condições, a temperatura do
condensador deverá ser mantida entre -40°C e -60"C, dependendo esse valor dos obstáculos que o
vapor encontra para atingir o condensador e, em geral, o arrefecimento deste faz-se à custa de
máquinas frigoríficas relativamente simples, utilizando, por exemplo, o freon 12.
Dado que nos aparelhos de junção única os recipientes contendo o produto a dessecar ficam
encerrados num espaço hermeticamente fechado, o seu aquecimento só pode fazer-se por meio de
dispositivos especiais. Ao fazermos o estudo teórico da liotïlização, tivemos oportunidade de
salientar a importância deste aquecimento e, ao mesmo tempo, chamámos a alcncão para os riscos
que envolve se não for convenientemente controlado, dado que pode levar à fusão dos eutélicos
existentes no produto congelado.
A:; soluções que têm sido adoptadas para a resolução desta importante como delicada fase de
todo o processo de liofilizaçáo resumem-se, nas suas variadas modalidades, a dois processos
básicos: aquecimento das prateleiras por um fluido circulante ou por resistências eléctricas.
241

O primeiro dos mencionados processos consiste em fazer circular no interior das prateleiras da
câmara de secagem um fluido aquecido a uma temperatura conveniente por um dispositivo situado
fora daquela e equipado com um termostato.
Este processo permite obter um aquecimento bastante regular desde que a temperatura exigida
se situe entre 30-40°C, mas torna-se irregular para temperaturas mais elevadas, na vizinhança de
80-90°C. De facto, a regularidade do aquecimento por este processo depende de múltiplos factores,
como a velocidade de circulação do fluido no interior das prateleiras, secção da tubagem c sua
disposição. Por outro lado, a multiplicidade das junturas situadas no interior da câmara de
secagem impõe o maior rigor na construção destes dispositivos, pois que, a verificar-se uma fuga na
canalização, isto traria consequências desastrosas para a manutenção do vazio.
O processo de aquecimento por resistências eléctricas é feito de várias maneiras, consoante a
natureza dos recipientes em que o material a liofilizar está contido. Assim, nos aparelhos destinados
à liofilização de produtos acondicionados em ampolas ou pequenos frascos, o aquecimento faz-se
por resistências eléctricas colocadas na parte inferior das prateleiras metálicas.
E necessário, contudo, que estes dispositivos obedeçam a certos requisitos, entre os quais são
de mencionar os seguintes:
a) As placas que constituem as prateleiras devem ser feitas de um metal born condutor do
calor;
b) alem disso, devem apresentar uma espessura tal que o calor possa difundir-se facilmente em
toda a sua extensão e não se registem diferenças acentuadas de'calor de um ponto para o outro;
c) as resistências devem estar perfeitamente embutidas na parte inferior das prateleiras, de
modo a obter-se um contacto térmico regular em toda a superfície destas.
A fim de se evitar sobreaquecimentos locais, sempre possíveis, os frascos ou as ampolas são
colocados em caixas metálicas e estas assentes sobre grelhas dispostas à superfície das prateleiras.
Deste modo, o produto a liofilizar nunca fica em contacto directo com a fonte calorífica e apenas é
aquecido por radiação, o que assegura uma distribuição bastante regular do calor.
O aquecimento de produtos acondicionados em frascos de grande capacidade pode fazer-se
pelo processo acabado de descrever. Neste caso, os frascos são encerrados, lado a lado, em caixas
metálicas c estas colocadas sobre as prateleiras aquecidas.
Outro sistema de aquecimento para frascos de grande capacidade é aquele que utiliza
alvéolos aquecidos individualmente, como no aparelho representado na Fig. 146. Neste caso, como
as resistências são todas iguais e os frascos têm. para cada produto, as mesmas exigências térmicas,
o problema da regularidade do aquecimento pode considerar-se resolvido.
Por outro lado, o eixo dos alvéolos pode estar na posição vertical ou horizontal, considerando-
se os primeiros como oferecendo melhores vantagens, sobretudo porque permitem o aquecimento de
frascos de capacidade variável. Supondo que tais alvéolos
242

foram construídos para receberem frascos de 1 litro, eles permitem, no entanto, dessecar igualmente
bem produtos contidos em frascos de 500 ml ou menos. Basta, para isso, centrar os frascos mais
pequenos no alvéolo e mante-los nessa posição por meio de uma peça fixada na extremidade superior
daquele, a qual tem um orifício por onde passa o gargalo do frasco que, assim, nunca mais é
descentrado.

©ooo ooo

Fig. 146. Aparelho de liotilização Greaves-Edwards com alvéolos aquecidos.


A. câmara de secagem mostrando os alvéolos; B, condensador; C, máquina de vazio;
D, alvéolo em secção longitudinal
243

Como equipamento normal dos liofÍ li/adore s figuram vários instrumentos de medida que tornam
possível controlar, em qualquer momenlo, as condições em que a operação está a ser conduzida.
Entre eles são de mencionar os termómetros, representados por pares termoeléctricos ou sondas de
resistência, insertos no produto congelado, que indicam constantemente a temperatura a que este se
encontra, e os indicadores de vazio, geralmente vacuómetros de PIRANI ou de Mc LEOD, ou ainda tubos
de HITTORF. Dada a multiplicidade de modelos de lioíili/adores exislentes no mercado parece--nos
aconselhável não descrever nenhum deles em pormenor, pois todos se fundamentam nos princípios
básicos que acabámos de passar em revista. O leitor interessado no assunto poderá encontrar os
elementos referentes a vários aparelhos na bibliografia citada no final deste capítulo e, bem assim,
recorrendo aos catálogos das casas produtoras destes aparelhos.

6.4.12. APARELHOS PARA A SECAGEM SECUNDARIA

Como já anteriormente dissemos, há necessidade, em certos casos, de completar a dessecação


obtida no liofilizador por uma secagem secundária, a qual pode ser motivada por várias razões, a
saber:

1 — O grau de vazio obtiiïo no liofilizador nào é suficiente para obter o teor exigido de
humidade residual. Isso acontece quando o condensador não se encontra, na fase final da operação,
a uma temperatura suficientemente baixa, quando o aparelho apresenta fugas ou quando as
máquinas de vazio não têm as características convenientes.
2 — Dado o custo bastante elevado dos liofilizadores, os seus utentes procuram tirar deles o
maior rendimento possível, mantendo-os, por isso, continuamente em laboração. Ora, acontece que
em certos casos a secagem final do produto, depois de ter estado um certo tempo no liofilizador.
pode fazer-se sem inconveniente em aparelhos bastante mais simples e, portanto, mais baratos.
Torna-se, pois, recomendável, do ponto de vista económico, completar a secagem fora dos
liofilizadores, de modo que estes podem receber nova carga de material e aumentar, assim, o
rendimento da instalação.
Esta secagem secundária apenas se faz quando a água sob a forma de gelo tiver sido
eliminada por sublimação e só se justifica, portanto, quando se quer obter um produto
excepcionalmente desidratado e destinado a ser conservado em ampolas fechadas à chama.
A Fig. 147 representa um destes aparelhos, próprio para a secagem secundária de substâncias acondicionadas
em ampolas. Estas são montadas em rampas amovíveis,as
244

quais, colocadas no aparelho, ficam ligadas ao sistema de vazio e em comunicação com um recinto
onde existe uma substância exsicante, geralmente, P2OS> Os aparelhos deste tipo têm uma capacidade
limitada e apenas se utilizam para terminar a secagem de produtos liofilizados em aparelhos de junção
múltipla.
Abertura para desfazer o vazio na rampa de
secagem

ÍSSS^SS^KÍSW^^

Fig. 147. Dessecador secundário de pequena capacidade (Usifroid)

Na Fig. 148 reproduz-se outro tipo de dessecador secundário de maior produção,


o qual é constituído por uma cuba de aço inoxidável em cujo interior existem várias
prateleiras, servindo as da parte superior para receber o material a secar e colocando-
-se nas de baixo tabuleiros com anidrido fosfórico. " " " .;,.<-..
245

indicadores de evaporação

Indicador de vazio

n " M Jl

"üEÍJIÜÜÜtr^

ÍÜÜÜÜ l ÜÜÜÜ

Flg. 148. Dessecador secundário de grande capacidade (Usifroid)

6.4.13. FECHO DOS RECIPIENTES

Como c evidente, os produtos liofilizados deverão ser conservados em recipientes fechados


para assim poderem conservar o reduzido grau de humidade que contêm, terminada a operação.
Como a liofili/ação se faz a pressão reduzida, finda ela torna--se necessário restabelecer a pressão
dentro dos recipientes, para o que se costuma usar um gás inerte, como o azoto ou o anidrido
carbónico, convenientemente exsicados, e, em certos casos, estirilizados, e só então se procede ao
seu fecho.
Por vezes, os recipientes são fechados sob vazio e, tratando-se de ampolas, estas são, nesse
caso, fechadas manualmente pela chama de um bico enquanto ligadas ainda à rampa do liofilizador
ou do aparelho de secagem em cujo interior ainda subsiste uma
246

baixa pressão. Para rolhar sob va/io os frascos provenientes de uma lioiïliz.ação em grande escala,
utilizam-se dispositivos especiais que permitem a aplicação simultânea das rolhas de borracha num
número considerável de recipientes.

BIBLIOGRAFIA

DELLA PORTA, P. c ROWB. T. W. G., Lê vide, Jan. Fcv., N." 91, 54, (1961).
Fi OSDORI . E. W.. Freezing and Drving. Reinhold Publish. Corp. , N. Y., 1948.
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Freezing and Drving, Acad. Press. CÏKKAvns, R. I, N., 'lhe Preservation of Protews hy
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Herman, Paris. 1960. ROWK, T. W. C!., Lê vide. lex pompes mécaniques a grandes viresses
de pompagr et f>on\pí'.\ u diffusinn.
Traitc de lyophilisation, llerman. Paris. 1960.
247

6.5. SUBLIMAÇÃO

Esta operação consiste em fazer passar uma substância directamente de sólida a gasosa, sem
passar pelo estado líquido, recolhendo-se a substância primitiva novamente solidificada.
Ao tratarmos díi LiofiUzação já nos referimos às condições que presidem à sublimação, a qual
só é possível realizar-se desde que não .se atinja o ponto triplo. Deste modo. para que um sólido
possa transformar-se, directamente, ern vapor, sem n formação intermediária de uma fase líquida, é
necessário que a pressão de vapor não ultrapasse o valor correspondente ao ponto triplo. Aliás»
isto conscgue-sc, facilmente, se o referido valor da pressão for relativamente elevado, pois, nestas
condições, a velocidade de vaporização será grande, íomando-se possível a sublimação do sólido à
pressão atmosférica.
E o que acontece, por exemplo, com a cânfora (ponto triplo: ! ~ J79°C. pressão de equilíbrio =
370 mm de Hg), a qual, se for aquecida, lentamente, a uma temperatura inferior a 179"C.
vaporizará" sem fundir, e, desde que o vapor seja condensado numa superfície fria. a pressão será
mantida sempre abaixo de 370 mm de Hg, de modo que a .sublimação será total.
Deve ler-se em consideração que se a pressão que define o ponto triplo de um sólido for
inferior a urna atmosfera c este for aquecido rapidamente, tal substância

Água

Bomb
a de
vazio

Fig. 149. Aparelhos para sublimação. A, à


pressão normal; B, sob pressão reduzida

fundira logo que a tensão do seu vapor ultrapasse o valor correspondente ao referido pomo triplo. E
o que acontece com a cânfora quando aquecida num vaso fechado, em a|uc a condensação do vapor
se faça deficientemente. Nestas condições, a pressão vai
248

aumentando e logo que atinja o valor de 370 mm de Hg aquela cetona funde em vê/, de sublimar,
podendo, evidentemente, entrar em ebulição.
No caso de substancias com uma pressão correspondente ao ponto triplo moderadamente baixa
(ácido bcnzóieo, 6 mm de Hg, p.f. 122l'C; naflaleno, 7 mm de Hg, p.f. 80"C, ctc.), a sublimação só se
faz em boas condições desde que se opere n pressão reduzida.
Na prática laboratorial a sublimação representa um meio de purificar substâncias sólidas que
sejam voláteis, permitindo a sua fácil separação das impurezas fixas que as acompanham. Além disso,
é ainda utilizada no campo analítico e na preparação industrial de certos produtos, como a cânfora,
o iodo e o cloreto mercúrico, por exemplo.
Os aparelhos utilizados para a sublimação dos corpos são, em geral, muito .simples, sendo
constituídos por um recipiente onde se aquece a substância suhlimável e urna superfície fria onde se
condensem os vapores formados. Assim, podem usar-se balões, matrases, retortas, vasos de fundo
aplanado, etc., os quais são aquecidos a banho de areia ou de óleo ou ainda por vapor
sobreaquecido. A Fig 149 representa dois dispositivos de sublimação, sendo um para trabalhar à
pressão normal e outro y pressão reduzida.

6.6. TORREFACÇÃO

Esta operação executa-se aquecendo os corpos em contacto directo com o ar, para os privar da
sua água de constituição e de certas matérias voláteis, de que resultam modificações na cor, aroma e
composição química.
A torrcfacção pode considerar-se uma calcinação incompleta, sendo raramente utilizada em
Farmácia, pois modifica, accntuadamente, as propriedades das drogas a ela sujeitas. Assim, por
exemplo, o ruibarbo em pó, depois de submetido à lorrefacção, perde as suas propriedades
purgativas, conservando, no entanto, as suas características adstringentes.

6.7 CARBONIZAÇÃO

É uma operação mercê da qual se provocam decomposições profundas em substâncias vegetais


ou animais submeiendo-as a temperaturas elevadas.
A carbonização faz-se cm recipientes fechados e ao abrigo do ar, podendo executar-se com o
f i m de aproveitar os vapores que se evolem ou a matéria residual, fixa. Como exemplo do primeiro
caso mencionamos o alcatrão vegetal e o óleo de cade, e do segundo o carvão vegetal e animal.

6.8. CALCINAÇÃO

Esta operação consiste em submeter um corpo a urna temperatura bastante elevada, de


modo a alterar profundamente a sua composição ou reduzi-lo a cin/as. Sem qualquer interesse
na Técnica Farmacêutica, é frequentemente usada na Análise Química e na preparação
industrial de certos produtos químicos minerais, praticando-se cm cadinhos de barro
refractário, de quart/o, de níquel, etc.
249

6.9. CRISTALIZAÇÃO

A cristalização é uma operação que se executa com o fim de purificar substâncias sólidas,
sendo baseada nas suas diferenças de solubilidade n u m determinado solvente.
Na sua forma mais simples, o processo de cristalização consiste no seguinte: 1) dissolução
da substância num solvente apropriado, aquecido ã ebulição; 2} filtração da solução
quente, para e li m i n a r os sólidos insolúveis; 3) arrefecimento da solução, de modo a
permitir que a substância dissolvida cristalize; 4) separação dos cristais formados por um
processo adequado (filtração, centrifugação, decantação).
A eficiência desta operação depende, fundamentalmente, do solvente utili/ado. o qual
deve obedecer a certas condições, tais como: 1) ter um elevado poder dissolvente para a
substância a cristali/ar a temperaturas elevadas e um baixo poder dissolvente para a
mesrrm à temperatura ambiente; 2) deve dissolver bem as ímpure/as a eli min ar ou dissolvê-
las apenas em muito pequena concentração: 3) deve originar cri stais bem formados da
substância a purificar: 4) deve poder ser facilmente eliminado da substância cristalizada;
5) não deve reagir com ela.

6.10. FUSÃO

Esta operação consiste em fazer passar um corpo do estado sólido a líquido por acção
do calor. Correntemente praticada nos laboratórios com fi n s analíticos para a determinação
do ponto de fusão, método de controlo do estado de pure/a dos compostos sólidos de constituição
química definida, a fusào utiliza-se ainda no campo farmacêutico com vários f in s , tais como:

1) Para privar os sais da sua água de cristalização (CaCf,. Nd,SO4 anidros);


2) para facilitar ou permitir a combinação de certas substâncias {/•>,$');
3) para separar um corpo fusível da ganga que o acompanha (.SV^.Vj;
4) para obter a cristalização de certos corpos fundidos, após arrefecimento (flor de
enxofre);
5) para facilitar a incorporação de substâncias medicamentosas insolúveis num excipiente
sólido (óvulos, supositórios, lápis).
250

Conforme a substância de que se trate, a fusão pratica-se em cadinhos ou cápsulas de porcelana,


sendo uma operação frequentemente utilizada na oficina farmacêutica para a preparação de cremes,
pomadas e ccrotos.

BIBLIOGRAFIA

CASADLO, S., Tecnologia Farmacêutica, pág. 97.


DCNOLL, A.. Cows de Pharmacie Pratique, vol. I, pág. 90.
VOGRL, A. L, Elementaiy P rã f-t i cal Organw Chemistiy, págs. 22, 32. 108.
251

6.11. DESTILAÇÃO 6.11.1.

GENERALIDADES

A destilação é um conjunto de operações que tem por fim separar as substâncias voláteis das
que o não são ou separar os constituintes de uma mistura líquida cujos componentes tenham pontos
de ebulição diferentes.
A destilação comporta uma serie de várias operações que poderemos enunciar do seguinte
modo, tendo em vista a ordem porque se processam: evaporação das substâncias voláteis,
condensação dos vapores formados c arrefecimento do destilado.
Em geral, a destilação pratica-se de acordo com dois métodos distintos. Num deles, o vapor
originado pela ebulição da mistura líquida é separado c condensado de modo que nunca volte ao
destilador nem contacte mais com novas porções de vapor. É o que acontece na chamada destilação
simples. No outro processo, denominado destilação fraccionada, a que se recoire quando se pretende
separar os componentes de uma mistura líquida, os vapores, antes de condensados, passam por uma
coluna de rectificação, onde se faz a separação dos constituintes da mistura.
Em casos particulares pode ainda praticar-se o que certos autores consideram como destilação
destrutiva. Esta consisle na decomposição pelo calor de determinadas substâncias, usualmente
produtos naturais, seguida da condensação c recolha das matérias voláteis que se formaram. Se bem
que não se trate de uma operação farmacêutica, ela é usada para obter drogas dotadas de alguma
actividade farmacológica. São exemplos do que afirmamos a destilação destrutiva da madeira e do
carvão para produzir alcatroes.
A destilação constitui um dos principais meios de que dispomos para separar os constituintes de
uma mistura líquida capaz de originar um vapor de composição diferente da sua e para os purificar
convenientemente, uma vez separados.
Daí o grande interesse de que esta operação se reveste tanto do ponto de vista científico como
industrial, recorrendo-se a ela, no campo farmacêutico, para preparar várias formas galénicas, como
os hidrolatos e alcoolatos, certas drogas, como as essências, e para a obtenção da água destilada,
sem dúvida o solvente mais utilizado na preparação de soluções medicinais.

6.11.2. TEORIA DA DESTILAÇÃO

A destilação é baseada no princípio da parede fria. Suponhamos dois vasos A e B, ligados por
um tubo, mantidos, respectivamente, a 50 e 10"C e que no vaso A existe um líquido. Este, como se
sabe, encontra-se em equilíbrio com o seu vapor o qual tem uma força elástica em A superior à de B,
pois a tensão de vapor de um líquido é
252

directamente proporcional à temperatura. Nestas condições, o vapor forma-lo cm A expande-se


para B onde, porque se toma salurante, se condensa em parle.
Porem, logo que o vapor se liver condensado em 6, o equilíbrio primil i vãmente existente entre a
fase líquida e a fase vapor em A é desfeito e, por isso, nova porção de líquido em A se transforma em
vapor de força elástica correspondente a 50"C, o qual será. igualmente, condensado quando
a t i n gi r B. Este processo manter-sc-á enquanto as condições de temperatura em A c R (orem
propícias a isso, conseguindo-se, deste modo, que lodo o líquido se volatize em A e os respectivos
vapores se condensem em B. O esquema da Fig. 150 representa, na sua expressão mais simples, um
aparelho destilatório, o qual compreende, pois, duas parles distintas; uma em que se aquece o
líquido para o transformar em vapor, e outra
^-~~-_____ -———-^ que actua como refrigerante e promove, assirn,
J Jj a condensação desse mesmo vapor.
Daquilo que atrás dissemos, ressalta que a
destilação é condicionada pelas diferenças das
tensões de vapor do líquido nos vasos A e B, ou, por
outras palavras, a destilação íar-se-á tanto mais
facilmente quanto mais elevada for
Fig. 150. Esquema ilustrando o princípio a
. . . ^
da destilação temperatura em A c mais baixa em 8. Do
ponto de vista prático, c vantajoso, por conseguinte,
que o líquido a destilar seja aquecido a uma temperatura elevada para que a tensão de vapor adquira
o seu valor máximo e que o condensador seja arrefecido a uma temperatura muito baixa, pois nestas
circunstâncias criam-se condições óptimas para um bom f l u x o de vapor de A para B.
Reparc-sc, no entanto, que o aquecimento do liquido está limitado, a determinada pressão,
por um certo valor de temperatura, que é. justamente, o da sua temperatura de ebulição. Quando esta é
atingida, os vapores formados encontram-se à sua tensão máxima, isto é, igualam a pressão existente
à superfície do líquido. A partir deste momento não há qualquer vantagem em elevar mais a
temperatura do líquido, pois a sua tensão de vapor, porque atingiu o valor máximo, já não pode
ser modificada e aquele entra em ebulição.
Todavia, se não é possível elevar a temperatura em A para além de certo valor, podemos, no
entanto, fa?,er com que a destilação se processe a uma temperai u ca inferior, pois as leis que regem
a ebulição dos líquidos aplicam-se, integralmente, no caso presente. Ora, uma vez que um líquido
entra em ebulição quando a sua tensão de vapor iguala a pressão sobre ele exercida, basta
d i mi n u ir esta para que a temperatura de ebulição do líquido baixe imediatamente e tanto mais
quanto maior for o grau de va/io aplicado. Nisto se baseia a destilação soh pressão reduzida, a qual é
largamente ap licada na prática, dado que permite a vaporização de líquidos a temperaturas
acentuada-mente baixas, com todas as vantagens disso resultantes.
253

Além das leis da ebulição, também a regra das fases, estabelecida cm 1875 por WILLARD GIBBS se
aplica à destilação, a qual diz respeito ao equilíbrio das diferentes massas homogéneas que
constituem um sistema físico. Nela figuram três parâmetros, que são: a fase, os componentes e a
variância ou graus de liberdade. Vejamos o seu significado.
Fase. Num sistema físico, pode haver diversas massas homogéneas. Massas distintas quanto à
composição química mas em estado físico idêntico constituem uma só fase. Assim, uma mistura de
tolueno e benzeno, líquidos completamente miscívei.s um com o outro, formam uma só fase porque em
cada fracção desta mistura existe identidade física.
Se considerarmos, porém, a água, à ebulição, já teremos duas fases distintas, uma líquida e
outra gasosa. Neste caso há identidade do ponto de vista químico mas não há identidade física.
Componentes. O. componentes de um sistema físico são as substâncias químicas definidas que
nele figuram. Deste modo, o sistema água-vapor de água tem um só componente e possui duas fases,
ao passo que a mistura tolueno-bcnzeno tem uma só fase e dois componentes.
Variância. Se encerrarmos um líquido num recipiente onde se faça o vazio e o isolarmos cm
seguida, ao fim de algum tempo parte do líquido ter-se-á Iransformado em vapor, que ocupará o
espaço deixado livre pelo referido líquido. Diz-se que o líquido está. então, em equilíbrio com o seu
vapor, podendo tal equilíbrio depender de um ou vários factores, como a pressão, a temperatura e
a composição do líquido, mant-?ndo-se inalterado enquanto pelo menos algum dos factores não
variar.
Quando apenas basta f i x a r o valor de um único factor para que todas as outras condições de
equilíbrio sejam determinadas, o sistema possuirá urna variância = l, mas tornando-se necessário,
para se conseguir o equilíbrio, fixar dois factores, o sistema terá uma variância - 2 e assim
sucessivamente.
A regra das fases é expressa pela fórmula seguinte:

<p + v = N + 2, representando (p o número de fases, V a

variância e N o número de componentes.

6.11.3. APLICAÇÃO DA REGRA DAS FASES À DESTILAÇÃO

Na prática da destilação podem considerar-se quatro casos distintos:

1—Destilação de um líquido formado por um só constituinte químico definido;


2— destilação de uma mistura de líquidos perfeitamente miscíveis um com o outro;
254

3 — destilação de dois líquidos imiscíveis;


4 — destilação de um liquido não miscível com a água, à custa de vapor não saturado.

6.11.3.1. Destilação de um líquido formado por um único componente

É o caso mais simples e serve para determinar o grau de pureza de um líquido. Se este for
encerrado num espaço fechado, produzirá vapor até que cslc último atinja certa pressão, a qual
apenas depende da temperatura a que o líquido estiver. Como se sabe, para uma dada temperatura,
a pressão do vapor em contacto com o seu póprio líquido é uma constante, sendo independente da
quantidade absoluta de líquido e de vapor presentes no sistema.
Contudo, a pressão de vapor de um líquido aumenta com a subida da temperatura, como se
pode ver na Fig. 151, e quando tal pressão iguala a pressão total exercida
sobre a superfície livre do líquido este entra em
ebulição.
Suponhamos a água em equilíbrio com o seu vapor. O
sistema tem, neste caso, duas fases (cp = 2), uma líquida e outra
gasosa, e o número de constituintes é igual a um, pois estamos
em presença de água apenas. Logo,

tp + V - N+2
2+V = l +2
V = l
Isto significa que um tal sistema é univariante e
determinado. Deste modo, se fixarmos a temperatura em 1(K)"C,
para este valor só há uma única pressão à qual é possível a
Fig. 151. Variação da pressão
de existência das duas fases líquida e gasosa em equilíbrio, ou seja
vapor de vários líquidos em função 760 mm de Hg. Inversamente, se fixarmos um valor de pressão,
da também só haverá equilíbrio entre as duas fases para um
determinado valor
de temperatura.
É mercê disto que a destilação de um composto químico de composição definida permite a sua
purificação, pois que, estando fixada a pressão, sabe-se, previamente, qual a sua temperatura de
ebulição. Assim, todo o vapor que passe acima ou abaixo dessa temperatura deve ser considerado
como impuro e, como tal, rejeitado,
255

6.11.3.2. Destilação de misturas líquidas

Como acabámos de ver, o ponto de ebulição de um líquido de composição definida é uma


constante e depende apenas da pressão exercida à sua superfície iivrc, sendo relativamente fácil
estabelecer uma relação entre a temperatura de ebulição do líquido e a pressão exterior sobre ele
exercida.
Se bem que a definição clássica de ponto de ebulição se aplique, igualmente» às misturas
líquidas, acontece, porém, que se torna difícil na prática saber qual a pressão total de vapor de urna
determinada mistura a partir do conhecimento das tensões de vapor dos seus constituintes. Por esse
motivo não é possível calcular, como no caso anterior, os pontos de ebulição de todas as misturas a
partir dos dados referentes a cada um dos seus constituintes, tomados isoladamente, e, nestas
circunstâncias., tais valores terão que ser determinados experimentalmente na maioria das vezes.
Entretanto, baseados no comportamento físico das misturas líquidas, podemos considerar três
casos, a saber:

1 — Misturas cujos componentes são miscíveis em todas as proporções;


2 — misturas cujos componentes são imiscíveis uns com os ouros;
3 — misturas cujos componentes apenas são miscíveis em certas proporções.

6.11.3.2.1. Líquidos miscíveis em todas as proporções

Estas misturas podem subdividir-se em três grupos distintos, consoante o respectivo ponto de
ebulição varia com a composição.

6.11.3.2.1.1. Misturas cujo ponto de ebulição varia


uniformemente

Constituem os casos mais frequentes na prática. Aplicando a regra das fases a um sistema
destes, teremos (p - 2, A' = 2; logo:

q> + y = N + 2
2+V=2+2V=
2

A variância será, portanto, de 2, podendo fazer-se variar, independentemente, dois factores. Se,
no entanto, fixarmos, arbitrariamente, o valor da pressão, teremos ainda um
256

grau de variância,-que será a temperatura. Se, todavia, escolhermos uma dada temperatura, o
sistema torna-se invariável, e, nestas condições, para uma temperatura e pressão fixas, haverá uma
só composição da mistura líquida e da fase gasosa que lhe corresponde. Será, então, possível
traçar-se a curva dos pontos de ebulição em função da composição da mistura, como se pode ver
no gráfico da Fig. 152. Consideremos agora uma mistura líquida correspondente à composição
Lr Se tal mistura for aquecida, a
tensão do vapor subirá e, quando a temperatura
atingir tí, a mistura entrará em ebulição, originando
nessa altura um vapor cuja composição é V t o qual é
muito mais rico no componente A, mais volátil do
que B, o de ponto de ebulição mais alto. Se a
temperatura continuar a subir, o líquido vai
enriquecendo em B e o seu ponto de ebulição subirá
igualmente, como é natural. Ao atingir o valor tr a
composição do líquido variou gradualmente para
L1 e o vapor originado por tal mistura terá agora
uma composição correspondente a V2. Verifica-se,
deste modo, que a destilação permitiu uma
L 100
separação parcial dos componentes A e B e toma-
Í %
se evidente que fazendo destilações sucessivas é
Composição possível uma separação quase completa dos dois
Fig. 152. Mistura binária com ponto de componentes. Basta, para isso,
ebulição
aumentando progressivamente. A, composição redestilar cada fracção recolhida entre intervalos
do convenientes de temperatura e repetir as
vapor; B, curva representando a composição
destilações um certo número de ve/es para que tal
objectivo seja alcançado. Naturalmente que a separação por este processo é morosa e exige um
número considerável de destilações, dependendo a facilidade de separação dos dois componentes
da inclinação da curva correspondente aos pontos de ebulição. Na realidade, quanto mais
afastados eles forem um do outro, mais fácil se tornará a separação de dois líquidos por esta
técnica, que constitui, no fundo, uma destilação fraccionada.
Desde que a mistura de dois líquidos miscíveis em todas as proporções seja uma solução
ideal, a lei de RAOULT aplica-se-lhe integralmente e torna-se possível estabelecer uma relação entre
a composição molecular de uma mistura deste tipo e a do vapor em equilíbrio com ela.
Segundo a referida lei, a pressão de vapor de um componente de uma solução a uma dada temperatura é igual à
pressão de vapor da substância pura multiplicada pela sua fracção molar na solução. Deste modo, supondo que temos
uma solução i
257

constituída por dois componentes, A e B, aplicando a lei de RAOULT, podemos escrever que a pressão de
vapor exercida por cada um dos componentes é:

e
PA =P°A XA PB=Pf>B X
B W

em que p é a pressão de vapor da substância, p° a pressão de vapor da mesma substância pura a uma
determinada temperatura e x a sua fracção molar na solução. Deste modo, a pressão total P,
desenvolvida pêlos dois componentes da mistura, será:

P=PA + PB=P°A *A + P ° B * B (2)

Como, por outro lado, as pressões de vapor são proporcionais às fracções molares na fase
gasosa, a composição desta é dada por:

_
B
P

e a concentração relativa dos componentes A e B nas fases líquida e vapor será:

yV yjO y
__í_ — "A . A /4\
X X
B PB B

Se p°A = p°B, a composição do vapor é igual à do líquido, sucedendo o contrário se p°. e p°0
tiveram valores diferentes.
1 l
A D
Vejamos um exemplo concreto. Suponhamos que os componentes A e B da mistura tinham pressões
de vapor de 100 e 60 mm de Hg, respectivamente, e que a fracção molar de A era de 0,75 e a de B
0,25. Nesta eventualidade, as pressões de vapor parciais correspondentes a cada uma das substâncias
serão:

P A = 100x 0,75 = 75 mm de Hg e
pB= 60 x 0,25 = 15 mm de Hg

e a pressão total do vapor será

p = p + p = 90 mm de Hg
258

Deste modo e de acordo com (3), a composição da fase vapor é:

75 15
:v = —— -0,833 e < = —— -0,167
A
90 90

Portanto, uma solução contendo fracções molares de 0,75 de Á c 0,25 de B está em equilíbrio
com um vapor constituído por 83,3% do primeiro componente A, isto é, o de maior tensão de vapor
ou, o que vale o mesmo, o de menor ponlo de ebulição, que por isso figura em maior concentração na
fase vapor do que na fase líquida,

6.11.3.2.1.2. Misturas com um ponto de ebulição mínimo

Na Fig. 153 representam-se as curvas típicas do ponto de ebulição em função da


composição para um sistema deste género. Aquecendo uma solução de composição Lt à
temperatura f ; , o líquido entra em ebulição e o vapor destilado terá uma composição
correspondente a Vr A medida que a temperatura de ebulição da mistura sobe, a composição do
destilado vai variando entre V e V,, correspondendo esta última composição à temperatura r,. Se
redestilarmos qualquer destas fracções, o
vapor aproxima-se da composição do sistema
de ponto de ebulição Lw/, como os gráficos da
Fig. 153 indicam. Do mesmo modo, uma
solução de composição L' t destila à
temperatura t' r originando um vapor de
composição V r e um líquido de composição L'
produz um destilado cuja composição
corresponde a V"2 e, à semelhança do que
acontece no caso do ramo esquerdo da curva,
também aqui a redestilação de qualquer das
fracções obtidas conduzirá à obtenção de um
líquido de composição LMÍ.
Ora este líquido, como se observa na Fig. 153, destilará
L L; L; completamente sem sofrer qualquer modificação na sua
Mi" v, v, V,'
100
Composição 100 % composição, dado que à temperatura do seu ponto de
ebulição, t ., o vapor tem precisamente a mesma
Fig. 153. Mistura tendo um ponto de ebulição composição que
259

equilíbrio com ele. Os sistemas em que isto se verifica são chamados misturas
azeotrópicas e os seus componentes não podem, por conseguinte, ser separados por
destilação. .-..
constituído pelo componente A quase

6.11.3.2.1.3. Misturas com um ponto de ebulição máximo


t.

Na Fig. 154 representa-se o diagrama relacionando a composição-ponto de ebulição de uma


mistura apresentando um ponto de ebulição máximo. Por um raciocínio semelhante ao feito no caso
anterior, chega-se à conclusão de que a destilação fraccionada de uma mistura líquida de
composição L; acabará por originar um destilado

í,

100% A V, V2 l, L2 LMa L,'


V/100% B Composição
Fig. 154. Mistura binária tendo um ponto de ebulição

puro e um resíduo de composição LMa, o


qual destilará sem sofrer qualquer
modificação. Analogamente, uma
mistura líquida L' l originará um
destilado que fraccionado conduzirá à
obtenção do constituinte B quase puro
e um resíduo LMa que representa também
uma mistura azeotrópica.
Este comportamento de certo
modo anormal que caracteriza as
misturas azeotrópicas pode explicar-se
do seguinte modo: quando
se adicionam dois líquidos, as moléculas de um misturam-se com as do outro e vice--versa, até a
mistura ficar homogénea. Todavia, acontece que cada molécula está sujeita, por parte das outras que a
rodeiam, a diversas influências, como choques, atracções e repulsões. Ora, tais influências aumentam
ou diminuem a facilidade com que as moléculas de cada um dos constituintes da mistura podem
escapar-se do líquido para passarem ao estado de vapor e têm uma intensidade variável, que é
função da proporção relativa dos dois componentes da mistura. Aliás, esta intensidade será tanto mais
marcada quanto maior for a diferença registada na estrutura química dos referidos componentes.
Na prática, as misturas azeotrópicas de ponto de ebulição mínimo são mais frequentes que as de
ponto de ebulição máximo, constituindo exemplo clássico de uma mistura pertencente ao primeiro
tipo o álcool etílico contendo 4,4% de água. Qualquer
260

destas misturas se comporta como se se tratasse de um composto químico puro, pois a composição da
fase vapor é igual à da fase líquida, o que torna impossível a separação dos seus dois constituintes,
a não ser que se empreguem métodos especiais. Um dos processos utilizados para destruir tais
misturas consiste na adição de um terceiro componenlc que altere as relações da pressão de vapor
do a/eótropo, método este muito usado na secagem do álcool hidratado, conforme já nos referimos
na pág. 192. recorrendo-se, por vezes, a métodos químicos e outros.

6.11.3.2.2. Destilação de uma mistura de dois líquidos imiscíveis

Suponhamos uma mistura numa proporção qualquer de dois líquidos nào miscívcis, a qual é
aquecida à ebulição. Neste momento o sistema tem três fases, sendo duas delas representadas por
cada um dos líquidos imiscíveis e a terceira pelo vapor.
Aplicando a um sistema destes a regra das fases, teremos que (p = 3 e N = 2. Logo:
(p + y = N + 2 3 +
V=2+2
V- l

Se fixarmos a pressão num dado valor, 760 mm de Hg, por exemplo, o sistema fica
determinado, pois a tal pressão o ponto de ebulição da mistura assim como a composição do
respectivo vapor estão fixados, querendo isto significar que a destilação de dois líquidos imiscíveis
será conseguida sempre à mesma temperatura desde que as condições sejam, evidentemente, sempre
as mesmas lambem.
Um dos casos correntes de destilação de dois líquidos imiscíveis é a codestilação com água.
quer dizer, a destilação de um líquido qualquer em presença da água, com a qual ele não seja
miscível. o que permite que a destilação se faça a uma temperatura mais baixa do que normalmente
se conseguiria.
Suponhamos o caso do bcnzeno, que ferve a 80"C à pressão normal, e da água, que ferve a
l(MÏ"C nas mesmas condições, quando ambos estiverem puros. A mistura dos dois, contudo, entra
em ebulição a 69,2"C e isto porque ao aquecermos uma mistura de líquidos imiscíveis o respectivo
ponto de ebulição será a temperatura à qual a soma das pressões de vapor dos constituintes igualar
a pressão atmosférica. Acontece que em tais circunstâncias o ponto de ebulição da mistura será
inferior ao do componente mais volátil, pois, desde que os líquidos sejam totalmente imiscíveis, a lei
das pressões parciais de DALTON aplica-se aos respectivos vapores saturados. Segundo a referida lei,
quando dois ou mais gases ou vapores que não reajam quimicamente uns com os outros estão
misturados a uma tempera)ura constante, cada gás exerce a mesma
261

pressão como se estivesse isolado c a soma dessas pressões é igual à pressão lotai do sistema, o que
pode ser expresso do seguinte modo:

Nisto reside, de facto, a explicação por que a mistura benzeno-água ferve a 69,2ÜC, quando
isoladamente o primeiro ferve, à pressão normal, a 8G"C e a segunda a !00"C.
Querendo calcular a composição do vapor originado por uma tal mistura, basla ler presente
que, segundo a lei de HENRY, as concentrações molares dos constituintes de uma mistura gasosa
são proporcionais ás tensões de cada um dos gases. Vejamos como se faz esse cálculo, reportando-
nos, para isso, ao sistema benzeno-água, colocado, por exemplo, à pressão de 760 mm de Hg, que
designaremos por P.
Sendo pl\ e p"Berr as pressões de vapor da água c do benzeno, respectivamente, para a
temperatura de ebulição do sistema, que como vimos, é, nestas condições, 69,2"C, teremos:

p = p» + p"
1
A ' Kd!7

P"AA fracção
molar, em percentagem, da água no vapor será dada por —— 100 e a
P
P" ,,
do benzeno por —— '-^- 100. Como, por outro lado, u pressão do vapor de atuía a
P
69,2°C é de 225 mm de Hg c a do bcnzeno, nas mesmas condições, é igual a 535 mm
de Hg, a fracção molar dos dois componentes no vapor originado por estes dois líquidos será
então;

225
Agua - —— x 1 00 = 29,6% 760

535
Benzeno = —— x 100 ^ 70,4% 760

e querendo calcular as quantidades dos componentes, em peso, basta multiplicar as suas fracções
molares pêlos respectivos pesos moleculares, 18 para a água e 78 para o benzeno.
Deste modo. lemos:

Agua = 29,6 x 18 = 533 Benzeno =


70,4 x 78 = 5491
262

A constituição do vapor originado pela mistura da água com o benzeno, expressa em g %, será,
pois, de:

533 x 100 Agua = ——


—————— = 9%
533 + 5491

5491 x 100
Benzeno =
533 + 5491

Uma das principais aplicações prálicas da codestilação com a água é a destilação de


substâncias nela insolúveis e que tenham um ponto de ebulição muito elevado, pois utilizando esta
técnica é possível destilar as referidas substâncias a uma temperatura inferior a 100"C e subtraí-las,
assim, à acção de um calor exagerado que, por vezes, as altera mais ou menos profundamente.
É evidente que a concentração do produto a destilar no vapor depende do seu ponto de
ebulição. No exemplo anterior, constituído por uma mistura de água-benzeno, este último figurava
em muito maior proporção no vapor originado por essa mistura exactamente porque o seu ponto de
ebulição é mais baixo que o da água. No caso, porém, de o produto codestilado com a água ferver a
uma temperatura superior ao ponto de ebulição daquela, a sua concentração no destilado será
menor. Eis um exemplo: a mistura água-nitrobenzeno destila a 99°C à pressão de 753 mm de Hg. A
esta temperatura, a pressão de vapor do nitrobenzeno puro é de p° = 19,7 mm de Hg e a da água
pura é de p° = 733,3 mm de Hg. Deste modo, a concentração dos dois componentes no vapor
originado pela respectiva mistura será:

733,3
x 100x18 = 1753 partes
753

19,7 Nitrobenzeno = ———— x 100 x 123 (') - 322 partes ou seja,


aproximadamente,
15,5% em peso de nitrobenzeno e 84,5% em peso de água.

6.11.3.3. Destilação de um líquido imiscível com a água, à custa de vapor não saturado

A destilação em corrente de vapor de água é um processo muito utilizado para o isolamento e


purificação de várias substâncias, sendo aplicável a líquidos considerados,

(') I 2 3 é o peso molecular do nitrobenzeno.


263

usualmente, como imiscíveis com a água ou que apenas sejam muito pouco solúveis nela.
Aqui apenas consideraremos o caso de líquidos totalmente imiscíveis e, portanto, os vapores da
mistura obedecerão à lei das pressões parciais de DALTON, a que nos referimos no parágrafo anterior.
Partindo do princípio de que a destilação do líquido não miscível se faz em presença de vapor
nào saturado, isto é, não contendo água condensada, o sistema compreende, em tais condições, duas
fases, correspondentes, respectivamente, ao líquido cm questão e ao vapor não saturado e terá, de
igual modo, dois componentes. Portanto, como (p = 2 e N = 2, teremos:

y+V=N+2
:, *:,(.r • 2 + V = 2 + 2
V
>:-'* .. =2 , - , . . - . . .

Há, por conseguinte, dois graus de liberdade possíveis, mas, na prática, fixa-se a pressão,
escolhendo-se a temperatura conveniente às condições experimentais mais favoráveis.
Sendo P a pressão total de vapor do sistema e p" a pressão de vapor do líquido não miscível
com a água, deduz-se que P — pQ corresponde à pressão do vapor de água nào saturado. Deste
modo, a composição do destilado é dada pela relação:

Peso do líquido não miscível com água p".M "*"


0
Peso de água (P-p }- 18

em que M corresponde ao peso molecular do líquido e 18 é o peso molecular da água. Tal relação
mostra que a quantidade de líquido não miscível presente no destilado aumenta com a subida da
sua tensão de vapor e com a diminuição da pressão exercida sobre o sistema, o que sugere que
este tipo de destilação deve fazer-se sob pressão reduzida. Vejamos um exemplo concreto.
Suponhamos o caso do geraniol, cuja destilação em corrente de vapor se fazia a 100°C e à
pressão de 60 mm de Hg. Nestas condições, sendo a pressão total do sistema

P = 60 mm de Hg e a do

geraniol

- p° = 5,26 mm de Hg

a pressão do vapor de água não saturado será , . -,-,-..

P - p° = 60 - 5,26 = 54,74 mm de Hg *. , y - *. ,<


264

Nestas circunstâncias

P ., 5,26 x 154 (O 810


geraniol_ '____ • '
_
agua />, 54,74x18
985

o que significa que o destilado é constituído por 45% de geraniol e 55% de água.
Se, entretanto, procedermos à destilação a 140°C e à pressão anteriormente utilizada, a
tensão de vapor do geraniol é agora p0 = 40,1 mm de Hg. Teremos, por conseguinte, que:

P - p° = 60 - 40,1 = 19,9 mm de Hg e portanto:

40,1x154 _ 6175,4
19,9 x 18 358,2

e o destilado passará a conter 94,5% de geraniol em vez de 45%, cifra


correspondcnle às condições experimentais do exemplo anterior.
Como já dissemos, diminuindo a pressão exercida sobre o sistema consegue-sc aumentar, no
destilado, a proporção do produto não miscível com a água. Sirvamo-nos, ainda, do geraniol como
exemplo e suponhamos que procedfamos à sua destilação em corrente de vapor não saturado a
100°C e à pressão de 30 mm de Hg. Nestas condições:

p° , = 5,26 mm de Hg
' gerânio! °

P = 30 mm de Hg

P - p° = 24,74 mm de Hg Deste

modo:

5,26x154 810

24,74x18 445

(') 154 é o peso molecular do geraniol.


265

e o destilado conteria 64,5% de geraniol cm comparação com 45%, quantidade obtida trabalhando à
pressão de 60 mm de Hg.
Em face deste resultado, seria lógico generalizar que quanto mais baixa for a pressão a que se
opere, mais eficaz se torna este processo de destilação. Nào há d ú v i d a que operando sob pressão
reduzida a destilação cm corrente de vapor origina um destilado mais rico em produto não miscívcl
com a água, mas tal aumento de rendimento assim obtido nào é considerado compensador. De
facto, é preciso não esquecer que ao baixar a pressão, baixa, simultaneamente, a temperatura de
ebulição do líquido e na prática a destilação por vapor de água nunca deve ser feita a temperaturas
demasiadamente baixas pelo simples motivo de que a condensação e arrefecimento do vapor se
tomam difíceis em lais circunstâncias.
Na realidade, ao diminuir a pressão torna-se igualmente menor a diferença enlre a temperatura
dos vapores a condensar e da água de arrefecimento e esla, portanto, perde certa capacidade de
absorver calor. Resumindo, podemos di zer que uma temperatura de ebulição baixa exige uma
grande quantidade de água para o arrefecimento dos vapores destilados, o que se pode traduzir em
dificuldades de ordem técnica por vezes insuperáveis, pelo que, neste caso, se prefere trabalhar à
pressão normal.

6.11.4. DESTILAÇÃO FRACCIONADA

E muito frequente recorrer à destilação para se separarem dois líquidos completa-mente


miscíveis, ulijizando-se, neste caso, a técnica da destilação fraccionada.
Ao estudarmos o comportamento dos líquidos miscíveis em Iodas as proporções, cujas misturas
apresentam uma variação uniforme do respectivo ponto de ebulição, já aludimos, ainda que
vagamente, no modo como se poderia conseguir o seu fraccionamento (pág. 256). Mas retomemos o
assunto com mais pormenor.
Suponhamos uma mistura obedecendo às condições atrás referidas, constituída por 500 ml de
X, p. e. = 70°C, e 500 ml de Y, p. e. = I20°C, e que a destilávamos separando cinco fracções
distintas, a saber:

/." Destilação

Fracção At fi, C, £>, E,


Temperatura de ebulição (1C 80-86 86-93 93-101 101-108 1 081 15
Total em ml 200 2ÍX) 200 200 200

O caminho a seguir para sermos levados à separação efectiva dos componentes X e Y


existentes na mistura inicial será, logicamente, rcdeslilar outras quantas fracções, que, por seu
turno, sofreriam novas redestilações.
266

Este processo de fraccionamento, como é intuitivo, implica, contudo, um número elevado de


sucessivas destilações até se conseguir separar os dois componentes no estado puro. Limitando-nos
apenas ao caso da fracção Ar vamos admitir que a destilávamos mais quatro vezes e que as diversas
fracções obtidas tinham as seguintes características:

2.a Destilação
A2 B2 C2 D2 E,
Temperatura de ebulição °C 75-79 79-89 89-104 104-113 113-117
Volume obtido em ml 325 135 100 125 315

3." Destilação
A, B, C3 D3 E3
Temperatura de ebulição yC 73-76 76-88 88-104 104-115 115-118
Volume obtido em ml 360 110 70 105 355

4." Destilação
^ ** C* *V E,
Temperatura de ebulição °C 71-73 73-76 76-104 104-117 117-119
Volume obtido em ml 410 75 40 70 405

5." Destilação
A, B, C, D5 E5
Temperatura de ebulição °C 70-71 71-85 85-105 105-119 119-120
Volume obtido em ml 475 20 10 20 475

É, pois, evidente, que as fracções A5 (p. e. 70-71°C) e E^ (p. e. 119-120°C) contêm,


respectivamente, os componentes X Q Y em estado praticamente puro, mas repare-se que a sua
separação só foi conseguida após cinco destilações e a recolha de um número bastante considerável
de fracções, o que torna a operação extraordinariamente morosa e maçadora.
Por isso, utilizam-se na prática as chamadas colunas de fraccionamento ou de rectificação, as
quais permitem, em certos casos, a separação dos componentes de uma mistura binária após uma só
destilação ou, pelo menos, reduzem o número de destilações necessárias para se obter a separação
de dois líquidos. Para que isto se torne possível, tais colunas de fraccionamento estão construídas de
modo a provocarem uma série contínua de condensações parciais do vapor formado e de
vaporizações também parciais dos condensados, pelo que o seu efeito se compara a uma série de
destilações separadas.
Par? compreender o seu funcionamento recorramos ao esquema teórico adoptado
por BACHMANN e suponhamos um aparelho formado por uma série de recipientes,
considerando três deles, situados no meio dessa série, conforme se representa na
Fig. 155. . , .,,,,
267

O recipiente A contém uma mistura binária, cuja composição corresponde a Lft (Fig. 152, pág.
256), sendo L2 e L a composição dos líquidos nos recipientes B c C, respectivamente.

Fig. 155. Aparelho teórico para a explicação do


funcionamento de uma coluna de rectificação (segundo
Bachmann)

Quando o líquido em A estiver à sua temperatura de ebulição, í4, emite vapores que passam
através da serpentina existente no fundo do recipiente B. Se nos reportarmos ao gráfico da Fig. 152,
pág. 256, que representa a temperatura cm função da concentração, vë-se que /4 > /,,-sendo esta a
temperatura de ebulição da mislura de composição L, contida em B. Deste modo, o vapor emitido em
A ao chegar a B aquece o conteúdo deste e fá-lo entrar em ebulição, condensando-se em seguida em
£', o mesmo acontecendo com o vapor emitido por B, que, após ter aquecido à ebulição o líquido do
recipiente C, se condensa em F.
Repare-se, no entanto, ainda segundo o gráfico da Fig. 152, pág. 256, que o vapor emitido no
recipiente A (V4) tem a mesma composição, Lr que o líquido encerrado cm B, e, assim, pode
suprimir-se a serpentina c fa/cr borbulhar directamente o vapor de A no líquido contido cm S; aliás,
acontece o mesmo com o vapor emitido em /? (V\), cuja composição, L ] t é, por sua vez, igual à do
líquido cm C, pelo que também nesse compartimento se faz a condensação do vapor de B.
Como se verifica ainda da observação do gráfico da Fig. 152 os líquidos à ebulição nos
recipientes A, B c C emitem um vapor mais rico que eles no componente mais volátil, e, por isso, tal
componente vai baixando de concentração nesses líquidos apesar da chegada sempre contínua de
vapor vindo do recipiente inferior, isto é, de A para fí, de B para C, ctc. Este desequilíbrio, no
entanto, é compensado, em parte, pelo
268

retorno parcial do líquido existente em cada um dos recipientes para o que lhe está situado
imediatamente abaixo, refluindo o líquido de B para A pelo tubo /, o líquido de C para B pelo tubo
K, e assim sucessivamente.
Vê-se, portanto, que uma série de recipientes como estes que acabámos de descre
ver permitiria realizar a separação dos dois constituintes de um líquido, a qual seria
tanto mais perfeita quanto maior o número de elementos que figuras
sem na referida série. Um aparelho destes, contudo, é puramente
& teórico, sendo substituído na prática pelas colunas de destilação
----- fraccionada ou de rectificação, cujo esquema está representado na
Fig. 156.
Uma coluna destas é constituída por um tubo cilíndrico, apresentando, a
espaços regulares, uma espécie de prato, o qual é perfurado por numerosos
orifícios através dos quais possa fluir o vapor ascendente. Estes pratos dividem
a coluna numa série de elemenlos: A, 5, C, etc., cujo funcionamento é
semelhante ao dos recipientes do aparelho teórico atrás descrito, sendo o
líquido mantido sobre cada prato mercê da pressão exercida pelo vapor que se
evola do prato situado por baixo, escoando o excesso de líquido para o prato
inferior através dos tubos F, G, //, etc.
Entretanto, a analogia entre uma coluna de fraccionamento e o aparelho teórico
atrás descrito só é completa se os vapores que abandonam cada um dos pratos
possuírem a composição tal qual é calculada à custa dos diagramas temperatura
de ebulição-composição. Quando isso se verifica, os pratos das colunas de
O
fraccionamento comportam-se como pratos teóricos, mas, na prática, esta condição
está longe de ser observada. De facto, é materialmente impossível evitar que
uma certa fracção do vapor emitido por um prato atravesse o líquido do prato
superior antes de ficar em equilíbrio perfeito com este, ou, ainda, que
determinada porção de líquido seja arrastada pela corrente de vapor de um
prato para o outro, e nisto reside o motivo por que um prato real é sempre
menos eficaz do que um prato
Fig. 156.
Esquema de teórico. " TI-;f<o; ^-ï:*n;-••' •
uma coluna de --1 :.. '- •• •
rectificação
Por isso, a eficiência de uma coluna de fraccionamento é
definida pela Altura Equivalente a um Prato Teórico (A.E.P.T.) e, assim, a uma coluna de 2 m que
tenha um poder de fraccionamento equivalente, por exemplo, a dez pratos teóricos corresponderá
uma

A.E.P.T. - -0,2 m.
10
269

Existem numerosos modelos de colunas de rectificação, mas em todos eles se procura manter
um contacto perfeito cnlre o vapor que sobe e o líquido que reflui, pois deste importante pormenor
depende o seu bom funcionamento. Aliás, estas colunas devem trabalhar sem que haja trocas de
calor com o exterior e para evitar isso alguns modelos estão providos de isolamento ou são
aquecidos para compensar qualquer possível perda de calor. Neste último caso, porém, o seu
aquecimento deve ser feito a uma temperatura cerca de 10-15"C abaixo daquela a que se encontra o
vapor, pois, se for exagerado, o poder separador da coluna é diminuído.

6.11.5 PRÁTICA DA DESTILAÇÃO

Passados em revista alguns aspectos teóricos desta operação, vejamos agora os processos
usados na prática laboratorial para se fazer uma destilação. São eles:

1 — Destilação simples;
2 — Destilação a pressão reduzida;
3 — Destilação em corrente de vapor;
4 — Destilação fraccionada.

6.11.5.1. Destilação simples

Este processo, como já vimos, não permite uma separação completa dos componentes de uma
mistura binária, a não ser que estes tenham pontos de ebulição muito afastados. Apesar disso,
utiliza-se bastante, tanto no laboratório como no domínio industrial, sempre que não seja necessária
uma separação absoluta dos constituintes da mistura a destilar ou quando se pretenda separar um
líquido de produtos não voláteis nele dissolvidos.
São vários os tipos de aparelhos utilizados para fazer uma destilação simples, os quais constam,
essencialmente, de um recipiente onde se procede à vaporização do líquido a destilar e de um
dispositivo que permite arrefecer e condensar o vapor formado. A Fig. 157 representa um dispositivo
típico utilizado numa destilação simples à escala laboratorial.
O líquido a destilar é colocado no recipiente A, sendo os vapores formados arrefecidos e
condensados no refrigerante 6, recolhendo-se o condensado no balão C, servindo o termómetro T
para medir a temperatura do vapor. A fim de evitar o sobrea-quecimento do líquido a destilar e a sua
ebulição tumultuosa e irregular, deve adicionar-se ao líquido, antes de se iniciar o aquecimento,
pequenos fragmentos de porcelana porosa ou qualquer outro material apropriado.
270

O a q u eci m en t o do halão destilatório pode fa/er-se por vários meios; a fogo duect o.
por meio de invólucros ou manias em que estão incorporadas resistências eléctricas, a
banho de óleo. e depende, principalmente,
da nalure/.a do l i q u i d o ;i d e s t i lar, devendo ter-se o cuidado de nunca
u t il i za r uni bico de gás para o aquecimento de líquidos i n M amáveis.
Por seu tu rno , proeurar-se-á escol h er um condensador apropriado às
características do produto a destilar,
recorrendo-sc ao t i p o m a i s apropriado a cada
caso, lembr ando que estes utensílios
foram descritos quando tratámos da
Refrigerarão (pá». 174). Quando a

Fig. 157. Dispositivo para destilação simples


destilação envolve o manuseamento de um \ o l u i i i e considerável de líquido utiliza-se,
de preferência, um a l a m b i q u e, q u e se compõe de três
peças: a curcíthita. o ( a p i t e i e o refrigerante (Hg. 158). A
cwcúbiía c uma caldeira ordinariamente
cilíndrica, de cobre estanhado, apresentando na pane
superior um rebordo por meio do qual ïica apoiada no
torno ou banho de aquecimento. O capitel é uma
espécie de tampa da eureúbita, á qual se deve adaptar
perfeitamente. Na sua extremidade superior ou. por
vezes, lateralmente, o capitel IÍga-se a um tubo comprido,
encurvado e de diâmetro relativamente largo,
chamado o colo de cisne, construído de maneira que os
vapores passem livremente sem aumentarem a pressão
no interior do aparelho. O colo de cisne, por sua vê/..
liga-se directamente a um refrigerante, geralmente em
forma de serpentina, mergulhado num recipiente com Fig. 158. Alambique com
banho
. de água. A. eureúbita: B. capitel;
agua que e constantemente renovada. c C0io de cisne

6.11.5.1.1. Aparelhos para a destilação da água

Não é exagero afirmar-se que a preparação da água destilada representa, de longe,


a mais importante aplicação da destilação no campo farmacêutico.
De facto, a água destilada é, sem duv ida , o veículo mais ut il i/ ad o na preparação de
soluções medicamentosas, quer destinadas a serem administradas per n\ ou por vi a
271

parenterat, representando, por isso, uma das matérias-primas que maior consumo têm nos
laboratórios farmacêuticos.
Entretanto, a destilação da água para uso farmacêutico, sobretudo aquela destinada à
preparação de soluções injectáveis, deve ser feita por processos adequados, pois a água destilada
tem que obedecer a condições bem especificadas, tais como não ser pirogcnica e não conter metais
ou gases dissolvidos, etc., devendo satisfazer aos rigorosos ensaios de controlo inscritos em todas as
farmacopeias.
Dada, pois, a importância que este produto representa para a actividade farmacêutica,
achamos justificável darmos uma ideia, ainda que sumária, dos principais modelos de aparelhos
utilizados na sua preparação.
Na generalidade, a água destilada é preparada a partir da água potável, devendo os aparelhos
utilizados na destilação satisfazer a certos requisitos, alguns deles de ordem meramente técnica e
outros de ordem económica, sobretudo a atender quando se trate de produção em grande escala.
Assim, um aparelho utilizado na destilação da água deve recuperar o calor latente
de vaporização, o que toma a produção mais económica. Além disso, não deve ocasio
nar o arrastamento de gotículas de água pelo vapor, o que elimina a presença de
substâncias dissolvidas ou suspensas e de pirogénio-s no destilado, não deve ceder à
própria água destilada as substâncias de que é feito e deve promover a eliminação dos
gases dissolvidos naquela antes da destilação propriamente dita. -?
Os aparelhos de destilação são de muitos e variados modelos, sendo uns construídos de vidro c
outros de metal. O vidro utilizado na fabricação dos destiladores deve ser dotado de alta resistência
hídrolítica, isto é, não deve ceder, mesmo em quantidade mínima, nenhum dos seus constituintes à
água. Exige-se, pois, mais de que um vidro neutro, um vidro muito resistente ao ataque pela água a
quente, como os vidros Pyrex e Jena. Normalmente, estes aparelhos são de baixo rendimento e
relativamente caros, alem de frágeis e difíceis de montar, dado o número de peças que os constituem.
Como metais usados na fabricação de destiladores podemos mencionar o cobre, geralmente
estanhado, e o aço inoxidável, sendo, por vezes, os refrigerantes prateados no seu interior.

6.11.5-1.1.1. Aparelhos de vidro ,,.-. ,v *

Entre os aparelhos deste tipo lemos o de Schofí-Jena, de rendimento muito limitado, que pode
trabalhar acopulado com outro igual, produzindo directamente água bidestilada. A Fig. 159
reproduz um esquema deste aparelho. Mais prático e de rendimento um pouco mais elevado é o
bidestilador Vel, também inteiramente de vidro, reproduzido na Fig. 160.
272

Outros modelos totalmente de vidro são o Kontadest, o Elektrodest, o Fontavapor, o Salvis, o


Aquast c o Biquast, cujas características, segundo GREPPIN, indicamos seguidamente.

Fig.159. Aparelho de Fig. 160. Aparelho de Vel


Schott-Jena

Kontadest (GEBR. MOI.LHR 1934). — É o tipo de aparelho complelamente de vidro com


alimentação de agua. Compõe-se de um balão no qual a água é levada à ebulição por uma chama de
gás. O vapor é conduzido por um tubo de vidro para o refrigerante, também de vidro. Débito: cerca
de l litro por hora.
Elekírodest (EuGEN POST, 1930). — Este aparelho é feito, também, inteiramente de vidro pyrex,
numa só peça, mas de uma concepção muito mais moderna que o precedente. A água é aquecida por
dois eléctrodos de corrente alterna que mergulham directamente no balão, o que torna o
funcionamento deste destilador muito mais económico. A passagem da corrente é facilitada pela
presença de nitrato de sódio, que se adiciona à água a destilar, sendo a corrente interrompida
automaticamente quando a água falta. Débito: 2 ou 4 litros por hora, segundo o modelo. O preço da
água torna-se muito menor do que nos modelos precedentes.
Fontavapor (Buem, 1950). — Baseado no mesmo princípio que o Elektrodest, não exige a
presença de electrólito em virtude do emprego de dois eléctrodos de grande superfície. O aparelho
compõe-se de duas partes. Débito: 3-5 l por hora, sendo o custo da água igual ao da produzida pelo
Elekírodest.
Salvis. — Aparelho inteiramente de vidro, com aquecimento eléctrico exterior, para água
bid^stilada. O primeiro balão é alimentado por água da canalização e o segundo pela água
destilada que sai do primeiro.
A destilação é muito lenta e difícil de regular, devendo ser constantemente vigiada. Débito:
cerca de 0,5 l por hora.
273

Aquaaí. — Este aparelho, de origem alemã, c constituído de molde a produzir uma água de
qualidade superior, Todo de vidro Jena 20, o aquecimento é teito externamente, por meio de uma
espiral eléctrica, estando o refrigerante e o regulador de nível colocados no interior do balão de
destilação.
O regulador está construído de maneira a produzir um efeito de
depressão semelhante ao duma trompa de água exactamente depois da
primeira zona de condensação do vapor de água. Deste modo, enquanto
que este já se transformou em fase líquida, o anidrido carbónico, os
vestígios de amoníaco e produtos de decomposição orgânica, voláteis a
100°C, são eliminados.
O Biquast é a combinação com um segundo aparelho semelhante ao
primeiro, para a obtenção de água bidestilada. Eis os dados técnicos
destes aparelhos:

Condutividade Resislividade Débito


Aquast 1.9 x 10"
526315 ohm x cm l litro/hora
Biquast 1,3 x IO6 •T
769230 ohm x cm 400 ml/hora
Biquast c/ refrig. 1,0 x 10"
quartzo 1000000 ohm x cm

6.11.5.1.1.2. Aparelhos de metal

Dentre os aparelhos metálicos mais usados na preparação da água


destilada podemos citar os destiladorcs Manestv e Slokes, o primeiro de
origem inglesa e o segundo de procedência americana, mas ambos iguais. Tais
aparelhos podem ser aquecidos u gás, gasolina, vapor ou electricamenle, sendo Fig.161.
Destilador
apresentados em vários tamanhos e modelos, cujo rendimento varia Fontavapor
desde cerca de 1.9 litros a pouco menos de 400 l/hora. A Fig. 162 representa um aparelho destes em
corte, operando-se o seu funcionamento da seguinte maneira: A água a destilar entra por Ü e sobe
ao longo de B, provocando a condensação dos vapores descendentes. Em virtude da troca de calor
entre o vapor e a água refrigerante, esta é aquecida a uma temperatura elevada, de que resulta que
os gases nela dissolvidos se evolern e saiam do destilador pela abertura G.
Uma certa quantidade dcsla água assim pré-aquecida passa para a caldeira A, para substituir
a água evaporada, e o excesso sai do aparelho pelo orifício H, estando calculado que são necessários
8 litros de água para se obter l litro de água destilada.
274

podendo aproveitar-se os 7 litros de água restante, que sai aquecida por H, para outros fins. Como
se pode ver na Fig. 162, há uma zona de água na parte de cima do condensador que, estando a um
nível superior ao da saída para H, não é removida
senão para substituir a água evaporada na caldeira.
Acontece, por outro lado, que a água acumulada nesse
ponto é mantida cons-tantemente à ebulição pelo vapor
libertado na caldeira c que começa a descer ao longo
do condensador, sendo aí que o amoníaco e oulros
gases se libertam. Repare-se que a extremidade
superior do condensador se eleva bem acima do nível
da água na câmara de ebulição e está protegida por
uma espécie de tampa de vidro, E, de modo que não
existe perigo de se verificar arrastamento de água
juntamente com o vapor.
Outro tipo de destilador metálico é representado
pelo aparelho de Barnstead, com numerosos modelos de
capacidade variável, os quais ainda são utili/ados em
alguns laboratórios.
Fig. 162. Aparelho Manesty para Na Fig. 163 reproduzimos um modelo deste
destilação de água
aparelho que funciona do seguinte modo: A água a
destilar entra no condensador por A e enquanto gira
em torno da parte externa deste é aquecida de tal modo
que quase ferve, devido ao calor latente de condensação do vapor existente dentro do
condensador.
Esta água segue pelo tubo B para um indicador de nível ligado a um evaporador aberto, C.
Estando a uma temperatura igual à do seu ponto de ebulição e em contacto com a atmosfera, a água
liberta praticamente todos os gases dissolvidos e todas as impurezas voláteis, efectuando-se, assim,
uma purificação preliminar. O indicador de nível, C, mantém, automaticamente, o nível constante,
saindo o excesso de água quente por G, podendo ser utilizada para outros fins.
No evaporador a água é transformada cm vapor, o qual sobe pelo tubo D para os tubos
internos do condensador, saindo, depois, pelo tubo E, água destilada, estéril e quimicamente pura,
graças a um processo simples, contínuo e automático.
Uma característica deste aparelho é a abertura H na extremidade do condensador. Por simples
diminuição do débito da corrente de água fria em A pode fazer-se sair por H um pouco de vapor não
condensado, as segurando-se, assim, uma maior eficácia, pois torna-se impossível a entrada de ar, e,
facto mais importante, impede-se a redissolução
275

de quaisquer gases que ainda não tenham sido eliminados, pois saem juntamente com o jacto de
vapor. Além disso, a abertura H torna o sistema aberto, impedindo, assim, o estabelecimento de
pressões internas.

Fig. 163. Aparelho de Barnstead

6.11.5.1.1.3. Destilação por termocompressão

A destilação por termocompressão baseia-se cm dois princípios fundamentais:

l — Destilação a pressão ligeiramente interior à pressão atmosférica; 2—compressão e


condensação do vapor assim produzido a uma pressão ligeiramente superior à mesma pressão
atmosférica.

Os destiladores que para este fim se empregam são de patente italiana e assentam em bases
teóricas completamente novas. A casa produtora é a firma PONZINI e MASCARINI, sendo conhecidos estes
aparelhos por destiladores de MASCARINI.
Como inovação curiosa, o dcstilador não contém qualquer refrigerante e o aquecimento é feito
electricamente, sendo o aparelho calorifugado, efectuando-se o seu funcionamento do seguinte
modo:
276

Numa caldeira de destilação (1), a água é mantida a nível constante graças a um alimentador
automático provido de um sistema de bóia (7).
Por meio de um dispositivo de aquecimento de pequeno poder (resistências, 5,6), aquece-se à
temperatura necessária a água contida em quantidade limitada na caldeira. Depois disso, o
aquecimento é consideravelmente reduzido e não é utilizado senão para compensar as perdas de
calor devidas a irradiação e ao transporte pela água à saída do escoador.

Fig. 164. Aparelho de destilação por termocompressão (esquema)

Inicia-se, então, o ciclo de produção, entrando em movimento o aspirador-compres-sor de


vapor (2), que tem por fim aspirar o vapor à medida que este se forma na caldeira e criando aí o
grau de vazio necessário. O vapor ligeiramente comprimido c condensado, depois, no condensador
de grande superfície (3), e durante esta mudança de estado cede à água da caldeira todas as calorias
de vaporização, de modo que l kg de vapor condensado produz outro kg de vapor na caldeira. Em (4)
a água destilada assim obtida é arrefecida e cede ainda as restantes calorias à água que, em contra--
corrente, alimenta o aparelho.
Segundo o fabricante, o processo apresenta as vantagens seguintes:

l .a — Obtenção de uma água destilada absolutamente pura e apirogénica;


2."—Consumo de energia insignificante — 15 litros por kw/h consumido, nas pequenas
instalações.
a
3. — Início muito rápido da destilação devido ao pequeno volume de água contido na
caldeira;
277

4.a — Consumo nulo de água de refrigeração;


5.a—O aparelho é de construção sólida, de manobra simples, não necessita de -?.. pessoal
especializado e oferece as melhores garantias de duração e funcionamento ininterrupto;
6.a—O rendimento, sempre elevado, varia segundo as dimensões dos diferentes modelos (de 5 a
1000 litros por hora).

Os aparelhos podem ser fornecidos ainda com um dispositivo de regulação para funcionamento
inteiramente aulomãtico, graças ao qual o aquecimento é regulado de modo a manter o grau de vazio
nos limites desejados.
Existem modelos especiais para a destilação de água do mar, para bases navais e instalações a
bordo de barcos, etc.
Os primeiros aparelhos apresentavam o inconveniente, comum, de resto, à maioria dos
alambiques de movimentação contínua, de não permitirem uma desgaseificação conveniente da água.
Hoje, o problema parece estar inteiramente resolvido com a introdução, nos aparelhos, de uma saída
para gases incondensáveis.

6.11.5.2. Destilação a pressão reduzida

Muitas substâncias não podem ser satisfatoriamente destiladas à pressão normal porque correm
o risco de se decomporem antes que o seu ponto de ebulição seja atingido. No entanto, desde que se
reduza a pressão exercida sobre a superfície livre de um líquido, a sua temperatura de ebulição
baixa de acordo com o grau de vazio feito, propriedade que é utilizada, na prática, para destilar
produtos constituídos por substâncias alteráveis ou decomponíveis pelo calor.
Aliás, a Tabela XXII é elucidativa sobre a relação pressão-temperatura de ebulição de vários
líquidos e mostra bem como, por este processo, é possível destilar a temperaturas relativamente
baixas certos líquidos com elevado ponto de ebulição.

Tabela XXII. Temperatura de ebulição aproximada de alguns produtos em função da pressão

Pressão (mm Hg) Agua Clorofórmio Bcnzalüeído Glicerina


f-^ "C nf~* •C
760 100 62 174 290
50 38 54 95 204
30 30 43 84 192
20 22 34,5 75 182
10 11 22 62 167
5 1 K) — 155
278

Na Fig. 165 representamos, esquematicamente, um dispositivo que pode ser usado para fazer
uma destilação sob pressão reduzida, em cuja montagem só deve ulilizar-se tubo de borracha de
paredes grossas e rolhas também de borracha que adaptem perfeitamente ao bocal dos frascos. O
líquido a destilar é colocado num balão de CLAISEN com dois colos, X, introduzindo-se na abertura do
colo direito um termómetro, c u ja ampola deve ficar abaixo da saída do ramo lateral, enquanto que
pelo da esquerda passa um tubo capilar, fechado na extremidade superior por um tubo de borracha
ao qual se aplica uma pinça de pressão regulável. O papel deste tubo capilar é o de permitir a
passagem de uma corrente de tinas bolhas de ar através do líquido quando o aparelho estiver sob
pressão reduzida, o que regulariza a ebulição e impede o sobreaquecimento do produto a destilar.

Fig. 165. Dispositivo para destilação sob pressão reduzida

Os vapores, depois de condensados em B. são recolhidos no balão C, fazendo-se a ligação do


dispositivo de destilação à máquina de vazio pelo balão E, o qual serve para restabelecer a pressão,
uma vez acabada a destilação, estando intercalado entre C e E um manómetro, D, para medir a
pressão a que se opera.

6.11.5.3. Destilação em corrente de vapor

A principal aplicação desta técnica de destilação em Farmácia é na preparação das águas


destiladas ou hidrolalos. os quais se obtêm destilando, em corrente de vapor de água, certas drogas
contendo essências.
Na Fig. 166 reproduzimos o esquema de um dispositivo que pode ser utilizado na prática de^te
tipo de destilação. O vapor é gerado no balão A, o qual está equipado com um tubo de segurança
que deve mergulhar bastante abaixo da superfície da água, passando através do tubo C para o
recipiente B mantido inclinado para evitar que o líquido seja projectado contra a entrada do lubo de
saída e seja arrastado para o
279

condensador. Uma vez que se pretenda separar o produto destilado da água, é vantajoso recolher-se
o destilado num vaso florentino, que permite essa separação com relativa facilidade.

Fig. 166. Dispositivo para destilação em corrente de vapor

Todavia, a preparação das águas destiladas faz-se quase sempre recorrendo a um alambique
cuja curcúbita A mergulha num banho de água C, que faz parte integrante do aparelho, conforme se
mostra na Fig. 167.

Fig. 167. Alambique de Soubeiran para destilação de plantas

Graças a um dispositivo idealizado por SOUBEIRAN, o banho está em comunicação com a


curcúbita por meio de um tubo B que corre ao longo da parede interna desta e termina na sua parte
inferior. Por cima da extremidade do referido tubo a curcúbita apresenta um diafragma metálico,
sobre o qual se coloca a planta que se pretende destilar. A câmara de destilação recebe deste modo
o vapor vindo do banho de água, sendo o destilado constituído pelo vapor de água condensado c
pela essência existente no produto destilado.
280

6.11.5.4. Destilação fraccionada

Pêlos motivos apontados quando tratámos da teoria da destilação, tivemos ocasião de ver que,
na prática, a separação de dois líquidos miscíveis formando uma solução ideal se faz recorrendo à
técnica da destilação fraccionada. Esta difere da destilação simples porque entre o balão destilatório
e o condensador se intercala uma coluna de fraccionamento ou de rectificação, das quais existem
vários modelos, uns mais eficientes, outros de menor poder de separação. Como o dispositivo
utilizado neste processo de destilação é, basicamente, o mesmo utilizado na destilação simples,
tendo apenas a mais a coluna de rectificação, neste parágrafo trataremos, unicamente, destas
últimas.
Uma das colunas mais conhecidas é a de VKÍRFUX (Fig. 168 B), considerada como tendo uma
eficiência de separação mediana, É constituída por uma série de dentes de vidro formando vários
andares dispostos a intervalos regulares. Tais dentes, que nascem das paredes, afilam-sc na
extremidade e convergem no centro, estando dispostos de modo que as pontas de cada par quase
locam umas nas outras. A sua inserção na coluna é feita de modo que fiquem ligeiramente inclinados
para baixo e formam como que uma espiral de vidro, de modo que o vapor tem que contactar com
eles forçosamente.

v
U

Fig. 168. A, coluna de Widmer: B, coluna de Vigreux; C, coluna tipo Hempel. para
enchimento; D, cone de Honeycomb, para suporte do enchimento

Existem muitos outros tipos de colunas, tidas como mais eficientes que a de VIGREUX, alguns
modelos das quais se representam na Fig. 168. Entre elas, podemos mencionar as colunas de
WIDMER, com espiral interior, e a coluna tipo HEMPEL. Esta última é constituída por um simples tubo
de vidro, cheio até alguns centímetros abaixo da tubuladura lateral com um material apropriado,
como anéis de porcelana, anéis de FISKE, anéis de RASCHIG ou pérolas de vidro (Fig. 169).
281

É aconselhável rodear as colunas de fraccionamento por uma manga ou camisa exterior de


vidro ou por uma ou duas camadas de amianto, pois tal isolamento diminui as perdas de calor e
aumenta a eficiência das colunas. Este isolamento é imprescindível desde que o ponto de ebulição
dos líquidos a destilar seja superior a 100!>C; quando essa temperatura for ainda mais elevada, a
coluna deve ser aquecida electricamcnte a uma temperatura vizinha, mas sempre inferior à do ponto
de ebulição dos componentes da mistura a destilar.

Fig. 169. Enchimento para colunas de fraccionamento. A. anéis de


Finske, de vidro; B, anéis de Raschig, de vidro; C.
pérolas de vidro

BIBLIOGRAFIA

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WULKEX, Catálogo N." 56. Sociedade Técnica Caler, Lda., Lisboa.
282
283

Operações físicas exigindo a intervenção de um líquido

7.1. DISSOLUÇÃO 7.1.1.

GENERALIDADES

Designa-se por dissolução a operação lísica que consisle em misturar, inliinainenie.


duas ou mais substâncias, de modo a formarem uma única fase. Desta operação resulta uma
solução, a qual não c mais do que uma mislura homogénea, cuja composição, no entanto,
pode ser variável.
Hm geral, considera-sc que uma solução é formada por dois componentes distintos: o
solvente e o soluto, também designado por solvido ou dissolvido. Quando, porém, só um dos
componentes é líquido, esle designa-se sempre por solve/He, e. no caso de todos serem
líquidos, considera-se como solvente aquele que figure em maior proporção.
Do ponto de vista teórico, podemos admitir a existência de soluções cujo solvente é
um sólido, um gás ou um líquido, se bem que. habitualmente, o termo solução se aplique,
apenas, aos sistemas cm que o solvente é representado por um líquido. ]•. este, alias, o
único caso que trataremos no presente capítulo, pois nele estão incluídas as soluções
farmacêuticas.
A solubilidade de uma substância num determinado solvente não c ilimitada. De
lacto, quando se põe um sólidti em contacto com um líquido que não exerça sobre aquele
qualquer acção química, pode acontecer que o sólido se dissolva totalmente no líquido
em questão, que se dissolva apenas parcialmente ou seja praticamente insolúvel nele.
Tal facto significa que uma substância pode ser mais ou menos solúvel n u m certo
líquido, isto é, cada produto tem um coeficiente de solubilidade característico, o qual é
d e f i ni d o como sendo a concentração, a determinada temperatura, da respectiva solução
saturada. Esta. por sua vê/, é Ioda a solução que se encontra em equilíbrio com um
excesso de solvido, dizendo-se que é não saturada quando esse equilíbrio não lenha
284

sido atingido e sobressaiurada quando a sua concentração ultrapassa a da solução saturada.


Nas soluções verdadeiras, as substâncias dissolvidas atingem um alto grau de dispersão,
apresentando as partículas dimensões inferiores a 0,001 |J, o que representa as condições ideais
para a absorção dos compostos medicamentosos pelo organismo, sendo esse um dos motivos por que
a forma galénica Solução é tão largamente utilizada.
Na realidade, as soluções ocupam hoje em dia um lugar destacado em todas as farmacopeias,
representando a forma farmacêutica geralmente preterida para a administração de medicamentos.
Mercê disso, e porque é uma das operações mais rotineiramente executada em todos os
laboratórios, há o risco de criar-se a ideia preconcebida de que a dissolução é uma operação
banalíssima e praticável sem qualquer dificuldade de maior, quando a realidade é bem outra. São
tantos e tão variados os factores que nela intervêm, como a temperatura, interacções solvente-soluto,
estado de divisão da substância a dissolver, agitação, constante dieléctrica do soluto e do solvente,
pH, etc., que a sua simples enunciação dá já uma pálida ideia das dificuldades que podem surgir ao
praticar-se uma operação que à primeira vista parece tão simples de executar.
Exactamente por isso, não é exagero dizer que se a dissolução é uma operação que muitas
vezes se reveste de extrema facilidade, também não é menos verdade que, nalguns casos, levanta
problemas bastante difíceis, cuja resolução exige do farmacêutico um conhecimento adequado dos
vários fenómenos com ela directa ou indirectamente relacionados, os quais procuraremos discutir
mais adiante.

7.2. MODOS DE EXPRIMIR A SOLUBILIDADE

Uma vez que numerosas substâncias são prescritas sob a forma de solução, é da maior
conveniência que o farmacêutico esteja familiarizado com a solubilidade dos fármacos de uso mais
corrente. Em muitos casos, as farmacopeias indicam, com precisão, essa solubilidade, sendo de ter
em conta, porém, que a maneira de a exprimir varia de um livro para o outro. Assim, a Farmacopeia
Portuguesa IV referia que a solubilidade, quando não houvesse indicação especial, era referida à
temperatura de 15°C e definia-a como o número de partes de solvente necessárias para dissolver uma
parte de soluto. A nossa actual Farmacopeia adopta um critério menos rígido, designando a
solubilidade de uma substância nela descrita, na rubrica características, por termos como muito
solúvel, facilmente solúvel, solúvel, ele., cujo significado se dá na Tabela XXIII.
285

Tabela XXIII. Termos usamos na Farmacopeia Portuguesa V para indicar a


solubilidade aproximada de uma substância

Quantidade relutiva flc solvente


'lermos para l parle de soluto
Muito solúvel ...................................................... Menos de l parte
Facilmente solúvel .............................................. De l a 10 partes
Solúvel.................................................................. De 10 a 30 partes
Pouco solúvel ...................................................... De 30 ;i 100 partes
Ligeiramente solúvel .......................................... De 100 a 1000 partes
Muito pouco solúvel .......................................... De 1000 a 10 000 partes
Praticamente insolúvel ........................................ Mais de 10 (MM) partes

73. MODOS DE EXPRIMIR A CONCENTRAÇÃO DAS SOLUÇÕES

A quantidade de substância dissolvida em qualquer solução pode indicar-se de várias


maneiras: em percentagem, molaridadc, normalidade, equivalentes ou miliequiva-lentes. Em
Farmácia, porem, a concentração de uma solução exprime-se quase sempre cm percentagem, a
qual pode ser indicada de modos diferentes:

1."— Percentagem expressa em massa de substância dissolvida em 100 ml de solução (m/v). —


Neste caso entende-se que em 100 ml de solução existem .v g de substância dissolvida.
Assim, uma solução a 5% (m/v) de glucose contém em 100 ml de solução 5 g daquele
açúcar.
y
2. — Percentagem expressa em massa de substância dissolvida em 100 g de solução (m/m). —
Significa que cada 100 g de solução tem dissolvidos .v i> de soluto. Exemplo: a
solução a 10% (m/m) de cloreto de sódio contém em 100 g de solução 10 g daquele sal.
É o critério mais utilizado nas prescrições magistrais.
3.° — Percentagem expressa em volume de substância dissolvida em 100 ml de solução (v/v).
— Indica o número de ml de produto dissolvido em 100 ml de solução. Deste modo.
uma solução de glicerina a 10% (v/v) conterá em 100 ml 10 ml daquele líquido.
4.° — Percentagem expressa em volume de substância dissolvida por massa de solução (v/m).
— Indica o número de mililitros de substância em 100 g de produto final.
p
5. — Em miliequivalentes (mEq). — São usados para exprimir as concentrações dos iões
existentes nas soluções de electrólitos destinadas a serem administradas, geralmente,
por via endovenosa.
286

Um mEq corresponde a 1/1000 de um Eq, sendo este o peso de uma substância que se combina
com um átorno-grama de hidrogénio. Portanto, um Eq é o peso de um átomo-grama ou de um
radical dividido pela respectiva valência.
Assim, por exemplo, o peso atómico do Na+ é 22,98 (aproximadamente 23) e o seu Eq
determina-se dividindo esse peso pela valência daquele metal que é 1. Temos, pois, que o Eq do Na+
é 23:1, ou seja, aproximadamente, 23 g e o seu miliequivalente é igual a 23:1000, ou seja cerca de
0,023 g ou 23 mg. Um mEq de Na+ combina-se com um mEq de Cl, originando um mEq de NaCl
que, por seu turno, é igual a cerca de 0,0585 g ou 58,5 mg. .
No entanto, se o catião do sal for bivalente ou o sal contiver dois catiões
monovalentes, o Equivalente-grama destes compostos obtém-se dividindo o respectivo
peso molecular por 2; analogamente, no caso do composto conter três catiões monova
lentes, o seu Eqg corresponderá ao respectivo peso molecular, mas agora dividido
por 3. '•
É de notar que a água de hidratação de um composto tem que ser considerada na determinação
do seu peso molecular, embora não interfira na valência.
A título de exemplo, vejamos como se determinam os Eqg de vários sais:

NaCl NaH2P04 NH4C1 NaHCO3 Na?HPO4,12H2O

CaCl,6HO K P O , 12HO

O cálculo do número total de mEq num determinado volume de uma solução pode fazer-se
dividindo a quantidade de electrólitos, expressa em g, existente nesse volume, pelo respectivo mEq,
também expresso em g. Vejamos dois exemplos:
1) Suponhamos uma solução contendo 1,20 g de bicarbonato de sódio em 20 ml e que
pretendíamos saber o número de mEq nela contidos.
O P,M. do bicarbonato de sódio é 84,02, pelo que o seu mEq é igual a 0,084. Como a solução
contém, em 20 ml, 1,2 g desta substância, o número de mEq existente
1.2
nesse volume será ————= 14,3 ou seja, a solução em referência contém 14,3 mEq de 0,084
Na+ e 14,3 mEq de HCO3~.
2) Suponhamos uma outra solução contendo 6 g de cloreto de sódio e 5,6 g de
lactato de sódio em 1000 ml. Para determinar os mEq nela existentes temos:
287

O P.M. de NaCl é 58,5, pelo que o seu mEq é igual a 0,0585 e o número de
6
mEq correspondente a 6 e deste sal é ———— = 102.6 mEq de Na e 102,6 mEq de Cl.
0,0585 *
Por outro lado, o P.M. do lactato de sódio é 112 e o seu mEq = 0,112. Logo,
+
5,6 = 50, o que significa que a solução contém 50 mEq de Na correspondentes
0,112
a 5,6, deste sal e mais 50 mEq de lactato. Deste modo, o número total de mEq, em 1000 ml desta
solução será:

Na............................................................ (102,6 + 50) =152,6 mEq


Cl .................................................................................. = 102,6 mEq
Lactado.......................................................................... = 50,0 mEq

Na Tabela XXTV indicamos a composição de algumas soluções electrolíticas, dando-se a


correspondência entre as respectivas composições, em g/100 ml de substância, e o número de mEq
de cada um dos seus componentes, também em 100 ml de solução.

Tabela XXIV. Correspondência entre as concentrações dos componentes


de várias soluções, em g/100 ml e em
Concen- N." de mEq de cada Componentes trações
Eq mEq componente em 100 ml
6 84 02
Bicarbonato de sód.o í ' °>Uíi4 HCO,- 71,4 71,4

NaHC0j, P.M. 84,02 j g ^ Q ^ N^ 95,2 95,2

Cloreto de amónio í °'9 53 5


- O-0535 Cl"4* 16,8 16.8

NH4C1, P.M. 53,5 1 , NH + l ' 37,4 37,4


Cl"
Cloreto de cálcio ^^ ^ Ca2+ 91,3 91,3
100,5 100.5
Cl
CaCL, 6H,O, P. M. 219,09 2 ' = 109,5
f ^ 7,5 74,55 0,0746 c,

Cloreto de potássio 134,0 134,0


íCl 10 74,55 0,0746 ™ KC1, P.M. 74,55

k 13,6 74,55 0,0746 £|"_ 182,3 182,3


288

Tabela XXIV. (Continuação)


Componentes Concentrações Eq N." de mEq de cuda componente em
mEq 100 ml ',
l
' 0,9 58,45 0,0585 Na+ 15,4 Cl 15,4

Cloreto de sódio 5,0 58,45 0,0585 Na+ 85,5 Cl- 85,5


l

• NaCl, P.M. 54,85 10.0 58,45 0,0585 Na* 170,9 Cl- 170.9

t 20.0 58,45 0,0585 Na+ 341,9 ' Cl


341,9 j

Cloreto de sódio 0.37 58,45 0.0585 i a- 6,3 /


Na1 6,3

Cloreto de potássio 0,13 74,55 0,0746 K' 1,74 Cl 1 .74


Cloreto de amónio 0,37 53,50 0,0535 Cl-' 6,9

,. Glicose 10,00 — — — —

Total... Na+-6,3; K4-l,74; Cl--14,94; NH/-6.9 '

Lactato de sódio 1,68 112,0 0,1120 Na+ 16,7 j Lactato


CH3CHOHCOONa,P.M. 112 16,7

Cloreto de sódio 0,500 58,45 0,0585 Na+ 8,5 :


' Cl- 8,5
i

Cloreto de potássio 0,075 74,55 0,0746 K+ 1,0


ci- 1,0
Cloreto de magnésio MgCl,, 6H2O 0,031 101,7 0,1017 Mg2^ 3,0 f Cl- 3,0
|
Cloreto de cálcio 0,063 109,54 0,1095 Ca2* 5,8 Cl- 5,8 )

Citrato de sódio 0,079 98,04 0,0980 Na+ 0,8 1 Citrato 0,8


ï
:
Acetato de sódio CH,COONa, 3H,O, 0,064 136,09 0,1361 Na* 4,7 Acetato
P.M. 136,09 4,7

Glicose 5,0 — — — —
Total... Na--14,07; K+-l,0; Cl-18,30; Mg2+-3.0; Ca:*-5,80; Acet-4,70; Citrato-0,80
289

Como está indicado na Tabela XXIV, os números de mEq nela reproduzidos refercm-se a 100
ml de solução. Querendo saber-se o número de mEq em ,v ml de cada uma das soluções
mencionadas, basta dividir o número de mEq em 100 ml por 100 e multiplicar o resultado obtido
por x.

7.4. SOLUÇÕES IDEAIS E SOLUÇÕES REAIS

Diz-se que uma solução é ideal quando as moléculas dos seus constituintes não se atraem por
forças especiais e quando não se manifesta qualquer variação da energia interna ao misturarem-se
os seus componentes. Nestas condições, o único efeito observado é o de uma simples diluição dos
constituintes, não se registando, ao juntarcm-se os componentes da solução, desenvolvimento ou
absorção de calor, nem contracção ou aumento de volume.
A lei de RAUOLT estabelece que numa solução ideal a pressão de vapor de cada constituinte é
proporcional à sua fracção molar e, segundo DALTON, a pressão total de vapor da solução será dada
pela soma das pressões parciais dos respectivos constituintes.
Assim, se tivermos uma solução ideal formada por dois componentes A e B, a tensão de vapor
do constituinte A, p^ será igual à pressão de vapor p°A da substância no estado puro, multiplicada
pela fracção molar de A:

ou =
PA = P" A- ———— - ——— PA P" A- X
A" +n

Do mesmo modo, a tensão parcial, p do constituinte B na solução será:

e a pressão total de vapor da solução será

Uma vez conhecidos os valores das pressões de vapor de cada constituinte puro para uma
temperatura determinada, pode construir-se um diagrama representando as variações das pressões
parciais e totais de vapor a essa mesma temperatura em função da composição da solução, como se
mostra na Fig, 170. No caso das soluções ideais, as propriedades de cada um dos seus constituintes
permanecem inalteradas e não são
290

praticamente influenciadas pela presença dos outros constituintes, pelo que estas obedecem à lei de
RAOULT, mas já o mesmo não acontece com as soluções não ideais ou
reais, as quais se afastam, nitidamente, da referida lei,
mercê de interacções de diversa nature/a que se manifestam
entre as moléculas dos seus constituintes.
Suponhamos, então, uma solução constituída por duas
substâncias, A e /ï, e que nela as forças de atracção entre
as moléculas de A e de B são mais fracas do que as das
moléculas de cada um dos constituintes entre si. Num caso
destes, a solução apresentará um desvio positivo em relação à
lei de RAOULT e a respectiva curva das pressões de vapor
passa, em certas circunstâncias, a apresentar um máximo,
como se pode ver na Fig. 171. Se, entretanto, as forças de
Fig. 170. Pressões de vapor parciais e atracção entre as moléculas de A e B forem mais intensas
totais de uma solução ideal para do que as forças de atracção de A para A e de B para B
uma
determinada temperatura observa-se um desvio negativo, apresentando, entào, a curva
das pressões de vapor um
mínimo desde que esse afastamento seja suficientemente grande. Em tal caso, como é
compreensível, as curvas das pressões de
vapor têm o aspecto das da Fig. 171 vistas
em posição invertida.
Estes desvios em relação à lei de
RAOULT são a consequência de fenómenos
ocorridos durante a dissolução de uma substância
noutra, como a solvatação e a
associação. A solvaíação traduz-se por um
desvio negativo, isto é, corresponde ao caso
cm que as forças de atracção entre os dois
constituintes da solução são mais fortes, e
quando isso se verifica acontece que a
solubilidade mútua das duas substâncias é
aumentada.
Por sua vez, os desvios positivos à Fig. 171. Pressões de vapor parciais e totais
referida lei traduzem-se por uma diminuição de uma solução não ideal a uma temperatura
de solubilidade mútua dos dois componentes determinada, apresentando um afastamento
positivo à lei de Raoult, para uma temperatura
da solução e são devidos, em grande parte, a determinada
uma interacção específica manifestada entre
as moléculas do mesmo constituinte, a qual provoca a associação das respectivas
moléculas em dímeros ou polímeros. No fundo, podem atribuir-se estes afastamentos
291

diferença existente entre as forças de coesão das moléculas da substância dissolvida, as quais
condicionam um certo número de inleracçõcs solvcnte-soluto, como passamos a expor.

7.5. INTERACÇÕES SOLVENTE-SOLUTO

Para que as moléculas possam existir agregadas sob a forma de líquidos ou sólidos existem
várias forças inlennolcculares que as mantêm unidas. Quando, porém, duas moléculas actuam uma
sobre a outra, duas espécies de forças se manifestam: as forças repulsivas e as forças atractivas.
Estas últimas são necessárias para manter as moléculas coesas, enquanto que as primeiras exercem
unia acção completamente oposta, de modo que o comportamento das moléculas de um composto é
governado por ambas.
A repulsão é devida ã interpenetração das nuvens electrónicas das moléculas e aumenta
exponencialmente com a diminuição da distância entre as mesmas, existindo, porém, uma distância
de equilíbrio, equivalente a 3 ou 4 Ã, em que as forças atractivas e repulsivas se igualam. A essa
distância a energia potencial de duas moléculas é mínima e o sistema atínge o seu estado mais
estável.
São várias, por outro lado, as forças atractivas intermolecularcs, corno as ligações
elcctrovalentes c covalentes. forças de Van Der WAALS e outras, e, ainda, us ligações hidrogénio, as
quais sào mais ou menos poderosas conforme o respectivo tipo e possuem uma certa energia que
pode ser tomada como índice da torça da ligação considerada. Assim, uma ligação electrovalente
tem uma energia aproximada de 100--200 kcal, mol '; uma ligação covalente possui uma energia de
50-150 kcal. mol ', a qual se situa enlre 1-10 kcal. mol"1 no caso das várias forças de Van Der
WAALS, enquanto que a energia de uma ligação hidrogénio é, conforme os casos, de 2-7 kcal.

Estas forças exercem, pois,como que uma pressão interna tendente a manter unidas as
moléculas, a qual é expressa em caloria por ml e pode ser calculada pela equação:

Atfv - RT
Pi = ———————— (4)
y

em que AHv c a variação do calor latente de vaporização da substância considerada e V o seu


volume molar à temperatura absoluta T.
Do que ficou dito, depreende-se que para se obter a dissolução de uma substância c necessário
vencer as forças atractivas que se manifestam tanto no soluto como no solvente. Isto exige, porém,
como é evidente, uma certa energia, a fornecer por interacções mútuas entre as moléculas dos dois
componentes da solução e, por isso, a solubilidade de um composto depende, em larga medida, das
suas características físicas e químicas, bem como das do próprio solvente.
292

É do conhecimento geral que a água constitui um bom solvente dos sais e açúcares, ao passo que o
éter, o benzeno e os óleos, em regra, dissolvem facilmente as substâncias pouco sulúveis na água. A
observação destes factos levou a afirmar-se que o semelhante dissolve o semelhante, querendo isto
significar que a solubilidade depende, fundamentalmente, da circunstância de o soluto e o solvente
possuírem determinadas características em comum, como, por exemplo, a mesma ou aproximada
polaridade. Vejamos, pois, como essas características condicionam as interacções sol-vente-soluto e
influenciam a solubilidade de uma substância qualquer num líquido, para o que vamos considerar os
solventes agrupados em três classes: polares, não polares e semipolares.

7.5.1. SOLVENTES POLARES

A solubilidade de um composto depende, em larga medida, da polaridade do solvente utilizado


ou, por outras palavras, da sua constante dieléctrica. Assim, os solventes polares dissolvem os
compostos iónicos e outras substâncias polares, pois só eles são capazes de vencer a energia das
forças atractivas intermolecularcs que mantêm coesas tais substâncias. É por este motivo que a água
dissolve grande número de compostos, tais como sais, ácidos, bases, produtos polidroxilados, e se
mistura em todas as proporções com o álcool e a glicerina.
Repare-se, porém, que HILDEBRAND demonstrou que não são apenas os momentos dipolares que
explicam, de modo cabal, a dissolução de muitos compostos polares na água. De facto, muitos casos
há em que a facilidade com que o soluto forma ligações hidrogénio com aquele líquido representa um
factor muito mais importante do que a polaridade propriamente dita e, assim, o nitrobenzeno, cujo
momento dipolar é maior do que o do fenol, é, no enlanlo, bastante menos solúvel na água do que
este último.
Na realidade, a água dissolve álcoois, aldeídos, cetonas, aminas e outros compostos
oxigenados e azotados desde que estes formem com ela ligações hidrogénio.

H H H H

R — O - - - -H — O - - - R —C = O . . . . H —O - - .
Ligação hidrogénio álcool-água Ligação hidrogénio aldeído-água
;
' " '" . ' H H
H3cv !
^ )C^O-.. H —O.... R 3 N... .H- O - - - .
H3C/
Ligação hidrogénio cetona-água Ligação hidrogénio amina-água.
293

A solubilidade de um composto depende, ainda, de certos caracteres estruturais da sua


molécula, em particular da proporção dos grupos polares e não polares nela existentes. Assim é
que, à medida que o tamanho da parte não polar de uma molécula aumenta, a sua solubilidade na
água diminui, como acontece, por exemplo, com os álcoois alifáticos. Também os compostos de
cadeia linear com mais de 4 ou 5 átomos de carbono, como álcoois monoidroxilados, aldeídos, cetonas
e ácidos, são pouco solúveis na água porque não formam com esta facilmente ligações hidrogénio.
Por outro lado, a presença de mais de um grupo polar na molécula aumenta a solubilidade desta na
água, o mesmo acontecendo quando o composto tem uma estrutura ramificada, sendo por este molivo
que o álcool butílico terciário é miscível com a água em todas as proporções, ao passo que o álcool
butílico normal apenas se dissolve na proporção de 8 g/IÜO ml de água a 20°C.
Pode dizer-se, em resumo, que os líquidos polares, como a água, actuam como solventes por um
dos três mecanismos seguintes:

1 — Devido à sua elevada constante dieléctrica (cerca de 80, no caso da água), os solventes
polares reduzem a força de atracção entre iões com carga eléctrica oposta, solubilizando,
portanto, compostos com ligações electrovalentes.
2 — Os solventes polares são capazes de quebrar as ligações cova lentes de electrólitos
potencialmente fortes por reacções ácido-base, uma vez que tais solventes são
anfipróticos. É por este motivo que a água promove a ionização de compostos como o
HCl:

na + np -> H3o+ + c/-Os ácidos orgânicos fracos não são apreciavelmente


ionizados pela água e a sua solubilidade parcial nesta é atribuída à formação de ligações
hidrogénio; no entanto, aqueles compostos e os fenóis dissociam-se facilmente em soluções de bases
fortes:

O O
^ ^ _+
R —C -f-NaOH^R C -O Na + H2O

OH
3 — Por último, repare-se que os solventes polares são capazes de solvatar moléculas e iões
através de forças de interacções dipolares, particularmente pela formação de ligações
hidrogénio, de que resulta um aumento da solubilidade de muitos compostos. Para que
isto se verifique é necessário, contudo, que o soluto seja também de natureza polar,
pois muitas vezes terá que competir com as ligações das moléculas do solvente já
associadas e só assim poderá obter lugar nessa estrutura previamente formada.
294

Como exemplo de uma interacção deste tipo pode citar-se a que ocorre entre o
oleato de sódio e a água:


C17H33~C-C

7.5.2. SOLVENTES NÃO POLARES

Os líquidos não polares, tais como os hidrocarbonetos, têm uma baixa constante dieléctrica.
Nestas condições, são manifestamente incapazes de neulralizar as forças atractivas interino l ecul
are s dos electrólitos fortes ou fracos, assim como também não destroem as ligações covalentes nem
ionizam os electrólitos fracos, visto serem solventes apróticos. Por estas razões, os solutos de
natureza iónica ou polar são praticamente insolúveis ou apenas muito pouco solúveis nos solventes
apoiares.
Estes solventes só dissolvem, na realidade, compostos igualmente não polares que tenham uma
pressão interna semelhante, através de acções entre dipolos induzidos, sendo as moléculas do soluto
mantidas em solução por forças de Van Der WAALS--LoxnoN. Os óleos, gorduras sólidas, alcalóides
(forma base) e ácidos gordos são exemplos de compostos tipicamente solúveis em solventes apoiares.

7.5.3. SOLVENTES SEMIPOLARES

Certos líquidos semipolares, como as cetonas e álcoois, podem indu/ir um certo grau de
polaridade nas moléculas de solventes não polares, actuando de modo a favorecerem a miscibiïidade
de um líquido não polar com outro polar. Assim, a acetona aumenta a solubilidade do éter na água e
o propilenoglicol aumenta a solubilidade mútua da água e essência de hortelã-pimenta e da água e
benzoato de benzilo.

7.6. TIPOS DE SOLUÇÕES

Existem duas categorias de soluções, ambas, aliás, largamente utilizadas em farmácia: as


soluções simples e as soluções extractivas, as quais passamos a estudar seguidamente.
295

7.6.1. SOLUÇÕES SIMPLES

Entende-se por solução simples a que resulta da dissolução total e completa de VM substância
de composição homogénea num solvente determinado. Dado, porém, K o presente capítulo se limita
ao estudo das soluções cujo solvente c um líquido, icna-. consideraremos os três casos seguintes:
solução de gás em líquido, solução de | i ï i d ( . em líquido e solução de sólido em líquido.

7.6.1.1. Soluções de gases em líquidos

A solubilidade dos gases nos líquidos depende de vários factores, uns inerentes à i natureza dos dois
elementos constitutivos da solução e à presença de substâncias e s i i a i i h a - - dissolvidas, sendo os
outros representados pela pressão e a temperatura.
A influência da pressão na solubilidade dos gases é expressa pela lei de HENRY, a q u a l
estabelece que a concentração do gás dissolvido num dado solvente é propor-uoi ud à pressão
parcial do mesmo gás não dissolvido e em contacto com a solução, desJ.; que a temperatura
permaneça constante. Esta lei pode ser expressa pela equação ! k p, em que c é a concentração em
g/i, do gás dissolvido, p é a pressão parcial do p á - em contacto com a solução e k uma constante,
cujo valor depende da natureza du ü a-ï e do solvente em causa.
K n i i e i a i ü o , conhecem-se vários casos de gases que em solução aquosa se afastam,
mi k Umu M ii e da referida lei e apresentam uma solubilidade na água maior do que aquela que a
íe ona prevê. São exemplos disto, entre outros, o ácido clorídrico, o amoníaco e o n n i d n d n
carbónico, mas o seu comportamento é explicado pelo facto de tais compos-ins r e a g i r e m com a
água, fenómeno tido como responsável pelo aumento de solubilidade cm n eles observado.
Km geral, é costume exprimir a solubilidade de um gás num líquido pelo coefí-i ' i f i : h ' ;/f
absorção de BUNSEN, o qual se define como sendo o número de litros de um L \ ÍV m c d i < k : nas
condições normais de pressão e temperatura, que se dissolve em l litro de M i h e n i e a uma
determinada temperatura e à pressão de 760 mm de mercúrio. Na l a h c l a X X V indicam-se os
coeficientes de absorção de vários gases na água a diver-Nas lemper.iíuras e a pressão constante, os
quais mostram que a elevação da temperatura t a / d i m i n u i r a solubilidade do gás, mantendo-se
constante a pressão.
De f a c i o . ' o aumento da temperatura provoca uma diminuição da solubilidade da mai o i u ;
dos gases devido a, nessas condições, aumentar a sua expansibilidade. Esta propriedade impõe,
por conseguinte, que se adoptem certas precauções ao destapar recipientes comendo soluções
gasosas conservadas em locais aquecidos, recomendando--se q ue . í.m ím-. casos, os recipientes
sejam, previamente, arrefecidos.
296

Tabela XXV. Coeficientes de absorção de vários gases na água à pressão de 760 mm de Hg

Gás Temperaturas em "C

O 20 30

H, 0,021 0,018 —
N^ 0,0245 0,016 0,0134
°2 0,0489 0,031 0,026
C02 1,713 0,88 0,665

Por outro lado, é frequente acontecer que a solubilidade de um gás num determinado líquido
diminua por adição, a este, de substâncias nele solúveis, particularmente se forem electrólitos. Em
tais casos, verifica-se que parte do gás dissolvido abandona a solução, designando-se esle
fenómeno por efeito de salting-out, o qual é devido à grande atracção para a água dos iões ou
moléculas da substância adicionada, de que resulta uma diminuição da concentração do solvente
nas proximidades das moléculas do gás dissolvido.

7.6.1.2. Soluções de líquidos em líquidos

É de cerlo modo frequente associarem-se dois ou mais líquidos numa preparação


farmacêutica, misturas essas que podem constituir soluções ideais ou reais, de acordo com o
conceito anteriormente dado. Na prática, os sistemas líquido-líquido agrupam-se em duas
categorias, conforme a solubilidade dos respectivos constituintes um no outro: a) sistemas
completamente miscíveis e b} sistemas parcialmente miscíveis, designando o temo miscibilidade a
solubilidade mútua dos componentes do sistema considerado.

7.6.1.2.1. Sistemas completamente miscíveis

A miscibilidade de dois líquidos depende, fundamentalmente, da sua natureza. Assim, a


junção de dois líquidos polares ou de um polar e outro scmipolar, tais como a água e glicerina,
água e álcool, glicerina e álcool e álcool com acetona, origina a formação de uma mistura
homogénea qualquer que seja a proporção de cada um dos líquidos, dizendo-se que, em lais casos,
eles são completamente miscíveis. Do mesmo modo, aliás, se comportam as misturas de líquidos
não polares, como o benzeno c o tetracloreto de carbono, por exemplo.
297

7.6.1.2.2. Sistemas parcialmente miscíveis

Se bem que alguns líquidos, como acabámos de ver, sejam miscíveis em todas as proporções,
outros há que uina vc/ misturados originam duas camadas distintas, cada uma das quais representa
uma solução saturada de um dos componentes do sistema no outro, que desempenha o papel de
solvente. Assim, se misturarmos água e éter, passado pouco tempo formar-se-ão duas fases distintas,
correspondendo a superior a uma solução de água no éter (este é o solvente porque está em maior
quantidade), enquanto a camada inferior representa uma solução de éter na água.
As solubilidades mútuas de tais líquidos, mantendo-se constante a pressão, são nitidamente
influenciadas pela temperatura, como se mostra na Fig. 172, onde se repre-

Fe
nol
Ág

Fig. 172. Diagrama representando a composição das fases do


sistema fenol-água em função da temperatura

senta o diagrama da composição das fases do sistema fenol-água (') em função da temperatura,
exemplo classicamente adoptado para ilustrar o assunto em discussão. Se misturarmos água e fenol
à temperatura de 0"C, obter-se-ão duas fases: uma delas constitui uma solução saturada de fenol na
água (cerca de 1% em peso) e a outra é uma solução saturada de água (27%) em fenol, cujas
composições correspondem, respectivamente, aos pontos a e b do gráfico da Fig. 172. À medida,
porém, que se eleva a temperatura, a solubilidade mútua das duas substâncias aumenta e ao atingir
aquela um certo valor, denominado temperatura crítica de dissolução, no exemplo presente

(') O fenol é um sólido de p. f. = 42°C, mas considera-se neste caso líquido, pois a adição de
uma quantidade mínima de água faz baixar imediatamente o seu p. f. e o sistema passa a ser
constituído, nestas condições, por duas fases líquidas.
298

65,85°C, a composição das duas misturas torna-se idêntica, passando ambas a conter 34,5% de fenol
e 65,5% de água, ao passo que acima de 65,85°C os dois líquidos se tomam miscíveis em todas as
proporções e passam a constituir um sistema homogéneo.
Do ponto de vista prático, o gráfico da Fig. 172 mostra-nos que todas as misturas cuja
composição se localize dentro da curva originarão sempre duas fases, enquanto que as
correspondentes a pontos situados fora dela constituirão um sistema homogéneo. Suponhamos, por
exemplo, que pretendíamos preparar uma solução de fenol na água à temperatura de 201>C. Nestas
condições, só é possível dissolver até um máximo de 8,4%, em peso, de fenol, conforme se pode ver
no diagrama da Fig. 172, em que o ponto ü dá a composição da solução àquela temperatura, sendo
evidente que se adicionarmos mais fenol a composição da mistura passa a cair no interior da curva
e, automaticamente, formar-se-ão duas camadas. Pela mesma razão, torna-se possível obter à
referida temperatura de 20°C uma solução perfeita de água em fenol, cuja concentração máxima é
definida pelo ponto b da mesma curva.
Em Farmácia utiliza-se uma preparação designada por fenol líquido, obtida misturando 100
partes, em peso, de fenol, aquecido a 45°C, com 10 partes de água, a qual, mesmo depois de
arrefecida, se mantém perfeitamente homogénea, pois a sua composição situa-se fora da zona
correspondente à formação das duas camadas.
Repare-se, porém, que nem todos os líquidos imiscíveis se comportam como o sistema água-
fenol. Na realidade, certos pares de líquidos apresentam uma maior solubilidade mútua quando a
temperatura baixa. Deste modo, a sua temperatura crítica de dissolução corresponde a um valor
mínimo e, portanto, a mistura desses líquidos só é homogénea para valores de temperatura situados
abaixo daquele. Outro exemplo é representado pelo que acontece com o sistema nicotina-água, o
qual tem duas temperaturas críticas de dissolução, entre as quais existe, portanto, uma zona em que
estes líquidos apenas são parcialmente solúveis. Finalmente, certos sistemas não possuem qualquer
temperatura crítica, significando isto que nunca se poderá obter com eles uma mistura homogénea,
qualquer que seja a temperatura a que se encontrem.

7.6.1.2,3. Influência de substâncias estranhas

A adição de uma substância a uma mistura binária de líquidos parcialmente miscíveis pode
originar efeitos variáveis. De facto, se a substância adicionada apenas for solúvel num dos
componentes ou for predominantemente solúvel num deles, regista--se uma diminuição da
solubilidade mútua dos dois componentes. Isto traduz-se, na prática, por uma variação da
temperatura crítica de dissolução do sistema considerado, a qual, por adição de uma terceira
substância com as características referidas, sobe ou desce em relação ao seu valor inicial.
Assim, ao adicionarmos naftaleno a uma mistura de água e fenol verifica-se que a temperatura
crítica do sistema sobe cerca de 20°C em relação ao seu valor original
299

(65,85°C), pois aquele hidrocarboneto apenas é solúvel no fenol, ao passo que a adição de cloreto de
potássio, solúvel unicamente na água, origina uma subida de cerca de 8°C.
Quando, porém, a substância adicionada a uma mistura binária de dois líquidos se distribui,
aproximadamente, em igual concentração nas duas fases, o efeito observado é contrário ao acima
descrito. Hm tal circunstância, acontece, de facto, que a solubilidade mútua dos componentes é
acrescida e, como consequência disso, uma temperatura crítica de dissolução originalmente alta toma-
se mais baixa, ao passo que outra, baixa, c elevada. É isto o que acontece, por exemplo, quando se
adiciona um sabão alcalino ao sistema fenol-água.

7.6.1.3. Soluções de sólidos em líquidos

As soluções de sólidos em líquidos constituem a grande maioria das soluções farmacêuticas e


por isso vamos considerá-las com certo pormenor. Estas soluções são influenciadas por vários
factores, como a temperatura, calor de fusão e ponto de fusão do soluto, etc. Seguidamente, vamos
passar em revista a acção desses diversos factores, começando pêlos atrás citados, examinando
como actuam no caso de soluções idciais e não ideais.

7.6.1.3.1. Soluções ideais

Segundo a lei de RAOULT, pode considerar-se que a pressão parcial de vapor ps de uma
substância dissolvida é igual à pressão de vapor p"^ da mesma substância pura, no estado líquido e
a igual temperatura, multiplicada pela sua fracção molar x. Deste modo: p = p'\.x, representando p°
a pressão de vapor do sólido puro, quando fundido.
Por outro lado, a actividade, as, da substância dissolvida é a relação entre a sua pressão
parcial de vapor e a pressão de vapor que a mesma apresenta quando pura e no estado líquido.
Assim, a =pjp'\ sendo evidente que a actividade da substância no estado sólido é inferior à que a
mesma apresenta no estado líquido e apenas ambas se igualam quando se atinge o ponto de fusão.
A solubilidade ideal de uma sublância sólida pode ser calculada a partir da equação de CLAUSIUS-
CLAPEYRON:

d In p H -H
_________r s _ ______v_____.v
dT RT2
300

300 em

que:

Hv é o calor latente de vaporização do sólido no estado líquido; H^ é o calor


latente de sublimação do sólido; Hf é o calor latente de fusão.

Substiluindo a pressão de vapor pela actividade a_ temos:

d In a H -H
dT RT1

Uma vez, porém, que a actividade do soluto numa solução corresponde ao produto da sua
concentração pelo respectivo coeficiente de actividade, se a concentração estiver expressa em
fracção molar, x, podemos escrever que:

<*s = x . f (7)

em que / representa o coeficiente de actividade. Contudo, nas soluções ideais / = l c, assim, a


actividade a^ torna-se igual a A", pelo que
(8)

em que Tf é a temperatura absoluta de fusão do sólido e T a temperatura absoluta da solução. Daqui resulta, por
conseguinte, que a fracção molar, jr, numa solução ideal, para determinado valor de temperatura, é uma
constante independente do solvente.
A partir da equação (8), HII.DEBRAND deduziu duas regras gerais relativas à solubilidade dos sólidos as
quais se podem enunciar da seguinte maneira:

1.°— A solubilidade de um sólido aumenta com a temperatura.


2.°— Se dois sólidos se encontram à mesma temperatura e possuem calores latentes de fusão próximos,
será mais solúvel o que tiver menor calor latente de fusão.

7.6.1.3.2. Soluções não ideais

Como atrás dissemos, a actividade de um soluto numa solução é dada pela equação (7), que na sua forma
logarítmica é:

log ax = log x + log f (9)


301

Dado que nas soluções não ideais /^ l, combinando as equações (8) e (9) obteremos a
solubilidade de uma substância neste tipo de solução, a qual será definida
por:
• / Tf -r

2,303 R \ Tf . T

significando isto que a solubilidade numa solução real corresponde à solubilidade de uma susbtância numa
solução ideal mais o logaritmo do respectivo coeficiente de actividade. A medida, porém, que o valor de / tende
para l, o comportamento de uma solução não ideal aproxima-se cada vê/ mais do comportamento de uma solução
ideal, motivo por que a equação (10), quando f = l, se transforma em (8). Entretanto, raramente acontece que a
solubilidade determinada experimentalmente nas soluções reais coincida com o valor calculado utilizando a
equação da solubilidade ideal, e isto porque o coeficiente de actividade, /, depende de vários factores, como a
natureza do soluto e do solvente e a temperatura da solução.
O termo hg f que figura na equação (10) é obtido considerando as forças inter-moleculares de atracção que
devem ser vencidas ou, por outras palavras, o trabalho que c necessário realizar para remover uma molécula do
soluto e depositá-la no solvente, o qual pode considerar-se como sendo executado em três fases ('):
l — A primeira destas fases envolve a remoção de uma molécula do soluto a uma temperatura determinada
e implica a realização de um trabalho que destrua as suas ligações com as moléculas adjacentes e permita,
assim, a sua passagem ao estado de vapor. Esse trabalho realizado para destruir as ligações entre duas
moléculas adjacentes é 2 W,, em que o índice 2,2 se refere à interacção entre moléculas do soluto. Quando,
porem, uma molécula abandona o soluto, o espaço assim criado fecha-se e melade da energia dispendida é
recuperada deste modo, pelo que o trabalho dispendido neste processo é, afinal, apenas W22. Esquematicamente
pode representar-se o que acabámos de dizer do seguinte modo:

Soluto Libertação de urna molécula


do soluto

2 — O passo seguinte consiste na torção, no solvente, de um espaço suficientemente grande para acomodar a
molécula do soluto anteriormente libertada, o que envolve a

(') Segundo MAKTTN, Physical Pharmacy, pág. 357.


302

realização de um trabalho Wn reterindo-se o índice 1,1 à energia da interacção entre as moléculas do solvente.

o o oo
o o ———>• o o
00 00
Solvente Formação de um espaço
no solvente

3 — A molécula do soluto é, finalmente, acomodada no espaço criado no solvente e o ganho em trabalho ou


diminuição da energia potencial neste passo é -W, 2, rcfe-rindo-sc o índice 1,2 à interacção do soluto com o
solvente. Como o espaço aberto no solvente durante a fase 2) foi, agora, fechado, regista-se uma diminuição
adicional de energia, -W, , e, por conseguinte, o trabalho total dispendido na soluhilização segundo este esquema
é (W22 + W( r - W, 2).

oo oo
O 0 + 0 ———> O • O
oo oo
Solvente Molécula Solução
do soluto

Foi demonstrado por SCATCHARD e por HILDEBRAND e WOOD que o logaritmo do coeficiente de actividade é ainda
proporcional ao volume do soluto, considerado como um líquido superarrefecido, e à fracção do volume total da
solução ocupada pelo solvente, de modo que se pode escrever:

In f= (W^ + H^,i — 2 ir,, a) ————— (11)


RT

representando V2 o volume molar do soluto líquido, <|> a fracção do volume total ocupada pelo solvente e T a
temperatura absoluta da solução. A equação ( I I ) pode ser transformada nesta outra:
K. *2
/ « / = [(1^) ''"—O^O '"T ——— (12)
RT
303

na qual os termos W1/2 são aproximadamente iguais ao termo a/V2 da equação de Van
| Der WALLS para líquidos e gases não ideais, e servem para medir as pressões internas
Í (pág. 291) do solvente e do soluto em soluções ideais apoiares ou moderadamente
ï" polares. Aos referidos termos W112 chamam-se parâmetros de solubilidade e são desi-
| gnados pêlos símbolos ôt e õ.,, respectivamente para o caso do solvente e do soluto.
4 Fazendo as necessárias substituições na equação (12), podemos escrevê-la agora, pas-
| sando para logaritmos decimais, do modo seguinte:

l o g f = ( S , — S,)* ——————— (13)


2,303 R T

Portanto, se substituirmos na equação (10) hg f pelo seu valor, leremos que a quantidade de
soluto não polar ou moderadamente polar dissolvida, expressa em fracção molar é:

(s, — s 2 y (H)
2,303 R \ T f . T / 2,303 RT

J* Quanto mais próximos forem os valores de 5 para os dois componentes da solu-


"ff cão, maior será a solubilidade mútua de ambos e, porque õ representa as forças de
Í coesão interna entre moléculas semelhantes, segue-se que quando Ô, e Ô2 são iguais, as
4;. forças de coesão do solvente e do soluto são também iguais. Neste caso, 5 | -5 2 = 0,
l e o último termo da equação (14) será, do mesmo modo, igual a zero, pelo que, em
l tal circunstância, a solubilidade do soluto se torna independente da sua actividade e
| apenas fica dependente do calor latente de fusão, do respectivo ponto de fusão e da
|: temperatura.
| Vem a propósito assinalar que as regras de solubilidade dos sólidos numa solução
t
ideal, tal como foram enunciadas na pág. 300, se aplicam, também, nos casos das
fV"
l- soluções não ideais, podendo ver-se nas Tabelas XXVI e XXVII exemplos que ilustram
f
4.
g" Tabela XXVI. Solubilidade de diferentes barbitúricos no álcool em
função
f do seu ponto de fusão
Produto P.f. "C Solubilidade no álcool

Secobarbital 95-96 1 g em 2 ml
Pentobarbital 132-133 1 » » 4 »
Amobarbital 156-158 1 » » 5 »
Fenobarbital 174-178 1 » » 10 »
Barbital 188-189 1 » » 14 »

a segunda deslas regras, os quais mostram como a solubilidade de alguns barbitúricos e sulfamidas
diminui progressivamente à medida que os respectivos pontos de fusão
aumentam.
304

Tabela XXVII. Solubilidade de diferentes sulfamidas em água (25CC) em função


do respectivo ponto de fusão
Produto P. f. ("d Solubilidade na água

Sulfanilamida 164-166 g cm 0.125 1


Sulfatiazol 173-175 » » 1,7 »
Sulfapiridinii 191-193 » » 3,5 »
Sulfamera/ina 234-23 K » » 5 »
Sulfadiazina 252-256 » » 13

7.6.1.3.2.1. Fenómenos térmicos ocorridos durante a dissolução

Como vimos (pág. 302), o mecanismo da dissolução envolve a neuirali/ação das forças
intermoleculares que tornam coesos os iões ou as moléculas da substância a dissolver, a
separação das moléculas do solvente para que as partículas do solvido encontrem espaço onde se
encaixem, sendo ainda de considerar as interacções mútuas solvente-soluto. Como então dissemos,
a anulação das pressões internas dos constituintes de uma solução só pode conseguir-se à custa de
certo trabalho ou energia e, se esta for representada pelo calor, é evidente que tal fenómeno será
endotérmico, ao passo que as interacções soluto-solvente libertam calor c são, por conseguinte,
exotérmicas.
Deste modo. ao fazer-se uma dissolução haverá, simultaneamente, uma absorção e uma
libertação de calor, e, por isso, conforme a magnitude de um e outro destes fenómenos, assim a
operação será acompanhada de um abaixamento ou elevação da temperatura inicial do solvente,
podendo acontecer, também, que esta se mantenha sem alteração.
Desde que as interacções soluto-solvente sejam de fraca ou n u l a actividade, o fenómeno
térmico prevalecente será o da absorção de calor necessário para vencer a coesão das moléculas
ou iões do soluto e do solvente, e, portanto, a dissolução provocará um abaixamento da
temperatura que, por vezes, é extraordinariamente acentuado.
Caso, porem, a quantidade de calor libertada pelas interacções dos componentes seja e'evada
e sobreleve a energia calorífica necessária para vencer as pressões internas daqueles, a dissolução
será acompanhada de libertação de calor, não havendo, por outro lado, qualquer modificação da
temperatura quando a magnitude dos fenómenos endotér-micos e exotérmicos se iguala.
305

Acontece que a solubilidade dos sólidos nas soluções altamente não ideais pode ser tratada
usando o calor de dissolução em vez do calor de fusão, exprimindo-se, neste caso, a fracção molar
do soluto do seguinte modo:

-v, dH
*«S——— = —————— ( ——————— ) (15)
A-i 2,303 R \ Ti. T, /

em que .vy e x, são as solubilidades expressas em fracções molares às temperaturas absolutas Tl e


T2, respectivamente, e A// é o calor de dissolução em cal. mol~'.
O calor de dissolução representa, pois, o número de calorias absorvidas por l mol de
substância dissolvida, c, conforme há um abaixamento ou uma elevação de temperatura, assim o
calor de dissolução terá, respectivamente, um valor positivo ou negativo, querendo isto significar que
no primeiro caso a dissolução se faz com absorção e no segundo com libertação de calor.

7.6.1.3.2.2. Dissolução de sais na água

Os fenómenos térmicos a que acabámos de aludir são bem palcntes ao dissolver--se um sal na
água. O efeito da temperatura na dissolução destes compostos está representado nos gráficos da Fig.
173, verificando-se que uma subida de temperatura aumenta a solubilidade dos compostos que
absorvem calor ao dissolverem-sc. Como, neste caso, o processo de dissolução é endotérmico, a
temperatura inicial do solvente baixa sempre de modo mais ou menos acentuado; compreende-se,
por isso, que o aquecimento da mistura aumente a solubilidade do sólido, o que, aliás, está explícito
nas expressões que regem quer a solubilidade ideal, quer a não ideal. Inversamente, porém, quando
a dissolução é um processo exotérmico, a solubilidade diminui com a subida da temperatura.
Se bem que a maioria dos sólidos absorva calor quando são dissolvidos, casos há em que isso
não se verifica. Assim, repare-se na curva de solubilidade do sulfato de sódio hidratado,
reproduzida na Fig. 173. Segundo ela, verit"Íca-se que até 32"C a dissolução deste sal é
endotérmica e, portanto, favorecida por um aumento da temperatura. A partir desse ponto, porém, a
curva começa a descer, pois o sal torna-se anidro e, portanto, a sua dissolução passa a constituir
um fenómeno endotérmico. O cloreto de sódio, por seu turno, constitui exemplo de uma substância
cuja dissolução na água não implica absorção ou libertação de apreciável quantidade de calor, pelo
que a respectiva solubilidade, tal como se depreende do exame da Fig. 173, pouco ou nada é
modificada pela variação da temperatura.
306

Como dissemos na pág. 305, estes fenómenos podem ser explicados em termos do calor de
dissolução. A//. Entende-se por calor de dissolução de uma substância cristalina a diferença entre o
calor de sublimação do sólido, dado pela energia reticular,
e o calor de hidratação dos iões na
solução:

A// (c. dissol.) = AW (cal. subl.)--A// (cal. hidr.j


(16)

A energia relicular é a energia necessária para


separar um ião grama da rede cristalina. Por sua
vez, o calor de hidratação e o calor libertado quando os
iões livres são hidratados e, desde que seja capaz de
fornecer a energia necessária para vencer as pressões
internas que os mantém unidos na rede cristalina, os
iões respectivos serão libertados do cristal e o sal
dissolver-se-á.
Repare-se que, por definição, nas soluções ideais
não há qualquer acção entre o solvente e o soluto, e,
IU" IO" portanto, nelas nào se verifica a hidratação ou
Temperatura em 'JC solvatação do dis-
Fig. 173.Curvas de solubilidade de
sais em função da temperatura solvido.
Em tal caso. a quantidade de calor
absorvida corresponde exactamente à que é
necessária para que os cristais se liquefaçam, sendo este o motivo porque na equação (8), que
traduz a solubilidade ideal (pág. 300), apenas figura o calor de fusão do soluto.

7.6.1.3.3. Outros factores que influenciam a solubilidade


dos sólidos

Passada em revista a influência da temperatura e factores a ela associados (calor latente de


fusão, calor de dissolução e ponto de fusão) na solubilidade dos sólidos, consideremos, agora,
outros elementos que podem, igualmente, influenciá-la.

7.6.1.3.3.1. Sistemas completamente miscíveis

A estrutura química do sólido desempenha um papel de enorme importância na respectiva


solubilidade. Como tal assunto foi, porém, considerado a propósito do estudo das interacções
solvente-soluto, dispensamo-nos de mais considerações a esse respeilo.
307

Apenas acrescentaremos que muitos compostos insolúveis ou pouco solúveis na água podem
transformar-se em derivados solúveis naquele solvente à custa Já introdução, nas respectivas
moléculas, de radicais polares, sendo numerosos os exemplos de substâncias medicamentosas
tornadas hidrossolúveis por este processo, sem que, mercê disso, as suas propriedades terapêuticas
sejam alteradas.
Na Tabela XXVI1T indicamos algumas das reacções correntemente utilizadas para a obtenção
de derivados solúveis na água, de acordo com BIÍLLAVITA.

Tabela XXVIII. Tipos de reacções de esterificação ou de eterificação de hidroxilos


alcoólicos e fenolicos para a obtenção de compostos hidrossolúveis

Composição do derivado Exemplos de compostos


Reagente utilizado
formado veis a i/uc a reacção conduz
CI.HSO, R.O.SO^H Esteres sultüricos do metilesculetoL
do (iictilbestrol, de vitaminas K.
C13PO R.O.P.O.(OH)2 (R.O» V O Ésteres fosfóricos de mianesina, de
vitamina K.
C13P R.O.COCH^ Fosfïlo neutro de guaiacol

(CH,CO)20 R.O.CO.CR.CH,.COOH Diaceti l morfina (heroína).

(-CH2.CO)2.0 Ésteres hemissuccínicos da hidroxi-


R.O.COO.C2H5 pregnandiona, do metilandroste-
nodiol, do clorantenicol.
Cl.COO.C,Hs R.O.C2H5 Éster etilcarbónico da q uin ina
(euquinina).
(C2H3),S04 R.O.CHrCH2.N.(C,H,)3 O- Éter etílico da morfina (dionina).

C1.CH2CH2.N.(C2H3)2 Heterósidos Éter dietilaminoetanólico da queli-


na, do dictilbcstrol. O-heterósidos
Glucose, lactose, da desoxicorticoste-
maltose rona. do estradiol, testosterona,
colesterol.

7.6.1.3.3.2. Estado físico do sólido

A forma cristalina ou amorfa sob que um sólido se encontra tem uma marcada influência na
respectiva solubilidade. Acontece, de facto, que muitos compostos podem apresentar-se em duas ou
mais formas cristalinas, as quais se distinguem não só pelo aspecto como, lambem, pêlos seus pontos
de fusão, densidade e coeficiente de solubilidade. Em regra, as substâncias polimórficas são
instáveis, tendendo, por isso, a converterem-se na sua forma estável, que. geralmente, se caracteriza
por ter um ponlo de fusão mais elevado e menor coeficiente de solubilidade.
308

Assim, o anidrido arsenioso pode apresenta r-se cm três tbrm;is distintas: prismática,
vítrea e octacdriea. O produto oficin ul (estável) corresponde ao uniiiriiio m:\eniti\o ociaédrico
q ue se dissolve cm SÓ parles de água e tem a densidade de 3,69, ao passo que a forma vítrea tem
a densidade de 3,7 e dissolve-se em 25 parles de água.
O enxofre sublimado c uma mistura polimórfica de cristais oclaédricos com prod u t o
amorfo, sendo os cristais muito mais solúveis no sulfureto de carbono (37.I.V/Í) do que a
variedade amorfa. Do mesmo modn, o fósforo branco c so lú vel cm siilíurclo de carbono (1:0,8
m l ) e no bcn/eno (1;3."> ml) , ao passo que o fósforo vermelho é insolúvel naqueles líquidos.
Um exemplo curioso deste polimorfismo é-nos dado pela ribollavina ou vi t a mi na B,,
sendo mais solúvel na água aquela que apresenta menor ponto de fusão, o que. aliás, está de
acordo com a ré ura de HILIM - BRAND .

7.6.1.3.33 Estado de divisão e agitação

Como o mecanismo da dissolução i m p li ca uma acção de superfície, é evidente que


quanto menores as partículas do soluto, maior será a área deste em contacto com o solvente;
por isso, uma substancia em pó será mais rapidamente dissolvida, em igualdade de condições, do
que se estiver sob a forma de grandes cristais, como se depreende da equação de NOYHS-WJIITM-.V
modificada:

de
= KS (C - C ) (17)
dl

em que K é uma constante, dependente da agitação e do coeficiente de difus ão do sólido no


líquido, 5 é a área do soluto, C é a concentração da solução no tempo / e C, e a concentração cio
soluto na zona de difusão que rodeia a porção daquele ainda não dissolvida.
Compreende-se, portanto, que quanto mais dividido estiver o sólido a dissolver mais
rapidamente se obterá a sua dissolução, acontecendo, ainda, que quando as partículas de um sólido
apresentam dimensões inferiores a 2 u observa-se uma d i m i nuição do respectivo ponto de fusão, do
que resulta um aumento de solubilidade (pág. 300).
Também a agitação da mistura soluto-solvente exerce uma i n tl u ê n ci a marcante na
velocidade de dissolução de um sólido, como igualmente se dcdu/ da equação atrás referida. D.-
facto, como C pode ser tomada como representando a concentração da solução saturada do
sólido em causa, isto significa que se a mistura solulo-solvenle for mantida em repouso,
depressa se formará à volta do sólido uma /ona. que. para todos os efeitos, corresponde a uma
solução saturada daquele. Deste modo, compreende-se
309

que a dissolução da substância dependerá do seu coeficiente de difusão no solvente, o qual, como é
evidente, pode ser aumentado pela agitação da mistura.
É por este motivo, aliás, que vulgarmente se procura apressar a dissolução agitando a mistura
sólido-líquido com uma vareta ou com um agitador mecânico ou magnético, como os representados
nas Figs. 174 e 175.

B——.

-l

Fig. 174. Agitador Fig. 175. Agitador


mecânico magnético

Ao preparar-se uma solução, o sólido é, normalmente, colocado no fundo do recipiente, sendo


este o motivo por que se pode formar à volta daquele a zona de
saturação a que atrás aludimos. Todavia, é possível evitar-se a
formação dessa zona e dispensar-se, por consequência, a agitação, se o
sólido for suspenso, dentro de um invólucro permeável, a uma altura
próxima da superfície do solvente.
Deste modo, como a Fig. 176 mostra, a solução formada à volta
do soluto desce rapidamente porque é mais densa que o solvente, sendo
este obrigado a circular por correntes de difusão, de modo que o sólido
estará sempre em contacto com solvente renovado, o que garante urna
apreciável velocidade de dissolução, sem que, para isso, seja
F
ig. 176. Dissolução por
necessário utilizar-se qualquer processo de agitação. correntes de difusão

7.6.1.3.3.4. Constante dieléctrica do solvente

Como tivemos ocasião de referir ao tratarmos das interacções solvente-soluto, a solubilidade de


uma substância é, em grande parte, condicionada pela polaridade que cia e o solvente possuem, a
qual, como se sabe, pode ser expressa em lermos de constante dieléctrica.
310

Para fixarmos ideias, relembremos que quanto mais polar for uma substância maior será a
respectiva constante dieléctrica e que, nestas condições, se poderá dizer que os compostos altamente
ionizáveis ou polares apenas se dissolverão em líquidos de elevada constante dieléctrica, ao passo que
os compostos apoiares unicamente se dissolvem em solventes de baixa constante dieléctrica.
Apesar de a polaridade, só por si, não explicar completamente a solubilidade de uma
substância num determinado solvente (pág. 292), a verdade é que o conceito de que o semelhante
dissolve o semelhante mais uma vez se confirma e conduz a resultados muito curiosos quando a
dissolução é encarada sob o aspecto de semelhança entre as constantes dieléctricas do solvente e do
soluto.
Assim, uma vez que a solubilidade de uma substância está, de certo modo, relacionada com a
sua constante dieléctrica e, ainda, com a do solvente, verificou-se que nalguns casos se torna possível
substituir um dado solvente, tido como o melhor para determinado composto, por outro ou por uma
mistura de vários líquidos, desde que o segundo solvente tenha a mesma constante dieléctrica que o
primeiro.
Este conceito tcm-sc revelado bastante útil, dado que veio abrir novos caminhos à resolução do
problema da dissolução de certos produtos farmacêuticos apenas solúveis em líquidos tóxicos, e,
portanto, sem qualquer possibilidade de utilização na preparação de soluções medicamentosas.
Numa circunstância destas, o líquido dotado de bom poder dissolvente para a droga que se pretende
dissolver, mas condenado pela sua toxicidade, será substituído por outro, não tóxico, que apresente a
mesma constante dieléctrica que ele.
Desde que o novo solvente seja constituído por uma mistura de dois ou mais líquidos, a
constante dieléctrica do sistema depende, como é óbvio, da constante de cada um deles e da respectiva
percentagem na mistura, sendo fácil calculá-la de modo aproximado uma vez conhecidos estes
elementos da seguinte maneira:

e, %A + z u % B + ...e %n
A K
n
sistema
l (K)

Assim, por exemplo, supondo que pretendíamos calcular a constante dieléctrica de um sistema
constituído por 50% de água, 30% de álcool e 20% de glicerina, teríamos, de acordo com a equação
dada acima e os valores constantes da Tabela XXIX:

e, x 50 +e,, .x 30 +e. . . x 20
agua âlrnnl
gíte crina
sistema
100

80,4x50 + 21x30 + 4 3 x20 = ———————————


——————— = 55,1 100

3i
311

Tabela XXIX. Constantes dieléctricas de vários líquidos (')

Constante dicléctrica
Líquido a 20"C
Acetona................................................................ 21,4 (2)
Ácido clorídrico.................................................. 4,6
Água .................................................................... 80,4
Álcool .................................................................. 13,1
Azeite .................................................................. 3,1
Benzeno .............................................................. 2,3
Benzoato de benzilo .......................................... 4,9
Clorofórmio ........................................................ 4,8
Etanol .................................................................. 25,7
Éter etílico .......................................................... 4,34
Etilcelossolve ...................................................... 14,5
Dioxano .............................................................. 2,26
Formamida .......................................................... 109
ülicerol................................................................ 43
Metanol................................................................ 33,7
Propilenoglicol .................................................... 32 (2)
Tetracloreto de carbono .................................... 2,24
Vaselina líquida.................................................. 2,5

Tabela XXX. Constantes dieléctricas de algumas substâncias medicamentosas


determinadas em dioxano a 25°C (:i)

Produto Constante dieléctrica


Ácido acetilsalicílico.......................................... 2.5830
Androsterona ...................................................... 2,2146
Barbital ........................................................ 2,2556
Colesterol ........................................................ 2,2134
Deidrocolesterol .................................................. 2,2111
Fenobarbital ........................................................ 2,2447
Metiltestosterona ................................................ 2,2130
Sulfanilamida ...................................................... 2,3496
Testosterona ........................................................ 2,2127

Vários casos de dissolução de substâncias medicamentosas têm sido resolvidos à luz deste
conceito, como o da progesteronu, por exemplo. Esta substância é solúvel n« bcn/oato de benzilo na
concentração de l (H) mg/mí, mas não é aconselhável injec-

( ' ) Segundo MARTIN, loc. cit., pág. 116.


(: ) Determinadas a 25"C.
(') Secundo K.UMI.KK e KULKARNI. apud MARTIN, loc. cit.. pág. 116.
312

tar-se este solvente puro em vi rt ud e da sua toxicidade. Entretanto, sabendo-se q ue a constante


dieléctrica do retendo líquido é igual a 4,9. procurou-se obter u n i sistema inócuo com uma
constante dielcclrica aproximada daquele valor e em que a solu bilidade da referida droga fosse da
mesma ordem de grande/a da registada no ben/.nalo de
bcn/ilo. Urn sistema correspondendo a tais requisitos é
representado pela mistura de 6% de cta-nol, 3% de
álcool ben/ílico, 20% de ben/oato de benzilo e 71% de
400 óleo de sésamo, o qual pode ser injectado sem qualquer inconveniente. Acontece, por vezes,
que o composto apresenta dois máximos de solubilidade correspondentes a valores distintos
da constante dieléctrica do solvente, É o que se
verifica, por exemplo, com o ácido salicílico. que exibe na sua curva de solubilidade
300 h
(Fig, 177} dois picos para valores de c = 15 e E = 25. respectivamente, facto atribuído a
diferentes espécies moleculares presentes na solução.
Porque a máxima solubilidade se verifica a e = 15, este valor da constante dieléctrica
200
representa aquilo que PARUTA e colab. designam por exigência dieléctrica (') do soluto, neste
caso particular, a exigência dieléctrica do ácido
salicílico. Este composto é mais solúvel na etilcelossolve do que em qualquer outro solvente
100 puro. o que, aliás, é perfeitamente lógico, urna vê/ que o valor de E para a elilcelossolve é.
aproximadamente, de 15, o que coincide, praticamente,
com a exigência dieléctrica do ácido salicílico.
10 20 Entretanto, é possível substituir a elilcelossolve por
60
30 4Ü
5ü Constante
Fig. 177. Solubilidade do ácido misturas binárias de v ari adis si mós solventes sem que a
salicílico a 30.6''C i/s. a constante solubilidade do ácido salicílico diminua em relação à
dieléctrica de 16 solventes puros. 1,
Dioxano; 2, benzeno; 3, clorofórmio; que apresenta na etilcelossolve. com a condição de que o
4, acetato de etilo, 5, etilcelossolve; valor de f do par ut il i/ a d o seja igual a 15. Por vc/cs,
6. acetona; 7, etanol; 8. propanol. 9,
n--butanol: 10, ciclohexanol; 11, PARUTA verificou existir mesmo um aumento de
álcool benzílico: 12. metanol; 13, solubilidade do ácido salicílico em certas misturas,
propilenoglicol: 14, etilenogh-col; 15,
como no caso do sistema clorofórmio-etanol, facto
atribuível a interacções soluto-solvente.
PARI TA também observou que a adição de sacarose à água Ia/, baixai a constante dieléctrica
daquela, baixa essa tanto mais acentuada quanto maior for a quantidade adicionada. Assim, a
solução a 65% de sacarose na água, que não é mais do que o xarope comum, tem uma constante
dieléctrica vizinha de 60, ao passo que a da água

(' ) P A R U I A utiliza a expressão ciielecfric requiremenl, que tradu/.imos por i:\igcncia


dieléctrica.
313

.pura, é, como vimos, de cerca de 80. Este facto, aparen l emente sem interesse, faz, porém, com que
o xarope seja melhor dissolvente de certos compostos do que a água, como se pode ver na Tabela
XXXI, e isto sem dúvida porque aquele líquido está mais próximo das exigências dieléctricas dos
compostos que nela figuram.

Tabela XXXI. Sol u bi l idades comparadas de alguns compostos na água (e = 80,4)


e no xarope comum (e = 60)

Solubilidade a 25"C. mg/ml


Substância Agua Xarope comum

Fenobarbítal 1,0 2,1


Quinina 0,3 1,1
Sulfanilamida 8,0 12,3
Ácido p-aminobenzóieo 4,8 8,6

Caso semelhante acontece com os barbitúricos. Tomemos como exemplo o feno-barbital, l g do


qual é aproximadamente solúvel em 1000 ml de água, em 40 ml de clorofórmio, em 15 ml de éter e
em 10 ml de álcool etílico. O estudo da solubilidade deste composto na água tem sido objecto de
investigação por parte de vários autores, os quais chegaram à conclusão de que é possível exceder a
sua solubilidade normal naquele líquido (0,1 g/100 ml) desde que se lhe assoeie um ou mais
solventes, conforme se mostra na Tabela XXXII.
Assim, verifica-se que a adição de 20% de álcool à água torna possível dissolver 0,22 g de
renobarbital em 100 ml desta mistura, concentração igualmente oblida quando o solvente é
constituído por 25% de propilenoglicol e 75% de água. Fazendo variar os componentes do sistema
dissolvente e a respccliva proporção, a solubilidade do fenobarbital aumenta, sendo possível
conseguir-se uma solução contendo 1,77 g deste composto por 100 ml de solvente constituído, por
exemplo, por 50% de propilenoglicol, 10% de álcool e 40% de água.
O facto citado nada tem de especial, pois desde há muito está empiricamente estabelecido que
vários compostos são mais solúveis numa mistura de solventes do que num único líquido. Todavia, se
atentarmos na coluna da Tabela XXXII que nos dá os valores de £ teoricamente calculados para os
vários sistemas propostos para a solubi-lização do fenobarbital, é fáeil estabelecer-se uma relação
de causa e efeito sobre o poder dissolvente desses sistemas. Repare-se que a solubilidade do
fenobarbital na água, cuja constante dieléctrica é de 80,4, é apenas de 0,100 g/100 ml, a qual,
porém, aumenta progressivamente à medida que a constante dieléctrica dos diversos solventes
diminui, até atingir o máximo de 1,77 g/100 ml nos sistemas considerados, quando a constante
dieléctrica destes se situa à volta de 50, Quer isto dizer que quando o valor de e da água pura
diminui de 80,4 para cerca de 50, por acção de outros líquidos a
314

Tabela XXXII. Solubilidade do fenobarbital em várias misturas de solventes (')


Solubilidade Propileno Glicerina Álcool Agua E do sistema (-)
g% glicol % % % %
e = 32 £ = 43 E = 25,7 e = 80,4
0,22 0 0 20 80 69,5
25 0 0 75 68,3
50 0 50 61,7
0,44 0 0 30 70 64
25 0 10 65 62,8
35 0 0 65 63,5
0 50 5 45 59
0,66 0 0 35 65 61,4
45 0 0 55 58,6
50 10 40 56,3
0,88 0 0 40 60 58,5
50 0 0 50 56,2
0 50 15 35 53,6
1,33 0 0 45 55 55,8
50 0 5 45 53,5
1 ,77 0 0 50 50 53,1
50 0 10 40 52,7
0 50 25 25 47.9

ela adicionados, a solubilidade do fenobarbital aumenta cerca de 18 vezes, números redondos.


Se bem que nunca seja de excluir a possível intervenção de uma acção solvente--soluto neste
apreciável aumento da solubilidade do fenobarbital em tais condições, parece que o paralelismo
registado entre este aumento de solubilidade, por um lado, e a diminuição da constante dicléctrica
do solvente, por outro, é por demais significativo para que possa negar-se uma correlação entre os
dois fenómenos referidos.

7.6.1.3.3.5. pH e solubilidade dos electrólitos fracos

Numerosos compostos químicos dotados de importantes propriedades terapêuticas, pelo facto


de se comportarem como ácidos ou bases fracas, são muito pouco ou mesmo

(') Segundo os dados de vários autores, modificados por MARTIN, loc. cr'/., pág. 377.
(2) Calculado pela equação indicada na pág. 310.
315

quase insolúveis na água. podendo, no entanto, assumirem, dentro de limite s bem detmidos de pH, a
forma de iões, geralmente hidrossolúveis. Compreende-se, portanto, a importância de que se reveste o
conhecimento do comportamento de tais produtos em face do pH do meio, pois só através desse
conhecimento se torna possível obter soluções aquosas desses compostos, afinal aquelas que mais se
utilixam como forma medicamentosa.
Assim, os ácidos orgânicos com mais de cinco ãtopios de carbono são relativamente insolúveis na
água mas reagem com soluções aquosas diluídas de hidróxidos alcalinos, carbonatos e bicarbonatos,
originando sais solúveis na água. Por sua vê/, os ácidos gordos são praticamente insolúveis na água e
solúveis em líquidos de baixa constante dieléclricu. mas podem solubüizar-sc na água quando sob a
forma de sabões de metais alcalinos ou de etanolaminas.
Ao contrário do que acontece com os ácidos carboxílicos atrás mencionados, os hidroxiácidos são
bastante solúveis na água, dada a circunstância de se solvalarem com ci a por formação de ligações
hidrogénio através dos hídroxilos existentes nas respectivas moléculas.
Também os ácidos aromáticos reagem com as soluções aquosas diluídas de álealis, formando sais
solúveis que, no entanto, são facilmente decompostos pela adição de substâncias de carácter mais ácido,
o que provoca a precipitação do ácido orgânico insolúvel na água. Estão neste caso vários compostos,
como os ácidos benzóico e salicílico, sendo de notar que, apesar de este último ser um hidroxiácido, tal
facto em nada concorre para a sua dissolução na água pela circunstância de o seu hidroxilo estar
comprometido numa ligação intramolecular com um dos oxigénios do grupo car-boxílico.
Também o fenol se comporta como uma substância fracamente acídica e é apenas ligeiramente
solúvel na água, mas dissolve-se facilmente em soluções diluídas de hidróxidos alcalinos. Acontece,
no entanto, que o fenol é um ácido ainda mais fraco do que o H-,CO^, motivo por que não é solúvel nas
soluções de carbonatos e bicarbonatos.
São numerosíssimos os compostos orgânicos usados como agentes terapêuticos contendo, na
respectiva molécula, um átomo de azoto básico. Entre eles podemos mencionar os alcalóides, aminas
simpaticomiméticas, anestésicos locais, e tantos outros.
Estes compostos caracterizam-se por serem derivados animados, de fórmula geral R.Nff, dotados de
fraca polaridade e, por conseguinte, m uit o pouco solúveis na água e s ol ú vei s nos solventes apoiares.
Entretanto, desde que o p l l do meio seja suficientemente baixo, originam sais solúveis na água. sendo
este o mecanismo mercê do qual se consegue a sua dissolução naquele solvente:

R.NH-. -f HCl -* [ R NH-* ]


316

É isto o que acontece, por exemplo, com a cocaína, cuja solubilidade é de l g/600 ml de água, a
qual, porém, aumenta para l g/0,4 ml em presença de ácido clorídrico. Tenha-se em atenção, no
entanto, que a adição de um álcali às soluções destes compostos promove a sua precipitação a partir
de certo valor de pH, pois tais compostos, como já dissemos, têm uma solubilidade muito diminuta na
água quando sob a forma de bases.
Ao contrário do que sucede com os compostos anteriores, o azoto alifático das sulfamidas tem
carácter suficientemente negativo para impedir a formação de sais com os ácidos e, por isso, aquelas
comportam-se como ácidos fracos. Nestas condições, as sulfamidas formam sais hidrossolúveis com
soluções alcalinas, os quais, porém, são decompostos por adição de um ácido forte.

NH.

H N Na Anião da
sulfamlamida

Os barbitúricos comportam-se de modo análogo às sulfamidas, dado o carácter acídico dos


carbonilos presentes nas suas moléculas. Assim, o barbital, em presença de uma solução diluída de
hidróxido de sódio, assume a forma aniónica, solúvel na água:

O Na

NH—C = O
Aniào do barbital

Na Tabela XXXIII indicam-se as solubilidade* do sulfatiazol na água, a diferentes valores de


pH, e os números que nela figuram são elucidativos sobre a importância da reacção do meio na
solubilidade desta, como, aliás, de tantas outras drogas.
317

Tabela XXXIII. Solubilidade do sulfatiazol na água em função do pH da solução

Valor de pll Solubilidade na água


a 25"C
6,0

7,5

9,35

10.2

7.6.2. SOLUÇÕES EXTRACTIVAS 7.6.2.1.

Generalidades

Entende-se por solução extractiva a que resulta da dissolução parcial de uma droga de
composição heterogénea num determinado solvente, querendo isto dizer que o solvente apenas
dissolve alguns dos constituintes da droga, ficando a maior parte desta por dissolver, a qual constitui
o que se designa por marco ou resíduo.
A par dos produtos químicos de composição definida, as drogas de origem vegetal representam,
de facto, a outra grande fonte de substâncias dotadas de propriedades i"ar-macológicas, e desde
sempre constituíram uma das matérias-primas utilizadas, tradicionalmente, pêlos farmacêuticos na
preparação de medicamentos.
Dada, porém, a sua composição complexa e ainda porque a sua administração, tal corno a
natureza no-las oferece, se torna desagradável ou desaconselhável, poucas vezes se utilizam
directamente. Na realidade, salvo raras excepções, representadas por alguns pós vegetais, na grande
maioria dos casos prefere-se submeter tais drogas a determinados processos tecnológicos tendentes a
retirarem delas aquilo que encerram de útil e a deixarem no marco ou resíduo tudo que não tem
actividade farmacológica ou seja inconveniente sob qualquer ponlo de vista.
Não admira, por conseguinte, que se tenha como facto assente que as técnicas de solução
extractiva nasceram no momento em que o homem começou a utilizar os vegetais como agentes
icrapêuticos, pois cedo aquele teria reconhecido que era bem mais fácil e agradável ingerir um
extracto do que a planta integral.
Está, de facto, provado que a maioria dos processos utilizados para a obtenção de soluções
extractivas já era conhecida dos povos das antigas civilizações, os quais utilizaram, em larga escala,
o processo mais simples para a preparação de um extraclo: a maceração em água. Com o decorrer
do tempo, associando a acção do calor à do dissolvente, foram sendo introduzidos outros métodos,
como a infusão, a decocção e a digestão, e ensaiaram-se outros solventes além da água.
318

Assim, são numerosas as referências ao emprego, enlre os egípcios e hebreus, do vinho e do


vinagre como líquido para a preparação de macerados, ao passo que o uso generalizado do álcool
para a preparação de tinturas remonta apenas ao século XVI4
De todos os processos usados na preparação de soluções extractivas, só a lixiviação é
relativamente recente. De facto, se bem que ARISTÓTÜLBS (384-322 a. C.) tivesse descrito um método
para a obtenção de potassa por li xiviaç ão de cinzas vegetais, esta técnica de extracção apenas
começou a despertar, verdadeiramente, o interesse geral a partir da terceira década do século
passado.
Iniciado o seu estudo por ROUBIQUET, em 1831, depressa a lixiviação conquistou uma posição
de destaque entre todos os processtos usados na extracção das drogas vegetais, não tardando a ser
admitida, como técnica extractiva, pelo Codex de 1837, exemplo seguido, depois, por todas as outras
farmacopeias.

7.6.2.2. Finalidade das soluções extractivas

As soluções extractivas são obtidas, principalmente, a partir de drogas vegetais secas ou


contendo reduzida quantidade de suco celular, com o propósito de extrair delas os constituintes
possuindo actividade farmacológica.
Atente-se, porém, no faelo de ser a composição química das plantas extraordinariamente
complexa, acontecendo que, ao lado de substâncias da maior importância do ponto de vista
terapêutico, muitas outras existem sem qualquer actividade farmacológica.
Como pertencentes ao primeiro grupo podemos eitur os alcalóides, heterósidos, taninos,
resinas, flavonas, essências, óleos, etc., ao passo que como exemplos de substâncias desprovidas de
interesse farmacodinâmico, mas figurando como constituintes normais das drogas de origem vegetal,
são de mencionar os açúcares, amido, substâncias proteicas, pectina e celulose.
Ora, como o principal objectivo que se pretende atingir ao preparar uma solução extractiva
é separar os princípios activos de uma droga dos que são inactivos, tonia--se evidente que este
desiderato depende, fundamentalmente, da selectividade do solvente utilizado para cada um dos
grupos de substâncias acima referidos.
A selectividade é, por conseguinte, uma das características a e xi g ir de qualquer processo de
extracção, pois é graças a ela que, tanto q uant o possível, se dissolverão apenas os princípios
activos e se deixarão, no resíduo, os compostos tïsiologicamente inactivos e que constituem, aliás, a
quase totalidade da droga.
É claro que esla selectividade está longe de ser absoluta, pois sucede que os compostos lidos
como inactivos apresentam sempre uma solubilidade relativa nos solventes utilizados na
preparação de soluções extractivas farmacêuticas.
319

Mesmo assim, a selectividade conseguida na prática pode considerar-se satisfatória, uma vez
que a simples variação do titulo do álcool utilizado como solvente confere a este valores diferentes da
respectiva constante dieléctrica, e, portanto, altera, de modo sensível, o seu poder dissolvente para
numerosas substâncias.
A luz deste conceito, poderemos compreender o motivo por que o álcool de concentração
relativamente elevada dissolve bem muitos dos compostos atrás citados como componentes activos
das drogas vegetais, mostrando-se, por outro lado, incapaz de dissolver os açúcares, gomas,
mucilagens, celulose, amido e pectina, enquanto que a água actua precisamente de modo inverso.
Desde que a escolha do solvente nào esteja sujeila às limitações impostas no campo
farmacêutico, a selectividade da extracção pode atingir um elevado grau, para o que basta jogar com
as polaridades relativas do solvente e dos compostos que se pretende extrair. É isto, afinal, o que se
faz nas investigações fitoquímicas, em que uma droga é extraída, sucessivamente, com solventes de
polaridade crescente, o que permite submetê-la a uma verdadeira extracção fraccionada, a qual
conduz à obtenção de fracções constituídas por compostos de polaridade também crescente.
Na técnica farmacêutica recorre-se, por vezes, a um processo destes para purificar uma droga,
como acontece, por exemplo, nas preparações de cravagem de centeio. Neste caso interessa,
sobretudo, obter um produto contendo os alcalóides existentes na droga, mas como esta tem uma
elevada percentagem do gordura, cuja presença no extracto c considerada inconveniente, é
aconselhável eliminá-la previamente.
Assim, o Formulário Nacional americano manda que a cravagem seja desengordurada por
lixiviação com hexano, líquido apoiar que dissolve a gordura mas não dissolve os alcalóides, e só
então é que o extracto propriamente dito é preparado por esgotamento da cravagem com álcool
diluído. Técnica semelhante é utilizada, aliás, pela Farmacopeia Portuguesa IV na preparação do
soluto injectável de ergotino, a qual implica, igualmente, um desengorduramento prévio da droga
com éter de petróleo, líquido de características muito parecidas com as do hexano.
Alguns autores especificam que as soluções extractivas, além de selectivas, devem ser ainda
económicas e conservadoras. Quer isto dizer que a solução extractiva, para ser económica, deverá
originar um bom rendimento extractivo no mínimo de tempo e com um mínimo de solvente. Por outro
lado, impõe-se que seja, igualmente, conservadora, isto é, a estrutura química dos princípios
dissolvidos deverá manter-se tal como na planta, nunca se devendo perder de vista que certos
processos usados na prática poderão originar alterações mais ou menos profundas de muitos
componentes das drogas. Se bem que estas alterações possam ser de varia natureza, são, particular-
mente, de temer as de carácter enzimáüco, que ocorrem facilmente nas macerações prolongadas em
meio aquoso, pelo que, sempre que a composição da droga assim o indique, esta deve ser estabilizada
previamente (pág. 114).
320

7.6.2.3. Factores que influenciam a dissolução extractiva

Do ponto de vista galénico, os processos extractivos limitam-se, praticamente, ao tratamento,


por um solvente adequado, de uma droga vegetal sólida e exsicada, de modo a oblcr-se uma solução
de determinados princípios existentes no material a extrair.
Estes processos são, no entanto, bastante complexos, neles intervindo vários fenómenos
relacionados com a extracção propriamente dita dos constituintes das células vegetais, além de
outros factores cuja influência na dissolução em geral já foi considerada quando estudámos as
soluções simples.
Por esse motivo limitaremos ao mínimo os comentários que faremos a respeito desses factores,
tanto mais que o que então dissemos se aplica, inteiramente, no caso presente.

7.6.2.3.1. Estado de divisão das drogas

Como é natural, o estado de divisão da droga, pêlos motivos anteriormente expostos (pág. 308),
desempenha uma influência decisiva nos processos de dissolução extractiva, tanto mais que neste
caso os solventes terão que embeber as células e retirarem delas os princípios activos aí existentes.
Como é do conhecimento geral, a estrutura histológica das diversas partes componentes de uma
planta é bastante heterogénea, havendo órgãos, como as raízes e os caules, extraordinariamente
compactos devido à grande percentagem de xilcma que neles figura, ao passo que as folhas e as
flores são órgãos de textura mais delicada, quase exclusivamente formados por células de paredes
celulósicas finas.
Deste modo, como o poder de penetração dos solventes depende, entre outros factores, da
consistência dos tecidos que formam o material a extrair, compreende-se que quanto menos rígida
aquela for, menor será o grau de divisão necessário para se obter uma boa embebiçào. For isso, as
fannacopeias estipulam que as drogas a submeter a um processo extractivo serão, conforme os casos,
contundidas, cortadas ou reduzidas a pó, cuja tenuidade dependerá da respectiva textura
(geralmente desde pó grosso a pó grosso n." ///)•

7.6.2.3.2. Agitação

Ao contrário do que acontece com a dissolução simples, as técnicas clássicas de dissolução


extractiva não recorrem à agitação, o que naiuralmente torna esses processos morosos, sobretudo
quando realizados à temperatura ambiente. É este, aliás,o motivo
321

por que a preparação de tinturas por maceração obriga a prolongar-se a operação durante alguns
dias, a fim de se assegurar um bom rendimento extractivo.
Se tivermos em conta que, como adiante veremos, os processos de extracção dependem, em
grande parte, de fenómenos de difusão e que a renovação do solvente em contacto com a substância a
dissolver desempenha um papel de grande influencia na velocidade da dissolução (pág. 308), não
repugna aceitar, logo à primeira visla, que a agitação pode abreviar, consideravelmente, a duração
de um processo extractivo.
Não admira, portanto, que vários investigadores se tenham dedicado, ultimamente, ao estudo
deste assunto, chegando à conclusão de que, na realidade, a maceração pode ser consideravelmente
encurtada quando feita sob agitação. Citam-se, a este propósito, os resultados obtidos por RAMOS
MOKUADO, o qual verificou que o teor da tintura de genciana cm derivados xantónicos, quando
obtida por maceração sob agitação mecânica durante 6 horas, é praticamente Igual ao da tintura
obtida por maceração durante 10 dias. o mesmo sucedendo no que dÍ7, respeito à concentração de
hesperidina na tintura de casca de limão.

7.6.2.3.3. Temperatura

A subida de temperatura provoca um aumento da solubilidade dos princípios activos das drogas,
motivo por que os processos de extracção a quente são sempre mais rápidos do que aqueles
realizados à temperatura ambiente.
Entretanto, vários componentes das drogas vegetais podem sofrer alterações mais ou menos
profundas pela acção do calor: hidrólises, facilmente verificadas no caso de heterósidos e
alcalóides de tipo éster; racemizaçõcs, como acontece com a hiosciamina que se transforma em
atropina; descarboxilações, como se observa com o ácido mecónico do ópio que origina, por perda de
um carboxilo, ácido coménico.

7.6.2.3.4. Acções mútuas exercidas pêlos componentes de uma mesma planta

Numa droga existem, por vezes, substâncias capazes de solubilizarem outras num determinado
solvente, acontecendo que lambem se pode observar o fenómeno oposto.
Assim, os heterósidos da dedaleira, aos quais esla deve as suas notáveis propriedades
cardJolónica.s, são muito pouco solúveis na água. Islo não impede, porém, que se utilize o infuso
aquoso daquela droga, o que se torna possível porque nela existem saponinas que solubilízam os
referidos heterósidos naquele líquido.
Normalmente, os alcalóides sào insolúveis na água mas o extracto de ópio, por exemplo, é
preparado por maceração aquosa porque o ácido mecónico nele existente torna os seus
alcalóides, particularmente a morfina, bastante hidrossolúveis.
322

("orno exemplo de insolubili/.açao pode citar-se a precipitação cios compostos de


rialure/a alcaloídica pêlos taninos, tão vulgares nas plunlas.

7.6.2.3.5. Influência da tensão superficial

Quando um líquido é posto em contado com unia supertíeie sólida, acontece que duas torças
absolutamente antagónicas começam a actuar. Uma é representada pela tcnsüo sitperjti ia ! do
líquido, a qual impede que este se espalhe, obrigando-o a ocupar a menor área possível, pelo que
ele toma, geralmente, a lonna de goticulas esféricas, ao passo que a outra corresponde à
atracção molecular entre o solido e o líquido, o que provoca a embebição da substância a extrair
pelo solvente.
listas torças actuam em sentidos opostos e poderão igualar-se ou sobrepor-se unia á outra,
havendo, portanto, a maior conveniência em que o sólido se deixe molhar facilmente pelo
solvente, pois só em tais condições esle poderá real i/ar. de modo efiea/. a sua acção dissolvente.
Ora. quanto menor for a tensão superficial de um líquido, maior e o seu poder de penetração
nos interstícios Je uma estrutura sólida, e. por conseguinte, maior será o seu poder de contacto e a
sua acção para aquela, pelo que seria de esperar qu^ a tensão superficial pudesse exercer uma
influência acentuada no rendimento de uma extracção sólido-líquido.
Manda a verdade di/er que durante muito tempo este aspecto dos fenómenos que presidem à
extracção foi comple^tmenlc ignorado, ale que em lu;\"í R I I I I K e V v i t s i ensaiaram o emprego
de vários agenles lensioactivos, misturados com o solvente, na preparação de extractos fluidos
de beladona. meimendro, ipecacuanha e quina, lendo verificado que alguns extractos assim
obtidos continham, em relação ás mesmas preparações feitas sem adição de tensioactivos. maiores
quantidades de alcalóides.
Dado o interesse de que tal assunto se reveste tanto do ponto de v i s t a farmacêutico como
industrial, numerosos autores têm dedicado, nestes últimos (rima anos. a sua atenção ao estudo da
influência dos tensioactivos na extracção de drogas contendo, especialmente, alcalóide>, sendo
os resultados obtidos considerados como bastante animadores c justificativos do emprego
generah/ado de tais produtos nas técnicas e xtractivas. De facto, RAMOS MORCXPO demonstrou que
lenómeno análogo se passa na extracção de derivados da ben/opirona, lendo verificado que o
'l\\'ccn 80 origina um aumento, poi ve/.es muito considerável, de compostos flavónicos nos
macerados de certas drogas.
Esta acção favorável dos tensioacíivos no rendimento de uma extracção parece estar
re'acionada com ti respectivo poder molhanle. com moditicações por ele indu/idas na
permeabilidade das membranas celulares e. ainda, com um mecanismo directo de soluhili/ação.
tradu/ido na formação de complexos princípio activo-agregados imcelares de tensmaclivo.
323

Segundo CARDONICA CARRO, OTERO AENLE e ARES POSADA, um tensioactivo favorecerá tanto mais o
rendimento extractivo quanto menor for a sua concentração crítica mïcelar e maior o seu poder
molhante. Por outro lado, de acordo com as observações daqueles autores, o tensioactivo só aumenta
a quantidade de princípios activos nos extractos desde que seja adicionado ao solvente numa
percentagem pelo menos igual à da sua concentração crítica micelar.

7.6.2.3.6. Natureza do solvente

• Por tudo quanto dissemos anteriormente sobre a influência do solvente a propósito dii solução
simples (págs. 291 e 309) e ao tratarmos da selectividade que deve caracterizar uma solução
extractiva, é evidente que a natureza do solvente desempenha um papel de importância capital no
rendimento de uma extracção.
Todavia, por razões facilmente compreensíveis, os solventes utilizados na preparação de
soluções extractivas farmacêuticas, sobretudo daquelas que se destinem a uso interno, deverão ser
inócuos, o que limita a muito poucos aqueles que se utilizam na prática.
Na realidade, podemos dizer que os únicos solventes usados em farmácia para a obtenção deste
tipo de soluções são a água, misturas hidroalcoólicas de título variável, a glicerina diluída com
álcool e água, o vinho e o vinagre. Acontece que na preparação de extractos secos se usam, por
vezes, outros solventes, como o éter ou a acetona, os quais, porém, são ulteriormente eliminados
aquando da concentração final do produto.

7.6.2.3.7. Influência do pH

Como já vimos (pág. 315), o pH assume uma importância decisiva na dissolução de muitos
compostos, pelo que na sua extracção a partir das drogas vegelais é necessário tomar em
consideração esse facto. Apenas acrescentaremos ao que então dissemos que muitas drogas contendo
alcalóides são extraídas com álcool diluído, para se preparar o que em Farmácia Galénica se
designa por tinturas, sendo possível a extracção, ern tais condições, dos referidos compostos,
existentes nas plantas sob a forma de sais, graças à polaridade que o álcool etílico diluído apresenta.

7.6.2.3.8. Tempo de extracção

O tempo de extracção é variável e, de um modo geral, depende, principalmente, da estrutura da


droga, do estado de divisão desta, da natureza dos princípios a extrair c do solvente. A extracção
pode ser total c, nesse caso, o esgotamento da droga deverá
324

prosseguir até que o solvente tenha retirado do produto a extrair a totalidade dos componentes que se
pretende dissolver. Muitas vezes, porém, a extracção é apenas relativa e nesta eventualidade, que
representa, aliás, o caso mais geral, as farmacopeia* indicam, especificamente, o tempo durante o
qual se deve prolongar a operação.

7.6.2.4. Mecanismo da extracção de sólidos

Como já anteriormente frisámos, os vários processos extractivos aplicam-se, quase


exclusivamente, a drogas sólidas exsicadas. Quer isto dizer que a maior parte da água normalmente
existente nas drogas foi removida, por evaporação, durante a secagem destas, de modo que as células
do material a extrair encontram-se mais ou menos retraídas e os diversos componentes do suco
celular estão agora precipitados sob a forma de sólidos amorfos ou cristalinos.
Como resultado desta desidratação e ainda por causa da rigidez das respectivas membranas, as
células exsicadas encontram-se quase completamente cheias de ar, já que o protoplasma está
reduzido, em tais condições, a uma delgada película aderente às paredes.
Logo, porém, que uma droga seca é posta em contacto com a água ou uma mistura
hidroalcoólica, verificam-se nela uma série de modificações tendentes a reconstituírem o estado em
que as respectivas células se encontravam antes da secagem. Na realidade, inicia-se, então, um
processo oposto ao verificado durante a exsicaçao do material, o qual se traduz na reidratação do
protoplasma, da pectina e de outros constituintes das células, recompondo-se, ainda, o suco celular
por redissolução dos compostos precipitados durante a exsicaçao. Todos estes fenómenos provocam,
entretanto, a expulsão, para o exterior, da maior parte do ar que ocupava o lúmen celular até aí
deixado vazio por retracção do protoplasma, embora uma certa quantidade daquele se possa
dissolver no solvente.
Só depois de restabelecido o estado normal do protoplasma por acção do solvente é que a
extracção propriamente dita se inicia. Vejamos, pois, em que consiste a essência do fenómeno
extractivo.

7.6.2.4.1. Extracção por maceração e técnicas correlacionadas

Nestes casos a extracção c realizada deixando a droga em contacto com o solvente durante
tempo e a temperatura variáveis e deve-se, principalmente, a um fenómeno de difusão, se bem que a
osmose intervenha igualmente, mas sempre de modo muito limitado.
325

Como atrás referimos, a droga a extrair deve ser dividida de acordo r-om a sua textura,
havendo muitos casos em que tem que ser pulverizada. Esta operação provoca não só um aumento
considerável da área oferecida à acção do solvente, como, inclusivamente, origina a ruptura das
paredes numa percentagem muito elevada de elementos celulares. Deste modo. o solvente tem
possibilidade de entrar cm contacto directo com os componentes de uma proporção muito grande de
células, uma vez que, fragmentadas as suas membranas, deixou de existir qualquer barreira que se
oponha à sua livre penetração na droga. Estamos, assim, perante um caso de dissolução simples, pelo
que. em grande parte, a extracção se resumirá à difusão da solução altamente concentrada em
princípios activos, localizada no interior das células fragmentadas, para o restante solvente, sendo
aqui que a agitação intervém favoravelmente, promovendo o aumento da velocidade com que essa
difusão se dá.
É necessário, contudo, não esquecer que mesmo numa droga pulverizada existe ainda um certo
número de células intactas e que, em tal circunstância, as suas membranas são de natureza
semipermeável, significando isto que elas permitem a penetração do solvente mas opõem-se à
passagem das substâncias dissolvidas.
Por outro lado, como é do conhecimento geral, quando uma membrana semipermeável separa
duas soluções, uma diluída e outra mais concentrada, o solvente desloca-se no sentido da solução
mais concentrada. Por consequência, como o succ celular é uma solução concentrada, o solvente que
banha as células penetrará no seu interior e, mercê disto, elas tornam-se cada vez mais túrgidas e
rebentam frequentemente, de modo que quando isso acontece estamos, de novo, perante um caso de
dissolução por simples contacto directo. Assim, apenas naquelas células cujas paredes se mantêm
intactas é que o fenómeno da osmose entra em jogo até que, teoricamente, se atinja igualdade de
concentração dentro e fora das células.
Como se torna evidente, a difusão será bastante lenta em tais casos, pelo que a extracção seria
um processo extremamente demorado se dependesse, em larga medida, de um fenómeno de natureza
puramente osmótica. Dado, porém, que a maioria das células apresenta as paredes fragmentadas,
quer como resultado da divisão prévia a que são submetidas, quer devido à pressão hidrostática
desenvolvida no seu interior durante a própria extracção, os processos extractivos a que nos vimos
referindo dependem, quase exclusivamente, do contacto directo do solvente com os componentes
celulares e da ulterior difusão da solução concentrada assim obtida.
Nos processo extractivos baseados na maceração, a droga é deixada em contacto com um
volume relativamente grande de solvente, até que os sólidos solúveis se distribuam uniformemente
através de toda a massa do líquido e se atinja um estado de equilíbrio, no que diz respeito a
concentração, entre o suco celular e o solvente que banha o material. Uma vez, porém, atingido esse
equilíbrio não mais há difusão e, a partir desse momento, a extracção cessa. Compreende-se, por
isso, que quanto maior for o volume de solvente em relação ao produto a extrair, mais tardiamente o
referido
326

equilíbrio será atingido, o que significa que, em tais circunstâncias, a extracção será levada mais
longe.
Outro mélodo correntemente utilizado na prática para se melhorar o rendimento extractivo é o
de repelir a operação várias vezes com doses fraccionadas de solvente. A renovação deste provoca a
alteração do equilíbrio a que acima aludimos, com o consequente aumento da difusão do material
solúvel do interior das células para o líquido que as rodeia, pelo que a extracção será
apreciavelmente melhorada.

Bi 2 3
Fig. 178. Diagrama ilustrando as diversas fases da extracção por maceração
A. A pulverização provocou a ruptura antecipada de certa
percentagem de células antes de serem molhadas pelo solvente. 1:
Logo que as células, até ai retraídas, entram em contacto com o
solvente, são embebidas por este. 2: Decorrido algum tempo, as
células ficam túrgidas e o suco celular já está recomposto, iniciando-
se a difusão do líquido intracelular para o exterior. 3: A difusão
terminou e neste momento a concentração das soluções dentro e fora
das células é igual.
B. Ao iniciar-se a maceração, certo número de células mantém
ainda as suas paredes íntegras. 1: A célula da esquerda, retraída
devido à exsicação, torna-se progressivamente mais túrgida quando
em contacto com o solvente. Como, neste caso, a parede celular está
intacta, funciona como uma membrana semiperrneável. Deste modo,
uma vez reconstituído o suco celular, o solvente passará para o
interior da célula. 2: Em virtude disso, a célula vai inchando cada vez
mais, acabando a parede por ceder à pressão interna sobre ela
exercida e rompe, após o que se inicia a difusão do seu conteúdo para
o exterior. 3: A difusão está em franco progresso e não tardará a
atingir-se o equilíbrio, como em A

Na Fig. 178 representam-se, graficamente, as fases principais do mecanismo da extracção por


maceração e técnicas com ela relacionadas. Procurou-se, assim, ilustrar de modo aproximado a
descrição que acabámos de fazer dos fenómenos em causa durante este tipo de extracção.
327

7.6.2.4.2. Mecanismo de extracção por lixiviação

A lixiviação, também chamada percolação ou deslocação, constitui uma das técnicas mais
importantes para a obtenção de soluções extractivas farmacêuticas.
A f i m de podermos dar uma ideia de como se desenrola o mecanismo da lixiviação, digamos
que esta consiste em submeter uma droga pulverizada e sujeita a uma maceração prévia, depois de
acondicionada num recipiente cilíndrico ou tronco-cónico, à acção de um solvente que a atravessa
em toda a extensão deslocando-se de cima para baixo.
Apresentando as coisas de uma forma muito simples, temos que a lixiviação de uma droga se
faz sobrepondo a esta uma camada de solvente que se vai deslocando, progressivamente, ao longo
dos interstícios existentes entre as partículas da substância. Deste modo, durante o deslocamento, o
líquido exerce o seu poder dissolvente sobre os princípios activos da droga, até ficar complctamente
saturado.
Desde já é de realçar o facto de que a lixiviação, contrariamente ao que acontece c«n a
maceração, em que o solvente se mantém estático, se abstrairmos, é claro, das correntes devidas à
difusão, é um processo de extracção verdadeiramente dinâmico, pois o solvente está sempre em
movimento contínuo. Este facto permite, por conseguinte, uma renovação permanente do solvente
que contacta com a droga, o que toma possível uma extracção total desta desde que a operação seja
convenientemente prolongada.
Neste processo de extracção há, pois, a considerar dois aspectos distintos, sendo um deles a
acção dissolvente propriamente dita, e o outro o deslocamento do líquido através do material a
exirair.
No que diz respeito ao fenómeno da dissolução, devemos ter presente que toda a droga
submetida a uma lixiviação é previamente reduzida a pó, cuja tenuidade varia c»m a sua natureza.
Deste modo, como já atrás dissemos a respeito da maceração, uma parte considerável das células
apresenta ruptura nas suas paredes, o que facilita extraordinariamente o contacto do solvente com
os sólidos a extrair. Também é de considerar, neste caso, a ruptura das membranas celulares por
aumento da pressão interna mercê da passagem de solvente para o seu interior, fenómeno que é de
esperar seja, sobretudo, mais pronunciado durante o período de maceração a que a droga é
submetida antes de se iniciar o deslocamento do solvente.
Como se vê, a acção extractiva é exercida em moldes praticamente iguais àqueles descritos a
propósito da maceração, isto é, a extracção é realizada, na sua maior parte, por contacto directo do
solvente com os princípios activos situados dentro das células fragmentadas, entrando, depois, em
jogo o fenómeno de difusão. Isto não exclui, evidentemente, a participação, se bem que em grau
muito limitado, de um mecanismo osmótico, o qual se verificará apenas nas células cujas membranas
se mantenham intactas.
Dado o carácter cinético da lixiviação, a difusão será, no entanto, acentuadamente mais rápida
neste caso do que na maceração, pois o movimento do solvente difícil-
328

mente permitirá que seja atingido um estado de equilíbrio absoluto entre as concentrações dos
líquidos localizados dentro e fora das células. As condições criadas por esta renovação constante do
solvente em contacto com a droga originam, assim, uma cor-rcnle difusória contínua orientada
sempre no sentido do interior para o exterior dos elementos celulares e, portanto, a extracção far-
se-á enquanto naquela houver material paru dissolver e se mantiver a substituição do líquido que as
banha. Nisto reside a diferença fundamental entre a mecânica da dissolução propriamente dita uil
como se processa numa maceração ou numa lixiviação.
Se, por um lado. o mecanismo básico da extracção é igual em todos os processos, aquilo que
imprime um cunho verdadeiramente característico e inconfundível à lixiviação é, como se depreende
do que .Uras dissemos, a movimentação regular do solvente ao longo da droga durante a operação.
Ora, acontece que esta movimentação do solvente que caracleri/a a lixiviação resulta da
actuação de várias forças, umas favorecendo-a c outras opondo-se a ela, pelo que é o somatório de
todos os factores intervenientes que determinará o modo como se fará a marcha do líquido através
do produto a esgotar. Vejamos, então, como esta se processa.
Suponhamos, para isso, que tínhamos colocado num recipiente cilíndrico, tapado na sua
extremidade inferior por um diafragma ou um pedaço de algodão hidrófilo, unui certa quantidade de
droga em pó e que sobre esta lançávamos uma camada de líquido A, conforme, está representado na
Fig. 179, 1. Imediatamente se observa que o liquide começa a movimentar-se através dos grânulos
da droga, não lardando, contudo, a parai na sua descida ao longo da coluna, como se indica na
Fig. 176, 2. Uma vez parado, o líquido só retomará a sua marcha descendente se adicionarmos à
coluna uma nova porção dele, sugerindo (ai comportamento (Fig. 179, 2, 3) que deve existir uma ou
mais forças capazes de obrigarem o solvente a deslocar-se para buixo, assim como, logicamente,
qualquer fenómeno actuará à semelhança de uma barreira invisível, mas intransponível, a qual se
opõe à livre deslocação do líquido até ao fundo da coluna.
Na realidade, é isto, precisamente, o que se passa. De facto, a pressão hidrostática
correspondente ao peso da coluna de líquido obriga este a descer ao longo da droga, enquanto outra
força, a da capilaridade, que representa a barreira a que acima nos referimos, se opòe ao movimento
descendente do solvente. Deste modo, dois c o nj unt os de forças antagónicas e desenvolvidas em
sentidos opostos comandam a descida do solvente, dependendo os movimentos deste das imensidades
relativas dessas forças contrárias. Perante isto, compreende-se que o líquido extractivo se deslocará
para baixo no momento em que a pressão hidrostática por ele exercida ultrapasse a força da
capilaridade e que seja obrigado a parar na sua marcha descendente quando uma e outra se igualam
(Fig. 179, 2, 4).
Uma vez atingido este ponto, o líquido só poderá mover-se de novo desde que a força da
capilaridade que se opõe ao seu deslocamento seja vencida pelo da coluna do solvente, o que se
consegue adicionando ao produto a lixiviar nova porção de líquido.
329

Graças a este facto, a primeira camada, A, é acrescida de uma segunda, B pelo que a pressão
hidrostática é aumenlada, retomando o solvente a sua marcha para baixo até ao momento em que a
capilaridade volte a contrabalançá-la. É isto, aliás, o que a Fig. 179, 3 e 4 mostra, podendo agora
compreender-se como a adição de sucessivas porções de solvente vai contrariando a acção da
capilaridade c força aquele a movimentar-se até ao tubo de saída.

Ph

Fig. 179. Diagrama mostrando a marcha do solvente através do material sujeito


à lixiviação
1. Vertendo uma porção de solvente sobre a droga em pó colocada no
lixiviador, aquele inicia a sua marcha descendente devido à pressão
hidrostática (Ph).
2. Após ter percorrido uma certa distância, o líquido pára devido ao facto
de a pressão hidrostática do líquido (Ph) ter sido igualada pela força da
capilaridade (Fe).
3. A adição de nova quantidade de solvente faz com que este retome o seu
movimento descendente, pois Ph > Fe.
4. As forças que obrigam o líquido a descer e a subir nos interstícios das
partículas voltam a equNibrar-se e, por isso, o solvente pára mais uma
vez. A adição de nova porção de líquido C, aumentando a pressão
hidrostática deste, faz reiniciar o movimento descendente. A manutenção
permanente desta camada de líquido à superfície da droga assegurará o
seu deslocamento ininterrupto através do produto a lixiviar.

Uma vez que o mecanismo íntimo do processo extractivo se baseia, principalmente, no


fenómeno da difusão e este depende, por seu turno, do ritmo a que é feita a renovação do solvente,
torna-se patente a importância de que se reveste a velocidade a que aquele se desloca para se obter
um perfeito e mais rápido esgotamento da droga. Como já dissemos, a lixiviação é precedida de
uma maceração do material a extrair, pelo que a partir de certo momento os interstícios entre as
suas partículas estão ocupados por uma solução concentrada de princípios activos. Ao iniciar-se o
movimento da primeira camada de solvente, esta vai deslocando na sua frente essa solução, ocupando
o espaço assim deixado livre. Deste modo, os tecidos ficam sendo banhados p»r solvente puro, o que
origina nova difusão da solução saturada do interior para o exterior das células. Como, porém, a
difusão não é instantânea, toma-se necessário um certo lapso de tempo para que o solvente se possa
saturar, o que apenas se consegue se a sua marcha não for demasiadamente rápida. Por outro lado,
atingido o estado de
330

equilíbrio entre as soluções fora e dentro das células, a difusão cessa, e. nestas condições, a
extracção só pode continuar se o líquido que ocupa os espaços intercelulares for renovado.
Para que a deslocação do solvente se faça a um ritmo adequado, torna-se necessário que a sua
altura no lixiviador seja mantida a um nível cerlo e determinado, mas outros factores há que
podem, igualmente, influenciá-la de um modo ou de outro.
Assim, o diâmetro das partículas do material a exlrair desempenha um papel importante a este
respeito, acontecendo que um pó demasiadamente fino retarda a velocidade de escoamento do
solvente porque origina canalículos muito estreitos, ao passo que as partículas grosseiras facilitam
e podem tornar demasiadamente rápida a sua marcha.
Também a tensão superficial do líquido utilizado exerce um efeito notável na deslocação deste.
De facto, como a capilaridade é função da tensão superficial dos líquidos e varia na razão directa
desta, na prática preferem-sc os líquidos de baixa tensão superficial. É que estes, além de
penetrarem bem nos interstícios da droga a extrair e serem, em regra, dotados de bom poder
molhante, deixam-se deslocar com relativa facilidade por não estarem muito sujeitos à acção da
capilaridade.
Por outro lado, os líquidos caracterizados por elevada viscosidade não são recomendáveis
para fazer uma lixiviação, pois deslocam-se lentamente, sendo, ainda, de notar que as drogas que
apresentam tendência a incharem por acção do solvente não se prestam a serem convenientemente
extraídas por esta técnica.

7.6.2.5. Extracção líquido-líquido

Considerados, na generalidade, alguns dos aspectos fundamentais relacionados com a


extracção de certos princípios solúveis existentes em produtos sólidos, vamos, agora, abordar o
problema da extracção por um líquido de uma substância dissolvida noutro líquido.
Se bem que este tipo de extracção não seja utilizado na obtenção de formas farmacêuticas,
acontece, porém, que o farmacêutico se vê obrigado a praticá-lo frequentemente, quanto mais não
seja quando procede, por exemplo, à dosagem de alcalóides numa droga, pois os processos
vulgarmente utilizados neste género de análises são baseados nele.
Consiste esta técnica em tratar uma solução com um solvente ou sistema de solventes não
miscíveis com ela, procurando-se, deste modo, que a subslância a extrair passe na maior quantidade
possível para o líquido com que se agita a primitiva solução.
Este fenómeno de distribuição de um sólido por dois solventes imiscíveis postos em contacto
com ele constitui a base do processo de extracção líquido-líquido e c regulado pela lei de NERNST,
segundo a qual a substância distribuir-se-á de tal modo pêlos dois solventes que a relação das
concentrações das duas soluções assim obtidas
331

c constante e independente da quantidade de sólido em contacto com os líquidos. Podemos,


por conseguinte, escrever:

Ci
K=
Cs

em que K é a constante acima referida, conhecida, vulgarmente, por coeficiente de [lartilfiíí, c Cs e,


Ci representam a concentração da substância dissolvida, respectivamente, na fase superior e na fase
inferior.
Esta equação esta sujeita, na prática, a um certo número de limitações, mas no caso da
maioria das extracções laboratoriais as soluções apresentam-se suficientemente diluídas e por isso
ela é válida para a discussão dos pormenores que vamos abordar.
Do ponto de vista prático, a extracção líquido-líquido executa-se com o fim de remover de um
sistema heterogéneo uma determinada substância nele dissolvida. Para isso, a solução a extrair é
agitada com um líquido imiscível com ela, dependendo a quantidade de substância que passa do
primeiro para o segundo solvente das proporções relativas tios volumes de ambos e do respectivo
coeficiente de partilha. Atingido o equilíbrio, a quantidade total de substância dissolvida na fase
superior é:

Kr

em que r é a relação entre os volumes das duas fases.


Por outro lado, a quantidade de substância existente na fase inferior após a extrac-
ção é:

fi/? = —— - —— (2)

Se a fase inferior for extraída, sucessivamente, com n volumes iguais da fase superior, cada
extracto conterá uma quantidade de soluto:

Kr
(3)
,,
" (Kr+l)n

ao pa i so que a quantidade deste deixada na fase inferior será:

Qfl=——-— (4)
( Kr+ \)"
332

Suponhamos, por exemplo, qu e procedíamos à exmicção de l M i o de uma solução aquosa


de determinada substância com l l itro de éler, e que o coeficiente de partilha A",, da
substância em questão, era 2.
Deste modo, aplicando u equação (1} para calcular a quantidade de substância qu e
nestas condições passa para o éter, o qual constitui a fase superior, temos, uma vê/ que K =
2 e r = 1:

Kr 2x1
Qh = —————— - ———————— - 0,667
( K r + 1) (2xl)+l

Quer isto significar, portanto, que adoptando o procedimento indicado poderíamos, após
agitação com l litro de éter sul t ui iço, obter cerca de 67% do total da substância contida na
solução aquosa.
Acontece, porém, que na prática se obtém um rendimento mais elevado se o líquido
extractivo for utilizado em várias fracções. Assim, vejamos o que aconteceria se
procedêssemos â extracção da solução aquosa usando ainda l li tr o de éter mas dividido cm
4 fracções de 250 ml cada.
Tomando em conta que, neste caso, a relação entre os volumes das d uns fases é de l : 4,
aplicando a equação (3), teríamos, unia vê/ qu e K - 2 e / = 0,25:

2 x 0,25
n
(2x0,25+ 1)"

e portanto, na

l.'1 extracção: a quantidade extraída (n - 1) era de 0,333


2/ » » » » (n = 2) >. » 0,222
3." » » » » (n = 3) » » 0.150
J
4. » » >> » (n = 4) » » 0.098

o que corresponderia à extracção, na totalidade das 4 fracções, de 0.803 de substância, ou


seja, cerca de 14% mais do que u obtida procedendo à extracção com l l i t r o de éler, mas
utilizado numa única vc/.
Ora, como a economia no uso dos solventes é sempre um factor a t e r em consideração e
porque, além disso, se torna difícil manejar volumes consideráveis de líquidos dur ante as
extracções à escala laboratorial, é evidente, como se iledu/ dos números atrás reproduzidos,
que é mais prático e mais vantajoso, do ponto de \isut de rendimento extractivo, utili/.ar
várias porções relativamente pequenas do solvente do que uma única porção, ainda que
representando um volume considerável.
333

7.6.2.6. Métodos para a obtenção de soluções extractivas

7.6.2.6.1. Soluções extractivas de sólidos

Pode dizer-se que os processos geralmente utili/ados para a obtenção de soluções extractivas
constituem variações da maceração e da lixiviação.
Assim, na maceração e técnicas correlacionadas a droga a extrair é posta em contacto com o
solvente, o qual actua sobre toda a sua superfície, circulando, deste modo, através dela em várias
direcções e exercendo a sua acção dissolvente até se estabelecer igualdade de concentração entre
os líquidos intra e exlracelulares.
Na lixiviação, pelo contrário, o dissolvente atravessa a droga pulverizada apenas num único
sentido, sendo o líquido constantemente renovado em virtude do movimento descendente a que está
sujeito. Mercê disto, durante a lixiviação a droga está sempre em contacto com novas porções de
solvente, pelo que nunca se estabelece igualdade de concentração entre os líquidos situados fora e
no interior das células, acabando estas l>«r cederem ao líquido extractivo a totalidade dos seus
constituintes solúveis desde que a operação seja suficientemente prolongada.
Com o decorrer do tempo, esies dois processos fundamentais de extracção sofreram algumas
modificações que conduziram ao aparecimento de outras técnicas, consideradas como métodos
dotados de características próprias e tidos, por conseguinte, como perfeitamente distintos e
individualizados uns dos outros. Assim, da maceração derivaram outr»s métodos extractivos, como a
digestão, a infusão e a decocção, ao passo que a diacolução, a evaculação e a extracção em
aparelho de SOHXLET são apenas meras variantes da lixiviação. Vejamos, pois, em que consiste cada
um destes processos utilizados na obtenção de soluções extractivas.

7.6.2.6.1.1. Maceração

A maceração é uma técnica de extracção em que a droga e o solvente são postos em contacto,
durante certo tempo, à temperatura ambiente, obtendo-se, deste modo, uma selução extractiva
designada por macerado.
A maceração utiliza-se, especialmente, na extracção de drogas com uma estrutura pauco
compacta e, por conseguinte, facilmente permeáveis aos líquidos e quando os seus princípios sejam
solúveis a frio ou alteráveis pela acção do calor,
Por ve/cs, recorre-se à maceração para se obter uma separação de certos princípios existentes
no material a extrair, conseguindo-se, por este processo, a dissolução de determinados constituintes
solúveis a frio, deixando no resíduo outros, insolúveis nas condições em que se opera, os quais não
têm qualquer acção farmacológica ou cuja presença no líquido extractivo seja indesejável ou,
mesmo, prejudicial. É graças a isto que, por exemplo, a maceração da ratânia permite obter um
líquido isento das muci-
334

lagens existentes naquela droga, apenas solúveis a quente, e que nos macerados de alteia, pela
mesma razão, se eliminam a fécula e a pectina que aquela contém.
Qualquer droga a submeter a esta operação deverá ser previamente dividida, conforme se
refere na pág. 320. Aliás, a Farmacopeia Portuguesa IV, no artigo respeitante aos macerados,
indica que o material a extrair será contundido, cortado ou grosseiramente pulverizado, conforme a
sua natureza. Isto significa que o grau de divisão de uma droga a macerar pode ser variável e
dependerá, muito especialmente, da respectiva estrutura, sendo intuitivo que quanto mais
compacta ela for maior deverá ser o seu estado de fragmentação. É de notar, porém, que este nunca
deve ir além do estado de pó grosseiro, pois só nestas condições é possível ao solvente uma fácil
circulação através do material a extrair, acontecendo que se a droga estiver sob a forma de pó
demasiadamente fino tem tendência, uma vez humedecida, para formar uma massa mais ou menos
aglomerada, no interior da qual o líquido extractivo dificilmente penetra e se difunde.
Se bem que, de um modo geral, não haja qualquer limitação específica quanto à natureza do
líquido a utilizar como solvente numa maceração, do ponto de vista farmacêutico este é quase
sempre a água ou misturas hidroalcoólicas e, em menor escala, o vinho ou o vinagre. Estes últimos,
aliás, nunca se empregam na preparação de soluções extractivas obtidas pela acção conjugada do
calor, uma vez que são alterados quando aquecidos.
O tempo de contacto da droga com o solvente durante a maceração é muito variável, indo
desde 30 minutos até vários dias. Em geral, as macerações prolongadas apenas são recomendáveis
quando o solvente c o álcool, o vinho ou vinagre, sendo absolutamente condenável o emprego da
água em tais casos, dado que os macerados aquosos são facilmente invadidos por microrganismos,
além de que há sempre o perigo de se registarem hidrólises enzimáücas de certos constituintes das
drogas. Por esta razão, a Farmacopeia Portuguesa IV especifica que as macerações aquosas
deverão ser feitas durante 2 horas e só no caso da preparação de tinturas, em que o solvente usado é
sempre um álcool mais ou menos concentrado, e de vinhos e vinagres, a droga é deixada em
contacto com o solvente durante muito mais tempo, em geral 10 dias.
A técnica da maceração geralmente adoptada preconiza um único esgotamento da droga pelo
solvente escolhido. Acontece, porém, que mesmo após o marco ter sido espremido este pode reter
uma quantidade importante de líquido, que, em certos casos, anda à volta de 30% do volume
inicialmente adicionado à droga. Tal facto traduz-se, como é evidente, numa perda importante de
solução extractiva, que fica aderente ao sólido que se pretende esgotar, sendo por este motivo que se
pratica, por vezes, uma maceração fraccionada. Neste processo a droga é extraída com novas
porções de solvente duas ou mais vezes, conseguindo-se, assim, uma mais perfeita extracção dos
constituintes solúveis existentes no material sujeito à operação.
Como já tivemos oportunidade de referir, a agitação constitui um factor importante na
dissolução, facilitando-a grandemente em virtude de promover uma renovação cons-
335

tante do solvente em contacto com o corpo a extrair (pág. 308). Por isso, não deve causar
estranheza que, apesar de as técnicas clássicas de maceração não considerarem a sua utilização, se
reconheça, actualmente, que o tempo normal de uma maceração possa ser consideravelmente
encurtado desde que a operação seja executada sob agitação constante (pãg. 320). Aliás, tem-se
proposto que a droga a macerar seja encerrada num saco de gaze e suspensa no solvente, pois, deste
modo, à medida que o líquido em contacto com a droga vai extraindo dela os princípios solúveis a
sua densidade aumenta, o que o obriga a deslocar-se para o fundo do recipiente, sendo substituído,
mercê disto, por novas porções de solvente, estabelecendo-se, portanto, uma renovação de líquido
análoga à provocada pela agitação, o que facilita bastante a extracção.

7.6.2.6.1.2. Digestão

É uma técnica extractiva em que a droga, segundo as especificações da nossa anterior


farmacopeia, é posta em contacto com o solvente, por tempo variável, à temperatura de 35-40°C.
Estes são, por conseguinte, os limites de temperatura a respeitar obrigatoriamente na prática deste
processo de extracção, os quais só poderão ser alterados quando se especifique, claramente, outras
condições de aquecimento.
Pode dizer-se, portanto, que a digestão difere, fundamentalmente, da maceração por ser
executada a uma temperatura um tanto mais elevada. Esta circunstância, entretanto, incrementa
nitidamente a capacidade extractiva do solvente, pois acontece que a elevação da temperatura não
só aumenta, em regra, a solubilidade dos princípios existentes na droga a extrair, como, também,
favorece os fenómenos da difusão por diminuir a viscosidade do solvente.
A digestão constitui um processo extractivo pouco utilizado em farmácia, limitando-se o seu
emprego, por assim dizer, à preparação da Água de Alcatrão, Forte, e da Água de Bálsamo de Tolu.
Repare-se, no entanto, que a digestão é uma técnica a que ainda se recorre com certa
frequência na indústria química e a(é farmacêutica, sendo de ponderar que, se muitas vezes, o
solvente utilizado é a água, pode acontecer que também se utilizem outros solventes, como líquidos
orgânicos de baixo ponto de ebulição.
Como a operação se pratica, geralmente, a 35-40°C, quer isto dizer que a mistura sólido a
extrair e solvente lerá de ser aquecida àquela temperatura, sendo costume, por isso, colocar a
droga e o dissolvente num balão ou num vaso tapado e mergulhá-lo num banho de água aquecido
àquela temperatura.
Vem a propósito, por conseguinte, chamar a atenção para o cuidado a ler com o recipiente
mais apropriado para se fazer esta operação, o qual deverá ser escolhido tendo em consideração,
sobretudo, a natureza do líquido que se utilize.
Como se compreende, no caso de este ser a água não se impõem cautelas especiais, podendo
usar-se um recipiente qualquer, desde que se possa lapar. Tratando-se,
336

porém, de líquidos voláteis, é necessário evitar a sua vaporização, a qual se pode traduzir numa
perda apreciável de solvente se o aquecimento for demasiadamente prolongado. Em tais casos, como
é lógico, deve utilizar-se um balão ao qual se adapte um refrigerante de refluxo, pois, nestas
condições, evita-se o facto atrás referido.

7.6.2.6.1.3. Infusão

É uma técnica extractiva que consiste em lançar sobre uma droga água fervente, mantendo-se
o sólido e o líquido, encerrados num vaso fechado, em contacto durante certo tempo.
A infusão é aplicável, principalmente, a substâncias de estrutura branda constituídas por
tecidos comparativamente moles, as quais, porém, deverão ser contundidas, cortadas ou
grosseiramente pulverizadas, conforme a sua natureza, a fim de que possam ser mais facilmente
penetradas e extraídas pela água.
A técnica para a prática da infusão descrita na nossa Farmacopeia IV consiste em submeter a
droga, previamente, a um dos tratamentos acima referidos, de acordo, evidentemente, com as suas
características, e infundi-la, depois, num vaso de louça, tapado, com água fervente, deixando em
contacto durante l hora, após o que se deixa arrefecer e se côa a solução obtida.
Os recipientes usados para infundir drogas deverão ser feitos de material que
suporte a temperatura de 100°C sem partir e seja mau condutor do calor, a fim de evitar o
arrefecimento demasiadamente rápido da água. Para este fim está especialmente indicado um
modelo de caneca de porcelana, própria para uso farmacêutico, tendo marcada no interior uma
graduação em g e provida de tampa, que impede perdas de solvente por evaporação.
O facto de se utilizar a água fervente faz com que o tempo geralmente atribuído à duração da
infusão seja significativamente mais curto do que o despendido numa maceração ou digestão, pois o
calor, como já vimos, facilita muito a dissolução.
No entanto, apesar desta incontestável vantagem, há sempre o risco de a água quente dissolver
uma apreciável quantidade de material inerte, como substâncias muci-laginosas e outras, que
poderão precipitar por arrefecimento. Além disso, a temperatura relativamente elevada a que a
água se encontra quando é posta em contacto com as drogas pode originar a coagulação quase
instantânea das matérias albuminosas existentes nas respectivas células, o que, a verificar-se,
dificulta bastante a extracção dos princípios nelas localizados por causa da camada isolante
constituída pelas albuminas coaguladas. Aliás, é em parte para evitar esta coagulação que certos
livros, como o Formulário Nacional Americano, mandam humedecer, previamente, a droga com
água fria, deixando-a em repouso durante 15 minutos, após o que se lança, então, sobre ela a água
fervente.
337

7.6.2.6.1.4. Decocção

A decocção consiste em manter um sólido em contacto, durante certo tempo, com um solvente,
normalmente a água, aquecido à ebulição, oblendo-se deste modo uma solução extractiva
denominada decocto ou cozimento.
A decocção é, pois, até certo ponto, semelhante à infusão, residindo a diferença fundamental
entre ambas no facto de a primeira ser executada a uma temperatura muito mais elevada, dado que
durante todo o processo extractivo a temperatura a que se opera é a correspondente à temperatura de
ebulição do solvente, ou seja, cerca de 100"C no caso de aquele ser a água, como, regra geral,
acontece.
Esta característica que define a decocção toma-a uma técnica de emprego restritivo, pois as
drogas a que ela se pode aplicar são em número reduzido, dado que muitos dos princípios activos
nelas existentes são alterados por um aquecimento prolongado a uma temperatura tão elevada.
De facto, apenas costuma ser usada com drogas muito compactas e de natureza lenhosa, cujos
princípios apenas sejam solúveis a quente e capazes de suportarem, sem alterações sensíveis, as
condições de temperatura e o período de aquecimento inerentes a este processo extractivo. Assim, por
exemplo, não se devem submeter à decocção drogas contendo essências, que se perderiam por
volatilização, nem compostos oxidáveis, hidrolisãvcis ou racemizáveis pela acção do calor.
Segundo a nossa anterior farmacopeia, as drogas a submeter à decocção devem ser previamente
contundidas, cortadas ou grosseiramente divididas, conforme a sua natureza, sendo depois adicionadas
de água na proporção de 1500 g para 100 g de droga, fervendo-se até o conjunto ficar reduzido a
1000 g, após o que se côa, espremendo, se deixa arrefecer e se decanta. Convém, além disso, ter-se
presente que o recipiente utilizado para fazer a decocção não deve ser atacado pêlos princípios activos
existentes na droga sujeita à operação, estando contra-indicado, por exemplo, o uso de vasos de ferro
para a decocção de drogas ricas em taninos, pois em tais condições obter-se-iam produtos fortemente
corados.
Em geral, os formulários estrangeiros procedem de modo diverso do nosso no que diz respeito
ao tempo de aquecimento, que fixam sempre de modo muito preciso: 15 minutos no caso da
Farmacopeia Americana, Brasileira e Helvética, e 15 a 30 minutos segundo a Farmacopeia Belga, consoante a
droga c de contextura branda ou compacta. Além disso, tanto a U.S.P. XVII como a Farmacopeia Helvética
mandam submeter as drogas a uma maceração prévia de 15 minutos e só então procedem à decocção pro-
priamente dita durante igual período.
Um tal critério parece-nos mais lógico e rigoroso, pois estabelecendo-se um tempo de aquecimento fixo
aumenta-se a probabilidade de .se obterem preparações mais uniformes. Este desiderato, no entanto,
dificilmente será atingido com a técnica da nossa anterior farmacopeia, uma vez que nela o período de
aquecimento eslá dependente do tempo necessário para se reduzir o peso inicial da mistura da droga e
solvente de 1600 g para 1000 g.
338

Ora, como na Farmacopeia Portuguesa IV nào se estipulam as características a que deve


obedecer o recipiente em que a decocção é realizada, compreende-se que o ritmo de evaporação da
água, e, por consequência, o tempo de aquecimento a que a droga ficará sujeita, dependerá, em
última análise, da forma do vaso utilizado. Deste modo, a velocidade de evaporação da água, será,
evidentemente, diferente conforme a dccocção for executada num balão, num copo ou numa cápsula
e, assim, quanto mais tempo a droga estiver sob a acção do calor mais concentrado ficará o
cozimento em princípios activos e em matérias inertes e maior será, também, a perda de princípios
voláteis ou termoïábeis.
Por outro lado, como a decocção é feita à temperatura de ebulição do solvente, este extrai
certas substâncias apenas solúveis a essa temperatura, as quais, todavia, precipitam, ulteriormente,
quando o decocto arrefecer. Além disso, durante a fervura as proteínas vegetais coagulam e os
tecidos da droga a extrair fixam, por embebicão, uma quantidade apreciável de solvente, motivo por
que, uma vez terminada a operação, se impõe coar a solução c espremer o marco, a fim de se
recuperar o máximo possível de líquido extractivo.
Entretanto, apenas é recomendável coar e espremer o cozimento quando este liver arrefecido
a cerca de 40°C, pois assim conseguc-sc eliminar já uma parte considerável das matérias insolúveis
a baixa temperatura, completando-se, mais tarde, a clarificação, quando o decocto estiver
completamente frio, procedendo-se, para isso, a uma decantação ou filtração.
É de assinalar ainda que as técnicas de preparação de decoctos mandam, em geral, passar
água fria ou quente através do coador ou do filtro usado para clarificar a solução, até se completar
o volume de 1000 ml. A nossa farmacopeia, no entanto, é omissa a tal respeito, e em resultado disso
a fórmula do nosso código não permite, como é evidente, obter 1000 g de produto final. Deste modo,
se quisermos obter essa quantidade de decocto ou uma parte alíquota dela ter-se-á que preparar um
excesso de cozimento para que seja possível obter, realmente, o peso desejado.

7.6.2.6.1.5. Lixiviação

Este método de preparar soluções extractivas, também conhecido por deslocação ou


percolação, é, segundo a Farmacopeia Portuguesa IV, «a operação que consiste em submeter as
drogas a loções repetidas, em aparelho especial, denominado deslocador ou lixiviador. a f i m de
lhes extrair os princípios activos».
Antes de mais, convém assinalar que a prática deste processo extractivo exige, ao contrário do
que acontece com as técnicas até ao momento estudadas, o emprego de um aparelho especial c
dotado de características próprias, o qual, ainda segundo aquele nosso código farmacêutico, «deve
ser constituído por um tronco de cone invertido, de vidro, porcelana, grés, cobre estanhado ou folha
de Flandres, tendo nu base inferior uma parte infundibulifonne prolongada em tubo munido de
torneira, devendo a sua capaci-
339

dade ser tal que o pó humedecido e ligeiramente comprimido não ocupe mais de dois terços do
tronco de cone».
Segundo o conceito atrás exposto, a lixiviação é um processo em que se procura extrair da
parte não solúvel de uma droga os princípios solúveis nela existentes à custa do deslocamento lento
mas regular de um determinado solvenle através da substância pulverizada e acondicionada num
percolador. Nesta técnica, tal como é geralmente praticada, o solvente, mercê dos fenómenos e
forças a que nos referimos na pág. 327, atravessa de cima para baixo a coluna formada pela droga
colocada no lixiviador e, porque o líquido extractor está sendo constantemente renovado, aquela é
submetida às sucessivas loções a que se alude na definição citada anteriormente.
Uma vez que a lixiviação implica o uso obrigatório de aparelhos com características bem
definidas, é natural que comecemos pelo seu estudo, reservando para o final o exame
pormenorizado das diversas fases por que passa esta operação tão importante no campo
farmacêutico.

7.6.2.6.1.5.1. Lixiviadores

Conforme já atrás tivemos ocasião de referir, a nossa farmacopeia anterior permite que os
percoladores sejam feitos do mais diverso material mas estabelece que deverão ter a forma de um
tronco de cone invertido.
Em certos países, contudo, usam-se também lixiviadores de forma cilíndrica e, assim, a
Farmacopeia Americana permite a utilização destes dois tipos de percolador, os quais, no entanto, têm
aplicações específicas. Na realidade, a U. S. P. recomenda o uso de aparelhos cilíndricos na
preparação de extractos fluidos e de lixiviadores cónicos quando as drogas incham acentuadamente
em presença do solvente.
Acontece que a maioria das farmacopeias, entre elas a nossa, apenas se limita a fazer uma descrição
geral destes aparelhos, sem entrar em demasiados pormenores. O Codex, no entanto, é mais preciso a
este respeito e fixa do seguinte H B modo as características a que deve obedecer um lixiviador
cónico, tomando, como exemplo, um aparelho com a capacidade de 2 l, capaz de
fazer a lixiviação de 500 g de droga (Fig. 180):
cm
Altura do tronto de cone AH ..........
Diâmetro superior GB........................
36
Diâmetro inferior CA ........................
IO
Altura do cone infundibuliforme ......
6,5
Diâmetro do tubo de escoamento E Ângulo CAD
Fig. 180. 5l
Diag r a m a ...................................... 45°
de um Ângulo BAH ......................................
lixiviador caniço 3"
340

Este ângulo BAH, formado pela parede do lixiviador, AB, e a normal, HA, pode ser ligeiramente
mais aberto nos aparelhos de maior capacidade, mas em nenhum caso deve ultrapassar 5°.
Na Fig. 181 reproduz-se um percolador em forma de tronco de cone,
correntemente utilizado nas oficinas farmacêuticas, o qual é constituído de
modo a adaptar-se ao recipiente situado inferiormente, que se destina,
simultaneamente, a recolher o percolado e a servir de base ou suporte ao
lixiviador. O lixiviador propriamente dito está munido de uma torneira na parte
inferior, a qual, como veremos mais adiante, serve para regular a velocidade de
escoamento do solvente, tão importante para se obter uma lixiviação da droga.
Na preparação em larga escala de certas formas galénicas, como tinturas
e extractos, usam-se aparelhos de grande capacidade, geralmente construídos
de metal, os quais, em vez de fecharem por
meio de uma rolha, como os aparelhos ~"-
representados na Fig. 181, são vedados com uma
tampa (Fig. 182).
Fig. 181. Lixiviador
7.6.2.6.1.5.2. Prática da lixiviação

Não é exagero afirmar-se que a lixiviação é a mais complexa de todas as


operações farmacêuticas extractivas, acontecendo que a fase da deslocação
propriamente dita deve ser antecedida por uma série de operações
preliminares, cuja correcta execução deverá obedecer a uma rolina
perfeitamente estabelecida, a inobservância da qual pode comprometer o
bom êxito da operação. São tão importantes, de facto, as várias fases que
integram esta técnica de extracção que as farmaco-peias não se dispensam de
as descreverem com o devido pormenor, ficando, por isso, o farmacêutico
obrigado a respeitá-las fielmente.
Fig. 182. Lixiviador Vejamos, pois, as regras a observar nesta operação, conforme
de grande estão descritas nas Generalidades da Farmacopeia Portuguesa IV, as
capacidade
quais passamos a transcrever seguidamente: «Humedece-se e mistura-se a
droga em pó, da tenuidade indicada, com o dissolvente, salvo se este for o
éter ou outro igualmente volátil, passa-se por um crivo de 80 malhas por cm2 e deixu-se macerar por
2 a 4 horas em vaso tapado- coloca-se o deslocador em posição vertical, com o auxílio de um suporte,
e adapta-se ao fundo do aparelho um tampão de algodão hidrófilo de 3 a 4 cm de espessura;
introduz-se depois
341

o pó humedecido, compmnindo-o ligeiramente por tornia a tornar a massa homogénea e


cobre-se com um disco do papel de lïltro ou musselina. que se fixa com uma camada fin a
de areia lavada ou um diafragma de pequenos orifícios. Ahre-se a torneira e verte -se. a
pouco e pouco, o di.s.solveme no deslocador, de modo a obler. sobre a areia ou o diafragma,
uma camada liquida de 2 a 3 cm de espessura; quando o pó estivei' embebido e começar o
escoamento pelo tubo, fecha-se a torneira e deixa-se macerar novamente por tempo
variável, conforme as drogas. Abre-se outra vê/ a torneira e deixa-se escapar o líquido
por forma que em 24 horas se ohte nha uma vê/ e meia o peso do pó. mantendo constante o
nível tio líquido sobre a areia ou o diafragma. A deslocação considera-se terminada
quando o líquido sair incolor, ou quase incolor, e st-rn cheiro e sabor da tlro.ua1>.
A leitura tias regras acabadas de transcrever sugere que a técnica da lixivim-ão
pode dividir-se em cinco /í/w.v (j/.\ii/ii(i\. a saber:

1 —Pulveri/ação da droga.
2 ~-Unmedeeimento do pó.
3—Acondicionamento do pó humedecido no l i \ i \ i a d o r e adição do solvente.
4—Período de maceração.
5 — Deslocação do solvente, regulada de modo a ohícr-se um determinado peso de
l i x i v i a d o n u m período de tempo prefix ad o.

Veiamos, agora, a ra/.ão de ser de toda esta série de operações.

7.6.2.6.1 .5.2.1. Pulverização da droga

Para que a percolaçiu) s eja o mais efica/ possível, i s t o é. para que ela p er mita obter
uma boa extracção da droga, torna-se necessário que esta se apresente f i n a m en t e dividida.
Lembramos que ao d i s cu t i r o mecanismo da extracção (pág. 327). t i ve m o s ocasião de d i / er
que esta depende, principalmente, do um fenómeno de difusão, o qual só é possível processar-se
em boas condições se a mamría das paredes celulares e s t i v er fragmentada. Como emào
assinalámos, esle faclo é de primordial importância para que se dê um contacto directo tio
solvente com as substancias solúveis do conteúdo celula r. além de que elimina as barreiras
que dificultam a livre passagem da solução assim formada para o exterior.
Teoricamente, portanto, haverá Ioda a vantagem em q u e a droga seja r cd u / i d a a um
estado de extrema divi são, mas na pratica o grau de pulvcri/a cão está condicionado por
vários factores de ordem geral ou particulares a cada droga.
Assim, considerando o assunto na generalidade, é evidente que a temiulude do pó
dependerá, fundamentalmente, da nalure/a tia droga e do solvente e a i n d a do g r a u de
342

extracção que se pretende obter. De facto, é ponto assome que deve ;t tender-se, em primeiro
lugar, à textura da droga, devendo esta ser lauto ma is hnameme d i v i d i d a quanto mais
compactos c duros íbrem os seus tecidos. Além disso, n s olubili dad e dos constituintes a
e x t r a i r é também um dos elementos que condicionam o grau de dmsáo da droga, pois se esta
contiver constituintes pouco ou dificilmente solúveis devera, como é lógico, ser redu/ida a pó
mais léniie do que outra que ceda facilmente os seus princípios.
Por outro lado, lambt:ni a nalure/a do solvente condiciona a lenuidade do pó. a qual
deverá ser maior desde que aquele não embeba os tecidos e lenha, por isso. dificuldade em
peneirar neles. Uma vê/, porém, que o dissolvente seja facilmente absorvido pelas células e as
laca inchar, já não se to rna necessário e e, ate. contraproducente que a substância se
apresente em partículas de dimensões n m i t o redu/idas. Concretizando, diremos que urna
li.ïiv/ii^tif com álcool etílico exige uma maior divisão da droga, pois este solvente torna os
tecidos mais rijos e penetra neles com d if ic u ld ade . ao passo que se praticarmos a operarão
com um álcool de t raça graduação esta aconselhado usar a droga mais grosseiramente
p ulve ri/n da . unia v c/ que esta e íacilmenic peneiradu e incha em presença de um
líquido desta nalure/a.
Pêlos motivos referidos na pág. 321, é evidente que quanto mais dividida uma droga se
apresentar mais lacil e rapidamente se obtém a sua extracção completa. Todavia, no caso da
i n i y i d í i J o há um limite a esse estado de d ivi são , o q u a l não pode ser ultrapassado sem se
correr o risco de perturbar o andamento normal da operação, pois nunca se deve esquecer
que um pó demasiadamente uno originara canalicuios muitos estreitos que dificultarão ou
poderão, mesmo, impedir o deslocamento do solvente ao longo da droga.
Do que acabámos de di/.er, conclui-se que o estado de div isào de uma droga a
••ubmeter á f ! \ i v u t ( ' ú o é um dos pomos capitais desla operarão, mas como esla depen-
dente de vários factores é praticamente impossível estabelecer uma regia gera! aplicável a
todas as substâncias, Daí. a farmacopeia especificar, para cada caso. a lenuidade do pó
a usar.

7.6.2 6 1.5.2.2 Humedecimento do pó

Como as drogas vegetais são cxsicadas, os respectivos sucos celulares enconlram--se


redu/idos a uma massa sólida e o volume das células esta, em geral, coiisidera-velmenle
diminuído. Mercê disso, quando são postas em contacto com um solvente incham de modo
mais ou menos acentuado, conforme a n a t u r v / a daquele.
Ora. se a droga fosse posta no l ixi vi ad o r sem prévio luimedecimento, uma vê/ que ela
liça mais ou menos comprimida, o aumento de volu me resultante da sua embebícão
343

só poderia dar-se à custa dos interstícios que separam os grânulos do pó. Este facto é ainda agravado
pela pressão hidrostática a que a droga está sujeita pela camada líquida a ela sobreposta, a qual é
especialmente de considerar nas partes inferiores do lixívia-dor, pelo que, em tais circunstâncias,
haveria o perigo de se formar uma barreira sem soluções de continuidade através das quais o
solvente pudesse caminhar.
É, pois, para evitar isto que as drogas a lixiviar são humedecidas, previamente, com o mesmo
líquido utilizado na sua percolação. Em geral, adiciona-se ao pó, nesta fase, entre 40 a 50% do seu
peso de solvente, cifra essa que na maioria dos casos anda, porém, à volta de 50%, tendo-se o
cuidado de malaxar o produto humedecido com a mão, para que fique perfeita e igualmente molhado.
Força-se, então, a massa assim obtida a passar através de um crivo com 80 malhas por cm2,
procurando-se, com isto, desfazer quaisquer grumos resultantes da aglomeração das partículas a
quando do humedccimcnto e, ao mesmo tempo, conseguir grânulos mais homogéneos. Este granulado
é colocado, seguidamente, num recipiente de boca larga, provido de tampa, como uma caneca de
porcelana, onde é conservado, em regra, durante 2 horas, e, por vezes, mais.
Esta operação só é dispensada quando o solvente utilizado é o éter ou um líquido igualmente
volátil, pois o seu baixo ponto de ebulição, aliado ao seu fraco poder de embebição, torna inútil que
se proceda ao humedeci mento.

7.6.2.6.1.5.2.3 Acondicionamento do pó no llxiviador

Colocado o lixiviador na posição vertical, para o que se pode usar um suporte metálico
apropriado ou se adapta o aparelho ao recipiente inferior destinado a receber o líquido deslocado,
introduz-se nele um fragmento de algodão hidrófilo, de modo a formar uma camada de 3 a 4 cm de
espessura. Sobre o algodão pode deitar-se um pouco de areia lavada, ou, como outros preferem,
lançar directamente sobre aquele a droga humedecida.
Esta deverá ser introduzida no lixiviador em pequenas porções de cada vez e ligeira mas
uniformemente comprimida com um calcador, repetindo-se esta operação sempre que se coloque no
aparelho nova quantidade de droga humedecida. Quando toda ela tiver sido transferida para o
lixiviador, cobre-se a sua superfície com uma rodela de papel de filtro e sobrepõe-se a esta uma
delgada camada de areia ou um disco perfurado de porcelana ou de metal, a fim de evitar que a
adição do solvente provoque a formação de crateras na droga e levante as partículas do pó já
comprimido (Fig. 183).
O acondicionamento da substância no lixiviador constitui, sem dúvida, a fase mais delicada de
todo o conjunto de operações que formam a lixiviação. Assim, caso a compressão do pó tiver sido
convenientemente executada, o solvente descerá vagarosamente e de modo regular ao longo da droga
humedecida, mas se o pó estiver desi-
344

gualmente comprimido ver-se-á o solvente caminhar mais depressa através de chaminés


correspondentes aos espaços onde as partículas da droga estiverem mais soltas (Fig. 183 D).

Disco perfurado
—Camada de areia
P;ipel de filtro

—— Droga humedecida

Camada de areia
Algodão hidrófilo

Fig. 183. A: lixiviador preparado e carregado de droga; B: lixiviador


devidamente carregado no que diz respeito à densidade das
camadas; C: deslocação regular do líquido num lixiviador bem
carregado; D; deslocação irregular do líquido num aparelho mal
carregado (segundo N. E. Foss, American Pharmacy)

Por outro lado, desde que o pó não esteja suficientemente comprimido, o dissolvente passará
através dele com excessiva velocidade, acontecendo precisamente o contrário se o pó tiver sido muito
comprimido. Trata-se, como se vê, de um passo da técnica bastante delicado e embora seja possível
afirmar que, regra geral, as drogas de natureza esponjosa ou as destinadas a serem extraídas por
líquidos aquosos devam ser
345

menos comprimidas do que aquelas com tecidos duros e compactos ou a extrair pelo álcool, a verdade
é que a sua correcta execução apenas se alcança através da prática.
Uma vez introduzida e devidamente acondicionada no lixiviador toda a carga de pó a
extrair, lança-sc o solvente sobre este, procurando manter sobre a areia ou o diafragma uma
camada líquida de 2 a 3 cm de espessura, conservando-se aberto o dispositivo que comanda a saída
do aparelho até o solvente começar a escoar pelo tubo. Neste momento, fecha-se o referido
dispositivo, tapa-se o l i x i v i a d o r e inicia-se a fase seguinte.

7.6.2.6.1.5.2.4. Período de maceração

Desde que toda a massa do pó esteja perfeitamente embebida pelo solvente e este atinja uma
altura de 2 a 3 cm acima da areia ou do diafragma, deixa-se o pó a macerar durante um período
variável.
Este depende, principalmente, da natureza da droga e do solvente a utilizar, motivo por que a
nossa anterior farmacopeia estabelece a sua duração para cada caso específico, se bem que, em
geral, seja de 24 horas quando se trate da preparação de tinturas e de 48 horas no caso de alguns
extractos.
Esta maceração dostina-se a permitir a perfeita embebição da droga pelo solvente e a
dissolução dos respectivos constituintes naquele, devendo ser suficientemente prolongada para que
os fenómenos de difusão se dêem até se obler igualdade de concentração entre os líquidos situados
dentro e fora das células. Uma vez atingido este ponlo não há qualquer vantagem em prolongar por
mais tempo a maceração, e, a partir deste momento, pode íniciar-se a percolação propriamente dita.

7.6.2.6.1.5.2.5. Lixiviação e ritmo de deslocação do solvente

Terminada a maceração a que nos referimos na alínea precedente, abre-se o dispositivo


(torneira ou pinça) que veda o percolador na sua par(e inferior e ínícia-se, então, a lixiviação
propriamente dita.
Nesta fase é necessário regular cuidadosamente o ritmo de deslocação do solvente, pois dele
depende a eficiência deste processo extractivo. De facto, se o solvente se desloca rapidamente
através da droga não terá tempo de penetrar nas respectivas células e dissolver as substâncias a
extrair; por outro lado, se a sua marcha for demasiadamente lenta, o líquido pode tornar-se
extremamente viscoso devido à grande quantidade de substâncias dissolvidas e ter;- dificuldade
em atravessar as camadas inferiores da droga, podendo acontecer que, por vezes, deixe mesmo de
f l u i r do produto a lixiviar.
346

Compreende-se, por isso. a importância de que se reveste a manutenção do ritmo


adequado da deslocação do solvente, c, assim, a Farmacopeia Portuguesa IV determina
que a velocidade de escoamento deve ser tal que em cada período í/r 24 horas se
ohíenha f/f// peso de //.v/v/í/f A J igual a unta vez e meia o peso da substância inlrodu-
lida no aparelho.
Quer isto dizer que se partirmos, por exemplo, de 100 g de droga, teremos que } obter 150
g de lixiviado em 24 horas, e, portanto, toma-se necessário que regulemos í a abertura da
torneira do l i x i viador de modo que esta deixe sair. por min uto , um : número determinado de
gotas de líquido para que ao fim de 24 horas tt.ihamos reco- í Ihido 150 g de extracto.
O problema consiste, por conseguinte, uma vê/ conhecido o peso de um certo
número de gotas do lixiviado, cm calcular o número de gotas do mesmo a recolher cm
24 horas, correspondente a uma vez e meia o peso da droga a extrair, e regular, depois,
a abertura da torneira, de molde a conseguir-se o pretendido ritmo de escoamento. l
Vejamos um caso concreto.[
Suponhamos que pretendíamos lixiviar uma droga, XI, gotas de cujo lixiviado
pesavam l g. Partindo de 100 g daquela, deveremos oblcr. como acima dissemos. 150 j
g de extracto por cada 24 horas, o que corresponderá a 6000 gotas de líquido em igual j
período ou 4 golas por minuto, pois 6000: (240 x 60) = 4,Io. No exemplo dado, é \\
necessário, portanto, manter um ritmo de escoamento de 4 gotas por minuto para que
no período de 24 horas se obtenham 150 g de lixiviado.

Para determinar o número de gotas a recolher por minuto pode recorrer-se ài


Tahela III (pág. 25), e no caso do produto a l i xi v i ar nào figurar nela teremos que deter-
minar quantas gotas correspondem a l g de lixiviado.
Entretanto, deve assinalar-se que o cálculo feito deste modo c meramente teórico,
! pois bascia-sc na premissa de que o peso das gotas do lixi viad o se mantém inalterável
durante toda a lixiviação. Ora, isto não é verdadeiro, acontecendo, como c lógico, que
as primeiras fracções do extracto estão bastante mais concentradas do que as subsequen-
temente recolhidas. Deste modo, a densidade do líquido vai diminuindo à medida qu•
a lixiviação prossegue, resultando disso que o número de gotas correspondente a l
irá aumentando à medida que decorre o icmpo de esgotamento.
A Farmacopeia Americana, por exemplo, adopta outro critério para controlar
escoamento, fixando três velocidades distintas, assim definidas: percolação vagarosa, a
qual não fornece mais de l ml de líquido por minuto; percolação a ritmo moderado,
originando entre l a 3 ml de lixiviado, e percolação rápida, a que origina entre 3 e
5 ml por minuto. Estamos, assim, perante uma atitude muito menos rígida que a da
nossa anterior farmacopeia, que apenas admite uma única velocidade de deslocação,
qualquer que seja a droga e respectiva quantidade a extrair \
Ora. considera-se que esse ritmo não deve ser uniforme mas dependente das
quantidades de droga e de solvente postas em jogo, devendo aquele tomar-se tanto mais
rápido quanto maiores elas forem. Assim. DENOÊL cita as seguintes velocidades, cxpres-
347

sãs em golas de lixiviado poi minulo, a respeitar na lixiviação dos seguintes pesos de
droga:
Peso de droga N." de. gotas por minuto
100 g 1-2
l 000 » 10-15
2000 » 20-25
10000 » 40-70

762.6.1.5.2.6. Determinação do fim da lixiviação

Iniciada a deslocação do solvente e regulada a respectiva velocidade, surge, então, o problema


de saber-se durante quanto tempo deve manter-se a extracção. De um modo geral, a lixiviação é
sempre uma operação demorada, que exige alguns dias para se completar, estabelecendo as
farmacopeias, para cada forma galénica, a quantidade de lixiviado a obter a partir de um
determinado peso de droga.
Entretanto, pode dizer-se que, em regra, a lixiviação deve prosseguir até ao momento em que o
líquido deixe de dissolver qualquer dos compostos existentes no produto submetido à operação.
A indicação disso pode ser obtida de diversas maneiras e, assim, a Farmacopeia Portuguesa IV.
como já tivemos ocasião de dizer (pág. 341), considera a lixiviação terminada quando o líquido sair
do lixiviado praticamente incolor e sem cheiro ou sabor da droga.
Outro processo utilizado para determinar o fim da operação consiste em evaporar um pequeno
volume de lixiviado num vidro de relógio, dando-se a extracção por finda quando não se obtiver
resíduo apreciável.
Tratando-se de drogas contendo princípios de natureza conhecida e facilmente pesquisáveis,
pode proceder-se u sua identificação na solução extractiva, interrompendo-se a extracção no
momento em que a sua presença no lixiviado deixe de ser reconhecida. Assim, por exemplo, é
relativamente fácil pesquisar alcalóides num percolado de uma droga contendo aqueles compostos,
para o que basta evaporar umas gotas de extracto, dissolver o resíduo num pequeno volume de um
ácido mineral diluído e adicionar à solução um reagente geral, como o de BOUCHARDAT, de MAYF.R ou de
BERTRAND. A não obtenção de um precipitado significa a ausência de tais substâncias, o que indica que
a operação pode ser dada como concluída.

7.6.2.6 1 5.2.7 Solventes usados na lixiviação

Do ponto de vista farmacêutico, o álcool de várias graduações é, praticamente, o único


solvente utilizado na lixiviação. A cie se recorre, de facto, para a preparação de inúmeras tinturas e
extractos e só muito raramente se empregam outros líquidos.
348

Assim, o éter é utili /ado IKI preparação do extracto de leio macho, devendo empregar-se,
neste caso, un i hxiviador como o representado na l ' i g . !S1 . pág. 340, que impede a
evaporação do solvente.
A água c de Iodos os líquidos o menos indicado como solvente na li xi via ção , pois
grande número de drogas, sobretudo aquelas ricus ctn substâncias mucilaginosas. incha
quando cm contacto com ela, resultando disso a obstrução dos eanalículos c a impos-
sibilidade de. nestas condições, haver deslocamento de solvente ao longo da droga a extrair. A
Farmacopeia Portuguesa IV todavia, ainda descreve uma preparação obtida por lixiviação
com água: O í'\!mt'/i> de crura^et/i de centeio ou ergoíino, mas repare --se que neste caso a
droga é ulil i/n ch t no estado de pó grosso, a f i m de se e v i t a r que seja demasiadamente
embebida pela água.
Como já referimos na pág. 322. modernamente tem-se proposto adicionar ao solvente um
agente tensioaclivo, constituindo tal prática a maioi intnjcão registada, ultima ment e, na
tecnologia da extracção.

7.6.2.6.1 6 Diacolação

Este processo de extracção é uma var iant e da li xi via ção e disiingue-se dela. fun-
damentalmente, pelo lacto de a droga ser acondicionada n u m ou numa série de tubos compridos
e estreitos e o líquido ser forçado a atravessar, sob pressão, o produto a
extrair, sendo a velocidade de deslocação do
solvente, nesta técnica, accnluadamente inferior à da
percolação vulgar.
Hm vez de empregar um único tubo. o c]uai.
necessariamente, leria que ser baslanle comprido e, por
isso. pouco manejável. prefere--se, geralmente, u t i
li/ a r uma série deles, conforme se vê na Fig. 184, que
representa um diacolador de BRKDDÏN.
As drogas a extrair por este processo
devem ser redu/idas a pó grosseiro, a f i m de
não oporem grande resistência à passagem do
líquido e são tratadas como usualmente, islo e,
humedecidas e deixadas a macerar no aparelho
dur.mie .il guni tempo. O solvente passa de um
t u b o para o o u i i o por acção da pressão aplicada
no primeiro t u bo da série, acontecendo, como
se depreende da Fig. 1S4. que umas ve/es alra-
Fig. 184. Q.acoiddor de Breddm vessa ü droga
de baixo para cima e outras
349

vezes no sentido oposto, sendo o ritmo do deslocamento de cerca de 6 gotas por minuto.
A diacolação apresenta certos inconvenientes de ordem prática que têm obstado à sua
generalização como técnica extractiva, sendo o principal deles a dificuldade que o líquido
experimenta em atravessar a enorme espessura do material a extrair, sobretudo quando este tem
tendência a aumentar de volume por embebição.

7.6.2.6.1.7 Evacolação

Este processo extractivo foi proposto por KESSLER em 1934, diferindo da diacolação pela
circunstância de o Ifq uido ser deslocado através da droga pelo vazio que se faz no frasco onde se
recebe o extracto.
Na Fig. 185 representa-se um evacolador de KESSLER, aparelho relativamente simples e fácil de
improvisar. O tubo T destina-se a receber a droga a extrair e deve ter um diâmetro tal que 100 g de
produto atinjam no tubo uma altura de 85 a 90 cm.
Desde que a droga não tenha tendência a inchar, pode dispensar-se o
seu humedecimcnlo prévio; caso contrário, impõe-
-se praticar esta operação, que, no entanto, deveria ser feita empregando
apenas uma quantidade de líquido correspondente a 1/5 do peso do
material a extrair.
Antes de começar a operação propriamente dita deve tomar-
-se a precaução de marcar no frasco onde se faz o vazio, V, o nível
correspondente ao volume do solvente usado na extracção. Posto isto,
coloca-se o líquido no reservatório F, fecha-se a pinça a e liga-se o
aparelho a uma máquina de vácuo, de modo a extrair o melhor possível o
ar interposto na massa da droga. Feito o vazio, fecha-se a torneira d e abre-se
a, de modo que o tluxo de líquido em G seja de l gota por minuto.
Quando o líquido tiver atravessado toda a droga, fecha-se a torneira b
e deixa-se que suba no tubo até formar uma camada de l cm sobre a superfície
do material, momento em que se fecha igualmente a torneira a. A droga é Fig. 185.
mantida em maceração no solvente durante 24 horas e só então se abre a Evacolador de
Kessler
torneira b o
suficiente para que o líquido passe para o recipiente V à razão de l gota por minuto, sendo
necessário abrir, igualmente, a para se substituir o líquido que vai sendo recolhido em V.
Quando todo o líquido do recipiente F tiver passado para o lubo e nele tenha entrado algum ar,
fecha-se a torneira a e coloca-se no frasco F água destilada. Novamente se abre a, deixando passar a
água para o tubo contendo a droga, até aquela
350

formar sobre esta uma ligeira camada, regulando-se, a partir deste momento, o fluxo da água, que
deve ser, igualmente, de l gota por minuto. Deste modo, a água vai deslocando na sua frente o
solvente que ficou a embeber a droga, sendo fácil determinar a posição a que se encontram os
líquidos no tubo, pois na zona de contacto de ambos forma-se um anel turvo, quase sempre visível.
Torna-se, assim, possível seguir o deslocamento do solvente, mas quando tal não aconteça deve
deixar-se correr a água através do tubo até que no vaso V se tenha recolhido o volume de solvente
inicialmente posto em F. Conseguido isto, interrompe-se a operação fechando-se a torneira í- ou b e
abrindo d, a fim de restabelecer a pressão.

7.6.2.6.1.8. Extracção em Soxhlet

É utilizada para extrair sólidos com solventes voláteis e exige o emprego de um aparelho especial
como o representado na fig. 186. Tal aparelho é constituído por três partes fundamentais; e permite a
extracção contínua de um sólido colocado na alonga B à custa de um líquido existente no balão A. A
característica mais saliente deste processo é que apenas exige um volume relativamente reduzido de
líquido para se extrair por completo um determinado sólido. Este, depois de
convenientemente pulverizado, é acondicionado na parte B do aparelho de SOXHLET,
procedendo-se como indicámos a propósito do carregamento dos lixivia-dores, ou,
então, é colocado dentro de cartuchos especiais que são, D depois, introduzidos na
referida alonga B. O solvente é posto no. balão A e aquecido à ebulição, escapando-
se os respectivos vapores pelo tubo situado lateralmente à esquerda do aparelho, até
chegarem à parte superior do mesmo, onde são condensados pelo refrigerante C. O
líquido resultante desta condensação cai, depois, gota a gota, sobre a droga em B,
onde se acumula e exerce a sua acção dissolvente. A medida que o líquido vai subindo
na parte B do SOXHLET sobe, igualmente, de nível no tubo lateral direito. Ora, como
este é um sifão, logo que o líquido atinja o ponto D, dá-se a descarga do recipiente B
e todo ou quase todo o líquido passa para o balão inferior A.
Tendo regressado ao balão A, o solvente é novamente evaporado, condensado,
posto em contacto com a droga situada em B e descarregado através do sifão lateral,
repetindo-se este ciclo tantas vezes quantas as necessárias para que o produto seja
complctamente extraído.
Fig. 186. Como se compreende, o aquecimento a que está sujeito o balão A depende do
Aparelho de ponto de ebulição do solvente utilizado e este, ao vaporizar-se, deixa aderentes às
Soxhlet
paredes do referido balão as substâncias extraídas. Deste modo, em cada ciclo da
351

operação a droga a extrair está sempre em contacto com líquido constantemente renovado e
conservando, por isso, intactas as suas propriedades dissolventes. Neste facto reside, aliás, a
explicação do motivo por que o aparelho de SOXHLET permite uma extracção altamente eficiente
empregando uma quantidade tão dimunuta de dissolvente em comparação com a que é necessário
utilizar nas outras técnicas para se obter o mesmo grau de esgotamento.

7.6.2.6.1.9. Outros métodos de extracção de sólidos

Além dos processos atrás refridos, outros métodos de extracção de drogas têm sido propostos
nos últimos anos, os quais, porém, ainda não foram reconhecidos como oficiais por qualquer
farmacopeia, pelo que nos referiremos a eles muito resumidamente.
Assim, por exemplo, BAY e GRISVOLD sugeriram uma técnica para a extracção de folhas de
beladona baseada na sua desintegração num extractor de .sumo, munidos de palhetas, usando a
água como solvente.
Por outro turno, GREGO e DUMEZ propuseram uma técnica especial de extracção de várias drogas
vegetais, como a noz-vómica, beladona, meimendro, estramónio, etc., submetendo-as à acção do
solvente aquecido sob pressão.
Também DEAN et ai. prepararam tinturas de beladona e meimendro recorrendo ao uso de um
moinho coloidal, ao passo que HEAD ef ai e BOSE et ai. puseram em prática técnicas extractivas
para a quina e a rauvólfia, baseadas no emprego de ultra--sons.

7.6.2.7. Extracção de líquidos

Quando um composto é mais soiúvel na água do que num solvente orgânico e o quisermos
extrair de uma solução aquosa com um liquido destes, é evidenle que tal extracção só poderá ser
realizada em condições muito precárias e, mesmo assim, obrigando a utilizar volumes
consideráveis de solvente orgânico.
Entretanto, a operação torna-se muito mais fácil de praticar e exige muito menor quantidade de
solvente se utilizarmos um aparelho de extracção contínua líquido-- líquido, como aqueles
representados na Fig. IS7, A e B, cuja concepção e funcionamento são semelhantes aos do SOXHLET.
O aparelho A é utilizado para extracção de soluções aquosas com um solvente menos denso
que a água, sendo o líquido extractor, depois de condensado, conduzido através do funil até ao fundo
do tubo, pelo que é, depois, obrigado a passar de baixo para cima ao longo da camada aquosa,
retirando desta, no decurso da sua marcha, os constituintes nele solúveis. Logo que a sua altura no
extractor atinge o nível da
352

tubuladura lateral, passa para o balão a ela adaptado, onde é, depois, vaporizado por aquecimento,
deixando aí a substância extraída, repetindo-se a operação tantas vezes quantas as necessárias.

Fig. 187. Aparelhos para extracção líquido-líquido. A, para líquidos menos densos que
a água; B, para líquidos mais densos que a água

Por sua vez, o aparelho B usa-se com solventes orgânicos mais densos que a solução aquosa e,
neste caso, o movimento do líquido é descendente, fazendo-se o seu escoamento para o balão lateral
pelo tubo situado na parle inferior do extractor, que funciona de sifão.

BIBLIOGRAFIA

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354
355

Esterilização

8.1. INTRODUÇÃO

Entende-se por esterilização a completa destruição ou remoção de todas as formas de vida,


incluindo os esporos e os vírus, existentes num material qualquer.
Este é o conceito de esterilização do ponto de vista bacteriológico, mas acontece que os meios
capazes de levarem a tal desiderato são em número restrito, não sendo raro utilizarem-se técnicas
que estão longe de conduzirem à esterilização segundo a definição atrás enunciada, pois se limitam
a destruírem, apenas, certos microrganismos e não a totalidade dos que possam existir no material
submetido à operação.
Entretanto, é costume incluir os processos que apenas originam a destruição parcial dos
germes entre as técnicas da esterilização, apesar de hoje se verificar, por parle de certas entidades
responsáveis, uma firme atitude de reprovação contra esta prática tão generalizada. E embora
concordemos com as limitações que se devem impor ao emprego do termo esterilização, somos
forçados a seguir a orientação tradicional, unia vez que não existe ainda uma nomenclatura precisa
e oficial para designar tais métodos.
Se bem que a noção de esterilização apenas se tenha tornado precisa na segunda metade do
século XIX, como resultado dos trabalhos de PASTLUR, a verdade é que ela já vinha sendo praticada
desde há bastantes anos atrás. Na realidade, foi SPAI I . AN/. ANI , um padre italiano que viveu no século
XVIII, quem fez a demonstração inequívoca de que uma infusão vegetal era rapidamente invadida
por microrganismos quando não tivesse sido aquecida, resultando disso a sua alteração, e que a
mesma infusão, aquecida à fervura, n u m recipiente fechado, já não apresentava desenvolvimento
microbiano.
Mais tarde, o francês APPKRI, aproveitando os processos empíricos até aí utilizados, idealizou
e pôs em prática uma técnica de conservação de alimentos, a qual consistia em aquecer as
substâncias alimentares alteráveis, acondicionadas em recipientes fechados, à temperatura do banho
de água à ebulição. Assim se tornou possível manter inalterados muitos alimentos durante um lapso
de tempo considerável desde que, uma vez submetidos ao aquecimento, não contactassem com o ar.
356

Nos meados do século XIX , TYNDALL retomou as experiências de SPALI.ANZANI e precisou as


condições em que um líquido rico em materiais nutritivos perdia a propriedade de fermentar após ter
sido submetido a um aquecimento. Este célebre físico inglês observou ainda um facto da maior
relevância no campo da esterilização, tendo demonstrado que o aquecimento, mesmo prolongado, de
um líquido aquoso à temperatura da ebulição não destruía todos os microrganismos nele existentes,
nomeadamente os esporos, e que um aquecimento descontínuo efectuado em três sessões, espaçadas
24 horas umas das outras, originava a destruição dessas formas de resistência. Assim estava
descoberto um dos primeiros processos práticos de esterilização pelo calor húmido, conhecido por
tindalização, que tão largo uso teve até há cerca de duas dezenas de anos atrás.
Porém, o estabelecimento das bases fundamentais sobre que assentam as técnicas de
esterilização pelo calor deve-se ao genial PASTEUR. Foi este cientista quem demonstrou que os agentes
da então denominada fermentação eram seres vivos, microscópicos, os quais se desenvolviam nas
soluções aquosas nutritivas, provocando, mercê disso, a sua alteração. PASTEÜ;K provou, também, que
esses seres microscópicos podiam ser mortos pelo calor, que o tempo necessário para os matar era
tanto menor quanto mais elevada a temperatura a que eram submetidos e que, mantendo constante a
temperatura, o tempo de aquecimento para se obter a morte dos germes variava consoante a sua
natureza.
Depois dos memoráveis trabalhos de PASTF.UR, as técnicas de esterilização pelo calor foram
sendo sucessivamente aperfeiçoadas e tornaram-se mais precisas com o aparecimento da auloclavc,
o aparelho universalmente utilizado para a destruição dos microrganismos pelo vapor de água sob
pressão idealizado por CHAMBERLAND, discípulo e colaborador daquele.

8.2. MECANISMO DA DESTRUIÇÃO DOS GERMES PELO CALOR.


TERMOSSENSIBILIDADE

Os microrganismos, à semelhança dos outros seres vivos, são constituídos por pro-toplasma,
uma mistura heterogénea de várias substâncias em solução verdadeira ou no estado coloidal. Ora,
entre os componentes fundamentais do protoplasma contam-se substâncias de natureza proteica, as
quais fazem parte integrante dos enzimas que comandam todas as funções vitais das células. Esta
circunstância torna os referidos sistemas enzimáticos sensíveis aos agentes desnaturantes das
proteínas, sendo aqueles, como resullado disso, total ou parcialmente inactivados pelo calor, outros
agentes físicos e por variadíssimos compostos químicos. E quando tal aconteça as complexas
reacções melabúlicas dependentes dos enzimas atingidos serão afectadas em grau corres-
357

pendente à desnaturação por eles sofrida, o que pode levar à morte ou, pelo menos, a uma
diminuição mais ou menos acentuada da vitalidade celular.
Na realidade, é hoje um facto geralmente admitido que o modo de acção do calor húmido sobre
os microrganismos é muito semelhante ao que se passa com a coagulação das proteínas por aquele
agente, estando muitos investigadores que se têm dedicado ao esludo deste fenómeno de acordo em
que a morte, pelo calor húmido, é devida a uma desnaturação das substâncias proteicas que
constituem as células microbianas. O calor seco, por seu turno, parece actuar, primariamente, por
um fenómeno de oxidação.
Repare-se, no entanto, que a sensibilidade dos diferentes microrganismos ao calor não é a
mesma, variando, além disso, para uma mesma espécie, com diversos factores, como o seu grau de
hidratação, idade da cultura, pH e composição do meio, etc.
Os germes presentes num produto a esterilizar pertencem, normalmente, aos grupos das
bactérias e fungos, incluindo as leveduras. Contudo, alguns microrganismos, sobretudo bactérias,
além de se apresentarem sob a forma vegetativa, isto é, sob a forma predominante quando o meio
lhes c favorável e lhes permite uma rápida multiplicação, originam, em certas circunstâncias,
esporos ou formas de resixíênda.
Ora, sucede que as formas esporuladas são extraordinariamente mais resistentes à acção letal
do calor do que as respectivas formas vegetativas e. quer umas, quer outras, reagem diferentemente
aquele agente físico conforme se encontrem hidratadas ou desidratadas. Assim, pode dizer-se que, de um
modo geral, as formas vegetativas são destruídas em meio aquoso por aquecimento a cerca de 60°C
e que os esporos são destruídos, em idênticas condições, quando aquecidos a 100-120°C. Em meio
anidro, porém, todos os microrganismos adquirem uma acentuada resistência ao calor c, por isso,
uma esterilização por calor seco deve ser feita a 181>'C, pois só a esta temperatura poderemos ter a
certeza da destruição dos esporos, cuja presença é sempre de considerar. Por outro lado, c curioso
realçar que as condições que asseguram a esterilização em meio aquoso — 60"C para as formas
vegetativas e 120"C para os esporos — correspondem, respectivamente, e com muito aproximação,
as temperaturas a que as proteínas são desnaturadas por coagulação quando hidratadas ou
dessecadas, facto que tem sido evocado em apoio do modo de acção do calor húmido sobre as
células microbianas, conforme atrás foi explanado.
Esta diferente termossensibilidade dos vários microrganismos constitui um dos mais delicados
problemas que se levantam no campo da esterilização, uma vez que torna impossível a aplicação
generalizada de uma única técnica a todo e qualquer material que se pretenda tornar estéril. De
facto, ao contrário do que em tempos se pensava, está actualmente demonstrado que, em razão da
diferente termossensibilidade dos diversos germes, um determinado processo de esterilização apenas
oferece segurança quando aplicado sempre nas mesmas condições ao mesmo tipo de material,
inicialmente infectado com os mesmos microrganismos, presentes na mesma concentrarão.
E como na prática se ignora a natureza dos germes existentes num produto a esterilizar e o seu
grau de poluição, jamais se pode ter a certeza, nas condições geral-
358

mente adoptadas, de que a esterilização é obtida com segurança absoluta, Daí o motivo por que se
impõe o controlo da esterilidade das preparações farmacêuticas sujeitas a uma técnica de
esterilização.
Como tivemos ocasião de dizer anteriormente, PASTEUR foi o primeiro a demonstrar que a
destruição dos microrganismos pelo calor é função de dois factores que actuam intimamente ligados:
temperatura e tempo de aquecimento. Por isso tem-se procurado determinar a termos sensibilidade
dos diferentes germes tendo em conta a actuação simultânea dos referidos factores, de modo a
exprimi-la em valores numéricos e tornar possível estabelecer comparações.
A princípio, utilizou-se para esse fim o chamado ponto térmico letal, definido como sendo a
mais baixa temperatura capaz de matar em 10 minutos os germes numa suspensão aquosa de uma
determinada bactéria, substituído, mais recentemente, pela noção de tempo térmico letal,
considerado como o mais curto período de lempo necessário para matar, a uma certa temperatura,
todos os microrganismos existentes numa dada suspensão.
Uma vez, porém, que os valores temperatura-tempo térmico letal estão dependentes de
numerosos factores, torna-se difícil oblerem-se dados iguais quando provenientes de laboratórios
diferentes, sendo, por isso, frequente encontrarem-se cifras referentes a uma mesma bactéria
variando de autor para autor. Apesar destas discrepâncias, o conhecimento do tempo térmico letal
pode, mesmo assim, prestar bons serviços na prática ao pretender estabelecer-se uma técnica de
esterilização para um determinado produto.

8.3. DINÂMICA DA ESTERILIZAÇÃO

Um dos motivos que levou ao abandono do conceito de ponto térmico letal foi o de que, no
dizer de PERKINS, nele estava implícita a ideia de que uma determinada temperatura provocava a
morte imediata de uma população bacteriana, independentemente do período de aquecimento, das
condições do meio e do estado fisiológico dos organismos que a constituem, o que é erróneo.
De facto, quando uma suspensão de microrganismos vivos é exposta a uma dose letal de calor,
o número destes decresce de modo regular. Na realidade, se imaginarmos que num determinado
meio existem microrganismos todos idênticos, poderemos admitir, e a experiénciam comprova-o, que
ao iniciarmos a esterilização todos eles têm a mesma sensibilidade ao efeito do calor. Se fixarmos
para a temperatura um valor constante, será necessário um certo tempo para que metade do número
de germes existente em l ml do meio seja morta.
Se o aquecimento não tiver alterado a estrutura dos germes não mortos, é evidente que a sua
probabilidade de serem atingidos por novo aquecimento será a mesma que inicialmente. Deste modo,
bastará o mesmo lempo de aquecimento para destruir metade
359

dos germes sobreviventes. Continuando o aquecimento, verificar-se-á sempre que é necessário um


mesmo tempo t para reduzir de metade o número de germes restantes, o que s ign if ic a que a lei da
destruição é exponencial e o seu período é t. Deste modo, se construirmos um gráfico inscrevendo em
ordenadas os logaritmos dos números de sobreviventes e em abcissas os respectivos tempos de
aquecimento, a curva obtida será uma l i n h a recta, conforme se pode ver na Fig. 188, 2 e 3.

Ternpo de aquecimento ern minutos


Fig. 188. Curvas típicas de sobrevivência. 1. ascósporos de pemcífio
aquecidos a 81 "C. A matoria é bastante sensível, registando-se a presença
de aigumas formas resistentes. 2 e 3. curvas referentes à destruição de
populações essencialmente uniformes

Uma vez que a esterilização pelo calor húmido segue, aparentemente, a lei das reacções de
primeira ordem, pode calcular-se a constante K do ritmo de destruição dos microrganismos
recorrendo à seguinte equação, na qual t é o tempo de contacto com o ugente esterilizante.

„ 2,303 número inicial de bactérias


K = ———— Io g número de bactérias no tempo t

Por seu turno, HIGUCHI e BUSSE derivaram e verificaram, experimentalmente, unia forma modificada da
clássica equação de ARRHENIUS para relacionarem o tempo de esterilização com ;i temperatura
absoluta, a qual é a seguinte:

0,219 A Ha
K
T
360

em que / é o tempo necessário para a esterilização, AHa representa o calor de activação exigido
para que se verifique a morte da espécie mais termorresistenle presente, em regra compreendido
entre 50-100 kcal, T é a temperatura absoluta da esterilização e K
é uma constante dependente do número e natureza da
N f espécie mais termorresistenle. Construindo um gráfico
utilizando, como coordenadas, o logaritmo do tempo
necessário para a esterilização e o recíproco da
\ \ \
temperatura absoluta da esterilização, obter-se-á uma
'Q \ ( linha recta, sendo os dado.s assim obtidos considerados
D de grande utilidade para se estabelecerem
-\ N
- K comparações entre tempos de esterilização a diferentes
N temperaturas e decidir quando é aconselhável operar a
\ * temperaturas mais altas ou mais baixas.
Por vezes, as curvas que relacionam a
50 60 /O 80 90 100 : destruição de um microrganismo em função do tempo
101201^0140100 de actuação do agente esterilizante a uma
Temperaturas (°C) determinada temperatura afastam-se, nitidamente,
Fig. 189. Relação entre tempo de daquelas representadas na Fig. 189, assumindo, então,
uma forma sigmoidal. Tal facto, no caso do agente u ti lizado ser o calor, é atribuído, entre outras
circunstâncias, ao facto de um aquecimento prolongado de uma população microbiana inicialmente
homogénea provocar o aparecimento de algumas formas termorresistentes.

8.4. MÉTODOS DE ESTERILIZAÇÃO

Os diversos métodos de esterilização podem classificar-se do seguinte modo; Métodos físicos


a) Calor
Calor seco Calor
húmido
b) Radiações
Radiações ionizantes Radiações
não ionizantes
c) Filtração

Métodos químicos
Formol
Óxido de etileno.
361

8.4.1. MÉTODOS FÍSICOS

Os métodos físicos de esterilização englobam todos aqueles processos em que se promove a


destruição dos germes por acção do calor ou de uma radiação e ainda as técnicas de filtração
através de superfícies filtrantes especiais, capazes de relerem os microrganismos existentes num
líquido que se pretende tornar estéril.

8.4.1.1. Esterilização pelo calor

O calor é o agente esterili/.ante mais usado, pois constit ui um processo simples,


económico e seguro para a destruição dos germes.
Relembremos, entretanto, que a sensibilidade dos diversos microrganismos à acção do calor
varia bastante. Como já dissemos, as formas vegetativas das bactérias são extremamente
lermossensívcis, sendo destruídas, quando em suspensão na agua, por aquecimento a 50-65"C,
durante poucos minutos. Já o mesmo não acontece, porém, com as formas de resistência — esporos
baclerianos — os quais, mesmo em meio aquoso, resistem, por vezes, ao aquecimento a 110-I20"C,
durante 10-15 minutos.
Os gráficos da í:ig. )8°< ilustram o que acabámos de afirmar. Por eles se verifica que a
relação entre o tempo de aquecimento necessário para assegurar a eslerili/ação e a temperatura é
tal que, no caso do bacilo tífico, ao aumentar-se a temperatura de 10"C, u tempo de aquecimento
para se conseguir a esterili/acão diminui, aproximadamente, de 100 para 1. Quando, porém, se
trata de esporos da bactéria termólïla. q ue é um dos germes mais resistentes à acção do calor, a um
aumento da temperatura de igualmente 10"C apenas corresponde urna diminuição do tempo
de esterilização de JO para I.
Por outro lado, os referidos gráficos mostram que a relação temperatura-tempo de
esterilização é aproximadamente linear quando se tomam em ordenadas os logaritmos dos tempos de
esterilização e em abcissas as temperaturas em graus C, o que significa que existe uma
proporcionalidade conslante entre a elevação da temperatura e a d i minuição do tempo de
esterilização dentro de uma larga escala de valores de temperatura.
Rsie facto tem grande importância, pois mostra que se uma esterilização é leila, por
exemplo, a I20°C, duruníe 10 minulos e a quisermos í a/e r a ))0"C, será necessário prolongar o
aquecimento de 50 vezes mais, isto é, durante 500 minulos ou cerca de K horas, de acordo com o
gráfico da Fig. 185 referente ao bacilo lermófilo. Hm procedimento destes, que poderá ser tido, à
primeira vista, como exagerado, juslifica-se plenamente. De facto, ao esterilizar-se um meio
qualquer, ignora se, em regra, a natureza das bactérias nele presentes, e, portanto, corno (ÏULLOÏ
acentua, deve proceder-se sempre corno se esse meio contivesse esporos e como se csle.s fossem de
re.sKlênciíi média. Ora, a esterilização é, no fundo, um caso de probabilidade, e. por isso, ao
prologar-se o tempo de aquecimento, diminui-se, simplesmente, a probabilidade do meio
362

conter ainda um germe vivo, pois se não se operar a 180°C em atmosfera seca, ou a 125°C em
presença de vapor de água, nunca se terá a certeza de eliminar todas as bactérias presentes desde
que, inicialmente, sejam em número elevado.
Acontece, de facto, que o número de germes presentes tem grande influência no sucesso da
esterilização. Assim, um meio contendo 1000 germes por ml poderá ser facilmente esterilizado por
aquecimento a 120°C durante 10 minutos, mas este processo de esterilização falhará se o mesmo
meio contiver 10000000 de germes por ml. Aliás, o facto é compreensível se nos lembrarmos que o
número de sobreviventes diminui exponencialmente com o tempo de aquecimento, de modo que, para
uma mesma temperatura, a duração da esterilização terá que ser tanto maior quanto maior o número
de microrganismos presentes no material a esterilizar.

8.4.1.1.1. Métodos de esterilização pelo calor seco

8.4.1.1.1.1. Aquecimento ao rubro vermelho

É aplicado à esterilização dos fios de metal usados em microbiologia para manuseamento de


germes.

8.4.1.1.1.2. Esterilização à chama

Difere do processo anterior porque os objectos a esterilizar são passados à chama, sem,
contudo, os deixar atingir o rubro. Aplica-se, por exemplo, à esterilização dos bocais de tubos,
frascos, balões, lâminas, etc.

8.4.1.1.1.3. Esterilização em estufa de ar quente

Constitui o método mais importante da esterilização pelo calor seco, útil i/ando-se, em regra,
estufas aquecidas electricamente e munidas de termostatos, sendo recomendável que possuam, também,
um dispositivo que assegure a circulação do ar no seu interior, o que torna o aquecimento mais
rápido e uniforme.
De facto, a circulação nas estufas de convecção natural depende ds correntes produzidas pela
subida do ar quente e descida do ar frio. Deste modo, quaisquer obstáculos que surjam no caminho
dessas correntes dificultam a circulação do ar, daí resultando, por vezes, diferenças acentuadas de
temperatura em diversos pontos dessas
363

estufas. Mercê disso, elas apenas devem ser utilizadas naqueles casos em que a esterilização exija um
tempo de aquecimento prolongado, pois em tais circunstâncias a deficiência atrás apontada acha-se
minimizada.
O que acabámos de dizer não se verifica nas estufas de convecção forçada, pois o ar quente c
obrigado a circular à volta dos objectos nelas colocados, verificando-se que as diferenças de
temperatura em vários pontos das prateleiras podem limitar-se a + l "C, enquanto nas de convecção
normal tais diferenças chegam a atingir 2O'C, segundo Avis. Outra grande vantagem das estufas de
circulação forçada de ar consiste na redução do tempo necessário para que seja atingido o equilíbrio
térmico entre o meio ambiente e o material a esterilizar.
Este método de esterilização tem as suas indicações específicas e em certos casos oferece
vantagens sobre a esterilização pelo calor húmido, pois este, apesar de ser considerado o método mais
eficaz para a destruição dos microrganismos, nem sempre pode ser utilizado eficazmente.
Produtos há, na realidade, como a vaselina, óleos, gorduras sólidas ou líquidas e pós, cuja
percentagem de água é muito diminuta e não se deixam penetrar pela humidade do vapor. Nestas
circunstâncias, os organismos resistentes que neles existam nunca ficam sujeitos a uma temperatura
letal, tornando-se impossível, por este motivo, esterilizá-los na autoclave.
Vários autores têm procurado explicar as diferenças registadas nas temperaturas necessárias
para se obter a esterilização pelo calor seco e húmido, relacionando este fenómeno com as condições
que provocam a coagulação das proteínas quando estas estão anidras ou hidratadas. Assim, já em 1810
LEWITH observara que a coagulação das proteínas ocorria a temperaturas tanto mais baixas quanto
maior a quantidade de água que continham e os dados seguintes ilustram o que se passa a este respeito:

Albumina do ovo + 50% de água coagula a 56°C


» » » + 25% » » » a 74U-80°C
» » » + 6% » » » a 145"C
» » » + 0% » » » a 160°-170ÜC

Daqui se depreende ser necessário utilizar, pelo menos, a temperatura de 160°C nos métodos de
esterilização pelo calor seco, pois, mesmo que os germes estejam parcialmente hidratados, a sua
exposição ao ar seco desidrata-os por completo antes que seja atingida a temperatura necessária à sua
morte por coagulação.
Como, por outro lado, o calor seco sob a forma de ar quente penetra lentamente no material, a
esterilização exige um aquecimento prolongado e, por isso, este agente esterilizante só deve ser
utilizado quando o contacto directo do material com o vapor sob pressão é injustificável ou indesejável. ,
n :n. $ *:> ; '. u fj *..*"&• •&;—--'
364

8.4.1.1.1.3.1. Resistência das bactérias ao calor seco

A resistência dos microrganismos, particularmente dos esporos bacterianos, ao calor seco é


conhecida desde há muito, tendo KOCH verificado, por exemplo, que os esporos do Bacillus anthracis
só eram destruídos, nestas condições, por aquecimento a 140°C, durante 3 horas.
Esta resistência das formas vegetativas e dos esporos ao calor seco varia conside-ravelmente
com a espécie bactcriana considerada, sendo umas mais rapidamente destruídas do que outras. Além
disso, é da maior importância ter-sc presente que o meio que rodeia os microrganismos exerce uma
influencia decisiva na sua resistência a esle agente físico. Assim, se aqueles estão rodeados por uma
película de matéria orgânica ou substâncias gordurosas, ficam como que isolados e protegidos
contra a acção do calor seco. WALTHR chamou a atenção para este facto, especialmente verificável
com instrumentos cirúrgicos, os quais, se estiverem perfeitamente limpos, são esterilizados por
aquecimento a 160°C, durante l hora. Basta, porém, que os referidos instrumentos estejam cobertos
com uma camada de gordura para que a sua esterilização exija um aquecimento durante 4 horas à
mesma temperatura.
O tempo térmico letal e respectivas temperaturas para certos esporos secos, em óleo anidro,
foram determinados por RODENBECK, e os resultados a que este autor chegou devem ser lidos em
conta ao estabelecer-se o período mais adequado de exposição para se conseguir a esterilização de
óleos, gorduras e outros produtos anidros, pelo calor seco. Assim, por exemplo, está determinado
que é necessário um aquecimento a 160"C, durante 160 minutos, para se destruírem os esporos num
óleo anidro, mas se este contiver uma quantidade, insignificante que seja, de água (0,5%), a
esterilização já é obtida após aquecimento à mesma temperatura apenas durante 20 minutos, desde
que o óleo não perca, evidentemente, a humidade durante a operação.

8.4.1.1.1.3.2. Prática da esterilização pelo calor seco

Devido aos múltiplos factores envolvidos neste processo de esterilização, torna-se difícil
estabelecer um modo operatório uniforme, no que diz respeito à temperatura e tempo de
aquecimento aplicável a toda a espécie de material.
Verifica-se, assim, que os objectos de vidro e de metal podem ser esterilizados em mais curto
lapso de tempo, pois suportam temperaturas mais elevadas do que os pós, os quais estão sujeitos a
alterações físicas e químicas diversas quando submetidos a temperaturas que ultrapassem certo
valor. O que importa, sobretudo, é ficar-se com a ideia de que o tempo de esterilização varia,
sensivelmente, com a natureza do material, o volume deste e a temperatura a que a operação é
conduzida.
365

8.4
.1.1.1.3.2.1. Material de vidro

Deve ser convenientemente limpo e seco, rolhando-se com algodão cardado os balões, frascos
e tubos, e envolvendo em papel pardo iodos os utensílios que não permitem a aplicação de uma
rolha de algodão.
Nunca se deve colocar na estufa uma carga excessiva de material, sendo necessário que este
fique disposto de modo a permitir a livre circulação do ar aquecido por entre todas as peças a
esterilizar. Carregada a estufa, liga-se o aquecimento, iniciando-se a contugem do tempo de
esterilização apenas a partir do momento em que o termómetro da est uf a acuse a temperatura de
16()°C, a qual deverá ser mantida durante, pelo menos, l hora.
hstas são, aliás, a temperatura e exposição mínimas geralmente adoptadas, conforme PERKINS
refere, se bem que algumas farmacopeias prefiram adoptar outras condições, as quais, porém, são
estabelecidas tendo sempre em conta que a esterilização só pode ser conseguida pela conjugação
apropriada dos factores (empo de exposição e l empem n ira utilizada, os quais são os elementos que
condicionam o sucesso da operação, quer se empregue o calor seco, quer o calor húmido. Na Tabela
XXXIV indicamos as especificações dadas em algumas farmacopeias para a esterilização de
vidraria, podendo verificar-se que a maioria delas adopta processos que ultrapassam as condições
mínimas capazes de assegurarem o objectivo pretendido.

Tabela XXXIV. Temperatura e tempos de esterilização recomendados para a esterilização


de material de vidro segundo várias fontes
Temperatura °C Tempo de exposição

Farm. Americana XVII 160-170 24 horas


I-arm. Britânica 140 160 durante um período maior mínimo de 1
hora
Farm. Internacional 170 2 horas
Farm. Italiana 170 2 horas
Farm. Japonesa 170- ISO mínimo de 2 horas

8.4.1.1.1.3.2.2. PÓS

Quuiquer que seja o tipo de recipiente em que os pós estejam acondicionados, verifica-se que a
transferência de calor através das respectivas paredes se processa tão lentamente que se toma
necessário prolongar, por vezes, o aquecimento durante um tempo anormalmente longo.
366

Assim, por exemplo, está demonstrado que são precisos 115 minutos pura que um frasco de
pouco mais de 100 ml de capacidade, contendo um pó, atinja, na estufa de ar quente, a temperatura
de 1600C no seu interior. Se considerarmos que o tempo necessário para destruir os germes
presentes na substância é de 2 horas, teremos que a esterilização, conduzida em tais circunstâncias,
exigirá um aquecimento da amostra a lóO^C, durante 4 horas.
Este facto deve-se tanto à espessura da camada de pó a esterilizar como à área exposta ao
calor, pois verificou-se que se aquecermos 30 g de pó, espalhados numa caixa de PETRI, de modo a
formar uma camada com 0,06 cm de espessura, a sua temperatura é já elevada ao fim de 30 minutos
e começa, a partir daí, a subir paralelamente à da estufa. Decorridos 60 minutos, o pó e o ar
ambiente estão à temperatura de I60°C, tornando-se, assim, possível conseguir a sua esterilização
ao fim de 2 horas.
Perante estes factos, PERKINS insiste em que nunca se deve proceder à esterilização de
embalagens de pós contendo mais de 30 g de produto, recomendando que, sempre que possível, o pó
deve ser aquecido numa caixa de PETRI, espalhado em camada delgada, à temperatura de 160°C,
durante 2 horas, ou de 170°C, durante l hora.
As Farmacopeias Britânica e Japonesa são das poucas que se referem, textualmente, à
esterilização destes produtos, indicando a primeira que a substância deve ser acondicionada de
molde a ficar em camada muito pouco espessa, sendo mantida a 150°C, durante l hora. A última
prescreve um processo mais de acordo com as indicações de PERKINS, recomendando que os pós
sejam esterilizados em caixas de PHTRI com tampa, espalhados de modo que a altura da camada não
ultrapasse 100 mm, devendo ser mantidos durante, pelo menos, l hora, à temperatura de 170-180ÜC.
Acontece, porém, que certas substâncias, como algumas sulfamidas, não suportam um
aquecimento a 160°C, pelo que é necessário esterilizá-las a temperatura mais baixa. Recorrendo,
mais uma vez, às indicações fornecidas por PERKINS, podemos dizer que tais substâncias serão
convenientemente esterilizadas em pequenas porções de 4-5 g, acondicionadas num duplo invólucro
de papel, fazendo o aquecimento a 140-150°C, durante 2 horas, no mínimo.
A Farmacopeia Portuguesa V (IX, 1) indica que a esterilização pelo calor seco de produtos
acondicionados nas suas embalagens definitivas pode ser feita por um dos seguintes métodos:

aquecimento a 180°C durante 30 min, no mínimo;


aquecimento a 170°C durante l h, no mínimo;
aquecimento a 160°C durante 2 h, no mínimo.

Trata-se, como se vê, de indicações de ordem geral não se especificando quais as substâncias a
que cada um destes métodos deverá ser aplicado. Deste modo, a selecção da técnica a utilizar fica ao
critério do operador que deverá ter em conta, como é evidente, as características do produto a
esterilizar para o guiar na escolha da técnica a utilizar.

8.4
367

.1.1.1.3.2.3. Gorduras

As substâncias gordurosas, quer sejam sólidas ou líquidas, são esterilizadas exclusivamente


pelo calor seco, visto que só a lemperalura atingida neste processo é capaz de garantir a destruição
dos germes que as poluam, dado o seu carácter anidro.
Entretanto, o seu processamento é ditado pêlos mesmos factores que condicionam a
esterilização dos pós, devendo acentuar-se que o ritmo de aquecimento das gorduras é ainda mais
lenlo do que no caso das substâncias pulverulentas.
Assim, como tivemos ocasião de assinalar a propósito destas últimas, há toda a vantagem em
esterilizar as gorduras em pequenas quantidades e, quando isso seja viável, acondicionadas em
caixas de PETRI, de modo a formarem uma camada pouco espessa, fazendo-se a esterilização a
lóO^C, durante 2 horas, ou nas condições indicadas para os pós pela Farmacopeia Japonesa. No
caso dos óleos, PF.RKINS recomenda esterilizá-los em tracções de 30 ml, acondicionadas em balões
de BKLLNMLYLÍR, de 200 ml de capacidade, ou em recipientes análogos, fazendo-se o aquecimento e
IVO^C, durante l hora, ou a 160"C, durante 2 horas. Este processo recomenda-se, por exemplo, para
a esterilização da glicerina, parafina e vários óleos.

8.4.1.1.1.3.2.4. Soluções e suspensões oleosas

Várias susbstâncias medicamentosas são usadas em dissolução ou suspensão num óleo


apropriado, destinando-se estas preparações, por vezes, a serem administradas por via parenteral.
Numa circunstância deslas, a preparação terá que apresentar-se estéril e, sempre que a
substância dissolvida ou suspensa o permita, a sua esterilização far-se-á como no caso dos óleos.
Contudo, nem sempre é possível submeter as soluções oleosas de substâncias farm aço logicamente
activas à temperatura de I60-170°C, e, por isso, várias farmacopeias prescrevem que, na
generalidade, tais preparações devem ser aquecidas, durante tempo variável, a 150"C.
Estão neste caso, por exemplo, as seguintes farmacopeias, cujas especificações a este respeito
são como se indica:

Farm. Britânica — As preparações oleosas injectáveis deverão ser mantidas a 150°C


durante l hora.

Farm. internacional — Os recipientes contendo soluções injectáveis oleosas, cujo


volume não ultrapasse 30 ml, serão esterilizados por aquecimento a 15()"C, durante duas
horas; tratando-se de recipientes de maior capacidade, o tempo de aquecimento prolongar-se-á
por um período suficiente para que o seu conteúdo seja mantido a 150°C, durante 2 horas.
368

A Farmacopeia Americana, à semelhança da nossa actual farmacopeia, deixa grande latitude ao


operador, apenas fixando, como normas gerais a respeitar, que a esterilização poderá fazer-se por
aquecimento a 160-17Ü"C. durante 2 a 4 horas, durante menos tempo a temperatura superior
àquela, ou a \4Q"C. durante um lapso de tempo capa/, de assegurar a esterilidade do produto, A
mesma farmacopeia acrescenta que o processo a escolher dependerá não só da natureza da
substância como da capacidade dos recipientes em que está acondicionada, que deverá ser a menor
possível.
Este procedimento, aliás, é perfeitamente lógico, pois, se considerarmos que o ponto fulcral de
todo o processo de esterilização pelo calor gira à volta do binário temperatura-tempo de
aquecimento, compreende-se que um produto só ficará devidamente esterili/,ado se for, realmente,
aquecido à temperatura conveniente durante o tempo considerado necessário. Deste modo, torna-se
imperioso que o material a esterilizar fique em perfeito equilíbrio térmico com o ar da estufa, o que
só se consegue ao fim de certo tempo.
Assim, HORLER determinou as temperaturas obtidas no interior de diversos recipientes vazios
quando a temperatura da estufa era de I20"C c o tempo necessário para que os mesmos recipientes
atingissem a referida temperatura, resultados esses expressos na Tabela XXXV. Por aí se vê que a
igualdade de temperatura no interior e exterior do recipiente só é atingida ao fim de tempo
variável, conforme a natureza e capacidade daquele. E como os números delerminados por HORLLR
apenas se referem a recipientes vazios, é evidente que se estes contiverem óleos, mais tardiamente
ainda se registará o equilíbrio térmico entre o ar na estufa e o interior dos vasos contendo o produto
a esterilizar.

Tabela XXXV. Temperatura no interior de vários recipientes vazios colocados


numa estufa a 120°C

Temperatura do recipiente Tempo necessário para


no momento que se atinja, no interior
em que ti estufa do recipiente, a temperatura
Natureza do recipiente atingiu !20"C da estufa
Ampolas de IO ml 105» 15 minutos
Frascos » 20 » 90" 25
» 100 » 95" 25
Recipientes de metal, 100 ml 106" 15 »
Matrascs de 100 ml 105" 20 »
Frascos » 500 » 98° 60 »

Na realidade, fixando eirr!50"C, durante l hora, o processo básico de esterilização por calor
seco para os óleos, JANOT e Rouss indicaram, conforme se vê na Tabela XXXVI, os aquecimentos
suplementares necessários para que se consiga uma esterili-
369

zação efectiva de um produto desta natureza acondicionado em balões de vidro corrente. A análise
desta Tabela, cujos dados foram obtidos utilizando o mesmo tipo de recipiente de vidro, com idêntica
espessura, mostra claramente que quanto maior for o volume de óleo, maior é o período de tempo
necessário para se obter a esterilização. Daqui se infere que se torna mais vantajoso esterilizar
volumes unitários inferiores a 100 ml, a fim de não ser necessário prolongar, demoradamente, o
tempo de aquecimento, para garantir-se a esterilidade do produto submetido à operação.

Tabela XXXVI. Tempo de esterilização e tempo de aquecimento suplementar para a


esterilização de volumes variáveis de óleos a 150°C
Volume de óleo Tempo de aquecimento Tempo de esterilização Tempo total de
(ml) prévio(min) (min) aquecimento (min)
20 90 60 150
30 105 60 165
50 112 60 172
100 127 60 187
200 154 60 214
20 x 20 128 60 188
8 x 50 138 60 198
4 x 100 142 60 202
4 x 200 164 60 224

8.4.1.1.1.4. Esterilização pêlos raios infravermelhos

O emprego dos raios infravermelhos constitui um método relativamente recente de


esterilização pelo calor seco, utilizando-se, para isso, lâmpadas emissoras daquela radiação,
capazes de provocarem um aquecimento da ordem dos 180"C. Utili/a-se, sobretudo, na esterilização
de seringas hipodérmicas e de material cirúrgico.

8.4.1.1.2. Esterilização pelo calor húmido

Os processos de esterilização pelo calor húmido podem ser conduzidos à pressão normal
ou superior àquela, realizando-se os primeiros à temperatura de 90-10()"C ou interior,
enquanto a esterilização sob pressão elevada é executada sempre acima de 100°C.
370

8.4.1.1.2.1. Tindalização

Este processo consiste no aquecimento descontínuo do material a esterilizar e baseia-se no


facto de as formas vegetativas serem facilmente destruídas a baixa temperatura em meio aquoso.
Em geral, praticam-se três aquecimentos sucessivos, intervalados de 24 horas, admitindo-se que
as formas esporuladas germinam nos intervalos dos aquecimentos desde que o meio lhes seja
propício, sendo as formas vegetativas resultantes dessa germinação destruídas nos aquecimentos
subsequentes.
A temperatura e o período de aquecimento variam bastante, conforme se pode ver nas
indicações dadas por DENOËL:

Temperatura de aquecimento N." de aquecimentos intervalados de 24 horas

\ hora a 50°C 5
l » » 60°C . 5
l » » 70°C 3
l » » 80°C 3

Outros autores preconizam ainda o aquecimento a 100°C, durante 20-45 minutos, em três
sessões igualmente espaçadas 24 horas umas das outras.
Este processo de esterilização, que teve grande voga até cerca de 1950, dada a simplicidade da
sua execução e porque não exige a aplicação de temperaturas elevadas, está hoje condenado e tem
sido posto de parte pelas farmacopeias como meio de esterilizar soluções medicamentosas. Este
procedimento é uma consequência directa de investigações levadas a cabo após a última guerra, as
quais vieram demonstrar que a generalização do emprego da tindalização assentava num erro de
interpretação das clássicas experiências de TYNDALL e PASTEUR.
De facto, nas suas experiências aqueles autores utilizaram infusões de plantas ou caldos de
cultura, isto é, meio ricos em substâncias nutritivas e, portanto, capazes de promoverem a
germinação dos esporos nos intervalos dos aquecimentos. Acontece, porém, que as soluções
medicamentosas estão longe de constituírem, na maioria das vezes, um meio propício à germinação
dos esporos, não sendo raro que algumas delas tenham propriedades bacteriostáticas. Ora, a
eficácia da tindalização, como método de esterilização, depende, precisamente, desta germinação,
pois as condições de aquecimento adoptadas apenas asseguram a destruição dos germes sob a forma
vegetativa e nunca dos esporos bacterianos, altamente termorresistentes. Daí o declínio do uso
desta técnica para a esterilização de líquidos medicamentosos.
371

8.4.1.1.2.2. Esterilização por aquecimento a 100°C

É um processo aplicável à esterilização de líquidos contendo substâncias alteráveis a


temperatura mais elevada, como acontece com numerosas soluções de produtos medicamentosos. É
simples de executar, pois basta mergulhar o recipiente contendo o líquido num banho de água à
ebulição, durante tempo variável, mas que, em regra, anda à volta de 30 minutos.
Dada u temperatura utilizada, este processo está longe, porem, de assegurar uma esterilidade
absoluta, sendo, por isso, pouco aconselhável e apenas deve ser utilizado quando se tome
imperioso adoptar uma solução de compromisso.

8.4.1.1.2.3. Esterilização pelo vapor fluente

Nesta técnica, os objectos a esterilizar são colocados na autoclave. cuja tampa c fechada,
manlendo-se, porém, aberta a torneira de purga, de modo que, assim, a temperatura no interior do
aparelho não ultrapassa os 10O'C.
A autoclave deve ser aquecida moderadamente para que se obtenha uma saída de vapor
regular mas não muito abundante. Nestas condições, o material a esterilizar é banhado por uma
corrente de vapor e aquece rapidamente devido à troca de calor resultante da condensação do vapor
da água.
Este método é prático, de fácil execução e não exige vigilância especial, deixando--se o
material exposto à acção do vapor geralmente durante 30 minutos. No caso de balões de capacidade
considerável, é conveniente prolongar u operação durante 45 minutos ou mais.

8.4.1.1.2.4. Esterilização por aquecimento a 100°C com


adição de um bactericida

Dado que o aquecimento a 100°C não promove uma esterilização conveniente, é prática de
certo modo generalizada adicionar à solução a esterilizar por este processo uma substância dotada
de propriedades microbicidas.
Por outro lado, algumas farmacopeias estipulam que sempre que os recipientes contenham,
depois de fechados, uma quantidade correspondente a várias doses e se retire o líquido
fraccionadamentc, por aspiração com agulha ou outro sistema, a preparação injectável deverá ser
adicionada de um consen-ante, em quantidade suficiente para impedir o desenvolvimento de
microrganismos, salvo se a própria preparação tiver propriedades bacteriostáticas ou bactcricidas.
372

O cnusentuirí' a e m p r eg ai em t a l caso podeia ser um dos se guinte s, mis concen trações que
se indicam, conforme vem especi! içado no St</>ieftu'>ií<> a iiinu^t "/»<'/< Ptn-ntut .' ™ l\ ( ' ) .

Fenol. ....................................................................... 0.5


Cre.sol ...................................................................... 0.1
Cloroeresol ....................... ...................................... d. l
Azotato de f e n i l mercúrio .................................... 0.001
Álcool ben/ilico .................................................... 2

Fenol........................................................................ 0.5
Cresci ...................................................................... 0.^
Clürocivsol ........................................................ ..... O, l
Álcool hcn/ilico .................................................... 2

841125. Esterilização pelo calor húmido sob pressão

De toilo\ os mélodos vulgarmente ulili/.ido^ para a deslrmcao dos micioi o calor


húmido, na forma de vapor s.uur.tdo sob pressão, é considciado L O I I I O o m el h o r e mais
eficiente De laclo. esir processo de estenli/acão reúne uumeiosas \ aniagens dificilmente
encontradas noutros agentes: H altamente leiat para os germes, e facilmente obtenível e
controlável e constitui, sem dúvida, o mais barato de todos os agcules esterili/aules
conhecidos., apenas não podendo ser utili/ado com substâncias alteráveis pelo calor e
humidade.
Neste méiodo de esteriü/u^ào utili/a-se o vapor da atina saturado, siíiiuticando isto
que. para um Jel er i iii nat lo valor de temperatura, o vapor esta a m á x i m a pressão c UM n a
maior densidade possíveis. Por outro lado, a t em p er a t u r a do vapo r sa t u rad o só pode ser
alterada fazendo variar a pressão a que se encontra. 1: esie, alias, o processo a q u e se
recorre para controlar a temperatura nas autoclaves. De facto, a pressão, em si. nada tem que
ver com as propriedades microbicidas do vapoi e representa, apenas, o meio utilizado
para se obterem temperaturas bastante ele\adas.

(') A Farmacopeia Portuguesa V umibrrn ;idmitf o cnipio^o ik1 hm-u-


iindas cm ca\ no entanto, os especificai.
373

8.4.1.1.2.5.1. Mecanismo do aquecimento pelo vapor

O aquecimento dos objectos colocados numa auloclave reali/a-se por contacto


directo com o vapor. Acontece, porém, que este apenas cede o seu calor após condensação e
transformação em água, querendo isto d i/cr que cada partícula de qualquer material poroso
sujeito à esterilização absorverá do vapor uma quantidade de humidade exactamente
proporcional à quantidade de calor por ele cedida. O processo de aquecimento por
condensação baseia-se, portanto, no calor latente do vapor, o qual,
nos limites de temperatura e pressão a que se opera, liberta cerca de
520 cal/g de condensado.
No caso das substâncias porosas, como
tecidos, o aquecimento processa-se gradual
mente, por camadas sucessivas. Assim, quando Coluna t e o r i
o vapor contacta com a parte externa do pro ca de solução,
a qual deve ser
duto, este, porque está mais frio, provoca a submetida á
condensação do vapor, o qual deixa aí uma temperatura
F
certa quanlidade de água. Imediatamente, nova '9- l y u
porção de vapor enche o espaço criado pela
diminuição do volume da primeira camada, passa através dela e vai
condensar-se na parte subjacente, aquecendo-a. Isto repete-se sucessivamente, ale que Ioda a
massa seja aquecida. Neste momento o produto conterá uma quanlidade de humidade condensada
exactamente correspondente à totalidade do calor cedido pelo vapor de água, o que explica o
motivo por que os artigos de penso ficam humedecidos após uma esteríli/ação na autoclave e
têm que ser exsicados ulteriormente. Logo, porém, que o material esteja completamente aquecido,
deixa de haver condensação, e, nessa altura, a temperatura a que se encontra iguala a do vapor
circundante.
Dado que os utensílios metálicos têm uma estrutura compacta, o seu aquecimento é mais
rápido e feito por condensação do vapor à respectiva superfície, cessando esta logo que a massa
metálica fique à mesma temperatura que o vapor de água.
Um problema que surge, frequentemente, ao farmacêutico é o da esterili/ação de líquidos
aquosos encerrados em recipientes de vidro. Como nos casos anteriores, também aqui é necessário
certo tempo para que o líquido se equilibre, lermicamenle, com o ambiente da câmara de
esterilização. Vejamos como se estabelece esse equilíbrio, recorrendo, para isso. à sugestiva
descrição que desse fenómeno OWFN nos dá. Ao aquecei, por exemplo, uma solução aquosa n u m
frasco ou ampola, podemos considerar uma coluna teórica de líquido, situada no centro do
recipiente, a qual será a ú l t i m a porção a at ing i r a temperatura desejada. Esta coluna,
contudo, não permanece csla cionária, pois as diferenças de temperatura registadas dentro do
recipiente provocam
374

correntes de convecção, que, necessariamente, originam um certo movimento do fluido. Apesar disso,
porém, esta parte central, como é compreensível, será aquela que mais tardiamente atingirá a
temperatura do vapor exterior e o seu aquecimento far-se-á, sobretudo, por convecção e condução
(Fig. 191 A).

Vapor
saturado
Solução
Parede do íiquc!.''d
frasco a. Foi
maçao cie
correntes
Calor
transmitido
p or
convecção,

As pressões
interior e exterior
estão igualadas

Última
parte da
período de
exposição

Fig. 191. A. Representação do aquecimento inicial; B, Representação do


aquecimento de um liquido por correntes de convecção; C. as pressões e
temperaturas interior e exterior estão, finalmente, igualadas

De facto, quando o vapor chega ao contacto com as paredes do recipiente aquecê-lo-á após
condensação e o calor será, depois, transferido, por condução, através do vidro para o fluido
encerrado no interior. Deste modo, a temperatura do líquido em contacto com as paredes é elevada
e, como resultado disso, aquele movimcnta-se ao longo destas em direcção à parte superior do
recipiente. Aí converge na parle central e desce até ao fundo, conforme se representa na Fig. 191 B,
375

A transferência do calor por convecçao e, em certa medida, também por condução, acaba por
fazer com que o conteúdo total do recipiente atinja a pressão e temperatura a que se encontra o
vapor circundante (Fig. 191 C) e é a partir desse momento que a esterilização propriamente dita se
inicia. Mais uma vez frisamos que este equilíbrio térmico apenas se estabelece após certo lempo, o
qual dependerá da natureza e dimensões dos recipientes colocados na autoclave e, até, da natureza
do líquido que se pretende esterilizar.

8.4.1.1.2.5.2. Tipos de autoclaves

A esterilização pelo calor húmido sob pressão efectua-se em aparelhos especiais — as


autoclaves — que, no fundo, são uma espécie de marmita de PAPIN aperfeiçoada. Estes aparelhos
fabrícam-se em variados modelos que, basicamente, se podem d i v i d i r em dois tipos distintos:
autoclave de paredes simples e de paredes duplas, existindo modelos pertencentes a esta última
classe que estão equipados com bombas de vazio, destinadas a eliminarem quase completamente o ar
da câmara de esterilização.

8.4.1.1.2.5.2.1. Autoclave de paredes simples

É constituída por um cilindro metálico resistente, vertical ou horizontal, de dimensões


variáveis, o qual fecha hermeticamente por meio de uma tampa provida de unia anilha de amianto e
mantida fixa por parafusos de orelhas, colocados em posições diametralmente opostas. Na parte
inferior do cilindro coloca-se água até determinada altura, dependente da
Válvula de
capacidade do aparelho, dispondo-se o material a segurança
esterilizar sobre uma prateleira perfurada ou em Torneira de descarga
Parafuso
cestos de arame que se apoiam sobre um suporte, cuja parte superior se eleva acima do
nível
Câmaraa ^ Tamp£
Aquecedor
da água. Como equipamento normal, cada autoclave Pa-9'uso
gásPrateleira
192.
Diagrama de uma autoclave
possui um manómetro, uma torneira de descarga e Fig.
perfurddd
horizontal .de paredesPara[uso
simples
uma válvula de segurança.
Este tipo de aparelho não costuma ter qualquer termómetro, de modo que a temperatura na
câmara de esterilização c indicada, indirectamente, pela pressão que o manómetro acusa. Isto lorna-
se possível porque a pressão a que o vapor de água
376

saturado se encontra, num dado momento, é constante para determinada temperatura e vice-versa.
ou seja, a cada valor de temperatura só corresponde um único valor de pressão.
Todavia, esta correspondência entre a pressão e a temperatura só é rigorosa se a pressão for
devida, exclusivamente, ao vapor de água saturado. Acontece, porém, que, ao iniciar-se a
esterilização, a autoclave está cheia de ar, de modo que se este não for completamentc expulso do
aparelho, a pressão total, no interior deste, fica sendo devida à soma das tensões parciais do vapor e
do ar. Desde que uma circunstância destas se verifique, a temperatura é manifestamente inferior
àquela que seria de esperar se no aparelho apenas existisse vapor, como se vê na Tabela XXXVII, o
que pode ocasionar

Tabela XXXVII. Correspondência pressão-temperatura no interior da autoclave


quando nela existe apenas vapor ou uma mistura de vapor e ar
Temperatura em "C
Pressão lida no manó- Expulsão completa Expulsão de metade Sem expulsão
metro (kg.cm-21 do ar do ar de ar
0 100 — —
0,4 109 94 72
0,7 115 105 90
1,0 121 112 100
1,4 126 118 109
1,8 130 124 115
2,0 135 128 121

erros mais ou menos grosseiros na condução de uma esterilização. Mas não ficam por aqui os
inconvenientes da presença de ar numa autoclave. Na realidade, além de falsear a relação pressão-
lemperatura, o ar impede a penetração do vapor nos interstícios dos objectos porosos, o que pode
comprometer a sua esterilização em profundidade, especialmente de temer no caso dos artigos de
penso e outros semelhantes. Além disso, como o ar não se mistura com o vapor e é mais denso do
que este, tende a descer para a parte inferior do aparelho, ficando essa área, por consequência,
muito mais fria, de modo que os objectos aí colocados não serão convenientemente aquecidos. Tais
diferenças de temperatura no interior da autoclave, devidas à presença de ar, são, por vezes,
bastante acentuadas, estando calculado que, sem descarga de ar, a parte superior do aparelho pode
estar aquecida a 115"C ao passo que a temperatura na parte inferior é apenas de 70<iC. Por todas
estas razões, toma-se evidente, portanto, a necessidade de se proceder o mais completamente
possível à evacuação do ar da autoclave ao iniciar-se uma esterilização.
377

Funcionamento da autoclave de paredes simples — Começa-se por verificar se o aparelho


contém a quantidade de água necessária, após o que se introduz nele a carga a esterilizar, ligando-se
o aquecimento. Coloca-se, depois, a tampa em posição, abre-se a torneira de saída, apertam-se,
entào, os parafusos e ajusta-se a válvula de segurança para a pressão desejada. O vapor de água vai
empurrando o ar e arrasla-o para o exterior através da torneira de descarga, também chamada
torneira de purga, a q u a l deve manter-se aberta até que todo o ar tenha sido expulso. Para verificar
isto, pode ligar--se um tubo de borracha à torneira de descarga e mergulhar a outra extremidade
num recipiente contendo água fria. Hnquanto houver ar na autoclave este sobe cm bolhas até à
superfície, mas logo que o borbulhar cesse pode dar-se por terminada a sua expulsão. Fecha-se,
então, a torneira de purga e deixa-se subir a pressão até atingir o valor correspondente à
temperatura desejada, a qual deverá ser mantida durante o tempo considerado necessário para se
obter a esterilização.
Terminada esta, desliga-se o aquecimento e deixa-se arrefecer o aparelho lentamente, até que
o ponteiro do manómetro fique na posição correspondente ao /,ero da escala. Abre-se, nessa altura,
a torneira de descarga muito lentamente, para que o ar possa entrar na autoclave.
Esta fase da operação deve merecer o maior cuidado, pois é capa/ de originar acidentes se for
mal conduzida. De facto, se a pressão no aparelho ainda é elevada, uma descompressão brusca
provocará a ebulição tumultuosa dos líquidos c a sua projecção para fora dos recipientes, pois as
rolhas de algodão cardado saltam facilmente dos bocais. Tratando-se de recipientes
hermeticamente fechados, as consequências derivadas de uma brusca descompressão da câmara de
esterilização podem ser ainda rnuis desastrosas, não sendo raro acontecer que os vasos estilhacem
quando as suas paredes não suportam a pressão exercida no seu interior, uma vez que a pressão
externa que a contrabalançava tenha baixado rapidamente.
Estas aulodaves de paredes simples, ainda muito utilizadas nos pequenos laboratórios
farmacêuticos, apresentam duas deficiências de vulto: não permitem uma purga completa do ar nem
a secagem do material após a esterilização, pelo que não se prestam para esterilizar roupas e artigos
de penso.

8.4 1 1 2 5 2.2. Autoclave de paredes duplas

Trata-se de um aparelho muito mais aperfeiçoado que o anteriormente descrito c em que os


defeitos atrás referidos foram eliminados.
Na Fig. 193 reproduz-se o esquema de uma autoclave desíe género, o qual mostra como e^tes
aparelhos são construídos e funcionam. Assim, na parte anterior está colocada a porta, que pode
fechar por meio de parafusos ou por uma cabeça de cabrestante com alavancas radiais que a fecham
automaticamente quando a pressão sobe. Este tipo de autoclave é constituído, ainda, pelas seguintes
partes: 1) Uma fonte de vapor externa
378

ao aparelho; 2) uma dupla parede formando uma manga de vapor que rodeia a câmara de
esterilização; 3) um tubo de descarga do ar e do vapor condensado, situado na parte interior da
câmara c munido de uma válvula termotáctil que promove, automaticamente, essa descarga; 4) um
termómetro colocado no interior do referido tubo de descarga, o qual indica, portanto, a temperatura
da zona mais fria do aparelho; 5) um sistema de vácuo para a secagem do material humedecido
durante a esterilização; 6) válvula com filtro para a entrada de ar estéril e quente.

r , . _ . , Válvula de segurança
e
Torneira de descarga Tubo de ,.
Ventun Manómetro manómetro do
reservatório

da câmara
f
iltro do ar Descarga para a
atmos[era

Tubo de
'-M Anteparo
descarga Prateleira
^-rr
perjurada Cam

Termómetro

Regulador da
pressão Entrada

Tampa
j Tubo de escoamento

Fig. 193. Esquema em corte longitudinal de uma autoclave de parede dupla

Além disso, estas autoclaves podem estar equipadas ainda com um sistema de arrefecimento
rápido, destinado a encurtar a operação quando a natureza dos líquidos o permite, e de um
dispositivo que torne possível realizar a esterilização automaticamente, sem que se torne necessária
a intervenção de um operador.

Funcionamento da autoclave — Inicia-se uma esterilização com o aparelho frio, deixando


entrar na dupla parede o vapor gerado numa caldeira ou vindo de uma conduta geral, mantcndo-se
fechada a ligação com a câmara de esterilização. Coloca-se na autoclave a carga a esterilizar e
fecha-se a respectiva porta. Entretanto, a dupla parede foi aquecendo e quando a pressão no seu
interior se estabilizou entre l- l , 3 kg.cm~2, liga-sc esta com a câmara, na qual o vapor, vindo da
dupla parede, penetra
379

através de uma conduta situada na parte posterior. A extremidade desta conduta abre contra um
anteparo, cuja função é deflectir o vapor, evitando-se, assim, um humedeci-mento exagerado do
material.
Quando o vapor é admitido na câmara de esterilização esla encontra-se cheia de ar, o mesmo
acontecendo com o material poroso aí colocado. Pelas razões já expostas quando tratámos da
autoclave de paredes simples, o ar deve ser completamente expulso do aparelho, o que se faz, no
caso presente, pelo chamado sistema por gravidade, que consiste no seguinle:
Ao dar-se a entrada do vapor na câmara, este, porque é mais leve, sobrepõe-se ao ar e, como,
por outro lado, está sob pressão, desloca-o gradualmente através dos espaços livres até ao tubo de
descarga. Enquanto o aparelho estiver frio, a válvula termotáctil, acopulada ao referido tubo,
mantém-se aberta, permitindo a saída do ar e da água de condensação, e apenas se fecha e
interrompe a descarga quando o vapor entrar em contacto com ela. A partir deste momento a
evacuação do ar torna-se completa, mas durante a operação a válvula termotáctil abre e fecha
intermitentemente, para descarregar a água condensada que se vai acumulando na câmara.
Repare-se que a colocação lógica do tubo de descarga na parte inferior, a existência de uma
válvula termotáctil e o facto de o vapor entrar sob pressão na câmara são tudo factores que
concorrem para uma eficiente eliminação do ar nestas autoclaves. A evacuação do ar demora cerca
de 5 a 10 minutos e pode ser facilmente controlada à custa das indicações dadas pelo termómetro
que equipa o aparelho.
De facto, a colocação do termómetro no tubo de descarga, através do qual se faz a drenagem
do ar e do vapor condensado da câmara de esterilização para o exterior, faz com que a temperatura
por ele registada corresponda sempre à temperatura do ambiente mais frio que circunda o material a
esterilizar, pois o ar gravitará sempre por baixo do vapor puro. Desde modo, uma vez que o
termómetro acuse a temperatura correspondente à pressão a que o vapor de água saturado se
encontre na câmara., não restam dúvidas de que o fluido em contacto com ele é constituído por vapor
puro e já não há mais ar dentro do aparelho.
A partir desse momenlo, pode contar-se o início do tempo de exposição dos objectos a
esterilizar à acção do vapor, a qual se prolongará por tempo variável, conforme a natureza e volume
dos recipientes colocados na autoclave.
Terminada a operação, corta-se o acesso do vapor à câmara mas mantém-se a sua circulação
na dupla parede. Deste modo, o vapor vai arrefecendo dentro da câmara por perda de calor através
da tampa não aquecida, e a sua pressão começa a descer.
O tempo de arrefecimento espontâneo da câmara, sem abrir a torneira de descarga, varia
bastante com o tipo de aparelho e a natureza do material nele contido, podendo ser de 10-20 minutos
ou, por vezes, superior a l hora. Querendo encurtá-lo, pode abrir--se, lentamente, a torneira de
descarga, não esquecendo, porém, os riscos que daí poderão advir, conforme já referimos na pág.
377. Quando o ponteiro do manómetro da câmara de esterilização atingir o zero, deixa-se entrar o
ar nesta através da válvula
380

que a põe em comunicação com o exterior, ou, se esta não existe, através da torneira de descarga.
Logo que os recipientes estejam suficientemente arrefecidos (temperatura inferior a 70"C) poderão
ser, então, retirados do aparelho.

Cápsula

p Entrada 'l f ^<


Entrada
d o va r
' P° S r M
do vapor
Válvula

Saída do vapor Saída da vapor


A B
Fig. 194. Válvula termotáctil. A, aberta; B, fechada

Secagem dos artigos de penso — As autoclaves do modelo correspondente ao diagrama da Fig.


193 permitem a secagem dos artigos humedecidos pela condensação do vapor, a qual se faz durante
o arrefecimento do aparelho. Para isso, terminada a operação, continua-se a deixar circular o vapor
na dupla parede mas corta-se o seu acesso à câmara. Abre-se, então, a torneira de descarga e
permite-se a saída brusca do vapor, até que o ponteiro do manómetro atinja o zero. Deste modo, a
humidade é eliminada por evaporação graças ao calor residual dos próprios objectos a secar e ao
calor proveniente da dupla parede, que se mantém aquecida pelo vapor da câmara, utilizando-se,
para isso, o tubo de VENTURI que aspira ar quente e filtrado, o qual arrasta o vapor de água e seca a
carga em 15-25 minutos.

8.4.1.1.2.5.2.3. Autoclave de vazio prévio

Os mais modernos aparelhos de esterilização estão equipados com bombas de vazio que
permitem remover até cerca de 98% do ar presente na autoclave. O vazio feito antes da admissão do
vapor na câmara tem como resultado permitir a fácil penetração deste em todos os espaços livres, o
que se traduz, na prática, por um aquecimento rápido e uniforme do material a esterilizar, mesmo
que se trate de embalagens compactas.
Este método, considerado como o único capaz de eliminar as deficiências de esterilização
resultantes de cargas exageradas ou mal distribuídas, tem, ainda, a incontestável vantagem de exigir
uma exposição ao vapor extraordinariamente curta. Traba-
381
382

Um aparelho deste tipo, pelas suas características, só está indicado na esterilização de


grandes quantidades de soluções para perfusão, mas apresenta algumas vantagens sobre a
autoclave clássica. Uma delas é a de que os frascos contendo as soluções injectáveis podem ser
esterilizados à medida que vão sendo cheios, o que diminui a possibilidade de formação de
pirogénios.
A outra consiste no facto de que todos os frascos serão submetidos às mesmas condições de
esterilização, o que não acontece nas autoclaves vulgares. Nestes aparelhos poderá suceder que os
produtos a esterilizar sofram um aquecimento mais prolongado devido a avaria no mecanismo que
comanda a velocidade de deslocação da cadeia, o que, evidentemente, só acontecerá
acidentalmente.

8.4.1.1.2.5.3. Condições a respeitar na esterilização pelo vapor

A maioria dos autores está de acordo em que o contacto directo com o vapor saturado à
temperatura de 12O'C, durante um período de 5 a 10 minutos, é suficiente para assegurar a
destruição das mais resistentes formas microbianas. Apesar disso, é difícil definir com precisão as
condições de temperatura e tempo de exposição aplicáveis à esterilização de todos os produtos, tão
variados eles são. A resolução deste problema tem que ser encarada sob vários ângulos e, assim, o
binário temperatura--tempo de exposição escolhido, além de ter que ser eficaz do ponto de vista
bacteriológico, deve permitir que a operação se realize num período razoável e atenda aos factores
económicos, sempre de considerar.
Segundo PERKINS, estudos cuidadosamente realizados e suficientemente comprovados pela
prática indicam como suficientes para assegurar uma esterilização eficaz as seguintes temperaturas
e tempos de exposição:

Temperatura {"C) Tempo cm minutos

132 2
125 S
121 12
116 18
115 3©

Estes números, porém, apenas dizem respeito à relação mínima temperatura-tempo que deve
ser mantida em todas as fracções da carga para que a esterilização seja conseguida e não incluem o
tempo adicional necessário para que o vapor penetre nos poros dos materiais de estrutura
descontínua nem para as transferências de calor através de recipientes cheios de líquidos.
No fundo, a programação de uma esterilização resume-se a escolher a mais elevada
temperatura compatível com o produto a esterilizar e a submetê-lo à acção do vapor
383

saturado d u r a n t e um período que se uelermine seja suficiente para assegurar o sucesso da


operação.
A determinação desse tempo é que constitui, no entanto, o ponto mais delicado do
processo, pois depende n fio só da temperatura como. também, de outros 1'aclore.s. nomea-
damente da nature/a da carga a cslenli/ar e. no caso dos líquidos, do seu volume.
A temperatura mais alta geralmente ulili/ada numa esierili/aeào pelo vapor situa--se
entre 12l-l23"C C) suficiente, como vimos, para obter a destruição das mais resistentes
formas de vida baclcriana nu m período relativamente curto. Outra ra/ão para se limitar
a temperatura àquele valor é o hiclo de I2I"(" constituir a temperatura critica para
muitos artigos de uso cirúrgico, cu jo aquecimento a temperaturas superiores aquela
abrevia, consideravelrnentc. a sua duração.
Não é exagero afirmar-se, por conseguinte, que cada produto a esterili/ar constitui,
quase sempre, u n i caso específico, e como t a l deve ser considerado. Posio isto. \ e j a m o s
agora as condições geral men te preconi/adas para a esterili/açáo de vá rios produtos pelo
vapor saturado.

841 12531 Utensílios cirúrgicos e artigos de penso

De um modo geral, a esíerih/ação destes artigos está subordinada a combinação


s i mu lt â n e a de qu at ro factores, a

1) Regulação da auioclave para a temperatura de 12!"C.


2) Processos correctos de acondicionamento do material,
3) Colocação conveniente da carga no aparelho, de modo a permitir a liv re ci r-
culação do vapor.
4) Período de exposição.

Se lais factores forem devidamente considerados. PI . KKINS afirma que os períodos de


exposição a seguir mencionados garantem uma margem de tempo s u f ic ie n te para que se dê
a penetração do calor e a esterili/açüo:
Minutos
Caixas de pensos, forradas de ga/.c .......................................................... 45
Instrumentos dispostos em tabuleiros e cobertos de ga/e ...................... 15
Instrumentos protegidos para serem arma/enados ................................... 30
Luvas de borracha envolvidas em gaze .................................................... 15
Seringas com os êmbolos separados, envol vidos em ga/e ou papel . ... 30
Pios de sul u rã .............................................................................................. 15

( ) A Farmacopeia Pomiguesa V recomenda que a cstcrili/ação polo vapor saturado de


produtor nas suas embalagens d efin i t i vas se deve fa/er. de um modo geral, por aqummento a
I 2 I " C . di ranic l? minuto--, embora admita que podem utili/ar-se outras cinnbina^iifs cli-
icmprnmii.i c tanpo. desdi.1 i|ik' à sua eficácia esteja comprovada.
384

8.4.1.1.2.5.3.2. Soluções aquosas , ,, v ,ilr , ,


""l*1
Estas constituem, sem dúvida, a espécie de material com que o farmacêutico mais
frequentemente trabalha e a sua esterilização terá que ser conduzida de molde a que a exposição ao
calor as torne estéreis mas não seja tão intensa ou prolongada que possa alterar ou destruir as
substâncias dissolvidas.
Na realidade, a termossensibilidade das várias substâncias normalmente utilizadas sob a
forma de soluções injectáveis ou certos constituintes dos meios de cultura usados em microbiologia
difere muito de uns para os outros.
Assim, os açúcares são parcialmente decompostos e caramelizam a temperaturas elevadas, a
peptona hidrolisa-se, a gelose perde a propriedade de solidificar, as vitaminas são mais ou menos
destruídas, etc., etc.
Em virtude disso, como acentua a Farmacopeia Americana, são as características das
substâncias dissolvidas que determinam o grau de aquecimento e o período de exposição ao
pretender-se esterilizar soluções, assim como é a capacidade dos recipientes e a espessura das
respectivas paredes que condicionam o tempo necessário para que os líquidos neles encerrados
atinjam a temperatura conveniente. Torna-se manifesto, portanto, que só é possível estabelecer-se
ciclos de esterilização adequados se se considerarem não só a natureza de cada solução, como,
igualmente, as características dos recipientes em que elas estão acondicionadas.
Deste modo, se a solução é compatível com um aquecimento a 121°C, tomando como ponto
assente que a esta temperatura os germes são destruídos por exposição ao vapor durante 10-12
minutos, a duração total da operação, incluindo o tempo necessário ao estabelecimento do
equilíbrio térmico com o líquido e o vapor, será, a partir do momento em que o termómetro do tubo
de descarga inferior acusar aquela temperatura, a seguinte:
Duração total
"'• .,.-'•(-.* .,*,-; •> •: •>!•< -•; do aquecimentos
'•' -ï-. • -1 ' * (minutos)

Tubos de ensaio espaçados, contendo 10 ml de líquido.............. 12


Tubos de ensaio em cestos, contendo 10 ml de líquido ............ 15
Balões ou frascos contendo 100 ml de líquido ............................ 15
Balões ou frascos contendo 500 ml de líquido ............................ 25
Balões ou frascos contendo 1000 ml de liquido .......................... 25-30
Balões ou frascos contendo 2000 ml de líquido .......................... 35-45
Ampolas de paredes finas, até 50 ml de capacidade .................. 6-8
Acontece, porém, que muitas soluções medicamentosas não suportam a temperatura de 121°C e, por
isso, a grande maioria delas são geralmente esterilizadas a temperaturas mais baixas. Se bem que as
várias farmacopeias indiquem, a propósito de cada soluçã
385

que inscrevem no texto, a temperatura a que deve fazer-se a respectiva esterilização, fixam ainda as
normas gerais que devem presidir a esta operação. Assim, a Farmacopeia Portuguesa IV, prescreve
que as soluções, desde que o seu volume unitário não ultrapasse 100 ml, serão esterilizadas por
aquecimento a 115°C, durante 30 minutos; quando porém, o volume exceda aquela cifra, o
aquecimento deverá ser prolongado, à mesma temperatura, até ao limite de l hora, em função do
volume de líquido a tratar. Tal procedimento, pelo menos no que diz respeito a recipientes cuja
capacidade não ultrapasse 1000 ml, parece ser suficiente para se garantir a esterilidade do material
submetido à operação, como se depreende dos resultados dos trabalhos de Buem, que resumimos na
Tabela XXXVIII.

Tabela XXXVIII. Tempo total de aquecimento necessário para se obter a esterilização a 115°C
de líquidos encerrados em vários tipos de recipientes
Tempo de aquecimento
Material da câmara Tempo Tempo total
a esterilizar e do material de esterilização de aquecimento
(minutos) (minutos) (minutos)
50 ampolas 12,5 20 32,5
1 frasco de 100 ml 15 20 35
1 » » 250 » 20 20 40
1 » » 500 » 25 20 45
1 » » 1000 » 30 20 50

8.4.1.1.2,5.4. Controladores do funcionamento da autoclave

Termómetros registadores — São acessórios de enorme vantagem que fornecem um gráfico da


temperatura do tubo de descarga durante o tempo que dura a esterilização. Torna-se, assim,
possível ao operador corrigir rapidamente quaisquer alterações verificadas no decurso da
operação, além de que o gráfico permite inspeccionar, em qualquer momento, as condições em que
uma dada carga de material foi esterilizada.
Conforme se disse na pág. 378, o termómetro deve estar colocado na parte mais fria da
autoclave, isto é, junto do tubo de purga.

Potenciómetros — Estes acessórios, acopulados a termopares, constituem o meio mais


racional e eficiente para se controlar o funcionamento das autoclaves e a penetração do calor
através das cargas porosas ou a sua transferência através dos vasos contendo soluções.
Os termopares, dois pequenos fios de metais diferentes, soldados nas extremidades, podem ser
colocados nos locais mais recônditos e inacessíveis das cargas a esterilizar,
386

ligando-se, através da porta do aparelho, os seus terminais a um potenciómetro. Qualquer


modificação da temperatura detectada pela extremidade do termopar é imediatamente indicada no
painel de leitura do potenciómetro, o qual tem, em geral, uma precisão de ±0,25"C. Fazendo-se
leitura das temperaturas a intervalos regulares, obtêm--se gráficos que constituem o processo mais
rigoroso para se determinar o grau de eficácia de uma técnica de esterilização.

Reguladores automáticos do ciclo de esterilização — Um dos grandes aperfeiçoamentos


introduzidos, nestes últimos anos, nas autoclaves é representado pelo aparecimento dos mecanismos
reguladores da esterilização, os quais são capazes de regular todas as fases da operação, limitando
ao mínimo a intervenção do operador. De facto, nos aparelhos equipados com tal dispositivo, aquele
nada mais tem a fazer do que carregar e descarregar a autoclave com o material a esterilizar. Na
realidade, apenas é necessário ligar o dispositivo de controlo, que ele se encarregará de aquecer o
aparelho, regular o tempo de exposição à temperatura correcta, promover a evacuação do vapor e a
secagem do material, avisando o final da operação por meio de um alarme sonoro, tudo feito
automaticamente, de acordo com um programa estabelecido previamente, em que todos os detalhes
da operação foram transmitidos ao regulador.
O objectivo primário do emprego destes dispositivos é o de eliminar, na esterilização, as
imprecisões inerentes à intervenção humana, como tempos de exposição ao vapor mais curtos ou
mais longos do que os correctos e erros na leitura das temperaturas. Desde que estes aparelhos
funcionem perfeitamente, para o que exigem uma inspecção periódica por pessoal habilitado, obtém-
se um grau de precisão impossível de conseguir pela regulação manual, além de economia de tempo
e pessoal.

8.4.1.1.2.5.5. Indicadores de esterilização

Por aquilo que foi dito atrás, para se poder confiar na eficácia de uma técnica de esterilização
pelo calor é necessário determinar, com precisão, a temperatura atingida no seio da carga a
esterilizar e o tempo durante o qual ela actuou sobre os germes presentes.
O único método verdadeiramente rigoroso e preciso para se obter tal indicação é aquele que
emprega termopares ligados a um potenciómetro, como referimos na pág. 385. Acontece, porém, que
muitas autoclaves não estão equipadas com este acessório recorrendo-se, por isso, muitas vezes, aos
chamados indicadores de esterilização que podem ser de natureza biológica ou química.

Indicadores biológicos — São constituídos por microrganismos vivos, geralmente esporos


secos, que se colocam na câmara de esterilização, juntamente com a carga a
387

esterilizar, os quais, finda a operação, são semeados e incubados em meios de cultura apropriados
para se determinar a sua sobrevivência.
Um indicador biológico pode ser constituído por unidades do produto a esterilizar inoculadas
artificialmente com o microrganismo de prova, ou por substâncias porosas, areia, vidro ou lâminas
metálicas, que servem de suporte aos microrganismos usados como testemunha, colocadas nos
locais considerados mais difíceis de esterilizar.
A Farmacopeia Portuguesa V recomenda os seguintes microrganismos testemunhas:

Esterilização pelo vapor: esporos de Bacillus stearotermophilus, ATCC 7953 ou


CIP 52.81. O número de esporos viáveis deve ser superior a IO5 por unidade de
indicador e o valor de D (') a 121°C deve ser de cerca de 1,5 min.

Esterilização pelo calor seco: esporos de Bacillus subtilis, var. niger ATCC 9372 ou CIP 77.18.
O número de esporos viáveis deve ser superior a IO5 por unidade de indicador e o valor de D deve
ser, a 160"C, de 5 a IO min, aproximadamente.

Esterilização por gases: esporos de Bacillus subtilis, var. niger ATCC 9372 ou CIP 77.18, ou
os de Bacillus stearotermophilus ATCC 7953 ou CIP 52.81.

Esterilização por radiações: esporos de Bacillus pumilus, ATCC 14884 ou CIP 3.83 para uma
dose única de 25 KGy (2,5 firad). O número de esporos deve estar compreendido entre IO7 e IO8 por
unidade de indicador e o valor de D deve ser de cerca de 3 KGy (0,3 (irad). Para doses mais
elevadas de radiação podem usar-se outras estirpes esporulantes com maior resistência, lais como
mutantes de Bacillus cereus SSIC 1/1 ou Bacillus sphaericus SSIC, A.
Como se compreende, é impossível obter-se uma indicação imediata sobre o modo como a
esterilização foi conduzida utilizando este método de controlo, pois, acabada esta, os indicadores
biológicos devem ser incubados durante vários dias, para se verificar se neles há sobreviventes.
Estes indicadores são, portanto, inadequados para verificações de rotina, se bem que constituam um
meio excelente para o controlo periódico das condições de funcionamento das autoclaves.

Indicadores químicos — De mais fácil manejo que os anteriores, têm ainda a vantagem de
fornecerem as indicações desejadas imediatamente após o termo da operação. Deve dizer-se, no
entanto, que o seu emprego tem estado sujeito a larga controvérsia, havendo autores que o
defendem e outros que lhe negam qualquer real utilidade.

(') O valor D é o valor de um parâmetro de esterilização (duração ou dose absorvida)


necessário para reduzir até 10 por cento do seu valor inicial o número de microrganismos viáveis.
Este valor D apenas tem significado em condições experimentais bem definidas.
388

Tais indicadores são constituídos por substâncias que sofrem modificação da cor ou da forma
após aquecimento à temperatura da esterilização. Assim, um fragmento de enxofre, acondicionado
num tubo de vidro, funde quando aquecido a 120°C durante alguns minutos, apresentando, depois de
arrefecido, uma forma diferente,
Os tubos indicadores de BROWNF contêm uma solução de cor vermelha que passa a verde
depois de um aquecimento a uma temperatura e durante tempo variáveis. Existem três tipos destes
indicadores, considerados por certos autores como muito satisfatórios, cuja mudança de coloração
se dá nas seguintes condições: tipo l, aquecimento a 1I5°C, durante 25 minutos; tipo //, 115°C, 15
minutos e tipo III. 160"C, durante 60 minutos.
GUILLOT refere,, ainda, o emprego de pinturas indicadoras, como estas:

Pintura A:

Carbonato de chumbo ......................................... l g


Sulfurcto de lítio ..................................................... 0,5 »

Pintura B:

Carbonato de chumbo .............................................. I g


Enxofre precipitado.................................................... 0,1 »
Carbonato de lítio...................................................... 0,3 »

Tais pinturas são aplicadas, por exemplo, sobre um vidro, podendo facilitar-se a sua aderência
pela junção de um silicato.
A pintura A posta directamente em contacto com a atmosfera da autoclave, passa de branco a
preto desde de que a temperatura atinja 100°C. Por sua vê/, a pintura B só adquire a cor preta
quando a temperatura de 100ÜC é mantida bastante tempo em atmosfera húmida, ou se a
temperatura de 130°C é mantida durante menos tempo que no caso anterior, etc.
Quer isto dizer que o ritmo de enegrecimenlo da pintura B, em função da temperatura,
acompanha a sensibilidade dos germes ao calor, como se pode ver no gráfico da Fig. 189, pág. 360
e, assim, o seu comportamento poderá ser tomado como índice do grau de destruição das bactérias.
Além disso, esta pintura também enegrece por acção do calor seco, verificando-se o aparecimento
da cor preta desde que a lemperatura de 180°C seja atingida e mantida durante o tempo necessário
para que se obtenha a esterilização
A pintura A' apenas serve de testemunha e desde que a pintura B apresente a mesma coloração
negra daquela, pode considerar-se que a operação foi convenientemente conduzida.
389

8.4.1.2. Esterilização por radiações

Apesar de os primeiros estudos acerca do efeito de várias radiações sobre os microrganismos


datarem do final do século passado, pode dizer-se que só após a última guerra se iniciaram
investigações em grande escala tendentes a determinarem a utilidade prática dos efeitos bactericidas
das radiações ionizantes. Os dados desde então reunidos permitem afirmar que o emprego destes
métodos de esterilização apresenta nítidas vantagens sobre os processos clássicos, tais como:

1) A esterilização por radiações ionizantes apenas origina uma insignificante elevação de


temperatura no material a elas sujeito, a qual, em regra, não vai além de 4-5°C.
2) Certas qualidades características de vários produtos alimentares, como o aroma, por
exemplo, mais ou menos alteradas quando os mesmos são esterilizados pelo calor,
mantêm-se integralmente depois de tais produtos serem irradiados.
3) Desde que se torne possível esterilizar um produto por radiações ionizantes, este método
garante uma considerável economia nas embalagens de metal ou de plástico utilizadas no
seu acondicionamento, as quais podem ser menos compactas e, portanto, mais baratas.
4) Vários medicamentos sensíveis ao calor podem ser eficazmente esterilizados por irradiação
sem sofrerem quaisquer alterações.

Considerando apenas o uso deste processo de esterilização no campo farmacêutico, podemos


dizer que se tem revelado capaz de aplicações muito úteis, havendo algumas farmacopeias,
incluindo a nossa, que já se referem a ele. Concretamente, a Farmacopeia Britânica cita-o como
processo para a esterilização de pós, c a U. S. P. XXII, no seu capítulo geral sobre esterilização,
refere existirem técnicas para a esterilização de certos tipos de produtos farmacêuticos por raios y e
raios catódicos, acrescentando que a aplicação de tais técnicas é ainda limitada por causa do
equipamento altamente especializado que exigem e devido, também, aos efeitos das radiações sobre
os produtos e recipientes usados no seu acondicionamento.
Estas são, na verdade, as grandes limitações que se opõem, por ora, à generalização do
emprego das radiações na esterilização de produtos farmacêuticos. De facto, se, por um lado, estas
técnicas são de incalculável utilidade em casos de substâncias facilmente alteráveis pelo calor, a
ponto de ser impossível esterilizá-las por qualquer dos métodos baseados no emprego daquele
agente físico, não é menos certo que também podem originar a destruição de alguns medicamentos,
como a insulina, pitui-trina, heparina, tetraciclinas, vitamina C, etc.
Em contrapartida, a maioria dos antibióticos pode ser esterilizada pelas radiações ionizantes,
o mesmo se dizendo em relação a várias hormonas corticóides, hidrolísados de proteínas, soros,
vacinas, cat-guts, etc.
390

8.4.1.2.1. Radiações usadas na esterilização

Em geral, as radiações podem ser classificadas em dois grandes grupos: 1) radia-


ções electromagnéticas e 2) radiações corpusculares.
É de notar que todas as radiações de maior comprimento de onda do que a luz
visível, como as ondas de rádio, radar e os infravermelhos, devem o seu efeito micro-
bicida ao calor que originam quando incidem sobre o material a esterilizar, ao passo que
as que possuem menor comprimento de onda exercem essa acção por impactos directos
sobre os microrganismos e, como não provocam aumento de temperatura apreciável,
constituem os chamados processos de esterilização a frio.
Como exemplo de radiações electromagnéticas podemos citar os raios ultravioletas,
os raios X e os raios y, constituindo radiações corpusculares os raios catódicos (elec-
trões), protões, neutrões e certas outras partículas subatómicas.
É costume dividir ainda as radiações em ionizantes, às quais pertencem os raios y,
raios X e raios catódicos, e em radiações não ionizantes, por exemplo, os raios
ultravioletas; na prática, porém, as radiações utilizadas como agentes esterilizantes limitam-
se aos raios y e raios catódicos.

8.4.1.2.2. Mecanismo de acção das radiações ionizantes sobre os


microrganismos
í-
Admite-se, geralmente, que o efeito microbicida das radiações ionizantes é devido,
sobretudo, a uma acção directa destas sobre os germes. Assim, pensa-se que quando um
fotào ou uma partícula colide ou fica muito próxima de uma célula microbiana provoca a
ionização dos constituintes da célula ou dos do espaço circundante, fenómeno que origina
a morte daquela.
Esta teoria, conhecida por teoria do alvo, pode ser expressa pela seguinte equação:

nln0 = e-D>in* (1)

em que n/n{) é a fracção dos organismos sobreviventes à acção da Dose D{ e DQ é a dose


média letal ou dose 63%, isto é, a dose de radiação que provoca a sobrevivência de 37%
dos organismos irradiados.
Se bem que o impacto directo seja o responsável pela destruição da maior parte dos
microrganismos presentes num meio irradiado, vários autores demonstraram que as
radiações podem exercer um efeito indirecto sobre os germes por intermédio de radicais
livres por elas produzidos no meio onde aqueles se encontram suspensos. Esses radicais
livres, originados, principalmente, pela acção das radiações sobre as substâncias dissol-
391

vidas no meio, actuam sobre os microrganismos através de mecanismos mal determinados,


provocando um efeito microbicida muito menos importante, é certo, do que o atribuído ao impacto
directo, mas ao qual se atribui, no entanto, algum significado.
De acordo com a equação (1), quando se bombardeia uma suspensão microbiana com
radiações ionizantes opera-se uma reacção de primeira ordem, e, por isso, a curva de sobrevivência
será exponencial, o que é geralmente observado no caso de bactérias. Isto, aliás, acontece sempre
que o microrganismo seja inactivado por um só impacto, assumindo as referidas curvas uma forma
sigmóide quando o germe apenas é destruído por dois ou mais impactos, como se verifica com
microrganismos diplóides.
Desde que a curva de destruição seja exponencial, a sua inclinação é independente do número
de germes; deste modo, para cada germe e para uma dose fixa de radiação, a percentagem de
mortalidade é constante.

8.4.1.2.3. Factores que influenciam os efeitos das radiações sobre os


germes

A esterilização de qualquer produto por radiações ionizantes implica que se considerem os


factores que podem influenciar o efeito das referidas radiações sobre os germes que inquinam o
material a esterilizar. Vejamos, portanto, aqueles que mais interessa ter na devida conta.
8.4.1.2.3.1. Concentração dos
microrganismos

Como já anteriormente se disse, a concentração de


um microrganismo em qualquer meio não afecta a
percentagem daqueles destruída por uma determinada
dose de radiação. Contudo, se tivermos uma série de
amostras do mesmo ou de diferentes produtos, contendo
várias concentrações da mesma bactéria, e as quisermos
reduzir todas à mesma concentração na mesma unidade
de tempc, será necessário aplicar às amostras com maior Ftg. 196. Curvas representando as doses de
percentagem inicial de germes uma maior dose de raios catódicos necessárias para reduzir ao
radiações, conforme se ilustra na Fig. 196. mesmo nível de esterilidade produtos tendo,
inicialmente, diferentes concentrações de um
mesmo microrganismo.
1) 1 x 103 bact./ml; 2) 1 x 10S
bact/ml; 3} 1 x 10°
bact./ml;
392

Repare-se, porem, que se ,1 coneenlrüvao dos germes p r c s e ni e s « . o n di ei o n a , ale ccrlo ponto, -t


dose ncves-,ar M p a i a M- obiei um deU-muuado ^ i ;i u dr estei ilid.ide. i a i intlucru i.i n.K) e minto
n i a K ada A -. MI M . por exemplo. se mn.i amosiia 4 \\\ci .ini.i ciitut v ui n n l w/ e s UM UM do que emua.
R. .1 p n m e n a e M i i i a usn.i dv^i1 dr I ~, U Í D V , H V u^ li^riranK-iilr - u p r í u n ;t aplicai" a M.'^ u tuia
para q u e amba s l i q i u - i n c -i n c i s , r i \ i o pela Mmple> i"a/ao de q u r a t o a L ^ ã n c i.le p n n i e n a
o í d ci n i !otí d,t com e í iti .is ao i < -. ' . w í\ Jttse anlnicliea/.

8.41.2.3.2. Radiossensibilidade das diferentes espécies

Como .iLOiikve kk c ai>-> oulio-- agrnh^ c s k-11 h/ aiit< i >. L ada L'^pt\ ir m r. i ohi.ma sfiu a u u u i --
'/ii>!hdid>ti.lc dilí-icuie p aia a-- UKÍUK.OÍ"'.. alem (Io que os esporos s.io, i g i i a l n ie i i l e - nuns
u^i^lirnle^ do q u r as iíinn.is \ f^D.ilp, as. í ' s ) r i o n s t / n ; ) . scni d i v i d a . o tactoi n i a i >
üiiportaiitr ,1 L {>n\idt'iai no ele-iio a »,ib!iM t o m u n t a drUMinmad a do\ L - ilc

•V í a h ei a \ \ \ í \ da uo-- uma i d r u dessa d i l e i e i u e se n s di d idade. se s ido de t u M .u


que á b.n. 1-ei'Uí uuus vcsisienïe que \ K -|.I l i u u t a « B :/;<'» » H >< Í , ii!in'<i>r\ < e unia espeue
p r o d u t o r a de e--

Tabela XXXIX. Radio:--seti&ibilidadRR relativas de dlqunia---. espei-ie?


ba expostas aos raios y produzidos por 1 kdocune d^ i, obd'!o 60

-i,X

Conto e e\ ideiile. quanto nteitoi toi a radiOsseitsíhil idade dr H Í I I deleimmado


n i ic uH^uu i si i io. maior seva a dose ne^essatui paia se ohtcM' u esienli/.i\.ui. •.outorme esH
representado nos gi-ai'ieo\ da l 'ij !. !(17 \eies %e \ e . de íaelo. q u e u ni a espeeie e i i k o \'e/es
ntais rcMsiemc que o i m a e \ i y e uma i n a d i a ^ a o i ^ u a l n i e i it e U : K O \ e / e s ma i s l o i l e p;u"j
que anib.ís se/an) desíríí/d.is no ííiesnio niíiio.
A l i a s , os d i l e r e n l e s niícvoi ^am-nios podem -.er classii ic.idos. no que d i / iespeiio a
SLUI rudiorie-isteuei.s. de aeoidu v.ou\ ,1 t /i)v ( nm/iu /'n.ti \ O i neees\,ina paia mie, em
393

certas e determinadas eondições, se obtenha a destruição de d39í da sua concentração inici al, ou.
o que vale o mesmo, 37f# de sobreviventes. Assim, o valor de Dn é de ?OOÜ rcp para /:. coli e dez
vezes maior no caso de B. i

Fig. 197. Diferente resistência de duas espécies bacterianas à radiação


representada pela dose média letal (Do) necessária para se obter â
esterilização

Estas diferenças de sensibilidade dos diversos microrganismos às radiações levanta, pois,


o mesmo problema que já debatemos a propósito dos métodos de esterilização pelo calor.
Mais uma vez frisamos que em virtude de raramente se conhecer a naiuuva dos
germes presentes no material a esterilizar, este deverá receber uma quantidade de
radiação capaz de destruir as espécies mais resistentes nele possivelmente existentes.
As unidades utilizadas para medir as radiações ionizantes são o rõcnigen, o raü
e o rcp:
Roemgen: quantidade de radiação X ou y que, atravessando l g de ar, liberta unia energia de
86 crg (aproximadamente, 97 erg/g de água).
Rcp quantidade de radiação de qualquer tipo que produz os mesmos eleitos que l rÒcnlí-ea de
raios X ou y.
Rad: dose absorvida de qualquer radiação equivalente a 100 erg/» de material absorvente.
394

Do ponto de vista prático, estas unidades equivalem-se, estando calculado que uma radiação
de 2 x IO6 rep ou rad assegura a destruição das formas mais resistentes e garante, assim, uma
esterilidade absoluta, pois a maioria dos germes é morta por uma dose de radiação da ordem de 5 x
\{f rep.
Outros factores de somenos importância podem influenciar a dose letal da radiação sobre os
microrganismos presentes no material a esterilizar. Citem-se, entre outros, o efeito da lensão do
oxigénio no meio, a existência, neste, de substâncias impeditivas de um crescimento normal dos
germes ou que os protejam contra os efeitos das radiações, o pH, a temperatura, etc.

8.4.1.2.4. Esterilização por radiações ionizantes 8.4.1.2.4.1. Raios

catódicos

São constituídos por electrões ou raios p artificialmente acelerados, originados quando se


estabelece uma elevada diferença de potencial entre um cátodo e um ou mais ânodos, num tubo onde
se tenha feito um vazio poderoso.
Sob a influência de forças electrostáticas esses electrões adquirem altas velocidades,
aumentando, assim, a sua energia e poder penetrante, o qual é dado pela equação:

0,542 E-0,133
R '- =———————:—— (2),
max n • '

em que Rmáx é o limite máximo de penetração (g/cm2) do material irradiado de densidade p e £ representa
a voltagem (Megavolt) à qual os raios catódicos tenham sido acelerados. A energia ganha por um
electrão em movimento à custa de uma diferença de potencial de l volt denomina-se elcctrão-volt,
ou, abreviadamente, eV. Na esterilização, a energia desta radiação tem que ser sempre muito
elevada, e, por isso, utiliza-se, como unidade prática, a energia correspondente a l milhão de
electrões-volt ou MeV.
Uma vez que o poder penetrante da radiação varia com a respectiva energia (Fig. 199), esta
deverá ser calculada de acordo com a espessura dos objectos a esterilizar.
Por outro lado, os raios catódicos não provocam uma ionização uniforme da matéria, estando
verificado, na realidade, que a maior intensidade de ionização não se regista à superfície do
absorvente mas sim a uma distância correspondente a cerca de 1/3 do limite máximo de penetração
para a energia a que o feixe está acelerado, sendo isto devido á difracção dos raios catódicos
quando colidem com o material irradiado (Fig. 198). Estes factos indicam, por conseguinte, que a
esterilização pêlos raios catódicos apenas ficará assegurada se esles possuírem uma energia tal que o
seu poder penetrante esteja de acordo com a espessura do material a irradiar. Se bem que possa
395

variar-se essa energia dentro de certos limites, acontece, porém, que na prática a esterilização é
geralmente feita com raios catódicos acelerados a 7 MeV, não se recomendando ultrapassar 15 MeV
dado o perigo de, nestas condições, poder manifestar-se radioactividade induzida.

100 - — —

Máxima para â
espessura R Média para
a espessura R

Minimo para a espessura R


O 0,4 0.8
1,2
Espessura R atingida pela
radiação
Fig. 198. Ionização dos raios catódicos em função da
espessura (Trump, Wright e Clarke)
0,4 0,8

100 -

1.6
1,2
Espessura- do absorvente
2
(g/cm )
:•'"' Fig. 199. Distribuição do máximo de ionização dos raios
catódicos
.,; ...,; ,.>,. a diferentes profundidades consoante a respectiva
energia

A grande vantagem apresentada pêlos electrões é a de poderem ser facilmente orientados por
um campo eléctrico sobre um determinado ponto, não provocarem radiações exteriores se a
instalação estiver bem concebida e as protecções que exigem serem muito menos importantes e
dispendiosas do que no caso dos raios y, pelo que não há perigo de contaminação para o pessoal.
396

Em vários países existem em laboraçào instalações que utilizam os raios catódicos na esterilização
de certos produtos farmacêuticos e alimentares. Em geral, as máquinas utilizadas na aceleração dos
electrões são do tipo electrostãstico, como o gerador de van der GRAAF, as quais, porém, devem
obedecer a certas características, pois só nessas condições poderão ser empregadas como fonte de
radiação esterilizante. Entre elas citamos as seguintes:

Voltagem: Determina o grau de penetração dos raios catódicos no material a


esterilizar.
Corrente do feixe de electrões: Condiciona o número de electrões que bombardeiam
a amostra por unidade de tempo e, por isso, o ritmo de esterilização do material de espessura
determinada pela voltagem.
Potência total: Combinação da voltagem e da corrente que condiciona a quantidade
de material que pode ser esterilizado.
Eficiência da utilização: Baseada na variação da ionização em profundidade dos
raios catódicos na matéria irradiada.
Funcionamento eficaz: Condiciona a percentagem do material que é necessário
esterilizar novamente, estando dependente, em geral, das características do tubo. Dele depende
o número de máquinas que é preciso ter em reserva.

Como atrás dissemos, na esterilização de produtos farmacêuticos utilizam-se electrões a 7 MeV,


mas esta energia nem sempre é suficiente para que a penetração se dê em certas embalagens. Em tais
casos, recorre-se à técnica de fogo cruzado, bombardeando o material, simultaneamente, de direcções
opostas. O feixe de electrões acelerados é conduzido por ondas de radar até ao material a esterilizar,
transportado num tapete rolante, onde aqueles chegam com uma velocidade muito semelhante á da
luz, fazendo-se a exposição durante l segundo, no máximo, em locais protegidos com paredes de 2,5 m
de espessura.
A velocidade atingida pêlos electrões é constante nas condições em que a máquina trabalha num
determinado momento, apenas dependendo do grau de vazio e da diferença de potencial entre o cátodo
e ânodo. Ora, como esta pode ser facilmente regulável, a velocidade será diminuída ou aumentada
conforme as circunstâncias o exijam, assim se obtendo uma menor ou maior penetração da radiação
esterilizante.
A dose de radiação utilizada neste processo de esterilização corresponde a cerca de l milhão de
Rõentgens e pode afectar as substâncias a ela submetidas. De facto, acontece que alguns sólidos
escurecem e certas soluções turvam ou floculam depois de irradiadas, pelo que esta técnica não deve
ser aplicada indiscriminadamente.
Se bem que este método de esterilização seja mais dispendioso que os métodos clássicos, está
sendo aplicado a alguns produtos, especialmente material de sutura. Na realidade, verificou-se que os
cat-guts esterilizados por este processo são mais resistentes e provocam menor incidência de reacções
tissulares do que aqueles que são
397

esterilizados pelo calor, pelo que tal processo é hoje aplicado rotineiramente a tais
f
produtos. ..'••-. . > • . . - • - ~
Também os conjuntos usados nas perfusões, seringas, agulhas, sondas e cânulas
são, actualmente, esterilizadas por radições (i, assim como certas vitaminas e anti
bióticos no estado sólido (penícilina, estreptomicina, tiamina, riboflavina). Em geral, as
preparações farmacêuticas líquidas não podem ser esterilizadas por radiações ionizantes,
pois estas alteram-nas profundamente, actuando não só sobre o solvente mas também
sobre a própria substância medicamentosa. . . ,,... „,..

- 8.4.1.2.4.2. Raios y <• ^ -,. : ^

São radiações de elevada energia emitidas por certos isótopos radioactivos. A quantidade de
energia E que uma radiação é capaz de fornecer representa o seu quan-tum e é dada pela equação E
= h v (3)

em que -.' . •;•_•:

/i = constante de Planck
v = frequência da radiação: ———
c = velocidade da luz .

\ = comprimento de onda da radiação.

Substituindo em (3) v pelo seu valor, teremos que

(4), ,
K ., ..^iv

pelo que a quantidade de energia cedida por uma radiação, cada vez que actua localmente, será tanto
maior quanto menor o seu comprimento de onda.
Como as radiações y são de menor comprimento de onda que os raios catódicos e ultravioletas,
por exemplo, possuem um quantum mais elevado do que aqueles, e, por conseguinte, são também
dotadas de muito maior poder penetrante, o qual é de alguns decímetros. Em virtude desta
propriedade, os raios y apresentam, em relação a outras radiações de menor energia, a vantagem de
actuarem, praticamente, em toda a espessura do material a esterilizar, pois a sua penetração é
exponencial e obedece à lei de LAMBERT-BEER:
398

em que / é a quantidade de radiação que atinge uma superfície de espessura x, I é a quantidade de


radiação emergindo dessa espessura x e \í é o coeficiente de absorção para a radiação em causa.
Sucede, porém, que o grande poder de penetração dos raios y torna difícil centrados sobre um
objecto e evitar a irradiação do espaço circunvizinho. Este facto obriga a proteger os locais de
trabalho com material relativamente opaco, como vidro conlendo chumbo, o que encarece bastante
as instalações utilizando este tipo de radiação.
Em geral, utilizam-se como fontes produtoras destas radiações o Cobalto 60 e o Tântalo 182, os
quais originam raios y com uma energia média, respectivamente, de 1,23 e 1,15 MeV; o Césio 137
também se usa para o mesmo fim. Se esta energia é suficiente para que os raios emitidos penetrem em
frascos de grande capacidade, a esterilização apenas será obtida rapidamente e em escala industrial
desde que a dose de radiação seja adequada, o que implica pôr em jogo uma quantidade muito
considerável de radioisótopo. Assim, está calculado que para uma fábrica de penicilina, de tamanho
médio, são necessários 50 mega-curies de isótopo radioactivo para esterilizar a sua produção, o que
representa uma grande quantidade de matéria-prima irradiante. Além disso, como a radiação nunca
pode ser interrompida, são necessárias as maiores precauções para proteger o pessoal, devendo
todas as operações de exposição serem comandadas à distância, o que torna este processo bastante
oneroso na prática.
Por outro lado, verifica-se que o vidro escurece por influência dos raios y, o que, entretanto, se
pode evitar incorporando-lhe cério, além de que muitos produios químicos são mais ou menos
profundamente alterados depois de expostos a estas radiações. Islo explica, aliás, por que motivo a
sua utilização é ainda muito limitada.

8.4.1.2.5. Esterilização por radiações não ionizantes 8.4.1.2.5.1. Luz

ultravioleta

Desde há muito se sabe que a luz solar exerce um efeito microbicida apreciável, atribuindo-se-
lhe, por exemplo, um acentuado papel na depuração espontânea das toalhas de água. É, sobretudo, a
radiação ultravioleta c responsável pelas propriedades esterilizantes da luz solar e, como tal, tem
recebido aplicações práticas, principalmente na depuração do ar ambiente, em hospitais,
laboratórios, etc. Considera-se que são as radiações compreendidas entre 2400-2800 Â as mais
eficazes, mas em geral as radiações ultravioletas mais vulgarmente utilizadas são as produzidas em
lâmpadas de quartzo, com vapor de mercúrio, que emitem 95% das suas radiações no comprimento de
onda Je cerca de 2500 Â. Tais radiações matam ou exercem efeitos nocivos não apenas sobre
bactérias, mas, também, sobre fungos, vírus e protozoários. Dado, porém, que estas radiações têm
muito fraco poder penetrante, só podem ser usadas para esterilizar superfícies, além de que o seu
poder esterilizante está praticamente limitado às
399

suspensões bacterianas em água pura. Na realidade, se a água tem outras substâncias em suspensão
ou em dissolução, particularmente certos compostos orgânicos, estes absorvem as radiações
ultravioletas e impedem-nas de atingir os microrganismos nela presentes.
Pode dizer-se que no campo farmacêutico as radiações ultravioletas não têm aplicação na
esterilização propriamente dita de produtos medicamentosos. De facto, as soluções apenas são
esterilizadas pela luz ultravioleta quando expostas, directamente, em recipientes de vidro abertos e
oferecendo uma superfície grande e muito delgada, o que tira qualquer utilidade prática ao processo,
ou, então, quando encerradas em recipientes de quartzo ou sílica, pois o vidro normal não é
penetrável por estas radiações. Acontece, ainda, que a grande maioria das substâncias cujas soluções
devem ser esterilizadas absorvem fortemente a luz ultravioleta ou são por elas alteradas, dada a sua
grande actividade fotoquímica.
Por todos estes motivos, as radiações ultravioletas apenas são utilizadas nos laboratórios
farmacêuticos para a manutenção de ambientes assépticos, aliás de capital importância na produção
e acondicionamento de certos produtos medicamentosos e outros, como os antibióticos, por exemplo.
Na verdade, a indústria farmacêutica faz largo uso da aplicação localizada de radiações
ultravioletas de alta intensidade sobre linhas de produção, em zonas estéreis destinadas ao
enchimento e capsulagem de recipientes, câmaras assépticas, em sistemas de condutas de ar a
fornecer a essas zonas, enfim, numa variedade de locais e condições em que a contaminação
bacteriana possa constituir um problema.
As lâmpadas de raios ultravioletas usadas para fins esterilizantes devem estar sujeitas a uma
inspecção cuidadosa, a qual deve incidir, principalmente, sobre o seu estado de limpeza e intensidade
de emissão. Na realidade, a existência de pó ou gordura sobre a superfície de vidro destas lâmpadas
reduz grandemente a intensidade da radiação emitida. Acontece ainda que a estrutura cristalina do
tubo de vidro da lâmpada se modifica gradualmente, resultando disso que uma apreciável quantidade
da radiação de 2537 A não passa para o exterior, pelo que em tal eventualidade a lâmpada deve ser
substituída.
O pessoal que trabalhe em áreas onde estejam instaladas lâmpadas de luz ultravioleta deve
estar protegido da acção dos raios directos ou reflectidos, pois eles podem originar vermelhidão da
pele e irritação intensa e dolorosa dos olhos.
As observações inicialmente feitas por CATES, em 1929, levaram a admitir a existência de uma
provável relação entre o comprimento de onda germicida e o absorvido pêlos componentes do DNA
(ácido desoxi-ribonucleico). Investigações subsequentes estabeleceram que há de facto uma ligação
nítida entre a curva da acção germicida e a curva da absorção no ultravioleta dos ácidos nucleicos ou
dos seus constituintes e que é essa absorção que desencadeia uma série de reacções conducentes à
morte da célula. Aliás, a acção dos espectros de efeitos mutagénicos ou capazes de retardarem a
divisão celular lembra, igualmente, a curva de aborção dos referidos ácidos.
400

8.4.1.2.5.2. Ondas curtas :


"**
São ondas hertzianas cujas frequências são de l a 50 megaciclos/s e actuam sobre os
microrganismos mercê da elevação da temperatura que provocam no meio irradiado à custa de
perdas dieléctricas.
O aquecimento dieléctrico é utilizado para se alcançar em pouco tempo, em materiais maus
condutores, temperaturas elevadas e uniformes, e processa-se de um modo diferente do aquecimento
normal. Neste a superfície externa do material é a primeira a ser atingida e o calor só chega à zona
interior ao fim de certo tempo, mais ou menos longo, pelo que há sempre uma acentuada diferença
térmica entre a periferia e a parte central do objecto. No aquecimento dieléctrico as coisas passam-se
de maneira diferente, pois as moléculas da substância má condutora orientam-se tão rapidamente
quanto a frequência do campo a que estão sujeitas, acontecendo que as perdas dieléctricas,
responsáveis por este tipo de aquecimento, atingem quase simultaneamente tanto a superfície como o
interior do corpo. Dado, porém, que se regista uma certa irradiação de calor à periferia, esta ficará
sempre a uma temperatura ligeiramente inferior à da parte central do objecto, pelo que se diz que o
aquecimento dieléctrico se faz de dentro para fora.
Em face disto, é compreensível que, do ponto de vista teórico, as ondas curtas apresentem
vantagem sobre os outros métodos convencionais de esterilização pelo calor, pois exigem uma menor
exposição ao agente esterilizante, a qual, por vezes, não ultrapassa alguns segundos. Este facto torná-
la-ias, por isso, recomendáveis para a esterilização de substâncias incapazes de suportarem
temperaturas elevadas durante tempo considerável e, por conseguinte, tal processo tem sido objecto
de vários estudos. Citamos, entre eles, a investigação levada a cabo por LUPI NOGUEIRA, o qual chegou,
porém, à conclusão de que tal processo oferece determinadas dificuldades de execução, pelo que está
ainda muito longe de poder constituir um método prático de esterilização de líquidos injectáveis.

8.4.1.3 Ultra-sons \^; !" ,

Na prática consideram-se ultra-sons aquelas ondas cujas frequências se situam entre 10


kilociclos e 1,5 megaciclos por segundo, sendo estas últimas obtidas em aparelhos que utilizam as
vibrações do quartzo piezoeléctrico.
Se bem que os ultra-sons também provoquem uma elevação de temperatura nos líquidos a eles
expostos, a maioria dos autores está de acordo em que estas radiações exercem o seu efeito letal
sobre os microrganismos através de uma acção específica, a cavitação. Tal fenómeno consiste na
formação de pequenas cavidades, correspondentes a zonas de pressão reduzida, seguidas do seu
rápido colapso, motivado por zonas de
401

acentuadíssima pressão mecânica. Estas variações de pressão, alternando com muita frequência (2 x
IO4 e l x 166 vezes por segundo), seriam as responsáveis pela morte dos microrganismos devido à
ruptura das respectivas membranas. Entretanto, como se observa a formação de água oxigenada nas
soluções aquosas tratadas pêlos ultra-sons, tal facto limita bastante o seu emprego como método de
esterilização de preparações injectáveis.

8.4.1.4. Esterilização por filtração

Uma vez que os microrganismos geralmente presentes numa solução têm dimensões muito
grandes em relação às moléculas dissolvidas, é possível separá-los, mecanicamente, desde que se
utilizem superfícies filtrantes com as características apropriadas. Tal processo de esterilização é
susceptível de prestar bons serviços no caso de líquidos termolábeis; no entanto, apesar de existirem
hoje filtros capazes de relerem alguns vírus, a esterilização por filtração é considerada,
tradicionalmente, como uma técnica falível, e, como tal, reservada, apenas, para aqueles produtos
que, pela sua natureza altamente instável, não possam ser esterilizadas pêlos processos usuais
baseados no emprego do calor.
Este processo de esterilização é admitido por várias farmacopcias, as quais, porém, só o
recomendam quando outros métodos, considerados como mais eficazes, não podem ser utilizados.
Trata-se, na realidade, de uma técnica de execução delicada, cujo sucesso depende do emprego de
elementos filtrantes com poros de dimensões iguais ou inferiores a 0,22 (4-m (') e obrigando à
observação de rigorosas condições de assepsia, pois só deste modo poderá haver uma probabilidade
aceitável de o líquido filtrado se apresentar estéril.
Dado que as superfícies filtrantes utilizadas neste processo de esterilização, sobretudo as velas,
podem ter soluções de continuidade, o que seria desastroso para a eficácia da operação, impõe-se
que esta seja verificada experimentalmente. Para isso, utilizam-se suspensões de determinadas
espécies microbianas, como Serratia marcescens ou Chromobacterium prodigiosum, as quais, depois
de filtradas através do elemento filtrante em ensaio, devem ficar isentas de qualquer microrganismo,
o que se verifica incubando o filtrado na estufa, durante alguns dias, a 37°C. Esta técnica de controlo
dos filtros aplica-se, aliás, tanto às superfícies rígidas, isto é, às velas, como aos vários tipos de
discos utilizados na filtração esterilizante.

{'} A filtração é um fenómeno complexo, em que intervém não só a retenção mecânica das
partículas cujas dimensões são superiores às dos poros do filtro, como igualmenle. várias
acções físico-
-químicas, entre elas a carga eléctrica do filtro e das partículas cm suspensão no meio a filtrar.
402

8.4.1.4.1. Tipos de filtros usados na esterilização

São vários os tipos de filtros que podem ser utilizados na esterilização de líquidos, os quais
agruparemos do seguinte modo:

a} Velas porosas.
b) Discos de amianto ou amianto e celulose.
c) Filtros de vidro poroso.
d) Discos de celulose tipo Millipore ou membranas de celulose.

Dado que as principais características de todas estas superfícies filtrantes e os dispositivos


usados na prática já foram tratados no capítulo referente à Filtração, a ele remetemos o leitor,
limitando-nos, agora, a citar, dentro de cada categoria, os filtros com propriedades estéril izantes.
Ames, porém, voltamos a frisar que esta técnica de esterilização obriga a trabalhar em rigorosas
condições de assepsia, sem o que os resultados a que conduz são mais que duvidosos. Deste modo, é
absolutamente indispensável que o filtro, incluindo o elemento filtrante propriamente dito e o
respectivo suporte, sejam previamente esterilizados, podendo esta esterilização prévia ser feita sobre
o conjunto suporte-filtro já montado, ou esterilizando cada uma das partes em separado. Além disso,
todo o material que possa contactar com o líquido, como balões, tubos, ctc., terá que ser, igualmente,
esterilizado. Todos os filtros a seguir citados, exceptuando os filtros de ZSIGMONDY e os de vidro
poroso, tanto podem trabalhar sob pressão como por sucção.

8.4.1.4.1.1. Velas porosas

Compreendem as velas de BERKEFELD-MANDLER (Pag. 76) e as de CHAMBERLAND--SELAS (Pag. 76). Na


filtração esterilizante só se devem utilizar velas de BERKEFELD correspondentes à porosidade W W e
velas de CHAMBERLAND L? ou L / r podendo, em ambos os casos, conduzir-se a operação sob pressão ou
por sucção. No uso e manutenção destes elementos filtrantes é aconselhável respeitar as seguintes
instruções, fornecidas pela Selas Corp. e reproduzidas no Remingtorí s Pharmaceutical Sciences:

Preparação dos filtros — Antes de ser usado, o filtro deve ser lavado com água destilada, a fim
de se arrastarem as poeiras existentes no seu interior. Em certos casos é conveniente fazer passar
através dele uma mistura quente constituída por l parte de ácido clorídrico e 3 partes de água
destilada, para se remover qualquer impureza adsorvida, seguindo-se uma lavagem cuidadosa com
água destilada, até eliminação completa do ácido. Após isto, monta-se a vela no respectivo suporte e
procede-se à esterilização do conjunto na autoclave.
403

Limpeza — O filtro deve ser cuidadosamente lavado logo após a sua utilização, nunca se
devendo, seja sob que pretexto for, deixar secá-lo antes de ter sido lavado. Para isso, deve começar-
se por emergi-lo em água, fazendo-o atravessar, seguidamente, pelo mesmo líquido em sentido
inverso ao utilizado na filtração.
Em certos casos torna-se necessário utilizar processos mais drásticos, podendo recorrer-se
então a um dos seguintes métodos:

l — Mergulhar o filtro em ácido azótico concentrado ou em solução de dicromato, própria para


limpeza de material, durante um mínimo de 6 horas e, de preferência, durante a noite. Lavá-lo,
depois, com abundante quantidade de água até esta não acusar reacção ácida.
Quando o filtro estiver altamente contaminado, recomanda-se submetê-lo a um aquecimento
conduzido do seguinte modo:

1 — Secar o filtro cuidadosamente.


2 — Colocar o filtro numa mutla à temperatura ambiente e aquecê-lo a cerca de 670°C, ao
ritmo de cerca de 150"/hora.
3 — Mante-lo à temperatura de 670°C durante, aproximadamente, l hora, e deixá--lo arrefecer
na mufla até atingir a temperatura ambiente.
4 — Fazer passar através dele água em abundância, para retirar dos poros o material
carbonizado.

8.4.1.4.1.2. Discos de amianto

Ulilizam-se principalmente os discos SEITZ (págs. 79 e 83) E.K., E.K.S., E.K.S.I. e E.K.S.2. ou
Sterimat, S.B. FORD, montados em suportes especiais, já anteriormente descritos, podendo
esterilizar-se o conjunto na autoclave a I20"C. Acontece, porém, que alguns destes discos são
preparados á custa de uma mislura de amianto e celulose e esta é susceptível de carameli/ar
ligeiramente àquela temperatura, pelo que é recomendável lavar o filtro, previamente, com água
destilada esterilizada, o que evitará o aparecimento de qualquer coloração nas primeiras porções do
filtrado. Além disso, estes filtros retêm unia quantidade apreciável de líquido aquoso, originando, por
isso, perdas de filtrado, podendo ser utilizados em sistema de filtração sob pressão ou por sucção,
dando-se preferência, geralmente, à primeira destas modalidades.

8.4.1.4.1.3. Filtros de vidro poroso

São muito utilizados na filtração esterilizante os filtros deste tipo com número de porosidade 1,6
(Tabela VII, pág. 78), os quais trabalham por sucção. A fim de evitar a colmatação dos poros destes
filtros, recomenda-se fazer, previamente, uma filtração
404

clarificante do líquido a esterilizar. Depois de utilizados, os filtros de vidro poroso devem ser
cuidadosamente limpos com mistura cromo-sulfúrica ou com ácido sulfúrico adicionado de nitrato de
sódio ou de potássio (12 horas de contacto), após o que são lavados com água até esta acusar
reacção neutra. Estes filtros esterili/am-se na auto-clave.

8.4.1.4.1.4. Membranas de celulose

As membranas de celulose modificada utilizadas na ultra-filtração desde há bastante tempo têm


sido empregadas com o fim de remover bactérias de certos líquidos. Inicialmente, usavam-se
membranas de nitrocelulose, oferecendo a Membranfilter--Gesellschapt, de Gòttingen, vários destes
filtros preparados segundo o processo de ZSIGMONDY. Estas superfícies fillranles, no entanto, apenas são
aconselháveis para certos casos especiais, como as análises bacteriológicas da água e provas de
esterilidade, não se prestando para a filtração de grandes volumes de líquido, dado que o seu débito é
muito pequeno.
Mais recentemente, a Müiipore Filter Corporation lançou no mercado uma gama muito completa
de discos fabricados com acetato de celulose, os quais permitem esterilizar, eficazmente, muitos
líquidos alteráveis pelo calor e estão sendo largamente utilizados em todos os laboratórios de
produtos farmacêuticos.
As características destes filtros foram indicados nas págs. 91 e 97, utilizando-se na
esterilização, sobretudo, os filtros HA (0,45 M, de diâmetro de poro) e GS (0,22 já), obteníveis em
diversos tamanhos, escalonados desde 13 mm a 293 mm. Dos dois, o filtro GS é o mais usado,
recomendando-se o seu emprego na filtração de soluções contendo soro, plasma ou tripsina,
susceptíveis de inquinação com espécies de Pseudomona ou outros microrganismos de menores
dimensões, os quais são relidos por aquela superfície filtrante. O filtro HA, porque tem poros mais
largos, origina um débito de filtrado cerca de três vezes superior ao obtido com o filtro GS, mas só
deve ser utilizado quando no produto a esterilizar não haja microrganismos cujas dimensões sejam
inferiores a 0,45 (J.
Estes filtros Müiipore podem ser utilizados virtualmente para a esterilização de todas as
soluções farmacêuticas e de muitos líquidos biológicos, devendo o tamanho do filtro e o respectivo
suporte serem escolhidos de acordo com o volume de líquido a esterilizar.
A fim de exemplificar os cuidados a observar para que a filtração atinja o máximo de eficiência,
os fabricantes agrupam os diferentes líquidos em três classes distintas, cada uma das quais engloba
produtos considerados representativos dentro de cada grupo. A partir dos exemplos dados poder-se-á,
por semelhança, estabelecer as condições a adoptar na filtração de qualquer outro produto.
405

Assim, temos:
- •*»•-

Classe / — Engloba as soluções aquosas, portanto as mais usuais em farmácia, as quais podem
ser filtradas directamente através do filtro, recomendando-se que em certos casos se coloque sobre
este, no mesmo suporte, um pré-filtro (pág, 94).
Estão incluídas nesta classe a água destilada, soluções endovenosas salinas e de
glucose, soluções oftálmicas, de vitaminas, etc. i•

Classe II — Neste grupo incluem-se os líquidos de natureza ,oieica ou oleosa, que exigem
tratamentos prévios à filtração esterilizante propriamente dita, tais como sedimentação, centrifugação
ou pré-filtração clarificante. São exemplos típicos desta classe os óleos vegetais, meios líquidos de
cultura não sintéticos e os meios de cultura de tecidos.

• Classe Hl — Inclui os produtos tidos como de filtração difícil, como soros, plasmas e outras
fracções do sangue, os quais exigem um tratamento prévio mais laborioso, como seja uma filtração
através de filtros sucessivamente mais apertados, antes da esterilização propriamente dita pelo filtro
GS.
Tanto os suportes como os filtros devem ser esterilizados por gás ou na autoclave. Neste último
caso recomenda-se uma exposição ao vapor a 121°C, durante 30 a 45 minutos, devendo ter-se em
especial atenção que tanto a temperatura como o tempo referidos são críticos, não suportando estes
filtros temperaturas superiores a 125°C. Além disso, recomenda-se deixar que a pressão da
autoclave, terminada a operação, desça lentamente, nunca se devendo promover a expulsão brusca
do vapor.

8.4.2. ESTERILIZAÇÃO POR SUBSTÂNCIAS QUÍMICAS NO


ESTADO GASOSO
-..•.- •»'

Neste capítulo apenas consideraremos o emprego de substâncias químicas no estado gasoso ou de


vapor para a destruição de todos os microrganismos vivos que contaminam um material sólido de
qualquer natureza.
Se bem que a esterilização por gases, conforme hoje é praticada, constitua uma conquista
relativamente recente da tecnologia, a verdade é que a ideia do emprego de vapores, como agentes de
desinfecção, surgiu há várias centenas de anos atrás. Na realidade, deste tempos imemoriais que se
vem tentando purificar o ar por fumigação e na Idade Média era hábito, durante as epidemias,
submeter as missivas aos fumos resultantes da incineração de determinados produtos, com a crença
de que tal prática poderia obstar à disseminação das doenças. Se bem que estes processos não
tivessem qualquer base científica, repare-se que, no entanto, constituíam uma atitude absoluta-
406

mento lógica perante o conceito então dominante de q ue as doenças eram causaaas por miasmas e
vapores deletérios, cujos efeitos perniciosos seriam combalidos pela acção de outros vapores.
Não admira, por i.sso, que, uma vê? demonstrado por PASTIÜ K que as doenças eram provocadas
por germes, se voltasse ã velha prática de p u rifi c ar o ar. mas agora aplicada à desinfecção de
enfermarias e salas de operações, a ("im de se diminuírem os riscos de infecção pós-operatória.
A LISIHR, famoso cirurgião escocês, contemporâneo de PASTHUK. se ficou devendo a primeira
tentativa, com bases verdadeiramente científicas, realizada nesse sentido, a qual consistia em
desinfectar a atmosfera dos teatros operatórios com pulverizações de fenol. Porém, as atenções
gerais concentraram-se, especialmente, na desinfecção do ar em recintos contagiados, mas foram os
aperfeiçoamentos conseguidos na íccnicu de desinfecção por fumigação que conduziram, mais tarde,
à prática de esterilização por gases, tal como hoje a entendemos.
Este processo de esterilização é hoje correntemente aplicado a vários materiais e a certos
medicamentos no estado sólido, sendo necessário, contudo, util i/ ar para cada gás condições bem
determinadas de temperatura, concentração, humidade e tempo de actuação,
Segundo LHOI-ST, as qualidades que um gás esterilizanlc ideal deveria possuir são as seguintes:

1) Ter uma actividade intensa e rápida contra bactérias, esporos e vírus, se


possível à pressão atmosférica.
2) Ter uma inércia total face ao material a esterilizar.
3) Possuir um excelente coeficiente de difusão, assegurando-lhe uma fá cil pene
tração e completa eliminação após a esterilização.
4) Ser inócuo para o homem e os animais.
5) Não ser inflamável.
6) Poder ser facilmente armazenado e manipulado.
7) Ser activo na ausência de humidade.
8) Ser de baixo custo e facilmente obtenível.

É evidente que qualquer dos gases até hoje conhecidos e usados na esterili/ação está longe
de obedecer a tais requisitos, e apenas o óxido de etileno se aproxima das condições exigidas por
LHOI-.ST. .

8.4.2.1. Formaldeído

Vários investigadores, como RIDEAI., TRILI.AT e outros, demonstraram, nos fins do século passado,
que os vapores de formol, cuja actividade microbícida já t i nh a sido estabelecida anteriormente,
podiam ser utili/ados. com êxito, na desinfecção de atmos-
407

feras confinadas. Isto foi o ponto de partida para a generalização do uso dos vapores de aldeído
fórmico na desinfecção de locais onde tivessem permanecido indivíduos sofrendo de doenças
infecciosas, prática seguida durante muitos anos pelas autoridades sanitárias de quase todas as
nações.
Mercê disso, é copiosa a literatura sobre a utilização do formaldeído para tal fim, tendo sido
possível estabelecer-se, através dos elementos coligidos, que a acção desinfectante deste gás depende,
fundamentalmcnfe, da temperatura a que actua e da humidade relativa do meio ambiente.
Na realidade, o aldeído fórmico gasoso apenas é estável a cerca de 80°C, acontecendo que à
temperatura ordinária se polimeriza e condensa facilmente sobre os objectos com os quais entre em
contacto, neles se depositando sob a forma de uma película. São vários os polímeros sólidos de
formaldeído, sendo uns cíclicos, como o trioxime-tileno, e outros de estrutura linear, como o
paraformaldeído.
Em consequência da sua rápida condensação e polimerizaçào à temperatura ambiente, o aldeído
fórmico gasoso apenas possui certa acção desinfectante cm profundidade quando actua a uma
temperatura relativamente elevada, pelo que a esterilização pêlos vapores de formol é feita em estufas
especiais.
Tais estufas são aquecidas a uma temperatura entre 80-85°C e estão equipadas com dispositivos
que permitem a vaporização simultânea de água e formol, devendo o material a esterilizar
permanecer em contacto com o gás durante, pelo menos, 2 horas.
Este processo é utilizado, principalmente, na esterilização de instrumentos cirúrgicos c médicos
e de certos materiais que não suportam as temperaturas exigidas pelas técnicas baseadas na acção do
calor, como artigos de borracha, de nylon, matérias plásticas, acetato de celulose e outros. Não tem,
porém, qualquer aplicação na esterilização de produtos farmacêuticos propriamente ditos, uma vez
que numerosas substâncias medicamentosas reagem com o formol e se torna difícil eliminar as
quantidades residuais deste gás.

8.4.2.2. Oxido de etileno

O uso dos vapores de óxido de etileno na esterilização é relativamente recente mas generalizou-
se nos últimos vinte anos, sendo este o gás actualmente mais utilizado na esterilização de produtos
terapêuticos no estado sólido. Tal facto deve-se à circunstância de muitas das desvantagens
encontradas no emprego do aldeído fórmico não se verificarem com o óxido de etileno, que pode ser
facilmente obtido e libertado em estado puro, não se polimeriza nem condensa sobre as superfícies
com que contacta e é rapidamente eliminado por simples arejamento.
O óxido de etileno é um gás incolor à temperatura ordinária, liquefazendo-se facilmente a
10,8ÜC e congelando a -111,3°C. Tem um cheiro etéreo, de certo modo agradável, e a sua toxicidade
por inalação é semelhante à do amoníaco. As soluções
408

aquosas de óxido de etileno são vesicantes para a pele e mucosas, o mesmo acontecendo com os produtos
que tenham absorvido o gás e sejam, depois, mantidos em contacto com o corpo humano,
A fórmula do óxido de etileno C//,—— CU. mostra que se trata do mais simples
<^o^-
composto epoxi existente e explica por que motivo se atribui o seu poder microbicida a uma acção
alquilante. Este gás é, por outro lado, altamente inflamável, e desde que a concentração dos seus
vapores no ar atinja 3% pode dar-se uma combustão seguida de explosão se o ar estiver confinado.
Por isso, na prática utiliza-se uma mistura constituída por 10% de óxido de etileno e 90% de
anidrido carbónico, conhecida por Carhoxide, a qual se pode combinar com o ar em todas as
proporções sem que haja risco de se inflamar,
Todavia, esta mistura tem um inconveniente devido à grande diferença das tensões de vapor
dos dois gases, sucedendo que o anidrido carbónico tem tendência a expandir-~se em primeiro
lugar, originando-se, por isso, um produto que se vai enriquecendo progressivamente em óxido de
etileno, com o consequente risco de se tornar explosivo. Além disso, também pode haver separação
dos dois gases motivada por arrefecimento, c após condensação do óxido de etileno apenas fica no
estado gasoso o anidrido carbónico o qual, porém, é inactivo.
Para evitar os inconvenientes apresentados pelo Carhoxide, esiudaram-se, nos últimos anos,
misturas de óxido de etileno com outros gases possuindo tensões de vapor próximas da daquele, o
que diminui os riscos de alteração das proporções dos respectivos componentes sob a influência de
variações térmicas. Eis duas dessas misturas:

Cryoxide 11% de óxido de etileno


54% de triclorofluorometano
35% de diclorodifluorometuno
Peunoxide 12% de óxido de etileno
88% de diclorodifluorometano

A acção microbicida do óxido de etileno exerce-se lentamente, sendo o tempo de exposição


necessário para se obter a morte dos germes tanto maís curto quanto mais elevadas forem a
temperatura e a concentração do gás na atmosfera, conforme se pode ver na Tabela XL. Por outro
lado, verifica-se que a esterilização pelo óxido de etileno não exige uma tão grande humidade como
no caso do formaldeído, podendo dizer-se que todos os produtos que tenham um grau de humidade
correspondente àquele que os chamados produtos secos em contacto com o ar têm, são esterilizáveis
sem dificuldade por esta técnica.
As reais vanlagens do emprego do óxido de etileno não são representadas propriamente pela
rapidez, simplicidade ou economia de tal processo, mas sim pelo grande
409

Tabela XL. Tempo necessário para a esterilização pelo óxido de etileno de um tecido de
algodão contaminado com esporos de Bacillus subtilis, var, Níger

Cone. de gás em Tempo de exposição (horas)


mgilitro
1/2 l 2 4 6 8 10 24
Temperatura: 37UC
22,1 +++ ++ + 0 o o
88,4 +++ + + o o 0 O
442 + 00 0 o o
884 O O 0 o o
Temperatura: 25°C
88,4 ++ ++ + + 0 0
884 +++ ++ o o o
0
+++: inferior a 99%; ++: redução entre 99 e 99,9%; +: redução superior s 99,9%; o: ausência total
de microrganismos. Adaptado de Philips

número de produtos que podem ser esterilizados por este gás sem sofrerem alterações apreciáveis,
justamente o que não acontece quando tratados por outras técnicas. Entre eles, podemos citar os
tecidos de lã e algodão, fibras sintéticas, artigos de couro, pinturas, plásticos, produtos biológicos e
farmacêuticos, etc.
Ao pretender utilizar-se o óxido de etileno na esterilização destes últimos é necessário ter
presente que aquele composto é altamente reactivo, de modo que muitas substâncias medicamentosas
poderão reagir com ele, originando produtos cuja actividade farmacológica pode ser diminuída ou
destruída. Assim, por exemplo, KAYE e colab. verificaram que se a penicilina pode ser esterilizada
pelo óxido de etileno sem sofrer qualquer modificação detectável, já o mesmo não acontece, porém,
com a estreptomi-cina, que perde certa actividade por acção daquele gás. O mesmo se verifica, aliás,
com a vitamina B , riboflavina, nicotinamida, piridoxina e ácido fólico, o que demonstra bem a
necessidade de se determinar a estabilidade de cada substância perante o óxido de etileno.
A penetrabilidade deste gás é notável, o que permite obter-se a esterilização em profundidade;
graças a eïta característica, o material a esterilizar pode ser envolvido em papel, polietileno ou
produtos semelhantes, dado que o gás penetra facilmente através deles e é, em geral, rapidamente
eliminado uma vez terminada a operação, o que não acontece no caso do formol. No enlanlo, a
borracha e alguns plásticos dissolvem certa quantidade de óxido de etileno, pelo que a eliminação do
gás residual é, então, mais demorada.
Muitos investigadores têm acentuado o facto de que a acção microbicida do óxido de etileno
não é afectada pela presença de produtos que normalmente diminuem ou
410

anulam as propriedades microbicidas da maioria dos agentes químicos. Assim, PHILLIPS pôde verificar
a destruição, pelo óxido de etileno, de esporos microbianos exsicados, quando misturados com fezes,
vaselina, óleo lubrificante, etc., desde que a camada a atravessar pelo gás não fosse demasiado
expessa.
Outra propriedade que impõe o óxido de etileno corno agente esterilizante é a de que,
aparentemente, é activo contra todos os tipos de microrganismos, incluindo bactérias, fungos e vírus.
O tratamento do material a esterilizar com óxido de etileno pode ser feito utilizando
equipamento bastante variável, desde dispositivos improvisados até aparelhos especialmente
construídos para o fim em vista, representando-se na Fig. 200 o esquema de uma instalação
industrial em que se utiliza o óxido de etileno sob pressão.

Fíg. 200. Aparelho para a esterilização por óxido de etileno

A mistura gasosa, isto é, o Carboxide, armazenada na garrafa metálica, /, entra na câmara de


expansão, 2, previamente aquecida a 40-50°C e evacuada de ar. Daqui o Carboxide passa à
auloclave, 3, também aquecida àquela temperatura e mantida a uma pressão negativa de 20-55 mm
de Hg. A pressão atingida pela mistura gasosa na autoclave é da ordem de 1,2-3 atmosferas,
prolongando-se a exposição do material a esterilizar durante 4 a 8 horas, dependendo o tempo de
actuação do gás das características desse material e do seu grau de poluição. Finda a operação, a
autoclave é evacuada pela bomba 4, após o que se deixa entrar no aparelho ar esterilizado, uma vez
que este antes de penetrar na câmara, é obrigado a atravessar o filtro 6.

8.4.2.3. Outro gases

Além do aldeído fórmico e do óxido de etileno, vários outros gases têm sido mencionados na
literatura como possuindo propriedades microbicidas. Entre eles podemos citar o ozono, brometo de
metilo, cloropictïna, óxido de propileno, epidoridrina
411

e etileninümi. Alguns deles têm sido ulili/ados cm casos especiais mas nuihuin se mostrou ainda capaz
de destronar o óxido de etileno. Assinalc-se, todavia, que a ai-leni mi na c dotada de extraordinária
actividade, indicando MAYO. MUSI-R c KAVI-: que este composto, em determinadas condições, apresenta uma
actividade mais de cem vezes superior à do óxido de etileno. Acontece, porém, que, à semelhança do
que sucede com o aldeído fórniico, a acção microbicida da etilenimina está dependente de uma
humidade relativa elevada, além de que este gás é inflamável e corrosivo paru muitos metais, tudo
factores que se opõem ao seu uso generalizado.
Mais recentemente, leni se utilizado os vapores de $-pyopu>lactomi como agente estéril i/ante de
certos produtos biológicos, como plasma, vacinas constituídas por vírus ínactivados e enxertos de
artérias humanas. O seu poder esterilizante é extremamente acentuado contra bactérias, fungos e
respectivos esporos.

BIBLIOGRAFIA

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dclphia, 1961.
412
413

II PARTE

FARMÁCIA GALÊNICA
414
415

Introdução

11 DEFINIÇÃO E OBJECTIVOS DA FARMÁCIA GALENICA

A Farmácia (. ialém ea c uma c-iéncm de aplicação q u e tem por f i m obter prepyTii-eòev


farmacêuticas, a que se dá o nome ilc mccUc;imenios. lestas preparações i l c vf i u ser doudas d ti
máxima a c i i \ idade, doseadas com a maior precisão e apresentadas sob u n i a forma que.
facilite u SD.J conservação c administração.
A f-armácia <. jalvuica estuda, poi lanto. a ! MH s formação cm medicamentos, dos produtos
naiurais Uumnuis, vegetais c línneryts), mi de síntese, loniando o^ ^üsvvpiu^i 1 -de .serem
admini-.irados aos seres vivos com fins profilácticos. í ui,i ií \ o \ ou ik diui;nôsiico das \árias
doencj.s,
Os \m-ii(c<.uin'n{<f\ upieseniam-se sob diversas fornias, ;i <(<ie chamaremos fi>rtthi.\ íainuit
('inií. as. listas são o resultado das varias operação -J iliie w-e svihmeiem as suhs-tàücias
nicdicamçnlosas u l i m de kiciiitarcrn a MUI posologia. admims\v,ïv.io, mascaiai o^ caracteres
o.r»anoieplicos e assc«urur a acc;;io desejada. As lonnas UirtnacèuHeas são \e /e s la m b e m
desititiatlas por !>'n-»iíis x u í r t i i f i i * ou f < * i t i h ( \ t n < \ i t f n f i i c f i i i > \ t i \ . Ha s npos de ío['tí):i\
kiniucèuiicas. como >s po,s. os comprimidos. ii\ xaropes, as pomadas, o.s suposiionos, os
óvulos, os colírios, ele., podendo, eonlorme a comenién cia, CÍITÍ mcMiio princípio
medicamentoso ser dispensado soh uma ou ouiia desias formas. A pemcihna (í c^nslitui exemplo cie
um produto que poderá sei m i t t / u d o sol) a forma de pó, de solução aquosa, de xarope, ile
capsulas, de comprimidos. <V poma das, de supositórios, tle tfi.jeclável. de óvukvs. ele. testas
diferentes lornus ilc apivsen-VacCu» constidiem as 1'ormas íarniaceulicas c cada vnua delas,
im)i\ ulualmenle. eorres-ponde \\ tiina iormuhi ou medieamenlo contendo pente Uma. ('orno st-
compreende, haverá nunierosíssuiTas tórmuías apresetiladas sob .1 mesma Vorma jmleuieu, já
t(tic o conceilo cie fórniuU» deponde uiúcamenle do cnlerio qualttali\o e quatuitanvíi que preside
a sua elaboração.
Para conseguir reali/ar o seu objeclivo, <v Kumáeia Cïalénica ser\e-se <je numerosas
ci'Micia.s fundamentais, como a física, a q u í m i ca e a botânica, e de ciên cia s de aplicação,
como a farmueojínüsia e a larmaeodiiiamut. ("oníugando esses conhecimentos, a Farmácia
(ialenica ocvipa se eiu obter piepara^òes medicameniosas sviscep\ivvis de se
416

conservarem com a máxima potência durante bastante tempo e de permitirem fácil administração.
Durante séculos a Farmácia Galénica só pôde recorrer a conhecimentos empíricos e a sua
missão de transformar os produtos medicinais em medicamentos era apenas uma verdadeira arte.
Actualmente, a Farmácia Galénica é, como dissemos, subsidiada por numerosas ciências,
constituindo ela própria uma ciência de aplicação e libcrtando-se cada vez mais do empirismo que a
caracterizou no passado. Efectivamente, a obtenção de medicamentos pressupõe o conhecimento
pleno das propriedades físicas, químicas e biológicas dos produtos utilizados nas preparações, bem
como os fins a que aqueles se destinam. Quer isto dizer que o farmacêutico deverá possuir uma sólida
cultura científica abrangendo noções exactas do conhecimento das matérias-primas utilizadas, da sua
compatibilidade e estabilidade e, ainda, das respectivas acções farmacológicas.
Os medicamentos devem ser verificados de rnodo a garantir-se a sua potência inicial e a
determinar-se qual o grau de destruição dos seus princípios activos com o tempo. Com efeito, uma
preparação farmacêutica não está eternamente apta a ser utilizada e, após um período mais ou
menos longo e dependente do processo de conservação, vai perdendo, progressivamente, a sua
actividade.
Na prática, considera-se que um medicamento perdeu a sua validade quando foram destruídos
mais de IO ou 15% dos seus princípios activos. O período durante o qual a. destruição se processou
até àquele limite é conhecido por prazo de validade de um medicamento.
Pelo que se disse, compete à Farmácia Galénica estudar a forma farmacêutica mais adequada
e o melhor meio de conservar os medicamentos, de modo a prolongar, na medida do possível, o seu
período de utilização.
O seu objectivo c preparar, conservar, acondicionar e dispensar medicamentos, doseados com
a maior precisão e apresentados sob uma forma que facilite a sua administração.
Em resumo, a Farmácia Galénica estuda os métodos racionais e científicos para a preparação
das formas farmacêuticas, o modo de associar as substâncias medicamentosas, as incompatibilidades
que se podem originar entre estas e a conservação das fórmulas preparadas.

1.2 EVOLUÇÃO DA FARMÁCIA GALÉNICA

O termo Farmácia Galénica representa uma homenagem a Claudius Galenus, médico-


farmacêutico (') que viveu em Roma durante o segundo século da nossa era.

(') Durante muitos anos a Medicina e a Farmácia constituíram um lodo indissociável em que o
mesmo indivíduo, médico-farmacêutico, desempenhava cumulativamente as funções inerentes ao
exercício destas duas profissões. Foram os árabes que fizeram as primeiras tentativas de separação
dos dois ramos da arle de curar, havendo, contudo, de início relações de carácter económico entre as
duas profissões. Só no século XIII foi proibida a aludida ligação.
417

Espírito verdadeiramente enciclopédico, sintetizou os conhecimentos farmacêuticos adquiridos até


então, atribuindo-se-lhe, também, a concepção de várias formas farmacêuticas. Os seus escritos
ficaram célebres e muitas fórmulas por ele idealizadas chegaram até aos nossos dias (').
A designação de Farmácia Galénica foi introduzida no século XVI e o conceito que exprimia
era muito mais restrito do que o actual. De facto, o aludido termo foi criado para significar a
Farmácia dos medicamentos complexos, que se pretendeu opor à Farmácia Química ou ramo
farmacêutico que se ocupava da preparação dos medicamentos contendo substâncias quimicamente
definidas.
Por medicamento complexo enlendia-se o que resultava da transformação dos produtos
naturais, chamados drogas, em preparações farmacêuticas constituídas por misturas de componentes
susceptíveis de serem administrados aos enfermos. Se o produto natural, submetido à mencionada
transformação, originava uma substância quimicamente definida, o medicamento com ela obtido dizia-
se medicamento químico.
Actualmente, à Farmácia Galénica compete a transformação de todas as substâncias
medicamentosas em medicamentos, quer aquelas sejam de natureza complexa, quer constituídas por
produtos químicos naturais ou sintéticos perfeitamente definidos. Observa-se, assim, que a noção de
Farmácia Galénica sofreu uma marcada evolução, tendo--se dilatado acentuadamente o conceito
inicial.
Durante muitos anos as substâncias medicamentosas de que o homem dispunha eram
exclusivamente constituídas por produtos de natureza animal, vegetal ou mineral. Posleriormente,
com o isolamento dos princípios activos, o homem teve a tentação de os substituir à droga. Este
critério nem sempre foi acertado, dado que cada droga pode conter mais do que um desses princípios,
quantas vezes uns reforçando ou compensando a acção farmacológica apresentada pêlos outros. São
numerosos os exemplos do que acabámos de dizer, mas tal assunto é mais do domínio da
Farmacognosia, sendo por isso deslocado tratar aqui desse problema.
Se, no entanto, são em elevado número as drogas que não devem ser substituídas pêlos
chamados princípios activos, também não é de negar que são numerosos os exemplos em contrário.
Razões de ordem económica e de facilidade de preparação têm levado à substituição quase
sistemática das antigas fórmulas, executadas a partir da droga, pêlos seus componentes principais
isolados ou obtidos por síntese. É esta, aliás, a tendência, cada vez mais acentuada, da Farmácia
Galénica, em parte justificada pela necessidade da preparação de medicamentos estáveis durante o
maior período possível e mais facilmente administráveis.

(') CLAUDIUS GALENUS nasceu cm Pcrgamo, em 131 da nossa era. Depois de ter estudado na Grécia e
em Esrnirna, veio fixar-se em Roma no império de MARCO AURÉLIO, que o tinha chamado a fim de
compor uma leriaga contra a peste. A sua oficina encontrava-se na Via Sacra e dela foram clientes
dois outros imperadores romanos, CÓMODO e SKPTÍMIO SEVERO. Entre as suas numerosas obras assinalamos
as seguintes: De psitana; de simpliciitm medicamentorum faculialibus; De antidote; De
medicamentorum composiíione secundum (ocos.
418

Nestas circunstâncias, observamos que as modernas Farmacopeias e Formulários vão banindo


inexoravelmente das suas monografias as fórmulas obtidas a partir dos produtos naturais. Códigos
recentes, como o norte-americano, o britânico, as Farmacopeias Europeia e Portuguesa V e tantos
outros, conservam uma percentagem mínima de extractos, tinturas, macerados, etc., incluindo, em
contrapartida, um número cada vez maior de novos produtos de síntese ou isolados de vegetais, que
empregam sob a forma de comprimidos, de supositórios, de injectáveis, ele.
Ao lado dos aspectos que acabámos de referir, são ainda de mencionar as tendências mais
recentes da Farmácia Galénica ao serviço da preparação de medicamentos concebidos e estudados
com o fim de se obter maior eficácia terapêutica e segurança de manejo. Queremos referir-nos aos
dois ramos mais recentes desta ciência — a B i ofar macia, Biofarmacotecnia ou Biogalénica c a
Farmácia Clínica. O primeiro tem como finalidade determinar as relações entre as propriedades físico-
quíinicas dos fármacos, a sua forma de administração e os efeitos biológicos observados,
constituindo uma ciência de extraordinário interesse, pois o mesmo fármaco pode ter uma acção
mais ou menos potente e eficaz consoante as propriedades físico-químicas que exibe e o modo como
foi transformado em medicamento. No que diz respeito à Farmácia Clínica, é de salientar a sua
importância pois o aparecimento de novos fármacos, cada vez mais potentes, obriga a cuidados
particulares no que respeita às incompatibilidades físicas, químicas ou biológicas a que pode dar
origem. Problemas complexos do foro toxicológico e da estabilidade medicamentosa são hoje
correntes, devido em grande parte à administração simultânea de diversos medicamentos ao mesmo
doente. Tais situações podem surgir em doentes ambulatórios e hospitalizados, competindo ao farma-
cêutico colaborar com o médico para o alertar e auxiliar na sua resolução.
A Farmacovigilância torna-se, pois, um imperativo a nível ambulatório ou hospitalar,
competindo-lhe «toda a actividade tendente a obter indicações sistemáticas sobre ligações de
causalidade provável entre medicamentos e reacções adversas» (OMS, 1972).
Assim, pode dizer-se que depois da década de sessenta se tem assistido ao nascimento e
desenvolvimento de novos ramos da ciência farmacêulica, o que obriga os profissionais conscientes a
uma preparação curricular mais lata e mais profunda.
É esta, pois, a evolução natural da Farmácia Galénica, que, de arte servindo-se do empirismo,
passou a ciência complexa e multifacetada, começando por todo o mundo a ser encarada e orientada
em bases completamente novas, em que a preparação do medicamento nunca pode ser apreciada
independentemente do f i m que dele se pretende. Há ainda muito caminho a percorrer neste sentido,
tornando-se necessário atingir um equilíbrio judicioso entre as formulações tradicionais e a
avalanche de novos dados e teorias que menosprezam a experiência das gerações passadas. É exemplo
disto o aparecimento de formulações galénicas não tradicionais, lais como as preparações
farmacêuticas de acção modificada e os novos sistemas terapêuticos.
419

Procuraremos, neste livro, situar-nos na época presente, sem, porém, esquecer que em
Farmácia Galénica, como em todas as ciências, é preciso um período de adaptação às novas
concepções, que carecem de ser verificadas prudentemente. Assim, nesta obra, tentaremos conciliar
os velhos conceitos ainda válidos com as novas teorias já suficientemente aceites. Daremos, ainda,
importância a muitas fórmulas consideradas obsoletas em países talvez mais progressivos, sem
esquecer as nossas condições de trabalho local e as limitações a elas inerentes. Do mesmo modo.
procuraremos nào olvidar os esludos galénicos que hoje se impõem como conducentes à preparação
dos mais aperfeiçoados medicamentos.
420
421

Bibliografia em Farmácia Galénica

Não pode dizer-se que seja particularmente abundante a literatura de que se dispõe em
Farmácia Galénica; contudo, melhor do que outras ciências médicas ou farmacêuticas, a Farmácia
Galénica pode orientar-se pêlos códigos oficializados a que se dá o nome de farmacopeias e/ou
formulários.
São, essencialmente, de três tipos as fontes bibliográficas ao serviço do farmacêutico ocupado
no estudo da Farmácia Galénica: as farmacopeias c formulários; os tratados gerais e outros livros
especializados em determinados sectores galénicos; os artigos publicados em revistas farmacêuticas,
de índole geral ou especializada.

2.1. FARMACOPEIAS

Por farmacopeia (do grego Pharmakon, droga, fármaco; podo, faço) entende-se uma lista de
fármacos e de fórmulas para preparar diversos medicamentos. É, pois, um livro oficial, elaborado
por uma comissão, o qual estabelece normas farmacêuticas destinadas a assegurar, numa entidade
político-geográfica determinada, a uniformidade da natureza, da qualidade, da composição e da
concentração dos medicamentos aprovados ou tolerados, sendo essas normas obrigatórias e
estabelecidas pelas entidades competentes e a elas se devendo cingir o farmacêutico.
Nem sempre a definição do farmacopeia correspondeu à noção que acabámos de dar. Durante
muitos anos as farmacopeias podiam ou não ser oficializadas e a maioria delas era elaborada por um
único autor. Às farmacopeias não oficializadas deve, de preferência, dar-se o nome de Dispensatórios.
As farmacopeias organi/adas por um único indivíduo, mas tornadas obrigatórias por decreto
estadual, eram designadas por Antidotários.
Entre nós houve várias farmacopeias do tipo dispensatório. A primeira delas, publicada em
1704 c designada por Pharmacopea Lusitana, deveu-se ao farmacêutico Frei D. CAETANO DCSANTO ANTÓNIO.
422

Além de diversas edições desta farmacopeia, saíram à luz muitos outros dispensatórios:
Pharmacopea Ulyssiponense, galenica e chymica (1716); Pharmacopea Tubalense (1735);
Pharmacopea Portuense (1766); Pharmacopea Dogmática medico--chymica e theorico-pratica (1772).
Em 1794, durante o reinado de D. Maria I, foi publicada a primeira farmacopeia portuguesa
oficializada, escrita pelo medico da rainha, Dr. FRANCISCO TAVARES. Esta farmacopeia, que constitui um
verdadeiro antidotário, manteve-se em vigência até 1835 e foi denominada Pharmacopeia geral para o
Reino e Domínios de Portugal.
Em 1835 toma-se obrigatório o uso do Código Pharmaceutico Lusitano, também chamado
Tratado de Pharmaconomia. Foi seu autor o médico AGOSTINHO ALBANO DA SILVEIRA PINTO.
A terceira farmacopeia legal, que já foi elaborada por uma comissão oficial composta por três
médicos, seis farmacêuticos e dois químicos, foi publicada em 1876 e tinha como título Pharmacopea
Portugueza. Depois de um período de vigência de sessenta anos, foi substituída por nova farmacopeia,
esta elaborada por uma comissão de médicos e farmacêuticos que de motu-próprio se constituiu para
o efeito. Esta farmacopeia representa a IV Farmacopeia Portuguesa legal. Em 1946 saiu a lume uma
segunda edição, que se mantém cm vigor na parte que não foi revogada. Posteriormente, foi criada a
Comissão Permanente da Farmacopeia Portuguesa, cujos primeiros membros foram nomeados em
1957. Essa comissão elaborou um Suplemento à 2.a Edição da IV Farmacopeia Portuguesa, o qual
entrou em vigor em 1962.
A Comissão Permanente da Farmacopeia Portuguesa procedeu à elaboração da Farmacopeia
Portuguesa V. Este código, em vigor desde 1987, compõe-se, presentemente, de 7 volumes e trata-se
de uma adaptação da Farmacopeia Europeia (European PharmacopoeialPharmacopée Européenne) do
Conselho da Europa. Sendo Portugal, actualmente, membro da CEE, é evidente a vantagem de termos
uma farmacopeia que constitui praticamente a tradução da Farmacopeia Europeia.

Cada nação tem a sua própria farmacopeia, havendo, no entanto, excepções constituídas por
países que tornaram obrigatório o uso de farmacopeias pertencentes a outras nações. Este facto
observa-se sempre que a evolução científica do país se encontra atrasada, quando a sua diminuta
área o justifique, ou ainda quando haja ligações de idioma, ancestralidade, etc., com essas outras
nações.
Existe também uma Farmacopeia Internacional elaborada por uma comissão de especialistas de
vários países, a qual se encontra publicada em francês, inglês e espanhol, edkada pela OMS.
Na página 423 transcrevemos uma lista das farmacopeias que maior interesse apresentam para
nós, com a indicação das abreviaturas por que serão designadas no decurso desta obra.
423

Principais Farmacopeias

Abreviatura
Farmacopeia adoptada Volumes e datas
2 volumes (1988)
British Pharmacopeia B.Ph.
Grã-Bretanha — Londres 2
volumes (1989)
Deutsches Arzneibuch D.A.B.
Alemanha — Berlim 14
European Pharmacopeia R.Ph. volumes 2." Edição (1969-
1991) 3 volumes (1965)
Itália — Roma 2
Farmacopoea Ufficiale delia Republica F.Ital. volumes (1954)
Italiana IX Espanha — Madrid l
Farmacopeia Oficial Espanola IX F.E, volume (1977)
Brasil — S. Paulo l
Farmacopeia dos Estados Unidos do F.Bras. volume (1946) e l
Brasil suplemento (1962)
Farmacopeia Portuguesa IV II Edição F.P.
Portugal — Lisboa (1987) l
volume
Farmacopeia Portuguesa V F.P. Bélgica 5 volumes
Pharmacopée Belge — V Edição Ph.Belg. (1989)
França — Paris 4
Pharmacopée Française (Codex Medica- Ph.F volumes (1963)
mentarius Gallicus) — X Edição (Codex) Dinamarca 4
Pharmacopoea Nórdica (Ed. Danica) P.Nord volumes (1990)
Suiça — Berna 3 volumes —
Pharmacopea Helvética — VIII Edição Ph.Helv. 3." Edição (1980)
Suíça 2 volumes (1963,
Pharmacopoea Internacional lis Ph.I. 1964)
Japão — Tóquio l
volume (1990)
Pharmacopoeia ot Japan Ph.J. USA — Washington

Pharmacopoeia of United States U.S.P.


— XXII revision

Em 1969 foi publicada, sob a direcção do Conselho da Europa, o primeiro volume da


Farmacopeia Europeia (European Pharmacopoeia) nas suas versões francesa e inglesa. Em 1971, foi
dado à estampa o seu segundo volume e em 1973 apareceu o 1.° Suplemento de actualização.
Actualmente, a Farmacopeia Europeia tem 14 volumes publicados em inglês e francês, e da sua
comissão fazem parte membros dos 19 países que aderiram à sua Convenção, entre os quais Portugal.
Inicialmente como observador (1982) e a partir de
424

1988 como membro de direito, Portugal tem participado rias reuniões da Comissão, o que lhe
permitiu editar os 7 referidos volumes que abarcam, praticamente, tudo o que foi publicado na
Farmacopeia Europeia.
Ao lado das farmacopeia^ queremos referir os formulários de índole galcnica, oficializados em
muitos países e dotados de carácter nacional, ou restritos a determinados serviços, como hospitais,
misericórdias, etc. Em algumas nações, como a América do Norte e a Grã-Bretanha, a publicação dos
formulários nacionais acompanha a das respectivas farmacopeias, constituindo aqueles um
complemento indispensável a estas.
São numerosos os formutários portugueses de carácter particular, oficializados nos respectivos
serviços. Lembramos os seguintes: Formulário do Hospital da Marinha, Formulário dos Hospitais
Civis, Formulário do Hospital Escolar, Formulário dos Institutos Maternais e, mais recentemente, o
Formulário dos Hospitais.
A subcomissão de Farmácia Galénica da Farmacopeia Portuguesa IV procedeu à elaboração
de um formulário galénico nacional de que foram publicados 2 volumes.
Nos Estados Unidos têm sido publicados, regularmente, e a partir de 1882, diversos
formulários nacionais. O último é o National Formulary XXfl, cuja oficiali/acão acompanhou a da
USP XXII Revision. É correntemente designado pela abreviatura N. F. XXII.
Na Grã-Bretanha observa-se também certa periodicidade no aparecimento dos formulários
nacionais, a qual coincide com as novas edições da farmacopeia. O formulário nacional inglês
denomina-se The Britiafi Pharmaceutical Codex e é conhecido pela abreviatura B. P. C.

2.2. TRATADOS DE FARMÁCIA GALÉNICA E OUTROS


LIVROS DE CONSULTA

Como já acentuamos, não é avultado o número de obras gerais sobre Farmácia Galénica.
Acrescentaremos ainda que. em Portugal, não existe nenhuma publicação actualizada que trate desta
ciência cm conjunto, a não ser as anteriores edições deste livro (1965, 1975, 1983). É certo que, nos
últimos anos, têm aparecido diversos artigos de revisão, publicados por autores portugueses, os quais,
esporadicamente, foram reunidos sob a forma de livro. Este facto, porém, não invalida a assinalada
inexistência de qualquer obra de vulto sobre Farmácia Galénica.
Entre as obras da Farmácia Galénica geral, apontamos os seguintes que mais particularmente
úteis se mostraram na elaboração do presente livro:
425
426
427
428
429

Para finalizar este capítulo, anotemos que a bibliografia agora citada não constitui
exclusivamente toda a bibliografia que consultámos e a que nos referiremos no texto. Muitas
vezes foi preciso recorrer a fontes diferentes das mencionadas, especialmente quando a
formulação galénica implicava conhecimentos de outros ramos do saber, como a
farmacologia, a química, a física, etc.
Na bibliografia indicada no final de cada capítulo deste livro serão citadas as
referências que consideramos mais úteis para o estudioso que pretenda aprofundar os
assuntos, tendo procurado, sempre que possível, restringirmo-nos às obras e idiomas mais
acessíveis.
430
431

Medicamentos

3.1. DROGA, FÁRMACO E MEDICAMENTO

Falámos atrás em droga, tendo-lhe atribuído um significado que poderemos considerar como
pouco preciso. De facto, quando então aludimos a drogas, referimo-nos, exclusivamente, aos produtos
de natureza animal, vegetal ou mineral empregados na preparação de medicamentos. A palavra droga
é, de preferência, tomada na acepção de matéria-prima de uso farmacêutico ou não, significando tanto
os produtos naturais, como os obtidos por síntese.
Contudo, a conotação actual entre droga e toxicomania leva-nos a procurar utilizar aquele termo
o menos possível a fim de evitar confusões resultantes do desvirtuamento do sentido daquela palavra
de há alguns anos para cá.
Julgamos não existir entre nós qualquer definição legal de droga. Contudo, no parecer da
Prucuradoria-Geral da República, publicado no Diário do Governo, II Série, N.os 250 e 76,
respectivamente de 27 de Outubro de 1955 e de 29 de Março de 1956, di/-se que a expressão droga
pode ser tomada «como significando ingrediente ou substância simples de natureza animal, vegetal ou
mineral, que serve, em regra, à fabricação de outros produtos, estes de natureza medicinal ou
química».
Efectivamente, o termo droga toma-se habitualmente no sentido lato, significando o produto
simples ou complexo que pode servir como matéria-prima de uso farmacêutico, químico, etc. Assim,
fala-se do mel, da cera, da banha, da beladona, do sulfato de cobre, do fenol e da anilina, designando-
os por drogas. Por esta pequena lista se verifica que a droga poderá ser de natureza animal, vegetal
ou mineral, ou, até, produzida por síntese química, sendo constituída por um único princípio, como o
sulfato de cobre, o fenol c a anilina, ou por uma mistura de princípios, como no caso do mel, da cera,
da banha e da beladona.
É habito corrente designar por fármacos (do grego Pharmakon) todas as drogas utilizadas em
farmácia e dotadas de acção farmacológica ou. pelo menos, de interesse médico. Quer isto dizer que o
conceito de droga abrange o de fármaco, ou que o fármaco é um tipo especial de droga. Servindo-nos
ainda do exemplo dado pelo sulfato
432

de cobre, podemos dizer que esta droga, utilizada na sulfatação das vinhas e em diversas preparações
químicas, constitui um fármaco sempre que se utiliza com fins medicinais, devido às suas propriedades
adstringentes.
De acordo com a ideia expressa, não se devem considerar como fármacos as drogas inertes
empregadas em Farmácia, como os excipienles e os adjuvantes duma dada preparação.
As drogas e os fármacos constituem, pois, as matérias-primas de que o farmacêutico se serve
para obter medicamentos.

Têm sido apresentadas numerosas definições de medicamento, mas, na maioria das ve7.es, essas
definições inspiraram-se em critérios diferentes e incompletos que não traduzem plenamente o
significado da palavra. É evidente que o químico, o galénico ou o médico apreciam o termo
medicamento de acordo com a sua especialização, desrespeitando mutuamente os sectores dos outros.
Infelizmente, mesmo quando se trata de definir medicamento, apreciado apenas sob um dado critério,
a divergência de opiniões é ainda manifesta.
Considerando, por exemplo, o sector da Farmácia Galénica, encontramos as mais variadas
definições, das quais salientamos as seguintes;

«Toda a substância que administrada convenientemente ao organismo enfermo possa


aliviar ou curar o seu estado patológico»;
«Qualquer substância simples ou complexa que aplicada no interior ou no exterior do
corpo do homem ou do animal possa produzir efeito curativo ou preventivo»;
«Toda a substância ou conjunto de substâncias que se administrem com fins terapêuticos».

Em qualquer destas três definições verificamos que se confunde o conceito de medicamento com
o de fármaco e, como já vimos, o medicamento é obtido, por meio de operações farmacêuticas, a partir
dos fármacos. Por outro lado, nas citadas definições é omissa qualquer alusão ao emprego do
medicamento com outros fins que não o curativo ou preventivo,
Quanto a nós, entendemos que o medicamento pode apresentar três finalidades distintas —
tratamento, profilaxia e diagnóstico das doenças — devendo o seu conceito ser extensível não só ao
homem e animais, mas ainda a todos os seres vivos, como as plantas.
O conceito de medicamento que deixámos expresso corresponde ao parecer emitido pela
Comissão Permanente da Farmacopeia Portuguesa na sua sessão de 15 de Julho de 1960. Segundo o
mencionado parecer, poderemos definir medicamento como «toda a preparação farmacêutica contendo
um ou mais fármacos, destinada ao diagnóstico, prevenção ou tratamento das doenças e seus sintomas
ou à correcção ou modificação das funções orgânicas, quer no homem, quer nos outros seres vivos».

3.2. MEDICAMENTO E REMÉDIO

A palavra remédio é empregada num sentido amplo e geral, sendo aplicada a todos os meios
usados com o fim de prevenir ou de curar as doenças. Deste modo, são remédios não só os
medicamentos, mas também os agentes de natureza física ou psíquica a que se recorre na terapêutica.
A ideia de remédio não está, portanto, obrigatoriamente ligada à composição farmacêutica que
constitui o medicamento.
433

Sem nos determos demasiadamente neste assunto, passemos em revista os principais tipos de
remédios que não podem ser considerados como medicamentos.

3.2.1. AGENTES FlSICOS

São de várias espécies: Aeroterapia ou climatoterapia, que constitui um meio de tratamento para
os debilitados, convalescentes, anémicos, tuberculosos, etc., e que se pode praticar na praia ou na
montanha; Helioíerapia ou tratamento pêlos raios solares; Radioterapia, em que se pode recorrer aos
raios X, raios y, ou a outras radiações; Termoterapia ou tratamento ligado à acção do calor;
Eiectroterapia como o emprego das correntes de alta frequência, no tratamento das hemorróidas ou
fissuras anais; Hidroterapia ou cura de água, que consiste na aplicação de banhos, duche, compressas
húmidas, etc., utilizando águas termais; Talassoterapia, ou emprego terapêutico das propriedades
revigorantes dos ares do mar, acompanhado ou não de banhos; Cinesiate-rapia, em que os meios
mecânicos, como a ginástica, são utilizados com vários fins, particularmente na reeducação dos
movimentos; Ventilüterapia; etc.

3.2.2. AGENTES PSÍQUICOS

Sob esta designção queremo-nos referir à acção psicológica desempenhada pelo médico ou pelo
psicólogo junto do paciente, a qual vai desde a simples confiança que lhe traz calma e bem-estar, aos
tratamentos mentais ulili/ados no foro psiquiátrico (psicanálise).
Antes de terminar este subcapítulo queremos lembrar que certos medicamentos, como os usados
com fins de diagnóstico, não podem ser considerados como remédios, já que esta palavra implica as
ideias de profilaxia ou de cura.

3.3. MEDICAMENTO, ALIMENTO E VENENO

Dependendo das circunstâncias e da quantidade administrada, um dado medicamento pode


tomar-se um veneno, ou um alimento pode funcionar como agente de cura. Antes, porém, de
desenvolver este assunto, definamos o que se entende por alimento e por veneno.

Do ponto de vista bromatológico, alimento tem sido definido como «toda a substância que se
ingere para manter o equilíbrio orgânico e para atenuar a fome». Do ponto de vista galénico, somos
levados a concluir que alguns alimentos podem utilizar-
-se como excipientes ou veículos que facilitam a administração dos fármacos. Um xarope
medicamentoso, por exemplo, além dos fármacos constituintes, possui apreciável quantidade de
sacarose, a qual lhe confere melhor sabor. A sacarose é destituída de interesse farmacológico mas,
simultaneamente com a sua acção edulcorante, fornece ao organismo do paciente uma certa
quantidade de energia que ele utili/a no seu metabolismo. Quer isto dizer que a droga sacarose se
434

comporta como um alimento.


Em determinadas condições, um dado alimento pode transformar-se na parte activa do
medicamento. O leite constitui um exemplo do que acabámos de dizer. Alimento puro, pode sofrer
determinadas transformações, vindo a constituir um verdadeiro medicamento. Assim, a partir do leite
de vaca obtêm-se leites fermentados, terapeuticamente activos. Ainda do leite é preparado um
medicamento injectável, o qual foi largamento empregado (proteinoterapia). Nos exemplos citados, o
leite, que é indiscutivelmente um alimento, funciona como um verdadeiro fármaco que, por seu lumo,
origina diversos medicamentos.
Finalmente, certos medicamenlos são empregados apenas como alimentos em doentes muito
debilitados ou naqueles que se não podem alimentar pelas vias de ingestão naturais, como, por
exemplo, as soluções injectáveis de glucose ou as emulsões alimentares, que se administram por via
endovenosa e que contêm açúcar, proteínas e gorduras.
Podemos afirmar que todas as substâncias medicamentosas se podem tornar tóxicas consoante a
quantidade administrada, a via de administração, as condições do paciente, etc. Em princípio,
portanto, todos os produtos medicamentosos podem funcionar como venenos. Esta noção é,
evidentemente, muito relativa porquanto não é aplicável a todos os doentes e para o mesmo doente
depende da dose e da via de administração. É claro que na prática interessa considerar valores médios
e esses levam-nos a concluir que existem substâncias eminentemente mais tóxicas do que outras. O
termo veneno reserva-
-se, portanto, para os produtos que introduzidos no organismo do indivíduo normal médio, em
pequena quantidade, sejam susceptíveis de provocar alterações da saúde ou conduzir à morte.
Este conceito impõe, como é evidente, a necessidade de se conhecer qual a dose de medicamento
capaz de induzir o aparecimento de fenómenos tóxicos, ou, por outras palavras, qual a dose máxima de
fármaco que o organismo humano é capaz de suportar, consoante a via de administração, sem que se
observem efeitos perniciosos. As doses máximas, que são valores médios e que, por conseguinte, não
atendem à idiossincrasia ou à sensibilidade do doente, expressam-se, habitualmente, por duas formas:
dose máxima por uma só vez e dose máxima no período de 24 horas. Em rigor, os valores das doses
máximas deveriam ser expressos em relação ao peso dos pacientes. Na prática, é hábito servirmo-nos
de tabelas onde estão inscritas as doses máximas dos

fármacos mais tóxicos, considerando-as em relação aos adultos e às crianças e tendo em atenção a
via de administração desejada. A Organização Mundial de Saúde elaborou uma dessas tabelas que
vem transcrita no Suplemento à IV Farmacopeia Portuguesa. Oportunamente, voltaremos a
considerar este assunto. A actual Comissão da Farmacopeia Portuguesa tem em elaboração um
volume exclusivamente dedicado à Posologia, onde se indicarão doses habituais e máximas,
interacções medicamentosas, etc.
Compete ao farmacêutico verificar se a posologia dos componentes de uma prescrição médica
não ultrapassa a dose máxima tolerada, considerada a via de administração escolhida e a quantidade
de medicamento que o doente deve tomar. Assim, por exemplo, pode-se administar a um adullo uma
solução injectável subcutânea ou uns comprimidos contendo, respectivamente, 0,001 g ou 0,002 g de
435

sulfato de atropina. Estes valores representam as doses máximas subcutânea e oral do fármaco citado,
por uma só vez. Nas 24 horas os valores das doses máximas de sulfato de atropina são de 0,002 g e
0,004 g, consoante a via de administração. Até às quantidades indicadas, o sulfato de atropina, nas
formas farmacêuticas mencionadas, constitui um medicamento. Se essas doses forem excedidas será
um veneno.
Cremos não ser ocioso, neste momento, lembrar os perigos de uma dosagem exagerada prescrita
pelo médico e descuidadamente aceite pelo farmacêutico ou devida, por exemplo, a um erro cometido
por este numa pesagem.
São de VALERI PAOLI, autor de Glosas Galenicas, as seguintes palavras, que, com a devida vénia,
transcrevemos para meditação: «Um erro na pesagem dos medicamentos pode pôr em perigo uma
vida. Na balança pode estar a Saúde ou a Morte».

3.4. CLASSIFICAÇÃO DOS MEDICAMENTOS

Existem numerosas classificações dos medicamentos, consoante o critério adoptado. Assim,


desde diversíssimas classificações terapêuticas a sistematizações galénicas e químicas, tem-se
intentado ordenar o estudo dos medicamentos, mas nem sempre do modo mais racional.
Uma das classificações mais intuitivas divide os medicamentos em simples e compostos,
consoante são preparados a partir de um ou de vários fármacos. Um xarope, uns comprimidos ou um
injectável de vitamina C; um pó de ópio; uma pomada de cânfora; etc., são medicamentos simples. Já
um pó de ópio com ipeca; um injectável de peni-cilina G com estreplomicina ou uns comprimidos de
ácido aceülsalicílico com cafeína, são medicamentos compostos.
Outras vezes os medicamentos são classificados em relação à sua forma de emprego, via de
administração, etc. É habito falar-se em medicamentos para uso externo e medicamentos para uso
interno. A maioria dos tratadistas define medicamento de uso interno como o que se desuna a ser
administrado no interior do organismo por via bucal e pelas cavidades naturais ou acidentais. As vias
oral, rectal, vaginal, nasal,

auricular, parenteral e traqueopulmonar constituem, portanto, meios de acesso para os medicamentos


de uso interno.
Os medicamentos de uso externo seriam de exclusiva aplicação na superfície do corpo ou em
mucosas facilmente acessíveis do exterior.
De acordo com o critério que expusemos, um medicamento administrado, por exemplo, na
mucosa rectal pode ser de uso interno (supositório) ou externo (pomada), consoante a /ona em que seja
aplicado. De facto, uma pomada espalhada na superfície da mucosa rectal facilmente acessível do
exterior constitui, obviamente, uma medicação externa, mas um supositório, actuando mais
profundamente, é um medicamento de uso interno. Considerando, porém, que se podem aplicar
profundamente na mucosa rectal pomadas introduzidas por meio de uma cânula, somos obrigados a
concluir que não é só a forma farmacêutica que condiciona a actuação interna ou externa, mas a zona
onde o medicamento é aplicado. Efectivamente, uma pomada administrada nas referidas condições deve
ser considerada como uma medicação interna. Por outro lado, o mesmo medicamento é ainda
436

susceptível de se empregar interna ou externamente, como acontece com a solução alcoólica de iodo,
com o extracto de beladona, etc.
Pensamos, portanto, que a divisão dos medicamentos em internos e externos só apresenta o
interesse de significar uma indicação do médico para o tipo de administração desejado. Finalmente,
acentuemos que os medicamentos de uso interno podem empregar-se externamente, mas, na maioria
dos casos, os medicamentos de uso externo
f
não podem ser administrados no interior do organismo. E por isso que ao farmacêutico compete
chamar a atenção do doente sempre que o medicamento dispensado se destina a aplicação externa.
Uma outra classificação de medicamentos divide-os em oficinais, especializados e magistrais.
São medicamentos oficinais os que se encontram oficializados nas monografias da Farmacopeia
Portuguesa. São, normalmente, preparações dotadas de boa conservação, que o farmacêutico pode
manipular c guardar até ao momento do emprego. Há, porém, algumas excepções a esta regra, como a
maioria das limonadas, a emulsão comum, etc., que se alteram rapidamente após preparação.
Consideram-se medicamentos especializados ou especialidades as preparações farmacêuticas
apresentadas no mercado em embalagem própria, destinada a ser entregue ao consumidor e com uma
designação ou marca privativa.
Não são consideradas especialidades farmacêuticas:

á) Os medicamentos produzidos em série que constem da Farmacopeia Portuguesa ou que


tenham por único princípio activo um produto nela inscrito;
b) Os produtos de toucador, quando no rótulo ou na literatura que os acompanha se não
declare que se destinam a tratamento sintomático ou curativo de situação patológica;

c) Os artigos de penso — gazes, ligaduras, algodões — embora impregnados de -;ft->:


substâncias medicamentosas, bem como os lápis medicamentosos utilizados como desinfectantes
ou cicatrizantes;
d) As farinhas e outros produtos alimentícios, ou suplementos alimentícios, em cuja literatura se
não indiquem propriedades terapêuticas específicas.

A definição e as limitações enunciadas a propósito de especialidades farmacêuticas são a


transcrição de um parecer da Comissão Permanente da Farmacopeia Portuguesa,. de 15 de Julho de
1960.
Considcrarn-se medicamentos magistrais os que não estão inscritos na Farmacopeia Portuguesa
e que são preparados pelo farmacêutico na sua oficina segundo as indicações expressas numa receita
médica, os quais apresentam, muitas vezes, má conservação, pois o clínico formula de acordo com as
necessidades do momento, não se interessando na conservação do produto por período mais ou menos
longo.
Finalmente, é de fazer uma breve referência aos chamados medicamentos similares (genéricos)
que são preparações idênticas a especialidades, que podem ser produzidos em série, mas que não têm
outra designação que não o nome ou nomes do fármaco ou fármacos constituintes. Naturalmente que
um similar de uma dada especialidade deve apresentar uma biodisponibilidade idêntica ou muito
437

próxima da especialidade que pretende reproduzir. Deve, pois, ser bioequivalente com ela. O seu
interesse é preferencialmente de natureza económica, visto serem dispensados a um preço inferior ao
do medicamento original.

3.5. MEDICAMENTOS ALOPATICOS E HOMEOPÁTICOS

HIPÓCRATES ('), célebre médico, considerado como pai da Medicina, enunciou dois axiomas que se
aceitaram como fundamentais na arte de curar. O primeiro especificava: Natura medicatrix medicus
interpres et menister (o organismo cura a doença, o médico não é mais do que o seu intérprete,
auxiliando-o).
O segundo axioma referia-se à aplicação dos medicamentos e era expresso por duas leis:
contaria contrariis curantur (curar provocando uma acção diferente no corpo) e simiíia similibus
curantur (curar provocando uma acção semelhante no corpo).
Das duas leis citadas nasceram dois sistemas terapêuticos, respectivamente designados por
alopatia e homeopatia. Os medicamentos utilizados nestes dois sistemas tomam o nome de alopáticos e
homeopáticos.
A Medicina e a Farmácia praticadas, habitualmente, entre nós e cujo ensino está oficializado,
correspondem ao conceito alopático. O sistema homeopático é muito mais

(I ) Nasceu na ilha de Cós, em 460 a.C.

raramente empregado, embora se tenha difundido em alguns países, como a Alemanha, a América do
Norte, o México, o Brasil e ene entrando-se em franca difusão em Portugal, após os esforços de vários
laboratórios suíços, alemães e franceses.
O conceito de homeopatia foi introduzido em 1796 pelo médico alemão SAMUEL HAHNEMANN (1755-
1834). Baseado na lei das semelhanças de HIPÓCRATRS, anunciou que «todo o medicamento activo provoca no
organismo humano uma espécie de doença, tanto mais peculiar, mais característica e mais intensa,
quanto mais activo é o medicamento». Dizia ainda que «deveria imitar-se a natureza, a qual às vezes
cura uma doença crónica por meio de outra doença que sobrevêm posteriormente; na doença que se
pretende curar, deveria empregar-se um medicamento que fosse capaz de provocar uma doença
artificial semelhante à primeira».
Além desses princípios, SAMUEL HAHNEMANN estabeleceu o princípio da «dinamização», o qual
consiste em «dividir ou diluir as substâncias medicamentosas com matérias inertes de tal modo que
seja possível graduar devidamente a potência da contra-doença escolhida para curar a doença
natural, de forma a que somente chegue a iniciar-se e não prejudique o corpo com desnecessária
intensidade».
Como atrás acentuámos, há países, que não o nosso, onde a homeopatia se tem radicado de
modo notório. Na América do Norte, por exemplo, existem cinco organizações nacionais, duas de
438

carácter internacional e dezanove sociedades homeopáticas. O Americam Institute of Homeopathy


publica um jornal taímensal e é a entidade responsável pela elaboração e actualização da farmacopeia
homeopática americana. Nesta farmacopeia inscrevem-se várias formas farmacêuticas, muito
diferentes, no seu modo de obtenção e características, das formas clássicas, tais como tinturas, pós,
essências, glóbulos, triturações, etc.
A principal característica da homeopatia reside no emprego de doses medicamentosas mínimas,
extremamente diluídas, havendo a este respeito quem aceite diluição dos fármacos até ao número de
Avogrado (6 x IO23) e quem admita, ainda actividade após não existir nem uma molécula de fármaco
no preparado. Este modo de proceder assenta na crença de que os princípios activos têm a sua
actividade potenciada com a diluição. No dizer de SHLLÉS MARTÍ, a homeopatia, depurada dos exageros
de alguns dos seus partidários, tem um sólido fundamento no que se verifica com a prática da
vacinação. Efectivamente, as vacinas estimulam as defesas do organismo em relação às causas de uma
doença, cujos sintomas se imitam. Há, portanto, certo paralelismo entre os objectivos da homeopatia e
da vacinação, cujos efeitos práticos não podem ser negados.
O reconhecimento oficial da Homeopatia no nosso país tem encontrado numerosos obstáculos,
tendo a Direcção Geral de Assuntos Farmacêuticos aceitado a dispensa desses preparados não lhes
chamando medicamentos, mas preparações homeopáticas.

3.6. A RECEITA MÉDICA

Por receita (do latim, recipe, lomc) entende-se um conjunto de indicações escritas, dadas pelo
médico ou veterinário ao farmacêutico, para a preparação e entrega de um medicamento. Usualmente,
comporta também instruções para o doente quanto ao modo de administração ou uso do medicamento
prescrito.
A maioria das receitas, a que, às vezes, se dá o nome de prescrições (do latim prae, antes; acribo,
escrevo), é redigida no idioma do país, sendo esse critério obrigatório em Portugal. Entretanto; em
diversos países é hábito utilizar-se o latim ou versões latinizadas de palavras nativas o que, entre
outras vantagens, traria a segurança da imutabilidade de significação, jã que se trata de uma língua
morta.
Numa receita médica podemos distinguir várias partes fundamentais: nome do doente; fãrmacos
utilizados e suas quantidades; forma farmacêutica pretendida; indicações quanto à administração do
medicamento; nome, morada e assinatura do médico.

3.6.1. NOME DO DOENTE

Se esta indicação não tiver sido feita pelo médico, compete ao farmacêutico inscrevê-la na
439

receita. Desta maneira, evitará possíveis enganos no acto da entrega do medicamento.


Uma receita em que for pedido qualquer medicamento considerado estupefaciente pela
legislação actual, tem que ser passada em modelo próprio (mod. n." 420 da Imprensa Nacional), sendo
obrigatória a indicação do nome e morada do paciente, inscrita pelo próprio médico.

3.6.2. FÁRMACOS UTILIZADOS E SUAS QUANTIDADES

O médico pode prescrever um medicamento, cuja composição indica, o qual será preparado pelo
farmacêutico, ou pode ainda pedir para ser dispensado um produto especializado. No primeiro caso,
deve indicar, de forma explícita, qual o fármaco ou fármacos constituintes e qual a sua quantidade. Se,
num ou mais casos, ultrapassar as doses medicamentosas consideradas máximas, deverá demonstrar
que tem plena consciência do facto, escrevendo por extenso e sublinhando as quantidades pretendidas.
Mesmo assim, a prudência aconselha o farmacêutico a pôr-se em conlacto com o médico para melhor
esclarecer o assunto.
Numa fórmula complexa pode o médico indicar, além dos componentes activos, os materiais
inertes que devem entrar na sua preparação. Teremos assim, habitualmente, três espécies de
constituintes fundamentais: os fármacos, os adjuvantes e o veículo ou excipiente. Os adjuvantes podem
ir exercer um efeito solubilizante, conservante, edul-corante, aromatizantc, etc., e não modificam,
regra geral, o efeito farmacológico dos

princípios medicamentosos. O veículo ou excipiente deverá ser destituído de actividade e ter como
função dar corpo aos fãrmacos, diluindo-os à concentração conveniente, ou proporcionando-lhe s
maior facilidade de administração. A quantidade de veículo desejada pelo médico deve vir indicada na
receita. Em casos particulares, dependentes do tipo de forma farmacêutica, é dispensável a citada
indicação.
Se o medicamento receitado pertencer ao grupo das especialidades, o farmacêutico, apenas
poderá dispensar o medicamento pedido, não devendo substituí-lo por outro, mesmo reconhecidamente
idêntico, sem prévio consentimento do médico.
Quanto aos medicamentos oficializados a receita poderá especificá-los em pormenor, como no
caso das fórmulas magistrais, mas é suficiente a indicação do nome por que vem inscrito na
Farmacopeia Portuguesa e a menção da quantidade desejada.
Esta parle da receita, sem dúvida a mais importante, é precedida de um símbolo ou de uma
abreviatura. Trata-se dos sinais R R., Re. ou Rpe. Estes símbolos ou abreviaturas têm a sua origem
num carácter que aparecia nas primitivas receitas egípcias e que era um amuleto representando o
olho do deus Horus. Para outros, seriam derivados da representação do signo de Júpiter, significando
uma petição de favores e de cura àquela divindade grega. É até possível que estas duas interpretações
correspondam à verdade e que do sinal alusivo a Horus se tenha passado, com o decorrer dos tempos
e a sucessão de civilizações, para o que invoca Júpiter.

3.6.3. FORMAS FARMACÊUTICAS PRETENDIDAS


440

Depois da indicação da composição do medicamento, o médico menciona a forma farmacêutica


desejada. Algumas vezes as quantidades indicadas referem-se a várias unidades galénicas, como por
exemplo, 6 pílulas, 12 papéis, 5 supositórios, etc. Outras vezes menciona-se apenas o quantitativo para
uma unidade indicando-se, depois, o número de unidades pretendidas (por exemplo, uma cápsula e
mais cinco iguais}.
Em certos casos o médico inclui, nesta parte da receita, a abreviatura F.SA. (faça segundo a
arte) ou outra equivalente, o que é, sem dúvida, um dos vestígios actuais da tradicional prescrição
latina.

3.6.4. INDICAÇÕES QUANTO À ADMINISTRAÇÃO DO


MEDICAMENTO

O médico deve mencionar na receita o modo e frequência de administração do medicamento.


Quando o medicamento se destina a uso externo deve assinalar o facto. Ao farmacêutico compete
incluir no rótulo do medicamento que dispensa certas indicações complementares que, nem por isso,
são pouco importantes. Entre elas lembramos: uso

externo (etiqueta impressa sobre fundo vermelho); para toma)' ti.v colheres das de sopa: para tomar
às colheres das de chá: para tomar às colheres das de café; para gargarejo: para fricção: paru
colutório; para inalarão; para uso ocular: agite antes de usar: etc.
Quando o medicamento é extremamente activo, podendo provocar intoxicações.
deve-se-lhe apor uma eliqueta com a palavra tóxico. A Farmacopeia Portuguesa, a

Lista de abreviaturas de algumas expressões latinas usadas nas


prescrições médicas
441

Ad libitum ad. lib. A vontade, a gosto


Altemis horis Horas alternadas
Ana aã a. De cada
Ante cibos c. Antes das refeições
Bis b. Duas v e/es
Bis in die bi. i d. Duas vezes por dia
Cochleare amptum Coeh. amp. Colher de sopa
Cochleare niagurn Coch. mag. Colher de sopa
Cochleare médium Coch. nied. Colher de sobremesa
Cochleare parvuni Cocli. parv. Colher de chá
Diebus alternis Dieb. ali. Dia sim, dia não
Ex modo praescripto e. m. p. Como se prescrevem ou indicam
Ftic. secundum F. S. A. Faça segundo a arte
artem Uma vê/ por semana Üiebdomadário)
üebdomadalis l lor. dec. Ao deitar
Hora decubiius Hor. som.; h. Ao deitar
Hora sommi s. Modo de preparação
Modo prescripto m. p. Modo de preparação
Modus 1'aeiendi m. f. A todas as horas
Omni hora omn. hor. Todas as manhãs
Omni mane omn. man. Todas as noites
Omni nocle omn. noct. Partes iguais
Partes aequales P. ae Pela boca
Per os P. o. Medicamento falseado que serve para
Placebo vetifi-
car a ausência do eleito
Post cibo p. c. psicológico
Post prandium p. numa droga em estudo
Pró ré nata prand. Depois de comer Depois de
Quantum satts p. r. n, comer Ocasionalmente Em
Recipe q. s. quantidade suficiente Recipe
Secundum artem Re. Segundo a arte De acordo com a
Secundum legem s. a. legislação Urna vê/, e meia
S esqui s. L Álcool etílico Três VLV.C-S por dia
Spiritus vini rectificatus
Ter in die S. V. R.
442

propósito das monografias dos fármacos, indica aqueles que são considerados tóxicos. Além disso,
os medicamentos destinados a uso veterinário devem ser assinalados com uma etiqueta tendo aquela
indicação escrila sobre fundo verde.

3.6.5. NOME, MORADA E ASSINATURA DO MEDICO

O nome, morada e assinatura do médico devem constar na receita, de modo a garantirem-lhe a


sua autenticidade.
As preparações contendo estupefacientes só serão dispensadas se estas condições se
verificarem, assim como a da indicação do nome e morada do doente a quem se destina o
medicamento. Estas receitas serão arquivadas pelo farmacêutico nos termos do decreto n.° 12210.
O farmacêutico deve tomar nota da composição da receita que teve de preparar e que
dispensou, num livro existente para o efeito, a que se dá o nome de copiador de receituário. Nesse
livro indica-se o número da receita, a composição qualitativa e quantitativa dos medicamentos e o
seu preço. Quando, na preparação, haja necessidade de incluir adjuvantes não expressos na receita,
estes devem indicar-se no copiador, para facilitar uma repetição da fórmula.
Para os medicamentos estupefacientes exisle um copiador de estupefacientes que está sujeito a
vistoria periódica por parte das entidades oficiais.
Por vezes observa-se, em certas receitas, que o médico escreveu determinadas expressões por
forma abreviada. A maioria dessas expressões, que se podem referir ao modo de preparação, à
composição, à forma ou à frequência de administração, c de origem latina, sendo conveniente que o
farmacêutico conheça o seu significado, quer para sua própria elucidação, quer para esclarecer o
doente quanto ao uso do medicamento. Como. por outro lado, o uso das citadas abreviaturas é muito
corrente na bibliografia de língua inglesa, que tantas vezes o fannacêutico tem necessidade de con-
sultar, transcrevemos um pequeno vocabulário com o significado dos termos latinos e respectiva
forma abreviada, de modo a permitir a sua rápida interpretação.
Para finalizar queremos referir que um certo número de medicamentos é de venda livre, isto é,
não carece de receita, dada a sua larga difusão e pequena toxicidade. Os povos anglo-saxónicos
chamam-lhes medicamentos O T C (over the counter).

BIBLIOGRAFIA

BOIRÜN, J. — «Lês bases scienlifiques de I'homéopathie — Pharm. Acta Helv., 39, 4-5, 1964.
GURIS, A. e Liar, A. — Pharmaïie Galénique, Masson, Paris. 1949.
JtNKiNs, G.: FRANCKE, D., BKKcuT. E. e SpKRANino, G. — The art of compounding — McGraw-
Hill Book
Co, Easion, 1957.
Prescription Pharmacy — Editado por Sprowls, Lippincott, Philadetphia, 1963.
VALERI PAOLI, J. F. — Glosas galenicas, Venezuela, 1956.
443

Administração de medicamentos

O efeito de um medicamento depende da quantidade de substância que penetra no organismo,


podendo actuar localmente na região da sua aplicação ou ser absorvido de modo a que atinja os
órgãos e tecidos cuja resposta é pretendida.
O aforismo latino «corpora non agunt nisi fluida» é perfeitamente aplicável à acção dos
medicamentos no organismo, já que a actividade medicamentosa é dependente do estado fluido das
substâncias actuantes. Efectivamente, qualquer substância que não actue nos tecidos sob a forma
fluida (gás, vapor, líquido, solução ou pseudo-solução) é destituída de actividade preventiva ou
curativa. Assim, mesmo os medicamentos aplicados sob a forma sólida devem fluidificar-se e/ou
dissolver-se quando em contacto com os tecidos.
Uma aplicação local de nitrato de prata em lápis, ou de uns cristais de sulfato de cobre, é
activa no organismo porquanto as substâncias mencionadas se dissolvem parcialmente nos líquidos
celulares com que são postas em contacto.
A cânfora, o ácido salicílico, o mentol c muitos outros compostos, quando aplicados em formas
sólidas locais, são activos do ponto de vista medicamentoso porque se volatilizam, impregnando, sob
a forma de vapores, os tecidos com que contactam.
Uma implantação de um sólido medicamentoso no tecido subcutâneo não actua como simples
corpo estanho, porquanto os seus constituintes se vão difundindo lentamente através dos tecidos à
custa da água dos líquidos extra vasculares.
Estes casos extremos pretendem mostrar que, mesmo para os medicamentos que aparentemente
actuam sob a forma sólida, há sempre transformações inerentes à presença de líquidos do
organismo, as quais são responsáveis pela sua disseminação nos tecidos.
Pode, porém, acontecer que algumas substâncias medicamentosas sejam introduzidas no
organismo, atravessando-o sem que haja qualquer dissolução ou fluidificação. Nestes casos não se
pretende, evidentemente, obter uma acção preventiva ou curativa, mas apenas utilizar o
medicamento com outros fins, como, por exemplo, no diagnóstico. É o que sucede com o sulfato de
bário, que, administrado por via gastro-
444

-intestinal e não se dissolvendo, actua como substância de contraste em exames radio-lógicos. É


exactamente por ser insolúvel que o sulfato de bário não é tóxico, competindo ao farmacêutico
verificar a ausência de sais de bário solúveis nas preparações daquela substância.
Pelo que ficou dito se compreende que os medicamentos podem actuar por dois caminhos
distintos, isto é, penetrando no meio interior de forma a atingirem os órgãos ou tecidos em que
devem actuar (medicamentos absorvidos), ou agindo localmente, ao nível da região que recebeu a
sua aplicação (medicamentos tópicos e locais).

4.1. MEDICAMENTOS TÓPICOS E LOCAIS

Entende-se por medicamentos tópicos os que se aplicam, externamente, sobre uma região
limitada do corpo, não proporcionando absorção sistémica dos seus constituintes. A sua aplicação
pode fazer-se sobre a pele e mucosas acessíveis do exterior.
Um lápis de nitrato de prata, uma pomada de ácido salicílico, uns óvulos de tanino, um
colutório de iodo, um colírio de sulfato de zinco, umas gotas nasais ou auriculares contendo anti-
sépticos, são essencialmente medicamentos tópicos.
Alguns medicamentos quando administrados, por exemplo, por via gastro-intestinal não são
absorvidos, desempenhando, porém, a sua acção em determinada zona do tracto digestivo. Neste
caso emprega-se o termo acção local para exprimir o seu modo de actuação. É o que sucede quando
se ingere subnitrato de bismuto em pó, substância que, não sendo absorvida, vai, contudo, actuar
localmente, protegendo a mucosa gástrica e duodenal. É ainda o que acontece com determinados
antibióticos, como a bacitracina ou a neomicina, ou com os anti-helmínlicos, como o cilrato de
piperazina, que actuam localmente no intestino, pela sua actividade anti-bacteriana ou vermicida.
São muitas as modalidades de acção dos medicamentos tópicos. Uns exercem um efeito anti-
inflamatório, como os óvulos e pomadas de hidrocortisona, outros são preferentemente destruidores
da queratina, como as soluções de sulfuretos alcalino-terrosos; alguns desempenham uma acção
anestésica local à custa do arrefecimento brusco dos tecidos, como o cloreto de etilo; outros, ainda,
actuam como simples protectores da epiderme, designadamente certos cremes absorventes das
radiações ultravioletas; etc., etc.
É hábito classificarem-se os medicamentos tópicos em várias categorias, consoante a sua
acção principal. Teremos, assim, fundamentalmente, tópicos anti-inflamalórios, revulsivos,
queratoplásticos, queratolíticos, cáusticos, protectores, anti-sépticos, anti-ecze-matosos,
parasiticidas, anti-seborreicos, etc.
Claramente que todas as classificações dos tópicos revelam defeitos, dada a simultaneidade
de acção que muitos deles apresentam. A classificação que adoptámos é das mais usuais, embora
nela se notem certos afastamentos dos critérios seguidos por outros autores e, muito especialmente,
em relação à literatura norte-americana.
445

4.1.1. ANTI-INFLAMATÓRIOS

Designados lambem por antif logísticos (do grego unti. contra, phlogo, ardor, queimar), são
considerados como os tópicos capazes de modificarem favoravelmente o estado de inflamação de
uma região do corpo ( ' ) .
Tais medicamentos actuam por favorecerem o desaparecimento dos edemas, desidratando os
tecidos tumefactos, quer por activação da circulação local, quer por vaso-conslrição na zona de
aplicação ou por coagulação das albuminas lissulares.
Os tópicos anti-inflamatórios clássicos podem ser considerados em duas categorias
distintas, de acordo com o modo de acção predominante:

1.°) Adstringentes.
2.") Emolientes.

4.1.1.1 Adstringentes

São lópicos que provocam a constrição das superfícies mucosas, pele, vasos sanguíneos ou
tecidos diversos, diminuindo as secreções e os corrimentos. Actuam por vasoconstrição local e
coagulação das albuminas, levando à absorção dos exsudatos de feridas c erupções cutâneas. Em
alguns casos provocam tão fortemente a constrição tios capilares e outros vasos sanguíneos de
calibre diminuto que podem ser ulili/ados para estancar pequenas hemorragias. Nessas
circunstâncias denominam-se extíftficos, citando--se entre eles diversíssimos metais e taninos.
Os adstringentes também se utilizam como antiperspirantes e desodorizantes, o que se deve à
constrição que provocam sobre os poros e ao efeito baclcricida que muitos revelam.
Rxistem numerosos adstringentes: ácidos diluídos; derivados metálicos, como o cloreto
férrico, sulfato de cobre, alúmen, acetotartarato de alumínio, sulfato de /inço, culamina, peróxido
de zinco, subacetato de chumbo, óxido amarelo de mercúrio, etc.; taninos diversos, muito
particularmente o ácido tânico ou galhotânico, os taninos de hamaméüa e da ratânia, o
acetilotanino (tatügénio). o albuminato de tanino (tanalhina), o caseinato de tanino (proian), o
subgalhato de bismuto (dermatol), etc.; o aldeído fórmico e muitos outros compostos.
Como atras dissemos, o modo de actuação dos adstringentes está particularmente relacionado
com a precipitação de albuminas, podendo admitir-se no caso dos metais

( ' ) h de notar que há medicamentos eapa/.es de diminuírem uma inflamação, quando


administrados internamente, após absorção para os órgãos c tecidos. Não são. porem,
medicamentos tópicos. A hidrocortisona e preparações orais, rectais e parentérkas de anti-
inflamatórios rum esleroides (NSAIS) constituem medicações deste tipo.
446

que estes se ligam aos grupos sulfidrilo e aminogcnio dos compostos proteicos segundo o esquema:

H-S.: ........................ M+n......... : N - H

Os adstringentes aplicam-se em soluções aquosas, pomadas, supositórios, óvulos, emplastros,


ele. Assim, o chumbo utiliza-se, de preferencia, sob a forma de diversos emplastros. Entre os
adstringentes mercuríais mais representativos citamos a pomada de óxido amarelo de mercúrio, que
tem, simultaneamente, uma nítida acção anti-séplica. Como medicamentos derivados do zinco
empregam-se as pomadas de óxido de /inço, o colírio de sulfato de zinco, que apresenta, também,
poder anti-séptico (conjuntivilc diplohacilar), e as suas soluções aquosas para aplicação cutânea. Entre
os tópicos contendo cobre lembramos as soluções aquosas de sulfato de cobre, como a água de
DALÍROUR e o licor de V[Ï.I.ATE. As soluções aquosas a 10-25%' de cloreto de alumínio são usadas como
antiperspiranles ou anidróticos. O sulfato de alumínio c potássio é um adstringente utilizado algumas
vezes sob a forma de óvulos; a solução aquosa de acetotartarato de alumínio, conhecida por solução
de BUROW, constitui outro exemplo do emprego das propriedades anti-inflamatórias do alumínio. O
nitrato de praia em solução aquosa é um adstringente utilizado como tópico cutâneo e ocular.
Além da sua acção adstringente por via digestiva, a qual determina prisão de ventre, os
taninos exercem, como os compostos metálicos descritos, uma acção constritora sobre as mucosas
externas irritadas ou hipersecretoras, o que se deve ao seu efeito coagulante das albuminas
tissulares superficiais. Utilizam-se soluções aquosas para aplicação nas mucosas bucal ou vaginal.
Emprcgam-se também pomadas e óvulos contendo taninos.

4.1.1.2. Emolientes

De acordo com a sua raiz etimológica latina (de emolliens, que amolece, que amacia), os
emolientes suo medicamentos que têm o poder de tornar os tecidos suaves e macios. Este
abrandamento tissular é conseguido à custa de uma activação da circulação local, uma vez que os
emolientes provocam calor e humidade.
Sendo activada a circulação local, produz-se aumento das defesas leucocitárias e atenuação da
dor devida à turgescência dos tecidos inflamados. Logo que estes se tornam mais moles, a causa
primária do estado doloroso desaparece e, secundariamente,
447

é facilitada a concentração das matérias purulentas e a redução dos condutos de supuração.


As investigações de BLANCK vieram demonstrar que o conteúdo em água do extracto córneo da
pele c o factor determinante quanto á sua flexibilidade e macieza. Sabe-se hoje, também, que a
fixação da humidade por essa zona da pele é devida à presença de substâncias nitrogenadas
(queratina) capazes de relerem três vezes o seu peso de água. É por este facto que as pomadas que
apresentam certo teor em gorduras ou óleos vegetais ou minerais manifestam acção emoliente, já
que originam uma película que impede a evaporação da água da queratina. Compreende-se também
que os compostos utilizados como emolientes deverão ser isentos de acidez. O óleo de amêndoas
doces, o óleo de amendoim c o azeite neutro são muito empregados, bem como os silicones
(Dimeticone) e os óleos minerais, como a vaselina e a parafina líquida.
Entretanto, a aplicação de camadas muito espessas de gorduras pode levar à obstrução total
dos poros, sucedendo que as toxinas celulares não se eliminem, o que ocasiona um certo efeito
congestivo.
Como exemplos de emolientes poderemos citar, ainda, as gomas, mucilagens, amidos, dextrinas
e alguns álcoois, como a glicerina, o propilenolicol c o sorbitol.
As cataplasmas de farinha de linhaça, o gUcerado de amido, o linimento óieo--calcário e
muitas mucilagens têm sido utilizadas como emolientes externos. Algumas vezes sucede que as
drogas vegetais sejam ricas, simultaneamente, em materiais muci-laginosos e em alantoína. Este
último princípio, que se encontra também nas larvas das moscas e na urina, manifesta apreciáveis
propriedades cícatrizantes das feridas ulceradas. Tem sido identificado em vários vegetais
emolientes, completando a sua acção an ti-inflamatória. Os estiletes de milho («barbas» de milho), a
borragem, o Symphytum consolida, o Pycnanthus angolensis, etc. possuem elevados teores de alan-
toína (0,2 a 2%).
Os emolientes são também chamados demulcentes, se bem que este termo seja mais empregado
para designar os medicamentos de uso interno local que apresentam a propriedade de amolecerem
as mucosas inflamadas do tracto digestivo ou do aparelho respiratório (l)-
Alguns são empregados como anti-inflamatórios das zonas acessíveis da faringe e da laringe.
O xarope de alteia e o de avenca são exemplos suficientemente representativos. Outros empregam-se
para atenuar as inflamações dos órgãos internos e proteger a superfície das mucosas do tubo
digestivo e das vias respiratórias. Utilizam-se em xaropes, poções, enemas ou, mesmo, em inalação.

(') A literatura norte-americana considera, separadamente, os emolientes e dcmulcentes,


admitindo que os últimos são constituídos por gomas, mucilagens, dextrinas, amidos f. glicóis poli-
hídricos. Uma vez que o seu mecanismo de acção é praticamente semelhante, não vimos vantagem
em os considerar em capítulo separado.
448

A água albuminosa, que é muitas vezes usada cm casos de intoxicação pêlos venenos
metálicos, constitui um emoliente que se pode administrar por via oral ou em enema. A tintura de
benjoim tem-se aplicado topicamente e também cm inalações, que, além de desinfectantes, são anti-
inflamatórias.

4.1.1.3. Outros anti-inflamatórios

Embora com mecanismo de acção bastante complexo e em parte desconhecido, poderemos


considerar ainda no grupo dos anli-inflamatórios os derivados corticóides tópicos. Enlre eles sào de
citar o acetato de cortisona\ a hidrocortisona livre e sob a fornia de acetato; a de.xametasona e o seu
fosfato sódico; o acetato de metilpredniso-lona\ o acetonido da (riancitiolona\ u betametasona e o seu
valerato; o acetonido de fluocinoiona e o hidrocortamalo.
De uma maneira geral, estes compostos são insolúveis na água, podendo apontar--se como
excepção o hidrocortamato e os fosfatos alcalinos de corticóides. Ulilizam-se em pomadas,
colírios, golas nasais e aerossoles. Apresentam acção anti-hialuronidásica, actuando sobre o tecido
conjuntivo, sendo por isso necessário que penetrem até às camadas profundas da pele.
Do mesmo tipo é o ácido glicirretínico, obtido a partir ao alcaçuz, o qual se tem utilizado em
pomadas, sob a forma de succinato ou de heterosídeo do ácido glu-curónico.
A arnica, droga rica cm estcróides, c também empregada como anti-inflamalória,
especialmente para atenuar as equimoses. A sua tintura, aplicada cxlernamenle, constitui um dos
medicamentos mais antigos, figurando em velhos formulários embrocacões de arnica preparadas a
partir da tintura daquela droga.
Ainda no grupo dos anti-inflamatórios são considerados os azulenos, nome criado por PIERRE
para designar o hidrocarboneto de cor azul de que derivou esta série de compostos. Encontram-se
em numerosas plantas, sendo distinguidos por um prefixo que alude à espécie botânica que os
contém: cham-azuleno ou camazuleno (de Chamomilla), vííiv-azuleno (de Vetiverias), etc.
Alguns pós dentífricos contêm azulenos de síntese, como o l,4-dimetil-7-isopropil-azuleno, que
é idêntico ao produto natural gwai-azuleno. A linlura de camomila é considerada como anti-
inflamatória devido precisamente ao seu conteúdo cm canut-zulcno.
Actualmente vários anti-inflamalórios não esteróides. que actuam sobre as prosta-glandinas,
são utilizados topicamente em cremes e geles.
449

4.1.2. REVULSIVOS

Habitualmente chamados resolutivos ou contra-irritantes, são medicamentos que actuam por


uma acção irritante local, provocando uma chamada de sangue ao ponto de aplicação, com
subsequente hiperemia. O seu uso assenta no princípio de que a irritação da pele provoca a
congestão dos tecidos subjacentes, descongestionando-se, por derivação, os órgãos profundos,
devido a uma acção sobre os nervos que regulam o calibre dos pequenos vasos sanguíneos.

Fig. 201. Zonas do corpo em que è hábito aplicarem-se revulsivos


I — para a laringite; 2 — para a tuberculose; 3 — para a
pericardite; 4 — para o vómito; 5 — para a apendicite; 6 —
para a ovarite; 7, 8, 9 e 15 — para o reumatismo ou a gota;
10 — para a dor de cabeça;
II — para a epilepsia; 12 — para a pleurisia; 13 — para o
lumbago; 14 e 16 — para a ciática

Os revulsivos classificam-se em suaves ou rubefacientes e enérgicos ou vesicantes. Os


rubefacientes provocam somente hiperemia na zona de aplicação, enquanto que os vesicantes
originam secundariamente a formação de vesículas epidérmicas, repletas de líquido de exsudação.
Não pode dizer-se que esta diferença seja perfeitamente delimitada, já que a formação de vesículas
pode depender da dose e do número de aplicações do revulsivo. Assim, muitos rubefacientes podem
tornar-se vesicantes, tudo dependendo das condições de administração.
Os revulsivos aplicam-se sob a forma de pinceladas, unguentos, pomadas, emplastros,
linimentos, etc.f em diversas regiões do corpo, deixando-os actuar por um período de tempo de
alguns minutos a horas, consoante o caso. São mais vulgares as aplicações na epiderme, nas regiões
correspondentes à laringe, pulmões, coração, rins e nervos ciáticos. Algumas vezes ainda se
utilizam revulsivos para combater as dores de cabeça, as ovarites e até a epilepsia. O esquema
reproduzido na Fig. 201 dá ideia das zonas do corpo em que é hábito aplicarem-se os revulsivos.
450

4.1.2.1. Rubefacientes

Têm sido empregados no tratamento da bronquite, na congestão gástrica com vómitos, nas
dores reumáticas, nas entorses c inflamações crónicas.
Entre eles lembramos a mostarda, a terebintina, o pimentão, a cânfora, o salici-lato de metilo, o
mentol e a amónia.
A mostarda pode sei utilizada sob a forma de cataplasma ou de sinapismo. Pode empregar-se
ainda o seu princípio activo dissolvido em álcool, constituindo a solução alcoólica de
isossulfocianato de alilo, impropriamente conhecida por tintura de mostarda. As cataplasmas não
devem ser feitas com água excessivamente quente, porquanto esta destroi o fermento existente na
farinha de mostarda (mirosinase), responsável pela hidrólise do sinigrosídeo, tornando-se activo
como rubefaciente.
Muitas vezes a aplicação da mostarda chega a originar vesículas, representando um dos
exemplos de uma droga simultaneamente rubefaciente e vesicatória, a que atrás aludimos.
A terebintina é utilizada sob a forma de essência de terebintina em alguns linimentos. Utilizou-
se, também, por via injectável, na prática dos abcessos de fixação, introduzida em 1900 por FOCHIER.
O pimentão tem-se utilizado em tinturas que se aplicam por pincelagem na pele. O mesmo
processo é empregado para a aplicação da solução alcoólica de iodo, que popularmente é conhecida
por tintura de iodo. O algodão iodado constitui também uma preparação que se utili/a como
rubefaciente.
A cânfora é utilizada como revulsiva em alguns medicamentos, como a água amónío-canforada
ou água sedativa, vários linimentos, como o linimento amoniacal--canforado, o de sabão com ópio, o
opodeldoque e, ainda, diversas pomadas. Faz também parte da composição da água de DALIBOUR
que, como já vimos, é uma solu-Çào aquosa contendo sulfato de cobre e de zinco.
O salïcilaío de metilo e o mentol empregam-se muitas vezes associados, em pomadas
rubefacientes, como o bálsamo analgésico. O salicilato de metilo é também muito utilizado em
cataplasmas contendo, como excipiente, o caulino, as quais são designadas, habitualmente, por
antiflogistinas.
A amónia é dos revulsivos mais utilizados, quer em solução aquosa, a 10-20%, quer sob a
forma de linimento.

4.1.2.2. Vesicantes

Utilizam-se para dominar formas mais intensas de dor e de inflamação, como nas pleurisias,
pericardites e ciática.
Entre os vesicantes poderemos citar as cantáridas, o ácido acético e, em determinadas
condições, a mostarda e o iodo.
451

As cantáridas actuam pelo seu princípio activo — a cantaridina —, podendo ser aplicadas em
tinturas (alcoólicas, acetónicas, aceto-etéreas e clorofórmicas), sinapismos, unguentos e emplastros.
Trata-se de mcdicamcnlos altamente vesicalórios cujo emprego deve ser cuidadosamente controlado,
havendo diversas contra-indicações para o seu uso, como a glomerulonefrite.
Algumas vezes, na preparação da tintura de cantáridas, associa-se ao líquido extractor o ácido
acétido, o que, além de exacerbar a actividade vesicatória, promove um maior rendimento extractivo
em cantaridina.
Ao lado dos fármacos citados como revttlsivos não queremos deixar de fazer referência aos
irritantes com propriedades esclerosanies, embora não possam considerar--se como lópicos no
sentido estricto do termo. Trata-se de drogas capazes de alterar as células mas que não destroem
grande número delas no local da sua aplicação. Tais agentes promovem o aparecimento de fibrose e
actuando sobre a íntima dos vasos sanguíneos procedem à sua «decapagem» o que leva a que
apresentem certo interesse na redução de varicoses e hemorroidal. A quinina associada à ureia é dos
esclerosantes mais usados, já que o alcalóide irrita localmente o tecido e desenvolve uma acção
anestésica local que diminui a dor da injecção e a ureia promove a desnaturação das proteínas que
representa o estímulo primário para a esclerose.
O morruato de sódio (solução estéril dos ácidos gordos do óleo de fígado de bacalhau sob a
forma sódica) c o sulfato de sódio e tetradecilo são também dois agentes esclerosantes com certo
interesse.

4.1.3. QUERATOPLASTICOS

São medicamentos que intensificam a queratínízação dos epítélíos promovendo, por isso, a
regeneração da camada córnea (Sfratum corne um) que corresponde á zona celular mais externa da
pele. As células dessa zona não possuem, geralmente, núcleo e encontram-se repletas de queratina. A
sua espessura varia nas diferentes partes do corpo, podendo considerar-se como mais espessas as
correspondentes às palmas da mão e plantas dos pés (de 0,5 a 0,6 mm). Em contrapartida, é
particularmente delgada a camada córnea da cara.
Este facto tem alguma importância na formulação de cremes e pomadas dérmicas, já que a
penetração dos medicamentos e a sua actuação no local exacto dependem, cm grande parte, da
espessura do Sfratum corneum.
Tem-se verificado que a ausência de vitamina A no regime alimentar do indivíduo pode levar à
queratinização anormal do seu epitélio cutâneo. Do mesmo modo, está demonstrado que dietas
pobres em vitamina C e vitaminas do complexo B alteram a histologia do epitélio cutâneo.
Os queraloplásticos actuam quer por estimulação da actividade das células do corpo mucoso
de Malpighi, quer por asfixia das células superficiais do epitélio. No
452

primeiro caso, a estimulação celular origina uma renovação do epitélio até à superfície, provocando
a queratinização. Os queratoplásticos que actuam deste modo tomam o nome de celulares. No
segundo caso diminuem o consumo de oxigénio das células do epitélio pela acção de compostos
redutores, o que provoca também a queratini/ação. A este último tipo de queratoplásticos é dada a
designação de redutores.

4.1.3.1. Queratoplásticos celulares

Entre os queratoplásticos celulares é hábito referir-se o Sudão !V ou vermelho escarlate, que é


empregado em pomadas de penetração média, numa concentração de 8%. O ácido pfcrico ou
trinitrofenol também é utilizado como queratoplástico celular, possuindo, igualmente, certo poder
adstringente por coagulação das albuminas. Emprega-se em solução aquosa, etérea ou alcoólica a
l %, no tratamento das queimaduras. Por último, podemos fazer ainda uma referência ao factor
respiratório cutâneo (S.R.F. — — Skin respiratory factor), que se pode obter dos extractos de
leveduras vivas e que tem demonstrado possuir acção cicatrizante.

4.1.3.2. Queratoplásticos redutores

O grupo dos queraloplásticos redutores está largamente representado. Pode dizer-se que o
grau de redução provocado c variável, sendo vulgar classifieá-los em subgrupos, por ordem
crescente daquela propriedade.

Redutores fracos —Tigenol, tumenol, ictiol, naftalan, ele.


Redutores médios — Alcatrão, óleo de cade, óleo de cedro, coaltar, enxofre,
bálsamo do Peru, resorcina, |3-naftol, etc. Redutores fortes —
Crisarobina, ácido crisofânico, antrarobina, pirogulhol e
derivados, etc.

Utilizam-se, de preferência, em pomadas dotadas de fraco poder de penetração.


O ictiol, chamado também sulfoictiolato de amónio, é. dos compostos citados, um dos mais
utilizados. Muito semelhantes são o tigenol e o tumenol-amónio, que, como o ictiol, provêm do
tratamento de xistos betuminosos do Tirol.
Estes queratoplásticos utilizam-se em pomadas e em óvulos. Secundariamente, lêm--se
empregado em mistura com o talco.
O alcatrão vegetal ou breu cru é empregado em pomadas que não deverão ser dotadas de
elevado poder de penetração cutânea (ver Pomadas).
453

O coallar ou alcatrão mineral é habitualmente utilizado sob a forma de emulsão,


conseguida à custa da tintura de quilaia. . """
O grupo dos redutores fortes é constituído por compostos tipicamente dotados de eivado poder
de fixação do oxigénio, como as antraquinonas e o pirogalhol. ,

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4.1.4. QUERATOLITICOS * " •'•'**
fiu:>^

Como o seu nome indica, os queratolíticos são medicamentos capazes de dissolver as


formações queratínicas. Sào susceptíveis de provocar o desaparecimento das calosidades e
cicatrizes. No mesmo grupo consideraremos, ainda, os depilatórios,
O ácido salicílico, tão utilizado em pomadas epidérmicas (ver Administração por via cutânea) e
no colódio salicilado, é um dos queratolíticos mais empregados, mas esta propriedade só se
manifesta em concentrações superiores a 2%. Em concentrações de l -2% é, essencialmente,
queratoplástico. O Peróxido de Benzilo é também um que-ratoplástico bastante usado, associando à
actividade destruidora da queratina certa potência microbicída, em especial em relação às bactérias
anaeróbias. Tem-se empregado em diversas formulações tópicas para combater o acne vulgaris e o
acne rosaccae.
Alguns queratolíticos são particularmente empregados para corrigir ou eliminar cicatrizes ou
infiltrações crónicas, destacando-se, de entre eles, certos fermentos pro-teolíticos, como a tripsina. A
pepsina e a papaína também são usadas com a mesma finalidade, cmpregando-se em pomadas c pós.
Uma patente norte-americana refere a associação, para efeitos tópicos, da papaína com a ureia.
A fibrolisina, associação de 2 moléculas de tiosinamina com uma molécula de salicilato de
sódio, é também utilizada para corrigir os tecidos cicatriciais. Emprega-se sob a forma de solução
injectável, que se aplica na zona queratinizada a corrigir.
Ainda no grupo dos queratolíticos devemos mencionar as substâncias usadas como
depilatórios, entre as quais citaremos os sulfuretos de cálcio, de sódio e de estrôncio
c o tioglicolato de cálcio, considerado dos menos irritantes para a pele, mesmo em con
centrações de 4 a 10%. , .. _,,,,.„-,
Os depilatórios utilizam-se, geralmente, sob a forma de pós, associados a substâncias inertes,
como o amido, ou dotadas de certo poder an ti-inflamatório, como o óxido de zinco. Empregam-se
ainda em solução ou em pastas contendo glicerina, óxido de zinco, amido e mentol.
Finalmente faremos referência ao ácido correspondente à vitamina A, conhecido por retLioina
ou ácido retinóico, o qual se tem utilizado com êxito em situações de hiperqueratosc: queratose
solar, ictiose, keratosis palmaris e plantaris. Emprega-se sob a forma de creme, geleia ou solução,
em regra em concentrações que variam entre 0,025% e 0,1%.
454

4.1.5. CÁUSTICOS

Entendemos por cáusticos os medicamentos tópicos destinados a destruir ou corroer


determinadas porções de tecido.
Consoante o seu poder corrosivo, podem ser classificados em cateréticos ou cáusticos fracos e
escaróticos ou cáusticos potentes.
Entre os cáusticos, lembramos o ácido azótico, o tenol, o hidróxido de potássio, o subacetato de
cobre, o anidrido crómico, o ácido tricloroacético, o podófilo, o nitrato de prata, o anidrido
arsenioso, o cloreto de zinco e o nitrato de mercúrio.
O ácido azótico aplica-se, geralmente, para destruir as verrugas, sob a forma de toques com
uma vareta de vidro. O ácido tricloroacético é normalmente ulilizado em solução clorofórmica. O
próprio ácido acético, que é considerado como um vesicante, também apresenta propriedades
cáusticas, empregando-se puro ou misturado com igual peso de formol.
A solução aquosa de cloreto de zinco (3 a 5%) constitui um dos cáusticos mais utilizados.
O nitrato de prata é usado puro, em lápis (pedra infernal), ou em misturas com nitrato de
potássio (lápis mitigados).
Em odontologia empregam-se alguns cáusticos como desvitalizantes da polpa dentária. Entre eles
conserva ainda a primazia o anidrido arsenioso, que pode ser associado ao fenol e a anestésicos
locais.
Em medicina veterinária usa-se, por vezes, um cáustico constituído pela associação de verdete,
mel e vinagre. Trata-se de um oximelito que a Farmacopeia Portuguesa IV considera equivalente ao
unguento egipcíaco.
O nitrato de mercúrio, que se prepara por dissolução do mercúrio em ácido azótico, é um
cáustico muito potente, exclusivamente aplicado em medicina veterinária.
A partir do Podophylum pelíalttm oblém-se uma resina (resina de podófilo ou podofilina), de
composição complexa (quercetina, podofilotoxina e glucosidos da pelta-tina) a qual se tem utilizado
em solução alcoólica a 25% para destruir certas formações de origem venérea que aparecem na
glande do homem e na vulva da mulher, as quais são provocadas por infecções de vírus. Estes
condilomas são proliferações devidas ao desenvolvimento anormal do epilélio. Usa-se ainda para
destruir papilomas, o que se deve à sua acção citotóxica.

4.1.6. PROTECTORES

Consideraremos sob esta rubrica os medicamentos cuja função é proteger os tecidos sobre que
se aplicam. A sua acção pode exercer-se em relação a simples causas mecânicas, como evitar o
contacto de uma ferida com a roupa, ou proteger dada zona
455

do corpo da acção do ar ou da lu/,. Podem também desempenhar a sua actividade protectora em


relação a úlceras internas, impedindo ou minimizando a acção dos sucos digestivos sobre elas.
Muitos dos agentes protectores têm funções adsorventes, fixando gases intestinais (carvão), toxinas
(caulino, atapulgite), etc.
Podemos, portanto, considerá-los como actuando interna ou externamente.

4.1.6.1. Protectores para uso interno

Trata-se de um grupo de compostos que não sofrem alteração química apreciável no tubo
digestivo e que não são absorvidos sistemicamente. Actuam pelas suas propriedades adsorventes,
como o caulino e a atapulgite, que fixam apreciável quantidade de microrganismos intestinais e suas
toxinas. Podem ainda reter gases, como acontece com o carvão activado que adsorve, quando seco,
gases, como o amoníaco, óxido nitroso, e dióxido de carbono, oxigénio, nitrogénio, cloro, etc.
Entretanto, é de notar que o carvão activado humedecido perde esta propriedade, pelo que pode
considerar-se irracional a sua utilização para fixar os «gases do estômago». Por último, podemos
considerar neste grupo as substâncias, como o subnitrato de bismuto, que desempenham funções
protectoras da mucosa gástrica e duodenal, dado que formam uma película isolante, a qual funciona
como uma espécie de penso. Estes compostos, acessoriamente, possuem poder adstringente e anti-
ácido.
Os silicones (dimeticonc ou simcticone), quando administrados per os, auxiliam a expulsão dos
gases do tracto digestivo porquanto, em virtude da sua hidrorrepelência, levam à formação de
bolhas gasosas que são eliminadas através de eruptos.

4.1 6.2. Protectores para uso externo

Como a sua designação indica, destinam-se a serem aplicados externamente na pele e


mucosas.
O colódio elástico e certas pomadas hidromiscíveis, que são capazes de deixar uma película
maleável à superfície da pele quando se evapora a água constituinte, são agentes protectores
externos. O colódio é uma solução etéreo-alcoólica de algodão pólvora que, ao evaporar o
dissolvente, ocasiona a formação de uma fina película protectora da zona sobre que é aplicada. Várias
pomadas e aerossoles, contendo polivinilpirroiidona (PVP), álcool poliviníüco, etilcelulose ou
poliacrüato de sódio, actuam de modo análogo ao colódio elástico ao evaporar-se a sua fase aquosa.
É ainda de referir que se empregam muitos pós protectores, como o licopódio, o talco, o
estearato de magnésio, etc. A própria pomada de óxido de zinco pode ser considerada um protector
cutâneo (acção adstringente e absorvente).
456

Os tópicos protectores do ar e da luz são habitualmente cremes, aerossoles ou loções. Os cold-


creams, do tipo da pomada rosada benzoinada, constituem exemplos de medicamentos tópicos
preservadores da acção do ar e da luz.
Por outro lado, existem vários compostos químicos capazes de absorver as radiações
ultravioletas solares responsáveis pelo aparecimento de queimaduras. Verificou-se que essas
radiações apresentam comprimento de onda compreendido entre 280 nm e 310 nm. Entre essas
substâncias figuram o ácido para-aminobenzóico e para-aminoben-zoaíos; salicilatos de mentilo, de
trietanolamina e de fenilo, antranilato de metilo; esculeüna e metilesculetina; metilitmbeliferona,
dioxibenzona e numerosos produtos patenteados.
Ao lado destes produtos tipicamente protectores contra os efeitos dos raios solares podemos
lembrar substâncias que aumentam ou diminuem a pigmentação da pele. Entre as primeiras citamos
o meíoxsaleno, produto extraído de Psorales coryfolia, de Amni majits e de Ruía chaíepensis, ou
preparado por síntese, que é capaz de levar à produção de melanina quando aplicado topicamente e
após exposição à luz ultravioleta. Usa-se no tratamento do vitiligo.
Como exemplo de produtos que diminuem a pigmentação lembramos a mono-benzona que
actua interferindo com a formação da melanina, cuja produção cutânea diminui. Vários tipos de
hiperpigmentação são tratados com a sua aplicação em pomada (20%) ou loção (5%).
Semelhante no seu efeito é a hidroquinona que é altamente irritante, o que obriga a ter cuidado
com os olhos, e cuja acção é temporária. Usa-se em cremes, loções e pomadas a 2%.

4.1.7. ANTI-SÉPTICOS E PARASITICIDAS

Consideraremos como tópicos anti-sépticos aqueles que destroem bactérias e fungos ou inibem
a sua proliferação nas mucosas, pele, couro cabeludo, unhas, etc.
Nas infecções bacterianas empregam-se diversos fármacos, como a iodocloro--hidroxiquinoleína
(Viofórmio). sob a forma de pomadas; utilizam-se ainda certos antibióticos, como as tetraciclinas,
bacitracina, cloranfenicol, geralmente em pomadas epidérmicas.
Nas infecções fúngicas recorre-se ao ácido undecilénico, deidro-undecilénico, tol-naftato,
nistacina, etc. Estas substâncias são empregadas em pomadas gordas ou com excipientes contendo
polietilenoglicóis, cuja penetração não é habitualmente muito profunda. Empregam-se também
soluções em polietilenoglicol 400 (o tolnaftato é usado em solução a 1% em PEG 400).
Os parasiticidas são utilizados para combater as infestações por vários parasitas. Entre eles
lembramos os anti-escabiótícos, que inibem ou destroem os ácaros da sarna. O enxofre e o benzoato
de benzilo, são, dos fármacos pertencentes a este tipo, os mais
457

utilizados. A sua penetração cutânea deve ser profunda, sem que, porém, se atinja a absorção
sistémica. O hexaclorociclohexano também é um parasiticida poderoso, mas como é muito tóxico o
seu uso restringe-se à medicina veterinária.

. BIBLIOGRAFIA :.

SELLÉS MARTI. E. — Farm. Galenica Especial, Madrid, 1953, págs. 290-315.


HARVEVS S. C. — in Reminglon's Pharmaceutical Sciences, Mack Publishing, Easton, Pensylvania, 1980,
págs. 716-734. BLAUG, S. — in Prescription Pharmacy, Ed. J. Sprowls, J. B. Lippincott Co
Philadelphia, Montreal,
1963, págs. 201-209. HARRY. R. G. — Cosmetologia moderna (tradução), Ed. Reverte, S. A.,
Barcelona, Buenos Aires, 1954,
págs., 1-29.
BLANK, J. H. — J. Invest. Dermatol., 18, 433, 1952. BLANK, J. H. — J. Invest. Dermatol., 21, 259, 1953.
l>
NOGUEIRA PRISTA, L.; CORREIA ALVKS, A. e ARAÚJO, M. FÁTIMA — Garcia de Orta, 8 (n. 2), 327-331, 1960.
458

4.2. MEDICAMENTOS DE ACÇÃO GERAL

4.2.1. ABSORÇÃO

O meio interno do organismo, no sentido em que o considerava CLAUDE BERNARD, é constituído^ pelo
sangue, linfa circulante e líquidos extravasculares. Estes últimos são, por seu turno, o conjunto dos
líquidos intercelulares ou líquidos lacunares do tecido conjuntivo e dos líquidos intracelulares, que
correspondem à parte citoplas-mática. De uma maneira geral, as suas quantidades relativas, no
homem adulto, são as seguintes:

Plasma.................................................. 2,5-3,5 litros


Líquido intercelular ............................ 9-15 »
Líquido intracelular ............................ 30 »

Considera-se que um dado medicamento foi absorvido quando após a sua administração o
fármaco ou fármacos componentes passaram para a corrente circulatória (sangue e linfa). Claramente
que este objectivo pode conseguir-se por meios naturais, como a absorção através da mucosa do
tracto gastro-intestinal, ou forçando a barreira cutânea, como acontece na administração de
medicamentos por via injectável.
Ao dar-se a penetração do medicamento no organismo, o fármaco ou fármacos responsáveis
pela acção daquele tendem, portanto, a passar à corrente sanguínea (fase de absorção),
distribuindo-se, depois, pêlos diversos tecidos e órgãos (fase de distribuição) e passando, por último,
novamente, à corrente sanguínea de onde são eliminados pêlos emunctórios naturais,
especialmente através da urina (fase de eliminação).
Em regra, o fármaco logo que se distribui sofre determinadas transformações, as mais das
vezes a nível hepático, delas resultando metabolismos vários, os quais são posteriormente
eliminados. Assim, uma apreciável percentagem do fármaco absorvido é, geralmente, eliminada sob
a forma de metabolitos, havendo, porém, certa excreção do fármaco não metabolizado, isto é,
correspondente à sua forma inicial.
O estudo dos fenómenos envolvidos na cinética da absorção, distribuição, meta-bolização e
eliminação dos fármacos toma o nome de farmacocinética. Este campo dos conhecimentos permite
quantificar o valor das relações entre as propriedades físico-químicas dos fármacos, a sua forma de
administração e os efeitos biológicos observados.
O efeito medicamentoso dos fármacos desenvolve-se a nível celular dos diversos tecidos
sobre os quais se distribuem, designando-se por fase farmacodinâmica essa actuação.
459

O esquema representado (Fig. 202) mostra as diversas fases por que passa um medicamento no
organismo, desde a sua administração até à realização do efeito farmacológico pretendido.

Faoe
Farns-

FATMCO !ÍTr« —^
ooMbtaado Piucção
no r*o*]itoc
4.

Fig. 202. Esquema representativo das principais etapas do


percurso de um fármaco no organismo

Como se compreende, a concentração em fármaco, no interior do organismo, depende, em cada


momento, da diferença entre a quantidade que nele penetrou e a quantidade que foi eliminada, tendo
ainda em conta as eventuais transformações químicas que a substância medicamentosa possa sofrer.
A intensificação do efeito farmacológico exercido pelo medicamento é, usualmente, função da sua
concentração no local onde deve actuar. Na prática corrente avalia-se, indirectamente, a concentração
determinando a quantidade de medicamento por unidade de volume de sangue, em função do tempo após
a administração. Quando o medicamento atinge a corrente circulatória, difunde-se pêlos outros
líquidos do meio interior e espalha-se pêlos diversos tecidos e órgãos. O equilíbrio da difusão é
atingido mais ou menos rapidamente, de modo que qualquer variação da concentração de um fármaco
no sangue é um índice da sua concentração actual nos outros tecidos.
Por outras palavras, de uma maneira geral, a concentração de uma substância medicamentosa
no sangue reflecte a intensidade do seu efeito farmacológico, mas são sempre de considerar as
alterações daquele valor, as quais traduzem variações da magnitude ou direcção da difusão.
460

Podemos representar, esquematicamente, a transferência de um medicamento desde o local de


administração até à eliminação, levando ainda em conta as eventuais bio-tran s formações
(essencialmente no fígado), do seguinte modo, em que os valores de K representam velocidades
específicas de difusão:

Local de K. K 3 Medicamento
Medicamento na cor- excretado pelo rim
absorção do rente circulatória
-
medicamento Medicamento
excretado por outros
emunctórios
Medicamento nos lí- Medicamento que
quidos inter e in- sofre
tracelulares biotransfor-
mação

Do que ficou dito pode concluir-se que a substância medicamentosa administrada terá que
atravessar uma ou mais membranas semipermeãveis até que atinja o local de actuação. A sua
possibilidade ou impossibilidade de penetração através dessas membranas condiciona, como é
evidente, a via de administração a eleger e também a distribuição e acumulação do
medicamento nos diferentes tecidos.
Fala-se, assim, em biodisponibilidade medicamentosa entendendo-se como tal a capacidade
com que o fármaco, veiculado em determinado medicamento, desempenhará as suas acções, sejam
elas meramente superficais (tópicas ou locais) ou envolvam absorção, com subsequente
distribuição, metabolízação e eliminação ('). E evidente que estamos aqui a considerar um conceito
lato da biodisponibilidade, pois esta, na maioria das vezes, apenas é relacionada com a absorção.
As membranas semipermeáveis do organismo são de natureza lipoproteica, admi
tindo-se que possuem colesterol, fosfolípidos, trigliceridos e ácidos gordos como com
ponentes lipóides distribuídos em duas camadas, e proteínas que formam uma única
camada com propriedades polares. =«*
wwm*
Estas membranas têm três qualidades fundamentais: a) Apresentam pequena tensão
superficial; b) são preferentemente atravessadas por substâncias dotadas de lipossolubilidade; c)
exibem alta resistência eléctrica.

(') O conceito de biodisponibilidade foi considerado pela primeira vez em 1954 por OSER et ai. a
propósito de vitaminas hidrossolúveis. Mais tarde CAMPBKLL e a sua equipa (1954) continuaram o estudo
empreendido admitindo que um dado medicamento era eficaz se pelo menos 70% da quantidade total
do fármaco era biodisponível.
461

A Fig. 203 é uma representação esquemática de uma membrana lipoproteica,


indicando-se também a sua possível composição química. '""•"''

Fig. 203. Representação esquemática de uma membrana biológica.


A: esquema, mostrando as camadas lipoide e
proteica; B: composição química — provável.

A penetrabilidade dos fármacos através das membranas biológicas depende, em larga medida,
da solubilidade daqueles. Os compostos com baixo coeficiente de partilha óleo/água são dotados de
fraco poder de penetração o qual vai aumentando à medida que cresce a lipossolubilidade em relação
à hidrossolubilidade da substância. Demonstrou-se, também, que as substâncias insolúveis nos
lípidos, mas de pequeno peso molecular, como a ureia e a água, são dotadas de excelente
penetrabilidade. Estes factos mostram que as membranas semipermeáveis funcionam como barreiras
lipídicas, que de onde em onde são interrompidas por pequenos canais ou poros, visíveis ao
microcópio electrónico, os quais são permeáveis à água e a certos iões e moléculas pouco volumosas.
A composição e selectividade das diversas membranas é muito variável, podendo apontar-se que
a barreira hemato-encefálica (sangue-encéfalo) só permite a passagem de compostos altamente
oleossolúveis, enquanto que as dos capilares intestinais, que são muito porosas, permitem,
inclusivamente, a penetração de compostos óleo-insolúveis de elevado peso molecular.
O transporte dos medicamentos através das membranas biológicas pode efectuar-se por dois
mecanismos diferentes, designados por transporte passivo e transporte activo.

4.2.1.1. Transporte passivo

Muitas das substâncias medicamentosas são transportadas através das membranas por simples
difusão. Fundamentalmente, este processo, que também é fisiológico, con-sisle num movimento da
região de maior concentração para a de menor concentração, baseado cm diferenças de pressão
osmótica. (Fig. 204).
462

Segundo a lei de FICK, a velocidade de difusão é proporcional à diferença das pressões


osmóticas, ou, o que é o mesmo, à diferença de concentrações existentes entre o ponto de onde parte
até àquele onde chega a substância dissolvida que se difunde. Deste modo, a difusão continua até que
se estabeleça o equilíbrio (dinâmico) das concentrações nos dois pontos, isto é, quando se atingiu a
iso-osmia.

Concentraçã Concentraçã
o elevada o baixa

Membran
a

Solvente Solvente

Fig. 204. Difusão simples do soluto e do solvente através de uma membrana

A expressão matemática que traduz a lei enunciada pode escrever-se do seguinte modo:
dm de
——— ^-KA
dx

em que —— representa a velocidade de difusão através da área A da membrana, e é

directamente proporcional à diferença de concentração das soluções nos dois lados daquela (de), e
inversamente proporcional à espessura da membrana (dx). K é o coeficiente de difusão.
Desde que a velocidade de difusão dos medicamentos é proporcional à sua concentração no
local de administração, o processo equivale, fundamentalmente, a uma reacção de primeira ordem.
No esquema dado na pág. 460 os valores de Ka. Kr K2, K , K4 e K são, portanto, velocidades
específicas de reacções de primeira ordem, o que mostra serem aplicáveis à eliminação ou às
biotransformações as considerações agora feitas.
Compreende-se, também, que para as substâncias dissolvidas que não possuem o poder de
atravessar as membranas biológicas, o equilíbrio só se possa estabelecer à custa do trânsito de
água, o qual se fará da solução mais diluída para a mais concentrada. É baseado nesta propriedade
que se empregam vários purgantes salinos (purgantes osmóticos), cujos constituintes, não
atravessando as membranas do tracto gastro-intes-tinal, provocam uma chamada de água tissular,
o que dilui o conteúdo fecal.
O coeficiente de difusão (K) pode calcular-se por meio da fórmula de EINSTEIN--STOKES que
mostra que aquela grandeza é directamente proporcional à constante dos
463

gases perfeitos (R = 8,314 x IO7 crg. grau ' mole ') e à temperatura absoluta (T) a que se opera, e
inversamente proporcional ao raio (r) das partículas em que o larmaeo se encontra dividido, à
viscosidade do meio t[, ao número de Avogadro (N = 6,02 x l (F) e a seis vezes o valor de rc (7T =
3,14):

RT
6nrr\ N

Pelo que se disse é compreensível admitir que, de um modo geral, a absorção por difusão
passiva seja tanto mais intensa quanto maior for a temperatura do pacienle (em regra é mais fácil a
absorção no indivíduo febril do que no indivíduo normal) e quanto mais dividido estiver o fármaco e
mais diminuía for a viscosidade do meio cm que aquele se administra.
Entretanto, cm meio aquoso simples os fármacos solúveis exibem coeficientes de difusão que
diferem muito pouco entre si, pois apenas variam com a raiz cúbica do seu peso molecular. Isto
significa que, intrinsecamente, grandes variações de peso molecular e configuração das moléculas se
traduzem em variações mínimas do valor de K. Segundo HUSSAIN, pode adoptar-se como valor
aproximado do coeficiente de difusão da maioria das moléculas dissolvidas em água o número 9,0 x
I O 6 cm2.s '.
Para o cálculo do oeficiente de difusão de compostos dissolvidos em água aceita--se uma
modificação da fórmula de EINSTEIN-STOKHS que considera o peso molecular do soluto em causa e o seu
volume específico (V), ou seja, o número de cm' ocupado por l g:

RT RT 3 / 4 TT N
K = —————— - ——————— X V —————
6 -n- r T;N 6^N 3 M V

Na tabela XLI indicam-se coeficientes de difusão de substâncias apoiares ou de electrólitos


fracos quando em solução aquosa a 25°C.

Tabela XLI. Coeficientes de difusão de vários compostos em água a 25°C

Composto K JO* cm-.s~'


oc-Alanina 0,91
P-Alanina 0,93
Aminobenzoico (ácido) 0,84
Glucose 0,67
Pentaeritritol 0,76
464

Estes valores de coeficiente de difusão dos compostos solúveis em água são bem mais elevados
dos que os que se encontram em suspensões oleosas injectáveis ou em pomadas.
Um de nós, trabalhando com cremes de dexametasona, encontrou o coeficiente de difusão de
0,15 x 10 l2 cm2.s~' para o esteróide. Da mesma forma, e apreciando a biodisponibilidade da
acedapsona em injectáveis oleosos (óleo de rícino + benzoato de bcnzilo) pôde determinar para a
substância um valor de K igual a 0,28 x IO" 12 cm2.s~'.
BRODIE e colaboradores, desenvolvendo a teoria de OVERTON sobre o coeficiente de partilha
óleo/água, aventaram uma sugestiva hipótese para explicar melhor o fenómeno do transporte
passivo dos medicamentos, especialmente através do epitélio gastro-intes-tinal. Efectivamente, este
epitélio actua como uma barreira lipídica (na realidade, lipo-proteica), susceptível de ser
atravessada, facilmente, pelas substâncias lipossolúveis e de difícil penetração para os compostos
lipo-insolúveís. De uma maneira geral, as substâncias não ionizáveis são lipossolúveis, enquanto
que as ionizáveis o não são. Ora, muitos dos medicamentos utilizados são ácidos fracos ou bases
fracas, cujas moléculas existirão, em solução, em parte ionizadas e em parte indissociadas. É
evidente que a predominância de uma destas formas sobre a outra está dependente do pH do meio e
da constante de dissociação do composto em causa, não se devendo esquecer que só as formas não
dissociadas são dotadas de boa penetrabilidade através da barreira lipídica da mucosa gastro-
intestinal. Nestas circunstâncias, é possível aumentar a taxa de absorção de um ácido ou de uma
base fraca por ajustamento apropriado do pH. Assim, sempre que o pH diminui, aumenta a
concentração da forma não dissociada do ácido fraco, aumentando também a respectiva taxa de
absorção gastro-intestinal. O mesmo efeito será obtido quando se aumente o pH, no caso do
medicamento ser constituído por uma base fraca.
Como é sabido, há uma relação directa ente pH e pKa para os ácidos e bases, a qual se
expressa do seguinte modo:

[ac. não ionizado]


pKa = pH + log
[ac. ionizado]
[base ionizada]
pKa = pH + log ———————————— , sendo [base não
ionizada]
pKa + pKb - 14

Em termos práticos isto significa que pH = pKa sempre que haja 50% de ionização. Por outro
lado, está bem determinado que as condições mais favoráveis para absorção de ácidos fracos se
observam quando o pKa é < 3, sendo > 7,8 o pKa óptimo para a absorção de bases fracas.
O ácido salicílico, por exemplo, é bem absorvido no estômago, uma vez que o seu pka é de 3 e
os valores do pH do plasma e do suco gástrico são, respectivamente, d<
465

7,4 e de l a 3,5. Com efeito, a pH 2, cerca de 91% do ácido salicílico encontra-se indissociado, e,
portanto, em condições óptimas para o seu transporte passivo, A pH 5 somente 1% do ácido
salicílico se não dissocia, o que mostra quanto é imprópria esta acidez para efeitos de absorção.
Quando os fármacos sofrem dissociação, a sua distribuição nos líquidos do organismo é
fortemente influenciada pelo pH. A atropina, por exemplo, que é fracamente absorvida pelo
estômago, é bem assimilada pela mucosa intestinal, sendo, porém, transportada de novo do plasma
para o estômago, onde é sempre detectável enquanto permanece no organismo. Esta excreção do
plasma para o suco gástrico é explicável pela influência que o pH exerce no equilíbrio de
distribuição dos medicamentos. Efectivamente, o pKa da atropina é de 9,65, podendo, portanto, a
sua forma não dissociada existente no plasma transitar para o estômago.
A Tabela XLII indica os valores de pKa de alguns ácidos e bases medicamentosas, a 25°C.
. ' . . . . , • . .

Tabela XLII. Valores de pKa de vários ácidos e bases fracos, a 25°C


Ácidos fracos Ácido acetil salicílico pKa
: T
-,._-, ••$ „,> Ácido bórico 3,49 '" - .-":";~ 9,24
!
••* --v^,;:^ -.i/.:.-;':.
• ,...- ;o i,,--. Ácido salicílico .•;>;&•;.,. -•"^ Barbital 3,00 : ^--'^. --. ç.
7,91 .rjv;;;
Benzilpenicilina Fenol ^, :.,, - .
2,76 ' - . "v ' '. 10,00

-'• Sulfadiazina 6,48 : - -


Bases fracas „ Antipirina Apomorfma Atropina 1,40 7,00 9,65 7,90 ' i»>t'-. tá» •
"* l"
-- -1 .;V-í Codeína • •v " -^y- r - ''; :

*T; Efedrina . >,? 9,36 js:;ífív:-'^":.'


f -\ Procaína ,» . : , . 8,80
Reserpina 6,60

Segundo Doluisio, J. e "Swintosky, J. — Amer. J. Pharm. 137, 147 (1965)

Considerações análogas às referidas a propósito da atropina podem ser feitas para várias
substâncias medicamentosas que sendo absorvidas de um dado ponto da mucosa gastro-intestinal
para o sangue são excretadas noutro local do tracto gastro-intestinal.
Na Tabela XLIII indicam-se quocientes entre a concentração do fármaco ionizado e não
ionizado, considerando-se uma base fraca como a antipirina, e as relações entre a forma não
ionizada e ionizada de ácidos fracos, como o ácido acetilsaücílico e o barbital, em função do pH.
466

Tabela XLIII. Efeito do pH na ionização


,'tt Ac, aceülsaliciïico (a) Barbitaí (a) Anlipirina ( b )
1,2 200 2,5 x 10'' 1,59
3,6 0,794 IO4 0.0063 1
5,6 0,00794 100 6,31 x I O 5
7,0 3,16 x W-4 3.98 2,5 x \Q~t>
7,5 IO-1 1,26 7,94 x IO' 7

(a) Não ionizado/ionizado


(b) Ionizado/não ionizado

Não é somente, porem, o grau de ionização das moléculas medicamentosas que afecta a
absorção gastro-intestinal. Como já referimos, é necessário que a forma não •iis.sociada seja
oleossolúvel, ou, melhor, que o seu coeficiente de partilha óleo/água seja elevado.
Muitas vezes, verifica-.se apenas a solubilidade relativa de um fármaco num dissolvente dos
óleos, como o clorofórmio, e na água. Na Tabela X L I V indicamos as variações da absorção de
barbitúricos pelo cólon do rato em função do coeficiente de partilha dessas substâncias em
clorofórmio/água. Como todos os barbitúricos mencionados apresentam constantes de dissociação
muito semelhantes, o diferente grau de absorção obtido apenas se pode relacionar com o respectivo
coeficiente de partilha.

Tabela XLIV. Comparação entre a absorção, pelo cólon do rato, de


vários barbitúricos e o seu coeficiente de partilha em CLCH/H O
C o ff i cie tu e Absorção
Barbitúrico de partilha (em percentagem)
Barbitaí 0,7 12
Aprobarbital 4.9 17
Fenobarbital 4,8 20
Sandoptal 10,5 23
Biitetal 11,7 24
Ciclobarbital 13,9 24
Pentobarbital 28,0 30
Secnhjirbitíil 50,7 40
-íxaal lOO.(K) 44

Segundo L. S. Schanker — J. Pharmacol. Exp. Therap.. 126, 2X3 (1959)

Os conhecimentos resumidamente expostos têm levado a procurar meios para melhorar a


absorção dos fãrmacos, quer por variação do pH. quer por modificação do coeficiente de partilha.
Assim, aconselha-se muitas vezes a ingestão de bicarbonato de
467

sódio acompanhando a administração oral de bases fracas terapeuticamente activas, já que a


elevação do pH do moio proporciona menor dissociação e, consequentemente, aumento da sua taxa
de absorção. Com a mesma finalidade são aconselhados tampões básicos fracos em soluções de
alcalóides midriáticos, utilizadas como colírios.
A eritromicina, antibiótico básico muito usado por via oral, apresenta um pKa de 8,6. Um dos
seus ésteres, o sulfato de laurilo da propionilerítromicina, tem um coeficiente de partilha
óleo/água 180 vezes mais elevado, o que lhe permite uma absorção muito mais intensa do que a da
base livre.
A heparina, que funciona como um árido, não é absorvida por via gastro-intestinal sempre que
o pH do meio seja superior a 4. A melilação do composto origina um éster dotado da mesma
actividade farmacológica mais susceptível de ser absorvido a pH compreendido entre 5 e 7.
O que acabámos de dizer não é, porém, aplicável à absorção de iodas as substâncias. Muitos
compostos que não satisfazem aos requisitos da teoria da dissociação e da lipossolubiüdade
passam facilmente do tracto gastro-inteslinal para o plasma, julgando--se que, nesses casos, existem
factores de outra ordem, como a formação de complexos com substâncias endógenas presentes.
DANIELLI designou este processo de transporte por difusão facilitada, c u j a principal
característica seria a existência de um transportador endógeno que, ao complexar a substância
medicamentosa, a tornaria lípossolúvel. Uma vez realizada a transferência do fármaco através da
membrana biológica, o complexo dissociar-se-ia e o transportador livre, regressado ao ponto de
partida, iria combinar-se com outra molécula do fármaco para dar novo complexo lipossolúvel. É
exemplo deste tipo de difusão a absorção intestinal dos sais de amónio quaternário. Efectivamente,
tratando-se de substâncias muito pouco oleossolúveis e altamente dissociáveis, a sua absorção pela
mucosa intestinal não pode ser explicada pela teoria da dissociação e do coeficiente de partilha.
LEVINE admite que existe um receptor aniónico (fracção fosfatídeo-peptídica) ao nível da mucosa, o
qual se combina com o catião de amónio quaternário, formando-se um complexo lipossolúvel e
absorvível.
Do mesmo tipo de combinação são as ligações dos fármaeos com as proteínas do organismo
para originarem compostos hidrossolúveis. Algumas vezes o fármaco, pouco solúvel na água e mal
disperso no suco entérico, liga-se às proteínas, especialmente plasmáticas, tomando-sc
hidrossolúvel. Haverá, assim, uma concentração tão baixa do fármaco livre no plasma e linfa que,
apesar da sua fraca solubilidade, se mantém um gradiente de concentração entre o lúmen
intestinal e o líquido extracelular. Esta ligação fármaco-proteína tem imensa importância,
podendo, por seu intermédio, compreender-se os mecanismos de acção de vários medicamentos,
especialmente no que diz respeito à duração do seu efeito farmacológico.
Esta propriedade, que interessa mencionar a propósito da absorção dos fármaeos, deve ser
especialmente considerada em relação com a manutenção do nível plasmático do medicamento.
Muitos compostos unem-se parcialmente às proteínas do plasma.
468

formando complexos e permanecendo, cm parte, também, no estado livre. Somente passa do plasma
para os tecidos o fármaco livre, nào apresentando o poder de transpor as paredes capilares a fornia
de complexo proteico. Daqui se compreende a relativa ineficácia de vários medicamentos que ficam,
assim, impossibilitados de atingirem o local dos tecidos em que desempenham a sua acção
farmacológica. As sulfamidas e as tetraciclinas^ por exemplo, só são activas sob a forma difusível,
isto é, quando se não encontram em ligação com as proteínas plasmáticas. Deste modo, c embora
possam localizar-se no sangue em elevada concentração, o facto não significa, obviamente, que
exerçam a esperada acção farmacológica. Na realidade, uma vê/ que estão ligadas a proteínas, tudo
dependerá da extensão da mencionada combinação e da concentração da sua forma livre.
De uma maneira geral, os fármacos podem unir-se às proteínas plasmátieas formando
verdadeiros adsorbatos, segundo a isotérmica de FREUNDUCH. No caso das sulfamidas, pode
expressar-se o fenómeno pela seguinte equação, em que C} é a concentração do fármaco sob a forma
de complexo proteico, C{ c a concentração do fármaco no estado livre e A" e a são constantes
características de cada sulfamida:

CP=Kq

Como é evidente, o grau de complexação pelas proteínas é dependente da concentração da


sulfamida.
Do que se expôs resulta que existem vários compostos que originam elevadas concentrações
sanguíneas, mas que não são activos in vivo.
Há numerosas substâncias cuja ligação com as proteínas plasmáticas (protein-bin-ding) é
particularmente fácil. Em princípio, poder-se-á usar uma terapêutica de associação de alguns desses
compostos com o agente farmacológico a empregar, desde que fosse dotado de menor tendência do
que aqueles para ser complexado.
Na prática, este princípio foi verificado ao observar-se que certas sulfonamidas, que
habitualmente se ligavam às proteínas plasmáticas, eram particularmente activas em indivíduos com
altas concentrações séricas de bilirrubina. É que esta, como o biscumoa-cetato de etilo e outras
substâncias, pode apresentar particular tendência para se combinar com as proteínas, deslocando
as sulfamidas eventualmente compexadas que, desta maneira, se podem concentrar nos tecidos a
tratar.
O que se expôs em relação às sulfonamidas pode ser repetido a respeito das tetraciclinas.
Efectivamente, estas, tal como aquelas, possuem tendência para combinar--se com as proteínas
plasmáticas e, por isso, a sua actividade não dependerá exclusivamente da concentração sanguínea
que atingirem, mas da relação entre a forma com-plexada e a forma livre. É por isso que compostos,
como certos antibióticos, que podem apresentar idêntico poder de inibição in vitro e originar
concentrações plasmáticas da mesma ordem, podem ser desigualmente activos in vivo.
469

A desmetilclorotctraciclina, que é mais susceptível de se combinar com as proteínas plasmáticas


e mais activa in vitro do que a tetraciclina, apresenta, pelas razões expostas, uma acção terapêutica
da mesma ordem que aquela.
Com a penicilina G e muitas das penicilinas semi-sintéticas passam-se factos semelhantes,
devido à maior ou menor tendência para originarem complexos proteicos.

4.2.1.2. Transporte activo

Os mecanismos de difusão atrás apontados não podem explicar cabalmente a absorção de


muitas substâncias. É o que acontece à glucose, cuja elevada hidrossolu-bilidade e peso molecular
não permitem que seja enquadrada entre os compostos absorvidos por transporte passivo. Admite-se
hoje que a penetração de muilas substâncias através da barreira lipídica das membranas biológicas
é conseguida à custa de energia celular. Diz-se que o transporte é activo quando uma substância
dissolvida é capaz de passar através da membrana semipermeável partindo de uma região de baixa
concentração para outra de elevada concentração. Pelo que se disse, é lógico que este processo se
observe no tracto gastro-intestinal, sendo corrente na absorção de produtos naturais como açúcares,
a-aminoácidos, sais biliares, pirimidinas e diversas vitaminas. Acontece também que alguns
fármacos, cujas estruturas sejam semelhantes às das substâncias atrás citadas, possam ser absorvidos
por transporte activo.
Neste mecanismo de transporte há, como dissemos, consumo de energia, circunstância que o
torna diferente da absorção por difusão, mesmo quando esta é facilitada. Certos venenos
metabólicos, como o dinitrofenol c os fluoretos, podem inibir o transporte activo. O mesmo se diz em
relação à baixa de oxigénio, que diminui a energia celular. O regime alimentar a que esteja
submetido um doente a quem foi administrado um medicamento que seja absorvido por transporte
activo pode influenciar a sua taxa de absorção, dada a acção competitiva entre os produtos naturais
ingeridos e o fármaco.

Ao lado dos tipos de transporte de que falámos pode citar-se a pinocitose, género de fagocitose
que é caracterizada pelo englobamento das substâncias através dos movimentos das membranas, que
formariam invaginações e vesículas, com subsequente libertação.
Certas quantidades residuais de proteínas, algumas macromoléculas de outro tipo e gotículas
lipídicas podem ser transportadas por este processo. Muito provavelmente a vacina Sabin oral é
absorvida por pinocitose.
Enire os factos curiosos relatados a propósito da fagocitose, conta-se que, ao fim de 6 a 14
dias da administração subcutânea de oxitetraciclina, se observaram cristais de antibiótico nos
polimorfonucleares e monócitos, o que explicaria uma certa acção prolongada e também uma
excelente distribuição para os tecidos infectados, já que a
470

tetraciclina era transportada pêlos elementos naturais de defesa do organismo. Pena é que com
muitos outros antibióticos tal não ocorra, pois entre as limitações vulgares destes compostos figura
a sua dificuldade de difusão no pus.

4.2.2. DISTRIBUIÇÃO E FIXAÇÃO DOS FÁRMACOS

Quando um fármaco penetra no organismo sofrerá uma certa distribuição que é dependente do
sangue e da linfa circulantes. Essa distribuição pêlos líquidos inter e intracelulares, pêlos tecidos,
glândulas e órgãos nunca é equitativa. Nào se pode, pois, falar num verdadeiro equilíbrio de
distribuição. Efectivamente, o corpo humano pode ser considerado como constituído por milhões de
microcompartimentos, diferenciáveis entre si por diversas características. Como já vimos, o
transporte medicamentoso ocorre sucessivamente em cada dois desses compartimentos, separados
por membranas semi-permeáveis. Nessas circunstâncias, não se pode esperar igual distribuição em
todos os locais do organismo, já que eles diferem consoante a natureza do tecido constituinte. Assim,
a distribuição para o fígado é forçosamente diferente da que se verifica para os pulmões ou para os
tecidos conectivos, etc. Daqui resulta também a diversa capacidade de fixação do fãrmaco pêlos
tecidos que apresentam, igualmente, variável capacidade de metabolização, diferentes receptores,
etc.
Com efeito, as propriedades físico-químicas dos fármacos, designadamente as suas
características de solubilidade, condicionam a fixação em dado tecido. É o que acontece com os
anestésicos e hipnóticos que têm particular afinidade pelas fibras nervosas mas que podem depois
fixar-se no tecido adiposo, como sucede ao penlobarbilal ou ao pentotal, respectivamente de acção
hipnótica curta e ultra-curta.
Os digitálicos fixam-se preferencialmente a nível do miocárdio e a maioria dos alcalóides
escolhe o parênquima hepático. Os arsenicais têm especial tendência para se depositarem nos pêlos,
os compostos de bismuto para se fixarem nas mucosas das gengivas, certas penicilinas, como a
nafcilina, têm afinidade para a bílis e vesícula biliar, as tetraciclinas para os ossos e dentes, etc.
Em alguns casos a distribuição é muito deficiente para determinados tecidos, pois há
membranas extremamente selectivas que se opõem à passagem de fármacos com fraca
lipossolubilidade, o que acontece por muitas vezes estes se terem ionizado no sangue. Entre essas
membranas temos a do sangue-encéfalo ou barreira hemato-en-cefálica que só se deixa atravessar
por compostos com elevado coeficiente de partilha lipídeos/água. É por essa razão que muitas vezes
tem de se recorrer à via intrarraquídea, apesar de ser incómoda e perigosa. Entretanto, os
investigadores procuram melhorar os seus compostos introduzindo-lhes radicais que lhes permitam
franquear a barreira hemato-encefálica. A ampicilina, por exemplo, só com muita dificuldade
franqueia a citada membrana que é, porém, levemente mais permeável à amoxicilina.
471

A placenta comporta-se também como uma barreira lipóide com características de


permeabilidade semelhantes às da membrana hemato-encefálica, porquanto as substâncias que
passam do sangue para o encéfalo também atravessam facilmente a placenta: barbitúricos,
salicilatos, tetraciclinas, meperidina, reserpina, liroxina, amoxicilina, etc.
Para lá destas situações, quando o fármaco foi absorvido pode, em princípio, atingir todos os
pontos do organismo, já que é transportado pêlos líquidos circulantes.
Claramente que o valor da concentração plasmática atingida pelo fármaco reflecte a sua
distribuição ao nível dos tecidos e órgãos. Para uma dose determinada, se essa concentração é
baixa significa que a droga foi fixada pêlos tecidos devido á sua afinidade para aqueles. Se, pelo
contrário, é elevada, é de esperar que o fármaco apresenle limitada tendência a ser retido pêlos
tecidos. Vimos já que a complexação das drogas com as proteínas do plasma (Protein-binding) é um
dos elementos preponderantes no equilíbrio da distribuição.
Designa-se por volume aparente de distribuição (Vd) a relação entre a quantidade total do
fármaco distribuída pelo corpo (W) e a sua concentração no plasma (C):

W
C

O volume de distribuição é o volume aparente do corpo humano, acessível ao fármaco, uma


vez que não se considera a quantidade de fármaco existente, no momento da determinação, no tracto
intestinal e na bexiga.
A aludida relação só representa um equilíbrio aparente que, contudo, tem o maior interesse
para fins práticos. Efectivamente, conhecido o volume aparente de distribuição, que é uma
propriedade característica de cada fármaco, pode calcular-se, em cada momento, a quantidade de
substância medicamentosa distribuída pelo corpo, bastando para isso avaliar a sua concentração
plasmática.
Habitualmente W é expresso em mg, C em mg/ml de plasma e Vd em ml. O volume aparente de
distribuição pode também ser calculado por outros processos, como a determinação da quantidade
excretada pela urina num período de tempo t em relação à quantidade de fármaco administrada.
Assim, se considerarmos Wi como a quantidade de fármaco inicialmente administrada e Ut
como a quantidade eliminada pela urina num tempo í, sendo Ct a sua concentração sanguínea ao fim
desse período, virá:

Wi - Vt Vd =
-—————
Ct

Suponhamos, por exemplo, que um doente tinha recebido por injecção endovenosa l g de
determinado fármaco. Ao fim de 4 horas da administração encontraram-se na
472

sua urina total 0,40 g de fármaco e a determinação da concentração plasmática revelou o valor de
0,03 mg/ml. Logo, o valor do volume aparente de distribuição será:

1000 mg-400 mg
Vd = —————————————— - 20 000 ml 0,03 mg . ml '

O volume aparente de distribuição é, por vezes, expresso em percentagem, designando-se, nessas


circunstâncias, por V%. Assim, será:

Vd
V% = —— x 100

em que P é o peso do indivíduo em g. Se, nesta expressão, substituirmos Vd pelo seu valor, dado pela
equação citada na página anterior, teremos:

W
y% x p = —— x
C

Esta última equação permite determinar a quantidade de substância activa necessária para que
se atinja a concentração plasmática desejada. Efectivamente, suponhamos que um fármaco
apresentava um volume de distribuição de 20%. Se com esse fármaco carecêssemos de uma
concentração plasmática de 0,1 mg/ml, teríamos, num paciente de 60 kg

V% - 2 0
W
C = 0,1 2 0x6 000 0- —— x 100, donde W= 1200 mg
0,1
p = 60 000 g

pelo que a quantidade de substância medicamentosa a administrar deveria ser de 1200 mg.

O volume aparente de distribuição pode modificar-se em determinadas circunstâncias,


designadamente nos indivíduos com alterações renais. E bem conhecido, por exemplo, o caso da
digoxina, cujo valor do volume de distribuição pode reduzir-se a metade se o paciente acusar a
existência de graves perturbações.
Na Tabela XLV indicamos os volumes de distribuição de vários fármacos, no indivíduo normal
e em doentes renais.
473

Tabela XLV. Fármacos que sofrem substancial variação do volume de distribuição


nas alterações renais
Fármaco V .-normal Vd-alteração renal

Carbenecilina 8,9 16,6


Cloxacüina 10,3 15,8
Insulina 46,0 24,0
Lincomicina 38,0 25,0
Meticilina 39,0 14,5
Quinidina i. v. 33,3 9,6
Quinidina p. o. 39,0 16,3

Adaptado de RITSCHEL, W. — in REMÍNGTON-S Pharmaceutical Sciences, pág. 710, 1980

4.2.3. ELIMINAÇÃO OU EXCREÇÃO

A eliminação de um fármaco do organismo pode fazer-se por diversas vias, como a pele,
pulmões, rins e intestino grosso. Acessoriamente, vários medicamentos são eliminados por duas ou
mais destas vias. De uma maneira geral, as substâncias deficientemente absorvidas por via gastro-
intestinal sào excretadas pelas fezes, se. bem que existam numerosas excepções, como a verificada
com a cloropromazina que, sendo bem absorvida, é, apesar disso, eliminada pelo intestino grosso.
A eliminação de fármacos pela pele é também de considerar, especialmente nos climas quentes
em que o suor é mais abundante. Tudo leva a crer que só são excretados por essa via compostos não
ionizados, já que é lipídica a natureza das membranas das glândulas sudoríparas. A vitamina C é
um dos produtos que pode ser assim excretado, talvez se explicando deste modo certas deficiências
de ácido ascórbico encontradas em indivíduos que habitam em regiões tropicais.
Os pulmões, por seu turno, constituem uma boa via de eliminação para as substâncias voláteis,
como o clorofórmio, o éter, as essências e o etanol.
São, contudo, os rins os principais emunctórios dos medicamentos.
A unidade funcional do rim é o tiefrão, pequeníssimo órgão cujo número em cada rim é da
ordem de um milhão. O nefrão é constituído pelo corpúsculo de Malpighi e pelo túbulo (ou tubo
renal).
O corpúsculo de Malpighi consta de um glomérulo, unidade filtrante que deixa passar
cristalóides mas não colóides, ligado a duas arteríolas, uma aferente e outra eferente, e da cápsula
de Bowman que é o extremo do túbulo.
Cada túbulo tem os seguintes segmentos: Tubo proximal, ligado ao glomérulo; ansa de Henle
(com um ramo descendente, um segmento delgado e um ramo ascendente); tubo distai; tubo colector
que conduz a urina aos condutos de Bcllini (Fig. 205).
474

O glomérulo recebe o plasma o qual é filtrado, com excepção das proleínas que se
mantêm, já que se trata de um verdadeiro ultrafiltrado. Ao nível dos túbulos renais são
reabsorvidos selectivamente os diversos produtos e por eles são eliminados oulros existentes no
plasma, ou compostos novos formados no epitélio renal. Assim, o rim
mantém ou restaura o volume rena! dos líquidos do
organismo, bem como a concentração das substâncias
existentes nos mesmos, particularmente os electrólitos.
A filtração glomerular é feita a nível do endotélio
capilar e do epitélio capsular, mediante uma pressão
que é igual à pressão sanguínea (derivada do trabalho
cardíaco) que no gloméruto é de 75 mm de Hg menos a
pressão coloidosmótica ou oncótica exercida pelas
proteínas do plasma (25 mm de Hg), a qual se opõe à
primeira por tender a reter o líquido nos capilares. Na
realidade, portanto, a pressão efectiva de filtração é de 75
- 25 = 50 mm de Hg.
Nos glomérulos são filtrados cerca de 125 ml de
Fig. 205. plasma por minuto, embora no mesmo
tempo passem pelo rim cerca de 700 ml de plasma. O
volume filtrado depende da pressão glomerular (variável em função da pressão arterial, tonos das
arteríolas, etc.), da pressão oncótica, do caudal circulatório renal e da pressão na cápsula de
Bowman. A nível dos túbulos dá-se, como dissemos, a reabsorção, principalmente de água, glicose,
sódio, potássio, ião cloreto, ião bicarbonato e ureia. Este processo é selectivo e destina-se a manter
constante a composição do sangue (homeostase).
O mecanismo de reabsorção é feito por difusão passiva e também por transporte activo. No
tubo proximal reabsorve-se glucose e potássio (transporte activo), sódio ë água (± 85%), cloreto,
fosfato e bircarbonato-ião. No tubo distai reabsorve-se essencialmente o sódio (transporte activo por
«bomba de sódio»), ião cloreto, ião bicarbonato e água (± 14%).
A reabsorção do sódio no tubo distai é regulada pela aldosterona, hormona do córtex que
estimula a retenção daquele ião. A formação de aldosterona depende da estimulação exercida pela
angiotensina que se forma à custa de renina. A renina é uma proteína, enzima proteolítica, formada
nas células juxtaglomeruhres, que actua sobre uma globulina — angiotensiogénio — que existe no
plasma sanguíneo. A partir dela produz-se a angiotensina I e angiotensina II, esta última um potente
vasoconstritor e hipertensor.
A zona juxtaglomerular reage com muita sensibilidade às modificações de pressão arterial e,
assim, uma queda de tensão, ou, melhor, uma diminuição do volume de
475

sangue circulante, faz baixar o estímulo de distensão da arteríola aferente, aumentando


concomitantemente a secreção da renina no aparelho juxtaglomerular. Ao atingir o sangue, a
renina forma angiotensina e esta origina a secreção de aldosterona (electro-cortina) que ocasiona a
retenção do sódio.

O rim é o regulador do equilíbrio ácido-base do organismo, função que desempenha por três
processos: mecanismo bicarbonato, mecanismo fosfato e formação de NH3. O mecanismo
bicarbonato c conservador da reserva alcalina do sangue, enquanto os dois restantes são
regeneradores da mesma.
Para que os citados mecanismos se ponham em acção carecem de um processo prévio que é a
formação de H?CO, a partir de CO, e H2O, a nível dos túbulos renais e por intervenção da anidrase
carbónica (forma-se nas células dos túbulos). O ácido carbónico dissocia-se imediatamente
originando H+ e CO.,H~, sendo o hidrogénio segregado pelo túbulo onde se troca por Na+ que
penetra nas células. Neste primeiro intercâmbio, o K+ compete com o H+ para o sódio, de modo que
a excreção do K+ é favorecida em estados de alcalose enquanto que na acidose (excesso de iões
hidrogénio) está praticamente inibida, desaparecendo da urina. Inversamente, a falta de ião
potássio leva a um estado de alcalose (por facilitar a eliminação de hidrogénio), enquanto que o seu
excesso reduz a excreção de H+ e provoca acidose.
A formação da urina principia, como se disse, com a filtração passiva do sangue arterial ao
nível do glomérulo. As drogas excretadas passivamente podem, contudo, sofrer apreciável
reabsorção nos túbulos (Fig. 206) se o seu coeficiente de partilha óleo/ água não for baixo. Do
mesmo modo, a reabsorção tubular dos fármacos ionizáveis
A. filtração glomerular do plasma e de fármacos
de baixo peso molecular; B. secreção
activa de ácidos orgânicos; C. secreção activa
de bases orgânicas; D. reabsorção passiva de
fármacos não ionizáveis,
solúveis nos lipídeos; E.
excreção urinária.

Fig. 206. Túbulo renal (esquema)

pode ser influenciada através de mecanismos enzimálicos competitivos. Esta


propriedade é, por vezes, aproveitada para diminuir a eliminação de um
medicamento do sangue para a urina. Assim, a penicilina G pode permanecer
mais tempo no plasma desde que seja associada a compostos, como o probenacide, que
originam bloqueio lubular. Efectivamente, ambos os compostos são de natureza ácida, competindo o
probenacide com a penicilina no que diz respeito à eliminação por via urinária.
476

Como atrás referimos, os fármacos podem ser eliminados do sangue quer sob a forma integral,
quer no estado de metabolitos. O fígado e outros órgãos e tecidos efectuam frequentes modificações,
acetilando, desanimando, conjugando, oxidando, hidrolisando, etc. os vários fármacos que, em regra,
se tornam menos tóxicos do que inicialmente. Em termos práticos pode dizer-se que as passagens
pelo fígado podem inactivar ou diminuir a potência de muitos fármacos. A levodopa, por exemplo,
administrada por via oral e depois da primeira passagem pelo fígado, apresenta uma actividade
inferior à exibida por via intravenosa. Entre os diversos tipos de metabolização que se encontram
nos fármacos lembremos que a fenacetina ou /?-acetofenetidina se transforma em paracetamoi, o
qual representa um metabolito comum, também, à ace-tanilida; a aspirina ou ácido acetilsalicílico
origina ácidos acético e salicílico; as peni-cilinas são parcialmente transformadas em ácidos
penicilóicos; o diazepam, fármaco ansiolítico, é hidroxilado a oxazepam e sob esta forma combinado
com o ácido gli-curónico; etc. Algumas vezes sucede mesmo que uma droga, intrinsecamente
inactiva, produz um efeito farmacológico após metabolização. E o que sucede com a imipramina
(pró-fármaco) que é desmetilada no organismo humano e ao transformar-se em nor-imi-pramina
passa a apresentar propriedades anti-depressivas.
Nem todas as substâncias, como é lógico, se eliminam com a mesma velocidade. Essa
velocidade específica de eliminação dependerá, naturalmente, do volume de distribuição do produto
e do seu índia1 de depuração plasmática (1DP), isto é, como já é hábito referir, da sua «clearance».
Tal propriedade pode definir-se como o volume de plasma que, em um minuto, se liberta da
quantidade de substância (fármaco, alimento, veneno, metabolito) excretada no mesmo tempo.
A eliminação de um fármaco é afectada pêlos tipos de tecidos em que se distribui. Assim, a
administração endovenosa pode levar à rápida transferência do fármaco da corrente circulatória
para os tecidos extravasculares até se atingir o equilíbrio. Quando se dá a sua eliminação por via
renal, o fármaco terá de sofrer uma série de transferências, principiando por percorrer caminho
inverso, isto é, dos tecidos moles extravasculares para o sangue e, só depois, será excretado deste
para os líquidos tubulares. Habitualmente, a velocidade de transferência dos tecidos extravasculares
para o sangue é idêntica à velocidade de passagem do sangue para a urina.
Todavia, pode acontecer que a passagem dos tecidos extravasculares para o sangue seja mais
lenta do que a transferência deste para a urina. Acontecerá, assim, que a velocidade de eliminação
do medicamento desses tecidos profundos variará ao fim de certo tempo.
Usualmente, a taxa de transferência dum fármaco existente na corrente circulatória para os
rins pode expressar-se por uma equação de primeiro grau, já que a velocidade de eliminação é
proporcional à concentração:

de ~~dt~ =
KfC
477

don

de resulta, por integração:

Kt
hg C =log C,———— (1) 2,303

em que Co é a concentração plasmática inicial da droga administrada (a um tempo de partida), C é


a concentração existente no sangue ao fim do tempo t c Ke é a velocidade específica de eliminação.
O valor de Co é teórico, a não ser que se trate de uma administração endovenosa, em que não
se pode falar, propriamente, de absorção. Admitindo que, para cada fármaco e via de
administração, Co é constante, se representarmos graficamente log C em função do tempo,
obteremos uma recla, cuja inclinação será dada por

2,303

logo que se observe completa absorção do medicamento.


Pela equação ( I ) verifica-se a existência de uma relação logarítmica entre as concentrações
plasmáticas e os tempos em que foram determinadas. É muito cómodo, com esta finalidade, utilizar
papel semilogarítmico, marcando, naturalmente, os próprios valores das concentrações.
A Fig. 207 mostra, como exemplo, a relação entre os logaritmos das concentrações plasmáticas
de teofilina (mg/ml) e o tempo (em horas). Nela estão representadas duas curvas, uma
correspondente à administração endovenosa de 0,5 g do fármaco (-o-o-)i e a outra dizendo respeito à
administração oral (-•-•-) de igual quantidade de medicamento. Quando o fármaco é aplicado em
injecção endovenosa observa-se que se atinge imediatamente a concentração plasmática máxima,
principiando também, imediatamente, a eliminação. A inclinação da recta é dada por

K
2,303

sendo Kf a velocidade específica de eliminação, que neste caso é igual a 0,23 h"1, o que significa que
a taxa de teofilina excretada por hora, é de 23% da quantidade existente no organismo.
Após a administração oral da mesma quantidade de teofilina, observa-se que a absorção
principia antes de uma hora, atingindo-se a concentração plasmática máxima decorridas cerca de
4,5 horas. Nota-se ainda que a concentração plasmática máxima subsequente à administração oral
de 0,5 g do fármaco é inferior à conseguida com a injecção endovenosa da mesma quantidade de
teofilina. Observa-se, por úllimo, que a
478

eliminação medicamentosa se processa segundo uma recta quase paralela à que traduz
a eliminação subsequente à administração endovenosa.
Para o caso dos injectáveis endovenosos, o valor de C é dado praticamente pela
quantidade administrada. Para os medicamentos administrados por via oral o valor de
Co poderá ser calculado por extrapolação gráfica
da respectiva curva.
Se, considerando ainda a equação de eliminação
atrás referida, pretendermos determinar qual o período
de tempo necessário para que dada concentração
plasmática se reduza a metade, teremos definido, como
é evidente, o período de semivida biológica do fármaco.
Nestas circunstâncias, o período de semivida
biológica (t 2 ou tfl 5) de um fármaco será dado pela
expressão
o
0,693 K (2)
tão prática para avaliar a
velocidade de eliminação, uma vez que seja conhecido o
0 2 4 6
8 tempo necessário para que uma dada concentração
Tempo (horas) plasmática de fármaco se reduza a metade.
Fig. 207. Relação entre os Como é evidente, o t pode exprimir-se
logaritmos das concentrações de outra forma, isto é, em função do volume de
plasmáticas de teofilina (via oral
e endovenosa) e os tempos de eliminação distribuição e do índice de Depuração
Segundo J. V. Swintosky — J. Am. Plasmática (IDP) ou «clearance»,

0,693 x Vd
ÍDP

j a que

IDP
K=

fórmula que em alguns casos pode ser útil.


Na Tabela XLVI indicamos os tempos de semivida biológica, volumes de distribuição e
«clearance» renal de várias penicilinas.
479

Tabela XLVl. Parâmetros farmacocinéticos de várias penicilinas (valores médios)

Penicilina ',* W v,(D IDP (mlnr 1}


Carbenecilina 1,00 10,0 86
Cloxacilina 0,50 14,6 224
Ampicilina 0,90 24,3 297
Oxacilina 0,50 19,0 402
Nafcilina 0,55 21,0 226
Meticilina 0,43 22,0 350

Adaptado de NOTARI, R. — op. cit., pág. 231

Se para cada fármaco se fizer um gráfico relativo à absorção e à excreção, colocando em


ordenadas as concentrações plasmáticas ou séricas, sucessivamente obtidas, após uma
administração, em intervalos de tempo determinados, e em abcissas os valores de tempo, obteremos
uma curva. A área sob a curva (AUC) é um parâmetro far-macocinético que nos indica os valores
das concentrações plasmáticas ou séricas para uma dada dose de fármaco num certo intervalo de
tempo.
Como consequência do conhecimento do período de semivida biológica dos medicamentos vem,
naturalmente, a necessidade de se estipular, para cada caso, a frequência da sua administração,
tendo sempre em atenção a via escolhida. Efectivamente, se a penicilina G em solução aquosa
injectável é rapidamente absorvida e eliminada, reduzindo-se a sua concentração no sangue a 50%
do valor inicial em cerca de l hora, é forçoso, para manter o organismo sob uma concentração
terapêutica que não ofereça oscilações demasiado grandes, que se efectuem frequentes
administrações do antibiótico. Por conseguinte, o tratamento habitual por penicilina G em solução
injectável aquosa obriga à administração do medicamento de 3 em 3 horas. Se a repetição da
injecção for mais espaçada, a concentração do antibiótico no sangue pode baixar a valores que já
não apresentem efeito terapêutico.
O valor de Ke para cada fármaco pode, portanto, ser determinado em função do seu período de
semivida biológica, segundo a equação (2), em que:
2,303
K=

1/2

ou, ainda, de acordo com a equação (1):

2,303 Co
K = ———— x h e ——
a O
C
480

("orno A' tem dimensões recíprocas- de um tempo ( ( / ' ) , e corrente exprimi- Ia em


horas ' (h M ou dias ' (J ' I.
tini face do que se expòe. pode concluir-se que, se é grande o período de semi vid a
biológica de um tármaeo ou, o que é o mesmo, se é diminuía a sua velocidade de
'liminação, será pequena a quantidade que é necessário administrar para manlcr um nível
sérico regular. Como é evidente, porém, é fundamental que o nível atingido soja
correspondente ao nível terapêutico desejado,
Actualmente, são conhecidos os períodos de semivida biológica de muitas substâncias.
Algumas eliminam se a velocidades muito elevadas, enquanto que outras se man têm durante
mais (empo na corrente circulatória. Como se compreende, um composto com elevado
período de semivida biológica permanece no organismo durante mais tempo. Neste fado se
baseiam as preparações chamadas de m-^ão prol ou'-'chia ou \uMentaua, pois se a acção
prolongada pode ser obtida à custa de determinadas modificações galénicas a que se
s ujeite o fármaco, pode também corresponder a uma propriedade intrínseca da própria
substância activa. Certas sulfamidas, por exemplo, sào susceptíveis de originar
concentrações plasmáticas que se mantêm por muito tempo, o que é devido ao seu elevado
período de se m i vida biológica e. em ú l t i m a análise, à sua facilidade de eomplexaçào
com as proteínas plasmáticas. Assim, a .\ullamcto\ipuiihirithi tem um período de semi v ida de
cerca de 30 horas: a suljanicmzinu tem um período de, aproximadamente, 16 horas e o
\ulfaiiazol de 4 horas. Poder-se-ia, pois. di/cr que a sultametoxipiridu/ina é dotada de
í/críïo lon^a, a si)lfamcra/,ina de m-ção nicilin e o sulfatia/ol de LICCIÏO i'in'!ti.
Na Tabela X L V I I indicamos, para vários fármacos. os valores dos períodos de
semivida biológica e das respectivas velocidades específicas de eliminação. Os valores
indicados são médios, observando-se oscilações, por vc/es profundas, consoante o indivíduo
em que f o i executado o estudo de eliminação. Fsta variabilidade biológica

Tabela XLVII. Período de semivida e velocidade de eliminação de vários compostos

Período Jc scniivhlu l t'!<>< iiltitJc dt' f!iniiti>i{'<!t>

Penieilina (1 i, f* lu>r;i 0.70

S ulla tiii/t »! 4.0 horas (í, 17


L i n c n i n ic in u 4.8 0.14
Oxii/epain s,o >. 0,0*7
Suiriso\a/ol 6.1 0.1 1
S u l tu e t iJ o l 8,0 » 0.0X7
Tema/cpam 5,3 0,130
Tetneiclimt s.o .- 0,0X7
AeeiiisulíïsoxLisol 13,1
SuJiadimelo.xina 4 í,O
481

leva a classificar os pacientes em rápidos e lentos excretores ou metabolizadores. Assim, por


exemplo, a isoniazida, tuberculostático bem conhecido, pode apresentar uma vida média de 45-80
minutos num paciente que tenha uma metabolização muito rápida, ou 140-200 minutos num paciente
cujas acetilações sejai,, lentas. Tudo leva a crer que os diferentes comportamentos observados tem
íntima relação com a hereditariedade, tendo-se mesmo criado um neologismo para expressar o
estudo das aludidas relações — Farmacogenética.
É, por exemplo, curioso assinalar que 95,4% dos esquimós são rápidos inactiva-dores da
isoniazida, que acetilam facilmente, enquanto que este número baixa para 44,9% se se considerarem
homens brancos dos Estados Unidos da America c do Canadá, ou 47,5% no caso de homens negros
dos Estados Unidos.
Se bem que a via renal represente a principal via de eliminação das substâncias
medicamentosas, deve considerar-se sempre a excreção por outros emunctórios do organismo e as
eventuais biotransformaçòes do fármaco. Deste modo, ao avaliar-se a quantidade do produto
eliminado, há que ter em atenção a excreção total e não apenas a eliminação renal. Por outro lado,
torna-se também importante, para conhecer o efeito farmacológico de um medicamento absorvido,
apreciar as concentrações máxima e mínima sanguíneas com ele conseguidas, após administração
repetida. Naturalmente, como já acentuámos, não é aconselhável que um fármaco sofra variações
muito notórias quanto à sua concentração plasmática. Este aspecto apresenta imenso interesse
quanto à frequência da repetição das doses administradas.
É relativamente fácil, uma vez que sejam conhecidos os valores da concentração
tcrapeuticamente activa do fármaco e a sua velocidade de eliminação, calcular as concentrações
plasmáticas máxima e mínima a que dá origem, quando administrado com determinada frequência.
Com efeito, sabendo-se que o fenómeno de eliminação se rege por uma equação de primeiro
grau, compreende-se que a administração repetida de um medicamento leve à manutenção de um
nível médio de concentração plasmática situado entre dois valores extremos, um máximo e outro
mínimo, respectivamente após ou antes de cada nova administração.
Retomando a equação (1), escrevamo-la do seguinte modo:

C = Co 10~^'/2'mi ou, o

que é o mesmo,

C = CoR, sendo R = l (r*""2-303

Nestas circunstâncias, a concentração plasmática, decorrido o tempo t após a primeira dose


administrada, e não entrando em conta com a demora da absorção, será C = CoR. Este valor é,
portanto, válido para a administração endovenosa.
482

Para a segunda dose injectada por via endovenosa, virá: C = Co + CoR, já que a
concentração então existente é a soma das concentrações remanescentes e a máxima concentração
atingida após essa segunda administração.
Como a concentração remanescente é C = CoR, a concentração máxima, depois da segunda
administração, uma vez que todo o fãrmaco tenha sido absorvido, será dada por:
C = C + Co ou C = Co

Antes da terceira administração, a concentração máxima inicialmente existente C2 = Co + CoR


é, em parte, eliminada, diminuindo a quantidade total para um valor mínimo:
C3 = CoR + CoR2

Prosseguindo neste raciocínio para n doses administradas, a concentração máxima obtida


será:

Cn = Co (l + R + R2 -f ......... /?"-')
ou,
CnR = Co (R + R2 + R* + ......... R")

que apenas difere da anterior por ter ambos os membros multiplicados por R. Subtraindo as
duas expressões finais, encontramos:

Co - CoR" Cn = ——
—————
l -R

Esta fórmula indica a concentração máxima obtida com a administração endovenosa repelida.
Admitindo um número de administrações muito elevado, n aproxima-se do infinito e como R é
menor do que a unidade, CoR" será igual a zero.
Virá então
Co
C , = ————— l - R

Por raciocínio análogo, aplicado à concentração mínima, teremos para a injecção endovenosa
repetida:

CoR C , =
—————
min.
l-R
483

Claramente que se o tármaco for administrado por outra via que não a endovenosa
r |. há que entrar em linh a de conta com o período de tempo necessário paru que se
j | verifique a absorção, isto é, com a velocidade de absorção.
\ í Admitindo que a absorção se processa também segundo uma equação de primeiro
grau e com velocidade idêntica à da eliminação, a concentração máxima obtida após
administração repetida, por uma via diferente da intravenosa, seria:

Co r
\-K

em que r = \(TKt ''2JO-\ sendo t' o lempo necessário para a absorção. Por esta fórmula
toma-se também evidente que a administração endovenosa origina sempre níveis san-
guíneos mais elevados.
Como consequência, infere-se, também, que a concenlação mínima obtida após
administração repetida dos fármacos por uma via diferente da endovenosa pode
achar-
-se mediante a fórmula referida para aquela via.
De um aitigo de DOLUISIO c SWINTOSKY retiramos um exemplo claro para se compreender
o modo como se determinam as concentrações plasmáticas máxima e mínima,
subsequentes à administração oral repelida de suffaefidol (SETD).
O fármaco em causa apresenta actividade bactericida, não atingindo ainda níveis
tóxicos quando se encontra numa concentração compreendida entre 5 a \5 mg por 100
ml de plasma. Quando se administra oralmente esta sulfamida, verifica-se que doses de
l g originam uma concentração inicial, calculada por extrapolação, de 7 mg por 100
ml de plasma. Quer isto di/er que Co ~ l mg%. Se consultarmos a Tabela XLVII, pág.
480, verificamos que o período de semivida biológica do fármaco é de 8 horas e que a
sua velocidade específica de eliminação é de Kc - 0,087 h\ Sabe-
-se também que, em comprimidos, o sulfaetidol leva, aproximadamente, duas horas a
ser absorvido (r' = 2h).
Se pensarmos em administrar o medicamento por via oral, repetindo cada admi-
nistração de 6 em 6 horas, o intervalo de tempo a considerar na eliminação, será / = 6
h.
Nestas circunstâncias, substituindo em R = ]0~*"'/2iWi l e K pêlos respectivos
valores (/ = 6 h e Kf = 0,087 h"1), vem R = 0,34. Por oulro lado, fa/cndo iguais
substituições em r = lO'^'72'01 ( r ' = 2 h e Kt, = 0,087 h/1), será r = 0,83.
Como Co = l mg %, a concentração máxima obtida neste regime terapêutico será:

Co r 7 x 0,83
C . - ———— - ——————— - 13 mg %
1-R 0,46
484

e a concentração mínima,

Co R 7 x 0,54
C . - ———— - ——————— - 8 mg %
""" l-R 0,46

Estes elementos mostram o acerto da administração de l g de sulfaetidol de 6 cm 6 horas.


Se o intervalo entre duas administrações fosse redu/ido para 4 horas, as concentrações máxima c
mínima seriam, respectivamente, de 19 mg % e 16 mg %, valores que excedem us exigências
terapêuticas atrás referidas.
Os elementos apresentados permitem ainda compreender que, por vezes, é mais
aconselhável utilizar um medicamento administrado em várias fracções do que apenas numa só
vê?. Assim, verificou-se, por exemplo, que a clorotiazida produz mais potente efeito diurético
quando administrada em diversas fracções. Nós próprios tivemos ocasião de observar que o cloridrato
de tiamina. administrado por via oral, era melhor absorvido quando a dose total diária era
repartida em doses administradas com certo intervalo de tempo.

BIBLIOGRAFIA

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485

4.3. AS VIAS DE ADMINISTRAÇÃO

São muitas as vias de administração dos medicamentos e por isso na sua preparação deve ser
considerada a via a que se destinam e a finalidade que deles se pretende.
Os medicamentos podem ser aplicados na peie, nas mucosas como a faríngica, a
traqueopulmonar, a genilurinária e a conjuntiva; podem, ainda, ser destinados a aplicação na
mucosa bucal, gástrica, intestinal e rectal. Por último, a sua via de administração poderá ser a
parenteral, com as suas numerosas subdivisões (intravenosa, íntradérmica, subcutânea,
intramuscular, intrarraquídea, intraperitoneal, intrapleural, etc.).
Preferentemente, as superfícies cutânea, da faringe, da conjuntiva e geniturinária são utilizadas
para aplicação tópica, o que não quer dizer que não possam promover uma absorção medicamentosa
acidental ou propositada.
A via gastro-intestinal, mais particularmente a mucosa do intestino delgado, está especialmente
adaptada à absorção, mas, como já vimos, há numerosos medicamentos que nela podem actuar
apenas localmente.
Vários fármacos podem exercer uma acção tópica ou sistémica quando aplicados em certas
mucosas, dependendo o tipo de acção registado não só das duas propriedades como, também, das da
preparação sob que são utilizados. Assim, por exemplo, a absorção de uma pomada ocular de
atropina pode estar dependente da forma física do sistema em que se encontra, como dispersão
sólido/sólido ou dispersão de uma solução num sólido; uns supositórios podem apresentar uma
acção local anti-hemorroidária, desde que o cxcipienle que serve de veículo à substância
medicamentosa possua uma elevada viscosidade; uma solução de uso nasal tópico pode ser
absorvida se contiver apreciável quantidade de agentes emulsivos, dotados de elevada hidrofilia;
uma solução aquosa de ácido bórico, que se pretendesse utilizar como medicamento tópico numa
área considerável da pele, poderia passar para o sangue, uma vez que o ácido bórico possui elevado
poder intrínseco de penetração cutânea, etc.
Corno consequência do que deixamos dito, é compreensível a importância que apresenta a
correcta preparação de um medicamento. São numerosos os exemplos, na literatura mundial, de
medicamentos cuja administração não origina a resposta terapêutica esperada. Se bem que, em
muitos casos, o facto possa ser atribuído às características do doente, como sensibilidade individual,
idade, coexistência de várias afecções, etc., não deve ser posta de parte a hipótese de uma
formulação ou manipulação inadequada,
A título de exemplo, relatamos a ocorrência verificada com comprimidos de prednisona,
preparados segundo a Farmacopeia Norte-Americana XVI. Observou-se que esses comprimidos, apesar
de titularem rigorosamente a quantidade de esteróide anunciada e de se desagregarem facilmente em
água, não proporcionavam a absorção intestinal do fármaco, porquanto o grau de tenuidade deste
não permitia a sua perfeita dispersão no suco entérico.
486

Observou-se, também, que certas tetraciclinas, utilizadas em cápsulas medicamentosas


contendo, como excipiente, o lactato de cálcio, não eram absorvidas por via gastro-intestinal, uma
vez que aquele composto inibia a sua penetração na mucosa (complexação das tetraciclinas pelo
cálcio).
SCHUBERT e WEINER referem diferenças substanciais na velocidade de absorção e na concentração
plasmática obtida com tenilindanediona administrada em comprimidos de
diversas proveniências mas com o mesmo título
em princípio activo.
FROSTAD relata, por seu turno, as significativas
diferenças observadas quanto à concentração
plasmática de p-aminossali-cilato de sódio
subsequente à ingestão de comprimidos
diversamente preparados. A Fig. 208 representa as
diferenças assinaladas por aquele investigador.
Muitos outros casos ilustrativos podem ser
citados, como o tacto da ampi-cilina anidra originar
níveis sanguíneos mais elevados do que quando tri-
hidralada, ou da griseofulvina ser melhor absorvida
se a administração se fizer concomitante -mente com
a ingestão de gorduras.
Horas Há, portanto, numerosos factores a considerar
Fig. 208. Níveis sanguíneos de p- para que um dado medicamento origine a resposta
aminossalicilato de sódio depois de
administração de 12 g do produto em terapêutica que dele se pretende. A adequada
comprimidos de diferentes proveniências. formulação e a
Segundo S. Frostad — Acta tuberc.
pneumol. Scand., 41. 68 (1961) escolha da via de administração são, porém, os
factores dominantes.
O assunto é tão importante que a literatura norte-americana introduziu um neologismo
(Biopharmaceutics)) para definir o estudo das relações entre as propriedades físico-químicas dos
fármacos, a sua forma de administração e os efeitos biológicos observados.
Entre nós o termo acima referido tem sido traduzido pelas palavras Biofarmácia, Biogalénica e
Biofarmacoíécnica, correspondendo o primeiro à fornia adoptada pela maioria dos países de idioma
de raiz, latina.
Como se compreende, a Biodisponibilidade medicamentosa dependerá, portanto, da concepção
«biofarmacêutica» do medicamento e da farmacocinética do princípio activo em causa,
designadamente do tipo da sua distribuição, metabolização e eliminação.
Neste capítulo iremos estudar as diversas vias de administração medicamentosa, indicando, em
cada caso, qual o tipo de medicação aconselhável para obter uma acção tópica ou geral.
487

4.3.1. ADMINISTRAÇÃO CUTÂNEA

Pode dizer-se que a administração cutânea é essencialmente destinada à obtenção de um


efeito tópico, mais ou menos profundo. Pode ainda dizer-se que raramente se utilizava esta via de
administração para se conseguir uma verdadeira absorção medicamentosa. A via cutânea, não é,
portanto, uma via de escolha, quando se pretenda uma acção medicamentosa sistémica, a qual pode
apenas se tentada em casos muito particulares, como a administração do ditofal para tratamento de
leprosos.
Entretanto, a criação de novas formas farmacêuticas (ver Novos Sistemas Terapêuticos) de
aplicação cutânea veio proporcionar uma excelente penetração da pele por vários fármacos, como
os coronariodilatadores, os quais são absorvidos sistemicamente. Tal sistema de administração
permite que o doente receba, constantemente, uma certa quantidade de fármaco, o que evita
sobredosagens ou concentrações inferiores à dose terapêutica, sendo muito mais prático do que a
administração tradicional.
À superfície da pele observa-se a presença de um induto gorduroso, contendo cerca
de 20% de colesterol, de que apenas uma décima parte está esterificada. Encontram-se
ainda ácidos gordos livres, como o oleico, e glicerídeos diversos. O pH desta zona
cutânea oscila entre 5 e 5,5. ;' • . - ,
A barreira gordurosa é descontínua, sendo interrompida pêlos orifícios dos canais
sudoríparos e pêlos folículos pilosos, ao nível dos quais a epiderme forma uma inva-ginação,
deixando um espaço entre o pêlo e a bainha, o qual se enche de sebo. Anotemos, como facto
curioso, que o colesterol, tão abundante na barreira externa da pele, está aqui representado numa
quantidade não superior a 1,5%.
O papel fisiológico da película lipídica, se bem que ainda não perfeitamente
esclarecido, é fundamentalmente de protecção contra os agentes físicos exteriores e
contras as infecções. Este induto gordo, devido à presença do colesterol (7-de-hidro-
colesterol), funciona também como precursor da Vitamina D Por último, tem-se-lhe
atribuído uma importante função na atracção sexual e na diferenciação das raças, o que
será devido a componentes ainda não identificados. .. •. : •

4.3.1.1. Histologia da pele . ^ ^d

Recordando a histologia da pele, lembramos que é constituída por 2 camadas tissulares


distintas, que são a epiderme e a derme. A primeira é formada por epitélio pavimentoso
estratificado, de tipo especial, e a segunda por tecido conjuntivo denso. A derme, também chamada
cútis ou córion, continua-se, em geral, com o tecido celular laxo subcutâneo, o qual forma a
hipoderme, habitualmente rica ainda em tecido adiposo.
488

Na epiderme observamos, de fora para dentro, a presença de várias camadas celulares, assim
distribuídas: 1) uma zona, mais ou menos espessa, de células anuclea-das, cujo protoplasma está
transformado numa substância córnea — stratum corneum; 2) urna zona de células achatadas em
menor grau do que na camada anterior, com núcleos pouco aparentes ou mesmo invisíveis,
apresentando um aspecto homogéneo e translúcido — stratum lucidum; 3) uma zona com três ou
quatro assentadas de células muito achatadas que se designa por stratum granolusom; 4) uma zona
constituída por várias assentadas de células poliédricas, com núcleo facilmente evidenciável, cujo
conjunto forma o corpo mucoso de Malgiphi ou stratum germinativum.
A camada córnea (stratum corneum) fica situada, como se deduz, imediatamente abaixo do
induto gorduroso e é essencialmente formada por células mortas ou em via de degenerescência,
muito ricas em queratina. Acessoriamente, apresenta ainda apreciável quantidade de ácidos gordos e
ésteres do colesterol. O conteúdo hídrico desta camada é relativamente pequeno, representando 7 a
20% da quantidade total da água da pele.
A queratina é uma proteína de suporte ou escleroproteína em cuja composição entra o
triptofano, a tirosina e a cistina. A presença deste último aminoácido é responsável pela abundância
de grupos dissulfurilo (-S-S-) na camada córnea,sendo a queratina que confere ao tecido grande
parte da sua elasticidade e solidez.
O stratum corneum provém da deslocação dos elementos epiteliais profundos para a periferia,
havendo, com esse deslocamento, a transformação e morte das células. Pode, pois, dizer-se que o
epitélio se renova pelas células profundas e se destrói pela superfície livre.
O stratum lucidum, formado por células translúcidas, ajustadas umas contra as outras, é
particularmente rico em eleidina, que é o precursor químico da queratina.
Subjacente a esta zona celular encontra-se o stratum granulosum de células losan-gulares, com
exoplasma bastante espesso. No citoplasma das suas células aparecem numerosas granulações,
admitindo-se que a sua composição seja de natureza glicopro-teica, precursora da eleidina, atrás
citada.
Por último, surge o corpo mucoso de Malpighi e, depois, a camada celular geradora, dotada de
grande vitalidade e sendo particularmente abundante em cisteína, aminoácido susceptível de se
combinar consigo próprio, por perda de dois átomos de hidrogénio, e de originar cistina. Do ponto
de vista químico existe, nesta assentada celular, apreciável preponderância de grupos sulfidrilo (-
SH), os quais se devem à cisteína presente.
Compreende-se, assim, que a biossíntese da queratina implique a transformação da cisteína do
corpo mucoso em cistina, que aparece como componente fundamental da queratina. Efectivamente, a
presença de cisteína diminui progressivamente à medida que se passa da assentada geradora para a
periferia, coincidindo essa diminuição com o aumento em cistina das camadas superficiais.
489

Em todo este conjunto celular aparecem fibrilhas, formando feixes que, com frequência, são
fusiformes, dispostas geralmente na periferia do citoplasma e seguindo longos trajectos sem
interrupção. Trabalhos de microscopia electrónica (DROCHMANS e PIERARD) revelam que o sistema
fibrilhar representa a linha de formação da qucratina que, em última análise, provém da camada
basal celular.
Nas camadas profundas da epiderme existem certas células especiais, denominadas melanocitos
(melanóforos; cromatóforos), cuja função é produzir melanina. Este é o principal pigmento da pele,
dos cabelos e também da coróide ocular. Não se trata de uma entidade química, pois há inúmeros
pigmentos, com cores principais como amarelo, vermelho, castanho e negro, todos originados pela
polimerização dos produtos de oxidação da tirosina e compostos di-hidroxifenilados (dopa,
epinefrina, catecol, etc.). Algumas vezes os pigmentos melânicos encontram-se combinados com
proteínas (melanoproteínas), as quais se ligam aos polímeros através de grupos sulfidrilo.
A formação da melanina a partir da tirosina consiste numa oxidação efectuada pelo enzima
tisosinase e catalisada pelo cobre. A tirosinase encontra-se nos melanóforos sob uma forma inibida,
possivelmente por acção do ácido ascórbico e do glutatião ou por simples efeito de grupos — SH.
Por exposição à radiação ultravioleta há como que uma aceleração na reacção tirosina-tirosinase ou
dopa-tirosinase, incrementando-se a coloração. Igual fenómeno pode surgir, por destruição dos
grupos — SH, nos locais de lesões inflamatórias da pele. De resto, a função da melanina nos
mamíferos parece estar relacionada com a protecção da pele para a luz, ultravioleta.
No albinismo, doença metabólica hereditária, observa-se que falta tirosina nos melanocitos, o
que conduz ao aparecimento de pele despígmentada.
A Fig. 209 mostra os principais passos do metabolismo da tirosina para a produção da
melanina.

INDOL - 5,S- QUINON*


Fig. 209. Metabolismo parcial da

Na Fig. 210 esquematiza-se o efeito da exposição da pele à luz solar.


490

A epiderme está separada da derme ou córïon por uma fina membrana basilar. A derme é
constituída por tecido conjuntivo denso e na superfície de contacto com a epiderme nota-se haver
interpenetração. A derme forma, assim, pequenas saliências — as papilas — que entram cm
escavações da base do cpilélio.

Fig. 210.

Da periferia para o centro, isto é, da zona papilar para a camada dérmica mais profunda —
zona reticular —, observa-se aumento do número e espessura dos feixes colagénios constituintes.
Nota-se ainda maior predominância de fibras elásticas. Quer isto dizer que o tecido conjuntivo
dérmico se torna, progressivamente, mais fibroso à medida que se caminha da superfície para o
centro.
A zona papilar representa cerca de um quinto da totalidade do córion.
A derme é atravessada pelas glândulas sudoríparas e sebaceas, as quais constituem uma das
melhores vias de penetração para os medicamentos. As glândulas sebaceas estão alojadas na zona
superficial da derme e fazem parte, na sua quase totalidade, do folículo piloso. Apenas uma em cada
dez aflora directamente à superfície da epiderme. Do folículo piloso, espécie de saco conjuntivo-
epitelial que envolve a raiz do pêlo, sai o pêlo propriamente dito. Constitui, como as glândulas
sebaceas, uma porta de entrada para a medicação cutânea.
491

A composição química das fibras colagéneas e elásticas é semelhante à da quera-tina. Como


ela, são formadas por escleroproteínas, agora constituídas por aminoácidos diferentes, também
unidos entre si por ligações de tipo diverso.

Fiq. 211. Corte histológico, esquemático, da pele


Segundo G. Valette — Précis de Pharmacodynamie, Masson e Cie,
Paris, 1959

Se o microscópio óptico nos mostra estruturas muito dissemelhantes para a epiderme (células p l
uri-e s trai i ficadas) e para a derme (trama colagénio e elástico), observa-se, ao microscópio
electrónico, que a pele apresenta uma estrutura fibrilhar como arquitectura preponderante. Este
facto tem imenso intea ï no que diz respeito à penetração dos medicamentos por via cutânea.
Fundamentalmente, são afinal dois sistemas de redes, cujas malhas se podem distender ou
apertar sob a influência de vários medicamentos. A penetrabilidade destes dependerá do efeito que
promovam, isto é, do alargamento ou retracção da rede. Ora, a derme apresenta elevada viscosidade
devida à presença de um poliolosídeo, o ácido hialurónico. Este composto, de alto peso molecular, é
constituído pela associação de moléculas de ácido glicurónico com acetilglucosamina. Certos enzimas,
como as hialuronidases, são capazes de desdobrar o poliolosídeo, originando a libertação das
moléculas constituintes (ácido glicurónico e acetilglucosamina) e diminuindo assim a viscosidade do
meio. Por outras palavras, as hialuronidases aumentam a difusão do medicamento., por permitirem
um alargamento das malhas da rede do tecido conjuntivo dérmico. Hoje utiliza-se esta substância
associada a outros agentes medicamentosos cuja penetração cutânea se pretende. Acontece também
que há muitos microrganismos
492

capazes de segregarem hialuronidases. Os estafilococos, por exemplo, difundem as suas toxinas no


tecido cutâneo com muita facilidade, devido à secreção simullânca daquela enzima. Uma das
causas pela qual os corticóides tópicos são anti-inflamatórios é o facto destes compostos inibirem as
hialuronidases, localizando a inflamação, por haver menor difusão tissular.
A hipoderme é a zona dcrmica subjacente ao corion. É constituída por duas porções, uma
camada fibro-adiposa e uma outra mais profunda, iminentemente fibrosa. Tal como na derme, a
substância fundamental do seu colagénio lem como componente o ácido hialurónico. A difusão
medicamentosa nesta zona não se pode, por isso, considerar das melhores. Lembremos ainda que a
hipoderme é rica em tecido adiposo, que pode desenvolver-se de tal modo a originar verdadeiros
lobos (panículo adiposo}.

4.3.1.2. O pH cutâneo

Se bem que. regra geral, o pH da camada gordurosa da pele seja de 5-5,5, o pH cutâneo oscila
entre 5,5 e 7. A sua constância é assegurada por um sistema tampão de acido láctico/lactato, pêlos
ácidos dicarboxílicos do suor, pêlos ácidos gordos das glândulas sebãceas e pêlos elementos ácidos
da queratina.
Ao nível das pregas cutâneas das palmas das mãos e das plantas dos pés observa--se, contudo,
uma diminuição da acidez.
Julga-se que a evaporação do suor se faça mais lentamente nessas regiões. É curioso assinalar
a relação deste fenómeno com o facto de serem estas as regiões mais facilmente vulneráveis aos
complexos micobactéricos, como associações de cocos e parasitas vegetais. É ainda digno de nota
assinalar o papel fungicida c antimicrobiano desenvolvido pêlos ácidos gordos da superfície cutânea,
a tal ponto nítido que a sua maior produção (durante a puberdade) leva ao regresso espontâneo de
certas dermato-fitias do couro cabeludo, como a infecção pelas tinhas.
Em muitas dermatoses observa-se, porém, alteração do valor normal do pH cutâneo, motivo por
que muitas preparações farmacêuticas de aplicação cutânea procuram corrigir a acidez ou
alcalinidade manifestadas. São exemplo do que acabámos de dizer, certas pomadas ou cremes de pH
baixo, as quais se utilizam nas dermatoses dos cimenteiros, doença profissional produzida peía
alcalinização contínua da superfície cutânea pêlos cimentes, h também o caso de certas afecções da
pele caracterizadas por aumento de acidez, como as psoríases, em que a aplicação de pomadas com
base em substâncias alcalinas, do tipo do carbonato de potássio, pode dar bons resultados.

4.3.1.3. Penetração cutânea

Pelo que ficou dito se compreende que um medicamento para penetrar na pele terá de
franquear duas barreiras fundamentais: a camada córnea com a película iipídica que a reveste
exteriormente e as assentadas da epiderme. Logo que estas duas barreiras
493

sejam vencidas, o medicamento atinge os tecidos subjacentes, podendo, eventualmente, passar à


corrente circulatória. Parece mesmo suficientemente demonstrado que logo que um dado fãrmaco
atravessa a assentada geradora, aparecerá sempre, pelo menos em quantidades ínfimas, no
aparelho vascular do corpo papilar.
Na maioria das vezes esta penetração profunda do fármaco pode não apresentar
inconvenientes de maior, mas relatam-sc casos de aparecimento de efeitos secundários
subsequentes à aplicação lópica de vários medicamentos. É o que se observou, por exemplo, com a
administração de pomadas anti-inflamatórias de
alguns corticos-teróides, como a fludrocortísona l
(LiviN-GOÜD, 1955).
Como vimos, a travessia da barreira lípida e
da camada córnea por um dado medicamento
pressupõe uma penetração através dos canais das
glândulas sebáceas e do pêlo e, acessoriamente, das
glândulas sudoríparas.
O esquema junto (Fig. 212) assinala as
principais portas de entrada dos medicamentos na
superfície cutânea. Por ele se observa que a entrada
dos medicamentos é frequentemente realizada
através do folículo piloso e das glândulas Fig. 212. Penetração cutânea transfolicular
sebáccas, podendo também ser considerada a
1 — Infundíbulo piloso — ponto de menor
passagem Iransepidérmica. resistência da superfície cutânea
É de notar que a espessura da camada 2 — Conduto de excreção do sebo
3 — Colo da glândula sebàcea
córnea é menor ao nível da inva-ginação 4 — Glândula sebàcea
correspondente à bainha do pêlo e que na base do 5 — Passagem transfolicular (2-3-4) 6—Passagem
transepidérmica (em regra, a penetração é menor
folículo a epiderme se do que em 2)
reduz a uma única assentada de células não
queratinizadas (camada basal). É esta a razão por que é maior o acesso por intermédio do folículo
piloso.
Pelo que se vê na gravura, nota-se ainda que há uma passagem medicamcnlosa através do
folículo piloso para a derme (passagem transfolicular) e desta, por via retrógada, para a epiderme.
Compreende-se, portanto, que embora existam poucos fármacos capazes de atravessar a
epiderme, se recorra, com tanta frequência, à via percutânea. Efectivamente, qualquer substância
que chegue a vencer o obstáculo constituído pelo sebo existente no folículo terá fones
probabilidades de atingir a derme.
O sebo é, como dissemos, uma gordura diferente da que reveste a camada córnea, menos rica
em colesterol do que ela. Nestas circunstâncias, comprecnde-se que a lipos-
494

solubilidade seja uma condição importante para a penetração cutânea dos fãrmacos. Pode mesmo
dizer-se que a solubilidade de uma substância nos lípidos é mais importante, do ponlo de vista da
penetração cutânea, do que a qualidade do veículo utilizado no medicamento. Assim, por exemplo, o
anti-histamínico piribenzamina é melhor absorvido pela superfície cutânea sob a forma de base
(olcossolúvel) do que sob a forma de cloridrato (hídrossolúvel), como o demonstram os trabalhos de
:
MICHK[,FFI,DF ,R e PncK.
Por esta razão, é pertinente faiar-se em poder intrínseco de absorção percutânea, havendo
diversos compostos particularmente aptos de per se para atravessarem a pele. Nalguns casos é
possível dar uma explicação para o facto, baseado nas propriedades químicas e físicas das
substâncias. Assim, por exemplo, o ácido salicílico, emitindo vapores a 37"C. apresenta forte poder
de penetração, independentemente do excipiente ou veículo em que seja administrado. O ácido bórico
é facilmente absorvido por vi a cutânea, mesmo quando aplicado em solução aquosa ou em
associação com o talco em pó. O iodo, possivelmente por se combinar com as duplas ligações dos
ácidos insatu-rados do índuto gorduroso cutâneo ou do sebo, é dotado de boa penetrabilidade. Os
sais de metais pesados (Pb, Hg, Bi), como o lactato de bismuto, ensaiado por MIYASAKI, são igualmente
bem absorvidos pela pele. já que reagem com os ácidos, dando sabões.
Os iodetos alcalinos libertam iodo que reage com ácidos insaturados, como o oleico,
promovendo-se, assim, a sua penetração cutânea.
O enxofre é reduzido, transformando-se em ácido sulfídrico, o que lhe proporciona uma
penetração profunda e lhe permite a sua utilização no combate à sarna, cujos ácaros depositam os
seus ovos nas camadas internas da pele.
Vários líquidos orgânicos penetram facilmente a supcrlíeie cutânea, como os hídro-carbonetos
compreendidos entre o hexano e o decano. Se o seu peso molecular for superior a este último,
observa-se retardamento de absorção por efeito de aumento da viscosidade. Estão neste último caso
as parafinas e vaselinas, de acção estritamente superficial.
Certos hidrocarbonelos, como o paracimeno, o ot-pineno e o limoncno, são bem absorvidos,
assim como as drogas em que existem em apreciável quantidade (essência de terebintina com a-
pineno; essência de laranja como limoneno, etc.). Éteres, como o eucalipto!, vitaminas e hormonas
lipossolúveis, alcalóides líquidos, como a nicotina e a conicina, fenóis, como o ácido fénico, o gaiacol
e o eugenol, são igualmente dotados de excelente poder de penetração cutânea.
O problema da penetração dos fármacos através da pele nào é, porém, tão simples corno foi
enunciado. Outros factores recentemente analisados entram ern jogo, sendo de considerar da maior
importância a hidratação do tegumento cutâneo. Com efeito, a queratimi da camada córnea é
higroscópica, amolecendo quando fixa apreciável quantidade de água. A sua hidratação processa-se
à custa da água difundida das camadas profundas da pele e a eliminação hídrica é efectuada por
evaporação para a atmosfera, em determinadas condições.
495

O MramtH comcum da pele contém, usualmente, cerca de 20% de água. Se esla quantidade
d i m i n u i para 10% ou menos a pele torna-se seca e rugosa.
Como acentuámos, a camada queratínica deixa evaporar mais ou menos água, conforme as
necessidades c circunstâncias, mantendo-se um epitclio fisiológico. Hntre-tanto, a água da pele
acha-se em parte armazenada no estado livre e em parte constituindo verdadeiras estruturas
físicas que se r^vem á formação de coacervatos (ver Colóides). A água livre funciona como um si,
.ente polar, evaporando-se facilmente, enquanto que a água restante é relativamente pouco
polar e tem dificuldade em se evaporar. Por seu lurno, os compostos tipicamente ionizáveis
difundem-se bem na água livre, enquanto que os menos polares o ia/em melhor na água dos
coacervatos.
Pelo que se disse compreende-se que a hidratação da pele promova a penetração dos
fármacos e. assim, as subslâncias que quebrem as estruturas físicas dos concervalos, como a
ureia a 10-20%, facilitam indirectamente a difusão tias substância aplicadas nu superfície
cutânea.
Estes factos têm especial interesse porquanto se pode, por oclusão adequada de uma zona
cutânea, aumentar o conteúdo hídrico da sua camada córnea. Assim os corticosteróides, como a
dexamelasona, são mais facilmente absorvidos se a /ona da sua aplicação se encontrar
protegida com um penso q u e evite a evaporação da água da pele. Isto significa que o grau de
penetração de um medicamento pode ser largamente influenciado pela fórmula medicamentosa,
utilizando-se pomadas que formam películas oclu si vas epidérmicas (como as que usam
vaselina como excipiente) que, aumentando a humidade e a temperatura no ponto de aplicação,
permitem uma m elho r absorção percutânea dos fármacos.
A Tabela XLVIII mostra o efeito da oclusão na penetração cutânea.

Tabela XLVIII. Efeito da oclusão na penetração cutânea {Segundo Mckenzie e Stoughton}

Mínima concentrarão eficaz


Composto Com oclusão S<rm oclusão l-actot de nb\t>i\ãt)
Dexumetasona 1 1 0000 i 100 x 100
Acetonido (ia triancinolona l ! (MH) 000 1 1 0000 x 100
Aceionido d LI Iluocinolona 1 1 000 000 1 10000 x 100

Fxiraído de J. W. Hadgratï —- Symposyum \< L'influente de hi foniuilf


sur di:s médicaments», Monlpcllicr. 1967

A penetração depende ainda, acessoriamente, do veículo ou excipiente u ti li / ad o para o


/ãrmaco. De um modo geral, os excipienles de natureza animal (como a banha, a lanolina, etc.) são
dotados de maior poder de penetração cutânea do que os de natureza vegetal (como o azeite, óleos
diversos, etc.) e estes mais do que os minerais (vaselina, parafina, etc.).
496

Segundo VALRTTF, et ai,, apurou-sc que o óleo de linhaça era altamente penetrante, seguido pêlos
óleos de noz, trigo, soja, amêndoas doces, bacalhau e atum, doiados de média penetração. O azeite,
como o óleo de colza, c pouco penetrante. Os factores químicos dos óleos que favorecem a sua
penetração cutânea são a existência de uma elevada percentagem de ácidos gordos de pequena cadeia
ou de ácidos gordos poli--insaturados e a ausência de elevada percentagem de insaponificável e de
lecitinas.
Uma vê/ que os excipientes hidrossolúveis ou hidromiscíveis são repelidos pela camada gorda
tegumentar, é hábito associá-los a detergentes que auxiliem a penetração. Igualmente se verifica que as
emulsões água em óleo ou óleo em água são dotadas de melhor poder de penetração do que os
medicamentos não emulsionados. Devemos salientar a excelente penetrabil idade obtida com emulsões
do tipo óleo em água, graças à molhabilidade dos seus excipientes e ao grau de dispersão apresentado
pelas respectivas partículas, o que favorece a absorção transfolicular, pois as camadas tegumentares
funcionam como membranas semipermeáveis através das quais só passam moléculas de muito reduzidas
dimensões.
A absorção percutânea pode ainda depender de outros factores, como a zona corpórea de
aplicação (a camada córnea da face é, por exemplo, muito menos espessa do que a das palmas das mãos
e das plantas dos pés), o número de glândulas sebáceas e sudoríparas por unidade de superfície, as
fricções e as massagens. Estas últimas, comprimindo os folículos, privam-nos do sebo, favorecendo
assim, indirectamente, a absorção cutânea. O mesmo se pode dizer em relação à aplicação
medicamentosa numa área da pele recentemente lavada com detergentes e barbeada.
Dadas as circunstâncias expostas, podemos considerar essencialmente três tipos de medicação
cutânea, quanto à sua penetrabilidade. Pode, assim, falar-se de acção epidérmica, endodérmica c
diadérmica. A primeira é exclusivamente circunscrita à epiderme e justifica-se sempre que se pretenda
uma acção superficial do medicamento. A penetração endodérmica é de média intensidade, enquanto
que a diadérmica é profunda, podendo, propositada ou acidentalmente, provocar uma aborção
sistémica.
Segundo HARRY, poderemos eslabelecer uma classificação de penetrabilidade dos medicamentos
pela superfície cutânea, de acordo com os principais tipos de excipientes ou veículos utilizados em
dermatologia.
Considerando deste modo o problema, e sem atendermos ao fármaco utilizado, as preparações
dermatológicas são susceptíveis de ser classificadas em 3 grupos, consoante o tipo de excipiente.
Teremos assim:

1) A lanolina, a banha, o dimetilsulfóxido (DMSO), os excipientes constituindo emulsões O/A


preparadas com gorduras naturais ou agentes emulsivos são dotados de excelente poder de
penetração, podendo servir para obter pomadas diadérmicas; as diaderminas ou cremes
evanescentes, as Lanette N e E e as associações de polietileno-glicóis, água, sulfato de luurilu e
sódio e álcool estearílico constituem excipientes compostos deste tipo;
497

2) os óleos vegetais, como o azeite e o óleo de amendoim simples e hidrogenado, as emulsões O/A
preparadas com óleos minerais e as emulsões A/O obtidas com drogas animais ou vegetais, constituem
um segundo grupo de excipientes cuja penetração se pode considerar endodérmica; como exemplos,
recordamos a pomada hidrófila da USP, as bases de GIBSON e de BEELER, o cold-cream, etc.;
3) as emulsões do tipo O/A obtidas com óleos minerais, os silicones, os óleos minerais, como a
vaselina, e os geles do tipo das alquil-celuloses, pectina, agar-agar, bentonite, etc. constituem
excipientes epidérmicos; a pomada cetílica da Farmacopeia Helvética e a mistura de álcool cetílico,
parafina e vaselina, preconizada no Suplemento à Farmacopeia Portuguesa IV, são exemplos
representativos desses excipientes.

4.3.2. ADMINISTRAÇÃO POR VIA BUCAL

Sob esta designação vamos referir-nos exclusivamente à acção tópica e à absorção feita através
das mucosas da boca.
A boca consta de uma cavidade delimitada por uma série de paredes e está dividida pelas
arcadas alvéolo-dentárias em duas zonas — uma anterior, o vestíbulo, outra posterior ou boca
propriamente dita. Como formação nela contida, que nos interessa destacar particularmente,
referiremos a língua, lembrando ainda que na boca se abrem as glândulas salivares. Estas são,
respectivamente de cada lado, a parótida, a submaxilar e a sublingual. A saliva contém numerosos
electrólitos e vários compostos orgânicos que também se encontram no plasma.
Entretanto, a sua concentração em proteínas é apenas de cerca de l % da do plasma e o seu pH
varia de 5 a 8.
Recentemente considera-se a saliva como um dos principais líquidos de distribuição dos
fármacos, podendo usar-se para estudar a farmacocinética de diversos produtos, em lugar de se
recorrer à análise do plasma. Com efeito, observa-se quase sobreposição entre a concentração
plasmática e salivar de muitíssimas substâncias, como a tolbuta-mida, a antipirina e a fenitoina.
O revestimento da boca é mucoso, encontrando-se um epitélio pavimentoso estratificado deste
tipo a forrar a face posterior da parede anterior da boca (lábios), a face interna das paredes laterais,
a face superior (abóbada palatina), a face posterior (véu do paladar) e, finalmente, a face inferior
(pavimento da boca).
As gengivas são, também, revestidas por mucosa que adere ao periósteo, e na língua reconhece-
se igualmente uma mucosa, bastante espessa na face dorsal mas, pelo contrário, muito fina na página
inferior.
À face inferior da boca corresponde a região sublingual que se estende das arcadas à base da
língua. A drenagem sanguínea desta zona é feita predominantemente pelas veias linguais (que são
tributárias da jugular interna) e ainda pela maxilar interna cujo sangue é transportado para a
jugular externa. Um fármaco absorvido nesta região passa,
498

pois, directamente à circulação geral, ao contrário do que acontece com as substâncias absorvidas
no segmento gastro-intestinal que são conduzidas primeiramente ao fígado.
Como consequência, muitos fármacos, que seriam inactivados por via gastro-inles-tinal
(fermentos digestivos; acidez gástrica; metabolização hepática), podem ser absorvidos por via
sublingual, também designada por perlingual.
Os medicamentos aplicados por via sublingual deslinam-se, portanto, a sofrer absorção devendo
permanecer debaixo da língua durante um período de tempo mais ou menos longo. Compreende-se
que a hiperemia das veias lingual e maxilar auxiliem a absorção, pelo que se recomenda que os
medicamentos sejam administrados depois das refeições, já que nessa altura é mais intensa a
irrigação das mucosas. Por outro lado, uma vez que o medicamento não deve ser deglutido, c também
preferível a administração pós-prandeal, já que a salivação está diminuída.
Por este facto, os medicamentos destinados a serem administrados por via perlin-gual não
devem conter edulcorantes e, de uma maneira geral, sialagogos. Utilizam-se pequenos comprimidos
que se devem dissolver lentamente (20 a 60 minutos) debaixo da língua.
Em certas situações de emergência, como por exemplo a administração de corona-
riodüatadores, convém reduzir substancialmente o período de desagregação ou de dissolução dos
comprimidos
Empregam-se, ainda, soluções alcoólicas de muitos fármacos, como trinitrina, nitrito de amilo,
vários alcalóides, etc. Diversas hormonas sexuais, como a metiltestos-terona, a progesterona, o
estradiol e o etinilestradiol, são aplicadas por via sublingual, sob a forma de comprimidos.
A velocidade e a taxa de absorção por via sublingual depende de muilos factores, como a
natureza do fármaco e as propriedades do excipiente. Ensaios efectuados em animais por KATZ e
BARR, que utilizaram comprimidos de fenobarbital, mostraram que certos excipientes promoviam mais
rápida e quantitativa absorção do que outros. Assim, com o fenobarbital, a mais eficaz absorção era
conseguida com excipientes de lactose (95% do fenobarbital era absorvido em duas horas), enquanto
que a substituição daquela pelo monoestearato de glicerilo apenas ocasionava a absorção de 22% do
fármaco. Já, porém, o monoeslearalo de glicerilo originava uma taxa de absorção de 100% de iodeto
alcalino ao fim de 3 horas de administração, enquanto que, no mesmo período de tempo, só se
absorviam 53% do iodeto quando os comprimidos continham a lactose como excipiente.
De um modo geral, observa-se também uma mais fácil absorção sublingual de medicamentos
dissolvidos em álcool do que em solução aquosa. Muitos alcalóides, por exemplo, são mais
facilmente absorvidos por esta via quando no estado de bases livres dissolvidas no etanol.
Ao lado da absorção perlingual teremos de considerar a utilização da mucosa da boca para
uma aplicação exclusivamente tópica. Várias soluções medicamentosas são utilizadas com este fim,
designadamente os gargarejos, como os de iodo, de fenolsalil.
499

etc. Algumas vezes o medicamento é aplicado sob a forma de pincelagem. designando--se por
colutório. A maior parte dos colutórios apresenta elevada viscosidade, de modo a aderirem
facilmente às mucosas. São geralmente a glicerina, o propilenoglicol e o sorbitol a 70% os líquidos
que se utilizam como veículos para este género de preparação.
Para aplicação tópica na mucosa bucal são ainda preparadas muitas pastilhas e comprimidos,
dotados de lenta velocidade de desagregação (30 a 60 minutos), de modo a permitirem uma acção o
mais duradoura possível. A sua superfície é geralmente grande, de forma a proporcionarem um
contacto íntimo entre os fármacos componentes e as mucosas sobre que devem actuar. Os excipientes
destas formas de aplicação tópica são normalmente as gomas arábica e adraganta, a metikelulose, a
gelatina, a manita, etc.
Entre as substâncias medicamentosas que se utilizam em comprimidos ou pastilhas tópicas
bucais, lembramos os anti-sépticos e desinfectantes, os anestésicos locais, os desodorizantes e os
adstringentes. Deste modo, são correntes fórmulas contendo sulfa-midas, antibióticos, aneslesina,
clorofila, etc., etc.
Por último, e constituindo ainda outro tipo de medicação para administrar na mucosa bucal,
lembramos os comprimidos ou pastilhas destinados a desagregarem-se ou dissolverem-sc na saliva,
proporcionando absorção simultânea pela mucosa da boca e por via gastro-intestinal ao deglutir-se
a saliva.

4.3.3. ADMINISTRAÇÃO POR VIA GASTRO-INTESTINAL

Se considerarmos o trajecto de um alimento, verificamos que, depois de permanecer certo


tempo na boca, passa através do esófago para o estômago e deste para o intestino delgado, onde se
processa a absorção. Para que isto seja possível, o alimento é transformado nesse trajecto por acção
da saliva (plialina e pectinase), pelo suco gástrico (pepsina) e pelo suco pancreático (tripsina,
amilase e Hpase). Os detritos alimentares, porção residual não absorvida, são, posteriormente,
eliminados pelo inleslino grosso. Desta rápida descrição conclui-se que é, fundamentalmente, a
mucosa do intestino delgado a que mais probabilidades apresenta de promover a absorção
medicamentosa. Efectivamente, as mucosas do esófago e do estômago comportam-se como mucosas
de passagem, se bem que se possa registar absorção gástrica de alguns fármacos.

4.3.3.1. Estômago

O estômago é um órgão simultaneamente muscular e glandular, móvel, contrátil e distensível. É


revestido na sua face interna por uma camada mucosa, apresentando grande quantidade de muco e
elevado teor de colesterol. Sendo também relativamente
500

pouco vascularizado, o estômago não está fisiologicamente adaptado às funções de órgão de


absorção. Antes de iniciar esle estudo, passemos em revista alguns aspectos fisiológicos do estômago
cujo conhecimento interessa para a perfeita compreensão do que se seguirá.
A mucosa gástrica tem três espécies de glângulas que são as córdicas que segregam muco, as
pilóricas que segregam sucos alcalinos ricos em muco e as fúndicas que possuem células com as
seguintes funções: células pépticas que produzem pepsigénio; células parietais (oxínticas) que
produzem HC1 e células mucosas que segregam mucina.
O suco gástrico produ/,ido é composto por HC1, pepsigénio, mucina e factor intrínseco, tendo
um pH ao redor de 1,5. Nas 24 horas a quantidade de suco elaborado é de aproximadamente 2,5
litros, numa taxa de cerca de 20 ml por hora, quando em repouso. O ácido clorídrico c formado à
custa de iões Cl~ que provêm do plasma (transporte activo) e do H+ segregado pelas células à custa
da decomposição da água. O OH" que resta da molécula da água é neutralizado por iões hidrogénio
provenientes do ácido carbónico. O pepsigénio cm presença do HC1 (na diluição gástrica à volta de
0,1% de HC1) origina a enzima proteolítica-pep£üia que apenas transforma as substâncias proteicas
cm proteoses e pcptonas. Para lá desta enzima, no estômago existe lipase gástrica (tem pequena
importância no desdobramento das gorduras) e renina (=lab=coalho) que transforma o caseinogénio
do leite em caseína.
O estômago é regulado por mecanismos nervosos que estimulam o apetite (sabor, aroma,
recordação de alimentos) e levam à libertação do suco (fibras colinérgicas provenientes do vago);
por processos mecânicos, como a distensão e por processos químicos em que há libertação de
gastrina por via sanguínea a qual estimula as glândulas fúndicas.
As alterações funcionais da motilidade gástrica, bem como da sua secreção, dá-se o nome de
dispepsia (indigestão). As causas do aparecimento desta alteração são várias, podendo citar-se a
inflamação do estômago (úlceras, inflamações atrófica ou hiper-trófica, anemia perniciosa, cancro)
colecistltes, apendicite crónica, ingestão de álcool, fumo, e te.
O poder de absorção do estômago exalta-se em condições patológicas, como lesões da mucosa,
tendo-se observado, por exemplo, que certos indivíduos portadores de úlceras gástricas e medicados
com subnitrato de bismuto são capa/es de absorver esta substância protectora, já que na sua urina se
tem detectado o bismuto.
Contudo, vários medicamentos são capazes de penetrar a mucosa gástrica proporcionando uma
verdadeira absorção, em todo o caso inferior à que se regista no intestino delgado. O álcool, a
aspirina, a cafeína, a antipirina, a acetanilida, etc. são exemplos de substâncias susceptíveis de serem
absorvidas por via gástrica.
Em muitos casos, tem-se observado incremento de absorção quando esteja presente o anidrido
carbónico. Assim, o álccol penetraria mais rapidamente através da mucosa gástrica quando
administrado em bebidas gasosas. BRADLEY, em 1936, assinalou que a
501

aspirina era absorvida mais rapidamente quando administrada em líquidos efervescentes ou quando
simplesmente associada ao NaHCO^ que, reagindo com o ácido clorídrico gástrico, libertava
anidrido carbónico. Admitiu, nessa altura, que o aumento da velocidade de absorção era devido,
principalmente, ao mais rápido esvaziamento gástrico pela pressão exercida pelo gás. Parece, porém,
confirmado que apenas se trata de uma maior ou menor solubilidade da aspirina, consoante o pH
local. A propósito da absorção pela mucosa intestinal retomaremos este assunto.
Também está descrita a absorção gástrica de alguns alcalóides, como a estricnina, mas tem-se
observado em animais de experiência com o piloro laqueado que a intoxicação pela estricnina
proveniente da exclusiva absorção gástrica só se verifica após um período de tempo muito superior
ao registado quando o alcalóide actuava no intestino delgado. De uma maneira geral, observa-se que
a acidez gástrica entrava a absorção dos alcalóides pela mucosa, sendo possível aumentar a
velocidade da absorção associando-
-Ihes medicamentos alcalinos, como o bicarbonato de sódio.
Fundamentalmente, com a mucosa gástrica passa-se o fenómeno já atrás referido: os compostos
com pequeno coeficiente de partilha óleo/água são dotados de fraco poder de penetração; de um
modo geral, as substâncias não ionizáveis penetram melhor do que as ionizáveis e a absorção destas
será tanto mais elevada quanto menos se dissociem. Nestas circunstâncias, e sendo os alcalóides
bases fracas, aumenta, por alcalini-zação. a predominância das suas formas indissociadas.
Atendendo ao baixo valor do pH do suco gástrico (l a 3,5 e mais vulgarmente l a 2,5) e à
presença da pepsina, muitos fármacos podiam ser destruídos no estômago quando administrados per
os. É, pois, necessário que se protejam os medicamentos sensíveis à acidez e à acção proteolítica, o
que se consegue recorrendo aos revestimentos gastro-resistentes. Trata-se de envolvimentos para
pílulas, comprimidos e cápsulas, os quais não são atacados pelo suco gástrico mas que, em
contrapartida, devem desagregar-se facilmente no suco intestinal. Algumas vezes, contudo, basta
associar ao fármaco tampões ou neutralizantes para o proteger da acção destrutiva pelo ácido
clorídrico do estômago, podendo, no entanto, administrar-se em comprimidos ou cápsulas contendo
carbonato de cálcio, hidróxido de alumínio, diidroxiaminoacetato de alumínio, etc.. Os salicilatos e a
aspirina, ao decomporem-se no estômago, libertam ácido saücílico que é irritante para a mucosa
gástrica, pelo que é aconselhável associar-
-Ihes bicarbonatos, que neutralizam a acidez estomacal.
Pelo que ficou dito se compreende que a mucosa gástrica não se destina à absorção, sendo esta
conseguida essencialmente nas primeiras porções do intestino delgado. Deste modo, quando se
ingere um medicamento, interessa que ele permaneça o mínimo tempo possível no estômago,
passando rapidamente para o intestino. A codeína, alcalóide analgésico que se comporta como uma
base fraca, manifesta os seus efeitos tanto mais rapidamente quanto mais rápido c o esvaziamento
gástrico. A curta permanência dos medicamentos no estômago é ainda desejável para evitar a sua
possível inactivação pela acidez e enzimas gástricos. Para os fármacos que se comportam como
ácidos
502

fracos, a permanência no estômago é ainda prejudicial porque esses fármacos dificilmente se


dissolvem no suco gástrico, dissolvendo-se, em geral, mais rapidamente no suco entérico.
Por todas estas razões é compreensível que os estudos de absorção gastro-intestinal conduzam
a resultados mais seguros quando executados sobre indivíduos em jejum, pois o tipo de alimentos, seu
volume, pressão osmótica, pH e capacidade tampão e a temperatura e a viscosidade do suco gástrico
são factores que influenciam a velocidade de esvaziamento do estômago. A ela não são alheias,
ainda, a idade e o estado de saúde do paciente.
O conteúdo gástrico abandona o estômago com uma velocidade que é dependente do seu
volume. Trata-se, portanto, de um processo que corresponde a uma reacção de primeira ordem:

volume que permanece = (volume no tempo zero) x exp.~~Kl

Com pequenos volumes há um lapso de tempo antes que o esvaziamento se inicie. Com grandes
volumes a velocidade de esvaziamento é inicialmente maior, embora o processo exponencial se não
mantenha ale ao fim.
Como consequência do que deixámos dito é compreensível que a ingestão de apreciáveis
volumes de líquido, quando se ingere um medicamento, favoreça o esvaziamento gástrico,
transferindo-se o fármaco para o intestino, onde deverá actuar.
As soluções ou as suspensões de partículas ténues deixam o estômago mais rapidamente do que
as substâncias gomosas ou pastosas; quanto menos viscoso for um líquido, mais facilmente atingirá o
intestino; as soluções de baixa pressão osmótica abandonam o estômago com mais rapidez do que as
de pressão osmótica elevada; as gorduras retardam o esvaziamento gástrico, o que não sucede com
as substâncias proteicas e muito menos com os amidos.
O esvaziamento do estômago está, também, relacionado com a acidez gástrica e com o pH
duodenal. Em indivíduos com hipercloridria nota-se, por exemplo, uma elevada velocidade de
esvaziamento, ocorrendo o contrário em doentes com aquilia.
Finalmente, mesmo em indivíduos sãos, é variável a velocidade de esvaziamento do conteúdo
gástrico, recomendando-se o decúbito sobre o lado direito, após a ingestão do medicamento.

4.3.3.2. Intestino delgado

A mucosa intestinal, em razão da elevada vascularização e extraordinário desenvolvimento da


sua superfície (vilosidades e válvulas coniventes), está fisiologicamente destinada à absorção.
Normalmente, para que um fármaco seja eficaz por via gastro--inlestinal deve ser absorvido pelas
mucosas, ocupando função primordial, nessa absor-
503

cão, a mucosa do intestino delgado. Este é constituído pelo duodeno, jejuno e íleo, sua porção
terminal, de forma regularmente cilíndrica, com um diâmetro médio de 3 a 3,5 cm.
O intestino delgado apresenta válvulas coniventes até cerca de 50 cm de distância da válvula
íleo-cecal. As vilosidades c as criptas de LIEBERKÜHN encontram-se em todo o seu comprimento. Em
corte histológico, o intestino delgado apresenta as seguintes túnicas: muscular, com duas camadas,
uma longitudinal e outra circular; submucoxa; muscularis mucosae; mucosa, onde o córion se
encontra repleto de glândulas tubulosas. Externamente, o intestino é envolvido pela serosa
periloneal que forra a túnica muscular. A túnica serosa é,
pois, uma membrana adventícia que se junta às túnicas
próprias do órgão.
A extensão do tracto intestinal é muito importante na
absorção dos fármacos, uma vez que estes devem dispor de
tempo para serem absorvidos, particularmente se a sua
solubilidade é pequena.
HIRSCH elaborou uma tabela de comprimentos intestinais no
homem vivo, os quais são consideravelmente mais curtos do
que os classicamente descritos em cadáveres. A Fig. 213. Corte histológico do intestino
Tabela XLIX reproduz esses valores. delgado
EDWARDS calcula que 500 ml de líquido ocupem
1 — Disposição da rede nervosa; 2 —
cerca de 100 cm do intestino, espalhando-se por uma Disposição da rede linfática quilífera; 3 —
superfície de 700 a 800 cm2. Uma vez, porém, que as Disposição da rede capilar arterial; 4 —
Disposição da rede venosa. S.M. — tecido
vilosidades intestinais aumentam enorme - submucoso; pi.M. — plexo de Meissner; r.l. —
mente a área da mucosa, pode calcular-se em 300 rede linfática; T.M. — túnica muscular; t.c. —
cm2 a superfície efectiva por 100 cm de comprimento.
A espessura da camada mucosa é de cerca de 25 \i. A irrigação do intestino pela corrente
circulatória faz-se, no adulto, segundo WAGNER, a um débito de cerca de 6000 ml por minuto.
A relação entre a área das superfícies mucosa e serosa (M/S) é maior na região proximal do
intestino delgado e diminui à medida que se caminha para a zona distai. Essa relação no duodeno,
jejuno e íleo do intestino do rato é de 11,3, 9,8 e 4,3, respectivamente. Por outro lado, o potencial
eléctrico observado através do intestino delgado é positivo nas superfícies serosas, sendo mais
elevado no jejuno do que no
504

Tabela XLIX. Comprimento de segmentos intestinais. Média obtida em dez indivíduos,


sendo cinco obesos r-K- •-,?• ..'•••-••TT>< -c- ---^

Altura do corpo 163 cm


Peso do corpo ' "' 85 kg
-'••'"- -• Distância do nariz ao ânus 453 cm
Distância do nariz ao piloro 64 » - !"
; ;
Distância do nariz à válvula íleo-cecal 347 » s í!^:j. ?s&-.:-3tâ;--
Comprimento do duodeno .... • ^v-r^ ^1 » ,-n
Comprimento do jejuno-íleo 261 »
;^ Comprimento do cólon 109 »
Comprimento do intestino delgado 282 »

Segundo J. Hirsch et ai. — Gaslroenterology, 31, 247 (1956) '-'?•


•"

íleo. O pH do suco intestinal aumenta da porção proximal para a porção distai do intestino (no
duodeno o pH é de 5 a 6 e no íleo de cerca de 8). Observa-se, pois, um gradiente, desde o duodeno
para o íleo, no que diz respeito à relação M/S potencial eléctrico e valor de pH (a relação M/S e o
potencial eléctrico diminuem, enquanto que se eleva o valor do pH).
Pelo que ficou dito, se compreende, também, que a zona do intestino delgado mais
propícia à absorção é a porção duodeno-jejunal. Para algumas substâncias, porém,
observa-se comportamento diferente, designadamente para os sais biliares e para a
vitamina B12, que são absorvidos, de preferência, no íleo. Trata-se de absorções por
transporte facilitado, em que aquelas substâncias encontram os receptores específicos
nas aludidas zonas. .. • -
No duodeno convergem muitas secreções como a pancreática (que contém tri-psina ('), amilase e
lipase. e, portanto, desempenha função importante no metabolismo das proteínas, hidratos de
carbono e gorduras); a bílis (que pêlos seus sais biliares actua estimulando a lipase e promovendo a
emulsificação dos corpos gordos), o suco intestinal libertado pelas glândulas de Lieberkuhn (contém
erepsina que c uma mistura de peptidases, invertase, maltase, lactase, e enteroquinase, que é
activador do tripsinogé-nio que produz a tripsina).
O suco entérico tem no duodeno pH ±5, aumentado para o jejuno e depois para o íleo e subindo
nos cólons até 8,3 — 8,4.
O intestino possui movimentos pendulares, movimentos de segmentação rítmica e movimentos
peristálticos ou de propulsão. Os movimentos pendulares e segmentares são de natureza miogénica,
isto é, do próprio músculo. Os peristálticos são induzidos a partir dos plexos de Auerbach (mecânico)
e de Meissner (sensitivo), admitindo-se que a serotonina (5-HT) seja um dos factores de estimulação.
(O 5-HT é poduzido nas células cromafins da mucosa gastro-intestinal), O vago inerva o plexo de
Auerbach e

(') Sob a forma de tripsinogénio.


505

aumenta o tono e o peristaltismo, enquanto que a estimulação simpática (nervo esplâ-nico) inibe o
tono e o peristaltismo. Do ponto de vistas fisiopatológico, é de lembrar que as duas alterações
intestinais mais correntes são a obstipação (constipação ou prisão de ventre) e a diarreia.
A obstipação pode dividir-se em espasmódica ou cólon irritável (pode provir de reflexos a
partir de vísceras abdominais enfermas, como vesícula, apêndice, duodeno, de psiconeurose, do uso
indiscriminado de purgantes, etc.), atónica ou cólon inactivo (dieta pobre em resíduos celulósicos,
hipovitaminose B , hipotiroidismo, doenças cardíacas, tuberculose, etc. — é característica de pessoas
idosas, ao contrário da obstipação espamódica), disquecia ou seja, a falta de hábito da evacuação
que leva à modificação do próprio recto que se relaxa, tornando-se tolerante aos estímulos normais.
Pela análise do que se disse é compreensível aceitar que a terapêutica do primeiro tipo de
obstipação se baseie no uso de antiespasmódicos anticolinérgicos, como a atropina e seus derivados,
enquanto que os restantes géneros de obstipação tenham de recorrer a outros tipos de medicação ou
somente à criação de hábitos fisiológicos.
A diarreia consiste em deposições demasiado frequentes de fezes líquidas. No caso há o aumento
de velocidade de trânsito intestinal, o que impede a absorção de água, podendo até levar à exsudação
daquela. Há várias espécies de diarreias, podendo classificar-se em funcionais e orgânicas.
As diarreias funcionais são causadas por acloridria, por fermentação e putrefacção, por
insuficiência pancreática exógena, por alergias ou por irritações do cólon. As diarreias orgânicas
são devidas a enterocoliles infecciosas (incluindo vírus) e a contaminação por salmonelas, colif
estreptococos dourados, intoxicações mercuriais ou arse-nicais, colites ulcerosas, etc.
No intestino e por todo o tracto digestivo existem numerosos microrganismos como coli,
Aerobacterium aerogenes, Clostridium Welchii, Streptococcus faecalis, Lactobacilus bifidux. Estes
atacam as proteínas e os hidratos de carbono produzindo produtos de putrefacção e fermentação,
respectivamente. Os germes anaeróbios, como os clostrídios, levam à putrefacção proteica com
produção de indol e escatol, H,S e histamina. Os germes aeróbios, como o Lactobacilus, produzem
ácido láctico e butiríco, à custa dos hidratos de carbono.

4.3.3.2.1. Influência da dissolução na absorção

Já vimos que existem numerosos factores determinantes da absorção. Efectivamente, o


esvaziamento gástrico influi na velocidade de penetração dos medicamentos na mucosa intestinal. Do
mesmo modo, não é indiferente o estado físico em que se encontra o medicamento. Um sólido
compacto terá mais dificuldade de absorção do que um sólido finamente dividido, e este será
absorvido mais lentamente do que uma solução aquosa ou alcoólica. De facto, para que um dado
fármaco possa actuar, quando administrado por esta via, terá, antes de mais, que se dissolver nos
sucos gastro-intes-
506

tinais. Ora, a dissolução leva certo tempo a realizar-se e, frequentemente, a demora que se regista na
absorção é a ela devida.
A dissolução duma substância sólida num dissolvente líquido que não reaja com ela, pode
expressar-se pela equação de NOYES-WHÏTNEY modificada (ver pág. 308):

de
= K S (Cs-C)
dt

em que dcldt é a velocidade de dissolução, S é a área do sólido, K uma constante, dependente da


agitação do dissolvente e do coeficiente de difusão da droga a dissolver, C é a concentração da
substância no solvente, no tempo t e C^ é a sua concentração na zona de difusão que rodeia a parte
não dissolvida. Esta /ona de difusão é como que uma película fina, saturada de solvido. Por este
facto, Cv pode, na prática, ser considerado equivalente à concentração de saturação. Assim, a
velocidade de dissolução dependerá, em última análise, da laxa de difusão das moléculas do solvido
da zona de difusão para o restante solvente.
Claramente que a velocidade de dissolução poderá ser aumentada diminuindo o tamanho das
partículas, já que é proporcional à superfície da substância a dissolver. Na prática corrente há
numerosos exemplos desta aplicação (')- A griseofulvina, agente antifúngico muito utilizado, é pouco
solúvel nos sucos gástrico e intestinal. Nestas circunstâncias, consegue-se melhor absorção por via
intestinal empregando-a dividida em pó muito ténue. É curioso observar-se que administrando 0,5 g
de griseofulvina, sob a forma de pó micronizado, se conseguem níveis plasmáticos idênticos aos
obtidos com l g de fármaco pulverizado mais grosseiramente. É que a solubilidade da griseofulvina
aumenta linearmente com o logaritmo da área das suas partículas. A Tabela L ilustra o que dissemos.

Tabela L. Níveis plasmáticos médios de griseofulvina no homem em função da


superfície específica das partículas do fármaco e da forma farmacêutica
Área específica Dose Níveis plasmáticos após 4 horas (mcg/ml)
(m2/g) (8) Comprimidos Suspensão
0,41 0,5 0,64 0,70
0,41 1,0 0,88 1,07
1,56 0,25 0,68 0,83
1,56 0,5 0,97 1,60

Extraído de Atkinson et a!. — Antibiolics and Chemotherapy, 12, 232 (1962)

(') Observe-se, porém, que nem sempre este conceito tem encontrado confirmação na
prática (G. LEVY — Amer. J. Pharm. 135, 78, 1963).
507

BAUER e colaboradores demonstraram que a espironolaclona, polente bloqueador da aldosterona,


era absorvida numa taxa 50% mais elevada, sob a forma de pó microni-zado, em relação à absorção
registada quando pulverizada de modo convencional. A experiência comparativa efectuou-se
administrando o fármaco, nos dois casos, em cápsulas de gelatina.
As sulfamidas são mais rapidamente absorvidas por via gastro-intestinal quando se encontram
divididas em partículas microcristalinas. Efectivamente, a superfície dos microcristais é mais facilmente
molhável pêlos sucos digestivos, incrementando-se a sua taxa de dissolução. Idêntico facto foi notado
por KAREMI e colaboradores com o cio-ranfenicol, para o qual observaram diferentes velocidades de
absorção gastro-intestinal, consoante o diâmetro das partículas em que estava dividido aquele
antibiótico. Assim, se as partículas tinham 200 u, de diâmetro, o cloranfenicol era absorvido ao fim
de uma hora de ingestão, e só passadas duas ou três horas quando o diâmetro era de 400 e 800 \í,
respectivamente.
A superfície das partículas ou área por unidade de massa (S) é dada pela expressão

6 P
S =—— x ——
D d

em que D é o diâmelro das partículas e Piá representa o volume ocupado pelo fármaco, sendo P o seu
peso e d a sua densidade.
Na tabela LI indicamos, a título de curiosidade, as relações entre diâmetros de partícula e
superfícies ocupadas por um grama de substância de densidade igual a 1.

Tabela LI. Relação entre o diâmetro das partículas e respectivas


superfícies específicas (1)

Diâmetro (D) (nm) Superfície específica (n^.g~r)


0,01 600
0,25 24
0,50 12
1,00 6
2,00 3
4,00 1,5
10,00 0,63
15,00 0,40
20,00 0,30
40.00 0,15

(') Quando se discute o tamanho de partícula c difícil dar uma ideia objectiva do que significa
determinado diâmetro. Com a finalidade de procurar esclarecer este ponto, lembramos que as
partículas do fumo do tabaco oscilam entre O, l e l u,; um pó finamente micronizado pode apresentar
diâmetros de partícula compreendidos entre 0,5 e lün. e a área ocupada por l g de substância assim
dividida é de 6a 12 x IO4 cm-1. Um pó obtido em moinhos coloidais terá partículas compreendidas
entre 10 e ISQu, com uma área de 0,4 a 6 X 10-( cnr/g.
508

A facilidade de dissolução é, portanto, uma das propriedades fundamentais para que se


verifique rapidez na absorção dum fármaco. Isto explica também a crença popular de que um
medicamento actua melhor quando administrado com água quente. Efectivamente, regra geral, o
coeficiente de solubilidade aumenta quando se eleva a temperatura.
JACK LEONARDS, estudando a velocidade de absorção de vários tipos de aspirina administrada
por via gastro-intestinal, chegou à conclusão que a velocidade máxima com que se atingem níveis
sanguíneos terapêuticos com o produto era depende da sua solubilidade nos sucos digestivos. A Fig.
214 mostra as concentrações plasmáticas de saücilato obtidas após ingestão de várias preparações
de ácido acetilsalicílico (aspirina.

60 -

£ 50 -

40 -

30 J

. _ _ _ M Aspirina x __.. _x
Aspirina tamponada a—- —
10 - o Aspirina em água quente A
—— 4 Aspirina efervescente
•------• Aspirina sódica

10 20 30 50 60
40

Fig. 214. Concentrações plasmáticas de salicilatos totais, após administração oral


de várias «aspirinas"

Segundo Leonards, J. — Clin. Pharmacol. Therap, 4, 476 (1963)

aspirina tamponada, aspirina administrada com água quente, aspirina efervescente e


acetilsalicilato de sódio) em função do tempo. Verificou-se que os níveis plasmáticos são tanto mais
altos e rapidamente obtidos quanto maior é a solubilidade da aspirina na água.
509

velocidade de dissolução dos fármacos nos sucos digestivos pode também ser aumentada,
incrementando a sua solubilização na zona de difusão ou, por outras palavras, elevando o valor de C(J
segundo a equação de NOYES-WHITNEY. Assim, por exemplo, se o fármaco se comporta como um ácido
fraco, pode aumentar-se o seu coeficiente de solubilidade elevando o pH do meio. Isto consegue-se
adicionando substâncias alcalinas ao ácido fraco (bicarbonato de sódio, citrato de sódio) ou substi-
tuindo-o por alguns dos seus sais hidrossolúveis.
A penicilina V, sob a forma de sal potássico (mais solúvel), é melhor absorvida por via gaslro-
intestinal do que sob a forma de sal e este origina, mesmo assim, melhores níveis plasmáticos do que
a penicilina V ácida, que é menos solúvel. A Fig. 215 ilustra o que acabámos de expor.

5 -

1 / 2 1 2 A 6
Horas Fig. 215. Níveis plasmáticos de
penicilina V depois da administração de 400000 U.
Sob a forma de ácido livre
Sob a forma de sal de
potássio Sob a forma de sal
de cálcio
Segundo H. Juncher e F. Raaschou — Anlibiot, Med. Clin. Therap., 4, 497 (1957)

Claramente que a penicilina V potássica ou outro sal de outra substância ao chegar ao


estômago deve ser decomposto pela acidez gástrica, libertando-se o ácido medicamentoso insolúvel
correspondente. Assim, pareceria à primeira vista que para efeitos de absorção era indiferente
administrar o sal ou o seu ácido. Entretanto, tal nào acontece
510

pois ao dar-se a decomposição gástrica o ácido precipita no suco estomacal em partículas


extremamente divididas o que permite que se processe mais facilmente a absorção. O que acabámos
de citar ocorre com numerosos compostos entre os quais salientamos o barbital e fenobarbital
sódicos que são muito melhor absorvidos do que os respectivos barbitúricos não salificados pelas
razões que apontamos.
Quando, por via gastro-intestinal se administra um óleo ou uma emulsão de óleo em água, a
absorção do fármaco dependera do seu coeficiente de partilha O/A.
Teoricamente, a absorção das substâncias medicamentosas em soluções de elevada viscosidade
dependerá da velocidade de difusão das suas moléculas para os locais de absorção, mas talvez
desempenhe papel primordial a motilidade do próprio tracto gastro-intestinal. No que diz respeito às
emulsões, tem ainda enorme influência o tamanho das partículas da fase dispersa.
Se a absorção por via gastro-intestinal implica a necessidade de que o fármaco se dissolva ou,
pelo menos, se disperse perfeitamente nos sucos digestivos, não é também de minimizar a
importância da sua lipossolubilidadc, ou melhor, do seu coeficiente de partilha óleo em água. Já
atrás expusemos a teoria de OVERTON, tendo indicado as condições de absorção para as diversas
substâncias. Nessa altura referimo-nos ainda ao interesse da ionização dos compostos, já que são
lipossolúveis as suas formas não dissociadas. O grau de ionização de um fármaco é, portanto, um
dos factores determinantes da velocidade de absorção. Só assim se explica que certas substâncias
facilmente solúveis nos sucos digestivos mas inteiramente lipo-insolúveis não sejam absorvidas por
via gastro-intestinal.
Pelo que ficou dito, compreende-se que a velocidade de cedência de um fármaco, a partir de
um medicamento e em condições óptimas para a absorção, é largamente influenciada pelo tipo de
forma farmacêutica. Pode dizer-se que a facilidade de absorção deve aumentar dos comprimidos
revestidos (drageias) para as soluções aquosas, segundo o esquema:

Drageia —» Comprimido —> Cápsula —> Pó —> Suspensão —> Emulsão O/A —*
—> Solução aquosa

Como corolário do que se expôs, sempre que se pretenda uma acção meramente local no
intestino, deve procurar-se que o fármaco se dissolva o menos possível nos sucos digestivos. É o que
sucede com certos anti-helmmticos, que deverão actuar sobre os vermes do intestino grosso e cuja
absorção gastro-intestinal não é, por isso, desejável. Nesses casos, de que pode servir de exemplo a
fenotiazina para uso veterinário, não é recomendável utilizar o fármaco dividido em partículas de
pequeno diâmetro. Com efeito, uma vez que a velocidade de absorção no intestino delgado é função
da superfície das partículas, quanto maiores elas forem tanto menor será a superfície total
apresentada e, portanto, mais lenta a sua dispersão ou dissolução nos sucos digestivos.
511

4.3.3.2.2. Influência da forma cristalina do fármaco na absorção

A lei de NOY[;S-WHITNEY demonstra ainda que a taxa de dissolução é afectada polo polimorfismo dos
cristais medicamentosos c sua hidratação ou sol vá tacão, uma vez que estes factores influenciam o
valor de C.
Muitos compostos são susceptíveis de se apresentar sob duas ou mais formas cristalinas,
calculando-se que cerca de um terço das substâncias orgânicas conhecidas manifeste polimorfismo.
Habitualmente, os derivados deste género apresentam características físicas diferentes, podendo dizer-
se que cada í i pó de cristais da mesma substância tem, em regra, pontos de fusão, coeficientes de
solubilidade c densidades d i fé-rentes.
Hspecialmentc em consequência da diversa solubilidade que manifestam, compreende-se que o tipo
cristalino do Tármaco tenha influência na velocidade de absorção. Por esta ra/ão, o mesmo fármaco
poderá aprescntar-se em estados mais ou menos activos do ponto de vista farmacológico.
Um composto que apresente polimorfismo pode ser tcrmodinamicamcnlc instável pois que tende
a transformar-sc na forma estável. O i/-se, então, que a substância é mcfa.Mvvc/. Em regra, a
forma estável apresenta ponto de fusão mais elevado c menor solubilidade do que a forma meïastável.
Como a conversão da forma metastávcl c extremamente lenta, empregam-se algumas vcz.cs cm
farmácia os derivados mclustávcis, devido à sua maior solubilidade, já que é limitada a vida de um
produto farmacêutico.
A rihoflavina ou vitamina B., aparece cm três estados cristalinos, cujos coeficientes de
solubilidade variam em larga medida: ó mg, 8 mg e 120 mg por l (K) ml de água. a 25"C. R
evidente que a forma mais aconselhável é. sem dúvida, a mais solúvel, que também apresenta o mais
baixo ponto de tusão.
O acetato de cortisona aparece em cinco diferentes estados cristalinos, conhecidos por formas /.
2, J. 4 c J. As formas / e J podem ser obtidas separadamente ou cm conjunto, e são consideradas
estáveis, tendo, de preferencia, sido utilizadas em comprimidos. A forma J tem sido preparada em
presença de água e corresponde a uma hidratação do produto, devendo ser usada em suspensões
orais. Com ela se conseguem diâmetros médios de partículas da ordem de K) p.
As substâncias podem lambem aprescntar-se sob a forma amorfa, que é mais solúvel do que a
respectiva forma cristalina. O anidrido arsenioso, por exemplo, é solúvel na água na proporção
de 40 p/l quando amorfo, e apenas de 14 g/1 quando cristalino. A novobiocina amorfa é cerca de dez
vezes mais solúvel do que a cristalizada. Acontece que as suspensões de novobiocina amorfa tendem a
cristal i/ar. podendo, porém, rctardar-se esta conversão por intermédio da associação de
mctilcclulose.
Grande número de substâncias orgânicas em solução tende a formar associações com o
dissolvente, as quais tomam o nome de solvamos. As sultamidas. a quinina, os
512

barbitúricos, as xantinas, os esteróides e as tctraciclinas, por exemplo, podem facilmente originar


estruturas hidratadas.
Compreende-se que a velocidade de dissolução da forma anidra dum composto não seja
necessariamente idêntica à apresentada pela forma hidratada. Assim, a cafeína, a teofilina e a
ampicilina, ao contrário do que seria de esperar, são mais solúveis na água quando anidras do que
quando hidratadas. Isto não se verifica com alguns solvatos orgânicos, como os que se formam com
dissolventes do tipo do acetato de etilo, do álcool amflico ou da acetona. As formas solvatadas da
fludrocortisona com acetato de etilo são muito mais hidrossolúveis do que as não solvatadas. A
triancinolona é mais utilizada em solvato eom u acetona (acetonido da triancinolona) do que sob a
forma livre.

4.3.3.2.3. Influência dos adjuvantes na absorção

Determinadas substâncias podem favorecer a absorção dos fármacos por via gastro--intestinal.
Consideraremos como adjuvantes de absorção os compostos capazes de proteger o fármaco da
destruição pêlos sucos digestivos e, principalmente, de originar com ele complexos mais facilmente
absorvíveis.
Algumas misturas eutéticas podem ser utilizadas com a referida finalidade, designadamente as
asssociações de sultatiazol com a ureia. Neste caso observou-se que ao juntar a mistura à água se
formam suspensões de partículas tnicrocristalinas de sulfa-tiazol. A maior velocidade de absorção é
devida, em última análise, à mais rápida dissolução do fármaco nos sucoï; digestivos.
Os complexos de cloridrato de tetraciclina com cloridrato de glucosamina ou de tetraciclina
base com hexametafosfato de sódio constituem outro exemplo de incremento de absorção, embora
ainda não esteja bem esclarecido qual o mecanismo por que actuam. Entretanto, certas amidas
aumentam a absorção da prednisona e da predni-soiona. A benzometamina, conhecido
antícolinérgico, é melhor absorvida em presença de ácidos acético, propiónico ou butírico.
O sulfato de lobelina origina, normalmente, níveis sanguíneos de 0,3 mcg/ml. Este valor pode
ser largamente aumentado (1,8 mcg/ml) quando se mistura o fármaco com pequenas quantidades de
carbonato de magnésio ou de fosfato tricálcico.
A vitamina B6 parece ser melhor absorvida quando em presença de D-sorbitol. O mesmo efeito
tem sido descrito para a vitamina B|2, em elevadas concentrações orais (l mg). Já, porém, com fraca
posologia de B|2 parece que o sorbitol desempenharia acção retardadora da absorção intestinal.
O EDTA parece aumentar de um modo geral a absorção dos fármacos, pois captando o cálcio
presente nas membranas torna maior o diâmetro dos poros ou incre-
513

menta os espaços existentes entre as células. Um outro método de incrementar a absorção consiste em
empregar misturas eutéticas. Com efeito, se a um composto pouco solúvel for adicionada uma
substância hidrossolúvel que com ele origine um eutctico é de esperar que se exalte a solubilidade do
primeiro produto, pois parece que ao absorver-se o segundo, aquele fica dividido em partículas
muito pequenas e, por isso, mais rapidamente susceptíveis de se dissolverem. O sulfatiazol ou o
acetaminofeno com a ureia constituem eutéticos que satisfazem ao que referimos. O mesmo sucede
com a associação de reserpina ou de sulfatiazol à PVP já que há formação de um coprecipi-tado que
é mais solúvel na água.
A nifedipina, fármaco muito pouco solúvel na água, melhora a sua solubilidade e a sua
biodisponibilidade quando associada à PVP. Nós própios melhorámos a sua solubilidade c
biodisponibilidade utilizando-a em mistura com o manitol.
A adição de agentes tensioactivos às substâncias medicamentosas pode facilitar a sua
absorção.Os tarmacos, lomando-se molháveis pela acção do tensioactivo, contactam mais facilmente
com os sucos digestivos, o que facilita a sua dispersão. Assim, não só as suspensões ou emulsões O/A
para o uso oral, mas os comprimidos, as cápsulas e os pós podem conter agentes que ocasionem
diminuição da tensão superficial.
O efeito dos tensioactivos na absorção intestinal é conhecido desde longa dala alravés do que
se passa com o metabolismo das gorduras. Efectivamente, estas, depois de saponificadas pelas
lipases, libertam ácidos gordos, cuja dispersão sob a forma de emulsão O/A e conseguida à custa dos
sais biliares que funcionam como emulgentes. Neste princípio fisiológico se baseia a associação de
substâncias tensioactivas a fármacos de tipo gordo, como as vitaminas lipossolúveis. A vitamina A,
por exemplo, é melhor absorvida por via gastro-intestinal quando em presença de emulgentes do tipo
O/A.
A adição de tensioactivos poderá ser prejudicial em certos casos, designadamente quando o
fármaco seja destruído pela acidez do suco gástrico, pois havendo mais íntimo contacto entre a
droga e o ácido clorídrico a alteração é também mais fácil. Inversamente, a adição de susbstâncias
hidrófobas a um fármaco retarda a sua molha-bilidade e, subsequentemente, a absorção gastro-
intestinal. É bem conhecido, por exemplo, o que se passa com alguns comprimidos que contêm
apreciável quantidade de estearato de magnésio, composto hidrófobo, como lubrificante: a absorção
é susceptível de se prolongar de tal modo que os comprimidos apresentem uma acção retarda ou
sustentada como muitas vezes se diz. DONAL.D SORBY e GACE Liu verificaram que as misturas
antidiarreicas contendo substâncias do tipo da atapulgite retardam a absorção gastro-intestinal de
compostos aminados, como a promazina.
A absorção lenta é desejada algumas vezes. Quando o período de semivida biológica do íarmaco é
muito pequeno, isto é, elevada a sua velocidade de eliminação, pode pretender-se que ele seja
absorvido lentamente, numa taxa constante, de modo que se assegure o nível terapêutico sanguíneo
por várias horas. Atendendo a que as liga-
514

coes de muitos fármacos com compostos macromoleculares originam complexos, dos quais o
fármaco só é absorvido depois de libertado de tais combinações, tem sido utilizadas resinas
trocadoras de iões, de elevado peso molecular, para fixarem as substâncias medicamentosas. Depois
de ingerido um medicamento, sob a forma de comprimido, por exemplo, o fármaco vai sendo
libertado lentamente do complexo para os sucos digestivos e só essa forma livre é absorvida. Deste
modo, conseguem-se, hoje, muitas preparações medicamentosas que, devido à progressiva e lenta
absorção a que dão origem, constituem formas farmacêuticas de acção prolongada (retardada ou sus-
tentada).
Certas macromoléculas não absorvíveis e electricamente carregadas podem, pelo contrário,
incrementar a taxa de absorção. Este aumento de absorção é devido ao efeito de DONNAN e ocorre
quando a macromolécula e a droga apresentam carga semelhante, possuindo a droga a capacidade
intrínseca de penetração na mucosa gastro-intestinal.
Representando as concentrações da droga, carregada negativamente, no plasma c no tracto
gastro-intestinal, por [D~] e [D~] , respectivamente, e admitindo que a concentração da
macromolécula, também com carga negativa, é [M \, teremos:

l+
[D-].,

o que traduz um aspecto da equação de DONNAN. Desta equação se verifica que logo
[D ]
que a concentração da macromolécula [M j, seja superior a zero, a relação ———— ",
[D]
K
é maior do que a unidade, o que prova que o efeito da macromolécula é favorecer a passagem do
lúmen intestinal para o sangue.
Exemplificaremos numericamente o que se disse, admitindo que desejávamos saber a relação
provável entre a concentração gastro-intestinal de bcnzilpcnicilina sódica a que se associou
carboxímetilcelulose sódica. São duas drogas tipicamente aniónicas e pelo que se escreveu a
macromolécula de CMC deverá incentivar a absorção da penicilina. Suponhamos que a
administração oral correspondeu a uma concentração de 4 x l (H mole/1 de benzilpenicilina sódica
com 12 x IO"3 mole/litro de carboximetilcelulose. Aplicando a fórmula antecedente virá

[D-JP / 12 x

[D-]t 4 x

o que significa que deverá existir uma relação de 2:1, entre a quantidade de antibiótico existente no
plasma e no tracto gastro-intestinal.
515

4.3.3.2.4. Transformações no intestino

Já vimos atrás que muitos fármacos são absorvidos no eslado de combinações com substâncias
presentes na mucosa. Compostos, como os barbitúricos, que são pouco solúveis em água e
dificilmente dispersíveis, combinam-sc com as proteínas do tecido mucoso e formam complexos
hidrossolúveis.
Este género de bioconjugação é frequente, podendo apontar-se, entre outros casos, a ligação
com o ácido glicurónico. Até há pouco í empo admitía-se que a formação de glicurónidos se
processava exclusivamente no fígado e nos rins. Hoje, sabe-se que muitos fármacos são conjugados com
o ácido glicurónico ao nível da mucosa gastro--intestinal. Entre eles, citamos a tiroxina e a tri-
iodotironina, que são transformadas em glicurónidos durante a absorção gastro-inteslinal.
Outras modificações são susceptíveis de se produzir no intestino, designadamente as
efectuadas por hidrólise. As substâncias de naíure/a proteica, como a insulina, as anlitoxinas, as
hormonas do lóbulo anterior da hipófise, ctc., são cindidas por hidrólise, originando
aminoácidos e peptídeos de menor peso molecular. Este facto impede o seu emprego por via gas-
tro-intestinal, já que o trânsito pelo tracto digestivo
ocasiona a sua destruição. ~ , . A
Cadeia
Cadeia / / \ longa3
curta / \ Esterificação
Nalguns casos, a hidrólise é, pelo contrário, Captação
necessária para que se promova a absorção do
fármaco. Já vimos o que se passa com as gorduras,
que são em pane absorvidas depois de hidroüsadas
nos seus elementos constitutivos (ácidos gordos e Secreção
glicerol). Com os ésleres do colesterol sucede um facto
semelhante. Na realidade,, cerca de 50% dos
triglicerídeos alimentares são absorvidos sob a
forma de monoglicerídeos pelas células da mucosa. para os
Quanto aos ácidos gordos libertados observa-se linfátic
igualmente excelente absorção se as suas moléculas Fig. 216.
são pequenas ( < l ü - 1 2
átomos de carbono) e então passam directamente das
células mucosas para a veia porta, já que sáo hidrossolúveis ou hidrodispersíveis. Os ácidos gordos
de longa cadeia são rodeados por um retículo endoplasmálico e formam os quilomicrons, os quais
deixam as células mucosas e penetram nos vasos linfáticos.
Na Fig. 216 esquematizam-se os fenómenos citados.
516

Alguns esteres do cloranfenicol, como o palmitato, são empregados por via oral. Para que o
antibiótico seja absorvido é necessário que o palmilato, que é menos solúvel do que o cloranfenicol
livre, seja saponifícado pelas esterases pancreáticas. Tem-se verificado que essa hidrólise só é
possível quando o palmitato de cloranfenicol se apresente no estado amorfo ou em agulhas
microcristalinas de 5 a 7 ^ de diâmetro. Se estiver presente uma quantidade de cristais tabulares
(forma polirmórfica A) superior a 10%, observa-se que os níveis plasmáticos de cloranfenicol são
substancialmente diminuídos. Isto cxp!ica-se pela rná dispersão dos cristais nos sucos digestivos,
que não têm, assim, capacidade de promover a hidrólise do palmitato. Como este não é directamente
absorvido pela mucosa, é necessário que seja saponifícado, previamente, pelas esterases, originando
cloranfenicol livre, já susceptível de absorção.

4.3.3.2.5. Modo de administração

Atendendo às circunstâncias que deixamos expressas precedentemente, considera-se que, em


média, um fármaco administrado por via gastro-intestinal atinge a concentração plasmática máxima
ao fim de 30 minutos a uma hora e meia após a ingestão. A absorção é mais rápida quando o
medicamento é administrado em jejum, com água. Há maior lentidão quando é ingerido com leite ou
com sopa, por exemplo. A ingestão com o estômago repleto, isto é, depois das refeições, ocasiona
absorção mais lenta. A absorção gastro-intestinal de muitas drogas é largamente afectada pela
presença de alimentos, havendo fármacos que nessas condições demoram mais tempo a passar à
corrente sanguínea, enquanto que com outros se incrementa a velocidade de absorção. Na Tabela
LU, adaptada de um trabalho de WELLINÜ, reportam-se diversos tipos de comportamento.
É particularmente curioso o facto de muitos medicamentos lipossolúveis melhorarem a sua
absorção quando administrados com dietas gordas. Tal facto foi referido pela primeira vez a
propósito da griseofulvina que se verificou originar níveis séricos muito mais altos quando ingerida
juntamente com gorduras do que quando administrada em jejum ou em conjunto com substâncias
proteicas. Tem-se admitido várias explicações para este evento, que não é inédito com a
griseofulvina, as quais são relatadas por BÜRI e SANNIE (1980) numa interessante revisão de conjunto
(Buri, P. e Sannie, E. —
— Journée cTenseignement Post-Universitaire du 16 Murs 1980 — Institute Gilkinet, Liège, 1980):
— os lípidos podem desempenhar o papel de simples dissolventes de compostos pouco ou nada
hidrossolúveis; — os ácidos gordos presentes aumentam a permeabilidade das membranas; —
libertação de colecistoquinina, o que provocaria a contracção da vesícula biliar e a secreção de
lipases pelo suco pancreático, originando-
-se uma pseudo-solução constituída por micelas que podem atravessar as células epite-liais da
mucosa intestinal.
517

Tabela LM. Fármacos que sofrem alterações da absorção gastro-intestinal


em presença de alimentos
Grupo l Grupo U Grupo III Grupo IV
(Redução (Demora (Não há variação (Aumento
da absorção) da absorção) da absorção) da absorção)
Várias eritromicinas Várias cefalosporinas Várias penicilinas Ciclacilina
Várias penicilinas Várias sulfamidas como amoxici- Diazepam
Várias tetraciclinas Paracetamol lina Dicumarol
Antipirina Cimetidine Cefradina Griseofulvina
Aspirina Furosemida Metromidazol 8-metoxaleno
Álcool Digoxina Oxazepam Nitrofurantoína
Isoniazida Eriiromicina Prednisona Propanolol
Levodopa Teofilina Riboflavina
Rifampicilina Espiramicina Hetacilina
Teofilina

Adapladu de P. WKLLJNO — Phannacy Int., l, 14, 1980

De um modo geral, os líquidos quentes favorecem a absorção, recomendando-se o seu emprego


quando se administram, por exemplo, barbitúricos ou anti-histamínicos.

4.3.4. ADMINISTRAÇÃO RECTAL

O recto constitui a porção menos flexuosa do intestino grosso, estendendo-se desde a altura
correspondente à terceira vértebra sagrada até ao ânus. O seu comprimento oscila entre 12 e 15
centímetros, podendo ser consideradas duas porções anátomo-his-tologicamente diferenciadas: o
recto pélvico e o recto perineal. O primeiro é, pelas suas características, a verdadeira terminação do
intestino grosso. Constitui a chamada ampola rectal, que é a porção mais volumosa e exlensa.
O recto perineal (canal anal) é a secção que continua a ampola rectal para o exterior,
apresentando cerca de 2 a 3 centímetros de comprimento e sendo mais estreito e fixo do que esta.
A histologia do recto pélvico mostra as mesmas túnicas constitutivas do intestino: serosa (em
parte da sua extensão), muscular, submucosa e mucosa (com o seu epitélio, córion e muscularis
mucosae}.
A assentada epitelial é particularmente rica em células caliciformes, elementos mucíparos que
lhe conferem acentuada diferença em relação à mucosa do intestino delgado.
Se bem que o epitélio do intestino grosso se não destine, fundamentalmente, à absorção
fisiológica, observa-se, porém, que o recto constitui uma boa v i a de absorção. Efectivamente, o
sangue do recto é drenado pelas veias hemorroidais, distribuídas em
518

três grupos distintos: a) veias hemorroidais superiores, que se ligam à veia poita hepática e se
distribuem pela ampola rectal; b) veias hemorroidais médias, que recebem, também, ramos
ampolares e confluem na veia cava inferior; c) veias hemorroidais inferiores, que comunicam
igualmente com a veia cava e se distribuem na região anal. Todavia, da parte mais elevada da região
anal partem vasos que se lançam nas hemorroidais superiores.
A circulação linfática desta região é formada por redes nascidas na mucosa e submucosa
donde resultam vasos que se dirigem ao canal torácico que, por seu turno, se abre na confluência
das veias subclávia e jugular interna esquerdas.
Na Fig. 217 mostram-se, em esquema, as alulidas relações.

Veia Jugular Direita


Veia Subclávia
Direita
Veia Cava
Superior

.. Canal
Toráci

Veia Cava Inferior -

Veia Ilíaca

Primitiva Veia

Veia Hemorroidal Média


Veias Hemorroidats

Veia Jugular
Esquerda Veia
Subclávia Esquerda
* * - • - - Gãnglioa
Inguinais > •

Fig. 217. Esquema da circulação rectal


519

4.3.4.1. Absorção

Em face da topografia vascular e linfática apresentada pelo recto é de prever que a maior
parte dos fármacos aí absorvidos passe directamente ao fígado, através da circulação portal.
Admitindo, porém, que alguma substância medicamentosa seja absorvida pelas hemorroidais médias
e pêlos canais linfáticos, pode pensar-se que essa

porção do fármaco escape à acção directa do fígado. Quanto às hemorroidais inferiores, parece que
não interessam, em razão da sua localização, ao processo de absorção.
Estas conclusões apresentam muito interesse quanto ao destino dos farmacos por via rectal e
quanto à importância desta via, comparada com a gastro-intestinal.
Durante vários anos pensou-se que a via rectal ofereceria nítidas vantagens sobre a oral. uma
vez que se admitia que os farmacos absorvidos na ampola rectal escapavam às modificações sobre
eles exercidas pelo fígado. Dizia-se, assim, que os farmacos escapavam à barreira hepática. Tal facto
poder-se-ia revestir de imenso interesse, porquanto muitas das substâncias sào transformadas no
fígado, modificando-se a sua actividade farmacológica. Sc bem que esta vantagem não seja
actualmente considerada como inteiramente válida j 1 ), outras há, mais consistentes, que se podem
resumir do seguinte modo:

— um medicamento introduzido no recto não sofre as transformações químicas devidas ao


contacto com os sucos digestivos;
— possibilidade de administração de produtos mal suportados por via oral. em razào das
propriedades eméticas ou irritantes gástricas que eventualmente apresentam ou, mais
simplesmente, pelo mau sabor ou cheiro de que sejam dotados;
— facilidade de administração, especialmente cm pediatria ou em geriatria;
— substituição da via parenlérica, quando a administração oral esteja contra-indi-cada ou
inacessível (alteração do mecanismo de deglutição).

Quando se compara a absorção rectal dos farmacos com a reali/ada ao nível da mucosa gastro-
intcstínal, verifica-se que a primeira não é inferior à segunda. B L C H I afirma mesmo que a absorção
por via rectal é, ordinariamente, mais rápida e completa do q ue por via oral. De facto, a
permanência dos medicamentos no estômago e as eventuais alterações químicas sofridas explicam,
em certa medida, o conceito formulado. Esta opinião não é partilhada por todos os autores, havendo
alguns que chegam a recomendar que as posologias por via rectal sejam superiores às habitualmente
estatuídas para administração oral (os excipientes dos medicamentos utilizados naquela via «ai a
pelariam» as mucosas com uma película viscosa, que dificultaria a absorção l.
Apesar das divergências assinaladas, é mais geral o conceito de que a via rectal possa
substituir a via gastro-intestinal para iguais quantidades de fármaco, aceitando-se que a absorção
seja, inicialmente, mais rápida. Por outras palavras, obtêm-se níveis sanguíneos comparáveis em
menor período de tempo quando a droga é administrada por via rectal, o que não significa que a taxa
de absorção seja forçosamente também mais

f l ) BITIIER assegura que cerca de 50% de um fármaco, administrado por via rectal, passam
directamente à circulação geral, escapando à barreira hepática (absorção pelas veias hemorroidais
médias).
520

elevada. Por motivos da acção irritativa exercida pêlos farmacos sobre a mucosa do recto é mesmo
aconselhável que a quantidade de substância medicamentosa administrada não ultrapasse os 4(H) a
500 mg, de uma só vez.
Quando se compara a via rectal com a via parenteral (intramuscular e hipodér-mica), o
problema, já de si complicado ao considerar-se isoladamente cada via, assume aspectos de grande
complexidade. Efectivamente, pode acontecer que a via rectal proporcione uma mais rápida
absorção, especialmente quando comparada com a absorção de medicamentos injectáveis oleosos. No
que diz respeito, porém, à taxa do fármaco absorvido, parece que, regra geral, a via parenteral
proporciona níveis plasmáticos medicamentosos mais elevados. Contudo, RENÉ FABRE e colaboradores,
ao compararem as diversas vias de administração, demonstraram que a sulfanilamida era absorvida,
em cães, numa taxa que diminuía pela ordem seguinte: via intraperitoneal, oral, rectal e
intramuscular. Estes resultados, como muitos outros aparentemente discordantes do conceito
generalizado, podem ser explicados pelas diferenças de veículos utilizados nas várias administrações
e, principalmente, por ser sempre difícil e perigoso extrapolar, para o homem, resultados obtidos com
animais de experiência.
É enorme a gama de compostos terapêuticos que se administram por via rectal. Os digitálicos,
alcalóides, barbitúricos, antitússicos, antibióticos, dilatadores coronários, hipnóticos, etc., constituem um
pálido exemplo da importância de que se reveste esta via.
Os factores dominantes na absorção rectal são essencialmente idênticos aos que regulam a
absorção por outras mucosas. Assim, o coeficiente de partilha óleo/água da porção indissociada da
molécula do fármaco e o seu grau de ionização constituem as principais propriedades que regulam a
velocidade e a taxa de absorção.
O pH do líquido da ampola rectal oscila entre 6,8-7,2, apresentando muilo pequena capacidade
tampão. Por este facto, os farmacos dissolvidos no líquido rectal modificam, mais ou menos
profundamente, o pH, consoante a sua natureza e o seu grau de dissociação. Deste modo, os ácidos e
bases fracos são mais rapidamente absorvidos do que os compostos altamente ionizáveis. SHANKER
demonstrou, por exemplo, que os farmacos que se comportam como ácidos são absorvidos mais
facilmente quando o pH do conteúdo rectal se torna propositadamente mais baixo. Os electrólitos
orgânicos fracos, que sejam facilmente solúveis nos óleos, são também absorvidos com rapidez.
As taxas e velocidades de absorção rectal de várias suifamidas foram estudadas em ratos por
KAKEMI e colaboradores. Observaram que as formas não ionizadas eram mais prontamente
absorvidas e que as suifamidas peneiravam melhor na mucosa rectal de que as lipo-insolúveis.
Verificaram, também, existir uma barreira ligeiramente ácida na zona recto-plasmática e que o pH do
medicamento influenciava largamente a absorção. Tudo leva a crer, portanto, que a absorção rectal é
efectuada por transporte passivo e subsequentemente influenciada, como a gastro-íntestinal, pela
velocidade de difusão e pela lipossolubilídade do fármaco.
521

4.3.4.1.1. Excipientes

A absorção dos fármacos por via rectr' não pode, porém, ser considerada indepen
dentemente dos excipientes ou veículos utilizados. Os supositórios, os recto-tampões e
os enemas e microenemas constituem as formas farmacêuticas empregadas por esta via.
Nelas utilizam-se excipientes sólidos (oleossolúveis ou hidromiscíveis), como nos supo
sitórios c rccto-tampões, ou líquidos, no caso dos enemas.
Quando o fármaco é administrado sob a forma de supositório com excipiente oleossolúvel é
necessário que este funda, originando emulsões ou pseudo-emulsões no líquido rectal. Se a substância
medicamentosa for incorporada cm supositórios de excipiente hidromiscível ou em recto-tampões
haverá, pelo contrário, formação de uma solução ou pseudo-solução com o líquido da ampola rectal,
não sendo preciso que se verifique a fusão do excipiente. Quando se trate de enemas ou de
microenemas, o veículo medicamentoso é constituído por água, glicóis vários, como a glicerina, ou
por óleos. Nestes líquidos o fármaco encontrar-se-á dissolvido, suspenso ou emulsionado.
A velocidade de difusão do fármaco do excipiente para a mucosa limita, como se compreende, a
velocidade de absorção. A tenuidade das partículas da substância medicamentosa, a sua solubilidade
no excipiente e, ainda, a eventual tendência do fármaco para formar complexos com os agentes
tensíoactivos presentes, são factores de enorme importância.
ALLAWALLA e RIEGELMAN estudaram estas influências, designadamente a facilidade do fármaco originar
soluções saturadas no líquido rectal, à medida que abandona o veículo medicamentoso. Assim, se
uma droga administrada em supositórios de manteiga de cacau for muito oleossolúvel e estiver
presente em pequena quantidade nos supositórios, terá fraca tendência para se dispersar no líquido
rectal. Pelo contrário, esta repartição será mais fácil se o fármaco for dificilmente solúvel no
excipiente e nele estiver presente em quantidades correspondentes à saturação.
Do mesmo modo que deixámos dito para a absorção gastro-intestinal, a elevada viscosidade dos
veículos, designadamente dos excipientes à temperatura do corpo, dificulta a absorção.
A presença de agentes tensioactivos pode ser favorável ou desfavorável à absorção rectal,
consoante os casos. Assim, a absorção do iodeto de sódio é acelerada pela presença do polissorbato
20 ou do sulfato de laurilo e sódio que retardam, porém, a penetração rectal do iodofórmio c do
triiodofenol. Este diverso comportamento é devido à complexação dos dois últimos fármacos pelas
micelas dos emulgentes, ao contrário do que sucede com o iodeto de sódio, que apenas beneficia da
sua presença (maior superfície de contacto entre o fármaco e a mucosa e acção peptizante exercida
sobre a mucosa pelo tensioactivo).
O mencionado tipo de interacção consiste na complexaçào dos fármacos pelas micelas dos
emulgentes. Como estas são demasiado volumosas, não podem passar
522

através das membranas porosas e, portanto, o complexo também não é susceptível de


ser absorvido.
A formação de micelas, porém, só se produz quando a concentração do agente tensioactivo
excede um determinado valor (concentração crítica micelar). Assim se compreende que o mesmo
tensioactivo possa exercer efeito positivo ou negativo na absorção, consoante a concentração em que
se encontra. Em concentrações inferiores à concentração crítica micelar aumenta a absorção, por ser
igualmente aumentado o contacto entre o fármaco e a mucosa.
Acima da concentração crítica micelar parte do tensioactivo originará micelas que podem
complexar o fármaco, retardando a absorção.
A Fig. 218, retirada de um trabalho de KAKEMI et ai., ilustra as absorções rectais do
sulfisoxazol em presença de diversas concentrações de polissorbato 80.

10 20 30
% de polissorbato

Fig. 218. Efeito da concentração de polissorbato 80 nos níveis sanguíneos obtidos com o
sulfisoxasol por via rectal
Segundo Kakemi et ai. — Chem. Pharm. Buli. (Tokyo), 13, 976 (1965)

Paralelamente com o fenómeno relatado não deve ser esquecido o facto de alguns tensioactivos aniónicos
poderem formar precipitados com fármacos catiónicos, do mesmo modo que os tensioactivos catiónicos poderão
reagir com drogas aniónicas. Os compostos insolúveis formados são muitas vezes inabsorvíveis, razão por que
se deve evitar esta incompatibilidade na prática farmacêutica.
523

Por último, chamamos a atenção para a importância de que se reveste a escolha


do tensioactivo adequado, pois, além das limitações citadas, a absorção pode ser favo
recida especificamente por um dado tensioactivo ou retardada por outro, quimicamente
muito semelhante.

4.3.4.1.2. Cinética da absorção

Convimos, portanto, que a absorção rectal está dependente de vários parâmetros. A


sua cinética tem sido estudada especialmente por RIEGELMAN e CROWELI, que demons
traram a semelhança entre a absorção pelo recto e pêlos cólons. É, porém, pertinente
chamar a atenção para a diferença entre a administração de um enema e de um supo
sitório ou de um microenema. No primeiro caso, a área de aplicação do medicamento
é muito maior do que quando se administram supositórios ou microenemas, uma vez
que estes só contactam com a ampola rectal. A absorção pelo cólon ou pelo recto
pélvico processa-se, porém, em moldes semelhantes. Pode dizer-se que a difusão do
fármaco do excipiente ou veículo para a mucosa obedece às leis da difusão radial.
Efectivamente, uma porção do cólon ou a ampola rectal podem ser considerados como
cilindros ocos, de extremos tapados, onde os fármacos se difundem unicamente em
direcção radial. - '- ,
RIEGELMAN e CROWELL, baseados neste princípio, estudaram, em ratos, a cinética de absorção de
compostos marcados com 131I. Os seus estudos que, diga-se de passagem, têm servido para alicerçar

as investigações subsequentes de outros autores, conduziram à conclusão de que a absorção rectal


corresponde a uma reacção de pseudo-primeira ordem:

Kt
hg (N~Nf) = hg (No- N ) - ————
2,303

em que: '"', : t

N = dose detectada por uma cintilador no tempo í; .-.'• .


N. = dose detectada pelo cintilador no fim da experiência;
No = dose total administrada;
K = velocidade específica da reacção.

A constante específica da equação traduz a velocidade de absorção dos compostos e depende,


como facilmente se deduz, de vários factores, designadamente da difusão e da fórmula utilizada.
524

.•;-, 4.3.4.1.3. Solubilidade relativa dos fármacos e excipientes

Postas estas generalidades, vejamos qual é, habitualmente, o comportamento de um


medicamento aplicado na mucosa rectal, tendo em atenção simultaneamente o fármaco e os
excipientes utilizados.
ALBUQUERQUE, na sua tese de doutoramento subordinada ao título «Administração de fármacos
por via rectal», tira algumas conclusões inteiramente pertinentes quanto à absorção das drogas pela
mucosa do recto, consoante a natureza do veículo em que se administram. Assim, a absorção é, cm
geral, mais rápida quando se usam soluções ou suspensões aquosas dos fármacos. A substituição da
água por óleos fluidos, como o azeite, retarda a absorção, essencialmente quando a droga se
encontra presente em pequena quantidade, estando longe de atingir a saturação do veículo. No caso
dos supositórios, obscrvou-se incremento de absorção quando os fármacos hidrossolúveis são
administrados em excipientes hidrófobos, como a manteiga de cacau; pelo contrário a absorção é
retardada se o fármaco hidrossolúvel se incorpora num excipiente miscível ou solúvel na água; os
excipientes mucilaginosos, como os polissorbatos, originam uma cadência lenta, geralmente
imperfeita (efeito micelar); os compostos hidro-insolúveis são melhor absorvidos em veículos oleosos
líquidos, como o azeite, do que em excipientes hidrófobos, não emulsivos.
Dos elementos que acabámos de expor, podemos tirar as seguintes ilações:

a) Quando se pretende uma rápida acção medicamentosa sistémica, deverá recor-:; " rer-se a um
excipiente gordo hidrófobo no qual o fármaco seja insolúvel e possa incorporar-se em suspensão;
b) se se requer absorção mais lenta, deverá eleger-se um excipiente gordo dotado
de certa hidrofobia, no qual o fármaco se não dissolva; r) a incorporação de fármacos
oleossolúveis em excipientes gordos hidrófobos
retarda a absorção;
d) a absorção de fármacos incorporados em excipientes hidrossolúveis ou hidro-miscíveis é,
regra geral, mais lenta do que quando administrados em excipientes gordos;
e) a presença de agentes tensioactivos numa medicação rectal pode ter o efeito de acelerar ou
retardar a absorção, tudo dependendo da sua quantidade e das incompatibilidades a que
pode dar origem.

4.3.4.2. Acção tópica

A administração rectal, além de constituir uma boa via para absorção sistémica dos
medicamentos, também pode servir para estimular o reflexo da defecação por acção irritante sobre a
mucosa ou destinar-se à aplicação tópica de medicamentos, regra geral anti-inflamatórios.
525

A fim de promover o reflexo da defecção cmpregam-se supositórios, como os de glicerina-


gelatinada, ou os de sabões com glicerina
Como medicações tópicas curativas da mucosa rectal têm sido utilizados fármacos anti-
inflamatórios, como a hidrocortisona, adstringentes, como os taninos, drogas possuidoras de acção
vitamínica P, etc. Os supositórios e algumas pomadas anti-hemor-roídárias constituem exemplo
destas medicações. Algumas vezes utilizam-se anestésicos locais, como a novocaína, e potentes
vasoconstritores, como a levorrenina. Do mesmo tipo são ainda alguns enemas cuja acção tópica é
meramente rectal.
Como a medicação tópica se destina a permanecer na mucosa sem que o fármaco seja
absorvido para a corrente circulatória, é também conveniente que o excipiente escolhido seja dotado
de alta viscosidade. Por outro lado, deve-se ter aqui bem presente toda a mecânica de absorção,
procurando agora diminuir a sua velocidade pelo conhecimento dos factores que nela interferem.
Por último, é conveniente ter em atenção a sensibilidade individual da mucosa do
recto, especialmente nas proctites, e levar em consideração que muitos pacientes não
retêm facilmente o medicamento, por este lhes produzir uma sensação análoga à neces
sidade de defecação.

4.3.4.3. Acção tópica e absorção pêlos cólons

Já dissemos que a absorção pêlos cólons se processava de modo semelhante à absorção rectal.
Quando, por via rectal, se administra um elevado volume de líquido (injecção rectal, enema ou
clister), esse líquido penetra nos cólons, espalhando-se, em função do seu volume, por uma zona
mais ou menos extensa do intestino grosso.
Os enemas podem destinar-se a uma acção meramente local ou a conter substâncias que devam
ser absorvidas. Os enemas de acção local podem ser evacuantes ou purgativos (água, soluções de
sabão, de sulfato de magnésio, de glicerina; infusões de sene; óleos; emulsões oleosas e de
parafinas; etc.), anti-helmínticos, emolientes, adstringentes, carminativos, etc,, ou destinarem-se a
exame radiológico dos cólons (clisteres opacos).
Os enemas podem ainda ter como finalidade uma absorção sistémica dos fármacos neles
contidos. Neste tipo de medicação podem ser considerados enemas alimentares com base em glicose,
leite, peptona, gema de ovo, etc. A sua utilização tem sido feita em doentes com obstrução das vias
digestivas superiores.
Os clisteres contendo hipnóticos, como o hidrato de cloral, ou anti-espasmódicos, como solução
aquosa de valerato de amónio, também se têm utilizado como medicação sistémica.
Não podemos terminar este subcapítulo sem chamar a atenção para o facto dos microenemas,
cujos volumes estão compreendidos entre l e 10 ml, actuarem em zona
526

diferente do intestino grosso. Efectivamente, estas preparações, também conhecidas por micro-
clismas, destinam-se a desenvolverem o seu efeito medicamentoso na ampola rectal e, por isso, as
considerámos em conjunto com os supositórios e recto-tampões.

4.3.5. ADMINISTRAÇÃO NASAL

A mucosa nasal constitui uma superfície de administração, tanto para medicamentos de acção
tópica (anti-infccciosos, vasoconstritores, antícongestivos), como de acção geral. Entretanto, pode
dizer-se que, na maioria das vezes, a administração nasal se destina a efeitos locais, finalidade que
exige boa penetrabilidade medicamentosa, sem que, contudo, interesse a absorção sistémica dos
fármacos.

4.3.5.1. Histologia e fisiologia

As fossas nasais são revestidas, na sua maior extensão, por uma mucosa de tipo respiratório,
constituída por epitélio pseudo-estratificado, cilíndrico, vibrátil.
A abertura exterior das fossas nasais é coberta por pele, que apresenta numerosas glândulas
sebáceas e pêlos. Segue-se-lhe uma zona de transição, sem camada de que-ratina, pêlos ou glândulas
e, por último, surge a mucosa nasal respiratória, também chamada pituitária. Esta mucosa, que nos
interessa considerar do ponto de vista da administração dos medicamentos, reveste os cornetos e os
seios nasais. A porção de tecido que cobre estes últimos é formada por epitélio cilíndrico simples,
enquanto que a mucosa que reveste os cornetos é constituída, externamente, por epitélio ciliado, com
numerosas células do tipo caliciforme. As células ciliadas são, habitualmente, bastante altas e têm a
sua parte profunda afilada num pé terminal, que contacta com o córion.
O córion, que é muito rico em fibras elásticas, apresenta diversas infiltrações linfocitárias e
numerosas glândulas túbulo-acinosas. Fortemente irrigado por vasos sanguíneos, mostra uma extensa
rede capilar entre as artérias e as veias. Estas, que são rodeadas por uma camada muscular e
ligadas entre si por fibras lisas, constituem um plexo facilmente contráctil. Quando este plexo se
contrai, o sangue é esvaziado, havendo, em contrapartida, turgescência sempre que se dilata. Esta
circunstância é de capital interesse quanto à acção dos fármacos, explicando, também, a facilidade
das epistaxes, uma vez que a rede capilar é muito abundante.
À pituitária segue-se, imediatamente, para o lado da faringe, a nasofaringe, também designada
por rinofaringe, cuja mucosa está, igualmente, interessada na acção dos medicamentos aplicados por
via nasal.
A mucosa nasal respiratória, em virtude da actividade das suas células, está revestida de uma
película de muco que se desloca continuamente no sentido da faringe pela agitação dos cílios
vibráteis. Admite-se que o movimento ciliar é comandado por via
527

nervosa, tendo BURN demonstrado que a acetilcolina é produzida localmente. Baixas concentrações
de inibidores das colinesterases aceleram o movimento ciliar, enquanto que elevadas quantidades
daquelas substâncias provocam diminuição dos movimentos vibratórios dos cílios.
O muco nasal apresenta-se como um produto moderadamente viscoso (cerca de 6 vezes a
viscosidade do muco gástrico) e com comportamento pseudo-plástico. É de natureza proteica, sendo
constituído pela associação de compostos formados por cadeias de amino-açúcares e ácidos
glicurónicos, ligados a moléculas polipeptídicas.
A viscosidade do muco nasal é um dos factores mais importantes no que diz respeito ao
movimento ciliar. Efectivamente, se é demasiado fluido ou exageradamente espesso, os cílios não
poderão remover a película que se forma à superfície do epitélio. Admite-se, mesmo, que cerca de
20% dos casos clínicos de afecções nasais são devidos, em última análise, a um aumento da
viscosidade do muco, o que origina a secura do epitélio.
São frequentes as condições climáticas, medicamentosas e acidentais que levam à variação da
viscosidade do muco nasal. Entre elas, lembramos a temperatura e o grau higrométrico do ar, as
poeiras, as invasões por vírus e as medicações gerais, como as do tipo atropínico.
A secreção da mucosa nasal tem reacção ligeiramente ácida (pH entre 5,5 e 6,5), sendo
influente, neste valor, a acção local do anídrido carbónico. O ar frio origina, normalmente, a subida
do pH do muco, enquanto que o ar quente o acidifica. As constipações, as rinites alérgicas e as
sinusites produzem ligeira alcalinização.
Estas fáceis variações do pH do muco nasal devem-se à fraca capacidade tampão que aquele
apresenta. Por isso, a administração de drogas não tamponadas, a pH 9,5, altera a acidez nasal,
pelo período de algumas horas; a aplicação de soluções ácidas (pH < 5) acidifica o muco,
mantendo-se essa acidez por algum tempo. Compreende-se que estas alterações do pH normal do
muco não sejam desejáveis, pois podem levar ao aparecimento de afecções nasais, provenientes da
lesão da mucosa.
Se bem que a tonicidade do muco nasal não esteja rigorosamente determinada, admite-se que o
funcionamento ciliar é mais perfeito quando os medicamentos aquosos, aplicados na mucosa, sejam
isotónicos como o soro sanguíneo. Entretanto, tal como acontece com os glóbulos rubros, há limites
de tolerância para as soluções hipo ou hipertónicas, sendo estas últimas menos prejudiciais. A água
destilada inibe o movimento ciliar. A actividade ciliar cessa, também, quando se apliquem na mucosa
soluções de cloreto de sódio de concentração superior a 4% ou inferior a 0,3%.
O muco nasal desempenha, entre outras funções, um papel protector. Funciona como uma
barreira que defende a mucosa das agressões externas. Por outro lado, a mucosa respiratória nasal
íntegra não constitui uma boa via de eliminação. Em condições normais, um fármaco administrado
por via endovenosa não se elimina pelo muco nasal, o que pode, porém, não suceder em doentes
portadores de rinite aguda ou de sinusite. Efectivamente, experiências realizadas por INGELSTEDT e
IVSTAM demonstram
528

que a fluoresceína injectada por via endovenosa não comunica fluorescência ao muco
nasal de indivíduos sãos, ao contrário do que sucede com a sua saliva, sucos digestivos
e humor aquoso,

4.3.5.2. Absorção

A fácil administração medicamentosa por via nasal e a extensa vascularização da mucosa


levam à sua utilização como via de absorção de alguns fármacos. • -íí-ï De uma maneira geral,
a absorção nasal processa-se nos mesmos moldes que a absorção por outras mucosas. Vários
fármacos em solução aquosa aí aplicados passam rapidamente ao sangue e distribuem-se pelo
organismo. O iodeto de potássio e o
salicilato de sódio são absorvidos com tal
velocidade que se identificaram, na urina, cerca de
20 minutos após administração (experiências
feitas em coelhos). O amoníaco também é
100. absorvido, rapidamente, por via nasal.
Certos alcalóides parassimpati-colíticos,
como a atropina e a escopola-mina, sob a forma
de sais hidrossolúveis, são absorvidos com
apreciável velocidade pela mucosa nasal. TONNDORF e
colaboradores executaram um estudo comparativo
da absorção da escopolamina por várias vias de
administração (subcutânea, oral e nasal), lendo
O 15 30 60 90 120 servido, como critério de controlo, a dminuição da
Tempo em minutos secreção salivar dos pacientes. Os resultados
Fig. 219. Taxa de absorção de escopolamina a 0,65%, obtidos, que são ilustrados na Fig. 219,
quando aplicada, no homem, por diversas vias de demonstram
administração e apreciada pela diminuição da secreção
salivar. A — injecção subcutânea; B — salivação normal; qua a via nasal é preferível à gastrointestinal e é
C — oral (cápsulas); D — oral (líquido); E — gotas nasais mais regular do que a subcutânea.
Segundo J. Tonndorf, R. Hyde, H. Chinn e J. Lett — Ann.
Otol. Rninol. and Laryngol., 62, 633 (1953)
A taxa de absorção dos medicamentos
aplicados por via nasal é
dependente do grau de divisão do fármaco e do tipo de medicamento utilizado. Assim, as substâncias
coloidais são mais lentamente absorvidas do que os compostos aplicados no estado de divisão
molecular (soluções). De um modo geral, os colóides, cujas micelas tenham carga eléctrica negativa,
penetram mais lentamente, pois são retidos pelo sistema retículo-endotelial. É o que sucede com os
vermelhos de tripano e do Congo.
529

As soluções aquosas dos fármacos, aplicadas em gotas, dão, normalmente, melhor absorção do
que outras formulações. É o que acontece à escopolamina, que administrada em dispersão origina
níveis sanguíneos inferiores aos conseguidos com soluções tendo como veículo a água.
A adição de agentes tensioactivos, judiciosamente escolhidos, incrementa a velocidade de absorção.
Entre eles verifica-se que o sulfato de laurilo e sódio e o dioctil-sulfossuccinato de sódio, ambos
aniónicos, não são nocivos para os cílios, quando em pequena concentração. Quantidades desses
agentes até 0,01% não provocam qualquer dano e incrementam a absorção dos fármacos associados.
Contudo, têm-se descrito casos de irritação da membrana mucosa quando nela se aplicam
medicamentos contendo 0,05% de sulfato de laurilo e sódio. Por seu turno, os compostos
tensioactivos não iónicos, como os polis sor batos, são bem tolerados, mesmo em concentração
elevada. Quanto aos detergentes catiónicos, do tipo do cloreto de benzalcónio, aconselha--se o seu
uso em concentrações que não ultrapassem 1:1000.
Além das soluções aquosas que se aplicam em gotas nasais, são empregadas dispersões
medicamentosas de fase dispersante líquida ou gasosa. As inalações de hormonas do lóbulo posterior
da hipófise e de insulina constituem exemplos deste tipo de medicação nasal. A vitamina B12 tem,
igualmente, sido empregada em soluções aquosas ou em pó diluído com lactose, que se dispersam na
mucosa. Nos casos citados, a via de absorção nasal é preferível à gastro-intestinal, já que as
hormonas proteicas, como a ocitocina e a insulina, seriam destruídas pêlos sucos digestivos e a
vitamina B12 necessita da presença ao factor intrínseco para que seja absorvida pela mucosa do
intestino. N. BORGLIN, por seu turno, observou que a acção farmacológica da ocitocina, por via nasal,
é quase quantitativamente idêntica à conseguida por via endovenosa. Nos últimos anos têm-se,
também, ensaiado contraceptivos aplicados por via nasal, havendo estudos feitos nesse sentido por
orientação da Organização Mundial de Saúde.

4.3.5.3. Acção tópica

A mucosa nasal é, preferentemente, utilizada para aplicação tópica de medicamentos. Regra


geral, pretendem-se acções anticongestivas, vasoconstritoras ou desinfectantes da mucosa. Uma
apreciável gama de tópicos nasais apresenta, mesmo, simultaneidade destas acções, não só por
associação de fármacos diferentes no medicamento, mas ainda porque, muitas vezes, um
vasoconstritor diminui as inflamações, etc.
O tratamento local e sintomático das diversas formas de rinite, melhorando as condições da
respiração nasal, não deve provocar lesões na mucosa e afectar os movimentos ciliares. Na prática
corrente, a desobstrução nasal consegue-se com o emprego de vasoconstritores adequados que
funcionam à semelhança da levorrenina. Entre eles são de citar a efedrina, a neo-sinefrina e outras
aminas aromáticas, ao lado de compostos derivados da naftilimidazolina.
530

A efedrina (0,5 a 3%) é talvez ainda hoje o fármaco mais utilizado como vaso-constritor nasal.
Sabe-se que a sua acção se assemelha à da adrenalina, sendo, porém, mais aconselhável do que esta
para aplicação tópica nasal. De facto, a efedrina tem uma acção mais duradoura, apresenta maior
estabilidade e não ocasiona hiperemia subsequente à acção descongestionante. O seu efeito
constritor nas arteríolas é menos marcado do que o da levorrenina, estando bloqueado o componente
vasodilatador. Tal efeito não se observa com a adrenalina, cuja administração nasal provoca
congestão da mucosa, após a vasoconstrição inicial. Como se compreende, esta hiperemia tardia da
mucosa e o edema secundário ligado à acção tópica da adrenalina podem provocar perturbações da
actividade ciliar e da produção do muco nasal.
Entre os fármacos anti-inflamatórios utilizados na mucosa nasal figuram os corti-costeróides,
sendo muito empregada a dexametasona a 0,02% que é mais potente do que a hidrocortisona e não
apresenta efeitos secundários. A prednisolona a 0,05% é também eficaz.
Como fármacos anti-infecciosos tópicos são empregados vários antibióticos bactericidas
(penicilina, estreptomicina, tirotricina, gramicidina, poliximina B, neomi-cina, etc.), embora se
reconheça que, pelo menos parcialmente, são absorvidos. Entre as substâncias anti-sépticas é ainda
de referir o timol, o eucaliptal e algumas essências, como o gomenol. Estes produtos podem ser
aplicados em pomadas ou em dispersões.
Neste grupo de compostos citamos ainda os lisózimas, que são elementos bacte-riolíticos
naturais dos tecidos e secreções, especialmente activos sobre a família das Coccaceae (Micrococcus,
Sarcina, Coccus), mas que actuam também sobre os bacilos patogénicos.
As sulfamidas, como o sulfatiazol e a sulfacetamida; a nitrofurazona, os derivados mercuriais
anti-sépticos, como o merfen, e os colóides de prata, como o argirol, são fármacos ainda
correntemente utilizados.
Por último, não queremos esquecer o emprego tópico de vários anti-histamínicos, já que muitas
das rinites observadas são de natureza alérgica. Anotemos, apenas, que pode haver absorção
acidental destes compostos, com subsequente aparecimento de efeitos secundários. Isto deve
constituir uma contra-indicação do seu uso em crianças de muito pouca idade.
..-..: Os medicamentos para administração tópica nasal são, normalmente, constituídos por soluções
aquosas que se aplicam em gotas ou em dispersão no seio de gases. Num número mais restrito de
casos, utilizam-se soluções oleosas ou pomadas de excipiente gordo ou hidromiscível.
Pelo que atrás ficou dito, parece, em princípio, que as soluções oleosas não são aconselháveis
para aplicação na mucosa nasal, uma vez que a sua viscosidade impediria o movimento ciliar.
Trabalhos recentes comprovam que as medicações aquosas podem também não ser sempre
aconselháveis, uma vez que os vasoconstritores nelas contidos apresentem, por efeito da sua
excelente penetração, uma acção muito rápida e intensa.
531

BREUNINGER demonstrou, em 1958, que as gotas nasais oleosas permanecem no nariz cerca de cinco
vezes mais tempo do que as aquosas, cujo desaparecimento é, fundamentalmente, devido à absorção. As
soluções oleosas, pelo contrário, não são removidas por absorção mas por arrastamento para a
faringe. Efectivamente, estas soluções não se misturam com o muco nasal, o que lhes vai apenas
servir de suporte móvel, alcançando as cavidades paranasais e as suas aberturas que se alargam,
devido ao seu efeito descongestionante, STENMANN invoca estes argumentos para afirmar que as soluções
oleosas nasais de uso tópico são preferíveis às aquosas. Por seu turno, BECKER defende as vantagens
do emprego dos óleos como excipientes no tratamento das rinites, já que, segundo afirma, o óleo
protege a mucosa, por evitar a secura das suas células. Muitos outros otorrinolaringologistas, como
TESCH, são do parecer de que é vantajosa a presença de óleos (parafina, óleos vegetais fluidos e
neutros) em medicações vaso-constritoras, pois aqueles originam uma acção mais constante, sem que
surja a vasodi-latação tardia ou a habituação, tão comum com o emprego das soluções aquosas.
A tendência actual é a utilização de apenas soluções aquosas, já que, apesar dos argumentos
invocados pêlos adeptos do meio oleoso, há sempre o risco de aspiração do corpo gordo, podendo surgir
pneumonias lipídicas. •*-•-
Já em relação às pomadas, as considerações atrás deixadas não parece que tenham perfeito
cabimento. De facto, se o fármaco se encontra disseminado num excipiente sólido, oleossolúvel, a
consistência e viscosidade deste irão prejudicar os movimentos ciliares, tornando deficiente o seu
arrastamento para a nasofannge, a que anteriormente fizemos referência. Como consequência, retarda-
se, demasiadamente, a acção terapêutica pretendida, podendo ainda surgir complicações inerentes à
composição oleosa, como a pneumonia lipídica.
Os factores mencionados têm levado à substituição das pomadas oleosas de descongestionantes
nasais por geleias aquosas, contendo os mesmos fármacos. Entre os excipientes preconizados neste
último caso figura o alginato de sódio. FIEDLER e LEE, estudando a composição de pomadas e geleias
contendo vasoconstritores, dão a sua preferência às geleias de alginato, com 1% de efedrina.

4.3.5.4. Influência das drogas no movimento ciliar

Muitos fármacos influenciam desfavoravelmente o trabalho dos cílios vibráteis da


mucosa nasal. Outros só podem ser utilizados em determinada concentração que, uma
vez excedida, conduz à perda, permanente ou temporária, do movimento ciliar. Sendo
larguíssima a utilização dos medicamentos tópicos nasais (em Portugal existe cerca de
uma centena de produtos especializados), é nosso objectivo citar as contra-indicações de
muitos fármacos actualmente em uso, bem como a de diversos adjuvantes e excipientes
utilizados na formulação farmacêutica. .,,
532

Os oxalatos, citratos, íartaraíos e vários agentes quelantes do cálcio, como o ácido


etüenodiaminotetracético (EDTA), provocam a paragem do movimento ciliar, tendo-se verificado, em
coelhos e ratos, que o seu uso continuado pode originar sinusites.
O propilenoglicol, apesar da sua elevada viscosidade e de ser hemolítico, não se
tem mostrado agressivo para a mucosa ciliar.
O álcool até 10% não é nocivo, podendo associar-se à glicerina e à água (4:4:92).
Os colóides de prata, quando aplicados na mucosa nasal, provocam, de início,
diminuição da actividade ciliar. Tem-se observado o aparecimento de edema e a frag
mentação do epitélio nasal após prolongado contacto da mucosa com soluções de
argirol a 10%. , •, - .
A este facto não é, por certo, estranha a alcalinidade que o fármaco comunica ao tecido. A
prática da associação do argirol ao ácido etilenodiaminotetracético, com o fim de complexar os iões
que se vão libertando com o tempo, parece-nos, francamente, de rejeitar, dada a circunstância
daquele quelante poder sequestrar o cálcio do muco, de acordo com o que anteriormente se disse.
As soluções de nitrato de prata ou de sulfato de zinco, mesmo quando diluídas (0,5%), destroem
os cílios.
Os compostos voláteis, dotados de cheiro, como a cânfora, o eucaliptal e o mentol, e as
essências, como o gomenol, ocasionam diminuição do movimento dos cílios que, no entanto,
recuperam rapidamente a sua actividade normal. O timol revela-se mais prejudicial, mas julga-se
que não provoca qualquer dano quando em concentração inferior a 0,1%.
Entre as sulfamidas parece ser mais recomendável a sulfacetamida, que se pode
administrar em meio aquoso, a pH vizinho de 7, sem que precipite. Empregam-se,
porém, com relativa frequência, várias fórmulas contendo sulfamidas, como o sulfatia-
zol, solubilizadas em água à custa da alcalinização do meio (pH 10). Quanto a nós, esta
prática é deletéria para a mucosa ciliada, sendo preferível administrar as sulfamidas sob
a forma ácida livre, dissolvidas em propilenoglicol ou em polietilenoglicol 400 (PEG
400), associados à água.

4.3.6. ADMINISTRAÇÃO OCULAR

São diversos os tipos de medicamentos administrados na região ocular. Soluções aquosas e


oleosas, suspensões e pomadas, constituem as formas farmacêuticas que mais vulgarmente se
utilizam.
É hábito designar por colírio qualquer preparação farmacêutica que se aplique na mucosa
ocular. Ultimamente, porém, nota-se que a maioria dos autores reserva aquele termo para as
preparações líquidas (soluções e suspensões), denominando pomadas oftálmicas os colírios pastosos.
533

A par destes medicamentos clássicos surgiram nos últimos anos novos sistemas terapêuticos
oftálmicos que, de acordo com HEIL MANN, podem ser classificados em unidades de difusão (ocusert e
soflens), unidades osmóticas (minibombas e microcom-partimentos) e unidades solúveis (implantes
terapêuticos solúveis = ITS; soluble ophtal-mic drug insert = SODI). Trata-se de formas
farmacêuticas preparadas para uma libertação tanto quanto possível regular das substâncias
medicamentosas, permitindo uma acção terapêutica constante e prolongada, , ,• -v-:, „.'
Os fármacos empregados nestas preparações desempenham efeitos variados, podendo, contudo,
dizer-se que actuam principalmente como anti-inflamatórios, mióticos, midriáticos, anestésicos
locais, vasoconstritores, vasodilatadores e anti-infecciosos.
Qualquer que seja o medicamento administrado por via ocular, deve ser estéril e ter reacção
próxima da neutralidade. Os líquidos aquosos devem, ainda, apresentar uma tonicidade compatível
com a fragilidade do órgão. Estas características, infelizmente, nem sempre se têm respeúado,
sobrevindo lamentáveis acidentes. É importante que o farmacêutico dedique à preparação dos
medicamentos oftálmicos pelo menos os mesmos cuidados de que se cerca quando prepara
injectáveis endovenosos. A aplicação de um colírio ou de uma pomada oftálmica constitui sempre
um traumatismo, e, portanto, tudo deverá ser feito para que essa agressão seja a menor possível.

4.3.6.1. Anatomia, histologia e fisiologia

O aparelho visual compõe-se das seguintes formações: globo ocular, pálpebras,


músculos motores do globo ocular e da pálpebra superior, aponevrose de TENQN,
aparelho lacrimal, vasos e nervos da órbita. -„,.,.. «/•.;••*.* Í*M i v,-^-
O globo ocular, de forma aproximadamente esférica, apresenta uma parede formada por três
membranas (fibrosa, músculo-vascular e nervosa) e contém três meios (humor aquoso, cristalino e
humor vítreo).
A membrana fibrosa, túnica externa, está representada na sua maior extensão pela
esclerótica e apresenta, à frente, a córnea, A zona de união entre as duas formações
designa-se por limbo esclero-corneal. No limbo encontramos, na região profunda, um
canalículo venoso anular, o canal de SCHLEMM, que comunica, para dentro, com a
câmara anterior do olho e, para fora, por meio de pequenas vénulas que atravessam a
esclerótica, com as veias ciliares anteriores. ,:-, •,., : >'. • • .
'.'.
."
A córnea, fina e transparente, não se mostra vascularizada, mas é muito rica em terminações
nervosas sensitivas que a tornam um dos tecidos do organismo mais sensíveis aos estímulos
dolorosos. Nela se distinguem as seguintes camadas: — epitélio anterior (pavimentoso estratificado),
limitante elástica anterior (membrana de BOWMAN), tecido próprio, limitante elástica posterior
(membrana de DESCEMET) e epitélio posterior (descrito por alguns autores como um epitélio cúbico
simples, referido por outros como um endotélio). As limitantes são membranas anistas e o tecido
próprio, que forma cerca
534

de 60% da córnea, é, por sua vez, formado por cerca de 60 lâminas, constituídas por fibrilas
entrecruzadas com células entre elas (Fig. 220).
A túnica média do globo ocular, membrana músculo-vascular, pode dividir-se em
três zonas: — coróide, corpo ciliar e íris. -'" ' """ " '
A coróide, fortemente vascularizada, ocupa a metade
posterior do olho e continua-se com o corpo ciliar, do qual está
separada por uma linha circular, festonada, a ora serrata. E '-- ••- J *•
O corpo ciliar, de secção aproximadamente trian
gular, relaciona-se pela sua face externa com a
esclerótica e apresenta, na face interna, duas zonas
distintas: — uma, posterior, finamente pregueada, o
orbiculus ciliaris; outra, anterior em relação àquela,
provida de um certo número de eminências (entre 70
e 80) que se designam por processos ciliares. Na
espessura do corpo ciliar encontramos o músculo
ciliar, que tem inserção no limbo esclero-corneal e
L
que é formado, sobretudo, por fibras de disposição
longitudinal ou radiada, contendo também alguns
feixes de fibras circulares situadas para dentro das
primeiras. -' '"' ?' ''"'
A íris, com um orifício central cujo diâmetro pode variar pela
acção de músculos, está colocada, como um diafragma, à frente
Fig. 220. Secção vertical do cristalino. O seu papel é, pois, o de regular a entrada dos raios
da
córnea mostrando a sua luminosos no olho, mas tem, ainda, como funções secundárias, as de
estrutura reter determinadas radiações (papel que pertence ao pigmento),
microscópica
eliminar resíduos celulares e intervir na formação do humor aquoso.
A — células epiteliais (camada); B
— membrana de Bowman; C — Este fornece os elementos nutritivos essenciais às estruturas não
substância própria da córnea; D — vascularizadas (córnea e cristalino) e provém do sangue de onde
membrana de Descemet; E —
se forma continuamente por intermédio dos processos ciliares. Circula na câmara anterior do olho
antes de ser drenado para o sangue venoso através do canal de Schlemm. É o humor aquoso que
regula a pressão intra-ocular necessária para a curvatura adequada do globo. Se esta pressão aumenta
demasiadamente, em regra por ter aumentado a resistência do escoamento através do canal de
Schlemm, instala-se uma doença conhecida por glaucoma, susceptível de ser atenuada por meio de
mióticos que alargam aquele canal.
A membrana interna do olho, a retina, é uma formação sensorial que recobre a
! ír
face profunda da túnica média. •' ;:
Na Fig. 221 está representada, em esquema, uma secção horizontal do globo ocular.
535

As pálpebras são formações músculo-membranosas, cuja face anterior é revestida por pele,
sendo a face posterior, que fica em contacto com o globo ocular, forrada por uma mucosa, que
cobre, também, a face anterior da córnea. Esta mucosa, lisa, brilhante, de coloração rosada na zona
palpebral, forma, ao inflectir-se da pálpebra para a face

Fig. 221. Secção horizontal do globo ocular (esquema)


1 — córnea; 2 — câmara anterior; 3 — cristalino; 4 — canal de Schlemm;
5 — corpo ciliar; 6 — íris; 7 — câmara posterior; 8 — ligamento suspensor;
9 — retina; 10 — coroideia; 11 — esclerótica; 12 — mácula; 13 — papila óptica;
14 — canal hialóide; 15 — artéria central da retina

anterior do olho, os fundos do saco óculo-palpebrais. Designa-se pelo nome de conjuntiva e pode,
portanto, ser dividida em três segmentos — a conjuntiva pálpebra!, a conjuntiva do fundo do saco e a
conjuntiva ocular. Rica em elementos celulares mucosos, a conjuntiva mantém sempre as condições
de humidade características do olho. É fortemente irrigada por vasos sanguíneos e linfáticos; os
primeiros reagem com facilidade, dilatando-se, em consequência da presença de corpos estranhos ou
de estados infecciosos. A vascularização da conjuntiva assegura a remoção, para a circulação geral,
do medicamento que com ela seja posto em contacto.
536

O aparelho lacrimal compõe-se da glândula lacrimal e das vias lacrimais. A glândula é, na


realidade, formada por duas partes, uma orbitaria ou principal, outra palpebral ou acessória,
separadas por uma lâmina fibrotendinosa. Os canais excretores da porção orbitaria abrem-se no
fundo do saco conjuntival; os da porção palpebral seguem,
alguns, o mesmo caminho, mas a maior
parte drena para os condutos da porção orbitaria.
As glândulas lacrimais, cujo produto da secreção
são as lágrimas, são formadas por um epitélío
glandular de tipo seroso em forma de ácinos. Os
canais excretores são revestidos por um epitélio
simples.
As vias lacrimais compreendem os canais
lacrimais, o saco lacrimal e o canal
lacrimonasal. O seu epitélio de revestimento é de
tipo cilíndrico com células superficiais providas
de cílios. O saco lacrimal situa-se no trajecto do
canal lacrimal e continua-se pelo canal nasal
Fig. 222. Glândulas lacrimais e seu que abre nas fossas nasais, no meato inferior, a
sistema de drenagem para a
cavidade nasal cerca de 3 cm da abertura nasal. A mucosa deste
canal apresenta um certo número de levantamentos
1 — Glândula lacrimal
2 — Saco lacrimal ou pregas, impropriamente chamadas válvulas.
3 — Canal lacrimonasal O epitélio de revestimento do olho e da face
4 — Canais excretores interior das pálpebras apresenta-se, como se disse,
',•;„
normalmente húmido, banhado por um líquido de natureza coloidal (película precorneana) que
deriva das secreções conjuntival e lacrimal, renovando-se continuamente e mantendo composição
constante, graças ao equilíbrio fisiológico que se estabelece entre as porções segregada, evaporada
e absorvida. Este líquido protege o epitélio da dessecação e dissolve os fármacos que se destinam a
serem absorvidos.
A Fig. 222 mostra as glândulas íacrimais e o seu sistema de drenagem para a cavidade nasal.

4.3.6.2. Preparações para uso oftálmico

A eficiência das preparações oftálmicas depende, em larga medida, do seu poder de penetração
através das túnicas e anexos do globo ocular.
As aplicações medicamentosas de uso oftalmológico actuam sobre a esclerótica, conjuntiva,
córnea e corpo ciliar, podendo os fármacos constituintes serem absorvidos, principalmente, pêlos
vasos da conjuntiva.
537

A maioria dos medicamentos oculares deve penetrar neste órgão de modo a oca
sionar a resposta pretendida. De um modo geral, as preparações oftálmicas misturam-
-se rapidamente com o líquido lacrimal e espalham os seus princípios activos pela
superfície da córnea e da conjuntiva, se bem que a permanência na córnea seja impe
dida pela lavagem efectuada pelas próprias lágrimas. Assim, quando se instilam umas
gotas oculares, por exemplo, a maioria do medicamento fica alojada no fundo do saco
óçulo-palpebral. A capilaridade e a difusão conservam, porém, certa quantidade de
medicamento sobre a córnea. Outra apreciável quantidade de substância medicamentosa
é drenada pelas lágrimas para a cavidade nasal. Experiências efectuadas com soluções
concentradas de fluoresceína sódica demonstram que, mesmo assim, o fármaco per
manece em contacto com a córnea, pelo menos durante 5 a 6 minutos. Entretanto,
segundo CORNIC, ao fim de 8 minutos, a concentração do fármaco está reduzida a cerca
de 1/1000 da inicial. . . • , . :.. , . . ;< - v • ,,

4.3.6.2.1. Penetração na córnea - - , , ... ,...,,. . ,,. ; -

Os trabalhos de COGAN e de SWAN têm contribuído para mostrar que a penetração dos
medicamentos através da córnea se processa, como em muitos outros casos, por transporte passivo,
baseado no coeficiente de partilha óleo/água. Por outro lado, as formas não dissociadas dos
medicamentos, geralmente lipossolúveis, seriam as mais facilmente absorvidas pela córnea. Como
muitos fármacos usados em oftalmologia se comportam como bases fracas, o pH da formulação teria
ainda o maior interesse.
As lágrimas apresentam capacidade neutralizadora das variações de pH produzidas pelas
soluções instiladas nos olhos. Assim, se uma solução aquosa de um sal de alcalóide (bromidrato de
homatropina, por exemplo) for aplicada na região ocular, uma apreciável quantidade de sal é
convertida em base livre, devido ao citado efeito. Nestas circunstâncias, a base homatropina, no
exemplo escolhido, penetra facilmente na camada lipóide das células da córnea, uma vez que é
dotada de lipossolubilidade. Ao atingir o tecido próprio, de características tipicamente hidrófilas e
com baixo conteúdo em lípidos, a forma básica do alcalóide é convertida em catião, devido ao pH do
meio celular. Novamente a forma não dissociada do alcalóide penetrará através do endotélio, que é
também de natureza lipóide, atingindo, então, o humor aquoso. Daí se difunde, mais uma vez sob a
forma catiónica, para a íris e corpo ciliar, onde irá exercer a sua acção midriática. A Fig. 223
auxilia a compreensão do que deixámos dito.
Experiências realizadas com doridrato de procaína mostram que a penetração
deste anestésico é mais intensa quando se tampona o meio para pH 7. E que a esse
pH a procaína base é posta em liberdade e sob essa forma é susceptível de transpor
as membranas lipóides. ' v , u^
538

A córnea não é inteiramente impermeável às substâncias ionizadas e aos produtos insolúveis


nos lípidos. Tal como na mucosa intestinal, admite-se aqui a existência de poros ou espaços
extracelulares, através dos quais passariam as moléculas de reduzidas dimensões. MAURICE assinala
ter conseguido obter a absorção de iodeto de sódio, de salicilatos, de fluoresceína e de azul de
metileno através da córnea, se bem que se trate de compostos hidrossolúveis e ionizáveis.

CH,— CH — CH2

NCH3CHOOCC0H
i i
CH, — CH — CH,
Homatropina Substân
cia

LJ
Humor

Fig. 223. Penetração do bromidrato de homatropina


na córnea (Segundo Kinsey)

, Tem-se notado que, para alguns fármacos, a penetração pêlos espaços extracelulares é
aumentada pela presença de agentes tensioactivos. O carbacol, por exemplo, é melhor absorvido
pela córnea quando em presença de cloreto de benzalcónio que diminui substancialmente a tensão
superficial.
Como atrás acentuámos, uma vez que um fármaco penetre na córnea acaba por atingir o
plasma circulante. Este facto apresenta interesse, pois a aplicação de colírios tem provocado
verdadeiras intoxicações sistémicas. A escopolamina, que habitualmente se usa em colírio a 0,2%,
tem originado efeitos secundários, mais ou menos graves, quando a sua concentração é de 1%.
Nessas circunstâncias, uma apreciável quantidade de fármaco atinge a corrente circulatória,
difundindo-se, depois, por todo o organismo. É curioso salientar que colírios de atropina, a l ou a
2% e os de homatropina a 5% não provocam intoxicações.
539

4.3.6.2.2. Características do líquido lacrimal


. "*"*-' •. -
As lágrimas são produzidas pelas glândulas lacrimais que são do tipo seroso. Não
correspondem simplesmente, portanto, a um filtrado sanguíneo.
O líquido lacrimal apresenta uma composição bastante complexa, salientando-se, entre os seus
constituintes, apreciável percentagem de albuminas e de cloreto de sódio. No líquido lacrimal
encontram-se, também, enzimas, como os lisózimas (').
Os componentes das lágrimas conferem-lhes propriedades características, como a tonicidade,
reacção sensivelmente neutra e capacidade tampão. Esta última é especialmente devida à presença de
compostos proteicos que actuam pelas suas propriedades anfotéricas.
A existência de lisózima explicaria, para muitos autores, a acção protectora das lágrimas em
relação às infecções microbianas. Esse efeito seria devido à acção lítica do lisózima sobre muitos
microrganismos.
As lágrimas apresentam reacção fracamente alcalina, cifrando-se em 7,4 o valor fisiológico do
seu pH. Admite-se que as suas características físico-químicas (condutibilidade, tensão de vapor e pH)
sejam muito semelhantes às apresentadas por uma solução aquosa contendo 0,28% de cloreto de
sódio e 0,20% de bicarbonato de sódio, saturada por anidrido carbónico. A presença de anidrido
carbónico é muito importante, já que o valor fisiológico do pH se modifica por simples exposição das
lágrimas ao ar. Uma vez que a presença de anidrido carbónico é tão influente na reacção do líquido
lacrimal, são de admitir variações normais do pH lacrimal dependentes da libertação deste gás das
camadas epiteliais e da sua difusão para a atmosfera.
Aceita-se, hoje, que as lágrimas possam apresentar variações de pH compreendidas entre 7,4 e 8,
tendo esta reacção ligeiramente alcalina do líquido lacrimal, como já dissemos, imenso interesse na
absorção dos fármacos por via ocular.

(') Segundo RIEDLEY, as lágrimas têm a seguinte composição por cento:


Água .............................................................................. 98,20
Sólidos totais................................................................ 1,80
Cinzas ............................................................................ 1,05
Azoto total.................................................................. 0,158
Azoto não proteico ...................................................... 0,05
,-> Ureia.............................................................................. 0,03
Proteínas (albuminas e globulinas)............................ 0,669
""" ' Açúcares ........................................................................ 0,65
•"-, Cloretos (em cloreto de sódio).................................. 0,658
•-.:*., Sódio (em óxido de sódio)........................................ 0,60
Potássio (em óxido de potássio) ............................. 0,14
Amoníaco ...................................................................... 0,005
540

As soluções ou suspensões aquosas destinadas ao uso ocular devem apresentar um pH


compatível com o do líquido lacrimal, não se excedendo, habitualmente, os valores extremos de 5 e de
8,5.
Os colírios aquosos devem ser preparados de tal modo que a sua tonicidade seja, tanto quanto
possível, idêntica à do líquido lacrimal.
Admite-se que as soluções de cloreto de sódio a 9-9,3%> são isotónicas com as lágrimas, o
que se baseia em considerações de vária ordem, inclusive na apreciação do abaixamento crioscópico
apresentado pelo líquido lacrimal.
Até cerca de 1950, era hábito prepararem-se os colírios com concentrações tais que a sua
tonicidade fosse equivalente à de uma solução aquosa de cloreto de sódio a 1,4%. Muitos formulários
e farmacopeias inscreveram este valor e todos os ajustamentos osmóticos eram executados nessa base.
Trabalhos posteriores de RIEDLEY, de KROGH e de GROVE-RASMUSSBN vieram demonstrar que as lágrimas
apresentam uma tonicidade aproximada da do plasma (equivalente à de soluções de cloreto de sódio a
0,93%), tendo-se então modificado o primitivo conceito.
Os colírios hipo ou hipertónicos nem sempre provocam irritação ou dor após a sua aplicação.
Estudos efectuados no sentido de mostrar a tolerância local aos colírios revelaram que as soluções
de cloreto de sódio, cujas concentrações estejam compreendidas entre 0,5 a 2%, são perfeitamente
toleráveis, desde que o epitélio da cómea se encontre intacto.
Ensaios realizados com colírios de sulfacetamida sódica em concentrações tão fortemente
hipertónicas como 20% (a isotonia consegue-se com 3,5% do fármaco) não originaram lesões e,
praticamente, não provocaram dor.
Estes conhecimentos levam-nos a considerar a isotonia como uma propriedade
desejável nos colírios, mas aceita-se a instilação ocular de soluções ou de suspensões
s
aquosas hipo ou hipertónicas. : - '"*"' ' ' -
MIRIMANOFF, num comentário que traduz certa dose de humorismo, sintetizou o problema com as
seguintes palavras: «L'importance de cette notion (isotonia), qui a fait couler beaucoup plus d'encre
que de larmes, a été fortement exagérée».
A hipertonia dos colírios aquosos não pode, em muitos casos, ser evitada. Basta que nos
lembremos de fármacos como a sulfacetamida, cuja concentração terapêutica eficaz é superior à
concentração correspondente à isotonia.
Já em relação à hipotonia, a atitude do farmacêutico terá de ser diversa, uma vez que, geralmente,
pode corrigir a pressão osmótica original pela dissolução do fármaco na concentração farmacológica
desejada, ajuntando isotonizantes adequados. Quando se administram pomadas oftálmicas os
problemas são um pouco diferentes, mas estas devem ser bem toleradas pela cómea, espalhando-se
facilmente pela conjuntiva. Para isso é hábito dar-lhes fraca consistência (deverão fundir a cerca de
37°C) e prepará-las com completa homogeneidade, sem partículas grumosas. As preparações de efeito
prolongado — unidades de difusão, unidades osmóticas e unidades solúveis — deve
541

libertar os farmacos de um modo constante, em regra segundo cinéticas de ordem zero. O seu
período de actuação varia entre um dia e uma semana, funcionando, afinal, como reservatórios
medicamentosos que inseridos no saco conjuntival vão cedendo os princípios de forma a que o doente
esteja sempre submetido ao seu efeito terapêutico.
A invasão da córnea por microrganismos é sustada pelo seu epitélio, sempre que este se
encontre intacto. A conjuntiva, por seu turno, difere das outras membranas mucosas pelo excelente
sistema de drenagem que possui, o qual, em muitos casos, elimina os agentes infecciosos pelas vias
lacrimais, para a cavidade nasal.
Em diversas conjuntivites, porém, os microrganismos instalam-se superficialmente e aí
proliferam, produzindo toxinas solúveis que vão penetrando nos tecidos e originando a resposta
patológica. O Staphylococcus aureus, que é o causador da maioria das infecções da conjuntiva,
actua do modo mencionado, sendo a difusão das suas toxinas auxiliada pela secreção de
hialuronidase.
Quando, por qualquer circunstância, o epitélio da córnea foi lesado, as defesas naturais
encontram-se seriamente diminuídas e o microrganismo poderá penetrar com maior facilidade. A
Pseudomonas aeruginosa é a bactéria que mais vezes aparece neste tipo de invasão, instalando-se e
proliferando facilmente, sempre que haja soluções de continuidade na córnea. Como se trata de um
microrganismo que é habitante normal do corpo humano, é de temer a sua invasão logo que haja
lesão da córnea.
Em conclusão, e de acordo com as ideias expostas, as formas de admi
nistração ocular devem ser estéreis. Mais ainda, deverão possuir substâncias anti-
-sépticas que evitem a proliferação microbiana quando se contaminem, eventualmente,
durante o uso.

4.3.6.2.3. Farmacos utilizados em colírios

É muito extensa a lista dos farmacos empregados em pomadas, preparações líquidas, ou mesmo
em pós oftálmicos.
As suspensões e as pomadas exigem uma perfeita dispersão do material constituinte, de tal
modo que as partículas dispersas não actuem como corpos estranhos capazes de lesar a córnea. É
por isso que nas pomadas, nas suspensões e, também, nos pós se utilizam as substâncias activas
numa tenuidade elevada (porfirizadas ou micro-nizadas).
Quando o excipiente é oleoso, deverá ter-se em atenção a sua acidez e importa
também considerar a sua viscosidade ou a sua consistência, que não é aconselhável
serem elevadas. •< .,.-'::;
Os farmacos empregados nas preparações oftálmicas podem agrupar-se em onze classes
diferentes, de acordo com a classificação estabelecida por RUNTI. A Tabela LTTI indica as principais
substâncias medicamentosas empregadas em colírios.
542

Tabela LHI. Principais farmacos empregados em colírios

Anti-infecciosos
Sulfamidas (sulfatiazol, sulfacetamida, sulfadicramida, etc.)
Antibióticos (penicilinas, estreptomicina, cloranfenicol, tetraciclinas, bacitracina, neo-
micina, polimixinas, espiramicina, etc.)
Corantes (azul de metileno, proflavina) \ .
Fenóis (resorcina)
Diversos (ácido bórico, boratos, propionato de sódio, nitrofurânicos)
Anestésicos locais f
Cocaína, procaína, tetracaína, lidocaína •
Anti-inflamatórios ,
Corticóides (cortisona, prednisolona, hidrocortisona),
Compostos metálicos (Cu, Zn, Hg, Ag)
Compostos organometálicos (argirol) .
Vitaminas
A, E, F, B,, B2, C, P
Aníicoagulaníes
Heparina
Míóticos
Pilocarpina, eserina, neostigmina, carbacol
Midriáticos
Atropina, homatropina, escopolamina, fenílefrina :

Vasoconstritores
Adrenalina, efedrina, nafazolina
Difenidramina, antazolina
Vasodilatadores
. . .
.
Etilmorfma, priscol
Enzimas ~- •
Hialuronidase, tripsina, lisózima, quimotripsina

Na tabela apresentada agrupámos os farmacos de acordo com a sua acção predominante. Há,
contudo, nesta lista substâncias medicamentosas que apresentam mais de um efeito farmacológico.
É o que sucede com os compostos metálicos, que classificámos como anti-inflamatórios, embora
possam manifestar acção anti-infecciosa, como acontece com o óxido de mercúrio, com o sulfato de
zinco e com o argirol.
543

4.3.7. ADMINISTRAÇÃO AURICULAR vpois, de uma via para


acção local, muitas vezes considerada em conjunto com a administração cutânea, já que
o canal auditivo é revestido de pele.

4.3.7.1. Anatomia, histologia e fisiologia


-
O aparelho auditivo é constituído pelo ouvido externo, ouvido médio e ouvido interno.
O ouvido externo é formado pelo pavilhão e pelo conduto auditivo. Este último, que mais
particularmente nos interessa, é um canal cilíndrico, de natureza cartilagínea na sua parte externa e
que se tornou ossificado na porção interna. É revestido por pele, cuja derme se liga fortemente ao
pericôndrio e periósteo, sem que se observe a interposição de tecido celular. No terço externo do
canal auditivo, que corresponde à zona cartilaginosa, a pele apresenta vários folículos pilosos que,
no adulto, são mais abundantes. Nessa zona observa-se, também, a existência de numerosas glândulas
sebáceas e ceruminosas.
Dado que os pêlos e as glândulas aparecem unicamente na porção mais externa do conduto
auditivo, compreende-se por que só nesta zona se regista o desenvolvimento de furúnculos (infecções
na raiz dos pêlos).
As glândulas sebáceas e ceruminosas expulsam os seus produtos de elaboração, cuja mistura
constitui o cerúmen dos ouvidos. Essa mistura é formada pelo sebum (glicéridos diversos, ésteres de
colesterol, esqualeno, vitamina E, etc.) e pela secreção ceruminosa (mucoproteídos, ácidos gordos,
glicéridos e sais minerais). A libertação do sebum parece depender de um controlo endócrino, por
acção da testosterona e da pro-gesterona, enquanto que a secreção das glândulas ceruminosas é
aumentada por estímulos do sistema nervoso simpático.
Os ouvidos externo e médio e o caracol, que já pertence ao ouvido interno, constituem as
partes do aparelho auditivo. Os canais semi-circulares e outras porções do ouvido interno controlam o
equilíbrio.
O ouvido médio é constituído pelo tímpano e sua cavidade que é uma espécie de bolsa cheia
de ar onde se encontram os ossículos que interessam à audição, isto é, o martelo, a bigorna e o
estribo. A cavidade conecta directamente com a faringe por intermédio da trompa de Eustáquio,
tubo que permite que a pressão do ar dos dois lados do tímpano seja igual.
O ouvido interno ou labirinto é constituído por uma série complexa de canais cheios de fluido
que intervém no controlo da orientação do indivíduo no espaço. As doenças e sintomas associados
com o ouvido interno são a vertigem de Manière, as náuseas e a sensação de som aos ruídos vários.
544

4.3.7.2. Medicamentos tópicos auriculares

Uma das afecções auriculares mais comuns é a excessiva acumulação de cerúmen, a qual
provoca diversas perturbações, como deficiência auditiva, dores, vertigens, etc. Vários medicamentos
são utilizados para a sua remoção, como as soluções de carbonato de potássio em glicerina, as
soluções de peróxido de hidrogénio a 5 e 10 volumes, e os óleos, como o de amêndoas doces.
As infecções do ouvido externo são também frequentes. A humidade, os traumatismos e certa
alcalinidade predispõem o ouvido para a proliferação microbiana.
A flora residente no ouvido externo é, habitualmente, constituída por Micrococcus
(M. aureus e M. albus), Corynebacíeria e outros microrganismos acidentais. Num
ouvido íntegro não aparece, regra geral, o Pseudomonas aeruginosa (bacilo piociânico),
mas este microrganismo desenvolve-se tão facilmente, quando haja para isso condições
favoráveis, que a maioria das otites externas é a ele devida (65 a 90% dos casos). Com
menos ocorrência, há otites externas devidas a Proteus vulgarís e a estreptococos e
estafílococos. -v i ';
Estes conhecimentos têm interesse na formulação dos medicamentos anti-sépticos para o ouvido
externo, já que, em regra, é o Pseudomonas aeruginosa o causador da infecção. Assim, devem
utilizar-se antibióticos, sulfamidas e outros fármacos que apresentem especificidade para este agente.
As infecções fúngicas do ouvido externo são muito raras e geralmente só aparecem depois de
uma terapêutica prolongada pela neomicina e cortiçosteróides anti-infla-matórios. OWEN e
colaboradores relatam o aparecimento de numerosas dermatites, subsequentes ao tratamento prolongado
de otites externas com neomicina.
Por último, lembramos que as infecções do ouvido exerno são mais frequentes na estação
quente, principalmente nos meses húmidos. A natação, provocando uma maceração dos tecidos, cria
condições favoráveis para o desenvolvimento de bactérias pato-génicas.
A inflamação do ouvido médio é, geralmente, concomitante com a inflamação das
cavidades nasais que com ele comunicam pela trompa de Eustáquio. A Fig. 224 ilustra
:: :
a aludida relação. ';
Estas infecções auriculares são, habitualmente, muito dolorosas e acompanhadas por
diminuição da acuidade acústica e por febre. Grande número das otites médias é devido a
microrganismos Gram-negativos. Os Proteus e Pseudomonas aparecem em muitos estados
infecciosos crónicos, mas pode dizer-se que se têm isolado todos os tipos de microrganismos
patogénicos naquelas infecções.
Pelo que se disse se compreende que os medicamentos administrados por
via auricular são, fundamentalmente, removedores do cerúmen, anti-infecciosos e anti-
-inflamatórios. Utilizam-se em soluções, suspensões, pós, aerossoles, pomadas e
otocones.
545

As soluções e suspensões devem ter o pH compreendido entre 5 e 7,8, sendo mais vulgares as
ligeiramente ácidas. A glicerina e o propilenoglicol são muito utilizados, como veículos, em gotas
auriculares, uma vez que a sua elevada viscosidade permite a aderência à superfície interna do
conduto auricular. Os óleos empregam-se igualmente, bem como o álcool.

Bula etmoidal

Corneto médio . -
Seio Frontal y*
Flecha no seio
Osso nass!
'»»> «..',-,,
Flecha no Corneto
Seio superior
Frontal Amígdal
a
Orifício do '.hfaringe
canai naso- a
íacrimal
Fossas na Abertura
sais para
externas Trompa
auditiva
Cavidade
Nasofarin
ge Palato
Vestíbulo

Fig. 224.

Na maioria das vezes, as pomadas contêm, como excipiente, a vaselina ou gorduras


emulsionadas.
Os pós são aplicados em elevado estado de divisão, citando-se, entre eles, os
;;
antibióticos, os corticosteróides, o ácido bórico, etc. -
Os olocones são medicamentos sólidos auriculares, com o peso de 15 a 20 centigramas,
constituídos pêlos fármacos e excipientes, como a manteiga de cacau ou ceras emulsionáveis. Os
proponentes desta forma farmacêutica (MADURO e CHEVANCE) advogam a sua eficácia por admitirem a
realização de um contacto mais demorado entre o
546

medicamento e a zona de aplicação e, por conseguinte, uma maior concentração do


fármaco ao nível dos tecidos afectados. -''K?:-:.--' ^- ?> *-. = • . • * « ,
Como farmacos removedores do cerúmen, citámos já o carbonato de potássio, que o
saponifica; a água oxigenada, que promove a sua desagregação; o álcool e os óleos, que facilitam a
sua dissolução; etc.
Entre os compostos anti-infecciosos mencionamos: antibióticos (cloranfenicol, tetra-ciclinas,
polimixinas, neomicina, estreptomicina, etc.); sulfamidas (sulfanilamida, sulfa-tiazol, sulfisoxazol,
etc,); anü-sépücos (fenol, ácido bórico, etc.).
Como anü-inflamatórios fazemos referência à hidrocortisona e à prednisolona e, entre os
anestésicos, lembramos a anestesina.
A maioria das vezes, num mesmo medicamento auricular associam-se diversas substâncias
medicamentosas, de modo a garantir simultaneidade de acção. Assim, os analgésicos, como a
anestesina, e os anti-inflamatórios, como a prednisolona, são empregados, frequentemente, em
conjunto com antibióticos ou sulfamidas, etc.

4.3.8. ADMINISTRAÇÃO TRAQUEOPULMONAR

Quando estudámos a administração por via bucal referimo-nos á existência de vários


medicamentos que actuavam na faringe, desempenhando aí um determinado efeito tópico. Também
quando falámos na administração nasal nos referimos à utilização da rinofaringe, a qual permite a
absorção de alguns farmacos.
Neste capítulo iremos considerar a administração medicamentosa na traqueia, nos brônquios e
no epitélio alvéolo-pulmonar.
Esquematicamente, pode dizer-se que o aparelho respiratório é composto pelas vias aéreas e
pelo parênquima pulmonar. As vias aéreas principiam nas fossas nasais, continuando-se pela
rinofaringe, laringe, traqueia, brônquios e bronquíolos. Nestes se inicia o parênquima pulmonar.
A traqueia e os brônquios são revestidos por uma mucosa com epitélio provido de células
cilíndricas ciliadas e de células secretoras de muco (células caliciformes). O seu córion é
particularmente rico em vasos e fibras elásticas.
O parênquima pulmonar inicia-se nos bronquíolos, dos quais saem os lóbulos pulmonares, que
são separados uns dos outros por tecido conjuntivo e constituem a unidade anatómica e fisiológica
do pulmão.
Os alvéolos pulmonares têm as suas paredes constituídas por um estroma conjun-tivo-elástico,
mostrando aberturas ou poros que estabelecem a comunicação de uns alvéolos com os outros, A rede
sanguínea dos alvéolos é muito rica, podendo alberga»1 4 litros de sangue por minuto, quando em
repouso, .-niiwïlx ••"-; ,

547
547

4.3.8.1. Acção tópica e absorção

A árvore pulmonar apresenta uma superfície que atinge 80 a 100 m2 no homem adulto. Por seu
turno, as mucosas traqueal e brônquica e o epitélio alveolar são facilmente permeáveis, permitindo a
absorção de compostos voláteis ou de dispersões de sólidos ou de líquidos numa fase gasosa
(aerossoles).

Fig. 225. Vias aéreas e alvéolos pulmonares


1 — Traqueia — (alta eficiência para partículas > 60 n; as partículas <
6 n só ficam retidas numa percentagem inferior a 1%)
2 — Brônquios primários — (as partículas < 2 |i não se depositam)
3 — Brônquios secundários — (atingem esta região as partículas < 2 n)
4 — Brônquios terminais — (as partículas < 0,6 \i não se depositam)
5 — Bronquíolos — (as partículas > 20 u, não atingem esta região)
6 — Condutos alveolares — (as partículas > 6 \i não atingem esta
região; as de 2 n são altamente eficientes)
7 — Alvéolos — (as partículas > 2 \i não atingem esta região)

Segundo Landahl, citado por J. Kanig — J. Pharm. Sei., 52, 524 (1963)

Como se compreende, ao administrar-se, por aspiração ou inalação, qualquer destes tipos de


medicamentos, a sua passagem pelas vias respiratórias e o local atingido (traqueia, brônquios,
parênquima pulmonar) são função do diâmetro das partículas dispersas. De facto, à medida que se
passa da traqueia para os brônquios primários, destes para os secundários e terminais e, por último,
para os bronquíolos, o calibre do conduto respiratório vai diminuindo progressivamente. Assim,
enquanto que partículas de 60 n de diâmetro não ultrapassam a traqueia, é necessária uma divisão até
20 |i para que os bronquíolos sejam atingidos e só partículas com cerca de 2 u, alcançam os
548

alvéolos pulmonares. Claramente que os vapores e os gases não apresentam esta limitação, já que
as suas partículas são muito menores. De modo inverso, porém, não é possível, neste estado de
divisão, garantir-se que um tarmaco actue sobre uma zona circunscrita e de maior diâmetro do
tracto respiratório, A Fig. 225 representa, de modo esquemático, as relações de calibre existentes
entre as vias aéreas e os alvéolos e as dimensões das partículas capazes de os atingirem.
Entre os medicamentos utilizados por via traqueopulmonar figuram os anestésicos gerais
voláteis, como o éter, o protóxido de azoto e o clorofórmio; os vasodilatadores, como os vapores de
nitrito de amilo; os an ti-reumatismais, como as inalações sulfurosas ou sulfídricas; os vapores an ti-
sépticos, provenientes do aquecimento das tinturas de benjoim e de eucalipto, ou, simplesmente,
desenvolvidos pêlos óleos essenciais; os fumos de cigarros ou de pós anti-asmáticos. etc.
Nos últimos anos tem sido utilizada, satisfatoriamente, a aplicação f'*iica intra-cavitária (por
via traqueobrônquica) de pomadas de consistência dura, conterPí9T agentes tuberculostáticos
geralmente associados. VOIGT e CHURIDT estudaram alguns preparados galénicos deste tipo.
Ao lado destas medicações, podemos citar o emprego recente, mas tão generalizado, dos
aerossoles. Mais tarde serão estudados em pormenor, mas, entretanto, diremos que são dispersões de
partículas sólidas ou líquidas no seio de gases. A noçãx) farmacêutica de aerossole não está em
perfeito acordo com o conceito físico-químico que admite um estado coloidal, em que as partículas
(micelas) apresentam cerca de 100 mu. de diâmetro. Efectivamente, os aerossoles farmacêuticos são
dispersões de partículas cujo diâmetro varia entre limites relativamente largos e, nalguns casos,
perderiam a sua eficácia se fossem coloidais. Como já vimos, mesmo para os fármacos que actuam
sobre os bronquíolos ou sobre os alvéolos pulmonares, é necessário que as suas partículas
apresentem diâmetros da ordem de 20 U, e de 2 (i, respectivamente.
As dispersões de sólidos ou de líquidos em gases, designadamente no ar, podem ser
conseguidas através de uma formulação criteriosa do medicamento que é, depois, disperso por meio
de aparelhos especiais. Estes são de vários tipos: atomizadorea, nebulizadores, insufladores,
vaporizadores, falando-se, assim, em atomizações, nebuliza-ções, insuflações e vaporizações.
Muitos fãrmacos são, hoje, aplicados na árvore pulmonar sob a forma de aerossoles. De facto,
e para lá da acção tópica que, eventualmente, se pretenda, a administração de muitos aerossoles
proporciona fácil absorção medicamentosa, passando o fármaco à pequena circulação e, depois, à
circulação geral, sem que sofra as modificações inerentes à sua travessia pelo fígado. Pode,
portanto, dizer-se que os fármacos absorvidos por via traqueopulmonar escapam à barreira
hepática. A principal vantagem da terapêutica por esta via de administração é, contudo, a de
permitir a aplicação tópica de poderosos agentes farmacológicos em determinadas zonas do tracto
respiratório. A penicilina, por exemplo, é utilizada em aerossole (pó ou solução aquosa dispersa no
seio de gases, como o ar) para acção local no tracto respiratório inferior. Parte deste
549

antibiótico é absorvido, penetrando na circulação. Já a estreptomicina, quando aplicada do mesmo


modo, não é absorvida funcionando, exclusivamente, como um tópico anti--infeccioso.
Antibióticos diversos, sulfamidas, aminas simpaticomiméticas, compostos arsenicais e iodados
são aplicados por via traqueopulmonar. As doses medicamentosas, administradas de cada vez, são
da ordem das que se utilizam por via subcutânea.

4.3.9. ADMINISTRAÇÃO GENITURINÁRIA

Sob esta designação iremos referir a administração medicamentosa através da


uretra, bexiga, vagina e útero.

4.3.9.1. Bexiga e uretra

Do ponto de vista histológico, a uretra e a bexiga apresentam, de fora para dentro, três
camadas celulares, a saber: 1) uma adventícia de natureza conjuntiva bastante vascularizada; 2)
uma túnica muscular, com duas ou três camadas de fibras lisas; 3) uma mucosa com um epitélio
estratificado especial (cpitélïo de transição).
Tanto nalgumas regiões da bexiga como na uretra observam-se aberturas ou canalículos
glandulares por onde segrega um líquido viscoso, semelhante ao muco.
A bexiga e a uretra são essencialmente formações destinadas à excreção. Compreende-se, pois,
que as suas mucosas, fisiologicamente inadapladas à absorção, não promovam, regra geral, a
penetração dos medicamentos. Estas duas superfícies de administração são, portanto, utilizadas para
medicamentos tópicos, mas em casos especiais em que haja inflamação, poderá ocorrer absorção
acidental. A absorção pela mucosa vesical tem sido, igualmente, observada com diversos farmacos,
como o álcool, sendo a mucosa uretral mais facilmente atravessada do que a vesical.
Do ponto de vista prático, pode afirmar-se que só se preparam medicamentos destinados a
produzir um efeito tópico na uretra ou na bexiga.
As velas medicamentosas, que são cilindros dotados de certa consistência e elas
ticidade conferidas pêlos excipientes, constituem uma das formas farmacêuticas empre
gadas para se conseguir uma acção tópica uretral, a maioria das vezes de natureza anti-
-iníecciosa.

4.3.9.2. Vagina e útero

A túnica externa da vagina é de natureza conjuntiva, apresentando elementos fibrosos elásticos


e musculares lisos. Imediatamente para o lado interno segue-se a camada muscular e, por último, a
mucosa contendo um córion com pregas longitudinais
550

(colunas vaginais) e papilas com numerosas fibras elásticas. A mucosa, que possui
epitélio pavimentoso estratificado, encontra-se destituída de glândulas, as quais apare
cem apenas no vestíbulo vaginal. •-} -•- <i•;•••• '-- --•" ; ; -^ ^ ••• - -.Í-W^^KV
A vagina possui artérias e veias, comunicando estas, directamente, com a circulação geral, sem
que haja passagem pelo fígado.-
Na prática corrente, a mucosa vaginal é apenas utilizada para aplicação de medicamentos
tópicos. Verifica-se, porém, alguma absorção medicamentosa por esta via, o que é susceptível de
interesse, dado que os fármacos absorvidos escapam à barreira hepática.
Os medicamentos administrados por via vaginal sào especialmente óvulos, comprimidos e
pomadas. Empregam-se por esta via fármacos adstringentes (taninos), anti-infecciosos (antibióticos,
sulfamidas), queratoplásticos (ictiol), cicatrizantes (alan-toína), etc.
Os comprimidos contêm, normalmente, como excipientes, misturas de lactose, sacarose e
glucose, uma vez que estes açúcares facilitam o desenvolvimento dos bacilos de DÕDERLEIN, parasita
necessário à sanidade da mucosa.
Além das infecções bactéricas mais correntes da mucosa vaginal devem ser consideradas as
produzidas por Trichomonae e por Moniüae. Os tricomonas são muitas vezes eliminados com
glicolilarsanilato de bismuto e com viofórniio, enquanto que para a monília se tem utilizado a
nistacina e o roxo de genciana. , ° ; ;'
O útero apresenta três camadas fundamentais: 1) túnica adventícia ou peritoneal, de natureza
conjuntiva; 2) túnica muscular ou miométrio\ 3) túnica mucosa ou endo-métrio.
A camada muscular mostra uma profunda vascularização, o que explica poder registar-se
absorção medicamentosa, acidental ou propositada, pelo útero.
Nos períodos pós-parto e pós-menstrual nota-se incremento de absorção pelo útero, o que tem
dado origem a certas intoxicações quando nessa altura se procede a lavagens útero-vagi na i s com
soluções aquosas de anti-sépticos não inócuos, como o cloreto mercúrico.

4.3.10. ADMINISTRAÇÃO PARENTERAL

Pode dizer-se que a administração parenteral (do grego: para = ao lado + enteron = intestino),
também chamada injectável, principiou a de sen volver-se depois dos trabalhos de PASTEUR sobre a
esterilização. Até essa altura, a via parenteral, que foi pela primeira vez utilizada de uma maneira
sistemática na terapêutica humana por ALEXAN-DER WOOD, em 1853, tinha dado origem a diversos
acidentes infecciosos, já que os medicamentos não eram esterilizados. A falta de assepsia das
preparações primitivas provocava, com certa frequência, o aparecimento de abcessos e de outras
infecções, o que originou o descrédito desta via de administração, por espaço de algumas décadas
551

É curioso relembrar que a Pharmacopeia Portugueza de '1876 já inscrevia alguns medicamentos


injectáveis, que, porém, não eram esterilizados. Ái^r ..-^ •?.-?£?.-. „ , ,•--,-.
A necessidade de utilização de medicamentos estéreis é, portanto, uma das exigências da via
parenteral. Além desta, requere-se, ainda, que os medicamentos aquosos injectáveis apresentem pH e
tonicidade compatíveis com os tecidos onde são aplicados. Estas três exigências são comuns aos
colírios aquosos, mas para a via parenteral é também importante que seja respeitada uma última
característica — ausência de pirogénios.
Os pirogénios são produtos de excreção ou de desagregação dos microrganismos que, quando
injectados em elevada quantidade, dão origem ao aparecimento de reacções febris. A sua presença
não é, portanto, desejável, especialmente quando é elevado o volume de medicamento a injectar. Na
prática corrente considera-se destituída de interesse a existência de pirogénios quando o volume de
líquido a injectar é inferior a 10 ml.
A via injectável pode ser subdividida em diversas vias de administração, considerando-se, como
mais importantes, a intradérmica, subcutânea, intramuscular, endovenosa, intrarraquídica,
intraperitoneal e intrapleural.
Das vias de administração assinaladas é evidente que a endovenosa é a de
acção mais rápida e de efeito mais intenso, uma vez que não comporta a fase de
absorção. Segue-se-lhe em potência e velocidade .-, >:
de actuação a via intramuscular, só depois poden
do considerar-se a administração subcutânea. É
curioso notar-se que algumas vezes a via rectal é
de efeito mais rápido e intenso do que a intramus
cular, como foi observado por GREENLEAF e HAD-
GRAFT a propósito da administração de hipnóticos
(Hg. 226).
Por via parenteral são administradas soluções e *---*
Subcutanaos
......... Oral
suspensões aquosas ou oleosas, emulsões de óleo em água e
Fig. 226. Relação entre a intensidade e
comprimidos que se implantam no tecido subcutâneo. a duração do efeito hipnótico-
No que diz respeito aos veículos aquosos (soluções, anestésico e
a via de administração.
suspensões e emulsões), interessa considerar a tonicidade da
fase aquosa, sendo desejável ; >,:.._;<:, ,>—'-"rr;-'^>«; que os Segundo J. Greenleaf e J. Hadgraft —
Chem. Drug, 173, 41 (1960)
medicamentos deste tipo sejam isotónicos com o soro sanguíneo. Naturalmente que, do mesmo modo
que acentuámos para os colírios, não há, obrigatoriamente, acidentes após injecção de líquidos hipo
ou hipertónicos. Pode dizer-se que é, em regra, tolerável uma hipotonía correspondente à de uma
solução aquosa de cloreto de sódio cuja concentração seja superior a 0,44%. Soluções mais
hipotónicas são naturalmente mal toleradas pêlos tecidos, provocando hemólise, no caso de
administração endovenosa.
552

As soluções hipertónicas são normalmente menos nocivas para os tecidos, designadamente


para o sangue, uma vez que a plasmólise, ao contrário da hemóïise, é um fenómeno reversível.
A tonicidade de uma solução não deve ser apreciada independentemente da via de
administração e do volume injectado. Compreende-se que a injecção de pequenos volumes de
soluções anisotónicas apresente um perigo muito relativo para os tecidos, já que aquelas são,
rapidamente, misturadas com os líquidos intra ou extravasculares, que amortecem o efeito
produzido. Por outro lado, a via escolhida é de primordial importância. Uma injecção
intrarraquídea obriga à preparação de uma solução rigorosamente isotónica, tal a fragilidade dos
tecidos onde a administração se faz; já as vias intramuscular, endovenosa ou subcutânea suportam
melhor as diferenças de pressão osmótica do líquido injectado.
É também desejável que o pH dos líquidos injectáveis seja ajustado próximo da neutralidade.
Não pensemos, porém, que se não administrem medicamentos ácidos ou alcalinos. Muitos fármacos
apenas são activos, estáveis ou solúveis a valores de pH não fisiológicos. A insulina, a morfina, as
vitaminas B,, B2, B6, B]2, o ácido pantoténico e o pantenol, etc., apenas são estáveis a baixo valor de
pH. Preparam-se, assim, diversos medicamentos injectáveis a pH próximo de 2. Em contrapartida,
muitos compostos, como as sulfamidas e os barbitúricos, exigem alcalinidade para se dissolverem na
água, sendo comum a administração por via parenteral de soluções de pH 9 ou 10.
Como acentuámos a respeito da tonicidade, interessa considerar o pH de uma solução,
suspensão ou emulsão relativamente ao volume administrado c à via por que se aplica. A capacidade
tampão dos tecidos e do sangue, em particular, compensa, facilmente, as diferenças existentes
quando seja pequeno o volume administrado. Os grandes volumes podem, pelo contrário, alterar
profundamente o equilíbrio fisiológico. Do mesmo modo, as vias mais melindrosas, como a
intrarraquídea, exigem maiores cuidados do que as menos afectadas pela variação do pH, como a
subcutânea.
Do que se disse compreende-se que é desejável preparar injectáveis neutros, api-rogénicos e
isotónicos sempre que se trate de soluções aquosas. Desejável não significa, portanto, obrigatório, e
essa obrigatoriedade só surgirá em determinadas condições que ao farmacêutico compete verificar
(volume a injectar e via de administração). Finalmente, todos os medicamentos injectáveis devem
apresentar-se estéreis, independentemente do volume administrado ou da via elegida para a sua
aplicação. Em alguns medicamentos injectáveis, cujos fármacos constituintes se alteram a
temperaturas elevadas e em que, portanto, a esterilização é feita por tindalização, pelo vapor fluente
ou por filtração, é necessária a presença de conservantes (anti-sépticos) que diminuam o risco de
ínquinação e de proliferação microbianas. Do mesmo modo, a presença de conservantes é
aconselhável nos injectáveis de doses múltiplas (multi-dose), mais susceptíveis de contaminação
durante o uso.
A maioria dos conservantes não pode ser considerada perfeitamente inócua para o naciente,
especialmente quando o volume injectávei é grande ou quando a via de
553

administração apresente particular risco de lesão dos tecidos em causa. Isto é o que sucede com a
aplicação de injectáveis por via intrarraquidea, os quais podem provocar necrose ou destruição do
tecido nervoso. Nestas circunstâncias, o suplemento à Farmacopeia Portuguesa IV anota
judiciosamente: «As preparações que tiverem sido adicionadas de conservantes serão administradas
pelas vias subcutânea ou intramuscular, com exclusão de qualquer outra via parentérica, excepto a
intravenosa quando o volume a injectar não exceder 15 ml. Em todos os casos o conservante
empregado não deve alterar a preparação injectável nem modificar a sua acção terapêutica».
De igual modo, a Farmacopeia Portuguesa V estabelece o mesmo limite, aliás de acordo com a
Farmacopeia Europeia.

4.3.10.1. Via intradérmica ?

Por administração intradérmica entende-se a prática da injecção entre a derme e a epiderme.


Os líquidos medicamentosos são, portanto, administrados na pele, usando-se para isso uma seringa
munida de uma agulha curta e fina. O volume injectado é sempre muito pequeno, da ordem dos 0,06
a 0,18 ml. Mesmo assim, uma administração deste tipo ocasiona o levantamento da epiderme,
formando-se entre esta e a derme uma papila contendo o líquido injectado.
É a pele do antebraço a zona geralmente escolhida para a administração intradérmica. Entre
os medicamentos aplicados por esta via citamos as soluções de histamina e diversos produtos
microbianos, como a toxina para a reacção de SCHICK.
Semelhante à administração intradérmica é a administração subepidérmica, em que se procede
à escarificação da epiderme com um vacinostilo ou com uma agulha, aplicando-se o medicamento
na zona lesada. Como exemplo desta administração, lembramos a vacinação antívariólíca, feita nos
moldes correntes, e as cuti-reacções.

4.3.10.2. Via subcutânea " "

Como o seu nome indica, por via subcutânea ou hïpodêrmica os medicamentos são
administrados debaixo da pele, no tecido subcutâneo. As doses dos fármacos aplicados por esta via
são, habitualmente, metade das empregadas por via oral.
Relembremos que a hipoderme é constituída por uma camada fibro-adiposa, superficial, e por
uma camada fibrosa, profunda. O seu colagénio é rico em ácido hialurónico que lhe confere
apreciável viscosidade, característica esta que determina a difícil difusão dos medicamentos no
tecido subcutâneo. Por outro lado, o traumatismo proveniente da aplicação da injecção liberta
histamina que, como a serotonina, retarda a absorção medicamentosa.
554

4.3.10.2.1. Medicamentos líquidos

Por via subcutânea, e em condições normais, só se aplicam, em regra, pequenos volumes de


medicamentos líquidos, da ordem dos 0,3 a l ml. A administração de volumes mais elevados poderá
originar a formação de edemas, cuja extensão depende da quantidade do líquido aplicado. Os líquidos
aquosos administrados por via subcutânea vão sendo absorvidos por um processo de difusão passiva,
no seio da substância fundamental do tecido, seguindo-se a sua penetração através do endotélio dos
vasos sanguíneos e linfáticos e, portanto, a sua passagem à corrente circulatória.
Agulha inserta na Agulha inserta
epiderme para no /^ tecido
injecção x

Epider

••^Tecido subcutâneo

Glândula sudorípara Glândula sudorípara

Fig. 227. Administração intradérmica e subcutânea (esquema)

Como o próprio tecido subcutâneo contém hialuronidases, estas vão hidrolisando lentamente o
ácido hialurónico, diminuindo a viscosidade do meio e facilitando, assim, a difusão medicamentosa.
Compreende-se, também, que a administração simultânea de hialuronidases com o medicamento
líquido promova a sua mais rápida difusão e absorção.
Em condições normais, se a injecção da solução aquosa for praticada muito lentamente, por
exemplo gota a gota, o líquido ir-se-á reabsorvendo se a sua velocidade de difusão for superior à
velocidade de administração. Em regra, mesmo para volumes relativamente pequenos, carece-se de
uma a duas horas até que se dê a completa difusão do medicamento. Quando a via hipodérmica é
necessária para administrar grandes volumes de soluções aquosas, pode recorrer-se à injecção
simultânea de hialuronidases. Desta maneira, pratica-se a perfusão subcutânea ou administração gota a
gota de grandes volumes de soluções aquosas. Esta prática, chamada hipodermoclise, é usada
555

em substituição da via endovenosa, quando esta seja pouco acessível, como nos recém-
-nascidos. ••' - • • * . • • . "*•".?•>.: Vi r.jrJ^-m -•- ?t: •-,
A administração conveniente de hialuronidases permite, muitas vezes, injectar, no
espaço de de?, a quinze minutos, volumes de soluções aquosas que, em condições
normais, demorariam algumas horas para serem absorvidas, O para-amino-salicilato de
sódio é um dos fármacos que se tem aplicado com hialuronidases, em perfusão sub
cutânea, em crianças e adultos. , . - j r\
Por via subcutânea administram-se, ainda, suspensões aquosas e oleosas e soluções
em óleos diversos. Compreende-se, no entanto, que, se esta via de administração é de
per se uma via que promove lenta absorção, o emprego de suspensões aquosas ou
oleosas ou de soluções oleosas só é desejável quando se requeira uma vagarosa cedên
cia do fármaco. " ••• ~ • .; ;
Nestas circunstâncias, aplicam-se, na hipoderme, numerosas formas farmacêuticas injectáveis
cujos excipientes são dotados de elevada viscosidade. Esta viscosidade dificultará a absorção,
prolongando o efeito terapêutico. Entre as substâncias usadas para incrementar a viscosidade das
soluções ou da fase dispersante de uma suspensão citamos a carboximetilcelulose sódica, a pectina,
a gelatina, as protaminas, as globulinas, a polivinilpirrolidona, o monoestearato de alumínio, etc.
Este último é utilizado em soluções ou suspensões .oleosas e os restantes compostos usam-se em
líquidos aquosos. Muitos antibióticos e hormonas são, assim, administrados nestes veículos de acção
retardada ou prolongada. A insulina, por exemplo, é empregada sob a forma de insu-lina-protamina-
zinco ou insulina-globulina-zinco. Note-se que a presença de zinco melhora a lentidão da absorção,
dadas as suas propriedades adstringentes. As penicili-nas podem ser, igualmente, administradas por
esta via, como acontece com a penicilina G-benzatina. A heparina, fármaco anticoagulante, é
usualmente aplicada por via endovenosa mas pode também ser administrada por via subcutânea,
especialmente associada à polivinilpirrolidona (heparina lenta).
Quanto à administração de soluções ou de suspensões oleosas, é fácil compreender que a
difusão medicamentosa deverá processar-se ainda mais lentamente. De facto, o solvente, não
miscível com a substância fundamental do tecido conjuntivo, formará pequenas gotículas
medicamentosas que devem originar a cedência do fármaco mediante fenómenos de fagocitose pêlos
leucócitos. Não é, porém, obrigatório que o fármaco seja absorvido simultaneamente com o veículo.
A administração subcutânea de óleo canforado origina absorção da cânfora muito antes de o óleo
atingir a corrente circulatória.
A velocidade de absorção de fármacos suspensos em líquidos aquosos ou oleosos, além de ser
afectada pela viscosidade da fase dispersante, dependerá da tenuidade das partículas da substância
medicamentosa. De um modo geral, quanto menor for o diâmetro das partículas e, portanto, quanto
maior a superfície total da fase dispersa, tanto mais rápida será a absorção.
Esta característica apresenta imenso interesse dado que, pela adequada divisão do pó
suspenso, se pode regular, em certa medida, a duração do efeito medicamentoso. Por
556

exemplo, a desoxicorticosterona, que em solução oleosa produz um efeito terapêutico que se mantém
por cerca de 8 dias, quando administrada, por via subcutânea, em suspensões cristalinas, dá origem
à obtenção de níveis plasmáticos assegurados por maior período de tempo. Assim, se os cristais
dispersos têm diâmetros compreendidos entre 5 e 150 M-, 150 e 250 fi ou 300 e 430 |l, a duração do
efeito terapêutico é, respectivamente, de 10, 26 e 44 dias.

:
4.3.10.2.2. Medicamentos sólidos

Por via hipodérmica, além das soluções ou dispersões aquosas ou oleosas, podem administrar-
se vários medicamentos sólidos, a que se dá o nome de implantações subcutâneas.
Os medicamentos sólidos aplicam-se, normalmente, por incisão no tecido subcutâneo, sendo
constituídos por minúsculas esférulas, obtidas por fusão, ou por pequenos comprimidos (7 mm de
diâmetro por 3 mm de espessura), a que os anglo-saxónicos dão o nome de «pellets». Em 1980 e por
sugestão de um de nós foram produzidos «pellets» esféricos pelo método de gotejamento que
descreveremos a propósito das «Pílulas».
Os fármacos contidos nas implantações vão sendo cedidos muito lentamente e muito
lentamente, também, vão passando à corrente sanguínea. Proporcionam, portanto, uma absorção
lenta e regular que é conseguida à custa da sua dissolução nos líquidos extravaseulares subcutâneos
e que pode prolongar-se desde alguns dias até meses.
Os excipientes empregados deverão, igualmente, ser susceptíveis de absorção, de modo a que
não funcionem como corpos estranhos. A maioria é inteiramente hidros-solúvel, mas têm sido
utilizadas substâncias solúveis nos óleos, como o colesterol.
São diversos os factores que afectam a velocidade de absorção dos fármacos contidos nas
implantações. Se bem que este assunto ainda não esteja perfeitamente esclarecido, pois muitos
trabalhos experimentais chegam a resultados contraditórios, o que tem levado a compreensível
desorientação, parece-nos poderem considerar-se, como mais importantes, as características a
seguir relatadas.

; 4.3.10.2.2.1. Forma geométrica e superfície

• Depois dos trabalhos de SHELESNYAK e ENGLE ficou suficientemente esclarecido que a taxa de
absorção num dado tempo era proporcional à área de implantação. Este facto tem imenso interesse,
uma vez que à medida que o sólido se vai dissolvendo no tecido cutâneo, vai diminuindo a sua
superfície, retardando-se a absorção. De facto.
557

o ritmo de absorção de um «pellet» é cada de vez mais lento à medida que vai diminuindo
tamanho por efeito da sua dissolução nos líquidos extravasculares. ; -ir.
Por outro lado, a forma geométrica da implantação afectará, como é lógico, a
velocidade da absorção. Quando as implantações
têm forma esférica são mais lentamente
absorvidas do que sob qualquer outra forma ^ TOO
geométrica. Efectivamente, na esfera é menor a
relação entre a superfície e o volume (e,
portanto, a massa) do que em qualquer outra
forma sólida. A Fig. 228, reproduzida de um
artigo devido a BALLARD e NELSON, mostra o
diferente comportamento de implantações
esféricas ou cilíndricas, de vários diâmetros, no
que diz respeito à absorção. "05
Está, também, demonstrado que a cinética ,§, 600
(D
de libertação do fármaco é, em regra, de •£ 500
ordem zero, isto é, a velocidade de cedência é Q
independente da concentração daquele. S 40°
l 300
O ° ta
20

£ 100
4O BO 120 160 ZOO
240 2QO SiO 560 «00
Tempo (horas)
Fig. 228. Diminuição do peso de
implantações cilíndricas ou esféricas, em
função do tempo. Os números que
interceptam as curvas referem-se à relação
inicial entre a altura e o diâmetro dos «pellets»
cilíndricos. A linha tracejada reproduz a
diminuição de peso de uma implantação
esférica
Segundo Ballard e Nelson — J. Pharm. Sei.,
51, 917 (1962)

4.3.10.2.22. Acidez ou basicidade ^ ,

Como em muitos casos análogos a que atrás aludimos, a absorção das implantações é
influenciada pelo facto do fármaco se comportar como um ácido fraco ou como uma base fraca,
dependendo da respectiva constante de dissociação. BALLARD e NELSON dedicaram-se ao estudo das
equações capazes de reger matematicamente o fenómeno, tendo publicado um detalhado artigo sobre
o assunto no J. Pharmacol. Exp, Therap., 135, 120 (1962).

4.3.10.2.2.3. Solubilidade

A solubilidade do fármaco no soro sanguíneo parece afectar favoravelmente a


velocidade de absorção. • .... , __.-.aM - -. .,
A relação entre a solubilidade do princípio activo e a dos excipientes deveria também afectar a
velocidade de absorção. Contudo, «pellets» compostos por hexestrol (pouco solúvel) e lactose (muito
solúvel) não são mais rapidamente absorvidos do que implantações preparadas exclusivamente com
hexestrol.
558

Entretanto, VALDA ARAÚJO, estudando «pellets» obtidos por gotejamento e preparados com fosfato
de riboflavina dissolvido em polioxietiíenoglicóis, chegou à conclusão que se consegue maior
lentidão no processo absortivo sempre que o fármaco esteja dissolvido no excipiente.

4.3.10.2.2.4. Fagocitose .Jri ; ,ti>;.,-;.,.,:,.,. i

Tem-se admitido que a fagocitose (pinocitose) seria um dos fenómenos necessários


para que fosse promovida a absorção das implantações. Estudos mais recentes levam a
considerar pouco importante este fenómeno, que tanto interesse apresenta, contudo, na
absorção de líquidos oleosos por via subcutânea ,;

4.3.10.2.2.5. Encapsulação
:•••- .. -.f•••'-•*.$ •
Alguns «pellets» ficam como que enquistados no tecido hipodérmico, revestindo--se de uma
cápsula fibrosa. Segundo muitos autores, o mencionado fenómeno retardaria a absorção. A
tendência actual é considerar desprovido de interesse este revestimento fibroso, no que diz respeito à
variação do teor da difusão medicamentosa.

Em resumo, podemos dizer que a velocidade de absorção dos fármacos, sob a forma de
implantações subcutâneas, depende fundamentalmente da superfície do «pel-let», da solubilidade dos
seus constituintes nos líquidos extra v ase u lares e da constante de dissociação do fármaco. A
fagocitose e a encapsulação parece não afectarem a taxa de absorção dos medicamentos. BALLARD
observou que a velocidade de absorção depende ainda da actividade física da zona de aplicação, tendo
feito experiências com implantações de penicilina-procaína.
São numerosos os fármacos empregados por via subcutânea sob a forma de «pellets», citando-
se, entre eles, várias hormonas sexuais (testosterona, androsterona, estradiol), corticóides, como o
acetato de desoxicorticosterona, vitaminas, como a riboflavina, antidiabéticos, como a tolbutamida,
etc.

4.3.10.3. Via intramuscular

Na administração intramuscular o medicamento é injectado nos músculos. Para isso a agulha


da seringa atravessa a pele, o tecido subcutâneo e a faseia ou membrana que envolve o músculo,
atingindo a massa muscular, onde se fará a deposição medicamentosa.
559

Habitualmente são escolhidos, para este tipo de administração parenteral, os músculos da


nádega, da coxa e da espádua. A Fig. 229 representa, esquematicamente, uma administração
intramuscular. ^ -..-*>.--• ...

Braço
Veia cefálica

Veia basílica
Cotovelo

Veia
basílica Pele
Tecido
subcutâneo
Faseia --" ';í
Antebraço

Agulha Agulha
inserta inserta no

Flg. 229. Via intramuscular e endovenosa (esquema)

O músculo estriado é dotado de elevada vascularização, sendo, em contrapartida, pouco


inervado por fibras sensitivas. Estas duas características conferem-lhe facilidade de absorção
medicamentosa e possibilidade de administração indolor. Efectivamente, por cada 50 mm3 de
volume do músculo, há cerca de 500 fibras estriadas e 1700 capilares.
No decurso do trabalho muscular, os capilares são dilatados por acções nervosas ou
hormonais, aumentando enormemente a superfície de absorção para a corrente sanguínea. Como
afirma REIN, na sua «Fisiologia Humana», o músculo nunca é submetido a um excesso de circulação
inútil e a dilatação da sua rede vascular é devida a reflexos vasomolores ou a acções directas sobre
os capilares. Nas circunstâncias referidas, compreende-se que a administração por esta via possa
ocasionar absorção mais rápida e injecção menos dolorosa do que a vida subcutânea. De facto, as
soluções aquosas absorvem-se com elevada velocidade quando administradas no tecido muscular
estriado, mas o mesmo não sucede quando o medicamento se apresenta no estado de suspensão ou
de solução oleosa. Nestes dois últimos casos acontece que o medicamento injectado funciona como
um verdadeiro depósito, dependendo a sua taxa de absorção da velocidade de dissolução do
fármaco suspenso ou do coeficiente de partilha óleo/água do princípio activo dissolvido.
Acessoriamente, e referindo-nos apenas aos injectáveis
560

oleosos, acentuamos que a absorção é ainda dependente da superfície total das gotículas
de óleo, aumentando com ela.
Por via intramuscular são administrados vários tipos de medicamentos líquidos, como
soluções e suspensões aquosas, oleosas, glicólicas, etc.
Habitualmente, os volumes dos líquidos administrados não ultrapassam os 10 ml, sendo na
maioria dos casos bastante menores (1-5 ml). Nestas circunstâncias, a preparação de medicamentos
injectáveis destinados à administração intramuscular não exige cuidados especiais, como a pesquisa
de pirogénios, já que a presença destes produtos apenas apresenta interesse real quando o volume
injectado é superior a 10 ml.
Ao concluir estas generalidades queremos chamar a atenção para o facto de algumas
injecções ditas intramusculares não atingirem o tecido alvo, mas executarem-se, realmente, no
tecido subcutâneo. Isto sucede quando haja largo envolvimento de tecido subcutâneo, o que pode
acontecer frequentemente nas mulheres, quando a injecção se pratica na nádega. A f i m de evitar
estes erros aconselha-se recorrer a agulhas compridas que dêem a possibilidade de atravessar todo
o tecido subcutâneo, permitindo que o líquido se injecte no músculo.
Por último, lembramos que algumas injecções intramusculares são dolorosas, pelo que é
frequente incluir na sua fórmula anestésicos locais que, simultaneamente, sejam conservantes, como
o álcool benzflico ou o clorobutanol.

4.3.10.3.1. Soluções aquosas : , ...

As soluções aquosas administradas por via intramuscular devem apresentar uma tonicidade
próxima da do soro sanguíneo. São toleráveis pequenos desvios no sentido da hipotonia e, em alguns
casos, é aconselhável uma ligeira hipertonicidade. Efectivamente, as soluções aquosas hipertónicas
provocam um leve derrame local dos fluidos dos tecidos (exosmose), o que pode originar uma
absorção uniforme. Diz-se mesmo que as soluções hipertónicas são mais rapidamente absorvidas, o
que será verdade dentro de certos limites. É, porém, de considerar que uma administração
parenteral corresponde sempre a um traumatismo e que para lá de considerações sobre a taxa de
absorção se deve ter em conta a tolerância local dos tecidos, com eventual aparecimento de dor.
Achamos, por isso, que as soluções aquosas destinadas a aplicação intramuscular devem ser
isotónicas ou ligeiramente hipertónicas. Só em casos especiais poderá recorrer-se a soluções
fortemente hipertónicas.
Em relação ao pH apresentado pelas soluções aquosas, lembramos que uma ligeira acidez ou
alcalinidade não provoca transtornos graves no tecido muscular. Na prática corrente considera-se
aceitável a utilização de injectáveis cujo pH varie entre 4,5-8,5, limites muitas vezes não acatados.
Quando o pH é demasiado baixo ou elevado, podem ocasionar-se reacções que vão da simples dor,
com congestão e inflamação subsequentes, até à destruição, por necrose, dos elementos celulares.
Tratando-se de líquidos
561

francamente ácidos, a sua injecção pode ocasionar coagulação das albuminas teciduais, o que
retarda ou mesmo impede a absorção medicamentosa.
De uma maneira geral, a administração de soluções aquosas cuja tonicidade e pH estejam
próximos dos valores fisiológicos, origina uma absorção do fármaco, efectuada
f
rapidamente e sem que se manifestem fenómenos adversos. E, porém, de ter em conta que a dor,
concomitante ou subsequente à injecção, não depende exclusivamente das características físico-
químicas da fórmula, mas pode estar ligada à acção do próprio fármaco. Um injectável de vitamina
Bj ou de complexo B é normalmente doloroso, mesmo quando o pH e a tonicidade da solução sejam
muito próximos dos valores ideais. A penicilina é dolorosa, ao contrário da estreptomicina, etc.
Por outro lado, verifica-se que é possível tornar indolor a administração injectável de várias
soluções hipo ou hipertónicas, desde que se injectem muito lentamente.

4.3.10.3.2. Soluções oleosas * ,,. \ .

Do mesmo modo que se utilizam soluções aquosas, é corrente o emprego de injectáveis


constituídos por soluções em óleo. Normalmente, exige-se que o óleo utilizado apresente uma acidez
inferior a 0,1%, expressa em ácido oleico.
A viscosidade do óleo utilizado é uma característica que interessa precisar, podendo dizer-se que
a tolerância local e a velocidade de absorção do fármaco são favorecidas pela fluidez da
preparação. Assim, por exemplo, o oleato de etilo, menos viscoso do que o azeite, tem-no substituído
total ou parcialmente na dissolução de muitos fármacos destinados a aplicação intramuscular. E,
porém, o coeficiente de partilha óleo/água do princípio activo e a velocidade da circulação
sanguínea local que condicionam, em última análise, a taxa de absorção.
Por vezes, a absorção tecidual do óleo efectua-se muito lentamente ou não chega
mesmo a operar-se. Formam-se, assim, verdadeiros nódulos de corpo estranho, a que se
dá o nome de oíeomas, abcessos frios ou abcessos assépticos. Em alguns casos, essa
deficiente absorção do veículo deve-se à reacção entre os sabões alcalinos, formados por
neutralização dos ácidos livres do óleo, com os princípios medicamentosos. De facto,
quando se procede à neutralização da acidez de um óleo, emprega-se, correntemente, o
carbonato de sódio ou mesmo o hidróxido de sódio, formando-se sabões (oleato de
sódio, estearato de sódio, etc.) que permanecem em pseudo-solução no veículo oleoso.
É, pois, necessário proceder à sua eliminação, o que se consegue, por exemplo,
juntando cloreto de sódio, que os obriga a flocular. Se a um óleo neutralizado, ao qual
não se tivessem eliminado os sabões formados, adicionássemos compostos de mercúrio
ou de bismuto, estes reagiriam com os sabões alcalinos presentes, originando, pelo
menos em parte, sabões mercuro-sódicos ou bismuto-sódicos. Ao injectar-se depois o
medicamento oleoso, aqueles sabões funcionariam como corpos estranhos, originando a
formação de abcessos dificilmente absorvíveis. . .: , • • ,„..:
562

Há alguns anos os acidentes citados registavam-se com muita frequência, dado o largo emprego
terapêutico, que na época se fazia, do mercúrio e do bismuro como agentes anti-sifilíticos.

4.3.10.3.3. Outras soluções f ~ , ,;'. \> .7"^'

Por via intramuscular podem injectar-se, ainda, soluções em veículos que não a água ou os
óleos. É o caso do emprego de vários álcoois, dos quais salientamos os glicóis, A maioria das
referidas soluções é constituída por misturas binárias ou ternárias em que um dos elementos é a
água. Contudo, empregam-se também soluções de glicóis sem serem associados à água. Se bem que
possam ser apontados vários inconvenientes a este tipo de medicação, normalmente viscosa e, em
regra, provocando dor, é corrente o emprego de injectáveis em que o dissolvente é exclusivamente
constituído por propilenoglicol, glicofurol, etc.
É de ter em atenção, como adiante apontaremos, as características de solubilidade na água
destes dissolventes e a sua toxicidade. De um modo geral, a absorção do fármaco é mais rápida se o
dissolvente escolhido for miscívcl com a água, ou, o que é o mesmo, com os líquidos teciduais. Neste
princípio se fundamenta o estudo do emprego de algumas formas medicamentosas de acção
prolongada destinadas a administração intramuscular. Com efeito, se o fármaco, insolúvel em água,
se dissolver num veículo hidromiscível mas anidro, ao proceder-se à injecção intramuscular
precipitará no seio do músculo: a água do tecido muscular mistura-se com o dissolvente injectado,
diminuindo o coeficiente de solubilidade do fármaco que precipita in silu. Algumas vezes essa
precipitação origina mesmo a cristalização do princípio medicamentoso no músculo. Diz-se que
houve formação de geno-cristais. Este tipo de injectáveis proporcionará a obtenção de um
verdadeiro depósito do fármaco no seio da massa muscular, de onde irá sendo absorvido muito
lentamente. Estas fórmulas injectáveis são designadas por fórmulas depósito ou depositum.
Como concretização do que acabámos de expor, citamos o emprego do trietileno-glicol,
veículo miscível com a água que dissolve, porém, fármacos hidro-insolúveis, como hormonas
sexuais. Ao injectarmos as soluções medicamentosas, contendo cerca de 100 mg do fármaco por
ampola, provoca-se a sua cristalização o que leva à lenta absorção do hormona administrada.
Também se utilizam, além dos óleos, veículos não miscíveis com a água. As suas soluções
injectáveis por via intramuscular comportam-se de modo análogo ao que indicámos para os óleos.
Acentuemos que, com algumas delas, só muito lentamente se dá a difusão do fármaco que é, por
isso, também lentamente absorvido. » <--v?
563

4.3.10.3.4. Suspensões . ; ..: ;

São de diversos tipos as suspensões empregadas para administração intramuscular. A


absorção do fármaco processa-se vagarosamente, conseguindo-se, sob esta forma, verdadeiros
injectáveis de acção prolongada. De um modo .geral, a velocidade de absorção depende do
coeficiente de solubilidade. Um exemplo claro do que dissemos pode ser representado pela
penicilina procaínica c pela penicilina benzatínica. Efectivamente, a penicilina procaínica é solúvel
na proporção de 8000 U por ml de água, enquanto que a penicilina benzatínica se dissolve, no
mesmo volume, apenas numa quantidade correspondente a 200 U. A importante diferença entre os
coeficientes de solubilitade dos dois antibióticos (a penicilina procaínica é 40 vezes mais solúvel)
ocasiona o diferente comportamento dos dois injectáveis. Embora aplicando-se ambos em suspensão
intramuscular aquosa, a penicilina procaínica é apenas mensurável no sangue até cerca de 24 horas
após a injecção, enquanto que a penicilina benzatínica ainda é evidenciável mesmo decorridos 10 a
15 dias. Vê-se, pois, que a velocidade de absorção do fármaco suspenso depende, fundamentalmente,
das suas características de solubilidade na água.
A cinética da libertação dos tarmacos em regra obedece às reacções de ordem zero, como pode
ver-se com os injectáveis de penicilina-procaína ou penicilina-benzatina e com a própria insulina
protamina-zinco. Quer isto dizer que a velocidade de cedência do fármaco a partir da suspensão é
independente da concentração daquele, exprimindo--se pela seguinte equação:

. . . , - . C = C -Kt - • ..
-- o '
•!-...j - • ...- . -

em que Co é a quantidade inicialmente administrada e, portanto, depositada no seio do músculo, C a


quantidade existente ao fim do tempo / c K a velocidade específica de libertação, característica de cada
fármaco. : MÏJ .'*-\ - ,-%?.; ,-;. •.-..j;.-^ ç--F. : .r-»v . -
Em relação às características físico-químicas das suspensões em veículo aquoso ou oleoso,
poderemos dizer que se devem observar as regras indicadas para as soluções aquosas ou oleosas.
Assim, é aconselhável que as suspensões aquosas tenham uma fase dispersante isotónica ou
ligeiramente hipotónica cujo pH se aproxime da neutralidade, Nas suspensões oleosas devem
utilizar-se óleos neutros. , . ;;- .- , ; , .^
É ainda de considerar o emprego dos adjuvantes (agentes suspensores e tensioac-tivos) que,
embora possam favorecer a fórmula pela maior facilidade de execução, são susceptíveis de
modificar a absorção medicamentosa, devido à formação de complexos. Este facto, aliás, já foi
discutido ao falarmos da via rectal e a ele voltaremos ao tratarmos da forma farmacêutica
suspensão.
Entretanto, acentuamos que, como em casos análogos, a velocidade de absorção, sendo
dependente do coeficiente de solubilidade, é implicitamente influenciada pelo diâmetro das
partículas suspensas. Naturalmente que não é possível, em todos os casos.
564

retardar a absorção preparando suspensões com partículas muito volumosas. Tecnicamente, o processo
teria dois inconvenientes: pequena estabilidade física da suspensão e eventual entupimento da agulha
por onde se injecta.

4.3.10.4. Via endovenosa ' ;

A administração endovenosa ou intravenosa é efectuada introduzindo-se o medicamento


directamente, por uma veia, na corrente sanguínea.
A prática das injecções endovenosas é muito antiga. Parece que já em 1642 se utilizou a via
intravenosa para experimentação no animal e o Journal dês Sçavants, de 23 de Janeiro de 1688, fala
da aplicação das infusões medicamentosas intravenosas no homem,
Por esta via somente se empregam preparações aquosas, sendo a sua quase totalidade sob a
forma de solução. Secundariamente esta via serve para administrar suspensões aquosas ou emulsões
de óleo em água. Em qualquer destes dois últimos casos, é fundamental que as partículas suspensas
ou emulsionadas apresentem diâmetros inferiores a 7 |^ (em regra 1-2 já), valor médio do diâmetro
dos eritrócitos. Efectivamente, uma vez que cada partícula dispersa apresente um volume inferior ao
do glóbulo rubro, não é muito de temer o aparecimento de fenómenos de embolia oi\ de trombose,
que ocorreriam se esse grau de divisão não fosse respeitado. Apesar disto, só em casos extremos se
utilizam tais preparações, com receio de que provoquem embolias pulmonares.
BRANEMARK e LINDSTRÕM verificaram que a administração de emulsões óleo/água em coelhos não
provocava acidentes graves tais como a agregação intercorpuscular dos eritrócitos ou das
plaquetas.
Em geral, a administração endovenosa é efectuada recorrendo-se, sobretudo, à veia basílica,
veia da região da prega do cotovelo, pois é superficial, localiza-se facilmente e está em ligação com
outras grandes veias do braço (Fig. 229, pág. 559).
Os volumes de líquido injectado variam entre limites muito latos, sendo correntes injecções de
l a 1000 ml, ou mais. À administração endovenosa de grandes volumes de soluções aquosas, dá-se o
nome de fleboclise, venoclise ou perfusão endovenosa. Habitualmente, a aplicação de elevados
volumes de soluções medicamentosas é feita lentamente, de preferência gota a gota.
Uma vez que por esta via o medicamento é administrado na corrente sanguínea, não se pode
falar em velocidade de absorção. De facto, os fármacos tlcam imediatamente em circulação e por
isso se compreende que a via endovenosa seja necessariamente a mais rápida. É bom não esquecer
que esta vantagem traz, como consequência, o perigo de reacções secundárias, que são aqui mais de
temer do que com outras vias de administração. Não se trata, propriamente, do risco de infecção
subsequente à aplicação de um preparado não estéril. Quanto a nós, e não considerando os casos
extre-
565

mós, a proliferação microbiana no sangue é melhor evitada do que em qualquer outra via
parenteral, dada a defesa exercida pêlos leucócitos e a grande diluição operada. Mas além da
infecção podemos considerar muitos outros acidentes, devidos ao emprego de medicamentos não
convenientemente formulados ou aplicados. O, caso mais simples é o da sobredosagem
medicamentosa. Com efeito, a introdução, na corrente sanguínea, de uma dose excessiva de fármaco
pode ocasionar reacções bem mais graves do que as provocadas quando o medicamento é aplicado
por outra via de administração.
Além disso, há que ter em conta a sensibilidade individual do paciente ao fármaco, sendo de
temer os choques injectáveis subsequentes à administração endovenosa, e, se ao médico compete
providenciar no sentido de que se evitem estes acidentes, o farmacêutico é obrigado a preparar
fórmulas que causem a menor perturbação possível. Entre os requisitos a que deve satisfazer um
injectável endovenoso, figuram a isotonia, a neutralidade e a ausência de pirogénios. Quanto à
isotonia, acrescentaremos àquilo que atrás deixamos dito, que uma solução, suspensão aquosa, ou
emulsão O/A pode não ser isotónica e apesar disso não provocar quaisquer fenómenos
desagradáveis quando aplicada por via endovenosa. É preciso distinguir que as soluções
hipertónicas ocasionam plasmólise, mas que este fenómeno é reversível; que uma solução pode ser
hipotónica mas não provocar hemólíse, já que é de considerar a resistência dos eritrócitos; a
anisotonia de uma solução a injectar não deve ser considerada, para apreciação dos efeitos
biológicos que provoque, independentemente do volume administrado. .
Colocado o problema nestes termos, diremos, em resumo, que é desejável que os medicamentos
destinados a serem administrados por via endovenosa sejam isotónicos. Pequenos desvios para o
lado da hipotonia (soluções correspondentes a concentrações de cloreto de sódio maiores de que
0,44%) são toleráveis sem acidentes, uma vez que a resistência dos eritrócitos permite evitar a
hemólise. Pequenos volumes (1-2 ml), mesmo fortemente hipotónicos, não ocasionam dano, uma vez
que são elevados o volume e a velocidade do sangue circulante, o que promove a rápida diluição do
líquido injectado.
E corrente a administração de soluções hipertónicas por via endovenosa, pois, mesmo para
volumes elevados (> 100 ml), o estado anti-fisiológico que se cria não provoca lesões apreciáveis,
visto que a plasmólise é reversível Acontece até que em certos casos recorre-se mesmo à
administração de soluções hipertónicas com o fim de provocar a absorção dos líquidos
extravasculares e de originar um efeito diurético ou, mais simplesmente, de se pretender apenas alimentar o
doente. : • - • . - • > ; ll<í "
No que diz respeito ao pH dos líquidos injectados, é aconselhável preparar soluções
sensivelmente neutras (6-7,5). Contudo, empregam-se, sem risco, injectáveis com pH bastante
afastado dos limites assinalados, É evidente que o volume administrado deve ser sempre considerado
quando o pH do medicamento não corresponde à neutralidade. Entretanto, lembremos que o sangue
apresenta elevada capacidade tampão, principalmente em relação aos ácidos (reserva alcalina do
sangue). Acentuemos, também, que a acidez inorgânica é muito mais prejudicial do que a acidez
proveniente de compostos orgânicos. Tal como no caso dos líquidos hipertónicos, o volume do
sangue
566

e a sua velocidade de circulação, pela diluição que determinam, são factores favoráveis na
correcção do pH do líquido injectado.
Finalmente, a ausência de pirogénios é obrigatória nos medicamentos administrados por via
endovenosa. Teoricamente, dever-se-iam pesquisar aqueles compostos em todos os injectáveis. Na
prática corrente, porém, verifica-se que é inútil proceder a essa pesquisa, sempre que o volume a
injectar seja inferior a 5 ml. Com efeito, seria necessária a existência de um verdadeiro
«concentrado de pirogénios» para que um volume tão pequeno provocasse acidentes de
hipertermia. Já, porém, a administração de volumes mais elevados obriga, sistematicamente, à
pesquisa de pirogénios. A atitude recomendada nada tem a ver com a análise que deverá ser feita
para todas as drogas em que seja de admitir ou prever a existência de pirogénios, como é o caso de
produtos biológicos (antibióticos, hormonas, citratos, gluconatos, etc.). Em todos esses casos as
farmacopeias mandam que se proceda à pesquisa de pirogénios nas matérias-
-primas.
O suplemento à F. P. IV, na sua monografia «Preparações Injectáveis», considera ainda outro
cuidado a ter com os medicamentos destinados à administração endovenosa, nos quais não tolera
conservantes germicidas, sempre que o volume a injectar seja superior a 15 ml. Esta precaução,
aliás inserta também na F. P. V, é bastante judiciosa, uma vez que se injectariam elevadas
quantidades de conservante, quando fosse grande o volume administrado.
A administração de grandes volumes de medicamentos injectáveis por via endovenosa tem
sido ultimamente estudada, procurando-se conseguir preparações que permitam a alimentação total
do doente, quando a via oral está impedida por qualquer razão. Este tipo de administração é
constituído por volumes elevados de líquidos, que se injectam, passando para a corrente sanguínea
do paciente açúcares (glucosc, frutose, sorbitol, xilitol, etc.), hidrolisados proteicos ou aminoácidos
puros ern solução compensada (solução de aminoácidos essenciais, solução de 20 aminoácidos),
gorduras emulsionadas (geralmente óleo de soja a 10-20%), vitaminas e sais minerais. A este tipo de
administração chama-se nutrição total parenteral (NTP) ou alimentação parentérica total (APT).
. A infusão pode aplicar-se nas veias periféricas, o que tem a vantagem de serem menores e mais
fáceis de eliminar as complicações do tipo infecção ou tromboflebite. Entretanto, se as soluções
açucaradas forem hipertónicas há sempre grande perigo em se produzirem esclerosações das veias
periféricas. Por outro lado, a agulha não deve permanecer por mais de 12 horas na mesma veia
superficial pois após este prazo eleva-
-se de 5 para 40-70% o risco de surgirem flebites. Por essa razão sempre que se preveja que a
alimentação tenha de se processar por um período superior a l semana aconselha-se que se recorra
ao uso de cateteres, sendo preferível a sua introdução na veia cava, apesar do perigo de poderem
surgir septicemias, particularmente devidas a Cândida albicans.
567

Postas estas generalidades, passemos rapidamente em revista os acidentes ou surpresas a que


pode dar origem uma administração endovenosa. Num artigo de CHARONNAT são sintetizados esses
acidentes do modo seguinte: a) lesões locais', b) fenómenos infecciosos; c) fenómenos térmicos; d)
fenómenos nervosos.

4.3.10.4.1. Lesões locais

Algumas vezes, a administração endovenosa pode provocar trombose. É um acidente bastante


perigoso, em geral atribuído à hipertonia da solução ou ao seu pH demasiado baixo. Diversos
injectáveis ocasionam a formação de esclerose venosa, tacto muitas vezes desejável como meio
terapêutico. E o que sucede com o emprego, como esclerosantes, do quinino, da antipirina e das
butazolidinas. Estes compostos, aplicados, por exemplo, no tratamento das varizes, promovem uma
verdadeira descapagem da parede vascular, de que resulta, depois, a sua regeneração.
O acidente local mais grave, subsequente à administração endovenosa, é sem
dúvida a grangrena. São as soluções ácidas as mais susceptíveis de a provocarem.
Também certos compostos, como a adrenalina, têm originado gangrenas mais ou menos
graves, o que em muitos casos se deve a ter-se praticado a injecção numa artéria que
se confundiu com uma veia. ..„,

4.3.10.4.2. Fenómenos infecciosos ;


•'- • < -:. , •• >> ;•• : ' •*> • ,>''iíC* '
Se bem que o sangue suporte melhor do que os restantes tecidos a contaminação microbiana,
as exigências de esterilidade para os preparados endovenosos devem ser rigorosamente respeitadas.
Entre as infecções mais vulgares é de assinalar a transmissão do vírus da hepatite ou do vírus da
SIDA no decurso de transfusões sanguíneas.

4.3.10.4.3. Fenómenos térmicos ??i/>f^tu & , * ,-.í

Sob esta designação não nos queremos referir aos fenómenos infecciosos que originam,
tardiamente, elevação de temperatura, mas aos acidentes térmicos que surgem rapidamente após
uma injecção. Em primeiro plano são de mencionar as hipertemias resultantes da presença de
pirogénios nos líquidos injectáveis. Oportunamente abordaremos esse assunto. Entretanto, queremos
aqui chamar a atenção para alguns fármacos que são, também, susceptíveis de originar alterações
de temperatura, como o gluconato de cálcio, os produtos de decomposição do ácido para-amino-
salicílico, etc.
568

4.3.10.4.4. Fenómenos nervosos

Entre os fenómenos de ordem nervosa rnais correntemente registados quando se


praticam injecções na corrente sanguínea, são de citar a onda de calor e os formigueiros
que tantas vezes ocorrem em muitos pacientes. Várias substâncias, como o gluconato de
cálcio, podem provocar estes fenómenos, os quais se conseguem atenuar aspirando um
pouco de sangue para a seringa e fazendo-o, assim, contactar com o medicamento antes
da injecção. - v'm.-. .---.•, -
Pode dizer-se que a via endovenosa não ocasiona sensação de dor ao injectar.
Entretanto, verifica-se que certos compostos, como a benzoquinona, utilizada em traba
lhos experimentais, provocam dores violentas nos animais injectados, manifestadas por
intensos gritos. <.
A injecção de volumes elevados é melhor tolerada quando a solução se encontra aquecida a
30-35°C e a administração se processa lentamente. Como regra, e salvo necessidade justificada
para outro procedimento, é aconselhável que a injecção seja lenta, mesmo que se trate de pequenos
volumes de líquido contendo substâncias inofensivas. Este cuidado evita a modificação brusca do
equilíbrio dos colóides plasmáticos, salvaguardando-se o aparecimento de fenómenos de choque e
de colapso cardíaco.
ROBINSON, citado por VALLETE, mostrou que para o pentobarbítal a toxicidade do medicamento
diminuía apreciavelmente com o aumento do tempo de injecção (para uma duração de 1/60 minuto a
DL5() era de 76 mg/kg; para 10 minutos a DL50 era de
200 mg/kg). .. - - - v ; ...'V.--.;jo".: ' ' "' " . - > * ' -.;.?*
Este aspecto tem o maior interesse quando se administram volumes elevados de
soluções medicamentosas que apresentam pequenas percentagens de histamina. CORRBIA
DA SILVA e SILVA COSTA observaram este fenómeno, ao verificarem que a velocidade da
injecção de hidrolisados proteicos afectava largamente a tensão arterial dos animais
ensaiados.

4.3.10.5. Via intra-arterial ;

Esta via proporciona uma acção medicamentosa mais rápida e intensa do que a via
endovenosa quando se pretende um efeito mais ou menos localizado. Por outro lado e segundo LESURE,
a toxicidade geral das substâncias é menor do que por via intravenosa.
Já anteriormente aos trabalhos de ALEXANDER WOOD, que teve o mérito de aplicar à clínica a
administração parcnteral, tinha sido utilizada a via intra-arterial. Os autores primitivos eram,
porém, do parecer que a via endovenosa seria a mais eficaz porquanto
569

«enviava ao coração o líquido injectado como à nascente comum para comunicar virtude a todos os
vasos que dele derivam».
Assim, depois de um curto período de aplicação esporádica, no século XVII, a via intra-arterial
foi abandonada, só voltando a ser utilizada depois dos trabalhos de LERI-CHE, de DE FOURMESTREAUX e de
REINALDO DOS SANTOS, há cerca de 50 anos.
Esta via foi empregada para aplicação de soros anti-tetânicos e anti-gangrenosos, de
mercurocromo, de violeta de genciana, etc.
Actualmente, a via intra-arterial é principalmente escolhida para injectar compostos opacos
aos raios X, a fim de se poderem executar exames radiológicos (angiorradiogra-fia ou
arteriografia). É corrente o emprego de produtos ricos em iodo e fortemente hipertónicos, os quais
se injectam nas artérias subclávia, femoral, etc. O 5-acetamido--2,4,6-triiodo-N-metilisoftalamato
de sódio é empregado em solução, a 66,8% ou a 80%, por via intra-arterial. O acetrizoato de sódio
(3-acetamido-2,4,6-triiodobenzoato de sódio) pode, igualmente, ser administrado por via intra-
arterial.

4.3.10.6. Via intrarraquídea

A administração intrarraquídea consiste em injectar a preparação medicamentosa no canal


raquideano, podendo ser praticada por via subaracnoidea ou intratecal e por via epidural ou
pendurai.
O emprego desta via deve-se à difícil passagem dos medicamentos do sangue para
o tecido nervoso especialmente para a região do encéfalo. '-'••-'
Efectivamente, observa-se que muitos medicamentos existentes no sangue só alin-gem com
dificuldade o tecido cerebral, levando para isso algumas horas. Já anteriormente citámos o facto,
ao aludirmos à chamada barreira sangue-encéfalo, mais correctamente designada por hemato-
encefálica. Actualmente, considera-se que os capilares cerebrais apresentam paredes formadas por
camadas celulares muito pouco permeáveis aos fármacos dotados de fraco coeficiente de partilha
óleo/água. Trata-se, afinal, de um caso particular de absorção em que, como vimos, este é um dos
factores decisivos.
Havendo, portanto, limitada passagem da corrente sanguínea para o tecido nervoso e sendo
muitas vezes desejável uma rápida resposta do organismo ao fármaco, há necessidade de recorrer à
administração intrarraquídea.
Os medicamentos injectáveis destinados a esta via são constituídos por soluções aquosas, as
quais devem obedecer, estritamente, aos preceitos exigidos a este tipo de forma galénica. Assim, por
via intrarraquídea impõe-se a administração de preparações aquosas neutras e isotónicas,
rigorosamente estéreis e apirogénicas. Por outro lado, condena-se a inclusão nos injectáveis de
qualquer conservante germicida que poderia vir a lesar elementos do tecido nervoso.
570

4.3.10.6.1. Via subaracnoidea

Os centros nervosos — encéfalo e espinal-medula — encontram-se protegidos por 3


membranas, as meninges, que, de fora para dentro, são a dura-mater, a aracnoidea e a pia-mater. No
espaço subaracnoideo, isto é, entre a pia-máter e o folheto visceral da aracnoidea, encontra-se o
líquido céfalo-raquidiano que enche igualmente as cavidades ventriculares do encéfalo. O orifício
de MAGENDIE, situado na face posterior do quarto ventrículo, estabelece a comunicação entre as
cavidades ventriculares e o espaço subaracnoideo.
O líquido céfalo-raquidiano, cujo volume é de cerca de 80 a 150 ml, é segregado pêlos plexos
coróides, espécie de vilosidades da pia-mater, particularmente desenvolvidas ao nível dos
ventrículos laterais e do terceiro ventrículo. Este líquido (') em constante formação, é absorvido
regularmente pelas granulações de PACCIONI. Pode falar-
-se, pois, em circulação céfalo-raquidiana, mas é bom anotar que o seu movimento é muito lento.
Nestas circunstâncias, um líquido injectado no espaço subaracnoideo só muito vagarosamente se
difunde, consoante a sua densidade e viscosidade. Compreende-
-se também que, por causa do pequeno volume e lentidão de movimentos do líquido céfalo-
raquidiano, as preparações injectadas devam apresentar pH e tonicidade próximos dos valores
fisiológicos, pois que, neste caso, não se pode pensar em compensações operadas por diluição ou
tamponação do meio. A confirmar o que dizemos, lembramos a trágica experiência da primitiva
sulfamidoterapia, em que se administraram soluções aquosas de sulfamidas com pH muito alcalino
(para que se dissolvessem na água), por via intrarraquídea. Houve diversos acidentes, consequentes à
administração de tais soluções, como paralisia dos membros inferiores, devida à lesão das fibras
nervosas. Do mesmo modo, a utilização de soluções anisotónicas não é recomendável por via
subaracnoidea, podendo surgir com o seu emprego acidentes mais ou menos graves, como náuseas,
vómitos, dores de cabeça, etc. Entretanto, infringe-se esta regra em casos muito particulares, em que
se utilizam soluções aquosas hipertónicas. Efectivamente, a difusão de um medicamento no líquido
céfalo-raquidiano é em parte dependente da sua densidade e da sua viscosidade. De um modo geral,
se um líquido for injectado no canal raquidiano de um paciente colocado em decúbito dorsal e tendo
a região anterior do corpo mais baixa, acontecerá que esse líquido atingirá o encéfalo tanto mais
rapidamente quando maior for a sua densidade. Nestas circunstâncias, pode conseguir-se maior
rapidez de difusão empregando soluções tornadas mais densas e viscosas por
junção de glucose, por exemplo.
"

(') O líquido céfalo-raquidiano deve apresentar-se límpido e incolor, com pH de 7,14 a 7,50,
ligeiramente mais viscoso do que a água e com uma pressão que varia entre 4,5-15 mm de Hg. Na
sua composição intervêm proteínas, ureia, ácido úrico, creatina, glucose e sais minerais.
571

Estas soluções dizem-se hiperbáricas, já que cada ml pesa mais do que l ml de líquido céfalo-
raquidiano (densidade de 1,005 a 1,009). É evidente que o seu uso pode provocar lesões, pois em
regra são também hipertónicas.
Em raquianestesia utilizam-se, com certa frequência, soluções de anestésicos locais, tornadas
hiperbáricas. É vulgar, por exemplo, o uso de soluções conlendo 5% de clori-drato de lidocaína e
7,5% de glucose, as quais são, também, hipertónicas.
Em alguns casos, a substância medicamentosa a injectar por via subaracnoidea é dissolvida
em líquido céfalo-raquidiano que se retira no momento, só depois se administrando a solução
extemporânea assim obtida. A procaína ou novocaína, por exemplo, pode aplicar-se por este
processo. Assim, o medicamento é dispensado sob a forma de cristais que se dissolvem no momento
do emprego, em líquido céfalo-raquidiano. Normalmente, é necessário l ml de líquido para dissolver
100 mg de procaína.

Espinal-rnedula
estreitando para o

Filum terminal*
Vértebra lombar
Agulha no espaço
subaracnoideo
Vértebra lombar
Espaço

Vértebra lombar
Dura mátir

Agulha no espaço subaracnoideo Fig. 230. Administração subaracnoidea ou intratecal


(esquema)

Pia máter Filum


terminale _,
Dura máter
_- Aracnoidea
! — Espaço
572

A prática da injecção subaracnoidea é sempre perigosa, pois o espaço subaracnoi-deo é


relativamente estreito em quase toda a sua extensão. De facto, a agulha pode perfurar a pia mater e
penetar na espinal-medula, causando dano irreparável. Uma vez que a espinal-medula termina, pouco
mais ou menos ao nível da primeira vértebra lombar, transformando-se num filamento muito estreito
(filum terminale), o espaço subaracnoideo alarga-se proporcionalmente. É por isso escolhida para
injecções a zona correspodente ao 2.°, 3." ou 4.° espaço intervertebrais lombares. Nessa região existe
maior volume de líquido céfalo-raquidiano, sendo menos de temer qualquer lesão medular.
Acrescentaremos, ainda, que o volume aquoso injectado no espaço subaracnoideo devera ser
pequeno, de preferência inferior a 10 ml. ^ . . . ;- ,
A Fig. 230 mostra a zona de administração subaracnoidea.

4.3.10.6.2. Via epidural

O espaço epidural ou peridural localiza-se entre a dura-máter e a parede do canal raquidiano


e, tal como o espaço subaracnoideo, alarga-se consideravelmente ao nível da região sacro-lombar.
As injecções por esta via são menos perigosas do que as intratecais e, geralmente, reservam-se
para se conseguir a anestesia dos membros inferiores e da pequena bacia.
Entre os anestésicos utilizados, citamos o cloridrato de lidocaína em concentrações de 0,6 a
1,5% e administrado em volumes de 20 a 30 ml.
A Fig. 231 representa, esquematicamente, a administração epidural e intratecal.
Espaço epidural

A
n
e
s
t
e
s
i
a

p
a
ravertebral
Anestesia
epidural
Espaço subaracnoideo (raquianestesia)
Flg. 231. Esquema mostrando a diferente localização da administração epidural e subaracnoidea
573

4.3.10.7. Via intraperitoneal

O peritoneu é uma membrana serosa que forra as paredes da cavidade abdominal e que recebe
os órgãos nela contidos tendo uma área de cerca de 22 000 cm2.
As serosas são constituídas por endotélio, tecido particularmente fino, sendo os líquidos
introduzidos na cavidade peritoneal absorvidos com facilidade, o que permite comparar a rapidez da
resposta obtida entre injecções intraperitoneais e endovenosas. Assim, após injecção intraperitoneal,
no coelho, de 100 ml de soro fisiológico, observa--se que se deu a absorção de 36% do cloreto de
sódio e de 23% da água ao fim de l hora. A absorção é efectuada, simultaneamente, por via linfática
e sanguínea. Nestas condições, a injecção intraperitoneal apresenta perigos semelhantes aos citados a
propósito da via endovenosa. Dado os acidentes que pode originar (infecção, formação de
aderências, etc,), a via intraperitoneal, é pouco empregada em medicina humana. Contudo, usa-se
correntemente em medicina experimental para avaliar a toxicidade ou o efeito farmacológico doe
medicamentos em animais.
Ao lado da injecção intraperitoneal queremos lembrar a chamada diálise peritoneal a que se
recorre na insuficiência renal aguda, em que se administram grandes volumes de líquidos, contendo,
em solução, sais de sódio, de cálcio e de magnésio, glucose, etc. E necessário que as soluções
destinadas a esta aplicação, e que às vezes se utilizam em volumes de 10-12 litros por dia, sejam
isentas de compostos tóxicos. Assim o bissul-fito de sódio, que se emprega como redutor em várias
soluções injectáveis na concentração de 0,05 a 0,1%, não deve figurar em preparações destinadas a
diálise peritoneal. De facto, sendo extraordinariamente elevado o volume do líquido administrado, é
também muito elevada a quantidade total de bissulfito que, dadas as características da via, se absorve
rapidamente, tendo HALABY e MATTOCKS assinalado acidentes de intoxi-cão em homens submetidos à
diálise peritoneal com soluções contendo bissulfito de sódio.

4.3.10.8. Via intrapleural

A pleura é a membrana serosa que, em cada hemitórax, reveste o pulmão e a parede torácica.
As duas pleuras são independentes, contactando entre si apenas numa pequena extensão retro-
external.
A injecção intrapleural de medicamentos promove a sua fácil absorção, já que o endotélio
constituinte é particularmente fmo.Observe-se, porém, que os gases só muito lentamente são
absorvidos pela pleura, facto em que assenta a terapâutica pelo pneumotórax.
As substâncias hidrossolúveis administradas por via intrapleural passam rapidamente ao
sangue, parecendo que a velocidade de absorção depende, entre outros factores, da viscosidade do
líquido injectado. Assim, e tendo em conta a elevada velocidade
574

da absorção, aconselha-se que as soluções injectáveis contenham compostos hidros-solúveis, capazes


de, pela sua alta viscosidade, retardarem a passagem dos fármacos à corrente circulatória. O sulfato
de estreptomicina, por exemplo, poderá, com vantagem, ser administrado em soluções contendo 1%
de carboximetilcclulose sódica. Nestas circunstâncias, o líquido injectável fica com uma viscosidade
de cerca de 6 centipoise, a 37°C. Em regra, os líquidos injectáveis apresentam pH à volta de 7-8,
sendo, no exemplo, recomendado o acerto a pH 7,8.
Em determinadas afecções pleurais, uma exsudação de fibrina ou um processo purulento podem
originar diminuição da velocidade de absorção dos medicamentos. Entretanto, esse atraso não é
normalmente muito acentuado, podendo passar-se de meia hora, nos casos normais, para uma a três
a horas nas circunstâncias assinaladas, tudo dependendo, também, da natureza do fármaco e da
formulação adoptada.

4.4. POSOLOGIA

A quantidade de medicamento que é necessário administrar, por determinada via, a fim de


produzir um dado efeito terapêutico, é designada por dose,
Se é conseguida a resposta clínica pretendida, diz-se dose terapêutica, a qual poderá ser
mínima (a menor quantidade precisa para produzir o efeito), média (a quantidade eficaz para um
grupo de indivíduos suficientemente numeroso para que represente um valor médio) e máxima (a
quantidade que não deve ser ultrapassada sem o que poderiam surgir efeitos tóxicos).
Excedida a dose máxima medicamentosa, atinge-se a dose tóxica, que poderá ou não ser mortal
(')•
Qualquer dos conceitos expressos é muito relativo, dado que todos eles foram estabelecidos
para o homem normal médio, não levando em conta a eventual hiper-sensibilidade, idiossincrasia ou
acostumância, particulares de cada doente.
A Farmacopeia Portuguesa IV inscreve uma lista de doses máximas dos medicamentos usuais,
considerando a via de administração empregada.
À secção da Terapêutica que estuda o modo de regular e de administrar as doses
medicamentosas dá-se o nome de Posologia. A Comissão da F. P. V está a preparar um volume
expressamente dedicado à Posologia dos Medicamentos.
Se bem que já víssemos que, em muitos casos, é possível estabelecer cientificamente quais as
doses terapêuticas a administar, na maioria das vezes as doses são determinadas empiricamente.

(') Designa-se por dose letal a quantidade de medicamento que ensaiada em animais de experiên-
cia se mostra mortal para uma dada percentagem. É actualmente expressa em termos de número de
animais mortos e designa-se por DLSI), quando a mortalidade é de 50 por cento.
575

E hábito estabelecer, para cada medicamento, relações posológicas entre o homem adulto e a
criança, o que se pode conseguir por meio de fórmulas, como a de BRUNTON, a de COWLING, a de YOUNG, a
de BOLOGNTNI ou a de CLARCKE. É ao médico que compete determinar a posologia a instituir em cada caso.
Entretanto, o farmacêutico tem necessidade de verificar se a posologia prescrita está de acordo com
a que se considera habitual. Para isso transcrevemos uma das tabelas mais usuais nos formulários de
terapêutica. Referimo-nos à tabela de JUNCKLER e GAUBIUS, a qual regula a dose medicamentosa em
função da idade do paciente.
Os dados mencionados nesta tabela são bastante aproximados, mas não entram em linha de
conta com as variações ocasionadas pelo próprio medicamento. De facto, observa-se, por exemplo,
que as crianças são muito mais susceptíveis aos estupefacien-

Tabela LIV. Escala de Junckler e Gaubius

Idade Posologia comparada


Adulto
l ano 1/15 a 1/12
l -2 anos 1/8
4 i£
2-3
3 -4
4 -7
l -14 Í/2
14-20 2/3

tes do que a outros medicamentos. A morfina é dos fármacos que é necessário manejar com extremo
cuidado, sendo preciso utilizar, em medicina infantil, doses inferiores às calculadas pela tabela ou
fórmulas resolventes atrás mencionadas (')•

(') Na fórmula de YOUNG divide-se a idade da criança, em anos, pela soma do número de anos
com 12. Assim, para uma criança de 4 anos, será;

4 4' l
4+12 16 4

isto c. a dose a administrar deve ser uma quarta parte da dose indicada para o adulto.

*
Segundo a fórmula de COWUNG adiciona-se l à idade da criança, em anos, e divide-se por 24 o
número obtido. Para uma criança de 3 anos será:

*U 3+1 4 l

, 24 - 24 6

o que signifca que a dose a administrar deve ser 6 vezes menor do que a estipulada para o adulto.
576

No que diz respeito à Medicina Veterinária, em geral a dose corresponde ao peso do animal,
mas há algumas excepções a esta regra. Assim, os bovídeos são muito menos sensíveis aos
medicamentos do que os equídeos, pelo que aqueles requerem doses mais elevadas para pesos
aproximadamente iguais.
. A Tabela LV relaciona quantidade de medicamento nara o homem e para varies
animais domésticos. .-. •••.- . .

Tabela LV. Posologia comparada para vários animais domésticos

N." de vezes a dose terapêutica


Animal humana média
Cavalo 16
Boi 24
Carneiro . ''' 3
Porco - - 2
Cão 1
Gato 1/2

Há certos fármacos que se comportam de modo diverso quando administrados ao homem ou


aos animais. O ópio afecta quase todos os animais domésticos com maior intensidade do que quando
aplicado ao homem. O cão apresenta, neste particular, comportamento semelhante ao manifestado
pelo homem.
O fenol, mesmo quando usado como anti-séptico externo, é altamente nocivo para os cães e
gatos.
A pilocarpina, fármaco altamente diaforético quando administrado aos seres humanos, não
revela efeito sobre os animais citados, à excepção do cavalo.

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580
581

Biodisponibilidade

De tudo o que se disse nos capítulos anteriores ressalta que a biodisponibilidade medicamentosa
é dependente de variados factores, podendo c devendo o farmacêutico nela intervir, especialmente a
nível da libertação dos fármacos que compõem o medicamento. Este, como regra geral, contém, além
das substâncias activas, produtos que em princípio são inertes e que representam os excipientes e os
adjuvantes.
Considerando as diversas fases por que passa um fármaco destinado a ser absorvido no
organismo, poderemos, portanto, lembrar a Libertação, Absorção, Distribuição, Metabolização e
Excreção, cujas iniciais originaram a sigla LADME. É função do farmacêutico conseguir a melhor
biodisponibilidade possível, isto é, 100%, o que em muitos casos não se atinge, quer devido a
dificuldades tecnológicas, quer especialmente motivado pelas propriedades físico-químicas do
fármaco (falta de adequado coeficiente de partilha lipídeos/água; pH de maior actividade biológica
não coincidir com o pH ideal de estabilização ou de ionização possível; inactivações enzimáticas;
reacções com produtos naturais do organismo; etc.)- Entretanto, devem procurar tornear-se os
obstáculos que impeçam uma boa absorção, sendo mesmo vulgares, hoje em dia, o uso de prô-
fârmacos ou pró-drogas que proporcionem fáceis travessias das membranas semi-permeáveis e que,
posteriormente, em regra por via enzimática, se desdobrem, libertando o fármaco.
A biodisponibilidade, como se compreende do que se disse, não é uma propriedade fácil de se
melhorar, mas com conhecimento e trabalho têm-se conseguido para a grande maioria dos
medicamentos libertações adequadas ao efeito pretendido, seja essa libertação rápida ou modificada.
Na maioria dos casos importa que a cedência seja feita a uma velocidade elevada, devendo a
absorção ser o mais completa possível. Em menos casos — formas farmacêuticas de acção
prolongada, sustentada ou, genericamente, modificada — a libertação deverá ser mais lenta, mas é
lógico desejar-se que a absorção corresponda à totalidade do que é cedido.
Atingir uma biodisponibilidade de 80-100% não é, pois, tarefa fácil, porquanto exige vários
conhecimentos que serão dados ao longo desta obra, a propósito das
582

diversas formas ou fórmulas farmacêuticas que iremos estudando. Por esse facto, o presente capítulo não
pode ser exaustivo, mas apenas tem a pretensão de colocar o aluno perante um problema geral. Trata-se,
mais do que de uma série de informações, de um aviso, um verdadeiro grito de alerta que tem por fim
preparar para estar atento.
Nas circunstâncias referidas, podemos dizer que a biodisponibilidade depende, essencialmente, de
factores fisiológicos, factores físico-químicos e factores farma-cotécnicos.

5.1. FACTORES FISIOLÓGICOS

" * Vimos já que a grande maioria dos farmacos são absorvidos por difusão passiva,
segundo a lei de FICK. '"'"""•
Vimos também que o raio das partículas e a viscosidade do sistema medicamentoso influem
negativamente na difusão, desejando-se farmacos muito divididos e que seja diminuta a viscosidade
do meio. Considerando a via oral, sabemos, também, que a primeira fase para a absorção consiste na
dissolução do fármaco no meio aquoso constituído pela água e sucos digestivos do tracto gastro-
intestinal, e que a dissolução se processa de acordo com a cinética de NOYES-WHITNEY.
>vn Por outro lado, temos conhecimento que após a mencionada dissolução o fármaco deve atrevessar
as membranas semi-permeáveisf o que exige que, simultaneamente, apresente um adequado coeficiente de
partilha lipídeos/água.
Não ignoramos, também, que o pH do meio influi na ionização e que sendo muitos farmacos
ácidos ou bases fracas podem ser melhor ou pior absorvidos consoante a dissociação sofrida. Assim,
para os ácidos fracos a absorção é máxima se o pKa>3, enquanto que para as bases fracas a
absorção máxima se situa a pKa<7,8 (maior coeficiente de partilha O/A).
Para lá da difusão passiva há outros processos de absorção, como a passagem dos
poros membranosos (moles com 7-10A0 de diâmetro e pesos moleculares inferiores a
150-400), transporte activo, transporte facilitado, pinocitose, etc. Estes processos são,
porém, muito menos utilizados pelo organismo que a difusão passiva, razão por que,
nestas generalidades, não os abordaremos. ., , ^.lt^-i;h -h-r>^K *m,. w
r i Finalmente, a biodisponibilidade de uma preparação medicamentosa depende ainda da via de
administração escolhida e do estado fisiológico do local. Por exemplo, a ampicilina e a amoxicilina
só com muita dificuldade atravessam as meninges íntegras. Contudo, quando estas se encontram
inflamadas observa-se que a injecção intravenosa daqueles antibióticos proporciona níveis
terapêuticos no líquido céfalo-raquidiano.
583

5.2. FACTORES FÍSICO-QUÍMICOS

Naturalmente que é muito grande a influência do comportamento físico-químico do fármaco na


biodisponibilidade. Assim, para lá da forma em que se encontra, das possibilidades de decomposição
quando administrado, da dimensão e estado cristalino das suas partículas, tem extraordinária
importância a sua solubilidade.

5.2.1. NATUREZA DA FORMA EM QUE SE ENCONTRA O FÁRMACO

Como se compreende, não é indiferente se o fármaco é um ácido, uma base, um éster, um


complexo, etc. Com efeito, os ácidos podem dissolver-se à custa de bases, as bases à custa de ácidos, os
ésteres podem ser saponificados no intestino, os complexos podem ter de ser desdobrados na fase pré-
absorvida. Por outro lado, a sua isomeria importa igualmente, em regra sendo mais activas as formas
L do que as D ou os racematos.
Alguns fármacos não são adequados para certas vias de administração, como a oral, dado que
se decompõem por efeito dos sucos digestivos, ou porque constituem moléculas muito volumosas ou
com alta hidrofïlia e baixo coeficiente de partilha O/A. É o que sucede com polipeptídeos, como a
insulina e a polimixina, ou com antibióticos muito hidrófilos, como os aminoglicosídeos. Outros
produtos, ao serem ingeridos com líquidos inadequados, podem ser complexados, não se processando
a absorção, a não ser de forma errática e incompleta. Estão neste caso as tetraciclinas, que
acompanhadas de leite, e devido ao cálcio deste, sofrem atrasos na absorção, que nunca é total.
Certas moléculas podem não ser bem absorvidas, como acontece com a ampicilina por via oral (40-
60% de absorção), o que se deve às suas características físico-químicas próprias. Estas situações têm
em antibioterapia riscos maiores do que a simples perda de antibiótico, pois o que não é absorvido
fica retido no intestino, podendo originar a destruição da flora saprófita.Por este motivo foram
concebidos pró-fármacos de ampicilina (bacampicilina, hetacilina, pivampicilina, etc.), que se desdobram
por via enzimática, após absorção.
O cloranfenicol é muito amargo, perdendo esse gosto por transformação em ésteres esteárico ou
palmítico, que são muito menos hidrossolúveis. Estes ésteres, que são inactivos in vitro, têm de sofrer
hidrólise antes da absorção, sendo as esterases pancreáticas os principais elementos intervenientes.
Em outros casos há limitações de via de administração, dadas as decomposições que podem
ocorrer ou o pKa não ser conveniente. E o que sucede com a acetilcolina, por via oral (hidrólise a
colina + ácido acético) ou com a morfina (pKa de 9,9).
584

Já a codeína (éster metílico da morfina) é bem absorvida por via oral, visto o seu
pKa ser apenas de 7,9. , .

A salificação de um fármaco pode interessar tecnologicamente, em regra para o tornar mais


hidrossolúvel. Do mesmo modo têm sido produzidos diversos complexos, com o que se pretendeu
aumentar a hidrossolubilidade. O pentobarbital sódico, as sulfamidas sódicas, a penicilina V
potássica são exemplo do que dissemos. A amino-filina é um complexo hidrossolúvel de teofilina com
etilenodiamina; vários complexos de tetraciclinas com glicocola ou com lisina têm, também, sido
preparados para formulações líquidas ou preparações sólidas a que se quiz incrementar a
biodisponibilidade.
É curioso notar que diversas destas formulações, ao chegarem ao estômago, são decompostas
pelo ácido clorídrico presente. Nota-se, entretanto, que se formam cristais, muito pequenos, do
princípio activo (pentobarbital, sulfamidas, penicilina V). O mesmo sucede com a aminofilina, que
origina cristais de teofilina de reduzidas dimensões e, por conseguinte, mais rápida e totalmente
absorvidos. Nós próprios temos trabalhado neste domínio, demonstrando que o fentiazac cálcico e a
ampicilina sódica são melhor absorvidos do que os respectivos ácidos, o que se deve ao facto dos
cristais obtidos por via química, in loco, serem de menores dimensões que os pós micronizados
obtidos pêlos processos tradicionais.

5.2.2. ESTADO FÍSICO DO FÁRMACO ....., ',

Como é sabido, a dimensão das partículas em que o fármaco se acha dividido é de extremo
interesse para a sua biodisponibilidade, sendo esta tanto melhor quanto mais pequenas forem as
partículas daquele.
A superfície específica (S) das partículas pode calcular-se pela fórmula, já anterior-
•mente citada,

6
. „ P
S=—x—, em que

D d

D é o seu diâmetro, p o peso e d a densidade.

A velocidade de dissolução depende dos parâmetros dados pela lei de NOYES-


-WraTNEY, que igualmente já foi estudada.
. ^ .. .*> tfV
de
= AS (C-C), em que
dt
585

A representa uma constante, S a área do sólido, dcldt a velocidade de dissolução, C a concentração


de substância no solvente no tempo r e C a concentração equivalente à de saturação.
Podemos determinar o valor de A, que depende da agitação, pois ele exprime a
relação
. -. - - - • • • •• K ^.-^.<4> *ií*irfj:v./ , :. ,
•"• ~ .- • -f-. '- •" •' ;;b
S ? - ' • ••, • : *
hV

entre o coeficiente de difusão K (na maioria dos casos de soluções aquosas K = 9x IO"6 cm2.s"" e o
produto da altura da coluna de difusão (h) pelo volume do líquido (V). O processo é simples de
executar, sendo habitual trabalhar-se com V = 500 ml e com uma agitação de cerca de 55 r.p.m.
Os fármacos podem ser cristalinos (agulhas, placas, esferas, romboedros, etc.) ou amorfos.
Como já vimos, o formato em que se apresentam pode ter importância na biodisponibilidade. Para
dar um exemplo, retomemos o caso dos ésteres do cloranfeni-col que, para serem absorvidos, devem
previamente ser saponificados pelas lipases pancreáticas. Ora, este ataque pelas lipases depende da
apresentação do fármaco. Se ele estiver em placas é dificilmente saponificado, melhorando este
ataque se se encontar em agulhas ou se for amorfo.
As formas metastáveis dos polimórfïcos são em regra mais solúveis e biodis-poníveis que as
formas estáveis. Entretanto, não devemos recorrer a produtos metastáveis pois esses produtos tendem
a modificar as suas características, transformando-se em formas estáveis num período de tempo
pouco previsível.

5.3. FACTORES FARMACOTECNICOS

O farmacêutico dispõe actualmente de uma gama muito extensa de excipientes que podem ou
não ser adequados para o fãrmaco com que quer trabalhar. Quanto aos adjuvantes (diluentes,
desagregantes, aglutinantes, lubrificantes, macromoléculas espessantes, tensioactivos, antioxidantes,
sequestradores, conservantes, etc.) mais se complica o problema.
Devem ser estudados aspectos como: a carga eléctrica do fármaco e sua tendência para
complexação com materiais ditos inertes de carga oposta; reacções químicas com excipientes e/ou
adjuvantes; viscosidades antes e após diluição em sucos digestivos, água, etc.; fixações por adsorção
em recipientes plásticos ou em borrachas; porosidade de fórmulas sólidas; revestimentos de
comprimidos e cápsulas; uso de cápsulas moles ou duras; plasticidade e tïxotropia de sistemas
heterogéneos líquidos ou semi-sólidos, etc., etc.

~
586

Ao longo deste livro procuraremos, a propósito de cada fornia galénica, referir os aspectos
tecnológicos que possam influir na biodisponibilidade medicamentosa.
Lembremos, entretanto, que as modificações do foro farmacotécnico no sentido de
ser melhorada a biodisponibilidade de uma formulação, devem ser conduzidas, paralela
mente com estudos de estabilidade, pois com frequência ao incentivar a biodisponibi
lidade podemos acelerar a decomposição do fármaco ou produzir substâncias inertes ou
não à custa da decomposição dos excipientes e adjuvantes. * . . , ,.
587

Classificação das formas farmacêuticas

Como atrás acentuámos, as matérias-primas medicamentosas, salvo raríssimas


excepções, necessitam de ser submetidas a um certo número de operações que têm pó
fim dar-lhes a forma farmacêutica mais adequada ao seu emprego terapêutico. Chama
remos, pois, forma farmacêutica, forma medicamentosa ou forma galénica ao estado
final que as substâncias medicinais apresentam depois de submetidas a uma ou mais
operações farmacêuticas executadas com o fim de facilitar a sua administração e obter
o maior efeito terapêutico possível. •>;-£.'**''"í.
Efectivamente, são pouquíssimos os fármacos susceptíveis de se administrarem directamente ao
doente. Consideremos, por exemplo, a beladona. Neste caso, uma das transformações mais simples
de executar consiste em reduzir a droga a pó, obtendo-se um pó de beladona, que já apresenta
vantagens quanto à facilidade de administração. A partir da droga pulverizada pode obter-se, por
esgotamento com álcool, uma solução extractiva que, satisfazendo a determinados requisitos,
constitui uma tintura. A solução extractiva pode ainda concentrar-se sob condições pré-
estabelecidas, obtendo-se um extracto, A tintura, por seu turno, pode servir para preparar um xarope
e o extracto pode usar-se como material para a preparação de pílulas, comprimidos, pomadas, supo-
sitórios, etc. O pó, a tintura, o extracto, as pílulas, os comprimidos e os supositórios são formas
farmacêuticas do mesmo fármaco.
Além das formas mencionadas existem muitas outras, quer directamente preparadas a partir
das drogas, quer obteníveis mediante a transformação de diferentes formas medicamentosas.
Como já sabemos, compete à Farmácia Galénica estudar as formas farmacêuticas, para o que
é habitual agrupá-las segundo diversos critérios.
Alguns autores sistematizam o seu estudo segundo o método operatório utilizado; outros,
ainda, preferem um critério misto, baseado nos dois anteriores, etc.
Se enfrentássemos a tarefa de escrever um compêndio de Farmácia Galénica prática, sem
responsabilidades didácticas, diríamos que a classificação das formas farmacêuticas era assunto de
importância secundária, pois cada forma seria tratada deta-
588

lhadamente, não importando o lugar onde fosse incluída. Seria, apenas, essencial um índice que
permitisse localizá-la facilmente. Tratando-se, porém, de um livro de estudo, destinado a alunos, a
classificação das formas galénicas assume nova importância. As matérias devem ser coordenadas de
maneira a imbricarem umas nas outras, numa sequência metódica e pedagógica. Não estamos, portanto,
perante o problema de elaborar um mero catálogo de formas galénicas, embora pudesse ser muito
completo, mas de sistematizar, com lógica, variadíssimos assuntos, conduzindo o aluno das matérias
mais fáceis para as mais complicadas, criando-lhe motivos para que a sua memória retenha sem esforço
e a sua inteligência deduza o que se segue.
Infelizmente, apesar de existirem algumas dezenas de classificações de formas farmacêuticas, não
encontrámos nenhuma que satisfizesse inteiramente aos objectivos em vista. Ao escrever estas palavras
sentimos a profunda actualidade dessas outras, do ilustre farmacêutico DUPUY que, em 1902, dizia:

:
-r,-. «Existirá uma classificação de formas farmacêuticas apresentando condições desejáveis
(ao ensino?). Não, e isso constitui uma lamentável lacuna».

Entre as mais notáveis classificações propostas figuram as de HENRI e GUIBOURT,


CHEVALIER e IDT, CHEREAU, SOUBERAIN, GOURMET, HUGUET, DUPUY, ASTRUC, GORIS e
LIOT, SELLÉS MARTI, DENOËL e VALERI PAOLI. Hvu^.; ;í>íï.v .c>ri* -•.<-• •-
Em Portugal poderemos citar as sistematizações seguidas por SACADURA BOTTE e por CARVALHO DA
FONSECA e, mais recentemente, a classificação proposta por ANÍBAL DE ALBUQUERQUE. Esta última, com algumas
ligeiras modificações, que considerámos beneficiarem o ensino, tem sido por nós adoptada desde que
regemos a disciplina de Farmácia Galénica. Já anteriormente, durante a docência do Prof.
ALBUQUERQUE, a
f t
mencionada classificação marcava a sequência do ensino de Farmácia Galénica. E, pois, uma
sistematização que poderemos considerar tradicional no ensino professado na Universidade do
Porto. A ela também nos rerportaremos neste livro, que não é mais do que um repositório da matéria
que ensinamos.
Deste modo, dividiremos as formas farmacêuticas em sete grupos, consoante a
operação farmacêutica principal que leva à sua obtenção, ou o tipo de administração a
que elas se destinam. ,.,.
l •"'' ''•>",*** ; -\ * f f ft **.••.' •"; - "A
"-

/ Grupo —Formas farmacêuticas obtidas por divisão mecânica das substâncias


medicinais: - , ..,,;; , , ï s ... . .

l —ESPÉCIES. Formas complementares: cigarros.


2—PÓS. Formas complementares: granulados, comprimidos, drageias, pílulas,
grânulos, bolos, chocolates, biscoitos, pastilhas, lentículas e cápsulas. 3 — POLPAS.
Formas complementares: conservas e electuários.
589

// Grupo — Formas farmacêuticas obtidas por extracção mecânica:

i_
l ————
/// Grupo — Formas farmacêuticas obtidas por dispersão mecânica: '
1 —EMULSÕES.
2 —DISPERSÕES COLO1DAIS e SUSPENSÕES. Formas complementares: aeros-
soles
-

/V Grupo — Formas farmacêuticas obtidas por dispersão molecular:

l — HIDRÓLEOS (soluções, macerados, infusos e cozimentos). 1 —


SACARÓLEOS LÍQUIDOS (xaropes, melitos e oximelitos).
3 — ALCOOLEOS (soluções, tinturas e alcoolaturas). -
4 — GLICERÓLEOS.
5— ETERÓLEOS.
6— ENÓLEOS.
7— OLEÓLEOS. "
8— SOLUÇÕES COM OU1TIOS DISSOLVENTES.
•*

V Grupo — Formas farmacêuticas obtidas por dissolução e evaporação. l—

EXTRACTOS.

VI Grupo — Formas farmacêuticas obtidas por destilação:

l— H1DROLATOS. .
2 — ALCOOLATOS. ;

Vil Grupo — Formas farmacêuticas obtidas por operações complexas ou múltiplas:

1 — PARA APLICAÇÃO NA PELE — pomadas, cremes, pastas dérmicas, cero-tos, unguentos,


glicerados, linimentos, emplastros, cataplasmas, sinapismos e banhos; preparações para uso
auricular.
2 — PARA APLICAÇÃO NAS MUCOSAS — colírios, nasoformas, supositórios, óvulos, velas,
lápis e irrigações.
3 — PARA USO PARENTERAL — soluções, suspensões e emulsões injectáveis.
590

Já se passaram mais de 25 anos sobre a publicação da 1." Edição deste livro de


Técnica Farmacêutica e Farmácia Galenica. Muitas coisas mudaram entretanto, tor
nando-se obsoletas certas preparações e outras ganhando relevo ou sendo rnesmo novas.
Decidimos, apesar destas modificações, manter a estrutura geral do livro, dando,
embora, maior importância às preparações que mais correntemente se utilizam nos dias
de hoje e apenas lembrando aquelas que, como os cigarros, as pílulas, os vinhos e as
polpas, quase já só pertencem ao passado. '•
O leitor nelas intessado poderá consultar edições antigas de Técnica Farmacêutica e Farmácia
Galenica. Quanto às novas preparações procurámos incluí-las na classificação galénica que
acabámos de expor, muito embora reconheçamos que algumas das inclusões feitas sejam, por vezes,
um pouco artificiais. Entretanto, julgamos que a tradição deve manter-se, ainda que o Homem não
fique estático na época que lhe foi dado viver.

BILIOGRAFIA

SELLÉS MARTÍ, E. — Programa de Farmácia Galénica, Madrid, 1938.


DUPUY, E. — Cours de Pharmacie, Ed. Maloine, Paris, 1902.
CARVALHO DA FONSECA, A. e ALVES, C. L. — Manual Pharmacotechnico, Lisboa, 1910.
ASTRUC, A. e GIROUX, J. — Traité de Pharmacie Galénique. Maloine, Paris, 1964.
Gows, A. e LIOT, A. — Pharmacie Galénique, Masson, Paris, 1949.
DENOËL, A. — Courí, de Pharmacie Pratique, Lês presses universitaires, Liège, 1954.
VALF.RT PAOLI, J. F. — Glosas Galenicas, Venezuela, 1956.
SACADURA BOTTE, J. — Elementos de Pharmacotechnia, 2." Edição. 1899.
591

Formas farmacêuticas obtidas por divisão mecânica

As formas farmacêuticas sólidas resultantes da transformação dos fármacos num


pó, que se pode dispensar directamente ou aglutinado em diversos estados, representam
a maioria dos medicamentos prescritos. Efectivamente, não só os pós medicamentosos,
mas várias formas deles derivadas, como cápsulas, granulados, comprimidos, etc., são
utilizadas em larga escala, calculando-se que, no seu conjunto, constituam cerca de dois
terços de toda a medicação actual.
As razões de tal preferência assentam em diversos factos, dos quais salientamos os seguintes:

1 —maior estabilidade medicamentosa, considerada a ausência de humidade;


2 — menor volume do que o ocupado pelas formas líquidas correspondentes, o que torna mais
económicos e fáceis o seu transporte e armazenagem;
3 — possibilidade de rápida preparação;
4 — menor sensação de gosto do que com os medicamentos líquidos, o que é particularmente
atenuado em formas, como as cápsulas, em que o fármaco é preservado dentro de cúpulas
ou invólucros próprios;
5 —facilidade de administração, sendo dispensável, na maioria dos casos, o uso de utensílios de
medida, corno colheres;
6 — menor dispêndio e cuidado na aquisição de embalagens adequadas, ao contrário do que
acontece com o acondicionamento de líquidos;
7 —possibilidade de se executarem revestimentos externos em algumas formas farmacêuticas,
tornando-as assim resistentes à acção do suco gástrico.

No presente capítulo iremos estudar as diversas formas galénicas em que a operação


farmacêutica fundamental é constituída pela divisão mecânica dos fármacos.
Essa divisão pode ser extremamente grosseira, originando pequenos fragmentos de droga, ou
poderá ser levada a um grau tal, que permita obter um pó de grande tenui-dade. No primeiro caso
poderá conseguir-se uma forma medicamentosa que geralmente serve para preparar infusões,
macerados ou cozimentos medicamentosos.
592

Se o fármaco é pulverizado, o produto final obtido é um pó, cuja tenuidade varia consoante o
tipo de pó pretendido. Como atrás assinalámos, é extremamente importante o grau de divisão sob que
se apresenta uma dada substância, pois dele depende, em larga medida, a acção farmacológica
obtida. Importa fixar este conceito, que não se restringe aos pós propriamente ditos, mas é também
extensível às formas faramacêuticas sólidas preparadas a partir deles. De facto, para que se
verifique uma boa absorção intestinal, por exemplo, de uns comprimidos ou de umas cápsulas, é
necessário que os pós componentes dessas formas medicamentosas apresentem um grau de tenuidade
adequado ao efeito farmacológico pretendido. A noção expressa é particularmente importante quando
os fármacos são dificilmente solúveis, como acontece com diversas sulfamidas, cortiçosteróides,
anidrido arsenioso, calomelanos, cloranfenicol, oxitetra-ciclína e griseofulvina. Nesse caso é sempre
conveniente reduzir a droga a pó muito ténue, de modo a compensar a sua deficiente dissolução nos
sucos digestivos.

7.1. ESPÉCIES ;

Designaremos por espécies as misturas de plantas ou de partes de plantas secas,


divididas em pequenos fragmentos, as quais eventualmente podem ser adicionadas de
compostos quimicamente definidos. >r
As espécies nunca contem substâncias muito activas, como, por exemplo, alcalóides ou
glucósidos, não só para evitar as incompatibilidades que se poderiam produzir, principalmente com
os taninos, mas porque podem originar intoxicações. Habitualmente, os componentes das espécies
são empregados em igual proporção.
Esta forma farmacêutica, hoje praticamente caída em desuso, destinava-se à obten
ção de formas mais complexas, como os macerados, infusos, digestos e cozimentos,
também eles hoje praticamente sem utilização terapêutica. Quer isto dizer que as espé
cies não se usavam directamente mas constituíam uma forma galénica intermediária para
preparação do medicamento definitivo. Apesar das espécies carecerem de interesse
terapêutico, elas aparecem ainda inscritas na Farmacopeia Suíça e as misturas de plantas
ou de partes de plantas têm hoje larga aplicação para a preparação, por exemplo, dos
chamados «chás medicinais». É por esta razão que entendemos dar algum relevo à
preparação e conservação desta velha forma farmacêutica. -

7.1.0.1. Preparação

Como se compreende, na preparação das espécies interessa considerar a qualidade das drogas
que nela figurarão. Importa, por isso, fazer a diagnose da droga e verificar o seu estado de
conservação. Naturalmente que serão rejeitadas as drogas com cheiro anormal (a mofo, por
exemplo); serão eliminados os resíduos de substâncias estranhas
593

à droga e que a acompanham (triagem); verificar-se-á se a droga já foi anteriormente


esgotada, pois podem aparecer no comércio drogas já extraídas por dissolventes
diversos.
Na preparação das espécies devem misturar-se, tanto quanto possível, fragmentos do mesmo
tamanho, provindo da mesma parte da planta. Assim, as folhas serão misturadas com as folhas, as
flores com as flores, etc. Eventualmente, as flores podem ser associadas a folhas ou a frutos; as
raízes, que, em regra, se associam a outras raízes, podem misturar-se com cascas, mas é fundamental
que as partes usadas sejam aproximadamente do mesmo tamanho.
As raízes e as cascas serão contundidas e cortadas; as sementes privam-se do episperma e as
folhas seccionam-se; quando haja pequenos frutos a incorporar, como os do aniz verde, não deve
proceder-se à sua divisão. Quando uma espécie contiver compostos quimicamente definidos, estes
podem distribuir-se no estado de pó sobre a mistura das plantas. Como alternativa, que
consideramos preferível, dissolvem-se as substâncias químicas na água ou no álcool e humedece-se a
mistura vegetal com a solução obtida, procedendo-se depois à eliminação do dissolvente por
aquecimento a cerca de 50°C. . .

7.1.0.2. Conservação ;

As espécies devem ser conservadas em frascos de vidro, com rolha esmerilada, sendo postas em
lugar seco e ao abrigo da luz; podem também ser conservadas em sacos de celofane ou em caixas de
cartão, prática menos aconselhável.
Como prazo de validade, não é aconselhável ultrapassar um ano após a sua pre
paração, havendo mesmo espécies que, pela sua natureza e mau acondicionamento, se
alteram em menos tempo. A título de exemplo, citamos as espécies contendo plantas
da família das Umbelíferas, que são particularmente atreitas a serem atacadas pêlos
insectos, e as espécies que possuem elevado teor em farinha, que são susceptíveis de
rançar.

7.1.1. FORMAS COMPLEMENTARES DAS ESPÉCIES 7.1.1.1. Cigarros

medicinais

Os cigarros são formados por folhas secas de plantas medicinais que se introduzem num
invólucro de papel adequado, ao qual se dá a forma de cigarro. Na maioria dos casos, as folhas são
previamente impregnadas com uma solução de nitrato de potássio, cuja quantidade é de cerca de 2
por cento em relação ao total da forma, e que se destina a facilitar a combustão das folhas.
594

Os cigarros medicinais apresentam o peso de l g cada ou, mais rigorosamente,


cada cigarro conterá l g de folhas secas.
Esta forma farmacêutica actua pelo facto dos fumos libertados durante a combustão serem
aspirados pelo paciente. Por esta razão, a maioria das fórmulas de cigarros contêm drogas como
alcalóides parassimpaticolíticos, estimulantes respiratórios, etc.

7.2. PÓS

7.2.0.1. Generalidades

Os pós resultam da divisão dos fármacos animais, vegetais, minerais, ou obtidos por síntese
química, podendo constituir uma forma de administração directa ou destinarem-se à obtenção de
outras formas galénicas. No primeiro caso, são susceptíveis de se aplicarem interna ou externamente,
conforme a natureza do fármaco que foi pulverizado. No segundo caso, constituem o ponto de partida
para a maioria das formas medicamentosas, já que é, normalmente, necessário reduzir as drogas a
pó antes de as submeter às diferentes operações farmacêuticas. Assim, para se prepararem comprimi-
dos, hóstias, pastilhas, pílulas, etc., é preciso pulverizar as drogas constituintes das respectivas
fórmulas, que só depois serão trabalhadas no sentido de se obter o medicamento desejado. Do mesmo
modo, para se conseguir uma solução simples ou extractiva, como uma tintura, é necessário reduzir as
drogas a pó de tenuidade adequada e só então submetê-las à dissolução ou à extracção.
No presente subcapítulo iremos estudar a forma farmacêutica pó, isto é, os pós para
administração directa, embora a doutrina exposta seja aplicável também aos pós que se empregam
na obtenção de outras formas galénicas.
A redução dos fármacos ao estado de pó apresenta numerosas vantagens. De uma maneira
geral, a pulverização não diminui a actividade dos fármacos e cria-lhes condições para que
apresentem um efeito farmacológico mais rápido e regular. Em casos especiais, como na
pulverização da raiz da ipeca, o conteúdo em princípios activos do pó é superior ao da droga, já que
essa operação obriga a rejeitar o cilindro central da raiz, onde é nulo o teor de alcalóides.
Dada a grande superfície apresentada, tanto maior quanto mais ténues forem as partículas
constituintes, os pós são mais facilmente dissolvidos ou extraídos pêlos diversos veículos utilizados em
Farmácia, Muitos são os fármacos que só se dissolvem depois de pulverizados e, de um modo geral, a
sua extracção pêlos dissolventes vai sendo mais eficaz à medida que diminui o diâmetro das suas
partículas.
Considerando ainda a grande superfície apresentada pêlos pós, é de prever que estes se
encontrem em melhores condições de absorção gastro-intestinal do que os fármacos
correspondentes. Por outro lado, a rápida difusão operada com os pós não só permite obter níveis
sanguíneos mais elevados e em menor período de tempo, como
595

ainda diminui o risco de provocar irritações locais no tracto gástro-intestinal, as quais, muitas vezes,
são causadas pela concentração das drogas naquelas regiões. ; ; . - v.
Na prática, verifica-se que, de uma maneira geral, os pós são tanto mais activos quanto mais
elevado é o seu grau de divisão, pois cada partícula apresenta também maior superfície específica.
Assim, as drogas micronizadas até cerca de l \i mostram apreciável energia de superfície, o que
parece explicar a sua maior actividade farmacológica. Observou-se, por exemplo, que o calomelanos
obtido pelo vapor ocupa uma superfície de 80 m2/molécula-grama, enquanto que com o calomelanos
preparado por sublimação essa superfície é apenas de 37 m2/molécula-grama. Do ponto de vista far-
macológico, a potência da primeira substância é sensivelmente dupla da da segunda.
Já que o aumento da superfície específica de um pó facilita a sua absorção por via intestinal,
deve atender-se a esse facto quando se prepara uma fórmula contendo princípios utilizados como
anti-ácidos gástricos ou como antidiarreicos, em que a absorção pode não ser desejável.
Ainda entre as vantagens apresentadas, lembremos a facilidade de deglutição dos pós, mesmo
quando é elevado o volume que se administra e a possibilidade de se misturarem com alimentos ou
bebidas, o que torna a sua ingestão mais fácil.
Entre os inconvenientes que os pós apresentam em relação aos fármacos ou às formas
galénicas do tipo dos comprimidos e cápsulas citamos a maior facilidade de alteração (oxidações,
hidrólises, racemizações, decomposições pela acção da luz, etc.), a qual é devida à maior superfície
apresentada. As drogas amargas, nauseosas ou corrosivas só excepcionalmente se administram sob a
forma de pó, pois essas características são difíceis de mascarar numa fórmula galénica deste tipo.
Recordemos, finalmente, que a pulverização das drogas vegetais ou animais promove a mistura dos
diversos conteúdos celulares, podendo, eventualmente, pôr em contacto um fermento com princípios por
ele desdobráveis. É assim que ao pulverizarem-se as folhas de louro--cerejo se mistura a emulsina,
localizada na endoderme, com um glucosido cianogenético existente no parênquima cortical. Em
presença da própria humidade residual da droga, o fermento actua provocando o desdobramento do
glucosido com produção de ácido cianídrico, aldeído benzóico e glucose. Um facto semelhante pode
ser referido com a pulverização da mostarda, uma vez que o seu sinigrosido é hidrolisado pela
mirosinase, produzindo-se isossulfocianato de aluo. Nos casos em que for aconselhável evitar estas
decomposições, as drogas a pulverizar devem estar estabilizadas previamente.

7.2.0.2. Definição e classificação dos pós

Em concordância com a Farmacopeia Europeia, a Farmacopeia Portuguesa V define pós como


«preparações farmacêuticas constituídas por partículas sólidas, livres e secas e mais ou menos finas.
Contêm um ou vários princípios activos adicionados ou não de adjuvantes e, se necessário, de
corantes e aromatizantes». Outras Farmacopeias, como
596

a Britânica de 1988 e a dos Estados Unidos da América XXII contêm definições muito semelhantes e, a
nosso ver, para definir perfeitamente esta forma farmacêutica só basta acrescentar que dentro de cada
categoria de pó deve haver uma relativa homogeneidade entre as partículas que o constituem.
Os pós podem ser divididos em simples e compostos. Chamaremos pó simples ao
que resulta da divisão de uma única droga e pó composto aquele que se prepara pela
mistura de dois ou mais pós simples.

7.2.0.3. Preparação dos pós


7.2.0.3.1. Pós simples

A preparação de um pó simples foi considerada em Técnica Farmacêutica. Recordemos que a


pulverização é uma operação complexa que se pode dividir em três partes fundamentais: l.a operações
preliminares; 2.a operação principal ou pulverização propriamente dita; 3.a operações acessórias.
As operações preliminares da pulverização são a triagem ou monda, a divisão grosseira, a
estabilização e o amolecimento. São principalmente os fármacos vegetais que necessitam destes
tratamentos prévios. Uma outra operação preliminar consiste na secagem, que é obrigatória para a
maioria das drogas animais e vegetais que se pretende pulverizar. Lembremos ainda que estas não
devem ser exsicadas por aquecimento a temperatura superior a 40-50°C> a qual deverá ser ainda mais
baixa se a natureza do fármaco não suportar esses aquecimentos. Nessas circunstâncias, as drogas
contendo princípios voláteis ou alteráveis pelo calor devem ser secas a 25°C ou à temperatura
ambiente, em exsícador apropriado.
A operação principal ou pulverização propriamente dita é efectuada por contusão ou por
trituração em almofarizes; mediante o emprego de intermédios sólidos, líquidos ou gasosos; por
fricção em tamises apropriados; por meios químicos; por porfirização e, ainda, por moedura em
moinhos adequados.
A escolha do processo ideal de pulverização depende das propriedades físico-
-químicas do fármaco, do grau de divisão desejado e da produção pretendida. Assim, enquanto o
carbonato de magnésio, pela sua textura, é facilmente pulverizável por fricção, o óxido amarelo de
mercúrio, que se destina ao uso oftalmológico, exige que se recorra à técnica da porfirização.
Substâncias, como o acetato de cortisona, que devem apresentar-se sob a forma de pequeníssimas
partículas para serem absorvidas, são preparadas por técnicas de cristalização, variando o tamanho e
forma dos cristais, entre outros factores, com o dissolvente utilizado. Compostos, como a griseofulvina,
tolbuta-mida e diversas sulfamidas, são pulverizadas por micronização, já que se pretende obter
partículas com poucas micra de diâmetro.
Algumas vezes, especialmente quando a pulverização é feita por trituração, pode acontecer que
as partículas cristalinas da droga se carreguem de electricidade estática,
597

repelindo-se umas às outras e chegando, por isso, a apresentar movimento. Entre as substâncias
susceptíveis de se comportarem do modo descrito, citamos o salicilato de fenilo, o mercurocromo e o
clorobutanol. Este fenómeno depende do grau de humidade do pó, acentuando-se com a secagem. Os
sais de penicilina G electrizam-se tão fácil-
f
mente que chega a ser impossível manuseá-los quando completamente secos. E frequente conseguir-
se atenuar o citado fenómeno tornando o ar condutor ou pulverizando, em presença de pequenas
quantidades de óleo, as substâncias capazes de se electri-zarem.
A mais importante operação acessória da pulverização é, como se sabe, a tami-sação. De facto,
cada pó deve ter a sua tenuídade bem estabelecida e esta é, geralmente, conseguida e determinada
por meio de tamises. Os produtos pulverizados são, para isso, passados através do tamis de abertura
de malha desejada, devendo o pó atravessá-lo integralmente. Quer isto dizer que, na maioria dos
casos, a tamisação se deve efectuar sem deixar resíduo.
Um pó de determinada tenuidade deve passar totalmente pelo tamis correspondente e, quando
submetido à tamisação pelo tamis de malhas mais apertadas que imediatamente se lhe segue, a
fracção que o atravessa não deve ser superior a 40%.
Segundo a Farmacopeia Portuguesa V, se um pó for caracterizado por um único
tamis, este deve deixar passar, no mínimo 97 por cento do pó, salvo indicação em
contrário. >;;/* > -íf:
Como jã vimos no início desta obra, a Farmacopeia Portuguesa V inscreve uma classificação
de tamises, os quais são designados por números a que correspondem aberturas de malhas que vão
desde 38 a 11 200 \L. Através do uso destes tamises é possível determinar a granulometria de pós,
aliás como também a nossa Farmacopeia estabelece na monografia geral dedicada a esta forma
farmacêutica quando diz que a «tenuidade de um pó deve ser determinada por tamisação (V.5.5.1.)
ou por outro método apropriado».
A avaliação da tenuidade nos pós micronizados é mais delicada do que acabámos de descrever
1
í ). Esse assunto será objecto de estudo detalhado sob a rubrica — — Verificação dos pós —, mas,
entretanto, diremos que há diversos processos de apreciação da tenuidade, baseados no uso de
microscópios, fundamentados na avaliação da velocidade de sedimentação, ou exequíveis mediante o
emprego de contadores electrónicos. A sensibilidade destes métodos é bastante variável e, assim,
enquanto que o microscópio óptico só permite apreciar partículas até 0,25 |i, o microscópio
electrónico torna viável a medição de partículas com 0,004 u. de diâmetro.
Descritas, portanto, as operações fundamentais que são necessárias para se obterem pós
simples, resta-nos lembrar que a escala de produção a que se opera também

(') É possível fabricar tamises com uma abertura de malha de 38 U, o que permite classificar,
por tamisação, um pó de elevada tenuidade. Observa-se, porém, que, até à data, não tem sido possível
obter tamises com malhas mais apertadas.
598
599

contudo, nem sempre menciona os pós titulados que se destinam à preparação exclusiva de outras
formas galénicas, obrigando, depois, à verificação do teor dos princípios activos nesses mesmos
preparados. O estrofanto, por exemplo, é utilizado, sob a forma de pó grosso n.° II, na preparação
da respectiva tintura, que, ao contrário das restantes, é doseada para ajustar o seu título (expresso
em ubaína). Noutros casos, como no da cravagem de centeio, a F. P. IV não avalia os alcalóides na
droga nem procede à sua dosagem na solução injectável ou no extracto respectivo. Mais acertado se
nos afigura, em casos destes, utilizar pós titulados, o que não significa que se dispense a dosagem
das formas extractivas com eles obtidas. Assim, a cravagem do centeio é muitas vezes utilizada no
estado de pó proveniente da droga desengordurada, devendo o seu título em alcalóides ser de 0,1%.
O mesmo se pode dizer em relação ao estramónio e a muitas outras drogas que se consideram
suficientemente activas, mas para as quais a F. P. IV é omissa quanto ao teor em princípios.
Os pós titulados apresentam diversas vantagens que poderemos resumir da seguinte
forma: ••;-.-,- < .-, . . ^ -- .v.;r:r-r.;:r> ? •;- • ; •, >• - .--*.:

a) Droga geralmetne em pó fino, de composição constante;


b) fácil manejo na preparação de pós compostos ou de formas complementares dos pós
(cápsulas, pílulas, comprimidos, etc.);
c) material que, em casos de emergência, pode substituir outras preparações da mesma droga;
d) teor mais elevado em princípios activos do que outras formas farmacêuticas,
como tinturas, infusos, macerados, etc.; ^ -- • " • •
e) obtenção mais económica e rápida, sem necessidade de recorrer a dissolventes e a
aparelhagem mais ou menos complicada.

Na prática, a droga é reduzida, normalmente, a pó fino, determinando-sc, numa fracção, o teor


de substância activa. Conhecido o título da droga, que deve ser superior ao do pó titulado a
preparar, dilui-se a porção remanescente de pó com uma quantidade conveniente de pó inerte.

7.2.0.3.2. Pós compostos

Como dissemos, entende-se por pó composto aquele que é obtido pela mistura de dois ou mais
pós simples. Fundamentalmente, a sua preparação consiste em pulverizar, separadamente, cada uma
das drogas constituintes, obtendo-se pós simples de idêntica tenuidade, os quais se misturam de
modo a conseguir uma forma suficientemente homogénea. É, portanto, a mistura a operação que
diferencia os pós simples dos compostos. Esta pode executar-se por espatulação, por trituração em
almofarizes, ou, se é apreciável a quantidade de pó composto, em máquinas ditas misturadores.
600

,. = O objectivo da mistura é conseguir-se um pó fino suficientemente homogéneo em que,


teoricamente, cada partícula de um dos constituintes esteja junta a partículas dos outros. Na prática,
nem sempre é fácil conseguir este objectivo, que depende, entre outras causas, da proporção relativa
dos componentes. Assim, na preparação de misturas binárias é mais fácil misturar os dois
componentes quando se encontram na fórmula numa proporção até 1:5. As misturas com
quantidades muito diferentes de componentes (1:20, por exemplo) são mais difíceis de executar.
A mistura de pós por espatulação sobre uma folha de papel, por exemplo, só é aconselhável
para muito pequenas quantidades de drogas pulverizadas, dotadas da mesma densidade e de
idêntico grau de divisão. O emprego de almofarizes facilita grandemente a mistura, que se faz por
trituração mais ou menos suave, consoante os casos. Normalmente, usam-se almofarizes de vidro,
estes obrigatoriamente empregues quando as drogas a misturar sejam o iodo ou corantes. A mistura
em almofarizes requer certa soma de trabalho, principalmente quando são elevadas as quantidades
de pó a preparar. Nesses casos é mais prático e eficiente recorrer-se aos misturadores, de que há
dois tipos principais: misturadores de recipiente fixo (de espiral, de tipo planetário, etc.) e
misturadores de recipiente móvel (de tipo cúbico, bicónico, em forma de V, etc.). Mais recente é o
misturador de LnrLEFORD-LoDiGE (recipiente fixo), que permite homogeneizar uma mistura de pós
em cerca de 30 segundos.
O funcionamento dos misturadores é bastante simples e será descrito, em porme
nor, quando tratarmos da preparação dos comprimidos, já que o seu uso não se res
tringe à homogeneização de pós, mas serve, ainda, para outras operações, como o
humedecimento dos pós destinados à granulação, que constitui uma fase importante da
preparação daquela forma farmacêutica. ^ ,. -
\
Qualquer que seja o tipo de instrumento usado na preparação de pós compostos, há um certo
número de regras a observar, as quais passamos a descrever:

1.° — Cada componente do pó composto deve ser pulverizado separadamente.


2.° — Os pós simples constituintes da fórmula devem apresentar a mesma tenui-dade quando
têm densidades muito próximas; no entanto, é sempre de atender que certas drogas apresentam uma
densidade muito mais elevada do que a dos restantes componentes do pó composto, sendo
aconselhável, nesses casos, pulverizá-las mais finamente para, assim, diminuir a sua densidade
aparente e aproximá-la da densidade dos restantes componentes. Assim, é por vezes necessário
porfirizar alguns constituintes minerais, em regra mais densos, para que depois de misturados com
os mais leves não tendam a depositar.
v 3.° — As substâncias moles, como as gomas e as resinas, devem ser pulverizadas por intermédio.
Devem misturar-se os pós sucessivamente, principiando pêlos que ocupem menor volume. Do mesmo
modo, há que recorrer ao uso de intermédios quando seja difícil homogeneizar dois ou mais
componentes da mistura. Assim, se se pretender um pó composto de ácido bórico e iodo, pode
dissolver-se o último em
601

álcool e adicionar-se a solução ao ácido. Uma agitação cuidadosa leva à evaporação


ulterior do dissolvente. . , >:.-.--^vv» '-*• ;'*
4.° — Quando um pó composto contém essências, tinturas, extractos fluidos ou medicamentos
voláteis, devem usar-se os pós mais absorventes da mistura para fixar aquelas substâncias. Por vezes,
é necessário incluir compostos não indicados na fórmula, como o fosfato de cálcio, o carbonato de
cálcio, a magnésia alva, o caulino, etc., os quais vão funcionar como verdadeiros absorventes.
Quando o volume de liquido é muito elevado, pode prodecer-se à sua concentração em condições
adequadas (60-70°C, sob pressão reduzida, por exemplo).
5.° — Na mistura de dois pós que entrem numa fórmula em quantidades muito desiguais, deve
principiar-se por triturar a droga mais activa com igual volume de diluente, reduzido a pó da mesma
tenuidade. A operação repete-se adicionando à mistura, de cada vez, um volume de diluente
aproximadamente igual ao que ela já ocupa, até que todo o diluente seja consumido. A este processo
dá-se o nome de método da diluição geométrica, que deve ser também empregado na obtenção de pós
compostos constituídos por vários componentes.
6.° — Se, num pó composto, existirem princípios muito activos, estes devem diluir-se nos pós
restantes, tendo o cuidado de lhes juntar um corante, como o carmim, para assegurar, por simples
observação visual, a sua perfeita homogeneidade. Para os pós brancos, usa-se, em regra, uma
quantidade de corante da ordem de 0,1 a 0,25%. O corante é habitualmente adicionado no estado de
pó. Pode, porém, ser aconselhável adicioná-lo em solução, para o que se deverá escolher um
dissolvente não reactivo e facilmente vaporizavel.
7.° — Se a quantidade de princípio activo for da ordem dos miligramas, em geral difícil de
pesar com exactidão, devem utilizar-se diluições em pós inertes. Assim, são correntes as diluições de
digitálicos, de vitamina B , etc., em excipiente constituído por lactose, manita e muitos outros pós
inertes. Empregam-se diluições a 1:10, 1:100, 1:1000, etc. Para se obter, por exemplo, uma diluição
a 1:100, pesar-se-ia 0,1 g de princípio activo, adicionar-se-lhe-ia 0,25 g de carmim e misturar-se-ia
intimamente o conjunto com 9,65 g de lactose. Quando precisássemos de utilizar, apenas, l mg ou l
cg de princípio activo para preparar um pó composto, bastaria que tomássemos 0,1 ou l g da mistura
diluída, incorporando-a, depois, nos restantes pós. Alguns livros de Farmácia Galénica designam
estas diluições por triturações (triturationes). Preferimos o termo diluição porque especifica mais
claramente do que se trata e, também, porque sob o nome de triturações é conhecida uma forma
galénica semelhante, usada em Farmácia Homeopática.
8.° — Se dois ou mais constituintes de uma mistura de pós reagirem entre si em presença da
humidade, como acontece com os bicarbonatos associados aos ácidos, deverá executar-se,
sepradamente, a pulverização de cada substância, secar os pós obtidos (40-50ÜC) e só depois se
proceder à sua mistura.
602

^ 9." — Quando num pó composto haja substâncias que formem misturas eutéticas líquidas, como
acontece com a associação do salicilato de fenilo (salol) com a cânfora, devem incorporar-se
compostos absorventes (carbonato de cálcio, fosfato tricálcico, lactose, carbonato e óxido de
magnésio, pó de alcaçuz, sulfato de sódio anidro, etc.), de modo a corrigir a incompatibilidade.
10.° — Se uma mistura de pós contiver extractos moles ou substâncias pastosas, estas deverão
ser incorporadas em compostos absorventes, como os atrás citados, a fim de se fixar a sua
humidade. Em certos casos, como na associação do ictiol com o talco, é necessário dissolver a
substância pastosa num líquido volátil e só depois incorporar, progressivamente, o outro
constituinte pulverizado. No caso citado, deve dissolver-se o ictiol em éter, incorporar o talco, a
pouco e pouco, e agitar até que se evapore o dissolvente.
O exemplo mencionado é, afinal, um caso particular do que se relatou em 3.°.
11.° — No caso de misturas deflagrantes ou explosivas — clorato de potássio com açúcar,
peróxidos com substâncias redutoras; etc. — as substâncias devem ser pulverizadas separadamente
e misturadas com cuidado num almaforiz ou sobre uma folha de papel, usando, para isso, uma
espátula de osso. A mistura só será tamisada por peneiro de musselina ou passada através de uma
gaze.
12.° — Para o caso das substâncias dificilmente miscíveis entre si, como o carvão e o
carbonato de magnésio, ou o licopódio e o talco, deve utilizar-se uni intermédio (álcool ou éter) que
depois se evaporará.
13.° — No caso de misturas de pós irritantes ou tóxicos, como as cantáridas, piretro, agárico,
agentes progestacionais, bicloreto de mercúrio, etc., deve operar-se usando uma máscara protectora
dos olhos e das vias respiratórias. A operação será conduzida, de preferência, em almofariz tapado.
• .''J' i i'-s"J

Os pós compostos podem destinar-se a serem administrados interna ou externamente. Alguns


pós para uso interno são administrados sob a forma de solução aquosa, podendo o pó produzir
efervescência quando se dissolve. Estes pós dizem-se efervescentes e esta propriedade é, em regra,
conseguida à custa da reacção de um carbonato ou bicarbonato com um ácido orgânico, como o
cítrico ou o tartárico. Usa-se, correntemente, o bicarbonato de sódio, que reage com o ácido orgânico
em presença da água usada para a ingestão do medicamento, produzindo-se libertação de anidrido
carbónico no seio daquela. Nas fórmulas dos pós efervescentes é muitas vezes aconselhável incluir
substâncias, como o fosfato monossódico, que actuem tamponando o meio, após a reacção (')•

(') Comercialmente, a adição do fosfato monossódico apresenta vantagens económicas, já


que o seu preço é inferior ao dos ácidos crítico ou tartárico que parcialmente substitui.
603

Os pós efervescentes destinam-se a proporcionar um paladar agradável, corrigindo


eventualmente o gosto de certos fármacos, o que é devido às propriedades acidulas do anidrido
carbónico. Este vai actuar, secundariamente, como estabilizante da mucosa gástrica, podendo ainda
incrementar a absorção medicamentosa.
Geralmente, usa-se uma quantidade fixa e arbitrária de ácido tartárico ou de ácido cítrico,
podendo ainda associarem-se estes dois compostos. A quantidade de bicarbonato de sódio que é
necessário adicionar pode calcular-se em função da acidez conferida pêlos ácidos presentes e pelo
próprio fosfato monossódico, de tal modo que, ao dar-se a reacção em presença da água, a solução
fique sensivelmente neutra.
Suponhamos uma associação de 10 g de ácido cítrico com 10 g de ácido tartárico e 15 g de
fosfato mosossódico. O cálculo da quantidade de bicarbonato a incluir na fórmula é executado
tomando como base que cada molécula de NaHCO^ (P. M. = 84) corresponde a M/3 de ácido
cítrico, M/2 de ácido tartárico e a M/1 de fosfato monossódico. Assim teremos:

.- -•
Acido cítrico . . . . .10 g Quantidade de bicarbonato
de sódio:
HOOC-CHrC-CHrCOOH, HfO 84 x 10
= 12 g
21
OH COOH 'T -" °
(P. M. = 210) '"'* ••'" ~
Acido tartárico . . . . 10 g
84 X 10
HOOC-CHOH-CHOH-COOH _____ =11,2
15
. (P. M. = 150) °
Fosfato monossódico . . ,15 g
84 x 15
NaH2POt • -> -; _____ - 105 g
120 (P.
M. = 120)

Deste modo, a quantidade total de NaHCO3 a utilizar é de 12 g+11,2 g + + 10,5 g = 33,7 g.


Os constituintes que figurem na fórmula de um pó efervescente devem ser secos (40-50°C),
pulverizados, misturados entre si e o produto final será exsicado, por seu turno, a cerca de 50UC.
Os pós efervescentes constituem uma forma dotada de má conservação, pois absorvem,
facilmente, humidade atmosférica, dada a grande superfície que apresentam. É por isso que são
geralmente substituídos por granulados, menos sujeitos a esta alteração (ver Granulados), ou se
empregam no estado de pó grosso.
604

<•:• Os pós destinados a uso externo devem apresentar todas as qualidades requeridas para os pós
em geral e mais as que lhes são exigidas para esse uso particular. De facto, além da característica de
homogeneidade, não devem ser susceptíveis de causar irritação local e devem fluir facilmente dos
recipientes onde estejam acondicionados, espalhando--se de modo uniforme na pele ou mucosa a que
devem aderir. A sua tenuidade será, pelo menos, a correspondente ao pó ordinário (0,180 mm de
abertura de malha do tamis).
É frequente desejar-se que um pó para uso externo apresente propriedades adsor-ventes e
absorventes, de modo a poder fixar os líquidos exsudativos, protegendo a epiderme da irritação.
Entre os absorventes mais usados figuram o caulino, a bentonite, o amido e certos pós hidrófilos.
É de boa prática proceder à esterilização dos pós aplicados sobre feridas, úlceras ou soluções
de continuidade da epiderme. Esse assunto será tratado no próximo subcapítulo.
Entre os pós para uso externo figuram os pós dentífricos. Na sua composição não se devem
incluir substâncias altamente abrasivas, que deterioram o esmalte, mas é prática corrente
empregarem-se compostos detergentes, como o sabão ou o sulfato de laurilo e sódio,'que facilitam a
remoção da sujidade, associados a abrasivos suaves. Chama-se abrasiva a uma substância sólida que
promove a remoção mecânica dos detritos e manchas dos dentes, além de executar o polimento da
superfície dos mesmos, Entre os abrasivos citamos o carbonato de cálcio precipitado, o fosfato
dibásico de cálcio, o fosfato tricálcico, o pirofosfato de cálcio e o metafosfato de sódio.
Não queremos terminar sem fazer uma ligeira referência aos pós destinados a serem
aplicados sob a forma de dispersão no seios dos gases (aerossoles), para os quais se requer um
elevado grau de tenuidade e um sistema adequado de dispersão gasosa. Empregam-se para uso
interno ou externo, recorrendo-se a insufladores ou a recipientes contendo gases propelentes. Este
assunto será estudado a propósito das Formas complementarei! das dispersões coloidais e
suspensões.

7.2.0.4. Esterilização dos pós (1)

Na presente rubrica não vamos abordar o problema da esterilização dos pós destinados à
preparação de medicamentos injectáveis. Esse assunto será tratado posteriormente, quando nos
referirmos àquela forma farmacêutica. Agora procuraremos, apenas, indicar os principais métodos
empregados para esterilizar os pós que se destinam a aplicação local.
Como regra, podemos dizer que seria desejável que todos os pós utilizados localmente, quer
sobre uma epiderme inflamada, quer sobre uma mucosa hipersecretora,

(') Veja-se, a este respeito, o que se diz na pág. 365, onde o assunto foi tratado na sua gene-
ralidade.
605

satisfizessem a condições de esterilidade bem definidas. Na pratica, isto nem sempre sucede, talvez
por se contar com as defesas naturais do indivíduo ou com o poder anti-
-séptico de muitos dos compostos empregados. É, porém, do maior interesse e, quanto a nós,
obrigatória, a esterilização dos pós que se destinam a serem aplicados sobre feridas ou mucosas
ulceradas. Do mesmo modo, devem ser esterilizados os pós que se aplicam na conjuntiva ocular.
O problema da esterilidade dos pós é mais complexo do que à primeira vista parece, pois são
raras as substâncias capazes de suportarem, sem alteração, uma esterilização pelo calor seco, a
temperaturas que permitam realmente a destruição dos microrganismos e das suas formas
esporuladas. Está nestas condições o aquecimento a 150°C durante uma hora, ou a Í40"C por
período de quatro horas ('). Se bem que o talco, a magnésia, o óxido de zinco e o caulino suportem,
sem alteração, estes aquecimentos, já o mesmo se não pode dizer relativamente a muitas sulfamidas,
aos antibióticos, como a penicilina e as tetraciclinas, e a outras substâncias que se utilizam na
terapêutica. Nesses casos há que considerar a destruição efectuada pelo calor, podendo-
-se diminuir a temperatura de esterilização ou recorrer a outros métodos, que não o do
calor seco. A primeira hipótese só se justifica quando o pó a esterilizar tenha sido
obtido e manipulado em condições de relativa assepsia e quando não se encontre
perfeitamente seco. Efectivamente, se tivermos um pó com 2-3% de humidade e o sub
metermos a um aquecimento a 120ÜC, em vaso fechado, acontece que o teor de água
existente, ao vaporizar-se, vai aumentar a eficácia da esterilização que, pelo menos
parcialmente, passa a ser conduzida a calor húmido. É claro que a regularidade e a
eficiência dos resultados dependerão da regularidade de humidificação do pó e da sua
relativa assepsia inicial. :<!
Em consequência do que acabámos de dizer, é vulgar, especialmente na literatura
norte^americana, ver-se indicado o aquecimento a 120-121"C, durante sessenta minutos, como
processo de esterilização de pós pelo calor seco.
Uma vez que o calor húmido é mais eficiente, tem-se proposto esterilizar os pós, conservados
em recipiente aberto, numa autoclave aquecida a 120°C, durante trinta minutos. O inconveniente
deste processo reside na fixação da humidade sobre os pós que terão de sofrer uma subsequente
secagem antes do uso. A fim de atenuar a condensação do vapor de água sobre o pó, durante a
esterilização, aconselha-se aquecê-lo, previamente, a 100-110°C, numa estufa. Mesmo assim, é
recomendável acondicionar o pó num tubo cilíndrico, aberto nas duas extremidades, o qual se
coloca, em posição

(') Muitas vezes o aquecimento de um pó a 140"C origina a formação de aglomerados superfi-


ciais (crostas), preconizando-se, para evitar esse fenómeno, que se proceda ao aquecimento prévio do
pó a 100°C, com o fim de remover toda a humidade. Este modo de proceder diminui, como veremos,
a eficiência da esterilização. Noutros casos, o referido fenómeno de endurecimento dos pós pode
atenuar--se misturando-se, antes da esterilização, com 1-2% de substâncias inertes ou não
prejudiciais ao seu afeito terapêutico (caulino, carbonato de magnésio, carbonato de bismuto, etc.).
606

horizontal, na autoclave, tapando-se os extremos do cilindro com algodão cardado. Algumas


sulfamidas destinadas ao polvilhamento de feridas são esterilizadas por este processo. Já o amido
não é susceptível de se esterilizar, sem inconvenientes, pelo método referido. De facto, os grãos de
amido, inchando pela acção do vapor de água, perdem parte do seu poder absorvente, desejável em
aplicações démúcas, e a secagem posterior não ocasiona inteira reversão do processo. É por isso
que se usa, habitualmente, o amido tratado por epicloridrina, que aumenta a resistência do seus
grãos à acção do vapor de água. Este amido é chamado amido absorvente e é vulgar associar--se a
cerca de 2% de óxido de magnésio, que o torna mais suave (')•
Outro processo de obter pós estéreis consiste em esterilizá-los recorrendo ao emprego de
gases, como o óxido de elileno ou a p-propiolactona, ou, ainda, utilizando radiações de pequeno
comprimento de onda (electrões acelerados, raios 7, etc.). Mais acessível de realizar na prática das
pequenas manipulações afigura-se-nos um método muitas vezes usado para pós anti-sépticos de
aplicação cutânea. Consiste em misturar o pó, cuja esterilidade é pretendida (sulfamidas, por
exemplo), com anti-sépticos poderosos, como o tetrabromocresol. Para isso, dissolve-se o agente
microbicida num dissolvente volátil, como o benzeno, e mistura-se a solução com o pó. A mistura é
homogeneizada e aquecida em recipiente aberto, a 30°C, durante 48 horas. Nestas circunstâncias, o
dissolvente é evaporado, conseguindo-se um pó estéril.

. 7.2.0.5. Modificações devidas à pulverização

De um modo geral, os pós apresentam certas diferenças em relação às drogas que os


originaram. Sob a presente rubrica iremos estudar as modificações físicas e químicas ocorridas
durante a pulverização,

Cheiro e sabor . - - . . „ . ; .,

A pulverização intensifica, normalmente, o cheiro e o sabor das drogas, já que a superfície


apresentada pêlos pós é superior à dos fármacos correspondentes.

Cor '., ', . .

Geralmente, os pós são mais claros do que as drogas de que provêm. Assim, o cinábrio, que se
apresenta como uma substância de cor vermelha-escura, torna-se ver-

(') ANDERSEN e colab. {Dansk Tids. Farm. 27, 25, 1953) descrevem do seguinte modo a preparação
do amido absorvente: tratam-se 100 g de amido com 5 g de hidróxido de potássio dissolvido em 20 g
de etanol anidro e 45 g de epicloridrina em 10 g de etanol; aquece-se a mistura a 40"C e seca--se
por 2 horas; repete-se o tratamento, elimina-se o álcool por lavagem aquosa e seca-se a 40°C;
adiciona-se, então, 2% de óxido de magnésio.
607

melho-vivo, por pulverização; o aloés, que é verde-garrafa, fica amarelo-ouro quando pulverizado.
Estas modificações devem-se a fenómenos de reflexão da luz, uma vez que a pulverização aumenta o
número de partículas sobre que aquela incide.

Volume

É evidente que o volume ocupado por um dado peso de pó deve ser superior ao apresentado
pela droga que lhe deu origem. Chamaremos volume aparente de um pó à soma do volume ocupado
pelas suas partículas sólidas com o volume de ar existente entre elas. Se o volume ocupado pelas
partículas sólidas é constante, já o mesmo não se pode dizer em relação à quantidade de ar, que
varia com diversos factores, como a forma e as dimensões das partículas. As partículas esféricas
podem empilhar-se de seis maneiras diferentes, sendo os arranjos cúbicos menos densos do que os
empilhamentos romboédricos. De facto, como demonstra a Fig. 232, o espaço deixado entre as
partículas arrumadas segundo uma estrutura cúbica é de cerca de 48% do volume aparente,
enquanto que este número se reduz a 26% no arranjo romboédrico.

& w-_\ Fig. 232. Empilhamento de partículas de pós: a)


Empilhamento cúbico;
, ,: . b) Empilhamento romboédrico

Do mesmo modo, a dimensão das partículas afecta o volume de ar existente entre elas, o que
tem especial interesse num pó composto por pós simples de diferentes tenuidades. Efectivamente, um
pó composto, com partículas de vários tamanhos, contém menos ar do que se todas as partículas
apresentassem idêntica tenuidade, uma vez que as mais pequenas podem ocupar o espaço existente
entre as maiores.
Pelo facto de existir maior espaço entre as partículas empilhadas segundo arranjos cúbicos
também se compreende que, só nesse arrumo, caibam entre as esferas mais volumosas esférulas
menores, com apreciável diâmetro. Pelo contrário, se as partículas mais pequenas dum pó composto
por dois pós simples de diferente tenuidade tiverem reduzidos diâmetros, é possível o empilhamento
romboédrico. Este facto tem o seu interesse, já que, no primeiro caso, teríamos um maior volume
aparente de pó, ou, por outras palavras, só seria possível um empilhamento pouco denso.
A forma e dimensão das partículas depende do tipo de pulverização executada e, assim, os
moinhos, por exemplo, tendem a tornar as partículas esféricas. Na prática,
608

pode reduzir-se, apreciavelmente, o volume de um pó, quer por remoção do ar existente entre as
partículas, por meio de máquinas de vazio, quer colocando o pó num recipiente que se bate,
verticalmente, numa superfície rígida. ^-v» => íivv.
Algumas vezes, como na preparação extemporânea de suspensões, é útil um pó dotado de
grande volume. Noutros casos, quando se empregam quantidades elevadas de fármacos, é desejável
reduzir, apreciavelmente, o volume ocupado pelo pó.

:>
, Densidade • . - •-. ' ' V

A densidade dos pós é, em regra, idêntica à das drogas que os originaram. Em determinadas
circunstâncias é possível aumentar a densidade de um pó, bastando, para isso, humedecê-lo com
dissolvente em que apresente solubilidade parcial. Evaporado o dissolvente, o pó seco obtido poderá
apresentar aumento da sua densidade.

vir Higroscopia e eflorescência . -: - ••• ' •--


• -••

Regra geral, os pós revelam maior afinidade para a água do que os fármacos não
pulverizados. Interessa considerar esta propriedade que obriga ao acondicionamento cuidadoso de
muitos pós em frascos hermeticamente rolhados e eventualmente providos de substâncias
exsicadoras. A quantidade de água fixada depende da natureza físico-
-química do pó, aumentando com o grau de divisão daquele e sendo, também, dependente do grau de
humidade relativa. Numa comunicação científica, SHOTTON e HAAB verificaram o efeito da humidade
e da temperatura na fixação de água por diversos pós. Assim, operando a 25°C e com uma
humidade relativa de 87%, o equilíbrio atingiu-
-se do seguinte modo: amido de milho 19,8% de humidade, amido de trigo 19,4% de humidade,
fécula de batata 26,4% de humidade, glucose 9,6% de humidade, lactose 0% de humidade, ácido
algínico 18,9% de humidade, goma adraganta 32,4% de humidade e goma arábica 28,9% de
humidade.
Para uma humidade relativa de 100% a percentagem de água fixada pêlos pós à mesma
temperatura foi de: amido de milho 27,4%, amido de trigo 28%, fécula de batata 35,6%, glucose
dissolve-se, lactose 0,1%, goma adraganta forma mucilagem, goma arábica forma mucilagem, ácido
algínico 30,3%.
Estes dados, além de mostrarem a nítida influência da humidade relativa na percentagem de
água fixada pêlos pós, apresentam interesse no sentido de se poderem seriar alguns pós, quanto à
sua higroscopia.
A eflorescência aumenta também com a pulverização, uma vez que a superfície de
evaporação da água de cristalização é maior. Este fenómeno manifesta-se em muitas
substâncias pela sua fácil transformação em pó à medida que se liberta a água de
cristalização. **"•••?*•.••-•• • i- ••- -••- -\ •• ,•;?•;•< s, -••'•-•
A libertação de água pode dar-se por alterações de humidade relativa, que pode ocorrer
durante a trituração das drogas. A água libertada do pó pode torná-lo pastoso ou chegar a
liquefazê-lo.
609

Na prática, os inconvenientes das substâncias eflorescentes são, em regra, atenua


dos substituindo o derivado hidratado pelo anidro ou, em caso de impossibilidade de
se conseguir este no comércio, exsicando a substância (pág. 202). É fundamental que,
nesta substituição, se atenda à diferença de peso molecular entre as formas anidra e
hidratada do composto, de modo a que a dose medicamentosa seja adequadamente
ajustada. .- .
As Tabelas LVH e LVHI transcrevem uma lista de pós higroscópicos e eflorescentes.

Tabela LVH. Pós higroscópicos e deliquescentes

Acetato de potássio Cloridrato de hidrastina


Brometo de amónio Fenobarbital sódico
Brometo de cálcio lodeto de amónio
Brometo de lítio Brometo lodeto de sódio
de sódio Citrato férrico Nitrato de sódio ;:
amoniacal Citrato de Pepsina ..
potássio Cloreto de Pilocarpina
amónio Cloreto de cálcio Sulfato de hiosciamina
Cloridrato de efedrina Sulfato de fisostigmina
Valerato de amónio

Tabela LVHI. Pós eflorescentes

Acetato de sódio Cloridrato de quinina


Acido cítrico Cocaína . "
Alúmen Codeína
"' Fosfato de sódio
. Sulfato de estricnina
Bissulfato de quinina Sulfato ferroso .;
Bromidrato de escopolamina Terpina
Cafeína
Carbonato de sódio

Solubilidade

Em geral, à medida que uma droga é progressivamente pulverizada aumenta a sua velocidade de
dissolução. Por outras palavras e dentro de certos limites, quanto mais ténues forem as partículas
constituintes de um pó, tanto mais facilmente se fará a sua dissolução. Esta regra não se verifica com todas as
drogas, particularmente com aquelas cuja pulverização possa modificar o seu sistema cristalográfico ou
transformá-las de amorfas em cristalinas. Como exemplo do que acabámos de dizer, lembramos o que se passa
com o anidrido arsenioso, que no estado amorfo (vítreo) é solúvel na água numa
610

proporção de 4%, diminuindo o seu coeficiente de solubilidade para 1,4% por pulve
rização (formação de anidrido arsenioso octaédrico) (')- ' , , . •" í-,r*T <",
No domínio das modificações alotrópicas operadas por pulverização, é de citar a
transformação da marcassite (sulfureto de ferro ortorrômbico) em pirite, que cristaliza
no sistema cúbico.
•- . •*{
Modificações químicas

Como se compreende, durante a pulverização há desenvolvimento de calor, o qual


pode contribuir para provocar modificações químicas nas diversas drogas. Esta alteração
consiste, geralmente, numa hidrólise em presença da humidade residual dos materiais a
pulverizar. Como exemplo do que dizemos, mencionamos os seguintes factos: a saca
rose, pulverizada demoradamente, pode desdobrar-se em glucose e frutose; o ácido ace-
tilsalicílico é susceptível de originar ácidos acético e salicílico o que, porém, só sucede
se houver humidade presente nos pós, pois em ambiente seco esse desdobramento não
se dá. í- • -
Por vezes, a pulverização provoca verdadeiras reduções da substância a pulverizar. É o que sucede
durante a trituração demorada do cloreto mercúrico, que, segundo VERNES, origina a formação de cloreto
mercuroso.

7.2.0.6. Alterações dos pós

Dada a sua apreciável superfície relativa, os pós podem alterar-se, facilmente, por
acção do ar, da luz, do calor, da humidade ou por inquinação fúngica ou bacteriana.
Acessoriamente, a cedência dos constituintes dos recipientes onde os pós se encontram
acondicionados ou do material usado na manipulação dos pós pode, também, contribuir
para a sua alteração, -.,^r'- : ••>• •«•"V-^.ïíí
Na maioria das vezes, as alterações dos pós são devidas a dois ou mais dos
citados factores. Assim, muitas das oxidações observadas são favorecidas pela presença
de vestígios de metais pesados, pela exposição à luz, pela acção do calor, etc. As
hidrólises são ocasionalmente aceleradas pela presença de enzimas e, noutros casos, o
seu incremento é devido à elevada temperatura a que se operou ou a que se armazenou
o pó. „

a) O ar actua não só pelo seu teor em oxigénio e anidrido carbónico, mas, ainda, pela humidade que
contém. Muitas substâncias, como álcoois, fenóís, aminas, cetonas, etc., oxidam-se facilmente em contacto
com o ar, tornando-se escuras ou adquirindo

(') O anidrido arsenioso octaédrico corresponde ao produto oficiital que é, também, designado por
opaco.
611

nova coloração. A morfina, a ergotamina, a vitamina C, a adrenalina, a peniciliiia G, a resorcina, a vitamina


D2, etc., são oxidadas isoladamente ou em mistura com outros pós, quando em presença de ar. Do mesmo
modo, muitas das drogas vegetais ou animais, como o ópio, a cravagem do centeio ou o pó de hipófise, podem
sofrer oxidação dos seus principais constituintes.
O anidrido carbónico existente *no ar é também susceptível de alterar alguns pós sobre que tenha
particular tendência a fixar-se. Estão neste caso o óxido de magnésio, o óxido de zinco, o hidróxido de cálcio,
a teofílina e muitas outras substâncias.
A humidade do ar é também prejudicial à estabilidade dos pós, pois provoca hidrólises e isomerizações.
O ácido acetilsalicílico é desdobrado, libertando ácidos acético e salicílicc, a hiosciamina racemiza se,
originando atropina, o pó de dedaleira sofre a hidrólise dos seus heterosidos, etc.
Se o pó for higroscópico, mais se acentuam as alterações mencionadas. Lembremos, assim, que a
pepsina e a peptona, dada a sua afinidade para a água, vão fixando a humidade atmosférica, empapando
mercê disso e sofrendo ainda, posteriormente, hidrólises ao nível das suas ligações carbâmicas. Recordemos,
também, o que sucede aos compostos deliquescentes, como o cloreto de zinco, o citrato ou o cloreto de colina,
o cacodilato de sódio, o salicilato de lítio e tantos outros. De facto, quando em contacto com a humidade
atmosférica, estas substâncias captam água em tal quantidade que acabam por deliquescer.
Claramente que se podem atenuar ou evitar as citadas alterações acondicionando os pós em recipientes
bem cheios e hermeticamente fechados. Pode ainda ser necessário colocar, no próprio recipiente, substâncias
exsicadoras, como o gele de sílica, as quais, pela sua avidez de água, impedem o humedeci mento do pó
medicamentoso.
b) A luz é outro dos agentes causadores da alteração de muitos pós, sendo especialmente activa a zona
do seu espectro correspondente às radiações ultravioleta e visível (até 500 nm). Assim, o iodofórmio, o aristol
e os iodetos libertam iodo; os fenóis, o salicilato de eserina, a apomorfina, a adrenalina, o ácido ascórbico,
certas fenotiazinas, etc., originam compostos corados; a menadiona e muitas outras quínonas reduzem-se e
descoram; a cianocobalamina ou Vitamina B|2 altera-se, rapidamente, pela acção da luz.
No entanto, estes efeitos nocivos da luz podem evitar-se acondicionando os pós em recipientes opacos,
em frascos de vidro corado ou em frascos incolores mas envolvidos por papel negro.
Na Tabela LIX indicamos uma relação de compostos que se alteram por acção do
ar (humidade, oxigénio e anidrido carbónico) e da luz. Já anteriormente (Tabela LVII)
mencionámos pós higroscópicos e deliquescentes. : /•,.--• . •"•
c) O calor é um dos mais importantes agentes de alteração dos pós. A simples trituração do ácido
acetilsalicílico provoca um aumento de temperatura que auxilia a sua hidrólise. Outras vezes, a própria
secagem pode provocar alterações, como acontece se submetermos o glicerofosfato de cálcio ou a vitamina Bt
a uma temperatura de
612

nova coloração. A morfina, a ergotamina, a vitamina C, a adrenalina, a peniciliiia G, a resorcina, a vitamina


D2, etc., são oxidadas isoladamente ou em mistura com outros pós, quando em presença de ar. Do mesmo
modo, muitas das drogas vegetais ou animais, como o ópio, a cravagem do centeio ou o pó de hipófise, podem
sofrer oxidação dos seus principais constituintes.
O anidrido carbónico existente *no ar é também susceptível de alterar alguns pós sobre que tenha
particular tendência a fixar-se. Estão neste caso o óxido de magnésio, o óxido de zinco, o hidróxido de cálcio,
a teofílina e muitas outras substâncias.
A humidade do ar é também prejudicial à estabilidade dos pós, pois provoca hidrólises e isomerizações.
O ácido acetilsalicílico é desdobrado, libertando ácidos acético e salicílicc, a hiosciamina racemiza se,
originando atropina, o pó de dedaleira sofre a hidrólise dos seus heterosidos, etc.
Se o pó for higroscópico, mais se acentuam as alterações mencionadas. Lembremos, assim, que a
pepsina e a peptona, dada a sua afinidade para a água, vão fixando a humidade atmosférica, empapando
mercê disso e sofrendo ainda, posteriormente, hidrólises ao nível das suas ligações carbâmicas. Recordemos,
também, o que sucede aos compostos deliquescentes, como o cloreto de zinco, o citrato ou o cloreto de colina,
o cacodilato de sódio, o salicilato de lítio e tantos outros. De facto, quando em contacto com a humidade
atmosférica, estas substâncias captam água em tal quantidade que acabam por deliquescer.
Claramente que se podem atenuar ou evitar as citadas alterações acondicionando os pós em recipientes
bem cheios e hermeticamente fechados. Pode ainda ser necessário colocar, no próprio recipiente, substâncias
exsicadoras, como o gele de sílica, as quais, pela sua avidez de água, impedem o humedeci mento do pó
medicamentoso.
b) A luz é outro dos agentes causadores da alteração de muitos pós, sendo especialmente activa a zona
do seu espectro correspondente às radiações ultravioleta e visível (até 500 nm). Assim, o iodofórmio, o aristol
e os iodetos libertam iodo; os fenóis, o salicilato de eserina, a apomorfina, a adrenalina, o ácido ascórbico,
certas fenotiazinas, etc., originam compostos corados; a menadiona e muitas outras quínonas reduzem-se e
descoram; a cianocobalamina ou Vitamina B|2 altera-se, rapidamente, pela acção da luz.
No entanto, estes efeitos nocivos da luz podem evitar-se acondicionando os pós em recipientes opacos,
em frascos de vidro corado ou em frascos incolores mas envolvidos por papel negro.
Na Tabela LIX indicamos uma relação de compostos que se alteram por acção do
ar (humidade, oxigénio e anidrido carbónico) e da luz. Já anteriormente (Tabela LVII)
mencionámos pós higroscópicos e deliquescentes. : /•,.--• . •"•
c) O calor é um dos mais importantes agentes de alteração dos pós. A simples trituração do ácido
acetilsalicílico provoca um aumento de temperatura que auxilia a sua hidrólise. Outras vezes, a própria
secagem pode provocar alterações, como acontece se submetermos o glicerofosfato de cálcio ou a vitamina Bt
a uma temperatura de
613

as destruições observadas devem-se à acção dos enzimas existentes no próprio


íarmaco. ; *-'.-. j.;,: ~ - - . . • > . .::i ;.T"
e) Os recipientes onde se encontram acondicionados os pós podem ceder parte dos seus constituintes que,
eventualmente, são susceptíveis de provocar alterações nos compostos daquela forma farmacêutica. Assim, os
fluoretos não devem ser guardados em frascos de vidro, sem que estes tenham recebido uma completa
parafinação interior; os taninos não devem ser acondicionados em recipientes de ferro, o mesmo se dizendo dos
pós ácidos ou alcalinos que atacam aquele metal. Se este tipo de alteração é bastante de recear, não menos é
de terner a inquinação dos pós por vestígios de metais cedidos pelo frasco, tambor ou bidão onde se encontram
guardados. Os metais alcalinos originam a decomposição hidrolítica de várias substâncias, podem predispor para
a precipitação de outras, etc. Os metais pesados, como o ferro e o cobre, actuam, por vezes, como
catalisadores, num dado processo oxidativo; o manganésio e o cobalto podem participar na actividade
fermentativa, etc. Se bem que as cedências mencionadas sejam mais de recear no caso de líquidos, conhecemos
alguns desses acidentes com pós acondicionados em frascos de vidro.
Não queremos terminar sem uma ligeira referência aos cuidados a observar durante a manipulação dos pós.
Efectivamente, muitas substâncias podem reagir com os materiais de que se serve o farmacêutico quando
prepara um pó. O iodo, o ácido salicílico, o óxido de mercúrio, o tanino, etc., não devem ser manipulados com
espátulas de metal, aconselhando-se o emprego de material de osso ou de aço inoxidável de muito boa
qualidade. Seria naturalmente prejudicial à estabilidade de uma fórmula de pó contendo adrenalina, vitamina C
ou apomorfma proceder-se à mistura daquelas substâncias em almofariz metálico ou empregar espátulas de ferro,
pois os vestígios dos metais cedidos poderiam ser suficientes para catalisar a oxidação dos compostos
mencionados.

7.2.0.7. Incompatibilidades dos pós

As principais incompatibilidades dos pós manifestam-se por formação de misturas eméticas, misturas
explosivas e misturas coradas.
o) Misturas entéricas — De um modo geral, define-se mistura eutética como a que resulta da mistura de
componentes cuja proporção lhe confira o mais baixo ponto de fusão. Em Farmácia Galénica chamaremos
mistura eutética a uma mistura de sólidos que se liquefaz ou que se torna pastosa à temperatura ambiente.
Quando se misturam fenóis ou compostos fenólicos, aldeídos ou cetonas, o ponto de fusão da mistura é
muito inferior ao de qualquer dos componentes isolados, podendo ocorrer a sua liquefacção ou empastamento.
Na prática clínica podem ser receitadas associações de diversas substâncias que originem a formação de
misturas eméticas, competindo ao farmacêutico conhecer os principais compostos que as podem produzir, a fim
de evitar essa incompatibilidade. Essencialmente, o método consiste em interpor
614

pós absorventes entre os constituintes da mistura. Como pós dotados de poder de absorção citamos, por ordem
decrescente de actividade, o carbonato de magnésio, o caulino, o óxido de magnésio, o fosfato tricálcico, o gele
de sílica, a lactose e o amido.
A quantidade de absorvente a utilizar com o fim de impedir a liquefacção de uma mistura de pós pode ser
calculada teoricamente, admitindo-se que aquele é necessário para envolver completamente as partículas de
cada constituinte.
Suponhamos, por exemplo, que tínhamos de preparar uma mistura de 5 g de piramido com 5 g de salol.
O primeiro tem um ponto de fusão de 107-108°C e apresenta uma densidade de 1,1, enquanto que o salol
funde entre 41 e 43"C e apresenta uma densidade de cerca de 1,0. Quando se tritura qualquer destas
substâncias, isoladamente, o diâmetro médio das suas partículas é de cerca de 200 u,. A mistura das duas
substâncias origina um eutético, cuja formação pode evitar-se com óxido de magnésio. Este produto é usado
por causa do seu elevado ponto de fusão (2800°C) e da sua grande superfície específica, pois pode ser reduzido
a partículas com, aproximadamente, 20 u, de diâmetro. A sua densidade é de 1,25.
;
A área de uma partícula esférica de piramido é dada por: < ' - -;V <;

2
; '" S=4 K r = 4K (100 n)2 - 4 TC (IO2 x IO"4 cm)2 = 4 TC IO"1 cm2

e a área de um círculo recoberto por uma partícula de óxido de magnésio será de:

"- Sl = TC r2 = TC (10 ^i)2 = TC (10 x 10"* cm)2 - K 10"* cm2 : V li


' '.' ''"

O número de partículas de óxido de magnésio para recobrir uma partícula de piramido é dado pelo quociente:

S1 T Calculando, por outro lado, o peso de uma partícula de

piramido, teremos:

4 •.(.;• H.
•.:•
p = y. d = ——TC r3 d = 4,19 x IO-6 x 1,1 =4,6 x IO* g

S 4 TC IO"1 " :
2
————— = 4 x l 0 = 400 -* „ ^-.r,- - ,
'•.•*"' - .'tíj- '-",
6 6 6
5 g: 4,6 x IO- - 1,08 x IO = 1,1 x IO , .w

': ' !J>1-:'V'


O número de partículas de piramido na fórmula será:
/•;;> f_"-f-;{-. -,.;
615

Por seu turno, o número de partículas de óxido de magnésio necessárias para recobrir todas as
partículas de piramido é calculado pela seguinte regra de três: •»-. .

l (piramido)..........,......,.............. 400 (óxido de magnésio) 4. <,


1,1 X IO6 ...................................... n

n = 4,4x!0 8 - ".;•— — -

É agora preciso saber qual o peso de uma partícula de óxido de magnésio, a fim
de avaliar o peso necessário para recobrir os 5 g de piramido: •

K r] J, = 4,19 x IO-9 x 1,25 = 5,2 X IO"9 g

Assim, o peso total de óxido de magnésio a empregar para recobrir os 5 g de piramido


será de: ; f. Jv . .,
V 9
4,4x10* x 5,2 x IO' = 2,3 g 1 . "'

Por raciocínio análogo determina-se qual a quantidade de óxido de magnésio necessária para
recobrir o salol existente na fórmula. O cálculo indica o peso de 2,5 g. Nestas circunstâncias,
precisaríamos, para evitar a liquefacção da mistura eutética, de adicionar 2,3 + 2,5 g = 4,8 g de
óxido de magnésio.
A quantidade a que chegámos teoricamente revela-se eficaz, na prática, para a
manipulação da citada mistura. ^-:•-••<•.;. -,: .-.,••-.:
As proporções entre os compostos que originam a mistura eutética e a intensidade e duração
da trituração a que os pós são submetidos afectam a magnitude do fenómeno.
Na Tabela LX indicamos uma lista de substâncias capazes de originarem misturas
eutéticas. " '"!_. ' .• "'"'''' ' ' • ^-••-<••-' • •. _-.- ' _ ^ .' "- 1 •' •
O estudo das misturas eutéticas tem sido realizado por numerosos investigadores, desde os
primórdios deste século até à actualidade. Assim, CAILLE observou o comportamento de cânfora-
salol e de cânfora-resorcina, tendo verificado que a primeira corres-

Tabela LX. Substâncias que produzem misturas eutéticas

Acetanilida Hidrato de cloral


Ácido acetilsalicílico Mentol
!; Ácido salicílico p-Naftol .- ., ,,
Antipirina Resorcina
Cânfora Salicilatos
Fenacetina Salol
Fenol Timol
616

ponde a um verdadeiro eutético, enquanto que a segunda pode apresentar dois pontos
de fusão mínimos e um outro mais elevado. "•' : "**
A Fig. 233 representa, segundo CAILLE, as curvas de fusão das misturas de salol--cânfora e de
resorcina-cânfora.

160 160

14 MO
O
0 120
12 100 \
0 80

10 60

0 40

8 20

O 20 40 60 80 O 20 40 60 80
100 % 100'%
de cânfora de cânfora
100 80 60 40 20 100 80 60 40 20
0% de 0% de
salol resorcina
Fig. 233. Ponto de fusão de misturas de salol-cânfora
(temperatura do eutético 6°C) e de resorcina-cânfora
(temperaturas dos eutéticos 10,5 e 28,5°C). O salol puro funde
a 43PC; a cânfora pura funde a 179°C; e a resorcina pura funde
a 109°C

Mais recentemente, HRYNAKOWSKI e ADAMANIS estudaram o comportamento de


sistemas binários constituídos pela associação de quinina com uretano ou com antipi-
rina. Os diagramas de equilíbrio revelam que se conseguem eutéticos quando o uretano
é empregado numa percentagem de 93,2 e a antipirina numa taxa de 72,9% (ponto de
fusão de 3t°C). . . . . . . • • - - • • - -»:-<
Na prática corrente é algumas vezes útil a formação de misturas eutéticas. Como exemplo, citamos o
caso da chamada mistura de Bonain, usada, entre nós, como anti--séptico e anestésico em
odontologia e que é constituída por partes iguais de fenol, mentol e cloridrato de cocaína. Os dois
primeiros componentes formam um eutético em que se dissolve o cloridrato de cocaína t1).
A formação de misturas eutéticas pode ainda apresentar um interesse diferente do que acabámos de
expor. De facto, SEKIGUCHI et ai. admitem que, quando uma mistura

(') Esta mistura pode cristalizar ao fim de algum tempo de preparação, pelo que CHARONNAT e
MIOCQUE (An. Pharm. Franc., 14, 171, 1956) aconselham a substituição de 2/3 do cloridrato de cocaína
por cocaína básica.
617

eutética constituída por dois componentes, sendo um hidrossolúvel, é exposta à acção dos líquidos
do tracto gastrintestinal, o composto solúvel dissolve-se rapidamente, deixando a substância
insolúvel em estado de extrema divisão e, portanto, mais susceptível de ser absorvida. GOLDBERG e
colab. prepararam verdadeiros eméticos de ureia com N-acetilaminofenol, tendo verificado que
era largamente aumentada a solubilidade do derivado fenólico, sendo de admitir que se
incrementasse, ainda, a sua absorção por via gastrintestinal. Os mesmos autores ensaiaram,
também, misturas eutéticas de griseo-fulvina com ácido succínico, concluindo desse estudo a
possibilidade de utilização clínica da referida associação, com vantagens de ordem posológica e
de uniformidade na resposta terapêutica.
b) Misturas explosivas — Quando se tritura um poderoso agente oxidante com um redutor
enérgico pode dar-se uma explosão mais ou menos violenta e perigosa, a qual é devida a uma
excessiva libertação de gases. Algumas vezes são prescritas misturas explosivas e cabe ao
farmacêutico cercar-se de cuidados especiais na sua manipulação. Assim, cada componente da
mistura deve ser pulverizado isoladamente, devendo a pulverização executar-se com suavidade,
evitando demasiada pressão no almofariz, ou procurando homogeneizar os pós numa folha de
papel, fazendo-os rolar sobre ela.
Em casos muito especiais, em que se verifique impossibilidade de manipulação, os constituintes da
mistura deverão ser dispensados, separadamente, em papéis, instruindo--se o doente quanto à sua
administração.
Na Tabela LXI dão-se exemplos de misturas explosivas.

Tabela LXI. Substâncias oxidantes e redutoras que originam misturas explosivas


Oxidantes Redutores
Clorato de potássio Ácido tânico
Clorato de potássio Carvão
Clorato de potássio Enxofre
Clorato de potássio Açúcares
Dicromato de potássio Hipofosfitos
Nitrato de potássio Enxofre
Nitrato de prata Substâncias orgânicas
Permanganato de potássio Sulfuretos
Peróxidos Essências

c} Misturas coradas — Algumas vezes a mistura de dois ou mais pós simples pode originar
compostos corados por reacção entre os constituintes.
Os pós de ruibarbo ou de aloés, adicionados de substâncias alcalinas, coram-se de vermelho
(reacção de BORNTRÀEGER); sais de prata, em presença de cloreto de sódio, originam cloreto de
prata, que é reduzido por acção da luz; os sais de mercúrio, como o calomelanos, reduzem-se com
libertação do metal quando misturados com substâncias
618

orgânicas, como o sabão alcalino; o fenol, associado aos sais de ferro, pode produzir misturas coradas;
a oxidase da goma arábica provoca numerosas incompatibilidades, traduzíveis, frequentemente, pela
formação de compostos corados, o que se pode evitar aquecendo a goma a 100°C, durante trinta minutos.
Na Tabela LXII indicamos algumas das substâncias que originam compostos corados em presença da
goma arábica não desenzimada.

Tabela LXII. Substâncias que coram com a oxidase da goma arábica


Adrenalina • Naftóis
Eserina , : Piramido ....
Fenol Pirogalhol
Guaiacol ' Tanino ''" "
Morfina Tiocol '''

d) Outras incompatibilidades — além das incompatibilidades referidas, que são as mais facilmente
observáveis, existem muitas outras que afectam as propriedades farmacológicas dos compostos misturados.
Assim, o calomelanos, em presença da antipirina, dá origem à formação de um derivado mercurial de
antipirina, mais tóxico do que qualquer das substâncias iniciais; o acetilotanino reage com o subnitrato
de bismuto, libertando-se ácido acético; o clorato de potássio, quando em presença do iodeto de
potássio, produz iodato; ele.
As incompatibilidades assinaladas ocorrem administrando as substâncias separadamente ou associando-as
sob a forma de pó composto.

7.2.0.8. Verificação dos pós


Para verificar a qualidade de um pó podem executar-se variados ensaios. As características
organolépticas, como a cor, o cheiro e o sabor, constituem verificações fáceis de efectuar, as quais,
muitas vezes, são suficientes para orientar o técnico quanto à identidade e estado de conservação dos
pós. Assim, é evidente que os pós simples são, em regra, facilmente reconhecidos pela sua cor ('), cheiro
ou sabor. Outras vezes há características muito particulares do pó, as quais permitem identificá-lo
mediante ensaios extremamente simples e fáceis de executar. E o caso dos pós de cânfora ou de
resorcina, que, além de apresentarem aroma «sui generis», ao serem lançados na água

{'} A apreciação da cor dos pós pode fazer-se, com certa exactidão, recorrendo a fotómetros.
como o de Pulfrich, devidamente adaptado. Malysz e Walicka (Acta Polon. Pharrn. 22, 155, 1965,
segundo Int. Pharm. Abs. 3, 196, 1966) relatam as conclusões a que chegaram num demorado estudo
sobre este assunto. ; :-> . ..•<,. ... .„, ,. . . ... ,
619

desenvolvem nela movimentos circulares característicos. O café puro, em pó, humedece rapidamente
com a água e deposita no fundo dos recipientes que a contenham; se, porém, estiver adicionado de
chicória, o..pó correspondente a esta droga fica a sobrenadar.
Os pós simples, animais ou vegetais, identificam-se, em regra, pelo seu exame microscópico e por
reacções de coloração ou de precipitação características de alguns dos seus componentes. As
determinações do ponto de fusão e dos espectros de absorção destes pós não dão, em geral, indicações
úteis. Já, porém, os pós quimicamente definidos podem ser apreciados pela avaliação do ponto de
fusão ou dos espectros de absorção nas regiões do ultravioleta ou do infravermelho, características
que não só os identificam corno permitem fazer ideia do seu grau de pureza. A própria solubilidade
em diversos dissolventes e a determinação da respectiva densidade podem prestar valioso auxílio na
identificação dos pós.
Como os processos de identificação e de dosagem dos pós simples são os mesmos que se descrevem
para as respectivas drogas, cujo estudo é efectuado nas cadeiras de Farmacognosia, Química
Inorgânica e Química Orgânica, não os mencionaremos neste livro, de índole exclusivamente
galénica, mas iremos ocupar-nos dos ensaios que interessam especificamente à tecnologia
farmacêutica.

7.2.0.8.1. Apreciação da tenuidade dos pós


Já vimos que, segundo a monografia sobre pós da Farmacopeia Portuguesa V, a tenuidade de um pó,
até ao limite de 74 |i de diâmetro de partícula, pode ser apreciada por tamisação. Pós mais ténues do
que estes dificilmente se poderão ensaiar pelo mesmo método, uma vez que a fabricação de tamises
com muito pequena abertura de malha apresenta sérias dificuldades. No entanto, como atrás também
dissemos, existem tamises que permitem classificar partículas com cerca de 40 [l. Esses tamises, de
fabrico delicado, ainda não se encontram correntemente entre nós. Por outro lado, os pós mais finos
do que estes, que se obtêm por micronização ou por precipitação e cristalização, não são susceptíveis
de serem avaliados por intermédio de tamises e por isso se introduziu uma técnica de verificação da
tenuidade dos pós, à qual se deu o nome de granulometria dos pós finos.
Pode dizer-se que foram os trabalhos de DALLAVALLE e os de SWINTOSKY e colab. que estabeleceram as
primeiras regras a este respeito. A eles sucederam-se outros investigadores, como SAUNDERS, CZETSCH-
LINDENWALD, GUILLOT, DAL BROLLO, etc.
Como se compreende, não é de esperar que, num pó de determinada tenuidade, todas as partículas
tenham exactamente a mesma dimensão. Essencialmente, interessam valores médios e a
predominância de partículas de dado tamanho é que condiciona a tenuidade do pó. Em regra, diz-se
que um pó tem uma dada tenuidade quando mais
620

de 50% das suas partículas satisfazem a esse requisito e as restantes apresentam graus de divisão
aproximados do pretendido.
A granulometria dos pós finos pode ser efectuada por diversos métodos, dotados de diferente
sensibilidade, sendo por isso cada um deles sugerido para apreciar tenui-dades situadas entre limites
específicos.
Não pretendemos fazer um estudo detalhado e exaustivo dos processos que hoje se
encontram ao dispor do prático empenhado em determinar diâmetros médios das
partículas dos pós. Entretanto, poderemos dizer que são, especialmente, cinco os méto
dos usuais, muitas vezes modificados no sentido de se adaptarem ao tipo de trabalho
de rotina exigido: .
1 — Determinação com microscópio óptico; i.
2 — Determinação com microscópio electrónico; ' :'
3 — Método de adsorção;
4 — Método de sedimentação;
5 — Processo electrónico. -, ."• •., .-,:•
l — Determinação com microscópio óptico — Em linhas gerais, este processo consiste em medir um
número de partículas de pó suficientemente representativo, utilizando-se, para isso, uma ocular
micrométrica e uma ampliação que, geralmente, anda à volta de 430-440 diâmetros. Como, na
maioria dos casos, estas determinações interessam à preparação de suspensões medicamentosas
destinadas a uso injectável, pode utilizar-se uma dispersão do pó e proceder nela à sua análise.
Medem-se 200 ou mais partículas ('), que se agrupam consoante o seu tamanho, expresso em micra
(A); determina-se o valor médio do intervalo no qual estão compreendidas as dimensões dessas
partículas (B) e o quociente entre os valores médios dos intervalos e o menor valor médio dos
intervalos calculados (C) que, no2 exemplo a seguir referido, é igual a 9,5. Determina-se, depois, o
quadrado dos números obtidos (C ).
Na Tabela LXIII indicamos, a título de exemplo, os grupos a fazer para uma determinação com
antibióticos, em que se desprezaram as partículas com diâmetro menor do que 5 (J,.
As medições a efectuar podem apresentar algumas dificuldades consoante a forma dos cristais. Para
cristais de aspecto esférico o problema simplifica-se, pois trata-se apenas de medir diâmetros. O
mesmo acontece com cristais lamelares, em que é fácil determinar a sua maior dimensão aparente.
Já, porém, com cristais em fornia de bas-

(') O cálculo de probabilidades indica que é necessário medir cerca de 100 partículas para
calcular o seu diâmetro médio com uma aproximação de 10%. Para um rigor até 1% é preciso
contar
10000 partículas. •••••
621

Tabela LXIII. Agrupamento das partículas de um antiobiótico em pó


Grupo A B C C2

\ 5- 14 9,5 1,00 1,00


2 15- 29 22,0 2,31 5,34
3 30- 49 39,5 4,16 17,31
4 50- 69 59,5 6,26 39,19
5 70- 99 84,5 8,89 79,03
6 100-149 124,5 13,10 171,61
7 150-199 174,5 18,36 337,09
8 200-249 224,5 23,63 558,38
9 250-300 275,5 28,95 838,10

Segundo as determinações da Food and Drug Administralion

tonete alongado, pode ocorrer medir-se o comprimento ou a largura. E por isso que há dispositivos
micrométricos, de forma circular, nos quais basta enquadrar o cristal para saber as suas dimensões
com certa exactidão (Fig. 234).
Fig. 234. Círculos calibrados, opacos

4 5 6 7 » ^^

{em cima) e transparentes (em


baixo), permitindo avaliar, para cada uma
das partículas, a superfície
equivalente aproximada

Na prática, contam-se as partículas de cada um dos grupos que mencionámos na Tabela LXIII e
determina-se a sua percentagem em relação ao total medido. Para partículas de forma lamelar de um
antibiótico ensaiado, a percentagem, em peso, seria:
«Peso relativo» das partículas de cada grupo = C2 x percentagem das partículas de cada grupo

Percentagem em peso = -
so relativo» x l (X) Soma dos pesos relativos
622

O método de determinação com microscópio óptico é susceptível de proporcionar medições


rigorosas de cristais sensivelmente esféricos cujas dimensões estejam compreendidas entre 0,25 e 300 \i,
sendo o seu óptimo situado entre 0,25 e 100 n-
2 — Determinação com microscópio electrónico — É fundamentalmente idêntico ao processo
óptico, mas permite mensurar partículas de mais reduzidas dimensões (tipo coloidal). Assim, a
sensibilidade deste método varia entre 0,004 e l |i.
3 — Adsorção — Recorre-se, neste método, ao uso de substâncias capazes de se fixarem nas
partículas de pó, em camada monomolecular. A sua sensibilidade é de 0,002-20 (i.
4 — Sedimentação — Os métodos microscópicos têm o inconveniente de se tornarem fastidiosos
de executar, dado o número de partículas cujas dimensões é necessário medir. Mais práticos são,
sem dúvida, os que apreciam o tamanho das partículas de modo indirecto, determinando a sua
velocidade de sedimentação no ar ou em diversos líquidos.
A sedimentação no ar obriga ao uso de aparelhagem dispensiosa ('), muito particularmente de
balanças ultra-sensíveis. O pó contido numa pequena câmara, é suspenso numa corrente de ar com
características constantes e cai por um orifício daquela sobre o prato de uma balança apropriada.
Desde que se disponha de um registo automático, pode calcular-se a percentagem de pó com
diâmetros menores do que 5 u,, 10 u., etc.
O aparelho de MARTIN, usado para efectuar a levigação em meio gasoso, pode servir para a
separação das partículas de diferentes tenuidades, as quais se podem depois medir, com maior rigor,
pelo método microscópico. Aquele aparelho consta de uma centrífuga que trabalha com uma
velocidade de 3500 rotações por minuto. À força centrífuga a que são sujeitas as partículas a
mensurar é contraposto um fluxo de ar, cuja intensidade se pode fazer variar. A amostra sujeita a
estas duas forças fracciona--se em função da tenuidade e da forma das partículas constituintes,
sendo as fracções separadas e examinadas como se referiu nas págs. 620 e 621.
Entre os métodos de sedimentação é de salientar o mais correntemente aplicado: sedimentação
em meio líquido. Baseia-se na lei de STOCKES, que regula a queda de isferas em fluidos e é, portanto,
rigoroso para as partículas de pó que apresentem a forma esférica.
Segundo a lei de STOCKES, a velocidade v de queda de partículas de raio r, num meio de
viscosidade T\, sendo c! a densidade da fase dispersa e dr a densidade da fase dispersante e
representando £ a aceleração da gravidade, é dada pela seguinte fórmula:
2r2g(d-dl)
v = ——————'—— (1) -.-c

(') Aparelho Micromérograph fabricado pela firma Sharples.


623

h Se substituirmos a velocidade de queda pela relação — ,


sendo h o espaço percorrido
no tempo t, teremos:
9r\h
(2)
2^« (d-d,) ou exprimindo t em minutos e r
em micra:
9r\/!
r =10"——————————— (3) 120^ (d-d,)
O pó cuja tenuidade se pretende mensurar é lançado em dispersão num líquido contido numa
espécie de proveta que funciona como um levigador.
Entre os levigadores mais representativos do processo figura o de ANDREASEN, que consta de um
cilindro de vidro de determinadas dimensões, no qual penetra uma pipeta fixa que não atinge o fundo
do recipiente. A suspensão é lançada no cilindro, até um ponto determinado, e as fracções que vão
sedimentando em intervalos de tempo previamente estabelecidos são retiradas com a pipeta. Em
regra, removem-se 10 ml de suspensão de cada vez.
Como fase liquida dispersante emprega-se, geralmente, a água ou o éter etílico, o que não
significa que se não usem outros líquidos de densidades e viscosidades conhecidas à temperatura da
experiência, nos quais sejam insolúveis e não reajam as partículas de pó a medir.
A água, que tem vantagens em muitos casos, apresenta elevadas densidade e viscosidade, as quais
podem retardar, demasiadamente, a queda de partículas muito ténues. Compreende-se, pois, que se
empregue este líquido para suspensões de partículas volumosas e densas. Pelo contrário, o éter
etílico, muito pouco denso e viscoso, permite determinações rápidas, dada a facilidade de
sedimentação, mesmo para partículas de reduzido tamanho e pouco densas. Em contrapartida, não é
possível medirem-se com ele partículas com diâmetros aparentes superiores a 30 n, a não ser que se
recorra a levigadores muito altos.
O levigador de ANDREASEN tem sofrido algumas modificações no sentido de se aumentar a sua
altura, permitindo, assim, mesmo com líquidos dotados de fracas densidade e viscosidade, avaliar
partículas de pó de elevadas dimensões. DAL BROLLO et ai. propuseram uma modificação do primitivo
levigador, pela qual o parâmeto h, isto é, a altura ou espaço percorrido pelas partículas desde a
superfície do líquido até à extremidade da pipeta, foi aumentado para l metro. Do mesmo modo, e a
fim de reduzir a quantidade de suspensão a empregar, foi substancialmente diminuído o diâmetro do
cilindro.
624

A Fig. 235 representa o levigador de ANDREASEN modificado por DAL BROLLO et ai. A Tabela LXIV,
extraída de um trabalho desses autores, mostra as características comparadas dos dois levigadores.
É evidente que para utilizar este método se toma necessário efectuar duas espécies de determinações.
A primeira, meramente teórica, permite avaliar o tempo de sedimentação para todas as partículas de
raio superior ao limite pretendido. Para isso recorre-se à fórmula (3), substituindo-se as letras pêlos
valores correspondentes do líquido dispersante e do pó disperso. Calcula-se, assim, para diversos
valores de r, como, por exemplo, 2 u., 5 u., 10 u,, '5 |J. etc., o tempo necessário para a deposição das
partículas com diâmetro superior ao dado pêlos raios equacionados. Suponhamos que pretendíamos
determinar os tempos de sedimentação de uma penicilina procaínica, usando como líquido
dispersante o éter etílico e trabalhando a 20°C. As grandezas que interessa substituir na fórmula (3),
são as seguintes:

g = 981 cm x s'1
r| =0,003 Po (poise)
d = 1,250 g x cm~3 (densidade da penicilina
procaínica)
dt = 0,174 g x cm3 (densidade do éter sulfúrico
cm O i J- saturado de
penicilina procaínica) h = 100 cm. Este
valor é o inicial, o qual diminui de 0,8 cm
cada vez que se retiram 10 ml da
Flg. 235. suspensão.
Levigador
de
Andreasen, Nas circunstâncias da experiência, o valor de
modificado
por Dal r é dado pela
Brollo et ai. fórmula: • •
h h
9 x 0,003 —— = 42,8 ——
8
t= 10 - r> r2
120x981 x 0,536
Assim, para partículas de diâmetro superior a 80 |i, o tempo
necessário para completa sedimentação seria:

h 100
t = 42,8 ——
2
= 42,82 —— = 2 min 40 s
r (40)
625

625 Tabela LXIV. Características


dos levigadores de Andreasen
Levigador de Andreasen
Características Normal Modificado
Altura total 500 mm 1350 mm
0 externo do cilindro 65 mm 40 mm
0 externo do capilar 6 mm 3 mm
0 interno do capilar 1 mm 1 mm
Capacidade da pipeta 10 ml 10 ml
Capacidade do cilindro 600 ml 1000 ml

Aplicando análogo raciocínio, conseguiríamos calcular o tempo necessário para que


sedimentassem as partículas de 60 \i, de 40 ji, de 30 n, de 20 [l, de 10 n, de 4 u,, etc.
Uma vez calculados teoricamente os tempos de sedimentação para os diferentes diâmetros de
partícula, é fácil determinar qual a sua percentagem relativa, em peso, no pó em análise. Para
isso, basta retirar, nos tempos determinados, amostras de suspensão, de 10 ml cada. Estas
amostras evaporam-se em cápsula tarada, indicando o peso do resíduo a quantidade de partículas,
de dado diâmetro, existentes em 10 ml da suspensão. Os valores obtidos reportam-se ao pó e
exprimem-se em percentagem.
Na Tabela LXV, ainda retirada do citado trabalho de DAL BROLLO et ai., indicamos os tempos de
sedimentação de partículas de penicilina procaínica avaliados segundo o método exposto.
Tabela LXV. Tempos de sedimentação de partículas de penicilina procaínica em
suspensão etérea
Partículas Altura (h) da Tempo de sedimentação
de diâmetro > que coluna líquida (cristais esféricos)
GO (cm) nün.,0. segundos
80 100,0 2 40
60 99,2 4 40
40 98,4 IO 30
30 97,6 1» 30
20 96,8 41 25
10 96,0 163 40
4 95,2 1017 30

O método da sedimentação para apreciar a tenuidade das partículas dos pós pode apresentar-
se, nas diversas Farmacopeias, de uma forma aparentemente mais simples do que a que indicámos.
É que, em cada caso, a referência é feita a um fármaco, como o sulfato de bário, o hidróxido de
alumínio, o caulino, etc., não aparecendo no texto
626

a indicação do cálculo teórico, mas apenas a descrição da prática do método em si. Acrescentaremos que
nem sempre é necessário o rigor dado pelo processo de ANDREA-SEN e que, por isso, a técnica pode
simplificar-se.
A título de exemplo, observemos as indicações dadas pela Farmacopeia Britânica de 1988 para
verificar a tenuidade do caulino medicinal. Este fármaco pode apresentar--se em pó de diversa
granulometria, compreendendo-se que quando se destina a ser usado como adsorvente intestinal deverá
ser muito elevado o seu grau de divisão. A B. Ph. indica um ensaio para o caulino leve que passamos a
descrever: agite fortemente 5 g de caulino numa proveta (16 cm x 35 mm) com 60 ml de solução de
pirofosfato de sódio a 1% m/v; deixe em repouso durante 5 minutos e retire 50 ml da suspensão, usando
para isso uma pipeta, cuja ponta se procura que esteja mergulhada a cerca de 5 cm da superfície livre do
líquido; junte 50 ml de água ao líquido que permanece na proveta e proceda do mesmo modo, repetindo a
operação, até extrair 400 ml de líquido; a suspensão remanescente não deve originar, por evaporação,
um resíduo superior a 25 mg. Segundo esta técnica, procura-se verificar qual a quantidade de partículas
demasiado volumosas existentes no caulino em ensaio.
O ensaio para determinar a quantidade de partículas finas deve, por sua vez, ser conduzido do
seguinte modo: Disperse 5 g de caulino em 250 ml de água, agitando vigorosamente durante 2 minutos
num balão com rolha. Passe imediatamente para um cilindro de vidro de 5 cm de diâmetro interno e
transfira 20 ml, medidos com uma pipeta, para uma cápsula de vidro. Evapore e seque na estufa a 100-
105°C até peso constante. Deixe em repouso a restante suspensão durante 4 h a 20°C. Retire uma
segunda fracção de 20 ml com uma pipeta que mergulhe até exactamente 5 cm abaixo da superfície para
uma cápsula de vidro. Evapore e seque na estufa a 100-105°C até peso constante. O peso de resíduo
desta segunda fracção não deve ser inferior a 70% do peso do resíduo obtido com a primeira fracção.
5 — Processo electrónico — Para determinar a granulometria de um pó por este processo, opera-se,
em regra, com um contador de COULTER. A base do método, que foi pormenorizadamente descrito por
BARNES e colab., consiste no seguinte: as partículas a medir são suspensas numa solução de um
electrólico (cloreto de sódio a 0,9 ou 1%) que se introduz num vaso de vidro, onde se encontra um
eléctrodo; a suspensão é, depois, obrigada a passar através de um pequeno orifício em frente do qual se
situa um outro eléctrodo; quando uma partícula passa através do orifício origina-se uma ligeira
alteração na resistência eléctrica do circuito; um circuito adicional detecta as alterações de resistência
como «pulsações», a intensidade das quais é proporcional ao volume da partícula que atravessou. Estas
«pulsações» são apreciadas num osciloscópio com que o aparelho está equipado.
A principal vantagem deste processo, cuja aparelhagem dispendiosa não permite fácil divulgação,
reside na rapidez com que é classificado o pó a ensaiar (Ver Suspensões).
627

A existência de todos estes métodos e ainda das suas variadas modificações leva a admitir que
possam apresentar numerosos inconvenientes. Se este raciocínio não é inteiramente justo para alguns
dos processos citados, como o do contador de COULTER, cuja principal desvantagem é de ordem
económica, já o mesmo não pode dizer-se em relação aos processos microscópicos e de sedimentação
que, aliás, são os mais utilizados.
Efectivamente, a forma das partículas de pó a mensurar é uma das mais importantes
características para o bom êxito da operação. Já vimos que os métodos de sedimentação só se
consideram rigorosos para partículas de forma esférica. As partículas de forma lamelar com
superfície plana, por exemplo, sofrem uma sedimentação muito irregular e complexa, como a de uma
folha de papel lançada no ar, já que a resistência à queda depende do ângulo que faz o plano da
partícula com a vertical. Do mesmo modo, os cristais que tenham tendência para aderir uns aos
outros (tixotropia) dificultam as medidas, dado que se não dispersam convenientemente no meio em
que é realizado o ensaio.
As determinações microscópicas ocasionam erros grosseiros resultantes da dificuldade de
determinação do diâmetro aparente. Além dos erros anteriormente citados, é de referir os que se
cometem por considerar, com idêntico diâmetro, partículas espessas ou finas que apresentem a mesma
forma aparente.
MARCEL GUILLOT, num valioso artigo crítico sobre a granulometría dos pós cristalinos, afirma que os
métodos microscópicos têm o inconveniente de serem «desprovidos de significado real, sempre que os
cristais se afastem muito da forma esférica».

7.2.0.8.2. Determinação do ângulo de repouso


Uma propriedade intrínseca dos pós é a resistência ao movimento relativo das suas partículas
quando submetidos a forças externas. O ângulo de repouso de um pó é uma das manifestações desta
propriedade e o seu conhecimento tem contribuído para avaliar a dificuldade apresentada pêlos pós
para fluírem livremente através de um orifício para uma superfície livre. De uma maneira geral,
aceita-se que os pós mais grossos escoam mais facilmente do que os pós finos, diminuindo essa
facilidade se, num pó composto, for muito elevada a percentagem de partículas demasiado finas.
Quando um pó ou material granulado corre livremente através de um orifício sobre uma
superfície plana, o material depositado forma uma pilha cónica. O ângulo da base do cone
denomina-se ângulo de repouso. Esta definição foi introduzida por DALLA-VALLE, em 1948.
O ângulo de repouso depende, essencialmente, da força de fricção entre as partículas de pó ou
granulado e exprime-se pela seguinte equação:
628

sendo u o coeficiente de fricção entre as partículas. Se se proceder à determinação da altura & do


diâmetro da base do cone formado, o ângulo de repouso pode definir-se pela expressão:
h

em que A é a altura e r o raio da base do cone. " :í ' 't"!Br- - ï"~"''••'•''• < ' • O coeficiente de
fricção entre as partículas de pó ou granulado pode avaliar-se
h através da determinação do
ângulo de repouso ou, em certos casos, pela relação —.
Esta avaliação apresenta muito interesse, pois elucida quando à facilidade de manuseio
dos pós, como, por exemplo, no enchimento de recipientes, ou no
escoamento de um distribuidor de uma máquina de compressão
para a matriz respectiva.
A determinação do ângulo de repouso tem sido executada por
numerosos processos que são relatados, entre outros, por TRAIN. Um dos
métodos mais compreensíveis e fáceis de executar é ò que recorre ao
uso de um funil onde se lança o pó que se deixa, depois, cair sobre
uma folha de papel.
A Fig. 236 esquematiza a operação. Segundo este método, a tangente de a é dada
pela equação (2).

Fig. 236. Determinação do ângulo de repouso

Tabela LXVI. Valores dos ângulos de repouso e dos tempos de


escoamento de vários pós simples (')
Pó Ângulo • Tempo de escoamento
Cloreto de sódio dí
, > ... repous
± 0,7° 3 s 0, s
Polietilenoglicol 42,0° ± 0,3° 13 s 0, s
Carbonato de cálcio 44,9° ±0,8° 34 s 1, s
Sílica gele 45,0° +1,0° 26 s 0, s
Talco (1000 50,9° +0,4° 24 s 1, s
Talco (2500 50,9° ±0,2° 25 s 1, s
Talco micronizado 51,8° +0,2° 24 s 0, s
Cloridrato de quinina 54,1° +0,6° 1 min s 12 s
Segundo Prisla, L., Morgado, R. e Fonseca, A. J,
(') Os valores dos ângulos de repouso e dos tempos de escoamento representam médias de, pelo
menos, quinze determinações, podendo considerar-se estatisticamente válidos.
629

A Tabela LXV1 indica valores de ângulos de repouso de vários pós simples, alguns constituídos
por partículas cúbicas, como o cloreto de sódio, outros por partículas aciculares, como o cloridrato
de quinina. Nela indicam-se, também, as variações dos valores dos ângulos de repouso,
subsequentes à diferente tenuidade das partículas em que foi dividida a droga.
Outros processos se têm usado para determinar o ângulo de repouso de pós e granulados, como
os que representamos esquematicamente na Fig. 237. Assim, muito semelhante ao descrito é o do
cone de leito fixo (II), o da caixa inclinada (III) e o cilindro rotativo (IV). A gravura elucida a forma
de determinação em qualquer dos casos, chamando-se apenas a atenção para o facto de o processo
IV avaliar o que se denomina ângulo cinético de repouso, normalmente inferior aos determinados
pelas restantes técnicas, e que são ângulos estáticos de repouso.

Flg. 237. Determinação de ângulos de repouso


{ l) — Funil fixo e cone de pó livre ,
(II) —Cone de leito fixo
(III) —Caixa inclinada
(IV) — Cilindro rotativo
Na mesma Tabela mencionam-se, ainda os tempos de escoamento de 10 g de cada pó em ensaio,
através de um funil, cujo bico apresentava o diâmetro interno de 4 mm, e que era agitado
automaticamente.
Na Tabela LXVII indicamos alguns dos valores experimentais de ângulos de repouso do amido
ou suas misturas com diferentes substâncias.
Pelo exame dessa Tabela deduz-se que há determinadas proporções de misturas em que é mínimo
o valor do ângulo de repouso e por isso também mínimas as forças de fricção entre as partículas.
Na prática considera-se com boas propriedades de escoamento um pó com um ângulo estático de
repouso inferior ou igual a 30°. Ângulos de repouso superiores a 40° sugerem difícil fluxo dos pós
ou granulados.
630

Tabela LXVII. Ângulo de repouso do amido de milho em pó ou das suas misturas com
diferentes substâncias
Ângulo
Composto adicionado Percentagem de repouso
Amido de milho _ 53°
Óxido de magnésio ....,:. , . 51°
idem 0,05
'.',-' " 0,10 '. 50°
J:
idem .': 1,00 '..,'. í •"•• 37° '•'•'•'
h
idem '""' ' 5,00 -^ 46° ":
idem 100,00 54°
Óxido de zinco 0,50 58°

Segundo J. Craick — J. Pharm. Pharmacol., 10, 73 (1958)

NELSON observou, também, que para os pós ou granulados simples há tenuidades determinadas
para as quais o ângulo de repouso atinge o mínimo valor. A divisão levada a um grau diferente
desse conduz ao aumento do ângulo de repouso e das forças de fricção entre as partículas do pó.
Assim, por exemplo, para o sulfatiazol consegue--se o menor ângulo de repouso quando o pó se
encontra dividido em partículas de cerca de 500 micra de diâmetro.
Do mesmo modo, a adição de um lubrificante (ver Comprimidos) a um pó ocasiona efeitos
benéficos ou não sobre o valor do ângulo de repouso, consoante a percentagem adicionada e o grau
de divisão do pó. Assim, juntando talco numa percentagem de 0,4-0,6% ao sulfatizol dividido em
partículas de cerca de 250 u., consegue-se que a mistura apresente um ângulo de repouso mínimo.
Já, porém, isso não ocorre quando aquele fármaco seja pulverizado em partículas de 500 n de
diâmetro médio e o talco se empregue em igual percentagem.

7.2.0.8.3. Determinação do volume aparente


Vimos atrás que o volume aparente de um pó é igual à soma do volume ocupado pelas suas
partículas com o volume de ar intersticial. Referimos, também, que o volume aparente era
influenciado pela forma e dimensão das partículas constituintes do pó.
A determinação do volume aparente é um ensaio muito simples que, fundamentalmente, consiste
em medir, num recipiente transparente (proveta graduada, copo graduado, etc.), o volume ocupado
por uma dada quantidade de pó.
Uma vez que a superfície livre do pó, no recipiente de medida, raras vezes é plana, há
necessidade de bater com o recipiente sobre uma superfície rígida, como a oferecida por uma mesa.
É claro que este modo de proceder pode falsear as leituras,
631

porquanto o pó é obrigado a expulsar parte do ar que contém. Nestas circunstâncias é preciso


normalizar o número, a intensidade e a frequência dos batimentos, a fim de tornar os resultados
reprodutíveis. As normas DIN (N." 53 194) obrigam a fazer a leitura depois de deixar cair 1250
vezes, de uma altura de 3 mm, um cilindro onde se encontra o pó. Em aparelho próprio submete-se o
pó acondicionado no cilindro a novas experiências, de 1250 quedas cada, até que o seu volume
aparente sofra uma diminuição inferior a 2%. O resultado será dado pelo valor do volume lido antes
da última determinação.
Um ensaio menos complicado do que o que descrevemos e que, quanto a nós, serve para o
trabalho de rotina, consiste no seguinte: lança-se o pó num copo graduado, em forma de sino; deixa-
se cair cuidadosamente o recipiente de uma altura de 2-3 cm sobre uma mesa de madeira; repete-se
a operação por duas vezes, com intervalos de 2 a 3 segundos; lê-se o volume de pó. Este método foi
divulgado por VAN OOTEGHEM.
A determinação do volume aparente dos pós interessa de sobremaneira no que diz
respeito à escolha do recipiente para o seu acondicionamento. Como veremos, este
ensaio é ainda importante quando o pó se destina à preparação de cápsulas medicamen
tosas, pois a escolha do invólucro de tamanho adequado dependerá do valor do volume
aparente do pó a distribuir. ,-..' :

7.2.0.8.4. Humidade
Regra geral, um pó deve apresentar um teor de humidade inferior a 8%. Em casos anormais de
conservação ou em comprovadas falsificação por humedecimento do pó, a taxa de humidade elevar-
se-á acentuadamente.
A determinação da quantidade de água existente num pó pode executar-se por diferentes
processos, dos quais o mais simples consiste em avaliar a perda de peso do pó quando submetido ao
aquecimento a 100-105°C. Para isso, colocam-se, em cápsula tarada, cerca de 5 g do pó
(rigorosamente pesados) e seca-se na estufa à temperatura mencionada, até peso constante. A
diferença de peso obtida, referida a 100 g de pó, indica a percentagem de humidade.
Um processo muito usado, especialmente para drogas vegetais, consiste em subme
tê-las ao arrastamento pêlos vapores de tolueno ou de xilol. Nestas circunstâncias, a
água existente no pó é arrastada pêlos vapores daqueles líquidos, medindo-se a sua
quantidade, depois de condensada e separada do tolueno ou do xilol (a água é imiscível
e mais densa do que estes líquidos), num tubo graduado que se adapta ao refrigerante.
Esta operação executa-se num aparelho do tipo de LEYMARIE, cujas dimensões estão
padronizadas internacionalmente. O tubo graduado apresenta-se com duas dimensões, de
acordo com o-teor de humidade previsto no pó. A Fig. 238 representa um aparelho
deste tipo. - .. .
632

O método de KARL-FISCHER é, porém, o que mais se utiliza. É-lhe dada preferência por permitir
trabalhar com quantidades mínimas de pó, porquanto é dotado de

Fig. 238. Aparelho do tipo de Leymarie

grande sensibilidade. Baseia-se na reacção quantitativa entre a água e uma solução de iodo e anidrido
sulfuroso em piridina e álcool metílico.
H S04CH3 H l

!+ 3 l II +' SÓ, + CH3OH -f H2O -

O termo da reacção pode ser apreciado pela variação da coloração de amarelo--canário para
âmbar ou, mais rigorosamente, por técnica electrométrica.
O pó cuja humidade se pretende determinar é adicionado a uma dada quantidade de álcool metílico
anidro, em marras previamente seco. Junta-se então o reagente titu-lante, gota a gota, até viragem.
633

A Farmacopeia Portuguesa V descreve esta técnica menciona em pormenor, também a


composição do reagente titulante. ndo
Outro processo de determinação da humidade consiste no uso de sistema
produzido por A/S N. Foss Electric (Copenhague), a que um se tem de Infra-tester. O
pequeno
princípio em que se baseia o aparelho é o seguinte:
Pesam-se, rigorosamente, numa balança que está incorporada
no aparelho, cerca de 5 g do produto cuja humidade se pretende
avaliar; a amostra conserva-se no prato da balança e submete-se
durante alguns minutos à acção calorífica dos raios infravermelhos
produzidos por uma lâmpada acoplada; pode-se controlar, continua-
mente, a perda de água do produto até obter peso constante, uma
vez que a balança é susceptível de se equilibrar por simples
deslocação de um cursor. O teor em humidade é determinado em
percentagem, mediante leitura directa numa escala do aparelho que
se encontra dividida em fracções de 0,1%. A sensibilidade do mé-
todo é de 0,2% e o tempo necessário para a determinação oscila
entre 3-15 minutos. A Fig. 239 representa o Infra-tester.
A determinação da humidade de um pó apresenta
muito interesse, pois há, por vezes, necessidade de se saber o teor
exacto
que se possa avaliar a percentagem de princípios activos. Por
outro
muitos pós facilmente alteráveis pela humidade, sendo de água
preciso verificar para lado,
água não excede o limite tolerável. . existem se
, • ; • ' • o teor de

Fig. 239. Iníra tester


7.2.0.8.5. Cinzas
Trata-se de uma determinação cujo interesse é especialmente restrito aos pós simples. Não
desejámos, entretanto, olvidá-la porque nem sempre é executada sobre as drogas, competindo ao
farmacêutico empenhado na preparação de alguns pós verificar o teor de cinzas daqueles.
A determinação das cinzas é preferentemente executada nos pós opoterápicos. Efectivamente,
durante a obtenção daqueles, podem os órgãos animais ser conservados em salmouras, resultando
daí uma inquinação com cloreto de sódio. Deste modo, vários pós de órgãos animais, como o fígado,
podem apresentar urna elevada taxa de cinzas solúveis que, em regra, não deverá ultrapassar a
percentagem de 6%.
Para determinar as cinzas totais calcina-se um dado peso de pó em cápsula de quartzo ou em
cadinho de porcelana, previamente tarados, utilizando-se uma mufla, cuja
634

temperatura seja de cerca de 500°C (temperaturas muito mais elevadas do que esta podem levar à
volatilização dos sais halogenados presentes, falseando os resultados). Ao fim de algumas horas,
deixa-se arrefecer a cápsula ou o cadinho e pesa-se. A diferença de peso indica a quantidade de
cinzas provenientes da amostra de pó ensaiada. Os valores obtidos serão referidos a 100 g de pó.
As cinzas conseguidas a partir das drogas animais ou vegetais são, geralmente, acinzentadas ou
mesmo róseas (presença de ferro). Em regra, uma fracção das cinzas totais é solúvel em água quente
(cinzas solúveis). A porção remanescente, que se pode avaliar filtrando (por filtro tarado) o produto
que resulta do tratamento das cinzas totais por água quente, constitui as cinzas insolúveis. Os pós
opoterápicos apresentam normalmente teores destas cinzas inferiores a 6%. Taxas mais elevadas
podem constituir indício de adulteração (junção fraudulenta de matérias minerais, como carbonato
ou sulfato de cálcio).

7.2.0.8.6. Extracto •••• •-.-••• *..-<.m.:


Tendo em atenção a identificação dos pós, especialmente de natureza animal ou vegetal, poderá
interessar obter com eles soluções extractivas, cujo dissolvente é, posteriormente, removido. Desta
série de operações resulta um resíduo constituído por um ou mais componentes, ao qual se dá o nome
de extracto.
A solução extractiva é conseguida, em regra, por maceração ou por extracção em aparelho de
SOXHLET, de cerca de 5 g de pó. O dissolvente é evaporado por simples exposição ao ar, por
aquecimento, ou no vazio. A água, o álcool e o éter são os solventes mais empregados.
Sobre os extractos assim obtidos podem, mai# facilmente, executar-se reacções de identificação
dos pós. Entre os ensaios que apresentam maior interesse, citamos a obtenção de eapilarogramas e
de cromatogramas em papel ou em camada fina. Lembremos que, em geral, cada pó apresenta
eapilarogramas ou cromatogramas característicos.

7.2.0.9. Acondicionamento dos pós


Os pós preparados em grande quantidade podem ser acondicionados em bidões, geralmente de
alumínio, em tambores de plástico, em frascos de vidro de capacidade apropriada, etc. Procurar-se-
á que os recipientes fiquem bem cheios e rolhados, de modo a minimizar as influências do oxigénio,
do anidrido carbónico e da humidade. Em casos especiais, incluir-se-á nos recipientes usados no
acondicionamento substâncias exsicadoras, como o gele de sílica, as quais não devem contactar
directamente com o pó medicamentoso.
635

Este tipo de acondicionamento interessa considerar na indústria e também na oficina de


farmácia, quando se dispensem apreciáveis quantidades de um mesmo pó. Constitui, portanto, uma
verdadeira armazenagem de produtos semi-acabados.
O acondicionamento final dos pós pode realizar-se sob duas formas principais:
1.° — em frascos ou caixas (cartão, metal, plástico, etc.);
2.° — em doses individuais, para o que o pó é acondicionado em invólucros de papel, de
celofane, etc.

7.2.0.9.1. Pós acondicionados em frascos ou caixas


É evidente que este processo de acondicionamento, em que um volume apreciável de pó é
entregue numa mesma embalagem, obriga o doente a medir as doses pretendidas. Como regra, essa
medição é efectuada com colheres, podendo, eventualmente, ser fornecida uma colher-medida com a
embalagem. Empregam-se frascos com tampa de desenroscar e de boca suficientemente larga para
permitir a entrada das colheres de medição.
Se o pó se destina ao polvilhamento cutâneo, pode a embalagem apresentar forma cilíndrica,
tendo uma tampa perfurada ou um único e estreito orifício susceptível de lançar um jacto de pó por
compressão das paredes flexíveis do recipiente.
Compreende-se que, dada a inexactidão do processo de medida, os pós dispensados como se
descreveu sejam apenas os dotados de fraca actividade farmacológica (pós efervescentes, anti-
ácidos, laxativos, desinfectantes cutâneos, para irrigação vaginal, etc.).

7.2.0.9.2. Pós divididos em papéis , , ..'."'', T „..,...


Chamaremos papel medicamentoso ou simplesmente papel (chartulae) à forma de
acondicionamento duma dada quantidade de pó num invólucro de papel, celofane, folhas metálicas
ou outros materiais que sirvam para o fim em vista.
O papel medicamentoso representa uma dose individual que se administra de uma só vez. O seu
uso corresponde à necessidade de acondicionamento de volumes de pó activo demasiado grandes
para que com eles se possam preparar cápsulas ou comprimidos (').

C) Algumas vezes recorre-se ao emprego de papéis medicamentosos com pequenos volumes de pó


susceptíveis de se administrarem em cápsulas ou em comprimidos. Isto ocorre, especialmente, em
pediatria, dada a dificuldade da criança deglutir aquelas formas farmacêuticas sólidas.
636

A prescrição de papéis é, em regra, feita de duas maneiras distintas: o médico indica uma quantidade
total de pó que determina seja dividida por um certo número de papéis, ou menciona o quantitativo de pó
a incluir num papel, mandando que se preparem outros iguais.
Do ponto de vista prático, este tipo de receita magistral obriga à preparação do pó medicamentoso
numa quantidade correspondente à totalidade das doses prescritas, a qual se divide, depois,
equitativamente, pelo número de papéis indicado. É aconselhável que não se observem, entre papéis do
mesmo pó medicamentoso, desvios de peso superiores a 5% .
A divisão do pó total, em papéis, pode efectuar-se por três processos fundamentais:
a) Divisão geométrica — Espalha-se o pó sobre uma superfície plana e com auxílio de uma
espátula procura-se juntá-lo de modo a que fique com um contorno rectangular ou
quadrangular; divide-se, depois, em tantas partes quantos os papéis a preparar.
b) Divisão visual — Pesa-se o pó que corresponde a um papel e distribui-se o resto do pó pêlos
papéis necessários, procurando-se que os seus volumes sejam aproximadamente iguais ao do
pó que se pesou.
c) Divisão com medidores de volume — Pesa-se o pó correspondente a um papel
e com auxílio de aparelhos de medida (colheres, compressores-doseadores de
-•• ; MICH-BIRK, etc.) medem-se volumes iguais ao apresentado pelo peso de pó
referido.

Como materiais usados para invólucros são mais empregados o papel vegetal e certos papéis
'corados (branco e azul, segundo a F. P. IV). Quando se acondicionam nestes papéis substâncias
voláteis ou ávidas de água, é vulgar envolvê-las em folhas de papel parafinado. O celofane, as folhas
metalizadas (papel com revestimento de alumínio, por exemplo) e diversos materiais plásticos têm
sido empregados na preparação industrial de papéis medicamentosos. Assim, as folhas de alumínio
são preferidas para conservar pós higroscópicos e efervescentes, dada a sua impermeabilidade à
água.
Quando o número de papéis é inferior a 6, é vulgar entregá-los encerrados num envelope, mas
para maiores quantidades convém recorrer ao uso de caixas com forma de paralelipípedo.
Os papéis dispõem-se em posição perpendicular ao plano do fundo da caixa, mas
quando são muito pequenos podem colocar-se paralelamente àquele plano. Neste caso,
os papéis são cortados com formato rectangular, sendo o seu comprimento cerca de
duas vezes o comprimento da caixa e a sua largura igual a quatro vezes a largura
daquela. A dobragem dos papéis, que só a prática permite realizar com perfeição, é
auxiliada com a própria caixa. ., .„.,.. ;, ,,,. . _. .,_...
637

Para isso faz-se em cada papel uma dobra correspondente a cerca de uma sétima parte da sua
largura e colocam-se, com a dobra feita, de modo a que cada papel se sobreponha, ligeiramente, ao
seguinte. Divide-se o pó, por qualquer dos processos mencionados, colocando-se cada fracção
individual no centro do papel. Começa-se pela direita e segue-se a direcção perpendicular ao
operador. Feita esta operação, dobra-se o papel de modo a inserir uma das margens a uns
milímetros abaixo da outra; dobra-se então a margem maior pela mais pequena, dobrando ambas
em direcção ao centro do papel. Em seguida dobram-se as extremidades abertas do papel, de modo a
que este fique com um comprimento ligeiramente menor do que o comprimento interior da caixa.
Esta operação pode fazer-se descentrando o papel em relação à caixa, o que permite obter uma
dobra maior do que a outra que nela se enfia.
Vincadas as dobras com uma espátula flexível, agrupam-se os papéis aos pares e acondicionam-
se na caixa.
A Fig. 240 esquematiza a operação de preparar e acondicionar papéis.

., BUÍ

Fig. 240. Diagrama esquemático da preparação e acondicionamento de papéis

7.2.0.10. Formulário de pós


Neste subcapítulo indicaremos diversas fórmulas de pós, mencionando o seu
método de preparação e, eventualmente, discutindo o seu interesse terapêutico. Estuda
remos fórmulas inscritas na Farmacopeia Portuguesa IV (F. P.), propostas para o For
mulário Galénico Nacional (F. G.), retiradas de outras farmacopeias e formulários, ou
indicadas em receitas magistrais. . . . . . . . _ ......... ...
638

1.» _ PÓS PARA USO INTERNO

Sulfato de sódio, seco, em pó ...................... 20 g


Fosfato de sódio, seco, em pó ...................... 40 »
Bicarbonato de sódio........................................ 60 »
Trata-se de um pó inscrito na F. P. IV com o nome de pó de sais de sódio e que pode substituir os
«Sais de Bourget». Emprega-se como anti-ácido e laxativo suave.
A sua preparação consiste na mistura de três pós simples, que devem apresentar
a mesma tenuidade (pó ordinário). Observemos que a F. P. não se refere, nesta fórmula,
à tenuidade do bicarbonato, o que não tem interesse, dado que por trituração a droga
fica dividida no estado de pó ou pó ordinário. _ ' . . . .

Sulfato de sódio, seco, em pó ...................... 44 g


Bicarbonato de sódio........................................ 36 » —
Cloreto de sódio, em pó ................................ 18 »
Sulfato de potássio, em pó ............................ 2 »
Este pó é designado pela F. P. IV com o subtítulo de pó caroíino, sendo considerado como equivalente
aos «sais de Carlsbad» ('). Apresenta propriedades purgativas. A sua preparação é idêntica à do pó
anteriormente referido.

m
Carbonato de cálcio.......................................... 32 g
Carbonato de magnésio.................................... 32 »
;;~
Carbonato de sódio .......................................... 26 »
Caulino, leve .................................................... 10 »
O pó referido foi proposto para o F. G. e é utilizado como anti-ácido, podendo administrar-se as
colheres.
As substâncias constituintes devem ser reduzidas a pó fino e misturadas. Lembremos que o caulino
leve se apresenta micronizado.

(') Célebre estância termal situada na Checoslováquia.


639

•*«'' ,
Ipecacuanha, em pó.......................................... 10 g
Ópio, em pó...................................................... 10 »
Lactose .............................................................. 80 »
Conhecido por pó de ipecacuanha composto, vem inscrito na F. P. IV, que o considera
equivalente aos chamados «pós de Dower». Trata-se de um pó estupefaciente, contendo, por cada
grama, dez centigramas de ópio. A fim de evitar ou atenuar a oxidação da morfina existente no ópio
(formação de oxidimorfina, amarela) usa-se como diluente a lactose, dado que apresenta
propriedades redutoras.

- • . . . . . . ..V, .,,;.,.„.. ,, ..,. ,. .. .,.


Estrofantina .................................................... 0,001 g
Lactose, em pó ............................................ 4,0 »
Carmim em pó fino .................................... 0,002 » ,
Com a preparação deste pó pretende-se conseguir uma diluição de estrofantina susceptível de se
utilizar cada vez que seja necessário empregar esta droga, evitando--se a pesagem de quantidades
muito pequenas. A proporção relativa entre o cardiotónico e o diluente é de 1:4000.
Em almofariz de porcelana tritura-se, demoradamente, a estrofantina com cerca de 0,4 g de
lactose; ajunta-se o carmim, que estará mais finamente pulverizado do que os restantes constituintes
da fórmula, e, só depois, a pouco e pouco, se adiciona a restante lactose.

Sulfato de atropina .................................... 0,005 g


Subcarbonato de bismuto .......................... 10,0 »
Brometo de cálcio ...................................... 20,0 »
Bicarbonato de sódio.................................. 15,0 »
Essência de hortelã-pimenta ...................... 0,2 »
Divida em 12 papéis iguais
O pó cuja fórmula se indica corresponde a uma receita magistral. Na sua preparação deve ter-se
em conta a necessidade de dispersar perfeitamente o sulfato de atropina, que constitui o fármaco
mais activo (acção anticolinérgica). Deve usar-se uma diluição de sulfato de atropina em lactose a
1:10. Num almofariz colocam-se 0,05 g da
640

diluição e misturam-se, a pouco e pouco, com o subcarbonato de bismuto, a que se adicionou a


essência; só então se adiciona o bicarbonato de sódio e, por último, o brometo de cálcio. Convém
evitar o contacto directo do sulfato de atropina com o bicarbonato e é aconselhável misturar sem
exercer demasiada pressão.

Vil

Extracto de beladona.................................... 0,5 g


Fenobarbltal .................................................. 0,4 »
Subnitrato de bismuto.................................. 24,0 »
Caulino, leve ................................................ 45,9 »
Essência de hortelã-pimenta ........................ 0,12 »
Trata-se de um pó antidiarreico. O extracto de beladona, o fenobarbital e a essência são
triturados em almofariz até homogeneização; adiciona-se, seguidamente, o subnitrato em porções de
l, 2, 4 e 9 g, misturando-se fortemente, após cada adição; juntam-se, então, cerca de 10 g de caulino
e o restante subnitrato; depois de bem triturada a mistura, adiciona-se o caulino remanescente e
homogeneiza-se.

Salicilato de bismuto..................................
.. . . Salol ............................................................ ãa 10 g
Faça um papel n.° 40
Este pó constitui um medicamento usado como desinfectante intestinal. Como se trata de um pó
muito movediço, é difícil conseguir a sua divisão em papéis pelo processo habitual. Mais exacto é
pesar cada papel individualmente.

K --1-;.':- -'• «i.'- •:-


. . ,. • :-'i,:ÍU^'; ?íï '4i,*í'«iv,V.h. •',
Piramido ............................................................ 3,6 g
Ácido acetilsalicílico ........................................ 2,4 »
Citrato de cafeína ............................................ 0,6 »
Fenobarbital ...................................................... 0,6 »
Divida em 12 papéis
^ '-''"' ; £•**-* .->• , . . • - ' - .• .-:>:• •• .. l
Esta mistura de pós constitui um medicamento antipirético e analgésico, Quando se procede à
associação dos seus constituintes, forma-se uma mistura eutética. A fim de a evitar recomenda-se
misturar o ácido acetilsalicílico com metade do seu peso de
641

óxido de magnésio; deve associar-se o piramido com metade do seu peso de amido previamente seco
e adicionar, então, 0,3 g do citrato de cafeína e o fenobarbital; completar a fórmula e misturar
levemente, sem exercer demasiada pressão.

Citrato de cafeína ............................................ l g


Antipirina .......................................................... 4 »
Brometo de sódio ............................................ 5 »
Trata-se de um pó que se toma pastoso. É conveniente substituir metade do peso de citrato de
cafeína por cafeína básica e adicionar magnésia alva para absorver a humidade.
XI
Sulfato de bário................................................ 135 g
Cacau.................................................................. 3 »
Açúcar ................................................................ 9 »
Goma arábica .................................................... l » *•=•
Goma adraganta ................................................ 2 »
Este pó constitui uma refeição opaca para radiologia. Foi proposto para o F. G.,
recomendando-se que se reduzam os componentes a pó fino e se proceda à sua mistura por
trituração.
XII
Ácido cítrico, em pó........................................ 300 g
Magnésia alva, em pó...................................... 200 »
Açúcar, em pó .................................................. 500 »
Essência de limão ............................................ l »
Constitui o chamado pó citro-magnésio ou de citrato de magnésio açucarado da F. P. IV. É um pó
efervescente, dotado de propriedades laxativas. As substâncias sólidas devem ser secas,
separadamente, e misturadas com a essência.

xra
Ácido tartário .................................................... 45,0 g
Bicarbonato de sódio........................................ 52,5 »
Tartarato de potássio e sódio.......................... 2,5 » '•
642

As susbstâncias devem ser secas, separadamente, a temperatura que não exceda 50°C, e
misturadas por trituração. É aconselhável que o grau de divisão dos pós não ultrapasse o de pó
grosso (diminuição da superfície relativa).

XIV

Acido tartárico, em pó .................................... 18 g


Divida em 10 papéis brancos

Bicarbonato de sódio........................................ 20 »
Divida em 10 papéis azuis

Trata-se, como é evidente, de um pó destinado a provocar efervescência quando lançado em água


o conteúdo de um papel branco e de um papel azul. A F. P. dá a esta fórmula a designação de Pós
efervescentes, Pós gasogéneos ou Pós de soda. A divisão em papéis separados evita a secagem e a
protecção contra a humidade, que seriam obrigatórias se os dois produtos estivessem juntos.

XV

Ácido tartárico, em pó .................................... 18 g '•^^••'•'•- «i


Divida em 10 papéis brancos

Tartarato de potássio e sódio, em pó............ 80 g \


Bicarbonato de sódio........................................ 20 »
Misture e divida em 10 papéis azuis

Tal como o anterior, o presente medicamento constitui uma fórmula de pós efervescentes,
devendo ingerir-se a solução aquosa resultante da dissolução do conteúdo de um papel azul e o de
um papel branco. O tartarato presente, que não reage com o ácido tartárico, é empregado como
laxativo.
A F. P. designa esfa fórmula por Pós efervescentes de Seidlitz, indicando, em subtítulo, os nomes
de Pós gasogéneos de Seidlitz e de Pós de soda de Seidlitz. Este tipo de pó foi introduzido na
Terapêutica por T. SAVORY, em 1815, pretendendo-se, com o seu emprego, substituir as famosas
águas laxativas de Seidlitz, cuja nascente se situa no nordeste da Checoslováquia.
643

Estramónio, folhas secas, em pó.................... 45 g


Beladona, folhas secas, em pó........................ 30 »
Lobéïia em pó .................................................. 10 »
Azotato de potássio .......................................... 15 »
Este pó, também designado por pó antiasmático, vem inscrito na F. P. IV. Trata--se de um pó
para fumigação, destinando-se a serem inalados os seus fumos. Acentuemos que, num trabalho
recente, H. POURRAT e A. POURRAT demonstraram a presença de atropina nos fumos produzidos pela
combustão de pós deste tipo. Já anteriormente, VINCENT e colab. tinham posto em relevo a acção
farmacodinãmica dos alcalóides da beladona, meimendro e estramónio quando administrados sob a
forma de fumos.

• i • .1.) '•: ••••.: ' • . ' ! • 'i


2.° — PÓS PARA USO EXTERNO , ,„., : • ,;

Mentol................................................................ l g
Talco .................................................................. 99 »
Este pó, que foi proposto para o F. G. com o nome de Pó de talco mentolado, prepara-se do
seguinte modo: reduz-se o mentol a pó fino e adiciona-se o talco, a pouco e pouco (diluição
geométrica), triturando até obter uma mistura homogénea. Deve passar-se por um tamis de 0,128
mm de abertura de malha. É um pó refrescante e isolante da epiderme.
n
Mentol.............................................................. l g
Cânfora ............................................................ 2 »
Óxido de zinco .............................................. 15 »
Amido .............................................................. 41 »
Talco .................................................. q. b. p. 100 »
Proposto para o F. G., é designado por Pó de mentol composto e apresenta propriedades
sicativas, adstringentes e refrescantes.
Todos os seus constituintes devem ser reduzidos a pó fino, sendo imprescindível que o amido e o
óxido de zinco sejam passados por um tamis de cerca de 2500 malhas
644

por cm2. Mistura-se, em almofariz, a cânfora com o mentol e adicionam-se, então, a pouco e pouco,
os restantes componentes. Passa-se por um tamis de 0,180 mm de abertura de malha.
m'
Carbonato de magnésio.................................... 100 g
Quina.................................................................. 100 »
Benjoim.............................................................. 100 »
Essência de eucalipto ...................................... 10 »
Uma vez que não há indicação especial, usar-se-á o pó fino de quina amarela titulando 5% de
alcalóides totais, dos quais 2% são de quinina. Mistura-se o pó de quina com o benjoim reduzido a
pó fino e, a pouco e pouco, adiciona-se a magnésia alva, na qual se incorporou, previamente, a
essência.
O pó é usado como anti-séptico cutâneo.>

IV

Iodo .................................................................... 0,15 g


Ácido bórico...................................................... 15 »
A preparação deste pó, conhecido por Pó de Salzherger, apresenta a dificuldade de uma perfeita
divisão do iodo no ácido bórico. Dissolve-se o iodo em éter e esta solução é misturada com o ácido,
agitando-se até que todo o dissolvente se tenha evaporado. O iodo deve ser pesado em vidro de
relógio, utilizando-se uma espátula de osso, e a trituração será efectuada em almofariz de vidro.

Ácido salicílico ................................................


Ácido bórico......................................................
Ácido benzóico ................................................ ãa 10 g
Talco ..........................................................q.b.p. 100 »

Trata-se de um pó dotado de propriedades anti-sépticas e queratolíticas, que se destina ao


polvilhamento de uma dada superfície cutânea.
Os fármacos devem pulverizar-se, procedendo-se, depois, à sua perfeita homogeneização. É
aconselhável triturar o ácido salicílico e adicionar-lhe, seguidamente, o ácido
645

bórico e o ácido benzóico. Só então se incorporará o talco, adicionado em pequenas porções. A


mistura deve tamisar-se por tamis de 0,128 a 0,180 mm de abertura de malha.

VI
Clorato de potássio .......................................... 5g
Acido tânico ....................................................... 3 »
Sacarose.............................................................. 7 »
Faça papéis n.° 5
Esta mistura de pós é destinada a gargarejes, para o que se dissolverá em água o conteúdo de
cada papel. Os constituintes do pó devem pulverizar-se, separadamente, e a sua mistura far-se-á com
cuidado, por agitação numa folha de papel (mistura explosiva).
i •• vn -,v ,f:»j t.. • i. ' .

Ácido cítrico......................................................
Sulfato de zinco................................................ ;"' ' ' '-"'
Alúmen .............................................................. ' ''
Sulfato de magnésio ........................................ ãa 10 g
Lactose .............................................................. 20 »
Para irrigação vaginal
Na preparação deste pó, cuja solução aquosa se emprega para irrigação vaginal, importa secar,
previamente, o ácido cítrico, o sulfato de magnésio e o alúmen.
O sulfato de alumínio e potássio e o sulfato de zinco são usados como adstringentes; o ácido
cítrico destina-se a provocar acidez, pois as irrigações vaginais devem ser feitas com líquido cujo pH
varie entre 3,5 e 5.

. , VIU . .-:!,
...

Sulfanilamida .................................................... 5 g
Amido absorvente ....................................q.b.p. 100 »
: Pó estéril para aplicação cutânea . ..

A presente fórmula destina-se a ser aplicada sobre uma superfície cutânea lesada e sujeita, por
isso, a contrair infecções. O pó poderá esterilizar-se, em tubo aberto,
646

numa autoclave, a 120°C, durante trinta minutos, devendo proceder-se, depois, à sua secagem. A
manipulação deve decorrer em ambiente asséptico e o seu acondicionamento será feito em caixa de
tampa perfurada, com possibilidade de se fechar hermeticamente mediante uma sobretampa. A
caixa também deve ser esterilizada.

. . ' -; . ,,-, : • fí
IX .. ...,..;., •'..
Carbonato de cálcio.......................................... 90 g
Perborato de sódio............................................ 10 g
Sacarinato de sódio .......................................... 0,3 » ia:.
Essência de anis .............................................. 0,2 » • .'•'•'• ;ui.

Este pó dentífrico actua pela acção abrasiva do carbonato de cálcio precipitado e pelo
poder branqueador do perborato. Deve procurar-se um carbonato de cálcio com elevada
percentagem de calcite (forma ortorrômbica, cujas arestas são arredondadas, o que não
acontece com a aragonite — romboédrica hexagonal).
Pulveriza-se o edulcorante (sacarinato de sódio) e adiciona-se-lhe, a pouco e pouco, o
carbonato de cálcio, onde já foi absorvida a essência. Por fim ajunta-se o perborato, que
convém não contactar directamente com a sacarina solúvel (mistura oxidante).

Fosfato de cálcio dibásico .............................. 97 g "'" ••" '


Dioctilsulfossuccinato de sódio ...................... 3 » ' 'il!t' '
Edulcorante ........................................................ q.b. •
Aromatizante...................................................... q.b. " "

Na fórmula deste dentífrico, o fosfato de cálcio dibásico (CaHPOt,ÏHf>) é o abrasivo.


Importa que a sua tenuidade seja, pelo menos, da ordem das 150 (l. Para evitar a
aglomeração dos seus cristais é, por vezes, necessário juntar um estabilizante, como o sulfato
de magnésio, dispensável no presente caso. O dioctilsulfossuccinato de sódio, que funciona
como detergente, pode apresentar-se sob a forma de líquido ou de cera com cheiro
característico. Como edulcorante pode usar-se o sacarinato de sódio ou os ciclamatos de
sódio ou de cálcio. A essência de hortelã-pimenta ou a vanilina podem servir como
aromatizantes.
647

647 BIBLIOGRAFIA

Livros de carácter geral:


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JEANNDJ, C., MANOEÜT, A. e VERAIN, A. — GALENICA — 3." génie Pharmaceutique, Technique el Documen-
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compounding, McGraw-Hill Book
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1947. HusA's PHARMACEUTICAL DISPENSING, Editado por Martin, Mack Publishing Co., Easton, 1966.

Livros e artigos de carácter especializado:


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648

.2.1. FORMAS COMPLEMENTARES DOS PÓS 7.2.1.1. Granulados 7.2.1.1.1.


Generalidades
Esta forma farmacêutica tem sido designada por diversos modos, salientando-se as seguintes
denominações: sacaretos granulados (') (F. P. IV), saccharures granules (Codex); granulado (F.
Argentina); Pulveres granulais ou poudres granulées (F. H. V).
A terminologia adoptada alude a duas características da fornia, isto é, à presença de açúcar e à
aglomeração dos pós medicamentosos constituintes.
De facto, os granulados são, em regra, constituídos por substâncias medicamentosas associadas
a açúcar e/ou outros adjuvantes, apresentando-se formados por pequenos grãos ou grânulos
irregulares, cujo conjunto tem aspecto homogéneo. Esta forma farmacêutica pode constituir um
medicamento directamente administrável por via bucal e, nesse caso, os princípios medicamentosos
não são, em regra, muito activos, ou destinar--se à preparação de comprimidos. Neste subcapítulo
iremos apenas tratar dos granulados que constituem o medicamento definitivo, deixando para a
rubrica Comprimidos aqueles granulados cuja preparação representa uma das operações
necessárias para obtenção dessa forma farmacêutica.
Se, como diz MÜNZEL, pretendermos definir cientificamente o termo «granulado», devemos
primeiro determinar quais as condições em que um aglomerado de grãos se pode assim denominar.
Efectivamente, um pó formado por cristais macroscópicos, portanto visíveis a olho nu, não constitui
um granulado. Este é formado por um conjunto de grãos, sendo cada grão um agregado assimétrico
formado por cristais, fragmentos de cristais ou partículas vegetais que geralmente constituem
dispersões microscópicas. Quer isto dizer que, enquanto que um cristal tem uma estrutura inteira-
mente cristalina e as partículas vegetais possuem uma harmoniosa estrutura celular, os grãos dos
granulados são compostos por aglomerados de um grande número de cristais ou de partículas
vegetais. Não têm uma forma geométrica bem definida mas esta lembra vagamente um bastonete, uma
secção de parafuso ou uma esfera. Aliás, a Farmacopeia Portuguesa V define granulados como sendo
«preparações farmacêuticas constituídas por grânulos sólidos e secos formados por aglomerados de
partículas de pó de resistência suficiente para permitir as diversas manipulações».
Na preparação dos granulados principia-se por se misturarem as substâncias sólidas prescritas.
Humedece-se a mistura com um líquido de granulação, que pode ser o

(') Os sacaretos podem, tecnicamente, ser considerados como xaropes evaporados à secura, apre-
sentando-se sob a forma de pós (sacaretos em pó) ou sob a forma de pequenos grãos de aspecto irre-
gular mas bastante homogéneo (sacarelos granulados).
649

álcool, a água, o éter ou soluções aglutinantes, como xaropes ou mucilagens, e obriga--se a massa
assim preparada a passar através de um crivo de larga abertura de malha. Os grãos formados são
secos e, posteriormente, calibrados por intermédio de um tamis de malha mais larga do que o
primeiro.
Os granulados apresentam certas vantagens sobre os pós:
— mais estéticos do que aqueles, não libertam pó aquando da sua armazenagem e administração;
— os grãos constituintes não aderem entre si, ao contrário dó que sucede com muitos pós, que se
aglomeram em presença da humidade;
— são mais agradáveis de ingerir do que os pós e a posologia é facilmente mantida, uma vez que
a sua quantidade se pode medir por meio de colheres;
— quando se preparam sob a forma efervescente, são susceptíveis de melhor conservação do que
os pós correspondentes, pois, tendo menor superfície, são menos afectados pela humidade;
ainda pela mesma razão, quando deitados em água efervescem mais lentamente do que os pós;
— ao contrário dos pós, podem ser revestidos com envolvimentos protectores, como, por
exemplo, o granulado de ácido p-amino-salicílico, que é susceptível de se revestir com ácido
esteárico.

7.2.1.1.2. Preparação dos granulados


Se bem que os granulados possam ser obtidos por 3 processos fundamentais, a húmido, a seco e
por fusão, a preparação do medicamento definitivo é, em regra, feita a húmido e, mais raras vezes,
por fusão. A granulação a seco utiliza-se na preparação de granulados que constituam uma fase
intermediária na obtenção de comprimidos.

7.2.1.1.2.1. Preparação a húmido


Este processo de preparação envolve quatro fases principais: a) humedecimento dos pós; b)
granulação da massa por meio de um tamis; c) secagem dos grãos húmidos; d) calibração do
granulado.
a) Humedecimento dos pós — Os componentes sólidos do granulado são pulverizados e
misturados num almofariz ou num misturador do tipo dos que descreveremos para a preparação dos
comprimidos. Os pós são então humedecidos com líquidos apropriados, como a água, o álcool ou o
éter, ou com soluções aglutinantes, como o xarope simples ou mucilagens de gomas, de ésteres da
celulose, etc.
O líquido utilizado não deve apresentar nem muito fraco nem exagerado poder de dissolução, a
fim de se evitar a formação de um granulado demasiado friável ou
650

húmido. Com esta finalidade podem usar-se a água, as misturas hidroalcoólicas ou de água-álcool-éter,
o álcool e o éter.
A água e o álcool diluído empregam-se para compostos hidrossolúveis; o álcool concentrado usa-se
para extractos e resinas, podendo empregar-se para substâncias lipófilas, bem como o éter e outros
dissolventes orgânicos facilmente removíveis.
Algumas vezes é prático utilizar o éter como líquido que promova a humidificação dos pós a que se
adicionam água ou soluções aglutinantes. De facto, o éter, pela sua pressão de vapor, obriga a água
ou as soluções aglutinantes a penetrarem nos mais finos poros dos pós, conseguindo-se, assim, uma
melhor humidificacão. Na prática, adicionam-se alguns mililitros de éter à massa humedecida,
misturando-se, cuidadosamente, o conjunto. Posteriormente, deixa-se evaporar o éter.
Como soluções aglutinantes empregam-se, de preferência, os xaropes comum e de glucose, podendo,
também, usar-se as mucilagens de goma arábica ou de goma adra-ganta e as soluções de gelatina, de
carboximetilcelulose, de metilcelulose, de pectina, de alginatos, etc.
A quantidade do líquido ou da solução aglutinante a juntar é função do seu poder dissolvente e
adesivo. Na prática devem realizar-se ensaios de orientação de cada vez que se prepara uma nova
fórmula para a qual não esteja estipulada a quantidade do líquido de humedecimento, pois interessa
que a massa obtida fique suficientemente adesiva mas não excessivamente húmida, o que ocasionaria
dificuldades aquando da sua passagem pelo crivo de granulação. Quando se trabalha com pequenas
quantidades é costume humedecer cerca de 80 a 90% da mistura das substâncias sólidas com o
líquido e ver se a massa origina, por moldagem manual, uma bola e se passa facilmente através do
crivo escolhido. O pó deixado de parte (20 a 10% do total) pode servir, caso seja necessário, para
corrigir qualquer excessivo humedecimento da mistura. Se não for empregado, é fácil proceder, depois, ao
seu humedecimento com uma quantidade de líquido igual a 1/5 ou a 1/10 da empregada anteriormente.
A quantidade do líquido de granulação depende também da abertura da malha do crivo utilizado,
sendo tanto maior quanto mais larga é aquela.
Para tamises de 25 malhas por cm2 são precisos cerca de 100 ml de álcool de 60° ou 150 g de
xarope comum por cada quilo de granulado.
b) Granulação da massa — A massa obtida é granulada por um crivo de abertura de malha
adequada. Na F. P. IV indica-se que o crivo deve ter 25 malhas por cm2, mas nem todos os granulados
satisfazem a esta exigência, sendo vulgares os crivos com abertura de malha de 1,2, de 1,7 e de 2,5 mm.
A granulação pode efectuar-se por meio de tamises (aço inoxidável, nylon, ferro estanhado) ou de
discos perfurados.
Quancio se trabalha em pequena escala, faz-se uma espécie de bola com a massa e, manualmente,
obriga-se aquela a passar através da rede do tamis com uma pressão firme. Compreende-se que os
grãos obtidos poderão ser mais ou menos compridos consoante a força empregada e a sua progressiva
aplicação. Temos tido bons resultados
651

utilizando para o efeito esmagadores de uso doméstico, como o vulgar «passe-vite». A massa é
obrigada a passar através de um disco perfurado sendo impelida com uma força constante que é
conseguida à custa de uma peça móvel que gira em volta de um eixo que assenta sobre o centro do
disco.
Em escala industrial recorre-se a granuladores de variados modelos, cuja descrição será feita a
propósito do artigo Comprimidos. Um granulador industrial pode dar rendimentos horários de 35 a
125 kg.

Flg. 241. Aparelhos para granulação a húmido e a seco (Erweka)

c) Secagem — Em casos relativamente raros, pode efectuar-se a secagem do granulado ao ar


livre. Melhor processo é, sem dúvida, proceder à secagem em estufas dotadas de ar circulante,
aquecido a 30-50°C.
Na indústria, depois dos trabalhos de PATEL et ai., vem-se fazendo a secagem por meio de
radiações infravermelhas, auxiliando-se a remoção da humidade com uma corrente de ar.
A temperatura da secagem é muito importante, porquanto alguns compostos podem
sofrer diversas alterações. Em regra, não se ultrapassam os 40°C, sendo a quantidade
de água residual de cerca de l a 3%. - - -
652

d) Calihração do granulado — Uma vez seco, o granulado é obrigado a passar por um crivo de malhas
mais largas do que o que serviu para a granulação. Esta operação, que tem por fim fragmentar alguns
grãos que se tenham aglomerado, deve ser executada livremente, por simples agitação do crivo e, em
nenhum caso, obrigando o granulado a passar, por compressão, pelas malhas do crivo.
Separam-se, posteriormente, os grãos de tamanho muito menor do que a média, usando para isso um
tamis com cerca de 0,7 mm de abertura de malha. A porção de granulado que atravessou esse tamis é
aproveitada, granulando-se novamente ao tamanho do grão desejado.
Além do citado processo de granulação a húmido, que é actualmente o mais corrente, pode granular-
se por outros métodos. Assim, o processo inicial de PLANES consistia em preparar um xarope
medicamentoso que se concentrava pelo calor e ao qual se juntava açúcar em quantidade tal que
originasse uma pasta que, depois de bem amassada, se passava por um crivo.
Os métodos que descrevemos originam granulados cujos grãos têm forma vermi-cular ou de
trocisco, como muitas vezes se diz. Um outro processo, proposto por MANSIER, PANNETIER e GAY, produz
grãos de forma sensivelmente esférica. Consiste em utilizar cristais de açúcar de 0,75 a 1,5 mm de
diâmetro, como núcleos sobre os quais se depositam os fármacos dissolvidos, emulsionados ou
suspensos em xarope comum (a 10% em relação ao produto final a obter) ou num líquido alcoólico (a
5% do total). Os cristais de açúcar são colocados numa bacia de drageifïcação, como as que des-
creveremos a propósito da obtenção de drageias, e, quando esta está em movimento, vai-se-lhes
ajuntando o fármaco disperso ou dissolvido. Durante a adição deve aquecer--se a bacia de
drageifïcação pela sua parte inferior ou, preferentemente, insuflar-se-lhe ar quente. Logo que a água
ou o álcool da solução, emulsão ou suspensão medicamentosa se evaporou, procede-se a nova
adição, até que todo o fármaco tenha sido fixado sobre os núcleos de açúcar.
É evidente que este método não permite uma disseminação perfeita dos princípios
medicamentosos sobre os núcleos açucarados. Talvez por isso, e também pela dificuldade de
execução, tem caído progressivamente em desuso.

7.2.1.1.2.2. Preparação por fusão


A preparação dos granulados por fusão consiste no aquecimento das substâncias
medicamentosas que, graças à água de cristalização e ao calor, fundem superficialmente,
aglomerando-se sob a forma de pasta, a qual é passada, depois, por um crivo. O aquecimento
efectua-se, em regra, a 90-105°C.
Este processo só é aplicável a algumas substâncias que apresentem as características requeridas,
como a mistura de ácido cítrico (cristalizado com uma molécula de água) com bicarbonato de sódio e
sulfato de magnésio. : . .
653

O método pode tornar-se extensível aos eutéticos que apresentem ponto de fusão superior à
temperatura ambiente. É o caso da associação de ácido bórico com hexametilenotetrazoto. Nestas
circunstâncias, é frequentemente possível fazer o aquecimento a temperatura inferior a 90°C.

7.2.1.1.3. Tipos de granulados , **>» • •*'»*. ;


Já vimos que os granulados, consoante o processo de obtenção, se apresentam com forma vermicular
ou sensivelmente esférica.
Por outro lado, os granulados vermiculares são constituídos por bastonetes mais ou menos dentados,
conforme a massa que lhes deu origem foi obrigada a passar por um tamis ou por um disco perfurado.
Compreende-se mesmo que, à medida que aumenta a espessura do disco, vá diminuindo o recorte do
grão obtido. Isto quer dizer que um grão proveniente de uma massa que se passou por um tamis (Fig.
242) tem uma superfície mais porosa do que um que resultou da passagem da massa por um disco
perfurado (Fig. 243). Deste facto resulta que, em regra, são mais facilmente desagregáveis em água os
grãos do primeira tipo, isto é, os mais porosos, os quais, porém, resistem menos do que os segundos ao
choque durante a armazenagem e o transporte.

Fig. 242. Granulado Fig. 243. Granulado


obtido por passagem obtido por passagem da
da massa através de massa através de um
um tamis disco perfurado

Há, também, vários tipos de granulados quanto à composição. Assim, se a maioria contém açúcar e,
por isso, esta forma é geralmente designada por sacaretos granulados, pode haver interesse em substituir
parte do açúcar de um sacareto granulado (cerca de 10%) por cacau, obtendo-se assim granulados com
chocolate.
Outra variedade de granulados é constituída pêlos granulados efervescentes. Na sua preparação
interessa evitar a reacção do ácido com o carbonato ou bicarbonato presentes, o que provocaria uma
libertação prematura de COr Nestas circunstâncias, a manipulação deve ser efectuada em meio anidro,
usando-se os pós secos e empregando--se o álcool de graduação elevada como líquido de granulação.
Geralmente, utiliza-se o bicarbonato de sódio como sal alcalino, e usam-se os ácidos cítrico e/ou
tartárico.
654

A técnica da fusão a que anteriormente nos referimos pode dar bons resultados. O processo
proposto por LUNAN nem sempre dá granulados com bom aspecto: misturar o bicarbonato com o açúcar e
a substância medicamentosa a incorporar; passar por tamis de 6 a 9 malhas porucentímetro; proceder
de igual modo com o ácido a empregar, misturar os dois pós e aquecê-los a 75-85 C; triturar, então, em
almofariz até consistência conveniente e obrigar a massa a passar por fricção através de um crivo de
abertura de malha adequada. Secar a cerca de 40°C.

7.2.1.1.4. Ensaio dos granulados ; •--.-.-;,,. -•.•>.>•.,.-,•


A verificação de um granulado é uma das operações obrigatórias quando este é utilizado na
fabricação de comprimidos. A esse propósito descreveremos, em pormenor, os ensaios a efectuar.
Entretanto, diremos que interessa avaliar, num granulado que se utilize directamente como forma
medicamentosa, o seu tempo de desagregação, a sua resistência, a sua humidade e o tamanho dos
grãos constituintes. O teor dos seus princípios activos deve ser igualmente apreciado.
a) Tempo de desagregação — Os granulados não revestidos devem desagregar--se ou dissolver-se
rapidamente em água, aquecida a 37°C. Consideramos como limite de tempo o preconizado a propósito
dos comprimidos, podendo usar-se aparelhagem semelhante à utilizada com esta forma farmacêutica.
Interessa, fundamentalmente, que o granulado seja colocado sobre uma rede ou num cesto perfurado,
com malhas cuja abertura não seja superior a 3 mm.
De acordo com a Farmacopeia Portuguesa V, para o efeito deve utilizar-se o dispositivo por ela
descrito para o «ensaio de dissolução das formas farmacêuticas orais sólidas». Se bem que a nossa
Farmacopeia deixe para cada caso a indicação da quantidade da amostra a usar, pode colocar-se no
cesto perfurado cerca de l g do granulado em ensaio. Este considera-se terminado quanto toda a amostra
passou através da rede por desagregação ou dissolução.
Para o caso particular dos granulados efervescentes, a Farmacopeia Portuguesa V determina que
eles devem dissolver-se em menos de 5 minutos.
Os granulados com revestimento devem satisfazer aos limites especificados para as drageias.
É possível utilizar outros aparelhos para esta determinação, como o de BRENNER, citado por MÜNZEL, ou
o aparelho Erweka.
De um modo geral, um granulado desagrega-se tanto mais rapidamente quanto mais solúveis na
água são os seus constituintes, quanto menores são os seus grãos e quanto maior for a sua humidade.
b) Resistência — A resistência de um granulado interessa especialmente no que diz respeito à sua
conservação, pois quanto mais duro se apresenta menos sujeito se
655

encontra a fragmentar-se. A dureza não pode, porém, ser excessiva, o que alteraria as boas
características do granulado e lhe aumentaria o seu período de desagregação.
MÜNZEL descreve um ensaio muito simples, mas que dá bons resultados quando devidamente
padronizado: encher 8 frascos de 60 ml com 30 ml do granulado em estudo; submetê-los a uma
agitação com frequência e amplitude de movimentos padronizados; de dois em dois minutos esvaziar
o conteúdo de um frasco e tamisar o granulado para retirar o pó que se liberta; pesar o granulado
remanescente.
De uma maneira geral, os granulados obtidos com soluções aglutinantes são mais resistentes do
que os preparados por simples adição dos dissolventes, como a água ou o álcool.
c) Humidade — Trata-se de uma determinação que se deve executar, sistematicamente, em todos
os granulados produzidos em larga escala, já que a humidade excessiva pode ser altamente
prejudicial à estabilidade dos fármacos presentes. São diversos os métodos utilizados, podendo servir
os que descrevemos a propósito do ensaio dos Pós.
d) Porosidade — A determinação da porosidade não constitui um ensaio de rotina, pois que o seu
interesse é muito relativo quando o granulado se destina a ser administrado directamente.
Entretanto, pode ser útil conhecer a porosidade de um granulado que se destine à preparação de
comprimidos. Sob a rubrica Comprimidos voltaremos a considerar este assunto.
e) Tamanho dos grãos constituintes — Os granulados que constituem a forma farmacêutica
definitiva devem ser isentos de pó. O tamanho dos respectivos grãos pode avaliar-se por tamisação.
O Dosagem dos princípios activos — A preparação industrial de granulados obriga à
identificação e dosagem sistemática dos seus constituintes farmacologicamente activos. Os métodos
empregados para cada caso são os adequados aos princípios medicamentosos em questão e o seu
estudo está fora do âmbito deste livro. Interessa, porém, assentar nos limites de tolerância habitual,
que estão compreendidos entre 88 e 110% da quantidade anunciada.

7.2.1.1.5. Acondicionamento e conservação

Em geral, os granulados conservam-se bem, desde que sejam acondicionados em frascos de vidro
ou em embalagem de material plástico hermeticamente fechados.
Tem-se proposto, para evitar a oxidação de alguns dos constituintes dos granulados, envolver os
respectivos grãos com bálsamo de Tolú. Alguns autores aconselham mesmo a ulterior junção de pó
de alcaçuz, que impediria a aderência dos grãos entre si.
656

7.2.1.1.6. Formulário
Esta forma farmacêutica, que já teve o seu período áureo de utilização, é hoje relativamente
pouco empregada como medicamento definitivo, servindo actualmente sobretudo como forma
intermediária na preparação de comprimidos.
Na presente rubrica citaremos algumas fórmulas de granulados que julgamos não só mais
usuais, como mais representativas do método de preparação.

Extracto de cola.................................................. 50 g
Sacarose .............................................................. 950 »
A preparação deste granulado pode ser realizada por vários processos. A F. P. IV manda
dissolver o extracto em cerca de 100 ml de álcool de 60" (trata-se do dissolvente que serviu para
obter o extracto de cola) e ajuntar, então, o açúcar em pó fino, misturando até consistência
apropriada.
A Farmacopeia Belga utiliza como veículo a água, com que dispersa o extracto, incorporando,
posteriormente, o açúcar finamente pulverizado.
O Codex manda dissolver o extracto em álcool de 60°, adicionar xarope comum, misturar e
ajuntar, depois, o açúcar.
Quanto a nós, parece-nos preferível e mais simples o processo da F. P. IV. Em qualquer dos
casos a massa obtida é granulada (peneira de arame de ferro estanhado de 25 malhas/cm2, segundo
a F. P. IV) e seca a 30-40°C.
Separa-se depois o pó libertado. • >

n
Glicerofosfato de cálcio .................................. 50 g
Açúcar em pó fino .......................................... 950 »
Álcool de 60° .................................................. q.b. »
Segundo a F, P. IV, deve misturar-se o glicerosfosfato com o açúcar e humedecer o conjunto com
o álcool, até consistência adequada. Granula-se, em seguida, como indicámos na fórmula anterior.
O sacareto de glicerofosfato de cálcio granulado é preparado, algumas vezes, contendo 10% do
princípio activo. Para isso misturam-se 100 g de glicerofosfato com 750 g de açúcar e ajunta-se, a
pouco a pouco, xarope comum (cerca de 150 g) até se obter uma pasta firme e homogénea que se
granula do modo habitual.
657

657
Se se pretende aromatizar esta fórmula, pode utilizar-se 0,1% de vanilina, que se dissolve em 10 g de
álcool de 60°. Com esta solução humedece-se o granulado seco e evapora-se o álcool a 40°C.
III

Bicarbonato de sódio........................................ 360 g ;-, •- •,


Ácido tartárico .................................................. 190 »
Ácido cítrico mono-hidratado.......................... 125 » >
Sulfato de magnésio ........................................ 500 »
Açúcar em pó fino .......................................... 105 »
Trata-se de um granulado efervescente, devendo principiar-se a sua preparação executando a
secagem do sulfato de magnésio, que cristaliza com l moléculas de água. A secagem faz-se a 50°C, até
que perca 23% do seu peso. Mistura-se, então, ao açúcar e restantes substâncias pulverizadas, tendo o
cuidado de exsicar, previamente, o ácido tartárico. A água de cristalização do ácido cítrico é necessária
para que se dê boa ligação da massa. A mistura dos pós é então aquecida à fusão e a massa obtida é
granulada por um crivo.
rv ' . ;.•,: .-
Cafeína .............................................................. 10 g
Ácido cítrico...................................................... 160 »
Ácido tartárico .................................................. 320 »
Bicarbonato de sódio........................................ 520 »
Misturar a cafeína com o bicarbonato e, à parte, misturar os ácidos. Adicionar as duas misturas
de pós e aquecer a banho-maria até fusão, agitando constanlemente. Granular.
Esta fórmula de cafeína granulada efervescente constitui um granulado que não contém açúcar,
não sendo por isso um sacareto. O modus faciendi referido pode servir para preparar a piperazina
granulada efervescente e o carbonato de lítio granulado efervescente.

Carbonato de lítio ............................................ 100 g


Bicarbonato de sódio........................................ 200 »
Açúcar, em pó .................................................. 400 »
Ácido tartárico, em pó .................................... 300 »
Álcool ................................................................ q.b.
658

A preparação citada é conhecida por carbonato de titio granulado efervescente e, segundo a F. P.


IV, é obtida por uma técnica diferente da que indicámos no exemplo anterior.
Os pós são secos separadamente, misturados e adicionados de álcool até que formem pasta de
consistência adequada. A pasta é, então, granulada por peneira de-arame de ferro estanhado, de 16
malhas/cm2. O granulado obtido é seco a temperatura que não exceda 40°C, após o que se lhe retira
o excesso de pó.
A técnica que descrevemos é utilizada, também, pela F. P. IV para a preparação da piperazina
granulada efervescente.

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659

7.2.1.2. Comprimidos .,.,,.


,- . ; •• .-.• ,.m- . , - . . ' - •
7.2.1.2.1. Generalidades . , . ,,, ,a /,,. ,
Comprimidos são preparações farmacêuticas de consistência sólida, forma variada, geralmente
cilíndrica ou lenticular, obtidas agregando, por meio de pressão, várias substâncias medicamentosas
secas e podendo ou não encontrar-se envolvidos por revestimentos especiais, tomando, nesse caso, a
designação de drageias.
Segundo a Farmacopeia Portuguesa V, esta forma farmacêutica é designada pelo nome latinizado de
compressi, mais de harmonia com as designações adoptadas em vários países.
Efectivamente, os ingleses e norte-americanos apelidam de tablets, ou compressed tablets, os
comprimidos tal como os concebemos. Na Bélgica o termo tablettes é normalmente empregado para
designar os comprimidos e, mesmo em França, onde o nome oficinal é comprimes, é vulgar serem
também chamados tablettes comprimées. Na Alemanha a designação corrente é tabletten, enquanto que
em Itália se prefere o termo compresse.
Estas diferenças de terminologia prestam-se a confusões com as pastilhas que, segundo a
Farmacopeia Portuguesa IV, se denominam simplesmente tabtettae e que em França se designam por
tablettes (ver Pastilhas). Esta confusão é ainda maior porque, em certos casos, os comprimidos podem
apresentar aspecto semelhante ao das pastilhas, delas diferindo, contudo, na forma de obtenção. De facto,
as pastilhas são obtidas por moldagem, enquanto que os comprimidos se preparam por compressão. A
literatura britânica diferencia, por isso, as pastilhas dos comprimidos, usando os termos de molded
tablets e compressed tablets.
Se bem que se tenha pretendido encontrar uma origem remota para a preparação dos comprimidos
farmacêuticos, estabelecendo-se analogias com os colírios secos dos romanos, com as terras sigiladas ou
com os trociscos, tudo leva a crer que só em 1843 foi elaborada, pela primeira vez, esta forma
farmacêutica. Com efeito, em 8 de Dezembro de 1843 BROCKEDON registou em Inglaterra, seu país natal, uma
patente para obtenção de «pílulas de grafite por pressão entre dois punções», a que deu o nome de
«Tabloids». O método era já empregado na fabricação de tijolos e de brinquedos de carvão, mas coube
a BROCKEDON o mérito de o aplicar à Farmácia. Foi assim que se difundiu, com alguma largueza, em
Inglaterra, a preparação de comprimidos de bicarbonato de potássio.
Posteriormente, DUNTON, nos Estados Unidos, e ROSENTHAL, na Alemanha, divulgaram a nova forma
farmacêutica que recebia, em 1877, a designação de pastilhas comprimidas (compressed tablets) dada
por JOHN WYETH, na América do Norte (').

(') O termo tablet foi provavelmente usado a partir de 1608 e designava, originalmente, um tipo
especial de pastilhas contendo açúcar. .....
660

Neste último país os comprimidos começaram a ser industrializados depois de 1894, precisamente 19
anos após ter sido inventada uma máquina manual de compressão, por J. REMINGTON. É, contudo, de
salientar que a primeira monografia oficial sobre comprimidos data de 1865 (comprimidos de
trinitrina) e vem inscrita na Farmacopeia Britânica.
Em França, apesar dos esforços de FÉDIT, a nova espécie de medicamento não ganhou aceitação.
Só em 1906 foi mencionada no formulário dos Hospitais Militares de Paris, mas ainda não aparecia
na Farmacopeia de 1908.
Foi, porém, a partir da primeira grande guerra (1914-1918) que o uso dos comprimidos mais se
divulgou, tendo substituído, em grande parte, as pílulas e as pastilhas medicamentosas. Entre nós são
oficializados em 1936, inscrevendo a Farmacopeia dessa época 3 monografias sobre comprimidos
medicamentosos.
Actualmente a forma farmacêutica comprimido ganhou especial relevo, dadas as vantagens que
apresenta e que poderemos sintetizar do seguinte modo: precisão na dosagem; conservação
geralmente ilimitada ou pelo menos muito melhor do que a apresentada pelas soluções; rapidez na
preparação; economia, atendendo à facilidade de produção e rendimento; boa apresentação; fácil
deglutição; reduzido volume.
As mencionadas propriedades levaram a que as farmacopeias inscrevessem, nas suas
monografias, numerosos tipos de comprimidos que vêm progressivamente substituindo outras formas
farmacêuticas. Nos códigos dinamarquês, sueco, britânico e norte--americano a quase totalidade dos
preparados galénicos é constituída por comprimidos e injectáveis. Este modo de ver não é adoptado
nos países latinos cujas farmacopeias, mais conservadoras, mantêm ainda grande número de
tinturas, extractos, xaropes e pílulas. Neste particular, é curioso observar a evolução da
Farmacopeia Norte-Ameri-cana que, em 1916, inscrevia apenas uma monografia de comprimidos, 3
em 1936, 51 em 1942, 91 em 1950, 113 em 1955, 116 em 1965, 171 em 1970 e 424 em 1985. A
Farmacopeia Russa mencionava 76 monografias sobre comprimidos e a Britânica de 1973, 204.
Muito longe estamos ainda das cifras anunciadas, mas, mesmo assim, na Farmacopeia
Portuguesa V já se incluem 32 monografias de comprimidos até 1989.
O interesse ganho pêlos comprimidos provém das vantagens a que atrás aludimos' e também das
múltiplas aplicações que esta forma farmacêutica tem tido. É bem conhecida a utilização dos
comprimidos não só com finalidade terapêutica, mas ainda analítica ou até depuradora de águas. Do
ponto de vista terapêutico, os comprimidos podem destinar-se a serem administrados per os, por via
hipodérmica (em injectável ou em implantação) ou podem servir para desempenhar, apenas, uma
acção externa local, na pele ou nas mucosas. Quando se destinam à administração oral são
susceptíveis de diferentes finalidades (dissolução na boca, administração sublingual, ingestão e
desagregação no estômago ou no intestino, etc.).
661

A aplicação local de comprimidos pode destinar-se a conseguir a desinfecção da pele ou das


mucosas (como a vaginal) ou, mais simplesmente, a proporcionar uma aromatização, como no caso
dos comprimidos contendo «sais» de banho.

:
" ' Fig. 244. Tipos de comprimidos

Do ponto de vista analítico é bem conhecido o emprego de tampões de pH, bem assim como
outros reagentes que se encontram comercializados sob a forma de comprimidos. A excelente
dosagem e a quase perfeita estabilidade desta forma permitem a sua utilização na preparação de
diversas soluções de análise. De resto, este uso é bastante antigo, dado que já em 1908 BRUÈRE
preconizava o emprego de comprimidos como reagentes analíticos.
Finalmente, no que diz respeito ao uso dos comprimidos como depuradores de águas, queremos
apenas lembrar que têm sido muito empregados, especialmente em campanha, os comprimidos de
cloraminas, de iodetos com iodatos, etc.

7.2.1.2.2. Manipulação dos pós ... ,:j ,,/


Como FERRAND, podemos considerar que a fabricação de comprimidos assenta, fundamentalmente,
nos princípios em que se baseia a fabricação automática e nas normas da preparação de pós
adequados para a compressão.
Com efeito, para que haja comprimidos é necessário que exista um pó, obedecendo a
determinados requisitos, o qual se comprime numa câmara de compressão formada na matriz da
máquina. O peso de pó comprimido é função do volume da câmara de
662

compressão e a aglutinação dependerá, entre outros factores, da pressão sobre ele exercida pelo
punção superior ou pêlos dois punções,
À primeira vista pareceria suficiente dispor de um produto e de uma máquina de compressão
para se obterem comprimidos. Isto, porém, só sucede num número muito restrito de casos, pois são
raros os pós que possuem a densidade suficiente para escoar livremente do distribuidor da máquina e
encher regularmente a matriz, que não provocam atritos na compressora e que se apresentam num
estado cristalino tal que permita a fácil coesão dos cristais entre si. Às substâncias que gozam destas
propriedades chamaremos directamente compressíveis e, em geral, para que originem comprimidos
regulares apenas é necessário padronizar o tamanho dos cristais e submetê-los a uma ligeira
secagem. Habitualmente, só as substâncias pertencentes ao sistema cúbico dão boa compressão
directa; a água de cristalização actua como agente de ligação, não se devendo por isso exagerar a
secagem; os sulfates não são, em geral, directamente compressíveis e os carbonatos só raras vezes
apresentam essa propriedade.
Entre as substâncias directamente compressíveis citamos o ácido bórico, o alúmen, o borato de
sódio, a urotropina, o bicarbonato de sódio, o brometo de amónio, o brometo de potássio, os cloretos
de sódio, amónio e potássio, o hidrato de cloral, o citrato de cafeína, alguns extractos, o iodeto de
potássio, o nitrato de potássio, a pancreatina, a pepsina, o permanganato de potássio, o sulfato de
zinco e a tiroidina.
Para que se consiga fazer a compressão da maioria das substâncias é necessária a presença de
adjuvantes, que têm por fim diluir o produto, aglutinar as suas partículas, facilitar a desagregação
do comprimido, evitar as aderências do pó aos punções e à matriz, facilitar o escoamento do
distribuidor, etc.
Os adjuvantes utilizados na preparação de comprimidos podem dividir-se em: diluentes,
absorventes, aglutinantes, desagregantes, lubrificantes, molhantes, corantes, tampões, aromatizantes,
edulcorantes, etc.
Estudaremos, seguidamente, os principais adjuvantes utilizados na preparação dos comprimidos.

7.2.1.2.2.1. Adjuvantes
a) DILUENTES — São produtos ordinariamente inertes, que se adicionam aos pós a comprimir
com a finalidade de originarem comprimidos de peso conveniente, quando os princípios activos são
empregados em muito pequenas quantidades. Podem ser solúveis, insolúveis e mistos.
Diluentes solúveis — Entre eles citaremos a lactose, a sacarose, o cloreto de sódio, a nianita. etc.
A lactose é um excelente diluente que, além de ligeiras propriedades redutoras, muito
recomendáveis na maioria dos casos, tem poder aglutinante, originando comprimidos com bom
aspecto, mas por vezes difíceis de desagregar. Entre os seus inconve-
663

nientes citam-se os que advêm do seu poder redutor e da sua facilidade de amareleci-mento (ver
Alterações dos comprimidos). É empregada em comprimidos destinados ao uso hipodérmico. A lactose
atomizada («spray-dried»), constituída por aglomerados esféricos de partículas, apresenta boas
características de escoamento e de aglutinação. Por este motivo, é utilizada como excipiente para
compressão directa, associada habitualmente à celulose microcristalina em concentrações nunca
inferiores a 40 ou 50%. A «Fast Fio» lactose é, ainda, outro tipo de lactose também usada para
compressão directa.
A sacarose deve ser empregada em pequena quantidade, visto que é altamente aglutinante e ataca
os punções. É particularmente recomendada para comprimidos que se destinam a dissolver-se lentamente
na boca. As associações de sacarose com outros compostos são também utilizadas na peparação de
comprimidos por compressão directa. Como exemplos deste tipo de excipientes, citamos o Sugartab,
constituído por 90 a 93% de sacarose e 7 a 10% de açúcar invertido, o Dilac, que contém 3% de
dextrinas, e o Nutab, que é também maioritariamente constituído por sacarose e à qual se associam o
açúcar invertido (4%), o amido de milho e o estearato de magnésio (cerca de 0,1 a 0,2% de cada).
O cloreto de sódio é um bom diluente, mas ataca os punções, sendo por isso pouco usado. Mesmo
assim, recomenda-se em comprimidos, como os de hipocloritos, em que auxilia a dissolução do princípio
activo. Emprega-se em comprimidos destinados a hipodermia.
A manha ou manitol é um outro excipiente que muito se usa, especialmente para. comprimidos que se
destinam a dissolverem-se na boca, pois dá uma agradável sensação de doçura e de frescor. Como não é
higroscópica, é aconselhável em comprimidos contendo compostos sensíveis à humidade, como a
vitamina C ou o ácido acetilsa-licílico. É muito usada em misturas com a vitamina B12. Como refere
KANIO, as misturas de manita com outros açúcares podem empregar-se, com êxito, para compressão
directa (produção de eutéticos adequados).
A glucose, o pó de alcaçuz e o sorbitol têm sido igualmente empregados. Recentemente, NASIR e
WILKEM propuseram o emprego do inositol como excipiente de comprimidos mastigáveis.
Diluentes insolúveis — Neste grupo são normalmente os amidos os mais utilizados. Empregam-se os
amidos de batata, de araruta, de mandioca, de trigo, de milho, de arroz, até de banana. Normalmente,
estes amidos têm à volta de 8-15% de água, que convirá eliminar em parte, diminuindo-a por secagem até
cerca de 3%. A secagem deve ser feita a temperatura inferior a 50"C, pois se aquecermos o amido a
100°C desidrata--se de modo irreversível, e ao fim de alguns meses os comprimidos terão grande difi-
culdade em desagregar. O Sta-RX 1500 é um amido de milho parcialmente hidrolisado e que é utilizado,
associado à celulose microcristalina, na compressão directa de fármacos. Apresenta excelentes
características de escoamento, mas perde-as quando é
664

adicionado a substâncias activas dotadas de más propriedades de fluxo. Este fenómeno é notório a
partir de concentrações de fármaco relativamente baixas (5 a 10%) e obriga à adição de um
lubrificante.
Além dos amidos, também a celulose microcristalina (Avicel) é utilizada na formulação de
excipientes para compressão directa, quer na forma de pó (Avicel PH 101), quer de granulado
(Avicel PH 102), e associada a diferentes tipos de lactose, amido ou fosfato dicálcico. Apresenta
também acção aglutinante e desagregante, o que a torna particularmente aconselhada para conferir
um adequado grau de aglutinação ao produto a comprimir sem afectar as respectivas características
de desagregação. Encontram-se ainda comercializados outros tipos de celulose, disponíveis em
diferentes variedades consoante o diâmetro das partículas, como o Medicel, o Eurcocel, o Eleema e o
Solka--Floc.
O pó de cacau tem sido, igualmente, utilizado como diluente, sobretudo em comprimidos para uso
pediátrico.
O caulino tem sido preconizado na preparação de comprimidos contendo compostos oxidantes
que reajam facilmente com a matéria orgânica.
O leite em pó é utilizado algumas vezes, especialmente quando se pretende conferir agradável
paladar à fórmula. Tem-se usado na preparação de comprimidos pediátricos de complexo B.
Além destes diluentes insolúveis podem usar-se numerosos compostos minerais de cálcio
(carbonato, sulfato, fosfato, citrato), de magnésio (carbonato, óxido), etc. Dos vários compostos de
cálcio citados, salientamos o fosfato dibásico, que é comercializado como excipiente para compressão
directa com a designação de Emcompress ('). É frequentemente utilizado em associação com a
celulose microcristalina, em partes iguais. Todavia, a percentagem de 60% não deve ser ultrapassada
quando veicula fármacos pouco solúveis em água, pois diminui acentuadamente a velocidade de
dissolução da substância activa. O sulfato de cálcio encontra-se comercializado como Compactrol (')
e é, também, um bom excipiente para compressão directa.
Diluentes mistos — São obtidos por mistura de diluentes solúveis com insolúveis. Entre essas
misturas cita-se o emprego do granulado simples da Farmacopeia Dinamarquesa, constituído por:
Amido de batata ......................................
700 partes
•í
f Glicerol ......................................................
2 »
l Solução de gelatina a 4% ......................
98 »
(misturar os componentes de I; humedecer
com q.b. de II)

(1) Edward Mendell C», New York (USA).


665

Quando os comprimidos se destinem a desagregar-se lentamente na boca, pode recorrer-se às


misturas de amido ou de dextrina com a goma adraganta, ou às misturas de lactose (80 g), ou de
amido de milho (80) e talco (20 g), devidas a DEPORTER. Podem ainda utilizar-se as misturas de
lactose e sacarose (ãa 50), etc.
b) ABSORVENTES — São substâncias que se adicionam com a finalidade de absorver a água dos
extractos ou de fixar certos princípios voláteis, como as essências. Outras vezes servem para
incorporar princípios higroscópicos, evitando que a humidade atmosférica ou residual dos pós
provoque a alteração desses princípios.
Quando se pretende fazer comprimidos que contenham extractos, o emprego dos extractos secos
não é de aconselhar. Trabalha-se então com extractos moles, dissolvendo-os num pequeno volume de
álcool ou de água e triturando-os com o absorvente. Recorre-se, para isso, aos amidos de trigo, arroz
ou mandioca, aos pós vegetais, como o alcaçuz e a alteia, à lactose, à dextrina, etc.
Quando há grandes quantidades de produtos a absorver, como extractos fluidos ou tinturas,
concentram-se as soluções, evaporando-as a banho-maria até pequeno volume, e absorvem-se então
em substâncias dotadas de alto poder de fixação, como o óxido e o carbonato de magnésio (5 a 10%
do peso do extracto ou da tintura), etc.
Para os óleos fixos, certos veículos oleosos e, ainda, no caso de honnonas e vitaminas
oleossolúveis, convém usar o fosfato tricálcico, o caulino ou a bentonite. Se existem vitaminas, faz-se
a secagem dos pós numa corrente de anidrido carbónico para evitar alterações. Sempre que possível,
empregar-se-ão compostos sólidos. É assim que se utiliza a vitamina E, sob a forma de
hemissuccinato, sólido, em lugar do acetato, líquido, até há pouco tempo empregado.
" Para as substâncias voláteis, como as essências utilizadas em comprimidos de uso externo,
emprega-se a terra de infusórios que, além do seu poder absorvente mais elevado, tem, sobre a
magnésia, a vantagem de não modificar o pH do meio. Usa-se, ainda, o pó de alcaçuz e a lactose.
Entre as substâncias difíceis de absorver figura a colina e os seus sais, que são altamente
higroscópicos. O fosfato tricálcico é considerado como um dos seus melhores absorventes.
Noutros casos é preciso combinar a substância líquida com um outro produto, de modo a
reagirem entre si para darem complexos sólidos. É o caso do bromofórmio, usado normalmente com
a urotropina, da água oxigenada com a ureia, do formol com o creosoto, etc.
Mais recentemente introduziu-se neste grupo de adjuvantes um gele de sílica pulverizado, muito
leve e de poros largos — AEROSIL ('), Levilite, CAB-O-SIL (2). Obtém-se por reacção de um ácido
forte com a sílica dissolvida em meio fortemente alcalino. Esta substância apresenta a faculdade de
absorver 200% de água, continuando, apesar disso, com aspecto seco.

C) DECIBSA, Rheinfelden. '-•


(2) GODHÍEY L. CABOT Inc., Boston Mass. (U.S.A.).
666

c) AGLUTINANTES — Certas substâncias, como o carvão, a gelose e a fenace-tina, não podem


aglomerar-se, solidamente, qualquer que seja a pressão que sobre elas se exerça. Para comprimir esses
compostos é necessário adicionar-lhes um aglutinante que, além disso, permitirá trabalhar com uma
compressão menor e, portanto, reduzir a força da máquina utilizada. No entanto, deve procurar-se
empregar a mínima quantidade possível de aglutinantes, visto que estes produtos se opõem à
desagregação dos comprimidos.
Os aglutinantes podem ser usados em pó e em solução ou dispersão, neste caso com a vantagem de
aumentarem a sua eficácia e garantirem uma melhor distribuição na mistura. São, em geral, compostos
com moléculas de longa cadeia.
Entre os aglutinantes mais utilizados citam-se os açúcares, como a sacarose (quer em pó, quer em
xarope), a glucose (que possui um grande poder adesivo, mas é cara) e a lactose, que dá um moderado
efeito aglutinante. Empregam-se, ainda, com frequência, os amidos (sob a forma de cozimento a 10-30%),
e as gomas arábica e adraganta. Estas, contudo, devem utilizar-se como último recurso, visto diminuírem
consideravel-mente a velocidade de desagregação dos comprimidos. A goma adraganta é, neste
particular, muito inconveniente, recomendando-se associá-la à maior quantidade possível de sacarose. As
gomas arábica e adraganta empregam-se sob a forma de mucilagens, respectivamente a 10-35% e a
10%. A goma arábica apresenta numerosas incompatibi-lidades devidas às suas peroxidases. Para as
eliminar, basta destruí-las por aquecimento da mucilagem em banho de água fervente, durante 30
minutos.
Atendendo à fácil alteração das mucilagens de goma por acção dos microrganismos aconselha-se a
junção de conservantes, como o ácido benzóico a 2%.
Na U. S. P. XV indica-se a seguinte fórmula:
Goma arábica ............................................ 350 g
,: ",. Ácido benzóico ........................................ 2 »
Água destilada ................................ q.b.p. 1000 ml
A mucilagem de goma arábica usa-se também associada ao amido: amido (5 g), goma arábica (2
g), água destilada (93 g).
A gelatina utiliza-se em solução aquosa a 2-4%. Verificou-se que as soluções a 4% são das que mais
firme ligação promovem, resultando um granulado muito resistente.
A polivinilpinolidona (PVP) é outro aglutinante muito empregado a 10-30%, quer em solução
alcoólica, quer aquosa. Dá bons resultados na preparação de granulados polivitamínicos.
A pectina, em solução aquosa a 5%, é um aglutinante regular. Do mesmo tipo são o ácido algínico e
os alginatos (de sódio, de propilenoglicol, de amónio e de cálcio, etc.), que geralmente se utilizam em
concentrações de 1%. Os alginatos são considerados excelentes aglutinantes, actuando, ainda, na
desagregação.
667

Os derivados da celulose são igualmente utilizados, mencionando-se, entre eles: a meticelulose 400 a
2-5%; a etilcelulose, que se utiliza em solução etanólica ou pro-panójica a 2-4%; a
carboximetilcelulose sódica (celulose glicolato de sódio), que é usada em dispersões aquosas a 1%.
Finalmente, queremos fazer referência à parafina, ácido esteárico, manteiga de cacau e carbowaxes
(polietilenoglicóis). Os primeiros podem utilizar-se a 1-2%, misturados ou dissolvidos. Os carbowaxes
mais empregados são o 4000 e o 6000, que se usam a 20% em relação ao peso do comprimido.
d) DESAGREGANTES — Para acelerar a dissolução ou a desagregação dos comprimidos na água
ou nos líquidos do organismo é muitas vezes necessário introduzir, na massa do comprimido, uma ou
mais substâncias, designadas por desagregantes ou desintegrantes. Com efeito, para que se verifique
perfeita actividade terapêutica é necessário que os comprimidos se desagreguem mais ou menos
rapidamente, consoante a acção desejada. Assim, os comprimidos devem apresentar um tempo limite para
que se realize a sua total desagregação (tempo de desagregação), tempo esse que pode variar em função
dos princípios activos (os comprimidos analgésicos devem desagregar-se mais rapidamente do que os
comprimidos de vitaminas, etc.) ou com a velocidade de absorção que se pretende.
A velocidade de desagregação é condicionada por diversos factores, entre os quais a compressão a
que o pó é submetido e a quantidade e concentração do desagregante empregado. Deste modo, verifica-
se, por exemplo, mesmo para pós muito solúveis que poderá haver dificuldades na desagregação dos
comprimidos se a compressão exercida for demasiada.
Depois dos trabalhos de BEERINOER está de certo modo provado que a rapidez de desagregação varia
directamente com a diferença de solubilidade dos componentes do comprimido. Esta lei está, porém,
sujeita a diversas limitações e não é verdadeira para muitos compostos, como o ácido acetilsalicílico em
presença de lactose. O mesmo se diz em relação ao p-aminossalicilato de sódio e ao salicilato de sódio,
cujos comprimidos se desintegram mais lentamente se contiverem amido. Nestes casos, parece haver uma
transformação do amido que gelifica por acção dos salicilatos.
A velocidade de desagregação é mínima para uma dada compressão, aumentando muito quando se
ultrapassa esse valor e acusando igualmente pequeno acréscimo se aquela diminui. O modo como é
executada a granulação também influi, podendo estabelecer-se que os comprimidos granulados a húmido
levam mais tempo a desagregar, mas são mais resistentes, isto é, menos friáveis, do que os granulados
a seco.
Qualquer que seja o tipo de desagregante, é mais eficaz juntar o desagregante sobre o granulado,
numa concentração de 2 a 15%, do que efectuar a granulação, estando já incluído o desagregante na
mistura. Há excepções a esta regra, como o caso do sulfatiazol associado ao amido, como desagregante.
Por último, observemos que a natureza da substância medicamentosa actua independentemente da
compressão e do desagregante escolhido, existindo compostos que
668

favorecem a desagregação, ao contrário de outros que a dificultam. Assim, verifica-se, por exemplo, que,
para o mesmo desagregante e idêntica força de compressão, o luminal é muito mais difícil de
desintegrar do que a aspirina ou o sulfatiazol. Na Tabela LXVIII transcrevemos os resultados de
experiências conduzidas nesse sentido por BURLINSON e PICKERING. Aí se inscrevem os tempos de desagregação
de comprimidos de luminal, sulfatiazol e aspirina, preparados com quantidades sucessivamente
crescentes de amido de milho.

Tabela LXVIII. Relação entre tempos de desagregação e quantidades de


desagregante
Amido
de milho % Luminal Sulfatiazol Aspirina
0 60 minutos 60 minutos 60 minutos
1 60 » 5 » 60 »
'2 60 » 2 » 60 »
5 40 » 30 segundos 1 »
10 5 »> 30 » 30 segundos
20 30 segundos 30 » 30 »
Segundo Burlinson, H. e Pickering, C. — J. Pharm. Pharmacol., l, 633 (1950)

Em face do que dissemos, compreende-se que algumas farmacopeias, como a norte-americana,


indiquem, como tempo de desagregação para os seus comprimidos, períodos que vão desde poucos
minutos a horas, conforme a substância de que se trate.
Os desagregantes actuam, geralmente, por três processos:
1." — inchando em contacto com a água, o que permite uma penetração rápida do líquido e favorece
a separação dos grãos constituintes do comprimido (amidos, pó de laminaria, pectina, agar-agar,
caseína, derivados da celulose, polpas secas de frutos, eu?.);
2.°— reagindo com água ou com o ácido clorídrico do estômago e libertando gases, como o
oxigénio ou o anidrido carbónico (carbonatos, bicarbonatos, peróxidos, misturas efervescentes, etc.);
3.° — dissolvendo-se na água e abrindo, assim, canalículos que facilitam a desagregação dos
comprimidos (lactose, glicose, cloreto de sódio, etc.).
Segundo SAGER, o poder de desagregação de um dado composto varia em razão directa com a
quantidade de água que é capaz de aborver e com a rapidez dessa absorção.
Entre os desagregantes utilizados é ainda o amido o que mais se emprega. Utiliza--se na proporção de
5 a 15%, dando geralmente bons resultados a 10%. Tira-se melhor
669

partido da sua aplicação se se incluir uma parte no granulado e se misturar a restante com o
lubrificante que se polvilha sobre o granulado pronto a comprimir.
Tem-se discutido a natureza do grão de amido consoante a sua proveniência botânica e a
importância de tal facto na velocidade de desagregação. Os estudos são um pouco contraditórios,
havendo quem considere o amido de milho como o mais eficaz, por apresentar um teor de cerca de 8%
de água, em relação a 12 e mesmo 15% que se chega a encontrar em outros amidos.
Nem sempre é recomendável empregar o amido como desagregante em comprimidos de substâncias
solúveis, pois muitas vezes (caso do PÁS) o tempo de desagregação aumenta em proporção com a
quantidade de amido adicionada. Ultimamente tem-se descrito o uso de derivados do amido como
desagregantes em comprimidos. HECHT e HUYCK citam o emprego do Dry-Flo (éster do amido de trigo,
contendo um radical hidrófobo) que é fornecido pela firma National Slarch Products, de Nova Iorque.
Introduzido pela firma Mendell (USA), usa-se actualmente um amido de rápida desagregação,
conhecido pelo nome de Explotab, e que é um carboximetilamido sódico, também designado por amido
glicolato de sódio.
Os derivados da celulose, como a carboximetilcelulose sódica, empregam-se em concentrações de
2%. Não se deve esquecer, porém, que esta substância pode criar incompatibilidades com muitos
compostos, pela sua acção aniónica e reacção alcalina, que é suficiente para acelerar a hidrólise da
aspirina, etc. Hoje está a usar-se também a carboximetilcelulose sódica reticulada (AC-DI-SOL da
firma americana F.M.C. Corp.) que sendo insolúvel em água absorve-a em elevada taxa. A metilcelulose
tem sido utilizada em comprimidos de hidróxido de alumínio.
Uma das celuloses purificadas, obtidas a partir da madeira, a que fizemos já referência, o Solka
Floc, tem sido empregada a 1% como desagregante. Esta variedade, a BW40, apresenta ainda a
vantagem de evitar o descabeçamento dos comprimidos, em razão da sua natureza fibrosa. Também a já
anteriormente citada celulose microcrista-lina, ou Avicel, apresenta boas características de
desagregação quando utilizada em percentagens próximas de 10%.
Os alginatos, a 2-10%, têm sido empregados, com êxito, especialmente o de cálcio, que é compatível
com a maioria dos compostos.
A bentonite e o Veegum (') preconizam-se, no estado de pó, para comprimidos granulados a seco,
dando a primeira bons resultados em comprimidos de tiroidina.
A gelatina a 4% tem revelado ser um excelente desagregante, muito embora se empregue, algumas
vezes, em concentrações superiores, como 10%.
A polivinilpirrolidona reticulada (Polyplasdone XL, da firma GAF dos EU) é
considerada um excelente desagregante. ,. ,.,,,.„„,.;. „.. , ... ,,-.-,., .,„,]•,,.•

C) VEEGUM (silicato coloidal de alumínio e magnésio) é um nome registado pela firma R. T.


VANDERBILT Co. (U.S.A.). . . . . . . . .., . ..... . ., .. ._ .„.,„,.;„ ,„, , ,
670

Entre as polpas de frutos secos têm sido usadas a de limão e a de laranja, cujo poder desagregante
se deve à pectina presente; o seu aroma recomenda-as como aroma-tizantes de diversos comprimidos. Na
prática, obtêm-se secando a 40°C a polpa dos frutos citados e pulverizando-a subsequentemente.
A pectina, a 3-5%, tem-se usado também como desagregante, mas os resultados obtidos são
incertos, aconselhando-se, de preferência, a sua associação ao amido.
Ainda como desagregantes tem sido proposta a galalite (formaldeído-caseína), as resinas trocadoras
de iões, catiónicas — Amberlites XE 58 e XE 88 (') e o Zeo Carb 215 —, certos polímeros carboxivinílicos,
como os Carbopol (2) e as misturas efervescentes.
Os desagregantes efervescentes asseguram a desintegração por permitirem libertações gasosas no
interior do próprio comprimido. Para isso, as substâncias devem reagir com água ou com suco gástrico,
ou entre si, em presença de água. No primeiro caso, teremos o uso de peróxidos (10-20%, como MgO2),
no segundo, o emprego de carbonatos ou de bicarbonatos, que reagem com o ácido clorídrico do
estômago. Por último, consideraremos as misturas efervescentes constituídas pela associação de um ácido
(cítrico, tartárico, bórico, etc.) com um bicarbonato (de sódio ou de potássio) ou carbonato (de cálcio, de
sódio, de potássio, de magnésio) que, em presença de água, dão origem à libertação de anidrido
carbónico. De uma maneira geral, basta adicionar 10% de uma mistura efervescente a um granulado
para que os comprimidos obtidos se desagreguem muito rapidamente.
Na Tabela LX1X indicam-se as quantidades de bicarbonato ou de carbonato a utilizar, segundo
GORIS e LIOT, para obter uma mistura efervescente, empregando 10 partes de ácido cítrico ou tartárico.

Tabela LXIX. Quantidades de carbonatos e de bicarbonatos necessárias para reagirem


com os ácidos cítrico ou tartárico
Para 10 partes Para 10 partes
Composto de ácido cítrico de ácido tartárico
NaHCO, 12 11,65
Na,CO," • ' 7,55 7,05
CaCO, 7,15 6,65
MgCO, (MgO 40%) 7 (aproxim.) 6,50 (aproxim.)
KHCO3 14,25 13,30
K2C03 9,85 9,90

Segundo Goris e Lioe — Pharmacie Galénique, Masson & C.a Paris, 1949, pág. 1796

(') Marcas registadas de RHOAM e HAAS (U.S.A.)


(2) Marca registada de B. F. GOODRICH CHEMICAL CO. (U.S.A.).
671

Quando se emprega uma mistura efervescente como desagregante, pode preparar--se o


granulado por dupla compressão, granular com um líquido anidro, como o álcool isopropílico com
5% de amido, ou ainda granular, separadamente, o bicarbonato e o ácido, de modo a evitar
qualquer eventual reacção durante a preparação.
Os comprimidos contendo desagregantes efervescentes devem ser conservados ao abrigo dos
mais leves vestígios de humidade, recomendando juntar-se-lhes l a 4% de um composto desidratante,
como o sulfato de sódio anidro.
A escolha de um desagregante ou de uma mistura de desagregação para uma dada fórmula é,
pelo que se disse, assunto a ponderar, tendo sempre presentes as características que se desejam para
o medicamento em questão. Um dado desagregante, muito aconselhável para determinados
fármacos, pode não o ser para outros, variando os tempos de desagregação, para o mesmo princípio,
em função do desagregante utilizado.
Em trabalho relativamente recente, DELONCA e colab. relatam as variações da velocidade de
desagregação de comprimidos que apenas diferem na qualidade do desagregante. Prepararam para
isso uma fórmula, granulada a seco, contendo ácido acetil-salicílico, ácido ascórbico, cloridrato de
tiamina, lactose, estearato de magnésio e talco. A quantidade de desagregante usada foi de 10%,
variando a sua qualidade desde várias espécies de amido a derivados da celulose, alginatos,
Carbopol, etc.
A Tabela LXX mostra as variações encontradas na velocidade de desagregação, ao fim de um dia
e de quatro e sete meses de preparação. Verifica-se, pela sua análise,
;•. -:;•>'
Tabela LXX. Tempos de desagregação de comprimidos em função da natureza do
desagregante
Tempos de desagregação, em água, ao fim
Desagregante de uma armazenagem de:
l dia 4 meses 7 meses
min s min s min s
Amido de arroz 42 2 25 45
Amido de batata 1 30 1 35 50
Amido de milho 30 57 25
Amido de trigo 3 30 3 40 1 10
Carboximetilcelulo.se 1 50 1 40 40
Etílcelulose 11 20 7 11 3 40
Metilcelulose 7 32 25 45 9
Acido algínico 52 5 35 5 50
Alginato de cálcio 2 2 2 50
Alginato de sódio 75 15 30 30 5 45
Veegum R 3 26 2 45 2 40
Carbopol 934 120 95 97

Segundo Delonca et. ai. — I. Pharm. Belg., 21, 67 (1966)


672

que a eleição de um desagregante deve ser feita conscientemente, não só tendo em atenção a sua função
mecânica, mas ponderando as eventuais incompatibilidades a que pode dar origem e ainda as variações
que confere à velocidade de desagregação após um período mais ou menos largo de armazenagem dos
comprimidos.
Um dos factos curiosos a assinalar nas fórmulas citadas é que, de um modo geral, a velocidade de
desagregação varia em função do período de armazenagem, nomeadamente ao fim de quatro meses após a
preparação.
e) LUBRIFICANTES — Entende-se por lubrificantes as substâncias capazes de assegurarem um
completo enchimento da matriz e de evitarem a aderência dos pós aos cunhos da máquina, durante a
compressão. Isto quer dizer que um bom lubrificante deve ter uma acção dupla: facilitar o deslizamento
do granulado do distribuidor para a matriz; diminuir a tendência do produto para aderir aos punções e
matriz, e, por conseguinte, promover uma fácil ejecção dos comprimidos.
Os lubrificantes devem, pois, ser deslizantes e anti-aderentes, contribuindo, por um lado, para
melhorar a conservação dos punções e matriz (quando haja misturas abrasivas) e, por outro,
conferindo ao comprimido aspecto mais brilhante e não pulverulento. Finalmente, sem os
lubrificantes o enchimento da matriz seria irregular e, por conseguinte, irregular também o peso dos
comprimidos obtidos. Do ponto de vista prático, os lubrificantes são predominantemente deslizantes
(como o talco e os carbowaxes) ou anti-aderentes (como os estearatos, gorduras várias, parafina,
etc.) (').
O mecanismo da acção lubrificante consiste em introduzir, entre duas superfícies que se
friccionam e onde haverá atrito, uma película que as separe. A diminuição do atrito pode ser
consequência da aderência das porções polares das moléculas do lubrificante, que terão longas
cadeias de átomos de carbono, às superfícies metálicas dos punções ou da matriz. É isto, de resto, o
que sucede quando se lubrifica com estearato de magnésio ou com outro estearato metálico, podendo
acrescentar-se que a eficácia deste tipo de lubrificante depende, em grande parte, do comprimento da
cadeia da molécula bipolar, aumentando com ele (2).
Na prática corrente, empregam-se quase sempre associações de lubrificantes dos dois tipos atrás
mencionados, designadamente a de talco com estearato de magnésio.
Se considerarmos como l o valor teórico para uma perfeita lubrificação, poderemos estabelecer
diversas graduações de lubrificação para um mesmo pó, conforme o lubrificante utilizado.

(') J. MAY considera três espécies de lubrificantes: de acção hidro-mecânica (parafinas, gorduras,
álcoois gordos, etc.); de acção ligante (sabões metálicos); anti-adesivos (talco, silicones). Também
DUVALL e co1. referem, recentemente, a fraca eficácia do talco como deslizante.
(2) G. GOLD e B. PALERMO referem o interesse dos lubrificantes em baixar a carga estática do
material a comprimir. Verificaram que, de uma maneira geral, o estearato de magnésio, o carbowax
4000, o sulfato de laurilo e sódio e o talco a 1% baixam substancialmente a carga eléctrica estática
de vários granulados.
673

Na Tabela LXXI apresenta-se uma série de lubrificantes utilizados em comprimidos de sulfatiazol,


com os resultados referidos à unidade.

Tabela LXXI. Poder lubrificante relativo de vários compostos para a obtenção de


comprimidos de sulfatiazol (1 = lubrificante perfeito)
Parafina 0,96 Monoestearato de alumínio 0,90
Estearato de magnésio 0,95 Álcool estearílico 0,90
Estearato de zinco 0,94 Álcool cetílico 0,90
Oleato de sódio 0,92 Cera branca 0,89
Estearato de sódio 0,91 Carbowax 4000 0,86
Ácido esteárico 0,90 Talco 0,85
Monoestearalo de glicerilo 0,90 Ácido bórico 0,76

Segundo E. Rotteglia — Lê compresse farmaceutiche, Edit. Farmacêutica, Milano, 1962, pág.


43

Qualquer que seja o tipo de lubrificante observa-se maior eficácia quando se mistura este com o
granulado já seco, e imediatamente antes da compressão, do que quando é incluído na massa a
granular (').
A sua distribuição é executada por dois processos fundamentais que poderemos resumir do seguinte
modo:
1.° — polvilhando-o, manualmente, usando um tamis de seda, sobre o granulado seco, colocado
sobre uma folha de papel vegetal, à qual se imprimem movimentos, de modo a facilitar a
homogeneização;
2." — em máquinas misturadoras que revolvem o granulado com o lubrificante, sem que aquele
fique triturado.
Na sua maioria, os lubrificantes são insolúveis em água e dotados de propriedades hidrófobas,
opondo-se, portanto, de certo modo, à penetração de água no comprimido. Neste grupo de compostos
podemos incluir o talco, os óleos vegetais, a parafina, o ácido esteárico, os estearatos, os oleatos, etc.
No segundo grupo, isto é, como lubrificantes solúveis, poderemos citar os carbowaxes, o benzoato de
sódio só ou em mistura com o acetato de sódio, o monoestearato de polietilenoglicol (Myrj 51 e 53), o
álcool láurico do polioxietilenoglicol (Brij 35), o ácido bórico, etc.
Alguns destes lubrificantes são adicionados a seco, enquanto que outros se incorporam em solução,
num dissolvente orgânico que se evapora facilmente. Os lubrificantes empregados a seco devem ter um
grau de tenuidade suficiente para que permitam

(') Ultimamente citam-se bons resultados empregando suspensões ou emulsões dos lubrificantes,
as quais se adicionam aos agentes aglutinantes, (estearato de magnésio + parafina líquida + talco
sobre o cozimento de amido).
674

um máximo revestimento dos grânulos a comprimir. De todos os citados e, sem dúvida, neste particular, o
estearato de magnésio o que mais vantagens oferece, dado que pode ser preparado, com facilidade, sob a forma
de pó impalpável, de muito baixa densidade (d = 0,25), empregando-se em percentagens de 1-3%. Dá muito
brilho aos comprimidos tendo, porém, o defeito de aumentar os seus tempos de desagregação. A sua alcalini-
dade pode, no entanto, provocar alterações diversas em muitas substâncias, designadamente nos comprimidos
de aspirina. Finalmente, tem o defeito de ser insolúvel, sobrenadando na água quando se desagrega o
comprimido antes da ingestão, o que não é, esteticamente, aconselhável. De um modo geral é menos reactivo
do que os restantes estearatos, como o de sódio ou mesmo o de zinco, que destrói a penicilina. O ácido
esteárico é também utilizado como lubrificante em concentrações compreendidas entre 0,25 e 2%.
O talco é um lubrificante considerado por vários autores como pertencendo ao tipo deslizante, que se
emprega em percentagens de 3-10%. O seu emprego apresenta certo perigo, podendo vir a funcionar como um
corpo estranho em algumas alterações das mucosas, como nos estados ulcerativos ('). Por esse facto tem-se
proposto a sua substituição pelo silicato de alumínio hidratado, que aliás é mais barato em certos países onde
o talco não existe, como na Alemanha Oriental. Para via interna deve usar-se o talco depois de lavado com
ácido clorídrico e água destilada. Uma boa mistura lubrificante é formada pela associação de 9 partes de talco
com l de estearato de magnésio. DEPOORTER propôs 5 misturas lubrificantes, as quais poderiam servir para
quase todos os tipos de comprimidos. Uma das mais usadas é constituída pela associação de manteiga de
cacau, estearina, amido, gelose e talco.
O amido tem sido considerado como um lubrificante do tipo deslizante (1-5%).
A vaselina líquida, a manteiga de cacau, a vaselina e a parafina devem ser utilizadas em
concentrações de 1-2%. Para assegurar uma distribuição homogénea aconselha-se dissolvê-las em 50
partes de éter, pulverizando-se a solução sobre o granulado e deixando, depois, evaporar o éter. Uma
boa mistura lubrificante pode conseguir-se associando os corpos gordurosos citados a 0,5% de talco. A
associação de manteiga de cacau com espermacete constitui a mistura de ALEXANDER.
No comércio aparecem, também, certos óleos vegetais hidrogenados, conhecidos pela designação
comercial de Slerotex. Este produto apresenta-se como um pó muito fino, facilmente dissemináveí no
granulado. Com esta finalidade pode também usar-se a Cutina HR, produto comercializado pela
Henkel e que é obtido a partir do óleo de rícino.
Os silicones podem ser também utilizados como lubrificantes (1-2%), muitas vezes associados ao talco
sob a forma de emulsão. Entre eles foi empregado, por MOHAN, o silicone SF-96 (1000).

Em dermatologia é conhecida uma afecção cutânea por granuloma do talco.


675

Entre os lubrificantes hidrossolúveis mencionamos a mistura de benzoato com acetato de sódio


(4:1) na percentagem de 4% em relação ao granulado.
Os cabowaxes 4000 (2%) ou 6000, sob a forma de pó fino, têm sido utilizados com muito sucesso
em comprimidos inteiramente solúveis, como os de vitamina C efervescente. Tem-se proposto,
também, lubrificar com soluções alcoólicas (álcool de 50°-60°) quentes, ou com soluções etéreas de
carbowaxes.
Os Brij e os Myrj 51 c 53 dissolvem-se em acetona, utilizando-se como lubrificantes
hidrossolúveis.
O ácido bórico, que só deve ser empregado em comprimidos para uso externo, pois não é
inteiramente inócuo, utiliza-se em concentrações de 2%, sendo considerado dos melhores
lubrificantes, do ponto de vista técnico.
Como acabámos de ver, entre outros fins, a adição de lubrificantes visa impedir atritos entre os
comprimidos e os cunhos da máquina. Esses atritos são de diversos tipos, designando-os os anglo-
saxões por sticking (aderência aos punções e matriz). O mencionado atrito poderia ainda ser
decomponível em dois outros, consoante as partículas se não destacassem da matriz criando
dificuldades de ejecção dos comprimidos (binding) ou dos punções, onde formariam rugosidades
(picking).
Ao lado destes atritos podemos ainda citar aqueles que são responsáveis pelo aparecimento de
comprimidos descabeçados, lascados ou exfoliados e a que se chama, conforme o tipo específico de
aderência, capping, fissuring, chipping e splitting. São insucessos que surgem na preparação dos
comprimidos e os quais muitas vezes são susceptíveis de ser remediados, já que são provocados por
causas bem definidas. Adiante voltaremos a este assunto. •,.. mi ;tu

/) MOLHANTES — Atendendo a que os lubrificantes têm propriedades


hidrófobas, para combater a repulsão da água por parte dessas substâncias é conveniente
incluir nos comprimidos produtos molhamos do tipo do sulfato de laurilo e sódio, dos
sais de trietanolamina ou do Tween 80. Estes compostos opõem-se à libertação do pó
durante a compressão, o que representa uma vantagem no caso dos pós a comprimir
serem tóxicos por via respiratória. A maioria destes compostos, tendo propriedades ten-
sioactivas, provoca um aumento da velocidade de desagregação dos comprimidos, que
se embebem mais facilmente pela água. .. ,

g) TAMPÕES — Há, por vezes, necessidade de se manter estável o pH duma fórmula,


recorrendo-se então ao uso de tampões, como os fosfatos alcalinos, o carbonato de cálcio, o citrato
de sódio, o glicinato de alumínio, o trissilicato de magnésio, a glicocola, etc.
Por exemplo, na preparação de comprimidos de penicilina G, para evitar a sua hidrólise ácida
no estômago, aconselha-se a junção de tampões que corrijam a acidez
676

gástrica. Nos comprimidos de aspirina, para evitar certas intolerâncias, especialmente a quem abuse
do seu emprego, associa-se, com grande vantagem, o glicinato de alumínio, que impede a hidrólise
do analgésico.

h) CORANTES — A coloração dos comprimidos obedece a dois fins principais: tornar os


comprimidos mais atractivos e evitar confusões com comprimidos tóxicos. Repare-se, porém, que não
há nenhuma convenção internacional que regule a cor dos comprimidos, faihanâo assim a ó)tima àas
finaiiàaáes enunciadas,
Entre nós é hábito utilizarem-se, como corantes para comprimidos tóxicos de uso externo, o azul
de metileno ou a eosina. Para as fórmulas de uso interno os corantes empregados devem ser os
autorizados na indústria alimentar.
Atendendo a que muitos dos corantes azóicos podem apresentar propriedades cancerígenas, tem
havido, ultimamente, especial cuidado na sua selecção para uso interno. Efectivamente, tem-se
provado que muitos dos corantes perigosos são lipossolúveis (geralmente com funções aminogénio
livres) e que a modificação das suas características de solubilidade diminui, regra geral, as
propriedades cancerígenas. Com efeito, a introdução nas suas moléculas de funções sulfónicas ou
carboxílicas, que tornam os corantes hidrossolúveis, é normalmente acompanhada por notória
diminuição da toxicidade.
A Farmacopeia Portuguesa V estipula, a este respeito, que os corantes utilizados na preparação
de comprimidos são os autorizados pelas Autoridades Nacionais responsáveis. Além disso, na
monografia intitulada «coloração de medicamentos» reúne num quadro os corantes mais
importantes de uso farmacêutico, indicando para cada um a sua denominação comum e outros
nomes também usuais, bem como a denominação química e uma descrição sumária. A Tabela LXXII
é uma transcrição do referido quadro. Na mesma monografia fazem-se, também, descrições sumárias
de alguns corantes orgânicos naturais, orgânicos sintéticos e minerais de uso mais corrente.
Observe-se que nem todos os corantes permitidos em Portugal para uso alimentar são aceites por
outros países. Assim, a Grã-Bretanha decidiu banir a tartrazina a partir de 1983 e na Rússia põem-
se obstáculos ao emprego do amarante, sempre com a alegação de possíveis propriedades
carcinogenéticas exibidas por aquelas substâncias.
A terra-de-sena queimada (E-181) e a urzela (orceína), ambas corantes naturais autorizados até
1974, foram proibidas em Portugal depois de 1976.
Os corantes são normalmente incorporados a seco ou utilizados em soluções aquosas ou
alcoólicas com que se molha o pó a comprimir, originando este último processo colorações mais
homogéneas.
Entre os inconvenientes do emprego dos corantes citamos o facto de poderem mascarar certas
alterações dos constituintes dos comprimidos. . . .. ...
677

Tabela LXXII. Corantes mais importantes de uso farmacêutico (1)

Cor e Denomin Outros Denominação


n." da ação nomes química ou
CEE comum usuais descrição

l. CORANTES ORGÂNICOS NATURAIS

amare Produto extraído da


los E Curcumina
100 cúrcuma e constituído
«Curcu principalmente pela 1,7-
ma» -bis(4-hidroxi-3-
metoxifenil)-l,6-
heptadieno-3,5-diona-
6,7-dimetil-9-
-(D'-l '-
ribitil)isoaloxazina.
E 101 Riboflavina Vitamina B_
vermel Carmim Laca alumínica, ou
hos E
120 «Cochonil alumínico--cálcica do
ha» ácido carmínico, corante
Vermelho antraquinónico extraído
natural da cochonilha.
n.° 4
verd Clorofilas e Verde Complexos porfirínicos
es E (lipos-solúveis ou
140 natural n."
clorofilinas 3 hidrossolúveis) extraídos
ou obtidos a partir de
plantas
negros
E 153 Carvão vegetal Carvão vegetal activado,
Carvão activado medicinal.
colorações
diversas Carotenóide extraído de
E 160 a Betacaroteno vegetais, ou obtido por
Alaranjado síntese, com predo-
alimentar minância da forma irans.
n,° 5
E 161 g Cantaxantina Alaranjado Produto do grupo das xantofílas
alimentar n.° 8 (carotenodionas) extraído de subs
tâncias animais ou vegetais ou
í •.„,,-. obtido por síntese.
E 162 Vermelho de «Betanina» Extracto aquoso da raiz da beter-
beterraba raba vermelha, contendo uma mis
tura de betalaínas.
Farmacopeia Portuguesa V ( Parte 2, Tomo IV), 1988.
678

Tabela LXXII. (Continuação)

Cor e Denominação Denominação


n." da Outros nomes química ou
CEE comum usuais descrição
sumária

II. CORANTES ORGÂNICOS SINTÉTICOS

amare Sal trissódico do ácido 3-


los E Tartrazina (')
120 Amarelo carboxi-5--hÍdroxi-l-/?-
ali- sulfofenil-4p-sulfofeni-
E 104 mentar lazopirazol.
n.° 4
Sal dissódico do ácido
2(2-quino-lil)-
Amarelo de indanodiona-1,3-
Amarelo ali- dissulfónico.
quinoleína
mentar n.° 13
vermel Sal dissódico do ácido
hos E Azorrubina
122 Carmoisi 2(4'-sulfo-l--naftilazo)-l-
na naftol-4-sulfónico.
Vermelho
alimentar
n.° 3
Amarante Sal trissódico do ácido 3-
E 123 hidroxÍ-4-
Vermelh -(4-sulfonafto-l-il-
o azo)naftaleno-2,7-
-dissulfónico.
alimentar
n.° 9
Eritrosina Sal dissódico ou
E 127 dipotássico da
Vermelh 2',4',5',7'-
o tetraiodofluoresceína.
alimentar
n.° 14
azui Sal cálcico do ácido 4-
sE Azul patenteado Azul
131 alimentar [a-(p-dieti-
V n." 5 laminofenil)a-(4-
E dietiliminociclo-
132 -hexa-2,5-
dienilideno)metil]-6-hi-
Indigotina droxibenzeno-1,3-
Carmin dissulfónico.
de
índigo 3,3 '-dioxo-2,2'bis-
Azul indolindeno-5,5 '-
alimen
tar n.° -dissulfonato dissódico.
l
ver l-[4-Dimetilamino-oc-
des Verde ácido Verde S
E brilhante BS Verde (4-djmeti-lÍminociclo-
alimentar hexa-2,5-dienilideno)-
n.° 4 benzil]-2-
hidroxinaftaleno-3,6--
dissulfonato de sódio.
negr Negro brilhante Sal tetrassódico do ácido
os Negro PN 2-[4-(sul-fofenilazo)-7-
NB Negro sulfo-l-naftilazo]-8--
aliment acetamido-l-naftol-3,5-
ar dissulfónico.
n.° l

(') Quando for utilizado este corante, é obrigatório mencioná-lo no rótulo.


679

Tabela LXXII. (Continuação)


Cor e n." da CEE Denominação comum Outros nomes Denominação química ou usuais
descrição sumária

III. CORANTES MINERAIS

brancos E 170 Carbonato de cálcio Carbonato de Composto obtido por reacção carbonatos dos
í "ií- cálcio preci- alcalinos sobre os de cálcio. sais
pitado

Dióxido de Branco Composto oxigenado de


E 171 de titânio te-travalente,
titânio obtido por precipitação.
titânio
Anidrido
titâ-
nico
Coloraç
ões Óxido férrico hidratado,
divers Ocre
as E preparado por processos
químicos.
E Óxido de
172 ferro, Óxido férrico anidro.
amarelo
E
172 Óxido de ferro,
Sesquióxido de Óxido ferroso-férrico.
vermelho ferro
Terra de
Sienna
Óxido de ferro, Óxido
de ferro
negro
magnétic
o

i) EDULCORANTES — Trata-se de substâncias empregadas para corrigir o gosto de uma dada


preparação, citando-se, entre elas, diversos açúcares, mais ou menos energéticos. Como
edulcorantes não energéticos são muito usados a sacarina ou o sacarinato de sódio, os ciclamatos de
sódio e de cálcio, etc.
Ultimamente, tem-se criado uma corrente de oposição à excessiva edulcoração dos comprjínidos,
que poderia dar origem a acidentes de intoxicação em crianças que ingerissem os medicamentos
como verdadeiras guloseimas.
j) AROMATIZANTES — A sua utilização é normalmente complementar da dos edulcorantes,
empregando-se várias essências, como as de laranja, limão, cereja, hortelã--pimenia, etc.
A aplicação destas essências é feita sob a forma líquida, absorvendo-se em substâncias adequadas,
mas podendo, também, utilizar-se sob uma forma puverulenta conseguida por atomização (Essências
do tipo Soflor).
680

7.2.1.2.2.2. Mistura dos constituintes

Como já vimos, é geralmente necessário proceder-se à granulação dos constituintes dos comprimidos
para se conseguir obter aquela forma farmacêutica. Em casos bastante raros (substâncias directamente
compressíveis) a operação de granulação é dispensável, tornando-se, mesmo assim, aconselhável
utilizar um pó cristalino com partículas de dimensões padronizadas.
Do que se disse se infere a necessidade de pulverizar, ou, pelo menos, de tamisar todos os
componentes que irão dar origem aos comprimidos. É essa, portanto, a operação imediata à pesagem dos
componentes sólidos. Pulverizados estes, devem ser intimamente misturados, seguindo-se a sua
granulação.
A granulação pode efectuar-se por via seca ou por via húmida. No primeiro caso haverá sucessivas
operações de compressão e fragmentação, enquanto que no segundo se preparará uma massa plástica que
se possa transformar em pequenos grânulos fáceis de comprimir. Qualquer que seja o processo adoptado,
deve usar-se um pó constituído por partículas não muito finas que apresentem dimensões sensivelmente
idênticas.
Como já sabemos do estudo da Técnica Farmacêutica, a aparelhagem usada na pulverização deve ser
escolhida de acordo com a quantidade de pó pretendida. Assim, para pequenas quantidades recorre-se ao
almofariz, tamisando-se, depois, pelo processo vulgar. Para quantitativos mais elevados, como acontece na
indústria farmacêutica, exige--se o emprego de moinhos e a tamisação é feita através de crivos
mecanizados.
A mistura dos pós simples efectua-se em almofariz ou em misturadores, ainda de acordo com a
quantidade a preparar. Em todos os casos é, porém, fundamental que se sigam, a par e passo, as regras
da preparação dos pós compostos. A operação de mistura pode encarar-se, no caso especial dos
comprimidos, considerando sistemas de dois ou mais sólidos (mistura de pós) ou sistemas
sólidos/líquidos (granulações a húmido).
Ocupando-nos do primeiro caso, podemos dizer que a mistura de pós pode processar-se por: a)
difusão, b) convexão e c) deslocação por deslizamento.
A difusão consiste numa redistribuição dás partículas ao acaso, enquanto que a convexão é um
movimento de grupos de partículas adjacentes, de um lugar panj outro da mistura. Chamaremos
deslocação por deslizamento à mudança da configuração dos componentes, mediante o deslizamento da
mistura segundo planos definidos. A Fig. 245 auxilia a compreensão do que se disse.
A operação de mistura obedece a uma lei exponencial de primeira ordem, que se pode traduzir por
681

sendo M o grau de mistura, t o tempo e A e K duas constantes dependentes do tipo de misturador,


das proporções e características dos componentes. De acordo com esta equação observa-se que a
curva entre o grau de mistura e o tempo é assintótica, nunca podendo, por isso, conseguir-se uma
mistura totalmente perfeita.

Fig. 245. Principais mecanismos de mistura


(Segundo LANTZ, JR, R. e SCHWARTZ, J. — in Pharmaceutical Dosage Forms:
Tablete, volume 2, Marcai Dekker, NY — Basel. 1981)

Em referência à mistura de sólidos com líquidos para a granulação podem ser consideradas três
fases importantes:
a) Aglomeração — A junção de líquidos (solventes, soluções aglutinantes) aos pós em movimento
leva a que estes se molhem, sendo em parte o líquido absorvido por capilaridade para os interstícios
das partículas, formando-se assim aglomerados volumosos. Claramente que a tensão interfacial entre
os líquidos e os sólidos desempenha papel primordial em toda esta operação, havendo casos em que,
para aumentar a molhabilidade (ver Suspensões), se torna necessário recorrer a agentes
tensioactivos.
b) Quebra dos aglomerados — À medida que progride a mistura e terminada a junção de líquido,
o deslocamento dos pós molhados leva à quebra dos aglomerados em agregados de menores
dimensões e de consistência muito menos dura.
c) Formação da Pasta — Quando o líquido estiver homogeneamente distribuído pelas partículas
dos pós em consequência da mistura se continuar a fazer, os aglomerados tomam-se mais viscosos,
aumentando o contacto partícula a partícula e expulsando-se o ar entre elas. Assim, e também porque
no líquido se foram dissolvendo alguns componentes do pó, vão-se criando condições para
aderência, a qual leva à formação de uma massa ou pasta própria para granular.
1.° — Moinhos — São de diversos modelos, como os de navalhas, de mós, de discos dentados e
de esferas. Do que conhecemos da indústria farmacêutica nacional,
682

julgamos que os mais utilizados são os de esferas e os de martelos. Entretanto, relembramos que este
assunto já se encontra tratado no capítulo «Pulverização» a pág. 131 deste livro.
Os moinhos de martelos efectuam o trabalho de divisão mediante uma série de lâminas ou
martelos, num eixo que gira a alta velocidade. Os martelos rodam sem contactar, directamente, com
nenhuma das peças da máquina. Quando o material a pulverizar os encontra é dividido, triturado e,
posteriormente, impulsionado pelo ar que circula devido ao movimento dos martelos, de encontro a
um crivo. Quando as partículas ainda não são suficientemente pequenas para atravessar as malhas
do tamis, voltam às navalhas e, novamente, são lançadas contra o crivo. O grau de tenuidade do pó
varia com diversos factores, designadamente com a espessura dos martelos. Martelos de superfície
plana e não cortante originam pós mais finos; martelos de bordos cortantes produzem pós mais
grossos. O crivo, que deve ser de material muito resistente (aço ou aço inoxidável), tem perfurações
circulares ou em espinha. As partículas que atravessam o crivo são de muito menores dimensões do
que os orifícios daquele, dado que o crivo é atravessado obliquamente e não na perpendicular.
Alguns desses moinhos são constituídos de modo a que haja possibilidade de utilização de ambas as
faces do tamis.
A velocidade da operação deve ser condicionada pela natureza do material a pulverizar, havendo
moinhos com sistemas de velocidade regulável. Normalmente, os martelos de um moinho podem
atingir 3000 a 5000 rotações por minuto. Algumas vezes é preciso arrefecer o material antes da
pulverização, pois pode dar-se o caso de aquecer em demasia, devido ao atrito.
Os moinhos deste tipo podem destinar-se não só a moer drogas, como servem, também, para
fragmentar comprimidos imperfeitos, a partir dos quais se pretenda obter um granulado. Algumas
vezes podem existir montados nos distribuidores das máquinas de compressão a fim de assegurar
uma boa dispersão do material. Como modelo típico citamos o de FITZPATRICK, que já anteriormente
foi estudado (ver pág. 136).
Os moinhos de bolas são constituídos por um cilindro metálico (aço) dentro do qual se encontram
diversas bolas geralmente também de metal, as quais ocupam cerca de 40% da capacidade da caixa.
Atendendo a que o cilindro roda sobre um eixo, no plano horizontal, as bolas movem-se no seu
interior provocando a pulverização do material. Habitualmente a sua velocidade é de 25-30 rotações
por minuto. Em alguns dos modelos o cilindro é de porcelana e é revestido, interiormente, de esmeril,
sendo as bolas de porcelana ou de pedra. Do mesmo modo que os moinhos de martelos, os moinhos
de bolas podem moer ou misturar drogas. Por vezes, o calor desenvolvido pelo atrito das bolas nos
pós auxilia a mistura, como fase prévia para a granulação.
Claro está que os moinhos de bolas, ao contrário dos de martelos, exigem, acessoriamente, a
utilização de tamises, de forma a estabelecer uma tenuidade adequada para os pós. Na indústria
utiliza-se, correntemente, um sistema de tamises encaixados uns nos outros, cuja "malha vai
diminuindo. O conjunto está montado numa haste vibratória e os pós vão passando, por gravidade,
dos tamises de malha mais larga para
683

os de malha mais apertada. As redes do tamis são geralmente metálicas (aço inoxidável, arame
estanhado, latão, níquel, etc.), mas, para certos pós, facilmente alteráveis por vestígios metálicos,
aconselha-se o uso do nylon, da seda e da crina. A tendência actual é, porém, empregarem-se
exclusivamente as redes de aço inoxidável e de nylon.
O número de malhas por cm2 que deverá apresentar a rede do tamis, nos moinhos de martelos ou
nos tamises propriamente ditos, é variável com a tenuidade pretendida, podendo, contudo, dizer-se
que se empregam correntemente peneiras com 40-80 fios por cm. No caso dos lubrificantes, em que o
bom êxito da aplicação depende, em grande parte, da finura do pó, podem usar-se tamises com maior
número de malhas.
2° — Misturadores — As máquinas capazes de proporcionarem uma mistura eficaz de pós secos
devem actuar suavemente, de modo a evitar a diminuição do diâmetro das partículas da mistura.
A ausência de peças móveis reduz a possibilidade de atrito e facilita a limpeza. Por outro lado, o
funcionamento lento evita a aglomeração das partículas na massa e impede a geração de calor
intenso.
Além da simples mistura de pós, estas máquinas podem proporcionar o
revestimento de granulados com o lubrificante antes da compressão, etc.
Os misturadores devem ser construídos com materiais fáceis de limpar e
que não reajam com as substâncias medicamentosas. Usa-se o aço
inoxidável, a alpaca (liga de 61% de cobre com 19% de níquel e 20% de
zinco) e ainda diversos plásticos.
Fundamentalmente, os misturadores são de dois tipos: recipiente fixo
com agitador, ou recipiente móvel, podendo, eventualmente, terem
intensificadores de agitação.
Se bem que os misturadores de recipiente fixo dêem misturas mais
perfeitas e apresentem maior facilidade de carga e descarga, a mais simples
limpeza e a menor potência consumida pêlos seus congéneres de recipiente
móvel levam a que a indústria utilize Fig. 246. Misturador em
especialmente estes últimos. espiral (Nautamix)
Entre os misturadores de recipiente fixo 1 — Motor
lem 2 — Cremalheira '•
bramos os misturadores em espiral, em que um 34 —
Parafuso sem-fim
— Abertura para
motor obriga um parafuso sem fim a descarga
movimentar-
se, promovendo a mistura dos pós. A Fig. 246 dá ideia do modo de concepção destes
misturadores, que também podem servir para promover a mistura de líquidos com pós,
funcionando, pois, como verdadeiros empastadores. - - ..-..---
684

Ao lado dos misturadores em espiral podem ser citados os planetários e os que possuem um recipiente
onde se movimentam diversas pás que promovem toda a agitação dos pós de encontro às paredes» do
recipiente e destas para a sua parte central. O esquema incluído (Fig. 247) elucida o seu funcionamento.
Queremos, contudo, salientar que os aparelhos do tipo planetário são os únicos estudados
cientificamente, permitindo que seja conseguida uma perfeita homogeneização da mistura. Podem
ser usados para misturar os líquidos de granulação aos pós a granular.

Fig. 247. Mislurador de pás 1—Courtois; 2 — Segundo Enrico


Viani, Ingegneria Chimica, 9, 5 (1960)

Recentemente, HUTCHINS e colab. ensaiaram a mistura de pós e a granulação num misturador de


recipiente fixo, o aparelho de Littleford-Lodige, Este é constituído por um cilindro horizontal, no interior
do qual existem diversas pás misturadoras e um triturador, movendo-se este conjunto em tomo de um
eixo. Para efectuar o lançamento do líquido ou da solução de granulação existe uma espécie de
atomizador, colocado sobre o triturador.
Trabalhando com este aparelho conseguiram misturar lactose, amido, fenacetina e corante verde
(215:50:30:5) em cerca de 30 segundos. A granulação desta mistura com cozimento de amido a 10%
opera-se em 5-10 minutos.
Os misturadores de recipiente móvel (Fig. 248), muito difundidos nos Estados Unidos e também
agora entre nós, são essencialmente de tipo cúbico, bicónico e em V. Os mais simples são
constituídos por cilindros ocos terminados em cone, cujas medidas são muito rigorosas. O seu
movimento em torno de um eixo transporta o pó à medida que o cone ascende, chegando este a um
ponto em que cai por simples gravidade. Como a superfície que causa o desvio e desequilíbrio do pó
é cónica, não há duas partículas que tomem caminhos paralelos, o que constitui a principal razão do
seu bom funcionamento. Geralmente, são construídos em aço inoxidável e a sua lim-
685

peza é extremamente simples, já que não existe qualquer obstrução interna, por serem inteiramente
lisos por dentro. Para se conseguir uma mistura homogénea por intermédio de aparelhos deste tipo
são, em regra, necessários 10 a 20 minutos.

Fig. 248.
Misturadores de
recipiente móvel
1--Rulon (cilíndrico): 2 —
Morandi (bicónico)

Em outros modelos existe> dentro do tambor misturador, uma série de desviadores automáticos
que separam o material dos eixos do aparelho. Este é o sistema dos mis-turadores de MCLELLAN, que
permite obter seis separações e misturas completas apenas com 30 revoluções de \ minuto cada (Fig.
249).

Fig. 249. Misturador com barras intensífícadoras (Patterson,


Kelly Co., Inc., USA)
686

Outros modelos têm a forma cúbica, sendo verdadeiras caixas de aço inoxidável que giram em
volta de um eixo. São especialmente empregados para misturar antibióticos (Fig. 250).
Talvez, porém, aconteça que o modelo mais difundido seja o conhecido misturador em V.
Funciona pelo princípio da subdivisão contínua do lote em duas metades que se recombinam sempre
que o V atinge a sua posição normal. Habitualmente, o ângulo de inclinação dos dois recipientes
constituintes do V é de 90°. São construídos em material plástico, em vidro ou em aço inoxidável e a sua
capacidade é

Flg. 251.

Misturador em V
Flg. 250. Segundo Enrico
Viani,
Misturador Ingegneria
cúbico Chimica, 9, 5
(1960)
(Morandi,
Milão)

extremamente variável, desde 2 litros até muitas dezenas de litros. Existem no mercado modelos
equipados com barras intensificadoras, situadas perto da superfície de carga, as quais podem girar
independentemente do tambor, chegando a atingir 2200 rotações por minuto, o que desagrega altamente
o material e o põe em condições de mistura.

Tabela LXXIII. Tempos de mistura necessários, em função do volume de pó, para um


misturador de determinada capacidade

Percentagem de volume de pós em relação à capacidade do Tempos de mistura necessários (minutos)


misturador

50 10
65 14 •:..-.
70 18
75 24
80 40 («)

(*) A mistura não ficou homogénea.


687

A Fig. 251 reproduz um misturador em V desprovido de barra de intensificação.


Um dos pontos mais importantes para haver plena eficiência dos misturadores é a relação entre a
quantidade de pós a misturar e a capacidade do misturador. Em regra, conseguem-se resultados
óptimos quando o volume de pós não excede 50-60% da capacidade do aparelho. Tal medida permite
que a operação seja menos demorada como se refere na Tabela LXXIII, que indica tempos de mistura
em função do volume de pó, para um misturador de duplo cone.

7.2.1.2.3. Granulação ,- :
7.2.1.2.3.1. Granulação a seco :
Por este processo, também designado por método da via seca ou da dupla compressão, pretendem-
se obter, com máquinas de compressão adequadas, granulados irregulares, vulgarmente designados
por briquetes.
Numa primeira fase, a partir da mistura dos pós constituintes não adicionados de lubrificantes,
obtêm-se comprimidos sem se observarem quaisquer cuidados especiais quanto a regularidade ou a
peso. Depois, os comprimidos imperfeitos assim preparados são fragmentados utilizando-se crivos,
moinhos de martelos ou tamisadores granuladores e conseguindo-se, assim, um granulado, embora
irregular, o qual se irá comprimir em definitivo após adição de lubrificantes.
Muitas vezes, para evitar atritos, é conveniente adicionar parte do lubrificante aos pós que se
destinam à pré-compressão. O Suplemento à segunda edição da quarta Farmacopeia Portuguesa não
prevê essa hipótese, ao estipular que «a substância activa, adicionada do diluente, aglutinante e
desagregante, é comprimida grosseiramente, os comprimidos são reduzidos depois a granulado
adequado e este, adicionado de lubrificante, é submetido à compressão definitiva».
As máquinas empregadas na pré-compressão podem ser compressoras vulgares, mas
habitualmente têm punções de maior diâmetro e possuem mais elevada potência. Acessoriamente,
podem ter mecanismos especiais de alimentação, a fim de se assegurar um perfeito enchimento da
matriz.
Como neste sistema de compressão se liberta muito pó, convirá possuir sistemas de aspiração ou
ter máquinas em que a compressão se exerça em ambiente isolado.
A fim de substituir as máquinas compressoras neste tipo de granulação, tem-se modernamente
difundido o uso de compactadores, dos quais o chilsonator (') é dos mais conhecidos. Este aparelho,
representado na Fig. 252, é constituído por dois cilindros metálicos, dentados, dispostos vis-a-vis.
Um motor acoplado providencia o movi-

(') Do nome do seu inventor, o americano Francis Chilson.


688

mento dos cilindros que rodam em sentido oposto. Entre eles é lançada a mistura de pós a
granular, a qual é comprimida, agregando-se de modo semelhante ao que sucedia nas máquinas de
compressão. Posteriormente, fracturam-se os blocos agregados num
tamisador-granulador. A casa Hutt (Schluchtern--Heilbronn, Alemanha)
fabrica modelos de máquinas para este tipo de granulação.
Como dissemos, a desagregação dos comprimidos leva à obtenção de
grãos irregulares, que se denominam briquetes ou slugs. Essa desagregação
pode ser conseguida manualmente, obrigando os comprimidos a
passarem através de um crivo, mas na indústria recorre-se aos moinhos de
martelos ou aos tamisadores-granuladores, como os granula-dores
oscilantes. As grelhas de tamisação devem ter orifícios ou malhas
escolhidas de acordo com o produto e com o comprimido definitivo que
se
Flg. 252. Chilsonator (esquema) pretende obter. São habitualmente de níquel e as suas
perfurações variam de 5/10 a 3 ou 4 mm de diâmetro.
O processo de granulação a seco pode servir para preparar comprimidos muito rapidamente,
pois permite dispensar a operação da granulação a húmido, que é mais demorada porquanto exige
secagem. A sua principal aplicação é, contudo, na preparação de comprimidos de substâncias
higroscópicas ou alteráveis em presença de humidade. Acessoriamente, e uma vez que dispensa a
secagem, é usado na fabricação de comprimidos de compostos termolábeis. Finalmente, emprega-se
em alguns casos em que haja incompatibilidades entre os constituintes, motivadas pela presença de
água.

7.2.1.2.3.2. Granulação a húmido


A granulação por via húmida consiste, fundamentalmente, no processo galénico da preparação
dos sacaretos. Como ROTTEGLIA, podemos dividir a operação em diversas fases, a saber:
1.° — humedecimento dos pós;
2." — granulação da massa húmida; 2." — secagem do granulado obtido; 4." —
calibração do granulado seco em grãos de tamanho uniforme.
1.° — O humedecimento da mistura dos pós costuma fazer-se numa máquina misturadora
provida de um sistema de agitação helicoidal ou planetário, como os
689

considerados atrás. Quando se trabalha em pequena escala, pode servir o almofariz, operando-se
como indicámos para a preparação dos sacaretos granulados. Como líquidos de humedecimento é
vulgar utilizarem-se a água, o álcool etílico mais ou menos concentrado, o éter contendo em
dissolução misturas gordas numa percentagem de 16,5%, o álcool isopropílico com 5% de amido ('),
etc. A adição de aglutinantes é, na maioria das vezes, indispensável.
As propriedades físico-químicas da substância ou substâncias a granular condicionam a
granulação e especificam o tipo de líquido a utilizar. Deste modo, para substâncias moderadamente
solúveis, bastará o emprego de um líquido, enquanto que para os compostos tipicamente insolúveis
pode ser necessário utilizar misturas aglutinantes. Assim, por exemplo, para granular fenacetina é
preferível utilizar álcool de elevada graduação, o que originará um granulado resistente; pelo
contrário, para granular lactose é preferível empregar álcool diluído. As substâncias aglutinantes são,
geralmente, empregadas sob a forma de soluções (sacarose, glucose, lactose, sorbitol, etc.), ou de
pseudo-soluções (gelatina, amido, metilcelulose, gomas, etc.), de modo a assegurar uma melhor
distribuição nos pós. Como líquidos empregam-se, de preferência, a água e o álcool, já que são os
mais baratos e os que apresentam menos inconvenientes.
Se se pretender dar à massa uma certa untuosidade, a mistura deve ser efectuada num
misturador de bolas, durante algum tempo, obtendo-se então, com o concurso de água e açúcares,
uma pasta que se transforma em pequenos cilindros quando passada por uma placa perfurada.
A quantidade de líquido de humedecimento não pode, com rigor, ser estabelecida a priori, pois
que os resultados dependem de diversas circunstâncias que só a prática pode devidamente
esclarecer. Mesmo assim, podemos dizer que as quantidades de líquido de granulação estão,
geralmente, compreendidas entre 1/5 e 1/10 da quantidade de matéria a granular. Claramente que
as proporções dependerão da natureza da substância, do seu grau de hidratação e do líquido de
humedecimento. Na Tabela LXXIV indicamos as quantidades de água e de diversas soluções
necessárias para granular l kg de sacarose.

Tabela LXXIV. Volumes de líquido, em ml, requeridos para granular 1000 g de


sacarose
ÁlcCOl Água Coz. amido a Gelatina a Goma arábica a Metilcelulose a 2%
10% 10% 10%
de 50°

150 100 100 65 70 100

(') Em rigor a granulação por meio do éter ou do álcool isopropílico não é uma granulação a
húmido, visto que não está presente água. É, porém, uma granulação com líquidos e por isso a estu
damos neste ponto. ,. . . . . . . . . . . „...,. ,. . ,
690

É ainda importante saber que se deve utilizar maior quantidade de líquido de granulação quando se
granula através de tamises ou de discos de malha larga do que quando a operação é conduzida obrigando
a massa a passar por tamises ou por discos de malha mais apertada.
A operação de humedecimento deve ser cuidadosa, de modo a que se consiga homogeneizar toda a
mistura, e o líquido de humedecimento deve ser lançado por intermédio de um sistema que o espalhe
regularmente.
Algumas vezes, pode servir um sistema de «chuveiro» que lança o líquido sobre a mistura dos pós,
agitada em aparelho próprio. O fim da operação é conseguir uma pasta suficientemente húmida para
formar um corpo susceptível de atravessar o crivo, resultando, assim, pequenos grãos que se mantenham
na sua forma e não se unam. Se, pelo contrário, a massa estiver demasiado húmida acontece que, embora
formando corpo, não é susceptível de produzir granulados.
Na indústria, a preparação da pasta efectua-se em aparelhos especiais, denominados
misturadores, de que há dois tipos principais, já anteriormente considerados:
— misturadores de cuba, os quais são munidos de pás de formas variadas e que giram com certa
velocidade, de modo a provocar o estiramento da pasta, ao mesmo tempo que esta se desloca
ao longo da cuba;
— misturadores de esferas, em que bolas de porcelana ou de aço inoxidável se deslocam no
sentido contrário ao da rotação da cuba onde se encontram.
Na prática corrente, considera-se que a massa está boa para granulação quando a sua
consistência é tal que comprimida entre as mãos a elas não adira, se mostre firme e mantenha a
forma esférica.
2.° — Após esta fase preparatória da granulação, a pasta obtida é obrigada a passar, manual ou
mecanicamente, através de tamises ou de placas perfuradas.
Na indústria farmacêutica nacional, a granulação da massa é ainda algumas vezes efectuada
manualmente. Este processo dá, como se compreende, pouco rendimento, já que um operador
experimentado pode, quando muito, produzir 25 kg de granulado em 2 horas de trabalho.
O uso de máquinas granuladoras pode reduzir para cerca de 10 minutos o período de tempo
necessário ao mesmo fabrico. Embora existam muitos modelos de máquinas de granulação, todas
elas são constituídas por:
— um dispositivo que exercendo pressão sobre a massa a obriga a passar através de uma grelha
ou placa perfurada; muitas vezes esse dispositivo é um parafuso ' sem-fim (triturador de
ALEXANDER-WERK), um grupo de palhetas metálicas (tipo rotativo) ou um jogo de barras horizontais
(tipo oscilante);
691

— um tamis ou grelha metálica que pode formar o fundo de um cilindro de eixo horizontal ou a
periferia de um cilindro de eixo vertical; os diâmetros dos orifícios das grelhas podem variar
de 0,5 a 4 mm.
Entre os granuladores mais utilizados figura, sem dúvida, o granulador oscilante, em que a
massa é obrigada a passar através de um tamis, geralmente de níquel ou de aço inoxidável,
impulsionada por intermédio de rolos colocados em posição horizontal. A tela metálica deve ficar a
distância exacta das barras horizontais, de modo a conseguir a granulação da massa húmida.
As Figs. 253 e 254 representam, em esquemas e em fotografia, um granulador oscilante. A massa
a granular é deitada em A e obrigada pêlos varões metálicos (R) a passar através da rede (AO,
sendo, então, recebida num tabuleiro fixado em M.
O\
l uu
Fig. 253. Granulador oscilante (esquema)

\'

A máquina possui outro tabuleiro destinado a substituir o anterior quando este estiver cheio. Este
tipo de granulador permite um rendimento de várias dezenas de quilos por hora e pode servir não só
para a granulação a húmido, como ainda para graduar granulados após secagem, reduzir a
granulado comprimidos imperfeitos obtidos por granulação a seco, etc.
No mercado existem numerosos tipos de granuladores, desde os modelos mais simples, como
vulgares máquinas de picar carne (tipo triturador de ALEXANDER-WERK)
692

92
e «passe-vite», até granuladores oscilantes cujo rendimento horário chega a ser superior a 100 kg de
granulado. Entre as máquinas mais vulgares lembramos as de tipo Courtoy, Frogerais, Kustner, Colton,
Stokes, etc. Um aspecto que muito interessa quando se faz a granulação é o tipo de tamis ou placa
perfurada que se escolhe. Naturalmente que essa escolha está em relação com o peso dos comprimidos que
posteriormente se

Fig. 254. Granulador oscilante (Manesty)


A — recipiente de carga, em aço; B — caixa de velocidades com movimento espe-
cial para efectuar o movimento oscilante; C —calha em aço para encaminhar o
granulado para os tabuleiros; D, E, M —suportes para os tabuleiros; F, G, H —
sistema motor; l —base da máquina; J, K — parafusos de fixação; L —corpo
intermédio; N — redes de aço; O — alavanca para suporte das redes; P, Q —
sistema de fixação das redes; R — varões de aço para distribuição do produto a
granular; S — segurança das alavancas de suporte das redes; T — veio com
movimento oscilante; U — peça com movimento oscilante.

pretendem obter e, como este se encontra relacionado com o diâmetro dos punções,2 poderemos
estabelecer uma equivalência entre o diâmetro dos punções e o número de malhas por cm do tamis.
Na Tabela LXXV estabelecem-se as relações habitualmente respeitadas entre
o tamis a empregar para a obtenção do granulado e os comprimidos que este
originará. . . ... _-., .. __ .......
693

Tabela LXXV. Relação entre o número de fios e malhas de um tamis e o diâmetro e o


peso dos comprimidos obtidos
N." de fios Aí." de malhas Diâmetro dos Peso dos
por cm por cm 2 punções (mm) comprimidos (g)
5 25 16 0,90-1,00
6 36 14-15 0,70-0,90
7 ,49 :. 12-13 0,40-0,70
8 64 10-11 0,20-0,40
9 81 8-9 0,12-0,20
10 100 "' 6-7 0,06-0,12
15 225 5 <0,06

No esquema que a seguir apresentamos, e que foi retirado de um trabalho de JAMINET e HESS,
indicam-se, em resumo, as operações fundamentais a executar para obter comprimidos.

Granulação a húmido Granulação a seco


Substância (s) activa(s) Substância(s) activa(s)
-f +
Excipiente Excipiente -'-j.
i l •,:
Mistura Mistura
Líquido de granulação —* malaxagem , J
l "' Pré-compressão
l l
Granulação a húmido * Granulação a seco
i i
•"• • ' Secagem Fase externa —* mistura *
| (lubrificante) |
Calibração do granulado * Compressão
i
Fase externa ———* mistura *
(lubrificante) |
Compressão
!|! :
Fases que pudern ser omitidas. . ' ' -—

3.° — A massa granulada é seguidamente seca. Naturalmente que é sempre preferível que a
secagem seja efectuada a temperatura o mais baixa possível pois que muitos constituintes dos
comprimidos são facilmente alteráveis, como o glicerofosfato de cálcio, o carbonato de bismuto, a
aspirina, o piramido, etc.
694

A duração da operação depende não só das substâncias a secar, como ainda do método utilizado
na secagem. Assim, por exemplo, compostos, como o hidróxido de alumínio, levam muito tempo a
secar, enquanto que outros, como o sulfato de sódio ou o sulfato de magnésio, eliminam água muito
rapidamente (').
A secagem deve ser feita de tal modo que o granulado não fique nem demasiado seco nem
excessivamente húmido. De um modo geral, interessa, para perfeita compressão, a existência de uma
quantidade óptima de água, a qual é variável com o tipo de comprimidos. Por outro lado, um
granulado demasiado seco origina comprimidos muito friáveis, o que é altamente prejudicial na
indústria.
Algumas vezes, a fim de que o granulado não seque excessivamente e para que se possa dispensar
um controlo constante da secagem, aconselha-se a junção de líquidos humectantes, como a glicerina
ou o sorbitol (l a 3%), na solução com que se faz a granulação dos pós.
A secagem do granulado pode ser efectuada por muitos processos, desde a exposição ao ar à
utilização de estufas, de radiações infravermelhas, de radiofrequência, etc.
Para se secar ao ar, o granulado é estendido em camada delgada sobre placas e abandonado;
deve ser mexido, de quando em quando, de forma a serem renovadas as superfícies. A técnica, que
não pode ser considerada industrial, é ainda usada para granulados que contenham princípios
voláteis, mas contra-indicada para substâncias alteráveis, de um modo geral, pela luz solar. A
operação carece de 24-48 horas.
A secagem na estufa exige que o granulado seja disposto em tabuleiros de modo a ficar com uma
espessura relativamente pequena. As estufas devem possuir um bom sistema de ventilação para
renovar o ar que se vai saturando de humidade (2). Como fontes térmicas pode servir o vapor de
água, o gás ou a electricidade. A temperatura e o tempo de secagem variam muito de composto para
composto, podendo, contudo, dizer-se que, vulgarmente, a operação se faz a 40-50°C durante 4 a 5
horas.
Algumas vezes é recomendável proceder à secagem fraccionada, em duas sessões de 3 a 2 horas,
respectivamente, aproveitando-se o intervalo entre os aquecimentos para proceder à calibração
prévia do granulado.
Em certos casos é vantajoso aquecer, muito gradualmente, o granulado, de modo a impedir a
formação de crostas que dificultam a secagem interna. Isso é essencialmente importante quando haja
açúcares, que se podem liquefazer, ou corantes susceptíveis de ficarem concentrados sobre alguns
grânulos, devido à capilaridade.

(') É evidente que a velocidade de secagem depende de factores externos e internos. Entre os
primeiros avultam a fonte calorífica, o grau de humidade, a pressão, o arejamento, etc. Entre os
segundos, podemos citar a capilariade, nos sólidos porosos, e a difusão, nos sólidos homogéneos; é,
ainda, importante o fluxo causado pela gravidade e o causado pela sequência vaporização-
condensação.
(2) A admissão do ar exterior e a evacuação do ar quente são limitadas ao volume necessário
para conseguir o arrastamento da água evaporada. As estufas devem possuir termorreguladores. O
ar que sai pode ser desidratado por passagem sobre «Carbagel» (granulado de carvão vegetal
contendo cloreto de cálcio), gele de sílica, ou outro desidratante, fazendo-se, então, recircular na
estufa.
695

Actualmente existem estufas de secagem (ver pág. 198) (leito flutuante = fluldized bed)
concebidas de tal modo que o granulado é atravessado por um turbilhão de ar quente e seco. O ar é
aspirado do exterior, aquecido à temperatura requerida através de resistências eléctricas e,
posteriormente, filtrado por um filtro. O ar circula de baixo para cima e o fundo do recipiente de
secagem, onde vai actuar, é de rede inoxidável. No seu extremo superior o recipiente possui um filtro
de nylon, o qual impede a saída das partículas a secar.
O referido sistema de secagem permite eliminar cerca de 67% de humidade num período de
tempo de 80 minutos. O consumo de energia é, por outro lado, mínimo (30 kWh para eliminar 40%
de água de 60 kg de granulado).
Existem no mercado aparelhos do tipo mencionado (Aeromatic) cujas capacidades
de secagem variam de 2 a 200 kg. O esquema (Fig. 255) auxilia a comprensão do
funcionamento de uma destas estufas de secagem. A Fig. 256 é uma fotografia duma
estufa Aeromatic. • .,. . . ... .. . i

Fig. 255. Estufa Aeromatic (esquema)


1 — Entrada de ar; 2 — Aquecedor de ar; 3 — Filtro de ar; 4 — Pequeno carro que
permite colocar o recipiente de secagem; 5 — Material a secar; 6 — Recipiente;
7—Filtro de nylon; 8 — Ventilador; 9—Motor; 10 — Regulação da circulação do ar;
11 — Saída do ar

A secagem pode ser feita, também, por intermédio de radiações infravermelhas de comprimento
de onda compreendido entre 10 000 a 16 000 Â (óptimo entre 10 000 a 12 000 A). Estas radiações
podem ser produzidas por lâmpadas de 250-500 W. Para se obterem resultados satisfatórios o
granulado deve ser disposto em camada de 5 a 10
696

milímetros de espessura, numa instalação que tenha a forma de um túnel de secagem. Este processo,
se bem que económico e rápido, não serve para eliminar grandes quantidades de água e carece de
um sistema de ventilação apropriado.
A secagem por radiofrequência tem sido igualmente empregada, embora quase só em escala
experimental. O processo baseia-se num aquecimento provocado em materiais não condutores por
rápida alteração de um campo eléctrico. FERRAND descreve o processo como se segue: o material a secar
é disposto entre duas séries de eléctrodos-placas paralelos. Os eléctrodos de
ordem par e de ordem ímpar, respectivamente, estão ligados entre si; uma
série conecta-se com a fonte produtora de alta tensão e a outra põe-se em
contacto com o solo, de modo a formar um campo eléctrico elipsoidal entre
as duas séries. A fricção interna, devida ao campo de alta tensão e alta
frequência, desenvolve calor, aquecendo-se toda a massa de granulado, do
seu interior para a periferia. Os eléctrodos são de cobre e a energia que lhes
é comunicada provém de um oscilador de radiofre-quência.
A humidade deve ser removida por ventilação, mas o processo só dá
Flg. 256. Estufa Aeromatic resultados quando o granulado não tenha mais de 20% de água.
Por este processo, como vimos, a secagem principia pelo interior dos
grânulos, ao contrário dos restantes métodos, em que se seca,
primeiramente, a superfície dos grãos e, só depois, o seu interior. Neste
processo excepção, aquece-se, pois, mais energicamente, o interior dos
grãos do que a sua superfície.
COOPER e colaboradores propuseram um sistema de secagem pelo vazio, com rotação. Trata-se
de um método ensaiado nos laboratórios Ciba e designado por Kovac, o qual teria a vantagem de
conseguir, também, a granulação dos pós. A mistura de pós a granular ou o granulado a secar são
colocados num recipiente de cone duplo, giratório. A rotação do aparelho proporciona a
temperatura óptima para a evaporação. Como dissemos, o aparelho tem ainda a vantagem de poder
servir para a granulação, bastando para isso que o líquido de granulação seja finamente disperso
sobre a mistura dos pós a granular. A Fig. 257 reproduz um esquema do aparelho.

4.° — Calibração do granulado. Normalmente os granulados têm de ser seleccionados antes da


compressão. Quando se trabalha por granulação a seco o processo é muitas vezes dispensável já que,
no decorrer da operação, teve obrigatoriamente de se
697

proceder a tamisações selectivas. A granulação a húmido conduz à obtenção de grânulos que sempre
se fragmentam durante a recolha e a secagem. Daí o facto do granulado ser sempre mais ou menos
irregular, sendo por isso obrigatória a sua calibração para que o peso dos comprimidos não sofra
variações apreciáveis. De uma maneira geral, verificou-se que se consideram como mais adequados,
para evitar variações de peso nos comprimidos, os grânulos de tamanho compreendido entre 545 e
855 \lm.

Fig. 257. Aparelho para secagem com rotação, no vazio Segundo J.


Cooper et ai. —J. Pharm. Sei.. 50, 67 (1961)

Na prática, não interessa que todos os grânulos tenham as mesmas dimensões. Assim, tolera-se a
existência de 10 a 20% de partículas menores do que a média, podendo executar-se a calibração
quer por tamisação, quer por intermédio de um gra-nulador oscilante.
A tamisação elimina o pó fino que acompanha os grânulos e destrói os aglomerados granulares
que se formaram durante a recolha e a secagem do granulado. É habitualmente conseguida com
peneiras sobrepostos que são agitados, mecanicamente, por um sistema de velocidade regulável. A
Fig. 258 mostra um desses conjuntos de tamises, de marca Erweka, cujo número de malhas de rede é
escolhido de acordo com o diâmetro e o peso dos comprimidos a obter.
A calibração do granulado por meio de um granulador oscilante é talvez a mais corrente na
grande indústria farmacêutica. Neste caso obtém-se, mais do que um gra-
698

nulado, um pó muito grosso, cujo diâmetro das partículas é condicionado pela malha da rede do
granulador. Por seu turno, esta deve ser escolhida em função do diâmetro e do peso dos comprimidos
pretendidos.

Fig. 258. Vibrador de tamises (Erweka)


Foi. Abel RoWãí

7.2.1.2.3.3. Granulação por processos especiais


Citámos já o processo de granulação e secagem subsequente, conhecido por Rovac. Semelhantes a ele,
podem ser citados outros métodos em que se recorre a uma simples bacia de drageificação de
velocidade regulável. Nela se lança a mistura dos pós a granular, põe-se em movimento e vai-se
aspergindo o líquido de granulação (finamente dividido) sobre a mistura, de modo a formar pequenos
grânulos. A velocidade da bacia deve ser progressivamente reduzida, de forma a que não haja grande
aumento do tamanho dos grânulos (ao finalizar, a bacia deve girar com uma velocidade de 3 rotações
por minuto). O processo deve-se a TWERCK, WALTERS e CARKHUFF e tem a vantagem de executar a granulação
e a secagem numa só fase.
DALE WURSTER idealizou um outro processo de obtenção de granulados que foi patenteado pela
Wisconsin Alumini Research Foundation. O aparelho consiste, em linhas gerais, no seguinte:
699

— um tubo vertical, terminado por uma parte mais larga, onde são lançados os pós a granular;
— um sistema compressor, de velocidade constante, que lança uma corrente de ar ascensional a
qual impede, temporariamente, a deposição dos pós em virtude da gravidade;
— um sistema de aquecimento destinado a elevar a temperatura do ar que entra nos
compressores;
— um sistema de placas ajustáveis que regulam a velocidade do ar;
— atomizadores que lançam a solução granulante sobre os pós.
A mistura a granular é suspensa na coluna à custa da corrente de ar ascensional. A velocidade
desta é de tal modo graduada que as partículas se mantêm em suspensão na parte inferior da coluna,
mas ao chegarem à sua porção superior, mais larga, caem em virtude da gravidade. Deste modo, as
partículas são forçadas a deslocarem-se, no turbilhão de ar, no sentido do extremo da coluna, e
quando o atingem voltam à zona de trabalho que se situa na parte inferior daquela.
A granulação é conseguida à custa da atomização de líquidos granulantes, que são lançados
sobre a suspensão das partículas, e o tempo necessário para a granulação e secagem depende do
rendimento dos atomatizadores e da temperatura do ar circulante. A Fig. 259 dá ideia do
funcionamento do aparelho.

Fig. 259. Aparelho de Dale Wursler


A — Aspecto geral; B — Esquema; 1 — Câmara de granulação; 2 — Corrente
de ar comprimido; 3 — Saída de ar; 4 — Tubo do atomizador; 5 — Atomiza-
dor; 6 — Entrada doar para atomização
700

Por este processo o granulado obtido fica perfeitamente seco e a laboração, além de muito
económica, é extremamente rápida, resultando que em 20 minutos se executa todo o ciclo de preparação
que habitualmente leva 24 horas.
Como veremos adiante, o método pode servir para revestir grânulos com diversos materiais
(protectores da acção do ar, protectores da desagregação gástrica, etc.). Pode servir ainda para revestir
substâncias muito frágeis, como as vitaminas A, D2, C, etc., e para a obtenção de comprimidos de
acção prolongada. A própria lubrificação do granulado pode ser executada pelo mesmo processo.
Aplicando o mesmo princípio, RAFF aconselha a preparação de um granulado universal, inerte, que
conterá o aglutinante e o desagregante dos comprimidos. Sobre esse granulado serão atomizados os
princípios activos e, finalmente, os lubrificantes. Entre as vantagens do processo lembramos a enorme
simplificação da manufactura, a melhor estabilidade da fórmula, a possibilidade de incorporar
perfeitamente corantes e a diminuição do tempo de desagregação dos comprimidos. Esta última vantagem
parece provir apenas da menor quantidade de lubrificante que é necessário usar, pois que a
distribuição daquele é muito mais homogénea.
Os corantes podem ser adicionados no estado sólido ou em solução. O método origina comprimidos
mais brilhantes e duros do que os obtidos pêlos processos clássicos.
.. :;- ',-',: , ' ::í,-:- : t' . , .' .. 'O. -ii l ,':

7.2.1.2.3.4. Ensaio dos granulados


Obtido o granulado, deve proceder-se ao seu ensaio, que incidirá sobre a determinação da humidade,
da porosidade, da resistência e do teor em princípios activos.
1) Determinação da humidade — Interessa largamente, pois é necessário saber qual o teor de
água existente num granulado que se vai comprimir para que a compressão decorra sempre nas
mesmas condições, que devem ser as melhores. Assim, trabalha-se, por vezes, com 2%, 1%, ou até com
0,5% de humidade. A ausência total de humidade dificulta a compressão do granulado.
O controlo da humidade pode fazer-se por secagem na estufa a 100-105°C, até peso constante, ou
a 50°C, trabalhando-se no vazio. O processo é, porém, muito demorado, devendo ter-se presente que a
secagem é uma operação preliminar da compressão e que, geralmente, é necessário comprimir
imediatamente após ela. Mais rápido do que este processo é, sem dúvida, executar essa determinação
pelo método de KARL-FISHER (ver pág. 631).
Também se tem proposto proceder à determinação da humidade avaliando-se a constante
dieléctrica do granulado. O método baseia-se no facto de a constante dieléc-trica da água ser muito
maior do que a dos restantes constituintes do granulado e, portanto, as variações do poder indutor
específico de um granulado húmido correspon-
701

erem ao seu conteúdo hídrico. Para isso, determina-se a variação da capacidade de um condensador,
entre cujas lâminas se coloca a substância em exame.
Uma vez que o poder indutor específico é uma função exponencial do grau de secagem, basta
construir, previamente, um gráfico padrão, relacionando aqueles dois valores, num dado granulado.
Com efeito, se em abcissas se inscrevem os logaritmos do grau de secagem (determinação feita na
estufa a 100"C) do granulado, em diversas fases, e, em ordenadas, os correspondentes valores do
poder indutor específico, conse-gue-se um gráfico que pode servir para avaliar, muito rapidamente e
apenas por medida da constante dieléctrica, o teor de água do granulado em exame. Efectivamente:

Peso do granulado seco 100-// ,:•• l» '••-••,


Peso da água H

sendo H a perda de água a 100"C da amostra analisada. Claro está que o granulado problema deve
ter a mesma composição e ser obtido em condições idênticas às do granulado que permitiu construir
o gráfico padrão.
2) Porosidade do granulado — Esta determinação interessa largamente na preparação dos
comprimidos, visto que quanto menos poroso for um granulado, isto é, quanto menos enrugada,
dentada ou frisada for a superfície, mais denso se torna e mais facilmente escoa do distribuidor para
a matriz. Por outro lado, um granulado muito poroso origina, regra geral, comprimidos mais friáveis
e mais facilmente desagregáveis. À quantidade de substância sólida, expressa em percentagem, em
relação ao volume de granulado, dá-se o nome de enchimento relativo ou embebição relativa, como
lhe chama CARDOSO DO VALE.
Como se compreende, o enchimento relativo do granulado variará inversamente com a porosidade, isto
é, quanto mais poroso for um granulado tanto menor será o seu enchimento relativo. Se um grão não
contiver poros, o seu enchimento relativo é de 100%.
O processo empregado na granulação tem muita influência sobre a porosidade. Assim os granulados
obtidos por compressão são menos porosos do que os conseguidos por granulação a húmido; os
granulados obtidos através de tamis são mais porosos do que os preparados por passagem através de
discos perfurados; a porosidade é tanto menor quanto mais apertadas forem as malhas dos tamises ou dos
discos.
A determinação da porosidade pode ser feita avaliando-se as densidade.1; aparente e real dos grãos.
Para essa avaliação recorre-se ao picnómetro e calcula-se a densidade real, usando um líquido que molhe
perfeitamente todos os contornos do grão, mas não o dissolva. Esse líquido deve ser muito pouco viscoso.
Habitualmente, emprega-se o éter, se o granulado for de lactose.
702

A determinação da densidade aparente ou fictícia consegue-se recorrendo a um líquido que, pela sua
elevada viscosidade e tensão superficial, apenas determine o volume aparente, pois não penetra nos
interstícios do grânulo. Para um granulado de lactose pode servir a vaselina líquida ou o propilenoglicol.
O enchimento relativo será dado pela expressão:

loo-

em que dr representa a densidade real e da a densidade aparente.


Por seu turno, a porosidade é obtida subtraindo de 100 o valor do enchimento relativo. Nestas
circunstâncias, a porosidade de um granulado é dada pela fórmula:

100 (d -da) ' "-:BV" ;


•*"

Suponhamos que a densidade real de determinado


3
granulado era de 0,755 g.cm"3 e que esse produto
tinha a densidade aparente de 0,502 g.cnr . A porosidade seria de 33,5%, pois que
100 (0,755-0,502) "'
- = 33,5 ••••--. ' '" •••
-••• -• ••••';• -• 0,755

3) Dimensões das partículas — A principal razão por que se deve proceder à determinação do
tamanho dos grãos constituintes de um granulado é estabelecer a frequência de distribuição das
dimensões daqueles. Se os granulados são constituídos por partículas esféricas o problema é fácil de
resolver, pois basta conhecer o valor dos diâmetros. Entretanto, esta situação é muito rara, e na
maioria das vezes os grãos apresentam formas irregulares, sendo mesmo assim possível estabelecer a
sua frequência de distribuição.
Por intermédio das técnicas que indicámos a propósito dos Pós procede-se à mensuração dos
grãos do granulado apresentando-se os dados por estabelecimento da relação que existe entre o seu
tamanho e uma ou mais formas de expressar a sua distribuição. Na Tabela LXXVI indicamos dados
de distribuição hipotéticos para granulados, os quais se exprimem em peso de grãos, em vez de
número de grãos, pois é naturalmente mais simples pesar uma dada quantidade de grãos retida num
tamis do que proceder à sua contagem.
703

Tabela LXXVI. Frequência da distribuição de dimensão de partículas de um granulado


hipotético
Frequência de Percentagem
Dimensões distribuição (%) cumulativa
(tamis. \im) em peso em peso
0— 100 6,0 6,0
100 — 200 16,0 22,0
200 — 300 19,0 41,0
300 — 400 25,0 66.0
400 — 500 ~ " 8,0 74,0 '
500 — 600 7,0 81,0
600 — 700 •"-" 6,0 87,0
700 — 800 4,0 91,0
800 — 900 2,0 93,0
900 — 1000 1,0 94,0
>1000 6,0 100,0
100,0

Pela análise da Tabela LXXVI observa-se que, por exemplo, existem 25% de grãos com dimensões
entre 300 e 400 |im, ou seja, que existem 66% de grãos com dimensões inferiores a 400 u.m.
Segundo esta técnica, e a partir dos valores conseguidos na prática, podem construir-se
histogramas tomando em ordenadas os valores da frequência (peso %) e em abcissas as dimensões
das partículas. Podem fazer-se, ainda, gráficos entre percentagens cumulativas ou os seus logaritmos
e as dimensões das partículas.
Quando as partículas ou grãos são esféricos o seu volume é fácil de determinar,
S
P°Í .,., ' ,
4 Tl :; , . • ."V J. "^ ^ '. '
V = —— nr* = ——D3 '• ••• •>< •••• •• '•-::•-'

sendo r o raio e D o diâmetro. Deste modo, o volume é proporcional e dependente,


directa e exclusivamente, do diâmetro, já que —— é constante e igual a 0,52. A esta
6
constante é hábito dar-se a designação de factor volume/forma, representando-se pela notação av.
Como a maioria das vezes os grãos não são esféricos, calcula-se av pela seguinte equação:
V
;< • •: • ' • -• :: i '. ' , ,: O.. = -
704

em que d é o diâmetro equivalente projectado, definido como sendo o diâmetro de uma esfera que
tenha a mesma área de projecção que a partícula quando esta seja colocada na posição mais
estável, no plano horizontal e olhada por cima. Em regra este valor determina-se fotograficamente.
Na Tabela LXXVII indicam-se, segundo FONNER et ai., os factores volume/forma e as densidades
aparentes de partículas de 20-30 mesh, obtidas por diversos processos de granulação.

Tabela LXXVII. Factores volume/forma e densidades aparentes de grãos de 20-30 mesh,


obtidos por diversos processos de granulação
Misturador
Granulação manual Granulador oscilante Moinho de Fitzpatrick em V (sólido!
Ilíquido)

a. 0,16 0,18 0,22 0,25


d (aparente) 0,40 0,39 0,43 0,51

Adaptado de D. Fonner, G. Banker e J. Swarbrick — J. Pharm. Sei., 55, 181, 1966

Como se pode deduzir da referida Tabela LXXVÏI tanto a densidade aparente como o factor
volume/forma variam em função do processo de granulação. A granulação a seco, executada com
máquina de excêntrico, originou, ainda segundo FONNER e colaboradores, grãos com o mais baixo
factor volume/forma (a =0,15) e a mais baixa densidade aparente (da = 0,37).
4) Resistência dos granulados — Chamaremos resistência de um granulado à propriedade que
apresenta de se manter sem libertação de pó, quando submetido a determinadas provas.
Os ensaios efectuados baseiam-se, geralmente, na agitação do granulado em frascos, durante
um período de tempo determinado, ao fim do qual se separa o pó libertado. Habitualmente, o ensaio
é executado em frascos de 60 ml de capacidade, nos quais se deitam 30 ml de granulado, isento de
pó. Os frascos são agitados com determinado ritmo e em cada 2 minutos separa-se o pó que se vai
libertando. Considera--se bom o granulado que, nessas circunstâncias, não origine mais de 10% de
pó, em relação ao seu peso. MÜNZEL, operando segundo este processo, verificou que eram muitos os
factores que influíam na dureza de um granulado. Assim, observou que os compostos hidrófilos
davam granulados tanto mais duros quanto mais hidratado era o álcool u^ado na granulação,
enquanto sucedia o inverso com as substâncias lipófilas. Do ponto de vista de resistência do
granulado, a concentração óptima da solução de gelatina de granulação era de 4%. No gráfico que
a seguir se apresenta e que foi traçado segundo o mencionado trabalho de MÜNZEL, vê-se, em
ordenadas, a percentagem de
705

ranulado não destruído e, em abcissas, o tempo de agitação em minutos. Dão-se dois exemplos de
compostos, um tipicamente hidrófilo, a lactose, outro lipófilo, a fenacetina
(Fig. 260).

l? 15
Tempo em minutos
Fig. 260. Variação da resistência dos granulados em função do tempo de agitação
As curvas de 1 a 9 e de 10 a 15 correspondem, respectivamente, ao comportamento
de granulados obtidos com 100 g de lactose (hidrófila) ou com 100 g de fenacetina
(lipófila), às quais se adicionaram os seguintes líquidos de granulação:
1 10 g de água 2 20 g de água 3 9 10 g de sol. gelatina 4% 10 20 g de álcool
20 g de álcool de 25° 4 20 g de absoluto 11 20 g de álcool de 95° 12 20 g de
álcool de 50° 5 20 g de álcool de álcool de 50" 13 22 g de sol. amido solúvel 14 33
95° 6 11 g de sol. amido solúvel 7 g de sol. amido solúvel 15 17,5 g de sol. gelatina
16,5 g de sol. amido solúvel 8 7,5 g 4%
de sol. gelatina 4% um granulado obtido a seco.
A curva 16 corresponde a
706

Os granulados preparados a húmido com soluções aglutinantes são mais resistentes do que os obtidos
apenas com o concurso de líquidos puros. Por outro lado, um granulado é tanto mais duro quanto menos
poroso se apresentar, quanto menores forem os orifícios da placa perfurada por onde passou a pasta,
quanto mais afastados estejam entre si esses buracos e quanto maior for a espessura da placa.
Na indústria, um dos principais objectivos é conseguir-se um granulado duro que, porém, não eleve
demasiadamente o tempo de desagregação dos comprimidos com ele fabricados. Com efeito, se o
granulado for duro, resiste bem às manipulações, sem libertar pó, o que é sempre aconselhável, não só
pelo aspecto higiénico, como ainda do ponto de vista económico.

7.2.1.2.4. Compressão 7.2.1.2.4.1. Considerações gerais


Para fazer um comprimido é preciso submeter o produto, convenientemente preparado, a uma
pressão exercida entre dois punções no interior duma câmara de compressão ou matriz, cujo fundo é
constituído pelo punção inferior.
O peso do comprimido é função da quantidade de produto admitido na matriz e, portanto, da
posição do punção inferior quando se encontra na ponto mais baixo do seu curso. Essa posição pode
regular-se de maneiras diferentes, consoante os tipos de máquinas de compressão.
Com efeito, os comprimidos resultam da compressão entre dois punções verticais e uma peça
perfurada, dita matriz. Como é lógico, o peso do comprimido não é determinado por pesagem
individual, mas por um método volumétrico, ou seja, pelo volume de granulado que fica aprisionado
no sistema punções-matriz. Claro está que para que este sistema volumétrico seja suficientemente
exacto é necessário que o produto apresente constância de características físicas, como a tenuidade
e a densidade. Se isto for observado, o volume e o peso da mistura a comprimir manterão uma
relação constante, tendo então os comprimidos o mesmo peso (') para cada regulação efectuada, o
que é perfeitamente exequível ajustando o curso inferior do punção de baixo. Por outro lado, um
plano rasante, que pode ser o distribuidor do pó (tremonha ou tolva), como acontece nas máquinas
de excêntricos, ou uma peça própria, como sucede nas máquinas rotativas, elimina o excesso de
granulado que fica sobre a matriz, antes da compressão.
Numa máquina de excêntrico, o punção superior desce e comprime a mistura que se encontra na
câmara de compressão formada na matriz, levando aquela mistura a um

í1) O peso de um comprimido raras vezes é absolutamente idêntico ao seguinte. Quando falamos em
pesos iguais queremos referir pesos semelhantes, dentro dos limites de tolerância aceites e de que
adiante trataremos (ver Verificação dos comprimidos).
707

grau de dureza regulável (pelo aumento ou diminuição do seu curso) e voltando, depois, à posição inicial.
Simultaneamente, o punção inferior sobe, vindo rasar o plano superior da matriz e, deste modo, o
comprimido é elevado e expulso, recomeçando novo ciclo de operações.
A dureza dum comprimido resulta, por conseguinte, da pressão exercida sobre o granulado pelo
punção superior e depende, portanto, da posição do punção superior quando está no ponto mais baixo
do seu curso, posição essa também regulável.
Dessa compressão resulta fricção e atrito com desenvolvimento de calor. Se a compressão fosse
adiabática, quer dizer, se não houvesse trocas térmicas com o exterior, a temperatura no seio do pó
poderia atingir 300 ou 400°C, o que levaria à alteração da maior parte dos seus constituintes. Mas,
como a compressão se dá em condições isotérmicas, o pó só aumenta muito ligeiramente de temperatura.
Mesmo assim, certas substâncias, como a aspirina, podem ser hidrolisadas durante o processo, devido
ao calor libertado.
Por outro lado, se a compressão for muito exagerada, não só se fatiga a máquina, o que pode
determinar a ruptura das peças essenciais, como também há o risco de se produzirem comprimidos não
desagregáveis. Deve, por isso, regular-se a compressão, de acordo com as possibilidades de aglutinação
do pó e com o uso a que o comprimido é destinado. Duma maneira geral, um comprimido deve ficar
intacto quanto se deixa cair da altura de um metro sobre um soalho, mas, por outro lado, deve ser
facilmente quebrado entre os dedos, dando uma fractura nítida.
O estudo aprofundado do fenómeno físico da compressão durante a preparação da forma
farmacêutica que nos ocupa tem sido efectuado por vários investigadores, dos quais salientamos HIGUCHI
e colab., ARAMBULO e colab., RAFF e colab., e SHLANTA e MILOSOVICH. Desde já salientamos a importância do
chamado ângulo de repouso, que traduz a facilidade de escoamento de um pó ou granulado, do
distribuidor da máquina para a sua matriz.
DALLAVALLE, que citamos através de MACEK, define ângulo de repouso (ver pág. 627) como o «ângulo da
base do cone formado quando um material granulado ou em pó cai livremente de um orifício sobre uma
superfície plana». Esta propriedade tem sido estudada por NELSON nos granulados a comprimir. Dos seus
estudos apurou--se que o fluxo de queda depende das forças de fricção que existem entre as partículas
granuladas, da distribuição das partículas de diferente tamanho, da quantidade de lubrificantes e de outros
adjuvantes e, provavelmente, ainda, de vários outros factores. Mais recentemente, FONNER et ai. estudaram
a influência do método de granulação sobre o valor do ângulo de repouso.
No que diz respeito à desagregação dos comprimidos, tem papel muito importante o volume total dos
espaços intersticiais entre os grãos que vão ser comprimidos.
Evidentemente que a desintegração será tanto mais rápida quanto maior for a superfície exterior
dos comprimidos e, por isso, estes devem ser, em regra, de forma lenticular e não plana.
708

7.2.1.2.4.1.1. Adesão e coesão das partículas


Ao admitirmos que sob uma pressão determinada exercida entre dois punções e uma matriz uma dada
quantidade de pó ou de granulado origina um aglomerado sólido de forma bem definida, temos de pensar
nas forças que se exercem entre as partículas comprimidas, as quais justificam a sua adesão e
coesão. Este problema pode ser subdividido, considerando-se, por um lado, as forças manifestadas
entre as partículas dos pós durante a granulação e, por outro, a textura do próprio granulado ou
mesmo do pó directamente compressível, na máquina compressora. No que diz respeito às forças de
coesão e adesão manifestadas entre as partículas do pó a granular, pode afirmar-se que nestes últimos
anos se tem esclarecido suficientemente o seu modo de interligação, muito em particular
nos granulados obtidos por via húmida. Assim, sabe-se hoje que a humidade
desempenha papel preponderante na adesão, formando-se verdadeiras pontes de líquido
entre as partículas do pó, o que permite que se obtenham grãos perfeitamente coesos.
A humidade intergranular pode dispor-se de várias formas, designadas por estado
pendular, estado capilar, estado Fig. 261. Diagrama do funicular e em gotículas.
No estado pendular a humidade
TríícuíaT°(jee um358? em forma Pontes entre as P31*111118 do P°' as 1uais flcam ligadas
presença de um líquido, umas às outras, conforme se mostra na Fig. 261 (A).
Segundo Barlow, c. G. — gstas pomes líquidas que mantêm as partículas coesas
Chem. Engr. Lond. n.- 220, , _ „ . , . .,
CE196 (1968) devem-se a tensão superficial e pressão capilar negativa, ocor
rendo aquando do humedecimento dos pós.
Quanto o espaço entre as partículas fica totalmente cheio pelo líquido de granulação a ligação é devida à
tensão superficial das partículas e à pressão capilar negativa através do espaço líquido, denominando-se estado
capilar (Fig. 261 C). A força de tensão é neste caso cerca de três vezes mais forte do que no estado pendular.
O estado de transição entre o pendular e o capilar denomina-se funicular (Fig. 261 B).
Finalmente, se a quantidade de líquido for apreciável, as partículas podem corresponder a ilhotas no seio
da fase líquida. A coesão manifesta-se aí apenas por acção da tensão superficial da gotícula, pois não existem
forças de atracção intergranular (Fig. 261 D).
Durante a secagem do granulado permanece sempre alguma humidade residual e formam-se, então, pontes
sólidas entre os grãos, o que se deve quer à fusão das pontes nas áreas de contacto entre as partículas, quer à
presença de agentes aglutinantes, quer à cristalização de materiais dissolvidos. Teremos, assim, pontes sólidas,
constituídas por ligações originadas por fusão parcial de componentes do sistema, ligações produzidas por
aglutinantes que endurecem e por cristalização de substâncias dissolvidas nas soluções aglutinantes.
709

Assim, a acção ligante que o polioxietilenoglicol 4000 apresenta, em relação às partículas


constituintes de um pó, pode explicar-se pelo facto de se tratar de uma substância facilmente fusível
(p. f. 53-56°C), o que justifica o seu uso como aglutinante em comprimidos numa concentração de
cerca de 20%.
Entre os aglutinantes que endurecem, produzindo pontes sólidas, são de citar a
polivinilpúrolidona, a gelatina e a carboximetilcelulose. Trata-se de colóides liófilos que se utilizam
sob a forma de soles e que facilmente originam os respectivos geles.
A formação de pontes sólidas devida à cristalização de substâncias dissolvidas é um fenómeno
que se observa na granulação a húmido, em que parte do material granulado se dissolveu na solução
de granulação. A resistência destas pontes cristalinas depende não só da quantidade de substância
cristalizada, mas também da velocidade de cristalização que pode condicionar a sua estrutura.
Compreende-se, mesmo, que ao formarem-se esses cristais a velocidade de secagem tenha
importância decisiva na coesão operada, pois uma secagem lenta leva a que os cristais cresçam
livremente, enquanto que uma secagem rápida produz cristais de mais diminutas dimensões.
Finalmente, pode operar-se a formação de pontes sólidas por deposição de
partículas coloidais que se encontram em dispersão no líquido de granulação.
Ao dar-se a evaporação desse líquido, as substâncias em dispersão são
transportadas para os pontos entre as partículas de pó e aí mantidas por forças
capilares. Depois da secagem, as partículas ficam ligadas entre si por forças
moleculares associadas, algumas vezes, a camadas de adsorção ou a forças
electrostáticas.
A Fig. 262 é um diagrama que explica o efeito das forças eléctricas sobre as
partículas de pequenas dimensões. Fig. 262. Efeito das
Na ausência de líquidos, portanto numa granulação a seco, são eléctricas forças
sobre
particularmente as forças de atracção molecular as responsáveis pela adesão partículas
das partículas entre si. Entretanto, enquanto que as forças de atracção do tipo valência quase não
afectam o processo, são principalmente as forças de V AN DER WAALS que permitem a ligação entre as
partículas, designadamente sempre que estas estejam a distâncias da ordem de 1000 Ã. Com efeito,
pode gerar-se certa carga electrostática devida à fricção das partículas, ou formar-se durante a
redução de tamanho destas, ou ainda ser proveniente da fixação de materiais iónicos na superfície
daquelas. Por outro lado, a par desta indução de dipolos, há que lembrar a possibilidade da
formação de pontes de hidrogénio (o que ocorre em muitos compostos, como os álcoois cetflico e
estearílico, o ácido bórico, etc.) e ainda o facto de certas formas ressonantes dos compostos poderem
exibir uma ligação dipolo-dipalo, como acontece com o ácido benzóico.
710

Na Tabela LXXVIII indicam-se, para vários tipos de compostos, os géneros de ligações


intermoleculares que correntemente exibem.
Tabela LXXVIII. Ligações intermoleculares correntemente exibidas por diversos
compostos

Principal
Grupo Exemplos tipo de
funcional Ac. cítrico, nicotínico, ligação
Ácido esteárico, Pontes de
tartárico,
Álcoo acetilsalicílico Inositol, Pontes de
l álcool estearílico, hidrogénio
Fenol sorbitol Fenol, ou dipolo-
Amida resorcina, timol
Acetamida, dipolo
Amina nicotinamida, ureia, » »
Aldeído fenacetina dipolo-
Cetona Codeína, morfina, dipolo
Éster glicina Hidrato de
Halogénio

As forças intermoleculares de natureza electrostática apresentam níveis energéticos relativamente


baixos quando comparados com as forças de atracção interatómicas, pois cifram-se entre l e 10
Kcal. mole~'. A sua intensidade pode ser determinada recorrendo às equações seguintes:

F =A.
- D (quando a < 1000 À)
24.
a2
F=- (quando a > 2000 Â)
B.

em que A e B são constantes características do material, D é o diâmetro das partículas e a é a


distância média entre elas.
Como se compreende, estas forças adquirem valor muito mais elevado à medida que as partículas
se aproximam, acontecendo que sempre que a distância entre elas seja inferior a 100 Ã, o que pode
suceder após a compressão, a atracção seja bastante notória. Este fenómeno constitui o fundamento
da interpretação teórica de MARSHALL acerca da compressão. Segundo este autor, a formação de um
comprimido deve-se a uma diminuição da energia livre de superfície do pó ou granulado,
correspondendo, pois, a uma redução do grau de heterogeneidade do sistema bifásico, que passaria a
apresentar algumas das características dos corpos sólidos.
711

MARSHALL designa o processo de obtenção de um comprimido por compactação e considera-o


dividido em duas fases: a compressão, durante a qual ocorrem fenómenos físicos de diferente
natureza dos quais resulta uma maior aproximação entre as partículas e um aumento do grau de
contacto entre elas, e a consolidação, em que a energia livre de superfície das partículas sólidas
diminui devido à formação de ligações sólido-sólido.
A primeira fase da compressão corresponde à redução da quantidade de ar existente entre as
partículas do pó, o que se processa com maior ou menor facilidade consoante diversos factores,
designadamente a forma cristalina e a granulometria por ele apresentada.
Com efeito, vimos atrás que a compressão directa de pós depende em larga medida do seu sistema
de cristalização, podendo dizer-se que os pós cristalizados no sistema cúbico têm largas
probabilidades de serem directamente compressíveis. Na realidade, todos os cristais que apresentem
um número importante de faces planas e arestas vivas, reunidas em conjuntos mais ou menos
compactos, comprimem melhor do que os cristais que exibem uma forma tendente para a esfera, em
que é mínima a relação superfície/volume. Em virtude do que se disse, é compreensível que as
substâncias que apresentam densidades aparentes superiores a l, ou seja, as substâncias cuja forma
cristalina se aproxima da esfera, sejam, em regra, dificilmente compressíveis.
Por outro lado, os materiais a comprimir são geralmente misturas de pós que, com relativa
frequência, foram submetidos a uma pulverização. Deste modo, as partículas apresentam uma
configuração irregular, pelo que originam empilhamentos desordenados e que contêm, ainda, uma
determinada quantidade de ar. Todavia, e no que diz respeito à granulometria, é importante lembrar
que nem todas as partículas do pó têm o mesmo diâmetro. Assim, o grau de desordem do
empilhamento é em certa medida compensado pela existência de partículas de menores dimensões
que, colocando-se nos espaços livres existentes entre as mais volumosas, promovem uma melhor
eliminação do ar e tornam o material a comprimir mais compacto.
Ainda a propósito da granulometria, parece que seriam as partículas com diâmetros médios
superiores a 420 ujn as que melhores resultados dariam no que diz respeito a uma mais forte coesão.
Segundo LAZARUS e LACHMAN, seria útil uma percentagem de 75% de partículas de pó de diâmetro médio
superior a 420 um para que a compressão decorresse em boas condições. Estes autores chamam, porém,
a atenção para o facto de se conseguir maior resistência com partículas pequenas sempre que a
compressão se exerça sobre cristais simples.
Na prática, pode dizer-se que, em regra, as partículas com diâmetros médios compreendidos entre
2000 e 250 |im (10-60 mesh) comprimem bem, encontrando-se já dificuldades se os diâmetros se
situam entre 250 a 75 |im (60-200 mesh).
Após a ocorrência do já referido rearranjo espacial das partículas, manifestam-se, devido ao
progressivo aumento da força de compressão exercida, alterações significativas da respectiva
configuração. Assim, as que são predominantemente plásticas ou elásticas deformam-se, adaptando a
sua forma à das partículas anexas. Nestas circuns-
712

tâncias, ao aumento da superfície específica corresponde, também, um acréscimo do grau de


contacto entre elas. Paralelamente, a deformação do material é acompanhada pela eliminação, em
maior ou menor grau, do ar existente no interior das próprias partículas, ou seja, verifica-se também
uma diminuição da já reduzida porosidade do pó ou granulado. Na realidade, a porosidade dos
materiais a comprimir é outra importante questão a pôr em relação à força de coesão apresentada
entre as partículas, reflectindo--se na dureza final do comprimido. De facto, quanto mais poroso for
um material mais difícil se toma a coesão e menos resistentes ficam os comprimidos com ele obtidos.
Mas nem todos os materiais sofrem deformação quando submetidos à acção de uma força exterior.
De facto, é habitual considerar um segundo grupo de produtos que, ao contrário dos anteriores, são
rígidos e dificilmente deformáveis. Estes compostos manifestam maior tendência para a rotura, pelo
que o aumento do grau de contacto entre as partículas é conseguido à custa da respectiva fractura. E
do mesmo modo que na primeira fase, de empilhamento e reordenação, as partículas de menores
dimensões desempenham um papel fundamental, também nesta segunda fase se lhes atribui uma
acção relevante, já que apresentam, por si só e independentemente das características do produto,
elevado grau de plasticidade.
Em resumo, durante a compressão as superfícies dos grânulos ou das partículas do pó
aproximam-se entre si tanto por redução de tamanho como por deformação plástica, sendo este
fenómeno acompanhado pelo aumento da superfície específica das partículas (relação entre a
superfície e a massa das mesmas). Esta grandeza afecta, em certa
medida, a facilidade de compressão e a resistência do comprimido
obtido. Assim, HIGUCHI observou que a progressiva compressão
de pós ocasiona uma elevação da superfície específica até um
valor máximo, passando esta a diminuir com a continuação do
aumento da pressão. Na Fig. 263 mostram-se claramente as
relações aludidas.
A principal consequência do aumento do grau de contacto
entre as partículas é a diminuição da energia livre de
superfície do pó resultante da criação de ligações sólido/sólido.
A natureza destas interacções depende das características do
próprio pó, mas sabe-se actualmente que a coesão e/ou
adesão das partículas se deve
às ligações de Van der Waals. Todavia, os compostos iónicos
Fig. 263. Influência da pressão constituem uma excepção, pois apresentam simultaneamente um
sobre a superfície específica de
partículas de ácido efeito de polarização superficial.
acetilsalicílico, lactose e sua
mistura.
A facilidade de agregação das partículas depende ainda, e à
Segundo T. Higuchi et ai — J. semelhança do que referimos a propósito da granulação a húmido,
da possibilidade de formação de pontes sólidas resultantes da fusão parcial de alguns compostos, ou
da cristalização de substâncias dissolvidas quer no líquido de aglutinação, quer na própria humidade
residual do produto. A este propósito, refere-se que as pressões elevadas exercidas em alguns
713

pontos do comprimido podem originar um aumento da solubilização. Na realidade, a humidade


desempenha uma acção importante na agregação das partículas de um pó, pois sabe-se que a
inclusão de compostos hidrossolúveis numa determinada fórmula facilita a obtenção de
comprimidos.
Por outro lado, se as partículas tiverem algum revestimento superficial devido a adjuvantes,
atraem-se melhor depois da pressão sofrida, uma vez que essas películas são penetradas pelas
arestas dos cristais e simultaneamente se geram cargas devidas ao deslizamento e à fricção operada
entre os pós ou granulados e as paredes da matriz. Do mesmo modo, pode aqui haver factores
mecânicos que condicionem uma mais forte ligação entre as partículas, pois certos adjuvantes, como
as celuloses modificadas, originam uma estrutura esponjosa ou fibrosa que retém as partículas
mediante o entrelaçamento de filamentos.
As observações assinaladas podem explicar-se pelo aumento da superfície específica Resultante
da criação de novas superfícies devido ao esmagamento cristalino. Já a diminuição da superfície
específica a partir de certos valores de pressão só se compreende admitindo a adesão das partículas
por influência das forças de Van der Waals.
Assim, para cada tipo de partículas deverá existir uma pressão crítica em que são máximas as
forças de adesão e coesão.
A Tabela LXXIX indica várias características físicas dos pós, entre as quais a sua densidade
aparente. Depreende-se da sua observação o interesse que apresenta a escolha da variedade
comercial mais adequada a cada caso.
Tabela LXXIX. Características físicas de alguns pás relacionadas com a sua
facilidade de escoamento
Densidade
aparente Escoamento do distribuidor
3
Produto (g- (-'m- ) Tipo de pó para matrizes
Amido de 0,56 Muito fluído Pode diminuir a facilidade de escoa-
trigo mento por ser higroscópico.
Bicarbonato 0,96 Coeso e fluído Pode diminuir a facilidade de escoa-
de sódio 1,08 Grânulos uniformes mento por ser higroscópico.
Carbonato de 0,92 Coeso e fluído Fraco escoamento quando proveniente
cálcio 0,36 Coeso de pacotes.
Caulino 0,48 Ruído Fraco escoamento quando proveniente
de pacotes.
Cloreto de 1,10 Grânulos uniformes ou Forma aglomerados com humidade
sódio grânulos fluídos e pó relativa de 40-50%.
Fosfato de 0,99 Grânulos uniformes Material pulverulento.
cálcio 1,31 Grânulos muito fluídos Pode diminuir a facilidade de escoa-
mento por ser higroscópico.
Hidróxido de 0,56 Fluído Material pulverulento e higroscópico.
f magnésio
Óxido de 0,56 Coeso Muito fraco escoamento quando pro-
titânio veniente de pacotes.
Talco 0,67 Fluído Bom escoamento e excessiva pulveru-
0,19 Fluído e coeso lência nas duas variedades.
714

.2.1.2.4.1.2. Comportamento do material elástico ou plástico a comprimir


Ao dar-se a compressão observa-se que Iodos os materiais a comprimir estão sujeitos a
apresentarem alguma deformação do tipo elástico, tendendo a retomar a forma inicial logo que cesse
a pressão sobre eles exercida. Assim, num material com comportamento estritamente elástico,
observa-se que após a compressão houve retomo à forma e volume originais, não tendo qualquer
espécie de importância as forças de ligação que se formaram durante a compressão. Felizmente, este
caso extremo, que pode ser exemplificado com partículas de antracite ou de poliestireno, é
extremamente raro, havendo, em regra, deformação do tipo plástico ao dar-se a compressão.
De acordo com SF.TH, que citamos através de CAVACO, podemos classificar como se segue o
comportamento das partículas durante a compressão:
1.°—Comportamento elástico ideal sempre que os produtos submetidos à compressão diminuem
de volume, retomando-o logo que aquela cessa;
2." — Comportamento plástico ideal quando o produto comprimido conserva o volume que
apresentava no momento em que se deu a compressão máxima;
3.°—Comportamento misto — plástico-elástico — quando após a compressão o produto retoma
facilmente o volume inicial;
4.° — Comportamento de deformação lenta (fluage) quando as substâncias só apresentam uma
redução instantânea de volume no início da compressão, reduzindo-se este,
progressivamente, à medida que aquela decorre.
Como se deduz do que se escreveu, as substâncias muito dificilmente com-
pressíveis têm um comportamento predominantemente elástico, enquanto que as que são
facilmente compressíveis apresentam evidente deformação do tipo plástico. Compreende-
-se, também, que para certas substâncias que exibam apreciável comportamento elástico
possa dar-se o descabeçamento dos seus comprimidos, pois as forças de coesão entre
os estratos constituintes daquelas não se opuseram suficientemente à tendência do pó
para retomar o seu volume inicial. -•

7.2.1.2.4.2. Máquinas de compressão

Quando se trabalha em pequena escala, como no domínio da oficina de farmácia,


podem utilizar-se máquinas compressoras manuais, de que existem vários modelos
fabricados, por exemplo, na Bélgica (Atelier de Construction Paret), na Inglaterra
(Manesty Machines, Ltd.), na Alemanha (Graefen; Hans Blache, Furbinato
G.M.B.H.), etc. -
715

Já a indústria farmacêutica só utiliza máquinas automáticas, as quais são de dois tipos: máquinas
de excêntrico, as mais utilizadas, e máquinas rotativas, empregadas apenas para grandes produções.
Máquinas de excêntrico ou alternativas — As mais simples são constituídas por dois punções, um
inferior e outro superior, por uma câmara de compressão ou matriz, cujo fundo é formado pelo
punção inferior, e por uma peça móvel distribuidora do pó, vulgarmente denominada tolva, tremonha
ou distribuidor. Os punções e matrizes são de aço temperado especial e algumas vezes o punção
superior tem gravado o nome do laboratório ou o do medicamento a preparar.
As Figs. 264 e 265 representam duas máquinas de excêntrico. O trabalho destas máquinas para
fabricar um comprimido compreende quatro tempos principais, cuja descrição retiramos, com a
devida vénia, de um trabalho de BOUVET:
«No primeiro tempo, encontrando-se os dois punções afastados ao máximo, o distribuidor desliza
entre os punções, sobre a mesa da máquina, e, passando por cima da matriz, enche o espaço criado
pela descida do punção inferior com o produto a comprimir.

Fig. 264. Máquina de excêntrico, manual (Manesty)


Fot. Abel Roldão
Flg. 265. Máquina de excêntrico
716

No segundo tempo o distribuidor retira-se rapidamente para trás ou para o lado, segundo os
casos, enquanto o punção superior desce e o inferior se conserva imóvel, dando-se então lugar à
compressão.
No terceiro tempo o punção superior sobe e o punção inferior eleva o comprimido até ao nível da
mesa da máquina.
No quarto tempo o comprimido é empurrado para o sistema de evacuação pelo bordo da peça
móvel e, como durante este tempo o punção inferior tomou a sua posição mais baixa, o granulado
pode novamente encher a matriz, recomeçando o ciclo».
Na máquina de excêntrico o movimento vertical alternativo do punção superior é assegurado por
um sistema inteiramente comparável ao que, num motor de explosão, acciona o pistão por meio de
uma biela. Na sua extremidade inferior está fixado o punção superior, que equivale ao pistão. O
sistema de excêntrico foi escolhido porque é o único, neste tipo de máquina, que permite uma rapidez
de cadência suficiente para um rendimento interessante. O movimento do punção inferior é
comandado por um sistema de «alavancas».
A Fig. 266 (I e II) esquematiza as operações mencionadas.

vü éS\
ti

Fig. 266-1.
Movimento dos
punções durante a Fig. 266-11.
compressão Movimento do
A = formação da câmara distribuidor
de compressão durante a
B = carga compressão
C = compressão 1 e 2 — Carga; 3 —
D = expulsão Compressão; 4, 5
e 6— Expulsão

Naturalmente que é necessária uma forte compressão para que os pós ou os granulados
aglutinem e originem um comprimido. Em média, a pressão necessária para obter um comprimido
vulgar é de 1500 a 2000 quilos por cm2. As máquinas de excêntrico são susceptíveis de exercerem
pressões muito superiores, o que traduz a sua potência. Há, frequentemente, máquinas cuja potência
é de 40-50 toneladas.
Como o esforço de compressão é exercido durante um período de tempo muito curto e o volante
da máquina armazena energia, a força absorvida pela máquina é de poucos cavalos-vapor
(geralmente 4 ou 5 C.V.).
717

O número de punções é muito variável, havendo máquinas com 10 ou mais punções (5 inferiores
e 5 superiores) e, como se compreende, o diâmetro destes varia em razão inversa com o seu número.
A cadência destas máquinas anda geralmente à roda de 60 a 90 compressões por minuto e o seu
rendimento, ou seja o número de comprimidos obtidos por minuto, é igual ao produto da cadência
pelo número de punções (cerca de 5000 comprimidos/hora por cada par de punções).
Estas máquinas têm normalmente um compensador, quer dizer, um sistema destinado a evitar a
blocagem da máquina quando a pressão é superior à potência disponível. Geralmente, é constituído
por uma simples mola, cuja tensão é regulada para a potência máxima; quando esta é ultrapassada,
a mola absorve o excesso de pressão. O sistema compensador pode ainda ser constituído por um
pistão que repousa em óleo, que se esvazia quando haja blocagem da máquina. Há ainda máquinas
em que a compensação é constituída por um pistão repousando em óleo ou em água, sobre o qual há
ar comprimido. Quando, porém, não há compensador, evita-se a blocagem fazendo rodar a máquina,
à mão, em sentido contrário.
Para utilizar a máquina começa-se por fazê-la girar, à mão, observando-se se todas as peças
deslizam sem atrito. Fazem-se depois alguns comprimidos, determinando-se o peso médio sobre 20
unidades. Se este não estiver certo, regula-se a posição do punção inferior até que o peso do pó ou
do granulado admitido na matriz seja o exigido. Uma vez acertado o peso, regula-se a compressão,
fazendo-se variar a posição do punção superior.
Existem no mercado diversos tipos de máquinas de excêntrico: Courloy, Frogerais, Beloni, Stokes,
etc.
Máquinas rotativas — Nestas máquinas os punções inferiores e superiores, assim como as
matrizes, são montados face a face sobre a mesma coroa circular, animada de movimento contínuo
sempre no mesmo sentido. Durante uma volta efectuam-se os seguintes movimentos:
— Num determinado ponto da coroa circular tem lugar a compressão, mas, nestas máquinas, o
comprimido resulta de uma pressão gradual exercida nas duas faces e não de uma força brusca
aplicada unicamente de cima para baixo, como acontece nas máquinas de excêntrico. Desta
progressividade da compressão resulta um comprimido com uma estrutura mais homogénea e que
ficará com menos ar retido entre os seus poros.
— Seguidamente, o punção inferior levanta o comprimido, que é expulso um
quarto de volta depois. Em seguida o punção inferior baixa e, num ponto diametral
mente oposto àquele em que se produz a compressão, tem lugar o enchimento. Entre
tanto, o punção superior já se elevou de modo a passar por cima do distribuidor fixo,
voltando os punções a aproximarem-se progressivamente para realizar a compressão
máxima no fim da volta, e assim por diante. ,
718

Habitualmente, estas máquinas têm 16 matrizes e 32 punções e apenas um distribuidor. Tal como
nas máquinas alternativas, cada matriz pode estar ainda preparada para receber mais do que um par
de punções.
Uma máquina rotativa pode chegar a ter 2 a 3 distribuidores e 40 jogos de punções e matrizes,
dando a coroa circular cerca de 10 voltas por minuto (15 a 20 em alguns casos). Por isso os
rendimentos chegam a atingir 100000 comprimidos por hora e mesmo mais (até 250000 em modelos
aperfeiçoados, como nalgumas máquinas construídas pela firma norte-americana F. J. Stokes
Machine Company).
A potência despendida é menor do que nas máquinas alternativas, sendo
habitualmente de 5 a 10 toneladas.
No comércio encontram-se máquinas rotativas que permitem fazer a
compressão em dois pontos (rotativas duplas) tal como esquematicamente se
indica na Fig. 267. As máquinas rotativas têm as seguintes vantagens:
— maior rendimento;
— facilidade de produção de comprimidos de grande diâmetro (até 2 cm);
— enchimento mais fácil das matrizes; ,
— comprimidos mais homogéneos;
Flfl. 267. — eliminação, praticamente completa, das vibrações pela transformação
Movimentação dos
comprimidos numa do movimento alternativo em movimento circular; Entre os inconvenientes
máquina contam-se:
rotativa dupla
—o preço, que é duas a três vezes superior ao de uma máquina de excêntrico;
—impossibilidade de se prepararem comprimidos de formas e dimensões
variadas, atendendo ao tempo que seria exigido para proceder à mudança dos punções e matrizes;
—as cabeças dos punções podem gastar-se de um só lado.
As Figs. 268 e 269 representam máquinas deste tipo e suas fases de trabalho. Entre os principais
tipos de máquinas rotativas citamos: Frogerais (francesa), Courtoy (belga), Stokes e Colton
(americanas), Beloni (italiana), Korsch e Fetle (alemãs) e Manesty (inglesa).
Punções e matrizes — Os punções empregados nas máquinas de compressão são de aço
inoxidável, podendo ter as cabeças cromadas ('). Podem ser de secção circular ou apresentarem
outras formas, como triangular, quadrangular, oval, poligonal, etc. (2).

(') Para casos especiais (comprimidos efervescentes) podem usar-se punções revestidos de
teflon njiitelrafluoroetileno) nas suas superfícies compressoras.
(2) Habitualmente reservam-se os punções circulares para a obtenção de comprimidos destinados
» uso interno, enquanto que os punções de secção angular são preferidos para medicamentos
destinados
a serem usados para aplicação externa. Este princípio, defendido por FRENDENBURG, não sofreu
ainda
ratificação internacional. . -, . . > H :.
(pol
719

Fig. 268. Máquinas rotativas 1—Manesty (16 punções); 2 — Colton de grande


produção

Flg. 269. Pormenor de compressão de uma máquina rotativa


1 — Carretel de alinhamento dos punções superiores; 2 — Peça ligada à mola; 3 —Guia dos
punções superiores; 4 — Punções superiores; 5 —Parafuso de fixação das matrizes; 6 —Punções inferiores; 7
—Plano inclinado para expulsão dos comprimidos; 8 — Guia dos punções inferiores; 9 — Regulação do plano
inclinado
720

Pelo facto de serem mais facilmente manipulados e por ser também mais fácil a deglutição dos
comprimidos, empregam-se normalmente punções de secção circular. A superfície compressora pode
estar gravada com dizeres referentes ao nome da especialidade, laboratório preparador, fim a que se
destina o comprimido (uso interno, externo, hipodérmico, sublingual, etc.), dosagem, etc., mas
habitualmente é polida e lisa, o que facilita a preparação dos comprimidos. A superfície compressora
pode também ser escavada (punções côncavos que se empregam, de preferência, na preparação de
drageias). As matrizes, que também são de aço inoxidável, podem apresentar-se revestidas por
carboneto de tungsténio, material que as torna muito mais resistentes, mas que também lhes eleva
considera-velmente o preço.
As máquinas de excêntrico podem possuir matrizes com um ou mais pares
de punções (matrizes múltiplas). Na Fig. 270 representa-se uma matriz
Fig. 270. Matrizes e punções com três pares e uma outra com sete pares de punções.
O diâmetro dos punções deve estar relacionado com o peso dos comprimidos a obter e, por outro
lado, com a tenuidade do granulado empregue, como já atrás dissemos. Na Tabela LXXX indicam-se
as relações rigorosas entre o peso dos comprimidos e os diâmetros dos punções a empregar.
No caso dos punções serem escavados deve observar-se, ainda, uma relação entre o seu diâmetro
e a sua curvatura. Isto tem especial interesse na fabricação de drageias, como adiante veremos.

Tabela. LXXX. Relação entre o peso dos comprimidos e o diâmetro dos punções
Peso dos comprimidos Diâmetro dos punções
em gramas em milímetros
De 0,06 a 0,10 ••; 6
» 0,10 a 0,12 7
» 0,12 a 0,15 8
» 0,15 a 0,20 9
» 0,20 a 0,30 10
» 0,30 a 0,40 11
» 0,40 a 0,55 12
» 0,55 a 0,70 13
» 0,70 a 0,80 14
» 0,80 a 0,90 15
» 0,90 a 1,00 16
721

7.2.1.2.4.3. Física da compressão


Vimos até aqui que os granulados, certos cristais e, de um modo geral, as partículas dos pós, eram
susceptíveis de se comprimirem quando sobre eles actuasse uma força adequada.
Vimos, ainda, que determinados factores, como o tamanho das partículas, a porosidade, a
presença de aglutinadores e o comportamento plástico ou elástico do material a comprimir
condicionavam o resultado da operação.
Sabemos também que as máquinas compressoras podem produzir pressões mais ou menos
elevadas, mas o valor das pressões exercidas só é apreciado de um modo indirecto e pouco exacto na
maioria desses aparelhos. Com efeito, os fabricantes de máquinas de comprimir limitam-se a indicar
a pressão total que é exercida sobre a base dos comprimidos. Ora, este conhecimento é precioso mas
incompleto e só seria integralmente verdadeiro se se tratasse da compressão de um líquido. Nesse
caso, isto é, se tivéssemos a matriz cheia de um líquido, a pressão exercida pelo pistão repartir-se--ia
uniformemente à sua superfície, de acordo com o princípio de PASCAL. Entretanto, a situação com que
se depara na fabricação de comprimidos é completamente diferente, pois a pressão recebida é
distribuída irregularmente através das partículas sólidas a comprimir. Sendo assim, há diferenças
notórias da distribuição, manifestadas ao nível das paredes da matriz e cabeça dos punções, o que
origina uma diferença na força de coesão dos grânulos, em função dos planos dos comprimidos e
segundo a direcção da força de compressão.
Por outras palavras, se fossem executados ensaios de clivagem nos
comprimidos segundo determinados planos, verificar-se-ia uma desigual
repartição das forças de compressão, havendo zonas mais duras do que Flg. 271. Distribuição
outras. das forças
Em regra, a força global de uma máquina é definida em função da pressão no decorrer da
compressão. Segundo
exercida ao nível do punção superior, de acordo com a figura 271. Essa E. Nelson — J. Am.
pressão (A) distribui-se sobre a matriz (C) e ao longo Pharm. Ass. Sei. ed.,
das paredes desta, onde exerce forte atrito (D), actuando, por fim, sobre o punção inferior (E). Como
este se encontra fixo, constitui um plano de resistência que exerce uma força igual, mas de direcção
oposta. Assim, é compreensível que o comprimido resultante apresente zonas onde a pressão foi mais
forte e outras onde aquela incidiu com menor intensidade. Deste modo, na prática, trabalhando-se com
máquinas de excêntrico, obtêm-se comprimidos em que as zonas de alta pressão se situam à periferia e
na sua parte central.
722

Estudos conduzidos por NELSON et ai. mostraram, para granulados de sulfatiazol, que havia uma
considerável diferença entre a força exercida pelo punção superior e inferior de uma máquina de
excêntrico, a qual era de 1390 Kg e 760 Kg, respectivamente. A adição de estearato de cálcio a 2%, como
lubrificante, reduziu substancialmente as diferenças de força entre os punções, pois estas passaram a ser
de 1010 Kg e 980 Kg, respectivamente. Nestas circunstâncias, estes autores introduziram uma notação
para apreciar o valor de um lubrificante, a qual é dada pela relação:
Pressão máxima (ou força) exercida pelo punção inferior
R
= ———————:——————————————————————————
Pressão máxima (ou força) exercida pelo punção superior
Assim, para um dado sistema a comprimir, o melhor lubrificante terá um valor próximo da unidade.
Na Tabela LXXXI indicam-se valores típicos de R para vários lubrificantes utilizados numa
concentração de 2%. Chamamos a atenção do leitor para a Tabela LXXI (pág. 673), cujos valores
coincidem, como é lógico, com os que agora mencionamos. A acção lubrificante que estamos a
considerar exerce-se, essencialmente, diminuindo o

Tabela LXXXI. Valores médios típicos de R para vários lubrificantes utilizados na


concentração de 2%
Lubrificante R Lubricante K
Estearato de magnésio 0,93-0,95 Álcool cetílico 0,87-0,90
Parafina 0,90-0,96 Monopalmitato de glicerilo 0,89
Estearato de cálcio 0,94 Talco 0,85
Estearato de zinco 0,94 Grafite '-''• 0,83
Monoestearato de glicerilo 0,90 Ácido bórico 0,76
Ácido esteárico 0,90 Amido de milho 0,68

atrito ao longo das paredes da matriz (Fig. 271). Quer isto dizer que grande parte da pressão de
compressão perdida é devida ao coeficiente de fricção (|i) apresentado pêlos pós ou granulados.
Relacionando este coeficiente com a diferença de pressão entre o punção superior e inferior (PA-PE)
e com a pressão transmitida às paredes da matriz (PM), poderemos escrever:

equação que permite calcular o coeficiente de fricção, sabida a pressão exercida pelo punção
superior e conhecidas as pressões suportadas pelo punção inferior e pelas paredes da matriz.
723

Em resumo, compreende-se o efeito lubrificante exercido por certas substâncias, o qual permite
que seja substancialmente diminuída a diferença de pressões entre os dois punções de uma
compressora. Por outro lado, é também compreensível que essa acção seja mais eficaz se o
lubrificante existir na superfície interior da matriz do que sob a forma de adjuvante no seio do pó
a comprimir. Os primeiros estudos efectuados neste domínio devem-se a BRAKE, em 1951, e foram
continuados por HIGUCHI e colaboradores (1954), GAGNON, MARKOWSKI e NELSON, sendo objecto de
algumas dissertações de doutoramento nas Universidades de Purdue e de Wisconsin.
Actualmente, há, no comércio, aparelhagem destinada a efectuar as aludidas determinações, a
qual quase sempre recorre à transformação das pressões em fenómenos eléctricos, cuja
intensidade se aprecia facilmente. Os transdutores (') utilizados são fundamentalmente de dois
tipos, podendo detectar quer as alterações da resistência ocorridas em pequenos filamentos
metálicos (transdutores de resistividade), quer a corrente eléctrica resultante das modificações da
estrutura cristalina de certas substâncias, como o quartzo, provocadas quando
sobre elas se exerce uma força Resistência (transdutores piezoeléctricos).
HIGUCHI, nos primeiros trabalhos que realizou sobre
eléctrica -
Punção inferior este
Cavidade doMatriz - assunt
punção o,
inferior utilizo
u
Resistência eléctrica transd
utores
de
Fig. 272. Conjunto de resisti
ligações necessárias para vi-
apreciaçãr dos fenómenos
compressivos efectuados dade.
pelo punção superior de uma
máquina de excêntrico e Com
suportados pela punção efeito,
se intercalarmos resistências eléctricas inferior (slrain
gauge), constituídas por um enrolamento Segundo E. Shotton e D. em fio
metálico protegido por papel, na base dos punções, aquelas sofrem
deformações consecutivas à pressão exercida, pois a deformação
elástica dos punções durante a compressão influi no comprimento e
diâmetro do fio das resistências. Assim, esse fio diminui o seu
comprimento, aumentando paralelamente o respectivo diâmetro, o que
provoca uma diminuição da resistência eléctrica. A variação da
resistência eléctrica é apreciada por meio de uma ponte de WHEATSTONE
ligada a um osciloscópio ou oscilógrafo. A Fig. 272, retirada de um
trabalho de SHOTTON e GANDERTON, mostra a localização da aparelhagem de
medida da pressão.
Se uma matriz de máquina de excêntrico for perfurada lateralmente, tendo ligada a essa
perfuração uma resistência para apreciação do esforço de fricção a que está

(') Um transdutor é um dispositivo que converte, proporcionalmente, uma grandeza física numa
outra que seja mais facilmente medida e detectada.
724

submetida a sua parede, pode apreciar-se aí a pressão exercida. NELSON indica o esquema de montagem
de um aparelho deste tipo, o qual se reproduz na Fig. 273. A aplicação destas noções a uma máquina
rotativa, possuindo um número elevado de punções, torna-se complexa, embora tenha sido realizada por
SHOTTON e GANDERTON, de acordo com a Fig. 274. Posteriormente, KNOECHEL et ai, aperfeiçoaram a
maquinaria necessária para determinar, em rotativas Stokes, as forças de compressão nas matrizes e as
forças de ejecção dos comprimidos dessas mesmas matrizes.

çao "V

eri
or
_JF!
çãc Katri
eric
r r —<5 l|l|————
Fig. 273. Dispositivo
para determinar as
pressões transmitidas à Fig. 274. Diagrama
matriz e punções representando a
numa máquina de aplicação a máquinas
excêntrico rotativas das
noções expostas.
Segundo E. Shotton, J.
J. Deer e D. Ganderton
— J. Pharm. Pharmac.,
15, 106T. 1963
A Fig. 275 reproduz uma máquina Stokes, modelo BB 2-27, rotativa, e nela se vê um osciloscópio &
as ligações necessárias para todo o controlo, segundo aqueles autores

Fig. 275.
725

Os transdutores de resistividade apresentam, contudo, alguns inconvenientes. Assim, são sensíveis


às variações de temperatura e à deformação das peças da máquina eventualmente ocorridas durante
a compressão, pelo que são, em regra, instalados aos pares. Além disso, e uma vez acoplados,
passam a fazer parte integrante do jogo de punções/matriz utilizado, o que torna a montagem
praticamente irreversível.
Os transdutores piezoeléctricos, pelo contrário, não são sensíveis às variações da temperatura ou
à deformação mecânica. Por outro lado, são facilmente instalados e a montagem não é irreversível,
podendo ser aplicados, sucessivamente, a vários jogos de punções/matriz. Adaptados pela primeira
vez por MARSHALL a este tipo de determinações, os transdutores piezoeléctricos têm vindo a gozar de
um reconhecimento cada vez maior e constituem, de facto, o método de avaliação das forças de
compressão mais utilizado actualmente.
Como referimos já, os sinais eléctricos emitidos pêlos transdutores são amplificados e, em
seguida, detectados em osciloscópios ou oscilógrafos. Este processo de detecção tem vindo a ser
progressivamente substituído, com vantagem, pela visualização e registo dos sinais eléctricos num
microcomputador, para o que basta intercalar um conversor de sinal analógico em digital entre o
amplificador e o microcomputador. Na Fig. 276 apresenta-se um esquema deste tipo de montagem,
no qual T é o transdutor, A o amplificador, C o conversor de sinal e M o microcomputador.

Fig. 276. Montagem utilizada no registo e medição das forças de compressão

O recurso ao tratamento electrónico dos sinais emitidos permite ainda, para além da
determinação das forças máximas de compressão, detectar e registar os sucessivos valores de força,
crescentes e decrescentes, ocorridos durante a preparação de um comprimido. Assim, e utilizando um
software adequado, é possível obter gráficos como o indicado na Fig. 277, ou seja, os denominados
ciclos de compressão força/tempo, a partir dos quais se pode determinar, segundo JONES, 5 intervalos
de tempo diferentes:
TC —tempo de consolidação;
TM — tempo de aplicação da força máxima ou «dwell time»;
TF — tempo de contacto com a força de compressão;
TP —tempo de permanência do comprimido na matriz e .j
TE —tempo de ejecção. , .,.,
726

Os ciclos de compressão força/tempo apresentam características próprias para cada tipo de material,
quer no que diz respeito à configuração da curva, quer relativamente ao valor dos diferentes períodos.
Assim, sabe-se que o tempo de aplicação da força máxima de compressão (TM) se reveste de
particular importância na obtenção de comprimidos dotados do adequado grau de coesão, pois a
deformação das partículas sólidas depende do tempo de actuação da força. Nestas circunstâncias, os
comprimidos
produzidos a alta velocidade e obtidos a
partir de substâncias predominantemente
plásticas são habitualmente pouco resisten
tes, ao passo que a resistência dos com
primidos preparados a partir de materiais
rígidos não é praticamente afectada pela
variação da cadência da máquina. O ácido
acetilsalicílico é um composto plástico e
facilmente deformável, e Prrr e NEWTON
verificaram, em trabalho recente, que as
TF i : TE propriedades dos comprimidos que o con-
i__ip ____1 tinham dependiam significativamente do
ritmo da compressão.
Flg. 277. Períodos do ciclo de compressão o fr do dos dclos de cornpressão
força/tempo " . .
força/tempo e a avaliação dos respectivos
períodos fornecem indicações úteis para a
análise do comportamento dos materiais durante a compressão. No entanto, existem ainda outras
determinações cujo contributo para o estudo daquele fenómeno se pode considerar de extrema
importância. Assim, recorrendo aos denominados transdutores de deslocamento é possível medir a
progressiva deslocação, descendente e ascendente, do punção superior de máquinas alternativas durante
um ciclo de compressão, e relacioná--la com a variação da força exercida durante esse mesmo ciclo.
Obtêm-se, assim, as curvas de compressão força/deslocação que, por representarem valores de força
exercida pelo punção superior num determinado espaço por ele percorrido, têm sido utilizadas para
comparar as energias dispendidas durante a preparação de um comprimido.
A Fig. 278 representa uma curva de compressão força/deslocação que, como se pode verificar, é
constituída por três curvas e um segmento de recta. O ponto B é fixado pelas coordenadas
correspondentes à deslocação máxima e à força máxima de compressão, e as curvas AB e DB indicam
os valores da força exercida no punção superior durante os movimentos descendente e ascendente,
respectivamente. O segmento de recta CB corresponde à situação teórica da compressão de um material
que apresenta um comportamento plástico ideal, ou seja, que conserva o volume apresentado no
momento da compressão máxima. Finalmente, a curva EB relaciona a força exercida no punção inferior
com o movimento descendente do punção superior.
A partir das curvas de compressão força/deslocação é possível determinar vários valores de áreas
sob a curva que permitem comparar as energias dispendidas durante ?
727

obtenção de um comprimido. Assim, a área da zona compreendida entre os pontos A, B e C


representaria a energia total fornecida pelo punção superior (Es), ou energia bruta. DOELKER
considera, ainda, várias subdivisões daquele valor e relaciona-as com os diferentes tipos de energia
gastos durante o processo. Assim, a área EBC corresponderia à energia transmitida ao punção
inferior (E^; a área ABE, que é numericamente igual à diferença entre Es e E,, equivaleria à energia
gasta, durante a compressão, para vencer o atrito manifestado entre as paredes da matriz e o
material a comprimir; a energia de expansão (Eg^), armazenada sob a forma de energia elástica
pelo comprimido e que é libertada na primeira fase do movimento ascensional do punção superior,
seria representada pela área DBC; finalmente, a energia realmente dispendida na formação do
comprimido, designada por energia líquida aparente (E,^), corresponderia à área ABD.

Deslocação (mm)
Flg. 278. Curva de compressão força/deslocação

A aplicação prática das determinações acima referidas tem muito interesse na formulação de
comprimidos, já que permite analisar e comparar, do ponto de vista quantitativo, muitos dos
problemas com que se depara o farmacêutico formulador. A este propósito, citamos ainda uma outra
característica mensurável, o índice de Plasticidade (IP). Este índice, proposto por STAMM e MATHIS, é
calculado a partir da fórmula

IP=100x—— =100x s ^3tp


: E E
" --- ' '••-• s s . . . .
em que E,^, Es e Ej^, correspondem às áreas sob a curva das zonas DBC, ABC e ABE,
respectivamente. Trata-se, como o próprio nome indica, de uma avaliação das características de
plasticidade (e, indirectamente, da elasticidade) do material a comprimir.
728

As curvas de compressão força/deslocação podem ser registadas directamente, através de montagens


complexas e de um software adequado, como o utilizado por CASAHOURSAT et ai. No entanto, podem
também ser elaboradas manualmente a partir das curvas de compressão força/tempo, já que a relação
entre a deslocação do punção superior (d) e o tempo (t) se pode considerar praticamente parabólica,
exprimindo-se segundo a equação
d = a + b.t + c.t2 ;
• :!"*'• : '' ''•'• "''
em que a, b e c são constantes. "'-' •' l
GOMEZ AMOZA descreve um processo simples e expedito para calcular as constantes a, b e c
conhecendo, apenas, os valores do tempo e da deslocação no momento em que se exerce a força
máxima de compressão. A determinação do tempo e da deslocação só se deve iniciar quando o
punção superior, no seu movimento descendente, rasa a matriz. Deste modo, a constante a é nula,
pois a deslocação do punção é nula para um valor de tempo igual a zero. Por outro lado, a
deslocação máxima (dm) corresponde ao tempo (tm) em que se exerce a força máxima de compressão.
Além disso, para um valor de tempo duplo de t o punção deverá estar novamente a rasar a matriz,
pelo que o valor da deslocação é nulo. Obtêm-se, assim, as equações

dm = b. tm + c (tm)2 • :
e i •, •; •
o = b. 2t + c (2t )2
a partir das quais é possível calcular os valores das constantes b e c, e definir a
equação correspondente ao movimento do punção.
A variação da porosidade de um pó ou granulado durante um ciclo de compressão
é outra determinação a partir da qual se pode caracterizar o material a comprimir. De
facto, a eliminação do ar inter e intragranular constitui, como já tivemos
ocasião de referir, uma das fases mais importantes do processo da
compressão e ocorre, segundo TRAIN e . MARSHALL, em 4 fases. Como se
pode observar na Fig. 279, a primeira fase (I) é rápida e o decréscimo da
porosidade é acentuado, admitindo-se que nela ocorre apenas o reor-
denamento espacial das partículas e a formação de estruturas sólidas em
coluna ou em abóbada. Em seguida (II), e devido à resis-tância oposta
por essas estruturas ao aumento da pressão, a diminuição da porosidade
não é tão acentuada. Admite-se também que,

Los f
Fig. 279. Variação da
porosidade
durante a
729

nesta altura, o material apresenta um comportamento elástico. Todavia, a partir de um determinado


valor de força ocorre a destruição daqueles empilhamentos e o material passa a apresentar
características plásticas (ITT). Nesta fase, a diminuição da porosidade é acentuada e relaciona-se
linearmente com o logaritmo da força de compressão. Finalmente, no último período (IV) é a própria
estrutura sólida já consolidada que é comprimida.
A relação entre a variação da porosidade (E) e a pressão aplicada (P) traduz-se pela equação de
HECKEL, cuja expressão matemática é

l
log —= K P + K, E
em que Ky e Kx são constantes.
A pressão (P) é calculada a partir do valor da força exercida (F), aplicando a equação
4 F P=-
71 D2
em que D é o diâmetro do comprimido.
Por outro lado, conhecendo a massa (m) e o diâmetro (D) do comprimido, a densidade real (dr) do
produto a comprimir e a respectiva altura (H) num determinado ponto da compressão, pode calcular-se a
porosidade (E) do produto recorrendo à equação
/ 4m s
E = 100 (l --
dr 7t D2 H' :... .-.:. -. •,-:•
A densidade real (dr) do pó ou granulado pode ser avaliada a partir da massa e das dimensões de
um comprimido para cuja preparação se utilizou uma elevada força de compressão, podendo
admitir-se, por isso, que a respectiva porosidade é nula. Por outro lado, sabendo a altura da câmara
de compressão e o valor da deslocação do punção superior, determina-se a altura (H) da massa a
comprimir num determinado ponto do ciclo de compressão.
Os gráficos de HECKEL são obtidos relacionando, num sistema de eixos coordenados, o inverso da
porosidade com o logaritmo da pressão exercida, e fornecem indicações acerca do comportamento do
material durante a compressão. Como se pode observar na Fig. 280, a natureza do pó ou granulado
condiciona a configuração final do gráfico, pois os produtos plásticos e deformáveis apresentam uma
fase inicial rápida, correspondente ao reordenamento espacial das partículas, à qual se segue uma
diminui-
730

cão lenta e progressiva da porosidade (curva A). No caso dos materiais rígidos e fragmentáveis, a fase
inicial é mais longa e nela ocorre a eliminação praticamente total do ar, já que, a partir de um
determinado valor de pressão, a porosidade se mantém praticamente constante (curva B). Pode admitir-
se, assim, que estas partículas são pouco deformáveis, processando-se a consolidação do material após
fragmentação e redução da dimensão das partículas.

Ti» A

Flg. 280. Gráficos de Heckel

No sector de Tecnologia Farmacêutica da Faculdade de Farmácia do Porto, idealizámos e aplicámos


um sistema para a avaliação das forças de compressão numa máquina alternativa KORSCH. Os
transdutores piezoeléctricos utilizados são da marca KISTLER e os sinais emitidos, depois de amplificados e
convertidos em sinais digitais, são recebidos num microcomputador AMSTRAD. O software utilizado permite
obter
— os valores das forças máximas de compressão exercidas no decorrer da preparação de um número
determinado de comprimidos e respeitantes a todas as unidades produzidas;
— os valores, crescentes e decrescentes, da força exercida ao longo de vários ciclos de
compressão e
— o registo gráfico dos ciclos de compressão força/tempo.
Além disso, instalámos também, na compressora, um transdutor de deslocamento BOURNS,
permitindo assim determinar a deslocação do punção superior e obter, em seguida, as curvas de
compressão força/deslocação.
731

Na Fig. 281 apresentamos o aspecto geral da montagem, podendo observar-se, na Fig. 282, o
registo de um ciclo de compressão força/tempo. A montagem foi utilizada no estudo comparativo de três
fórmulas de comprimidos contendo dipirona e preparadas segundo diferentes técnicas de fabrico. Os
resultados dos vários ensaios convencionais de verificação de comprimidos não permitiam fazer qualquer
distinção significativa entre as três preparações. Todavia, a obtenção dos valores da força máxima de
compressão e dos ciclos de compressão força/tempo correspondentes a cada uma das fórmulas, assim
como o subsequente traçado das curvas de compressão força/deslocação, permitiu distingui-las e
seleccionar a mais adequada, pois as energias dispendidas na compressão eram notoriamente diferentes.

Fig. 281. Aspecto geral da montagem usada na medição das


forças de compressão

s i i r ; P i i i mir u T l Kba
r tc r p o f p r
r-ü
\
l } l \
/
/
/ l
í
/
i 'l
\y\
/

Fig. 282. Registo de um ciclo de compressão forca/tempo


732

Ao lado destes processos de medida, têm sido descritos outros que se baseiam na variação da
condutibilidade eléctrica de comprimidos contendo grafite, e ainda na determinação da variação da
porosidade dos aglomerados comprimidos a diferentes pressões. Com efeito, a dureza dos comprimidos
depende da área de ligação no interior da massa que sofreu a pressão, o que está relacionado com o
volume relativo (Vr) dos comprimidos e, portanto, com a sua porosidade (e).
Designamos por volume relativo de um comprimido a relação entre o seu volume aparente e o volume
real, o qual é o volume que o comprimido apresentaria se não tivesse poros. Assim, o
Volume aparente V =-
Volume real
pode calcular-se determinando a altura do comprimido em estudo (h), que corresponde ao volume
aparente, e a altura de um comprimido com idêntica área de base, mas em que a força de compressão
fosse tal que se eliminassem todos os poros (ho). Logo
h
V = —— ho
A porosidade (e) do comprimido está relacionada com o volume relativo (Vr) pela seguinte
igualdade:
l
,,,54! , e = l ———

que mostra que à medida que Vr se aproxima da unidade, decresce a porosidade, que será igual a
zero quando V = 1.
É evidente que a equação referida é idêntica à que passamos a escrever, tomando os valores da
densidade aparente e real do comprimido, de acordo com o que se disse a respeito da porosidade (ver
pág. 702).

densidade aparente e = l --
densidade real

Por outro lado, e de acordo com o que deixámos dito, a porosidade será também dada pela
seguinte igualdade:
altura do comprimido à densidade real e= l --
altura do comprimido em estudo
733

Em 1923, WALKER admitiu uma relação entre o volume relativo e a força de compressão (PA)
Vr = C-K. log PA " '-••• ^ •'•'
em que C e K eram constantes.
Por seu turno, BAL'SHIN mostrou existir uma relação entre a dureza dos comprimidos Fc e o seu volume
relativo Vr.

F= Fco V,- • :- > '••


em que F é a dureza do comprimido quando Vr = l, isto é, quando não haja poros no seu interior, e m e uma
constante, particular de cada sistema.
Uma vez que a porosidade aumenta com o aumento do volume relativo, pôde aplicar-se a equação de
RYSHKEWITCH para relacionar a dureza com a porosidade de um comprimido:

Fc = F& exp.-"

em que b é uma constante empírica.


Também HIGUCHI e colaboradores puderam verificar existir uma relação linear entre a dureza e a porosidade
de um comprimido, sempre que esta se situasse entre 5-20 por cento.
Finalmente, KNUDSEN, atendendo às equações citadas e considerando que em termos gerais a resistência do
comprimido aumenta com a tenuidade das partículas, propôs uma nova equação:

'- FC = K.D-. exp.-"*

em que K, a e b são constantes empíricas, e é a porosidade e D é o diâmetro médio das partículas a


comprimir.
Este autor observou que tanto em comprimidos de cloreto de sódio como de hexametilenotetrazoto
(urotropina) a redução do tamanho das partículas incrementava a dureza daqueles para cada valor da
pressão. Entretanto, sempre que a pressão era extremamente alta, observavam-se fenómenos de
descabeçamento dos comprimidos (capping), os quais eram mais evidentes se se empregavam partículas
extremamente pequenas.
A equação de KNUDSEN não pode aplicar-se às substâncias que, como o ácido acetilsalicílico,
apresentam maior dureza individual dos cristais do que a produzida pelas forças de ligação entre eles.
734

De tudo o que se disse, resulta que a dureza de um comprimido é função da porosidade e da força
de compressão. Por outro lado, como é lógico, o comprimido desagregar-se-á na água tanto mais
facilmente quanto mais poroso se apresentar. Para um comprimido de certa porosidade, a velocidade de
penetração dos líquidos é função do diâmetro médio dos poros, cujo valor pode ser calculado pela seguinte
fórmula:

KS
em que D representa o diâmetro médio, e a percentagem dos espaços vazios (porosidade), expressa pela
relação entre o volume médio do comprimido e o volume ocupado pela matéria que lhe deu origem, K
uma constante que, para poros esféricos, é igual a 3, e S a superfície média do comprimido considerada
na sua totalidade,2 correntemente denominada por superfície específica (relação entre a superfície do
comprimido em cm e o seu volume em ml).
A avaliação do diâmetro médio dos poros pode fazer-se recorrendo a processos que se baseiam no
princípio de BECHHOLD, de que falámos na página 82 deste livro.
Recentemente, foi desenvolvido um processo de determinação por LOWENTHAL e BURRUS baseado numa
modificação da fórmula de KOZENY e CARMAN para a filtração (pág. 69). Segundo estes autores, chega-se à
seguinte expressão matemática que relaciona a superfície específica do comprimido (S), expressa em
cm2.!!!!-1, com a porosidade (e), a área (A) da secção horizontal do comprimido e o volume de ar (Q) que
o atravessa no tempo í, sendo L a espessura do comprimido e T| a viscosidade do ar à temperatura da
experiência:
14 AP.A.t e3
S = —— . ————— . ————— z (1)
p T).L.Q (l-e)
AP é a pressão diferencial nas duas faces do comprimido e p é a densidade do pó. Na prática, o
comprimido é colocado num suporte adequado (Fig. 283) procedendo-se à aplicação do vazio cuja
intensidade se determina com um manómetro acopu-lado. À medida que o ar passa através do
comprimido, o que se deve à porosidade que este apresenta, a água desloca-se da proveta numa
quantidade equivalente à quantidade de ar que passou pelo comprimido no mesmo intervalo de tempo.
Este método tem evidentes vantagens sobre os processos em que o comprimido é atravessado por um
liquido, mesmo apoiar, pois este líquido pode sempre dissolver qualquer porção de matéria constituinte
daquele. O diâmetro médio dos poros é dado pela seguinte fórmula:
:_ ' 4 e
D = —— . ———— (2)
S l-e
que não inclui nenhuma constante, como a que citámos anteriormente.
735

LOWENTHAL e BuRRUS apresentam uma expressão final resolvente que engloba as equações (1) e
(2):
~-V-

P.A.t.e

a qual aplicam à determinação do diâmetro médio dos poros dos comprimidos preparados com vários
fármacos e adjuvantes.

Fig. 283. Aparelho para determinar a permeabilidade de um comprimido ao ar

7.2.1.2.5. Preparação dos comprimidos •


Pelo que deixámos dito, e uma vez que a sua fórmula esteja teoricamente bem estruturada, a
preparação de comprimidos não pode ser considerada difícil. Fundamentalmente, trata-se de obter
um pó, a maioria das vezes composto, o qual se granula a seco ou a húmido, segundo os casos. Se a
granulação é executada a húmido há que seguir a técnica de preparação dos sacaretos granulados,
tendo apenas em atenção a escolha do crivo adequado para o peso dos comprimidos a obter. Seco o
granulado, procede-se à sua calibração e, por último, associa-se-lhe o lubrificante ou mistura de
lubrificantes, depois do que se procede à compressão.
Se o granulado é obtido por via seca há que misturar intimamente os pós secos, tamisá-los,
adicionar-lhes ou não parte do lubrificante e comprimi-los, obtendo-se
736

comprimidos cujo aspecto tem pouco interesse, desde que satisfaçam às necessárias condições de
dureza. Esses comprimidos, geralmente grandes (às vezes com vários gramas de peso), são
fragmentados por trituração e o granulado assim obtido é, depois, calibrado e adicionado de
lubrificante. Novamente se comprime, mas, desta vez, havendo a preocupação de obter comprimidos
perfeitos, com as características de peso, resistência e desagregação desejadas.
Uma vez que as operações preliminares da compressão já foram tratadas anteriormente, iremos
agora indicar os passos fundamentais da compressão propriamente dita.
De posse do granulado, lança-se este no distribuidor da máquina que se regula para o peso
desejado, mediante um dispositivo que permite aumentar ou diminuir o curso do punção inferior.
Acertado o peso sobre um certo número de unidades estipuladas pela farmacopeia (20 comprimidos),
passa-se a regular a compressão, o que é susceptível de se executar modificando o curso do punção
superior ('). Com efeito, a compressão depende da distância a que fica o punção superior do inferior
na sua máxima descida e todas as máquinas são providas de um dispositivo que permite encurtar ou
alargar essa distância.
Estas operações são habitualmente conduzidas fazendo a máquina girar manualmente e só depois
dos respectivos acertos se entra no trabalho automatizado, que carece de eventuais correcções. Ainda
durante o trabalho manual convém verificar o tempo de desagregação, o que não dispensa esse
controlo durante a fabricação automática.
São estas, em resumo, as fases da preparação de comprimidos de materiais não directamente
compressíveis. Quando às substâncias directamente compressíveis, pode dizer-se que a obtenção de
comprimidos consiste, fundamentalmente, na compressão. No entanto, é também necessário que o
sólido directamente compressível esteja dividido em partículas de dimensões semelhantes e adequadas
ao tamanho dos punções escolhidos. Por outro lado, é quase sempre indispensável uma secagem
prévia da substância, conduzida a temperatura compatível com a sua natureza.
Dissemos, no início deste subcapítulo, que era fácil preparar comprimidos. Muitas vezes, porém,
sucede que nem todas as regras a observar foram devidamente seguidas ou que tenhamos que
manipular compostos dificilmente compressíveis. É esse o assunto que seguidamente iremos abordar.

7.2.1.2.5.1. Dificuldades na compressão


Já vimos atrás que nem todas as substâncias apresentam a mesma dificuldade ou facilidade em
serem comprimidas. Vimos também que em muitos casos poderia haver

(') Em alguns dos modelos de máquinas (rotativas Manesty) a compressão é regulada fazendo
variar a altura do punção inferior.
737

alterações durante a compressão, quer pelo calor desenvolvido, quer pelo facto de se ter exagerado a
força de compressão, etc.
Os atritos, que tantas vezes se verificam, constituem, contudo, a principal dificuldade a vencer
quando se fabricam comprimidos em larga escala.
Assim, durante a compressão, podemos observar a formação de sticking (conjunto do binding e
do picking), o que pode ser devido às seguintes causas:
— granulado húmido;
— absorção de humidade durante a compressão;
— humidade libertada do interior do comprimido; , 'h(
— emprego de punções ou matrizes riscados;
— existência de folgas entre a matriz e o punção inferior; ....,., ..
— deficiente quantidade de lubrificante.
Pode ainda acontecer que os comprimidos saiam descabeçados, lascados ou exfoliados (capping),
separando-se a sua parte superior quando são ejectados da matriz. As causas deste insucesso são
muito variadas, podendo apontar-se: pressão demasiada, presença de muito ar absorvido, elevada
percentagem de partículas demasiado pequenas ('), falta de aglutinantes ou secura exagerada do
granulado, cristais muito grandes, punções e matrizes sujos ou rugosos e exagerada velocidade de
compressão.
Algumas vezes podem, em parte, obviar-se estes inconvenientes, limpando os punções repetidas
vezes com um pano de lã e lubrificando-os com um pouco de talco, estearato de magnésio ou parafina
líquida (envolvem-se com um fio de lã embebido em parafina líquida). Outras vezes é preciso
proporcionar certa humidade ao granulado ou ao pó a comprimir. A própria fenacetina, que é
considerada dos compostos mais difíceis de trabalhar, pode comprimir-se facilmente, segundo SETH e
MÜNZEL, desde que tenha 2,23 a 2,54% de humidade.
Um dos aspectos em que é preciso tomar cuidado é a tenuidade das partículas do lubrificante que
pode acontecer ser menor do que a dos pós a lubrificar. Tal facto cria problemas técnicos que
também podem surgir se houver um tempo de mistura demasiado elevado. JONES chama a atenção
para estas situações num estudo apresentado à FIP em 1976.
Uma situação que pode acontecer, embora raramente, é obter-se uma massa para comprimir que
exiba uma viscosidade indesejável, dificultando ou impossibilitanto o trabalho da máquina.
Observámos esses óbices com o pantotenato de cálcio amorfo e,

(') Não deverá haver mais de 20% de partículas demasiado pequenas ou de pó a envolver
granulado. Percentagens menores do que estas são geralmente benéficas à composição.
738

por isso, julgamos mais aconselhável o uso de pantotenato de cálcio corresnondente à forma
cristalina estável.
Em certos casos obervam-se variações do peso dos comprimidos, o que se pode dever a um
trabalho imperfeito por parte da máquina mas que, na maioria das vezes, resulta apenas do irregular
calibre dos grânulos a comprimir. Torna-se, então, necessária nova calibração do granulado,
recorrendo a uma rede de malhas mais apertadas. Quando a irregularidade do peso é devida ao
imperfeito trabalho da máquina, é de considerar a incompleta descida dos punções inferiores. Este
facto acarreta, igualmente, uma alteração da dureza do comprimido e, geralmente, é consequência de
uma deficiente quantidade de lubrificante (deslizante) ou da sua irregular distribuição.
Muitas das dificuldades com que se depara na compressão são ocasionadas pela elevada
velocidade a que trabalha a máquina. Igualmente deve evitar-se que a força de compressão seja
demasiada, porquanto os comprimidos seriam dificilmente desagregáveis (')•
Por último, é necessário cuidado quando se comprimem substâncias oxidantes, como o clorato de
potássio. Como é lógico, usar-se-ão excipientes inorgânicos que, ao contrário dos orgânicos, não
reagem com o oxidante durante a compressão. Entre estes excipientes citamos o caulino, o cloreto de
sódio e o sulfato de sódio, podendo usar--se o talco como lubrificante.
Em relação ao aludido caso do permanganato ou do clorato de potássio, pode, regra geral,
executar-se a compressão de qualquer destes compostos sem auxílio de adjuvantes, desde que os
cristais não sejam demasiado grandes.
Os compostos altamente explosivos, como a trinitrina, o tetranitroeritritol ou o dinitroisossorbido
só devem ser comprimidos quando adequadamente diluídos com pós inertes, de tal modo que se possa
garantir que não haja concentração do composto activo em qualquer ponto do granulado. A
granulação não deve ser conduzida em presença de dissolventes orgânicos inflamáveis.
Postas estas considerações, apresentamos uma Ficha de Produção de comprimidos, retirada do
Manual de Fabrico da Central de Medicamentos (Brasil). Nela se indicam os componentes e suas
qualidades, bem como todo o processo operatório e os controlos a efectuar durante e após fabricação.

(') A força de compressão não se exerce uniformemente sobre toda a massa a comprimir em
virtude da fricção desenvolvida entre as partículas do pó e a parede da matriz da máquina. A
formação de pontes temporárias e esteios no pó ou no granulado suporta também parte da pressão
exercida. Deste modo, fonriam-se zonas de alta pressão à periferia, próximo da zona onde desce o
punção e na parte central, de tal modo que a densidade e a porosidade do comprimido variam nas
suas diferentes regiões.
Nas máquinas rotativas, movendo-se os dois punções que exercem aproximadamente a mesma
pressão, verifica-se muito menor variação no volume aparente, que difere, principalmente, no centro
dos comprimidos.
739

LOTE N."
PRODUTO: DIPIRONA — 500 mg — comprimido. / _ FÓRMULA para:
100.000 comprimidos
v Matéria-prinia V Quantidade V N." etiqueta V
Dipirona 50 kg
Amido 4,6 kg 4--I.
Gelatina em pó 1,2 kg
Lactose 8 kg
Estearato de 1,2 kg
Magnésio
Material recebido por: ........................ Em: ....../....../......
Material examinado por: ................... Em: ....../....../......
Fabricação: Início: ....../.....J...... Término: .....J..,.../......

PRECAUÇÕES: — Mantenha condições de higiene. ^ '


— Proteja da luz e humidade. """' ^''" ''"' "
— Acondicione logo após o fabrico e aprovação do Controlo do granel.

// _ TÉCNICA DE FABRICAÇÃO:
1 — Misture homogeneamente em um misturador em «V» a Dipirona com o Amido, a Lactose e a
Gelatina em pó por 30 minutos.
2 — Aos poucos, submeta a mistura a um misturador de massas, humedecendo com uma mistura de
Água e Álcool (7:3), até uma consistência homogénea.
3 — Passe em crivo de 42 malhas por cm2.
n
«;'...
•.,•••. 'Mi'-- 1 '.
4 — Seque em estufa a 36°C. ^ - •.
5 — Uniformize o granulado e acrescente o Estearato de Magnésio.
6 — Envie amostra ao Controlo de Qualidade para determinação da faixa de compressão. 7—
Comprima com punção de 12 mm. Peso do comprimido: 0,65 g ± 5%. •>.•• '•••—$
8 — Durante a compressão, fazer pesada de l em l hora.
No início da compressão, ou seja, na l.a hora e independentemente do Controlo, o operador
fará pesagens de 15 em 15 minutos.
740

9 — Controlo Físico-Químico (feito pelo pessoal do Controlo de Qualidade):


a) — no início da compressão
b) — de 3 em 3 horas.
Data Hora Peso TESTES Rubrica
médio Dureza Desintegr.

10— Peso do comprimido: teórico 0,65 g ± 5%. Determinado:


.......................... g
11 — Após o térmico da compressão, envie ficha e amostra ao Controlo de Qualidade, para
doseamento do teor de Dipirona.
Teor normal: 0,5 g + 5%. .
Teor encontrado: .................... g de Dipirona. ^ ^
Feito por:................................ Em: ....../....../......
12— Após a aprovação, envie Ficha ao Sector de Comprimidos.
13 — Determine a renda granel. ;
. :.v
Renda: .................................... comprimidos. •
14 — Envie ficha e produto ao Sector de Acondicionamento. "

SECTOR DE ACONDICIONAMENTO E EMBALAGEM


Ficha recebida por: .......,.....,...........Em: ....../....../......
Produto examinado por: ..................Contido em: ....................................
Quantidade recebida: ........................comprimidos.
RENDA DAS CAIXAS
Produção Quantidade Determinad Verificada
Envelopes com 10 a
Caixa com 100 envelopes x
Recuperação
741

16— Determine as rendas:


Renda Perfeita: .................. % *••
Renda Recuperação: .......... %
Renda Real: ........................ %
Justificativa: .................................................................................................................
17 — Após a embalagem envie ficha e amostras representativas (20 envelopes) ao Controlo
de Qualidade, para aprovação final.
Amostras recebidas por: ........................ Em: ....../....../...... i .Í;,T' '_-/
Conferidas etiquetas, números e processo por: ...........................................................
Aprovada por: .......................... Em: ....../......A.....
Arquivada por: .......................... Em: ....../....../......

7.2.1.2.6. Tipos especiais de comprimidos


A grande maioria dos comprimidos destina-se a ser deglutida e só no estômago ou no intestino
aqueles medicamentos sofrem a sua desagregação. São excepção a esta regra os comprimidos
efervescentes, que devem desagregar-se previamente em água, antes da ingestão. Casos há, porém,
em que se procura preparar comprimidos cuja aplicação é completamente diferente. Referimo-nos aos
comprimidos para uso externo, aos comprimidos para aplicação bucal e vaginal e aos comprimidos
para utilização parenteral.
1) Comprimidos para uso externo — Podem destinar-se à preparação de soluções anti-sépticas,
adstringentes, isotónicas ou aromáticas, sendo aplicados em banhos, em gargarejes, etc.
Os comprimidos de bicloreto de mercúrio e de oxicianeto de mercúrio da Farmacopeia
Portuguesa IV constituem exemplo da referida aplicação. Como atrás foi acentuado, devem ser
corados, empregando-se, entre nós, respectivamente a eosina e o azul de metileno. Algumas
farmacopeias, como o Codex, estipulam que os comprimidos para uso externo devam apresentar forma
poligonal.
Em regra, os comprimidos para uso externo devem dissolver-se facilmente na água,
podendo conter cloretos de sódio ou de potássio, como excipientes, e ácido bórico,
como lubrificante. ; .*,^'

2) Comprimidos para dissolver ou desagregar na boca — Sob esta designação estudaremos os


comprimidos que se destinam a dissolverem-se, mais ou menos lentamente, na boca (acção tópica ou
absorção pela mucosa), e os comprimidos de absorção sublingual.
742

No primeiro caso, devem apresentar elevada superfície, a fim de proporcionarem mais íntimo
contacto entre os princípios activos e a mucosa. Habitualmente, destinam--se a exercer uma
actividade local, anti-séptica ou desinfectante, podendo conter antibióticos, sulfamidas ou formol,
algumas vezes associados a anestésicos locais, do tipo da anestesina.
A dissolução destes comprimidos deve processar-se lentamente (30 a 60 minutos), podendo conter,
como excipientes, a sacarose ou a manita, associadas às gomas, à metilcelulose, à gelatina, etc.
Ao lado do referido tipo de comprimidos queremos citar os comprimidos para mastigar. Trata-se
de fórmulas contendo, em regra, vitaminas (C, A, E, etc.) ou analgésicos, como o ácido
acetilsalicílico. Os ciclamatos ou a sacarina sódica são os edulcorantes mais vulgares e a vanilina tem
sido o aromatizante preferido em muitos casos.
Os comprimidos sublinguais ou de administração pcrlingual destinam-se a serem disssolvidos
lentamente debaixo da língua. Esta via de absorção promove a passagem rápida e directa dos
princípios activos para a corrente sanguínea, evitando-se, assim, a sua degradação no tracto gastro-
intestinal. São as veias linguais e a maxilar interna as portas de acesso, passando as substâncias
absorvidas, imediatamente, para as veias jugulares. Como se compreende, trata-se de uma via
recomendada sempre que os princípios activos sejam destruídos pêlos fermentos digestivos ou quando
sofram degradação em meio ácido.
Estes comprimidos devem ser de reduzidas dimensões, terem forma lenticular e apresentarem
pequena espessura. A sua desagregação não deve obedecer às regras gerais da desagregação para
comprimidos destinados a serem ingeridos, sendo aconselhável que demorem 20 a 60 minutos a
desintegrar-se totalmente. Entretanto, há casos em que se necessita de uma rápida absorção
perlingual, como sucede com os dilatadores coronários. Nestas situações deseja-se, pelo contrário,
uma muito rápida desagregação e dissolução do princípio medicamentoso.
A fim de eliminar a estimulação das glândulas salivares, com o concomitante aumento da
produção de saliva, que poderia arrastar os princípios para o tracto digestivo, é aconselhável que não
contenham edulcorantes. Assim, a sacarose não deve ser utilizada sozinha, podendo, contudo,
empregar-se em associação com a manita ou com a lactose. A fim de retardar a desagregação não se
devem incluir desagregantes e é recomendável que contenham, pelo contráno, uma pequena
quantidade de gomas. Como lubrificante aconselha-se o estearato de magnésio, a 3-4%, que, pela sua
acção hidrófoba, diminui a salivação.
A velocidade de absorção e o coeficiente de absorção dependem de muitos factores, como da
natureza da substância activa e do excipiente, especificamente escolhido, o que foi demonstrado por
meio de ensaios conduzidos com compostos marcados com isótopos radioactivos.
743

Por outro lado, a absorção é favorecida pela hiperemia local, devendo os comprimidos serem
administrados após as refeições, pois nessa ocasião encontra-se particularmente irrigada a mucosa
bucal.
Ente os comprimidos empregados por esta via de absorção citamos os de metiltestosterona,
trinitrina, nitrito de amilo, estradiol, progesterona, etinilestradiol, etc. Trata-se, pois, especialmente, de
um conjunto de hormonas sexuais e de dilatadores coronários.
3) Comprimidos vaginais — Os comprimidos de aplicação vaginal são destinados a promoverem
uma acção local, geralmente microbicida ou regeneradora dos epitélios.
A maioria desses comprimidos possui excipientes solúveis como a lactose, a glucose e a sacarose,
os quais podem, acessoriamente, desempenhar funções terapêuticas, dado que favorecem o
desenvolvimento dos bacilos de DÔDERLEIN, assegurando a salubridade da mucosa vaginal. Os
carbowaxes são também empregados como excipientes. A forma destes comprimidos é, geralmente,
oval ou redonda.
4) Comprimidos efervescentes — Já atrás dissemos que a preparação de comprimidos
efervescentes obrigava à obtenção de dois granulados, os quais se misturavam, posteriormente, para
efectuar a compressão, ou a recorrer à granulação na ausência da humidade (líquidos anidros ou
granulação a seco).
A efervescência promovida pela libertação de gás (oxigénio ou anidrido carbónico) pode
conseguir-se à custa de inclusão de um peróxido, o que é raro, ou, mais correntemente, a partir da
junção de um ácido, como o cítrico, o tartárico, o ascórbico, o algínico, etc., com um bicarbonato ou
um carbonato. Este último tipo de efervescência torna os comprimidos mais agradáveis e melhora a
absorção, dado que o gás carbónico estabiliza a mucosa gástrica. Entre os bicarbonatos pode usar-se
o de sódio. O carbonato de cálcio, é, também, empregado.
Habitualmente, a granulação é conduzida a seco ou recorrendo ao álcool iso-propflico com 5% de
amido, ou à glucose líquida ('), cujo pequeno conteúdo em água não é suficiente para promover a
reacção entre o ácido e o carbonato presentes. Neste último caso, a granulação deve ser conduzida a
50-60°C, empastando-se a mistura com a glucose líquida.
Pode ainda recorrer-se à preparação de granulados por fusão na água de cristalização,
aquecendo-se a mistura do ácido com o bicarbonato, a 100°C. Por este processo faz-se, por exemplo,
a granulação de uma mistura de ácido cítrico com bicarbonato de sódio e sulfato de magnésio. O
método é ainda susceptível de ser aplicado às misturas eutéticas.
r
(') A glucose líquida é um produto da sacarificação incompleta do amido, contendo glucose,
maltose, dextrina e água. Apresenta-se como líquido muito viscoso, cuja densidade é de cerca de 1,6.
744

Um último processo de preparação de granulados efervescentes consiste em granular,


separadamente, a parte ácida e a alcalina e juntar, depois de secos, os dois granulados, que só então
se comprimem.
Entre os lubrificantes que poderemos citar, recomendam-se compostos inteiramente solúveis em
água, como o acetato ou o benzoato de sódio, alguns Myrjs (51 e 53) e Brijs (35), mas é
especialmente utilizado, com excelentes resultados, o carbowax 4000.
A preparação de comprimidos efervescentes deve decorrer em ambiente de humidade controlada
(não superior a 25% de humidade relativa), podendo a própria máquina de compressão possuir um
dispositivo de aquecimento ou de circulação de ar quente. As máquinas destinadas à produção em
série deste tipo de comprimidos possuem, muitas vezes, um sistema de lubrificação adicional dos
punções, que são revestidos na sua face compressora por politetrafluoroetileno (Teflon).
Os comprimidos efervescentes são habitualmente higroscópicos, devendo ser, por isso,
conservados com cuidados especiais, em tubos ou frascos, hermeticamente fechados e contendo
substâncias exsicadoras (gele de sílica).
Actualmente, encontram-se no mercado numerosos comprimidos efervescentes, como as
associações de ácido acetilsalicílico com bicarbonato de sódio e ácido cítrico, as preparações
contendo vitamina C ou complexo B, etc.
Algumas vezes a compressão é difícil, como no caso da vitamina C, podendo melhorar-se, em
parte, pela junção de substâncias absorventes da humidade, como o gele de sílica. Sempre que
possível, porém, não se devem empregar estes compostos, pois que a presença de produtos insolúveis
nos comprimidos impede a obtenção de um líquido límpido quando estes são deixados desagregar em
água. Melhor será usar o sulfato de sódio anidro.
Para finalizar, queremos fazer uma referência aos comprimidos efervescentes destinados a
preparar inalações e gargarejos. AMACKER cita como excipientes para estes casos a
carboximetilcelulose e o gele de ácido silícico, sendo a efervescência conseguida a quente, à custa de
ácido bórico e bicarbonato de sódio incorporados.
5) Comprimidas estéreis — Sob esta designação consideraremos os comprimidos para
implantação e os comprimidos destinados à preparação de soluções injectáveis. Claramente que a
utilização destes dois tipos de medicamentos obriga a que a sua preparação decorra em ambiente
asséptico, empregando-se pós esterilizados (pelo óxido de etileno e outros gases, pelas radiações,
pelo calor, etc.) e manipulando-se com os cuidados que descreveremos a propósito da preparação de
injectáveis extemporâneos.
Os comprimidos para a preparação de injectáveis (comprimidos hipodérmicos) serão
inteiramente solúveis em água, devendo, por isso, ter-se o maior cuidado na escolha dos excipientes e
lubrificantes (Brij 35, Myrj 51 e 53, acetato de sódio, carbowax, etc.).
Os comprimidos para implantação, conhecidos entre os ingleses por peüets, têm forma cilíndrica
ou discóide e destinam-se a serem aplicados no tecido subcutâneo do
745

homem ou dos animais. O medicamento aí fixado é gradualmente cedido, passando à circulação.


Haverá, pois, uma absorção prolongada do medicamento, para o que é necessário que os
comprimidos se dissolvam lentamente nos líquidos e\travasculares (ver pág. 556), de modo que a
cedência da substância medicamentosa possa durar alguns dias ou, mesmo, vários meses.
As implantações têm sido empregadas especialmente para administrar hormonas (como o acetato
de desoxicorticosterona e a testosterona) ou vitaminas (como a ribo-flavina). Ultimamente têm sido
substituídas por suspensões aquosas de princípios activos, geralmente hormonas, sendo essas
fórmulas conhecidas por Depositam.
Os comprimidos hipodérmicos são comprimidos destinados à preparação de soluções injectáveis
extemporâneas. Actualmente, com o advento dos liofilizados, a sua importância é cada vez menor.
Foram introduzidos na terapêutica pelo americano FULLER e tiveram a sua grande aplicação nos
serviços farmacêuticos militares.
Tal como os pellets, devem ser preparados com pós estéreis e em ambiente também estéril,
observando-se as regras gerais adoptadas no fabrico dos injectáveis de preparação asséptica.
Recentemente, propôs-se executar a esterilização de comprimidos hipodérmicos (procaína solúvel) já
acondicionados em frascos com rolha de polietileno. Nestas circunstâncias os comprimidos são
submetidos à acção do óxido de etileno que, penetrando através do polietileno, promove a destruição
dos microrganismos presentes.
Como excipientes para estes comprimidos têm sido propostos o sorbitol, a glucose, a manita e a
glicocola. Os lubrificantes são os já anteriormente citados, podendo ainda empregar-se o ácido
bórico, dado que a concentração presente por injectável é sempre inferior ao centigrama, quantidade
considerada não tóxica (').
Como se compreende, tanto os comprimidos para implantação como os comprimi
dos hipodérmicos devem ser embalados assepticamente, em recipientes perfeitamente
estanques. • •&.»>>

7.2.1.2.7. Alterações em comprimidos


Podemos considerar os comprimidos como sendo sistemas sólidos heterogéneos. As formas
galénicas deste tipo são as que apresentam maior estabilidade, dado que a ausência de água
pressupõe ausência de vida, e, simultaneamente, ausência de hidrólises. O aforismo latino «corpura
non agunt nisi soluta» pode ainda ser aplicado neste caso, em toda a sua plenitude, admitindo-se que
a maioria dos compostos sofre pequenas ou nulas alterações, quando no estado seco, diminuindo
igualmente as incom-patibilidades que possam apresentar entre si. Se bem que o princípio enunciado
seja

(') SOLLMANN, na sua Farmacologia, faz referência a que a injecção de 0,5 g de ácido bórico,
no homem adulto, não provoca qualquer sintoma de intoxicação.
746

verdadeiro na maioria dos casos, acontece que, por vezes, determinados comprimidos sofrem
alterações mais ou menos profundas, por influência do ar, da humidade, dos excipientes e até dos
materiais onde se encontram acondicionados.
Para apenas citarmos alguns exemplos, lembremos as alterações por acção do ar e da luz que se
verificam em tantos compostos, como a vitamina C, que amarelece com o tempo. Outras substâncias,
como a trinitrina, sofrem desdobramentos pela acção da humidade, os quais são acelerados pela
presença de determinados excipientes, como o chocolate, ou pelo facto dos comprimidos se
encontrarem acondicionados em invólucros de celofane, de polietileno, etc.
a) Oxidações — Se bem que menos frequentemente do que os medicamentos injectáveis, existem
muitos comprimidos susceptíveis de se alterarem por oxidação dos seus constituintes.
Algumas vezes essas alterações, observáveis, por exemplo, pelo aparecimento de coloração
amarelada nos comprimidos, devem-se exclusivamente ao excipiente, não chegando a afectar o
princípio activo. É o que sucede, muitas vezes, com a lactose, que amarelece. Pode evitar-se essa
oxidação, associando-se catalisadores negativos, como o EDTA (etilenodiaminotetracetato de sódio),
pois tudo leva a crer que se trata de um fenómeno em que os iões metálicos pesados, como o cobre e
o ferro, desempenham papel preponderante.
A glucose apresenta comportamento semelhante, podendo corrigir-se a sua oxidação de modo
análogo. O facto mencionado tem especial interesse pois, muitas vezes, tem-se atribuído ao princípio
activo a alteração verificada nos comprimidos, quando afinal o problema é mais simples de resolver.
Como exemplo, citamos o caso dos comprimidos de aminofilina, cujo amarelecimento se deve, em
grande parte, à alteração do excipiente.
Certos excipientes provocam, também, destruição dos princípios activos, como a lactose que
destrói a neomicina e as polimixinas. As alterações assinaladas com a lactose e a glucose em
presença de fármacos ou excipientes aminados ou amidados podem interpretar-se por uma simples
reacção de Maillard em que os grupos aminados (aminoácidos, peptídeos, antibióticos
aminoglucosídicos, metaclopramida, aminofilina, etc.) se combinam com os hidroxílos glucosídicos
dos açúcares redutores originando tons que vão do amarelo-escuro ao castanho. Outras vezes
observa-se apenas uma diminuição do coeficiente de absorção intestinal para o princípio activo, o
que pode ser motivado pela escolha indevida do excipiente. É o que sucede com o lactato de cálcio
em relação às tetraciclinas já que o cálcio é fixado pêlos hidroxilos do antibiótico. O fosfato de
cálcio aumenta a toxicidade da vitamina D2, não devendo, por isso, ser empregado como excipiente
em comprimidos de calciferol.
Entre os exemplos mais típicos de oxidação recordamos o da vitamina C, cujos comprimidos devem
ser preparados tendo cm vista evitar-se essa alteração. Assim, tem-se proposto adicionar lactose à
vitamina, granulando a mistura em presença
747

de amido de milho, com álcool de 70°. A lactose, tendo uma função aldeído livre, comportar-se-ia
como um redutor, dificultando a oxidação; o amido de milho seria o desagregante. A granulação far-
se-ia por tamis de nylon, de crina ou de aço inoxidável e, como lubrificante, poder-se-ia empregar a
mistura de talco com estearato de magnésio. Mesmo havendo particular cuidado em evitar a oxidação
da vitamina, quer secando o granulado a temperaturas baixas (30-40°C), quer procedendo como foi
indicado, o ácido ascórbico sofre alterações, especialmente quando a sua quantidade seja um pouco
elevada (500 mg ou mais por comprimido).
Em virtude disso existem no mercado granulados de vitamina C revestida, a qual foi designada,
primitivamente, pelo termo francês «enrobé». Esta vitamina revestida é formada por grânulos de
ácido ascórbico os quais sofreram um revestimento com uma camada isolante de etilcelulose, de
gelatina, de açúcar, de acetoftalato de celulose, etc.
Pode usar-se para fazer esse revestimento uma solução a 2% de etilcelulose em álcool absoluto
ou em álcool isopropílico. A2 vitamina é empastada com a solução e a massa passada por um peneiro
de 90 — 100 malhas por cm . A secagem do granulado é feita a 25-30°C.
A preparação dos comprimidos com a vitamina revestida não oferece já tantas dificuldades,
podendo-se comprimir directamente. Como lubrificante pode usar-se o talco em mistura com o
estearato de magnésio.
O Suplemento à Farmacopeia Portuguesa IV inscreve os comprimidos de vitamina C, que prepara
granulando a mistura de amido, lactose e vitamina com uma solução constituída por acetoftalato de
celulose e ftalato de etilo, dissolvidos em álcool isopropílico e benzeno, em partes iguais. O
granulado é seco na estufa a 40"C.
Muitas vezes a preparação dos comprimidos de ácido ascórbico em concentração elevada, como
500 mg ou l grama por comprimido, envolve dificuldades, sendo regra empregar-se um excesso de
excipiente e fazendo-se os comprimidos ligeiramente maiores do que o habitual. Por outro lado, a fim
de dificultar a oxidação, é hábito juntar um catalisador negativo. Por último, é aconselhável, nestes
casos, acondicionar os comprimidos em recipientes que contenham uma substância exsicadora.
A reserpina é outra substância facilmente alterável por oxidação. A sua preparação pode fazer-se
facilmente quando se trata de obter comprimidos titulados ao decimili-grama, bastando misturá-la
com glucose e comprimir em presença de estearato de magnésio. Para obter comprimidos titulados
ao miligrama, convém preparar um granulado de amido de batata com lactose, usando, como líquido
de granulação, uma solução de gelatina a 4% ou o cozimento de amido a 10%. Sobre este granulado
seco lança-se, depois, uma solução de reserpina numa mistura de clorofórmio com éter (').
Homogeneiza-se e evapora-se a mistura dissolvente. Usa-se o talco e o estearato de magnésio como
lubrificantes.
(') O clorofórmio é o dissolvente da reserpina, enquanto que o éler facilita o contacto entre
solução e o granulado (ver pág. 649).
748

A sulfadiazina é igualmente oxidável, podendo diminuir-se a sua oxidação por junção de


compostos redutores, como o bissulfito de sódio ('). O Suplemento à Farmacopeia Portuguesa IV
inscreve comprimidos de sulfadiazina a 0,5 g, granulando a substância activa com cozimento de
amido a 10%. Como lubrificante utiliza uma mistura de ácido esteárico, estearato de magnésio e
talco. Emprega o amido como desagregante.
A morfina e a petidina constituem ainda exemplos de compostos oxidáveis, podendo fazer-se a
preparação de comprimidos destas substâncias associando-lhes lactose e granulando com solução
de gelatina a 4%.
O cloridrato de promazina é também facilmente oxidável, adquirindo cor verde. Tem-se proposto,
para evitar essa alteração, adicionar redutores, como o bissulfito ou o metabissulfito de sódio. Além
disso, convirá trabalhar ao abrigo da luz e conservar os comprimidos em embalagens opacas.
A própria vitamina B6, que ultimamente se emprega em concentrações muito elevadas, como 300
mg por comprimido, é particularmente sensível à acção da luz. Recomendam-se cuidados
semelhantes aos citados para a promazina, bem como recorrer à drageificação que, claro está, é o
melhor processo de evitar as alterações oxidativas durante a armazenagem. O paracetamol pode, em
determinadas circunstâncias, originar coloração avermelhada. Tal alteração deve-se à existência de
para-aminofenol livre o qual reage com vestígios de ferro para dar um complexo corado.
b) Hidrólises — As hidrólises podem ocorrer, igualmente, em vários constituintes dos
comprimidos. Muitas vezes podem processar-se logo durante a preparação, mas na maioria dos
casos só são observáveis a longo prazo.
Considerámos já o exemplo dos comprimidos de trinitrina (trinitroglicerina), os quais sofrem
decomposição, originando-se ésteres mono e dinítricos bem como ésteres nitrosos. As modificações
citadas, que alteram a actividade terapêutica da droga, são aceleradas pela presença de matéria
orgânica, sendo o cacau e o chocolate, que tantas vezes são ainda empregados como excipientes, as
substâncias mais responsáveis pela aludida decomposição. Estes factos levaram a propor o emprego
de lactose e glicerol como excipientes. Nessas circunstâncias, o período de validade dos
comprimidos é de cerca de l ano. A não observância das aludidas regras reduz de 40 a 60% a vida
destes comprimidos. Para que a sua armazenagem decorra em óptimas condições aconselha-se o uso
de tubos de vidro, com rolha também de vidro. O emprego de materiais de plástico ou a presença de
borracha ou de algodão aceleram, largamente, a decomposição da trinitrina ou permitem que ela ou
os seus ésteres se volatilizem e evolem.

(') A junção de redutores, como o bissulfito, deve ser extremamente criteriosa, dado que este
composto pode reagir, chegando a inactivar a substância activa, como sucede com os corticóides que
sejam cetonas cc-p-insaturadas.
749

Talvez o exemplo mais clássico de decomposição hidrolítica seja o apresentado pelo ácida
acetilsalidlico. A vulgar aspirina desdobra-se, facilmente, em ácido acético e ácido salicílico quando
existam vestígios de humidade, sendo o calor desenvolvido durante a compressão uma das causas
desse desdobramento. Por esta razão, os comprimidos de ácido acetilsalicílico são preparados por
granulação a seco. Geralmente mistura-se a aspirina com amido, que actua como desagregante, e
usa-se o talco como lubrificante.
Na realidade, foi demonstrado por RIBEIRO que o estearato de magnésio acelera a decomposição
do produto, razão por que se deverá banir o seu uso. Algumas vezes aconselha-se juntar à aspirina
compostos ácidos, como o ácido cítrico ou o tartárico, a fim de retardar a sua hidrólise. Este modo
de proceder filia-se em que a decomposição é acelerada pela alcalinidade. Como foi, porém,
esclarecido por EDWARDS, tanto o meio ácido como o meio alcalino aceleram a hidrólise, resultando,
como mais aconselhável, operar a pH próximo da neutralidade. Com efeito, como adiante veremos, a
aspirina decompõe-se a pH alcalino, de acordo com uma reacção de segunda ordem, mas a pH baixo
a degradação processa-se igualmente, embora seguindo a mecânica das reacções de primeira ordem.
No Suplemento à Farmacopeia Portuguesa IV inscrevem-se os comprimidos de ácido
acetilsalicílico a 0,5 g, sendo a sua preparação feita juntando a este composto 0,1 g, de amido,
depois de seco na estufa a 40°C.
Algumas vezes a aspirina é adicionada à cafeína, normalmente em quantidade dez vezes menor.
Os comprimidos deste tipo preparam-se triturando a cafeína, juntando-lhe a aspirina, o amido e
metade da quantidade total de lubrificante (talco); comprime-se a mistura e fragmentam-se os
comprimidos obtidos por crivo adequado, por meio de um granulador ou de um moinho de martelos.
Adiciona-se o resto do lubrificante e volta-se a comprimir, agora em definitivo. Raras vezes será
ainda necessária nova compressão para se obterem comprimidos perfeitos.
Entre os compostos facilmente hidrolisáveis queremos lembrar, também, o glicero-fosfalo de
cálcio, cuja decomposição é particularmente acelerada pelo aumento da temperatura, de tal modo
que, na secagem do granulado, não se deve ultrapassar os 40°C. Como líquido de granulação tem
sido muito usado o álcool, havendo o cuidado de associar o glicerofosfato a um açúcar, como a
sacarose ou a lactose (aglutinantes).
Atendendo a que são bastante numerosas as substâncias susceptíveis de se decomporem por
intermédio da humidade, transcrevemos uma lista dos casos em que habitualmente se procede à
granulação a seco. Não quer isto dizer que todos os compostos citados tenham de ser,
obrigatoriamente, granulados a seco, mas que o processo é aconselhável (Tabela LXXXII).
Ao lado das alterações típicas de hidrólise não devemos esquecer as alterações que podem ser
motivadas por acção da humidade, que poderá provocar desenvolvimento fúngico à superfície dos
comprimidos. Como se compreende, esse fenómeno pode ser combatido com a inclusão de
fungistáticos ou de fungicidas na massa dos comprimidos
750

Tabela LXXXII. Lista de substâncias que preferentemente se granulam a seco

Acetilfenitidina (acetilfenitidina, amido, PEG-4000 e esterato de cálcio:


0,3; 0,069; 0,092; 0,009). (ácido acetilsalicílico, amido: 0,5; 0,10). (ácido
acetilsalicílico, ác. cítrico, carbonato de cálcio, saca-
Ácido rinato de sódio: 0,30; 0,03; 0,098; 0,0034). (ácido fólico, amido, lactose, talco e
acetilsalicílico ácido esteárico: 0,005;
0,015; 0,14; 0,018; 0,002). (sulfato de di-hidroestreptomicina, amido, estearato
Ácido de
magnésio, talco: 0,360*; 0,025; 0,006; 0,009). (fenazona, pectina, talco e leite
acetilsalicílico desengordurado em pó:
0,5; 0,03; 0,01; 0,02). (cloridrato de efedrina, amido, CMC, leite em pó, for-
solúvel maldeído-caseína e estearato de alumínio: 0,05; 0,016;
0,0025; 0,002; 0,0025; 0,0005).
Ácido roliço (estrona, amido, lactose e talco: 0,001; 0,05; 0,04; 0,009). (penicilina V 200 (XX)
U.I**; lactose 0,02 g; amido 0,03 g;
talco 0,013; estearato de magnésio 0,002).

0,360 g de sulfato de di-hidroestreptominica equivalem a 0,250 g de base.


Em regra, cada mg de penicilina V potássica tem uma actividade equivalente a 1500 U. t.

Empregam-se, com essa finalidade, o p-hidroxibenzoato de metilo, o p-hidroxibenzoato de propilo, o


ácido sórbico, etc.
Assim, LUPI NOGUEIRA recorreu ao emprego da mistura de metil e propilparabenos, respectivamente a
Estrona
Penicilina V
0,18 e 0,02%, para evitar o desenvolvimento de bolores em comprimidos de inosito-hexafosfato de
cálcio e magnésio. Também MARQUES LEAL aconselha, pela mesma razão, o uso de conservantes em
comprimidos de tanalbina.
Ao lado destas inquinações, são de citar as invasões por artrópodos, tendo RAMOS BANDEIRA
identificado um coleóptero nas embalagens de comprimidos de fermentos lácticos, o qual originara a
depreciação do medicamento.
Outras vezes, as variações de conteúdo hídrico dos comprimidos podem traduzir--se numa
alteração do seu tempo de desagregação. Assim, certos comprimidos de cloridrato de promazina,
titulados a 50 mg e apresentando tempos de desagregação de cerca de 10 minutos, acusaram
aumento de 5 a 10 minutos no valor deste índice quando conservados, durante alguns meses, a cerca
de 50"C.
Inversamente, os granulados muito secos podem provocar ruptura da parte superior do
comprimido, durante a compressão, e os comprimidos obtidos terão tendência a diminuir o tempo de
desagregação à medida que decorre a armazenagem se não forem conservados em embalagens
estanques. De certo modo, pode corrigir-se esta alteração juntando glicerina ao granulado, a qual,
funcionando como humectante, impede a perda de água durante a compressão. É o que sucede com
certos comprimidos de carvão.
751

Com efeito, a obtenção destes comprimidos é bastante trabalhosa, dado que o carvão é dificilmente
aglutinável. Há quem aconselhe a utilização de goma arábica a 10%, ou gelatina a 4%, como
aglutinantes. Uma fórmula recente propõe a aglutinação com solução a 25% de polivinilpirrolidona,
preconizando, como lubrificante, uma solução de silicone a 5% em cloreto de metileno.
Em alguns comprimidos de carvão do nosso mercado observa-se, por vezes, um anormal
período de desagregação. Isto deve-se, sem dúvida, à presença de gomas, razão por que o seu
emprego deverá ser evitado, parecendo-nos mais aconselhável utilizar, como aglutinantes, a gelatina
ou a polivinilpirrolidona.
São numerosas as substâncias, dotadas de certa fragilidade, que são difíceis de aglutinar e de
comprimir, como a metionina, /conhecido aminoácido lipotrópico. Aconselha-se a adição de 10% do
seu peso em sacarose, aglutinando com solução de gelatina a 4%. Como desagregante, poderá servir
o amido a 10%, recomendando-se a mistura de talco e estearato de magnésio (8 e 3%,
respectivamente) para evitar os atritos. Outros sugerem a junção de 10% de lactose, granulando com
5% de pectina e xarope comum, podendo este ser substituído, com vantagem técnica, por xarope de
goma.
Ao lado da metionina lembramos o meprobamato, cujos comprimidos são obtidos, segundo o
Suplemento à Farmacopeia Portuguesa IV, associando amido e granulando com solução de gelatina
a 15%. A isoniazida ou hidrazida do ácido isonicotínico é preparada, sob a forma comprimida,
misturando-a com amido e lactose e granulando com cozimento de amido a 15%. Como lubrificante
poderá servir a associação do talco, ácido esteárico e estearato de magnésio.
O fenobarbital, bem como muitos outros barbitúricos, pode ser granulado em associação com
açúcar de leite, por intermédio de cozimento de amido a 10%. O estearato de magnésio e o talco são
os lubrificantes usuais. No que diz respeito ao hexobarbital, já, porém, se aconselha a que se proceda
à granulação a seco, a fim de evitar qualquer possibilidade de hidrólise.

c) Perda de constituintes voláteis — Por vezes sucede que determinados compostos presentes
nos comprimidos se volatilizem, como acontece com diversas essências e com a cânfora.
Naturalmente que a preparação dos comprimidos obriga, neste caso, à utilização de absorventes. Por
outro lado, a secagem deve ser conduzida a baixa temperatura e os comprimidos, depois de
preparados, serão conservados em lugar fresco e acondicionados em frascos impermeáveis, bem
rolhados. Adiante veremos que os recipientes de material plástico, são, regra geral, pouco
aconselháveis para este fim, dado que são permeáveis às essências, aos terpenos, às cetonas, etc.

As alterações assinaladas dependem, em grande parte, da temperatura a que os comprimidos


sejam submetidos. Se bem que não se possa verificar proporcionalidade entre a temperatura e a
velocidade de destruição dos fármacos nos comprimidos, existe certa relação entre as duas
grandezas, a qual se tem procurado evidenciar, especialmente
752

depois dos trabalhos de ERIKSEN e colab. Estes autores procuraram uma interpretação matemática da
cinética da decomposição a temperatura elevada, baseada no estudo da equação de ARRHENIUS, a
qual, porém, só é inteiramente válida para os sistemas líquidos homogéneos ou heterogéneos, como
adiante se demonstrará (Ver ESTABILIDADE DOS MEDICAMENTOS). Entretanto, acrescentamos que, em muitos
casos, como nós próprios verificámos, é possível predizer, com certa aproximação, qual o prazo de
validade de uns comprimidos quando submetidos a ensaios de decomposição acelerada.
A Farmacopeia Britânica, que inscreve uma lista de produtos de curto prazo de validade,
menciona, entre eles, os comprimidos de trinitrina, cuja vida terapêutica estipula em um ano. O
Formulário Galénico Nacional indica, para cada fórmula, o respectivo prazo de validade.

7.2.1.2.8. Selecção dos comprimidos ,• ••••.••


.- -V. T • j- • '-M • ^-J.:
Após a sua preparação, os comprimidos vêm geralmente acompanhados de certa quantidade de
pó, que se deve eliminar. Para isso, podem ser agitados (o que pode provocar a sua fragmentação),
escovados (por intermédio de uma espécie de pincéis, o que é mais eficaz e menos violento) ou
ventilados (com ar comprimido, que arrasta inteiramente todo o pó e não ocasiona qualquer
fractura).
Claramente que destes processos é o último o que apresenta maior número de vantagens, pois
permite recuperar todo o pó, desde que a operação seja conduzida num túnel adequado. Só nestas
condições o método não é perigoso para os operadores que, de outra forma, estariam sujeitos a
absorver o pó libertado, pelas vias respiratórias. A este respeito é de salientar que muitas drogas
activas podem ser extremamente perigosas para o pessoal laborante, não devidamente protegido.
Como exemplo, citamos os acidentes observados em alguns técnicos que preparavam comprimidos
contendo agentes progestacionais, substâncias que são absorvidas pela árvore brônquica e até pela
superfície cutânea. A melhor protecção consiste no uso de exaustores do pó e no emprego de fatos
adequados para o pessoal, sendo o operador obrigado a usar máscara provida de ar exterior, não
contaminado. Os fatos de papel, que se destroem depois de cada laboração, mostram-se os mais
aconselháveis.

7.2.1.2.9. Acondicionamento dos comprimidos


Até que sejam embalados definitivamente, os comprimidos são guardados em armazém, podendo
servir, para isso, frascos de vidro, de aço inoxidável, de alumínio, de folha de Flandres, de ferro, de
material plástico, etc. De um modo geral, é o vidro que apresenta menos limitações, reguladas pelas
propriedades particulares de cada princípio activo. Assim, um vidro que ceda iões alcalinos ou metais
pesados não é
753

aconselhável para acondicionar penicilina. Do mesmo modo, seria inteiramente reprovável guardar
comprimidos de urotropina, estreptomicina ou cloreto de sódio em recipientes de folha de Flandres
ou de ferro, não sendo aconselhável acondicionar comprimidos contendo essências em frascos de
polietileno, etc.
Por outro lado, recomenda-se que os comprimidos de reduzidas dimensões sejam guardados em
pequenos frascos, para que o peso exagerado ou a fricção os não deteriorem. Em cada frasco convém
introduzir uma substância exsicadora, de modo a evitar a acção da humidade, sendo vulgar
empregar-se o gele de sílica, corado pelo cloreto de cobalto, que funciona como um indicador e nos
orienta quanto à quantidade de humidade absorvida. A sua regeneração é fácil, bastando aquecer a
lóO^C, até mudança da cor rósea (humidade) para azul. Alguns frascos são equipados com
substâncias exsicadoras, geralmente introduzidas na sua tampa. Quando isso não sucede pode intro-
duzir-se, no frasco em questão, um pequeno saco de pano, contendo o gele de sílica ou outra
substância exsicante apropriada.
A escolha da embalagem definitiva é igualmente um problema da maior importância mas, como
atrás acentuámos, as alterações nos sistemas sólidos heterogéneos ocorrem em grau diminuto se as
compararmos com as que se registam no seio dos líquidos.
Se, porém, algumas decomposições se observam, devem-se, regra geral, à acção da humidade e da
luz. Compreende-se, assim, a excepcional importância de que se reveste a escolha da embalagem,
pois condicionando, em larga medida, a vida do produto, deve, por conseguinte, ser feita com o
maior critério, de forma a evitar possíveis alterações nos comprimidos a que se destina.
Claro está que, em todos os casos, as embalagens devem ser hermeticamente fechadas e
impermeáveis aos gases e à humidade atmosférica.
Podemos dizer que as embalagens destinadas aos comprimidos são fundamentalmente de dois
tipos, consoante se destinam a acondicionar, separadamente ou em conjunto, uma ou mais unidades:
unitárias e múltiplas.
As embalagens unitárias encontram-se difundidas em larga medida, dado que são económicas,
muito práticas e mais adequadas para a maioria dos comprimidos. Neste tipo de acondicionamento o
comprimido é apresentado individualmente em carteiras de papel ou películas termocoláveis de
diferentes materiais. Naturalmente que o papel é o material menos aconselhável, dado que não é
impermeável.
O processo das películas termocoláveis é, a todos os títulos, o melhor, usando-se, assim, o
celofane transparente ou opaco, o alumínio revestido de verniz, o polietileno, o papel revestido de
polietileno, etc. Segundo este processo, os comprimidos são acondicionados em cintas que se fecham
com auxílio de máquinas próprias, pelo calor e pressão, ou por alta frequência. Algumas das
máquinas utilizadas no acondicionamento proporcionam a extracção do ar no momento da
termocolagem. Para que o vácuo criado se mantenha é, porém, necessário que o material da fita não
seja poroso e apresente elevada resistência, como sucede com o policel. Frequentemente a embalagem
é feita em fita termocolável, mas pode ser constituída por uma placa que contém uma
754

espécie de «bolhas» onde os comprimidos se encontram aprisionados, individualmente em cada


receptáculo, tomando então a designação de embalagem blister.
Os comprimidos, acondicionados como se descreveu, apresentam-se isolados uns dos outros, numa
cinta contínua, flexível, que se pode dividir em fracções de uma ou mais unidades. Nem todos os materiais
mencionados apresentam igual resistência à penetração da humidade, podendo citar-se por ordem
crescente de eficiência: acetato de celulose, papel parafinado, celulose regenerada recoberta de
nitroparafma, clareia de poüvinilo, derivados clorados do cautechú, polletileno e alumínio revestido
de verniz.
O celofane ou celulose do tipo da seda artificial, é designado no comércio por letras, como IS
(duas faces termocoláveis), ISA (duas faces termocoláveis com banho especial de cloreto de
polivinilideno — saran) e ISAK (maior impermeabilidade).
O papel parafinado varia muito de eficácia, consoante a espessura da camada de parafina
depositada, e tem ainda o inconveniente desta última poder fundir, quando se executa a colagem das
cintas pelo calor, o que a levaria a misturar-se com os comprimidos. O alumínio emprega-se fixado
sobre papel, sendo a aderência conseguida à custa de parafina, cera microcristalina ou resina
sintética. É de todos os materiais citados o que maior resistência apresenta à penetração da
humidade, podendo acondicionar comprimidos que se exponham ao ar marítimo, sem qualquer
espécie de alteração.

Flg. 284. Máquinas para termocolagem


l—Servac 150/1, que permite o acondicionamento de
12000 comprimidos por hora II — Sealital, que permite o
755

No mercado existem numerosas variedades de máquinas para executar a termoco-lagem das


cintas onde são acondicionados os comprimidos. Os sistemas podem ser perfeitíssimos, com
processos de rejeição adequada quando, por qualquer motivo, os comprimidos não estejam
inteiramente bem moldados, não tenham o peso devido, etc.
A maioria destas máquinas permite trabalhar com celofane ou com alumínio, bastando para isso
variar a temperatura das maxilas de soldagem, o que se consegue por meio de um reóstato. A Fig.
284 mostra duas máquinas para termocolagem de fitas.

Fig. 285. Comprimidos e cápsulas acondicionados em embalagens de fita


termocolével (Servac)
756

A embalagem múltipla realiza-se acondicionando os comprimidos em tubos, frascos ou caixas, A


matéria-prima destes recipientes é também variável, usando-se o vidro, o alumínio, o cartão, a baquelite,
as fibras plásticas, etc. Os frascos de vidro ou de alumínio fecham-se com tampas bem adaptadas, por
vezes reforçadas com cintas de matéria plástica, como cloreto de polivinilo ou polietileno. Os recipientes
de plástico são de pior qualidade pois, regra geral, sào porosos. Muitas vezes observa-se que só o fundo
dos frascos é permeável, o que pode ser atenuado por imersão num banho de parafina (camada
suficientemente espessa e sem espaços de ar). Pela mesma razão, quando se empregam rolhas de cortiça
convirá parafiná-las.
Algumas vezes, os tubos ou frascos contêm pequenos exsicadores, o que é extremamente vantajoso,
podendo estes fazer parte da própria rolha, que é perfurada para o efeito.

-• - : ^ •"'
<***'
Flg. 286. Máquina de contar comprimidos (King triumph)
Existem
permitem nesta máquinainstanlanemente,
seleccionar, três interrupções rotativas
qualquer lote que
de
comprimidos
um ponto entre 1 que
luminoso e 1000. Cadaa válvula
permite de contagem
comprovação visual tem
da
contagem.

Na indústria o enchimento dos frascos e tubos pode ser feito por intermédio de máquinas
apropriadas que contam os comprimidos. Os modelos são muito variados, desde simples planos
inclinados de contagem mecânica, até às máquinas rotativas em que a contagem é efectuada por
dispositivos com células fotoeléctricas, sendo os impulsos transmitidos a um contador electrónico
que acciona um relais. Na Fig. 286 reproduzimos uma máquina de contagem de comprimidos.
757

Para terminar, queremos lembrar que o acondicionamento de comprimidos destinados a uso


parenteral deve decorrer em condições que permitam garantir a sua esterilidade. Desde modo, devem
utilizar-se recipientes estéreis, susceptíveis de serem fechados hermeticamente e em ambiente
asséptico.

7.2.1.2.10. Verificação dos comprimidos


Os ensaios de controlo de comprimidos são executados durante a sua preparação ou após
aquela. Com efeito, durante a fabricação e antes da compressão, devem ser doseados os princípios
activos nos granulados, de modo a haver garantia de boa distribuição. A porosidade e a resistência
do granulado interessa igualmente ser determinada, como atrás já acentuámos. A regulação de
máquinas para a compressão exige também que o peso dos comprimidos seja controlado, bem como
a desagregação e a resistência que, de certo modo, são função da força de compressão empregada.
Uma vez preparado o lote, os comprimidos devem ser submetidos a ensaios, a fim de se verificar
se as características da forma galénica obtida correspondem às necessidades pretendidas. Este
procedimento ocasiona, como é evidente, o aparecimento de certas duplicações ou repetições de
ensaio. Por comodidade estudaremos aqui todos os ensaios de verificação, independentemente da
altura em que se executam.
O controlo dos comprimidos pode incidir sobre a dosagem dos princípios constituintes,
realizando-se esta por processos químicos, físico-químicos ou- biológicos, ou sobre a avaliação de
determinadas características físicas (peso, desagregação, inabilidade, dureza, etc.). Finalmente, em
certos casos terá ainda interesse proceder-se ao controlo microbiológico dos comprimidos
(comprimidos de aplicação parenteral, por exemplo).

7.2.1.2.10.1. Determinações físicas


Entre as determinações físicas figura o exame da superfície dos comprimidos e a apreciação da
sua cor, dureza, resistência, peso, tempo de desagregação e características de dissolução.
1) Exame da superfície — A superfície do comprimido, observada a olho nu ou com a lupa, deve
apresentar-se lisa. Por outro lado, cortando-o transversalmente, deverá notar-se uma fractura isenta
de estrias. Comprimidos riscados, falhados ou apenas sujos, devem rejeitar-se. Algumas vezes
acontece que certos princípios reagem, em determinadas condições, com o aço dos punções ou das
matrizes. É o que sucede com a uro-tropina que, sendo comprimida em ambiente demasiado húmido,
origina comprimidos manchados de vermelho.
758

2) Cor — Quando a fórmula contém corantes e se destina à produção de grandes lotes de


comprimidos, interessa manter a regularidade da cor em todos eles. A manejra mais prática de o
conseguir é pintar, numa cartolina, a tonalidade exacta que se pretende, servindo esse cromo de
padrão para futuras preparações. À primeira vista parece que bastaria usar sempre a mesma
quantidade de corante, para que a cor obtida fosse sempre igual. Tal não acontece, dado que
qualquer pequena variação da tenuidade dos pós se pode traduzir numa modificação da cor.
Algumas vezes pode haver dúvidas quanto à natureza do corante utilizado, sendo um dos
melhores métodos de identificação o processo da cromatografia em papel ou em camada delgada. A
cor deve ser homogénea, excepto nos comprimidos obtidos com a mistura de granulados de cores
diferentes em que talvez se procure apenas um efeito espectacular.
3) Medida — Sabendo-se que a escolha de punções é função do peso dos comprimidos,
compreende-se que a avaliação do seu diâmetro constitua uma das características a determinar. Por
outro lado, como os comprimidos são preparados com uma certa quantidade de granulado de
tenuidade estabelecida e sofreram uma determinada força de compressão, é lógico que se avalie
também a sua altura (espessura no centro e nos bordos).
As duas determinações são executadas com uma craveira e a Farmacopeia Britânica indica a
relação entre pesos e diâmetros de comprimidos. Julgamos que a padronização das características
dos comprimidos apresente vantagens para o doente, dado que eliminaria dúvidas, removidas pela
simples avaliação do tamanho do comprimido em causa.
Na gravura junta representamos alguns tipos de comprimidos de superfície plana ou abaulada,
indicando o modo de avaliação das suas medidas (')•

Flg. 287. Determinação de diâmetros e espessuras de comprimidos


h = altura; c = espessura; d = diâmetro; r(, rz = raios da calote; o comprimido
assinalado com a letra K mostra, em perfil, um relevo de inscrição

(') No PDR (Physicians' Desk Reference) dos Estados Unidos da América do Norte incluem-se,
(i.ïra identificação dos produtos especializados, quadros onde cada comprimido é apresentado nas
dimen
sões í- cores próprias. ,
759

Acrescentamos, por último, que a determinação das medidas nos dá. por vezes, indicações a
respeito do estado de conservação da fórmula. É o que acontece com comprimidos efervescentes, que
aumentam o diâmetro sempre que principiam a decompor-se por terem absorvido humidade.
4) Uniformidade de massa — É evidente que uma das regulações mais importantes das máquinas
de compressão consiste no ajustamento do peso dos comprimidos, o qual é dado por um processo
volumétrico, função da capacidade da câmara de compressão.
Como já acentuámos, na prática é impossível conseguir que todos os comprimidos de um mesmo
lote apresentem pesos rigorosamente iguais. O intervalo de variação diminui à medida que aumenta
o peso dos comprimidos.
A fim de acertar o peso, pesam-se várias unidades, geralmente 20, observando-se se o valor da
média se afasta dos limites de tolerância estabelecidos.
As farmacopeias e formulários marcam os limites de tolerância a observar, os quais são função
do peso teórico dos comprimidos, sendo a percentagem de tolerância tanto maior quanto menor for
esse peso, como se pode ver nas tabelas LXXXIII, LXXXIV e LXXXV.

Tabela LXXXIII. Tolerância de peso segundo a Ph. I.


Comprimidos Tolerância
Até 25 mg _., ,v,, j De 26 a 150 ±15 % .t •• , ,,,
mg De 151 a 300 mg De peso maior do que 300 mg ± 10% ± 7,5% ± 5%

Tabela LXXXIV. Tolerância de peso segundo a F. P. V

Comprimidos Tolerância
Até 80 mg ('•' . ± 10%
De 80 a 250 mg ± 7,5%
De peso igual ou superior a 250 mg ± 5%

Tabela LXXXV. Tolerância de peso segundo a F. F.

Comprimidos Tolerância
Até 150 mg " ± 7,5%
De peso igual ou superior a 150 mg ± 5,0%
760

De qualquer modo, todas as farmacopeias são unânimes em especificar gue não mais de 10% dos
comprimidos pesados se afastem da média determinada numa percentagem superior à estabelecida, mas
que não deve haver nenhum cujo peso médio se afaste de mais do dobro dessa percentagem.
O número de unidades tomadas para ensaio de peso é, igualmente, variável, mas, em regra, é de 20
comprimidos. Por razões óbvias, o número de comprimidos deveria aumentar à medida que diminui o
peso individual, de acordo com a Tabela LXXXVI.

Tabela LXXXVI. Relação entre o número de comprimidos a ensaiar e o peso de cada


comprimido
N.1' de comprimidos a ensaiar Peso de cada unidade
20 0,15 a 0,50 g
50 0,075 a 0,15 g
100 menos de 0,075 g

A Farmacopeia Portuguesa V manda pesar, em todos os casos, 20 comprimidos. De modo idêntico procede
a USP e a BPh. Já as Farmacopeias Dinamarquesa, Norueguesa e Helvética recomendam 100 comprimidos,
enquanto que a Finlandesa aconselha 50 e o Codex 10.
Na Tabela LXXXVII inscrevemos as normas estipuladas pelas farmacopeias Britânica, Americana,
Helvética e Portuguesa.

Tabela LXXXVII. Tolerância de peso em comprimidos admitida por várias famacopeias


Farmacopeia B. Ph. USP F. H. F. P. V
N." de comprimidos 20 comp. 20 comp. 100 20 comp.
Peso dos comprimidos ±% +% comp.
± % ±%
< 0,013 10 15 — —
< 0,080 — — — 10 .2 o

0,013 - 0,130 0,080 - 10 to "• • — 7,5 ,|
0,250 '
< 0,250 — — 10 —
5
ju
> 0,250 — 'L. — f2
0,130 - 0,324 7,5 7,5 -— —
0,250 - 0,500 — — 8 —
> 0,324 5 5 — —
> 0,500 — — 5 —
761

Do ponto de vista prático, interessa grandemente que se recorra à utilização do cálculo


estatístico aplicado ao controlo da variação do peso, durante a compressão. Constroem-se,
assim, gráficos entre pesos médios de comprimidos e tempo de labora-ção. Geralmente
pesam-se 20 unidades, de 10 em 10 minutos, durante a compressão, e determina-se, em cada
pesagem, o valor do peso médio. Por outro lado, poderá ser útil conhecer a variação entre o
valor mínimo e máximo das pesagens efectuadas, num determinado lote, o que corresponde à
amplitude (u>). Esta determinação permite diagnosticar, precocemente, o mau
funcionamento da máquina. Na Fig. 288 representamos tmfò far*a hE -sanação àe peso
mè8io, para comprimidos cujo peso teórico seria de 0,20 g. Operou-se sobre 20 unidades de
cada vez, com que se avaliou o peso médio do lote, em todos os 10 minutos de trabalho da
máquina. A tracejado marcam-se os limites práticos, além dos quais se não deve passar
(tolerância de ± 7,5%). Sempre que a média encontrada se aproximava dos vaJores
tracejados a máquina era regulada de

Fig. 288. Carta de contrato do peso de comprimidos


762

novo. O diagrama obtido (carta de controlo) revela, portanto, o valor dos pesos médios (A) e da
amplitude (B).
A carta de controlo é, pode dizer-se, imprescindível quando se comprimem grandes quantidades
de matéria-prima. Nessas circunstâncias, tem imenso interesse determinar, com rigor, o grau de
precisão do trabalho executado, quer na granulação, quer na compressão. A realização deste
objectivo só pode ser conseguida correctamente pela aplicação do cálculo estatístico.
Para isso, é pesado um número de comprimidos suficientemente representativo e a partir dos
valores encontrados calcula-se o desvio padrão e, por último, os limites de confiança.
Relatamos, seguidamente, os resultados obtidos com comprimidos de aminofilina com
pentobarbital (peso teórico 0,3 g) que foram por nós ensaiados.
Pesámos, individualmente, 40 comprimidos, com uma aproximação até 0,1 mg. Com esses valores
calculámos o peso médio dos comprimidos e seguidamente avaliámos a diferença entre o peso de cada
comprimido (X) e o seu peso médio (X). Esses resultados foram quadrados, procedendo-se ao seu
somatório. A cifra correspondente ao somatório foi dividida por AM pesagens, isto é, por 39,
calculando-se a raiz quadrada do número obtido, o que nos conduziu ao valor do desvio padrão.
A média dos pesos foi de 0,2978; o somatório dos quadrados das diferenças Z A2 = 0,00057363.

2 A2 0,00057363
Variância = ———— — —————————
39

Desvio padrão: s= V ———— = 0,0038 -.-----• .*


N-l

A partir deste valor calculámos os limites de confiança (limites fiduciários), dados


í por ± t x S em que S =——— sendo s o desvio padrão, S , o erro padrão da
média
^/-y
e N o número de determinações efectuadas; t é um factor determinado, em tabelas, como a do
Suplemento à F. P. IV, pelo número de graus de liberdade (factor de STU DENT-FISHER) que
corresponde a N-l, e pelo nível de probabilidades desejado (P = 0,99 altamente significativo, P = 0,95
significativo).
0,0038 Com efeito, se í = 0,0038 S =——^__ = 0,000605, e t,
para 39 graus de
•x
liberdade e P = 0,99, virá igual a 2,705.
763

Logo, a média aritmética ± / x S , será:


;

0,2978 ± 0,000605 x 2,705 . .


o que mostra que
0,2978 + 0,00163 = 0,2994 '' -
e que
0,2978 - 0,00163 = 0,2962
Nestas circunstâncias, e com uma probabilidade de 99%, não deve haver nenhum comprimido pesando
mais de 0,2994 g ou menos de 0,2962 g, o que revela que a preparação foi excelentemente conduzida pois que
há apenas 1% de probabilidades de se ultrapassarem os limites citados e, portanto, menos de 1% de
probabilidades de se terem atingido os limites mais amplos, tolerados pela nossa Farmacopeia (0,285 e 0,315
mg).
5) Velocidade de desagregação — Salvo raras excepções, os comprimidos destinam-se a sofrerem uma
desagregação, isto é, uma desintegração mais ou menos rápida, quando em contacto com líquidos aquosos.
Dessa desagregação resultam pós, misturas de pós ou grânulos de tamanho sensivelmente igual ao dos que
serviram para preparar os comprimidos. Na realidade, a desagregação inclui duas fases: na primeira há desin-
tegração até aos grânulos que originaram o comprimido e na segunda os grânulos desintegram-se, obtendo-se
o pó que serviu para os preparar.
Em casos especiais, os comprimidos são inteiramente solúveis em água, como sucede com os que se
destinam ao uso parenteral ou com os que são formados por compostos activos que se dissolvem e que só
contêm excipientes também hidros-solúveis. Ao lado destes podemos considerar os comprimidos destinados a
serem implantados no tecido subcutâneo, os quais se devem dissolver completa mas lentamente nos líquidos
extravasculares.
Apenas um único caso poderá ser citado como fugindo à necessidade de desagregação ou dissolução em
água. Trata-se dos comprimidos destinados a serem mastigados e que actualmente tanta voga vão tendo entre
nós. Correspondem às formas já oficializadas em 1948 na Dinamarca e que alguns designam por dulciblettae.
Contêm, habitualmente, como princípios activos, diversas vitaminas, como o ácido ascórbico e as vitaminas A e
E, analgésicos como o ácido acetilsalicílico, etc.
Como é evidente, a desagregação deve decorrer num período de tempo da ordem do necessário para a
digestão (3 a 4 horas). Em vários casos, porém, há necessidade que o medicamento actue muito rapidamente
(analgésicos, antiespasmódicos, antipiréticos, alguns bacteriostáticos, etc.) e, nessa conformidade, tem sido
estipulado um período de desagregação muito inferior ao período de digestão. Como adiante veremos, empre-
gam-se também muitos compostos cuja acção se pretende seja prolongada, o que obriga
764

a que, por vezes, se preparem comprimidos apresentando elevado tempo de desagregação. Esse assunto
será tratado adiante (ver formas farmacêuticas de acção prolongada).
Resumindo, poderemos dizer que a velocidade de desagregação exigida a um comprimido deve
depender da acção medicamentosa e da matéria-prima, sendo lógico, portanto, estabelecerem-se tempos
de desagregação diferentes, consoante os fármacos utilizados. Este modo de proceder é adoptado por
alguns códigos, como a farmacopeia dos Estados Unidos e a farmacopeia Britânica. Já entre nós admite-
se sempre o mesmo tempo de desagregação para todas as variedades de comprimidos.
Tem-se procurado estabelecer uma fórmula que relacione a velocidade de desagregação com
determinadas características dos comprimidos. É, assim, muito conhecida a equação de HIGUCHI, segundo
a qual a velocidade de desagregação dependeria da porosidade ou percentagem de espaços vazios que é
susceptível de ser calculada em função do diâmetro médio do poro e da superfície específica, isto é, da
relação entre a superfície dos comprimidos em cm2 e o seu volume em ml, de acordo com o que se disse na
pág. 733.
A citada determinação é susceptível de ser realizada com aparelhagem complicada, tendo sido
verificado que a porosidade representa 1,9-2,6% do volume total em comprimidos de cloreto,
brometo ou iodeto de sódio.
Julgamos que o estudo dos tempos de desagregação só pode ser devidamente controlado por
ensaios in vivo, tendo sido executadas algumas provas desse tipo em que se segue a desagregação
através de um exame radiográfico.
Por razões de ordem prática e até de economia, os ensaios estabelecidos para avaliar o tempo de
desintegração consistem essencialmente em colocar o comprimido ou comprimidos em contacto com a
água pura ou adicionada de ácido clorídrico e de pepsina, a determinada temperatura, calculando o
tempo necessário para que se dê a desagregação.
As condições estabelecidas pêlos diversos códigos são muito variáveis, servindo-se alguns de
material rudimentar, enquanto outros lançam mão de aparelhagem bastante complicada. Em face
das várias modalidades operatórias, passemos uma rápida vista de olhos sobre o que está
consignado nas principais farmacopeias, analisando o assunto de diversos pontos de vista.
Número de comprimidos submetidos ao ensaio — Nem todas as farmacopeias se referem ao
número de comprimidos que se deverá utilizar em cada ensaio. Para aquelas que o especificam pode,
contudo, dizer-se que esse número vai de l a 6. Parece-nos que um exame simultâneo de várias
unidades é preferível, para evitar causas de erro, a uma análise executada apenas sobre um
comprimido. Acresce ainda que, depois dos trabalhos de VOLCKERINGER sobre a sulfanilamida, está
demonstrado que comprimidos provenientes de um mesmo lote podem apresentar características de
desagregação completamente diferentes. Não obstante este óbice, encontrámos as farmacopeias Argen-
tina de 1943, Japonesa de 1951 e Helvética de 1934 operando apenas sobre uma unidade. Executa o
ensaio sobre dois comprimidos a farmacopeia Jugoslava de 1951 e
765

a que, por vezes, se preparem comprimidos apresentando elevado tempo de desagregação. Esse assunto
será tratado adiante (ver formas farmacêuticas de acção prolongada).
Resumindo, poderemos dizer que a velocidade de desagregação exigida a um comprimido deve
depender da acção medicamentosa e da matéria-prima, sendo lógico, portanto, estabelecerem-se tempos
de desagregação diferentes, consoante os fármacos utilizados. Este modo de proceder é adoptado por
alguns códigos, como a farmacopeia dos Estados Unidos e a farmacopeia Britânica. Já entre nós admite-
se sempre o mesmo tempo de desagregação para todas as variedades de comprimidos.
Tem-se procurado estabelecer uma fórmula que relacione a velocidade de desagregação com
determinadas características dos comprimidos. É, assim, muito conhecida a equação de HIGUCHI, segundo
a qual a velocidade de desagregação dependeria da porosidade ou percentagem de espaços vazios que é
susceptível de ser calculada em função do diâmetro médio do poro e da superfície específica, isto é, da
relação entre a superfície dos comprimidos em cm2 e o seu volume em ml, de acordo com o que se disse na
pág. 733.
A citada determinação é susceptível de ser realizada com aparelhagem complicada, tendo sido
verificado que a porosidade representa 1,9-2,6% do volume total em comprimidos de cloreto,
brometo ou iodeto de sódio.
Julgamos que o estudo dos tempos de desagregação só pode ser devidamente controlado por
ensaios in vivo, tendo sido executadas algumas provas desse tipo em que se segue a desagregação
através de um exame radiográfico.
Por razões de ordem prática e até de economia, os ensaios estabelecidos para avaliar o tempo de
desintegração consistem essencialmente em colocar o comprimido ou comprimidos em contacto com a
água pura ou adicionada de ácido clorídrico e de pepsina, a determinada temperatura, calculando o
tempo necessário para que se dê a desagregação.
As condições estabelecidas pêlos diversos códigos são muito variáveis, servindo-se alguns de
material rudimentar, enquanto outros lançam mão de aparelhagem bastante complicada. Em face
das várias modalidades operatórias, passemos uma rápida vista de olhos sobre o que está
consignado nas principais farmacopeias, analisando o assunto de diversos pontos de vista.
Número de comprimidos submetidos ao ensaio — Nem todas as farmacopeias se referem ao
número de comprimidos que se deverá utilizar em cada ensaio. Para aquelas que o especificam pode,
contudo, dizer-se que esse número vai de l a 6. Parece-nos que um exame simultâneo de várias
unidades é preferível, para evitar causas de erro, a uma análise executada apenas sobre um
comprimido. Acresce ainda que, depois dos trabalhos de VOLCKERINGER sobre a sulfanilamida, está
demonstrado que comprimidos provenientes de um mesmo lote podem apresentar características de
desagregação completamente diferentes. Não obstante este óbice, encontrámos as farmacopeias Argen-
tina de 1943, Japonesa de 1951 e Helvética de 1934 operando apenas sobre uma unidade. Executa o
ensaio sobre dois comprimidos a farmacopeia Jugoslava de 1951 e
766

Temperatura a que é conduzido o ensaio — Em princípio parece que a temperatura de 37°C seria
a indicada, já que representa a temperatura fisiológica. Alguns códigos prescrevem, contudo,
temperaturas ligeiramente superiores, como a Farmacopeia Dinamarquesa (38-39°C) e a Sueca
(40°C). A U.S.P. tolera valores que vão de 35 a 39°C, ao passo que a Farmacopeia Portuguesa V
estipula que a temperatura do líquido de desagregação esteja compreendida entre 36 e 38°C. Já a
Farmacopeia Belga prescreve, com critério pouco defensável, a temperatura da água tépida, que não
especifica de modo preciso. O Codex de 1949, depois de demorados trabalhos devidos a VOLC-
KERINGER, preconizava a temperatura normal a 20°C que entendeu ser a mais fácil de conseguir. Não
nos devemos, contudo, esquecer que, como o próprio autor confessa, as variações de temperatura
podem arrastar variações do tempo de desagregação que vão de 20 a 50%. Talvez por estas razões a
Farmacopeia Francesa de 1965 mande utilizar água (350 ml) aquecida a 37° ± 2°C.
Tempos de desagregação — São normais períodos de tempo variando entre 10 e 15 minutos como
necessários para a desagregação dos comprimidos. As Farmacopeias Dinamarquesa, Chilena e
Russa prescrevem o tempo de 10 minutos. Outras, como a Helvética, Argentina, Portuguesa IV e
Britânica, indicam o período de 15 minutos. A tendência actual é aumentar os tempos de
desagregação para este último valor, ou ainda para cifras mais elevadas, visto estar provado que
períodos de tempo de cinco minutos, como alguns códigos chegaram a prescrever, são insuficientes
para a maioria dos comprimidos. Assim, o Codex de 1965 estabelece o período de 45 minutos como
limite de tempo de desagregação para comprimidos normais.
Em face, porém, do tempo de desagregação ser dependente, além da técnica de fabrico, da
natureza dos fármacos, parece-nos que seria preferível estabelecer períodos de tempo de
desagregação variáveis com a substância medicamentosa. É afinal o que fazem a U.S.P. e a F. P. V,
onde se encontra discriminado, a propósito de cada espécie de comprimidos, o tempo máximo
permitido para a sua desintegração. Assim, para fazermos uma ideia da variabilidade desses
períodos, diremos apenas que na U.S.P. XVI eles oscilavam entre 5 minutos para o ácido
acetilsalicílico e i hora para o suifato de neomicina. Também na Farmacopeia Portuguesa V se
indicam tempos de desagregação de 15 minutos, para os comprimidos de etinilestradiol, de 30
minutos, para a carbamazepina e a piridoxina, entre outros e de 60 minutos para a griseofulvina, a
neomicina e o verapamil.
Na Farmacopeia Britânica encontramos também exemplos desta orientação quando se foge à
regra geral de 15 minutos, mencionando-se o período de meia hora para os comprimidos de luminal
e de barbital, e de 3 minutos para a aspirina.
Técnica operatória — Algumas farmacopeias operam em matrás ou balão, adicionando os
comprimidos ao volume de líquido e agitando, lentamente, à temperatura estabelecida. Findar-se-á a
operação quando os comprimidos estiveram desagregados. Quanto a isto, parece-nos que se deveria
definir melhor nalguns códigos o que se
767

entende por comprimido desagregado. Muitas vezes acontece a quem faz esta determinações não saber se
há-de considerar o ensaio terminado, visto os comprimidos se desfazerem em fragmentos irregulares.
Para evitar este inconveniente mandam as Far-macopeias Francesa, Norte-Americana e Portuguesa V
usar uma rede metálica cuja malha é de 2 mm. O processo, aliás não é novo, tendo aparecido pela
primeira vez na Farmacopeia Alemã 5.° edição, de 1926.
Outro facto que carece ser considerado é o ritmo de agitação, estabelecendo a U.S.P. e a
Farmacopeia Portuguesa V um vai-vém de 28 a 32 agitações por minuto.
O método da Farmacopeia Britânica de 1953 consistia em colocar os comprimidos em tubos com água,
fazendo com que o comprimido passasse de um a outro extremo do tubo sem, contudo, embater nas suas
paredes. MARCUS EI.LIS propõe para a agitação dos comprimidos um dispositivo especial que imprime aos
tubos 28 rotações por minuto.
No processo descrito por BORASI os comprimidos são submetidos à acção de uma bomba aspirante-
premente que trabalha, na parte correspondente ao estômago, a 10 rotações por minuto e na porção
destinada a representar o intestino, a 16 rotações no mesmo período de tempo.
CASADIO, reportando-se a CALAMARI e ROOTH, propõe operar em aparelho totalmente susceptível de ser
montado com as escassas possibilidades da pequena oficina farmacêutica. Traia-se de um conjunto
constituído por um copo sem bico, contendo 250 ml de água, ao qual se adaptou uma rolha de borracha
perfurada por 3 tubos. Os tubos laterais são do mesmo diâmetro, destinando-se o primeiro a contactar
com o ar que borbulhará no seio da água ao ser aspirado pelo segundo, que se liga a uma trompa de
vazio. O tubo central, de 25 mm de diâmetro, termina por uma pequena rede com 4 malhas por
centímetro e destina-se a conter o comprimido em ensaio. A intensidade do vazio efectuado deve poder
regular-se por intermédio de uma torneira que se liga à trompa e será condicionada de tal modo que
borbulhem na água 120 bolhas de ar por minuto. Como se vê, neste método a agitação é constante e em
condições semelhantes às fisiológicas. Por outro lado, a presença da rede indica-nos, de modo preciso, o
fim do ensaio. Parece, pois, que o mencionado processo pode dar bons resultados práticos na
determinação do tempo de desagregação dos comprimidos. Como inconveniente só lhe pode ser apontado
o facto de se trabalhar apenas com uma unidade e, portanto, obrigar a repetir a operação para que o
analista fique com a certeza de que o acaso não influiu nos resultados (Fig. 289).
A Farmacopeia Portuguesa V inscreve um método para apreciar a desagregação dos comprimidos
baseado na aplicação de um conjunto rígido que suporta 6 tubos cilíndricos de vidro e em cuja placa
inferior está fixada uma rede metálica de fios de aço inoxidável com abertura de malha de 2 mm. O
cesto, contendo 6 comprimidos, deverá movimentar-se no líquido de desagregação (36-38°C), durante
o ensaio, num
768

ritmo de 28 a 32 movimentos de vai-vém por minuto. A agitação é vertical e o ensaio considera-se


terminado quando:
a) não haja qualquer resíduo sobre a rede;
b) se subsiste um resíduo, este seja apenas constituído por uma massa mole que não inclua
qualquer núcleo palpável, não embebido;
c) não subsistam mais do que fragmentos do revestimento do comprimido.

Hede de
4 malhas1
por crr

Fig. 289. Dispositivo de Casadio para apreciar a desagregação de


comprimidos

Segundo a nossa farmacopeia, os comprimidos não revestidos devem desagregar-se, nestas


circunstâncias, no período de tempo indicado na respectiva monografia. Claramente que não se
consideram aqui os comprimidos para administração hipodérmica, os quais é hábito dissolverem-se
completamente em período inferior a 2 minutos. Esta norma é estipulada pela U.S.P. que, aliás,
indica ainda que estes comprimidos se dissolvam sem efervescência, originando soluções límpidas.
Também os comprimidos para aplicação sublingual e vaginal e os comprimidos efervescentes
não devem satisfazer a estes limites de tempo de desagregação. Assim, preconiza-se, para os
primeiros, uma desagregação em não menos de 20 minutos e não mais de l hora. Para os
comprimidos vaginais, recomenda-se o período de 4 a 5 minutos e para os efervescentes estabelece-
se um máximo de 2 minutos.
Na gravura da pág. seguinte (Fig. 290) reproduzimos alguns cestos que podem ser usados para
estudar a desagregação. A parte inferior da gravura representa uma placa perfurada por vários
orifícios circulares, providos de rede, sobre os quais assentam
769

tubos de vidro, abertos nas duas extremidades. Em cada um desses tubos é lançado um comprimido
a ensaiar.
No mercado encontra-se um aparelho que permite fazer o ensaio, tendo a vantagem de ser
inteiramente automático e de registar o período de desagregação. Trata-se do aparelho Erweka
(agitação mecânica pendular; 54 movimentos por minuto; 8 movimentos de 4 mm de amplitude,
seguidos de l de 20 mm; peso de 10 gramas aplicado sobre os comprimidos). Este aparelho,
apresentando movimentos pendulares, é dos que melhor reproduz a desagregação in vivo, já
que os movimentos gástricos são normalmente desse tipo. A Fig. 291 reproduz um aparelho
Erweka.
Da análise sumária destes métodos salientamos as seguintes
características que julgamos deverem ser observadas: 1)
padronização do ritmo e tipo de agitação utilizados; 2) existência de
uma rede, sobre a qual são colocados os comprimidos,
cuja abertura de malha é de 2-3 mm; 3)
emprego de água destilada aquecida a
37° ± 2°C; 4) utilização, em todos os o0
ensaios, do mesmo volume de água; 5)
estabelecimento de tempos limites de
desagregação, de acordo com a Flg. 290. Cesto para
natureza do fármaco ou fármacos apreciar a
constituintes dos comprimidos; 6) desagregação de
comprimidos
1
emprego de, pelo menos, 5 agitação vertical;— Haste que permite a
comprimidos em cada ensaio.
6) Ensaio de dissolução — Uma das provas mais importantes para se saber das qualidades de
uma preparação sólida consiste na determinação da sua velocidade de dissolução. Tal medida
orienta muito melhor o técnico do que o conhecimento da velocidade de desagregação, único método
utilizado até há alguns anos para apreciar a qualidade de comprimidos ou de cápsulas no que diz
respeito à libertação dos seus princípios activos.
Naturalmente que o teste de dissolução poderia ser aplicado a todos os tipos de comprimidos,
qualquer que fosse o seu princípio medicamentoso. Entretanto, compreende-se que o ensaio tenha
maior interesse para apreciar os compostos pouco solúveis na água. É por isso que a USP XX não
obriga à execução do referido ensaio para todos os comprimidos, mas apenas para aqules cujos
fármacos apresentem muito fraca hidrossolubilidade. Assim, o teste é exigido naquele código para
comprimidos de aceto-hexamida, dexametasona, digitoxina, meprobamato, metandroestenolona,
metilpred-nisolona, nitrofurantoína, prednisolona, sulfato de quinidina, sulfametoxazol, bem como
770

para comprimidos contendo a associação de teofilina, cloridrato de efedrina e feno-barbital.


Como já anteriormente dissemos, a velocidade de dissolução de um sólido áját pode calcular-se
pela fórmula de Noyes-Whitney (ver pág. 308).
dc —j-— = A.S.(CK-C) em que A representa uma
constante dependente do coeficiente de difusão do fármaco, da agitação e
do volume de líquido com que se opera; Ct é a concentração do fármaco
dissolvido na camada de difusão; C é a concentração da solução no tempo
t e S é a superfície do sólido.
A equação referida foi modificada por Nemst (fórmula de Noyes-
Nernst), substituindo o valor de A pela relação entre o coeficiente de
difusão do sólido no líquido (K) e o produto da espessura da camada de
difusão (h) pelo volume de líquido (V)
A=-
hV
Assim virá:
K S (C(-
dc d.
Ao iniciar-se a C) h dissolução, Cs é praticamente idêntico ao
coeficiente de solubilidade e C é igual a zero. Uma vez que se pode
calcular a superfície específica (S) do fármaco, é muito fácil determinar a
Flg. 291. Aparelho
Erweka para apreciar a velocidade inicial de dissolução.
Suponhamos, por exemplo, que nos era
desagregação de
Fot. Abel Rokjão pedida a estimativa teórica da velocidade de dis
solução da dexametasona na água, admitindo-se que tínhamos
uma quantidade de
fármaco de 25 mg, dividido em partículas de 10~2 cm de diâmetro. A
densidade da
dexametasona é de cerca de 1,20 e a sua solubilidade na água é de 0,1 mg/ml.
Admitamos que o ensaio se fazia num volume de 500 ml de água e que a agitação se
processava a um ritmo de 55 r.p.m. ,.. . .
771

Aceitando a esfericidade das partículas, o volume de cada partícula de dexamela-sona seria


—— TC r' = —— x 3,14 x (0,5 x I(r2)3 =—— x 3,14 x 0,125 x 10^
33 3
25 x IO'3
No volume ocupado por 25 mg de droga, isto é, em —————, pois
1,20
p
—— = Volume das partículas, d
25 x IO"3 3 '*"* ' :
haverá ————— x —————————————— = 39 800 partículas
1,20 4x3,14x0,125x10-* ;

A área ocupada por estas partículas (S) é de .


2
4 TC r x 39800 „
ou seja u.
12,49 cm2 (')
De acordo com HUSSAIN, o valor de h para a maioria dos compostos, quando o ritmo de agitação
é de 55 r.p.m., pode cifrar-se em 50 x lO^1 cm. Como, por outro lado, Cs é, de início, igual ao
coeficiente de solubilidade da dexametasona (0,1 mg/ml) e C é nulo nessas condições, virá:
d 12,49x9,OxlO-"xO,l
—- = —————————————— = 4,5x10-* mg. cm2, s'1, ml-'
d, 5,0 x IO-3x 500
porquanto A' (coeficiente de difusão do fármaco em água) pode ser estimado com boa aproximação
em 9,0 x 10"*. s"1 (ver pág. 463).
A aparelhagem utilizada para determinar a velocidade de dissolução pode ser de variados
modelos, como os que esquematicamente se reproduzem nas figs. 292, 293 e 294 e que retiramos,
com a devida vénia, de um trabalho de Manna.

6 ('} Claramente que pode calcular-se a


superfície específica aplicando a fórmula S = ——
que citámos a págs. 507:
6 25x10-'
S= ——2 x ————— =12,5 cm2
t IO- 1,20
772

Flg. 293. Métodos de dissolução com agitação forçada


l Rotativo; b) Do copo; c) Tubo oscilante; d) Disco rotativo; e) Agitador; f) Medida de partículas; g)
Sonder e Ellenbogen

Fig. 294. Métodos de dissolução SINK ou de esgotamento (meio de dissolução com menos de 10% do dissolvido;
Cs muito maior do que C)
l Absorção; b) Separação; c) Diálise com célula rotativa; d) Diálise com frasco rotativo;
e) Diálise com célula oscilante As flechas pontilhadas indicam a direcção da matéria
dissolvida
773

A Farmacopeia Norte-Americana indica dois aparelhos para executar o ensaio de dissolução de


comprimidos: o primeiro é constituído por um cesto rotativo, com malhas de 40 mesh (0,42 mm) e o
segundo possui um agitador em pá.

{parelho com pá agitadora Aparelho com cesto de rede


Fig. 295. Esquemas dos aparelhos de dissolução utilizados pela F. P. V

A USP XXII, que em regra manda utilizar o aparelho I para os ensaios de dissolução, indica nas
monografias respectivas a forma de executar o teste, estabelecendo para cada caso os limites de
aceitação. Com certa frequência estabelece-se que após 30-40 minutos de agitação se tenham dissolvido
60-80% do princípio medicamentoso libertado.
Semelhantes a estes dois aparelhos são os indicados pela Farmacopeia Portuguesa V, que os designa
como aparelho com pá agitadora e aparelho com cesto de rede (Fig. 295).
774

O ensaio é executado sobre ura comprimido, em cuja monografia se deve indicar, entre outras
características, o tipo de aparelho a utilizar, a composição e o volume do líquido de dissolução, a
velocidade de agitação e a quantidade de substância activa que deve dissolver-se ao fim de um
determinado intervalo de tempo.
CARSTENSEN, em 1977, propôs uma diferenciação entre a dissolução de comprimidos preparados por
granulação a seco ou a húmido. Com efeito, quando os comprimidos são obtidos por compressão directa
ou por dupla compressão, a dissolução dos seus princípios activos segue a chamada lei da raiz cúbica,
enquanto que os comprimidos preparados por granulação a húmido se desintegram previamente em grãos
porosos ou pouco porosos os quais libertam os fármacos segundo uma mecânica diferente.
Consideremos o primeiro caso, isto é, o dos comprimidos obtidos por granulação a seco. Neste tipo de
preparação a desagregação origina imediatamente partículas de fármaco que tendem a dissolver-se de
acordo com a equação da raiz cúbica de HIXSON--CROWELL.
vvy3 - w3 = R (t-t,)
em que tt é o tempo de desagregação, Wo a quantidade de fármaco existente inicialmente, W a quantidade
de fármaco não dissolvida ao fim do tempo t e R uma constante de dissolução (velocidade média da raiz
cúbica de dissolução). R pode calcular-se determinando-se o peso (W) de fármaco que se não dissolver em
tempo determinado, como 10, 20, 30, 40 ou 50 minutos, após a desagregação, uma vez que é conhecido
Wa, já que este corresponde à quantidade inicial de fármaco:
W"3 - W"3 R = ——-—————

Suponhamos, por exemplo, uns comprimidos de sulfonamida com o peso inicial de 500 mg os quais
levaram 10 minutos a desagregar, em 1000 ml de água. Ao fim de 20, 30 e 40 minutos procedeu-se à
determinação da quantidade de sulfonamida dissolvida, 3tendo-se encontrado as concentrações que
referimos na Tabela LXXXVIII, o que permitiu calcular (W^' - W"3) e R.
Tabela LXXXVIII. Dissolução de uma sulfonamida a partir de comprimidos granulados a seco
Tempo Concentração Peso não
(min) (mg. mi~') dissolvido (g) W a" 3 - W" R
10 0 0,5 0 —
20 0,240 0,260 0,150 0,0150
30 0,392 0,108 0,310 0,0155
40 0,471 0,029 0,487 0,0162
R (médio) = 0,0156
775

Já quanto aos comprimidos obtidos por granulação a húmido a dissolução processa-se segundo um
esquema diferente. Ainda segundo CARSTENSEN, a desagregação pode originar grãos porosos ou pouco
porosos. No primeiro caso aquele investigador admite que a dissolução se faz por difusão no líquido de
desagregação, dependendo do volume e do tempo de penetração do líquido nos poros.
Em relação aos grãos pouco porosos é fundamentalmente importante o tempo de penetração do líquido
de desagregação nos poros, parecendo ser secundário o fenómeno da difusão. A quantidade de fármaco
dissolvido (Q) por unidade de superfície é dependente da porosidade (e) e da fracção de fármaco nos
grãos ou no comprimido (B) de acordo com a seguinte equação:
Q = (K'Bet)l/2
sendo t o tempo e , .
K' = 2 Cs K
(recordemos que Cs é a concentração do fármaco dissolvido na camada de difusão e K o seu coeficiente de
difusão).
Exemplificando, suponhamos que uns comprimidos não porosos continham 150 mg de fármaco 2e 250
mg de excipiente, ambos com a densidade de 1,2. Cada comprimido tinha uma superfície de l ,5 cm e um
volume de 0,35 cm3. Interessava-nos calcular K' e saber qual a quantidade (Q) de fármaco que se poderia
dissolver por unidade de superfície, ao fim de 30 minutos.
Admitamos que laboratorialmente se verificou libertarem-se 100 mg de fármaco de cada comprimido,
decorridos 10 minutos de ensaio.
A quantidade total de fármaco + excipiente é de 400 mg e o volume correspondente a esta massa será,
portanto, de 0,4 : 1,2 = 0,33 cm3. Como o volume do comprimido era de 0,35 cm3
, o espaço nele ocupado
pelo ar era de 0,35 - 0,33 = 0,02 cm3, o que representa uma porosidade (e) de 0,02 : 0,35 = 0,057 ou
5,7%.
Aplicando a equação anteriormente transcrita virá:
r 15° n
2
100 mg.cm- = K' ———— (0,057) (10 min) '•'',
L 4(YI J
donde
100
(K')1/! = —— = 216,5 e 0,462
"'• • " ' K' = 216.52 = 46 872 mg2 . cm'4 . min'1
Ao fim de 30 minutos a quantidade de fármaco que se poderia dissolver seria dada por:
150
1DU
r i i/
Q =|46872 46872 ———— (0,057(30) '•'' = V 30056,7 = 173,4
40 1 - 4 0 0 J
776

o que significa, portanto, que decorridos os 30 minutos já todo o fármaco de um comprimido se teria
dissolvido.
Para lá dos ensaios de desagregação deve, também, pensar-se na dissolução dos princípios activos
contidos nas drageias. Nos casos mais simples a drageificação foi apenas efectuada com a finalidade de
preservar o fármaco ou fármacos da humidade ou da degradação fotolítica. Nessas circunstâncias, cedida a
camada de revestimento, tudo se passa como indicámos a propósito dos comprimidos, feitos por granulação a
seco ou a húmido e, neste caso, considera-se, ainda, a porosidade relativa dos grãos constituintes. Algumas
vezes a drageificação terá sido executada para evitar a desagregação gástrica, mas a camada de
revestimento deverá ser libertada em suco entérico artificial, por saponificação, por influência do pH, por
hidrólise, etc. Assim, o comprimido fica livre do seu revestimento e tudo se passará depois como para o
tipo de drageias a que anteriormente nos referimos.
Um terceiro caso pode, porém, surgir. Trata-se das drageias cujo revestimento foi executado para
prolongar a libertação do fármaco, conseguindo-se uma acção terapêutica que dure mais tempo. Com efeito,
neste último tipo de drageias deve ter-se uma porção de fármaco que rapidamente seja posta em contacto
com o líquido intestinal (dose de acção imediata) e outra porção, fixada por adsorção a excipientes ou
matrizes inertes, que só muito lentamente vai sendo cedida, o que proporciona um efeito terapêutico que pode
ser mantido por várias horas (dose de manutenção). A libertação do fármaco deve ser regular e obedece a
uma cinética diferente das que apontámos. De uma forma geral, a percentagem do volume de líquido que
penetra e dissolve o fármaco contido numa matriz inerte é proporcional à raiz quadrada do tempo. Quer isto
dizer que a quantidade de fármaco dissolvido (Q) é proporcional a t"2 de acordo com a seguinte equação

Q = K t'/2 ou Q = K VT

sendo K uma constante que representa a inclinação da linha obtida ao tomar em ordenadas a percentagem de
fármaco libertada e em abcissas a raiz quadrada do tempo, expresso em minutos. GOODHART et ai. e PARNAROWSKI
apresentaram dois estudos sobre este assunto.

7) Resistência — Naturalmente que os comprimidos devem apresentar uma resistência suficiente para
não quebrarem, quer durante as operações que precedem o acondicionamento, quer durante a
armazenagem. Esta propriedade mais desejável é, ainda, quando os comprimidos se destinam a serem
revestidos, isto é, quando constituem uma fase da preparação das drageias. E se bem que a avaliação da
resistência não se encontre habitualmente incluída nas Farmacopeias, constitui uma preocupação real das
várias comissões que as elaboram. Por isso se refere, na monografia de comprimidos da Farmacopeia
Portuguesa V, que «devem oferecer resistência suficiente para permitir que sejam submetidos às diversas
manipulações sem esmigalharem ou partirem».
777

A resistência de um comprimido ao choque depende de diversos factores, como a coesão dos


componentes, aglutinantes utilizados, granulação executada a seco ou a húmido, tamanho e forma dos
grânulos, lubrificante empregado, pressão exercida durante a compressão, tamanho e forma dos
comprimidos, estado dos punções e matrizes, etc.
As gomas ou a gelatina em solução aquosa comportam-se como excelentes aglutinantes no que diz
respeito a comunicarem resistência aos comprimidos, sendo mais eficazes do que o cozimento de amido,
mesmo em concentrações de 10-15%.
O talco não actua desfavoravelmente sobre a resistência dos comprimidos, ao contrário do estearato
de magnésio. Igualmente conferem boa resistência os carbowaxes e o ácido esteárico.
Os comprimidos em que a granulação tenha sido feita a húmido são normalmente mais resistentes do
que aqueles em que a granulação foi conduzida a seco. Ora, os grânulos obtidos a seco são, como é
sabido, muito menos porosos e por isso necessitam de maior força de compressão para aglutinarem.
A fim de se avaliar a resistência dos comprimidos têm sido criadas numerosas provas. As mais simples
consistem no seguinte:
— prendendo o comprimido entre o 2." e 3.° dedos da mão, este deve partir-se em duas metades, por
compressão do polegar; o ensaio deve realizar-se sem demasiado esforço, mas sem excessiva facilidade;
— deixando cair o comprimido da altura de l metro, sobre uma superfície de madeira, aquele não deve
partir.
Claramente que estes ensaios são muito falíveis, o primeiro pela demasiada subjectividade de que se
reveste e o segundo por se não definir a dureza da madeira.
Actualmente existem numerosos testes para ensaiar a resistência dos comprimidos. Fundamentalmente,
consistem na determinação da resistência do comprimido ao esmagamento ou à penetração, sob pressão
axial ou radial (dureza), e na avaliação da resistência mecânica a acções diversas, o que é determinado
pela percentagem de detritos que se separam do comprimido (friabilidade).
A friabilidade dos comprimidos é, portanto, um grau de resistência que pode ser manifestado em
relação ao choque, atrito, rolamento, agitação e flexão, sucedendo que do ponto de vista prático tem
particular interesse avaliar-se o grau de resistência à agitação e ao rolamento.
Quando se quebra um comprimido, as superfícies fracturadas revelam que a fractura se produziu,
predominantemente, nos cristais que apresentam superfície plana, ou em volta deles, como resultado da
cisão das ligações cristal-cristal.
É bem marcada a influência do tamanho dos cristais, aumentando a resistência do comprimido com a
tenuidade das partículas cristalinas. KNUDSON, em 1959, deduziu
778

uma equação que permite relacionar a dureza de um sólido comprimido (F) com a porosidade (P) do
material que lhe deu origem:
Fr = K L~a exp. f')
em que L é o tamanho médio dos grânulos e b, K e a são constantes empíricas. Todavia, a citada
igualdade não pode ser aplicada às substâncias que, como o ácido acetilsalicflico, apresentem maior
dureza individual dos cristais do que a produzida pelas forças de ligação entre eles.
A dureza de um comprimido é pr
oporcional ao logaritmo da força de compressão e inversamente proporcional à porosidade daquele.
Quanto maior for a força de compressão usada na produção de comprimidos, tanto menos porosos e
mais duros estes se apresentarão. Desta forma, compreende-se que na medida em que se eleve a força de
compressão obteremos comprimidos mais resistentes e menos porosos, acarretando esta diminuição de
espaços vazios um maior período de desagregação. Nas Figs. 296 e 297 indicam-se, respectivamente, as
variações entre dureza e força de compressão e dureza e porosidade, segundo HIGUCHI e colaboradores
(1953).
SHOTTON e GANDERTON estudaram também as relações entre a força de compressão, a dureza e a
porosidade de comprimidos. Na Tabela LXXXIX indicam-se as mencionadas relações.

i noo 2 coo -••• ooo n ooo H ooo


Fcrça de compressão em libras
Fig. 296. Relação entre a dureza e a força
de compressão
Segundo Higuchi, T. et aí. — J. Am. Pharm. ASS. Sei. Ed, 42, 194 (1953)

:"> i C 15 ?0 25 30 Fig. 297. Relação entre a dureza


e a porosidade
Segundo Higuchi, T. ef ai. — J. Am. Pharm. Ass. Sei. Ed., 42. 194 (1953)
779

779
Tabela LXXXIX. Relação entre a força de compressão, dureza e porosidade
Força de compressão Dureza
em kg/cm2 (médias) em kg Porosidade %
:
2020 10-13 7,55 '"•"-••'
1655 7,47 9,29 •'••'• ; v- '•
1375 5,82 10,86 ü ;
855 2,63 16,25 .„, ;.
530 1,58 19,92

Quanto à inabilidade, um trabalho de A. ALBUQUERQUE e IRENE TAVARES demonstra haver relações de


proporcionalidade entre ela, a força de compressão e a resistência dos comprimidos.
Nas Tabelas XC e XCI indicamos os resultados obtidos com comprimidos preparados com dois tipos
de granulado:
A — (lactose, amido, talco, estearato de magnésio e solução de metilcelulose 400 a 5%) e B — (lactose,
amido, talco, estearato de magnésio e cozimento de amido a 5%).
Tabela XC. Comprimidos preparados com granulado A — relação entre a compressão, a resistência ao
esmagamento e a friabilidade
Compressão Resistência
(unidades ao esmaga- Tempo de rolamento (minutos)
empíricas) mento (g) 4 6 8 10 12 14
3,10 2.800 0,45 1,5 2,4 7,2 — — „ o
3,15 3.130 0,45 0,47 0,64 1,6 3,8 7,4 II i.
3,20 4.300 0,36 0,40 0,61 0,66 0,69 1,4 Is •«
3,25 4.420 0,42 0,42 1,13 1,3 1,9 2,2 ë^-g
3,30 4.550 2,1 4,07 — — — — í*t
3,40 5.630 2,7 5,33 — — — — &

Segundo A. Albuquerque e M. Irene Tavares — Rev. Port. Farm. 16, 374 (1966)

Tabela XCI. Comprimidos preparados com granulado B — relação entre a compressão, a resistência ao
esmagamento e a friabilidade
Compressão Resistência
(unidades ao esmaga- Tempo de rolamento (minutos)
empíricas) mento (g) 4 6 8 10 12 14
3,05 1.840 0,46 1,1 2,3 7,01 _ , __
3,10 3.190 0,37 0,56 0,73 0,99 2,1 '"—
Q"ai &
3,15 4.070 0,29 0,49 0,66 0,77 0,97 1,2 3 S?«i
3,20 4.970 0,25 0,72 0,94 1,04 1,3 1,4 §*'
3,25 5.420 0,20 0,94 0,97 1,3 1,4 1,5 £.8 f
3,30 6.660 0,54 0,71 0,82 1,8 1,9 2,06 S

Segundo A. Albuquerque e M. Irene Tavares — Rev. Port. Farm. 16, 374 (1966)
780

O estudo destas relações foi ainda efectuado por outros investigadores, como SEITZ e FLESSLAND.
Existem dispositivos capazes de determinar a dureza ou a friabilidade e, assim, a avaliação da dureza é
conseguida por intermédio de aparelhos nos quais o comprimido é submetido a uma determinada pressão,
até que se dê a sua ruptura.
Nestes aparelhos o comprimido é apertado entre um suporte e uma parte móvel que pode ser
impulsionada por uma força constituída por pesos, por molas ou por ar comprimido. No dispositivo de
SYLVIO CIMINO, que é uma modificação do método de BERRY ou de PAMPLONA MONTEIRO, citados por MONTENEGRO,
a força é constituída por pesos, ou por pesos e aceleração da gravidade. No primeiro destes aparelhos a
compressão é radial (Fig. 298), mas no segundo é axial (há uma peça que cai sobre o comprimido,
colocado em posição horizontal).

Fig. 298. Dispositivo de Sylvio Cimino para apreciar a dureza de comprimidos


Fig. 299. Aparelho Monsanto para apreciar a dureza de comprimidos
Fot. Abel Roldão
781

ALBUQUERQUE e TAVARES descrevem um aparelho semelhante ao de CIMINO em que o peso é conseguido


mediante o emprego de granalha de chumbo, contida num reservatório.
Mais vulgarizado entre nós é, sem dúvida, o aparelho de STOCKES-ADAMS (Monsanto Chemical Company,
St. Louis). O comprimido em exame é colocado em posição radial, de encontro a um suporte. No bordo
oposto aplica-se uma parte móvel que o vai comprimindo. A força é exercida por uma mola que se aperta,
à medida que se roda um parafuso. Toma-se nota da pressão exercida, numa escala do aparelho, quando
o comprimido parte. A Fig. 299 representa um aparelho Monsanto. Do mesmo tipo deste é o aparelho
Pfizer (hardness-tester), descrito por FAIRCHILD e MICHEL.
Transcrevemos, seguidamente, uma tabela em que se relaciona o peso dos comprimidos com a. sua
dureza, apreciada através de ensaios com o aparelho Monsanto (Tabela XCII). Os limites nela indicados
são valores médios que correspondem às exigências habituais da indústria farmacêutica. Entretanto,
nenhuma farmacopeia oficializou ainda estes ensaios que, quanto a nós, são de capital importância.

Tabela XCII. Relação entre o peso dos comprimidos e a sua dureza (Monsanto)
Peso (g) : Dureza (kg)
< 0,015 0,4 "": _
: 0,015-0,075 0,8
0,075-0,150 1,4
0,150-0,300 3,0
0,300-0,450 4,5
> 0,450 6

A ERWEKA dispõe também de um aparelho que opera por peso exercido radial-mente sobre o
comprimido. A escala está graduada em unidades de 0,25 kg. Quando a pressão de esmagamento é
exercida pelo ar comprimido, este pode ser fornecido, por pressão pneumática, dada por uma bomba
manual. O aparelho Strong-Cobb aplica este princípio: o comprimido é colocado sobre um suporte ao
qual se ajusta uma peça móvel cuja força é dada pelo ar comprimido; a pressão pneumática exerce-se de
modo lento e gradual, sendo medida num manómetro, como se pode ver na Fig. 300. Cada unidade da
escala corresponde a 0,73 Kg.
As determinações executadas com este aparelho são mais exactas do que as
conseguidas com o de Monsanto em que, muitas vezes, a compressão da mola não
é proporcional à pressão por ela exercida. Na Tabela XCIII indicam-se as relações
entre o peso dos comprimidos e a pressão que devem suportar no aparelho Strong-
-Cobb. :~
782

Algumas vezes torna-se importante estabelecer uma relação, tanto quanto possível exacta,
relativamente às leituras dadas pêlos vários aparelhos que permitem determinar a dureza dos
comprimidos.
Na Tabela XCIV indicamos as equivalências entre os principais
instrumentos de medida da dureza actualmente utilizados.
No que diz respeito à Inabilidade dos comprimidos, interessa-nos, essencialmente,
considerar a resistência à agitação e a resistência ao rolamento. A resistência à
agitação determina-se nos moldes que indicámos para os granulados. Para isso
pode empregar-se o aparelho de NUTTER, que consiste num agitador onde se
colocam os comprimidos e que se move com um ritmo de 250 agitações por
minuto, percorrendo um espaço de 10 cm. Nestas circunstâncias, os comprimidos
são submetidos a 3750 agitações, em cada 15 minutos. Consideram-se bons os
comprimidos que, quando agitados durante 15 minutos, não libertam mais de
10% do seu peso, em pó. O ensaio realiza-se com 20 comprimidos, que se pesam
antes e depois da agitação, tendo o cuidado de separar o pó que se libertou, por
simples tamisação.
A resistência ao rolamento pode ser apreciada, facilmente, por meio de
diversos aparelhos, como o
de SPENGLER, que utiliza vários frascos, cheios de comprimidos, os quais submete a
um movimento de rotação de 145 voltas por minuto. O ensaio considera-se
terminado depois de efectuadas 10 000 voltas. O peso do pó e detritos separados
Fig. 300. Aparelho não deve ser superior a 10% do peso dos comprimidos de que se partiu.
Strong-Cobb para Outro aparelho, que está sendo muito usado entre nós, é o friabilómetro
apreciar a dureza de
Roche que consiste num cilindro de plexiglas, de 30 cm de diâmetro por 4 cm de espessura, o

Tabela XCIII. Relação entre o peso dos comprimidos e a sua dureza (Strong-Cobb)

Peso Dure
Ig) za
< 1,5
0, 3
1 *S
0,1 a 7,5
783

Tabela XCIV. Comparação das escalas de diferentes aparelhos destinados a determinar a dureza de
comprimidos
Aparelho Comprimento da escala Escala graduada em kg
percorrido por kg (cm)

Erweka 0,94 0,25


Pfizer 0,90 -•• ' 0,20
Stockes 0,30 1,0
Srong-Cobb 0,80 0,73

qual é susceptível de rodar sobre o seu eixo, com uma velocidade de 25 voltas por minuto. O ensaio
realiza-se submetendo os comprimidos a 100 voltas (4 minutos). Uma espécie de espátula que existe no
aparelho recolhe os comprimidos e lança-os, em cada rotação, de uma altura de 15 cm. Como nos ensaios
antecedentes, determina-se o peso dos comprimidos (parte-se de 20 unidades), antes e depois do
rolamento, exprimindo--se a friabilidade em função da percentagem de pó separado (Fig. 301).

Fig. 301. Friabilómetro Roche 1 —Motor; 2 —Cilindro de Plexiglas; 3


—Lâmina interna
Foi. Abel Roldão
784

A experiência obtida com o emprego deste aparelho mostra que são apenas considerados bons, do
ponto de vista da inabilidade, os comprimidos que perdem menos de 0,8% do seu peso, quando submetidos
ao ensaio descrito. Observa-se, deste modo, que muitos comprimidos de superfície plana perdem mais de
1% do seu peso, o que não é aconselhável comercialmente tendo em conta os atritos que se notam durante
a armazenagem e o transporte, recomendando-se, por isso, que aqueles apresentem forma biconvexa. Por
outro lado, tem ainda interesse o método de granulação usado. A granulação a húmido origina granulados
menos friáveis do que a granulação a seco; interessa, também, que o desagregante seja granulado em
conjunto com os restantes componentes e não adicionado sobre um granulado já feito.
A Tabela XCV mostra a diferença de friabilidade de comprimidos de carbromal, sulfatiazol e luminal,
preparados segundo os três processos descritos.

Tabela XCV. Valores relativos de friabilidade de vários comprimidos


Friabilidade
Comprimidos Granulação a húmido Granulação a seco

Carbromal 2 39 49
Luminal ,* 3 14 12
Sulfatiazol 2 4 28

A = amido junto ao pó antes da granulação B = amido junto ao granulado seco

7.2.1.2.10.2. Princípios activos


A identificação e dosagem dos constituintes dos comprimidos é um ensaio dos mais importantes.
Segundo a nossa legislação, cada nova especialidade, cuja aprovação se requeira, carece de métodos de
controlo que habilitem não só o farmacêutico ou o laboratório preparador, mas também as entidades
oficiais, a identificar e dosear os constituintes discriminados na fórmula. Claramente que nesta
identificação e dosagem só serão considerados os princípios activos, excluindo-se, portanto, os diversos
excipien-tes utilizados.
A identificação e a dosagem a que aludimos recorre a muitos processos, desde os métodos físico-
químicos às práticas químicas ou biológicas. Comprimidos há, porf'Ti, em que só os processos biológicos
(farmacodinâmicos ou microbiológicos) permitem dosear o princípio activo presente. Noutros casos, que
são em maior número, as técnicas físico-químicas ou químicas indicam, com elevada margem de
segurança, os resultados procurados.
785

O controlo analítico dos fármacos tem imenso interesse, visto que os comprimidos podem apresentar
quantidades de princípios activos diferentes das indicadas na fórmula e não obstante terem um peso
regular, bastando que os pós a comprimir apresentem diferentes densidades para que sejam
desigualmente distribuídos.
Por outro lado, os princípios activos podem ser alterados, durante a armazenagem, pela acção da
luz, da humidade, do calor, ele.
Normalmente, tolera-se uma variação de princípios activos, em relação às quantidades anunciadas,
compreendida entre 88 e 110% (85-115%). De qualquer modo, em relação aos comprimidos oficinais,
as farmacopeias estabelecem, para cada caso, os limites de tolerância.
O número de comprimidos a usar em cada ensaio de dosagem dos princípios
activos é variável, dependendo, entre outros factores, do rigor do método aplicado. Em
regra, ensaia-se sobre 10 a 50 comprimidos que se reduzem a pó, o qual, depois de
bem homogeneizado, fornece uma amostra média com que se opera. A Farmacopeia
Portuguesa V indica que a amostra inicial deve ser constituída por 20 unidades, para
a maior parte dos casos, ou por 25, em alguns casos. - s.
O cálculo rigoroso do número de ensaios a efectuar é dado pela equação:

em que n é o número de repetições necessárias para o coeficiente de segurança desejado e u é um


coeficiente, variável com a segurança pretendida e dado pela tabela I do Suplemento à Farmacopeia
Portuguesa IV (ver Cálculo Estatístico). Se o nível de probabilidades escolhido for P = 0,99 (resultados
altamente significativos), u será igual a 2,6 (rigorosamente 2,576); para P = 0,95 (resultados
significativos), » = 2 (rigorosamente 1,960); s é o desvio padrão e 5- o limite de tolerância.
Assim, para que tenhamos resultados com 99% de probabilidades, virá:

O valor de i é dado por

em que A = (X-X), representando X o valor de cada determinação e X o valor da média


aritmética de N determinações. -••-• ••-.••• , •;«...- . < • • / -
786

Se, por exemplo, pretendermos conhecer os resultados das dosagens com uma aproximação de 5%,
virá:

5 X 100

Como se compreende, à medida que a exigência aumenta haverá necessidade de efectuar maior
número de determinações. Deste modo, se pretendermos um rigor até 1%, teremos que efectuar mais
dosagens, já que o^ virá menor e, à medida que ele diminui, aumenta o valor de n, na fórmula indicada.
Determinado, portanto, «, se ele for maior do que W, teremos de efectuar ainda (n-N) ensaios para
atingir o grau de segurança pretendido.
A identificação e a dosagem dos constituintes dos comprimidos é realizada, como dissemos, por
métodos muito variáveis.
Actualmente, além dos processos clássicos, pode recorrer-se a técnicas mais fáceis e práticas, como as
titulações em meio anidro, a complexometria, a espectrofotometria no ultravioleta e no infravermelho e a
cromatografia líquida ou em fase gasosa.
Como técnicas preparativas mais recentes, citamos a extracção por contra-corrente e a separação
cromatográfica. Esta última poderá ainda realizar-se em coluna, em papel e em camada delgada, podendo
executar-se uma cromatografia preparativa.
Os ensaios de electroforese podem ainda servir para caracterizar e até dosear os constituintes dos
comprimidos.
No que diz respeito à tolerância, é aceite, regra geral, e como dissemos, uma variação entre 88-110%
da quantidade anunciada. Claramente que esta tolerância é motivada pela diminuição de teor de
princípios activos, pêlos erros inerentes ao doseamento, quer devidos à pequena quantidade de princípio
activo existente por comprimido, quer aos defeitos do método (processos biológicos dão resultados aproxi-
mados; processos espectrofotométricos ou volumétricos podem permitir um grau de rigor até 1-2%) e
pelas sobrecargas de princípios activos juntas por se prever uma quebra em função do tempo de
armazenagem.
Normalmente, comprimidos de fabrico e dosagem cuidadosa dão oscilações entre 95 e 105% da
quantidade anunciada, o que significa uma tolerância de 5%. Este valor é, no entanto, difícil de se
encontrar e é atendendo a isso que as farmacopeias são, regra geral, menos exigentes.
Entre os ensaios a que hoje se dá uma certa importância conta-se a uniformidade de teor em princípio
activo. Esta, como é evidente, depende, entre outras causas, da uniformidade do peso e é desejável que
seja mínima a variação encontrada em cada lote. Como é também lógico, a uniformidade de teor tem
tanto maior importância
787

quanto menor seja a quantidade de substância medicamentosa e é por isso que a USP manda averiguar a
uniformidade em todos os comprimidos, drageias ou cápsulas que contenham uma quantidade unitária de
fármaco inferior ou igual a 50 mg.
Em termos gerais, tendo-se tomado uma amostra de 30 comprimidos, 10 devem ser submetidos a um
ensaio individual e 9 em 10, pelo menos, devem ter teores entre 85-115% da média das tolerâncias, não
havendo nenhum que se situe fora de 75-125% dessa média. Se 2 comprimidos saírem destes limites
deverá proceder-se à análise individual dos 20 comprimidos restantes que devem satisfazer à localização
entre 85-115% da média aceite.
Também a Farmacopeia Portuguesa V obriga à realização do ensaio de uniformidade de teor em
comprimidos que contenham quantidades de princípio activo inferiores a 2 mg ou em que o fármaco
representa menos de 2 por cento da massa total da preparação. O ensaio não é exigível para preparações
polivitamínicas ou com oligoele-mentos e a sua realização dispensa a do ensaio de uniformidade de
massa.
Pelo que se disse, compreende-se a necessidade de identificar e dosear os princípios activos dos
comprimidos. A dosagem é executada por processos tanto quanto possível específicos do princípio em
causa, muitos dos quais vêm descritos nas farma-copeias e formulários. Outras vezes, porém, é necessário
recorrer à experimentação, pois que os métodos ofïcinais podem não ser aplicáveis à preparação em
causa, na qual podem existir substâncias que perturbem a dosagem.
No que diz respeito à identificação, se bem que geralmente seja fácil de executar, dado que se sabe de
que princípio ou princípios se trata, complica-se nalguns casos como, por exemplo, em intoxicações com
comprimidos desconhecidos.
COOPER (1954) estabeleceu uma série de provas químicas tão rápidas e simples quanto possível, não
necessitando de reagentes fora do comum e permitindo, em regra, determinar a natureza dum produto
desconhecido, sob a forma de comprimidos.
Como as reacções em tubo de ensaio exigem quantidades consideráveis de produto e também porque as
tentativas para obter um extracto aquoso são dificultadas pela presença de constituintes inactivos nos
comprimidos, que, podendo gelificar por aquecimento, obrigariam a filtrações, com perda de tempo, o
autor optou pelo ensaio da mancha sobre papel, o que evita essas complicações, assim como o uso de
reagentes muito enérgicos ou do calor. Após estes ensaios preli; linares sobre o papel, podem, no entanto,
realizar-se ainda outras provas de confirmação.
O método de ensaio proposto consiste no seguinte: extraem-se do interior do comprimido, para o caso
de se encontrar recoberto, alguns miligramas do produto, que é distribuído sobre cinco papéis
absorventes do tipo usado na cromatografia, lançando--se sobre ele algumas gotas dos cinco reagentes
adiante indicados. Nota-se a coloração que aparece e, se houver dúvidas, repete-se a adição. Deve
proceder-se depois a um prova de comparação com uma amostra do produto que for identificada, assim
como a um ensaio em branco com o papel que for utilizado na verificação. - ". . . • :
788

Os reagentes usados são os seguintes:

A — Piridina l ml, clorofórmio 9 ml (não se conserva mais de uma semana). B — Solução de acetato

cúprico a 0,5% (pode conservar-se durante um mês).

Para preparar o reagente A + B, deitam-se duas gotas de A sobre a amostra e depois uma
gota de B, observando-se a cor à luz reflectida.

C — Solução aquosa de nitrito de sódio a 10% l ml, ácido clorídrico diluído 9 ml (deve preparar-se
no momento de emprego).

D — Solução aquosa de ácido iódico ou de iodato ácido a 20% (conserva-se durante um mês).
E — Solução aquosa de cloreto férrico a 1% (conserva-se durante um mês).

F — Solução aquosa de /7-dimetilaminobenzaldeído a 2% em ácido clorídrico a 20% (só se conserva


durante uma semana).

Na Tabela XCVI indicam-se, segundo COOPER, as reacções a efectuar para a identificação de vários
comprimidos.
Outros autores, como HEFFERREN e MARQUES LEAL, estabeleceram chaves dicotómicas, respectivamente para os
comprimidos que mais correntemente se utilizam na América do Norte e para diversas sulfamidas do nosso
mercado.
Quando se prepara uma fórmula de comprimidos deverá proceder-se ao estudo da sua estabilidade. Os
ensaios serão conduzidos a diferentes temperaturas e graus de humidade, de acordo com o que adiante se
relata (ver Estabilidade dos Medicamentos). Geralmente, aprecia-se a estabilidade conservando os
comprimidos na estufa a 25, 37 e 45°C. Por outro lado, é também conveniente observar o seu
comportamento quando em presença da humidade, para o que podem ser conservados, a cada uma destas
temperaturas, em recipiente saturado de humidade.
Nalguns casos, é ainda conveniente observar-se o comportamento dos comprimidos quando submetidos à
acção das, mdiações .visíveis e ultravioletas.

7.2.1.2.11. Formulário dos comprimidos

Sob esta rubrica não pretendemos apresentar um formulário onde o prático possa ir encontrar a
resolução de problemas específicos, mas apenas mencionar algumas fórmulas de comprimidos que
julgamos representativas desta preparação galénica.
789

Tabela XCVI. Reacções de identificação de vários comprimidos


(Ordem reagentes e colorações obtidas)
A -t S c D F. F
Barbitúricos Violeta
Violeta Amarelo
Hidralazina Violeta Azul Amarelo
Amarelo
Isopropilartere Púrpura — — Verde —
Fenilbutazona Vermelho Castanho Castanh Negro Castanho —
A .LU! Azul- Ocre Amarelo
Sais de amónio
Calcifero]........ Azul
Azul p. a Verde Verde Verde
Acetilxalicilato
Salicilatos Verde p.a Purpura Esverde
Sulfamidas....... Verde
Verde
Vente Ocre
Procainamid» Verde Laranja Amarelo Vermelh
o tijolo Laranja
Verde Ocre Vermelho Amarelo
Salicilamída Verde
Verde Negro Negro Ptirpura
Quelina Verde
Verde Negro Ocre
Para-amino- Amarelo-
Verde Piirpura Amarel
Salicilato
Pamaquina...... de VerdeVerde Amarelo
Laranja Azul
Púrpura Púrpura Verde
Amarelo
Biscumacetalo
Sulfato de Verde p.a Amarelo Azul- Amarelo
TiouraeUo
Memtiouracilo Amarelo-
Amarelo- Negro Amarel
Diodo-
Propiltiouradl Amarelo
hidroxiquinolef Amarelo- Amarelo Negro
Amarelo Negro
Aiul- —
Ocre
Amarelo
Etopromazina
na ..................
........................
Tiacetazona Rosa
Purpura
............ - Púrpura Púrpura Salmio- Amarelo
Cloropromazin
a p.a rosa
Dielazina Vermelh Púrpura Salmão-
Azul- Púrpura Vermelho
Violeta
Benzocafn» - Amarelo
Amarelo Laranja
Ocre Laranja
Laranja
Estilbeitrol
Morfina Amarelo Laranja Verde
Colquicina Amarelo
Ocre Amarelo Amarelo
Violeta
Ácido
Ergotamina. — Azul-
Castanho _ Violeta
Metionina Castanho Amarel
Giraios - - z Amarelo ~
Amarelo
Amarelo
Tartaratos = = - Amarelo Amarelo
............ Amarelo
Dkiclomina
Formaldeído Amarelo
Amarelo Amarelo
De-
Tartaralo de — — _Ocre Amarelo Amarelo
Ácido Ocre
Ocre
ClorotelracLClin Ocre
Malealo de Castanho
Pancreatina Laranja Laranja Amarelo
Amarelo
Codeína..........
Nicotinamida Amarelo
Amarelo
Tolazolina — — — — Amarel
Arnnk
>
petiana
Cloroquina
........................ z ~ ~ ~ Amarel
o
................ — — — — Ammk)
Cortisona
CLoranfenicol _ _ _ _ Anunlo
Amarelo
Primidona ~ ~ ~ — Amarelo
Na indicação das reações coradas, a abreviatura p.a significa passando a. Segundo J.
Cooper — Pharm, J., 173, 481 (1954)
790

Quase todas as fórmulas que indicaremos correspondem a monografias incluídas no Formulário


Galénico Nacional, estando por isso suficientemente experimentadas.

Cloridrato de efedrina.................................. 50 g
Lactose .......................................................... 17 »
Amido de milho .......................................... 25 »
Solução de gelatina a 4% .......................... q.b.
Talco .................................................... q.b.p. 100 »
Humedeça a mistura da lactose, amido e cloridrato de efedrina com a solução de gelatina; granule e
seque na estufa a 40°C. Ajunte o talco e faça comprimidos com o peso médio de 0,10 g, utilizando punções
de cerca de 6 mm de diâmetro.

H-.; ' • :.
Pentobarbital sódico...................................... 100 g
Lactose .......................................................... 100 »
Amido ............................................................ 10 »
Cozimento de amido a 10% ...................... q.b.
Estearato de magnésio.................................. 3»
Talco .................................................... q.b.p. 230 »
Humedeça a mistura do pentobarbital, lactose e amido com o cozimento; granule e seque na estufa a
temperatura que não exceda 50°C. Misture as restantes substâncias e faça comprimidos com o peso médio
de 0,230 g, utilizando punções de cerca de 9 mm de diâmetro.
m
Fenolftaleína .................................................. 100 g
Lactose .......................................................... 150 »
Cozimento de amido a 10% ...................... q.b.
Estearato de magnésio.................................. 2»
Amido ............................................................ 20 »
Talco .................................................... q.b.p. 300 »
791

Humedeça a mistura da fenolftaleína e lactose com o cozimento; granule e seque na estufa a temperatura
inferior a 50°C; ajunte as restantes substâncias e faça comprimidos com o peso médio de 0,300 g,
utilizando punções de cerca de 10 mm de diâmetro. Observe-se que, nesta fórmula, ao contrário das
anteriores, se junta o amido, como desagregante, sobre o granulado já preparado.

IV '., ' ,-: .. ,


Cloridrato de clorodiazepóxido.................... 10 g
Lactose .......................................................... 200 »
Amido ............................................................ 28 »
Álcool de 70° .............................................. q.b.
Talco .................................................... q.b.p. 250 »
Humedeça a mistura do cloridrato de clorodiazepóxido, lactose e amido com álcool; granule e seque na
estufa a temperatura que não exceda 40°C; misture o talco e faça comprimidos com o peso médio de 0,250
g, utilizando punções de cerca de 9 mm de diâmetro.
Nesta preparação, dada a pequena quantidade de princípio activo, foi possível utilizar uma quantidade
elevada de lactose, o que permite executar a granulação com álcool diluído.

Codeína .......................................................... 20 g
Terpina hidratada .......................................... 100 » '
:
Benzoato de sódio........................................ 250 »
Lactose .......................................................... 300 »
Amido ............................................................ 100 »
Cozimento de amido a 10% ...................... q.b.
Talco .............................................................. 40 »
Estearato de magnésio.................................. 10 »
Humedeça a mistura dos cinco primeiros componentes com o cozimento de amido; granule e seque na
estufa a temperatura inferior a 40°C; misture o talco e o estearato e faça comprimidos de peso médio de
0,820 g, utilizando punções de cerca de 14 mm de diâmetro.
792

,. ,; Extracto de cáscara-sagrada ........................ 100 g ,


r. Cáscara-sagrada, em pó fino ...................... 100 »
Lactose .......................................................... 100 »
Amido ............................................................ 50 »
Cozimento de amido a 10% ...................... q. b.
Talco .............................................................. 20 »
Humedeça a mistura dos quatro primeiros componentes com o cozimento; granule e seque na estufa a
temperatura que não exceda 40°C; ajunte o talco e faça comprimidos de peso médio de 0,370 g, utilizando
punções de cerca de 10 mm de diâmetro.

VII
Metionina ...................................................... 500 g . .t
Lactose .......................................................... 200»
Solução de gelatina a 4% .......................... q.b. . ,,
Talco .............................................................. 5 8 » ~,
Estearato de magnésio.................................. 22 »
Humedeça a mistura da metionina e lactose com a solução de gelatina; granule e seque na estufa a
temperatura inferior a 40°C; misture o talco e o estearato e faça comprimidos de peso médio de 0,780 g,
utilizando punções de cerca de 14 mm de diâmetro.

vm
Adipato de piperazina .............................. 300 g
Amido........................................................ 70 »
Lactose ...................................................... 50 »
Manita........................................................ 30 »
Solução de gelatina a 20% .................... q.b.
Estearato de magnésio.............................. 7,5 »
Talco .................................................. q.b.p. 500 »
Humedeça a mistura do adipato, amido, lactose e manita com a solução de gelatina; granule e seque na estufa em
temperatura que não exceda 50°C. Ajunte as restantes substâncias e faça comprimidos com o peso médio de 0,500
g, utilizando punções de cerca de 12 mm de diâmetro.
793

lodocloro-hidroxiquinoleína .......................... 250 g


Amido ............................................................ 65 »
Extracto de fel de boi ................................ 10 »
Cozimento de amido a 10% ...................... q. b.
Ácido esteárico em pó ................................ 2 »
Estearato de magnésio.................................. 3 »
Talco .................................................... q.b.p. 350 »
Humedeça a mistura da iodocloro-hidroxiquinoleína, do extracto e de trinta gramas de amido com a
solução de gelatina; granule e seque na estufa a temperatura inferior a 50°C. Adicione vinte e cinco
gramas de amido e misture os lubrificantes. Faça comprimidos com o peso médio de 0,350 g, utilizando
punções de cerca de 10 mm de diâmetro.
Observe-se que nesta fórmula se empregou parte do amido na preparação do granulado e que a
porção restante foi adicionada quando se juntaram os três lubrificantes.
:
X _ .
Para-amino-salicilato de sódio .................... 500 g
Bissulfito de sódio........................................ 0,5 »
Xarope comum .............................................. q. b.
Álcool ............................................................ q.b.
Ácido esteárico.............................................. 0,5 »
Estearato de magnésio........................ q.b.p. 530 » •< , ; *;<•
Humedeça o p-amino-salicilato de sódio e o bissulfito com a mistura do xarope e álcool em partes iguais
(peso/peso). Granule e seque na estufa a temperatura que não exceda 40°C; ajunte as restantes
substâncias e faça comprimidos com o peso médio de 0,530 g, utilizando punções de cerca de 12 mm de
diâmetro.

XI
Pepsina .......................................................... 100 g
Cloridrato de betaína .................................... 400 »
Lactose .......................................................... 100 »
Amido ............................................................ 150 »
Cozimento de amido a 10% ...................... q.b.
Ácido esteárico em pó ................................ 16 g
Talco .................................................... q.b.p. 800 »
794

Humedeça a mistura da pepsina, cloridrato, lactose e amido com o cozimento. Granule e seque na estufa a
temperatura inferior a 30°C. Misture as restantes substâncias e faça comprimidos de peso médio de 0,800
g, utilizando punções de cerca de 14 mm de diâmetro.
xn
Folhas de beladona, em pó fino................ 10 g
Extracto de beladona.................................... 10 »
Fenobarbital .................................................. 20 »
Lactose .......................................................... 180 »
Amido ............................................................ 50 »
Carbonato de cálcio...................................... 3»
Gele de sílica................................................ 3»
Xarope comum.................. l
Água destilada .................. / aã (vol/vol) q.b.
Álcool ................................ J
Estearato de magnésio.................................. 3»
Talco .................................................... q.b.p. 300 >»
Dilua o extracto com cerca de 10 ml de água destilada e ajunte-o à mistura de pó de folhas com o
fenobarbital, lactose, carbonato de cálcio, gele de sílica e a trinta gramas de amido. Humedeça com a
mistura de xarope, água e álcool; granule e seque na estufa a temperatura inferior a 40°C. Adicione vinte
gramas de amido, o talco e o estearato. Faça comprimidos de peso médio de 0,300 g, utilizando punções
de cerca de 9 mm de diâmetro.
xm
Hidróxido de alumínio coloidal.................. 250 g
Trissilicato de magnésio .............................. 500 »
Fosfato tricálcico .......................................... 3 »
Amido de milho .......................................... 177 »
Agar-agar, em pó ........................................ 20 »
Sacarina sódica.............................................. l »
Ciclamato de cálcio...................................... 10 »
Solução de gelatina a 2% .......................... q.b.
Estearato de magnésio.................................. 15 »
Talco .................................................... q.b.p. 1000 »
795

Dissolva a sacarina e o ciclamato em q.b. de água e incorpore a solução assim obtida em 127 g de amido;
ajunte o hidróxido, o trissilicato, o fosfato e o agar-agar. Humedeça com a solução de gelatina, granule e
seque na estufa a temperatura que não exceda 40"C. Ajunte o estearato e o talco incorporados no amido
restante e faça comprimidos com o peso médio de l g, utilizando punções de cerca de 16 mm de diâmetro.
Estes comprimidos, que se utilizam como correctores da acidez gástrica, destinam--se a serem
dissolvidos lentamente na boca.

XIV
Ácido acetilsalicílico .................................... 80 g
Manita............................................................ 98 »,
Sacarina sódica.............................................. l »
Goma arábica ................................................ 4,5 »
Amido ............................................................ 11 »
Talco .............................................................. 8,5 »
Vanilina.......................................................... l » T -
Misture a manita com a sacarina e granule com mucilagem de goma arábica a 20%. Seque na estufa em
temperatura que não exceda 45°C. Misture com o ácido acetilsalicílico e, após homogeneização, adicione
o amido junto com a vanilina. Adicione o talco e faça comprimidos com o peso médio de 0,204 g,
utilizando punções de cerca de 9 mm de diâmetro.
Estes comprimidos destinam-se a serem mastigados.

XV

Cloridrato de tiamina.................................... 5
Riboflavina .................................................... 2
Nicotinamida.................................................. 20
Cloridrato de piridoxina .............................. 2
Pantotenato de cálcio.................................... 3
Lactose .......................................................... 75
Álcool ............................................................ q.b.
Amido ............................................................ 20
Talco .................................................... q.b.p. 150
796

Humedeça a mistura dos cloridratos, riboflavina, nicotinamida, pantotenato e açúcar de leite com o
álcool; granule e seque na estufa a temperatura inferior a 35°C. Ajunte as restantes substâncias e faça
comprimidos com o peso médio de 0,150 g, utilizando punções de cerca de 8 mm de diâmetro.
É conveniente adicionar um suplemento de 10% de cloridrato de tiamina, em relação à quantidade
discriminada na fórmula, já que esta substância se decompõe facilmente. Uma vez que o mononitrato de
tiamina é mais estável do que o cloridrato, este deve ser substituído por aquele sempre que isso seja
possível.
Os pantotenatos são também muito pouco estáveis, mesmo em preparações sólidas, recomendando-se
empregar um suplemento de 20% em relação à quantidade discriminada na fórmula.

XVI

Cloridrato de fenazopiridina ........................ 100 g


Amido de milho .......................................... 19 »
Alginato de sódio ........................................ l »
Agar-agar ...................................................... 2 » "~
Gelatina.......................................................... 4,5 »
Polissorbato 80.............................................. 0,8 »
Água destilada .............................................. 37,5 »
Estearato de magnésio.................................. 0,5 »
Talco.................................................... q.b.p. 130 »

Misture a fenazopiridina e o alginato com 12 gramas de amido e com l grama do agar-agar;


humedeça a mistura com a solução obtida pela dissolução da gelatina e do polissorbato na água.
Granule e seque na estufa a temperatura inferior a 50°C. Ajunte a mistura do amido com a gelose
restante; adicione o estearato e o talco. Faça comprimidos com o peso médio de 0,130 g, utilizando
punções de cerca de 7 mm de diâmetro.
Observe que, segundo esta técnica, se utiliza o polissorbato para facilitar o humedecimento da
fenazopiridina com o líquido de granulação. O agar-agar funciona como aglutinante e como
desagregante, sendo por isso dividido em duas partes, uma que se utiliza na massa a granular e outra
que se adiciona sobre o granulado já seco. Embora a gelose seja um dos principais desagregantes, não é
de desprezar, também, a função dupla exercida pela gelatina, alginato e amido que facilitam a
aglutinação e a desagregação.
797

XVII , •
Sulfato de isoprenalina ................................ 20 g
Glicose............................................................ 270 »
Etilenodiaminotetracetato de sódio .............. 0,12 »
Bissulfito de sódio........................................ 1,50 »
Gelatina.......................................................... 2 »
Água destilada .............................................. 40 »
Polietilenoglicol 6000 .................................. 3 »
Estearato de magnésio.................................. 3 »
Misture o sulfato de isoprenalina com a glicose, bissulfito e EDTA. Humedeça esta mistura com a solução
de gelatina em água. Granule e seque em estufa de vazio, primeiro a 35°C durante 5 horas e, depois,
sucessivamente, a 45, 55 e 65°C durante 5, 3 e 2 horas, respectivamente. Ajunte o estearato e o
polietilenoglicol 6000 e faça , comprimidos com o peso médio de 0,300 g, utilizando punções de cerca de 9
mm de diâmetro.
Esta preparação é muito delicada de executar dada a facilidade de oxidação do sulfato de
isoprenalina que origina um composto corado. Por este facto, incluiu-se na fórmula um redutor
(bissulfito) e um catalisador negativo (EDTA). A lubrificação é conseguida à custa do estearato de
magnésio e do polietilenoglicol 6000 que tem, também, uma acção protectora, pois funciona como uma
espécie de revestimento que impede a acção do oxigénio.

Xvm

Reserpina........................................................ 0,25 g
Lactose .......................................................... 45 »
Amido ............................................................ 45 »
Cozimento de amido a 10% ...................... q.b.
Clorofórmio.................................................... 15 »
Éter ................................................................ 8 »
Estearato de magnésio.................................. l » • • • • •
Talco .................................................... q.b.p. 100 » .
Humedeça a mistura da lactose e amido com o cozimento. Granule. Seque na estufa a temperatura que
não exceda 40°C; dissolva a reserpina no clorofórmio, ajunte o éter e distribua homogeneamente a
solução no granulado. Seque, rapidamente, a 30°C. Misture as restantes substâncias e faça comprimidos
com o peso médio de 0,100 g, utilizando punções de cerca de 6 mm de diâmetro.
798

Observe-se que, neste processo, se procede à dispersão do princípio activo sobre •••)
os excipientes, recorrendo-se a uma solução. Embora se possa pensar que este sistema
não origine uma distribuição perfeita da reserpina, tal não sucede na prática.

BIBLIOGRAFIA í

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WURSTER, D. — J. Amer. Pharm. Ass. Sei. Ed., 49, 82, 1960. .-,. .- ... . • • -.
800

7.2.1.3. Drageias 7.2.1.3.1. História e generalidades


Julga-se que a ideia de se revestirem as formas farmacêuticas sólidas, como as pílulas, se deve ao
médico persa RHAZÉS (865-925), que utilizou, para tal fim, as mucilagens.
Mais tarde, AVICENA (980-1030), que foi considerado como um dos expoentes máximos da medicina
árabe, empregou as folhas de ouro e de prata para envolvimento da mesma forma farmacêutica.
Em 1608, o farmacêutico JEAN RENOU recorreu, também, à douragem das pílulas para camuflar o gosto
amargo conferido pelas substâncias que entrassem na sua composição.
Se bem que, entretanto, tenham aparecido alguns medicamentos impregnados e até envolvidos por
açúcar, só em 1771 temos notícia de um envolvimento açucarado, executado sobre pílulas vermífugas.
Trata-se das célebres pílulas do DR. RYAN e do Du. ANDERSON, que tanto voga tiveram nos Estados Unidos. Em
1837, FORTIN patenteou um processo de revestimento de pílulas com açúcar. Outros farmacêuticos
preconizaram, ulteriormente, diversos envolvimentos, de entre os quais salientamos GAROT (1838),
RAMON (1840), DESCHAMPS (1841), e WARNER (1866). Anos mais tarde, UNNA (1884) sugeriu o emprego da
queratina que, envolvendo as pílulas, as poderia tornar resistentes à acção do suco gástrico.
Os comprimidos revestidos tiveram, portanto, a sua origem nos envolvimentos pilulares, muito
particularmente naqueles feitos com base em açúcar.
Até cerca de 1940 não se encontram modificações substanciais, no que diz respeito à técnica de
revestimento de comprimidos, em relação ao processo inicialmente usado. Nessa altura foram vencidas
diversas dificuldades técnicas que se opunham à execução prática do problema do revestimento a seco. Se
bem que uma patente de NOYES, datada de 1896, já assegurasse a execução de tal processo, só em 1937 ele
se tornou realizável em larga escala ('), consistindo em revestir os comprimidos por um invólucro que é
aplicado numa máquina de compressão rotativa. Finalmente, em 1959, WURSTER pôs em prática um novo
método de revestimento, por suspensão do material a envolver numa corrente de ar ascencional.
Muito embora se possam revestir numerosas formas farmacêuticas, como os granulados, as pílulas e
as cápsulas, é, sem dúvida, nos comprimidos que os envolvimentos têm maior aplicação. É habitual
designar-se por drageificação a operação

(') Depois da patente de P. J. NOYES foi registada uma outra, em 1917. pela firma Síokes, de uma
máquina rotativa para drageificar por compressão. No entanto, só em 1937 a firma Kilian patenteou um
modelo rotativo de compressora que permitiu a centragem dos comprimidos a revestir. • - >.;.
801

farmacêutica de revestimento, se bem que alguns autores, mais puristas, pretendam reservar o termo,
exclusivamente, para os envolvimentos açucarados.
Aos comprimidos revestidos chamaremos dragelas, qualquer que seja a espécie de envolvimento que
possuam, o que está de acordo com a nomenclatura adoptada pelo Suplemento à 2.a edição da
Farmacopeia Portuguesa IV.
O termo drageia, que adoptaremos para designar os comprimidos revestidos, deriva do francês
«dragéé», a amêndoa da Páscoa, a qual, por seu turno, provém do grego «tragemata», a guloseima. Esta
designação, segundo BOUVET, citado por DAVID e DAVID, encontra-se em documentos antigos, desde 1391.
Entre nós encontramos, com o mesmo significado, expressões como drágea (que alguns defendem como
etimologicamente mais rigorosa), grageia ou grangeia (talvez por influência espanhola) e até o termo
confeito, que foi adoptado pela nossa Farmacopeia (1946) para designar as pílulas revestidas. Esta forma
é, ainda, denominada confetti pêlos italianos e coated-tablet pêlos anglo-saxões.
As vantagens da drageificação residem principalmente em:
— poder administrar-se o princípio medicamentoso desprovido de qualquer aroma ou sabor
desagradável que eventualmente tenha;
— tornar possível o emprego de substâncias que ataquem as mucosas, evitando a acção emética que
possivelmente possam apresentar (emetina, certas sulfamidas, etc.);
— permitir, mediante envolvimento adequado, que os comprimidos resistam à acção do suco gástrico,
o que tem interesse não só para subtrair o medicamento às eventuais alterações pelo ácido clorídrico e
pepsina do estômago, mas também para permitir que certos compostos, como os anti-sépticos intestinais,
actuem exclusivamente no ponto desejado do tracto digestivo;
— promover mais fácil deglutição dos comprimidos que deslizam melhor para o estômago, já que as
suas arestas foram arredondadas;
— permitir eficaz protecção e conservação dos princípios medicamentosos, além de melhorar a sua
apresentação;
— Evitar incompatibilidades entre componentes que podem, assim, ficar separados;
— Impedir a formação de pó e facilitar o deslizamento dos comprimidos para as cadeias de
acondicionamento.

7.2.1.3.2. Drageificação , ',


7.2.1.3.2.1. Aparelhagem
Para fazer a drageificação usam-se turbinas ou bacias especiais (de aço inoxidável, de vidro ou, mais
vulgarmente, de cobre), girando em volta de um eixo inclinado e possuindo uma abertura centrada com
esse eixo. A forma das bacias é variável,
802

podendo estas serem esféricas ou piriformes. A relação entre o diâmetro médio das bacias e a sua
profundidade anda à volta de 1,4 ou 1,5:1. Se a bacia for muito grande, essa relação pode ir até 1,8:1. Em
regra, uma bacia com cerca de 90 cm de diâmetro pode servir para revestir 120 000 comprimidos de 10
mm e de 0,3 g de peso ou 250000 comprimidos de 7,5 mm, pesando 0,15 g. A Fig. 302 representa, em
esquema, várias bacias de drageificação.

Fig. 302. Bacias de drageificação (esquema)

O sistema mecânico que imprime o movimento de rotação à bacia deve ser de velocidade
regulável, pois há fases da drageificação que necessitam de maior velocidade do que outras. É
o que acontece na fase de polimento; pelo contrário, na secagem convém trabalhar com
velocidade lenta. Regra geral, as drageificadoras giram a 30
*.- rotações por minuto, embora se reduza essa •••••;.
velocidade quando os comprimidos a revestir sejam quebradiços.
Tem também interesse considerar o ângulo formado entre o eixo
das bacias de drageificação e o plano horizontal. Esse ângulo
anda, normalmente, à volta de 25", mas às vezes convém
aumentá-lo ou diminui-lo, segundo se quer trabalhar com maior
ou menor atrito. No início da operação há necessidade de se
operar com um ângulo maior, mas na fase do polimento, sendo
conveniente que as drageias deslizem somente umas sobre as
outras, há vantagem em trabalhar com um ângulo menor. Há,
por isso, aparelhos que permitem fazer variar o ângulo de
inclinação de 0° a 45°. As bacias de drageificação necessitam,
ainda, de aquecimento, que pode ser directo ou indirecto. O
primeiro pode conseguir-se mediante o emprego de bicos de
BUNSEN, de resistências eléctricas e até
Fig. 303. Drageificadora
(esquema)
1 — Interruptor da resistência de
aquecimento do ar
2 — Aquecimento do ar
3 — Termostato
4 — Termómetro ..
803

mesmo de petróleo. O aquecimento indirecto, sendo mais vantajoso, pode ser executado por
meio de serpentinas em que circula vapor de água, de modo a que a temperatura possa rer
regulada. Mais recentemente, tem-se recorrido aos raios infravermelhos, que devem actuar a
cerca de 10 cm de distância dos comprimidos.
Quando se trabalha com aquecimento directo forma-se uma crosta de açúcar na face
interna da bacia drageificadora que, actuando como uma lixa, ajuda a regularizar a
superfície do comprimido a drageificar.
Simultaneamente, é, em regra, vantajoso insuflar na bacia de drageificação uma corrente
de ar quente, cujo efeito se completa aspirando o pó que se vai libertando dos comprimidos.
Para evitar a humidade, tão prejudicial à operação, o ar quente pode passar através de
substâncias higroscópicas, de modo a ser exsicado. Os sistemas de insuflação devem aquecer
o ar até cerca de 50-60°C, podendo servir, na pequena indústria, um aparelho do tipo dos
secadores de cabelo. Na gravura junta mostram-se drageificadoras com sistema de ar (Fig.
304).

Fig. 304. Bacias de drageificação


804

Pelo contrário, em certos casos há necessidade de se evitar qualquer intervenção do calor,


operando-se, por isso, a frio, o que torna as operações mais demoradas e, também, mais
difíceis. Este método usa-se, por exemplo, para as drageias contendo fermentos ou outras
substâncias alteráveis pelo calor.

7.2.1.3.2.2. Fases da drageificação


Para preparar drageias devem usar-se comprimidos bastante duros, de forma o mais
convexa possível e cujos bordos não estejam afastados mais do que l mm. Além disso, quanto
mais pequenos forem os comprimidos, dentro de certos limites, mais fácil se toma a
drageificação.
A Tabela XCVII mostra a relação entre o diâmetro e a curvatura dos respectivos punções,
de modo a obterem-se comprimidos adequados à drageificação.

Tab6la XCVII. Curvatura dos punções em relação ao seu diâmetro


Diâmetro dos punções
em milímetros (Flecha)
6 1 •
i 7 1,1
8 •• .%r . U
9 ,*», ,-.: 1.4
10 - :•> ' '. s u •'•' •••• . -
11 •( • i*
12 • ,,, 'W
13 ^ 1,8

Os punções podem também apresentar-se com concavidade correspondente à existência de


um duplo raio. Este sistema, que tem sido utilizado, não apresenta vantagens especiais sobre
o clássico. A Fig. 305 representa os dois tipos de punção. Anotemos, como curiosidade, que
um punção de duplo raio de 10 mm de diâmetro apresentará um valor de R de 10, um valor de
S de 2,65 e r igual a 2,5. Um punção côncavo clássico, como o mesmo diâmetro, tem um valor
de R de cerca de 7.
Inicialmente, antes de se colocarem na estufa para secagem, os comprimidos devem ser
peneirados para separar o pó que deles se desprende. Trabalha-se com quantidades
apreciáveis de comprimidos, de modo a ficar com a turbina quase cheia. Com efeito, é
praticamente impossível drageificar menos de 500 a 1000 g de comprimidos, aumentando a
facilidade da operação, dentro de certo limite, com o peso total de comprimidos a revestir.
805

Fig. 305. Corte esquemático de um punção de duplo raio e de um


punção côncavo clássico

Normalmente, uma drageificação compreende três fases:


camada isolante (facultativa) camada elástica camada alisante
I." fase J
{adiç adição de xapore simples
(co 2." fase
r;
(corado ou não) 3." fase | polimento

/." fase
Camada isolante — Usa-se, em geral, para comprimidos contendo compostos
higroscópicos, tendo em vista impedir-se a sua alteração pelo contacto com a humidade
(extractos, como o de fígado, sais biliares, etc.).
O processo tem, além disso, a vantagem de isolar o comprimido das restantes camadas,
podendo proteger as substâncias medicamentosas de incompatibilidades entre si e até de
oxidações. A camada isolante pode servir ainda para revestir os comprimidos com
envolvimentos gastro-resistentes. Como se depreende, a camada isolante não é aplicada,
obrigatoriamente, em todas as drageias.
806

Empregam-se como banhos isolantes soluções de goma laca, sandaraca, bálsamo de Tolú,
acetato de polivinilo, zeína, polivinilpirrolidona, acetoftalato de celulose, etc. Citamos alguns
exemplos de soluções isolantes:
Sandaraca — 200 g
{ Goma laca — 100 »
Álcool de 95° — 750 ml
n Goma laca — 180 g Terebintina de Veneza — 4 g
Álcool de 95° q.b.p. — 450 » III Goma laca — 2 »
rv
{ Álcool absoluto saturado com bálsamo Sandaraca — 20 »
Colofónia — 20 »
Álcool de 95° — 75 »

O modo operatório consiste em aquecer a bacia, com os comprimidos a drageifi-car, e deixá-los


rolar durante 8 a 10 minutos, o que tem por fim eliminar as arestas vivas que impediriam a
preparação de drageias regulares. Retira-se o pó, por peneiração, e adiciona-se a solução isolante, a
pouco e pouco, de forma a humedecer os comprimidos, mas sem que estes adiram uns aos outros.
Normalmente, depois de cada adição, deixa-se rolar a bacia durante 10 a 15 minutos, repetindo-
se as adições mais 4 ou 5 vezes. Retiram-se então os comprimidos, que vão, seguidamente, para a
estufa aquecida, a cerca de 37°C, durante 24 horas.
Camada elástica — Passa-se, em seguida, para a camada elástica, assim chamada por entrar na
sua composição a gelatina, que vai conferir à drageia uma certa elasticidade. Esta camada é
conseguida à custa da adição alternada de um xarope de gelatina e de um pó fino que contém, em
regra, um lubrificante, como o talco.
Como exemplo de uma solução gelatinosa, muito correntemente utilizada, mencionamos a
seguinte fórmula:
Gelatina......................................................60 g
Goma arábica ............................................ 60 »
Açúcar........................................................ 1500 »
Água .......................................................... 1000 ml
A preparação deste xarope faz-se deixando macerar a gelatina com a goma em água,
dissolvendo-as, depois, a banho-maria e juntando, então, o açúcar. Entre os pós, que devem ser
adicionados em pequenas porções para que a superfície das
807

drageias não fique irregular, citamos um comendo amido e outro açúcar como componentes
principais:
Açúcar ............................................................ 540 g
Carbonato de cálcio...................................... 135 »
Talco .............................................................. 48 »
Goma arábica ................................................ 3 »

Amido ............................................................ 630 g f


Talco .............................................................. 63 »
Goma arábica ................................................ 7 » (')
As fórmulas citadas (xarope e pó) chegam, em regra, para revestir 25 quilos de comprimidos.
Para a aplicação da camada elástica procede-se da seguinte maneira: aquece-se a bacia de
drageificação a 70-80°C e, fazendo rolar os comprimidos procedentes do tratamento anterior ou os
comprimidos livres de pó, a que não se quis dar revestimento isolante, adiciona-se lentamente o
xarope, aquecido a igual temperatura; alternadamente com lançamento do xarope, polvilha-se sobre
os comprimidos um pouco de pó lançado de um peneiro muito fino.
Depois de cada adição de xarope-pó, deixa-se rolar a bacia durante 15-20 minutos, findos os
quais se procede a nova adição, sendo, em regra, necessário aplicar 6 a 7 camadas. Feito isto,
novamente se retiram os comprimidos para uma estufa aquecida a 37°C, onde permanecem 24 horas.
Camada alisante — Tem por fim tornar lisa a superfície das drageias. Com essa finalidade
empregam-se suspensões açucaradas como, por exemplo, a seguinte fórmula que é suficiente para 25
quilos de comprimidos.
Carbonato de cálcio...................................... 150 g
Talco .............................................................. 20» "".i;..
Açúcar ............................................................ 710 »
Água .............................................................. 375 ml
Prepara-se o xarope dissolvendo o açúcar na água aquecida; adiciona-se o carbonato e o talco;
agita-se e coa-se por gaze.

O As fórmulas sem amido são melhores para as substâncias higroscópicas.


808

O modo de operar é semelhante ao anterior: os comprimidos são aquecidos a 70-80°C, adiciona-


se o xarope também aquecido a essa temperatura e, a seguir a cada adição, rolam-se os comprimidos
durante 20 minutos, repetindo a operação 6 a 8 vezes.
Durante o lançamento das camadas deve fazer-se o aquecimento com ar quente ou com radiação
infravermelha.
Como aconteceu após a aplicação das camadas anteriores, faz-se a secagem das drageias na
estufa, a 37°C, durante 24 horas.

2." fase
Para drageias brancas adiciona-se xarope comum, preparado a frio, a fim de evitar a cor
amarelada que toma quando obtido por dissolução do açúcar a quente.
A aplicação do xarope deve ser conduzida a certa temperatura (70-80°C), sendo os comprimidos
igualmente aquecidos. A última adição deve fazer-se com o xarope diluído em água, a 1:1, para que as
drageias fiquem húmidas. Deixam-se estar na bacia dra-geificadora durante 2 horas, tendo o cuidado de tapar
a abertura daquela com um pano húmido, para que adquiram a humidade necessária para o polimento (dar um
quarto de volta à bacia, de quando em quando).
Para a obtenção de drageias coradas deve aplicar-se o xarope comum, previamente adicionado do corante
solúvel pretendido.
As cores mais usadas, por serem as de mais fácil aplicação, são a amarela e a vermelha. A adição do
xarope, pouco concentrado em corante (0,25 g/kg), deve fazer-se muito lentamente, aplicando-se o número de
camadas necessárias para se obter a cor desejada. Se, depois de 4 a 5 adições, a cor se mantiver ainda clara,
deve aumentar-se a concentração para 0,50/™> ou mesmo até l"/™.
Se aparecerem manchas nas drageias, não se pode elevar a concentração do corante pois que isso
acentuaria ainda mais as irregularidades da coloração.
De qualquer modo, há que atender ao peso final das drageias, não se devendo exagerar o número de
camadas de corante, que as poderia tornar demasiado pesadas.
Uma variante desta técnica consiste em aplicar o xarope não diluído sobre as drageias e em as fazer rolar,
na última aplicação, até libertarem pó. Retiram-se, então, para um peneiro, que se coloca sobre um recipiente
com água a ferver, até adquirirem um brilho húmido. Novamente se passam para a drageificadora, para se
proceder à última fase, que corresponde ao polimento.
TUCKER propôs o uso de um método de coloração por meio de corantes insolúveis, em que estes são
misturados com óxido de titânio, que funciona como um extensor e como uma rede opaca. A cor final não
depende do número de camadas de corante mas da relação entre as quantidades deste e do óxido de titânio.
Cada corante tem, assim, apenas ur.ia tonalidade, o que, como se compreende, é muito vantajoso e não cria
dificuldades em igualar a cor de um lote com a de outro. Por outo lado, como os pigmentos são mais estáveis à
luz, as drageias assim coradas mantêm-se mais tempo sem alteração da sua cor.
809

A suspensão do corante faz-se no xarope e usam-se tensioaetivos, como o dioctil-sulfossuccinato


de sódio, para aumentar a molhabilidade. Uma fórmula de suspensão que dá bons resultados é a que
passamos a transcrever:
Dioctilsulfossuccinato de sódio.......... 0,01 g
Corante insolúvel ................................ l a 15 »
Dióxido de titânio .............................. l a 100 »
Xarope comum.................................... 500 ml
Água destilada .................................... 250 » t.«
Além dos corantes usuais temos experimentado o próprio carvão vegetal que, em suspensão
xaroposa, origina boas drageias coradas de negro intenso.
FAULI e PLA DELFTNA referem, também, o uso de adsorbatos de corantes em hidróxido de
alumínio, tendo empregado, com bons resultados, a seguinte fórmula:
Amarelo de quinoleína adsorvido em A1(OH)3...... 42 g
Azul de indantreno .................................................... 0,126 »
Excipiente.................................................................... 957,874 »
O excipiente era constituído por:
Dioctilsulfossuccinato de sódio ................................ 0,0025 g
Água destilada............................................................ 49,5 ml
Xarope comum ..................................................q.p.b. 1000 g
3." fase
Para efectuar o polimento das drageias empregam-se parafinas ou ceras (naturais ou sintéticas),
geralmente dissolvidas em álcool, éter ou tetracloreto de carbono, dissolvente que, embora
tecnicamente seja bom, apresenta o inconveniente de ser tóxico. Uma fórmula que dá bons resultados
é a seguinte:
Cera branca.................................................... 3 g ••.'';,-
Cera de carnaúba.......................................... 6 »
Dissolvente apropriado........................ q.b.p. 400 ml ïf
ou esta outra:
Cera branca.................................................... l g
Cera de carnaúba .......................................... 2 »
Parafina .......................................................... l »
Clorofórmio.................................................... 150 »
810

Colocam-se as drageias na drageificadora e, lançando-se, a pouco e pouco, a solução, deixam-se


rolar durante cerca de 30 minutos, até que se revistam com uma camada de cera, ficando mais ou
menos polidas (').
Passam-se então as drageias para outro tipo de bacia, forrada interiormente de camurça ou de
flanela, onde adquirem o brilho peculiar. Geralmente, a turbina é de secção mais ou menos
prismática, para ser mais fácil de forrar, e o rolamento dura algumas horas. Nas Figs. 306 e 307
estão representados vários modelos de turbinas de polimento.
Finda a fase do polimento guardam-se as drageias, tendo o cuidado de não lhes tocar com as
mãos.

Flg. 306. Turbinas para polimento de drageias (esquema;

Fig. 307. Turbina para polimento

7.2.1.3.2.3. Processos especiais de drageificação


Descrevemos até aqui os processos clássicos de drageificar. No entanto, outros métodos são,
actualmente, empregados, entre os quais poderemos referir a drageiflcação por meio de películas, a
drageiflcação por compressão, drageiflcação entérica, etc.

(') Pode usar-se uma bola de cera lançada 4ia bacia aquecida, onde rolam as drageias.
811

Antes, porém, de estudarmos esses métodos iremos mencionar algumas das variantes tendentes
a tornar mais rápida a técnica da drageifícação clássica.

7.2.1.3.2.3.1. Processos rápidos de drageificação clássica

Um dos métodos considerado entre os mais práticos para uma rápida drageificação é o devido
a SVANVIK, o qual tem a vantagem de possibilitar a execução de todo o ciclo de revestimento dos
comprimidos em cerca de 8 horas de trabalho.
Para realizar o envolvimento por este método é necessária uma bacia de drageificação
susceptível de rodar a uma velocidade de 25 rotações por minuto. O processo obriga à aplicação de
quatro camadas envolventes, todas elas contendo açúcar em solução ou em pó. Vamos descrevê-lo
para 25 kg de comprimidos.
1.a Camada — Aos comprimidos, isentos de pó, adicionam-se a pouco e pouco, misturando
cuidadosamente, 375 ml da seguinte solução:

Gelatina.......................................................... 15 g
Açúcar ............................................................ 660 »
Água destilada .............................................. 325 »

Logo que a mistura ficou feita, junta-se talco em excesso e faz-se rodar a bacia ainda por l ou
2 minutos, retira-se o excesso de talco e humedecem-se os comprimidos, até aglomeração, com um
pouco de solução açucarada de gelatina.
A rotação da turbina permite a separação dos comprimidos uns dos outros e origina a
libertação de pó, que é retirado.
2." Camada — Os comprimidos voltam a ser humedecidos com a mesma solução de gelatina
que, caso assim se pretenda, poderá conter 1%" de corante. Junta-se, então, um pó constituído pela
mistura, em partes iguais, de talco, amido e açúcar, finamente pulverizados, continua-se a rodar a
bacia por alguns minutos e retira-se o excesso de pó.
3." Camada — Esta camada é obtida apenas com o concurso da solução inicial de gelatina e
açúcar, que é lançada até os comprimidos ficarem humedecidos. Como sempre, vai-se insuflando ar
quente. A operação dá-se por terminada quando se formar, nas paredes da bacia de drageificação,
uma camada lisa e seca.
4.a Camada — Humedecem-se os comprimidos com a solução de gelatina. Então, deitam-se
sobre eles 25-40 ml de líquido de polimento com a seguinte composição:

Xarope comum .............................................. 110 g


" Glucoce líquida ............................................ 40 »
Mucilagem de goma arábica........................ 45 »
Parafina líquida ............................................ 10 »
Talco .............................................................. 7 »
812

Auxiliando-se a secagem com ar frio, faz-se rodar a turbina até que os comprimidos apresentem
certo polimento.

7.2.1.3.2.3.2. Revestimentos especiais


Revestimentos metálicos — Os revestimentos metálicos executam-se normalmente sobre
comprimidos previamente revestidos, isto é, sobre verdadeiras drageias a que apenas não se deu o
polimento. A sua finalidade é, pois, melhorar a apresentação.
Para obter este tipo de revestimento, as drageias, antes da última fase, serão lançadas em bacias
de vidro, semelhantes às mencionadas para a drageificação clássica mas, geralmente, de forma
esférica e rodando sobre um eixo horizontal. Os metais empregados — ouro e prata — utilizam-se em
folhas e a aderência é conseguida com soluções acéticas de gelatina, com mucilagens de goma ou
com albumina de ovo. As soluções são lançadas na bacia contendo as drageias e, quando se nota que
já não estão demasiado húmidas, adicionam-se as folhas metálicas. Como solução mais empregada
cita-se a de gelatina, contendo 15 g dissolvidos em 85 g de ácido acético a 33%, ou a 25 g/50 g de
ácido acético.
Menos frequentemente tem sido empregada a metalização com pó de magnésio ou de alumínio,
podendo a aderência ser obtida com a seguinte solução:
Mucilagem de goma arábica a 33% ........ 250 g
Xarope simples ............................................ 500 »
Álcool de 90-94» ...................................... 250 »
Revestimentos com po/ietilenoglicóis — Há mais de duas dezenas de anos GANS e CHAVKIN
propuseram a utilização dos carbowaxes como revestimento para comprimidos, o que teria a vantagem
de se poder executar muito mais rapidamente a operação. Numa bacia de drageificação, em
movimento, contendo os comprimidos, junta-se, a pouco e pouco, uma solução alcoólica a 25% de
polietilenoglicol 6000, mantida à temperatura de 50°C. A primeira pane da operação de revestimento
leva cerca de uma hora. Aplica--se então uma solução do polietilenoglicol a 50%, até que as
drageias tenham um revestimento igual a 50% do peso do comprimido. Esta segunda operação leva 3
a 4 horas. A coloração pode também ser conseguida desde que se empreguem corantes solúveis na
solução do polietilenoglicol a 40%. A concentração de corante é habitualmente de 0,1 a 0,25%. O
polimento é dado com ceras, da maneira vulgar.
De tipo semelhante são as coberturas de Polyox ('), que são resinas polioxietilé-nicas
hidrossolúveis de elevado peso molecular (100000 grupos polioxietilénicos) e

(') Marca registada da firma Union Carbide Chemical Company, U.S.A.


813

mínima toxicidade. Empregam-se habitualmente em solução no álcool isopropílico, associadas aos


polietilenoglicóis.
Os Polyox são designados por letras e números cujo significado é semelhante ao dos silicones
(os números indicam viscosidade em centipoise) (').
Emprega-se, segundo parece com certo êxito, a seguinte solução aconselhada por BLAUO e Gnoss:
Polyox WSR 301.......................................... 0,2 g v
PEG 400........................................................ 5 » '- v
Álcool isopropílico a 91% ................ q.b.p. 100 ml
A aplicação da película é feita de modo idêntico ao indicado para os polietilenoglicóis e o
polimento consegue-se também com ceras dissolvidas em tetracloreto de carbono.
Revestimentos com derivados da celulose — O emprego de hidroxietilcelulose a 5% em solução
alcoólica de 50° como meio de revestimento data de 1954 e deve-se a DOERR, SEARLES e DEARDORFF.
As drageias assim revestidas mantêm a forma dos comprimidos e quase não aumentam de peso (+
3%), notando-se ainda por baixo da película as gravações que eventualmente aqueles apresentem.
Este sistema (Filmtab), que foi patenteado pêlos laboratórios Abbot, origina drageias muito bem
protegidas e com excelente aparência.
AWE e FREUDENSTEIN preconizaram, por seu turno, o uso de suspensões contendo
carboximetilcelulose sódica associada à sacarose, amido e corantes. A drageificação levaria 4
horas sendo a secagem executada por radiações infravermelhas e o polimento conseguido com
postonal (polietilenoglicol, cerca de 3500) dissolvido em clorofórmio.
Uma fórmula deste tipo, que achamos satisfatória para a cobertura, é a seguinte, que daria
para 300 000 comprimidos de 8 mm de diâmetro.
I Açúcar................................................................ 11500 g
Água .................................................................. 5 500 »
Carboximetilcelulose (de baixa viscosidade).. 355 »
H Álcool ................................................................ l 000 »
Dissolver os componentes sólidos de I na água, juntar H e, após homogeneização, completar
com água o peso de 18 500 g, adicionando, então, 3750 g de álcool.

(') O Polyox WSR 301 origina soluções aquosas a 1% com uma viscosidade de 3000 centipoise
(temperatura de 25"C). o WSR 35 dá soluções a 5% com uma viscosidade de 300 centipoise, etc.
814

Também SAHLESTROM propõe um líquido de revestimento contendo carboximetilce-lulose, cuja


composição é a seguinte:
Açúcar ...................................................... 600 g ,i;: .,,,;
; i, Amido........................................................ 100»
Carboximetilcelulose ................................ 5»
Água..........................................................400» •,.,-.
Revestimentos com zeína — Como se sabe, a zeína é uma proteína extraída do glúten de
milho (Zea mays), que se utiliza em diversas indústrias, como a da fabricação de filmes.
WINTERS e DEARDORFF preconizaram o seu uso, como película de revestimento, dissolvida a 10%
em isopropanol a 91% e contendo 3% de Tween 20 e 0,03% de eritrosina. Este sistema de
revestimento dá películas muito finas, ficando as drageias com forma e peso praticamente iguais
aos dos comprimidos.
Revestimentos com PVP — O emprego de polivinilpirrolidona a 10-20-30% em álcool
absoluto ou isopropílico, para formar películas em comprimidos, tem-se difundido bastante,
especialmente quando associada à goma laca (como nos preparados cosméticos para ondulação
permanente) ou aos PEG. Foi BALUO e a sua equipa quem se dedicou particularmente ao estudo da
drageificação com este envolvimento, tendo BARAHONA introduzido várias modificações no processo
inicial de AHSAN e BLAUC.
Revestimentos com silicones — Da mesma maneira que as películas anteriormente citadas,
podem ser utilizados diversos silicones que protegerão os comprimidos contra a humidade,
oxigénio do ar, etc. Pode conseguir-se esta película aplicando uma emulsão ou solução de silicones
(7-10% em acetona) sobre os comprimidos que rolam numa bacia de drageificação, descrevendo
NEUHOFF o processo em pormenor.

Além dos revestimentos referidos podem mencionar-se muitos outros, como os poliacrilatos
catiónicos (dimetilaminoetilmetacrilato), que se usam a cerca de 14% em solução acetónica ou
isopropanólica. A firma Rohm and Haas tem, para o efeito, um produto à venda, que é conhecido
comercialmente por Eudragit-E.
Revestimentos gastro-resistentes — Destinam-se a evitar que o comprimido se desagregue no
estômago, sendo, pelo contrário, facilmente desagregado no intestino. Drageias nestas condições
resistem pelo menos 2 horas em contacto com o suco gástrico, devendo desagregar ao fim de l
hora no intestino.
Na sua monografia sobre comprimidos a Farmacopeia Portuguesa V estabelece que, quando
submetidos ao ensaio de desagregação, nenhum comprimido com revestimento gastro-resistente
deve apresentar o mínimo sinal de desagregação após 2 horas em ácido clorídrico 0,1 N e que,
quando depois se substitui este líquido por solução tampão de fosfato de pH 6,8, devem todos
desagregar-se no tempo máximo de 60 minutos.
813
815

Na Fig. 308 indicam-se os órgãos do tracto gastrintestinal especialmente implicados na absorção dos
princípios existentes em drageias. Os medicamentos, passando da saliva (pH 6-7) para o estômago (pH
0,9-1,6) e, depois, para o intestino (pH<8,3), sofrem alterações diversas. Na Tabela XCVIII indicam-se
os tempos máximos prováveis de permanência em cada um desses órgãos.

Estômago

Duo
deno

Fig. 308. Esquema do tracto gastrintestinal

As substâncias usadas para proporcionar um revestimento com tal fim têm que ser necessariamente
atóxicas e não possuírem actividade fisiológica. Tem-se proposto o uso da queratina acética ou amonical,
a 7%, cuja aplicação se faz filtrando a solução de queratina sobre o comprimido, a que foi aplicado um
prévio revestimento de manteiga de cacau.

Tabela XCVIII. Tempos de permanência das drageias no tracto gastrintestinal


Horas pH (suco) pH (bolo alimentar)
Estômago 1-5 0,9-1,6
í Duodeno: 5,9-6,2
Intestino delgado 1-5 8,3 •! Jejuno: 6,2-7,3
1 íleo: ligeiramente > 7
Intestino grosso 4-10 <7,5

Segundo Drug and Cosmetic Ind., 87, 464 (1960)

Alem desta substância, têrn-se empregado outras, como o salol (usado deste 1891),
a goma taça isenta de arsénio, associada ao óleo de rícino ou à lanolina, o glúten, a
sandaraca, o acetoftalato de celulose, o ácido abiético ou o abietato de etilo, o estea-
rato de n-butilo, etc. .. .
816

A aplicação de camadas gastro-resistentes, mas enterossolúveis, é conseguida segundo a técnica


geral de drageificação atrás mencionada. Habitualmente, estes revestimentos são aplicados em lugar
da camada isolante. Acontece até que muitas das substâncias isolantes podem, quando a sua
espessura é demasiada, tornar-se gastro-
-resistentes. É o que sucede, por exemplo, com a goma laca, que citámos a propósito dos
envolvimentos gastrossolúveis e que também mencionamos neste subcapítulo.
A técnica de preparação de drageias gastro-resistentes não difere, portanto, da técnica geral de
drageificação. Entretanto, é aqui obrigatório que se verifique sempre se o envolvimento efectuado
resiste à acção do suco gástrico e se se dissolve com rapidez em presença do suco entérico.
l — Revestimento com goma laca — Sendo das substâncias mais utilizadas, a goma laca tem sido
exaustivamente estudada por muitos investigadores e inscrita em várias farmacopeias. Uma das
dificuldades do seu uso consiste na falta de elasticidade e de aderência que a caracterizam, as quais
se podem remediar por adição de corpos gordos.
No estado seco perde, rapidamente, cerca de 50% das suas propriedades gastro-
-resistentes, pelo que se aconselha conservá-la em solução. Por esse facto, as firmas norte-
americanas vendem-na habitualmente dissolvida, com os nomes de pharmaceuticat glaze ou candy
glaze. Entre as fórmulas que nos parecem mais aconselháveis para envolvimentos gastro-resistentes,
citamos as seguintes:

I Goma laca ............................................ 25 g


-'L Óleo de rícino...................................... 5 »
Álcool de 96» ...................................... 95 »
H Goma laca ............................................ 700 »
Isopropanol............................................ 1000 ml
m Goma laca ............................................ 23,5 g
Monoleína ............................................ 3 »

A goma laca, que apresenta vantagens de ordem económica, não satisfaz, porém, às condições de
um bom revestimento gastro-resistente, pois que nem sempre é segura a sua acção, podendo originar
perturbações intestinais ao transformar-se em resinatos alcalinos. Por outro lado, a sua
desagregação só se processa praticamente quando há apreciável alcalinidade, podendo vir a
dissolver-se apenas na porção terminal do jejuno e dificultando, eventualmente, a absorção dos
fármacos.
2 — Acetoftalato de celulose — Trata-se de um dos mais usados envolvimentos
gastro-resistentes, cuja dissolução no intestino é efectuada após hidrólise enzimática,
independentemente do pH do meio. .„ . .
817

Introduzido no arsenal farmacêutico por HIATT (1940), foi especialmente estudado por MALL e colab. e por
COUVREUR e colab.
Já no Suplemento à Farmacopeia Portuguesa IV se inscrevia esta substância e se indicava uma
solução com ela obtida (ver pág. 747 deste livro), a qual se deve a MICCIHE:
Acetoftalato de celulose .............................. 8 g
Ftalato de etilo.............................................. 4 » -., ,.
Álcool isopropflico........................................ 44 » t.-.:
Benzeno.......................................................... 44 »
COUVREUR recomenda a seguinte fórmula para envolvimento:

Acetoftalato de celulose .............................. 12 g _


Ftalato de etilo.............................................. 3 »
Acetato de etilo ............................................ 42,5 »
Álcool isopropílico........................................ 42,5 »
Nestas fórmulas o ftalato de etilo desempenha a função de plastificante, impedindo o aparecimento de
fendas nas drageias.
A técnica de aplicação das soluções de acetoftalato de celulose é bastante simples e segue as regras
gerais já anteriormente enunciadas. Fundamentalmente, consiste em lançar a solução (preferentemente
atomizada) sobre os núcleos que se fazem rolar, a frio, na bacia de drageificação. Em regra, são
necessárias cerca de 20-30 aplicações, mas o processo não é demorado porque entre uma camada e a
seguinte não há necessidade de um intervalo de tempo superior a 5-6 minutos. A fim de acelerar a
evaporação é conveniente dispor de um aspirador de ar (com sistema anti-deflagrante), o que protege
também o pessoal laborante da acção nociva dos vapores e dos dissolventes.
STIVIC e MALIK compararam diversos envolvimentos gastro-resistentes para comprimidos, tendo concluído
por achar preferível o acetoftalato de celulose.
3 — Revestimento com ácido abiético — Este composto, só ou associado aos seus ésteres, ácidos
gordos e ácido benzóico, tem sido usado desde 1937, data em que ELDRED o experimentou como
envolvimento gastro-resistente.
Entre nós, SOUSA DIAS ensaiou o emprego de um produto de associação do ácido abiético com o anidrido
maleico, o qual considerou promissor no revestimento gastro--resistente de comprimidos. Aliás, além da
referida associação, o anidrido maleico tem sido combinado com vários produtos, obtendo-se polímeros de
condensação, cujas propriedades permitem o seu emprego no tipo de envolvimentos de que estamos tra-
tando. E o caso das suas combinações com o estireno, anidrido itálico, ácido esteárico, etc., que têm sido
objecto de numerosas patentes.
818

4 — Polímeros sintéticos — Na alínea anterior referimos o uso de diveros polímeros do anidrido


maleico utilizados em envolvimentos entéricos. Muitos são, porém, os produtos de condensação que
se encontram ao alcance do prático que pretenda tornar os seus comprimidos gastro-resistentes.
Entre eles lembramos as resinas sintéticas vinílicas e acrílicas. Um destes produtos é designado por
Eudragit L ('), que, do ponto de vista químico, é um polímero acrílico com radicais carboxilo. Trata-
se de um verniz, insolúvel em meio ácido mas facilmente solúvel a pH neutro. Do mesmo género e
fornecido pela mesma firma é o Eudragit S que, porém, só se dissolve em meio alcalino.
Na Tabela XCIX indicamos a velocidade de dissolução de pequenas quantidades desses
envolventes, em função do pH do meio.

Tabela XCIX. Velocidade de dissolução dos Eudragit em função do pH


Tempo de dissolução em minutos pH do meio

5,7 6 6. 5 7 7,5 8
EUDRAGIT L 720 720 80-120 20-40 720 15 120 16 15 15
EUDRAGIT S
720 20-30

As referidas substâncias são fornecidas pela casa preparadora sob a forma de solução em álcool
isopropílico. A sua concentração é de cerca de 14%.
Para aplicar estes revestimentos procede-se como com o acetoftalato de celulose. Normalmente,
emprega-se a solução de Eudragit numa proporção de 16 g por cada quilo de comprimidos,
preferentemente já revestidos com uma camada de açúcar, os quais se fazem rolar até secagem. A
operação tem de se repetir até que se apliquem 20-60 camadas do verniz protector. Habitualmente,
são suficientes 30-35 camadas.
5 — Estearato de burilo — O estearato de n-butilo, não sendo uma gordura, comporta-se como
estas pelo facto de não ser decomposto no estômago mas hidrolisado no intestino. Os produtos de
hidrólise são o álcool butílico e o ácido esteárico que, em tão pequenas quantidades, se mostram
atóxicos.
Para a aplicação de um revestimento de estearato de butilo recorre-se a uma técnica mais
primitiva do que a que mencionámos. Efectivamente, o revestimento é obtido por simples imersão dos
comprimidos num banho que contém a solução de envolvimento. Usa-se a seguinte mistura:
Estearato de n-butilo............................ 70 partes
"" Cera de carnaúba.................................. 30 »

(') Fornecido por Rohme and Haas.


819

A mistura é aquecida à fusão a cerca de 70°C e o comprimido a revestir é mergulhado e retirado


logo em seguida. O revestimento solidifica em alguns segundos, sendo suficiente a aplicação de três
ou quatro camadas de revestimento para evitar a desagregação no suco gástrico.
A estabilidade do revestimento é limitada, aparecendo fendas na superfície da drageia após
quatro semanas de preparação. Pode-se retardar o aparecimento das fendas adicionando um
plastificante à mistura, como na seguinte fórmula, recomendada por STOKLOSA e OHMART:
45
partes
30 »
25 »
Estearato de n-butilo . Cera de carnaúba .......
Ácido esteárico...........
O próprio acetoftalato de celulose pode ser aplicado pelo mesmo processo de imersão,
aconelhando-se a fórmula seguinte:
5
47,
5
47,
Acetoftalato de celulose Acetato de etilo ..............
Álcool de 95" ................
Algumas vezes usam-se revestimentos múltiplos, ficando a drageia com diversas camadas ou
extractos. Na Fig. 309 representam-se cortes esquemáticos de drageias com duas ou mais camadas.
Assim, por exemplo, têm-se utilizado drageias de pepsina com pancreatina destinadas a ceder o
primeiro produto no estômago e o segundo no intestino. Na prática,

núcleo
contendo
substâncias
núcleo activas
contendo isolamento
as preliminar
l.a camada
substâncias de
activas substâncias
activas
camada isolamento
intermédio
2a camada de
isoladora substâncias
activas
isolamento

Fig. 309. Drageias plurl-estratificadas


820

conseguem-se obter drageias fazendo comprimidos de pancreatina, dando-lhes na camada isolante o


levestimento entérico e aplicando, posteriormente, a pepsina, durante a drageificação, sob a forma
de xarope de pepsina.

:, 7.2.1.3.2.3.3. Drageificação por compressão


A drageificação a seco ou por compressão consiste em aplicar aos comprimidos determinadas
capas, o que se consegue mediante máquinas adequadas de compressão. O processo foi patenteado, em
fins do século passado, por PARKER NOYES, mas só verdadeiramente em 1937 se tornou praticável em
larga escala.
Este método de drageificar apresenta nítidas vantagens sobre o processo clássico: os
comprimidos não sofrem qualquer acção do calor ou da humidade; é possível associar, num mesmo
comprimido, substâncias que reajam entre si; podem conseguir-se drageias gastro-resistentes com
espessuras exactas de cobertura entérica; diminui-se, apreciavelmente, o tempo de desagregação das
drageias, visto que neste processo tudo se comporta, a esse respeito, como se se tratasse de
comprimidos; esta técnica dá maior rendimento do que a drageificação clássica, que é muito
demorada.
O método baseia-se, fundamentalmente, na existência de um núcleo (comprimido) que é centrado
na matriz de uma máquina rotativa e recebe uma capa de excipiente adequado nas suas partes
inferior e superior, as quais lhe são soldadas por compressão. A sequência de movimento na máquina
drageificadora de compressão pode esquematizar-se assim:
Um vibrador conduz os comprimidos por um plano inclinado até um disco com alvéolos. Este
disco, cuja rotação está sincronizada com a da máquina de compressão rotativa, lança os
comprimidos nas matrizes que já receberam previamente uma camada de pó, destinada à cobertura
inferior do núcleo. Neste momento o punção superior comprime o comprimido de encontro ao pó do
revestimento ficando completa a camada inferior. A matriz, liberta já do punção superior, recebe a
segunda porção de pó, desta vez destinado à cobertura correspondente à parte superior do
comprimido. Nesta altura, o comprimido é submetido a uma compressão entre os dois punções e
posteriormente ejectado da matriz. A Fig. 310 dá ideia das operações que acabámos de descrever.

Fig. 310. Sequência das fases da drageificação por compressão (esquema)


821

O sistema encontrou de início sérias dificuldades, dada a necessidade de centrar o comprimido e


as capas, acontecendo, muitas vezes, saírem comprimidos total ou incompletamente revestidos, ou
capas soldadas sem núcleos. Assim, foi idealizado um sistema electromagnético (junção de ferro aos
comprimidos, o que permitia a fácil centragem desses núcleos, mas que provocava
incompatibilidades diversas com a matéria activa) ou a acopulação de aparelhos de raios X à
máquina de compressão. Actualmente, há dispositivos electrónicos que fazem saltar os comprimidos
não revestidos, saindo também as capas, como desperdício. Deste modo, cada comprimido a
drageificar sofre um teste, durante a compressão, por intermédio de um dispositivo electromecânico.
As dra-geias a que faltem o núcleo ou as capas fazem parar a máquina e são imediatamente expulsas.
Igualmente, se falhar a alimentação de núcleos ou de capas, o dispositivo citado obriga a máquina a
parar. COOPER e PASQUALE, numa interessante revisão de conjunto sobre os diversos tipos de maquinaria
destinados a este género de compressão, focam em pormenor os pontos que acabámos de abordar.
Existem no comércio duas espécies de máquinas para drageificar a seco; máquinas de dois
corpos (num fazem os comprimidos — núcleo — e no outro comprimem-nos com as capas) como as
do tipo Manesty Dry Cota (Fig. 311), e máquinas do tipo Kilian Prescoter ou Frogerais, que apenas
aplicam as capas a comprimidos já preparados com outra compressora.

Flg. 311. Máquina para obtenção de drageias por compressão (Manesty Dry Cota)
822

Como bem se compreende, qualquer dos processos tem vantagens e inconvenientes, dado que o
primeiro obriga a um único modelo de comprimidos, mas apresenta cadência mais regular, pois que
o núcleo pode ser menos duro e por isso a adesão das capas é mais perfeita; o segundo processo
permite uma maior flexibilidade de trabalho, visto que a obtenção do núcleo pode executar-se em
qualquer máquina, dando-nos a possibilidade de o ensaiar laboratorialmente e, só depois dessa
verificação, proceder à cobertura com as capas desejadas.
A aderência das capas ao núcleo constitui outro problema que criou certas dificuldades no
começo da utilização deste método. Verifica-se, contudo, que o núcleo (comprimido a revestir) deve
ser feito com um granulado mais grosso do que o das capas, pois, nestas circunstâncias, terá maior
porosidade e as capas aderem mais facilmente, por haver interpenetração dos respectivos grânulos.
Aconselha-se, igualmente, introduzir, tanto no granulado dos comprimidos como no das capas, uma
cera cuja presença aumenta a aderência. Numerosos autores se têm dedicado ao estudo da produção
de drageias por compressão, procurando relacionar a facilidade desta com o tipo de granulado
empregado na formação das capas. Entre eles salientamos LINDE, WINDHEUSER, BtUBAUGH e, mais
recentemente, LACHMAN e colaboradores. Entre os granulados propostos para a preparação de capas
menciona-se o seguinte que sabemos ser utilizado entre nós com certo êxito:

Lactose .......................................................... 73 g
Goma adraganta ........................................ 2 »
Sacarose .................................................... 15 »
Cera................................................................ 4 »
Lubrificantes e corantes ................... q.b.p. 100 »

Trabalhando com uma máquina de tipo Manesty Dry Cota, LACHMAN, SYLWESTRO-Wicz e SPEISER
referiram as influências da tenuidade dos granulados de revestimento na uniformidade do peso das
drageias. A fórmula para revestimento que experimentaram é a seguinte:
Lactose .......................................................... 16 kg
Aerosil compositum O ............................ 1,5 »
Gelatina ..................................................... 0,5 »
Amido de araruta.......................................... 2,5 »
Amido de trigo ........................................ 2,5 »
Talco ............................................................ l »
Ácido esteárico.............................................. l »
Agua destilada .............................................. q.b.

(') O Aerosil compositum é um produto de marca registada, contendo 85% de sílica coloidal e
15% de hidrolisado de amido.
823

Desde que o granulado esteja bem preparado e os núcleos tenham a dureza adequada, as
máquinas de revestimento dão cadências muito apreciáveis. Assim, uma Pres-coter, com 20 matrizes e
respectivos punções, pode dar, em média 12000-25000 drageias por hora. Este rendimento aumenta
largamente com o número de punções, podendo-se atingir 1000 comprimidos por minuto com
modelos Colton de alta velocidade (Mod. 241-33) regulados a 33 revoluções por minuto.
Para fechar este subcapítulo queremos aludir ainda à possibilidade de preparar comprimidos
com duas e três coberturas. As firmas alemãs Horn, de Worms, Kilian, de Colónia e Fette, de
Hamburgo e a britânica Manesty, de Liverpool, fabïicam as máquinas necessárias a tal tipo de
revestimento.

7.2.1.3.2.3.4. Drageificação por suspensão no ar


Falámos atrás num processo de obtenção de granulados por suspensão, numa corrente de ar, do
pó que se pretende granular. Esse processo, devido a WURSTER, é susceptível de ser aplicado à
drageificação de comprimidos (air suspension coating). Para isso, basta substituir o pó por
comprimidos e as soluções de granulação por soluções de drageificação.
O aparelho é constituído por uma coluna vertical, mais
estreita na parte inferior, por onde entra uma corrente
ascensional de ar, cuja força é susceptível de
regulação. Na parte superior do aparelho existe Câmara de
um exaustor para retirar o excesso de humidade e revestimento
dos
permitir a secagem, podendo o ar que entra no aparelho ser
aquecido por meio de resistências ou de um sistema de gás. Um
atomizador lança a solução de revestimento sobre
os comprimidos suspensos no Secção em ar.
No esquema da Fig. 312 fun forma de mostra-se a base
de funcionamento do aparelho. Atomizad
Os comprimidos suspensos or -- no ar, quando atingem o ponto mais alto do aparelho
(em que o ar tem menos força corrente por ser mais larga a coluna), tendem a cair e recebem a
solução atomizada, cujo solvente ë facilmente evaporado pela agitação e pela temperatura a que se
opera.
Têm sido propostos vários materiais de revestimento: xarope simples; xarope com
polietilenoglicol 4000 a 50%; xarope simples com cozimento de amido a 4%; polieti-
824

lenoglicol 4000 e polissorbatos; ceras; resinas, etc. SINGISER e LOWENTHAL sugeriram a utilização de
líquidos para revestimento gastro-resistente, citando a seguinte fórmula:
Acetoftalato de celulose .............................. 62,5 g
-t J; : Álcool absoluto ............................................ 240 »
Plastificante C).............................................. 10 »
o Corante .......................................................... q.b.
Acetona.......................................................... 1000 ml
Normalmente, para l kg de comprimidos bastam 625 ml de liquido, sendo a atomização regulada
para as dimensões do aparelho (por exemplo, a 47-48 ml/minuto). O ar que entra deve ser aquecido
a 50-60°C e o ar que sai pelo exaustor deve ficar a 20-2VC.
A firma Kilian já fabrica máquinas destinadas à produção de drageias revestidas por este
processo.
Entretanto, lembramos que o primitivo método de WURSTER tem sofrido algumas modificações, como
as propostas por MESNARD, ROSEN e SCOTT, e CALDWELL e ROSEN.

7.2.1.3.2.3.5. Drageificação por fixação electrostática de pós


Já anteriormente utilizado na indústria das pinturas, o processo de fixação electrostática de pós
sobre os comprimidos tem recebido alguma atenção. A completa ausência de dissolventes, a rapidez
de execução e a igualdade de espessura da camada de revestimento são algumas das vantagens do
processo. Entre os materiais usados neste tipo de drageificação podemos citar os polímeros vinflicos
e acrílicos, os derivados da celulose e os polioxietilenoglicóis.

7.2.1.3.2.3.6. Drageificação automatizada


De tudo o que se disse sobre esta forma farmacêutica sobressai a ideia de que o êxito da
drageificação manual depende da habilidade do operador. Quer isto dizer que a drageificação tem
sido encarada mais como uma arte do que como uma ciência. Desta circunstância resulta a
variabilidade observada na qualidade das drageias, não só de operador para operador, de
medicamento para medicamento, mas ai"da de lote para lote. Compreende-se que numa
drageificação com açúcar, em que a camada de revestimento representa um peso quase idêntico ao
do núcleo, seja mais fácil conseguir

(') Como plastificantes tem-se aconselhado a triacetina, o propilenoglicol ou o óleo de rícino.


825

resultados satisfatórios do que quando se empregam finas películas de matérias isolan-tes, cuja
quantidade é desprezável em relação ao peso do comprimido. Mesmo assim, a drageificação pêlos
processos clássicos, com açúcar e gelatina, obriga, em regra, ao dispêndio de um mínimo de dois a
quatro dias.
LACHMAN, considerando estes problemas, idealizou um sistema automatizado de drageificação, o
qual permite executar todo o revestimento em cerca de três horas. Entre as vantagens deste novo
processo figura a facilidade de reprodução dos resultados obtidos, já que o factor humano é
eliminado, ou, pelo menos, minimizado. Por outras palavras, o autor conseguiu pôr em prática um
método que, devido à automatização introduzida, torna possível preparar drageias sem prática
variação de peso e com idêntico aspecto. Garante, também, inteira reprodutibilidade de resultados e
permite executar toda a operação de revestimento em cerca de três horas.
A Fig. 313 representa, em esquema, uma instalação para produção automatizada de
drageias. , ..„ ... . .,„ ,,

KTD

Fig. 313. Esquema de uma instalação para drageificação automatizada


I-2 —Válvulas solenóides
3 — Turbina
4 — Ar quente
5 — Exaustor de ar
6 — Programador
7 — Transmissor de ordens
8 — Compressor hidráulico . : •..-.•= <
9 — Misturador da suspensão ;
10 —Aquecedor 'i,.;',-' •»,'••
II—Filtro ., .... „ :,p~- ,!,,
826

As modificações propostas por LACHMAN consistem, fundamentalmente, numa diferente concepção


das turbinas de drageificação e num novo sistema de lançamento dos materiais de revestimento sobre
os comprimidos a drageificar. As referidas modificações dispensam a intervenção dos operadores nas
fases da drageificação em que maior importância tinham a sua técnica e a sua habilidade manual.
a) Bacias de drageificação — Entre as dificuldades apresentadas pelo método clássico de
drageificação figura a tendência dos comprimidos para aderirem uns aos outros, quando
humedecidos pêlos líquidos usados no revestimento. Esta dificuldade só é imperfeitamente removida
na prática clássica. De facto, o operador procura separar os comprimidos uns dos outros,
remexendo-os com uma das mãos, que introduz na turbina em movimento. Segundo LACHMAN, esta
operação é perfeitamente dispensável, desde que as turbinas sejam providas de barras fixas no seu
interior, as quais actuam como verdadeiras barreiras com que chocam os comprimidos. A máxima
eficiência consegue--se com 4 barras dispostas entre si em ângulo recto. Assim, as barras dispõem-se
sensivelmente segundo as arestas de uma pirâmide, cujo vértice fica situado a cerca de 10 cm do
centro do fundo da bacia de drageificação. As barras, que saem do citado ponto, dirigem-se para os
bordos da turbina, ficando deles distanciadas cerca de 20 cm. Nas Figs. 314 e 315 mostra-se o
formato de uma dessas barras e indica-se a sua posição na turbina.

Fig. 314. Turbina de drageificação com barras Fig. 315. Panela de drageificação com
barras fixas
1 — Barras fixas formando ângulos de 90°
2 —Eixo de rotação

Anotemos que o sistema utilizado por LACHMAN não era inteiramente novo.
É prática corrente executar-se o revestimento de granulados em bacias de drageifi
cação, evitando-se a aderência dos grânulos uns aos outros com uma barra, geral-
827

mente de madeira, que se coloca na turbina apoiada no fundo e segundo o eixo maior daquela.
Para que o ar que se emprega na secagem incida sobre os comprimidos de forma eficiente, o
sistema de LACHMAN inclui um tubo secador terminado numa espécie de Y (Fig. 316-1).

Fig. 316-1. Bacia de drageificação com barras, mostrando o formato e posição


destas (esquema)
b) Lançamento das líquidos de revestimento — Uma das causas da irregularidade observada durante
a drageificação clássica provém das diversas quantidades de soluções e de pós lançados sobre os
comprimidos. Como se compreende, essas quantidades variam com a arte do operador e com as
circunstâncias particulares com que depara durante a operação. Com o fim de obviar este
inconveniente, o autor do método que estamos descrevendo procurou padronizar os sistemas de
lançamento dos líquidos e

Fig. 316-11. Atomizaçáo dos líquidos de revestimento


828

pós de revestimento. Para isso, emprega atomizadores de modelo especial, em que a força propulsora
para efectuar a dispersão não provém de ar comprimido mas de uma pressão hidráulica, susceptível
de acerto e regulação às condições desejadas. Neste sistema haverá, pois, uma verdadeira ejecção de
líquidos sobre os comprimidos.
Trata-se, portanto, de um sistema de dispersão de gotículas líquidas, sem serem suspensas numa
corrente de ar, como é vulgar poder fazer-se. Esta modificação permite obter maior uniformidade na
aplicação e, subsequentemente, conseguir revestimentos com menor espessura (Fig. 316-11).

7.2.1.3.3. Verificação de drageias ••<-


Poderemos dizer que o controlo das drageias é muito semelhante ao que se efectua com os
comprimidos. Há, no entanto, que considerar a presença da camada de revestimento, a qual lhes
pode conferir características próprias.
A verificação de peso, realizada nos mesmos moldes que descrevemos para os comprimidos, só
apresenta razão de ser nas drageias cuja camada de revestimento contém princípios activos.
Nas restantes drageias, que, aliás, são as mais numerosas, a operação é dispensável, já que a
uniformidade da dosagem individual não foi afectada pelo revestimento do núcleo. Entretanto, é
imprescindível efectuar a verificação do peso dos comprimidos antes da sua drageificação. Deste
modo, o controlo das drageias é, em parte, executado durante a laboração da forma farmacêutica
para que os resultados obtidos não sejam afectados pelas variações introduzidas pela aplicação e
polimento da camada de cobertura. Acessoriamente, será feita uma verificação sumária do peso final
das drageias, podendo, em regra, estipular-se que os desvios encontrados devem satisfazer à
tolerância geral indicada para os comprimidos.
Na maioria dos casos (excepção feita às películas de revestimento mais finas, como as de
etilcelulose), a camada de drageificação pesa 35 a 55% do peso dos comprimidos e é susceptível de
ser removida mecanicamente, ou por imersão em álcool isopropflico a 45% e a 90%. Naturalmente
que é sobre os comprimidos assim obtidos que se procederá à dosagem dos princípios activos.
Um processo prático de eliminação da camada de revestimento consiste em lavar as drageias
com água, passá-las por álcool forte e secá-las, depois, em corrente de ar quente.
Se na capa de revestimento existirem substâncias activas, o que alguma vezes
acontece, não se deverá recorrer aos processos de lavagem, mas sim de remoção
mecânica. Pode também fazer-se a lavagem por qualquer dos líquidos indicados, desde
que se guarde esse líquido e na solução obtida se doseiem os princípios activos exis
tentes na camada de drageificação. .., ..._. ... ...„,, .,,,,.. -
829

Pode apresentar ainda interesse a pesquisa de vestígios de dissolventes não inócuos nas películas
de revestimento. Assim, HOLL e colab. indicam uma técnica rápida, baseada na reacção
halofórmica, para a detecção da acetona usada como dissolvente do acetoftalato de celulose.
No que diz respeito à desagregação, devem ser efectuados ensaios vulgares e ensaios específicos
para revestimentos gastro-resistentes.
A Farmacopeia Portuguesa V, na sua monografia sobre comprimidos e a respeito dos
comprimidos revestidos, estipula as normas a que deverão obedecer esses ensaios e que,
fundamentalmente, diferem dos indicados para os comprimidos pela natureza do líquido e pelo tempo
de desagregação admitidos.
Para drageias vulgares indica-se a seguinte técnica: Em cada um dos seis tubos do aparelho
descrito a propósito dos comprimidos introduza uma drageia e, seguidamente, um disco; coloque o
conjunto no vaso cilíndrico que contém água como líquido de desagregação. Mantenha o aparelho
em funcionamento durante 60 minutos, salvo excepção justificada a autorizada, e depois examine o
estado das amostras. Se um só dos comprimidos se não desagregar, repita o ensaio com outros 6
comprimidos substituindo a água por ácido clorídrico 0,1 N. Os comprimidos satisfazem ao ensaio se
todos se desagregarem no meio ácido. Os comprimidos de película devem satisfazer ao mesmo ensaio
mas o aparelho deve ser manado em funcionamento durante 30 minutos, salvo excepção justificada e
autorizada.
Para drageias gastro-resistentes estipula-se: Efectue o ensaio como no caso anterior mas não
introduza discos e utilize como líquido de desagregação ácido clorídrico 0,1 N. Mantenha o aparelho
em funcionamento durante 2 horas. Nenhum comprimido deve apresentar o mínimo sinal de
desagregação nem fendas que possam permitir perda de conteúdo, com exclusão do desprendimento
eventual de fragmentos de revestimento. Substitua a solução ácida por solução tampão de fosfato de
pH 6,8 e utilize um disco em cada um dos tubos. Mantenha o aparelho em funcionamento durante 60
minutos. Todos os comprimidos se devem desagregar.
A Farmacopeia Portuguesa IV recorria ao emprego sucessivo de sucos gástrico e entérico
artificiais em vez do ácido clorídrico 0,1 N e do tampão de fosfatos de pH 6,8.
Estes sucos, cuja composição pode variar segundo o autor, tem pH de 1,2 a 1,6 e de 7,4 a 8,
respectivamente.
A composição do suco gástrico artificial da Farmacopeia é a seguinte: 0,32 g de pepsina (título
2500), 0,2 g de cloreto de sódio, 9,1 g de metilparabeno, 0,7 ml de ácido clorídrico e água destilada
q.b.p. 100 ml. O pH desta solução é de cerca de 1,2.
O suco entérico artificial é preparado com os seguintes componentes: l g de pancreatina, 0,68 g
de fosfato monopotássico, 0,1 g de metilparabeno, 3,8 ml de NaOH N/1 e água destilada q.b.p. 100
ml. O pH desta solução deve ficar compreendido entre 7,4 e 7,6.
830

Como dissemos, além destas fórmulas muitas outras têm sido estabelecidos, designadamente para
o suco pancreático, podendo conter mucina ('), bicarbonato de sódio, sais biliares, etc.
A título de exemplo, indicamos a composição de um destes sucos entéricos artificiais, que nos
parece ser dos mais utilizados: 0,5 g de mucina, 8 g de pancreatina, 15 g de bicarbonato de sódio, 30
g de sais biliares e água q.b.p. 1000 ml.
Por vezes, chega-se a discriminar a composição do suco gástrico com o estômago vazio e com o
estômago cheio.
Suco gástrico existente no estômago cheio: Preparar duas soluções, a e b, que se misturam,
ficando a pH 4; a solução a conterá 1,4 g de cloreto de cálcio, 10-15 ml de ácido clorídrico normal,
3,2 g de pepsina (título 2500), 1,3 g de mucina e água q.b.p. 500 ml; a solução b é constituída por
300 ml de mucilagem de goma arábica e água q.b.p. 500 ml.
A desagregação das drageias, especialmente das que têm revestimentos gastro--resistentes, pode
também ser apreciada por processos realizados no homem ou em animais.
Naturalmente que os processos in vivo são efectuados com controlo radiográfico, recorrendo ao
emprego de isótopos radioactivos ou avaliando-se as velocidades de absorção ou de eliminação do
medicamento. Assim, emprega-se, como já atrás dissemos, o sulfato de bário, o ácido iodoalfiónico,
etc., que são revestidos pela camada gastro-resistente, seguindo-se o comportamento apresentado,
quer no homem, quer em animais, por meio de radioscopia ou de radiografias. Outras vezes, aprecia-
se o teor de medicamento no sangue ou na urina, o que dá uma ideia da desagregação, no primeiro
caso pela velocidade de absorção, no segundo pela velocidade de eliminação. Um composto muito
prático para avaliar a desagregação através da velocidade de eliminação é a riboflavina, que
comunica às urinas cor amarela muito intensa e fluorescência.
O emprego de radioisótopos tem sido igualmente utilizado, se bem que em pequena escala,
usando-se, como núcleo de comprimidos que se revestem com capas gastro-resistentes, o cloreto de
sódio marcado com 24Na, ou o iodeto de potássio com 1311.
Por último, resta-nos aludir à determinação da humidade, ensaio que apresenta interesse na
previsão da estabilidade da forma e dos princípios activos constituintes. Opera-se sobre o pó
resultante da trituração de 10-12 drageias e utilizam-se os processos convencionais descritos
anteriormente (Ver Pós).

(') A presença de muco no estômago eleva o tempo de desagregação de muitos comprimidos.


831

BIBLIOGRAFIA

Livros e artigos de carácter geral:


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Artigos de carácter especializado:


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832

7.2.1.4. Pílulas, grânulos e bolos


Sob esta rubrica estudaremos três formas farmacêuticas que diferem entre si, fundamentalmente,
pelo peso que apresentam: pílulas, grânulos e halas.
Estas preparações são dotadas de consistência firme, têm uma forma sensivelmente esférica e
destinam-se a serem administradas por via oral, sem serem mastigadas. Em regra, o seu modo de
obtenção consiste na preparação de uma massa firme, plástica e adesiva, à qual é dada a forma de
um cilindro que se secciona em tantas porções quantas as pílulas, grânulos ou bolos a preparar. As
porções de massa assim obtidas são roladas de maneira a que fiquem com a forma esférica.

7.2.1.4.1. Pílulas 7.2.1.4.1.1. Generalidades


As pílulas são preparações farmacêuticas de consistência firme, sensivelmente esféricas, cujo peso é
de cerca de 20 centigramas e que se destinam a serem deglutidas sem mastigar.
Normalmente, o diâmetro das pílulas está compreendido entre 6 e 8 mm. Em casos especiais, o
seu peso pode afastar-se dos 20 centigramas, não sendo, porém, inferior a 5 centigramas nem
devendo ser superior a 30 .centigramas.
A designação de pílula provém do termo latino pílula, diminutivo de pila, que significa bola. A
citada palavra latina originou, em português, as designações de pírola e de pílula, conforme veio
transmitida por via popular ou por via erudita. É assim que em antigas farmacopeias do nosso país
aparece a palavra pírola aludindo a esta forma farmacêutica, a qual, mesmo actualmente, continua a
ser empregada em linguagem popular. A corruptela do termo latino pílula originou em Espanha a
palavra píldora que tem apreciável afinidade com a forma popular portuguesa.
O uso das pílulas pode dizer-se que é tão antigo como o emprego dos medicamentos sólidos ou
semi-sólidos, o que é compreensível, dada a intuitiva tendência para arredondar uma massa
medicamentosa com o objectivo de facilitar a sua ingestão. É natural que, inicialmente, fossem
apenas as substâncias medicamentosas, ou as suas misturas, a serem arredondadas. Com o decorrer
dos tempos, o homem teria procurado adicionar produtos inertes que proporcionassem a formação
de uma massa plástica e melhorassem o aroma e o sabor dos compostos medicinais. Teria nascido
assim, no dizer de SELLÉS MARTÍ, o emprego dos excipientes ou intermédios a que, na presente época,
se recorre normalmente, muito em especial sempre que a quantidade do princípio activo é demasiado
pequena para, por si só, ser susceptível de se manejar.
833

É também natural que a imperfeita selecção dos excipientes ou a elevada adesivi-dade das
próprias substâncias medicamentosas levasse à obtenção de pílulas não desagregáveis no tracto
gastro-intestinal, as quais seriam destituídas de acção ou, quando muito, poderiam desempenhar um
papel laxativo, por exercerem peso sobre o conteúdo fecal (caso das pílulas perpétuas de antimònio).
Julgamos que, desta maneira, terá nascido a ideia de se incluírem entre os componentes das
pílulas excipientes destinados a promoverem a sua fácil e rápida desagregação nos sucos digestivos
(desagregantes).
As pílulas apresentam diversas vantagens sobre outras formas farmacêuticas, pois
— mascaram o cheio e o sabor de muitos fármacos, especialmente quando se encontram
revestidas;
— como são muito concentradas em agentes medicamentosos, ocupam pequeno volume e são
relativamente resistentes às alterações pela luz, humidade e ar;
— dada a sua forma e consistência e ainda considerando o pequeno volume que ocupam, são
facilmente administráveis.
— podem ser revestidas, quer para protecção dos agentes medicinais que contenham, quer para
só se promover a sua desagregação no suco entérico;
— a sua produção é relativamente fácil, podendo conseguir-se um rendimento apreciável, mesmo
com aparelhos muito simples.

7.2.1.4.1.2. Excipientes
Na preparação das pílulas misturam-se produtos medicinais com substâncias inertes que
funcionam como excipientes, de modo a obter-se uma massa dotada de determinadas características,
a qual é, posteriormente, dividida em fracções que correspondem às pílulas. À massa plástica,
adesiva e firme que se obtém chama-se massa pilular, sendo essas propriedades normalmente
conferidas pelo excipiente que se utilizou. Casos há, muito raros, em que não é necessário adicionar
excipientes aos agentes medicamentosos. Por outras palavras, a simples mistura dos princípios
medicamentosos origina uma massa pilului com as características desejadas e cujo peso permite a
divisão directa em pílulas. É o que sucede quando se misturam 0,65 g de extracto mole de valeriana
com 0,65 g de extracto mole de meimendro e com 0,65 g de óxido de zinco. Na realidade, a adição
dos três produtos citados, nas quantidades referidas, permite obter 1,95 g de massa pilular
adequada, da qual se preparam 10 pílulas de 0,195 g cada.
O exemplo mencionado constitui, porém, uma excepção e, em casos correntes, toma-se imperiosa
a adição de vários excipientes, que umas vezes são pós, outras têm consistência mole e outras ainda
se apresentam no estado líquido.
A escolha judiciosa do excipiente ou excipientes a empregar depende principalmente das
propriedades físicas dos agentes medicamentosos, não devendo esquecer-se as
834

eventuais incompatibilidades químicas e farmacológicas que podem originar. Por outro lado, além
da preparação de uma massa plástica, firme e adesiva é preciso ter presente que as pílulas se
destinam a serem engolidas sem mastigar, tendo por isso que sofrer a desagregação no tracto gastro-
intestinal. Normalmente, os bons excipientes possuem carácter coloidal, conferindo essa
característica à massa pilular.
Na presente rubrica iremos estudar os excipientes que mais frequentemente se empregam na
preparação das pílulas, classificando-os em três grandes grupos: a) excipientes aglutinantes; b)
excipientes secos ou absorventes; c) excipientes líquidos.

7.2.1.4.1.2.1. Excipientes aglutinantes ••


Este tipo de excipientes é habitualmente necessário para produtos medicamentosos pulverulentos
ou secos que sejam insolúveis nos dissolventes ordinários ou que neles originem soluções cuja
viscosidade e adesividade não permitam a obtenção de massa pilular. Uma vez que são relativamente
abundantes os compostos orgânicos e inorgânicos cujas características de dissolução se enquadram
no que dissemos, compreende-se que os excipientes aglutinantes sejam em regra preferidos.
O mel, o xarope comum, as soluções de glicose, as mucilagens de goma arábica ou de goma
adraganta, certos extractos moles, o glicerado de amido, a conserva de rosas, a manteiga de cacau, a
vaselina, os polietilenoglicóis, etc. são excipientes deste tipo.
Mel, xarope comum, glicose — Tanto o mel como os melitos, o xarope comum ou o xarope de
glicose são excipientes adequados para a transformação de pós vegetais em massa pilular, a qual
fica dotada de certa higroscopia que impede a secagem das pílulas e o seu subsequente
endurecimento.
Por vezes pode empregar-se uma mistura de xarope simples com xarope de glicose na proporção
de 2:1, a qual se mostra aconselhável quando os princípios das pílulas sejam pós vegetais ou
extractos secos. Quando o poder adesivo da citada mistura é insuficiente para conferir a adesividade
necessária à massa, pode associar-se a goma arábica, numa quantidade de l a 2 centigramas por
pílula.
A junção de glicerina aos xaropes aglutinantes pode favorecer a aglutinação e a conservação de
pós, que, como o de quina, tendam a perder água por evaporação.
Mucilagens de gomas — As mucilagens de goma arábica ou de goma adraganta apresentam certo
poder aglutinante, podendo usar-se com vários pós que tenham pequena tendência para a aglutinação.
Entretanto, é preferível associá-las à glicerina, ao mel ou ao xarope de glicose, sempre que se deseje
um excipiente fortemente adesivo e plástico. Neste particular, a glicerina revela elevado poder
plastificante, podendo ser substituída pelo propilenoglicol ou pelo sorbitol a 70%.
A mucilagem de goma adraganta não é muito empregada sozinha porquanto torna as pílulas
duras. O mesmo se diz em relação à mucilagem de goma arábica, que só se
835

utiliza isoladamente quando se pretende que a massa pilular apresente muito pequeno volume (caso
da preparação de grânulos segundo a F. P. IV).
Entre as misturas mais usadas lembramos a seguinte: '
Goma adraganta em pó................................ 6 g -,
Glicerina ........................................................ 30 »
Água destilada ................................ cerca de 10 »
Tritura-se a goma com a glicerina em almofariz e ajunta-se a água até à obtenção de uma pasta
homogénea que constituirá um excipiente de eleição para aglutinar pós brancos e cristalinos, pouco
solúveis nos dissolventes ordinários. É necessária certa experiência para o uso deste excipiente, cujo
excesso torna a massa pilular demasiado elásüca e, por isso, dificilmente rolável. O citado
inconveniente atenua-se com a junção de uma pequena quantidade de xarope de glicose. Pode,
também, ter-se já preparado um excipiente sem a mencionada desvantagem. Trata-se da mistura de
goma arábica com glicerina e mel na porporção de 12:7:12. Na realidade, o mel, cujo conteúdo em
açúcar invertido (glucose + frutose) é de 64-69%, funciona nesta fórmula como uma fonte natural de
glucose.
Tem sido proposta, como excipiente adesivo, uma mistura de goma arábica (5 g) com goma
adraganta (5 g) e com glicerina (50 g). Esta associação presta bons serviços na prática corrente, já
que o poder aglutinante da goma adraganta é compensado com a forte acção ligante exercida pela
goma arábica, evitando-se o endurecimento das pílulas com a presença da glicerina.
Extractos moles — Os extractos moles, cujo teor em água é de cerca de 20-25%, apresentam
forte poder aglutinante. Na preparação das pílulas têm sido usados extractos moles inertes, como o de
grama, ou extractos moles cuja actividade terapêutica não prejudica a acção farmacológica das
pílulas, como o extracto de levedura de cerveja.
O extracto de grama é frequentes vezes usado só, podendo, no entanto, associar--se ao pó de
alcaçuz ou à glicerina. O extracto mole de levedura de cerveja origina pílulas que não endurecem e
se desagregam rapidamente nos sucos digestivos, o que se deve ao elevado teor em sais minerais e à
facilidade de inchar, que as células da levedura apresentam. Por outro lado, a sua acção
estomáquica e o conteúdo vitamínico em complexo B, longe de prejudicarem a actividade
farmacológica das pílulas, podem constituir um reforço terapêutico desejável.
O próprio extracto seco de levedura de cerveja pode ser utilizado como aglutinante, bastando
para isso misturá-lo com uma mistura hidroglicérica em partes iguais.
Glicerado de amido — Correntemente usado pêlos norte-americanos como aglutinante pilular,
especialmente para pílulas brancas, não tem tido boa aceitação entre nós, talvez por se associar ao
glicerado de amido a ideia de uso externo que constitui o seu emprego normal. A sua manipulação
requere também alguma prática, porquanto pode tornar as pílulas demasiado frágeis.
836

Polieíilenoglicóis — Estes compostos, tipicamente hidrossolúveis, têm sido utilizados como


aglutinantes para substituir a goma arábica. Empregam-se associados a uma solução aquosa de
gelatina (1:1) ou ainda misturados com xarope comum.
É principalmente o PEG 4000 o que mais tem sido usado, se bem que o PEG 6000 também se
tenha ensaiado. A quantidade de polietilenoglicol por pílula é da ordem dos 3 a 4 centigramas,
embora se possa utilizar maior ou menor quantidade.
Do mesmo tipo de excipientes é o Postonal de que há duas variedades fundamentais:
polioxietilenoglicol (Postonal proposto para o Suplemento à DAB 6) e o éster do polioxietilenoglicol
com o ácido ricinoleico (Postonal W, Hoechst).
Substâncias de tipo gordo — Como excipientes aglutinantes empregam-se verdadeiras gorduras,
como a manteiga de cacau, produtos principalmente constituídos por esteres do colesterol, como a
suarda, e misturas de hidrocarbonetos, como a vaselina.
A manteiga de cacau é dos três excipientes citados o de mais fácil digestão, dado que é
saponificado pelas lipases do tracto gastro-intestinal. Sendo hidrófoba, tem-se empregado para
proteger da hidrólise determinados compostos, como os heterósidos (pó de dedaleira em pílulas).
Uma vez que o seu ponto de fusão se situa próximo de 36"C, é aconselhável, pêlos menos no tempo
frio, associá-la ao óleo de amêndoas doces.
A lanolina ou suarda não deve ser utilizada, dada a sua difícil digestibilidade e a sua
consistência. Tem-se, entretanto, empregado na preparação de pílulas que contenham apreciável
quantidade de líquidos aquosos (lanolina anidra).
A vaselina, que não é metabolizada no organismo, apresenta características físicas de
consistência e adesividade aconselháveis na preparação das pílulas. Tem-se empregado quando os
princípios activos são facilmente reduzidos, como o nitrato de prata e o permanganato de potássio.
Nesses casos, é vulgar associá-la ao caulino e à parafina líquida.

7.6.1.4.1.2.2. Excipientes absorventes


Estes excipientes são necessários para conferir consistência de massa pilular aos princípios
medicamentosos líquidos ou moles. Por vezes, a sua selecção é difícil, principalmente quando é
elevada a quantidade de líquido presente na fórmula. Em certos casos, é necessário conjugar o uso
dos pós absorventes com determinados excipientes líquidos, de modo a tomar possível a preparação
de uma massa suficientemente plástica. Pode, assim, acontecer que seja grande a quantidade de
excipientes na massa, o que obriga a preparar pílulas de peso superior a 20 centigramas.
Claramente que esta dificuldade se não verifica sempre que o líquido seja susceptível de evaporação
e os princípios medicamentosos não sofram alteração pelo calor.
Entre os excipientes deste grupo citaremos os pós de alteia, de alcaçuz e de levedura seca, o
óxido de magnésio, o fosfato tricálcico, o amido, as misturas de açúcares, o caulino e o sabão.
837

Os pós vegetais são utilizados como absorventes puros, sempre que não seja necessário conferir-
se poder aglutinante à mistura. O fosfato tricálcico é especialmente utilizado para fixar compostos
oleosos ou o ictiol, e os amidos são desejáveis para absorver óleos associados a líquidos aquosos.
Pó de alteia — O pó de raiz de alteia é bastante rico em amido e em mucilagem, o que lhe confere
elevado poder absorvente. As pílulas preparadas com pó de alteia ficam, no entanto, demasiado
elásticas e desagregam-se dificilmente. A associação de gomas enrijece extraordinariamente a massa
e as pílulas têm fortes probabilidades de se não desagregarem no tracto digestivo.
Pó de alcaçuz — Além de funcionar como um bom absorvente, o pó de alcaçuz apresenta
apreciável poder aglutinante, propriedade que se deve ao seu elevado teor em açúcares e
glicirrizina. Esta última substância é um heterósido do tipo das saponinas e possui poder emulsivo, o
que permite utilizar o pó de alcaçuz como absorvente de compostos hidro-insolúveis. Assim, o
creosoto, o alcatrão e o ictiol são facilmente fixados pelo pó de alcaçuz, já que a glicirrizina presente
ocasiona a sua dispersão (emulsão O/A), quando em presença de água.
Entre as contra-indicações do pó de alcaçuz citamos o poder de retenção dos alcalóides por
adsorção (chega a fixar 43% de nitrato de estricnina e 36% de sulfato de atropina). Se em muitos
casos estas adsorções não têm particular interesse, dado que posteriormente os alcalóides são
eluídos no estômago por acção do ácido clorídrico, pode acontecer que se não verifique a aludida
libertação.
Além deste inconveniente, o alcaçuz apresenta uma acção estimulante sobre o córtex supra-renal,
não podendo, por isso, ser considerado um pó inerte.
Do ponto de vista técnico, observou-se que as pílulas contendo pó de alcaçuz podem fendilhar,
pelo que se recomenda que este pó seja associado aos açúcares, amido, glicose ou alginatos.
Pó de levedura — O pó de levedura apresenta-se como um produto de cor amarelada-
acastanhada, inodoro e de sabor salgado. Prepara-se a partir da levedura do pão, que se lava para
eliminar o mau sabor e se seca a 120°C, o que provoca a destruição das diástases.
Pode usar-se na preparação de pílulas que contenham apreciável quantidade de extractos
medicamentosos, como o de genciana, o de ópio ou o de cravagem de centeio.
Óxido de magnésio — Como já vimos no subcapítulo PÓS, trata-se de um excelente absorvente
para diversos líquidos (essências, balsamos, óleo-resinas). Entre os seus inconvenientes figura a sua
fraca densidade, o que leva à obtenção de pílulas com grande volume e o facto destas se tornarem
muito duras. O carbonato de magnésio pode substituí-lo com vantagem, desde que na fórmula não
intervenham princípios dotados de carácter ácido.
Fosfato tricálcico — Esta substância é também um bom absorvente, sendo utilizado para fixar
óleos, vitaminas lipossolúveis (axeroftol, ct-tocoferol), ictiol, etc. Foi
838

empregado para absorver a vitamina Dy mas esse uso deve ser banido, dado que é incrementada a
toxicidade daquela.
Amido — Bom absorvente, emprega-se, por vezes, associado à glicose, sacarose ou lactose e à
dextrina. A mistura de SAIKO é uma das mais clássicas destas associações:
Glucose (ou lactose, ou sacarose) .............. 60 g
Dextrina.......................................................... 20 » '•,
Amido............................................................ 20 » '''''
•;!
Este excipiente pode utilizar-se com numerosos alcalóides sem que haja o perigo de que sejam
fixados por adsorção. A citada mistura é empregada na preparação da massa pilular, em conjunto
com uma solução aglutinante assim constituída:
Gelatina.......................................................... 5 g
Água destilada .............................................. 5 »
Glicerina ........................................................ 90 »
Metilparabeno ................................................ 0,2 »
Caulino — Funciona como um bom absorvente da água e de soluções oleosas, conferindo o
desejável poder de desagregação às pflulas com ele preparadas. O seu uso tem-se praticamente
circunscrito às pflulas de compostos alteráveis, como o Sãlicilato de sódio, iodetos alcalinos, nitrato
de prata e permanganato de potássio.
Sabão — O sabão animal, que é, fundamentalmente, constituído por estearato de sódio,
apresenta maior poder absorvente para os óleos e resinas do que o sabão vegetal (sabão medicinal
ou sabão amigdalino), cujo principal componente é o oleato de sódio.
Emprega-se na preparação de várias pflulas, como as de creosoto, substância que, em presença
da água e do sabão, é emulsionada (emulsão O/A). Em regra, usam-se pesos iguais de creosoto e de
sabão animal.

7.2.1.4.1.2.3. Excipientes líquidos

Estes intermédios, a que preferentemente se dá o nome de veículos, são empregados pelo poder
dissolvente que apresentam para um ou mais dos constituintes de uma fórmula de pflulas. Nessas
circunstâncias, se a solução obtida for dotada de apreciável viscosidade, pode servir como agente de
aglutinação, originando uma massa pilular adequada. É o que acontece com o emprego da água ou
do álcool diluído, respectivamente para os extractos aquosos e alcoólicos. Contudo, nem sempre um
bom dissolvente é um bom veículo para pílulas, pois importa que, além dessa propriedade, a
839

solução obtida seja suficientemente viscosa e adesiva. Assim, o álcool ou o éter, que são bons
dissolventes da cânfora, não originam soluções viscosas e adesivas que permitam a obtenção de
massa pilular. Já o óleo de rícino, que é muito viscoso e só parcialmente dissolve a cânfora, constitui
um bom veículo para aquela substância, do ponto de vista da preparação de uma massa pilular
dotada de consistência adequada.
A água é pouco empregada sozinha, podendo, contudo, servir para emulsionar pequenas
quantidades de goma-resinas. Utiliza-se algumas vezes associada ao álcool em pflulas que contenham
resinas. Do mesmo modo, é frequente o emprego de soluções hidroglicéricas.
O álcool de elevada graduação pode servir como dissolvente de matérias resinosas mas, em
geral, as pflulas obtidas apresentam elevados tempos de desagregação. É por isso que, nestes casos,
se associam, correntemente, pós inertes. Isto não sucede na associação de extracto de aloés com
extracto de ruibarbo, em partes iguais, já que só é resinoso o primeiro medicamento. Para obter
massa pilular adequada, basta empregar 0,5 g de álcool por cada 8 g da citada mistura, observando-
se que as pflulas assim preparadas se desagregam com regularidade.
Ainda entre os líquidos usados como veículos podemos referir o ácido láctico, que se tem
empregado para os sais de quinina, pois provoca uma apreciável redução no volume apresentado
por aqueles.
Os óleos, como o azeite ou o óleo de amêndoas, são por vezes utilizados como excipientes
pilulares. Assim, usaram-se na preparação de pílulas contendo terebintina, as quais apresentam
especial tendência para endurecer com o tempo.

;
7.2.1.4.1.3. Preparação das pflulas ' '* ' ' *"'
Sob esta rubrica principiaremos por descrever a preparação de pílulas pelo processo
clássico, utilizado na pequena oficina, para, em seguida, nos referirmos à fabricação
industrial desta forma farmacêutica. •>.-••

7.2.1.4.1.3.1. Processo clássico de obtenção

Para preparar pflulas é necessário proceder-se à mistura dos princípios medicamentosos sólidos
ou líquidos com os excipientes, obtendo-se uma massa pilular que depois se div!de em tantas porções
quantas as pflulas pretendidas.
Misturam-se, intimamente, as substâncias secas (princípios activos ou excipientes) por ordem
crescente do seu peso. A mistura deve realizar-se em almofariz de forma baixa, de bordos
arredondados e sem bico, cujo pilão, quase cilíndrico, tenha cerca de
840

20 centímetros e apresente a extremidade arredondada, de modo a que se adapte perfeitamente à palma


da mão do operador.
Quando na fórmula haja substâncias cuja quantidade seja inferior a 5 mg (como pode acontecer
com as pílulas de vitamina B]2) e em que, portanto, haja dificuldades de pesagem, devem usar-se
diluições a 1:3 ou 1:10, em pós inertes (lactose, manita).
Adicionam-se, então, os componentes líquidos ou pastosos, distribuindo-se uniformemente, por
trituração, até que se obtenha uma massa com a consistência própria. Durante esta operação é
necessário destacar a massa das paredes do almofariz, recomendando-se, para isso, uma espátula
pequena, de lâmina larga e não flexível.
Em geral, a operação dá-se por terminada quando a massa já não adere às paredes do almofariz, o
que significa que adquiriu a consistência adequada (plástica, firme e adesiva).
Na prática, a obtenção de uma massa plástica, adesiva e firme pode apresentar algumas
dificuldades, especialmente quando a fórmula das pílulas contiver componentes líquidos lipófilos. Nesse
caso, a incorporação do composto lipófilo pode executar-se por três processos fundamentais, a que
chamaremos: método de adsorção, método de emulsificação e método de plastificarão.
O método de adsorção consiste em adicionar ao líquido lipófilo substâncias adsor-ventes, sendo o
adsorbato posteriormente plastificado por adição de geles (mucilagens de gomas, soluções de gelatina,
etc.). Como exemplo.citamos a preparação de umas pílulas de creosoto (composto lipófilo). O
creosoto é adicionado de pó de alcaçuz, plastificando-se a mistura por adição de glicerado de amido.
O processo de emulsificação baseia-se na adição de agentes emulsivos que provoquem a dispersão do
princípio lipófilo sob a forma de emulsão O/A. À mistura formada podem ajuntar-se pós absorventes, até
plastificação. Retomando o exemplo anterior, as pílulas poderiam ser preparadas por mistura do
creosoto com sabão animal, podendo dispensar-se a adição de pós absorventes.
O método de plastificação consiste em ajuntar ao produto lipófilo um excipiente mole e gorduroso
ou resinoso (vaselina, benjoim, cera, manteiga de cacau, etc.) que se (nisture facilmente com ele. Umas
pílulas de creosoto poderiam ser preparadas por este método, por simples incorporação do creosoto no
benjoim ou na manteiga de cacau.
A Fig. 317 representa, esquematicamente, os três processos de preparação que enunciámos.
A massa pilular é, então, removida e malaxada entre os dedos. Passa-se, seguidamente, para uma
pedra mármore ou para o tabuleiro de um pilulador, onde é rolada em pequenos cilindros, a que se dá o
nome de magdaleões.
Na prática rola-se a massa primeiramente nas mãos até se conseguir um cilindro grosseiro. Passa-
se este para a pedra ou para o tabuleiro do pilulador e com uma espátula larga, ou com uma régua
também larga, de madeira lisa, vai-se rolando o cilindro até que o seu comprimento permita um fácil e
equitativo fraccionamento.
841

O magdaleão é dividido em tantas porções quantas as pílulas a preparar. Para isso pode-se usar,
como unidade de medida de cada fracção, a largura da lâmina de uma espátula pequena,
procurando-se aumentar o comprimento do cilindro, de tal modo que corresponda a um número
exacto de vezes da citada medida.

Método de adsorção
liquido gele
adsor- píl
lipófilo ula
plastifi-
Método de ação
emulsífica

líquido
agente são O/A
lipónlo ab1
emul-stvo so

Mistura

Fusão

líquido exci- -; • •.
lipófilo piente
resinoso
ou gor- •- •" • '-l
duroso
Flg. 317. Diagrama esquemático representando a preparação de pílulas
pílula

Mais correcto, porém, é recorrer-se ao emprego de um pilulador (Fig. 318). Este consta de um
tabuleiro rectangular de madeira, onde se encontra encaixada no seu terço inferior e no sentido da sua
largura uma régua metálica canelada (').
842

Os sulcos da régua apresentam secção herni-circular e sobre eles se colocará o magdaleão, cujo
comprimento será suficiente para cobrir um número de sulcos igual ao número de pílulas a preparar.
O pilulador possui ainda uma outra peça de madeira que assenta sobre o rebordo do tabuleiro, a
qual é susceptível de correr livremente sobre este. Esta peça tem incrustada uma régua metálica canelada
semelhante à primeira, cujos sulcos correspondem perfeitamente aos desta.

Flg. 318. Pilulador (Uhlmann)

Ajustada esta segunda régua sobre o magdaleão, efectua-se o corte deste no número de fracções
igual ao número de pílulas a preparar. Se a massa pilular tiver consistência adequada, um simples
movimento de deslizamento da segunda régua ao longo do tabuleiro permite obter pílulas irregularmente
arredondadas, às quais se confere a forma esférica definitiva, quer trabalhando manualmente, quer
arredondando-as com um disco próprio. Este é de madeira, podendo apresentar o fundo móvel ou fixo, e
serve para rolar as pílulas de modo a torná-las o mais esféricas possível.
O disco, conhecido por disco de VIDAL, apresenta, na face inferior, um rebordo a toda a volta, cuja
altura corresponde ao diâmetro das pílulas. São preferíveis discos de fundo móvel, já que permitem
ajustar, com rigor, a altura do rebordo ao diâmetro da pílula.
O disco é aplicado suavemente sobre as pílulas, imprimindo-se-lhe um movimento de rotação.
É conveniente polvilhar a massa pilular e o próprio magdaleão com pós lubrificantes, como o talco, o
licopódio, a lactose ou o alcaçuz. Estas substâncias impedem que as pílulas adiram umas às outras,
sendo ainda aconselhável juntar uma pequena quantidade de pó lubrificante, aquando do seu
acondicionamento definitivo.
843

7.2.1.4.1.3.2. Preparação industrial


Na produção em larga escala de pflulas contendo princípios medicamentosos muito activos é
extremamente importante o rigor com que se procede à divisão do magdaleão.
Pela Fig. 319 observamos que o magdaleão é um cilindro que será seccionado em uns tantos
pequenos cilindros, cuja altura é igual ao diâmetro dos sulcos do pilulador. Por outro lado, cada um
desses pequenos cilindros originará uma pílula esférica.

Fig. 319. Pilulador com magdaleão (esquema)

Considerando c o diâmetro do magdaleão e h a altura dos pequenos cilindros formados, o volume


de cada um desses cilindros será:
.> • : • : ! .• :•
. . „ (l)"* •
,^ :,;?

Este volume é, por seu turno, igual ao volume de cada pílula esférica, cujo valor é dado por:

4 4
3 - l 'l \
Logo virá:
7"-7'(? ) •L\\-L,(!L}'
•2 l 3 \2 l
Calculando a partir desta equação o valor de c, que corresponde ao diâmetro do magdaleão,
teremos:
/ = ''\' — = 0,8 /í
2
844

Quer isto dizer que se deverá preparar um magdaleão cujo diâmetro seja igual a 0,8 h, sendo h a
distância entre os bordos cortantes dos sulcos metálicos do pilulador.
Nas pequenas produções este conceito é, como se compreende, perfeitamente dispensável. Já
para a preparação de muitas pílulas torna-se mais prático calcular, matematicamente, o valor do
diâmetro do magdaleão do que proceder por tentativas, alongando ou encurtando o cilindro, de
acordo com as distâncias entre os bordos cortantes dos sulcos do pilulador. Por outro lado, o
conceito deixado expresso permite calcular, com rigor, para um pilulador determinado, cujo valor
de h seja conhecido, a quantidade de massa pilular a obter.
Efectivamente, na composição de umas pílulas teremos de considerar o volume ocupado pêlos
princípios medicamentosos, pêlos excipientes sólidos e pêlos excipientes líquidos utilizados. É
necessário que a mistura dos pesos respectivos permita obter magdaleões de diâmetro e de
comprimento tais que seja possível dividi-los em fracções correspondentes aos sulcos do pilulador
utilizado. Torna-se, assim, importante calcular a massa total a obter para uma preparação correcta.
Designemos por n o número de pílulas por que terá de se dividir o peso p de substância
medicamentosa. Seja k a quantidade de excipiente para obtermos uma massa pilular com p gramas
de substância activa. Admitamos que a citada mistura carece de / gramas de líquido para se
transformar em massa plástica e que são precisos /' gramas para se conseguir efeito análogo, com os
excipientes sozinhos, numa quantidade igual a k gramas. O comprimento L' do magdaleão de
diâmetro c, obtido com os excipientes e princípios medicamentosos, será dependente do somatório p
+ k + f. Por seu turno, um magdaleão exclusivamente constituído por k gramas de excipiente
humedecido com f gramas de líquido, apresentará um comprimento que designaremos por L", o qual
é dependente da soma das quantidades k e f.
O magdaleão (constituído por princípios activos e excipientes) a utilizar para dividir no
pilulador, deve apresentar um comprimento L igual ao produto do número de pílulas n pelo valor de
h. L = nh.
Nos casos gerais, L não é igual a L', sendo maior do que este. É, pois, necessário aumentar o
comprimento do magdaleão, com excipientes humedecidos, numa extensão L-L', para que seja
conecta a divisão da massa pilular. Toma-se, pois, necessário sfectuar duas operações prévias de
orientação, que descrevemos do seguinte modo:
1.° — Misturam-se os princípios medicamentosos de peso p com o excipiente de peso k.
Adiciona-se o líquido de humedecimento até consistência plástica e prepara-se um cilindro
de diâmetro igual a c, em que c = 0,8 h. Toma-se nota do peso (f) de líquido utilizado.
Determina-se o comprimento (L') do cilindro.
2.° — Mistura-se o mesmo peso (k) de excipiente com líquido de humedecimento, em tal
quantidade que origine uma massa plástica, e prepara-se um cilindro de diâmetro c, em que
c = 0,8 h. Toma-se nota do peso do líquido utilizado (f'). Determina-se o comprimento do
cilindro (L").
845

A Fig. 320 representa, em esquema, os dois cilindros preparados como se disse e mostra também
o cilindro com dimensões adequadas (L) para se dividir rigorosamente, num pilulador com 10 sulcos,
isto é, para 10 pílulas.

Fig. 320. O cilindro n." 1 foi obtido com princípios medicamentosos e excipien-
tes. O cilindro n.° 2 foi exclusivamente preparado com excipientes. O cilindro
n." 3 representa o magdaleão a preparar para se conseguir a exacta divisão da
massa pilular no pilulador esquematizado (10 sulcos: n = 10}

A quantidade de excipiente para o segundo ensaio (obtenção de um cilindro exclusivamente


constituído por excipientes e líquido de humedecimento) pode
k exprimir-se em gramas por
centímetro, sendo igual a: ——
Por seu turno, a quantidade de líquido consumida nesse meio, expressa em gramas
/' por centímetro, é dada por: ——
A quantidade de excipiente sólido para conseguir um cilindro de comprimento
k L-L' será: —— (L-L' > e a quantidade de líquido para plastificar os pós que origina-
L
rão a massa" desse cilindro de.comprimento L-L', será dada por:
f ,
—-— (L-L').
L"
Assim, o magdaleão total, de comprimento L, carece de uma quantidade de excipiente dada pela
soma da quantidade existente no cilindro (L') com a necessária para preparar um cilindro de
comprimento (L-L'). Nestas circunstâncias, a quantidade de excipiente sólido para n pílulas será:

k r (L-L') i
í- ^ —— (L-L') = t l + •
L" L L"
846

A quantidade de líquido de humedecimento para o magdaleão de comprimento L será dada por:


f. •: •.••••- w,,:.:,. T
f+-!—(L-L')

Obtêm-se, assim, com rigor, as quantidades de excipientes sólidos e líquidos que são necessárias
para preparar o peso de massa pilular facilmente divisível pelo número desejado.
Suponhamos que pretendíamos preparar 1000 pílulas de determinado princípio activo, titulando
cada pílula 0,1 g desse princípio. Como excipiente sólido utilizávamos o polietilenoglicol 4000 e,
como excipiente líquido, empregávamos uma mistura de água e glicerina, em partes iguais.
Por hipótese, dispúnhamos de um pilulador com 10 sulcos (n = 10), tendo cada
sulco o diâmetro de 0,58 cm (h = 0,58 cm). Nestas circunstâncias, precisaríamos de
preparar um magdaleão cujo comprimento fosse ,v;
L = n.h isto é,
L= 10x0,58 cm = 5,8 cm
Começaríamos por fazer uma mistura de 1,0 g de princípio activo com uma pequena quantidade
de polietilenoglicol 4000 humedecido com a mistura de água-glice-rina, de modo a que a massa
ficasse plástica. Suponhamos que gastávamos 0,8 g de excipiente sólido (k = 0,8 g) e 0,17 g de água-
glicerina (f =0,17 g). Com a massa preparávamos um cilindro de diâmetro c = 0,8 h = 0,8 x 0,58 cm
= 0,464 cm. Medido o seu comprimento, verificávamos ser este de 5 centímetros (Z/ = 5 cm).
Preparávamos, então, outro cilindro com idêntico diâmetro, mas exclusivamente constituído por
polietilenoglicol 4000 (0,8 g) e por água-glicerina. Suponhamos que a quantidade de solução agora
necessária era de 0,08 g (f = 0,08 g). Determinávamos o comprimento do cilindro tendo, por
hipótese, encontrado o valor de 2 centímetros (L' = 2 cm).
O peso total de polietilenoglicol 4000 a consumir para preparar um magdaleão de comprimento
L = 5,8 centímetros e cujo diâmetro fosse de c = 0,464 centímetros, seria:

= 1,12

(L-U) , r (5,8 cm —5 cm)


k l + ————— = 0,8 g l +
I" J L 2 cm
847

A quantidade de líquido consumido nestas circunstâncias seria de:

0,08
(L-L') = 0,17 g (5,8 cm —5 cm) =
I" + • g 2 0,202

Os pesos citados seriam os necessários para preparar 10 pílulas. Para 1000 pílulas
careceríamos de 112 g de polietilenoglicol 4000 e de 20,2 g de uma solução aquosa de glicerina
em partes iguais.
Este modo de proceder só é prático para preparar grande número de pílulas, como na produção
em escala industrial. O processo pode simplificar-se sempre que a quantidade de princípio activo é
muito pequena em relação à quantidade de excipiente, pois, nesse caso, os valores de f e /' são
praticamente iguais.
Na indústria, os pós são homogeneizados e malaxados com as substâncias pastosas ou líquidas,
em misturadores apropriados, do tipo dos que descrevemos para a preparação dos comprimidos. É,
todavia, preciso ter em atenção que as massas pilulares são mais duras do que as que servem para
preparar granulados, devendo-se usar máquinas muito resistentes (misturadores do tipo planetário
ou helicoidal).
A massa pilular é laminada por intermédio de rolos de aço ou de
pedra, até que apresente a espessura desejada, sendo, seguidamente, pas-
sada entre rolos canelados que preparam os magdaleões. Cada rolo
canelado permite, assim, obter diversos magdaleões que ficam paralelos
uns aos outros. Numa outra máquina procede-se à secção dos referidos
magdaleões, obtendo-se fragmentos cilíndricos que são posteriormente
rolados até que adquiram a forma esférica. Este arredondamento é
executado em discos agitados mecanicamente, existindo no comércio
vários tipos de piluladores automáticos (Fig. 321) que chegam a
proporcionar um rendimento horário de 20000 a 30000 pílulas.
As pílulas também podem ser
preparadas por compressão entre >•"<«*••-' -
punções de cavidade hemi-esférica. Flg. 321. Pilulador
Estas pílulas, que apenas se diferenciam
dos comprimidos pela sua forma, distinguem-se das obtidas pêlos
processos clássicos porque apresentam uma linha de soldadura
meridiânica.
848

Este método, que se tem empregado para preparar pílulas ricas em extractos vegetais e resinas,
apresenta algumas dificuldades, já que há tendência para a sua fragmentação, quando a pílula é
ejectada da matriz. WELTI mostra a vantagem de fabricar este tipo de pílulas apenas à custa da
compressão do punção superior sobre as massas contidas numa matriz hemi-esférica. Quer isto dizer
que a compressão se efectua, não entre os dois punções, mas entre o punção superior e a matriz. Esta
é perfurada e atravessada por uma pequena peça que se movimenta sincronicamente com o punção
superior, cuja função é apenas empurrar a pílula formada na matriz para o exterior da câmara de
compressão.
A Fig. 322 esquematiza os dois tipos de máquinas de compressão mencionados, mostrando como
é possível a fragmentação das pílulas nas máquinas clássicas.

Fig. 322. Maquinas de compressão para a obtenção de pílulas


A B
1— Distribuidor 1 — Distribuidor
2 — Punção inferior hemi-esférico 2 — Punção superior
3—Fragmentos da pílula 3—Peça que ejecta a pílula
4—Pílula

Outro processo de preparação industrial ou semi-industrial de pílulas é conhecido por método de


gotejamento. Os primeiros trabalhos executados neste domínio devem--se a ADLER, a SANDEU, e,
principalmente, a HANSEN que, em 1951, teve a ideia de preparar pílulas de fármacos lipossolúveis
dissolvidos num excipiente gordo que se
849

levava à fusão e se gotejava de modo a que se obtivesse esta forma farmacêutica. Posteriormente,
GIALDI e PONCI relataram também os resultados das suas experiências, conduzidas no mesmo sentido. Foi,
porém, em 1956 que uma publicação de BJORNSSON e MILLER veio tornar o primitivo processo extensivo às
pflulas de substâncias solúveis ou dispersíveis na água, justificando-se também a construção de
aparelhagem própria para a produção em escala industrial.
O princípio geral em que se baseia o método é o seguinte: a substância medicamentosa, dissolvida
na quantidade de excipiente necessária, é aquecida a uma temperatura compreendida entre 50 e 70°C; a
massa pilular assim obtida goteja num líquido mantido a baixa temperatura e no qual seja insolúvel. Se
a densidade do líquido onde se recebem as golas da massa pilular for inferior à desta, as gotas são
obrigadas a percorrer um certo caminho no seio do líquido, arredondando-se e solidificando. Se a
altura da coluna líquida atravessada e a sua densidade e temperatura forem judiciosamente escolhidas,
as gotas solidificadas serão perfeitamente esféricas e o seu peso não apresentará oscilações apreciáveis.
O rendimento do processo depende, entre outros factores, da abertura de escoamento das gotas, da
altura da massa pilular e da sua temperatura.
Segundo este processo, é possível preparar pflulas utilizando-se como excipiente o polietilenoglicol
4000 ou óleo de soja hidrogenado, respectivamente usados para fármacos hidrossolúveis ou lipossolúveis.
Assim, o luminal sódico tem-se empregado em pílulas cujo excipiente é constituído por polietilenoglicol
4000. Principia-se por dissolver aquele fármaco em glicerina e incorpora-se, seguidamente, a solução no
excipiente fundido. A massa obtida é mantida a 60°C, num recipiente próprio, fazendo--se gotejar por
uma abertura de 6 milímetros de diâmetro, situada na parte inferior daquele. As gotas são recebidas
em óleo de soja contido num cilindro de 28 cm de altura. Nas condições assinaladas, é possível
conseguir-se um rendimento de 30 gotas por minuto, e os desvios de peso observados não ultrapassam ±
2%.
Uma vez preparadas as pflulas, deve proceder-se ao seu desengorduramento, para o que se pode
utilizar o éter de petróleo.
Como atrás referimos, o método proposto por BJORNSSON e MILLER levou a que várias firmas
construtoras de aparelhos fabricassem piluladores para produção de pílulas por gotejamento. Entre eles
lembramos o sistema Piluterm, produzido pela casa dinamarquesa Schubert e Co., que permite uma
produção de vários milhares de pflulas por hora. Este aumento de rendimento é conseguido à custa da
incorporação de uma bomba aspirante-premente que retira, em cada movimento, uma certa quantidade
de massa pilular de um recipiente onde se encontra fundida e a comprime de encontro a uma abertura
cujo diâmetro condiciona o peso das pflulas. A Fig. 323 representa um aparelho Püuterm e um esquema
do modo como podem ser obtidas as pflulas segundo o primitivo processo de gotejamento.
É possível que a inovação introduzida por BJORNSSON e MILLER tenha trazido novo alento à forma
farmacêutica pflulas. Apesar disso, especialmente nos países latinos, as
850

pílulas foram sendo gradualmente substituídas pêlos comprimidos porque esta fornia farmacêutica se
pode preparar com maior rendimento de fabrico e porque é susceptível de menos alterações.
Julgamos que o espaço de tempo de 35 anos, decorrido desde 1956, data em que aqueles autores
publicaram o seu trabalho, até à presente época, é mais do que suficiente para definir uma posição
de destaque de uma forma farmacêutica. Ora, apesar das tentativa isoladas e dos êxitos conseguidos,
o prognóstico de sucesso para as pílulas não lhes é, de modo algum, favorável.

(2 ^
(
) 1 — 9

)
5^ • (
(3
1
)
0

Flg. 323. Aparelho utilizado na preparação de pílulas por gotejamento


Iaquecimento,
— Aspecto geral do Piluterm:
contendo uma (1) árvore
bomba de transmissão;(4)
aspirante-premenle; (2)coluna
motor;de (3)golejamento;
câmara de (5)
vaso
IIcargade recolha
— Esquema: dastermómetro;
(1) golas que solidificam
(2) sistema termostático de aquecimento;
de com a abertura
arrefecimento; {6} de 14 cm;
cilindro de {4) tubo de
recolha escoamento
com a attura com
òe 28acm;
altura
(7) de 1(3)
tubo
recipiente
cm;
de (5)
carga
de
sistema
com
torneira;
com (6) revestimento
a altura de 10 cm; (11)isolante;
diâmetro (9)interno
massadopllular fundida;
recipiente (10) nivel
de carga com da massa pilular
(12}
forma diâmetro
a gota eInterno
o niveldodo tubo de escoamento
liquido de (6 mm),
arrefecimento (2(13)
cm);distancia
(14) entre
sifão de ocerca
ponto
nível
deonde
36 cm;
se
constante;
(15} liquido de arrefecimento; (16) sistema de arrefecimento; (17) pílulas

7.2.1.4.1.4. Incompatibilidades e dificuldades na preparação das


pílulas
A preparação das pílulas pode apresentar algumas dificuldades, quer devidas a acções mútuas
entre os constituintes, quer por impossibilidade de se lhes dar à forma, o peso ou o volume
adequados. Em alguns casos torna-se mesmo necessário dividir a massa pilular num número de
pílulas superior ao estipulado na receita, recomendando-
851

-se que o doente deve ingerir uma quantidade tal dessas pílulas que permita a observância
posológica estabelecida pelo médico.
Outras vezes é possível, por meio de artifícios, diminuir o volume dos pós medicamentosos
destinados a administrar sob a forma de pílulas, de modo que aquelas apresentem um volume
compatível com a sua finalidade. É o que sucede, por exemplo, quando se preparam pílulas contendo
20 centigramas de sulfato de quinina que, sendo muito leve, apresenta elevado volume. Basta
adicionar algumas gotas de ácido láctico para que o pó se transforme em massa pilular de
consistência adequada, a qual permite a divisão em pílulas de volume normal.
As incompatibilidades apresentadas pêlos constituintes das pílulas são, em muitos casos,
incompatibilidades dos pós. Há, porém, exemplos de reactividade mais geral, pois que na
preparação das pílulas intervêm outros produtos, como extractos, tinturas, excipientes, etc.
Assim, quando se empregam extractos vegetais, é de ter em atenção que é vulgar aqueles
apresentarem reacção ácida. Umas pílulas contendo bicarbonatos ou nitritos originariam, nestas
condições, produção de anidrido carbónico ou de bióxido de azoto. A incompatibilidade citada é
perfeitamente resolúvel se se proceder à prévia neutralização do extracto ácido, com compostos
alcalinos, como o óxido de magnésio. Como exemplo, citamos a associação do pó de ruibarbo com
bicarbonato de sódio, na proporção de 15:20.
Na Bélgica, é relativamente vulgar a associação de vitamina BI (cloridrato de tiamina) com
fosforeto de zinco. Umas pílulas preparadas com estes fármacos podem levar à produção de
hidrogénio fosforado. A incompatibilidade soluciona-se misturando, separadamente, os fármacos com
excipientes neutros (gomas, xarope comum, polietile-noglicóis) e só depois se procedendo à
associação das misturas parciais.
Os extractos higroscópicos são facilmente alteráveis, sendo por isso aconselhável empregar
excipientes pilulares dotados de elevado poder absorvente (alcaçuz, alteia, etc.).
Os extractos vegetais podem também ser decompostos pela acção de substâncias alcalinas,
libertando amoníaco ou aminas diversas. Assim, seria prejudicial empregar o óxido de magnésio,
como excipiente pilular, em pílulas contendo extracto de pirliteiro. O mesmo se diz em relação
àquele excipiente, quando associado à colina (hidrato de trimetiletanolamónio), aos cloretos,
iodetos ou brometos de amónio, etc.
Certos princípios medicamentosos, como as resinas e alguns derivados fenólicos, endurecem
apreciavelmente por acção da alcalinidade. As pílulas que contenham estes compostos não
comportarão excipientes alcalinos.
As reacções entre os princípios medicamentosos e os excipientes operam-se, frequentemente, por
redução catalisada pela luz. O nitrato de prata e o permanganato de potássio não devem, por isso,
ser associados a excipientes dotados de poder redutor: Empregam-se associados a substâncias
inorgânicas inertes, como o caulino, o talco ou a terra de infusórios. O salicilato de sódio é
facilmente oxidável, sendo essa oxidação
852

catalisada em presença de alguns excipientes orgânicos e, por isso, também, neste caso, se aconselha
o caulino, como excipiente.
Algumas vezes a oxidação pode ser evitada incluindo compostos redutores na massa pilular.
Entre estes, é muito utilizada a lactose, que se emprega, por exemplo, nas pílulas de iodeto ferroso.
As oxidações e as alterações pela humidade podem evitar-se desde que as pílulas sejam
revestidas por envolvimentos adequados. Em certos casos, esses revestimentos são apenas
constituídos por pós inertes sobre os quais se rolam as pílulas depois de preparadas, como acontece
com pílulas contendo sais ferrosos, cuja protecção parcial se consegue com ferro em pó. Este
rolamento é, por vezes, usado com o fim de mascarar o cheiro ou o sabor dos medicamentos. Assim,
as pílulas contendo iodofórmio, extracto de valeriana, guaiacol, ele., devem ser roladas em pó de
café, cujo aroma atenua o desagradável cheiro dos princípios medicamentosos.
Além destes revestimentos podem utilizar-se outros envolvimentos protectores ou gastro-
resístentes e enterossolúveis. Trata-se da aplicação de camadas de vernizes, de soluções ou
dispersões várias, que aderem às pílulas, as quais se podem executar nas condições que descrevemos
para a obtenção de drageias. Como veremos, no subcapítulo seguinte, as pílulas revestidas por esses
processos podem ficar destituídas de cheiro e de sabor, tornarem-se menos sujeitas à oxidação ou à
destruição dos seus princípios medicamentosos pela acção da humidade ou serem unicamente
desagregáveis no suco entérico.

7.2.1.4.1.5. Revestimentos de pílulas ••.,-,• w.t.

Os revestimentos pilulares podem aplicar-se com várias finalidades principais:

— protecção dos constituintes das pílulas da acção dos agentes atmosféricos (luz, humidade,
anidrido carbónico, oxigénio);
— eliminação ou atenuação do cheiro ou sabor desagradáveis conferidos pêlos princípios
medicamentosos;
— dar melhor aspecto à fórmula;
— evitar que as pílulas se desagreguem no suco gástrico, quer para proteger o seu
conteúdo medicamentoso da acção do ácido clorídrico e da pepsina, quer para
atenuar fenómenos irritativos locais produzidos pêlos princípios activos sobre as
mucosas gástrica e esofágica, quer, ainda, para permitir uma acção tópica ou
uma absorção ao nível do intestino. ,.. ,.
São muito diversos os revestimentos que se têm utilizado para envolver pílulas. Entretanto, tal
como para os comprimidos, podemos dividi-los em dois grandes grupos:
853

revestimentos normais ou gastrossolúveis e revestimentos gastro-resistentes mas enteros-solúveis.


A aplicação dos envolvimentos pilulares pode fazer-se na pequena oficina por técnicas muito
simples ou ser executada no domínio industrial, para o que se requere aparelhagem adequada e se é
obrigado a trabalhar com elevado número de pílulas.
Na presente rubrica iremos considerar os revestimentos que julgamos mais usados,
descrevendo a operação de envolvimento quando efectuada em pequena escala. Apenas
faremos uma ou outra referência quanto aos processos industriais usados no revesti
mento, porquanto a técnica a seguir é a que mencionámos a propósito da obtenção das
drageias. ,,..,-,

7.2.1.4.1.5.1. Revestimentos gastrossolúveis


Este tipo de envolvimento pilular pode executar-se com pós inertes e por dragei-ficação,
efectuada nos moldes clássicos ou realizada por processos especiais.
a) Revestimento com pós inertes — Trata-se do revestimento mais simples, a que já aludimos na
preparação das pílulas. Consiste em fazê-las rolar, logo após a sua preparação, sobre um pó inerte,
que pode ser o licopódio, o talco, o amido, a grafite, o alcaçuz, a alteia, o café ou a canela. Estes pós
aderem às pílulas e evitam a tendência para adesão que aquelas mostrem entre si. Em alguns casos
protegem as pílulas, pela sua acção hidrófoba ou pelo seu poder absorvente; noutros atenuam, pelo
seu aroma, o cheiro desagradável apresentado pêlos princípios medicamentosos.
O licopódio (esporos de Lycopodium davatum) é, sem dúvida, dos melhores pós isolantes tendo
apenas o inconveniente de ser caro e de apresentar um efeito dessecante muito pronunciado.
O talco é igualmente um bom lubrificante, que se emprega em pílulas brancas, mas cujo excesso
deve ser evitado (acção irritante sobre as mucosas do tracto digestivo). Deve satisfazer às condições
de pureza que indicámos no artigo Comprimidos.
O pó de alcaçuz também é muito usado, apresentando menor poder dessecante do que o
licopódio.
O pó de raiz de alteia é especialmente empregado pelo seu poder absorvente.
Os amidos não são utilizados muitas vezes porquanto formam aglomerados em presença da
humidade.
A grafite, que é uma forma alotrópica do carbono (sistema hexagonal), tem sido recomendada
para envolvimento de pílulas ferruginosas. O mesmo emprego se tem dado ao ferro porfirizado, a que
já nos referimos como material de envolvimento de pílulas contendo sais ferrosos.
O pó de café pode empregar-se para atenuar o cheiro de pílulas contendo
princípios de odor repugnante (creosoto, iodofórmio, extracto de valeriana, valeria-
natos, etc.). •••••• — ' --v-.-
854

b) Revestimentos obtidos por drageificação clássica — Trata-se de envolvimentos açucarados,


executados nos moldes descritos para a drageificação de comprimidos. A estas pílulas dá a F. P. IV a
designação de confeitos. Observemos, porém, que as pílulas, desde que sejam suficientemente duras,
dada a sua forma esférica, são mais facilmente drageificáveis do que os comprimidos.
A operação é do domínio industrial e o objectivo é realizado em três fases distintas, como para os
comprimidos. Na primeira fase executa-se a aplicação da camada isolante (eventual), da camada
elástica e da camada alisante; na segunda fase são aplicadas camadas de xaropes, corados ou não;
na terceira realiza-se o polimento das pílulas revestidas.
Por vezes, o revestimento é executado com xaropes contendo chocolate. Entre as fórmulas de
mais corrente uso, citamos a seguinte:
Cacau em pó ................................................ 100 g
Açúcar............................................................ 1200 »
Água destilada .............................................. 660 »
A solução, que se prepara a quente, é empregada em conjunto com a seguinte suspensão:
Amido ............................................................ 75 g
Talco .............................................................. 25 »
Água destilada .............................................. 100 »
c) Revestimentos especiais — São vários os envolvimentos não açucarados que se podem aplicar
nas pílulas. Entre eles lembramos os seguintes:
Os revestimentos para dourar ou pratear pílulas podem ser aplicados depois da drageificação
daquelas com açúcar, em turbina própria, empregando-se o ouro ou a prata, em pó, sobre as pílulas
humedecidas com soluções acéticas de gelatina.
Na pequena oficina de farmácia pode proceder-se ao humedecimento das pílulas com mucilagem
de goma ou com xarope comum (l a 2 gotas por 20 a 30 pílulas) e, em aparelho adequado, ajuntarem-
se-lhes folhas de ouro ou de prata, conforme o revestimento pretendido. O aparelho mais
correntemente utilizado consiste numa caixa metálica ou de madeira, formada por dois hemisférios,
polidos interiormente, que se adaptam, dentro da qual se colocam as pílulas humedecidas e os metais
de revestimento. Em regra, a caixa apresenta uma haste metálica ou de madeira que funciona como
ur.ia espécie de cabo por onde se segura, o qual permite agitá-la até completo recobrimento das
pílulas. A quantidade de prata ou de ouro necessária para o recobri-mento é de cerca de l miligrama
por pílula. As pílulas são, em seguida, polidas por agitação num recipiente envernizado
interiormente.
855

Este modo de proceder origina pílulas cujo envolvimento é menos regular do que o que se obtém
pelo processo industrial.
Não podem ser prateadas as pílulas que contenham enxofre, sulfuretos, halogenetos alcalinos ou
mercúrio e seus sais, o mesmo se aplicando aos revestimentos com ouro sobretudo quando se trate de
pílulas em cuja constituição exista mercúrio ou sais mercuriais.
Os revestimentos contendo bálsamo de Tolú são aplicados algumas vezes, especialmente quando se
pretende evitar a acção da humidade ou do oxigénio do ar sobre os princípios activos das pílulas. À
operação de revestimento com bálsamo de Tolú que se deve a BLANCARD, dá-se o nome de toluização.
As pílulas são mergulhadas numa solução de bálsamo de Tolú, de preferência velho e quebradiço, em
éter ou numa mistura etéreo-alcoólica, contida numa cápsula de fundo plano, à qual se imprime um
movimento de rotação, até que todo o dissolvente se tenha evaporado. A operação repete-se uma a
duas vezes e, após a secagem das pílulas ao ar livre (l hora), procede--se ao seu aquecimento, na
estufa, a 35°C.
A fim de tomar este envolvimento mais impermeável aos agentes atmosféricos, podem adicionar-
se corpos resinosos, como a sandaraca ou a mastica.
Eis algumas das fórmulas usadas: ,-...-. .. ,-,.. .„„.. -.• • .-„., ,,
•'f^-fi. • <*;*
I Bálsamo de Tolú .......................................... 5 g
Éter ................................................................ 20 » :.

H Bálsamo de Tolú .......................................... l g


Sandaraca ...................................................... 2,5 »
Éter ................................................................ 25 »
(• ' '
Hl Bálsamo de Tolú .......................................... 5 g
Mastica .......................................................... 5 »
Éter ................................................................ 30 »
A resina de sandaraca tem sido também proposta em associação com a terebintina de Veneza.
JOUVE preconizou a seguinte fórmula:

Sandaraca ...................................................... 500 g ,


Terebintina de Veneza.................................. 10 »
Álcool de 90° .................................... q.b.p. 1000 » , . ;. 3
A resina de copal, que apresenta elevado índice de acidez, tem-se também utilizado em solução
alcoólica a 1:4, em revestimentos pilulares.
Todos estes revestimentos podem tornar-se gastro-resistentes, dependendo isso da espessura da
camada aplicada. Na realidade, BURKEY e BREW estudaram o comporta-
856

mento de pílulas toluizadas, tendo verificado que podiam não chegar a desagregar-se no suco
entérico se a camada de revestimento fosse demasiado espessa. Por seu turno, COUVREUR chamou a
atenção para o facto das pílulas contendo sandaraca poderem resistir à acção do suco gástrico por
períodos de tempo de 45 a 75 minutos.
A manteiga de cacau é normalmente aplicada em mistura com chocolate (1:2). As pílulas, sem
revestimento com pós inertes ou apenas roladas sobre amido, são imersas na citada mistura
aquecida à fusão.
A parafina sólida, fundida a cerca de 80°C, pode igualmente empregar-se para o revestimento
de pílulas. Em regra é suficiente uma quantidade de parafina de 2 a 3 g para recobrir 1000 pílulas.
Os revestimentos com gelatina, aplicada em solução aquosa, que pode conter açúcar e goma
arábica, foram preconizados por GAROT, sendo hoje raras vezes utilizados, devido à morosidade da
operação. As pílulas, espetadas em alfinetes compridos, são imersas, por uma só vez, na solução
aquecida a 40-50°C, imprimindo-se-lhes um movimento giratório, durante a operação. Depois de
retiradas da solução, a gelatina que as reveste solidifica (2 a 3 minutos), obtendo-se um invólucro
contínuo em toda a superfície pilular.
Entre as fórmulas propostas recomendamos as seguintes, que nos parecem mais aconselháveis:

I Gelatina.......................................................... 30 g
Água destilada .............................................. 10 »
if
H Gelatina.......................................................... 12 »
Açúcar............................................................ 6»
Goma arábica ................................................ 8»
Água destilada .............................................. 15 »
Para preparar a solução (II) procede-se do seguinte modo: corta-se a gelatina em pequenos
fragmentos, adiciona-se a goma e a água e macera-se durante algum tempo; ajunta-se o açúcar e
dissolve-se a quente.

7.2.1.4.1.5.2. Revestimentos gastro-resistentes


Como corolário do que anteriormente foi dito, os revestimentos gastro-resistentes podem
executar-se com diversos fins:
— evitar a intolerância gástrica para certos agentes medicamentosos e proteger a mucosa
estomacal (sais mercuriais, arsenicais, creosoto);
— preservar certos princípios de serem inactivados pelo suco gástrico;
857

— permitir a associação de dois compostos, em que um tenha de actuar no estômago e outro no


intestino, para se conseguir uma acção sinérgica (pepsina associada à pancreatina);
— proporcionar uma acção farmacológica prolongada ou sustentada, desde que, numa mesma
pílula, parte do agente medicamentoso seja libertada no estômago e a restante quantidade só
seja cedida no intestino.
Entre as substâncias utilizadas para conseguir revestimentos pilulares gastro-resis-tentes e
enterossolúveis, citamos o salol, o glúten, a queratina, a goma laca, a álcool cetílico, o estearato de
butilo e o acetoftalato de celulose.
Saio! — o salol ou salicilato de fenilo é um composto de ponto de fusão 41-43°C, que é insolúvel
em meio ácido e se dissolve a pH superior a 7. Trata-se de um éster que, pela acção das esterases
intestinais, se hidrolisa com libertação de ácido salicílico e de fenol. A sua introdução como
revestimento pilular deve-se a CEPPI, em 1891.
A salol tem sido empregado, quer fundido, quer em solução alcoólica ou etérea. O método
habitual de revestimento consiste na imersão das pílulas, espetadas em alfinetes compridos, no salol
fundido (método de SUCHOMEL e OEDER) ou nas suas soluções alcoólicas ou etéreas. Mais raras vezes
o salol aplica-se segundo a técnica de drageificação que descrevemos para os comprimidos. Com o
fim de tomar os envolvimentos mais resistentes à acção do suco gástrico, visto que o salicilato de
fenilo se torna quebradiço ocasionando o fendilhamento das películas, tem-se associado aquele à
goma laca, ao tanino, ao acetilotanino, ao benzonaftol, ao bálsamo de Tolú, etc.
Eis algumas das fórmulas mais usadas:

(fórmula de YVON)
Salol .............................................................. 2 g
Tanino ............................................................ 0,5 »
Éter ................................................................ 10 »
n
(fórmula de DANZEL)
Salol .............................................................. 1,5 g
Benzonaftol.................................................... 0,6 »
Acetilotanino.................................................. 0,9 »
Álcool de 90° .............................................. 23 »
Éter ................................................................ 7,2 »»
858

(fórmula do B.P.C.) , .. ,.,,'-. i-


•'''•'' Salol .............................................................. 20 g "''"'
Goma laca .................................................... 30 »
Éter ................................................................ 100 »
Álcool ............................................................ 100 »
:
iv '' ' ' '• '" ;'i;

(fórmula de COUVREUR)
Salol .............................................................. 20 g
Goma laca, clara .......................................... 30 » - •' '«'
Éter ................................................................ 30 ml
Álcool .................................................. q.b.p. 150 »

y-, -, : . -. • - •
Salor .............................................................. 22,5 g
Ácido esteárico.............................................. 2,5 »
Solução alcoólica de goma laca a 10% .... 10 ml
Glúten — O glúten tem sido utilizado, embora o seu emprego dê resultados inconstantes, podendo
as pílulas resistirem ou não ao suco gástrico, consoante a espessura da camada de revestimento.
GLOBUS aconselha o uso de uma solução de 3 g de glúten em 15 ml de álcool de 60", devendo
aplicar-se três camadas de revestimento. O método seguido é o da imersão das pílulas na solução de
glúten contida numa cápsula larga de fundo chato. As pílulas são agitadas na solução e o glúten é
precipitado por adição de umas gotas de formol diluído. O formol reage com o glúten pêlos grupos -
NH2 que esta proteína apresenta (-NH2 + HCHO2 — » -N = C7/2), aumentando-se a sua resistência ao
ataque pelo suco gástrico. A operação termina com a aplicação de uma quarta camada de glúten,
desta vez sem adição de formol.
Goma laca — As exigências de qualidade deste produto e o seu empego foram esclarecidos a
propósito da obtenção de drageias gastro-resistentes.
Queratina — Trata-se de um produto de natureza proteica (escleroproteína) obtido por tratamento de
tecidos córneos animais. A queratina, que se não dissolve na água, é, porém, solúvel em ácido acético e
em amónia.
É necessário aplicar muitas camadas de queratina para que as pílulas resistam à acção do suco
gástrico por período de tempo apreciável. Segundo BRENNER, um envol-
859

vimento com queratina amoniacal com a espessura de 190 \i, só protege as pílulas da acção do suco
gástrico por um período de cerca de 25 minutos. Têm sido, por isso, propostas técnicas tendentes a
aumentarem a resistência das pílulas à acção da pepsina clorídrica. Entre elas, descrevemos a
seguinte: rolam-se as pílulas em manteiga de cacau fundida ou numa mistura de manteiga de cacau
com cera; quando o revestimento gordo está quase seco, retiram-se as pílulas e rolam-se sobre uma
pequena quantidade de grafite, procurando-se que adquiram brilho, mediante agitação. Depois de
um repouso de 15 minutos, a cerca de 0°C, aplicam-se umas 10 camadas de queratina amoniacal.
Entre as soluções de queratina mencionamos as seguintes:
i , ; -•
(queratina acética)
Queratina........................................................ 7g
Ácido acético ................................................ 100 »

(queratina amoniacal) - (

Queratina........................................................ 7g
Amónia a 10%.............................................. 50»
Álcool ............................................................ 50 »
Tanto a fórmula (I) como a fórmula (II) são preparadas por digestão da queratina a 30-40"C,
durante 24 horas, nos veículos respectivos. Ao fim desse tempo filtram-se por algodão de vidro.
Estearato de butilo — Este revestimento foi considerado a propósito do estudo das drageias,
podendo ser aplicado às pílulas pela técnica de imersão.
Acetoftalato de celulose — Pode dizer-se que o acetoftalato de celulose conserva um lugar de
destaque entre as substâncias utilizadas na preparação de revestimentos gastro-resistentes. A sua
aplicação já foi descrita no subcapítulo Drageias, podendo efectuar-se na pequena oficina pelo
método de imersão.

7.2.1.4.1.6. Ensaio das pílulas ' '


As verificações do peso e da velocidade de desagregação das pílulas são ensaios a que sempre se
deve proceder. Quando se trabalha em escala industrial torna-se imprescindível a análise qualitativa
e quantitativa dos princípios activos existentes nas
860

pílulas. Esta análise é, por vezes, bastante difícil, dada a circunstância de muitas pílulas conterem
preparações extractivas, como extractos ou tinturas, o que obriga a que se recorra, frequentemente,
à cromatografia em papel ou em camada delgada.
Peso — Se bem que alguns autores aceitem para as pílulas desvios médios da ordem de ± 15% e
desvios individuais até ± 30%, julgamos que estes limites representam uma tolerância excessiva. De
facto, nas preparações bem controladas não se observam desvios máximos superiores a 5%. Nestas
circunstâncias, somos do parecer de que são suficientes limites de tolerância, para o peso médio, de
± 7,5% e de ± 3,5%, respectivamente para as pílulas de peso compreendido entre 0,1 g e 0,15 g e
entre 0,15 g e 0,3 g.
O método de verificação é idêntico ao que indicámos para os comprimidos, devendo pesar-se 20
pílulas, em conjunto e individualmente, e determinar-se o seu peso médio e os afastamentos
individuais. Nas condições referidas, só duas pílulas em 20 poderão apresentar desvios individuais
superiores ao dobro dos desvios médios permitidos.
Uma vez que a F. P. não especifica limites de tolerância para o peso das pílulas, julgamos
possível adoptarem-se as variações que mencionámos, visto serem consentâneas com a preparação e
terem sido sugeridas por vários autores, como CASADEO e FRANQUEZA GRANER.
Velocidade de desagregação — A apreciação da velocidade de desagregação das pílulas pode
efectuar-se nas condições que descrevemos para os comprimidos. Entretanto, sendo em regra mais
lenta a sua desagregação do que a de comprimidos ou drageias contendo os mesmos princípios
medicamentosos, é aconselhável estabelecer os seguintes limites:
Pílulas sem revestimentos gastro-resistentes — Devem desagregar-se em menos de duas horas;
Pílulas com revestimentos gastro-resistentes — Em suco gástrico artificial não devem
desagregar-se em menos de duas horas.

7.2.1.4.1.7. Acondicionamento
O acondicionamento das pílulas pode ser executado de modo idêntico ao dos comprimidos. É
importante atender a que a conservação das pílulas é mais precária do que a dos comprimidos, o que
se deve, principalmente, ao mais elevado teor em água. Por outro lado, as pílulas podem endurecer
ao fim de certo tempo de armazenagem, o que está relacionado com o grau de humidade e com a
temperatura ambientes, mas também depende dos próprios excipientes empregados na sua
fabricação.
861

7.2.1.4.2. Grânulos , ,, . .

Grânulos são formas farmacêuticas semelhantes às pílulas, de peso inferior ou igual a 0,05 g, em cuja
composição entram fármacos muito activos que se administram em dose de mg ou fracção de mg.
A sua preparação decorre em moldes idênticos aos que mencionámos para as pílulas, empregando-
se, em geral, como excipiente, uma mistura de lactose com goma arábica, adicionada de água, de xarope
comum ou de melito simples.
A substância medicamentosa é misturada em almofariz de porcelana com a lactose e depois com goma
arábica, humedecendo-se a mistura com água destilada, com xarope comum ou com melito. Prepara-se
um magdaleão como foi indicado para as pílulas e divide-se este em pilulador adequado.
Se o princípio medicamentoso é solúvel na água, no álcool ou no éter, pode utilizar-se a sua
solução naqueles líquidos incorporando-se, então, a lactose. Deixa-se evaporar o dissolvente e, por fim,
adiciona-se a goma arábica. A mistura de pós assim preparada é tornada adesiva por intermédio de
xarope comum, o que permite obter uma massa de consistência própria para preparar o magdaleão.
A F. P. IV inscrevia dois tipos de grânulos — grânulos de anidrido arsenioso e grânulos de
estrofantina. Os primeiros são preparados de tal forma que contenham l mg de anidrido arsenioso,
enquanto que os segundo devem titular apenas 0,1 mg de estrofantina por grânulo. Esta diferença de
quantidades de princípio activo obriga a adoptar técnicas de preparação ligeiramente diferentes. Assim,
e recordando o que se disse a propósito dos Pós, deve preparar-se uma diluição prévia de estrofantina
com lactose, pois é incómodo e quiçá pouco rigoroso pesar tão pequena quantidade de estrofantina
(0,005 g para 50 grânulos, por exemplo). É preferível utilizar uma estrofantina diluída ao centésimo com
lactose.
A homogeneidade da mistura garante-se com a adição de uma pequena quantidade de carmim. Este
não é o modo de proceder da F. P. IV para os grânulos de estrofantina, pois que a fórmula que indica
refere-se à preparação de 100 grânulos e, portanto, a quantidade total de estrofantina a pesar é de 0,01
g. Mesmo assim, a referida farmacopeia manda misturar a estrofantina (0,01 g) com a décima parte
da lactose e o carmim e, depois, com o açúcar restante (3,6 g) e a goma arábica (l g). A fórmula para
100 deste grânulos é a seguinte:

Estrofantina.............................................. 0,01 g
Lactose .................................................... 4 »
Goma arábica, em pó ............................ l »
Carmim, em pó fino.............................. 0,002 »
Água destilada ........................................ q.b. ,,,,
862

«Triture demoradamente em gral de porcelana a estrofatitina com a décima parte do açúcar,


ajunte o carmim e, a pouco e pouco, o açúcar restante; adicione a goma e tanta água quanta baste
para formar massa de consistência pilular que dividirá em 100 grânulos.
Se utilizarmos um pó diluído ao centésimo, teremos, como é evidente:

Pó ao centésimo .......................................... lg
Lactose .......................................................... 3»
Goma arábica em pó .................................. l»
Água destilada .............................................. q.b.

Resultariam assim 100 grânulos titulando cada um 0,001 g de estrofantina.


Este modo de proceder pode e deve adoptar-se para quaisquer outros grânulos cuja quantidade
de princípio activo seja inferior a l mg por grânulo, como é o caso da utilização da aconitina, da
digitalina, etc. Se a quantidade de princípio medicamentoso estiver compreendida entre l mg e 0,1 mg
pode também usar-se um pó diluído ao centésimo, de que se tomará uma quantidade superior a l g,
completando-se, com lactose, o peso de 4 g:

Pó ao centésimo .............. quantidade necessária ,


Lactose .............................. q.b. para completar 4 g
Goma arábica .................... lg
Água destilada .................. q.b.

A preparação dos grânulos titulados ao mg, como os de anidrido arsenioso, não obriga ao uso de
pós diluídos nem necessita do emprego do carmim.
A fórmula da F. P. IV para os grânulos titulados a l mg de princípio activo, é a seguinte:
Anidrido arsenioso, porfirizado .................. 0,10 g
Lactose em pó.............................................. 4 »
Goma arábica em pó .................................. l »
Água destilada .............................................. q.b.

«Triture demoradamente em gral de porcelana o anidrido com o açúcar, ajuntando este a pouco
e pouco; misture a goma e adicione tanta água quanta baste para formar massa de consistência
pilular que dividirá em 100 grânulos».
863

Os grânulos são formas farmacêuticas dotadas de boa conservação, devendo, para isso, serem
acondicionadas em frascos rolhados e mantidos ao abrigo da luz.

7.2.1.4.3. Bolos ' i!; --•


Os bolos são formas farmacêuticas semelhantes às pílulas, em regra de peso superior a l g e inferior ou
igual a 50 g, que se destinam ao uso veterinário.
A massa pilular é obtida de modo idêntico ao que indicámos para as pílulas, fazendo-se, porém, cada bolo
de per se e por isso não se recorrendo a piluladores. A massa é trabalhada manualmente, dando-se-lhe a forma
arredondada.
A consistência apresentada pêlos bolos é geralmente mais mole do que a das pílulas, de modo a que a sua
ingestão seja facilitada.
A F. P. IV já não inscrevia nenhum bolo. A título de exemplo apresentamos a fórmula dos bolos purgativos
da Farmacopeia Espanhola IX ed. e da Farmacopeia Belga IV:

(F. Esp. IX ed., pág. 1151) ^

Óleo de cróton.............................................. 10 gotas


Aloés em pó ................................................ 10 g
Sabão potãssico .................................. q.b.p, l bolo

Ajunta-se o aloés ao óleo; mistura-se perfeitamente e, a pouco e pouco, adiciona--se o sabão até
consistência plástica.

(F. Bei. IV, pág. 134)

Aloés em pó ................................................ 15 g
Carbonato de magnésio................................ 5 »
Sabão branco ................................................ 5 »

Faça um bolo de 25 g

Como no exemplo anterior, o sabão serve de excipiente e facilita a desagregação do bolo no


estômago.
864

BIBLIOGRAFIA
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COUVREUR, A. — Lês enrobages modemes dês dragées et dês pilules— Vigot Fréres, Paris, 1954.
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JENKINS, G. FRANCKE, O., BRECHT, E. e SPERANDIO, G. — The art of coitipoimding — Mc Graws — Hill
Book Co., New York, 1957.
MÜNZEL, K., BÜCHI, J. e SCHULTZ, O. — Galenisches praktikum — Verlags. Stuttgart, 1959.
SELLÉS MARTÍ — Farmácia galenica general — Madrid, 1963. WELTI, H. — Pharm. Acta Helv.
39, 139, 1964.
865

7.2.1.5. Biscoitos •- .....^ • • ^., w».* ••••..•,•:•,.-.'• ..^i


Os biscoitos são preparações farmacêuticas que têm por base o açúcar e farinhas, aos quais se
adicionam substâncias medicamentosas. O seu aspecto é idêntico ao dos biscoitos ordinários e o seu uso
destina-se, principalmente, a tornar a medicação mais agradável.
As substâncias medicamentosas podem adicionar-se à própria massa da farinha com o açúcar, a qual é
posteriormente cozida. Este processo só é susceptível de se pôr em prática com princípios que se não
destruam por aquecimento a 140-150°C. Outro método de preparação consiste em adicionar aos
biscoitos ordinários a substância medicamentosa dissolvida num líquido volátil, como o éter, que depois
se deixa evaporar livremente.
Esta forma farmacêutica teve uma época de franca difusão, especialmente em medicina infantil
(biscoitos vermífugos e purgativos), depois do que caiu no esquecimento. Ulteriormente, voltou a ser
aceite na América do Norte, em especial para a administração de fármacos anti-ácidos que se destinem
à correcção da acidez gástrica, como nos casos de úlcera péptica. Neste particular, a sua utilização
justifica-se, pois que, além da acção neutralizante do ácido clorídrico, pode apontar-se a necessidade da
frequente ingestão de alimentos que é uma das características dos referidos estados ulcerosos. Este
último tipo de biscoitos contém hidróxido de alumínio, combinações de hidróxido de alumínio com
hidróxido de magnésio, diaminoacetato de diidroxialumínio, etc. Os fármacos são suspensos em soluções
dotadas de certo poder aglutinante e adesivo (metilcelulose, gelatina) que se lançam, em volume
rigorosamente medido, sobre um biscoito ordinário. Na sua superfície molhada, contendo o fármaco em
solução ou suspensão no aglutinante, aplica-se outro biscoito, constituindo-se, deste modo, uma
verdadeira «sanduíche».
Os biscoitos alteram-se facilmente em presença da humidade, pelo que se recomenda que sejam
guardados em recipiente fechado conservado em lugar fresco e seco. Na indústria é hábito envolvê-los em
cintas de celofane ou em papel metalizado.

7.2.1.6. Chocolates
Os chocolates são preparações farmacêuticas obtidas pela mistura de chocolate com uma ou várias
substâncias medicamentosas. Destinam-se a serem ingeridos, podendo ou não serem mastigados.
Inicialmente, prepararam-se a partir da mistura do cacau com o açúcar, à qual se adicionava o
fármaco ou fármacos desejados. Depois da trituração em almofariz ajuntava-se glicerina ou xarope
comum, até consistência própria. Posteriormente, têm sido obtidos misturando intimamente o chocolate
alimentar com os fármacos, em almofariz
866

aquecido. A pasta assim obtida é moldada como se descreve para a obtenção das Pastilhas. Podem
também preparar-se por compressão em máquina adequada, ou fundindo a pasta e vertendo-a em
moldes lubrificados. O seu peso e forma são variáveis, sendo vulgares os chocolates de 2 g, com
forma discóide. Dada a semelhança na preparação, é corrente considerarem-se os chocolates como
um tipo especial de pastilhas. Entretanto, preferimos estudá-los separadamente, pois que as pastilhas
se destinam a dissolverem-se ou desagregarem-se com lentidão na boca, o que está longe de cons-
tituir uma das características dos chocolates.
A maioria dos chocolates medicamentosos contém fármacos purgativos, como a escamónea e a
fenolftaleína, ou vermífugos, como a santonina.

7.2.1.7. Pastilhas • : - «sã


:
7.2.1.7.1. Generalidades '' " " ••••"••••> ••'•^•">" '>
Pastilhas são preparações farmacêuticas de consistência sólida, destinadas a dissolverem-se
lentamente na boca, que são preparadas por moldagem de uma massa plástica constituída, na
maioria das vezes, por mucilagens e/ou açúcar associados a princípios medicamentosos.
A definição que acabámos de dar permite englobar sob esta rubrica vários tipos de medicamentos
cuja preparação tem de comum a moldagem de uma massa suficientemente elástica e adesiva. As
pastilhas distinguem-se, portanto, das pílulas pela forma de administração e dos comprimidos pelo
método de fabrico.
O termo pastilha provém da palavra latina pastillus, que significa pequeno bolo, e era também
dada às preparações farmacêuticas, em regra discóides, que se obtinham por recorte de uma massa
elástica conseguida pela mistura de vinho ou de vinagre com pós medicamentosos.
Entre nós tem-se defendido o conceito de reservar a palavra pastilha para as formas
farmacêuticas exclusivamente compostas por açúcar e por uma ou mais substâncias medicamentosas
ou aromáticas. Este modo de ver filia-se, certamente, na influência da literatura francesa, em que o
termo pastilles designa as referidas formas e a palavra tabletíes se refere aos preparados
semelhantes que, além do açúcar, contêm mucilagens de goma arábica ou de goma adraganta. O
termo tablette foi traduzido por SACADURA BOTTE para tabela, cujo uso se generalizou em algumas
regiões do nosso país.
Por seu turno, a Farmacopeia Portuguesa IV considerava como sinónimas as expressões pastilha
e tablettae, pretendendo assim designar os preparados cujo exci-piente é constituído por mucilagens
e açúcar.
Dadas as circunstâncias referidas, somos de parecer de que não há qualquer vantagem em
considerar, como formas farmacêuticas diferentes, preparações que apenas
867

se distinguem pêlos excipientes que podem conter. Nesta ordem de ideias, sob a rubrica geral de
Pastilhas consideraremos os dois tipos de preparações a que aludimos.
Os ingleses e norte-americanos designam as pastilhas preparadas com açúcar e gomas pelo
nome de troches, termo que provém da palavra grega trochos ('), que significa redondo ou circular.
Além destas pastilhas empregam outras, cujo excipiente é constituído por gelatina, em regra
associada à glicerina, a que, correntemente, dão o nome de pastilles. Sob a designação geral de
lozenges englobam os troches e as pas-tiiles e até certos comprimidos que se destinam a dissolverem-
se lentamente na boca.
Por último, nos países latinos usam-se ainda outras espécies de pastilhas cuja principal
característica é uma elevada percentagem de gomas. Em Espanha, este tipo de medicamento tem sido
denominado por pastilhas de goma e em Portugal e na França é corrente a designação de pastas.
No intuito de sistematizar a classificação que iremos seguir e de mostrar a correspondência entre
a nossa nomenclatura e a adoptada em outros países, apresentamos a tabela seguinte:

Tabela C. Designação, em vários idiomas, dos diversos tipos de pastilhas


Tipos de pastilhas Designação
1 — Com açúcar e mucilagens Tabelas = tablettes = troches (Inglês)
2 — Com elevada percentagem de goma Pastas = patês (Francês) = pastilhas de goma
(Espanhol)
3 — Com açúcar, sem mucilagens Pastilles (Francês)
4 — Com gelatina Pastilles (Inglês)

7.2.1.7.2. Preparação das pastilhas 7.2.1.7.2.1. Pastilhas contendo


mucilagens e açúcar
Este tipo de pastilhas, sem dúvida o mais difundido, constitui uma preparação apesentada, em
regra, sob a forma de pequenos cilindros, cuja altura é de cerca de 1/3 a 1/5 do diâmetro e que pesa,
aproximadamente, l g.
Trata-se de verdadeiros sacaróleos sólidos, já que é avultada a percentagem de açúcar
constituinte.
A obtenção destas pastilhas compreende um certo número de fases, das quais destacamos as
seguintes: a) Preparação da mucilagem; b) Preparação da pasta; c) Divisão da pasta; d) Secagem.
(') Esta palavra originou o termo latino TROCHISCUS que, por seu turno, deu origem à designa-
ção de trocisco em português.
868

;•••• 7.2.1.7.2.1.1. Preparação da mucilagem


A mucilagem pode fazer-se com goma arábica, com goma adraganta ou. com outros produtos
como a metilcelulose.
A goma adraganta, que ultimamente vem sendo substituída pela goma de Karaya, origina maior
número de incompatibilidades e as pastilhas obtidas dissolvem-se mais rapidamente do que quando
preparadas com goma arábica. Apesar disso, é a única goma recomendada pela F. P. IV, talvez por
não ser necessário empregá-la numa quantidade tão elevada como a requerida para as pastilhas que
se preparam com goma arábica, pois, normalmente, cada pastilha carece de 3-12% de goma arábica
e 1-2% de goma adraganta.
A mucilagem de goma adraganta é preparada fazendo macerar 10 g de goma em 90 ml de água
destilada, durante 24 horas. Ao fim desse tempo coa-se por expressão. A mucilagem pode conseguir-
se mais rapidamente triturando a goma em pó, num almofariz, com 9 a 15 vezes o seu peso de água.
Este método origina, porém, muci-lagens menos viscosas.
Trabalhando com goma adraganta ou mesmo com goma de Karaya, são necessários cerca de 100
g de mucilagem por quilo de pó para o transformar em massa de consistência apropriada para obter
pastilhas.
A mucilagem de goma arábica é preparada a 40-50% em água fria, para o que a goma deve ser
agitada, de quando em quando, até dissolução. Depois de coada, a mucilagem deve ser aquecida a
banho de água durante 30 minutos, substituindo-se a água que se evaporou. Este aquecimento
destina-se a destruir as oxidases da goma.
Além destas mucilagens, classicamente empregadas na preparação das pastilhas, pode usar-se a
obtida com metilcelulose. Esta substância, que não apresenta inconvenientes de ordem
farmacológica, confere maior viscosidade à saliva, obrigando os princípios activos a contactarem,
por maior período de tempo, com a mucosa da boca. A sua introdução na manufactura das pastilhas
deve-se a RAMOS MORGADO et ai., embora tenha sido anteriormente proposta por TROTTER, HAWKINS e
PARROTT para preparar comprimidos destinados a dissolverem-se lentamente na boca.
Empregando-se metilcelulose (Methocel) em dispersão aquosa a 30% consegue-se obter uma
massa de consistência adequada para a preparação das pastilhas ('). Nota-se, porém, que é elevada a
velocidade de desagregação das fórmulas assim preparadas, tendo-se obtido melhores resultados
quando a quantidade de metilcelulose é, aproximadamente, de 0,3 g por pastilha de l g de peso. Ainda
segundo os mesmos autores, é vantajosa a incorporação directa da metilcelulose em pó, no açúcar
das pastilhas, sendo obtida a massa por subsequente adição de água.

(') A qualidade da metilcelulose ë, como se compreende, extremamente importante para o bom


êxito da operação. Os autores do método empregaram uma amostra do produto que correspondia à me-
tilcelulose 400.
869

7.2.1.7.2.1.2. Preparação da pasta , .. :


Incorpora-se, a pouco e pouco, num almofariz, a mucilagem com cerca de três quartas partes do
açúcar prescrito na fórmula. Este deve ter sido finamente pulverizado, de modo a facilitar a mistura. Uma
vez obtida uma pasta homogénea, adiciona-se-lhe o restante açúcar, previamente misturado com os
princípios medicamentosos e com os corantes e/ou aromatizantes que eventualmente se empregam. Todo
esse conjunto é trabalhado no almofariz e, posteriormente, malaxado, até que se obtenha uma massa de
consistência firme que não adira aos dedos.
Se o princípio medicamentoso se apresenta sob a forma líquida, como um infuso, pode utilizar-se na
preparação da mucilagem ou então incorpora-se no açúcar. Caso seja muito volátil, deve associar-se a
cerca de uma décima parte do açúcar da fórmula.
A aromatização das pastilhas pode efectuar-se durante a preparação da pasta, utilizando-se, para isso,
a vanilina, diversas essências, tinturas ou hidrolatos. Em regra, são suficientes 1-3 g de essência por quilo
de pastilhas, sendo vulgarmente empregadas as essências de anis, de hortelã-pimenta e de limão. É
variável a quantidade de tintura a utilizar como aromatizante, oscilando à volta de 10 g por cada 1000 g
de pastilhas. Os hidrolatos empregam-se em maior quantidade, já que podem servir, como veículo, na
preparação da mucilagem de goma.

7.2.1.7.2.1.3. Divisão da pasta .


Logo que a massa trabalhada no almofariz apresente a devida consistência, passa--se para um
tabuleiro onde é espalhada por meio de um rolo. O tabuleiro deve ser previamente polvilhado com
amido, talco ou lactose, ou com uma mistura de amido e açúcar em pó finíssimo (2:1), o que evita a
aderência da massa à superfície onde é espalhada. Os tabuleiros são, em regra, de madeira, de forma
rectangular, tendo junto aos bordos, correspondentes ao seu comprimento, umas finas réguas de
madeira, latão ou aço sobre que assenta o rolo. A espessura da massa será assim condicionada pela
altura das réguas. São usuais réguas com 4 mm de altura, mas pode ser aconselhável dispor de réguas
mais baixas ou mais altas (2, 3, 5, 6 mm). Espalhada a massa com a espessura pretendida, é apenas
necessário proceder ao seu recorte, para o que se podem empregar furadores, tais como o de
FRANCISCUS, ou compressores-doseadores que, por meio de uma mola, lançam fora a pastilha depois de a
cortar. Dada a exigência de que cada pastilha deverá, depois de seca, pesar cerca de l g, é necessário
escolher os diâmetros dos aparelhos de recorte de acordo com a espessura e a densidade da massa.
870

Em regra, a espessura é de 4 mm, devendo usar-se, com a maioria das massas, compressores-
doseadores cujo diâmetro seja de 16 mm. Nestas circunstâncias, o peso das pastilhas, após secagem, é
de cerca de l g.

Flg. 324. Obtenção de pastilhas


Na gravura podem observar-se o tabuleiro, o rolo
e dois compressores-doseadores
Foi. Abel Rotd&o

Há tabelas que relacionam, para pastilhas de diferentes substâncias, a espessura da massa com o
diâmetro do molde que a deve recortar, de modo a que o peso final de cada pastilha seja de l g
(Tabela Cl).

Tabela Cl. Relação entre a espessura e o diâmetro das pastilhas


Espessura em mm
Pastilhas Diâmetro de 15 mm Diâmetro de 19 mm
Bálsamo de Tolú 5,2 3,3
Bicarbonato de sódio 4,5 3,5
Clorato de potássio - -<>4t-. .- . :l V,' '..: - '• . 3,1
Hortelã-pimenta . -,**,•.• ....... 3,2
Ipecacuanha . :,M r/ 3,3
Santonina *,è 3,2
871

Se bem que as pastilhas de secção circular sejam as mais correntemente empregadas, esta forma
não é obrigatória, podendo moldar-se pastilhas de secção triangular, rectangular, hexagonal, etc. É
evidente que, também nesse caso, se deverá dar à massa uma espessura tal que a área recortada
permita obter pastilhas pesando cerca de l g. Anotemos, porém, que se têm preparado pastilhas com
peso diferente do habitualmente consagrado.
A altura (h) que cada pastilha deve apresentar, isto é, a espessura que se deve conferir à massa,
pode calcular-se com rigor, sabendo-se que o volume (V) ocupado por uma pastilha é dado pela área
de base multiplicada pela altura:

V = S.h '''"' '


Para N pastilhas, o volume Ví será:

V, = S./iJV *'•-*• '••• '••

A área da base de cada pastilha é fácil de avaliar, indicando-se na Fig. 325 o modo de proceder,
consoante a forma da pastilha.
Quando se prepara a massa total para N pastilhas pode formar-se com ela uma bola de diâmetro
D. O volume da bola obtida é, evidentemente, igual a V,, exprimindo--se da seguinte forma:
ï'. '•: \' <> . '-" .. •-'
4 D
4ir _ ^ / \' 4-r D3 ir D1
3 3 ' 2 •' 3

Igualando as duas expressões, que traduzem o valor de V,, virá:

3
ir D
S.h.N = ———
donde: 6

Pode, portanto, escolher-se o molde que recortará a área desejada (S), determinando-se a altura (ft)
com que a massa deve ficar para se obterem pastilhas do peso pretendido.
872

Forma da pastilhaSuperfície

- s A.B. „

Elipse

Quadrado

Rectângulo
Oct
ógo
no

Losango

Rg. 325. Modo de calcular a área da base de uma pastilha

Suponhamos, por exemplo, a preparação de umas pastilhas cilíndricas de l g cada,


cuja densidade seja de 1,1. „ -.., f .... , , . „..„,_ , .,r .. w _ ,
873

Nestas circunstâncias, o peso de uma pastilha será dado por:


-•••.-• P = V.d ou / g = V x 1,1 í, '.-: ; -i-sl»..K--
donde se calcula que o volume de cada pastilha é de 0,9 cm3. !
^
. i- , ' .. ;.-';?é ••<'
Para 10 pastilhas o volume será de 9 cm3 e é igual a: ' '"'''•' • '-
$^\->:_;;.- * . .'-' .- '-
-" '"'*•"' V, = S.h.N = SAIO = 9 cm3 ' ' '* '- "" ";;
Se o recorte da massa for executado com um molde circular de 19 mm de diâmetro, virá:
'''•'•'•" S = TI r2 = 3,14 x (9,5)2 = 282 mm2 ' * ' J';_ V /'"

e a espessura a conferir à massa será dada por: > . . ' - .

V
-• '•• "•- , , 9 cm? . *ÍTO «i\-:-
...--.- h = ———— = ———————— = 3,2 mm , , ,.
S N
- 282 mm2.10 ',',."".-,

7.2.1.7.2.1.4. Secagem , :.-:.,f , :-s, ,-íl(J-jíllt, ,,1-»,^ ,,,0;.-.,.,, -i


A pasta obtida, como se disse, apresenta um teor de cerca de 5-6% de água, que convirá eliminar
por secagem. Esta deve ser efectuada muito lentamente, de modo a evitar a deformação das pastilhas.
De facto, a secagem deve realizar-se com a mesma velocidade no interior e no exterior da massa das
pastilhas, pois, de contrário, formar-
-se-ia uma crosta que impediria a operação. Para isso é hábito expor as pastilhas ao ar, durante 24 a 72
horas, submetendo-as, depois, a um aquecimento na estufa, a temperatura inferior a 40°C.
A aromatização das pastilhas pode efectuar-se depois da sua secagem, recorrendo-
-se ao método de GAROT. Para isso devem introduzir-se num frasco onde se encontra a essência dissolvida
em éter que, posteriormente, se deixa evaporar.

7.2.1.7.2.2. Pastilhas com elevada percentagem de gomas


Estas pastilhas, também designadas por pastas e por pastilhas de goma, são muito
semelhantes, na sua composição e modo de preparação, às pastilhas anteriormente
descritas; entretanto, apresentam elevada percentagem de goma arábica e menor quan
tidade de açúcar do que aquelas. .,, ,,,.„,.,,„„ _.,, .,....,.. ,„_,
874

Segundo o modo de preparação, as pastas podem ser transparentes ou vazadas e opacas, sendo o
aspecto destas devido à interposição de ar por agitação ou à adição de claras de ovo. A quantidade de
goma em relação à do açúcar é de 3/2, 4/3, ou, quando a goma é de excepcional qualidade, de 1/1 (').
As pastas transparentes preparam-se por dissolução, a quente, da goma arábica e do açúcar em
água destilada, num macerado, num infuso, num cozimento, etc. Promove-se a evaporação da água, sem
agitar, a banho de água fervente, tendo o cuidado de eliminar a espuma quando o líquido principia a
tornar-se muito viscoso. Nessa altura ajuntam-se os restantes princípios que entram na fórmula. Coa-se a
massa para moldes de lata, previamente oleados com parafina (2) ou recobertos por papel, ou ainda
para uma pedra de mármore também lubrificada.
As pastas opacas preparam-se por dissolução nas mesmas condições, mas a evaporação é facilitada
pela agitação contínua, até consistência de mel espesso, facto por que também se designam por pastas
batidas. Logo que se atingiu a consistência de mel espesso, adicionam-se claras de ovo batidas, os
hidrolatos que entram na composição da fórmula e os princípios medicamentosos daquela. Procede-se
então como foi dito para as pastas transparentes, isto é, continua-se a evaporação da água a banho-maria
fervente, mas agora agitando sempre, para remover a maior parte da água. A operação pode ser levada a
cabo sem haver necessidade de se adicionarem claras de ovo. Efectivamente, estas, ao coagularem pelo
calor, aumentam a opacidade das pastas, mas a presença de bolhas de ar interpostas na massa pela
agitação é suficiente para que as pastilhas não fiquem transparentes.
Do mesmo modo que com as pastas vazadas procede-se, depois, ao seu lançamento sobre uma placa
de mármore ou em moldes lubrificados.
Esfriada a massa, obtêm-se, em qualquer dos casos (transparentes ou opacas), lâminas
ligeiramente elásticas que, se não se preparam por meio de moldes, serão recortadas com a forma de
quadrados de 15 milímetros de lado.
A massa das pastas pode-se tornar mais elástica e mole desde que se inclua glicerina na sua
composição (cerca de l a 2%).
Com o fim de conservar as pastas por bastante tempo, visto que amolecem ou se tornam duras, o que
depende da temperatura e da humidade que as cerca durante a armazenagem, é hábito polvilhá-las com
açúcar cristalizado (3), guardando-as em caixas de lata, em lugar fresco e seco. Esta operação de
recobrimento com açúcar pode conseguir-se imergindo-as em xarope comum saturado de açúcar, de
modo a que a sua superfície fique revestida de pequenos cristais de sacarose. Depois de se ter observado
a deposição do açúcar, retiram-se do xarope, escorrem-se e deixam-se secar.

(') Segundo SCHULTZ e BRÜNING (Pharm. Acta Helv. 39, 35, 1964) a melhor proporção de goma--
açúcar é de (1/1).
(23) Pode usar-se o óleo de amêndoas ou, até, o óleo de amendoim.
( ) Este açúcar é muitas vezes designado por açúcar cândi, palavra que provém do árabe (cand)
e que significa açúcar cristalizado. -.? • •••.-c 1=-;;. ..s, > .. •,. -
875

Além deste tipo de pastilhas de goma usam-se, por vezes, pastilhas de forma aproximadamente
esférica, cuja massa é preparada de modo análogo ao que mencionámos, mas em que os moldes são
cavidades em madeira com a forma de semi--esferas.
As pastas usam-se, especialmente, como medicamentos béquicos. ' •/ !J ivfti.

7.2.1.7.2.3. Pastilhas sem mucilagem e com açúcar


Este tipo de pastilhas é actualmente muito pouco usado. Trata-se de pastilhas semi--esféricas, ou
melhor, com a forma de uma calote esférica. Contêm, exclusivamente, açúcar, substâncias
medicamentosas e/ou princípios aromáticos.
São preparadas misturando o açúcar com os princípios medicinais, dissolvidos ou suspensos em
cerca de uma décima parte do seu peso de água. A mistura, agitada e aquecida a banho de água
fervente, logo que esteja à fusão é lançada, com a ajuda de uma vareta ou de um recipiente com um bico
fino, sobre uma superfície plana e fria (placa de mármore, folha de Flandres, aço). Quando as gotas da
mistura fundida caem sobre a superfície fria solidificam, tomando a forma chata na zona de contacto
e ficando arredondadas na sua secção superior. Secam-se então a cerca de 40°C.
Estas pastilhas são designadas pêlos franceses por postules à Ia goutte. •'-'"

7.2.1.7.2.4. Pastilhas contendo gelatina


Conhecidas por pastilhas de glico-gelatina, diferem das anteriores pela natureza do excipiente. De
facto, este é constituído por gelatina-glicerinada, podendo ou não conter gomas e açúcar.
Estas pastilhas, cuja forma é bastante variável mas que, na maioria das vezes, é rectangular ou
quadrada, têm o peso compreendido entre l e 2 g.
A textura e a elasticidade da massa constituída dependem das quantidades relativas de glicerina,
gelatina e água, podendo incrementar-se a sua dificuldade de dissolução na boca por adição de goma
arábica.
Uma fórmula que dá bons resultados práticos é a que seguidamente transcrevemos:
Gelatina.......................................................... 10 g
Glicerina ........................................................25 »
Água destilada .............................................. 25 »

A gelatina, depois de lavada com álcool, é cortada em pequenos fragmentos e amolecida em água
aquecida a banho-maria. Adiciona-se então a glicerina e continua-se o
876

aquecimento até que se obtenha uma solução límpida. Deixa-se arrefecer, conse-guindo-se, assim,
uma massa suficientemente elástica e firme, que se dissolverá lentamente na boca.
Entre as fórmulas que contêm goma arábica citamos a seguinte que promove uma muito lenta
dissolução das pastilhas na boca:
Gelatina.......................................................... 10 g
Glicerina ........................................................ 25 »
Água destilada .............................................. 20-25 »
Goma arábica ................................................ 0,25 »
Em casos especiais, estas pastilhas podem não conter glicerina. Assim, nas preparações cujo
princípio medicamentoso é a penicilina G, não se deve incluir glicerina, que destrói aquele
antibiótico.
A junção dos princípios medicamentosos é, em regra, executada quando na preparação da
massa gelatinosa se observa apreciável espessamento. Se o fármaco não é solúvel, é aconselhável
misturá-lo, previamente, com a glicerina, de modo a que constitua uma pasta que então se
incorpora na massa gelatinosa.
Preparada a massa, deita-se esta em moldes de vidro ou de latão, lubrificados com parafina
líquida ou com um óleo, ou lança-se sobre uma superfície plana e fria (pedra mármore) onde se
espalha livremente sob a forma de toalha. Neste último caso, após solidificação, recortam-se as
pastilhas com a forma e o peso pretendidos.

7.2.1.7.3. Fabricação industrial de pastilhas


A preparação industrial de pastilhas é executada por processos que envolvem maquinaria
apropriada. A massa é preparada em misturadoras de tipo semelhante ao que referimos para a
granulação no fabrico de comprimidos e, seguidamente, laminada à espessura conveniente por
passagem sob um cilindro de mármore ou de metal. Por meio de tapetes rolantes, a pasta obtida é
transportada para uma máquina provida de muitos punções, sendo por eles recortada, segundo a
forma e o peso pretendidos.
O rendimento do processo nunca é muito elevado, assim se explicando que as pastilhas tenham
vindo a ser progressivamente substituídas por comprimidos que, corno elas, apresentam larga
superfície de contacto e lenta dissolução quando administrados por via oral.
Entre as modificações mais importantes realizadas neste domínio citamos a substi
tuição das gomas por metilcelulose, segundo a técnica proposta por TROTTER et ai. Estes
autores prepararam comprimidos destinados a cederem lentamente os seus princípios
medicinais na mucosa bucal, utilizando como excipiente uma massa constituída por
metilcelulose (70%) e por açúcar (25%). ;:•_£,; .. : ..,,•jfnïi.ià ..
877

jam presentes aldeídos ou cetonas (provenientes da inversão do açúcar ou existentes nos aromatizantes).
A reacção é mais fácil em meio alcalino.

HO-C- H '••••'
Ç-CH-CH,
•*••C-9CH-CH,
C ANH,
H-

LOJ —

:
' O
CH, OH
C- C-
-— C-R,
"•'i ,: •"'!) ?.ti

7.2.1.7.5. Verificação das pastilhas


Y r
iXf ':. . --!•!;-,.
. •.!%. !0i::«'0
São variados os ensaios que se podem executar com as pastilhas, dependendo a sua selecção do tipo
de pastilha e da finalidade medicamentosa desejada. Contudo, a regularidade de aspecto e a
homogeneidade da cor são características que se devem respeitar em todos os casos, apenas se
tolerando que algumas pastilhas apresentem a sua superfície rugosa e irregularmente recoberta por
açúcar cristalizado.
Velocidade de dissolução — Entre os ensaios mais importantes a que se deve submeter esta forma
farmacêutica figura a determinação da sua velocidade de desagregação ou de disssolução em água.
Efectivamente, o tempo que as pastilhas levam a dissolverem-se ou a desagregarem-se na boca
condiciona, de certo modo, a sua actividade, sendo, em regra, desejável que não seja inferior a 30
minutos nem superior a l hora.
A apreciação da velocidade de dissolução pode fazer-se por qualquer dos processos que indicámos a
propósito do estudo dos tempos de desagregação dos comprimidos. Como líquido de ensaio utiliza-se a
água destilada, conduzindo-se a operação sobre 5 pastilhas, que se agitam regularmente naquele
líquido mantido a 37°C.
É compreensível que as pastilhas preparadas com grande quantidade de goma arábica (pastas)
sejam as que mais elevados tempos de dissolução apresentem. As pastilhas de glico-gelatina, a que se
associaram gomas, também só se dissolvem lentamente. Já as tabelas, cuja quantidade de mucilagem é
relativamente pequena, dissolvem-se mais rapidamente, sendo máxima a velocidade de dissolução das
pastilhas exclusivamente preparadas com açúcares e princípios medicamentosos ou aromáticos. Assim,
trabalhando com aparelho Erweka para apreciar o tempo de dissolução das
878

879
diferentes pastilhas (tabelas ou tablettes) inscritas na F. P. IV, verificámos que esse período oscilava
entre 16 minutos (pastilhas de santonina) e 24 minutos (pastilhas balsâmicas), sendo de 18 minutos
para as restantes fórmulas (pastilhas de carvão, de clorato de potássio, de bicarbonato de sódio e de
hortelã-pimenta).
A substituição da goma adraganta pela metilcelulose a 30% aumenta substancialmente os
períodos de desagregação nas mencionadas pastilhas. É evidente que se pode apreciar, durante a
dissolução de uma pastilha, a regularidade ou irregularidade de cedência dos seus princípios
medicamentosos, para o que é suficiente proceder à sua dosagem no líquido de ensaio, em tempos
pré-estabelecidos. Podem, assim, ser construídas curvas de cedência, marcando-se em abcissas a
quantidade de princípios activos dissolvidos e em ordenadas os tempos em que se procedeu à recolha
do líquido aquoso e à sua análise.
Na Fig. 326 mostram-se as relações que mencionámos, quando se submeteram à dissolução 5
pastilhas de bicarbonato de sódio (substância hidrossolúvel) preparadas com metilcelulose a 30%.

0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0.6 NaHCOs/LITRO


Flg. 326. Curva de cedência de pastilhas de bicarbonato de sódio

A Tabela CII indica as quantidades de carvão (substância hidro-insolúvel) cedidas por 5


pastilhas preparadas com metilcelulose na concentração de 30%.
Em qualquer dos casos observa-se uma certa regularidade de cedência, a qual é necessária para
que as fórmulas apresentem a acção farmacológica pretendida.
879

Tabela CM. Quantidades de carvão cedidas por pastilhas em função do tempo (1)
Tempos . Quantidades
u
de carvão
(em minutos) ' cedidas (em g)
10 . ' . ,, 0,04
20 , '" ' 0,12
50 •'•' • - • ' • " "•'• "",: ••• 0>66
so • • "'; - ; = : j i -* "• 1,10
Segundo Morgado « ai. Rev. Port. Farm., 15, 273 (1965)

Dureza — A dureza das pastilhas contendo gomas ou mucilagens é, também, uma das
características que interessa considerar, dela dependendo, em larga medida, a velocidade de
desagregação que apresentam.
Para apreciação da dureza podem utilizar-se os métodos que indicámos a propósito dos
comprimidos, sendo corrente o emprego do aparelho de Monsanto quando as pastilhas têm a forma
cilíndrica.
As pastilhas contendo mucilagens e açúcar apresentam durezas da ordem de 8-15 kg (aparelho
de Monsanto). Já as pastas, cujo excipienfe é muito rico em goma arábica, são, em regra, mais duras.
Friabilidade — Trata-se de um ensaio que pode dar indicações preciosas em relação à
resistência que as pastilhas apresentam aquando do seu acondicionamento e transporte.
Para as pastilhas de forma cilíndrica pode usar-se o friabilómetro Roche, sendo a quantidade de
pó libertada habitualmente superior à taxa estipulada para os comprimidos. Em regra, as pastilhas
preparadas com metilcelulose originam menores resíduos pulverulentos (0,18 a 0,89 por cento, nas
pastilhas inscritas na F. P. IV e preparadas com Methocel 400).
Não é vulgar proceder-se à determinação da friabilidade das pastilhas de glico--gelatina, dada a
sua característica elasticidade. Para elas é aconselhável determinar-se a consistência da geleia que
originam, podendo recorrer-se aos processos do penetrómetro, cuja técnica de ensaio descreveremos
a propósito das Pomadas.
Na Tabela CH.I indicamos os resultados dos ensaios feitos por MORGADO et ai. sobre as pastilhas
inscritas na F. P. IV, quer preparadas com goma adraganta, quer obtidas com metilcelulose a 30%.
Peso — Numa fabricação bem controlada de pastilhas é possível não ultrapassar desvios médios
superiores a ± 10% e desvios individuais maiores do que ± 20%. Se bem que não conheçamos
normas oficializadas para as variações de peso a tolerar nas pastilhas, julgamos que os limites
citados satisfazem na generalidade.

Ensaio efectuado com cinco pastilhas de carvão titulando 0,20 g por pastilha.
880

Tabela CHI. Características da resistência de desagregação de pastilhas inscritas na F. P. IV

ENSAIOS Pastilhas Pastilhas de Pastilhas Pastilhas de Pastilhas de Pastilhas de


de Clorato Carvão de Balsâmicas Bicarbonato de Hoterlã-- Santohina
Potássio sódio Pimenta
Metil- Metil- Metil- Metil- Metil- Metil-
F.P. celulose F.P. F.P. celulose F.P. celulose F.P. celulose F.P. celulose
Dureza celulose
(Ap. 15 12 - 13 13 14 8 10 12 •} 12 14 11 12
Monsanto)
Friabilidade
(Friab. 1,12% 0,74% 1,83% 1,84% 0,69% 1,23% 0,18% 2,28% 4,32%
Roche)
Desagregação 0,31% .80 :
18 18 57 24 35 18 45 0,89%
18 73 0,34%
16 37
total min min min min min min min min min min min min
(Erweka) 55 30 39 55 28 24
s s s s s s

Segundo Morgado et ai. — Rev. Port. Farm., 15, 273 (1965)


881

Água — A sua apreciação é executada, normalmente, pelo método de KARL-FIS-CHER ou por


secagem até peso constante, caso não contenham compostos voláteis.
É variável o teor de água existente nos diversos tipos de pastilhas, dependendo isso da natureza
dos excipientes utilizados, do método de preparação seguido e da secagem efectuada. Lembramos,
por exemplo, que a goma arábica apresenta um teor normal de humidade compreendido entre 12-
15%, que a secagem pode reduzir para 3-4%.
;
7.2.1.7.6. Acondicionamento , •: ;
O acondicionamento das pastilhas pode efectuar-se de modo análogo ao que indicámos para os
comprimidos. É, porém, hábito empregarem-se caixas de forma circular, quadrada ou rectangular,
feitas de madeira, de material plástico ou de folha de Flandres. Importa, em todos os casos, que os
recipientes fechem hermeticamente, a fim de se evitar a acção deletéria da humidade. É costume
revestir interiormente as caixas com papel vegetal ou embrulhar nele as pastilhas, que depois se
introduzem no recipiente.

7.2.1.7.7. Formulário das pastilhas


Como em casos análogos, procuraremos indicar algumas das fórmulas mais representativas dos
diversos tipos de pastilhas, mencionando o seu modus faciendi.

Macerado de alteia ...................................... 90 g


Goma adraganta ............................................ 10 »
Açúcar, em pó.............................................. 1000 »
Estas pastilhas, que devem a sua actividade à acção emoliente ou demulcente da mucilagem da
alteia, são obtidas do seguinte modo: prepara-se a mucilagem de goma utilizando-se o macerado
como veículo; ajunta-se o açúcar e divide-se a massa em pastilhas de l grama, podendo empregar-se
moldes com o diâmetro de 15 mm, sendo a espessura da massa de 5,2 mm.
n '} :i
'::
.— Cloridrato de cocaína .................................. l g
Açúcar, em pó.............................................. 989 »
Mucilagem de goma adraganta .................. 100 »
Vanilina em pó ............................................ 0,25 »
882

Estas pastilhas, dotadas de acção anestésica local, podem ser preparadas pela forma que
passamos a descrever: mistura-se a vanilina com o açúcar e dissolve-se o cloridrato em cerca de 5
ml da água prescrita para a mucilagem; mistura-se a solução da cocaína com a mucilagem e
prepara-se a massa do modo habitual, fazendo pastilhas de l g. Nestas circunstâncias, cada pastilha
conterá l mg de cocaína.

Hl -• : • -..''í

Santonina ........................................................ 10 g .- ,(><


Açúcar, em pó .............................................. 990 » .,,,
Mucilagem de goma adraganta.................... q.b.
Trata-se de uma fórmula de pastilhas inscrita na F. P. IV. Tritura-se a santonina com cerca de
200 g de açúcar e incorpora-se esta mistura na pasta preparada com a mucilagem e o resto do
açúcar. Na prática verifica-se que é, em regra, suficiente uma quantidade de mucilagem de cerca de
90 g.
Cada pastilha deve conter l cg de santonina.

Essência de hortelã-pimenta ........................ 3-10 g


Açúcar em pó .............................................. 1000 »
Mucilagem de goma adraganta.................... q.b.
Conhecidas por pastilhas de hortelã-pimenta, inglesas, são preparadas misturando--se a essência
com a décima parte do açúcar; ajunta-se a mucilagem com o açúcar restante e, depois, o açúcar
aromatizado. Pode substituir-se a mucilagem de goma adraganta por 100 g de mucilagem de goma
arábica. A massa obtida é estendida com uma espessura de 5,2 mm, procedendo-se ao recorte
circular das pastilhas com moldes de 15 mm de diâmetro.

Eucaliptol ......................................................0,5 g
Mentol............................................................0,5 »
Tintura de salsaparrilha................................ 5 »
Glicerina ........................................................12,5 »
Goma arábica ................................................300 »
Açúcar em pó ..............................................200 »
Água destilada ..............................................300 »
883

Trata-se de pastilhas de goma ou pastas, constituindo uma fórmula conhecida pela designação de
pastilhas de Valda.
Dissolve-se o eucaliptol na untura, ajunta-se o mentol e a glicerina. À parte, dissolve-se a goma
na água e coa-se; a esta mucilagem adiciona-se o açúcar, que se dissolve, e procede-se à
concentração a banho de água, até consistência de xarope muito espesso. Ajunta-se a solução do
eucaliptol e do mentol e lança-se em moldes lubrificados com óleo de amêndoas. Seca-se na estufa a
cerca de 40°C.
É hábito corarem-se estas pastilhas, para o que se adiciona o corante em solução aquosa logo
após a junção do eucaliptol e mentol dissolvidos na tintura e na glicerina. Tem-se empregado, como
corante, o verde malaquite a 1%, se bem que se não deva utilizar esta substância, dada a sua
toxicidade.

• vi '•''• -

Goma arábica................................................ 300 g


Açúcar, em pó.............................................. 250 »
Infuso de espécies de flores ...................... 250 » _^
Tintura de bálsamo de Tolú a 1/5 ............ 2,5 » <
Água de flores de laranjeira ...................... 50 » "
Glicerina ........................................................ 20 »

Esta pasta, que foi muito utilizada com o nome de pasta balsâmica ou pasta
peitoral de Regnault, é preparada do seguinte modo: dissolver a goma no infuso frio;
ajuntar a água de flores de laranjeira e a tintura e dissolver o açúcar a banho-maria;
evaporar até consistência viscosa; adicionar a glicerina e continuar a evaporação até
obter uma pasta firme; verter a massa sobre uma superfície de mármore polvilhada com
amido ou em moldes lubrificados. .í.-.- i -...., ' -íi .

vn

Mentol.................................................. 3 mg
Eucaliptol ............................................ 3 cg
Gelatina glicerinada .................... q.b.p. l pastilha

Dissolve-se o mentol no eucaliptol e adiciona-se esta solução à glico-gelatina quente, cuja


quantidade é de, aproximadamente, 2 g por pastilha.
884

885
!
vm '•••',- ^,r:s:t'•"'•'
Penicilina G cálcica........................ 100000 unidades •" «1;";*"-!>
Citrato de sódio.............................. 2g '
Amido .............................................. 20 » ,}•
Gelatina............................................ 40» ;. - ;.,t,
Sacarose............................................ 60 »
Água destilada ................................ 140 »
Essência de hortelã-pimenta .......... q.b.
Na preparação destas pastilhas não se inclui a glicerina, dado que poderia hidro-lisar a
penicilina G. A gelatina deve, preferentemente, ser do tipo «pharmagel B», isto é, com ponto
isoeléctrico de 4,7. Por outro lado, não deverá conter anidrido sulfuroso, o que é vulgar na gelatina
comercial, uma vez que os redutores também destroem a penicilina.
É aconselhável adicionar um agente conservante para impedir o desenvolvimento de fungos.
Pode servir o propilparabeno (Nipazol) numa concentração de 0,1%. A presença de citrato de sódio
é aconselhável para manter a estabilidade da penicilina (acção tampão), que é menos alterável a pH
próximo da neutralidade.
A técnica de preparação de tais pastilhas é a seguinte: ferve-se o amido, a gelatina, o açúcar e o
citrato, durante 3 minutos na água; deixa-se arrefecer a 40°C e adiciona--se a penicilina e a
essência, agitando sempre. Obtém-se uma geleia que se divide, por corte, em pastilhas.
Se se pretender juntar o conservante, deve ter-se em atenção que o Nipazol só é solúvel em água
quente, devendo, por isso, ser adicionado de início.

BIBLIOGRAFIA
Livros de carácter geral: . .
. ' 'Tli«.
DENOËL, A. — Cours de pharmacie pratique — Lês Presses Universitaires, Liège, 1954.
Husa's pharmaceutical dispensíng — Marck Publ. Co, Easton, 1965. ç-,",
JENKINS el ai. — The ait of compounding-McGraws Hill Book Co., New York, 1957.
SPROWLS — American pharmacy-Lippincot, Philadelphia, 1963.
MÜNZELL e ai. — Galenisches praktíkum — Verlags, Stuttgart, 1959.
'• : '•:• •: • "•-.' ... ..'*.."' í; , '•:* .'• • ^
Artigos de carácter especializado: '
MORGADO, R., MATOS, L, CRUZ, A. e PRISTA, L. — Rev. Port. Farm. 15, 273, 1965. TROTTER,
O., HAWKINS, D. e PARROT, E. — Amer. J. Pharm, 128, 50, 1956. MÜNZEL, K. — Pharm.
Acta Helv. — 26, 91. 1951.
PKTER, D. — Medicated Lozenges, in Pharmaceutical Dosage Forms: Tablets, Mareei Dekker, New York and Basel, 1980.
885

7.2.1.8. Lentículas ^

7.2.1.8.1. Definição e preparação


Esta forma farmacêutica assemelha-se às pastilhas e aos comprimidos, sendo designada pêlos
anglo-saxões por molded tablets ou por trituration tablets (T.T.).
As lentículas são pequenos discos de consistência firme, cuja espessura varia, normalmente, ente
2,4 e 3,2 mm e em que o diâmetro oscila entre 4 e 5,6 mm.
Destinam-se à administração gastro-intestinal, devendo ser deglutidas sem mastigar, ou são
utilizadas para a preparação de soluções para uso hipodérmico.
As lentículas são obtidas, por moldagem, em aparelho especial, de misturas das substâncias
medicamentosas com açúcares, como a sacarose ou a lactose, ou com outros excipientes. Para a sua
preparação tritura-se o excipiente com o princípio medicinal e humedece-se o pó resultante com
álcool ou com uma solução hidroalcoólica. A pasta obtida é introduzida nos alvéolos do aparelho de
moldagem, que é constituído por uma placa perfurada, geralmente com 50 a 500 aberturas
correspondentes à área das lentículas que se desejam preparar. A referida placa, que é construída
em plástico, aço inoxidável, níquel ou cauchu endurecido, coloca-se sobre um vidro ou sobre uma
pedra mármore, enchendo-se os seus alvéolos com a massa, por intermédio de uma espátula.
Retira-se o excesso de pasta, por raspagem, e procede-se à secagem
ao ar livre da massa aprisionada nos alvéolos, tendo o cuidado de
alternar a superfície que assenta sobre a pedra ou o vidro, de modo a
que seja permitida a evaporação nas duas faces das lentículas. À placa
ajusta-se, então, uma outra, onde existem saliências que se encaixam
perfeitamente nos orifícios da primeira. Nestas circunstâncias, as
lentículas são obrigadas a sair dos alvéolos, procedendo-se depois à
secagem final, a 40-60°C, numa estufa. A Fig. 327 representa um
aparelho da marca Colton para a obtenção de lentículas.
As lentículas destinadas à preparação extemporânea de soluções
injectáveis deverão ser produzidas assepticamente, empregando-se pós
Fig. 327.. Aparelho para estéreis e trabalhando-se em câmaras de humidade e temperatura
preparação de
lentículas (Coton) controladas, com ar filtrado. A estas lentículas, que se devem dissolver
rápida e totalmente na água, dão os norte-americanos a designação de hipodermic tablets, que se
representa pela abreviatura H. T.
A sacarose origina lentículas mais duras do que a lactose. Para esta última considera-se o álcool
de 50° como o melhor líquido de humedecimento, sendo, em regra.
886

suficiente 1,3 ml por cada 100 g de lactose. As misturas de sacarose e lactose são também
empregadas, especialmente na proporção de 20:100.
O caulino e o carbonato de cálcio são, igualmente, utilizados como excipientes para as lentículas
destinadas à administração gastro-intestinal, usando-se sempre que os princípios medicamentosos
possam ser reduzidos pêlos açúcares, como sucede com o permanganato de potássio ou com o nitrato
de prata.
Para uso hipodérmico usam-se exclusivamente a lactose, a sacarose, a glicose e o sulfato de
sódio. Alguns fabricantes preferem empregar a p-lactose, cuja solubilidade na água é cerca de duas
vezes superior à da a-lactose (açúcar de leite oficial).
Entre os fármacos correntemente utilizados sob a forma de lentículas podemos citar o cloreto
mercuroso, o permanganato de potásso, o nitrato de prata e alcalóides, como a morfina e a
estricnina.
As lentículas são pouco usadas nos países latinos. Entretanto, é muito frequente o seu emprego na
América e na Grã-Bretanha.
As lentículas destinadas à administração gastro-intestinal devem satisfazer aos ensaios de
velocidade de desagregação ou de dissolução que indicámos para as pastilhas e podem acondicionar-
se como os comprimidos ou como as pastilhas.
As lentículas para uso hipodérmico devem dissolver-se em água destilada num prazo máximo de 2
minutos. Estas lentículas devem ser expedidas em frascos de vidro que fechem hermeticamente, os
quais se esterilizam antes do acondicionamento.

7.2.1.8.2. Formulário
Indicamos apenas duas fórmulas, suficientemente representativas, de lentículas: lentículas de
sulfato de estricnina, para uso oral, e lentículas de sulfato de morfina, para aplicação hipodérmica.

Sulfato de estricnina .................................... 0,050 g

Faça 50 lentículas contendo l mg de sulfato de estricnina.


Dilui-se o sulfato de estricnina com cerca de 4 g de lactose, utilizando o carmim (cerca de 16 mg)
para verificar uma perfeita homogeneização. Completa-se, com lactose, o peso de pó necessário para
enchimento do número de moldes a utilizar, convindo preparar lentículas cujo peso esteja
compreendido entre 0,08 g e 0,09 g.
A determinação do peso de excipiente a empregar é feita ensaiando, previamente, os moldes com
lactose humedecida com álcool de 50°. Toma-se, então, nota do peso que eles retêm, devendo
empregar-se para a preparação da fórmula medicamentosa uma quantidade de excipiente igual a
essa, menos o peso do princípio activo. No presente caso, porém, a quantidade de princípio activo é
desprezável.
887

Calculado o peso total de lactose, mistura-se esta intimidamente com os restantes componentes
da fórmula e humedece-se com álcool de 50°.
Enchem-se os moldes e secam-se as lentículas a 40°C. .->.«.'••
Sulfato de morfina........................................ l g •' ' '
Sacarose ........................................................ 7,5 »
Lactose .......................................................... l »
Misture intimamente os pós. Humedeça-os com álcool de 50° e encha 100 alvéolos do molde.
Seque a temperatura não superior a 40°C.
Toda a operação deve ser conduzida em câmara asséptica, sendo necessário utilizar-se pós
estéreis para esta preparação, que se destina a uso hipodérmico.
Cada lentícula deverá conter l cg de morfina sob a forma de sulfato. Para aplicação desta
fórmula deve dissolver-se uma lentícula em 2 ml de água esterilizada, injectando-se a solução por via
subcutânea ou intramuscular.

BIBLIOGRAFIA > », -~'í'


JENKDÍS et ai. — The artof compounding — McGraw Hill Book Co., New York, 1957. DENOËL,
A. — Cours de pharmacie pratique — Lês Presses Universitaires, Liège, 1954. HOUVER —
Dispensing of Medication, Mack Publishing Co., Easton, 1980. Husa's pharmaceutical
dispensing — Mack Publ. Co., Easton, 1965.

ir ••:•. .i
888

7.2.1.9. Cápsulas
Podemos definir cápsulas como preparações farmacêuticas constituídas por um invólucro de
natureza, forma e dimensões variadas, contendo substâncias medicinais sólidas, pastosas ou líquidas.
O invólucro das cápsulas é, correntemente, de natureza amilácea (hóstias) ou constituído por gelatina
(cápsulas gelatinosas).
O conteúdo das cápsulas amiláceas é sempre sólido, enquanto que o das cápsulas de gelatina, que
na maioria das vezes é sólido, pode também ser constituído por líquidos que não dissolvam as suas
paredes.
O acondicionamento das substâncias medicamentosas nos referidos invólucros
apresenta diversas vantagens: . -. -
1.° — o uso de cápsulas constitui um meio de administração de substâncias nau-seosas ou de sabor
desagradável sob uma forma em que não se apercebe o seu gosto;
2.° — as paredes das cápsulas amiláceas e gelatinosas são digestíveis e libertam, rapidamente, os
medicamentos depois da ingestão;
3.° — graças à elasticidade das suas paredes, as cápsulas são de mais fácil deglutição do que os
comprimidos;
4.° — as cápsulas gelatinosas são susceptíveis de serem revestidas por invólucros gastro-resistentes,
podendo passar pelo estômago sem serem desagregadas ou constituírem um preparado de acção
modificada.

7.2.1.9.1. Hóstias ou cápsulas amiláceas -*i .


_ '^íl;*> -. '• •'
7.2.1.9.1.1. Generalidades x.,; «. ,í • * • - . . . . • ,•..>
Esta forma farmacêutica, cuja designação corrente entre nós é de hóstias (do latim oblatam), é
constituída por duas cúpulas de pão ázimo, de forma redonda, bicôncavas na parte central e planas nos
bordos, no interior das quais se acondicionam medicamentos sólidos pulverulentos.
Tudo leva a crer que as hóstias tiveram a sua origem num preparado de sulfato de quinina que se
introduzia entre duas rodelas de farinha cozida e era conhecido por «remede du cure de Pérols». Em 1853,
GUH.LERMOND apresentou à Sociedade Médica de Lião uma forma farmacêutica semelhante à anterior, a
qual era constituída por duas rodelas de pão ázimo, entre as quais se encontravam pílulas esmagadas. A
esta preparação deu o autor o nome de énazimes.
Foi, contudo, em 1872 que LIMOUSIN, com a colaboração de TOIRAY, construiu um aparelho que permitia
obter as hóstias tal como hoje as conhecemos. Quatro anos mais
889

tarde, DIGNE aperfeiçoou o método de preparação proposto por LIMOUSIN, o que veio a permitir a
enorme difusão desta forma farmacêutica.
As hóstias, que tiveram um largo emprego durante mais de 50 anos, têm sido relegadas para
plano secundário e, a pouco e pouco, foram sendo substituídas por outras formas farmacêuticas que
sobre elas apresentam a vantagem de um maior rendimento de produção e melhor conservação.
Quanto a nós, não vemos razões farmacológicas para que os comprimidos ou as cápsulas gelatinosas
sejam mais eficientes do que as clássicas hóstias mas compreendemos a maior divulgação destas
formas, dada a tendência para a industrialização que é característica da época presente.
Em França esta forma galénica é designada por cacheis, nome que também se tem
divulgado em países de língua anglo-saxónica. Entretando, é também corrente, na
América, a designação de konseals. - - -. - . ....

7.2.1.9.1.2. Fabricação e tipos de cúpulas


São dois os tipos de cúpulas amiláceas de que, actualmente, se dispõe: cúpulas para hóstias de
fechar a húmido e cúpulas para hóstias de encaixe ou de fechar a seco.
As hóstias do primeiro tipo são constituídas por dois invólucros de bordos salientes e planos, os
quais permitem a sua colagem, mediante um ligeiro humedecimento e compressão. A Fig. 328 a)
mostra várias hóstias de fechar a húmido.
As hóstias de encaixe são formadas por duas cúpulas de diâmetros ligeiramente diferentes, o que
permite a introdução da mais pequena na maior. Há, portanto, um verdadeiro encaixe duma cúpula
na outra, o que justifica a designação que lhes tem sido dada. A Fig. 328 b) e c) representa duas
variedades de hóstias de fechar a seco.
A preparação das cúpulas é feita industrialmente, limitando-se o farmacêutico a adquirir no
comércio os tipos de que necessita. Resumidamente, podemos dizer que esta fabricação obriga às
seguintes operações fundamentais: prepara-se um cozimento de amido de trigo ('), a cerca de 100°C,
após o que se deixa em repouso durante 24 horas; adiciona-se, então, amido de milho, aquecendo-se
num forno a 145°C, por um período de 50 a 60 segundos.
O emprego destes dois amidos é necessário porquanto o amido de trigo origina cúpulas elásticas
e o de milho confere-lhes um brilho característico. Efectivamente, os invólucros das hóstias devem
apresentar elasticidade e serem digestíveis e brilhantes.
Obtida a massa dos amidos procede-se à sua moldagem, conseguida em moldes de metal, que são
uma espécie de batentes onde aquela é apertada. Um dos batentes reproduz as cúpulas em oco e o
outro em relevo. As cúpulas formadas ficam ligadas entre si, numa grande folha de pão ázimo, pelo
que terão de ser recortadas em

(') O amido é preparado à custa de uma farinha de trigo que foi desengordurada e a que se
retirou todo o seu glúten. • • . - . . - • ...._, ..,
890

máquinas próprias. Este corte pode deixar apenas as cúpulas (hóstias de fechar a seco) ou as
cúpulas com uma pequena margem que mais tarde se destina à colagem das hóstias (hóstias de
fechar a húmido).

:
Flg. 326. Tipos de hóstias
a — De fechar a húmido
b — De fechar a seco (tipo Secca)
c — De fechar a seco (tipo Pastilha)

Os invólucros das hóstias podem ter inscrito, numa ou nas duas faces circulares, o nome do
medicamento, a que se destinam, da farmácia que as preparou, etc. Esta operação é, também, do
domínio industrial, marcando-se as cúpulas, antes do corte, com um carimbo de borracha contendo
os dizeres desejados.
Algumas cúpulas de hóstias são coradas, usando-se, para isso, corantes permitidos para a
alimentação e legalmente aprovados, os quais se incluem na mistura dos amidos.
Algumas cúpulas de hóstias de encaixe ou as de fechar a húmido são fabricadas com diversas
capacidades, pois destinam-se a conter quantidades variáveis de substâncias pulverulentas.
Designam-se por números, sendo mais correntes os seguintes: 00, O, 0,5, /, 7,5, 2 e 2,5.
Do ponto de vista prático, como a possibilidade de acondicionamento nas cúpulas depende do
volume aparente dos pós, é costume relacionar o número da cúpula com a quantidade de pó,
comprimido ou não, que ela é capaz de receber. Mais correcto é, sem dúvida, indicar a capacidade
exacta de cada cúpula de dado número. Contudo, é habitual relacionarem-se os números das cúpulas
com os pesos de diversas substâncias que, no estado de pó, podem acondicionar, o que nos parece
constituir um sistema sujeito a erros, uma vez que não atende à tenuidade do pó.
891

A Tabela CTV indica as quantidades aproximadas de bicarbonato de sódio, ácido acetilsalicílico e


salicilato de sódio e os números das cúpulas correspondentes que as podem acondicionar. Os valores
indicados foram obtidos com pós não comprimidos ou calcados.

Tabela CIV. Pesos de várias substâncias que é possível acondicionar em cúpulas de diversos
números
N° das cúpulas Bicarbonato Acido acetil- Salicilato
(Sevcik) de sódio salicílico de sódio
00 0,35 g 0,27 g 0,17 g
0 0,44 » 0,34 » 0,21 »
0,5 0,55 » 0,43 » 0,25 »
1 0,64 » 0,52 » 0,32 »
1,5 0,78 » 0,63 » 0,42 »
2 1,02 » 0,83 » 0,52 »
2,5 1,50 » 1,01 » 0,61 »

Se bem que entre nós ainda se utilizem as cúpulas de fechar a húmido, em vários países, como a
Bélgica, a Alemanha e mesmo a França, a grande maioria das hóstias é do tipo de encaixe. Há dois
modelos de cúpulas de encaixar: as do tipo Secca, que apresentam uma espécie de saliência
cilíndrica na sua superfície circular, e as do tipo Postula, cujas superfícies circulares são planas.
Na Tabela CV indicamos as relações mais correntemente observadas entre o número das cúpulas
do tipo Pastilla e as suas dimensões.
As cúpulas do tipo Secca apresentam alturas idênticas às do tipo Pastilla mas os seus diâmetros
são ligeiramente inferiores. Entretanto, dado que possuem uma pequena saliência, de forma
cilíndrica, na qual o pó também se acondiciona, o seu volume é, aproximadamente, igual às
correspondentes do tipo Pastilla. Assim, para fins práticos,

Tabela CV. Dimensões e volumes das cúpulas de hóstias do tipo Pastilha


N.° da cúpula d(cm) h(cm) Volume (ml)
00 1,30 •••••.. . ' <W&t. •• 0,73
0 1,52 ^ 0,S5 1,00
1 1,70 ~ OJS5 1,25
"*"" ~ 2 1,90 ' '" " "' 0,55 ' " 1,56
2,5 1,90 0,71 2,00

d = diâmetro da cúpula; h = altura da cúpula


892

podemos considerar que a sua capacidade é a seguinte: 00 (0,73 ml); O (1,00 ml); l (1,25 ml); 2
(1,56 ml); 2,5 (2,00 ml).
Ainda do ponto de vista prático, é possível acondicionar, em cúpulas de hóstias de fechar a húmido, as
quantidades de pó que enchem perfeitamente os correspondentes invólucros dos tipos Secca ou Pastilla.

7.2.1.9.1.3. Preparação das hóstias


A forma farmacêutica hóstia é, normalmente, de preparação extemporânea, correspondendo a uma
exigência magistral.
A manipulação das hóstias pressupõe a preparação dos pós que devem ser acondicionados nos
respectivos invólucros. Esse assunto já foi estudado anteriormente, pelo que nos dispensamos de o
abordar de novo. Diremos apenas que preparado o pó deverá proceder-se à sua equitativa divisão pelo
número de cúpulas, de capacidade apropriada, a utilizar. A escolha das cúpulas de número exacto, isto
é, com a devida capacidade, deve fazer-se tendo em atenção o volume aparente do pó. Procurar-se-á
usar cúpulas cujo volume corresponda, sensivelmente, ao da fracção de pó a acondicionar, dando-se uma
tolerância de ± 10%. Se a diferença entre o volume aparente do pó e a capacidade dos invólucros
ultrapassar 10%, pode aumentar-se o volume do pó com substâncias inertes (lactose, por exemplo), de
modo a que a mistura já encha perfeitamente as cúpulas de capacidade imediatamente superior. De
preferência, não se usarão hóstias de grande capacidade, pois são difíceis de deglutir e só em casos
especiais (pós altamente corantes, como o azul de metileno, ou muito leves, como o óxido de
magnésio) se trabalhará com cúpulas cuja capacidade seja superior ao volume do pó (+ 10%).
O fraccionamento dos pós pêlos invólucros pode fazer-se pêlos métodos usuais de divisão dos pós em
papéis, colocando-se a quantidade exacta de pó nas cúpulas, com o cuidado indispensável para não
sujar os seus bordos. A fim de facilitar a divisão, têm sido idealizados numerosos sistemas, como as
colheres-doseadoras de FINOT (conjunto de várias colheres cuja capacidade difere entre si, permitindo a
escolha da colher adequada ao volume de pó que se pretende medir) e os compressores-doseadores. Estes
últimos são mais práticos e exactos e permitem graduar a quantidade de pó a deitar nos receptáculos
para obter as hóstias. São aparelhos que doseiam e comprimem ligeiramente o pó a acondicionar, sem
que haja necessidade de proceder à sua prévia divisão. Além disso, permitem a deposição, nas cúpulas,
do pó medido, sem que se sujem os bordos daquelas, o que nem sempre é fácil quando se trabalha por
outro processo.
Os compressores-doseadores são constituídos por um cilindro oco, no qual se desloca, suavemente,
um pistão, cuja regulação é executada pelo operador. O aparelho possui uma espécie de cremalheira que
permite fixar o pistão à altura que se pretende. Nestas circunstâncias, na parte inferior do cilindro fica
um espaço vazio que será ocupado pela fracção de pó a acondicionar, o qual sofre uma compressão
quando se faz
893

descer o pistão. Obtém-se, assim, uma espécie de pastilha, cujo peso será igual ao da fracção de pó a
introduzir nas cúpulas de cada hóstia. Na prática, aplica-se o aparelho sobre o pó colocado numa
superfície rígida, e, por tentativas, procurar-se-á obter uma «pastilha» que tenha o peso pretendido.
Depois, com a regulação correspondente a essa «pastilha», vão-se fazendo outras com o pó a
distribuir, até que todo ele fique acondicionado nas cúpulas. Existem vários modelos de
compressores-doseadores, como os de FINOT, de LENGLEN e os de DIGNE, que consideramos mais perfeitos
(Fig. 329).
Quando o fraccionamento é executado por um processo diferente há, por
vezes, necessidade de se comprimir levemente o pó dentro da cúpula, de modo a
que seja facilitado o fecho da hóstia. Essa operação leva-se a efeito com
pequenos calcadores de metal ou de madeira que apresentam superfícies de
diferentes dimensões, consoante o tamanho das cúpulas a utilizar.
É evidente que a operação de distribuição dos pós pelas cúpulas pode ser
efectuada dispondo estas sobre uma superfície plana e limpa, como uma folha de
papel estendida na mesa de trabalho. Existem, no entanto, aparelhos que
permitem realizar a operação de distribuição do pó e o fecho das hóstias, os
quais, conforme as cápsulas amiláceas são de fechar a seco ou a húmido, são
fabricados em duas modalidades que passamos a descrever.
Fig. 329. Aparelho de fechar a húmido — O modelo mais corrente é, sem dúvida, o de
Compressores-- LENGLEN, constituído
doseadores para por três placas metálicas reunidas por dobradiças e inteiramente sobreponíveis,
hóstias
mostrando a Fig. 330 A o referido aparelho aberto. As placas 2 e 3 possuem
1 — de
aberturas De vários diâmetros, correspondentes às hóstias a preparar, colocando-se na placa 2 as
cúpulas vazias com a parte oca virada para cima, após o que se aplica sobre elas a placa l
apresentando orifícios tronco-cónicos que cobrem, exactamente, os bordos das cúpulas e servem de
funil para facilitar o lançamento dos pós que as irão encher (Fig. 330 B). Feita a distribuição do pó
pelas cúpulas, comprime-se este, ligeiramente, com um calcador apropriado e levanta-se, então, a
placa 1. Feito isto, introduzem-se as cúpulas que irão formar a outra hemí-hóstia na placa 3 e
humedecem-se os bordos dessas segundas cúpulas, usando para isso um rolo de borracha molhado
em água destilada (Fig. 330 B). Justapõem-se, então, as placas 2 e 3 e comprimem-se ligeiramente
(Fig. 330 C), obtendo-se, deste modo, a colagem das hóstias, as quais são, depois, retiradas uma vez
aberto o aparelho.
894

Existem aparelhos para fechar hóstias a húmido, constituídos apenas por duas placas. Numa das
placas colocam-se nos alvéolos respectivos as cúpulas para enchimento. As faces da segunda placa
são diferentes, sendo uma lisa, onde se encontram os orifícios para introduzir as cúpulas que
funcionam como tampas. A outra face apresenta os orifícios em secção tronco-cónica, o que permite
a introdução dos pós nas cúpulas que desempenham a função de recipientes. Colocadas as cúpulas
na primeira placa, ajusta-se sobre ela a segunda placa e procede-se ao enchimento. Uma vez este
executado, levanta-se a segunda placa e nela se introduzem as cúpulas que fecharão as primeiras e
que, posteriormente, se humedecem. As placas são, então, ajustadas e comprimidas.

Fig. 330. Aparelho de fechar hóstias

Quando não haja aparelho para fechar hóstias a húmido pode improvisar-se um sistema
constituído por dois frascos com idêntica abertura, de secção circular, onde se encaixam os
invólucros. Na boca de um dos frascos coloca-se a cúpula onde se deita o pó. A outra cúpula
encaixa-se na boca do segundo frasco e humedece-se o seu bordo. Inverte-se então o segundo frasco
sobre o primeiro, tendo o cuidado de verificar se os invólucros ficaram bem ajustados, e comprime-
se ligeiramente.
Aparelho de fechar a seco — Este aparelho permite, graças a um sistema de contraplacas, que as
cúpulas que funcionam como recipiente subam e se encaixem nas que actuam como tampa, que
descem. A operação de enchimento e distribuição é semelhante à que descrevemos anteriormente.
895

7.2.1.9.1.4. Incompatibilidades

De um modo geral, a preparação dos pós para dispensar sob a forma de hóstias deve obedecer às
regras da manipulação daqueles. Os problemas que eventualmente surgem quando se preparam
cápsulas amiláceas são, por isso, casos particulares resultantes das incompatibilidades entre os pós
simples ou das dificuldades das suas associações.
É evidente, por exemplo, que as substâncias higroscópicas e deliquescentes só se poderão utilizar
sob a forma de hóstias quando adicionadas de compostos absorventes, como o carbonato e o óxido
de magnésio, o caulino, o sulfato de sódio anidro, etc. Do mesmo modo, as misturas eutéticas só
poderão ser acondicionadas em hóstias desde que se possa impedir a incompatibilidade (').
Igualmente, os compostos dotados de elevado poder de fixação de gases, como o carvão activado (Oy
COr Nr etc.), o quermes--mineral (O2), os iodetos (CO2), etc., podem perder o seu interesse
terapêutico ou sofrerem alterações mais ou menos profundas na sua composição.
As substâncias facilmente volatilizáveis não se devem empregar sob a forma de hóstias. De igual
modo, os compostos eflorescentes perdem a sua água de cristalização, embora essa perda não
prejudique, geralmente, o seu emprego sob a forma de cápsulas amiláceas.
Os compostos que reagem com o amido das cúpulas, como o iodo, não podem ser acondicionados
em hóstias.

7.2.1.9.1.5. Alterações das hóstias


Sob esta rubrica iremos considerar a alteração das cúpulas amiláceas e das próprias hóstias
quando conservadas em condições deficientes.
As cúpulas de pão ázimo, dada a sua natureza amilácea e a sua fragilidade mecânica, são
susceptíveis de se alterarem pelo calor e pela humidade. O calor dilata-as e deforma-as e a
humidade amolece-as, tornando-as impróprias para o uso.
Além das alterações assinaladas, as cúpulas podem ser invadidas por parasitas que nelas
depositam os seus ovos (moscas, ácaros, etc.). A inquinação pode provir da presença de amido de
milho cru, das caixas de cartão em que são expedidas as cúpulas,

(') Por vezes pode recorrer-se a artifícios, a fim de evitar que dois componentes do pó a dis-
pensar sob a forma de cápsulas amiláceas originem incompatibilidades diversas. Na Grã-Bretanha há
cúpulas de hóstias em que existe um septo perpendicular à superfície plana do invólucro. Este tipo de
cúpula permite adicionar, separadamente, os dois pós reactivos, sendo as hóstias obtidas designadas
por bi-palatinóides.
896

da falta de higiene dos operários que as fabricam ou das poeiras atmosféricas. É por todas estas
razões que se recomenda que as cúpulas sejam preparadas a temperaturas que dêem garantia de
estabilidade e que toda a sua manipulação decorra em ambiente higiénico. Devem ser
acondicionadas em caixas ou frascos, bem fechados, contendo algodão no fundo, e conservadas em
lugar fresco e seco.
As alterações das hóstias podem resultar de inquinações várias, da acção da humidade, da
decomposição dos pós constituintes, etc. Assim, as hóstias contendo pós opoterápicos são facilmente
invadidas e alteradas por Aleuribius farinae, Anobium paniceum, Lepisma domestica, etc.

7.2.1.9.1.6. Acondicionamento

Sendo as hóstias medicamentos tipicamente magistrais, não se põe o problema do seu


acondicionamento e conservação a longo prazo. Assim, as hóstias dispensam-se, em regra, em caixas
de cartão, tendo o cuidado de as dispor sobre uma camada de algodão em rama, para evitar a sua
deterioração pelo choque.
Quando o farmacêutico dispense uma grande quantidade de hóstias da mesma
espécie pode ter vantagem em as preparar com alguma antecedência, guardando-as até
à sua expedição. Neste caso é aconselhável acondicioná-las em frascos de vidro, de
capacidade apropriada, os quais se rolharão perfeitamente. A introdução de pequenos
sacos, contendo substâncias exsicadoras (gele de sílica, por exemplo), pode auxiliar a
conservação. . . •..'..'! ..ri

7.2.1.9.1.7. Vantagens e inconvenientes


VlC- :f'.
Como já vimos, uma das principais vantagens das hóstias consiste em evitar o sabor e,
eventualmente, o cheiro de muitos medicamentos. Os invólucros das hóstias permitem uma fácil
desagregação no estômago, o que pode também ocasionar uma rápida acção medicamentosa.
Efectivamente, a desagregação das hóstias pode dizer-se que principia na boca, onde as cúpulas são
ensalivadas durante alguns segundos (10 a 20) e daí transitam para o estômago, devendo a
deglutição ser auxiliada com a ingestão de 50-60 ml de líquido como água, chá, etc. Basta a
presença de ptialina salivar para que se observe a desagregação num período máximo de 3 minutos,
cifra que pode ainda ser inferior, consoante o volume e a temperatura do líquido que auxilia a
deglutição das hóstias.
Entre os inconvenientes desta forma farmacêutica citamos o facto de não poder ser revestida e de
só servir para administração de pós secos. Por outro lado, a sua prepa-
897

ração é do exclusivo domínio da oficina de farmácia, dado que a fragilidade das cúpulas não permite
transportes e que a mecanização da sua produção não ultrapassa o rendimento de 20 000 hóstias
diárias (').

7.2.1.9.1.8. Ensaio das hóstias '


Tratando-se de uma fórmula de preparação magistral, o controlo das hóstias na prática corrente
apenas incide sobre o peso e a apreciação da velocidade de desagregação.
Para determinar a variação de peso é costume pesar, em conjunto e individualmente, cerca de 20
hóstias. Não devem ser observadas variações de peso maiores do que 10 a 15%, respectivamente
para as hóstias de peso superior ou inferior a 0,5 g.
As cápsulas amiláceas devem desagregar-se totalmente quando lançadas em água destilada num
período de tempo inferior a 5 minutos.
Numa produção industrial de hóstias pode ainda ter interesse executar a identificação e a
dosagem dos constituintes, o que será feito por métodos adequados a cada caso.

7.2.1.9.1.9. Formulário
Apresentamos algumas fórmulas de hóstias, indicando o modo de proceder à sua preparação.

Subnitrato de bismuto
Benzonaftol............................................ ãa 0,3 g
Numa hóstia n.° 12 iguais
Trata-se de uma fórmula que é usada como anti-séptico intestinal, o que se deve à acção do
benzonaftol e também do subazotato, que impede as fermentações pútridas. Pesam-se 3,6 g de cada
uma das substâncias activas.
A mistura dos dois pós não oferece qualquer dificuldade e o seu acondicionamento pode
efectuar-se em cúpulas de capacidade correspondente ao número O, já que a densidade do sal de
bismuto é muito elevada (d - 4,9).

(') Entre as máquinas automáticas destinadas à preparação das hóstias, podemos citar as da
marca WIERSBINSKI (com as quais uma única operária pode vigiar 5 máquinas, cuja produção é de
cerca de 100000 hóstias por dia).
898

Sulfato de estricnina .................................... 0,005 g


Pó de quina .................................................. 0,150 »
Extracto de genciana .................................... 0,100 »
Lactose .......................................................... 0,500 »
Numa hóstia e mais 49 iguais
Embora a quantidade de sulfato de estricnina, por hóstia, seja bastante reduzida, o seu
quantitativo para preparar o pó é de 0,25 g, o que já não oferece qualquer dificuldade de pesagem.
Deve diluir-se a estricnina em 20 g de lactose, podendo usar-se o carmim para assegurar uma boa
dispersão. Como o extracto de genciana é mole, é conveniente misturá-lo, à parte, com os 5 g da
lactose restante e secar o pó obtido, a cerca de 50°C. O pó de quina deve também ser seco a essa
temperatura. Misturam-se, em seguida, os pós, até completa homogeneidade. Podem ser usadas
hóstias n." 1.

m .. ,

Salol
Urotropina ........................................ ãa 30 cg
Numa hóstia n." 10 •.-«•.;"•- ..-•• •'• <

Esta mistura de pós pode ficar pastosa se houver apreciável humidade residual no salol e no
hexametilenotetrazoto. Deve, por isso, proceder-se à sua secagem, separadamente, e é aconselhável
juntar um absorvente, que pode ser a lactose.

rv

Carvão vegetal .............................................. 0,325 g


F. S. A. Uma cápsula amilácea n." 10

Embora esta preparação pudesse ser acondicionada em invólucros com capacidade inferior, é
aconselhável que se utilizem cúpulas de grandes dimensões. É preferível empregar invólucros para
fechar a seco (n.° 2) mas, após preparação, devem colocar-se as hóstias contra a luz, a fim de nos
certificarmos que tanto o enchimento como a união dos bordos foram realizados em boas condições.
O enchimento pouco cuidadoso será revelado pelo aparecimento de manchas negras nos bordos e
uma união incompleta é facilmente visível.
899

Hidrato de cloral .......................................... 0,25 g


Ácido acetilsalicílico .................................... 0,25 »
F. S. A. Uma hóstia e mais 19 iguais
Quando se tritura a aspirina com o hidrato de cloral forma-se um eutético líquido. Na
determinação da quantidade de absorvente necessário para evitar a incompatibilidade, deve atender-
se também ao volume aparente dos pós obtidos, com o fim de encher o melhor possível as cúpulas das
hóstias que se escolhem. Pode usar-se, como absorvente, o caulino. Se misturarmos o hidrato de
cloral com 100 mg de caulino e o ácido acetilsalicílico com a mesma quantidade deste absorvente,
teremos uma mistura perfeitamente seca que se pode acondicionar em invólucros de hóstias de
fechar a seco de capacidade correspondente ao número 1.

VI

Citrato férrico amoniacal ............................ 0,5 g


Numa hóstia n.° 20 • .. •,
Deve usar-se citrato seco, mas se as hóstias com ele preparadas forem expostas ao ar húmido
acontece que em cerca de 7-8 dias o pó se torna pastoso. Deve, por isso, juntar-se cerca de 60 mg de
carbonato de magnésio, por hóstia, a fim de evitar o empastamento.

BIBLIOGRAFIA
CARLO, M. E. — Journëes Pharmaceutiques Françaises — Conférences de Ia Societë de Tecnhique
Phaimaceutique, pág. 227, 1952.
DENOËL, A. — Cours de Pharmacie Pratique, Lês Presses Univereitaires, Liëge, 1954.
GORIS, A. e LIOT, A. — Pharmacie Galënique, Masson, Paris, 1949. VAN OOTEOHEM, M. — J.
Pharm. Belg. 48,73, 1966.
900

7.2.1.9.2. Cápsulas gelatinosas :•. 7.2.1.9.2.1. Generalidades


l

Podemos definir cápsulas gelatinosas como preparações constituídas por invólucros gelatinosos
ocos, de forma esférica, ovóide, ovóide com uma ponta alongada ou cilíndrica, corados ou não, os
quais contêm substâncias medicamentosas sólidas, pastosas ou líquidas.
As cápsulas gelatinosas são preparadas com gelatina, adicionada ou não de substâncias
emolientes, como a glicerina ou o sorbitol, as quais lhe modificam a sua consistência.
Classificam-se em cápsulas duras, quando o invólucro é apenas constituído por gelatina, e em
cápsulas moles ou elásticas sempre que aquele é formado por gelatina adicionada de emolientes.
Foi MOTHES o criador desta forma galénica que se introduziu na prática farmacêutica em 1833 (').
As primeiras cápsulas foram preparadas por um processo rudimentar de imersão de moldes em
soluções de gelatina glicerinada. Eram, portanto, cápsulas moles, mas as dificuldades de fabrico e o
pequeno rendimento da sua produção levaram outros investigadores a tentar novos métodos para as
preparar. Assim, em 1844, VIEL sugeriu a sua obtenção por um processo de compressão das
substâncias medicamentosas líquidas entre folhas de gelatina mole, o qual sofreu diversos
aperfeiçoamentos, como os introduzidos por LAVALLÉ e THÉVENOT, em 1846, e os preconizados por
COLTON e, mais recentemente, por SCHERER, em 1933.
Em 1948 foi fabricada uma máquina (Accogel) para produção automática de cápsulas moles, a
qual permite o enchimento dos invólucros com substâncias líquidas e sólidas. Posteriormente, tem-se
difundido, na Grã-Bretanha, um processo de origem holandesa para a fabricação de cápsulas moles
sem soldadura.
Ao lado destes processos que revelam acentuada tendência para a industrialização, não
queremos deixar de referir a preparação das cápsulas moles por imersão, obtidas segundo a técnica
sugerida por LEPINOIS e MICHEL.
As cápsulas duras, que desempenham nos nossos dias um papel bem mais importante do que as
cápsulas moles, foram inventadas, segundo se supõe, por LEHUBY, em 1846, que trabalhou,
primitivamente com tapioca e, mais tarde, com geleias de carra-guem. O processo de preparação a
partir da gelatina foi patenteado por MURDOCK, em 1848.
Nos últimos anos, as cápsulas de gelatina dura conquistaram uma grande aceitação tendo
suplantado, de uma maneira geral, as drageias, a tal ponto que constituem hoje, juntamente com os
comprimidos, as formas mais correntes de administração oral de medicamentos.

(') Patente francesa 9660 de 25 de Março de 1834 pedida em nome de Molhes e Dublanc.
901

Na realidade, as cápsulas gelatinosas duras são consideradas, actualmente, uma das melhores
formas para acondicionar substâncias medicamentosas, pois protegem-nas contra a acção da luz, do
ar e da humidade. Além disso, são facilmente administradas, possibilitam em alguns casos a
associação de substâncias normalmente incompatíveis, impedem que se notem o sabor e odor
desagradáveis dos fármacos, podem ser preparadas com facilidade e grande precisão de dosagem (±
1%), ocupam pequeno volume, conservam-se bem e a sua apresentação é deveras atraente.
Por outro lado, as substâncias medicamentosas administradas sob a forma de cápsulas
gelatinosas orais são rapidamente libertadas quando em contacto com o suco gástrico (') e é possível
revesti-las com envolvimentos gastro-resistentes, conseguindo--se que a sua desagregação só se
efectue no intestino. Sob a forma de cápsulas gelatinosas é possível administrar medicamentos
destinados a proporcionarem uma acção farmacológica prolongada ou sustentada. Basta, para isso,
que, em lugar de pós ou de líquidos, sejam acondicionados no invólucro gelatinoso pequenos
grânulos que apesen-tem tempos de desagregação adequadamente escolhidos. As Spansules norte-
americanas são cápsulas deste tipo contendo grânulos revestidos a que, por vezes, se dá o nome de
microdrageias.
As cápsulas gelatinosas podem ser administradas por vias diferentes da bucal preparando-se
cápsulas para aplicação rectal, nasal e vaginal.
A fim de satisfazerem aos requisitos que delas se esperam, é necessário que as cápsulas possuam
certas qualidades que WIDMANN sintetiza do seguinte modo:
1.° —as substâncias activas devem ser estáveis;
2." — os receptáculos gelatinosos não devem sofrer alterações, mesmo em países tropicais;
3." — os compostos medicamentosos devem libertar-se rapidamente dos invólucros, não
provocando irritações nas mucosas;
4.° — os adjuvantes utilizados devem ser destituídos de qualquer actividade farmacológica
significativa;
5." — as cápsulas devem poder administrar-se sem qualquer incómodo causado pelo cheiro ou
pelo sabor dos seus componentes;
6.° — os tamanhos e formatos das cápsulas devem ser adequados à administração;
7° — a produção em escala industrial, por via mecânica, deve atender ao rigor de dosagem e
manter a constância característica das qualidades de cada medicamento.

(') W. Stepp (Med. Klin. 49, 1896, 1954) afirma que as cápsulas gelatinosas se dissolvem rapi
damente no estômago, mesmo quando haja graves alterações da secreção do suco gástrico. Entretanto,
Fantus, citado por Foote em American Pharmacy, é do parecer que algumas substâncias, como o sub-
nitrato de bismuto, quando administradas em cápsulas, podem provocar a formação de enterolitos
(cálculos intestinais). - .-.- .--
902

As cápsulas duras têm forma cilíndrica, arredondada nos extremos, e são formadas por duas
partes abertas numa extremidade, com diâmetros ligeiramente diferentes, podendo o seus extremos
abertos encaixarem um no outro. São também chamadas gelotuhos, cápsulas de encaixe ou cápsulas
operculadas , e na literatura francesa são vulgares as designações de gélules e de pulvulus.
Os invólucros para as cápsulas duras apresentam-se no comércio com variados tamanhos,
designados por um número arbitrário, tal como as cúpulas das hóstias. Ao contrário, porém, do que
acontece com estas, à medida que vai sendo mais elevado o seu número, vai diminuindo a
capacidade dos invólucros: 000, 00, O, 1 , 2 , 3, 4, 5.
As cápsulas moles, que se destinam, preferentemente, a acondicionar líquidos, podem apresentar
variadas formas e tamanhos e conter substâncias medicamentosas em quantidades variáveis, desde
0,2 g até 5 g.

7.2.1.9.2.2. Fabricação dos invólucros , ,. , .,


Os invólucros das cápsulas de gelatina dura são exclusivamente constituídos por gelatina
hidratada, enquanto que os das cápsulas moles possuem, além daquela substância, produtos
emolientes, como a glicerina, o sorbitol, a sacarose, o propilenoglicol e outros compostos similares.
Os invólucros destinados a cápsulas moles ou duras podem ainda conter outros produtos, como
corantes, agentes microbicidas, antioxidantes, etc. Sendo, porém, a gelatina o seu constituinte
fundamental é justo que nos detenhamos um pouco no método da sua obtenção, pois ele pode
esclarecer alguns pontos que interessam à manipulação galénica das cápsulas.
Actualmente distinguem-se três tipos de gelatina, a saber:
— gelatina de ossos, proveniente dos ossos desengordurados e desmineralizados que produzem
osseína, a qual é tratada por água de cal;
— gelatina extraída da pele dos bovídeos, obtida por tratamento directo com água de cal;
— gelatina extraída da pele dos suínos, a qual se consegue por tratamento com ácidos, a pH 3,5.
O tratamento pêlos ácidos, ao contrário da extracção pêlos álcalis, só altera frouxamente os
grupos amídicos das moléculas proteicas. Nestas condições, uma pele de porco tratada pêlos ácidos
origina gelatina com ponto isoeléctrico vizinho de 8. Já a gelatina obtida a partir das peles dos
bovídeos que se submeteram à acção da água de cal, sofreu apreciável decomposição dos seus
grupos amídicos e, por isso, situa-se próximo de 4,7 o seu ponto isoeléctrico. No comércio estas duas
variedades de gelatina são conhecidas por Pharmagel A (ponto isoeléctrico de 8) e por Pharmagel B
(ponto isoeléctrico de 4,7).
903

A gelatina apresenta, praticamente, a mesma composição em ácidos animados que o colagénio. O seu
peso molecular situa-se ente 40000 e 110000, em virtude do que pode originar geleias por arrefecimento
das suas soluções feitas a quente, em concentração superior a 1-2%.
A qualidade da gelatina destinada à fabricação das cápsulas deve ser controlada pêlos fabricantes
que, geralmente, consideram maior número de exigências do que o especificado nas monografias das
farmacopeias. Assim, os ensaios efectuados consistem em várias determinações químicas e
bacteriológicas que permitem estabelecer o grau de pureza da gelatina, bem como outras, de natureza
física, como a determinação da viscosidade e do índice de BLOOM. Este último é um valor empírico
relacionado com a estrutura e a rigidez da gelatina e dá uma ideia da ordem de grandeza do seu peso
molecular. Um interessante artigo de KUHN aborda alguns destes problemas e indica a principal
literatura a consultar a tal respeito.
Efectivamente, das características da gelatina usada na fabricação dependem, em larga medida, as
qualidades das cápsulas, como a uniformidade da espessura das respectivas paredes, a qual está, em
larga medida, dependente da viscosidade e do índice de BLOOM do produto utilizado ('). Assim, importa
que os invólucros sejam facilmente digeríveis; que não percam ou absorvam mais do que uma quantidade
mínima de água; que não se deixem atravessar pela humidade e que em presença desta não modifiquem,
apreciavelmente, as suas propriedades mecânicas (elasticidade, dureza, etc.); que sejam, tanto quanto
possível, impermeáveis ao anidrido carbónico e ao oxigénio; que se não alterem com as variações da
temperatura de armazenagem; que eliminem as radiações luminosas capazes de provocarem a alteração
dos princípios activos, etc.
Além disso, para que haja eficiência na administração de uma cápsula oral, rectal ou vaginal
torna-se necessário que a gelatina constituinte do seu invólucro sofra rápida desagregação em
presença dos líquidos fisiológicos com que é posta em contacto. Segundo CZETSCH-LINDENWALD, as
cápsulas de gelatina pura libertam o seu conteúdo após cerca de cinco minutos de imersão em água,
seja qual for a natureza dos princípios medicamentosos. É de esperar que o período de desagregação
possa variar consoante os adjuvantes que se juntarem à gelatina, sendo por isso avisado esperar-se
que a libertação do conteúdo possa ocorrer até ao limite máximo de trinta minutos. Assim, observa-
se, por exemplo, incremento no tempo de desagregação de cápsulas coradas opacas, de cor vermelha
ou negra, em relação às cápsulas transparentes, incolores ou coradas.
O ar e, particularmente, os seus constituintes — o oxigénio e o aniírido carbónico —, o vapor de
água, o calor e a luz são factores que constituem o meio ambiente

(') Uma gelatina só é considerada própria para ser usada na fabricação de cápsulas se a respec-
tiva solução a 6,66% tiver uma viscosidade compreendida entre 42-48 milipoise e um índice de
BLOOM pelo menos igual a 25Ü.
904

natural em que todos os medicamentos se acham inseridos e que concorrem, em maior ou menor
grau, conforme a natureza dos mesmos, para a sua inactivação. Vejamos, então, como as cápsulas
gelatinosas se comportam perante os diversos factores ambientais susceptíveis de alterarem os
fármacos.
A quantidade de água residual dos invólucros das cápsulas duras oscila entre 14-16%, sendo
desejável que estas não absorvam água do meio ambiente, o que provoca o seu amolecimento, nem
percam a sua água residual, o que, a verificar-se, ocasiona perda de elasticidade e as torna
quebradiças. O comportamento destes receptáculos em diferentes condições de humidade
atmosférica relativa foi, por isso mesmo, objecto de cuidadosas investigações, tendo as experiências
realizadas permitido concluir que as cápsulas de gelatina dura, mesmo não embaladas, são
relativamente insensíveis às variações de humidade nas condições normais. Daqui se infere,
portanto, que elas são capazes de proteger as substâncias nelas acondicionadas contra alterações
provocadas pela humidade.
Para se verificar a permeabilidade das cápsulas ao oxigénio enchem-se os invólucros com
substâncias ávidas deste gás (catalisador BTS, por exemplo), observando-se o aumento de peso das
cápsulas após uma exposição de 20 horas. De um modo geral, apurou-se destes ensaios que os
invólucros de gelatina dura impediam ou dificultavam, apreciavelmente, a penetração do oxigénio no
interior da cápsula, mesmo quando se tratava de cápsulas de encaixe em que não havia verdadeira
colagem dos hemi--receptáculos.
Por outro lado, a permeabilidade ao anidrido carbónico pode ser avaliada expondo cápsulas
cheias com óxido de cálcio a uma atmosfera daquele gás e determinando, ao fim de certo tempo, o
aumento de peso por elas sofrido em tais condições. Ensaios feitos variando o tempo de exposição e
a concentração de anidrido carbónico na atmosfera confinante com as cápsulas provaram que as
paredes destas são bastante impermeáveis àquele gás. No caso de cápsulas bem fechadas, verificou-
se que a velocidade de absorção de CO2 pela substância nelas acondicionada é apenas de cerca de
1/3 a 1/5 da que é observada quando ela está em contacto directo com o referido gás.
Quanto às variações da temperatura já os invólucros gelatinosos apresentam notória
sensibilidade. Temperaturas de 35-40°C, durante algum tempo, podem provocar aumento da
fragilidade das paredes das cápsulas, que se tornam quebradiças. Este fenómeno depende, também,
do grau de humidade relativa, diminuindo com o aumento deste. De um modo geral, pode considerar-
se como temperatura de conservação óptima o intervalo térmico compreendido entre 10 e 25°C.
A luz também desempenha um importante papel na alteração de muitos produtos
medicamentosos, pelo que houve necessidade de determinar qual o grau de protecção exercido pelas
paredes das cápsulas gelatinosas sobre os fármacos nelas acondicionados em relação aos efeitos
nocivos das radiações.
No entanto, os ensaios realizados nesse sentido têm-se limitado à simples detecção visual das
alterações sofridas por substâncias facilmente oxidáveis, como o ácido
905

natural em que todos os medicamentos se acham inseridos e que concorrem, em maior ou menor
grau, conforme a natureza dos mesmos, para a sua inactivação. Vejamos, então, como as cápsulas
gelatinosas se comportam perante os diversos factores ambientais susceptíveis de alterarem os
fármacos.
A quantidade de água residual dos invólucros das cápsulas duras oscila entre 14-16%, sendo
desejável que estas não absorvam água do meio ambiente, o que provoca o seu amolecimento, nem
percam a sua água residual, o que, a verificar-se, ocasiona perda de elasticidade e as torna
quebradiças. O comportamento destes receptáculos em diferentes condições de humidade
atmosférica relativa foi, por isso mesmo, objecto de cuidadosas investigações, tendo as experiências
realizadas permitido concluir que as cápsulas de gelatina dura, mesmo não embaladas, são
relativamente insensíveis às variações de humidade nas condições normais. Daqui se infere,
portanto, que elas são capazes de proteger as substâncias nelas acondicionadas contra alterações
provocadas pela humidade.
Para se verificar a permeabilidade das cápsulas ao oxigénio enchem-se os invólucros com
substâncias ávidas deste gás (catalisador BTS, por exemplo), observando-se o aumento de peso das
cápsulas após uma exposição de 20 horas. De um modo geral, apurou-se destes ensaios que os
invólucros de gelatina dura impediam ou dificultavam, apreciavelmente, a penetração do oxigénio no
interior da cápsula, mesmo quando se tratava de cápsulas de encaixe em que não havia verdadeira
colagem dos hemi--receptáculos.
Por outro lado, a permeabilidade ao anidrido carbónico pode ser avaliada expondo cápsulas
cheias com óxido de cálcio a uma atmosfera daquele gás e determinando, ao fim de certo tempo, o
aumento de peso por elas sofrido em tais condições. Ensaios feitos variando o tempo de exposição e
a concentração de anidrido carbónico na atmosfera confinante com as cápsulas provaram que as
paredes destas são bastante impermeáveis àquele gás. No caso de cápsulas bem fechadas, verificou-
se que a velocidade de absorção de CO2 pela substância nelas acondicionada é apenas de cerca de
1/3 a 1/5 da que é observada quando ela está em contacto directo com o referido gás.
Quanto às variações da temperatura já os invólucros gelatinosos apresentam notória
sensibilidade. Temperaturas de 35-40°C, durante algum tempo, podem provocar aumento da
fragilidade das paredes das cápsulas, que se tornam quebradiças. Este fenómeno depende, também,
do grau de humidade relativa, diminuindo com o aumento deste. De um modo geral, pode considerar-
se como temperatura de conservação óptima o intervalo térmico compreendido entre 10 e 25°C.
A luz também desempenha um importante papel na alteração de muitos produtos
medicamentosos, pelo que houve necessidade de determinar qual o grau de protecção exercido pelas
paredes das cápsulas gelatinosas sobre os fármacos nelas acondicionados em relação aos efeitos
nocivos das radiações.
No entanto, os ensaios realizados nesse sentido têm-se limitado à simples detecção visual das
alterações sofridas por substâncias facilmente oxidáveis, como o ácido
906

ascórbico, ou da descoloração experimentada por tiras de papel de filtro embebidas em soluções de


corantes, após exposição das cápsulas em que foram encerradas à acção directa da luz solar durante
períodos variáveis.
Assim, as experiências feitas com ácido ascórbico encerrado em cápsulas verdes (opacas),
amarelas (opacas) e vermelhas (opacas e transparentes) mostraram que esta substância não sofre
qualquer transformação quando submetida à luz solar em tais condições, ao passo que se for
acondicionada em cápsulas transparentes castanhas ou azul-violáceas adquire uma ligeira coloração
amarelada, prova de ter sido parcialmente oxidada. Sujeito às mesmas condições de radiação, o
ácido ascórbico acondicionado em cápsulas transparentes e não coradas sofre profunda alteração,
revelada pela coloração acastanhada que apresenta no fim do ensaio.
No que diz respeito aos corantes, as experiências realizadas também foram concludentes, pois
demonstram que as cápsulas opacas asseguram uma melhor protecção que as cápsulas
transparentes, sendo de realçar que essa protecção é potencializada pela presença de pigmentos
incorporados na própria cápsula. É de notar, ainda, que as cápsulas coradas de negro são as que
melhor protegem os corantes nelas encerrados da descoloração provocada pela exposição à luz solar,
seguindo-se, em ordem de eficiência, aquelas que se apresentam coradas de vermelho.
Considerando que as radiações ultravioleta, pela sua energia, são as que provocam maior grau
de alteração nos fármacos, estudámos a protecção oferecida por cápsulas gelatinosas à menadiona
nelas acondicionada e submetida a uma radiação de 2600 Â, determinando, ainda, eventuais
modificações induzidas nas próprias cápsulas por essa radiação. Os resultados obtidos mostram que,
no caso desta substância, as cápsulas exercem já um acentuado efeito protector contra a radiação
ensaiada, sendo esse efeito aumentado pela presença de corantes incorporados nas próprias
cápsulas, obtendo-se o máximo de protecção com um corante castanho.
No que diz respeito à acção das radiações ultravioleta sobre as paredes das cápsulas, verificou-
se que os tempos de desagregação não se alteram quando a exposição é inferior a l hora e 15
minutos, mas que a cedência da substância acondicionada nas cápsulas (corante vermelho n.° 1)
diminui linearmente, dentro de certos limites, em função do tempo de exposição às radiações.
Portanto, a fabricação de cápsulas gelatinosas coradas justifica-se plenamente, pois, como se
conclui do que atrás se refere, os pigmentos que entram na sua constituição desempenham uma
função bem mais importante do que um simples atractivo visual. Tais corantes podem ser misturados
com a gelatina, antes do fabrico dos receptáculos, ou podem ser aplicados sobre os mesmos, já feitos
mas ainda vazios, descrevendo Tuc-KERMAN e MARTIN (/. Nat. Pharm. Assoe., 2, 60, 1955, citados em
Husas Pharmaceu-tical Dispensing, 1958) um método para corar cápsulas vazias utilizando corantes
dissolvidos em álcool de 70°. A firma Parke Davis emprega nas suas cápsulas cinco corantes
fundamentais, que são o amarelo de tartrazina, o amarante, a eritrosina, o
907

carmim índigo e o negro brilhante. Por seu turno, a casa Eli Lilly utiliza os mesmos corantes e ainda o
carvão vegetal.
Como referimos atrás, as cápsulas gelatinosas podem ser transparentes ou opacas, obtendo-se estas
últimas por adição de óxido de titânio à massa gelatinosa utilizada na sua fabricação. As cores dos
receptáculos opacos são mais brilhantes, devendo-se isto ao facto de se terem formado verdadeiras lacas
de corantes hidrossolúveis que precipitaram por acção do óxido de titânio no estado de sais insolúveis
sobre o suporte gelatinoso.

7.2.1.9.2.3. Cápsulas duras •• • . ' ,,, . •>. ,••


Como dissemos, as cápsulas duras são constituídas por duas partes cilíndricas, arredondadas nos
extremos, apresentando diâmetro e comprimento diferentes. A parte mais comprida serve para
acondicionar as substâncias medicamentosas e a outra actua como uma espécie de tampa na qual se
encaixa a primeira. O ajustamento das duas metades consegue-se por simples acção mecânica, podendo
proceder-se à colagem das duas porções, mediante o emprego de soluções de gelatina, goma arábica,
colódio, etc.
A preparação dos invólucros é inteiramente do domínio industrial, sendo as firmas Parke Davis e Eli
Lilly os seus principais produtores. Fundamentalmente, a preparação consegue-se por imersão de
punções cilíndricos, arredondados nos extremos, em soluções aquosas de gelatina, aquecidas a 57°C, as
quais contêm vários adjuvants não emolientes (anti-sépticos, corantes, anti-oxidantes, etc.). Os punções
são, geralmente, de bronze e parece ser importante a existência de pequena quantidade de magnésio na
sua composição. O seu diâmetro condiciona a capacidade da cápsula obtida. Usam-se placas com 200 a
500 punções que se mergulham, simultaneamente, na mesma solução gelatinosa. Após o recobrimento
com a gelatina, retira-se, mecanicamente, o excesso desta, compreendendo-se que a altura do corte influa,
também, na capacidade dos receptáculos obtidos. É de notar que a produção dos invólucros é hoje feita
em larguíssima escala, produzindo a firma Parke Davis cerca de 20 milhões de unidades diárias.
Algumas máquinas têm uma série de barras nas quais estão fixados os punções. Em regra, cada barra
possui trinta punções e existem setecentas e cinquenta barras por máquina. O ciclo de produção é de
40 minutos, o que leva ao rendimento horário de 25 000 receptáculos.
NORRIS descreve pormenorizadamente a preparação das cápsulas duras, que se encontra também
sintetizada num artigo de EQUIPART.
Os receptáculos para cápsulas duras são fabricados com diversas capacidades, designadas por
números. Pode relacionar-se o número do receptáculo com o peso de determinado pó que é capaz de
acondicionar, mas, como se compreende, este processo está sujeito a erros pois depende, para a mesma
substância, da tenuidade e arrumo das partículas do pó, e, para diferentes compostos, da sua densidade.
908

A Tabela CVI indica os pesos médios de vários pós susceptíveis de serem acondicionados em
invólucros.

Tabela CVI. Quantidades de pó susceptíveis de serem acondicionadas em receptáculos


gelatinosos de diversa capacidade
Número dos receptáculos gelatinosos Peso médio do pó em g
Produto em pó 000 00 0 / 2 3 4 5
Acetanilida 0,97 0,65 0,45 0,39 0,26 0,19 0,13 0,06
Ácido acetilsalicílico 0,97 0,70 0,45 0,32 0,26 0,19 0,13 0,06
Acido dietilbarbitúrico 1,00 0,70 0,51 0,36 0,28 0,21 0,16 0,11
Aloés 0,97 0,65 0,45 0,32 0,26 0,19 0,13 0,06
Concentrado de vit. D2 1,19 0,87 0,60 0,43 0,33 0,25 0,19 0,12
Fenacetina 0,94 0,61 0,44 0,34 0,26 0,19 0,14 0,09
Hidrato de piperazina 0,94 0,61 0,40 0,29 0,25 0,19 0,15 0,11
Meprobamato 0,64 0,45 0,33 0,24 0,18 0,13 0,11 0,07
Pó de Dower 1,16 0,78 0,56 0,39 0,26 0,19 0,13 0,06
Pó de ruibarbo 1,16 0,78 0,52 0,39 0,26 0,19 0,13 0,06
Subnitrato de bismuto 1,94 1,30 0,90 0,65 0,52 0,39 0,26 0,13
Sulfato de quinina 0,77 0,52 0,39 0,26 0,13 0,13 0,09 0,05
Sulfatiazol 0,93 0,58 0,37 0,27 0,21 0,16 0,11 0,08

Mais exacto é, sem dúvida, indicar as capacidades dos invólucros, procedendo-se ao


acondicionamento dos pós em função do seu volume aparente. A Tabela CVI-A indica as
capacidades dos diversos receptáculos utilizados em medicina humana.

Tabela CVI-A. Capacidade dos receptáculos gelatinosos


N." dos receptáculos Volume (ml)
gelatinosos d(cm) l(cm) Parke Davis Eli Lilly
000 0,93 23.2 1,37 1,42
00 0,80 2fã 0,95 0,92
0 0,73 1,85 0,68 0,70
1 0,66 1,«7 i .- 0,50 0,50
2 0,60 1,54 0,37 0,40
3 0,56 1,36 0,30 0,37
4 0,51 1,25 0,21 0,21
5 0,47 0,93 0,13 0,12

d = diâmetro do receptáculo; l — comprimento do receptáculo


909

Para medicina veterinária (animais de grande corpulência) existem ainda outros tipos de
cápsulas, que se distinguem pêlos seguintes números: n." 10 (correspondente a ± 30 g), n.° 11 (± 15
g) e n.» 12 (± 7,5 g).
Encontram-se à disposição do farmacêutico invólucros para cápsulas correspondentes aos números
que indicámos (000, 00, O, l, 2, 3, 4, e 5), quer transparentes, quer opacas, podendo ainda ser ou não
coradas. A Fig. 331 representa as dimensões comparadas das várias cápsulas duras (Parke-Davis).
Capacidade em mililitros
1,37 0,95 0,68 0,50 037 0,30 0,21 0.13 ' '

000 00 O l 2 3
4 S
Número da cápsula

Fig. 331. Cápsulas


duras A — Esquema 8
— Cápsulas coradas
910

Algumas vezes adopta-se o uso de invólucros cujas metades são diferentemente coradas, o que apenas
apresenta o interesse de se tornarem mais atractivos os medicamentos ou de se identificar determinada
fórmula farmacêutica.
A preparação das cápsulas duras consiste, fundamentalmente, no seu enchimento, já que os
respectivos invólucros são adquiridos no comércio. É evidente que, para uma pequena preparação,
bastaria escolher os invólucros de capacidade adequada ao volume ocupado pelo peso de pó e enchê-los,
com auxílio de funis e calcadores, ou por meio de compressores-doseadores. Se este método pode servir
para uma pequena produção, já não é avisado proceder-se com tal simplicidade quando se pretendam
fabricar cápsulas em escala industrial ou semi-industrial. De facto, só por acaso a quantidade de pó
prescrita numa formulação encherá exactamente um invólucro gelatinoso de dado número. Pôr outro lado,
sendo habitualmente volumétrico o processo de enchimento das cápsulas, impõe-se que estas fiquem
perfeitamente cheias, pois de modo diverso haveria erros posológicos. A esta circunstância acresce a da
indústria preparar cápsulas cujo momento de utilização só muito dificilmente se pode prever, não sendo
aconselhável a existência de uma camada de ar sobre os pós susceptíveis de se alterarem por acção dos
componentes desse ar. Nessas circunstâncias, é necessário completar, com pó inerte, o volume de pó a
acondicionar num dado receptáculo gelatinoso, caso aquele volume seja inferior a 90% da capacidade do
receptáculo.
Geralmente, o processo de enchimento industrial baseia-se numa distribuição volumétrica, em que o
pó cai, pela acção da gravidade, sobre um hemi-invólucro aberto que funciona como receptáculo.
Compreende-se que este escoamento do pó, do recipiente para a cápsula vazia, possa apresentar
dificuldades de vária ordem, principalmente devidas às forças de atracção entre as partículas que
constituem o pó.
A adição, aos pós, de substâncias ditas lubrificantes, pode diminuir as forças de fricção entre as
partículas, facilitando o seu escoamento e o enchimento dos invólucros gelatinosos. Já vimos que o ângulo
de repouso de um pó condiciona a facilidade de escoamento e que a adição de lubrificantes pode diminuir
o seu valor. Essas substâncias são compostas por pequenas partículas que, graças a forças de atracção,
são adsorvidas na superfície das partículas do pó. A Fig. 332 esquematiza o comportamento das partículas
de um pó, antes e depois da adição de um lubrificante.
A quantidade de lubrificante deve ser suficiente para recobrir completamente todas as partículas de
pó. No entanto, uma quantidade demasiada não é adsorvida, indo aglomerar-se e influenciar,
desfavoravelmente, o escoamento. Dada a circunstância do elevado estado de divisão do lubrificante, é,
em regra, suficiente uma pequeníssima quantidade para impedir as forças atractivas entre as partículas do
pó.
Já vimos atrás que o óxido de magnésio, dividido em partículas de 0,05 \i (óxido de magnésio leve),
auxilia o escoamento do amido quando lhe é adicionado numa concentração de 0,5%. Também o
estearato de magnésio facilita, largamente, o escoamento dos pós, quando adicionado numa taxa de 1%.
O mesmo se diz em relação à sílica coloidal (partículas entre 0,01 e 0,04 u,), a qual, adicionada numa
percentagem
911

de 0,05 a 0,5%, favorece a operação. No comércio encontra-se este gele de sílica sob o nome de
Aerosil ou de Levilite, designações que correspondem a marcas registadas por diferentes
fabricantes, respectivamente de sílica anidra e hidratada.

Flg. 332. Partículas de um pó antes


e depois da lubrificação
I — Antes da ao (-* forças de
atracção) ação~t t>
partículas de
lubificação lubrificante)

O talco, que se apresenta constituído por partículas lamelares, não facilita o escoamento dos pós,
embora seja um bom lubrificante de granulados. Esta aparente anomalia parece estar relacionada
com o diâmetro médio das partículas do talco que, em geral, não são muito pequenas, e, por isso, só
pode funcionar como lubrificante deslizante quando se íUpõe entre partículas de tamanhos elevados,
como no caso dos granulados.
Mais de 90% da totalidade das cápsulas de encaixe produzidas em todo o mundo são cheias por
meio de aparelhos, muitas vezes extremamente simples, mas em todo o -caso possuindo sistemas
mecanizados.
Segundo CZETSCH-LINDENWALD a dosificação correcta das cápsulas duras depende de três factores
fundamentais:
1) Escolha de invólucros de capacidade exacta;
2) Método de enchimento; :
'"'..-,
3) Produto a encapsular. ''"*" '" •-"•-"'-.'

1) Escolha de invólucros de capacidade exacta -' ' '• *!


Normalmente, escolhida a capacidade do invólucro, o pó a acondicionar é adicionado de pós
inertes que funcionam como düuenles, os quais contêm substâncias lubrificantes. A diluição é
executada de tal forma que o volume aparente do pó permita
912

encher, perfeitamente, os receptáculos escolhidos. A mistura de lactose com 1% de estearato de magnésio


é dos diluentes mais utilizados.
A escolha da cápsula a utilizar pode fazer-se avaliando o volume aparente de um dado peso de pó a
acondicionar, por exemplo, em 10 cápsulas. Para esta medição pode usar-se uma proveta de pequeno
diâmetro, procedendo-se como foi indicado no artigo Pós (ver pág. 630). Em função do volume aparente e
do peso do pó é fácil calcular a sua densidade aparente, que se exprime em g por ml.
No nomograma representado (Fig. 333) indicam-se, em ordenadas, as capacidades dos diversos
tamanhos de cápsulas e os seus respectivos números. Em abcissas, mencionam-se os pesos de pó, em
g, por cápsula e na linha superior, paralela ao eixo das abcissas, indicam-se as densidades
aparentes dos pós.

0,1 02 0,3 OA 0.5 OS 0.7 0,8


peso em g
Flg. 333. Nomograma para enchimento de cápsulas

Suponhamos que a quantidade de pó prevista por cápsula é de 0,65 g e que a densidade aparente
desse pó é de 1. Traça-se uma linha perpendicular desde a abcissa até que encontre a linha
correspondente à densidade aparente de 1. Então procura-se a intercepção desse ponto com o eixo
das ordenadas, traçando-se uma paralela à abcissa. No caso presente, a capacidade do invólucro
seria de 0,65 ml e corresponderia à das cápsulas n." 0.
Se não se quiser proceder pelo processo do nomograma pode efectuar-se o enchi
mento por simples medida do volume aparente dos pós, o qual se relaciona com a
capacidade dos invólucros. . . » , . . .,„>•
913

2) Métodos de enchimento • \
- •.;•»•_!»«« n.
O método de enchimento das cápsulas é muito variável, podendo ser manual, automático ou semi-
automático. Se atendermos, exclusivamente, à precisão dos resultados, não há dúvida que o melhor
método de enchimento manual consiste, como diz BROJO, em «dividir a totalidade do pó em tantas
porções iguais quantas as cápsulas a preparar, pesando cada dose em seu papel e lançando depois o
conteúdo em cada receptáculo». Na prática podem dispor-se os hemi-recepuSculos numa placa de
madeira, plástico, cartão, metal, etc., com as extremidades abertas voltadas para cima. O pó é,
seguidamente, lançado por meio de um funil, o que diminui as perdas e constitui um processo
relativamente higiénico de enchimento.
A técnica descrita é bastante morosa, substituindo-se, algumas vezes, por um processo que consiste
em mergulhar verticalmente os hemi-receptáculos gelatinosos, pela sua extremidade aberta, no pó
disposto em forma de bloco de superfície rectangular e com uma altura de cerca de seis milímetros
sobre uma superfície plana e rígida. Se o movimento com os receptáculos for acompanhado por uma
ligeira pressão e rotação, cada invólucro fica suficientemente bem cheio (Punching method). Este
processo pode tornar-se rigoroso desde que o bloco de pó seja dividido em tantas partes quantas as
cápsulas a preparar, procedendo-se então ao enchimento como foi referido anteriormente (B/ocking
and dividíng method). Se quisermos dispensar esta operação prévia de fraccionamento do pó, toma-
se necessário que os invólucros fiquem completamente cheios com a prensagem executada pelo
operador. A operação de enchimento por este processo pode realizar-se em menos de um terço do
tempo necessário para o enchimento com o pó dividido. Um operador experimentado consegue um
apreciável grau de precisão na dosagem, trabalhando por este método (desvio padrão relativo de
cerca de 2,6%).
A regularidade de enchimento pode ser apreciada pesando individualmente as cápsulas cheias e
usando, como tara, os invólucros vazios. Alguns pós, como o sali-cilato de sódio, criam dificuldades
ao enchimento manual, já que as suas partículas se carregam de electricidade estática e tendem a
aderir aos invólucros de gelatina. Este inconveniente remedeia-se triturando o salicilato em
almofariz com umas gotas de parafina líquida. Outras vezes basta humedecer os pós com álcool
(uma a duas gotas por cápsula) para que se facilite o enchimento pelo processo de prensagem
descrito.
A indústria farmacêutica tem ao seu dispor vários tipos de máquinas de enchimento que se
baseiam num dos seguintes princípios:
— O pó granulado é lançado no invólucro da cápsula, procedendo-se ao seu nivelamento com
uma superfície rasante (máquinas do tipo Parke Davis);
— O pó é lançado nos invólucros mediante a força dada por um parafuso sem-fim (máquinas do
tipo Hofliger-Karg);
— O pó é lançado por meio de compressores-doseadores (máquinas do tipo Zanasí).
914

Um sistema semi-industrial dos mais usados entre nós é constituído por um conjunto de placas e
contraplacas, funcionando como os aparelhos de fechar hóstias. A Fig. 334 representa aparelhos
deste tipo. Os processos de enchimento com aparelhos manuais dão menores desvios padrão (1,76%
com o aparelho de Féton, segundo CZETSCH-LINDENWAL) do que os métodos inteiramente automatizados
(1,9

Flg. 334. Máquinas de encher cápsulas


I — Transmoto, tipo R. 324.
II — Máquina de enchimento, tipo 8, de E. Lilly ou de Parke Davis, largamente
difundida nos E.U.A. e Brasil

É grande a variedade de aparelhagem de que actualmente dispõe a indústria farmacêutica para o


enchimento de cápsulas. Entre os métodos mais perfeitos são de citar os que, automaticamente,
separam os invólucros antes do enchimento, proporcionam o acondicionamento dos pós e fecham as
cápsulas. Muitos destes aparelhos permitem cintar as próprias cápsulas com uma película de
gelatina, o que evita a libertação do seu conteúdo. Dispositivos mecânicos procedem à limpeza
exterior das cápsulas cheias e sistemas electrónicos permitem a sua contagem.
Entre as máquinas mais difundidas para o enchimento e fecho de cápsulas citamos as da marca
Hôfliger-Karg (Fig. 335) que chegam a encher 400 cápsulas por minuto e as Colton, com uma
produção de vinte a cem mil unidades diárias. A firma Nigris de Milão fabrica uma máquina (modelo
NZ 58) que pode dar rendimentos da ordem de quinze mil cápsulas por dia. Tal produção é, também,
facilmente conseguida com máquinas Omega de proveniência italiana, que podem funcionar em
ambiente asséptico com humidade relativa controlada.
Em Portugal, a firma F. R. Baptista (Lisboa) fabrica um modelo de máquina de enchimento
simultâneo de 50 cápsulas.
915

Flg. 335. Máquina completamenle automática para encher e fechar capsulas de


gelatina dura (Hofliger — mod. QKF 400ST)
I — Aspecto geral
II — Esquema de funcionamento: 1 — funil de carga; 2 — compressores giratórios; 3
— agitador; 4 — funil de distribuição em forma de rim

3) Produto a encapsular , ,.,....<.•


O produto a encapsular influencia, notavelmente, o enchimento. Se há pós que, pela sua elevada
densidade e existência de diminutas forças de atracção entre as partículas, podem encher com
facilidade os invólucros gelatinosos, acontece que outros, que não apresentam estas propriedades,
escoam irregular e morosamente para esses mesmos invólucros. Assim, os materiais húmidos, os
cristais aciculares, os pós em que o volume aparente difere muito do volume real (amido, sulfato de
bário) correm dificilmente, sendo inexacto o processo de enchimento. Já os pós constituídos por
partículas esféricas ou cúbicas não oferecem obstáculo ao enchimento dos invólucros gelatinosos.
Na prática, consideram-se como escoando sem dificuldade todos os pós que fluem livremente de
um funil cujo tubo tenha um calibre de 4 mm de diâmetro interno (este diâmetro corresponde ao
diâmetro interno das cápsulas n.o 5). Estão nestas circunstâncias os cristais de cloreto de sódio, a
fenacetina e o açúcar. Entre os produtos que, nas condições referidas, correm irregularmente,
citamos os amidos, o bicarbonato de sódio e o cloridrato de quinina.
Com a finalidade de melhorar o escoamento dos pós já vimos que se pode adicionar-lhes
lubrificantes. Do mesmo modo, é, por vezes, necessário proceder à sua granulação (ver Granulados e
Comprimidos), o que provoca a formação de pequenos
916

grânulos, cujas forças de inter-atracção são diminuídas, os quais, por serem mais densos do que o pó
correspondente, têm maior tendência para fluírem livremente. Utilizam-se, assim, granulados em que cada
partícula tem cerca de 0,3 a 0,7 mm de diâmetro. Em regra, usa-se o álcool como líquido de
humedecimento, podendo juntar-se substâncias aglutinantes, como a lactose ou os polietilenoglicóis.
Emprega-se, muitas vezes, uma solução alcoólica de carbowax 4000 a 0,5-1%, granulando-se por tamis
com abertura de malha de 0,5-0,7 mm. O granulado seca-se a 35-40°C e adiciona-se, então, o lubrifi-
cante (estearato de magnésio a 1%, talco a 2-3%, etc.).
LIST e MÜLLER, baseados no trabalho de GOLD, DUVALL e PALERMO, construíram um aparelho registador
para medir o escoamento das misturas destinadas a serem metidas em cápsulas. Graças a um método
utilizando a medida da cotangente do chamado «ângulo de escoamento», é possível determinar em
curto espaço de tempo e com uma reprodutividade satisfatória a quantidade de uma substância
lubrificante que melhor se ajuste ao produto a acondicionar em cápsulas gelatinosas.
As cápsulas duras contêm, preferentemente, compostos sólidos. Entretanto, podem acondicionar-
se nos invólucros gelatinosos substâncias pastosas ou líquidas. No caso do medicamento ser pastoso é
conveniente preparar com ele uma massa pilular que se rola de modo a formar magdaleão (ver
Pílulas) de diâmetro ligeiramente menor que o dos invólucros escolhidos. O magdaleão é dividido em
tantos segmentos quantas as cápsulas a preparar, acondicionando-se, em cada receptáculo, um dos
segmentos obtidos.
Os medicamentos líquidos serão introduzidos nos receptáculos por meio de pipetas ou de buretas.
Após a distribuição é necessário colar os bordos das hemi-cápsulas, a fim de evitar o extravasamento
do líquido. Para isso humedecem-se os bordos com água e roda-se a hemi-cápsula, que serve de
tampa, de um quarto de volta.
A colagem dos bordos das cápsulas é sempre muito conveniente, mesmo que o medicamento a
acondicionar não seja líquido. Na prática dispensa-se esta operação quando os pós não apresentam
elevada tendência para saírem dos receptáculos. Ela é, porém, aconselhável sempre que o pó a
acondicionar tenha mau cheiro ou mau sabor, como sucede com o cloranfenicol. Ainda para evitar a
presença de pó à superfície externa das cápsulas é também importante limpá-las depois do fecho. A
maneira mais fácil de executar esta operação é rolá-las sentre dois panos limpos, humedecidos com
álcool. Nestas circunstâncias, as cápsulas perdem os vestígios de produtos que tenham aderido à sua
superfície exterior e readquirem o brilho original dos seus invólucros.
As cápsulas de gelatina clássicas compõem-se, como se sabe, de duas partes cujas paredes são
absolutamente lisas e encaixam uma na outra. Dadas as suas características e ainda porque é
necessária uma diferença de diâmetro, ainda que mínima, entre as duas metades, para que seja
possível o seu encaixe, é evidente que tais cápsulas, mercê disso, correm o risco de se abrirem em
virtude de acções mecânicas a que estão submetidas durante o seu manuseamento.
917

Para procurar suprimir este inconveniente, existe no mercado um tipo de cápsulas de gelatina
dura (') cujos hemi-receptáculos, graças à existência de ranhuras e saliências, só se adaptam quando
sobre eles é exercida uma certa pressão (Fig. 336). Esta característica faz com que estas cápsulas
possuam forças de separação bastante elevadas, o que explica a sua resistência à abertura e assegura
um acondicionamento perfeito das substâncias nelas encerradas.

£
Fig. 336. Cápsulas duras Snap-fit (Parke-Davis) ^r

As vantagens de tal tipo de cápsulas podem resumir-se assim: resistência à abertura durante o
transporte e contagem em aparelhos automáticos, que lhes imprimem acentuadas sacudidelas;
possibilidade de serem submetidas a tratamentos para se tornarem gastro-resistentes sem o perigo de
se abrirem; facilidade de acondicionamento automático em alvéolos, visto apresentarem dimensões
constantes.

7.2.1.9.2.4. Cápsulas moles


As cápsulas moles ou elásticas são constituídas por invólucros de gelatina em cuja massa se
incluíram substâncias emolientes, como a glicerina, o propilenoglicol, o sor-bitol, os
polietilenoglicóis, etc.
(') Estas cápsulas estão comercializadas pelas casas Eli Lilly e Parke Davis sob as designações,
respectivamente, de Lock-cap e Snap-fií. Mais recentemente foi lançado outro tipo de cápsulas, mais
seguras que as Snap-fit ou Lock-cap que apresentam bordos cónicos e a que se deu o nome de Coni--
Snap.
918

Distinguem-se quatro tipos de cápsulas moles que passamos a descrever: . •"' '•'•
Cápsulas propriamente ditas — De forma mais ou menos ovóide, pesando aproximadamente l g o
invólucro e o conteúdo, contêm cerca de 0,5 g de substância activa, sólida ou líquida. A sua
capacidade é de cerca de 0,5 ml. Capsulinas — São pequenas cápsulas moles, de forma não
esférica, que contêm cerca de 0,2 a 0,25 g de princípios medicamentosos sólidos ou líquidos. O
invólucro contendo as substâncias medicinais pesa, aproximadamente, 0,5 g. A sua capacidade é
de cerca de 0,25 ml.
Pérolas — São pequenas cápsulas moles, de forma esférica, que contêm cerca de 0,20 a 0,25 g de
substâncias medicamentosas líquidas. A sua capacidade é, aproximadamente, de 0,2 ml.
Glóbulos — São grandes cápsulas moles contendo quantidades de princípios medicamentosos,
sólidos ou líquidos, superiores a 0,5 g. Em casos especiais fabricam-se cápsulas contendo l g, 2 g
e mesmo 5 g de substâncias medicinais (óleo de rícino, óleo de fígado de bacalhau, etc).

** m*a

? * * * *

Fig. 337. Vários tipos de cápsulas moles


919

919
As Figs. 337 e 338 reproduzem vários tipos de cápsulas moles. A preparação dos invólucros das
cápsulas moles é executada por dois processos fundamentais: por imersão e por compressão.

Flg. 338. Vários tipos de cápsulas moles

1) Preparação por imersão " ,. • • ' - . ; • •


A preparação por imersão baseia-se no processo de fabrico inicialmente exposto por MOTHES, em
1833. Este processo, que pode satisfazer às necessidades da pequena oficina, comporta quatro fases
principais: preparação da massa de gelatina; preparação dos invólucros; enchimento dos receptáculos;
fecho das cápsulas.
920

a) Preparação da massa de gelatina — As paredes das cápsulas são constituídas por gelatina
adicionada de água e de glicerina ou outro emoliente adequado (sorbitol, propilenoglicol,
polietilenoglicóis). Estas substâncias conferem elasticidade à gelatina, devendo ser adicionadas
numa quantidade criteriosamente estudada, pois que o seu excesso pode provocar o amolecimento da
membrana, dada a avidez de água por elas manifestada. São possíveis diversas fórmulas, indicando-
se na Tabela CVII algumas das mais utilizadas (').

Tabela CVII. Fórmulas para preparação de gelatina glicerinada


Peso em g
Gelatina glicerina Água Referência bibliográfica
20 40 20 Farmacopeia Belga (IV)
23 45 n ,. Farmacopeia Holandesa
20 10 25 Farmacopeia Francesa (1937)
24 18 47 B.P.C, f)

Para a preparação da massa principia-se por macerar as folhas de gelatina (lavadas


previamento com álcool e secas), durante cerca de doze horas, em água. Ao fim desse tempo
escorrem-se e mergulham-se na solução de água glicerinada. Aquece-se a banho--maria, em
recipiente tapado, até que a gelatina se tenha dissolvido. Concentra-se então a banho-maria, mas em
recipiente aberto, até consistência própria (consistência elástica).
Se pretendermos corar os invólucros, ajunta-se à massa, no momento da concentração, o corante
hidrossolúvel desejado.
Durante a concentração procurar-se-á homogeneizar a cor, por agitação cuidadosa, mas é
importante que se evite a formação de espuma. Sem deixar arrefecer (visto que o arrefecimento leva à
solidificação da gelatina glicerinada), elimina-se a espuma eventualmente formada, podendo passar-
se a solução por um tamis de malha apertada. Interessa ainda que toda a operação decorra sem
agitações violentas, que levariam à incorporação de bolhas de ar na solução, as quais poderiam
ficar retidas na massa que irá constituir os invólucros das cápsulas.
Todas estas operações que são, na aparência, muito simples carecem de bastante prática para
que se obtenham invólucros perfeitos. Não só o termo da concentração que

(') Esta massa de gelatina glicerinada não deve ser confundida com a gelatina glicerinada utili-
zada na preparação de supositórios (na F. P. IV a massa para supositórios contém gelatina
glicerinada na proporção de 4:21).
(2) A fórmula citada no British Pharmaceutical Codex contém, ainda, 7 g de xarope comum e
6 g de mucilagem de goma arábica. ,
921

originará a consistência elástica pretendida, mas ainda as quantidades relativas de gelatina-glicerina-


água desempenham um papel preponderante na qualidade do produto final.
As soluções gelatinosas obtidas solidificam ao arrefecerem, conseguindo-se uma massa que se
pode usar imediatamente, ou ser guardada até ao momento do emprego. Para que a sua conservação
seja mais perfeita, e uma vez que a gelatina constitui um bom meio de cultura para os
microrganismos, é aconselhável adicionarem-se conservan-tes à massa gelatinosa. Entre eles
emprega-se o ácido benzóico, o benzoato de sódio a 0,5-1%, ou o p-hidroxibenzoato de metilo a 0,1-
0,2%.
b) Preparação dos invólucros — Funde-se a massa de glicerina gelatinada numa cápsula larga, a
uma temperatura compreendida entre 45-60°C, e no líquido resultante mergulham-se, repetidas
vezes, moldes com a forma dos invólucros desejados.
Os moldes são constituídos por um corpo de alumínio ou de estanho, (mais raras vezes de cobre,
por este metal ser facilmente oxidável), o qual deve apresentar a forma esférica ou ovóide e o volume
que se pretende conferir ao invólucro. Estes moldes estão, habitualmente, fixos num prato por meio
de uma haste de 2-3 cm de comprimento, permitindo, assim, serem mergulhados simultaneamente na
massa fundida. A superfície dos moldes deve ser polida, estar perfeitamente limpa e torna-se
necessária a sua lubrificação, para que a massa que lhes vai aderir se possa retirar facilmente. Os
moldes untam-se, cuidadosamente, com produtos hidrófobos dotados de elevada viscosidade, como a
parafina líquida, o óleo de rícino, os silicones, etc. O excesso de lubrificante é prejudicial, pois, não
se misturando com a massa gelatinosa, pode ficar a sobrenadá-la.
A Fig. 339 representa um conjunto de moldes em forma de oliva, ligados ao
respectivo prato. t , .„.,. . .._„,.

Fig. 339. Aparelhos para preparar cápsulas moles por imersão


922

A preparação dos invólucros é conduzida mergulhando os moldes na massa fundida durante


alguns segundos, após o que se retiram e se deixam escorrer. Repete-se esta operação várias vezes,
até que se tenha formado uma película de espessura suficiente à volta do molde. É importante não
deixar aquecer demasiadamente os moldes metálicos em cada imersão, pois a elevação da sua
temperatura diminui a fixação da gelatina. Se o processo de formação da película for demasiado
demorado, importa, também, que se vá compensando a perda de água que vai sendo evaporada da
massa gelatinosa.
Após várias aplicações, o molde fica revestido por uma camada de gelatina glice-rinada de
espessura suficiente para poder funcionar como uma parede que retenha as substâncias
medicamentosas. Nessa altura retiram-se os invólucros por tracção brusca, procurando-se não
rebentar a película. A operação deve executar-se com as mãos envolvidas por finas luvas de
borracha, sem esperar que a gelatina solidifique comple-tamente.
c) Enchimento dos recipientes — Obtidos os invólucros da forma e capacidade desejada, a
operação imediata consiste no seu enchimento, que se efectua através da abertura de que ficam
providos (ponto de encontro da haste metálica com o corpo do molde). O enchimento pode executar-
se com substâncias líquidas, sólidas ou pastosas. Em qualquer dos casos, as cápsulas assentam-se,
pela extremidade oposta à abertura, numa espécie de prancheta com orifícios, que se destinam a
mante-las direitas.
O enchimento com líquidos que não dissolvam as paredes gelatinosas, como os óleos, os
dioxolanos (') ou os polietilenoglicóis, pode fazer-se por meio de pipetas ou de buretas. O
acondicionamento de pós ou de produtos pastosos efectua-se adaptando pequenos funis à abertura
das cápsulas por onde se fazem transitar as substâncias medicamentosas, mediante pressão exercida
com espátulas ou calcadores adequados.
d) Fecho das cápsulas — As cápsulas fecham-se por intermédio de uma gota da solução de
glicerina gelatinada que serviu para as preparar. Pode ainda fundir-se o que resta do seu colo com
auxílio de uma espátula aquecida. Posteriormente, imergem-se as cápsulas, pelo ponto de colagem,
num banho da mesma solução gelatinada e retiram--se com cuidado.
Após o fecho, as cápsulas podem ser lavadas com álcool de 90° ou com éter, deixando-se depois
secar espontaneamente.
A fim de proteger as paredes das cápsulas moles da fixação da humidade atmosférica, há quem
aconselhe engordurá-las, externamente, com parafina ou com silicones. Tal isolamento, porém,
nunca deve ser feito com óleo vegetal, pois é de temer o seu rançamento, dada a grande superfície de
exposição apresentada.

(') Os dioxolanos são obtidos por reacção entre a glicerina e as cetonas, em presença de
substancias desidratantes. São miscíveis com a água, mas não dissolvem a gelatina.
923

2) Preparação por compressão


É sem dúvida este o processo mais divulgado para obter cápsulas moles. O método inicial de VIEL
tem sofrido muitas modificações tendentes a conseguirem-se maiores rendimentos de produção.
As cápsulas obtidas por compressão são preparadas com massas gelatinosas ligeiramente mais
duras do que as que se empregam no processo de imersão. Algumas dessas massas contêm açúcar e
gomas na sua composição, como a inscrita no BPC, a que atrás fizemos referência.
O processo de preparação por compressão baseia-se no aprisionamento de quantidades
estabelecidas de substâncias medicamentosas sólidas ou líquidas entre folhas de gelatina glicerinada
que, depois, se soldam por compressão e se recortam. Os invólucros resultam, fundamentalmente, da
soldadura ou colagem de dois hemi-receptáculos gelatinosos que se unem no momento da
compressão. Por esse facto, nas cápsulas preparadas por compressão oberva-se a existência de uma
linha de união dos hemi-receptáculos, a qual contorna toda a cápsula. Isto não sucede nas cápsulas
preparadas por imersão.
São, essencialmente, duas as variantes do método de obtenção de cápsulas pelo processo da
compressão. A técnica mais simples consiste no uso de um rapsulador constituído por duas placas
perfuradas, cuja forma e dimensões dos respectivos orifícios condiciona o formato e a capacidade das
cápsulas. Uma das placas é provida de uma espécie de goteira, que a circunda, a qual se destina a
receber o excesso de medicamento quando se procede ao enchimento de um dos hemi-receptáculos.
Sobre essa placa, aquecida pelo vapor de água, coloca-se uma folha de gelatina mole ('), a qual se
adapta à superfície da placa e toma a forma dos alvéolos daquela. Depositam-se,

Flg. 340. Capsulador


(') Empregam-se folhas de gelatina que se preparam com uma
mistura de cerca de 30% de água, 30% de glicerina e 40% de
gelatina. Essa massa é fundida e vertida em placas metálicas,
rectangulares, em camada de espessura desejada.
924

então, as substâncias medicamentosas nas concavidades que correspondem às hemi--cápsulas. Se os


fármacos são líquidos poderão distribuir-se em quantidade exacta em cada receptáculo, mediante o
uso de uma pipeta. Podem ainda lançar-se, em excesso,
sobre a folha de gelatina moldada, ficando retida a quantidade de
líquido suficiente para encher cada cápsula e sendo o excesso recolhido
na goteira do aparelho. Os compostos sólidos são, preferentemente,
distribuídos em solução ou suspensão oleosa, as quais, para efeitos de
enchimento, funcionam como se se tratasse de um fármaco líquido.
Numa placa semelhante e cujos alvéolos correspondem aos da
primeira, deposita-se uma segunda folha de gelatina que se submete à
acção do vapor de água. Justapõem-se, então, as duas placas, tendo o
cuidado de acertar os semi--invólucros gelatinosos e procede-se à sua
soldadura por compressão em prensa adequada. Após a soldadura dos
invólucros gelatinosos convém lavar, externamente, as cápsulas com
álcool ou éter, utilizados isoladamente ou em mistura. A Fig. 340
representa um capsulador.
O processo que acabámos de descrever e que foi largamente
difundido, com algumas modificações, por COLTON, só permite trabalhar em
escala reduzida. Um método mais aperfeiçoado é o idealizado por
SCHERER, em 1933, e que ainda hoje constitui o processo industrial mais
correntemente utilizado para a preparação de cápsulas moles. Recorre a
uma máquina, em que duas folhas de gelatina são obrigadas a passar em
frente de duas matrizes cilíndricas rotativas. Cada uma dessas matrizes
tem uma secção dentada, cuja abertura corresponde ao molde do hemi-
receptáculo da cápsula pretendida.
No momento em que as duas folhas de gelatina passam pela matriz
Fig. 341. Máquina dá-se a sua moldagem e ao mesmo tempo é injectada a quantidade de
medicamento líquido, destinada a ficar aprisionada entre elas, e que
Scherer constituirá o conteúdo de cada cápsula. A soldagem dos hemi-
receptáculos faz-se por compressão. A Fig. 341 representa uma máquina
de SCHERER.
925

O processo descrito só com algumas modificações se pode aplicar à preparação de cápsulas


contendo medicamentos sólidos. A máquina Arcogel (Laboratório Lederle), que foi introduzida em
1948, tem um dispositivo de vazio, pelo qual a gelatina se molda com a forma da cápsula pretendida,
tornando possível a
inclusão de pós nos invólucros. A quantidade de pó é exac- • -• — - •
lamente calculada e lançada entre os dois hemi-receptáculos,
antes da sua soldadura.
Um último processo de obtenção de cápsulas moles ë considerado de origem
holandesa. Para a sua execução toraa-
-se necessário dispor de um sistema em forma de funil provido de aberturas
concêntricas, no qual se deitam, simultaneamente, a substância a capsular e a
gelatina liquefeita. A gelatina que vai saindo do sistema, em virtude da força da
gravidade, toma a forma de um tubo, no interior do qual se encontram as
substâncias medicamentosas. Em razão da tensão superficial, o tubo de gelatina
tende a originar gotas, mais ou menos esféricas, as quais se recebem num banho
de parafina líquida arrefecida a 3-4°C. Ao contactar com a parafina arrefecida, a
gelatina começa a endurecer e a forma esférica das cápsulas tende a aperfeiçoar-
se durante a progressão por elas efectuada no seio da parafina. As cápsulas são,
seguidamente, desengorduradas e submetidas a uma desumidi-ficação numa
câmara em que circula ar isento de humidade. O fundamento deste processo é,
portanto, muito simples, podendo conceber-se a preparação das cápsulas através
da observação do esquema representado na Fig. 342. Fig. 342.
Existem máquinas muito aperfeiçoadas para a produção deste tipo de Preparação de
cápsulas. Entre elas citamos um modelo em que um dispositivo adequado cápsulas pelo
método
comprime o tubo de gelatina, obrigando-o a destacar as gotas que vão constituir holandês (esquema)
as cápsulas e acelerando-se, assim, a sua produção. No mercado existem
máquinas capazes de dar uma produção horária de 30 000 cápsulas. A — folhas de gelatina
B — substâncias
Uma das características curiosas do processo é a economia de gelatina que medicamentosas C —
proporciona, pois, ao contrário do que sucede nos outros métodos, não há formação de retalhos de
gelatina. Por outro lado, é relativamente fácil variar as dimensões das cápsulas, já que aquelas são
principalmente condicionadas pela quantidade de matéria-
-prima retida. Assim, regulando o fluxo dos componentes activos, podem obter-se cápsulas cujo
conteúdo varia de 10 a 400 mg.
A precisão de dosagem é bastante apreciável (± 1,5%), as cápsulas ficam com aspecto mais
brilhante e são mais facilmente solúveis do que as preparadas pêlos clássicos métodos de
compressão.
926

A Tabela CVIII resume as características dos principais tipos de cápsulas gelatinosas, moles e
duras, que correm no nosso mercado.

Tabela CVIII. Características dos principais tipos de cápsulas gelatinosas


Processo de Solda- Composição
Tipo' de cápsula Fabricação Forma dura do invólucro
Esférica '
Ovóide +
Cápsulas de gelatina Imersão Ovóide com
mole, com diversos colo
graus de elasticidade
Compressão Esférica Gelatina — emoliente-
Ovóide + -água, substâncias
Em forma aromatizantes, coran-
de supositó- tes, conservantes
rio, etc.
Processo
holandês Esférica
Cápsulas de gelatina Gelatina-água, subs-
dura Imersão Cilíndrica, tâncias aromatizantes.
arredondada corantes, conser-
nos extremos vantes

7.2.1.9.2.5. Cápsulas gastro-resistentes


Por vezes é necessária a preparação de cápsulas que resistam, sem alteração, à acção do suco
gástrico. Essas cápsulas devem, porém, desagregar-se rapidamente no suco intestinal, e por isso se diz
que são gastro-resistentes e enterossolúveis.
São múltiplas as razões da preparação das cápsulas que satisfaçam aos dois requisitos enunciados
podendo sistematizar-se, do seguinte modo, a necessidade da sua obtenção:
— O princípio activo não deve ser digerido nem degradado no estômago;
— A substância medicamentosa é irritante para a mucosa gástrica;
— O fármaco produz náuseas ou vómitos se actuar no estômago;
— Interessa que o princípio activo não sofra diluições antes de atingir o intestino;
— A substância medicamentosa só deve produzir o seu efeito máximo no duodeno ou no jejuno.
Na prática, é necessário que os envolvimentos gastro-resistentes impeçam o ataque da cápsula pelo
suco gástrico durante a sua permanência no estômago. Por outras
927

palavras, interessa saber-se o tempo de trânsito das cápsulas no estômago, a fim de se protegerem
adequadamente.
Como já noutro ponto foi dito (ver Administração por via gastro-intestinal), o tempo que um
medicamento oral leva a atingir o intestino depende de inúmeros factores, como a alimentação, o
volume gástrico, etc. LARK-HOROVITZ e LENO demonstraram, com cloreto de sódio marcado, que ao fim
de uma hora de ingestão aquela substância ainda se mantinha no estômago. Só decorridas cerca de
duas horas o cloreto de sódio se dirigia para o piloro, transitando então para o intestino delgado.
HODGE e colaboradores fizeram ensaios semelhantes corn sulfato de bário, concluindo que o tempo
médio de permanência no estômago era igual ou superior a duas horas. Em muitos doentes, porém,
não se observam estas regras gerais, podendo citar-se numerosíssimos casos em que é mais
demorada a permanência dos medicamentos no estômago. Por todas estas razões é necessário que os
envolvimentos gastro-resistentes proporcionem uma certa margem de segurança, e assim, a
Farmacopeia Jugoslava obriga a que os revestimentos suportem seis horas de contacto com o suco
gástrico sem alteração apreciável. Para a D. A. B. 7." foram propostos períodos de duas e de três
horas. Entretanto, e atendendo aos casos gerais, pois só para eles se pode equacionar, com
segurança, o problema, acordou-se em ser considerado suficiente o período de duas horas sem que
haja desagregação das cápsulas no suco gástrico. É, aliás, este o limite estipulado pela Farmacopeia
Portuguesa V na sua monografia sobre cápsulas ao tratar das cápsulas gastro-resistentes.
O envolvimento das cápsulas para que se tornem gastro-resistentes pode ser efectuado por
processos industrializados, idênticos aos que descrevemos na preparação das drageias. Uma vez que
o método e as substâncias envolventes são essencialmente as mesmas, remetemos o leitor para o
respectivo subcapítulo.
Há, porém, muitos envolvimentos que se praticam mais correntemente com as cápsulas do que
com os comprimidos. Assim, o salol tem sido utilizado em revestimentos extemporâneos de cápsulas
gelatinosas, porquanto é insolúvel em meio ácido e se dissolve a pH superior a 1. Os revestimentos
com salol são, contudo, cristalinos e podem fendilhar-se facilmente, não garantindo uma eficaz
protecção das cápsulas.
O tratamento das paredes das cápsulas por agentes desnaturantes representa um dos métodos há
mais tempo utilizados para torná-las gastro-resistentes, tendo sido proposta a utilização, para esse
fim, do formol e de sais de ferro e de crómio. Na prática, porém, apenas o processo que utiliza o
formol se impôs. A princípio, usavam-se soluções de formaldeído bastante concentradas ('), mas
reconheceu-se que essa técnica originava um endurecimento ulterior dos invólucros gelatinosos, de
que resultava que os

(') O processo da foimilação da gelatina foi usado peta primeira vez por HAUSMANN, em 1885,
tendo sido aperfeiçoado doze anos mais tarde por aquele investigador e por WEYI.AND. O método
primitivo consistia no tratamento da gelatina por uma solução de aldeído fórmico a 18%, durante
dezoito minutos.
928

respectivos tempos de desagregação eram inconstantes e, por vezes, muito elevados. Por esse motivo,
utilizam-se soluções de formol menos concentradas, geralmente soluções alcoólicas a 1-5%.
É de notar, porém, que a imersão das cápsulas vazias na solução de formol é susceptível de
deformá-las, sobretudo quando a solução é aquosa, resultando certas dificuldades no seu enchimento e
acondicionamento com máquinas automáticas que, como se compreende, só trabalham convenientemente
quando os invólucros se apresentam perfeitamente moldados.
Ensaios realizados no Laboratório de Tecnologia Farmacêutica da nossa Faculdade mostraram que é
possível tomar gastro-resistentes as cápsulas gelatinosas mergulhadas, durante 24 horas, em solução
alcoólica de formol a 5%. Todavia, para que este tratamento seja eficaz é necessário secar as cápsulas
previamente na estufa, a 5()°C, durante 15 dias, e soldar a linha de união dos hemi-receptáculos com
solução alcoólica de goma-laca.
A fim de eliminar as deformações motivadas pela imersão das cápsulas de gelatina em soluções de
formol, BOYMOND e colaboradores propuseram o seu tratamento, em ambiente fechado, com formol
gasoso, à temperatura de 20°C e 65% de humidade relativa. Experiências por nós realizadas levaram-nos à
conclusão que os vapores de formol, actuando durante 48 horas numa atmosfera contendo 72% de
humidade relativa, originam, de facto, cápsulas que apenas se desagregam no suco gástrico ao fim de 2
horas. Todavia, deve notar-se que, embora as paredes dessas cápsulas se mantivessem intactas, se verificou
que o corante nelas encerrado era cedido mesmo pelas cápsulas fechando sob pressão, o que contradiz
as observações de outros autores.
Entretanto, e à semelhança do que acontece com os comprimidos, também as cápsulas podem
tomar-se gastro-resistentes se forem recobertas por uma camada de certos vernizes. Este processo tem-
se desenvolvido bastante não só devido ao aperfeiçoamento de novos materiais, como também ao
desenvolvimento de técnicas para a sua aplicação, como o sistema de pulverização «airless», os aparelhos
de WURSTER, STEIN-BERG e PELLEGRINI. Daremos, seguidamente, algumas fórmulas de vernizes gastro-resistentes
e enterossolúveis, os quais já deram as suas provas.
MÜNZEL, Buem e SCHULTZ indicam as seguintes fórmulas para o revestimento de comprimidos, que são
também aconselháveis para o tratamento das cápsulas gelatinosas:

Verniz celulósico I v ,. ,;, .-,,;, »;..;•:,., *: „-,,. -••


Acetoftalato de celulose (verniz).............................. 27 partes
Triacetina (triacetato de glicerina, plastificante) .... 6 »
Metanol l ...................................... 30 » ' . ' . . •
~, e- • f (Solventes)
Clorofórmio J ...................................... 237 » • •*
929

Verniz celulósico II ' . :


«t; •'•!
Acetoftalato de celulose (verniz).............................. 12 partes
Ftalato de etilo (plastificante) .................................. 3 »
Acetato de etilo l ................................ 67,5 »
Isopropanol j (Solventes) ................................ 67,5 >»

KLÀUI recomenda a utilização de misturas de acetoftalato de celulose e acetoftalato de polivinilo


com derivados de ácidos gordos de elevado peso molecular e ROTHGANG, por seu turno, propôs o
emprego das seguintes soluções de vernizes:
. „: .•• :: ;::.>ï".{í'.-. f ••""-i.Ji ,&|-1úk
Eudragit L ou S (').................................................. 1,0 partes „,
Álcool isopropílico .................................................... 2,0 » / .,
Ftalato de butilo ou óleo de rícino ........................ 0,01 »
Eudragit L ou S ........................................................ 1,0 partes
Álcool isopropílico .................................................... 2,0 »
Álcool butílico............................................................ 0,1 »
. *<} ^
Monoestearato de polioxietileno sorbitol ................ 0,01 »

Estas soluções podem ser aplicadas com uma pistola «Optima-E» com uma pressão de 0,5-1
atmosfera, tratando-se, de cada vez, uma carga correspondente a 500-1000 g de cápsulas, que
podem ser colocadas numa bacia de drageificação ERWEKA. A aplicação do verniz deve fazer-se
descontinuamente, de modo a que o verniz possa secar à medida que vai sendo aplicado.
Experiências por nós realizadas mostraram que o acetoftalato de celulose cons
titui, de facto, um revestimento adequado para a obtenção de cápsulas de gelatina
gastro-resistentes e enterossolúveis. A solução de acetoftalato que se mostrou mais
aconselhável para o fim em vista é constituída por 8 partes daquela substância, 4 partes
de ftalato de etilo e 88 partes de acetona. As cápsulas foram imergidas quatro
vezes nessa solução, procedendo-se à respectiva secagem, em corrente de ar quente,
entre a aplicação de cada duas camadas sucessivas. As cápsulas assim tratadas apre
sentam excelente aspecto, não se diferenciando facilmente das não submetidas a este
tratamento. . . . .. . . .

Veja-se drageias (pág. 800).


930

Também a goma-laca pode ser usada como revestimento gastro-resistente de cápsulas


gelatinosas, utilizando-se uma solução alcoólica a 5% contendo 1% de óleo de rícino, a qual é
atomizada sobre as cápsulas.

7.2.1.9.2.6. Outros tipos de cápsulas

Além da gelatina têm sido utilizadas outras substâncias na fabricação dos invólucros capsulares.
DARRASE e DUPONT propuseram, em tempos, o emprego do glúten para preparar cápsulas duras, tendo
designado a forma medicamentosa assim obtida pelo nome de glutubos. Essas cápsulas destinavam-se
à administração oral de produtos sólidos ou líquidos que exercessem efeito irritativo na mucosa
gástrica, uma vez que só se desagregavam no intestino.
Semelhantes são as cápsulas preparadas com zeína (proteína extraída do milho — Zea mays —
com o peso molecular de cerca de 38 000), cujo emprego foi proposto por PIPHER ('). A sua
preparação pode descrever-se, em linhas gerais, do seguinte modo: a 100 g de zeína, misturada a
temperatura inferior a 40°C com 25-65 g de água, adiciona-se uma mistura constituída por 10-50 g
de um plastifïcante atóxico e fixo; aquece-se a mistura, muito lentamente, até uma temperatura
ligeiramente inferior à do ponto de ebulição do constituinte mais volátil, formando-se, assim, uma
pasta homogénea que se molda em folha de espessura adequada, a qual serve para preparar os
receptáculos capsulares.
A zeína é solúvel em diversos dissolventes primários que apresentem funções -OU, -NH2 -CONH1
e -COOU. Entre eles citamos o metanol, os glicóis e os álcoois furfurílicos. Como plastificantes
podem ser utilizados diversos ácidos gordos, como o láurico, o merístico, o palmítico e o esteárico.
Além do glúten e da zeína, tem sido proposta, embora sem grande sucesso, a metilcelulose como
material para preparar invólucros, os quais servem para a fabricação de cápsulas oficinais na Grã-
Bretanha.

(') Patente U.S., n." 2846353.


A zeína é algumas vezes tomada como sinónimo de glúten. Na verdade, a zeína é obtida por
extracção do glúten com álcool isopropílico a 85%, sendo o extracto obtido esgotado pelo hexano e
precipitado pela água.
931

7.2.1.9.2.6.1. Microencapsulação
..,.,-.
Entre as variedades de cápsulas medicinais não queremos esquecer as microcápsulas a que
actualmente tanto se recorre não só com a finalidade de proteger os fármacos ou minimizar as suas
incompatibilidades, mas também para os libertar em determinadas condições que podem importar
para a sua disponibilidade biológica con-seguindo-se acções, por exemplo, mais prolongadas.
A microencapsulação é, pois, um método de envolvimento de pequenas entidades (partículas
sólidas, gotículas, dispersões) por intermédio de revestimentos individuais que libertam o fármaco
em função da humidade, pH, forças físicas ou por outros processos, tudo dependendo da natureza e
espessura da parede envolvente.
Em regra, as microcápsulas têm dimensões de cerca de 200 |i, podendo algumas ser bem mais
pequenas e outras atingirem até 5000 [í. A sua utilização prática iniciou--se, de acordo com Luzzi,
em 1957, mas é de 1970 para cá que o seu interesse se tornou muito aparente.
A microencapsulação pode conseguir-se por diversas técnicas, algumas baseadas em processos
químicos que envolvem modificações ou mudanças de fase; outras são mecânicas e carecem de
equipamentos sofisticados a fim de produzir a modificação física necessária.
Entre os métodos mais correntemente aplicados em Farmácia figuram operações químicas
baseadas na separação de fases ou coacervação.
O termo coacervação tem sido empregado em química coloidal para descrever a separação de um
precipitado líquido ou fase, quando se adicionam, em determinadas condições, soluções de dois
colóides liófilos. É o que sucede quando se juntam soluções de goma arábica (aniónica) com
soluções de gelatina carregada positivamente, o que acontece a pH menor que 4,7 (ver Emulsões).
Por extensão, este termo tem sido usado não só para o caso de existirem dois ou mais colóides
(coacervação complexa), situação semelhante à da química coloidal, mas também para os sistemas
em que se produzem gotículas com apenas um colóide (coacervação simples).
Neste último tipo de coacervação o colóide liófilo, que se encontra no seio da água, é adicionado
de uma substância que possua fortes propriedades hidrófilas, como o álcool, ou o sulfato de sódio.
Formam-se, assim, duas fases, uma bastante rica em gotículas coloidais e outra pobre nessas mesmas
gotículas. Se estiverem presentes os núcleos a encapsular, originam-se as microcápsulas que vão
depositando. Este processo tem sido empregado não só com a gelatina, mas com outras substâncias
coloidais como o acetoftalato de celulose. JANSON e WAGNER, MERKLE e SPEISER e PTNHO et ai. utilizaram este
composto por coacervação simples, empregando o sulfato de sódio como desidratante que conduzia à
separação das fases.
Em linhas gerais, o diagrama de fabricação utilizado para obter microcápsulas de fenacetina é o
seguinte:
932

Suspensão de fenacetina numa solução aquosa de acetoftalato em tampão de fosfato


de pH 7,3

•í" .-••>' \ 60°C . '.v-


:-M»
i 4- Solução
de sulfato de sódio

5°C \-v .

Separação das

microcápsulas

+ HOOCCH, a

2 "6 Fixação das paredes das


--
ií-
microcápsulas

5°C

Lavagem com

H?O

Secagem

PHARES e SPERANDIO procederam à microencapsulação de vários analgésicos utilizando gelatina e


álcool ou sulfato de sódio.
No que diz respeito à coacervacão complexa, há mais elementos, visto ser conhecida há também
mais tempo. Procurando esquematizar a microencapsulação de um óleo por intermédio da goma
arábica e gelatina, podemos apresentar este diagrama, retirado de um trabalho de Luzzi:
933

Goma dissolvida em H2Ü

Emulsificação

Solução de gelatina de -—>


pele de porco Mistura
pH = 8

Ajustar pH a 4,5
Juntar formaldeído

l Ajustar
pH a 9-10

Recolha das microcápsuias

Pelo que se vê, o processo descrito baseia-se na incompatibilidade gelatina--goma arábica


a baixo valor de pH. O formaldeído destina-se a endurecer as paredes das cápsulas, pois
reage com os grupos — NH2 da gelatina RN = CH2).
(RNH2 + O = CH2
934

Na Fig. 343 está representada esquematicamente uma instalação para a produção de


microcápsulas.

Fig. 343. Esquema para microencapsulação Técnica utilizada


por National Cash Register Co.

7.2.1.9.2.7. Incompatibilidades
Pode dizer-se que são de dois tipos principais as incompatibilidades observadas na preparação
das cápsulas: 1) as que resultam da acção dos constituintes sobre o invólucro gelatinoso; 2) as que
se devem à acção dos constituintes entre si.
Entre as acções dos constituintes sobre os invólucros gelatinosos podemos citar a dissolução da
gelatina operada pêlos líquidos acondicionados nos receptáculos, a infiltração e a difusão dos
princípios medicamentosos nas paredes das cápsulas, etc. Deste modo, os líquidos aquosos, como as
soluções hidro-alcoólicas, não devem ser acondicionados em receptáculos gelatinosos, cujas paredes
acabam por dissolver-se neles total ou parcialmente. Certas substâncias, como o guaiacol, difundem-
se na gelatina, podendo impregná-la em larga medida. Este fenómeno tem sido apreciado após
alguns meses de fabricação das cápsulas e foi referido por DARQUENNES. Outros compostos, como a
hexilresorcina e o anidrido arsenioso, têm sido também encontrados nas paredes das cápsulas moles
algum tempo depois da sua preparação. Estes acidentes, que podem ter
935

uma importância relativa em cápsulas de preparação extemporânea, ganham especial interesse com
o tempo de armazenagem, podendo as cápsulas tornarem-se impróprias para consumo, quer pelo
cheiro que apresentam, quer pêlos fenómenos irritativos que provocam. Por outro lado, sendo,
geralmente, o conteúdo das cápsulas que é apreciado por dosagem, é necessário levar este factor em
consideração a fim de que os resultados do ensaio não sejam falseados.
A água residual existente nos invólucros pode também ser absorvida pelas substâncias
higroscópicas eventualmente contidas nas cápsulas, sendo este fenómeno mais aparente com as
cápsulas duras que contenham compostos ávidos de água. Já com as cápsulas moles, cujo conteúdo
seja constituído por produtos medicinais em suspensão oleosa, é menos de temer o citado risco, dada
a característica hidrofobia dos óleos. Entretanto, não julguemos que as soluções medicamentosas,
cuja fase líquida é um óleo, não estão sujeitas a alterações pela humidade: as vitaminas A e D,
quando dissolvidas em óleos vegetais ou animais, podem alterar-se devido à cedência de água dos
invólucros gelatinosos onde se encontram acondicionadas.
As acções das substâncias medicinais sobre as paredes das cápsulas são largamente influenciadas
pelas condições de armazenagem (temperatura, grau de humidade, etc.), devendo ser lembrado que
já a temperatura de 40°C torna friáveis os invólucros das cápsulas duras e deforma os das cápsulas
moles.
O extracto de fel de boi é um dos produtos tipicamente higroscópico que, segundo LEUPIN,
aumenta de peso, mesmo numa atmosfera contendo 20% de humidade relativa (absorção de 3% de
água). Quando a humidade relativa é de 40%, a taxa de água fixada ë de 6%, e num ambiente
saturado de vapor de água o referido extracto chega a absorver 120% de humidade.
A glucose mantém-se sem alteração até 60% de humidade relativa, mas com 80% de humidade a
fixação de água pode atingir 10%. O lactato de sódio e a ureia chegam a absorver, respectivamente,
220% e 150% de humidade.
Quanto à interacção dos fármacos acondicionados em receptáculos gelatinosos são de considerar
as incompatibilidades resultantes das respectivas associações, independentemente dos invólucros. Os
problemas fundamentais são, portanto, os que se observam com os pós, para cujo subcapítulo
remetemos o leitor.
A USP XVII, nalguns casos de flagrante incompatibilidade, cuja resolução se afigure difícil,
sugere que se acondicione uma das substâncias reactivas numa pequena cápsula que, por seu turno,
se inclui numa cápsula maior que conterá também a segunda substância reagente.
Em regra, as principais incompatibilidades são devidas à formação de misturas eutéticas ou de
misturas coradas. Os compostos voláteis serão absorvidos em drogas inertes e os líquidos que
dissolvem a gelatina deverão ser concentrados à secura e o resíduo obtido disperso num óleo, que se
acondicionará nos respectivos receptáculos.
936

;L.j 7.2.1.9.2.8. Ensaio das cápsulas .;v:..: •,-, „.-..•...,&<, , ,~


Há um certo número de verificações que sempre se devem efectuar nas cápsulas gelatinosas,
designadamente, o peso, o tempo de desagregação e a humidade. Em casos especiais convirá
executar outros ensaios como a pesquisa de arsénio na gelatina, a avaliação das cinzas e a
identificação do corante utilizado. Na indústria farmacêutica, ao lado destas determinações próprias
da forma medicamentosa, deve ainda proceder-se à caracterização e dosagem dos princípios activos.
Estes últimos ensaios são, como se compreende, variáveis de fórmula para fórmula, saindo, por isso,
do âmbito deste livro de índole exclusivamente galénica.
1) Peso — Não se encontram muitos estudos que digam respeito às exigências de exactidão do
peso dos pós, líquidos ou substâncias pastosas acondicionados em receptáculos gelatinosos.
Vimos já que a exactidão do peso de produto medicamentoso depende, em larga medida, do
processo de enchimento adoptado e também da natureza do produto a acondicionar. Assim, para as
cápsulas duras contendo pós, o afastamento entre o peso médio e o peso pretendido depende da
forma cristalina do pó e é maior nos processos de enchimento manual do que nos sistemas
mecanizados. Para as cápsulas moles a exactidão dependerá do tipo de cápsula fabricada (imersão,
compressão nas suas diferentes formas e processo holandês), da natureza sólida ou líquida do
produto, da viscosidade e polaridade do líquido, etc. Nestas circunstâncias, compreende-se o critério
adoptado por SANDEU, que admite uma tolerância de ± 7,5%.
Se bem que os métodos de enchimento que actualmente se podem utilizar proporcionem variações
de peso inferiores às assinaladas, mesmo para substâncias de difícil manipulação, acontece que nem
sempre são respeitadas as exigências oficiais, aparecendo cápsulas que não satisfazem às condições
enunciadas. SUNE e PERIS referem os resultados de uma prospecção conduzida nesse sentido,
observando que algumas preparações industrializadas em Espanha apresentavam afastamentos
superiores aos tolerados pelas USP XVI e BPh (1958). A idênticas conclusões chegou STOCH que
estudou vários produtos especializados existentes no mercado britânico.
A técnica seguida pela maioria das farmacopeias para apreciar a variação de peso consiste em
pesar em conjunto e individualmente um número de cápsulas igual ou superior a 10. Determina-se,
assim, o peso médio e verifica-se se os afastamentos encontrados se enquadram em limites
previamente estabelecidos. Em regra, são mais elevadas as tolerâncias percentuais concedidas para
as cápsulas menos pesadas. O número de cápsulas ensaiado deveria estar relacionado com o peso,
sendo maior para as cápsulas que contivessem menor quantidade de princípios medicamentosos.
Entretanto, as diversas farmacopeias indicam sempre que se proceda sobre o mesmo número de
unidades, de modo a tornar mais acessível o ensaio.
937

Em geral, pesa-se o conteúdo com o invólucro, descontando-se, depois, o peso deste último. Esta
operação é relativamente fácil de executar sempre que os receptáculos gelatinosos contenham pós,
granulados ou microdrageias. Já a remoção de líquidos ou de substâncias pastosas pode, porém,
apresentar dificuldades de ordem técnica, obrigando à lavagem dos invólucros com líquidos que não
os ataquem (éter, etanol absoluto, etc.) e à sua subsequente secagem no vazio fosfórico.
A BPh (1963) manda pesar uma cápsula, remover o conteúdo e pesar os dois hemi-invólucros
(cápsulas duras); a diferença entre os pesos representa o peso de conteúdo medicamentoso. Repete-
se a operação com mais 19 cápsulas, calculando-se o peso médio das 20 cápsulas ensaiadas. O peso
do conteúdo de cada cápsula não deve diferir do peso médio em mais de 10%, tolerando-se que duas
cápsulas apresentem desvios até 20%.
A Farmacopeia Francesa ensaia apenas 10 cápsulas, indicando que o seu peso médio deve estar
compreendido entre ± 15% do peso teórico se este for inferior a 250 mg, e entre ± 10% do peso
teórico caso este seja superior a 250 mg.
Na Tabela CIX indicamos, em linhas gerais, o modo de proceder adoptado por algumas
farmacopeias, bem como as tolerâncias de desvio de peso por elas consentido.
Julgamos útil instituírem-se limites de afastamento médio e individual, tal como estabelecem as
Farmacopeias Britânica, Norte-Americana e Dinamarquesa. Efectivamente, expressando a tolerância
apenas em relação ao peso médio, os desvios indivi-

Tabela CIX. Processos e tolerâncias oficializados para apreciação do peso de


cápsulas gelatinosas
Tipo Conteúdo Afastamento permitido

de das N." de cápsulas em relação ao peso teó-


Farmacopeia cápsulas cápsulas examinado rico ou ao peso médio
Britânica duras sólido 20 ±7,5% cap. peso > 300 mg
(1988) ±10% cap. peso < 300 mg
Dinamarquesa duras sólido 20 18 cápsulas±10%
(1948) moles líquido 20 2 cápsulas+20%
Francesa duras sólido 10 Peso teórico A<peso
(1965) moles líquido 10 médio+x
=x±15%, se /l<250mg
r
••' " '••"-'' '"•'"• •••'• " '""' . . ^. -'':':.. • ' =x±10%, se j4>250mg
Helvética VII duras sólido 20 ±7,5% cap. peso>300mg
(1987) moles líquido 20 ±10% cap. peso<300mg
Norte-Americana duras sólido 1.° ensaio: 10 85-115% do valor médio
XXII 2.° ensaio: 20 27 cápsulas
85-115% do valor médio
Portuguesa duras sólido 20 ±7,5% cap. peso>300mg
moles líquido 20 ±10% cap. peso<300mg
938

duais podem afastar-se dos desejados e, apesar disso, as cápsulas serão toleradas. Este método de
verificação que é, aliás, o do Codex, parece-nos menos exacto do que o adoptado pela BPh e USP.
O ensaio de uniformidade de massa inscrito na Farmacopeia Portuguesa V deter
mina a seguinte técnica: «Pese uma cápsula cheia, sem perder quaisquer fragmentos do
invólucro, abra a cápsula e extraia o seu conteúdo tão completamente quanto possível.
No caso de cápsulas de invólucro mole, lave este com éter ou com outro solvente
apropriado e deixe-o exposto ao ar livre até ao desaparecimento do cheiro do solvente.
Pese o invólucro e calcule a massa do conteúdo. Repita a operação em mais 19
cápsulas». Determina também que não mais do que 2 das 20 unidades ensaiadas
poderão diferir da massa média encontrada em percentagem superior a ± 10% para
cápsulas com menos de 300 mg e a ± 7,5% para cápsulas com mais de 300 mg de
massa média e que em nenhum caso poderá a diferença exceder o dobro dessa percen
tagem. '
Além deste ensaio, a Farmacopeia Portuguesa V inscreve também um ensaio de uniformidade de
teor.
De qualquer modo, somos do parecer que tolerâncias da ordem de ± 5% para a média e de ±
10% quando consideradas as cápsulas individualmente, são suficientemente amplas, podendo servir
tanto para as cápsulas cheias à mão, como por sistemas mecanizados.
FRANQUESA GRANER, tendo em atenção as considerações deixadas expressas, aconselha o seguinte
ensaio: «Pesar individualmente 10 cápsulas; esvaziá-las e pesar individualmente as cápsuls vazias;
por diferença obtêm-se os pesos individuais dos conteúdos; nenhum deles deve afastar-se ± 10% do
peso teórico e a sua média deve estar compreendida entre ± 5% do valor teórico».
2) Tempo de dissolução ou de desagregação — A desagregação das cápsulas de gelatina
processa-se em duas fases distintas. Na primeira o invólucro dissolve-se parcialmente no seu ponto
mais frágil e liberta o conteúdo da cápsula. Num segundo tempo opera-se a dissolução dos
receptáculos gelatinosos.
Se bem que a gelatina se dissolva fácil e rapidamente no suco gástrico, é conveniente estipular
um prazo de tempo máximo, dentro do qual o conteúdo medicamentoso das cápsulas seja libertado,
ficando apto para desempenhar a acção farmacológica desejada. Chama-se a este período tempo de
desagregação das cápsulas, o qual pode ser avaliado por simples imersão daquelas em água
destilada, mantida a cerca de 37°C. Têm sido propostos alguns aparelhos destinados a facilitarem a
apreciação do tempo de desagregação das cápsulas, tornando-se útil dispor de um sistema que
obrigue as cápsulas a manterem-se mergulhadas na água até à dissolução dos seus invólucros. Uma
improvisação que dá bons resultados práticos consiste em colocá-las num copo onde se encontra a
água aquecida a 37°C, obrigando-as a imergir por intermédio de uma rede que se ajusta à superfície
do líquido. Interessa também que se agite regularmente o
939

líquido de desagregação, durante o ensaio. Compreende-se ainda que é vantajoso proceder ao ensaio
usando, simultaneamente, várias cápsulas.
CzETSCH-LiNDENWALD propôs um aparelho muito simples, constituído por um tubo de vidro fechado
nas duas extremidades, o qual apresenta um estrangulamento central onde são colocadas as cápsulas a
analisar. Do mesmo modo, podem servir para esta determinação os aparelhos que citámos a propósito dos
comprimidos, como o de ERWEKA ou o sistema preconizado na Farmacopeia Portuguesa V.
Das farmacopeias que consultámos, apenas a Helvética VI e D.A.B. 7." propõem o emprego de
soluções clorídricas de pepsina, em lugar de água destilada. Como se viu a propósito dos comprimidos, é
indiferente proceder de uma ou de outra forma.
O período de tempo considerado como limite para a desagregação ou dissolução é também variável de
farmacopeia para farmacopeia, indo desde 6 minutos até 30 minutos.
Na Tabela CX indicamos as técnicas de controlo e os tempos de desagregação estabelecidos em
algumas das actuais farmacopeias.

Tabela CX. Técnicas de controlo de tempos de desagregação oficializadas por algumas


farmacopeias
Limite do tempo de
Líquido desagregação ou de
Farmacopeia de ensaio Temperatura dissolução
Britânica Água 36°-38°C Até dissolução
(1988)
Dinamarquesa Água 38°-40°C 10 minutos (libertação
(1948) do conteúdo)
Francesa Água 37°±0,5"C 30 minutos (dissolução
(1987) do conteúdo)
Helvética VII Variável de fórmula 36-38-C Variável de fórmula
(1987) para fórmula para fórmula
Portuguesa V Água 36-38-C 30 minutos (libertação
do conteúdo)

A apreciação dos tempos de desagregação das cápsulas que apresentem revestimentos gastro-
resistentes é conduzida em moldes semelhantes aos que indicámos. Interessa aqui, porém, avaliar-se
a resistência apresentada em relação ao suco gástrico, determinando-se o tempo de desagregação
em suco entérico. Nestas circunstâncias, as cápsulas serão mergulhadas em ácido clorídrico O, l N
ou numa solução clorídrica de pepsina, mantida a cerca de 37°C, não se devendo dissolver total ou
parcialmente, após uma agitação prolongada. Em regra, aceita-se que resistam duas horas nas
condições assina-
940

Após o citado ensaio, as cápsulas devem romper e ceder os seus princípios activos num
período de tempo inferior a 60 minutos quando mergulhadas numa solução tampão de pH 6,8, de
solução de pancreatina alcalina ou um suco entérico artificial, aquecido à mesma temperatura.
Algumas farmacopeias preconizam maiores períodos de desagregação (l hora e 30 minutos, 2
horas).
A Tabela CXÍ indica, em resumo, as técnicas de controlo de algumas farmacopeias
e os tempos de desagregação para as cápsulas gelatinosas resistentes à acção do suco
gástrico. . . .. .....„.., „-,

Tabela CXI. Técnicas de controlo e tempos de desagregação oficializados para


cápsulas gastro-resistentes
Resistência ao Tempo de desagrega-
ácido clorídrico ção em solução de
Tempe- 0,1 N ou ao suco pH 6,8 ou em suco Solução entérica
Farmacopeia ratura gástrico artificial entérico artificial artificial
Britânica 36-38°C 2 horas 1 hora Tampão de fosfa-
(1988) tos de pH 6,8
Francesa 37±0,5°C 1 hora 2 horas
(1987)
Helvética VII 37°C 2 horas 3/4 de hora Tampão de fosfa-
(1987) tos de pH 6,8
Norte-Americana 37°±2"C 1 hora 2 horas+eventual Solução de pan-
XXII limitação de tempo creatina com
na monografia KH2PO4 e NaOH
Portuguesa V 36-38-C 2 horas 1 hora Tampão de fosfa-
tos de pH 6,8

Ao lado dos ensaios de desagregação é de lembrar a realização de testes de dissolução que


devem ser aplicados quando os princípios activos contidos nos invólucros são pouco solúveis na
água. O clorodiazepóxido, a indometacina, o sulfato de quinidina e outras substâncias são
submetidas a estes ensaios quando dispensadas sob a forma de cápsulas.
A avaliação é feita de modo idêntico ao que indicámos para os comprimidos, tudo levando a
crer que a dissolução dos princípios activos se processa em condições semelhantes às apontadas
quando aqueles são constituídos por grãos pouco porosos obtidos por granulação a húmido. Esta
asserção é particularmente válida se as cápsulas contêm excipientes hidrófobos como o talco ou o
estearato de magnésio, penetrando lentamente o líquido de dissolução de acordo com a cinética
atrás mencionada.
As farmacopeias não especificam as condições de controlo das cápsulas de gelatina destinadas
ao uso rectal ou vaginal. Ora, tanto a cavidade rectal como a vaginal apre-
941

sentam muito menos quantidade de líquido do que a que se encontra no tracto gastro-
-intestinal. Por outro lado, o pH das secreções rectal ou vaginal é apreciavelmente mais elevado do
que o do suco gástrico.
No recto (comprimento de 12-15 cm e diâmetro de 5-6 cm) o pH está compreendido entre 7,3-7,6,
podendo variar, em determinadas circunstâncias, entre 4,6 e 8,8.
A secreção vaginal tem pH de cerca de 4,5, podendo variar, mesmo em condições normais, entre
3,9 e 6,3.
Os ensaios in vivo revelam que as cápsulas de gelatina para uso rectal libertam o seu conteúdo
em, aproximadamente, 27 minutos, e as de uso vaginal em 5-8 minutos.
Do ponto de vista prático podemos, portanto, considerar aplicáveis às cápsulas rectais e vaginais
os ensaios executados com as cápsulas de uso oral, sendo válidos os tempos de desagregação então
estipulados.
3) Água — Para determinar o teor de água existente nos invólucros das cápsulas de gelatina
podem ser utilizados três métodos fundamentais:
— Aquecimento na estufa até peso constante;
— Método de KARL-FISCHER;
— Método de destilação azeotrópica com xileno ou tolueno.
Qualquer destes métodos foi descrito a propósito de ensaios efectuados com os pós, razão por
que nos dispensamos de os transcrever de novo (ver pág. 631).
Lembramos que o teor de água residual das cápsulas de gelatina mole é de 8-10% e o das
cápsulas de gelatina dura é de 14-16%. KUHN, utilizando o método de KARL-
-FiscHER, encontrou, para este último tipo de cápsulas, o valor médio de 16,73%.

7.2.1.9.2.9. Acondicionamento das cápsulas


A escolha judiciosa de embalagens para cápsulas deve ter em atenção a região onde o produto é
consumido, cujo clima influi na estabilidade do mesmo, e a sensibilidade relativa da preparação.
São especialmente de temer os climas húmidos e quentes, devendo ser acondicionadas de tal
modo que sejam pouco ou nada influenciadas pelas condições deletérias de conservação as cápsulas
que se destinem a essas regiões.
Por meio de ensaios conduzidos com cápsulas cheias de gele de sílica, cuja variação de peso se
aprecia, foram estudados vários tipos de embalagem, tendo-se chegado à conclusão de que os
recipientes constituídos por vidro, polietileno (politeno) ou por alumínio se poderiam considerar
eficientes, desde que ficassem hermeticamente fechados. Já o polistireno (polystyrol) não se revela
eficaz, deixando passar água através
942

das suas paredes (4 mg de água por semana e por cápsula, quando as embalagens são expostas numa
atmosfera de humidade relativa elevada).
Do que se disse compreende-se que se prefira proceder ao acondicionamento das cápsulas em
frascos de vidro, de alumínio ou de polietileno. Quanto a nós, consideramos preferíveis os dois primeiros
processos de embalagem, que devem apresentar tampas de enroscar e cintas plásticas adicionais, a fim
de garantir a estanquicidade dos recipientes. Os frascos de polietileno, se bem que satisfaçam na
maioria dos casos, podem apresentar maior permeabilidade ao vapor de água.
Em muitos casos, inclui-se no recipiente onde se acondicionam as cápsulas pequenos exsicadores
contendo gele de sílica, os quais exercem o seu efeito fixador da humidade, principalmente após a
abertura dos repicientes. A Fig. 343-A representa um dos tipos de exsicador mais utilizado, o qual está
incorporado na rolha do frasco onde se acondicionam as cápsulas.

Ffg. 343-A. Frasco contendo cápsulas e respectiva tampa com sistema exsicador

Actualmente, inúmeras fórmulas de cápsulas são acondicionadas em embalagens tipo «blister», em


tudo idênticas às usadas para os comprimidos ou, até, em fita ter-mocolada de alumínio ou de material
plástico.
Por último, interessa ainda considerar, durante o acondicionamento, a atmosfera da sala onde aquele
é efectuado. É importante que a temperatura e o grau de humidade sejam regulados de acordo com a
sensibilidade dos princípios medicamentosos. Assim, por exemplo, na preparação e acondicionamento
de cápsulas contendo cloridrato de betaína e pepsina deve ter-se o cuidado de evitar a presença de
humidade (salas mantidas a 20-25"C com uma humidade relativa não superior a 40%), que seria rapi-
damente absorvida pelas substâncias medicamentosas.
943

7.2.1.9.2.10. Formulário das cápsulas


Embora fossem relativamente poucas as fórmulas inscritas nas farmacopeias sob a forma de cápsulas de
gelatina há alguns anos atrás, esta preparação farmacêutica tem vindo a adquirir, progressivamente, grande
prestígio, sendo muito numerosos os produtos especializados que assim se dispensam bem como as fórmulas
inscritas nas farmacopeias (')• Como em casos análogos, indicaremos algumas fórmulas de cápsulas, mencionando
as particularidades que nos parecem de maior interesse para a sua preparação.

l,.
í. " :! •. '•'-
Sulfatiazol ................................................ 0,165 g ",
Ftalilsulfatiazol ........................................ 0,165 »
Sulfaguanidina.......................................... 0,165 »
Ácido ascórbico ...................................... 0,050 »
Menadiona................................................ 0,005 »
'• ' ''' Faça uma cápsula e mais onze iguais I.IM.J-.-] fi.< i

Trata-se de uma fórmula usada como anti-séptico intestinal, constituída pela associação de três
sulfamidas com vitaminas C e K3.
Podem usar-se cápsulas duras n.° 00, completando-se o seu enchimento com lactose (acção dilueme e
protectora da oxidação da vitamina C), eventualmente associada a 1% de estearato de magnésio.
n
Menadiona................................................ 0,25 g
Bitartarato de colina .............................. 0,25 »

Numa cápsula e mais nove iguais


O sal de colina é muito higroscópico, devendo associar-se-lhe uma substância absorvente da
humidade. Pode utilizar-se o pó de alcaçuz, numa quantidade de 0,15 g por cápsula, acondicionando-se
a mistura em cápsulas duras n.° 00.

(') A BPh (1963), a USP XVII e a F. I. VII (1%5) inscrevem, respectivamente, 16, 22 e 5
monografias de cápsulas enquanto que a BPh de 1988 e â USP XXII inscrevem, respectivamente, 58
e 203.
944

m v s

Ácido acetilsalicílico ................................ 0,45 g


Cafeína ...................................................... 0,05 »
É uma medicação analgésica e antipirética, cuja preparação não oferece dificuldades. Podem usar-se
cápsulas duras n." O, visto que a quantidade discriminada de aspirina enche praticamente cada
receptáculo desse número.

IV

Vitamina A ................................ 5000 Unidades Internacionais


Vitamina D2 .............................. 2000 » »

Numa cápsula e mais 19 iguais

Para preparar cápsulas duras pode usar-se o acetato de axeroftol, de ponto de fusão 57-58°C, o que
é preferível à utilização da vitamina sob a forma de álcool, que é líquida. A quantidade de vitamina A
(acetato) a empregar por cápsula é de 1,72 mg, dado que l U. I. de vitamina A equivale a 0,344
microgramas de acetato de axeroftol.
O peso de vitamina D2 a incluir por cápsula é de 50 mcg (l mcg de vitamina D2 cristalizada o 40
U. L).
Para evitar a oxidação da vitamina A (ligações isoprénicas facilmente alteráveis) aconselha-se a
adição de 0,01 mg de ot-tocoferol por cápsula. Pode usar-se a lactose como diluente, ajustando-se a sua
quantidade de acordo com a capacidade da cápsula desejada. É conveniente um peso mínimo de 0,2 g
de lactose por cápsula.
A fórmula referida pode empregar-se em cápsulas moles (pérolas, por exemplo). Para isso
dissolvem-se as vitaminas (axeroftol e calciferol) e o antioxidante em azeite neutro, saturado de anidrido
carbónico, o que impede a acção deletéria do oxigénio atmosférico.

Anidrido arsenioso ....................................


Sulfato de estricnina .......................... ãa 0,033 g
Ferro reduzido .......................................... 0,650 »

Faça em uma cápsula n.° 10 iguais


945

A fórmula citada apresenta propriedades reconstituintes e fortificantes. Dada a grande densidade do


ferro reduzido é possível empregar cápsulas de pequena capacidade
(n.° 1).

•i. •:-.. ' ; VI •::,(„: S


.obiiív r-Mi-r
Penicilina G potássica .... 100 000 Unidades Internacionais
Sulfadiazina ...................... 0,5 g
Numa cápsula n." 12
Cada miligrama de penicilina G potássica padrão equivale a 1595 U. I. Dada a transformação da
penicilina em ácido penflico pela acidez do suco gástrico, as cápsulas devem ser revestidas por
envolvimentos que evitem a sua desagregação no estômago, proporcionando a libertação do seu
conteúdo no intestino delgado. É corrente a utilização de acetoftalato de celulose como revestimento
gastro-resistente.

VTI

Mononitrato de tiamina.................................... lg
Divida por 10 cápsulas de capacidade apropriada
Esta fórmula é apenas constituída pelo mononitrato de tiamina, sal mais estável do que o
cloridrato, que tantas vezes se utiliza como fonte de vitamina B,. Embora seja vulgar a dosagem de
100 mg por cápsula, é de lembrar que a vitamina B,, quando administrada por via oral, não é
absorvida senão em taxa bastante inferior, sendo a quantidade excedente excretada com as fezes.
Podem usar-se cápsulas n." 4 ou n." 5, o que depende da tenuidade do pó utili
zado. • • - •- .....— . .,,. ..... - .... •
•: •' '•;, i *\ •'.,.: v;: . -: .m m.r' •'':> :•>£: ;...;.
. : :„ ... ,'„
Vffl

Bromofórmio............................................ 0,10 g
Codeína .................................................... 0,01 »
Urotropina ................................................ 0,15 »
Beladona em pó...................................... 0,02 »
Acónito em pó........................................ 0,02 »
Terpina hidratada .................................... 0,15 »
Benzoato de sódio .................................. 0,15 »
Numa cápsula e mais 5 iguais ,„_„..
946

Trata-se de uma fórmula medicamentosa utilizada no tratamento das tosses rebeldes.


Nesta preparação encontramos um princípio líquido que é o bromofórmio. A sua absorção pode
fazer-se associando-o à urotropina (hexametilenotetrazoto), com a qual origina um produto sólido. É
também necessário particular cuidado com a uniforme distribuição da codeína, cuja quantidade é
muito inferior à dos restantes componentes.

IX
Fenilbutazona ................................................ 0,10 g
• '• Gentisato de amidofebrina .......................... 0,50 » •'•-'' '
''*"""' '• ' Cloridrato de tiamina .................................. 0,02 »
.•'j ^: i"' '
' "\ <* ..;.>:. . : .;.-• Numa cápsula e mais 5 iguais 'ïr^J ?•
Esta fórmula é usada como anti-reumatismal, propriedade que se deve aos seus três componentes.
Seria preferível empregar o mononitrato de tiamina em lugar do clori-drato, mas o derivado da
amidofebrina é particularmente sensível aos oxidantes. A fenilbutazona é muito pouco solúvel em
água, razão por que, às vezes, se dá a preferência ao seu sal sódico (l g de fenilbutazona dissolve-se
por adição de 0,27 g de bicarbonato de sódio).

Pepsina ......
Pancreatina
Faça 10 cápsulas iguais
Nesta fórmula observa-se a associação de dois produtos dotados de actividade
enzimática, devendo a pepsina actuar em meio ácido e a pancreatina em meio alcalino.
Surge, assim, a necessidade de proteger a pancreatina do ácido clorídrico por meio de
um envolvimento gastro-resistente. A dificuldade pode ser resolvida preparando umas
pílulas de pancreatina, as quais se revestem com acetoftalato de celulose, com goma
laca, ou queratina. Numa cápsula de grande capacidade introduz-se uma pílula e a
quantidade exacta de pepsina.. ........ . . . . . . . . . L^W^JUV>.-.,.
.-- „.,. . ...: -,.>3
A fórmula para preparar as pílulas pode ser a seguinte:
Pancreatina .................................................... 2,5 g
Bicarbonato de sódio.................................... 0,5 »
Extracto de grama ........................................ q.b.
947

Outro processo de preparação consiste em acondicionar a pancreatina numa pequena cápsula dura
n.o 3 ou 4, revestir essa cápsula com envolvimento gastro-resis-tente e acondicioná-la, juntamente com a
pepsina, numa cápsula n.° 00 ou 000.

XI •: -••--•!**• .:". ..•"- - --,-,..

Extracto etéreo de feto macho.................... 0,5 g

Para uma cápsula gelatinosa n." 26 <


A substância medicamentosa pode ser dispensada em cápsulas moles ou duras,
sendo aconselhável que estas últimas sejam cintadas, ou, pelo menos, soldados os seus
bordos com uma solução de gelatina. .
». ,,-~ • ' .' '
• ' ' -j- • •'•

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Sciences, Mack Pub., Easton, 1980.
949

7.3. POLPAS
As polpas são formas farmacêuticas de consistência mole, obtidas a partir de plantas, de partes
de plantas ou de órgãos animais, com aproveitamento das zonas moles e carnudas e rejeição das
partes fibrosas ou duras das drogas utilizadas.
Conhecidas, antigamente, sob a denominação de Pulpolitos de CHEREAU, as polpas constituem o resultado
da polpação, que é uma operação de divisão de materiais farmacêuticos frescos. São formas muito simples,
cuja importância é semelhante à das Espécies e que, tal como estas, caíram praticamente em desuso.
Era hábito dividi-las em polpas animais e polpas vegetais.

7.3.1. FORMAS COMPLEMENTARES DAS POLPAS


Sob esta designação iremos considerar duas formas farmacêuticas que, como as polpas, são
actualmente muito pouco usadas: conservas e electuários.
As conservas são formas obtidas pela mistura de açúcar com substâncias medicamentosas de origem
vegetal.
Os electuários são formas farmacêuticas de consistência mole, constituídas por misturas complexas
de polpas, extractos, pós vegetais, etc., que se agregam por intermédio de xaropes, de mel, de melitos, de
vinhos medicinais e, até, de resinas líquidas.
Os electuários destinados a medicina humana, e que hoje não se utilizam, devem apresentar
consistência de massa pilular, enquanto que os utilizados em medicina veterinária têm a consistência de
mel espesso. Para se conseguir a consistência apropriada incluem-se, na preparação de alguns
electuários, pós, como o de alcaçuz ou de alteia, ou até mesmo a farinha.
Os electuários, hoje rarissimas vezes utilizados, tiveram, porém, uma excepcional voga em razão do
seu carácter de medicamentos complexos, por vezes com mais de 50 produtos diferentes na sua
composição. Entre os electuários mais famosos conta-se a célebre teriaga de ANDRÓMACO, cuja preparação
constituía a prova final do exame a que eram submetidos, em alguns países, os futuros boticários. Aos
electuários que continham ópio na sua composição era dado o nome de opiatos.
A F. P. IV ainda inscrevia Q electuário de sene. • .

BIBLIOGRAFIA

VALERI PAOLI, J. F. — Cátedra Galenica. Caracas, 1959.


GORIS, A. e LIOT, A. — Pharmacie Gaiénique, Masson, Paris, 1949.
950
951

Formas farmacêuticas obtidas por extracção mecânica

8.1. SUCOS >


Os sucos são líquidos ou soluções extractivas sólidas ou pastosas retiradas das células animais ou
vegetais. São obtidos por escoamento espontêneo ou preparados por intervenção de diversas operações
mecânicas, como a incisão, a decantação, a expressão, a centrifugação e a filtração.
Os sucos animais provêm de líquidos de secreção ou de líquidos celulares e podem apresentar-se no
estado líquido ou como sólidos de consistência variável. Os sucos vegetais podem ser de diversos tipos,
consoante os princípios constituintes, dizendo-se aquosos, oleosos, gomosos, gomo-resinosos e
balsâmicos.
A actual importância medicamentosa dos sucos é diminuta. Entretanto, a tecnologia
da sua obtenção continua a ter interesse e o estudante de Farmácia deve conhecer as
linhas gerais da sua produção. É por esse facto que mantivemos, na forma original, este
capítulo da Farmácia Galénica. ,
r
' • i- t •• -. • • - -'sí^í .v•,
.•.*•.'.-• •'• . •.-."SI.-í^-TJVÏ '• ;" .-••'. .r^fifií;

8.1.1. SUCOS ANIMAIS


Mais do que uma forma farmacêutica estes sucos são verdadeiras drogas. Assim, a banha, o óleo de
bacalhau, o espermacete, a bílis de boi, etc., são sucos animais que constituem drogas de interesse farmacêutico.
Normalmente, estes sucos não se empregam tal como se obtêm, mas são adminis
trados após tratamentos adequados, que os transformam em formas farmacêuticas. A
banha t o espermacete são empregados como excipientes de pomadas; o óleo de
bacalhau é administrado sob a forma de cápsulas ou em emulsões; a bílis de boi serve
para obter um extracto, que depois se pode administrar em cápsulas ou em compri
midos. . . .
952

8.1.2. SUCOS VEGETAIS

Consoante o seu principal elemento constitutivo podem dividir-se em aquosos, oleosos, gomo-
resinosos, resinosos, balsâmicos, etc. Têm para nós especial interesse, como forma farmacêutica, os
sucos aquosos, que podem, por seu turno, ser açucarados, herbáceos ou ácidos.

8.1.2.1. Sucos aquosos açucarados

São caracterizados por apresentarem apreciável percentagem de açúcares, como sacarose,


glicose, levulose, manita, genciobiose, trealose e outros. Contêm, também, notória quantidade de sais
minerais e orgânicos (cítrico, málico e tartárico) e é frequente a presença de corantes (clorofila,
flavonas e pigmentos antociânicos). Acessoriamente, podem conter gomas, albuminas, substâncias
pécticas, heterosídeos, mucilagens, etc. São, normalmente, obtidos por expressão, quer através de
coadores, quer por meio de prensas, como a de COLLAS.
Entre os sucos açucarados de interesse farmacêutico citaremos o de maná e o de alcaçuz.
O maná é um suco concreto obtido por incisões da casca do Fraxinus Ornus e do F. excelsior.
Dele se obtém, por expressão, o maná em lágrimas, que constitui um suco muito rico em manita e que
se usa como purgativo fraco.
O suco do alcaçuz é obtido tratando as raízes secas do alcaçuz por água e submetendo-as a
expressão subsequente. É muito rico em glicirrizina, substância hete-rosídica que apresenta acção
estimulante das cápsulas supra-renais. A partir deste suco obtém-se, por concentração, um extracto
que serve para preparar muitas fórmulas farmacêuticas, como xaropes, pílulas, etc.
;
'- "'/.IMA SüOüí . ï BA.2.2. Sucos aquosos
herbáceos
Entre estes sucos, que são obtidos por expressão de plantas herbáceas, citaremos o suco de
agriões e o de couves.
O suco dos agriões apresenta elevado conteúdo em iodo, ferro, senevol feniletílico e vitamina C.
É antiescorbútico e alimentar.
O suco de couve tem-se empregado para combater a úlcera gástrica, dada a presença de
vitamina U, para a qual se tem descrito certa acção adjuvante na regeneração da mucosa estomacal.
953

8.1.2.3. Sucos aquosos ácidos


São sucos que apresentam especial predominância de ácidos orgânicos, como o cítrico, o málico e
o tartárico. Têm apreciável quantidade de vitaminas, pigmentos (especialmente antociânicos) e pectina.
São obtidos a partir de frutos, como as groselhas, as amoras, os marmelos ou as maçãs. Além dos
constituintes citados, contêm 5 a 20% de glúcidos, 0,1 a 1% de substâncias proteicas e 75 a 95% de
água.
Normalmente usam-se em Farmácia Galénica para preparar outras formas farmacêuticas, como xaropes
e extractos. Para se obterem expurgam-se os frutos das suas partes rijas (caroços, sementes, pedúnculos e
cascas) e polpa-se ou raspa-se o conjunto obtido. Se os frutos são relativamente consistentes
(marmelos, maçãs) procede-se à raspagem através de um crivo. Se são moles e suculentos
(amoras, groselhas) são apenas espremidos suavemente.
Na indústria, as operações mencionadas são conduzidas em aparelhos
especiais, como extractores, raladores, refinadores, etc. A Fig. 344 representa
um ralador do tipo BERTUZZI.
Uma vez obtidos os sucos, procede-se à
sua clarificação. Para isso são colocados a Fig. 344. Ralador Bertuzzi
fermentar, durante alguns dias, até que uma
pequena porção de suco não turve quando se lhe adiciona metade do seu
volume de álcool. A fermentação decorre a uma temperatura de 20-25°C
(algumas vezes a 10-11°C) e consiste, essencialmente, numa produção de
álcool, a partir da glucose, e de ácido péctico, formado à custa da pectina.
Esta é um composto glucídico constituído por moléculas complexas, muito longas e filiformes. O
principal elemento constitutivo das cadeias de pectina é o ácido galacturónico parcialmente
esterificado pelo álcool metílico.
A pectina, formada por fermentação à custa da pectose ('), pode transformar-se em ácido péctico (por
influência dum enzima presente nos próprios frutos — a pectase), o qual origina a formação de uma
geleia. Resumidamente, poderemos esquematizar as modificações operadas do seguinte modo:

Pectase
Pectose Pectina ácido péctico (gele)

(') O simples aquecimento das polpas dos frutos verdes origina, igualmente, a transformação da
pectose em pectina. ..,,,, ,.„. .,....,„ ,„ . •. . ... ••.;>.*.^.i uír-wíj T: n
954

Ao mesmo tempo que ocorrem estas transformações, opera-se a inversão da sacarose,


originando-se glucose e levulose. A glucose sofre, então, a fermentação alcoólica, produzindo álcool
e anidrido carbónico. A presença de ácidos facilita a fermentação péctica e o anidrido carbónico, ao
evolar-se, faz com que o ácido péctico que gelifica venha sobrenadar o suco. O suco fica, portanto,
dividido em duas partes — uma,
perfeitamente líquida, e a outra, gelificada, que se separa por
decantação.
Pode acontecer que a fermentação péctica não termine em ácido
péctico mas que este precipite sob a forma de pectatos insolúveis, caso
estejam presentes certos catiões alcalino--terrosos ou pesados. A
fermentação alcoólica da glucose é possível devido às leveduras
existentes no suco, provenientes do ar e dos próprios frutos.
Se o fruto não for demasiado rico em pectose, que, como já vimos, é
necessária à clarificação, pode adicionar-se-lhe uma pequena
quantidade de um suco de frutos que apresente elevada quantidade de
pectose ou de pectina (cerejas negras, ginjas vermelhas).
A clarificação destes sucos pode ser feita por outros processos,
como a filtração a frio, que é muito demorada, a filtração a quente, que
já é mais prática e rápida e a depuração por coagulação. Este último
processo consiste em aquecer o suco a uma temperatura vizinha
de 90°C, o que origina a coagulação das albuminas, que se separam,
posteriormente, por decantação. Na indústria, é frequente empregar-se
a centrifugação como operação prévia da clarificação. Na Fig. 345 está
representada uma centrífuga industrial VERONESI. Destes processos é
preferível o da fermentação, já que ao formar-se o ácido péctico, que
Flg. 345. Centrífuga Veronesi
gelifica, as albuminas presentes e os outros corpos, que turvam o suco, ficam
aprisionados no gele de ácido péctico, tornando-se límpido o suco obtido. Por
outro lado, a própria fermentação alcoólica é benéfica, dado que o álcool formado passará a actuar
como verdadeiro conservante, impedindo posteriores alterações do suco.
Não se fique, porém, com a ideia de que todos os sucos só são exclusivamente submetidos a estas
operações de clarificação. Efectivamente, na indústria alimentar são muitas vezes desejáveis sucos
muito límpidos que não apresentem vestígios de pectina. Para isso, em regra, aquecem-se os sucos
brutos a 40-50°C, ajuntando-se-lhes, então, um enzima pectolítico capaz de acelerar fortemente a
cisão hidrolítica da pectina. De
955

facto, o enzima abre as cadeias do ácido galacturónico e saponifica os radicais metílicos presentes.
Esta operação torna o suco muito menos viscoso, permitindo a sua fácil filtração.

...; ..
8.1.2.3.1. Conservação dos sucos ácidos ,., .,. ., ...,,.,.. ,,, , %(,
Em regra, os sucos ácidos conservam-se mal. O melhor processo para evitar a sua alteração
reside em esterilizá-los pelo método de NICOLAS APPERT, que consiste em aquecer o suco a 100"C, isto
é, por imersão do recipiente em que se encontra o suco, num banho-maria fervente, durante 30-45
minutos. O recipiente deve ser, depois, perfeitamente tapado, de modo a evitar qualquer entrada de
ar; a tampa deve aplicar-se com o suco quente, situação em que, portanto, o ar se encontra expulso.
Este facto provocará a aderência da tampa ao recipiente, no qual será feito um certo grau de vazio,
sendo, assim, eficazmente melhorada a conservação. Outro processo consiste em os esterilizar, por
autoclavação, no vazio, a 70°C, ou por filtração (sistema de ZAIS--BOHY). Para evitar a oxidação dos
componentes dos sucos tem sido proposto o uso de substâncias redutoras, como o anidrido sulfuroso,
o bissulfito de sódio e o metabissul-fito de sódio ('). A fim de reforçar a esterilização, dificultando a
proliferação microbiana, têm-se adicionado aos sucos substâncias conservantes anti-sépticas, como o
ácido benzóico, o ácido salicílico e o formol. O uso destes compostos não é isento de inconvenientes,
propondo-se, actualmente, o emprego de p-hidroxibenzoato de metilo (0,1-0,15%) e de p-
hidroxibenzoato de propilo (0,02-0,1 %), que apresentam menor toxicidade. É importante lembrar
que, tratando-se de dois compostos pouco hidros-solúveis, se deve procurar fazer a sua dissolução no
suco, a quente.

8.1.2.3.2. Ensaio dos sucos ácidos -'•


Este ensaio incide especialmente sobre a apreciação da densidade que os sucos apresentam a
15°C. Esta deve variar entre 1,007-1,075, mas consideram-se em melhores condições os sucos cuja
densidade esteja compreendida entre 1,027-1,075. A F. P. IV inscreve as densidades toleráveis, para
diversos sucos, como o de amoras, de groselhas e de marmelo. Estes destinam-se essencialmente à
preparação de xaropes, inscrevendo a F. P. a quantidade de açúcar a juntar, em função da densidade
que o suco apresenta (Tabela XV da F. P. IV). No comércio encontram-se concentrados semelhantes
a estes sucos, os quais se destinam a substituí-los, quando a época do ano não permita obtê-

(') Os compostos que libertam anidrido sulfuroso, além da sua acção redutora, desempenham
funções microbicidas. • • -
956

-los directamente. Estes concentrados são, em regra, obtidos artificialmente pela mistura de açúcar e de
água à essência que exista no suco em questão. Neste caso são corados artificialmente.
É importante verificar a natureza do corante adicionado, que deve ser permitido para a alimentação.
A identificação dos corantes é fácil de executar recorrendo a ensaios de cromatografïa em papel ou em
camada delgada. Por outro lado, existem descritas reacções específicas para os corantes naturais de
cada suco. Assim, por exemplo, o suco de groselha, natural, que é vermelho, cora de roxo pela
adição NaOH; isto não acontece quando o suco é corado artificialmente com corantes não naturais.

8.1.2.3.3. Sucos ácidos da F. P. IV » .


A F. P. IV inscreve 4 sucos ácidos: amoras, groselhas, marmelo e maçã.
Suco de amoras (Mori succus) — obtido por expressão das amoras e clarificação subsequente
por fermentação e filtração, ou por coagulação pelo calor. Nesta preparação devem evitar-se
materiais de ferro ou de estanho, que alteram os constituintes do suco.
O suco de amoras contém especial abundância de ácido cítrico e de sais de potássio. A sua
densidade está compreendida entre 1,037-1,050.
Usa-se na preparação do xarope de amoras, que tem propriedades adstringentes.
Suco de groselhas (Ribesiarum succus) — obtido por expressão de polpa de groselhas, é
clarificado por fermentação e filtração (suco de groselhas depurado).
Como é pouco rico em pectose, é normalmente adicionado de 5% de suco de cerejas pretas ou
de 10% de suco de ginjas vermelhas para acelerar a fermentação. Contém ácidos cítrico e tartárico
e açúcares. A sua densidade está compreendida entre 1,028-1,054.
Usa-se na preparação do xarope de groselhas, que se utiliza como edulcorante e aromatizante.
Suco de marmelo (Cydonii succus) — é obtido por expressão da polpa do marmelo em começo
de maturação e privado do seu revestimento lanoso. Posto em lugar fresco, decantado e filtrado
depois de sofrer ligeira fermentação, constitui o Suco de marmelo depurado — «Cydonii succus
depuratum», cuja densidade deve ser de 1,047-1,068.
Suco de maçã (malorum succus) — obtido por expressão da polpa de maçãs, é especialmente
rico em ácido málico. Este suco usa-se na preparação do extracto de maçãs, ferruginoso, cujo
principal componente é o malato ferroso.
957

BIBLIOGRAFIA
BÉRIO, V. — succhi di frutta — Boll. Chim. Farm. 102, 578, 1963.
DENOP.L, A. — Cours de Pharmacie Pratique, Lês Presses Universitaires, Liège, 1954.
GORIS, A. e LIOT, A. — Pharmacie Galénique, Masson, Paris, 1949.
GUICHARD, C. — Tecnhologie pharmaceutique, Ed. Flammarion, Paris, 1967.
958
959

Formas farmacêuticas obtidas por dispersão mecânica

9.1. EMULSÕES 9.1.1. GENERALIDADES

Como já vimos na Técnica Farmacêutica, ao estudar a emulsificação, as emulsões são produtos


de aspecto leitoso resultantes da dispersão de um líquido num outro, com o qual não seja miscível, à
custa de um agente emulsivo, cujo papel é o de facilitar a formação e tornar estável o sistema
disperso assim obtido.
Além do agente emulsivo, de capital importância na obtenção destas preparações farmacêuticas,
uma emulsão tem sempre uma fase aquosa e outra oleosa, podendo quer uma, quer outra,
representar a sua fase externa, pelo que há emulsões O/A e A/O. Ambas são utilizadas em farmácia,
embora as emulsões para uso interno correspondam, quase exclusivamente, a preparações do tipo
O/A.
*• :. • . . ... . :'». i '•
9.1.2. HISTÓRIA
'i.au ;; í - •.. • \rjTV <-Vu-:^ /
A palavra emulsão deriva do verbo latino emulgeo, que significa mungir, aplicando-se, de um
modo geral, a todas as preparações de aspecto leitoso com as características de um sistema disperso
de duas fases líquidas. Inicialmente, apenas se usavam emulsões naturais, como as preparadas com
amêndoas e água, atribuindo-se a GREW a obtenção das primeiras emulsões para uso medicinal. O
referido autor emulsionava óleos com gema de ovo, tendo comunicado os resultados das suas
experiências à Real Sociedade da Grã-Bretanha em 1674.
Com o andar dos tempos a utilização destas preparações foi-se difundindo cada vez mais, como se
pode ver em várias obras farmacêuticas do séc. XV11I. Assim, por exemplo, a Quincy's Pharmacopeia
de 1718 inclui 24 fórmulas destas. .,,_. ..
960

Entretanto, a lista dos agentes emulsivos foi aumentando progressivamente e em 1757 FRENCH,
farmacêutico londrino, já utilizava, além da gema de ovos, as gomas arábica e adraganta, xaropes, mel e
mucilagem na preparação das suas emulsões.
Durante o séc. XIX assiste-se a um renovado interesse por estas preparações, patente nas numerosas
fórmulas então publicadas e nos progressos introduzidos na sua manipulação. Na realidade, foi na segunda
metade do século passado que se codificaram os principais métodos de preparação das emulsões, como o
método inglês ou da goma húmida, o método continental ou da goma seca e o método do frasco, proposto por
FORBES, em 1872, para a preparação de emulsões contendo essências.
Durante o presente século a teoria das emulsões tem merecido a atenção de
numerosos investigadores, devendo-se a este facto, aliado à síntese de grande número
de agentes tensioactivos feita nestes anos mais recentes, o uso cada vez mais genera
lizado que se vem fazendo destas preparações, quer no campo farmacêutico, quer no
campo da cosmética. ,,.

9.1.3. FINALIDADE DA EMULSIFICAÇÃO


O interesse que a emulsificação tem na tecnologia farmacêutica deriva da circuns
tância de tomar possível a administração, numa única mistura, de substâncias hidro e
lipossolúveis, a qual, conforme o fim a que se destina, poderá representar uma emulsão
para uso interno ou externo. ,

9.1.3.1. Emulsões para uso interno


Uma emulsão para uso interno pode ser administrada oralmente ou por via endovenosa.
.^:.r-- . .'.it . a) Emulsões administradas por via oral.
As emulsões destinadas a serem administradas por via oral pertencem exclusivamente ao tipo O/A.
Recorre-se a esta forma medicamentosa quando o óleo medicinal possui um paladar desagradável,
conseguindo-se, muitas vezes, disfarçar por completo o seu gosto graças à divisão do óleo em pequenas
gotículas na fase externa, aquosa. É corrente juntar a estas substâncias edulcorantes e aromatizantes, com o
objectivo de melhorar o gosto da preparação.
A escolha destes agentes correctivos deve incidir, contudo, apenas naqueles que sejam hidrossolúveis, pois
é da maior vantagem que tais substâncias fiquem concentradas na fase externa da emulsão, uma vez que só
deste modo poderão disfarçar eficazmente o gosto da droga que se pretende corrigir. Aliás, se esta última
apresentar um
961

apreciável coeficiente de solubilidade na água, distribuir-se-á nas duas fases da preparação e quando isso
acontece o seu paladar nunca poderá ser convenientemente encoberto pêlos correctivos. Compreende-se,
por isso, que uma emulsão O/A só conseguirá disfarçar, com êxito, o paladar de uma droga quando esta
for totalmente insolúvel na água.
Em certos casos, porém, torna-se possível corrigir o gosto desagradável de algumas substâncias
hidrossolúveis que figuram na mesma emulsão O/A recorrendo a uma dupla emulsificação. De facto, HUSA
refere um exemplo destes, em que se consegue encobrir o gosto amargo de um produto solúvel na água
incorporando-o, primeiramente, na fase interna de uma emulsão do tipo A/O. Esta emulsão é, depois,
transformada numa outra de tipo O/A por adição de um agente emulsivo hidrófilo, daqui resultando que a
substância amarga fica situada na parte mais interna da fase aquosa da dupla emulsão água-óleo-água,
conseguindo-se, assim, disfarçar o seu paladar desagradável.
Muitas vezes recorre-se à emulsificação para facilitar a absorção de gorduras pelo intestino. Estas,
como se sabe, são normalmente emulsionadas no duodeno pêlos sais biliares e depois hidrolisadas por
enzimas do suco pancreático, daí resultando a formação de ácidos gordos e glicerina que são absorvidos
através da parede intestinal. Acontece, porém, que as gorduras intactas poderão franquear, igualmente,
aquela parede desde que se apresentem emulsionadas em glóbulos com diâmetros inferiores a l N.. Deste
modo, para aumentar a absorção de um óleo pelo intestino está indicado administrá-lo sob a forma de
emulsão, aconselhando-se que os glóbulos dispersos tenham um diâmetro médio de cerca de 0,5 u,, pois
assim a sua absorção dar-se-á eficazmente.
Às emulsões para uso oral, devidamente edulcoradas e destinadas a serem administradas às colheres e
que, por isso, são verdadeiras poções, é corrente dar-se a designação de looques (looks ou loochs). Este
nome deriva, possivelmente, do termo árabe lahok (secar), sendo, também, provável que a palavra grega
que significava lamber tenha contribuído para a sua raiz etimológica, já que as primitivas preparações
apresentavam a consistência de mel e eram administradas chupando uma espécie de pincel que nelas se
molhava.
A F. P. IV inscreve o looaue branco, o qual é uma emulsão de óleo em água que pode ser utilizada
como excipiente em várias preparações medicamentosas.

endovenosa âíí!t:l • -'T f* f "';-b) Emulsões administradas por via


Nestes últimos anos tem-se proposto a administração, por via parenteral, de óleos alimentares e
medicinais sob a forma de emulsão do tipo O/A.
É evidente que a preparação de emulsões destinadas a serem administradas por via
endovenosa levanta problemas delicados, sendo necessário dispensar o maior cuidado
à escolha dos emulgentes a utilizar e ao diâmetro e uniformidade dos glóbulos
dispersos. . ,„.._.. _,.,„„....„> .„-,...„-._..,„,. -™^,,.-,™,..,
962

9.1.3.2. Emulsões para uso externo , b « , í > í,


Presentemente, as emulsões constituem uma das formas mais usadas em dermatologia, podendo
afirmar-se que têm vindo a substituir progressivamente as antigas pomadas feitas com excipientes de
natureza gordurosa.
As emulsões para aplicação externa tanto podem ser do tipo O/A como A/O, tornando-se possível
preparar fórmulas de consistência muito variável.
A preferência que tem distinguido estas preparações filia-se numa série de características por
elas apresentadas, tais como a obtenção de produtos com a desejada consistência, a facilidade com
que se espalham sobre a área afectada, a sua fácil remoção e o facto de não mancharem as roupas
dos doentes.
Por vezes, a emulsificação de uma substância medicamentosa numa base provoca a diminuição
do ritmo de absorção dessa substância através da pele e das membranas mucosas e tal propriedade
pode ser aproveitada para a obtenção de fórmulas de acção retardada. Assim é que a efedrina, sob a
forma de emulsão O/A, é mais lentamente absorvida pela mucosa nasal do que se for aplicada em
solução oleosa, o que toma possível prolongar-se o seu efeito vasoconstritor local.
Em regra, contudo, a emulsificação aumenta a absorção percutânea dos fármacos
com pequeno coeficiente de partilha óleo/água, estando verificado, por exemplo, que
mesmo os anti-sépticos hidrossolúveis são mais rapidamente absorvidos através da pele
quando dissolvidos na fase externa de uma emulsão O/A do que quando incorporados
num veículo gordo. .

9.1.4. COMPONENTES DE UMA EMULSÃO - " - -•


A própria definição de emulsão diz-nos que estas formas farmacêuticas são basicamente
constituídas por duas fases distintas, uma de natureza aquosa e outra oleosa, além de nelas figurar
sempre um terceiro componente, representado pelo agente emul-sivo. Vejamos, portanto, qual a
composição de cada um dos três elementos que constituem uma emulsão.

9.1.4.1. Fase aquosa 7. ;K.-.;k


A água representa sempre uma das fases obrigatoriamente presentes em todas as emulsões,
podendo conter em dissolução várias substâncias, como produtos medicamentosos, conservantes,
corantes, edulcorantes e aromatizantes.
Em geral utiliza-se a água destilada ou desionizada, pois a presença de sais de cálcio e
magnésio, existentes nas águas duras, constitui um elemento perturbador da estabilidade das
emulsões, sobretudo quando na sua preparação se utilizam sabões
963

alcalinos como emulgentes. Pelo mesmo motivo torna-se necessário estabelecer, previamente, a
compatibilidade entre todos os electrólitos a dissolver na fase aquosa e o agente emulsivo a utilizar,
de modo a evitar a inactivação deste.
Como exemplo de substâncias medicamentosas que, por vezes, se adicionam à fase aquosa
podemos citar o iodeto de potássio, o cloreto de amónio e o hidrato de cloral. Em qualquer dos
casos, a substância deve ser adicionada à emulsão a pouco e pouco e o mais diluída possível, a fim
de se minimizar qualquer acção sobre o emulgente, pelo que é aconselhável dissolvê-la na totalidade
da água que figure na fórmula.
Pelas razões atrás expostas, os correctivos também deverão ser adicionados à fase aquosa, ao
passo que os agentes conservantes se dissolverão na fase aquosa ou oleosa consoante a acção
protectora que dele se pretende.
As emulsões estão sujeitas ao ataque de bactérias e fungos, especialmente se contêm mucilagens
de gomas, de modo que é prática corrente figurar na sua constituição um agente antimicrobiano.
Acontece, porém, que várias substâncias microbicidas são incompatíveis com certos agentes
emulsivos do tipo macromolecular, com os quais formam complexos inactivos.
O ácido sórbico na concentração de 0,2% p/v parece ser o agente antimicrobiano mais eficaz.
Pode utilizar-se, igualmente, o ácido benzóico, cuja concentração, como molécula indissociável, deve
atingir 25 mg/100 ml da fase aquosa, sendo também frequente usarem-se os p-hidroxibenzoatos de
metilo e de propilo.
Os agentes protectores são dissolvidos na água, podendo, no entanto, acontecer que
sejam também parcialmente solúveis nos óleos. Em tais casos a molécula da substância
microbicida distribuir-se-á nas duas fases, de acordo com os respectivos coeficientes de
solubilidade, sendo necessário, então, que se use uma quantidade de tal produto de
modo a obter-se uma concentração na água capaz de inibir o desenvolvimento micro
biano. »„,,*

9.1.4.2. Fase oleosa


A fase oleosa de uma emulsão pode ser constituída por óleos, essências, resinas, gomo-resinas,
ceras e gorduras, além de substâncias lipossolúveis, como o salicilato de fenilo, cânfora, vitaminas
oleossolúveis, antioxidantes e anti-sépticos, etc.
As substâncias de natureza gorda presentes numa emulsão estão sujeitas a serem mais ou menos
facilmente oxidadas pelo oxigénio atmosférico e por acção dos fungos e bactérias.
Admite-se que o processo oxidativo das gorduras dispersas numa emulsão se inicia na interfase
óleo-água, podendo depois propagar-se no interior das gotículas oleosas, e quando tal acontece o
ritmo da oxidação é rápido. Em geral, a oxidação no interior das gotículas depende da
susceptibilidade do agente emulsivo ao oxigénio e só se verifica se o emulgente for mais oxidável do
que a própria gordura. Caso contrário, a película
964

interfasial se encarregará de proteger da oxidação a fase interna das emulsões O/A. Assim, por
exemplo, emulsões preparadas usando linoleato, oleato e estearato de sódio, como agentes emulsivos,
apresentam índices de peróxidos de 60, 36 e 17, respectivamente, o que demonstra bem a influência
da natureza do emulgente no grau de oxida-bilidade destas formas farmacêuticas.
Por este motivo é vulgar adicionar-se às emulsões substâncias antioxidantes, indicando THORVICK
que os compostos insolúveis na água são os mais activos. Figura, por conseguinte, na fase oleosa das
emulsões, podendo citar-se como mais usados o a-tocoferol, o galhato de dodecilo e de propilo e,
ainda, o ácido nor-di--hidroguaiarético (NDGA).

9.1.4.3. Agente emulsivo

Ao tratarmos do aspecto teórico da emulsificação na Técnica Farmacêutica, já tivemos ocasião


de pôr em destaque a importância que os agentes emulsivos assumem na obtenção de emulsões.
Como então nos referimos pormenorizadamente às características gerais a que um emulgente deve
obedecer, apenas consideraremos neste capítulo os aspectos ligados à sua utilização como
componentes de uma forma galénica.
Não será demais insistir que as qualidades de uma emulsão dependem, em grande parte, do
agente emulsivo utilizado na sua preparação e, por isso, é da maior importância que o farmacêutico
conheça perfeitamente as propriedades dos numerosos emul-gentes que a indústria química lhe
oferece. Importa, principalmente, estar familiarizado com as suas propriedades emulsivas, com as
suas incompatibilidades, com a sua toxicidade e saber quais os que podem ser utilizados em
preparações para uso interno e aqueles cujo emprego está exclusivamente confinado a preparações
destinadas a uso externo.
Na realidade, se os agentes emulsivos não possuem acção medicamentosa, assumem, no
entanto, um papel da maior importância na tecnologia das emulsões, figurando em todas as
preparações farmacêuticas deste tipo. Por tal motivo terão que ser comple-tamente inócuos,
sobretudo quando utilizados em fórmulas para uso interno, pois só assim estas serão bem toleradas e
não prejudicarão o organismo. Ora, dá-se o caso de certos agentes emulsivos não serem totalmente
inócuos, provocando alguns deles hemólise, o que torna particularmente delicada a escolha de um
emulgente para emulsões destinadas à administração intravenosa.
A Tabela CXII, reproduzida do trabalho de GALLO, indica algumas das propriedades
farmacológicas de um certo número destes produtos e mostra bem a necessidade de se proceder,
criteriosamente, à sua escolha.
Do ponto de vista galénico, podemos agrupar os diversos emulgentes em duas classes
principais: os agentes emulsivos para uso interno e para uso externo. Tal divisão tem a vantagem de
delimitar o campo de utilização dos vários emulgentes e sem dúvida que se toma de extrema
utilidade na prática, mas presta-se mal para o estudo sis-
965

Tabela CXII. Propriedades farmacológicas de alguns emulgentes


Concentração
DL5lf.v.lKg DL10oral/Kg Hemólise irritante (olho
Emulgentes de rato de rato (Con. %) do coelho)
Sulfato de laurilo e sódio — 0,004 —
Cetilpiridínio 30 mg 200 mg — 1:5000
Miristilpirrolínio 30 » 250 » — 1:3000
Cloreto de benzalcónio — 350 >» — > 1:5000
Monolaurato de PEG 600 8,5 ml — <0,4 —
Myrj 52 36,7 » — 3,5 —
Brij 35 13,0 » — 7 —
Tween 40 .....c .f 50,0 » — 3,5 —
Tween 80 5,8 g 25 g >0,1 —
Antarox A 200 1,2 ml — <0,4 —
Monoleato de PEG 1000 18,4 » — <0,4 —
Myrj 49 10,2 » — 1,75 —
Miristato de sacarose — 580 mg muito activo —
Pluronic F-68 7,7 g 15 g 10 >75:100

Segundo U. Gálio — Boll. Chim. Farai.. 101. 180 (1962)

temático dos vários emulgentes, pois nada nos diz sobre a sua natureza ou origem. Por
isso, embora adoptando tal divisão, consideraremos dentro de cada um destes dois
grandes grupos vários subgrupos, os quais correspondem inteiramente à classificação
dos emulgentes seguida na Técnica Farmacêutica. Assim, quer se trate de produtos para
uso interno ou externo, serão agrupados em três rubricas principais: agentes emulsivos
naturais, agentes emulsivos sintéticos (iónicos e não iónicos) e agentes emulsivos
auxiliares ou secundários. ..... -, -_. ....

9.1.5. AGENTES EMULSIVOS PARA USO INTERNO >,,-9.1.5.1. Agentes emulsivos


naturais
Gomas — São produtos utilizados desde há muito tempo como agentes emulsivos, especialmente a
goma arábica, que é considerada por vários autores como sendo provavelmente a única goma tendo
propriedades de verdadeiro emulgente, distinguindo-se as outras gomas de origem natural por
originarem emulsões viscosas mas grosseiras.
A goma arábica é o agente emulsivo talvez mais utilizado na farmácia de oficina, pois origina
facilmente emulsões do tipo O/A por trituração de um óleo com água em almofariz. Além disso, constitui
um dos emulgentes mais inócuos de que se dispõe, podendo ser usada em preparações para via
parenteral.
966

As emulsões preparadas com esta goma mantêm-se estáveis numa larga zona de pH, que vai de 2 a
10, mas são destruídas a pH fortemente alcalino. Acontece, porém, que a viscosidade conferida pela goma
arábica à fase aquosa é de certo modo diminuta, motivo por que é costume usar-se, simultaneamente, um
agente espessante, como a goma adraganta ou a gelosa, a fim de evitar que as emulsões originem
creme.
A goma arábica contém oxidases susceptíveis de reagirem com certos medicamentos, podendo originar
a sua oxidação o aparecimento de colorações róseas, azuis ou violáceas, corno acontece, por exemplo,
com o piramido, ou provocar a destruição de certas substâncias altamente oxidáveis, como a vitamina A.
Por isso se recomenda o aquecimento da goma a 100°C, durante l hora ou na respectiva mucilagem a
b.m. fervente durante 1/2 hora, a fim de se destruírem as referidas oxidases.
Os produtos contendo goma arábica são facilmente atacados por agentes microbianos, pelo que devem
conter sempre um conservador, que pode ser o álcool (6% do total da emulsão), o ácido benzóico (0,2%)
ou o p-hidroxibenzoato de metilo (0,2%).
A goma arábica é incompatível com numerosas substâncias, como o bórax, o cloreto férrico, o
acetato básico de chumbo, o álcool concentrado e sabões alcalinos, pois um dos seus principais
constituintes é o arabinato de cálcio. Além disso, é também incompatível com a gelatina a pH inferior a
4,7, pois abaixo deste valor aquela apresenta carga positiva enquanto a goma arábica é sempre negativa,
de modo que em tais condições dá-se o fenómeno de coacervação e as duas substâncias precipitam.
A goma adraganta raramente é utilizada isoladamente, associando-se muitas vezes à goma arábica,
originando emulsões O/A estáveis, devido à sua elevada viscosidade. Se bem que isto não constitua uma
regra absoluta, é vulgar usarem-se 10 partes de goma adraganta para 90 partes de goma arábica. Um
g de goma adraganta pode emulsionar entre 20 a 40 g de óleo.
A goma de Karaya é uma goma particularmente rica em grupos acetilados fixados em polissacaridos
de elevado peso molecular. Usa-se como sucedâneo de goma adraganta.
Gema de ovo — É considerada um excelente emulgente do tipo O/A, constituindo a própria gema do
ovo uma emulsão também O/A, naturalmente formada à custa de uma mistura emulsiva um tanto
complexa, em que figuram a lecitina, o colesterol e uma fracção proteica.
Este emulgente é resistente aos ácidos e ã acção dos electrólitos mas decompõe--se por fermentação
com relativa facilidade, pelo que as emulsões com ela preparadas devem conter substâncias
conservantes: 0,2% de ácido benzóico, 10% de álcool ou 0,2% de p-hidroxibenzoato de metilo. Mesmo
assim, devem ser consumidas no espaço de alguns dias e conservadas em frigorífico.
A gema de um ovo normal pesa cerca de 15 g e é capaz de emulsionar 250 ml de essência ou 120
ml de um óleo fixo.
Gelatina — A gelatina origina emulsões do tipo O/A, usando-se frequentemente em preparações
farmacêuticas e alimentares. Trata-se de uma substância de fracas
967

propriedades emulsivas, cujas soluções aquosas, são, no entanto, extremamente viscosas, tornando-se sólidas
à temperatura ambiente desde que a concentração de gelatina seja superior a 2%. Por este motivo não
deve ultrapassar-se a concentração de 0,5%, dissolvendo-se a gelatina na água, a quente.
A gelatina é um colóide protector cuja eficiência depende do pH do meio, acontecendo que para
valores de pH abaixo do seu ponto isoeléctrico a gelatina fica carregada positivamente, sendo negativa a
sua carga eléctrica quando o pH é superior ao ponto isoeléctrico. Este, no entanto, varia com a origem da
substância. Assim, a gelatina obtida por tratamento ácido tem um ponto isoeléctrico de 8 e a sua
actividade emulgente exerce-se melhor a pH 3, apresentando-se a gelatina, nestas circunstâncias,
positivamente carregada. Por outro lado, a gelatina obtida por tratamento alcalino tem o seu ponto
isoeléctrico situado a pH 4,7, sendo usada na prática em solução de pH ± 8, apresentando-se, nestas
condições, com carga eléctrica negativa.
GALLO representa do modo seguinte a ionização das gelatinas a diferentes valores de pH:

CONH, f CONH2
NH,+ " [ i 1 NH,+ [
NH; + R < CONH2 1 NH2
R CONH2
Gelatina A (ácida) COOH coo* 1
[ coo* NH NH
COO+
pH 3 pH 5 pH 8 pH 9
COOH (p.I.)
( E
[ NH,+ R < NH,+ [ 3+
NH NH2+
R NH2
MV R lR NH,+ < NH2
Gelatina B (alcalina) R COOH < COOH 1 COO+ CO
COO+ O+
pH 3 pH 4 pH 5 (p.I.) pH 9
*

Do ponto de vista prático interessa chamar a atenção para a circunstância de não se


poderem associar as gomas e a gelose, substâncias de carga eléctrica negativa, com uma
gelatina carregada positivamente. Por esse motivo, a associação de gelatina ácida, positiva,
com goma arábica, negativa, é incompatível dado que origina a precipitação dos dois
colóides. Contudo, a gelatina de ponto isoeléctrieo 4,7 já é compatível com as gomas se
estiver a um pH em que se apresente carregada negativamente.
No mercado aparecem algumas variedades de gelatina sob a forma granular, as quais
são muito úteis para a preparação de emulsões. Tais produtos são designados por Pharmagels
('). O Pharmagel A é uma solução de gelatina ácida e parcialmente hidro-lisada por
aquecimento em b.m. à ebulição em presença de ácido tartárico, ao passo que o Pharmagel B é
uma solução de gelatina tornada alcalina pela adição de 0,5 a 1% de

Pharmagel Corporations, 55 W. 42nd St., New York 18, N. Y.


968

bicarbonato de sódio, a qual é perfeitamente compatível com a goma arábica. Na Tabela CXI11
indicam-se algumas das características destes produtos.
A gelatina é muito usada na preparação de emulsões de parafina líquida, as quais, porém,
deverão ser obtidas num homogeneizador. Além disso, sempre que a fase oleosa representa uma
percentagem diminuta, a emulsão deve ser estabilizada com uma goma viscosa ou com alginato de
sódio, a fim de se evitar a formação de creme.

Tabela CXIII. Características dos Pharmagels


Produto Ponto iso-eléctrico pH óptimo a que Carga eléctrica na zona de
actuam pH óptimo
Pharmagel A Pharmagel 8 4,7 38 +
B

Extracto de malte — É um líquido castanho, viscoso, que contém dextrina, proteínas e outras
substâncias que lhe conferem propriedades emulgentes. É usado juntamente com outros agentes
emulsivos secundários para emulsionar e corrigir o paladar do óleo de fígado de bacalhau.
Lecitinas — São ésteres glicerofosfóricos da colina e de ácidos gordos diversos, como o oleico,
palmítico, esteárico, etc.
Pode utilizar-se a lecitina da gema de ovos, a lecitina das sementes de soja ou a lecitina e
cefalina do tecido nervoso. Em geral, estes produtos alteram-se com muita facilidade e apresentam,
por vezes, gosto e cheiro desagradáveis, pelo que o seu uso não está generalizado.
As lecitinas são emulgentes do tipo O/A, mas o seu poder emulsivo depende dos ácidos gordos
que figuram na sua constituição e também da posição da colina. Esquematicamente a sua fórmula
pode representar-se do modo seguinte:
K,—C—
0-CH.ci ;
t l
"i l»Ó
H.

A)
jO
l \0——CH,—CH,—XH, CoUmini (B)
Ac. gordos Glicerina Ácido tosfurico
Ácido glicerofosfõrico + colina = «-leciiina (A)
Acido ghcerofosíórico + colamina =a-cefalioa !:--•:... •
(^|
969

9.1.5.2. Agentes emulsivos sintéticos . .• • • •


Se bem que a indústria química tenha preparado nestes últimos anos nume
rosos emulgentes sintéticos, a verdade é que apenas um número limitado deles é
considerado próprio para uso interno. A maioria deles caracterizam-se por serem
substâncias não iónicas, isto é, não dissociáveis, comportando-se, portanto, como
compostos apoiares. Entre eles figuram o monoestearato de glicerilo purificado, os
ésteres do sorbitano (SPANS) e do polioxietilenossorbitano (TWEENS), e, ainda, os
ésteres da sacarose. Empregam-se, também, se bem que menos frequentemente, agentes
anfólitos. -/ '••- ,

9.1.5.2.1. Agentes não iónicos


O monoestearato de glicerilo é o mais simples dos compostos não iónicos utilizados como agentes
emulsivos, correspondendo a sua constituição à fórmula:

CH,.OCO.C,TliJ5 CHOH
••
CH,OH

a qual mostra que o radical ácido, de características lipófilas, é a parte mais volumosa e importante
da sua molécula, pelo que não é de estranhar que tal composto origine emulsões do tipo A/O. Dado o
desequilíbrio existente na sua composição, em que a parte lipófila tem um predomínio evidente sobre
a parte hidrófila, representada pela molécula da glicerina, o monoestearato de glicerilo é um mau
agente emulsivo, sendo utilizado, sobretudo, como agente auxiliar, a fim de aumentar a consistência
da fase oleosa.
Existe, todavia, uma variedade deste produto, designada por monoestearato de glicerilo auto-
emulsionante, o qual não é mais do que aquele éster adicionado de uma certa quantidade de sabão
ou de sulfato de laurilo e sódio, constituindo tal mistura um emulgente muito mais equilibrado do que
o produto primitivo. Este monoestearato de glicerilo auto-emulsionante, dada a presença do sabão,
possui um E.H.L. mais elevado que o monoestearato puro e, ao contrário dele, origina emulsões O/A.
Spans e Tweens. Representam uma série de óptimos agentes emulsivos derivados do sorbitano.
Este, por sua vez, resulta da desidratação do sorbitol, a qual pode fazer-se entre os átomos de
carbono 2 e 6, originando um sorbitano de constituição piranósica (I), ou entre C3 e C6, formando-se,
neste caso, um sorbitano
970

furanósico (11). Este último composto pode sofrer uma nova desidratação, originando um sorbido
(III):

CH,—OH
HC—OH o
l / \
HO—CH —HOH CH, CH-CH.-O H"
-HC—OH 110—CH CH—OH
l \, \ /
HC—OH \x OH
i Y% i
CHL—OH \-£ OK
^ d)
HO-HC———CH-OH
H^J CH-CHOH-CH.OH

HOHC ——— CH CH, l ' l • CHOH


! CH ———
H,C
N x
o
• , (M) '-;•
Os Spans (') são obtidos esterificando os sorbitanos ou os sorbidos com ácidos gordos de elevado
peso molecular, como os ácidos láurico, palmítico, esteárico e oleico, podendo indicar-se
esquematicamente a sua estrutura do modo seguinte:

H,C CH-CHrOCO-R
HOHÍ ÍHOH
"\ / R = radicai de ácido gordo.
H OH

Estes compostos são predominantemente lipófilos, pelo que originam emulsões do tipo A/O,
dependendo a sua lipofilia do tamanho da cadeia carbonada do ácido esteri-ficante e do grau de
esterificação. São designados por um número, Span 20, Span 40, Span 60, etc., correspondendo a
cada produto uma composição específica conforme se indica na Tabela CXIV.
A designação de Span corresponde a uma marca comercial destes produtos, existindo no
mercado outros preparados com idêntica composição, como os A r laceis (maior pureza) e os Crílls,
cuja correspondência se indica na Tabela CXIV.

(') Atlas Powder Co., Wilmington Del.


971

971 Tabela CXIV.


Correspondência entre Spans, Crills, Arlacels e Tweens
Crill n." 1 igual a Arlacel ou Span 20 Crill n.° 6 igual a Tween 20
v :
Crill n.° 2 » » » » » 40 •'•''' Crill n.» 7 » » » 40
Crill n." 3 » » » » » 60 "- -• Crill n.° 8 » » » 60
Crill n.° 3-A » >, » » » 65 ,>•/,.. •', Crill n.» 9 » » » 61
Crill n.° 4 » » » » » 80 •'. ''\\ Crill n.° 9-A » » » 65
Crill n." 5 » » » » » 85 '***'*',- '• Crill n." 10 » » 80
Crill n.° 11 » » » 81
Crill n.° 12 » » » 85

Os Tweens representam outra classe de emulgentes não tónicos. Derivam dos Spans por
introdução, nas respectivas moléculas, de radicais tipicamente hidrófilos, pelo que são solúveis na
água e dispersíveis nos óleos, originando, portanto, emulsões do tipo O/A. O seu poder emulsivo
está dependente do grau de esterificação, como acontece com os Spans, donde derivam, e, ainda, do
volume da parte hidrófila da sua molécula, que é constituída por grupos polimerizados de óxido de
etileno (-CH2.O.CH^-), tomando-se tanto mais hidrófilos quanto mais cadeias oxietilénicas contiverem.
A sua derivação a partir de um Span pode representar-se do seguinte modo:

. .
... ' ;- ... ... .,,„. CH, CH-CH.-O-R -
,(..•. i 'j,"i sr
SPAN+n(CH,-CH,)^HO-CH,-(CH.-0-CH,)I-Ciri-0-CH CH-0-CH,-(CH,-O-CH,),-CH,-
OH •-.'•W
0
\/ ,,-•'
.:,;,. ' í: í •, , :.;-•». -' f '..: .;., 0-CH,-(CHrO-CH,)I-
CH,-OH •, ;'i./.,
indicando n o número total de grupos CH2.O.CH2 introduzidos na molécula do Span que, no
exemplo dado, será igual à soma dos valores de x. Concretamente, desde que n seja de cerca de 20,
o composto obtido passa a ser solúvel na água, comportando--se como um emulgente O/A.
Um Tween em que haja três grupos polioxietilénicos é, dum modo geral, mais hidrófilo que um
outro que apenas contenha dois ou um desses grupos. Entretanto, a solubilidade dos compostos
deste tipo depende do equilíbrio existente entre os grupos do polioxietileno e o número de radicais
de ácidos gordos esterificantes da parte sor-bitano da respectiva molécula. Se considerarmos um
composto destes e mantivermos fixo o número de grupos polioxietilénicos, veremos a sua
hidrossolubilidade diminuir com o aumento da cadeia carbonada do ácido esterificante e do grau de
esterificação.
Os Tweens, também designados por polissorbatos, aparecem ainda no mercado sob a marca
comercial de Crills, indicando-se na Tabela CXIV, a correspondência existente entre estas duas
séries de produtos. — :••• -— • — • • -- -.-•
972

Além dos Spans e Tweens podemos citar ainda outros compostos não iónicos contendo cadeias
de polioxietileno: os Mirj e os Bríj. Os primeiros são ésteres e correspondem à seguinte constituição:
R-COO-CH2-CH,O(CH2.O.CH2)rí-CH2-CH2OH, em que R representa um radical de um ácido gordo,
enquanto a constituição dos Brij, que são éteres, pode ser indicada como sendo:
R-CO-CH^-CH^O(CH2.O.CH2)a2-CH2-CH,OH, correspondendo R a um radical de um álcool
superior.
Dado o facto de conterem cadeias polioxietilénicas, estes produtos são hidrófilos e, por
conseguinte, originam emulsões O/A. A sua constituição, porém, é bastante variável, podendo conter
entre 50 a 100 grupos hidrófilos, caracterizando-se pelas suas excelentes propriedades emulgentes,
sendo, além disso, compatíveis com o cálcio e os electrólitos.
Na Tabela CXV indica-se a designação comercial de vários destes emulgentes, o seu nome
químico e os respectivos valores de E.H.L.

9.1.5.2.1.1. Aplicação da noção de equilíbrio hidrófilo-lipófilo à preparação de


emulsões
Conforme já referimos ao abordarmos a teoria das emulsões (pág. 156), a noção de E.H.L.
introduzida por GRIFPIN veio tornar mais racional a preparação destas formas farmacêuticas.
De acordo com a escala estabelecida por aquele autor (pág. 157), uma emulsão A/O deverá ter
um E.H.L. compreendido entre 3 e 8, ao passo que o E.H.L. das emulsões O/A vai desde 8 a 16.
Dentro de cada um daqueles tipos, certa e determinada emulsão apresentará, contudo, um valor de
E.H.L. característico, o qual dependerá da sua composição qualitativa e quantitativa. Acresce que
esse valor de E.H.L., próprio de cada emulsão, corresponde ao seu máximo de estabilidade, motivo
por que o agente emulsivo a utilizar na sua preparação deve ser escolhido de acordo com ele, pois só
nesta circunstância a emulsão ficará com óptimas qualidades.
Para que na prática seja possível escolher o agente emulsivo mais apropriado a cada emulsão
toma-se imperioso calcular, em primeiro lugar, o valor do E.H.L. correspondente à fórmula que se
pretende preparar. Para tanto, é necessário conhecer, de antemão, os valores dos E.H.L. dos
respectivos constituintes, para o que se pode recorrer aos dados publicados por diversos
investigadores.
Como, por outro lado, também é conhecido o E.H.L. de vários emulgentes, acontece que, na
maioria dos casos, é relativamente fácil calcular o E.H.L. de uma emulsão e escolher, depois, o
emulgente mais aconselhado à sua preparação. , ,,, m,,_.
973

973
Tabela CXV. Constituição química e valores aproximados do E.H.L. de vários
agentes emulsivos (a)
Nome químico ou designação Valor

genérica Nome comercial de E.H.L.


:: b
Trioleato de sorbitano Span 85», Arlacel 85 1,8
Cera do polioxietileno sorbilol ,., ,: ;. Atlas G-1706b 2,0
Triestearato de sorbitano Span 6í5b , 2
-' ,
í: Jil
Ester de etilenoglicol e ácido gordo Emcol E0-50< "' ' •Ï.T
Monoestearato de propilenoglicol (puro) <-3<t •
Sesquioleato de sorbitano Arlacel Cb . , .í . 3,7
Monoestearato de glicèrol Atmul 67h, Atmul 84" 3,8
Tegin 515d, Aldo 33C, forma pura
Monoleato de sorbitano Span 80h 4,3
Monolaurato de propilenoglicol Atlas G-917b, Atlas G-3851" 4,5
Monoestearato de sorbitano Arlacel 60h, Span 60h 4,7
Monoestearato de glicerilo auto-emulsionante Ado 28e, Tegin" 5,5
Monopalmitato de sorbitano Span 62b ,__.-.. , 5,9
Monolaurato de dietilenoglicol (isento de sabão) Atlas G-2124b . , ;•- -, W
b h
Monopalmitato de sorbitano Span 40 , Arlacel 40 vv,
Goma arábica ' "*" ..-. ..• t, «.»
Dioleato de polioxietilenomanitol Atlas G-2800* •;<•.<-,•.*•- ';• M v
Monolaurato de sorbitano Span 20*. Arlacel 20" 8,6
Éter láurico de polioxietileno Brij 30" -94
Monoestearalo de polioxietilenossorbitano Tween 61h ., > v_- 9,6
Gelatina *' 9,8
Monoleato de polioxietilenossorbitano Tween 81" l ' 10,0
Triestearato de polioxietilenossorbitano Tween 65* 104
Trioleato de polioxietilenossorbitano Tween 85b 11,0
Monoestearato de polioxietileno Myrj 45» ' '" ;'.. 11,1
Monoestearato de polietilenoglicol 400 S-54P 1W
Oleato de trietanolamina IV>
Alquilfenil-polioxietileno Igepal CA-63V .. . >"' 124
Éter alquil-arílico de polioxietileno '< Atlas G-1690» '} ')' 1W
Goma adraganta IW
Monolaurato de polioxietilenossorbitano Tween 21h _ ^Jlá-
:
Óleo de rícino polioxietilénico Atlas G-1794" 1W
Monoestearato de polioxietilenossorbitano Tween 60* 14,9
Monoleato de polioxietilenossorbitano Tween 80» . , , . ..... , r .'.-..{Úfl
Monoestearato de polioxietileno Myrj 49" ',",,'' ' ' - '' 'T5.0
Monopalmitato de polioxietilenossorbitano Tween 40" "" - - ' 15.Í
Monoestearato de polioxietileno Myrj 51" •; .:. c.a. 16,0
Monolaurato de polioxietilenossorbitano Tween 20" 16,7
Éter láurico de polioxietileno Brij 35" 16,9
Monoestearato de polioxietileno Myrj 52* 16,9
Monoestearato de polioxietileno Myrj 53* 17,9
Oleato de sódio ... ,\. 18,0
Sulfato de laurilo e sódio 40,0

(a) Segundo Martin in Husa's Phannaceutical Dispensing, 5.a ed., Mack Publishing Co. Easton,
1959, pág. 183, 'Atlas Powder Co., Wilmington. Del. "Emulsion Corp., Chicago, III. "Goldschmidt
Chemical Corp., New York, N. Y. 'Glyco Chemical Corp., New York, N. Y. 'General Aniline and Fihn
Corp. New York, N. Y. . . . . . .._,.,.' ._, ___.- ..__... . . . .
974

Por vezes, haverá necessidade de empregar um novo tipo de óleo ou um novo emulgente, para os quais
não se conheçam os valores de E.H.L. e, neste caso, é preciso determiná-los experimentalmente. Vejamos
como isso se pode fazer.
Determinação do E.H.L. de um óleo — Querendo determinar o E.H.L. de um óleo, prepara-se
com ele uma série de emulsões obtidas à custa de um par de dois emulgentes, misturados em
proporções variáveis, de modo a originarem valores definidos mas escalonados de E.H.L. Após
algum tempo, geralmente decorridas 24 horas, procede-se ao exame de todas as emulsões, toma-se
como ponto de referência aquela que se apresenta mais estável, isto é, que não tenha aspecto
grumoso nem registe separação das fases, admitindo-se que o seu valor de E.H.L. é o que
corresponde ao do óleo em ensaio.
Suponhamos, por exemplo, que pretendíamos determinar o E.H.L. do óleo X, utilizando, para
isso, como emulgente, uma mistura de Span 60 (E.H.L. = 4,7) e de Tween 60 (E.H.L. = 14,9).
Preparávamos, então, uma série de emulsões contendo 10 g de óleo X, 5 g de uma mistura dos
referidos emulgentes, combinados em variadas proporções, e água até perfazer 100 g. Decorridas 24
horas examinávamos as preparações, registando-se os seguintes resultados:

Composição do emulgente E.H.L. (*)


% de Span % de Tween íía mistura Resultado
90 10 5,7 Mau
80 20 , '".' ' v :,., 6,8
30 '*'•";'• 7,8 í>i,,j „. Razoável
« 40 83 : ' H ^ : Bom
•;" só •-..38 ,:,'.' • 9^8 Excelente
40 «0 •' ,«J- - . 10i8 ' • -jí3ï" '.: Bom
30 70 11,8 Mau

Como a emulsão mais estável tem um E.H.L. igual a 9,8, este será, por conseguinte, o valor de
E.H.L. que passa a ser atribuído ao óleo em ensaio.
Determinação do E.H.L. de um emulgente — Na literatura encontram-se descritos os E.H.L. de
numerosos agentes emulsivos, existindo vários métodos para a sua determinação. Acontece que os
valores determinados para os agentes sintéticos são bastante uniformes, mas o mesmo já não se
verifica no que diz respeito aos agentes emulsivos de origem natural, observando-se, por vezes,
diferenças acentuadas nos valores de

(*) O E.H.L. da mistura é a soma dos valores correspondentes aos dos seus constituintes, de
acordo com as respectivas concentrações. Sendo o E.H.L. do Span 60 igual a 4,7 e o do Twecn 60
igual a 14,9, teremos no casa da primeira emulsão da lista: E.H.L. devido ao Span 60 = 90x4,7:100
= 4,2; E.H.L. devido ao Tween 60=10x14,9:100=1,5. Logo, E.H.L. da mistura = 4,2+1,5 =
5,7.
975

E.H.L. calculados em laboratórios diferentes. Assim, por exemplo, CHUN e colab. fixam o E.H.L. da
goma adraganta em 13,2, ao passo que GUESS determinou, para a mesma substância, o valor de
11,92. Este facto é explicável pela circunstância do produto em questão ter uma composição
complexa, que pode variar conforme a origem e de amostra para amostra, pelo que tais diferenças
são plenamente justificáveis.
São vários os métodos propostos para a determinação do E.H.L. dos emulgentes. Uma destas
técnicas consiste em determinar a temperatura a que turva uma solução a 5% do composto a ensaiar,
a qual representa o seu ponto de nebulosidade. Quanto maior for o E.H.L. da substância, mais
elevada será a temperatura necessária para originar a primeira névoa perceptível. Este método,
contudo, apenas é aplicável aos agentes não iónicos hidrossolúveis.
DANTES, em 1957, propôs uma fórmula para calcular o E.H.L. de todos os agentes tensioactivos, o
emprego da qual obriga, porém, ao conhecimento da respectiva estrutura química. Essa fórmula é a
seguinte: E.H.L. = Z (números de grupos hidrófilos) -n (números de grupos por grupo CH2) + 7, em
que n é o número de grupos -CH2-existentes na molécula do tensioactivo. Cada radical tem um
número de grupo hidrófilo característico, determinado por DAVIES, correspondendo, por exemplo, aos
radicais — SO4-/Va*, — COQ-K- e — COO~Nar os números de grupos 38,7, 21,1 e 19,1, respec-
tivamente (ver Tabela CXVI).

Tabela CXVI. Número de grupos para o cálculo de EHL, segundo Davies

Grupos hidrófilos Número do


-S04Na grupo ., -»; 38.7
-COOK
;.
'.
-COONa ,„.
-N (anima 2,1
terciária) Éster
(anel sorbitano) 'í,ff,'
Éster (livre) 0.5
-COOH 0,3
Hidroxilo (livre) 3

0,47
5
0,47
5
0,47
5
Grupos lipófllos ' .. «jjí, ."ia
-CH — r ."'^ateaft
-CH 2 -
-CH3 = CH —
-(CH, — CH2 — CH, — O) —
976

Assim, para se calcular o equilíbrio hidrófilo lipófílo do oleato de sódio, de fórmula:


CH3 (CH2)7 - CH = CH - (CH2), COONa, teremos:
EHL = 19,1 - (17 x 0,475) + 7 = 18,1 valor condizente com o obtido por outros processos.
Um outro processo baseia-se na aplicação da fórmula seguinte:
E.H.L. = 20 (l ———'-—), em que I.S. é o índice de saponificação do emulgente e I.A.
I.A.
o índice de acidez do ácido esterificante. Como é evidente, este método apenas pode
ser aplicado a compostos de tipo éster, sendo, por isso, largamente utilizado no cálculo
do E.H.L. dos Spans e Tweens. Apliquemo-lo concretamente à determinação do E.H.L.
do Tween 80, por exemplo. Este é o monoleato de polioxietilenossorbitano, sendo o seu
índice de saponificação I.S. = 49,5, e o índice de acidez correspondente ao ácido
oleico, I.A. = 198,6. Logo, o • --—

\
= 15,02.
- "
49,5 E.H.L. (Tween 80) = 20 l l — -
198,6
Tratando-se de produtos complexos, como a goma arábica, adraganta e outros, é preferível
recorrer ao método preconizado por CHUN e colab.
Segundo aqueles autores, prepara-se uma série de emulsões de um óleo de E.H.L.
conhecido à custa de uma mistura constituída por várias proporções de emulgente pro
blema e de um outro emulgente cujo E.H.L. está previamente determinado. A melhor
emulsão desta série constitui o ponto de partida para calcular o E.H.L. do novo agente
emulsivo. Suponhamos, por exemplo, que nessa série a melhor emulsão de um óleo
tendo um E.H.L. igual a 11 correspondia à preparação obtida com uma mistura
emulgente contendo 40% de Span 80 (E.H.L. = 4,3) e 60% de emulgente problema. O
E.H.L. deste será dado pela fórmula: . ,,. ,,(•, ;;),ft

E.H.L. do óleo — E.H.L. do emulgente padrão x P E.H.L. = ————————————


———————————-———-———————

em que P representa a percentagem do emulgente padrão e N a percentagem do emulgente


problema. Deste modo, o novo emulgente terá um
..!•.'
11 - 4,3 x 0,40 . ii .--
E.H.L. = ————————————— =15,5 , .,;•
..' „. .„ .._ ... . 0,60 ._ ._., _ ' . ,_" . . . ..
977

O processo é, afinal, o mesmo que utilizámos para determinar o E.H.L. de um óleo, só que na
equação do problema a incógnita é agora outra.
Aplicação pratica da noção de E.H.L. à preparação de emulsões — Como já por várias vezes
referimos, cada emulsão possui um valor de E.H.L. característico, o qual depende das substâncias
lipossolúveis e respectivas concentrações que figuram na sua fórmula. Ora, como esse valor de
E.H.L. corresponde ao máximo de estabilidade da emulsão, há toda a vantagem que o emulgente
utilizado iguale esse valor.
Na Tabela CXVII reproduzimos os valores de E.H.L. de várias substâncias mais vulgarmente
usadas sob a forma de emulsão, a qual nos ajuda a resolver, facilmente, o problema em epígrafe.

Tabela CXVII. Valores do E.H.L. de várias substâncias


Valor de E.H.L.
Substância A/O O/A Solubilização
Ácido esteárico '• ,',!•»: •. V.-I1Í'.' -•
Álcool cetilico 17
13 , . . . ' • ' •
Cera de abelhas 5 10-16
Cera microcristalina 9,5 , ,,
Essências . - -;n ..... '
Ftalato de dimetilo 15
Óleo de sementes de algodão 7,5
Óleos vegetais 7-12
Óleos minerais leves 4 10 • • - - . : -
Óleos minerais pesados 4 10,5
Lanolina anidra ,-:..... .: i.»íg"iw •-.:•-• 15 J,-,- -....-.:. ••>.•
Parafina líquida , • 4 10,5
Parafina sólida . > 9
Silicones 10,5
Vitaminas desengorduradas "V": 16,5
Vitaminas não desengorduradas 15

Suponhamos o caso mais simples, que pode ser exemplificado com uma emulsão O/A de parafina
líquida. Segundo a mencionada Tabela, o E.H.L. deste produto em emulsão do referido tipo é de
10,5. Teremos, pois, que utilizar um emulgente O/A cujo valor de E.H.L. se aproxime o mais possível
do do óleo a emulsionar. Recorrendo à Tabela CXV, (pág. 973), verifica-se que o Tween 65 tem,
precisamente, um E.H.L. de 10,5, pelo que será este o agente emulsivo aconselhado para a
preparação da referida emulsão.
978

Vejamos, agora, um exemplo mais complexo, supondo que pretendíamos obter uma emulsão
O/A com a seguinte fórmula:
Cera................................................................ 5 g' 'W- « ^
Parafina líquida ............................................ 26 » '•' •" A
Óleo vegetal.................................................. 18 » '•••
Glicerina (') .................................................. 4 » •*-.?
Agente emulsivo .......................................... 5 »
Água q.b.p................................................... 100 »
Impõe-se, antes de mais, calcular o E.H.L. correspondente à fórmula em questão e por isso é
necessário determinar a percentagem total das substâncias lipossolúveis que nela figuram e a
percentagem parcial de cada uma delas em relação a esse total. Como se vê, a cera, a parafina e o
óleo vegetal somados representam 49% dos componentes da emulsão e, portanto, teremos que a
cera corresponde a 5/49 ou, aproximadamente, a 10% da fase oleosa, a parafina líquida a 26/49
ou 53%, e o óleo vegetal a 18/49 ou 37% da mesma fase.
Deste modo e de acordo com os valores constantes da Tabela CXV1I, o valor de E.H.L. da
emulsão será:

E.H.L. devido à cera = 10 x 15:100


.................................. 1,5
» » » parafina líquida = 53 x 10,5:100 ............ 5,6
» » ao óleo vegetal = 37 x 9:100...................... 3,3
E.H.L. total .................................................................... 10,4
restando, depois disto, escolher o agente emulsivo mais apropriado a tal emulsão.
Naturalmente que também tem interesse a quantidade do emulgente escolhido, pois um total
insuficiente para recobrir completamente as gotículas da fase interna prejudica a estabilidade da
emulsão, enquanto que um excesso pode, pelo menos, ocasionar a formação indesejável de espuma.
Na prática é hábito, para evitar cálculos, recorrer a quantidades excessivas de emulgente, mas é
relativamente fácil determinar com exactidão o total necessário.
Suponhamos que desejámos emulsionar 100 g de óleo, de densidade 0,999, em 100 g de água,
fazendo-se uma dispersão até obter partículas de diâmetro médio de IO"1 cm (l |i). O volume de cada
partícula seria:
K D3 ————— = 0,524x IO'12 cm3 -- ^ s-
-•

(') A glicerina, como, aliás, os poliálcooís, não interfere no E.H.L.


979

O número total de partículas existentes em 100 g seria: " •"""


'j; •~-\ '-•' J?T* •• ; -. <j->' 100
-= 199 x IO12
0,524 x l O-'2 . •" *
•• --.•-.d s;;
A área de cada partícula podia estimar-se em
. . . ; . .-. : iKtïí >. i.:..;.', i'.
- •- - n D2 = 3,14 x IO'8 cm2 ' ;)i>t ! * '"-'••"•"• " '*5' ';> "•''-•''
•• • • fi ,i)£i:'i^v .;•-:•,•'•; ';:....•'.:
A superfície total ocupada pelas partículas seria: '"' " •' '"-V l? '*'
•-1- •••:"" ' s • ',í;t;! t«/l
3,14 x IO"8 x 199 x IO12 = 600 x IO4 cm2 '•< '* -'-'-'J r*
Se, como acontece na maioria dos casos, a área ocupada por cada molécula de emulgente na
interfase4 óleo/água for de 30 (Â)2, isto é, 30 x 10-" cm2, precisamos de
600 x IO
——————— = 2 x IO21 moléculas. 30 x 10"
Se o peso molecular do nosso agente emulsivo for 1000, o que é vulgar, então virá:
1000 x 2 x IO21 1000 x 2 x IO21 .„ t
——————————— = ——————————— = 3,32 g
N 6,023 x IO23
Na prática, em regra, utilizam-se 5 g % de emulgente o que, como se vê, é um pouco excessivo.
Misturas de emulgentes — Desde há muito que é prática corrente utilizar-se na preparação de
emulsões um agente emulsivo complexo, constituído por duas ou mais substâncias. A princípio essas
misturas eram constituídas por um agente emulsivo primário, composto tensioactivo destinado a
favorecer a dispersão da fase interna, associado a um ou mais agentes emulsivos auxiliares, cuja
finalidade era a de aumentar a viscosidade da fase externa.
Tais associações caracterizavam-se por serem formadas por agentes emulsivos todos do mesmo tipo,
sendo frequente, por exemplo, usar a goma arábica juntamente com a gelose e a goma adraganta,
substâncias que originam emulsões O/A.
Entretanto, depois que GRIFFTN introduziu, em 1949, a noção de E.H.L., assistiu-
-se a uma verdadeira revolução no campo da tecnologia das emulsões, começando, a
partir da?, a utilizar-se misturas de emulgentes pertencentes a grupos antagónicos. Este
assunto já foi considerado, do ponto de vista teórico, ao estudarmos a emulsificação na
Técnica Farmacêutica (pág. 147 e seguintes), pelo que agora apenas nos ocuparemos do
aspecto prático do emprego de tais misturas. „ .... ,. .„.„....,.,.
980

A utilização de emulgentes mistos constituídos por agentes emulsivos O/A e A/0 baseia-se no
facto, já várias vezes assinalado, de que cada emulsão tem um valor próprio de E.H.L. e que o
emulgente a utilizar na sua preparação deve igualar esse valor. Uma vez que dois agentes emulsivos
sejam quimicamente compatíveis entre si e dado que os respectivos valores de E.H.L. são
algebricamente aditivos, pode associar--se um emulsivo de baixo E.H.L. (tipo A/O) com outro de
elevado E.H.L. (tipo O/A), de modo a obter um E.H.L. correspondente ao de qualquer emulsão.
Demonstrado o rigor deste conceito, a prática veio mostrar que as emulsões assim preparadas
apresentavam melhores qualidades que as obtidas com um único emulgente, e o processo não tardou
a generalizar-se.
No fundo, a questão do uso de misturas de emulgentes limita-se à determinação do E.H.L. da
fórmula a preparar e à escolha, por exemplo, de um Span e de um Tween que, misturados em
determinadas proporções, originem um E.H.L. igual ao da emulsão que se pretende obter.
Retomemos, como exemplo, a emulsão constituída por cera, parafina e óleo vegetal, cuja fórmula
indicámos na pág. 978, à qual corresponde o E.H.L. calculado de 10,4. Se quiséssemos utilizar na
sua preparação uma mistura de Span 80 e Tween 60, começaríamos por procurar na Tabela CXV,
pág.973, quais os valores de E.H.L. a eles correspondentes, que, como se pode ver, são 4,3 e 14,9,
respectivamente. De posse destes dados, poderíamos, por tentativas, chegar à composição da mistura
destes emulgentes cujo E.H.L. é, aproximadamente, igual a 10,5.
O problema, no entanto, pode resolver-se por um sistema de duas equações a duas
incógnitas, em que estas representam as concentrações dos emulgentes a utilizar. No
exemplo vertente, representemos a concentração do Span por A e por B a do Tween 60.
Teremos então: r>,.. • ,- •;..
: . -..Lê:. _- . . ..,. :;.-
., -
A + B = 100 (1)
EHL de A x 0,01A + EHL de B x 0,01B = EHL da emulsão (2)

Sendo o EHL de A = 4,3, o EHL de B = 14,9 e o EHL da emulsão = 10,5, podemos fazer as
respectivas substituições na equação (2), e assim:
v
h S
A + B = 100 (1)
4,3 x 0,01 A + 14,9 x 0,01 B = 10,5 (3) " ''"'' " ": "' "!Jii '!'r' L

Como A = 100-B, se substituirmos A na equação (3) por este valor, vem: 4,3 x 0,01 (100-B)

+ 14,9 x 0,01 B = 10,5 (4)


981

Resolvendo esta equação em ordem a B, temos: •'"isf;


•l'.' • ".'•
4,3 - 0,043 B + 0,149 B = 10,5 ' ••••*-"*;' ' '" "' - 0,043 B + 0,149 B =
10,5 - 4,3 , "'.'..
6,2 • ••—•
B=-
0,106
B = 58,4 . . 'K-,

Substituindo o valor de B na equação (1), temos que

A = 100 - 58,4 •. : • • "* ''"'"


A = 41,6 -l---;.» MA*;

Determinámos, assim, a constituição do emulgente misto que dá um E.H.L. de 10,5 à qual


corresponde 41,6% de A, ou seja de Span 80, e 58,4% de B ou, no nosso caso, de Tween 60. Repare-
se, porém, que a fórmula da emulsão prescreve o emprego de 5 g da referida mistura, pelo que
teremos que calcular os pesos do Span e do Tween correspondentes a essa quantidade, os quais são,
respectivamente 2,08 g e 2,92 g.
A Atlas Powder Company idealizou alguns processos para a rápida determinação do E.H.L. de
tensioactivos os quais não exigem que se façam tais contas. Um deles é um método baseado no
gráfico reproduzido na Fig. 346, em cujas ordenadas se marcam à esquerda os E.H.L. dos vários
Spans e à direita o E.H.L. correspondente aos Tweens, figurando em abcissas a percentagem de
Tween. Se quisermos determinar por meio deste gráfico qual a proporção de Span 80 e de Tween 60
a utilizar na preparação da emulsão considerada no exemplo resolvido atrás algebricamente,
procedemos do modo seguinte: Na linha da esquerda marcamos o ponto correspondente ao E.H.L. do
Span 80, isto é, 4,3, e na linha da direita o ponto correspondente ao E.H.L. do Tween 60, ou seja
14,9. Unem-se, depois, estes dois pontos por meio de uma recta. Em seguida toma-se, no eixo das
ordenadas, o ponto correspondente ao E.H.L. da emulsão a preparar, que no nosso exemplo é de 10,5.
A partir deste ponto tira-se uma paralela ao eixo das abcissas a qual vai interceptar a linha
anteriormente traçada. Desse ponto baixa-se uma vertical até ao eixo das abcissas, lendo-se na
intercepção destas duas últimas linhas a percentagem de Tween a utilizar. Como se pode ver no
gráfico da Fig. 346, esse ponto corresponde a 58,5% de Tween 60, valor este precisamente igual ao
obtido pelo método algébrico atrás exposto. A diferença de 58,5 para 100 dava-nos a percentagem de
Span 80 necessária para completar a mistura emulsiva. -í^--; .• -
982

O cálculo da quantidade relativa dos emulgentes pode também fazer-se pela clássica regra do x. Com
efeito, e ainda de acordo com o exemplo citado, suponhamos que desejamos saber qual a quantidade relativa
de Span 80 (EHL = 4,3) e de Tween

PERCENTAGEM DE TWEEN

Flg. 346. Gráfico Atlas para o cálculo de EHL de misturas de Spans e Tweens

60 (EHL = 14,9) no total de 5 g da mistura emulsiva, pretendendo-se um equilíbrio hidrófilo lipófilo


final de 10,5:
•"•h; Vi, ?..,«?. j'j .•.-/•j-TO.j-nq ,-: 'tuíjj <>•..
6,2

10,5

...J:: 4,3 4,4

Assim, teríamos de utilizar 6,2 partes de Tween 60 (10,5 - 4,3 = 6,2) e 4,4 partes de Span 80
(14,9) - 10,5 = 4,4). Isto significa que, no total de 10,6 partes da mistura, existirão 6,2 de Tween e
4,4 de Span, ou, o que é o mesmo, 5 g da mistura emulgente deverão conter 2,92 g de Tween 60 e
2,08 g de Span 80.
Na prática, recomenda-se utilizar várias proporções de emulgente, com as quais se deve preparar
uma série de emulsões, elegendo-se assim a mistura que origine a melhor
983

preparação. Quer isto dizer que se torna necessário fazer várias várias emulsões, obedecendo à
mesma fórmula básica e ajustadas, igualmente, ao mesmo valor de E.H.L., mas em que este é obtido
com combinações de vários emulgentes. Só o comportamento de tais preparações permitirá escolher
o emulsivo mais eficaz. A Tabela CXV111, adaptada de Remington's Pharmaceutical Sciences,
exemplifica o que acabamos de dizer.

Tabela CXVIII. Estabilidade de emulsões de Etiodol (') ajustadas ao mesmo valor de


EHL
Preparação Span % Tween % Resultado
1 40 41 20 59 Razoável
2 60 34 20 66 »
3 80 32 20 68 »
4 20 43 40 57 Bom
5 60 27 40 73 Razoável
6 80 22 40 78 Bom
9 80 21 60 79 »
13 80 25 80 75 Excelente

Vários ésteres da sacarose são também empregados como emulgentes internos,


encontrando-se no comércio sob a designação de Sucrodets. Resultam de esterificação
de pelo menos uma das funções álcool primário daquele açúcar por um ácido gordo de
peso molecular elevado, como, por exemplo, o ácido láurico. Os monoésteres são
compostos solúveis na água e, como tal, conduzem à formação de emulsões do tipo
O/A, dotadas de aroma e paladar agradáveis. Estas propriedades, juntamente com a
circunstância de não serem tóxicos, torna-os utilizáveis na preparação de fórmulas
para administração oral. ...,. „„.,.,.,„.,,...».. ,n

oa/àH,oocc,,H,i
ÓH H "" ÓH H
Monolaurato de sacarose Dipalmitato de s

(') O Etiodol é constituído pêlos ésteres dos ácidos iodados do óleo de sementes de papoila,
utilizado como meio de contraste em certas explorações radiográficas. .-,-..,—,...- r -
984

9.1.5.2.2. Agentes anfotéricos ou anfólitos - •'

São compostos contendo radicais lipófilos constituídos por cadeias de ácidos gordos de elevado
peso molecular ligadas a diversos aminoácidos. Em meio ácido estes produtos comportam-se como
bases aminadas e em meio alcalino funcionam como ácidos, não sendo ionizados em meio neutro.
Duma maneira geral, são emolientes e inócuos, sendo, além disso, compatíveis com os agentes
iónicos e não tónicos. Correspondendo à fórmula geral //jiV* - R - COO~, alguns destes compostos
são usados como detergentes na preparação de pomadas e outros, ainda, utilizam-se na preparação
de injectáveis. Entre eles cita-se o dodecil-diaminoetil-glicocola, conhecido, abreviadamente, por DAG,
que tem propriedades bactericidas, mesmo quando em presença de proteínas. Sob a designação geral
de Tego são fornecidos ao comércio vários emulgentes anfotéricos, utilizando-se, também,
ultimamente, o Miranol C2M, cujas soluções a 20% têm pH 8,1-8,3.

9.1.5.3. Agentes emulsivos auxiliares

São de certo modo numerosos os produtos que podem ser utilizados como esta-bilizantes das
emulsões, sendo de mencionar, entre eles, certas substâncias de origem natural, como a gelose, os
alginatos, o carraguem ou alga perlada e a pectina, além de alguns derivados obtidos sinteticamente
da celulose.
Apesar de a maior parte das substâncias atrás citadas ser utilizada, de preferência, como meros
agentes estabilizantes, isto não exclui que se comportem como agentes emulsivos primários. Assim é
que a pectina, segundo GOLDNER, pode actuar como um verdadeiro agente emulsivo, o mesmo
sucedendo com a metilcelulose, 15 cPo, quando utilizada em concentração de 5 a 10%.

9.1.5.3.1. Derivados da celulose

Os mais empregados são a metilcelulose, a etilcelulose, a metiletilcelulose e a


carboximetilcelulose sódica. Estes produtos correspondem às fórmulas seguintes:
985

.-o-/ H IIK -K H H \-0- H OCH,


i\ lÓH
S H 1 O/' 3— CHa À— 1
C ———
n ,-/ ÒJ1 — 9\ H
—— O — C. - " Xc-o-
CH.— ( u- -*/
M ooomet celulose 1\Dimet
•"- J3—CH,
lcclolc»=
"l ' H OH
/\—v\H !
/"f— 1
—— ?\ H
_</ OH H H \0 — __"/"
\! g
l\?
——— O' / ^ ^-C —
1 H^— 0— CH4— CHS— ÜH n CH, _0— CH.— COO-Nk+
Elilcílalois Ca rbúïiraetilcelulose
Na etilcelulose os grupos -CH} da metilcelulose estão substituídos por grupos etílicos, possuindo
a metilcelulose, simultaneamente, grupos -C//3 e -Cfly Todas estas substâncias originam soluções
aquosas de elevada viscosidade, a qual varia, porém, de um produto para outro. Tratando-se de
compostos contendo numerosos grupos hidrófilos, conduzem, como seria de esperar, à obtenção de
emulsões do tipo O/A.

Metilcelulose (Cellothyl, Cellogel C, Tylose, Methocel)


Apresenta-se sob a forma de pó ou massas fibrosas muito livres, insolúveis nos solventes
orgânicos, inchando em presença da água e originando com ela soluções coloidais ou geleias,
conforme a concentração, que pode variar desde l a 10%.
No comércio aparecem várias qualidades de metilcelulose que se distinguem pela viscosidade
que conferem às respectivas soluções. As variedades mais correntes são a metilcelulose 15, 25, 100,
400, 1500 e 4000, indicando os números as viscosidades expressas em centipoise (ver Suspensões).
Em geral, os produtos de baixa viscosidade, até 400 centipoise, são os preferidos para a preparação
de emulsões, reservando-se as qualidades de maior viscosidade para preparação de pomadas e de
suspensões.
As soluções de metilcelulose preparam-se a frio, triturando-se a substância com água, num
almofariz, até se obter uma geleia límpida. São estáveis para valores de pH compreendidos entre 2 e
10, floculando quando aquecidas acima de 60°C. São incompatíveis com os taninos, fenóis e
electrólitos, tornando-se mais viscosas em meio alcalino.

Metilcelulose (Cellofas A, Edifas A)


Massas fibrosas, solúveis na água fria, originando soluções neutras, que precipitam pêlos
electrólitos. A solução de metiletilcelulose a 1% tem uma viscosidade de 5 a 10
986

centipoise a 20°C. A variedade Cellofas A é insolúvel na água a temperaturas superiores a 60°C, ao


contrário da Edifas A, que se dissolve na água fervente. Para preparar uma geleia deste último
produto adicionam-se 9 partes de água à ebulição a l parte de Edifas A, podendo diluir-se à vontade
depois de arrefecida.
Carboximetilcelulose sádica (CMC, Cellofas B, Collocel, Celulose glicolato, Tylose sódica,
Goma de celulose, CMCNa)
E um pó inodoro e esbranquiçado, podendo apresentar-se também com o aspecto de massas
fibrosas. É fornecida nas qualidades de baixa, média e alta viscosidade, estando o pH das soluções
aquosas compreendido entre 6,5-8. Estas soluções precipitam quando aquecidas acima de 60°C por
acção dos ácidos e de sais de Hg, Cr, Fe, Al, Ag e Pb. Por outro lado, é compatível com detergentes
aniónicos, já que a CMCNa é também aniónjca. Dotada de fraco poder emulsivo, dada a sua
afinidade para a água, é usada, principalmente, para aumentar a viscosidade da fase aquosa. As
soluções de CMCNa preparam-se suspendendo a substância em água fria, obtendo-se uma solução
límpida decorrida 1/2 hora. Pode-se também molhar a substância com um pouco de álcool ou de
glicerina e juntar, depois, a água gradualmente, triturando-se a mistura num almofariz.
A viscosidade das soluções de CMCNa diminui com a elevação da temperatura. Pode adicionar-
se-lhes, porém, sem qualquer inconveniente, até 50% de álcool, glicerina, metilcelulose,
propilenoglicol, alginato de sódio e trietanolamina. Como conser-vante aconselha-se o fenol, o
benzoato de sódio e o clorobutol.

9.1.5.3.2. Alginatos '.


São sais de sódio, de amónio ou de trietanolamina do ácido algínico, composto obtido de certas
algas e que é um polímero do ácido manurónico. Dão com a água soluções coloidais de viscosidade
variável, comportando-se como agentes emulsivos fracos do tipo O/A. Usam-se, em geral, como
agentes espessantes e estabilizantes. Como são facilmente atacados por agentes microbianos
recomenda-se juntar-lhes um produto anti-séptico.

;.xr^v°-iXí~ïxf
--ML.A54 Kc_o/L
l
Mfi • ••
987

Habitualmente são empregados na concentração de 0,5-1%, quase sempre associados às gomas


ou à gelatina. Precipitam a pH inferior a 4, devido à decomposição do sal e libertação do ácido
algínico, e originam sais insolúveis com certos catiões, como o Ca", A/***, Zn" e Cu". Acontece que
o alginato de cálcio acabado de preparar toma a forma de um gele, sendo por isso utilizado, por
vezes, como excipiente de cremes e pomadas. Esta preparação faz-se adicionando a uma solução
aquosa de alginato de sódio um sal de cálcio, por exemplo, o citrato.

9.1.5.3.3. Pectina -,;rrï, - -í:-n : •,; ,S-HÍ


É um agente emulsivo muito fraco, fermentando, além disso, facilmente. Por vezes emprega-se o
seu derivado sódico, o qual é incompatível com os agentes catiónicos, cálcio e metais pesados.
Geralmente, a pectina usa-se associada à goma arábica.

COOCH,

OH H

9.1.5.3.4. Gelose
A gelose é um produto extraído de certas algas, sendo vulgarmente conhecida por agar-agar. Dá
com a água, a quente, soluções viscosas, as quais solidificam por arrefecimento quando a sua
concentração é superior a 1%. Quimicamente é um polissaca-rido de estrutura complexa, cuja
unidade principal é a galactose, contendo ainda radicais sulfúricos e l a 2% de proteína. É, por
conseguinte, uma substância rica em grupos hidrófilos, predominantemente solúvel na água, o que a
toma um emulgente de más qualidades. É usada, juntamente com a goma arábica, para preparar
certas emulsões de parafina empregadas como laxativos.

CH.-OH H
lJ l ___
HO /9————°\ H /V————°\ O
y"- M\v<^.-°Hv
í! ! TT- ü O U -rr *; f.-,-, l-
1\/|
H/\ ? /l
.___},/ \1\ ?
H ?"/
\,l____!/
H
/'
/ IIHII OH
OH H
988

ï-
9.1.5.3.5. Alga perlada >••«
Também conhecida por musgo de Irlanda ou carraguem, a alga perlada incha quando colocada
em água fria e cerca de 47% dissolve-se lentamente naquele líquido. A sua decocção a 5% origina
um gele por arrefecimento. É constituída em grande parte por hidratos de carbono complexos
possuindo unidades de galactose sulfatada que se ligam a catiões metálicos, designadamente ao
cálcio. O N.F. americano (1960) descreve um extracto aquoso seco desta alga, que se apresenta sob
a forma de um pó acastanhado, com o qual se pode preparar extemporaneamente a respectiva
mucilagem. A alga perlada é um emulgente O/A usado, por exemplo, na obtenção de emulsões de
óleo de fígado de bacalhau.

9.1.5.3.6. Dextrinas
São produtos resultantes da hidrólise parcial do amido, usados como agentes emulsivos fracos do
tipo O/A em solução a 50%. As mucilagens de dextrina são preparadas a quente.

9.1.5.3.7. Sólidos finamente divididos ;-


Alguns sólidos finamente divididos, como certas arguas coloidais, a bentonite, o Veegum, os
hidróxidos de magnésio e de alumínio e o gele de sílica constituem exemplos de substâncias
insolúveis que têm sido usadas como agentes emulsivos.
Foi PICKERING quem demonstrou, em 1907, que os pós facilmente molháveis pela água originavam
emulsões O/A, ao passo que aqueles preferentemente molhados pêlos óleos podiam formar emulsões
do tipo contrário. Entre os primeiros contam-se as arguas e como exemplo dos segundos pode
mencionar-se a grafite, acreditando-se que tais produtos são capazes de se concentrarem na
interfase, conseguindo estabilizar as emulsões porque originam uma película compacta à volta dos
glóbulos dispersos. impedindo a sua coalescência.
989

Se bem que estas substâncias, por si só, possam, na realidade, actuar como agentes emulsivos
primários, não é menos certo que na prática corrente elas são utilizadas, de preferência, como
agentes estabilizantes, sendo essa a razão por que as incluímos entre os agentes auxiliares, como,
aliás o faz MARTIN na sua classificação dos emulgentes.
A hentonite, que deriva o seu nome do facto de ter sido encontrada numa região dos Estados
Unidos situada junto do forte Benton, é um silicato de alumínio hidratado coloidal (A/2O34SíO2,OW2).
Em presença da água dá geles que são particularmente estáveis a pH superior a 7. Em geral forma
emulsões O/A, bastando, para isso, juntar, lentamente, o óleo a emulsionar ao gele de bentonite em
água. Se adicionarmos, contudo, este último ao óleo obter-se-á uma emulsão A/O.
O Veegum (') também pode ser usado para preparar emulsões estáveis de óleos minerais ou
vegetais em água, mas, no entanto, é mais frequentemente usado como estabilizante de cremes e
loções obtidas com sabão ou agentes não iónicos. A mesma aplicação tem, por exemplo, o
Pharmasorb Colloidal (2), o magma de magnésia e o caulino (ver Suspensões).

9.1,6. AGENTES EMULSIVOS PARA USO EXTERNO


Se bem que alguns agentes emulsivos naturais de origem vegetal ou animal continuem a ser
utilizados na preparação de emulsões destinadas a uso externo, sem dúvida que são os agentes
sintéticos os mais empregados actualmente na obtenção destas emulsões.
Este facto pode explicar-se por várias razões. Em primeiro lugar, tratando-se de preparações
para aplicação externa, não é de exigir aos emulgentes nelas utilizados o mesmo grau de inocuidade
que devem apresentar aqueles a administrar internamente. Esta circunstância toma possível o
emprego de muitas substâncias que não podem figurar em emulsões destinadas a serem ingeridas,
justificando-se a preferência dada aos emulgentes sintéticos pelas incontestáveis vantagens que eles
apresentam em re/ação aos produtos naturais.
Na realidade, os produtos sintéticos são superiores às gomas e proteínas porque são menos
atacados pêlos microrganismos, o que se reflecte na melhor conservação das emulsões com eles
preparadas. Além disso, correspondem melhor às exigências da tecnologia das emulsões, pois os
seus grupos hidrófilos e lipófilos estão combinados de molde a obter-se uma grande gama de valores
de E.H.L., o que permite a possibilidade de se dispor facilmente do agente emulsivo mais
aconselhado a cada caso.

O2 Silicato de alumínio e magnésio coloidal Vanderbilt Co., New Yoik.


( ) Silicato de alumínio e magnésio hidratado. Mineral and Chemical Corporation of America,
Menlo Park, N. Y.
990

Vamos passar em revista, nesta secção, os principais agentes emulsivos naturais e sintéticos
usados na preparação de emulsões para uso externo. Como já anteriormente considerámos os
agentes não iónicos, estes não serão aqui tratados, lembrando, porém, que tudo aquilo que se disse a
propósito do seu emprego nas emulsões para uso interno tem inteira aplicação no caso presente.

9.1.6.1. Agentes emulsivos naturais


í- ., *• '
9.1.6.1.1. Saponinas • •
São agentes emulsivos do tipo O/A, podendo ser usados sob a forma de tinturas, actuando
especialmente pelas suas propriedades tensioactivas.
Entre as saponinas usadas sob a forma de tintura temos a da salsaparrilha, a da polígala e a da
quilaia, esta última utilizada para preparar o alcatrão mineral saponinado da F. P. IV.
Entre os derivados das saponinas empregados como emulsivos contam-se os sais de sódio e de
cálcio do ácido ursólico, o primeiro dos quais se comporta como emulgente O/A e o segundo como
emulsivo do tipo A/O.

i >! ;
9.1.6.1.2. Geras ' " ' - "> ^ -"
São agentes emulsivos do tipo A/O, cujas propriedades se devem aos respectivos constituintes,
como o palmitato e cerotinato de cetilo ou de merissilo. Por vezes, juntam-se às ceras agentes
emulsivos do tipo contrário mas em quantidade tal que o E.H.L. dessas misturas pode não sair dos
limites que definem as emulsões A/O. Usam-se para esse fim os sabões alcalinos ou o bicarbonato ou
o borato de sódio, os quais, reagindo com os ácidos livres das ceras, originam os respectivos sabões
de sódio.

9.1.6.1.3. Lanolina
A lanolina ou suarda é a gordura da lã e deve as suas propriedades emulsivas aos esteróis que
contém. Como as moléculas destes compostos são predominantemente lipófilas, a lanolina é um
agente emulsivo do tipo A/O. Este produto desempenha um papel de grande importância na
tecnologia das pomadas, pois graças a ele é possível incorporar numa mistura de excipientes gordos
certa quantidade de água, que é dispersa sob a forma de uma emulsão A/O.
991

O colesterol, componente normal da lanolina, pode ser utilizado com a mesma finalidade, usando-
se, também, em substituição da lanolina, que pode originar reacções alérgicas, uma mistura de esteróis
conhecida pela designação de álcoois da lã. Tal produto é um poderoso agente emulsivo do tipo A/O,
sendo obtido por extracção do insaponificável da lã por solventes apropriados. Na sua composição
figuram 30% de colesterol, 25% de lanosterol e 5% de agnosterol, utilizando-se esta mistura na prepa-
ração de pomadas feitas à custa de e.xcipientes gordos e a que haja necessidade de adicionar
quantidades apreciáveis de água.

-". .,„; :..,- : ./

HO/\

9.1.6.2. Agentes emulsivos sintéticos


9.1.6.2.1. Agentes aniónicos
Trata-se de substâncias ionizáveis, sendo a parte tensioactiva da respectiva molé
cula representada pelo anião. Esta classe de emulgentes engloba os sabões mono e
polivalentes, os sabões de bases orgânicas e, ainda, os sulfates e sulfonatos.

9.1.6.2.1.1. Sabões V .".;./ ' . . ' ' .


São bons agentes emulsivos, reservados, porém, exclusivamente para uso externo dado que têm mau
sabor e exercem um efeito irritante e laxativo sobre o tracto intestinal. Largamente utilizados na
indústria, são igualmente empregados na obtenção de emulsões farmacêuticas e cosméticas, originando
emulsões O/A ou A/O, conforme a sua constituição.
Assim, os sabões alcalinos originam emulsões O/A, emulsionando com relativa facilidade óleos
fixos e essências. Em geral, bastam 10% de sabão para emulsionar estas últimas, sendo necessário
utilizar até cerca de 20% de sabão para conseguir emulsionar convenientemente os óleos espessos.
Os sabões alcalinos mais utilizados são os oleatos de sódio, potássio e amónio, o linoleato de
amónio, o palmitato de sódio e o ricinoleato de sódio. Este último é um agente emulsivo particularmente
poderoso.
992

Os sabões podem ser adicionados já preparados ao óleo que se pretende emulsionar, mas, por vezes,
preparam-se extemporaneamente por reacção entre os ácidos livres existentes na própria gordura que vai
ser emulsionada, juntando-se-lhe, para tanto, uma solução aquosa de um hidróxido alcalino, de um
carbonato ou, até, de um borato. Nestas condições, os ácidos livres da gordura serão neutralizados
em quantidade correspondente à substância alcalina adicionada, originando os respectivos sabões que
passam a representar o emulgente que vai formar e estabilizar a pretendida emulsão. Este processo é,
aliás, bastante utilizado na prática e à sua custa se conseguem emulsionar as ceras na água.
Na preparação das emulsões utilizam-se também sabões de bases orgânicas, chamados, por vezes,
amino sabões, obtidos fazendo reagir compostos amino-hidroxilados com ácidos gordos.
N H , 'l +
[ CHvü-CHrOH
CH. j
Estearato de 2-me[il-2-amino-i-prop<no!
Na realidade, tem sido proposto o uso de sabões de 2-metil-2-amino-l-propanol na preparação de
emulsões farmacêuticas, sendo frequente utilizarem-se os sabões de eta-nolaminas e de morfolina.
Aquelas são representadas por três compostos: a mono, di e trietanolamina ('), cujos sabões se
preparam extemporaneamente juntando a substância dissolvida em água a um ácido gordo ou a uma
gordura aquecidos a 60-70°C.
^CH,_CH,OH CH,_CH,_011 '' '
NH,-CH,-CH,OH NH^ N-CH,-CH,-OH "'''
CH,-CH,OH N CH,-CH,-OH
X
[ ,CH.-CHOHCH, "l + X^-CHrCHOIICH, CH!-CHOHCH. J , : ..,
ElteHto d« triilDproplnoUmina
As emulsões preparadas com estes emulgentes são constituídas por gotículas de
reduzidas dimensões, têm um pH de cerca de 8 e são muito estáveis, apenas sendo
alteráveis pela presença de cálcio. Estes compostos originam emulsões O/A e têm um
poder emulsivo apreciável: 6 a 10 partes de estearato de trietanolamina emulsionam até
100 partes de gordura, constituindo um emulgente aconselhável na preparação de cre
mes de beleza. .•__

(') Em geral a trietanolamina do comércio é uma mistura dos três mencionados compostos,
contendo 2 a 5% de monoetanolamina, 20 a 25% de dietanolamina e 70 a 75% de trietanolamina.
993

Por seu turno, o oleato de trietanolamina caracteriza-se por originar emulsões muito fluidas.
Actualmente tem-se dado especial atenção aos perigos que advêm do uso indiscriminado das
etanolaminas, pois a sua possibilidade de conversão no organismo em nitrosaminas torna-as
potencialmente cancerígenas.
Algumas aminas voláteis, como a morfolina, são utilizadas na preparação de produtos para
horticultura ou de ceras para polimento, uma vez que após a aplicação da emulsão a amina volátil
vaporiza-se, deixando uma película aquo- resistente de cera ou de óleo.
C^HuCOO' r
Esteai

Como já se disse, os sabões de bases orgânicas produzem emulsões O/A, apresentando estes
em relação aos sabões inorgânicos a incontestável vantagem de possuírem um equilíbrio hidrófilo-
lipófilo mais perfeito e de serem praticamente neutros, pois o seu pH anda à roda de 8. Estes sabões
são, em regra, preparados extemporaneamente e in situ, querendo isto significar que são obtidos no
próprio momento em que se procede à emulsificação, da qual resulta uma fase dispersa constituída
por partículas de dimensões muito reduzidas e, portanto, emulsões de grande estabilidade.
Os sabões resinosos são obtidos por acção dos álcalis sobre certos produtos resinosos. Os mais
usados são os sabões alcalinos de colofónia ou de outras resinas e, ainda, o abietato de sódio, os
quais são especialmente empregados para emulsionar a creolina, o lisol, hidrocarbonetos, fenóis e
cresóis.
Acontece, porém, que tanto os sabões orgânicos como os inorgânicos são decompostos pêlos
ácidos, além de serem sensíveis à acção do cálcio e de outros iões.
Os sabões alcalinos apenas são estáveis a pH superior a 10, ao passo que os sabões orgânicos se
mantêm em solução com pH = 8. Estes últimos são compatíveis, por conseguinte, com um pH
praticamente neutro, mas em qualquer dos casos a adição de um excesso de ácido a qualquer destes
tipos de sabões provoca a precipitação imediata do respectivo ácido gordo, o qual é insolúvel na
água. Este facto arrasta consigo a destruição da emulsão, pois o ácido livre, devido ao seu carácter
pronuncia-damente lipófilo, ficará quase totalmente concentrado no interior da fase oleosa e não
tem, por isso, propriedades tensioactivas. A destruição das emulsões estabilizadas com sabões dá-se,
principalmente, por acção dos ácidos fortes, mas pode ser provocada, também, por certos ácidos
fracos, como os ácidos benzóico, salicílico e bórico, os quais podem baixar o pH suficientemente
para originarem a precipitação dos ácidos gordos dos sabões.
994

Por outro lado, tanto os sabões orgânicos como os alcalinos, solúveis na água, são transformados
em compostos nela insolúveis em presença de iões alcalinoterrosos. Uma vez que estes originam
emulsões A/O, a sua adição a uma emulsão estabilizada por um sabão orgânico ou alcalino pode
provocar a sua insolubilização e, portanto, a destruição da preparação, ou originar a inversão das
fases desta, transformando-a num produto A/O.
Os sabões alcalinos são os mais sensíveis à acção destes iões, particularmente do cálcio, sendo
os sabões orgânicos um pouco mais resistentes. Por este motivo adicionam-se, por vezes, agentes
sequestrantes às emulsões, a fim de aumentar a sua tolerância ao cálcio. Entre estes compostos são
de mencionar o Calgon ou hexametatosfato de sódio, e o EDTA ou ácido etilenodiaminotetracético.

9.1.6.2.1.2. Compostos sulfatados e sulfonados


Estes produtos, obtidos por acção do ácido sulfúrico sobre certos óleos ou sobre alguns álcoois
gordos, como o láurico e cetflico, correspondem às fórmulas gerais seguintes:

'Sulíjlo de llqujlo Sulfonato de llquilo


em que ^? é um radical alquilo contendo entre 8 e !2 átomos de carbono.
Os óleos sulfatados são preparados a partir de óleos contendo compostos hidroxi-lados, como o
ácido ricinoleico, existente no óleo de rícino. Este ou o respectivo derivado hidrogenado, depois de
sulfatados, constituem bons agentes emulsivos do tipo O/A, apresentando em relação aos sabões a
vantagem de serem mais estáveis em presença de iões polivalentes, sucedendo, mesmo, que formam
com o cálcio compostos hidrossolúveis. Por outro lado, os óleos sulfatados não são decomponíveis
pêlos ácidos em baixa concentração, o que permite a obtenção de emulsões com pH ácido, tornando-
-se, por isso, extremamente úteis no campo da dermatologia, em que se prefere o emprego de cremes
ou de loções com reacção ácida para não neutralizarem os ácidos gordos naturais da pele, tão
importantes na defesa desta contra os microrganismos.
Entre os álcoois gordos sulfatados temos o sulfato de cetilo e sódio, o sulfato de laurílo e sódio e
o sulfato de laurilo e trietanolamina. Todos eles são produtos largamente utilizados na preparação
de loções e cremes de uso medicinal, sendo capazes de, por si só, originarem emulsões do tipo O/A.
Todavia, figuram, por vezes, na preparação de ceras emulgentes, associados, neste caso, a agentes
estabilizantes, como o álcool cetflico, álcool estearílico e monoestearato de glicerilo, atribuindo-se a
estas misturas a propriedade de originarem preparações com consistência mais apropriada, melhor
peneT trabilidade e melhor acção emoliente.
995

Como exemplo de um produto desses podemos mencionar a Cera Lanette SX, a qual é uma
mistura de álcool cetílico e estearílico, contendo cerca de 10% dos respectivos ésteres. Na
designação da cera, S significa que esta é sulfatada e X indica que possui 10% de ésteres.
Os álcoois gordos sulfatados são incompatíveis com o iodo, sais de mercúrio, concentrações
relativamente elevadas de ácidos e de agentes catiónicos, sendo hidrolisáveis por aquecimento
prolongado.
Os compostos sulfonados são usados, principalmente, como agentes molhantes e muito menos
vezes como emulgentes. Um dos mais conhecidos é o Aerosol OT (') ou dioctilsulfossuccinato de
sódio

CHrCOO-C,Hn Na Tabela CXIX indicam-se os principais

tensioactivos aniónicos sintéticos.

9.1.6.2.2. Agentes catiónicos (2)


Esta classe de substâncias caracteriza-se pelo facto de as propriedades tensioactivas se
encontrarem localizadas na parte catiónica das respectivas moléculas. São sais de amónio
quaternário, correspondentes à fórmula geral:

sendo Hal um radical de um halogénio e constituindo os radicais 7?|^?2»/?3 e R4 a parte não polar da
molécula, geralmente uma cadeia hidrocarbonada ou uma amida de um ácido gordo.
Estes compostos são solúveis na água, originando soluções neutras ou ligeiramente alcalinas ao
tornasol, espumando por agitação. São agentes emulsivos do tipo O/A, mas, apesar disso, utilizam-se
principalmente como bactericidas, na desinfecção da pele, das mãos e de instrumentos cirúrgicos. São
incompatíveis com as substâncias aniónicas,

(') Produzido pela American Cyanamid Company, New York, N. Y.


(2) Algumas destas substâncias são utilizadas, também, para preparações destinadas ao uso
interno, lendo-se empregado, mesmo, em medicamentos de aplicação parenteral.
996

Tabela CXIX. Principais tensioactivos aniónicos sintéticos


Nome comercial Composição química Principal uso

Aerosol AS Isopropilnaftalenossulfonato de sódio Molhante, penetrante


» NY Diamilsulfossuccinato de sódio » »
» IB Dibutilsulfossuccinato de sódio » »
» MA Diexilsulfossuccinato de sódio » »
» OT Dioctilsulfossuccinato de sódio » » ''' '
Alkanol B, Sá, Hg Alquilnaftaleno sulfonato de sódio Molhante
» S Tetrahidronaftaleno sulfonato de sódio Molhante, dispersante
Arctic Sintex A CH3 (CH2)7 CH= Detergente, molhante,
= CH (CH2)7 COOC2H4SO3 Na emulsionante
Areskelene 400 Dibutüfenil fenol dissulfato de sódio Emulsivo
Darvan n.° 1 Alquil naftaleno sulfonatos de sódio
polimerizados (alquilo de cadeia
curta) Dispersante
Darvan n." 2 Alquil naftaleno sulfonatos de sódio
polimerizados (alquilo de cadeia
longa) »
Duponol C Sulfato de laurilo e sódio Detergente, emulsionante,
molhante
Gardinol LS Sulfato de oleílo e sódio » »
Hytergen Amida de ácido gordo sulfatado Detergente
Igepon A C17H33 COO C2H4S03Na Detergente, emulsionante,
molhante
Igepon T CH,7H33CON(CH3),C2H4S03Na Detergente
Intramine Sal sódico da laurilo e miristilo cola-
mida sulfonada Detergente, molhante
Invadine B.C. Alquil fenileno sulfonato de sódio Molhante
Maprofix Álcool cetílico sulfatado Detergente
Mercerol Álcool oleico sulfatado Molhante
Nacconol E Alquil aril sulfonato de sódio Detergente
Nekal B X Isobutilnaftaleno sulfonato de sódio Molhante
Oratol Amida sulfonada Molhante e detergente
Penequik Éster sulfonado Molhante e penetrante
Santomerse Dodecilbenzil-sulfonato de sódio » »
Detergente
Santomerse B Lauril alquil meta sulfobenzoato de Molhante, penetrante e
sódio detergente
Sulfamine Amina sulfatada Detergente . ,
Teepol Sal sódico de éster sulfúrico de um
álcool dodecílico secundário Detergente
Tergitol 7 Sal sódico de éster sulfúrico do 3-9-
-dietiltridecanol Molhante, dispersante
Tergitol 8 Sal sódico do éster sulfúrico do 2-eti-
lexanol » »

Adaptado de Lupi Nogueira — Rev. Port. Faim., 5, 139 (1953)


997

como os sabões, acontecendo que a precipitação pode não ser imediatamente evidente se a
concentração das substâncias for muito baixa. No entanto, mesmo que não haja precipitação a
incompatibilidade mantém-se, perdendo o agente catiónico as suas propriedades germicidas e o
agente aniónico a sua acção emulgente no todo ou em parte. Entre os agentes catiónicos mais usados
citam-se o

Cetavion ou brometo de cetiltrimetrlamónio (CIAR Cetrimida)

Zefiron, Zefirol. Triton. R CH,


Cequartyl ou cloreto de
benzalcónio, em que R varia
de C3H,, a C,,H3,

Desogene ou tnmetil-1-p-
toluilalQUilamónio, CH / SO.CH;
\_CH__.N^£H'
em que x varia entre
X 8 e 10
' \=___/ l CH!
ICH,J«
CH,
/"V—
Cloreto de cetilptriüimo

Bradosol ou brometo de —
dodecildimetilfenoxie-
tilamónío OCHr
CH,
l
O cloreto de benzalcónio é um dos agentes catiónicos mais utilizados em farmácia. Tenha-se em
atenção, porém, que esta substância é incompatível com o bórax, o iodo, iodetos de sódio e potássio,
o cloreto de zinco e oxidantes, etc.

9.1.6.2.3. Agentes não iónicos


Como os Spans e Tweens já foram estudados quando tratámos dos agentes emul-
sivos para uso interno apenas nos resta considerar, nesta rubrica, os Carbowaxes
(Macrogol), que se têm empregado tanto em preparações de aplicação externa como
internamente. , >,
998

Estes produtos são polioxietilenoglicóis, abreviadamente designados por PEG, e correspondem à


fórmula geral:
-. ...T .-i,:-:!'-: -:<,:-• ••• .. :„'/..! «'.mn,. „
-••:>: :.-..

São classificados segundo um número: Carbowax 200, 300, etc., o qual depende do grau de
polimerização do grupo oxietilénio e nos dá uma ideia do peso molecular aproximado do composto,
verificando-se que, à medida que este aumenta, aumenta, paralelamente, a consistência da
substância, como se pode ver na Tabela CXX.

Tabela CXX. Características dos Carbowaxes


Carbowax 200 Aspecto .,-- Líquido Ponto de fusão (°C)
' .„, 300 400

1000 » —
1500 Vaselina 38-tl -
1540 Cera de abelhas 43-16
4000 Parafina mole 53-56
6000 Parafina dura 55-63

Estas substâncias são solúveis na água, sendo maus emulgentes O/A visto a sua molécula não
estar equilibrada, contendo apenas grupos hidrófilos.
Os polioxietilenoglicóis funcionam como bases cujo pH está compreendido entre 6 e 7, sendo de se
registar a sua incompatibilidade com os seguintes produtos: Fenol, resorcina, barbitúricos, taninos,
ácido salicflico, ácido undecilénico, sulfatiazol, iodo, crísarobina, pirocatequina, penicilina e
bacitracina.

9.1.7. MÉTODOS DE EMULSIFICAÇÃO


Tendo-nos referido, anteriormente, ao aspecto mecânico da preparação de emulsões
e passado em revista os utensílios e aparelhagem nela utilizada, desde os almofarizes
aos moinhos coloidais e homogeneizadores (pág. 163 e seg.), apenas consideramos,
neste capítulo, a emulsificação do ponto de vista galénico, isto é, os processos usados
para obtenção da forma farmacêutica emulsão. -- - - - - -
999

Assim, poderemos dizer que segundo a ordem por que se misturam as fases e a natureza daquela
em que se dispersa, inicialmente, o emulgente, existem dois métodos distintos de emulsificação: a)
adição da fase externa à fase interna contendo o agente emulsivo e b) adição da fase interna à fase
externa contendo o emulgente. Estes dois processos constituem os métodos básicos utilizados, na
prática, para a obtenção de emulsões e os outros métodos que depois surgiram são meras variantes
daqueles. Porque a goma arábica é o agente mais vulgarmente utilizado em qualquer dos dois
processos referidos, estes são conhecidos, respectivamente, pêlos métodos da goma seca e da goma
húmida.
l —Adição da fase externa à fase interna contendo o agente emulsivo (Método continental ou da
goma seca)
É um dos métodos preferidos por muitos farmacêuticos para a preparação de emulsões O/A nas
suas oficinas, e consiste em triturar o óleo e a goma arábica em pó num almofariz de porcelana,
triturando a mistura até que a goma se tenha distribuído uniformemente no óleo, adicionando-se,
então, de uma só vez, um determinado volume de água, e triturando a mistura rapidamente, de modo
a formar-se a emulsão primária, que será, depois, diluída gradualmente com a restante água e os
outros componentes hidrossolúveis.
A proporção relativa entre a goma, a água e o óleo necessários para obter a emulsão primária é
de 1:2:4. A preparação da emulsão de óleo de fígado de bacalhau da F. P. IV constitui um exemplo
suficientemente representativo do emprego deste método de emulsificação.
Como atrás dissemos, o processo continental pode ser utilizado com agentes emulsivos diferentes
das gomas, designadamente com emulgentes hidrófilos, como os alginatos, os derivados da celulose,
etc.
Para preparar emulsões em escala industrial recorre-se ao emprego de reservatórios, providos de
agitadores mecânicos, que misturam a fase oleosa com o emulgente. Posteriormente, adiciona-se uma
pequena quantidade de água, continuando-se a agitação de modo a formar uma emulsão A/O. Junta-
se, então, a quantidade suficiente de água para inverter a emulsão, devendo ser rápida essa adição e
agitando-se sempre a mistura. Por fim, ajunta-se a água restante ou a solução aquosa dos
constituintes hidrossolúveis que entrem na composição da fórmula, homogeneizando-se
perfeitamente.
Se a fase oleosa contiver substancias do tipo ceroso ou gordo deve proceder-se à fusão da
mistura (para isso os reservatórios onde se opera têm a possibilidade de serem aquecidos,
geralmente por meio de vapor de água circulante), juntando, então, a fase aquosa aquecida à mesma
temperatura. A agitação deverá manter-se até que a emulsão arrefeça completamente. Em regra,
conseguem-se boas emulsões por este processo, que muitas vezes dispensa a homogeneização
subsequente.
1000

2 —Adição da fase interna à fase externa contendo o agente emulsivo (Método inglês ou da goma
húmida)
Para obter a emulsão primária por este método podem utilizar-se as mesmas proporções de
goma, água e óleo que no processo anterior. O método inglês difere, no entanto, do anterior porque
se emprega mucilagem de goma em vez de goma seca. Tritura-se l parte de goma com 1 partes de
água até que se forme a respectiva mucilagem. Adiciona-se, então, o óleo, a pouco e pouco, agitando
sempre, de modo a que se emulsione cada fracção antes da adição subsequente.
Quando se junta demasiado óleo pode acontecer que a emulsão se torne muito espessa e que não
absorva o óleo com rapidez. Esta situação é facilmente corrigida adicionando uma pequena
quantidade de água à mistura, a qual a torna, de novo, homogénea. A trituração deve prolongar-se
por l a 3 minutos após se ter obtido a emulsão primária.
Servindo-nos ainda da preparação da emulsão de óleo de fígado de bacalhau, como exemplo da
aplicação deste método, começar-se-ia por misturar l parte de goma arábica com duas partes de
água, obtendo-se a respectiva mucilagem. Se a goma estiver no estado de pó é possível auxiliar a
formação da mucilagem triturando-a, previamente, com glicerina, só depois ajuntando a água. A
subsequente adição do óleo deve ser feita em fracções de 1-5 ml de cada vez, agitando a mistura
continuadamente.
Em muitos casos, o método da goma húmida não apresenta vantagens sobre o processo
continental, mas só ele pode ser usado quando o agente emulsivo não possa ser obtido no estado
seco, como sucede com a gema de ovo, ou quando a fase oleosa seja demasiado viscosa para
proporcionar perfeita distribuição do emulgente.
Quando se trabalha em escala industrial, misturam-se os componentes da fase oleosa, sendo
necessário, por fusão. Esta mistura e adicionada à fase aquosa contendo o emulgente a uma
temperatura idêntica à da fase oleosa. A emulsificação faz-se em reservatórios providos de
agitadores mecânicos, dotados de um sistema de aquecimento por meio de vapor de água circulante.
A emulsão assim preparada é homogeneizada, posteriormente, por intermédio de homogeneizadores
ou de moinhos coloidais.

3 — Modificação dos métodos principais (Método do frasco)

Os dois processos de emulsificação referidos têm sofrido algumas modificações tendentes a


melhorarem a sua eficácia ou a sua rapidez em casos específicos. Uma dessas modificações é
conhecida por método do frasco, proposto por FORBES para facilitar a emulsificação quando se
utilizavam as gomas secas. O processo é, contudo, praticável com a goma húmida.
1001

b) Determinação do teor em gordura total — Esta determinação é efectuada por extracção da


emulsão com éter sulfúrico ou com éter de petróleo, recorrendo-se, de preferência, ao aparelho de
SOXHLET.

c) Determinação do pH — A avaliação do pH pode fazer-se por métodos colo-rimétricos e


potenciométricos, estes últimos indicados para emulsões de fase aquosa díspersante.
d) Avaliação da estabilidade — Este assunto já foi referido a pág. 166 deste livro. Entretanto,
acentuamos que para avaliar a estabilidade das emulsões têm sido propostos diversos métodos e
aparelhos, como o de PERSOZ (Chimie et Ind., 52, 88, 1944), e os que se baseiam na aplicação da
força centrífuga com o fim de acelerar a floculação da fase interna.
Um processo simples e prático de apreciar a estabilidade consiste em diluir a emulsão em ensaio
com quantidades crescentes de água, determinando-se os graus de sedimentação ou de separação
obtidos, a intervalos regulares. •• •-,-•• .-'•.•> •• • ; * • •
e) Determinação da viscosidade — A viscosidade ds emulsões é determinada com viscosímetros do
tipo rotativo, como o de BROOKFIELD, o de DRAGE e o de EPPRECHT, exprimindo-se, habitualmente, em
centipoise (cP0). Em regra, uma emulsão líquida tem uma viscosidade compreendida entre 500 e
2500 cPo, a 20°C, o que não significa que se não preparem emulsões muito mais fluidas do que estas.
KNOECHEL e WURSTER estudaram a influência de vários factores, entre os quais a viscosidade, na
estabilidade das emulsões. Empregando diferentes qualidades de metil-celulose como agentes
emulsivos, prepararam emulsões do tipo O/A, cuja estabilidade foi apreciada durante um período de
sete meses. Não encontraram variações dignas de registo na viscosidade, cuja importância
consideraram diminuta no fenómeno da coalescência das partículas dispersas.
Posteriormente, Fox e SHANGRAW investigaram o comportamento de emulsões
concentradas de água no óleo, observando que as suas curvas de escoamento em função
da pressão se podiam relacionar com o grau de coalescência apresentado. ••;•.-,.
f) Determinação do diâmetro das partículas dispersas — Esta avaliação apresenta muito interesse
não só do ponto de vista tecnológico, como também porque o grau de divisão condiciona, de certo
modo, a actividade terapêutica. Efectivamente, são muitas as situações em que a via de
administração determina o diâmetro das partículas emulsionadas, lembrando, entre outros casos, a
aplicação de emulsões oleosas intramusculares com o fim de provocar a formação de anticorpos, à
custa de agentes imu-nológicos aquosos, que se emulsionam em parafina líquida refinada. Na
realidade, para que haja uma pronta resposta aos antigénios introduzidos, torna-se necessária uma
1002

Empregado, de preferência, para a produção em pequena escala, a ele se pode recorrer quando
se pretendem emulsionar óleos pouco viscosos ou essências. As proporções relativas de goma
arábica, água e essência são de 1:2:2 ou 1:2:3, observando-se, portanto, um incremento da
quantidade de emulgente em relação à anteriormente estipulada, em virtude da fraca viscosidade
apresentada pêlos óleos essenciais.
Para preparar a emulsão agitam-se, energicamente, num frasco seco, l parte de goma arábica
com 2 a 3 partes da essência e logo que a goma esteja perfeitamente misturada adicionam-se duas
partes de água, continuando a agitação até completa emulsificação. Na prática observa-se que a
agitação a intervalos irregulares é mais eficaz do que a agitação rítmica e contínua. Preparada a
emulsão primária, ajunta-se a água restante, a pouco e pouco, agitando, ainda, até homogeneização.
Quando o emulgente é um sabão ou um material saponoso hidrossolúvel pode recorrer-se à
simples agitação da sua solução aquosa com o óleo contido no frasco.
Estes processos que descrevemos para preparar emulsões de fase externa aquosa e que
concretizámos com a goma arábica como emulgente, são processos gerais que, com variantes
adequadas a cada caso específico, se empregam para a preparação das emulsões destinadas ao uso
oral. Entretanto, pode dizer-se que a preparação das restantes emulsões decorre em moldes muito
semelhantes a estes. Sob a rubrica Formulário daremos exemplos de diversas preparações que
poderemos considerar típicas na tecnologia das emulsões.

9.1.8. VERIFICAÇÃO DAS EMULSÕES


O controlo das emulsões visa, especialmente, a apreciação do seu teor em água e gordura total, a
determinação do pH e da viscosidade, a avaliação da estabilidade e a medição dos diâmetros das
partículas dispersas. Para cada fórmula, especialmente, também tem interesse a identificação e a
dosagem dos princípios activos presentes.
No que diz respeito ao controlo da forma farmacêutica, único que pretendemos estudar,
observamos que as determinações que se efectuam são de âmbito geral em outros preparados
galénicos, ou foram tratados a propósito da Emulsificação. Na presente rubrica não pretendemos,
portanto, mais do que enunciar problemas cuja resolução é acessível a quem nos tenha acompanhado
no decorrer das páginas deste livro.
a) Determinação do teor em água — Para realizar este objectivo pode o prático
recorrer aos diversos métodos indicados para outras formas farmacêuticas, designada
mente ao processo de KARL-FISCHER, que se poderá aplicar sempre que a emulsão não
contenha compostos reactivos com a solução titulante. Nestas circunstâncias, não se
deve empregar o citado processo sempre que na emulsão existem ácidos insaturados,
compostos redutores e outras substâncias que reajam com o iodo. . .,
1003

profunda emulsificação em que as partículas da fase aquosa sejam pequenas e tenham,


aproximadamente, o mesmo diâmetro.
A medição do diâmetro das partículas faz-se por microscopia, nas condições que referimos para
os Pós e para as Suspensões.

;
9.1.9. FORMULÁRIO DAS EMULSÕES - ' ^
A título de exemplo, apresentaremos, seguidamente, algumas fórmulas de emulsões, indicando o
modo de preparação e fazendo o respectivo estudo crítico.

>:
Amêndoas doces............................................ 10 g
IR.:, m; Açúcar em pó .............................................. 10 » •^'^
'••''-•> Água .............................................................. 100» •'•-•::
Contunda as amêndoas e o açúcar, em gral de pedra, até obter pasta homogénea; ajunte a pouco
e pouco a água; coe, espremendo.
Esta emulsão, do tipo O/A, que é designada por emulsão comum (F. P. IV), é conseguida e
estabilizada pela conglutina, princípio emulgente de natureza proteica, que é um dos constituintes
das amêndoas. Emprega-se para preparar o Looque branco, emulsão açucarada que se administra
às colheres (').
•< ísn; <:•.;! .•
n
-.1 ;;.<.-•*'i/i-ï
,-, ;, Óleo de amêndoas ........................................ 19 g
Goma adraganta, em pó .............................. 0,3 »
; . , __ Água de loureiro-cerejeira............................ 10 »
Emulsão comum............................................ 80 »
Misture, em gral de pedra, a goma, o óleo e a água, agitando vivamente por algum tempo; ajunte
a pouco e pouco a emulsão.
Conhecida por Looque branco da F. P. IV, esta preparação, que é uma emulsão de óleo em
água, em que a goma adraganta desempenha importante papel emulgente, não deve ser adicionada
de cloreto mercuroso nem de substâncias ácidas, adstringentes ou alcoólicas.

(') É frequente designar os looques por poções (Poções-emulsão), dada a característica edulcora-i
da foima e o facto de ser administrada às colheres (ver Suspensões).
1004

.,(• • .. .: -,; :.. . .... . Hl . - •-- .)::,lvUïf;


Óleo de bacalhau.......................................... 400 g
Glicerina ........................................................ 120 »
Goma adraganta em pó ..............................10 »
Goma arábica em pó .................................. 90 »
Hipofosfito de sódio ....................................5 »
Hipofosfito de cálcio.................................... 7 »
Água destilada, fervida e resfriada ............ 368 »
Ortossulfimida benzóica ..............................0,1 »
Benzaldeído....................................................0,5 »
A presente emulsão — emulsão de óleo de fígado de bacalhau composta, da F. P. IV — pode
preparar-se do modo que passamos a descrever.
Dissolva os hipofosfitos e a Ortossulfimida na água; misture as gomas, em gral de pedra bem
seco, com o óleo já adicionado do benzaldeído; ajunte, de uma só vez, cerca de metade da solução
aquosa à mistura do óleo com as gomas; agite energicamente; adicione a solução restante, agora a
pouco e pouco, até conseguir uma emulsão homogénea; junte, então, a glicerina.
Nas condições referidas, forma-se uma emulsão do tipo O/A bastante estável, que contém, como
substâncias medicamentosas, os hipofosfitos e o óleo de bacalhau. A completa dispersão deste no
seio da fase aquosa permite a ingestão do medicamento sem repugnância, sendo adicionados, para
melhorar o seu sabor e cheiro, a ortossulfi-mida benzóica (sacarina) e o benzaldeído,
respectivamente. A emulsão fica com partículas dispersas que têm diâmetros compreendidos entre 17
e 25 u,.
Embora se tenha proposto a substituição da goma arábica por vários emulgentes, como o
monoleato de glicerilo (50 g para a fórmula citada) e haja quem aconselhe o emprego de 150 g de
xarope comum em vez da glicerina, não nos parece que essa preparação possa ser considerada como
oferecendo apreciáveis vantagens tecnológicas.

Parafina líquida ............................................50 ml


Glicerina ........................................................12,5 »
Benzoato de sódio........................................0,5 g
Vanilina..........................................................0,05 »
Clorofórmio....................................................0,25 »
Carboximetilcelulose sódica ........................l »
Água q.b.p.....................................................100 ml
1005

Junte o clorofórmio à parafina e adicione esta mistura à solução aquosa dos restantes
componentes, a pouco e pouco, agitando sempre.
Esta fórmula, utilizada como laxativo, é, como as anteriores, uma emulsão de óleo em água. O
benzoato de sódio e o clorofórmio desempenham a função de conservantes; a carboximetilcelulose e a
glicerina aumentam a viscosidade da fase externa e a vanilina é o aromatizante a que se deu a
preferência.
Pode preparar-se, também, uma fórmula estável, substituindo a carboximetilcelulose por uma
mistura, em partes iguais, de goma arábica com goma adraganta, ou empregando 1,25 g de goma
arábica e 0,5 g de alginato de sódio.

Hidróxido de potássio .................................. 0,7 g n ..


Ácido esteárico.............................................. 15 » , ; , . •> -
Glicerina ........................................................ 5 » •-• : •
Aromatizante..................................................q.b. • /•
Conservante.................................................... q.b. . .: : . . i .>j
Água destilada .................................... q.b.p. 100 »
Funda o ácido esteárico a cerca de 70°C e adicione-lhe, a pouco e pouco, a solução do
hidróxido, glicerina e conservante (metilparabeno a 0,2%) na água, aquecida à mesma temperatura.
Agite, deixe arrefecer a 40"C, e ajunte o aromatizante, misturando bem.
Nesta fórmula, o hidróxido de potássio reage com parte do ácido esteárico, originando estearato
de potássio que emulsiona o resto do ácido na solução aquosa. A glicerina é utilizada como
humectante, para impedir a evaporação da água da fase dispersante, actuando ainda como
emoliente. Esta fórmula é empregada para aplicação na superfície cutânea, apresentando
penetração diadérmica.
VI -í •
; -.• ,' : Sb :;i ;,
Trietanolamina .............................................. 0,55 ml
Benzoato de benzilo .................................... 20 »
'ï . Ácido esteárico.............................................. 2 g
. • Água destilada q.b.p..................................... 100 »
Funda o ácido esteárico a cerca de 70°C e adicione-lhe o benzoato de benzilo que
é empregado como fármaco escabicida. Dissolva a trietanolamina na água, aqueça esta
solução a cerca de 70°C e ajunte-a, a pouco e pouco, à mistura anterior, agitando
sempre. ...... _
1006

A fórmula presente é uma emulsão de óleo em água, que se destina a ser empregada
externamente, e cujo agente emulsivo é o estearato de trietanolamina formado in loco.

Álcool cetílico .............................................. 6,4 g


,:. Álcool estearílico .......................................... 5,4 » :
.•:• " Sulfato de laurilo e sódio .......................... 1,5 » mn.- i'n>
Vaselina.......................................................... 14,3» •:.'. oú.ii; .
Parafina líquida ............................................ 21,4 »
Água destilada .............................................. 50 »
A preparação desta emulsão consiste em aquecer à fusão os constituintes lipófilos e adicionar-
lhes a água à mesma temperatura, a pouco e pouco, agitando sempre até homogeneização.
Esta emulsão, que pode constituir um veículo para substâncias medicinais de uso externo,
representa um exemplo em que se procurou elevar o equilíbrio hidrófilo--lipófilo do sistema com
a introdução de sulfato de laurilo e sódio. De facto, o álcool cetílico e o álcool estearílico são
compostos dotados de poder emulsivo água no óleo, enquanto que o sulfato de laurilo e sódio tem
um E.H.L. da ordem de 40. Nas circunstâncias referidas, a emulsão é do tipo O/A, sendo, por isso,
facilmente removível da pele por lavagem com água.

. .-.'•.„*, VIU
' Brometo de cetiltrimetilamónio ..................0,1 g .
Pectina............................................................ l »
Parafina líquida ............................................ 12 »
Lanolina ........................................................ l »
Ácido bórico.................................................. 2 »
Essência de alfazema.................................... 0,1 »
Água destilada q.b.p. .................................... 100 »
Dissolver, na água aquecida a 80°C, o brometo, o ácido bórico e a pectina. A esta mistura,
adicionar, agitando sempre, a fase oleosa obtida por fusão, aquecendo a 80°C a lanolina com a
parafina. Ajuntar a essência quando a emulsão estiver a cerca de 40°C, agitando ainda até
arrefecer.
Trata-se de uma loção empregada como anti-séptico cutâneo, propriedade que se deve ao ácido
bórico e ao brometo de cetiltrimetilamónio. A estabilidade da emulsão
1007

é devida à presença do emulgente catiónico e da pectina; a lanolina apresenta baixo equilíbrio


hidrófilo-lipófilo compensado pêlos emulsivos anteriormente citados.

Óleo de rícino .............................................. 50 g ,: -f


Polissorbato 20.............................................. 3 » . . .,;
Agua destilada .................................... q.b.p. 100 » ,
Misture o óleo com o polissorbato e ajunte a água, a pouco e pouco, até perfeita homogeneização.
A presente emulsão, do tipo O/A, é empregada como purgativa. ,"" "

Solução de hidróxido de cálcio (F. P. IV) 50 g


Óleo de amendoim ...................................... 50 »
Ácido oleico.................................................. q.b.
Misture o óleo com a solução, junte V gotas de fenolftaleína e adicione o ácido oleico, gota a
gota, até que desapareça a coloração rósea (pH ± 8,6). Agite energicamente.
Por este processo formam-se, in siíu, sabões de cálcio, especialmente oleato de cálcio, os quais
actuam como emulgentes da água no óleo. A emulsão, que fica estável, não comporta, em regra, mais
do que 1% de ácido oleico. O emprego deste último pode dispensar-se, como faz a F. P. IV, mas as
emulsões obtidas, além de mais difíceis de preparar, tendem a originar a separação das suas fases.
A fórmula referida é empregada para uso externo, constituindo um verdadeiro linimento
(Linimento óleo-calcário, da F. P. IV).

XI
I Estearato de butilo........................................ 100 g
Span 60.......................................................... 2 »
Hexaclorofeno ................................................ 0,2 »
H Monopalmitato de sacarose.......................... 2,5 »
Metilparabeno ................................................ 0,2 »
Água .............................................................. 85 »
1008

Aquecer a mistura dos componentes de I, a 75°C; dissolver o éster da sacarose e o metilparabeno


na água aquecida à mesma temperatura. Ajuntar a fase aquosa a I, agitando sempre.
A fórmula citada constitui uma emulsão O/A utilizada como anti-séptico externo, em pediatria.

BIBLIOGRAFIA

Livros e artigos de carácter geral:


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Artigos de carácter especializado: . . . . .


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farmacêuticas
dos agentes de actividade superficial», em Bibliografia Farmacêutica, n.° 43, 1959).
1009

9.2. DISPERSÕES COLOIDAIS E SUSPENSÕES

Como diz SELLES MART|, «os corpos (rígidos ou fluidos) nem sempre apresentam uma estrutura
física homogénea, podendo aparecer formados por componentes discretos, diferenciados substancial
ou estruturalmente, que oferecem entre si superfícies de separação». Já vimos que as emulsões
correspondem a sistemas heterogéneos em que partículas líquidas se encontram em dispersão no seio
de outro líquido. Trata-se, pois, de um sistema bifásico, heterogéneo, de que em Farmácia há outras
formas medicamentosas representativas, como as suspensões, que são dispersões grosseiras de
partículas sólidas num meio líquido ou semi-sólido, e as dispersões de sólidos ou de líquidos no seio
de gases (aerossoles).
Sempre que haja contacto de duas substâncias em distinto estado físico podemos dizer que
existem duas fases e que a superfície de contacto entre elas aumenta quando se dividem e subdividem
indefinidamente e quando se misturam intimamente os produtos dessas subdivisões. Deste modo,
podemos chegar até às grandezas moleculares e atómicas e, quando isso suceder, o sistema será
totalmente homogéneo.
Considerados os três estados da matéria é, portanto, lícito afirmar que as substâncias sólidas,
líquidas ou gasosas podem dispersar-se no seio de sólidos, líquidos ou gases originando sistemas
homogéneos ou heterogéneos. Os primeiros são constituídos por uma única fase e denominam-se
soluções verdadeiras; os segundos apresentam duas fases designadas por interna, descontínua ou
dispersa e por externa, contínua ou dispersante.
As emulsões ou as suspensões e as soluções verdadeiras apresentam como característica
comum o facto de terem um componente mais ou menos dividido no seio de outro, variando
periodicamente no espaço as propriedades do sistema. Esta propriedade define os sistemas
dispersos, mas enquanto que as soluções verdadeiras são sistemas homogéneos, as suspensões e
as emulsões são sistemas heterogéneos.
Entre estes dois estados extremos, constituídos, por um lado, pelas suspensões e emulsões e,
por outro, pelas soluções verdadeiras, há casos intermediários que gozam de algumas das
propriedades comuns a ambos os tipos de sistemas referidos. Trata-se dos sistemas coloidais que
são caracterizados pela existência de partículas dispersas cujas dimensões estão compreendidas
entre 0,001 (i e 0,1 H-. As partículas dos sistemas coloidais apresentam tamanho maior do que as
existentes nas soluções verdadeiras (< 0,001 (i), mas são de dimensões inferiores às das
suspensões (>0,1 n).
De acordo com OSTWALD e tendo em vista todas as possibilidades de interposição que existem
entre sólidos, líquidos e gases, podemos admitir a seguinte classificação geral dos sistemas
dispersos:
1010

Fase externa Fase interna

\Solida Líquida Gasosa \


Mistura de pós Inclusões Inclusões Pedra-pomes
Sólida Líquida Soluções coloidais de Soluções coloidais de líquidos; Espuma
pós; suspensões

emulsões
Gasosa Fumos Névoas ou nuvens Não há formação de
sistema, visto haver uma única fase

Dos sistemas apresentados neste quadro apenas têm interesse farmacêutico as emulsões, as
suspensões, as dispersões coloidais e as dispersões de sólidos ou de líquidos no seio de gases
(aerossoles). As misturas de pós, que têm, igualmente, grande importância farmacêutica, não devem,
contudo, as suas propriedades aos fenómenos considerados neste capítulo.
Deixando para mais tarde o estudo dos aerossoles, ocupemo-nos das dispersões coloidais e das
suspensões farmacêuticas. Na Tabela CXXI indicamos os graus de dispersão mais correntemente
empregados.

Tabela CXXI. Sistemas dispersos. Dimensões de partícula ™;


Soluções verdadeiras < 0,001 \i ou \im (l |im ou nm = IO 7 cm = 10 À)
Soluções coloidais 0,1 u, a 0,001 \i
Emulsões > 0,1 \L '"'• "' ' ^''- • •'<•
Suspensões > 0,1 (i
Aerossoles > 0,1 (J,

9.2.0.1. Dispersões coloidais


9.2.0.1.1. Generalidades e terminologia -, ;
Como é sabido, o termo colóide (Do grego Kolla, goma + eidos, forma) que hoje se emprega na
acepção de dispersão coloidal, foi proposto por GRAMAM, em 1861, e resultou das conclusões das
suas experiências sobre a difusão. Nessa altura, GRAHAM dividiu as substâncias em duas categorias
— colóides e cristalóides — distinção que é artificial pois há cristalóides que podem originar
dispersões coloidais e colóides que se podem obter no estado cristalizado. Deve, assim, falar-se em
estado coloidal ou em sistemas coloidais, e só nessa acepção empregaremos a palavra colóide.
1011

Às dispersões coloidais cuja fase externa é líquida dá-se o nome de soles, podendo classificar-se
em Uófobos e liófilos. Os soles liófobos são constituídos por partículas geralmente sólidas que não
têm nenhuma relação com o dissolvente, cuja viscosidade e tensão superficial praticamente não
modificam. Os soles liófilos apresentam as suas partículas altamente impregnadas de dissolvente
(solvatadas), comportando-se como sendo líquidas. Possuem elevada viscosidade e a sua tensão
superficial é, em regra, inferior à do meio da dispersão.
Os termos liófobo e liófïlo correspondem, pois, sensivelmente, às antigas designações de
suspensóides e de emulsóides.
Muitos colóides liófilos, como as gomas, o amido, a caseína, a gelatina e outras proteínas, são de
origem natural. Os colóides liófobos podem obter-se mediante procedimentos diversos a que mais
tarde nos referiremos.

9.2.0.1.2. Estabilidade dos colóides M^.kim j., < -«,>,,<,,,,.i.,,

Uma vez que as partículas coloidais têm dimensões muito reduzidas, a acção da gravidade
exercida sobre elas não é de molde a provocar, por si só, a separação das fases. Efectivamente, se
aplicássemos a lei de STOCKES à queda de esférulas de vidro, no seio da água, concluiríamos que
partículas com raio de 0,01 u. levariam cerca de 16 anos a depositar...
Como as partículas que constituem a fase dispersa de um sistema coloidal apresentam diâmetros
compreendidos entre 0,1 e 0,001 \í, isto significa que são praticamente incapazes de sedimentarem. A
separação das fases de um sistema coloidal só se observa quando se dá «envelhecimento do colóide»,
isto é, quando as partículas se aglutinam, originando agregados de maiores dimensões.
Estudaremos, seguidamente, as causas que impedem a aglutinação das partículas nos soles
liófobos e liófilos.

9.2.0.1.2.1. Estabilidade dos soles liófobos

A enorme superfície de um colóide liófobo permite-lhe adsorver iões e ao ganhar essa carga
eléctrica acontece que cada partícula repele a partícula próxima, evitando-se agregações e
precipitações.
Os iões adsorvidos na superfície da partícula coloidal tendem a atrair iões de carga oposta,
acabando por se formar uma dupla camada de cargas eléctricas de sinal contrário. A espessura desta
dupla camada é pequena quando comparada com o diâmetro das partículas coloidais. A dupla
camada consiste em duas «conchas» de iões de
1012

carga oposta, mas enquanto que a camada interna é estreita e compacta, aderindo firmemente à
superfície da película, a camada externa é larga e difusa, com alta concentração de iões próximo da
partícula mas diminuindo progressivamente à medida que aumenta a distância da partícula ao seio
do meio de dispersão, onde os iões positivos e negativos são em igual número. A camada externa é
facilmente removida quando a partícula coloidal se desloca.
Entre a superfície da partícula coloidal e o meio de dispersão existe um potencial. Este é o
potencial total, que pode ser dividido em duas partes. A primeira, é o potencial entre a camada
interna e a superfície da partícula coloidal. A segunda é o potencial leta ou electrocinético que
corresponde à diferença de potencial existente através da camada externa e que vai desde o extremo
da camada interna até ao seio do meio de dispersão.
Supondo que a parte difusa da dupla camada é equivalente a um condensador de
placas paralelas situadas à distância d, com uma carga e por unidade de superfície e
sendo E a constante dieléctrica do meio, a diferença de potencial entre as placas cor
responderia ao potencial zeta. Tem-se assim: ..._ _.._..., .... .,,.,. .,
4 TI e d
• • • - " \ = —————(1),

fórmula que aplicaremos mais tarde.


Admitamos que determinadas partículas coloidais dispersas em água adsorvem iões
cloro provenientes da ionização de cloreto de sódio dissolvido naquele líquido. Nestas
., , . . ,1 , , circunstâncias, as partículas coloidais carregaram-se
negativamente, sendo o cloro-ião o responsável por essa
———tolalPotencial———. carga. Sendo assim, a camada interna, aderente às
_ partículas, apresenta um potencial negativo. Os iões de
Ci Na- a sinal contrário, sódio-ião neste caso, originam na
C'—
Cl Na | camada externa, difusa, um potencial positivo. Ora,
~ Na+ Na+ como a camada difusa não migra com a partícula coloi-
QI_ Na ' dal, o que acontece com a camada interna, fixa, existe
B
ci—
Cl
' uma diferença permanente de potencial. O potencial zeta
_ Ka >• é o potencial que existe desde o extremo da camada
^______ __ interna de iões cloro até à solução. Quanto maior for o
Potencial zeta potencial zeta de um colóide liófobo, tanto maior será
(camada difusa) i_-i'j j
,
Camada a sua estabilidade.
f ixa Quando uma voltagem externa é aplicada a uma
dispersão coloidal as partículas coloidais carregadas
migram para o eléctrodo de carga oposta. Tal fenómeno conhece-se pelo nome de electroforese. As
experiências realizada neste domínio permitiram mostrar que muitos colóides estão carregados
negativamente, como o ouro, prata, enxofre, trissulfureto de
1013

arsénio, bactérias e vírus. Da mesma forma, muitas dispersões liófilas, como as de goma arábica e de
gelatina básica, têm carga negativa. Apesar das partículas coloidais serem muito maiores do que os
iões, a sua velocidade electroforetica é bastante superior ao que se poderia pensar. Entretanto, a
mobilidade dos iões é cerca de 10 vezes maior do que a das partículas coloidais.
Se bem que não sejam perfeitamente conhecidos os factores que regulam a selectividade de
adsorção dos iões por uma partícula coloidal, verifica-se que em muitos casos o ião adsorvido é o ião
comum. Assim, quando se adiciona uma solução de nitrato de prata a uma solução de iodeto de sódio,
sendo o iodeto em excesso, a partícula coloidal de iodeto de prata formada adsorve o iodo-ião, ficando
carregada negativamente. Se o nitrato de prata estiver em excesso, o ião adsorvido é o Ag*, ficando a
partícula com carga positiva. A camada difusa será, respectivamente, constituída por iões Na* e NO3~:

AgNO, + Nal —» [Agi] r~ l Na* (sole negativo) (excesso)


AgNO3 + Nal -> [Agi] Ag* i NO3~ (sole positivo) (excesso)

Ao conjunto da partícula com os iões que a rodeiam dá-se o nome de micela.


Com relativa frequência observa-se que o ião adsorvido nas partículas não é um dos reagentes, mas
um produto da reacção entre eles. É o que sucede quando se faz reagir um sal de alumínio com hidróxido
de sódio. A constituição de uma micela é, neste caso, a seguinte:

[A12O3, xH2O] AlO2-jNa*

9.2.0.1.2.2. Estabilidade dos soles liófilos


Os soles liófilos ionizam-se em presença da água. A goma arábica, por exemplo, contém ácido
glicurónico, arabinatos, etc., devendo o seu carácter ácido à ionização destes produtos. Por este
facto, a goma arábica apresenta carga negativa. Devido a circunstâncias semelhantes, muitas gomas
e outros produtos naturais usados em Farmácia como colóides liófilos, têm carga negativa, pois
apresentam na sua composição grupos carboxílicos ou sulfúricos.
As proteínas têm características anfotéricas, dependendo a sua carga eléctrica do pH do meio.
Assim, estes produtos comportam-se como ácidos em meio alcalino e como bases em meio ácido. A
gelatina, que é obtida por hidrólise parcial do colagénio,
1014

é formada por cadeias polipeptídicas de variado comprimento, e por este facto pode encontrar-se
carregada positiva ou negativamente, consoante o pH do meio em que decorreu aquela hidrólise:
(Gelatina B) (Gelatina A) ' <•'',: y. •..-.
R - CH - COO* <—— R - CH - COO- ——> R - CH - COOH „
l OH- l H» l
' ""' "' NH2 NHS* NH3» '" •"-'--••
Chama-se ponto isoeléctrico ao pH para o qual é máximo o número de moléculas electricamente
neutras, isto é, sob a forma anfotérica. A esse pH o potencial zeta é igual a zero, tendo o colóide a
sua mínima estabilidade e viscosidade.
Os colóides liófobos são precipitados por pequenas concentrações de electrólitos ou de Colóides
de carga oposta. Os colóides liófilos são mais estáveis do que aqueles, o que se deve à sua solvatação
(hidratação). De facto, quando um colóide hidrófilo de determinada carga é adicionado a um colóide
hidrófobo com a mesma carga, as partículas deste são como que revestidas, adquirindo algumas das
propriedades do colóide hidrófilo. Diz-se que o colóide hidrófilo actuou como protector do colóide
hidrófobo. A adição dos colóides protectores aos colóides hidrófobos permite a secagem do sistema
coloidai, passando este ao estado sólido, podendo o pó obtido originar facilmente um sole por adição
de água. A estes colóides dá-se o nome de colóides reversíveis.
A capilaridade pode utilizar-se para determinar a carga de um colóide. Se mergulharmos uma
tira de papel de filtro, suspensa numa solução de um colóide que seja um corante, podem dar-se dois
casos: a tira ficar toda corada ou mostrar que houve subida da água mas notar-se que o corante
ficou retido na linha de partida. No primeiro caso o corante tinha carga negativa e no segundo carga
positiva. Com efeito, a tira de papel molhado apresenta carga negativa e, nestas circunstâncias, só o
colóide negativo sobe na tira, enquanto que o colóide positivo é precipitado, separando-se do meio
de dispersão. Tal fenómeno é perfeitamente visível, usando soluções de amarante (colóide negativo,
visto ter um radical sulfónico) ou de azul de metileno (colóide positivo, usado sob a forma de
cloridrato).

i 9.2.0.1.2.3. Efeito dos electrólitos .,...-, VJ

O potencial zeta pode modificar-se por adição de electrólitos ao sole. Com efeito, se juntarmos
iões de sinal oposto ao apresentado pela superfície sólida, à medida que aumenta a concentração
daqueles diminui a carga por unidade de superfície e, muito provavelmente, a espessura da dupla
camada. ,,,.-5 ,. ...... ^. . ..... .....
1015

Ora, os soles liófobos são muito sensíveis à acção dos electrólitos, observando-se que a junção de
soluções muito diluídas daqueles é suficiente para fazer baixar o potencial zeta para além de um
valor crítico, produzindo-se a floculação do colóide. Nota-se também que o poder floculante do ião
(de sinal contrário ao da partícula dispersa) é tanto mais pronunciado quanto maior for a sua
valência.
Por adição de concentrações mais elevadas de iões plurivalentes pode chegar a inverter-se o
potencial zeta, obtendo-se um sole estável, de sinal contrário. Uma concentração mais elevada ainda
provocará nova floculação, mas agora por efeito de outro ião do electrólito. Estas noções têm imenso
interesse na preparação de suspensões, devendo recorrer-se, nalguns casos, à chamada floculação
controlada para obter medicamentos de boa qualidade.
Os soles liófilos só floculam perante a acção de concentrações muitíssimo elevadas de electrólitos.
Por outras palavras, não basta neutralizar a carga eléctrica de um sole liófilo para que ele flocule,
pois isso só acontece em consequência da desidratação das suas partículas. Esta floculação é, no
entanto, reversível, desde que seja eliminado o electrólito.
A desidratação parcial de um sole liófilo origina um estado semi-sólido sem líquido
sobrenadante, a que se dá o nome de gele. A gelificação, que interessa largamente em Farmácia, é,
como o estado coloidal, um estado geral da matéria. Os geles podem definir-se como colóides liófilos
arrefecidos ou solidificados por aumento da viscosidade, a qual pode diminuir até que o sistema se
liquefaça de novo, por exemplo, por simples agitação. Assim, muitas emulsões coaguladas ou
gelificadas por prolongado repouso recobram a sua fluidez ao serem agitadas. Em certas suspensões
tixotrópicas observa-se o mesmo fenómeno por agitação. Os geles tendem sempre a regenerar os
soles, podendo originar uma elevadíssima pressão de embebição.

9.2.0.1.2.4. Associação de colóides . ,,.,


É possível a associação de dois colóides liófobos com cargas do mesmo sinal, desde que entre
eles não se verifique qualquer reacção química. A mistura de soles liófobos de carga contrária
provoca precipitação de ambos os colóides, a não ser que haja uma desproporção muito grande entre
as suas quantidades. Neste último caso, pode acontecer, tal como sucedia com a adição de
electrólitos, que não haja precipitação mas estabilização de um deles com a carga do outro.
Quando a um colóide liófobo se adiciona uma pequena quantidade de colóide liófilo possuidor de
carga do mesma sinal, nota-se que a sua estabilidade é substancialmente aumentada, ficando menos
sensível aos agentes floculantes. Diz-se que houve protecção e chama-se colóide protector ao colóide
liófilo adicionado. Fundamentalmente, o fenómeno pode explicar-se pela formação de uma capa de
colóide liófilo à superfície das partículas sólidas que passam a apresentar as características dos
soles
1016

liófilos. A protecção de um colóide liófobo pode também conseguir-se adicionando-lhe uma


quantidade relativamente grande de colóide liófilo de carga contrária, mas a junção de pequenas
quantidades deste último sensibiliza o colóide liófobo inicial.
O poder protector de um colóide é definido pelo seu número de ouro, isto é, pelo número de mg
de substância liófila que evita a mudança de cor vermelha para azul, de 10 ml de sole de ouro (cone.
0,05 a 0,06 g/litro) quando adicionado de l ml de solução de cloreto de sódio a 10%. Quanto mais
baixo é o número de ouro, mais eficiente é a acção protectora. Na Tabela CXXII indicam-se os
números de ouro de vários compostos.

Tabela CXXII. Números de ouro de vários compostos


Gelatina .................................................................. 0,005
Goma arábica ........................................................ 0,15
Dextrina .................................................................. 6,20
Amido de batata .................................................... 25,00
Oleato de sódio...................................................... 2,00

A junção de dois colóides liófilos de carga contrária pode provocar a sua coagulação mútua.
Nestas condições, as partículas dispersas separam-se sob a forma de gotículas líquidas. A este
fenómeno dá-se o nome de coacervação. Como exemplo, citamos o que acontece quando se adiciona
um sole positivo de gelatina a um sole de goma arábica, cujas partículas se encontram carregadas
negativamente (ver pág. 959).
Certos colóides liófilos proteicos, como a albumina, podem coagular por aque
cimento. Diz-se que houve desnaturação das proteínas (formação de novo arranjo
intramolecular), a qual é seguida pela floculação e coagulação. Pode evitar-se
este fenómeno desde que se afaste o sole do seu ponto isoeléctrico. No caso
presente bastaria acidificar o meio: haveria desnaturação, mas o sole não coagularia
por aquecimento. _

9.2.0.1.3. Preparação de soluções coloidais


Os colóides liófilos são constituídos por produtos naturais ou de síntese que apresentam
moléculas de elevado peso molecular, como a gelatina, as albuminas, as gomas, o amido, os
alginatos, a carboximetilcelulose, a metilcelulose, o Carbopol 934, etc. Em regra, não se empregam
como agentes medicamentosos, mas apenas para favorecerem a preparação de vários Tiedicamentos.
1017

Os colóides liófohos são mais empregados como substâncias dotadas de actividade


farmacológica definida e a sua preparação pode, em alguns casos, ser exigida mesmo na pequena
oficina farmacêutica.
Dada a circunstância de que o tamanho das partículas coloidais está compreendido entre o das
partículas das soluções e o das suspensões, compreende-se que se possam preparar colóides liófobos
quer aumentando o grau de divisão das segundas (dispersão), quer diminuindo o das primeiras
(condensação). São, portanto, essencialmente dois os processos de obtenção de colóides liófobos:
por dispersão e por condensação. Em qualquer dos casos pode a técnica usada recorrer a meios
físicos ou químicos.

9.2.0.1.3.1. Métodos de dispersão

a) Físicos — Os processos físicos de dispersão são bem conhecidos do estudante de Farmácia:


obtenção de metais coloidais por pulverização eléctrica, fazendo-se saltar o arco voltaico entre
eléctrodos do respectivo metal mergulhado em água ou em líquido adequado (método de BREDIG e de
SVEDBERG); pulverização de substâncias por meio de moinhos coloidais.
O ouro coloidâl tem sido obtido pelo método de BREDIG. Resultados semelhantes são conseguidos
por passagem da corrente eléctrica através de uma solução diluída de cloreto de ouro, que é
reduzido, originando uma solução coloidâl daquele metal.
b) Químicos — Os métodos químicos de dispersão consistem em fazer dispersar precipitados em
meio aquoso levemente alcalinizado ou acidificado, por exemplo. Obtêm-se assim soles por
pepüzação, palavra que tem origem na acção da pepsina sobre a clara de ovo coagulada, que é por
ela tornada solúvel na água. Este termo é sinónimo de defloculação.
Na prática empregam-se várias substâncias que actuam como peptizantes. É curioso observar-se
que o peptizante não é forçosamente um colóide. Em boa verdade, a maioria desses agentes não se
comporta como um sistema coloidâl. Assim, a sacarose pode desempenhar o papel de peptizante
para o óxido de ferro que se dispersa em solução coloidâl; o açúcar invertido é considerado cerca de
7 vezes mais activo do que a sacarose para dispersar o hidróxido de ferro; certos citratos solúveis
podem ser empregados para dispersar compostos de ferro sob a forma de soluções coloidais (efeito
sequestrador) e o hidróxido de cobre é tomado coloidâl pelo açúcar ou pela caseína.
Nos casos citados trata-se de uma acção soluhilizante que muitas vezes é conse
guida pela adição de substâncias tensioactivas, como os polissorbatos, o sulfato de
laurilo e sódio, o dioctilsulfossuccinato de sódio, etc. Este assunto será tratado a
propósito do estudo das Soluções (ver solubilização). .., .„,„ -„.;„.
1018

*Msi 9.2.0.1.3.2. Métodos de condensação


a) Físicos — Consistem em obter dispersões coloidais a partir de soluções, por diminuição da
solubilidade do dissolvido, substituindo rapidamente o solvente por outro adequado. É o caso da
tintura de benjoim que, dispersa em grande quantidade de água, dá origem a uma solução coloidal
estável. Algumas vezes, quando se dilui uma tintura resinosa ou balsâmica ou um extracto fluido com
água, o colóide formado tende a flocular, agregando-se as partículas constituintes. É então
aconselhável proceder à dispersão em presença de colóides hidrófilos, como a goma arábica, os
quais evitam o mencionado fenómeno.
b) Químicos — A preparação de colóides por condensação química pode conseguir-se mediante
os mais variados tipos de reacção (redução, oxidação, hidrólise, dupla decomposição, etc.). Assim, a
prata coloidal pode ser preparada por redução do nitrato de prata pelo tanino. O formol e a
hidrazina podem, também, utilizar-se como agentes redutores de vários produtos para que se
obtenham soluções coloidais, etc.
O enxofre coloidal pode conseguir-se por reacção do ácido clorídrico sobre o tiossulfato de sódio
em solução aquosa. Trata-se, como é evidente, de uma redução.
Os soles de hidróxido de ferro obtêm-se pela acção de amónia sobre as soluções diluídas de
cloreto férrico (hidrólise). Se a amónia for cuidadosamente adicionada à solução concentrada de
cloreto férrico, até que se forme um precipitado que não se redissolva, e se se proceder à filtração e
diálise subsequentes, permanecerá na solução oxicloreto de ferro, que apresenta marcadas
propriedades coloidais. Estes processos de hidrólise são empregados para a obtenção de muitos
colóides, como compostos básicos de alumínio, de zinco, de crómio, etc.
A dupla decomposição é também frequentemente utilizada, como no caso da preparação do
ferrocianeto de cobre coloidal, que se pode obter por reacção entre soluções diluídas de ferrocianeto
de potássio e de sulfato de cobre.
De um modo geral, os soles obtidos podem purificar-se por diálise, que elimina o excesso de
electrólitos, mas aquela não deve ser levada ao exagero, pois poderia haver diminuição da
estabilidade do colóide, já que a presença de pequenas quantidades de electrólitos é indispensável
para se obterem dispersões estáveis.
Na preparação de soluções coloidais liófobas é muitas vezes útil a presença de colóides liófilos
(protectores), como a gelatina, as gomas, a caseína e outras proteínas. Assim, as soluções de prata
coloidal podem obter-se por precipitação do nitrato de prata com hidróxido de sódio em presença de
gelatina, caseína, albumina ou seus derivados, ou por precipitação de iodeto ou de cloreto de prata,
em presença de gelatina.
Estes produtos podem secar-se posteriormente (no vazio), obtendo-se sob forma de pós que se
dispersam com facilidade na água. Trata-se, pois, de colóides reversíveis, e essa propriedade é
devida à presença das substâncias liófilas que se encontram presentes (gelatina, caseína, proteínas,
etc.).
1019

Entre estes colóides de prata são de citar o Colargol, o Protargol e o vitelinato de prata (Argirol,
Silvol, Solargentum). A F. P. IV inscreve o Colargol, que é um poderoso germicida, sob o nome de
prata coloidal. Trata-se de uma combinação de prata e matérias proteicas constituídas por produtos
de desintegração da albumina de ovo em meio alcalino. O seu conteúdo em prata metálica é de 70 a
80%.
A prata coloidal dispersa-se lentamente na água (1:2,5), originando soluções coloi-dais com
reacção alcalina fraca. Estas soluções devem preparar-se no momento do emprego, por agitação e
repouso subsequente, à temperatura ambiente. A filtração só se deve efectuar no momento de
dispensar o medicamento.
A pulverização do Colargol prejudica a preparação e a estabilidade das suas soluções coloidais.
Do mesmo modo, não se devem esterilizar as dispersões aquosas de prata coloidal que, em caso de
necessidade, serão preparadas por técnica asséptica.
O colargol é incompatível com os ácidos minerais diluídos e com as soluções salinas
concentradas, que floculam o colóide. A prata coloidal e as suas soluções (partículas de 9 a 35m|i)
devem ser guardadas em frascos fechados e ao abrigo da luz.
O Proíargol é um proteinato de prata cujo teor em prata metálica é de 7,5 a 8,5%. Esta
substância apresenta quase toda a prata constituinte sob a forma ionizada, razão por que é mais
irritante e mais fortemente germicida do que o argirol, o qual, apesar de mais rico em prata, possui-a
no estado de combinação orgânica.
O proteinato de prata dispersa-se lentamente na água (1:2), originando soluções coloidais muito
sensíveis à acção dos electrólitos e dos oxidantes. Estas soluções produzem precipitados em presença
dos taninos e a sua alcalinidade é suficiente para decompor os sais de alcalóides, libertando as bases
respectivas. O Protargol é, também, muito sensível à luz.
As soluções de Protargol devem ser preparadas no momento do emprego, para o que se lançará
o produto, cuidadosamente, na água, de modo a que sobrenade. A dispersão, que é, como dissemos,
muito lenta, não pode ser apressada por agitação, que faria flocular o colóide.
O Argirol, que vem inscrito na Farmacopeia Portuguesa IV com o nome de vite-Hnato de prata, é
também conhecido por proteinato de prata, suave. Contém 19 a 25% de prata metálica em
combinação com substâncias proteicas. Dispersa-se mais facilmente na água (1:1) do que o
Protargol, originando soluções coloidais dotadas de fraca alcalinidade. Na preparação das suas
soluções, cuja concentração habitual é de 5%, mas que pode ir até 50%, deve evitar-se a agitação
enérgica. As soluções serão obtidas recentemente, de preferência no momento do emprego. Deve
evitar-se a acção da luz, acondicionando-se em frascos de vidro âmbar.
O Argirol, que como os anteriores colóides de prata é um anti-séptico particularmente aplicado
nas mucosas, apresenta as mesmas incompatibilidades que o Colargol.
Com frequência, na preparação de soluções coloidais aquosas intervêm outros líquidos, como o
álcool e os glicóis. De facto, pode preparar-se, por exemplo, uma dispersão aquosa de enxofre
dissolvendo-o em polietilenoglicol 200-300 e adicionando
1020

água a esta solução. O álcool é susceptível de se empregar com idêntica finalidade mas, no caso de
se ter usado como dissolvente do enxofre, convirá que a dispersão, operada por junção da água, seja
estabilizada com um colóide protector. Por esta razão, emprega-se, correntemente, em lugar da
água, uma solução aquosa de gelatina a 1%.
Podem preparar-se dispersões coloidais cuja fase externa seja um óleo (azeite, óleo de amendoim,
óleo de rícino, etc.). É hábito estabilizar estas dispersões por adição de pequenas quantidades de
lanolina, colesterol, lecitina ou oleatos.
Nos últimos tempos têm-se preparado dispersões coloidais contendo isótopos radioactivos para
aplicar com fins terapêuticos ou de diagnóstico. Assim, diversos colóides radioactivos podem
localizar-se em tumores, lesões ou embolias, servindo para a localização daqueles e indicando ainda
o seu tamanho. Por outro lado, os radiocolóides podem constituir um óptimo meio de terapêutica
anticancerígena, uma vez que são pouco solúveis e se fixam em determinados órgãos e tumores onde
emitem radiações.
Na F. P. V inscrevem-se diversas soluções coloidais injectáveis contendo isótopos radioactivos.
Entre elas citamos as de enxofre coloidal e tecnécio [""Tc], de ouro [198Au] coloidal, de sulfureto de
antimónio coloidal e tecnécio [Wl°Tc] e de sulfureto de rénio coloidal e tecnécio [""Tc]. Nestes
produtos o radionuclido fixa-se na partícula coloidal, sendo, em regra, a gelatina utilizada como
estabílizante. Nalguns casos (sulfureto de antimónio coloidal e tecnécio) recorre-se à
polivinilpirrolidona como estabili-zante. O pH dos injectáveis das referidas preparações situa-se
entre 4 e 7.
Usam-se também agregados de albumina com radionuclidos, mas as suas partículas tênr
dimensões bastante superiores, podendo considerar-se já como fazendo parte das suspensões
(microesferas).

9.2.0.1.4. Formulário das dispersões coloidais

• •,'- Vitelinato de prata........................................ 2,5 g


Água destilada .................................... q.b.p. 50 »

Espalhe o vitelinato de prata à superfície da água contida num copo e agite,


cuidadosamente, até perfeita dispersão. Em alternativa, e quando esta fórmula não se
destine a ser empregada como colírio, pode proceder-se à trituração do vitelinato com
uma pequena quantidade de glicerina, adicionando, posteriormente, a água, até ao peso
desejado. . .. - ,:, ..-,. _; : .... .• _,<. .,^.\,- --•::
1021

-W-
Nitrato de prata ............................................ 2,2 g
lodeto de potássio ........................................ 2,2 »
Gelatina.......................................................... 0,3» ;
Água destilada .................................... q.b.p. 100 »
Dissolva a gelatina e, depois, o iodeto de potássio em 50 ml de água quente. Deixe
arrefecer; dissolva o nitrato de prata na água restante e junte esta solução, lentamente, à
primeira, agitando sempre.
Como o peso molecular do nitrato de prata (169,89) é ligeiramente superior ao do iodeto de
potássio (166,02), na fórmula há um pequeno excesso de iodeto de potássio, o que provoca a
formação de micelas carregadas negativamente. A gelatina é o colóide protector utilizado.
-- .-í;ïi; 'Aí!' : • - '• •
:-•;*( III
' I Álcool ............................................................ 100 ml
Enxofre q.b.p. ................................................ saturação "'
n Gelatina t......................................................... lg -",»< .,n ^
Água destilada q.b.p. .................................... 100 » . i ...
Sature 100 ml de álcool com o enxofre. À parte dissolva a gelatina na água quente. Depois de
fria ajunte a esta solução a solução alcoólica de enxofre, agitando continuadamente. Destile, a
pressão reduzida, até que o volume final seja de 150 ml.
A dispersão coloidal assim preparada titula 0,1% de enxofre e pode ser utilizada por via
parenteral, desde que a preparação tenha sido efectuada por técnica asséptica.

• - •>. y. IV
. .. _. ,i Tintura de beladona...................................... 5g
Água de hortelã-pimenta q.b.p. .................. 100 »
A tintura de beladona é preparada com álcool de 70° e quando se adiciona, a pouco e pouco,
sobre a água, com agitação continuada, vai-se dispersando, obtendo-se uma solução coloidal que se
administra per os.

Albumina de ovo.......................................... 100 g


Água destilada .............................................. 900 »
1022

Agite, fortemente, a albumina numa pequena quantidade da água; ajunte a água restante e coe.
Trata-se de uma fórmula inscrita na F. P. IV, destinando-se a ser empregada como emoliente,
por via oral ou em enema. Tem-se utilizado esta preparação como antídoto das intoxicações pêlos
metais pesados, devendo recordar-se, no entanto, que alguns albuminatos, como o de mercúrio, são
solúveis em excesso de albumina.
A conservação da água albuminada é bastante precária, convindo prepará-la extemporaneamente.

9.2.0.2. Suspensões 9.2.0.2.1. Generalidades


Suspensões são sistemas heterogéneos em que a fase externa ou contínua é líquida ou semi-sólida
e a fase interna ou dispersa é constituída por partículas sólidas insolúveis no meio utilizado. O
diâmetro médio das partículas pode variar, segundo os casos, desde cerca de O, l u, até algumas
centenas de micra. Se a fase externa for dotada de pequena viscosidade pode observar-se que
partículas suspensas apresentam movimento browniano.
Em farmácia, as suspensões são utilizadas com três finalidades principais, isto é, para uso oral,
para aplicação tópica na pele e nas mucosas ou para administração parenteral.
O seu emprego justifica-se por várias razões, designadamente pela insolubilidade dos fármacos
nos veículos habitualmente usados, pelo mau sabor que os compostos podem apresentar em solução
ou no estado de pó, ou pelo facto de se pretender prolongar uma acção medicamentosa, retardando-
se a absorção de um fármaco por via injectável, por exemplo.
Assim, algumas drogas, como o acetato de cortisona e a hidrocortisona e seus ésteres, são
insolúveis nos veículos habituais. Certas substâncias apresentam um sabor muito desagradável,
diminuindo o gosto que produzem à medida que diminui a sua solubilidade, o que tem levado a
preparar suspensões dos seus derivados menos solúveis. É o que sucede com o tanato de quinina e
com o palmitato de cloranfenicol, que se empregam sob a forma de suspensão, para substituir,
respectivamente, o sulfato de quinina e o cloranfenicol, mais solúveis e amargos do que aqueles
derivados.
A preparação de suspensões injectáveis corresponde, muitas vezes, à necessidade de se obterem
acções farmacológicas mantidas por maior lapso de tempo, constituindo exemplo desta aplicação os
injectáveis de derivados da insulina, os injectáveis de penicilina ligada à procaína ou à N-N'-
dibenziletilenodiamina, e as medicações paren-terais constituídas por esteróides administrados sob a
forma de grandes cristais dispersos em meio aquoso.
1023

Muitas vezes acontece que as substâncias medicamentosas se tornam quimicamente mais estáveis
quando administradas em suspensão. A penicilina-procaína é menos alterável do que a penicilina G
livre sob a forma de sal sódico ou potássico; o ácido acetilsalicílico, em suspensão, hidrolisa-se em
menor grau do que quando dissolvido; o acetato de 6-rx-cloroprednisona, que é solúvel em
propilenoglicol, destrói-se facilmente em solução, utilizando-se de preferência as suas suspensões em
parafina liquida, muito menos alteráveis.
Se é aparentemente fácil preparar suspensões, a obtenção de uma forma farmacêutica que
satisfaça cabalmente às necessidades da terapêutica actual pode revestir-se de dificuldades diversas
e envolve um conhecimento perfeito da física da dispersão. Efectivamente, uma suspensão, como uma
emulsão, representa um sistema termodinamica-mente instável, isto é, as partículas dispersas, em
razão da sua grande superfície e energia livre, tendem a agrupar-se de modo a que seja reduzida a
área inicial que apresentam e assim o seu nível energético. Numa suspensão líquida haverá, pois,
tendência para as partículas sólidas se unirem umas às outras, floculando ou originando agregados
mais firmes que sedimentam e que não são susceptíveis de serem novamente suspensos.
Do ponto de vista galénico, interessa obter suspensões que não depositem rapidamente e que se
possam reconstituir com facilidade por agitação. Interessa ainda que a redispersão operada por
agitação origine um produto de aspecto homogéneo, em que se não observe a presença de quaisquer
aglomerados de partículas. Importa, finalmente, que não se verifique crescimento dos cristais
durante a armazenagem. Numa palavra, é preciso que as suspensões sejam fisicamente estáveis.
Das exigências assinaladas se compreende que além da concentração desejada, do tamanho dos
cristais escolhidos, da viscosidade e da densidade da fase dispersante e dos aditivos eventualmente
juntos, a temperatura de armazenagem, a própria agitação durante o transporte, etc., podem influir
grandemente na qualidade do medicamento obtido.
Se às exigências gerais assinaladas adicionarmos as impostas pelo tipo de administração a que se
destina esta forma farmacêutica, compreenderemos plenamente as dificuldades que surgem na
correcta preparação de suspensões.
Assim, numa suspensão para uso oral, o tamanho das partículas dispersas pode condicionar a
facilidade de absorção ou a predominância de uma acção local no intestino, mas o diâmetro das
partículas influi também na rapidez de efeito de um medicamento injectado ou na acção terapêutica
de um preparado dermatológico.
O diâmetro das partículas suspensas' é ainda importante numa suspensão parenteral, já que
partículas demasiado volumosas podem obstruir a agulha com que aquela seja injectada, e
partículas muito pequenas podem não produzir a acção prolongada que eventualmente se pretenda.
Uma suspensão demasiado viscosa pode não fluir livremente da boca do frasco onde se
acondiciona ou da agulha da seringa com que se administra. Também, quando
1024

uma suspensão se destina à aplicação cutânea ou nas mucosas, é importante que a sua viscosidade
permita que seja facilmente espalhada pela superfície afectada a cobrir, mas não deve ser tão móvel
que não seja retida nessa mesma superfície. Uma forma deste tipo deve ainda secar rapidamente,
promovendo a formação de uma película protectora da área afectada.
Finalmente, não esqueçamos que na preparação de muitas suspensões é obrigatória a
esterilização, a qual pode criar problemas dificilmente solucionáveis, até porque os microrganismos
se podem desenvolver no interior dos cristais suspensos e aí resistem à destruição pêlos meios
compatíveis com a estabilidade do sistema.
No presente capítulo iremos ocupar-nos das suspensões em geral, tratando em pormenor da
preparação das suspensões destinadas ao uso oral.
No segundo e terceiro volumes desta obra abordaremos a preparação das suspensões utilizadas
por via parenteral e ocular e para aplicação dérmica.

9.2.0.2.2. Aspectos físicos das suspensões


Se as partículas sólidas dispersas numa suspensão fossem constituídas por esferas com o mesmo
diâmetro e de superfície perfeitamente lisa e se a fase dispersante apresentasse as propriedades dos
líquidos newtonianos, seria fácil discutir as leis físicas que governam a estabilidade das suspensões.
Infelizmente, não se verifica nenhuma destas condições e por isso será mais árdua a nossa tarefa.
Os principais aspectos teóricos que julgamos dever considerar, com o objectivo de dar as bases
para a preparação racional das suspensões, são os seguintes: flutuação das partículas suspensas;
velocidade e modo de sedimentação; crescimento dos cristais; redispersibilidade.

9.2.0.2.2.1. Flutuação das partículas suspensas


Sempre que se põe em contacto um líquido com um sólido nele insolúvel, podem ocorrer três
situações diferentes:

1.° — O líquido espalha-se sobre o sólido, deslocando os gases adsorvidos e molhando-o


completamente;
2.° — o líquido não molha o sólido, mas permanece sobre ele tomando o aspecto de gotas ou a
forma lenticular;
3.° — o líquido espalha-se parcialmente, formando um ângulo de contacto definido com o sólido.
1025

A terceira hipótese é a mais vulgar na prática, tendo-se desenvolvido o conceito de ângulo de


contacto ou de molhabilidade como um meio de traduzir a facilidade com que os líquidos se espalham
sobre as superfícies sólidas.
A molhabilidade é tanto maior quanto menor for o ângulo de contacto e se este ultrapassar o
valor de 90°, quando um corpo sólido hidro-insolúvel é posto em contacto com a água, diz-se haver
hidrorrepelência, sendo aquele considerado como hidrófobo. Pelo contrário, se, nas referidas
condições, o ângulo de contacto é agudo, o corpo sólido insolúvel é denominado hidrófilo.
De modo semelhante, quando os sólidos hidrófilos são imersos em veículos apoiares, como os
óleos, observa-se certa óleorrepelência. Aos compostos sólidos facilmente molháveis pêlos óleos e
dissolventes apoiares chamaremos oleófilos ou lipófilos.
A Fig. 347 mostra, em esquema, ângulos de contacto desde O até 180°.

.f* (ȕ U>

; _ O < 90° 9: 90"


9 > 9O°
. . Fig. 347. Ângulos de contacto 0 de O a 180°

Há vários sólidos susceptíveis de serem molhados por solventes polares ou apoiares, mas
observa-se sempre um certo carácter preferencial e, assim, quando uma substância se mistura com
uma fase e se adiciona a outra fase, durante a mistura nota-se que é expelida a fase menos molhante.
Por exemplo, o óxido de zinco é molhado mais eficazmente pelo azeite do que pela água, mas esta
molha-o melhor do que a parafina líquida.
Quando, na preparação de uma suspensão, as partículas sólidas não são suficientemente
molhadas pela fase dispersante, observa-se que tendem a flutuar, aglomerando-se junto à superfície
do líquido. Este fenómeno, que é uma consequência do elevado ângulo de contacto sólido-líquido,
depende, como é lógico, da tensão interfacial e das tensões superficiais do sólido e do líquido. Pode
escrever-se:
1026

em que 0 é o ângulo de contacto e ys yL são, respectivamente, as tensões superficiais do sólido (') e do


líquido e YSL é a tensão interfacial sólido-líquido. Daqui se conclui que a molhabilidade de um sólido
pode ser incrementada pela diminuição da tensão interfacial e da tensão superficial da fase líquida,
conseguindo-se uma molhabilidade total quando o segundo membro da equação citada iguala o
primeiro.
A acção principal dos agentes molhantes consiste em diminuir o ângulo de contacto entre a
superfície sólida e o líquido. São compostos que adicionados à água ou a outros líquidos favorecem a
susbtituição de uma interfase sólido-ar por uma interfase sólido-líquido. Devem ter as seguintes
propriedades: 1.° concentrarem-se na interfase sólido-líquido e reduzirem o ângulo de contacto
(diminuição da tensão interfacial); 2.° difundirem-se rapidamente do líquido para a interfase sólido-
líquido.
Muitos agentes molhantes facilitam a molhabilidade dos sólidos pela água ou pelas soluções
aquosas, sendo então chamados humectantes por alguns autores (2). Empregam-se na preparação
das suspensões, embora a sua escolha deva ser extremamente criteriosa, dadas as limitações
impostas pela sua possível toxicidade, em especial no caso dos medicamentos injectáveis. Além disso,
para que um agente molhante actue eficientemente é necessário que confira ao sistema um equilíbrio
hidrófilo-lipófilo compreendido entre 6 e 9.
Alguns agentes molhantes tipicamente hidrófilos aumentam a afinidade dos sólidos para os óleos
mais eficientemente do que para a água. Trata-se de um fenómeno a que se recorre na indústria das
tintas, empregando-se para isso certas atuirias alifáticas ou compostos alifáticos de amónio
quaternário. Estas substâncias fixam-se à superfície das partículas sólidas pêlos seus grupos
hidrófilos e dispõem os grupos hidrófobos no sentido de repelir a fase aquosa. Daqui resulta que as
partículas sólidas ficam mais hidrófobas do que inicialmente, tornando-se, por isso, mais facilmente
molháveis pêlos óleos e veículos pouco polares.
Na preparação de suspensões pode interessar, portanto, a inclusão de agentes molhantes capazes
de evitarem o referido fenómeno da flutuação. Entre os molhantes mais correntemente utilizados
citamos numerosos tensioactivos, como os polissorbatos, os Myrjs, o sulfato de laurilo e sódio, o
dioctilsulfossuccinato de sódio e, de um modo geral, os agentes emulsivos do tipo O/A.
Como molhantes que favorecem o contacto entre as partículas sólidas e os óleos, poderemos
referir o monoestearato de alumínio, os Spans, etc. No entanto, não só os

(') Infelizmente não é possível determinar a tensão superficial dos sólidos, admitindo-se, no
entanto, que é semelhante à que apresentam quando fundidos.
(2) É corrente considerarem-se como equivalentes as expressões molhante e humectante. Preferi-
mos, à semelhança da literatura norte-americana e inglesa, reservar o termo humectante para as
substâncias capazes de relerem água numa dada preparação farmacêutica, opondo-se assim à
evaporação natural daquele líquido. Estão nestas circunstancias a glicerina, o propilenoglicol e o
sorbitol a 70% que, com alguma frequência, se empregam na preparação dos cremes (pomadas de
tipo emulsão O/A).
1027

molhantes mas, igualmente, outras substâncias constituídas por macromoléculas fortemente


hidrófilas (carboximetilcelulose, goma arábica, etc.) ou compostos hidrófilos insolúveis em água
(bentonite, hidróxido de alumínio, Aerosil, etc.) são susceptíveis de atenuarem a tendência para a
flutuação que as partículas sólidas possam, eventualmente, manifestar. Na Tabela CXXIII indicam-se
os ângulos de contacto entre vários líquidos de tensão superficial conhecida e dois sólidos pouco
energéticos, a 20°C.

Tabela CXXIII. Ângulos de contacto entre vários líquidos e a parafina sólida ou o polietileno
Líquidos (*) Parafina sólida Polietileno
108
Água (y L = 73) , 94
iHM
Glicerol (y L = 63) -96*'- ' •• :" " •"- ; W"" ' :

Formamida (y L = 58) --. <- 91 77


Benzeno (y L = 29) - •••'••! 24 Espalha-se
n-Hexadecano (y L = 28) 28 »
n-Decano (y L = 24) 4 "
(*) Y L expresso em erg/cm!

A avaliação prática do grau de molhabilidade das substâncias tem sido intentada


por diversos processos, pouco rigorosos e objectivos. Assim, DRAVES propôs um ensaio
empírico que se baseia na determinação do tempo que leva a imergir um fragmento de
algodão cardado na solução em estudo. Por seu turno, ZACEK preconiza um processo
que se fundamenta no facto seguinte: uma dada quantidade de pó passa através de uma
gaze hidrófila, juntamente com um líquido, se este o molhar. Pela avaliação da percen
tagem de pó que atravessa a ! gaze, em condições padronizadas, pode apreciar-se o seu
grau de molhabilidade. ' . i .:•

9.2.0.2.2.2. Sedimentação
Na preparação de uma suspensão é necessário que as partículas se encontrem homogeneamente
dispersas no veículo por um período de tempo satisfatório e que sejam facilmente ressuspensas após
deposição.
Ora, numa suspensão, as partículas tendem a depositar, o que se deve à acção da força da
gravidade sobre elas exercida. É claro que quanto menor for o tamanho e a densidade das partículas
e mais viscosa se apresentar a fase dispersante, mais lenta será a deposição. A lei de STOKES, já
aplicada a outras formas, como as emulsões, se bem que não seja verdadeira para as suspensões
farmacêuticas, é ainda uma das mais exactas expressões matemáticas que se pode utilizar para
traduzir o fenómeno. Efectivamente,
1028

esta lei só é realmente válida se o meio de dispersão ocupar um volume infinitamente maior do que o
ocupado pela fase dispersa, se a fase dispersa for constituída por partículas esféricas de superfície
lisa, se as partículas não tenderem a aglutinar-se, mantendo-se isoladas, se forem desprezíveis os
efeitos eléctricos entre as partículas sólidas e o líquido dispersante, etc.
Compreende-se que as suspensões, especialmente em razão da elevada concentração da fase
dispersa, não sigam inteiramente a lei de STOKES. HIGUCHI aplicou a equação de KO7.ENI às suspensões
concentradas, admitindo que a sedimentação das partículas sólidas se processava de acordo com o
fluxo de escoamento dos líquidos através de uma camada porosa (ver pág. 70). Para efeitos práticos e
com certa aproximação, poderemos, contudo, servir-nos da lei de STOKES e assim admitir que a taxa
de sedimentação se aproxima de zero à medida que a diferença entre a densidade das partículas
sólidas e do líquido dispersante tende a anular-se, que as partículas suspensas diminuem de tamanho
e que a viscosidade da fase líquida aumenta.
Nas circunstâncias referidas, pode pensar-se que seria suficiente reduzir as partículas suspensas a
dimensões coloidais para que se evitasse praticamente a sedimentação, mas além dessa solução nem
sempre ser possível (por alterar, por exemplo, a biodisponibilidade desejada), não é, por si só,
suficiente.
A densidade das partículas é, em geral, mais elevada do que a da fase líquida, oscilando para
muitos compostos, como os esteróides, entre 1,2-1,3. Seria assim preciso que fosse incrementada
largamente a densidade do veículo, para se evitar a sedimentação. Têm sido propostas algumas
modificações de veículos com essa finalidade, mas essa prática é pouco aconselhável do ponto de
vista farmacêutico. Assim, o sorbitol a 70% pode aumentar a densidade do meio aquoso até 1,3, mas
a viscosidade da fase dispersante obtida é demasiada (180 centipoise) para muitas suspensões.
Tal como nas emulsões, têm-se utilizado óleos iodados como fase dispersante de suspensões
oleosas. Este processo de incrementar a densidade do veículo só pode servir quando se preparam
suspensões afins com o óleo iodado, como as dispersões de compostos radiopacos.
O aumento da viscosidade constitui, pois, o processo mais utilizado para impedir a sedimentação,
mas é preciso não esquecer que, enquanto que os líquidos puros têm uma viscosidade definida, uma
suspensão pode apresentar diversos valores de viscosidade, dependentes do tratamento a que foi
submetida. Com a finalidade de esclarecer este importante problema, passemos em revista as
diferentes propriedades do movimento de vários sistemas Teológicos.
O termo reologia (do grego rheo, escoar, mover e logos, ciência) foi sugerido por BINGHAM e
CRAWFORD e engloba as condições de movimento dos líquidos e de deformação dos sólidos. A reologia
constitui, como se sabe, um importante capítulo da Física, onde é estudada a viscosidade dos
líquidos.
A lei de atrito de NEWTON só é válida para líquidos de composição simples e viscosidade
relativamente baixa. Em líquidos complexos, como as suspensões, intervêm
1029

outros factores além dos expressos pela lei do atrito. Há, pois, numerosos líquidos não newtonianos
que se classificam em 4 grupos: plásticos, tixotrópicos, pseuclo-plásticos e dilalantes.
A Fig. 348 mostra as características de escoamento de várias substâncias. Da sua análise
observamos que um líquido newtoniano (A), quando sob a acção de uma pressão P, escoa com uma
valocidade (v) que é directamente proporcional à pressão exercida. Um líquido plástico (B), nas
referidas condições, só apresenta escoamento a partir de uma pressão mínima, a que se dá o nome
de valor de cedência. Este valor é uma

Pressão Fig. 348. Características de escoamento de


várias substâncias
1 — Valor de cedência; 2 — Grau de tixotropia
(A) — Tipo newtoniano; (B)—Tipo plástico; (C) — Tipo plástico com
tixotropia; (D) — Tipo pseudo-plástico; (E) — Tipo dilatante; (F) —
Tipo
pseudo-plástico com tixotropia Seg. A. Martin — Physical
Pharmacy, Lea e Febiger, Philadelphia, 1960
constante que representa, portanto, a pressão mínima necessária para que se inicie o escoamento. Se
a força aplicada é inferior ao valor de cedência, a substância comporta-se corno uma matéria
elástica. O escoamento do tipo plástico está frequentemente associado com uma estrutura interna
que é destruída por agitação, mas se reconstitui pelo repouso. As substâncias que mostram este tipo
de escoamento dizem-se tixoírópicas (C). A bentonite, a hectorite, o hidróxido de alumínio, o Veegum
(') e o Aerosil (') são substâncias tixotrópicas que quando dispersas em água originam geles por
repouso, os quais se tornam líquidos por agitação (passagem a sole).
O monoestearato de alumínio é uma substância tixotrópica empregada em suspensões oleosas
injectáveis e LESSHAFFT relata o uso da dimetildialquilamónio-hectorite (2) que, ao contrário da
hectorite, é hidrófoba e lipófila.
(') Nome registado.
(2) Preparada com o nome de Bentone 38 por National Lead Co. Os grupos alquílicos são uma
mistura entre C18 e C16 numa razão de 70:30, aproximadamente. - • •> . *;
1030

Muitos dos hidrocolóides naturais ou sintéticos (goma adraganta, metilcelulose,


carboximetilcelulose, alginatos, Carbopol 934, etc.) comportam-se, em dispersão, como líquidos
com escoamento pseudo-plástico (D).
O escoamento do tipo dilatante (E) é apresentado por algumas suspensões com concentrações
muito elevadas de sólidos (pastas, tintas, etc.). Como se vê na Fig. 348, à medida que aumenta a
pressão aumenta a resistência ao escoamento.
Em geral, a velocidade de sedimentação não constitui um problema capital na preparação das
suspensões. Mais importante é, sem dúvida, o modo de sedimentação e as alterações físico-químicas
sofridas pelo sedimento mantido em repouso. É destes dois factos que nos iremos ocupar
seguidamente.

9.2.0.2.2.3. Crescimento dos cristais

Quando os cristais de uma substância se encontram em suspensão num meio • líquido no qual a
substância é parcialmente solúvel, pode observar-se o fenómefïo do crescimento dos cristais. Para
isso é preciso que a concentração na solução seja superior ao coeficiente de solubilidade da
substância. Esta alteração, que corresponde a um dos fenómenos que é preciso evitar na preparação
das suspensões, pode dever-se a variações de temperatura, ao polimorfismo apresentado pelo
composto suspenso e ainda às diferenças de tamanho dos cristais dispersos. Efectivamente, o
abaixamento térmico de uma suspensão pode diminuir o coeficiente de solubilidade da substância e o
polimorfismo afecta também aquela característica. Do mesmo modo, as diferenças de tamanho dos
cristais suspensos influenciam a solubilidade, sendo esta tanto maior quanto menores forem aqueles.
De facto, o tratamento mecânico a que foi sujeita uma droga para a sua redução a pó é susceptível
de afectar a sua solubilidade, já que se podem ter induzido variações na energia livre superficial.
A solubilidade aumenta à medida que diminui o tamanho das partículas, de acordo com a
seguinte equação aproximada:

•-:.-.; ; .-. .--. s 2yV l \ '"•


IQO ________ __ _____________________ /________ ___ ________•)
,: . ,-.. Só 2,303 RT r r, '[.._ YI ... .... :-. ,

em que S é a solubilidade das partículas mais pequenas, S0 a solubilidade das partículas


maiores, y a tensão superficial das partículas, V o volume molar (volume em cm3 por
molécula-grama), r e ro os raios das partículas em cm, R é a constante dos gases
(8,314 x IO7 erg. grau^.mol.') e T a temperatura absoluta. ,. • ••.
1031

Substituindo o volume molar pela relação entre a molécula-grama e o peso específico


(M/p), obtém-se

S 2y M i l
log —— = ——————— X —— X (—— — ——),
S« 2,303 RT f r r,
expressão que algumas vezes toma este outro aspecto, considerando em vez dos raios os diâmetros
das partículas (d e do)

;
' ' t' ,,- : S _ 47 M l l
f
- •'•-• »,v- ° S. 2,303 RT e d d, ' -

Suponhamos, assim, que pretendíamos que um sólido fosse pulverizado a um grau de divisão tal
que a sua solubilidade aumentasse de 10%, sabendo-se que a respectiva tensão superficial era de 100
dine.crrr1 e que o seu volume molar era de 50 cm3, trabalhando-se à temperatura de 27°C. Este
exemplo retirado de HILDEBRAND e Scorr, permite ver que haveria necessidade de dividir as
partículas até que o seu raio fosse de 4,2 x 10-" cm:

2 x 100 x 50
!
.. i-.,,^.. -.'v 2,303 X 8,314 x 10 X (273 + 27) X 0,0414
.'••;inol tu- ..•;. - . . = 4,2 x IO'6 cm,

cálculo feito supondo 7/ro desprezável em presença de l Ir e substituindo S/Sa por 1,1 (10% de
aumento de solubilidade).
HIGUCHI descreve com certo pormenor a forma de calcular a diferença de solubilidade entre
cristais suspensos, de diversos tamanhos, baseando-se ainda nas equações anteriores. Verifica,
assim, para uma mesma substância em pó grosso ou dividida em cristais cúbicos, que a solubilidade
aumenta de 8% quando a aresta dos cristais é de 0,1 n, duplicando o valor inicial se as partículas
atingem 0,01 n de aresta.
A Tabela CXX1V mostra a diferença de solubilidade (S) de pequenas partículas
em função do seu raio. O composto experimentado tem um peso molecular de 500 e
exibe uma densidade p = 1. A tensão superficial existente entre as partículas é de
30 erg/cm2. . ., .
1032

Tabela CXXIV. Diferença de solubilidade de partículas de pequenas dimensões em função


do seu raio
Raio em micra S
0,01 7 v .
0,10 1,12 V'
1,0 1,01
10,0 1,001

Pelas fórmulas anteriores vê-se também que a diminuição da tensão superficial pode reduzir as
diferenças de solubilidade e, portanto, a tendência para crescimento dos cristais. Assim, alguns
agentes tensioactivos podem baixar a tensão superficial de sólidos para a água até menos de 10 dine.
cm"1, o que ocasiona que se tornem desprezáveis os efeitos induzidos pela variação de tamanho das
partículas. Estas substâncias não eliminam, porém, o crescimento cristalino devido à presença de
formas metastáveis.
As noções deixadas expressas têm particular interesse para a escolha do tipo cristalino ou
amorfo do produto a suspender. Assim, a prednisolona pode obter-se cristalizada do metanol ou da
acetona aquosos. Os primeiros cristais apresentam-se sob a forma de hidrates, facilmente suspensos
na água, enquanto que os segundos, que são anidros, correspondem a um estado metastável.
O acetato de cortisona é perfeitamente empregado em suspensões aquosas de cristais aciculares
cujo tamanho está compreendido entre 10-30 (i. Para que não haja tendência de os cristais se
aglomerarem e aumentarem de tamanho cristaliza-se o acetato de cortisona dissolvendo-o num
veículo orgânico, como a acetona, o etanol ou o propilenoglicol (nunca o metanol), adicionando,
depois, água à solução. Para fórmulas injectáveis este acetato é esterilizado, logo de início, a 90°C
por 4 dias, a fim de evitar a inclusão de microrganismos nos cristais que se vão formando. É curioso
observar também que o aquecimento só permite a formação de cristais aciculares, que são os únicos
que interessam na preparação farmacêutica.
Numa suspensão, as partículas maiores tendem a depositar pela acção da gravidade, mas as
partículas de tamanho inferior a 5 (i de diâmetro, quando suspensas na água, apresentam
movimentos brownianos.
Na maioria das suspensões farmacêuticas não se observa este movimento brow-niano, mesmo que
as partículas tenham dimensões assaz pequenas, porquanto aquelas contêm, em regra, agentes
suspensores, que, elevando a viscosidade da fase dispersante, impedem a mobilidade das partículas.
Assim, por exemplo, não se notam movimentos brownianos quando as partículas se encontram
dispersas numa solução aquosa de glicerina a 50%, já que é elevada a viscosidade do meio.
1033

9.2.0.2.2.4. Redispersibilidade
Quando se observa uma suspensão dotada de alguma estabilidade física nota-se que a fase
dispersa está disseminada homogeneamente não havendo flóculos ou agregados. Existe, portanto, um
estado de dispersão em partículas primárias, dizendo-se que a suspensão está defloculada. Esse
estado pode ser alterado de uma forma rápida, por simples diminuição ou anulação da carga
eléctrica das partículas, ou de uma forma lenta, devido à formação de agregados de partículas
atraídas por forças de London-Van der Waals.
No primeiro caso, a rápida baixa do potencial zeta (ver pág. 1012) leva a que as partículas se
reunam em flóculos, os quais depositam. Origina-se, assim, um sedimento pouco compacto, ficando o
líquido sobrenadante destituído de partículas e, por isso, perfeitamente límpido. Diz-se que a
suspensão floculou ou coagulou, e o depósito formado é, em regra, facilmente redisperso por simples
agitação.
Se, entretanto, não houver baixa do potencial zeta, as partículas acabam, muito lentamente, por
se aproximarem umas das outras constituindo agregados compactos que sedimentam, deixando
sempre a camada do líquido sobrenadante com certa turvação, visto permanecerem dispersas algumas
pequenas partículas. Neste caso fala-se em partículas defloculadas.
A Tabela CXXV indica as principais diferenças entre os estados de floculação e de defloculação.

Tabela CXXV. Propriedades de partículas floculadas e defloculadas numa suspensão

Defloculadas Floculadas
As partículas existem como entidades sepa- As partículas formam agregados;
radas;
A velocidade de sedimentação é lenta; A velocidade de sedimentação é rápida;
Frequentemente o sedimento não se dispersa O sedimento é fácil de dispersar;
com facilidade;
A suspensão mantem-se mais tempo com A suspensão desfaz-se mais rapidamente e o
bom aspecto; o sobrenadante permanece sobrenadante é límpido
sempre turvo.

Assim, quando a fase dispersa de uma suspensão sedimenta, esse sedimento pode corresponder a
um estado de floculação ou a uma agregação de outro tipo, constituindo-se verdadeiros aglomerados
tão fortemente aglutinados entre si que é impossível dispersá-los homogeneamente por agitação. No
primeiro caso diz-se que houve floculação da fase dispersa, enquanto que no segundo se fala de
aglomeração e de formação
1034

de pasta ou massa, fenómeno que a literatura anglo-saxónica refere com o nome de «caking».
Vejamos em que diferem, fundamentalmente, estes dois tipos de depósito. As partículas dispersa
podem apresentar, na sua superfície, grupos ionizáveis ou podem adsorver iões da solução, os quais lhe
conferem carga positiva ou negativa. As moléculas dos dissolventes podem igualmente ser fixadas
fortemente nas superfícies das partículas. Estas, ficando carregadas electricamente, são rodeadas por
uma «atmosfera iónica» em que predominam iões de carga oposta. Estes iões formam uma camada
eléctrica dupla, consistindo numa camada à superfície das partículas e numa camada difusa, livremente
móvel.
A partícula suspensa com a sua camada eléctrica fixa move-se num campo eléctrico e a diferença de
potencial ao longo da parte difusa da dupla camada é, como já vimos, designada por potencial zela.
Naturalmente que se esse potencial zeta, positivo ou negativo, for elevado, as partículas têm
pequena tendência a aglutinar, uma vez que se repelem em virtude da carga eléctrica. Entretanto, este
estado de defloculaçào não pode manter-se indefinidamente pois existem também forças de atracção
entre as partículas e a gravidade vai obrigá-las finalmente a sedimentar.
Assim, quando a energia de repulsão é grande, é também elevado o «potencial de barreira» que se
opõe à colisão das partículas. O sistema mantém-se então sem flocular, mas as partículas, embora
lentamente, acabam por sedimentar no fundo do recipiente, agregando-se de modo a que as pequenas
preencham os espaços deixados entre as maiores. À medida que a sedimentação progride vai-se
comprimindo o depósito formado, de tal modo que se origina um aglomerado que, em regra, não é
redispersível.
Consideremos agora a floculação. É estranho que duas partículas suspensas, tendo uma apreciável
«barreira de potencial» entre si, possam sedimentar em conjunto para dar origem a um floculado. No
caso das soluções coloidais, o agente floculante concentra-se na dupla camada e reduz a repulsão das
partículas. No caso das suspensões, existe um mínimo energético secundário talvez à distância de 1000
a 2000 Â de separação. As partículas podem aproximar-se umas das outras a esta distância e origi-
narem livremente uma estrutura na suspensão. Quer isto dizer que as partículas flo-culadas se
encontram frouxamente ligadas, depositando rapidamente e, por estas razões, redispersam-se com
facilidade por agitação, já que não dão agregados ou aglomerados firmes. Em contrapartida, as
partículas que não floculam depositam mais vagarosamente, mas tendem a formar sedimentos
demasiadamente aglomerados ou aglutinados, os quais não são susceptíveis de redispersão, mesmo
quando agitados energicamente.
A formação de aglomerados ou de agregados não pode ser evitada por diminuição do tamaniio das
partículas ou por aumento da viscosidade da fase dispersante, de acordo com a lei de STOCKES. Mais
ainda, a menor granulometria do pó disperso e o incremento da viscosidade da fase líquida (valor de
cedência, viscosidade, tixotropia) agravam, em regra, a formação de aglomerados não redispersíveis.
1035

Nestas circunstâncias, é quase sempre preferível preparar suspensões susceptíveis de flocular, pois
nelas não se observa a formação de aglomerados irredispersíveis. Claramente que o ideal é obter
suspensões dotadas de tendência controlada para a floculação. Sendo assim, torna-se necessário
avaliar o grau de floculação, para o que se têm proposto dois métodos principais, que iremos,
seguidamente, descrever.

9.2.0.2.2.4.1. Avaliação das propriedades das suspensões


O grau de floculação de uma suspensão pode apreciar-se determinando a relação entre a altura do
sedimento e a altura da fase líquida, ou recorrendo-se à electroforese.
A primeira técnica consiste em introduzir a suspensão numa proveta e deixá-la depositar até que
não aumente a altura do sedimento. Mede-se então essa altura (Hs) e a altura da fase líquida (Hl).
A relação Hs/HI indica o volume de sedimentação, ilustrando a Fig. 349 o que
acabámos de dizer. . .-, .

Flg. 349. Esquema representando a


determinação da quantidade de
sedimento formado numa
suspensão
Hs 40
= 0.142 —— ,—
—=
0,571 Hl

Quanto maior é a relação Hs/HI tanto mais elevado é o grau de floculação mas os floculantes não
devem ser adicionados em excesso pois podem originar inversão da carga eléctrica das partículas
dispersas. Nestas circunstâncias é, em regra, preferível a adição de pequenas quantidades de agente
floculante.
A segunda técnica baseia-se na determinação do potencial zeta e serve-se de uma célula de
microelectroforese. As partículas migram para o pólo oposto à sua carga, com
1036

uma velocidade que depende do potencial zeta, sendo a mobilidade electroforética definida como a
velocidade em cm/s, para um gradiente de potencial de l V/cm. Observa-se o movimento das partículas
na célula, sob a influência do campo eléctrico, mediante o uso de um microscópio.
O potencial zeta é então calculado pela seguinte expressão, deduzida da fórmula (1), que
escrevemos na pág. 1012.

4 Jl T| m \ --•

em que E é o potencial zeta, T| e E são, respectivamente, a viscosidade e a constante dieléctrica da fase


dispersante e m é a mobilidade electroforética. NASH e HAECER retomaram este assunto dando-lhe novo
tratamento matemático.
MARTIN estudou o comportamento das suspensões de sulfamerazina, cujas partículas apresentavam
carga negativa, e que pôde fazer flocular, de modo controlado, por adição de iões alumínio (A/3C/6). De
modo semelhante procedeu à floculação controlada de partículas de subnitrato de bismuto, carregadas
positivamente, por junção de iões fosfato (KHfO,).
A Fig. 350, retirada do citado trabalho de MARTIN, é um diagrama representativo da floculação
controlada do subnitrato de bismuto em suspensão. Inicialmente, as partículas de subnitrato de
bismuto mostram um elevado potencial zeta (carga positiva
Zona de
Poten-
açlomeraçiio

Conceniraçüo de KH;P04
Fig. 350. Diagrama que representa a floculação controlada de partículas
de subnitrato de bismuto em suspensão, quando se adiciona fosfato
dibásico de potássio como agente floculante
Segundo A. Martin — J. Pharm. Sciences, 50, 515 (1961)
1037

devido aos iões BiO2*). À medida que se vai adicionando fosfatião, o potencial decresce até que a
suspensão exibe o seu máximo de floculação. Seguidamente, o potencial zeta inverte-se diminuindo a
floculação, mas aumentando a tendência para formar aglomerados. Nas mesmas circunstâncias
observa-se que o volume de sedimento determinado pela relação Hs/Hl vai aumentando até um valor
em que a floculação é máxima, para em seguida diminuir e a suspensão voltar a adquirir a inicial
tendência para formação de sedimentos não redispersíveis.
Pela análise do diagrama apresentado verificamos que tanto a determinação da relação Hs/Hl
como a medida do potencial zeta dão indicações preciosas para se saber se a suspensão tende a
flocular ou a formar aglomerados irreversíveis. Como se compreende, esta noção é extremamente útil
para a preparação das suspensões farmacêuticas, obrigando apenas ao trabalho da construção das
curvas de sedimentação ou de potencial. Ainda pelo diagrama referido, vemos que se pode evitar a
formação de algomerados irredispersíveis, desde que se confira às partículas suspensas uma carga
eléctrica de sinal contrário ao seu. Pode, pois, ser útil usar agentes floculantes, desde que o seu
emprego seja suficientemente controlado. A Fig. 351, retirada do citado trabalho de NASH e HAECER,
mostra a curva de floculação de um esteróide (adrenocor-ticóide) em veículo aquoso.
RAMBERLITA ARAÚJO, na sua Tese de Mestrado, apresenta as curvas de floculação do caulino a 2%
(cujas partículas exibem carga negativa, pois se trata de silicatos

0.0001 0001 001


Flg. 351. Curva de floculação de um esteróide (adrenocorticóide) em veiculo aquoso
O
em gráfico
veícubs representa
aquosos, o comportamento
contendo de uma(tensioactwol,
pollssorüato suspensão inicial
PEG de esterôide (4%)
cloreto
ulterioresdadiluições.
sódio (isotoni-zante)
A linfia recta á^ool 60
e paralelabenzilico
à que representa a
4000
(conservante). a (suspensor),
qual sofreu
concentração do
esleròide
diluições e suspensão
da a linha quebrada
inicial em mostram,
veículos respectivamente,
que contém ou que o comportamento
não possuem cloretodas
de
sódio. A linha
iniciai foi curva
diluída com representa o comportamento do esterúide quando a suspensão
água destilada.
1038

ionizáveis) por acção de iões alumínio, tal como é possível apreciar na Fig. 352. Como se vê há uma
nítida inflexão correspondente à floculação máxima em que, portanto, o potencial zeta era igual a zero.
A adição de mais Al3* origina, como é lógico, a descida da relação Hs/Hl, visto as partículas
passarem a adquirir carga positiva (a adsorção do alumínio-ião).

Fig. 352. Curva3de floculação do caulino em suspensão, por intermédio de


iões Al -

Como anteriormente referimos, pode ser desejável adicionar agentes molhantes, não só para
impedir a sua flutuação, mas ainda para diminuir o risco do crescimento dos cristais. Por outro lado,
os agentes molhantes são susceptíveis de reduzir a tendência das partículas para aderirem entre si,
produzindo-se aglomerados que se não podem ressuspender. Entre os molhantes podem utilizar-se
tensioactivos não-iónicos, como os polissorbatos, mas é preciso não esquecer que, nestes casos, a
medida do potencial zeta não pode fornecer indicações quanto ao grau de floculação, dada a ausência
de carga do agente molhante. Nestas situações é preferível juntar uma quantidade de agentes
molhantes apenas suficiente para impedir a flutuação, homogeneizando o floculado que se forme por
intermédio de carboximetilcelulose sódica. Esta técnica é utilizada com alguns esteróides, verificando-
se que a carboximetilcelulose faz com que se eleve até um máximo a carga eléctrica das partículas
suspensas, provocando o excesso de carboximetilcelulose uma diminuição ulterior da carga. Na
prática e no citado caso verificou-se que a concentração óptima da carboximetilcelulose é de 0,5%.
Ainda do trabalho de R. ARAÚJO retiramos o gráfico (Fig. 353) bem elucidativo quanto à influência
da adição de CMC.
1039

Recorrendo a técnica análoga tem-se utilizado o alginato de sódio e o sulfato de dextrano e sódio. Já
os agentes capazes de aumentarem a viscosidade das suspensões mas dotados de características não
tónicas, como a metilcelulose, a polivinilpirrolidona e o dextrano sob a forma livre, em lugar de
estabilizarem a suspensão, aceleram a formação de aglomerados irredispersíveis.

%CMC
Flg. 353. Influência da CMC sobre a estabilidade de suspensões a 2% de caulino em partículas
de 37 u
O — decorridas 8 horas de sedimentação; A — decorridas 24 horas de sedimentação; ü —
decorridas 48 horas de sedimentação.

9.2.0.2.3. Preparação das suspensões


São diversos os factores que afectam a estabilidade e a acção farmacológica de uma suspensão
medicamentosa. A tenuidade das partículas suspensas, a natureza da fase dispersante, os molhantes e outros
adjuvantes utilizados, a tendência para flocular ou para formar aglomerados, etc., são aspectos que se
devem equacionar sempre que se pretenda obter uma perfeita suspensão.
Julgamos que foi em 1940 que pela primeira vez foi chamada a atenção dos farmacêuticos e
médicos para a importância do tamanho das partículas suspensas na velocidade de absorção dos fármacos.
FLEPPIN, REINHOLD e PHILLIPS mostraram, nessa
1040

altura, que a sulfadiazina microcristalina era mais facilmente absorvida do que quando num estado
mais grosseiro de pulverização. Também GREENGARD e WOLEY puderam observar que o enxofre
coloidal era mais facilmente absorvido do que quando pulverizado mais grosseiramente. Estas
primitivas verificações têm sido confirmadas em larga escala com muitos fármacos, bastando citar,
como exemplos, o palmitato de cloranfe-nicol e a griseofulvina.
Entretanto, lembramos que a duração da acção medicamentosa de suspensões parenterais pode
ser largamente influenciada pelo tamanho dos cristais. Assim, certas hormonas esteróides podem
apresentar-se em injectáveis de acção prolongada, desde que os cristais dispersos tenham
diâmetros maiores do que 100 |i. Não é possível utilizar cristais maiores do que 300 (j. já que a
injecção se torna dolorosa e, quiçá, se origina a obstrução das agulhas.
Algumas vezes, no entanto, o uso de cristais de menor diâmetro pode, pelo contrário, ocasionar
uma acção farmacológica mais prolongada. Assim, a penicilina G-procaína quando administrada
em suspensão oleosa contendo monostearato de alumínio é tanto mais lentamente absorvida quanto
mais pequenos forem os cristais dispersos. É que, neste caso, as propriedades reológicas do
sistema são influenciadas pela superfície específica das partículas e uma maior superfície torna as
suspensões mais viscosas. Graças à tixotropia, a mistura pode ainda ser injectada, mas o depósito
que se forma após injecção no músculo é tão viscoso que o fármaco só muito lentamente é
absorvido.
O tamanho das partículas suspensas, além de dever ser considerado no que diz respeito à
velocidade de absorção dos fármacos, interessa ainda na preparação de suspensões para
aplicação local nas mucosas ou na pele.
Efectivamente, uma suspensão para uso dermatológico deve ter as partículas tão pequenas
quanto possível, de modo que não provoque quaisquer irritações aquando da sua aplicação. Do
mesmo modo, as suspensões destinadas a oftalmologia devem ser preparadas com partículas de
dimensões extremamente reduzidas.
Se na preparação de suspensões magistrais o farmacêutico fica, em regra, limitado a introduzir
pequenas modificações na fórmula, de modo a torná-la mais estável e elegante, já o mesmo se não
pode dizer em relação às suspensões especializadas, cuja obtenção nos ocupará seguidamente.
Fundamentalmente, a preparação das suspensões obriga à divisão do fármaco sólido até ao
grau de tenuidade desejado, mas são raros os casos em que só por esse meio se conseguem obter
formas farmacêuticas com as características aconselháveis. De facto, é reduzido o número de
fármacos cujas propriedades físico-químicas na concentração terapêutica habitual permitem obter
suspensões por simples divisão adequada no seio da fase dispersante.
Na maioria das vezes, torna-se imprescindível que o fármaco, levado ao grau de divisão
desejado, seja disperso num sistema que contenha substâncias que promovam o aumento da
viscosidade da fase externa. Quer isto dizer que, em regra, as suspensões
1041

farmacêuticas possuem agentes suspensores dos tipos plástico ou pseudo-plástico, os quais,


adicionados em quantidade conveniente, impedem a excessiva floculação da fase dispersa. Finalmente,
existem fármacos cuja administração sob a forma de suspensões obriga a ensaios de floculação
controlada, de tal modo que não depositem com excessiva velocidade e cujos sedimentos sejam
facilmente redispersíveis.
Neste subcapítulo iremos tratar da preparação de suspensões, abordando, portanto, as seguintes
rubricas principais: a} Redução do tamanho das partículas; h} Suspensões sem necessidade de agentes
suspensores; c) Aumento da viscosidade da fase dispersante; d) Floculação controlada.

9.2.0.2.3.1. Redução do tamanho das partículas


,- .T:--.- •!
Os processos de redução do tamanho das partículas podem aplicar-se às drogas no estado seco ou
já depois de dispersado o sólido no meio líquido. Em linhas gerais, a divisão do fármaco seco em
partículas de tenuidade pretendida decorre nos moldes que mencionámos no capítulo da pulverização
e a divisão das drogas no seio de líquidos dispersantes é executada mediante aparelhagem idêntica à
que descrevemos a propósito das emulsões (vide Emulsificação).
Teremos, assim, desde o vulgar almofariz aos moinhos e micronizadores, toda uma gama de
maquinaria a que, consoante o grau de divisão e a produção pretendida, se pode recorrer para dividir
os fármacos no estado seco. Ao lado dos processos citados não queremos esquecer os que se servem da
cristalização corno meio de obter partículas cujo diâmetro médio é da ordem de alguns u. A
cristalização é essencialmente uma operação que se efectua em duas fases, numa das quais se inicia a
formação dos núcleos, enquanto que na outra se promove o seu crescimento até ao tamanho preten-
dido. Partindo de uma solução sobressaturada e provocando a cristalização do material dissolvido por
diminuição da temperatura, num meio agitado, podem formar-se cristais de 5 \l e até de tamanho
inferior. Consegue-se, assim, a divisão do fármaco em partículas de dimensões sensivelmente
homogéneas, as quais podem servir para a preparação de suspensões que se administram pelas vias
oral, cutânea, parentérica, etc.
Na prática corrente é, porém, habitual proceder-se à divisão do sólido a suspender quando este já
se encontra disperso no líquido que originará a suspensão. Se, inicialmente, só o almofariz constituía
toda a aparelhagem de que o farmacêutico dispunha para preparar as suas suspensões, pode dizer-se
que, na actualidade, são múltiplos os instrumentos de preço acessível a que pode recorrer. Essa
moderna maquinaria é mesmo indispensável sempre que se trabalhe em escala industrial, em que não
só a quantidade da produção, mas também a exigência de reprodutibilidade dos resultados a impõem
como imprescindível.
Sem procurarmos detalhar um assunto que, como dissemos, já foi abordado a propósito da
Emulsificação, citamos, entre os aparelhos mais vulgarmente utilizados, o
1042

homogeneizador valvular, os liquefactores e os moinhos coloidais, os moinhos de bolas e até os sistemas


produtores de ultrassons.
Qualquer destes aparelhos, muito particularmente os homogeneizadores e os moinhos coloidais,
proporciona uma adequada divisão do sólido disperso, podendo graduar--se o tamanho das partículas a
suspender mediante ajustamentos fáceis de conseguir. Os liquefactores apenas promovem a desagregação
dos aglomerados dispersos mas, embora não permitam graduar a tenuidade das partículas, propiciam, em
regra, a obtenção de boas suspensões para uso oral ou dermatológico. Na pequena oficina de farmácia
podem prestar serviços inestimáveis, pois são económicos e eficientes, permitindo a obtenção de
suspensões homogéneas, sem grande trabalho. De resto, além da divisão das partículas a suspender é, em
geral, necessário dispersar mecanicamente o sólido na fase externa da forma farmacêutica. Quando se
trabalha em pequena escala, os liquefactores podem servir para essa operação. Entretanto, na grande
indústria existem variados modelos de misturadores que servem para o trabalho de dispersão de sólidos
em líquidos, os quais têm, como peça fundamental, uma hélice, uma turbina de ventoinha, uma turbina de
lâminas planas ou uma pá de roda propulsora, que fazem movimentar o líquido no seio do qual se
encontram.
O movimento dos líquidos impulsionados por estes sistemas é semelhante, desde que não haja peças
com que choque a dispersão, além das paredes do aparelho onde está contida. Se, porém, existirem barras
próprias para deflexão, no trajecto do líquido, observa-se incremento da agitação.
OLDSHUE descreve em pormenor este tipo de aparelhos num artigo de revisão de onde retiramos algumas
gravuras elucidativas (Figs. 354, 355, 356, 357).

Flg. 354. Mislurador de hélice

Fig. 355. Misturador de hélice tendo barras de deflexão


1043

Fig. 356. Misturador de turbina com lâminas planas

Fig. 357. Misturador de turbina de lâminas planas tendo barras de deflexão

Na prática, a escolha do tipo ideal de misturador deve executar-se de acordo com a velocidade
de sedimentação que o sólido apresenta na suspensão.
Quando a velocidade de sedimentação é pequena podem utilizar-se, na mistura, aparelhos de
hélice, cuja capacidade pode ir até 2500 litros (líquidos viscosos) ou a muito mais (líquidos que se
comportam praticamente como a água). O movimento de rotação das hélices é de cerca de 280-420
r.p.m. e a potência disponível é normalmente inferior a 3 cavalo-vapor.
Quando a sedimentação é muito rápida, o grau de uniformidade da suspensão é função da
potência aplicada, utilizando-se geralmente turbinas de lâminas planas para conseguir a dispersão.
Uma das dificuldades técnicas, que muitas vezes surge neste tipo de suspensões, é a extracção de uma
parte da suspensão, sem que a mistura perca a sua homogeneidade. Nesses casos é, em regra, útil um
reservatório principal que diminui de capacidade junto ao fundo por onde é retirada a suspensão. Um
sistema de agitadores de acordo com o esquema representado na Fig. 358 permite manter estável a
suspensão.
Se, na preparação da suspensão, o material a dispersar tiver tendência para aglomerar, é, em
regra, necessário recorrer a agitadores que se movam com grande velocidade (1150-1750, 3000 e
4000 r.p.m.).
Em muitos laboratórios de indústria farmacêutica usam-se agitadores móveis que se podem
aplicar no tanque ou no reservatório onde se faz a mistura. Em geral, estes agitadores são montados
concentricamente ao reservatório, como se mostra na Fig. 359.
1044

O emprego de moinhos de bolas para a obtenção de dispersões de sólidos em líquidos é também


corrente, devendo-se o seu efeito mais ao atrito desenvolvido do que ao esmagamento dos sólidos.
Este facto está em oposição com o que se passa quando
estes moinhos são empregados para pulverizar sólidos a seco.
Em geral, a obtenção de suspensões por este processo obriga ao
uso simultâneo de ten-sioactivos cuja presença facilita a operação.
É, porém, importante que a quantidade de ten-sioactivo não provoque
a formação de espuma estável durante o decorrer da laboração.
Este tipo de moinho é utilizado na preparação de diversas
suspensões injectáveis, como as de cortisona e seus derivados, as de
testos-terona, etc. Usa-se, também, para suspensões orais de misturas
anti-ácidas tixotrópicas (hidróxido de alumínio, trissilicato de alumí-
nio, etc.).
A utilização de ultrassons como método de dispersão é
relativamente pouco frequente, sendo, porém, abundante a literatura a
esse respeito, da qual salientamos os trabalhos de ROSE, de MOURNIER et ai,
de NEUWTON, de MISEK e SKAUEN e de ARAÚJO e BELCASTRO. A exposição do
material sólido-líquido à acção de ultrassons leva à obtenção de
partículas muito finamente divididas, as quais se mantêm de modo
estável em suspensão.
Fig. 358. Corte Entretanto, tem sido observada a destruição, por cisão molecular e
esquemático de um reser- por oxidação, de
vatório permitindo retirar vários compostos submetidos à acção dos ultrassons. Assim, ARAÚJO (')
uma porção de
suspensão sem que se dê descreve a destruição da penicilina G-procaína e do sulfatiazol em
suspensões; BEAL e SKAUEN relatam a diminuição da viscosidade de diversos tensioactivos, admitindo
que os ultrassons provoquem despolimerizações responsáveis por esse facto; FENN e BELCASTRO
demonstraram que algumas sulfonamidas eram decompostas, libertando ácido p-amino-benzóico.

(') O. ARAÚJO — Tese de doutoramento, Perdue University. 1957.


1045

Entre a aparelhagem de que se pode dispor para o efeito citamos o aparelho Puc--Vikosator
produzido por Prosbet-Class e o Minisonic e o Rapisonic que são fornecidos pela firma Sonic
Engineering Corporation, Stanrford, Connecticut (USA).

r~f.

1 2
Fig. 359. Agitador portátil (Agitomic)
1 —Esquema; a— prato de deflexão
2 — Aspecto geral

9.2.0.2.3.2. Suspensões que não necessitam


de agentes suspensores -
Sc um sólido adequadamente pulverizado for facilmente molhável, não apresentar excessiva
tendência para a floculação nem para formar aglomerados e se tiver uma densidade próxima da do
líquido de dispersão, é evidente que pode obter-se com ele uma suspensão, sem que haja necessidade
de se recorrer ao uso de agentes suspensores. Não são, porém, muitas as substâncias que satisfazem
a estes requisitos, mas citamos algumas fórmulas cuja preparação dispensa o emprego de agentes
suspensores.
O carbonato de magnésio (magnésia alva) pode dispersar-se perfeitamente em água, sendo a
suspensão suficientemente estável e não apresentando qualquer tendência para aglutinar. Já, porém,
se adicionarmos hidróxido de magnésio a uma solução de bicarbonato de sódio formam-se,
vagarosamente, cristais de carbonato de magnésio, que se aglutinam, originando uma massa
compacta que se não pode dispersar por agitação.
A estabilidade e o gosto de uma suspensão de magnésia a 5% podem melhorar--se por adição de
25% de xarope comum ou de flores de laranjeira, que actuam pelo poder edulcorante e por
aumentarem a viscosidade da fase externa.
1046

É fácil dispersar 18 g de óxido de zinco com 18 g de amido numa mistura de água de cal com
glicerina (90 ml:28 ml), obtendo-se uma preparação estável, desde que se inclua na fórmula um
molhante, como a tintura de alcatrão mineral saponinado (l ml). Esta fórmula, que é correntemente
prescrita em dermatologia, não carece da junção de nenhum agente suspensor. No entanto,
observemos que a própria glicerina desempenha, além do seu efeito emoliente, a função de aumentar
a viscosidade da fase dispersante.
A calamina, o borato de sódio e o amido dispersam-se relativamente bem no álcool de 70" em
concentrações de 6,2%, 1,3% e 6,2%.

9.2.0.2.3.3. Aumento da viscosidade da fase dispersante


Uma vez que o aumento da viscosidade da fase externa de uma suspensão melhora, muitas vezes,
a sua estabilidade, recorre-se a este processo com certa frequência. No entanto, acentuamos o que
atrás já deixámos dito, isto é, que em muitas suspensões o aumento da viscosidade da fase
dispersante pode conduzir ao incremento da tendência apresentada pelas partículas sólidas para se
aglomerarem numa massa compacta.
Chamaremos agentes suspensores aos compostos que se podem utilizar para aumentar a
viscosidade da fase externa de uma suspensão. Estas substâncias devem ser inócuas e não
apresentarem qualquer actividade farmacológica nas concentrações em que se empreguem. Requere-
se, por outro lado, que provoquem apreciável aumento da viscosidade quando presentes em pequena
quantidade e que as propriedades reológicas do sistema assim preparado não se alterem com o
tempo de armazenagem.
Trata-se de um conjunto de compostos que actuam como colóides protectores capazes de
formarem uma película em volta das partículas dispersas e/ou aumentarem a viscosidade do meio
dispersante. Actuam por retardarem a floculação e reduzirem a velocidade de sedimentação do
matéria! suspenso.
Existem diversos factores que condicionam a escolha do agente suspensor ideal para uma dada
preparação. Efectivamente, sendo grande o número de líquidos dotados de elevada viscosidade há
que os escolher conscienciosamente, devendo ser considerados os seguintes factores principais:
incompatibilidades, facilidade de preparação, obtenção comercial num grau de pureza adequado, pH
e temperatura de estabilidade óptimos e via de administração.
São fundamentalmente as substâncias que em dispersão se comportam como líquidos de
escoamento plástico ou pseudo-plástico as que correntemente se utilizam como agentes suspensores.
Assim, entre os compostos tixotrópicos, usam-se as arguas, como a bentonite, a hectorite e o Veegum
e compostos como o hidróxido de alumínio e o Aerosil. Como substâncias pseudo-plásticas
lembramos as gomas arábica e adra-ganta, a metilcelulose, os alginatos, a carboximetilcelulose
sódica e o Carbopol 934.
Passamos, em seguida, a estudar com mais pormenor os agentes suspensores que
a prática consagrou. Para comodidade de estudo, classificámo-los em dois grupos, con
soante se utilizam para suspensões aquosas ou oleosas. '•'
1047

a) Agentes suspensores para veículos aquosos — Sob esta rubrica pormenorizaremos o estudo de
alguns dos mais utilizados agentes suspensores para suspensões aquosas. Lembramos, porém, que o
estudo destas substâncias só se considera completo com a descrição feita a propósito de muitas delas
no artigo Emulsões.
Goma arábica — Muito usada para suspensões orais, pode empregar-se em pó, em mucilagem ou
em xarope. A sua concentração na preparação final oscila entre 5 e 15 por cento.
Dado que as suas soluções'são ácidas (em concentração de 1,5% na água apresentam um pH de
2,6), deve ter-se o cuidado de não a utilizar em suspensões que contenham fármacos alcalinos.
Precipita quando em presença de metais pesados e de taninos. É, pela mesma razão, incompatível
com soluções alcoólicas de concentração superior a 35 por cento.
A viscosidade das soluções aquosas de goma arábica não varia com o pH do meio se este se
mantiver compreendido entre 4 e 10.
Na preparação de pequenas quantidades de suspensões deve triturar-se a goma em pó, em
mucilagem ou em xarope, num almofariz, com os sólidos a suspender, só depois se adicionando o
veículo aquoso. Se a água é utilizada em larga escala, sob a forma de mucilagem, deve usar-se água
esterilizada por ebulição e adicionada de agentes microbicídas, como a mistura de 0,15% de
metilparabeno com 0,02% de propilparabeno. A mucilagem obtém-se peneirando a goma sobre água
quente e agitando energicamente em aparelho adequado. Quando se trabalha com a goma em pó que
se mistura com as substâncias sólidas, é aconselhável molhá-la, antes da adição da fase aquosa, com
líquidos, como a glicerina, o propilenoglicol ou até o álcool. Este modo de proceder permite uma
melhor dispersão da goma, evitando a formação de grumos.
Goma adraganta — Talvez menos utilizada do que a goma arábica para preparações orais, a
goma adraganta é correntemente empregada em suspensões de uso externo. Na prática, é frequente
usar-se numa concentração até 2%, mas quando se destina à administração oral é preferível não
ultrapassar 1% em razão do mau sabor que comunica aos medicamentos.
As dispersões de goma adraganta apresentam a sua máxima viscosidade a pH 5, não se
aconselhando, por isso, usá-las a pH inferior a 4 ou superior a 6. Precipita das suas soluções
quando em presença de mais de 40% de álcool.
A goma adraganta é empregada, de preferência, em pó, que se hidrata muito lentamente pela
acção da água. É conveniente molhá-la, previamente, com álcool ou com glicerina (que não é tão
eficaz) antes da adição da fase aquosa. Deve ser trabalhada como indicámos para a goma arábica.
Entre as incompatibilidades a que pode dar origem cita-se a gelificação observada
nas suas mucilagens quando adicionadas de subnitrato de bismuto. Evita-se a formação
de gele sólido juntando aniões trivalentes, como o fosfato de sódio ou o citrato de
sódio. Para 60 ml de mucilagem a 1% são suficientes 50 mg e 10 mg, respectivamente,
destes sais. - —• • -
1048

Goma de Karaya — Esta goma, que é extraída de Sterculia urens e que tem substituído no nosso
país a goma adraganta, difere dela especialmente pelo seu elevado conteúdo em grupos acetilos.
Alginatos — Usam-se diversos sais do ácido algínico, os quais apresentam carácter aniónico,
sendo a sua viscosidade máxima conseguida a pH igual ou superior a 5. A esta regra faz excepção o
éster — alginato de propilenoglicol — que, não sendo ionizável, se mantém mesmo a pH inferior a 5.
O alginato de sódio é o derivado mais frequentemente utilizado. Trata-se de um composto solúvel
na água (a 5% dá geles sólidos) e no álcool diluído. Quando dissolvido em álcool muito diluído
origina soluções mais viscosas do que na água. A adição de álcool de graduação mais elevada
precipita o alginato das suas pseudo-soluções aquosas (álcool a 30-40%).
A estabilidade dos alginatos é boa quando o pH está compreendido entre 4 e 11,5. A pH inferior
a 3 decompõem-se libertando ácido algínico. Todos os iões metálicos, incluindo os alcalino-tenosos,
originam espessamento dos soles de alginato de sódio, sendo o fenómeno particularmente evidente
com o cálcio (ver Emulsões, pág. 982).
Sendo bons meios de cultura, é aconselhável juntar substâncias conservantes (nitrato de
fenilmercúrio a 1:50000, timerosal a 1:50000, benzoato de sódio a 1,5%, combinação de 0,2% de
metilparabeno com 0,02% de propilparabeno) aos soles de alginatos. No comércio encontra-se o
alginato de sódio com diversas viscosidades, sendo a sua concentração escolhida em função da
viscosidade inicial: alginato de alta viscosidade — 0,75 a 1%; alginato de baixa viscosidade — 1,5 a
3%.
Entre os alginatos de sódio comerciais mais vulgares citamos os da firma Kelco Chemical Co.,
Nassam St. N.Y. 5. U.S.A.: Kelgin (de viscosidade média); Kelgin LV (de baixa viscosidade); Kelgin
XL (de viscosidade muito baixa); Kelcosol (de alta viscosidade).
Como alginato de propilenoglicol citamos o Kelcoloid HV (alta viscosidade) e o Kelcoloid LVF
(baixa viscosidade).
A firma Alginate Industries Ltd., de Londres, tem, também, vários alginatos de sódio designados
pelo nome genérico de Manucol. O alginato de propilenoglicol, que produz, é conhecido por
Manucolester.
1049

Actuando de modo idêntico aos alginatos, poderemos citar a pectina e a alga perlada. A pectina é
pouco usada, visto ser instável em meio alcalino e precipitar por acção de vários metais pesados.
Metilcelulfise — Por tratamento da celulose com substâncias como o cloreto de metilo, são
preparadas diversas metilceluloses que diferem entre si pela viscosidade que apresentam.
Na prática usam-se, preferentemente, as metilceluloses de viscosidade mais elevada, se bem que no
comércio existam 6 tipos diferentes deste produto, designados por 15, 25, 100, 400, 1500 e 4000,
significando estes números a viscosidade média, em cen-tipoise, das respectivas soluções a 2%, a
20°C.
As metilceluloses 1500 e 4000, que mais vezes se utilizam na preparação de suspensões orais,
podem empregar-se em pó ou sob a forma de solução. Este último estado é preferível, aconselhando-
se a seguinte técnica operacional: diluir a metilcelu-lose com cerca de metade da água, aquecendo a
90"C; agitar e deixar em repouso por 20 a 30 minutos, passados os quais se junta a água restante,
fria ou até gelada. Outro método de obtenção consiste em macerar o produto com a totalidade da
água prescrita, durante 10 a 12 horas, ou em tratar o pó por álcool ou por glicerina e então juntar a
água fria.
Como já foi mencionado atrás (vide Emulsões), as soluções de metilcelulose aquecidas a 50-60°C
coagulam originando geles que se destroem por arrefecimento. Este comportamento é estruturalmente
diferente do apresentado pêlos outros hidrocolóides que só gelificam por arrefecimento.
As quantidades de metilcelulose 400, 1500 e 4000 necessárias para a preparação de suspensões
são, respectivamente, de cerca de 2,4, 1,7 e de 1,35%. De uma maneira geral são estáveis a valores
de pH compreendidos entre 2 e 12.
Este agente suspensor é empregado em diversas suspensões de uso oral, como as de sulfato de
bário, de fenacetina, etc.
Semelhante à metilcelulose é a etilcelulose, cuja descrição foi feita a propósito das Emulsões.
Tem sido utilizada em algumas suspensões de uso oral, designadamente como suspensor do ácido
acetilsalicílico. No comércio aparece em 5 diferentes graus de viscosidade, sob o nome de Cellosíze
(Union Carbide Chemicals Co.). Um dos tipos mais usados é o Cellosize WP/300. Recentemente ORY e
STEIOER-TRIPPI estudaram pormenorizadamente o Cellosize WP/4400.
A viscosidade das dispersões de etilcelulose não é afectada pelas variações de pH entre 5 e 10.
Carboximetilcelulose sádica — Preparada por tratamento das celuloses bastante puras pêlos
álcalis e subsequente reacção com o monocloroacetato de sódio, a carboxi-metilcelulose sódica
apresenta-se no comércio em três variedades principais: de alta viscosidade, de média viscosidade e
de baixa viscosidade.
A viscosidade destes três tipos de Carboximetilcelulose é referida às soluções
aquosas a 20°C, exprimindo-se em centipoise: ., ......
1050

Alta viscosidade — 1500 centipoise (dispersão a 1%).


Média viscosidade — 400-600 centipoise (dispersão a 2%).
Baixa viscosidade — 25-50 centipoise (dispersão a 2%).
A sua estabilidade pode considerar-se boa a valores de pH compreendidos entre 3 e 11,5.
O aquecimento origina diminuição da viscosidade das suas dispersões, sendo importante lembrar que
apresenta carácter aniónico. Tem sido empregada em diversas suspensões, como as de sulfato de bário, de
sulfamidas, etc.
Celulose microcrsstalina — A sua preparação é efectuada por demorada hidrólise ácida da celulose. Pode
misturar-se com a água originando dispersões tixotrópicas, estáveis por largo período de tempo. Recentes
investigações de BATTISTA e SMITH provam que é um bom agente suspensor.
Carbopol 934 — O carbopol 934, que é preparado por B. F. Goodrich Chemical Co., Cleveland, Ohio,
U.S.A., é um polímero aniónico carboxivinílico de elevado peso molecular:
(-CH.-CH-),, " ' '" ' '""'^*""...."„'' '
COOH
Apresenta-se como um pó branco, que se dispersa facilmente em água, originando soluções ácidas (a
solução a 1% apresenta pH 3). Se se proceder à neutralização das suas soluções obtém-se um gele límpido.
As dispersões aquosas de Carbopol 934 resistem à invasão pêlos microrganismos e a sua viscosidade não é
afectada pelo aquecimento.
As soluções preparam-se por simples adição de água ao pó, devendo agitar-se energicamente durante toda
a operação. Alguns autores aconselham adicionar uma pequena quantidade de açúcar, juntando em seguida a
água. Por este processo, conse-gue-se uma dispersão homogénea de Carbopol, mesmo trabalhando em
almofariz.
Para se conseguir preparar um gele ou, mesmo, obter soluções muito viscosas, basta adicionar-lhes uma
solução alcalina, como a de carbonato de sódio a 10%.
A estabilidade das suspensões de Carbopol é afectada pela adição de vários electrólitos (Zn++, Bi*^*"). Do
mesmo modo, esta substância é incompatível com o ácido benzóico e com o benzoato de sódio, que podem dar
origem à formação de precipitados. Os conservantes habituais (parabenos, fenol, sais de fenilmercúrio,
mertiolato, cloreto de benzalcónio, etc.) não interferem na viscosidade das dispersões de Carbopol quando
empregados nas concentrações usuais. As dispersões neutralizadas de Carbopol sofrem uma degradação
oxidativa quando expostas à luz, o que obriga a conservá-las em frascos de vidro corado ou a incluir na sua
preparação catalisadores negativos como o EDTA.
Os gráficos da Fig. 360 mostram a eficiência de vários agentes suspensores em relação à viscosidade,
enquanto que os da Fig. 361 põem em evidência a influência da temperatura na viscosidade de dispersões
aquosas de vários agentes suspensores.
1051

Viscosidade
(Brookfield)
o> ui ^ Co ro -*
l l

•^tí^

Arguas — Empregam-se várias arguas de estrutura montmorilonítica devido ã propriedade de


originarem dispersões tixotrópicas muito viscosas. As mais importantes são a bentonite, a atapulgite, a
hectorite e o Veegum.
A Fig. 362 representa a estrutura de uma argila montmorilonítica.

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1052

Fig. 362. Argila de estrutura montmorilonítica

A bentonite é um silicato de alumínio hidratado, coloidal, que absorve, aproximadamente, 12 a 15


vezes o seu peso de água, formando uma dispersão tixotrópica. Usa-se em concentrações de 2 a 5%.
Tem carácter aniónico, sendo a sua viscosidade largamente influenciada pelo pH (viscosidade máxima
na zona alcalina). Nestas circunstâncias é incompatível com os agentes catiónicos, como o cloridrato de
benzalcónico, o violeta de genciana ou a Vitamina B,.
As propriedades suspensoras da bentonite dependem da presença de grupos hidroxi-lados colocados
sobe a superfície externa dos seus cristais. Estes grupos são anfotéricos, com predominância de carácter
ácido fraco, sendo de notar que em presença de um excesso de aniões as partículas de bentonite
coalescem e floculam.
A bentonite pode utilizar-se sob a forma de gele ou no estado de pó. Para preparar o gele, que
constitui verdadeiramente um magma, deve pulverizar-se a bentonite sobre água quente em quantidade
suficiente para que se dê o seu total humedecimento. Após repouso de 24 horas, com agitação ocasional,
adiciona-se a água necessária para completar a dispersão e mistura-se bem até homogeneizar. Este
processo favorece a máxima hidratação da bentonite.
Quando a bentonite se emprega no estado de pó deve misturar-se com os sólidos insolúveis, num
almofariz, ajuntando então o líquido dispersante, a pouco e pouco.
Em regra, as suspensões contendo bentonite possuem substâncias alcalinas que incrementam a
viscosidade do meio (óxido de magnésio a cerca de 50 mg por l ml de água; hidróxido de cálcio),
mas o excesso de alcalinidade provoca a gelatinização da bentonite, anulando a sua faculdade de
acluar como agente suspensor.
Semelhante à bentonite é a atapulgite, que é uma argila constituída por silicato de
alumínio e magnésio hidratado, cujo nome deriva da região de onde foi extraída —
— Attapulgus (Geórgia). . *• fí
1053

O seu conteúdo em magnésio é superior ao que habitualmente se tem encontrado em arguas do


tipo montmorilonítico. MARTIN BARR descreve, em pormenor, a estrutura e as propriedades desta
argila que pode ser activada pelo calor e que se distingue, segundo os tratamentos térmicos a que
foi sujeita, pelas iniciais LVM, RVM e HVM.
Dotada de excelente poder absorvente das toxinas intestinais
e absorvendo a parte aquosa das secreções inflamatórias, a
atapulgite auxilia a formação das fezes,
sendo utilizada em algumas fórmulas
usadas como desinfectantes intestinais e
antidiarreicas.
A Fig. 363 dá ideia da estrutura da
atapulgite.
O Pharmasorb é uma atapulgite
purificada, frequentes vezes empregada
na preparação de suspensões
medicamentosas.
Hectorite — Veegum — Muito
semelhante à bentonite, dela se
diferencia por ser essencialmente um
silicato de magnésio que só apresenta muito
O H,0 râ (OH) Q Ox.gímo . Süido o Mg, ,
Fig. 363. Estrutura da atapulgite
pequena quantidade de alumínio. Foi
introduzida na prática, em 1936, por
STRESSE e HOFFMAN, que lhe deram aquela designação alusiva ao facto de ter
sido extraída em Hector (Califórnia). De cor branca e apresentando maior facilidade
de hidratação do que a bentonite, tem sido preferida para a preparação de suspensões
orais.
A sua forma purificada (por eliminação de carbonatos, silício, etc.) é designada por Veegum (da
firma R. T. Vanderbilt Co. N. Y., U.S.A.). Esta substância, que é incolor, inodora e atóxica, tem sido
utilizada tanto paia suspensões de uso interno como de uso externo. Emprega-se em concentrações
de 1,5 a 2,5% nas suspensões. Habitualmente parte-se de uma dispersão a 5% que se emprega na
proporção de 30-50% em relação ao volume total da suspensão. A preparação da dispersão de
Veegum é executada pulverizando-o sobre a água e agitando energicamente. Utilizando-se água
quente acelera-se a dispersão, aumentando ligeiramente a viscosidade do sistema. Estas dispersões
são estáveis desde pH l até pH 11 e não carecem da adição de agentes conservantes.
No comércio encontram-se dois tipos de Veegum: regular e de alta viscosidade (Veegum HV).
Na Tabela CXXVI indicamos os principais agentes suspensores utilizados na formulação das
suspensões orais, mencionando as suas características, composição e firma preparadora.
1054

Tabela CXXVI. Características de alguns colóides hidrófilas empregados em suspensões de uso oral
Composição Estab % P/V para Firma
üi-
Agente suspensor ou origem dadc Incompatibilidades 800 cP, a preparadora
20-C
a) Hidratos de
Carbono
Goma arábica Mucilagens 4-10 Taninos, metais Várias
pesados;
mais de 34% de
Goma adraganta Mucilagens 2,5-9 álcool.
Sunitrato de 2,75 Várias
bismuto; mais
de 40% de álcool.
Kraystay A (baixa 1,80
vis.)
Kraystay E (média Extracto de 4-10 Mais de 10% de 1,38 Kraft Foods
vis.) alga
perlada álcool;
catiões (K, NH,, Co.
Chicago
Ca,
Mg). 90
(USA)
Kraystay H (alta vis.) 1,23
Pectina Do limão ou 2-9 Óxido de zinco; 3,2 Várias
maçã mais de
t 10% de álcool.
b) Sintéticos ou
Derivados
dos Hidratos de - --
Carbono
Kelgin (média vis.) 1,15

Kelgin LV (baixa Alginatos de 4-11,5 Iões cálcio; sais de 2,05 Kelco Co.
vis.) sódio metais
pesados; mais de 31
Nassau St
10%
de álcool. N.
Y. 5 (USA)
Kelgin XL (muito 3,05
baixa vis.)HV (alta
Kelcoloid Alginatos de 2,5-7 Idem. 0,94 Idem
vis.) propile-
noglicol
Kelcoloid LVF (baixa 1,55
vis.)
Methocel 15 cPo Metilceluloses 2-12 Taninos, soluções 7,7 Dow
salinas
muito concentradas Chemical
Co,
Midland,
Mich. (USA)
Methocel 25 cP
Methocel 100 cPD Metilceluloses 2-12 Taninos, soluções 6,2
Methocel 400 cPn salinas
muito concentradas 3,5
1055

Tabela CXXVI. (Continuação)


Composição Estabili- % f/V Firma
para
Agente suspensor ou origem dade íncompaíihüidades SOO cPa, a 20°C preparadora

Methocel 1500 cPo Metilceluloses 2-12 Taninos, soluções salinas Dow


2,4 Chemical
Methocel 4000 cP. muito concentradas 1,7 Co,
Midland,
Mich. (USA)

• ' -> 1,35

CMC-70 (baixa . .,
vis.) 4,1
CMC (média vis.) Carboximetilcelulose 3-11,5 Cloreto férrico; sulfato de
CMC (alta vis.) 1,9
sódica alumínio a 10%. 0,7 :
'.r ï -

c) Arguas ' 14 ^
Hidrófilas

!
Bentonite . Silicato de alumínio 3-10 Iões Ca ++; electrólitos di Várias
6,3
V coloidal e trivalentes.
Pharmasorb ,, Silicato de alumínio Idem. Minerais and
;
e magnésio hidra- Che-
micals
Corpo-
< tado ration of Amé-
\ ~ rica,
".. r. . Menlo
Park, N. Y.
(USA)
Veegum Silicato de alumínio 3-11 Iões Ca ++. R. T.
6f)
e magnésio coloi- . ' Vanderbilt
Co., 230 Park
dal Av. N. Y.
(USA)
Veegum HV 4,8

d) Polímeros i
Vinílicos
Carbopol 934 Polímero carboxi- 5-10 Luz. B. F.
— Goodrich
vinílico Chemical Co
Cleveland
15,
Ohio (USA)
1056

Além dos agentes suspensores já citados e que, como dissemos, são os que mais correntemente se
empregam na preparação de suspensões aquosas, poderiam ser mencionadas ainda a gelatina
(Pharmagel B, aniónica; Pharmagel A, catiónica), os polietileno-glicóis (400 e 4000), o álcool
polivinílico, a polivinilpirrolidona, etc.
O álcool polivinílico (PVA), cuja estrutura básica é a seguinte,

... CH-CH,-CH -CH,-CH —CH,—...


™, cm ÓH OH

é um bom colóide protector que se emprega na preparação de suspensões para uso externo. A
polivinilpirrolidona (PVP) é um polímero, correspondendo à seguinte fórmula geral

H.C C=0
'S.-'
—CH-CH.-

cujo peso molecular depende do método de preparação seguido (20 000 a 70 000).
Solúvel na água, nos álcoois e em várias cetonas e éteres, as suas soluções coloidais aquosas a 5%
(25°C) apresentam pequena viscosidade. Assim o Kollindon 17 e o Kollindon 25 (Badische Anilin & Soda
Fabrik A.G. — Ludwigschafen am Rhein) têm uma viscosidade de 1,35 e 1,8 cPu, respectivamente. O pH das
soluções aquosas, que se mantém por aquecimento, está compreendido entre 4,5 e 7.
O amido de trigo tratado pelo óxido de etileno dá lugar à formação de hidroxietilamido de que, no
comércio, se encontram as variedades CWS (solúvel em água fria) e HWS (solúvel em água quente).
Estes agentes suspensores são compatíveis com o álcool e usam-se também na preparação de suspensões
aquosas.
Pode conseguir-se uma suspensão estável de enxofre a 10% em veículo aquoso contendo 6% de PEG 400,
desde que se inclua na fórmula 4% de hidroxietilamido CWS.
Ao lado destes típicos agentes suspensores não queremos esquecer o uso de certos líquidos e soluções
newtonianas que podem aumentar a viscosidade da fase dispersante. Entre eles lembramos a glicerina, o
sorbitol, o propilenoglicol, as soluções de glucose hipertónicas e as soluções de sacarose a 65%. Na Tabela
CXXVII indicamos as visco-sidades de alguns líquidos newtonianos, a 20°C.
b) Agentes suspensores para veículos oleosos — Na preparação das suspensões oleosas só se
emprega uma pequena variedade de agentes suspensores. De facto, para
1057

Tabela CXXII. Viscosidade absoluta de alguns líquidos newtonianos, a 20°C


Líquido . f Viscosidade (cPt)
Água . 1,0087
Álcool .. .,. . . 1,72
Glicerina, 93% . . 400
Propilenoglicol 56
Sorbitol, 70% 180
Xarope comum 190

uso oral, quase só se utilizam dispersões aquosas e para uso parentérico é relativamente restrito o
número de suspensões oleosas.
Os suspensores mais utilizados são a lanolina, as ceras, o monostearato de alumínio e alguns óleos,
como o de rícino.
A lanolina é habitualmente utilizada a 5-6% em solução no azeite ou em óleos semelhantes, como o
de amendoim. As suspensões injectáveis oficinais de iodobismu-tato de quinina e de subcarbonato de
bismuto constituem exemplos representativos desse uso.
As ceras, como a cera branca, têm sido empregadas em algumas suspensões, designadamente nas de
penicilina G procaínica em meio oleoso. A sua quantidade é de cerca de 1%.
O óleo de rícino tem-se utilizado na preparação de suspensões oleosas injectáveis e em colírios,
como os de esteróides. Trata-se de um líquido newtoniano dotado de elevada viscosidade absoluta
(1000 cPo, a 20°C), que geralmente se emprega em associação com outros óleos muito menos
viscosos (a viscosidade absoluta do azeite, a 20°C, é de 84 centipoise).
É curioso observar que alguns óleos, como o de soja, têm, independentemente da viscosidade
que apresentam, certo poder antifloculante, o qual se deve à presença de substâncias dotadas de
actividade superficial que fazem parte da sua composição.
O monostearato de alumínio é um composto de alumínio que contém quantidades variáveis de
ácidos esteárico e palmítico (A12O3 por cento: 14,5-16,0).
Apresenta-se como um pó branco ou amarelado, volumoso, de cheiro fraco, carac
terístico. É um agente suspensor tixotrópico que se tem empregado, a 2%, em diversas
suspensões, como a de penicilina G procaínica para uso parenteral. , ,,,. ,

9.2.0.2.3.4. Floculação controlada


Vimos, até aqui, que para preparar muitas suspensões basta molhar o sólido a suspender com
um agente molhante conveniente (em alguns casos dispensável) e dispersá-lo por meios mecânicos
no seio da fase externa que já contém o agente suspensor
1058

adequado. Noutros casos é aconselhável misturar o sólido com o molhante e o suspen-sor,


adicionando-se, então, o líquido constituinte da fase externa e procedendo à dispersão mecânica.
Finalmente, observámos que raras substâncias são susceptíveis de se dispersarem por mistura
directa com os líquidos que constituem a fase externa do sistema, dispensando-se o uso de agentes
molhantes e de suspensores.
Esquematicamente, poderíamos pois dizer que, na maioria dos casos, a preparação das
suspensões se pode fazer por dispersão dos seguintes sistemas:
1) Sólido + Líquido -— -•-- •
2) (Sólido + Suspensor) + Líquido
3) (Sólido + Molhante) + (Líquido + Suspensor)
4) (Sólido + Molhante + Suspensor) + Líquido
A estes métodos, que se têm utilizado quase empiricamente há largos anos, ajuntaremos um
processo verdadeiramente científico de preparar suspensões. Trata-se da floculação controlada.
Como se requer que as suspensões farmacêuticas não dêem origem a aglomerados
irredispersíveis e que, por outro lado, só floculem lentamente de modo a que tenham boa
apresentação, é óbvio que o problema se pode resolver com elegância desde que se possa
controlar a velocidade de sedimentação, sem que o material agregado se torne compacto ou
pastoso.
Se as partículas a suspender apresentam carga positiva toma-se, pois, aconselhável juntar um
agente floculante negativo, como o fosfatião, só depois se incluindo o agente suspensor que
retardará a floculação. Esta forma de proceder tem interesse pois muitos dos agentes suspensores
são colóides hidrófilos carregados negativamente que, quando juntos directamente ao sólido a
dispersar dotado de carga positiva, provocariam a sua total deposição. Como exemplo, citamos a
adição de bentonite ou de carboximetilcelu-lose (aniónicas) a partículas de subnitrato de bismuto
(catiónicas).
Se, porém, o subnitrato for adicionado de uma quantidade controlada de KH2PO4 a floculação
não é total e toma-se possível e vantajosa a adição ulterior da carboxime-tilcelulose ou da
bentonite (').
Este processo, que se pode seguir para as partículas carregadas positivamente, não serve,
como é óbvio, para produtos com carga negativa, como as sulfamidas. Torna-se então necessário
efectuar uma operação prévia de envolvimento das partículas de modo

(') B. ECANOW e R. WILSON (J. Pharm. Sei. 52, 1031, 1963), ensaiando suspensões de subnitrato
de bismuto a 2% e adicionando, como agentes floculantes, fosfato trissódico, fosfato dibásico de
sódio, fosfato monobásico de sódio e ácido fosfórico (ImM de fosfato por 100 ml de suspensão),
mostraram que a acção floculante era dependente do pH, incrementando-se à medida que
aumentava a acidez. Esta verificação está de acordo com as propriedades apresentadas pêlos soles
liófïlos em relação ao valor de pH para o qual se observa a floculação.
1059

a conferir-lhes carga positiva. Certos compostos, como os ácidos aminados ou a gelatina abaixo
do seu ponto isoeléctrico, podem desempenhar esse papel. Uma vez realizada essa operação, já
se torna possível adicionar os iões fosfato ou outros agentes floculantes e proceder como
MARTIN indica no artigo a que já anteriormente nos referimos. Este autor esquematiza, do
seguinte modo, a sequência da preparação das suspensões de substâncias carregadas
negativamente:

à) Envolvimento das partículas com uma substância carregada positivamente;


b) adição dos edulcorantes e aromatizantes julgados necessários à fórmula;
c) floculação parcial das partículas por acção de um composto carregado negativamente, se
o potencial zeta é propício à formação de aglomerados irredis-persíveis;
d} adição de um agente suspensor ou mistura de agentes suspensores em tal quantidade
que não se atinja o potencial zeta correspondente à aglomeração irreversível (caking).
A Fig. 364, retirada ainda da publicação de MARTIN, esquematiza a preparação de
uma suspensão estável de substâncias com ; .,,,,.,; .
carga eléctrica negativa. - _,^
Na prática pode tomar-se como p - \ ffà\ ^^
exemplo a obtenção de uma suspensão ^-=^ \ ^ix 2 Só
estável de sulfatiazol. Parte-se de um sul- -~^T *" —^~————*" £j
fatiazol sódico, hidrossolúvel, que se pré- (A*/ \fy ^8
cipita em meio ácido, numa solução de
gelatina. As partículas de sulfatiazol assim
obtidas ficam envolvidas por uma camada
de gelatina e passam a apresentar carga
positiva. Segue-se, então, a junção do
agente floculante aniónico (KH2PO4) em
quantidade controlada e, por último, a
Fig. 364. Sequência dos passos na preparação de uma
suspensão estável
adição do agente suspensor hidrófilo 1 — Substância catiónica
(bentonite, goma adraganta, 2(adsorvente)
— Agente floculante
carboximetil-celulose sódica, etc.). aniónico

9.2.0.2.4. Tipos de suspensão


São muito variados os tipos de suspensão que se utilizam em Farmácia. Como já acentuámos,
aquelas podem destinar-se à administração oral, à aplicação na pele ou nas mucosas, ou, ainda, à
administração parenteral. Por outro lado, consoante as suas características, as suspensões têm-se
designado por magmas, geleias, geles, etc. Numa
1060

tentativa de harmonizar estas nomenclaturas, tentativa essa particularmente difícil porquanto não
há correspondência completa entre os termos tradicionais entre nós e em outros países, dividiremos
as suspensões em líquidas ou fluidas e semi-sólidas ou consistentes, como as pomadas.
Às suspensões líquidas, contendo açúcar, destinadas ao uso oral, que se administram às
colheres, daremos o nome de poções-suspensões ou julepos. A Farmacopeia Portuguesa IV dá-lhes
a designação de misturas, termo que julgamos pouco conveniente por inexpressivo e porque se
presta a confusão com a palavra misture que em idioma anglo-saxónico é usada por definir
dispersões de partículas com diâmetros menores do que l n..
Às suspensões de uso oral, muito viscosas, geralmente formadas por partículas de substâncias
inorgânicas com cerca de l u. de diâmetro, que se encontram distribuídas numa massa gelatinosa,
daremos a designação de magmas ou de geles (').
Às suspensões semi-sólidas, geralmente constituídas por partículas de substâncias orgânicas ou
inorgânicas num estado de divisão próximo do submicroscópico, que se utilizam localmente nas
membranas mucosas ou na pele, chamaremos geleias ou pomadas-geleias.
A algumas suspensões aquosas muito fluidas dá a F. P. IV, quanto a nós impropriamente, a
designação de águas. Estão nestas circunstâncias a água amónio-canforada e a água branca ou
végeto-mineral.
No presente capítulo dedicaremos, principalmente, a nossa atenção às suspensões de uso oral.
As suspensões para uso parentérico serão estudadas a propósito das Preparações Injectáveis e as
geleias sob a rubrica Pomadas.
Entre as substâncias que correntemente se empregam sob a forma de suspensão, por via oral,
citamos as seguintes: ácido acetilsalicflico, acetilsulfisoxazol, almíscar, carbonato de cálcio,
caulino com pectina, fosfato de cálcio, difenilidantoína, eritromi-cina, fenoximetilpenicilina,
nistacina, novobiocina cálcica, palmitato de cloranfenicol, nitrofurantoína, oxitetraciclina,
salicilamida, sulfacetamida, sulfamerazina, sulfadiazina, tetraciclina, etc.
Para uso oral utilizam-se, também, diversos magmas ou geles, como o de hidróxido de
magnésio, de bentonite, de subcarbonato de bismuto com hidróxido de bismuto, de hidróxido de
alumínio, de aminoacetato de di-hidroxialumínio, etc.
Como suspensões para aplicação na pele e nas mucosas lembramos as de sulfureto de selénio
(anti-seborreico tópico), acetato de cortisona (anti-inflamatório ocular), pred-nisolona (anti-
inflamatório ocular), geleia de efedrina (vasoconstritor nasal), etc.

{') Os geles resultam da desidratação parcial dos soles liófilos que passam ao estado semi-
sólido sem apresentarem líquido sobrenadante. Podem formar-se pela rápida precipitação de
soluções sobressa-turadas na forma de massa gelatinosa, por alteração da temperatura, por adição
de um segundo dissolvente ao sole liófilo ou por outros meios.
1061

Para uso parenteral empregam-se diversas suspensões aquosas e oleosas. Entre as primeiras
referiremos as de esteróides anti-inflamatórios, preparados contendo insulina, hormonas sexuais,
penicilina G-procaína, penieilina G-benzatina, etc. Como exemplo de suspensões oleosas destinadas
ao uso parenteral lembramos as de iodobismutato de quinina, de subcarbonato de bismuto, de
hidróxido de bismuto, de penicilina G-procaína, etc. Muitas das suspensões citadas são preparadas
sob a forma definitiva. Outras, porém, só são concluídas no momento da sua utilização. A estas
últimas dá-se o nome de suspensões de preparação extemporânea, reservando-se o seu uso para
aquelas substâncias sólidas cuja estabilidade é precária quando em contacto demorado com a fase
dispersante. São, pois, apresentadas sob a forma de um pó que, no momento do emprego, é
adicionado de água ou de um veículo adequado (muitas vezes contendo tensioactivos e
conservantes) nos quais se dispersa por agitação.
Grande parte das suspensões injectáveis são de preparação extemporânea, embora outras,
como a de subcarbonato de bismuto, possam ser logo obtidas na sua forma definitiva. Algumas
suspensões orais, como as de ácido acetilsalicílico, podem também ser preparadas
extemporaneamente, por simples adição de água a uma mistura de pós e subsequente agitação.
A preparação das suspensões líquidas destinadas ao uso oral é feita nos moldes a que nos
referimos nos artigos antecedentes a propósito da obtenção de suspensões aquosas. Nestas formas
deve procurar corrigir-se o sabor ou o cheiro desagradável que eventualmente seja apresentado
pelo fármaco ou fármacos utilizados. Assim, é hábito incluírem-se substâncias edulcorantes
(sacarose, glicose, sacarina sódica, eiclamatos de sódio ou de cálcio, etc.) e aromatizantes (umas
vezes utilizados sob a forma de essências, outras empregados sob a forma de xaropes, etc.) Entre as
essências mais empregadas citamos as de limão, de laranja, de banana, de tangerina, de ananás, de
hortelã--pimenta, de anis, de canela, de framboesas e de groselhas. A vanilina e o aldeído benzóico
são também empregados com certa frequência. Os xaropes são ainda usados algumas vezes, pois
associam ao seu poder corrector do aroma e do gosto certa facilidade de impedirem a floculação
visto que aumentam a viscosidade da fase dispersante. Entre os xaropes mais utilizados citamos os
de groselhas, de alcaçuz, de chocolate, de flores de laranjeira, de casca de limão, de framboesas,
de genciana, de ruibarbo e de cerejas.
Algumas vezes pode também desejar-se corar as suspensões para o que se deve recorrer a
corantes cujo emprego seja permitido para uso alimentar.
A utilização de agentes conservadores dotados de propriedades bactericidas, fungicidas,
bacteriostáticas ou fungistáticas torna-se, em regra, desejada ou mesmo obrigatória. Entre os
conservantes mais usados citaremos o p-hidroxibenzoato de metilo a 0,15-0,2% (metilparabeno ou
Nipagin), o p-hidroxibenzoato de propilo a 0,02% (propil-parabeno ou NipazoF), o benzoato de
sódio a 0,1-1,5%, o nitrato de fenilmercúrio a 1:50 000, o timerosal a 1:50000, o álcool a 4-20%,
etc.
1062

A preparação de suspensões aquosas, muito viscosas (magmas e geles), pode decorrer também de
acordo com o que foi especificado anteriormente. Entretanto, há casos especiais em que a dispersão é
obtida à custa de reacções químicas. Tomemos para exemplo a suspensão de hidróxido de magnésio.
Segundo a Farmacopeia Portuguesa IV esta fórmula (Mistura de magnésio F. P. ou Leite de
magnésio F. P.) é preparada por dispersão, a quente, do óxido de magnésio com água, incorporando-
se, depois, o xarope de flores de laranjeira como corretor e estabilizante. Fundamentalmente,
observa-se a hidratação do MgO, formando-se Mg (OH)r segundo o esquema:

Mg O + Hfl -> Mg (O//)2


Este processo, que é o mais conveniente para fins industriais, não é o único meio de obtenção do
magma de hidróxido de magnésio. Efectivamente, este pode conseguir--se à custa de uma dupla
decomposição, de acordo com a equação:

2 NaOH + MgSOt -> Mg (OH)2 + Na2SO4


O magma de hidróxido de magnésio pode atacar o vidro dos recipientes onde se encontre contido,
pelo que se recomenda juntar-lhe 0,1% de ácido cítrico que minimiza aquela acção (efeito sequestrador
do ácido cítrico).
O magma de hidróxido de bismuto com subcarbonato de bismuto é preparado, habitualmente,
por reacção entre o subnitrato de bismuto, o ácido azótico, o carbonato de amónio e a amónia diluída.
As reacções que ocorrem são as seguintes:

Bi (OH),NO} + 2NHO} -> Bi (NO^ + 2Hf>


!
''-'• Bi (NO,), + 3 NHflH -» Bi (OH), + íNHfNO,
4 Bi (NO,), + 6 (NHJfO, + Hf> -> (BiO)fO,,
Hf) + \2NHfiO, + 4CO2
O excesso de alcalinidade, produzido pela amónia e pelo carbonato de amónio, é eliminado, do
mesmo modo que o nitrato de amónio, por lavagem com água (até que não avermelhe a fenolftaleína).
Nestas circunstâncias, obtém-st uma mistura de hidróxido e subcarbonato de bismuto que se apresenta
como um precipitado gelatinoso.
A suspensão de hidróxido de alumínio pode ser obtida pela dispersão directa do hidróxido
coloidal em água, mas pode também preparar-se por intermédio da reacção do cloreto de alumínio
com o bicarbonato de sódio ou com a amónia. Precipita o hidróxido de alumínio gelatinoso que,
tratado em moinho coloidal, origina um magma ou um gele que constituí a forma farmacêutica.
Do mesmo tipo é o gele de fosfato de alumínio que se prepara por dupla decomposição entre o
cloreto de alumínio e o fosfato de sódio em condições controladas, de
1063

a ser obtido um precipitado gelatinoso de partículas finamente divididas. O produto é então dialisado
e adicionado de edulcorantes, aromatizantes e conservantes adequados, podendo melhorar-se a
dispersão por tratamento em moinho coloidal.

9.2.0.2.5. Incompatibilidades
A maioria das incompatibilidades que podem surgir na preparação das suspensões deve-se à acção
de cargas eléctricas de sinal contrário entre os agentes suspensores ou os tensioactivos e os fárrnacos
dispersos. Assim, deve evitar-se a adição de agentes aniónicos a fárrnacos carregados positivamente e
vice-versa.
Lembremos que as gomas, a carboximetilcelulose sódica e as arguas (bentonite, Veegum,
hectorite, atapulgite, etc.) se comportam como substâncias aniónicas, podendo originar precipitações
quando adicionadas a fárrnacos catiónicos, como os alcalóides, alguns antibióticos (estreptomicina,
canamicina, etc.), muitos anestésicos locais, acrifla-vina, vitamina BI, vitamina B6, roxo de genciana,
sais de amónio quaternário, etc. A junção de gelatina catiónica (Pharmagel A) aos agentes suspensores
aniónicos ocasiona, também, a formação de precipitados ou coacervação.
Por vezes, a formação destes precipitados não é aparente, porquanto alguns deles se dispersam sob
a forma coloidal. Isto acontece, por exemplo, quando esteja presente um excesso de tensioactivo. Este
facto torna ainda mais real o perigo das incompatibilidades que podem atingir o domínio da
inactivação ou da modificação de actividade farmacológica sem que o operador tenha consciência do
ocorrido.
Na Tabela CXXVIII, extraída de um trabalho de MILLER, assinalam-se algumas destas
incompatibilidades.
CLOSSET fez um estudo profundo das incompatibilidades mais vulgares dos diversos excipientes
utilizados na preparação dos medicamentos, trabalho que recomendamos ao leitor interessado. Mais
recentemente, citamos G. Du BAN, que publicou um artigo de revisão sobre o assunto, com numerosas
referências bibliográficas.
A inactivação de certos agentes conservantes tem sido também referida na literatura. BOLLE e
MIRIMANOFF foram os primeiros investigadores a observarem a destruição de vários agentes conservantes por
substâncias tensioactivas não iónicas. De NAVARRE, estudando este problema, concluiu que a inactivação
dos conservantes pêlos emulsivos não íónicos pode ser minimizada por adição de 5-10% de etanol ou
de hexilenoglicol. O metil e o propilparabeno são inactivados pelas soluções a 5% de agentes tensioac-
tivos não tónicos. LACH et aí. mostraram que os parabenos se combinavam com os polietilenoglicós e
KOSTENBAUDER e colaboradores observaram que uma concentração de 5% de polissorbato 80 inactiva 78%
de p-hidroxibenzoato de metilo e 95,5% de p-hidroxibenzoato de propilo. De facto, os polissorbatos
são, de certo modo, com-plexantes de compostos contendo funções fenólicas, como os parabenos, o
fenol, o
1064

Tabela CXXVIII. Incompatibilidades de alguns farmacos com agentes


suspensores e tensioactivos
Carhoxime- Sulfato
Alginato tiícelulose de laurilo
Farmacos \ de sódio a 1%sádica a 1% e sódio a 1%
Acriflavina 0,1% + + +
Antazolina 0,5%, cloridrato •*•
Cloreto de benzalcónio 0,1% + +: +
Fenacaína 1% - •+•
Estreptomicina l %, sulfato + + +
Meperidina 1%, cloridrato +
Metilrosanilina 0,1%, cloridrato +
Quinacrina 1%, cloridrato + + + .
Tenilpiramina 0,5%, cloridrato +
Tiamina 1%, cloridrato + +
O sinal (+) indica a incompatibilidade reconhecida como dando precipitação imediata.
Segundo O. Miller — J. Amer. Pharm. Assoe. Prat. Ed.13, 657, 1952.

ácido salicílico, a resorcina, etc. Pela razão apontada, os Myrjs e os Bríjs são também incompatíveis
com compostos que apresentam hidroxilos livres, o que, segundo MERZ, se deve à formação de ozonidos.

9.2.0.2.6. Conservação das suspensões


A estabilidade das suspensões pode ser apreciada dos pontos de vista físico, químico e
microbiológico. Assim, uma suspensão deve manter-se em dispersão homogénea durante um período de
tempo o maior possível, sendo facilmente redispersíveis por agitação os precipitados que
eventualmente se formem. Nestas circunstâncias, é hábito conveniente rotular as suspensões líquidas
com a indicação «agite antes de usar». As suspensões semi-sólidas, como as pomadas e as geleias, não
devem, porém, ser submetidas a esse tratamento.
A estabilidade química depende de vários factores (farmacos, agentes suspensores, molhantes,
temperatura de conservação, luz, pH, etc.), sendo, em regra, melhor do que a das soluções dos
farmacos correspondentes. Em geral, a decomposição (hidrólise, isomerização, oxidação, etc.)
processa-se de acordo com reacções de zero ordem, em que a velocidade específica de degradação é
independente da concentração do fármaco.
Algumas vezes, as suspensões aquosas de colóides hidrófilos (goma arábica, bentonite, metilcelulose,
alginato de sódio, etc.) sofrem acidificação durante o período
1065

de armazenagem. JOSLTN e SPERANDIO referiram e estudaram pormenorizadamente o mencionado


fenómeno.
Com frequência, a instabilidade física e química das suspensões obriga à sua preparação
extemporânea. Este método é bastante utilizado na fabricação de suspensões injectáveis e tem-se
principiado a difundir para a obtenção de suspensões de uso oral (palmitato de cloranfenicol,
ácido acetilsalicílico, etc.).
Finalmente, é importante evitar-se a invasão e o desenvolvimento microbiano nas suspensões,
para o que se usam diversos agentes conservantes a que já fizemos referência nos artigos
antecedentes. Entretanto, assinalemos que as suspensões destinadas à administração ocular ou
parenteral devem encontrar-se estéreis, o que obriga a que sejam preparadas por técnica asséptica.

9.2.0.2.7. Ensaio das suspensões


O controlo das suspensões pode ser exercido sob variados aspectos, como a determinação do
tamanho das partículas dispersas, a viscosidade, a dosagem dos princípios activos, etc.
Reportando-nos, como sempre, exclusivamente ao controlo galénico, iremos considerar apenas os
ensaios de determinação do tamanho das partículas e da viscosidade do sistema. Aliás, a avaliação
da tenuidade da fase dispersa é, em regra, executada por métodos em que se aprecia a velocidade
de sedimentação, e o conhecimento da viscosidade pode elucidar em relação à estabilidade da
fórmula durante os períodos de armazenagem e de utilização.

9.2.0.2.7.1. Determinação do tamanho das partículas suspensas


Uma vez que a forma das partículas não é rigorosamente igual, a determinação do seu
tamanho, expressa em diâmetro, aresta, etc., pode ocasionar erros, especialmente se a tenuidade é
apreciada por métodos de medição directa. Por esta razão e também porque o processo de medição
é bastante fastidioso, a granulometria executada por microscopia directa (ocular micrométrica,
câmara de contagem), nos moldes descritos a propósito dos Pós, não é utilizada, com frequência,
na indústria em larga escala.
Em regra, a determinação da tenuidade das partículas suspensas faz-se por processos indirectos
que se baseiam na velocidade de sedimentação segundo a lei de STOKES. O mais simples destes
métodos é o da pipeta de ANDREASBN que descrevemos a propósito dos Pós. Na prática, esta técnica
apresenta algumas limitações, dada a morosidade da sedimentação das partículas cujo diâmetro
seja inferior a 6 (l. Este facto limita o uso da pipeta de ANDREASEN que tem sido substituída por
outros processos, como os que avaliam a velocidade de deposição das partículas por meio do
movimento de uma peça, na qual é recolhido o sedimento. O citado movimento é apreciado por
1066

microscopia, por meio de quimógrafos, por registo automático, etc. A mais elegante modificação
deste tipo de teste é, indubitavelmente, o micromerógrafo a que nos referimos anteriormente (ver
pág. 623). Entre as modificações que recorrem ao uso de quimógrafos citamos a aplicação da
balança de ODEN que, segundo GERDING e SPERANDIO, permite determinar o poder suspensor em
condições padronizadas.
A balança de ODEN já era conhecida de há muito, datando de 1915 a primeira comunicação do
seu inventor, à qual se seguiu outra, em 1924, em que o nome de FISCHER se veio juntar ao de ODEN.
O sistema por nós utilizado consta de 2 pratos equilibrados, um dos quais mergulha na
suspensão contida no recipiente enquanto que o outro comporta massas para equilibrar o primeiro.
À medida que o sedimento se vai depositando sobre o prato mergulhado na suspensão, o sistema
vai-se desequilibrando, sendo possível tomar nota da medida desse desequilíbrio, desde que o
travessão esteja ligado a um estilete inscri-tor aplicado a um quimógrafo. O sistema mencionado
permite acompanhar o comportamento da suspensão de uma maneira contínua, num intervalo de
tempo apreciável. Na Fig. 365 apresentamos um esquema da aparelhagem utilizada na
determinação.

Fig. 365. Esquema da aparelhagem utilizada na determinação do poder suspensor


pela balança de Oden
A — suspensão; B — prato da balança; C — pesos; D — estilete
inscritor; E — cilindro

A fim de padronizar as condições operatórias estabelecem-se as seguintes regras:


num copo de 250 ml, com o diâmetro interno de 7 cm, colocam-se 180 ml da suspen
são á examinar; nela se mergulha o prato do aparelho (0 5,5 cm), de tal modo que
fique a uma profundidade de 1,5 cm. -
1067

Fig. 366. Contador electrónico Coulter


1 — Aspecto geral.
2 —Esquema mostrando a disposição do tubo (B), com abertura calibrada (A); C é o elétrodo interior e D o
eléctrodo exterior; £ é a suspensão em estudo; F é a torneira que estabelece a ligação com a máquina de
vazio (P); J e R são o manómetro de mercúrio e o seu reservatório, respectivamente; K, L e M são eléctrodos
que contactam com a coluna de mercúrio, servindo para estabelecer o volume da tomada de ensaio.
1068

As leituras devem fazer-se imediatamene após a introdução do prato na suspensão e


restabelecimento subsequente do equilíbrio (2 minutos, no máximo). Por este processo estabelece-se
uma relação entre quantidades do produto sedimentado e tempos de deposição. Efectivamente,
rolando o cilindro com uma dada velocidade, nele se vão registando os movimentos do estilete
inscritor. Se a suspensão não depositar ou o fizer de modo extremamente lento, o registo obtido é
uma recta paralela à base do cilindro. Se, pelo contrário, houver sedimentação a curva obtida será
tanto mais inclinada quanto maior for a velocidade de deposição das partículas suspensas.
A determinação da tenuidade das partículas pode fazer-se, também, rapidamente, desde que se
recorra ao emprego dos contadores electrónicos. As partículas passam, separadamente, através de
um orifício muito fino, sendo contadas por registo do número de interrupções num facho luminoso
ou por registo das alterações da condutibilidade do sistema.
A Fig. 366 representa o diagrama de um contador electrónico (Coulter Company). As
partículas em suspensão num electrólito, contidas no copo (E), são aspiradas para um tubo de
vidro através de um fino orifício existente na sua parede (A).
A variação da condutibilidade ocasionada pela passagem das partículas através do orifício é
apreciada entre 2 eléctrodos, um que se encontra no tubo de vidro (C) e outro que está mergulhado
na suspensão (D). Um oscilógrafo regista a variação da condutibilidade observada.
Os tubos podem ter orifícios variando de 11 a 560 |1 de diâmetro, pelo que há possibilidade de
apreciação das partículas desde que o seu diâmetro esteja compreendido entre 2 e 40% do diâmetro
do orifício.
Diminuindo a sensibilidade, só as partículas de maior diâmetro poderão ser
medidas, o que permite obter curvas da sua distribuição. ,• •

9.2.0.2.7.2. Viscosidade e comportamento reológico

Como anteriormente mostrámos, a viscosidade pode influenciar não só a estabilidade de uma


suspensão, como até a sua acção farmacológica. Nestas circunstâncias é compreensível que se
procure determinar a viscosidade, mas sendo as suspensões, em regra, líquidos não newtonianos, é
adequado recorrer-se a viscosímetros rotativos, como o de BROOKFIELD, cujo emprego foi descrito,
pormenorizadamente, por RUNIKIS (ver POMADAS, II volume).
Entretanto, STANKO e DEKAY empregaram o viscosímetro de HOEPPLER para a determinação da
viscosidade das suspensões de sulfamerazina a 5% em presença de 1% de diversos agentes
suspensores (metilcelulose, carboximetilcelulose, alginato de sódio). A Tabela CXXIX indica os
resultados obtidos por aqueles autores.
1069

Tabela CXXXI. Suspensões de caulino com pectina (O,4% de CMC)


Amostra Diâmetro Quantidade Viscosidade Redis-
de das de 27«C persibili- HslHl HslHl HslHl
caulino partículas pH espuma (cP0) dade * 4h 24 h 120 h
w (cm)
A 37 4,4 0,3 55 + 0,733 0,540 0,480
A 74 4,4 0,3 50 + 0,700 0,506 0,440
B 37 4,5 0,4 55 + 0,720 0,520 0,426
B 74 4,5 0,4 50 + 0,653 0,480 0,393

fácil.

9.2.0.2.7.3. Determinação do potencial zeta

A magnitude do potencial zeta é, como já sabemos, um dos factores mais importantes, se não o
mais valioso, na estabilidade de uma suspensão. O seu valor pode calcular-se através das fórmulas
já indicadas (Equações l e 2), determinando-se a
mobilidade das partículas dispersas, em células de microelectroforese.
A Fig. 367 representa, esquematicamente, uma célula de microelectro-
forese.
Reportando-nos ainda à publicação de STANKO e DEKAY, obervamos
que estes autores determinaram o potencial zeta de suspensões de
sulfamerazina preparadas com diversos agentes suspensores. As
determinações foram executadas imediatamente e ao fim de várias
semanas de preparação. A Tabela CXXXII indica os valores encontrados
por aqueles autores.
Fig. 367. Célula de Os investigadores mencionados observaram que era muito baixo o
microelectroforese potencial zeta das suspensões preparadas com metilcelulose. Notaram,
também, que as suspensões de algina-to de sódio eram bastante
Na parte superior da gravura vê-se estáveis (o potencial zeta a que se observa a floculação é de 29 milivolt).
uma objectiva de microscópio; a
célula padrão está representada por Finalmente, observaram que a
um círculo central assinalado com carboximetilcelulose de viscosidade média tendia a originar suspensões
uma seta e, lateralmente, observam-
que, com o tempo, apresentavam consideráveis baixas de potencial zeta,
o que poria em risco a sua estabilidade.
1070

1071
Tabela CXXXII. Valores de potencial zeta de suspensões de sulfamerazina a 5%, com 1% de agente suspensor

Potencial zeta (milivolt)


Agente suspensor Inicial l semana 3 semanas 7 semanas

Metilcelulose 25 cPo 39 9 19 24
Metilcelulose 4000 cPo 7 16 5 5
Carboximetilcelulose sódica
(média viscosidade) 133 174 104 113
Idem (alta viscosidade) 80 142 201 142
Alginato de sódio 119 141 142 126

9.2.0.2.8. Formulário das suspensões


Iremos considerar diversas fórmulas de suspensões aquosas e oleosas destinadas aos uso interno
e externo. Algumas são preparadas sem auxílio de agentes suspensores, outras, mais vulgares,
obrigam à inclusão desses adjuvantes.

Óxido de magnésio ...................................... 5 g


Xarope de flores de laranjeira .................... 25 »
Água .............................................................. 70 »
Misture o óxido com a água, aqueça até fervura, deixe arrefecer e ajunte o xarope.
Trata-se de uma fórmula inscrita na F. P. IV, com o nome de Mistura de magnésia (Leite de
magnésia), que ë, fundamentalmente, uma suspensão edulcorada que se administra oralmente, às
colheres. Nestas condições, constitui uma poção-suspensão, também chamada julepo.
Dada a difusibilidade do óxido de magnésio, não é necessário utilizar agentes suspensores na
preparação. O xarope de flores de laranjeira, empregado como edulco-rante e aromatizante, impede
a deposição rápida das partículas dispersas, em virtude da viscosidade elevada que apresenta.

Goma arábica desenzimada, em pó............ 10 g


Xarope de flores de laranjeira .................... 20 »
Água .............................................................. 70 »
1071

Triture a goma com o xarope até obter uma mistura homogénea; ajunte a água, a pouco e pouco.
Esta peparação — julepo gomoso — é utilizado como um verdadeiro excipiente suspensor que se
emprega na obtenção de diversas suspensões (terpina, quermes mineral, piramido, ácido
acetilsalicílico, etc.). O julepo gomoso é, também, um razoável corrector do aroma e do gosto
apresentados por muitos fármacos.

.. . m
- - Calamina........................................................ 8 g
Cloridrato de difenidramina ........................ l »
Cânfora .......................................................... 0,1 »
Glicerina ........................................................ 2 »
Alginato de sódio ........................................ 0,35 »
Polissorbato 80.............................................. 0,1 »
Água destilada .................................... q.b.p. 100 »
Triture a calamina, o cloridrato de difenidramina e a cânfora com a glicerina. Disperse o
alginato na água, ajunte o polissorbato e misture com a dispersão anterior até obter uma suspensão
homogénea.
Nesta fórmula, destinada ao uso externo, associa-se a um agente anti-histamínico — cloridrato
de difenidramina — a calamina (óxido de zinco com cerca de 0,5% de óxido de ferro), a qual
funciona como adstringente e anti-séptico fraco, e a cânfora.
Emprega-se o alginato de sódio como agente suspensor e o polissorbato como molhante. A
glicerina permite uma mais fácil dispersão dos fármacos na água, incrementando, muito
ligeiramente, a viscosidade da fase dispersantc. A fim de evitar o desenvolvimento de
microrganismos, pode adicionar-se cerca de 0,1% de metilparabeno.

IV
Palmitato de cloranfenicol, amorfo ............ 5,5 g
Carboximetilcelulose sódica ........................0,65 »
Polissorbato 80.............................................. 0,5 »
p-hidroxibenzoato de metilo ........................0,5 »
Essência de anis ..........................................0,05 ml
Glicerina ........................................................3,5 g
Álcool ............................................................ l ml
Xarope comum.............................................. 58 g
Água destilada q.b.p.....................................100 ml
1072

Disperse a carboximetilcelulose em cerca de 20 ml de água e junte o xarope. Triture o


cloranfenicol com a glicerina e o polissorbato; adicione, a pouco e pouco, a mistura dos restantes
componentes depois da dissolução prévia da essência e do p-hidroxibenzoato no álcool. Complete o
volume com água.
Esta suspensão, destinada ao uso oral, é preparada com palmitato de cloranfenicol amorfo, pois
esse é mais facilmente saponificado pelas lipases digestivas do que o éster cristalizado (ver pág.
516). A fim de facilitar o referido desdobramento e também para manter a suspensão estável por
maior lapso de tempo, deve empregar-se o palmitato finamente dividido, de preferência micronizado.
O principal agente suspensor é a CMC (cuja acção é completada pelo xarope e pela glicerina). A
edulcoração desta fórmula não é perfeita, dado o característico amargor do palmitato, melhor
tolerado, porém, do que o cloranfenicol sob a forma de álcool livre.

Sulfato de neomicina.................................................... 0,5 g


Acetato de hidrocortisona, micronizado...................... 0,5 »
Carboximetilcelulose sódica.......................................... 0,05 »
Polissorbato 80..............................................................III gotas
Veículo tamponado isotónico C, da F. P. IV .. q.b.p. 100 ml
Triture em almofariz os três primeiros componentes com o polissorbato; ajunte, agitando sempre,
o veículo. Use técnica asséptica.
Teoricamente, a neomicina dotada de carácter catiónico, é incompatível com a CMC, aniónica.
Parece que, entretanto, não se têm verificado quaisquer acidentes de ordem prática nesta
preparação que se emprega como tópico auricular.

VI ' ''
Enxofre precipitado ...................................... 5g
Glicerina ........................................................ 5»
Polissorbato 80.............................................. X gotas
Solução alcoólica de cânfora ...................... 10 g
Polietilenoglicol 400 .................................... 20 »
Água destilada .............................................. 60 »
Misture o enxofre com o polissorbato; ajunte a solução de cânfora, a glicerina, o
polietilenoglicol e a água, agitando sempre.
Esta suspensão destina-se a uso dermatológico (antipruriginosa) e o PEG 400 facilita a
penetração cutânea, melhorando a estabilidade da fórmula.
1073

vn
Óxido de zinco em pó fino........................50 g
Azeite desacidificado .................................... 50 »
Triture o óxido de zinco com o azeite, até suspensão homogénea.
Trata-se de uma suspensão oleosa, destinada a uso externo. Dada a viscosidade do azeite e a
lenta sedimentação do óxido de zinco, não é hábito incluir agentes suspen-sores na preparação.
,-, ^,.:' . . ; _' vm .
. ';,- '-í>. R ,
Oxido de zinco ............................................ 25 g
Tintura de alcatrão mineral saponinado .... 10 »
Talco.............................................................. 25 »
Glicerina ........................................................ 25 »
Alginato de sódio (alta viscosidade).......... 0,02 »
Água destilada q.b.p..................................... 100 »
Disperse o alginato na água. Triture o óxido de zinco, o talco e a glicerina. Adicione, misturando
sempre, a tintura de alcatrão saponinada e a dispersão do alginato, agitando até obter uma suspensão
homogénea.
Semelhante à fórmula anterior, esta suspensão aquosa, para uso externo, contém, como
substâncias medicamentosas, o óxido de zinco, o alcatrão e o talco. A dispersão do alcatrão mineral
no álcool da tintura é conseguida à custa das saponinas da quilaia (ver Tintura de alcatrão mineral
saponinado F. P. IV). A estabilidade da suspensão é assegurada pelo alginato de sódio e pela
glicerina, que também desempenha acção anti-séptica.
A referida suspensão pode preparar-se sem alginato de sódio, embora apresente menor
estabilidade.
K
Tumenol amónio .......................................... 3 g
Óxido de zinco ............................................ 20 »
Talco .............................................................. 20 »
Glicerina ........................................................ 30 »
Água destilada q.b.p..................................... 100 »
Trate o tumenol com a água, em almofariz. Triture o óxido de zinco e o talco com a glicerina.
Junte as duas misturas, triturando sempre, até obter uma suspensão homogénea.
1074

Como a fórmula anterior, esta preparação é empregada como queratoplástico, actividade que é
completada pela acção anti-inflamatória e secante que apresenta o óxido de zinco.
X
Cloroiodoquina .............................................. 3 g ..,,.„
Oxido de zinco ............................................ 20 » , . lV. .,
Talco .............................................................. 20 » ; W ','••"
Glicerina ........................................................ 30 » ,... ,. ,.
Água destilada .............................................. 30 » ,0 .-:,..,.
Esta suspensão, conhecida por Suspensão de Viofórmio, composta, é usada como anti-séptica e
cicatrizante.

Cloreto de alumínio, cristalizado com seis moléculas de água ..5,85 g


Amónia (26° Be o 29,4%) ............................................................4,24 »
Água destilada .......................................................................... q.b.p. 100 ml
Dissolva o cloreto de alumínio e a amónia, respectivamente em cerca de 40 e 50 ml de água.
Ajunte, a pouco e pouco, com enérgica agitação, a solução amonical à solução cloretada. Mantenha
a agitação por duas a três horas. O pH da dispersão deve ficar próximo de 8.
Operando nas circunstâncias descritas, obtém-se um gele que titula, aproximada
mente, 2,5% de A/2O3. . .... ,,.. . ,
xn ' - ' • '"'• ' •''••"';*
Caulino esterilizado ...................................... 10 g
Gele de alumina (a 2,5% de A/2O3) .......... 36 ml
Parafina líquida ............................................ 5»
Pectina ............................................................ l g
Glicerina ........................................................ 1,4 »
Sacarina .......................................................... 0,01 »
Vanilina .......................................................... 0,01 »
Benzoato de sódio ........................................ 0,36 »
Ácido benzóico.............................................. 0,23 »
Sulfato de estreptomicina ............................ l »
Metilparabeno ................................................ 0,03 » •''
Propilparabeno .............................................. 0,01 » '..'",.
Água esterilizada ................................q.b.p. 100 ml ,,.,., _
1075

Esta suspensão, que se destina à administração oral (anti-diarreica e anti-séptica intestinal),


pode preparar-se do modo que iremos descrever.
Dispersar o caulino em cerca de 20 ml de água, onde já se dissolveu o ácido benzóico. O pH da
dispersão deve ficar compreendido entre 4,5-5.
Preparar uma solução, a quente (± 70°C), da pectina em cerca de 7 ml de água. Deixar
arrefecer, ajuntar a glicerina e completar o peso de 10 g.
Em aparelho provido de agitador, emulsionar a parafina líquida no gele de alu-mina. Ajuntar a
esta emulsão a solução de pectina, agitando sempre; adicionar a sacarina e a vanilina e, por último,
o metil e o propilparabeno. Misturar, finalmente, a dispersão do caulino e completar o volume com
água, onde já se dissolveu o sulfato de estreptomicina. Verificar se o pH da dispersão está
compreendido entre 5,6 e 6,2, corrigindo-o, eventualmente, com ácido benzóico e ben/.oato de sódio.

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1077

9.2.1. FORMAS COMPLEMENTARES DAS SUSPENSÕES: AEROSSOLES

9.2.1.1. Definição e generalidades

A palavra «aerosol» é um termo empregado em química coloidal, tendo sido definido por
WHYTLAW-GRAY e PATTERSON como um sistema coloidal constituído por partículas sólidas ou líquidas
muito divididas, dispersas num gás. Segundo SINCLAIR, o diâmetro das partículas constituintes deve
ser inferior a 50 11 e, usualmente, menor do que 10 (l.
De acordo com a definição citada, considerava-se como «aerosol» qualquer sistema constituído
por uma fase dispersante gasosa no seio da qual se encontravam suspensas pequenas partículas
sólidas ou líquidas. Assim, as nuvens, os fumos, o pó ou a humidade dispersos na atmosfera seriam,
essencialmente, sistemas desse tipo. Posteriormente, o conceito inicial sofreu algumas modificações e,
em 1943, a palavra «aerosol» foi utilizada para designar certas preparações insecticidas contidas em
recipientes sob pressão, de onde eram libertadas num elevado grau de dispersão. A Chemical Specia-
lities Manufactureis Association, em 1957, definiu «aerosol» como um produto conservado em
recipiente adequado, o qual era lançado no estado de dispersão, à custa de uma força propulsora
proveniente da expansão de gases liquefeitos contidos no mesmo recipiente.
Actualmente, a definição anterior tomou maior latitude, já que se considera que a força
propelente provenha não só de gases liquefeitos mas também de gases comprimidos. Segundo este
conceito, a formação de um «aerosol» dependerá do poder de propulsão conferido pêlos gases,
exigindo para a realização plena do objectivo pretendido, a existência de recipientes resistentes,
onde estará contido o gás ou gases propelentes em mistura com o produto a dispersar. Por outras
palavras, o conceito actual de «aerosol» implica a ideia de recipiente, pois dele depende em grande
parte, como veremos, o bom êxito do preparado. Por este facto é corrente a substituição do termo
«aerosol» na literatura anglo-saxónica, por pressure pack, pressurized packaging e pressurized
product que envolve já a noção da forma de acondicionamento.
Em Portugal, o termo aerossole, que preferimos por razões ortográficas a «aerosol», tem sido
empregado para designar as suspensões de finas partículas sólidas ou líquidas, no seio do ar ou de
gases. Nesta definição englobam-se, portanto, todas as formas farmacêuticas satisfazendo aos
requisitos apontados, isto é, todas as dispersões em fase gasosa, qualquer que seja o sistema
utilizado na sua produção. Assim, os fumos de cigarros ou de pós antiasmáticos, as dispersões de
vitamina B|2 aplicadas na mucosa nasal, as diversas inalações e vaporizações, constituem exemplos
do uso terapêutico dos aerossoles. Nem todas estas formulações satisfazem aos requisitos terapêu-
ticos desejados. Efectivamente, muitas delas estão longe de permitir a administração
1078

qualitativa ou quantitativamente desejada, podendo actuar por defeito ou por excesso. Muitas não
são suficientemente estudadas para se poder garantir a sua penetração no organismo até ao local
pretendido, designadamente as destinadas à árvore brônquica, onde o diâmetro das partículas é
sumamente importante.
Só os aerossoles produzidos em recipientes adequados, providos de válvulas e onde exista um gás
propelente, são susceptíveis de realizar eficazmente a sua missão terapêutica.
Por comodidade de estudo, dividiremos a nossa exposição em duas partes fundamentais: aerossoles
primitivos e aerossoles propriamente ditos.

9.2.1.2. Aerossoles primitivos . ,


Não se pode afirmar com precisão quais foram os primeiros medicamentos aplicados por
inalação. Contudo, pode dizer-se que a prática da aspiração de fumos provenientes da combustão de
drogas medicinais é imensamente antiga.
Na Farmacopeia Portuguesa IV conserva-se ainda o chamado pó de estramónio composto cujos
fumos apresentam propriedades antiasmáticas. Do mesmo modo, o fumo dos cigarros antiasmáticos,
que contêm alcalóides da lobélia, da beladona e do mei-mendro em dispersão finíssima, penetra na
árvore brônquica, exercendo aí o seu efeito.
A prática da combustão do enxofre que, libertando SO2, actua como um desinfectante de
ambientes e os fumos de vários germicidas têm sido usados desde há muito. Criou-se mesmo a
designação de fumigações para exprimir os preparados que, libertando fumos e vapores anti-
sépticos, operam a desinfecção de determinados ambientes ou de zonas do corpo. Nalguns casos, a
fumigação era susceptível de permitir a absorção dos fármacos, como nas antigas práticas do
tratamento mercurial.
Todas estas preparações farmacêuticas são fundamentalmente aerossoles que não necessitam de
aparelhagem própria para a sua produção. A tenuidade das partículas suspensas não é, porém,
padronizada e os resultados terapêuticos são, portanto, muito variáveis. Estes sistemas dispersos,
são, afinal, semelhantes aos aerossoles naturais, como os nevoeiros e o fumo. Efectivamente, tanto
nos nevoeiros como nos fumos, a fase externa é gasosa, mas nos primeiros a fase interna é líquida e
nos segundos sólida.
É compreensível que se formem fumos sempre que as partículas dispersas sejam suficientemente
pequenas para não flocularem. Os fumos podem também ser produzidos pela condensação de
vapores, como acontece com o cloreto de amónio, formado por reacção do ácido clorídrico com a
amónia.
O ar das cidades contém, geralmente, uma apreciável quantidade de partículas sólidas em
dispersão, as quais provêm do pó e das combustões dos diversos carburantes (indústrias, automóveis,
aquecimento, etc.). A combinação de certos factores geográficos e climatéricos, associada a elevadas
concentrações de produtos de combustão no ar, pode criar condições respiratórias deficientes, já que
a atmosfera fica como que saturada
1079

de nevoeiros e de fumos. Certas cidades, como Londres, Los Angeles e Donora, são particularmente
atingidas, mas, mesmo entre nós, já temos lamentáveis exemplos da referida situação. Tem-se
admitido que a inspiração continuada dos fumos e nevoeiros pode conduzir ao desenvolvimento de
carcinomas pulmonares. Por outro lado, a importância na saúde pública das dispersões de partículas
sólidas em gases é também muito considerável, especialmente no que se refere aos operários que
trabalham em minas. Partículas de sílica e de carvão, libertadas nas minas, vão-se depositando na
árvore respiratória dos mineiros que contraem afecções muito graves, designadas, respectivamente,
por silicose e por antracose.
Estes factos têm levado ao estudo dos meios necessários para diminuir a quantidade de produtos
resultantes das combustões, ou para provocar a floculação dos aerossoles formados. Habitualmente a
floculação é conseguida criando-se campos eléctricos de elevada tensão (princípio de COTTRELL para
a captação de poeiras e de fumos).
Do ponto de vista farmacêutico, a inalação directa de fumos terapêuticos está praticamente
abandonada, tendo vindo a ser substituída pela administração de aerossoles obtidos com
aparelhagem adequada. Cronologicamente, podemos dizer que da simples
inalação de fumos se passou para a terapêutica em que se recorre a
aparelhos primitivos que já tornam possível a administração de soluções
ou de pós, sem que para tal haja necessidade de combustão, chegando-se
por fim aos actuais «pres-surized products», tão do agrado norte-
americano. A maioria dos primitivos aparelhos destina-se a proporcionar a
produção de dispersões gasosas de partículas sólidas ou líquidas, as quais
são inaladas pelo paciente. Os aparelhos produtores são de variados tipos,
como atomizadores, nebu-Hzadores, insufladores e vaporizadores. Em todos
estes aparelhos é fundamentalmente o ar (produzido por compressão ou
libertado de uma garrafa) que dispersa a solução ou o pó sob a forma de
aerossole.
Os atomizadores são fundamentalmente tubos em T em que o ar injectado
num dos ramos cria
vazio parcial na haste do T que se mantém mergulhada na solução
medicamentosa. A pressão necessária pode conseguir-se com uma pêra de
Fig. 368. Atomizador
borracha ou por meio de ar ou de outro gás comprimido.
A Fig. 368 mostra um atomizador de largas partículas medicamentosas
para tratamento das vias respiratórias. parte terminal do aparelho é afilada, condicionando, de certo
modo, o diâmetro médio das partículas.
1080

Os nebulizadores são atomizadores especiais, dentro de frascos. Geralmente são accionados pelo
ar comunicado por uma pêra de borracha, ou pela compressão e expansão repetidas das paredes
flexíveis de um recipiente que, em regra, é de plástico.
O primeiro sistema (Fig. 369) é utilizado para inalações antiasmáticas e broncodi-latadoras,
como a solução de adrenalina.
Os nebulizadores feitos de material plástico originam dispersões mais grosseiras, a maioria das
vezes utilizadas apenas para aplicações tópicas na mucosa nasal (Fig. 370).

Flg. 369. Fig. 370.


Nebulizador Nebulizador de
(De Vilbiss material plástico

Pode dizer-se que os actuais aerossoles, dispensados em recipiente especial e produzidos pela
acção propulsora de gases, são os descendentes dos nebulizadores.
Os insufladores são construídos para dispersar partículas sólidas no tracto respiratório. O
tamanho das partículas dispersas, à custa de ar comprimido insuflado, é dependente do grau de
divisão em que se encontram os pós antes da dispersão. Administram-se, por este sistema, pós
micronizados, como a vitamina B|2 diluída em lactose, ou a penicilina, dividida em partículas de
cerca de 5 u, de diâmetro. A Fig. 371 representa um insuflador.
Habitualmente, os insufladores proporcionam uma administração levemente mais irritante do
que os nebulizadores ou atomizadores, já que estes dispersam soluções e não pós.
Os vaporizadores são empregados para humedecerem a atmosfera, dispersando água ou
líquidos voláteis sob a forma gasosa. Semelhantes são os sub/imadores, em
1081

que se sublimam compostos, como carbonatos de aminas simpaticomiméticas. Os sistemas mencionados


não proporcionam, regra geral, a obtenção de partículas sempre iguais e muito pequenas. Entre os
seus defeitos é de salientar a tendência que as
partículas dispersas apresentam para coalescerem, aderindo entre si.
São muito variados os tipos de soluções ou de pós empregados para com
eles se conseguirem aerossoles que se administram por intermédio dos
aparelhos a que fizemos referência. Assim, utilizam-se, habitualmente, soluções
salinas aquosas e soluções aquosas contendo álcool, glicerina ou
propilenoglicol. A nebulização de soluções, cujo veículo seja exclusivamente
constituído por água, leva à formação de uma névoa, a qual se evapora
rapidamente em condições normais de humidade. Nestas circunstâncias, é
desejável a presença de um humectante, como a glicerina ou o
propilenoglicol, os quais, evitando a evaporação, mantêm as gotículas
dispersas. Uma fórmula correntemente utilizada em nebulizações
antiasmáticas é a seguinte:
Flg. 371. Insuflador (Abbott Laboratories) Tartarato de adrenalina....................................................
0,1 g
Propilenoglicol.................................................................. 2,5 »
Glicerina........................................................................... 2,5 »
Bissulfito de sódio .......................................................... 0,1 »
Solução isotónica de cloreto de sódio.............. q.b.p. 100 ml
O agente broncodilatador é a adrenalina, que se emprega sob a forma de tartarato para evitar a
oxidação (efeito sequestrador sobre os metais pesados). O bissulfito de sódio é um agente redutor que
capta o oxigénio, impedindo a conversão da adenalina na sua forma oxidada — adrenocromo. A
glicerina e o propilenoglicol são os humec-tantes atrás aludidos.
A terramicina, antibiótico de largo espectro, é empregada em aerossoles obtidos por meio de
nebulizadores. Pode utilizar-se a seguinte fórmula:
Terramicina.................................................... 5 g .->•;;
Propilenoglicol .............................................. 7,5 »
Água destilada .................................... q.b.p. 100 ml :
Esta solução, que contém 50 mg de antibiótico por ml, é nebulizada nas vias respiratórias.
1082

9.2.1.3. Aerossoles propriamente ditos


| v
•w '
9.2.1.3.1. História .-. • . -:
Como já dissemos, os actuais aerossoles são, de preferência, dispensados em embalagem
adequada, dela dependendo, em larga medida, a eficiência da fórmula. Esses recipientes contêm um
gás comprimido ou liquefeito que, ao expandir-se pela abertura de uma válvula do próprio
recipiente, forma a dispersão gasosa pretendida. Ao gás comprimido ou liquefeito que exerce esse
efeito propulsor daremos o nome de prope-lente (').
Pode dizer-se que, se a difusão prática dos aerossoles principiou há muito pouco tempo, a ideia
em que aqueles se baseiam tem pelo menos cerca de 60 anos. Efectivamente, em 1923 a Société
Chimique dês Usines du Rhône patenteou «um recipiente metálico para conservar e projectar
líquidos perfumados, sob pressão, contendo cloreto de etilo ou outros líquidos comprimidos,
misturados com as essências».
Em 1927, na Noruega, ERIC ROTHEIM requereu também uma patente descrevendo recipientes para
aerossoles, idênticos aos actuais. Segundo ROTHEIM deveriam ser verificadas duas condições
fundamentais para que o preparado fosse eficaz:

1 — O propelente ter de funcionar como dissolvente e originar pressão interna;


2 — a pulverização do líquido ser conseguida por simples pressão dos dedos sobre uma peça
adequada da embalagem e, terminado o movimento, o recipiente ficar estanque.
A partir de 1931, data em que ROTHEIM patenteou o seu processo na América do Norte,
sucederam-se os pedidos de patentes, devendo salientar-se, entretanto, a utilização prática dos
aerossoles no campo dos insecticidas, levado a cabo durante a 2." Guerra Mundial. Assim, em 1942,
o exército americano utilizou com êxito, no Extremo Oriente, um aerossole insecticida em que o
propelente era o diclorodifluoro-metano. Este aerossole, concebido por GOODHU e SULLIVAN, foi
designado por «bomba», termo que se generalizou para todas as embalagens destes produtos.
Foi a partir de 1942 que a indústria dos aerossoles principiou a desenvolver-se de modo notório.
O emprego de recipientes mais leves que os iniciais, mas que resistem à elevada pressão interior, o
uso do azoto, do butano e da série de derivados haloge-nados do metano e do etano como
propulsores e a obtenção de válvulas mais perfeitas e seguras vieram contribuir para o citado
desenvolvimento.
O consumo mundial de aerossoles tem aumentado nos últimos anos. A segurança de manejo, as
melhores condições económicas de obtenção e, finalmente, o rigor

Do verbo propelir (Do latim propellere, impelir para diante).


1083

posológico, têm levado à sua plena aceitação, desde os domínios da indústria em geral, até,
particularmente, à cosmética e à terapêutica.
Nalguns países, como a América do Norte, Canadá, Alemanha e Inglaterra, o seu consumo é
elevadíssimo. Mesmo entre nós, em que a terapêutica pêlos aerossoles se pode considerar
insignificante, houve, durante 1962, um consumo de 60000 unidades de aerossoles (medicamentosos
e não medicamentosos). O mercado europeu (considerando apenas a Europa Ocidental), que
representa cerca de 25% do consumo mundial de aerossoles, já em 1964 movimentou 526 milhões de
unidades.

9.2.1.3.2. Vantagens e emprego


Se bem que inicialmente tenha havido, em geral, má aceitação para os aerossoles, em razão do
seu elevado custo, as suas vantagens tbram compreendidas, a pouco e pouco, e o seu mercado
expandiu-se apreciavelmente.
Entre as vantagens dos aerossoles avultam as seguintes:
1 — Enorme superfície de dispersão obtida a partir de um volume determinado. Efectivamente, l
ml de líquido disperso em gotículas de 10 Jl de diâmetro origina 2 x IO12 gotículas.
2 — Aplicação fácil e rápida.
3 — Protecção do produto contra as acções e contaminações exteriores, como o efeito do ar e da
luz e as inquinações microbianas. De facto, uma vez que as embalagens são estanques, os produtos
podem ser esterilizados, mantendo-se nesse estado desde que não haja contacto com o meio exterior.
4 — Rigor posológico. Uma vez que as válvulas podem estar perfeitamente calibradas, lançando
um jacto de aerossole de cada vez que se comprimem, é evidente que cada dose aplicada ou
administrada poderá ser rigorosamente idêntica à anterior.
Os aerossoles são utilizados para muitos fins, representando a sua aplicação em farmácia um dos
campos de maior interesse. Entre as aplicações vulgares dos aerossoles lembramos as seguintes:
insecticidas e desodorizantes de ambientes; cosméticos e aro-matizantes corpóreos; pinturas e
vernizes; produtos alimentares; produtos industriais; produtos farmacêuticos; etc.
De entre todas estas rubricas iremos considerar apenas os aerossoles farmacêuticos, cuja
preparação e propriedades gerais não se afastam muito das dos restantes.
Este tipo de aerossoles, a que por vezes chamamos medicamentosos, pode destinar--se à aplicação
tópica numa dada zona cutânea ou à administração nas mucosas nasal, traqueopulmonar, vaginal,
rectal, etc.
As aplicações cutâneas dos aerossoles são variadas e destinam-se a obter acções tópicas. Estes
aerossoles podem substituir as pomadas, cremes, linimentos, pós, etc. A
1084

sua administração é vantajosa, já que são menos irritantes, principalmente por não carecerem de
auxílio manual para se difundirem na pele aquando da sua aplicação. A sua distribuição é, regra
geral, também mais uniforme. Deste modo, empregam-se aerossoles anti-sépticos, desodorizantes,
anti-histamínicos, adstringentes, fungicidas, etc. São várias as preparações contendo esteróides,
calamina, óxido de zinco, enxofre, resor-cina, alcatrão e muitos outros fármacos de acção tópica.
Ainda no domínio da aplicação cutânea, é de citar o uso das películas protectoras e dos aerossoles
destinados a provocarem arrefecimento da pele, tão usados nas queimaduras pela acção local que
exercem.
As administrações de aerossoles na mucosa nasal são também correntes, não só para se
conseguir uma acção tópica, como para se promover uma absorção que, em última análise, depende
do tamanho das partículas dispersas.
Os aerossoles têm sido utilizados para administração auricular, especialmente no ouvido médio,
onde a sua acção tópica pode ser desejada (otite média).
Vários preparados para aplicação dentária têm sido dispensados sob a forma de aerossole
(anestésicos, emolientes, adstringentes, anti-infecciosos, etc.). As acções tópicas de diferentes
aerossoles têm sido também aproveitadas por via vaginal e rectal.
É, porém, a inalação a administração terapêutica mais frequentemente realizada com aerossoles.
Já atrás considerámos este assunto (ver pág. 547) e então vimos as diversas possibilidades
preventivas e curativas apresentadas por aerossoles medicamentosos adequadamente formulados.
Recordaremos, apenas, que a acção exercida no tracto respiratório é essencialmente dependente do
diâmetro das partículas dispersas. Os bron-quíolos exigem partículas de menor dimensão do que os
brônquios primários e estes do que a traqueia, etc., etc.
Em alguns estados inflamatórios das vias respiratórias a diminuição da viscosidade das secreções
brônquicas representa uma importante necessidade clínica. A terapêutica mucolítica por meio dos
aerossoles permite melhorar essas condições, sendo, assim, correntes fórmulas de aerossoles com
fármacos mucolíticos, como enzimas (quimotrip-sina, hialuronidase, tripsina), tensioactivos
(cetilpiridínio, etanolamina), iodetos alcalinos, etc. CAVANNA e ROCHIETTA assinalam este emprego numa
curiosa revisão de conjunto.
Na terapêutica por inalação de aerossoles temos, pois, a considerar, como mais corrente, o
emprego de fármacos mucolíticos, broncodilatadores, anti-inflamatórios e anti-infecciosos.
Entre as vantagens dos aerossoles medicamentosos sobre outras formas farmacêu
ticas salientamos as seguintes: . . ;,.
1 — Geralmente provocam menor irritação da pele ou das mucosas.
2 — Podendo preparar-se e manter-se estéreis, são susceptíveis de aplicação em feridas
infectadas.
3 — Os aerossoles contendo gases liquefeitos secam rapidamente quando aplicados,
devido à evaporação do propelente. "i ''•••"
1085

4 — A medicação pode ser aplicada numa área restrita, permitindo rápida acção tópica ou
absorção do fármaco componente.
5 — O emprego de aerossoles por inalação pode substituir a administração paren-teral de vários
fármacos, o que representa comodidade para o doente e permite que os medicamentos absorvidos
escapem à barreira hepática. Para muitos autores, a administração de fármacos sob a forma de
aerossole, por via traqueopulmonar, é preferível à ingestão dos medicamentos e até mesmo à sua
administração por via intramuscular, admitindo-se que a rapidez de acção dos aerossoles é
semelhante à conseguida por injecção endovenosa.

9.2.1.3.3. Tipos de aerossoles


Quando se pensa na formulação de um aerossole podem considerar-se dois tipos principais de
constituintes: o fármaco e o propelente. A solubilidade do fármaco no propelente ou em certos
líquidos que àquele se adicionam constitui uma das principais características do aerossole formado.
Do mesmo modo, o facto de se utilizarem gases liquefeitos ou comprimidos, como propelentes,
também fará variar o tipo final do aerossole.
Em relação à solubilidade do fármaco no propelente podemos estabelecer as seguintes
variedades de aerossoles:
l—Fármaco solúvel no propelente;
2 — fármaco insolúvel no propelente mas que está dissolvido num líquido miscível ou imiscível
com aquele;
3 — fármaco em suspensão no propelente;
4 — fármaco insolúvel no propelente, mas disperso (suspensão ou emulsão) num veículo não
solúvel naquele.
Para comodidade de classificação, estudaremos, separadamente, os aerossoles obtidos com gases
liquefeitos e com gases comprimidos.

9.2.1.3.3.1. Sistemas com gases liquefeitos


Nesta variedade de aerossoles consideraremos os sistemas constituídos por duas fases e por três
fases.
Se num recipiente adequado e fechado por meio de uma válvula colocarmos um gás liquefeito a
baixa temperatura, quando o gás atingir a temperatura ambiente, parte dele passa ao estado gasoso,
ocupando a zona superior do recipiente. Atingir-se-á rapidamente um equilíbrio entre o número de
moléculas que abandonam o líquido para se vaporizarem e o número daquelas que deixam o estado
de vapor para passarem ao
1086

estado líquido. Este equilíbrio é evidentemente estabelecido no momento em que a pressão no


interior do recipiente é igual à pressão de vapor do propelente. Esta, que é independente da
quantidade de propelente, exerce-se em todas as direcções.
Ao abrir-se a válvula do recipiente, a pressão interna força o líquido a sair para o exterior
através de um tubo que nele mergulha e que comunica com a válvula. Quando o propelente atinge a
atmosfera vaporiza-se imediatamente pelo contacto com o ar quente exterior. Se o recipiente em
questão contiver, além do propelente, um fármaco dissolvido ou suspenso, este dispersar-se-á no seio
do propelente gasoso, constituindo-se o aerossole. Após cada descarga do propelente diminui a sua
quantidade no estado de gás, dentro do recipiente, pelo que novamente haverá trocas entre a fase
líquida e gasosa, até se atingir o equilíbrio e a pressão inicial.
A pressão no interior do recipiente corresponde,
2
portanto, à tensão de vapor do propelente
utilizado. Esta pode exprimir-se em kp.cnr2
(quilograma
2
força por centímetro quadrado), embora na
prática se use também a notação kg.cnr ou kg/cm (quilograma massa por centímetro quadrado).
Recorde-se que l kp. cm"2 equivale a l2 atmosfera técnica (l at) e que l atmosfera normal ou física
(l atm) é igual a 1,033 at (= 1,033 kp. cm' ).
A literatura anglo-saxónica utiliza, como unidade de pressão, o psia (pound/square inch absolute
= libra por polegada quadrada), que se substitui, muitas vezes, pela forma abreviada psi. l psia (= l
psi ou l Lb. in~2) equivale a 0,074 kp. cm~2 (= 0,0704 at).
Com frequência aparece ainda, em obras inglesas ou norte-americanas, uma outra unidade para
designar a pressão no interior dos recipientes. Trata-se do psig (pound/ /square inch gauge) que é o
excesso de pressão em relação à pressão exterior. Nestas circunstâncias, o psia é igual à soma de
14,7 com o psig (l psia = l psig + 14,7), já que l atm (atmosfera normal ou física) corresponde a 14,7
psia.
A pressão existente na maioria dos recipientes de aerossoles é da ordem de 3,14 a 3,83 kp. cm~2
(= 30 a 402 psig), a 20°C. Inicialmente prepararam-se aerossoles com pressão interna muito superior
(6 kp. cm" ), a qual exigia recipientes mais resistentes2 e economicamente menos acessíveis.
A Tabela CXXXIII indica a relação entre kp. cm" e psig.

Tabela CXXXIII. Relação entre psig e kp. cm2


psig kp. cm~2 (kg. cm"2)

5 1,38
10 1,74
15 2,09
— 20 2,44
25 2,79
30 3,14
40 3,83
1087

a) Sistemas de duas fases


As substâncias activas (medicamentosas, no caso de aerossoles medicinais) podem dissolver-se
no propelente. Isto consegue-se por via directa ou utilizando-se um cossol-vente. Há, evidentemente,
formação de duas fases, uma constituída pelo propelente líquido com as substâncias dissolvidas e a
outra pelo vapor do propelente.
A Fig. 372 mostra um modelo de recipiente para sistemas de duas fases. Quando
se comprime a válvula do aparelho, libertam-se os princípios activos com o propelente
ou com a mistura do propelente e cossolvente. Obtêm-se, assim, verdadeiras atomiza-
ções a que, em língua inglesa, se dá o nome de spray. •. .-

fl^
©

Flg. 373. Recipiente


para produção de
aerossoles.
Sistema trifásico
imiscível
1 —fase de vapor;
2 — solução
aquosa das
substâncias activas;
Flg. 372. Recipiente para produção de aerossoles.
Sistema bifásico
1 — fase de vapor;
2 — fase líquida (solução de propelente e substâncias activas);
3 — atomização.

Entre os cossolventes utilizados figuram o álcool, óleos minerais, glicerina, propi-lenoglicol,


polietilenoglicóis, acetona e acetato de etilo. Para inalação empregam-se, correntemente, a glicerina, o álcool
etílico e o propilenoglicol.
A substância medicamentosa pode, também, ser insolúvel no propelente, preparando-se então uma
verdadeira suspensão. Nestes casos há necessidade de associar agentes tensioactivos que facilitem a dispersão.
O talco tem-se utilizado sob a forma de suspensão em propelentes, associando-se-lhe o meristato de isopropilo
como dispersante. Vários antibióticos são também assim empregados.
1088

b) Sistemas de três fases • •>'•>- >'.~A'V ••*•< •••' '••


Estes sistemas caracterizam-se pela existência de dois líquidos imiscíveis ou emulsionáveis, os quais
constituem duas fases, sendo a terceira formada pelo vapor do propelente.
Um dos líquidos não miscível ou emulsionável é o propelente. O outro é habitualmente uma solução aquosa
do medicamento. A predominância da água é uma das características dos sistemas de três fases.
Se os líquidos se não misturam, em geral o propelente líquido fica retido no fundo do recipiente,
sobrepondo-se-lhe a fase aquosa. Este sistema requer uma abertura de saída de formato especial, como a que
está representada na Fig. 373. O aerossole é libertado sob a forma de atomização (spray).
Se o propelente é susceptível de se emulsionar com a fase aquosa, o aerossole libertado toma o aspecto de
espuma em que parte do propelente se encontra no seio do líquido disperso e daí se evapora quando em
contacto com o meio ambiente. A quantidade de propelente é muito menor do que a utilizada nos aerossoles do
tipo anterior (spray). Assim, enquanto que estes últimos contêm 80 a 90% de propelente, os aerossoles que se
dispersam sob a forma de espuma só apresentam 6 a 10% do propelente. Como exemplo do tipo de aerossole de
3 fases, sendo duas emulsionáveis, lembramos alguns sabões de barba e vários «shampoos».
As dispersões deste tipo devem ser dispensadas em recipientes de sistema valvular
adequado (Fig. 374), recomendando-se a agitação antes do uso. ,;,

9.2.1.3.3.2. Sistemas com gases comprimidos


Do mesmo modo que os anteriores, estes tipos de aerossoles podem apresentar-se como verdadeiras
soluções, suspensões ou emulsões.
Como gases propelentes empregam-se o azoto, o anidrido carbónico e o protóxido de azoto, que se
introduzem sob pressão no recipiente e cuja expansão, através de uma válvula, promove a formação do
aerossole. Na Fig. 375 está representado um recipiente com gás comprimido, para obtenção dos aerossoles.
Essencialmente, são de três tipos os aerossoles conseguidos por este processo: sólidos dispersos num gás,
líquidos dispersos num gás, emulsões gasosas.

a) Sólidos dispersos
Empregam-se por este processo suspensões de sólidos finamente divididos no seio de um gás, como o azoto.
Como o poder dissolvente do azoto das misturas utilizadas é, geralmente, mínimo, obtêm-se verdadeiras
suspensões pelo método em questão.
1089

Pastas dentífricas, lacas para o cabelo, pomadas, cremes, xaropes antitússicos, produtos vitaminados, etc.,
têm sido dispensados nesta forma. Nalguns casos o medicamento propriamente dito é um sólido pastoso,
requerendo, por isso, uma elevada pressão inicial para que se forme o aerossole. Habitualmente, o azoto
encontra-se a uma pressão de cerca de 8 kg cnr2, a 20°C (').

Flg. 374.
Recipiente para Fig. 375.
produção de Recipiente para
aerossoles. produção de
Sistema trifásico aerossoles contendo
(emulsão) gás comprimido
1 — fase de
vapor; 1 —propelente (gás
2 —fase líquida
(emulsão de comprimido);
propelente,
água e subs- 2 — líquido
tâncias
activas); concentrado.
3 —aerossol
(esquema)

SCIARRA reporta-nos algumas das características de aerossoles constituídos por misturas de vaselina e parafina
líquida dispersas pelo azoto, com uma pressão de 90 psig, a cerca de 20"C (= 7,33 kp. cnr2). Este investigador
observou que a viscosidade do sistema a dispersar era o principal obstáculo à formação dos aerossoles. Assim,
enquanto que dão boa dispersão misturas até 60% de vaselina e 40% de parafina líquida, nota-se que o
aerossole se não forma com as características devidas, quando a quantidade de vaselina aumenta.

(') Em muitos casos não se deve considerar o produto dispensado como um aerossole, pois que
o propelente pode ser utilizado apenas para facilitar o seu escoamento da embalagem, sem que se forme
uma dispersão em fase gasosa. , . .. , •,*..*.-. ...
1090

b) Líquidos dispersos num gás .: - --. • ' - '.h,,*-


Pelo que se deixou dito se compreende que as misturas líquidas sejam mais adequadas à produção de
aerossoles do que as dispersões de sólidos em gases. Como propelentes podem usar-se, também, o azoto, o
anidrido carbónico e o protóxido de azoto.
Ainda, retomando o exemplo da parafina líquida associada à vaselina, verifica-se que se conseguem
dispersões com 10 a 30% de vaselina e 90 a 70% de parafina líquida.
Misturas de PEG 4000 com PEG 400 são também perfeitamente dispersas até 10% do primeiro com 90% do
segundo.
Certas soluções aquosas de complexos iodados podem ser dispensadas por este processo, como agentes
mucolíticos. Soluções polivitamínicas diversas apresentam-se algumas vezes em aerossoles deste tipo.

c) Emulsões em gases
Muito semelhantes às emulsões dispersas com gases liquefeitos, estes aerossoles diferem por se usar, como
propelente, o N2O ou o CO2 comprimidos. Têm-se também empregado misturas de protóxido de azoto com o
octofluorciclobutano (gás liquefeito).

9.2.1.3.4. Preparação de Aerossoles ;,- ;' i' : \


Na preparação dos aerossoles teremos que considerar a preparação do medicamento propriamente dito, a
escolha do propelente e o enchimento dos recipientes. A preparação do medicamento deve atender às
características de solubilidade atrás apontadas e ao tipo de aerossole que se deseja. É evidente que tratando-se
de dispersões de líquidos ou sólidos numa fase gasosa, a sua estabilidade é regida pela lei de STOKES, como em
qualquer suspensão. Assim, uma vez que se não pode aumentar a viscosidade da fase dispersante, só nos resta o
recurso de diminuir o diâmetro das partículas e procurar propelentes cuja densidade seja o mais próxima
possível da do material constituinte da fase dispersa.
O caso mais simples é o de um pó que se suspenderá no propelente e que deverá apresentar uma tenuidade
adequada à finalidade terapêutica desejada. Claramente que para se conseguir uma dispersão regular interessa
incluir, juntamente, certos agentes tensioactivos que, em geral, não são iónicos (0,25 a 10% de Spans ou de
Tweens). As tetraciclinas são dispensadas em aerossoles deste tipo, havendo o cuidado de que 95% das suas
partículas tenha diãrnetros médios inferiores a 15 u,. .
1091

Entre os inconvenientes do método figura a fácil aglomeração das partículas, a


qual é favorecida pela presença da humidade (atrai os compostos mais hidrossolúveis
e polares). A diminuição da diferença de densidade entre os pós suspensos e os pro-
pelentes retarda a sedimentação, favorecendo a formação de um
••J*>* " perfeito aerossole. Se as substâncias medicamentosas são tipica
mente apoiares poderemos pensar em dissolvê-las no próprio
propelente. Este processo é muito fácil mas é relativamente raro.
KANIG indica uma lista bibliográfica de trabalhos em que se cita
o poder dissolvente de diversos propelentes para vários compos
tos de uso químico e farmacêutico.
Quando os fármacos são hidrossolúveis pode proceder-se à sua dissolução em água ou
em misturas hidro-alcoólicas que se juntam ao propelente. É por vezes vantajoso obter
soluções de fármacos cuja densidade seja semelhante à do propelente líquido. O uso de álcool
etílico ou de álcool isopropílico auxilia a dispersão do propelente na camada aquosa. A fim
de resolver o problema de miscibilidade da fase aquosa nos propelentes têm-se empregado
várias técnicas, conseguindo-se, não soluções ou emulsões, mas verdadeiras pseudo-soluções
entre as soluções do fármaco e do propelente. Os tensioactivos têm sido utilizados para
realizar este efeito, designadamente os Tweens e os Spans. A tensão interfacial (solução
aquosa/propelente) pode ser avaliada por métodos práticos, como o processo do tubo capilar.
Para isso, coloca-se um tubo capilar entre as duas fases, mantidas a temperatura
determinada. A Fig. 376 representa um tensiómetro aconselhado por KANIG e SHIN. Pela fórmula
rhg (d-d'}
em que r é o raio do tubo capilar, h a altura da coluna do tubo, (d-d'} a diferença de
densidade entre a fase líquida e a fase de vapor e g a aceleração da gravidade, é possível
calcular a tensão interfacial do sistema (y).
Fig. 376. O método é aplicável para a determinação da tensão interfacial entre a solução e o
Tensiómetro propelente, estando ou não presentes tensioactivos.
A — tubo de
Como por outro lado foi demonstrado, por CHUN e MARTIN, existir uma relação entre
admissão B l as tensões y= interfaciais obtidas e os valores do equilíbrio hidrófilo-lipófilo (E.H.L.)
vedação de tar-C dos tensioactivos utilizados, é possível relacionar estas duas grandezas.
J raxa, em
neopreno F —
suporte do termó-
metro G —tubo de
vidro para
pressão J —
1092

A Fig. 377 mostra a aludida relação quando se utilizam sistemas constituídos por água e propelente 11,
contendo como tensioactivos diversos Igepal CO, na concentração de 0,1%. No presente caso, a tensão
interfacial, expressa em dine. cm~2, está relacionada com o E.H.L. pela seguinte equação:

Y = 49,5 - 3,32 (E.H.L.)

Valores de EHL
Flg. 377. Relação entre tensão interfacial e EHL (Igepal CO) Segundo K. Kanig — J.
Pharm. Sei., 52, 513 (1963)

Na Tabela CXXXIV indicam-se os valores do E.H.L. e as tensões interfaciais determinadas (sistemas


água/propelente 11).
Desta maneira pode calcular-se, teoricamente, o valor da tensão interfacial água/propelente, desde que seja
conhecido o valor de E.H.L. do tensioactivo empregado. No caso a que aludimos é fácil verificar que as tensões
interfaciais avaliadas experimentalmente com o Igepal CO, a 0,1%, são bastante próximas das obtidas
teoricamente por inteinédio da equação anterior. Assim, por exemplo, para o Igepal CO-210 a tensão
interfacial será:

Y = 49,5 - 3,32 (E.H.L.) = 49,5 - 3,32 x 4,6 = 34,2 dine. cm"1


1093

Tabela CXXXIV. Relação entre os valores do EHL e da tensão interfacial de vários sistemas (')
Tensão interfacial
Tensioactivo EHL a 25°C (experimental)
Igepal CO-210 4,6 37,2 dine. cm~'
» CO-430 8,9 18,0 » »
» CO-530 10,9 12,3 » »
» CO-610 12,2 5,5 »»
» CO-710 13,5 4,0 » »
»> CO-730 15,0 1,5 » »

Dissemos atrás que a preparação de emulsões medicamentosas podia também ser desejável para produzir
aerossoles. Como exemplo deste tipo de fórmula citámos os sabões para a barba, em que habitualmente o
propelente liquefeito se disssolve, em parte, no sabão, estando a quantidade restante com ele emulsionada.
É preferível utilizar, para estas preparações, emulsões de O/A. As emulsões A/O dão, geralmente, maus
aerossoles.

9.2.1.3.4.1. Propelentes
Consideramos como propelentes ou gases propulsores os compostos capazes de, pela sua brusca expansão,
promoverem a formação do aerossole. Actualmente, admite-se que os propelentes são tanto ou mais
importantes do que os restantes componentes do aerossole. De facto, eles funcionam como o órgão propulsor de
dispersão o que leva a serem apelidados de coração do aerossole.
Mantendo a classificação anterior, iremos dividi-los em dois grupos:

a) Propelentes constituídos por gases liquefeitos:


b) Propelentes constituídos por gases comprimidos.

a) Gases liquefeitos .• :
'j. ..'.•••
Segundo a Chemical Specialities Manufactureis Association, um propelente deste tipo é um gás liquefeito
com pressão de vapor superior à pressão atmosférica, à temperatura de 40°C (cerca de 105°F). Os propelentes
devem, pois, ter uma tensão de vapor maior que l atm (= 14,7 psia), a 40°C.

C) Os tensioactivos empregaram-se na proporção de 0,1%, sendo os sistemas constituídos por propelente


l i e água.
1094

Entre os propelentes mais usados figuram os derivados clorados e/ou fluorados de hidrocarbonetos como o
metano, o etano e o butano. O seu emprego deve-se ao baixo ponto de ebulição e ao facto de, regra geral, não
serem irritantes nem tóxicos ou inflamáveis. Por outro lado, a pressão que originam no interior dos recipientes
é principalmente dependente da tensão de vapor de cada propelente e independente da sua quantidade. Nos
últimos anos o seu uso tem sofrido forte contestação, como é demais conhecido, começando a serem
substituídos por outros propelentes.
Pode dizer-se que a nomenclatura dos propelentes está normalizada por meio de números que indicam a
sua composição. Assim, cada propelente clorado e/ou fluorado é designado por um conjunto de 3 algarismos. O
primeiro algarismo da direita indica o número de átomos de flúor existentes na sua molécula; o segundo
algarismo refere o número de átomos de hidrogénio + /; o terceiro algarismo refere o número de átomos de
carbono — l (quando este terceiro algarismo é igual a zero, omite-se na nomenclatura).
Na Tabela CXXXV, indicamos a fórmula química, nomenclatura e principais
propriedades de vários propelentes correntemente utilizados. : , ,

Tabela CXXXV. Características de alguns propelentes


Ponto Pressão
de ebulição de vapor
(1 atmosfera) em Kp. cm'2
Nome químico Fórmula Numeração "C (20°C)
Triclorofl uormetano CC1,F 11 23,77 1,21
Diclorofluormetano CC12F2 12 — 29,77 5,93
Monoclorodifluormetano CHC1F2 22 — 40,8 9,60
Diclorotetrafluormeíano
(simétrico) CC1F2CC1F2 114 3,55 1,93
Diclorotetrafluormetano
(assimétrico) CC12FCF, 114 a 3,2 1,96
Monoclorodifluormetano CH3CC1F2 142 b — 9,4 2,99
Difluoretano CH,CHF2 152 a — 24 5,35
Octofluorciclobutano CF2CF2CF2CF2 C-318 — 6,1 2,78

É de notar que existem numerosas marcas registadas destes produtos, como Algo-frene, Arcton, Flugene,
Flurion, Freon, Genetron, Isotron, Ucon, etc. A discriminação dos produtos em causa faz-se indicando-se a
seguir ao nome de registo o número que internacionalmente especifica de que composto se trata. Assim fala-
se em A/gofrene 11, em Arcton 11, Freon 11, Ucon 11, etc., querendo-se mencionar sempre o triclorofuor-
metano, embora de fabricantes diferentes.
1095

Nem todos os propelentes apresentam o mesmo grau de toxicidade. De uma maneira geral e segundo
MARCEL MAESTKE, os propelentes 112, 113 e 21 são mais tóxicos do que o 11 e o 22 e estes mais do que o 12, 23,
114 e C-318. Este último grupo não apresenta qualquer perigo para a saúde, mesmo quando aspirados os seus
vapores em concentrações de 20% numa exposição de duas horas.
Os propelentes fluorados e clorados derivados dos hidrocarbonetos de baixo peso molecular são
especialmente estáveis, o que se deve à alta coesão molecular. Por seu turno, esta é dependente da forte fixação
dos átomos de flúor aos átomos de carbono do hidrocarboneto. Deste modo, a maioria destes compostos
suporta temperaturas até 125°C, mesmo em presença de ferro, cobre ou óleos. Alguns, como o propelente 22,
podem mesmo ser aquecidos a 150°C, sem decomposição. O material plástico, regra geral, não é atacado pêlos
propelentes deste tipo que também se não decompõem. Já, porém, a maioria das borrachas incha em contacto
com eles, sendo a borracha natural mais facilmente atacada. Os produtos sintéticos, corno o neopreno, são mais
resistentes. Observa-se, também, que a compatibilidade é tanto maior quanto mais elevado é o número de
átomos de flúor existentes na molécula do propelente.
Pelo que ficou dito se compreende que o C-318 seja dos propelentes mais estáveis até hoje obtidos, já que é
inteiramente fluorado (octofluorciclobutano).
Entre as alterações dos propelentes é de citar a sua possibilidade de reacção com a água, a qual leva à
hidrólise destes compostos com produção de ácidos corrosivos. De uma maneira geral, a hidrólise é lenta, mas
há propelentes mais facilmente decom-poníveis do que outros. O triclorofluormetano (Propelente 11) é muito
facilmente decomponível, pelo que se não utiliza para dispensar líquidos aquosos. Efectivamente, pode
hidrolisar-se com produção de ácido clorídrico.
Este propelente pode reagir com o álcool, formando-se aldeído acético, ácido clorídrico e cloreto de etilo
-/ !•- '
CCl-f + CM.-.OH ^ CH£HO + HC! + CHCIF ' ';iii"' " ' ''
CH,CHO + ,:C,H,OHf±CH,CH(OC,Hs), + H1O
C,H,OH + HC/ z± C,H,CJ + H,O '"
De uma maneira geral, quanto mais fluorado é o propelente menos hidrolisável se mostra. Os propelentes 318,
114 e 12 são considerados pouco decomponíveis, sendo de salientar a estabilidade do primeiro, que é
extremamente inerte.
Se a estabilidade aumenta normalmente com a substituição de átomos de cloro por flúor e com o número
total de átomos de flúor, observa-se que o poder dissolvente do composto varia em razão inversa. De um modo
geral, os propelentes contendo cloro e flúor apresentam melhores propriedades dissolventes do que os que só
contêm flúor.
A solubilidade depende, também, do peso molecular da substância a dissolver,
sendo mais solúveis os compostos apoiares com moléculas pequenas. Os propelentes 11,
142 h e 152 a são muito bons dissolventes, utilizando-se para dissolver fármacos como
a atropina, efedrina e tripelenamina. . . . . . .
1096

Na Tabela CXXXVI damos exemplos de diversos compostos com os quais o diclorodifluormetano


(Propelente 12) é miscível em todas as proporções.

Tabela CXXXVI. Líquidos miscíveis em todas as proporções com o diclorodifluormetano,


à temperatura ambiente
Hidrocarbonetos Derivados hatogenados
Benzeno Bromofórmio
p-Cimeno Clorofórmio
Heptano Tetracloreto de carbono
Ligroína óleos minerais Esteres

Tetrai dronaf taleno Acetato de amilo


Tolueno Acetato de etilo
Xileno Benzoato de benzilo
Ftalato de dietilo
Álcoois Lactato de etilo
Amílico Salicilato de metilo
Butílico
Etílico Éteres
Feniletílico Cellosolve
Metílico Dioxano
Propílico Éter etílico
Fenetol •-,
Cetonas
Acetona Outros compostos
Acetofenona Acido acético
Cicloexanona Acetonitrilo
Metiletilcetona Aldeído benzóico
Nitrobenzeno
Piridina
Sulfureto de carbono

A Tabela CXXXVII indica a solubilidade de alguns propelentes em água, à pressão de 760 mm de mercúrio.
Finalmente, na Tabela CXXXVIII menciona-se a solubilidade da água nos propelentes líquidos mais
utilizados.
Alguns propelentes utilizam-se em mistura, ficando a tensão de vapor da mistura compreendida entre os
valores das tensões individuais, à temperatura considerada e dependendo das proporções dos compostos.
Suponhamos, por exemplo, uma mistura em partes iguais de Propelentes 11 (P.M. = 137,4) e 12 (P.M. =
120,9). As suas tensões de vapor em kg. cm 2 são, respectivamente, de 0,90 e de 5,73 (temperatura de 20°C).
1097

Tabela CXXXVII. Coeficiente de solubilidade de alguns propelentes


em água {Pressão de 760 mm de 'Hg)
Temperatura g de propelente
Propelente °C em 100 g de água
CC13F 27 0,110
CC12F2 - • ,: 25 0,028
CHC1F2 25 0,300
C2C12F4 25 0,024

Atendendo a que a mistura contém 50% de um e 50% do outro, virá, em relação aos pesos moleculares:
50 50 • ,
Propelente 11:———— = 0,364; Porplente 12: ———— = 0,413
137,4 120,9
logo:
0,364
- = 0,468 (fracção molar do Propelente 11)
0,364 + 0,413
e
0,413
0,413 + 0,364 A tensão de vapor da referida mistura é dada por:

0,468 x 0,90 + 0,532 x 5,37 = 3,49 kg. cm"2

Tabela CXXXVIII. Solubilidade da água em propelentes líquidos (peso %, a 21 °C)


- = 0,532 (fracção molar do Propelente 12).

Triclorofluormetano 0,009
Diclorodifluormetano •' 0,0076
Monoclorodifluormetano 0,114
Dic lorotetrafluormetano 0,007
Diclorotetrafluormetano (assimétrico) 0,006
Monoclorodifl uoretano 0,054
~* Difluoretano 0,17
Octofluorciclobutano < 0,01 (')

C) Determinada a 30°C.
1098

pois no caso de soluções ideais a pressão de vapor total da mistura é igual à soma das fracções molares de cada
componente multiplicadas pela pressão de vapor do respectivo componente puro, à mesma temperatura.
A Fig. 378 representa o diagrama das tensões de vapor de várias misturas de Propelentes 11 e 12. Por
ele se pode verificar que, a 20°C, a mistura de 50%

Pressão absoluta (kg. cm- ;!)

Temperatura (°C) Fig. 378. Diagrama das tensões de vapor de misturas de


Propelentes 11 e 12
'••' 1 — Propelente 12 puro •"•
2 — 80% de Propelente 12 + 20% de Propelente 11
3 — 60% » » 12 + 40% » » 11 '•'
'.' - 4— Mistura de 50% de cada um dos propelentes , ... • .
5 — 40% de Propelente 12 + 60% de Propelente 11
6 — 20% » » 12 + 80% 11 '"•'
7 — 10% » » 12 + 90% 11
8 — Propelente 11 puro
(—} — Pressão atmosférica
1099

de Propelente 11 com 50% de Propelente 12 origina uma pressão aproximada de 3,5 kg. cm"2.
Entre os gases liquefeitos poderiam ainda considerar-se hidrocarbonetos puros, como o butano, o propano e o
isobutano. Se a sua toxicidade é desprezável, o seu mau aroma e a sua inflamabilidade levam, porém, a recusá-los
para fins farmacêuticos. KANIC fala, contudo, da possibilidade de utilização de misturas de hidrocarbonetos com
derivados fluorados. Entre eles mostra-se promissora a associação de Propelente 318 com o isobutano, a qual não
é atacada em meio aquoso ácido ou alcalino.
Com o fim de estabilizar o Propelente 11 foi também patenteada a sua associação com o nitrometano (Freon 11
S), que se mostra mais resistente à hidrólise catalítica pêlos metais (Fe, Cu) e que apresenta menos possibilidades
de reagir com o etanol.

b) Gases comprimidos -•. "

Como já atrás ficou dito, utilizam-se, como gases comprimidos, o azoto, o protóxido de azoto e o anidrido
carbónico.
A pressão desenvolvida pêlos gases comprimidos depende, em larga medida, da temperatura e da
quantidade de gás presente. Efectivamente, segundo a equação dos gases perfeitos será:

PV = nRT :

em que P é a pressão (em atmosfera), V o volume em litro, n o número de moléculas do gás (g/P.M), R a
constante dos gases (0,08205 litro. atm. grau"1. mole~') e T a temperatura absoluta (273 + t°C).
Em razão do que dissemos, compreende-se que a pressão do propelente diminua à medida que o aerossole
vai sendo dispensado. Isto não se verifica com os gases liquefeitos em que a pressão se mantém.
O azoto é utilizado em diversos aerossoles tanto para dispersão de sólidos como de líquidos. Pouco solúvel,
é compatível com a maioria dos compostos.
O protóxido de azoto é estável em presença dos oxidantes e da humidade. Usa-se muitas vezes associado ao
anidrido carbónico. Este último é relativamente inerte, mas a sua dissolução em água origina uma diminuição
do pH a qual pode não ser desejável. Tem-se utilizado em vários xaropes com que seja compatível (ácidos).
1100

Empregado, de preferência, para a produção em pequena escala, a ele se pode recorrer quando se
pretendem emulsionar óleos pouco viscosos ou essências. As proporções relativas de goma arábica, água e
essência são de 1:2:2 ou 1:2:3, observando-se, portanto, um incremento da quantidade de emulgente em
relação à anteriormente estipulada, em virtude da fraca viscosidade apresentada pêlos óleos essenciais.
Para preparar a emulsão agitam-se, energicamente, num frasco seco, l parte de goma arábica com 2 a 3
partes da essência e logo que a goma esteja perfeitamente misturada adicionam-se duas partes de água,
continuando a agitação até completa emulsificação. Na prática observa-se que a agitação a intervalos
irregulares é mais eficaz do que a agitação rítmica e contínua. Preparada a emulsão primária, ajunta-se a água
restante, a pouco e pouco, agitando, ainda, até homogeneização.
Quando o emulgente é um sabão ou um material saponoso hidrossolúvel pode recorrer-se à simples
agitação da sua solução aquosa com o óleo contido no frasco.
Estes processos que descrevemos para preparar emulsões de fase externa aquosa e que concretizámos com
a goma arábica como emulgente, são processos gerais que, com variantes adequadas a cada caso específico, se
empregam para a preparação das emulsões destinadas ao uso oral. Entretanto, pode dizer-se que a preparação
das restantes emulsões decorre em moldes muito semelhantes a estes. Sob a rubrica Formulário daremos
exemplos de diversas preparações que poderemos considerar típicas na tecnologia das emulsões.

9.1.8. VERIFICAÇÃO DAS EMULSÕES


O controlo das emulsões visa, especialmente, a apreciação do seu teor em água e gordura total, a
determinação do pH e da viscosidade, a avaliação da estabilidade e a medição dos diâmetros das partículas
dispersas. Para cada fórmula, especialmente, também tem interesse a identificação e a dosagem dos princípios
activos presentes.
No que diz respeito ao controlo da forma farmacêutica, único que pretendemos estudar, observamos que as
determinações que se efectuam são de âmbito geral em outros preparados galénicos, ou foram tratados a
propósito da Emulsificação. Na presente rubrica não pretendemos, portanto, mais do que enunciar problemas
cuja resolução é acessível a quem nos tenha acompanhado no decorrer das páginas deste livro.
a) Determinação do teor em água — Para realizar este objectivo pode o prático
recorrer aos diversos métodos indicados para outras formas farmacêuticas, designada
mente ao processo de KARL-FISCHER, que se poderá aplicar sempre que a emulsão não
contenha compostos reactivos com a solução titulante. Nestas circunstâncias, não se
deve empregar o citado processo sempre que na emulsão existem ácidos insaturados,
compostos redutores e outras substâncias que reajam com o iodo. . .,
1101

Uma vez que o problema do planeamento e fabricação das válvulas transcende o domínio farmacêutico, não
pormenorizaremos a sua descrição. Para o estudioso que pretenda conhecer mais profundamente a sua
estrutura, aconselhamos a leitura da obra clássica de HERZKA e PICKTHALL — Pressurized Packaging (Aerosols) e a
de um artigo de TROADEC — Lês «volves» aérosols. Igualmente recomendamos a leitura de um interessante artigo
da autoria de DAVID J. HOWLETT publicado na Pharmaceutical Manufacturing International de 1990.

Fig. 380. Válvulas doseadoras


I — Para gases liquefeitos
II — Para gases comprimidos
1—obturador; 2—juntas; 3 — cápsula para fecho hermético; 4—mola; 5 —
câmara de dosagem; 6 — tubo mergulhador

9.2.1.3.4.3. Enchimento dos recipientes


O enchimento dos recipientes é uma das operações fundamentais da preparação dos aerossoles.
Do mesmo modo que veremos para os produtos injectáveis, esta operação
1102

apresenta as suas dificuldades e, por isso, tal como para aqueles, a consideraremos em capítulo
separado.
Naturalmente que o enchimento dos recipientes de aerossoles apresenta dois pontos fundamentais:
acondicionamento das substâncias activas e adição dos propelentes.
Se o enchimento do recipiente com os princípios medicamentosos (soluções, suspensões, emulsões
e pós) é uma operação que não oferece qualquer dificuldade, já, pelo contrário, a adição dos
propelentes carece de equipamento especializado e processa-se segundo uma técnica delicada.
Os produtos activos da fórmula, como soluções, pós, suspensões e emulsões, são simplesmente
lançados nos recipientes abertos e a sua quantidade pode ser avaliada por pesagem. A adição dos
propelentes baseia-se, fundamentalmente, na sua facilidade de liquefacção, quer por diminuição da
temperatura até um valor inferior ao seu ponto de ebulição, quer por aumento de pressão para um
valor superior ao da sua tensão de vapor. Em qualquer dos casos o propelente ficará liquefeito. São,
portanto, dois os métodos para enchimento dos recipientes com os propelentes:

a) a frio; ,
b) por compressão.

a) Enchimento a frio — Neste processo o propelente arrefecido é lançado no recipiente onde já


se encontram os produtos medicamentosos na forma adequada. Logo

Rg. 361. Esquema representativo do processo de


enchimento a frio
1 —suporte da garrafa de propelente; 2 — válvulas; 3
— redutor de pressão; 4 — recipiente contendo neve
1103

após a junção do propelente a embalagem do aerossole é fechada, adaptando-se-lhe a válvula


respectiva. Em seguida, o recipiente é mergulhado em água, aquecida a cerca de 60°C, operação que
se destina a verificar qualquer eventual fuga de gás propulsor.
Este método é bastante simples e rápido, mas habitualmente não se emprega quando os
medicamentos se encontram em meio aquoso, já que se opera a congelação da água à temperatura a
que se efectua o enchimento. Efectivamente, as manipulações necessárias processam-se a cerca de —
40"C.
Na Fig. 381 representamos, de modo esquemático, o enchimento pelo processo descrito.
b) Enchimento por compressão — Uma vez que este processo
não sofre limitações como o anterior, podendo ser utilizado para
todos os tipos de aerossoles, é sem dúvida o que maior difusão tem
tido.
Fundamentalmente, baseia-se na intro
dução do propelente sob pressão no reci
piente, que já contém os princípios medica
mentosos e se encontra provido da respec
tiva válvula. É importante a remoção do ar,
antes da junção do propelente, o que se
executa por aspiração com máquinas de
vazio. Este problema não surgia no proces
so anterior visto que o ar era expulso pela
volatilização de parte do propelente, já que
se operava em recipiente aberto. O enchi
mento industrial é habitualmente feito pelo
método de compressão (Fig. 382). As ca
deias de montagem são diferentes de fabri
cante para fabricante, podendo, contudo,
apontar-se dois tipos básicos de enchi
mento: rotativo e em tinha. A Fig. 383 mos
tra os dois tipos de maquinaria referidos.
Quando o propelente é um gás compri
mido solúvel na preparação, é conveniente
proceder-se à agitação do recipiente durante
Fig. 382. Enchimento por compressão o enchimento, de modo a
proporcionar a
1 — buretae de pressão (Pyrex); 2 — resguardo saturação do líquido medicamentoso. Algu-
pr^r<So cTU^éïtr mas máquinas usadas na indústria são pró-
dos; 5 — plataforma para o recipiente vidas de sistemas de agitação adequados.
1104

A obtenção de aerossoles estéreis pode ser conseguida empregando recipientes e válvulas


esterilizadas pelo óxido de etileno. Os propelentes esterilizam-se por filtração, por exemplo por filtro
SEITZ. O enchimento é asséptico, sendo aconselhável trabalhar-se em ambiente de ar condicionado, cuja
pressão no interior do compartimento seja ligeiramente superior à pressão externa.
Na Fig. 384 mostram-se algumas embalagens de aerossoles.

Fig. 383. Enchimento por compressão


1 — enchimento rotativo (The Kartridg-Pak Corp);
2 — enchimento em linha (Armstrong)
1105

Fig. 384. Embalagens de aerosscles


1106

9.2.1.3.5. Ensaio dos Aerossoles .,,,.., ;!e ,


Os ensaios a executar sobre os aerossoles são bastante complexos. Efectivamente, uma tal
preparação, acondicionada num recipiente provido de válvula adequada e impulsionada pelo
propelente, deve apresentar características bem determinadas. Entre elas avulta o tipo de aerossole
obtido, o diâmetro médio das partículas dispersas e a velocidade de descarga. Por meio destes
elementos pode avaliar-se a estabilidade do aerossole e a sua eficácia no que diz respeito à
administração. Além destes ensaios interessa ainda considerar os referentes ao propelente (tensão de
vapor, temperatura de congelação, inflamabilidade, toxicidade, solubilidade, etc.). Vê-se, pois, que é
enorme a variedade de verificações a executar durante e após uma produção de aerossoles
medicamentosos em larga escala. Tal complexidade de métodos sai fora do âmbito deste livro.
Entretanto, daremos, sumariamente, uma relação dos ensaios mais frequentemente efectuados com a
finalidade de verificar a qualidade de um aerossole.
a) Aspecto dos aerossoles — Para os aerossoles que são dispensados sob a forma de
pulverizações ou de atomizações constituídas por partículas sólidas ou líquidas num gás, interessa
apreciar o aspecto da dispersão. Se bem que sejam numerosos os processos existentes, pode dizer-se
que consistem, fundamentalmente, em produzir o aerossole, durante um tempo determinada,
recebendo-o num alvo colocado a uma distância estabelecida. As técnicas de ROOT e as de DIXON
são ainda as mais utilizadas, se bem que os resultados obtidos não apresentem o grau de
reprodutibilidade desejado.
Em trabalho recentemente publicado MISZUK et aí. descreve novo instrumento destinado a
apreciar o aspecto dos aerossoles.
b) Velocidade de descarga — Como se compreende, da velocidade de descarga de um recipiente
de aerossoles dependerá o seu período de utilização. A velocidade de descarga é habitualmente
expressa em gramas por segundo. Claramente que para aerossoles medicinais é do maior interesse
determinar qual a quantidade dispensada após cada compressão da válvula, isto é, qual a dose
unitária de aerossole. Nos métodos propostos a avaliação é feita por pesagem do recipiente antes e
depois da libertação do aerossole. As válvulas são comprimidas durante l a 5 segundos, avaliando-se
a variação de peso correspondente à saída do aerossole durante esse período.
c) Viscosidade — Como já foi acentuado atrás, as características do aerossole dependem, em
grande parte, da viscosidade dos líquidos a dispersar. Na pág. 1090 indicámos mesmo que, a partir
de certa viscosidade, a dispersão é insuficiente. É evidente, contudo, que a alta viscosidade dos
líquidos que se pretendem dispersar sob a forma de aerossole pode ser contrabalançada com a
escolha de propelentes mais poderosos ou de válvulas adequadas. Por outro lado, a viscosidade do
líquido a dispersar terá de se considerar especialmente em relação às peças mais estreitas do
recipiente, já
1107

que é aí que a sua circulação mais deficiente se tomará (tubo de saída, canalículos, válvulas, etc.).
d) Diâmetro das partículas — São variados os processos a que se recorre para determinar o
diâmetro médio das partículas constituintes de um aerossole porquanto este pode ser originado por
um pó, por suspensões e por emulsões. Entre os métodos mais utilizados, figuram os que
seguidamente expomos.

Microscopia
Emprega-se o microscópio óptico ou variantes em que se melhore o seu poder de resolução (luz
ultravioleta ou monocromática do sódio), o ultramicroscópio e o microscópio electrónico que permite
avaliar partículas até 0,001 ji.
Todos estes processos têm o inconveniente de serem fastidiosos, requerendo que se analise grande
número de partículas para que os resultados possam ser estatisticamente significativos.

Sedimentação ' • ' ' " • •


A aplicação da lei de STOKES permite calcular o diâmetro das partículas dispersas mediante o
conhecimento da sua velocidade de queda. Baseados neste conceito há diversos processos indirectos
de cálculo, como o da balança de ODEN, o da pipetagem, o da centrifugação, etc. Os princípios em
que se fundamenta o seu emprego são os que indicámos anteriormente a propósito dos pós e das
suspensões.

Precipitação electrostática '


Estes processos baseiam-se na avaliação da carga das partículas, a qual está directamente
relacionada com o seu tamanho.
Assim, por exemplo, aerossoles de ácido esteárico foram carregados com correntes de 40, 80 e
120 microamperes, tendo-se determinado o número de cargas eléctricas por partícula, em cada caso.
Puderam construir-se gráficos relacionando o número de cargas por partícula (ordenadas) com o
respectivo raio, em micra (abcissas).

Método fotométrico
Se fizermos incidir sobre um aerossole um facho de luz de intensidade bem determinada, verifica-
se que a luz transmitida, é, entre outras variáveis, dependente do tamanho das partículas dispersas.
Neste princípio se fundamentam alguns dos processos de determinação do diâmetro de partículas,
que KANIG, na revisão de conjunto já assinalada, descreve em pormenor.
1108

Tem imenso interesse verificar a variação do tamanho das partículas dispersas durante a
armazenagem de um aerossole por um período prolongado. Efectivamente, observa-se, em muitos casos,
um aumento de diâmetro como se tivesse havido verdadeiro crescimento das partículas. IRVINO PORUSH e
colaboradores, num interessante artigo, chamam a atenção para o facto mencionado.

9.2.1.3.6. Formulário dos aerossoles \


Sob esta rubrica procuraremos dar uma ideia dos principais tipos de aerossoles medicamentosos,
indicando a sua composição e métodos de preparação. Por comodidade de exposição, estudaremos,
sucessivamente, os aerossoles para aplicação cutânea, nasal e traqueopulmonar. Aos restantes aerossoles,
que se administram por vias diferentes das mencionadas, faremos também uma breve referência.
Aerossoles para aplicação cutânea — Já atrás mencionámos as inúmeras aplicações de fármacos
que se administram na pele, sob esta forma galénica. A acção pretendida é predominantemente tópica,
podendo falar-se em aerossoles protectores, anestésicos locais, anti-inflamatórios, anti-sépticos, etc.
Assim, são utilizadas soluções, suspensões, pós e pomadas que se dispersam em aerossoles, sob a forma
de atomização ou de espuma.
Num aerossole constituído por duas fases teremos de considerar o uso dos cossol-ventes a que se
recorre na maioria das vezes. O álcool não é aconselhável para aerossoles destinados a serem aplicados
sobre grandes áreas de pele irritada ou queimada. De preferência, é substituído por glicerina e por outros
glicóis (propilenoglicol, polietileno-glicóis, etc.), por óleos vegetais, por vaselina líquida, etc., que se
mostram menos irritantes.
As fórmulas podem ser obtidas a partir das formulações básicas seguintes:

Fármacos ........................................................ 10 g
Propelente 12/11 (50:50).................... q.b.p. 100»
ou
Fármacos ........................................................ 1-5 g 5
Cossolventes ..................................................10 »
Propelentes 12/11 (50:50) ..................q.b.p. 100 »

Tanto o tipo dos propelentes como a sua quantidade podem variar de fórmula para fórmula, mas é
sempre necessário empregá-los numa proporção muito superior à dos restantes constituintes da
preparação.
1109

Como exemplo de um pó disperso em aerossole, citamos a seguinte fórmula contendo


antibióticos:
Sulfato de neomicina.................................... 0,75 g '"•'-•
Sulfato de polimixina B.............................. 150000 U.I. •'••,''•*
Bacitracina-zinco............................................ 37,50
Propelente 114 a .......................................... 83,50 g
Os pós empregam-se micronizados, apresentando as suas partículas um diâmetro médio de 60 \i.
A pressão interna no recipiente é inferior a 3,14 kp. cm'2, a 20°C.
Um outro exemplo de aerossole para uso cutâneo é dado pela fórmula que transcrevemos
seguidamente, a qual é dotada de propriedades anti-sépticas, refrescantes e lubrificantes: ^
Diclorofeno .................................................... 0,04 g
Hexaclorofeno................................................ 0,02» ,f , , , ;
Dipropilenoglicol .......................................... 0,50 » >: ( tVo- •;
Meristato de isopropilo ................................ 0,50 »
Mentol............................................................ 0,04 »
Talco micronizado ........................................ 10,00 »
v Propelente 12/11 (50:50).............................. 88,90»
O diclorofeno e o hexaclorofeno são anti-sépticos ('): o mentol é refrescante e o talco anti-
adesivo. O cossolvente é o propilenoglicol. O meristato de isopropilo utiliza-se como dispersante do
talco, já que esta fórmula é uma verdadeira suspensão daquele silicato.
Como aerossoles que, após aplicação, dão origem à formação de uma película plástica e
adesiva, facilmente removível com água quente, mas não com água fria, mencionamos as seguintes
fórmulas:
Polivinilpirrolidona (PVP) ............ 2 g 2 g 2 g '
Acetato de polivinilo .................... 3 » 3 » 3 » "<
Polietilenoglicol 600 (PEG 600).. 0,5 » 0,2 » 0,5 »
Etanol absoluto .............................. 24,5 » 24,8 » 24,5 »
Propelente 114 a............................ 49,0 » 49,0 » 23,0 »
Propelente 142 b............................ 21,0 » 21,0 » 35,0 »

(') O diclorofeno (G-4) é quimicamente o 2,2'-metileno-bis-(4-clorofenol); o


hexaclorofeno (G-ll) é o 2,2'-metileno-bis-(3,4,6-triclorofenol).
1110

Em fórmulas deste tipo a polivinilpirrolidona e o acetato de polivinilo são os polímeros que


originam a película protectora. O etanol e o PEG são os cossolventes. A solução obtida é atomizada
pêlos gases liquefeitos propulsores. Após aplicação, estes vaporizam-se, assim como o álcool. Com estes
excipientes obtêm-se várias preparações protectoras da pele, as quais contêm antibióticos, anti-sépticos,
etc.
Os sistemas de 3 fases são particularmente utilizados na obtenção de verdadeiras pomadas, que são
administradas em aerossoles sob a forma de espuma. Trata-se, portanto, de autênticas emulsifïcações
entre os constituintes activos e os propelentes.
A aplicação da pomada sob a forma de aerossole oferece várias vantagens, das quais salientamos
a facilidade de cobrir grandes áreas do corpo sem se provocar o habitual traumatismo inerente ao
acto de espalhar um sólido sobre a pele. O tamanho das partículas dispersas na superfície cutânea
condiciona, como nos casos anteriores, o grau de penetrabilidade do medicamento.
Têm-se proposto vários excipientes para este tipo de aerossoles, de entre os quais destacamos o
seguinte:
:i
I Ácido merístico ............................................ 1,33 g • •"'•'/
Ácido esteárico.............................................. 5,33 » •:•":•.<•».«r:'u.
Álcool cetílico .............................................. 0,50 » _i
Lanolina.......................................................... 0,20 »
Meristato de isopropilo ................................ 1,33 »
: •••••.•.!>".)
.. .^ , ... .,,.
II Trietanolamina .............................................. 3,34 g
Glicerina ........................................................ 4,70 »
Polivinilpirrolidona........................................ 0,34 »
Água destilada .............................................. 8,93 »
Os componentes de / são misturados e homogeneizados por fusão; os componentes de // dissolvem-se
na água. Prepara-se então a emulsão resultante da mistura de I e II, operando por aquecimento, a
80°C, das duas fases, juntando a segunda à primeira e agitando sempre até arrefecimento. Preparada
a emulsão, que é do tipo O/A, pode incorporar-se nela o fármaco desejado (por exemplo, um
antibiótico hidrossolúvel), acondicionando-se no recipiente onde se juntarão os propelentes.
Como atrás acentuámos, a quantidade de propelentes em relação ao total é muito menor que quando
se pretende um spray. A presente base de pomadas será perfeitamente dispersível sob a forma de
espuma, utilizando-se as seguintes proporções:
Excipiente de pomada + fármaco .............. 92 g
Propelente 12 ................................................ 3,2» „, :;1;>
Propelente 114 a .......................................... 4,8 » .;i n..;, , n,
1111

Como se vê, este sistema de aerossole trifásico apresenta uma reduzida quantidade de propelente
(8%), em oposição ao que acontecia com os aerossoles bifásicos (80-90%). Esta fórmula origina
espuma estável.
Ainda neste tipo de aerossoles trifásicos têm-se proposto várias fórmulas de uso geral.
Transcrevemos uma base que origina espuma que se destrói rapidamente:
. Etanol ............................................................ 46-66 g .*.,.•
Tensioactivo .................................................. 0,5-5 » ; ,,
Água .............................................................. 28-42 »
Propelente ...................................................... 3-15 g .
Trata-se, pois, de uma base com características muito diferentes da anterior.
Enquanto que, agora, a espuma do aerossole desaparece quase após a aplicação, nos
aerossoles que tínhamos precedentemente citado a espuma permanece durante algum
tempo. Naturalmente que a estabilidade da espuma é desejável quando se pretende, por
exemplo, preparar um sabão de barba. Pelo contrário, é preferível um aerossole cuja
espuma desapareça rapidamente, sempre que a sua administração se processe numa zona
ulcerada ou queimada da pele. ,., .,-,-,,• : •

Aerossoles para uso nasal


Citaremos apenas um exemplo de um descongestionante nasal, utilizado sob a forma de
aerossole:
Timol..........................................'.................... "0,1 g
Mentol............................................................ 0,5 »
Cânfora .......................................................... 0,5 »
Eucaliptol ...................................................... 0,15 »
Trietilenoglicol .............................................. 1,25 »
Propilenoglicol .............................................. 2,50 »
Propelente 12/11 (50:50).............................. 95 » '""

Além dos fármacos (timol, eucaliptol, cânfora e mentol) há a assinalar a presença de 2


cossolventes (trietilenoglicol e propilenoglicol). Trata-se, como é evidente, de um sistema de 2 fases,
em que o aerossole é disperso sob a forma de atomização.

Aerossoles para inalação •«*


Como deixámos dito no capítulo relativo à administração traqueopulmonar, ^a eficácia de um
aerossole destinado a aplicação por esta via, depende, em larga medida, das dimensões das
partículas obtidas por dispersão. Também, pelo que se disse, se
1112

verifica que este tipo de aerossole é constituído por sistemas de duas fases em que se dispersam pós
micronizados ou líquidos.
A pressão interna do recipiente afecta de modo notável o diâmetro das partículas obtidas, sendo
estas tanto menores quanto mais elevada é a pressão interior. PORUSH e colaboradores, no artigo a
que já fizemos referência, citam as variações de diâmetro de partículas de isoproterenol, consoante a
pressão interna é de 45 ou de 80 psig. Na Tabela CXXXIX indica-se a citada variação

Tabela CXXXIX. Efeitos da pressão interna no diâmetro das partículas dispersas


Pressão Diâmetro médio Percent. de partículas com diâmetro:
(psig) M <5u < 7 \í < 10 u.
80 1,9 99,6 100,0 100,0
45 3,9 69,0 89,0 98,6

Indicamos, seguidamente, algumas fórmulas de aerossoles destinados a inalação.

Adrenalina ...................................................... 0,25 g , ...


Ácido clorídrico 3N...................................... 0,50 » , ., ..,
:
Ácido ascórbico ............................................ 1,15 » .'. •.,-.. .:..;,-,
Água .............................................................. l » ,'.!•'•!•!!•!
ii>u
Etanol absoluto.............................................. 33,10 » ;uiaÍA
Propelente 12 ................................................ 25,00 »
Propelente 114 .............................................. 40,00 »

Nesta fórmula, o fármaco presente é a adrenalina que se utiliza como antiasmático. O ácido
clorídrico é empregado para dissolver a adrenalina sob a forma de cloridrato. A fim de impedir a
transformação do fármaco em adrenocromo, por oxidação, junta-se o ácido ascórbico que
desempenha a função de redutor. Os dissolventes são a água e o álcool.
Uma fórmula utilizada como dilatador das coronárias é a que passamos a trans
crever: ' .: ,-:•: :,ur,.' i ,,.. , , ., . , 1 .., .

Nitrito de octilo ............................................ lg ; . .-


Propelente 12/114.......................................... 99» ,.

Trata-se, como é evidente, de um sistema bifásico dos mais simples.


1113

Outros ripas de aerossoles ••"•<••-<


Entre as várias aplicações dos aerossoles, lembramos o seu uso para administração gastro-
intestinal. Geralmente, o jacto do aerossole é recebido numa colher-medida, cujo conteúdo se ingere.
Como exemplo citamos uma fórmula polivitamínica, acondicionada em recipiente contendo, como
propelente, um gás comprimido.
Vitamina B, .......................................................... l mg
Vitamina B2 (sob a forma de fostato sódico) .. l »
....,__. Vitamina PP .......................................................... 50 »
Pantenol.................................................................. l »
Vitamina B6 .......................................................... 2,5 »
Vitamina C ............................................................ 40 »
Vitamina B12 ........................................................ l mcg
Água destilada ............................................ q.b.p. 100 g
Prepara-se a solução das vitaminas na água, acondicionando-se num recipiente adequado em
que se introduz azoto, de modo que a pressão interna seja de 90 psig. Se à fórmula pretendêssemos
adicionar vitaminas hidro-insolúveis, como a A ou a D2, prepararíamos previamente uma dispersão
destes compostos na água, recorrendo a agentes emulsivos como o polissorbato 80. Na prática, para
uma adição à fórmula citada de 5000 U.I. de vitamina A e de 1000 U.I. de vitamina D2, seria
suficiente uma quantidade de 10 g de polissorbato 80.
Algumas vezes utilizam-se aerossoles anestésicos da mucosa oral, associados a adstringentes
(como sais de zinco) e a anti-sépticos (clorobutanol, sais de amónio quaternário, etc.). Como
fármacos anestésicos é habitual empregarem-se a benzocaína e a tetracaína.

BIBLIOGRAFIA

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1115
1116

índice
1117
1118
1119

I Parte
TÉCNICA FARMACÊUTICA

L— INTRODUÇÃO.......................................................................................................................................................... 17
2. —OPERAÇÕES FARMACÊUTICAS DE USO GERAL ........................................................................................ 21
2.1. — Pesagem.......................................................................................................................................................... 21
2.1.1. — Balanças de precisão .......................................................................................................................... 21
2.1.2.— Pesos .................................................................................................................................................... 22
2.2. — Medição de volumes de líquidos ................................................................................................................ 22
2.2.1. — Instrumentos utilizados ..................................................................................................................... 22
2.2.2. — Conta-gotas normal ............................................................................................................................ 23
2.2.3. — Correspondência entre peso e volume ............................................................................................ 26
2.2.4. — Medição de doses de medicamentos................................................................................................ 28

3.—OPERAÇÕES FARMACÊUTICAS PROPRIAMENTE DITAS .......................................................................... 31


4. —OPERAÇÕES MECÂNICAS DE SEPARAÇÃO .................................................................................................. 33
4.1. — Separação de corpos sólidos ...................................................................................................................... 33
4.1.1. — Triagem ou monda ............................................................................................................................ 33
4.1.1.1. —À mão .................................................................................................................................... 33
4.1.1.2.—Por crivo ................................................................................................................................ 34
4.1.1.3. — Por ventilação ........................................................................................................................ 34
4.1.1.4.—Por lavagem .......................................................................................................................... 34
4.1.2. — Tamisaçào ............................................................................................................................................ 35
4.1.2.1. — Tamises .................................................................................................................................. 36
4.1.2.2. — Classificação dos tamises .................................................................................................... 36
4.1.2.3.—Técnica da tamisação .......................................................................................................... 39
4.1.3. — Levigação ............................................................................................................................................ 40
4.2. — Separação de sólidos de líquidos ou de líquidos imiscíveis .................................................................. 42
4.2.1. — Decantação .......................................................................................................................................... 42
4.2.1.1. — Por escoamento .................................................................................................................... .42
4.2.1.2. — Por pipeta ................................................................................................................. 43
4.2.1.3. — Por sifões .................................................................................................................... 43
4.2.1.4. — Por vasos florentinos ........................................................................................................... 45
4.2.1.5. — Por funis ou ampolas de decantação ....................................................................... ....... 46
4.2.2. — Expressão ............................................................................................................................................ 46
4.2.2.1. — Expressão manual ................................................................................................................ 47
1120

4.2.2.2. — Expressão mecânica................................................................................................. ........... 48


4.2.2.2.1. — Prensas de parafuso ............................................................................................ 48
4.2.2.2.2. — Prensas hidráulicas .............................................................................................. 50
4.2.2.3. — Pratica da expressão ............................................................................................................ 5 1
4.2.3. — Centrifugação ...................................................................................................................................... 52
4.2.3.1. — Tipos de centrífugas ............................................................................................................ 52
4.2.3.2. — Cálculo da força centrífuga desenvolvida por uma centrifugadora .............................. 56
4.2.3.3. — Pressão centrífuga ................................................................................................................ 58
4.2.3.4. — Indicadores de velocidade .................................................................................................. 60
4.2.3.5. — Prática da centrifugação ...................................................................................................... 62
4.2.4. — Filtração .............................................................................................................................................. 64
4.2.4.1. — Generalidades ........................................................................................................................ 64
4.2.4.2. —Teoria da filtração ................................................................................................................ 66
4.2.4.3. — Materiais filtrantes ................................................................................................................ 70
4.2.4.3.1. — Papel ....................................................................................................................... 70
4.2.4.3.2. — Polpa de papel .................................................................................................... 71
4.2.4.3.3. —Tecidos.................................................................................................................. 71
4.2.4.3.4. — Materiais fibrosos ................................................................................................ 72
4.2.4.3.5. — Meios filtrantes rígidos ........................................................................................ 73
4.2.4.3.5.1. — Alumina ............................................................................................ 73
4.2.4.3.5.2. — Carvão ................................................................................................ 74
4.2.4.3.5.3. — Septos metálicos .............................................................................. 74
4.2.4.3.5.4. — Materiais orgânicos .......................................................................... 75
4.2.4.3.5.5. — Sílica .................................................................................................. 76
4.2.4.3.5.6. — Caulino e porcelana ........................................................................ 76
4.2.4.3.5.7. — Vidro poroso .................................................................................... 77
4.2.4.3.5.8. — Placas e discos filtrantes ................................................................ 79
4.2.4.4. — Adjuvantes de filtração ........................................................................................................ 81
4.2.4.5. — Técnicas de filtração ............................................................................................................ 84
4.2.4.5.1. — Filtração por gravidade ...................................................................................... 85
4.2.4.5.1.1. — Filtração a quente ............................................................................ 87
4.2.4.5.1.2. — Filtração a frio .................................................................................. 89
4.2.4.5.1.3. — Filtração de líquidos voláteis .......................................................... 89
4.2.4.5.1.4. — Filtros de lã ou algodão.................................................................. 89
4.2.4.5.1 .5. — Filtração contínua .................................................................... 90
4.2.4.5.2. — Filtração por sucção ............................................................................................ 90
4.2.4.5.3. — Filtração sob pressão ......................................................................... 95
4.2.4.6. — Ultra-filtração ........................................................................................................................ 99
4.2.4.7. — Métodos para avaliar o grau de clarificação dos líquidos ............................................ 101
4.2.5. — Clarificação.......................................................................................................................................... 102
4.2.5.1. — Métodos de clarificação ...................................................................................................... 102
4.2.5.1.1. — Por acção do calor .............................................................................................. 102
4.2.5.1.2. — Por acção do calor após a adição de substâncias proteicas .......................... 103
4.2.5.1.3. — Pela gelatina.......................................................................................................... 104
4.2.5.1.4. — Por coagulantes sintéticos .................................................................................. 104
4.2.5.1.5. — Pelo leite .............................................................................................................. 104
4.2.5.1.6. — Por polpa de papel e outras substâncias.......................................................... 104
4.2.5.1.7. —Por fermentação.................................................................................................... 105
4.2.5.1.8. — Por sedimentação .................................................................................................. 105
1121

Pag.
5. — OPERAÇÕES MECÂNICAS DE DIVISÃO .......................................................................................................... 107
5.1. — Divisão de sólidos ........................................................................................................................................ 107
5.1.L —Generalidades ...................................................................................................................................... 107
5.1.2. — Divisão grosseira ................................................................................................................................ ]09
5.1.2.1. —Por secção.............................................................................................................................. 109
5.1.2.2. — Por contusão .......................................................................................................................... 110
5.1.2.3. — Por rasuração ..................................................................:..................................................... 111
5.1.2.4. — Por granulação ...................................................................................................................... 111
5.1.2.5.—Por extinção .......................................................................................................................... 112
5.1.3. — Pulverização ........................................................................................................................................ 112
5.1.3.1. — Operações preliminares ...........................—.—...................................................................... 113
5.1.3.1.1. — Triagem ou monda .............................................................................................. 113
5.1.3.1.2.— Divisão grosseira .................................................................................................. 113
5.1.3.1.3. — Secagem ................................................................................................................ 113
5.1.3.1.4.—Amolecimento ...................................................................................................... 114
5.1.3.1.5. — Estabilização .......................................................................................................... 115
5.1.3.1.6.— Métodos de estabilização .................................................................................... 118
5.1.3.1.6.1.—Destruição dos enzimas pelo álcool à ebulição .......................... 118
5.1.3.1.6.2.—Destruição dos enzimas pelo calor húmido .................................. 120
5.1.3.1.6.3.— Outros métodos ................................................................................ 122
,. - 5.1.3.2. — Operação principal ou pulverização propriamente dita....................................................
123
5.1.3.2.1.— Pulverização em almofariz .................................................................................. 123
5.1.3.2.1.1. —Por contusão...................................................................................... 124
5.1.3.2.1.2. —Por trituração .................................................................................... 125
5.1.3.2.2.— Pulverização por intermédio ................................................................................ 125
. 5.1.3.2.2.1.—Intermédios sólidos ..........................................................................
125
5.1.3.2.2.2.— intermédios líquidos .......................................................................... 126
5.1.3.2.2.3.—Intermédios gasosos .......................................................................... 126
:••;, 5.1.3.2.3. —Pulverização por fricção ......................................................................................
126
5.1.3.2.4. — Pulverização química ............................................................................................ 127
; 5.1.3.2.5. — Porfirização............................................................................................................
128
5.1.3.2.6. — Pulverização por moinhos .................................................................................. 128
--i 5.1.3.2.6.1. — Moinhos manuais ..............................................................................
129
5.1.3.2.6.2. — Moinhos accionados por motores .................................................. 129
5.1.3.2.6.2.1. —Moinhos de laboratório ............................................ 129
5.1.3.2.6.2.2.— Moinhos de tipo industrial ...................................... 130
5.1.3.3. — Operações acessórias da pulverização ................................................................................ 140
5.1.3.3.1. —Tamisação .............................................................................................................. 140
:••• . 5.1.3.3.1.1. —Classificação dos pós ...................................................................... 142
5.1.3.3.1.2. — Determinação do grau de tenuidade de um pó .......................... 143
5.1.3.3.2. — Trociscação ............................................................................................................ 145
5.2. — Pulverização de substâncias moles ou polpação ...................................................................................... 145
5.3. — Divisão de líquidos ou emulsificação ........................................................................................................ 147
5.3.1. —Generalidades ...................................................................................................................................... 147
5.3.2. —Tipos de emulsões.............................................................................................................................. 148
-•"'. 5.3.2.1. — Determinação dos tipos de emulsões ................................................................................ 148
- ' 5.3.3. — Teoria das emulsões .......................................................................................................................... 150
.. -7 5.3.4. — Agentes emulsivos .............................................................................................................................. 152
"- 5.3.4.1. — Equilíbrio hidrófilo-lipófllo .................................................................................................. 156
5.3.4.2.—Classificação dos agentes emulsivos .................................................................................. 159
1122

Pág.
5.3.5. — Preparação de emulsões .................................................................................................................... 162
5.3.5.1. — Agitação manual ................................................................................................................. 162
5.3.5.2. — Agitação mecânica................................................................................................................ 163
/; 5.3.5.2.1.—Moinhos coloidais ................................................................................................
164
5.3.5.2.2. — Homogeneizadores........,...,................................................................................... 164
5.3.6. — Estabilidade das emulsões ................................................................................................................ 166
5.3.6.1. — Floculação c formação de creme ...................................................................................... 166
5.3.6.2.— Coalescência e separação das fases .................................................................................. 169
5.3.6.3. — Relação ente o volume das fases ...................................................................................... 170
5.3.6.4. — Inversão das fases ................................................................................................................ 170
6. —OPERAÇÕES FÍSICAS EXIGINDO A INTERVENÇÃO DO FRIO OU DO CALOR.................................. 173
6.1.—Refrigeração ................................................................................................................................................ 173
6.1.1. — Generalidades...................................................................................................................................... 173
6.1.2. — Métodos de refrigeração .................................................................................................................... 174
6.1.2.1. — Refrigeração por aumento do calor sensível do refrigerante ........................................ 174
6.1.2.2. — Refrigeração por mudança de fase c absorção de calor ................................................ 176
6.1.2.2.1. — Refrigeração por calor de fusão ........................................................................ 176
6.1.2.2.2.— Refrigeração por calor de vaporização ............................................................ 178
6.1.2.2.3. —Refrigeração por calor de sublimação .............................................................. 178
6.1.2.2.4.— Refrigeração por calor de dissolução ................................................................ 179
6.2. — Evaporação .................................................................................................................................................... 180
6.2.1. — Generalidades ...................................................................................................................................... 180
6.2.2. —Factores que influenciam a evaporação .......................................................................................... 180
6.2.3. —Processos de evaporação .................................................................................................................. 181
6.2.3.1. —Evaporação espontânea .......,....................i........................................................................... 18)
6.2.3.2. — Evaporação pelo calor ........................................................................................................ 181
6.2.3.3. — Evaporação sob pressão reduzida ...................................................................................... 185
6.3. — Secagem e exsicação.................................................................................................................................... 189
6.3.1. —Secagem ............................................................................................................................................ 189
6.3.2. — Secagem de gases .............................................................................................................................. 189
6.3.2.1. — Secagem por adsorção ........................................................................................................ 189
6.3.2.2. — Secagem por contacto com substâncias higroscópicas .................................................... 190
6.3.3. — Secagem de líquidos .......................................................................................................................... 191
6.3.3.1, — Secagem por destilação ...................................................................................................... 191
;
• 6.3.3.2. — Secagem por contacto com substancias higroscópicas .................................................... 192
6.3.4. —Secagem de sólidos .......................................................................................................................... 193
6.3.4.1. — Generalidades ........................................................................................................................ 193
6.3.4.2. — Processos de secagem .......................................................................................................... 194
6.3.4.2.1. — Exposição ao ar livre .......................................................................................... 194
6.3.4.2.2. — Secagem pelo ar seco à temperatura ambiente .............................................. 195
6.3.4.2.3. — Secagem pelo ar quente ...................................................................................... 196
6.3.4.2.4. — Secagem por radiações infravermelhas .............................................................. 202
6.3.5. — Exsicação .......................................................................................................................................... 203
6.3.6. — Conservação das substâncias secas .................................................................................................. 203
6.4. — Liofilização .................................................................................................................................................... 205
6.4.1.—Generalidades ...................................................................................................................................... 205
6.4.2. — Teoria da liofilização ........................................................................................................................ 208
6.4.2.1. —Fenómenos físicos da congelação ...................................................................................... 210
6.4.2.1.1. — Cristalização da água ......................................................................................... 210
1123

6.4.2.1.2. — Cristalização de soluções .................................................................................... 211


6.4.2.1.2.1. — Cristalização de soluções salinas .................................................... 21)
6.4.2.1.2.2. — Cristalização de soluções complexas.............................................. 212
6.4.2.2. —Mecânica da congelação ...................................................................................................... 213
6.4.2-2.1. — Primeira fase da congelação, Formação de cristais de gelo .......................... 213
6.4.2.2.2.—Congelação final. Formação de misturas eméticas .......................................... 214
6.4.3. — Determinação da temperaiura de congelação total ........................................................................ 214
t. 6.4.4. — Análise térmica dos sistemas congelados ........................................................................................ 216
6.4.5. — Congelação a temperaturas muito baixas ........................................................................................ 217
"•. 6.4.6. — Processos para obtenção de congelações rápidas .......................................................................... 218
6.4.7. — Sublimação do gelo............................................................................................................................ 219
£•" 6.4.7.1. — Emissão de vapor ............................................................................................................... 220
:
- 6.4.7.1.1. —Resistência oposta pelo espécime ...................................................................... 221
6.4.7.1.2. — Resistência oposta pelo aparelho........................................................................ 222
• 6.4.7.2. —Aquecimento do material congelado .................................................................................. 223
6.4.7.3. — Condições de vazio ............................................................................................................. 226
6.4.7.3.1. — Bombas rotativas .................................................................................................. 228
: 6.4.7.3.2. — Bombas de difusão .............................................................................................. 229
6.4.8. —Condensação...................................................................................................................................... 230
6.4.9. —Secagem secundária.......................................................................................................................... 231
6.4.10. — Aspectos práticos da liofilização .................................................................................................... 232
L
6.4.10.1.— Dispositivos e processos de congelação ........................................................................ 232
•" 6.4.10.1.1.—Congelação de produtos acondicionados em ampolas ou frascos-ampolas.. 233
-. 6.4.10.1.2.—Congelação de produtos acondicionados em recipientes de grande
capacidade ...................................................................................................... 236
6.4.10.1.2.1. — Por rotação lenia ...................................................................... 236
:' '•' 6.4.10.1.2.2.—Por rotação a grande velocidade............................................ 237
r 6.4.11. —Tipos de liofilizadores ................................................................................................................. 238
•f 6.4.11.1. —Aparelhos de junção múltipla ........................................................................................ 239
6.4.11.2. — Aparelhos de junção única .............................................................................................. 239
6.4.12. — Aparelhos para a secagem secundária .......................................................................................... 243
6.4.13. —Fecho dos recipientes ...............................—.—.......................................,...,.................................... 245
6.5. —Sublimação .................................................................................................................................................... 247
6.6. —Torrefacção .................................................................................................................................................... 248
6.7. —Carbonização ............................................................................................................................................... 248
6.8. —Calcinação ...................................................................................................................................................... 249
6.9. —Cristalização .................................................................................................................................................. 249
6.10. — Fusão ............................................................................................................................................................ 249
6.11. —Destilação ..................................................................................................................................................... 251
6.11.1. —Generalidades .................................................................................................................................... 251
6.11.2.—Teoria da destilação ........................................................................................................................ 251
6.11.3. —Aplicação da regra das fases à destilação .................................................................................... 253
6.11.3.1. — Destilação de um líquido formado por um único componente ................................ 254
6.11.3.2. — Destilação de misturas líquidas ..................................................................................... 255
6.11.3.2.1.—Misturas cujo ponto de ebulição varia uniformemenle ............................ 255
6.11.3.2.1.2. — Misturas com um ponto de ebulição mínimo ...................... 258
•""»" 6.11.3.2.1.3.—Misturas com um ponto de ebulição máximo ...................... 259
6.11.3.2.2. — Destilação de uma mistura de dois líquidos imiscíveis ............................ 260
6.11.3.3. — Destilação de um líquido imiscível com a água, à custa de vapor não saturado .. 262
6.11.4. — Destilação fraccionada ...................................................................................................................... 265
6.11.5. —Prática da destilação ........................................................................................................................ 269
1124

6.11.5.1 —Destilação simples .............................................................................................................. 269


6.11,5.1.1. —Aparelhos para a destilação da água............................................................ 270
6.11.5.1.1.1. —Aparelhos de vidro ...................................................................... 271
6.11.5.1.1.2. —Aparelhos de metal...................................................................... 273
6.11.5.1.1.3. — Destilação por termocompressão ................................................ 275
6.11.5.2. —Destilação a pressão reduzida .......................................................................................... 277
•• 6.11.5.3.— Destilação cm corrente de vapor .................................................................................... 278
6.11.5.4. —Destilação fraccionada...................................................................................................... 280
7. —OPERAÇÕES FÍSICAS EXIGINDO A INTERVENÇÃO DE UM LÍQUIDO ................................................ 283
7.1. —Dissolução ....................................................................-^ 283
7.1.1. — Generalidades ...................................................................................................................................... 283
7.2. —Modos de exprimir a solubilidade ............................................................................................................ 284
7.3. — Modos de exprimir a concentração das soluções .................................................................................... 285
7.4. — Soluções ideiais e soluções reais................................................................................................................ 289
7.5. — Interacções solvenle-soluto ......................................................................................................................... 291
7.5.1. — Solventes polares ................................................................................................................................ 292
7.5.2. — Solventes não polares ........................................................................................................................ 294
7.5.3. — Solventes semipolares ........................................................................................................................ 294
7.6. —Tipos de soluções ...................................................................................................................................... 294
7.6.1. — Soluções simples ................................................................................................................................ 295
7.6.1. K —Soluções de gases em líquidos .......................................................................................... 295
7.6.1.2. — Soluções de líquidos em líquidos ...................................................................................... 296
7.6.1.2.1. — Sistemas completamente miscíveis .................................................................... 296
7.6.1.2.2. — Sistemas parcialmente miscíveis ........,.................—........................................... 297
7.6.1.2.3.— Influência de substâncias estranhas .................................................................. 298
7.6.1.3. — Soluções de sólidos em líquidos ........................................................................................ 299
7.6.1.3.1, —Soluções ideiais .................................................................................................... 299
' 7.6.1.3.2. —Soluções não ideiais ............................................................................................ 300
7.6.1.3.2.1. — Fenómenos térmicos ocorridos durante a dissolução .................. 304
7.6.1.3.2.2. — Dissoluções de sais na água .......................................................... 305
7.6.1.3.3. — Outros factores que influenciam a solubilidade dos sólidos.......................... 306
7.6.1.3.3.1. — Sistemas completamente miscíveis ................................................ 306
7.6.1.3.3.2. — Estado físico do solido .................................................................... 307
7.6.1.3.3.3. —Estado de divisão c agitação .......................................................... 308
7.6.1.3.3.4. —Constante dieléctrica do solvente .................................................. 309
7.6.1.3.3.5. —pH c solubilidade dos electrólitos fracos ...................................... 314
7.6.2. — Soluções extractivas .......................................................................................................................... 317
7.6.2.1. —Generalidades ........................................................................................................................ 317
7.6.2.2. — Finalidade das soluções extractivas .................................................................................... 318
7.6.2.3. — Factores que influenciam a dissolução extractiva ............................................................ 320
7.6.2.3.1. —Estado de divisão das drogas ............................................................................ 320
7.6.2.3.2. — Agitação ................................................................................................................ 320
7.6.2.3.3.—Temperatura .......................................................................................................... 321
, 7.6.2.3.4. — Acções mútuas exercidas pêlos componentes de uma mesma planta .......... 321
7.6.2.3.5. — Influência da tensão superficial.......................................................................... 322
7.6.2.3.6. —Natureza do solvente .......................................................................................... 323
7.6.2.3.7. — Influência do pH .................................................................................................. 323
7.6.2.3.8. — Tempo de extracção ............................................................................................ 323
7.6.2.4. — Mecanismo da extracção de sólidos .................................................................................. 324

1125
1125

7.6.2.4.1.—Extracção por maceração e técnicas correlacionadas ...................................... 324


--•-' • 7.6.2.4.2. — Mecanismo de extracção por lixiviação ............................................................ 327
7.6.2.5. — Extracção líquido-líquido...................................................................................................... 330
7.6.2.6. — Métodos para a obtenção de soluções extractivas .......................................................... 333
7.6.2.6.1. —Soluções extractivas de sólidos .......................................................................... 333
Vi--* 7.6.2.6.1.1. —Maceração.......................................................................................... 333
• --;- 7.6.2.6.1.2. —Digestão.............................................................................................. 335
•í< ..tfxjjv ,;,-, 7.6.2.6.1.3. —Infusão................................................................................................
336
7 •".'••' 7.6.2.6.1.4. —Decocçào............................................................................................ 337
7.6.2.6.1.5. — Lixiviação .......................................................................................... 338
, • 7.6.2.6.1.5.l.—Lixiviadores ................................................................ 339
•' 7.6.2.6.1.5.2. —Prática da lixiviação .................................................. 340
•' 7.6.2.6.1.5.2.1. —Pulverização da droga ......................
341
!
7.6.2.6.1.5.2.2. — Humedecimento do pó...................... 342
"'' . '*•••-• 7.6,2.6.1.5.2.3. —Acondicionamento do pó no
lixiviador 343
:
' ' ,-• • - - . , -•••• • . ' , - 7.6.2.6.1.5.2.4. —Periodo de maceração ......................
345
• • - " — ' ':-- 7.6.2.6.1.5.2.5. — Lixiviação e rilmo de deslocação do
• n • ' ""••• "" solvente .............................................. 345
'•ï- 7.6.2.6.1.5.2.6.—Determinação do fim da lixiviação
347
^ .. -• - - - • 7.6.2.6.1.5.2.7. —Solventes usados na lixiviação ........
347
7.6.2.6.1.6. —Diacolação.......................................................................................... 348
7.6.2.6.1.7. —Evacolação ........................................................................................ 349
• • - 7.6.2.6.1.8. —Extracção em Soxhlet ......................................................................
350
7.6.2.6.1.9. — Outros métodos de extracção de sólidos ...................................... 351
'^' - 7.6.2.7. —Extracção de líquidos ..........................................................................................................
351
8.—ESTERILIZAÇÃO ....................................................................................................................... 355
8.1. —Introdução ...................................................................................................................................................... 355
8.2. — Mecanismo da destruição dos germes pelo calor. Termossensihilidade ................................................ 356
8.3. —Dinâmica da esterilização ............................................................................................................................ 358
8.4. —Métodos de esterilização .............................................................................................................................. 360
8.4.1. —Métodos físicos .................................................................................................................................. 361
8.4.1.1. — Esterilização pelo calor ........................................................................................................ 361
••<* 8,4.1.1.1. —Métodos de esterilização pelo calor seco ........................................................
362
r
8.4.1.1.1.1. — Aquecimento ao rubro vermelho .................................................... 362
'•- '• 8.4.1.1.1.2. — Esterilização à chama ......................................................................
362
8.4.1.1.1.3. — Esterilização em estufa de ar quente ............................................ 362
8.4.1.1.1.3.1. —Resistência das bactérias ao calor seco .................. 364
8.4.1.1.1.3.2. — Prática da esterilização pelo calor seco .................. 364
ïC 8.4.1.1.1.3.2.1. — Material de vidro.............................. 365
8.4.1.1.1.3.2.2. —Pós...................................................... 365
8.4.1.1.1.3.2.3. — Gorduras ............................................ 367
8.4.1.1.1.3.2.4.— Soluções e suspensões oleosas ...... 367
8.4.1.1.1.4.— Esterilização pêlos raios infravermelhos ........................................ 369
8.4.1.1.2. —Esterilização pelo calor húmido ........................................................................ 369
8.4.1.1.2.1. —Tindalização ...................................................................................... 370
^ 8.4.1.1.2.2. —Esterilização por aquecimento a 10Ü°C ........................................ 371
8.4.1.1.2.3. — Esterilização pelo vapor fluente ...................................................... 371
8.4.1.1.2.4. — Esterilização por aquecimento a 100°C com adição de um
• • bactericida ..........................................................................................
371
8.4.1.1.2.5. — Esterilização pelo calor húmido sob pressão ............ 372
1126

8.4.1.1.2.5.1. — Mecanismo do aquecimento pelo vapor ................ 373


8.4.1.1.2.5.2. —Tipos de autoclaves .................................................. 375
8.4.1.1.2.5.2.1. —Autoclave de paredes simples ........ 375
8.4.1.1.2.5.2.2. —Autoclave de paredes duplas.......... 377
8.4.1.1.2.5.2.3. —Autoclave de vazio prévio.............. 380
8.4.1.1.2.5.2.4. — Esterilizador contínuo por vapor
sob pressão ...................................... 381
8.4.1.1.2.5.3. — Condições a respeitar na esterilização pelo vapor.. 382
8.4.1.1.2.5.3.1. —Utensílios cirúrgicos e artigos de
Y.^ . penso.................................................. 383
8.4.1.1.2.5.3.2. —Soluções aquosas .............................. 384
8.4.1.1.2.5.4.—Controladores do funcionamento da autoclave ...... 385
8.4.1.1.2.5.5. — Indicadores de esterilização...................................... 386
8.4.1.2. —Esterilização por radiações .................................................................................................. 3Sy
8.4.1.2.1. — Radiações usadas na esterilização ...................................................................... 390
8.4.1.2.2. — Mecanismo de acção das radiações ionizantes sobre os microrganismos.... 390
:?•-•-. :ífc> :>(;.• ••'•; 8.4.1.2.3. — Factores que influenciam os efeitos das radiações sobre os germes .......... 391
. . 8.4.1.2.3.1. —Concentração dos microrganismos ................................................ 391
,•, ... - 8.4.1.2.3.2. — Radiossensibilidade das diferentes espécies .................................. 392
.. , 8.4.1.2.4. — Esterilização por radiações ionizantes .............................................................. 394
8.4.1.2.4.1. —Raios caóticos .................................................................................. 394
8.4.1.2.4.2. — Raios -y ............................................................................................ 397
8.4.1.2.5. — Esterilização por radiações não ionizantes ..................................................... 398
8.4.1.2.5.1. —Luz ultravioleta ................................................................................ 398
8.4.1.2.5.2. — Ondas curtas...................................................................................... 400
8.4.1.3. —Ultra-sons ............................................................................................................................ 400
8.4.1.4.— Esterilização por filtração ................................................................................................ 401
8.4.1.4.1.—Tipos de filtros usados na esterilização ............................................................ 402
8.4.1.4.1.1. — Velas porosas .................................................................................... 402
8.4.1.4 1.2. — Discos de amianto ............................................................................ 403
8.4.1.4.1.3. — Filtros de vidro poroso .................................................................... 403
8.4.1.4.1.4. — Membranas de celulose .................................................................. 404
8.4.2. — Esterilização por substâncias químicas no estado gasoso ............................................................ 405
8.4.2.1. —Formaldeído .......................................................................................................................... 406
8.4.2.2. — Óxido de etilcno .................................................................................................................. 407
8.4.2.3.—Outros gases .......................................................................................................................... 410
1127

II Parte

FARMÁCIA GALÉNICA

' .... ..,.-.... Pág.


1. —INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 415
1.1. —Definição e objectivos da Farmácia Galénica ......,..,..,..,...,..,..,..,..,..,..,..,..,..,..,...,..,................ 415
1.2. — Evolução da Farmácia Galénica ...,..,..,...,..,..,...,..,..,..,...,...,..,..,..,..,..,..,..,..,..,..,..,,.,..,...,., 416
2. — BIBLIOGRAFIA EM FARMÁCIA GALÉNICA ...................................................................................... 421
2.1 —Fannacopeias ..,,,,.,,..,...,..,..,...,..,...,..,.,,,„,,.,,.,„,..,...,..,..,...............,..,........-.........-......... 421
2.2. — Tratados de Farmácia Galénica e outros livros de consulta .................................................................. 424
2.3.— Principais revistas de Farmácia Galénica .............,..,...,..,..,...,..,.......,..,..,..,..,..........,.-,.,,..,.,,, 427
3.— MEDICAMENTOS ................................................................................................................. 431
3.1. — Droga, fármaco e medicamento ..,,..,.......,................,..,.,....,..,..,..,..,..,...,..,..........,..,....—.—........ 431
3.2. — Medicamento e remédio .............................................................................................................................. 433
3.2.1.—Agentes físicos ................................................................................................................... 433
3.2.2. — Agentes psíquicos .......................................................................................................................... 433
3.3. — Medicamento, -ilimento e veneno ,...,...,.,,..,.,,.,...,..,..,...,..,.......,..,.......,..,..................-.............. 433
3.4. — Classificação dos medicamentos.........,..,...,.,,..,...,..,..,...,..,.......,..............,.-,.,,.,..,..,..,..,,,..,.. 435
3.5. — Medicamentos alopálicos e homeopáticos..................................................................................... 437
3.6.— A receita médica ,.,,,„.,,,,,,.,,,,,...,..,..„..„..,..,..,.................................................,..,..,..,,,,,, 439
3.6.1. —Nome do doente .,,.,,,,.,„,,,,.,„,,..,,.,,,,,,,.,.,,,,,,,,.,,..,..,..,..,..,..,...................... 439
3.6.2. — Fármacos utilizados e suas quantidades .......................................................................................... 439
3.6.3. — Formas farmacêuticas pretendidas .................................................................................................... 440
3.6.4. — Indicações quanto à administração do medicamento .................................................................... 440
3.6.5.—Nome, morada e assinatura do médico .......................................................................................... 442
4. — ADMINISTRAÇÃO DE MEDICAMENTOS.......................................................................................................... 443
4.1. —Medicamentos tópicos e locais.,...,.,,.,,,,,,,,,,,,,,,..,.,,,,.,..,,.,-,-,—..................................... 444
4.1.1. — Anti-inflamatórios................................................................................................................................ 445
4.1.1.1. — Adstringentes ........................................................................................................................ 445
4.1.1.2. —Emolientes,,,.,,,,.,..,....,..,..,..,..,..,.......,.......,..,..,..,...,..,..,,,,,,,,,,,,,,,,,,. 446
- 4.1.1.3. — Outros anti-inflamatórios .,,,,„,,,,,,,,,,,,„,,.,,,,-,.,-,.,..,..,..,.....,..,,,,,,, 448
'<-'• 4.1.2. — Revulsivos ,,,..,.,,..,,.,„,,,,,,,,,,„,,,,.,,,,,,,,,,,,,..,,,,,,,,,,,,.,,,,,,,,.,.,...,... 449
'•.cf- 4.1.2.1. —Rubefacientes ............................. ..................................................................................... 450
- -'•-' 4.1.2.2. — Vesicantes .............................................................................................................................. 450
Í-: ; 4.1.3. — Queratoplásticos ....,..,..,...,..,„.,..,..,„,,,,,„,,,,,,,,,,,.„,,.,...,,,..,.,,,,,,„„.,,,„,, 451
-7.; 4.1.3.1. —Queratoplásticos celulares ,,,,,„,„.,,,„,„.,,,,.,...,..,.,..,.......,..,..,..,..,..,..,..„„ 452
- .. 4.1.3.2. — Queratopláslicos redutores ,„,,,„„.„.,,,,,,,,„„.„,.„,-...................................
452
1128

.........................--—•••••••••»»•••••••-• ..............-•-.------••-••-----••• 453 4 l 4. _ Queratolíticos .,...........-


.....................--..-----•---------•••••--••-----••••-'••••••-•----•• 454 4 l 5. _ Cáusticos .................-
•—•—•— •—•—•——————••——•• 454 ........-.---••—•—•••-•>-••••-•----•---•—•—•••••••••—
4.1.6. — Protectores .............—.......-........-.---••—•—•••-•>-••••-•----•---•—•—•••••••••—•—•—•— •—•—•——————•• 455
4.1.6.1. — Protectores para uso interno .....,..........................-,......-.-—.-.-.....-.-•---—•--••--•
455
4.1.6.2. — Protectores para uso externo ...............-...............-,.....--——.-...-.----—•--•--•
456
4.1.7. — Ami-sépticos e parasilicidas ................................-.-.......-..-...-..--—.-.--.-•---—----••
4.2. — Medicamentos de acção geral ........................................................................................................ 458
4.2.1. — Absorção .............................................. ............................................... ....... ..........
................................ 458
4.2.1.1. — Transporte passivo ................................................................................................................ 461
4.2.1.2. — Transporte activo .................................................................................................................. 469
4.2.2. — Distribuição e fixação dos fármacos .............................................................................................. 470
4.2.3. — Eliminação ou excreção .................................................................................................................... 473
4.3. — As vias de administração ............................................................................................................................ 485
4.3.1. — Administração cutânea ...................................................................................................................... 487
4.3.1.1. — Histologia da peie ................................................................................................................ 487
. 4.3.1.2. — O pH cutâneo ...................................................................................................................... 492
4.3.1.3. — Penetração cutânea .............................................................................................................. 492
4.3.2. — Administração por via bucal ............................................................................................................ 497
4.3.3. — Administração por via gastro-intestinal .......................................................................................... 499
4.3.3.1. — Estômago ............................................................................................................................ 499
4.3.3.2. — Intestino delgado .................................................................................................................. 502
4.3.3.2.1. — Influência da dissolução na absorção................................................................ 505
4.3.3.2.2. — Influência da forma cristalina do fármaco na absorção ................................ 511
• 4.3.3.2.3. — Influência dos adjuvantes na absorção ............................................................ 512
4.3.3.2.4. — Transformações no intestino .............................................................................. 515
4.3.3.2.5. — Modo de administração ...................................................................................... 516
• 4.3.4. — Administração rectal ..........................................................................................................................
517
4.3.4.1. — Absorção .............................................................................................................................. 518
4.3.4.1.1. — Excipientes ............................................................................................................ 521
4.3.4.1.2. — Cinética da absorção .......................................................................................... 523
4.3.4.1.3. — Solubilidade relativa dos fármacos e excipientes ............................................ 524
4.3.4.2. —Acção tópica ........................................................................................................................ 524
4.3.4.3. — Acção tópica e absorção pêlos cólons ........................................................................... 525
4.3.5. — Adminsitração nasal .......................................................................................................................... 526
4.3.5.1. — Histologia e fisiologia .......................................................................................................... 526
4.3.5.2. — Absorção................................................................................................................................ 528
4.3.5.3. — Acção tópica ........................................................................................................................ 529
4.3.5.4. — Influência das drogas no movimento ciliar ...................................................................... 531
4.3.6. — Administração ocular ........................................................................................................................532
4.3.6.1. — Anatomia, histologia e fisiologia ........................................................................................ 533
4.3.6.2. — Preparações para uso oftálmico .......................................................................................... 536
4.3.6.2.1. — Penetração na córnea .......................................................................................... 537
4.3.6.2.2. — Características do líquido lacrimal .................................................................... 539
4.3.6.2.3. — Fármacos utilizados em colírios ........................................................................ 541
4.3.7. — Administração auricular .................................................................................................................... 543
4.3.7.1. — Anatomia, histologia e fisiologia ........................................................................................ 543
4.3.7.2. — Medicamentos tópicos auriculares ...................................................................................... 544
4.3.8. — Administração traqueopultnonar ........................................................................................................
546
4.3.8.1. — Acção tópica e absorção .................................................................................................. 547
1129

Pag.
5.4.9. — Administração geniturínária ............................................................................................................ 549
4.3.9.1 —Bexiga c uretra .................................................................................................................... 549
'•"' 4.3.9.2. —Vagina e útero ....................................................................................................................
549
4.3.10. — Administração parenteral............................................................................................................... 550
"•"' 4.3.10.1. —Via intradérmica................................................................................................................
553
4.3.10.2. —Via subcutânea.................................................................................................................. 553
'• 4.3.10.2.1.—Medicamentos líquidos .................................................................................. 554
4.3.10.2.2. —Medicamentos sólidos .................................................................................... 556
4.3.10.2.2.1. — Forma geométrica e superfície ................................................ 556
•-' - •• •• 4.3.10.2.2.2.—Acidez ou basicidade ..............................................................
557
4.3.10.2.2.3. — Solubilidade................................................................................ 557
4.3.10.2.2.4. — Fagocitose .................................................................................. 558
4.3.10.2.2.5.— Encapsulação............................................................................. 55»
4.3.10.3. — Via intramuscular.............................................................................................................. 558
4.3.10.3.1. — Soluções aquosas............................................................................................ 560
4.3.10.3.2. — Soluções oleosas ............................................................................................ 561
4.3.10.3.3.— Outras soluções .............................................................................................. 562
4.3.10.3.4. — Suspensões ...................................................................................................... 563
'" 4.3.10.4.— Via endovenosa ................................................................................................................ 564
1
4.3.10.4.1. —Lesões locais .................................................................................................. 567
4.3.10.4.2. — Fenómenos infecciosos .................................................................................. 567
4.3.10.4.3. — Fenómenos térmicos ...................................................................................... 567
4.3.10.4.4. — Fenómenos nervosos ...................................................................................... 568
-~": 4.3.10.5.— Via intra-arterial ................................................................................................................
568
' '' 4.3.10.6. — Via intrarraquídea ............................................................................................................
569
'' 4.3.10.6.1. — Via subaracnoidea..........................................................................................
:
570
'' 4.3.10.6.2.— Via epidural ....................................................................................................
572
4.3.10.7. —Via intraperitoncal ............................................................................................................ 573
4.3.10.8. — Intrapleural ........................................................................................................ 573
4.4. — Posologia........................................................................................................................................................ 574
5. — BIODISPONIBILIDADE .......................................................................................................................................... 581
5.1. —Factores fisiológicos ...................................................................................................................................... 582
5.2. —Factores físico-químicos .............................................................................................................................. 583
5.2.1. — Natureza da forma em que se encontra o fármaco ...................................................................... 583
5.2.2. — Estado físico do fármaco .................................................................................................................. 584
5.3. — Factores farmacotëcnicos .............................................................................................................................. 585

6. — CLASSIFICAÇÃO DAS FORMAS FARMACÊUTICAS .................................................................................... 587

7.— FORMAS FARMACÊUTICAS OBTIDAS POR DIVISÃO MECÂNICA .......................................................... 591


7.1. —Espécies .......................................................................................................................................................... 592
7.1.0.1. —Preparação.............................................................................................................................. 592
7.1.0.2.—Conservação .......................................................................................................................... 593
7.1.1. — Formas complementares das espécies ................................................................................—........... 593
7.1.1.1. — Cigarros medicinais .............................................................................................................. 593
7.2.— Pós .................................................................................................................................................................. 594
7.2.0.1. — Generalidades ....................................................................................................................... 594
7.2.0.2. — Definição e classificação dos pós ...................................................................................... 595
7.2.0.3.—Preparação dos pós .............................................................................................................. 596
1130

7.2.0.3.1. —Pós simples .......................................................................................................... 596


7.2.0.3.1.1. —Pós simples titulados ...................................................................... 598
7.2.0.3.2. — Pós compostos .................................................................................................... 599
7.2.0.4. — Esterilização dos pós .......................................................................................................... 604
7.2.0.5. — Modificações devidas à pulverização ................................................................................ 606
7.2.0.6. — Alterações dos pós .............................................................................................................. 610
7.2.0.7. —Incompatibilidade dos pós .................................................................................................. 613
7.2.0.8.—Verificação dos pós ............................................................................................................ 618
. , ifi 7.2.0.8.1,—Apreciação da tenuidade dos pós .................................................................... 619
.... . 7.2.0.8.2,—Determinação do ângulo de repouso ................................................................. 627
7.2.0.8.3. —Determinação do volume aparente .................................................................... 630
7.2.0.8.4. — Humidade............................................................................................................. 631
7.2.0.8.5. — Cincas.................................................................................................................... 633
7.2.0.8.6. — Extracto ............................................................................................................... 634
7.2.0.9. — Acondicionamento dos pós ................................................................................................ 634
7.2.0.9.1. — Pós acondicionados em frascos ou caixas ...................................................... 635
7.2.0.9.2. — Pós divididos em papéis .................................................................................... 635
7.2.0.10.— Formulário de pós................................................................................................................ 637
7.2.1. — Formas complementares dos pós .................................................................................................... 648
7.2.1.í. —Granulados ............................................................................................................................ 648
7.2.1.1.1. —Generalidades ...................................................................................................... 648
7.2.1.1.2. —Preparação dos granulados ................................................................................ 649
7.2.1.1.2.1. — Preparação a húmido ................................................................. .... 649
7.2.1.1.2.2. —Preparação por fusão ...................................................................... 652
7.2.1.1.3. —Tipos de granulados ............................................................................................ 653
7.2.1.1.4. — Ensaio dos granulados ........................................................................................ 654
7.2.1.1.5. — Acondicionamento e conservação ...................................................................... 655
7.2.1.1.6. —Formulário ............................................................................................................ 656
7.2.1.2. —Comprimidos ........................................................................................................................ 659
7.2.1.2.1. — Generalidades ...................................................................................................... 659
7.2.1.2.2. — Manipulação dos pós .......................................................................................... 661
7.2.1.2.2.1.—Adjuvantes ....................................................................................... 662
7.2.1.2.2.2. — Mistura dos constituintes ................................................................ 680
7.2.1.2.3.— Granulação............................................................................................................ 687
7.2.1.2.3.1. —Granulação a seco .......................................................................... 687
7.2.1.2.3.2. — Granulação a húmido ...................................................................... 688
7.2.1.2.3.3. — Granulação por processos especiais .............................................. 698
7.2.1.2.3.4. — Ensaio dos granulados .................................................................... 700
7.2.1.2.4. —Compressão ....................................,.................,............,...,...........,...!,......,....,..... 706
7.2.1.2.4.1. — Considerações gerais ........................................................................ 706
7.2.1.2.4.1.1.—Adesão e coesão das partículas ............................. 708
7.2. l .2.4. l .2. — Comportamento do material elástico ou plástico
a comprimir................................................................ 714
7.2.1.2.4.2.—Máquinas de compressão ................................................................ 714
7.2.1.2.4.3. —Física da compressão ...................................................................... 721
7.2.1.2.5. — Preparação dos comprimidos .............................................................................. 735
^. 7.2.1.2.5.1. —Dificuldades na compressão .......................................................... 736
7.2.1.2.6. — Tipos especiais de compridos ............................................................................ 741
7.2.1.2.7. —Alterações em comprimidos .............................................................................. 745
7.2.1.2.8. — Selecção dos comprimidos ................................................................................ 752
7.2.1.2.9. — Acondicionamento dos comprimidos ....................................—......................... 152
1131

••
*_•*, 7.2.1.2.10.—Verificação dos comprimidos.............................................................................. 757
7.2.1.2.10.1. — Determinações físicas .................................................................... 757
7.2.1.2.10.2. —Princípios activos ............................................................................ 784
7.2.1.2.11.— Formulário dos comprimidos .............................................................................. 788
7.2.1.3. — Drugeias.................................................................................................................................. 800
7.2.1.3.1. —História e generalidades ...................................................................................... 800
7.2.1.3.2. — Drageificação ........................................................................................................ 801
7.2.1.3.2.1. — Aparelhagem ...................................................................................... 801
7.2.1.3.2.2.— Fases da drageificação .................................................................... 804
7.2.1.3.2.3. — Processos especiais de drageificação.............................................. 810
7.2.1.3.2.3.1.— Processos rápidos de drageificação clássica ............ 811
*''-———•• : 7.2.1.3.2.3.2. —Revestimentos especiais ............................................ 812
-•:" ••••••- 7.2.1.3.2.3.3.— Drageificação por compressão.................................. 820
'-^ " 7.2.1.3.2.3.4. — Drageificação por suspensão no ar ........................ 823
^ ' .; .--•'• 7.2.1.3.2.3.5. — Drageificação por fixação electrostática de pós .... 824
*»'* 7.2.1.3.2.3.6.— Drageificação automatizada ...................................... 824
*''
:>
7.2.1.3.3. —Verificação de drageias ...................................................................................... 828
7.2.1.4. — Pílulas, grânulos e bolos...................................................................................................... 832
*"'-' 7.2.1.4.1. —Pílulas .................................................................................................................... 832
7.2.1.4.1.1. —Generalidades .................................................................................... 832
" -..v 7.2.1.4.1.2. — Excipientes ........................................................................................ 833
7.2.1.4.1.2.1. — Excipientes aglutinantes ............................................ 834
' ... 7.2.1.4.1.2.2. — Excipientes absorventes ............................................ 836
7.2.1.4.1.2.3.—Excipientes líquidos .................................................. 838
• :Jí 7.2.1.4.1.3. —Preparação das pílulas...................................................................... 839
7.2.1.4.1.3.1. —Processo clássico de obtenção ................................ 839
7.2.1.4.1.3.2.— Preparação industrial.................................................. 843
7.2.1.4.1.4.—íncompatibilidades e dificuldades na preparação das pílulas...... 850
7.2.1.4.1.5. — Revestimento de pílulas .................................................................. 852
7.2.1.4.1.5.1. — Revestimentos gastrossolúveis .................................. 853
7.2.1.4.1.5.2. — Revestimentos gastro-resislentes .............................. 856
7.2.1.4.1.6. — Ensaio das pílula» ............................................................................ 859
7.2.1.4.1.7. — Acondicionamento ............................................................................ 860
. . . 7.2.1.4.2.— Grânulos ................................................................................................................ 861
7.2.1.4.3. —Bolos...................................................................................................................... 863
7.2.1.5.— Biscoitos ................................................................................................................................ 865
;'"; 7.2.1.6. — Chocolates.............................................................................................................................. 865
7.2.1.7. — Pastilhas.................................................................................................................................. 866
7.2.1.7.1. —Generalidades........................................................................................................ 866
7.2.1.7.2. — Preparação das pastilhas ...................................................................................... 867
7.2.1.7.2.1.—Pastilhas contendo mucilagens e açúcar ........................................ 867
7.2.1.7.2.1.1. —Preparação da mucilagem ........................................ 868
• 7.2.1.7.2.1.2. —Preparação da pasta .................................................. 869
7.2.1.7.2.1.3. —Divisão da pasta........................................................ 869
*'•' 7.2.1.7.2.1.4.— Secagem ...................................................................... 873
:
' '- - 7.2.1.7.2.2. — Pastilhas com elevada percentagem de gomas ............................ 873
i?r. ii*> • 7.2.1.7.2.3. — Pastilhas sem mucilagem j com açúcar........................................ 875
*-' 7.2.1.7.2.4. — Pastilhas contendo gelatina.............................................................. 875
" , 7.2.1.7.3.—Fabricação industrial de pastilhas ...................................................................... 876
7.2.1.7.4. —Alterações das pastilhas ...................................................................................... 877
7.2.1.7.5.—Verificação das pastilhas .................................................................................... 878
1132

- '

7.2.1.7.6. — Acondicionamento ..................:.......................................„.................................... 882


7.2.1.7.7. — Formulário das pastilhas...................................................................................... 882
7.2.1.8. — Lentïculas .............................................................................................................................. 886
7.2.1.8.1.— Definição e preparação ........................................................................................ 886
7.2.1.8.2. —Formulário ............................................................................................................ 887
7.2.1.9. — Cápsulas ................................................................................................................................ 889
7.2.1.9.1.—Hóstias ou cápsulas amiláceas .......................................................................... 889
7.2.1.9.1.1. —Generalidades.................................................................................... 889
7.2.1.9.1.2. — Fabricação e tipos de cúpulas ........................................................ 890
i((|j "'.' 7.2.1.9.1.3.— Preparação das hóstias .................................................................... 893
,'.*,,. 7.2.1.9.1.4. —Incompatibilidades ............................................................................ 8%
:,!-, 7.2.1.0.1.5. —Alterações das hóstias...................................................................... 8%
.;y, 7.2.1.9.1.6. — Acondicionamento ............................................................................ 897
tn-y . 7.2.1.9.1.7. — Vantagens e inconvenientes................................,...................—..... 897
'.-.c; 7.2.1.9.1.8. — Ensaio das hóstias............................................................................898
-i;,í 7.2.1.9.1.9. — Formulário ........................................................................................ 898
7.2.1.9.2.— Cápsulas gelatinosas ............................................................................................ 901
V >, 7.2.1.9.2.1. — Generalidades .................................................................................... 901
-•< . 7.2.1.9.2.2. —Fabricação dos invólucros .............................................................. 903
7.2.1.9.2.3. — Cápsulas duras .................................................................................. 907
7.2.1.9.2.4. — Cápsulas moles ................................................................................ 917
>i- 7.2.1.9.2.5. — Cápsulas gastro-resistentes .............................................................. 926
- 7.2.1.9.2.6. — Outros tipos de cápsulas ................................................................ 930
7.2.1.9.2.6.1. —Microencapsulação .................................................... 131
7.2.1.9.2.7.—Incompalibilidades ............................................................................ 934
7.2.1.9.2.8. — Ensaio das cápsulas ........................................................................ 936
7.2.1.9.2.9. — Acondicionamento das cápsulas .................................................... 941
7.2.1.9.2.10:—Formulário das cápsulas .................................................................. 943
7.3.— Polpas ............................................................................................................................................................ 949
7.3.1. — Formas complementares das polpas ......—................................................,.................—.—.—.—...... 949
8.— FORMAS FARMACÊUTICAS OBTIDAS POR EXTRACÇÃO MECÂNICA .................................................. 951
8.l. —Sucos .............................................................................................................................................................. 951
8.1.1.Sucos animais............................................................................................................................................ 951
8.1.2.— Sucos vegetais .................................................................................................................................... 952
8.1.2.1. —Sucos aquosos açucarados .................................................................................................. 952
8.1.2.2. — Sucos aquosos herbáceos .................................................................................................... 952
8.1.2.3. — Sucos aquosos ácidos .......................................................................................................... 953
8.1.2.3.1.—Conservação dos sucos ácidos .......................................................................... 955
8.1.2.3.2. —Ensaio dos sucos ácidos .................................................................................... 955
8.1.2.3.3.— Sucos ácidos da F. P. IV .................................................................................. 956
9 —FORMAS FARMACÊUTICAS OBTIDAS POR DISPERSÃO MECÂNICA .................................................... 959
9.1. — Emulsões ........................................................................................................................................................ 959
Ï.l.l. — Oenenüidades ...................................................................................................................................... 959
9.1.2.— História ................................................................................................................................................ 959
9.1.3.— Finalidade da emulsificação .............................................................................................................. 960
9.1.3.1. — Emulsões para uso interno .................................................................................................. 960
9.1.3.2. — Emulsões para uso externo ................................................................................................ 962
1133

9.1.4. —Componentes de uma emulsão ........................................................................................................ 962


9.1.4.1. — Fase aquosa ....................................................................................................................... 962
9.1.4.2. — Fase oleosa ............................................................................................................................ 963
9.1.4.3. — Agente emulsivo .................................................................................................................. 964
9.1.5. —Agentes emulsivos para uso interno ................................................................................................ 965
9.1.5.1. — Agentes emulsivos naturais.................................................................................................. 965
: y. 1.5.2. — Agentes emulsivos sintéticos .............................................................................................. 969
9.1.5.2.1. — Agentes não Jónicos ............................................................................................ 969
9.1.5.2.1.1.—Aplicação da noção de equilíbrio hidrófilo-hipólilo à preparação
de emulsões ........................................................................................ 972
9.1.5.2.2. —Agentes anfotéricos ou anfólitos ........................................................................ 984
9.1.5.3. _ Agentes emulsivos auxiliares .............................................................................................. 984
9.1.5.3.1. — Derivados da celulose .......................................................................................... 984
9.1.5.3.2. — Alginatos................................................................................................................ 985
í • 9.1.5.3.3. — Pectina.................................................................................................................... 987
; ' 9.1.5.3.4. —Gelose .................................................................................................................... 987
9.1.5.3.5. —Alga perlada.......................................................................................................... 988
9.1.5.3.6. — Dextrinas................................................................................................................ 988
9.1.5.3.7. — Sólidos finamente divididos ................................................................................ 988
9.1.6. — Agentes emulsivos para uso externo .............................................................................................. 989
9.1.6.1.—Agentes emulsivos naturais.................................................................................................. 990
9.1.6.1.1. —Saponinas .............................................................................................................. 990
9.1.6.1.2. — Ceras ...................................................................................................................... 990
9.1.A. 1.3. —Lanolina ................................................................................................................ 990
9.1.6.2.—Agentes emulsivos sintéticos .............................................................................................. 991
9.1.6.2.1. —Agentes aniónicos ................................................................................................ 991
9.1.6.2.1.1. —Sabões ................................................................................................ 991
9.1.6.2.1.2. — Compostos sulfatados e sulfonados ................................................ 994
9.1.6.2.2. — Agentes catiónicos ................................................................................................ 995
9.1.6.2.3. — Agentes não iónicos ............................................................................................ 997
9.1.7.— Métodos de emulsificação ................................................................................................................ 998
9.1 .S. _ Verificação das emulsões ..................................................................................................................
1001
9.1.9 — Formulário das emulsões ....................................................................................................................
1003
9.2. — Dispersões coloidais e suspensões ..............................................................................................................
1009
9.2.0.1. — Dispersões coloidais.................................................................................................. 1010
9.2.0.1.1. —Generalidades e terminologia .............................................................................. 1010
9.2.0.1.2. — Estabilidade dos colóides .................................................................................... 1011
9.2.0.1.2.1. — Estabilidade dos soles liófobos ...................................................... 1011
9.2.0.1.2.2. —Estabilidade dos soles liófilos .......——........................................ 1013
9.2.0.1.2.3. — Efeito dos electrólitos ................................-,——......................... 1014
9.2.0.1.2.4. — Associação de colóides .................................................................... 1015
9.2.0.1.3. — Preparação das soluções coloidais...................................................................... 1016
9.2.0.1.3.1.—Métodos de dispersão ...................................................................... 1017
9.2.0.1.3.2. —Métodos de condensação ................................................................ 1018
9.2.0.1.4. — Formulário das dispersões coloidais .................................................................. 1020
9.2.0.2. — Suspensões ...................-..............—.———.....——.............................................................. 1022
9.2.0.2.1.— Generalidades......................................,....-,——.................................................. 1022
9.2.0.2.2. — Aspecios físicos das suspensões ........................................................................ 1024
9.2.0.2.2.1. —Flutuação das partículas suspensas .......,........................———.—— 1024
9.2.0.2.2.2. — Sedimentação ............................................................................ 1027
9.2.0.2.2.3. —Crescimento dos cristais ......———...........................................,..,.... 1030
1134

9.2.0.2.2.4. — Redispcrsibilidade ............................................................................ 1033


9.2.0.2.2.4.1.— Avaliação das propriedades das suspensões ..........
9.2.0.2.3. — Preparação das suspensões .................................................................................. 1039
9.2.0.2.3.1. — Redução do tamanho das partículas .............................................. 1041
- - 9.2.0.2.3.2. — Suspensões que não necessitam de agenles suspensores ............ 1045
9.2.0.2.3.3. — Aumento da viscosidade da fase dispersante .............................. 1046
• •; • • • • 9.2.0.2.3.4. — Floculação controlada ...................................................................... 1057
9.2.0.2.4. — Tipos de suspensão.............................................................................................. 1059
;:.Y_ÍÍÍ 9.2.0.2.5. — Incompatibilidades ................................................................................................ 1063
9.2.0.2.6. — Conservação das suspensões .............................................................................. 1064
9.2.0.2.7. — Ensaio das suspensões ........................................................................................ 1065
9.2.0.2.7.1. — Determinação do tamanho das partículas suspensas .................... 1065
9.2.0.2.7.2. — Viscosidade e comportamento reológico ...................................... 1068
9.2.0.2.7.3. — Determinação do potencial zela .................................................... 1070
9.2.0.2.8. —Formulário das suspensões.................................................................................. 1071
9.2.1. — Formas complementares das suspensões: aerossoles...................................................................... 1078
9.2.1.1. —Definição e generalidades................................................................................................... 1078
9.2.1.2. — Aerossoles primitivos .......................................................................................................... 1079
9.2.1.3. — Aerossoles propriamente ditos ......,...,.................—............................................................. 1083
9.2.1.3.1. — História .................................................................................................................. 1083
9.2.1.3.2. — Vantagens e emprego .......................................................................................... 1084
9.2.1.3.3.— Tipos de aerossoles.............................................................................................. 1086
9.2.1.3.3.1.—Sistemas com gases liquefeitos ...................................................... 1086
9.2.1.3.3.2.—Sistemas com gases comprimidos .................................................. 1089
9.2.1.3.4.— Preparação de aerossoles .................................................................................... 1091
9.2.1.3.4.1. — Propclcntes ....................................................................................... 1094
9.2.1.3.4.2. —Recipientes e válvulas .................................................................... 1101
9.2.1.3.4.3. —Enchimento dos recipientes ............................................................ 1103
9.2.1.3.5.— Ensaio dos aerossoles .......................................................................................... 1107
- . 9.2.1.3.6.— Formulário dos aerossoles .................................................................................. 1109

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