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Resumo
A crescente utilização de fontes renováveis como solar e eólica junto com desenvolvimento
de dispositivos inteligentes distribuídos permite a utilização integrada de dados para viabilizar um
suprimento energético otimizado e sustentável. O equilíbrio entre a geração e consumo passa a
considerar cada vez mais o lado da demanda na gestão de recursos e o desenvolvimento tecnológico
propõe soluções para esses cenários. Nesse trabalho são introduzidas as características para
compreensão de sistemas transativos de energia, a tecnologia de registros distribuídos blockchain e
estudos de caso da aplicação dessa ferramenta para soluções energéticas. A metodologia utilizada
se baseia em pesquisa bibliográfica para contextualização das temáticas propostas e na reunião de
projetos implementados por empresas, start-ups e universidades. Esses casos foram sintetizados e
separados por área de aplicação. O artigo termina com uma avaliação sobre a adoção e velocidade
de penetração do blockchain em questões enfrentadas pelos cenários da energia transativa.
Desde o Acordo de Paris, diversas nações buscam ajustar a matriz energética para um consumo de
baixo carbono. A Agência Internacional de Energia analisou metas exequíveis para uma penetração
de fontes renováveis de 65% no uso geral e de 80% na geração e energia até 2050.
O balanceamento da geração intermitente de parques solares e eólicos, sua integração com a rede e
a cobertura no suprimento em momentos de pico são desafios dessa transformação do planejamento
do setor energético. O planejamento consiste não apenas na expansão da oferta para garantir o
suprimento, mas considera também o lado da demanda, analisando comparativamente as
alternativas de ação e procurando o caminho mais eficiente e de menor custo para o atendimento
das necessidades.
O planejamento sob a ótica da demanda procura formas de reduzir a demanda de energia sem
comprometer as necessidades dos serviços do consumidor. Duas estratégias desse tipo de
planejamento são programas de aumento da eficiência energética e ações para o gerenciamento pelo
lado da demanda (GLD) (do inglês, Demand Side Management). Esse trabalho focou em destacar
ações relacionadas à segunda estratégia, analisando em especial a abordagem de energia transativa
(ET) como resultado de uma evolução do GLD e o ferramental tecnológico que viabiliza sua
aplicação.
A Comissão Reguladora Federal de Energia dos Estados Unidos da América define a resposta à
demanda como:
“Mudanças no uso da eletricidade por usuários finais em relação aos seus padrões normais de
consumo, em resposta a mudanças no preço da eletricidade ao longo do tempo, ou para incentivar
pagamentos destinados a induzir um menor uso de eletricidade em momentos de altos preços no
mercado atacadista ou quando a confiabilidade do sistema é posta em risco.”
O GLD pode ser dividido entre direto e indireto. O primeiro consiste em momentos em que a
concessionária de energia determina as cargas a serem reduzidas ou desconectadas dos sistemas
através de um contrato de interrupção que compensa os consumidores participantes. Já no GLD
indireto o consumidor determina seu perfil de demanda em resposta aos sinais de preço da energia
no mercado, ou seja, a elasticidade do preço gera uma tendência de alteração na demanda.
Desde a implementação dos primeiros programas de GLD, os sistemas de energia têm se tornado
cada vez mais complexos. Paralelamente ao aumento da geração distribuída há uma maior
acessibilidade a equipamentos mais engenhosos quanto ao uso da energia, como por exemplo,
termostatos inteligentes com resposta em tempo real da demanda associada ao preço (Chassin,
2015). Esses aparelhos à disposição do consumidor final e conectados à rede provocam um aumento
da complexidade no monitoramento e gerenciamento do uso da energia.
A energia transativa (ET) (do inglês, Transactive Energy) está associada a conceitos como
“democratização da eletricidade” e “internet das coisas (IoT)” e se preocupa em criar incentivos
para assegurar que todos os recursos estejam gerando/consumindo eletricidade de uma forma
compatível para o sistema de energia (Chen, 2016). Assim, a ET é uma forma variada e generalizada
de GLD, na medida que gere tanto o lado da oferta (geração distribuída) quando da demanda
(consumo final).
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Para atender a estas tendências de descentralização e digitalização são necessárias técnicas locais
de controle e gestão distribuída (Ahsan, 2017). Tecnologias de registro distribuído (TRD) (do inglês,
Distributed ledger technologies) foram concebidas principalmente para facilitar operações não
centralizadas, removendo a necessidade de gestão central. Como resultado, TRD poderiam ajudar a
abordar os desafios enfrentados pelos sistemas descentralizados de energia. Uma das formas de
TRD mais conhecidas é a do Blockchain (em inglês significa cadeia de blocos) e é caracterizada por
possuir um mecanismo de consenso descentralizado e mecanismos de segurança baseados em
criptografia (Mengelkamp, 2017).
Esse trabalho tem como objetivo apresentar a compreensão conceitual da metodologia de sistemas
de energia transativa (SET), seu potencial de viabilização através da tecnologia do blockchain e
demonstrações práticas realizadas em casos de estudo.
2. METODOLOGIA
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3. RESULTADOS / DEMONSTRAÇÃO DE APLICABILIDADE
3.1. Energia Transativa
3.1.1. Definição
Essa definição ampla é feita intencionalmente para permitir o reconhecimento do uso de técnicas
existentes e considerar como possibilitar novas técnicas nos sistemas de distribuição, na interface
entre transmissão e distribuição e talvez até de forma mais ampla na cadeia energética. (GWAC)
De acordo com o Smart Grid Dictionary 6th ed, ET é definida como um modelo de negócios que
permite a participação de recursos distribuídos de energia no mercado para apoiar na distribuição
de eletricidade segura, limpa, resiliente, confiável e com bom custo benefício, através do suprimento
de negawatts ou kilowatts para uma rede interconectada. A Renewable Energy World (2014) define
negawatt como um watt de energia que o usuário não consume, devido à economia no consumo ou
uso de produtos de alta eficiência energética.
Chen (2016) avalia que no âmbito da ET, dispositivos inteligentes distribuídos (DID) são
controlados diretamente pelos seus proprietários. Os mecanismos de transação são projetados para
alinhar comportamentos individuais com os interesses do sistema. De forma similar à programas de
GLD, a ET está preocupada em criar incentivos para garantir que todos os recursos estejam gerando
e consumindo eletricidade de uma forma adequada para o sistema. Contudo, a ET expande o
conceito de GLD tanto do lado da oferta quanto para o lado da demanda e visa o equilíbrio entre os
dois em tempo real, de forma autônoma e descentralizada.
3.1.2. Características
De acordo com Chen (2016), ao invés de serem controlados por comandos centralizados, DID
tomam base em incentivos econômicos, transformando assim a participação de um dispositivo para
uma natureza voluntária. A troca de informações e transações ocorrem de forma descentralizada
para garantir a escalabilidade no sistema e estão sob supervisão humana. Assim, os DID são
controlados por seus donos e não por empresas de energia, o que garante autonomia e protege a
privacidade dos atores.
O principal documento referência para ET, Transactive Energy Framework da GWAC, possui um
extenso detalhamento sobre sua concepção e composição. No Quadro 1 é feito uma síntese dos
atributos identificados que traduzem qualidades e características das dimensões da ET.
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Quadro 1 - Atributos da ET. Fonte: Adaptado de GWAC
Quando recursos próximos ao consumo final são considerados em um sistema dinâmico, as relações
no sistema de distribuição sofrem alterações significativas.
Acerca desse nível na cadeia de suprimento, Kok (2016) avalia que dispositivos consumidores ou
geradores de eletricidade de pequeno a médio porte negociam automaticamente uns com os outros,
com recursos da rede física e com sistemas de despacho de fornecedores de energia através de
algoritmos eletrônicos de mercado eficientes e escaláveis. A fim de destacar as vantagens do
gerenciamento energético feito em SET, é possível realizar uma comparação com outras
abordagens.
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Kok (2016) considera se as decisões sobre questões locais são tomadas de forma centralizada ou
localmente e ainda se a comunicação entre as partes acontece de forma uni ou bidirecional para
segregar as diferentes possibilidades. A Figura 1 representa uma classificação das abordagens
considerando esses fatores.
Figura 1 - Abordagens para o gerenciamento energético na distribuição. Fonte: Adaptado de Kok (2016)
Como todos os recursos atuantes no mercado comunicam sua reação pretendida a uma gama de
níveis de preços, a reação de um agrupamento é então conhecida antecipadamente e o mecanismo
de mercado pode determinar o preço para um equilíbrio adequado entre a oferta e a demanda. Do
ponto de vista dos consumidores finais, o agente local do sistema de gestão atua para licitar no
mercado e reagir aos sinais de preço resultantes com objetivo de atender o consumidor.
Diferentemente da abordagem por otimização centralizada não existe envolvimento direto de um
controle externo.
Em síntese, abordagens de controle transativo são capazes de acessar todo o potencial de resposta
dos DID, proporcionar maior certeza sobre a reação momentânea do sistema, realizar um mercado
eficiente com incentivos adequados e proteger a privacidade do usuário final proprietário de
dispositivos que participem no gerenciamento da energia (Kok, 2016).
Depois da indústria, o setor de edificações é quem mais consome energia primária, sendo que em
2020 foi responsável por 30% da demanda, contra 43% do setor industrial. Essa parcela é composta
por edifícios residenciais, comerciais e públicos e a principal forma de consumo energético é a
eletricidade (BP, 2020). No caso particular do Brasil, a EPE projeta que em 2029 esse setor será
responsável por 51% da demanda nacional de energia elétrica, sendo que a participação no consumo
das residências terá um aumento de 47% para 56%.
Portanto, uma melhor compreensão da demanda residencial de eletricidade é fundamental para lidar
com a transição prevista do sistema de energia elétrica de sua estrutura tradicional para um sistema
transativo. Uma tecnologia que vem ganhando espaço e auxilia nesse objetivo são os sistemas de
gerenciamento doméstico de energia (do inglês, Home Energy Management Systems (HEMS)) que
consideram tanto padrões de consumo quanto custos na tomada de decisão para o melhorar o
suprimento energético.
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De acordo com Ha (2006), a aplicação de HEMS pode ser entendida como uma residência que
oferece serviços de gestão de energia para o monitoramento e gerenciamento eficiente da geração
de eletricidade, conservação de energia, bem como métodos de armazenamento de energia. Além
disso, inclui também os serviços de comunicação e sensoriamento que facilitam o levantamento
estatístico do fluxo de energia de diversos residentes.
Pratt (2016) propõe que a operação de HEMS em um mercado transativo de energia pode ajudar no
cumprimento de objetivos tanto de consumidores quanto de prestadores de serviço. É destacado que
como os HEMS podem alterar cronogramas operacionais dos aparelhos, sua adoção pode causar
mais mudanças nos perfis de energia residenciais, além daquelas já trazidas pela adoção de placas
solar fotovoltaicas, veículos elétricos e medidas de eficiência energética.
Na Figura 2 é representado como os HEMS participam reagindo a sinais de preços, retornando essas
informações para o nó responsável pela transação junto com previsões do perfil energético e por fim
atuando de forma automática em benefício do proprietário da residência.
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Quadro 2 - Funcionalidades de HEMS. Fonte: Adaptado de Mahapatra (2019).
Monitoramento Torna a informação em tempo real sobre o padrão de uso de energia acessível, facilita
a utilização da energia e muda o foco do usuário para a conservação da eletricidade.
Registro Recolhe e salva dados relativos à unidade de electricidade consumida por cada
aparelho, gerada a partir de recursos distribuídos e dos estados de conservação de
energia. Inclui ainda a análise da resposta da demanda aos preços em tempo real.
Controle Dividido em controle direto e remoto, essa funcionalidade permite que o usuário
acesse, monitore e controle seus padrões de consumo seja por um controle no
dispositivo eletrônico (direto) ou em computadores e celulares (remoto).
Gestão Melhora tanto a otimização quanto a eficiência na utilização da energia elétrica. Pode
abranger operações que incluem serviços de gestão de sistemas de energia renovável,
de armazenamento de energia, de eletrodomésticos, de baterias e carros elétricos.
Alarme São gerados e transmitidos alarmes à central do HEMS que contém dados sobre as
localidades de ocorrências de falhas, tipos e outras informações.
3.2. Blockchain
O conceito de blockchain (do inglês, cadeia de blocos) teve sua origem no sistema de criptomoeda
Bitcoin, introduzido pelo Satoshi Nakamoto. Apesar de ter sido desenhado com uma abordagem
monetária, o blockchain possui diversas aplicações será mostrado nas próximas seções. As
características fundamentais dessa tecnologia contemplam:
• uma estrutura baseada de blocos hasheados;
• um algoritmo de consenso como, por exemplo, Proof-of-Work (PoW) (Prova de Trabalho)
ou Proof-of-Stake (PoS) (Prova de Consumo) e;
• uma arquitetura descentralizada.
Recentemente o blockchain vem ganhando destaque como solução para integridade global de dados
e transparência, uma vez que dados são tidos como fator chave para sistemas modernos. (Cui, 2019)
3.2.1. Definição
Andoni (2019) define blockchain como sendo uma estrutura de dados digitais, composta de um
banco de dados compartilhado e distribuído que contém em ordem cronológica um log de transações
que está sob expansão contínua. Essa estrutura de dados nada mais é do que um registro (em inglês,
ladger) que pode conter transações digitais, registros de dados e arquivos executáveis. As transações
são então agregadas em formações maiores, chamadas blocos (em inglês, blocks), que recebem uma
marca de data e hora e estão vinculadas criptograficamente aos blocos anteriores, formando assim
uma cadeia (em inglês, chain) de registro que determina a ordem de sequência de eventos ou a
blockchain.
Para Pieroni (2018) blockchain é um contrato digital que permite que um parceiro conduza e fature
uma transação diretamente com outro parceiro (conceito par-a-par, em inglês Peer-to-peer ou P2P).
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3.2.2. Princípios fundamentais da estrutura
Um bloco que compõe a cadeia armazena informações diversas, além de uma marcação temporal,
que o tornam único. Um dos algoritmos utilizados retorna uma sequência de comprimento fixo
conhecida como hash (do inglês, mistura) após receber uma informação de entrada. Uma expansão
e agrupamento de múltiplos hashes pode ser estruturada em uma Merkle Tree (ou Hash Tree, do
inglês, árvore de Merkle ou árvore de hash). Um outro conceito da criptografia relevante ao
blockchain é o nonce, que é um número arbitrário com uso único (em inglês é a junção de number
(número) e once (uma vez)).
Conforme apresenta Gamage (2020) um bloco contém um cabeçalho (header) composto por quatro
informações: hash do bloco anterior, registro de data e hora (Timestamp), um nonce e o hash raíz
da árvore. Esse último funciona como um identificador único para todas as transações combinadas
dentro do bloco. Para Ma (2020), o cabeçalho do bloco tem o papel mais importante e decisivo, pois
carrega metainformações do bloco atual e descreve sua estrutura, sua semântica e seu
armazenamento.
Como exemplo tem-se a aplicação no cenário da Bitcoin em que cada bloco de dados registra as
informações de uma transação enviadas pelos nós participantes dentro de uma janela de tempo.
Alguns exemplos de informações as identificações de emissor e remetente, valor transacionado e
data e horário. Uma vez que a estrutura representada na Figura 3 é concluída o bloco é conectado à
cadeia que registra todo o histórico de transações realizadas e é finalmente transmitido em tempo
real para toda a rede compartilhada. (Wu, 2018)
A conexão de um bloco à cadeia está sujeita à uma verificação da unicidade daquele conjunto, de
forma análoga à quando um terceiro partido funciona como intermédio neutro em uma negociação
para evitar fraudes. No caso simples de uma negociação entre dois partidos, um banco funciona
como uma autoridade central com função de verificador da transação, mantendo em seus registros
todas as informações envolvidas. Entretanto, segundo Andoni (2019), o blockchain tem como
objetivo a remoção de tais intermédios e a substituição por uma rede de usuários digitais que
trabalham em parceria para verificar transações e assegurar a integridade das informações no
registro.
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Ao contrário do que um sistema com autoridade centralizada, cada membro da rede possui sua
própria cópia do registro ou consegue acesso via nuvem. Na Figura 4 é ilustrado de forma
simplificada um sistema de transação centralizado e outro distribuído. No primeiro um único
elemento atua como autoridade de confiança para gerir os registros, enquanto no segundo cada
membro possui uma cópia dos registros. (Andoni, 2019)
Vários algoritmos surgiram com o objetivo de evitar um ataque por parte de um elemento da rede
que eventualmente possua controle de um grande número de nós (Cui, 2019). Cada algoritmo
presente na literatura possui características distintas além de vantagens e desvantagens. Como
exemplo, dois exemplos são apresentados: Proof-of-Work (PoW) (Prova de Trabalho) e Proof-of-
Stake (PoS) (Prova de Participação).
O caso PoW trata de um modo de execução por tentativa e erro, que exige alto poder computacional
e consome muita energia. De acordo com Gamage (2020), nós da rede precisam resolver funções
matemáticas unidirecionais e complexas, antes que eles possam adicionar novos blocos à cadeia.
Esse processo de encontrar a prova correta através de solução de funções criptográficas é chamado
de mineração e os nós e elementos que a executam, mineradores. Estes competem entre si e tão logo
um minerador descubra a solução (hash), ele transmite uma mensagem para a rede e outros nós
verificam o valor encontrado e o aceitam à medida que começam a atuar no próximo bloco da cadeia,
usando como entrada o hash do bloco anterior (Andoni, 2019).
O PoS trata de um algoritmo de consenso alternativo ao PoW, uma vez que exige menor poder
computacional. Segundo Cui (2019), ao invés de ser necessário provar que uma quantidade de
trabalho foi realizada, os mineradores devem provar a posse de uma certa quantidade de
participações em sistemas blockchain. Entretanto, Gamage (2020) acrescenta que sistemas de PoS
utilizam uma abordagem aleatória ou baseada na idade das participações para garantir que nem
sempre os minerados com maior volume tenham prioridade. A lógica desse algoritmo é que as
entidades que detêm uma participação no sistema são adequadas para manter a sua segurança, uma
vez que a sua participação irá diminuir de valor caso a segurança do sistema corrompa. (Bentov,
2016).
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Uma vez que os blocos são confirmados e adicionados à cadeia eles são tidos como não repudiados,
isto é, assegurados que ninguém pode negar sua validade, e difícil de serem manipulados, garantindo
assim a transparência e confiabilidade de toda a base de dados. (Yang, 2017). A Figura 5 representa
as etapas de uma transação no blockchain, na qual usuários chegam a um acordo sobre a transação,
o que é incluído em um bloco. Seu conteúdo é confirmado por nós distribuídos através de um
algoritmo de validação e o bloco é então adicionado à crescente cadeia, antes da transação ser
confirmada e o pagamento de, realizado.
Figura 5 – Etapas de uma transação em blockchain: Acordo, criação do bloco, mecanismos de validação, adição ao
registro e confirmação de pagamento. Fonte: Andoni (2019)
3.2.3. Classificação
De acordo com Wu (2018), blockchain pode ser dividido em três categorias: público, consórcio e
privada. Na Tabela 1 é feita uma comparação entre essas classificações com base em características
reunidas da literatura.
Gamage (2020) faz uma abordagem diferente e sugere um agrupamento das cadeias em dois tipos
principais: sem ou com permissão. Blockchain sem permissão não impõe qualquer restrição aos seus
nós, de forma que qualquer um pode ler abertamente, inspecionar e participar da validação dos dados
de acordo com um protocolo de consenso da cadeia em questão. Uma aplicação desse tipo de
blockchain são as criptomoedas como, por exemplo, o Bitcoin.
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Já um blockchain com permissão restringe os acessos para um grupo limitado de participantes, assim
como ocorre com o processo de validação. Essas cadeias autorizadas são particularmente úteis para
aplicações comerciais e sociais que requerem uma estrutura distribuída de registro, mas não um
incentivo via criptomoeda. (Gamage, 2020)
Na Tabela 2 é feita uma comparação similar à apresentada por Wu (2018), mas considerando as
características em uma base de dados distribuída restrita, além dos diferentes tipos de blockchains.
Tabela 2 - Comparação entre os tipos diferentes de blockchain. Fonte: Adaptado de Gamage (2020).
Base de dados
Sem Aberta com Fechada com
Característica distribuída
permissão permissão Permissão
restrita
Acesso público à leitura Disponível Disponível Não disponível Não disponível
Acesso público à escrita Disponível Não disponível Não disponível Não disponível
Imutabilidade Alto Médio Baixo Baixo
Desempenho Baixo Médio Alto Alto
Escalabilidade Baixo Médio Alto Alto
Descentralização Alto Médio Baixo Baixo
Distribuição Alto Médio Baixo Baixo
Auditabilidade Alto Alto Baixo Baixo
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3.3. Aplicações do Blockchain na Energia Transativa
As características destacadas do blockchain sustentam que essa tecnologia é uma potencial solução
para as abordagens sugeridas em SET. A seguir são apresentados alguns estudos de casos que
empregam essa estratégia tecnológica de registros distribuídos em áreas como negociação de
energia, conexão de plataformas de Internet das Coisas (IoT, do inglês Internet of Things) e
eletromobilidade.
A negociação (trading) de energia no modelo tradicional do mercado não regulado é gerida por
organizações centralizadas. Conforme exposto na seção 3.1 os SET são compostos por elementos
distribuídos, de forma que essas características divergentes originam um embate. Segundo Wu
(2018), se por um lado o estabelecimento de uma organização central leva à problemas como alto
custo operacional e baixa segurança da informação, a sua ausência provoca uma desconfiança em
relação à entidade comercial.
O modelo de negociação P2P baseado no blockchain é capaz de propiciar uma plataforma eficiente,
de baixo custo, aberta e confiável. Na Figura 6 é esquematizado um processo de negociação de
energia com o blockchain em um SET.
Avaliando aplicações práticas, algumas empresas já estão realizando projetos em mercados locais e
em microredes. A LO3 Energy formou uma parceria com a Transactive Grid e conseguiram com
êxito realizar a primeira transação P2P com blockchain entre um produtor residencial de energia
solar fotovoltaica e seu vizinho no bairro do Brooklyn, em Nova Iorque.
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A start-up australiana Power Ledger tem um projeto piloto no país, cujo objetivo é desenvolver de
um mercado residencial de comercialização P2P de eletricidade entre prosumidores e consumidores
locais. Entre os resultados obtidos é dado destaque para o potencial de economia nas contas de
energia e maior lucro para o produtor. Como exemplo, um prosumidor com instalação solar FV
recebe tipicamente 7ct/kWh quando exportando o excedente de energia para a rede, enquanto
consumidores pagam cerca de 25ct/kWh. O projeto P2P da Power Ledger acordou um esquema de
preços para o valor de 20ct/kWh comprado através da plataforma, dos quais 75% são destinados aos
prosumidores e 25% para empresas de serviço de energia.
Na Holanda, a Vattenfall administra uma plataforma teste em blockchain que permite a negociação
de energia através de uma rede de negócios P2P, onde indivíduos determinam de quem comprar ou
para quem vender a energia auto-gerada (prosumidor). Em Amsterdã a colaboração entre a Spectral
Energy e a Alliander está desenvolvendo uma plataforma também em negociação P2P, que utiliza
blockchain fechada com permissão (ver Tabela 2) com ênfase em transações de alta velocidade e
melhoria de performance.
Os DID são elementos presentes em SET e compõem parte essencial da tecnologia da Internet das
Coisas (IoT, do inglês Internet of Things). Cui (2019) apresenta o conceito de IoT como permitir
que vários tipos de dispositivos possam coletar e trocar dados através da rede, o que inclui não
apenas computadores e telefones inteligentes, mas também carros, máquinas de lavar louça,
televisores e outros aparelhos domésticos comuns conectados à Internet. O blockchain pode
viabilizar plataformas de IoT e o gerenciamento de ativos, como, por exemplo, através dos HEMS
apresentados na seção 3.1.4
Na Inglaterra, a DAJIE (Distributed Autonomous Joint Internet and Energy) oferece uma solução
em forma de software que é instalado em dispositivos IoT. A energia gerada por prosumidores criam
criptomoedas (com aplicação do blockchain) que são armazenadas em uma carteira digital, sendo
que seu valor unitário equivale a 1kWh produzido. Essas moedas podem, por exemplo, serem
utilizadas na obtenção de créditos de carbono e no pagamento de serviços de energia.
Na Finlândia, a empresa de energia Fortum oferece uma solução baseada em blockchain que permite
consumidores controlar aparelhos domésticos pela internet e, portanto, otimizar sua demanda de
energia a fim de reduzir as contas de energia. A plataforma integra dados de previsões
meteorológicas, previsões de demanda de energia e preços de eletricidade em tempo real.
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A tecnologia do blockchain precisa superar desafios relacionados ao seu desempenho e
escalabilidade para conseguir prevalecer nos serviços de IoT. Adicionalmente, o monitoramento e
registro do uso de energia em cada dispositivo pode ser interpretado como intrusivo. Dessa forma,
de acordo com Andoni (2019), novos padrões precisariam ser desenvolvidos não apenas para
alcançar a interoperabilidade de DID, mas também para prevenir a ação de hackers e proteger a
privacidade dos usuários individuais.
3.3.3. Eletromobilidade
Veículos elétricos (VE) vêm ganhando cada vez mais espaço no setor de transporte, por
representarem uma alternativa mais sustentável de locomoção em comparação a veículos de
combustíveis fósseis. Em SET são considerados como evolução de sistemas de mobilidade, podendo
ter atuações adicionais por armazenarem consideráveis quantidades de energia em suas baterias.
Além do custo ainda relativamente alto dos VE, um problema enfrentado pelos usuários está na
questão do carregamento, uma vez que a quantidade de estações existentes é bem inferior do que o
número de postos de combustíveis tradicionais. Esse gargalo na estrutura acaba por restringir o
crescimento no uso de VE. Como apresenta Wu (2018), atualmente existe uma gama de operadores
de estações de carregamento de VE e plataformas de pagamento, mas que não dispõem de uma
padronização uniforme, o que ocasiona é tido como inconveniente pelos usuários.
Segundo Andoni (2019) a natureza descentralizada do setor de transportes com a presença de vários
atores (veículos, motoristas, estações de abastecimento, serviços por aplicativos) provoca uma
aproximação natural de implementações via blockchain. Entre as vantagens dessa descentralização
destacam-se a eliminação da necessidade de uma infraestrutura de carregamento com gestão
centralizada, tolerância à falhas, assim como eliminação da fixação de preços e proteção contra
conluios entre as estações de abastecimento e fornecedores de transporte.
Assim como apresentado na seção anterior, a aplicação do blockchain precisa superar questões
acerca da privacidade e segurança das informações e uso da estrutura de VE. Nas soluções baseadas
em blockchains privadas os proprietários de VE podem ter maior transparência no abastecimento e
potencialmente pode ter um maior leque de opções de fornecedores de energia. Adicionalmente, o
uso dessa tecnologia oferece uma plataforma única de verificação e comunicação que funcionaria
em diferentes localidades, inclusive para o caso de viagens através de fronteiras. Para os operadores
da rede, os sistemas blockchain oferecem uma solução baseada no mercado e que pode ser utilizada
na gestão otimizada e coordenação de carregamento de VE. (Andoni, 2019)
A também alemã Car eWallet desenvolveu uma plataforma de transações em blockchain que integra
diversos serviços de mobilidade, carros carregando em diferentes fornecedores de energia, estações
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de abastecimento, estacionamentos, aluguel e serviços de carros compartilhados (car sharing) com
veículos físicos e a infraestrutura existente. A empresa remove a necessidade de uma autoridade
confiável centralizada através do uso de registro distribuído que comporta a possibilidade de escolha
do usuário entre pagamento automático ou manual.
Nos Estados Unidos da América, a Oxygen Initiative fechou uma parceria para o uso da
Share&Charge para estabelecimento de pagamento em tempo real em estações de abastecimento de
VE. As modalidades de tarifa podem variar entre fixa, baseadas no tempo de uso ou em unidade
energética (kWh). A Oxygen Initiative planeja expandir a plataforma para comportar outras
ferramentas de pagamento e o serviço de car sharing.
Nos estudos de caso apresentados foi possível notar que os projetos pilotos da aplicação do
blockchain em SET ocorreram em países desenvolvidos. Levando em consideração que uma parcela
considerável da população mundial vive sob pobreza energética, é natural que a escalabilidade
global dessas soluções ocorra de forma gradual e leve ainda anos.
Como apresentado, o blockchain possui uma gama de alternativas e seu sucesso no setor de energia
depende de algumas adaptações não somente tecnológicas, mas também econômicas e regulatórias.
Ao propor a eliminação de atores intermediários durante a negociação, mas necessitar serviços
adicionais na operação são estabelecidas provocações para um redesenho da regulação vigente e
viabilização econômica para o surgimento do mercado de negociação P2P de energia.
O objetivo proposto pelo trabalho é atingido à medida que a pesquisa realizada apresenta a
metodologia de SET e suas características, assim como sua viabilização tecnológica devido à
compatibilidade com as soluções trazidas pelo blockchain. Na seção 3.3 são mostrados casos de
sucesso que sustentam o cenário provocado pela união dessas temáticas.
Como trabalhos futuros são sugeridas possibilidades como uma avaliação do cenário brasileiro para
a geração distribuída e modelo regulatório para adoção de novas tecnologias presentes em SET,
casos de aplicação de TRD em outras áreas do setor de energia, o desenvolvimento de certos tipos
blockchain para contornar problemas nas aplicações na área de energia e uma abordagem com viés
econômica dessas soluções e quais desafios a serem enfrentados.
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5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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