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RECURSO ESPECIAL
Os 12 erros mais comuns
e como evitá-los

Giovanni Fialho
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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

Entendendo melhor o STJ 2

Erro 01 - Escrever o REsp como se fosse apelação 3

Erro 02 - Não especificar adequada e expressamente 9


o dispositivo de lei federal violado

Erro 03 - Não infirmar todos os fundamentos do 14


acórdão acerca da questão

Erro 04 - Apontar afronta à Constituição Federal 22

Erro 05 - Apontar lei local como violada 26

Erro 06 - Não comprovar feriado local, 32


ponto facultativo ou suspensão do expediente

Erro 07 - Não esgotar a instância de origem 37

Erro 08 - Matéria de fato 42

Erro 09 - Cláusula contratual 48

Erro 10 - Não infirmar fundamento constitucional autônomo 51

Erro 11 - Apontar afronta a Súmula 55

Erro 12 - Não fazer cotejo analítico 58

Mas, tio Gi, e o prequestionamento? 63

Conclusão 64

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

Recurso Especial:

Os 12 erros mais comuns


e como evitá-los
Olá, Dr(a). advogado(a)!

Parabéns por ter chegado até este e-book!

Em primeiro lugar, devo alertar que este não será um conteúdo técnico, formal e frio,
como estamos tão acostumados nas academias e corredores forenses. Este é um livro
digital com propósitos muito claros, tais como:

a) Trocarmos experiências sobre as particularidades e as especificidades do recur-


so especial;

b) Conversarmos de maneira natural, dando exemplos e fazendo comparações que,


assumo, não são comuns no sisudo mundo jurídico, mas acredito que aprenderemos
muito mais numa conversa informal, talvez até acompanhados de um drink e
um petisco;

c) Contribuirmos com a dissolução da barreira que existe entre servidores públicos


e advogados;

d) Desmistificarmos o “longínquo e inacessível” Tribunal Superior; e

e) Democratizarmos o acesso à jurisdição superior (minha grande missão com este


trabalho).

Sim, é claro que há muita informação técnica com instruções, demonstração de erros,
sugestões e exemplos, tendo como premissas os 12 erros mais comuns cometidos nas
petições dos recursos especiais, mas, além disso, quero que seja uma experiência agra-
dável, construtiva e proveitosa para que, no seu próximo Recurso Especial (REsp), você
já perceba significativa diferença na hora de elaborar suas razões. Combinado?

E tem mais uma coisa: você terá meu e-mail para contato! Quero saber suas impressões,
dificuldades, interesses e também todos os avanços que você vai ter a partir de agora ao
elaborar seus recursos especiais.

Meu grande objetivo é democratizar o acesso à jurisdição superior e isso só será possível
à medida que você colocar em prática as lições deste e-book e dos meus outros materiais
e cursos nas suas próximas – e melhores – razões recursais, pois, lembrando-se de uma
frase do pensador chinês Confúcio: “A essência do conhecimento consiste em aplicá-lo, uma
vez possuído.”

Giovanni Fialho
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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

Giovanni Fialho

Para iniciarmos nosso diálogo, é educado apresentar-me!


Sou Giovanni Fialho, nasci em São Luís/MA e fui criado em Brasília/DF. Sorridente,
brincalhão e descontraído, acredito que seriedade e sisudez sejam coisas diferentes: pode-
mos viver a vida de maneira séria e responsável, mas de forma alegre, leve e divertida.
Adoro filosofia, psicologia (cheguei a prestar vestibular para ambas as áreas), fi-
nanças pessoais e literatura. Gosto de poesias e sempre que possível escrevo alguns versos
como forma de acalentar a alma.
Tenho alguns hobbies: ler (romances, finanças e psicologia, especialmente), via-
jar, explorar novos lugares, conhecer restaurantes, drinks e culturas diferentes, cozinhar,
jogar cartas (adoro canastra e buraco). Eventualmente degusto um bom charuto cubano
(acompanhado de whisky, fica perfeito). Não curto e não acompanho nada de esportes
(nem futebol!). Sou fã de MPB, bossa nova e alguns pops rocks. Um dos meus grandes ído-
los (talvez o maior) é o eterno Raul Seixas.
Por certa época, dediquei-me ao estudo de várias abordagens do desenvolvimen-
to humano, como programação neurolinguística e neurossemântica, coaching, mentoria,
hipnose, constelação sistêmica e familiar, psiquiatria para leigos, técnicas avançadas de
estudo, leader training etc. Esses estudos e imersões ajudaram-me a desenvolver uma me-
lhor versão de mim mesmo, o que não significa que aquilo que é bom para mim seja bom
para todos. Cheguei inclusive a integrar uma obra coletiva, na qualidade de coautor1.
Na área jurídica, sou graduado em Direito pelo Centro Universitário de Brasília
(UniCeub/2008), com pós-graduação em Processo Civil pela mesma instituição (2010). Cur-
sei a Escola Superior da Magistratura/DF (2012) e fui professor de cursinhos para concur-
sos. Além disso, atuo como instrutor interno do STJ.
Servidor efetivo do STJ (Analista Judiciário – Área Judiciária) desde fevereiro de
2009, sempre desempenhei funções na assessoria de Ministros em todas as áreas e órgãos
especializados (Turmas e Seções de Direito Público, Privado e Penal, além da Corte Espe-
cial e do Conselho de Administração). Também atuei no Ministério Público Federal como
assessor de Subprocurador-Geral da República junto ao próprio STJ. Ao todo, examinei
aproximadamente 14 mil processos, sendo, em sua grande maioria, Recursos Especiais e
seus respectivos agravos.

1 Hipnose terapêutica, coordenação de Inês Marcel. Aurora Vita, São Paulo: 2016.
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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

Entendendo melhor o STJ


No âmbito da Justiça comum, o acesso à jurisdição superior, por determinação consti-
tucional, é essencialmente concretizado pelo Recurso Especial. Segundo o relatório de
prestação jurisdicional do STJ, a proporção de recursos especiais e agravos em recursos
especiais é absurdamente significativa, como se pode ver do seguinte resumo:

Ano Total de petições Total de REsp/ Percentual


AREsp
2014 314.316 251.138 79,90%
2015 332.905 264.645 79,49%
2016 335.779 266.651 79,41%
2017 327.129 247.841 75,76%
2018 346.337 259.281 74,86%

Da leitura desse quadro-resumo, percebe-se o grau de importância do recurso especial


e seus respectivos agravos, responsáveis por mais de ¾ da atividade jurisdicional do
Superior Tribunal de Justiça.

O REsp, todavia, é considerado, por muitos profissionais da advocacia, complexo de ser


elaborado, visto que seus requisitos não se encontram todos expressamente arrolados
na lei processual, como ocorre com a maioria dos outros recursos.

Como sabemos, a interpretação da lei e da própria Constituição resultou na construção


jurisprudencial acerca dos inúmeros requisitos de admissibilidade do REsp, o que refle-
te, ante a peculiaridade que lhe é intrínseca, a dificuldade de compreensão e o conse-
quente alto índice de inadmissibilidade, o qual, somente no ano de 2016, por exemplo,
foi de aproximadamente 88,32%.

Recentemente, foi implementada a Inteligência Artificial para triar, examinar e já su-


gerir o tipo de decisão a ser proferida. A tecnologia, indiscutivelmente, quebra novos
paradigmas e faz parte do cotidiano forense. Portanto, é mais do que necessário ter em
mente que a própria forma de apresentação do REsp já traz mais chances de sucesso em
sua admissibilidade.

Assim, o propósito deste e-book, juntamente com os outros trabalhos que tenho rea-
lizado na área, é democratizar o acesso à jurisdição superior. Faço isso divulgando
informações concretas, práticas e efetivas sobre o Recurso Especial, de modo a aumen-
tar as chances de conhecimento dos seus recursos e de possibilitar, de alguma forma,
melhorias sociais no acesso ao Tribunal de Sobreposição.

Então, vamos ao conteúdo em si? J

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

Erro 01
Escrever o REsp
como se fosse apelação
A apelação é considerada “o recurso por excelência”, ou seja: possui amplo
grau de cognoscibilidade, bastando ficar minimamente clara a intenção de re-
forma da sentença para que a devolutividade seja atendida, remetendo a questão
ao Tribunal de Justiça ou ao Tribunal Regional Federal.

É possível – e aceita na jurisprudência – até mesmo a repetição na íntegra dos


termos da petição inicial, contestação ou alegações finais, desde que hábeis a
demonstrar a intenção de reforma da sentença e que se insurjam contra o teor
da sentença, atendendo ao princípio da dialeticidade (CPC, 1.010 e 1.013).

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDENATÓRIA - DE-


CISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO - INSUR-
GÊNCIA RECURSAL DA DEMANDADA.

[...]

2. A jurisprudência deste Tribunal Superior é no sentido de que, embora


a mera reprodução da petição inicial nas razões da apelação não enseje,
por si só, afronta ao princípio da dialeticidade, se a parte não impugna os
fundamentos da sentença, não há como conhecer da apelação, por des-
cumprimento do art. 514, II, do CPC/73, atual art. 1010, II, do CPC/15. In-
cidência do teor da Súmula 83/STJ.

3. Agravo interno desprovido.

(AgInt no REsp 1790742/CE, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA,


julgado em 27/05/2019, DJe 03/06/2019.)

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Na esfera penal, esse efeito permite até mesmo a abordagem de novas temá-
ticas e fundamentações, quando houver recurso exclusivamente da defesa e que
este não agrave a situação do réu, como se vê do seguinte julgado:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO


(ART. 121, § 2º, III, IV e V, DO CP). DOSIMETRIA. FIXAÇÃO DA PENA-BASE
ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. ALEGAÇÃO DE ALTERAÇÃO DE FUNDAMEN-
TAÇÃO EM RECURSO EXCLUSIVO DA DEFESA. REFORMATIO IN PEJUS.
INOCORRÊNCIA. SITUAÇÃO DO RECORRENTE INALTERADA.

1. Sabe-se que em razão do efeito amplamente devolutivo da apelação,


pode o Tribunal, ao julgar recurso exclusivo da defesa, apresentar novas
fundamentações, desde que não agrave a situação do recorrente.

[...]

3. Agravo regimental improvido.

(AgRg no HC 320.398/MT, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, jul-


gado em 28/06/2016, DJe 01/08/2016.)

Em contraposição, o REsp é recurso de fundamentação vinculada, isto é, só


tem cabimento dentro das específicas hipóteses previstas no art. 105, III, da
Constituição Federal. Nesse sentido:

O recurso especial é recurso de fundamentação vinculada, limitado em ex-


tensão pela matéria recursal devolvida e adstrito às questões jurídicas deci-
didas em única ou última instância.

(AgInt no AgRg no REsp 1371046/RJ, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLI-


ZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/05/2019, DJe 16/05/2019.)

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

Mas o que significa isso, na prática? Então, é o seguinte:

Não adianta alegar no REsp matérias de “justiça”, “liberdade” ou qualquer outra tese ou
abordagem jurídica, mesmo que em essência tenha-se esse mister
na defesa que se faz em juízo.
Não adianta declamar bravatas de injustiças e desacertos, de violações e garantias.

Não adianta nada fazer discursos (às vezes acalorados) falando da necessária tutela estatal
para os mais variados temas e realidades da vida.

Não, não estou dizendo que isso não é importante. Estou dizendo que o “palco” para esse
tipo de postura não é o recurso especial.

É aquela história: adianta ser um piloto habilidoso, com domínio do carro e suas funcionali-
dades, querer que o veículo alcance 320 km/h, mas o veículo ter um motor 1.0 com 80 cava-
los? Pois é, não adianta, porque não tem como alcançar o resultado pretendido!

Portanto, é preciso entender cada tipo de ferramenta para que a funcionalidade seja devida-
mente aplicada, de acordo com a necessidade.

Isso me faz lembrar uma frase: “Quem só conhece martelo, vê prego em tudo!”

É uma ótima reflexão mesmo, pois, se a única ferramenta que eu sei usar é o martelo, em
qualquer situação vou querer usá-lo para bater, mesmo que não sejam as marteladas as
melhores alternativas.

Por outro lado, no momento em que eu conhecer e aprender a utilizar uma chave de fenda,
por exemplo, ao invés de querer martelar um parafuso, saberei parafusá-lo, dando-lhe me-
lhor destino em suas funcionalidades.
Uau, isso pareceu até livro de autoajuda!

Bem, mas vamos voltar ao REsp, neném! O que temos é o seguinte:

Tenha em mente que o recurso especial possui fundamentação vinculada, o


que significa dizer: o STJ deve analisar somente aquilo que lhe foi devolvido, nos
estritos limites em que o foi, nos termos do princípio da devolutividade estrita.

Não é atribuição do STJ (lembrando que esse estudo é amparado no enten-


dimento da própria Corte Superior e não em reflexões doutrinárias ou acadê-
micas) adentrar em questões que não lhe tenham sido especifica e restritamente
colocadas a julgamento.

É por essa razão que geralmente as decisões em sede de REsp são pontuais e objeti-
vas. Observe que um acórdão proferido em apelação, por exemplo, tem fundamentação
mais genérica, discorrendo de forma usualmente ampla e reflexiva sobre possibilidades
atinentes à causa posta em julgamento.

Por sua vez, o julgamento do REsp é diferente, segmentando as teses em pon-


tos independentes (embora às vezes haja interdependência ou prejuízo, já que se
trata de unidade decisória). É esse o motivo pelo qual você já deve ter observado
decisões de REsp serem mais ou menos assim:

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

Quanto à tese de afronta ao art. x, não prospera porque (...)

Referente à violação dos arts. x e y, a pretensão esbarra na Súmula (...)

Por fim, o dissídio pretoriano não realizou o devido cotejo analítico, pois deixou
(...)

No que concerne à tese de serem irrisórios os honorários advocatícios, em afronta


ao art. 85 do CPC (...)

Não dá a impressão de serem questões bem estanques, diversas entre si? Pois
é exatamente desse jeito!

A maioria das petições e recursos existentes no ordenamento jurídico brasi-


leiro possui espaço para livre argumentação, e, consequentemente, livre decisão
motivada, o que não acontece com as razões e decisões do recurso especial, haja
vista a tecla na qual estamos dando ênfase: o recurso especial possui funda-
mentação vinculada.

Por isso, cada tese (ou afronta) veiculada no recurso especial em regra é ana-
lisada de maneira pontual e aparentemente independente na decisão proferida,
muito embora às vezes outras questões sejam analisadas conjuntamente e sem-
pre deva ser observada eventual prejudicialidade.

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

# Na prática

Como meu objetivo é sairmos do plano teórico e conhecer-


mos ideias mais concretas e úteis para a elaboração das suas
petições, então é mais do que necessário pensar na questão
prática, que é a feitura da sua peça recursal, buscando maiores
chances de admissibilidade – e de sucesso da sua causa.

Ao elaborar a petição, tenha em mente que só será decidido


estritamente aquilo que for devolvido ao STJ. Portanto, desen-
volva raciocínios e argumentações de maneira pontual para só
depois desenvolver suas argumentações jurídicas.

É óbvio que cada um tem a sua característica literária e reda-


cional e isso é uma individualidade muito importante, tanto que
a literatura estuda os estilos e diferenças entre os autores de va-
riados gêneros e épocas com proficuidade.

Longe de mim querer “homogeneizar” o jeito de cada um es-


crever suas peças e defesas jurídicas!

A ideia aqui é somente demonstrar o que seriam excessos de


acordo com o propósito que você mesmo quer alcançar. Exces-
sos esses que, pela própria ideia do termo, só atrapalham.

Então vamos lá.

Cuidado com aquelas petições que citam muitas doutrinas,


clássicos, referências históricas e construções jurídicas. Não que
isso seja ruim ou proibido. O problema é sempre o excesso. Por-
tanto, elabore um texto objetivo, claro e direto.

Estritamente no REsp, para fazer valer a fundamentação vin-


culada, sugiro até mesmo elaborar previamente, seja no bloco
de notas do computador, celular ou em um papel qualquer, um
índice resumido dos pontos que serão alegados, mais ou menos
assim (teses meramente exemplificativas):

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

Violação a ser alegada Tese central Referências no caso


Art. 1022 do CPC Omissão, porque o TJ não falou - Aleguei no agravo de instrumento (fls...)
da questão x. - Aleguei nos embargos (fls...)

Art. 298 e art. 489, § 1º, III, Ao revogar a tutela provisória, - Decisão de 1ª instância (fls...)
ambos do CPC o juiz não fundamentou seu - Constou no agravo de instrumento (fls...)
convencimento de modo claro - O TJ afirmou que (fls...)
e preciso, de acordo com as
necessidades e características
do caso concreto, o que foi
ratificado pelo Tribunal de
origem, mantida a decisão não
fundamentada.
Arts. 186, 624 e 927 do Código A empresa fulana de tal, - No acórdão constou que não há responsabili-
Civil contratada como empreiteira, dade civil, por não ficar configurado o contrato
injustificadamente, suspendeu de empreitada (fls....)
a obra, causando prejuízos
diversos ao recorrente e a seus
clientes, devendo, por isso,
arcar com as perdas e danos
frutos da sua conduta.

Art. 85, § 2º, do CPC Honorários fixados - Pouco tempo de tramitação (só 1 ano
em valor excessivo e meio);
(20% sobre a causa), o - Julgamento antecipado - só prova
que equivale a R$ 350 documental;
mil reais. - Causa tramitou em comarca da
capital.
- Sem maiores problemas ou diligên-
cias para o advogado.

A partir desse “mapa”, você terá a orientação de como desenvolver suas razões
recursais de maneira objetiva e orientada ao propósito de fundamentação vincu-
lada, facilitando – e muito – o trabalho de construção textual, que partirá desse
índice.

#Para saber mais


AgInt no AREsp 1325685/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA;

AgInt no AgRg no REsp 1371046/RJ, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA;

AgInt no AREsp 1307819/SC, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA.

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Erro 02
Não especificar adequada
e expressamente o dispositivo
de lei federal violado
Pode parecer curioso, mas este ponto, muitas vezes decorrente do Erro 1, só
é definido como “erro” devido à especificidade técnica do recurso especial, em
cujas razões não é cabível a mera irresignação jurídica ou o simples pedido de
novo julgamento da causa.

Embora seja sempre necessário explicar adequadamente qual a tese jurídica en-
volvida e sua aplicação ao caso concreto, é comum nos textos e razões jurídicas que
as referências aos dispositivos de lei envolvidos sejam indiretas, como por exemplo:

• (...) razão pela qual deve incidir ao caso o art. 166 do Código Tributário; ou

• (...) levando-se em consideração o inadimplemento da obrigação, po-


sitiva e líquida, conforme previsão do art. 397 do Código Civil; ou

• (...) sendo inequívoco que tal conduta não configura o tipo penal do art.
21 da Lei n. 7.492/86.

Sim, são formatos comuns de conclusões e raciocínios jurídicos que fazem


referências a textos de lei. Entretanto, quase sempre não se aplicam ao recurso
especial, cuja tecnicidade própria exige, via de regra, maiores cuidados e espe-
cífica indicação do(s) dispositivo(s) tido(s) por violado(s).

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Desse modo, ao elaborar o REsp, sugiro sempre que coloque em primeiro


plano nas suas alegações a afronta à lei federal, que é, afinal, a causa de
pedir, a razão de ser do próprio recurso especial, demonstrando, na sequên-
cia, qual o motivo dessa violação legal.

Por isso, busque ter uma redação mais direta, como nos exemplos a seguir:

· Nesse cenário, tem-se que o art. 166 do Código Tributário foi violado pelo Tri-
bunal de origem, na medida em que (...); ou

· O art. 397 do Código Civil foi afrontado, porquanto, mesmo em se tratando de


obrigação positiva e líquida (...); ou

· Inequívoca a negativa de vigência ao art. 21 da Lei n. 7.492/86, pois a conduta


descrita na denúncia e apurada na instrução não configura o tipo penal em
foco, pelos seguintes motivos (...)

Observe que, em todos esses exemplos, o foco da redação foi afronta (ou vio-
lação ou negativa de vigência) ao dispositivo legal, sendo explicitado o motivo
com as respectivas razões, diferentemente dos primeiros exemplos (mais comu-
mente utilizados), em que o ponto essencial da argumentação figura no raciocí-
nio jurídico, complementado com a referência ao texto da lei.

Vamos aprofundar um pouco mais esse assunto, neném?

Um exemplo comparativo (caso meramente hipotético):

Argumentação livre Explicitação

em Apelação: do dispositivo violado:

Vigora no direito brasileiro, como viga mestra


de sustentação das relações jurídicas, o princí-
pio da liberdade de contratar e do efeito vincu-
O art. 406 do Código Civil foi violado, haja
lante dos contratos, razão pela qual não podem
vista haver previsão contratual expressa de
os juros de mora serem calculados pela taxa que
serem os juros de mora de 1% ao mês, não
esteja em vigor para a mora do pagamento de
podendo ser utilizada a taxa que estiver em
impostos devidos à Fazenda Nacional, nos ter-
vigor para a mora do pagamento de impos-
mos do art. 406 do Código Civil, tendo em vista
tos devidos à Fazenda Nacional.
que há na cláusula 4.2 do contrato de prestação
de serviços expressa previsão de juros de mora
de 1% ao mês.

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Perceba a diferença: na apelação (coluna da esquerda), é possível desenvolver


livremente a argumentação jurídica, o que torna o próprio texto mais solto, mais
livre de ser trabalhado.

Por outro lado, no REsp, a argumentação é mais objetiva, partindo da de-


monstração de qual (ou quais) dispositivo foi violado.

Presta atenção, neném: não estou dizendo que a única forma de expor suas razões
é essa que eu trouxe no exemplo, até porque é claro que o estilo redacional de
cada indivíduo deve ser respeitado, como já falei.

Pode-se até mesmo utilizar o mesmo texto que expus como apelação, mas
desde que especifique melhor qual o dispositivo violado, porque, da forma como
está elaborado, não reúne condições de admissibilidade, já que incide a Súmula
n. 284/STF.

Esse enunciado, existente desde dezembro de 1963 e plenamente válido e


aplicável, diz o seguinte:

É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamenta-


ção não permitir a exata compreensão da controvérsia (SÚMULA n. 284/STF).

Deficiência na sua fundamentação e exata compreensão da controvérsia são ex-


pressões que podem gerar dúvidas e ampla aplicação, especialmente pelo fato de que
“compreensão” enseja juízo absolutamente subjetivo.

Por essa razão, existem algumas hipóteses de aplicação desse enunciado (ao
menos 10), e, no exemplo dado no quadro acima, nos depararíamos com somen-
te uma dessas formas, ou seja: não foi indicado precisamente o dispositivo de
lei federal violado.

Assim, você precisa dizer especificamente que “o artigo x foi violado” para
não correr esse enorme risco.

Por isso eu enfatizei anteriormente que o foco do seu texto argumentativo


deve ser o(s) dispositivo(s) violado(s) para então ser demonstrada a malversação,
e não, como sói acontece, o inverso (se precisar, olha lá atrás o que o tio Gi disse).

Olhe só este exemplo de acórdão sobre isso:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE INDICA-


ÇÃO DOS DISPOSITIVOS LEGAIS VIOLADOS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N.
284 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - STF. CONEXÃO ENTRE CRIMES
DE COMPETÊNCIA FEDERAL E ESTADUAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N.
122 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. COMPETÊNCIA DA JUSTI-
ÇA FEDERAL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. Quanto à aplicação do princípio da insignificância, o agravante deixou

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de indicar, expressamente, qual dispositivo de lei foi violado pelo acórdão


recorrido, incidindo, na espécie, a Súmula n. 284/STF.

2. Conforme dispõe a Súmula n. 122/STJ, compete à Justiça Federal o pro-


cesso e julgamento unificado dos crimes conexos de competência Federal
e Estadual, não se aplicando a regra do art. 78, II, ‘a’, do Código de Processo
Penal - CPP. Assim, a conexão entre os delitos previstos no art. 55 da Lei
Federal n. 9.605/98 e art. 2º, caput, da Lei Federal n. 8.176/91 impõe o proces-
samento perante a Justiça Federal.

3. Agravo regimental desprovido.

(AgRg no REsp 1790545/RS, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA


TURMA, julgado em 27/08/2019, DJe 04/09/2019.)

#Na prática

Você já deve ter entendido, mas, para deixar bem


claro: desenvolva suas razões recursais a partir da
violação da lei, de modo que o leitor compreenda,
logo no primeiro passar de olhos, qual o dispositivo
afrontado, buscando, se possível, discurso direto.
Assim, fica muito mais seguro e certo ter o seu
recurso admitido quanto a esse ponto.

#Para saber mais

AgRg no REsp 1817683/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA;


AgInt no REsp 1508703/RN, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA;
AgInt no AREsp 1049022/RJ, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA;
AgInt no AREsp 1465252/GO, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA;
AgRg no AREsp 1477652/RS, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA;
REsp 1755958/MG, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA;
REsp 1822666/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA;
AgInt no AREsp 1407932/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA;
AgInt no AREsp 1374956/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA.

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

Erro 03
Não infirmar todos os fundamentos
do acórdão acerca da questão
Este é um ponto que exige um pouco mais de raciocínio jurídico. Então vamos partir de
uma situação corriqueira na qual todo mundo, de alguma forma, já esteve presente.

Estão num carro duas pessoas: Ana, dentista, 42 anos, que está dirigindo, e sua filha,
Eduarda, estudante, 16 anos, no banco do passageiro. Ana saiu do seu consultório,
pegou a filha na escola e está indo para casa almoçar antes de enfrentar o turno da
tarde, em que terá reuniões para tentar se credenciar a novos planos de saúde.

Eduarda geralmente aproveita esse momento no carro, quando está a sós com a mãe,
para falar das descobertas da adolescência e “sondar o terreno” nas suas pretensões
juvenis, principalmente porque o pai não está junto.

Elas travam o seguinte diálogo, que eu mesmo inventei aqui para nosso estudo:

- Oi, filha!

- Oi.

- Tudo bem?

- Uhum! (idioma monossilábico típico de adolescentes)

- Como foi na escola?

- Normal. (Se você é pai/mãe de adolescente, sabe muito bem o que esse “normal” quer
dizer, quase um “não me enche o saco”! kkkkkkk)

- Alguma novidade?

- Não... Ah, tem sim! Amanhã é aniversário da Gabrielle e ela convidou a galera pra ir à noite
naquela pizzaria da praça. Posso ir?

- Não!

- Por que não?! Vai todo mundo!

- Primeiro porque você não é todo mundo (não podia faltar a resposta típica de mãe, né?).
Além do mais, você não arrumou seu quarto, como eu mandei, não fez o trabalho de geografia e
também porque eu estou sem dinheiro.

- Eu arrumei meu quarto, sim, você que não viu! Até troquei o lençol e coloquei aquele rosa que

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você comprou!

O professor cancelou o trabalho de geografia, porque ele disse que só precisa fazer quem não tiver
tirado 7 na prova, eu tirei 8,5, então já passei de ano e não preciso fazer.

E você não precisa me dar dinheiro, porque eu guardei o dinheiro que minha vó me deu de natal e
eu uso ele.

- Mas você não vai mesmo assim!

- Mas mãe, por quê?

- Porque eu não gosto da Gabrielle e acho que ela não é uma boa companhia para você.

- Você que sempre implicou com ela. Ela tira boas notas, você sabe onde ela mora, é amiga dos
pais dela, como pode não gostar dela?

- Vou pensar no seu caso, Eduarda!

Tirando o fato de que estou me sentindo quase um roteirista de novela infantil, algumas
conclusões iniciais sobre esse diálogo:

1. Grande chance de Eduarda tornar-se advogada!

2. Ana deu 3 motivos para Eduarda não ir à pizzaria: não arrumou o quarto; não
fez o trabalho de geografia; falta de dinheiro.

3. Pela autoridade ínsita à condição de mãe (poder familiar), qualquer dos moti-
vos seria suficiente, por si só, para impedir que Eduarda fosse ao aniversário.

4. Eduarda insurgiu-se impugnando os 3 motivos utilizados por Ana.

5. Em acréscimo, um 4º motivo surgiu (não gosto da Gabrielle), que também foi


questionado por Eduarda (você que sempre implicou).

Agora vamos trazer esse diálogo para o universo jurídico do recurso especial, porque ele
tem muito a nos ensinar!

Creio que você já deva ter entendido a analogia entre a mãe decidir (acórdão) e a filha
recorrer (REsp). Até aí é simples, não é mesmo?

O essencial vem agora: vamos identificar os trechos do diálogo como se fossem situa-
ções jurídicas:

- Amanhã é aniversário da Gabrielle e ela convidou a galera pra ir à noite naquela pizza-
ria da praça. Posso ir? (Pedido dirigido ao TJ/TRF, seja em ação autônoma ou fase
recursal.)

- Não! (Negado provimento ou improcedência.)

- Por que não?! Vai todo mundo!

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- Primeiro porque você não é todo mundo (não podia faltar a resposta típica de mãe,
né?). Além do mais, você não arrumou seu quarto, como eu mandei, não fez o trabalho de
geografia e também porque eu estou sem dinheiro. (Fundamentos da negativa, no total
de 3 motivos.)

- Eu arrumei meu quarto, sim, você que não viu! Até troquei o lençol e coloquei aquele rosa
que você comprou!

O professor cancelou o trabalho de geografia, porque ele disse que só precisa fazer quem
não tiver tirado 7 na prova, eu tirei 8,5, então já passei de ano e não preciso fazer.

E você não precisa me dar dinheiro, porque eu guardei o dinheiro que minha vó me deu de
natal e eu uso ele. (Impugnação aos 3 fundamentos utilizados.)

- Mas você não vai mesmo assim!

- Mas mãe, por que?

- Porque eu não gosto da Gabrielle e acho que ela não é uma boa companhia para você.
(Novo fundamento surgiu.)

- Você que sempre implicou com ela. Ela tira boas notas, você sabe onde ela mora, é amiga
dos pais dela, como pode não gostar dela? (Impugnação ao 4º fundamento utilizado.)

- Vou pensar no seu caso, Eduarda! (Retirado de pauta.)

Agora vamos pensar que os motivos de Ana são os fundamentos de um acórdão e as


insurgências de Eduarda são os argumentos de um recurso especial. De maneira siste-
matizada, temos o seguinte esquema:

Arrumei, sim. Você que


Não arrumou o quarto não foi conferir. Até troquei
o lençol.
Não preciso mais fazer,
Não fez o trabalho
porque o professor cance-
de geografia
lou
Eu tenho a grana que
Estou sem dinheiro
minha vó me deu no natal
Não gosto dela, Você que sempre implicou
é uma companhia ruim com ela

Sabemos que, pela autoridade que Ana possui como mãe, ela nem precisaria dar moti-
vos, mas isso é psicologicamente inconsistente. Então, mesmo que ela quisesse dar só
um motivo, seria suficiente para subsidiar sua decisão. A questão é que Eduarda impug-
nou cada um dos fundamentos.

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Imaginemos que Eduarda tivesse falado que tinha arrumado o quarto e que não precisa-
va mais fazer o trabalho de geografia. Mesmo assim, o motivo de Ana “estar sem dinhei-
ro” seria suficiente, por si só, para manter a autoridade da sua decisão.

Por isso, para que Eduarda conseguisse derrubar a decisão, seria preciso, para começar,
questionar todos os motivos que ela elencou. E ela fez isso.

Mas, depois, Ana trouxe mais um motivo, que é o fato de não gostar da amiga Gabrielle
(preocupações legítimas de mãe). E esse motivo também foi impugnado pela Eduarda.

Se ela não tivesse impugnado esse motivo, a decisão de Ana restaria soberana, porque
somente ele é, por si só, suficiente para manutenção da decisão tomada.

Em outras palavras, é um jogo argumentativo: tese – antítese - síntese.

Você deve estar se perguntando: mas tio Gi, qual o motivo de analisarmos esse diálogo
com tantas abordagens? É porque ele representa a ideia central, traduzida em uma situ-
ação cotidiana, de um dos erros mais comuns do recurso especial e que gera sua inad-
missibilidade, materializada pela Súmula n. 283/STF.

Então, mudando a linguagem para o juridiquês, vejamos o que diz o texto dessa Súmula:

É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em


mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles (Súmula
n. 283/STF).

Esse enunciado, editado pelo STF em dezembro de 1963, consolida a ideia de que no
REsp não é possível, mesmo quando conhecido, decidir além de seu objeto e de suas ra-
zões.

Por isso, é imprescindível analisar o acórdão recorrido de forma a mapear


adequadamente os fundamentos utilizados para cada ponto e, assim, im-
pugná-los um a um no recurso especial. Do contrário, permanecerá hígido o
decisum proferido.

Trocando em miúdos, o Enunciado n. 283/STF diz que não adianta julgar o recurso, pois,
mesmo que eventualmente provido, não terá essa decisão força suficiente para descons-
tituir o acórdão recorrido, tendo em vista que alguns fundamentos não foram devida-
mente infirmados.

É usual ocorrer esse tipo de circunstância quando o acórdão fundamenta e em seguida


traz acréscimos do tipo “ainda que assim não fosse (...)” ou “mesmo que superado/afas-
tado esse entendimento (...)”

Preste atenção: mais de um motivo (leia-se: fundamento) foi utilizado para justificar
aquela conclusão jurídica. Portanto, todos esses motivos devem ser infirmados no re-
curso especial, da mesma forma que na história entre Ana e sua filha Eduarda.

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A questão possui tamanha relevância que foi incorporada ao texto da lei, as-
sim constando no Código de Processo Civil vigente:

Art. 932. Incumbe ao relator:

III – não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha


impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida.

Nota-se que a redação desse dispositivo não é a mesma da Súmula n. 283/STF (em
verdade, é praticamente o mesmo texto da Súmula n. 182/STJ), mas possui a igualdade
da ideia: impugnação de todos os fundamentos da decisão recorrida.

Agora fale a verdade para o tio Gi: está ficando mais claro, não está?

É óbvio que não podemos esquecer os capítulos da decisão judicial, de modo que a
impugnação específica disposta nesse art. 932, III, refere-se a fundamentos dentro do
mesmo capítulo decisório.

Vamos olhar um acórdão para entender um pouco mais essa questão:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIO-


NAL DE ALUGUEL. VALOR DO ALUGUEL FIXADO EM QUANTIA SUPERIOR
À PLEITEADA NA INICIAL. JULGAMENTO ULTRA PETITA. NÃO OCORRÊN-
CIA. NULIDADE DA PROVA PERICIAL. FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RE-
CORRIDO NÃO IMPUGNADOS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 283/STF. AGRAVO
INTERNO NÃO PROVIDO.

1. Não configura ofensa ao art. 1.022 do CPC/2015 o fato de o col. Tribunal de


origem, embora sem examinar individualmente cada um dos argumentos
suscitados pelo recorrente, adotar fundamentação contrária à pretensão da
parte, suficiente para decidir integralmente a controvérsia.

2. Segundo o entendimento do STJ, não configura julgamento ultra petita a


fixação de aluguel em valor superior ao pleiteado pela parte na ação revisio-
nal, pois a quantia requerida é meramente estimativa, a depender de laudo
pericial e da fixação pelo juiz. Precedentes.

3. A ausência de impugnação, nas razões do recurso especial, de funda-


mentos suficientes à manutenção do acórdão estadual, quanto ao desin-
teresse na produção da prova pericial e à preclusão para impugnar seu
conteúdo, atrai a incidência da Súmula 283 do STF.

4. Agravo interno desprovido.

(AgInt no AREsp 1449843/PR, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TUR-


MA, julgado em 03/09/2019, DJe 19/09/2019.)

Nesse caso, interessante refletir sobre as ponderações do Ministro Raul Araú-


jo em sua decisão monocrática, a qual consignou expressamente que o recurso

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especial apontou o art. 473, § 3º, do CPC como violado, visto que “a perícia é
nula, pois ‘lastreada exclusivamente na avaliação de outros imóveis do condomí-
nio industrial do próprio recorrido”.

E decidiu o titio Raul Araújo:

Ainda, no tocante à alegação de nulidade da prova pericial, foi disposto que


‘a apelante se manifestou pelo desinteresse na produção da prova e não im-
pugnou seu conteúdo, tornando preclusa a faculdade processual de impug-
nação da decisão e inviável a rediscussão a respeito da finalização da perícia’.

Ocorre que a parte recorrente não impugnou a fundamentação acima, autô-


noma e suficiente à manutenção do aresto hostilizado, a qual permaneceu
incólume.

Vamos entender:

1º - O acórdão de origem solucionou a controvérsia com dois fundamentos:


a) teria a apelante se manifestado no sentido de não ter interesse em produção
da prova pericial; e b) não ter impugnado o seu conteúdo, caracterizando-se a
preclusão para questionar o ato de realização da perícia.

2º - No recurso especial, apesar de indicar violação do art. 473, § 3º, do CPC


diante da nulidade da perícia, não teria sido infirmado o fundamento de preclu-
são, que é autônomo e suficiente por si só, dentro do próprio capítulo da senten-
ça, para manter o acórdão recorrido. Por isso, a incidência da Súmula n. 283/STF.

Será que agora está clareando a mente?

#Na prática

Uma dica prática para evitar esse equívoco é: faça


uma espécie de mapa dos fundamentos utilizados no
acórdão recorrido, igual fizemos acima no exemplo
da Ana e da Eduarda, mãe e filha.

Você pode fazer isso de forma simples: usando um


papel, celular ou computador. Escreva quais os fun-
damentos utilizados pelo acórdão recorrido. Após,
elabore a petição do REsp, confira se todos os itens
anotados estão correta e claramente impugnados no
texto da sua petição.

Ah, outra ideia interessante é utilizar pequenos títu-


los para separar as questões, os chamados intertítu-
los, o que facilita a leitura e a agilidade de localiza-
ção de tópicos.

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#Para saber mais

AgInt no REsp 1673329/DF, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TUR-


MA;

REsp 1812097/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA;

AgInt no REsp 1619661/MG, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA;

AgInt no AREsp 1364933/MS, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA


TURMA;

AgInt no AREsp 1159241/PR, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE,


TERCEIRA TURMA;

AgInt no AREsp 1360924/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUAR-


TA TURMA.

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Erro 04
Apontar afronta
à Constituição Federal

Para adentrarmos nesse próximo erro, é imprescindível lembrarmos uma lição introdu-
tória do Direito.

Pois bem. Lembra o que é competência? Podemos dizer que seria o conjunto de limites
dentro dos quais cada órgão do Judiciário exerce sua função jurisdicional de maneira
legítima.

Vamos ver o que diz alguém mais importante do que eu (por enquanto, hehehe):

A competência é a quantidade de jurisdição, de ‘poder jurisdicional’, cujo


exercício é atribuído a cada órgão. É, por isto mesmo, a concretização da
jurisdição, como verdadeira repartição ideal dela, identificando qual órgão
jurisdicional deve atuar perante qual situação e em qual território. (Cássio
Scarpinella Bueno, Curso Sistematizado de Direito Processual Civil – vol. 1,
7ª ed., São Paulo: Saraiva, 2013, p. 262).

Competência é a demarcação dos limites em que cada juízo pode atuar. Em-
bora comumente se diga que competência é a medida da jurisdição, isto é,
a jurisdição para o caso específico, deve-se frisar que a questão não é, exa-
tamente, de quantidade, mas dos limites em que cada órgão pode exercer
legitimamente a função jurisdicional. Trata-se de fixação de limites, não de
mensuração de quantidade. (Elpídio Donizetti, Curso Didático de Direito
Processual Civil, 17ª, São Paulo: Atlas, 2013, p. 256).

Agora que já refrescamos a memória, sabemos que essas regras de competência não
servem somente para a 1ª instância, não é mesmo? Elas servem para todos os tribunais
e instâncias, ainda mais quando decorrem expressamente da Constituição Federal!

Agora que já refrescamos a memória, sabemos que essas regras de competência não
servem somente para a 1ª instância, não é mesmo? Elas servem para todos os tribunais
e instâncias, ainda mais quando decorrem expressamente da Constituição Federal!

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É exatamente aí que a porca torce o rabo. A Constituição é categórica ao estabelecer que


compete ao STJ julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última
instância, pelos TJs ou TRFs, quando a decisão contrariar tratado ou lei federal ou ne-
gar-lhes vigência – art. 105, III, a.

O texto da norma constitucional é claro ao se referir às espécies normativas contraria-


das que podem ser questionadas em especial: lei federal e tratado. Na maioria das vezes,
diante da estrutura da nossa organização juspolítica, o recurso versa sobre lei federal.

Agora eu te pergunto uma coisa: onde se situa a lei federal naquela nossa velha conhe-
cida “hierarquia das leis”, na inesquecível pirâmide de Hans Kelsen?

Pronto, para não correr o risco de você dizer que não lembra, eu a trouxe para sua con-
sulta: a ideia central da hierarquia das leis é essa do desenho.

Lei federal, independente da sua categorização em lei complementar, lei


ordinária, medida provisória etc., é uma norma hierarquicamente inferior à
Constituição e superior aos atos normativos concretos (resoluções, decretos
com efeitos concretos, portarias etc.).

Então, eu te pergunto uma coisa: é possível alegar no REsp que um dispositivo da Cons-
tituição foi violado?

Não, neném, não é possível, por dois motivos:

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

Primeiro, porque qualquer dispositivo da Constituição não é lei federal.

Segundo, porque compete ao STF analisar suposta afronta a dispositivos da Constitui-


ção, e isso está categoricamente disposto no art. 102, III, da CF/88, que diz:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda


da Constituição, cabendo-lhe:

III – julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única


ou última instância, quando a decisão recorrida:

a) contrariar dispositivo desta Constituição.

Pergunto novamente: a qual órgão compete analisar eventual afronta a norma consti-
tucional?

Ao STF, claro! É isso que está no art. 102, III, a, da CF.

E a análise de eventual afronta a lei federal?

Isso também já vimos: cabe ao STJ, conforme art. 105, III, a, da CF.

Então, já que a regra é “cada um no seu quadrado”, como diria o axé da Dança do Qua-
drado, o quadrado do STF é julgar afronta à Constituição Federal (recurso extraordinário) e o
quadrado do STJ é julgar ofensa à lei federal (recurso especial).

Então por que tantas petições de REsp apontam afronta a dispositivos da


Constituição? Acredito que a resposta, em sua maioria, seja desconheci-
mento da sistemática dos recursos destinados aos tribunais superiores,
cujas características permitem a interposição simultânea de recurso espe-
cial para o STJ e extraordinário para o STF, em exceção ao princípio da unir-
recorribilidade recursal.

Essa metodologia, como você deve se lembrar, não é nova, já estando prevista no art.
541 do CPC/73, sendo mantida na atual sistemática processual, art. 1.029 do CPC vigen-
te, sendo tão importante que, muitas vezes, a depender da circunstância em julgamento
e dos fundamentos utilizados pelo Tribunal de origem, é imprescindível a interposição
simultânea dos dois recursos (veremos isso adiante).

O fato é que: jamais, nunca, never alegue no REsp que um artigo da Constituição Federal
teria sido violado, pois esse é um erro GRITANTE e como diria um colega que também é
assessor, em tom de brincadeira: “Que bobinhx! X advogadx nem sabe pra que serve o STJ!”

Para essa lição ficar bem marcada, vamos ver a jurisprudência?

ADMINISTRATIVO. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO N. 3/STJ. SERVIDOR


PÚBLICO. FGTS. ACÓRDÃO BASEADO EM FUNDAMENTO EMINENTEMEN-
TE CONSTITUCIONAL. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA.

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

1. A hipótese permitida constitucionalmente para interposição de recurso


especial pela alínea ‘a’ do inciso III do artigo 105 da CF, em suma, restringe-
-se à violação de Tratado ou dispositivo de Lei Federal, excluída, portanto,
da competência atribuída a esta Corte Superior, a apreciação e julgamen-
to de suposta afronta à norma da Constituição Federal. Precedentes.

2. Agravo interno não provido.

(AgInt nos EDcl no REsp 1761945/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL


MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/02/2019, DJe 26/02/2019.)

# Na prática

Muito fácil: só aponte afronta à lei federal.

Somente utilize a Constituição, se necessário, para


fundamentação de teses jurídicas, mas não aponte
um dispositivo da CF como se tivesse sido violado.

Se houver ofensa à Constituição, interponha o com-


petente Recurso Extraordinário para o STF, nos ter-
mos do art. 102, III, a.

#Para saber mais

REsp 1816307/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA;

AgInt no AREsp 1370746/SC, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA;

AgInt no AREsp 805.749/DF, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA;

REsp 1672894/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA;

AgRg no REsp 1075022/SC, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA.

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Erro 05
Apontar lei local como violada

Como vimos no erro anterior, agora você já sabe que não pode alegar afronta a disposi-
tivos da Constituição Federal, pois o meio correto para isso é o recurso extraordinário,
dirigido ao Supremo Tribunal Federal.

Mas o art. 105, III, a, da CF/88 traz mais informações necessárias ao estudo do REsp e
que – pasmem – causam grandes e absurdos erros na interposição.

Esse dispositivo é expresso ao dizer que caberá recurso especial por afronta a tratado
ou lei federal. Não é qualquer lei: é somente lei federal, federal, federal, fe-de-ral, F-E-
-D-E-R-A-L!

Então, neném, o que é lei federal?

1º - Lei é todo ato normativo abstrato e genérico emanado do Poder Legislativo por de-
corrência direta da Constituição.

2º - Federal é a lei produzida para regular relações na ordem federal ou nacional, em


regra, produzidas pelo Congresso Nacional.

Importante colocar, em regra, porque existem algumas hipóteses legislativas que se en-
quadram no conceito de lei federal para fins de interposição do REsp mas não são pro-
duzidas pelo Congresso Nacional, como Medidas Provisórias e Decretos.

Também existem algumas leis que são federais mas cujo conteúdo não é federal (devido
à peculiaridade do Distrito Federal, por exemplo, a lei de organização judiciária do DF).

Esse erro é comum, uma vez que causas são levadas ao Judiciário – legitimamente –,
cujas relações jurídicas são estabelecidas de acordo com o previsto na legislação dos
Estados e Municípios, que detêm, como sabemos, Poder Executivo e Legislativo e, por
isso, produzem leis e atos próprios.

Então, vamos entender a questão da melhor forma possível, ou seja, fazendo você ter
mais clientes, claro!

Um exemplo: chega a você um novo e potencial cliente e narra seu problema, que tem a
ver com matéria tributária, quanto ao pagamento do IPTU.

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

Onde está previsto esse tributo?

a) Constituição Federal: art. 156, I;

b) Código Tributário Nacional (Lei n. 5.172/66): arts. 32 a 34;

c) Leis e decretos do Município onde está situado o imóvel do seu cliente (ou do
Distrito Federal, que não tem Município, por previsão constitucional).

Quem advoga na área tributária, sabe que é um emaranhado de normas, referências e


alterações que dá nó na cabeça de qualquer mortal (e talvez até dos deuses do Olimpo).

Em 1ª e 2ª instância, é plenamente possível – e deveras necessário, muitas vezes – fundamen-


tar suas pretensões e argumentar a questão nas leis regentes da matéria, sejam elas federais,
estaduais ou municipais (ou até espaciais, se houvesse)!

Mas, não é sempre assim, neném! Chegando ao STJ via REsp, você não pode simplesmen-
te alegar que a lei federal (Código Tributário) e as leis municipais foram violadas, porque
essas leis municipais NÃO são federais, portanto não se encaixam no conceito de lei
federal previsto no art. 105, III, a, da Constituição Federal.

Você até pode vir a mostrar que a lei federal, que no nosso exemplo é o Código Tribu-
tário, foi violada, sendo por isso cabível o REsp. Mas não pode dizer que houve afronta
à lei municipal (ou distrital ou estadual), porque o STJ, em outras palavras, vai dizer o
seguinte: “não tenho nada a ver com isso, já que compete ao Tribunal de Justiça de cada
Estado dar a última palavra sobre as leis locais”.

É esse o sentido do Enunciado n. 280/STF:

Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário. (Súmula n. 280/STF).

Então, chega de passar a vergonha de dizer no REsp que lei local (estadual, municipal
ou distrital) foi violada, porque agora você já sabe que isso não pode, certo?

Veja um exemplo de julgado do STJ:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO


EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TOMBAMENTO. INVIABI-
LIDADE DE ANÁLISE DE LEI MUNICIPAL EM RECURSO ESPECIAL. SÚMU-
LA 280/STF. ENUNCIADOS SUMULARES DE TRIBUNAIS NÃO SE EQUIPA-
RAM A LEIS FEDERAIS, PARA FINS DE INTERPOSIÇÃO DO APELO NOBRE.
INVIABILIDADE DE EXAME DE NORMAS CONSTITUCIONAIS, SOB PENA
DE USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO STF. INOCORRÊNCIA DE VÍCIOS
NA FUNDAMENTAÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. JULGAMENTO CITRA
E EXTRA PETITA. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. SÚMULA 284/STF. SUSCITADO
CERCEAMENTO DE DEFESA NO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE E
NA JUNTADA DE DOCUMENTOS. INVERSÃO DO JULGADO. REEXAME DO
CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. INVIABILIDADE. PEDIDO DEMOLITÓ-
RIO. FUNDAMENTO DO ACÓRDÃO RECORRIDO NÃO ATACADO. SÚMULA
283 DO STF. INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS, PRESTAÇÃO DE CAU-
ÇÃO E CONFIGURAÇÃO DE LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ NA PROPOSITURA DA

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

AÇÃO. NOVA ANÁLISE DOS FATOS E PROVAS DA CAUSA. DESCABIMENTO.


CONDENAÇÃO DO AUTOR DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM HONORÁRIOS.
MÁ-FÉ AFASTADA. IMPOSSIBILIDADE. ACÓRDÃO RECORRIDO EM SINTO-
NIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO
DEMONSTRADO. FALTA DE COTEJO ANALÍTICO. FINALMENTE, AUSÊN-
CIA DE INTERESSE RECURSAL. PEDIDOS MINISTERIAIS JULGADOS TO-
TALMENTE IMPROCEDENTES - A FAVOR DAS PARTES ORA AGRAVANTES,
PORTANTO. AGRAVO INTERNO DOS PARTICULARES A QUE SE NEGA PRO-
VIMENTO.

1. Nos termos do que decidido pelo Plenário do STJ, aos recursos interpos-
tos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de
março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na for-
ma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência
do Superior Tribunal de Justiça (Enunciado Administrativo 2).

2. Inexiste a alegada violação dos arts. 2º, 126, 128, 458, 459, 460 e 535 do
CPC/1973, pois a prestação jurisdicional foi dada na medida da pretensão
deduzida, conforme se depreende da análise do acórdão recorrido. O Tribu-
nal de origem apreciou fundamentadamente a controvérsia, não padecendo
o acórdão recorrido de qualquer omissão, contradição ou obscuridade. Ob-
serve-se, ademais, que julgamento diverso do pretendido, como na espécie,
não implica ofensa à norma ora invocada.

3. O Recurso Especial se fundamenta, em diversos momentos, em suposta


violação da Lei Municipal 3.781/2013 (fls. 2.724, 2.786, 2.787, 2.813, 2.819);
o acórdão recorrido, por sua vez, baseou-se na necessidade de atendimento
dos requisitos da Lei Municipal 428/1979 - o Código de Obras do MUNICÍPIO
DE SANTO ÂNGELO/RS - para negar o pedido de demolição do imóvel (fls.
2.599/2.600). Inviável, assim, a modificação das conclusões do acórdão re-
corrido no ponto, pois tal providência exigiria a análise de Legislação local,
vedada à luz da Súmula 280/STF.

[...]

18. Agravo Interno dos Particulares a que se nega provimento.

(AgInt no AREsp 842.731/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO,


PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/06/2019, DJe 27/06/2019.)

Mas tem outra coisa: mesmo que você aponte somente lei federal como violada, é tam-
bém possível que essa eventual afronta só possa ser verificada pelo STJ se também for
apreciada a legislação local.

Para exemplificar, vamos usar o mesmo caso do IPTU.

Nessa hipótese, você alega afronta aos correspondentes dispositivos do Código Tributá-
rio, alegando que a alíquota incidente deve ser de natureza residencial e não comercial,
como entendeu a Corte de origem.

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Até aqui estaria tudo certo, mas tem um “probleminha” essencial: o Tribunal de Justiça
estadual entendeu que a alíquota seria comercial porque a legislação urbanística do mu-
nicípio prevê que a região onde situada o imóvel tem destinação comercial.

Nesse caso, você já percebeu que a decisão judicial teve que analisar a legislação mu-
nicipal para concluir qual o destino dado ao imóvel e, por conseguinte, definir qual a
alíquota tributária incidente.

Assim, da mesma forma, não pode o STJ examinar a legislação local para verificar se o
entendimento proferido pela Corte estadual está ou não alinhado com os termos da lei
municipal e o sentido dado quanto ao destino do imóvel no plano urbanístico e conse-
quente legislação.

Por isso, mesmo que você indique no seu REsp somente dispositivos de lei
federal como violados, o Superior Tribunal não poderá verificar se ocorre-
ram as alegadas afrontas, visto que a análise demandaria, obrigatoriamen-
te, exame da lei local, o que também atrai o mesmo Enunciado n. 280/STF.

É um pouco mais elaborado esse raciocínio do que na primeira hipótese, não é mesmo? Mas veja
o seguinte julgado:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL.


ADICIONAL POR TEMPO DE SERVIÇO. ART. 1º DO DECRETO 20.910/1932 E
DOS ARTS. 186 E 927 DO CÓDIGO CIVIL/2002. DEFICIÊNCIA NA FUNDA-
MENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. PRESTAÇÕES DE TRATO SUCESSIVO. SÚ-
MULA 85/STJ. DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.
SÚMULA 282/STF, APLICADA POR ANALOGIA. ANÁLISE DE LEGISLAÇÃO
LOCAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 280/STF.

1. Cuida-se, na origem, de ação objetivando o pagamento/implantação de


quinquênio no percentual de 5% (cinco por cento) sobre o salário-base.

2. Não se conhece de Recurso Especial no que se refere à violação ao art. 1º


do Decreto 20.910/1932 e aos arts. 186 e 927 do Código Civil/2002, quando a
parte não aponta, de forma clara, o vício em que teria incorrido o acórdão
impugnado. Aplicação, por analogia, da Súmula 284/STF.

3. Em se tratando de relação de trato sucessivo, o indeferimento do pedido


pela Administração é o termo a quo para o cômputo do prazo quinquenal.
Em não havendo negativa expressa, o entendimento jurisprudencial é de
que nas hipóteses em que a Administração, por omissão, não paga benefí-
cios aos servidores, a prescrição não atinge o próprio fundo de direito, mas
tão somente as parcelas vencidas a mais de cinco anos da propositura da
ação, nos termos da Súmula 85/STJ.

4. A demanda foi dirimida no acórdão recorrido com base em Direito lo-


cal (Lei Orgânica do Município de Juazeirinho e Lei Municipal 246/1997).
Logo, é inviável sua apreciação em Recurso Especial, em face da incidên-

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cia, por analogia, da Súmula 280 do STF: “por ofensa a direito local não
cabe Recurso Extraordinário”.

5. Recurso Especial não conhecido.

(REsp 1814166/PB, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA,


julgado em 13/08/2019, DJe 05/09/2019.)

# Na prática

Em primeiro lugar, jamais diga que uma lei local foi


violada, porque você não merece mais passar por
essa vergonha, não é mesmo?

Em segundo lugar, busque isolar as teses jurídicas


entre lei federal e lei local, extraindo da controvérsia
somente a tese jurídica com referência à legislação
federal. É possível que em alguns casos seja quase
indissociável e, por isso, talvez impossível fugir do
Enunciado n. 280/STF.

Nesse caso, sugiro que você use toda sua capacidade


estratégica na construção de teses jurídicas e desen-
volva esse potencial argumentativo ínsito à advoca-
cia. Não, eu não estou sendo irônico, estou sendo
sincero e te explico o por quê.

Você terá mais trabalho, é óbvio, mas não adianta


dar “murro em ponta de faca”. Será necessário de-
duzir teses jurídicas tangenciais à questão principal
para ter mais chance de admissibilidade.

É necessário pensar com outras regras do jogo.

Isso te dá absoluta chance de admissibilidade? É cla-


ro que não! Mas aumenta – e muito – as chances, a
depender da forma e do conteúdo que você aborde
no seu recurso especial, lembrando, claro, da neces-
sidade do famoso prequestionamento.

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# Para saber mais

AgInt no AREsp 1419534/DF, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA;

AgInt nos EDcl no AREsp 1160270/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, Rel. p/ Acórdão Ministro NAPO-
LEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA;

AgInt no AgInt no AREsp 1070584/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA;

AgInt no AREsp 1206646/SP, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA;

AgInt no AREsp 1266937/SP, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA;

AgInt no REsp 1583923/RR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA;

AgInt no AREsp 792.500/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA;

AgInt no AREsp 1124027/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA;

REsp 1701865/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA;

AgRg no AREsp 892.699/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA.

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Erro 06
Não comprovar feriado local ou sus-
pensão do expediente

Esse ponto já gerou algumas boas e várias controvérsias, principalmente devido à apa-
rente quebra de paradigma com a sistemática do atual CPC de 2015 e também com a
mudança de procedimento adotado na vigência do CPC de 1973.

No CPC anterior, 0após entendimento do STF dizendo que era possível comprovar feria-
do local (ou encerramento antecipado do expediente) em sede de agravo interno, o que
passou a ser aplicado também pelo STJ, a mudança legal introduzida pelo CPC de 2015
causou novo debate.

A essência da controvérsia é porque o art. 932, parágrafo único, da Lei Adjetiva assevera:

Art. 932, parágrafo único. Antes de considerar inadmissível o recurso, o re-


lator concederá o prazo de 5 (cinco) dias ao recorrente para que seja sanado
vício ou complementada a documentação exigível.

Essa norma alinha-se ao sistema de princípios do Código, que se lastreia na primazia


do mérito, razão pela qual prevista a intimação do(a) recorrente para sanar vicio ou
complementar a documentação antes de o recurso ser simplesmente “não conhecido”.

Por outro lado, existem dois outros artigos no CPC que causaram confusão. São eles:

Art. 1.003, § 6º. O recorrente comprovará a ocorrência de feriado local no


ato de interposição do recurso.

Art. 1.029, § 3º. O Supremo Tribunal Federal ou o Superior Tribunal de Justi-


ça poderá desconsiderar vício formal de recurso tempestivo ou determinar
sua correção, desde que não o repute grave.

Vemos que o art. 1.003, § 6º, é categórico ao dizer que o feriado local deve ser compro-
vado no ato da interposição do recurso, sem qualquer ressalva.

Além do mais, a desconsideração do vício formal permitida pelo art. 1.029, § 3º, só pode
ocorrer se o recurso for tempestivo.

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Então, a matéria foi solucionada pelo órgão jurisdicional máximo do STJ,


que é a Corte Especial, entendendo que o próprio Código estabelece que a
tempestividade deve ser comprovada no ato da interposição do REsp, não
sendo aplicável o parágrafo único do art. 932, tendo em vista que na pró-
pria legislação consta que a desconsideração de vício formal exige, em pri-
meiro lugar, que o recurso seja tempestivo.

Vamos estudar o julgado:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FERIADO LOCAL.


COMPROVAÇÃO. ATO DE INTERPOSIÇÃO DO RECURSO.

1. O propósito recursal é dizer, à luz do CPC/15, sobre a possibilidade de a


parte comprovar, em agravo interno, a ocorrência de feriado local, que en-
sejou a prorrogação do prazo processual para a interposição do agravo em
recurso especial.

2. O art. 1.003, § 6º, do CPC/15, diferentemente do CPC/73, é expresso no


sentido de que ‘o recorrente comprovará a ocorrência de feriado local no
ato de interposição do recurso’.

3. Conquanto se reconheça que o novo Código prioriza a decisão de mérito,


autorizando, inclusive, o STF e o STJ a desconsiderarem vício formal, o § 3º
do seu art. 1.029 impõe, para tanto, que se trate de ‘recurso tempestivo’.

4. A intempestividade é tida pelo Código atual como vício grave e, portanto,


insanável. Daí porque não se aplica à espécie o disposto no parágrafo único
do art. 932 do CPC/15, reservado às hipóteses de vícios sanáveis.

5. Seja em função de previsão expressa do atual Código de Processo Civil,


seja em atenção à nova orientação do STF, a jurisprudência construída pelo
STJ à luz do CPC/73 não subsiste ao CPC/15: ou se comprova o feriado local
no ato da interposição do respectivo recurso, ou se considera intempestivo
o recurso, operando-se, em consequência, a coisa julgada.

6. Agravo interno desprovido.

(AgInt no AREsp 957.821/MS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, Rel. p/ Acórdão


Ministra NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL, julgado em 20/11/2017, DJe
19/12/2017.)

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#Era uma vez a segunda-feira de carnaval...

Tem gente que gosta de festejar, tem gente que aproveita mesmo é para descan-
sar, outros ainda para fazer retiros espirituais ou religiosos. Tanto faz. O que
importa é que o famoso feriado de carnaval é tradicionalíssimo – e desejado pela
maioria.

Mas entre o descanso e a cerveja, enquanto alguns cantam “Oh, abre alas que eu
quero passar”, outros são arrastados e pisoteados pelos intermináveis trios elé-
tricos e outros mais esquecem que depois de nove meses você tem o resultado,
uma questão jurídica com grande repercussão surgiu no STJ.

Preste atenção, neném!

No julgamento do REsp 1.813.684/SP, após idas e vindas, pedidos de vista, votos


divergentes, convergentes e novas divergências, formação de ao menos 3 corren-
tes dentro do STJ, problemas de modulação de efeitos e outras complicações, a
Corte Especial (órgão máximo jurisdicional do STJ) definiu os seguintes pontos:

A controvérsia inicial limitava-se à segunda-feira de carnaval, mas a decisão foi


ampliada para todos os feriados locais;

A segunda-feira de carnaval e corpus christis não são feriados nacionais, por


não estarem previstos na Lei n. 6.802/80 c/c a Lei n. 9.093/95;

Mesmo sendo praxe não ter expediente forense nessas datas, não pode ser pre-
sumido o ponto facultativo nesses dias, ante o expresso impedimento do CPC;

É obrigatório comprovar que a segunda-feira de carnaval e o dia de corpus


christis é ponto facultativo ou feriado, juntando o respectivo ato normativo no
momento da interposição do REsp, conforme exigido pelo CPC 1.003, § 6º do
CPC;

A ausência de expediente não pode ser comprovada posteriormente. Logo, se


você não demonstrar esse fato na interposição do REsp, seu recurso não vai ser
conhecido e já era, você não terá outra chance.

Ante as inúmeras controvérsias surgidas entre os titios e titias da capa preta na


Corte Especial, buscaram uma posição conciliatória, sugerida pelo titio Luis
Felipe Salomão, prevista no art. 927, § 3º, do CPC.

Conclusão do julgamento: todo e qualquer feriado local, ponto facultativo ou


suspensão do expediente (incluindo segunda-feira de carnaval e corpus christi)
deve ser comprovado no ato da interposição do REsp, sob pena de não conheci-
mento.

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

Modulação dos efeitos: fica permitida a comprovação posterior à interposição


do REsp para aqueles recursos interpostos até a data de publicação do acórdão,
que ocorreu em 18 de novembro de 2019, salvo se já tiver transitado em julgado.

Para seu límpido estudo, veja a ementa desse julgado:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. FERIADO LOCAL. NECESSIDADE


DE COMPROVAÇÃO NO ATO DE INTERPOSIÇÃO DO RECURSO. MODULAÇÃO
DOS EFEITOS DA DECISÃO. NECESSIDADE. SEGURANÇA JURÍDICA. PROTE-
ÇÃO DA CONFIANÇA.

1. O novo Código de Processo Civil inovou ao estabelecer, de forma expressa,


no § 6º do art. 1.003 que “o recorrente comprovará a ocorrência de feriado local
no ato de interposição do recurso”. A interpretação sistemática do CPC/2015,
notadamente do § 3º do art.

1.029 e do § 2º do art. 1.036, conduz à conclusão de que o novo diploma atribuiu


à intempestividade o epíteto de vício grave, não havendo se falar, portanto, em
possibilidade de saná-lo por meio da incidência do disposto no parágrafo único
do art. 932 do mesmo Código.

2. Assim, sob a vigência do CPC/2015, é necessária a comprovação nos autos de


feriado local por meio de documento idôneo no ato de interposição do recurso.

3. Não se pode ignorar, todavia, o elastecido período em que vigorou, no âmbito


do Supremo Tribunal Federal e desta Corte Superior, o entendimento de que
seria possível a comprovação posterior do feriado local, de modo que não pare-
ce razoável alterar-se a jurisprudência já consolidada deste Superior Tribunal,
sem se atentar para a necessidade de garantir a segurança das relações jurídi-
cas e as expectativas legítimas dos jurisdicionados.

4. É bem de ver que há a possibilidade de modulação dos efeitos das decisões


em casos excepcionais, como instrumento vocacionado, eminentemente, a ga-
rantir a segurança indispensável das relações jurídicas, sejam materiais, sejam
processuais.

5. Destarte, é necessário e razoável, ante o amplo debate sobre o tema instala-


do nesta Corte Especial e considerando os princípios da segurança jurídica, da
proteção da confiança, da isonomia e da primazia da decisão de mérito, que
sejam modulados os efeitos da presente decisão, de modo que seja aplicada, tão
somente, aos recursos interpostos após a publicação do acórdão respectivo, a
teor do § 3º do art. 927 do CPC/2015.

6. No caso concreto, compulsando os autos, observa-se que, conforme docu-


mentação colacionada à fl. 918, os recorrentes, no âmbito do agravo interno,
comprovaram a ocorrência de feriado local no dia 27/2/2017, segunda-feira de
carnaval, motivo pelo qual, tendo o prazo recursal se iniciado em 15/2/2017
(quarta-feira), o recurso especial interposto em 9/3/2017 (quinta-feira) deve ser
considerado tempestivo.

7. Recurso especial conhecido.

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(REsp 1813684/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, Rel. p/ Acórdão Ministro LUIS
FELIPE SALOMÃO, CORTE ESPECIAL, julgado em 02/10/2019, DJe 18/11/2019)

Esse julgamento foi um importante marco devido à modulação dos efeitos re-
alizada, tanto que a AASP – Associação dos Advogados de São Paulo, amicus
curiae na causa, publicou uma nota celebrando o fato: “A decisão proferida
hoje pela Corte Especial representa uma significativa vitória dos jurisdiciona-
dos e da advocacia”.

# Na prática

Atentar-se ao prazo é algo essencial, tanto que muito conhece-


mos a velha brincadeira: “advogado não tem vida, tem prazo”.

Mas, além disso, você deve comprovar no próprio REsp (e isso


também vale para o recurso extraordinário) que houve feriado
local, seja municipal, estadual ou distrital, ponto facultativo ou
que o expediente foi encerrado mais cedo, juntando inclusive
cópia da lei ou do ato normativo respectivo. Essa exigência tam-
bém é válida para a segunda-feira de carnaval e dia de corpus
christi.

Desse modo, sempre confira corretamente o prazo recursal e,


caso haja um feriado local ou a suspensão do expediente, lem-
bre-se de alegar isso em preliminar no REsp e juntar o respecti-
vo ato!

Você já percebeu, neném, que aqui é onde “a porca torce o rabo”


e, se você não tomar cuidado, vai acabar se lascando por não po-
der comprovar o prazo depois de interposto o recurso especial.

Então, pelo amor de seja-lá-quem-você-acredite, tome cuidado


com isso, porque, depois, não adianta chorar o leite derramado,
ok?

#Para saber mais

AgInt no REsp 1805589/MT, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA;

AgInt no AREsp 1434220/MA, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA;

AgInt no AREsp 1447974/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA;

AgInt no AREsp 1405602/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA;

AgInt no AREsp 1443953/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA;

AgRg no AREsp 1502325/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA.

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Erro 07
Não esgotar a instância de origem

Para tratar desse erro, vamos novamente lembrar o que está na Constituição:

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:

III - julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última


instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Esta-
dos, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida (...) (gri-
fos nossos).

Dessa expressão em destaque, “causas decididas”, surgem algumas conclusões, entre


elas: a causa só é considerada realmente decidida se não tiver mais possibilidade de
alterações no julgado pelo Tribunal de origem, o que, em outras palavras, significa:
quando não couber mais recurso perante o TJ ou TRF.

Você deve lembrar-se de que os recursos podem ser divididos em duas categorias:
ordinários e extraordinários. Nestes, estão o recurso especial (nosso queridinho) e o
recurso extraordinário para o STF.

Também deve lembrar-se de que o REsp e o RE possuem fundamentação vinculada, so-


mente sendo cabíveis em hipóteses muito, muito específicas, previstas expressamente
na própria Constituição.

Ok! Recordamos isso para que toda a informação esteja fresca em sua memória e para
que possamos avançar.

Então, a pergunta da vez é: Como pode o STJ – por meio de um recurso extraordinário
(lato sensu) – analisar uma questão que ainda poderia ter sido decidida pelo Tribunal
de origem – de maneira ordinária?

E a resposta é: não pode!

Esse é o sentido do Enunciado n. 281 do STF:

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

É inadmissível o recurso extraordinário, quando couber na justiça de ori-


gem, recurso ordinário da decisão impugnada. (Súmula n. 281/STF).

Ou seja, você só pode interpor o recurso especial quando não puder mais apresentar
recurso ordinário junto ao TJ ou TRF (isso não significa embargos de declaração prote-
latórios, ok?).

Vamos lembrar a ideia geral do trâmite processual:

Petição apresentada ao TJ ou TRF,


em grau recursal ou originário

Decisão monocrática

Acórdão

Agravo interno
Embargos de declaração

Acórdão dos embargos


de declaração

Recurso Especial

Por esse quadro, você já se lembrou de que, se tiver sido proferida decisão monocrática,
pode apresentar o agravo interno para que o órgão colegiado possa se manifestar. Você
PODE, mas se quiser ter a oportunidade de utilizar o REsp, você DEVE interpor o agravo
interno!

Isso porque não cabe recurso especial contra decisão monocrática.


Assim, se não for apresentado o agravo interno,
seu REsp não vai ser conhecido – e fim.

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

Por mais incrível e esdrúxulo que possa parecer, sempre aparecem recursos que foram
interpostos contra decisão monocrática (caberia agravo interno), contra sentença (ca-
beria apelação ou recurso em sentido estrito), contra decisão interlocutória de 1º grau
(caberia agravo de instrumento ou recurso em sentido estrito) etc.

Espie este julgado aqui:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDE-


NATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA DA PRESIDÊNCIA DESTA CORTE QUE
NÃO CONHECEU DO RECLAMO ANTE A AUSÊNCIA DO ESGOTAMENTO
DAS VIAS ORDINÁRIAS. INSURGÊNCIA RECURSAL DA DEMANDADA.

1. Consoante a jurisprudência desta Corte Superior, a legislação processual


vigente (artigo 932 do CPC) permite ao relator julgar monocraticamente re-
curso inadmissível. Ademais, a possibilidade de interposição de insurgência
para apreciação do órgão colegiado (artigo 1.021 do CPC) afasta qualquer
alegação de ofensa ao princípio da colegialidade. Precedentes.

2. Não se conhece do recurso especial interposto contra decisão monocrá-


tica ante o não esgotamento das instâncias ordinárias, sendo aplicável o
óbice da Súmula 281 do STF.

3. Agravo interno desprovido.

(AgInt no AREsp 1480690/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA,


julgado em 26/08/2019, DJe 30/08/2019.)

Um ponto interessante tem a ver com os embargos infringentes. Sim, sabemos que eles
existiam no CPC de 1973, art. 530, e que foram abolidos no atual Código. No regime
anterior, era obrigatória a oposição dos infringentes, quando cabíveis, sob pena de não
conhecimento do REsp, nos termos do Enunciado n. 207/STJ:

É inadmissível recurso especial quando cabíveis embargos infringentes contra o


acórdão proferido no tribunal de origem. (Súmula n. 207/STJ).

E você deve estar pensando: essa Súmula perdeu objeto, já que os infringentes deixaram de
existir, certo?

Errado! Ela continua aplicável, por uma singela razão, conhecida para quem atua no cri-
me: os embargos infringentes continuam a existir e serem obrigatórios – nas hipóteses
legais – no âmbito do processo penal.

Tá duvidando? Aposto um chocolate. Olha o que diz o CPP:

Art. 609, parágrafo único. Quando não for unânime a decisão de segunda
instância, desfavorável ao réu, admitem-se embargos infringentes e de nu-
lidade, que poderão ser opostos dentro de 10 (dez) dias, a contar da publica-
ção de acórdão, na forma do art. 613. Se o desacordo for parcial, os embar-
gos serão restritos à matéria objeto da divergência.

Giovanni Fialho - 40
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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

Viu, eu disse! Você me deve um chocolate (eu prefiro amargo)! J

Se nós pensarmos bem, esse Enunciado n. 207/STJ, por tratar de um tipo específico de re-
curso, é mera especificidade da própria Súmula n. 281/STF, que aborda genericamente
todo e qualquer tipo de recurso objetivando o exaurimento da instância de origem.

De qualquer forma, as peculiaridades que havia nos embargos infringentes, principal-


mente as divergências, controvérsias e alterações legislativas existentes no âmbito do
CPC/73, fizeram com que o Superior Tribunal editasse essa súmula, cuja aplicabilidade
ainda subsiste, embora limitada à ordem processual penal. Vejamos.

PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO


ESPECIAL. USO DE DOCUMENTO FALSO E ESTELIONATO. RECURSO ES-
PECIAL NÃO CONHECIDO NOS TERMOS DA SÚMULA 207 DO SUPERIOR
TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. INOVAÇÃO
RECURSAL. INCABÍVEL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. Caracterizada a votação não unânime prejudicial à defesa, imprescin-


dível a oposição dos infringentes para fim de esgotamento da instância.
Inteligência da Súmula 207/STJ.

2. In casu, no julgamento da apelação criminal houve um voto favorável, ain-


da que parcialmente, ao recurso do réu e que restou vencido pelo chamado
‘voto médio’ (2 votos pelo desprovimento do apelo defensivo e 1 voto por seu
parcial provimento).

3. ‘Os embargos infringentes, recurso exclusivo da defesa, previsto no art.


609 do Código de Processo Penal - CPP, não exige, para sua interposição que
o acórdão tenha reformado a sentença de mérito, consoante o art. 530 do
Código de Processo Civil - CPC. No processo penal, basta que o acórdão te-
nha sido não unânime e seja desfavorável ao Réu.’ (AgRg no AREsp 334.087/
SP, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, QUINTA TURMA, DJe 12/11/2013)

4. A tese de ‘fungibilidade recursal’, não foi alegada em sede de recurso es-


pecial e representa, portanto, indevida inovação recursal, motivo pelo qual
não pode ser analisada. Precedentes.

Agravo regimental desprovido.

(AgRg no AREsp 751.566/RJ, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA


TURMA, julgado em 09/08/2016, DJe 19/08/2016.)

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

# Na prática

Então, neném, antes mesmo de você apresentar seu


REsp, verifique se ainda cabe algum recurso ordiná-
rio na origem. Mas, para isso, é necessário entender
a sistemática processual e os recursos cabíveis.

Não adianta interpor um monte de recurso sem pé


nem cabeça, como recurso em sentido estrito numa
causa cível, porque é completamente incabível. En-
tão, estude, estude e estude!

Particularmente, acho que, para adquirir segurança


na sistemática recursal, fluxogramas ajudam bastan-
te. J

#Para saber mais – Súmula n. 283/STF

AgInt nos EDcl no AREsp 1376834/RS, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA;

AgInt no AREsp 1363023/MG, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA;

AgInt no AREsp 1285051/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA;

AgInt no AREsp 1324359/PA, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA;

AgRg no AREsp 1072277/MG, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA.

#Para saber mais – Súmula n. 207/STJ

AgRg no AREsp 1265529/RS, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA;

AgRg no REsp 1708043/MG, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA;

AgRg no AREsp 994.536/SE, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA;

AgRg nos EDcl no AREsp 725.067/SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA;

AgInt no AREsp 995.276/SP, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA.

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

Erro 08
Matéria de fato

Você já sabe e eu já falei um monte, mas é importante lembrar, porque disso decorre
praticamente tudo: a função essencial do STJ é uniformizar a interpretação da legisla-
ção federal.

Muito se confunde interpretação de lei com análise o caso concreto. Então, vamos agora
esclarecer um pouco mais esse assunto, ao menos para que você possa começar a des-
mistificar a aplicação da famigerada Súmula nº 7/STJ, que tem o seguinte texto:

A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial. (Sú-


mula n. 7/STJ).

A redação é singela e você é inteligente o suficiente para perceber aquilo que não pode
em REsp: reexame de prova. Até porque a decorrência comum da interpretação da lei (e
sua consequente uniformização) é atribuir o sentido da lei. Sim, o sentido da lei decorre
de uma situação de fato, mas isso não quer dizer que o STJ precise necessariamente ve-
rificar se os fatos alegados aconteceram ou não.

Vamos dar alguns exemplos do que se constitui como simples reexame de prova:

a) Se no caso concreto consta a informação x ou y;

b) Se a intimação foi entregue para Maria ou para João;

c) Se fulano praticou ou não o ato em apuração;

d) Se o valor da perícia está adequado com a média do mercado;

e) Se a assistência técnica permaneceu com o produto para conserto por tantos


dias;

f) Se o fiscal que assinou o alvará estava regularmente inscrito no conselho profis-


sional;

g) Se a perícia é ou não necessária;

h) Se a dosimetria da pena está de acordo com as circunstâncias do caso.

Esses são alguns exemplos de situações que muito comumente aportam no STJ por meio
de REsp, mas todas elas não podem ser objeto de análise, porque significam ir além do
debate jurídico: recurso versus acórdão.

Podemos até mesmo dizer, de maneira bastante singela, que o REsp não permite olhar

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

além do acórdão; não permite virar a página para conferir se aquela situação realmente aconte-
ceu naqueles moldes alegados.

Ou seja: o exame do REsp limita-se aos seus argumentos e aos fundamentos do acórdão
– e nada além disso. Isso significa matéria de Direito!

Mas tio Giovanni, os fatos não importam? É claro que importam – é deles que surgem todas
as controvérsias jurídicas, já que o Direito é uma ciência social aplicada.

O que estou buscando dizer é que não vai o STJ, em REsp, avaliar se aqueles
fatos ocorreram realmente da maneira como alegado. A análise vai se limi-
tar aos efeitos jurídicos dos fatos previamente constatados pela instância de
origem, ou seja, os eventos são tomados como pressupostos a partir do que
se encontra incontroverso e das conclusões do Tribunal de origem.

A partir daí, o STJ avalia as consequências jurídicas daqueles fatos ou so-


mente a tese jurídica abstrata.

Vamos pegar alguns exemplos de questões jurídicas que cabem ao STJ em REsp:

a) Tendo a parte ciência da informação x em tal momento processual, qual o efeito


jurídico-processual decorrente?

b) A intimação destinada a João foi entregue no endereço correto, mas, para a pes-
soa de Maria, que assinou o comprovante de recebimento. Considera-se João
como intimado ou não?

c) O ato em apuração foi praticado por fulano. Esse ato enquadra-se no tipo penal
do art. x ou é contravenção do art. y?

d) O valor médio do mercado do imóvel é de R$... , conforme ficou demonstrado


pelo Tribunal de origem. A perícia avaliou o imóvel em R$... , valor abaixo da
média do mercado. Isso, por si só, enseja a necessidade de nova perícia?

e) O fato de a assistência técnica permanecer com o produto por mais de 45 dias


enseja necessidade de entrega de um novo?

f) O fiscal que assinou o alvará estava com a habilitação profissional suspensa, fru-
to de um procedimento administrativo junto ao respectivo conselho de classe.
Tal fato enseja a nulidade do alvará?

Esses são alguns exemplos que peguei das mesmas questões anteriormente colocadas
para demonstrar como existe substancial diferença na forma como a questão é levada
ao STJ.

Perceba que, se você foca na dúvida “aquele fato aconteceu ou não?” ou “não foi nessas
circunstâncias” ou ainda “isso foi diferente do que decidido”, provavelmente seu recurso vai
morrer na Súmula n. 7/STJ.

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

O ponto do seu REsp deve ser tese jurídica, no que, inclusive, podemos dizer que se
encaixa a consequência de determinado fato.

O conhecido brocardo da mihi factum dado tibi jus (dê-me os fatos que eu te darei o
direito) é plenamente válido para as instâncias ordinárias, mas não para o STJ, cuja finalidade
institucional não é especificamente “dar o direito”, e sim preservar a autoridade da legislação
federal. A propósito:

AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM


RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. ILICITUDE DA PROVA
VALORADA PELO TRIBUNAL DO JÚRI. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMEN-
TO. NULIDADE. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS QUESITOS NO MOMEN-
TO PRÓPRIO. PRECLUSÃO. TESE DE QUE A DECISÃO DOS JURADOS FOI
MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. SÚMULA N. 7 DO
STJ. DOSIMETRIA. EXISTÊNCIA DE PLURALIDADE DE QUALIFICADORAS.
UTILIZAÇÃO DE UMA PARA QUALIFICAR O CRIME E DAS DEMAIS PARA
MAJORAR A PENA-BASE. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. AGRAVO REGIMEN-
TAL DESPROVIDO.

1. Não sendo a questão referente à eventual ilicitude da prova abordada pelo


Tribunal de origem, carece, nesse ponto, o recurso do devido prequestio-
namento, pelo que incide, in casu, o disposto no enunciado 7 da Súmula de
Jurisprudência deste Tribunal Superior.

2. Conforme se depreende do acórdão proferido pelo Tribunal de origem,


não houve impugnação defensiva após a leitura dos quesitos pelo Juiz-Pre-
sidente, o que obsta a análise de eventual vício diante da ocorrência de pre-
clusão.

3. Para afastar a conclusão do Tribunal de origem de que a sentença conde-


natória não é manifestamente contrária às provas dos autos, seria neces-
sário o revolvimento do conjunto fático-probatório amealhado durante a
instrução criminal, providência vedada em recurso especial, consoante o
disposto na Súmula n. 7 do STJ (AgRg no REsp n. 1.789.414/RO, de minha
relatoria, SEXTA TURMA, julgado em 19/3/2019, DJe 3/4/2019).

4.Havendo pluralidade de qualificadoras reconhecidas pelo Tribunal do


Júri, é idônea a utilização de uma delas para qualificar o referido delito e das
demais para sobrelevar a pena-base.

5. Agravo regimental desprovido.

(AgRg nos EDcl no AREsp 1229969/RJ, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA


PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 17/09/2019, DJe 26/09/2019.)

AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM


RECURSO ESPECIAL. OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENI-
ZATÓRIA E EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO. PLANO DE SAÚDE. CUSTEIO DE
PRÓTESE. CLÁUSULA RESTRITIVA. NATUREZA ABUSIVA. AUSÊNCIA DE
PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282 E 356/STF. DESPESAS MÉDICAS.

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REEMBOLSO INTEGRAL. DESCABIMENTO. RESPONSABILIDADE CIVIL.


DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. AGRAVO NÃO PROVIDO.

1. [...]

4. No caso dos autos, a Corte de origem concluiu, mediante o quadro fáti-


co-probatório carreado aos autos, que a conduta da recorrida não causou
abalo psicológico, mas representou mero aborrecimento, e, por tal razão,
indeferiu o pleito indenizatório.

5. A alteração das premissas fáticas delineadas pelo acórdão recorrido de-


mandaria a reanálise do contexto fático-probatório dos autos, providên-
cia, todavia, incabível em sede de recurso especial, a atrair a incidência
da Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça.

6. Esta Corte de Justiça tem entendimento de que a incidência da Súmula


7/STJ impede o exame de dissídio jurisprudencial, na medida em que falta
identidade entre os paradigmas apresentados e os fundamentos do acórdão,
tendo em vista a situação fática do caso concreto, com base na qual deu so-
lução à causa a Corte de origem.

7. Agravo interno não provido.

(AgInt nos EDcl no AREsp 1430915/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA
TURMA, julgado em 10/09/2019, DJe 02/10/2019.)

É claro que cabe ao STJ “dizer o direito”, mas como mera decorrência de uma análise de afron-
ta a lei federal, hipótese na qual aplicável o brocardo latino da mihi factum dado tibi ius,
aplicando o direito à espécie, conforme art. 255, § 5º, do RISTJ, Súmula nº 456/STF e art.
1.034 do CPC.

#Na prática

Você nunca vai conseguir sucesso num REsp se entrar no arris-


cado embate de questionar a ocorrência dos fatos. Lembre-se
que o STJ toma como premissa para decidir toda a estrutura
fática que foi delineada pelo Tribunal de origem.

Por isso você precisa focar suas teses no efeito jurídico de de-
terminado fato ou na mera questão jurídica (mais abstrata).

Para isso, não caia na falácia de que “os fatos são mais importan-
tes porque o juiz sabe o direito”, já que a finalidade do STJ é dife-
renciada. Então, verifique se na petição a matéria jurídica está
adequadamente estabelecida e indicada e verifique se a análise
jurídica foi apreciada pelo Tribunal de origem sob o enfoque fá-
tico. Se tiver muito evidente a questão fática, buscar tangenciar
a controvérsia com outras teses jurídicas.

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

#Para saber mais

AgInt no AREsp 1339625/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA;

AgInt no AREsp 1454689/GO, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA;

AgRg no AREsp 1300204/PR, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA;

AgInt no REsp 1708289/PE, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA.

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Erro 09
Cláusula contratual

Vimos no Erro 8 que o REsp destina-se a exame de matéria exclusivamente de direito e


também os motivos de incidência da Súmula n. 7/STJ. Então, da mesma forma que não
cabe apreciação de questões de fatos e provas, também não cabe ao STJ exame de cláu-
sula contratual.

O direito dos contratos possui vasta regulação legal, cuja base está no Código Civil, mas
que se estende por dezenas – talvez centenas – de leis esparsas, dos mais diversos tipos
de contratos. Toda essa grande quantidade de lei e milhares de dispositivos legais pode,
obviamente, ter sua aplicação ou interpretação questionada em sede de REsp.

O que não tem cabimento, de jeito nenhum, é querer que o STJ interprete o alcance, a
aplicabilidade ou mesmo o sentido de cláusula contratual, porquanto isso vai além do
conceito de lei federal e de matéria de direito. Por isso a Súmula n. 5/STJ:

A simples interpretação de cláusula contratual não enseja recurso especial.


(Súmula n. 5/STJ).

Perceba, neném, como a ideia é muito parecida com a Súmula n. 7, já que reforça a impos-
sibilidade de o STJ analisar em REsp questões que não sejam de direito (você já sabe e
vou repetir 500 vezes até entrar na sua cabeça que essa é a finalidade maior da existência
do STJ).

Essa súmula tem duas abordagens:

a) A primeira, que é mais rara, acontece quando no recurso consta expressamente


que “a cláusula x do contrato foi violada”. Aqui, se você se lembrar, tem dois pro-
blemas, pois, além de não ser matéria de direito, também está apontando uma
determinada regra jurídica (contrato) como violada para fins de REsp, que passa
muito longe do conceito de lei federal, como vimos lá atrás, nos Erros 4 e 5.

A segunda hipótese, muito mais comum, ocorre diante da necessidade de


verificar os termos de um contrato como condição para analisar a alegada
afronta à lei federal. Ou seja, no REsp é indicado um determinado dispositi-
vo de lei federal como violado, mas, para que se possa realizar esse exame
pretendido – se houve ou não a alegada afronta –, é imprescindível olhar o
contrato.

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

Acho que a melhor forma para entender essa segunda hipótese é um exemplo
prático. Vamos a ele:

O REsp alega violação do art. 439 do Código Civil que diz assim:

Art. 439. Aquele que tiver prometido fato de terceiro responderá por perdas
e danos, quando este o não executar.

A alegação deduzida no recurso especial é no sentido de que não foi prometido fato de
terceiro, tendo ocorrido mera menção ao nome de fulano para fins de referência dos
termos do trabalho realizado por ele, na qualidade de artista plástico.

Como pode qualquer julgador decidir se nesse singelo caso houve promessa de fato de
terceiro, conforme art. 439 do Código Civil, sem examinar os termos do próprio contra-
to? Pois é, não tem como.

Exatamente por ser necessário o exame das cláusulas contratuais para verificar qual a
referência e o sentido atribuído ao nome de fulano, não pode o STJ verificar a ofensa ao
art. 439 do Código Civil, esbarrando na Súmula n. 5.

E agora, ficou mais compreensível essa 2ª hipótese de aplicação da Súmula n. 5? J

Mas, atenção, não se trata somente de contrato no sentido estrito do termo (ato negocial en-
tre duas partes). Existem vários julgados aplicando o mesmo entendimento da Súmula
n. 5/STJ diante da necessidade de exame de estatuto social, atas de assembleia etc.

PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO


ESPECIAL. DISSOLUÇÃO E LIQUIDAÇÃO DE SOCIEDADE. SOCIEDADE POR
QUOTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO
JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. SUCESSÃO DO HERDEIRO NA SOCIE-
DADE. INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULA CONTRATUAL. INADMISSIBILIDA-
DE. SÚMULA N. 5 DO STJ. ALTERAÇÃO NO CONTRATO SOCIAL. AUSÊNCIA
DE REGISTRO PÚBLICO. PRODUÇÃO DE EFEITOS. PRINCÍPIOS VENIRE
CONTRA FACTUM PROPRIUM E BOA-FÉ OBJETIVA. DECISÃO MANTIDA.

1. Inexiste afronta ao art. 535 do CPC/1973 quando a Corte local pronunciou-


-se, de forma clara e suficiente, acerca das questões suscitadas nos autos,
manifestando-se sobre todos os argumentos que, em tese, poderiam infir-
mar a conclusão adotada pelo Juízo.

2. O recurso especial não comporta exame de questões que impliquem in-


terpretação de cláusula contratual (Súmula n. 5 do STJ).

3. No caso concreto, o Tribunal de origem, após análise da cláusula con-


tratual, concluiu pela possibilidade de sucessão dos herdeiros do de cujus
na sociedade empresária. Entender de modo contrário demandaria nova
análise do contrato, inviável em recurso especial, ante o óbice da referida
súmula.

Giovanni Fialho - 50
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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

4. No caso dos autos, impõe-se a aplicação dos princípios do venire contra


factum proprium e da boa-fé objetiva, tendo em vista que o recorrente, apesar
de ter anuído expressamente à alteração contratual para permitir a sucessão
causa mortis, alega a inoperância de tal cláusula pela ausência do devido
registro, omissão a que, como sócio, deu causa (precedentes).

5. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no AREsp 204.801/RS, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA,


QUARTA TURMA, julgado em 27/08/2019, DJe 30/08/2019.)

#Na prática

Em primeiro lugar, nada de alegar afronta a algum


dispositivo do contrato, estatuto social etc. Primei-
ro, por não se enquadrar no conceito de lei federal;
segundo, por esbarrar na Súmula n. 5/STJ.

Em segundo lugar, na hora de expor o raciocínio


jurídico em sua petição, busque colocar-se do outro
lado (julgador). Limite-se à matéria de lei federal,
especialmente partindo do que foi consignado pelo
Tribunal de origem, cuja conclusão fática, probató-
ria e também do exame das cláusulas contratuais é,
em regra, aceita como verdadeira pelo STJ.

#Para saber mais

AgInt no AREsp 1450979/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA;

AgInt no REsp 1295875/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA;

AgInt no REsp 1792726/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA;

AgInt no REsp 1578318/TO, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA;

AgInt no REsp 1815585/DF, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA;

AgInt no AREsp 1407738/RJ, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA.

Giovanni Fialho - 51
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Erro 10
Não infirmar fundamento
constitucional autônomo

Você lembra do diálogo entre a Ana e a Eduarda, mãe e filha, que analisamos lá atrás
no Erro 3? Se você não se recordar completamente, sugiro que pare aqui e releia esse
trecho para que você possa avançar com segurança no raciocínio que faremos.

Então, lá no Erro 3, falamos sobre a Súmula n. 283/STF, explicando que não há razão
para o STJ apreciar determinado REsp se a conclusão adotada no Tribunal de origem
subsiste em face de fundamentos que não foram infirmados nas razões recursais. Por
isso, tem que impugnar todos os fundamentos dentro daquele ponto objeto de recurso
especial.

Agora imagine o seguinte: dentro do mesmo ponto (na linguagem jurídica: dentro do
mesmo capítulo da sentença), o Tribunal de origem decidiu a questão com mais de um
fundamento, sendo de ordem constitucional um desses fundamentos. Como fica então
a aplicação da Súmula n. 283/STF?

Simples: ela não se aplica nesse caso, incidindo, na verdade, a Súmula n. 126/STJ, que
diz o seguinte:

É inadmissível recurso especial, quando o acórdão recorrido assenta em funda-


mentos constitucional e infraconstitucional, qualquer deles suficiente, por si só,
para mantê-lo, e a parte vencida não manifesta recurso extraordinário. (Súmula
n. 126/STJ).

Da leitura desse enunciado, creio que você já deve ter percebido que a ideia é a mesma
da Súmula n. 283/STF, mas com um desdobramento específico por se tratar de matérias
constitucional e legal simultaneamente invocadas pelo acórdão recorrido em seus fun-
damentos relativos ao mesmo ponto.

Trocando em miúdos:

Se o Tribunal de origem diz que não é cabível o pedido tal devido à aplica-
ção ao caso de um dispositivo de lei federal e também porque haveria regu-
lamentação constitucional, tem-se aqui 2 fundamentos, sendo que ambos

Giovanni Fialho - 52
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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

devem ser atacados se forem suficientes, por si sós, para a manutenção do


decisum: sendo o primeiro por meio do REsp e o segundo por meio do recur-
so extraordinário para o STF.

Claro que essa situação pode ocorrer em qualquer processo e matéria, porém é mais
comum nas causas relativas a direito público devido ao grande espectro de questões des-
se jaez (nossa, falei bonito!) disciplinadas na Constituição Federal, sendo mais raro nas
causas de direito privado (raro mas não incomum).

Dê uma olhada neste julgado:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JU-


RISDICIONAL. ALEGAÇÃO GENÉRICA. ICMS. DIREITO DE CREDITAMEN-
TO. FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. INE-
XISTÊNCIA.

1. ‘Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a deci-


sões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos
de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até
então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça’ (Enunciado Ad-
ministrativo n. 2, sessão de 09/03/2016).

2. Por força da Súmula 284 do STF, não se conhece do recurso especial quan-
do a tese de violação do art. 535, II, do CPC/1973 é genérica, sem especifica-
ção do vício de integração e de sua relevância para a solução da lide.

3. A existência de fundamento constitucional autônomo não atacado por


meio de recurso extraordinário enseja a aplicação do óbice de conheci-
mento do recurso especial estampado na Súmula 126 do STJ.

4. Hipótese em que o acórdão recorrido consignou vasta fundamentação


de índole constitucional, não impugnada, para concluir pelo direito par-
cial da empresa agravada ao creditamento de ICMS.

5. Agravo interno não provido.

(AgInt no AREsp 1018228/PI, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA


TURMA, julgado em 23/09/2019, DJe 25/09/2019.)

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

#Na prática

Na hora de fazer seu queridinho REsp, sugiro usar a


mesma dica que dei no Erro 3: fazer um mapa dos
fundamentos e impugnar cada um. A diferença é
que a impugnação vai ser por meio de um recurso
autônomo – recurso extraordinário, para o STF, mas
que se assemelha e muito ao recurso especial.

Ah, outra coisa: é possível, também, abrir uma preli-


minar no REsp na tentativa de explicar porque NÃO
seria o caso da Súmula n. 126/STJ, demonstrando
que o fundamento constitucional utilizado não é au-
tônomo, por si só, para a manutenção do acórdão re-
corrido ou que se trata de ofensa meramente reflexa.

Mas eu acho isso bem arriscado. Por isso, sugiro que,


na dúvida, melhor interpor o extraordinário.

#Para saber mais

AgInt no REsp 1376515/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA;

AgInt no REsp 1515848/PE, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA;

AgInt no REsp 1693916/PE, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA;

AgInt no AREsp 722.596/RJ, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA;

AgInt no AREsp 997.038/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA;

AgRg no REsp 1740500/TO, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA.

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

Erro 11
Apontar afronta a Súmula
Nos Erros 4 e 5, vimos bastante sobre o que é lei federal, lembra? Fazendo um resumo
rápido para recordar: com base no art. 105, III, a, da Constituição, que já citamos um
milhão de vezes aqui, podemos dizer que lei federal é todo ato normativo abstrato e
genérico produzido pelo Poder Legislativo Federal e emanado diretamente da Consti-
tuição Federal.

Então agora vamos entender outra questão: o que é uma súmula?

Primeiro, apesar de usarmos no dia-a-dia (e neste e-book, inclusive) a expressão Súmu-


la nº 7/STJ, sabemos que está errado, já que o correto é o Enunciado nº 7 da súmula de
jurisprudência do STJ, pois o vocábulo súmula significa resumo, sinopse. De qualquer
maneira, fica para registro, mas entendemos o que queremos comunicar, não é mesmo?

Súmula, de qualquer maneira, é o resumo de determinado entendimento; é a conden-


sação do modo de pensar ou decidir de certo órgão, independente de sua natureza. Por
isso, inúmeros órgãos possuem súmulas, tanto de natureza administrativa (AGU, CARF,
CADE etc), quanto de natureza judicial (tribunais).

Agora eu te pergunto uma coisa: Súmula se enquadra no conceito de lei federal, previsto
lá no art. 105, III, a, da CF/88?

Se você disser que sim, eu juro que te bato! É claro que não é lei federal, caramba!

Não é ato normativo, não é produzido pelo Poder Legislativo em sua função típica, não
emana diretamente da Constituição, não é abstrato e genérico, já que decorre da con-
solidação de entendimentos aplicados em casos concretos. Ou seja: não é lei federal.

Conclusão inevitável: nunca diga que o acórdão recorrido violou uma súmula, nem mes-
mo do próprio STJ ou até as vinculantes do STF, porque o REsp é incabível!

Ah, você ainda duvida do que eu falo? Então olhe o que o STJ teve que fazer para deixar
isso ainda mais claro:

Para fins do art. 105, III, a, da Constituição Federal, não é cabível recurso
especial fundado em alegada violação de enunciado
de súmula (Enunciado n. 518/STJ).

Então, pare com essa mania maluca de dizer que o acórdão violou a Súmula x do STJ,
porque isso tá feio demais e você tá passando vergonha, viu?

Ah! Mas, tio Gi, o Tribunal de origem decidiu realmente em sentido contrário ao que
dispõe uma súmula do STJ. O que posso fazer, então?

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Essa questão é a mesma se o entendimento adotado pelo Tribunal de origem estiver con-
trário à jurisprudência do STJ, mesmo que não exista súmula sobre a questão e mesmo
que seja representativo de controvérsia.

É preciso extrair da controvérsia os dispositivos legais envolvidos e apontá-


-los como violados. Para isso, necessário estudar a questão, ler os acórdãos,
entender qual a base legal do debate jurídico e, assim, extrair os dispositi-
vos legais envolvidos.

Sobre isso, julgados têm aos montes. Olhe este aqui:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLA-


RATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM OBRIGAÇÃO
DE FAZER E INDENIZAÇÃO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ENSINO. 1. IN-
DICAÇÃO DE OFENSA A SÚMULA. IMPOSSIBILIDADE NO APELO NOBRE.
2. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282 E 356 DO STF. 3.
APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. VÍCIO NA PRES-
TAÇÃO DO SERVIÇO. FORNECEDOR. LEGITIMIDADE RECONHECIDA. RES-
PONSABILIDADE OBJETIVA E SOLIDÁRIA. PRECEDENTES. 4. PRETENSÃO
DA PARTE AGRAVADA DE CONDENAÇÃO DA AGRAVANTE À MULTA POR
LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. RAZÕES DEFICIENTES. SÚMULA 284/STF. 5. HO-
NORÁRIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO EM AGRAVO INTERNO. NÃO CABI-
MENTO. 6. AGRAVO IMPROVIDO.

1. Não cabe ao STJ apreciar violação a verbete sumular em recurso espe-


cial, visto que o enunciado não se insere no conceito de lei federal, pre-
visto no art. 105, III, a, da Constituição Federal, consoante a Súmula 518
desta Corte: “Para fins do art. 105, III, a, da Constituição Federal, não é
cabível recurso especial fundado em alegada violação de enunciado de
súmula”.

2. A ausência de prequestionamento se evidencia quando o conteúdo nor-


mativo contido nos dispositivos supostamente violados não foi objeto de
debate pelo Tribunal de origem. Hipótese em que incidem os rigores das
Súmulas n. 282 e 356/STF.

3. De fato, a condição de fornecedora da recorrente foi devidamente reco-


nhecida pela instância ordinária à luz do Código de Defesa do Consumidor,
de plena aplicabilidade à espécie, não havendo como acolher a tese de sua
ilegitimidade. Assim, uma vez constatada a franquia, o fornecedor responde
solidária e objetivamente pelos danos decorrentes do serviço. Precedentes.

4. Relativamente à pretensão de aplicação da multa por litigância de má-


-fé por parte do agravado, a argumentação expendida nas razões do apelo
extremo não particulariza qual o dispositivo legal que teria sido malferido.
Desse modo, incide o enunciado sumular n. 284 do STF.

5. Com efeito, a jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que não have-


rá majoração de honorários no julgamento de agravo interno e de embargos

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de declaração oferecidos pela parte que teve seu recurso não conhecido in-
tegralmente ou improvido.

6. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no AREsp 1194242/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE,


TERCEIRA TURMA, julgado em 07/08/2018, DJe 13/08/2018.)

#Na prática

Esse ponto é simples, não é mesmo?

Nada de alegar que a súmula x ou y foi violada, por-


que agora você já sabe que isso não pode de jeito
algum, ok?

Somente alegue afronta à lei federal e, se precisar,


use as súmulas como argumentação jurídica para
explicar a violação alegada.

#Para saber mais

AgInt no AREsp 1410995/GO, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA;

AgInt nos EDcl no REsp 1624092/DF, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA;

AgInt no REsp 1724930/SP, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA;

AgRg no AREsp 1196276/RJ, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA.

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Erro 12
Não fazer cotejo analítico
Vamos falar um pouco do tal do dissídio pretoriano? Esse cara também é chamado de
“divergência jurisprudencial” e está previsto lá no art. 105, III, c, da Constituição Fede-
ral, que diz o seguinte:

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:

III – julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última


instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Esta-
dos, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida:

c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro
tribunal.

Vamos traduzir o que diz esse dispositivo constitucional: dois tribunais diferentes de-
cidem em sentidos diversos acerca do mesmo ou similar fato e sobre o qual índice a
mesma norma jurídica.

Para nossa primeira observação, vamos brincar de jogo de adivinhação! No art. 105, III,
c, da Constituição, qual é a palavra que existe depois de “atribuído” e antes de “tribunal”?

c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído OU-
TRO tribunal.

Outro é um pronome indefinido que, no contexto analisado, significa “qualquer tribunal


do país, exceto aquele contra o qual você está recorrendo”. Ou seja, tribunais diferentes;
diferentes; diferentes.

Se você está recorrendo contra acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, por
exemplo, você pode alegar que o Tribunal de qualquer Estado do país, do Distrito Fede-
ral, qualquer TRF ou o próprio STJ tenha decidido aquela questão de maneira diversa,
você só não pode alegar que o próprio TJMG decidiu de maneira diferente. Sabe por
quê? Porque não é outro tribunal, é o mesmo tribunal, neném!

Parece óbvio o que estou falando? Só parece, porque estou trazendo mastigado para
você, mas muitos recursos são interpostos cometendo esse erro, acredita? E, para com-
provar isso, o STJ teve que editar uma súmula explicando a questão:

A divergência entre julgados do mesmo tribunal não enseja recurso especial


(Súmula n. 13/STJ).

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Eventual divergência entre julgados do próprio tribunal dá ensejo, por exemplo, ao inci-
dente de uniformização de jurisprudência, mas não ao REsp, ok?

Portanto, superado o primeiro ponto, vamos aos demais.

Para comprovar o dissídio, são obrigatórios 3 itens,


que configuram o cotejo analítico:

Semelhante situação de fato (ou igual);


Idêntica norma jurídica incidente sobre ambas as situações;
Conclusões diversas de cada tribunal.

Na sua mente pode ter passado agora a seguinte dúvida: “Ah, Giovanni, tem que ter to-
dos esses 3 elementos ou basta só um deles?”

Resposta do tio: TODOS OS 3! Entendeu ou quer que desenhe? Pois bem, vamos agora
analisar melhor cada um desses elementos.

Suponhamos que perante tribunais diferentes tenham sido proferidos os seguintes


acórdãos:

a) Situação de fato: ação de indenização extracontratual;

b) Norma jurídica incidente: ambos os acórdãos fundamentaram-se no art. 406 do


Código Civil;

c) Conclusões: O Tribunal 1 decidiu que os juros de mora incidem à taxa de 1% ao


mês e o Tribunal 2 decidiu que os juros de mora incidem à taxa de 0,5% ao mês.

Nesse exemplo, temos configurado o dissídio, podendo, em tese, ser aceito o REsp pela
alínea c do permissivo constitucional.

Situação de fato: Se a situação de fato do acórdão recorrido e do paradigma for exa-


tamente a mesma (idêntica, portanto), é um “universo dourado”, maravilhoso! Mas isso é
raríssimo de acontecer, já que sempre existe algum ponto ou elemento que se diferencia no caso
concreto. De qualquer maneira, o mais importante é demonstrar que se tratam de situações
similares.

Situação de direito (norma jurídica incidente): Aqui não tem como escapar, não há
semelhança que resolva, tem mesmo é que ser idêntica a norma jurídica utilizada para
decidir a controvérsia em ambos os julgados, tanto o recorrido quanto o paradigma.

Ou seja, não adianta alegar que ambos trataram da prescrição quinquenal, sendo que
um o fez com base no art. 206, § 5º, do Código Civil e outro o fez com base no art. 1º do
Decreto n. 20.910/32. Mesmo que as duas normas disponham sobre o prazo de 5 anos de
prescrição, são aspectos, fundamentos e aplicações bem diferentes, não podendo, por
isso, ser comparadas.

Conclusões (dissídio propriamente dito): Neste momento, ocorre o grand finale, o in-
comparável desfecho para que se tenha a divergência configurada. É preciso que cada
tribunal (o recorrido e o paradigma) tenha decidido de forma diversa.

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Somente assim é possível demostrar que, diante de similar situação de fato, à luz da
mesma norma jurídica, dois tribunais decidiram de forma diversa, o que causa instabi-
lidade jurídica (e até pode afrontar, em última instância, o pacto federativo).

Esses 3 elementos juntos formam o que se chama cotejo analítico! (Ohh! Agora conse-
gui ajudar com esse mistério?)

Um último ponto também muito importante é que não adianta trazer no seu recurso
especial somente a ementa dos julgados paradigmas. É preciso que você reproduza os
trechos dos acórdãos de modo a demonstrar a similitude fática dos casos, a mesma base
jurídica e a conclusão divergente. Então, é mesmo um trabalho de comparação entre o
acórdão recorrido e o(s) paradigma(s). Nesse sentido, o seguinte julgado:

PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. ALIENA-


ÇÃO DE IMÓVEL. EMBARGOS DE TERCEIRO. ILEGITIMIDADE. FIRMADO
NO JULGADO O DESPEJO DA RECORRENTE, AFASTANDO SUA POSSE DIRE-
TA. FUNDAMENTO INATACADO. SÚMULA 283/STF. DEFICIÊNCIA RECUR-
SAL. SÚMULA 284/STF. PREQUESTIONAMENTO. NECESSIDADE, MESMO
EM SE TRATANDO DE MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. DISSÍDIO INTER-
PRETATIVO. NÃO DEMONSTRAÇÃO NOS TERMOS REGIMENTAIS. AGRAVO
INTERNO DESPROVIDO.

1. Na inicial do apelo especial, não foi questionada a inexistência de posse


direta do imóvel, o que afastaria a legitimidade da parte para a apresentação
dos embargos de terceiro. Fundamento inatacado, suficiente para manter o
julgado. Incidência da Súmula 283/STF.

2. É inadmissível o inconformismo por deficiência na sua fundamentação


quando as razões do recurso estão dissociadas do decidido no acórdão re-
corrido. Aplicação da Súmula 284/STF.

3. Os arts. 109 da CF; e 87 e 113, § 2º, c/c o art. 125, I e III, do CPC/1973 não
foram prequestionados no julgado recorrido, nem sequer implicitamente, e
a recorrente, a despeito da oposição dos embargos declaratórios, não alegou
violação do art. 535 do CPC/1973 no recurso especial. Desse modo, aplica-se
à hipótese dos autos as Súmulas 282 e 356 do STF.

4. Quanto ao dissídio jurisprudencial, verifica-se que a alegação não foi


devidamente fundamentada. Inexiste no recurso especial o adequado co-
tejo analítico nos termos regimentais, com a demonstração da similitude
fática entre acórdãos que tenham se debruçado sobre o mesmo disposi-
tivo de lei federal. Há apenas mera indicação de julgados que seriam di-
vergentes, o que torna inviável o conhecimento do recurso com base na
alínea c do permissivo constitucional.

5. Agravo interno desprovido.

(AgInt no REsp 1625144/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TER-


CEIRA TURMA, julgado em 23/09/2019, DJe 27/09/2019.)

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Lembre-se, por fim, de comprovar a origem do julgado paradigma, nos termos do § 1º


do art. 1.029 do CPC. Diante das facilidades tecnológicas e de acesso a informações,
parece-me que a opção mais fácil é juntar a íntegra do julgado em anexo às razões re-
cursais, indicando a fonte.

Lembrando que a mera referência à fonte e aos trechos do julgado (mesmo que bem
demonstrado o dissídio) não é suficiente para comprovar a divergência, sendo impres-
cindível fazer prova da divergência, sob pena de não conhecimento do recurso.

Em um julgado interessante, o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho fez constar que o
dissídio não deve somente estar demonstrado, mas também documentado. Veja:

[...] 15. A interposição de Recurso Especial para o Superior Tribunal de Jus-


tiça requer o primoroso atendimento de requisitos constitucionais de alta
definição jurídica; assim, a demonstração da chamada divergência preto-
riana deve se dar de forma analítica e documentada, por meio do cotejo
analítico, para se comprovar que a decisão recorrida está em desacordo com
precedentes julgados de outros Tribunais, inclusive e especialmente deste
STJ (art. 105, III, c da Carta Magna).

[...]

(AgInt no AREsp 842.731/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO,


PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/06/2019, DJe 27/06/2019.)

Por isso, bastante cuidado na hora de elaborar seu recurso pela alínea c, porque – seja-
mos honestos – ela possui muitos detalhes, o que facilita o não conhecimento.

#Na prática

Vamos colocar os pingos nos is: é difícil demonstrar o


dissídio. Não é impossível, mas, na prática, é muito mais
simples entrar com o REsp pela alínea a (afronta à lei fe-
deral) do que pela c.
Se você vai se aventurar pelo dissídio pretoriano, lembre-
-se de buscar julgado de tribunal diferente, explicando
detalhadamente os 3 pontos exigidos (não bastando para
isso a mera reprodução das ementas), devendo ser detida-
mente expostos os acórdãos na petição, com reprodução
clara dos trechos que demonstrem a similitude fática,
base jurídica e divergência de entendimentos.

Lembre-se sempre, sempre e sempre destes três pontos:

Fatos similares – Direito aplicável igual – Conclusões dife-


rentes.
Além do mais, lembre-se de documentar suas alegações,
ou seja, comprovando a origem do julgado paradigma, nos
termos do art. 1.029, § 1º, do CPC e do art. 255 do RISTJ.

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#Para saber mais

AgInt no AREsp 871.671/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA;

AgInt no REsp 1376515/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA;

AgInt no REsp 1194535/ES, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA;

AgInt no REsp 1680192/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA;

AgInt no AREsp 1299825/MG, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA;

EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 1797895/RS, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA.

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Mas, tio Gi, e o


prequestionamento?
Se, após a leitura e o estudo desses erros, você está se
perguntando sobre o prequestionamento, devo dizer
que não foi colocado neste manual propositadamen-
te, já que essa exigência não é somente um “erro da
petição”. Na verdade, o prequestionamento é muito
mais complexo, porque ele passa por verdadeira es-
tratégia processual a ser conduzida antes mesmo de
proferido o acórdão pelo TJ ou TRF.

Se o processo é um xadrez, posso até dizer que o pre-


questionamento talvez seja a rainha, com multiplici-
dade de funções, mas também com grande visibili-
dade.

Muito mais do que um “erro”, o prequestionamento


é uma condicionante estratégica para interposição
do REsp. Por isso, não caberia como sendo um item
deste estudo.

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Recurso Especial: Os 12 erros mais comuns e como evitá-los

Conclusão
Eu sou meio bobo, sabe? Às vezes me emociono com coisas simples, mas acre-
dito que são o combustível da vida. E eu – de verdade – fico feliz de você ter
chegado até aqui (se está lendo a conclusão antes de terminar o conteúdo, pode
parar!).

Meu objetivo era demonstrar que a maior parte das hipóteses de inadmissibi-
lidade do REsp pode ser evitada (ou mitigada) com cuidados simples, sempre
partindo da compreensão do mister desse recurso e do STJ: uniformizar a inter-
pretação da legislação federal.

Por isso, ao identificar erros mais comuns cometidos na petição do REsp, e ex-
plicar os motivos, minha proposta foi desmistificar um pouco a atuação jurisdi-
cional do Superior Tribunal de Justiça e propiciar mais condições de admissibi-
lidade do seu recurso especial.

Tenho certeza de que vários mitos foram derrubados e equívocos desfeitos – e


agora você tem muito mais chances de ter um recurso especial melhor elabo-
rado, com mais chances de admissibilidade. Vou usar de licença poética: você
agora pode elaborar um recurso foda!

Se eu te ajudei ou se posso ajudar de outra forma, eu quero saber o que mudou


ou melhorou nas suas atividades e na sua vida, ok? É só me chamar pelas redes
sociais ou pelo e-mail.

Forte abraço com sucesso e admissibilidade,

Giovanni Fialho.

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RECURSO ESPECIAL
Os 12 erros mais comuns
e como evitá-los

Giovanni Fialho

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