Você está na página 1de 12

UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

INSTITUTO UFC VIRTUAL


SISTEMAS E MÍDIAS DIGITAIS

​Análise Semiótica da Obra Audiovisual ​“Dirty Computer”

PEDRO LUCAS MACIEL MOREIRA - 431302

2020.1
INDICE:
INTRODUÇÃO​ ………………………………………………………………….…………………. 03
PARTE I​ ………………………………………………………………………….………...………. 03
​ ………………………………………………………………………....………………..05
PARTE II…
PARTE III​ …………………………………………………………………………….………………06
PARTE IV​……………………………………………………………………...………..…………...07
​ ………………………………………………………………………………..………...10
PARTE V…
PARTE FINAL​…………………………………………………………………………………....….11
​ …………………………………………………………………………….…….12
REFERENCIAS…
INTRODUÇÃO:

Dirty Computer foi o terceiro álbum da cantora e atriz Janelle Monáe, lançado no dia 26
de abril de 2018. Para esse álbum ela lançou um filme, em que a própria usa ​Emotion
Picture (jogo de palavras com ​Motion Picture em que a ela faz a definição como um filme
narrativo que acompanha um álbum musical) para definir essa obra audiovisual, para
simbolizar e mostrar toda a história por trás das letras, referências, símbolos e imagens. A
artista usa o Afrofuturismo, movimento pluridisciplinar que estabelece o encontro entre a
história, o resgate da mitologia e cosmologias africanas com a tecnologia, a ciência, o
novo e inexplorado, já usado para o conceito de seus dois álbuns anteriores, mas com
Dirty Computer a cantora utiliza isso para associar aos atuais movimentos políticos e
sociais que acontecem pelo mundo, principalmente ligado a luta contra o racismo (o
movimento Black Lives Matter), feminismo e o movimento LGBT e desse modo podemos
capturar mais significamente as referências dadas na obra audiovisual em suas imagens e
letras.

A obra acompanha uma jovem negra chamada Jane 57821 numa sociedade futura em
que as pessoas são chamadas de computadores e qualquer traço de humanidade e
liberdade nesses indivíduos são considerados inapropriados e precisam ser “limpos”
imediatamente e assim tempos que durante a obra ele vai mostrar a busca pela liberdade
e felicidade daqueles que são considerados diferentes em uma sociedade. Desse modo, ​o
objetivo dessa análise é observar e pontuar como a obra audiovisual se associa aos
aspectos dos movimentos políticos e sociais que acontecem ao redor do mundo.

PARTE I:

O filme começa com a narradora (a própria Jane) falando: “​They started calling us
computers. People began vanishing and the cleaning began. You were dirty if you looked
different. You were dirty if you refused to live the way they dictated. You were dirty if you
showed any form of opposition at all. And if you were dirty... It was only a matter of time.​ ”
[Eles começaram a nos chamar de computadores. Pessoas começaram a desaparecer e a
limpeza começou. Você era sujo se você parecesse diferente. Você era sujo se você se
recusasse a viver da maneira que eles ditam. Você era sujo se mostrasse qualquer tipo de
oposição. E se você fosse sujo… era apenas uma questão de tempo]. Após essa fala
introdutória temos a personagem principal sendo carregada em uma espécie da maca
flutuante por pessoas vestidas totalmente de branco com máscaras de gás para dentro de
um centro. Esse centro é responsável pelo limpeza feita em quem era considerado um
computador sujo, em que essa limpeza consistia no apagamento de memórias do
indivíduo (esses processos são chamados de Nevermind).

.
Imagem 01 Imagem 02
​Nos primeiros segundos quando vemos a personagem ser carregada para o centro que
irá apagar sua memórias, temos esses dois símbolos que podem ser associados o
primeiro com a cultura africana e o empoderamento desses artefatos e o segundo com o
feminismo, ambos aspectos sendo considerados desviantes e impuros pela sociedade
controladora no filme considerados os ​Dirty Computer.​ O título ​Dirty Computer
[Computador Sujo] foi definido pela cantora em uma ​entrevista em que ela diz que “nós
somos CPU’s e nossos cérebros estão fazendo ​uploads​, ​downloads e transmissões e
assim como todos os computadores nós temos bugs e vírus”, mas a mesma se pergunta
se esses aspectos são positivos, negativos ou apenas características e pede a sociedade
“uma conversa como seres humanos sobre o que significa dizer a alguém que sua
existência seja ela homossexual, minorias, mulheres, pobre, faz com que você tenha ​bugs
e vírus. [...] trata-se de abraçar essas coisas, mesmo que isso deixe os outros
desconfortáveis”.
Desse modo, podemos associar os símbolos e a definição da autora sobre o Dirty
Computer em que esse signo carrega um significado e associação direta a lutas por
direitos iguais que acontecem hoje em dia ligados aos negros, LGBT e mulheres em que
mesmo no século 21 ainda temos a polícia ​perseguindo e assassinando negros sem
motivo​, pessoas LGBT ​sendo mortas, violentadas e discriminadas diariamente e mulheres
sendo ​violentadas e discriminadas e sendo proibidas de terem ​oportunidades e
pagamentos iguais aos homens​. Assim, podemos ver como a história do filme associa o
Dirty Computer e transforma-o em um signo que ao mesmo tempo que é associado a algo
visto como “ruim” e impuro por parte da sociedade (e no filme como algo que precisa ser
limpo) a artista usa ele como forma de empoderar e celebrar quem é diferente e não segue
o padrão imposto pela sociedade.

PARTE II:

Imagem 03 Imagem 04

​A primeira memória que vemos a ser apagada (o chamado Nevermind) é a ​Memory


203206 que representa a música ​Crazy, Classic, Life. ​A música começa com Martin Luther
King lendo uma parte declaração de independência dos Estados Unidos e enquanto esse
áudio é mostrado, o filme mostra diferentes pessoas de várias características e aspectos
que são considerados fora do padrão social por parte sociedade. O vídeo e a música se
relacionam ao todo a cultura americana durante as várias décadas, como é mostrado na
imagem diferentes grupos e símbolos que vão desde de David Bowie e o Woodstock e
outros movimentos culturais americanos, o aspecto do ​American’s Dream [Sonho
Americano] (um ideal de liberdade americano) e associam esses aspectos a liberdade de
ser quem você é e celebrar isso como forma de empoderamento.

Assim, temos o vídeo mostrado uma festa que celebra os diferentes tipo de pessoa
enquanto a cantora cita na música vários indivíduos responsáveis pela luta anti racista nos
Estados Unidos durante o século 20, como Nina Simone e Malcolm X principalmente na
parte em que canta “​I'm not America's nightmare. I'm the American dream​” [Eu não sou o
pesadelo da américa. Eu sou o sonho americano.] interpolando o discurso de Malcolm X “​I
Have a Nightmare (I Charge the White Man)​“ em que a cantora faz o contraste no discurso
de Malcolm com o aspecto de liberdade americano (o ​American’s Dream)​ falando que pela
sua liberdade ela não é um pesadelo e sim o sonho americano.

Enquanto a primeira parte da música celebra a juventude e a liberdade dos indivíduos, a


segunda parte fala sobre a realidade em ser uma mulher negra e não-hetero na sociedade
e essa mudança é bem marcada tanto em vídeo quanto na música, na primeira parte o
vídeo é marcado por cores e claridades (vistos a imagem 03) e a música por um som
alegre, mas ao mudar a segunda vemos que as cores são substituídas por tons mais
escuros e um menor contrastes entre as figuras e a música toma um tom mais sério. As
imagens que seguem no vídeo são policiais invadindo a festa agredindo e prendendo as
pessoas apenas por serem considerados os ​Dirty Computer e ​vemos as mesmas pessoas
que no começo são mostradas em um ambiente luminoso junto ao discurso de Martin
Luther King, agora presos e algemados a escuridão (imagem 04). As letra da música fala
diretamente sobre a brutalidade policial e o encarceramento da população negra e assim
mostra a relação com a realidade em que tanto na obra quanto na vida real a polícia se
mostra como a principal forma de controle e aprisionamento da população negra.

PARTE III:

Imagem 05 Imagem 06
​Nessa parte da obra temos a personagem Jane passando pelo processo de
apagamento de memórias e como é mostrado nas imagens 05 e 06, o conteúdo dentro
dela é colorido e brilhante fazendo oposição às cores fria e minimalistas do ambiente em
que a personagem está no momento. Pode-se associar a substância colorida ao aspecto
de tirar tudo aquilo que é diferente e apenas deixar aquilo que é frio e sem vida dentro de
você, transformando o indivíduo em uma máquina sem sentimentos e facilmente
controlada. Ambos símbolos e informações podem ser associadas a forma de como certos
povos tiveram sua cultura e identidades tiradas e expropriadas pelos brancos europeus e
assim serem controlados por esse grupo que estava no controle (a escravidão, as
colonizações por exploração e os genocídios indígenas).

Enquanto essas imagens estão sendo mostradas temos a música ​Take a Byte sendo
mostrada e cantada no momento. Esse termo se associa ao ​byte (unidade de informação
digital), na forma em que ao serem considerados computadores são retirados informações
digitais dessas pessoas e também ao pecado original bíblico (doutrina cristã que pretende
explicar a origem da imperfeição humana) em que Eva dá uma mordida (que do inglês
vem de ​taking a bite)​ na maçã que foi dita por Deus que se fossem comer eles morreriam.
Desse modo, a artista associa isso a forma de como parte da sociedade considera os
relacionamentos LGBT como algo proibido, um tabu, um pecado, mas que é algo
irresistível e chama a pessoa que a deseja para vir tentar uma chance com ela mesmo
com todo a proibição que a sociedade coloca.

PARTE IV:
Imagem 07

​Nessa parte será analisado as memórias correspondentes as canções ​Screwed e


Django Jan​e. Na memória correspondente a ​Screwed vemos no vídeo Jane e seus amigos
em trajes coloridos sendo perseguidos por drones em um prédio igualmente cheio de
cores e também em uma festa cheia de luzes estroboscópicas e holográficas e todo esses
visuais interpolando imagens rápidas e quase imperceptíveis de bombeamentos, guerras e
protestos (como vistos na imagem 07). Desse modo, a canção usa dois significados da
palavra Screwed para fazer relação entre o vídeo e a música, essa palavra pode ser
traduzido para “Ferrados” e a cantora utiliza essa palavra para se relacionar tanto ao
sentido de uma insinuação sexual quanto do estado da sociedade americano em que os
jovens estariam “ferrados” pela guerras, violências e atos desumanos causados por
políticos. Assim, essa dualidade é vista nas letras e nas imagens é um assunto que pode
ser tratado e associado a letra é sobre a violência armada em que ela faz na letra uma
referência palavra Screwed e a locais em que pessoas foram mortas ​por conta da violência
armada e outro sentido da palavra quando na letra se fala de usar as insinuações sexuais
​ m que a
ditas pela ​letra para o poder e controle​. Da mesma forma de ​Crazy, Classic, Life e
​ essa também há e os
canção tem uma segunda parte em que a cantora faz uma ​rap, n
versos aqui se relacionam diretamente ao sexismo na sociedade e a eleição do presidente
Donald Trump, falando sobre como os jovens também estão “ferrados” com os políticos
que ​bloqueiam o pagamento igualitário​, ​são corruptos e tentam ao máximo ​censurar as
mulheres​.

Algo que pode ser visto no final da canção se relaciona muito ao que acontece
atualmente nos Estados Unidos é a cena que a personagem de Zen (interpretada pela
atriz Tessa Thompson e um dos pares românticos da personagem de Janelle) é
sequestrada e colocada dentro de uma van à força por policiais e isso pode-se associar
diretamente aos protestos anti racista de 2020 em que o mesmo acontecia com quem
estava protestando e era ​sequestrado e colocado em uma van no meio de todos e mesmo
essa obra sendo de 2018 é bem visível como as simbologias usadas nela se relacionam
muito bem dois anos depois.

Imagem 09 Imagem 10

Imagem 11​ ​Imagem 12

Após o término dessa memória temos o começo de outra que não se parece muito bem
como uma memória ou algo que pertenceu a realidade da personagem e sim mais como
um sonho, já que até os próprios homens que estão conduzindo o apagamento de
memória se perguntam isso. Esse sonho é corresponde a canção ​Django Jane.​ A canção
talvez seja uma das ​mais pessoais (no sentido da artista Janelle Monáe) do álbum, em que
ao mesmo tempo que fala de assuntos recorrentes no projeto sobre empoderamento negro
e feminino, ela também canta sobre sua vida, conquistas e desafios. No vídeo vemos
inicialmente a personagem em um trono rodeada de mulheres negras (imagem 09) com
trajes que lembram o grupo dos ​panteras negras e a cultura africana principalmente
puxada aos conceitos do Afrofuturismo. Desse modo, os signos de trono e os trajes
usados pelos personagens são relacionados ao significado que a música quer passar de
mulheres negras no topo, figuras essas que são colocadas como lutadoras fortes pela luta
anti racista e pelo empoderamento negro e também pela força de ter uma mulher negra no
comando de um mundo ainda racista e patriarcal. Na imagem 10 temos a imagem da
personagem nua se olhando no espelho que está posicionado em sua genitália, essa
imagem é relacionado à imagem 12 que é uma fotografia chamada “Self-Portrait” da artista
Armen Susan Ordjanian. Ao mesmo tempo que a personagem mostra essa imagem a
cantora fala ”Let the Vagina have a monologue” [Deixe a vagina ter um monólogo] assim é
perceptível que o signo do espelho é relacionado com o signo do órgão reprodutor
feminino em que ele é relacionado diretamente ao empoderamento feminino, em dar
espaços às mulheres falarem suas narrativas, suas histórias que se relacionam a peça de
teatro ​The Vagina Monologues.​
PARTE V:

Imagem 13 Imagem 14

Usando a mesma analogia da canção anterior em ​Pynk,​ o signo do órgão genital


feminino é usado novamente para se associar ao feminino e dessa vez também se usa o
signo da cor rosa que é usado como também como uma associação ao órgão e ambos os
signos se relacionam na imagem 13 que mostra uma roupa com a forma da vulva feminina
e dessa forma usa todos os aspectos, signos e símbolos para usar primeiramente como
uma forma de empoderamento feminino ao associá-los com beleza e força e também de
certa forma associá-los a tudo ao redor, quando a mesma conta que a cor rosa está em
tudo desde corpos até símbolos. A sexualidade também é tema central explicitado por
esses já que a canção e as imagens se relacionam diretamente ao amor e sexo entre
pessoas do mesmo sexo e assim podemos ver que na próxima memória que acompanha a
canção ​Make Me Feel​, essa tema ao redor da sexualidade fica mais evidente já que nessa
memória temos a personagem em uma colorida festa com dois parceiros ao mesmo tempo
se associando a pansexualidade e ao poliamor, tópicos dos movimentos LGBT e também
a própria artista autora da obra que se ​assumiu pansexual​.
A próxima “memória”, que é mais associada
a um sonho na obra, corresponde a música ​I Like
That ​, a música coloca o mesmo aspecto pessoal
com a autora falando de sua vida e associando a
temas como o empoderamento negro tanto do
indivíduo como da sua cultura e isso fica claro no
uso de imagens referentes ao Afrofuturismo,
aspecto recorrente nas obras de Monáe, em que tem a proposta de enaltecer a negritude e
a cultura africana misturando elementos culturais com ficção científica. Desse modo, é
perceptível como os signos que se passam no vídeo se associação a esses elementos que
tem como base o enaltecimento da cultura negra, fazendo assim mais uma forma da obra
de retratar esse tema de uma maneira empoderadora e forte.

PARTE FINAL:
Na parte final temos a conclusão do processo de ​Nevermind (apagamento de
memória) em Jane e sua transformação em um dos agentes desse governo. É mostrado
uma memória em uma praia de Jane e seus dois pares amorosos Zen e Ché, mostrando
com a conexão entre eles é forte. Após isso temos o “fim” do filme em que a personagem
está totalmente transformada, sem memórias e lembranças servindo ao governo.
Entretanto, temos uma cena pós crédito que mostra que tanto Jane quanto Zen não
esqueceram suas memórias e junto a Ché conseguem escapar de lá ao som da canção
Americans. A canção funciona como uma síntese maior dos assuntos do álbum junto com
toda a ideia da sociedade dos estados unidos atual. Na música a artista cita todos os
preconceitos e ideias a sociedade americana desde racismo até o sexismo e a lgbtfobia e
termina a canção com uma gravação do reverendo ​Sean McMillan falando que os estados
unidos não é a america dele até negros, lgbts e mulheres serem respeitados, não
violentados e terem igualdade.
Dessa forma, é possível observar a forma como a artista usa os signos, símbolos,
referências e analogias para dialogar a sua obra com as letras e assim mostrar o
verdadeiro significado que fica em que assiste e ouve essa obra o de empoderamento dos
grupos que normalmente são marginalizados, excluídos e invisibilizados pela sociedade
patriarcal branca e heterossexual. O uso do signo de Computador Sujo usado pela artista
mostra como ela consegue misturar os conceitos de tecnologia com os da lutas e
movimentos sociais e políticos que acontecem hoje de uma maneira poderosa e cheia de
referências a acontecimentos recentes e importantes no mundo atual.

REFERENCIAS:
https://www.youtube.com/watch?v=jdH2Sy-BlNE&feature=emb_title
https://medium.com/@stephieborges/as-visões-do-futuro-por-janelle-monáe-e0591f21c518
https://genius.com/albums/Janelle-monae/Dirty-computer
http://valkirias.com.br/janelle-monae-e-resistencia-e-orgulho-em-dirty-computer/
https://jornaldesacordo.com/2018/12/03/the-desacordo-sessions-uma-analise-imaculada-a-dirty-co
mputer/
https://www.publico.pt/2018/05/11/culturaipsilon/noticia/janelle-monae-nao-e-pesadel
https://www.geledes.org.br/dossie-afrofuturismo-saiba-mais-sobre-o-movimento-cultural/
https://www.theguardian.com/music/2018/feb/22/you-dont-own-or-control-me-janelle-monae-on-her-
music-politics-and-undefinable-sexuality?CMP=share_btn_tw
https://belezablackpower.com.br/2018/04/27/janelle-monae-dirty-computer-e-afrofuturismo/

Você também pode gostar