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ESCOLA DE ENFERMAGEM DE RIBEIRÃO PRETO

Programa de Pós-Graduação – Enfermagem Psiquiátrica

TRABALHO FINAL DA DISCIPLINA

BREVE HISTÓRICO DA LOUCURA E ABORDAGENS CONTEMPORÂNEAS EM


SAÚDE MENTAL

Disciplina: Saberes e práticas em Saúde Mental

Docentes: Lucilene Cardoso, Regina Célia Fiorati e Toyoko Saeki

Discentes:
Erika Gonçalves Cardim
Iani Fassa dos Santos
Maiza dos Santos Rodrigues
Nicole Stef Vieira Candeloro
Regiane Sedenho de Morais
Introdução

“Loucura” é uma doença? Loucura é uma construção social? Loucura realmente


existe? A ideia mais certeira sobre essa palavra, é que ela representa diversas concepções
construídas a partir de diferentes pontos de vista. Foucault (1999) interessado em encontrar a
origem, isto é, o ponto zero da loucura, depara-se com um dilema importante: “ela só existe
em uma sociedade, ela não existe fora das formas de repulsa que a excluem ou a capturam”
(p. 150), isto é, a loucura existe circunscrita nas épocas e culturas.

É fato que as experiências mentais consideradas “anormais” acontecem desde os


tempos mais remotos da humanidade e alcançam um número significativo de sujeitos no
mundo todo. Tendo isto em vista, o instigante psicólogo Isaías Pessotti (1994) se dedicou à
construção da evolução da loucura ao longo das épocas.

Com base no livro “A loucura e as épocas”, Pessotti (1994), notamos a aura de


estranheza e repulsa dos envoltórios da loucura, produzindo violências físicas e psicológicas,
preconceitos, exclusão social e sofrimento. Antes do século XIX, não havia cisão entre razão
e loucura. As referências do que, posteriormente, seria denominado como loucura, eram
personalidades incomuns, comportamentos considerados estranhos, sujeitos irritantes ou até
mesmo influenciados por forças sobrenaturais (Pessotti, 1994).

Com o passar dos séculos, novos conceitos e formas de intervenção foram sendo
construídos, considerando contextos sociais e políticos que, ainda que sejam considerados
avanços em termos de intervenção de forma humanizada, é necessário um constante pensar, a
fim de que as abordagens, tratamentos e intervenções sejam sempre atualizadas, considerando
as demandas sociais, etnográficas, políticas e, principalmente subjetivas, já que cada ser
humano é único.

O presente artigo tem como objetivo apresentar, com base nos conhecimentos
construídos ao longo das discussões na disciplina de Saberes e Práticas em Saúde Mental,
ofertada pela Escola de Enfermagem da USP - Universidade de São Paulo, campus Ribeirão
Preto, um breve histórico do conceito de loucura, bem como intervenções e abordagens
contemporâneas em Saúde Mental. Destacamos a importância de que tais reflexões sejam uma
constante no trabalho em saúde mental, a fim de inovar e promover a saúde mental em sua
totalidade.

Breve histórico da loucura


Ao longo da Idade Média e do Renascimento, a loucura foi vinculada ao contexto
sociocultural, ganhando representações religiosas, mágicas e sobrenaturais. Segundo Pessotti
(1994), durante mais de um século, diversos religiosos difundiram ideias e obras polêmicas
em resposta aos pensadores do paganismo. Ou seja, já neste momento a loucura está atrelada e
a serviço de interesses religiosos e políticos. Esta crença atribuía a loucura a possessões
demoníacas, influência de deuses pagãos, feitiçarias e entre outras forças externas e
sobrenaturais.

De forte cunho social, essas explicações, apesar de infundáveis, são consideradas


pioneiras do cristianismo e fundamentam os processos inquisitórios. Por séculos, todos que
acreditavam em outros deuses, em formas científicas de conhecer o mundo ou até aqueles que
não tinham crença alguma, foram perseguidos, violentados, presos e mortos.

Nessa extensa perseguição, destaca-se a perseguição aos religiosos. Alegavam que os


monges eram alvos favoritos dos demônios e que exerciam suas forças neles, que podia ser
afirmada ao observar os comportamentos dos monges, como irritação no nariz, coceiras, sono
durante as orações, entre outros. Inclusive acreditavam que o tédio era causado pelo demônio
do meio dia, que causava a impressão de que o tempo estava num ritmo lento e de que o sol
estava parado (Pessotti, 1994).

A ideia de tédio vinculada às práticas budistas, posteriormente, se transforma na


concepção da melancolia, considerada um esvaziamento interno. O desânimo, a tristeza e a
melancolia tornam-se uma tentação demoníaca, sendo assim, passam a ser consideradas
pecados (Pessotti, 1994). Apesar de serem pensamentos remotos, ainda hoje exercem
determinada influência em falácias populares, por exemplo, em frases como “depressão é falta
de Deus” ou que os sujeitos acometidos pela esquizofrenia escutam “vozes do além”,

No período medieval, também conhecido como idade das trevas, a conexão entre Deus
e os humanos, era intermediada pela Igreja. Tanto o conhecimento religioso quanto o
conhecimento sobre as anormalidades eram produzidos em mosteiros e difundidos pelas
instituições e pelos conhecidos doutores da fé cristã. O louco ainda era visto como possuído
pelo demônio e ainda era um ser maligno, perverso e perigoso. Como forma de expurgar seus
males, eram pressionados a confessar seus atos e comportamentos, o que era razão para serem
levados à fogueira ou exorcizados (Stone, 1999).
É somente a partir do Renascimento, quando o homem se torna o centro das atenções,
que a loucura é desvinculada da natureza sobrenatural e realocada enquanto uma transgressão
das regras sociais. Isto é, os loucos passam a ser vistos como aqueles que ameaçam a ordem
social por não terem controle sobre seus atos. A partir disso, são isolados da sociedade, ato
que ainda hoje permeia as internações contemporâneas.

Essa exclusão se agrava com a crise econômico entre os séculos XV e XVI:

A pobreza e a mendicância passaram a fazer parte da vida nas cidades europeias da


época. Para enfrentá-las, o Estado passou a disseminar por todo o seu território
instituições que tinham como seu objetivo final abrigar as pessoas desempregadas, os
doentes e os inválidos para o processo produtivo. Dessa forma, os hospitais gerais
eram permeados por valores morais, sendo o lugar social destinado ao erro; por isso os
que ali se encontravam deveriam ser segregados do convívio social e familiar
(Queiroz, 2009, p.19)

Com efeito, os miseráveis passaram a ser recolhidos das ruas e institucionalizados nos
chamados hospitais gerais, os quais também serviam de pensões, prisões, reformatórios, entre
outros. Esses hospitais eram caracterizados enquanto instituições de caridade, no entanto
exibiam explícitos aspectos coercitivos, como a internação ou aprisionamento compulsório
e/ou forçado. Acolhiam o que a sociedade definia como escória social: mendigos, sarnentos,
crianças órfãs, “loucos”, epilépticos, etc. Ressalta-se que os sujeitos “válidos” eram obrigados
a trabalhar e aderirem às práticas religiosas cristãs, como orações e missas (Queiroz, 2019).

Diversas figuras da exclusão social foram internadas nessas instituições, experiência


que Foucault (1999) chamou de “a grande internação” (p.45). De acordo com Queiroz
(2009), os hospitais gerais apresentavam finalidade assistencialista com o intuito de “sanear”
as cidades. Assim, a exclusão dos desajustados indesejáveis tornou-se cada vez mais natural,
desresponsabilizando a sociedade das agressões que ocorriam nesses locais. Essa situação
perdeu sua finalidade quando não obteve êxito em diminuir a pobreza.

A loucura seguiu sendo considerada digna de confinamento, já que sua imagem estava
atrelada ao estranho, peculiar e violento. Foi apenas no século seguinte que a loucura adquire
status de doença mental. Segundo Birman (1978), com a criação dos hospícios/manicômios, a
loucura torna-se verdade médica. E dessa verdade surge o campo da psiquiatria.

A fundação da psiquiatria é atrelada a Phillipe Pinel, médico responsável por conferir


aos hospitais gerais caráter terapêutico. Em 1973, Pinel foi designado médico chefe do
hospital Bicétre, uma instituição assistencial e filantrópica com imensa variedade de internos.
Sua proposta inicial foi desamarrar os internos. Destaca-se que:

Neste momento, houve um processo de mudanças de amarras, pois os alienados, ao


serem libertados das correntes que estavam presas aos seus corpos, passaram a ser
acorrentados pelo saber médico científico e pelo hospital psiquiátrico (Queiroz, 2019,
p.23).

Queiroz (2009) afirma que a proposta de Pinel se pautava no tratamento moral, ele
acreditava que através da reclusão/asilo, essa conjuntura poderia corrigir os erros mentais.
Ressalta-se que as contribuições de Pinel foram muito além das desamarras, ele fundou a
psiquiatria como uma especialidade médica a partir de uma síntese nosográfica sobre as
doenças mentais:

Pinel funda uma tradição – a da clínica – como orientação consciente e sistemática. Os


hábitos bizarros, as atitudes estranhas, os gestos e olhares são registrados e
comparados com o que está por perto, com o que é semelhante ou diferente. Colocado
em um lugar da ciência que, acredita-se, não é contaminado pelas influências da
cultura, da economia e da sociedade, o alienista, valendo-se de sua percepção social,
determina o que é normal e o que é patológico. Esse é o método do conhecimento, o
que opera a passagem da loucura para a alienação mental (Bercherie, 1989, p.31).

Com a ascensão do capitalismo, os ‘loucos” eram considerados improdutivos e


incapazes de viver em sociedade burguesa, sendo assim, nascem os manicômios, esclarecidos
por Franco Basaglia (2005) da seguinte forma:

Historicamente, o manicômio nasceu para a defesa dos sãos. Os muros, quando a


ausência de terapias impossibilitava a cura, serviam para excluir e isolar a loucura, a
fim de que não invadisse o nosso espaço. Mas até hoje eles conservam essa função:
dividir, separar, defender os sãos mediante a exclusão de quem já não é são. Dentro
dos muros, que o psiquiatra faça o que puder. Concedam-lhe ou não os meios para
trabalhar, consistiam-lhe ou não tratar de quem lhe foi confiado, ele deve antes de tudo
responder pela segurança da sociedade, que quer ser defendida do louco (Basaglia,
2005, p.49)

Nesse contexto, a função disciplinadora dos corpos é descrita por Foucault (1987)
enquanto “um poder que, em vez de se apropriar e de retirar, tem como função adestrar”
(p.83). A padronização e o rigor das burocracias e regras se intensificam com o passar do
tempo, influenciando na perda da personalidade dos internos, o que Goffman (1974) definiu
como mortificação do eu. Segundo Gomes (2006), isso se caracteriza por:
Práticas padronizadas, perda do nome, confisco de bens pessoais, ou seja, a separação
entre pessoas e as suas coisas, exposição contaminadora, em que o sujeito é obrigado a
conviver com coisas com as quais não se identifica e mantinha certo distanciamento
(sujeira e alimentos estragados) (...) (Gomes, 2006, p. 42)
Sob o aval da psiquiatria, os manicômios erradicaram a autonomia dos internos,
tornando-os sujeitos mortos de personalidade, determinada como incapacidade mental, e
consequente, social:

Dentre as diferentes práticas e mecanismos de exclusão e controle que vêm operando –


e se sofisticando – em nossas sociedades, sobressai-se, em seus múltiplos aspectos, a
realidade do “louco e da loucura”. Transformada, pelos saberes médicos, em doença,
alienação, desajuste, irracionalidade e perversão, a loucura carrega um conjunto de
práticas, concepções e saberes que, ancorados em uma moralidade ditada pelos bons
costumes, pela ordem e pelo trabalho produtivo, faz desligar, de forma explicitamente
violenta, os diferentes laços de construção e pertencimento humanos (Luchmann;
Rodrigues, 2007, p. 402).

Partindo deste ponto, o que se pode perceber é que os hospitais psiquiátricos, além de
não ter exata função em atender as demandas das pessoas internadas, se tornaram cada vez
mais espaços nos quais prevaleciam relações de poder, dominação, autoritarismo,
discriminação e opressão de todos os tipos. Contudo, esse modelo de tratamento da loucura
começa a ser questionado e iniciam-se reflexões sobre novas formas de enfrentamento desta
realidade.

Apesar do espanto ao conhecer a trajetória violenta e interdita da loucura, a ideia dessa


reflexão é provocar um olhar crítico sobre nossas práticas e saberes interdisciplinares. Em
nossas vivências, tão mecânicas e automáticas, a singularidade subjetiva desaparece em prol
do controle, dito como o “melhor para o paciente”, como aprimorar essa realidade?

Abordagens Contemporâneas em Saúde Mental

Até aqui apontamos brevemente a trajetória da loucura construída a partir do cunho


sócio-histórico com o intuito de compreendermos um dos pilares que sustentam a concepção
do transtorno mental, os reflexos na sociedade e suas práticas de enfrentamento até os dias de
hoje. Apesar de esclarecer os saberes e práticas da saúde mental, instiga-nos a pensar:
subjetivamente, o que é a experiência da loucura? Seria a loucura um modo destoante de se
viver? São estes os questionamentos que orientam a presente reflexão.

Segundo Kantorski et.al. (2021) após a Segunda Guerra Mundial importantes


mudanças acerca da psiquiatria começam a acontecer, principalmente sobre forte
questionamento acerca dos manicômios. França, Inglaterra e Estados Unidos que irão propor
novos delineamentos sobre o olhar da psiquiatria, que vai para além dos muros dos
manicômios e dão espaço para o cuidado à saúde mental, tais como a psiquiatria de setor e a
psiquiatria preventiva.

Mas é por meio das experiências de Franco Basaglia e seu grupo, na Itália, que se
inicia um movimento de democratização acerca da saúde mental. Esta não vem com a
intenção de remodelar as estruturas vigentes, mas sim um rompimento com a cultura
manicomial, promovendo inclusive o fechamento destas instituições. (KantorskI et.al, 2021).

Em resposta a esse processo, antigos manicômios foram abolidos por meio da Lei 180,
conhecida como Lei Basaglia, aprovada na década de 70. Esta lei propunha o trabalho mais
humanizado no sistema de saúde, especialmente no acompanhamento psiquiátrico dos
indivíduos. Para Amarante (2003), apud Yasui (2006):

Há uma dimensão epistemológica na Reforma Psiquiátrica que se caracteriza pelo


conjunto de questões que se situam na produção dos saberes e demandam a
desconstrução dos conceitos fundantes da psiquiatria, tais como doença mental,
alienação, isolamento, terapêutica, cura, saúde mental, normalidade, anormalidade. E a
reconstrução/invenção de um novo marco teórico e de novos operadores conceituais.
(Yasui, 2006, p. 69).
De acordo com Kantorski et.al (2021) as ideias de Basaglia tiveram grande impacto
acerca das práticas e políticas de saúde mental em muitos países, inclusive no Brasil. Por volta
da década de 1970, as discussões acerca da saúde pública se intensificam dando origem à
reforma sanitária e movimentos populares pela saúde, bem como a criação do Centro
Brasileiro de Estudos de Saúde - CEBES. É neste contexto, e orientada pelos mesmos ideais
de democracia, que surge a reforma psiquiátrica. Esta se tornou a luta pelos direitos humanos,
fim de manicômios e também melhores condições de assistência (Melo, 2002).

Vários eventos foram importantes para a construção deste processo, tais como V
Congresso Brasileiro de Psiquiatria (1978), I Congresso Brasileiro de Psicanálise de Grupos e
Instituições com a presença de Basaglia, I Conferência Nacional de Saúde Mental e o II
Congresso Nacional do Movimento dos trabalhadores em Saúde Mental (1987). Vale destacar
este último, o qual deu origem ao Manifesto de Bauru e que representou a fundação do
movimento antimanicomial, firmando junto à sociedade um compromisso sobre as questões
da loucura e seus tratamentos (Luchmann e Rodrigues, 2007).

Em meio a este processo, surge a luta antimanicomial, cujo lema se tornaria por “uma
sociedade sem manicômios”. Alguns desfechos dessas ações de lutas foram a lei número
10.216 de 06 de abril de 2001, conhecida como “Lei da Reforma Psiquiátrica” ou “Lei Paulo
Delgado”, em que também se estabelece a criação dos CAPS - Centros de Atenção
Psicossocial.

Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS)

De acordo com Yasui (2006), o processo da Reforma Psiquiátrica se concretiza por


meio da construção de uma rede de serviços de atenção e cuidados fundamentados em
instrumentos teóricos e técnicos visando a transformação da assistência em saúde mental. O
autor cita o Programa Saúde da Família (atual Estratégia Saúde da Família) como sendo uma
importante proposta de transformação da assistência em saúde no campo da atenção básica. E
também se refere ao Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), como sendo:

“[...] o principal instrumento de implementação da política nacional de saúde mental,


deve ser entendido como uma estratégia de transformação da assistência que se
concretiza na organização de uma ampla rede de cuidados em saúde mental. Neste
sentido, não se limita ou se esgota na implantação de um serviço. O CAPS é meio, é
caminho, não fim. É a possibilidade da tessitura, da trama, de um cuidado que não se
faz em apenas um lugar, mas é tecido em uma ampla rede de alianças que inclui
diferentes segmentos sociais, diversos serviços, distintos atores e cuidadores (Yasui,
2006, p. 107).
Uma das dimensões essenciais do trabalho do CAPS é o de pensar um projeto
terapêutico singular para cada indivíduo que busca cuidado, considerando a complexidade de
cada ser humano. Este projeto deve contemplar uma diversidade de estratégias de cuidado
articuladas em rede, o que demanda o reconhecimento do território e seus recursos (Yasui,
2006).

A Reforma Psiquiátrica propõe o distanciamento dos conceitos de “loucura” e “doença


mental”, junto ao entendimento de que todos os indivíduos são compostos de subjetividades,
vivenciando experiências humanas e são plenos de direitos. Esta nova narrativa vem
estruturando alguns trabalhos na área do cuidado, lutando pelo protagonismo dos sujeitos
frente a suas experiências, considerando suas vivências e validando seus projetos (Corradi-
Webster Santos E Leão, 2017). A partir dessa premissa, parte-se à compreensão de que o
indivíduo que vivencia o sofrimento psíquico é especialista dessa característica. Entretanto,
profissionais de saúde podem colaborar para a jornada de recuperação dessas pessoas (Slade,
2009). A fim de ampliar o leque de definições sobre o que realmente significa recuperação,
introduziu-se no campo da saúde mental, o conceito de recovery, no final da década de 1980,
que será exposto mais detalhadamente a seguir. Este foi introduzido a partir da história de
superação de pessoas que experienciaram sofrimentos mentais (Duarte, 2007).
Ao discutir o tema cuidado no contexto das novas propostas em saúde pública, Ayres
(2004) desenvolve uma análise do cuidado sob quatro perspectivas conceituais, sendo a
ontológica, a genealógica, a crítica e a reconstrutiva. A primeira categoria define o cuidado do
ponto de vista filosófico, envolvendo os aspectos de movimento, interação,
identidade/alteridade, plasticidade, projeto, desejo, temporalidade, não-causalidade e
responsabilidade. O cuidado como categoria genealógica remete às ideias de Michel Foucault
sobre o “cuidado de si” definido como um movimento de construção, manutenção e
transformação da identidade dos indivíduos na civilização ocidental cristã. Já o cuidado como
categoria crítica diz respeito ao cuidado como modo de interação nas e pelas práticas de saúde
em seus moldes contemporâneos, focalizando as recentes problematizações do cuidado no
âmbito de suas configurações técnicas e institucionais. Nesse âmbito, o autor comenta que:

Então é forçoso, quando cuidamos, saber qual é o projeto de felicidade, isto é, que
concepção de vida bem sucedida orienta os projetos existenciais dos sujeitos a quem
prestamos assistência. Como aparece ali, naquele encontro de sujeitos no e pelo ato de cuidar,
os projetos de felicidade a quem estamos cuidando? Que papel desempenhamos, os que
queremos ser cuidadores, nas possibilidades de conceber essa felicidade, em termos de saúde?
Que lugar podemos ocupar na construção desses projetos de felicidade de cuja concepção
participamos? (Ayres, 2004, p. 85).

O cuidado como categoria reconstrutiva concebe a potencialidade de um diálogo


aberto e produtivo entre a tecnociência médica (as práticas assistenciais) e “a vida que se quer
feliz”. Assim, a interação terapêutica apóia-se na tecnologia, mas não se limita a ela. E,
utilizar ou não certas tecnologias e quais tecnologias utilizar resultam de um juízo prático,
diferente do conhecimento produzido pelas ciências (Ayres, 2004).

Estudo realizado por Bustamante e Mccallum (2014), cujo objetivo foi realizar uma
reflexão sobre o cuidado, mostrou a importância de se compreender o cuidado no sentido das
práticas cotidianas construídas em diferentes contextos e que envolvem uma diversidade de
maneiras de cuidar. Dentre essas práticas, a sabedoria prática seria valorizada e incluída nas
práticas de saúde. As autoras discutem que valorizar a sabedoria prática presente no cuidar
pode aproximar os profissionais (incluindo os pesquisadores) dos usuários dos serviços de
saúde.

O conceito de Recovery como prática de cuidado em saúde


O recovery pode ser compreendido como o fortalecimento individual, para o
restabelecimento de sentidos, redefinição de senso de valores, descoberta de novas
identidades e maior participação social (Deegan, 1988). Os sujeitos, neste panorama, são
responsáveis por seus processos de reabilitação que não acontecem facilmente sem um
contexto social que favoreça a reabilitação. Desta forma, esta jornada precisa exercer o
estabelecimento de vínculos sociais, bem como, proporcionar ambientes significativos para o
sucesso do recovery (Deegan, 1988, Mezzina et al., 2006). Sobre a composição de sentidos
nos contextos dos sujeitos, Doroud, Fossey e Fortune (2007) enfatizam que, um lugar para
pertencer, ser e tornar-se é ferramenta essencial, impactante e capaz de orientar essa prática.

De acordo com Deegan (1988), o recovery não se associa à remissão total do que se
conhece por sintomas, nem ao retorno ao estado anterior do sujeito, no entanto, se associa a
restituição diária de esperança, desenvolvimento de autoconfiança e retomada do controle
sobre a própria vida. Segundo Davidson e Schmutte (2020) o conceito trata-se da busca por
objetivos ser mais significativa do que os efeitos do sofrimento, refere-se à recuperação
comportada a realidade do sujeito que aceita e supera desafios diários e, a reconstrução e
desenvolvimento de conexões sociais, ambientais, espirituais, pessoais em conjunto com o
fortalecimento para enfrentar os efeitos da discriminação que intersecciona a vida desses
indivíduos.

O Recovery tem sido discutido e implementado como diretriz de um sistema de


cuidado em saúde mental. Este conceito toma como imprescindível a ampliação do cuidado
para além da clínica farmacológica, abarcando de forma holística os desafios dos sujeitos em
sofrimentos psíquicos graves, uso abusivo de álcool ou demais drogas, bem como, organiza
intervenções também ampliadas. Também busca validar uma vida significativa, vinculada à
autonomia e à relevância dos sonhos e jornadas singulares das pessoas, dentro de seus
contextos sociais, comunitários, institucionais e das políticas públicas. Este sistema caminha
na contramão do paternalismo e na tutela feita por profissionais de saúde. Com base em três
décadas de evidências, lista-se seis princípios do recovery como proposta prática, de pesquisa
e de políticas públicas: a) auxílio para moradia; b) apoio para busca de emprego; c) rede de
apoio social; d) suporte entre pares; e) bem-estar e autogestão e; f) cuidado centrado na pessoa
(Davidson e Schmutte, 2020).

O conceito de recovery propõe intervenções adequadas a sua perspectiva, e dentre


essas intervenções está o suporte entre pares que consiste no suporte entre pessoas com
experiências semelhantes. Propõe que pessoas que estão em um processo mais avançado de
recovery auxiliem pessoas que estão enfrentando um conflito semelhante já superado pelo
indivíduo que oferecerá suporte, compartilhando estratégias de lida e oferecendo empatia.
Esta prática é capaz de enfatizar as potencialidades dos pares, considerando que estes se
encontram no papel de auxiliares (Repper e Carter, 2010). Autores ainda apontam que este
apoio mútuo enriquece o sentimento de esperança entre essas pessoas, maior controle sobre
mudanças de vida, aumento de autocuidado e maior percepção de pertencimento ao contexto;
sendo também capaz de alterar níveis de depressão e psicose entre os pares (Davidson,
Bellamy e Guy, 2012).

Por um longo período, pessoas em sofrimento psíquico foram percebidas como


incapazes de zelar por suas vidas, assim como apoiar outras pessoas. A iniciativa de suporte
entre pares tomou forma na Europa na década de 1990, com a contratação de sobreviventes de
sofrimentos mentais que se recuperaram “até certo ponto” para auxiliar pessoas que estavam
em crise. A literatura evidencia que milhares de norte-americanos, dentro e fora das
configurações convencionais da saúde mental, foram contratados para prestarem serviços por
pares (Schmutte et al. 2020). Corroborando com os autores supracitados, Stratford et al.
(2019) destacam que o suporte entre pares é produto de um movimento de base comunitária
com foco direcionado aos direitos humanos, respeitando as diversidades culturais e
promovendo a restauração da dignidade humana. Apontam ainda, que havendo apoio
comunitário e político, o suporte entre pares poderá se expandir mundialmente considerando
seus efeitos amplos e benéficos.

De acordo com Rufato et al. (2021) o apoio entre pares ocorre quando pessoas com
vivências desafiadoras atingem níveis de êxito em sua condição e dão suporte a outras pessoas
que vivenciam questões semelhantes. A realização do suporte entre pares no ambiente de
saúde mental pode promover mudanças significativas em nível cultural das instituições, visto
que promove restauração das pessoas como cidadãos plenos de direitos e atuantes em suas
comunidades. Com o estabelecimento desta rede de apoio, os indivíduos constroem espaços
seguros de acolhimento para compartilharem experiências e ainda divulgarem estratégias de
lidar com suas singularidades (Kantorski et al., 2017). De acordo com Gillard (2019) entre os
benefícios deste suporte estão: capacitação dos indivíduos em relação às suas experiências,
aumento de expectativas em relação ao futuro dos pares e o senso de empoderamento,
autonomia e fortalecimento de tomada de decisão.

As relações estabelecidas em suporte entre pares são horizontais, embasadas em


esperança, entendimento, respeito e aceitação. A execução da prática de suporte entre pares
com pessoas que vivenciam experiências com vozes, foco deste projeto, possibilita quebras de
estigmas que interseccionam a experiência de ouvir vozes, combatendo a permanência de
culturas estereotipadas, promovendo melhor qualidade de vida a esses sujeitos. Configuram-
se como terapêuticos para pessoas que ouvem vozes, visto que são espaços seguros para falar
sobre a experiência, onde há possibilidade de se estabelecer relações interpessoais, reduzindo
o isolamento, criando vínculos de cuidado e afeto entre os pares (Rufato et al., 2021). Cabe
ainda aqui esclarecer que, de acordo com Cardano (2018), a experiência de ouvir vozes é
privada, configurando-se como parte do mundo particular de quem as ouve, sendo
frequentemente difícil definir com clareza a origem dessas. As vozes, bem como seu tom e
discursos podem ser variáveis, no entanto, estão associadas às histórias e contexto cultural dos
ouvidores. A prevalência mundial de pessoas que experienciam a audição de vozes consiste
entre 4% a 10% da população mundial (Baker, 2016).

Movimento de Ouvidores de Vozes

De acordo com Corstens et al. (2014) o Movimento Internacional de Ouvidores de


Vozes ou Hearing Voices Movement (HVM), evidencia usuários dos serviços em saúde
mental e validam suas experiências. O Movimento de Ouvidores de Vozes teve início na
década de 1980 com o psiquiatra holandês Marius Romme, e sua paciente Patsy Hage,
baseando-se no pressuposto de que cada pessoa constrói diferentes concepções sobre suas
experiências e a causa destas. Patsy Hage era importunada por suas vozes, sendo nenhum
neuroléptico capaz de cessá-las. Inspirada pela leitura de um livro que realizava uma espécie
de discurso hábil a desencadear a desmedicalização dos sujeitos, Patsy Hage começou a
perceber suas vozes de forma muito singular. Em seu relato ela afirma que este livro a
inspirou a compreender a própria experiência. Marius Romme, evidencia que o fato de Hage
atribuir uma origem para suas vozes, deu-lhe grande conforto. Neste sentido, Romme se
perguntou se Hage seria capaz de compartilhar tal estratégia com outros ouvidores, bem
como, se esses ouvidores validaram a experiência compartilhada. A partir disto, sucedeu-se
sua participação em um programa de televisão, com significativa repercussão e respostas de
muitos ouvidores de vozes. Realizou-se uma conferência em 1987, com a participação de 360
ouvidores de vozes, sendo este o primeiro momento em que ouvidores se reuniram
publicamente a fim de discutir, fora do contexto médico, sobre suas experiências. Após uma
conferência ocorrida na Holanda, denominada “Pessoas que ouvem vozes”, Romme, Escher e
Paul Baker (educador social, familiar de ouvidor e defensor dos direitos humanos), iniciaram
atividades para o estabelecimento da rede dos ouvidores, sucedendo assim a ampliação de
estudos e iniciativas públicas sobre auto e mútuo auxílio, a priori na Holanda e posteriormente
na Inglaterra, desdobrando-se ao longo dos anos por outros países (Cardano, 2018).

As vozes são uma espécie de mensagem codificada, que em alta intensidade, são
sentidas enquanto intrusivas, agressivas e insuportáveis (as vozes de comando) - ideações
suicidas e até mesmo violentas em relação a outras pessoas. Ao longo dos grupos de
ouvidores, das experiências compartilhadas e da reprodução da voz interna (narrativa), esses
ouvidores constroem interpretações - a partir de investigações conscientes e inconscientes -
que acalentam o sintoma do “ouvir vozes”.

Nota-se que há uma marca forte da experiência de internação, da interferência religiosa, dos
preconceitos, das explicações mágicas até mesmo demoníacas.

A partir das concepções trazidas por Paul Baker (2009), evidencia que as pessoas
constroem significados diferentes para suas vivências, discorrem sobre que o HVM sugere
seis pressupostos fundamentais sobre a audição de vozes: (1) qualquer pessoa pode vivenciar
este fenômeno, visto que ouvir vozes está ligado à natureza do ser humano; (2) a aceitação aos
diversos sentidos dados às vozes é necessária, e está intimamente ligada ao sucesso do
processo de recovery; (3) Apropriação da experiência, bem como ampliar a compreensão dos
sentidos atribuídos às vozes, são aspectos importantes para o ouvidor; (4) A audição de vozes
precisa ser vista dentro dos contextos vivenciais; (5) Desenvolver aceitação das vozes é mais
útil do que tentar eliminá-las; (6) Grupos de suporte entre pares auxiliam na construção de
estratégias de lidar com as vozes e na atribuição de sentidos, bem como o empoderamento dos
ouvidores (Baker, 2009). Evidencia-se, neste sentido, que criar um vínculo entre especialistas
pela experiência (ouvidores de vozes) e os especialistas pela profissão, seria o modo mais
fidedigno de compreender e manejar tais vivências, promovendo respeito, direitos humanos,
dignidade aos que ouvem vozes e conhecimento aos profissionais e familiares dos ouvidores.
Os autores seguem esclarecendo que o problema mais significativo não está em ouvir vozes,
mas no relacionamento que os sujeitos estabelecem com suas vozes, bem como, a força e
influência que estas têm sobre eles (Corradi-Webster et al., 2021).

O suporte entre pares tomou forma de movimento social advindo do HVM,


implementado e desenvolvido especialmente por pessoas inseridas no contexto de saúde
mental e comunitária. Este manejo tem como objetivo principal preparar pessoas que vivem
em sofrimento psíquico, para que estas sejam protagonistas de seu próprio cuidado (Corstens
et al., 2014).
Reabilitação psicossocial

De acordo com Hirdes e Kantorski (2004), a reabilitação psicossocial constitui um


processo que facilita a oportunidade a indivíduos (prejudicados, inválidos ou com desordem
mental) de melhorar suas competências através da introdução de mudanças ambientais,
visando ao alcance de uma vida com a melhor qualidade possível. Envolve princípios,
objetivos, valores e modos de organizar serviços e métodos voltados à prevenção/redução das
desabilidades associadas à desordens mentais e de comportamento e “é particularmente útil
para ser empregada em cuidado na comunidade, ainda que a maioria de suas técnicas e
terminologias seja de alguma maneira associada ao cuidado hospitalar. Isto se deve ao fato de
ter sido inicialmente praticada no asilo, em grandes hospitais mentais” (Hirdes e Kantorski,
2004, p. 217).

O processo de reabilitação psicossocial é complexo, pois necessita da articulação de


várias instâncias, políticas específicas e capacitação técnica dos profissionais e se reflete na
concretude das ações dos trabalhadores em saúde mental. O interesse pela reabilitação
psicossocial surge no contexto da reforma psiquiátrica devido à três fatores: diminuição dos
pacientes internados em hospitais psiquiátricos, a partir dos anos 60 em todo o mundo;
demandas dos pacientes ainda hospitalizados e crescimento dos direitos dos doentes mentais;
e evolução dos conhecimentos psiquiátricos, incluindo as intervenções da farmacologia e da
psicoterapia (Hirdes a Kantorski, 2004).

A Reabilitação Psicossocial objetiva a redução de sintomas, redução de iatogeneria,


melhorar a competência social, reduzir a discriminação e estigma, fornecer apoio às famílias,
garantir apoio social, capacitar para autonomia (também no sentido de ajudar o cuidador; ter
um cuidador que aposte na autonomia do paciente). Além disso, visa à organização e
articulação dos serviços. Tem como estratégias importantes: mobilizar o tratamento
farmacológico, manutenção do uso contínuo de medicação, prevenção de recaídas,
treinamento de habilidades sociais e atividades básicas da vida diária - ABVD, que só podem
ser adquiridas se experienciadas. Destacamos ainda o apoio psicológico, atividades de lazer,
reabilitação profissional por meio de cooperativas e empresas sociais, visando a uma
possibilidade de renda própria, bem como trocas sociais e redes de apoio.

A reabilitação a partir do hospital psiquiátrico

Para Pratt et. al. (1999), apud Hirdes e Prado Kantorski (2004), o conceito de
recuperação representa um importante ganho em reabilitação psiquiátrica, pois, em função de
muitas condições serem de longa duração, os profissionais ou as pessoas com doenças
mentais não utilizavam a expressão cura: “Atualmente, o conceito e a importância de
recuperação de doenças mentais severas é aceito e reconhecido por muitos setores e
representa a promessa de esperança para o futuro. Ressalta-se que, para muitas condições,
recuperação significa cura.” (Hirdes e Prado Kantorski, 2004; p. 219).

Visa ajudar os pacientes a adquirirem seus papéis sociais na comunidade. É preciso


traçar os objetivos de vida singulares para cada usuário, como por exemplo objetivo,
habilidade e recursos para atingir determinados objetivos. É um trabalho complexo e precisa
construir objetivos segundo necessidades e desejos do usuário. Os valores e atitudes gerais da
equipe são fundamentais para a estrutura de serviços psicossociais. É uma tarefa conjunta,
porque o serviço precisa estar funcionando dentro de uma lógica dos serviços psicossociais.

Os impactos negativos são aqueles que causam disfunção e desvantagens sociais, ou


seja, não conseguir realizar determinadas tarefas e papéis ou mesmo preconceitos e pobreza.

Quanto à organização dos serviços, o usuário é capaz de descobrir seus pontos fortes,
suas habilidades e como potencializar isso dentro das comunidades.

Quanto aos profissionais da reabilitação, é necessário que estes trabalhadores


acreditem que todas as pessoas têm direito à reabilitação, por maior que sejam as disfunções.
Precisam acreditar na dignidade dos seres humanos, ter um certo grau de otimismo para
considerar a melhora e desenvolvimento dos usuários, assumindo o papel de mediador.
Eticamente, deve considerar as singularidades, cultura e vivências dos usuários.

A Reabilitação Psicossocial tem como princípios fundamentais: autonomia dos


serviços/individualização da atenção aos usuários, trabalho considerando escolhas e
diferenças dos desejos dos usuários, abordagem holísticas, trabalho com objetivos e valores
compartilhados.

Conclusão

Partindo da realização deste trabalho, da leitura dos textos e das palestras oferecidas
pela disciplina em questão, o que se pode perceber é que a “loucura” e o “louco” tiveram ao
longo do tempo diversos tratamentos, no entanto, o que marca essa temática é principalmente
a violência, a negligência e a exclusão. Tendo em vista essa problemática, as mudanças
resultantes ao longo da história, em especial, o movimento da reforma psiquiátrica, muda de
forma significativa a visão e a forma de tratamento de pessoas com transtornos mentais, ainda
que longe do ideal. O que se percebe é que há uma busca constante sobre quais os fatores
imprescindíveis para uma real reabilitação psicossocial. Esta, quando balizada também pelas
demandas e especificidades do paciente, aproxima-se de algo mais eficaz e humanizado.
Contudo, tal trabalho deve-se a diversos atores, sendo, além dos profissionais de saúde, os
direitos do paciente, participação da família e da comunidade, inclusive dos possíveis
empregadores.

Passaram-se séculos desde a primeira concepção do conceito de loucura e novos


conceitos e formas de intervenção foram sendo construídos, considerando contextos sociais e
políticos. Ainda que sejam considerados avanços em termos de intervenção de forma
humanizada, apontamos como necessária uma constante reflexão, a fim de que as abordagens,
tratamentos e intervenções sejam sempre atualizadas, considerando as demandas sociais,
etnográficas, políticas e, em especial, as subjetivas. Acreditamos que com os avanços
alcançados até aqui, ainda que estejamos longe de intervenções ideais, é possível pensar e
construir novas formas de intervir, a fim de oferecer melhor qualidade de vida às pessoas com
sofrimento mental.

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