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História da Publicidade e da Propaganda: Campo da Historiografia

da Comunicação e da História do Brasil1


SANTOS, Moacir José dos 2 (Doutor)
CARNIELLO, Monica Franchi3 (Doutora)
Universidade de Taubaté - SP

Resumo: A publicidade e propaganda constituem recurso fundamental na instrumentalização dos meios


de comunicação de massa como elemento de interação política e social do poder público e da iniciativa
privada com a população. A partir desta constatação, delineou-se como objetivo apresentar e discutir as
características relacionadas à história da publicidade e da propaganda que permitem defini-la como um
campo de pesquisa e apontar os eixos temáticos adequados a seu aprofundamento. Concernente a esse
objetivo se realizou a discussão teórica dos desafios metodológicos para a produção do conhecimento
acerca da história da publicidade e da propaganda. Conclui-se que o campo da história da publicidade e
da propaganda representa um espaço pertinente a interação entre a história e a comunicação, com a
utilização das técnicas de pesquisa histórica sob a perspectiva dos estudos da área da comunicação.

Palavras-chave: história da publicidade e da propaganda; historiografia da comunicação.

Introdução
A história do Brasil tem como característica, nas últimas décadas, o papel
desempenhado por empresas de comunicação ou grupos políticos que usam
estrategicamente ações de comunicação em diversos tipos de plataformas para atingirem
seus objetivos. Ressalta-se o uso político da publicidade e da propaganda, entretanto,
sua presença é mais ampla no conjunto da sociedade brasileira. Essa condição não é
uma exclusividade nacional e sim um vetor da experiência contemporânea. Atualmente,
poucas sociedades estão distantes da experiência midiática e das condições que a
caracterizam. A história do século XX pode ser investigada sob variadas perspectivas.
Entre elas, a história da comunicação e demais campos a ela correlatos. A história da
publicidade e da propaganda é, com certeza, um campo a ser explorado com maior
profundidade, com contribuições inegáveis para a compreensão do papel histórico da
comunicação.
O presente artigo parte da constatação da existência de investigações sobre o uso
1
Trabalho apresentado no 10º Encontro Nacional de História da Mídia - Alcar 2015 - GT História da
Publicidade e da Comunicação Institucional. Porto Alegre, RS - 03 a 05 de junho de 2015.
2
Doutor em História – UNESP. Docente do Mestrado em Planejamento e Desenvolvimento Regional da
Universidade de Taubaté – SP. E-mail: professormoacirsantos@gmail.com
3
Doutora em Comunicação e Semiótica – PUCSP. Docente do Mestrado em Planejamento e
Desenvolvimento Regional da Universidade de Taubaté – SP. E-mail: monicafcarniello@gmail.com
da propaganda e da publicidade com intuitos políticos, especialmente os detentores do
poder em determinado momento histórico (BRIGS & BURKE, 2004). A emergência dos
meios de comunicação de massa, ainda no início do século XX, apesar do caráter
incipiente inerente a todo campo de atuação humana em constituição, contou com a
apropriação política. Da União Soviética à Alemanha Nazista, do Estado Novo de
Getúlio Vargas à Ditadura Militar e das democracias do passado e do presente, bem
como regimes opressores pretéritos e contemporâneos. Não há regime político ou
Estado isento do uso dos recursos dos meios de comunicação de massa.
A publicidade e propaganda ocupam espaço privilegiado na instrumentalização
dos meios de comunicação de massa como elemento de interação política com a
população. Tal constatação evidencia a necessidade de se explorar a história da
publicidade e da propaganda como campo de conhecimento subjacente a história da
comunicação, vinculado também ao próprio campo da pesquisa histórica. Observa-se
que a história da publicidade e da propaganda tem a condição de associar áreas distintas,
mas conexas, Comunicação e História. Nota-se que os trabalhos realizados sob o prisma
da Comunicação e da História são pertinentes e contribuem para o avanço do
conhecimento. Contudo, o avanço para a estruturação de um campo de pesquisa capaz
de definir as especificidades da história da publicidade e da propaganda pode produzir
ganhos inequívocos para a interdisciplinaridade a ela subjacente.
O objetivo do presente artigo é apresentar e discutir as características
relacionadas à história da publicidade e da propaganda que permitem defini-la como um
campo de pesquisa e apontar os eixos temáticos adequados a seu aprofundamento.
Concernente a esse objetivo se realizará a discussão dos desafios metodológicos para a
produção do conhecimento acerca da história da publicidade e da propaganda. A
relevância da discussão apresentada no artigo corresponde à necessidade de avançar
quanto à interdisciplinaridade correlata a compreensão da dinâmica contemporânea. O
papel central da comunicação em suas diversas facetas tem como fator estruturante a
dinâmica histórica. Compreender essas intersecções favorece a construção do
conhecimento adequado tanto ao avanço do saber relativo aos processos de
comunicação quanto à constituição histórica da sociedade.
História da publicidade e da propaganda: campo de pesquisa
O papel central dos meios de comunicação na sociedade e na história
contemporânea é irrefutável. Esta realidade torna a reflexão e a estruturação de formas
de investigação do impacto dos meios de comunicação indispensável. Um modo
adequado de se produzir o conhecimento sobre essa realidade é a definição de campos
de pesquisa concernentes às características dos meios de comunicação de massa. A
publicidade e a propaganda têm destaque no leque de atividades midiáticas,
particularmente por seu papel estratégico para expansão e reprodução de empresas
privadas e na comunicação governamental. Embora os interesses privados sejam
distintos das atividades relacionadas ao poder público, faz-se necessário admitir o
objetivo, daqueles que ocupam o poder, em cativar a opinião pública e cria condições
propicias a sua manutenção no poder (CAPELATO, 2011).
Nota-se, a significativa extensão de práticas a espaços sociais tocados por
procedimentos relativos à publicidade e propaganda (ORTIZ, 1994). Investigar, sob a
perspectiva histórica, a dinâmica social concernente publicidade e a propaganda implica
em reconhecer seu impacto sobre a formação da opinião pública, seja sob a perspectiva
do consumo ou dos processos políticos historicamente constituídos. Ao constatar-se a
dupla condição característica à publicidade e a propaganda, identificam-se os dois eixos
temáticos relacionados à sua constituição. O primeiro eixo é relacionado à função
econômica da publicidade e da propaganda, o convencimento e a persuasão do
consumidor. O segundo eixo remete a apropriação dos mecanismos pertinentes à
publicidade e a propaganda como intermediação entre o poder público e a sociedade.
Neste sentido, mesmo quando revestido de caráter informativo o fluxo de informação
entre o poder público e a sociedade, é elaborado e realizado com o uso de critérios
derivados da publicidade e da propaganda.
O vínculo entre publicidade e propaganda e os interesses econômicos é visceral.
E o desenvolvimento da publicidade e da propaganda está diretamente correlacionado à
dinâmica do capitalismo (HARVEY, 2011). A expansão do capital sustentou a sua
estruturação. Observa-se, contudo, a subordinação da publicidade e da propaganda aos
paradigmas sociais e culturais vigentes em cada sociedade e período histórico. A
historicidade da publicidade e da propaganda produz um campo de pesquisa
conveniente à investigação da tensão entre os valores socialmente consolidados e a
contínua transição típica do capitalismo, correspondente ao objetivo de se convencer o
consumidor a contribuir com o ciclo de realização do capital.
A publicidade e a propaganda ocupam função estratégica na reprodução do
capital. Seu papel de convencimento, de articulação de novas necessidades de consumo
e da identificação entre o papel social e os produtos consumidos que permitem essa
associação é vital. Walter Benjamin notou, argutamente, a correlação entre consumo e
papel social ao descrever o flâneur na Paris da segunda metade do século XIX (1985). O
personagem caracterizado por Benjamin é um novo tipo social, correspondente à
decadência da aristocracia e a emergência de uma burguesia ansiosa por ser reconhecida
por elementos não financeiros ou produtivos. É a busca da aura de relevância adequada
à distinção social em reformulação no mundo do capitalismo industrial. A sociabilidade
pré-revolução francesa associava a nobreza aos gestos e comportamentos considerados
relevantes, legitimadores da posição social e política que cada indivíduo ocupava.
Norbert Elias (2011) caracteriza a corte francesa como o epicentro de uma sociabilidade
aristocrática definidora dos hábitos, comportamentos e valores considerados superiores.
A Revolução Francesa e a difusão dos valores a ela associados, acrescida das
consequências relacionadas à expansão industrial alterou drasticamente as estruturas
sociais característica do Antigo Regime. Em pleno século XIX as referencias dos
valores e comportamentos considerados legítimos encontravam-se em reformulação. O
flâneur é um personagem extremo, caricato e concentrador dos elementos presentes na
formação da sociedade burguesa e dos gostos, gestos e comportamentos considerados
elegantes, desejáveis. O mundo da aristocracia tornara-se decadente, descartável. Mas o
universo industrial, focado no produtivismo é áspero, rude, pois associado à mercadoria
e as relações tensas presentes na constituição do capital e nos seus conflitos com a
classe operária em transformação. Enquanto Marx (2013) captou a tensão e os conflitos
subjacentes formação, reprodução e expansão do capital com alterações nas relações
sociais, na organização dos territórios e dos Estados com efeitos econômicos e políticos
até então inéditos poetas e escritores como Charles Baudelaire e Edgar Alan Poe
captaram a emergência de novos tipos sociais correspondentes a novas formas de
sociabilidade e vivência da sociedade moderna (BENJAMIN, 2006).
Baudelaire caracteriza o flâneur como o sujeito despreocupado, desvinculado
das contradições e lutas presentes na gênese da modernidade e no processo de sua
efetivação, a modernização. A leitura desatenta qualifica o flâneur em oposição ao
financista, ao industrial, a elite econômica em ascensão com o capitalismo industrial e
também a classe operária, as mazelas inerentes a sua inserção na sociedade e nas
relações produtivas capitalistas. Entretanto, o flâneur supera a condição de ser o
contraponto ao mundo do trabalho e aos extremos nele presente. O flâneur transita na
cidade e nas possibilidades ensejadas com a modernidade. Observa, circula e consome
sob critérios de existência cujo cerne tem como motivação sua distinção das condições
objetivas do mundo do trabalho e do mundo capital. O flâneur existe e desfruta da
modernidade.
Como personagem literário o flâneur concentra a vontade de experimentar a
modernidade, compreende-la, sem o envolvimento com as condições de sua produção.
O flâneur permite a compreensão da modernidade e das suas contradições. Sua presença
na literatura é sintoma do desejo de vivenciar a modernidade e da superação das suas
contradições, ao menos sob a perspectiva da experiência pessoal. O flâneur é também
um personagem social, pois condensa a vontade social de se depreender da realidade
material e experimentar as inovações e surpresas da modernidade. Nova sociabilidade,
novas tecnologias, novos objetos e o consumo como vetor da modernidade. Transcende-
se a tradição. Repudia-se a repetição dos usos e dos costumes como fonte de
legitimidade.
Ainda assim, vivenciar por completo a aventura da modernidade é para poucos,
para aqueles com recursos para mergulhar na modernidade. Ao investigar a constituição
da arte moderna Bourdieu desenvolve uma abordagem provocativa para a sociologia da
arte do século XIX e do início do século XX (1996). O sociólogo afirma que a criação
artística revolucionária, transgressora das regras acadêmicas constituídas nos séculos
anteriores e base tanto da criação artística quanto da apreciação da arte pro parte do
publico, era uma atitude possível apenas aos artistas com recursos econômicos
adequados a torná-los independentes da simpatia dos críticos de arte e do público ou
abnegados o suficiente para sujeitarem-se a condições de vida típicas da pobreza ou
mesmo da miséria. O flâneur é análogo ao artista moderno, realiza-se somente quando
desprendido das exigências sociais relacionadas a trabalho e a aceitação social.
O sucesso literário do flâneur corresponde ao talento de Poe e Baudelaire.
Porém, a repercussão do flâneur também corresponde a uma aspiração comum aos
sujeitos sociais do século XIX e dos períodos históricos subjacentes, experimentar a
modernidade. A publicidade e a propaganda conectam os consumidores com os objetos
e conceitos cuja aquisição remete ao envolvimento com os sonhos e desejos típicos da
modernidade. O consumo é o caminho para a realização e não um meio de subsistência.
Eis a promessa da modernidade, realização pessoal, concretização da felicidade como
experiência imediata, sem a espera do paraíso.
O desenvolvimento da publicidade e da propaganda no século XIX conecta-se a
própria urgência em incorporar os consumidores de modo em efetivar o processo de
consumo como mecanismo de realização dos investimentos capitalistas. Desse modo, a
função econômica da publicidade e da propaganda é o convencimento e a persuasão do
consumidor para integrá-lo mais efetivamente ao processo econômico. Vivenciar a
modernidade é o atrativo oferecido com a publicidade e a propaganda. O consumidor
distingue-se do flâneur, mas acessa as experiências do flâneur. Consome sem
desvincular-se do mundo do trabalho, substrato da sua integração ao mercado.
O campo de pesquisa da história da publicidade e propaganda tem então, como
recorte delimitador, a experiência social do consumo e sua função, que excede a simples
reprodução do capital. Trata-se da integração simbólica e ideológica. Os mecanismos e
formas de criação publicitária respondem a essa lógica transcendente a função
econômica necessária as empresas e a sobrevivência das agências de publicidade. A
historicidade da publicidade e da propaganda é o mecanismo delineador da integração
das massas ao capitalismo. Imagens, textos, anúncios na imprensa, no rádio, da
televisão e mais recentemente na internet ainda obedecem a esse mecanismo de
integração social. De Adorno (1986) a Bauman (1998) a publicidade e a propaganda
constituem parte da investigação sobre a indústria cultural e seus desdobramentos.
Investigar a historicidade da publicidade implica, portanto, em situar a criação
publicitária como vetor de experiência simbólica e de como ela constitui-se sob esse
prisma.
O segundo eixo remete a apropriação dos mecanismos pertinentes à publicidade
e a propaganda como intermediação entre o poder público e a sociedade. Investigar as
conexões entre a elaboração dos fluxos de comunicação originados no Estado e nas
instituições a ele correlatas é uma opção de investigação significativa na historiografia e
nos estudos da área da comunicação. A dimensão política da comunicação está presente
de modo indelével nos debates sobre o papel do Estado e suas relações com a sociedade,
especialmente quando se trata de problematizar contextos históricos em que o exercício
autoritário do poder pautava as relações sociais e políticas.
Apesar da pertinência da produção relativa a esse eixo ainda é possível delinear
a necessidade de se buscar o historiar das lides relativas à constituição dos fluxos de
comunicação entre o poder público e a sociedade. Trata-se de investigar os processos de
elaboração dos mecanismos de exercício da publicidade e da propaganda situando os
agentes sociais envolvidos com sua estruturação. Propõe-se para esse eixo a perspectiva
de constituição de uma perspectiva de comunicação apta a complementar as
investigações centradas na análise de conteúdo. As investigações dedicadas à análise de
conteúdo tem o mérito de evidenciar os sentidos presentes em cada contexto de
elaboração dos mecanismos de publicidade e propaganda. No Brasil a historiografia
produziu trabalhos relevantes para a compreensão da história nacional mediante o
exame da comunicação oficial, especialmente nos momentos de exceção como o Estado
Novo (1937-1945) e a Ditadura Militar (1964-1985). As peças e estratégias de
comunicação foram examinadas a luz do seu contexto histórico e das relações de poder
pertinentes a sua constituição (BARBOSA, 2013).
A sugestão da realização de investigações centradas nos personagens envolvidos
com a elaboração das estratégias de comunicação governamental e da disseminação dos
conteúdos a ela pertinentes com as ações de publicidade e propaganda, tem a
possibilidade de favorecer a investigação da atuação dos sujeitos sociais e suas ações.
Reside aí o principal desafio para a efetivação deste procedimento. Localizar e propiciar
expressão para os sujeitos envolvidos com a estruturação da comunicação
governamental sob a perspectiva da publicidade e da propaganda. Trata-se de delinear
como os sujeitos históricos vivenciaram sua trajetória histórica, como percebiam sua
função e as possíveis contradições entre suas convicções e obrigações profissionais.
A estruturação da história da publicidade e propaganda como campo de pesquisa
remete a exploração mais acentuada dos dois eixos propostos sob a perspectiva da
comunicação, com a incorporação das técnicas de investigação concernentes a pesquisa
histórica, mas sob critérios relacionados ao conhecimento pertinente a comunicação. Os
debates realizados no campo da comunicação podem estimular a aplicação mais efetiva
da pesquisa histórica ao direcionar de modo mais conciso as investigações mediante
questionamentos e debates que os historiadores não promovem, pois se distinguem das
preocupações especificas deste campo de conhecimento. A próxima seção busca
apresentar os desafios metodológicos para a produção do conhecimento acerca da
história da publicidade e da propaganda enquanto campo de conhecimento caracterizado
por investigações originárias da área da comunicação e com a aplicação de técnicas de
investigação relacionadas à pesquisa histórica.

Metodologia da história da publicidade e da propaganda


A metodologia concernente a investigação da história da publicidade e da
propaganda tem como característica delineadora responder as demandas
epistemológicas originárias em duas áreas do conhecimento distintas apesar da relativa
proximidade, a comunicação e a história. Apesar do partilhar de determinados
elementos comuns como o privilegiar da investigação das ações humanas no tempo e no
espaço, ambas as áreas tem como vetores investigações e objetos específicos. De modo
sucinto é possível relacionar a especificidade da comunicação com o debate sobre a
estruturação e a realização dos fluxos de comunicação na sociedade. E a história tem
sua particularidade na investigação das diversas formas de ação dos homens ao longo
tempo (HALBAWCHS, 2006). E, a partir de suas respectivas áreas de atuação
comunicólogos e historiadores compartilham objetos de pesquisa em comum, sob
perspectivas distintas (MIGUEL, 2000). O dialogo entre os profissionais da área da
comunicação e da história pode produzir avanços consideráveis quanto ao conhecimento
produzido sobre os objetos em comum. A realização deste avanço possível está
associada à estruturação de procedimentos de pesquisa interdisciplinares, com a
utilização combinada de técnicas do campo da comunicação e da história (BARBOSA,
2013).
O principal desafio consiste em se detectar que a elaboração das ações de
publicidade e propaganda tem uma dinâmica particular, relacionada a demanda que
motiva a produção do conteúdo e as formas de produção disponíveis em cada momento
histórico. Além destas variáveis observa-se a pertinência de se considerar o papel
relativo aos sujeitos históricos envolvidos com a elaboração das ações e conteúdos de
publicidade e propaganda. Tais aspectos constituem referencias para delinear a
metodologia mais adequada a estruturação do campo de investigação da história da
publicidade e da propaganda.
A metodologia concernente a história da publicidade e da propaganda tem como
referência os recursos próprios a analise de conteúdo típica das pesquisas relacionadas
às investigações relacionadas semiótica e aos estudos da linguagem. Esses recursos
permitem empreender a análise de conteúdo de modo caracterizar as especificidades da
linguagem publicitária. Faz-se necessário acompanhar esse procedimento com o
estabelecer da correlação entre a linguagem publicitária, seu contexto histórico e os
propósitos que a motivam. Deste modo associa-se a investigação dos processos
constitutivos da linguagem publicitária e dos seus vínculos históricos, especialmente seu
lugar social, relacionando produção e público alvo. Por exemplo, a qualificação dos
profissionais que trabalham com publicidade e propaganda pode ser investigada como
um processo relacionado a própria competividade do setor e também a constituição de
um mercado de trabalho caracterizado por uma intensa especialização do trabalhador,
própria da dinâmica capitalista, especialmente na segunda metade do século XX.
O recurso da associação entre análise de conteúdo em associação a avaliação do
lugar social da produção e distribuição da publicidade e da propaganda favorece a
investigação da publicidade e da propaganda como espaço articulado a reprodução
capitalista, alicerçado no consumo e que necessita de um plano simbólico próprio, apto
a contribuir para o estimulo aos processos de produção e distribuição das mercadorias.
O desafio consiste em não se sucumbir a realização de um trabalho excessivamente
dedicado a analise de conteúdo sem relaciona-lo ao contexto histórico ou, o contrário,
privilegiar o processo histórico em seu delineamento mais amplo desconsiderando as
particularidades da publicidade e da propaganda em cada conjuntura histórica, que
contém condicionantes específicos ao trabalho técnico dos profissionais da área.
Outro desafio a formação de uma metodologia de investigação própria a história
da publicidade e da propaganda é a pertinência de se considerar o papel relativo aos
sujeitos históricos envolvidos com a elaboração das ações e conteúdos de publicidade e
propaganda (LAMBERT, 2000). Recuperar a atuação dos atores históricos responsáveis
por estruturar as atividades de publicidade e propaganda significa privilegiar um terreno
de investigação fecundo para a compreensão da dinâmica característica ao campo em
questão.
Empreender investigações sob a perspectiva histórica com foco na atuação dos
atores históricos do setor exige o uso de dois recursos, a depender do momento histórico
pesquisado. Um dos procedimentos é o uso das técnicas relativas a história oral para a
constituição e exame da memória dos personagens relacionados a publicidade e a
propaganda. O enfoque nas experiências profissionais conta com a possibilidade de
revelar os mecanismos de formação profissional não vinculados a formação escolar.
Favorece-se o reconhecimento das práticas profissionais formadoras dos trabalhadores
da área, apreendidas na convivência entre os profissionais mais experientes e os
iniciantes. Entretanto, o procedimento requer do pesquisador o exame crítico do relato
das fontes para evitar a conversão da investigação em hagiografia. Afinal, os relatos das
memórias dos pioneiros cumprem esse papel.
A pesquisa histórica distingue-se por propiciar voz as experiências históricas e
por, simultaneamente, examina-las criticamente mediante a comparação entre relatos
distintos e as condições de sua produção. Torna-se imprescindível avaliar os
depoimentos com o recurso da contextualização histórica e as atribuições realizadas aos
profissionais da área em suas empresas e as expectativas sociais e econômicas
delineadoras da existência da publicidade e da propaganda em cada conjuntura histórica.
Ao optar-se por aplicar os cuidados descritos neste artigo tem-se a condição de
produção de uma história da publicidade e da propaganda efetiva, apta a superar a
simples perspectiva memorialística.
Os cuidados correlatos à aplicação das técnicas da história oral para o
reconhecimento da atuação dos profissionais da publicidade e da propaganda é
parâmetro para a utilização de documentos produzidos no âmbito das agências de
publicidade e propaganda. Os procedimentos internos do trabalho de produção e
administração das agências constituem acervo fundamental para a investigação da
história da publicidade e da propaganda. O exame crítico destes documentos permite o
aprofundamento nos processos relativos à profissão e sua correlação com os demais
atores sociais que requerem o trabalho dos profissionais da área, desde empresas a
instituições públicas.

Considerações finais
O objetivo do presente artigo foi apresentar e discutir as características
relacionadas à história da publicidade e da propaganda, particularmente quanto a sua
estruturação enquanto campo de pesquisa e apontar os eixos temáticos adequados a seu
aprofundamento. Concernente a esse objetivo se efetuou a discussão dos desafios
metodológicos para a produção do conhecimento acerca da história da publicidade e da
propaganda.
Identificaram-se dois eixos associados ao campo da história da publicidade e da
propaganda. O primeiro eixo correlaciona-se a função econômica da publicidade e da
propaganda, o convencimento e a persuasão dos consumidores. A investigação das
estratégias relacionadas a ele é uma das linhas que delineiam o campo da história da
publicidade e da propaganda. O segundo eixo associa a apropriação dos mecanismos
pertinentes à publicidade e a propaganda com a intermediação entre o poder público e a
sociedade. Sob essa perspectiva, mesmo quando revestido de caráter informativo, o
fluxo de informação entre o poder público e a sociedade é constituído e efetuado
mediante a aplicação de critérios derivados da publicidade e da propaganda.
O desenvolvimento da história da publicidade e propaganda como campo de
pesquisa implica o aprofundamento da investigação dos dois eixos delineadores desse
campo do conhecimento sob a perspectiva da comunicação, com a utilização das
técnicas de investigação próprias da pesquisa histórica, mas a partir de parâmetros
pertinentes ao conhecimento produzido na área da comunicação. Os debates efetivados
no campo da comunicação favorecem o uso da pesquisa histórica ao direcionar as
iniciativas de estudo para se estruturar pesquisas em relação a temas que são explorados
de outro modo pelos historiadores.
Os eixos delineadores das ações para a constituição do campo da história da
publicidade e da propaganda têm como referencial metodológico a premência de se
identificar os referenciais necessários a sua caracterização. Constata-se que a pesquisa
sobre a publicidade e propaganda deve observar a dinâmica particular característica da
área, especialmente as demandas que motivam a produção do conteúdo e as formas de
produção disponíveis em cada momento histórico. Outro fator a ser considerado para
estruturação da metodologia de pesquisa é o papel relativo aos sujeitos históricos
envolvidos com a elaboração das ações e conteúdos de publicidade e propaganda. Esses
aspectos são referencias para se definir a metodologia mais apropriada a estruturação do
campo de investigação da história da publicidade e da propaganda.
Evidentemente a estruturação do campo de pesquisa requer a atuação de
profissionais da história e da comunicação que o privilegiem enquanto campo de
pesquisa. E o debate entre os profissionais dedicados a investigar a história da
publicidade e da propaganda sob a perspectiva interdisciplinar é o caminho mais efetivo
para a produção de conhecimento adequado aos critérios aplicados por historiadores e
comunicólogos. E reconhecimento do campo da história da publicidade e da propaganda
apresentado neste artigo não esgota o tema. Ao contrário, provoca para o debate críticos
sobre as características deste campo e da constituição de outras possibilidades de
investigação.

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