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A substituição de casas populares

de alvenaria, feitas pelo governo


federal, por casas containers:
uma medida possível

Luiz Felipe de Lima


Faculdades Integradas Teresa D’Ávila – FATEA
feliplima22@gmail.com

José Wilson de Jesus Silva


Faculdades Integradas Teresa D’Ávila – FATEA
jwjsilva@gmail.com

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RESUMO

Para resolver o problema do déficit habitacional, o governo adotou técnicas de construção


de casas populares em larga escala com o menor custo possível, que resultou em mora-
dias desumanas e de baixa qualidade. Estas são construídas com princípios projetivos
semelhantes para qualquer tipo de região, tendo um programa de necessidades fixo,
o que resulta em edificações com uma arquitetura não humanizada, que se preocupa
mais com o retorno financeiro do que com o conforto de seu usuário. A fim de se obter
habitações populares mais humanizadas e que consigam trazer uma maior qualidade
de vida aos seus usuários, este trabalho se resume em estudar em quais possibilidades é
possível haver a substituição do sistema construtivo de alvenaria, por casas de container
e garantir construções humanizadas. Para isso foi desenvolvida uma tabela com vários
aspectos de viabilidade que foram analisados por meio de pesquisa bibliográfica, além de
um projeto arquitetônico simples desenvolvido no software de modelagem 3D Sketchup
que serviu de parâmetro para análise da viabilidade da substituição de casas de alvenaria
por casas containers, que se mostrou viável apenas em cidades portuárias, ou em cidades
próximas à região de portos.

PALAVRAS-CHAVE:
Déficit Habitacional; Habitação de Interesse Social; Casa Container; Arquitetura.

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ABSTRACT

In order to solve the problem of housing shortage, the government has adopted tech-
niques of affordable housing construction on a large scale at the lowest possible cost,
which resulted in inhuman housing and low quality, they are built with similar projective
principles for any type of region and a fixed program of needs which results in buildings
with non-humanized architecture, which is more concerned with the financial return than
the comfort of the user. In order to obtain affordable housing and more humanized and
that can bring a higher quality of life for their users, this work comes down to study at
what possibilities there may be replacing the masonry construction system for container
houses and ensure humane buildings. Thus, it was developed a table with various aspects
of viability that were analyzed by means of literature, also a simple architectural design
developed in 3d sketchup modeling software which served as a parameter to analyze the
viability of replacing brick houses by container-house which proved to be feasible only
in port towns, or in town close to harbor areas.

KEY-WORDS:
Housing Deficit; Housing Social Interest; Container house; Architecture.

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1. INTRODUÇÃO

Desde o início do Programa de Aceleração e Crescimento – PAC (em janeiro de 2007),


desenvolvido pelo Governo Federal, obteve-se no Brasil um crescimento exponencial no
setor habitacional. Esse crescimento deu-se principalmente pelo conjunto de políticas
que favoreceu o planejamento e execução de obras públicas relacionadas à infraestrutura,
saneamento, habitação, transporte, energia e recursos hídricos, com o objetivo de acelerar
o crescimento econômico brasileiro.
No contexto habitacional, o país retomou a prática da construção de Habitações de
Interesse Social (HIS) (que já era adotada nos programas para a população mais carente
desde o extinto Banco Nacional da Habitação- BNH). Um dos principais promotores das
HIS no Brasil tem sido o Programa “Minha Casa, Minha Vida” (MCMV) lançado em
2009 pelo Governo Federal no contexto do PAC, e que já entregou cerca de dois milhões
de moradias para a população de baixa renda.
Embora o MCMV tenha sido uma medida importante na intenção de implantar
políticas públicas que garantam o direito à moradia, o programa apresenta uma série de
deficiências, entre as quais podemos citar a baixa qualidade arquitetônica das habitações
“oferecidas” à população, que é baseada em uma produção padronizada e em larga escala
de tipologias habitacionais com o mesmo programa arquitetônico (sala, cozinha, banheiro
e dois dormitórios), fora das realidades locais, com má inserção no espaço urbano e isolada
da cidade. Além disso, essas habitações não são sustentáveis, visto que as características
físicas dos terrenos e suas condições bioclimáticas não são levadas em consideração. Essas
carências demonstram existir um déficit qualitativo no MCMV.
Sabe-se que sem habitação de qualidade é impossível ter-se uma vida digna. Um
país só consegue se desenvolver quando sua população reside em moradias de qualidade,
visto que a habitação interfere em outras áreas da vida do homem, por exemplo, a saúde.
Pessoas que residem em casas com pouca iluminação ou ventilação natural tendem a
sofrer mais com doenças relacionadas à falta desses atributos.
Sendo assim, nessa pesquisa buscou-se desenvolver possibilidades para minimizar
o déficit qualitativo do MCMV e englobar novas práticas sustentáveis às HIS. Para tanto,
este projeto teve como objetivo estudar a viabilidade de haver a substituição de sistemas
construtivos convencionais (como o de alvenaria) por sistemas construtivos inovadores
(como steel frame e o container) a fim de melhorar a qualidade das HIS, tornando-as
mais humanas e sustentáveis.
Com isso, espera-se possibilitar que esses novos sistemas construtivos ganhem mais
espaço e abrangência no cenário nacional, de forma a gerar mais empregos para a população
brasileira, e contribuir para o desenvolvimento socioespacial e socioeconômico do Brasil.
O estudo de viabilidade será desenvolvido por meio de pesquisa bibliográfica

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realizada pela leitura de obras de autores renomados e especialistas no âmbito da
arquitetura. Os dados estarão em uma tabela que servirá de base para a análise posterior.
Como complemento, será desenvolvido um projeto simples de arquitetura de uma
casa container, desenvolvido no software de modelagem 3D Sketchup. Como resultado,
espera-se ter uma tabela com dados de viabilidade e o projeto arquitetônico de uma casa
container que servirá de parâmetro para provar a viabilidade de substituição de casas de
alvenaria por casas containers.
Por ser um tema abrangente, o projeto apresenta grande relevância no cenário
nacional, visto que produzir habitações de qualidade para a população de baixa renda
pode, direta ou indiretamente, contribuir para o desenvolvimento do Brasil. Outro ponto
a ressaltar é que o projeto é de grande interesse acadêmico, pois desenvolver novos estudos
que possibilitem melhorar a qualidade das HIS é de extrema importância, já que eles
podem servir de referências para outros trabalhos, visto que esse tema está em voga nos
encontros acadêmicos e na mídia brasileira.
Além disso, o trabalho se relaciona com o grupo de pesquisa, visto que ambos têm
por objetivo procurar novos materiais e técnicas que possam ser aplicadas nos processos
construtivos, a fim de aumentar o desempenho sem abrir mão da sustentabilidade.

REFERENCIAL TEÓRICO
2.1. Moradia: Necessidade do Ser Humano

Desde os primórdios de sua história, o homem cria abrigos para se proteger dos
perigos e intempéries, como qualquer outro animal. Embora os animais construam sempre
o mesmo tipo de abrigo com os mesmos materiais, o homem vem evoluindo sua forma de
construção (seja com técnicas ou materiais diferentes), e atualmente possuímos abrigos
das mais variadas formas.
Entretanto, de acordo com Penzim (2001) “Moradia [...] É muito mais que lugar do
abrigo, é lugar de constituição da vida, revelando-a em suas múltiplas dimensões.” A casa
é um espaço privilegiado para o ser humano. “Habitat é lugar de vida. Não sem razão
utiliza-se com frequência o verbo viver no sentido de habitar. Não há como viver sem que se
ocupe um espaço” (PENZIM, 2001, p.01). Moradia é uma necessidade para o ser humano.
A habitação é entendida como um direito humano de necessidade básica (LIMA,
2011). Condições de moradia adequadas são identificadas na Declaração Universal de
Direitos Humanos de 1948 como um direito inerente ao ser humano, afetando diretamente
sua qualidade de vida.

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O artigo 6º da Constituição Brasileira (1998) apresenta a moradia dentro do
conjunto de direitos sociais e acrescenta, ainda, no artigo 7º, inciso IV, que o
salário mínimo recebido seja capaz de atender suas necessidades vitais básicas
incluindo, dentre outras, novamente o direito à moradia. Com isso, fica evidente
que a questão da habitação é fundamental. Além de ser um direito básico de
qualquer ser humano, é identificada como uma das prioridades a serem tratadas
pelo Estado. (LIMA, 2011, p. 02)

No entanto, mesmo a casa sendo sinônimo de vida, há ainda pessoas que vivem
sem as condições mínimas necessárias para que o local seja considerado uma habitação.
Montoia (2010, p. 34) diz que “De acordo com os dados da Organização das Nações Unidas
(ONU), um em cada três moradores de cidades nos países em desenvolvimento mora em
bairros pobres ou miseráveis”.
As “moradias” de tais bairros (pobres ou miseráveis) são extremamente precárias, já
que carecem de condições básicas para a qualidade mínima de vida, como falta de água
encanada, energia elétrica e/ou esgotamento sanitário. Além disso, casas nessas condições
agravam a transmissão de doenças, a escassez e contaminação de água, poluição ambiental
e aquecimento global, sem contar os problemas que já são enfrentados pela população
desses bairros, como a fome, pobreza, criminalidade e violência social.
Outro fator que contribui para a falta de qualidade de vida desses moradores é a
alta densidade populacional em uma única residência (que geralmente são em metragens
enxutas), o que resulta na utilização de um mesmo cômodo para a realização de várias
atividades como cozinhar, dormir, estudar e passar roupa. Atividades que exigem
determinado nível de concentração (como fazer lições de casa) ficam comprometidas
pela falta de privacidade.
É preciso morar dignamente para que se possa ter uma vida com qualidade.
Contudo em uma sociedade em que a desigualdade socioespacial se faz presente no
cotidiano das cidades brasileiras, surge a seguinte interrogação:

Como podem os pais, mais frequentemente a mãe sozinha, favelada ou encortiçada,


matricular seus filhos na escola, seguir-lhes as lições ou organizar-se para vaciná-los
na data certa quando vivem todos amontoados num barraco?[...] Como pode a
criança sem casa nem mesa apropriada fazer as lições [...] ou motivar-se para ler?
(CHERKEZIAN e BOLAFFI,1998, p.128)

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2.2.O DÉFICIT HABITACIONAL BRASILEIRO

Ao analisar tais problemas de moradia concluímos que o déficit habitacional é um


problema frequente no Brasil, ele é subdividido em dois tipos: o déficit quantitativo, que
seria a quantidade de unidades que precisam ser construídas para atender à demanda
geográfica e o outro é o déficit qualitativo que representa a quantidade de unidades
habitacionais consideradas inadequadas pela falta de infraestrutura, localização precária
ou pelo excesso de pessoas (CIB & UNEP, 2002).
Na tentativa de encaminhar soluções para esse problema (principalmente ao déficit
quantitativo), uma das medidas tomadas pelo Governo ao considerar a questão da falta de
moradia e da existência de habitações precárias, foi a construção de conjuntos habitacionais
ou casas populares pelos Estados. Oliveira et al. (2004) afirma que:

Tal produção se dá num contexto condicionado por dois fatores: construção


em grande escala e ao menor custo possível. As habitações assim produzidas
são “vendidas” com prazos de pagamento de até 25 anos, não sendo, portanto, a
prestação a fonte de sustentação financeira do sistema e nem elemento de pressão
para a melhoria da qualidade (OLIVEIRA et al., 2004, p. 01).

Os projetos dessas habitações são baseados em princípios projetivos semelhantes para


qualquer tipo de região. Assim uma casa que é construída no sul do Brasil é a mesma para
o nordeste brasileiro (desconsiderando o clima de cada local), e o programa arquitetônico
é fixo, ou seja, uma casa com o mesmo número de cômodos tanto para uma família de
três, quanto para outra de sete membros.
O critério de projeto que prevalece é baseado na padronização das habitações. Além
disso, nota-se a falta da aplicação dos padrões qualitativos associados à humanização da
arquitetura nos conjuntos habitacionais (KOWALTOWSKI, et al., 2006).
Kowaltowski et al. (2006) reforça ainda que:

Descrições dos conjuntos habitacionais típicos e casas populares encontradas


no Brasil incluem elementos de uma arquitetura não humanizada, como a
monumentalidade, a alta densidade de ocupação, a falta de um paisagismo
e de acuidade estética no uso excessivo de objetos artificiais e preocupação
desmedida com a segurança em oposição à proteção. A monotonia do espaço,
das cores e dos detalhes é um elemento arquitetônico que também corrobora
nesse sentido, prevalecendo ainda à falta de manutenção dos edifícios e terrenos
(KOWALTOWSKI et al., 2006, p.133)

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Em resposta a esse déficit habitacional, tanto quantitativo como principalmente
qualitativo, a reutilização de containers para uso residencial se apresenta como tendência
no cenário da arquitetura contemporânea mundial.

2.3. ARQUITETURA EM CONTAINERS

A arquitetura, entendida tradicionalmente como a arte/ciência de planejar e construir


o habitat artificial do homem, sempre foi pensada a partir de princípios fundamentais da
Tríade de Vitrúvio (ZOMER, 2009) que englobavam elementos como a estaticidade, a
estabilidade e a durabilidade. Zomer (2009) afirma que:

As vertiginosas mudanças econômicas, sociais e culturais da nossa época solicitam


novas alternativas de planejamento espacial fundamentadas em princípios
diretamente opostas àquelas anteriormente vigentes, como a mobilidade, a
flexibilidade, a instabilidade, a mutabilidade, a instantaneidade, a efemeridade e
a reciclagem, alterando assim o espaço da moradia que se tem transformado ao
longo do tempo, contribuindo para a produção de diferentes modos de ser e existir
no mundo, ao mesmo tempo em que se produz a partir das vicissitudes da própria
existência (FERRARO, 2009 apud ZOMER, 2009, p. 03).

Essa premissa vem sendo confirmada com novos modelos para a construção de
moradias, entre eles as casas-containers, que “refletem uma mudança de comportamento
da sociedade, pois assumem um papel prático na vida dos indivíduos, seja por causa da
mobilidade, do preço ou das constantes catástrofes naturais” (MILANEZE et al., 2012,
p.618). Além disso:

Na arquitetura e engenharia as casas-containers vêm conquistando espaço como


habitação em vários países. Além do fator ambiental, possivelmente o proprietário
poderá usufruir de um espaço para moradia, em pouco tempo e com alto índice de
estética e conforto. Podem-se encontrar trabalhos realizados com containers, que
mostram ser possível tornar uma velha caixa de metal em sofisticadas e modernas
habitações. (MILANEZE et al., 2012, p.617)

O container surgiu na cidade de Nova York, nos Estados Unidos, em 1937, criado
por Malcom Mc Lean, que era proprietário de uma pequena empresa de caminhões e
queria uma forma de transportar as mercadorias de forma mais rápida e segura, criou
assim o container que com o passar do tempo passou por várias padronizações e é usado
internacionalmente até os dias de hoje.

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Depois de usados por longos períodos de tempo, em dez anos em média, os
containers são nacionalizados, ou seja, é feita a baixa de seu registro de origem e
descarte em qualquer país do mundo. Neste estado não podem mais transportar
mercadorias, pois acabam virando sucatas. (BIANCONI, DEMÉTRIO e PICCOLI,
2012, p. 12)

Assim, precisam de um descarte correto (o que na maioria das vezes não acontece)
“já que são produzidos a partir de materiais metálicos e não biodegradáveis, o que os torna
um grande problema, pois formam montanhas de lixo no contexto urbano das cidades
portuárias.” (MILANEZE et al., 2012, p.616)
Usá-los na construção de moradias, é uma forma de reaproveitar este material, que
além de ser mais sustentável, pode ser econômico. Construções com containers duram até
90 anos e, além disso, tornam-se mais vantajosas na relação da questão custo-benefício,
do que os materiais usados tradicionalmente para edificar uma casa.

2.4. O USO DE CONTAINERS NAS HABITAÇÕES DE INTERESSE


SOCIAL

Aguirre, Oliveira e Brito Correa (2008) destacam que:

Em um país de dimensões continentais, nossa região apresenta características que


a torna singular; não só nosso clima é diferente, mas também a maneira como
vivemos e percebemos o espaço que nos diferencia do restante do país. Estas
questões, raríssimas vezes, são levadas em conta no momento de se fazer um projeto
de habitação social. Normalmente questões como quantidades de habitações e
valores monetários são colocadas acima de aspectos de adequação da proposta,
fator decisivo que faz com que a maioria dos projetos sofra alterações assim que
são concluídas as obras (AGUIRRE, OLIVEIRA e BRITO CORREA, 2008 p. 01)

“Um dos maiores atrativos da utilização de containers para fins de habitação é a


possibilidade de futuros deslocamentos e a possibilidade de modificações na unidade
habitacional atendendo à demanda por flexibilidade na arquitetura.” (AGUIRRE,
OLIVEIRA e BRITO CORREA, 2008, p.04).
Para Alfonsim e Fernandes (2003), a habitação desempenha três diferentes funções:
Função Social - abrigo da família, base para o seu desenvolvimento; Função Ambiental
- inserção no ambiente urbano com garantia da qualidade do espaço construído e
Função Econômica - novas oportunidades de geração de emprego e renda, além da
profissionalização.

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A ideia de casa-container corrobora as definições de Alfonsim e Fernandes, “A
Habitação de Interesse Social projetada a partir do uso de containers reciclados se mostra
adequada para o propósito habitacional com valores sustentáveis”. (AGUIRRE, OLIVEIRA
e BRITO CORREA, 2008, p. 08).

2.5 QUESTÕES AMBIENTAIS ENVOLVIDAS NO PROJETO COM


CONTAINERS

De acordo com Tavares (2010), “desenvolvimento sustentável é o que atende às


necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das futuras gerações de
atenderem às suas próprias necessidades”. Projetar com Containers comprova ser uma
alternativa altamente sustentável para construção de moradias. Entre as inúmeras
justificativas podemos citar:
A economia de água na obra. Embora a água não seja vista e nem tratada como
material de construção, o consumo é bastante elevado, de acordo com a Revista
Sustentabilidade. Para a confecção de um metro cúbico de concreto, se gasta em média de
160 a 200 litros e, na compactação de um metro cúbico de aterro, podem ser consumidos
até 300 litros de água, o que não acontece em obras com container.
Além disso, reutilizar um material nobre descartável (como o container) proporciona
economia de recursos naturais que não foram utilizados na construção da casa: areia,
tijolo, cimento, água, ferro etc (MILANEZE et al. 2012). Isso gera uma obra mais limpa,
com redução de entulho.
Outro fator que o torna sustentável é a sua durabilidade, por ser uma estrutura
projetada para resistir às piores condições climáticas (frio e calor), além de resistência à
água salgada, fortes ventos e tempestades. Pode durar mais de 90 anos.
A impermeabilização máxima do terreno (15%) também entra na lista, já que mais
de 85% do terreno fica permeável, contribuindo para absorção da água das chuvas, além
de preservar o solo e o lençol freático.
O container também consegue agregar ao projeto várias técnicas sustentáveis como
captação da água da chuva, adoção de telhados verdes, e inovações tecnológicas que tragam
mais conforto térmico para a habitação, como o Isoft (isolante térmico) feito de garrafa PET.

3. MATERIAL E MÉTODOS

A metodologia deste trabalho foi dividida em três fases. A primeira etapa consistiu-
se em levantar o referencial teórico, que foi feito por meio de levantamento bibliográfico

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em fontes relacionadas ao tema, foram colhidas detalhadamente informações sobre a
arquitetura em container, desde a aquisição do produto até a sua finalização em uma casa,
neste processo verificou-se em quais casos esse tipo de construção se torna viável, custos,
técnicas, novas tecnologias sustentáveis que poderiam ser aplicadas nessas casas, entre
outras informações consideradas convenientes. Essa etapa se encerrou com estudos de
casos em obras que utilizaram o container como principal matéria prima.
Após essa fase foi elaborada uma tabela com vários aspectos de viabilidade, que
foram analisados de acordo com as informações do referencial teórico. Como transição
para a última etapa foi feita uma visita técnica a uma casa container durante a mostra
de Arquitetura e Decoração “Casa Cor SP”. Posteriormente foi desenvolvido um Projeto
Arquitetônico para moradias de interesse social, usando o container como matéria prima.
Esse projeto foi desenvolvido com o software de modelagem 3D Sketchup e servirá como
um parâmetro de moradia de interesse social de qualidade.

4. RESULTADOS OBTIDOS

Para saber se a substituição de casas de alvenaria por casas containers é tecnicamente


viável, desenvolveu-se um estudo para analisar viabilidade da implantação desse novo
sistema construtivo para HIS no Brasil. Os resultados são encontrados na tabela 01.

Tabela 1: Análise dos Aspectos de Viabilidade.

Aspecto É viável? Por quê?


Já existem diversas edificações de container espalhadas pelo
mundo. Além disso, há certa facilidade em adquirir o container,
já que no Brasil existem diversas empresas que oferecem esse
tipo de serviço. Outro fator importante está na flexibilidade
com transporte das unidades, que de acordo com Romano, De
Técnico Sim Paris e Neuenfeldt Júnior (2014) “Pode ser realizado por navio,
caminhão, helicóptero ou o avião, sendo opcional o carregamento
do container montado ou desmontado em peças” (ROMANO,
DE PARIS e NEUENFELDT JÚNIOR, 2014, p. 86). Com relação
à adaptação do container para a arquitetura, os cortes exigem
mão de obra especializada.

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O projeto se mostra também financeiramente viável, Sotello
(2012) explica que uma casa feita com dois containers de 40
pés (cerca de 60 m²), com dois quartos, dois banheiros, sala e
cozinha tem um preço médio por metro quadrado de R$ 396,00
S i m ( c o m (sem acabamentos) e R$ 950,00 (com acabamentos). Calculando
Financeiro a l g u m a s o custo total com o preço do metro quadrado sem acabamentos,
restrições) a moradia teria um custo de cerca de R$ 23.000,00. Além disso,
outro fator considerável está na economia com as fundações (que
geralmente aumentam o custo total da obra) e nas ferragens.
Alguns sites especializados no assunto afirmam que a economia
pode chegar até 30% em relação a uma casa de alvenaria.
Um fator extremamente importante é a adaptação do container
com relação ao clima específico, que permite uma série de
adaptações, a fim de aproveitar as condições ambientais locais,
Geográfico Sim potencializando ou minimizando fatores naturais (como
insolação e ventilação) que podem maximizar o conforto térmico
das edificações. Além disso, casas container acabam por reforçar
a cultura do espaço onde estão instaladas, intensificando as
características de cidades portuárias.
Talvez seja esse o principal fator que aumenta a viabilidade desse
tipo de construção. Sotelo (2012) afirma que uma casa feita com
S i m ( c o m dois containers de 40 pés (cerca de 60 m²), com dois quartos, dois
Tempo a l g u m a s banheiros, sala e cozinha pode ser montada em sete dias. As casas
condições) containers se mostram úteis nesse quesito, por exemplo, para
áreas que sofreram algum tipo de desastre natural e que tenham
pressa em reconstruir moradias para sua população.
Embora não exista uma lei regulamentadora para a construção
de casas containers, de acordo com a Revista Téchne
(2015) é importante seguir algumas das Normas Brasileiras
Regulamentadoras. As casas-contêiner devem atender a todos os
Jurídico Parcialmente critérios da Norma de Desempenho NBR 15.575:2013, da mesma
forma que uma casa ou prédio de apartamentos erguidos com
sistemas convencionais ou inovadores. A casa-contêiner também
requer uma manutenção preventiva que atenda ao Manual de
Uso, Operação e Manutenção em conformidade com a NBR
14.037, procedendo-se à gestão da manutenção de acordo com
a NBR 5.674.
Fonte: O autor, 2015.

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É importante ressaltar que na substituição de casas de alvenaria por casas containers,
existem alguns pontos a serem pensados, a começar do principal quesito que é a localização,
já que a aquisição do container só torna-se vantajosa quando as localidades são próximas
às cidades portuárias, devido ao custo reduzido de transporte. Assim a substituição só
seria viável nas cidades que possuem portos ou nas cidades próximas a elas, restringindo
o projeto para outras áreas do Brasil.
Na Figura 1, são ilustrados os principais portos brasileiros com depósitos de
containers, onde provavelmente seriam instaladas as HIS feitas de containers.

Figura 1. Fonte: ANTAQ. Anuário estatístico de 2007. Agência Nacional De Transportes


Aquaviários, 2012. Disponível em: <http://www.antaq.gov.br/portal/Anuarios/Portuario2007/
Index.htm>. Acesso em: 24/02/2015.

Outro fator importante a ser levado em consideração é que por se tratar de uma
construção pouco usual, pode enfrentar problemas em algumas cidades. Contudo os alvarás
e licenças para uma construção de container são os mesmos exigidos por construções de
alvenaria, obtidos junto à Prefeitura.

5. CONCLUSÃO

A moradia é uma necessidade básica do ser humano, sem ela é impossível ter-se
uma vida digna. Oferecer possibilidades para suprir o déficit habitacional de uma região
é responsabilidade do Estado, que para isso concede moradias populares ou conjuntos

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habitacionais (que na maioria das vezes são de baixa qualidade arquitetônica) para a
população de baixa renda.
Nesse contexto, a casa container se mostra uma alternativa altamente viável para
minimizar o déficit qualitativo dos Programas Habitacionais do Governo Federal, visto
que esse sistema construtivo exige a participação de profissionais capacitados, o que pode
aumentar a qualidade das habitações.
Além disso, a construção com containers é uma alternativa sustentável, pois
possibilita a reutilização de um material nobre e a economia de recursos naturais, além
da adoção de técnicas sustentáveis como telhado verde, placas solares e reutilização de
água ao projeto. Porém, é importante ressaltar que a adoção de casas containers pelo
Governo é uma possibilidade de complemento e não uma forma única de construção de
casas populares. Outro ponto importante é que a casa container se mostra viável como
moradia popular apenas em regiões portuárias ou em cidades próximas a portos, já que
o transporte do container pode encarecer o custo final do projeto.
Como complemento deste trabalho, é indicação de que haja um levantamento de
informações técnicas importantes para a elaboração de normas regulamentadoras para
a construção de habitações em containers, além de produtos que consigam maximizar o
tempo útil da estrutura do container.

REFERÊNCIAS

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