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Cuidar também pode siginificar manter uma certa distância, como foi O
primeiro, continua Moura, é a surra de cansanção (Jatropha urens), uma planta
urticante que produz uma coceira intensa e que, com golpes vigorosamente
desferidos, pode produzir queimaduras muito dolorosas, que Maria Felipa e
suas companheiras teriam dado nos soldados portugueses.
. Ainda assim, mais uma vez podemos identificar ao menos duas conclusões
aparentemente contraditórias no seio destes estudos (que, em sua maior parte,
enfocam as ciências da natureza): por um lado, várias abordagens defendem
um conceito de cuidado novo e explicitamente recíproco que supere o
excepcionalismo humano e contribua para o fim do Antropoceno, a atual era
em que uma espécie detém poder e controle desproporcionais. Por outro lado,
a noção de cuidado tem sido associada a uma missão de preservação quase
pastoral e de natureza terapêutica ligada a percepções de totalidade e à
recuperação de funções perdidas. Este uso paliativo adota o cuidado como um
substituto moral para ideias de pureza que evocam tanto aspirações identitárias
quanto nacionalistas (Murphy 2015; Duclos & Criado 2019).
É, no entanto, no cruzamento destes dois ângulos de discussão - ética
ecológica cotidiana e envolvimento natural-cultural pós-humanista - que chego
aos limites da (minha) compreensão do cuidado como uma ética intensificando
a tensão especulativa.
a ética da permacultura é uma tentativa de descentralizar a subjetividade ética
humana, não considerar os humanos como mestres ou mesmo como
protetores, mas como participantes da teia dos seres vivos da Terra.
cuidado, como um processo dinâmico e forma complexa de sustentar
naturezaculturas. Requer movimentos especulativos deslocados que
descentrem a “ética” e a coloquem como uma força distribuída entre as
múltiplas agências que fazem mais do que relações humanas.
Debate sobre a ética do cuidado na permacultura exemplo de caminhos
alternativas na politica de viver com cuidado em mundos mais que humanos. –
Bellacasa chama de alterbiopolítica
Não tem como o humano experimentar a vida se não estiver sendo suprido e
nutrido por toda forma de vida que organismos não humanos proporcionam.
Por exemplo o ar, a agua, as plantas em forma de alimento, remédio...comer é
a evidencia de que a vida não pertence ao humano, ela transita de um corpo a
outro, de uma forma a outra. O humano depende de outras vidas para
permanecer vivo. (coccia)
O cuidado requer escuta, e quando não ouvimos o que os não-humanos estão
querendo nos dizer, o que estão experimentando ou necessitando, a resposta
também pode ter consequencia para nós – desde falhas e erros diários, a
epidemias relacionadas à falhas de cuidado.
SOBRE O CUIDADO COM AS PLANTAS
Agricultura, práticas e saberes que sobreviveram apesar do capitalismo, apesar
da globalização, da agricultura industrializada, da modernização.
Starhawk cita Mabel McKay, uma curandeira Powo: “Quando as pessoas não
usam as plantas, elas ficam escassas. Você deve usá-los para que eles
apareçam novamente. Todas as plantas são assim. Se não forem recolhidos,
ou conversados e cuidados, eles morrerão” (citado em Star Hawk 2004, 9; ver
também Mendum 2009). Mas apesar de ser vital, a agência humana nas
ecologias nas quais nos envolvemos, não está no centro. Ou seja, a forma de
vida da planta depende da interação e cuidado com a forma de vida humana.
Mas existem plantas que não dependem da existencia humana né? Bom, fiquei
na dúvida. Existem espécies espontaneas... Por exemplo, algumas plantas
deveriam ser ignoradas porque não existem para os humanos, mas para outros
– os animais -minhocas, outras substancias no solo. Numa vertente mais recente
da sua investigação, focada em cientistas e outros profissionais que investigam a
senciência das plantas, Myers incentiva o envolvimento em ecologias afectivas com
plantas nas quais o cuidado se torna um fio relacional básico, transmitido pelo amor e
paixão exibidos pelo observador das coisas, através de seu próprio envolvimento
corporal, imerso, no cultivo da afetividade. Através de modos envolventes de
conhecimento e escrita, Myers não apenas modifica nossa percepção do envolvimento
dos cientistas e de seus assuntos, as plantas, mas também nos convida a nos
tornarmos pesquisadores de um tipo diferente: “Aqui eu convido você a cultivar seu
planta interna. Este não é um exercício de antropomorfismo – uma representação de
plantas no modelo do humano. Pelo contrário, é uma oportunidade de vegetalizar o
seu corpo já mais que humano. Para despertar o planta latente em você, você
precisará se interessar e se envolver nas coisas que interessam às plantas ”(Myers
2013).
É, no entanto, no cruzamento destes dois ângulos de discussão - que chego aos
limites da (minha) compreensão do cuidado como uma ética, intensificando a tensão
especulativa. A permacultura convida-nos a pensar com os “limites” – de terras e
sistemas, onde os encontros são ao mesmo tempo desafiantes e diversificados para
além do esperado e administrável. Então vamos lá. Incorporada na interdependência
de todas as formas de vida – humanos e suas tecnologias, animais, plantas,
microorganismos, recursos elementares como o ar e a água, bem como o solo de que
nos alimentamos – a ética da permacultura é uma tentativa de descentralizar a
subjetividade ética humana, não considerar os humanos como mestres ou mesmo
como protetores, mas como participantes da teia dos seres vivos da Terra. E, no
entanto, ou na verdade, de forma correlativa, apesar desta postura não centrada no
ser humano, da afirmação de que os seres humanos não estão separados dos
mundos naturais, a ética da permacultura cultiva obrigações éticas específicas para os
seres humanos. As ações coletivopessoais também são movidas pelo compromisso
ético e pela exigência de resposta neste mundo. Possivelmente, esta forma de
obrigação eticamente descentralizada transmite uma tensão, mas não, creio eu, uma
contradição. Fazer perguntas sobre os compromissos éticos natureza-culturais dos
agentes que “trabalham a natureza” traz questões mais preocupantes em torno da
obrigação de cuidado em mundos além dos humanos: Que noção de ética está em
ação em posturas de princípios que visam descentrar a posição dos humanos na
Terra, ao mesmo tempo em que afirmam sua obrigações específicas? Certamente a
ética não pode ser descentralizada desta forma se permanecer ligada a presidir às
ações morais de sujeitos racionais, individuais e obviamente humanos. Mas então por
que seria necessária algo como “agência” ética se ela é distribuída mais no “trabalho
da natureza” do que nas agências humanas? Isso não é simples antropomorfismo? A
pergunta que fiz no início do livro permanece: em vez de diluir a obrigação à medida
que evitamos a ética centrada no ser humano, podemos redistribuí-la? Em qual quer
caso, afirmar o cuidado, como forma dinâmica e complexa de sus Requer movimentos
especulativos deslocados que descentrem a “ética” e a coloquem como uma força
distribuída entre as múltiplas agências que fazem mais do que relações humanas
A primeira parte do capítulo aborda os significados da biopolítica como uma
abordagem que traz de volta a manutenção cotidiana da vida ao centro de um
cenário de questionamento ético em que uma ética descentralizada do cuidado
poderia fazer a diferença. Éticas não normativas.
uma ética que pretende abranger mais do que agências humanas na teia do
cuidado.
visões feministas de ética do cuidado construídas a partir de pontos de vista
fundamentados em compreensões coletivas do trabalho das mulheres na
manutenção das relações cotidianas. O trabalho pessoal para transformar a
forma como a sociedade lida com o cuidado dos outros no quotidiano foi
provocado por um repensar colectivo tornado possível pelos movimentos de
mulheres. Tal forma de abordar o problema do cuidado como algo que pode
ser feito individualmente, mas está sempre interligado dentro de esforços
coletivos.
Pensar a sobrevivência e o bem estar humana depende diretamente dos outros
seres da Terra, e pensar o cuidado com base em ecosmologias naturais-
culturais não antropocêntricas.
A interferência do não humano entidades animais/orgânicas no ético e no
político tem suas especificidades. Se pensarmos o ético não apenas como uma
categoria abstrata, mas algo prático do cotidiano, ao lidar com agenciamentos
que envolvem entidades organicas entraremos em um mundo povoado por
preocupações específicas e envolvem esferas afetivas associadas a corpos
vivos e sofrimento.
O envolvimento com outras pessoas não humanas do mundo animal/orgânico
produz um conjunto diferente de preocupações éticas do que o envolvimento
com entidades tecnológicas. As coisas não são uma coisa só – como se os
humanos não fossem “o” humano (Papadopoulos 2010).
A ética do cuidado da permacultura baseia-se na percepção de que estamos
inseridos numa teia de relações complexas nas quais as ações pessoais têm
consequências para mais do que nós próprios e os nossos familiares.
É uma prática relacional que envolve formas de conhecer – sobre a
compostagem.
A interdependencia natureza-cultura não é apenas um princípio moral, é uma
questão de fato que nos tornamos conscientes. Torna-se uma questão de
cuidado envolver-se em ações éticas.
Conectar as práticas da ética da permacultura como fazeres ecológicos cotidianos
com uma noção feminista de cuidado desloca moralidades biopolíticas, permitindo-nos
visualizar a alterbiopolítica como uma ética de empoderamento coletivo que coloca o
cuidado no centro da busca das lutas diárias pelo florescimento esperançoso de todos
os seres, da bios entendida como uma comunidade mais que humana.
O que procuro aqui não é delinear um imperativo de cuidado de alcance
universal que definiria as relações humanas com todos os seres da Terra, mas
aprender especificamente com essas práticas de cuidado que incluem relações
práticas, particulares e mutáveis onde os humanos estão envolvidos com
outros seres humanos que não os humanos. humanos de maneiras não
redutíveis a um uso centrado no ser humano e também são radicalmente
natureza-culturais. Sem cuidar de outros seres, não podemos cuidar dos
humanos. Sem cuidar dos humanos, não podemos cuidar das ecologias em
que vivem.
Eu considero essas práticas marcadas por uma forma de ética biopolítica
sintonizada com a consciência natureza-cultural, mas também porque aqui o
cuidado com o próprio corpo não é separável do cuidado com as pessoas e
com a terra. Este movimento exemplifica bem a interdependência das “três
ecologias” – do eu (corpo e psique), do coletivo e da terra – que Félix Guattari
notoriamente apelou com urgência política para o futuro próximo, acreditando
que nenhuma poderia ser realizável sem o outro (Guattari 2000).