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CENTRO UNIVERSITÁRIO CESUMAR – CÂMPUS PONTA GROSSA

CURSO DE GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

MARIA ALICE DALA LANA ZIMMERMANN

RESENHA CRÍTICA DO LIVRO CLÍNICA PERIPATÉTICA – ANTÔNIO


LANCETTI

PONTA GROSSA – PR
30/04/2021
O Livro “Clínica Peripatética” foi publicado em 2016 pelo argentino
Antônio Lancetti, militante da luta antimanicomial e direitos humanos. Nesse
livro, Lancetti trata da clínica fora dos settings tradicionais como hospitais
psiquiátricos ou consultórios. O livro conta com 6 capítulos que abordam ideias
sobre luta antimanicomial no Brasil, CAPS, redução de danos e agentes
comunitários.
O capítulo um é intitulado como “Fontes da clínica peripatética” e logo no
início o autor explica sobre o peripatetismo, que nada mais é ideias e
conversas que ocorrem durante um passeio, caminhando. Ele explica sobre o
setting e como ele seria um espaço paradoxal – é e não é – sendo um espaço
dentro-fora facilitador da comunicação entre o inconsciente-inconsciente.
Dentro desse capítulo Lancetti comenta também sobre a desconstrução
manicomial, que mostrou o cenário do hospício são “promotores de identidades
cronificadas e que a clínica reabilitativa é iminente ao processo de
desmontagem manicomial” (LANCETTI, 2016). Ao falar da pedagogia da
surpresa, Lancetti comenta sobre o crack na cidade de Santos e como meninas
e meninos estavam morando na rua, o que levou a desenvolver a metodologia
de atingir esses meninos e meninas no momento e lugar onde menos se
espera. Outra estratégia para lidar com meninos e meninas em situação de rua
era a internação invertida. Em vez de internar esses meninos, internavam-se os
educadores. Além disso, comenta-se sobre as sessões que acontecem
caminhando, sobre acompanhantes terapêuticos, saúde mental – e como essa
ainda é peripatética, indo até as famílias e atendendo em hospitais e abrigos –.
O segundo capítulo com o título “CAPS, burocracia e turbinação” inicia
contando sobre o primeiro Naps – núcleo de atenção psicossocial – de Bauru.
Lancetti (2016) descreve-o como uma “casa clara, limpa e aconchegante, com
espaços de convivência grupal.”. Aqui, entra-se em uma discussão sobre fazer
saúde mental, e, como sabemos, fazemos isso combatendo manicômios. Foi
em Bauru que lançou-se a máxima “por uma sociedade sem manicômios”. Os
Naps se formaram rapidamente, com técnicos exercendo funções de
psicólogos e assistentes sociais em escolas. Trabalhavam com salários baixos
que eram compensados com baixas horas de trabalho. Lancetti comenta
também sobre a mudança do nome Naps para Caps, preferindo usar o termo
centro ao invés de núcleo. O Caps também é paradoxal porque sua prática
ocorre dentro e fora das unidades ao mesmo tempo e a desconstrução
manicomial nos ensina justamente isso, a importância do dentro e fora do
estabelecimento, “das bordas como espaço privilegiado de produção de
subjetividade cidadã” (LANCETTI, 2016). Ao final do capítulo, o autor
aconselha o trabalhador de saúde mental a nunca esquecer que a razão de
sua existência é o manicômio.
No capítulo três, diferente dos outros, Lancetti expõe uma conversa com
Domiciano Siqueira sobre redução de danos. Siqueira comenta sobre a ideia
do projeto ter surgido em 1995 e apenas em setembro de 1996 o trabalho foi
colocado em prática no campo. Aqui, os dois comentam sobre a troca de
seringas, sobre o objetivo não ser a abstinência e ainda discutem sobre como
os postos de saúde não pertencem a pessoas relacionadas com o tráfico de
drogas e que essas pessoas acabam buscando nos redutores a vacina, o o
encaminhamento, a retirada de documentos, etc. Domiciano explica que o
objetivo não é fazer guerra as drogas, não é fazer campanhas de prevenção a
drogas e sim se aproximar dessa comunidade para então poder intervir em
uma parte muito íntima da vida de cada um, que é a sexualidade e o uso de
drogas. Ele ainda comenta com Lancetti como a aderência é grande e quando
eles frequentam esses lugares os usuários costumam gostar, porque antes do
que eles fazem, esses trabalhadores o enxergam, e mesmo que essa não seja
a estratégia mais adequada para os padrões da saúde pública, é assim que
tem funcionado. Domiciano siqueira comenta também sobre a efetividade da
redução de danos, como pessoas que aplicaram isso nas suas vidas,
diminuíram o uso de drogas e aumentaram a qualidade do consumo de drogas,
apesar de muitas delas ainda não deixem de usar drogas. Ele ainda compara a
abstinência e a redução de danos. A primeira seria uma proposta que valoriza
a possibilidade de fracasso, enquanto a outra valoriza a possibilidade da vitória.
Ainda é comentado como a presença das drogas na vida das pessoas,
principalmente das periféricas, se justifica exatamente porque a sociedade
padronizada deixa que eles carreguem um peso que todos deveriam carregar.
Por fim, ele menciona que a guerra as drogas é uma ideia mesquinha e fadada
ao fracasso e que o ideal seria lutar pelas pessoas e pela sua liberdade.
O quarto capítulo tem como título “Redução de danos como ampliação
de vida” e Lancetti já inicia falando que a RD é uma prática e uma política de
saúde pública, prática pois está em sintonia com as ações sanitárias que
buscam a defesa da vida e política porque diverge da guerra as drogas. Nesse
capítulo o autor também comenta sobre como o conjunto-droga está
relacionado com o capitalismo contemporâneo e por isso é difícil implantar
programas de RD. Lancetti ainda diz que para a psicanálise o dependente de
droga foi considerado inadequado, pois recusam a passagem da relação com o
outro. Quem trabalha com drogados está exposto a muita frustração, pois
quando menos se espera eles podem voltar a usar droga e se proteger do
conceito de recaída.
O capítulo 5 tem como título “A potência terapêutica dos agentes
comunitários da saúde” e como o próprio nome diz esse capítulo comenta
sobre a força dos agentes comunitários e sua importância frente a saúde
mental brasileira, sobre a importância da multidisciplinaridade, fazer circular o
saber e sobre a potência que isso tem.
O último capítulo tem como nome “práxis peripatética” e uma das
discussões são ainda sobre os agentes comunitários e como esses vivem na
alma da periferia e são por definição paradoxal porque esses são parte da
comunidade e ao mesmo tempo parte da organização sanitária e como isso
torna esses profissionais potentes na promoção de saúde mental. Comenta-se
também sobre as chamadas makarenkadas, que são conflitos entre um sujeito
com uma vida muito difícil e ao mesmo tempo tão necessitados de afeto e
conforto. Essas ações quando são repetidas costumam transformar em abuso
de poder, rebelião e violência. Lancetti ainda comenta que ser amigo do
analista peripatético é uma relação paradoxal, visto que ao mesmo tempo ele é
amigo ele também é um estrategista, pois está sempre atento aos passos do
percurso feito. Porém o autor fala ainda que mesmo que paradoxal,
experiências de amizade são importantes.
Tendo em vista o livro comentado até aqui, considero esta obra
essencial a todo trabalhador ou a todas as pessoas que se interessam por
saúde mental. Lancetti trás aqui uma visão diferente sobre a saúde mental
brasileira, um breve histórico e sobre a redução de danos, junto com Domiciano
Siqueira, uma visão esclarecedora sobre essa prática e como a RD ainda é
vista de forma errônea.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

LANCETTI, A. Clínica Peripatética. São Paulo: Hucitec, 2005

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