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____________________________________________________________ Cristina Carapeto

Introdução

O papel crucial da componente biótica no ciclo dos materiais na Terra é uma


descoberta relativamente recente. O movimento dos materiais através dos
ecossistemas é impulsionado pelo movimento da energia. No capítulo anterior vimos
que as cadeias alimentares representam uma sequência linear de transferência de
energia desde os produtores até aos consumidores de topo. A essência deste
padrão é o consumo: a transferência de energia é activada pelo consumo de
carbono pelos produtores e pelo consumo de outros organismos pelos seres
heterotróficos. Neste processo muitos materiais, incluindo a água, são transferidos
juntamente com a energia.

Ao contrário da energia, o material orgânico e inorgânico movimenta-se nos


ecossistemas de uma forma cíclica1 e contínua. Os elementos químicos movem-se
dos produtores para os consumidores e destes para o meio físico de forma a que os
materiais possam ser reutilizados continuamente. Em muitos casos estes ciclos
dependem da actividade dos decompositores para devolverem os materiais ao
ecossistema. Tais sequências são importantes porque diferentes organismos têm a
capacidade de decompor diferentes tipos de materiais. Estes ciclos transferem
elementos químicos entre os organismos e o meio abiótico (donde lhes vem o nome
de ciclos biogeoquímicos), servem para a formação de tecidos orgânicos e por
último servem de alimento aos organismos nos diversos níveis tróficos. Pelas razões
expostas os ciclos mencionados têm também o nome de ciclos de nutrientes.

Dos 92 elementos naturais que ocorrem, cerca de 40 são essenciais à vida, sendo
que seis destes formam cerca de 95% da massa dos seres vivos (animais, plantas,
microrganismos). São eles o carbono, o oxigénio, o hidrogénio, o nitrogénio, o
fósforo e o enxofre. Estes elementos, e alguns outros, são necessários em
quantidades relativamente elevadas e por isso são chamados macronutrientes.

1
É importante perceber que o movimento dos materiais é potencialmente, mas não necessariamente,
cíclico. Numa escala global existe uma tendência para que estes movimentos sejam cíclicos mas sob
determinadas circunstâncias alguns elementos podem permanecer durante longos períodos num
componente do ecossistema onde fiquem indisponíveis para outras partes do sistema.
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Outros elementos como o zinco, o cobre ou o ferro são necessários à vida em


quantidades muito menores pelo que são classificados como micronutrientes.

Fig. 1 Ciclo de materiais e de nutrientes nos ecossistemas

Além do hidrogénio e do oxigénio, quatro outros elementos (C, N, P e S) têm uma


importância especial no estudo do nosso planeta. Devido à existência de vida na
Terra, cada um destes quatro elementos segue um ciclo na Natureza, onde passa
através de estados moleculares de energia cada vez mais elevados, à medida que
os elementos são incorporados nas células de organismos; em seguida, eles
percorrem o caminho inverso, através de estados moleculares de energia cada vez
mais baixa, à medida que os organismos se decompõem. Na ausência de
perturbações significativas, estes processos definem um ciclo natural para cada
elemento, com um equilíbrio entre as suas fontes e os seus depósitos, quase
perfeito. Muitos fluxos geoquímicos ocorreriam mesmo na ausência de vida, apenas
porque todas as formações geológicas estão constantemente a sofrer erosão e a
degradar-se. Os vulcões libertam enxofre para a atmosfera quer haja ou não

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organismos presentes. Por outro lado, os organismos alteram a velocidade relativa


dos fluxos. No entanto, a actividade humana aumentou de tal forma desde a
Revolução Industrial, que tem que ser olhada e tida como uma perturbação
significativa destes ciclos biogeoquímicos.

O ciclo dos nutrientes tem sido muitas vezes estudado pela introdução de
marcadores radioactivos nos ecossistemas. Por exemplo, Whittaker (1961) seguiu a
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introdução do ácido fosfórico marcado com P num aquário. Ele verificou uma
sequência definida da tomada do nutriente:

32
1. P era rapidamente absorvido pelo fitoplâncton e subsequentemente libertado

2. Algas filamentosas nos lados e no fundo do aquário lentamente absorviam o 32P

32
3. Os crustáceos que se alimentavam das algas absorviam o P ainda mais
lentamente

32
4. P começou a acumular-se nos sedimentos do fundo e era sequestrado em
formas menos reactivas.

Este tipo de ciclo é semelhante ao que acontece em lagos naturais; o fósforo e


outros nutrientes acumulam-se nos sedimentos do fundo, tornando-se indisponíveis
para serem utilizados, razão pela qual o fósforo é tantas vezes o nutriente limitante
nos lagos.

Os ciclos de nutrientes podem ser vistos de duas formas: os ciclos locais, tal como o
exemplo acima descrito, que envolve elementos sem mecanismos para transporte a
longa distância e os ciclos globais que abrangem intercâmbios envolvendo
mecanismos de transporte a longa distância.

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Os ciclos biogeoquímicos, que podem ser mais ou menos complexos, consoante o


elemento em causa, podem ser divididos em dois tipos básicos: os ciclos gasosos
nos quais o reservatório do elemento é a atmosfera ou a hidrosfera e os ciclos
sedimentares em que os elementos têm como reservatório a crusta terrestre.
Ambos os tipos estão intimamente ligados ao ciclo hidrológico. Como exemplo de
elementos que seguem o ciclo gasoso temos o oxigénio, o hidrogénio e o nitrogénio,
enquanto que o ferro, o fósforo e o zinco, para mencionar apenas alguns, seguem o
ciclo sedimentar.

Os nutrientes são muitas vezes o factor limitante da produtividade primária e


secundária e a circulação de substâncias biologicamente importantes depende da
sua quantidade absoluta e da sua velocidade de reposição. Quando a reposição é
lenta, o meio físico em questão, pode tornar-se demasiado pobre num ou mais
elementos, limitando a produtividade. Os ecossistemas não são unidades isoladas e
os nutrientes entram nos diversos sistemas e partem desses mesmos sistemas por
mecanismos de transporte biológicos, geológicos e meteorológicos. Os mecanismos
de transporte biológico incluem a movimentação dos organismos, ou de partes
deles, através dos ecossistemas. O transporte de nutrientes por mecanismos
meteorológicos incluem aqueles que vêm dissolvidos na água da chuva ou da neve,
gases atmosféricos e poeiras carregadas pelo vento. O transporte geológico inclui
elementos levados por correntes de água superficiais ou subterrâneas.

Iremos considerar o ciclo de quatro elementos cruciais para a vida: o ciclo do


carbono (C), o ciclo do nitrogénio (ou ciclo do azoto) (N), o ciclo do fósforo (P) e o
ciclo do enxofre (S). Cada ciclo difere dos outros em formas muito importantes.
Tomados em conjunto eles ilustram os aspectos essenciais dos ciclos globais. As
suas diferenças e semelhanças estão ilustradas na tabela 3.1.

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Tabela 3.1 - Alguns aspectos principais de quatro importantes ciclos biogeoquímicos

Elemento Tipo de Reservatórios Aspectos especiais


ciclo

Carbono Gasoso Grandes quantidades na Intimamente relacionado com os


atmosfera e nos oceanos processos da energia através da
fotossíntese; não requer organismos
especializados para a sua conversão
química.

Nitrogénio Gasoso Grandes quantidades na Requer organismos especializados para


atmosfera várias das suas transformações
químicas.

Fósforo Sedimentar Grandes quantidades de A sua disponibilidade depende do pH da


fosfatos nas rochas água ou do solo; pode ficar retido nos
sedimentos profundos por isso o tempo
para completar o seu ciclo pode ser
muito longo.

Enxofre Sedimentar Grandes quantidades na São necessárias bactérias


atmosfera, que não é o seu especializadas para a conversão de
reservatório, e nos algumas das suas formas
sedimentos

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Ciclos Biogeoquímicos: Definições

¾ Reservatório: Uma porção de matéria definida pelas suas características físicas,


químicas e biológicas e que, para efeitos práticos, se considera homogénea.

¾ Fluxo: Quantidade de matéria transferida entre reservatórios por unidade de


tempo.

¾ Fonte: Fluxo de matéria para o interior de um reservatório.

¾ Sumidouro: Fluxo de matéria para o exterior de um reservatório.

¾ Tempo de Renovação: Tempo necessário para esvaziar o conteúdo de um


reservatório caso se suprimam as fontes e se mantenham os sumidouros.

¾ Ciclo: Um sistema constituído por dois ou mais reservatórios interconectados


através de processos de transferência de matéria, os quais ocorrem de uma forma
cíclica (conservação de massa).

Cristina Carapeto
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O Ciclo Hidrológico

O ciclo hidrológico, ou ciclo da água, é o processo de reciclagem global da água.


Neste processo, que é fortemente dependente da energia solar, existem dois
componentes: a evaporação e a precipitação. Cerca de 1/3 da energia solar é
dissipada neste ciclo.

A principal fonte de água são os oceanos. A energia radiante faz com que a água se
evapore para a atmosfera, os ventos distribuem-na sobre a superfície do globo e a
precipitação fá-la regressar à terra onde pode ser armazenada, temporariamente,
nos solos, lagos e calotes polares. A perda de água ocorre pela evaporação,
transpiração ou como fluxo líquido através dos rios e ribeiros e dos lençóis de água
subterrâneos, a partir dos quais regressa de novo aos oceanos. É o movimento da
água, sob a influência da força da gravidade, que une o movimento dos nutrientes
das comunidades terrestres e aquáticas. As comunidades terrestres perdem
nutrientes dissolvidos e particulados para as correntes superficiais e subterrâneas;
os sistemas aquáticos ganham nutrientes vindos das descargas das correntes
superficiais e das águas subterrâneas.

De acordo com Ricklefs & Miller (2000), o total de água disponível na Terra é de
cerca de 1,4 milhares de milhão de km3, ou seja, 1.400.000 × 1018 g. Mais de 97% de
toda a água disponível encontra-se nos oceanos. Outros reservatórios de água
disponível incluem as calotes polares, glaciares (29.000 × 1018g), aquíferos (8.000 ×
1018g), lagos e rios (100 × 1018g), humidade do solo (100 × 1018g), vapor de água na
atmosfera (13 × 1018g) e toda a água armazenada nos organismos vivos (1 × 1018g).1

Na terra, a precipitação excede a evapotranspiração2. Sobre os oceanos, a


evaporação excede a precipitação numa quantidade semelhante. Muita da água que
se evapora dos oceanos é transportada pelos ventos para os continentes onde cai
sob a forma de chuva, neve ou granizo. Este fluxo de vapor de água atmosférico

1
Note que, porque a densidade da água é massa / volume (g/cm3), 1g = 1 cm3
2
Evapotranspiração é a perda total de água, por evaporação, através das plantas e do solo,
simultaneamente.

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proveniente dos oceanos em direcção à terra (40 × 1018g / ano), é equilibrado pelas
escorrências desta de volta para as bacias oceânicas. Quer isto dizer que muitos
ecossistemas terrestres sobrevivem devido à água que se evapora dos oceanos.

Os efeitos indirectos da perda de água no ciclo hidrológico são profundos. Na


maioria dos ecossistemas naturais a precipitação é interceptada pela vegetação,
infiltra-se nas camadas superficiais do solo e serve para recarregar os aquíferos.
Depois, a sua libertação gradual, através de nascentes, mantém o fluxo de rios e
ribeiros a níveis relativamente uniformes. O reservatório de água subterrânea pode
ser suficiente para manter o fluxo dos cursos de águas superficiais que alimenta,
mesmo em períodos de seca. Além disto, muitas impurezas, detritos e
microrganismos são retidos no solo durante este processo de infiltração. As
actividades humanas e a necessidade de criar mais espaço para o nosso
estabelecimento têm provocado grandes alterações no ciclo hidrológico. À medida
que se destroem as florestas, ou quando os terrenos são submetidos a pastagens
intensivas, o caminho natural da água é desviado do processo de infiltração para as
escorrências superficiais, passando a água a correr directamente para os rios e
ribeiros. O desenvolvimento urbano e suburbano representa o caso mais extremo.
Além de alterar profundamente o relevo da Terra, o processo das escorrências
superficiais é fortemente acentuado pela impermeabilização das cidades, onde se
substitui o solo poroso por asfalto. Embora não haja uma perda efectiva de água no
cômputo final, há uma perda para o reservatório subterrâneo com consequências
graves para os ecossistemas e mesmo para nós.

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O Ciclo do Carbono

O carbono, juntamente com o oxigénio e o azoto, é um bom exemplo do primeiro

tipo de ciclos biogeoquímicos mencionados __ ciclos gasosos. O reservatório


atmosférico do dióxido de carbono é relativamente pequeno, sendo caracterizado
por uma grande actividade. Em contrapartida, os oceanos são reservatórios maiores.
Os combustíveis fósseis e outros depósitos deste elemento na crusta terrestre
aprisionam o carbono de forma eficiente e durante longos períodos de tempo.
Contudo, eles não constituem reservatórios de carbono, mas sim compartimentos
que podem até exceder em quantidade o reservatório atmosférico.

O dióxido de carbono é o principal componente gasoso da atmosfera de Marte e


Vénus e seria também o componente principal da atmosfera terrestre, se não fosse
a presença de vida no nosso planeta (Margulis e Lovelock, 1989). O dióxido de
carbono atmosférico entra nos ecossistemas terrestres e aquáticos através dos
organismos autotróficos que o utilizam para a síntese de matéria orgânica. Enquanto
as plantas terrestres utilizam o CO2 atmosférico como a sua fonte de carbono para a
fotossíntese, as plantas aquáticas usam os carbonatos dissolvidos. Estes dois sub-
ciclos (terrestre e aquático) estão ligados pelas trocas de CO2 entre a atmosfera e os
oceanos da forma que se segue:

CO2 atmosférico CO2 dissolvido


CO2 + H2O H2CO3 (ácido carbónico)

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Além disto, o carbono encontra o seu caminho, para as águas interiores e para os
oceanos, como bicarbonato que resulta do desgaste das rochas ricas em cálcio, tais
como o calcário e o cré1:

CO2 + H2O + CaCO3 CaH2(CO3)2


Dióxido de carbono + Água + Carbonato de cálcio Bicarbonato de cálcio

Durante a fotossíntese as moléculas de carbono reagem para formar compostos


orgânicos, como por exemplo a glicose, que servirão de alimento aos consumidores
e assim serão passados através das cadeias alimentares.

Dióxido de carbono + Água + Energia solar → Glicose + Oxigénio


6CO2 + 6H2O + E → C6H12O6 + 6O2

Posteriormente a respiração, as fermentações e as combustões irão devolver o


dióxido de carbono de novo à atmosfera. Na verdade, há várias maneiras de uma
mesma molécula de carbono ser devolvida ao meio abiótico de onde partiu. Da
mesma forma que, através da fotossíntese, as plantas sintetizam compostos
orgânicos a partir do dióxido de carbono, da água e da energia, elas irão libertar os
mesmos elementos no processo de respiração celular.

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calcário orgânico macio, formado de grãos de natureza diversa, designadamente fragmentos de
foraminíferos;

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Este processo resultará na produção de energia disponível, calor, dióxido de


carbono e água, o que pode ser ilustrado pela reacção seguinte:

Glicose + Oxigénio → Dióxido de carbono + Água + Energia


C6H12O6 + 6O2 → 6CO2 + 6H2O + E

O carbono libertado, sob a forma de dióxido de carbono, pode então reentrar na


componente abiótica do ciclo para ser novamente utilizado. Verifica-se que há
sempre uma quantidade de energia que é perdida sob a forma de calor e que não
poderá ser reutilizada, de acordo com as leis da termodinâmica. Nos animais, o
processo de respiração celular (moléculas orgânicas são decompostas a fim de
gerarem energia celular) também ocorre e, portanto, o carbono também pode ser
devolvido à atmosfera a nível dos consumidores. Se, no entanto, um átomo de
carbono passar dos produtores aos consumidores primários, depois aos
consumidores secundários e assim por diante, ele acabará por entrar na cadeia
alimentar dos decompositores. Estes consomem matéria orgânica morta de plantas
e animais e transformam-na em tecidos vivos. Para a sua actividade, estes
organismos necessitam de despender energia (respiração celular) libertando,
inevitavelmente, dióxido de carbono para a atmosfera.

O dióxido de carbono existente nas partículas do solo pode também dissolver-se na


água aí existente, reagir com outras substâncias e eventualmente juntar-se à água
dos rios sendo, assim, o carbono transportado para o mar. Aí o carbono poderá ser
incorporado nas conchas de diversos animais marinhos que, por sua vez, com o
tempo, se transformarão em rochas sedimentares, retirando, pelo menos
temporariamente, o carbono do seu ciclo. Depósitos do mesmo tipo (rochas
calcárias) também existem nos ecossistemas terrestres. Os combustíveis fósseis
são outro enorme compartimento sequestrador de carbono retirado do seu ciclo e

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que, não fosse a intervenção humana, seria apenas libertado aquando da ocorrência
de fenómenos naturais.

O padrão básico do ciclo do carbono está ilustrado na figura 2.

Difusão

Atmosfera:
CO2

Fotossíntese

Combustão de
combustíveis fósseis
Água:
CO2 dissolvido Plantas

Consumo

Animais

Sedimentos:
combustíveis fósseis
Decomposição

Fig. 2 Esquema do ciclo do carbono

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O Homem intervém no ciclo do carbono de duas formas principais: 1) pela


combustão do petróleo, carvão e gás natural (reservas de carbono isoladas
profundamente no nosso planeta) provocando uma libertação de dióxido de carbono,
e 2) pela desflorestação (as árvores utilizam e armazenam átomos de carbono para
fabricarem moléculas orgânicas).

A principal causa do aumento do CO2 atmosférico nos anos recentes tem sido a
utilização de combustíveis fósseis, mas a exploração das florestas tropicais também
provoca uma libertação significativa de CO2, embora o efeito exacto dependa do
facto de a floresta ser abatida para agricultura permanente, agricultura volante ou
produção de madeira. As queimadas que se seguem à maioria dos abates de
florestas rapidamente convertem alguma da vegetação em CO2 enquanto que o
apodrecimento da vegetação restante liberta CO2 durante um período de tempo mais
alongado.

Se as florestas são abatidas para fornecer campos agrícolas permanentes, o


conteúdo de carbono do solo é reduzido pela decomposição da matéria orgânica,
pela erosão e por vezes por remoções mecânicas da camada superior do solo. Os
abates de florestas para agricultura volante têm efeitos semelhantes, mas a
regeneração da flora do chão e da floresta secundária, durante o período de pousio,
recupera uma proporção do carbono originalmente perdido.

A agricultura volante e a extracção de madeira envolvem um abate "temporário" no


qual a libertação líquida de CO2 por unidade de área é significativamente menor que
no caso dos abates "permanentes" para agricultura e pastagens.

A quantidade total de carbono libertada para a atmosfera pelas actividades humanas


atinge os 5,1 a 7,5 x 109 toneladas por ano em comparação com as 100 x 109
toneladas libertadas naturalmente pela respiração do biota mundial (Mooney et al.,
1987). Para onde vai então o CO2 extra? O observado aumento atmosférico de CO2
é responsável por 2,9 x 109 toneladas por ano (igual a 39 - 57% das entradas
antropogénicas). O repositório para muito do restante é a dissolução nos oceanos.
Também é possível que as comunidades terrestres actuem como um depósito para
o CO2 atmosférico. Assim, parte do aumento do CO2 pode servir como "fertilizante"
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para as comunidades terrestres e ser assimilado em biomassa extra. Sabe-se que
aumentando a concentração de CO2 em ambientes controlados se aumenta as
velocidades de fotossíntese e crescimento de muitas espécies de plantas (Strain,
1987).

Estimativas para as futuras emissões e concentrações de CO2 a esperar na


atmosfera variam de forma considerável. Um aumento atmosférico da concentração
de um gás radiativo como o CO2 pode causar um aquecimento global da Terra,
através do chamado efeito de estufa. A atmosfera comporta-se como o vidro de uma
____
estufa durante o dia a radiação solar aquece a superfície da Terra que a seguir
re-irradia energia para fora, principalmente como radiação infra-vermelha. O CO2 é
um dos gases (juntamente com os óxidos de nitrogénio, o metano, o ozono e vários
fluorcarbonetos) que, como o vidro de uma estufa, absorve a radiação infra-
vermelha e mantêm a temperatura elevada. Acredita-se que presentemente a
temperatura do ar à superfície da terra é 0,5 ± 0,2 °C mais quente do que em
tempos pré industriais.

Geológico

Biótico
+
Biótico
Químico Agro-industrial

Fig. 3 O ciclo global do carbono.

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O Efeito de Estufa

O efeito de estufa aparece como uma consequência da atmosfera ter uma


capacidade selectiva na sua resposta aos diferentes tipos de radiação que a
atingem. A atmosfera transmite facilmente a radiação solar permitindo que cerca de
50% a atravesse de forma inalterada e aqueça a superfície terrestre. A energia
absorvida pela Terra é irradiada de volta para a atmosfera, mas esta radiação
terrestre é uma radiação infravermelha de comprimento longo e, em vez de ser
transmitida através da atmosfera para o espaço, grande parte é absorvida pelas
nuvens, fazendo com que a temperatura da Terra aumente. Portanto, uma grande
parte da energia absorvida pela atmosfera é devolvida à superfície terrestre
oferecendo-lhe um aquecimento adicional. Este é considerado como um processo
semelhante àquele que se verifica nas estufas (permite que a luz solar entre e
aprisiona o calor) daí o nome de efeito de estufa.

2. A superfície da Terra
irradia calor (ondas
infravermelhas) para a
1. A energia solar, ao atmosfera e algumas
penetrar na atmosfera, escapam-se para o espaço
aquece a superfície da
Terra.

3. Os gases com efeito de


estufa e o vapor de água
absorvem alguma radiação
infravermelha e re-irradiam
parte dela para a Terra

4. Quando os gases com efeito de


estufa se acumulam na atmosfera,
mais calor é aprisionado na
superfície terrestre. A temperatura
das águas superficiais dos
oceanos sobe, mais vapor de água
entra na atmosfera e a temperatura
da superfície terrestre aumenta.

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Os gases com efeito de estufa actuam como uma substância isoladora colocada
sobre a Terra, mantendo o calor. Quando aumenta a concentração destes gases
aumenta a capacidade da atmosfera bloquear o escape das radiações
infravermelhas. Por outras palavras, a camada isoladora torna-se mais espessa.
Sem a existência de algum tipo de efeito de estufa global as temperaturas seriam
muito mais baixas do que as que se verificam, rondando talvez apenas os -17 °C,
em comparação com os +15 °C que é a temperatura média do planeta. O efeito de
estufa ajuda a compreender as elevadas e as baixas temperaturas que se observam
respectivamente em Vénus (que tem um "cobertor" de CO2 em seu redor) e em
Marte, onde a atmosfera é pouco espessa.

O efeito de estufa, sendo uma característica importante da atmosfera, é apenas


possível devido à existência de um pequeno grupo de gases que incluem o vapor de
água e que, no seu conjunto, formam menos de 1% do volume total da atmosfera.
Existem cerca de vinte destes gases com efeito de estufa. Depois do vapor de água,
os cinco mais importantes são o dióxido de carbono (CO2), o metano (CH4), os
clorofluorcarbonetos (CFCs), o óxido nitroso (N2O) e o ozono (O3). Todos este gases
aumentaram a sua concentração atmosférica desde a Revolução Industrial até aos
nossos dias, sendo o dióxido de carbono o mais importante de todos eles. O CO2
tem um potencial de aquecimento, por unidade de gás, mais baixo que os outros
gases, mas existe em muito maior quantidade na atmosfera. Sem qualquer dúvida,
os gases com efeito de estufa presentes na atmosfera são muitíssimo influenciados
por processos naturais. Por exemplo, dois terços do óxido nitroso na atmosfera
provêm de solos naturais e dos oceanos e um terço do metano provem dos
pântanos e da acção das térmitas. Os vulcões podem emitir enormes quantidades
de poeiras, carbono e também enxofre para a atmosfera. Contudo, o aumento
regular dos gases com efeito de estufa nos últimos 100 anos não pode ser
facilmente explicado pelas causas naturais. Também ninguém duvida do facto de
que a presença dos gases com efeito de estufa é influenciada pelas actividades
humanas. De destaque são as actividades de mineração e queima de combustíveis
fósseis, as quais são responsáveis por 75% do aumento das emissões de CO2,
cerca de 39% das emissões de metano e 36% das emissões de óxido nitroso. As
alterações na utilização dos solos, pela desflorestação, pela implementação de
campos de cultivo intensivo de arroz, pela criação de animais domésticos e pelo

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aumento dos solos agrícolas, são responsáveis por cerca de 25%. Por isso os
efeitos antropogénicos causam quase 75% do aumento dos gases com efeito de
estufa e os processos naturais apenas 25%. É muito difícil ter estimativas correctas
e exactas sobre as emissões de gases com efeito de estufa a partir das actividades
humanas, no entanto muito do CO2 emitido é provocado pela queima industrial de
combustíveis fósseis e pela manufactura de cimento, o que é facilmente
documentado na nossa sociedade actual.

Para onde vão as emissões de carbono dependentes das actividades humanas?


Pelo menos uma parte será absorvida pela atmosfera, pois tem-se verificado que a
concentração atmosférica de CO2 continua a aumentar desde o início da Revolução
Industrial. Contudo, o aumento das concentrações atmosféricas não é suficiente
para explicar o destino de todo o dióxido de carbono emitido. Sabe-se também que
os oceanos absorvem uma enorme quantidade, mas mesmo assim o equilíbrio só se
explica se tomarmos em consideração um reservatório de carbono não identificado.

Para a década de 80 o ciclo global do carbono pode ser resumido da forma que se
segue (WHRC, 2002) (as unidades estão em PgC)2:

Aumento Emissões de Emissões líquidas Reservatório de


_ Absorção _
atmosférico = combustíveis + de alterações no pelos oceanos
carbono não
fósseis uso dos terrenos identificado

3,3 (±0,2) 5,5 (±0,5) 1,6 (±0,7) 2,0 (±0,8) 1,8 (±1,2)

A média anual de emissões de 7,1 PgC durante a década de 1980 (5,5 ±0,5 Pg da
combustão de combustíveis fósseis e 1,6 ±0,7 Pg das alterações no uso dos
terrenos) é maior que a soma da acumulação anual de carbono na atmosfera (3,3
±0,2) e a absorção anual de carbono pelos oceanos (2,0 ±0,8). Um reservatório
adicional de 1,8 PgC/ano é necessário para equilibrar o orçamento. Este
reservatório de carbono não identificado tem sido alvo de grandes atenções já que
ele é indispensável para explicar o equilíbrio do ciclo do carbono. Contudo a sua
identificação permanece difícil.

2
Pg (pentagrama); 1 Pg = 1015
9

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