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INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA

E TECNOLOGIA SÃO PAULO


Curso de Licenciatura em Letras

Trabalho final da disciplina Avaliação e Currículo


6º semestre

Larissa Costa da Silva


Paola Gentile
Susana Lopes Ribeiro Barbosa

Profa. Adriana Paes de Jesus Correa

Análise do PPC do Curso Técnico de Nível Médio


em Florestas na Forma Concomitante (Ifam)

São Paulo
2021
Introdução
Este relatório tem como objetivo analisar o currículo do Curso Técnico de Nível
Médio em Florestas na Forma Concomitante ofertado ao povo jarawara pelo Instituto Federal
de Educação Ciência e Tecnologia do Amazonas (Ifam), campus Lábrea.
Nosso objetivo inicial era fazer a análise do projeto político-pedagógico (PPP) de uma
escola indígena da rede regular, estadual ou municipal, de ensino público, para que
pudéssemos confrontá-lo com as teorias estudadas na disciplina Avaliação e Currículo do 6º
semestre do curso de Licenciatura em Letras. Porém, nossos contatos com algumas escolas
das redes estaduais de São Paulo e do Mato Grosso não tiveram resposta em tempo hábil para
a realização deste trabalho.
Assim sendo, pegamos o currículo proposto para um curso de Ensino Médio
Concomitante oferecido por um instituto federal como objeto de estudo. Este relatório traz um
breve histórico da legislação que embasa a Educação Indígena no Brasil, analisa a concepção
de currículo e de avaliação que o documento sugere, bem como a sua organização. A análise
documental foi complementada com a entrevista de uma professora da instituição.

Breve histórico da legislação Educação Indígena no Brasil


Antes da Constituição de 1988, as crianças indígenas que queriam estudar eram
matriculadas em escolas regulares da rede. Muitas famílias recusavam-se a matricular os
filhos pois, além de terem de sair do território, as crianças eram submetidas à escolarização
em Língua Portuguesa, que não dominavam, e um currículo que nada tinha da cultura
indígena.

Linha do tempo
1988 – Constituição Federal
- rompe com a postura integracionista que havia até então, que considerava os indígenas
uma categoria socialmente transitória, até que fosse “civilizado” – direito de serem
índios e permanecerem assim;
- garante que os povos indígenas podem usar, cada um, a própria língua materna e seus
processos de aprendizagem na educação escolar;
- escola deve contribuir para o processo de reafirmação étnica e cultural.

1996 – LDB
1
- consolida o direito à educação diferenciada, pautada na língua e nos costumes de cada
povo, em território indígena – bilinguismo;
- formação dos próprios indígenas para que atuassem como docentes;
- recuperação da memória, reafirmação de identidades e acesso aos conhecimentos
técnicos e científicos da sociedade nacional – interculturalidade.

1998 – Referencial Curricular para a Educação Indígena


- legislação sobre o tema não deve ser muito específica nem detalhada, para que os mais
de 200 povos tivessem liberdade de organizar o currículo de acordo com a cultura, os
costumes e as tradições de cada um.

1999 – Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Escolar Indígena + Parecer 14/99
do CNE + Resolução 3/99 do CNE
- autonomia pedagógica e financeira;
- formação específica de indígenas para atuar como docentes nas escolas indígenas;

2001 – Plano Nacional de Educação (2001-2011)


- criação da categoria de “escola indígena”, para assegurar o modelo de educação
intercultural e bilíngue;
- criação de linhas de financiamento próprias;
- estados e União devem prover as escolas indígenas com recursos como biblioteca,
laboratório etc. e material pedagógico.

Legislações estaduais - desafios:


- Como vencer a lacuna entre o que prevê a legislação e a realidade de cada estado?
- Como fazer para que as escolas indígenas não sucumbam diante das demais escolas
estaduais?
- O que depende de legislação e o que os próprios povos indígenas podem contribuir
para que os direitos sejam garantidos e respeitados?

Qual concepção de currículo se faz presente na experiência relatada?


De acordo com Saviani (2016, p. 57), currículo é o conjunto de atividades nucleares
desenvolvidas pela escola. (...) Um currículo é, portanto, uma escola funcionando, isto é, uma
escola desempenhando a função que lhe é própria.
2
Mas, se a escola se justifica em função da necessidade de assimilação do
conhecimento elaborado, isto não significa que este seja mais importante ou
hierarquicamente superior. Trata-se, na verdade, de um movimento dialético, isto é,
a ação escolar permite que se acrescentem novas determinações que enriquecem as
anteriores e estas, de forma alguma, são excluídas. Ao contrário, o saber espontâneo,
baseado na experiência de vida, a cultura popular, portanto, é a base que torna
possível a elaboração do saber e, em consequência, a cultura erudita. (SAVIANI,
2016, p. 58)

No que diz respeito à experiência em análise, percebemos um grande diálogo entre o


que a escola desenvolveu e a concepção de currículo multiculturalista proposta por Silva
(2010) no texto O currículo como narrativa étnica e racial.
Segundo esse autor, a teorização crítica sobre o currículo esteve inicialmente
concentrada na análise da dinâmica de classe, da qual as chamadas “teorias da reprodução”
são exemplos. No entanto, logo ficou claro que as relações de desigualdade e poder na
educação e no currículo não podiam ficar restritas à classe social. “Como análise política e
sociológica, a teoria crítica do currículo tinha de levar em conta também as desigualdades
educacionais centradas nas relações de gênero, raça e etnia” (SILVA, 2010, p. 99).
Ele afirma ainda que, a partir das análises pós-estruturalistas e dos Estudos Culturais,
o currículo passou a ser problematizado como sendo racialmente enviesado. É também nas
análises mais recentes que os próprios conceitos “raça” e “etnia” se tornam crescentemente
problematizados” (ibidem, 2010, p. 100).
Assim, de acordo com a visão do autor, a teorização social contemporânea sobre raça e
etnia é constituída pelo caráter histórico e construído das categorias raciais e pela importância
política e estratégica do sentimento de identificação étnica e racial. “É precisamente nessa
difícil problemática que se inserem as teorizações críticas contemporâneas sobre o currículo
preocupadas com a identidade étnica e racial” (SILVA, 2010, p. 100). A identidade étnica e
racial é, portanto, desde o princípio, uma questão de saber e poder.
“A própria história do termo mais fortemente carregado e polêmico, o de “raça”, está
estreitamente ligada às relações de poder que opõem o homem branco europeu às populações
dos países por ele colonizados” (ibidem, p.100).
Conforme Silva (2010), em termos de representação o currículo conserva, de forma
evidente, as marcas da herança colonial. Dessa forma, esse documento tende a ser, entre
outras coisas, um texto racial. “A questão da raça e da etnia não é simplesmente uma “tema
transversal”: ela é uma questão central de conhecimento, poder e identidades” (SILVA, 2010,
p.100).

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Para o autor, o conhecimento sobre raça e etnia incorporado ao currículo não pode ser
separado daquilo que as crianças e os jovens se tornarão como seres sociais. Por essa razão,
com o objetivo de propor um olhar crítico sobre o aspecto racial do currículo, ele faz as
seguintes indagações: “Como desconstruir o texto racial do currículo, como questionar as
narrativas hegemônicas de identidade que constituem o currículo?” (ibidem, 2010, p. 102).
Com o objetivo de responder tal questionamento, Silva propõe a construção de um
currículo multiculturalista que não seja simplesmente folclórico, mas profundamente político.
Para tanto, deveria ser elaborado levando em consideração as seguintes questões:
● Quais são os mecanismos de desconstrução das identidades nacionais, raciais e
étnicas?
● Como a construção da identidade e da diferença está vinculada às relações de poder?
● Como a identidade dominante tornou-se referência invisível através da qual se
constroem outras identidades como subordinadas?
● Quais os mecanismos institucionais responsáveis pela manutenção da posição
subordinada de certos grupos étnicos e raciais?

Diante do exposto, buscamos verificar em que medida a experiência em análise pode


ser encaixada na proposta de Silva (2010). Para isso, faz-se necessário destacar alguns
elementos da história recente dos Jarawara.
De acordo com o relato da equipe de coordenação do curso, os Jarawara iniciaram seu
processo de alfabetização em 1989. Em 2008, formou-se a primeira turma do Ensino
Fundamental na aldeia Casa Nova. A partir de então, os alunos desejaram continuar os
estudos e, por essa razão, decidiram reivindicar a criação de um curso de nível médio, que só
seria criado em 2018. De acordo com a equipe do curso:

[...] Isso foi possível devido ao trabalho coletivo dos Jarawara da aldeia Casa
Nova/Nascente no que pode ser categorizado como luta pela educação formal. Esse
processo teve o protagonismo de 15 jovens, que inspiraram o desejo em outros
jovens e adultos a iniciarem sua inserção na escola. Neste contexto, situa-se a busca
pelo ensino médio na aldeia. [..] (MAXIMINIANO, FONSECA, MITIDIERI, 2020,
p. 618)

O tempo decorrido entre o início da alfabetização e a criação do curso de Ensino


Médio já diz muita coisa sobre o posicionamento do poder público sobre a questão.
Para a criação do Curso Técnico em Florestas, houve uma mobilização dos indígenas,
dos representantes das entidades locais de apoio a esses povos e do Ifam Campus Lábrea na
busca pela criação do curso. Contudo, convém lembrar que entre todas as dificuldades

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enfrentadas por esses grupos, a maior delas se deu por parte do Governo Federal, que
demorou para entender a relevância de um projeto dessa natureza. Tal situação remete a uma
das indagações feitas por Silva (2010) anteriormente e diz respeito aos mecanismos
institucionais responsáveis pela manutenção da posição subordinada de certos grupos étnicos
e raciais. Ou seja, não é do interesse de certos governos que os povos indígenas tenham
acesso a níveis mais altos de educação e, por conseguinte, a uma plena participação social.

Como o currículo é organizado?


Segundo Silva (2010), Henry Giroux compreende o currículo por uma concepção
emancipadora e libertadora em que as pessoas se tornariam conscientes das instituições e
estruturas sociais opressoras por meio do processo pedagógico. Um dos três conceitos
defendidos por Giroux é a “esfera pública”, em que

A escola e o currículo devem ser locais onde os estudantes tenham a oportunidade


de exercer as habilidades democráticas e da participação, de questionamentos dos
pressupostos do senso comum da vida social. (SILVA, 2010, p. 54-55)

Alinhada com essa concepção, a organização curricular da escola indígena foi


constituída com a participação ativa do Povo Jawarara, por meio de seus representantes e de
ampla consulta feita à comunidade. O objetivo do projeto foi oferecer um ensino bilíngue que
conseguisse abranger a vivência, a interculturalidade, o interesse etnopolítico e o contexto
sócio-histórico dessa comunidade.
Devido à matriz curricular diferenciada e específica, respeitando a interculturalidade
da comunidade, o planejamento e a execução das disciplinas ocorre com base no trabalho em
conjunto de um professor yara (não indígena, na língua jarawara) e um mediador jarawara. Os
processos de ensino e de aprendizagem visam a relação dialógica, com ações de colaboração e
compartilhamento entre os sujeitos, prevendo um papel ativo dos allunos, conforme prevê a
DCCNEI, no Art. 5°:

Art. 5 Na organização da escola indígena deverá ser consideradas participação de


representantes da comunidade, na definição do modelo de organização e gestão, bem
como:
I - suas estruturas sociais;
II - suas práticas socioculturais, religiosas e econômicas;
III - suas formas de produção de conhecimento, processos próprios e métodos de
ensino-aprendizagem;
IV - o uso de materiais didático-pedagógicos produzidos de acordo com o contexto
sociocultural de cada povo indígena; (DCNEEI, 1999.)

5
Outra temática abordada pela organização do currículo foi a concepção e construção
de um calendário que respeitasse as atividades e particularidades da comunidade. Priorizando
as condições naturais, as enchentes dos rios, o período de plantio e colheita, as questões
sociais e a organização e o funcionamento da aldeia é possível traçar um paralelo sobre a
concepção de currículo escrita por Silva (2010) e a perspectiva de currículo do Giroux, como
uma noção política cultural:

O currículo envolve significado e a construção de significados e valores culturais. O


currículo não está simplesmente envolvido com a transmissão de “fatos” e
conhecimentos “objetivos”. O currículo é um local onde, ativamente, se produzem e
se criam significados sociais. (SILVA, 2010, p. 55)

A organização curricular, portanto, prevê uma relação entre os componentes


curriculares e que as atividades do curso sejam adaptadas a dinâmica da aldeia e aos ciclos
produtivos – em especial, a produção agroextrativista – exemplificados no calendário.
No geral, nota-se, no PPC analisado, o respeito à autonomia e aos valores culturais e
sociais do Povo Jarawara, além da construção de um currículo que perpassa a concepção da
educação formal,.

Sobre a Pedagogia da alternância


Uma das garantias que a LDB dá às escolas em geral é a liberdade de escolher a
melhor forma de organizar o tempo pedagógico para atender às necessidades do público-alvo.
As DCNEEI reforçam essa premissa no inciso IV dos artigos 2º e 7º:
Art. 2º As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Escolar Indígena na
Educação Básica têm por objetivos:
(...)
IV - assegurar que o modelo de organização e gestão das escolas indígenas leve em
consideração as práticas socioculturais e econômicas das respectivas comunidades,
bem como suas formas de produção de conhecimento, processos próprios de ensino
e de aprendizagem e projetos societários; (...)

Art. 7º A organização das escolas indígenas e das atividades consideradas letivas


podem assumir variadas formas, como séries anuais, períodos semestrais, ciclos,
alternância regular de períodos de estudos com tempos e espaços específicos,
grupos não-seriados, com base na idade, na competência e em outros critérios, ou
por forma diversa de organização, sempre que o interesse do processo de
aprendizagem assim o recomendar. (DCNEEI, 1999. Grifo nosso.)

A escola indígena que estudamos adotou a alternância para organizar o seu tempo
escolar. Segundo Teixeira, Bernartt e Trindade (2008), consiste em uma “metodologia de

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organização do ensino escolar que conjuga diferentes experiências formativas distribuídas ao
longo de tempos e espaços distintos, tendo como finalidade uma formação profissional”.
Os mesmos autores explicam que ela foi criada em 1935, na França, para atender a um
grupo de agricultores insatisfeitos com a educação dos filhos, que nada tinha a ver com a
educação para a vida no campo. Em 1969, a pedagogia da alternância chegou ao Brasil com
uma missão de padres jesuítas que se instalou no Espírito Santo, onde foram abertas três
Escolas Família Agrícola, como são denominadas.
Somente em 1998 essa forma de organização do tempo escolar foi reconhecida pelo
Ministério da Educação e, com base na experiência de quase 30 anos, recomendada para
escolas rurais. A escola da qual estudamos o PPC alterna os turnos entre a escola e a aldeia a
cada sete dias nos períodos de cheia (fevereiro a maio); nos períodos de seca (agosto a
novembro), alunos e professores ficam uma semana na aldeia e 15 dias no campus, pela
dificuldade de deslocamento. Dessa forma, conseguem respeitar o calendário jarawara (veja
imagem a seguir), pois a maioria dos alunos trabalha na coleta da castanha, na pesca do
matrinxã e na preparação e plantio do roçado, assim como na coleta e no preparo do óleo de
andiroba e copaíba e de outros frutos regionais, que marcam os ciclos produtivos da aldeia.

7
Fonte: Projeto Pedagógico de Curso Técnico de Nível Médio em Floresta na Forma Concomitante. 2018, p. 34.

Como é a avaliação da aprendizagem?


Segundo Vasconcellos (2005), a avaliação é um processo amplo da existência humana,
que exige uma reflexão crítica sobre a prática escolar, no sentido de “captar seus avanços,
suas resistências, suas dificuldades e possibilitar uma tomada de decisão sobre o que fazer
para superar os obstáculos”. (VASCONCELLOS, 2005).
De acordo com o PPC da escola/curso em questão, a construção do currículo perpassa
a realidade do Povo Jarawara e leva em consideração que se trata de um povo de recente
contato, falantes exclusivamente da língua indígena e, portanto deve atender às
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especificidades dessa comunidade, respeitando os princípios constitucionais. Além disso,
deve-se considerar que o ensino ofertado para o grupo de alunos jarawara é de nível
médio/técnico e na modalidade Jovens e Adultos. Isso significa, necessariamente,
metodologias de ensino mais acessíveis e processos avaliativos mais flexíveis. Desse modo, a
educação formal deve ser pensada de maneira a respeitar os processos próprios de
aprendizagem desse perfil de aluno, valorizando, acima de tudo, a concepção de
interculturalidade, conforme atestam os documentos oficiais:

[...] a garantia de que a normatização do processo de reconhecimento das escolas


indígenas se pautasse pelas características específicas da educação escolar
indígena quanto a conteúdos curriculares, calendário, metodologias e avaliação
adequada às realidades socioculturais de cada povo, respeito ao ciclo de produção
econômica e às manifestações culturais e materiais didáticos contextualizados
cultural e linguisticamente1 (BRASIL, 1991)

[...] a criação da categoria escola indígena, autônoma, com suas normas e


ordenamentos jurídicos próprios, com suas experiências pedagógicas, curriculares
e organizativas peculiares construídas pelo ensino intercultural2 (Parecer
CNE/CEB n° 14/99)

Os projetos político-pedagógicos terão por base as Diretrizes Curriculares


Nacionais referentes a cada etapa da Educação Básica, as características próprias
das escolas indígenas, em respeito à especificidade étnico-cultural de cada povo
ou comunidade, as realidades sociolinguísticas, os conteúdos curriculares
especificamente indígenas, os modos próprios de constituição do saber e da
cultura indígena e a participação da respectiva comunidade.3 (RESOLUÇÃO
CNE/CEB No 03/99)

No que concerne aos instrumentos e processos avaliativos, de acordo com o relato da


equipe de coordenação do curso, constante em artigo publicado, ao longo das aulas, foi
percebido pelos docentes o interesse dos alunos na produção de desenhos. Com essa
percepção, passou-se a utilizar o desenho como forma de síntese ilustrada do conhecimento
aprendido nas diferentes disciplinas. Segundo a visão da equipe, a avaliação não pode ser
vista “como método simplesmente quantitativo, mas um espaço interativo/dialógico para se
fazer um processo de síntese, demonstração do que foi aprendido” (MAXIMINIANO;
FONSECA; MITIDIERI, 2020, p. 636).

1
Portaria Interministerial MJ e MEC no 559, de 16/04/1991. In Legislação Indigenista Brasileira e Normas
Correlatas. Brasília, FUNAI / CGDOC, 2003.
2
O Parecer CNE/CEB n° 14/99 orienta os sistemas de ensino quanto às concepções e tratamento a ser
dispensado às escolas indígenas a partir do disposto na LDB.
3
A Resolução CNE/CEB no 03, publicada em novembro de 1999, estabelece a estrutura e o funcionamento das
escolas indígenas no âmbito da educação básica.

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Os critérios e instrumentos de avaliação do rendimento acadêmico são estabelecidos
pelos professores yaras, em um constante processo de avaliação em que se destacam,
prioritariamente, o desenvolvimento:
I. do raciocínio;
II. do senso crítico;
III. da capacidade de relacionar conceitos e práticas;
IV. de associar causa e efeito;
V. de analisar e tomar decisões;
VI. o desenvolvimento da escrita Jarawara e em Língua Portuguesa.
Segundo a equipe, a “natureza da avaliação do rendimento acadêmico pode ser teórica,
prática ou a combinação das duas formas, ficando a critério do docente a forma e quantidade a
ser adotada para cada critério” (MAXIMINIANO; FONSECA; MITIDIERE, 2020, p. 636).
Dessa forma, os processos avaliativos vêm sendo definidos e redefinidos pelos
docentes de acordo com o conteúdo ministrado e com a receptividade dos alunos, para que
“busquem sentido, significado e relevância no processo avaliativo que conduzem,
contemplando, preferencialmente, uma avaliação inter/transdisciplinar” (MAXIMINIANO;
FONSECA; MITIDIERI, 2020, p. 637). Essa visão converge com o que diz Hoffman:
“Quando se acompanha para ajudar no trajeto, é necessário percorrê-lo junto, sentindo-lhe as
dificuldades, apoiando, conversando, sugerindo rumos adequados a cada aluno” (HOFFMAN,
2001, p. 62). Contempla, igualmente, a visão dessa autora quando diz que

as condições de aprendizagem definem, igualmente, as condições de avaliação,


uma vez que cria ou não situações de investigação e intervenção adequadas à
observação ampla e continuada da evolução de cada aluno em todas as dimensões
abordadas.” (ibidem. 2001, p. 72)

Tendo em vista a valorização da oralidade nos processos de ensino e de aprendizagem


dos alunos jarawaras, dado que eles não dominam o idioma português e tampouco a escrita,
outro instrumento avaliativo bastante utilizado é a apresentação oral. Convém lembrar que o
ensino é mediado pelos alunos indígenas que falam português – o que, no contexto da aldeia,
possuem o status de professores por serem exímios conhecedores dos saberes locais,
conforme o relato da equipe.
Além disso, ao longo do curso, percebeu-se ainda que são próprias dos indígenas as
ações coletivas. Dessa forma, o trabalho em grupo passou a compor o conjunto de
instrumentos avaliativos.

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Por fim, ao longo do processo de construção das aulas, alunos e professores
construíram um caderno chamado sibani (descobrir/conhecer, no idioma jarawara). Ele é o
espaço para a descrição das descobertas e a síntese das pesquisas e para desenhar o que foi
aprendido, além de ser utilizado como instrumento avaliativo. Vale lembrar que as anotações
são feitas em jarawara e em português, conforme o esperado em um curso bilíngue.

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