Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Publicado em
14/01/2020
Borges seria então o elo para que outro argentino, Julio Cortázar, fizesse, para
Abreu, a ponte entre a literatura e outras expressões artísticas. “Com o Cortázar,
comecei a apreciar artes plásticas, o surrealismo, ouvir jazz.”
A influência de Cortázar foi tamanha, que Abreu, a exemplo do que faria com
Leminski em Vida, levou a sua experiência de leitura da obra do contista
argentino para os palcos. Volta ao dia foi a primeira encenação da Companhia
Brasileira de Teatro, em 2002, e discute temas recorrentes na obra de Cortázar,
como liberdade e sonho. O título da peça faz referência a Volta ao dia em 80
mundos, um livro inclassificável do escritor argentino. “Um dia li uma frase no
conto 'O perseguidor', que é uma homenagem libertária que o Cortázar faz ao
pássaro do jazz Charlie Parker, e achei que devesse insistir na leitura da sua
obra. Era 1999, e não foi nada difícil. Eu estava justamente encenando Adeus,
Robinson!, um texto radiofônico do próprio Julio Cortázar. O ensejo da montagem
foi um estímulo e, desde então, quase que diariamente, convivo com o
imaginário torto, livre e assustadoramente real dos seus textos.”
Leitor caótico, o diretor diz que sempre foi pautado pelas referências que
encontrava nos autores prediletos. Assim como Borges o levou a Cortázar, o
autor de O jogo da amarelinha o levou a Clarice Lispector, William Faulkner e
Anton Tchecov, que se mostrou uma descoberta tão fascinante quanto foi a de
Cortázar. Além da obra em prosa, que Abreu considera “uma fonte inesgotável
de sabedoria literária”, o autor russo, célebre pelos seus contos, leva vantagem
no cânone pessoal de Abreu por ser também um dramaturgo cuja obra ainda
ainda representa um desafio tanto para o público como para atores e diretores.
Com uma rotina de leituras profissionais bastante intensa, Abreu admite que não
consegue acompanhar tudo que o mercado editorial brasileiro produz hoje, mas
que está sempre “ligado”. Mas diz que segue alguns escritores, como o angolano
Gonçalo M. Tavares. “Tenho hoje uma quantidade muito grande de leitura
profissional, então o deleite fica sempre comprometido. Não consigo ler tudo o
que sai assim, no calor da hora, mas a literatura está em 100 % do que faço no
teatro, e sou muito grato a ela por isso.”