Você está na página 1de 167

Todo o conteúdo deste ebook foi desenvolvido pela

Descola em parceria com a professora do curso.


OLÁ!
Você já viu ou provavelmente está vendo o curso
Cultura Antirracista - Comportamentos e atitudes
para criar uma sociedade mais justa e sem
preconceitos
Esperamos que você tenha gostado do conteúdo e
que tenha aprendido como e porque o racismo se
apresenta de maneira estrutural em nossa sociedade
a partir do contexto histórico e contemporâneo dos
negros no Brasil.
A partir deste material complementar as videoaulas,
você dará sequência à jornada de aprendizagem
sobre como promover mudanças de mentalidade
e comportamentos sociais de modo a adotar uma
postura antirracista. Ao combater seus próprios vieses
e preconceitos, poderá influenciar positivamente as
pessoas em seus espaços de atuação, com uma nova
mentalidade sobre equidade e diversidade.
Neste ebook, falamos mais dos conceitos apresentados
e relacionamos filmes e livros complementares, para
que você siga aprofundando os conceitos abordados
nas videoaulas e aprenda mais.
Abraços,
Equipe Descola
Uma escola de inovação online
01 QUEM MINISTRA O CURSO

02 VIDAS NEGRAS IMPORTAM

03 A HISTÓRIA EDITADA

04 POR QUE O RACISMO É ESTRUTURAL?

05 O NEGRO FORA DA LEI

06 ELES REPRESENTAM A NEGRITUDE

07 VIESES INCONSCIENTES

08 O ESSENCIAL É INVISÍVEL AOS OLHOS

09 SEJA VELADO OU EXPLÍCITO, É RACISMO


É PRECISO SER ANTIRRACISTA 10
POR ORGANIZAÇÕES MAIS INCLUSIVAS 11
O QUE FAZER EM CASO DE RACISMO 12
A PUREZA DA RESPOSTA DAS CRIANÇAS 13
CARTILHA ANTIRRACISTA 14
LIVROS 15
ESTRELAS DO CINEMA 16
APERTA O PLAY 17
descola.org | Cultura Antirracista

01
QUEM
MINISTRA
O CURSO
Alexandra Loras

6
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

O país do futebol, que


consagrou seu rei Pelé
e tantos outros atletas
que disseminaram com
orgulho as cores da nossa
bandeira nos pódios de
olimpíadas e outros eventos
esportivos mundiais. O
país do samba de Gilberto
Gil e Jorge Ben que, por
vezes, se inspiraram na
multiplicidade das nossas
cores, levando nossa
cultura e contexto social
aos palcos de todo mundo.
Esses são alguns dos clichês
que podem ressoar de bate-
pronto nas pesquisas dos
estrangeiros que buscam
visitar ou até escolher o
Brasil como morada.

7
descola.org | Cultura Antirracista

Somos o país tropical, do carnaval, da alegria, do calor e


da receptividade de seu povo. É claro que somos muito
além disso. Só que, por vezes, esses atributos reconhecidos
mundialmente podem deixar transparecer aos visitantes
que a diversidade da fauna e flora e da miscigenação
de raças em decorrência da forte imigração europeia
incide positivamente também no respeito e igualdade de
oportunidade entre as raças.
Era o que pensava Alex andra Baldeh Loras, quando
chegou ao Brasil, em 2012, acompanhada de seu marido,
Damien Loras, ex-cônsul da França. Filha de pai gambiano
e mãe francesa, desde muito nova, ela mesma pôde sentir
os efeitos da discriminação na própria família, na qual
reconhecia um racismo velado no convívio com os avós
maternos. E, no início dos trabalhos diplomáticos ao lado
do marido, a expectativa da palestrante e mestre em
gestão de mídia francesa, era reconhecer na miscigenação
brasileira um cenário diferente: democrático e de equidade
de direitos. No entanto, a rotina pessoal e de trabalho
fizeram com que ela reconhecesse um panorama inverso,
de desigualdade e discriminação. Ela mesma sentiu o
peso da estereotipação preconceituosa em ocasiões em
que foi confundida com a hostess ou a babá em encontros
com a elite paulistana ou passeios em família.
8
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

Desde então decidiu transformar a narrativa pessoal em


missão de disseminar o discurso de respeito e equidade
de direitos entre os seres humanos.. Há quase dez
anos atua como palestrante e consultora facilitando o
diálogo sobre racismo, justiça racial, diversidade, políticas
de igualdade de gênero e racial nos principais congressos
e organizações do país. Uma das principais ativistas da
causa negra no Brasil, aqui na Descola, Alexandra é quem
irá conduzir a sua jornada de conhecimento e revisão de
conceitos para entender o contexto histórico que nos levou
a um racismo estrutural e à importância urgente de adotar e
disseminar práticas antirracistas para a construção de uma
sociedade mais justa e igualitária.

w w w.linkedin.com/in/alex andra-baldeh-loras

@ alex andraloras

9
descola.org | Cultura Antirracista

02
VIDAS
NEGRAS
IMPORTAM
#blacklivesmatter,
#icantbreath e a força
propulsora das hashtags
tão necessária para o
ativismo antirracista

10
Minnesota, 25 de maio de 2020
Câmeras de rua e inúmeros pedestres
testemunharam a morte de um afro-americano,
durante uma abordagem policial que, mesmo em
plena pandemia do coronavírus, causou revolta
e levou milhares às ruas dos Estados Unidos.
Acusado de usar uma nota de US $20,00 dólares
falsa em um supermercado, George Floyd tentava
se esquivar e pedia para o policial parar, pois não
conseguia respirar. Ainda assim, Derek manteve os
joelhos pressionados contra o pescoço da vítima,
até que perdesse a consciência e fosse levado em
uma maca para o hospital.
George Floyd não resistiu, mas, o crime de
homicídio culposo e injúria racial já estava
documentado. Inúmeros vídeos deram
conta de espalhar a ação feito pólvora nas
redes sociais, impulsionados por hashtags
como #blacklivesmatter, #icantbreath,
#blackouttuesday - só para citar alguns
exemplos dos filtros que registravam a
indignação dos internautas que clamavam pelo
fim do racismo.
HASHTAGS EM NÚMEROS

#blacklivesmatter - 26.2 milhões +

#icantbreathe - 1.246.813

#blm - 8 milhões +

Fonte: instagram/janeiro/2021
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

A origem do movimento antirracista Black Lives


Matter data de julho de 2013. Foi quando a
escritora americana Alicia Garza estava com seu
marido e amigos em um bar, onde, na verdade,
a maioria checava o celular com frequência
na expectativa do veredicto do julgamento do
voluntário de vigilância da vizinhança que atirou
e matou Trayvon Martin, um garoto afro-
americano de 17 anos carregando um pacote
de bala de uma loja de conveniência. Quando
a notícia chegou, decretando a inocência do
acusado - Alicia Garza foi para casa com raiva
e com o coração partido, abriu o Facebook e
escreveu uma postagem que terminava com as
palavras “nossa vida é importante”.
O movimento se formou rapidamente em
torno desse sentimento. #BlackLivesMatter, a
hashtag que muitos usaram para compartilhar
a postagem de Garza, emprestou ao grupo seu
nome. As palavras, tornaram-se um emblema da
causa antirracista, que é impulsionado a cada
episódio de suspeita ou evidência de injúria racial,
reforçando a urgência de revisão de direitos e
políticas para uma sociedade mais igualitária.
13
descola.org | Cultura Antirracista

Voltando ao caso de
Minnesota, Derek Chauvin
foi preso dias depois da
morte de Floyd, mas, em
outubro de 2020, foi solto
após pagar fiança de U$1
milhão e aguarda em
liberdade o julgamento
agendado para março
de 2021. Se condenado
pode pegar até 40 anos
de prisão por homicídio
em segundo grau
(assassinato intencional
não premeditado) e
assassinato em terceiro
grau (quando o responsável
pela morte atuou de forma
imprudente).

14
Porto Alegre, 19 de novembro
de 2020
João Alberto Silveira Freitas, cidadão negro,
foi brutalmente agredido por dois seguranças
brancos em uma loja do supermercado
Carrefour, em Porto Alegre (RS), às véspera do Dia
da Consciência Negra.
A confusão começou quando o cliente teria
se desentendido com a operadora de caixa,
que chamou a segurança. João Freitas foi
espancado até a morte do lado de fora da
loja. Os dois homens foram autuados em
flagrante por homicídio qualificado e os vídeos
do espancamento voltaram a impulsionar as
hashtags dos movimentos antirracistas, em um
clamor por justiça.
descola.org | Cultura Antirracista

De acordo com o Atlas da Violência, divulgado em agosto


de 2020, os assassinatos contra os negros aumentaram
11,5% nos últimos dez anos, ao passo que os índices
criminais envolvendo outras raças caíram 12,9% no
mesmo período. Entre os negros, a tax a de homicídios
no Brasil saltou de 34 para 37,8 por 100 mil habitantes
entre 2008 e 2018. O relatório também mostra que, em
2018, os negros representaram 75,7% das v ítimas de
todos os homicídios.

16
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

ESTIGMAS IGUAIS PARA REAÇÕES


DIFERENTES
Os números deixam claro que os dois casos que relatamos
não ocorrem de maneira isolada. Centenas de negros são
torturados até a morte por policiais brancos. Aqui foram
apenas dois exemplos de situações bem semelhantes
que ocorrem com frequência lastimável. De acordo
com a Anistia Internacional, entre 2001 e 2015, 800 mil
negros foram assassinados no Brasil. No vídeo, você viu a
Alexandra refinar ainda mais a estatística:

Nos Estados Unidos, em 2019, a polícia


matou 259 negros. No Brasil, foram
4.533 negros mortos por autoridades. 17
vezes mais que em território americano.
A reação da população frente aos casos, entre os dois
países, é outra diferença gritante. Enquanto os americanos
provocaram a maior onda de manifestações dos últimos 50
anos, com protestos em 75 cidades, no Brasil, a reação foi
bem mais amena, com o barulho da indignação ressoando
praticamente só nas redes sociais.
17

Por aqui, a mídia quase não
comentou esse horror. Por
vezes nos deparamos com o
silenciamento da imprensa
diante do genocídio da
juventude negra no Brasil.
Isso acontece muito em
decorrência do raciocínio
herdado dessa dor histórica
que é a escravidão, que faz
com que pensemos que “Ah,
deve ser bandido! E bandido
bom é bandido morto” a
cada negro assassinado no
Brasil.
– Alex andra

Créditos: Veja
Lembra do caso do menino Miguel Otáv io Santana da
Silva, de cinco anos, morto em Recife (PE) ao cair de um
prédio enquanto estava sob os cuidados da patroa da
mãe, empregada doméstica? E se fosse o contrário? Será
que o encaminhamento e desfecho do caso teria sido
diferente?
Por isso, a urgência de revelar fatos históricos envolvendo
os negros, que nos foram poupados em muitos livros
de História. De reforçar a educação acerca da estrutura
que rege o racismo no contexto brasileiro e mundial.
De desmistificar e desconstruir conceitos e atitudes
discriminatórias veladas e explícitas, para que saibamos
combatê-los, atuando como agentes transformadores em
prol de uma sociedade mais igualitária.

19
descola.org | Cultura Antirracista

03
A HISTÓRIA
EDITADA
Para compreender a
origem do racismo é
preciso olhar para a
história brasileira e o que
foi orquestrado para que
os negros permanecessem
na base da pirâmide
20
O que aconteceria se, em uma situação de guerra e
apropriação territorial, toda a população da cidade de São
Paulo fosse obrigada a deixar suas famílias, suas origens e
cultura para viver sob o domínio estrangeiro? Parece loucura?
A situação te parece improvável? Pois foi o que aconteceu no
Brasil Colônia. Doze milhões de negros foram arrancados
da África para serem tratados como mercadoria pelos
europeus. Parte dessa história você conhece a partir das
aulas de História. No entanto, por vezes, seguimos sem
conhecer profundamente os bastidores de quase 400 anos
de exploração, violência e aniquilação da dignidade dos
negros.
Como disse Nelson Mandela, “ ninguém nasce racista,
nos tornamos” . Seja por meio da educação que recebemos,
das influências subliminares e estratégicas presentes em
nossa sociedade, da estereotipação do branco como
padrão para o belo impostos pelo marketing e a mídia.
De geração em geração, essas sementes do imaginário
coletivo alimentaram nossos vieses inconscientes e
preconceitos.

21
descola.org | Cultura Antirracista

Só que a sociedade mudou e não há mais espaço, nem deve haver tolerância para o
racismo. É preciso parar de regar essas sementes.
Mas, se os detalhes passam despercebidos em muitas
salas de aula, por anos a fio, fica mesmo complicado
compreender como o racismo foi estruturado em nossa
cultura.
Bem, a Alê já nos contou que a visão discriminatória sobre
o negro começou a ser incutida já no livro de Genesis,
da Bíblia, em que Noé amaldiçoa seu filho Cam dizendo
que toda sua descendência seria escravizada, servil e
teria a cor da pele preta. A professora lembrou também
que a exploração negra foi autorizada pelo Papa Nicolau
V, quando disse que “ os negros não tinham alma, que
poderiam ser escrav izados” .
Dali em diante, quase 400 anos de exploração, opressão
e violência se passaram até a libertação. Institui-se,
então, uma hierarquia sociológica para as raças na qual
a segregação contínua do negro, os manteve na base da
pirâmide.

22
Créditos: British Library - Escravos cortando cana de açúcar na Ilha de Antígua, 1823
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

O RACISMO INCUTIDO NA HISTÓRIA


Durante o período escolar, tivemos contato com vários autores que
dedicaram seus estudos a compreender e nos ensinar os diversos
capítulos da História Geral e do Brasil. No entanto, podemos observar as
lacunas em alguns pontos de vista de historiadores que editaram alguns
fatos sob o aspecto sociológico e civil de equidade racial.

23
Créditos: British Library - Escravos trabalhando na
descola.org | Cultura Antirracista produção de açúcar na Ilha de Antígua, 1823


O que chamamos de História Geral deveria ser denominado
‘História branca europeia’.
– Alex andra

24
Você se lembra dessa fala da Alê? Ao explicar o
contexto histórico do racismo, a professora justifica seu
posicionamento detalhando que, para muitos autores, a
branquitude é narrada sempre como um lugar de vantagem
estrutural do branco em uma sociedade estruturada
pelo racismo, ou seja, entre os povos colonizados pelos
europeus. “A ideia de superioridade surge ali e se espalha
via colonização. Dessa forma, as definições da branquitude
são colocadas como universal”, complementa Alexandra.
Gilberto Freyre foi um dos mais importantes sociólogos
do Brasil, com uma obra dedicada à análise das relações
sociais no período colonial brasileiro e como essas
relações contribuíram para a formação do povo brasileiro
no século XX. No entanto, as produções de Freyre são um
tanto controversas. Apesar de caminhar na contramão de
teorias eugênicas dos antropólogos da época e defender
a miscigenação como positiva, o historiador foi alvo das
críticas dos movimentos antirracistas por ter formulado
uma espécie de mito da democracia racial no Brasil
colonial e no Brasil republicano, apontando a miscigenação
como fundamento para essa ideologia.

25

descola.org | Cultura Antirracista

No livro Casa-grande & Senzala Freyre conta como os


negros, índios e brancos conseguiram, na estrutura da
fazenda açucareira, viver em relativa harmonia. Isso
baseado por um lado no temperamento moldável do
português, que já tinha, mesmo em seu país, longa
convivência e mestiçagem com outros povos. Por outro,

Créditos: “Flagellation of a Female Samboe Slave” (1796) por William Blake


havia a necessidade natural dos homens portugueses
de fazer sexo – como não havia brancas suficientes,
teriam decidido acasalar com negras e índias. E estas os
aceitavam, formando o fenômeno único, segundo Freyre, da
mestiçagem em alto grau e profunda significação.
– Rev ista Superinteressante, setembro de 2003

26
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos


Nós temos uma história tão bonita de miscigenação...
[Fala-se que] as negras foram estupradas no Brasil. [Fala-se
que] a miscigenação deu-se no Brasil pelo estupro. [Fala-se
que] foi algo forçado. Gilberto Freyre, que é hoje renegado,
mostra que isso se deu de forma muito mais consensual.
– Folha de S.Paulo, 4/3/2010
Créditos: “Three Young White Men
and a Black Woman”(1632) por
Christiaen van Couwenbergh
27
A TEORIA DO BRANQUEAMENTO E
O MITO DA DEMOCRACIA RACIAL

Os movimentos antirracistas explicam que a miscigenação


da população brasileira não ocorreu de forma natural e
sim que foi arquitetada como um plano para diminuir
a incidência da raça negra e indígena no país. Então, a
teoria do branqueamento racial ou darwinismo social foi
difundida pelos europeus e pensadores que apoiavam a
causa como forma de alienação das identidades de negros
e indígenas. Como os negros não eram considerados
parte da população, acreditava-se que, com essa medida,
os filhos mestiços seriam incluídos na sociedade.
Por isso, permitiu-se o casamento fora do religioso,
senhores praticavam violência sexual contra as mulheres
escravizadas com o objetivo de clarear a população e os
governantes facilitaram a chegada de imigrantes ao Brasil,
oferecendo-lhes trabalho e moradia.
O antropólogo e médico João Baptista de Lacerda foi
um dos principais expoentes da “tese do branqueamento
racial” entre os brasileiros. Em 1911, Lacerda participou
do Congresso Universal das Raças, que reuniu líderes de
todo o mundo em Londres para debater a relação das
raças com o progresso das civilizações. Durante o evento,
recitou parte de seu artigo “Sur les métis au Brésil” (Sobre
os mestiços do Brasil, em português), em que defendia
o fator da miscigenação como algo positivo. No entanto,
seu posicionamento, nitidamente contrário, poderia ser
destacado no seguinte trecho:
“A população mista do Brasil deverá ter no intervalo de um
século, um aspecto bem diferente do atual. As correntes
de imigração europeia, aumentando a cada dia mais o
elemento branco desta população, acabarão, depois de
certo tempo, por sufocar os elementos nos quais poderiam
persistir ainda alguns traços do negro.”
descola.org | Cultura Antirracista

04
POR QUE O
RACISMO É
ESTRUTURAL?
Para entender a origem
da discriminação e abismo
socioeconomico que
separa brancos e negros é
preciso reconhecer a raiz
do problema
30
Racismo é a discriminação social baseada no conceito
de que ex istem diferentes raças humanas e que ex iste
superioridade entre elas. Consiste em uma atitude
depreciativa e discriminatória não baseada em critérios
científicos em relação a algum grupo social ou étnico.
Quando pensamos em racismo, o que logo vem à nossa
mente é uma violência direta contra o negro, o indígena, um
judeu, por exemplo. A gente logo imagina um xingamento,
que alguém foi impedido de frequentar certo local ou
ganhou salário inferior por conta do tom da pele. Pensamos
em discriminação, em violência.
O racismo é muito mais do que isso. Como explica
o advogado, filósofo e professor Silvio Almeida,
independentemente de aceitarmos ou não, o racismo
constitui as relações no seu padrão de normalidade. Por
isso, retomamos o contexto histórico e cultural desde o
Brasil Colônia, e vamos relacionar, no capítulo a seguir, as
leis segregacionistas implantadas em nosso sistema desde
o Império. Para contextualizar e facilitar a compreensão
acerca do racismo estrutural. E também porque, para
entender o abismo social e econômico que separa brancos
e negros, é preciso voltar à raiz do problema.

31
descola.org | Cultura Antirracista


O racismo estrutural é uma forma de
racionalidade, de compreensão das
relações que constitui certas ações de
maneira consciente ou inconsciente.
Trata-se de um fenômeno conjuntural
evidenciado na política, na economia
e na subjetividade e não de uma
patologia social ou desarranjo
institucional.
Prof. Silv io Almeida

32
O RACISMO ESTRUTURAL
EM NÚMEROS
Quando a semelhança entre passado e
presente, não é mera coincidência

1988 2019
O Brasil foi o último país do continente americano a abolir No Brasil, 44,5% da população preta ou parda vivia, em
a escravização. Mesmo assim, após a assinatura da Lei 2018, em domicílios com a ausência de pelo menos
Áurea, cerca de 1,5 milhão de pessoas passaram a compor um serviço de saneamento básico (coleta de lixo,
a sociedade brasileira sem nenhum suporte do Estado. abastecimento de água por rede e esgotamento sanitário
Ocuparam morros ou locais insalubres. por rede). Mas entre os brancos esse percentual era de
27,9%.
O adensamento domiciliar excessivo (mais de três
moradores para cada cômodo utilizado como dormitório
no domicílio) foi mais frequente entre negros (7%) do que
entre brancos (3,6%).

33
1988 2019
Em sua visão eugenista, os europeus consideravam que os O percentual de jovens de 18 a 24 anos pretos ou pardos
povos de origem europeia eram mais inteligentes e mais com menos de 11 anos de estudo e que não frequentava
capazes de prosperar. Daí incutiram a ideia de que negros e escola caiu de 2016 (30,8%) para 2018 (28,8%). Esse
indígenas eram preguiçosos e não serviam para o trabalho. indicador era de 17,4% entre os brancos, em 2018.
Você vai ver no capítulo a seguir que o negro foi banido
também do sistema educacional desde os tempos do No mercado de trabalho, os pretos ou pardos
império. Pode estar aí a raiz da segregação. Após centenas representavam 64,2% da população desocupada e
de anos vivendo sob a mesma regra, como seria possível, 66,1% da população subutilizada. E, enquanto 34,6% dos
então, chegar no mesmo lugar que o branco, uma vez que trabalhadores brancos estavam em ocupações informais,
eles foram induzidos a começar a corrida com bastante entre os pretos ou pardos esse percentual era de 47,3%.
desvantagem? O rendimento médio mensal das pessoas brancas
ocupadas (R$2.796) foi 73,9% superior ao da população
preta ou parda (R$1.608). Os brancos com nível superior
completo ganhavam por hora 45% a mais do que os pretos
ou pardos com o mesmo nível de instrução.
A desigualdade também estava presente na distribuição de
cargos gerenciais, somente 29,9% deles eram exercidos por
pessoas pretas ou pardas.

Fonte: IBGE
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

05
O NEGRO
FORA DA LEI
Entenda como o racismo
também se estruturou a
partir das leis imperiais,
que apartaram os negros
de uma série de direitos
civis fundamentais

35
Para continuar a fundamentar a compreensão sobre como o racismo foi estruturado em nossa sociedade, também é
preciso conhecer o percurso histórico da instituição de leis desde os tempos do império, que segregaram a população
negra de direitos básicos como a educação.
Vamos agora nos guiar por uma linha do tempo constitucional, antes mesmo do decreto da abolição da escravatura, em
1888, com o decreto da Lei Áurea, até a atualidade. Assim, fica mais fácil entender a origem de tantas estatísticas que,
ainda hoje, retratam que os negros figuram na base das pirâmides sociais.

1837 A primeira Lei da Educação excluía os negros das


escolas
A partir da Constituição de 1824, que declarava a todos os
cidadãos o direito à instrução primária gratuita, foi crescente
a necessidade de “instruir e civilizar” o povo. Isso colocou a
aprendizagem da leitura, da escrita e das contas, bem como a
frequência à escola como um aspecto de grande importância para
a edificação de uma nova sociedade. No entanto, esse direito era
restrito aos livres e aos libertos, e valia tanto para a educação das
crianças quanto para jovens e adultos. Para escravos e indígenas,
além do trabalho pesado, bastava a doutrina aprendida na
oralidade e a obediência pela violência física ou simbólica. Desse
modo, o acesso à cultura da leitura e da escrita era considerado
inútil para esses segmentos.
1850 Lei das terras: negros não podem ser proprietários
Foi a primeira iniciativa no sentido de organizar a propriedade
privada no Brasil. Até então, não havia nenhum documento que
regulamentasse a posse de terras, mas, com as transformações
sociais e econômicas pelas quais passava o país, o governo se viu
pressionado a organizar esta questão.
A Lei de Terras foi aprovada no mesmo ano da lei Eusébio de
Queirós, que previa o fim do tráfico negreiro, e já sinalizava a
abolição da escravatura no Brasil. Então, diante da eminência
da libertação os escravos, grandes fazendeiros e políticos
latifundiários se anteciparam para impedir que negros pudessem
também se tornar donos de terras.

1871 Lei do ventre liv re


Também conhecida como Lei Rio Branco determinava que
os filhos de mulheres escravizadas que nascessem após 28
de setembro de 1871, seriam considerados livres. A teoria era
diferente da prática, no entanto, à medida que essas crianças
deveriam ficar sob a tutela dos senhores de suas mães até
completarem oito anos. Depois disso, os senhores receberiam
indenização do Estado ou poderiam se valer da força de trabalho
do indivíduo até sua maioridade. A conclusão a que se chega é
que nenhum escravizado nascia, de fato, livre.
1885 Lei do Sex agenário
A Lei nº 3.270 de 28 de setembro de 1885 – concedia liberdade
aos escravos com mais de 60 anos de idade. Ocorre que, diante
das condições insalubres de vida e trabalho aos quais os negros
eram submetidos, muitos morriam muito antes de chegar à
terceira idade. Sem contar que a lei apresentava um artigo
que determinava que o escravo, ao atingir os 60 anos, deveria
trabalhar gratuitamente por mais três anos para seu proprietário.

1888 Lei Áurea


Em 13 de maio, a princesa Isabel assina a lei que pôs fim à
escravização. O decreto libertou cerca de 700 mil negros que
ainda compunham o regime escravocrata. A essa altura, a maioria
já tinha conseguido sua liberdade por meio da fuga, compra de
alforria ou como resultado dos movimentos abolicionistas e leis
anteriores. Entre as figuras representativas para conquista da
abolição, é preciso enfatizar o importante papel desempenhado
pelos escravizados nessa luta. Ao contrário do que o estado
monárquico quis passar, o fim da escravidão não foi um
presente da monarquia. Na verdade, o processo de abolição
da escravidão foi gradual e inevitável. Além de ter um impacto
político infinitamente maior do que o social, uma vez que o Brasil
foi o último país ocidental a acabar com a exploração negra.
Nesse sentido, a lei serviu muito mais para acalmar os ânimos >>
internacionais, porque nossas relações diplomáticas com a
Inglaterra, por exemplo, já estavam sendo prejudicadas.
Só que, mesmo após o decreto da princesa, as condições
de trabalho e subsistência da população negra continuaram
insalubres por anos a fio. Sabe a expressão “pra inglês ver?” Tá
explicada, né?

1890 Lei dos vadios e capoeiristas


Apenas dois anos após a abolição, o decreto 847 do Código
Penal determinaria que aqueles que estivessem pelas ruas, sem
trabalho ou residência comprovada seriam presos. Além de
levantar colocar a efetiva liberdade em xeque, essa lei era como
um beco sem saída para os negros. Vamos lembrar que após a
Lei Áurea, a população até então escravizada não contou com
incentivos governamentais ou políticas públicas que dessem a
eles condições dignas de subsistência. Diante dessa lacuna social
que se formava, dá pra imaginar qual era a cor da população
carcerária daquela época, né? A mesma que predomina até hoje:
de cada três presos, dois são negros.
1968 Lei do Boi
Foi a primeira lei brasileira a estabelecer cotas nas universidades.
Mas não para os negros e sim para os filhos de fazendeiros. Um
dos artigos dizia “Estabelecimentos de Ensino Médio agrícola e
as Escolas Superiores de Agricultura e Veterinária, mantidos pela
União, reservarão, anualmente, de preferência, 50% de suas vagas
a candidatos agricultores ou filhos destes, proprietários ou não
de terras, que residam com suas famílias na zona rural. E 30% a
agricultores ou filhos destes, proprietários ou não de terras, que
residam em cidades ou vilas que não possuam estabelecimentos
de Ensino Médio.

1989 Lei 7.716 - Racismo é crime inafiançável e não


prescreve
Nasce a nossa atual constituição. Foram necessários 488 anos
para ter uma constituição que dissesse que racismo é crime! Na
maioria das ocorrências se minimiza o racismo enquanto injúria
racial e nada acontece. Só para citar um exemplo, até 2017, um
levantamento obtido pela GloboNews demonstrava que, em 30
anos com a lei em vigor, apenas 244 processos de racismo foram
julgados no estado do Rio de Janeiro.
2001 Conferência de Durban
A África sedia a III Conferência Mundial de Combate ao Racismo,
Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata,
organizada pela ONU e dirigentes mundiais. Motivados, em grande
parte, pelos anos de luta do Apartheid, foram estabelecidas a
Declaração e Programa de Ação de Durban, documentos que
propunham políticas de reparação e ações afirmativas contra
o racismo, a discriminação racial, a xenofobia ou qualquer
intolerância correlata, bem como a proteção das vítimas.

2003 Lei 10639 e a obrigatoriedade do ensino de


Cultura Negra
A lei estabelece as diretrizes e bases da Educação Nacional, para
incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da
temática “História e Cultura Afro-Brasileira”.

2009 Primeira Política de Saúde da População Negra


O Sistema Único de Saúde (SUS) estabelece a Política Nacional
de Saúde Integral da População Negra, com o objetivo de garantir
a equidade e a efetivação do direito à saúde de negras e negros.
No entanto, os índices de 2020 continuam alarmantes: 65% das
mulheres vítimas de violência obstétrica no Brasil são negras. Elas
também são a maioria (54,1%) entre as vítimas de mortalidade
materna na faixa etária de 15 a 29 anos.
2010 Lei 12.288 - Estatuto da Igualdade Racial
Destinado a garantir à população negra a efetivação da igualdade
de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais,
coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais
formas de intolerância étnica. O documento é formalizado depois
de 122 anos de formalização da Lei Áurea em um país em que
ainda teima em negar a existência de racismo.

2012 Lei 12711 - Cotas nas universidades


A lei garante a reserva de 50% das matrículas por curso e turno
nas 59 universidades federais e 38 institutos federais de educação,
ciência e tecnologia a alunos oriundos integralmente do ensino
médio público, em cursos regulares ou da educação de jovens e
adultos.
06
ELES
REPRESENTAM
A NEGRITUDE
Relembre ou
conheça algumas das
personalidades notáveis
que marcaram época e se
consagraram na história
do Brasil e mundo
descola.org | Cultura Antirracista

“E viveram felizes para sempre”


Quando você termina assim um conto de fadas para Lembra que a Alê propôs que enxergássemos o mundo ao
embalar o sono de uma criança branca, ela pode sonhar inverso? Ao imaginarmos que parte de nossas referências
com a representação de si mesma refletida nas diversas midiáticas e do marketing fossem negras? O exercício deixa
princesas que ela pôde ver estampadas nos livros. Assim claro que, na multiplicidade das cores das prateleiras das
como um menino branco pode estimular seu imaginário lojas, da TV, da política, ainda há falta muito para equiparar
por meio do arquétipo do super-herói, no qual ele se vê a representatividade interracial.
representado uma série de vezes. São tantos superpoderes,
que ele pode até escolher!
Mas e uma criança negra? Como se vê por meio das
princesas? E dos super-heróis? Em meio a “Obamania”
estadunidense, em 2009, a Disney finalmente preencheria
essa lacuna com o lançamento de “A princesa e o Sapo”.
Tiana chegou às telas com sua coroa brilhante e um vestido
bufante para se juntar à Cinderela, Bela Adormecida e
o time da realeza. Moana chegou mais para frente para
engrossar o caldo. No time dos meninos o Pantera Negra,
a Tempestade e o Luke Cage são algumas das criações da
Marvel com superpoderes.

44
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

Parte desse longo caminho, no entanto, já vem sendo Aqui na Descola relacionamos apenas alguns deles, mas,
trilhado há centenas de anos, e muitas personalidades não apenas brasileiros como de outras nacionalidades.
negras já cravaram sua notoriedade. Em seu livro “Afro- Vamos retomar ou conhecer algumas das criações e
Brasil Reluzente: 100 personalidades notáveis do século contribuições dos negros para a área academica, social e
XX”, o cantor, compositor e escritor Nei Lopes, compila os científica?
grandes nomes da negritude brasileira.

45
descola.org | Cultura Antirracista

ALEK WEK
Modelo e estilista sul-sudanesa-britânica que começou
sua carreira na moda em 1995, aos 18 anos. Foi aclamada
por sua influência na percepção de beleza na indústria
da moda. Ela é do grupo etnico Dinka no Sudão do Sul,
mas escolheu a Grã-Bretanha como refúgio em 1991, para
escapar da guerra civil no Sudão.

46
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

ANGELA DAVIS
Referência mundial do ativ ismo negro e
empoderamento feminino, Angela Davis foi perseguida
pelo FBI, presa e depois inocentada. Recebeu homenagens
de John Lennon e Yoko Ono, que lançaram a música
‘Angela’, e dos Rolling Stones, que gravaram a canção
‘Sweet Black Angel‘, em que abordavam problemas legais e
pediam a libertação da ativista. Em 2012, a cineasta Shola
Lynch dirigiu e lançou o documentário ‘Libertem Angela
Davis’, em que trata deste período de sua trajetória.
Atualmente, é professora emérita do departamento de
estudos feministas da Universidade da Califórnia, a mesma
instituição que a demitiu por seu posicionamento político e
ativismo.
É autora de obras que abordam as condições carcerárias
nos EUA, a disputa de classe, o racismo, o papel da mulher
negra em uma sociedade desigual e racista. Entre suas
obras mais conhecidas estão: ‘Mulheres, raça e classe’
(2016), ‘A liberdade é uma luta constante’ (2016) e ‘Mulheres,
cultura e política’ (2018).

47
descola.org | Cultura Antirracista

BARACK OBAMA
Eleito com quase 70 milhões de votos, o primeiro
presidente negro da história dos EUA foi também o
mais bem votado por lá. Durante oito anos de governo,
Obama deixou legados históricos, como a retomada das
relações diplomáticas com Cuba, após meio século de
distanciamento e uma vitória na Suprema Corte, que
autorizou o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Em
2010, o Obamacare facilitou o acesso ao sistema de saúde
de cerca de 20 milhões de americanos, em grande parte de
baixa renda. Seu livro de memórias “A promised land” (Uma
terra prometida) vendeu 887 mil cópias apenas no dia de
seu lançamento, em novembro de 2020.

48
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

BELL HOOKS
Gloria Jean Watkins, na verdade, emprestou o nome de sua
avó materna para se tornar aclamada intelectual, teórica
feminista, artista e escritora. Escreveu mais de trinta
livros de gêneros diversos, como teoria crítica, memórias,
poemas e literatura para crianças. Em 2014 fundou o
Instituto Bell Hooks para combater a discriminação racial
por meio de eventos, cursos e palestras.

49
descola.org | Cultura Antirracista

CONCEIÇÃO EVARISTO
Participante ativa dos movimentos de valorização da cultura
negra em nosso país, a mestre e doutora em literatura
brasileira estreou no segmento em 1990, quando passou
a publicar seus contos e poemas na série Cadernos Negros.
Escritora versátil, cultiva a poesia, a ficção e o ensaio.
Seus trabalhos extrapolaram os muros brasileiros para se
tornarem referência em outros países.
Nos últimos anos, três de seus livros foram traduzidos para
o Francês e publicados em Paris pela editora Anacaona.
Em 2017, o Itaú Cultural de São Paulo realizou a Ocupação
Conceição Evaristo contemplando aspectos da vida e da
literatura da escritora. No contexto da exposição, foram
produzidas as Cartas Negras, retomando um projeto de
troca de correspondências entre escritoras negras iniciado
nos anos noventa. Em 2018, a escritora recebeu o Prêmio
de Literatura do Governo de Minas Gerais pelo conjunto de
sua obra.

50
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

DJAMILA RIBEIRO
Natural de Santos, no litoral de São Paulo, Djamila é uma
das principais vozes da militância feminista e contra o
racismo na atualidade. Pesquisadora e mestre em Filosofia
Política pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Colunista da Folha de São Paulo, a escritora já foi secretária
adjunta da Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania de
São Paulo. Também é coordenadora da coleção de livros
Feminismos Plurais, da qual faz parte o Pequeno Manual
Antirracista, livro mais vendido de 2020, com o qual Djamila
foi agraciada com o Prêmio Jabuti, mais tradicional da
literatura Brasileira.

51
descola.org | Cultura Antirracista

ELLEN JOHNSON SIRLEAF


Política e economista liberiana que foi presidente da Libéria
entre 2006 e 2018. Ellen foi a primeira mulher a ser eleita
chefe de estado de um país africano. Em 2001 ganhou o
Prêmio Nobel da Paz graças aos seus esforços em promover
os direitos das mulheres.

52
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

GLÓRIA MARIA
Uma das primeiras repórteres negras do Brasil, a carioca
estreou em 1971, durante o desabamento do Elevado Paulo
de Frontin, no Rio de Janeiro. Daí em diante foi galgando
seu espaço nos principais telejornais da TV Globo, cobrindo
eventos nacionais e internacionais.
A partir de 1986, a jornalista integrou a equipe do
Fantástico, do qual foi apresentadora de 1998 a 2007. No
programa, ficou conhecida pelas matérias especiais e
viagens a lugares exóticos e por entrevistar celebridades
como Michael Jackson, Harrison Ford, Nicole Kidman,
Leonardo Dicaprio e Madonna.

53
descola.org | Cultura Antirracista

HATTIE MCDANIEL
Primeira atriz afro-americana a ganhar o Oscar em
1940, pela personagem Mommy, em “E o vento levou”. Filha
de um casal de ex-escravos, Hattie foi uma das precursoras
da raça negra a trabalhar no rádio, enfrentando e militando
contra o racismo. No início de sua carreira, ela dividia seu
tempo entre testes e filmes e o trabalho de empregada
doméstica, que lhe complementava o orçamento.
A atriz interpretou mais de setenta personagens no
cinema, mas, apesar de ter recebido o prêmio máximo da
academia americana, grande parte dos papéis que viveu era
empregada, serva ou escrava.

54
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

JESSE OWENS
Atleta norte-americano que ganhou quatro medalhas
de ouro nos Jogos Olímpicos de 1936. Suas conquistas
foram importantes não só para ele, mas também para a
humanidade, pois os jogos aconteceram em Berlim, na
Alemanha, quando o líder nazista Adolf Hitler estava no
poder.
Owens subiu ao ponto mais alto do pódio nas provas de
100 metros rasos, salto em distância, 200 metros rasos e
corrida de revezamento 4x100 metros, provando para o
ditador que a tal supremacia física e intelectual ariana só
existia em sua cabeça doentia.

55
descola.org | Cultura Antirracista

LEWIS HAMILTON
Piloto automobilístico britânico, Hamilton também é
designer de moda, ativ ista e músico. Foi agraciado por
promover o seguimento global da Fórmula 1, atraindo um
público mais amplo fora do esporte, em parte, devido ao
seu estilo de vida de alto nível, ativismo ambiental e social
e suas façanhas na música e na moda. Tornou-se um
defensor proeminente de apoio ao ativismo no combate ao
racismo, inclusive por defender uma maior diversidade no
automobilismo. Hamilton foi listado na edição de 2020 da
Time como uma das 100 pessoas mais influentes em todo o
mundo.

56
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

MAE JEMISON
Médica, engenheira e ex -astronauta americana, foi a
primeira mulher negra a v iajar ao espaço, quando serviu
como especialista de missão a bordo do ônibus espacial
Endeavour. Jemison integrou o grupo de astronautas da
NASA de 1987 e serviu na missão STS47, que orbitou a terra,
em setembro de 1992.

57
descola.org | Cultura Antirracista

MARIA FIRMINA DOS REIS


Considerada a primeira romancista brasileira, em 1847,
aos 22 anos, foi aprovada em um concurso público para
a Cadeira de Instrução Primária, sendo assim a primeira
professora concursada de seu Estado. Maria demonstrou
sua afinidade com a escrita ao publicar “Úrsula” em 1859,
primeiro romance abolicionista, primeiro escrito por uma
mulher negra brasileira.
Com a obra “Úrsula”, primeiro romance literário afro-
brasileiro, Maria Firmina se consagrou escritora. Em 1887,
no auge da campanha abolicionista, a escritora publica o
livro “A Escrava”, reforçando sua postura anti-escravocrata.
Ao aposentar-se, em 1880, fundou uma escola mista e
gratuita.

58
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

NILO PEÇANHA
Com a morte de Afonso Pena, antes do término do
mandato, o advogado Nilo Peçanha assumiu a presidência
do país. Tornou-se o 7º presidente do Brasil República
entre 1909 e 1910.
Durante o curto período de seu governo foi criado o
Serviço de Proteção ao Índio (SPI) cuja chefia foi entregue
ao marechal Cândido Rondon, que havia realizado várias
expedições pelo norte de Mato Grosso, onde exerceu uma
intensa atividade indianista. Foi responsável também por
inaugurar o Ensino Técnico no país.

59
descola.org | Cultura Antirracista

OPRAH WINFREY
Referência midiática mundial, além de jornalista
e apresentadora, Oprah também é psicóloga, atriz,
produtora, editora e escritora norte-americana. Venceu
por várias vezes o prêmio Emmy por seu programa The
Oprah Winfrey Show, o talk show com maior audiência da
televisão norte-americana.
Como atriz foi indicada ao Oscar pelo filme “A cor púrpura”
(1985). Eleita pela revista Forbes a mulher mais rica do ramo
de entretenimento no mundo durante o século XX, Oprah é
uma das filantropas mais influentes de todos os tempos, e a
primeira mulher negra a ser incluída na lista de bilionários,
em 2003.

60
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

TONI MORRISON
Toni Morrison nasceu em 1931, em Ohio, nos Estados
Unidos. Formada em letras pela Howard University, estreou
como romancista em 1970, com O olho mais azul. Em
1975, foi indicada para o National Book Award com Sula
(1973), e dois anos depois venceu o National Book Critics
Circle com Song of Solomon (1975). Amada lhe valeu o
prêmio Pulitzer. Foi a primeira escritora negra a receber
o prêmio Nobel de literatura, em 1993. Aposentou-se em
2006 como professora de humanidades na Universidade de
Princeton.

61
descola.org | Cultura Antirracista

ZEZÉ MOTTA
A emblemática Xica da Silva foi apenas um dos
personagens marcantes da atriz que vem dedicando
mais de 50 anos à cultura brasileira. A estreia de Maria
José Mota não poderia ser mais marcante: Em janeiro de
1968, ela integrou o coro do musical “Roda Viva”, escrito por
Chico Buarque e dirigido por José Celso Martinez Correia.
Um dos mais emblemáticos espetáculos dos anos 60, que
foi atacado pelo Comando de Caça aos Comunistas e teve
seus atores ameaçados e agredidos. Com mais de 50 anos
de carreira, a atriz e cantora tem em seu currículo 55 filmes,
35 novelas e 14 discos gravados. Além disso, seu nome
figura entre as principais ativ istas do mov imento negro.

62
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

07
VIESES
INCONSCIENTES
Como nossas crenças e visões
estereotipadas de mundo
podem reforçar preconceitos
e interferir na maneira como
nos relacionamos e enxergamos
quem é diferente de nós

63
descola.org | Cultura Antirracista

Vieses são as crenças que formamos com base nas


informações que recebemos e nas nossas ex periências
ao longo da v ida. Essas crenças se tornam a lente com
a qual enxergamos o mundo. Os vieses são inconscientes
quando os usamos de maneira automática, como atalho
mental para tomar decisões rápidas. É como se cada
experiência fosse salva em um grande banco de dados
dentro da nossa mente, formando um sistema de crenças.
A cada nova interação, nosso cérebro recorre a essas
informações para julgar a situação que está sendo vivida.
Quer um exemplo de como isso funciona na prática?
Parado no farol vermelho, um homem branco decide fechar
os vidros do carro diante da aproximação de um pedestre
negro. De maneira velada ou explícita, a atitude demonstra
que o motorista se sentiu ameaçado por aquele pedestre só
por conta da cor de sua pele.
As famílias Souza e Silva não se conhecem, mas dividem
uma tenda em um parque com seus respectivos filhos. A
primeira é totalmente composta por brancos. Enquanto
a mãe da família Silva serve o lanche para as crianças, de
longe, a Sra. Souza conecta a roupa branca e a pele negra
da moça e, inconscientemente, lhe impõe o rótulo de babá
ou ajudante da família.

Os v ieses inconscientes são os


preconceitos e julgamentos
instantâneos que ex istem em nós e que,
muitas vezes, nem nos damos conta de
que os temos.
Ao falarmos sobre vieses, não estamos tratando dos
nossos valores e sim de resoluções automáticas do nosso
cérebro baseado no nosso repertório, que acabam gerando
estereótipos. Entretanto, a quebra de alguns tipos de
vieses pode, necessariamente, passar pela conscientização
dos benefícios de promover um ambiente diverso e de
equidade racial e de gênero. Como assim?

65
Quando você esbarra com frases assim,
fica mais fácil de entender:

ch o r a”
m n ã o
“ H om e
“ To do ja p o n ê s é
in t e li ge n t e”

i st a s”
er r o r
s sã ot
ra b e
“Á

A MUDANÇA SOCIAL COMEÇA EM


VOCÊ E TRANSFORMA O OUTRO.
Como você pode ser agente de transformação e quebrar
os vieses? Comece por tomar consciência de seus vieses.
Porque sim, todos nós os temos e está tudo bem. isso
não nos torna uma pessoa ruim, porque é natural do ser
humano. Mas ainda bem que temos a capacidade de
refletir.
O Teste de Associação Implícita (TAI) é uma ferramenta
do campo da psicologia social que tem como objetivo
detectar a força da associação subconsciente de uma
pessoa entre representações mentais de objetos na
memória. Por meio dele é possível identificar os vieses
inconscientes.

Acesse aqui para fazer o


seu teste:
http://dsco.la/associacao-implicita

67
SEJA ANTIRRACISTA VOCÊ TAMBÉM
Você contribui para a equidade de gênero e preconceitos de qualquer ordem quando:

Não recorre a estereótipos e generalizações do tipo “Lugar de


mulher é na cozinha”, “Toda negra sabe sambar”.
Não pressupõe que determinada pessoa não desempenha bem
uma atividade por causa do gênero ou da raça.
Não restringe homens e mulheres, de qualquer raça, a
determinadas áreas de atuação profissional
Não relaciona o caráter e comportamento de uma mulher
baseando-se na cor, comprimento da saia ou do decote.
Não hipersexualiza a mulher. Tampouco o faz por conta de seu
tom de pele.
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

Os vieses são rótulos que damos a


pessoas e a coisas a partir de uma
série de acontecimentos em nossas
v idas. Eles nascem de uma mescla de
processos culturais e cognitivos, o que
quer dizer que tendemos a enxergar
o mundo de acordo com nossas
referências e com as experiências que
tivemos.
Todo mundo tem viés. Alguns de forma
mais clara e outros de um jeito um
pouco mais velado. O que importa aqui
é que, se você tiver consciência dos
seus vieses, vai ter maior capacidade de
evitar e saber como lidar com eles.
No curso Vieses Inconscientes, vamos
te mostrar o que são, como se formam Clique no link abaixo para acessar o curso
e uma série de casos importantes sobre Vieses Inconscientes, da Descola.
o tema. Vamos te dar recursos para que
você possa identificar os seus e saber https://descola.org/v ieses-inconscientes
como evitar em situações do cotidiano.

69
descola.org | Cultura Antirracista

08
O ESSENCIAL
É INVISÍVEL
AOS OLHOS
Compreenda e ajude a
disseminar corretamente
alguns dos conceitos que
compõem o ativismo negro

70
Apesar de a população afrobrasileira
ser cinco vezes maior do que a
população negra nos Estados Unidos,
o que podemos ver por lá é um senso
de justiça muito maior em casos
de violência e opressão contra os
negros. Boa parte dessa realidade
se deve aos resultados do sistema
de cotas raciais que encurtaram
a desigualdade, permitindo que
muitos negros ocupassem cargos de
liderança e tivessem influência na
política e na mídia para cobrar por
justiça e impulsionar a repercussão
de casos de homicídio e violência em
geral, por exemplo. Esta é parte de
uma conquista obtida após mais de
130 anos do fim da escravização, que
ainda não vemos por aqui. Por essas e
outras que não podemos subestimar as
transformações sociais possíveis de se
realizar com a adoção das cotas raciais.

71

descola.org | Cultura Antirracista

Quando a base
da pirâmide se
movimenta, toda a
estrutura da sociedade
se movimenta com ela
– Angela Dav is

72
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

No entanto, o egocentrismo
presente na nossa narrativa
acadêmica, escolar e do audiovisual


brasileiro faz com que os brancos
naturalizem sua cor como padrão.

Dessa forma, quando a branquitude


não se reconhece como raça, o que
ela está fazendo é inferiorizando as
outras etnias
– Angela Dav is

Por isso, é importante fazer o


exercício, compreender e disseminar
alguns conceitos essenciais que
norteiam o ativismo negro na luta
para diminuir o abismo social que
ainda persiste entre as raças.

73
descola.org | Cultura Antirracista

PRIVILÉGIO
O dicionário define como vantagem, direito ou prerrogativa,
válidos apenas para um indivíduo ou um grupo, em
detrimento da maioria. No entanto, durante a vídeoaula, a
Alê explicou porque, dependendo do repertório histórico
e social de cada indivíduo, é difícil compreender na
prática. Quando alguém entende o racismo como “um
problema dos negros”, provavelmente, essa pessoa não
reconhece que a sua herança racial contribuiu para atingir
determinado patamar social.
Como você assistiu ao vídeo indicado pela professora, é
como se, em uma corrida por um prêmio, fosse dado aos
brancos o direito de largar à frente dos negros por conta
de suas condições familiares, sociais e acadêmicas, que
acabam por ser privilegiadas.
É importante entendermos e reconhecermos nosso lugar
de privilégio se queremos ter uma atitude antirracista.

74 74

Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

A branquitude é sempre um lugar de vantagem estrutural


do branco, em uma sociedade hierarquizada pelo racismo.
Ou seja, isso ocorre entre todos os povos colonizados por
europeus, porque a ideia de superioridade surge ali e se
espalha via colonização.
– Alex andra

75
descola.org | Cultura Antirracista

COTAS
As cotas raciais são uma medida de ação contra a
desigualdade num sistema que priv ilegia um grupo
racial em detrimento de outros – esses, oprimidos
perante a sociedade. Ao contrário do que diz o senso
comum, cotas raciais não se aplicam somente a pessoas
negras. Em várias universidades, por exemplo, existem cotas
para indígenas e seus descendentes, que visam abarcar as
demandas educacionais dessas populações. Há, em alguns
lugares, cotas diferenciadas para pessoas pardas, também –
caso contrário, estão inclusas nas cotas para negros.

Como as cotas funcionam?

Para que usufruam das cotas, as pessoas devem assinar


um termo em que se autodeclaram negras, indígenas ou
pardas, que então será a garantia documental do uso dessa
política afirmativa. Quando se trata de concurso público
para algum emprego, a pessoa pode passar por uma
entrevista.

76 76
A existência dessa entrevista, por exemplo, é algo que causa
alguma discórdia quando se trata de cotas raciais, em razão
de ela ser subjetiva. Afirma-se que existe a possibilidade de
haver jogos de influência, pagamento de propina e outras
atitudes por meio de quem quer usufruir das cotas raciais
ilegalmente – uma pessoa branca, por exemplo.
Em 1997, apenas 1,8% dos jovens entre 18 e 24 anos que se
declararam negros havia frequentado uma universidade,
segundo o Censo. As políticas públicas em torno do direito
universal de acesso ao ensino, principalmente superior,
começaram a ser reivindicados, então, pelo movimento
negro.
Quando a questão das cotas para estudantes negros
chegou ao Supremo Tribunal Federal, em 2012, foi
votada como constitucional por unanimidade. Mas foi em
2000 que, por conta de uma lei estadual, a Universidade
Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) foi a pioneira em
conceder uma cota de 50% em cursos de graduação, por
meio do processo seletivo, para estudantes de escolas
públicas.

77
descola.org | Cultura Antirracista

Depois da UERJ, a Universidade de Brasília (UnB) se


propôs a estabelecer as ações afirmativas para negros no
vestibular de 2004. A instituição foi a primeira no Brasil a
adotar cotas raciais. De lá para cá, várias universidades e
faculdades vêm adotando sistemas de ações afirmativas
para os vestibulares e exames admissionais.
A consolidação das cotas aconteceu principalmente com a
lei nº 12.711, de agosto de 2012, conhecida também como
Lei de Cotas. Ela estabelece que até agosto de 2016
todas as instituições de ensino superior devem
destinar metade de suas vagas nos processos
seletivos para estudantes egressos de
escolas públicas. A distribuição dessas
vagas também leva em conta critérios
raciais e sociais, pois considera
fatores econômicos.

Fonte: politize.com.br

78
descola.org | Cultura Antirracista Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

MERITOCRACIA
O termo se refere a um sistema político em que os bens
econômicos e/ou poder político são investidos em
indivíduos com base no talento, esforço e realização,
ao invés de riqueza ou classe social. Dessa maneira, a
ascensão profissional é baseada no desempenho, que
pode ser mensurado por meio de exame ou realização
demonstrada.
Um exemplo são os programas de promoções
organizacionais que propõem metas ou desafios aos
colaboradores para que ascensão de cargos ou salários.
Significa que cada indivíduo é capaz de prosperar sem
respaldo do Estado, família ou sociedade. Contudo, apesar
de o esforço profissional ser colocado como prerrogativa
no conceito de meritocracia, o que se identifica, na prática,
é que a questão do privilégio conferido à branquitude
ainda interfere bastante nas possibilidades de ascensão
do negro na sociedade. É só lembrarmos do vídeo que
complementou o capítulo sete da aula da Alê. Fica difícil
para o negro vencer uma corrida uma vez que as
circunstâncias de vida e social o colocaram em
posição de desvantagem no momento da
largada.
79 79
descola.org | Cultura Antirracista

INTERSECCIONALIDADE
Como a Alê contou no vídeo, durante as consultorias que
presta nas organizações, às vezes, a liderança prioriza
ações de igualdade de gênero às questões de desigualdade
racial. Contudo, a professora explica que não há como
separar as coisas porque “na multidão da nossa unicidade
e da complexidade do nosso ser, há vários fatores que
atrapalham as pessoas frente às oportunidades”. Até
porque a maioria das mulheres são negras, assim como
os portadores de deficiência e comunidade LGBTQI+.
Pensando que não há apenas uma característica a nos
resumir enquanto seres humanos, em 1989, a ativista
Kimberlé Crenshaw cunhou o termo para se referir a como
cada indivíduo sofre opressões com base nas diferentes
categorias sociais em que se encaixa: em relação a gênero,
raça, classe, etnia, deficiência, sexualidade.

80 80
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

De acordo com Crenshaw


interseccionalidade é “uma
conceituação do problema que busca
capturar as consequências estruturais
e dinâmicas da interação entre dois
ou mais eixos da subordinação. Ela
trata especificamente da forma pela
qual o racismo, o patriarcalismo, a
opressão de classe e outros sistemas
discriminatórios criam desigualdades
básicas que estruturam as posições
relativas de mulheres, raças, etnias,
classes e outras. Além disso, a
interseccionalidade trata da forma
como ações e políticas específicas
geram opressões que fluem ao
longo de tais eixos, constituindo
aspectos dinâmicos ou ativos do
desempoderamento” (2002).

81
descola.org | Cultura Antirracista

LUGAR DE FALA É DIFERENTE


DE REPRESENTATIVIDADE

Você não precisa ser negro pra falar contra o racismo.


Você pode e deve se responsabilizar por isso. Mas, é
importante estar consciente de que o branco fala a
partir de outra perspectiva social, que é diferente do
negro.
– Djamila Ribeiro

Foto: Uol

82
Para entender o debate acerca da expressão, é necessário
compreender e reconhecer as camadas sociais, tão distintas
e delimitadas em nossa sociedade. No Brasil, mulheres
negras são a maioria dentre a população apartada do
sistema educacional. São a maioria também entre as
vítimas de violência doméstica e obstétrica. Dentre as
experiências compartilhadas pelos homens negros estão a
maior taxa de letalidade e encarceiramento. Enquanto isso,
qual é o lugar social da maioria dos homens brancos? São
eles que ocupam os cargos de gestão, recebem os maiores
salários, são maioria na política institucional, etc.
Entender que, enquanto negros compartilham
ex periências marcadas pela opressão, brancos
compartilham ex periências priv ilegiadas, é
fundamental para entrar no debate de lugar de fala.

83
descola.org | Cultura Antirracista

EQUIDADE
“Qualidade que nos permite dizer que uma pessoa está
predisposta a fazer, por sua própria escolha, aquilo que
é justo, e, quando se trata de repartir alguma coisa entre
si mesma e a outra pessoa, ou entre duas pessoas, está
disposta a não dar demais a si mesma e muito pouco à
outra pessoa do que é nocivo, e sim dar a cada pessoa
o que é proporcionalmente igual, agindo de maneira
idêntica em relação a duas outras pessoas. A justiça, por
outro lado, está relacionada identicamente com o injusto,
que é excesso e falta, contrário à proporcionalidade, do
útil ou do nocivo. No ato injusto, ter muito pouco é ser
tratado injustamente, e ter demais é agir injustamente.”
Assim o termo foi definido pelo filósofo grego Aristóteles,
aproximando o conceito de equidade ao de justiça.
Entretanto, de acordo com informações divulgadas no
portal Politize, o equitativo é considerado o mais justo, não
de acordo somente com a lei, mas sim como uma correção
da justiça legal que não deixará lacuna sociais – pois irá
prever particularidades e diferenças não observadas pelo
tratamento generalizado da lei.

84 84
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

A partir disso, é possível


concluir que o princípio
da equidade exige o
reconhecimento das
desigualdades ex istentes
entre os indiv íduos para
assegurar o tratamento
desigual aos desiguais na
busca da igualdade. Há,
então, uma necessidade
de conferir a determinados
grupos uma proteção
especial e particular por
conta de sua própria
vulnerabilidade.

Fontes: politize.com.br

85
descola.org | Cultura Antirracista

09
SEJA VELADO
OU EXPLÍCITO,
É RACISMO
Reconheça as diferentes
formas de discriminação
racial presentes em nossa
sociedade

86
“imagina,
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos
tenho vários
empregados
Não sou racista.
negros
Tenho até amigos
negros

Logo eu
que nunca
destratei
nenhum
negro

87
descola.org | Cultura Antirracista

Esse discurso é comum entre aqueles que buscam uma


justificativa pronta quando questionados sobre práticas
discriminatórias. No entanto, esses argumentos são rasos
e estão longe de contextualizar ou de serem o bastante
quando tratamos de práticas de igualdade.
Todos os dias identificamos exemplos de racismo explícito,
das mais diferentes proporções até casos de comoção
mundial, como a morte de George Floyd que relembramos
no comecinho do e-book. Mas, é muito comum que
a prática racista esteja camuflada em ex periências
cotidianas ou formas ofensivas de brincadeira.
Normalmente, o racista não admite seu preconceito, mas,
mesmo assim, age de maneira discriminatória. Estando ou
não evidente, a vítima tem o direito de denunciar qualquer
forma de ultraje, constrangimento e humilhação.

88 88
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos


É impossível não ser racista quando
fomos criados em uma sociedade
racista. É algo que está em nós e contra
o que devemos lutar sempre.
– Djamila Ribeiro, em
“ Pequeno Manual Antirracista”

Créditos: Uol

89
SEJA ANTIRRACISTA VOCÊ TAMBÉM
Fique ligado, identifique e ajude a combater atitudes agressoras como:

Dar apelidos de acordo com as características físicas da vítima;


Inferiorizar as características estéticas da etnia em questão;
Considerar a vítima inferior intelectualmente, podendo até negar-lhe
determinados cargos no emprego;
Ofender verbal ou fisicamente a vítima;
Desprezar os costumes, hábitos e tradições da etnia;
Duvidar, sem provas, da honestidade e competência da vítima;
Recusar-se a prestar serviços a pessoas de diferentes etnias.
Para além do racismo explícito, que discrimina, ofende e xinga descaradamente, vamos retomar os tipos de racismo
conforme a Alê explicou no vídeo?

Racismo Simbólico - “ Bandido bom é bandido morto”


Quando os negros são percebidos como violadores (mais do que os brancos) dos valores
sociais tradicionais, como a autossuficiência, o trabalho ético e o respeito as autoridades.
Ocorre quando tornamos legítimo o fato de o negro ser punido ou morto por
determinada atitude.
Outros exemplos: “negros exigem muitos direitos” “estão melhor agora do que nunca”.

Racismo Aversivo - É aquele em que o indiv íduo muda de calçada


quando vê uma pessoa negra em sua direção

Racistas aversivos podem até demonstrar compaixão por vítimas de injúria racial, também
apoiam políticas públicas de apoio à equidade e se definem como não preconceituosos.
Mas, a crença e o sentimento negativo em relação aos negros persiste, ainda que de maneira
inconsciente, pois demonstra certo desconforto diante da presença de pessoas negras.
Outros exemplos: fechar a janela do carro quando um negro se aproxima, quando um
segurança acompanha o negro no mercado pressupondo que ele será desonesto ao furtar
algo.
Racismo moderno - “ Os negros ganham mais do que os brancos”
É uma derivação do racismo simbólico, pois, a partir da década de 1960, principalmente
nos EUA, os debates antirracistas pleiteavam a igualdade de oportunidades entre todas as
raças. Não era mais uma briga somente contra a discriminação. Foi então que o racismo
simbólico ganhou uma versão, digamos, mais sutil e implícita, que pode ser verificada
quando o diálogo diz respeito à ascensão profissional da população negra.
Outros exemplos: “Discriminação é coisa do passado, porque os negros agora podem
competir profissionalmente e conquistar o que desejam.” “Eles nunca estiveram tão bem
quanto agora. Tem conseguido mais do que merecem.” “Eles não precisam de ajuda, só
devem se esforçar”. “As cotas beneficiam os negros”.

Racismo Segregacionista - limitar o negro a profissões menos


favorecidas
Atitudes que segregam ou apartam o negro do convívio rotineiro com determinada pessoa
ou quando deixamos evidente que o negro não faz parte de determinado contexto social.
Outros exemplos: determinar que a babá se vista de branco, pressupor que o indivíduo
exerça determinada profissão por conta da cor da pele.
Racismo Ambivalente - dois pesos e duas medidas
Quando o indivíduo apresenta uma visão polarizada, agindo de uma forma diante de uma
pessoa branca e de outra diante de um negro. Mas ainda assim não se declara racista.
Exemplos: quando a empresa estabelece que o domínio do inglês é primordial para a
contratação, mas há pessoas brancas que não falam o idioma entre os colaboradores.
Quando criticamos a influência imigratória dos afrodescendentes na cultura brasileira e não
fazemos o mesmo com a influência dos imigrantes europeus.

Preconceito Sutil - “ Ah, mas você é diferente. É uma negra


educada, articulada, acadêmica”

Como se a educação, instrução fosse um priv ilégio dos brancos. Assim, o racista sutil
pode negar emoções positivas ou demonstrar-se preconceituoso de maneira indireta e fria.
Racismo Cordial - “ Aí, mas você não é negra. Você é mulata”
Sem querer ofender, a pessoa nega a origem do outro, reforçando o negativismo
relacionado aos negros. Sem contar que a palavra mulata é extremamente racista,
porque deriva de mula: o cruzamento do burro com o cavalo. E, na época da escravização,
os filhos das mulheres negras vítimas de estupro por parte de seus senhores, eram
chamados de mulatos.
Mais adiante, preparamos uma cartilha antirracista explicando a origem dessa e de outras
expressões que não cabem mais no nosso vocabulário.
Outros exemplos: “Fulano é moreninho” “Beltrano tem o pé na cozinha”
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

10
É PRECISO SER
ANTIRRACISTA
Porque, diante da opressão,
discriminação, segregação de
direitos e violência, não basta
não ser racista. É preciso deixar
de compactuar e combater
esses cenários

95
descola.org | Cultura Antirracista

“ Em janeiro de 2020, um policial militar foi flagrado dizendo que um operador de


loja tinha cara de ladrão”

Foi assim que Fábio Turci, jornalista


da TV Globo, apresentou a matéria
na primeira edição do SPTV e, em
seguida, chamou o vídeo para
que os telespectadores pudessem
conferir como tinha sido a
abordagem.
O vídeo mostra um rapaz que, ao ser
enquadrado, comenta que aquele
era o quarto enquadro do dia. Aí o
policial rebate:

“ Tu tem cara de ladrão,


você vai ser enquadrado
dez vezes!”

96
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

Ao final da matéria, o jornalista tomou


seu papel de formador de opinião para
se posicionar:
“Se você é branco, nunca passou por
isso. E aí talvez você pense que racismo
é teoria, vitimismo ou mimimi. Mas não
é. Isso aqui é vida real”
Foi então que Fábio se dirigiu ao telão
para mostrar a reação dos internautas,
que fizeram questão de documentar
que aquele não era um fato isolado:
“Fui abordado pela PM e eles nem
pediram meu documento. Apenas
perguntaram ‘de quem era o carro’, por
ser um carro importado e eu, negro,
estar dirigindo”.
“Sempre que vou a alguma loja de
departamentos preciso estar de olho,
porque movimentos incertos fazem
com que seguranças achem que estou
roubando”.

97
descola.org | Cultura Antirracista

Diante da matéria exibida e da chancela dos internautas,


Fábio encerra o quadro perguntando aos telespectadores:
“O que você faz com essa informação? Se conforma? Acha
que tá tudo certo assim ou que isso não está certo, que não é
justo, e aí você acorda e tenta fazer alguma coisa?”
O que Fábio propunha é o mesmo que a Alê, tantos
outros ativistas e nós aqui da Descola estamos propondo:
acordar e tentar fazer alguma coisa é adotar uma
postura antirracista.
Quando nos calamos diante de um ato discriminatório
ou piada racista em vez de repreender quem os fez,
também estamos adotando uma postura racista. Sim!
Porque estamos sendo coniventes e cúmplices dessa
violência. E é por isso que a proposta deste curso não é
apontar o dedo e evidenciar os erros, mas sim conscientizar
a respeito da necessidade de abertura para o diálogo
e conscientização acerca de como a história pregressa
contribuiu para nossa realidade socieoeconômica.

98 98
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

Ao disseminar esse conhecimento,


fica mais fácil compreender que
a mudança começa quando
chamamos para cada um de nós a
responsabilidade em promover
atitudes antirracistas, sobretudo,
para os que buscam uma postura
ética e de respeito à diversidade
no seu dia a dia. Mais do que
falar, é preciso agir e entrar para
o combate. Você age ao intervir
diante de um ato discriminatório
ao ampliar as oportunidades
oferecidas aos negros, ao implantar
regras de conduta antirracistas
e de combate ao racismo entre
seus colaboradores. Age também
quando você os ouve e os considera
para a inovação de seus produtos
e serviços e decisões estratégicas.
É um trabalho de formiguinha,
mas que deve começar e ser
disseminado por cada um de nós.

99
Créditos: Lufe Gomes

descola.org | Cultura Antirracista

Claro que o branco de hoje


não é responsável pelo que
houve no passado, com a
escravização. Assim como o
alemão da nossa geração não
é responsável pelo holocausto,
de Hitler. Mas somos, sim, todos
responsáveis em repensar e
reconstruir nossa sociedade.
– Alex andra

100
Foi por isso que “emprestamos” parte da frase célebre de
Angela Dav is para o título deste capítulo. Não basta ser
antirracista, é preciso ser antirracista”.
A filósofa, escritora e professora norte-americana
é referência mundial do ativ ismo negro e
empoderamento feminino. Nascida em Birmingham,
no Alabama, quando a cidade e a maioria dos Estados
Unidos ainda sofria os efeitos da segregação racial. Para se
ter ideia do nível de horror o bairro em que ela nasceu era
conhecido pela tradição de se explodir casas de famílias
e igrejas nos bairros negros – preferencialmente, quando
esses locais estavam ocupados.
Na adolescência, Davis organizou um grupo de estudos
sobre as questões raciais. O seu grupo foi descoberto,
perseguido e proibido pela polícia. Após concluir os
estudos básicos, aos 19 anos de idade, Davis mudou-se
para o estado de Massachusetts, no norte dos Estados
Unidos, para estudar na Universidade de Brandeis.

101
descola.org | Cultura Antirracista

A partir daí, Davis integrou-se


ativamente na luta social, tendo filiado-
se ao SNCC, que era uma organização
antirracista fundada pelo ativista negro
Stokely Carmichael. A SNCC tinha como
princípios a resistência pacífica, ideal
de luta também defendido pelo ativista,
filósofo, teólogo e pastor negro Martin
Luther King. Com o tempo, a SNCC
deixou de existir. Tanto Carmichael
quanto Angela Davis aderiram a um
estilo de luta pelos direitos mais radical,
filiando-se ao Partido dos Panteras
Negras, que mais tarde ficou conhecido
como Movimento dos Panteras Negras.
Os Panteras Negras eram adeptos de
uma luta antirracista mais incisiva e
combativa, aderindo, inclusive, à luta
armada contra o racismo. Angela Davis,
contudo, fazia parte de uma frente
pacífica do movimento. Nessa época,
a ativista também se filiou ao Partido
Comunista dos Estados Unidos.

102 102
Conheça a obra de Angela Davis:

Mulheres, Raça e Classe


A filósofa expõe uma de suas maiores ideias, a de que há uma
intersecção entre classe, raça e gênero, além, apresentar a sua
tese contra o sistema carcerário.

Mulheres, Cultura e Política


Trata-se de uma compilação de artigos escritos e conferências
proferidas por Davis. Nesse livro, ela faz uma espécie de balanço
geral sobre a sua luta e sobre a situação do feminismo negro no
mundo.
Estarão as Prisões Obsoletas?
Neste livro a filósofa explora sua tese contra o encarceramento,
apresentando, a partir da visão do sistema carcerário dos EUA,
como as prisões tornaram-se espaços para prender minorias
étnicas.

A Liberdade é Uma Luta Constante


O livro é uma compilação de artigos, entrevistas e palestras feitos
entre 2013 e 2015. Trata-se de um apanhado geral de várias ideias
da autora e foi organizado pelo militante Frank Barat.

Fonte: Brasil Escola


SEJA ANTIRRACISTA VOCÊ TAMBÉM

Não se cale quando presenciar uma cena de discriminação


Não naturalize cenas de violência contra pessoas negras. Ou
melhor: qualquer tipo de violência.
Recorra a fontes oficiais e autores que são referências sobre o
tema. Ao se informar em fontes confiáveis, você constrói argumentos
baseados em fatos
Reconheça seus privilégios.
Não seja indiferente - se você tiver a coragem de fazer isso, seria
ótimo.
Ex. Vá a uma loja de briquedos e peça para comprar superheróis
negros.
Apoie pessoas. Seja um mentor. Ajude a encontrar um estágio e
um trabalho.
Apoie debates públicos e organizações que combatem o racismo.
Conheça os movimentos anti-racistas no Brasil e no mundo como
o Diário Antirracista, Educafro, Plano de Menina, etc.
Siga os influenciadores! Djamila Ribeiro, Silvio Almeida, Alexandra
Loras, AD Junior e muitos outros que vão te nutrir com conteúdo
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

11
POR
ORGANIZAÇÕES
MAIS INCLUSIVAS
Diversidade é sinônimo de
resultado. Veja as mudanças
organizacionais possíveis para
promover um ambiente de trabalho
diverso, frutífero e igualitário

107
descola.org | Cultura Antirracista

Em 2018, o Instituto Ethos fez um levantamento entre as


500 maiores empresas do Brasil. O estudo constatou que
a presença de negros em cargos de liderança e gestão era
de apenas 6%. A estatística correspondente às mulheres na
liderança foi ainda mais desanimadora: apenas 0.4%. Essas
fatias são irrisórias e a desigualdade escancara quando
olhamos para o total da população negra em nosso país:
118 milhões.
Por outro lado, apesar de se verem pouco representados,
um estudo encomendado ao Instituto Locomotiva pelo
Instituto Feira Preta, apontou que o negro mov imenta
R$1,7 trilhão por ano no Brasil . Divulgada em 2018,
a pesquisa “A Voz e a Vez – Diversidade no Mercado
de Consumo e Empreendedorismo”, que contou
com o apoio do Itaú, revela, ainda, um perfil dos
empreendedores negros no país: 29% dos negros que
trabalham têm o seu próprio negócio, totalizando
14 milhões de empreendedores que mov imentam,
aprox imadamente, R$ 359 bilhões em renda própria
por ano .

108 108
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

Você parou para pensar como os dois cenários


estatísticos são paradoxais? O primeiro alerta para a
baixa representatividade da diversidade em cargos de
liderança, enquanto o segundo, felizmente, aponta para
uma ascensão do negro no mercado consumidor. Percebe
o sinal de alerta? Quando os empreendedores e a alta
liderança não incluem o negro em seus comitês executivos,
não considera seus hábitos de consumo como parâmetro
e, consequentemente, não os contempla na divulgação de
seus produtos ou serviços, estão deixando de explorar um
mercado em potencial altamente promissor.
O cenário deixa claro que a classe empreendedora e a
alta gestão corporativa precisam promover mudanças
significativas. Antes de colher os louros econômicos,
é necessário mexer na base dos valores institucionais
e acolher, de uma vez por todas, a diversidade. Mas,
lembre-se de que boas intenções não bastam. A
inclusão efetiva demanda ação e mudança, como as
que propomos a seguir.

109
SEJA ANTIRRACISTA VOCÊ TAMBÉM
Reflexões e mudanças organizacionais possíveis para promover um ambiente de trabalho diverso,
frutífero e igualitário

1. Mapeie e inclua a diversidade


Certifique-se de que as equipes sejam compostas de maneira
diversa. Como? Forme um comitê heterogêneo para fazer um
levantamento entre seus colaboradores: qual a porcentagem de
negros, pardos, pessoas com deficiência, mulheres, LGBT? Já existe
alguma ação inclusiva sendo colocada em prática? Com quais
critérios? O primeiro passo do comitê é mapear e analisar o quanto a
organização já contempla diversos públicos em suas ações. Isso trará
novos pensamentos e discussões. Um olhar diferenciado para o time.
2 - Esteja aberto e promova o diálogo
Convide seus mais diversos públicos para conversar, compartilhar
suas histórias, anseios e necessidades. Pergunte e os ouça de
maneira empática: como a empresa pode ajudá-los, além de
desenvolver institucionalmente como uma marca diversa e inclusiva?
Em seguida, faça uma reflexão, como a Alexandra propõe no vídeo:
pergunte-se:
Criamos núcleos de diversidade na empresa e debates por exemplo
sobre interseccionalidade, Queer theory, cotas ou metas?
Organizamos ao menos cinco encontros por ano para discutir do
tema e agir na luta antirracista, anti-homofóbica etc?
Somos orientados para uma convivência harmoniosa e promovemos
palestras e debates sobre o tema?
Concordamos em discordar? Lembre-se de que o não concordar é
bem vindo para abrir a visão da empresa.
3- Analise os canais de comunicação
Com o mapa de seus públicos traçado, a comunicação institucional
exerce papel fundamental na disseminação desses novos caminhos
e valores para uma cultura organizacional mais inclusiva. O trabalho
aqui é bastante extenso e minucioso. A começar pela revisão do
manual de integração e de políticas e normas internas. É importante
checar se as mensagens neles contidas transcrevem a diversidade
como valor da organização. Em seguida, o comitê deve avaliar os
canais de comunicação interna: eles abarcam todos os públicos?
Neste momento, é ainda mais imprescindível revisar e promover
a adequação necessária aos formatos e linguagem: a empresa
se comunica de modo que todos se sintam acolhidos? Para se
respaldar ainda mais nesse quesito, o comitê pode investir na
elaboração de guias de comunicação inclusiva, nos quais os
colaboradores sejam orientados sobre as formas de tratamento
discriminatórias e aprendam a substituí-las por ex pressões
mais respeitosas aos mais diversos públicos.
4- Analise seus clientes
Dentre os que realizam testes em usuários, cheque e, se necessário,
oriente-os para que contemplem a diversidade em suas amostras.
Veja se elas são, de fato, diversificadas, a fim de limitar o erro de
cobertura de público-alvo e coibir vieses na leitura de dados.

5 - Crie seu soft ware, aplicativo, produtos,


solução com conjuntos de dados que sejam
racialmente diversos
Não recorra a conjuntos de dados que contenham apenas faces
brancas, personas brancas, testes com pessoas brancas. Enriqueça
sua base de dados pensando e considerando a diversidade.
6- Avalie todo o seu processo de trabalho
Se você atua diretamente com a elaboração do produto ou serviço,
identifique onde a exclusão de pessoas diversas acontece. Leve a
discussão para o seu time, você também é responsável por isso.

7- Reconheça seus v ieses inconscientes


Reconheça comportamentos e falas preconceituosas, quando
ocorrerem, e quebre o ciclo. Discuta-os de forma empática e sem
julgamentos. A compreensão deve começar em você, na liderança,
para disseminar boas práticas e intenções entre os demais.
8 - Eduque-se e capacite sua equipe
Se você estivesse entrando em um novo mercado ou lançando um
novo produto, você faria sua lição de casa primeiro, certo? Então,
com o trabalho de diversidade e inclusão não é diferente. Há ótimos
livros, treinamentos e consultores trabalhando neste espaço. Busque
instrução e ajude a disseminar esse conhecimento entre todos da
sua organização. Lembre-se de que você pode e deve recorrer à
Comunicação Institucional e ao Marketing, que farão esse trabalho
por meio dos canais de comunicação interna.

9 - Oportunidades iguais
Certifique-se de que todas as suas descrições de trabalho
mencionam que você é um empregador que oferece oportunidades
de maneira igualitária. Estudos mostram que os grupos
marginalizados são mais propensos a se candidatar a um emprego
que faz uma declaração sobre a organização que mostra que ela
valoriza a diversidade.
descola.org | Cultura Antirracista

Com estratégias como essas, sua organização sente os benefícios e colhe os frutos de engajar-se em prol do antirracismo.
Veja o que dizem as estatísticas.
Diversidade é sinônimo de:

Lucro e competitiv idade Atração e retenção de talentos


Ao contratar diversas etnias, organizações tendem a Organizações que investem em diversidade projetam uma
lucrar 33% mais. Ao contemplar diversidade de gênero, o imagem pública de maior compromisso com valores,
aumento é de 21%. A multiplicidade de pontos de vista e responsabilidade social e igualdade de oportunidades,
repertório cultural amplia a compreensão de todos acerca aspectos muito valorizados por consumidores, jovens
das necessidades e expectativas dos mais diferentes tipos talentos e investidores. A boa imagem atrai, no processo de
de clientes. (Mckinsey and Company, 2018) recrutamento, indivíduos talentosos que desejam conjugar
carreira com propósito, que selecionam empresas pelas
Senso de pertencimento afinidades com os seus valores pessoais.

Cerca de 80% dos empregados de empresas preocupadas Estudo da Randstad (2015), multinacional holandesa de
com diversidade admitem ter espaço para expor ideias e Recursos Humanos, mostrou que 87% dos profissionais do
inovar. Quando isso não acontece o percentual cai para mundo valorizam o tema. No Brasil, esse número chega a
55%. (Hay Group, 2015) 91% das pessoas.

Criativ idade e inovação


Empresas mais diversas registram o dobro de patentes do
que as empresas sem políticas e práticas de diversidade.
(revista norte-americana Financial Management, 2018)
116
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

12
COMO
COMBATER
O RACISMO
Saiba como agir em casos
de discriminação no
ambiente de trabalho

117
descola.org | Cultura Antirracista

Afora as discrepâncias de salários e oportunidades


praticadas entre negros e brancos, a discriminação no
ambiente de trabalho pode ser ainda mais ofensiva. Há
casos em que há distinção ou exclusão da v ítima. Já
o assédio moral ou sexual se caracteriza por condutas
abusivas que atinjam a integridade física ou psicológica
de um indivíduo. Aqui estamos tratando da discriminação
social, mas não podemos nos esquecer de que a
discriminação afeta outros públicos diversos como os
LGBTQI+ e portadores de deficiência, por exemplo.
Segundo a Constituição brasileira, todos somos iguais
perante à Lei, o que garante a inviolabilidade do
direito à vida, à liberdade, à igualdade e à segurança. A
discriminação se caracteriza quando essa inv iolabilidade
é desrespeitada, contrariando os princípios
constitucionais.

118
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

Diante de demonstrações racistas, Alê afirma que a primeira


coisa a ser feita é uma revisão dos termos institucionais
de conduta. “Não podemos fazer Gaslighting, que é
omitir ou manipular o que realmente aconteceu, e tentar
diminuir o que a vítima sentiu.” Por isso a importância
de compor um comitê de diversidade, como sugerimos
no capítulo anterior. Assim, esse time pode auxiliar na
apuração efetiva dos fatos antes de qualquer tomada de
decisão. E, assim como a professora destacou no vídeo,
é importante contar com o apoio de consultores negros
para conduzir de maneira eficaz as crises que envolverem
episódios de racismo. A contratação de um sensitive reader
(leitor sensível, em tradução livre) pode ajudar a filtrar os
conteúdos produzidos pela organização de maneira a
identificar pautas ou redações inapropriadas.
Antes de oferecermos os caminhos para condução de
eventos discriminatórios no ambiente de trabalho, vale
lembrar que as próprias campanhas internas, seja de
comunicação ou de políticas de gestão, a promoção
de eventos, palestras e cursos que abram espaço para
o diálogo e temáticas ligadas à diversidade, tendem a
contribuir para um clima organizacional de respeito às
diferenças, minimizando o preconceito no ambiente
organizacional.
119
Se ainda assim você se deparar com casos de discriminação, a plataforma de soluções em Recursos Humanos Xerpa
divulgou um artigo recomendando os seguintes passos:

Deixe claro o repúdio institucional em casos de discriminação


O departamento de Recursos Humanos pode criar canais exclusivos para denúncias
de discriminação, bem como assédio e outros desvios de conduta corporativa. Além do
canal, é importante utilizar as políticas de condutas institucionais para deixar claro que a
organização conta com um procedimento para nortear investigações e processos deste
tipo. Assim, os colaboradores se sentirão mais à vontade para se manifestar, pois saberão
que as devidas providências serão tomadas.

Preserve a identidade dos envolv idos


O anonimato dos envolvidos deve ser preservado, a fim de evitar que o caso se torne alvo
de especulações dos demais colaboradores. Esta também é uma medida de contenção
para evitar que o caso se alastre, prejudicando o clima institucional e eventual exposição
desnecessária da organização.
Cheque os fatos
Converse individualmente com a vítima, com o acusado e com possíveis testemunhas e
analise o que, de fato, ocorreu.

Consulte a Lei
Antes de tomar providências, consulte o que diz a Constituição. A Lei 9.029/1995 veda
“qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho,
ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar,
deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros”.
O racismo, por exemplo, é considerado crime inafiançável e imprescritível. Já com relação
ao preconceito com mulheres no mercado de trabalho, a Lei proíbe a exigência de testes de
fertilidade ou gravidez, assim como a indução à esterilização.
Outro ponto de atenção são as demissões realizadas pela empresa. Desligar um funcionário
por razões discriminatórias exige reintegração do profissional com ressarcimento
integral dos valores relativos ao tempo em que ele ficou parado. Outra consequência pode
ser o pagamento do dobro da remuneração do período de afastamento.
Dê apoio emocional e legal à v ítima
A organização deve se posicionar sempre ao lado da vítima, não importa qual seja o status
do agressor na organização.
O apoio do RH e dos gestores é fundamental para que a pessoa discriminada se sinta
acolhida e tenha mais tranquilidade para enfrentar o problema sem medo de retaliações.
Acione o departamento jurídico para prestar consultoria e serviços gratuitos ao
colaborador. Além disso, fique atento aos efeitos emocionais e psicológicos que a situação
causou à pessoal, tomando as atitudes necessárias para preservar a sua saúde mental.

Aplique a punição adequada ao agressor


Após investigar os fatos, a empresa deve punir o agressor por meio de advertência,
suspensão ou, se houver reincidência, demissão por justa causa.
Se nada for feito, a vítima tem o direito de comunicar o caso a uma Delegacia Regional do
Trabalho e à polícia, agravando ainda mais o problema.
Ser conivente com a discriminação no ambiente de trabalho aumenta o risco de sofrer
prejuízos administrativos e judiciais por parte do empregado e do Poder Público.
Fonte: xerpa.com.br
Recorra aos canais de denúncia:
A Polícia Federal incentiva a denuncia de crimes de ódio, ou seja, qualquer tipo de
intolerância ou preconceito (homofobia, xenofobia, antissemitismo, racismo). Esses crimes
podem ser denunciados pelo site da Polícia Federal ou pelo e-mail
denuncia.ddh@ dpf.gov.br. Em casos de crimes de ódio na internet, é recomendável
tirar sempre print ou foto da página agressora, pois, as imagens poderão ser usadas como
prova.
Disque Racismo: Com o objetivo de proteger os direitos da população negra, indígena,
cigana, ribeirinha e quilombola o disque racismo também zela pelas matrizes de religiões
africanas. As vítimas podem ligar para o número 156 e escolher a opção 7.
13
A PUREZA DA
RESPOSTA DAS
CRIANÇAS
Como educar e estimular
pequenos antirracistas
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

Estamos caminhando para o final do curso, que para nós


é uma grande proposta de abertura de diálogo e reflexão
acerca de comportamentos, falas e mudanças de atitude
em prol de uma sociedade antirracista. Lembramos que a
intenção aqui não é apontar o dedo ou determinar o que
é certo ou errado, mas sim debater de maneira saudável e
propor novos caminhos para uma sociedade cada vez mais
igualitária e livre de preconceitos.
Se por um lado não há mais espaço para tolerância ao
crime, à discriminação e à desigualdade escancarada que
presenciamos com frequência, por outro, a diversidade
de gerações, de gênero e étnica só tendem a somar.
Repertórios diversos contribuem em todas as esferas
da vida. Já espalhamos as estatísticas ao longo do
curso e cremos também que o benefício e as trocas são
perceptíveis no dia a dia, certo?
Muito bem. Se o consenso por aqui está mais do que claro,
precisamos regar as sementes certas. Ou melhor: é preciso
também plantar as sementes certas.
Porque, se Mandela e o racismo estrutural já nos ensinaram
que não nascemos racistas, nos tornamos, é preciso cortar
esse mal pela raiz. E a raiz está na infância.

125
descola.org | Cultura Antirracista

Todo o empenho em formar, educar e estimular as crianças


sob as práticas antirracistas será colhido na sociedade que
pretendemos deixar para que nossos pequenos assumam
as rédeas do futuro. Um futuro de mais respeito, igualdade
e oportunidade para todos.
Antes disso, porém, temos que olhar para nossas
crianças e nos perguntar: se eles são educados pelos
exemplos de seus pais, professores e familiares, o que
estamos fazendo para projetar esse futuro?
E as perguntas continuam...
Seus filhos assistem desenhos animados com negros?
Como são os brinquedos dos seus filhos?
Você conv ida a diversidade dentro de casa?
De que forma você inclui temáticas afro-brasileiras no
currículo das crianças?
Na escola, qual foi o viés histórico dado ao período da
escravização? Com o romantismo e a edição peculiar da
maioria dos historiadores ou eles conheceram a realidade
da exploração que assolou o povo negro? Eles foram
apresentados à diáspora negra, por exemplo?

126
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

DIÁSPORA BLACK
A diáspora africana é o nome dado
a um fenômeno caracterizado pela
imigração forçada de africanos,
durante o tráfico transatlântico de
escravizados. Além dos negros,
nestes fluxos forçados, embarcavam
nos tumbeiros (navios negreiros)
modos de vida, culturas, práticas
religiosas, línguas e formas de
organização política que acabaram
por influenciar na construção das
sociedades às quais os africanos
escravizados tiveram como
destino. Estima-se que durante
todo período do tráfico negreiro,
aproximadamente 12 milhões de
africanos foram transportados para
as Américas, dos quais, em torno de
5 milhões tiveram como destino o
Brasil.

Créditos: Wikipedia - Inspeção e venda de um escravo africano


127
descola.org | Cultura Antirracista

A diáspora africana foi um processo


que envolveu migração forçada,
mas também redefinição identitária,
uma vez que estes povos (balantas,
manjacos, bijagós, mandingas, jejes,
haussás, iorubas), provenientes do
que hoje são Angola, Benin, Senegal,
Nigéria, Moçambique, entre outros,
apesar do contexto de escravidão,
reinventaram práticas e construíram
novas formas de viver, possibilitando
a existência de sociedades afro-
diaspóricas como Brasil, Estados
Unidos, Cuba, Colômbia, Equador,
Jamaica, Haiti, Honduras, Porto
Rico, República Dominicana,
Bahamas, entre outras.

Créditos: “Negros no fundo do porão” (1835)


por Johann Moritz Rugendas
128 128
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

Ao embarcar nos navios negreiros, jejes, iorubas e tantos


outros, eram obrigados a deixar para trás sua história,
costumes, religiosidade e suas formas próprias de
identificação. Passavam, então, a ser identificados pelos
traficantes com base nos portos de embarque, nas regiões
de procedência ou por identificações feitas pelos traficantes.
Neste contexto, na diáspora, novas configurações identitárias
iam surgindo: bantus (povos provenientes do centro-sul
do continente), nagôs (povos de língua ioruba), minas
(provenientes da Costa da Mina). Além destes, crioulos
(escravizados nascidos na América) e, em um contexto de fim
da escravatura, afrodescendentes.
A diáspora, neste sentido, constituiu um processo complexo que
envolveu a promoção de guerras em África e a destruição de
sociedades; captura de homens, mulheres e crianças; travessia
do atlântico que durava em média 40 dias (entre Angola e
Bahia, por exemplo); a inserção brutal em uma nova sociedade;
lutas por liberdade e sobrevivência e a construção de novas
identidades. As sociedades construídas com base no processo
de diáspora africana, apesar das marcas estruturais decorrentes
do passado escravocrata, conectam-se social e culturalmente,
seja por meio da história e desse passado comum, das
manifestações artísticas, da ciência, da religiosidade, da black
music, do jazz, do soul, do reggae, do samba.
Fonte: palmares.gov.br 129
descola.org | Cultura Antirracista

A publicitária e ativista Deh Bastos reforça o alerta: “Se


os pais não consomem intelectualidade preta, se não
lêem ou assistem filmes com personagens negros, não
há como as crianças entenderem isso, mesmo que você
ofereça brinquedos interraciais, por exemplo. Nós, adultos,
precisamos ter essa consciência. E ela é um caminho
sem volta”, orienta. “Entender como essa estrutura social
funciona é a forma de combatê-la”.

Créditos: Lufe Gomes

130
SEJA ANTIRRACISTA VOCÊ TAMBÉM
Dicas para formar crianças livres de preconceito:

Eduque as crianças para respeitar as diferenças.


Seja em casa ou no ambiente escolar, estimule a curiosidade dos
pequenos para a diversidade que compõe nossa cultura, costumes e
composição social.
Apresente a eles nosso folclore e seus personagens, assim como
brincadeiras que estimulem noções de limite e respeito ao próximo.
Quando for presentear uma criança, escolha brinquedos livres de
estereótipos sociais.
Fique atento a textos, histórias e expressões que podem
estigmatizar e carregar preconceitos.
Ensine a não classificar ninguém pela cor e eduque-os para não
discriminar os colegas. Corte o bullying pela raiz, a começar dentro
de casa e entre seus familiares.
Estimule a convivência de crianças de diferentes raças/etnias.
Adote posturas inclusivas. Lembre-se de que o exemplo começa por
você.
Valorize sempre o comportamento respeitoso e sem preconceito.
Cheque se a escola do seu filho adota uma postura antirracista e
que ações são propostas.
Confira se a biblioteca do seu filho tem livros diversos e não só
de princesas brancas. Caso contrário, proponha a inclusão desse
repertório e leve você também adiante histórias que contemplem a
diversidade.

Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

Ninguém está ausente do raciocínio,


por isso é preciso levar isso para as
crianças
– Alex andra

133
descola.org | Cultura Antirracista

14
CARTILHA
ANTIRRACISTA
Repense o seu vocabulário,
substitua expressões e
termos enraizados em
nossa sociedade, e ajude a
combater o racismo sutil

134
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

Como dizia Freud “o sujeito se constitui mostrar de onde elas vêm e porque a gente
através da linguagem”. É por meio não deve mais usar. Quer ver só?
dela que interpretamos quem somos
e também o mundo em que vivemos Os riscos de falar “ no automático”
para que possamos, de fato, nos Você mesmo pode ter usado as expressões
conectarmos com a nossa realidade. “Vou dormir cedo, porque amanhã é dia de
O fato é que a linguagem nunca branco” ou “Não quis denegrir ninguém com
deve ser vista como um instrumento meu comentário” de maneira automática,
estático de comunicação, mas sim sem a mínima intenção de ofender ninguém.
como uma ferramenta que demanda Mas se analisarmos a origem delas,
constante rev isão para acompanhar percebemos como a linguagem reproduz
as mudanças sociais. O pronome e reforça estereótipos típicos do período
Vossa merce, por exemplo, se tornou colonial, quando a escravidão era praticada
obsoleto há séculos no nosso dia no Brasil. No entanto, uma atenção redobrada
a dia. E, assim como tantas outras às escolhas do vocabulário podem minimizar
palavras rebuscadas caíram em desuso, essa relação preconceituosa entre negritude e
não há mais espaço para expressões negatividade.
discriminatórias e estereotipadas, que Aprenda mais sobre a origem de expressões
só servem para aumentar o abismo da de cunho racistas e veja porque elas não
segregação racial. A origem de algumas servem mais:
delas é amplamente conhecida, mas
outras a gente fala sem querer ofender
ninguém. Mas a história ta aí para

135
SEJA ANTIRRACISTA VOCÊ TAMBÉM

A coisa tá preta Cabelo ruim, cabelo de


Uma forma de associar a palavra bombril, cabelo duro
preta a uma situação desconfortável, Termos racistas usados como bullying que
difícil ou perigosa. depreciam as pessoas negras. Falar mal
Substitua por: a coisa tá difícil das características do povo afro também é
racismo.
A dar com pau Substitua por: cabelo crespo, cacheado,
Tem origem nos navios que traziam afro
os povos escravizados, quando
algumas pessoas preferiam morrer Cor de pele
de fome a serem escravizadas. Elas A expressão ficou conhecida para descrever
eram alimentadas à força com uma a cor rosa-claro, fazendo referência à pele
colher de pau grande. de pessoas brancas. Porém, já sabemos
Substitua por: muito, bastante que as cores de pele de uma sociedade
mista e plural são muitas.
Substitua por: rosa-claro ou bege
Cor do pecado Criado mudo
Utilizada como elogio de maneira Era a referência comum ao indivíduo
equivocada, está associada ao escravizado que permanecia a noite
imaginário da mulher negra toda em silêncio, ao lado da cama dos
sensualizada. É só pensarmos que senhores, à disposição deles.
pecar não é positivo, ter a pele
associada ao pecado significa que Substitua por: mesa de cabeceira
ela é ruim. Portanto, essa é outra
expressão que relaciona a negra a
algo ruim.
Risque do seu vocabulário!

Denegrir
Tem como real significado tornar negro,
Coisa, serv iço ou “escurecer”. É usado para difamar ou
trabalho de preto acusar alguém de injustiça, sempre de
O termo é carregado de preconceito, forma pejorativa.
uma vez que descreve as pessoas
negras como incapazes e Substitua por: difamar
preguiçosas.
Risque do seu vocabulário!
Disputar a nega Escravos
Quando os senhores disputavam Este termo trata os africanos como
algum jogo o prêmio era uma pessoa passivos e desprovidos de subjetividade.
escravizada Os africanos que vieram para o Brasil
eram pessoas, reis, rainhas, camponeses,
Substitua por: desempate homens e mulheres escravizados contra a
vontade.
Substitua: escravos por pessoas
escravizadas, e escravidão por
escravização
Empregada doméstica
As negras que trabalhavam nas Feito nas cox as
casas dos senhores feudais eram Antigamente, as telhas das casas
consideradas “domesticadas”, eram moldadas nas coxas dos
porque, na visão da época, os negros escravos. Como as anatomias
eram como animais que precisavam eram diferentes, cada telha tinha
ser domados. um formato e acabavam não se
encaixando. Por isso, estariam mal
Substitua por: trabalhadora/
feitas.
secretária/funcionária do lar
Substitua por: trabalho mal feito
Humor negro Judiação
A expressão descreve um tipo de Do verbo “judiar”, significa tratar os judeus
humor ácido com piadas de mal como foram tratados. É usado como
gosto com temas mórbidos, sérios sinônimo de fazer sofrer, atormentar,
ou tabus com tom politicamente maltratar ou ainda com tom de pena.
incorreto.
Substitua por: sofrimento, maltrato
Substitua por: humor ácido

Inveja branca Lista negra


Associa o negro ao negativo, a algo Usada para descrever pessoas que, por
que faz mal, e o branco ao que é alguma razão negativa, estão excluídas de
positivo, um sentimento do bem. certos grupos ou ainda que alguém está
sendo perseguido.
Substitua por: inveja
Substitua por: lista proibida ou restrita
Mercado negro Mulata
Expressão preconceituosa para se A palavra significa, literalmente, o
referir a um sistema de compra e cruzamento de um asno macho com
venda clandestino, ilegal. uma égua. O termo surgiu na época da
escravização, quando muitas mulheres
Substitua por: mercado clandestino escravizadas eram violentadas pelos
“seus senhores” e tinham filhos que eram
chamados de mulatos.
Substitua: pardo ou
mestiçoescravização
Moreno
Quando as pessoas acreditam que “ Tem o pé na cozinha”
chamar alguém de negro ou preto é Referência preconceituosa a pessoas
ofensivo, e que ao chamar de moreno negras, uma vez que, na época da
ou mulata amenizaria o incômodo. escravização, este era o espaço
destinado às mulheres negras
Prefira chamar a pessoa pelo
nome. Risque do seu vocabulário!
“ Não sou tuas negas” Tem caroço nesse angu
Trata a mulher negra como Frequentemente, a alimentação dos
“qualquer uma” ou “de todo mundo”, escravizados estava restrita a um prato
reforçando o tratamento que de angu com fubá. No entanto, às vezes,
eram, seguidamente, assediadas e as negras que os serviam conseguiam
estupradas. A frase deixa explícito esconder um pedaço de carne ou
que “com as negras pode-se fazer de torresmos para que a refeição ficasse
tudo, inclusive, desfazer, maltratar” mais nutritiva.
e que “com as demais não se pode
fazer o mesmo”. Ou seja, além de Substitua por: aí tem coisa
racista, a expressão está carregada de
machismo.
Risque do seu vocabulário! Samba do Crioulo Doido
Título de um samba canção composto
Nhaca por Sérgio Porto que ironizava a
Desde a época colonial, o termo é obrigatoriedade de as escolas de
usado para definir algo com cheiro samba retratarem em seus enredos
forte, desagradável. O que pouca apenas temas que contemplassem fatos
gente sabe é que Inhaca é uma ilha de históricos. O que a expressão acaba
Moçambique, e é daí que vem o uso fazendo é reforçando o estereótipos e
do termo, mais uma vez para reforçar o descriminação aos negros.
uso de estereótipos e preconceitos.
Substitua por: confusão, trabalhada,
Substitua por: cheiro ruim bagunça

Fontes: Racismo Sutil - Para Todos - Programa SESC e SENAC de diversidade; O racismo sutil por trás das palavras - Ministério Público do
DF e territórios
descola.org | Cultura Antirracista

Viu como o racismo está embutido em expressões


que usamos sem perceber? E não se trata só da
descriminação, que nunca deveria ter sido aceita
em nossa sociedade, mas, também de compreender
o quanto certas expressões carregam a dor, a
exploração e as marcas de uma história social que
ficou para trás. Por essas e outras que práticas
mais inclusivas de linguagem são tão urgentes
e necessárias. Para que a comunicação seja
utilizada para o bem de todos, para ampliar
o uso de ex pressões de representativ idade
e respeito aos mais diversos públicos no
inconsciente coletivo .

Quando você usa, você contamina


positivamente o outro, que leva
adiante.
No final das contas o que se pretende é uma
sociedade mais igualitária como resultado principal
deste trabalho em conjunto.

142
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

15
LIVROS
9 livros para você
aprofundar seu
conhecimento na cultura
antirracista.

143
descola.org | Cultura Antirracista

Afro-Brasil Reluzente: 100 personalidades notáveis do A liberdade é uma luta constante


século XX Angela Dav is
Nei Lopes
A ativista política Angela Davis reúne uma ampla seleção
Relacionamos aqui no e-book apenas algumas das de seus artigos, discursos e entrevistas recentes realizados
personalidades negras que se destacaram Brasil afora. em diferentes países entre 2013 e 2015, organizados
Nesta obra, Nei Lopes apresenta cem perfis biográficos pelo militante dos direitos humanos Frank Barat. Os
de personalidades afrodescendentes contemporâneas textos trazem reflexões sobre como as lutas históricas
que, por seus dotes pessoais, posicionamentos, esforços, do movimento negro e do feminismo negro nos Estados
estudos e trabalhos conseguiram ou estão conseguindo Unidos e a luta contra o apartheid na África do Sul se
romper o denso véu com que o racismo envolve e oculta a relacionam com os movimentos atuais pelo abolicionismo
presença negra na nossa sociedade. prisional e com a luta anticolonial na Palestina.

144
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

Por um feminismo afro-latino americano


Lélia Gonzalez

Lélia Gonzalez foi uma das mais importantes intelectuais


brasileiras do século XX, com atuação decisiva na luta
contra o racismo estrutural e na articulação das relações
entre gênero e raça em nossa sociedade.
Por um feminismo afro-latino-americano reúne em um
só volume um panorama amplo da obra desta pensadora
tão múltipla quanto engajada. São textos produzidos
durante um período efervescente que compreende
quase duas décadas de história ― de 1979 a 1994 ― e
que marca os anseios democráticos do Brasil e de outros
países da América Latina e do Caribe. Além dos ensaios
já consagrados, fazem parte desse legado artigos de Lélia
que saíram na imprensa, entrevistas antológicas, traduções
inéditas e escritos dispersos, como a carta endereçada
a Chacrinha, o Velho Guerreiro. O livro traz ainda uma
introdução crítica e cronologia de vida e obra da autora.

145
descola.org | Cultura Antirracista

Interseccionalidade Lugar de fala


Carla Akotirene Djamila Ribeiro

A intenção da coleção Feminismos Plurais, coordenada por Com o objetivo de desmistificar o conceito de lugar de
Djamila Ribeiro, é trazer para o grande público questões fala, Djamila Ribeiro contextualiza o indivíduo tido como
importantes referentes aos mais diversos feminismos de universal numa sociedade cisheteropatriarcal eurocentrada,
forma didática e acessível. Neste volume, a autora Carla para que seja possível identificarmos as diversas vivências
Akotirene discute o conceito de interseccionalidade como específicas e, assim, diferenciar os discursos de acordo com
forma de abarcar as interseções a que está submetida uma a posição social de onde se fala.
pessoa, em especial a mulher negra. Como abordamos
aqui no e-book, o termo define um posicionamento do
feminismo negro frente às opressões da nossa sociedade
cisheteropatriarcal branca, desfazendo a ideia de um
feminismo global e hegemônico como diretriz única para
definir as pautas de luta e resistência.
146
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

O feminismo é para todo mundo


Bell Hooks

Com peculiar clareza e franqueza, Hooks incentiva leitores


a descobrir como o feminismo pode tocar e mudar,
para melhor, a vida de todo mundo. Homens, mulheres,
crianças, pessoas de todos os gêneros, jovens e adultos:
todos podem educar e ser educados para o feminismo.
O livro apresenta uma visão original sobre políticas
feministas, direitos reprodutivos, beleza, luta de classes
feminista, feminismo global, trabalho, raça e gênero e
o fim da violência. Além disso, esclarece sobre temas
como educação feminista para uma consciência crítica,
masculinidade feminista, maternagem e paternagem
feministas, casamento e companheirismo libertadores,
política sexual feminista, lesbianidade e feminismo.

147
descola.org | Cultura Antirracista

Gênios da Humanidade - Ciência, Tecnologia e Racismo estrutural


Inovação Africana e Afrodescendente Silv io Almeida
Carlos Eduardo Dias Machado e Alex andra Loras
Nos anos 1970, Kwame Turu e Charles Hamilton, no livro
Alexandra Loras contribui para este estudo histórico sobre
“Black Power”, apresentaram pela primeira vez o conceito
a participação negra nas ciências exatas, biológicas e
de racismo institucional: muito mais do que a ação de
humanas, acrescido de dados sobre a situação nos EUA,
indivíduos com motivações pessoais, o racismo está
no Brasil, nos antigos reinos africanos e nos 54 países
infiltrado nas instituições e na cultura, gerando condições
soberanos que, em 2017, compõem o continente africano.
deficitárias a priori para boa parte da população. É a partir
A obra relaciona as invenções africanas e afrodescendentes
desse conceito que o autor Silvio Almeida apresenta dados
dos tempos antigos e modernos que, com o passar dos
estatísticos e discute como o racismo está na estrutura
anos, caíram tantas vezes no esquecimento e foram
social, política e econômica da sociedade brasileira.
marginalizadas pelo eurocentrismo. Conheça as mulheres
e os homens de origem africana participaram de algumas
invenções que mudaram os rumos da história moderna.
148
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

Pequeno Manual Antirracista


Djamila Ribeiro

No livro mais vendido no Brasil em 2020, a filósofa e ativista


Djamila Ribeiro trata de temas como atualidade do racismo,
negritude, branquitude, violência racial, cultura, desejos
e afetos. Em onze capítulos curtos e contundentes, a
autora apresenta caminhos de reflexão para aqueles que
queiram aprofundar sua percepção sobre discriminações
racistas estruturais e assumir a responsabilidade pela
transformação do estado das coisas. Djamila Ribeiro
argumenta que a prática antirracista é urgente e se dá nas
atitudes mais cotidianas. E mais ainda: é uma luta de todas
e todos.

Fonte: amazon.com
149
descola.org | Cultura Antirracista

16
ESTRELAS
DO CINEMA
Selecionamos algumas
das produções que
dão a devida luz à luta
antirracista, ao racismo
como ele é, além da
merecida homenagem à
cultura negra
150
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

AmarElo - É tudo pra ontem (2020) Alô, priv ilégio? É a Chelsea (2019)

Nos bastidores do Theatro Municipal de São Paulo, o rapper Um dos passos necessários para que os brancos adotem
e ativista Emicida celebra o grande legado da cultura negra uma postura antirracista é reconhecer seus privilégios
brasileira. Como o próprio Emicida afirmou em entrevista sociais. No entanto, o conceito pode ser difícil de ser
à imprensa, a ideia do documentário é jogar luz em uma absorvido na prática. Neste documentário, a atriz, escritora
parte da história do Brasil que foi invisibilizada e a que nem e ativista Chelsea Handler estimula a compreensão
os próprios brasileiros tiveram acesso. Para isso, ele retoma explorando os impactos do privilégio branco na cultura
tópicos como a escravização, imigração e apagamento americana na própria vida e carreira.
histórico, formação das periferias, entre outros, colocando a
luta antirracista no centro do debate.

151
descola.org | Cultura Antirracista

Soul (2020)

O que constitui nossas personalidades


e paixões? Ou melhor, o que faz de nós
quem somos? Esses questionamentos,
que são capazes de gerar vastas
reflexões para qualquer adulto, são
premissas para Soul, nova animação
da Pixar. A história profunda e delicada
sobre o sentido da vida traz à narrativa
seu primeiro protagonismo negro
(assim como boa parte do elenco) em
uma jornada até a vida após a morte e
também à origem da nossa existência.
Soul ainda traz como pano de fundo
a cultura negra norte-americana,
principalmente da cena nova-iorquina
de jazz, passando por vários ambientes
e aspectos cotidianos da comunidade
afro-americana.

152
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

A negação do Brasil

A 13 emenda (2016) Neste documentário, o diretor Zito Araújo analisa a


influência das telenovelas no imaginário coletivo nacional,
A 13ª Emenda foi um documento assinado pelo, até então, enquanto faz uma denúncia contra o racismo televisivo
presidente dos Estados Unidos da América, Abraham e o papel estereotipado destinados a atores negros.
Lincoln, em 1º de fevereiro 1865. A 13ª Emenda tinha como Remontando ao exemplo de black face isto é, quando
obetivo acabar com a escravidão no país de forma objetiva. personagens negros são representados por atores brancos
No documentário homônimo, a diretora Ava DuVernay com o rosto pintado - ocorrido na novela “A cabana do
escancara como a escravidão germinou um sistema de Pai Tomás”, de 1969, na qual o ator Sérgio Cardoso se
criminalização e prisão dos negros no país. pintou de preto para interpretar o papel do protagonista, o
escravizado Tomás, o cineasta apresenta um panorama do
racismo na teledramaturgia brasileira. 153
descola.org | Cultura Antirracista

Olhos que condenam (2019)

A minissérie de Ava DuVernay remonta


o caso real dos “Central Park Five”,
cinco adolescentes negros que foram
acusados pelo espancamento e estupro
de uma mulher branca em 1989. Todos
tiveram suas vidas interrompidas e
passaram de cinco a 12 anos atrás das
grades, depois de serem coagidos pela
polícia a confessarem o crime, mesmo
não tendo nenhum tipo de evidência
que os ligasse ao ocorrido.
154
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

Estrelas além do tempo (2016) Histórias Cruzadas (2012)

O filme se passa na década de 1960, durante a corrida O filme mostra o drama das empregadas negras nos
espacial e conta a história de três matemáticas negras Estados Unidos durante a conturbada luta pelos direitos
que tentam se auto afirmar dentro da NASA, ainda muito civis em meados do século passado.
racista e sexista. Dentre os percalços que enfrentam
diariamente, elas têm que lidar com o chefe (Kevin Costner) No Mississipi dos anos 60, uma jornalista (Emma Stone)
e o funcionário Paul (Jim Parsons), que tenta sabotá-las. escreve um livro contando as histórias de mulheres negras
Baseado em fatos reais, o longa foi indicado a três Oscars, como Aibileen (Viola Davis) e Minny (Octavia Spencer) e
incluindo o de melhor filme. outras, que trabalham nos lares das famílias ricas, expondo
como elas sofrem preconceitos ao mesmo tempo em que
amam as crianças das quais cuidam.

155
descola.org | Cultura Antirracista

Cara gente branca (2017)

Baseado no aclamado filme de


mesmo nome, esta série original da
Netflix segue um grupo de estudantes
negros na Winchester University, uma
faculdade predominantemente branca
da Ivy League. Os alunos se deparam
com uma paisagem de preconceito
cultural, injustiça social, ativismo
equivocado e política escorregadia.
A série usa ironia, autodepreciação,
honestidade brutal e humor para
destacar questões que ainda
atormentam a sociedade “pós-racial”
de hoje. O criador Justin Simien atua
como produtor executivo.

156
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

17
APERTA O
PLAY
Pra dançar, refletir e agir
contra o racismo

157
descola.org | Cultura Antirracista

É por meio da arte que a gente


se expressa, demonstra nosso
descontentamento e nossas lutas. É
por meio da arte que a gente briga por
respeito e destaca nossos feitos.
A playlist antirracista é enorme. Aqui
selecionamos apenas alguns dos acordes
que embalaram gerações e exaltaram a
igualdade e o respeito pelo povo negro
de maneira subliminar ou explícita.
158
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

Ordinary Love - U2 “ Nós não podemos ir além,


2013 Se não pudermos sentir o amor comum.
A música é uma homenagem a Nelson Mandela e também E não conseguimos alcançar mais coisas,
está no filme biográfico do ícone sul-africano “Longo
Caminho para a Liberdade (2013)”. Se não conseguirmos lidar com o amor comum.”
Tradução livre.

159
descola.org | Cultura Antirracista

Olhos coloridos - Sandra de Sá


1995
Nesta canção Sandra de Sá relembra
a miscigenação que compõe o povo
brasileiro.

“ Você ri da minha roupa


Você ri do meu cabelo
Você ri da minha pele
Você ri do meu sorriso
Mas, a verdade é que você,
todo brasileiro,
Tem sangue crioulo
Tem o cabelo duro
É Sarará crioulo”

160
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

Tributo a Martin Luther King - Wilson Simonal

1967
Justa homenagem do compositor brasileiro ao maior líder da luta pela
igualdade dos direitos civis da história da humanidade. A música foi
lançada antes mesmo do assassinato de Martin Luther King, em abril de
1968, em Memphis, EUA.

“ Sim, sou um negro de cor Ouvir minha voz


Meu irmão de minha cor Oh yes!
O que te peço é luta sim, luta mais Lutar por nós
Que a luta está no fim Luta negra demais
Lá lá lá lá lá lá lá... (uohh-oh-oh) (Luta negra demais!)
Cada negro que for É lutar pela paz
Mais um negro virá (É Lutar pela paz!)
Para lutar Luta negra demais
Com sangue ou não Para sermos iguais
Com uma canção Para sermos iguais”
Também se luta irmão

161
descola.org | Cultura Antirracista

Angela - John Lennon & Yoko Ono


1967 - 1974
No álbum “The sound of black power”, a dupla
icônica faz referência à prisão da ativista e
demonstra seu apoio à força da luta política de
Angela Davis.

“ Irmã, há um vento que nunca morre


Irmã, estamos respirando juntos
Irmã, nosso amor e esperanças para
sempre continuam se movendo tão
lentamente no mundo
Eles te deram luz do sol
Eles te deram mar
Eles te deram tudo,
menos a chave da prisão
Eles te deram café
Eles te deram chá
Eles te deram tudo
menos igualdade”
Tradução livre.
162
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

Sweet Black Angel - Rolling Stones “ Ela é um doce anjo negro, woh
1972 Não um negro doce escravo
A banda inglesa também demonstrou sua Dez pequenos negros
admiração e apoio à ativista Angela Davis.
Sentando no muro
Seus irmãos foram uma queda
Caindo um por um
Por um juiz que assassinaram
E um juiz que roubaram
Agora o juiz, ele vai julgá-la
Para todos aqueles ele é
valioso
Bem a garota em perigo
A garota nas cadeias
Mas ela continuar
empurrando
Deveria você fazer o
mesmo?”
Tradução livre.

163
descola.org | Cultura Antirracista

Todo camburão tem um pouco de


nav io negreiro - O Rappa
1994
Só uma das canções que marcaram
o repertório da banda, que, com
frequência, se destacou pelas letras
marcadas contra o racismo e a
desigualdade social.

“ Tudo começou quando a gente


conversava
Naquela esquina ali
De frente àquela praça
Veio os homens e nos pararam
Documento por favor
Então a gente apresentou
Mas eles não paravam
Qual é negão? Qual é negão?
O que que tá pegando?
Qual é negão? Qual é negão?”
164
Comportamentos e atitudes para criar uma sociedade mais justa e sem preconceitos

Clara Nunes - Canto das três raças


1976
Considerada uma das maiores de sua geração, Clara Nunes foi a
primeira cantora brasileira a vender mais de cem mil cópias de um
disco, com “Tristeza Pé no Chão”. Suas conquistas lhe renderam o título
de Rainha do Samba.

“ Ninguém ouviu Onde se refugiou


Um soluçar de dor Fora a luta dos
No canto do Brasil Inconfidentes
Um lamento triste Pela quebra das correntes
Sempre ecoou Nada adiantou
Desde que o índio guerreiro E de guerra em paz
Foi pro cativeiro De paz em guerra
E de lá cantou Todo o povo dessa terra
Negro entoou Quando pode cantar
Um canto de revolta pelos ares Canta de dor”
No Quilombo dos Palmares

165

Você também pode gostar