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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

FACULDADE DE CIÊNCIAS DA SAÚDE DO TRAIRI


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA

DINORAH DE FRANÇA LIMA

CUIDADOS POPULARES EM SAÚDE: USO DAS ERVAS E DE REZAS EM


SANTA CRUZ/RN

SANTA CRUZ
2021
DINORAH DE FRANÇA LIMA

CUIDADOS POPULARES EM SAÚDE: USO DAS ERVAS E DE REZAS EM SANTA


CRUZ/RN

Dissertação apresentada ao Programa de


Pós- Graduação em Saúde Coletiva da
Faculdade de Ciências da Saúde do Trairi
da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, como requisito parcial para a
obtenção do título de Mestre em Saúde
Coletiva.
Linha de Pesquisa: Trabalho, educação e
a produção social do processo saúde-
doença.
Orientadora: Dra. Mercês de Fátima dos
Santos Silva
Coorientadora: Dra. Raquel Littério de
Bastos

SANTA CRUZ
2021
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial da Faculdade de Ciências da Saúde do Trairi - FACISA
- Santa Cruz
Lima, Dinorah de Franca.
Cuidados Populares em Saúde: Uso das ervas e de rezas em
Santa Cruz/RN / Dinorah de Franca Lima. - 2021.
71f.: il.

Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande


do Norte, Faculdade de Ciências da Saúde do Trairi, Programa de
Pós Graduação em Saúde Coletiva. Santa Cruz, 2021.
Orientador: Mercês de Fátima dos Santos Silva.
Coorientador: Raquel Litterio de Bastos.

1. Plantas Medicinais - Dissertação. 2. Sistemas Tradicionais


de Saúde - Dissertação. 3. Práticas Sociais de Saúde -
Dissertação. I. Silva, Mercês de Fátima dos Santos. II. Bastos,
Raquel Litterio de. III. Título.

RN/UF/FACISA CDU 633.88

Elaborado por José Gláucio Brito Tavares de Oliveira - CRB-15/321


DINORAH DE FRANÇA LIMA

CUIDADOS POPULARES EM SAÚDE: USO DAS ERVAS E DE REZAS EM SANTA


CRUZ/RN

Dissertação apresentada ao Programa de


Pós- Graduação em Saúde Coletiva da
Faculdade de Ciências da Saúde do Trairi
da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, como requisito parcial para a
obtenção do título de Mestre em Saúde
Coletiva.

Linha de Pesquisa: Trabalho, educação e


a produção social do processo saúde-
doença.

BANCA EXAMINADORA

Dra. Mercês de Fátima dos Santos Silva


Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Orientadora

Dra. Raquel Littério de Bastos


Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Coorientadora

Dr. Dimitri Taurino Guedes


Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Examinador Interno

Dra. Bárbara Luna de Araújo


Faculdade de Ciências Humanas e Sociais de Igarassu
Examinadora Externa
Aos meus pais, Jailton Mata de Lima e
Claudineide de França, e à minha avó
Mariado Carmo de Lima (in memorian).
AGRADECIMENTOS

Aos meus pais Jailton Mata de Lima, Claudineide de França Lima e ao meu
irmão Jordan de França Lima por todo amor, cuidado, zelo e fortaleza ao longo da
minha existência.
Ao meu parceiro, Bruno de Souza Rodrigues, pelo amor, afeto e compreensão
da minha vida corrida durante esse período e por ter me apoiado tanto.
À minha orientadora, Mercês Fátima, por ter me acompanhado ao longo dessa
trajetória do mestrado.
À minha coorientadora, Raquel Littério, pelas contribuições e sugestões para
enriquecer o trabalho.
À professora Janete Lima de Castro pelo incentivo e motivação para
potencializar a minha carreira acadêmica e profissional.
Aos participantes do estudo que mesmo diante da pandemia me acolheram em
suas casas, minha eterna gratidão!
RESUMO

O uso da natureza articulado à sociodiversidade dos povos e comunidades, com suas


visões de mundo, saberes e práticas culturais singulares, fornecem as bases
terapêuticas para variáveis sistemas culturais de cuidado e de cura nas sociedades.
Por isso, que as terapêuticas populares com seus saberes e práticas, estão
intrinsecamente relacionados aos territórios em saúde e como parte integrante da
reprodução sociocultural e econômica das suas comunidades. É refletindo sobre este
palco social, que o presente estudo visou identificar as práticas de cuidados populares
em saúde com uso de ervas medicinal numa área remota do Nordeste brasileiro. Para
tanto, realizamos entrevistas semiestruturadas com terapeutas populares de cuidado
em saúde, em Santa Cruz-RN. Da análise temática das narrativas produzidas por
nossos interlocutores, emergiram as seguintes categorias analíticas: 1) “Ervas e
Práticas de rezas”: a transmissão do cuidar; 2) “Saúde como produção de sentido de
vida” e 3) “Encontros e desencontros dos sistemas culturais de saúde: O SUS e o
popular”. As terapeutas populares, com suas práticas de cultivo de ervas e rezas,
constituem um patrimônio cultural em saúde, conforme encontramos em diálogo com
a literatura científica, sendo suas práticas e saberes promotores e protetores de saúde
e de espaços saudáveis de vida.

Palavras-chave: Plantas Medicinais. Sistemas Tradicionais de Saúde. Práticas


Sociais de Saúde.
ABSTRACT

The use of nature articulated to the sociodiversity of peoples and communities, with
their worldviews, knowledge and unique cultural practices, provide the therapeutic
bases for variable culturais systems of care and healing in societies. That is why
popular therapies, with their knowledge and practices, are intrinsically related to health
territories and as an integral part of the sociocultural and economic reproduction of
their communities. Reflecting on this social stage, this study aimed to map popular
health care practices using medicinal herbs in a remote area of Northeastern Brazil.
Therefore, we conducted semi-structured interviews with popular health care
therapists in Santa Cruz-RN. From the thematic analysis of the narratives produced by
our interlocutors, the following analytical categories emerged: 1) “Herbs and prayer
practices”: the transmission of care; 2) “Health as the production of meaning in life”
and 3) Meetings and disagreements of cultural health systems: SUS and the popular.
Popular therapists, with their practices of cultivating herbs and praying, constitute a
cultural resistance in health, as we find in dialogue with the scientific literature, and
their practices and knowledge are promoters and protectors of health and healthy living
spaces.

Keywords: Medicinal Plants. Traditional Health Systems. Social Practices.


LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Mapa Político Administrativo do RN ......................................................... 16


Figura 2 – Imagens de Santos Católicos na sala ...................................................... 18
Figura 3 – Devoção aos Santos Católicos ................................................................. 19
Figura 4 – Mapa das Regiões de Saúde do RN ........................................................ 19
Figura 5 – Mapa do território de saúde do Maracujá ................................................. 21
Figura 6 – Modelo de determinação social da saúde proposto por Dahlgren e
Whitehead ................................................................................................................. 47
Figura 7 – Cultivo das plantas no quintal de Crajiru .................................................. 48
Figura 8 – Babosa fazendo carinho na planta ........................................................... 48
LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Perfil Social das Agentes Culturais de Saúde ........................................ 30


Quadro 2 – Ervas por indicação de uso..................................................................... 37
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CAPS Centros de Atenção Psicossocial


CEP Comitê de Ética em Pesquisa
CER Centro de Reabilitação
CNS Conselho Nacional de Saúde
DSS Determinantes e Condicionantes da Saúde
ESF’s Equipes de Estratégia Saúde da Família
FACISA Faculdade de Ciências da Saúde do Trairí
GEERS Grupo de Estudos e Pesquisa Equidade Racial em Saúde
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IFRN Instituto Federal do Rio Grande do Norte
IST’s Infecções Sexualmente Transmissíveis
PNPIC Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares
REGIC Regiões de Influências das Cidades
SAE Serviço de Atendimento Especializado
SAMU Serviço de Atendimento Móvel de Urgência
SUS Sistema Único de Saúde
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 12
1.1 A cidade da Santa: Santa Cruz do Inharé ........................................................ 16
1.2 Território de Saúde............................................................................................ 19
1.3 Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares ...................... 23
2 OBJETIVOS ........................................................................................................... 26
2.1 Objetivo geral .................................................................................................... 26
2.2 Objetivos específicos ....................................................................................... 26
3 MATERIAL E MÉTODOS ...................................................................................... 27
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................. 30
4.1 “Ervas e Práticas de rezas”: a transmissão do cuidar ................................... 31
4.2 Saúde como produção de sentido de vida ...................................................... 45
4.3 Encontros e desencontros dos sistemas culturais de saúde: O SUS e o
popular ..................................................................................................................... 49
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 58
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 59
ANEXO I – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO – TCLE ..... 65
ANEXO II – TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA GRAVAÇÃO DE VOZ ................. 67
ANEXO III – TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA USO DE IMAGENS (FOTOS E
VÍDEOS).................................................................................................................... 68
ANEXO IV – ROTEIRO NORTEADOR DE ENTREVISTA........................................ 69
12

1 INTRODUÇÃO

A utilização dos elementos da natureza para o cuidado em saúde é um marco


da humanidade. Essa potente riqueza aliada a uma sociodiversidade é demonstrada
pela variedade de povos e comunidades, com visões, saberes e práticas culturais
singulares. No que se refere ao uso terapêutico das plantas e ervas medicinais, esses
saberes e práticas estão intrinsecamente relacionados aos territórios e seus recursos
naturais, como parte integrante da reprodução sociocultural e econômica desses
povos e comunidades. A integração ou harmonia ser humano/natureza e
natureza/cultura é sinônimo de equilíbrio para os indivíduos, e garantia de saúde para
a comunidade. Sendo assim, as ervas e os recursos naturais fornecem as bases
terapêuticas desse sistema de cuidado em saúde e cura1.
As práticas populares de cuidado em saúde são utilizadas em diversos lugares
do Brasil, tradicionalmente orientadas por benzedores, curandeiros, costureiras de
rendiduras, pajés, remedeiros, raizeiros, massagistas tradicionais, homeopatas
tradicionais, parteiras, entre outros2. Nesse sentido, vale destacar que esses
conhecimentos tradicionais representam um patrimônio imaterial imensurável
reconhecido através do Decreto nº 5.753, de 12 de Abril de 20063.
Na Constituição Federal de 1988, responsável pela criação do Sistema Único
de Saúde (SUS), apresentou-se como diretriz o atendimento integral, com prioridade
para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais4, evidenciando
a necessidade de uma prática de saúde que levasse em consideração os
determinantes e condicionantes da saúde dos sujeitos. O SUS foi regulamentado pela
lei 8080/905, que dispõe sobre os seus princípios, fazendo-se pensar na necessidade
de dar ênfase aos aspectos sociais, simbólicos e culturais.
A Portaria nº 971, de 03 de Maio de 2006, instituiu a Política Nacional de
Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no SUS, que tem como diretriz o
fortalecimento e ampliação da participação popular e do controle social, na
perspectiva de resgatar e valorizar o conhecimento tradicional e promover a troca de
informações entre grupos de usuários, detentores de conhecimento tradicional,
pesquisadores, técnicos, trabalhadores em saúde e representantes da cadeia
produtiva de plantas medicinais e fitoterápicos6.
O conhecimento e o uso das espécies vegetais encontram-se nas mais
diferentes regiões do país onde se estabeleceram as religiões de matrizes africanas,
13

em territórios dos povos originários e no campo 7. O emprego das plantas, tanto na


saúde quanto em seus aspectos mágicos, é muito antigo no cenário brasileiro,
havendo, assim, uma coexistência com a medicina ocidental8.
Os estudos de Loyola7 e Meira2 corroboram com o pensamento de que a saúde,
principalmente nas comunidades do campo até a década de 70, era basicamente
tratada com medicamentos extraídos das florestas. Além de contar com os
conhecimentos sobre plantas medicinais e práticas tradicionais de cuidado em saúde
no exercício desses ofícios, utilizam-se uma diversidade de conhecimentos sobre
ervas, simpatias, defumação, oração, benzimentos, remédios caseiros, garrafadas,
dentre outros.
As práticas de saúde populares sofreram um lento processo de
marginalização2. Tais práticas são contra hegemônicas perante a supervalorização e
o domínio das lógicas da medicina moderna e do uso de fármacos sintéticos como
tendência de cuidado em saúde, especificamente com uma perspectiva biologicista e
fragmentada.
Mesmo diante da forte utilização do medicamento sintético, observa-se um
crescimento daqueles que usam as plantas medicinais, isoladamente ou em conjunto
com ele, e isso é realizado com base no conhecimento popular, por serem alternativas
com menos efeitos adversos e de menor custo9.
Um dos aspectos importantes a ser ressaltado nesse processo é o papel do
usuário, o qual ao procurar assistência no serviço de saúde, ainda sofre preconceitos,
uma vez que o conhecimento popular sobre o processo saúde-doença e suas diversas
formas de manifestação não é valorizado, e em alguns casos, sequer escutado. Os
profissionais de saúde geralmente têm uma atitude desfavorável consoante às
representações mais amplas da classe médica10. À vista disso, há a necessidade do
estabelecimento de diálogos e principalmente da interação entre o conhecimento
popular e o conhecimento científico.
A formação dos profissionais de saúde ainda tem o enfoque
predominantemente biologicista, curativo, médico centrado e desarticulado das
práticas em saúde11.
Essa formação deveria englobar aspectos de produção de subjetividade; de
habilidades técnicas e de pensamento; e o adequado conhecimento do SUS, tendo
como objetivos a transformação das práticas profissionais e da própria organização
do trabalho, e estruturar-se a partir da problematização do processo de trabalho e sua
14

capacidade de dar acolhimento e cuidado às várias dimensões e necessidades de


saúde das pessoas, dos coletivos e das populações12.
Diante disso, implica a necessidade de aprofundamento do conceito de
integralidade, entendida como um conjunto articulado e contínuo das ações e dos
serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em
todos os níveis de complexidade do SUS4. Enfatizando mais uma vez a garantia aos
cidadãos de um cuidado contemplando todos os níveis de complexidade do sistema
como também de ações, tanto na proteção, promoção da saúde e prevenção de
doenças, para viabilizar uma atenção integral, superando a prática de intervenções
fragmentadas do cuidado, na perspectiva de contemplar as dimensões do ser humano
em sua totalidade biopsicossocial.
Como profissional sanitarista, bacharela em Saúde Coletiva pela Universidade
Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), trabalhadora do SUS, preocupada com as
iniquidades sociais e comprometida com as questões sociais, me inseri no campo do
bairro do Maracujá, situado no município de Santa Cruz/RN, para pesquisar o enfoque
nos usuários e nas usuárias que encontram nas plantas um modo de cuidado, fruto
do cotidiano popular que representa um patrimônio cultural, e que no seu dia a dia,
cantam, rezam e cultivam nas suas próprias vidas as práticas sociais de cuidado em
saúde a partir de um conhecimento ancestral, repassado de geração em geração a
partir da oralidade e da vivência.
Cabe pontuar que, por práticas sociais de saúde as ações terapêuticas dos
agentes culturais de saúde (benzedores, curandeiros, costureiras de rendiduras,
pajés, remedieiros, raizeiros, massagistas tradicionais, homeopatas tradicionais,
parteiras, entre outros), suas atuações de orientação à saúde nas suas comunidades
como prevenção de doenças, nos rituais de rezas, de banhos com finalidade de curar
pessoas em processo de adoecimentos, trabalhos de limpezas e cuidados promotores
de saúde.
É evidente, nestas práticas sociais realizadas pelos e/ou pelas agentes
culturais de saúde, que suas ações não se reduzem a uma evidência “orgânica”,
“natural” e “objetiva”. Suas práticas estão intimamente ligada as suas concepções de
saúde-doença que são construídas em cada sociedade, em cada grupo cultural e suas
teias de relações sociais13. Por isso, os rituais de reza com a finalidade de cura e
cuidado também serão tratados como práticas sociais de saúde.
No nosso campo, encontramos algumas práticas sociais de saúde, as práticas
15

das benzedeiras e rezadeiras, que consistem em rituais de benzeduras praticadas por


mulheres, de forma muito tímida, não explicitadas pelas informantes. Mas cabe
ressaltar que, as rezadeiras ou benzedeiras acionam seus conhecimentos do
catolicismo popular, ofícios, ladainhas, súplicas e rezas com objetivo de restabelecer
o equilíbrio material, físico e/ou espiritual das pessoas que buscam ajuda. Para
realizar a benzedura e de cura pela reza são utilizados símbolos e gestos como ramos
verdes de plantas, sinais da cruz, pano, linha e reza 13,14. Os raizeiros e as raizeiras
são pessoas que se destacam na comercialização das plantas e produtos
medicinais, detentores de um conhecimento capaz de identificar, coletar, preparar e
indicar os vegetais como forma de tratamento 14. Esses atores/atrizes sociais têm
elevadorespeito onde vivem.
Desse modo nos estudos socioantropológicos constata-se que os processos
de saúde-doença-cuidado revelam as mediações entre as finalidades e osmeios de
cada sistema de saúde, expressando seus significados cognitivos, éticos e
estéticos15. Ou seja, independente do sistema de saúde a ser utilizado para o
tratamento de uma determinada doença, há um cuidado particular, individual de cada
pessoa, a ser levado em consideração para o restabelecimento da sua condição de
saúde.
Dadas estas assertivas, é que pretendemos conhecer as práticas sociais de
cuidado realizadas pelas agentes culturais de saúde como são desenvolvidas e como
são relacionadas com as suas concepções de saúde e de doença num território de
saúde, no interior do Rio Grande do Norte, em Santa Cruz, região do Semiárido
Potiguar, no bairro Maracujá; quais são as práticas de cuidado utilizadas com o uso
das plantas medicinais e rezas pelos terapeutas populares do bairro Maracujá em
Santa Cruz/RN? Quem são esses agentes culturais de saúde? Qual é a percepção
desses sujeitos sobre saúde? E por fim: Como percebem a potência no uso das
plantas e da reza no cuidado em saúde?
O contexto escolhido para a pesquisa de campo foi o município de Santa Cruz-
RN, dado a inserção do Mestrado de Saúde Coletiva na região, bem como ao
desenvolvimento da pesquisa “Determinantes Culturais e Saúde: os desafios para
atuação dos profissionais de saúde em diversidade sociocultural nas Unidades
Básicas de Saúde em Santa Cruz-RN” realizada pelo Grupo de Estudos e Pesquisa
Equidade Racial em Saúde (GEERS) da Faculdade de Ciências da Saúde do Trairí
(FACISA) da UFRN, do qual o presente estudo faz parte. Tomamos as práticas sociais
16

de cuidado de ervas medicinais realizado pelos agentes culturais de saúde por ser
uma prática comum na cidade e, sobretudo, no bairro Maracujá, mesmo com a
existência do sistema oficial de saúde com seus serviços e redes de saúde, o que se
revelam como práticas complementares de saúde.

1.1 A cidade da Santa: Santa Cruz do Inharé

O município de Santa Cruz está situado no estado do Rio Grande do Norte, e


encontra-se localizado a 122 km de Natal, capital do estado, com acesso pela rodovia
BR 22616. Atualmente é também conhecida como Cidade Santuário, em virtude de ter
em seu território a Estátua de Santa Rita de Cássia, maior estátua religiosa da América
Latina, fortalecendo o turismo religioso e a economia local17. Santa Cruz está
localizada no semiárido potiguar, na Região do Trairi, área remota do Nordeste
brasileiro, marcada historicamente pela ocorrência de secas, que leva à
vulnerabilidade ambiental, social e econômica, sobretudo, na zona rural do município
(figura 1).
Figura 1 – Mapa Político Administrativo do RN

Fonte: IBGE, 2020.

Como área remota apresenta-se como uma complexa experiência social e


intersubjetiva nas relações sociais, dada por diversas formas de especificidades:
geográfica; ambiental, sociocultural; além das especificidades de acesso ao suporte
de serviços e comunicação em saúde e pela deficiência de infraestrutura em alguns
serviços18,10.
17

Esta complexidade insere-se como uma das facetas analíticas deste estudo,
que toma a perspectiva da área remota como um marcador social da diferença, que
modela as experiências e vivências das pessoas que vivem e trabalham nessas
regiões18. Tal modelagem refletem as relações sociais, as moralidades e as formas
de pensar, ser e de operacionalizar a cultura política local a partir de códigos sociais
próprios de contextos interioranos, o que não significa afirmar que esses aspectos
socioculturais inexistam nos centros urbanos, mas são singulares dessa área.
Embora seja uma área remota, Santa Cruz possui características de Centro de
Zona, segundo as definições estabelecidas pelas Regiões de Influências das
Cidades(REGIC), que compreende cidades de menor porte e com atuação restrita à
sua área imediata, exercendo funções de gestão elementares. No caso de Santa
Cruz, a centralidade abrange sete municípios (Campo Redondo, Lajes Pintadas,
Japi, São Bento do Trairi, Coronel Ezequiel, Tangará e Sítio Novo) que contemplam
a dinâmica dos fluxos de serviços que articulam a rede urbana, dentre elas,
destacamos a presença de duas instituições públicas de ensino19, sendo a UFRN e
o Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN), que potencializam o ensino, a
pesquisa e a extensão na região do Trairi, o comércio e imobiliárias locais.
De acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), a população de 2017 é de 37.142 habitantes, 51% constituem-se da
população feminina. Do total da população 85% são residentes na zona urbana. A
origem da cidade, de acordo com a fontes historiográficas apresenta duas versões, a
primeira refere-se às narrativas da oralidade dos moradores e outra versão baseado
nos registros históricos oficiais19.
A primeira versão assume um caráter mítico-religioso, vinculada à. narrativa
daexistência de Inharé, árvore abundante na região, considerada sagrada e que ao
aparecer com galhos quebrados, anunciava secas, epidemias e outros males14.
Conta-se ao tomar conhecimento do fato, um missionário católico dirigiu-se a árvore
e fez uma cruz com galhos de Inharé e os males cessaram, a água jorrou em
abundância, os animais tornaram-se mansos e as aves entoaram cânticos, quase que
por encanto. Assim, a localidade foi chamada de Santa Cruz do Inharé. Anos depois,
esse nome foi trocado por Santa Cruz do Trairi, nome indígena dado à importância do
curso d’água que banha o território e depois a cidade passou a chamar simplesmente
Santa Cruz19.
A segunda versão, dos registros oficiais, aponta que a cidade era habitada
18

pelos povos Tapuias, com o avanço da colonização no século XVIII iniciou-se as


atividades pecuárias na localidade e aglomeração humana em torno da capela,
erguida pelos irmãos Rocha e um companheiro João Rodrigues da Silva. A capela foi
erguida sob a invocação de Santa Rita de Cassia, dos quais os irmãos eram devotos.
Da aglomeração surgiu Santa Cruz19.
Quaisquer versões que se adotem, percebe-se a influência da colonização da
igreja católica na mítica da cidade santuário. A devoção à Santa Rita, padroeira da
cidade, está por toda parte na cidade e em algumas casas. A Santa das causas
impossíveis e, sobretudo, da cura de doença, atrai para cidade grande número de
fiéis, especialmente em dois períodos do ano, em maio, 22, dia da procissão de Santa
Rita, e 12 de outubro, data da Romaria da gratidão, que celebra a inauguração do
santuário no alto de Santa Rita. Além dessas datas, todos os dias 22 de cada mês,
celebra-se a Romaria da coroa.
Este processo de colonização apresenta-se nas falas e nas residências das
nossas informantes que embora que realizem, para além dos cultivos de ervas
medicinais como raizeiras, algumas praticam o benzimento, entretanto, não gostam
de ser confundidas com práticas de outras espiritualidades, sobretudo, de matriz afro-
indígenas (figura 2).

Figura 2 – Imagens de Santos Católicos na sala

Fonte: Autora do trabalho, 2020.

Por isso, não se apresenta tão simples neste estudo, discutir religiosidades das
agentes culturais de saúde, que ao serem perguntadas sobre suas religiões, todas
responderam ser católicas. As imagens dos Santos Católicos em suas residências, na
sala principal, locais que costumam receber pessoas, estão por toda parte e são
exibidas com muita devoção e sempre a imagem de Santa Rita faz-se presente, mas
19

como veremos, se quisermos “classificar” nossas informantes, estas seriam raizeiras.


Assim, como em todo o Rio Grande do Norte, em Santa Cruz a religião com
maior número de praticantes é a Católica Apostólica Romana (figura 3), contabilizando
aproximadamente 30.519 pessoas, quase o total da população. Praticantes
Evangélicos não ultrapassam um número de 4.000 e Espíritas não completa nem uma
centena de pessoas. Outras expressões de religiosidade nem sequer chegam a
constar nos dados informados no portal do IBGE16.

Figura 3 – Devoção aos Santos Católicos

Fonte: Autora do trabalho, 2020.

1.2 Território de Saúde

Santa Cruz como território em saúde insere-se na V Região de saúde do estado


do Rio Grande do Norte, tendo na sua jurisdição 21 municípios adscritos (Municípios
da Região Política Administrativa do Trairi e do Potengi), sendo Santa Cruz a cidade
polo da regional17 (figura 4).

Figura 4 – Mapa das Regiões de Saúde do RN

Fonte: SESAP, 2020.


20

A rede hospitalar do município encontra-se caracterizada por dois hospitais, um


hospital geral de gestão municipal, Hospital Regional Aluízio Bezerra, com serviços
de urgência, referência para a 5ª região de saúde e outro de gestão federal, Hospital
Universitário Ana Bezerra, com atendimento materno-infantil, sendo referência para a
5ª região de saúde no pré-natal de alto risco e parto de risco normal17.
Além disso, o município conta com o Serviço de Atendimento Móvel de
Urgência (SAMU), a rede de atenção psicossocial constituída por dois Centros de
Atenção Psicossocial (CAPS), sendo uma unidade CAPS II, que promove atendimento
a todas as faixas etárias para transtornos mentais graves e persistentes, inclusive pelo
uso de substância psicoativas, e uma unidade CAPS AD em fase de implementação
que promove atendimento também a todas as faixas etárias e se especializa em
transtornos pelo uso de álcool e outras drogas; a rede de atenção específica à saúde
de pessoas com deficiência com o Centro de Reabilitação (CER), que desenvolve
ações integradas com a rede para a recuperação de pessoas com deficiência e; o
Serviço de Atendimento Especializado (SAE) é um serviço especializado para
pessoas que vivem com HIV/AIDS e outras Infecções Sexualmente Transmissíveis
(IST’s), funcionando no Hospital Regional Aluízio Bezerra com equipe multiprofissional
formada por psicóloga, farmacêutica, assistente social, médica infectologista,
enfermeira e técnica de enfermagem17.
Acrescido as redes de serviço listadas acima, os/as usuárias de saúde podem
contar, a partir do desenvolvimento de pesquisas e estágios de ensino, com a Clínica
Integrada do Serviço Escola da UFRN, que dispõe de serviços especializados em
enfermagem, nutrição, fisioterapia e psicologia, ofertados de forma gratuita por
discentes, professores e técnicos dos cursos da Faculdade de Ciências da Saúde do
Trairi.
Embora que, Santa Cruz apresente minimamente um desenho de uma rede em
saúde, no cotidiano no serviço em saúde, parece-nos, que ainda há problemas no
atendimento das necessidades de saúde, sobretudo, porque a área da saúde mental
não se apresenta adequada, não atende as demandas do município, e as redes e
linhas de cuidado não apresenta as referências e contrarreferências, nem fluxo do
serviço de saúde20 como preconiza o Sistema Único de Saúde.
No que se refere às Equipes de Estratégias da Famílias (ESF’s), o município
conta com 12 ESF, distribuídas em sete territórios em saúde, sendo seis na zona
urbana (Bairro do DNER; Bairro do Paraíso I e Paraíso II; Bairro do Maracujá e Bairro
21

Conjunto Cônego Monte e Centro) e uma na zona rural (Bairro Bonsucesso), não
oferecendo cobertura total à população.
No território em Saúde do Maracujá (figura 5), bairro onde residem nossos
informantes, tem apenas uma ESF formada por um médico generalista20, uma
enfermeira, uma auxiliar de enfermagem, uma dentista, uma assistente de saúde
bucal, um auxiliar de farmácia e 11 Agentes Comunitários de saúde, para uma
população de 6.000 habitantes e 1.624 imóveis. O Programa de Estratégia da Família
preconiza que o máximo, 4.000 pessoas, sendo a média recomendada de 3.000
pessoas, respeitando critérios de equidade para essa definição21. Como bairro
apresenta-se ainda em expansão, há uma população descoberta no bairro, como
percebido na vivência no território.

Figura 5 – Mapa do território de saúde do Maracujá

Fonte: Google Maps, 2021.

Para além da ESF, o bairro possui equipamentos sociais como igreja católica e
igrejas evangélicas, um Centro dos Idosos, onde antes da pandemia, ocorria o Forró
dos Idosos e ações de educação em saúde; quadras esportivas, dois cemitérios,
supermercados e vários salões de beleza; não possui associação de

1Assim, como outros interiores das áreas remotas do Brasil, no Bairro Maracujá, como em todo território
de Santa Cruz-RN, há problemas de fixação de profissionais médicos nos serviços de saúde, ocorrendo
grande rotatividade desses profissionais nos serviços.
22

bairro, entretanto, por um curto espaço de tempo funcionou no território um Conselho


Local de Saúde (2019-2020); e as agentes culturais de saúde, que são, a grosso
modo, não relacionadas com o território de saúde.
Isso demonstra que, mesmo levando em consideração os princípios do SUS,a
saber, da integralidade e equidade, e a importância do processo de territorialização
em saúde, ainda se deixam de lado aspectos culturais de saúde, fundamentais para
práticas de cuidado em saúde de uma dada população.
Dessa forma, apresenta-se um território de atenção à saúde, fragmentado, com
ações sem o embasamento da realidade local, e sem contemplar as demandas
territoriais, de maneiras casuísticas e pouco resolutivas. Isto vai de encontro à
perspectiva de rede em saúde, tendo a Atenção Básica da Saúde22 como
coordenadora do cuidado e elemento de referência para o movimento integrado em
rede do cuidado em saúde, reverberando a lógica da constituição federal consolidada
pelas leis orgânicas da saúde 8080/905 e 8142/9023.
Por isso, acreditamos que a relevância do estudo pode estar em proporcionar
um panorama sobre os cuidados populares em saúde no bairro Maracujá, localizado
no município de Santa Cruz/RN, a fim de subsidiar a construção de uma ferramenta
estratégica para o delineamento de políticas públicas para o reconhecimento dos
saberes das agentes culturais de saúde e visibilizar o uso das ervas e práticas de reza
como promotores de saúde.
Ademais, pode possibilitar a construção de cooperação com os profissionais de
saúde a fim de promover a valorização, respeito à cultura e religiosidade dos sujeitos,
tendo em vista que esses fatores influenciam no processo de saúde-doença-cuidado.
Com isso, espera-se contribuir para minimizar as iniquidades em saúde, garantindo a
equidade de acesso aos serviços de qualidade na prática do cotidiano do serviço em
saúde, principalmente para quebra de preconceitos e uma integração dos saberes
acadêmicos com os saberes populares como contraponto à cultura hegemônica e/ou
dominante24.
Além disso, com a imersão nesse cenário para o conhecimento da diversidade
e do universo cultural que permeia o uso das ervas medicinais no cuidado em saúde,
apontar a importância da valorização e reconhecimento das práticas populares,
considerando ser um modo legítimo de cuidado e concepção integral da saúde,
auxiliando no enfrentamento das doenças, em consonância com a diretriz da Política
Nacional de Práticas Integrativas e Complementares de Saúde, que apregoa o
23

incentivo à pesquisa e desenvolvimento de plantas medicinais e fitoterápicas,


priorizando a biodiversidade do País, conforme também preconizado pela
Organização Mundial de Saúde25.

1.3 Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares

Hoje se percebe que no Brasil e no mundo tem-se notado que as questões


ambientais, sociais e econômicas misturam-se ao tema qualidade de vida, cuidado,
acesso à saúde, segurança, autonomia e humanização. Destacamos a necessidade
de uma abordagem interdisciplinar que possibilite explorar as especificidades de
cuidado, algumas vezes invisíveis, mas importantes no contexto dos diferentes grupos
sociais, e isso se deve à reivindicação dos movimentos sociais da década de 1980, à
inclusão de cuidados com perspectiva de traduzir e integrar, para sua realidade,
práticas do sistema médico.
Esse ideário culminou na aprovação da Política Nacional de Práticas
Integrativas e Complementares no SUS, em 03 de maio de 2006, através da portaria
Ministerial GM/MS nº 971, incluindo-se outras formas de cuidado, mas não dando
destaque às raízes afro-brasileiras25.
Sob uma abordagem antropológica, a busca por formas de tratamento
alternativo e complementar com diferentes apropriações/construções acerca do
corpo, da produção e do consumo de produtos e de novos estilos de vida, desperta o
indivíduo para interconectividades na perspectiva do olhar, do detalhe do Outro,
reconhecendo as outras culturas, outras formas de viver, adoecer, curar e morrer, com
o outro e com o ambiente26, 53.
A utilização de ervas e os rituais de benzer se encontram presentes como forma
de cuidado, demonstrando que essas práticas não são usadas somente na ausência
dos recursos do sistema de saúde, mas também se constituem como uma alternativa
de cuidado dos grupos sociais, sendo assim uma das práticas do sistema de cuidado,
que leva em consideração a integração entre corpo, alma, espírito e ambiente27.
A presença e difusão do uso de fitoterápicos como prática de cuidado é cada
vez maior pela população28. Iniciativas como as implantações de “Farmácias Vivas”
nos territórios potencializam a utilização dessas práticas29. Constitui-se, portanto,
como uma forte estratégia para difundir o uso de fitoterápicos na Atenção Primária à
Saúde.
24

Resgatar o uso das ervas medicinais, como uma forma de cuidado que
promove o alívio do sofrimento, faz pensar na importância que esse cuidado tem para
as pessoas, bem como a necessidade de integrar esses conhecimentos com a
comunidade científica para valorizar o conhecimento popular30.
Neste sentido, o processo de saúde-cuidado é resultante da historicidade dos
sujeitos, dos significados compartilhados, entre o passado e o presente, resultando
em algo adaptado, diferente, influenciado pela espiritualidade, ambiente físico e
natural onde os grupos sociais convivem. A saúde é vista não pela ausência de
doença, é “direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso
universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação”4.
É necessário, portanto, que no currículo de formação dos profissionais de
saúde sejam inseridas disciplinas contemplando as diversas formas de cuidado,
diferentes do cuidado da biomedicina, e que não se detenham tão somente às
questões biológicas, mas incluam também: a antropologia, a sociologia, a medicina
tradicional chinesa, a medicina homeopática; uma vez que as suas presenças nas
graduações da área da saúde é incipiente, promovendo relativo desconhecimento na
maioria dos profissionais31. Para realização de experiências exitosas é fundamental a
articulação entre a gestão municipal e a Atenção Primária à Saúde, em parceria com
as Instituições de Ensino32.
Para isso, deve ser garantido investimento por parte do Ministério da Educação
e da Saúde para o desenvolvimento de pesquisa, ensino e ações de extensão na
graduação e pós-graduação voltadas aos profissionais de saúde em formação, mais
uma vez contando com parceria das Instituições de Ensino.
Na Atenção Primária à Saúde, as Práticas Integrativas e Complementares
devem ser vistas como um grande potencial de recursos interpretativos, terapêuticos
e de promoção da saúde como um campo a ser investigado33.
A forma como o sistema de saúde se relaciona com os usuários deve ser
pautada numa escuta qualificada que leve em consideração os saberes de saúde
praticados pelos grupos sociais33, ou seja, a diversidade das práticas de cuidado que
envolvem as crenças, religiosidade, hábitos alimentares, apoio social e prevenção de
doenças.
Sob a ótica da educação popular em saúde, Paulo Freire34 propõe a valorização
dos saberes populares, ou saberes socialmente construídos na prática comunitária,
25

com vistas à valorização do diálogo, da problematização e na ação comum entre


profissionais e população – numa perspectiva de que tanto os profissionais (ou
educadores) quanto a população (educandos) têm seus respectivos conhecimentos,
e, portanto, todos sempre têm algo a aprender ou a ensinar por meio do diálogo e da
troca de vivências.
A formação dos profissionais de saúde é marcada por modelos prescritivos e
autoritários. O campo da educação em saúde é multifacetado, para a qual convergem
diversas concepções, tanto da educação quanto da saúde, e que retratam as distintas
compreensões do mundo e são demarcadas por sua diversidade35. Diferentemente
desse modelo, apresentam-se propostas de educação popular em saúde como
correntes contra hegemônicas diante dessas barreiras históricas.
É mister destacar a necessidade de uma visão holística e contextualizada do
conceito de saúde para servir de inspiração ao educador em saúde.
Diante da valorização do conhecimento popular, Boaventura de Sousa Santos
apresenta a ecologia de saberes36 definida como uma:

forma de extensão ao contrário, de fora da universidade para dentro


da universidade. Consiste na promoção de diálogos entre o saber
científico ou humanístico, que a universidade produz, e saberes leigos,
populares, tradicionais, urbanos, camponeses, provindos de culturas
não ocidentais (indígenas, de origem africana, oriental, etc.) que
circulam na sociedade. [...] Começa a ser socialmente perceptível que
a universidade, ao especializar-se no conhecimento científico e ao
considerá-lo a única forma de conhecimento válido, contribuiu
ativamente para a desqualificação e mesmo destruição de muito
conhecimento não-científico e que, com isso, contribuiu para a
marginalização dos grupos sociais que só tinham ao seu dispor essas
formas de conhecimento.

Por isso, numa assistência de saúde em que está presente o modelo


hegemônico centrado na doença, o saber científico destaca-se em detrimento do
saber popular. Perde-se o valor dos cuidados alternativos em saúde e passa-se à
dependência entre os médicos e os medicamentos industrializados. Mais uma vez,
ressalto a importância do diálogo e respeito entre os dois saberes - científico e popular
- como uma prática indispensável nos serviços de saúde36.
26

2 OBJETIVOS

2.1 Objetivo geral

 Conhecer as práticas de cuidados populares em saúde nas práticas de reza e/ou


de cultivo de uso de ervas medicinais num território em Saúde em Santa Cruz/RN.

2.2 Objetivos específicos

 Identificar as ervas medicinais utilizadas pelas agentes culturais de saúde como


prática de cuidado;
 Apreender a concepção de saúde na percepção das agentes culturais de saúde do
território de saúde do Bairro Maracujá em Santa Cruz/RN;
 Verificar as principais características das práticas sociais de saúde realizadas pelas
agentes culturais de saúde, a partir da utilização das ervas medicinais.
27

3 MATERIAL E MÉTODOS

Trata-se de uma pesquisa de natureza exploratória-descritiva, desenvolvida


mediante abordagem qualitativa. De acordo com Minayo37, a pesquisa qualitativa leva
em consideração o “universo de significados, crenças, valores, atitudes, processos e
fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis”.
Para atingir os objetivos propostos no presente estudo, realizamos entrevista
semi-estruturadas, nos moldes da técnica de história de vida, com agentes culturais
desaúde, em sua maioria mulheres, 85,7%, no bairro, Maracujá em Santa Cruz-RN,
território que apresentamos em seções anteriores.
Esta técnica de entrevista foi empregada com a finalidade de situar o relato das
informantes na reconstrução da trajetória de vida a partir da temática proposta pela
pesquisadora, a saber, o uso de ervas medicinais nas práticas de cuidado em saúde.
Por isso, coube à pesquisadora ultrapassar o caráter individual e singular do
que as informantes lhes transmitiram, de forma a desvelar as teias sociais em que a
informante de pesquisa está inserida. Neste sentido, as interferências da
pesquisadora foram mínimas, entretanto, tinha-se em mente que embora a condução
da entrevista tenha sido das informantes, o comando foi sempre da pesquisadora,
tendo em vista que foi ela quem escolheu o tema da pesquisa, quem formulou as
questões e propôs os problemas38.
Este tipo de técnica está passível de algumas críticas, tais como, produção de
narrativas cronológicas, com direcionamentos de fatos nem sempre lineares nas teias
sociais, mas se apresentando conforme uma cronologia39. Ou ainda, pode-se cair em
algumas armadilhas de análises macrossociais na tentativa de relacionar a passagem
do individual ao social, evidenciando o social em detrimento as vivências e
experiências das pessoas nos seus contextos singulares39. Para evitar essas
armadilhas, buscamos apresentar as contradições, conflitos e tensões socioculturais
das informantes, além de não adotar a perspectiva de análise de biografias
cronológicas.
Para viabilizar a identificação dos participantes da pesquisa foi utilizada a
técnica snowball, bola de neve40, que:

para o pontapé inicial, lança-se mão de documentos e/ou informantes-


chaves, nomeados como sementes, a fim de localizar algumas
pessoas com o perfil necessário para a pesquisa, dentro da população
28

geral. [...] Em seguida, solicita-se que as pessoas indicadas pelas


sementes indiquem novos contatos com as características desejadas,
a partir de sua própria rede pessoal, e assim sucessivamente e, dessa
forma, o quadro de amostragem pode crescer a cada entrevista, caso
seja do interesse do pesquisador. Eventualmente o quadro de
amostragem torna-se saturado, ou seja, não há novos nomes
oferecidos ou os nomes encontrados não trazem informações novas
ao quadro de análise40.

As sementes se constituíram pelos moradores do bairro Maracujá, usuários e


profissionais de saúde da Unidade Básica de Saúde 2, localizado no município de
Santa Cruz, os quais indicaram as informantes que iriam colaborar para a construção
da rede dos participantes da pesquisa. Assim, foram incluídas na pesquisa pessoas
com idade igual ou superior a 18 anos; agentes culturais de saúde no bairro Maracujá,
em Santa Cruz/RN, os quais aceitaram participar voluntariamente da pesquisa por
meio da concordância com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)3 e
do Termo de Autorização para Gravação de Voz e Registro de Imagens4. Foi utilizado
como critério de exclusão a possibilidade de desistência do usuário por vontade
própria no decorrer da coleta de dados para a pesquisa, como também foram
excluídas da análise de conteúdo trechos das falas que não respondiam aos objetivos
do estudo.
No total, conseguimos entrevistar sete agentes culturais de saúde, sendo seis
mulheres e um homem. Os encontros com as informantes ocorreram em suas
residências, diante dos seus quintais de ervas medicinais e/ou altares de santo
católicos, nos meses de outubro a dezembro de 2020. As entrevistas foram
registradas por meio de gravação em áudio que foram transcritas pela pesquisadora.
Houve a garantia de sigilo das informações, assim como o anonimato, em todo o
decorrer da pesquisa, e visando assegurar tais atributos foram utilizadas como
pseudônimos plantas medicinais.
O roteiro de entrevista que norteou os encontros com as informantes foi
constituído de perguntas abertas sobre as concepções de saúde das informantes,
como se deu a transmissão de saberes de suas práticas, bem como, quais as
relações das suas práticas de cuidados com o SUS5.

2O contato com os moradores ocorreu a partir da inserção da Profa. Mercês, coordenadora do Projeto
maior, ao qual este estudo faz parte, na disciplina “Saúde e Cidadania”, SACI. SACI é um componente
curricular prático, interdisciplinar, que ocorre semestralmente nos territórios de saúde de Santa Cruz-
RN.
3 Consultar anexo I.
4 Consultar anexo II e III.
29
A pesquisa ocorreu no cenário pandêmico dado a isto que cabe ressaltar
algumas ressalvas, a primeira que não realizamos o processo de validação das
entrevistas, tendo em vista que, só foi possível realizar um encontro com cada
informante. Segunda ressalva, seguimos os protocolos sanitários devido à pandemia
de COVID-19, mantendo os cuidados para proteger as informantes da pesquisa e
diminuir o risco de infecção no momento da coleta de dados, incluindo o uso de
máscaras, utilização de álcool, distanciamento social e ligação prévia questionando
sobre a existência de algum sintoma suspeito.
Embora que em alguns registros fotográficos as informantes apareçam sem
máscara, enfatizamos que foi respeitado o distanciamento social e a pesquisadora no
momento do registro estava utilizando máscara.
Das entrevistas emergiram narrativas que foram analisadas a partir da técnica
de codificação temática, a partir dos núcleos gerais de sentido pré-estabelecido no
roteiro de entrevista: 1) Como se deu a transmissão de saberes; 2) De que forma o
aprendizado estabelecido influencia sua vida; 3) Qual a concepção de saúde
apreendida com as práticas de cuidado; 4) Quando ou em que situações procuram-
se os serviços de saúde e; 5) Os profissionais da saúde são informados sobre os
saberes de sua prática de cuidado.
Após leitura exaustiva das narrativas foram estabelecidos os núcleos de
sentidos e significados comuns das narrativas relatadas42. A partir dos agrupamentos
dos sentidos e significados emergiram sete categorias analíticas, que foram
sintetizadas em três temáticas 1) “Ervas e Práticas de rezas”: a transmissão do cuidar;
2) “Saúde como produção de sentido de vida” e 3) “Encontros e desencontros dos
sistemas culturais de saúde: O SUS e o popular”, que apresentaremos na seção a
seguir. Já os dados quantitativos para caracterização do perfil foram organizados com
o auxílio do programa Excel versão 2010.
Quanto aos aspectos éticos, destaca-se que foi seguida a Resolução n° 510/16
do Conselho Nacional de Saúde (CNS) onde se estabelecem as normas que
regulamentam as pesquisas com seres humanos no âmbito das Ciências Humanas e
Sociais. O projeto da pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP)
da FACISA - UFRN, sob o parecer 3.737.675.

5 Consultar anexo IV.


30

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Como apontamos acima, o estudo contou com a participação de setes


informantes, moradores do Bairro Maracujá, em Santa Cruz. Dos setes informantes,
seis eram mulheres; quatro solteiras, com idade entre 40 e 80 anos e de maioria
autodeclaradas negras (1 preta e 3 pardas). Quanto à escolaridade: duas analfabetas,
duas com ensino fundamental completo e duas com ensino médio completo, o que
demonstra baixa escolaridade, dados que estão em sintonia com a pesquisa realizada
no município de Montes Claros em Minas Gerais43 e em Cruzeta-RN14, em que a
maiorias das usuárias das ervas medicinais e das rezadeiras são a maioria do gênero
feminino e com baixa escolaridade.
Esses dados sobre a baixa escolaridade revelam, sobretudo, como o processo
de apreensão dos saberes ocorrem a partir do uso da oralidade. Assim, o uso das
ervas medicinais por pessoas de maior idade aponta para uma prática que atravessa
gerações, fruto de um conhecimento empírico44. Mas também demarcam as
diferenças estabelecidas do processo de aprendizagem do sistema oficial e do
sistema popular de saúde.
De acordo com levantamento que realizamos e apresentamos no (quadro 1),
ao perguntarmos sobre a religião, as informantes responderam ser católicas,
entretanto, Capim Santo, no decorrer da nossa conversa, afirmou acreditar também
no “Espiritismo”, embora seja católica. Além de Capim Santo, Manjericão, embora
tenha se declarado católica, afirmou não acreditar em santos da igreja católica, sua fé
e crença relaciona-se apenas com o “poder de Deus”6.

Quadro 1 – Perfil Social das Agentes Culturais de Saúde

Agentes Gênero Cor/Raça Idade Estado Escolaridade Religião


Culturais Civil
de Saúde
Crajiru Feminino Parda 59 Solteira Ensino Médio Católica
Completo
Mastruz Feminino Branca 69 Casada Analfabeta Católica
Cidreira Feminino Parda 74 Solteira Analfabeta Católica
Capim Feminino Branca 40 Casada Ensino Médio Católica
Santo Completo

Babosa Feminino Preta 60 Solteira Ensino Católica

6 Oscasos da fé e crença de Capim Santo e Manjericão precisaria ser mais explorada, mas como não
foi possível, estes casos serão aprofundados no desenvolvimento do projeto de pesquisa
“Determinantes Socioculturais de saúde”.
31

Fundamental
Completo
Manjericão Feminino Parda 68 Solteira Ensino Católica
Fundamental
Completo
Hortelã Masculino Pardo 84 Viúvo Analfabeto Católico

Fonte: Dados da pesquisa, 2020.

Há perspectiva do catolicismo popular, com predomio do culto aos santos,


presentes em seus altares, com entrelaçamento das culturas dos povos, tendo a
presença do ser divino como grande amigo e aliado de vida, no exercício do ser
católico. A maioria demonstra que a religiosidade está presente no cotidiano destes
participantes do estudo. Principalmente pelas mulheres, a começar pelas salas de
suas casas, onde se encontram altares de imagens de santos e nas paredes (figura
1, 2), onde estão de certa forma, materializados suas crenças14.
A religiosidade também se fez presente nas suas narrativas, quando Babosa,
por exemplo, informa-nos no início do nosso encontro que é necessário ter fé para
que as ervas façam sua parte no processo de cuidado e termina nosso encontro com
ofício de Nossa Senhora - “Sagrada face do Senhor, alivia a nossa dor! Aliviai a
nossador!”
Das narrativas das informantes emergiram três categorias analíticas 1) “Ervas
e Práticas de rezas”: a transmissão do cuidar; 2) Saúde como produção de sentido de
vida e; 3) Encontros e desencontros dos sistemas culturais de saúde: O SUS e o
popular.

4.1 “Ervas e Práticas de rezas”: a transmissão do cuidar

Nas falas das nossas informantes quanto à aproximação da prática de cuidado


através do uso das ervas e rezas, é notória a ascendência desse conhecimento. Há
forte presença no seio familiar: a influência dos parentes com a indicação de ervas e
chás tanto para o cuidado individual como também na perspectiva do coletivo com
ênfase no altruísmo. Destaca-se também o apreço à natureza e o encantamento com
as ervas. Essas emoções foram fortemente sentidas nas nossas conversas.
Logo, o processo de construção do conhecimento teve como origem as
relações do dia a dia, comunitário, entre as pessoas, evidenciando um aspecto cultural
32

45
enraizado na população estudada .
Com mamãe… Ela passava muita coisa pra mim… Chá disso é bom
para isso… A gente começa a pegar, né. (Babosa)

Foi da genética, certo. A minha tia ela cuidava muito de ervas e sempre
dizia: “isso serve para isso… Isso serve para isso…” Tá entendendo?
Aí, eu fui me interessando, então, graças a Deus, até hoje é o que eu
uso… Como meio de me cuidar... Da minha saúde e a saúde do
próximo. (Crajiru)

Como fui criada pela minha avó, né. Aí a gente tende a crescer vendo
elas praticando… E você involuntariamente fica adquirindo esse
conhecimento, desde então, desde criança, eu assim...Tudo é com
remédios da natureza, as plantas... Tipo uma gripe… Toma chá de
casca de limão, mel...né. Chá de Camomila, Erva-Doce e daí por
diante... Uma coisa maior… Se tivesse uma bronquite: lambedor de
cebola branca, com casca de cumaru… Enfim... É tanto que hoje eu
tenho 40 anos e nunca tive contato com antibióticos. (Cidreira)

Porque eu toda vida gostei de plantas e rosas. Cidreira, arruda, todas


as plantas eu gosto… De muita, muita planta… Ah, se eu pudesse era
muita planta… E, tudo, tudo… sempre sabendo o que eu uso… O que
é que é bom… Que vale a pena mais do que um comprimido comprado
na farmácia tem delas que é bem melhor! Eu vejo assim... Tem planta
que ela é muito boa… Ela serve mais do que você gastar milhares e
milhares de dinheiro em farmácia. (Manjericão)

Lá nós plantava, o meu pai plantava. Ele... ele ia pro campo mais outro
irmão, e dizia: “olhe, menino, vocês, tá aqui os pés de fruta. Aí ele
dizia: “Lá vamos pro campo. Vocês pegue essas plantas que têm aí;
cajueiro, laranja, limão, manga, coqueiro”. É tudo.

Toda qualidade de planta que tinha, né? De tudo tinha. Aí vamos


plantar. Planta um lado primeiro, aí depois... planta o mês. Aí... aí um
vai cavando e o outro enterrando... E eu ainda faço. (Hortelã)

Observa-se, ainda, que o uso das plantas está associado com a crença e fé
dos sujeitos, como se não bastasse somente o uso da planta em si mesmo, mas
também a crença de que a cura será atingida.

[...] Peço. Ave Maria. Eu uso a fé demais. Eu tenho muita fé. Boto as
mãos pro céu. Faço aquelas oração bem bonita, tanto pra mim quanto
pra todos... o pessoal, né? Eu não quero só pra mim não, eu quero pra
todos.(Mastruz)
33

Essa minha aproximação foi assim... é porque a gente é católico, a


gente gosta muito de rezar, eu pego o meu terçinho e rezo todo dia,
três horas da tarde, três horas da manhã. Parece que é Jesus que já
me acorda para mim rezar aquele terço. E aí eu vivo pedindo as coisas
a Deus: felicidade, saúde... [...] (Cidreira)

Quanto ao processo de aproximação a essas práticas, ficou nítido que se deu


por meio de crenças, valores, conhecimentos dos familiares e amigos. Até mesmo por
curiosidade.
Natural… Natural, mesmo.. Isso, com a vivência de mamãe.[...] E com
aquelas ervas ali eu fiz um milagre de Deus... (Babosa)

Foi. Da minha tia, foi. Julia Pedro. (Crajiru) Aproximação foi através da
família. (Capim Santo) Eu sozinha... Desde os 13 anos de idade.
(Manjericão)

Foi sozinha mesmo, né? Eu fui sozinha mesmo. Aí sobre a Legião de


Maria, quando entrou tudinho, aí eu fui com elas né?

Mas né... foi por mim mesmo. É, no tempo de eu pequena mesmo...


(Mastruz)

Meu filho, é o seguinte: a gente quando é criança, a gente tem muita


vontade de aprender as coisas, né? E tudo que eu vi, bastava eu ver
uma vez, eu já aprendia. Aí mamãe ensinava a gente a rezar, e a que
ela não ensinava eu pedia as velhinhas de fora, assim, as velhinhas
que sabiam ensinar. Aonde tinha uma velhinha que chamava dona
Ana, ela me ensinou o ato de contrição, até hoje eu sei. Dos amigos e
da minha família, que eu aprendi. (Cidreira)

Aproximação foi através do pai. (Hortelã)

Com relação se houve algum acontecimento em sua vida ou alguma


experiência que fez o usuário procurar as práticas populares de cuidado, foram
constatados episódios especiais, levando os sujeitos a buscarem as práticas, mas
também ficou evidente o uso das plantas e da reza nas vidas dos sujeitos,
independentemente da existência desses episódios. Inclui-se também a preocupação
do cuidado de si e do próximo.

A família e tipo, por exemplo… Eu sempre penso em mim e penso no


próximo. Eu tenho um neto que tem fibrose cística, então sempre eu
tenho o cuidado de colocar na alimentação dele alguma coisa que
34

ajude ele ter uma melhora, entendeu? Aí, a preocupação… De sempre


arrumar um jeitinho... Eu prefiro fazer dessa forma… De cuidar das
pessoas...Não só de mim… Deixa eu dar só um exemplo… Eu tava na
pandemia, eu fiquei de 5 meses sem trabalhar… Mas, um dia na
semana eu ia para o posto fazer suco verde para as meninas… Que
trabalham para não pegar o corona, graças a Deus… Só teve duas
que pegou… (Crajiru)

Como falei no capítulo anterior, toda a versão da minha vida, de


infância e de adolescência com a minha avó… Eu levo isso para vida.
Assim, não teve um fato especial para eu ter procurado as plantas...
Já é uma coisa que a planta faz parte da minha vida, adoro cultivar as
plantas, eu sei como cuidar delas, o preparo... Ah, não precisa… Não
teve um fato especial. É pelo fato de eu ter já nascido assim... E Eu
passo isso para frente… (Capim Santo)

Tive! E faz pouco tempo… Porque um dia eu tava escutando o rádio e


tinha um rapaz, que tinha muito diabetes. tinha muito… Tinha duas
feridas grandes, aí eu escutando, mas aí… Cheguei na rua de
mototáxi, e dei de cara com ele.. Ai, Toninho... Eu queria muito te
ver…Eu dei de cara com ele… (Diga) Má rapaz é verdade que você
tava com diabetes, tinha duas feridas grandes, Começou a tomar
crajiru e ficou bom? Aí, ele levantou a calça e Olhe, isso aí… As duas
feridas tinham sarado… (Manjericão)

Minha filha, eu quando tava grávida do meu primeiro filho, eu sonhei


um sonho assim que eu vendo uma santa, né? Eu vendo Nossa
Senhora Aparecida no mato, assim, aí mamãe, eu ia com mamãe né...
dentro dessa capoeirinha ela tava lá, ela tava sentadinha lá no canto.
Daquele jeito que é Nossa Senhora Aparecida. Aí eu fui, cheguei, me
aproximei, minha mãe disse “minha filha, aproxime dela e pergunte se,
quando você vai ter esse menino”. Aí eu disse “é mesmo, mamãe”. Aí
eu saí pra ela e mamãe ficou lá me esperando. Isso é no sonho, né...
Não vou dizer que foi realidade porque foi eu sonhando, né. Aí eu
chegava e perguntava a ela quando é que era que eu ia ter aquela
criança. Ela disse: “minha filha, você vai ter no dia 7 de julho, você vai
ser muito feliz.” Eu disse “obrigado, santinha, agradeço.” Passei até a
mão assim na barriga. “Agradeço pelas suas palavras”. Aí voltei, contei
a mamãe. Contei a mamãe, né? Ela disse “foi mesmo, minha filha?”.
Eu disse “foi”. Quando foi no outro dia eu contei à mamãe. Eu digo
“mamãe, eu vou contar, porque pode ser que não seja, e se eu for
contar depois de eu ter o menino o povo diz que é mentira minha. Eu
vou contar logo.” Aí eu fui e contei: “mamãe, a santinha disse que eu
ia ter esse menino no dia 7 de julho e eu ia ser muito feliz.” Apois não
foi que eu tive, menina... eu tive. Que meus filhos tudo é bênção pra
mim. Aí foi que eu criei fé. Aí foi que eu fiquei mais com fé. De viver da
igreja, né. Viver numa igreja. (Cidreira)
35

Nunca outro que me ensinou não. Até hoje, eu chego, pego um pé, um
pé de pau desse, encosto aí... É... Cajueiro, eu enterro a castanhinha;
quando tá pronto de mudar [...]. Quando chove, eu vou, boto um
bocado de mato, com os pauzinho. Enquanto ele tá dessa cor assim,
eu vou... Ali, por trás da parede, tem uns pés, anão. (Hortelã)

A respeito de como se deu o processo de inserção das práticas de cuidado, até


se tornarem conhecedores, a trajetória foi marcada por conversas com os idosos e
amigos. Experimentando as indicações e comprovando a potência do uso, destacando
também a importância da crença para a efetividade do tratamento.

É aquela coisa... Olhe, eu sempre procurei… Perto da minha idade as


pessoas para conversar, né… Conversar sobre isso… Muita gente…
Eu dei aula… A 100 idosos… Desses 100 idosos, 5 faziam esse tipo
de trabalho… De fazer chá de ervas, entendeu? Quer um calmante?
Faz um chá de erva cidreira. Tá acelerado? Se tiver um capim santo…
É um processo todo, entendeu? Aí eu fui aprendendo, vendo que
funcionava e botei em prática. (Crajiru)

Foi através de conversas, minha avó conversava com as amigas…


Elas transferiam conhecimento uma para as outras... Ah, eu tô com
cólica… Toma chá de tal erva três vezes ao dia… Ah, faz banho de
assento… Três vezes ao dia… E sempre… Isso fica na cabeça da
gente, né?! Quando a gente faz e entende o valor que você fez e deu
certo... Né… Porque possa ser às vezes um pouco de fé, ou efeito
placebo... Eu não sei… Só sei que dá certo, é. E tudo tem que ter fé
também… Tem gente que não acredita… Mas, temos que respeitar
quem não acredita… E acho que vale a pena acreditar. (Capim Santo)

Já em relação ao tempo de quando aconteceu a aproximação dos sujeitos às


práticas de cuidado e a reza, a maioria relatou que desde a infância, com 7 anos, 12
anos e 13 anos. Dois não informaram precisamente a idade, mas destacaram que há
trinta anos ou mais, corroborando assim com a ideia de que essa prática vem sendo
utilizada há bastante tempo.

Meu amor, faz muito tempo… Há uns 30 anos, faz tempo demais…
(Babosa)

Faz mais de trinta anos que eu tô nessa luta, eu comecei cedo… Fui
pegando as coisas da minha tia e fui praticando... (Crajiru)

Eu tinha 13 anos… (Manjericão)


36

É, no tempo de eu pequena mesmo, né? (Mastruz) Desde pequena.


Assim, uns 7 anos, 8 anos. (Cidreira)

Mulher, minha fia, tô dizendo... fui pra Cerro Corá, de Patu. Dormi em
seis cantos, de Patu a Cerro Corá. Com 12 anos. (Hortelã)

Questionados de como se deu a transmissão desse conhecimento, os sujeitos


da pesquisa pautaram que foram pelas conversas com familiares e amigos, como
também pela curiosidade em aprender.

Ela sempre dizia… Isso, isso e isso é bom para isso, isso e isso… Aí,
eu ia fazendo, isso é bom para inflamação. Esse é bom para osso… E
assim, foi sendo… Tomava as ervas e ficava boa… (Babosa)

Aonde eu via um pé de planta eu perguntava para a pessoa que tinha


e o que servia… Era uma rosa, era uma coisa… E eu ia trazendo.. E
plantava…E minha mãe dizia se era para disenteria, se era para febre,
para muita coisa… Aí, sabugueira… Essas coisas... E ia trazendo…
Desde os meus 13 anos que eu tenho essa… (Manjericão)

É, assim, de conversa, a gente conversando né? Aí pega e fala nas


coisas que a gente vê, que a gente sonha, que a gente pega e cria fé.
E é por isso que eu digo que é de família né? Coisa que acontece
mesmo com a família da gente. (Cidreira)

A respeito se existe tempo diferente para o acesso a esses conhecimentos,


observa-se que não, e as práticas de cuidado fazem parte da vida e cotidiano dos
sujeitos da pesquisa, conjuntamente com o uso da tecnologia para realizar pesquisas
e atentar-se às novidades.

Não… Não… Sempre eu quero plantar! Sempre eu quero plantar! E


quando morre uma planta… Minha vontade é de arrumar outra…
(Capim Santo)

Não, a cada dia que surge uma novidade eu vou no Google, pesquiso,
e vejo o que realmente dá certo.. E vou lá, faço e dá certo… (Crajiru)

Levando em consideração o objetivo do estudo de identificar as ervas


medicinais utilizadas pelos agentes culturais de saúde do bairro Maracujá,
apresentamos o (quadro 2), onde as ervas medicinais estão descritas conforme os
dados
37

informados pelos entrevistados. Destacamos que não realizamos um aprofundamento


botânico.
Quadro 2 – Ervas por indicação de uso

ERVAS MEDICINAIS INDICAÇÃO DE USO


Romã Inflamação
Boldo Intestino
Alho Alergia
Cumaru Gripe
Açafrão da Terra Inflamação
Urtiga branca Tosse
Hortelã grosso (Erva Santa) Antibiótico/Barriga (Digestão)
Sabugueira Febre
Erva Doce Calmante/ Vômito / Desmaio
Farinha de Linhaça Ossos
Manjericão Acordar/ Antibacteriano
Capim Santo Calmante/ Baixar pressão arterial
Babosa Cicatrizante/ Cabelo (Hidratação)/
Caspa/ Higiene Dental
Suco de Limão Gripe
Mel Gripe
Gengibre Gripe/Febre
Graviola Desmancha Tumor
Própolis Alergia
Limão e Canela Imunidade
Crajiru Imunidade
Mastruz Afinar o sangue
Arruda Dor de ouvido/Mal olhado
Cidreira Relaxar/ Tirar o fastio “Abrir o
apetite”
Louro Empachamento/ Tempero
Casca de Ameixa, Casca de Inflamação
Cumaru, Casca de Aroeira,
Quixabeira, Cajueiro
(Garrafada)
Mel, Babosa e Inflamação
whisky
(Garrafada)
Mastruz com leite Gripe
Moringa Baixar glicose/ ansiedade
Couve Coração
Pinha Coração, Tontura
Hortelã da folha miúda Verme
Canela de Velho Artrose

Fonte: Dados da pesquisa, 2020.

Com a aquisição do conhecimento do uso das ervas no cuidado em saúde,


38

ficou evidente essas práticas como promotoras de saúde. Foi ressaltada a questão
financeira também pelo baixo custo do tratamento, e a relação com as ervas foi
colocada como propulsora de bem estar e até mesmo o fato de não fazer uso das
práticas, mas de ensinar para as pessoas. Fazer uso dos chás ao invés de
medicamento sintético.

Ah, mudou... É aquele negócio assim... Para melhor! Ah, eu vou tomar
isso... Não é só remédio de farmácia... E às vezes as condições, né...
Você nem sabe quanto eu gastei naqueles... Suspiro. Ai, Jesus... E a
coisa natural, já tá dizendo: é coisa de Deus! Uma coisa santa! Eu sei
que tem gente... Diz... Demora para fazer efeito... Mas, a gente não
passa nove meses para nascer, né? (Babosa)

Com certeza, tudo de bom. Mudanças positivas [...] (Crajiru)

Porque todas as vezes que eu tive contato foram positivas. Assim,


positivas em relação a tudo. Até assim… Pronto, eu sofri um acidente
de moto, né. Aí eu tive queimadura de primeiro e de segundo grau, aí
né… Eu fui lógico no sistema de saúde e tal… Eles fizeram todos os
procedimentos, limpezas e tal… Passaram pomada e tudo. Eu usei a
pomada apropriada para isso… E a minha pele ficou preta. Tipo, ficou
estourada… Tipo assim.. Que jogou óleo quente. Em cima de outra
queimadura. Aí eu fiquei horrorizada! Aí, eu disse… Não, peraí…
Babosa! Fui lá no muro, peguei a Babosa, tirei a geleinha, botei na
geladeira e todo dia eu fazia a compressa, três vezes, a mesma coisa
que a médica disse… Olha, De três em três horas você passa o
creme… Eu fazia com a babosa. Não ficou mancha. Hoje a pessoa...
Eu digo… que isso é uma queimadura, eu tenho que caçar os sinais
porque, às vezes, até eu me esqueço onde eu tive. [...] Porque eu tinha
babosa e a gente usa no dia a dia Babosa… Tem gente que gasta
horrores de dinheiro com cremes… Eu pego a minha babosinha e
limpo a minha pele… No rosto é ótimo! Nossa Senhora. É ótimo, eu
tenho quarenta anos, todo mundo diz… Menina, tu tem quarenta
anos? O povo “Deve ser horrores de Renew” Eu disse “Não, é lá no
muro meu Renew”. É caríssimo, é só botar uma aguinha nele…
Porque você sabe, assim... Quem faz uso de procedimentos químicos
no cabelo, aí joga aquela arruma de produto, né. O segredo gente é a
Babosa! Passa no liquidificador com o seu creminho mais baratinho
que tiver, passa no cabelo… Não tem segredo, nenhum! Babosa é
perfeito!
[...] E não tem segredo… Serve até para escovar os dentes, porque
você pega a babinha e vai escovando os dentes. Ele não vai agredir
sua gengiva, vai deixar a sensação de limpeza, porque você sabe que
a maioria dos cremes dental, né. Tudo tem produtos químicos [...]
(Capim Santo)
39

É porque eu acho assim, que quando eu chego nas minhas plantas eu


tenho um outro ar! Somente… Eu gosto de regar, de agoar… Eu gosto
de botar adubo… Para remédio não, eu acho mais difícil… Eu ensino
o povo fazer! Mas, eu não faço para mim!
Eu ensino o povo, eu ensino muito ao povo! Olhe, isso aqui é bom
para gripe… É mastruz com leite [...] (Manjericão)

Eu acho que positiva mulher, porque às vezes a gente tá tão aperreada


com uma dor, aí vai ali e tira aquela folha, aquela coisa, e faz um chá,
aí toma. A gente fica tão sossegada. Eu acho que me dou muito mais
do que com remédio assim... de farmácia. Vamos correr pra farmácia?
Não, eu corro assim pra meu muro. Eu vou pegar uma folha, vou fazer
um chá e vou tomar. E fico relaxada. (Cidreira)

As práticas de cuidado colocadas em destaque pelas agentes culturais de


saúde foram o autocuidado, uso de chás, garrafadas, lambedor e com bastante fé
para que faça efeito.

É você sempre tá orientando as pessoas para se cuidar, se amar


acima de tudo. Quando você se ama, você é capaz de cuidar bem de
você [...] (Crajiru)

Eu gosto ao acordar de manhã ir cuidar das minhas plantas, eu cuido


de mim e das minhas plantas. [...] Eu acho que você fazer caminhada,
fazer uma coisa que você gosta… É tomar um chá que você… É,
porque assim... Tem vários tipos de chá... Ah, você não gosta de chá…
Mas, às vezes nem experimentou... Né. Eu gosto muito de chá de Erva
Doce, Camomila, Gengibre… Menina, como você aguenta, né? É…
Fazer caminhada, tomar bastante água… Né. Que as pessoas só
tomam água quando estão com sede… Aí vem ene problemas. Eu
bebomuito água. E é isso. Fazer exercício físico. (Capim Santo)

É caminhar, é tomar seu remedinho certo. Quem tiver com seu


problema, tomar certinho, não deixar atrasar nem... os que é pra tomar
na hora certa, tomar na hora certa. Caminhar, fazer seus exercícios,
pra mim é ótimo. É. Eu tomo chá também. Eu ensino... (Cidreira)

Pode fazer a garrafada. O lambedor é isso. A senhora pega um bocado


de folha dessa que eu tô lhe dizendo......aí bota na vasilha, seca,
entendeu? Aí pega um quilo ou dois de açúcar; bota em riba. Aí dá um
barro no açúcar, mode ele não ser só o açúcar seco, viu? D’água. Aí
pode botar pra ferver. Quando ele desmanchar aquele mé, a senhora
vai... vira mé... a senhora vai, coa bem coadinho, aí bota na garrafa.
Pode tomar, que abaixo de Deus, é o remédio do mundo. É esse. De
qualquer um pé de pau que dá remédio. A senhora não precisa pisar
ele não. A senhora bota a folha, bota o talo, bota aquela vasilha, bota
o açúcar. Molha ele no açúcar, pra derreter. Quando ele derrete, que
40

apura, fica como mel de abelha. Aí a senhora bota num vidrozinho,


tampa. Quando ele tiver frio, né, aí fica tomando. Aí a senhora com
dois dias, diz: “Mas rapaz, é uma relíquia. Tô boazinha. Tô sentindo
mais nada”. O Capim-Santo dá. O couve dá. É do jeito que eu tô
dizendo à senhora: toda a qualidade dessas plantas que eu tô falando
aí, tudo dá o chá. E dá a saúde. Mas primeiro tem isso: se Deus quiser.
Se Deus não quiser, não tem... porque se fosse a vontade do povo,
Deus não dominava o mundo mais não, mas Deus domina.[...] Muita
fé. Muita fé. Muita, muita... sobrando. Nada é impossível. Tem que ser
a regra. (Hortelã)

O uso e aprendizado dessas práticas de cuidado influenciam positivamente a


vida dos sujeitos, o vínculo afetivo com as ervas, a possibilidade de ajudar o próximo
com o conhecimento ancestral.

Mulher, é umas coisa tão boa! Mulher, eu faço um lambedor... Eu só


agradeço... O Deus... Pai Bom! Na caminhada é só vitória... É muito
bom... (Babosa)

De uma forma muito positiva. Porque eu ajudo a mim, porque eu ajudo


o próximo. É. Eu me sinto feliz em fazer isso… (Crajiru)

Positivamente, porque quando eu tô ajudando o próximo, eu estou me


ajudando. E é isso que eu quero para o resto da minha vida. (Crajiru)

É bom demais, eu converso com elas… Digo: Como você tá linda!…


Bom dia…
Mas, é tão linda de mamãe!… Risos… Tem que receber uma
aguinha… Eu já to aperriada com isso, 10 dias hoje sem água. Mas,
eu converso com elas, digo que elas estão lindas [...] Para mim... Eu
me sinto que elas se sentem que elas se enchem para me dar
alegria… Eu acho, sabe… Que elas agradecem por eu conversar com
elas… (Babosa)

É muito bom! Foi muito bom para mim! Porque ainda hoje eu levo…
Eu tenho essa vontade de plantar, quanto mais eu pego, mais dá
vontade… Olhe, isso aqui tudo é eu que arrumo, planto [...]
(Manjericão)

É... a gente acredita muito nas coisas, porque minha avó também era
rezadeira. É. Minha vó, mãe de mamãe, ela era muito curandeira. E
mamãe ainda também é. Mamãe, só não tá curando mais porque ela
não tá mais sabendo. Que ela tá com 96 anos, vai fazer agora em
março 96 anos, ela não tem mais como. Ela não atina muito bem. Tem
hora que ela tá rezando, aí atrapalha, não sabe mais. Mas mamãe
rezava que o dente caía. Isso não é uma fé pra gente? É fé. A gente
fica com fé numa reza dessa, viu? Reza forte. Aí a gente tem, né... Aí
41

pronto, eu pego a acreditar assim nessas coisas, assim... (Cidreira)

Sim, a gente tinha também no quintal, né, tinha aquele remédio.


Tomava também remédio. Remédio medicinal. É, isso no roçado.
Sofrimento, minha filha. Fui criada na agricultura, a coisa mais que eu
já sofri na minha vida. Trabalhei muito. Trabalhei muito pra me
aposentar. Quase que morro pra poder me aposentar. Rezo, todo dia,
minha filha. Todo dia eu rezo. Todo dia, todo dia eu tenho um terço ou
dois pra rezar. Eu rezo nas três horas da manhã, eu rezo na hora que
vou me deitar de noite, rezo na novena aqui do Divino Pai Eterno,
assisto à missa na televisão de noite e rezo, que eu sou sozinha e
Deus. (Cidreira)

Os cuidados com a saúde dos sujeitos da pesquisa não tiveram modificações,


permaneceram os mesmos durante a vida e na percepção do uso da prática,
obtiveram mudanças positivas ao longo da sua experiência, de acreditar cada vez
mais no poder das plantas e no cuidado em saúde.

Não… Sempre tenho… [...] Agora eu acredito mais ainda! Cada vez
mais... Porque eu tomo! E me sinto... Cada vez mais forte! Pra mim a
planta... Não tem... O Manjericão... O Arruda.. O Manjericão é bom
para um monte de coisa... Ele é antibacteriano. [...] Eu lavei muito a
minha perna com ele, tomei muito... Água, chá dele... Tomei muito chá
dele... Capim Santo, outro coisa boa... Capim Santo. Erva Cidreira...
Relaxante natural... (Babosa)

Permanece… (Manjericão)

Mudou… E a curiosidade a cada dia cresce! Entendeu? Aí veio o


pessoal da FACISA, mostrou aquelas coisas aí enriqueceu mais a
minha mente para eu acordar para uma realidade em que eu já vivia,
mas não sabia como praticar da forma correta. Aqueles chá verde [...]
Aquilo ali tudo mudou… Ajudou demais. (Crajiru)

Não. Continuam do mesmo jeito. Muita fé (risos) (Mastruz)

Eu sempre era muito engembrada quando eu era... Quando eu não


caminhava. Minha vida era só de trabalhar no roçado. Depois que eu
peguei de cuidar mais da minha saúde eu fiquei melhor. Desde muito
nova né, minha filha, que 40 anos atrás é muito tempo, né? 40 anos
atrás que eu caminho. Eu caminho, eu procuro as minhas melhoras.
Eu quando preciso de um médico eu vou lá no médico... Essas coisas.
E quando eu não preciso, que dá pra eu passar em casa só com um
chá, com coisa dos remédios do mato, eu passo. (Cidreira)
42

Todo tempo eu acredito. Desde pequena que eu acredito em reza,


nessas coisas. Em plantas medicinais. Eu acredito muito nessas
coisas. (Cidreira)

Toda vida acreditei! (Hortelã)

A maioria dos familiares faz uso das ervas e da reza e acreditam nessa prática
de cuidado, mas alguns familiares, como os da Babosa, não acreditam.

Eu tenho duas filhas, né... Que diz... Ah, mãe... Isso não serve, não!
Não... Mas, eu acredito! Esse negócio de só viver tomando remédio
de farmácia... Mulher, eu já tomei tanto... Não, mulher... É... Um
paliativo, né... Que sabe que lá... Lá é que depois... É que junta as
coisas... E o natural, não vai atingir em nada, não... Se não servir...
Mal é o que não vai fazer... É natural. Agora o de farmácia é fogo, né
[...] Chá de arruda é muito bom para cólica, elas até hoje lembra desse
negócio… Mastruz com leite? Mãe, eu não quero não… Meu Deus do
céu… Mãe, isso não serve não… É uma coisa negativa, que acaba
não servindo, não [...] (Babosa)

É aquela coisa, todo mundo se cuidando. Entendeu? Meu neto… Eu


cheguei… Tão tudo… (Faz um sinal para baixo com o polegar)
Exemplo, né… Aí eu vou lá e… Graças a Deus, beleza… Às vezes é
só um quebrante… Que dá para resolver… Quebrante: É uma dor que
você sente no seu corpo… Umas dores… Você sente o corpo todo
dolorido… Chama-se de quebrante. Aí na oração a gente faz sobre
isso. Já o olhado é aquela coisa de você tá com o olho morto, às vezes
aparece uma febre que você acha que tá doente de outra coisa, mas
não é, é o olhado. Que dá vômito e febre, principalmente em
criancinha, mas quando eu vejo um aperriado, eu curo, mas a pessoa
nem sabe que eu tô curando, entendeu? Porque tipo eu olho para cara
da pessoa, pego o nome e vou fazendo minha oração. Isso e dá certo,
graças a Deus! (Crajiru)

Nunca usei remédio. Só as plantas… E… Sempre fui assim… Toda a


minha família. Se for ali… É incrível… Quando chega gente… Gente,
tem remedinho para dor de cabeça? Parece que é uma mania, né. Aí
o povo toma remédio… Eu digo, gente… Eu não tomo remédio… Aí,
você não sente dor de cabeça? Sinto… E espero ela passar… Eu tomo
um chá e espero ela passar… Ah, você tem muita paciência… Porque
você toma um chá e daqui a uma hora, que isso… O chá vai fazer
efeito… Dor de cabeça, quando tá muito forte, o Gengibre… Ou às
vezes, até a água com limão… Água com limão [...] Porque a dor de
cabeça, fica lá… Apertando, apertando… Você toma aquela aguinha
refrescante… Geladinha… Aí, ela já vai dando uma paz para você, né.
E, sempre… Vá curtir uma musiquinha, ficar no seu cantinho… Fica
quieto, respira, respeite a dor, que às vezes a gente não respeita e
43

quer passar por cima dela… Ela passa, e às vezes vai tão longe que
demora a voltar! Aqui é incrível, se chegar uma pessoa com dor…
(Capim Santo)

Acreditam, porque eles levam pra fazer também. Levam. Do que eu


planto... Agora eu digo assim, e volto atrás. Eu, porque... Não é porque
eu tô contando a vocês não, pabulando, enchendo o saco. É porque
eu tenho pena. Mas, muitas, muitas pessoas chegam aqui, às vezes
eu tenho vontade de dizer: “Vocês não levam...não têm que levar nada
daí. Vocês são moços, por que não plantam? Vocês não levam pra
fazer o chá daqui? Não pode levar um pé e plantar lá, né?”. Aí só
querem vir arrancar aqui, queimar. Queima. Bota dentro do fogo e
queima. Com pouco mais tá dois, três mortos. Lá eu arranjo um outro
de fora, não planto daquele não. Mando outro de fora pra fazer a
planta. (Hortelã)

O entendimento das práticas está diretamente relacionado à crença religiosa


individual, embora se declarem católicos. Acreditam na figura de um Deus único, na
pessoa de Jesus Cristo e veem a prática da cura como um dom divino.

Não, não... Eu sou católica. Eu tenho minha filha que é evangélica e


eu respeito. E ela me respeita, mas ela... Deus é um só! Religião não
salva ninguém, Deus é um só! Mas, eu quero a minha e pronto.
(Babosa)

Católica, tem… Tem… Porque pronto um exemplo… A cura, né.


Quando eu evangelizava, o padre disse, se você tem o dom da cura,
você pode curar, e eu faço isso também. Tá certo? Cura de olhado,
quebrante, essas coisas… Eu faço esse trabalho. (Crajiru)

A minha religião é católica. Mas só falando com Jesus Cristo e pronto.


Eu não vou à igreja, eu não rezo novena, eu não creio em santo, de
pau que bateram com martelo… Não! Só Jesus e acabou-se!
(Manjericão)

É da Igreja Católica mesmo. (Mastruz)

A religião é como diz o outro: só foi a que meu pai me ensinou. E minha
mãe. (Hortelã)

Além disso, há um destaque para tradição da fé nessas práticas de cuidados,


no sentido de crer para dar certo, de conversar com o divino para potencializar o
tratamento. A tradição de se encontrar com a natureza, a questão do
44
autoconhecimento e autocuidado.
Pela fé, né. Influe, né... Porque quando eu faço para mim mesmo
tomar... Eu primeiro converso com Deus, sabe? Eu primeiro, digo –
Senhor, e dá certo... Das plantas, né... Porque é a natureza! (Babosa)

Que sem a fé ninguém faz viagem nenhuma, não vai a lugar nenhum…
E que a saúde está acima de tudo. Primeiro a fé e depois vem os
cuidados. Está interligada porque se eu tenho um conhecimento de
uma coisa boa… Eu vou repassar aquilo para alguém, né. (Crajiru)

A tradição de você voltar para você e saber o que você quer… Né.
Consumir as coisas que você vai consumir, selecionar a forma de você
fazer, tipo eu vou fazer um chá… Porque entre o veneno e o remédio,
né. É a dose, né… Não pelo fato de um chá… Ah, Um camomilinha…
Você tem que saber como fazer, como tomar, a dose… Que hora
toma… E, é isso… A tradição é essa de ter o contato com a natureza
e sempre que for possível, fazer…(Capim Santo)

Ah… Eu pondo na minha cabeça que isso vai acontecer, se Deus


quiser… Pronto… Nessa doença… Eu vou ficar boa, se Deus quiser…
Jesus… Jesus… Vai amanhecer outra pessoa, pra mim eu to falando
com ele… E vai dar certo! Agora, assim… A gente somos humanas e
a gente caí em doença… E termina perdendo a fé, tem hora…
(Manjericão)

Assim, eu me cuido muito bem, sabe? Assim, eu gosto, eu gosto de


me cuidar. [...] E sempre me pegando com Deus pra me... pra me
alimpar o meu corpo de tudo, né?(Mastruz)

Muita. Nós sem Deus e Nossa senhora, não somos nada. Nada, nada,
viu! Nós tem que pedir... se deitar, rezar, tomar bênção à pai do céu
e mãe do céu, que é nosso pai, nossa mãe. Não é os burro que hoje
se deita, não se benze. (Hortelã)

Considerando que a religiosidade apresentou-se como um aspecto importante


na vida dos entrevistados, compreende-se que esta, por sua vez, deve ser levada
também em consideração pelos profissionais de saúde, na medida em que o respeito
às crenças individuais pode levar a um melhor acolhimento, proporcionando o
estabelecimento de um vínculo de confiança e facilitando por sua vez a adesão
terapêutica. Sendo assim, entendido como mais um elemento a auxiliar na cura das
doenças46.
45

4.2 Saúde como produção de sentido de vida

Na ótica dos sujeitos da pesquisa, a saúde é colocada como pilar no sentido da


vida, englobando a qualidade de vida, viver bem, não sentir dor, ajudar quem não tem
saúde, ter uma boa alimentação, caminhar, andar, passear, viajar na perspectiva de
sesentir livre. A saúde foi colocada ainda como bênção, estando associada a valores
positivos. Também foram referidas as práticas de atividade física, dançar, exercitar o
corpo, trabalhar e ter boa qualidade de vida espiritualmente.
Sendo assim, o conceito de saúde posto pelos sujeitos está alinhado com o
conceito ampliado de saúde, descrito nos Anais da 8ª Conferência Nacional de
Saúde47:

resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda,


meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso
e posse da terra e acesso a serviços de saúde. É, assim, antes de
tudo, o resultado das formas de organização social da produção, as
quais podem gerar grandes desigualdades nos níveis de vida. A saúde
não é um conceito abstrato. Define-se no contexto histórico de
determinada sociedade e num dado momento de seu
desenvolvimento, devendo ser conquistada pela população em suas
lutas cotidianas.

Abrangendo não só a ausência de doenças, como as reflexões abaixo:

Aí, meu Deus do seu! Saúde é tudo, Jesus! Diante do senhor meu
pai... A gente com saúde oh... Palminhas... Doente? Não faz nada,
não... Saúde para mim é tudo... Não tem nem o que comparar... É viver
bem! (Babosa)

A saúde é tudo! Porque sem saúde você jamais… Né, progride em


alguma área… Não é verdade? Em algum setor… Ou em algum
sentido? Então, se você está com saúde, você pode ajudar a quem
não está com saúde. E por aí vai… Entendeu? (Crajiru)

Na minha mente quando se fala em saúde… É ter qualidade de vida,


né? Ter qualidade de vida espiritualmente… O corpo da gente… É
terqualidade de vida do amanhecer até anoitecer, né.
Você acordar disposto, fazer suas coisas e chegar no final do dia e fez
tudo o que você fez, sem sequelas, sem dor…. Dor num sei aonde...
Dor de cabeça num sei aonde… Eu entendo por saúde, assim… É ter
qualidade de vida na questão de você ter uma boa alimentação, né?
Ter uma orientação de uma boa alimentação, né? Ter uma boa
orientação no seu bem-estar. Isso é qualidade de vida e é o que eu
considero isso como saúde. (Capim Santo)

Minha filha, saúde para mim é tudo na minha vida! Ninguém sem
46

saúde… Ninguém, sem saúde pode dizer que tá morto… O bolso


podeestar estufando de dinheiro, é coisa linda para todo lado… Mas,
saúde para mim não existe preço! Não existe preço... De jeito
nenhum! Eu játive muita saúde na minha vida… Saltei, cantei, dancei
forró e hoje… A gente principalmente agora… Num desastre… Eu
digo um desastre, para tudo na vida… E para todo mundo… Para
todo o mundo, saúde é muito importante! (Manjericão)

É. Estar respirando. É. Estar caminhando. Eu acho bom andar... Eu


gosto de passear. Eu gosto de sair. Eu já tô aperreada porque Eu
nãoposso sair, porque a gente quando vai tem de botar uma máscara,
né? Eu só gosto de andar bem à vontade. Pra... sair à vontade de
casa. Sair prum canto que eu gosto. Não gosto de sair assim prum
canto que eu não gosto. Eu gosto de sair à vontade. Pronto, aí depois
dessesproblemas todinho, aí eu fico presa dentro de casa. Ai eu fico
“ai meuDeus, como é que eu faço?”. Eu não sei o que é... Não sei se
é permitido por Deus, não sei porque é que aquela doença não se
acabapra eu andar no mundo. Aí as menina diz “a senhora tá doida
pra andar”. Eu digo “é claro. E não gosto de estar dentro de casa. Eu
gostoé de estar andando”. Eu gosto de sair, eu gosto de viajar, de tá
passeando. Mas... Aí eu fico presa dentro de casa. Não me sinto muito
bem não mas eu digo assim... Mas no começo eu fiquei muito contra,
né? Eu digo “não, quer saber? Eu vou ficar quieta, porque já que está
acontecendo, eu acho que é permitido por Deus”. É uma coisa que
Deus botou no mundo... Eu tô achando que assim... que foi uma coisa
que Deus botou no mundo pro povo aprender, porque muita gente não
sabia mais o que era Deus não, né? Muita gente. Tinha gente aí que
não sabia mais o que era Deus. Era só festa, só falava em festa, só
falava nisso, naquilo. E... Deus pra muita gente não existia não. Aí
Deus botou essas coisas no mundo pro povo ir aprendendo um
pouquinho, né? (Mastruz)

Saúde? Saúde eu acho que tô com saúde quando eu não tô sentindo


nada. Aí eu digo: “tô com saúde”. E acho muito bom. Durmo e acordo
agradecendo a Deus por a minha saúde, que tô com 75 anos... Eu vou
dizer 75... porque tá faltando poucos dias pra fazer. Aí eu fico muito
agradecida a Deus. Porque a minha idade, eu vejo gente aqui muito
mais nova do que eu, meu Deus, ah Jesus, não vai se levantar não?
é um “ai”, é um “ui”... eu me levanto, fico brincando aqui… Tem que
ter fé em Deus, né minha filha? Caminho, me levanto, não tô me
escorando, “ai”... Saúde pra mim é tudo. É bênção. É coisa boa. É, é
não sentir dor, não sentir dor nos ossos que é a coisa mais triste. A
minha mãe, Ave Maria, faz até dó. Mas o povo também tem preguiça
de se levantar pra caminhar quando é novo, aí quando fica velho fica
se maldizendo. Pra quê não cuidou da saúde desde novo, né? Porque
eu não sinto, porque faz mais de 40 anos que eu caminho. Eu caminho
todo dia. Já hoje eu caminhei. É, se exercitar. E eu faço exercício
também na FACISA. Quando dá... Agora não. É, mas eu faço tudo
isso. Eu danço. Em casa quando eu chego eu faço meus exercícios
tudinho,quando eu chego da caminhada. Tudinho eu faço. (Cidreira)

Trabalhar. (Hortelã)

Ademais, o modelo proposto por Dahlgren e Whitehead48 corrobora com os


47

achados da pesquisa, trazendo aspectos dos Determinantes e Condicionantes da


Saúde (DSS) apresentadas em diferentes camadas, a partir de uma camada mais
próxima dos determinantes individuais até uma camada mais afastada, onde se
encontram os macrodeterminantes, conforme a figura 6.

Figura 6 – Modelo de determinação social da saúde proposto por Dahlgren e


Whitehead

Fonte: Comissão Nacional sobre os Determinantes Sociais da Saúde (2008).

A imersão no território se constitui como um passo imprescindível para


caracterização da população, compreensão de seus problemas de saúde, bem como
analisar e avaliar a atuação dos serviços sobre os níveis de saúde dessa população28.
A integração do serviço de saúde com o povo implica no estabelecimento de vínculo,
potencializando as relações de afeto e confiança que permitem o desenvolvimento de
um cuidado integrado e integral entre os trabalhadores do SUS com os usuários.
Como espaço produtor de saúde, destaca-se o espaço dos quintais, localizados
no meio urbano, como também rural, para o cultivo de plantas tanto com fins
medicinais como ornamentais a fim de semear árvores frutíferas, roseiras, entre outras
espécies vegetais, situados ao redor ou no final das residências44.
No estudo realizado por Arnous et al.49 78,5% das pessoas possuem o hábito
de cultivar as plantas medicinais em seus quintais e jardins (figura 7 e 8), e 38,2%
também adquirem nos quintais dos vizinhos e amigos, enquanto apenas 3 pessoas
relataram que compram as plantas. Ou seja, trata-se de um espaço valioso na medida
em que possibilita a plantação das mais diversas espécies vegetais, bem como
48

proporciona a permanência dos saberes populares e promove o contato do homem


com a natureza.

Figura 7 – Cultivo das plantas no quintal de Crajiru

Fonte: Dinorah Lima, 2020. Legenda: Residência de Crajiru, Santa Cruz/RN.

Figura 8 – Babosa fazendo carinho na planta

Fonte: Dinorah Lima, 2020. Local: Residência de Babosa, Santa Cruz/RN.

A autora Oakley destaca o papel da figura feminina como responsáveis pela


preservação e manutenção dos quintais, visto como um legado cultural, contribuindo
até mesmo com a preservação da biodiversidade local 44,41.
49

Nos quintais do bairro Maracujá, observamos que o uso do espaço se dá tanto


nos arredores quanto no final das residências, com cultivo de uma grande variedade
de ervas, plantas ornamentais e frutíferas. Em todas as residências ficou claro que
são territórios bem cuidados, regados de afeto e de grande importância na vida dos
sujeitos. Dos 7 quintais visitados, 6 eram pequenos espaços porque as casas estavam
situadas em espaço urbano e apenas 1 detinha um amplo espaço para plantação,
apesar do clima quente e semiárido, pouco favorável para o cultivo, demostrando que
os sujeitos da pesquisa se dedicavam ainda mais e redobravam a atenção às plantas.

4.3 Encontros e desencontros dos sistemas culturais de saúde: O SUS e o


popular

Todos os sujeitos da pesquisa fazem uso do SUS, entretanto um dos usuários


faz o cuidado em saúde apenas com o uso do saber popular, pautado na utilização
das plantas. Como a maioria são mulheres, elas recorrem ao SUS quando precisam
realizar exames ginecológicos, de rastreamento de câncer de mama, de tireoide,
acompanhamento de taxa de colesterol, glicose, etc.
Para Capim Santo, preferem fazer uso das plantas medicinais no lugar dos
medicamentos indicados pelos médicos. Além disso, a procura pelo SUS se dá para
situações mais complicadas, como problemas no joelho e casos de procedimento
cirúrgico. Para situações como gripe, resfriado, dor de cabeça, crise de verme, má
digestão, as usuárias fazem uso de plantas. Entretanto, foi observada a utilização de
medicamento para colesterol, e em casos de doenças relacionadas ao sistema
nervoso.

Dor no joelho… Eu passei seis meses andando com uma


bengalinha… Preventivo… Mas quando eu tô gripada? Eu não vou
para o posto, vou não… Resolvo por aqui mesmo. Tossindo? Resolvo
por aqui mesmo… Alergia? Eu torrei o Alho… Pisei… Coloco em um
vidrinho, aí, ô… (RESPIRA FUNDO, FAZENDO O GESTO DE
INALAÇÃO) Aí ô acaba espirro, acaba aquele pingadeiro… O Alho! Eu
tomo água de alho, homi eu tomo um bucado de coisa… Risos… Água
de alho em jejum… (Babosa)

Olhe eu faço o meu exame ginecológico, faço a bicha mamaria… Isso,


mamografia. Faço o que pedir… E sempre tô fazendo… Todo ano eu
tenho a obrigação de fazer esses exames… Tenho esse cuidado.
(Crajiru)
50

Sim, sim! Sempre que preciso uso, mas quase não preciso… Nunca
vou porque, né. Para ir precisa tá sentindo alguma, né. Assim, faço
exames… Como, por exemplo, em seis e seis meses… Taxa,
colesterol, glicose, sempre tô fazendo… Exame preventivo, exame da
mama, sempre a gente tem que tá indo… Né. Porque tem doenças
que é silenciosa, ah… Tá tudo bem. Mas, aí não tá… Assim… Na
FACISA… A gente sempre tem esse contato… De ter os cuidados…
De ter conhecimentos… Sempre estão lá… Vamos fazer aqui uma
glicose, para ver se tá OK. Eu já tive até com a glicose alta, né. Uma
vez… Eu tive uma glicose muito alta. O estresse do dia a dia… Na
correria e tal… Enfim, outros fatores. E eu baixei a minha glicose com
uso do chá! O chá de moringa! Que é esse pé que tem aqui na frente
da minha casa. É, o Moringa baixa a glicose e ele tem ene
propriedades… Porque essa Moringa… Ela é original da África e ela é
um suplemento. Então, quando você consome ela, você tira aquela
ansiedade de tá comendo, porque ela tá te suprindo… E você
involuntariamente, baixa a glicose… Você tem energia para caminhar,
você tem energia para fazer suas coisas… Então, eu não tomo
remédio de farmácia… Até fui a uma nutricionista, e ela disse: olhe…
Você toma um remedinho para lhe ajudar. Eu disse, olhe deixe pela
minha conta que eu volto e faço os exames e se ela continuar alta eu
tomo o seu remédio. E ela disse: mas por quê? Eu disse: deixe
comigo. Então, se passaram 15 dias… Ela passou a dietinha, e eu?
Meu Moringa na salada, Moringa moída no suco e tal? E com 15 dias
eu voltei e fiz dois tipos de exames, fiz um em jejum, né. E… Aí tomei
café… Meio e 40 minutos depois fiz outro exame e deu paridade.
(Capim Santo)

Toda situação… Toda semana estou no médico… De três… Em três


meses eu faço exame de sangue…Sobre ir a médico eu sou muito
cuidadosa. Agora nessa doença qualquer coisa eu corro para o
médico… (Manjericão)

Vou, vou, minha filha. Vou no posto de saúde. Quando eu me sinto


que tô com as taxas altas, eu vou. E eu tenho também um problema
de tireoide, que tenho que fazer exame. Eu vivo em tratamento da
tireoide. Mas agora eu fiz, esse mês de agosto eu fiz os exames. O
médico disse que tava ótimo. Tava muito bom. Porque da tireoide eu
tenho uma doutora que faz o tratamento com nós, que ela é doutora
F., de Natal, mas desde essa pandemia ela não veio ainda não. Aí a
gente fica mandando fazer uns exames, o médico olha e diz “tá tudo
bem”. (Cidreira)

É... Aqui no posto. Quando eu tô doente, quando eu tô sem...


Assim...que eu posso ir. Sem precisar ir ninguém mais eu. O posto é
aqui pertinho. Eu vou só. É. Aí eu vou sozinha. Eu vou pegar meus
remédios, que eu tomo remédio pra dormir. Pegar remédio pra nervo.
Pronto. Eu mesmo vou ali no posto; eu pego minhas requisição pra
comprar remédio. Assim, mulher: meus problemas é só, assim, eu
tenho... sobre doença? O que eu tenho mesmo é só colesterol... e, e...
Não, um dia tá... é não. Meu colesterol é baixo. Minha pressão é boa
toda, não tem jeito pra ela... Eu posso morrer de raiva e ela nem
sobe nem desce. Fica normal. É. Isso. E sobre a saúde, é assim: eu
mesmo quem procuro. Quando eu tô sentindo alguma coisa, eu já tô
correndopro posto. Agora vem de muito tempo, que eu venho tudo. Eu
sou uma
51

pessoa que eu me cuido muito bem do meu corpo, Eu. O que Eu


puder fazer pra mim, eu não sentir nada, eu faço. Mas não é como a
gente quer, né? Porque, olhe, eu fiz a cirurgia, saiu outro, com três
meses eu fiz aqui no hospital Aluízio... Doutora quem fez as minhas
cirurgia.(Mastruz)

Em relação ao atendimento no SUS, referem-se especificamente ao


profissional médico, que atendem bem, respondendo aos seus questionamentos.
Eles estão mais preparados, preocupados com o bem estar dos usuários e com a
família. Eles estão mais humanos. Quando as consultas são realizadas sempre pelo
mesmo médico, o atendimento é facilitado, por se sentirem mais à vontade ao
reencontrarem um médico conhecido. Para quem trabalha no serviço de saúde fica
mais fácil a marcação dos exames.
Ficou claro que os sujeitos têm uma visão voltada para o atendimento médico
e marcação de exames. Apenas Mastruz citou a atuação do profissional enfermeiro,
destacando o modelo centrado na figura do médico. Por outro lado, observa-se um
atendimento humanizado.

Aqui o médico é bom… Ele dá atenção, você pergunta as coisas e ele


responde bem direitinho… Não como aqueles que só baixa a cabeça,
faz a receita e manda você ir embora. Ele não… E ele ainda diz
assim… Desejo saúde para a senhora e daqui… Quando a senhora
acabar esse remédio, vai precisar de mais. [...] Ele dá atenção, você
pergunta as coisas e ele responde bem direitinho… Não como aqueles
que só baixa a cabeça, faz a receita e manda você ir embora. Ele
não… E ele ainda diz assim… Desejo saúde para a senhora e daqui…
Quando a senhora acabar esse remédio, vai precisar de mais.
(Babosa)

Olhe, sempre que eu procurei foi respeitoso, entendeu? Foi


respeitoso, foi… Teve a preocupação, né. Foi legal, foi ótimo, assim…
Hoje as pessoas estão mais preparadas, eu vou dizer assim… Do que
há vinte anos atrás…. Era uma coisa mais seca… Era uma coisa,
assim… Há… Uma coisa assim… Tão… Hoje eu já vejo que tem uma
preocupação mais com o seu bem estar… Aquela preocupação com
a família… Um carinho a mais… Eu acho que tá se trabalhando para
as coisas melhorarem… Né. Porque assim… Quando eu tive o meu
filho, 22 anos atrás, era uma coisa meia seca, é isso? Tá, pronto. Você
entendeu… Não entendeu… Hoje tem aquela explicação, atende
bonitinho. Eu acho que as pessoas estão mais humanas, hoje em
atendimento com o paciente. Sim, sim, quando o meu filho era
pequeno eu ia no postinho do meu bairro e ele tava com uma dorzinha
na barriga e aí eu perguntei… Eu posso dar chá de boldo? Aí... Pode…
Achei até interessante um médico me aconselhando uma erva. Pode
dar um chazinho de boldo porque ele tá com prisão de ventre. A
barriguinha tá inchada. Má digestãozinha… Então, isso vai ajudar.
Outra vez ele tava com um vermezinho e ele tomou remédio de verme,
52

aí eu posso dar Macela? Que é uma coisa que bota no leite… Aí


ajudou, o remédio ajudou e a outra coisa ajudou dentro das suas
proporções. E ele acolheu. Então, quando eu voltei... Ele disse: deu
certo, né. Deu certo… Então pra mim, quando tem um médico que tem
noção disso, é legal! Mas, tem… Ah, isso é besteira, isso aí é... Né...
Aí a gente fica meio... Quando tem o respeito do profissional na crença
das pessoas… Tem uma segurança. Porque é tipo um trabalho junto!
(Capim Santo)

Olha, eu não tenho que reclamar porque graças a Deus como eu


trabalho , você sabe que tem tudo haver, né. Sempre tudo é fácil para
mim. Mas não é tanto para quem não trabalha, não tem esse acesso…
De tipo uma mamografia, bota meu nome… Entendeu? Eu não estou
me privilegiando por isso, entenda… Que quando chega a vez, eu tô
lá para fazer. (Crajiru)

Eu gosto! Até porque assim… Eu tenho uns médicos aí que são de


conhecido… Já conhece os meus problemas tudinho… Aí a gente
conversa, me deixa bem à vontade… Porque tem médico que a gente
não vê e não conhece… Aí fico acanhada e não pergunto… Mas, eles
são muito bons! Me deixa à vontade e conversa bastante! (Manjericão)

Graças a Deus fui muito bem arrecebida. A menina cuidou muito bem
d’eu. A doutora J. fez a punção... fez a cirurgia e ela... a menina... a
enfermeira ficou tomando conta de mim. Graças a Deus fui muito bem
arrecebida. Umas pessoas muito boas. Tanto num canto como no
outro, onde eu chego é muito bom. Graças a Deus. (Mastruz)

Mais ou menos, minha filha. Assim, nem é tudo e nem é também, eu


vou dizer, lá em baixo. Porque, sei lá minha filha, você sabe, a gente
faz mais fé no... Eu faço fé também nos profissionais daqui, mas
naqueles que a gente já é acostumado fazer direto, a gente sempre...
acredita mais naquela... (Cidreira)

Atende, tudinho. Nunca fui pra nenhum, de doutor, de saúde, de tudo.


Não tem um pra me dizer: “Olhe, o senhor errou nisso e eu não faço
isso pro senhor”. Tudo querem bem a Eu. Não é pabulando não.
(Hortelã)

De acordo com as respostas dos sujeitos pode-se compreender que eles


comentam e expõem a utilização das plantas, mas não são todos os profissionais que
acreditam e recomendam essa prática de cuidado em saúde. Entretanto, Cidreira
destacou que não conta o uso das rezas, e os demais entrevistados não fizeram
referência sobre essa temática, o que aponta um receio de tratar com os profissionais
acerca da prática da reza e fé no cuidado em saúde, e até mesmo de sofrer
preconceito.
A cultura influencia nos processos de saúde e doença, e as representações dos
usuários sobre o modo de enfrentar esse processo são fundamentais para as práticas
53

de cuidado50.
Os aspectos culturais, sociais, emocionais, espirituais, patológicos, são
essenciais para efetivamente fazer uma atividade de saúde transformadora, e por isso
a importância da empatia e da escuta qualificada no cuidado em saúde51.

Não... Não… Nem todos eu conto… Tem uns que diz… Não, não
serve não.. Porque o chá de Quebra Pedra é para os rins… Eu fui
dizer issoao Doutor F. e você nem sabe o que ele disse… Ele disse
que não funciona. Mas, ele quebra as pedras dos rins da gente... E a
gente coloca, bota ela para fora em pedacinhos… E ele diz que não
funciona… Aí, eu já parei… Eu tomo chá de quebra pedra… (Babosa)

Sim! (Capim Santo)

Falo. Quando eles vêm aqui, eu falo. Mas não; é difícil eles passar
aqui. É, quando, quando eu vou... Eu conto do mesmo jeito que eu tô
contando a você. (Mastruz)

Das rezas não. Das plantas às vezes eles perguntam, às vezes tá em


reunião assim, aí a gente diz. Lá no grupo dos idosos a gente fala.
Quando elas estão naquelas reuniões, ficam perguntando “você usa
isso, você usa chá de fulano, coisa de fulano?”. “Uso, uso, e eu gosto.
Acho bom”. [...] Nós temos essas reuniões, lá no clube dos idosos.
Mas esse ano passou-se o ano todinho e nós não tivemos, não
assistimos nada. É por isso que eu também tô meia bamba, porque
ninguém teve mais nenhuma reunião com eles lá. Tô sentindo falta.
Exatamente. É. Por causa da pandemia. Aí a gente esse ano não teve
nada pra gente. A gente ficou assim... Eu achei tão ruim filha, porque
eu gosto muito de fazer exercício. Gosto de fazer. É, eu falo, os
meninos me perguntam. (Cidreira)

Conto! Porque tem muitos deles que são católicos... (Manjericão)

Os diagnósticos e os tratamentos prescritos pelos profissionais de saúde


resolveram a maioria dos casos que levaram os sujeitos da pesquisa aos serviços de
saúde. Mas houve o caso de Babosa, que não foi resolvido pelo uso da “benzetacil”,
e sim pela planta Crajiru, reforçando o entrelaçamento do saber popular e o SUS. Por
esse motivo, é importante entender como os profissionais reagem frente ao
aparecimento de saberes sobre saúde que não são validados pelo conhecimento
científico52.

Mas, tem casos como esse meu que quase não resolvia… Porque
tomei benzetacil demais. Das feridas que eu tenho… Úlcera venosa.
Sarou lavando e tomando… O crajiru (Babosa)

A prevenção é o melhor remédio para todos e para tudo nessa vida.


54

Fui super bem atendida, graças a Deus! (Crajiru)

Resolve, né… Porque às vezes muda de remédio, troca… Agora


praticamente eu tenho muito remédio… Toda semana eu vou lá, elas
passam remédio e eu compro… E vou melhorando, né… (Manjericão)

Resolve, resolve. (Hortelã)

Em relação às questões de saúde ou mal-estares que não levam os


participantes da pesquisa a recorrer aos serviços de saúde, destaca-se situações
como gripe, tosse, enxaqueca, verminoses do tipo giárdia e ameba, bem frequente no
território. Nesses casos, faz-se uso das plantas. Matruz e Manjericão enfatizaram a
ida aos serviços de saúde, e para Manjericão, principalmente no período dessa
pandemia de Covid-19. Vale ressaltar também a questão da dificuldade do acesso,
pontuada por Cidreira, e evidenciada pela demora na marcação de consultas. É
importante destacar a integração entre os saberes populares com o conhecimento
científico, na medida em que há o reconhecimento de um ajudar o outro, para
contribuir com a saúde dos pacientes.

Uma tosse, uma gripe… Não vou, não… Uso banho, lambedor…
Inalação... Banho de Cumaru… Banho de Cumaru. Às vezes eu boto
até um pouquinho de Vick porque eu inalo… Para dormir. Para dar
aquele cheirinho… Casca de alho, uso remédio caseiro! E… Fico bem,
graças a Deus! Eu tenho uma saquinha ali, cheia de casca de alho…
Que eu nem jogo, nem no mato… (Babosa)

Uma enxaqueca que eu tenho, crônica. Que desde pequena que eu


tenho. Desde os 12 anos. Não, entenda. Eu não procurava, né... Mas,
aí hoje… Eu já tento resolver, tipo… Recorria para os chás. Mas é
aquela coisa que quando você não quer ir para um caminho… Te leva
um outro, que vai dar certo… Por exemplo, crise de verme, eu e o meu
povo aqui tá com crise de verme… Você sabe que aqui em Santa Cruz
Giárdia e Ameba é o que são os vermes reis… E qual é o remédio
dele? Hortelã da folha miúda… Você lava, bem lavado e come a
folhinha por sete dias. Depois você tá zen, não tem problema
nenhum… Na crise,no momento em que você tá com a crise. O ideal
seria pela manhã…Entendeu? Porque você ainda vai se alimentar…
Aí vai ter o alimento para fazer o trabalhinho lá dentro… Risos…
(Crajiru)

Olha, eu sempre indico, eu acho que é sempre bom ter uma plantinha,
um chazinho, e que não deixe de ir ao médico. Né, eu não vou me
sentir segura 100% e vá sim, porque uma mão lava a outra, né? O
médico tá lá, estudou, tem todo um conhecimento… Sabe até um
pouco mais do que você… E você sabe, você sabe da sua rotina e o
médico sabe, então vocês podem trabalhar juntos, com o médico, com
a enfermeira, com qualquer profissional… É uma ajuda! É uma troca
de conhecimento, porque, né? A gente tem essa troca de
conhecimento do profissional com o paciente, e eu super indico de
55

você ter uma qualidade de vida… (Capim Santo)

Por qualquer coisa eu vou! Porque eu fico nervosa!


Principalmente, agora nessa doença… (Manjericão)

Não. Toda vez que eu me sinto mal eu já tô no médico, já. É. É por


Natal, é por Parnamirim. Aonde tiver um médico que dê certo pra mim,
eu já tô lá. (Mastruz)

Eu já senti mal aqui, já senti, eu já fiquei vomitando, com a licença da


palavra, sentada nessa cadeira, quase desmaiando molhada de suor.
Mamãe tava até aqui, ela ficou chorando por ao redor de mim. Mas aí
ela fez um chá de erva-doce, viu? Fez um chá de erva-doce e eu fiquei
melhor. Aí eu não fui não. Não procurei não. Porque aqui quando a
gente chega em algum canto tem que ir com um negócio... Tem que
ircom 100 anos pra poder dar um... Eu acho muito ruim essas coisas
daí que a gente tem que ajustar uma consulta. Não tem que dizer
assim “eu vou pegar uma ficha e me consultar”. Não, tem que ir pegar
uma ficha pra marcar praquele dia. Eu acho difícil demais isso. As
pessoas dessa idade, minha filha, é muito difícil. A gente não é aquela
pessoa jovem, que tem força, tem coragem, raciocina tudo na cabeça.
Não é. A gente vai esquecendo. Tem até uma música que conta o
sofrimento que a pessoa já tá, e ninguém ignore, porque isso aqui se
a pessoa não morrer, vai passar por isso. (Cidreira)

Há um reconhecimento da assistência dada pelo SUS como um direito, e


quando necessitam dos serviços de saúde são bem acolhidos, embora haja
dificuldade na marcação das consultas e demora na entrega dos resultados dos
exames realizados. Destaca-se que há bons e maus profissionais na rede. Manjericão
enfatizou que não iria deixar de comprar alimentos para pagar consultas particulares,
pois encontra no SUS a possibilidade desse atendimento. Durante a pandemia da
Covid-19, a usuária realizou o teste para identificar a presença do vírus e conseguiu
ter uma assistência adequada e com uma equipe multiprofissional, graças à potência
de um sistema de saúde gratuito, mas que ainda apresenta dificuldades.

Agora com esse negócio da pandemia houve muito atraso dos


exames, né... Eu tô com uns exames aí, que a menina disse que vai
demorar muito… Muito… Muito… Primeiro, eu vou comprar os
remédios para ver o que vai ser… (Babosa)

Eu fui para UPA, lá em cima no Paraíso! E sempre eu vou só aí porque


lá… Porque quando eu comecei a não sentir gosto, nem cheiro…
Nada! Eu fiz o teste para ver se era positivo, deu positivo. Foi bom.
Eles são ótimos! Agora lá tem gente de todo jeito, a verdade é essa…
Tem gente que dá atenção… Tem gente que não dá… Mas, pelo
médico e a atendente lá… O pessoal da enfermagem… Foi muito
bom… Não... Sempre o meu SUS foi isso aí… Sempre bem atendida,
né! [...] Agora, se o meu SUS, eu tenho ele… Se eu chegar num canto
56

em que eu não for bem atendida… Eu berro na hora! Ligeiro demais!


Eu berro ligeiro… Porque aquilo ali é a gente tá pagando. Toda hora
em que eu, você ou qualquer um for no médico… Ele tá ganhando por
aquilo ali… E se eu não for bem atendida eu dou um pisante na hora…
Porque a gente tem aquilo ali que é para gente ir pro médico. Se não…
Se eu não tenho condições de pagar uma consulta particular, né?
Pronto, nessa semana eu ia pagar uma consulta particular… Segunda
feira. Depois de amanhã, mas eu já pensei em pagar… Mas eu tenho
um médico aqui que é tão bom… E por que eu ia tirar da minha boca
para pagar consulta. Se eu tenho cartão do SUS. (Manjericão)

Tudo bem, graças a Deus. Só dá pra... Só tem a... As mais difíceis


são quando eles marcam um... A gente faz a consulta, né, e marca, e
elespassam um exame pra gente fazer... A gente faz aquele exame e
não arrecebe o resultado. Porque é pelo SUS, a gente coloca lá pra
eles marcar o dia de a gente ir e não aparece. Pronto, só tem essa
ultra que tá empancada do ano atrasado. Do seio... Mas... E essa
outra, que eu bati tá fazendo... Eu bati no dia 6. Já mandei três vezes
ali no... Pra pegar, e não chegou ainda no hospital. Porque eu fiz no
Ana Bezerra e vai lá pro Miguel Lula. Já mandei pegar três vezes pra
eu ir apresentar ao médico que pediu aqui no posto, e não chegou
ainda. Aí eu digo: “Precisa... será que vai precisar eu ir brigar lá pra
eu arreceber?” Porque a outra que eu fiz, que essa eu fiz, precisou
eu ir lá na maternidade pegar uma terma lá com a pessoa pra
procurar minha ultra e minha mamografia, que tava empalhada. Eu
fiz, passoudois meses, três meses, aí eu digo: “Peraí que eu vou, que
eu sou desembuchada pra tudo, sabe?” Eu... Eu não tenho medo.
Olhe, sendo a verdade, eu não tenho medo de falar em canto
nenhum. Eu vou mesmo, com gosto de gás. Cheguei lá, muito bem
educada, que eu sou meia doidona, mas quando eu chego assim
num canto (risos)... Cheguei, eu dei boa tarde, bom dia, como é que
tá. Que eu conheço um rapaz lá. Eu digo: “Ei, meu amigo, [...] você
não vai me entregar meus exames não? Eu estou precisando pra
apresentar”. “Não, porque não sei o quê...” Eu digo “Não sei o quê
não. Tá tudo certinhoaí, eu fiz minha mamografia, eu fiz minha ultra...
Eu quero meus exames tudo na palma da minha mão pra eu
apresentar à doutora J.”.(Mastruz)

Quando questionados para tecer comentários adicionais, os sujeitos


demonstraram o lugar tão crucial e importante que as plantas e a natureza ocupam
nas suas vidas, sentimento demonstrado ao logo de todas as entrevistas bem como
expressaram a necessidade de ter fé, organização e da disciplina com o uso das
plantas medicinais, conforme destacado nos discursos a seguir:

As plantas para mim é tudo! Porque para mim, graças a Deus. Eu jogo
dentro da comida várias coisas, escondido das meninas… Às vezes
comem e nem sabe… A farinha da linhaça, ninguém quer… Pros
ossos! Principalmente para elas que são novas… O meu já tá mais
sambado… Mas, os delas? Que estão novas? Jogo as sementes junto
com o feijão… Todo mundo come o feijão e fica bom todo… Gengibre
57

também é bom… (Babosa)

Eu diria o seguinte… Que as pessoas… A natureza veio para nos


curar! Você está estressada, tá louca da vida… Vai lá para um bosque,
dá uma volta, tira o chinelo, relaxa… Para você ver o que você vai
ganhar com a natureza… Entendesse? Então, é isso que eu diria...
Que as pessoas que estão estressadas vão pescar não, porque vão
ter que pegar no anzol, a isca… Vão passear!!! Eu tenho essa visão.
(Crajiru)

Eu acho que tem que ter fé para dar certo e disciplina. Porque se você
faz uma coisa desorganizadamente não vai dar certo. Isso acontece
com remédio natural, e com remédio que a gente conhece da
farmácia… Cuidado e disciplina… Sempre! (Capim Santo).
58

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa demonstrou que os cuidados populares e práticas de reza está


integrado a um conjunto de sujeitos caracterizados por pessoas idosas, com baixo
nível de escolaridade, com conhecimento pautado na ancestralidade, nas relações
familiares e de amizade ao longo de sua vida, religiosidade, como também pela
curiosidade em aprender sobre a potencialidade do uso das plantas no cuidado em
saúde.
Indica que essas práticas de cuidado necessitam de valorização e
disseminação no espaço acadêmico, nos serviços de saúde e na sociedade. Deve-
se, portanto, pensar essa prática como alternativa legítima no cuidado em saúde a fim
de colaborarmos na luta por uma saúde livre de preconceitos, paradigmas e racismo
institucional. Uma prática em saúde que leve em consideração o conceito ampliado
de saúde e os aspectos destacados pelos sujeitos, respeitando os seres humanos e
os saberes populares, a fim da prestação de um cuidado nos serviços de saúde que
complemente e escute os saberes sem arrogâncias e prepotências, indo ao encontro
da proposta política do SUS.
A partir da realização desse estudo espera-se contribuir para o fortalecimento
do uso das práticas populares de cuidado em saúde, reconhecendo a importância do
uso das plantas e da reza na saúde dos indivíduos, auxiliando, dessa forma, tanto
para a diminuição do adoecimento quanto para a cura das enfermidades.
É inegável a necessidade de ampliação de estudos na área da saúde coletiva
integrados com o pilar das ciências sociais para aprofundamento das análises sociais
no campo da saúde.
Este trabalho ficou marcado por um grande desafio a ser vencido na medida
em que teve que ser desenvolvido ao longo de um período marcado pela ocorrência
da pandemia de Covid-19.
59

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papel da religiosidade na promoção da saúde do idoso. RBPS 2008; 21 (3):
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47. Brasil. Ministério da Saúde. Ministério da Previdência e Assistência Social.


Relatório Final da 8ª Conferência Nacional da Saúde. Brasília: MS; 1986. 29
p.

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das iniquidades em saúde no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2008.

49. Arnous, AH, Santos AS, Beinner, RPC. Plantas medicinais de uso caseiro -
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para a Saúde 2005; 6 (2):1-6.

50. Junges JR, Ávila SRB, Fernandes P, Lima MS. Saberes populares e
cientificismo na estratégia saúde da família: complementares ou
excludentes?. Ciênc. saúde coletiva 2011; 16 (11):4327-4335.

51. Lopes OS. Práticas Populares de Cuidado, Ação Comunitária e Promoção da


Saúde. 1. Ed. João Pessoa; 2019. 108 p.

52. Borges MS, Shimizu HE, Pinho DLM, Almeida AMO. O modo de cuidar na
benzeção: saber popular e racionalidade divina. Rev Min Enferm. 2008; 12
(2):241-8.

53.Bastos, RL. O universo da religiosidade terapêutica e das novas


apropriações/construções acerca do corpo nos rituais de cura. Revista FECAF de
Estudos Acadêmicos e Científicos. 2018. 21-30.
65

ANEXO I – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO – TCLE

Esclarecimentos

Este é um convite para você participar da pesquisa: Determinantes Culturais e


Saúde: os desafios para atuação dos profissionais de saúde em diversidade
sociocultural nas Unidades básicas de Saúde, que tem como pesquisadora
responsável a Prof. Dra. Mercês de Fátima dos Santos Silva.
Esta pesquisa tem o objetivo de construir um módulo experimental de formação
em Determinante cultural em saúde em contexto de diversidade cultural para
profissionais de saúde das Unidades Básicas de Saúde na região do Trairi no Rio
Grande do Norte.
O motivo que nos leva a fazer esse estudo é para identificar os principais
desafios enfrentados pelos profissionais de saúde, no que diz respeito, ao processo
de saúde-doença-cuidado e seus determinantes culturais, como também identificar o
perfil dos profissionais que enfrentam este desafio e organizar um esquema teórico-
analítico para trabalho em saúde com diversidade cultural, tendo em vista contribuir
com o estabelecimento das novas propostas curriculares dos profissionais de saúde
que prevê a valorização e o respeito as práticas tradicionais e populares de cuidado à
saúde no Sistema Único de Saúde (SUS);
Durante a realização da pesquisa, será solicitado que você participe de uma
entrevista dialogada e responda algumas perguntas. Esta pesquisa apresenta riscos
mínimos, podendo provocar apenas um desconforto pelo tempo exigido ou
constrangimento pelo teor de alguns questionamentos (tais como a renda familiar e
grau de escolaridade). Com base nas informações coletadas de você e de outros
indivíduos, poderemos apresentar um mapeamento de práticas populares de cuidado
em saúde existente na cidade de Santa Cruz-RN, bem como apontar os desafios para
aceitação das referidas práticas no processo de cuidado nos serviços de saúde.
Durante todo o período da pesquisa você poderá tirar suas dúvidas ligando
para a Profa. Mercês de Fatima dos Santos Silva, celular 84 99915.6841.
Você tem o direito de se recusar a participar ou retirar seu consentimento, em
qualquer fase da entrevista, sem nenhum prejuízo para você.
66

Os dados que você irá nos fornecer serão confidenciais e serão divulgados
apenas em congressos ou publicações científicas, não havendo divulgação de
nenhum dado que possa lhe identificar.
Esses dados serão guardados pelo pesquisador responsável por essa
pesquisa em local seguro e por um período de 5 anos.
Se você tiver algum gasto pela sua participação nessa pesquisa, ele será
assumido pelo pesquisador e reembolsado para você.
Se você sofrer algum dano comprovadamente decorrente desta pesquisa, você
será indenizado.
Qualquer dúvida sobre a ética dessa pesquisa você deverá ligar para o Comitê
de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências da Saúde do Trairi (FACISA), telefone
3291-2411.
Este documento foi impresso em duas vias. Uma ficará com você e a outra com
o pesquisador responsável Prof. Merces de Fatima dos Santos Silva.
Consentimento Livre e Esclarecido

Após ter sido esclarecido sobre os objetivos, importância e o modo como os


dados serão coletados nessa pesquisa, e ter ficado ciente de todos os meus direitos,
concordo em participar da pesquisa: Determinantes Culturais e Saúde: os desafios
para atuação dos profissionais de saúde em diversidade sociocultural nas Unidades
básicas de Saúde, e autorizo a divulgação das informações por mim fornecidas em
congressos e/ou publicações científicas desde que nenhum dado possa me identificar.

Santa Cruz, Rio Grande do Norte, de de 20 .

Assinatura do participante da pesquisa

Impressão
Assinatura do pesquisador responsável datiloscópica do
67

ANEXO II – TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA GRAVAÇÃO DE VOZ

Eu,
, depois de entender os riscos
e benefícios que a pesquisa intitulada “DETERMINANTES CULTURAIS E SAÚDE:
OS DESAFIOS PARA ATUAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE EM DIVERSIDADE
SOCIOCULTURAL NAS UNIDADES BÁSICAS DE SAÚDE”, poderá trazer e, entender
especialmente os métodos que serão usados para a coleta de dados, assim como, estar ciente
da necessidade da gravação de minha entrevista, AUTORIZO, por meio deste termo, os
pesquisadores Dinorah de França Lima, Layse Naele Melo da Silva, Joelson Pereira da Silva,
Joismene Gíulio Reinaldo, Leonardo Azevedo de Medeiros, a gravação de minha entrevista
sem custos financeiros a nenhuma parte.
Esta AUTORIZAÇÃO foi concedida mediante o compromisso dos pesquisadores
acima citados em garantir-me os seguintes direitos:
1. Poderei ler a transcrição de minha gravação;
2. Os dados coletados serão usados exclusivamente para gerar informações para a
pesquisa aqui relatada e outras publicações dela decorrentes, quais sejam: revistas
científicas, congressos e jornais;
3. Minha identificação não será revelada em nenhuma das vias de publicação das
informações geradas;
4. Qualquer outra forma de utilização dessas informações somente poderá ser feita
mediante minha autorização;
5. Os dados coletados serão guardados por 5 anos, sob a responsabilidade da
pesquisadora coordenadora da pesquisa Merces de Fatima dos Santos Silva de, e
após esse período, serão destruídos e,
6. Serei livre para interromper minha participação na pesquisa a qualquer momento e/ou
solicitar a posse da gravação e transcrição de minha entrevista.

Este documento foi impresso em duas vias. Uma ficará com você e a outra com a
pesquisadora responsável Mercês de Fatima dos Santos Silva.

Santa Cruz, Rio Grande do Norte, de de 20 .

Assinatura do participante da pesquisa

Impressão
Assinatura do pesquisador responsável datiloscópica do
68

ANEXO III – TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA USO DE IMAGENS (FOTOS E


VÍDEOS)

Eu,
, AUTORIZO a Profa. Mercês de Fátima dos
Santos Silva, coordendora da pesquisa intitulada: “ DETERMINANTES CULTURAIS
E SAÚDE: OS DESAFIOS PARA ATUAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE EM
DIVERSIDADE SOCIOCULTURAL NAS UNIDADES BÁSICAS DE SAÚDE” a fixar,
armazenar e exibir a minha imagem por meio de foto ou vídeo com o fim específico
de inseri- la nas informações que serão geradas na pesquisa, aqui citada, e em outras
publicações dela decorrentes, quais sejam: revistas científicas, congressos e jornais.
A presente autorização abrange, exclusivamente, o uso de minha imagem para
os fins aqui estabelecidos e deverá sempre preservar o meu anonimato. Qualquer
outra forma de utilização e/ou reprodução deverá ser por mim autorizada.
O pesquisador responsável Mercês de Fátima dos Santos Silva, assegurou-me
que os dados serão armazenados em meio digital, sob sua responsabilidade, por 5
anos, e após esse período, serão destruídas.
Assegurou-me, também, que serei livre para interromper minha participação na
pesquisa a qualquer momento e/ou solicitar a posse de minhas imagens.

Santa Cruz, Rio Grande do Norte, de de 20 .

Assinatura do participante da pesquisa

Impressão
Assinatura do pesquisador responsável datiloscópica do
69

ANEXO IV – ROTEIRO NORTEADOR DE ENTREVISTA

I – Caracterização do perfil
1 - Nome
2 - Idade
3 - Gênero
4 - Cor/Raça/Etnia
5 - Estado Civil
6 - Local De Nascimento 7- Endereço
7 - Contato
8 - Escolaridade
II – Práticas de Cuidado em Saúde
1- Como se aproximou dessa prática de cuidado em saúde?
2- Foi uma aproximação que fez sozinho ou por intermédio de alguém (família)?
3- O que o motivou, alguma experiência ou acontecimento em sua vida, procura por
algo?
4- Como foi o processo de inserção, até se tornar um conhecedor dessa prática?
5- Há quanto tempo aconteceu isso? Quantos anos você tinha?
6- Existem tempos diferentes para o acesso a esses conhecimentos?
7- Quais plantas o Sr(a) utiliza como forma de cuidado/tratamento em saúde?
8- Você percebe momentos de mudança na sua vida a partir do acesso de alguns
destes conhecimentos?
9- De que forma este aprendizado influencia sua vida?
10- A sua percepção da prática mudou ao longo da sua experiência?
11- O que é a saúde no entendimento do Sr(a)?
12- Esse entendimento está baseado na religião que o Sr(a) prática?
13 - Que práticas de cuidado em saúde o Sr(a) gostaria de destacar?
14- Como o Sr(a) e os membros de sua casa/comunidade lidam com esses
cuidados?
15- Os cuidados praticados pelo Sr(a) mudam ao longo do tempo ou permanecem
sempre os mesmos?
16 - Como esses cuidados influenciam a sua vida cotidiana?
17- O Sr(a) utiliza os serviços de saúde, não é?
18- Quando ou em que situações o Sr(a) procura os serviços de saúde?
70

19 - Como avalia o atendimento realizado por eles?


20- A sua filiação religiosa e/ou as práticas que você exerce influência no
atendimento que recebe nesses serviços?
III - Relação com o SUS
21- O Sr(a) fala com o profissional da saúde sobre os saberes de sua prática de
cuidado?
22- Os diagnósticos e os tratamentos prescritos pelos serviços de saúde resolvem
os problemas que levaram o Sr(a) até lá?
23- Existem questões de saúde ou mal-estares que não levam o Sr(a) a procurar os
serviços de saúde?
24 - O Sr(a) possui alguma experiência com o SUS que gostaria de relatar?
25 -Gostaria acrescentar algum comentário relacionado com as questões
apresentadas?

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