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RECIFE
2017
Orientador:
Prof. Dr. Roberto Antônio Dantas de
Araújo.
Co-orientador:
Prof. MSc. Eduardo Salmar Nogueira e
Taveira
RECIFE
2017
AGRADECIMENTOS
Às minhas duas irmãs, Amélia e Renata, que tanto amo e por ter sido criado
junto com elas na casa de Rio Doce, onde dividimos muitos momentos de felicidade
e onde conheci meus melhores amigos que ficaram para vida inteira: Digo, Paulo
André, Léo, Gilberto, Gabriel e Raphael.
À Renata Cabral, por ter me ajudado a dar sentido e corpo a esse trabalho,
sem a qual dificilmente conseguiria apresentá-lo. Também a Eduardo Salmar, por
delinear as primeiras linhas desse trabalho. A Roberto, meu orientador.
(Bibi Xukuru)
RESUMO
A utilização da terra como matéria prima de construção data de 9000 a.C. e tem
início junto com o desenvolvimento das primeiras cidades. Ainda hoje, considerados
como patrimônio da humanidade pela UNESCO, resistem ao tempo, edificações de
até três mil anos, como o templo de Ramsés II, no Egito, construído com tijolos de
terra crua. O clima foi um fator determinante no surgimento de diversas técnicas e
métodos de utilização da terra nos continentes, também disseminadas para outros
países no período colonial. Deste período, restam edificações oficiais históricas
ainda íntegras no Brasil, destaca-se o uso das técnicas de taipa de mão, taipa de
pilão e tijolos de adobe. O uso da terra como matéria prima para construção caiu em
obsolescência desde o surgimento do concreto. Apesar disso, cerca de 40% da
população mundial ainda vive em moradias construídas com terra, comumente
associadas à cenários de pobreza, porém, ainda conservando a memória construtiva
de séculos. Dessa forma, o presente trabalho, contribui através da elaboração de um
manual de taipa de mão - O Fazer da Taipa, com o compartilhamento de critérios
técnicas para executar a construção de uma edificação duradoura e de qualidade.
Pesquisando indícios da existência dessas edificações, em Pernambuco,
encontramos um levantamento de exemplares históricos, de 1982, o Plano de
Preservação dos Sítios Históricos do Interior - PPSHI –, que trouxe o roteiro a ser
investigado acerca do estado de conservação dessas edificações em taipa de mão.
Lamentavelmente, apenas um exemplar permanecia preservado, ainda que pela
família detentora do patrimônio – O Engenho Juá, Tracunhaém. Na intenção de
contribuir com a permanência e resgate da memória construtiva com terra,
aceitamos um convite do Povo Xukuru – povo indígena situado na Serra do Ororubá,
agreste de Pernambuco – a fim de colaborar com o processo de fortalecimento da
cultura e emancipação indígena Xukuru, que teve sua cultura, praticamente,
dizimada com a chegada dos colonos portugueses em suas terras, em meados e
1680. Para esse resgate, foi usado uma metodologia do arquiteto Hassan Fathy,
registrada no livro Construindo com o Povo: arquitetura para os pobres. O processo
foi autogerido pelo Povo Xukuru, e facilitado por nós, que delineou suas demandas e
suas fontes de orientação. Durante uma das cerimônias religiosas, definiu-se que
seria construída a Casa de Cura - Xeker Jetí – e como seriam seus moldes inéditos:
taipa de mão preenchida com pedras e coberta por palha. Seguiu-se um processo
ABSTRACT
The use of the land as a constructive feedstock goes back as far as 9000 a.C. and
was initiated along with the development of the first cities. Today, regarded by
UNESCO as Humanity’s Heritage, they resist time. Edifications up to three thousand
years, such as Ramses’ II temple, in Egypt, built with raw land made bricks are
exemplary. The weather was a decisive factor in the emergence of various methods
and techniques regarding the use of land in the continents, also disseminated to
other countries in the colonial period. From this period, there are still, intact, official
and historical edifications left in Brazil. From the latter, the use of the vernacular
technique techniques stand out. The use of land as a feedstock for construction,
however, has fallen into obsolescence ever since the emergence of the concrete.
Nevertheless, about 40% of the world’s population still live in houses built with land,
often associated to poverty. Yet, those houses represent the constructive memory of
the centuries. The present work, therefore, contribute, through the elaboration of the
vernacular technique manual – ”O Fazer da Taipa” -, with the sharing of technical
criteria that can subsidize the construction of a long lasting and quality edification.
Researching sings of the existence of those edifications, in Pernambuco, we found a
survey of historical samples, of 1982, the Preservation of Historical Sites in the
Country’s Interior Plan – PPSHI -, that brought the itinerary to be investigated
concerning the state of conservation of those edifications built with taipa de mão.
Regrettably, only one of those exemplary was still preserved, even if only by the
family who own the patrimony. – the Juá’s Sugar Mill, in Tracunhaém. Intending to
contribute for the preservation and to rescue the land’s constructive memory, we
accepted the invitation of the Xukuru Tribe – indigenous tribe located in the Ororubá
Sierra – in order to collaborate with the process of strengthening their culture e and
Xukuru’s emancipation, who had their culture practically decimated when the
Portuguese settlers arrived in their land, around 1680. To accomplish that rescue,
Hassans Fathy’s methodology was used, which the author registered in his work
Construindo com o Povo: arquitetura para os pobres. The process was self managed
by the Xukuru Tribe, and facilitated by us; the people itself elected their own demand
and their guidance sources. During one of the their religious ceremonies the
construction of the ”Casa de Cura” – Xeker Jetí - was defined and also how its
unique mold: vernacular technique filled with rocks e covered with straws. A process
of collaborative construction followed what would become the Xukuru’s traditional
building. Considering the approaches of the present work, we observed the urgent
need for the establishment of protective and conservation policies that effectively
preserve the landmade buildings that still persist in the world, with a zealous look to
Pernambuco’s patrimony that, unfortunately, is gradually being lost. We also
conclude the necessity of the establishment of technical criteria to build vernacular
technique with quality, enabling, thus, the extraction of all its emancipatory potential,
when transmitted and assimilated properly. Finally, registering and adding to the
process of rescuing the constructive memory of a traditional people, the Xukuru
Tribe, we learnt the power of the land.
Keywords: Construction with land. Vernacular techniques. Sugar-mill. Pernambuco.
Rescue. Xukuru.
SUMÁRIO
PREFÁCIO
INTRODUÇÃO ..........................................................................................................15
PARTE I ....................................................................................................................18
PARTE II ...................................................................................................................48
CONCLUSÃO ...........................................................................................................91
GLOSSÁRIO .............................................................................................................97
PREFÁCIO
O interesse pessoal pelo tema surge a partir de vivências com o meu pai,
Antenor Vieira, arquiteto e professor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo
da Universidade Federal de Pernambuco, que defendia, entre outras linhas de
pesquisa, a Arquitetura de Baixo Impacto Ambiental com uso de materiais
tradicionais. Ele projetou, ao lado de Gustavo Bandeira, a reforma do Horto de Dois
Irmãos com edificações construídas através da técnica de solo cimento e tijolos
ecológicos produzidos no local da obra (Fig. 01).
FIGURA 1 – Execução da Reforma do Horto de Dois Irmãos com tijolos de solo
cimento.
Fonte: Acervo pessoal de Antenor Vieira
Ao ingressar no curso Arquitetura e Urbanismo, entrei com um olhar apurado
para o tema e com a ideologia que assimilei do meu pai. No entanto, salvo as aulas
dele, pouco encontro sobre essa tipologia construtiva e, ao contrário do que
esperava, ela parecia não ter espaço dentro do curso de Arquitetura e Urbanismo da
UFPE. Identificada a deficiência acadêmica, estimulei meu pai a repassar seus
conhecimentos acerca do tema e a ministrar cursos sobre construções ecológicas
com terra. Com isso, abrimos um escritório para realizar projetos com esse viés e
tivemos a oportunidade de construir, juntos, uma casa de baixo impacto ambiental,
FIGURA 2 – Detalhe do terraço da casa no FIGURA 3 – Fachada lateral da casa no
Bonsucesso. Bonsucesso.
Fonte: Acervo pessoal. Fonte: Acervo pessoal.
Meu interesse em escrever sobre o tema confirmou-se quando, em março de
2015, desenvolvi o ideário desse trabalho orientado por Eduardo Salmar, detentor da
Cátedra da UNESCO em Arquitetura de Terra e professor da Universidade
Metodista de Piracicaba - UNIMEP. Há cerca de vinte anos, Salmar criou um dos
primeiros laboratórios para estudo da construção com terra no Brasil. Além disso,
desenvolveu metodologias de ensino da arquitetura de terra e é professor da
disciplina de Tecnologia da Construção, na qual seus alunos experimentam métodos
de construção com terra (Fig. 04 e 05).
Salmar também atua construindo edificações com terra, como sua própria
casa, em taipa de pilão, utilizando desenhos contemporâneos (Fig. 06 e 07).
FIGURA 06 – Casa de Eduardo Salmar.
Fonte: Arquivo pessoal do autor.
FIGURA 07 – Casa de Eduardo Salmar.
Fonte: Arquivo pessoal do autor.
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INTRODUÇÃO
O homem, ao deixar de estabelecer seu abrigo nas proteções que a própria
natureza propiciava, como as cavernas, inicia sua trajetória na construção de sua
moradia, apropriando-se, para tal, dos materiais que estavam ao seu redor. Assim,
essas construções refletiam os meios nas quais estavam inseridas, harmonizando-
se com eles. Segundo o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento - CEPED (1984), a
pedra, a madeira e, principalmente, a terra, por ser mais abundante, foram os
materiais que, até pouco tempo, abrigaram a humanidade.
FIGURA 8 – Templo de Ramsés II, no Egito, construído em 1250 a.C. em tijolos de adobe.
Fonte: http://www.kemetmaa.fr (acessado em 03/10/2016)
Como mostra o mapa a seguir (Fig. 9), seja como prática ancestral ou trazida
pela colonização, a construção com terra se faz presente em todos os continentes.
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Como essa é uma atividade que envolve termos técnicos e diversas formas
de construção em terra nem sempre conhecidas, preparamos um Glossário
Ilustrado, apresentado ao final do trabalho e que pode ser consultado à medida que
algumas dessas técnicas forem citadas ao longo do texto.
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PARTE I
CAPÍTULO I - A CONSTRUÇÃO COM TERRA: ENTRE O PASSADO E O
PRESENTE. UMA APROXIMAÇÃO HISTORIOGRÁFICA.
Os mais diversos climas e regiões existentes no planeta nos propiciam um
catálogo de distintas técnicas e métodos que utilizam a terra como material
construtivo. O mapa abaixo mostra os principais focos de desenvolvimento da
construção com terra no mundo e sua expansão para as demais civilizações.
FIGURA 10 – Núcleos de criação e disseminação do desenvolvimento das técnicas de
construção com terra no mundo. Fonte: Obede Faria, adaptado de Meunier (1988).
A África possui um vasto acervo de construções com terra crua, indo de
construções vernáculas, como aldeias, povoados e cidades, a grandes templos e
mesquitas, presentes em praticamente todo o território africano.
De acordo com a interpretação do mapa, compreende-se como locais
difusores, no oeste, a região do Sudão, além do trecho de Djibuti, Etiópia e Somália;
a sul, apresenta-se uma região central, compreendida pela Namíbia, Botsuana,
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FIGURA 11 – Mesquita de Djénne, Mali, construída em adobe em 1280 d.C.
Fonte: https://saoromaomoveis.wordpress.com (acessado em 21/05/2016)
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FIGURA 12 – Cidade de Tomboucto totalmente construída com terra e Mesquita Djénne, Mali.
Fonte: https://weezbo.com (acessado em 21/05/2016)
FIGURA 13 – Preparação da massa para FIGURA 14 – Comunidade em mutirão
revitalização da Mesquita Djénne. rebocando a Mesquita Djénne.
Fonte: http://photos1.blogger.com (acessado em Fonte: https://naturalhistory.si.edu (acessado em
21/05/2016) 21/05/2016)
FIGURA 15 – Kasbah Aït-Ben-Haddou, no Marrocos, construída com taipa de pilão em 757d.C.
Fonte: https://pinterest.com (acessado em 21/05/2016)
resgatadas pelo arquiteto Hassan Fathy, quando contratado para projetar a cidade
de Nova Gourna, no Norte da África.
Como levantado anteriormente, além de grandes cidades e templos, vários
povos e tribos contribuíram para o patrimônio da arquitetura com terra na África.
Cercados por infinitas paisagens semidesérticas com solo alaranjado, ergueram as
mais variadas construções utilizando, como matéria-prima, o seu solo, sua própria
terra. Desenvolveram, assim, seus modelos de habitação de acordo com suas
organizações sociais e, basicamente, utilizaram a terra para construir suas
moradias. Schoenauer (1981) descreve algumas tipologias usadas nessas aldeias,
que parecem surgir da terra como formigueiros, dado o seu grau de interação e
adaptabilidade com o material encontrado no local.
FIGURA 16 – Habitação Luos. Figura 17 – Detalhe construtivo da habitação
Fonte: http://www.johntyman.com (acessado em Luos.
21/05/2016) Fonte: http://www.johntyman.com (acessado em
21/05/2016)
Os Mesaquines Quisar estão localizados no Sudão e, segundo Schoenauer
(1984), vivem do cultivo de variedades de milho. Sua tipologia construtiva consiste
em cinco ou seis cabanas redondas ligadas por muros e dispostas ao redor de um
pátio. Cada módulo possui uma atividade diferente, como dormitório principal,
armazenagem, curral, etc. Os filhos homens dormem em uma espécie de mezanino
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FIGURA 18 – Habitação dos Gurunsi, em Burkina Faso, construída com adobe e
rebocada com barro.
Fonte: https://pinterest.com (acessado em 22/05/2016 )
O autor afirma que o módulo básico desse complexo se forma a partir da
junção de 3 ou 5 cabanas construídas com tijolos de adobe. Essas são agrupadas
de forma geminada na periferia e compõem um labirinto. Por fora, esses complexos
parecem uma fortaleza, pois possuem apenas uma entrada principal que,
normalmente, localiza-se próxima a um Baobá.
Os Dogons, assim como os Gurunsis, vivem em habitações agrupadas umas
às outras (Fig. 19), mas que possuem um formato retangular e não são geminadas.
Trata-se de um grupo de agricultores que vivem próximos às falésias de Bandiagara,
no Mali, e que trabalham de forma coletiva na terra: cada homem tem o direito de
trabalhar algumas parcelas da terra, mas não detém sua posse (SCHOENAUER,
1984).
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FIGURA 19 – Habitação dos Dogons, em Burkina Faso.
Fonte: https://pinterest.com (acessado em 22/05/2016 )
Segundo Schoenauer (1984), os Dogons possuem dois tipos básicos de
aldeia: o meseta, localizado em um terreno mais plano, e o risco, situado nas
escarpas de Bandiagar (Fig. 20 e 21). Essas casas também são construídas com
tijolos de barro e palha secos ao sol.
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FIGURA 20 – Habitação Dogon tipo Meseta. FIGURA 21 – Habitação Dogon tipo Risco.
Fonte: https://pinterest.com (acessado em Fonte: https://pinterest.com (acessado em
22/05/2016 ) 22/05/2016 )
A cozinha, diferente do resto da casa, possui planta circular e é usada nos
tempos de chuva. Essa habitação principal possui teto plano de barro, diverso
daqueles presentes nas outras cabanas com tetos cônicos de palha, de forma que
as vigas e esteio ultrapassam as paredes e servem de andaime para futuros reparos
nas paredes de barro. Da antessala ou cozinha, existe um acesso para ele, que, em
noites muito quentes, serve de dormitório para a família.
Assim como a habitação principal, os lugares de guardar grãos também
possuem teto plano de barro e planta quadrada. No entanto, esses são cobertos por
um telhado cônico de palha. O "cone" é preparado no solo, como um guarda-sol, e,
em seguida, colocado em cima da estrutura.
Esses complexos, segundo Schoenauer (1984), são construídos de forma
agrupada, formando verdadeiros assentamentos. As aldeias maiores são divididas
em dois distritos, cada um com seu centro religioso. Seus pontos mais importantes
são a praça pública e a casa de reunião ou toguna, espécie de casa de governo
onde os homens se reúnem em assembleia presidida pelo ancião da aldeia.
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FIGURA 22 – Cidade de Arg-E-Bam, no Irã, construída com adobe e terra empilhada no séc. I d.C.
Fonte: htpps://icsns.org/ (acessado em 23/05/2016 )
Também no Yemen, encontra-se um vasto patrimônio construído com terra.
Nesse país, localiza-se a cidade de Shibâm, considerada a “Manhattan do deserto”
(Fig. 23) por causa dos seus arranha-céus de 30m de altura, com três a oito
pavimentos totalmente construídos em terra, há cerca de 500 anos. Para alcançar
essa façanha, foram usadas as técnicas de terra empilhada, terra compactada e
tijolos de adobe. Na cidade de Sanaa, encontram-se muralhas em adobe e pedra,
assim como edifícios com três a sete pisos, com 25 a 28m de altura e fundações do
século XIII (Fig. 24).
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FIGURA 23 – Cidade de Shibam, a “Manhattan do deserto”, construída em adobe, no Iêmen do Sul.
Fonte: htpps://ecoeficientes.com.br/ (acessado em 23/05/2016 )
FIGURA 24 – Cidade de Sanaa, construída em adobe, no Iêmen do Sul.
Fonte: htpps://ecoeficientes.com.br/ (acesso em 23/05/2016 )
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FIGURA 25 – Perspectiva de Cointeraux de uma FIGURA 26 – Ilustração do processo construtivo
construção em taipa de pilão. da taipa de pilão.
Fonte: htpps://fr.wikisource.org/ (acesso em Fonte: htpps://fr.wikisource.org/ (acesso em
07/10/2016) 07/10/2016)
FIGURA 27 – Fachada do prédio construído em taipa de pilão no ano de 1828, em Weilburg,
Alemanha.
Fonte: http://www.dachverband-lehm.de/ (acesso em 07/10/2016)
Na América do Norte, destacam-se as regiões do México e sul dos Estados
Unidos, onde se encontram construções de povos tradicionais, como os Pueblos,
sendo os mais conhecidos o Taos Pueblo (Fig. 28) e o Acoma City. Estes consistem,
segundo Schoenauer (1981), em moradias coletivas e semipermanentes, habitadas
por diferentes povos indígenas, tendo a agricultura como atividade principal
desenvolvida pela população local. Essa ocupação consiste em um agrupamento de
várias casas coladas umas sobre as outras, com três a cinco pavimentos, teto plano
e, em geral, dispostas ao redor de um pátio central. As casas são agrupadas
formando um jogo de reentrâncias e saliências no pátio interno e uma verdadeira
muralha na face externa. Schoenauer (1984) afirma que essas construções eram
feitas com barro apiloado, sendo hoje utilizados tijolos de adobe ou pedra.
Tradicionalmente, essas habitações não possuem portas e são acessadas pelos
tetos planos construídos com barro, conforme descreve o autor:
“(...) de uma parede a outra se colocam vigas de madeira de cedro de 30cm de
diâmetro e transversal a essas, pequenas vigas coladas umas as outras. Sobre
essas vigas se coloca uma camada de pedaços de cedro, fibras e ervas para
formar um suporte de 7,5 a 10 cm que será coberto com adobe. (...) o excesso no
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FIGURA 30 – Portal de entrada da cidade de ChanChan maior complexo urbano construído com terra
do mundo, no Peru.
Fonte: http-//www.loveperu.co/ (acessado em 30/10/16)
Percebe-se, nesse breve percurso pela história do uso da terra nos diversos
continentes e nas mais diversas culturas, que o uso da terra foi fruto de uma
adaptação do homem ao meio, visto que algumas técnicas surgem em lugares
diferentes de forma simultânea, como o tijolos de adobe utilizados na América do
Sul, na Ásia e na região do México. Gernot Minke (2015, p. 13) afirma que “em
quase todos os climas quentes, áridos ou temperados a terra sempre prevaleceu
como material mais utilizado para construção”. O autor destaca a grande capacidade
do barro em regular e estabilizar a umidade do ar durante todo o ano, diminuindo
com isso a variação térmica presente na maioria dos climas onde ele foi utilizado.
Além disso, a terra foi empregada de forma requintada em algumas culturas,
como na África e Ásia, para a construção de imponentes edifícios, a exemplo de
mesquitas e templos, perpetuando-se na história desses continentes.
O nosso recorte territorial, isto é, o Brasil, também possui uma história
privilegiada do uso da terra. Seja durante o processo de colonização, quando a
maioria das técnicas foram introduzidas, seja na modernidade, no processo de
apropriação da terra como material de construção no final do século XX; possuímos,
assim, grandes exemplares de arquitetura construída com terra.
A cultura da construção com terra no Brasil inicia-se a partir da colonização,
período em que ocorre a amálgama da forma de construir do europeu com as
técnicas tradicionais do país. Das técnicas de construção com terra, podemos
encontrar, tradicionalmente, no Brasil, as taipas de pilão e de mão e o tijolo de
adobe. A taipa de pilão foi muito usada nas edificações oficiais, como em Casas de
Câmara e Cadeia, enquanto a taipa de mão e os tijolos de adobe, nas edificações
vernáculas.
Por todo o país, observamos expoentes dessa cultura construtiva, como a
cidade de Ouro Preto-MG, permeada por várias casas construídas em taipa de mão,
e Pirenópolis-GO, com um teatro e algumas igrejas construídas em terra.
No estado de São Paulo, quando da interiorização da colonização, por
exemplo, os Bandeiristas utilizaram um método de construção misto, em que foi
empregada a Taipa de Pilão nas paredes externas e a Taipa de Mão nas paredes de
divisão interna dos cômodos. Essas edificações eram muito bem executadas e
muitas continuam conservadas e habitadas até hoje.
Dentre essas edificações, destaca-se a casa do Padre Inácio, patrimônio
nacional, localizada em Cotia, São Paulo, há poucos anos restaurada e em
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Ainda em São Paulo, foi possível localizar o uso misto da taipa de pilão e de
mão nas casas de fazenda do interior do estado. Um dos municípios detentores
desse patrimônio é Itú, onde podemos nos deparar com antigas casas de fazenda
do ciclo do café e em bom estado de conservação, como mostra o levantamento
anterior a esse trabalho, feito pelo autor em 2013 (Fig. 33 á 36).
FIGURA 33 – Primeira casa de fazenda visitada. Itu, São Paulo
Fonte: Acervo pessoal.
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FIGURA 34 –Segunda casa de fazenda visitada.
Fonte: Acervo pessoal.
FIGURA 37 – Detalhe de uma das edificações construídas em tijolos de solo cimento assetados de
topo, nesse caso uma jaula do Horto de Dois Irmãos.
Fonte: Acervo pessoal.
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FIGURA 38 – Casa de taipa feita sem critérios FIGURA 39 – Casa de taipa de mão projetada
técnicos no interior de Pernambuco. por Zanine Caldas, obedecendo alguns critérios
Fonte: Acervo pessoal. técnicos.
Fonte: SILVA (1991)
Por fim, vem a pele do edifício, o barreamento, que também sofre variação de
acordo com a cultura construtiva do lugar. Inicia-se com a mistura da terra e
possíveis aditivos - dependendo da cultura local - com água. Existem vários métodos
de realizar a mistura da massa, tanto manual como mecanicamente. Uma das
formas manuais é feita em cima de uma lona resistente e a mistura acontece pela
pisada de pessoas. Primeiramente, faz-se a mistura da terra com seus aditivos e,
em seguida, com a água, que deve ser colocada aos poucos, à medida que o barro
é pisado. Para se obter uma mistura homogênea, é necessário fazer uma espécie de
"charuto" com a massa, onde a parte de baixo, que pode ainda estar seca, virará
para cima (Fig. 42 e 43) Esse processo deve ser realizado até a completa
homogeneização da mistura.
FIGURA 42 – Mistura sendo feita com os pés. Figura 43 – “Charuto” para homogeneização.
Fonte: Acervo pessoal. Fonte: Acervo pessoal.
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FIGURA 45 – Primeira camada sendo
aplicada durante curso facilitado pelo autor.
Fonte: Acervo pessoal.
Depois, deve ser aplicada uma segunda camada de revestimento que precisa
ter alto grau de impermeabilização. Um dos revestimentos naturais mais eficazes é
uma massa feita com barro e esterco de cavalo misturados e deixados para curtir
em um tonel de 100 litros durante dez dias. Após a cura, a mistura recebe um copo
(200 ml) de óleo de linhaça, quatro litros de grude - feito com trigo ou polvilho - e um
pouco de leite em pó ou soro de leite. Feito isso, ela pode ser aplicada sobre a
parede (Fig. 46).
FIGURA 46 – Segunda camada sendo aplicada
durante curso facilitado pelo autor.
Fonte: Acervo pessoal.
46
Outra forma mais simples é a mistura do barro com o líquido viscoso extraído
da palma, que é um excelente impermeabilizante. Para retirar este líquido, basta
colher algumas palmas, partir em pedaços e deixá-los por alguns dias imersos
dentro da água (NEVES, 2010). Mistura-se, então, essa água com o barro peneirado
e a massa estará pronta para ser usada.
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PARTE II
CAPÍTULO 3 - A CONSTRUÇÃO COM TERRA: ENTRE O PASSADO E O
PRESENTE, UMA APROXIMAÇÃO IN LOCO
Na parte I do trabalho, nos aproximamos, por via de pesquisa historiográfica,
da construção em terra, vista primeiramente como cultura construtiva e, em seguida,
como técnica. Nessa segunda parte, nossa aproximação das construções com terra
ocorre a partir de visitas in loco realizadas em Pernambuco e, em seguida, da
experiência de resgate da cultura construtiva do povo Xukuru do Ororubá, em
Pesqueira-PE.
Nosso olhar para esses dois universos ocorre tanto do ponto de vista da cultura
arquitetônica e construtiva preexistente como da técnica, essa última vivenciada a
partir da experiência de construção, como será visto adiante.
Em Pernambuco, foi encontrado o uso massivo da terra na forma da taipa de
mão nas construções vernaculares, principalmente, no interior do estado, pois a
terra era o material mais abundante. Em seu livro “Os Mocambos do Nordeste”,
Gilberto Freyre cita o uso dessa técnica nas construções dos negros alforriados,
denominadas de Mocambos, normalmente localizadas próximas das Casas
Grandes.
Como visto no capitulo II, muitas vezes por falta de conhecimento técnico, tempo
ou recursos, essas construções encontram-se com péssimo nível de acabamento, o
que faz com que a imagem dessa técnica esteja associada a um baixo
desenvolvimento econômico. Decidimos, assim, pesquisar a existência do uso da
taipa de mão em outros extratos sociais e descobrimos que esse cenário não foi
sempre assim.
O Plano de Preservação dos Sítios Históricos do Interior - PPSHI - , com livro
publicado em 1982, fez o levantamento de importantes exemplares de nossa
arquitetura na área urbana e rural dos municípios interioranos. Dentre os sítios
pesquisados, estão os Engenhos da região da Mata Norte de Pernambuco, alguns
com as Casas Grandes construídas em taipa de mão, na época ainda em bom
estado de conservação. Nesse levantamento, encontramos cinco sedes rurais de
cana de açúcar com sua Casa Grande em taipa de mão. São elas: Engenho
Passassunga, em Bom Jardim; Engenho Junco, em Nazaré da Mata; Engenho
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FIGURA 49 – Mapa do percurso partindo de Recife para levantamento do estado de conservação dos
Engenhos pernambucanos construídos com taipa de mão.
Fonte: Google Earth.
FIGURA 50 – Casa Grande do Engenho Junco FIGURA 51 – Casa Grande do Engenho Junco
construída com taipa. construída com taipa.
Fonte: PPSHI Fonte: PPSHI
FIGURA 52 – Vista geral atual do Engenho FIGURA 53 – Vista atual da capela do Engenho
Junco. Jnco sobre o mesmo ângulo do PPSHI.
Fonte: Acervo pessoal. Fonte: Acervo pessoal.
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FIGURA 57 – Trecho interno em taipa.
Fonte: Acervo pessoal.
Fazenda Cachoeira do Taépe, Surubim
A Casa Grande de Cachoeira do Taépe é um dos grandes exemplares do uso
da taipa em edifícios de grande porte, sendo tombada estadual e nacionalmente. O
PPSHI encontrou a edificação em bom estado de conservação (Fig. 58). Até 2011,
ainda se mantinha íntegra, mas com precária conservação (Fig. 59). Esse descaso
culminou na quase ruína da casa que, segundo placa fixada no local, passou, em
agosto de 2013, por uma “obra emergencial de escoramento, sobrecobertura e
desinfestação” (Fig. 60). Nessa obra, foi feita a estabilização através de escora das
paredes e encapsulamento de sua estrutura a fim de evitar maiores danos. Mesmo
assim, mais de 3 anos depois e, até o presente trabalho, o edifício não passou por
obra de restauro e encontra-se em péssimo nível de conservação. Junto à Casa
Grande, existe uma pequena casa de taipa em bom estado de conservação e ainda
habitada (Fig. 61).
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FIGURA 60 – Escoramento e Sobrecoberta em Figura 61 – Casa de taipa vernácula habitada.
2016. Fonte: Acervo pessoal.
Fonte: Acervo pessoal.
a
FIGURA 62 – Fachada principal da 1 Casa Grande do Engenho Juá
Fonte: Acervo pessoal.
a
FIGURA 63 – Detalhe da janela da 1 Casa Grande do Engenho Juá em março de
2016.
Fonte: Acervo pessoal.
55
a
FIGURA 64 – Fachada posterior da 1 Casa Grande do Engenho Juá em março de 2016.
Fonte: Acervo pessoal.
FIGURA 65 – Fachada principal do Engenho Juá FIGURA 66 – Fachada principal do Engenho Juá em
a
com a 2 Casa Grande ao fundo. marco de 2016.
Fonte: PPSHI. Fonte: Acervo pessoal.
a
a
FIGURA 67 – Fachada principal da 1 Casa FIGURA 68 – Fachada principal da 1 Casa Grande do
Grande do Engenho Juá. Engenho Juá em março de 2016.
Fonte: PPSHI. Fonte: Acervo pessoal
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FIGURA 69 – Vista interior da sala de acesso FIGURA 70 – Vista interior do primeiro
e entrada para capela interna. pavimento.
Fonte: Acervo pessoal. Fonte: Acervo pessoal.
um novo processo de fixação de sua cultura. Por esse motivo, não existem registros
de suas construções tradicionais antes da colonização europeia.
Assim, o processo de resgate que será relatado nesse trabalho diz respeito
ao modo de fazer utilizado pelos Xukuru depois da colonização europeia, pois é o
mais longe na historia que a memória coletiva desse povo consegue alcançar.
FIGURA 75 – Vila de Cimbres, onde se pode notar, em primeiro plano, um muro de tijolos e pedra e
os materiais mais encontrados no território: pedra e barro. Em segundo plano, uma residência
construída no período da colonização europeia.
Fonte: Acervo Pessoal
Na literatura que trata dos métodos construtivos com terra levantada para
este trabalho, não consta essa forma de fazer a taipa. Portanto, os Xukuru são
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O convite foi realizado num cenário onde o povo passa por vários eixos de
resgates da sua cultura, já acontecidos na agricultura, no artesanato, na educação e
agora, inicia-se na forma de construir. Com isso, escutamos suas preocupações
sobre a afirmação de sua cultura tradicional e fomos introduzidos a história desse
povo, contada anteriormente, de forma resumida.
através das casas camponesas, foi imbuído de realizar a construção da vila de Nova
Gourna com grande limitação de tempo e recursos financeiros.
Assim, era necessário que a própria comunidade definisse o que seria afinal
construído afim de com essa tomada de decisão eles se apoderassem, desde o
início, do processo de tomada de decisão participativa.
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FIGURA 76 – Lugar para construção do Xeker Jetí ao lado do terreiro. Nessa foto, Daniel Guimarães
está fazendo o levantamento da área e Thiago França, ao fundo, está na entrada do terreiro.
Fonte: Diana Nobre.
FIGURA 77 – Grupo em conversa com os Xukuru, na qual foi decidido o que seria construído e a
técnica empregada.
Fonte: Acervo pessoal.
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FIGURA 78 – Grupo recolhendo depoimentos na Vila de Cimbres. Nesse caso, com um construtor de
cercas de pedras rejuntadas a seco.
Fonte: Iran Xukuru.
FIGURA 80 – Casa de pedra construída com pedras da região rejuntadas com barro de formigueiro.
Fachada e rebocada com barro de formigueiro e pintada com tinta cal.
Fonte: Acervo pessoal.
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FIGURA 81 – Fachada e lateral da casa de Ninha onde podem ser vistos os estágios
da construção e seu Mané Dez Conto.
Fonte: Daniel Guimarães.
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Ninha, responsável pela construção da sua casa, relatou que gastou apenas
2kg de prego na construção já que a madeira para a taipa foi retirada da mata, o
barro em volta da casa, as pedras espalhadas por perto e a estrutura para o telhado
foi reaproveitada por ele de uma demolição.
Podemos verificar assim, que Ninha estava construindo há 6 anos sua casa
de forma intuitiva, com materiais e técnicas locais. Apesar de ainda não ter sido
concluída, ele já mora lá com sua família - esposa e filho.
FIGURA 83 – Detalhe do reboco de barro feito FIGURA 84 – Detalhe do telhado e do interior da
por Ninha colocado sobre o entramado casa de Ninha.
preenchido com pedras. Fonte: Daniel Guimarães.
Fonte: Daniel Guimarães.
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FIGURA 85 – Índio desenhando uma forma no lugar da construção.
Fonte: Daniel Guimarães.
acatada pelos Xukuru e tal informação nos direcionou durante todo o trabalho. As
lideranças continuaram a consultar a entidade para colher informações e receber
pedidos, como a orientação da entrada para o lado que o sol nasce, ou seja, no
leste.
FIGURA 86 – Desenho de Dona Maria representando a Oca tradicional Xukuru.
Fonte: Acervo pessoal.
Tomando esse desenho como base, partimos para a etapa de projeto, focado
na definição do tamanho da estrutura, inclinação do telhado e dimensão de beirais,
por exemplo, culminando em uma estrutura de 5m de raio com 1,2m de beiral, doze
lados e um pilar central (Fig. 87). Além disso, foi feito o cálculo de toda a estrutura,
definindo quantidade, tamanho e dimensão das peças.
FIGURA 87 – Maquete do Xeker Jetí.
Fonte: Daniel Guimarães.
FIGURA 88 – Pejí utilizado no terreiro da Aldeia Boa Vista
Fonte: Acervo pessoal.
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O partido adotado para tal foi um hexágono com paredes de taipa amarrada
com cipó, preenchida com pedra e barro, por fim, rebocada com barro de formigueiro
(Fig. 89). O telhado foi executado com estrutura recíproca, também amarrada com
cipó, e, na coberta, foi utilizado o sistema de palha-barro-palha (Fig. 90). O processo
de construção envolveu toda a comunidade e, para executar o preenchimento da
taipa com barro, foi feito um grande mutirão, durante um Toré, envolvendo todas as
faixas etárias (Fig. 91). Conseguimos construí-lo em um único dia e isso nos deu
segurança para replicar essas técnicas na obra do Xeker Jeti (Fig. 92).
FIGURA 89 – Preenchimento da taipa sendo feito FIGURA 90 – Crianças colocando barro no teto.
por Seu Mané. Fonte: Daniel Guimarães.
Fonte: Daniel Guimarães.
FIGURA 91 – Pejí sendo rebocado pela comunidade em um mutirão envolvendo todas as faixas
etárias, durante um Toré.
Fonte: Thiago França
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FIGURA 92 – Pejí taipa preenchida com pedras, rebocado com barro e telhado de palha com barro
por cima, finalizado em um dia de trabalho com os Xukuru.
Fonte: Daniel Guimarães.
FIGURA 94 – Retirada consciente de caibros na mata.
Fonte: Daniel Guimarães.
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essa técnica e os próprios indicaram a técnica conhecida por eles, o banho com óleo
queimado, e assim foi feito (Fig. 98 e 99).
FIGURA 98 – Base do pilar sendo pintada com óleo. FIGURA 99 – Pintura a 30cm do nível do
FoNTE: Daniel Guimarães. solo.
Foto: Daniel Guimarães.
FIGURA 100 – Palmeira do coco Catolé de onde foi retirada a palha para cobertura.
Fonte: Daniel Guimarães.
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Essa palha, para garantir uma coberta mais resistente foi virada, como
denominado pelos Xukuru, principalmente, pelas mulheres e crianças, em outro
grande mutirão (Fig. 101). Além disso, as palhas foram amarradas em duplas (Fig.
102) e colocadas com cerca de 10cm de distância umas das outras, garantindo uma
coberta forte e resistente às intempéries.
FIGURA 101 – Palha depois de virada. FIGURA 102 – Palha amarrada em dupla.
Fonte: Acervo Pessoal. Fonte: Acervo Pessoal.
Na etapa de tratamento das madeiras, foi feita a raspagem das peças, para
retirar as cascas, seguida de um tratamento com duas demãos de óleo de linhaça
para hidratação e proteção delas. Foram feitos também os cortes de encaixe das
peças da estrutura de madeira.
ETAPA 1 - Fixação do pilar central, concretando sua base com uma mescla de
cimento, areia e pedra. Esse pilar possui cerca de 45cm de diâmetro e, para seu
erguimento, foi necessário construir uma estrutura auxiliar, onde foram fixadas
roldadas e catracas para sustentar o pilar enquanto era erguido (Fig. 103 e 104).
ETAPA 3 - Com todos os pilares periféricos fixados, foram feitos cortes com
motosserra no topo desses para posterior encaixe das linhas (Fig. 107).
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FIGURA 107 – Corte com motosserra no pilar periférico para encaixe das linhas.
Fonte: Acervo pessoal.
ETAPA 4 - No pilar central, foi feito um entalhe ao longo de todo seu perímetro, com
5cm de profundidade e 10cm de largura, chamado pelos Xukuru de carretel (Fig.
108). No interior desse corte, foram feitos ainda doze rasgos com 5cm de
profundidade para encaixe das “cabeças” das linhas.
FIGURA 108 – Entalhe com formal no pilar central para encaixe das
cabeças das linhas do telhado.
Fonte: Daniel Guimarães.
ETAPA 5 - Colocação das vigas de amarração entre pilares que, assim como os
pilares, tiveram um corte específico para encaixe nos mesmos e foram furadas com
arco de pua - ferramenta manual que substitui a furadeira – e pregadas nos pilares
(Fig. 109).
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ETAPA 6 - A montagem das linhas do telhado, que passou primeiro por um trabalho
de carpintaria, no qual foram feitos quatro cortes em cada peça, sendo eles: macho
para encaixe no pilar central, fêmea para encaixe da mão francesa, fêmea para
encaixe no pilar periférico e corte para encaixe das vigas de borda (Fig. 110 e 111) .
As linhas foram, então, todas montadas na estrutura dos pilares e, posteriormente,
foram encaixadas as vigas de borda.
FIGURA 110 – Corte com enxó para encaixe FIGURA 110 – Corte com enxó para encaixe fêmea
fêmea do pilar periférico. do pilar periférico.
Fonte: Acervo pessoal Fonte: Acervo pessoal.
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FIGURA 112 – Fixação das linhas dos telhado no pilar periférico e ajuste no entalhes.
Fonte: Acervo pessoal..
FIGURA 113 – Fixação das linhas do telhado no pilar central.
Fonte: Acervo pessoal.
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FIGURA 114 – Término do trabalho de fixação das linhas do telhado.
Fonte: Acervo pessoal.
FIGURA 115 – Fixação dos caibros na diagonal. FIGURA 116 – Caibros fixados na diagonal.
Fonte: Daniel Guimarães. Fonte: Daniel Guimarães.
dias de trabalho e foram reunidas pessoas de três aldeias diferentes para sua
realização.
FIGURA 117 – Cobertura com palha sendo executada.
Fonte: Acervo pessoal.
FIGURA 118 – Cobertura com palha sendo executada.
Fonte: Acervo pessoal.
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FIGURA 119 – Cobertura com palha sendo executada.
Fonte: Acervo pessoal.
FIGURA 120 – Entramado feito com esteios de eucalipto, com varas colhidas na mata, amarradas
com cipó de cesto pronto para receber as pedras.
Fonte: Acervo pessoal.
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FIGURA 121 – Pajé Xukuru, Seu Zequinha, prepara cipó de cesto para amarração do entramado da
taipa.
Fonte: Acervo pessoal.
A trama pronta recebeu o preenchimento com pedras soltas entre as varas da
estrutura (Fig. 122), que posteriormente será preenchida e rebocada com barro.
Essa é a grande diferença do método construtivo utilizado pelos Xukuru em relação
as taipas do resto do estado de Pernambuco (Fig. 123).
FIGURA 122 – Parade de taipa recebendo as pedras soltas para posterior preenchimento com barro.
Fonte: Acervo pessoal.
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FIGURA 123 – Xeker Jetí com paredes preenchidas com pedra e fixação dos caibros.
Foto: Acervo pessoal.
FIGURA 124 – Cobertura com palha executada e inicio do barreamento.
Fonte: Acervo pessoal.
encontrado pelo próprio Pajé do povo Xukuru. No entanto, esse barro, segundo os
dizeres do povo, era “chorão”, ou seja, possuía uma grande quantidade de argila e
iria rachar muito depois de seco. De acordo com conhecimento anteriormente
adquirido em práticas anteriores, listados no capitulo dois, adicionamos ao barro
uma quantidade de 1/3 de areia e 1/5 de esterco de cavalo fresco para estabilizá-lo
e mitigar o efeito de retração da argila, alcançando o resultado esperado.
FIGURA 125 – Aspecto da parede de taipa antes de ser preenchida e rebocada com barro. Essa foto
mostra que o barro e a pedra são usados praticamente nas mesmas proporções
Fonte: Acervo pessoal.
FIGURA 126 - Preparação da massa com os pés para posterior barreamento.
Fonte: Acervo pessoal
FIGURA 127 – Reboco sendo feito por Dona Maria, liderança
espiritual.
Fonte: Acervo pessoal.
FIGURA 128 – Reboco sendo feito por um jovem de 17 anos
que costuma construir casas de taipa com o pai.
Fonte: Acervo pessoal.
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FIGURA 129 – Parede de taipa vista pelo lado de dentro, depois do seu exterior ter sido rebocado
com barro de formigueiro.
Fonte: Acervo pessoal.
FIGURA 130 – Xeker Jetí coberto e rebocado após os 40 dias de processo para sua construção.
Fonte: Acervo pessoal.
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CONCLUSÃO
coco catolé. Além disso, eles despertaram para o grande potencial do uso do
eucalipto para construção, transformando a área em uma grande reserva energética
de madeira.
Também são ambientalmente corretas, uma vez que utilizam materiais locais,
dispensando o transporte por longas distâncias, como acontece com os materiais
das construções convencionais. Além disso, nessas técnicas é utilizado o barro em
seu estado cru, ou seja, ele não é queimado como os tijolos de oito furos. Esses dois
fatores fazem com que essas técnicas sejam cada vez mais necessárias na corrida
para alcançarmos um desenvolvimento humano sustentável.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BAHN, Paul G. (dir. Ed.) The Atlas of World Archaeology. London: The Brown
Reference Group plc., 2000.
CAPUTO, Homero Pinto. Mecânica dos solos e suas aplicações. Rio de Janeiro:
1977.
Garzon, Lucia Esperanza. Tecnicas mistas. In: Tecnicas de construção com terra.
(org.) NEVES, Celia; FARIA, Obede Borges. Bauru: FEB-UNESP/PROTERRA, 2011,
p. 62-70.
MINKE, Gernot. Manual de construção com terra: Uma arquitetura sustentável. Sao
Paulo: B4, 2015.
DA SILVA, Suely Ferreira. Zanine: sentir e fazer. São Paulo: Agir, 1991.
VAN LENGEN, Johan. Arquitetura dos índios da Amazônia. São Paulo, B4, 2013.
VARGAS, Milton. Identificação e classificação dos solos. São Paulo: ABCP, 1981.
GLOSSÁRIO
Tijolos de Adobe
O tijolo de adobe é utilizado desde os primórdios da civilização, há, pelo
menos, 10.000 anos, e, segundo Rotondaro (2011), é um dos sistemas construtivos
mais empregados e difundidos no mundo, aproveitado tanto para a alvenaria quanto
para a cobertura das edificações, na forma de abóbodas e cúpulas. Existem
evidências de seu uso nas primeiras cidades e povoados da Mesopotâmia, assim
como em Creta, Egito, Oriente Médio e Sudoeste da Ásia. Como exemplo ancestral
do uso do adobe, temos as cidades de Catal Huyuk, na Turquia, com 8.000 anos,
Ganj-Dareh, no Irã, construída por volta de 7000 a.C, e Uruk, dos Sumérios, com
4.800 anos (ROTONDARO, 2011).
O adobe, segundo Rotondaro (2011), possui inúmeras vantagens no seu uso,
como a facilidade de fabricação; bom isolamento térmico; formas e dimensões
variáveis; grande capacidade de reciclagem; uso de mão de obra não especializada;
diversidade de uso exemplificada em paredes, arcos, abóbodas e cúpulas e imensa
disponibilidade enquanto matéria-prima. Dentre as desvantagens, podemos citar:
baixa resistência à tração e reflexão; esforço humano considerável para fabricação;
necessidade de grandes áreas para produção e estocagem e elevado grau de
porosidade.
Para confecção dos tijolos, usa-se uma massa plástica de barro lançada em
moldes ou formas estocados e secados à sombra. Para seu assentamento, utiliza-se
uma argamassa parecida com a dos tijolos (Fig. 131 e 132).
FIGURA 131: Moldagem dos tijolos de adobes FIGURA 132: Casa construída em adobe em Marizá,
Fonte: Acervo pessoal. Bahia.
Fonte: Acervo pessoal.
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O solo utilizado para confecção dos tijolos de adobe deve ser, segundo
Rotondaro (2011), areno-argiloso com pouco silte. Ainda segundo o autor, se o solo
possuir muita argila, acontecerá retração na massa e, consequentemente, fissuras
nos tijolos ao secar. Se ele tiver alto teor de areia ou silte, faltará coesão interna e a
massa irá desagregar facilmente, diminuindo a resistência à compressão dos blocos.
Existem algumas dissidências em relação à porcentagem do solo, mas a norma
peruana NTE E 080 (SENCICO, 2000), fala em uma composição granulométrica de
argila - 10% a 20%, silte - 15% a 25% e areia - 55% a 70%.
Muitas vezes, adicionam-se alguns estabilizantes na massa com funções
específicas como fibras vegetais, estercos ou pelos de animais, para evitar fissuras
de retração, e emulsão asfáltica, para aumentar o grau de impermeabilização.
O processo de produção dos adobes pode ser dividido em quatro etapas:
preparação da terra e das adições; preparação da massa; moldagem dos adobes;
secagem e armazenamento.
Barro de preenchimento, técnica mista ou Taipa de Mão
A taipa de mão consiste em preenchermos uma trama de madeira ou bambu
com uma massa plástica de barro (Fig. 133). Para isso, é necessário o uso das
mãos (Fig. 134) e, dependendo da trama, duas pessoas preenchendo, ao mesmo
tempo: uma por dentro e outra por fora, fazendo o trabalho no mesmo local e ao
mesmo tempo. Parte do processo pode ser visto nas imagens a seguir, realizadas
durante um Curso de Bioconstrução facilitado pelo autor em Gravatá-PE.
FIGURA 133 – Trama para taipa amarrada com FIGURA 134 – Preenchimento de uma trama
cipó, Gravatá – PE. de taipa.
Fonte: Acervo pessoal. Fonte: Acervo pessoal.
99
FIGURA 135 – Casa construída com cob. FIGURA 136 – Interior de uma casa construída com
Fonte: https:// www.minimalisti.com (acesso Cob.Fonte:https://www.frommoontomoon.blogspot.co
em 04/10/2016) m (acesso em 04/10/2016).
100
FIGURA 137 – Painel de taipa de pilão com FIGURA 138 – Construção com taipa de pilão.
taipal tradicional no Museu da Energia em Itu- Fonte:http://www.recriarcomvoce.com.br
SP. (acesso em 03/10/2016)
Fonte: Acervo pessoal.
FIGURA 139 – Máquinas manuais para FGIRA 140 – Tijolos prensados
prensagem dos tijolos. Fonte: Acervo pessoal.
Fonte: Acervo pessoal.