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O FUTURO É INFUNGÍVEL: TOKENIZAÇÃO, NON-FUNGIBLE

TOKENS (NFTS) E NOVOS DESAFIOS NA APLICAÇÃO


DO CONCEITO DE VALOR MOBILIÁRIO

ISAC COSTA

“Qualquer tolo pode pintar um quadro. Mas é preciso alguém


inteligente para vendê-lo”. – Samuel Butler (1835-1902)

Sumário: Introdução. 1. Bancos de dados, direito de propriedade e crédito .2. Quais são
as características fundamentais de redes blockchain? 3. O que é tokenização e quais são as
suas vantagens e riscos? 4. Das criptomoedas aos NFTs. 5. Howey 4.0: o conceito de valor
mobiliário na criptoeconomia. Síntese conclusiva. Referências bibliográficas

Introdução

Este artigo procura explicar o que é tokenização, enfatizando como o pro-


cesso de emissão e negociação de ativos em registros distribuídos difere dos
mecanismos tradicionais de registro centralizado de propriedade e, ainda,
avançamos na descrição das características e aplicações dos tokens não fun-
gíveis (non-fungible tokens, NFT), cuja circulação impõe uma análise de sua
possível qualificação como valor mobiliário, nos termos da regulação vigente
do mercado de capitais.
Em uma primeira aproximação, podemos afirmar que os sistemas de
registro distribuídos decorrentes da proliferação de novas aplicações e
modelos de negócios associados à tecnologia blockchain permitiram a criação
de “cartórios globais” nos quais as pessoas e empresas podem registrar títu-
los eletrônicos de qualquer natureza, independente de previsão normativa
prévia. Por meio de regras especificadas em protocolos de comunicação e

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códigos programáveis, é possível identificar os proprietários de títulos digi-


tais, quer tenham lastro em bens móveis ou imóveis da economia real, quer
tenham existência puramente virtual, assim como os direitos decorrentes e a
utilização desses títulos para diversas operações econômicas.
Essa expansão abre inúmeras oportunidades – e riscos – para a criação de
novos produtos e serviços financeiros, transcendendo as fronteiras estatais
e as jurisdições existentes e o tratamento usual conferido ao direito de pro-
priedade, aqui tomado em sua acepção mais ampla, abrangendo qualquer
bem, móvel ou imóvel, tangível ou intangível.
O presente texto se divide em cinco partes.
Na primeira seção, procuro destacar a relevância de sistemas de bancos
de dados para viabilizar jurídica e operacionalmente o direito de proprie-
dade e a circulação do crédito. A meu ver, apesar de ser um tema aparente-
mente lateral às discussões usuais sobre a criptoeconomia, trata-se de uma
imersão necessária para compreendermos o ponto de contato entre o novo
universo criado pelos criptoativos e, em especial pelos NFTs, e a o sistema
jurídico existente.
Na segunda seção, enumero as características fundamentais das redes
blockchain, a fim de destacar aspectos funcionais relevantes para a compreen-
são das seções seguintes.
Na terceira seção, apresento o conceito, as vantagens e os riscos do pro-
cesso de emissão e negociação do processo de tokenização de ativos.
Na quarta seção, descrevo o surgimento dos NFTs, suas características
essenciais e sua relação com as demais espécies de criptoativos.
Na quinta seção, especulo a respeito da verificação da qualificação jurí-
dica de NFTs à luz do teste empregado pela Comissão de Valores Mobiliários.
Considero que a popularização de criptoativos é um fenômeno rela-
tivamente recente e sua utilização tem sido mais intensa por pessoas mais
jovens, em geral, e com ideais mais libertários, o que pode explicar a difi-
culdade do estabelecimento de um diálogo entre os entusiastas da criptoe-
conomia e os investidores tradicionais, os agentes públicos e a população em
geral, juntamente com a complexidade de terminologia ainda em forma-
ção e a necessidade de uma conjugação de saberes ecléticos – computação
(especialmente criptografia, redes de computadores, programação e bancos
de dados), economia (especialmente teoria dos jogos, economia comporta-

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mental e finanças) e direito (regulação do mercado bancário e do mercado


de capitais, propriedade intelectual e tributação).
Com o presente texto, espero contribuir para uma aproximação entre
mundos ainda distantes, mas cuja comunicação pode resultar em uma rup-
tura dramática e benéfica de padrões vigentes para as relações econômicas
em um contexto de protagonismo das tecnologias da informação e uma
sociedade hiper conectada.

1. Bancos de dados, direito de propriedade e crédito

A concreção do direito de propriedade exige um sistema (eletrônico ou não)


para registro do bem (móvel ou imóvel), de seu proprietário e eventuais ano-
tações relativas à imposição de restrições sobre parcelas do direito de pro-
priedade (as faculdades de usar, fruir e dispor da coisa)1.
A existência de uma base de dados mantida pelo Estado ou por entes pri-
vados viabiliza a realização de transações no sistema financeiro, a dinâmica
dos direitos reais e dos direitos decorrentes da propriedade intelectual, for-
necendo segurança jurídica nas relações em uma sociedade.
No Brasil, o Estado delega a particulares o registro da propriedade de
imóveis, contratos, títulos de crédito e outros documentos2. Mas não pre-
cisamos nos limitar à noção cartorial de registro. Em nosso país, há bases
de dados que viabilizam a propriedade de moeda de curso legal: o Sistema
de Pagamentos Brasileiro (Lei nº 10.214/2001), o sistema bancário e as con-
tas de depósito mantidas pelas instituições financeiras (Resoluções CMN
nº 3.695/2009 e 4.753/2019), assim como as contas de pagamento manti-

1 
Para uma exposição detalhada sobre os diferentes sentidos do direito de propriedade e suas
limitações, cf. Penteado, Luciano de Camargo. Direito das Coisas. 3. Ed. São Paulo: Thomson
Reuters, 2014, caps. III e V.
2 
A função pública notarial e de registro é própria do Estado e, por força do art. 236 da Cons-
tituição da República, é delegada a profissionais do direito que a exercem em caráter privado,
após seleção em concurso público de provas e títulos. Conforme a Lei nº 8.935/1994, compete
aos notários: 1 – formalizar juridicamente a vontade das partes; II – intervir nos atos e negó-
cios jurídicos a que as partes devam ou queiram dar forma legal ou autenticidade, autorizando
a redação ou redigindo os instrumentos adequados, conservando os originais e expedindo
cópias fidedignas de seu conteúdo; IlI – autenticar fatos.

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das pelas instituições de pagamento (Lei nº 12.865/2013). Ainda, as Juntas


Comerciais guardam informações acerca das quotas de sociedades limita-
das e os escrituradores das sociedades anônimas mantêm o Livro de Ações
Nominativas previsto no Código Civil e na legislação societária.
Esses sistemas podem ser designados de diversas formas, e, especifica-
mente para o registro de títulos de crédito eletrônicos, Fábio Ulhoa Coelho
sugere o termo Entidade de Registro de Títulos Eletrônicos (ERTE), caso da
central depositária da B33.
Também encontramos as infraestruturas de mercado financeiro4 (Resolução
CMN nº 4.593/2017), tais como as centrais registradoras de duplicatas escri-
turais (Lei nº 13.775/2018, Resolução CMN nº 4.815/2020 e Carta Circular
BCB nº 4.015/2020) e de recebíveis de arranjos de pagamento (Resolução
CMN nº 4.734/2019, Circular BCB nº 3.952/2019, assim como as custodiantes
de valores mobiliários (Resolução CVM nº 32/2021), os escrituradores de valo-
res mobiliários (Resolução CVM nº 33/2021) e, no caso brasileiro, a central
depositária mantida pela B3 armazena todas as posições de investidores em
valores mobiliários detidos no país (Lei nº 12.810/2013 e Resolução CVM nº
31/2021).
Nesse contexto, é importante frisar a preocupação com a identificação
dos beneficiários finais das transações realizadas no mercado financeiro, com
a especificação de requisitos acerca dos investidores, para fins de prevenção
à lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo (Lei nº 9.613/1998,
Circular BCB nº 3.978/2017 e Instrução CVM nº 617/2019).
Para além do mercado financeiro, podemos mencionar o registro de
direitos e obrigações relativos à propriedade industrial (Lei nº 9.279/1996),

3 
Cf. Coelho, Fábio Ulhoa. Títulos de Crédito. Uma Nova Abordagem. São Paulo: Thomson
Reuters, 2021.
4 
De acordo com o Banco Central do Brasil, as infraestruturas de mercado financeiro “São
integrantes do Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB) os serviços de compensação de che-
ques, de compensação e liquidação de ordens eletrônicas de débito e de crédito, de transfe-
rência de fundos e de outros ativos financeiros, de compensação e de liquidação de operações
com títulos e valores mobiliários, de compensação e de liquidação de operações realizadas em
bolsas de mercadorias e de futuros, de depósito centralizado e de registro de ativos financei-
ros e de valores mobiliários”. Informação disponível no site do BCB em https://www.bcb.gov.
br/estabilidadefinanceira/infraestruturamercado. Acesso em 22 set. 2021.

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com destaque para o papel do Instituto Nacional de Propriedade Industrial


(INPI, Lei nº 5.648/1970), que conduz os procedimentos administrativos
em matéria de marca, patentes e licenças.
Graças à existência desses “bancos de dados” – sobre os quais incide uma
regulação importante para o bom funcionamento do sistema econômico – é
possível, por exemplo, que o Poder Judiciário identifique ativos e realize atos
de constrição patrimonial em procedimentos de execução, mediante comu-
nicação com as entidades reguladores do Sistema Financeiro Nacional, as
infraestruturas de mercado financeiro e os cartórios.
Destarte, não há sistema econômico em escala e com segurança jurídica
sem sistemas de informação que permitam a pesquisa, a inserção, a atuali-
zação e a exclusão de dados relacionados aos bens e aos sujeitos de direito.
Apesar da intensa – e necessária – disciplina jurídica sobre a matéria, a
globalização dos mercados e a criação de novos produtos e serviços finan-
ceiros têm encontrado obstáculos relevantes decorrentes de limitações dos
sistemas tradicionais de controle de propriedade.
Primeiro, o registro da propriedade se dá exclusivamente dentro do
território nacional, com impacto no custo, velocidade e transparência em
operações transfronteiriças5, especialmente pagamentos internacionais6.
A ausência de mecanismos centralizados de pesquisa e interoperabilidade

5 
Cf. Bech, Morten Linnemann; Faruqui, Umar; Shirakami, Takeshi. Payments without
borders. BIS Quarterly Review, Mar. 2020.
6 
A principal plataforma que viabiliza a comunicação entre sistemas de pagamentos de dife-
rentes países é o protocolo da Society for Worldwide Interbank Financial Telecommunica-
tions (SWIFT), estabelecida em 1973 e com sede na Bélgica, por meio do qual instituições
financeiras e correspondentes podem enviar mensagens acerca de transações de pagamento.
Cada instituição é identificada por um código único, denominado de bank identifier code
(BIC), SWIFT code, SWIFT ID ou código ISO 9362. As contas são identificadas por códigos
padronizados denominados de International Bank Account Numbers (IBAN), conforme a
norma ISO 13616-1:2020. Cf. International Standards Organization – ISO. Banking –
Banking telecommunication messages – Business identifier code (BIC). ISO 9362:2014. Geneva, 2014.
Disponível em https://www.iso.org/standard/60390.html. Acesso em 29 set. 2021; Interna-
tional Standards Organization – ISO. Financial services – International bank account number
(IBAN) – Part 1: Structure of the IBAN. ISO 13616-1:2020. Geneva, 2020. Disponível em https://
www.iso.org/standard/81090.html. Acesso em 29 set. 2021.

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entre sistemas mantidos por diferentes instituições dificulta a concessão de


empréstimos, o fornecimento e a substituição de garantias.
Segundo, as disfunções da burocracia estatal comprometem a eficiência
econômica, haja vista as relevantes taxas cobradas pelos cartórios e os longos
processos envolvendo marcas e patentes junto ao INPI7. Nesse contexto,
vale mencionar os esforços legislativos para modernizar os sistemas de regis-
tro e aumentar a segurança jurídica de documentos eletrônicos, tais como as
disposições da Lei nº 13.874/2019 acerca da digitalização de documentos8,
as regras de uso de assinaturas eletrônicas da Lei nº 14.063/2020, assim como
a criação, pelo Provimento CNJ nº 89/2019, das diretrizes necessárias para a
criação do Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imó-
veis (ONR), definido pela Lei nº 13.465/2017 para operacionalizar o registro
eletrônico de imóveis previsto na Lei nº 11.977/20099. Apesar das louváveis
iniciativas regulatórias e da crescente digitalização de serviços públicos no
Brasil, algumas limitações estruturais mencionadas ainda são relevantes ou
mesmo insuperáveis.

7 
Conforme o INPI, o tempo médio de exame técnico de um pedido demora, em média dez
anos. CGPE/DIREX. INPI: metas e resultados. Balanço da gestão 2015 – 2018. Brasília, 2019.
Disponível em https://www.gov.br/inpi/pt-br/backup/arquivos/INPI_metas_e_resultados_
balanco_gestao_20152018.pdf. Acesso em 29 set 2021. De acordo com a Lei nº 9.279/1996, as
patentes podem ter validade de 20 anos contados da data de depósito e não será inferior a 10
anos da data da concessão, em regra. Contudo, os processos de análise do INPI podem levar
até 30 anos, fazendo com que o prazo de validade das patentes pudesse ser, na prática, bem
maior que o limite de 20 anos, o que levou o Supremo Tribunal Federal a declarar inconsti-
tucional o limite mínimo de 10 anos após a concessão, por violação ao princípio da tempora-
lidade da proteção patentária (art. 5º, XXIX 5º da Constituição). Supremo Tribunal Fede-
ral. Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.529-DF, Rel. Min. Dias Toffoli, j. em 06 maio 2021.
8 
Para documentos particulares, as partes podem acordar sobre mecanismos de comprovação
de autoria, integridade e confidencialidade e presumem-se autênticos, independentemente
de aceitação, documentos privados e públicos certificados conforme o padrão de Infraestru-
tura de Chaves Públicas (ICP-Brasil), disciplinado pela Medida Provisória nº 2.200-2/2001.
Cf. Didier JR.; Fredie Souza; Oliveira, Rafael Alexandria de. O uso da tecnologia blockchain
para arquivamento de documentos eletrônicos e negócios probatórios segundo a lei de liber-
dade econômica. Revista de Estudos Jurídicos do Superior Tribunal de Justiça, v. 1, n. 1, 2020.
9 
Cf. Nalini, José Renato de Freitas. O registro de imóveis e o registro em blockchain. In:
Galhardo, Flaviano et al. (Org.). Direito Registral e Novas Tecnologias. Rio de Janeiro: Forense,
2021.

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Terceiro, a circulação e a execução de recebíveis diversos, tais como aque-


les decorrentes de contratos atípicos ou royalties de direitos de autor, é difi-
cultada pela ausência de padronização específica na lei ou nos usos e costu-
mes10, em âmbito nacional ou internacional, o que conduz a dúvidas quanto
à existência e exigibilidade dos títulos, inviabilizando sua utilização para fins
de obtenção de crédito ou para sua utilização em operações de securitiza-
ção11, o que representa um óbice ao financiamento da atividade econômica,
dados os riscos jurídicos e operacionais envolvidos.
Nesse contexto, podemos afirmar que a tutela de direitos patrimoniais e
o bom funcionamento do sistema econômico, sobretudo do mercado finan-
ceiro, dependem de um bom conjunto de sistemas de informação, os quais
têm os bancos de dados como seu núcleo fundamental.
Falar em blockchain e registro distribuído significa falar em uma tecno-
logia de bancos de dados com características que favorecem o desenvolvi-
mento de certas aplicações, permitindo superar alguns dos obstáculos indi-
cados nesta seção e, simultaneamente, criando novos riscos e problemas.

10 
Fábio Ulhoa Coelho oferece uma crítica fundamentada ao anacronismo de regras que men-
cionam documentos em papel e o “monopólio constitucional do registro pelos cartórios”, o
que causa insegurança jurídica em relação à executividade de diversos títulos. Para o autor,
só é possível proceder ao registro de títulos de crédito típicos, isto é, aqueles cujos requisi-
tos encontram previsão legal. Com a devida vênia, discordo deste entendimento, pois, como
veremos, há diversos títulos eletrônicos registrados em redes blockchain, onde a padroniza-
ção decorre da própria estrutura dos ativos digitais emitidos, fornecendo a flexibilidade e a
segurança jurídica necessária para a circulação desses títulos e a análise de sua existência e
exigibilidade. Cf. Coelho, Fábio Ulhoa. Títulos de Crédito. Uma Nova Abordagem. São Paulo:
Thomson Reuters, 2021, especialmente o cap. 2.
11 
A necessidade do mercado para a securitização de recebíveis diversos levou a Comissão
de Valores Mobiliários a regulamentar os direitos creditórios não padronizados na Instrução
CVM nº 444/2018 (art. 1º, § 1º), como aqueles: “I – que estejam vencidos e pendentes de
pagamento quando de sua cessão para o fundo; II – decorrentes de receitas públicas originá-
rias ou derivadas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como de
suas autarquias e fundações; III – que resultem de ações judiciais em curso, constituam seu
objeto de litígio, ou tenham sido judicialmente penhorados ou dados em garantia; IV – cuja
constituição ou validade jurídica da cessão para o FIDC seja considerada um fator preponde-
rante de risco; V – originados de empresas em processo de recuperação judicial ou extrajudi-
cial; VI – de existência futura e montante desconhecido, desde que emergentes de relações já
constituídas; e VII – de natureza diversa, não enquadráveis no disposto no inciso I do art. 2º
da Instrução CVM 356, de 17 de dezembro de 2001 [definição geral de direitos creditórios]”.

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2. Quais são as características fundamentais de redes blockchain?

Em um sistema de registro distribuído12, o acesso aos dados e a garantia de sua


integridade são feitas não por uma autoridade central, mas por todos os par-
ticipantes da rede na qual os dados circulam. Cada participante é chamado
de nó da rede e a validação das transações ocorre em cada um deles13. Uma
forma didática de compreender este arranjo é pensar em uma professora de
escola primária fazendo um desenho na lousa e pedindo que todas as crian-
ças repliquem a imagem na folha de seu caderno.
Nesse arranjo, se A transfere recursos para B, cada nó da rede irá atualizar
a sua cópia, a fim de manter a sincronia de todos os registros. Caso algum
participante desobedeça ao comando de atualização, sua cópia será igno-
rada. Assim, quando desejamos consultar uma informação, em vez de nos
dirigirmos ao sistema de um banco ou a um cartório, fazemos uma requi-
sição à rede, que irá responder com base em um consenso obtido dentre as

12 
O mais correto seria falar em registro descentralizado, mas o termo distributed ledger techno-
logies (DLT, “tecnologias de registro distribuído”) já se consagrou e o adjetivo “distribuído”
vem sendo utilizado em artigos e projetos de lei sobre o tema. A distinção é de gênero e espé-
cie: sistemas distribuídos são gênero, que envolvem múltiplas instâncias de sistemas em uma
rede, mas cujo acesso aos dados pode ser controlado de maneira centralizada. Um sistema
de uma grande empresa que lida com uma grande quantidade de dados e diversas regras de
negócio pode ser dividido de forma a ser executado em múltiplos computadores espalhados
por uma rede privada ou pública. Trata-se de um sistema distribuído, porém não um sistema
descentralizado. Este último é espécie de sistema distribuído, no qual cada participante da
rede é uma instância autônoma, replicando a execução dos demais nós da rede.
13 
“Sendo complexos, redes blockchain exibem um conjunto de características essenciais,
decorrentes de sua fundamentação em tecnologias de rede ponto-a-ponto, criptografia assi-
métrica e mecanismos de consenso. Redes blockchain prescindem de intermediários e são
transnacionais. São também resilientes e resistentes a alterações, permitindo o armazena-
mento de dados não repudiáveis [termo utilizado para controle da integridade de dados],
de forma pseudônima e transparente. A maioria, senão todas as redes blockchain possuem
regras de mercado ou baseadas em teoria dos jogos para a obtenção de consenso entre os
participantes [acerca dos dados], para fins de coordenação de pessoas, computadores e outros
dispositivos. Essas características, quando combinadas, permitem o desenvolvimento de pro-
gramas autônomos e explicam por que redes blockchain podem ser ferramentas poderosas
para facilitar atividades econômicas e sociais outrora inviáveis” (em tradução livre). Cf. De
Filippi, Primavera; Wright, Aaron. Blockchain and the Law. The rule of code. Cambridge:
Harvard University Press, 2018, p. 33.

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cópias existentes, como se fosse realizada uma votação. Enquanto a maioria


concordar a respeito de determinado fato (ex. “A têm saldo X em conta”, “o
imóvel I pertence a P”), podemos confiar na informação obtida, sem precisar
recorrer à fé pública do Estado ou à credibilidade de um ente privado.
Graças a esta característica, os sistemas de registro distribuído permitem
a criação de uma comunidade supraestatal para o armazenamento de qual-
quer informação, em especial o registro de imóveis, de marcas e patentes e
de ativos financeiros14.
O termo blockchain remete à estrutura da primeira rede de registro dis-
tribuído, criada em 2009 para viabilizar a criptomoeda Bitcoin. Nessa rede,
as transações são armazenadas em blocos consecutivos e encadeados, que
se acumulam de forma análoga às rochas sedimentares, fazendo com que os
dados mais antigos se tornem inalcançáveis para fins de adulteração. Outra
forma didática de pensar a respeito deste encadeamento é imaginar bonecas
russas: é preciso superar diversas camadas para conseguir remover as infor-
mações mais antigas15.
Essa dificuldade de atualização faz com que as redes blockchain sejam
consideradas imutáveis e, por isso, sejam úteis para o armazenamento de

14 
Para um interessante catálogo de aplicações, cf. Ashurst, Stephen; Tempesta, Stefano.
Blockchain Applied. Practical Technology and Use Cases of Enterprise Blockchain for the
Real World Abingdon: Routledge, 2021. Ao longo da obra, os autores mostram como a des-
centralização dos dados pode ajudar na comunicação entre diferentes sistemas, permitindo
que produtos e serviços sejam oferecidos mediante a checagem rápida de informações, com
baixo custo e transparência. Uma conclusão interessante dos autores é que “acreditamos
fortemente na necessidade de diminuir dependências de autoridades centrais que têm con-
trole total, inclusive governos. Não se trata de não confiar neles, na verdade, é o contrário.
Como seres humanos, tendemos a confiar mais nas autoridades do que em nossos pares. É
uma questão de escala. O controle centralizado é um ponto vulnerável a falhas. É um gargalo
no processo. A escala só pode ser alcançada com distribuição e redundância de serviços. As
tecnologias de registro distribuído (DLT) possuem esses atributos por princípio. Além disso,
sua natureza imutável (ou, pelo menos, difícil de adulterar) é perfeitamente aplicável em
cenários de auditoria independente, essenciais para cadeias de suprimentos confiáveis [por
exemplo]” (em tradução livre).
15 
Para uma visão adicional das caraterísticas das redes blockchain e dos problemas que a tec-
nologia pretende resolver, cf. Komalavalli, C.; Saxena, Deepika; Laroiya, Chetna. Over-
view of blockhain technology concepts. In: Krishnan, Saravanan. Handbook of Research on
Blockchain Technology. Academic Press, 2020.

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dados cujo histórico é tão importante quanto a situação atual (considere, por
exemplo, todas as prenotações em uma certidão de matrícula de um imóvel).
A imutabilidade é garantida por meio de algoritmos criptográficos de
geração de códigos hash16, um valor matemático gerado a partir de um bloco
de transações, como se fosse seu DNA, o qual é propagado para o bloco
seguinte. Essa lógica de encadeamento faz com que, se alguém desejar adul-
terar um código mais antigo, esta pessoa deverá alterar todos os blocos sub-
sequentes, o que demandaria mobilizar todos os participantes da rede para
poder rasurar suas cópias do registro distribuído.
Portanto, o termo blockchain, embora bastante enraizado em aspectos
computacionais de implementação da tecnologia aqui discutida, tem um
significado importante para que possamos entender uma das suas principais
vantagens, que é a imutabilidade.
A depender do arranjo instituído – as regras de comunicação são denomi-
nadas de protocolo, um termo da ciência da computação17 – qualquer pessoa
pode acessar a rede e processar e validar as informações, caso em que temos
as redes blockchain públicas. Caso exista um ente público ou privado ou um
consórcio de tais entes que controle a rede e restrinja o acesso e as transa-
ções apenas a membros específicos, estamos diante de uma rede blockchain
privada. Um meio termo envolve as redes blockchain permissionadas, nas quais
há um controle centralizado de papéis: qualquer participante pode acessar

16 
Uma função hash é uma função matemática que gera, de forma eficiente, um resultado
numérico a partir de um conjunto de dados, servindo como uma “impressão digital”. Se há
dúvida sobre eventual adulteração do conjunto de dados, basta executar a função hash e verifi-
car o resultado – o valor calculado será diferente do que seria obtido para o conjunto original.
Desse modo, é possível verificar a integridade da informação com um custo computacional
relativamente baixo. Outra propriedade importante da função hash é a dificuldade ou impos-
sibilidade de se obter o conjunto de dados de origem a partir do resultado (é uma função não
inversível). Cf. Peterson, Larry L.; Davie, Bruce S. Computer Networks. A Systems Approach.
6. Ed. Cambridge: Morgan Kauffman, 2021, section 8.2 (Cryptography Building Blocks).
17 
Protocolo é, em essência, um conjunto de regras acordadas entre partes sobre como ocor-
rerá a comunicação entre elas. Cf. Tanembaum, Andrew S.; Feamster, Nick; Wetherall,
David. Computer Networks. 6. Ed. Harlow: Pearson, 2021, p. 49.

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as informações e solicitar a realização de transações, mas apenas certos parti-


cipantes específicos realizar as funções de processamento e validação18.
Além da imutabilidade, outra vantagem da descentralização é a redun-
dância das informações, a qual também permite a comunicação entre sis-
temas distintos. Essa característica pode ser uma vantagem em termos de
infraestrutura de mercado financeiro. Diversas instituições financeiras
podem manter cópias dos dados dos investidores, o que pode facilitar a
obtenção de dados para a análise de risco para concessão de crédito, a oferta
personalizada de produtos financeiros e a portabilidade de investimentos,
que são imperativos que norteiam a estratégia de open banking em curso em
diversos países, liderada no Brasil pelo Banco Central19.
Adicionalmente, ao menos em teoria, um consórcio das entidades admi-
nistradoras de mercado de bolsa e de balcão de todo o mundo poderia se
valer de uma rede blockchain privada ou permissionada para o processamento
de informações sem ter que recorrer a um sítio de contingência para fazer
frente a recuperação em caso de incidentes cibernéticos ou desastres, o
que incrementaria a resiliência operacional dos recursos de tecnologia da
informação.
A transparência e a rastreabilidade das transações é um terceiro benefí-
cio das redes blockchain, corolário da redundância, vantagem anteriormente
descrita. Essa característica pode ser particularmente útil em um sistema de
controle de procedência de insumos e mercadorias ao longo de uma cadeia
de suprimentos, assim como se precisamos monitorar o fluxo de recursos em
um sistema financeiro. O registro de votos e movimentações de quaisquer
naturezas facilita a criação de trilhas de auditoria e mitiga assimetrias de
informação, propiciando vantagens em termos de governança e facilitando a

18 
Para uma descrição mais detalhada sobre os tipos de redes blockchain segundo o controle
de acesso cf. Rauchs, Michel. Distributed Ledger Technology Systems. A Conceptual Framework.
Cambridge: Cambridge Centre for Alternative Finance, 2018. No Apêndice desse estudo, são
listadas várias redes com suas características, dentre as quais os mecanismos de consenso e
governança.
19 
Para uma visão abrangente sobre o papel do Banco Central e os pilares de sua agenda regu-
latória, cf. Paixão, Ricardo Fernandes; Aguiar, João Benício; Ragazzo, Carlos. O Regulador
Inovador: Banco Central e a agenda de incentivo à inovação. São Paulo: Instituto ProPague,
2021.

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fiscalização de atividades em desconformidade com as regras estabelecidas


pelos participantes20.
Desse modo, as tecnologias de registro distribuído, tomadas aqui como
sinônimos de redes blockchain asseguram a imutabilidade do histórico das
transações, a redundância que aumenta a resiliência operacional e a intero-
perabilidade entre sistemas dos participantes da rede, bem como a transpa-
rência e a rastreabilidade das transações, diminuindo assimetrias de infor-
mação, com benefícios em termos de governança e responsabilidade dos
participantes.

3. O que é tokenização e quais são as suas vantagens e riscos?

Um token nada mais é do que um título registrado em uma rede blockchain21.


Os tokens “nativos” das redes Bitcoin e Ethereum são, respectivamente, as
criptomoedas bitcoin e ether, e podem ser utilizadas como unidades de conta,
meio de pagamento e, para alguns, reserva de valor, isto é, podem desem-
penhar as funções econômicas tradicionais de uma moeda, ainda que sem
nenhum respaldo estatal envolvendo sua aceitação22.
É possível utilizar redes blockchain como Ethereum, R3 Corda e Hyper-
ledger para criar tokens com funções diversas, a partir de programas que cos-
tumam ser designados como smart contracts. Esses programas com designação
questionável – que não são contratos no sentido jurídico do termo e muito
menos inteligentes no sentido de implementar alguma das técnicas de inte-
ligência artificial – permitem a automação de certas transações, como, por
exemplo, “se alguém utilizar essa quantidade de tokens para comprar uma

20 
Uma reflexão sobre vantagens e controvérsias em torno da governança descentralizada
pode ser encontrada em WRIGHT, Aaron. The rise of decentralized autonomous organiza-
tions: opportunities and challenges. Stanford Journal of Blockchain Law & Policy, v. 4, n. 2, jun.
2020. Disponível em https://stanford-jblp.pubpub.org/pub/rise-of-daos/release/1. Acesso
em 29 set 2021.
21 
Utilizarei a expressão token, em vez de título, por ser mais comum nos textos sobre a tecno-
logia blockchain.
22 
Para uma descrição terminológica detalhada, cf. Tasca, Paolo; Tessone, Claudio J. A Taxo-
nomy of Blockchain Technologies: Principles of Identification and Classification. Ledger, v. 4,
2019.

294
O FUTURO É INFUNGÍVEL: TOKENIZAÇÃO, NON-FUNGIBLE TOKENS (NFTS)…

música, credite 80% na conta da plataforma e 20% na conta do detentor dos


direitos autorais”.
Desse modo, é possível conceber tokens que funcionem dentro de uma
plataforma de comércio eletrônico como uma espécie de moeda social, com
um saldo em uma carteira digital, permitindo a aquisição de produtos e ser-
viços. Nessas hipóteses, estamos diante de situações “puras” de tokens de
consumo ou de utilidade, também designados como utility tokens.
Essa lógica também permite criar tokens que conferem direitos econômi-
cos e direitos de participação aos seus titulares, no âmbito da rede em que
são registrados. Por essa razão, os tokens podem desempenhar funções muito
semelhantes às dos títulos de crédito, representando relações de dívida, e às
dos valores mobiliários, representando relações de participação ou, ainda,
relações híbridas de dívida e de participação. Nesses casos, se o token repre-
senta um valor mobiliário, em razão do conceito de security na tradição jurí-
dica anglo-saxã, recebe o nome de security token, hipótese em que sua emis-
são e negociação se enquadram na competência regulatória das comissões
de valores mobiliários (no Brasil,, a CVM e, nos EUA, a depender do caso, a
Securities and Exchange Commision – SEC ou a Commodity Futures Trading Com-
mission – CFTC)23.
Os participantes de uma rede podem trocar tokens entre si como forma de
realizar transações diversas, as quais podem ou não ter correspondência com
negócios efetivados no mundo real. Por exemplo, a compra e venda de um
insumo pode corresponder ao registro de mudança de propriedade de tokens
em uma rede destinada ao monitoramento de uma cadeia de suprimentos.
A emissão e a circulação de tokens é governada por regras efetivadas pelo
projeto da estrutura desses tokens (os direitos de seus titulares, as informa-
ções nele contidas, as regras de negócio), com a programação da lógica de
emissão e circulação. O número de tokens em circulação, por exemplo, pode
ser fixo ou pode aumentar ao longo do tempo, até atingir um limite máximo.

Organisation For Economic Co-Operation And Development – OECD. The Toke-


23 

nisation of Assets and Potential Implications for Financial Markets. OECD Blockchain Policy
Series. Paris, 2020. Disponível em https://www.oecd.org/finance/The-Tokenisation-of-
-Assets-and-Potential-Implications-for-Financial-Markets.htm. Acesso em 29 set 2021.

295
ISAC COSTA

Ao falarmos em tokenização, não há absolutamente nada de novo no pro-


cesso de abstração que permite referenciar um bem corpóreo ou intangível
em um sistema de dados: os diversos títulos existentes na prática de mer-
cado, tipificados ou não, são representações de bens. Em princípio, qualquer
bem pode ser objeto de tokenização, permitindo a circulação de riqueza de
forma eficiente e sem gargalos operacionais ou políticos decorrentes de ins-
tituições intermediárias centralizadas públicas ou privadas.
Podemos considerar o processo de securitização como um antecessor
desse movimento24. Securitizar consiste em transformar direitos creditórios
em securities, isto é, valores mobiliários, a fim de se valer de todo o regime
jurídico do mercado de valores mobiliários para emitir e negociar os títulos
securitizados. Busca-se, com isso, uma estrutura legalmente tipificada para
estruturar operações de cessão de recebíveis já constituídos (créditos) ou a
constituir (direitos creditórios), de modo que o risco de crédito da carteira
de recebíveis seja segregado do risco de crédito da cedente25.

24 
Não há uma definição clara de securitização na legislação brasileira. As Leis nº 9.514/1997
e 11.076/1994 mencionam, respectivamente, securitização de créditos imobiliários e de cré-
ditos do agronegócio. A Instrução CVM nº 356/2001 trata de créditos securitizados ao dis-
ciplinar fundos de investimento em direitos creditórios. Por seu turno, a Instrução CVM nº
414/2004 regula as companhias securitizadoras de créditos imobiliários e a Instrução CVM nº
600/2018 trata da securitização de créditos do agronegócio.
25 
“[N]o contexto do agronegócio e dos créditos imobiliários, a securitização é uma “opera-
ção” pela qual certos créditos imobiliários ou direitos creditórios do agronegócio são “vincu-
lados” ao pagamento de certos títulos de crédito, representativos de promessa de pagamento
em dinheiro devida por uma companhia com o propósito específico de adquirir os menciona-
dos recebíveis, formalizada por meio de um documento chamado “Termo de Securitização”
que preencha os requisitos legalmente aduzidos”. Cf. Ribeiro JR., José Alves. Securitização de
Recebíveis. Elementos constitutivos no direito brasileiro. São Paulo: Thomson Reuters, 2020,
Cap. 2. Ainda, de acordo com a Circular BCB 3648/2013, “Art. 115. Para fins do tratamento
de exposições de securitização tradicional ou sintética mediante a utilização de abordagens
IRB, aplicam-se as seguintes definições: I – securitização tradicional é o processo em que o
fluxo de recebimentos associado a um conjunto de ativos subjacentes é utilizado para a remu-
neração de títulos de securitização estruturados em, no mínimo, duas classes de priorização
de pagamento, no qual há transferência dos ativos subjacentes para a contraparte emissora;
II – securitização sintética é o processo em que o fluxo de recebimentos associado a um con-
junto de ativos subjacentes é utilizado para a remuneração de títulos de securitização estru-
turados em, no mínimo, duas classes de priorização de pagamento, no qual o risco de crédito

296
O FUTURO É INFUNGÍVEL: TOKENIZAÇÃO, NON-FUNGIBLE TOKENS (NFTS)…

Nesse sentido, algo parecido ocorre com a tokenização. As operações eco-


nômicas são estruturadas não em um arranjo jurídico pré-definido como no
caso da securitização, mas em um arranjo tecnológico. A diferença fundamen-
tal está no fato de que, quando utilizamos tokens, as operações de leitura e
escrita são realizadas em um registro descentralizado, isto é, uma base de
dados que não necessariamente precisa ser controlada pelo Estado, por seus
delegatários ou por entes privados. Disso decorrem algumas consequências
práticas importantes.
Primeiro, os registros descentralizados podem ter alcance global e supraes-
tatal. Assim, prestar uma garantia para uma operação financeira ou registrar
uma marca tornam-se operações que transcendem fronteiras. O registro de
uma marca ou o depósito de uma patente podem ser feitos uma única vez
e ter validade em todos os países do mundo. Em teoria, uma pessoa pode-
ria dar um imóvel em garantia no Brasil para obter empréstimo junto a um
banco nos Estados Unidos. As ações emitidas por uma companhia norte-
-americana poderiam ser negociadas em quaisquer bolsas no mundo, com a
alteração do registro da propriedade na rede blockchain.
Segundo, a confiança na integridade do registro é mantida pela colaboração
entre todos os participantes na rede e pela existência de algoritmos cripto-
gráficos que permitem a identificação de adulterações, assegurando a imu-
tabilidade dos registros armazenados. Não é mais necessária a presença de
uma autoridade central, pública ou privada, à qual devamos recorrer para
obter uma informação necessária para a realização de uma transação ou o
exercício de um direito.
Terceiro, a transparência que decorre da detenção de cópias dos registros
por alguns ou todos os participantes da rede permite a auditoria das transa-
ções, o que pode facilitar os procedimentos de recuperação de ativos e de
identificação de padrões suspeitos de atuação. Empresas como ChainAnaly-
sis, Elliptic e CipherTrace oferecem serviços de auditoria de registros distri-
buídos para empresas de todo o mundo, a fim de rastrear o fluxo de valores
em casos de fraudes. A transparência nas transações também pode benefi-

relativo aos ativos subjacentes é transferido por meio de derivativo de crédito ou qualquer
outro instrumento que permita tal transferência; (grifei).

297
ISAC COSTA

ciar o processo de formação de preços dos ativos, mitigando assimetrias de


informação envolvendo a pré-negociação e a pós-negociação.
Obviamente, surgem preocupações relevantes quanto à proteção de
dados pessoais e ao sigilo de operações financeiras, mas há mecanismos já
implementados ou em desenvolvimento que permitem conciliar o impera-
tivo de privacidade com a transparência imanente de redes blockchain26.
Quarto, a emissão de tokens faz com que estes já estejam aptos à nego-
ciação em um mercado secundário com uma infraestrutura potencialmente mais
eficiente, viabilizando transações bilaterais entre participantes da rede ou,
então, negociação multilateral por meio de exchanges nas quais o ativo digi-
tal seja listado, à semelhança do que ocorre com os valores mobiliários nos
mercados de bolsa e de balcão. Diante da precária interoperabilidade entre
sistemas de cartórios e de centrais registradoras, constatamos a dificuldade
em negociar duplicatas escriturais, recebíveis de arranjos de pagamentos ou
outros tipos de recebíveis.
No que concerne aos valores mobiliários, convém frisar que sua negocia-
ção pode ocorrer apenas se houver o registro prévio em central depositária,
sendo a B3 a única a prestar esse serviço no Brasil para todos os valores mobi-
liários admitidos pela legislação, impondo custos relevantes em função de
seu monopólio. No momento em que este texto é escrito, além da B3, ape-
nas a empresa Mark2Market (M2M) obteve autorização para manter central

26 
Um estudo sobre as soluções de compromisso envolvendo imutabilidade das redes blo-
ckchain e direito ao esquecimento e transparência versus proteção de dados pessoais é Tatar,
Unal; Gokce, Yasir; Nussbaum, Brian. Law versus technology: Blockhain, GDPR and tough
tradeoffs. Computer Law & Security Review, v. 38, Sep. 2020. Para os autores, o projeto da rede
poderia permitir um escopo reduzido de dados a serem armazenados, segundo a vontade de
cada usuário e, adicionalmente, seria possível assegurar a anonimização de dados para aten-
der aos imperativos de privacidade e segurança. Outra análise sobre o tema, envolvendo a uti-
lização de redes blockchain para sistemas de identidade digital e o enfrentamento de questões
de proteção de dados pessoais, pode ser encontrada em Kondova, Galia; Erbguth, Jörn. Self-
-Sovereign Identity on Public Blockchains and the GDPR. Proceedings of ACM SAC Conference,
Brno, Czech Republic, March 30- April 3, 2020 (SAC’20). Disponível em https://ssrn.com/
abstract=3515213. Acesso em 29 set. 2021.

298
O FUTURO É INFUNGÍVEL: TOKENIZAÇÃO, NON-FUNGIBLE TOKENS (NFTS)…

depositária de certificados de recebíveis do agronegócio em dezembro de


202027.
Existe atualmente uma grande expectativa quanto à possibilidade de
redução de custos de custódia e de compensação e liquidação de operações,
com base em projetos usualmente designados com a sigla “DeFi”, abreviação
de decentralized finance ou, literalmente, finanças descentralizadas28. Embora
as discussões técnicas subjacentes ao tema sejam complexas, a ideiaé relati-
vamente simples: os participantes de um sistema de negociação e registro
de propriedade podem ser nós de uma rede blockchain de modo a permitir o
empréstimo de ativos, a realização de pagamentos, a movimentação de cus-
tódia e a concessão de garantias, dentre outras transações, sem a necessidade
de infraestruturas centralizadas de mercado.
Entretanto, há riscos importantes que precisam ser mitigados no projeto
do registro distribuído. O principal problema está no processo de identifica-
ção dos proprietários dos ativos registrados na rede blockchain. Se a propriedade
se dá por meio de pseudônimos, estamos diante de um mecanismo de títulos
ao portador, criando um terreno fértil para a ocultação de bens, a lavagem de
capitais e o financiamento de atividades ilícitas.
Ademais, torna-se inviável a efetivação de qualquer ato de constrição
patrimonial por parte do Poder Público e, embora a utilização de contratos
eletrônicos programáveis possa facilitar o regime de autotutela privada na
execução de contratos, o uso de pseudônimos pode comprometer a eficiên-
cia econômica pela exigência de garantias excessivas. A rede do Bitcoin per-
mite a realização da pergunta “fulano tem o saldo suficiente para fazer esta
transação?” e do comando “transfira tanto de fulano para ciclano” sem que
se saiba praticamente nada sobre as partes envolvidas e cada participante da
rede possa verificar as transações realizadas. Por isso, não é possível, em prin-

27 
Bertão, Naiara. CVM dá autorização inédita para empresa de tecnologia concorrer com B3
em depósito de ativos. Valor Investe, 8 dez. 2020. Disponível em https://valorinveste.globo.
com/produtos/servicos-financeiros/noticia/2020/12/08/cvm-da-autorizacao-inedita-para-
-empresa-de-tecnologia-concorrer-com-b3-em-deposito-de-ativos.ghtml. Acesso em 22 set.
2021.
28 
Cf. Zetzsche, Dirk A.; ARNER, Douglas W.; Buckley, Ross P. Decentralized Finance (DeFi).
Journal of Financial Regulation, v. 6, n. 2, Sep. 2020. Os autores explicam que não se trata de um
termo técnico ou jurídico, mas sim uma designação de mercado.

299
ISAC COSTA

cípio, saber se alguém detém certo saldo em bitcoins ou quem é o detentor


de determinado saldo, tornando a rede impermeável a qualquer Estado ou
empresa.
Essa opacidade só pode ser mitigada se as transações com os ativos em
uma rede blockchain forem realizadas por meio de ambientes centralizados
de negociação, as chamadas exchanges, o que, em última análise, subverte
o modelo centralizado idealizado pelo criador do Bitcoin. Os Estados têm
imposto deveres de informação para as exchanges, a fim de saber quem são
seus clientes e quais são as operações que realizam, tal como ocorreu no Bra-
sil por meio da Instrução Normativa RFB nº 1.888/2019.
Como já mencionado, a transparência e a rastreabilidade nos registros
distribuídos, ainda que seletiva, representa um desafio para a salvaguarda
de informações sensíveis ou cujo sigilo seja legalmente exigido – lembrando
que, como estamos falando de uma rede global e supraestatal, os requisitos
legais serão diversos em termos de subconjuntos de dados sujeitos a algum
tipo de restrição de acesso. Se, para fins de controle e prevenção à prática
de ilícitos, é necessário ter os dados de quem é o proprietário de determi-
nado ativo registrado na rede blockchain, a presença de cópias destes dados
em tantas mãos, especialmente na hipótese em que todos os participantes
podem ter um registro completo, dificulta o controle de acesso a informa-
ções sensíveis.
Infelizmente, muitos projetos envolvendo criptoativos parecem carecer
de uma função social ou econômica genuína e o modo como algumas redes
são projetadas permite que ocorra a circulação de riqueza sem a identifica-
ção dos beneficiários finais, o que, aliada à elevada volatilidade dos ativos,
acaba criando um ambiente fértil para a concretização de fraudes, para a eva-
são de divisas e também para práticas de lavagem de capitais e financiamento
do terrorismo.
Os crimes preexistem às novas tecnologias e atualmente os criptoati-
vos podem ser utilizados para finalidades lícitas. Quando a internet surgiu,
muito se especulou sobre como a conectividade indiscriminada seria capaz
de potencializar atos ilícitos. Hoje é indiscutível que toda tecnologia traz
riscos, mas os retornos podem ser bastante vantajosos. Precisamos mapear
adequadamente os riscos ao compreender a tecnologia blockchain e dialogar
com os empreendedores e agentes econômicos dispostos a atuar em confor-

300
O FUTURO É INFUNGÍVEL: TOKENIZAÇÃO, NON-FUNGIBLE TOKENS (NFTS)…

midade com a regulação e, ainda, colaborar para a adaptação da regulação


vigente.
Na seção a seguir, descrevemos como foram desenvolvidas diversas apli-
cações de tokens, desde a criação da criptomoeda Bitcoin até a concepção
de tokens não fungíveis, utilizados como certificados negociáveis de proprie-
dade digital em um sistema de registro descentralizado global.

4. Das criptomoedas aos NFTs

Os criptoativos podem desempenhar múltiplas funções: pagamentos,


reserva de valor, aquisição de bens e serviços, contratos de investimento
coletivo, títulos de dívida e até mesmo cestas de ativos. Para isso, existe uma
nomenclatura em torno da qual vem sendo estabelecido um consenso: crip-
tomoedas (cryptocurrencies), utility tokens, security tokens e stablecoins.
Desde o surgimento da rede do Bitcoin, a programação do protocolo
permite a identificação individualizada de cada unidade mínima de negocia-
ção, no caso, 1 satoshi, sendo que 1 bitcoin = 100.000.000 satoshi. Isso quer
dizer que, em última análise, é possível identificar, para cada satoshi emitido,
todos os códigos de endereços de pessoas que algum dia possuíram aquele
satoshi em suas carteiras – é exatamente essa fungibilidade relativa29 que per-
mite o rastreamento de transações em investigações de fraudes, procurando
identificar destinatários de vantagens indevidas. O raciocínio é semelhante
ao de códigos sequenciais em cédulas de papel-moeda, cada uma podendo
ser distinguida da outra. Porém, simultaneamente, as cédulas, assim como os
satoshis e os bitcoins, são intercambiáveis.
Encontramos o conceito legal de fungibilidade no art. 85 do Código Civil
brasileiro: “são fungíveis os móveis que podem substituir-se por outros da
mesma espécie, qualidade e quantidade”. Desde logo, ressalta-se que esta-
mos tratando de bens móveis, caso de valores mobiliários e quaisquer ativos
digitais. A fungibilidade é a propriedade de trocar bens móveis equivalentes
e essa equivalência decorre da coincidência de quantidade e qualidade e,
principalmente, de espécie.

Lielacher, Alex. Crypto’s fungibility problem. Brave New Coin, Aug. 28th, 2019. Disponível
29 

em https://bravenewcoin.com/insights/cryptos-fungibility-problem. Acesso em 30 set. 2021.

301
ISAC COSTA

Um quilo de açúcar pode ser considerado equivalente a outo quilo de


açúcar, sem maiores especificações. Essa equivalência deixa de ser verda-
deira, se passarmos a distinguir o açúcar refinado do açúcar mascavo. Duas
cédulas de R$ 5,00 são equivalentes entre si, ainda que possuam códigos
sequenciais diferentes. No entanto, para um colecionador de moedas, uma
cédula riscada pode não ser equivalente a uma cédula em bom estado de
conservação.
Assim, a fungibilidade é uma questão de grau e, sobretudo, de consenso
das partes envolvidas a respeito da especificidade dos atributos do bem em
questão.
No universo de inúmeros criptoativos, os tokens não fungíveis (NFTs) são,
de forma simplificada, certificados de propriedade digital associados a bens
reais ou puramente virtuais, que podem ser negociados da mesma forma que
outros criptoativos. No entanto, são certificados infungíveis, na medida que
são únicos, isto é, ainda que o conteúdo digital possa ser copiado, é pos-
sível identificar univocamente quem é o proprietário, dentro de uma rede
blokchain, daquele ativo digital, criando uma escassez artificial30.
Em termos técnicos, um NFT nada mais é do que um token registrado em
uma rede blockchain que associa um conteúdo a um proprietário digital31.
Alguns elementos estruturais que um NFT costuma ter são32:

a) Nome;
b) Conteúdo principal e prévia de conteúdo: informações relativas ao
conteúdo representado pelo NFT (uma referência a uma imagem, um
áudio, um vídeo, as coordenadas de uma propriedade etc.);
c) Descrição;
d) Privilégios (perks): uma espécie de recompensa prometida para o
adquirente do NFT;

30 
Cf. Fortnow, Matt; Terry, Quharrisson. The NFT Handbook. How to create, sell and buy
non-fungible tokens. Hoboken: Wiley, 2021, Cap. 2.
31 
Fairfield, Joshua. Tokenized: The Law of Non-Fungible Tokens and Unique Digital Property.
Indiana Law Journal, forthcoming, 2021. Disponível em https://ssrn.com/abstract=3821102.
Acesso em 30 set. 2021.
32 
Fortnow, Matt; Terry, Quharrisson. The NFT Handbook. How to create, sell and buy non-
-fungible tokens. Hoboken: Wiley, 2021, p. 35-42.

302
O FUTURO É INFUNGÍVEL: TOKENIZAÇÃO, NON-FUNGIBLE TOKENS (NFTS)…

e) Descrição de itens físicos, se aplicável;


f ) Atributos: informações adicionais quando o NFT será utilizado em
determinados aplicativos, tais como jogos;
g) Conteúdo exclusivo: informações que só podem ser acessadas pelo
titular do NFT;
h) Royalties: valores a serem pagos para o criador do NFT em cada transa-
ção subsequente;
i) Quantidade ofertada: embora os NFTs sejam únicos, é possível emitir
séries limitadas, com certa quantidade de cópias idênticas.

Com base nas discussões das seções anteriores, é possível perceber que
estamos diante de um sistema alternativo de registro de propriedade, um
sistema transparente, auditável, de escala global e supraestatal, com a possi-
bilidade de negociação com custos potencialmente reduzidos em termos de
segurança e custódia dos títulos digitais. A propriedade de qualquer token
pode ser verificada e alterada por meio de um “cartório” global e descentra-
lizado, garantindo autenticidade, procedência, durabilidade e escassez.
O valor dos NFTs é derivado da percepção de sua escassez pelos poten-
ciais adquirentes, no contexto em que irão ostentar o status de proprietários
desses ativos. Obras de arte, joias, itens colecionáveis e outros bens de luxo
têm seu valor socialmente estabelecido de forma semelhante. Vale pontuar
que o direito de propriedade não é um fim em si mesmo, mas um acesso
específico a determinados recursos ou benefícios socialmente pactuados.
Os NFTs representam uma categoria abstrata de ativos, que podem ter
lastro em bens únicos no mundo real, tais como obras de arte (pinturas,
esculturas, músicas, filmes etc.) ou bens de existência puramente virtual,
como uma mensagem em uma rede social, um vídeo contendo uma jogada
incrível de um jogo de basquete, uma imagem de humor (meme), uma cria-
ção artística sem suporte físico (uma imagem editada, por exemplo), um
fragmento de um código de programação com valor histórico e outros exem-
plos, dentre os que tiveram sua negociação divulgada pela mídia ao longo de
2021, ano em que os NFTs se popularizaram em maior escala.
É forçoso reconhecer que algumas figuras de cachorrinhos, gatinhos ou
animações hoje se encontram tão arraigadas no imaginário coletivo quanto
os mosaicos de Marilyn Monroe ou da Sopa Cambpell de Andy Warhol, para

303
ISAC COSTA

focar em exemplos de pop art. Artistas como Banksy desafiam o modelo padrão
de arte, pintando muros nas ruas, cujas fotos são exibidas em exposições.
O seguinte excerto descreve de forma didática e precisa as funções e van-
tagens da emissão e negociação de NFTs33:
Os NFTs representam uma evolução da propriedade física de um ativo
específico. O token digital inclui um conjunto de informações registradas no
blockchain que representa o ativo vinculado ao token. Com isso, também é
possível identificar com precisão o seu titular, que pode fazer valer os direi-
tos sobre o bem e também optar por trocá-lo. Na prática, os tokens digita-
lizam algo e suas trocas e transferências podem ocorrer com segurança e
sem intermediários. Na verdade, esses ativos digitais podem ser trocados em
mercados especiais, criando assim um processo de tokenização da realidade
para o digital. Todas as informações, procedimentos e negócios podem ser
facilmente rastreados com o apoio do blockchain que permite monitorar a
transferência de propriedade e pagar ao autor original no futuro, se neces-
sário. Os NFTs podem ser usados ​​para criar propriedade digital verificável,
autenticidade, rastreabilidade e segurança, facilmente exploráveis em ​​ dife-
rentes setores e atividades. Isso inclui arte criptográfica, coleções digitais,
jogos online, patentes ou outros direitos de propriedade intelectual, imó-
veis, objetos preciosos, veículos, licenças e documentos financeiros. Os NFTs
são negociados globalmente, uma vez que as plataformas de tecnologia de
razão distribuída operam além das fronteiras.
Uma imagem digital intitulada “Everydays: The First 5000 Days”, criada
pelo artista Beeple foi arrematada por cerca de USD 69 milhões em leilão
conduzido pela Christie’s em março de 2021. A NBA, liga de basquete norte-
-americana, comercializa momentos emocionantes de suas partidas na plata-
forma NBA Top Shots, obtendo uma forma de licenciamento digital bastante
rentável, receita seguida pelas ligas de beisebol e futebol americano (MLB
e NFL, respectivamente)34. Cartões colecionáveis de jogadores de futebol

33 
Eu Blockchain Observatory And Forum. Demystifying NFTs. NFT – Legal Token Clas-
sification Report, 2021. Disponível em https://www.eublockchainforum.eu/events/demysti-
fying-nfts. Acesso em 30 set. 2021.
34 
NFL Anuncia lançamento de plataforma de NFT em parceria com a Dapper Labs. Coin-
telegraph Brasil – Exame, 29 set 2021. Disponível em https://exame.com/future-of-money/nfl-

304
O FUTURO É INFUNGÍVEL: TOKENIZAÇÃO, NON-FUNGIBLE TOKENS (NFTS)…

podem ser negociados na plataforma SoRare (atualmente avaliada em USD


4,3 bilhões)35. Outros ambientes de negociação de NFTs têm se tornado
populares, como é o caso de OpenSea (a maior plataforma em agosto de
2021, com 130 mil usuários), Rarible, KnownOrigin, SuperRare, Mintable,
Nifty Gateway e Binance NFT36. As primeiras plataformas brasileiras tam-
bém começam a surgir, como a 9block37.
Tendo em vista a facilidade com a qual podemos replicar um conteúdo
digital, a existência de um NFT parece um contrassenso. Se qualquer um
pode acessar a imagem, o áudio ou um elemento gráfico em um game ou
outro ambiente virtual, como alguém pode afirmar ser o proprietário
daquele ativo? Esta perplexidade é resultante da percepção usual de que
há valor apenas em bens excludentes, isto é, aqueles bens cuja fruição pode
ser objeto de restrição, uma noção imanente ao direito de propriedade. A
criação de escassez digital pode ser uma aliada de artistas e criadores de
conteúdo, pois permitem a venda direta de seus produtos a interessados e
a eventual repartição de receitas, com elevado grau de desintermediação.
Embora usualmente haja uma identidade entre escassez e exclusão, a
infungibilidade de um bem pode ser fruto de uma narrativa, de um con-
texto no qual, ainda que aquele bem possa ser replicado ou objeto de fruição
simultânea, seu proprietário atribua a ele um valor e, por isso, está disposto
a adquirir o título representativo da propriedade. Logo, é possível haver
escassez sem exclusão, desde que a atribuição de valor, segundo um processo
individual ou coletivo, se dê em um contexto específico.

-anuncia-lancamento-de-plataforma-de-nfts-em-parceria-com-a-dapper-labs/. Acesso em
29 set. 2021.
35 
Ahmed, Murad; Bradshaw, Tim. SoftBank buys into $4bn NFT fantasy football start-up.
Financial Times, Sep. 21st 2021. Disponível em https://www.ft.com/content/9b247322-fc83-
4e7b-bd03-c66eaf1dc762. Acesso em 20 set. 2021.
36 
Haacke, Bruno. 7 plataformas de NFT para você ficar de olho em 2021. Coin Times, 16 jul.
2021. Disponível em https://cointimes.com.br/7-plataformas-nft-para-voce-ficar-de-olho-
-em-2021/. Acesso em 30 set. 2021.
37 
Rubinstein, Gabriel. Plataforma brasileira estreia com Felipe Neto e quer democratizar
NFTs. Exame, 09 jun. 2021. Disponível em https://exame.com/future-of-money/dinheiro-
-tendencias/plataforma-brasileira-estreia-com-felipe-neto-e-quer-democratizar-nfts/.
Acesso em 30 set. 2021.

305
ISAC COSTA

É exatamente o que ocorre com os NFTs. Sua emissão se dá dentro de


ambientes nos quais é possível identificar o proprietário (ou seu pseudô-
nimo), o qual pode ostentar aos demais membros daquela rede o seu status
de detentor daquele certificado único de propriedade digital, podendo usar,
fruir e dispor do respectivo token único e de quaisquer direitos a ele associa-
dos. Jogadores de um game online, por exemplo, podem adquirir NFTs de
artefatos virtuais representados dentro da experiência do jogo e se apresen-
tar, perante os demais jogadores, como o dono daquele artefato (um castelo,
uma arma, um traje etc.). Esses NFTs podem ser negociados até mesmo fora
das respectivas plataformas onde os jogos são executados, passando a ter
liquidez e um mercado secundário para trocas.
Assim, o valor dos NFTs é guiado, inicial e principalmente, pelas empre-
sas responsáveis por controlar o contexto no qual são emitidos, mas, poste-
riormente, se houver um efeito de rede e aumento de liquidez, o valor passa
a ser pautado pela demanda dos interessados e suas expectativas de valoriza-
ção no mercado secundário.
Entendo que esse raciocínio não se aplica a NFTs associados a bens que
existem fora das redes blockchain. Por exemplo, a tokenização de bens corpó-
reos requer a presença de uma entidade capaz de custodiar esses bens, a fim
de manter a conexão entre o mundo real e o mundo virtual, prevenindo a
emissão de múltiplos tokens sobre o mesmo lastro. Dessa premissa decorre
que a total e absoluta descentralização pode ser inviável para certos tipos
de tokens, sendo necessário implementar um controle físico centralizado dos
bens, a fim de assegurar a lisura das transações. Nese sentido, a existência do
lastro e sua integridade são problemas comuns à securitização e à tokenização.
Feita essa ressalva, convém ressaltar que o valor dos NFTs também pode
ser fruto de funções específicas. Por exemplo, é possível programar smart
contracts para pagar valores aos criadores de conteúdo encapsulado no NFT
em cada venda subsequente ou, então, remunerá-los a título de royalties pelo
consumo do conteúdo em plataformas de streaming. Nesse sentido, NFTs
podem ser uma forma interessante de implementar a circulação de direi-
tos relativos à propriedade intelectual. Esses direitos creditórios, por assim
dizer, podem até mesmo ser fracionados e vendidos separadamente.
NFTs também podem ser objeto de “aluguel”. No jogo Axie Infinity, por
exemplo, o ingresso depende da compra de NFTs para que o usuário receba

306
O FUTURO É INFUNGÍVEL: TOKENIZAÇÃO, NON-FUNGIBLE TOKENS (NFTS)…

tokens à medida que completa determinados desafios. Esses tokens podem ser
acumulados para a criação de novos NFTs, os quais podem ser vendidos em
um mercado secundário e, dada a grande popularização do jogo, passaram a
ser negociados intensamente, adquirindo expressão monetária considerável.
Esse modelo de jogo, com apelo financeiro, é designado de “play-to-earn”38.
Como alguns jogadores não dispõem dos recursos para ingressar no jogo,
surgiu um mercado de aluguel de NFTs, à semelhança do que ocorre com
aluguel de carros para motoristas que desejam obter renda extra em aplicati-
vos de transporte individual urbano, mas não dispõem do automóvel. Desse
modo, a lógica de remuneração em tokens do jogo Axie Infinity se tornou
uma forma de obtenção de renda alternativa diante do desemprego gerado
pela pandemia.
A lógica de propriedade e arrendamento pode ser estendida a nomes de
domínio da internet (meusite.com.br), que podem ser negociados via NFT
(a plataforma OpenSea tem uma seção especial para esse tipo de negociação.
Adicionalmente, dada a semelhança com o registro de imóveis, é per-
feitamente possível a utilização de NFTs como certificados de propriedade
imobiliária digital, seja de propriedades inteiras ou de frações ideais. Com
isso, podemos até cogitar do parcelamento virtual de propriedades, sem o
burocrático e custoso desmembramento com o respectivo registro em car-
tório, o que pode ser muito útil em operações envolvendo propriedades
rurais, viabilizando o controle de excedente de reserva legal, parcelas arren-
dadas ou cedidas via direito de superfície e outros mecanismos da legislação
ambiental.
Ainda é cedo para formular juízos definitivos sobre o potencial dos
NFTs39. Certamente, há movimentos especulativos sem fundamentos eco-
nômicos, mas, com o tempo, assim como ocorreu com a própria internet,

38 
Além Do Axie Infinity: 10 games em blockchain para ganhar criptomoedas. Cointelegraph
Brasil – Exame, 29 set. 2021. Disponível em https://exame.com/future-of-money/alem-do-
-axie-infinity-10-games-em-blockchain-para-ganhar-criptomoedas/. Acesso m 29 set. 2021;
Franco, André. Esqueça o bitcoin: NFTs subiram até 11.369%; veja 6 gamecoins promissoras.
Exame, 24 set. 2021. Disponível em https://exame.com/future-of-money/6-gamecoins-pro-
missoras/. Acesso em 30 set. 2021.
39 
Algumas opiniões relevantes no mercado brasileiro podem ser encontradas em Simões,
Luiz Felipe. NFTs: moda passageira ou um novo paradigma de arte e investimento? Estadão,

307
ISAC COSTA

será possível desenvolver aplicações úteis, especialmente para substituir sis-


temas obsoletos de dados relativos a direitos de propriedade e créditos.

5. Howey 4.0: o conceito de valor mobiliário na criptoeconomia

Há milhares de criptoativos em circulação40 e sua qualificação jurídica ainda


é um desafio em todos os países, de modo que não se sabe, a priori, quem é
a entidade responsável por disciplinar os prestadores de serviços, exigir a
prestação de informações e obedecer a comandos do Estado.
No Brasil, o critério de incidência da competência da Comissão de Valo-
res Mobiliários é o conceito de valor mobiliário, trazido no art. 2º da Lei nº
6.385/197641. Além da existência de valores mobiliários por definição legal,
independente de sua essência econômica (caso das ações, debêntures e deri-
vativos, por exemplo), encontramos na lei uma definição material de valor
mobiliário, isto é, um conjunto de elementos normativos que, quando veri-
ficados no caso concreto, justificam a incidência do regime regulatório de
competência da CVM.
Primeiro, é preciso haver um contrato de investimento coletivo, indepen-
dente de forma, por meio do qual investidores aportem dinheiro, bens ou
direitos suscetíveis de avaliação econômica. Esses recursos coletivos serão
reunidos e ficarão à disposição de um empreendedor.

16 set. 2021. Disponível em https://einvestidor.estadao.com.br/comportamento/nfts-moda-


-passageira-ou-novo-paradigma/. Acesso em 30 set. 2021.
40 
Uma das principais fontes de informações sobre cotações e criptoativos em circulação é
a CoinMarketCap – https://coinmarketcap.com/, que também agrega o volume financeiro
negociado nas diversas exchanges.
41 
Tive a oportunidade de detalhar os critérios utilizados para a análise de criptoativos como
security tokens em Costa, Isac. Plunct, plact, zum: Tokens, valores mobiliários e a CVM. Mos-
quera, Roberto Quiroga; Pinto, Alexandre Evaristo; Eroles, Pedro. Criptoativos: estudos
jurídicos, regulatórios e tributários. São Paulo: Quartier Latin, 2021. No prelo. No presente
artigo, além de recapitular algumas das conclusões desse estudo anterior, avanço na análise
da qualificação jurídica de NFTs, um problema que, no momento em que esse texto é escrito,
ainda não foi enfrentado nem pelos reguladores norte-americanos nem pelo regulador brasi-
leiro. O ponto de partida, obviamente, será o conceito de valor mobiliário pela CVM (security,
no caso da SEC e da CFTC).

308
O FUTURO É INFUNGÍVEL: TOKENIZAÇÃO, NON-FUNGIBLE TOKENS (NFTS)…

Segundo, como contrapartida do investimento recebido, o empreende-


dor promete algum tipo de direito econômico ou direito político (de voto),
consubstanciando uma parceira, uma remuneração ou uma participação no
projeto que justificou a captação dos recursos.
Terceiro, os investidores têm a legítima expectativa de que irão obter
o retorno prometido em razão da atuação do empreendedor ou de tercei-
ros por ele designados. Os investidores podem até contribuir, em alguma
medida, para o sucesso do projeto, mas o esforço de terceiros (o empreen-
dedor ou outros) é o fator determinante para o estabelecimento e o desen-
volvimento da relação.
Quarto, esses contratos precisam ser ofertados publicamente, isto é,
investidores devem ser o alvo de atos de distribuição pública, cum conceito
jurídico indeterminado enunciado e exemplificado no art. 19, §§ 1º e 3º da
Lei nº 6.385/197642. Para os fins da discussão aqui proposta, a divulgação
aberta a investidores indiscriminados, por meio da internet, de contratos de
investimento coletivo é considerada oferta pública para os fins da regulação
do mercado de capitais brasileiro43.
Daí a redação do inciso IX do art. 2º da Lei nº 6.385/1976, segundo o qual
são valores mobiliários, “quando ofertados publicamente, quaisquer outros
títulos ou contratos de investimento coletivo, que gerem direito de parti-
cipação, de parceria ou de remuneração, inclusive resultante de prestação
de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de
terceiros”.
A consequência da qualificação jurídica de determinado ativo financeiro
como valor mobiliário é a exigência de registro do emissor e de registro da

42 
Art . 19. [...] § 1º – São atos de distribuição, sujeitos à norma deste artigo, a venda, promessa
de venda, oferta à venda ou subscrição, assim como a aceitação de pedido de venda ou subs-
crição de valores mobiliários, quando os pratiquem a companhia emissora, seus fundadores
ou as pessoas a ela equiparadas. [...] § 3º – Caracterizam a emissão pública: I – a utilização
de listas ou boletins de venda ou subscrição, folhetos, prospectos ou anúncios destinados ao
público; II – a procura de subscritores ou adquirentes para os títulos por meio de emprega-
dos, agentes ou corretores; III – a negociação feita em loja, escritório ou estabelecimento
aberto ao público, ou com a utilização dos serviços públicos de comunicação.
43 
Esse é o entendimento consolidado da CVM, expresso nos Pareceres de Orientação nº 32
e 33/2005.

309
ISAC COSTA

oferta pública (ou dispensa de requisito ou dispensa de registro). Em termos


práticos, isso significa que uma empresa que deseja acessar o mercado de
capitais deve fornecer um conjunto de informações a respeito de sua ati-
vidade, de sua governança, dos fatores de risco envolvendo a sua atividade,
entre outros, a fim de obter um registro de companhia aberta.
Adicionalmente, ao ofertar seus valores mobiliários em mercado, o emis-
sor deve seguir um rito de oferta pública, prestando todas as informações
necessárias para a tomada de decisão pelos investidores, com a intermedia-
ção de instituições integrantes do sistema de distribuição para a colocação
dos valores mobiliários em mercado.
A verificação dos elementos do conceito de valor mobiliário no caso con-
creto levou a CVM – e, nos Estados Unidos, a SEC, ao analisar o conceito
de security – a responsabilizar todas as pessoas e empresas envolvidas em
emissões sem que o registro tivesse sido obtido previamente. A CVM tem
aplicado o chamado teste de Howey, criado pela jurisprudência norte-ame-
ricana, consistindo na busca pelas respostas às seguintes perguntas44: (a) Há
investimento? (b) esse investimento é formalizado por um título, ou por um
contrato? (c) O investimento é coletivo? (d) Alguma forma de remuneração
é oferecida aos investidores? (e) A remuneração oferecida tem origem nos
esforços do empreendedor ou de terceiros?
Esse teste foi desenvolvido para fins de aplicação do conceito de security
trazido no Securities Act de 1933, particularmente no julgamento do caso SEC
vs. Howey & Co. em maio de 194645, de modo a abarcar diversas situações

44 
Processo Administrativo CVM nº RJ2007/11593, Rel Dir. Marcos Barbosa Pinto, j. em
15.01.2008.
45 
“durante cerca de duas décadas, a conceituação de ‘valor mobiliário’ atendeu muito mais
à motivação de apanhar um enorme espectro de contratos de investimento, na tentativa de
proteger a poupança privada através de uma definição bastante aberta e, consequentemente,
abrangente”. Mattos Filho, Ary Oswaldo. Direito dos Valores Mobiliários. v. 1. t. 1. Rio de
Janeiro: FGV, 2015, p. 59 e ss. Descreve o autor que “Este caso diz respeito ao procedimento
de oferta pública de venda de pequenas unidades de terrenos plantados com pés de laranja,
conjuntamente com o oferecimento de um contrato optativo de prestação de serviço para o
cultivo, trato, negociação da produção de laranjas e da remessa do lucro ao proprietário do
imóvel; [...] A distância, a falta de conhecimento especializado, bem como a falta de escala
faziam com que, quase obrigatoriamente, fosse assinado o contrato de prestação de serviços
acoplado ao contrato de venda e compra do lote de terra. O material de venda enfatizava a

310
O FUTURO É INFUNGÍVEL: TOKENIZAÇÃO, NON-FUNGIBLE TOKENS (NFTS)…

que pudessem ser enquadradas na hipótese de incidência trazida na lei e,


com isso, proteger os investidores por meio de filtros de acesso ao mercado,
por empresas, para a captação de recursos.
Ao adaptar o teste de Howey para a análise da qualificação jurídica de ati-
vos digitais, a SEC, nos Estados Unidos, tem considerado como um aspecto
central da oferta do contrato de investimento coletivo a constatação de uma
expectativa, pelos investidores, do esforço de um terceiro, capaz de asse-
gurar os direitos atrelados aos ativos ofertados, que devem consubstanciar
alguma vantagem econômica, um retorno sobre o investimento realizado.
Nesse contexto, a SEC busca a presença de um participante ativo (active par-
ticipant), cuja atuação é determinante para o sucesso do projeto financiado
pela emissão46.
Dessa forma, é preciso verificar quem está por trás das principais decisões
do projeto, da programação dos tokens, dos esforços de divulgação, da manu-
tenção da rede em funcionamento, da gestão dos recursos e sua eventual dis-
tribuição, enfim, quem é responsável pelo sucesso do projeto, a fim de que
este participante ativo fique sujeito a sanções por não ter obtido o registro
prévio de emissor e da oferta pública perante o regulador. Esse raciocínio
já foi utilizado pela CVM ao analisar uma oferta de criptoativos em 202047.
Com base nesses critérios e na descrição das características dos NFTs
mencionadas na seção anterior, podemos especular sobre as dificuldades
para a aplicação do teste de Howey para essa nova categoria de ativos digitais.
O valor de um NFT deriva de um contexto, uma narrativa em torno da
qual seu titular decide se irá adquiri-lo ou vendê-lo. Alguém é responsável
por elaborar essa narrativa e, eventualmente, por manter as condições que
determinam a percepção de valor e a demanda dos interessados. O respon-
sável por este processo pode ser o criador do conteúdo, a plataforma na qual

possibilidade de retorno de 10% ao ano, durante o prazo de vigência do contrato de prestação


de serviços, que era de dez anos”.b
46 
Cf. United States Securities And Exchange Commission. Framework for “Investment
Contract” Analysis of Digital Assets. Washington, Apr. 3rd 2019. Disponível em: https://www.sec.
gov/corpfin/framework-investment-contract-analysis-digital-assets. Acesso em 30 set. 2021.
47 
Processo Administrativo CVM nº 19957.003406/2019-91, Rel. Dir. Gustavo Gonzalez, j. em
27.10.2020.

311
ISAC COSTA

é negociado ou uma empresa que, além de viabilizar a existência de um mer-


cado, agregue criadores de conteúdo.
Desse modo, para determinar a qualificação jurídica de um NFT como
valor mobiliário com base na noção de participante ativo, o primeiro passo
será identificar quem é o responsável ou quem são os corresponsáveis pelo
processo de geração de demanda, para além da atuação dos próprios titula-
res dos NFTs, que, em conjunto, poderão deflagar um efeito de rede que se
destaque das intenções originais de quem emitiu o NFT.
Em seguida, será necessário averiguar quais são os direitos do titular do
NFT, se há direitos econômicos como royalties ou algum tipo de partilha de
recursos em vendas futuras, se a expectativa de retorno sobre o valor inves-
tido decorrerá da mera negociação e passagem do tempo ou de um esforço
ativo para o desenvolvimento desse mercado, ou se haverá pagamentos
de bônus, aluguéis ou outras operações financeiras (pelo seu valor, NFTs
podem ser utilizados como garantias). Ou seja, será imprescindível a análise
casuística da essência econômica da operação, para que se possa averiguar
a existência de uma parceria, participação ou remuneração que decorre do
esforço preponderante de quem emitiu o NFT ou de terceiro.
Nessa etapa do raciocínio, convém frisar que algumas pessoas podem
comprar NFTs pelos mesmos motivos que compram obras de arte ou outros
bens de luxo, como um mecanismo de consumo conspícuo, de ostentação,
sendo a valorização do ativo ao longo do tempo um objetivo mediato ou até
mesmo um efeito colateral positivo bem-vindo, que, no entanto, não foi
determinante para a aquisição. Assim, a ideia de expectativa de retorno de
investimento e o próprio caráter de “investimento coletivo” pode ser colo-
cado em xeque. Já no caso de fracionamento de NFTs para obtenção de par-
celas de rendimentos futuros, a expectativa de retorno pode ser mais proe-
minente, a depender dos demais aspectos do NFT.
Situação interessante envolve NFTs lastreados em imóveis, os quais, à
semelhança dos imóveis negociados tradicionalmente, não são valores mobi-
liários, assim como cotas de condomínio. Porém, se houver oferta pública e
a gestão dos imóveis ficar a cargo do emissor dos NFTs ou de terceiro, esses
tokens podem se aproximar substancialmente de cotas de fundos de investi-
mento imobiliários, no caso, os chamados “fundos de tijolos”. Essas cotas são
valores mobiliários.

312
O FUTURO É INFUNGÍVEL: TOKENIZAÇÃO, NON-FUNGIBLE TOKENS (NFTS)…

No caso de games play-to-earn, surge uma discussão muito interessante:


o esforço que leva à geração de tokens é uma recompensa ao esforço pre-
ponderante do investidor. Cabe à empresa que oferece o jogo viabilizar o
ambiente de sua utilização e as ações de marketing, mas é o “trabalho” do
jogador que irá render frutos, em uma lógica semelhante à de sistemas de
marketing multinível como a Herbalife48. A conduta da empresa que fabrica
o jogo como participante ativa é condição necessária, mas não suficiente e
sequer preponderante para determinar o rendimento que será auferido por
cada jogador. Portanto, os conceitos de “investimento” e de “remuneração
decorrente do esforço de terceiro” se distanciam se sua acepção usual.
A ausência de regulação leva a situações curiosas. Um dos executivos
da plataforma OpenSea negociou NFTs antes de sua ampla divulgação em
destaque para os usuários49, auferindo um lucro significativo em uma espé-
cie de insider trading. Dado que não estamos falando de securities ou valores
mobiliários, não é possível responsabilizar o referido executivo com base na
regulação do mercado de capitais.
No momento em que esse texto é escrito, a insegurança jurídica em torno
da possibilidade de qualificação de um token ou NFT como valor mobiliário
(security) ainda representa um óbice relevante para o desenvolvimento da
criptoeconomia em diversos países.

48 
Uma interessante provocação pode ser encontrada em MADEIRA, Cauê. O que pirâmides,
games, daytrade e NFT têm em comum? Exame, 16 set. 2021: “Para começar, vivemos a gami-
ficação da vida. Se somos todos competitivos por natureza, a internet deu novos contrastes
à busca pelo Santo Graal do sucesso financeiro. A cada dia pipocam gurus de soluções mila-
grosas, dispostos a ensinar atalhos que, na prática, não existem. Recentemente o brasileiro
descobriu o investimento em ações e muitos resolvem arriscar uma entrada no daytrade, essa
modalidade de negociação pela oscilação de preço dos ativos financeiros ao longo do dia. É
uma dinâmica bastante arriscada, e de certa forma é um jogo também. Requer pensamento
lógico, estratégia, uma boa dose de adrenalina e dinheiro para investir. Ao vencedor, multi-
plicadores. Aos perdedores, a chance de queimar uma grana”. Disponível em https://exame.
com/bussola/geekonomy-o-que-piramides-games-daytrade-e-nft-tem-em-comum/. Acesso
em 30 set. 2021.
49 
Murphy, Hannah. OpenSea admits NFT insider’s trading incident. Financial Times, Sep.
15th 2021. Disponível em https://www.ft.com/content/cda0b01f-c027-4a4a-9e29-46c8a60
5954b. Acesso em 30 set. 2021.

313
ISAC COSTA

Síntese conclusiva

Não há sistema econômico em escala e com segurança jurídica sem sistemas


de informação que permitam a pesquisa, a inserção, a atualização e a exclu-
são de dados relacionados aos bens e aos sujeitos de direito.
As tecnologias de registro distribuído, tomadas aqui como sinônimos de
redes blockchain asseguram a imutabilidade do histórico das transações, a
redundância que aumenta a resiliência operacional e a interoperabilidade
entre sistemas dos participantes da rede, bem como a transparência e a ras-
treabilidade das transações, diminuindo assimetrias de informação, com
benefícios em termos de governança e responsabilidade dos participantes.
Tokens são títulos digitais registrados em uma rede blockchain e podem
ser projetados e programados para desempenhar funções de moeda (cript-
pomoedas), aquisição de produtos e serviços (utility tokens ou tokens de
consumo), relações de dívida ou de participação como valores mobiliários
(security tokens), ativos digitais lastreados em outros ativos para maior previ-
sibilidade da flutuação de preços (stablecoins) ou certificados negociáveis de
propriedade digital (non-fungible tokens). A emissão e a circulação de tokens
é governada por regras efetivadas pelo projeto da estrutura desses tokens (os
direitos de seus titulares, as informações nele contidas, as regras de negó-
cio), com a programação da lógica de emissão e circulação.
A tokenização de ativos permite o armazenamento de dados sobre proprie-
dade e circulação em um registro descentralizado, viabilizando sistemas de
alcance global e supraestatal, sendo a integridade dos dados garantida pelos
participantes da rede e não por entes centrais públicos ou privados – o que
permite a superação de gargalos operacionais ou políticos – e, ainda, permi-
tindo a rastreabilidade das transações e a criação de um mercado secundário
para a negociação dos títulos digitais, com potencial redução de custos de
infraestrutura (pagamento, compensação, liquidação e custódia).
Na hipótese de redes blockchain sem algum tipo de controle dos dados
dos participantes, a impossibilidade de identificar os proprietários dos tokens
viabiliza a sua utilização para fins ilícitos. Disso não decorre uma relação
necessária entre criptoativos e fraudes financeiras ou lavagem de capitais.
Os crimes preexistem às tecnologias, as quais propiciam novas formas de

314
O FUTURO É INFUNGÍVEL: TOKENIZAÇÃO, NON-FUNGIBLE TOKENS (NFTS)…

praticá-los, criando novos riscos, que precisam ser enfrentados e sopesados


com os benefícios potenciais e efetivos.
No universo de inúmeros criptoativos, os tokens não fungíveis (NFTs) são,
de forma simplificada, certificados de propriedade digital associados a bens
reais ou puramente virtuais, que podem ser negociados da mesma forma
que outros criptoativos. No entanto, são certificados infungíveis, na medida
que são únicos, isto é, ainda que o conteúdo digital possa ser copiado, é
possível identificar univocamente quem é o proprietário, dentro de uma
rede blokchain, daquele ativo digital, criando uma escassez artificial. Nesse
contexto, a fungibilidade é uma questão de grau e, sobretudo, de consenso
das partes envolvidas a respeito da especificidade dos atributos do bem em
questão.
A criação e circulação de NFTs se dá em um sistema alternativo de regis-
tro de propriedade, transparente, auditável, de escala global e supraestatal,
com a possibilidade de negociação com custos potencialmente reduzidos
em termos de segurança e custódia dos títulos digitais. A propriedade de
qualquer token pode ser verificada e alterada por meio de um “cartório” glo-
bal e descentralizado.
A infungibilidade de um bem pode ser fruto de uma narrativa, de um
contexto no qual, ainda que aquele bem possa ser replicado ou objeto de
fruição simultânea, seu proprietário atribua a ele um valor e, por isso, está
disposto a adquirir o título representativo da propriedade. Logo, é possível
haver escassez sem exclusão, desde que a atribuição de valor, segundo um
processo individual ou coletivo, se dê em um contexto específico.
O valor dos NFTs é guiado, inicial e principalmente, pelas empresas res-
ponsáveis por controlar o contexto no qual são emitidos, mas, posterior-
mente, se houver um efeito de rede e aumento de liquidez, o valor passa a ser
pautado pela demanda dos interessados e suas expectativas de valorização
no mercado secundário.
Enquanto não for editada regulação específica, a análise de NFTs como
valores mobiliários envolverá a aplicação do teste de Howey, que foca na
verificação de oferta pública de ativos para os quais os investidores têm
expectativa de obter rendimentos em virtude do esforço de outrem. Assim,
será preciso identificar quem está por trás da narrativa e do contexto no qual
o NFT é criado, além da inspeção dos direitos conferidos ao seu adquirente,

315
ISAC COSTA

em especial fluxos financeiros em transações futuras ou pagamentos inter-


mediários de bônus, aluguéis ou outras operações.
Se o motivo determinante da aquisição for a posse de um item colecioná-
vel ou a ostentação da propriedade do NFT, a ideia de expectativa de retorno
esmaece, assim como a noção de “investimento coletivo”. Ademais, na hipó-
tese de NFTs representativos de imóveis, dependendo da configuração, a sua
essência pode se aproximar de cotas de fundos de investimentos imobiliários.
No caso de games play-to-earn como o popular Axie Infinity, os conceitos
de “investimento” e de “remuneração decorrente do esforço de terceiro” se
distanciam se sua acepção usual, o esforço que leva à geração de tokens é uma
recompensa ao esforço preponderante do investidor. a conduta da empresa
que fabrica o jogo como participante ativa é condição necessária, mas não
suficiente e sequer preponderante para determinar o rendimento que será
auferido por cada jogador.
Ainda é cedo para formular juízos definitivos sobre o potencial dos NFTs.
Certamente, há movimentos especulativos sem fundamentos econômicos,
mas, com o tempo, assim como ocorreu com a própria internet, será possível
desenvolver aplicações úteis, especialmente para substituir sistemas obsole-
tos de dados relativos a direitos de propriedade e créditos.
Para concluir este texto, reproduzo a lista a seguir, extraída de estudo de
Wang et al.50 para que você possa expandir a pesquisa sobre o tema a partir
de projetos concretos:

Projeto Site

3d punks http://www.3dpunks.com/

Aavegotchi https://aavegotchi.com/

Alien worlds https://alienworlds.io/

Art blocks https://artblocks.io/

Wang, Qin; LI, Rujia; Wang, Qi; Chen, Shiping. Non-Fungible Token (NFT): Overview,
50 

Evaluation, Opportunities and Challenges. Cornell University arXiv:2105.07447v1, 16 May


2021. Disponível em https://arxiv.org/abs/2105.07447. Acesso em 30 set. 2021.

316
O FUTURO É INFUNGÍVEL: TOKENIZAÇÃO, NON-FUNGIBLE TOKENS (NFTS)…

Async art https://async.art/

Axie innity https://axieinfinity.com/

Beeple https://www.beeple-crap.com/

Bored ape yacht club https://boredapeyachtclub.com/#/

Bullrun babes https://opensea.io/collection/bullrunbabestoken

Cargo https://cargo.build/

Chubbies https://chubbies.io/

Coingecko website https://coingecko.com/en

Cometh https://www.cometh.io/

Crypto stamp https://crypto.post.at/

Cryptocats https://cryptocats.thetwentysix.io/

Cryptokitties https://www.cryptokitties.co/

Cryptopunks https://www.larvalabs.com/cryptopunks

Cryptoslam https://cryptoslam.io/

Cryptovoxels https://www.cryptovoxels.com/

Cryptowine https://grap.finance/#/

Dappradar website https://dappradar.com/

Decentraland (mana) https://decentraland.org/

Dego https://dego.finance/

Deipulse website https://defipulse.com/

Ens domains https://app.ens.domains/

Fast box https://www.fastbox.cc/

Flow https://www.onflow.org/

Gods unchanged https://godsunchained.com/

317
ISAC COSTA

Hashmasks https://www.thehashmasks.com/

Icecap https://icecap.diamonds/

Known origin https://www.knownorigin.io/

Makersplace https://makersplace.com/

Meebits https://meebits.larvalabs.com/

Megacryptopolis https://mcp3d.com/

Mintable https://mintable.app/

Mintbase https://www.mintbase.io/

Moon cats rescue https://mooncatrescue.com/

Mycryptoheroes https://www.mycryptoheroes.net/

Nba top shot https://nbatopshot.com/

Nft bank https://nftbank.ai/

Nft box https://nftboxes.io/

Nft diamonds https://nftdiamonds.co/

Nifty gateway https://niftygateway.com/

Nonfungible website https://NonFungible.com

Opensea platform https://opensea.io/

Picasso punks https://opensea.io/collection/picassopunks

Polkamon https://polkamon.com/

R planet https://rplanet.io/

R.a.r.e art lab https://www.lagelnd.com/rare

Rarible https://rarible.com/

Sandbox https://www.sandbox.game/en/

Skyweaver https://www.skyweaver.net/

318
O FUTURO É INFUNGÍVEL: TOKENIZAÇÃO, NON-FUNGIBLE TOKENS (NFTS)…

Somnium space https://somniumspace.com/

Sorare https://sorare.com/

Superrare https://superrare.co/

Topps mlb https://toppsmlb.com/

Tradestars https://tradestars.app/

Trevorjonesart https://www.trevorjonesart.com/

Uno cial punks https://opensea.io/collection/unofficialpunks

Unstoppable domains https://unstoppabledomains.com/

Viv3 https://VIV3.com

Wax: Worldwide asset


https://on.wax.io/wax-io/
exchange

https://github.com/worldwide-asset-exchange/
Wax:worldwide asset exchange
whitepaper

Wiv https://www.wiv.io/

Zora https://zora.co/

Referências bibliográficas

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start-up. Financial Times, Sep. 21st 2021. Disponível em https://www.ft.com/
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legraph Brasil – Exame, 29 set. 2021. Disponível em https://exame.com/future-
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Bertão, Naiara. CVM dá autorização inédita para empresa de tecnologia concorrer
com B3 em depósito de ativos. Valor Investe, 8 dez. 2020. Disponível em https://
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REVISTA DE DIREITO DAS SOCIEDADES E DOS VALORES MOBILIÁRIOS
© Almedina, 2021

COORDENAÇÃO: Grasiela Cerbino, Gustavo Machado Gonzalez e José Romeu Garcia do Amaral,
Erasmo Valladão Azevedo e Novaes França e Nelson Eizirik

ORGANIZAÇÃO: Erik F. Oioli e José Romeu Garcia do Amaral

CONSELHO EDITORIAL: Erasmo Valladão Azevedo e Novaes França, Nelson Eizirik, Otávio Yazbek,
Joseph McCahery, Marcelo Vieira Von Adamek, André Antunes Soares Camargo, Ana Cláudia Karam
Abdallah, Evandro Fernandes Pontes, Erik F. Oioli, Luis André de Moura Azevedo, José Romeu Garcia
do Amaral, Marcelo Godke Veiga, Igor Muniz, Grasiela Cerbino, Gustavo Machado Gonzalez, Luis Felipe
Spinelli, Andre Grunspun Pitta e João Pedro Barroso do Nascimento

DIRETORIA EXECUTIVA: Erik F. Oioli e José Romeu Garcia do Amaral

EQUIPE TÉCNICA: Maria Gabriela Damiani, Leonardo Auriema, Guilherme Gudin, Artur S. Boaretto,
Julia Hebling, Ana Luiza Mendonça e Marília Lopes

DIAGRAMAÇÃO: Almedina

DESIGN DE CAPA: Roberta Bassanetto

ISSN:

Este periódico segue as regras do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990).
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro, protegido por copyright, pode ser reproduzida,
armazenada ou transmitida de alguma forma ou por algum meio, seja eletrônico ou mecânico, inclusive
fotocopia, gravação ou qualquer sistema de armazenagem de informações, sem a permissão expressa e
por escrito da editora.

Dezembro, 2021

EDITORA: Almedina Brasil


Rua José Maria Lisboa, 860, Conj.131 e 132, Jardim Paulista
CEP: 01423-001 São Paulo, Brasil
editora@almedina.com.br
www.almedina.com.br
ÍNDICE

editorial

Mercado de Capitais – A Relevância das Leis 6404 e 6385


Roberto Teixeira da Costa

Breves Notas sobre Brazilian Depositary Receipts (BDR), Lei nº 6.404/76


e Lei nº 6.385/76
Alexandre Costa Rangel

A Intermediação em Mercado Secundário: Transformações


e Desafios Atuais
Aline de Menezes Santos

O Interesse Social das Companhias: Perspectivas e Desafios diante


do Capitalismo de Stakeholders e dos Investimentos ESG
Ana Frazão

A Definição de Companhia Aberta nas Leis nº 6.385/76 e 6.404/76:


Evolução Necessária
André Grunspun Pitta

A Reforma da1 Lei 6.404/1976


Arnoldo Wald

Opção de Venda de Ações no Mercado de Private Equity, art. 1.008


do Código Civil e Sociedade Leonina
Daniel de Avila Vio

3
REVISTA DIREITO DAS SOCIEDADES E VALORES MOBILIÁRIOS

Maximização do Valor das Ações – Operação Neutra em Relação


ao Interesse da Companhia – Abuso do Direito de Voto de Conflito
de Interesses – Benefício Particular e Conflito de Interesses
– Conceitos e Precisões Terminológicas
Erasmo Valladão Azevedo e Novaes França

Esgarçando o Direito Societário


Evandro Fernandes de Pontes

A Remuneração das Debêntures Participativas da Vale


Fábio Ulhoa Coelho

O Conflito de Interesses do Cotista nos Fundos de Investimento


Gabriela Codorniz e Nicole Dyskant

O Futuro é Infungível: Tokenização, Non-Fungible Tokens (NFTS)


e Novos Desafios na Aplicação do Conceito de Valor Mobiliário
Isac Costa

Gestão de Recursos de Terceiros e Fatores ESG (Environmental, Social &


Governance): Riscos, Oportunidades e Desafios para a Construção
de Mandatos de Investimento
Julya Sotto Mayor Wellisch

Synthetic Prime Brokerage e os Limites da Aplicação da Instrução CVM



nº 530/2012 aos Intermediários
Luciana Dias

Duas Questões sobre a Função Social das Companhias


Marcelo Barbosa e Renata Prado Sardenberg

A Nova Regulamentação da CVM sobre Insider Trading – Resolução


CVM 44
Maria Isabel do Prado Bocater

O Perfil do Contencioso Societário Brasileiro: A Predominância


de Ações Anulatórias de Deliberação Assemblear Relativamente
a Ações Indenizatórias
Mariana Pargendler e André Elias Schwartz

Operação de Reorganização Societária Proposta por Acionista


– Possibilidades ainda não Exploradas da Lei nº 6.404/1976
Otavio Yazbek

4
EDITORIAL

5
REVISTA DIREITO DAS SOCIEDADES E VALORES MOBILIÁRIOS

Boa Leitura!

DIRETORIA EXECUTIVA

6
EDITORIAL

SUMÁRIO

1. MERCADO DE CAPITAIS – A RELEVÂNCIA DAS LEIS 6404 E 6385


2. BREVES NOTAS SOBRE BRAZILIAN DEPOSITARY RECEIPTS (BDR), LEI N°6.404/76 E
LEI N° 6.385/76
3. A INTERMEDIAÇÃO EM MERCADO SECUNDÁRIO: TRANSFORMAÇÕES E DESAFIOS
ATUAIS
4. O INTERESSE SOCIAL DAS COMPANHIAS: PERSPECTIVAS E DESAFIOS DIANTE DO
CAPITALISMO DE STAKEHOLDERS E DOS INVESTIMENTOS ESG
5. A DEFINIÇÃO DE COMPANHIA ABERTA NAS LEIS Nº 6.385/76 E 6.404/76: EVOLUÇÃO
NECESSÁRIA
6. A REFORMA DA LEI 6.404/1976
7. OPÇÃO DE VENDA DE AÇÕES NO MERCADO DE PRIVATE EQUITY, ART. 1.008 DO
CÓDIGO CIVIL E SOCIEDADE LEONINA
8. MAXIMIZAÇÃO DO VALOR DAS AÇÕES - OPERAÇÃO NEUTRA EM RELAÇÃO AO
INTERESSE DA COMPANHIA - ABUSO DO DIREITO DE VOTO DE CONFLITO DE
INTERESSES - BENEFÍCIO PARTICULAR E CONFLITO DE INTERESSES - CONCEITOS E
PRECISÕES TERMINOLÓGICAS
9. ESGARÇANDO O DIREITO SOCIETÁRIO
10. A REMUNERAÇÃO DAS DEBÊNTURES PARTICIPATIVAS DA VALE
11. O CONFLITO DE INTERESSES DO COTISTA NOS FUNDOS DE INVESTIMENTO
12. O FUTURO É INFUNGÍVEL: TOKENIZAÇÃO, NON-FUNGIBLE TOKENS (NFTS) E NOVOS
DESAFIOS NA APLICAÇÃO DO CONCEITO DE VALOR MOBILIÁRIO
13. GESTÃO DE RECURSOS DE TERCEIROS E FATORES ESG (ENVIRONMENTAL, SOCIAL
& GOVERNANCE): RISCOS, OPORTUNIDADES E DESAFIOS PARA A CONSTRUÇÃO DE
MANDATOS DE INVESTIMENTO
14. SYNTHETIC PRIME BROKERAGE E OS LIMITES DA APLICAÇÃO DA INSTRUÇÃO CVM Nº
530/2012 AOS INTERMEDIÁRIOS
15. DUAS QUESTÕES SOBRE A FUNÇÃO SOCIAL DAS COMPANHIAS
16. A NOVA REGULAMENTAÇÃO DA CVM SOBRE INSIDER TRADING - RESOLUÇÃO CVM 44

7
REVISTA DIREITO DAS SOCIEDADES E VALORES MOBILIÁRIOS

17. O PERFIL DO CONTENCIOSO SOCIETÁRIO BRASILEIRO: A PREDOMINÂNCIA DE


AÇÕES ANULATÓRIAS DE DELIBERAÇÃO ASSEMBLEAR RELATIVAMENTE A AÇÕES
INDENIZATÓRIAS
18. OPERAÇÃO DE REORGANIZAÇÃO SOCIETÁRIA PROPOSTA POR ACIONISTA –
POSSIBILIDADES AINDA NÃO EXPLORADAS DA LEI Nº 6.404/1976

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