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no Enfrentamento
à Violência
CONTRA MULHER
4
Homens na
Sociedade Ocidental
os impactos produzidos
pelas mudanças nas
relações de gênero
Rose Marques
Kevin Batista
Hugo Dantas
50 FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA
UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE
SUMÁRIO
Introdução 52
1. Gênero e transformação
das representações sociais 55
2. Mídia, masculinidade e violência 58
Referências 63
52 FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA
UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE
INTRODUÇÃO
S
e você chegou até aqui, é prová- reflexão sobre a construção da masculini-
vel que já tenha refletido sobre dade”. Neste vídeo você encontra uma sé-
como educamos nossos filhos, rie de entrevistas e falas que estimulam
sobre as masculinidades que a reflexão sobre o que pode ser um ho-
são legitimadas socialmente e tantas ou- mem, enfatizando a pluralidade das mas-
tras inquietações. Você, sendo homem, já culinidades e suas construções ao longo
parou para pensar sobre suas atitudes e/ da história de brasileiros e brasileiras.
ou omissões no exercício dessas masculi- Nas próximas páginas, você será convi-
nidades? E você, mulher, como tem perce- dada/convidado a pensar sobre a constru-
bido a construção dessas masculinidades ção dessas masculinidades no Ocidente e
no cenário em que vive? como as mudanças nas relações de gênero A masculinidade
A história nos conta a imagem de um mobilizam o questionamento da masculi- hegemônica
É um referencial estático
homem necessariamente provedor, chefe nidade hegemônica (branca, heterosse- sobre “ser homem”.
e ativo. Aliás, a atividade é colocada sem- xual e dominante) e a visibilidade e a pro- Incorpora a ideia de
pre como um atributo essencial do mascu- dução de outras e novas masculinidades. “honra” de ser homem
lino/homem, pois “homem de verdade” é A imagem do homem na sociedade e defende que todos os
aquele que nada teme, nem mesmo usar a ocidental passa da lógica de guerra à ló- homens devem tê-la
como ideal. Segundo
força para exercer seu poder. Mas, afinal, gica capitalista. Desloca-se da Era Medie- esse referencial, os
o que é ser homem em nossa sociedade? val e a defesa do rei por meio da paixão, homens são superiores
Até aqui, você também pôde acessar da violência e da crueldade, atravessan- às mulheres e o homem
algumas perguntas e outras respostas do as formas violentas de defesa da hon- branco, cisgênero,
sobre homens, masculinidades e como ra da família e da Nação pelos duelos, heterossexual, urbano
e de classe média
eles são construídos na sociedade. Para para, enfim, chegar à imagem de homem
está em um patamar
saber mais como essa construção acon- moderno que sabe usar da polidez e do maior na hierarquia
tece aqui, no Brasil, você pode assistir ao cavalheirismo. Esse último serviria ao Es- social (CONNELL;
documentário “O que te torna viril? Uma tado, à família e ao trabalho. MESSERSCHMIDT, 2013).
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no Enfrentamento à Violência CONTRA MULHER
#FICAADICA
• Assista a “O que te torna viril?
Uma reflexão sobre a construção
da masculinidade”.
Disponível em: https://www.youtube.
com/watch?v=znQaRkcNblg&t=70s
• Veja o documentário
“O silêncio dos homens” (2019).
Disponível em: https://
www.youtube.com/
watch?v=NRom49UVXCE&t=2768s
• “Precisamos falar com os
homens? / Do we need to talk
to men?: uma jornada pela
igualdade de gênero” (2017)
Disponível em: https://www.youtube.
com/watch?v=jyKxmACaS5Q&t=2354s
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UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE
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GÊNERO E TRANSFORMAÇÃO
DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
O
s mesmos questionamentos As representações sociais de mulheres
que lhe trouxeram até este tex- e homens foram construídas a partir dessa
to têm afetado muitas outras divisão entre papéis de homens e papéis de
pessoas para um grande movi- mulheres. Esses papéis são determinados
mento de mudança. Não é mais admissível social e historicamente, sendo os papéis de
viver numa sociedade estruturada pelas cuidado e reprodução atributos considera-
desigualdades de gênero, com ampla tole- dos “naturais” das mulheres, e os papéis
rância às violências contra mulheres. Mas de liderança, produção, trabalho e supri-
você sabe o que é gênero? Provavelmente já mento são “essencialmente” dos homens.
ouviu alguma explicação abstrata ou mes- Essas fronteiras de gênero, em que um lado
mo restrita ao sexo biológico e noções de é a dominação e o outro é a subordinação,
“masculino” e “feminino”. Mas gênero é, so- alimentam a existência de um ideal de fa-
bretudo, um jeito de pensar e ver o mundo, mília nuclear, heterossexual e monogâmi-
sempre considerando a forma como os in- ca, que é considerado o núcleo central da
divíduos são afetados a partir de suas iden- sociedade. Tal modelo de família é patriar-
tidades, performances e construção social. cal, herança da colonização.
Gênero também é uma categoria de aná-
lise, como sustentam algumas autoras fe-
ministas, podendo ainda ser entendido de
muitas outras formas. É possível aprofun-
dar essa leitura a partir das referências ao
fim do texto e também assistindo ao vídeo
“Vulnerabilidade social, gênero e masculini-
dades: leituras interseccionais”, produzido
pelo Núcleo Feminista de Pesquisas em Gê-
nero e Masculinidades (Gema), da Universi-
dade Federal de Pernambuco (UFPE).
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2
MÍDIA, MASCULINIDADE
E VIOLÊNCIA
O
“homem ocidental” tem a es- A família já foi abordada no primeiro
cola, as mídias e a família pa- tópico como espaço de pedagogia da vio-
triarcal como pilares para sua lência e subordinação. As pedagogias atra-
construção e sustentação. Es- vessam a família e se intensificam na esco-
ses âmbitos por séculos fundamentam e la. No período colonial, apenas os meninos
naturalizam a superioridade dos homens eram levados à escola para consolidação
sobre mulheres e crianças, enaltecendo as da moral colonial, princípios fundamentais
qualidades ditas “masculinas” como ide- da masculinidade hegemônica (branca,
ais e desejadas. Mas você já pensou sobre heterossexual, dominante). E por mais que
a base histórica deste edifício? atualmente a escola seja lugar de educação
Perceba que a estrutura colonial euro- para todas e todos, esse espaço reproduz,
peia impôs aos povos latino-americanos muitas vezes, a estrutura de dominação
e brasileiros modos, costumes e visões de masculina e subordinação das mulheres
mundo que sustentam a violência como desde meninos e meninas. Para ampliar
força da civilização e a violação do corpo esse diálogo sobre a escola, sugerimos a
das mulheres como sinônimo de povoa- playlist “Desafio da igualdade” no perfil da
mento. Neste processo de colonização, a Plan Internacional Brasil no YouTube.
oposição entre masculino e feminino con- Nesse contexto educacional, caracte-
tribuiu para uma cultura de exclusão das rísticas como dominação, protagonismo,
mulheres dos espaços públicos e das de- competitividade e liderança são algumas
cisões políticas, intensificando o sexismo, associações ao “universo masculino” es-
a misoginia e a homofobia. Isso signifi- timuladas, ao mesmo tempo, como cami-
ca, respectivamente, a discriminação das nhos de sucesso na vida adulta. Prepara-
mulheres por serem mulheres; o ódio e a -se o menino para se tornar o homem viril
aversão às mulheres; e a discriminação e a e de sucesso nos negócios.
aversão a homens “afeminados”, os quais Portanto, atrelar atributos ditos mascu-
se assemelham de alguma forma a carac- linos ao reconhecimento, sucesso e cresci-
terísticas femininas, pela forma de falar, mento profissional é um mecanismo que
de comportar-se ou de amar. sustenta os homens e as masculinidades
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no Enfrentamento à Violência CONTRA MULHER
VOCÊ
SABIA? em lugar de poder, tomada de decisão e pri-
Os mecanismos de homofobia e vilégios a partir de comportamentos como
sexismo são faces da mesma moeda agressividade, competitividade e arrogância.
do machismo. Para o pesquisador Enquanto isso, leveza, parceria e cooperação
Daniel Welzer-Lang (2001; 2004), eles são tidas por atitudes fracas, não cabem no
promovem a hierarquização entre empreendedorismo e no ramo comercial.
homens/homens, mulheres/mulheres Certamente você já deve ter ouvido a ex-
e homens/mulheres. São formas de pressão “mercado predatório”. Essa carac-
controle social que se exercem entre os terística exigiria dos trabalhadores (a priori,
homens desde os primeiros passos da homens) agressividade, coragem e violên-
educação masculina. Assim, para que o cia para sobreviver a essa “selva”. Um curta
homem seja valorizado, ele precisa ser Síndrome que expressa muito isso é o “Purl”, da Dis-
viril e demonstrar superioridade, de Burnout ney Pixar, também disponível no YouTube.
força e competitividade. Distúrbio Mas, então, você pode se perguntar:
psíquico “E esses comportamentos são negativos?
produzido
Qual é o problema de essas característi-
pela exaustão
extrema no cas masculinas serem estratégias dentro
âmbito do do mundo capitalista?”. Aqui é preciso
trabalho. parar e refletir. Por ser violenta e viola-
dora, essa masculinidade (hegemônica)
imposta e convocada pela sociedade é
danosa a todas e todos que estão em vol-
ta do homem, inclusive contra ele mesmo
(ZANELLO, 2020). São justamente esses
comportamentos que promovem assédio
moral e sexual no ambiente de trabalho,
produzem trabalhadores compulsivos
(workaholics) e Síndrome de Burnout.
Dentre os veículos de propagação,
imposição e convocação dessa mascu-
linidade danosa, estão as mídias. Desde
a invenção da rádio e das revistas, são
estratégias de grande propagação de
informações. Mas não só isso: elas pro-
duzem cultura e ditam comportamentos.
Após as duas grandes guerras mundiais,
consolidaram-se também o cinema e a
televisão na produção da cultura de mas-
sa. E após os anos 1980, com a chegada
da internet ao Brasil, a propagação de no-
tícias, conteúdos e discursos sociais man-
tém-se crescente entre as populações.
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UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE
ILUSTRADOR
Carlus Campos é artista gráfico, pintor e gravador,
começou a carreira em 1987 como ilustrador no jornal O
POVO. Na construção do seu trabalho, aborda várias técnicas
como: xilogravura, pintura, infogravura, aquarelas e desenho.
Ilustrou revistas nacionais importantes como a Caros Amigos
e a Bravo. Dentro da produção gráfica ganhou prêmios em
salões de Recife, São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.